Você está na página 1de 68

0

UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO


DO RIO GRANDE DO SUL

ALOIS GUILHERME PLETSCH SALDANHA

A CRISE DA EXECUÇÃO PENAL EM FACE DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL


DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE VIDA
DOS ENCARCERADOS NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE

Ijuí (RS)
2019
1

ALOIS GUILHERME PLETSCH SALDANHA

A CRISE DA EXECUÇÃO PENAL EM FACE DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL


DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE VIDA
DOS ENCARCERADOS NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE

Monografia final apresentada ao curso de


Graduação em Direito, requisito parcial para
aprovação no componente curricular Trabalho de
Conclusão de Curso – TCC.
Unijuí – Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul.
DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e
Sociais.

Orientadora: Ma. Eloisa Nair de Andrade Argerich

Ijuí (RS)
2019
2

minha família, pelo carinho e


À compreensão, pelo aprendizado da
humildade e perseverança, pelo amor e dedicação.
3

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço а Deus, que permitiu que tudo isso acontecesse ao


longo da minha vida, não somente nos anos em que fui acadêmico do curso
de Direito, mas em todos os momentos, sendo o maior Mestre que alguém
pode conhecer.

Durante todo o período de elaboração deste estudo contei com a colaboração


de muitas pessoas que merecem, aqui, o meu agradecimento e homenagem.
Em primeiro lugar, agradeço à professora Eloisa Nair de Andrade
Argerich, que não só orientou a minha pesquisa com excelência, como
também serviu de apoio e admiração durante toda a graduação. A você,
Eloísa, serei eternamente grato.

À Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul


(Unijuí), e ao seu corpo docente, direção e administração, que me
oportunizaram a janela de onde vislumbro um vasto horizonte, eivado pela
acendrada confiança no mérito e ética aqui presentes.

Ao Programa “Universidade Para Todos” (ProUni), que me proporcionou


o ingresso no Ensino Superior por meio de bolsa integral de estudos.

À minha mãe, Adriane Isabel Pletsch Martini, que incansavelmente se


dedica à família, e que durante o meu crescimento desempenhou o papel de
mãe e de pai, sendo um exemplo de mulher e um espelho de ser humano que
vislumbro todos os dias.

À minha família, pelo apoio e cooperação recebidos durante o percurso


acadêmico, em especial aos meus tios Julio, Regina e Tânia; aos meus
avós Alois e Maurília; e ao meu irmão Felipe, os quais abrilhantaram meu
caminho e me proporcionaram a força necessária para chegar aqui hoje.

Aos meus amigos, pela resiliência e inúmeras palavras de apoio.

E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha formação, o


meu muito obrigado!
4

“A injustiça em qualquer lugar é uma


ameaça à justiça por toda parte.”

(Martin Luther King Jr.)


5

RESUMO

O presente estudo tem por finalidade analisar e discutir a crise eminente no atual sistema
penitenciário brasileiro, que se caracteriza como um ambiente de violência extrema, de
corrupção e de condições desumanas frente ao princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana. A pena privativa de liberdade, nos dias atuais, é considerada a sanção de maior
representatividade no sistema repressivo – eis que constitui a pena por excelência. Faz
referência a castigo duro e feroz, aplicado ao delinquente enquanto inimigo da sociedade.
Com ela, busca-se corrigir o que parece incorrigível no sistema vigente. A incredulidade no
que tange à busca da reinserção social do apenado como função primordial da pena advém,
em sua grande maioria, da sociedade – a qual ignora as mazelas decorrentes das prisões e não
muda sua perspectiva quanto ao apenado, tratando-o como eterno excluído. Em razão disso, o
atual sistema prisional brasileiro tem se constituído em um paradoxo, pois de um lado
convive-se com uma acentuada escalada da violência e a exigência da população pela
aplicação de penas mais severas; enquanto de outro com a superpopulação e os problemas
enfrentados no cárcere, tais como a divisão entre facções criminosas e grupos sem
faccionamento, estes últimos formados por detentos que estudam, trabalham ou até mesmo
participam de projetos sociais. O Presídio Central de Porto Alegre, anteriormente chamado de
Cadeia Pública de Porto Alegre, foi objeto de uma recente pesquisa divulgada pelo Correio do
Povo (2018), mostrando as diversas faces da prisão e o que ocorre no lado de dentro. Ainda,
no tocante às condições do Presídio Central, é nítida a superlotação carcerária, dividida entre
facções e não facções, o que foge do controle do Estado, sem condições estruturais mínimas
de manutenção da ordem dentre os detentos, que não são ressocializados, retornando piores à
sociedade do que quando ali adentraram. A realidade mostra que o sistema prisional gaúcho
possui sérios problemas, exigindo investimentos por parte do Estado, o que gera a
necessidade de repensar o conceito que se tem sobre a prisão, e trabalhar no sentido de
humanizar o cumprimento da pena.

Palavras-chave: Pena. Sistema Penitenciário Brasileiro. Presídio Central de Porto Alegre.


Dignidade Humana. Direitos Humanos. Ressocialização.
6

ABSTRACT

The purpose of this study is to analyze and discuss the eminent crisis in the current Brazilian
penitentiary system, which is characterized as an environment of extreme violence, corruption
and inhuman conditions against the constitutional principle of the dignity of the human
person. The custodial sentence, nowadays, is considered the sanction of greater
representativeness in the repressive system - this is the penalty par excellence. It refers to hard
and ferocious punishment, applied to the delinquent as an enemy of society. With it, it seeks
to correct what seems incorrigible in the current system. Unbelief in the search for social
reinsertion of the grieving as the primary function of the pen comes, for the most part, from
society - which ignores the evils arising from prisons and does not change its perspective on
the grieving, treating it as eternal excluded . As a result, the present Brazilian prison system
has become a paradox, since on the one hand there is a marked escalation of violence and the
population's demand for more severe sentences; while overpopulation and the problems faced
in jail, such as the division between criminal factions and groups without factions, the latter
formed by prisoners who study, work or even participate in social projects. The Porto Alegre
Central Prison, formerly known as the Public Chain of Porto Alegre, was the subject of a
recent survey released by the Correio do Povo (2018), showing the various faces of the prison
and what happens inside. Still, with regard to the conditions of the Central Prison, the
overcrowding of prisons, divided between factions and non-factions, is clear, which escapes
from the control of the State, without minimum structural conditions of order maintenance
among detainees, who are not re-socialized, returning worse society than when they entered.
The reality shows that the prison system in Rio Grande do Sul has serious problems, requiring
investments by the State, which generates the need to rethink the concept of prison, working
to humanize the fulfillment of the sentence.

Key words: Feather. Brazilian Penitentiary System. Central Prison of Porto Alegre. Human
Dignity. Human Rights. Resocialization.
7

LISTA DAS SIGLAS

CCDH Comissão de Cidadania e Direitos Humanos


CF/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
DEPEN Departamento Penitenciário Nacional
DP Defensoria Pública
DUDH Declaração Universal dos Direitos Humanos
INFOPEN Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias
LEP Lei de Execução Penal
ONU Organização das Nações Unidas
PCPA Presídio Central de Porto Alegre
PLS Projeto de Lei do Senado
PPL Pena Privativa de Liberdade
RE Recurso Extraordinário
STF Supremo Tribunal Federal
SUSEPE Superintendência dos Serviços Penitenciários
8

LISTA DAS FIGURAS

Figura 1. Pessoas privadas de liberdade no Brasil (jun./2016) ................................................. 47


Figura 2. Presos por natureza da prisão e tipo de regime ......................................................... 48
Figura 3. Faixa etária da população carcerária ......................................................................... 49
Figura 4. Raça/cor da população carcerária.............................................................................. 50
Figura 5. Escolaridade da população carcerária ....................................................................... 50
Figura 6. Distribuição do registro dos crimes tentados e consumados no sistema federal ....... 51
9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10

1 ASPECTOS GERAIS DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO .............................. 13


1.1 Origens históricas e evolução da pena de prisão ........................................................... 14
1.2 Evolução do sistema penitenciário no Brasil.................................................................. 17
1.3 A pena privativa de liberdade ......................................................................................... 20
1.3.1 A execução da pena privativa de liberdade .................................................................... 21
1.4 A violação do princípio da dignidade da pessoa humana na pena de prisão .............. 24
1.5 Despersonalização do apenado ........................................................................................ 26

2 A INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL ASSEGURADA


CONSTITUCIONALMENTE AOS PRESOS ..................................................................... 28
2.1 O significado do respeito à integridade física e moral, segundo a Constituição
Federal de 1988 ....................................................................................................................... 28
2.2 O princípio da dignidade da pessoa humana à luz da Execução Penal ....................... 31
2.3 Lei de Execução Penal: aspectos atuais referentes ao cumprimento da pena
privativa de liberdade ............................................................................................................ 34
2.4 A Reforma da Lei de Execução Penal que tramita no Congresso Nacional ............... 37
2.4.1 A visão de juristas brasileiros com relação à Reforma da LEP.................................... 39
2.5 O Garantismo Penal de Luigi Ferrajoli .......................................................................... 42

3 A SITUAÇÃO DO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE:


CONDIÇÕES DOS ENCARCERADOS, SEGUNDO O INFOPEN (2016) ..................... 46
3.1 Situação dos presídios no Brasil: análise de dados ........................................................ 46
3.2 Situação do Presídio Central de Porto Alegre: análise da realidade prisional ........... 52
3.3 Desrespeito à pessoa privada da liberdade como ser humano e a atuação dos
Direitos Humanos ................................................................................................................... 53
3.3.1 Posição da juíza Sonáli da Cruz Zluhan quanto à humanização da pena
privativa de liberdade............................................................................................................... 55
3.3.2 Posição de Sidinei Brzuska, Juiz da Vara de Execuções Criminais de
Porto Alegre ............................................................................................................................. 56
3.3.3 Posição de Alexandre Brandão, dirigente do Núcleo de Defesa em Execução
Penal da Defensoria Pública do RS ........................................................................................ 58

CONCLUSÃO......................................................................................................................... 60

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 63
10

INTRODUÇÃO

Na contemporaneidade, é latente o progressivo agravamento da insegurança e do medo


que afetam diretamente a vida dos cidadãos brasileiros. Por si só isso já impede e dificulta o
exercício de liberdades comuns do dia a dia, atingindo setores que vão desde a economia até a
saúde das pessoas submetidas ao estresse cotidiano originado na violência.

Com o crescimento da população faz-se mister um maior investimento na área de


Segurança Pública. O Estado, porém, enquanto meio garantidor de preceitos fundamentais, ao
não fazer as inovações, mostra-se omisso frente a tais necessidades.

Insta consignar que a repetição de práticas não efetivas, associadas à deficiência de


planejamento e à atuação emergencial, resulta na evidente piora não só das estatísticas, mas,
também, da insegurança daqueles que tentam levar uma vida normal. Isso demonstra que a
falta de políticas públicas abrange a comunidade como um todo.

Passam-se os anos, mudam os governos, mas o cenário é sempre o mesmo: promessas.


Ademais, parece natural que os governantes prefiram priorizar aquilo que é mais aparente,
motivo pelo qual o sistema prisional, invisível à população livre, perde em investimentos para
o policiamento ostensivo. Sabe-se, entretanto, que quanto mais policiais nas ruas, mais espaço
será necessário nos presídios.

O evidente descaso é o responsável direto pelo déficit atual, e comprova que as


grandes prisões brasileiras são carentes de recursos ante a ausência de interesse estatal. Em
consequência, o resultado é visível: degradação humana e indiferença social, já que não se
trata apenas da falta de recursos materiais e humanos, mas, também, de civilidade.
11

Os grandes estabelecimentos prisionais (em especial o Presídio Central de Porto


Alegre, objeto deste estudo), estão se transformando em centros de recrutamento de mão de
obra para o crime. É indubitável que a atuação das facções representa uma lógica de mercado,
eis que os grandes grupos criminosos estão atentos à representatividade desse espaço. O que
se vê é o comando das facções, pois no interior do estabelecimento prisional os detentos são
obrigados a aderir a algum grupo sob pena de vulnerabilidade, discriminação e sofrimento
(agravado).

Muitas investigações terminam dentro das penitenciárias, causando o esgotamento da


atividade policial, pois lhes cabe prender o indivíduo que já está recolhido ao cárcere. As
facções comandam de dentro para fora, o que mostra que o Estado perdeu completamente o
controle, mas ainda não assimilou a lição. Em outras palavras, quem comanda o presídio são
os presos, ou melhor, as facções.

Nesse passo, embora os direitos dos presos tenham atingido status constitucional, a
estrutura processual inviabiliza a sua concessão, pois, como se vê, o atual sistema possui
natureza inquisitiva. O sistema acusatório e garantidor, por mais que instituído pelos diplomas
legais, está omisso na prática. Esta natureza híbrida possui origem na tensão entre jurisdição e
administração, eis que o conflito existente, face às diversas mazelas provindas do sistema
carcerário, segrega a dignidade humana e vai na contramão do sistema processual de
garantias.

É evidente que da perda do direito de ir e vir decorrem inúmeras limitações. Deste


modo, é dever do Estado suprir as necessidades dos detentos, pois, como se sabe, apesar de o
preso possuir sua liberdade restringida, ele não perde (ou não deveria perder) todos os seus
direitos adquiridos enquanto cidadão.

O presente estudo utiliza como referência o Presídio Central de Porto Alegre – modelo
da realidade perversa que abrange as cadeias brasileiras – e busca esclarecer e evidenciar as
mazelas advindas do cárcere brasileiro. Demonstra, também, que o descaso do Estado frente à
situação encontrada afeta diretamente a integridade física e moral dos apenados.

A pesquisa é do tipo exploratória e utiliza, no seu delineamento, a coleta de dados em


fontes bibliográficas, jornais e índices gráficos do Levantamento Nacional de Informações
12

Penitenciárias (Infopen). Com base em tal tema, contou-se com o auxílio das legislações
pertinentes à matéria e com a própria Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
(CF/88). A partir delas é possível perceber a agressão da integridade física e moral dos
apenados face às garantias constitucionais trazidas à baila. Além disso, houve a exploração de
diversas obras de distintos autores, os quais debatem a temática abordada, ampliando o campo
de ideias e configurando-se no corpus da pesquisa realizada.

Inicialmente, o primeiro capítulo faz uma abordagem acerca dos aspectos gerais do
sistema prisional brasileiro, bem como das origens históricas, da evolução da pena de prisão e
do sistema penitenciário no Brasil. Isso possibilita uma melhor compreensão do tema em
discussão, uma vez que o sistema é falho no que diz respeito à integridade física e moral do
apenado.

O segundo capítulo aborda o respeito à integridade física e moral assegurada


constitucionalmente aos presos face à sua relação com os direitos fundamentais. Sua
expressiva importância no cenário da execução penal tem despertado muitas críticas e debates
quanto à violação da integridade física, psíquica e moral dos apenados.

Por fim, o terceiro capítulo busca especificar as condições de vida dos encarcerados no
Presídio Central de Porto Alegre e tecer algumas considerações sobre a situação dos presídios
no Brasil, tudo isso face ao desrespeito à pessoa privada de liberdade como ser humano e a
atuação dos Direitos Humanos. Como subsídio, o estudo conta com os dados do
Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) e dos relatos de autoridades
que trabalham diretamente com o referido estabelecimento prisional, a fim de esclarecer as
mazelas impostas aos encarcerados.
13

1 ASPECTOS GERAIS DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO

Cabe, inicialmente, tecer algumas considerações acerca do disposto no art. 5º, XLIX,
da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), que assim expressa: “é
assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral.” Na contemporaneidade,
todavia, não é exatamente isso que acontece. Há uma inegável discrepância entre a realidade
prisional e o que é preconizado pela legislação. A falta de políticas públicas e o descaso com
as normas existentes fazem com que a ressocialização não aconteça, e que ao cumprir sua
pena, o apenado deixe o presídio muito pior do que quando ingressou.

Ao declarar o respeito à integridade física e moral dos presos, o texto constitucional


observa que lhes é assegurada a conservação de todos os direitos reconhecidos à pessoa em
liberdade, exceto, é claro, daqueles que são incompatíveis com a condição peculiar de uma
pessoa encarcerada, como a liberdade de locomoção (art. 5º, XV), o livre exercício de
qualquer profissão ou ofício (art. 5º, XIII), o exercício dos direitos políticos (art.15, III) e a
inviolabilidade domiciliar com relação à cela (art. 5º, XI), entre outros. Aos presos são
garantidos, porém, os demais direitos e garantias fundamentais, tais como o direito à liberdade
religiosa (art. 5º, VI), o direito à vida e à dignidade humana (MORAES, 2005).

