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MONTES CLAROS
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2019
MONTES CLAROS
2019
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Aprovado em:
Banca Examinadora
DEDICATÓRIA
À José Fernandes Guimarães (in memorian), do qual nunca conheci, mas sou encantado com
sua história.
À minha avó materna Joana Antunes (in memorian) que me fez gostar da religiosidade.
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço ao ótimo trabalho como minha orientadora Dra Ivete Batista
da Silva Almeida, que para além das orientações acadêmicas me mostrou novas perspectivas
acadêmicas. Mostrando assim como uma amiga para toda a vida.
A CAPES pelo financiamento da pesquisa
Aos meus professores, amigos e estagiário do PPGH Unimontes. Em especial aos
professores Drª Rejane Meireles e Dr. Heiberle Hirsgberg pelas importantes contribuições ao
trabalho durante a banca de qualificação.
Agradeço ao grupo de Estudos Negros, que despertou em min vários questionamentos
necessários à problemática do trabalho.
A pessoas que contribuíram para execução da pesquisa ajudando com as fontes. Em
especial aos de dentro dos terreiros Mãe Duca, Dona Vanjú, Rodolfo e Toni Preto. Além
disso, à Rilson Santos e Lúcio Benquerer pela disposição e ajuda com a imprensa e fotografia.
Ainda Gustavo Moreira e Regina do grupo Banzé.
Aos colegas de trabalho do Pronatec Unimontes, pelas contribuições. Em especial à
Ana Maria Lacerda pelos conselhos e carinho. Aos colegas da Escola Estadual de Ventania
pelo apoio.
Ao meu namorado Filipe de Jesus Sampaio pelo apoio, ajuda e incentivo. Agradeço
assim aos meus Pais Jackson e Cida, minha Irmã Eva Viviane e meus amigos, em especial
Allana Cardoso por me mostrar os caminhos da militância.
Sou muito grato a todos.
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RESUMO
SILVA, José Vinícius Peres Silva. (2019) Pompa e Requinte: Memória visual do Candomblé
e Umbanda em Montes Claros. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em
História social da Universidade Estadual de Montes Claros. Montes Claros-Minas Gerais
ABSTRACT
SILVA, José Vinícius Peres Silva. (2019) Pompa e Requinte: Visual memory of Candomblé
and Umbanda in Montes Claros. Masters dissertation. Postgraduate Program in Social History
of the State University of Montes Claros. Montes Claros-Minas Gerais
This work aims to identify the visual representations of Candomblé and Umbanda in the city
of Montes Claros in the 1960s. For this, we use imagery materials present in illustrated
magazines, periodicals and family albums to identify discourses and visions about these
religions. In this way, we highlight how these external and internal discourses and their
process of transformation were produced that placed them as part of folkloric manifestations
alongside Christian groups in the city. These ideas were appropriated by the city elites within
the regionalist context of the time.
LISTA DE FIGURAS
Figura 27. Carteirinha de sócio do terreiro dos Filhos de Pai Gonzaga assinada pelo sacerdote
José Fernandes.
Figura 28. Fotografias guardadas de José Fernandes Guimarães, lembranças de Mãe Duca
Figura 29. Pai Gonzaga em Incorporação com o médium José Fernandes
Figura 30. Pai Gonzaga no Terreiro de Alcina
Figura 31. Toque de Umbanda da família Pereira Porto
Figura 32. No Terreiro Filhos de Pai Gonzaga, em Montes Claros, vê-se, manifestando com
Oxóssi, o babalorixá Teresino, chefe do Terreiro
INTRODUÇÃO
expressões foram considerados relevantes e icônicas para essas pessoas. A comparação entre
o registro fotográfico no âmbito da fotorreportagem e das coleções particulares será
necessária, pois acreditamos que a diversificação de fontes traga maior solidez para as
reflexões e discussões que serão levantadas pela pesquisa.
Dentro da proposta abordaremos dois terreiros importantes na cidade de Montes
Claros daquele período, um de Umbanda, liderado pelo Pai de Santo José Fernandes e outro
de Candomblé, fundado pelo Babalorixá Teresinho Nery Santana ambos retratados na
publicação que estudaremos durante a década de 1960 e parte de 1970. Essas duas figuras são
importantes e podem ser consideradas icônicas, tendo como base as imagens fotográficas que,
“segundo uma semiótica planar, para Ana Maria Maud in Ciro Flamarion (1997), a imagem é
um texto-ocorrência em que a iconicidade tem a natureza de uma conotação veredictória
culturalmente determinada: se se quiser, uma espécie de faz-de-conta ‘realista’ de fundo
cultural”.
Sendo assim, para memória dos praticantes dessa religião na região do norte de Minas
Gerais, os dois Pais de Santo, sendo considerados de acordo com Ângela Cristina Borges em
Umbanda Sertaneja (2007) e Tambores do sertão (2014) como grandes figuras na propagação
desses cultos na região.
A presença das referências visuais às religiões de matriz africana pode ser notada
desde o século XIX, todavia, seriam em 1951 que uma fotorreportagem de uma revista de
circulação nacional causaria grande impacto entre o público, os formadores de opinião e os
praticantes do candomblé. Em uma reportagem da revista O Cruzeiro, essa publicação trouxe
a matéria intitulada As noivas dos deuses sanguinários assinada pelo repórter Arlindo Silva,
com fotografias de José Araújo Medeiros. Nela, abordava-se um terreiro de Candomblé em
Salvador, Bahia, onde foram realizadas cerimônias de iniciação na religião. Foram
apresentadas 38 fotografias que retratavam a rotina do terreiro, rituais e sacrifícios sendo atos
que até então eram inéditos para o fotojornalismo brasileiro da época.
A reportagem é o objeto central da obra do antropólogo Fernando de Tacca (2009) em
seu trabalho intitulado Imagens do sagrado: entre Paris Match e o Cruzeiro conforme ele
retratava a revista O cruzeiro pretendia opor a outra publicação realizada por um periódico
francês do mesmo ano. A revista Paris Match também foi quem abordou inicialmente a
temática da revelação do que era proibido, fazendo-o de uma forma sensacionalista.
A publicação provocou nos jornalistas da Cruzeiro o desejo de superarem o furo de
reportagem da adversária francesa, apresentando imagens mais marcantes, causando grande
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polêmica entre os intelectuais e o interior do próprio candomblé, mas fazendo sucesso junto
ao grande público.
Segundo Tacca (2009), as duas publicações romperam com o silêncio acerca desse
ritual sagrado, mostrando cenas e cenários da religião que caracterizaram um ambiente
fechado de registros fotográficos. As fotografias deixaram de modo geral encurtar o
distanciamento com o qual a sociedade da época olhava para os cultos do candomblé e seus
adeptos. De qualquer forma, as reportagens envolveram uma polêmica disputa sobre o lugar e
os compromissos que envolvem espaço jornalístico, sobretudo, da fotorreportagem, valendo-
se, principalmente, do ineditismo das imagens dos rituais secretos de iniciação dos praticantes
do candomblé num discurso que oscilava entre a lucratividade do furo de reportagem e a
prestação de serviço, ao trazer informação sobre o que não se conhecia.
Por meio da visibilidade que essas fotografias tiveram, fundava-se, segundo Ana Paula
Goulart Ribeiro, uma "escola de fotojornalismo baseada na importância da imagem como
notícia"1 (pg. 23), com ênfase na qualidade técnica, propiciada pelas novas câmeras de médio
formato, priorizando assim o registro documental. Ribeiro ainda coloca a diferenciação em
que as fotografias produzidas pelo O Cruzeiro sobre a Paris Match, destacando-se o papel
inovador e certa brasilidade nos conteúdo foto jornalísticos que ainda eram pouco conhecidos
entre os leitores do período.
Contudo, além da fotorreportagem, que foi o nosso suporte que nos possibilita a
compreensão de elementos que irão participar dos repertórios visuais a partir da experiência
coletiva com o contato com as imagens da imprensa, nos utilizou também das fotografias de
coleções particulares, mais especificamente, de fotografias de coleções de famílias de
praticantes da umbanda e do candomblé, com o objetivo de observarmos quais momentos são,
para eles, icônicos; seriam os mesmos que aqueles eleitos pela imprensa? Qual o lugar dessas
imagens na construção dos referenciais visuais e das representações sobre o candomblé e
umbanda para esses praticantes? Entender esses processos passa por entender um pouco sobre
o lugar da fotografia em nossa sociedade e da fotografia com fonte histórica.
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A proposta central na imprensa ilustrada ao usar a fotografia parte de uma grande discursão sobre a definição
do fazer jornalístico. Conforme Jorge Pedro Sousa (2000), a noção de fotojornalismo é difícil de ser
estabelecida, seja pela variedade de profissionais que nem sempre apresentam “unidade na expressão e
convergências temáticas, técnicas, de abordagens e de pontos de vista” (SOUSA, 2000, p.11) seja pela confusão
provocada pelos contatos com a publicidade. Também se torna difícil estabelecer uma noção precisa quando se
têm vários fotógrafos, que se dizem jornalistas, mas se dedicam a outros suportes de difusão. Para o autor, o
fotojornalismo será entendido como a “(...) atividade que pode informar, contextualizar, oferecer conhecimento,
formar, esclarecer ou marcar pontos de vista (opinar) através da fotografia de acontecimentos e da cobertura de
assuntos de interesse jornalístico
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Haroldo Lívio, com fotografias de Rilson Santos e Waldevino Fátimo. Dentro desse contexto,
dois pais de Santo, José Fernandes da Umbanda e Pai Teresino do Candomblé, destacaram-se
como os sujeitos retratados nessa reportagem. Chama-nos a atenção nessa reportagem à
estrutura do discurso visual que se distancia daquele anterior, da poderosa O Cruzeiro,
demonstrando a possibilidade de localizarmos aí um novo conjunto de situações que
caracterizariam as representações sobre o candomblé e a umbanda em Montes Claros.
Manteremos uma forma de diálogo com a publicação da revista Encontro e as imagens
realizadas pelos familiares e frequentadores dos dois terreiros na década de 1960. Essas
imagens foram encontradas em álbuns de família e negativos do período mantidos por um
descendente dos pais de santo que serão estudados. Um processo comparação será necessário,
pois acreditamos que a diversificação de fontes dentro do contexto de estudos com a
fotografia faz-se fundamental neste momento.
Desta forma, que a Umbanda aparece nos noticiários da cidade de Montes Claros
desde a década de 1950, sobre notas policiais. Como foi relatado por Borges (2007), onde o
nome do Sacerdote José Fernandes Guimarães foi vinculado a uma tentativa de uso “ilegal”
da medicina. Com o crescimento de sua casa, inauguração do seu terreiro, a imprensa muda
de estilo, e passa a vincula-lo ao calendário social da cidade, destacando com a riqueza de
suas festas. Em meados da década de 1960, o seu centro, juntamente com o trabalho do
Candomblecista Terezino Nery foram aos poucos aglutinados as ideologias de resgate cultural
e “folclórico”, que passaram a ser mantidos e vistos como manifestações populares regionais,
por mais que suas religiões foram trazidas de outros lugares do País.
