Você está na página 1de 29

LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof.

Fernando Gajardoni – Intensivo II –


09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

Como vimos na aula passada, podem opor embargos de terceiro:

a) Terceiro possuidor ou proprietário/possuidor do bem - art.


1.046, § 1º, do CPC.

b) Quem for parte na execução - art. 1.046, § 2º, do CPC.

É hipótese bizarra em que o próprio executado pode opor embargos de


terceiro. É a única hipótese que quem é parte e, portanto, em princípio oporia
embargos à execução, vai opor embargos de terceiro. Por quê? Porque a lei diz que
quando a parte possui um bem que, pelo título da aquisição ou pela qualidade que
possui esse bem, não pode ser penhorado, a própria parte pode opor embargos de
terceiro. Exemplo clássico: Sou locador de um carro. Vem o meu credor e penhora o
carro. Eu vou falar o quê? Que o carro não é meu, que sou só locador. Apesar de eu
ser parte, a lei permite que eu oponha embargos de terceiro com base no a RT.
1.046, § 2º. Eu já cansei de ver juiz rejeitando embargos de terceiro sob o
fundamento de que o réu é parte ilegítima para opor embargos de terceiro, que
seriam embargos à execução. Mas está errado, porque o art. 1046, § 2º autoriza
expressamente.

c) Cônjuge ou companheiro na proteção da meação ou do bem de


família

O cônjuge pode opor embargos de terceiro quando a penhora dos bens vai
atingir o patrimônio comum do casal. O cônjuge/companheiro pode opor embargos
de terceiro para livrar a parte que lhe cabe. Essa hipótese de embargos de terceiro
vem sendo utilizada também para que o cônjuge tente liberar o bem de família e
não só a meação.

4.1. Legitimidade Passiva

Isso é muito simples porque quem vai ser réu no processo de embargos de
terceiro vai ser o autor da ação onde ordenada a constrição. Você tem que tomar
cuidado para não falar que é o exequente porque os embargos de terceiro
alcançam várias hipóteses de constrição e não somente a execução. Caso eu seja o
exequente numa execução e você seja o réu e eu requeiro a penhora do seu carro,
quando o terceiro opuser os embargos de terceiro vai ser contra mim e não contra
você que é o réu da execução. No mesmo sentido, se eu sou autor de uma
reintegração de posse e eu reintegro um carro em meu poder e um terceiro se diz
dono desse carro, o réu dos embargos de terceiro sou eu porque eu sou o autor da
ação onde foi ordenada a constrição.

Aqui é bom fazer um destaque. O Superior Tribunal de Justiça tem diversos


precedentes no sentido de que: se o executado indicou o bem à penhora ele deve
figurar como litisconsorte passivo necessário do exequente. A regra é que o réu nos
embargos de terceiro levou à constrição do bem, em regra, o autor da execução.
Por outro lado, muitas vezes na execução o réu, devedor diz que não tem nada, que
só tem esse carro e indica à penhora um bem que não é dele, um carro que é do
pai dele, por exemplo. Então, eu sou o credor e o devedor indica o carro do pai
dele. Vem o pai e opõe embargos de terceiro. Pela regra inicial que eu te dei, o réu
sou eu que sou o autor da ação onde houve a constrição. Mas nesse caso

107
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

específico, o executado foi quem deu causa à penhora. Por quê? Porque ele falou:
“penhora o carro.” Consequentemente, nesses casos, você tem que admitir uma
hipótese de litisconsórcio em que, ao mesmo tempo figurem exequente e
executado como réus nos embargos de terceiro. Só se ele indicar. Se não indicar,
fica só o autor da ação principal.

A legitimidade passiva é extremamente simples nos embargos de terceiro e


era só o que eu tinha pra falar.

5. PRAZO PARA OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO

A regra sobre prazo para oposição de embargos de terceiro é a regra do art.


1.048, do CPC.

Aqui temos que fazer uma observação porque os prazos são distintos. O art.
1.048 traz uma regra que pode ser bipartida.

Art. 1.048 - Os embargos podem ser opostos a


qualquer tempo no processo de conhecimento enquanto
não transitada em julgado a sentença, e, no processo de
execução, até 5 (cinco) dias depois da arrematação,
adjudicação ou remição, mas sempre antes da assinatura
da respectiva carta.

• Se a constrição se deu no processo de conhecimento (ou cautelar


– a lei não fala, mas eu acrescento) são cabíveis embargos de
terceiro até o trânsito em julgado da sentença.

Essa é a primeira regra de prazo. Ocorrendo uma ação de obrigação para


entrega de coisa. O juiz me assegura a posse de um maquinário no começo do
processo a título de tutela antecipada. Essa decisão gerou uma constrição sobre o
bem e isso é um processo de conhecimento. Essa constrição pode ser atacada até o
transito em julgado do da sentença desse processo que reconhecer que eu tenho
direito ao maquinário. Após, um abraço. Mas até o transito em julgado eu tenho
plena possibilidade de embargar de terceiro. O que causa uma situação pitoresca.
Por quê? Porque pode acontecer de os embargos de terceiro estarem correndo, o
juiz dá a sentença de primeiro grau reconhecendo que eu tenho que ficar com o
maquinário, o processo segue para o tribunal e eu continuo com o maquinário, o
cara perde no tribunal, vai para o STJ e eu continuo com o maquinário. Vai para o
STF e eu continuo com o maquinário. Até aí ainda não transitou em julgado. Quando
está lá no STF, pra julgar o último recurso, aparece um terceiro que diz: eu sou
dono do maquinário, embargos de terceiro. Pode? Pode! Porque o prazo é até o
transito em julgado.

108
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

E qual a situação pitoresca (e essa anotação, geralmente, não é feita pela


doutrina)? Pode acontecer de, nessa hipótese, serem cabíveis embargos de terceiro
no processo principal em grau de recurso. É plenamente possível o cabimento de
embargos de terceiro nessa hipótese, no processo principal em grau de recurso.
Então, está lá o processo no STF, você tem que entrar com embargos de terceiro
para poder liberar o maquinário. Mas apesar de o processo estar no STF a
competência, nessa hipótese é sempre do primeiro grau. Você não vai entrar com
embargos de terceiro perante o Ministro do Supremo. A primeira instancia é que vai
ter que se virar para apreciar esses embargos de terceiro até porque você há de
concordar que o STF apreciando, eu suprimiria indevidamente graus de jurisdição.
Não teria sentido imaginar o Supremo julgando originariamente embargos de
terceiro. Essa é a primeira hipótese do prazo (que pode ser bipartido): até o trânsito
em julgado. Agora, vamos para a segunda parte do prazo.

• Se a constrição se deu no processo de execução são cabíveis


embargos de terceiro no prazo de até 5 dias depois da
arrematação ou adjudicação, mas sempre antes da assinatura da
carta.

No processo de conhecimento embargos de terceiro acontecem. É raro, mas


você tem que saber. Na maioria das vezes, os embargos de terceiro ocorrem no
processo de execução.

Se eu tenho uma execução e penhorei o bem. Se eu avaliei o bem e


arrematei o bem, até aqui eu posso opor embargos de terceiro. A qualquer
momento. Mas depois da arrematação, eu conto cinco dias. Se, em cinco dias, o
pretenso proprietário ou possuidor do bem não opuser embargos de terceiro, se em
cinco dias a mulher não opuser embargos de terceiro para livrar a meação dela
(para aqueles que entendem que cabem embargos de terceiro nessa situação),
automaticamente, não cabem mais embargos de terceiro e o bem vai ser alienado
pela sua integralidade. E, chupe o dedo o terceiro, entre com ação autônoma
posteriormente, mas, na execução, ele não consegue mais resolver esse problema.
Esse é um prazo decadencial de cinco dias. Passou, você perde o direito à via dos
embargos de terceiro. É um prazo muito parecido do MS, de 120 dias. Você perde a
via, mas no fundo você pode até discutir. Nada impede que eu entre com uma ação
contra o executado para receber o valor do meu carro que, afinal de contas foi
vendido para pagar dívida dele.

Nosso legislador, nas reformas recentes que ele fez no processo de


execução, fez uma alteração perfeita no art. 746, do CPC. Quem estudou isso
lembra, da época da faculdade, que depois da arrematação e da adjudicação, o
devedor ainda tem jeito de tentar reverter a adjudicação e a arrematação através
de um negócio chamado embargos de segunda fase ou de embargos à
arrematação ou adjudicação. Diante de um vício no leilão, o que o devedor pode
fazer? Ele pode embargar a arrematação e tentar cancelar o leilão. O art.746 fala
exatamente isso:

Art. 746 - É lícito ao executado, no prazo de 5


(cinco) dias, contados da adjudicação, alienação ou
arrematação, oferecer embargos fundados em nulidade
da execução, ou em causa extintiva da obrigação, desde
que superveniente à penhora, aplicando-se, no que

109
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

couber, o disposto neste Capítulo. (Alterado pela L-


011.382-2006)

Aqui ele trata dos embargos de 2ª fase (embargos à arrematação ou


embargos à adjudicação). Você consegue entender por que falamos em embargos
de 2ª fase? É em detrimento dos embargos de 1ª fase, que são os embargos à
execução. Mas qual é o mérito do legislador, da Lei 11.382? É a unificação do prazo.
Antes era 15. Agora, na nova redação do art. 746 houve uma unificação dos prazos
de impugnação, da arrematação e da adjudicação. Se o devedor quiser impugnar a
hasta, cinco dias (embargos de 2ª fase) e se um terceiro quiser impugnar a hasta? 5
dias também. Portanto, passou cinco dias, fica sossegado, arrematante. Passados
cinco dias, sossega arrematante. Por quê? Porque não tem mais possibilidade de
oposição, nem de embargos à arrematação, nem de embargos à adjudicação e nem
de embargos de terceiro. Isso foi o que o art. 746 fez e, ligando ele com o art.
1.048, do CPC, você chega à conclusão que 5 dias é o prazo para qualquer
impugnação relativa à hasta, à arrematação ou à adjudicação.

6. PROCEDIMENTO

Nós vamos conversar sobre o procedimento no processo de embargos de


terceiro. E, como você sabe, eu não vou ficar repetindo isso, o procedimento é a
forma como os atos processuais se combinam no curso do processo. E como andam
os embargos de terceiro dentro do processo civil?

