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A LEGISLAÇÃO CONTÁBIL E FISCAL DO SETOR PÚBLICO BRASILEIRO E A


ADOÇÃO DE PRÁTICAS DE BOA GOVERNANÇA

André Luiz Villagelim, Mestrando em Ciências Contábeis da Universidade do Estado


do Rio de Janeiro – UERJ

Cíntia de Melo de Albuquerque, Mestranda em Ciências Contábeis da Universidade


do Estado do Rio de Janeiro – UERJ

Lino Martins da Silva, Prof. LD. Titular e Coordenador Adjunto do Programa de


Mestrado em Ciências Contábeis da Universidade do Estado do Rio de Janeiro –
UERJ

Francisco José dos Santos Alves, Prof. Dr. do Programa de Mestrado em Ciências
Contábeis da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ

Área Temática: F) Sector Público

Palavras-chave: Governança Governamental; IFAC; Lei nº 4.320/64; Lei de


Responsabilidade Fiscal; Finanças Públicas.
A LEGISLAÇÃO CONTÁBIL E FISCAL DO SETOR PÚBLICO BRASILEIRO E A
ADOÇÃO DE PRÁTICAS DE BOA GOVERNANÇA

Resumo

Em um ambiente cuja cultura predominante é a de que mudanças na administração


das entidades do setor público somente ocorrem por força de mandamentos legais, a
presente pesquisa buscou evidenciar dispositivos na legislação brasileira da área de
finanças públicas, que favoreçam a adoção de práticas de boa governança em
conformidade com as recomendações da IFAC. A revisão da literatura contextualiza o
ambiente legal à que estão sujeitas as organizações públicas e a importância da
adoção de práticas de boa governança neste setor. Os resultados mostraram que há
pouca correspondência entre as práticas recomendadas pela IFAC e as leis
analisadas.
INTRODUÇÃO
O bom desempenho das organizações é de grande importância para
determinação de sua eficiência e eficácia. Para garantir o bom desempenho, algumas
empresas têm adotado a prática da governança corporativa, cuja definição dada por
Slomski et al (2008, p. 8) é “o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e
monitoradas, em que, através de mecanismos específicos, gestores e proprietários
procuram assegurar o bom desempenho da empresa para aumento de sua riqueza.”
Assim como empresas privadas se preocupam com o seu bom desempenho,
as instituições públicas também devem procurar observar tal questão, já que as
instituições funcionam para servir a sociedade e com recursos provenientes do povo.
Segundo Wilson (2000), desde os anos 1990 a governança dos países tem tido
grande destaque no contexto internacional. No Brasil, o advento da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF) traz à tona a importância do controle social, que
também é muito explorada pela New Public Management (NPM) e pelos órgãos
internacionais que editam normas para o setor público. Segundo Secchi (2009),
valores como controle, transparência, orientação ao serviço e produtividade dentre
outros são próprios do modelo de administração pública gerencial. Assim, este modelo
de administração pública gerencial direciona para a adoção de boas práticas de
governança por parte dos entes públicos (BOGONI et al, 2010; REZENDE, 2009).
A International Federation of Accountants (IFAC) publicou um estudo sobre
práticas de governança para o setor público, a fim de orientar as entidades para o
atingimento de seu bom desempenho, controle e transparência.
Contudo, diferentemente das organizações do setor privado, as entidades do
setor público possuem características próprias que tornam o ambiente, por vezes, de
difícil implementação de mecanismos de controle e de estruturas e estratégias
organizacionais que possam contribuir para melhoria de seu desempenho. Neste
sentido, Rezende (2009) afirma que a falta de incentivos que possam superar
ineficiência dos modelos tradicionais é o principal problema da administração pública.
Um sistema de governança seria favorecido pelo aumento da capacidade gerencial da
administração pública através da adoção de modelos dotados de maior accountability,
credibilidade e sistemas de incentivo.
Além disso, em muitos casos, principalmente quando se trata de municípios
pequenos, o despreparo de gestores públicos e a falta de recursos financeiros não
permitem avançar na melhoria da estrutura organizacional. Soma-se a isso que o
ambiente cultural dominante na administração pública é de que as mudanças somente
são realizadas em decorrência de obrigação legal. Desta forma, é de grande
relevância o apoio político à adoção de práticas de boa governança conforme ocorreu
em países como Inglaterra, Austrália e Nova Zelândia (REZENDE, 2009). Segundo
Mello (2006), fatores como a responsabilidade em prestar contas e a responsabilidade
fiscal formaram a base para o estabelecimento de princípios de governança nesses
países. No Brasil, por seu turno, surgem novas propostas de relatórios a fim de dar
maior transparência às ações dos governos (BOGONI et al, 2010).
Visto o contexto sociopolítico brasileiro, surge a seguinte questão de pesquisa:
a legislação contábil e financeira na área governamental favorece a adoção das
práticas consideradas de boa governança conforme o padrão estabelecido pela IFAC
para o setor público?
Tal estudo é relevante, pois existe uma escassez de estudos sobre o tema, e
contribuirá para agregar conhecimento nesta área, ampliando a compreensão acerca
da importância da governança para o setor público e seu atual nível de aplicação no
Brasil. Vale ressaltar que a boa governança estimula melhores práticas de eficiência e
transparência na administração pública, que são cada vez mais cobrados, seja pela
sociedade ou por órgãos internacionais como a IFAC.
Desta forma, o presente estudo, através de uma pesquisa bibliográfica e
documental, teve por objetivo investigar se a legislação contábil e financeira na área
governamental favorece a adoção das práticas consideradas de boa governança
conforme padrão estabelecido pela IFAC para o setor público com relação às
dimensões de controle e relatórios externos. Para isto, foram pesquisadas na
legislação brasileira as palavras-chave dos itens relativos às recomendações do IFAC
para a adoção das práticas de boa governança.
Desta forma, esta pesquisa pode ser classificada como uma pesquisa
descritiva, usada para identificar e obter informações sobre as características de um
determinado problema ou questão. Sendo organizada da seguinte forma: a primeira
seção contendo esta introdução; a segunda apresentando um referencial teórico
composto da legislação contábil e financeira aplicada ao setor público brasileiro, a
governança corporativa e as práticas de boa governança segundo a IFAC; a terceira
contendo a metodologia utilizada; a seguinte contendo a apresentação e análise dos
resultados e por último as considerações finais.