É indubitável que tanto o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, como o
Pacto de São José da Costa Rica, em seus arts. 10 e 5º, respectivamente, consagram regras
protetivas aos direitos dos presos, garantindo-lhes um tratamento digno inerente à pessoa
humana. Neste sentido, dispõe o art. 10 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos:

1. Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e
respeito à dignidade inerente à pessoa humana.
2. a) As pessoas processadas deverão ser separadas, salvo em circunstâncias
excepcionais, das pessoas condenadas e receber tratamento distinto, condizente com
sua condição de pessoa não-condenada; b) As pessoas processadas, jovens, deverão
ser separadas das adultas e julgadas o mais rápido possível.
3. O regime penitenciário consistirá num tratamento cujo objetivo principal seja a
reforma e a reabilitação normal dos prisioneiros. Os delinqüentes juvenis deverão
ser separados dos adultos e receber tratamento condizente com sua idade e condição
jurídica. (BRASIL, 1992a).

Na mesma direção seguem as recomendações do Pacto de São José da Costa Rica,


promulgado pelo Estado brasileiro, em 1992, ao tratar do direito à integridade no seu art. 5º:
14

1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral.
[...]
4. Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias
excepcionais, e devem ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de
pessoas não condenadas.
5. Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e
conduzidos a tribunal especializado, com a maior rapidez possível, para seu
tratamento.
6. As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a
readaptação social dos condenados. (BRASIL, 1992b).

Percebe-se, assim, que a questão relativa ao respeito à integridade do preso tem sido
alvo de muitos debates e sensacionalismos, já que a mídia tem dado especial atenção às
mazelas do sistema prisional, principalmente quando ocorrem rebeliões, fugas ou motins.

Especificamente em relação à divulgação da imagem de pessoas presas, o que se vê


no dia a dia é uma crescente degradação da imagem e da honra produzida pelos
meios de comunicação de massa, que reproduzem a imagem do preso sem que haja
prévia autorização do preso, tampouco um fim social na sua exibição. Utilizam sua
imagem, pois, como produto da notícia, a fim de saciar a curiosidade do povo
(BUCCI, 2003, p. 156).

Com efeito, a CF/88, ao assegurar ao preso o direito à integridade física e moral, não
dá à sociedade o direito de subtrair os seus direitos constitucionais. Nesse sentido, esclarece
Adauto Suannes (2004, p. 181) que:

[...] a condição de cidadão preso não lhe retira o direito ao respeito à integridade
moral e à dignidade. Seus direitos personalíssimos devem ser tutelados de forma
mais eficaz, não só por jornalistas, como também por autoridades policiais e
membros do Ministério Público, que devem se abster de exibir presos à mídia.

De modo semelhante, a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984),


assegura ao preso, no seu art. 40, “[...] o respeito à integridade física e moral dos condenados
e dos presos provisórios.” À luz dessas considerações, passa-se a abordar aspectos pertinentes
ao tema que ora se expõe a fim de provocar uma reflexão mais pontal acerca da crise no
sistema prisional.

1.1 Origens históricas e evolução da pena de prisão

É imprescindível, antes de abordar aspectos gerais do sistema prisional brasileiro,


assinalar que a prática punitiva no decorrer da História da humanidade passou por inúmeras
transformações, variando de acordo com a realidade econômica, política e social vigente no
15

país. Isso demonstra que o regramento jurídico na área penal movimenta-se de tal forma que é
possível identificar os sistemas de punição existentes desde os tempos mais remotos.

Isso posto, em um primeiro momento estuda-se as origens históricas, a evolução da


pena de prisão e do sistema penitenciário brasileiro, o que possibilita melhor compreensão do
tema em discussão, uma vez que hoje há um sistema falho no que diz respeito à integridade
física e moral do apenado.

Na contemporaneidade, os termos pena e prisão são utilizados de forma conectada,


apesar de diferenciados e constituírem temas polêmicos e complexos na seara do Direito
Penal e Processual Penal. Sob o aspecto histórico, percebe-se que ambos se relacionam com o
direito de punir – poder-dever de punir – titularizado pelo Estado, que visa pôr fim aos
conflitos de interesses, declarando a vontade do ordenamento jurídico ao caso concreto.

A fim de melhor clarificar a punição aplicada pelo Estado e compreender a origem do


direito soberano de punir, bem como o seu fundamento, Fernando Antônio Sodré de Oliveira
(2012, p. 122) utiliza as lições de Hobbes: “[...] o direito de punir não tem origem no pacto.
Sua origem está no estado de natureza, pois no momento em que todos resolveram resignar
seu direito a todas as coisas, renunciam também a esse direito.” Isso significa que o direito de
punir, segundo Hobbes, para ser legitimado, precisa respeitar não só as leis naturais, mas
atender o bem comum.

Em consequência do direito de punir, surge a necessidade de leis que asseguram


apenas ao Estado o direito e o controle das condutas desviantes do bem comum, evitando a
vingança privada (justiça pelas próprias mãos) (OLIVEIRA, 2012).

Há, contudo, uma pergunta de maior importância que é mister responder, a saber: qual
o significado do termo pena? No entendimento de Odete Maria de Oliveira (1984, p. 2),
“etimologicamente, o termo pena procede do latim (poena), porém, com derivação do grego
(poine) significando dor, castigo, punição, expiação, penitência, sofrimento, trabalho, fadiga,
submissão, vingança e recompensa.” Observa-se, portanto, que o termo pena tem o
significado semelhante em qualquer idioma, enquanto a sua função repressiva mostra as
extintas fases, que variam de cultura para cultura.
16

A primeira fase da pena ocorreu, segundo Oliveira (1984, p. 3), por meio da vingança
individual, considerada “[...] a forma mais remota da manifestação da pena”, ou seja, “a
satisfação do lesado contra quem lhe causara um mal.” Isso ocorria porque naquele tempo não
havia autoridade soberana e competente com o direito de punir.

Já a segunda fase da pena, na percepção de Oliveira (1984, p. 3), surgiu com a


organização ainda primitiva do clã e do grupo que, “[...] imbuídos de um espírito de
solidariedade e interesse comum na proteção da coletividade, se colocava ao lado do
vingador, exercendo uma vingança coletiva e singular, manifestada de forma ilimitada, com
excessos, sem sistema nem lógica.”

Na verdade, tanto a vingança individual como a coletiva visava satisfazer o interesse


do lesado que, na verdade, manifestava-se como uma pena, sem, contudo, estar baseada em
regras e num sistema punitivo garantido pelo ordenamento jurídico.

Nesse contexto, surgiu a vingança da Paz Social que, segundo Oliveira (1984, p. 4),
pode ser assim descrita:

Com o aparecimento da sociedade da estrutura familiar, a penalidade se expressava


sob a forma da privação da paz social. O membro do mesmo grupo que cometia um
delito era expulso da tribo, ou da comunidade da paz, sem armas nem alimentos e
ninguém podia auxiliá-lo, mas persegui-lo. Era atingido, também, seu patrimônio.

Outro tipo de pena surgida no Período Neolítico, ou seja, na segunda Idade da Pedra,
introduziu a vingança limitada e do Talião Material, o que representou uma grande conquista,
“[...] pois estabelecia uma proporcionalidade entre ação e a reação do delito cometido e da
pena imposta.” Conforme Oliveira (1984, p. 4), passou-se do período da vingança ilimitada
para a vingança limitada, ou seja, a retribuição do dano praticado pelo delinquente era de
igual com igual, aplicando-se o famoso princípio de Talião: “olho por olho, dente por dente”.

No Brasil, a pena se encontrava inserida nas Ordenações Filipinas, as quais vigoraram


até o advento do primeiro Código Criminal do Império, em 1830, e era dominada por um total
sentimento de vingança. Com o desenvolvimento da própria sociedade e com o evoluir da
civilização, outros valores relacionados a esse tipo de vingança foram surgindo, de modo que
não mais se aceitava que o direito e a religião continuassem sendo analisados como um só,
pois a autoridade pública precisava ser fortalecida (OLIVEIRA, 1984).
17

Muitos outros aspectos relacionados à pena poderiam ser objeto deste estudo, porém, o
que interessa é compreender como a pena tornou-se proporcional ao crime, ou seja, como
surgiu a moderação das punições. Várias teorias sustentam a justiça penal, todavia, o novo
direito não poderia mais manter a vingança suprema do soberano, mas, sim, estender-se à
defesa da sociedade, abandonando seu caráter retributivo, atenuando a punição e formando
um consenso a respeito da prevenção do delito (OLIVEIRA, 1984).

Observa-se do estudo evolutivo da pena, que em todas as épocas, com suas


diferentes civilizações, sempre houve uma grande variedade de punições e uma
diversidade abundante de instrumentos para executá-las. As mais elementares
formas de punições eram sempre cruéis, selvagens e desumanas e de incrível
ferocidade, refletindo os costumes punitivos de cada organização social e a
formação cultural de cada povo. (OLIVEIRA, 1984, p. 27).

Após descrever sucintamente a origem histórica e a evolução da pena de prisão no


Brasil, passa-se, a seguir, a discorrer sobre a evolução do sistema penitenciário no país.

1.2 Evolução do sistema penitenciário no Brasil

A evolução do sistema prisional brasileiro pode ser analisada a partir de dois enfoques:
o primeiro relaciona-se à política criminal aplicada no Brasil e os aspectos negativos
existentes nas prisões brasileiras. Marisa Bueno e Rogério Maia Garcia (2006, p. 51) afirmam
nesse sentido que:

[...] a crescente produção legislativa, resultado da reação simbólica estatal, com


intuito de acalmar a população, que, instigada pela mídia, exige uma postura
imediata frente à crescente criminalidade, fazendo surgir, assim, um direito penal de
emergência.

O sistema penitenciário brasileiro tem sido marcado por episódios que realçam a falta
de políticas públicas na área penal e o descaso com um novo modelo prisional que promova a
reintegração do apenado à sociedade após o cumprimento de sua pena.

O segundo ponto a ser analisado diz respeito aos aspectos negativos das penitenciárias
brasileiras, que são consequência de uma política criminal desatenta e inconsequente.
Percebe-se que tanto o Legislativo como o Executivo quer dar uma resposta rápida à
sociedade, encarcerando todos aqueles que cometem delitos. Muitas vezes, porém,
desrespeitam a segurança do acusado e a garantia do devido processo legal, utilizando-se do
18

mau uso do poder como forma de punir, e de um sistema prisional desestruturado, com penas
desproporcionais e um ambiente prisional que viola a dignidade humana.

Necessário se faz descrever, então, mesmo que suscintamente, os sistemas


penitenciários existentes na atualidade, a fim de verificar aquele que mais se adapta à
realidade brasileira. Segundo entendimento de Ana Elise Bernal Machado, Ana Paula dos
Reis Souza e Mariani Cristina de Souza (2013, p. 3) quanto à execução das penas privativas
de liberdade, existem três sistemas penitenciários: “o sistema Filadélfia (ou celular), o de
Auburn (silent system) e, por fim, o sistema Progressivo (inglês ou irlandês).”

O sistema que mais se aproxima do adotado pelo Brasil é o progressivo, embora com
algumas modificações. Esse sistema “surgiu na Inglaterra no século XIX e considerava o
comportamento e aproveitamento do preso, verificados por suas boas condutas e trabalho
[...]” (MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013, p. 3).

Segundo o art. 32 do Código Penal, existem três penas no Brasil: I – pena privativa de
liberdade; II – pena restritiva de direitos; III – pena de multa, o que permite entender que a
legitimidade social da prisão se dá para melhor controlar a população carcerária
(MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013, p. 4).

Relativo à legitimidade social da prisão, assinala-se que no início do século XX


surgiram tipos modernos de prisões, ou seja, adequados à qualificação dos presos, segundo
determinada categoria. Essas categorias criminais referem-se às contravenções, aos menores,
aos processados e mulheres.

Não se objetiva, porém, adentrar nas diversas categorias criminais para legitimidade
da prisão, pois o que interessa a esta pesquisa é verificar como a realidade prisional se
apresenta em face dos antecedentes e grau de criminalidade do condenado, bem como em
relação à sua índole, caráter e periculosidade.

O sistema prisional brasileiro encontra-se em estado precário, sendo que o ponto mais
grave diz respeito à falta de investimentos e ao descaso do poder público. Isso demonstra que
o sistema que deveria se tornar um instrumento de substituição de penas desumanas não tem
desempenhado o seu papel, tornando-se uma “escola de aperfeiçoamento de criminosos”, haja
19

vista seus espaços insalubres e inadequados, que violam a integridade, tanto física quanto
moral dos apenados (MACHADO; SOUZA; SOUZA, 2013).

Nota-se que o sistema prisional brasileiro, com a superpopulação dos presídios, viola o
art. 5º, XLIX, da CF/88, que diz: “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e
moral”, mostrando mais uma vez que as autoridades públicas agem como se nada estivesse
acontecendo no cárcere brasileiro (BRASIL, 1988).

Vale lembrar o que diz a Lei de Execução Penal, em seu art. 88, parágrafo único:

O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho


sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e
condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados). (BRASIL, 1984).

De acordo com dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen),


existe um déficit muito grande de vagas em todo país, ou seja, o número de vagas existente é
de 368.049 em todo país, sendo que há hoje 726.712 presos, demonstrando que o déficit de
vagas é em torno de 358.663 (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Tais dados indicam que o sistema carcerário encontra-se em crise, e urge que o poder
público tome providências para amenizar esse problema, sob pena de sofrer um colapso e
haver rebeliões nas prisões brasileiras, inclusive no Presídio Central de Porto Alegre, que é
objeto de análise nesta pesquisa.

Apesar do descaso e das falhas nos sistemas carcerários, existem excelentes projetos
em alguns Estados com a finalidade de ressocializar o apenado, a exemplo do projeto adotado
na Bahia – o “Programa Educar para Reintegrar”, cuja finalidade é a alfabetização dos
apenados, possibilitando-lhes não apenas a formação pedagógica, mas uma melhoria
terapêutica (SANTOS, 2011).

Sendo assim, percebe-se que a superlotação das penitenciárias, com o déficit de vagas
apresentado anteriormente, viola efetivamente as normas e princípios constitucionais,
notadamente no que diz respeito aos detentos e à sua dignidade.
20

1.3 A pena privativa de liberdade

De início, cabe frisar que o Estado é a única entidade de poder soberano, de modo que
é o titular exclusivo do direito de punir (por muitos chamado de “poder-dever de punir”). Este
direito de punir é genérico e impessoal, eis que não se dirige especificamente contra esta ou
aquela pessoa, mas à coletividade como um todo. Trata-se, portanto, de um poder abstrato de
punir qualquer um que venha a praticar fato de infração penal (CAPEZ, 2013).

Desde o surgimento da sociedade, em razão dos conflitos ocasionados pelo convívio


social, fez-se necessária a criação de leis e a imposição de sanção para que elas fossem
respeitadas. Assim, conforme Cesare Bonesana Beccaria (2000, p. 41), “[...] as leis são
condições sob as quais homens independentes e isolados se uniram em sociedades, cansados
de viver em contínuo estado de guerra e de gozar de uma liberdade inútil pela incerteza de sua
conservação.”

Criou-se, então, a pena privativa de liberdade com o intuito de impedir que o


delinquente pratique novos delitos ou que outros cidadãos também os pratiquem. Objetivou-
se, outrossim, a reinserção social do apenado, de modo a integrar novamente a sociedade em
melhores condições após o cumprimento da pena.

O Código Penal brasileiro, em seu art. 33, caput, prevê duas espécies de pena privativa
de liberdade: a reclusão e detenção. A princípio, não há diferença entre a pena de reclusão e a
de detenção, todavia, elas existem, mesmo que poucas. Entre essas diferenças pode-se citar a
pena de reclusão no início do cumprimento da pena, a qual é destinada ao crime de maior
gravidade. Por outro lado, o delito de menor gravidade é punido com detenção, cujo regime
de cumprimento da pena pode, no máximo, iniciar em regime semiaberto. Nada, porém,
impede que o condenado à pena de detenção cumpra sua condenação em regime fechado, por
força da regressão de pena, a qual poderá ocorrer durante a sua execução (BRASIL, 1941).

