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Notas de Pesquisa

Distribuição espacial A transição demográfica que ocor-


reu lentamente nos países desenvolvidos
e crescimento da acompanhou a elevação da qualidade de
vida, com inserção das pessoas no mercado
população idosa nas de trabalho, oportunidades educacionais
capitais brasileiras de favoráveis, bem como boas condições sani-
tárias, alimentares, ambientais e de moradia
1980 a 2006: (CERQUEIRA; OLIVEIRA, 2002).
No entanto, no Brasil e em outros
um estudo ecológico países em desenvolvimento, esse processo
foi rápido e desvinculado de uma política
Silvana Lopes Nogueira* social favorável, sem melhora concomitante
Júnia Maria Geraldo** na qualidade de vida da população idosa
Juliana Costa Machado*** (CARVALHO; GARCIA, 2003). A cada ano,
Rita de Cássia Lanes Ribeiro**** 650 mil novos idosos são incorporados
à população, e a maior parte apresenta
Introdução doenças crônicas não transmissíveis e limi-
tações funcionais (VERAS, 2007).
Do ponto de vista demográfico, enve- Cabe ressaltar que o processo de
lhecimento é caracterizado pelo aumento na envelhecimento populacional não ocorre
proporção da população a partir de 60 anos, de maneira uniforme em todas as regiões
para países em desenvolvimento, e de 65 brasileiras. Assim, este trabalho teve como
anos, para os desenvolvidos, em relação à objetivo avaliar a distribuição espacial e o
população total. Esse processo ocorre como crescimento da população acima de 60 anos
conseqüência da queda da fecundidade, no Brasil, focalizando as diferenças entre as
aliada ao aumento da expectativa de vida e capitais. Os dados obtidos foram relaciona-
à redução da mortalidade (MOREIRA, 2000; dos entre si e com outros encontrados na
CARVALHO; GARCIA, 2003). literatura, permitindo também que se tenha
No Brasil, verifica-se que atualmente uma visão prospectiva acerca do processo
a redução da natalidade ocorre em ritmo de envelhecimento nessas cidades.
mais acelerado do que a diminuição da mor-
talidade, resultando em limitação progres- Metodologia
siva no ritmo de crescimento populacional
(WONG; CARVALHO, 2006). Realizou-se um estudo ecológico de
Segundo a Organização das Nações série temporal, utilizando dados sobre
Unidas (ONU), os idosos representavam, sexo e faixa etária da população idosa e
em 2005, 10,4% da população mundial, da total, residentes nas capitais brasileiras
e projeções revelam que, até 2050, esse e no país, no período de 1980 a 2006. Em
valor será superior a 20%. Paralelamente, relação à cidade de Palmas-TO, encontrou-
o percentual de crianças reduzirá de 30% se informações disponíveis somente a partir
para 21%, no mesmo período. de 1981.
Em relação à população brasileira, o Os dados foram obtidos diretamente
grupo de 0 a 14 anos correspondia, em do Sistema de Informação do Ministério
2000, a 30% do total, enquanto os maiores da Saúde (DATASUS, 2007) e do Instituto
de 65 anos eram apenas 5%. No entanto, Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,
projeções indicam que, em 2050, os dois 2007), acessados entre 10 de janeiro e 25
grupos se igualarão em 18% (IBGE, 2007). de fevereiro de 2007.

* Profissional de Educação Física. Mestranda em Ciência da Nutrição pela Universidade Federal de Viçosa.
** Nutricionista. Mestranda em Ciência da Nutrição pela Universidade Federal de Viçosa.
*** Economista doméstica, graduada pela Universidade Federal de Viçosa.
**** Professora associada da Universidade Federal de Viçosa. Doutora em Saúde Pública pela Universidade Federal de
Minas Gerais.