2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 A legislação contábil e fiscal aplicada ao setor público brasileiro
A contabilidade pública no Brasil teve como marco importante em sua história a
Lei 4.320, de 17 de março de 1964. Pérez e Hernandez (2007) destacam a
importância de seu surgimento num contexto de reorganização e reforma da
administração pública em diversos países da América Latina, com a aprovação de leis
semelhantes à lei brasileira.
Esta lei foi elaborada para estatuir normas gerais de direito financeiro para
elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos
Municípios e do Distrito Federal, contendo a discriminação da receita e despesa de
forma a evidenciar a política econômica financeira e o programa de trabalho do
Governo, obedecendo aos princípios de unidade, universalidade e anualidade.
A Lei 4.320/64 determina que a Contabilidade deva ser organizada de forma a
permitir o acompanhamento da execução orçamentária, o conhecimento da
composição patrimonial, a determinação dos custos dos serviços industriais, o
levantamento dos balanços gerais, a análise e a interpretação dos resultados
econômicos e financeiros.
Além disso, a contabilidade deve evidenciar, em seus registros, o montante dos
créditos orçamentários vigentes, a despesa empenhada e a despesa realizada, à
conta dos mesmos créditos, e as dotações disponíveis. Os resultados gerais do
exercício serão demonstrados no Balanço Orçamentário, no Balanço Financeiro, no
Balanço Patrimonial, na Demonstração das Variações Patrimoniais.
De acordo com a Lei 4.320/64, o controle da execução orçamentária é exercido
de forma interna e externa. O Controle Interno será exercido pelo Poder Executivo,
compreendendo a legalidade dos atos de que resultem a arrecadação da receita ou a
realização da despesa, o nascimento ou a extinção de direitos e obrigações; a
fidelidade funcional dos agentes da administração, responsáveis por bens e valores
públicos; e o cumprimento do programa de trabalho expresso em termos monetários e
em termos de realização de obras e prestação de serviços. O controle deve ser
realizado sem prejuízo das atribuições do Tribunal de Contas ou de órgão equivalente
através da prévia verificação da legalidade dos atos de execução orçamentária e da
prestação ou tomada de contas anual, quando instituída em lei, ou por fim de gestão.
O Controle Externo deve ser exercido pelo Poder Legislativo, com o objetivo de
verificar a probidade da administração, a guarda e legal emprego do dinheiro público e
o cumprimento da Lei de Orçamento.
Pode-se observar que a Lei 4.320/64 tem uma grande ênfase/ evidencia na
execução e no controle do orçamento. Lima et al (2009), Galera e Bolivary (2007),
Dáros e Pereira (2009) e Silva (2009) destacam a valorização do controle na estrutura
das demonstrações contábeis, sobretudo, o orçamentário no que diz respeito a sua
evidenciação.
SILVA (2009) acrescenta que a ênfase dada à legalidade fez com que os
aspectos orçamentários e financeiros fossem privilegiados em detrimento da
contabilidade patrimonial.
Em 04 de maio de 2000, foi publicada a Lei Complementar nº 101 – a LRF (Lei
de Responsabilidade Fiscal). Além de outras providências, a LRF estabelece normas
de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, reforçando o
caráter de controle e ampliando a necessidade de transparência. Tal responsabilidade
pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem
desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento
de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições
no que tange a renúncia de receita; geração de despesas com pessoal, da seguridade
social e outras; dívidas consolidada e mobiliária; operações de crédito, inclusive por
antecipação de receita; concessão de garantia e inscrição em restos a pagar (BRASIL,
2000).
A LRF trouxe como instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais
deve ser dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os
planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o
respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o
Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
A Lei Complementar nº 131, de 27 de maio de 2009, veio acrescentar
dispositivos à LRF a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de
informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Incentiva, ainda, a participação
popular e realização de audiências públicas durante os processos de elaboração e
discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos e a adoção de
sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo
de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União de modo a garantir a
transparência, disponibilizando, também, a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso
a informações referentes a receitas e despesas públicas.
A Lei Complementar nº 131/2009 garante ainda que qualquer cidadão, partido
político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal
de Contas e ao órgão competente do Ministério Público o descumprimento das
prescrições estabelecidas na Lei.
O principal produto da contabilidade pública são as demonstrações contábeis
que, no seu processo de reconhecimento, mensuração e divulgação dos elementos
contábeis (ativos, passivos, receitas, despesas) devem ser compreensíveis e
representar justa e adequadamente a movimentação, origem e aplicação dos recursos
públicos, (CARLIN, 2008). Isto porque, sua principal função social é de servir como
instrumento de controle por parte da sociedade no acompanhamento das políticas
públicas, baseadas na prestação dos gestores públicos e na correta aplicação dos
recursos públicos.
A questão do controle social é importante na medida em que a sociedade
passa a controlar a eficiência e eficácia da prestação dos serviços públicos, da
aplicação dos recursos públicos e verificar a qualidade dos gastos.