Não se pretende, contudo, esgotar a matéria referente à progressão de regimes e de


cumprimento da pena, eis que se trata de uma análise frente às condições trazidas pela
execução da pena no âmbito carcerário atual.
21

1.3.1 A execução da pena privativa de liberdade

A Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, denominada Lei de Execução Penal, regula a


execução da pena privativa de liberdade no ordenamento jurídico atual. Tal dispositivo legal
foi formulado para exercer de maneira eficiente a sentença ou decisão criminal e, ainda,
proporcionar as condições para uma efetiva reinserção social do apenado (BRASIL, 1984).

A CF/88 menciona o princípio da humanidade como um de seus princípios


norteadores, ressaltando a proibição da imposição de penas violadoras à integridade física ou
moral de quem a receber. Em face de tal princípio não há, no Brasil, a instituição da pena de
morte, tortura, de penas cruéis, ou de trabalho forçado.

Apesar da proibição da pena sobre o corpo (suplícios, mutilações), a pena de prisão


não tem correspondido com as finalidades de recuperação do preso, havendo uma verdadeira
contradição nesse sentido. A pena, portanto, se justifica por sua necessidade, de modo que,
sem ela, não seria possível o convívio pacífico em sociedade nos dias de hoje
(BITENCOURT, 2003).

As penas privativas de liberdade estão previstas pelo Código Penal, sendo que para os
crimes ou delitos cabem as penas de reclusão e detenção. A lei das contravenções penais
também prevê pena privativa de liberdade, que é a prisão simples (GRECO, 2008).

No tocante à execução da pena privativa de liberdade, Júlia de Renor Oliveira Campos


(2014, p. 36) aduz que:

Quando se diz que a pena privativa de liberdade restringe apenas o direito de ir e vir
do condenado, nada mais é do que uma mentira. A pena de prisão incide em esferas
muito mais amplas e diversas do que unicamente a liberdade do indivíduo. Na
prática, os demais direitos dos presos, que lhe são garantidos pela Constituição
Federal e pela própria Lei de Execução Penal, são, em sua maioria, deixados de
lado, seja por questões estruturais da própria penitenciária, seja por deficiências
econômicas, ou ainda propositalmente, para causar ‘aversão à prisão’ pelo preso.

De certo que a execução privativa de liberdade não considera os direitos fundamentais


do condenado, pois o sistema penal brasileiro tem como característica a punição e não a sua
responsabilização pelo ato praticado. A implementação do sistema punitivo na execução penal
visa dar uma resposta à sociedade quanto ao fato ocorrido, e não atender os interesses e
necessidades das partes envolvidas.
22

No âmbito da execução penal, os apenados têm seus direitos fundamentais e sociais


restringidos em razão da intervenção do Estado – Jurisdição, uma vez que o juiz atua como
agente condicionado aos interesses da sociedade, que deseja ver o acusado afastado do seu
meio e cumprindo a pena imposta, suprimindo direitos estabelecidos pelo texto constitucional.

Entende-se, todavia, que a execução privativa de liberdade não assegura ao apenado a


possibilidade de ressocialização, uma vez que o processo “é o meio pelo qual o Estado
procede a composição da lide, aplicando direito ao caso concreto [...]” Na maioria dos casos,
a aplicação da pena visa a concretização do direito e não da justiça (CAPEZ, 2013, p. 58).

Por outro lado, não se pode deixar de registrar que a execução privativa de liberdade
não pode ser abolida de forma abrupta, pois tanto o Poder Judiciário como os operadores do
Direito, o próprio apenado e a sociedade em geral não possuem uma cultura voltada à paz, e
sim à penalização dos fatos cometidos.

“A nosso juízo, a arquitetura ideal de execução está ligada a reformulações na prática


e na cultura da execução penal.” (PRADO, 2002, p. 480). Isso decorre do fato de que a
transformação dos valores éticos e sociais exige tempo, mudanças práticas e alteração da
teoria. Nesta perspectiva, o referido autor sustenta que:

[...] a postulação de uma nova práxis importa em modificar a cultura da e na


execução penal, alterar o sentido do patrimônio simbólico, dos modos padronizados
de pensar e de saber que se manifestam expressamente através da conduta social de
todos os principais autores.

Importante destacar que não se sustenta a abolição total da execução privativa de


liberdade, mas sim a importância de o apenado ter assegurados os regramentos constitucionais
relativos aos direitos fundamentais. Segundo Alexandre Rosa (2002, p. 406), “[...] estabelece-
se, portanto, um sistema de garantias com o objetivo de sua preservação e realização.”

Constata-se que a execução da pena privativa de liberdade, na atualidade, não tem


cumprido com o previsto pela Lei de Execução Penal, ou seja, com o propósito de
ressocialização do condenado, que é possibilitar a sua volta à sociedade com a dignidade
preservada. Frente às condições dos estabelecimentos prisionais, “[...] não se pode exigir mais
do que a sentença impõe, e tudo que se deve exigir dele há de estar condicionado pelo fim de
humanizar as relações sociais presentes e futuras.” (PRADO, 2002, p. 479).
23

A atual realidade prisional evidencia que a pretensão punitiva do Estado não alcança
os fins propostos, pois ainda há falhas nesse processo de execução, em que os condenados não
encontram um terreno fértil para a redução da pena e ressocialização.

Com efeito, analisando aspectos jurisprudenciais quanto à execução privativa de


liberdade e à violação da dignidade humana, verifica-se que, muitas vezes, não há
compreensão exata do que significa assegurar ao preso garantias mínimas de ressocialização.

Nesse contexto, percebe-se que o poder público tem negligenciado a observância do


princípio da dignidade humana, no caso específico do Presídio Central de Porto Alegre, objeto
central deste estudo. A Ementa de Apelação Cível transcrita a seguir permite compreender a
situação do sistema penitenciário do Estado do Rio Grande do Sul:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO


ESTADO. INOPERÂNCIA DO PODER PÚBLICO QUANTO AO SISTEMA
PENITENCIÁRIO. PRESÍDIO CENTRAL. SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA E
AMBIENTE DEGRADANTE. FATO NOTÓRIO. TEORIA DA RESERVA DO
POSSÍVEL. NÃO INCIDÊNCIA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA
RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, DO MÍNIMO EXISTENCIAL E
DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRECEDENTE DO
STF EM JULGAMENTO DE REPERCUSSÃO GERAL. DEVER DE
INDENIZAR CARACTERIZADO. DANOS MORAIS. QUANTUM. REDUÇÃO.
O Ente Público responde objetivamente por eventuais danos causados, seja de ordem
moral ou material, porque incide a teoria do risco objetivo da administração. Mesmo
em se tratando de conduta omissiva pela inoperância estatal no cumprimento de um
dever prestacional, no caso, a deficiência do sistema penitenciário, a
responsabilidade estatal dá-se de forma objetiva, na esteira do disposto no art. 37, §
6º, da Constituição Federal. É dever do Estado e direito subjetivo do preso que a
execução da pena se dê de forma humanizada, garantindo-se os direitos
fundamentais do detento, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral
(artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal). O descumprimento desse dever
constitucionalmente imposto de que seja assegurado ao preso o respeito à sua
integridade física e moral resulta na responsabilidade objetiva do Estado pelos danos
resultantes da demora na construção e reforma de unidades prisionais e consequente
superlotação carcerária, porquanto evidenciado o nexo causal, o vínculo direto e
imediato entre a omissão e o dano sofrido pelo preso. Hipótese em que restou
suficientemente comprovada a omissão do Estado, até porque se trata de fato notório
o descaso com a população carcerária devido à superlotação das galerias e o
ambiente degradante a que são submetidos os correicionados, estando plenamente
caracterizados os requisitos da responsabilidade civil: a conduta omissiva
consistente na falta de atuação suficiente para evitar a ofensa à integridade física e
moral do autor; e o nexo causal entre a insuficiência das políticas públicas prisionais
adotadas e a violação à dignidade do apenado resta caracterizado porque, tivesse o
Estado, através de seus agentes, adotado postura exigível de prevenção não teria
ocorrido o evento danoso, sobretudo se considerado que o ente público assume uma
posição especial de garantia em relação aos presos, circunstância que lhe confere
deveres específicos de vigilância e de proteção de todos os direitos dos internos que
não foram afetados pela privação de liberdade. Danos morais in re ipsa, decorrentes
do próprio fato, ou seja, da falta de espaço físico individual disponível na cela, a
total falta de salubridade do ambiente, de condições estruturais do presídio e pelas
deficiências na prestação das assistências material, de saúde, laboral e educacional.
24

Comporta redução o valor da condenação fixado na sentença para a quantia de R$


500,00, considerado o parâmetro adotado pelo colegiado, por ano ou fração,
observado o tempo em que o autor permaneceu recluso no Presídio Central de
14/03/2017 até 09/08/2017, a natureza jurídica da condenação e os princípios da
proporcionalidade e razoabilidade, bem assim a repercussão de centenas de
condenações similares na combalida situação financeira do ente demandado.
COMPENSAÇÃO DA INDENIZAÇÃO COM O VALOR DEVIDO
PELO APENADO. IMPOSSIBILIDADE. Inexistindo débitos e créditos recíprocos,
líquidos, vencidos e fungíveis, inviável o pleito de compensação formulado pelo
ente público. Exegese do art. 369 do CC. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO. (RIO GRANDE DO SUL. Apelação Cível nº 70078615713. Nona
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator Tasso Caubi Soares Delabary,
julgado em 24/10/2018).

Evidencia-se que os Tribunais Superiores estão atentos, por exemplo, ao cumprimento


da pena no Presídio Central, onde a superlotação é um fator degradante e gerador da violação
do princípio da dignidade humana.

1.4 A violação do princípio da dignidade da pessoa humana na pena de prisão

Insta consignar, face ao acima transcrito, que o princípio da dignidade da pessoa


humana, fundamento da CF/88, consagrado no seu art. 1º, inc. III, garante os direitos
fundamentais de todos, independentemente de estar cumprindo pena de prisão. Denota-se,
portanto, que a superlotação das penitenciárias, com o déficit de vagas apresentado
anteriormente, viola efetivamente as normas e princípios constitucionais, notadamente no que
diz respeito aos detentos e à sua dignidade.

O princípio da dignidade humana, fundamento do Estado Democrático de Direito, é


uma qualidade intrínseca ao ser humano, pois sem dignidade o homem não vive ou sobrevive.
Neste sentido, as lições de Ingo Wolfgang Sarlet (2001, p. 32) são esclarecedoras ao
mencionar que a dignidade humana é uma:

[...] qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do
mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando,
neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a
pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como
venham a lhe garantir as condições existentes mínimas para uma vida saudável,
além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos
da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

Na verdade, o sistema prisional brasileiro anda na contramão da dignidade humana,


uma vez que as penitenciárias brasileiras não possuem estrutura suficiente para atender as
25

demandas relativas ao número de presos que são encarcerados em nome do combate à


criminalidade.

Ainda sobre a dignidade humana, Flávia Piovesan (2012, p. 446) alerta que se deve
buscar o equilíbrio e a reciprocidade entre o Estado e o agente causador do dano a fim de
salvaguardar os direitos do ser humano e não apenas as prerrogativas do Estado. Afirma,
também, que os direitos e as garantias constantes no texto Constitucional são cláusulas
pétreas, e a dignidade humana é uma qualidade intrínseca de cada um.

Por fim, na visão de Alexandre de Moraes (2011, p. 94), a dignidade da pessoa


humana pode ser caracterizada como

[...] um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na


autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a
pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo
invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas
excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos
fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas
as pessoas enquanto seres humanos.

Constata-se, portanto, que a dignidade da pessoa humana dá sustentação aos direitos


humanos fundamentais, nos quais se incluem os direitos dos presos, que também são sujeitos
de direitos, todavia, ao serem condenados, alguns ficam suspensos ou são restringidos.

Ademais, da maneira como se encontram atualmente os estabelecimentos prisionais no


Estado brasileiro, a dignidade da pessoa humana constantemente está sendo violada, pois as
condições precárias da estrutura física têm demonstrado que o processo de ressocialização
está cada vez mais distante do que preconiza a Lei de Execução Penal, retirando a
personalidade do apenado, ou seja, deixando-o à mercê de um Estado precário que não possui
interesse em sua reinserção social.

Nessa perspectiva de desumanização das penitenciárias e presídios, o condenado não


consegue se manter íntegro e fiel às suas convicções, e perde a sua personalidade, pois:
26

[...] o sistema prisional atual forma pessoas mais cruéis diante da falta de estrutura
que não oferece segurança e não previne o crime, sendo a superlotação um dos
fatores que mostra plenamente a condição desumana, que precisa urgentemente de
mudanças, e conscientizar a sociedade de que o ser humano que cumpriu sua pena
tem o direito de recomeçar sua vida, sem discriminação, pois um sistema rotativo é
desumano, pois prende o indivíduo que comete um crime e, após cumprimento da
pena, marginaliza-o, sem ressocialização, embora a finalidade da pena não seja a
reincidência. (CASTRO, 2005, p. 124)

Dessa forma, falar sobre a despersonalização do apenado é essencial para compreender


a importância da sua ressocialização.

1.5 Despersonalização do apenado

Inicialmente, é necessário entender o significado de “despersonalização” para, então,


abordar a sua relação com o apenado em cumprimento de pena em estabelecimentos
prisionais. Despersonalização é um termo utilizado pela Psicologia e Psiquiatria e, por isso,
adota-se o conceito das Ciências:

A despersonalização é o resultado do desenvolvimento de sentimentos e atitudes


negativas, por vezes indiferentes e cínicas em torno daquelas pessoas que entram em
contato direto com o profissional, que são sua demanda e objeto de trabalho
(RABIN; FELDMAN; KAPLAN apud ABREU et al., 2002).

Relacionando este conceito ao caso específico desta pesquisa, entende-se que a


despersonalização ocorre no âmbito do sistema prisional, e representa a desumanização do ser
humano, da sua qualidade de vida e bem-estar psicológico. E, em razão de estar cumprindo
pena em estabelecimentos prisionais em condições precárias, há violação da dignidade
humana e da personalidade do apenado. Segundo entendimento de Pâmela Ghisleni (2014, pp.
196-197):

O sistema prisional tem por objetivo punir, do ponto de vista da retribuição,


reeducar e ressocializar o transgressor da norma de tal maneira que ele possa, após
reflexão em cárcere sobre sua conduta, voltar à convivência em sociedade [...] Logo
no primeiro momento em que o apenado é submetido ao cárcere, sua autonomia e
personalidade são feridas, uma vez que ele acaba por perder o vínculo com todos os
seus objetos pessoais. Isso significa que o condenado é privado de ter os
pressupostos mínimos de pertencimento à sociedade, tais como sua roupa e
documentos, o que se configura em uma perda da identidade.

Importante anotar que o sistema prisional exige que o apenado passe a viver no cárcere
de acordo com as normas estabelecidas pelos próprios condenados, cujas regras obstaculizam,
27

na maioria das vezes, a ressocialização e a reeducação daqueles que se encontram em


ambiente inóspito.

Fundamental destacar, ainda, que as regras de convivência impostas aos condenados


geram a sua despersonalização porque desde o momento que ingressam na prisão deixam de
ser humanos para se tornarem mero número frente à multidão do cárcere. Passam, assim, a ter
a sua intimidade e integridade física violadas, já que a superlotação dos estabelecimentos
prisionais não permite que a Lei de Execução Penal seja colocada em prática.
28

2 A INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL ASSEGURADA CONSTITUCIONALMENTE


AOS PRESOS

Este capítulo dedica-se à integridade física e moral assegurada constitucionalmente


aos presos, e traduz uma preocupação constante na sua relação com os direitos fundamentais.
Nesse cenário, a Execução Penal tem despertado muitas críticas e debates quanto à violação
da integridade física, psíquica e moral dos apenados.

Investiga-se, portanto, o significado de integridade física e moral segundo a


Convenção Interamericana de Direitos Humanos e a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 (CF/88), a partir de um estudo reflexivo sobre a suposta violação da dignidade
da pessoa humana e suas consequências.