O universo das representações sociais a partir de uma interpretação histórica pode ser
interpretado por meio das contribuições da Nova história cultural, onde para Peter Burke
(2008) “o historiador cultural abarca artes do passado que outros historiadores não conseguem
alcançar. A ênfase em “culturas” inteiras oferece uma saída para a atual fragmentação da
disciplina.” (p.8). Desta forma, essa linha ditou uma nova forma de identificar as relações dos
sujeitos históricos com o universo no qual eles circulam. Desta forma, pensar nas
representações suscita dentro do ambiente da cultura um grau maior de compreensão.
Sendo assim, podemos perceber que o processo das produções de conceitos e
conhecimentos da história e da cultura passou por uma mudança a partir de novas ideias e
questões relativas ao tempo no qual os próprios historiadores viveram. Conforme Sandra
Jatahy Pensavento (2005), grandes questionamentos sobre a conceituação da ciência histórica
e sua utilidade foram discutidos e reelaborados por vários estudiosos que modificaram
algumas das definições antigas sobre o conhecimento que se tinha.
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Entendemos que, para pensar em visualidade como proposta nos estudos de história
visual, o conceito de Representações sociais funcionaria como instrumental teórico
importante. Depurar as representações sociais atribuídas às imagens é um exercício no qual o
historiador deverá ter em vista o longo processo de criação, circulação e difusão desses
produtos.
Valendo-se disso, utilizaremos nosso trabalho como uma proposta exclusiva da
história visual que conforme Ulpiano T. Bezerra de Meneses (2005) é no campo da
visualidade que a história visual se apresenta:
Desta forma, perceber que nossas fontes foram problematizadas enquanto sua
especificidade. Perceber que as visualidades enquanto uma conduta própria que articula
transformações que vão além de outros meios como o texto, só a imagem como proposta de
estudo foram importantes para estabelecer tal questão. Por meio disso para se trabalhar com
tais fontes, e se produzir de fato uma história visual, faz-se necessária a reconstrução do que
se constitui a iconosfera:
Perceber a imagem enquanto uma fonte histórica que necessita de uma metodologia
própria e específica. Procuramos no nosso trabalho com fotografias na década de 1950 e 60,
observar todos esses aspectos das instancias no qual as imagens são produzidas e veiculadas.
Bem como é importante observar, sobretudo os álbuns pessoais, como e porque foram
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guardadas e os sentidos que foram dadas a elas posteriormente a sua produção. A iconsfera,
conforme Meneses (2005) aponta perpassa todo esse ambiente que a imagem se insere e ainda
o modifica.
Para identificar essa iconocidade que permeiam nosso trabalho, é importante perceber
as fotografias como uma fonte importante. Elaboradas para funcionarem como um jogo de
espelhos, a fotografia, sucinta a ilusão de substituta da própria realidade. As imagens não são
dadas, meras evidências indiciárias, mas construções imaginárias. Elas não se reduzem a
evidências documentais, objetivas. Elas simbolizações construídas histórica e socialmente.
Vistas por esse ângulo, o que importa resgatar ou discutir é o modo como uma imagem
idealiza, metaforizam, constrói um campo de significação Conforme Mauro Guilherme
Pinheiro Koury (1998).
Desse modo, podemos perceber na fotografia não somente como documento, mas um
grande porcentual de pesquisa. Igualmente, a fotografia para Ana Maria Mauad (2011) deve
submeter-se a críticas para que posteriormente ela possa vir a ser organizada numa ordem
cronológica. A essa ordem nos ateremos na produção da pesquisa, obedecendo a um ideal
significativo que siga um critério de seleção, a fim de que se evite a mistura da fotografia,
visto que, ainda conforme Mauad (2011), seu objeto que é a foto em si, deve ser trabalhado e
estudado separadamente, garantindo, pois a individualidade do objeto fotográfico a ser
estudado, que tanto pode ser um álbum, uma foto ou no caso uma revista ilustrada, para que
em seguida possa-se estudar a parte material.
A partir destes pontos, organizamos roteiros de análise no intuito de decompor a
imagem fotográfica em unidades, guardando a devida distinção entre forma, conteúdo e
expressão. Essa proposta é adaptada para a nossa realidade da pesquisa. É possível
destacarem-se itens como a revista nas quais as fotografias foram publicadas, agência
produtora da fotografia, ano, local retratado, tema retratado, pessoas retratadas, objetos
retratados, atributo das pessoas, atributo da paisagem, tempo retratado e fotógrafos que
produziram o material. Destacando ainda para uma análise o seu nível conceitual,
morfológico, compositivo e enunciativo.
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Como parte do nosso trabalho com imagens foi retratado por meio da revista ilustrada,
os textos que acompanham as fotografias estabelecem uma relação que os torna um específico
tipo de fonte. Por meio disso, para perceber com os sentidos da mensagem que a imagem
transmite são alterados conforme as narrativas presentes nas matérias estudadas utilizamos
para isso a compreensão de Sophie Van der Linden, em seu trabalho Para ler o livro ilustrado
(2011), onde é necessário compreender que;
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Por isso, no que tange ao presente trabalho de qualificação de mestrado em história social, procuraremos dentro
do limite da pesquisa feita até o momento ressaltar tais ponderações que foram estudadas até o momento. Desta
forma, ao propor os estudos sobre imagens das religiões de matriz africana entendemos que alguns conceitos
vinculados aos estudos do fenômeno religiosos bem como de propostas voltados a antropologia da religião
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utilizadas no trabalho encontram-se ainda no processo inicial de concepção e estudo, fazendo com que as
analises sobre essa temáticas serem ainda brandas e não aprofundadas. Espere-se assim, que após esse processo,
as indicações e ponderações da banca possa ajudar para sanar tais questões.
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1. IMAGENS DO OUTRO
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Demonstrando tal produção, destacamos o trabalho de Boris Kossoy e Maria Luiza Tucci Carneiro em o Olhar
do outro (1994), que conforme a coluna cultura e pensamento de Mauricio Falaviginia para o site oficial da
Unicamp (acesso: 11/07/18 às 17:24) o texto: por mais que novamente, pela força do discurso historiográfico,
sejam inseridas em outro contexto escrito, de viajantes e cronistas europeus que em suas passagens por terras
brasileiras narraram o exótico visitado, afoitos por contarem a seus pares europeus os costumes de uma
sociedade estranha, de cores e feições inquietantes.
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capitalizado e produzido para propiciar nas ideias de colecionismo e ilustração dos outros
ambientes, representações sobre esses povos. Nesse sentido, os valores que essas imagens
estabeleceram dentro deste contexto foram por muito tempo vinculado à conquista sobre essa
sociedade justificando as dominações imperiais, se abstendo ainda dos estudos etnográficos
proporcionando a externalização de um mundo diferente e ou entretendo a partir daquele que
afeta o cotidiano da população.
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Nome dado a um antigo formato de apresentação de fotografias, patenteado pelo fotógrafo francês André
Adolphe Eugène Disdéri em 1854. De tamanho diminuto (9,5 x 6 cm), a foto, geralmente revelada pela técnica
de impressão em albumina, era colada em um cartão de papel rígido um pouco maior (10 x 6,5 cm
aproximadamente)
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oitocentista. Por trabalhar com imagens do tamanho retrato, sua produção ainda se destacou
retratando a família real brasileira daquele período.
Sobre imagens que transmitem um fortalecimento dos seus personagens com olhares
em perspectiva de fortalecimento. Mostrando um poder que se redime por meio de suas
vestimentas “rudimentares”, Cristaliza-se assim, a cultura brasileira nas suas representações
dos negros do Brasil imperial. Henschel (1827-1882) também enviou diversos trabalhos para
Europa, e assim produzindo uma icnografia que justifica no “diferente” artigo de luxo para o
cotidiano do grande continente industrializado do momento.
As pessoas necessitavam de notícias, de novidades e de clareza sobre um mundo
desconhecido, e nada melhor do que uma reprodução “fiel” desse real, que a fotografia
proporcionava. Além desse contanto, a sua forma de reprodução mais rápida e que detinha em
si, uma lógica diferente dos padrões de arte e representação de uma realidade proporcionaram
tal aceitação e visão diferente. Por mais que essas ideias foram importantes, a sua
democratização, a participação cada vez maior das pessoas e o surgimento de fotógrafos
fizeram com que essas imagens cada vez mais foram revertidas e consumidas pela sociedade
da época. (KOSSOY e CARNEIRO,2004).
Uma definição que propomos pensar foi a Antropologia de urgência, pensada por José
da Silva Ribeiro (2005) no artigo Antropologia visual, práticas antigas e novas perspectivas
de investigação onde um diálogo de como os etnográficos atrelados ao uso da imagem eram
voltadas para a documentação e preservação das práticas culturais ameaçadas.
Numa era da reprodutibilidade técnica e da expansão industrial a Antropologia visual
orientada para alimentar e enriquecer as coleções dos museus. Tinha como objetivo situar-se
nas sociedades, “geográfica física e culturalmente distante”. Uma visão “efêmera” construída
do outro. Esta construção feita pelas novas maquina, não eram inocentes, transportavam
consigo as interpretações subjetivas dos operadores, inseparáveis da sociedade ocidental. As
tendências visualizastes dos discursos antropológicos abriram também o caminho à
representação.
Na convergência de imagens e representações sociais condicionadas nesse momento
de reprodutibilidade da técnica fotográfica, as visualidades estabilizaram certas ideias que
inseridas aos meios de comunicação de grande peso, como foi o caso das revistas ilustradas
propuseram uma acepção de imagens que muito foram consumidas e vivenciadas para o
cotidiano dos leitores desses periódicos. Essa relação estabelecida pela imprensa e as
visualidades não foram uma novidade, pois antes da fotografia já se estabeleciam ideias e
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narrativas que expressavam uma construção imagética 5, mas foi só com o uso da
fotorreportagem, e sua intensificação ao longo do século XX que muitas dessas questões se
destacaram como interpretações de mundo.
Conforme ALMEIDA (2014), apud Gisele Freud, a fotografia trazia para a imprensa a
“possibilidade de apresentar os acontecimentos com a velocidade e o detalhamento que os
novos tempos exigiam”. Desde seu inicio, o seu uso era apenas ilustrar uma história, mas
subsequente a isso desde o final do século XIX, a apresentação de lugares distantes e a
glamorização da vida luxuosa das elites; com a chegada do cinema, surgiram ainda as seções
especializadas sobre celebridades, bem como outros grandes fatores como a guerra, a fome e
os horrores que muitas vezes noticiados e visualizados pelas imagens que estavam
acompanhados os antigos textos propuseram uma nova interpretação.