2.2 Governança Corporativa


O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) (2009, p. 19) define
governança corporativa como “sistema pelo qual as organizações são dirigidas,
monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários,
Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle.” Slomski et al (2008) e
Silva (2006) destacam a preocupação de garantir um bom desempenho através da
utilização da Governança coorporativa.
Segundo o IBGC, recomendações objetivas devem ser derivadas dos
princípios das boas práticas de governança corporativa.
Alguns valores são considerados no que diz respeito à governança corporativa.
Quatro podem ser apresentados segundo Andrade e Rossetti (2009, p.140):

Fairness – senso de justiça, equidade no tratamento dos acionistas.


Respeito aos direitos dos minoritários, por participação equânime
com a dos majoritários, tanto no aumento da riqueza corporativa,
quanto nos resultados das operações, quanto ainda na presença
ativa em assembléias gerais.
Disclosure – transparência das informações, especialmente das de
alta relevância, que impactam os negócios e que envolvem
resultados, oportunidades e riscos.
Accountability – prestação responsável de contas, fundamentada nas
melhores práticas contábeis e de auditoria.
Compliance – Conformidade no cumprimento de normas reguladoras,
expressas nos estatutos sociais, nos regimentos internos e nas
instituições legais do país.

A governança surge primeiramente na área privada, das grandes corporações.


A preocupação com os investidores constituiu a principal causa da atenção necessária
à boa gestão das empresas. No Setor público os desafios de eficiência e eficácia em
um ambiente complexo e com crescente incerteza constituem importante tema de
debate político e acadêmico (RUAS, 1997). A insatisfação do modo como a
modernização foi promovida no setor público foi uma dos fatores responsáveis pelo
surgimento do pensamento acerca da governança pública (KISSLER e HEIDEMANN,
2006).
Segundo o estudo de Souza e Siqueira (2007), há evidência que este termo
governança pública é uma evolução do termo nova administração pública. O termo
nova administração pública seria, por sua vez, uma tradução do termo New Public
Management (NPM), que é baseada em reformas que visam introduzir melhorias nos
serviços prestados pela administração pública e assegurar a transparência e a
qualidade das informações, assim como seu controle. Para isso, são introduzidos no
setor público modelos e práticas utilizadas no setor privado. O cidadão passa a ter
uma maior importância, tornando-se fundamental nesta nova gestão pública, pois é
para ele que a informação se dirige. (MARQUES e ALMEIDA, 2004).
A adoção de práticas de boa governança no setor público está ligada
diretamente com a visão da nova gestão pública, que vem obrigando sua introdução
em ambientes de prestação de serviços do setor público, como, por exemplo, no
ambiente universitário de Portugal (MARQUES, 2007).
Contudo, antes de se falar em governança no setor público, há que se fazer a
diferenciação entre o termo governabilidade e governança. A principal diferença,
segundo Matias-Pereira (2008, p. 67):

Está na maneira como a legitimidade das ações dos governos é


entendida. No conceito de governabilidade, a legitimidade é
proveniente da capacidade do governo de representar os interesses
de suas próprias instituições. Por sua vez, no conceito de
governança, uma parcela de sua legitimidade advém do processo
como ela se concretiza.

Segundo Secchi (2009), o termo governança possui diferentes definições de


acordo com as diferentes áreas do conhecimento. Pode ser concebido como
mudanças nas relações de poder dos Estados no cenário mundial, quando tratado por
estudos de relações internacionais; como práticas de gestão que ajudam países a
melhorar suas condições de desenvolvimento econômico e social, segundo teorias do
desenvolvimento; e como conjunto de princípios básicos para aumentar a efetividade
de controle, na linguagem empresarial e contábil.
O Banco Mundial que, segundo Borges (2003), tem forte política voltada para
influenciar a adoção da governança pelos países, conceitua o termo como “a maneira
pela qual o poder é exercido na administração dos recursos econômicos e sociais do
país, com vistas ao desenvolvimento” (WORLD BANK, 1992, p. 1).
Segundo Slomski et al (2008) poucos estudos são encontrados quanto à
governança no setor público e aqueles que são encontrados tentam adaptar os
princípios de governança do setor privado estabelecidos pelo IBGC. Em países
desenvolvidos, porém, há diversos estudos direcionados ao setor público e podem ser
encontrados códigos de boas práticas especialmente estabelecidos na área
governamental, como é o caso do Reino Unido.
Segundo o código estabelecido pelo Tesouro Nacional do Reino Unido para
adoção de boas práticas de governança corporativa para os departamentos do
governo central (UNITED KINGDOM, 2005, p. 3):