No seu foco mais específico, o capítulo aborda aspectos referentes ao cumprimento da


pena privativa de liberdade em relação aos direitos supracitados. Com isso, visa demonstrar a
ineficiência e a carência do sistema penal vigente, que agrava consideravelmente o problema
da violência e da reincidência, constituindo-se num obstáculo à reinserção social.

O desafio que se apresenta é analisar a reforma da Lei da Execução Penal e verificar


quais as alternativas propostas visam amenizar os problemas causados pela aplicação e
violação da Lei de Execução Penal (LEP). Sabe-se que o objetivo da execução penal, além do
viés punitivo, é reeducar e ressocializar o transgressor da norma penal, de tal maneira que ele
possa, após reflexão sobre sua conduta, voltar à convivência em sociedade.

Pretende-se, ainda, trazer a visão dos juristas nacionais e estrangeiros, bem como
demonstrar por meio da teoria do Garantismo, de Luigi Ferrajoli, que se pode enfrentar
situações radicais e críticas de desrespeito ao ser humano enquanto apenado. Realiza-se,
assim, a partir de dados estatísticos e entrevistas já realizadas e publicadas no meio eletrônico,
uma reflexão sobre as condições precárias do Presídio Central de Porto Alegre.

2.1 O significado do respeito à integridade física e moral, segundo a Constituição


Federal de 1988

O direito à integridade física (corporal) passou a ser reconhecido pelo Direito


Internacional dos Direitos Humanos a partir da Segunda Guerra Mundial. Em consequência, a
Convenção Americana de Direitos Humanos (adotada e aberta à assinatura na Conferência
29

Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José da Costa Rica, em 22 de


novembro de 1969) estabeleceu no seu art. 5º, o direito à integridade pessoal:

1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral.
2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos
ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o devido
respeito à dignidade inerente ao ser humano.
3. A pena não pode passar da pessoa do delinquente.
4. Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias
excepcionais, e devem ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de
pessoas não condenadas.
5. Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e
conduzidos a tribunal especializado, com maior rapidez possível, para seu
tratamento.
6. As penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a
readaptação social dos condenados. A simples leitura do dispositivo mencionado já
revela a profunda relação do direito à integridade pessoal e a pena privativa da
liberdade. (BRASIL, 1992a).

No plano internacional, anterior ao Pacto de São José da Costa Rica, a Declaração dos
Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1948, mesmo não
contemplando expressamente o direito à integridade física e psíquica, estabeleceu que
“ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou
degradante (art. V)”, demonstrando preocupação com a dignidade do ser humano.

Da mesma forma, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 1966, não


contempla expressamente o direito à integridade física e psíquica, mas a proibição de tortura,
tratamentos cruéis, desumanos e degradantes que significa a garantia da integridade física e
psíquica do homem (BRASIL, 1992b).

Nessa perspectiva, a CF/88, seguindo nessa linha humanitária, reconheceu o direito à


integridade física do cidadão como condição essencial à sua dignidade e o elevou à condição
de direito fundamental do mais alto valor.

O direito à integridade está elencado no art. 5º da Carta Magna, e contempla a mesma


preocupação em todos incisos, ou seja, que o Estado tem o dever de assegurar que não haja a
sua violação:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes: [...]
III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
30

XLVII – não haverá penas:


a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
LXII – a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados
imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer
calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;
LXIV – o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por
seu interrogatório policial;
LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; [...]
(BRASIL, 1988).

A CF/88 apresenta um extenso rol relacionado à necessidade de preservação da


integridade física e psíquica do ser humano, notadamente daqueles que se encontram
encarcerados em decorrência do cumprimento de penas.

Sarlet (2007, pp. 424-425) menciona que não há como confundir o direito à
integridade corporal com o direito à vida, pois:

[...] embora a relação de complementaridade entre ambos, não é no direito à vida


que se achará, s.m.j., o fundamento constitucional adequado para um direito
fundamental à integridade corporal, até mesmo pelo fato de o direito à integridade
corporal cobrir precisamente as situações que dizem respeito a intervenções na
estrutura física e psíquica da pessoa humana que não tem por consequência a morte
ou que não colocam efetivamente a vida no sentido da sobrevivência física.

O autor supracitado acredita que é preciso haver distinção entre o direito à integridade
física e psíquica e o direito à integridade moral, “[...] que, juntamente com as duas primeiras
manifestações, compõem o direito à integridade pessoal”. Este, porém, não será objeto desta
pesquisa, pois se refere aos direitos à honra e à imagem, embora o apenado tenha direito à
proteção de todos os seus direitos, mesmo daqueles que não estejam inter-relacionados, mas
que são reconhecidos pelas leis internacionais e nacionais (SARLET, 2017, p. 425).

Nota-se, contudo, que esses direitos são inseparáveis do princípio da dignidade da


pessoa humana, uma vez que a proibição da tortura e de tratamentos desumanos e degradantes
exigem o respeito e a proteção da dignidade, da segurança e integridade pessoal, que
englobam a integridade física, psíquica e moral. Nesse sentido, o cumprimento da pena em
estabelecimentos prisionais brasileiros sem condições para uma sobrevivência digna não
condiz com o que expressa a CF/88, sendo de domínio público a situação vivenciada pelos
apenados nas prisões brasileiras (SARLET, 2017).
31

Cabe referir que é inegável o conflito existente entre a dignidade da pessoa humana e a
Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84). Destaca-se, nesse sentido, a superlotação dos
presídios e a ociosidade dos presos, pois não há nenhum tipo de trabalho carcerário. Ademais,
há a morosidade da Justiça, os parcos investimentos no sistema carcerário, a falta de
melhorias estruturais e de capacitação de agentes penitenciários para dar cumprimento ao
previsto na Lei. Tudo isso revela um sistema carcerário cada vez mais ineficiente na
reintegração social dos presos (SARLET, 2017).

Verifica-se, assim, que o respeito à integridade física, psíquica e moral consagrado no


texto constitucional apresenta uma indissociável ligação com a dignidade da pessoa humana e
com os direitos humanos e fundamentais reconhecidos e protegidos pela esfera internacional e
constitucional.

Nessa ótica, a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) merece ser colacionada,
pois definiu, em 16 de fevereiro de 2017, “que o preso submetido a situação degradante e à
superlotação na prisão tem direito à indenização do Estado por danos morais.” No Recurso
Extraordinário (RE) 580252, com repercussão geral reconhecida, os ministros restabeleceram
decisão que havia fixado a indenização em R$ 2 mil por condenado (STF, 2017)1.

Constata-se, assim, que a integridade física, psíquica e moral estão inter-relacionadas e


devem ser analisadas a partir da dignidade humana.

2.2 O princípio da dignidade da pessoa humana à luz da Execução Penal

É imperioso ressaltar que a dignidade da pessoa humana tardou a ser reconhecida nos
planos internacional e constitucional brasileiro. Explica Karine da Silva Cordeiro (2012, p.
77) que “[...] sobreveio a Segunda Guerra Mundial e o desprezo e o desrespeito pelos direitos

1
No caso concreto, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul (DP-MS), em favor de um condenado a 20 anos
de reclusão, cumprindo pena no presídio de Corumbá (MS), recorreu contra acórdão do Tribunal de Justiça local
(TJ-MS) que, embora reconheça que a pena esteja sendo cumprida “em condições degradantes por força do
desleixo dos órgãos e agentes públicos”, entendeu, no julgamento de embargos infringentes, não haver direito ao
pagamento de indenização por danos morais. O Plenário acompanhou o voto proferido em dezembro de 2014
pelo relator, ministro Teori Zavascki (falecido), no sentido do provimento do recurso. Em seu voto, o ministro
restabeleceu o dever de o Estado pagar a indenização, fixada em julgamento de apelação no valor de R$ 2 mil.
Ele lembrou que a jurisprudência do Supremo reconhece a responsabilidade do Estado pela integridade física e
psíquica daqueles que estão sob sua custódia. Ressaltou também que é notória a situação do sistema
penitenciário sul-matogrossense, com déficit de vagas e lesão a direitos fundamentais dos presos (STF, 2017).
32

humanos”, manifestados no período nazi-fascista, os quais “resultaram em atos bárbaros que


ultrajaram a consciência da Humanidade”, provocando a necessidade de compreensão dos
direitos humanos sob outra ótica. Dessa forma, a dignidade da pessoa humana passou a
ocupar um espaço significativo nos ordenamentos jurídicos mundiais, dentre eles, o Brasil, na
Constituição de 1988, também chamada de Constituição Cidadã.

Em relação à concepção de dignidade da pessoa humana, Mariana Filchtiner


Figueiredo (2007, p. 52) ressalta que:

[...] pode-se compreender que a dignidade, como qualidade intrínseca de todo o ser
humano, é irrenunciável e inalienável, qualificando-o como tal e dele não podendo
ser destacada. Todos são iguais em dignidade, como explicita a DUDH/ONU logo
no artigo 1º. Inadmissível cogitar-se de uma pessoa sem dignidade, por mais
ultrajantes que sejam os atos praticados pela mesma, por mais graves que sejam as
deficiências pessoais, ou ainda evidentes que tenham sido os atos tendentes à
renúncia da própria dignidade. Trata-se de uma capacidade potencial de
autodeterminação, independendo de efetiva realização no caso concreto [...]

É indubitável que o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana está


ligado à integridade física, psíquica e moral de qualquer pessoa, esteja em condição de
liberdade ou não.

A dignidade da pessoa humana ganhou maior representatividade na atual Constituição


brasileira como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Flademir Jerônimo
Belinati Martins (2012, p. 98) observa nesse sentido que:

Embora já se tenha mencionado que o valor da dignidade da pessoa humana


constitui o valor-guia do ordenamento constitucional brasileiro, importa ressaltar
que ele foi expressamente positivado pelo constituinte de 1988 numa fórmula
principiológica. O postulado da dignidade da pessoa humana não é, portanto, criação
constitucional, mas valor a que a constituição decidiu atribuir máxima relevância
jurídica mediante formulação principiológica (deontológica) e expressa incorporação
ao sistema jurídico constitucional. Trata-se, portanto, de princípio constitucional que
tem a pretensão de plena normatividade (CF/88, art. 1º, inc. III).

Não se descarta, portanto, que o princípio da dignidade da pessoa humana apresenta


conteúdo normativo de valor axiológico:

[...] seja quando está em causa a natureza e a intensidade da sua relação com os
direitos humanos e fundamentais, sendo considerada na ordem jurídica como um
conjunto de princípios estruturantes com contornos gerais e necessários para
assegurar a não violação da integridade física, psíquica e moral do ser humano.
(SARLET, 2017, p. 262)
33

Nesta perspectiva, observa-se que o princípio da dignidade da pessoa humana está


consagrado expressamente no art. 1º, inc. III, da CF/88, como um dos fundamentos
republicanos, haja vista que:

[...] no momento em que a dignidade é guindada à condição de princípio estruturante


e fundamento do Estado Democrático de Direito, é o Estado que passa a servir como
instrumento para a garantia e promoção da dignidade das pessoas individuais e
coletivamente consideráveis. (SARLET, 2007, p. 262).

Em outras palavras, mas seguindo o mesmo raciocínio, a dignidade da pessoa humana


consiste em um valor-fonte, ou seja, segundo o ministro César Peluso (STF, 2008), a
dignidade da pessoa humana “constitui verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o
ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos
fundamentos que se assenta entre nós, à ordem republicana e democrática.”

É inquestionável que a dignidade humana está expressamente consagrada no texto


constitucional. A LEP, no entanto, não faz menção em seus artigos, de forma taxativa, à
expressão “dignidade humana”, mas deixa implícito, notadamente, no art. 40, que o apenado
deve ser tratado respeitosamente em relação à sua integridade física e moral. Dentre outras
situações elencadas no Capítulo II da LEP, percebe-se a necessidade de assegurar os direitos
fundamentais à saúde, ao trabalho, à segurança, à assistência social, educacional, material e
jurídica, a fim de garantir e preservar os direitos fundamentais (BRASIL, 1984).

Guilherme de Souza Nucci (2008, p. 400), por outro lado, aduz que

Quanto ao respeito à integridade física e moral do condenado, é óbvio o desrespeito,


também, de dispositivo constitucional. Se em vários estabelecimentos penitenciários
brasileiros não se consegue evitar a violência sexual, pois não se garante o
isolamento do preso, tampouco se concede ao condenado, no devido tempo, os
benefícios a que faz jus, não há respeito algum por sua integridade física e moral. É
fundamental mudar a mentalidade dos operadores do Direito para que se provoque a
alteração do comportamento do Poder Executivo, responsável pela administração
dos presídios.

Um aspecto que chama a atenção diz respeito ao descumprimento da LEP e,


consequentemente, aos estabelecimentos prisionais que, ao invés de integrarem o preso à
sociedade, se transformaram em escolas do crime. Por essa razão, na atualidade discute-se
com veemência, a eficácia das prisões:
34

É tão grande a crise prisional que tentam novos meios para mudar a sua imagem,
incluindo-se aí, saídas do condenado para trabalhar e estudar, centros de tratamento
comunitário, tratamento especial para os drogados etc. O Direito Penal encontra-se
na UTI no que diz respeito ao sistema prisional, pois é límpido que a pena de prisão
deteriorou todo o sistema penal. Em quase todas as suas formas dissolve o núcleo
familiar, causando danos sérios. É cara e antieconômica; cara quanto à inversão em
instalações, manutenção de pessoal; antieconômica porque o condenado não produz
e deixa a família no abandono material. Outros problemas insolúveis da prisão são a
prisionalização e a estigmatização dentro da política criminal. (NASCIMENTO,
2007, pp. 215-216).

Nesse sentido, considerando as atuais condições vivenciadas pelos apenados no


cumprimento da pena privativa de liberdade no Presídio Central de Porto Alegre, pode-se
afirmar que a dignidade da pessoa humana assume particular importância prática.

2.3 Lei de Execução Penal: aspectos atuais referentes ao cumprimento da pena privativa
de liberdade

A Lei nº 7.210/84 foi criada com a finalidade de regulamentar a relação entre o preso,
Estado e Judiciário, visando, primordialmente, a ressocialização do apenado, sem descartar,
contudo, a punição, uma vez que objetiva concretizar a sanção imposta na sentença.

A LEP estabelece, em seu art. 1º, o objetivo da execução penal, que é: “efetivar as
disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica
integração social do condenado e do internado.” (BRASIL, 1984). Segundo Norberto Cândido
Pâncaro Avena (2014, p. 79), a execução penal tem como intenção principal “Proporcionar
condições para a integração social do condenado não se resume ao plano teórico, mas, ao
contrário, tem balizado as decisões do Poder Judiciário no momento de decidir sobre a
concessão ou negativa de benefícios.”

Na verdade, a referida lei, a partir do art. 10, dispõe os deveres do Estado com relação
ao apenado, objetivando a prevenção do crime e o seu retorno ao convívio social. Ressalta-se
que o Estado tem o dever de promover assistência no âmbito material, da saúde, judicial,
educacional, social e religioso, não só ao preso, mas também ao internado, possibilitando-lhe
condições de ser reinserido socialmente (AVENA, 2014).

Para que se possa compreender os aspectos atuais do cumprimento da pena privativa


de liberdade, segundo a LEP, faz-se necessário retomar alguns aspectos relativos à pena
privativa de liberdade, já trabalhados no primeiro capítulo deste estudo.
35

Registra-se, nesse sentido, que no Direito Penal pátrio os regimes de cumprimento da


Pena Privativa de Liberdade (PPL) podem ser:

1º) Fechado – cumpre a pena em estabelecimento penal de segurança máxima ou


média;
2º) Semiaberto – cumpre a pena em colônia penal agrícola, industrial ou em
estabelecimento similar;
3º) Aberto – trabalha ou frequenta cursos em liberdade, durante o dia, e recolhe-se
na Casa do Albergado ou estabelecimento similar à noite e nos dias de folga.
(CAPEZ, 2013, p. 34).

Destaca-se que o regime inicial de cumprimento de pena deverá ser estipulado na


sentença condenatória, conforme o art. 110 da Lei de Execução Penal (LEP). O juiz deverá
atentar, também, para as determinações contidas no art. 33 do Código Penal, o qual estabelece
a distinção entre a pena de reclusão e a pena de detenção (BITENCOURT, 2012).

