Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Francisco José dos Santos Alves, Prof. Dr. do Programa de Mestrado em Ciências
Contábeis da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ
Resumo
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 A legislação contábil e fiscal aplicada ao setor público brasileiro
A contabilidade pública no Brasil teve como marco importante em sua história a
Lei 4.320, de 17 de março de 1964. Pérez e Hernandez (2007) destacam a
importância de seu surgimento num contexto de reorganização e reforma da
administração pública em diversos países da América Latina, com a aprovação de leis
semelhantes à lei brasileira.
Esta lei foi elaborada para estatuir normas gerais de direito financeiro para
elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos
Municípios e do Distrito Federal, contendo a discriminação da receita e despesa de
forma a evidenciar a política econômica financeira e o programa de trabalho do
Governo, obedecendo aos princípios de unidade, universalidade e anualidade.
A Lei 4.320/64 determina que a Contabilidade deva ser organizada de forma a
permitir o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da
composição patrimonial, a determinação dos custos dos serviços industriais, o
levantamento dos balanços gerais, a análise e a interpretação dos resultados
econômicos e financeiros.
Além disso, a contabilidade deve evidenciar, em seus registros, o montante dos
créditos orçamentários vigentes, a despesa empenhada e a despesa realizada, à
conta dos mesmos créditos, e as dotações disponíveis. Os resultados gerais do
exercício serão demonstrados no Balanço Orçamentário, no Balanço Financeiro, no
Balanço Patrimonial, na Demonstração das Variações Patrimoniais.
De acordo com a Lei 4.320/64, o controle da execução orçamentária é exercido
de forma interna e externa. O Controle Interno será exercido pelo Poder Executivo,
compreendendo a legalidade dos atos de que resultem a arrecadação da receita ou a
realização da despesa, o nascimento ou a extinção de direitos e obrigações; a
fidelidade funcional dos agentes da administração, responsáveis por bens e valores
públicos; e o cumprimento do programa de trabalho expresso em termos monetários e
em termos de realização de obras e prestação de serviços. O controle deve ser
realizado sem prejuízo das atribuições do Tribunal de Contas ou de órgão equivalente
através da prévia verificação da legalidade dos atos de execução orçamentária e da
prestação ou tomada de contas anual, quando instituída em lei, ou por fim de gestão.
O Controle Externo deve ser exercido pelo Poder Legislativo, com o objetivo de
verificar a probidade da administração, a guarda e legal emprego do dinheiro público e
o cumprimento da Lei de Orçamento.
Pode-se observar que a Lei 4.320/64 tem uma grande ênfase/ evidencia na
execução e no controle do orçamento. Lima et al (2009), Galera e Bolivary (2007),
Dáros e Pereira (2009) e Silva (2009) destacam a valorização do controle na estrutura
das demonstrações contábeis, sobretudo, o orçamentário no que diz respeito a sua
evidenciação.
SILVA (2009) acrescenta que a ênfase dada à legalidade fez com que os
aspectos orçamentários e financeiros fossem privilegiados em detrimento da
contabilidade patrimonial.
Em 04 de maio de 2000, foi publicada a Lei Complementar nº 101 – a LRF (Lei
de Responsabilidade Fiscal). Além de outras providências, a LRF estabelece normas
de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, reforçando o
caráter de controle e ampliando a necessidade de transparência. Tal responsabilidade
pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem
desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento
de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições
no que tange a renúncia de receita; geração de despesas com pessoal, da seguridade
social e outras; dívidas consolidada e mobiliária; operações de crédito, inclusive por
antecipação de receita; concessão de garantia e inscrição em restos a pagar (BRASIL,
2000).
A LRF trouxe como instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais
deve ser dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os
planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o
respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o
Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
A Lei Complementar nº 131, de 27 de maio de 2009, veio acrescentar
dispositivos à LRF a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de
informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Incentiva, ainda, a participação
popular e realização de audiências públicas durante os processos de elaboração e
discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos e a adoção de
sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo
de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União de modo a garantir a
transparência, disponibilizando, também, a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso
a informações referentes a receitas e despesas públicas.
A Lei Complementar nº 131/2009 garante ainda que qualquer cidadão, partido
político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal
de Contas e ao órgão competente do Ministério Público o descumprimento das
prescrições estabelecidas na Lei.