Consoante a isso, conforme a autora a fotografia seria o típico meio de expressão de
uma sociedade tecnológica, aceito por todos os grupos como instrumento capaz de reproduzir
a realidade, e ainda ela representava a capacidade de expressar os desejos e as necessidades
dos grupos sociais dominantes, e interpretar a sua maneira os acontecimentos da vida em
sociedade.
Historicamente percebemos como a técnica fotográfica foi capaz de reproduzir
inúmeras visões que ficaram marcadas por meio de indumentárias sobre as mais variadas
possíveis percepções que ela construiu. Sendo assim, no que tange ao eixo da temática
proposta pela pesquisa as construções imaginas sobre o outro foram até o momento proposta
por nós como eixo para perceber as visualidades que perduraram no final do século XIX e
início do XX. Para relatar isso, a imprensa ilustrada foi o grande foco para perceber que a
reprodutibilidade destacada tem em suas perspectivas.
Exemplificando a imprensa ilustrada e seu uso das Imagens, utilizaremos do trabalho
de Marta Emísia Barbosa, Famintos do Ceará (2004) sobre as fotografias que ainda no
contexto do Império Brasileiro noticiavam as realidades sobre a seca que existia no Ceará do
final dos oitocentos. Dentro de uma perspectiva que analisava os caminhos feitos pela
fotografia e como elas passaram a representarem ideias sobre o cearense e mais tarde o
nordeste através de imagens que paralisavam as ideias sobre um país que sobre, mais um
sofrimento longíssimo e distante.
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Entendemos que as produções sobre algo, no caso as culturas de matriz africanas foram reproduzidas sobre
inúmeros meios que deram significados sobre estes ao longo do processo histórico. Os textos descritivos, a
literatura pode ser um exemplo. No que se refere ao trabalho, percebemos que é a imagem o ponto central de
discursão e sua proposta.
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feitos desenhos que foram transmitidos para as folhas já imprensas com os textos dos jornais.
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Esse último fotógrafo, conforme Ivete Almeida (2014, p. 33) ex-atuante na Paris Match trabalhou no
departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) no governo Vargas que foi posicionado como “estrela da
revista”. Realizou reportagens sobre variados temas atuando na fotorreportagem sobre política, personalidades,
religião e realidade brasileira.
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no processo histórico que não é homogêneo mais sim transformador. No que tange as nossas
ideias, as construções sobre o outro, o diferente e o pouco cotidiano foi identificado como
temáticos constantemente presentes dentro deste contexto. Imagens que por muito tempo
definiam e reconcentravam as representações sociais firmadas por elas mesmas. A imprensa
ilustrada pode ter se associado às primeiras fotografias que inicialmente, acompanhadas das
etnografias aqui citadas, mostramos refletiram sobre essa necessidade de uma
reprodutibilidade que ocasionaram nessas construções. Um processo histórico que nesse
âmbito utilizou dentro dessas perspectivas da imagem para chegar a tais considerações e
visualidades sobre o diferente.
pela vestimenta, além de outros traços corporais típicos como no caso do gaúcho, ou ainda as
expressões e a integração com o entorno de um porto de pequenas embarcações à vela, um
vestido de renda e um cesto na cabeça, que ajudam a caracterizar uma baiana” (p. 2).
Com isto, aparece no momento uma visualidade etnográfica “superficial e fluida”
sobre a cultura popular. Ainda segundo o autor, foi possível identificar nesse período uma
superposição de discursos sobre a nação, alguns deles de vanguarda, outros herdados do
ideário nacionalista de Vargas. Reafirmando esse momento parte das temáticas retratadas se
absteriam das religiões de Matriz Africana. Da década de 1940 e 1961, o Candomblé e a
Umbanda foram tema de pelo menos seis reportagens, entre as quais apresentam matérias
ilustradas e fotorreportagens, o que bastante significativo se considerarmos que a construção
de Brasília produziu apenas cinco em O Cruzeiro.
Como exemplo, uma produção que trazia essa proposta de “práticas religiosas”, que se
misturavam com as expressões de matriz africana e outras propostas visuais da revista. A
matéria acima, retratando uma festa de Boi Bumba Com um texto de Luiz Alpino e
fotografias de Pierry Veger. Sobre as imagens que apresentam uma narrativa em primeira
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instancia, com o texto que acompanha, estabelecendo uma relação de colaboração entre os
dois.
Nota-se que as fotografias que acompanham estão em posição bem destacadas que
refletem a intenção de demonstrar o valor “real” que a proposta da fotorreportagem pode
demonstrar nesse período. Compondo a cena retratada os personagens estabelecem uma
proximidade ao elemento espiritual da cena, “o boi” que transmitem a proposta etnográfica
que a produção de Veger8 pode ressaltar. A imagem maior, na parte direita da reportagem
ocupa uma página inteira da publicação e representa um homem que pela indumentária funde
a figura do “boi”, principal indivíduo da narrativa, onde sua cara pintada passa uma
transformação onde o homem se mistura ao animal sagrado.
É importante destacar que encontramos na revista destaques que utilizam dessas
temáticas, mas não definiram representações únicas acerca dessa visão “etnográfica” que essa
matéria propunha. Desta forma nota-se na presente matéria,
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Exercendo várias atividades como fotógrafo, jornalista e etnólogo foi um importante intelectual do século XX
que se debruçou nos estudos acerca do Candomblé e religiões africanas.
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Sete anos após publicação com imagens de Veger, a proposta desta outra
fotorreportagem demostra o tom preconceituoso e simplista que a produção aborda para
demonstrar as religiões de Matriz Africana. Com o título, a Mascara da Macumba, com
profissionais que buscaram uma narrativa que tentavam retratar “religiões empobrecidas”
(CRUZEIRO, 1952), produziram representações agora diferenciadas das outras aqui
apresentadas.
Com imagens que utilizam de um grande espaço do trabalho, o culto retratado tem em
seu aspecto ritualístico produzido numa perspectiva quase “cômica” e rudimentar. Com a
personagem que com um charuto nas mãos e em posição comum ao transe religioso, sua
representação evoca ao uma proposta de polemizar através das expressões faciais carregadas
de uma impressão grotescas, que o próprio texto fez questão de ressaltar.
Essas reportagens, bem como outras que forma veiculadas pela Cruzeiro nesse tempo
destacado, tinham como a religiosidade com tema principal. Desta forma conforme
Ramanello (2009) “recebia enfoques diferenciados que variavam de abordagens
antropológicas e objeto de estudos do folclore brasileiro, caso de polícia, objeto de estudos da
psicanálise e outros”. Enquanto manifestações da religiosidade popular eram geralmente
caracterizadas como parte de uma cultura ingênua ou atrasadas (p.45).
Consoante a isso, partes das representações visuais destinadas no Candomblé pela
revista foram produzidas sobre essa perspectiva. Pensando nessa proposta abordaremos aqui
outra fotorreportagem que teve grande repercussão no momento ao qual foi veiculada.
Destacando ainda os significados que a circulam.
publicação realizada por um periódico francês do mesmo ano. A revista Paris Match 9foi o
modelo para tal crítica.
Segundo o antropólogo as duas publicações romperam com o silêncio acerca desse
ritual sagrado, mostrando cenas e cenários da religião que caracterizaram um ambiente
"preservado" de registros fotográficos (TACCA, 2009). As fotografias deixaram de modo
geral encurtar o distanciamento com o qual a sociedade da época olhava para os cultos do
candomblé e seus adeptos. De qualquer forma, as reportagens envolveram uma polêmica
disputa por espaço jornalístico, valendo-se, principalmente, do ineditismo das imagens dos
rituais secretos de iniciação dos praticantes da religião.
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Paris Match é o nome de uma revista francesa de atualidades, de periodicidade semanal, fundada em 1949 e
célebre pelo seu lema "lepoidsdesmots, lechocdesphotos" ("o peso das palavras, o choque das imagens," em
tradução literal). Desde janeiro de 2008 apresenta um outro mote: "a vida é uma história verdadeira", de forma a
inscrever o jornal num contato mais pessoal com os leitores.
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Fonte: Revista O Cruzeiro, 15 de setembro de 1951, pp. 12-13. Coleção digital Biblioteca
Nacional.
Fonte: Revista O Cruzeiro, 15 de setembro de 1951, pp. 14-16. Coleção digital Biblioteca
Nacional.
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Com imagens em preto e branco, que hora foram apresentadas como suporte para o
texto e ainda colocado em destaque em uma página inteira. a Paris Mach, juntamente ao
cineasta e autor das imagens Henri-Georges Clouzot10 buscaram em um estudo que viu nos
“ritos fantásticos que assombravam as noites da maior cidade da América do Sul” (TACCA,
2009). Enunciando tal questão, a busca por uma cerimônia “fetichista” típicos de uma visão
dada aos países sul-americanos, demonstrando tal perspectiva de culto rudimentar.
Nota-se, que existe uma semelhança com as produções de José Medeiros para o
periódico brasileiro. A riqueza de imagens na segunda fotorreportagem destacada, com uma
maior quantidade de detalhes que demonstram uma diversidade do culto. Mas mesmo assim
as posições dos indivíduos perante o rito a pose e o momento fotografado podem demonstrar
tal inspiração entre as duas produções.
As imagens que rementem ao proibido estando ligada essencialmente a oposição feita
para com a publicação francesa, insere se em sua essência a representação do rito. Um
trabalho que se baseava muito mais no fazer, do que no que era o candomblé. Percebemos
isso nas três imagens, da publicação da O Cruzeiro que abriram a referida reportagem com
uma descrição longa do ritual de iniciação das iaôs, destacando por reproduções diretas dos
trabalhos executados nos terreiros.
Segundo Denize Conceição Camargo,
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Conforme Tacca (2009) Clouzt, já clamado por filmes como Corbeau, de Manon, de Miquette et as Mère,
realizou no curso das cerimonias secretas onde ele foi excepcionalmente admitido após três meses de pesquisas e
procedimentos. O cineasta nunca tinha usado uma câmera fotográfica. Seu sucesso surpreendeu a ele próprio.
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documental aqui é mais presente, pois a necessidade que esses padrões de matérias na revista
foram muitos utilizados na época.
A feitura do santo, na fotorreportagem corresponde o principal ritual da rotina do
Candomblé na vida de uma praticante. Seu aspecto “escondido” reflete o segredo que a
religião transparece por conta de uma especificidade de culto do costume dessa religião. Desta
forma, mostrar aquilo que não é permitido, foi uma proposta que instaura uma “aura” sobre o
conjunto de fotografias, de inovação e interesse. Sendo assim, o que as imagens transparecem
são necessariamente esse vinculo com o “proibido” que elas representam.
Para Fernando de Tacca (2009), o próprio significado que as imagens retratadas por
José Medeiros na Reportagem estudada foram modificadas por meia repercussão que as
fotografias tiveram naquele do momento. Pois, a própria ideia da produção da matéria veio de
uma da insatisfação da publicação da Revista Paris Mach que já havia produzido um material
visual recorrente. O periódico Francês, conforme o próprio depoimento de Medeiros no artigo
de Fernando de Tacca (2009) sofreu grande críticas por ter retratado o Candomblé da Bahia
com uma áurea sensacionalista, um “furo” de reportagem e que trazia uma visão estereotipada
do Candomblé do momento.