Não se pode negar que o regime de cumprimento da pena, principalmente a de


privação de liberdade, conduz o condenado a uma situação de encarceramento, na qual terá
que cumprir a sanção que lhe foi imposta pelo Estado Jurisdicionado, perdendo o seu direito
constitucional de ir e vir. Todos os outros direitos inerentes ao indivíduo, entretanto, devem
ser resguardados, como define o art. 3º da Lei de Execução Penal: “Ao condenado e ao
internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.”
(BRASIL, 1984).

Um aspecto essencial que precisa ser considerado e que já foi referido anteriormente
diz respeito ao Código Penal, responsável pelas leis que regulam os regimes prisionais. Não
se pode deixar de mencionar, porém, que a Lei de Execução Penal é uma legislação especial
criada exclusivamente para trazer um suporte ao Código Penal em relação à execução das
penas, como o próprio nome supõe e o art. 1º expõe: “A execução penal tem por objetivo
efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a
harmônica integração social do condenado e do internado.” (BRASIL, 1984).

A Lei de Execução Penal contém as regras a respeito da execução das penas privativas
de liberdade, restritivas de direitos e multa. Regulamenta, assim, além dos deveres (art. 38 e
39), os direitos do preso (arts. 40 a 43), o seu trabalho interno e externo (arts. 28 a 37), a
transferência de regimes (arts. 110 a 119) e as infrações disciplinares e sanções (arts. 44 a 60)
(MIRABETE, 2016).
36

Observa-se que como a intenção do Estado não é simplesmente a punição do


condenado, mas principalmente a sua ressocialização, “foi instituída uma fase de classificação
do condenado para que a execução de sua pena tenha a devida eficácia. Essa classificação
encontra-se prevista nos arts. 5º a 9º-A da Lei de Execução Penal.” (MIRABETE, 2016, p.
121).

A classificação é feita pela Comissão Técnica de Classificação, formada por dois


chefes de serviço, um psicólogo, um psiquiatra e um assistente social, e será
presidida pelo diretor do estabelecimento. Usam-se como base os precedentes e a
personalidade dos condenados. Os indivíduos terão, assim, suas penas
individualizadas, conforme suas necessidades de reintegração.

Como dito anteriormente, é assegurado ao condenado, por fornecimento do Estado,


assistência material (instalações higiênicas, alimentação e vestuário), assistência à saúde
(farmacêutica, médica, odontológica), assistência jurídica (Defensoria Pública), assistência
educacional (instrução escolar e formação profissional), assistência social (amparo),
assistência religiosa (cultos) e, ainda, assistência ao egresso (orientação), como preveem os
arts. 10 a 27 da Lei de Execução Penal (BRASIL, 1984).

Garantir aos presos seus direitos é uma preocupação que a Lei de Execução Penal traz
expressa em seu art. 41, ao expressar:

Art. 41. Constituem direitos do preso:


I – alimentação suficiente e vestuário;
II – atribuição de trabalho e sua remuneração;
III – Previdência Social;
IV – constituição de pecúlio;
V – proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a
recreação;
VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas
anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;
VIII – proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX – entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
XI – chamamento nominal;
XII – igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da
pena;
XIII – audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV – representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura
e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes;
XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da
responsabilidade da autoridade judiciária competente. (incluído pela Lei nº 10.713,
de 2003).
Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos
ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.
37

É perceptível que cabe ao Estado assegurar assistência material a todos os presos,


sem descuidar da real condição em que eles se encontram, ou seja, é preciso haver punição
dos condenados mas sem a violação dos seus direitos. A LEP, portanto,

[...] tem função importantíssima na manutenção da execução penal, implementando


diversas regras para que o indivíduo possa o mais rápido e o mais eficiente possível
se reintegrar no meio social. (SOUZA, 2006, p. 125).

Embora a LEP tenha a finalidade de reeducar o condenado para que possa retornar ao
convívio social, sabe-se que a ressocialização não acontece, pois a situação em que se
encontram as prisões, com a superlotação das celas e a falta de estrutura física que possibilite
a prática de atividades educativas, de trabalho, de lazer em nada contribuem para dar ao preso
condições de se regenerar. Nesse sentido, Nucci (2008, p. 109) explica que:

O que acaba atrapalhando muito o sistema penitenciário brasileiro em sua finalidade


ressocializadora é a superlotação que os estabelecimentos enfrentam. Sem respeitar
o número de vagas que a Lei de Execução Penal estabelece para os regimes de
cumprimento de penas a recuperação fica muito mais difícil. Em um sistema falho
como o que vivem os presídios brasileiros, a ressocialização acaba se tornando uma
opção do condenado.

Urge, então, que o Estado agilize a votação da proposta de Reforma da LEP que
tramita no Congresso Nacional, pois com mudanças substanciais no sistema de execução
penal talvez seja possível, no decorrer de sua implementação, dar efetividade aos direitos
fundamentais constitucionais dos apenados.

2.4 A Reforma da Lei de Execução Penal que tramita no Congresso Nacional

Tramita no Congresso Nacional, desde 2013, o Projeto de Lei nº 513, que objetiva a
reforma da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), elaborado por uma comissão de
juristas, entregue para apreciação, discussão e votação em plenário em dezembro de 2012.

Essa proposta havia sido aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado
em setembro de 2012 e, em seguida, “[...] foi convertida em projeto de lei assinado pelo então
presidente do Senado, Renan Calheiros. O texto aprovado é um substitutivo do senador Jader
Barbalho (PMDB-PA).” (CONSULTOR JURÍDICO, 2017).
38

Observa-se que o responsável pela relatoria do referido projeto, o senador Antonio


Anastasia (PSDB-MG), fez a leitura e a defesa do voto, utilizando-se dos mesmos argumentos
da comissão de juristas. Assim, segundo informações da Agência do Senado,

Os relatores argumentam que a proposta ataca uma série de problemas estruturais do


sistema carcerário, como excesso de presos provisórios; a falta de vagas para
cumprimento dos diversos regimes de pena; a superlotação nos estabelecimentos
prisionais; e o desvio da finalidade de execução da pena. (CONSULTOR
JURÍDICO, 2017).

Registra-se que o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 513/2013 não teve andamento
desde 2017, apesar da necessidade de agilização de encaminhamento para aperfeiçoar a LEP.
“A proposta tem como um dos seus principais objetivos atacar problemas enfrentados pelo
sistema carcerário brasileiro, como a superlotação de presídios, a informatização e a
ressocialização de detentos.” (CONSULTOR JURÍDICO, 2017).

A proposta de modificação da LEP também altera o Código de Processo Penal


(Decreto-Lei nº 3.689, de 1941), a Lei de Crimes Hediondos (Lei nº 8.072, de 1990), o
Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 1940), entre outras leis. A falta de vontade política,
entretanto, não tem possibilitado o andamento do projeto, até porque, à primeira vista, vai de
encontro aos interesses eleitorais.

É inquestionável a necessidade de mudanças no sistema carcerário brasileiro, haja


vista a situação de precariedade em que se encontra e que tem sido noticiada constantemente
pelos meios de comunicação.

Frente a esta realidade, a comissão de juristas que preparou a reforma da Lei de


Execução Penal, destaca as questões que envolvem a efetivação dos direitos dos presos, a
desburocratização da execução das penas e o combate à superpopulação carcerária.

Para demonstrar a seriedade com que foram tratadas as questões pertinentes à reforma,
analisa-se, a seguir, a visão de juristas sobre o anteprojeto, com destaque para o entendimento
do ministro Sidinei Beneti, do Superior Tribunal de Justiça, presidente da Comissão.
39

2.4.1 A visão de juristas brasileiros com relação à Reforma da LEP

Ao iniciar a abordagem sobre a visão de juristas brasileiros que participaram da


Comissão do Anteprojeto do PLS 513/2013, cabe fazer algumas importantes observações. O
grande desafio da Comissão foi elaborar um texto que apresentasse a compreensão do
apenado como sujeito de direitos e os direitos fundamentais dos cidadãos e, assim, obter uma
resposta ao combate à impunidade e aplicação de penas adequadas.

Neste sentido, o ministro Sidnei Beneti, presidente da Comissão, ressaltou que o grupo
teve em vista “os grandes princípios enfeixados no binômio garantia dos direitos
fundamentais do ser humano condenado e garantia de direitos fundamentais dos cidadãos que
têm direito de exigir a adequada execução da pena no necessário combate à impunidade.”

Para fundamentar uma prática emancipatória que possibilite ao apenado o retorno ao


âmbito social, familiar e trabalhista, o ministro Sidinei Beneti ressaltou a importância do
trabalho desenvolvido, cuja ação foi norteada por alguns princípios:

1º) Humanização da sanção penal e garantia dos Direitos Fundamentais do


condenado, em qualquer modalidade de pena e regime prisional, do destinatário de
medida de segurança e do preso provisório, evitando-se ao máximo restrições
derivadas de más condições de execução penal; 2º) Efetividade do cumprimento da
sanção penal aplicada pela sentença, de modo a afastar-se o máximo possível a
sensação de impunidade, de que resulta incentivo ao cometimento do delito; 3º)
Busca de ressocialização do sentenciado, pelo trabalho e o estudo, preparando-se
para o retorno à convivência social; 4º) Desburocratização da tramitação de
procedimentos judiciais e administrativos relativos à execução; 5º) Informatização
para a segurança e agilização das tramitações necessárias; 6º) Previsibilidade
objetiva dos passos da execução da pena, de forma a poderem o sentenciado e o
sistema administrativo-judiciário antever até mesmo as datas dos passos efetivos do
desenvolvimento da execução – inclusive as datas de transferência a regimes
prisionais e da soltura automática, sem necessidade de requerimento e
processamento de alvará de soltura, ante imediata colocação em liberdade na data
do cumprimento da pena constante de sistema informatizado capilarizado aos
estabelecimentos. (SENADO FEDERAL, 2013).

O primeiro e mais sensível efeito da adoção desses princípios é o discurso da


Comissão de juristas, cujo modelo garantista é oposto ao retributivo da pena e nada
ressocializador. A construção do arcabouço teórico a partir dos princípios transcritos
anteriormente traz para a estrutura da reforma a necessidade de assegurar os direitos dos
apenados, bem como a humanização da sanção penal em qualquer medida ou prisão aplicada.
Destaca, ainda, a importância da efetividade no cumprimento da sanção penal, que não pode
desvirtuar a sua verdadeira intenção, qual seja, a de evitar a impunidade e o incentivo ao
40

cometimento do delito. Por outro lado, agregando argumentos aos princípios, advogam que a
busca incessante pela ressocialização do sentenciado passa, necessariamente, pelo trabalho e
estudo, cujos direitos os qualificam para a volta à convivência social.

Por último, destaca-se que o discurso garantista da Comissão proporciona a


desconstituição dos entraves e obstáculos que impedem que o cumprimento da pena auxilie na
reeducação do apenado, evitando, assim, conflitos carcerários, como fugas, rebeliões e
motins.

A grande questão oculta que permeia o debate jurídico sobre os conflitos carcerários
no país está interligada ao descumprimento do Estado com a sua obrigação de implementar
políticas públicas que zelem pela integridade física e moral dos apenados.

Nesse contexto, Maria Tereza Uille, da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos


Humanos do Paraná, ressalva que a discussão das propostas ocorreu com base em três
aspectos fundamentais: eixo administrativo, eixo dos direitos e deveres dos presos e do
sistema disciplinar, e eixo dos procedimentos e órgãos da execução penal e benefícios
penitenciários. (CONSULTOR JURÍDICO, 2013).

Este rol de eixos temáticos evidencia com muita propriedade a preocupação da


Comissão em assegurar a tutela dos direitos e garantias dos apenados, impedindo que a
constante violação noticiada deixasse de ser a marca registrada do sistema penitenciário
nacional. Da mesma forma, que a reforma proposta viabilizasse uma qualificação profissional
adequada aos detentos, a fim de que tivessem condições de sair das penitenciárias com uma
profissão.

Quanto à proposta relacionada à questão do trabalho dentro do cárcere, ressalva a


referida relatora que “o trabalho do preso será remunerado com o valor nunca inferior a um
salário mínimo. Atualmente, a Lei de Execução Penal estabelece o valor mínimo de três
quartos do salário mínimo para essa remuneração.” (CONSULTOR JURÍDICO, 2013, [s.p.]).

Importantes, ainda, são as recomendações do anteprojeto ao PLS 513/2013 relativas à


assistência social, especialmente quanto à obtenção de documentos de cidadania (RG, CPF,
41

Certidão de Nascimento e Título Eleitoral), que por si só possibilitariam que o apenado se


habilitasse a usufruir seus direitos como cidadão.

É salutar a percepção do Promotor de Justiça, Marcellus Ugiette – um dos


representantes do Ministério Público – quanto à extinção dos hospitais de custódia para
tratamento psiquiátrico. Tal problema, contudo, não pode ser tratado no âmbito da Segurança
Pública, pois se sabe que questões ligadas à loucura do apenado constituem um problema de
Saúde Pública e devem ser tratadas por especialistas da área de Psiquiatria e Psicologia.

Não menos importante é a visão do professor Gamil Föppel, da Bahia, ao se referir à


impossibilidade de manter apenados em Delegacias de Polícia, pois não se justifica um
tratamento desumano e indigno àqueles que cometeram delitos. Por essa razão,

A LEP dará um prazo máximo para que os Estados se adequem e acabem com essa
anomalia que é haver presos em delegacias de polícia. Sendo levado adiante este
projeto, a sociedade terá uma lei muito mais justa e muito melhor no que diz respeito
às finalidades legítimas e constitucionais atribuídas à pena. (SENADO FEDERAL,
2013, pp. 2-3).

Outro ponto a ser observado é quanto à criação de mecanismos para enfrentar o


problema da superpopulação carcerária, pois segundo Denis Praça, da Defensoria Pública do
Rio de Janeiro, é preciso fazer com que “os direitos dos presos saiam do papel e venham para
o mundo real.” O representante da Defensoria Pública entende que a questão da saúde e da
educação do preso deve ser olhada pela ótica da realidade dos cárceres brasileiros e, assim,
atender o mínimo essencial para que a “nova LEP modifique substancialmente a vida
carcerária no Brasil.” (SENADO FEDERAL, 2013, p. 3).

Sem querer esgotar o tema, aborda-se um aspecto fundamental que diz respeito às
prisões brasileiras, notadamente quanto ao atendimento das mulheres encarceradas. Aspectos
mais abrangentes sobre as questões que permeiam o cárcere brasileiro não serão abordadas,
tendo em vista que este estudo é apenas um trabalho monográfico e não uma dissertação de
mestrado.

Nesta seara, na visão da juíza Nídia Rita Coltro Sorci, do Tribunal de Justiça de São
Paulo, o projeto constituiu-se num grande avanço para as mulheres encarceradas. Observa-se
42

que na cidade de São Paulo, a juíza é responsável por quase cinco mil presas, e revelou que a
população carcerária feminina só vem crescendo, vindo a triplicar nos últimos dez anos.

Na visão de alguns juristas, portanto, pode-se afirmar que há uma grande preocupação
em dar nova configuração ao sistema carcerário nacional. Mesmo, porém, que o
posicionamento teórico dos juristas tenha sido fértil em demonstrar a necessidade de
modificações e aperfeiçoamento da Lei de Execução Penal, a questão entrava no processo
legislativo do PLS 513/2013, que não avança em suas discussões porque não há interesse do
Congresso Nacional em dar o devido encaminhamento, já que os sentenciados não exercem o
direito político ao voto.

2.5 O Garantismo Penal de Luigi Ferrajoli

O art. 5º, inc. XLIX da CF/88 assegura “aos presos o respeito à integridade física e
moral.” Todavia, como bem visto na contemporaneidade, não é exatamente isto que acontece.
Há uma inegável discrepância entre a realidade prisional e o que é preconizado na legislação.
A falta de políticas públicas e o descaso com as normas existentes fazem com que a
ressocialização não aconteça, e que após o apenado cumprir sua pena deixe o presídio muito
pior do que quando entrou.

É fato notório que a Lei de Execução Penal do Brasil é considerada uma das mais
modernas do mundo, entretanto, tal lei é inexequível em vários dos seus dispositivos, uma vez
que não há estrutura adequada à sua aplicação, tampouco ao cumprimento das penas
privativas de liberdade ou às medidas alternativas apresentadas à espécie.