R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 25, n. 1, p. 195-198, jan./jun. 2008


Nogueira, S.L. et al. Distribuição espacial e crescimento da população idosa nas capitais brasileiras de 1980 a 2006

Foi considerado idoso o indivíduo com urbanizadas e industrializadas do país, per-


idade igual ou superior a 60 anos (BRASIL, maneceram com proporção de idosos acima
2003). Entretanto, o cálculo do índice de da média nacional, que era de 6,07%, em
envelhecimento foi realizado por meio do 1980, e 8,44%, em 2006. As cidades do Rio
quociente entre a população com idade de Janeiro-RJ e Porto Alegre-RS, tanto em
superior a 65 anos e aquela com idade 1980 quanto em 2006, ocupavam o primeiro e
inferior a 15 anos. Esse índice permitiu a o segundo lugares, respectivamente, no per-
identificação de alterações na estrutura centual de idosos da população das capitais
etária da população ao longo dos anos es- brasileiras. Esta diferença, em comparação
tudados. Shryock e Siegel (1976) sugerem com o restante do país, pode estar envolvida,
um índice de envelhecimento inferior a 15% entre outros elementos, com a qualidade de
como sendo indicativo de uma população vida, situação socioeconômica e escolari-
jovem; entre 15% e 30% uma população em dade de seus habitantes (ALBUQUERQUE,
nível intermediário; e acima de 30% poderia 2005; PEREIRA et al., 2003).
ser considerada uma população idosa. É interessante notar que algumas ci-
A distribuição espacial e a evolução do dades apresentaram aumento mais acentua-
número de idosos nas capitais brasileiras do no percentual de idosos nesse período.
foram verificadas por meio do cálculo da Como relatado anteriormente, vários fatores
proporção de pessoas de 60 anos e mais interferem no envelhecimento populacional
por capital, no período estudado. dos municípios, tais como redução nas taxas
Realizou-se também a comparação do de fecundidade e aumento da expectativa de
crescimento percentual dos idosos para o vida, mas um aspecto muito importante que
total do Brasil, por sexo, entre 1980 e 2006. deve ser analisado refere-se aos movimen-
tos migratórios, especialmente no caso das
Resultados e discussão capitais. Martignoni et al. (2006) destacam
que, no Brasil, a mobilidade da população
Durante o período analisado, houve idosa em relação às migrações é bem menor
aumento de 59,3% na população total do que para outras faixas etárias.
brasileira, enquanto o grupo acima de 60 No período analisado, o aumento mais
anos elevou-se em 118,2%. Na década expressivo na proporção de idosos foi
de 80, houve desaceleração no ritmo de registrado em Brasília (92,5%), seguida por
crescimento populacional brasileiro, pro- Goiânia, com crescimento de 74,7%.
vocada pela queda da fecundidade, mais Belo Horizonte também obteve ele-
pronunciada no meio rural. Entretanto, de vação bastante significativa da população
maneira generalizada, pode-se afirmar que o idosa, da ordem de 70,4%. De acordo com
processo de envelhecimento da população Zahreddine e Rigotti (2006), a esperança de
brasileira tem sido muito acelerado, particu- vida ao nascer do belorizontino tem aumen-
larmente na Região Sudeste. De acordo com tado, e a cidade apresentou, entre os censos
dados das Nações Unidas, de 1975 a 2000, de 1991 e 2000, redução da taxa de fecun-
outras populações apresentaram incremen- didade total, que atualmente está abaixo da
tos bem menores na proporção de idosos, taxa de renovação de gerações, que é de
como as populações da América do Norte 2,1 filhos. Além disso, o saldo migratório tem
(20,2%), Europa (28,9%) e Ásia (40,7%) se mantido negativo em alguns períodos, e
(UNITED NATIONS, 2005), o que reflete um grande parte da população que emigra da
processo de envelhecimento diferenciado. capital mineira é formada por jovens. Todos
O aumento da população idosa, esses fatores corroboraram para que, nos
observado quando se contrastam os dados últimos anos, houvesse um envelhecimento
de 1980 e 2007, é um fenômeno que traz desta população.
consigo uma série de implicações sociais, Para o total do Brasil, observa-se notável
culturais e epidemiológicas. variação na estrutura etária da população
Apenas sete capitais, situadas nos idosa, entre 1980 e 2006. A faixa etária de
Estados do Sul e Sudeste, as regiões mais 60 a 64 anos contém o maior percentual de