Desta forma, a intelectualidade no período da divulgação da matéria pela revista agiu
de uma forma apática á publicação francesa, com duras críticas e depoimentos de rejeição.
Um caso citado por Tacca de Roger Bastide que na própria O Cruzeiro, teria escrito um texto
de repúdio a publicação. Tal polemica e insatisfação da revista foi às motivações para a
reportagem que objetiva mostrar um Candomblé que é povo, por uma publicação feita por
“brasileiros”.
Posteriormente, após a polêmica gerada pela reportagem foi publicado um livro com
todas as fotografias feitas por José Medeiros no ano de 1957. No novo lançamento da obra
“Candomblé” foi acrescido 22 imagens a mais além das publicadas na revista totalizando
assim 60 imagens. A parir deste feito, uma nova interpretação sobre as discursões envolvendo
essa a reportagem foi revelada. Para Tacca (2009), com a publicação do livro;
ter sido amplamente ilustrada, tendo sido publicada com quatorze fotografias em preto e
branco, distribuídas em seis páginas numa reportagem que inicia a quinta edição do periódico
ilustrado.
Não obstante, o que se vê aqui em consonância às primeiras fotografias da revista
Encontro de Montes Claros, foi uma diferença de postura que retratavam sobre outras
perspectivas e visões que traziam os terreiros representados. Desta forma, apesar dos 13 anos
que separam as duas reportagens as representações que foram criadas aqui também mudaram,
mas o que se pode correlacionar às propostas dentro do aspecto “Documental” que as
fotografias dentro da imprensa ilustrada propõem em seu cerne.
O editor-chefe e criador da revista em Montes Claros Lúcio Marcos Benquerer 11,
revelou algumas informações básicas que foram necessárias para estruturar a condição desse
periódico frente ao cotidiano da Imprensa na cidade naquele momento. Sua formação em
Economia e Sociologia proporcionou sua ligação com a comunicação e o Jornalismo que
aumentou seu interesse em realizar o projeto da revista ilustrada.
Sua ligação com a imprensa acontece com seu trabalho no Jornal “Montes Claros”, na
década de 1950. Participando inicialmente como repórter e redator, segundo ele “sua
facilidade com as letras” fez despertar sua participação efetiva e interesse na área da
comunicação. Juntamente com outros amigos, que estavam imersos nesse ambiente decidiram
trazer para Montes Claros, uma “modernidade” que somente uma revista ilustrada
descompromissada e com linguagem “mais fácil” poderia fazer. A necessidade de justificar a
revista como “moderna” foi uma fala recorrente do entrevistado que ressaltava tal proposta
como “inovadora e diferenciada”.
Destacando o surgimento da revista ilustrada em consonância com as demais
publicações que existiam, percebemos que esse movimento acontece em grande escala com
outras produções nacionais que surgiram a partir uma grande demanda que as imagens
fotográficas que somente as produções de revistas ilustradas proporcionaram.
Importante destacar, que na o poder advindo das revistas de variedades tem esteve
muito ligado ao valor dado às imagens nesse momento, pois conforme ria Catarina Baptista e
Karen Abreu (2010), desde o inicio do século XX nascem inúmeros veículos que se
transformariam em “verdadeiros fenômenos de vendagem”. Para exemplificar em 1928, o
jornalista Assis Chateaubriand lança a revista O Cruzeiro, que dando ênfase às grandes
11
De acordo com Ivone Silveira e Maria José Colares em Montes Claros Ontem e Hoje (1995), Lúcio Benquerer
foi fundador e diretor da revista Encontro. Ela passa a ser dirigida pelo Jornalista Jorge Silveira de 1967 à 1969.
Atuando como chefe da CODEVASF, ganhou vários concursos de contos e literatura. Foi editor do Diário de
Montes Claros de 1970 à 1981.
41
Fonte: Revista Montes Claros em Foco, outubro de 1964. Acervo do Centro Cultural
de Montes Claros
42
A imagem foi um padrão para o periódico Encontro marcando as suas edições que
aconteceram até o ano de 1968, com o seu fim. Lúcio, ainda questionado sobre sua atuação
justificou que a sua ligação com a revista aconteceu somente até o ano de 1965, e que após
isso os outros atuantes que dirigiam o periódico.
Sua produção era baixa tiragem sendo a numeração não revelada pelo entrevistado, sua
circulação se concentrava apenas em Montes Claros e nas cidades próximas da região Norte
de Minas Gerais. Por ser caracterizada para um publico local, sua produção era pequena. As
informações contidas na ficha catalográfica da edição estudada, ajuda a perceber tal
dimensão.
Em consonância a isso, as grandes gigantes do ramo nesse período, como as revistas
Cruzeiro, Manchete, Belo Horizonte, alterosa, mantinham divulgação semanal e com alta
tiragem. Segundo Catarina Baptista e Karen Abreu, essas revistas abrangiam todo o território
brasileiro que tinham produção de 15 mil a 17 mil exemplares vendidos nos anos de 1950 a
1960. Isso nos mostra o quanto, em relação a essas de circulação nacional, a encontro ainda
tinha uma dimensão local, quase que artesanal (BAPTISTA e ABREU, 2010)
A quinta edição da Encontro, no ano de 1964, foi aqui estudada e observada como o
objeto do estudo apresentamos a ficha catalográfica que acompanhava tal lançamento;
Ficha Catalográfica
Ano V- N° 20 Edição de agosto-setembro do ano de 1964
Valor Cr $ 200,00
Direção: Konstantin Christoff, Lúcio Marcos
Benquerer, Waldir Senna Batista
Gerentes: Humberto Santos (Montes Claros) e Lúcio
Benquerer (Belo Horizonte)
Departamento Artístico: José Luiz Paoliello, Konstantin Cristoff
Departamento Fotográfico: Arnaldo Caldeira, José Gomes, José
Gonçalves e Waldevino Fátimo de Lima
Departamento cultural: Haroldo Lívio
Departamento social Laercio Pimenta
Departamento de esportes: Departamento de esportes: Estanislau
Guimarães
44
12
Conforme Yvone Silveira e Maria José Colares em Montes Claros Ontem e Hoje (1995), Konstantin Chistoff,
nascido na Bulgária em 1932 chegou na cidade aos seis anos. Médico, atuava como cirurgião do Hospital da
Santa Casa de 1948 à 1980. Co fundador da faculdade de medicina da Unimontes, também fazia pinturas e
destacava- se desde o início como artista. Manteve várias exposições de seus trabalhos. Desempenhava o papel
de cartunista em vários veículos impressos da cidade, sendo dois deles as revistas ilustradas O Cruzeiro e Montes
Claros em Foco. Haroldo Lívio, em sua publicação Nelson Vianna, o Personagem (1995), aponta em sua
bibliografia como “cronista”. Desempenhou papel jornalístico durante muitos anos no periódico Jornal Montes
Claros, na década de 1970 e 1980.
45
por correspondência13 e que após isso começou acompanhar seu amigo e cunhado em outras
atividades que necessitavam de ajuda.
A referida reportagem destacada foi feita com o acompanhamento de Waldevino
Fátimo, que mantinha uma relação próxima na sua produção, fazendo outras matérias
fotográficas para o periódico. Como já foram destacados, os dois não estava ligada
diretamente a imprensa, mas mantinham diversos trabalhos que produziram uma referência
para o cotidiano da cidade. Por isso, a proximidade dos dois fotógrafos facilitava na produção
de matéria e cobertura de eventos que a revista produzia.
Rilson Santos continuou mantendo seu trabalho em outras áreas bem como em jornais
e até mesmo na revista oposta, Montes Claros em Foco um trabalho rotineiro que
proporcionou sua participação no cotidiano da cidade. Destacamos tal proposição, ao pensar
que a relação do fotografo com esse tipo de produção era comum e imbuído desse meio, suas
fotografias absorviam tal ligação. Nesse sentido, o que entendemos dessa relação de
proximidade era uma forma de produzir que modificou o trabalho dos dois fotógrafos,
alterando sua visão e construção estética na produção de imagens.
Esse ambiente propicia às construções de fotografias que ora eram inseridas na revista,
na imprensa e que também representavam os álbuns pessoais e familiares, de acordo com o
relato do entrevistado, produziam certa condição visual que modificava e delimitava um
padrão para aquelas imagens. Contudo, o que encontramos dentro desse contexto, foi uma
relação muito intima e necessária entre a imagem fotográfica e imprensa daquela época. Os
dois fotógrafos estudados, a sua ligação com a revista e com os assuntos dedicados a ela
proporcionaram uma forma de fazer que seja própria daquela comunidade específica.
Outro ponto, a respeito da edição estudada, foi à ligação entre o departamento próprio
de fotografia que a revista mantinha com o setor dedicado a cultura. Uma das pessoas que
estavam à frente, desse departamento e que também foi o redator da reportagem aqui
estudada, Haroldo Lívio, mantinha uma relação de proximidade com tal temática. Segundo
Lúcio Benquerer, o também falecido chefe do setor dedicado a assuntos culturais mantinha
uma relação muito próxima por fotojornalismo e por assuntos temáticos e diversos que
diferenciavam do cotidiano de Montes Claros, nesse momento. Conforme o entrevistado, sua
formação em sociologia poderia ser um fator que contribuiu para produção de alguns assuntos
destinados à revista, como a matéria dedicada aos terreiros de Candomblé e Umbanda.
13
Nos anos 1940 e 1950, com a popularização do rádio e dos eletrodomésticos, se difundiram os cursos de
eletrônica e rádio por meio de 'cartas-aula'. Instituto Universal Brasileiro e Instituto Monitor, foram os pioneiros
dos cursos por correspondência.
47
para destacar e “preparar” o leitor acerca da temática proposta na matéria que abriria o
conteúdo da edição V da Encontro.
Paralelamente, a fotorreportagem demonstra algo que não estava vinculada uma busca
pelo diferente, documental. Ela foi apresentada, nessa chamada inicial como um “trabalho
sério” e resultado de “exaustivas pesquisas”, mas o conteúdo que foi noticiado não estabelece
uma quantidade de informação e destaque que trazia sobre os terreiros fotografados como um
trabalho extenso da forma como foi destacado na chamada. Podemos perceber que por mais
que as imagens do Candomblé e Umbanda sejam os outros destaques na revista, o próprio
conteúdo do texto jornalístico não se difere muito, trazendo aqui uma relação de explicação
“sutil” dessas fotografias apresentadas.