Inúmeras são as demonstrações das falhas do sistema prisional brasileiro e,


consequentemente, da execução penal no Brasil. Superlotação, rebeliões, motins e fugas são
alguns dos problemas noticiados diariamente pelos veículos de comunicação, que acabam por
estampar de forma pública e notória a total ineficiência do Estado na recuperação e
ressocialização do apenado, manifestando o caos vivido pelo sistema penitenciário brasileiro.

Frente à aplicação da pena, Luigi Ferrajoli (2002, p. 21) embasa a sua visão na
concepção da Teoria do Garantismo Penal. De acordo com o seu pensamento, o modelo
garantista clássico é fruto da tradição jurídica do Iluminismo e do Liberalismo, e está
43

embasado na legalidade estrita, na materialidade e na lesividade dos delitos, na


responsabilidade pessoal, no contraditório entre as partes e na presunção de inocência.

A teoria do garantismo, além de fundar a crítica do direito positivo referente aos seus
parâmetros de legitimação externa e interna é, por consequência, também uma crítica das
ideologias: das ideologias políticas, sejam jusnaturalistas ou ético-formalistas, que
confundem, sob o plano político externo, a justiça com o direito, ou pior, vice-versa; e das
ideologias jurídicas, sejam normativas ou realistas, que confundem, paralelamente, sob o
plano jurídico ou interno, a validade com o vigor, ou, ao contrário, a efetividade com a
validade (FERRAJOLI, 2002).

Destarte, esta teoria do garantismo penal mostra-se importante justamente por permitir
uma crítica das ideologias, evidenciando que a lei penal e a execução da pena devem atender
aos anseios daqueles a que se destinam.

No entendimento de Salo de Carvalho (2008, p. 143), “a minimização do sofrimento


(redução de danos) gerado pela pena (violência pública) e negação da violência privada
ilegítima [...]” possibilita a compreensão da necessidade de deslocar o problema da pena da
esfera jurídica à política, uma vez que o garantismo defendido por Luigi Ferrajoli apresenta a
pena como uma função reeducativa, fazendo-se necessária a ruptura na unidade do processo
penal.

Primeiramente, questiona-se a possibilidade de os operadores do Direito,


principalmente o juiz, tomar decisões com relação à pena sem um modelo que justificasse a
sua aplicação. Nesse sentido, a legitimação da aplicação da pena no Brasil está baseada em
uma legislação ultrapassada, uma vez que o sistema de execução pátrio contraria o garantismo
penal, instrumentalizando a utilização de medidas opressoras e não de reeducação e reinserção
social.

No sistema de execução penal, a pena imposta tem característica sancionatória e visa


dar uma resposta à sociedade frente à adversidade ocorrida, direcionando a sanção aplicada à
prevenção de novos delitos. Contraria, assim, o que defendem os garantistas, dentre eles
Ferrajoli (apud CARVALHO, 2008, p. 145), para quem a pena pode ser interpretada como
“[...] técnica institucional de minimização da reação violenta ao desvio socialmente não
44

tolerado, e de garantia do indiciado contra os arbítrios, os excessos e os erros comuns em


sistemas a-jurídicos de controle social.”

“A pena, portanto, seria um instrumento político de negação da vingança; um limite ao


poder punitivo; um mal menor às possibilidades vindicativas que se produziriam na sua
inexistência.” (FERRAJOLI apud CARVALHO, 2008, p. 149). Significa dizer que Ferrajoli
não nega a aplicação da pena, mas, pelo contrário, “reconstrói o modelo genealógico
seriamente abalado pelo direcionamento do direito penal à Defesa Social.”

Evidencia-se, assim, que o modelo garantista nega o direito penal do inimigo, uma vez
que reconhece o outro como uma pessoa com dignidade, que deve ser respeitada apesar de ter
cometido um delito e, portanto, não deve ser vista como um meio para aplicação da pena, mas
sim como um fim (CARVALHO, 2008, p. 149).

Vive-se em uma sociedade em constante progressão civilizatória, a qual exige que os


instrumentos utilizados na aplicação da pena não servem apenas para o controle social ou para
conter os ímpetos agressivos do homem, mas, principalmente, para garantir uma justiça
restaurativa e não retributiva.

Denota-se, assim, que o sistema carcerário nacional está distante da teoria garantista,
uma vez que “[...] tem como norte a pedagogia disciplinar. Conforma, pois, um modelo
otimizado de violação dos direitos fundamentais”, exacerbando as relações intramuros e
provocando a rebelião, motins, condutas ilícitas, o que demonstra a existência de um conflito
entre a legislação da execução penal e o cotidiano carcerário (CARVALHO, 2008, p. 221).

Com efeito, o fenômeno da conflitividade carcerária, que se manifesta em fugas,


rebeliões, motins, indisciplina, tem a violação, por parte do Estado, como principal fato
gerador dos direitos constitucionais dos apenados. Isto porque as rebeliões nas penitenciárias
brasileiras têm relação direta com as péssimas condições carcerárias, os maus tratos sofridos
pelos detentos e a sua superlotação.

As transgressões às regras impostas nas penitenciárias indicam que,


45

A imensa maioria dos protestos reivindicatórios massivos produzidos a prisão tem


sua origem nas deficiências efetivas do regime penitenciário. As deficiências são tão
graves, que qualquer pessoa que conheça certos detalhes da vida carcerária fica
profundamente comovida. (BITENCOURT, 2011, p. 229).

Assinala-se, portanto, que a situação do Presídio Central de Porto Alegre retrata a


fragilidade do cumprimento do previsto pela LEP, uma vez que a execução da pena privativa
de liberdade estabelece padrões de boa conduta carcerária, exigindo disciplina e uma conduta
dos apenados que não subverta a ordem, tampouco que participem em movimentos que
possam provocar motins, rebeliões, etc.

Deste modo, percebe-se que é imprescindível efetuar a análise dos dados que
identifiquem as péssimas condições dos presídios brasileiros – degradantes, desumanas,
indignas e torturantes –, em especial do Presídio Central de Porto Alegre. Dessa forma, será
possível demonstrar que há constante violação dos direitos fundamentais e que os objetivos da
LEP não estão sendo alcançados face à falta de políticas públicas que proporcionem a
reeducação do apenado e sua reintegração na sociedade.
46

3 A SITUAÇÃO DO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE: CONDIÇÕES


DOS ENCARCERADOS, SEGUNDO O INFOPEN (2016)

Este capítulo tem por objetivo especificar as condições de vida dos encarcerados no
Presídio Central de Porto Alegre, em especial quanto ao respeito ao ser humano, à restrição da
liberdade e à atuação dos Direitos Humanos nesse cenário.

Após analisar essa realidade apresenta-se a posição da juíza Sonáli da Cruz Zluhan; do
defensor público do RS, Alexandre Brandão, dirigente do Núcleo de Defesa em Execução
Penal; e do juiz de Direito Sidinei Brzuska, titular da Vara de Execuções Criminais de Porto
Alegre. A finalidade é demostrar que os fenômenos violência e violação dos direitos humanos
estão inter-relacionados, bem como comprovar o tratamento desumano, cruel e indigno vivido
pelos presos, sentenciados ou não, no Presídio Central de Porto Alegre.

Inicialmente, porém, faz-se algumas considerações sobre a situação dos presídios no


Brasil, com base em dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias
(Infopen) relativos ao ano de 2016 (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Destaca-se que as respostas político-criminais à violência e a consequente violação


dos direitos humanos, existentes na grande maioria dos presídios brasileiros e no Presídio
Central de Porto Alegre, são situações-problema que não se ignora, mas que constituem tarefa
complexa, nem um pouco fácil e tampouco de solução a curto prazo.

3.1 Situação dos presídios no Brasil: análise de dados

A atual situação dos presídios no Brasil está relacionada ao fato de o Governo Federal
não apresentar uma política voltada ao cumprimento da obrigação constitucional que prevê a
garantia da integridade física e moral do apenado, tampouco cumprir com os objetivos
previstos na LEP.

Com o intuito de contextualizar a situação dos presídios no Brasil buscou-se resgatar,


na medida das limitações pessoais e acadêmicas, os dados do Levantamento Nacional de
Informações Penitenciárias (Infopen), colacionando aqueles considerados mais importantes e
necessários para esta pesquisa, que não é terminativa mas, sim, explicativa.
47

Figura 1. Pessoas privadas de liberdade no Brasil (jun./2016)

Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, jun./2016).

Conforme se depreende da Figura 1, supra, há uma grande quantidade de pessoas


encarceradas no território brasileiro. Percebe-se, ainda, que o déficit de vagas é quase
equivalente ao número de vagas ocupadas em presídios, ou seja, condena-se muito mais do
que o sistema suporta.

Nesse viés, embora se tenha uma ampla Lei de Execução Penal no que diz respeito à
sua taxatividade, percebe-se que o escrito não condiz com o que é aplicado cotidianamente,
resultando no caos em que se encontra o sistema penitenciário brasileiro.

Frente aos dados expostos na Figura 1, insta consignar que do número total de
encarcerados, 33.868 se encontram no Estado do Rio Grande do Sul, fazendo com que o
Estado venha a ocupar a sétima posição entre os maiores índices de habitação carcerária no
país (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

No atual contexto político-social e jurídico constata-se que o Direito Penal vem sendo
alvo de inúmeros questionamentos acerca de sua eficácia e efetividade. Nesse sentido, é
fundamental analisar aspectos referentes aos presos sem condenação, com medida de
segurança, sentenciados e em regime fechado e aberto, entre outros.
48

A partir do texto que segue, passa-se a representar graficamente os dados encontrados


no Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – Infopen (MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA, jun./2016), cuja releitura permite compreender que a pena, com suas limitações e
características do modelo retributivo, tem sido utilizada como instrumento de coação,
repressão e não de ressocialização.

A Figura 2, a seguir, revela uma característica grave do atual sistema penitenciário


brasileiro, em que 40% dos presos se encontram detidos sem haver condenação. Isso, por si só
já mostra que o Direito Penal, que deveria ser tratado como Ultima ratio2, vem sendo
utilizado como meio primordial para a solução do delito – ou até mesmo do processo, haja
vista que o preso se encontra privado da sua liberdade sem ao menos existir uma sentença
condenatória transitada em julgado.

Figura 2. Presos por natureza da prisão e tipo de regime

Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, jun./2016).

Observa-se, em relação ao perfil da população carcerária, um expressivo número de


indivíduos na faixa etária dos 18 aos 24 anos que, em uma análise inicial, deveriam estar
cursando o Ensino Médio ou Superior. A falta, porém, de políticas públicas na área da
educação, bem como de pespectivas em razão da falta de empregos, gera desocupados e
desempregados que encontram no crime um meio de sobrevivência.

2
Ultima ratio significa “última razão” ou “último recurso”.
49

É inegável que o abismo racial faz parte da história brasileira, sendo a estigmatização
dos cidadãos negros reforçada pelo preconceito e senso comum, pois são percebidos como
potenciais pertubadores da ordem social e constantes alvos de investigações policiais
(ADORNO et al., 2010). Mesmo, porém, que os dados estatísticos revelem que o perfil da
população carcerária, no que tange à cor, representa um índice superior a 50% de negros, é
necessário ressaltar que “as extremas desigualdades sociais, a baixa participação dos cidadãos
negros nas universidades e escolas particulares [...]” são obstáculos que contribuem para
impedir a universalizaçção da cidadania plena entre a população (ADORNO et al., 2010,
[s.p.]).

Esse fenômeno está enraizado no imaginário social e é comprovado pelos dados que
seguem. Não se pode, contudo, generalizar, pois “[...] não há diferenças entre o ‘potencial’
para o crime violento revelado pelos réus negros comparativamente aos réus brancos.”
(ADORNO, et al., 2010, [s.p.]).

Denota-se que do universo total de presos no Brasil, 55% têm entre 18 e 29 anos
(Figura 3), ou seja, são jovens que estão encarcerados, provavelmente pela falta de acesso à
cultura, educação, lazer, etc. Sob a ótica estadual, as maiores taxas de jovens presos com
menos de 25 anos são registradas no Acre (45%), seguido do Amazonas (40%) e Tocantins
(39%) (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Figura 3. Faixa etária da população carcerária

Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, jun./2016).


50

Em relação à raça/cor, os dados do Infopen apontam que 64% da população prisional é


composta por pessoas negras, sendo o maior percentual verificado no Acre (95%), Amapá
(91%) e Bahia (89%) (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Figura 4. Raça/cor da população carcerária

Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, jun./2016).

Quanto à escolaridade, 75% da população prisional brasileira não chegaram ao Ensino


Médio e menos de 1% dos presos têm graduação. Este fator denota a relação que há entre a
ocorrência de delitos por parte da população hipossuficiente e o seu nível de educação, com
pouco acesso à informação e oportunidades. Entre os que cometem delitos e crimes estão
aqueles que não possuem Ensino Fundamental completo, o que remete à compreensão sobre a
falta de políticas públicas e sociais na área educacional, o que dificulta o acesso à justiça
penal e a um processo justo (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Figura 5. Escolaridade da população carcerária

Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, jun./2016).


51

Com relação aos crimes tentados e consumados pelas pessoas presas no sistema
federal, constata-se os relacionados ao tráfico de drogas, os quais levam mais pessoas às
prisões, representando 28% da população carcerária total. Somados, roubos e furtos chegam a
37%, enquanto homicídios representam 11% dos crimes que causaram a prisão
(MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Figura 6. Distribuição do registro dos crimes tentados e consumados no sistema federal

Fonte: Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, jun./2016).

O Infopen indica que 4.804 pessoas estão presas por violência doméstica e outras
1.556 por sequestro e cárcere privado. Crimes contra a dignidade sexual levaram 25.821
pessoas às prisões, das quais 11.539 respondem por estupro e outras 6.062 por estupro de
vulnerável (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2016).

Feitas as constatações acerca do atual sistema penitenciário brasileiro, observa-se o


evidente afronte ao princípio constitucional da dignidade humana, eis que tanto em relação à
infraestrutura como às políticas públicas adotadas pelo sistema, este caminha em passo
distante do ideal.

Registre-se, contudo, que não se tem o objetivo de trazer à baila todos os dados
inerentes ao sistema carcerário, mas fazer uma demonstração do impacto da banalização do
sistema frente à integridade física e moral do apenado.

Mister se faz, também, analisar as condições de vida dos encarcerados no Presídio


Central de Porto Alegre – objeto principal do presente estudo, a fim de constatar e evidenciar
52

o crítico descaso e a inobservância frente à Lei de Execução Penal, bem como o princípio
constitucional da dignidade da pessoa humana.

3.2 Situação do Presídio Central de Porto Alegre: análise da realidade prisional

Feitas as análises acerca do atual sistema penitenciário brasileiro, faz-se necessário


observar a realidade do Presídio Central de Porto Alegre (PCPA), que compõe uma área de 25
mil metros quadrados, com capacidade para receber 1,9 mil presos, mas que na data desta
pesquisa abrigava 4,7 mil apenados (JORNAL DO COMÉRCIO, 2017).

Nesta senda, o que se tem é uma superlotação de 250%, somada aos três mil
funcionários, visitantes e voluntários que passam por lá diariamente. Registra-se, ainda, que
essa população supera o número de habitantes em 42% dos municípios gaúchos (JORNAL
DO COMÉRCIO, 2017).

A superlotação traz problemas diários, especialmente em relação à alimentação, saúde,


higiene e segurança dos apenados. Segundo dados do Jornal do Comércio (2017), o Presídio
Central de Porto Alegre apresenta dados positivos em alguns aspectos, tais como:

“Temos a menor taxa de mortalidade entre cadeias na América Latina”, orgulha-se


o coronel Marcelo Gayer, diretor do Central. A média é de quatro a cinco mortes por
ano, todas por doenças, “e só porque pacientes terminais são trazidos para cá de
outras prisões”, ressalta. O diretor aponta que o índice de tuberculose fica entre
20% e 30% nos presídios brasileiros, enquanto no Central é de 0,016%. Lá, o último
homicídio foi registrado há dois anos e meio. O número de mortes é, de fato, baixo.