Governança corporativa é a maneira pela qual as organizações são


dirigidas e controladas. Ela define a distribuição de direitos e
responsabilidades entre os diferentes intervenientes e participantes
da organização, determina as regras e procedimentos para a tomada
de decisões sobre assuntos corporativos, incluindo o processo
através do qual os objetivos da organização são definidos, e fornece
os meios para atingir esses objetivos e monitoramento do
desempenho.

Na Holanda, segundo trabalho apresentado pelo Ministério das Finanças


daquele país na 9th Fee Public Sector Conference (THE NETHERLANDS, 2000), a
governança corporativa aplicada ao setor público foi denominada pelo Government
Audit Policy Directorate (DAR) do Ministério das Finanças Holandês com o termo
“government governance”. Segundo o estudo Holandês, a governança governamental
consiste em quatro elementos: “management”, “control”, “supervision” e
“accountability”, ou seja, gerenciamento, controle, supervisão e prestação responsável
de contas e transparência, embora este último termo seja de difícil tradução.
Para fins deste artigo, tendo em vista as definições anteriormente
apresentadas, considera-se que governança é o conjunto de princípios básicos e
práticas que conduzem à administração pública ao alcance da eficiência, eficácia e
efetividade nos seus resultados, através de um melhor gerenciamento dos seus
processos e de suas atividades, promovendo a prestação de contas responsável por
parte dos gestores e a transparência de suas ações.
No setor público, considerando apenas as organizações públicas prestadoras
de bens e serviços, puramente públicas, excluindo-se, desta forma, as empresas de
economia mista, a justificativa para adoção de boas práticas de governança não é a
atratividade de recursos por meio de investidores, mas sim o aumento da eficiência e
eficácia (FONTES FILHO, PICOLIN, 2008).

2.2.1 Práticas de boa governança segundo a IFAC


A International Federation of Accountants (IFAC), fundada em 1977, é uma
organização internacional que conta com um corpo extenso de países associados.
Tem como missão servir ao interesse público, fortalecer a profissão de contabilidade
em todo o mundo e contribuir para o desenvolvimento de economias internacionais
fortes, com a adesão a padrões de alta qualidade profissional através da convergência
internacional de normas e tratar sobre questões de interesse público onde a perícia da
profissão é mais relevante (IFAC, 2009).
A IFAC, além de emitir pronunciamentos contábeis de padrão internacional,
International Public Sector Accounting Standards (IPSAS), cujo objetivo é oferecer
normas que favoreçam qualidade e uniformidade dos relatórios financeiros
governamentais em todo o mundo (IFAC, 2009), realiza também diversos estudos que
contribuem para o cumprimento de sua missão.
Em 2001, a IFAC publicou um estudo, chamado Governance in the Public
Sector: A Governing Body Perspective (Study 13), cujo objetivo é contribuir para a boa
governança e a accountability no setor público. Este estudo estabelece linhas gerais
de princípios de governança e sua aplicação em entidades do setor público (IFAC,
2001).
Embora a IFAC tenha estabelecido princípios em seu estudo, reconhece a
importância dos princípios estabelecidos pelo Cadbury Report, inclusive, sua aplicação
para as entidades do setor público. Contudo, ressalva que a administração pública
possui complexidades outras que não são observadas na administração de empresas
privadas. Assim, influenciada pelos princípios para a vida pública estabelecidos pelo
Nolan Report, redefine os três princípios estabelecidos pelo Cadbury Report:
Transparência - A transparência é necessária para assegurar que
stakeholders possam ter confiança na tomada de decisões e ações das entidades do
setor público, na gestão de suas atividades e nos indivíduos que a gerenciam. Estar
aberto através de consulta significativa com as partes interessadas e comunicação de
informações completas, precisas e claras que levem a medidas rápidas e eficazes e
ergue-se a um exame necessário.
Integridade - engloba tanto as operações simples e complexas. Baseia-se na
honestidade e objetividade, e elevados padrões de decoro e probidade na gestão dos
fundos públicos e de recursos e gestão dos assuntos de uma entidade. É dependente
da eficácia do sistema de controle e sobre as normas de pessoal e profissionalismo
dos indivíduos dentro da entidade. Ela se reflete tanto na decisão da entidade de
tomada de decisão e na qualidade de seus relatórios financeiros e de desempenho.
Accountability - é o processo pelo qual as entidades do setor público e os
indivíduos dentro delas são responsáveis por suas decisões e ações, incluindo a sua
gestão de fundos públicos e todos os aspectos de desempenho, e submeter-se-ão ao
escrutínio externo adequado. É alcançado por todas as partes tendo uma
compreensão clara de responsabilidades, e com papéis bem definidos através de uma
estrutura robusta. Com efeito, a responsabilidade é a obrigação de responder por uma
responsabilidade conferida.
Estes princípios são incorporados em cada um das quatro dimensões
estabelecidas pela IFAC (2001) para governança na administração pública:
1- Padrões de Comportamento: como a gestão da organização exerce
liderança na determinação dos valores e normas da organização, que definem a
cultura da organização e o comportamento de todos dentro dela;
2 - Estruturas Organizacionais e Processos: como a gestão de direção dentro
das organizações é nomeada e organizada, como as suas responsabilidades são
definidas e como é responsabilizada;
3 – Controle: a rede de vários controles estabelecidos pela gestão de direção
da organização para apoiá-lo na consecução dos objetivos da entidade, a eficácia e a
eficiência das operações, a confiabilidade dos relatórios internos e externos e o
cumprimento das leis e regulamentos e políticas internas e externas.
4 - Relatórios Externos: como a gestão de direção da organização demonstra a
sua responsabilização financeira pela gestão dos recursos públicos e o desempenho
no uso.
Estas dimensões são decorrentes dos princípios de governança adaptados à
administração pública, decompostos em desdobramentos acerca das recomendações
necessárias à boa governança neste setor. Essas recomendações estão sumarizadas
na Tabela 1.