6.1. 1ª Etapa: PETIÇÃO INICIAL

Como todo processo, começa com uma petição inicial com previsão no art.
1.050, do CPC, e merece alguma atenção. Primeiro porque obedece a todos os
requisitos dos arts. 282 e 283 (é uma inicial como qualquer outra).

a) Rol de Testemunhas

O que vou tentar mostrar nessa petição inicial? Que sou


proprietário/possuidor do bem que foi penhorado, adjudicado, arrestado, bloqueado,
que foi constrito. O mais importante é que é requisito da petição inicial dos
embargos de terceiro que você junte rol de testemunhas. E, nesse sentido, o
procedimento dos embargos de terceiros e aproximam muito do procedimento
sumário. Você já estudou comigo e viu que o procedimento sumário exige que a
parte apresente rol de testemunhas. Eu já cansei de ver gente perder a
oportunidade de produzir prova testemunhal em embargos de terceiro porque não
fez a inicial ser acompanhada do rol de testemunhas e o art. 1.050 é expresso:

Art. 1.050 - O embargante, em petição elaborada


com observância do disposto no Art. 282, fará a prova
sumária de sua posse e a qualidade de terceiro,
oferecendo documentos e rol de testemunhas.

Sob pena de preclusão. Se você não arrolar aqui, você não pode querer ouvir
depois. Preclui o direito de ouvir as testemunhas. Essa é uma posição
extremamente formalista. Eu, como magistrado, me recuso a não deixar que o cara
ouça a testemunha só porque ele não arrolou na petição inicial. Mas é uma postura

110
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

minha. Você não vai encontrar esse tipo de postura no Judiciário brasileiro que
adota a preclusão extrema (não arrolou aqui, dançou).

b) Valor da Causa

A segunda observação sobre a petição inicial e que você deve estar atento, é
a questão do valor da causa. Tem se entendido que o valor da causa é o valor do
bem constrito. Ou seja, do bem que se pretende liberar. É o valor do bem que se
pretende liberar. Entretanto, se o valor do bem for superior ao do processo de
execução, o valor da causa será o do processo de execução. A regra é que o valor
da causa seja o do bem que quer ser liberado. Mas se esse valor for maior do que o
valor da execução, vale o valor da execução.

Vamos pensar num exemplo prático. Eu sou seu credor e você me deve 50
mil reais. De tudo o que você tem, a única coisa que pode ser penhorada é uma
chácara de passeio cujo valor é 200 mil reais. Eu só posso penhorar esse bem, não
importa que o valor dele é maior que o da execução. Esse bem será penhorado.
Vem o terceiro, opõe embargos de terceiro, dizendo que a chácara é dele. Nesse
caso específico, o valor do bem que ele quer liberar (200 mil) é maior do que o
valor da própria execução (50 mil), então, ele é obrigado a dar o valor de 200 mil
reais para esses embargos. Ele vai te dar um valor de 50 mil, que é o valor da
execução. Você tem que concordar comigo que essa jurisprudência beneficia o
terceiro por causa das custas. Se fossem 200 mil, o valor das custas seria bem
maior.

c) Cumulação de Pedidos

É fundamental você saber que, mais uma vez, a jurisprudência tem


entendido que é vedada a cumulação de pedidos, especialmente a pretensão
indenizatória com os embargos de terceiro. Os embargos de terceiro só podem
objetivar a liberação do bem. Não podem objetivar outra coisa que não seja a
liberação do bem. Eu não posso querer cumular o pedido de liberação do bem
penhorado, constrito, com o pedido de indenização.

Pontes de Miranda, em uma de suas passagens, diz algo que cai bem aqui.
Ele fala que os embargos de terceiro servem para impedir e não para pedir. Você
impede a constrição e não pede. Invariavelmente, na prática forense, eu canso de
indeferir petição inicial parcialmente porque tudo é dano moral. Pede-se dano moral
por causa de cinco dias de atraso na prestação. Vira mexe você tem embargos de
terceiro em que o cara alega que o bem é dele, que o credor sabia e quer dano
moral pela ofensa à honra. É caso de indeferir parcialmente e tocar somente os
embargos de terceiro. Aí vem a pergunta: mas eu não posso pedir indenização em
casos extremos? Pode, mas autonomamente.

6.2. 2ª Etapa: RECEBIMENTO DA AÇÃO

Isso tem previsão no art. 1.052, do CPC. É óbvio que o juiz pode indeferir a
inicial, mas nós aqui estamos imaginando que está tudo certinho e que ele recebe
essa petição inicial. De acordo com o art. 1.052 se, eventualmente, forem recebidos
os embargos de terceiro, o juiz ordenará a suspensão total ou parcial do processo
principal (onde houve a constrição, o bloqueio, a tutela antecipada, a arrematação,
etc.).

111
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

Art. 1.052 - Quando os embargos versarem sobre


todos os bens, determinará o juiz a suspensão do curso do
processo principal; versando sobre alguns deles,
prosseguirá o processo principal somente quanto aos
bens não embargados.

O que você tem que entender é o seguinte: se houve a constrição no


processo principal, eu não posso prosseguir nos atos de constrição se tem um
terceiro que está falando que o bem é dele. A consequência é que, se o juiz recebe
os embargos de terceiro e está para vender o carro do devedor da exceção, eu não
posso vender o carro enquanto não decidir se o carro é dele ou se é de terceiro. Por
isso que o art. 1.052 determina que, uma vez recebidos os embargos de terceiro
suspende-se o processo principal e os atos decorrentes da constrição ali ocorrida.

Aqui vai, entretanto, o destaque: às vezes eu penhorei 5 carros no processo


principal. E o terceiro impugna apenas um. É evidente que a suspensão é só
relacionada aos bens impugnados. Se eu embarguei de um, os outros quatro
continuam sendo constritos e alienados normalmente.

Na aula passada, falamos de embargos de terceiro na execução por carta. É


aquele que eu mando uma precatória lá da minha cidade, de Franca, pro juiz de SP
que penhora um bem e vem um devedor e opõe embargos de terceiro. Se eu, juiz
de Franca determinar expressamente qual é o bem, o embargo sou eu que julgo.
Mas se for o juiz de SP que escolheu o bem, é o juiz de SP que julga. Se
eventualmente o juiz de SP recebe os embargos em SP ele tem que comunicar o
juiz deprecante para que o juiz deprecante suspenda o processo principal (porque o
processo não está em SP). É importante que vocês entendam o seguinte:

“A execução por carta (do art. 747, do CPC), quando os embargos de terceiro
forem de competência do juízo deprecado, ele comunicará o recebimento dos
embargos ao juízo deprecante para fins de suspensão da ação principal.”

6.3. 3ª Etapa: POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR

Isso está nos arts. 1.050, § 1º e 1.051, do CPC. Isso é muito interessante.
Essa é uma liminar que tem o objetivo de assegurar o terceiro a posse do bem
constrito. Eu penhorei um carro, o carro foi removido, o terceiro entra com
embargos de terceiro dizendo que o carro é dele, o juiz dá a liminar e devolve o
carro para ele. Portanto, diz-se em doutrina que a liminar dos embargos de terceiro
tem natureza antecipatória de tutela.

Essa liminar pode ser concedida com ou sem audiência de justificação. Como
assim? É aquela audiência que o juiz faz só para verificar os requisitos da liminar.
Não é audiência de instrução. Essa audiência de justificação pode ser feita nos
embargos de terceiro e tem previsão expressa.

E caso o juiz dê tutela antecipada, ele pode determinar a liminar com ou sem
caução. Quer dizer, o juiz pode chegar à conclusão de que pode ser mentira que o
terceiro é proprietário do bem. Então ele assegura a posse ao terceiro, mas manda
dar algo em garantia porque se estiver mentindo terá como indenizar os prejuízos
causados ao credor.

112
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

Art. 1.051 - Julgando suficientemente provada a


posse, o juiz deferirá liminarmente os embargos e
ordenará a expedição de mandado de manutenção ou de
restituição em favor do embargante, que só receberá os
bens depois de prestar caução de os devolver com
seus rendimentos, caso sejam afinal declarados
improcedentes.

Qual é o receio que você tem que ter? E aí é importante a gente ter algumas
aulas porque parece, lendo o art. 1.051 (parte final) que a caução é um dispositivo
cogente, que da maneira como é redigido, parece que o juiz é obrigado a fixar
caução. A jurisprudência é pacífica no sentido de que o art. 1.051 não é cogente.
Mas depende do caso. Nos casos em que é explícito que o indivíduo é proprietário,
não há por que você se preocupar com essa questão da caução. Então, é casuístico,
fica a critério do juiz decidir se dá a liminar com ou sem caução.

6.4. 4ª Etapa: CITAÇÃO DO RÉU

Aqui temos que fazer uma ressalva porque a citação dos embargos de
terceiro segue, de modo geral, as regras do Livro I, do CPC. Não há nenhuma regra
aqui que justifique comentário da minha parte. Cabem todas as modalidades de
citação.

O grande problema dos embargos de terceiro (e aqui vem a minha crítica) é


que os juízes, quando vão citar o réu dos embargos de terceiro (e o réu da ação de
embargos de terceiro, como regra, é o autor da ação onde houve a constrição),
considerando que esse réu já tem advogado por conta da ação principal, cita o réu
dos embargos na pessoa do advogado constituído na ação principal. Apesar disto
não ter maiores repercussões práticas (porque acaba que o réu vem lá e impugna
os embargos), tecnicamente é incorreto porque a citação da inicial tem que ser
feita pessoalmente e não na pessoa do advogado. A grande maioria dos juízes faz
isso: cita na pessoa do advogado constituído na ação principal. Isso não traz
maiores repercussões práticas, mas, tecnicamente, está equivocado porque, de
acordo com o art. 213, do CPC,a citação da inicial tem que ser pessoal. Eu faço isso
na pessoa do advogado, mas antes de você passar, você tem que saber que é
pessoal.

6.5. 5ª Etapa: RESPOSTA DO RÉU

A resposta do réu tem previsão no art. 1.053 e causa dois espantos.

Art. 1.053 - Os embargos poderão ser contestados


no prazo de 10 (dez) dias, findo o qual proceder-se-á de
acordo com o disposto no Art. 803.

O primeiro espanto: não cabe reconvenção nos embargos de terceiro. E para


entender o motivo, vamos voltar o recado do Pontes de Miranda: “os embargos de
terceiro não servem para pedir, só para impedir”. A consequência prática é que se o
autor não pode pedir, eu também não posso. A finalidade aqui é discutir somente a
proteção da posse e da propriedade.

113
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

O segundo espanto é que o prazo de contestação a que é especial.


Diversamente do mundo em que consta prazo de 15 dias, os embargos de terceiros
deverão ser contestados no prazo de 10 dias. Portanto, temos um prazo especial de
contestação que não é o de 15 dias.

Neste caso aplica-se o art. 188 do CPC? Prazo em quádruplo para a Fazenda
contestar? E o art. 1921, prazo em dobro para litisconsortes com diversos
procuradores? É óbvio que aplica. A parte geral aplica sempre na parte especial,
salvo situações excepcionais em que a própria lei já prevê a não aplicação. Neste
caso aplicam-se os arts. 188 e 191, do CPC.