Podemos ainda identificar tal questão, principalmente pelo público que a revista era
destinada, basicamente pelos próprios montesclarenses e alguns municípios próximos. Por
trazer uma ideia sobre terreiros da cidade que nesse momento era relativamente pequena, essa
proposta pode ser mais aproximada do cotidiano dos moradores da região, podendo assim ter
um cárter de apresentação por meios vinculados a “cultura” do ambiente. Sobretudo a isso,
acreditamos que esse foi aspecto inicial dessa analise, sendo apenas questões centrais do
estudo.
Considerando a nota inicial sobre a matéria, uma fotografia foi usada para ilustrar tal
apresentação. Diferentemente das outras imagens presentes no corpo da reportagem não
contem sujeitos em sua composição. Enfeitados de flores e adornos que lembram um altar
religioso católico, a característica sincrética produz uma aproximação coma tradição religiosa
comum na região do leitor14. O requinte e luxo os santos transparece, com vários elementos
cautelosos e robustos justificando assim a demonstração de cuidado refinado e bem elaborado
abre visualmente o imaginário acerca da consequente matéria dedicada.
14
Conforme Ênio José da Costa Brito (2016) estudando a folia de reis em Montes Claros, a região é marcada um
uma rica cultura que se volta na valorização dessas práticas e que por demonstrar uma fé católica que transmite e
transparece nas tradições populares da cidade.
49
15
As explicações ritualísticas, bem como a definição mais profunda acerca das religiões aqui tratadas, serão
aprofundadas no segundo capítulo do trabalho. Portanto, para fins de estudo o Candomblé a Umbanda aqui, são
entendidas como religiões diferentes mas que estabelecem uma relação por conter elementos semelhantes.
50
16
Essa tonalidade era utilizada nos tons de vermelho e alaranjado pois devido as fotos serem em Preto e
Branco, e já existirem processo de coloração da imagem, mas muitas vezes caro essa técnica foi utilizada pela
revista. Por conta da característica artesanal e regional da publicação, uma forma de dar destaque e “modernizar”
a suas páginas foi tal questão.
52
para o leitor, bem como a necessidades de imagens que construíram representações das
religiões brasileiras de matriz africana.
Essa foto, por está logo abaixo do grande título, excepcionalmente colorido, pode ser
muito bem descrita pela sua opção de tratar de uma composição coletiva de uma cena do rito,
mas acaba por está pouco destacada e com relação a sua imagem acima, não surte muito
destaque. Além de o tamanho menor que as outras imagens de toda a matéria, contêm poucos
elementos em destaque, com exceção da estrela no centro do rito, mas que acaba por ser
despercebida diante o contexto geral coletivo, principalmente com relação as fotografia da
próxima pagina subsequente. Nota-se, que as outras fotografias, são diferentes evocam esse
ideal de “documental”, distante dos leitores.
Não obstante, percebemos posteriormente a divisão que a reportagem produziu,
diferenciando um espaço específico para a “Linha de Candomblé” (p.8 e 9) o destaque foi
destinado a casa de Oxóssi, chefiada por Pai Teresino, e após isso, nas paginas subsequentes
estão a oferta que abrangeu a “Linha da umbanda”, do Sacerdote José Fernandes. Essa
separação foi muito importante, provavelmente nas diferenciações entre as duas religiões e os
conceitos que os Pais de Santo tinham diante uma identidade muito diferente entre suas casas.
Posteriormente, esse assunto será abordado com maior clareza, no segundo capítulo do
trabalho as duas casas serão caracterizadas com mais aprofundamento.
Com relação às diferenças entre as duas Religiões, talvez a necessidade desse discurso
de diferenciação de acerto perante a própria visão do que se tinha delas como algo unificada e
relativa aos povos “negros africanos”. Desta forma, identificamos também que ao preocupar
em estabelecer uma relação destacada e fixada no texto que acompanhava a matéria, as
explicações são claras e concisas, não muito aprofundadas. Por isso, ter utilizado e dividido
em dois blocos, ressaltou ainda mais a ideia de uma divisão que tornavam duas coisas
distintas.
Essa dissociação que foi destacada pela publicação nem sempre se estabeleceu como
marcante ao definir tal diferenciação de culto. Em um passado recente, no ano de 1952, em
então reportagem da O Cruzeiro, os cultos de Umbanda, Candomblé e Espiritismo se
misturavam pelos textos fotojornalísitco do periódico.
A matéria abaixo (figura 16) que se utiliza das imagens com uma proposta de
revelação, onde o aporte da imagem revela-se assim indispensável para a compreensão da
redação, revelando assim uma narrativa que aparece a cada nova imagem. As fotografias aqui
estão intercaladas entre tamanhos médios e que em alguns momentos ocupam grande parte
das paginas. Compondo uma imagética que define o culto por meio do transe e possessão,
54
acaba por credibilizar a ideia inicial da reportagem que queria “desmascarar” um culto. O que
nos chama atenção para a discussão presente é a ideia de utilizar o termo “macumba” que
unifica os cultos, sem fazer uma diferenciação ou explicação mais detalhada dos eventos que
estão sendo retratados. A imagem apresenta o mesmo peso sobre o texto, que associados os
dois meios, apresentam uma relação de Disjunção, pois ao interlocutor ver primeiramente a
imagem, o texto a coloca como “falso” acontecimento. Ou uma “encenação”.
toda a reportagem dos terreiros definidos como “Moc Afro-Brasileira”. Percebemos assim que
a página descrita é divida por duas colunas não demarcadas e ilustradas por outras duas fotos
cada uma em oposição á outra sendo destacadas em sentidos contrários, onde a sua oposição
demarca meia página transversal para cada uma.
As duas imagens impressas nesse trecho são em preto e branco com o destaque apenas
para o Candomblé. No entanto percebemos que tanto o texto como as fotografias tratam de
um sentido “idealizado” de uma cultura distante e ancestral, uma forma de padronização sobre
essa temática religiosa na mídia ilustrada da época. A primeira imagem é uma representação
do Orixá Oxóssi, sendo uma referência ao guardião da floresta e da caça. Na segunda
fotografia aparecem à reprodução de outras duas entidades Obaluaé e Omulo, ambos com
uma ligação forte ao espírito e conhecimento, e a ancestralidade, posto que Omolu representa
um orixá antigo.
O texto introdutório, acompanhado as imagens faz um caminho explicativo da cultura
brasileira de matriz africana colocando assim a África como berço central do surgimento das
“práticas culturais”17 que foram estudadas pela revista. Não obstante, identificamos elementos
padrões nas explicações sobre origem dessa cultura. Tanto a ligação da escravidão e a
estereótipos, “A magia negra, o samba e as comidas da cozinha baiana foram trazidos para o
Brasil no bojo dos navios negreiros” que tanto relativizava e de certa forma produz
18
17
Nota-se que a todo o momento o texto define apenas como “práticas culturais”, “mistério “e “fetichismo”.
Desta forma, tanto o candomblé e a Umbanda não foram conceituadas enquanto religiões. Essas visões serão
aqui descritas no próximo tópico destinado.
18
Todos esses produtos da cultura, expostos no excerto são produtos da cultura brasileira o samba teve grande
influencia portuguesa, a culinária baiana a presença de saberes e fazeres indígenas e europeus, bem como o
Candomblé e a Umbanda. Uma cultura que aqui foi reduzida a uma exterioridade.
56
discurso de Nação. Por último, outro grande ponto que ressalta tal orientação foi “E o
elemento negro, cativo e saudoso de seu lar, trouxe em seu sangue a nostalgia, o doce langor
africano e as tradições e costumes das civilizações primitivas”. Mostrando assim, o critério
que a pesquisa “documental” seguiu no interior da reportagem.
Mais do que trazer um discurso que propiciava uma aceitação, pois ligar elementos do
Candomblé e Umbanda, práticas religiosas suburbanas, escondidas e negligenciadas nesse
momento (PRANDI, 1990). A revista Encontro, junto com o redator da publicação buscava
dialogar com certos padrões de práticas que vinculavam essa ideia de nacional as religiões de
Matriz africana.
Acompanhando tal discurso, as duas fotografias presentes na página 9 buscam
exatamente adicionar o valor que o texto pode ter sido colocado dentro a dinâmica desta
reportagem. Em duas imagens cada uma, identificamos dois indivíduos dentro do quadro
escolhido de destaque. Subsequente ao texto, a primeira imagem mostra em primeiro e único
plano o Ogã da casa junto ao orixá Oxóssi, esse santo que representa a casa no qual foi feita o
trabalho da revista em um aspecto onde a luz se recendia dando um grande destaque para a
cena de forma que a imprevisibilidade possa ser o foco central que a imagem propôs mostrar.
Mais do que isso, o próprio semblante dos sujeitos em posições de obediência mostram uma
cena retirada do tempo no qual o ritual estava sendo feito. Para isso, é importante perceber
como todos os elementos da foto estão sendo retratados e posto.
Candomblé e Umbanda regionais. Desta forma foi relatado, “com a conquista da interclânica,
os cultos afro-brasileiros penetraram pelo interior da Nação, chegando até nós, em Montes
Claros, nos chapadões do Norte mineiro, atraídos pelo afluxo da corrente imigratória
nordestina.” Essa descrição foi usada na medida em que posteriormente, a reportagem
destacou em apresentar os dois terreiros retratados na matéria dos “ritos fetichistas”.
“Moc Afro-brasileira” foi o título escolhido para representar os cultos regionais
fotografados. Acompanhado de fotografias produzidas na casa de Candomblé de Pai Teresino,
o que podemos encontrar pela frente uma nova descrição agora feita especificamente sobre os
terreiros de Montes Claros. Iniciando assim uma apresentação da casa de santo e algumas
informações pontuais não muito extensas sobre o ambiente que foi visitado. Isso foi
importante, pois com relação ao ambiente dedicado a Umbanda, a redação vai além com
outras informações diferentes que não estão presentes na primeira parte da reportagem. Esse
texto inicial ainda configura como apresentação das duas casas de Santo, basicamente a
descrição conduz;
Nota-se a necessidade dar crédito os dois terreiros com o registro civis a eles cabidos.
Uma opção que demonstra ao leitor credibilidade e talvez seriedade para com as escolhas do
jornalista com a matéria realizada. Essa questão foi um ponto importante se voltarmos a
pensar como as negligencias com que essas religiões historicamente forma presenciadas em
seu processo de formação. Mais do que uma identidade de informação correta e muito bem
escolhida o registro tanto cível como em âmbito nacional pode ser um discurso necessário
para o reconhecimento do ambiente onde a reportagem foi feita. Sobre uma forte influência de
destacar a cidade ao qual foi feita bem como seus personagens centrais, os Pais de Santo
Teresino e José Fernandes, acontece pelo fato de mostrar como essa organização pode ser
típica de uma cidade aberta e grandiosa, ou como essa cidade nos seus terreiros também se
59
mostra moderna e muito bem auxiliada e com presença do direito e algo que valida um
discurso de nacional vigiante nesse momento.
