Análise do Capítulo X- "Corrida de Cavalos" dos Maias
Este capítulo, "corrida de cavalos", inicia com a narração do desfecho de um
encontro de Carlos com a condessa Gouvarinho e revela que já se sente farto dela ("E nessa tarde, como não havia ainda outro esconderijo, tinham abrigado os seus amores dentro daquela tipóia de praça. Mas Carlos vinha de lá enervado, amolecido, sentindo já na alma os primeiros bocejos da saciedade. Havia três semanas apenas que aqueles braços perfumados de verbena se tinham atirado ao seu pescoço – e agora, pelo passeio de S. Pedro de Alcântara, sob o ligeiro chuvisco que batiam as folhagens da alameda, ele ia pensando como se poderia desembaraçar da sua tenacidade, do seu ardor, do seu peso…”) Quando, depois, Carlos ia a descer a rua de S. Roque, encontrou o marquês, "tristonho, com um embrulho na mão, e o pescoço abafado num enorme cachenez de seda branca". Durante a conversa, Carlos apercebeu-se que a corrida de cavalos tinha sido antecipada para o Domingo seguinte. Maia ficou contente, pois daí a cinco dias iria, finalmente, conhecer a mulher que ele vira à entrada do Hotel Central, pois certamente também iria estar nas corridas, um acontecimento social tão divulgado. "E (ela) estaria lá, ele ia conhecê-la, enfim!" Enquanto Carlos e o marquês vão falando das corridas, Maria Eduarda passa no seu coupé, deixando Carlos ali estagnado a observá-la, enquanto Rose o aponta à mãe, explicando-lhe, talvez, que fora ele o médico que a tinha consultado: “Carlos olhou, casualmente; e viu, debruçado à portinhola, um rosto de criança, de uma brancura adorável, sorrindo-lhe, com um belo sorriso que lhe punha duas covinhas na face. Reconheceu-a logo. Era Rosa, era Rosicler: e ela não se contentou em sorrir, com o seu doce olhar azul fugindo todo para ele – deitou a mãozinha de fora, atirou-lhe um grande adeus. No fundo do coupé, forrado de negro, destacava um perfil claro de estátua, um tom ondeado de cabelo loiro. Carlos tirou profundamente o chapéu, tão perturbado, que seus passos hesitaram. “Ela” abaixou a cabeça, de leve;”. Após passar o coupé, Carlos e o marquês dirigem-se ao Ramalhete; Maia, pelo caminho, vai traçando um plano para se encontrar com Maria Eduarda. Chegando ao Ramalhete juntam-se todos, estando também presente o Dâmaso. Durante o jantar Carlos vai contar a Dâmaso o seu plano para conhecer os Castro Gomes: este levá-los-ia até aos Olivais para lhe mostrar a coleção de Craft e em seguida jantariam no Ramalhete. "Depois ia refazendo o plano da visita aos Olivais, mais largo agora, mais brilhante." Depois do sarau no Ramalhete, chega o dia das corridas. Carlos vai ao hipódromo na esperança de ver Maria Eduarda, mas fica desiludido, pois ela não aparece. "...Madame Gomes; não a tornara a ver; não a esperava nas corridas." É Domingo, um dia quente, com o céu azul. No Hipódromo Carlos fala com a sua velha amiga D. Maria da Cunha e conhece Clifford, que era o dono do cavalo que tinha mais expectativas de ganhar e por causa de quem as corridas tinham sido antecipadas. "Era o famoso Clifford, o grande sportman de Córdova." Entretanto, a Gouvarinho diz a Carlos que seu pai faz anos e ela tem de ir ao Norte. Propõe-lhe então que se encontrem na estação e que sigam juntos no comboio até Santarém, onde passarão a noite juntos; depois, ela seguirá até ao Porto e ele regressará a Lisboa. Carlos hesita. Ocorre uma situação caricata e ridícula, quando irrompe uma discussão, sob o pretexto de que tinha havido "batota" nas apostas, havendo insultos e pancadaria. As mulheres fogem histéricas aos gritos, perdendo também a pose e os bons modos. "De repente, fora, houve um rebuliço, e as vozes sobressaltadas gritando: "ordem"...". Assim, ficou provado que as pessoas de sociedade que ali estavam, embora pretendessem dar-se ares de civilizadas, facilmente perdiam a postura, deixando “estalar o verniz “. Assim, neste célebre episódio das corridas, um episódio crítico, apresenta-se a alta sociedade lisboeta, num evento social que se supõe de civilizado. Querendo parecer chiques, os portugueses imitavam os costumes estrangeiros, importando assim as suas modas, como as corridas inglesas de cavalos. Carlos, para animar as corridas, decide apostar num cavalo que aparentemente não promete sair vencedor, mas, surpreendentemente, o animal acaba por ser o primeiro a chegar à meta e Carlos consegue ganhar muito dinheiro "No fundo do chapéu já reluzia ouro". Aqui podemos aplicar o provérbio “Sorte no jogo, azar no amor”. Este é o primeiro presságio do capítulo. Entretanto Carlos vai falar com Dâmaso e ele conta-lhe que Castro Gomes partira para o Brasil e que Maria Eduarda está num apartamento no prédio do Cruges. De regresso a casa, Carlos pensa na desculpa de querer falar com Cruges, só para poder passar pelo prédio onde também está Maria Eduarda, alimentando assim a esperança de a ver. No entanto, quando chega ao prédio, a criada diz que Cruges não está e Carlos acaba também por não ver Maria Eduarda. Carlos regressa ao Ramalhete, onde encontra Craft. Um criado entrega uma carta a Carlos "Um bilhete apenas, um doente...". Ao abri-la depara com uma agradável surpresa, pois a autora é a senhora Castro Gomes "Madame Castro Gomes apresenta os seus...", que lhe pede para ir consultar na manhã seguinte uma pessoa de família que se encontra doente. Carlos resplandece de tal modo de felicidade que Craft percebe que lhe terá acontecido algo de muito bom. "...todo banhado num sorriso, como em êxtase." Refigura-se, então, o tão ansiado encontro entre Carlos e Mª Eduarda, as duas personagens entre as quais existia de uma grande atração.