6.6. 6ª Etapa: SEGUE O RITO DAS CAUTELARES INOMINADAS

Aqui, o código faz algo que não tem muita lógica, mas em nome da
celeridade ele faz isso. A partir da contestação, que é de dez dias, o rito muda. Ele
deixa de ser especial. O procedimento deixa de ser um procedimento especial. Só
que, diversamente dos demais procedimentos especiais em que, chega um
momento, e viram rito ordinário, olha o que acontece, nos termos do art. 1.053:
depois dessa fase, o processo começa a correr de acordo com o art. 803, que traz o
rito das cautelares inominadas. Ele quer dar celeridade e manda seguir o
procedimento das cautelares inominadas e você, consequentemente, não segue o
rito ordinário, mas o rito do Livro III, do CPC, que trata dos procedimentos
cautelares.

6.7. 7ª Etapa: SENTENÇA

A natureza jurídica da sentença dos embargos de terceiro é desconstitutiva


porque objetiva desconstruir a penhora, a arrematação, a constrição havida no
processo principal. Você pode chamar também de constitutiva negativa.

6.8. 8ª Etapa: APELAÇAÕ

Por que estou destacando a apelação? A primeira coisa para você fazer
atrasar absurdo o processo são os embargos de terceiro porque a apelação dos
embargos de terceiro tem duplo efeito, ou seja, devolutivo e suspensivo. Por que
isso atrasa o processo? Porque eu sou o credor e penhoro esse celular que pertence
a você. Você dá um jeito de falar que esse celular é do seu pai. É manifesto que não
é do seu pai. Mas aí o seu pai entra com embargos de terceiro. Feito isso, o juiz
suspende a venda do celular. Ótimo e o juiz julga logo depois improcedentes os
embargos de terceiro. O seu pai apela. A apelação tem duplo efeito. Continua
suspensa a venda nos embargos de terceiro. Se você pegar alguns Estados mais
avançados do ponto de vista Judiciário, que nem Minas e RJ, em quatro meses você
resolve o problema. Agora, se você se depara com alguns Estados em que o
sistema Judiciário é totalmente ineficiente, leia-se Bahia e SP, que demora 4 ou 5
anos para julgar uma apelação, na hora que julgar essa apelação e acaba o efeito
suspensivo, o seu celular já não tem mais valor nenhum. Você entendeu o que eu
quis dizer? Eu acho justo que tenham embargos de terceiro, mas tinha que ter uma
reforma legislativa para tirar esse efeito suspensivo da apelação porque não tem
cabimento esse negócio.

114
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

7. DIREITO SUMULAR E QUESTÕES PRÁTICAS

Presta atenção aqui: a primeira grande consequência que eu quero te


apontar de direito sumular nos embargos de terceiro e questões práticas advindas
disso é a questão a súmula 375, do STJ, que fala sobre fraude à execução e diz:

STJ Súmula nº 375 - DJe 30/03/2009 - O


reconhecimento da fraude à execução depende do
registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-
fé do terceiro adquirente.

Eu preciso que você lembre alguns conceitos de fraude à execução para eu


poder explicar qual é a aplicação prática que isso tem nos embargos de terceiro.
Fraude à execução é um assunto que vai ser dado pelo Daniel porque tem a ver
com execução, questão de responsabilidade patrimonial. A fraude à execução está
prevista no art. 593, do CPC.

Art. 593 - Considera-se em fraude de execução a


alienação ou oneração de bens:
I - quando sobre eles pender ação fundada em
direito real;
II - quando, ao tempo da alienação ou oneração,
corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à
insolvência;
III - nos demais casos expressos em lei.

E tínhamos a seguinte situação:

• Antes da Sumula 375 do STJ – Antes da súmula 375 do STJ, tudo o que
o devedor fizesse antes da citação para o processo, não havia fraude.
Quer dizer, se eu vendi minha fazenda e logo depois fui citado no
processo de execução, não havia que se falar em fraude porque eu não
sabia que devia. Não havia que se falar em fraude. Antes da súmula
entendia-se, portanto, que depois da citação e, portanto eu já sei que tem
alguém no meu pé querendo me cobrar, qualquer alienação realizada
após a citação, seria realizada com fraude à execução, mas desde que
não houvesse outros bens. Então, antes da citação, sem fraude. Se eu
vendi minha chácara depois de ter sido citado, o que acontece é que se
presumia que eu estava de má-fé e se eu não pagar a dívida, eles tomam
a chácara do terceiro que adquiriu, para pagar a dívida do credor. Por isso
é que antes de comprar um bem imóvel, o que você costuma fazer? Tirar
certidões no cartório para verificar se não há nenhuma ação contra o
devedor porque, se ele já foi citado, poderia ocorrer a fraude.

• Depois da Súmula 375 do STJ – Acontece que o STJ, de uns tempos


para cá e a partir da Súmula 375, mudou esse posicionamento. Sabe por
quê? Porque ele começou a se preocupar mais com o terceiro de boa-fé
do que com o credor. A súmula 375, na verdade só veio consolidar esse
entendimento. Após a súmula, o termo que define se tem ou não a fraude
não é mais a citação, mas o registro da penhora ou averbação do art. 614-
115
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

A, do CPC. O termo que define agora se tem ou não a fraude à execução é


o registro da penhora ou a averbação do art. 615-A e não mais a
averbação. O art. 615-A, para quem não lembra, é um dispositivo da nova
lei de execução que diz que toda vez que você distribui uma execução,
você pode pegar certidão no cartório para averbar na matrícula dos bens.
Você não precisa do despacho do juiz. Olha o que diz o art. 615-A:

Art. 615-A. O exeqüente poderá, no ato da


distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento
da execução, com identificação das partes e valor da
causa, para fins de averbação no registro de imóveis,
registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à
penhora ou arresto. (Acrescentado pela L-011.382-2006)
§ 1º O exeqüente deverá comunicar ao juízo as
averbações efetivadas, no prazo de 10 (dez) dias de sua
concretização.
§ 2º Formalizada penhora sobre bens suficientes
para cobrir o valor da dívida, será determinado o
cancelamento das averbações de que trata este artigo
relativas àqueles que não tenham sido penhorados.
§ 3º Presume-se em fraude à execução a
alienação ou oneração de bens efetuada após a
averbação (art. 593).
§ 4º O exeqüente que promover averbação
manifestamente indevida indenizará a parte contrária, nos
termos do § 2º do art. 18 desta Lei, processando-se o
incidente em autos apartados.
§ 5º Os tribunais poderão expedir instruções sobre
o cumprimento deste artigo.

Se eu averbei e o terceiro comprar, significa que ele vai ter visto. Então,
depois ele não reclama que comprou um bem que estava com problema. Mas o que
me interessa é que, no novo modelo, o termo que define a fraude à execução, não
é mais a citação é o registro da penhora ou averbação do art. 615. O terceiro que
comprou não ficou sabendo que o imóvel garantia o pagamento de uma dívida?
Haverá fraude. A aula não é sobre esse tema. Esse é só um lembrete para poder
introduzir os temas relacionados embargos de terceiros. E exatamente, então,
relacionado a essa súmula 375, do STJ é que você percebe a importância do art.
615-A. Esse artigo é importante porque diz que se eu não averbar e o devedor
vender, mesmo que ele tenha sido citado, se o terceiro comprou de boa-fé, um
abraço porque ele não sabia que esse bem garantia o pagamento de uma dívida.

Mas o mais importante saber é o seguinte, e aí eu volto para os embargos de


terceiro. Preste atenção. São três considerações sobre essa súmula que são
extremamente importantes. São três perguntas que eu vou fazer:

1. É possível que o terceiro rediscuta a ocorrência da fraude à


execução reconhecida na execução, via embargos de terceiro?

O juiz disse: “tem fraude à execução. O Gajardoni vendeu após o registro da


penhora. Vem o terceiro em embargos de terceiro e quer discutir de novo. Ele pode
fazer isso? Ou seja, querer discutir tudo de novo porque considera que o juiz está
errado e não teve fraude à execução? Pode ou não? Pode. E sabe por que pode? Por

116
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

causa do art. 472, do CPC que diz que a coisa julgada só é dada entre as partes. O
terceiro foi parte na execução? Não. Ele era parte estranha. Como ele não era parte
na execução, ele pode discutir tudo de novo e o juiz provavelmente vai manter a
decisão dele na execução, mas ele pode até mudar, pelo menos em tese.

2. É possível que o reconhecimento da fraude à execução ocorra


no julgamento dos próprios embargos de terceiro?

Mudou o foco. Na primeira hipótese, o juiz tinha reconhecido na execução à


fraude e eu, nos embargos de terceiro, vou discutir se teve ou não a fraude. Agora,
aqui, eu quero saber se nos embargos é possível a discussão disso. Então, vamos
imaginar a seguinte situação: eu entro com uma execução contra você e penhoro
um bem seu. Não tem discussão. Eu acho que o bem é seu. Aí o seu pai entra com
embargos de terceiro, dizendo que o bem é dele (e não do filho). Eu sou réu nesses
embargos, sou o credor e na hora percebo que ele comprou o bem depois do
registro da penhora e eu só consigo ver isso nos embargos de terceiro. A pergunta
é: é possível que nos embargos de terceiro o juiz fale o seguinte: julgo
improcedentes os embargos de terceiro porque o bem foi adquirido em fraude à
execução, já que foi comprado após o registro da penhora? Entenderam o
raciocínio? A resposta é positiva também. É plenamente possível que se reconheça
fraude à execução nos embargos de terceiro e qual vai ser a consequência prática
de eu reconhecer a fraude à execução nos embargos de terceiro? O
reconhecimento da ineficácia da alienação operada, com manutenção da penhora
sobre o bem. Quero dizer: “ah, papai, dançou porque você comprou depois do
registro, considere que cometeu fraude à execução e o bem vai continuar sendo
vendido.”

3. É possível o reconhecimento da fraude contra credores no


julgamento dos embargos?

Pode ocorrer a fraude contra credores no julgamento dos embargos? Mudou o


foco porque aqui eu não estou mais nessa discussão da súmula (antes e depois).
Aqui eu quero algo mais. Eu quero provar que, independentemente de registro,
houve concilium fraudis entre comprador e vendedor. Eu quero melar os embargos
de terceiro numa ação pauliana, numa ação revocatória. E essa questão você tem
toda capacidade de responder lembrando, mais uma vez, daquela máxima do
Pontes de Miranda: os embargos servem para impedir, não para pedir. A
consequência prática é que não é possível. Para evitar qualquer dúvida, o STJ
chegou até a editar uma súmula, a Súmula 195, do STJ, que estabelece com todas
as letras o seguinte:

STJ Súmula nº 195 - DJ 09.10.1997 – Em


embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude
contra credores.