O principal produto da contabilidade pública são as demonstrações contábeis
que, no seu processo de reconhecimento, mensuração e divulgação dos elementos
contábeis (ativos, passivos, receitas, despesas) devem ser compreensíveis e
representar justa e adequadamente a movimentação, origem e aplicação dos recursos
públicos, (CARLIN, 2008). Isto porque, sua principal função social é de servir como
instrumento de controle por parte da sociedade no acompanhamento das políticas
públicas, baseadas na prestação dos gestores públicos e na correta aplicação dos
recursos públicos.
A questão do controle social é importante na medida em que a sociedade
passa a controlar a eficiência e eficácia da prestação dos serviços públicos, da
aplicação dos recursos públicos e verificar a qualidade dos gastos.
Padrão de Comportamento
• Liderança
• Código de Conduta
• Probidade e Propriedade
• Objetividade, Integridade e Honestidade
• Relacionamento
Estrutura Organizacional e Controle Relatórios Externos
Processo
• Responsabilização Legal • Gerenciamento de Risco • Relatórios Anuais
• Responsabilidade de Prestar • Auditoria Interna • Uso dos padrões de
Contas por Dinheiro Público • Comitês de Auditoria contabilidade
• Comunicação com • Controles Internos adequados
Stakeholders • Orçamentos • Medidas de
• Papéis e Responsabilidades • Gestão Financeira Desempenho
• Equilíbrio de poder e autoridade • Treinamento de Pessoal • Auditoria Externa
• Diretoria da organização
pública
• Presidente da organização
pública
• Membros da Diretoria Não-
Executiva
• Gerentes Executivos
• Política de Remuneração
Fonte: IFAC (2001)
3 METODOLOGIA
3.1 Tipo e Método de Pesquisa
Collis e Hussey (2005, p.23) classificam os muitos tipos de pesquisa de acordo
com o objetivo, o processo, a lógica e o resultado da pesquisa. De acordo com essas
classificações, o presente estudo pode ser classificado como uma pesquisa descritiva
- usada para identificar e obter informações sobre as características de um
determinado problema ou questão, qualitativa - subjetiva e envolve examinar e refletir
as percepções para obter um entendimento de atividades sociais e humanas, básica -
tem como objetivo principal contribuir para o conhecimento, em geral para o bem
comum, ao invés de resolver um problema específico e dedutiva - desenvolve uma
estrutura conceitual e teórica para depois ser testada por observações empíricas.
O método adotado neste trabalho foi a pesquisa bibliográfica e documental.
Vergara (2005, p. 48) define a pesquisa bibliográfica, como o “estudo sistematizado
desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais, em redes
eletrônicas, isto é, material acessível ao público em geral”. A pesquisa documental foi
realizada através da análise da Lei nº 4.320/1964 e da Lei Complementar nº 101/2000
(LRF), que representam as principais normas vigentes no que concerne a finanças
públicas.
4 RESULTADOS
4.1 Apresentação e análise dos resultados
A seguir são apresentados os resultados da pesquisa, considerando-se as
dimensões de controle e relatórios externos estabelecidas pela IFAC, conforme já
exposto no referencial teórico e na metodologia.
Dimensão Controle
Na tabela 2, estão relacionadas às recomendações de melhores práticas de
governança relacionadas à dimensão controle. São marcados os itens cuja legislação
favorece a adoção.
Gestão de risco
A IFAC recomenda que haja uma gestão de riscos estabelecida na estrutura de
controle interno da entidade e que haja procedimentos para identificar e avaliar os
riscos internos e as oportunidades oriundas de fatores externos. Apesar de na Lei nº
4.320/64 não haver menção a respeito deste tipo de gestão, a LRF introduz a
preocupação com a questão ao imputar uma responsabilidade na gestão fiscal onde
os riscos devem ser prevenidos e identificados (Art. 1º, §1º). Entretanto, a revisão de
riscos passados e previsão de riscos futuros não são tratadas.