Tabela 1 - Recomendações da IFAC sobre Governança no Setor Público

Padrão de Comportamento
• Liderança
• Código de Conduta
• Probidade e Propriedade
• Objetividade, Integridade e Honestidade
• Relacionamento
Estrutura Organizacional e Controle Relatórios Externos
Processo
• Responsabilização Legal • Gerenciamento de Risco • Relatórios Anuais
• Responsabilidade de Prestar • Auditoria Interna • Uso dos padrões de
Contas por Dinheiro Público • Comitês de Auditoria contabilidade
• Comunicação com • Controles Internos adequados
Stakeholders • Orçamentos • Medidas de
• Papéis e Responsabilidades • Gestão Financeira Desempenho
• Equilíbrio de poder e autoridade • Treinamento de Pessoal • Auditoria Externa
• Diretoria da organização
pública
• Presidente da organização
pública
• Membros da Diretoria Não-
Executiva
• Gerentes Executivos
• Política de Remuneração
Fonte: IFAC (2001)

3 METODOLOGIA
3.1 Tipo e Método de Pesquisa
Collis e Hussey (2005, p.23) classificam os muitos tipos de pesquisa de acordo
com o objetivo, o processo, a lógica e o resultado da pesquisa. De acordo com essas
classificações, o presente estudo pode ser classificado como uma pesquisa descritiva
- usada para identificar e obter informações sobre as características de um
determinado problema ou questão, qualitativa - subjetiva e envolve examinar e refletir
as percepções para obter um entendimento de atividades sociais e humanas, básica -
tem como objetivo principal contribuir para o conhecimento, em geral para o bem
comum, ao invés de resolver um problema específico e dedutiva - desenvolve uma
estrutura conceitual e teórica para depois ser testada por observações empíricas.
O método adotado neste trabalho foi a pesquisa bibliográfica e documental.
Vergara (2005, p. 48) define a pesquisa bibliográfica, como o “estudo sistematizado
desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais, em redes
eletrônicas, isto é, material acessível ao público em geral”. A pesquisa documental foi
realizada através da análise da Lei nº 4.320/1964 e da Lei Complementar nº 101/2000
(LRF), que representam as principais normas vigentes no que concerne a finanças
públicas.

3.2 Coleta, Tratamento e Análise dos Dados


Para realização da coleta de dados foi feita uma revisão bibliográfica e uma
análise documental. A revisão bibliográfica permitiu compreender um pouco mais
sobre a história, conceitos e estrutura da legislação contábil e fiscal aplicada no setor
público brasileiro, assim como das práticas de boa governança. A análise documental
permitiu que fosse observado se na legislação brasileira existem itens que favorecem
a adoção das práticas de boa governança sugeridas pela IFAC. Para isto, foram
pesquisadas na legislação as palavras-chave dos itens relativos às recomendações do
IFAC para a adoção das práticas de boa governança.
A população para análise e coleta de dados abrange todas as leis, portarias,
decretos e normativos nacionais que tratam da legislação contábil e financeira do setor
público e todas as recomendações das melhores práticas de governança no setor
público. Entretanto, a unidade de análise foi focada na Lei nº 4.320/64, na Lei
Complementar nº 101/2000 e nas recomendações da IFAC para adoção de práticas
de boa governança – as dimensões de controle e relatórios externos.
Para apresentação dos resultados, foi utilizada uma tabela onde são
organizadas as melhores práticas de governança coorporativa recomendadas pela
IFAC da dimensão controle e relatório externo. Nesta tabela os dados coletados são
apresentados de forma que permita a identificação de se as práticas de governança
são favorecidas pela legislação brasileira. Quando o item é favorecido pela legislação
brasileira, a marcação utilizada é “S”, quando não, “N”. Em alguns casos, na
verificação se a legislação favorece ou não determinado item de governança indicado
pelo IFAC não há clareza quanto sua indicação, entretanto pode-se observar que de
forma indireta, sua adoção é favorecida pela adoção de outra prática. Neste caso,
adotou-se a codificação “P” para indicar que atende de forma parcial.