Eu quero te mostrar uma coisinha à luz dessa súmula. Você sempre estudou
que a consequência prática da fraude contra credores é a anulação do ato jurídico.
Entretanto, apesar do que a súmula 195 diz, todo mundo entendeu que não dá para
anular ato jurídico por fraude contra credores nos embargos de terceiro. Apesar
disso, a doutrina capitaneada (porque todo mundo escreveu depois dele) pelo
Dinamarco sustenta há uns vinte anos que:

117
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

“Não é possível anular o ato, mas é possível declarar-se a ineficácia da


transação, de modo incidental, sem coisa julgada material.”

Esse é o raciocínio da doutrina. Eu entro com a execução contra você. O seu


pai opõe embargos de terceiro. Eu vejo que seu pai e você estão mancomunados,
por causa do bem que seu pai comprou de você antes do registro da penhora. Mas
que e manifesto o dolo. Seu pai não trabalha, é você que o sustenta, como é que
ele comprou o seu carro? Então, eu alego, em embargos de terceiro que houve
fraude contra credores porque vocês simularam um negócio jurídico para poder me
prejudicar. Eu não posso, de acordo com a Súmula 195 pedir a anulação do negócio
jurídico, ou seja, eu não posso pedir para pegar o carro, voltar para o seu nome
para depois eu ir lá e penhorar. Mas o professor Dinamarco, interpretando a súmula
diz: tudo bem, eu não posso pedir isso, mas eu posso pedir, simplesmente, para
que o juiz reconheça incidentalmente, só para esse processo, sem coisa julgada
material, como você faz em inúmeras questões processuais, a ineficácia só para
esse ato. E aí o juiz não declara a fraude contra credores, mas ele considera ineficaz
a alienação e eu consigo penhorar o bem. É uma forma inteligente de enganar a
Súmula 195, mas não se pode deixar o cara enganar a Justiça, enganar o credor.

Para encerrar o bate-papo sobre embargos de terceiro, você viu que tudo
decorreu da Súmula 375. Agora, vamos para a segunda súmula que eu quero
analisar é a Súmula 84, do STJ que é extremamente conhecida e diz com todas as
letras o seguinte:

STJ Súmula nº 84 - DJ 02.07.1993 - É admissível a


oposição de embargos de terceiro fundados em alegação
de posse advinda de compromisso de compra e venda de
imóvel, ainda que desprovido do registro.

Ou seja, ela basicamente está dizendo que contrato de gaveta (contrato não
publicizado, que não é público), dá ensejo ao cabimento de embargos de terceiro. E
para você entender o raciocínio desta súmula eu tenho que dar uma breve
lembrada de dois conceitos. Segundo o art. 108, do Código Civil, as transações
sobre imóveis cujo valor seja superior a 30 salários mínimos tem um requisito de
forma indispensável: escritura pública. E, de acordo ainda com o Código Civil, a
transferência da propriedade imóvel só se opera com o registro da escritura
pública. Isso é Código Civil puro. A escritura pública é meio de aquisição da
propriedade imóvel e só com o registro é que você consegue adquirir a propriedade
imóvel. E a posse, como eu adquiro? Posse não precisa de escritura. Posse se
adquire pela tradição. Se você compreendeu isso, fica fácil de entender a Súmula
84. Na aula passada eu falei que os embargos de terceiro servem para proteger a
propriedade e a posse (art. 1.046, § 1º). Existem embargos de terceiro de
proprietário e existem embargos de terceiro de possuidor.

Eu comprei sua casa sem escritura pública. Contrato de gaveta. E já comecei


a morar na casa. Mas como você não transcreveu o registro, porque não houve
escritura pública, a casa continua em seu nome. O seu credor vai pesquisar no CRI
e descobre que você tem uma casa. O que ele pede? A penhora da casa. Quando
ele faz isso, eu sou intimado e digo que comprei a casa e apresento embargos de
terceiro, mostrando o contrato particular para o juiz, que é a súmula 84. Quando eu
mostro o contrato particular, eu estou defendendo a propriedade ou a posse? A
posse, porque não sou proprietário. E a súmula quer dizer isso: eu prefiro defender
a posse. Por isso ela diz que é possível a oposição de embargos de terceiro

118
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

fundados na alegação de posse e não de propriedade. A ideia que eu quero que


você tenha é que o STJ não está fazendo nada de irregular. Ele não está violando o
Código Civil porque aqui, os embargos de terceiro defendem a posse e não a
propriedade.

Mas a questão pode ser piorada. Existe um princípio no processo civil


brasileiro que envolve relação de sucumbência. Quem paga honorários advocatícios
é quem dá causa ao evento. O grande problema prático que decorre da Súmula 84
é que o cara que pediu a penhora da casa foi lá no registro de imóveis e a casa
ainda consta no seu nome. Ele pediu a penhora só porque está no seu nome. Ele
entrou com embargos de terceiro e aí eu que sou comprador apresentei o contrato.
Quem deu causa à constrição? Ele que pediu a penhora, ou você que não fez
escritura e que não registrou a transferência da propriedade no registro de imóveis?
Você concorda comigo que o culpado pela constrição não foi o credor, mas você
que é o embargante? Por isso, o STJ editou uma outra súmula, que é a Súmula 303:

STJ Súmula nº 303 - DJ 22.11.2004 - Em


embargos de terceiro, quem deu causa à constrição
indevida deve arcar com os honorários advocatícios.

E qual é a interpretação que o STJ faz dessa Súmula 303? É que nas
hipóteses da Súmula 84 o culpado pelos embargos de terceiro é aquele que não fez
escritura pública ou que não a registrou, portanto, é o embargante ou o
embargado? Portanto, o embargante, ou seja, o terceiro. Então, pela Súmula 84, eu
consigo liberar o bem, mas como eu fui o responsável pela constrição, eu vou pagar
as custas do processo e eventuais honorários.

Mas, vamos complicar um pouco mais. Eu comprei sua casa. Você deve uma
grana. Vem o credor e pede a penhora da casa. Eu venho com embargos de terceiro
e alego o quê? Súmula 84: está aqui o contrato particular que não registrei. O
credor tem duas opções quando ele recebe os embargos de terceiro e vê que eu
tenho um contrato particular:

1º) “Aceito, realmente, não sabia disso”. Mas o juiz o condena ao


pagamento das custas porque ele deu causa.

2º) “Nem a pau, fraude!” Grita aqui e ali e não aceita o compromisso
particular. Se ele não aceita, ele não está ratificando o ato constritivo que você
deu causa? Ele está insistindo no erro. Portanto, o STJ diz que:

“Não se aplica esse entendimento (esse que quem paga as custas é aquele
que não registrou) se o credor/embargado insistir na constrição, vez que a partir daí
ele está ratificando o erro e dando causa ao prosseguimento dos embargos de
terceiro.”

Sumarizando: Súmula 84, compromisso particular, não dá para livrar o bem.


Mas o negócio é o seguinte: se eu comprei um bem, se você vendeu e não averbou,
quando tiver os embargos de terceiro, se o credor topar liberar o bem (Súmula 303)
e quem paga as custas sou eu que sou o culpado de não ter feito o registro. Agora,
se ele, mesmo vendo que eu tenho o compromisso particular, quiser brigar, quiser
insistir, quiser bater-boca e tocar os embargos de terceiro para decidir se pode ou
não penhorar o bem, aí cai a Súmula 303 e a consequência prática é a de que ele é
quem vai pagar as custas, caso perca no final.

119
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

AÇÃO MONITÓRIA
(Procedimentos Especiais)

1. GENERALIDADES

Aqui eu tenho três observações para fazer:

1.1. NATUREZA JURÍDICA

È pacífico na doutrina brasileira que a ação monitória constitui em espécie de


tutela diferenciada. O que é uma tutela diferenciada?

“Tutela diferenciada é uma tutela cujo procedimento é modificado, tanto do


ponto de vista do rito quanto da cognição, à luz do direito material.”

O legislador chegou em determinado momento e percebeu uma situação


bizarra que acontecia no sistema brasileiro. Se eu falasse: você me deve 5 mil e
não te desse prova escrita nenhuma disso, se eu quisesse te cobrar, eu teria que te
cobrar via ação de cobrança, ação de conhecimento. Se o meu vizinho tivesse num
papel de padaria babado de manteiga a minha declaração de que devo cinco mil,
para ele cobrar os 5 mil, ele tinha, exatamente, o mesmo mecanismo que eu tinha,
ou seja, ação de cobrança. O legislador percebeu que isso causava uma situação de
absoluta disparidade porque uma coisa é você dever 5 mil de boca, outra coisa é
você dever 5 mil tendo assinado um documento. Então, o legislador percebeu que
precisava criar um procedimento que modificasse essa situação que, todos
concordam comigo, de absoluta injustiça, e que permitisse que aquele que tem
uma prova escrita da existência da obrigação tivesse um procedimento melhor,
mais célere para a cobrança da dívida. A ação monitória é isso: ela é uma tutela
diferenciada que foi moldada para melhorar o mecanismo de cumprimento das
obrigações fundadas em prova escrita. Quer dizer, a ideia é criar um procedimento
melhor para quem tem prova escrita em detrimento de um procedimento não tão
bom para quem só tem prova oral, até porque a prova oral é a prostituta das provas
(você tem grande possibilidade de manipular). A possibilidade de manipular uma
prova escrita já é algo mais complexo de ser feito.

Essa é a primeira grande nota e a gente vai ver, no desenvolver da aula que
essa grande intenção do legislador foi um baita tiro no pé. A ação monitória foi um
dos grandes fracassos legislativos do Brasil. É uma porcaria. Quando eu era
advogado, entrei com ela. Nunca entre com monitória. É uma roubada terrível. E a
gente vai ver por que a monitória não deu certo no Brasil.

1.2. HISTÓRICO

120
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

A segunda observação é que eu quero que você tenha uma noção breve da
origem da monitória. Muitas coisas não estão escritas nos manuais e vêm caindo. É
importante que a gente traga informações que estão fora dos manuais. A ação
monitória nasceu no direito canônico, mas deixando o direito canônico de lado, a
origem brasileira da ação monitória é uma ação chamada ação decendiária, cuja
origem estava nas Ordenações Manuelinas e Filipinas que, como você deve saber,
vigeram no Brasil durante um bom tempo, desde a descoberta até o regulamento
737. As regras processuais brasileiras nesse período estavam nas Ordenações
Manuelinas e Filipinas. No direito luso-brasileiro, portanto, é que eu tenho o
primeiro exemplar da ação monitória, que se chamava ação decendiária, também
chamada de ação de assinação de 10 dias.