O que foi importante aqui, que ao relativizar uma ligação nacional com a necessidade
de colocar o registro civil em destaque, bem como as legalidades “máximas” da união dos
cultos afro-brasileiros, transformando uma exaltação da prática para demonstrar uma
soberania e pincipalmente uma ligação próxima com esse contato nacional e muito bem
ligado ao estado e as indulgências próprias dele. Não obstante, esse ponto deverá se desdobrar
no trabalho posteriormente.
Os cultos pesquisados e descritos pela revista são ainda conceituados ao final desse
pequeno texto, como “definitivamente incorporados ao acervo de cultura popular da Princesa
do Norte” remetendo assim a uma ligação muito forte da proposta que sempre evoca, como
plano de fundo, a cidade. Uma ligação que vai se estabeleceu ao longo de todo o trabalho, faz-
se reconhecer Montes Claros, enquanto palco de uma diversidade de cultura e principalmente
qualificar o seu nome com vários aspectos que aqui se encontram demonstrando que se temos
“muitas coisas, somos muitos!”
O terreiro de Oxóssi Caçador, comandado por Pai Teresino foi determinado pelo
periódico com poucas descrições em relação ao espaço dedicado à Umbanda, em toda a
produção. Com duas páginas dedicadas ao seu acervo, apenas três fotografias ilustram essa
reportagem bem como um texto explicativo. Outra grande parte dessa narrativa é dedicada à
explicação do conceito “Similie” que tem quase metade do espaço, do trabalho para essa
discussão.
Uma descrição básica intercalada entre três fotos acima em um ao lado mostra o local
onde se encontrava o terreiro, “Vila Guilhermina”, e ainda a informação da especificidade do
Candomblé que ocorre apenas em Montes Claros, e segundo a própria revista uma “tenda” em
Teófilo Otoni. Pela interpretação, não sabemos ao certo se essa justificativa diz respeito às
casas de Candomblé, ou se é algo específico do culto que faz existir apenas nessas cidades. O
que aparece foi à primeira informação. Sabemos que no presente momento à época o
Candomblé passou a ter um crescimento de adeptos, conforma Prandi (1990) e que sua
expansão alcançou grandes expansões a partir dos anos 70.
Logo depois, o texto nos explica e conceitua os Orixás dentro do cotidiano da religião,
liga-os a origem africana e ainda cita algumas divindades que estão presentes no terreiro da
casa apresentada. Entre elas estão, Oxóssi, Oxalá, Xangó e Ogum, além dos cânticos
destinados a cada uma dos santos e suas oferendas. Nessa mesma proposta existe uma
60
diferenciação entre as funções destinadas para cada praticante e o valor grande dos atabaques
e Ogãs dentro do cotidiano do terreiro.
Entre quatro imagens que circunscrevem os dois textos informativos acerca da “Linha
de Candomblé” conceituada pela reportagem. Uma relação estabelecida consoante às três
primeiras imagens (Figura 7) que apresentam cenas de um mesmo rito em posições
semelhantes nos seus sujeitos representados. Já na última foto, de baixo as primeiras, a
comunicação estabelecida foi diferente, pois o sorriso do Êre (Figura 8) remete uma nova
mensagem que se distancia de um “ocultismo” que as três fotografias iniciais podem ter
proporcionado.
Figura 18. Dança dos Orixás
A última personagem que foi representada, uma “devota”, cessa o caminho percorrido
pelas outras duas entidades apresentadas. Nota-se que, apesar de não ser uma figura de grande
hierarquia dentro da teologia própria da religião, a muzenza foi aqui retratada com igualdade
em relação aos outros dois sujeitos. Desta forma, a sua posição, os olhos fechados e os objetos
próprios do rito justificam o aspecto documental do ritual retratado.
Abaixo às essas imagens, acompanhada ao texto foi apresentado à figura de um Erê
junto aos instrumentos do culto, sem a presença de uma plateia ou outras pessoas que
participariam da cena.
O menino, na figura da entidade difere das outras fotografias por está de frente e com
um aspecto que evoca mensagens contrárias a primeiras apresentadas. O sorriso do garoto Erê
e a posição frontal a câmera transparece um humanização recorrente que não distancia mais
aproxima de um ritual mais humano e dinâmico. Outro ponto relativo a relação estabelecida
foi a movimentação contida nas primeiras fotografias acima e parada pela naturalidade de um
sorriso que transparece na imagem. Além que as tonalidades mais escuras e anoitecidas dos
primeiros exemplos, contrastam com uma claridade e exposição maior na imagem
subsequente.
Isso tudo pode ser muito bem explicado quando no próprio texto descreve o rito como
uma festa. Uma festa, que rodeada de “cânticos” e “expressões cabalísticas” (ENCONTRO,
1964) se concentra entre rituais que acalmam para receber os orixás, entre uma visão muito
63
descritiva e simples diante as extensões que um toque de Candomblé. Houve ainda a presença
de relatos das danças e dos batuques como uma forma da expressão completa do rito
retratado.
Ao término da primeira parte da reportagem, foi posto que, “alguns instrumentos do
Terreiro de Oxóssi Caçador já foram doados ao Museu e Centro de Estudos Folclórico de
Montes Claros” (ENCONTRO, 1964) argumentando dentro da materialidade como a cultura e
objetos desse povo tem um significado muito maior, sendo assim objeto de museus. O que faz
esses objetos e imagens terem esse valor? Completando tal intenção de vinculo com a
antiguidade e mostrando essa religião entre um processo de importante preservação.
Seguindo nesse sentido, o texto que fecha a linha de Candomblé com o subtítulo;
“Simile”. O termo foi utilizado na reportagem para designar o sincretismo religioso,
vinculando essas práticas às semelhanças entre o catolicismo. Além de uma conceituação do
nome, o redator cita alguns exemplos que vinculam os orixás do candomblé a ligação de
santos católico devido o processo de colonização. Sendo assim ele justifica que
“Continuariam adorando seus deuses africanos e conservariam seus nomes
originais, entretanto, o culto seria dedicado aos santos da Igreja Católica
Aparentemente, tratava-se de uma conversão em massa, feita da noite para o
dia”. (ENCONTRO, 1964. p. 9)
Algo importante dentro destas informações foi tratar as religiões brasileiras de Matriz
africana como fetichistas, como em; “Os fetichistas, da mesma maneira que os brancos e os
coléricos sabiam que tudo aquilo era uma farsa, pois continuavam acreditando em seus mitos
pagãos e os nomes dos mártires e beatos da Santa Madre Igreja” (ENCONTRO, 1964. p. 9)
categorizando assim os rituais que provavelmente continham esse diferencial de culto às
imagens e questões diferenciadas. Não obstante, por tratar o candomblé com essa designação
poderiam então revelar essa visão de “ancestralidade” que perdurava em seu texto, o mais
importante foi que até no título da matéria esse termo aparece.
Porque os nomes que conceituam a matéria, “Ritos fetichistas” foi vinculada de forma
única as duas religiões como Umbanda e Candomblé, pois não são usadas no decorrer do
texto? Essa visão não transparecia ser unívoca, mas com esse conceito embarcando todo
essas religiões ao mesmo nome podem ter construído representações.
Alguns exemplos “símilis” (sincretismos) foram citados no texto, como relativizar;
(ENCONTRO, 1964. p. 9)
Finalizando tal explicação o texto refere “uma grande relação de outras simílis que são
mantidas apenas para perpetuar a tradição.” Nota-se que mais uma vez a palavra tradição
aparece fortalecendo a ideia que tratamos aqui anteriormente.
Nota-se que a beleza e requinte foram a chave do nosso questionamento. O que estaria
por traz de tal exaltação? Diferentemente do Candomblé nas propostas relativas da Umbanda
de Babalaó José Fernandes, a destreza deste local foi muito presente. Mais que isso, ao relatar
a presença de “personalidades” à situação com que o terreiro transparece dentro da
reportagem se configura como uma proposta para além de um rito religioso distante. Já não
foi mais um culto ancestral e africano, nos arredores da cidade, mas sim uma festa que busca
na sociedade de Montes Claros ligação com seu cotidiano e a vivência cultural da cidade.
O ambiente do terreiro bem como suas dependências foram retratadas pela publicação
o “o salão de roncóo”, “quarto de santo”, “as relíquias”, “os paramentos e os amuletos”; “a
camarinha”, “a sala do médico”, e “o salão de banquete” construção de festiva que exalta
grandiosidade durante o texto ressaltando fotografias que demonstram tal relação. Pois a
proposta visual que coloca na festividade se destaca com relação à matéria realizado sobre o
Candomblé ressaltando assim uma oposição que estabelece postura diferenciada.
Consoante ainda a caracterização da Umbanda, a redação ainda sugere que; “É um
legado dos elementos negro que tanto influiu na formação do tipo étnico brasileiro, a
presença do brasileiro traz o odor e a música da macumba” (ENCONTRO, 1964. p. 10). Essa
visão sobre essas práticas reforçam nesse momento que a religião tem em sua origem o negro.
Algo importante, pois, ao relativizar tal palavra propões uma identidade que foge somente à
origem africana que já foi posto anteriormente. Além do mais a necessidade de ressaltar tal
questão foi a justificativa da origem da palavra Macumba, remetendo uma fala do próprio Pai
de Santo, “instrumento indígena africano e que macumbeiro é a expressão correta para
designar o músico que executa aquele instrumento” destacando a diante a provável
necessidade de uma abertura dessas questões para a visão diferenciada sobre o terreiro e
alguns termos pejorativos.
Finalmente, ao terminar a reportagem a narrativa mais uma vez convence de uma
apresentação para uma abertura dos terreiros para necessariamente strar esse novo.
Concluindo a fala, o exposto;
Justificando assim, nas imagens a relativa apresentação descrita de uma forma breve,
mas que resume a ligação do terreiro de Umbanda com o “requinte” demonstrado pela
narrativa proposta da matéria. Ao colocar-se para as imagens, o narrador já articula uma nova
67
percepção para o leitor, pois como o texto modifica nossa ideia sobre as imagens veiculadas
(VAN DER LINDER, 2011), a sua finalização dando grande validade para as ilustrações que
permeiam a imaginação dos seus leitores para o valor das fotografias.
A imagem além de despertar o interesse, justifica-se dentro do corpo jornalístico como
uma proposição para alterar uma mensagem, além de construir representações das sociedades
que nelas estão sendo significadas (MOSCOVICI, 2005). Sobre essa visão, ao que parece a
produção da Revista “Encontro” no momento das escolhas das fotografias e da produção do
texto que as acompanha bem como as próprias legendas instauraram assim uma visão
específica construindo ideias e ao mesmo tempo remodelando imaginários sobre o que seria a
Umbanda dentro do cotidiano da matéria ilustrada.
Sobre essas questões, ao instaurar as representações sobre as imagens da Umbanda de
José Fernandes, percebemos uma necessidade muito importante de vincular essas propostas
ao coletivo, grandioso e provavelmente de aceitação para com esse rito. Diferentemente do
início da reportagem em que o ocultismo e a sensação de “documentário” transparecido pela
reportagem aqui, podemos perceber que essa visão foi esquecida principalmente por colocar
no terreiro dos Filhos de Pai Gonzaga uma caracterização de festa popularmente cheia e
aberta, uma visão muito mais centrada nas propostas de festa religiosas como as católicas do
que o “escondido e periférico” Candomblé.