3.3 Limitações da pesquisa


Alguns fatores temporais forma limitantes da presente pesquisa e como
conseqüência o estudo ficou restrito apenas a verificação das práticas de boa
governança da IFAC relativos às dimensões de controle e de relatórios externos, ou
seja, duas das quatro dimensões. A adoção das recomendações da IFAC neste
estudo justifica-se por este modelo consolidar práticas de accountability
implementadas em diversos países. No que tange a legislação contábil e financeira na
área pública, foram adotadas a Lei nº 4.320/64 e a Lei Complementar nº 101/2000
(LRF), pois são normativos que representam o marco legal da contabilidade no setor
público, além de possuir dispositivos importantes relativos ao controle e divulgação de
relatórios externos.

4 RESULTADOS
4.1 Apresentação e análise dos resultados
A seguir são apresentados os resultados da pesquisa, considerando-se as
dimensões de controle e relatórios externos estabelecidas pela IFAC, conforme já
exposto no referencial teórico e na metodologia.

Dimensão Controle
Na tabela 2, estão relacionadas às recomendações de melhores práticas de
governança relacionadas à dimensão controle. São marcados os itens cuja legislação
favorece a adoção.

Tabela 2 - Dimensão controle

CONTROLE Lei 4.320/64 LC 101/00


Gestão de Risco
A legislação estabelece a gestão de risco como parte da
N S
estrutura de controle interno
Na legislação há procedimentos para identificar e avaliar os
riscos internos e as oportunidades oriundas de fatores N S
externos
A legislação dispõe sobre a revisão dos riscos passados e faz
N N
previsão dos riscos e mudanças futuras
Auditoria Interna
A legislação estabelece que haja uma função de auditoria
N N
interna, como parte da estrutura do controle interno
A legislação dispõe que a função de auditoria interna garanta
a revisão, a avaliação e os relatórios de adequação dos
N N
sistemas gerenciais, financeiros, operacionais e controles
orçamentários
Comitês de auditoria
A legislação orienta quanto à formação de comitê de auditoria N N
com a responsabilidade de rever as estruturas de controle e
dos processos de auditoria externa
As leis dispõem que o comitê de auditoria seja independente
N N
da administração executiva da entidade
Controle interno
A legislação dispõe sobre medidas para assegurar o
P N
estabelecimento de uma estrutura interna de controle
A legislação dispõe que a estrutura de controle interno da
N N
organização seja revisada e testada periodicamente
Orçamento
Há na legislação dispositivo para que a organização tenha que
adotar procedimentos para assegurar um orçamento efetivo e S S
eficiente
Administração Financeira
As leis dispõem quanto à implantação de um sistema sólido de
S S
administração financeira
A legislação dispõe sobre a integração do orçamento com a
S S
Contabilidade
A legislação dispõe que juntamente com o orçamento, seja
S S
elaborado o fluxo de caixa
Treinamento
A legislação estabelece que haja políticas adequadas de
N N
recrutamento e treinamento
Fonte: elaborada pelos autores

Gestão de risco
A IFAC recomenda que haja uma gestão de riscos estabelecida na estrutura de
controle interno da entidade e que haja procedimentos para identificar e avaliar os
riscos internos e as oportunidades oriundas de fatores externos. Apesar de na Lei nº
4.320/64 não haver menção a respeito deste tipo de gestão, a LRF introduz a
preocupação com a questão ao imputar uma responsabilidade na gestão fiscal onde
os riscos devem ser prevenidos e identificados (Art. 1º, §1º). Entretanto, a revisão de
riscos passados e previsão de riscos futuros não são tratadas.
Auditoria / Comitê de auditoria / Controle interno
Não há nada na legislação estudada que favoreça a adoção de boas práticas
de governança relativa à auditoria, comitê de auditoria e controle interno. Entretanto,
na Lei nº 4.320/64 é mencionado que a contabilidade ou órgão equivalente deverá
verificar exata observância dos limites das cotas trimestrais atribuídas a cada unidade
orçamentária, dentro do sistema que for instituído para esse fim (art. 80). Além disso,
procura assegurar que haja um controle interno através do art. 75 e 76, apesar de não
orientar na elaboração de sua estrutura.

Orçamento
Para que a boa governança na dimensão controle seja favorecida, é necessário
que a organização adote procedimentos para assegurar um orçamento efetivo e
eficiente. Na legislação contábil e fiscal aplicada ao setor público verifica-se a
existência de dispositivos que levam as entidades a adotarem procedimentos que
assegurem um orçamento efetivo e eficiente. Na Lei nº 4.320/64 há orientação para a
elaboração de uma lei orçamentária, onde são citados os itens que devem
acompanhar e integrar a lei do orçamento. Ela discorre sobre o assunto do título I ao
título XIII e no artigo 97 trata da efetiva arrecadação da receita, o que colabora na
consecução de um orçamento efetivo.
A LRF regulamenta o assunto ao determinar no seu art. 2° que “a Lei do
Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa de forma a evidenciar a
política econômica financeira e o programa de trabalho do Governo”. Além disso,
“estabelece que deva haver compatibilidade da programação do orçamento com os
objetivos e metas estabelecidos” (art. 5º, inciso I).