Essa ação decendiária funcionava assim (só para você entender como foi a
origem da coisa): vinha a lei (Ordenações Filipinas) e dava um rol de documentos
(recibo de profissional liberal, recibo de compra de padaria, recibo de comércio,
carta epistolar) e dizia que quem tem esse documento pode pedir ao juiz que assine
dez dias (por isso assinação de dez dias ou decendiária) para que o devedor pague.
Não é uma execução, não penhora bem, não tem nada disso. Mas era assim:
“devedor, esse documento prova que você deve. Pague em dez dias.” Se o devedor
pagasse, acabou. Se ele não pagasse, gerava ação de rito comum ordinário, de
cobrança. É igualzinho o padrão da monitória, mas recebia esses nomes.

O grande problema é que essa ação de assinação de dez dias, que existiu
durante muito tempo no Brasil, nascida do direito canônico, e foi introduzida no
Brasil pelas Ordenações Manuelinas e Filipinas, quando veio o Código de 1939 e
depois o Código de 1973, que são os códigos de processo civil vigentes no Brasil,
essa ação decendiária caiu fora, foi excluída. Não havia previsão de ação
decendiária no Brasil em 1939 e nem em 1973. Não se admitiu mais essa ação
decendiária ou de assinação de dez dias que só foi inserida no Brasil,
posteriormente, no ano de 1995. A ação monitória só voltou para o Brasil em 1995,
com outro nome. Deixou de ser ação decendiária e passou a ser ação monitória. Em
1995, o legislador inseriu no CPC brasileiro o art. 1.102-A:

Art. 1.102-A - A ação monitória compete a quem


pretender, com base em prova escrita sem eficácia de
título executivo, pagamento de soma em dinheiro,
entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel.

Presta atenção: a monitória nada mais é do que a evolução da decendiária


com outro nome.

1.3. ESPÉCIES DE PROCESSOS MONITÓRIOS

No mundo, existem três tipos de processos monitórios:

a) Processo Monitório PURO


b) Processo Monitório MISTO
c) Processo Monitório DOCUMENTAL

PURO – O processo monitório puro e aquele que pode ser calcado,


estabelecido através de prova oral, testemunhos. Esse é o sistema adotado pela
Alemanha. Eu pego meus três amigos, vou até o juiz peço para o juiz uma ação

121
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

monitória. O juiz marca uma audiência e essas três testemunhas dizem: eu sei que
o Zé deve dez mil. O juiz, com base nessa prova testemunhal, autoriza o início da
monitória e assinala um prazo de X dias para que o devedor pague. É esse o
raciocínio do processo monitório puro.

MISTO – O procedimento monitório misto é aquele que, regra geral, a


obrigação tem que ser apresentada em prova escrita, documento. Tem que ter
prova escrita mas, admite-se em alguns casos a prova oral. É o caso do sistema
italiano onde a regra é que você só pode ter monitória com base em prova
documental, mas em alguns casos, como crédito de profissional liberal, dá para
fazer isso que fazem na Alemanha. Eu consigo 3 testemunhas que dizem que o Zé
deve 2 mil e depois começa a monitória através de uma ordem de pagamento que
pode ser cumprida ou descumprida. Não é uma execução, não tem penhora de
bens. Mas é possível que haja essa ordem inicial de pagamento à luz de prova oral.
Por isso, o sistema italiano é diferente do nosso. É injusto como parte da
doutrina faz ficar querendo comparar o que eles fazem lá com o que fazemos aqui
porque o sistema deles é muito diferente porque o Brasil adota o último tipo de
processo monitório.

DOCUMENTAL – não tem exceção. No Brasil, só se admite monitória com


base em prova documental. Não tem nenhuma exceção. Sem prova documental,
não é possível o ajuizamento da ação monitória. Por isso é injusto querer comparar
o italiano ao nosso. Todo mundo que aproxima muito o sistema italiano na
monitória dá um tiro no pé e acaba cometendo erros gravíssimos.

(Intervalo)

2. NATUREZA DA MONITÓRIA NO BRASIL

Prevalece o entendimento no Brasil de que a ação monitória é um processo


de conhecimento de rito especial. Tanto o é que está no Livro IV, do CPC, que é
o livro dedicado aos procedimentos especiais e não aos processos especiais. A
doutrina está coberta de razão porque a monitória é um processo de acertamento,
que parte da necessidade da declaração da existência do crédito. Toda vez que eu
tenho que declarar a existência de uma obrigação, que eu tenho que reconhecer a
existência de uma obrigação, isso só pode ser classificado como processo de
conhecimento. A índole declaratória, a índole de acertamento da monitória
prevalece como sendo ela um processo de conhecimento. Para muitos pode parecer
uma coisa óbvia.

Tem gente muito boa como, por exemplo o professor Dinamarco, que diz que
a monitória é um quarto tipo de processo, como é no direito italiano. Lembra que eu
falei que as comparações com o direito italiano são sempre muito perigosas?
Vamos acompanhar o raciocínio dele e depois você julga por si só se acha que ele
está certo. Ele diz que a monitória figura como um quarto tipo de processo (ou seja,
conhecimento, execução, cautelar e monitória) pelo seguinte motivo: porque ela
não chega a ser uma execução, porque você não penhora bens do devedor, mas o
juiz, a partir do momento que entra a monitória, ele já manda pagar. Ele não manda

122
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

citar para contestar, ele manda intimar para pagamento. Então, no entender dele,
como tem esse ato inicial, que não é o reconhecimento da obrigação, mas sim, uma
ordem de pagamento, a monitória não poderia ser encaixada no processo de
conhecimento porque o juiz, aqui, manda pagar. Ele não declara. E não poderia
estar na execução porque o pagamento não é sob pena de penhora. Então, de
acordo com ele, seria um meio termo entre conhecimento e execução porque não
declara e manda pagar (não é conhecimento), mas manda pagar sem ser sob pena
de penhora (não pode ser execução).

Não é, entretanto, o sistema que a doutrina reconhece como sendo monitório


no brasileiro. O que eu quero que você entenda desde já é que, quando o juiz
recebe a monitória (e é por isso que a doutrina diz que é um processo de
conhecimento), ele analisa o documento escrito (que é esse documento que vai
fundamentar a existência da monitória) e faz um juízo provisório da existência da
obrigação. Então, quando o juiz determina “intime-se o réu para pagar”, ele já
reconheceu, ainda que sumariamente, a existência da obrigação. Por isso que a
índole permanece sendo declarativa. De qualquer modo, você tem as duas posições
e já sabe qual é a posição dominante na doutrina, ou seja, de que a monitória não é
um quarto tipo de processo, mas sim um processo de conhecimento, até porque as
características do processo de conhecimento prevalecem muito mais do que as
características do processo de execução.

3. PRESSUPOSTOS DA AÇÃO MONITÓRIA

São três os pressupostos para o cabimento da ação monitória no Brasil:

3.1. PROVA ESCRITA

No Brasil, como vimos, não adotamos o sistema da prova oral.


Necessariamente, a prova será escrita. Debate-se na academia e na jurisprudência,
qual é o conceito de prova escrita para fins monitórios. Tem prevalecido o
entendimento de que

“Prova escrita é todo e qualquer documento, sozinho ou em conjunto, que


mereça fé e atue como fonte do convencimento do juiz a respeito da existência da
obrigação.”

Ou seja, prova documental (escrita) para fins de monitória, não precisa ser
um documento só, pode ser um conjunto. E o que mais importa para se estabelecer
é que esse conjunto de documentos ou o documento por si só tenha que ser capaz
de dar ao juiz a impressão a respeito da existência da obrigação. A partir dessa
premissa, do que é prova escrita, eu posso trabalhar com vocês várias questões. E
é isso que eu me disponho a fazer a partir desse momento.

a) Documento unilateral

Isto é, aquele documento que foi forjado por apenas uma das partes. O
documento unilateral viabiliza, para fins de prova escrita, o ajuizamento da
monitória? A resposta para essa questão é: depende. Depende do quê? Depende de

123
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

quem fez o documento. Por exemplo, se o documento foi feito pelo próprio devedor,
ele espelha bem a existência de uma obrigação. Então, aqui, o documento
unilateral, desde que produzido pelo devedor, não tem problema algum.

E se o documento unilateral foi produzido por terceiro? Você imagina a


seguinte situação: as partes compareceram num leilão de gado e uma pessoa
arrematou o gado da outra e a empresa de leilão emitiu um documento de que
fulano arrematou a vaca e que vai pagar daqui a trinta dias. Acontece que não
pagou. Esse documento é suficiente para instruir a ação monitória? Vejam que ele
não teve a participação do credor e nem do devedor. Só da empresa de leilão.
Regra geral, a resposta é positiva. Mas é bom se destacar que regra geral apenas
porque, convenhamos, o importante desse documento é que ele espelhe a
verossimilhança da obrigação. Eu fiz questão de dar um exemplo bastante
verossímil e que o juiz, conhecendo a idoneidade da empresa de leilão, pode
acreditar que, em tese, aquele crédito é existente. Por isso que aquele documento,
em princípio, pode ser usado, desde que espelhe uma verossimilhança da
alienação. Mas, evidente que há documentos absolutamente furados. Por quê? Você
me deve três mil reais. Ali, quando você assumiu a dívida comigo, a gente não
assinou nada, mas tem uma testemunha que viu. A testemunha vai lá e faz uma
declaração de que viu fulano de tal pegar emprestado 3 mil reais de cicrano de tal.
Você acha esse documento é suficiente para a monitória? Você concorda comigo
que isso seria uma forma de tapear o requisito da monitória brasileira? Aqui eu
estou fazendo uma monitória oral. É uma forma de documentalizar a prova oral.
Nesse caso, não vai caber a monitória, evidente. É casuístico, mas a regra geral é a
de que o terceiro pode, sim, emitir documento e, em tese, é aceito, desde que não
seja para tapear os requisitos da monitória.

A briga maior está quando o documento é emitido pelo credor. E quando isso
acontece, surge a seguinte dúvida: ele pode dar ensejo à monitória? Você acha que
o credor tem idoneidade de emitir um documento dizendo que o devedor deve para
ele sem o devedor assinar absolutamente nada? A coisa fica complicada. Então,
para seguir o padrão de que o devedor sempre pode, o terceiro pode às vezes, a
regra geral para o credor é de que não. O documento unilateral emitido
exclusivamente pelo credor, regra geral, é de que não pode ser aceito.

“A jurisprudência brasileira, contudo, cada vez mais vem reconhecendo a


viabilidade da monitória na hipótese de casos em que, apesar de emitido
unilateralmente pelo credor, o documento espelhe a existência da obrigação.”

Eu vou te dar três exemplos colhidos da jurisprudência do STJ em que, apesar


de a regra determinar que não cabe documento emitido pelo credor, tem-se
admitido o manejo da monitória nesses casos.