Auditoria / Comitê de auditoria / Controle interno
Não há nada na legislação estudada que favoreça a adoção de boas práticas
de governança relativa à auditoria, comitê de auditoria e controle interno. Entretanto,
na Lei nº 4.320/64 é mencionado que a contabilidade ou órgão equivalente deverá
verificar exata observância dos limites das cotas trimestrais atribuídas a cada unidade
orçamentária, dentro do sistema que for instituído para esse fim (art. 80). Além disso,
procura assegurar que haja um controle interno através do art. 75 e 76, apesar de não
orientar na elaboração de sua estrutura.
Orçamento
Para que a boa governança na dimensão controle seja favorecida, é necessário
que a organização adote procedimentos para assegurar um orçamento efetivo e
eficiente. Na legislação contábil e fiscal aplicada ao setor público verifica-se a
existência de dispositivos que levam as entidades a adotarem procedimentos que
assegurem um orçamento efetivo e eficiente. Na Lei nº 4.320/64 há orientação para a
elaboração de uma lei orçamentária, onde são citados os itens que devem
acompanhar e integrar a lei do orçamento. Ela discorre sobre o assunto do título I ao
título XIII e no artigo 97 trata da efetiva arrecadação da receita, o que colabora na
consecução de um orçamento efetivo.
A LRF regulamenta o assunto ao determinar no seu art. 2° que “a Lei do
Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa de forma a evidenciar a
política econômica financeira e o programa de trabalho do Governo”. Além disso,
“estabelece que deva haver compatibilidade da programação do orçamento com os
objetivos e metas estabelecidos” (art. 5º, inciso I).
Administração Financeira
Faz parte de um bom controle um sistema sólido de administração financeira e
que integre a contabilidade com o orçamento. A legislação estudada favorece essa
prática.
A LRF é clara ao estabelecer um sistema integrado de administração financeira
e controle e a Lei nº 4.320/64 ao integrar o orçamento com a contabilidade em seus
art. 85 e 89. Desta forma, pode-se afirmar que há consonância com a recomendação
da IFAC de ter um sistema sólido de administração financeira e a integração entre a
contabilidade e orçamento. Além disso, a LC nº 131/09, que alterou a LRF, reforçou tal
entendimento ao determinar que a transparência seja assegurada pela adoção de
sistema integrado de administração financeira e controle.
Em relação à elaboração do fluxo de caixa juntamente com o orçamento, a LRF
estabelece prazo para que seja divulgada a programação financeira e o cronograma
de execução mensal de desembolso. A Lei 4.320/64 teve suas demonstrações
financeiras alteradas pela Secretaria de Tesouro Nacional (STN), Portaria STN nº 749,
de 15 de dezembro de 2009, que acrescentou a Demonstração dos Fluxos de Caixa.
Treinamento
A Lei nº 4.320/64 e a LRF não referencia a questão do treinamento.
Relatórios Anuais
Tanto a Lei nº 4.320/64 quanto a LRF estabelecem a obrigatoriedade da
publicação de seus demonstrativos e relatórios, tanto contábeis, orçamentários e
financeiros, quanto fiscais. Entretanto, não há obrigatoriedade de publicação de
relatório de auditores.
O artigo 48 da LRF estabelece que são instrumentos de transparência da
gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos
de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as
prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da
Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas
desses documentos.
A Lei nº 4.320/64, por sua vez, no art. 109, estabelece que os orçamentos e
balanços das entidades compreendidas no artigo 107 serão publicados como
complemento dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do
Distrito Federal a que estejam vinculados. No art. 111, a Lei nº 4.320/64 dispõe que o
Conselho Técnico de Economia e Finanças do Ministério da Fazenda, além de outras
apurações, para fins estatísticos, de interesse nacional, organizará e publicará o
balanço consolidado das contas da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, suas
autarquias e outras entidades, bem como um quadro estruturalmente idêntico
baseados em dados orçamentários.
Medidas de Desempenho
A LRF sempre que se refere ao desempenho na gestão fiscal trata do equilíbrio
entre as receitas e as despesas e o desempenho entre a previsão e fixação e a
respectiva execução orçamentária (inciso I do art. 50; art. 58). Contudo, este não é o
desempenho de que trata as boas práticas de governança. Pode-se verificar que no
contexto da governança governamental as medidas de desempenho estão focadas em
resultados, enquanto que a Lei Complementar nº 101/2000 enfoca somente aspectos
orçamentários de previsão de receitas e a fixação despesas e as respectiva execução
orçamentária.