Nesse sentido as seis fotografias presentes na linha da Umbanda retratam uma postura
diferenciada. Sua posição em que acima encontramos quatro fotografias destas, que não estão
em primeiro plano imediato, mas que ao focar no Preto velho da cerimônia acaba por
transparecer todos os visitantes do local muito bem caracteriza das indumentárias próprias da
religião. Dentre todas as fotografias da matéria a entidade aparece em cinco, estando
incorporado na figura do Sacerdote do local. Algo muito presente, se pensarmos que no texto
que acompanha essas fotografias o nome dele aparece três vezes em um curto espaço de
tempo.
A característica de coletivo foi presente do terreiro não percebemos a
rudimentariedade proposta ao candomblé que foi colocado nas paginas anteriores. Aqui, a
festa é grande e demonstra uma riqueza de detalhes e pessoas no seu cotidiano. Vale destacar
que por se tratarem de religiões diferentes, podem ter sim uma diferença nos ritos, mas a
opção por tal qualificação não foi destacada.
Na primeira imagem, que acompanha o título, acompanhada uma considerável
quantidade de pessoas estão posicionadas ao redor e atrás da entidade presente no ritual. Com
a bengala e as veste bem típicas aderidas ao Preto Velho, sentado ele transparece em uma
68
visão de Pai, ou que demonstra uma sabedoria e liderança diante as pessoas, por está sentado
e a multidão. Não obstante, enxergamos certa similaridade nas fotografias subsequentes.
Estando associado aos ancestrais africanos, são entidades de Umbanda, o Preto Velho
foi um espírito que se apresentam em corpo de velhos africanos que viveram nas senzalas,
majoritariamente como escravos que morreram no tronco ou de velhice, e que adoram contar
as histórias do tempo do cativeiro. São divindades purificadas de antigos escravos africanos.
Figura 21. Na abertura dos trabalhos ritualísticos, o Pai Gonzaga de Angola Faz uma preleção
sôbre o evento e aconselha suas filhas de seita.
Figura 22. ““Pai Gonzaga de Angola, incorporado no seu cavalo, tira uma de suas
curimbadas”.
Figura 23. Prêto Velho Tata-Nagô, ao lado do Pai Gonzaga, canta o hino do cerimonial.
Mais do que isso, a própria Umbanda enquanto religião dos espíritos distancia-se do
Candomblé que remete o culto a deuses sagrado e distante de lendas e costumes africanos. A
Umbanda evoca tal facilidade de acesso e principalmente de maior concepção e aceitação.
Desta forma, posteriormente trataremos mais amplamente de diferenciar as construções, as
indumentárias e principalmente os frequentadores destas duas religiões distintas, mas que
contém em sua história formações análoga. Principalmente a história que reflete o surgimento
destas duas na cidade de Montes Claros também foi um fator diferenciado nas fotografias
analisadas e irá refletir em como elas foram representadas.
Concluído tal analise, a importância da reportagem que pretendia trazer uma
documentação sobre tal religiosidade na cidade de Montes Claros do ano de 1964. Como
proposta que acabou por tornar ausente na figura da religião do outro, presente. A reportagem
institui certas representações que estão diretamente ligadas a uma conjuntura maior, onde o
contexto subjetivo das culturas visuais estabelecidas nesse momento sobre o Candomblé e a
Umbanda.
Para entender tal problematização propomos definir que desde algum tempo antes da
década de 1960, relativo ao tempo no qual nossos estudos se encontram, várias visões foram
construídas acerca das religiões de Matriz Africana. Desta forma, Andreas Hofbauer, no seu
artigo, Dominação e contrapoder: o candomblé no fogo cruzado entre construções e
desconstruções de diferença e significado (2006), utiliza desses discursos para refazer uma
construção discursiva sobre essas práticas.
Para ele, advindo de uma interpretação que buscava em padrões biológicos e
evolucionistas que seguia parâmetros para identificar a raça e mundo da simbolização que
seria cultura. Paralelamente seguindo os ensinamentos de Franz Boas, começavam a operar
com uma noção sistêmica de cultura, isto é, com a ideia de uma pluralidade cultural (p.2).
Conforme o próprio autor, essas produções advindas de uma sociedade no qual as ideias de
cientificidades começam a ser articuladas e que definiam essas culturas a partir de produções
reducionistas.
Consequentemente, o autor coloca nas interpretações de Arthur Ramos (década de
1940), definições que colocava “padrões de culturas que os negros da África transportavam
para o novo mundo” (p.2). Especialmente, desta forma a religiosidade seria exemplificada
com o objetivo de melhor avaliar possíveis processos de adaptação e transformação.
Nas interpretações de Roger Bastide, que não obstante escrevia para a revista O
Cruzeiro, reconhecido como um grande intelectual inserido no ambiente midiático da década
de 1950 vê essas religiões como “resistência cultural”. Conforme o autor ele apoiava-se,
argumentações que o “candomblé resiste a qualquer forma de mistura e às transformações
provocadas pela modernização”. O antropólogo, desta forma reduz esse vinculo de
ancestralidade ao Candomblé e utilizando a Umbanda como parte de uma sociedade sincrética
que representava a aculturação no qual esse ambiente se configurava.
É importante entender que esse discurso que diferencia as duas distinções religiosas
também foi utilizadas na referida reportagem estudada de Montes Claros. Ao propor uma
produção que dividia as duas religiões, e ao mesmo tempo qualificava o Candomblé como um
reflexo da cultura africana e Umbanda como uma “mistura”.
Importante ressaltar, que uma produção de interpretações sobre os cultos de Matriz
africana teve muito em suas abordagens temáticas que procuravam nas visões de “possessão e
transe” como ideia de uma subversão do mundo “real”. Tal questão foi um dos destaques que
a revista Cruzeiro representou em algumas das matérias aqui estudadas. Da fotorreportagem
de José Medeiros e Arlindo Silva sobre a feitura de santo em um terreiro em Salvador- BA, as
73
produções que buscava uma investigação sobre a verdadeira realidade que “desmascarava”,
tinham no transe religioso tal proposta.
Marcio Goldman, ao propor em A construção ritual da pessoa: a possessão no
Candomblé refaz esse caminho de entender como um discurso inteiro criado acerca do transe
nas religiões de matriz africana. Ao citar os autores do início do século XX até a década de
1940, ele relata que as interpretações colocavam em uma visão cientificista ao perceber tal
questão como “regressão”, “estados afetivos profundos e arcaicos” e a uma situação de
“perturbação mental” ao qual a essas religiões estavam submetidas.
Para propor uma alternativa a essas discussões, ele propõe uma visão estruturante da
antropologia de Levi-Strauss onde;
Conhecido como pioneiro da Umbanda em Montes Claros e sua região, muitas das
memórias sobre o médium estiveram ligadas ao seu trabalho de difusor da religião no
ambiente onde vivia. Conforme Ângela Cristina Borges em Umbanda Sertaneja (2011) e
Tambores do Sertão (2014), parte dos relatos orais descritos por ela “emergia um clima de
75
feitos como “consultas médica” que os seus clientes descreviam os sintomas e enfermidades e
o próprio médium indicava um diagnóstico com ervas, e ou remédios alternativos produzidos
em sua própria casa Borges (2011).
O centro Nossa senhora do Rosário mantinha atividades voltadas a Umbanda no período
noturno. Com reuniões de desenvolvimento espiritual que destacavam os cultos aos pretos
velhos, Caboclos e Meninos de Angola, como as “sessões de posse” com escoras e exus
Borges (2011). Essas sessões foram descritas por Borges (2007), como pouco rotineiras e que
a rotina dos trabalhos era por motivações “alheiras” para resolução de problemas materiais e
amorosos (nota sobre a umbanda da época).
Como médium e vidente, sua postura extrapolava as noções de apenas um conhecido
umbandista, pois a ideia de que se tinha sobre ele, conforme Borges (2011) representavam
muitas vezes variedades de afazeres o tornando um homem místico aos olhos do povo da
época. Parte desse imaginário vem da figura do seu guia e preto velho que o acompanhava,
Pai Gonzaga.
Associado à sua figura, o seu companheiro espiritual era quem ministrava as sessões
umbandistas no período noturno de sua casa, e que o ajudava na sua vidência e
desenvolvimento como o seu poder espiritual. Conforme. Associados com uma provável
dualidade que se estabelecia entre os dois personagens o “poder” de Seu Zé Fernandes
ultrapassava o que era comumente referido aos médiuns por conta da carga e do valor que seu
preto velho se estabelecia ao seu corpo físico e mental
Extrapolando assim, os imaginários construídos sobre a figura do médium em 1959 o
sacerdote inaugura outro ambiente voltado a sua religião, o “Terreiro dos Filhos de Pai
Gonzaga”. Esse feito, conforme Borges (2011) e (2014) teve em sua produção e execução
com o contato do médium com algumas figuras do candomblé, sendo a maior de todos, seu
amigo “Joãozinho da Goméia” do Rio de Janeiro e Mãe menininha da Bahia. Pai Joãozinho
mantinha grande influência com o trabalho de Terezino Nerry, candomblecistas que também é
personagem da pesquisa. Desta forma, os próprios rearranjos das religiões se complementam
e a seu destaque com Zé Fernandes produziu uma necessidade de um local voltado a festas e
trabalhos com a “Umbanda de Terreiro”, diferente das sessões mediúnicas que eram
executadas no centro Espírita Nossa Senhora Aparecida. Consequentemente com as festas
aqui incrementadas em um calendário religioso, que até e não era executado pelo sacerdote.
Conforme depoimento oral de Maria do Carmo, “Ele ganhou o terreno para construir o
terreiro”. Todo isso, conforme a sua afilhada de terreiro “era para as festas que eram
77
realizadas como caboclo de serra mandinga, Festa da Oxum, Barco de Iemanjá, festa de
Cosme e Damião”.
Essa proximidade com o Candomblé de Joaozinho da Gomeia, não fez de Zé
Fernandes um candomblecista, mas proporcionou um enriquecesse de seu trabalho na
Umbanda diversificando assim o ambiente religioso no qual ele estava inserido. O babalorixá,
conforme Borges (2011) despertou no médium a necessidade de “saudar” seu “orixá de
cabeça”20. Sendo assim, dentro de seu calendário festivo a festa dedicada à mãe Oxum
destacou-se entre as atividades do Terreiro “Filhos de Pai Gonzaga”.