• 1º Exemplo – Duplicata sem aceite e sem comprovante de


recebimento da mercadoria – Você sabe que a duplicata aceita é título
executivo e que a duplicata não aceita, desde que protestada com
comprovante de recebimento também é título executivo. O que o STJ está
dizendo, é o seguinte: se, eventualmente, você tem a duplicata emitida e
não tem o comprovante de recebimento da mercadoria, isso não é título
executivo. Mas é um documento escrito que tem uma certa
verossimilhança, até porque se o cara emitir uma duplicata sem lastro,
comete um crime (crime de emissão de duplicata fria, inexistente). O STJ

124
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

admite, nesse caso, a emissão de duplicata só pelo credor como título


monitório.

• 2º Exemplo – Guia de recolhimento de contribuição sindical


acompanhada de notificação do devedor – Você sabe que quando vai
pagar um tributo como esse, eles emitem uma guia e mandam pra sua
casa. O que acontece? Você não paga e aí eles pegam aquela guia que
não tem “paga”, não tem aceite, não tem nada, junta o que você recebeu
na sua casa (notificação de pagamento) e entra com a monitória. A
jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que isso é título monitório
porque, apesar de emitido unilateralmente pelo credor, espelha,
razoavelmente, a existência da obrigação.

• 3º Exemplo – Caderneta de padaria e de posto de gasolina – É


o exemplo mais pitoresco. Eu, na minha experiência profissional, já tive
vários casos desses e, em todos, admiti o cabimento da monitória, mas
me senti inseguro porque você tem que partir da confiança, da boa-fé. No
interior é muito comum. Você chega na padaria e pede uma determinada
quantidade de pães. O padeiro anotava na caderneta e você não
assinada. Posto de gasolina na cidade do interior é a mesma coisa. Se
você deu um cano na padaria e no posto de gasolina, tem uma
razoabilidade naquilo que está na caderneta. O cara não vai te cobrar pão
que você não pagou. Tem uma razoabilidade na caderneta.

b) Documento bilateral

Se o documento for bilateral, acho que não precisamos nem entrar no mérito.
As duas partes participaram da confecção, eu não tenho dúvida nenhuma de que
tem cabimento a ação monitória. Eu quero apenas lembrar que o que nos interessa
no documento bilateral é que ele espelhe a verossimilhança da existência da
obrigação. É importante que o juiz olhe o documento e verifique que é cabível a
ação monitória.

c) Título de crédito prescrito

Essa é a hipótese mais comum de ação monitória, que não podem mais ser
executados. Existem uma súmula do STJ, que é a 299, que sinaliza positivamente
nesse sentido:

STJ Súmula nº 299 - DJ 22.11.2004 –É admissível


a ação monitória fundada em cheque prescrito.

Você pode interpretar como qualquer título de crédito prescrito: promissória,


duplicata, letra de câmbio, enfim! Todos os títulos prescritos podem admitir o
cabimento de ação monitória.

d) Conjunto de documentos

Também, tem-se admitido que mais de um documento seja juntado para que
se verifique a verossimilhança da obrigação. Na verdade, você não precisa que a
125
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

obrigação esteja provada por apenas um documento. Da junção desses


documentos, tem-se admitido a extração da verossimilhança da obrigação e a
consequente cobrança pela via monitória.

Eu gostaria de dar alguns exemplos, todos extraídos da jurisprudência do STJ,


exemplos em que não se reconhece a verossimilhança em apenas um documento,
mas que da junção de vários, você reconhece a verossimilhança:

• 1º Exemplo: Súmula 247 – É um exemplo muito importante e já


bastante suado. E por que é importante estabelecer a Súmula 247?
Porque o STJ, através de uma outra súmula, Súmula 233, entendeu que o
contrato de abertura de crédito em conta-corrente (cheque especial) não
é título executivo extrajudicial porque apesar de ter duas testemunhas
que assinam a abertura em conta, o que é o contrato em conta-corrente?
Um empréstimo. Você tem lá o limite de 10 mil. Você vai emitindo os
cheques e gastando esses 10 mil. Não é assim? O STJ entende que se
você pegar os extratos e o contrato de abertura de crédito em conta-
corrente, que tem duas testemunhas, isso não é título executivo (a
Súmula 233 fala isso) e não é porque você não tem como apurar se a
pessoa gastou ou não gastou os 10 mil da conta-corrente. É inseguro. O
título é ilíquido. Não é título executivo, ainda que você junte os extratos,
mostrando que o cara deu o cheque no dia 10, no dia 11, no dia 12 e por
aí vai. Não é título Executivo, mas a junção do contrato, mais os extratos,
indiciam a verossimilhança da obrigação. Por isso veio a súmula 247 que
diz:

STJ Súmula nº 247 - DJ 05.06.2001 - O contrato


de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado
do demonstrativo de débito, constitui documento hábil
para o ajuizamento da ação monitória.

Não cabe execução, mas cabe monitória. Percebam que a verossimilhança


não vem, nem do contrato e nem do demonstrativo do débito (dos extratos), mas
vem dos dois.

• 2º Exemplo: Cobrança de fatura de cartão de crédito – Esse


também é um exemplo que entra na monitória, segundo o STJ. Você
mostra os extratos da fatura do cartão de crédito, mas você não tem
como comprovar cabalmente se a pessoa fez ou não aquela despesa.
Então, por execução não dá, mas dá para fazer o quê? Monitória. Você
junta o contrato de cartão de crédito e a fatura do cartão de crédito. Da
junção desses dois documentos, há verossimilhança suficiente para a
cobrança via monitória.

e) Documentalização da prova oral

É um exemplo fácil de ser explicado. No Brasil, nós adotamos o procedimento


monitório escrito, documental. Exatamente por isso, o conceito de prova escrita,
para nossa monitória, é um conceito estrito. Prova escrita para fins de monitória é
prova escrita em sentido estrito. Em papel. Prova documental na monitória é prova
no papel, porque se você pegar o concito de prova documental do art. 364, do CPC,
você sabe o que é documento, para fins de prova? É todo suporte material que
126
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

caiba numa informação. Então, por exemplo, fita de vídeo, gravação telefônica,
pedra esculpida, fotografia, tudo isso é prova documental, porque prova
documental para o CPC é qualquer suporte material em que você consiga colocar
alguma informação (CD, HC de computador). Mas para fins de monitória, não
adotamos o conceito do art. 364, do CPC. O conceito de prova documental aqui é de
prova documental estrita, ou seja, de papel. Você não pode instruir a monitória com
um vídeo do réu, assumindo que deve, porque nós adotamos o conceito de prova
documental estrita. E documentar da prova oral é pegar testemunha e colocar no
papel. Vai uma pessoa ao cartório e faz uma escritura pública, falando que fulano
deve. Pacífico. Não cabe monitória através de Documentalização de prova oral. Não
adianta querer instruir a monitória com esse tipo de prova.

Caso real que eu tive: o caboclo bateu o carro e foram parar na delegacia. No
B.O., um falou que assumia a culpa e que no prazo de 30 dias pagaria o dano. A
autoridade policial reduziu a termo e acabou. Surgiu a seguinte questão: esse
documento é viável ou não para fins de monitória? Eu acabei entendendo, apesar
da verossimilhança, que ele esbarrava nessa questão do testemunho. Sim, porque
ali, nada mais foi do que um testemunho assinado. Se você partir do princípio que
isso é cabível para fins de monitória, você vai poder pegar testemunho em
delegacia, pedaço de inquérito, prova testemunhal colhida em outro processo e
começar a entrar com monitória com base nisso. Você entendeu o risco? Porque, na
verdade, eu estaria transformando a nossa monitória, que é documental, em
monitória pura, que é a que admite prova oral. Mas eu confesso para vocês que até
hoje eu mesmo tenho dúvida se não deveria ter admitido, nesse caso, porque,
afinal de contas os dois assinaram.

De tudo isso que eu falei, só tem uma regra: convencimento. Se o juiz olhou e
se falou: “putz, parece que tem o crédito!” Corre a monitória. Convenceu, cabe a
monitória.

3.2. PROVA ESCRITA SEM EFICÁCIA DE TÍTULO EXECUTIVO

Esse é o segundo requisito para o cabimento da monitória. Obviamente,


todos concordam que se tivesse eficácia de título executivo, não precisaria entrar
com a monitória. A pessoa pode entrar direto com a execução.

Aqui, entretanto, tenho uma reflexão para fazer com vocês. Eu tenho título
executivo. Mesmo assim eu posso entrar com monitória? “Ah, eu sei lá, tenho medo
do juiz achar que o meu título executivo não é título executivo.” Ou, “ah, meu título
executivo é extrajudicial e eu queria um título judicial.” Existem duas posições na
doutrina sobre o tema, sobre se aquele que tem título executivo pode entrar com
ação monitória. É o mesmo raciocínio que se faz sobre se é possível entrar com
ação de cobrança. Quem tem título executivo pode entrar com processo de
conhecimento? A pergunta é essa.

A primeira posição diz que não sob o fundamento de que falta interesse
processual e adequação. Eu tenho um cheque não prescrito, eu teria que entrar
com execução. Não poderia entrar com monitória ou com ação de conhecimento
pelo rito ordinário para cobrar o cheque. Essa primeira posição é a posição
tradicional da doutrina. Eu ouso dizer e é uma ousadia da minha parte dizer que é a
posição dominante. É a que prevalece pelo menos no âmbito da jurisprudência e da
doutrina. É a que mais se vê.

127
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

Máxima vênia, tenho acompanhado pelo professor Humberto Theodoro


Júnior, sou adepto da segunda posição. Me parece que é plenamente possível
ajuizamento de monitória quando se tem título executivo. E os fundamentos que
nós usamos (eu e o Humberto) para admitir o uso da monitória, ainda que se tenha
título executivo, são dois.

O primeiro é o seguinte, atualmente a execução de título judicial tem


mecanismos mais eficazes do que a execução de título extrajudicial. Quer a prova?
Se eu vou executar extrajudicialmente um cheque, o devedor é citado para pagar
no prazo de três dias, sob pena de penhora. Depois disso, embargos à execução
com aquele monte de alegação. Agora, se for sentença, condena e, se não pagar
em 15 dias, multa de 10%. Qual é mais atrativo? Título judicial. Então, por que eu
não poderia pegar o meu cheque e, em vez de entrar com execução de título
extrajudicial, usar uma execução judicial, que é muito mais íngreme, mais forte?
Então, eu entraria com a monitória de cheque não prescrito para que, no final, o juiz
me desse um título judicial e aí ele não vai ter que pagar em 3 dias sob pena de
penhora, mas em 15 dias, sob pena de multa, que é um mecanismo muito mais
adequado.

O segundo argumento que usamos é o seguinte: há casos de dúvida sobre a


executoriedade do documento. Você vai tocar uma execução pra depois correr o
risco de chegar lá na frente, o juiz falar que você não tem título executivo e você
ter que começar tudo de novo? Não é melhor entrar com a monitória de uma vez
porque, pelo menos aí você está garantido?