Para amenizar os demais problemas do PCPA, as autoridades que atuam no dia a dia
no local desenvolvem projetos que visam oportunizar aos detentos a realização de alguma
atividade voltada à educação, artesanato, marcenaria, entre outros:

O diretor do PCPA afirma que ali são desenvolvidos vários projetos que servem de
modelo para o Brasil, e que o fator de dificuldade existente, hoje, é, realmente, a
superlotação – se, em vez de 4,7 mil presos, houvesse 2,5 mil, seria possível
abranger a todos com algum projeto. Na área de educação, há um Núcleo Estadual
de Educação de Jovens e Adultos (Neeja) com aulas dos ensinos Fundamental e
Médio, com as quais os presos podem concluir seus estudos. (JORNAL DO
COMÉRCIO, 2017).

Para a efetiva garantia de alguns direitos fundamentais, o PCPA desenvolve programas


para dependentes químicos, procurando assegurar melhores condições psíquicas e físicas ao
53

apenado durante o tempo de cumprimento da pena. Os presos usuários de crack ou outras


drogas pesadas são isolados dos demais presos e passam por um tratamento de recuperação
específico para desintoxicação. Nesse sentido se manifesta o diretor do PCPA:

Em cinco anos foram atendidos mais de mil presos, de acordo com o diretor do
presídio, sendo a grande maioria usuários de crack e outras drogas pesadas. “Quase
todos eles eram rejeitados pela família. Hoje, conseguimos trazer a família para
perto.” Como não há lugar para todos os presos necessitados, é dada prioridade aos
pertencentes a facções criminosas. (JORNAL DO COMÉRCIO, 2017).

Apesar dos programas de recuperação e reinserção social dos apenados, contudo,


constata-se, ainda, que muitas mazelas persistem no Presídio Central de Porto Alegre, e que
há diversos fatores que afetam não só a integridade física do apenado, mas, também, o fator
psicológico. Nesta linha, registra-se que o objetivo deste estudo não é esgotar o assunto, mas
sim analisar as principais rupturas sociais deste sistema face à dignidade da pessoa humana.

Faz-se mister, portanto, adentrar na opinião de autoridades que atuam diretamente no


Presídio Central a fim de compreender o que de fato ocorre no dia a dia da instituição, haja
vista as dificuldades e os desafios da aplicação da Lei de Execução Penal e dos clamores da
sociedade, que exige a máxima do Direito Penal do inimigo: “bandido bom é bandido morto”.

3.3 Desrespeito à pessoa privada da liberdade como ser humano e a atuação dos Direitos
Humanos

No contexto do sistema prisional brasileiro e na situação vivenciada no Presídio


Central de Porto Alegre, segundo dados do Infopen já citados anteriormente nesta pesquisa,
vale destacar o importante papel que assumem os Direitos Humanos, pois são inerentes ao
homem e têm o propósito de salvaguardar a dignidade da pessoa humana.

Interessante lembrar que não faz muitos anos que os Direitos Humanos ganharam
notoriedade no Brasil e no mundo, e que desde o século XVII a efetiva proteção dos direitos
humanos sempre foi precária na maioria dos países. Evidentemente que

[...] essa morosidade na garantia dos direitos humanos acontece pelo fato de que não
há interesse na garantia plena dos direitos humanos, pois, para que o cidadão possa
ter vida digna, depende do acesso aos direitos civis, sociais e coletivos, ou seja, não
adianta ter direito de votar e ser votado se não tem acesso à educação e assistência à
saúde, enfim, no sistema capitalista, como será mencionado adiante, a elaboração de
políticas sociais pelo Estado servem, simplesmente, para garantir o mínimo ao
cidadão, não há interesse em resolver as mazelas que atingem a grande maioria da
população. (SANTOS, 2017, p. 10).
54

Por esse viés, percebe-se que um dos grupos mais atingidos por essa sonegação de
direitos é o dos presidiários que, excluídos da sociedade, invisíveis aos olhos dessa e da
família, não recebem do Estado a atenção exigida tanto pela CF/88 como pela Declaração
Universal dos Direitos do Homem no que concerne à efetivação de seus direitos mínimos,
quais sejam: saúde, educação, integridade física e moral, gerando, por sua vez, mais
desigualdades sociais (SANTOS, 2017).

Neste sentido, Oscar Vilhena Vieira (2008, p. 207) expõe, também, que são as
desigualdades sociais “que causam a invisibilidade daqueles submetidos à pobreza extrema, a
demonização daqueles que desafiam o sistema e a imunidade dos privilegiados”, corroendo o
próprio Estado de Direito e a observância das leis infraconstitucionais.

Neste aspecto, os encarcerados não são vistos como detentores de direitos e deles é
afastada a garantia inerente à dignidade humana, uma vez que, na visão de Ana Paula de
Barcellos (2019, p. 52), “[...] a concepção da dignidade da pessoa humana parece ser afastada
dos rotulados como criminosos e bandidos, a hipótese é a de que a própria concepção de
dignidade está vinculada às práticas do indivíduo e não à sua condição inerente de ser
humano.” Desse modo, os direitos humanos estão interligados à dignidade da pessoa humana
e, também, aos direitos individuais e coletivos reconhecidos a todos os cidadãos, inclusive os
privados de liberdade.

Na verdade, os direitos humanos têm o propósito de salvaguardar a dignidade humana,


pois durante muito tempo as políticas sociais desenvolvidas pelo Estado serviam,
simplesmente, para garantir o mínimo ao cidadão, sem interesse em encontrar soluções para
minimizar as mazelas da maioria da população. Infelizmente, parece que essa realidade ainda
não mudou, pois as políticas sociais e públicas – dever do Estado – continuam oferecendo o
mínimo para a sobrevivência da população e, em relação à situação dos estabelecimentos
prisionais, a realidade é revoltante e caótica (SANTOS, 2017).

A realidade dos cárceres brasileiros, noticiados constantemente por revistas, jornais e a


TV, demonstram a necessidade de maior atenção aos direitos humanos dos presos. Sabe-se
que a LEP, em vigor desde 1984, com algumas alterações ao longo dos anos, entre elas a
alteração da progressão de regime decretada pela Lei nº 13.769/18, sinaliza a implantação de
um sistema mais humanitário, voltado aos direitos dos reclusos.
55

O tratamento aos presos, a superlotação carcerária e a falta de condições estruturais


das penitenciárias têm sido as maiores violações dos direitos humanos dos presos no Brasil.
Com relação à situação do Presídio Central de Porto Alegre se manifesta a juíza Sonáli da
Cruz Zluhan, o defensor público do RS, Alexandre Brandão, dirigente do Núcleo de Defesa
em Execução Penal; e o juiz de Direito Sidinei Brzuska, titular da Vara de Execuções
Criminais de Porto Alegre, todos em reportagem publicada pelo Jornal Correio do Povo, em 2
de setembro de 2018.

3.3.1 Posição da juíza Sonáli da Cruz Zluhan quanto à humanização da pena privativa de
liberdade

Antes de referir a posição da juíza Sonáli da Cruz Zluhan quanto à humanização da


pena privativa de liberdade, deve-se assinalar que a crise vivenciada na área de Segurança
Pública no Estado do Rio Grande do Sul não é recente e que os índices de violência atingiram
níveis preocupantes no decorrer dos tempos.

O problema relativo ao encarceramento dos apenados vem de longa data e, nesta


senda, a solução também precisa de maturação. A Segurança Pública não é responsabilidade
exclusiva do Executivo, eis que esta é compartilhada pelo Legislativo, Judiciário e
comunidade – confirmando, deste modo, a sua prioridade para toda a sociedade.

A situação vivenciada pelo PCPA evidencia a ausência de política de Estado, bem


como políticas públicas concretas e permanentes que visam mudanças não só na estrutura
física, mas também com relação à ressocialização dos apenados.

Obviamente, que o Estado do Rio Grande do Sul, com a grave crise econômica que
vem enfrentando nos últimos anos, não tem conseguido dar conta das demandas sociais.
Nessas se incluem a melhoria das condições da Segurança Pública, em especial das
penitenciárias, destacando-se o Presídio Central de Porto Alegre.

Diante dessa realidade, a fiscalização realizada pela magistrada Sonáli da Cruz Zluhan
e destacada em recente reportagem do Jornal Correio do Povo (2018), demonstra a
preocupação de que não adianta trabalhar apenas na lógica de criar mais vagas nos
estabelecimentos carcerários se não houver uma mudança na cultura do sistema prisional com
a humanização da pena privativa de liberdade.
56

Isso significa que aumentar a quantidade de presos por galeria/cela só aumenta a


violência interna e possibilita que as facções se tornem mais fortes, segundo escreve o Jornal
Correio do Povo (2018, p. 6):

Não acredita em ressocialização com o sistema como é hoje. Em um evento sobre o


tema no último mês em Porto Alegre, ela afirmou que o sistema carcerário está
totalmente falido e não há como falar em recuperação. “Prender como se prende
hoje em dia não leva a nada, a gente só alimenta a facção, que toma conta das
penitenciárias.” Sonáli, que é responsável pela inspeção nos presídios, conta que a
CPPA só funciona hoje em dia porque há um pacto com os plantões de galeria e com
as facções. “Se eles quisessem, eles viravam o Central. São quase 5 mil pessoas. É
uma cidade lá dentro, 400 pessoas dentro de cada galeria. Quem manda na galeria
tem geladeira, cela mais conservada, com pouco mais de individualidade.” Ela
garante que para entender o que acontece lá, só convivendo. “Não é questão de
gostar, ter raiva ou não de preso, faz parte da sociedade. Nunca se prendeu tanto e
nunca a violência cresceu tanto. As pessoas estão cada vez mais apavoradas.”

A juíza tem razão em suas afirmações, uma vez que a situação carcerária do Rio
Grande do Sul é uma das questões mais complexas da Segurança Pública do Estado. Em
2017, segundo a Superintendência dos Serviços Penitenciários (SUSEPE, 2018), a população
carcerária chegou a 37 mil presos, sendo que em apenas um ano houve um aumento de 3.446
presos nos regimes fechado, semiaberto e aberto.

Observa-se que a situação do PCPA se mostra totalmente desumana e deficiente,


podendo ser considerada uma grande escola do crime. A situação de privação de liberdade
impossibilita a reintegração social do apenado e requer a promoção de ações voltadas à
inserção e aceitação do indivíduo no mercado de trabalho. Há, portanto, necessidade da
participação conjunta da sociedade, do Poder Judiciário, Executivo e Ministério Público para
a efetivação de tais práticas.

Ressalva-se, ainda, que a crise e a falência do sistema penitenciário brasileiro, no qual


se inclui o Estado do Rio Grande do Sul, é reflexo do problema social existente na sociedade
brasileira face a deficiência cultural, social, política e econômica.

3.3.2 Posição de Sidinei Brzuska, Juiz da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre

O Brasil é o terceiro país do mundo com maior número de presos, ficando somente
atrás dos Estados Unidos e da China. Em São Paulo se encontra um terço dos detentos, o que
57

denota que não são raros os casos de superlotação nos presídios brasileiros e, notadamente, no
Presídio Central de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

É senso comum que a vida de um detento interno no sistema carcerário gaúcho é


considerada péssima, tanto nos aspectos de higiene, como em relação ao número de presos
por cela e a própria segurança. Apesar das péssimas condições, contudo, registra-se a
existência de dispositivos legais que servem para assegurar os direitos dos presos,
principalmente a CF/88 e a Lei de Execução Penal. A violação dos direitos humanos dos
apenados tem sido constante e prova o desrespeito aos seus direitos fundamentais, indo contra
a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948, art. 7º).

A posição do magistrado Sidinei Brzuska quanto à situação vivenciada no PCPA,


como, por exemplo, a superlotação, permite compreender que a violação das regras e dos
princípios constitucionais traz uma sobrepena ao condenado, uma vez que o convívio neste
local gera maior ansiedade e insegurança, pois ele se submete às facções que comandam o
presídio e às dificuldades inerentes à vida no cárcere. Nesse aspecto, o magistrado afirma que:

[...] uma parcela significativa da sociedade tem o pensamento de que bandido bom é
bandido morto e que, dentro dos presídios, quanto pior, melhor. Porém, segundo o
magistrado, o que aconteceu foi que, com isso, as organizações criminosas
transformaram as penitenciárias no quanto pior, melhor para o crime. “As facções
não reclamam de condições estruturais, do local, da comida ou colchão. Os presídios
se tornaram postos seguros para essas pessoas que comandam o crime dali”, frisa
ele, que ressalta que o Presídio Central é o berço de tudo. De acordo com Brzuska,
tudo é controlado de dentro do presídio. “O Estado se encolheu neste ‘quanto pior,
melhor’ por muitos anos”, aponta o magistrado. Para ele, aos poucos a
administração dessas penitenciárias foi repassada para os detentos. Para retomar o
controle, que é o que o governo busca hoje, não é algo fácil. (CORREIO DO POVO,
2018).

Cabe referir, portanto, que a atuação do magistrado no Rio Grande do Sul é muito
elogiada e mostra uma preocupação com o ser humano que está vivendo uma situação
temporária de privação da liberdade. Em sua fala, Brzuska ressalta que se o preso for tratado
sem a dignidade humana inerente a qualquer pessoa, certamente ao retornar ao convívio na
sociedade, enfrentará as consequência do cárcere e a discriminação pelo resto da vida.

Destarte, a violação dos direitos dos encarcerados tem consequências nocivas na forma
como irão reagir quando inseridos na sociedade. Sabe-se que a ressocialização é uma utopia
58

no país, uma vez que o Estado é extremamente ineficaz no que se refere à sua reeducação, não
auxiliando na reintegração dos presos na sociedade.

3.3.3 Posição de Alexandre Brandão, dirigente do Núcleo de Defesa em Execução Penal da


Defensoria Pública do RS

A CF/88 estabelece um rol de direitos e garantias que protegem o acusado desde o


momento de sua prisão em flagrante até a sua saída do sistema prisional. Por outro lado,
garante aos cidadãos, incluindo os apenados, em seu art. 5º, LXXIV, que “o Estado prestará
assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.” Nesse
aspecto, a Defensoria Pública assume o papel fundamental de prestar assistência integral aos
sentenciados, acusados, presos, bem como aos seus familiares (BRASIL, 1988).

Conforme o art. 134 da Carta Magna, a Defensoria Pública é uma instituição


permanente, essencial à função jurisdicional do Estado e, portanto, tem o dever de promover
os direitos humanos e a defesa de todos aqueles que necessitarem de um advogado, seja no
âmbito judicial ou extrajudicial (BRASIL, 1988).

Da mesma forma, a Lei de Execução Penal, no art. 81, ressalta o papel da Defensoria
Pública que, entre outros, faz a fiscalização do ambiente carcerário a fim de garantir a
integridade física e moral dos presos, proporcionando condições para que o apenado se sinta
respeitado em seus direitos, mesmo que a situação dos estabelecimentos prisionais no Brasil
seja caótica.

Com efeito, mas não menos importante, é a posição do Defensor Público Alexandre
Brandão, atuante no Núcleo de Defesa em Execução Penal da Defensoria Pública do RS, que
assim se manifestou a respeito:

Para ele, o sistema prisional brasileiro, como o gaúcho, é caótico. “Infelizmente é


uma das vergonhas nacionais.” De acordo com ele, hoje existe um punitivismo
muito grande, uma ideia de que a solução é prender. “Não se pergunta o que está
gerando a criminalidade, o que se pode fazer para resolver esse problema.
Simplesmente se quer prender e, atualmente, nós temos uma das maiores
populações carcerárias do mundo”, destaca. Conforme os dados do Departamento
de Segurança e Execução Penal, na tarde do dia 20 de agosto, 39.809 pessoas
estavam atrás das grades no Estado. “Hoje, todo o nosso sistema prisional está
superlotado”, frisa. Brandão diz que o Estado prende, mas quem administra as
galerias são os presos. “Eles que se coordenam, estabelecem as normas. A pessoa
que é presa fica à mercê da facção da galeria na qual está recolhido. Muitos
conseguem sair e participar de projetos, mas nem todos que gostariam.”
(CORREIO DO POVO, 2018).
59

Merece destaque o trabalho da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul que vem
assegurando a defesa criminal eficaz daqueles que têm sua liberdade restringida e que não
possuem condições de constituir um advogado particular. Observa-se, também, que a
garantia de uma efetiva e completa assistência técnica é indispensável para a preservação
dos direitos e garantias fundamentais do apenado. Neste sentido,

Periodicamente, a Defensoria Pública fiscaliza as penitenciárias do Rio Grande do


Sul. Brandão lembra que o sistema, no todo, é melhor que o de muitos Estados,
mas ainda falta muito para dizer que é bom. “A pessoa que vai para o presídio,
primeiro, ela não tem garantia da sua integridade física. Existe uma alta
propagação de doenças no sistema prisional, são presídios úmidos, superlotados, a
maioria dorme no chão e com colchão de espuma direto no concreto. Falta de
condições mínimas para quem está recolhido”, detalha. Para o defensor, a
sociedade não quer investir nessa área porque ninguém se importa com quem está
atrás das grades. “O grande trabalho nosso é garantir o direito daqueles que estão
presos. Eles precisam ser punidos pelo crime, se foi julgado nesse sentido, só que
eles têm direitos ainda. A dignidade, a saúde e a sair de lá, pelo menos, como
entrou, mas não sai.” (CORREIO DO POVO, 2018).