Administração Financeira
Faz parte de um bom controle um sistema sólido de administração financeira e
que integre a contabilidade com o orçamento. A legislação estudada favorece essa
prática.
A LRF é clara ao estabelecer um sistema integrado de administração financeira
e controle e a Lei nº 4.320/64 ao integrar o orçamento com a contabilidade em seus
art. 85 e 89. Desta forma, pode-se afirmar que há consonância com a recomendação
da IFAC de ter um sistema sólido de administração financeira e a integração entre a
contabilidade e orçamento. Além disso, a LC nº 131/09, que alterou a LRF, reforçou tal
entendimento ao determinar que a transparência seja assegurada pela adoção de
sistema integrado de administração financeira e controle.
Em relação à elaboração do fluxo de caixa juntamente com o orçamento, a LRF
estabelece prazo para que seja divulgada a programação financeira e o cronograma
de execução mensal de desembolso. A Lei 4.320/64 teve suas demonstrações
financeiras alteradas pela Secretaria de Tesouro Nacional (STN), Portaria STN nº 749,
de 15 de dezembro de 2009, que acrescentou a Demonstração dos Fluxos de Caixa.

Treinamento
A Lei nº 4.320/64 e a LRF não referencia a questão do treinamento.

Dimensão Relatórios Externos


Na Tabela 3, estão relacionadas recomendações de melhores práticas de
governança relacionadas à dimensão relatórios externos.

Tabela 3 - Dimensão relatórios externos

RELATÓRIOS EXTERNOS Lei 4.320/64 LC 101/00


Relatórios Anuais
A legislação dispõe quanto a publicação do relatório anual,
S S
das demonstrações financeiras e do relatório de auditores
Uso de Normas Contábeis Apropriadas
A legislação assegura que as demonstrações financeiras
S N
devem ser preparadas de acordo com os padrões contábeis
Medidas de Desempenho
A legislação dispõe sobre a adoção de medidas de
desempenho para assegurar e demonstrar que os recursos N N
são obtidos com economicidade e utilizados com eficiência
Auditores Externos
A legislação dispõe sobre a realização de auditorias externas
S N
nas organizações
A legislação estabelece independência da auditoria externa na
S N
realização das auditorias
Fonte: elaborada pelos autores

Relatórios Anuais
Tanto a Lei nº 4.320/64 quanto a LRF estabelecem a obrigatoriedade da
publicação de seus demonstrativos e relatórios, tanto contábeis, orçamentários e
financeiros, quanto fiscais. Entretanto, não há obrigatoriedade de publicação de
relatório de auditores.
O artigo 48 da LRF estabelece que são instrumentos de transparência da
gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos
de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as
prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da
Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas
desses documentos.
A Lei nº 4.320/64, por sua vez, no art. 109, estabelece que os orçamentos e
balanços das entidades compreendidas no artigo 107 serão publicados como
complemento dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do
Distrito Federal a que estejam vinculados. No art. 111, a Lei nº 4.320/64 dispõe que o
Conselho Técnico de Economia e Finanças do Ministério da Fazenda, além de outras
apurações, para fins estatísticos, de interesse nacional, organizará e publicará o
balanço consolidado das contas da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, suas
autarquias e outras entidades, bem como um quadro estruturalmente idêntico
baseados em dados orçamentários.

Uso de Normas Contábeis Apropriadas


A LRF dispõe somente sobre o equilíbrio fiscal e a gestão responsável,
abstendo-se de tratar de matéria contábil. Entretanto, a Lei nº 4.320/64 é clara em
relação à obrigatoriedade de os demonstrativos observarem padrões e normas
contábeis instituídos em lei. Em seu art. 110 dispõe que os orçamentos e balanços das
entidades já referidas obedecerão aos padrões e normas instituídas por esta lei,
ajustados às respectivas peculiaridades.
Cabe ressaltar que hoje se vislumbra importantes alterações conceituais nas
normas contábeis, com a convergência ao padrão internacional. O CFC emitiu
diversas resoluções no ano de 2008 versando sobre as NBC T 16 – Normas
Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público. Segundo Dáros e Pereira
(2009) as novas normas são um instrumento para elevar a eficácia e efetividade das
leis quanto aos seus objetivos de promover o planejamento, a transparência e
responsabilidade da gestão fiscal. A STN também trabalha neste sentido e promoveu
recentes alterações nas práticas de contabilidade do setor público através da portaria
nº 462, de 05 de agosto de 2009, aprovando a 2ª edição do Manual de Demonstrativos
Fiscais, tendo seus efeitos aplicados a partir de janeiro de 2010, e a portaria nº 467 de
06 de agosto de 2009, que aprovou novos procedimentos contábeis patrimoniais,
procedimentos contábeis específicos e o plano de contas aplicado ao setor público,
que constam da 2ª edição do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público.
A adaptação das normas brasileiras às normas internacionais propiciou a
introdução do registro de depreciação, amortização, teste de impairmant; uma maior
clareza em relação ao regime de contabilização que deve ser adotado, no caso o de
competência; o aumento do controle com a utilização da Demonstração do Fluxo de
Caixa, (ALBUQUERQUE, VILLAGELIM e ALVES, 2009). Estas alterações também
favorecem a adoção de práticas de boa governança.