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indivíduos em todo o período, representando dice de idosos. Por outro lado, as capitais
cerca de 30% da população idosa. Entretan- Palmas e Porto Velho foram as que obti-
to, verifica-se crescimento mais expressivo veram menores índices de envelhecimento
no grupo de indivíduos acima de 75 anos, neste mesmo período.
especialmente aqueles com 80 anos e mais. Em relação ao gênero, entre os dados
Isto indica uma alteração na composição obtidos para a população brasileira, encon-
interna do grupo etário dos idosos. trou-se maior número de mulheres (aproxi-
A proporção da população “mais idosa” madamente 51%) do que de homens, para
está aumentando em ritmo bastante ace- todos os anos. De acordo com Pereira et
lerado. Em 1980, o Brasil possuía cerca de al. (2003), este fenômeno tem ocorrido não
560 mil idosos com mais de 80 anos; já em apenas no Brasil, mas também em muitos
2006, esta parcela da população aumentou outros países, pois o aumento da expectativa
para quase dois milhões de habitantes. de vida é sempre mais significativo para as
A infra-estrutura das cidades brasilei- mulheres. Os autores associam esse achado
ras deve, portanto, ser adequada para a fatores como o menor consumo de álcool
atender a essa maior demanda de idosos, e tabaco (associados a várias doenças),
pois, além das alterações demográficas, melhoria do atendimento médico-obstétrico
o Brasil também passa pela transição e menor exposição a riscos, como acidentes
epidemiológica, com alterações relevantes e homicídios (PEREIRA et al., 2003).
no quadro de morbimortalidade, em que
predominam as doenças crônicas não-trans- Considerações finais
missíveis. Conseqüentemente, é inevitável
que os gastos públicos sejam reforçados De um modo geral, o Brasil encontra-se
no tratamento, hospitalização e reabilitação num processo de envelhecimento popula-
(ALBUQUERQUE, 2005). cional bastante acelerado, que pode ser
Ao se analisar o índice de envelhecimen- evidenciado pela evolução do índice de
to no Brasil, observou-se que houve aumento envelhecimento, no período de 1980 a 2006.
de 85,3% no intervalo estudado, passando Há predominância de idosos entre 60 e 64
de 10,5% em 1980 para 19,43% em 2006. anos, embora seja a faixa etária acima de
Em 1980, com exceção do Rio de Janeiro e 80 anos a que tem mais se elevado, em
Porto Alegre, todas as capitais, assim como termos percentuais. As capitais brasileiras
o total do Brasil, poderiam ser consideradas experimentam o mesmo processo, mas em
uma população predominantemente jovem diferentes graus.
(SHRYOCK; SIEGEL, 1976). Em 1985, 1990 e Assim, outros estudos são impres-
1995, esse índice continuou se elevando. So- cindíveis para acompanhar a tendência
mente em 2000 o Brasil atingiu um índice de do envelhecimento populacional no Brasil,
envelhecimento intermediário, enquanto 14 pois, mesmo não tendo sido considerada a
capitais apresentavam classificação igual ou migração no presente estudo, a constatação
superior à do país. Segundo o IBGE (2004), do aumento do número de idosos permite o
a projeção do índice de envelhecimento para norteamento de políticas públicas interven-
2050 é de 105,6%. cionistas, o que influencia positivamente na
Além de possuírem expressivo percen- qualidade de vida dos idosos.
tual de idosos, ao longo desses 27 anos, as Por outro lado, tendo em vista a grande
cidades do Rio de Janeiro e Porto Alegre velocidade com que este processo ocorre,
destacaram-se por apresentarem índices de ações concretas devem ser realizadas, tais
envelhecimento notadamente superiores às como a reestruturação da previdência social
demais capitais. A primeira obteve índices e uma aplicação prática mais efetiva dos
cerca de duas vezes maiores que a média direitos assegurados no Estatuto do Idoso
nacional no período estudado. Porto Alegre brasileiro. No âmbito acadêmico e técnico,
se manteve em segundo lugar. Recife so- faz-se necessário investir na formação ade-
bressaiu por registrar um aumento bastante quada de profissionais, para lidar com esta
significativo, da ordem de 114,3%, no ín- parcela da população.

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Nogueira, S.L. et al. Distribuição espacial e crescimento da população idosa nas capitais brasileiras de 1980 a 2006

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Recebido para publicação em 28/02/2008.


Aceito para publicação em 25/04/2008.

198 R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 25, n. 1, p. 195-198, jan./jun. 2008

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