Inobstante o comprometimento da Defensoria Pública gaúcha em defesa dos


segregados, sabe-se que o Estado ainda não está perto do ideal no que diz respeito à
melhoria dos presídios, em especial o PCPA.

Neste ponto, importante destacar o papel exercido pela Defensoria do Estado do RS


quanto à defesa criminal eficaz dos apenados. Há, porém, a necessidade do reconhecimento
estatal de que os hipossuficientes economicamente necessitam de maior proteção.
60

CONCLUSÃO

O atual sistema de execução penal brasileiro encontra-se em conflito. As condições


advindas do cárcere são falhas frente ao cumprimento do mínimo, pois não há estrutura e
tampouco preparo. Ao mesmo tempo percebe-se que não há necessidade de punir menos, mas
sim de punir melhor, punir sob o prisma disciplinar, frente à justificativa da Defesa Social –
eis que o Direito de Punir, como se sabe, deslocou-se da vingança do soberano à defesa da
sociedade.

A prisão, da forma como se percebe na atualidade, constitui-se numa realidade


truculenta, provinda de um sistema desigual e opressivo, movido pelo ódio e opressão –
fatores ligados ao total descaso do Estado-Nação – os quais realimentam o aspecto perverso
do sistema.

A proteção resultante dessa falha é ilusória, eis que, como se vê, apenas os valores
negativos são reforçados. Enquanto isso, quanto mais gravosa for a pena e as medidas
impostas aos condenados, maior a probabilidade de reincidência, o que vai na contramão do
sistema acusatório de garantias.

Evidencia-se, portanto, que a falência da prisão se dá justamente pelo fato de o Direito


Penal desempenhar um papel limitado e medíocre na prevenção da criminalidade. De nada
vale tipificar e impor penas rigorosas na ilusão de um efeito preventivo.

É fato notório que o crime resulta de fatores sociais que não são afetados pela ameaça
penal ou pela efetiva imposição da pena. O que entrava, porém, é uma questão sócio-política,
cuja prevenção exige a elaboração de um amplo programa, projetado no plano político e
econômico.
61

Insta consignar que a pena não se funda na retribuição, mas se destina à proteção do
bem jurídico tutelado e deriva da função estatal que garante a tutela e a manutenção da ordem
jurídica. A retribuição em nada se identifica com o escopo da pena – ao menos em tese –, eis
que presume a ideia de culpa como pressuposto de punição, jamais sendo capaz de justificar a
tipificação de determinadas condutas.

Para que se encontrem meios alternativos ao cumprimento da pena privativa de


liberdade, faz-se necessário o conhecimento brando de todo o sistema de execução penal.
Imperioso, porém, o reexame dos critérios de criminalização mediante a utilização da
limitação da via punitiva, que visa favorecer a tutela de bens jurídicos verdadeiramente
importantes para a vida social.

Como se vê, a qualidade da norma jurídica brasileira, lamentavelmente, difere da


situação social do país e, embora isso aconteça, não é possível continuar com uma “letra
morta”, ou seja, com um sistema ineficiente que não beneficia ninguém! Enquanto o
sentenciado for tratado de forma desumana e degradante, a sociedade continua insegura e
movida pelo medo, e o Estado passa a ser uma máquina ineficaz!

É certo que a garantia constitucional frente à dignidade humana é o modo privilegiado


de ressocialização do preso e, por outro lado, uma alusão para que não sejam dados motivos
para reincidir no erro anteriormente cometido. As influências que levam ao fato delitivo,
contudo, são inúmeras e, por este motivo, não há como realizar uma abordagem ligada apenas
a fatores de ordem social. O que se sabe, todavia, é que a desigualdade dá origem à
delinquência.

Por meio disso, ao refletir acerca da execução penal, constata-se que a Lei de
Execução Penal garante ao preso e ao internado a devida assistência e outras garantias legais.
Em direção oposta ao que estabelece a Lei, entretanto, os presídios (mais especificamente o
Presídio Central de Porto Alegre, objeto deste estudo) propiciam um ambiente degradante e
desumano ao preso, tendo em vista a superlotação, a ausência de assistência médica, a
precariedade na alimentação e a falta de higiene, cujos fatores desencadeiam diversas
doenças.

É evidente que a pena privativa de liberdade é a solução para diversos delitos, todavia,
o que advém do cárcere brasileiro é uma “fábrica de criminosos”. O sistema, porém, é falho
62

no tocante à reinserção social, sendo necessária a adoção de medidas alternativas


proporcionais aos Direitos Humanos. Ademais, o cumprimento da pena privativa de
liberdade, de forma alguma poderá se dar em desfavor da dignidade humana. Isso posto,
constata-se a necessidade urgente da implantação de políticas públicas frente a este fato
gerador.

Imperioso ressaltar que uma sociedade democrática tem sua identidade diretamente
relacionada ao compromisso com a garantia e a efetivação dos Direitos Humanos, e não ao
seu controle ou negação. Desse modo, a correção das injustiças advindas das mazelas do
sistema penitenciário brasileiro está fortemente ligada à garantia constitucional frente à
dignidade da pessoa humana, sendo que a mudança nesse sentido representa o avanço da
democracia.

O estudo da questão carcerária e as graves violações a que os apenados estão


submetidos no Brasil permite concluir que o sistema prisional brasileiro está em fase terminal.
É necessária, então, uma reforma urgente em todos os aspectos, desde a prisão do delinquente
até o acompanhamento do egresso do sistema, procurando inseri-lo socialmente, a fim de
evitar que seja mais um número a engrossar as estatísticas da reincidência.
63

REFERÊNCIAS

ABREU, Klayne Leite de; STOLL, Ingrid; RAMOS, Letícia Silveira; BAUMGARDT,
Rosana Aveline; KRISTENSEN, Christian Haag. Estresse ocupacional e Síndrome de
Burnout no exercício profissional da psicologia. Psicologia, ciência e profissão. Brasília, v.
22, nº 2, 2002, pp. 22-29. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414-
98932002000200004&script=sci_arttext&tlng=es. Acesso em: 24 nov. 2018.

ADORNO, Sergio et al. A criminalidade negra no banco dos réus: discriminação e


desigualdade no acesso à justiça penal. Relatório de pesquisa. São Paulo: Núcleo de Estudos
da Violência, Fundação Ford, CNPq e FAPESP, 2010.

AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Execução penal: esquematizado. São Paulo: Forense,
2014.

BARCELLOS, Ana Paula de. Violência urbana, condições das prisões e dignidade humana.
Revista de Direito Administrativo. Disponível em: DADOS/Downloads/8074-17397-1-
PB.pdf. Acesso em: 16 maio 2019.

BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. Tradução de Lucia Guidicini e
Alessandro Berti Contessa. Revisão de Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Martins Fontes,
2000.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 8. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1,
2003.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. 4. ed. São
Paulo: Saraiva Jur, 2011.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 17. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1,
parte geral, 2012.

BRASIL (Constituição, 1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.


Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 02 set. 2018.

BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal.


Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 24 nov. 2018.
64

BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em: 20 set. 2018.

BRASIL. Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992a. Promulga a Convenção Americana


sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969).
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm. Acesso em: 20 set.
2018.

BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992b. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.
htm. Acesso em: 20 set. 2018.

BRASIL. Lei nº 13.769, de 19 de dezembro de 2018. Altera o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de


outubro de 1941 (Código de Processo Penal), as Leis nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de
Execução Penal), e 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos), para
estabelecer a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar da mulher gestante ou
que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e para disciplinar o
regime de cumprimento de pena privativa de liberdade de condenadas na mesma situação.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13769.htm.
Acesso em: 16 maio 2019.

BUCCI, Eugênio. Sobre ética e imprensa. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.

BUENO, Marisa; GARCIA, Rogério Maia. A crise do sistema punitivo: entre a


hipercriminalização e a prisão preventiva como antecipação da pena. In: AZEVEDO, Rodrigo
Ghiringhelli de; CARVALHO, Salo de (Orgs.). A crise do processo penal e as novas
formas de administração da justiça criminal. Porto Alegre: Nota 10, 2006.

CAMPOS, Júlia de Renor Oliveira. A ilusão da função ressocializadora da pena privativa


de liberdade: uma análise à luz do sistema penal brasileiro. Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Natal, 2014. Disponível em: https://monografias.ufrn.br/jspui/handle/
123456789/891. Acesso em: 16 maio de 2019.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 17. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, parte geral
(arts. 1º a 120), 2013.

CARVALHO, Salo de. Pena e garantias. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da libertação. Rio de Janeiro: Revan/ICC, 2005.

CONSULTOR JURÍDICO. Comissão define eixo administrativo de reforma da LEP. 22


out. 2013. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2013-out-22/juristas-concluem-
discussao-parte-administrativa-reforma-lep. Acesso em: 24 nov. 2018.

CONSULTOR JURÍDICO. Reforma da Lei de Execução Penal é aprovada pela CCJ do


Senado. 01 out. 2017. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-out-01/reforma-lei-
execucao-penal-aprovada-ccj-senado. Acesso em: 24 nov. 2018.

CORDEIRO, Karine da Silva. Direitos fundamentais sociais: dignidade da pessoa humana e


o mínimo existencial, o papel do Poder Judiciário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
65

CORREIO DO POVO. Do lado de dentro. Porto Alegre, ano 123, nº 337, 2 set. 2018.

FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002.

FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Direito fundamental à saúde: parâmetros para sua


eficácia e efetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

GHISLENI, Pâmela Copetti. O sistema penitenciário brasileiro e o princípio da dignidade da


pessoa humana. Revista Direito em Debate. Ijuí, RS, v. 23, nº 42, 2014, pp. 176-206.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 10. ed. Rio de Janeiro: Impetus, v. I, 2008.

JORNAL DO COMÉRCIO. Uma cidade gaúcha chamada Presídio Central. 2017.


Disponível em: https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/2017/12/geral/603480-uma-
cidade-gaucha-chamada-presidio-central.html. Acesso em: 19 maio 2019.

MACHADO, Ana Elise Bernal; SOUZA, Ana Paula dos Reis; SOUZA Mariani Cristina de.
Sistema penitenciário brasileiro – origem, atualidade e exemplos funcionais. Revista do
Curso de Direito da Faculdade de Humanidades e Direito, v. 10, nº 10, 2013, pp. 201-212.
Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/RFD/article/view/
4789. Acesso em: 15 set. 2018.

MARTINS, Flademir Jerônimo Belinati. Dignidade da pessoa humana: princípio


constitucional fundamental. Curitiba: Juruá, 2012.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Infopen. Levantamento Nacional de Informações


Penitenciárias. Atualizado em junho/2016. Secretaria Nacional de Segurança Pública,
Junho/2016; Fórum Brasileiro de Segurança Pública, dezembro/2015; IBGE, 2016.
Disponível em: http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/
relatorio_2016_junho.pdf. Acesso em: 15 set. 2018.

MIRABETE, Júlio Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. 33. ed. São
Paulo: Atlas, 2016.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil: interpretada e legislação constitucional. 5.


ed. São Paulo: Atlas, 2005.

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. Teoria geral. 14. ed. São Paulo:
Atlas, 2011.

NASCIMENTO, José Flávio Braga. Curso de criminologia. São Paulo: Juarez de Oliveira,
2007.

NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: RT,
2008.

OLIVEIRA, Fernando Antônio Sodré de. O direito de punir em Thomas Hobbes. Ijuí, RS:
Unijuí, 2012.
66

OLIVEIRA, Maria Odete de. Prisão: um paradoxo social. Florianópolis: Ed. da UFSC/
Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina, 1984.

ONU. Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948.
Disponível em: https://nacoesunidas.org/direitoshumanos/declaracao/. Acesso em: 19 maio
2019.

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o Direito Constitucional Internacional. 13. ed.


São Paulo: Saraiva, 2012.

PRADO, Geraldo. A execução penal e o sistema acusatório. In: CARVALHO, Salo de (Org.).
Crítica à execução penal. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2002, pp. 477-486.

RIO GRANDE DO SUL. Apelação Cível nº 70078615713. Nona Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator Tasso Caubi Soares Delabary, julgado em 24/10/2018. Disponível em:
https://www.tjrs.jus.br/novo/busca/?proxystylesheet=wp_index&client=wp_index&filter=0&
getfields=*&aba=juris&entsp=a__politica-site&wc=200&wc_mc=1&oe=UTF-8&ie=UTF-
8&ud=1&lr=lang_pt&sort=date%3AD%3AS%3Ad1&as_qj=&as_q=&q=70078615713&site
=ementario. Acesso em: 24 nov. 2018.

ROSA, Alexandre. O juiz (garantista) e a execução penal por uma racionalidade


consequencialista (MacCormick). In: CARVALHO, Salo de (Org.). Crítica à execução
penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, pp. 401-418.

SANTOS, Ivanete Aparecida da Silva. Direitos humanos e educação escolar prisional: um


estudo de caso na Penitenciária Estadual de Cruzeiro do Oeste. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Programa de Pós-Graduação em
Educação/PPGE, Centro de Educação, Comunicação e Artes/CECA. Cascavel, PR, 2017.
Disponível em: http://tede.unioeste.br/bitstream/tede/3346/5/IvaneteAparecida_Silva2017.
pdf. Acesso em: 16 maio 2019.

SANTOS, Sintia Menezes. A ressocialização através da educação. Florianópolis: UFSC,


2011. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br:8080/portal/conteudo/ressocializa
%C3%A7%C3%A3oatrav%C3%A9s-da-educa%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 15 set.
2018.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na


Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

SARLET, Ingo Wolfgang. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma


compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. Revista Brasileira de Direito
Constitucional. São Paulo, v. 5, nº 9, jan./jun. 2007, pp. 361-388. Disponível em:
https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/27252/dimensoes_dignidade_pessoa_humana.pdf.
Acesso em: 9 fev. 2019.

SENADO FEDERAL. Assessoria Parlamentar. Informativo. Presidente do Senado recebe


proposta de reforma da Lei de Execução Penal. Brasília, 5 dez. 2013. Disponível em:
http://midia.apmp.com.br/arquivos/pdf/informativo051213.pdf. Acesso em: 16 maio 2019.
67

SENADO FEDERAL. Projeto de Lei do Senado nº 513, de 2013. Altera a Lei de Execução
Penal. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/115665.
Acesso em: 24 nov. 2018.

SILVA, José Afonso da. Direito constitucional positivo. 34 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2011.

SOUZA, Paulo S. Xavier. Individualização da pena: no estado democrático de direito. Porto


Alegre: Sergio Antônio Fabris, 2006.

STF. Supremo Tribunal Federal. HC 106876- 2008. Disponível em: http://www.stf.jus.br/


portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=106876&classe=HC-MC&codigoClasse
=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M. Acesso em: 9 fev. 2019.

STF. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 580252/2017. Disponível em:


http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=336352. Acesso em: 15
set. 2018.

SUANNES, Adauto. Os fundamentos éticos do devido processo penal. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2004.

SUSEPE. Superintendência dos Serviços Penitenciários. População carcerária do Rio


Grande do Sul chega a 37 mil em 2017. 2018. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-
grande-do-sul/noticia/populacao-carceraria-do-rio-grande-do-sul-chega-a-37-mil-em-2017-
diz-susepe.ghtml. Acesso em: 19 maio 2018.

VIEIRA, Oscar Vilhena. A desigualdade e a subversão do Estado de Direito. In:


SARMENTO, Daniel; IKAWA, Daniela; PIOVESAN, Flávia (Orgs.). Igualdade, diferença
e direitos humanos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 191-216.

Você também pode gostar