Existem essas duas posições, a primeira delas mais calcada na letra da lei,
nas condições e requisitos da ação; mas me parece que a segunda é a mais correta.

3.3. PROVA ESCRITA TEM QUE SER REPRESENTATIVA DE CRÉDITO

O último requisito para o cabimento da monitória é que a prova escrita sem


eficácia de título Executivo tem que ser representativa de crédito ou de obrigação
de entrega de coisa móvel. Tem que ter dinheiro, obrigação de entrega de coisa
móvel. Você só pode, pela monitória, pretender obter dinheiro ou coisa móvel.
Consequentemente, ficam de fora da monitória (não adianta querer entrar porque
não vai obter via monitória): obrigação de fazer ou não fazer. Ah, mas eu tenho um
documento em que ele prometeu me construir um muro. Monitória não dá! E
também fica de fora a entrega de bem imóvel. Ficam de fora:

• Obrigação de fazer ou não fazer e fica de fora


• Entrega de bem imóvel.

Nesses dois casos, ainda que você tenha prova escrita sem eficácia de título
Executivo, você não pode entrar com a monitória, tem que entrar com ação de
conhecimento, pelo rito sumário ou ordinário, a depender do valor da causa. Repito:
não exista uma razão lógica para o legislador ter adotado essa postura de só
admitir monitória na entrega de coisa móvel, foi opção legislativa.

128
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

4. PROCEDIMENTO MONITÓRIO

4.1. 1ª Etapa: PETIÇÃO INICIAL

A petição inicial da monitória tem que preencher os requisitos do art. 282,


como qualquer petição inicial, mas mais do que isso, ela tem que vir acompanhada
de um documento indispensável que, por tudo o que já dissemos aqui, sirva de
prova escrita sem eficácia de título executivo. Então, é requisito indispensável da
inicial da monitória, que ela venha acompanhada de prova escrita sem eficácia de
titulo Executivo, que é o documento monitório.

A segunda observação da petição inicial da monitória, que me parece


relevante, é que, se a obrigação for por quantia, apesar de não ser uma execução,
a monitória tem que vir acompanhada da memória de cálculo prevista no art. 614,
II, do CPC.

Art. 614 - Cumpre ao credor, ao requerer a


execução, pedir a citação do devedor e instruir a petição
inicial:
I - com o título executivo extrajudicial; (Alterado
pela L-011.382-2006)
II - com o demonstrativo do débito atualizado
até a data da propositura da ação, quando se tratar
de execução por quantia certa;
III - com a prova de que se verificou a condição, ou
ocorreu o termo (Art. 572).

E isso por quê? Porque apesar de não ser execução, você vai determinar que
uma pessoa pague. E pague o quê? Pague a quantia que está na memória de
cálculo, com juros, correção monetária e tudo o mais.

A terceira observação sobre a inicial da monitória é a que chama mais a


atenção e que causa maiores problemas:

“Regra geral, é indispensável a declinação da causa de pedir na ação


monitória.”

A monitória é processo de conhecimento e todo processo de conhecimento


tem que ter os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido. Nesse sentido, a
monitória se afastaria da execução porque na execução não tem causa de pedir
porque a causa de pedir é o próprio título executivo. Na monitória precisaria dizer
qual é a causa de pedir, que é a origem da dívida, a origem do crédito. Na monitória
eu precisaria revelar a origem do crédito, a origem da dívida. E, portanto, aqui
surgem os problemas práticos porque a respeito dessa questão de precisar da
origem da dívida, a jurisprudência faz uma ressalva. Regra geral, eu preciso falar
por que o cara assinou o recibo dizendo que me deve 3 mil (“foi por causa da
compra de um violão Fender”). É mais ou menos isso. Acontece que o STJ tem dito
que títulos de créditos prescritos não precisam da indicação da origem da dívida.
Quer dizer, se eu tenho uma duplicata, uma promissória, uma letra de câmbio
prescrita ou seja, qualquer título de crédito prescrito, o STJ está entendendo que,
mesmo na monitória, esse título não perdeu a natureza cambial. E se não perdeu a
natureza cambial, eu poderia entrar com ação monitória sem indicar a origem da

129
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

dívida. Você concedeu um empréstimo ilegal que prescreveu. Você pode entrar com
a monitória sem falar que aquilo é empréstimo ilegal porque o STJ tem essa
posição. Isso é o prevalecente no STJ.

Por outro lado, a jurisprudência, quando o assunto é cheque, muda um pouco


de figura. Quer dizer, para qualquer título de crédito prescrito, como não perdeu a
natureza cambial, não precisa da indicação da origem (causa de pedir). O problema
é o cheque porque a Lei do Cheque, no seu art. 62, (Lei 7.357/85) traz uma situação
anômala que não tem nos outros títulos. Essa Lei do Cheque fala o seguinte: no
prazo do cheque (seis meses), ele é título executivo (ajuízo execução). Acontece
que ela diz que o cheque conserva a natureza cambial em apenas dois anos. Então:

• Até 6 meses, título executivo.


• Até 2 anos, não é mais título executivo (porque está prescrito), mas
conserva a natureza cambial.
• Após 2 anos, o cheque não é título Executivo e não conserva a natureza
cambial.

Esse é o quadro do cheque. Portanto, se você adotar o raciocínio do STJ e


aplicá-lo ao cheque, você já vai encontrar julgados dizendo que até dois anos, não é
título executivo. Eu posso entrar com a execução? Não, mas eu posso entrar com a
monitória. E, nesse caso, eu não preciso indicar a causa de pedir porque conserva a
natureza cambial. O STJ falou que o título prescrito não precisa da indicação da
origem porque não perdeu a natureza cambial. Agora, passados os dois anos, não é
titulo executivo e também não tem mais a natureza cambial. Virou só prova escrita
e prova escrita ralé. Nesse caso, você precisa de causa de pedir. Aí o cheque,
depois dos anos, eu preciso contar para o juiz a origem da dívida.

É assim que funciona a petição inicial da monitória. “Ah, Gajardoni, então,


quer dizer que para todos os títulos, não precisa.” Não, não precisa. “Mas para o
cheque, precisa?” depende do tempo do cheque. Se for emitido há menos de 2
anos, conservou a natureza cambial, não preciso falar a causa de pedir. Passados
os dois anos, eu preciso dar todos os dados da existência do crédito porque como o
cheque perdeu a natureza cambial, você precisa dar todos esses elementos.

Com essas considerações, eu encerro a petição inicial da monitória.

4.2. 2ª Etapa: DESPACHO INICIAL DO JUIZ

Esse é o cérebro da monitória e é isso que diferencia a ação monitória de


todos os demais procedimentos especiais. Quando o juiz vai dar o despacho inicial,
ele faz o exercício de cognição sumária (superficial) sobre o documento. E o que ele
quer perceber no documento para poder autorizar o início da monitória? Ele quer,
nesse exercício de cognição sumária sobre o documento, verificar a
verossimilhança da existência da obrigação. Ele vai pegar sua monitória, vai olhar a
monitória e vai ver o documento que instrui a monitória. À luz desse documento,
ele faz um exercício de cognição sumária. Esse documento representa,
suficientemente, a existência do crédito? É isso que ele vai verificar. E se for
positiva ou negativa a resposta, as consequências serão diversas para o
procedimento.

130
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

Se esse exercício de cognição sumário for um exercício que leve a uma


resposta negativa, quer dizer, o documento não representa de modo
verossimilhante, a existência de uma obrigação, neste caso, estamos diante de
típica hipótese de impossibilidade jurídica do pedido. A lei veda a monitória se o
documento não representa suficientemente a existência da obrigação. No meu caso
da polícia (depoimento na polícia), eu fiz esse exercício e entendi que aquele
documento não representava adequadamente a existência da obrigação. No
entanto, se o juízo é negativo, numa postura mais tradicional, diante da
impossibilidade jurídica do pedido, o caso é de indeferimento da inicial e isso está
no art. 295, § único, do CPC (impossibilidade jurídica do pedido, indeferimento da
inicial). Agora, me parece que essa é uma postura extremamente formalista, até
porque se você falar “não representa adequadamente a obrigação, indefiro a
inicial”, como o cara vai fazer? Vai entrar com uma ação de conhecimento pelo rito
comum, vulgo, ação de cobrança. Então, numa postura mais moderna, espera-se do
juiz que, ao invés de indeferir a inicial, ele determine a emenda para converter a
monitória em rito comum (sumário ou ordinário). Esse é o juízo negativo. No foro,
infelizmente, quem acaba fazendo esse juízo é o cartório que já dá um despacho
pronto para o juiz sobre se é ou não admissível a monitória. E o juiz acaba não
fazendo esse importante juízo.

Agora, o juízo pode ser positivo. Nesse juízo positivo, é o juízo em que o juiz,
analisando que documentos chega a que conclusão? “esse documento representa
de maneira bastante verossimilhante a obrigação.” Quando nós estivermos diante
de um juízo positivo, automaticamente, aplicamos ao caso, o art. 1.102-B, do CPC,
porque o juiz determina aquilo que a partir de agora vamos chamar de mandado de
pagamento ou entrega da coisa que, para simplificar, vamos chamar de MPE.

Art. 1.102-B - Estando a petição inicial


devidamente instruída, o Juiz deferirá de plano a
expedição do mandado de pagamento ou de entrega da
coisa no prazo de quinze dias.

Quando ele diz “devidamente instruída”, o que quis dizer? Estando com um
documento que represente a verossimilhança na obrigação.

Quanto a esse juízo positivo, o que deve ficar bastante claro para você é que
nós estamos num juízo de cognição sumário, trata-se de uma decisão provisória
(porque mais adiante o juiz pode concluir que o documento não espelha
absolutamente nada).

Outra observação importante sobre esse momento: nós estamos diante de


típica hipótese de contraditório diferido ou, como prefere parte da doutrina, de
contraditório postergado. Por quê? Quando o juiz pega o documento escrito, ele
avalia a existência ou não do crédito. Isso é uma finalidade de conhecimento. É
uma atividade cognitiva, se é assim, a monitória só pode ser processo de
conhecimento e é tão assim que o contraditório fica postergado. Primeiro eu faço o
juízo, depois eu ouço o réu.

Eu já vi várias questões de concurso que tentam relacionar a monitória com


essa questão do contraditório diferido. A monitória é um típico processo em que o
réu só é ouvido depois de que o juiz já fez uma análise sobre a existência ou não do
crédito. Nunca esqueça de relacionar esses dois momentos.

131
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

Terceira observação: essa decisão que manda expedir o mandado de


pagamento ou entrega, tem que ser fundamentada? É óbvio que tem que ser
fundamentada. O juiz precisa falar porque aquele documento espelha ou não
espelha a existência de uma obrigação.