Medidas de Desempenho
A LRF sempre que se refere ao desempenho na gestão fiscal trata do equilíbrio
entre as receitas e as despesas e o desempenho entre a previsão e fixação e a
respectiva execução orçamentária (inciso I do art. 50; art. 58). Contudo, este não é o
desempenho de que trata as boas práticas de governança. Pode-se verificar que no
contexto da governança governamental as medidas de desempenho estão focadas em
resultados, enquanto que a Lei Complementar nº 101/2000 enfoca somente aspectos
orçamentários de previsão de receitas e a fixação despesas e as respectiva execução
orçamentária.

Auditores Externos
A LRF não trata da questão de auditoria externa. A Lei nº 4.320/64 se refere ao
controle externo exercido pelo poder legislativo e pelos Tribunais de Contas, que neste
caso, será avaliado por auditores. A independência é relativa. Em princípio mantêm-se
a independência por se tratar de outro órgão responsável pelo controle. Entretanto, o
órgão é do mesmo ente da federação o que pode prejudicar a independência caso
haja interferência política.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A administração pública está sujeita ao cumprimento de diversas leis e
regulamentos que disciplinam assuntos variados sobre os muitos aspectos que
envolvem o oferecimento de bens e serviços públicos ao cidadão. Neste trabalho
optou-se por trabalhar a legislação básica que rege as finanças públicas, considerando
a importância desta área para o desenvolvimento das atividades das entidades deste
setor. Embora seja complicado realizar um trabalho científico utilizando a legislação,
levando-se em conta as constantes modificações promovidas pelos legisladores, ainda
mais em um momento de grandes mudanças nesta área de finanças públicas, tendo
em vista à convergência das normas contábeis brasileiras ao padrão internacional, há
que se considerar que os estudos realizados nas normas de hoje podem influenciar
em melhores normas no futuro, principalmente num ambiente em que, culturalmente,
as mudanças ocorrem mais por força de mandamentos legais do que por simples
iniciativa de gestão em se melhorar a qualidade, eficiência e eficácia dos serviços e
bens oferecidos à sociedade.
Assim, observa-se da análise feita da Lei Complementar nº 101/2000 (LRF) e
da Lei nº 4.320/1964 que há pouca correspondência entre as práticas de boa
governança estabelecidas pela IFAC para o setor público e os dispositivos normativos
estabelecidos nestas leis no que se refere às dimensões de controle e relatórios
externos. As duas dimensões totalizam 19 recomendações e apenas 9 destas
recomendações são favorecidas pela legislação pública brasileira em estudo. Dentre
elas as relativas à gestão de risco, orçamento e administração financeira na dimensão
controle e, na dimensão relatórios externos, relatórios anuais, uso de normas
contábeis apropriadas e auditoria externa.
Desta forma, para que possa haver a adoção de práticas de boa governança
no setor público brasileiro é necessário que haja normativo que favoreça a adoção das
demais recomendações, visto a importância de haver maior eficiência e eficácia nas
operações, relatórios internos e externos confiáveis e responsabilização pela gestão
de recursos públicos. Questões estas importantes e cada vez mais valorizadas,
inclusive pela convergência das normas contábeis e pela nova contabilidade do setor
público.
Recomenda-se para pesquisas futuras uma ampliação dos normativos
estudados, a verificação de se estas práticas são adotadas em instituições públicas e
das conseqüências trazidas pela sua adoção.
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à Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, que estabelece normas de
finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras
providências, a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de informações
pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios. Disponível em:
www.planalto.gov.br/ccivil.../LEIS/.../Lcp131.htm. Acesso em 03 de outubro de 2009.

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- Plano de Contas Aplicado ao Setor Público, da 2ª edição do Manual de Contabilidade
Aplicada ao Setor Público, e dá outras providências. Secretaria de Tesouro Nacional.
STN. Disponível em
http://www.stn.fazenda.gov.br/legislacao/download/contabilidade/Portaria_STN_467_2
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________. Portaria nº 749, de 15 de dezembro de 2009. Aprova a alteração dos


Anexos nº 12 (Balanço Orçamentário), nº 13 (Balanço Financeiro), nº 14 (Balanço
Patrimonial) e nº 15 (Demonstração das Variações Patrimoniais), inclui os anexos nº
18 (Demonstração dos Fluxos de Caixa), nº 19 (Demonstração das Mutações no
Patrimônio Líquido) e nº 20 (Demonstração do Resultado Econômico) da Lei nº 4.320,
de 17 de março de 1964, e dá outras providências. Secretaria de Tesouro Nacional.
STN. Disponível em
http://www.stn.fazenda.gov.br/legislacao/download/contabilidade/Portaria_STN_749_A
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