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Ler este conto infantil fez-me reviver experiências da minha infância, repletas de brincadeiras ao ar livre com
amigos e primos. Também me recordou de que é, por vezes, em circunstâncias de maior necessidade que o
afeto, a solidariedade e a amizade mais se fazem sentir.
Todos os anos agradeço as celebrações em que menos coisas materiais recebi,
porque me fizeram sentir o amor de uma forma mais profunda.
Porém, nas vésperas do Ano Novo, os adultos ficavam geralmente tristes a relembrar
o passado ou a criar esperanças em relação ao futuro. Só que, desta vez, nesse ano, nem
valia a pena sonhar: para os pais de Chabela e muitas outras famílias não havia que comer
em casa.
Entretanto, inconformados com a situação, Chabela, Laurita e Gusti tinham querido
ajudar…e tinham feito grandes descobertas: a Dona Célia tinha muito macarrão, a Avó
tinha bastantes repolhos e os Gutiérrez, cebolas e cenouras. Descobriram ainda que os
sete irmãos Pérez podiam dispensar alguma carne e muitos pães...
Ao fim da tarde gerou-se uma grande confusão no bairro: não havia macarrão nem
repolho nem cebolas em nenhum das casas! A própria dona da mercearia descobriu que
lhe faltavam algumas latas de conservas… De repente, alguém gritou:
— Há fogo no baldio! Olhem o fumo!
Todos acorreram e viram, na semiobscuridade da última noite do ano, uma enorme
fogueira sobre a qual a panela da Avó, qual joia raríssima, faiscava e cantava com o bojo
cheio de pequenas coisas que exalavam um cheiro delicioso. Tudo se dourava alegremente
no crepitar do azeite, e as crianças, diligentes, agitavam, cortavam e repartiam, em
movimentos que muito se assemelhavam a uma estranha dança do fogo.
Todos as fitaram, boquiabertos.
Mas não se detiveram por muito tempo, pois havia que tratar da mesa.
Uma mesa feita de muitas mesas.
Uma mesa muito comprida, para a passagem de um Ano Novo de partilha.
Laura Devetach