4.3. 3ª Etapa: CITAÇÃO

Exatamente por causa da briga sobre se a monitoria é processo de execução,


de conhecimento ou se é um quarto tipo de processo, existia uma discussão
acadêmica sobre se era cabível na monitória todos os tipos de citação ou só alguns
tipos. Isso porque no processo de conhecimento cabem todos. E no processo de
execução só cabe citação pessoal e por edital. Há dúvida sobre a citação por hora
certa e por carta não cabe nunca. É assim que funciona no processo de execução. E
na monitória?

O professor Ernani Fidelis dos Santos sempre sustentou que não caberia, por
exemplo, citação por edital na monitória. Então, se você não localizasse o réu, você
tinha que entrar com a ação pelo rito comum. Mas esse entendimento acabou
superado pelo próprio STJ que editou a Súmula 282, deixando claro que no processo
monitório, cabem todos os tipos de citação. Ele não fala isso expressamente, mas a
interpretação tem que ser esta porque a Súmula 282 diz o seguinte:

STJ Súmula nº 282 - DJ 13.05.2004 - Cabe a


citação por edital em ação monitória.

Ora, se cabe citação por edital, cabem todas as espécies de citação na ação
monitória, afinal de contas, ela é um processo de conhecimento. Entretanto, cabe a
seguinte ressalva: verificada a verossimilhança do documento pelo juiz, ele manda
expedir MPE. O réu está em local incerto e não sabido. Você intima o réu para pagar
ou entregar, como? Por edital. Mas a eficácia disso e zero é a mesma coisa. Por
isso, citou por edital, automaticamente, tem que aplicar por analogia, a súmula
196, do STJ que nada mais manda do que aplicar o art. 9.º, II, do CPC.

STJ Súmula nº 196 - DJ 09.10.1997 - Ao


executado que, citado por edital ou por hora certa,
permanecer revel, será nomeado curador especial, com
legitimidade para apresentação de embargos.

“Ao executado”, no caso aqui, ao réu na monitória que, citado por edital, não
pagar ou não entregar a coisa, será nomeado curador especial. Portanto, citou por
edital na monitória, o mínimo que se espera é que você nomeie curador especial
para que, hipocritamente, apresente embargos por negativa geral. Aliás, é uma
piada. Você finge que o réu tem direito de defesa. Mas não haveria como ser
diferente. É algo necessário, a citação por edital e, mais necessária ainda, a
nomeação de curador especial.

4.4. 4ª Etapa: RESPOSTA DO RÉU

132
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

O réu pode apresentar as seguintes reações (todas são esperadas no prazo


de 15 dias). O art. 1.102-B diz que a resposta do réu é esperada no prazo de 15
dias. Quantas respostas são possíveis? Ele tem a possibilidade de responder de três
maneiras diferentes:

a) Através do cumprimento do mandado de pagamento


entregue – Ou seja, ou ele paga ou entrega a coisa. Atenção porque nesse
momento, o legislador fez uma opção para incentivar a entrega. Ele estabelece no
art. 1.102-C, §1º, do CPC, uma sanção premial. Quer dizer, um castigo positivo. O
art. 1.102, § 1º fala que, se você pagar ou entregar a coisa em 15 dias você ganha o
direito de não pagar custas e honorários advocatícios. É bondade com o chapéu
alheio. Concorda comigo? E as custas ficam por conta do autor.

b) O réu queda-se inerte – A segunda reação é não ter reação. É a


inércia do réu. E, nesse momento, surgindo a inércia do réu, surge o efeito previsto
no art. 1.102-C, § 3º

§ 3º - Rejeitados os embargos, constituir-se-á, de


pleno direito, o título executivo judicial, intimando-se o
devedor e prosseguindo-se na forma prevista no Livro I,
Título VIII, Capítulo X, desta Lei. (Alterado pela L-011.232-
2005)

Se o réu se quedar inerte, haverá a conversão do mandado de pagamento ou


entrega (MPE) em título executivo. E, consequentemente, já destaco, em título
executivo judicial. O que vira título executivo é o MPE e, a partir daqui prossegue
como se fosse processo execução.

Presta atenção numa coisa muito importante: essa decisão que converte o
MPE em título executivo, não depende de fundamentação. É automática. O juiz
simplesmente coloca: o réu, não pagou, o MPE virou título executivo, prossiga-se
em execução judicial.

c) O réu apresenta embargos ao MPE – A terceira opção do réu é


apresentar embargos ao MPE. Você não embarga a ação, mas a ordem do juiz que
mandou você pagar ou entregar. São embargos ao mandado monitório ou ao
mandado de pagamento ou entrega. A partir do momento que o réu apresenta
esses embargos, automaticamente, você tem que aplicar o art. 1.102-C, § 2º, do
CPC, que diz que no momento em que o réu apresenta os embargos a ação é
automaticamente transformada em ação que vai seguir o rito ordinário. Ou seja, a
monitória vira procedimento de rito ordinário, sem nenhuma particularidade a não
ser o fato de que você fez uma tentativa de mandado de pagamento pela via
executiva. Não colou, virou ação de cobrança. É isso que acontece com a ação
monitória, seja no direito brasileiro, seja no direito italiano, seja no direito alemão e
era assim que também aconteceria na ação decendiária.

§ 2º - Os embargos independem de prévia


segurança do juízo e serão processados nos próprios
autos, pelo procedimento ordinário.

Aqui, entretanto, eu queria fazer um destaque bem importante porque é


objeto de uma súmula do STJ que entendeu que, exatamente por virar rito ordinário
é cabível reconvenção. É a súmula 292, do STJ:
133
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

STJ Súmula nº 292 DJ 13.05.2004 –A reconvenção


é cabível na ação monitória, após a conversão do
procedimento em ordinário.

Eu entro com uma ação contra você dizendo que você me deve e apresento o
recibo que você assinou. O juiz faz aquele juízo de verossimilhança e manda
expedir o mandado de pagamento ou entrega. O oficial de justiça vai até você e
manda que você entregue ou pague no prazo de 15 dias. Você fica doido porque
não deve. Quem deve sou eu a você. Aí você apresenta embargos ao mandado
monitório. A partir do momento que você opôs embargos, aquela ação virou uma
ação de cobrança. Se é rito ordinário, a Súmula 292 diz o seguinte: “réu, você pode
opor embargos ao mandado monitório e pode, ao mesmo tempo, atravessar uma
reconvenção dizendo: “está aqui, eu também tenho provas de que ele me deve.” E
junta documentos, etc.
A gente pode chegar a uma conclusão óbvia: qual é o requisito para reconvir
na monitória? Embargar. Porque você só pode reconvir a partir do momento que
vira ação de rito ordinário.

4.5. 5ª Etapa: EMBARGOS AO MANDADO MONITÓRIO

Ou embargos ao mandado de pagamento ou entrega. Quando eu chego a


esses embargos eu tenho que ter em mente que superei as outras duas hipóteses,
de conversão do título e também a questão da inércia. Esses embargos, nos termos
do art. 1.102-C, § 2º, é processado nos mesmos autos da monitória (não tem nada
de apenso, ele vai lá dentro) e, mais do que isso, independem de garantia do juízo.
Até porque se dependessem de garantia do juízo, não seriam embargos monitórios,
seriam embargos à execução.

Agora, a briga toda dessa questão do mandado monitório é a questão da


natureza jurídica desse inferno aí. Eu odeio monitória. A natureza desses embargos
é um verdadeiro inferno porque ninguém até hoje conseguiu esclarecer isso de
maneira adequada. O STJ adota as duas posições. Tem duas posições e o STJ
consegue adotar as duas. Existem duas posições diametralmente opostas na
doutrina a respeito da natureza jurídica dos embargos ao mandato monitório.

• Marcato, Dinamarco, Humberto Theodoro, Vicente Greco Filho – Para


essa turma, a natureza jurídica dos embargos ao mandato monitório é de
ação desconstitutiva. Igual aos embargos à execução. Você quer
desconstituir o mandado de pagamento ou entrega. Você quer falar que
aquele juízo de verossimilhança que aquele juiz fez no processo está
errado e aquele mandado não poderia ter sido expedido.

• Ada Pelegrini Grinover, Nélson Néri, Sálvio de Figueiredo Teixeira,


entre outros – Essa corrente adota o entendimento de que essa natureza
jurídica é de contestação. Para eles o legislador, em vez de chamar de
contestação monitória, chamou de embargos ao mandado monitório.

Qual é o problema prático dessa discussão? É que a definição da natureza


jurídica dos embargos tem absoluta relevância para as consequências práticas. E eu
gostaria de, com você, refletir sobre isso, já deixando claro que o STJ, dependendo
do tema, adota uma das duas posições. Ora ele acha que é ação, ora ele acha que é

134
LFG – PROCESSO CIVIL – Aula 07 – Prof. Fernando Gajardoni – Intensivo II –
09/10/2009
EMBARGOS DE TERCEIRO – AÇÃO MONITÓRIA

contestação. Vou fazer algumas perguntas práticas e a gente junto decide se é


ação ou contestação.

Aplicam-se os prazos do art. 188 e 191, do CPC? Prazo em quádruplo


ara fazenda e prazo em dobro quando os litisconsortes têm diferentes
procuradores? Se você adotar a posição de que é ação, a resposta é que não
porque isso é prazo para a contestação. Se você adotar a resposta de que é
contestação, aí sim. O que o STJ fala? Sim. Aqui, ele entendeu que é contestação.
Aplica o art. 188 e o art. 191.

Cabe reconvenção? Se você adotasse a primeira posição, qual seria a


resposta? Que não. Reconvenção é atrelada a uma contestação. Se você adotar a
segunda posição, você diz que sim. A posição do STJ é que sim (Súmula 292).
Portanto, cabe reconvenção na monitória. Os embargos, portanto, teriam natureza
de contestação.

Ônus da prova – Você lembra que o ônus da prova é de quem tem que
provar o fato. Se você adotar a teoria de que é ação, o ônus da prova é de quem
afirma, portanto, quem teria que provar que o mandado de pagamento ou entrega
não vale? O embargante porque é ele que afirma que o mandado está errado.
Competiria ao embargante a prova disso. O cheque está lá prescrito eu embargo o
mandado monitório, portanto, sou eu que tenho que provar que o mandado não é
devido. Eu, embargante. Esse é o raciocínio do STJ. Para isso, ele entende que é
natureza de ação. Aqui, ele não adotou a posição de que é contestação porque se
fosse contestação o ônus da prova seria do autor. Então, eu embargaria e ficaria
esperando que o autor provasse a existência da obrigação.

Para as duas primeiras polêmicas, ele adota a teoria da contestação. Para a


última, ele adota a teoria da ação. Para você passar no concurso, não precisa
resolver esse problema. Você pode deixar do jeito que está. O que você precisa
saber é que existe a polêmica e que existe entendimento para cada um dos temas.
Eu sou da turma que entende que tem natureza de ação.

135

Você também pode gostar