Auditores Externos
A LRF não trata da questão de auditoria externa. A Lei nº 4.320/64 se refere ao
controle externo exercido pelo poder legislativo e pelos Tribunais de Contas, que neste
caso, será avaliado por auditores. A independência é relativa. Em princípio mantêm-se
a independência por se tratar de outro órgão responsável pelo controle. Entretanto, o
órgão é do mesmo ente da federação o que pode prejudicar a independência caso
haja interferência política.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A administração pública está sujeita ao cumprimento de diversas leis e
regulamentos que disciplinam assuntos variados sobre os muitos aspectos que
envolvem o oferecimento de bens e serviços públicos ao cidadão. Neste trabalho
optou-se por trabalhar a legislação básica que rege as finanças públicas, considerando
a importância desta área para o desenvolvimento das atividades das entidades deste
setor. Embora seja complicado realizar um trabalho científico utilizando a legislação,
levando-se em conta as constantes modificações promovidas pelos legisladores, ainda
mais em um momento de grandes mudanças nesta área de finanças públicas, tendo
em vista à convergência das normas contábeis brasileiras ao padrão internacional, há
que se considerar que os estudos realizados nas normas de hoje podem influenciar
em melhores normas no futuro, principalmente num ambiente em que, culturalmente,
as mudanças ocorrem mais por força de mandamentos legais do que por simples
iniciativa de gestão em se melhorar a qualidade, eficiência e eficácia dos serviços e
bens oferecidos à sociedade.
Assim, observa-se da análise feita da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF) e
da Lei nº 4.320/1964 que há pouca correspondência entre as práticas de boa
governança estabelecidas pela IFAC para o setor público e os dispositivos normativos
estabelecidos nestas leis no que se refere às dimensões de controle e relatórios
externos. As duas dimensões totalizam 19 recomendações e apenas 9 destas
recomendações são favorecidas pela legislação pública brasileira em estudo. Dentre
elas as relativas à gestão de risco, orçamento e administração financeira na dimensão
controle e, na dimensão relatórios externos, relatórios anuais, uso de normas
contábeis apropriadas e auditoria externa.
Desta forma, para que possa haver a adoção de práticas de boa governança
no setor público brasileiro é necessário que haja normativo que favoreça a adoção das
demais recomendações, visto a importância de haver maior eficiência e eficácia nas
operações, relatórios internos e externos confiáveis e responsabilização pela gestão
de recursos públicos. Questões estas importantes e cada vez mais valorizadas,
inclusive pela convergência das normas contábeis e pela nova contabilidade do setor
público.
Recomenda-se para pesquisas futuras uma ampliação dos normativos
estudados, a verificação de se estas práticas são adotadas em instituições públicas e
das conseqüências trazidas pela sua adoção.
REFERÊNCIAS
BOGONI, Nadia Mar et. al. Proposta de um modelo de relatório de administração para
o setor público baseado no Parecer de Orientação nº 15/87 da Comissão de Valores
Mobiliários: um instrumento de governança corporativa para a administração pública.
Revista de Administração Pública, RAP, Rio de Janeiro, 44 (1), p. 119 – 42, jan./fev.
2010.
BORGES, André. Governança e política educacional: a agenda recente do Banco
Mundial. Revista Brasileira de Ciências Sociais. vol. 18, nº. 52. 2003.
DÁROS, Leandro Luís. PEREIRA, Adriano de Souza. Análise das normas brasileiras
de contabilidade aplicadas ao Setor público – nbcasp: mudanças e desafios para a
Contabilidade pública. Congresso USP. 2009. Disponível em:
www.congressousp.fipecafi.org/artigos92009/467.pdf. Acesso em 30 de setembro de
2009.
LIMA, Diana Vez de; SANTANA, Cláudio Moreira; GUEDES, Marianne Antunes. As
normas brasileira de contabilidade aplicadas ao setor público e a legislação contábil
pública brasileira: uma análise comparativa à luz da teoria contábil. Contabilidade.
Gestão e Governança. Brasília, v. 12. n. 2, p. 15 – 23, mai/ago. 2009.
SILVA, Edson Cordeiro da. Governança corporativa nas empresas: guia prático de
orientação para acionistas. São Paulo: Atlas, 2006.