Parte da associação de José Fernandes e Joãozinho da Gomeia tem relação a sua
“clarividência”, e sua facilitada de adivinhar os acontecimentos, e isso fez com que os
zeladores se aproximassem com o médium e passaram a serem amigos e próximos conforme
depoimento de Mãe Duca. O tratamento de vidência era feito fora de assuntos religiosos, mas
para assuntos pessoais
Em agosto de 1958, em uma publicação da federação espírita e umbandista brasileira
fundada por Tancredo da Silva Pinto21, a revista Mironga destacava a construção do seu
terreiro. Tal fato foi apresentado em uma matéria em folha inteira que destacava a atuação e
trabalhos de José Fernandes como do Candomblecista Terezino Nerry Santana;
20
No livro Orixás Ancestrais, de Rubens Saraceni temos a conceituação onde é explicado que na energia divina
viva de Deus se encontra a origem dos nossos códigos genéticos específicos e que são esses que determinarão as
naturezas distintas de cada ser e que por sua vez, distinguem também os Orixás. A obra faz um comparativo
entre a energia divina e os ácidos nucléicos que dão origem ao DNA e RNA do corpo humano, exemplificando
assim a forma de concepção do espírito. Dito isso, entendemos que as características do seu Orixá ancestre vão
ser sua natureza íntima, o seu modo de agir e sentir circunstâncias diversas que não irão mudar. A forma como
você se relaciona com você mesmo, seu furor ou sua doçura interna que só quem é do seu convívio íntimo ou
que está disposto a perceber, tem a capacidade de identificar. O Orixá ancestre traz para o ser aquela
característica que se manifesta quando ele está em plenitude com o seu “eu” e é, portanto, a sua essência. Fonte:
https://umbandaead.blog.br/2017/01/02/o-que-significa-ser-filho-de-um-orixa/ acesso dia 20/04/2019 as 23:11
21
Segundo Marlyse Meyer (1993), em Caminhos do imaginário no Brasil, sendo um dos idealizadores da escola
de Samba Vavai, no Rio de Janeiro, esteve muito tempo ligado às produções culturais como o Carnaval. Como
autor de samba pertenceu a União brasileira de Compositores (UBC), criando alguns trabalhos no Samba. Como
ator de cinema e jornalista, funda a revista Mironga na década de 1950. Como responsável pela luta contra a lei
do silêncio que estabelecia os batuques advindos dos terreiros apenas até às 10 horas da noite, trabalhou como
essencialmente como militante da época. Para tal citação foi também um dos fundadores da Confederação
Espírita Umbandista do Brasil (CEUB) na década de 1950, Nesse contexto, juntamente Martinho Mendes
Ferreira instauraram a instituição. Tancredo viajou por todo o país, fundando federações em defesa da religião
em Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Pernambuco e outros estados com o propósito
de organizar e dar personalidade ao culto a nível nacional. Essa atuação foi destaque que fortaleceu ainda mais
seu vínculo com a religião conforme a autora por meio do contato com seus avós africanos foi iniciada em
Angola, criando o rito “Omolokôi” misto de Fé Banto e Umbanda, para muitos, conforme destacado por ela foi
“Um papa negro”. Principalmente por conta de uma vasta participação de elementos culturais, como sambista e
organizador do carnaval e atitudes políticas que institucionalizaram a sua ligação com as religiões de Matriz
Africana, principalmente a Umbanda.
78
Fonte: Revista Mironga, julho e agosto de 1958. Acervo do IHG de Montes Claros
Ao criar um ambiente externo ao centro Nossa Senhora do Rosário para seu trabalho.
O seu ofício passa por uma nova perspectiva onde os dois ambientes ao mesmo tempo em que
se complementavam, devido ao seu nome mantido como médium e de Pai de Santo de
Umbanda. O funcionamento do terreiro acontecia em um local externo da cidade, que
conforme Borges (2011) facilitou na inclusão dos instrumentos “Atabaques” proporcionando
na forma atual da execução da Umbanda na região. E ainda conforme Borges (2011)
facilitando o problema com a polícia não os perturbando durante a noite em seus toques.
O crescimento da cidade proporcionou com tal mudança, por conta da impossibilidade
das sessões “terreiradas” que poderiam incomodar os seus vizinhos devido ao ritual ser
noturno e longo com a presença dos toques. Esse sempre foi um desejo do sacerdote que
gostaria que sua fé extrapolasse os atendimentos e sessões espiritualistas mantidas no seu
primeiro endereço. Desta forma, os dois lugares foram utilizados, tanto no caso das sessões de
passe, Umbanda de mesa e atendimentos mediúnicos como no seu terreiro fora nos limites da
cidade onde ocorriam as festas destinadas aos calendários festivos da Umbanda. E, portanto,
de sua intenção, por meio da proximidade do Candomblé, da festa de Oxum, sua Orixá mãe
de “sua cabeça”.
Os instrumentos utilizados, bem como as vestimentas na execução das festas e das
sessões foram originalmente emprestados por Joãozinho da Gomeia, que por ser carioca e ter
sido conforme Leonardo Campos (2004) um “respeitável” sacerdote poderia ter tido alguma
relação com a matéria veiculada no periódico da associação espírita Umbandista do Brasil.
Toda essa construção social dada ao trabalho de José Fernandes, seu crescimento
como uma figura importante devido suas atividades e com o terreiro com o destaque de seu
centro umbandista proporcionou a ele esse aumento da visibilidade conseguindo toda uma
repercussão e brilho ao seu nome. Apesar desse pioneirismo que evocou à sua pessoa,
podemos estabelecer outra visão da Umbanda em Montes Claros? Como foi construído esse
destaque para o sacerdote?
O médium José Fernandes tem em seu nome um destaque que o fez ser lembrado para
além do ambiente religioso de matriz-africana da cidade. Isso se deu por conta da extensa lista
de atividades que desempenhou durante sua vida, tais como seus atendimentos mediúnicos,
como decorador de festas com temática cultura afro-brasileira e com relações próximas aos
políticos da época. O próprio contato com que tinha com os diversos setores da sociedade de
Montes Claros serviu para ocupar vários espaços com sua Umbanda. Partes das
80
Fonte: Carlos Wagner Guimarães apud BORGES, Ângela Cristina Soares. 2007
81
Isso demonstra como a preocupação do Pai de santo ao externalizar sua festa para
todos. Apesar de existirem outras casas de Umbanda na cidade e que, portanto, teria
festividades, mas que não careciam de grandes apresentações como era o caso da festa de
Oxum.
Para além dos folhetos sobre a programação de sua festa, no periódico impresso
Gazeta do Norte22 na coluna Cook Tall, de Lazinho Pimenta23 da cidade de Montes Claros
manteve várias publicações a respeito das festividades e sessões (públicas) no terreiro “Filhos
de Pai Gonzaga”. Conforme publicação de 8 de dezembro de 1962;
22
Jornal Gazeta do Norte, teve seu fundador o jornalista Dr. José Tomás de Oliveira, com experiência em
Recife, de onde vivia. Ele durou cerca de 50 anos na cidade. (SILVEIRA e MOREIRA, 1995)
23
Lazinho Pimenta foi o primeiro colunista social a permanecer nos jornais, firmando o nome e tornando-se
querido pela sociedade foi jornalista Lazinho Pimenta. Realizou grandes festas, entre elas as eleições de Miss
Montes Claros, Brotos do Ano, Festas das Mães. Foi professor de História cursando na Fafil, começou o
jornalismo na Gazeta do Norte, passando para o Jornal de Montes Claros. Recebeu homenagens e a medalha da
Inconfidência. (SILVEIRA e MOREIRA, 1995)
82
Como foi explicada anteriormente, a presença do Pai de Santo para o médium era rotineiro
nos seus trabalhos e devido ser de outros estados e uma figura “respeitável” o fazia como uma
qualificação importante para o cotidiano da cidade.
Somado à participação nas colunas sociais, outro fator que acionava a sua construção
de respeitável e ponte da Umbanda com a sociedade foi seu contato com o setor político do
momento. Como aparece o Então prefeito de Montes Claros, Geraldo Ataíde em umas das
sessões no terreiro Filhos de Pai Gonzaga, na já apresentada revista Espírita Umbandista,
Mironga em 1958
Figura 29. O prefeito de Montes Claros, o Dr. Geraldo Ataíde, discursa saudando o
babalorixá José Fernandes Guimarães
Fonte: Revista Mironga, julho e agosto de 1958. Acervo do Instituto Histórico e Geográfico
de Montes Claros
Essas informações foram constadas em relatos orais com uma frequentadora do local
durante a década de 1950. Conforme Eva Rodrigues Silva, moradora de Francisco Sá a
presença na casa de José Fernandes não era religiosa mais para “cura” de um “mau físico”.
Atualmente evangélica, a entrevistada não via o médium como um pai de Santo da
Umbanda e assim desconhecia que seu trabalho estendia para outras práticas. De forma
diferente, apesar de demonstrar a importância dado ao seu trabalho, Rilson Santos comparou
José Fernandes ao de “Chico Xavier de Montes Claros”. Esse misto de curandeirismo e
86
mediunidade colocado na figura de José Fernandes delimitou a sua visão perante as pessoas,
estendo assim para além dos limites da religiosidade Umbandista. É certo que parte da
sociedade procura o mediu como uma alternativa mais barata do que a medicina
convencional. Sobre esses o depoimento oral concedido Eva rodrigues justifica tal questão.
Mas sua atuação ultrapassava essa condição sendo reconhecido também como guia espiritual.
Aos três anos, Maria do Carmo, em 1958 foi orientada para um tratamento espiritual
com José Fernandes, ficando “internada” no centro Nossa Senhora, enquanto seus pais
voltavam para a zona rural onde trabalhavam. Durante o um ano e meio que passou no local,
Mãe Duca, como hoje é chamada, passou por um desenvolvimento espiritual que a aproximou
do sacerdote, mantendo assim como seu zelador e padrinho. Para ela José Fernandes era como
um “Pai” que auxiliava na sua vida durante o tempo que ficou internado no centro. Após isso,
começou-se assim a fazer parte das reuniões e trabalhos espirituais do local, mantendo uma
amizade e carinho pelo seu padrinho. Mãe Duca, ainda menina e com pouco conhecimento
ajudou como babá de uma filha do Sacerdote.
Nota-se que a narrativa da sacerdotisa, sua história de iniciação na Umbanda se
confunde com à do próprio Zé Fernandes. Que devido as enfermidades o desenvolvimento na
religião foi indicado.
Hoje sacerdotisa da Umbanda, Mãe Duca revela que sua função esteve associada aos
aprendizados que fez junto com toda a sua vida ao lado de seu padrinho espiritual. Após sua
morte a família que não era umbandista, não continuou com os atendimentos e finalizaram as
atividades da casa 25. Por não esperar a morte, os afilhados não guardaram nenhum material. E
por isso mantendo a função de Mãe pequena 26 na casa, com o falecimento de seu mentor, o
desejo despertou, conforme em própria fala;
Eu não tinha desejo, vontade de abrir minha casa. Uma casa, mas os filhos
que ficaram com ele. Du Carmo, precisamos de você para continuar essa
missão, nessa conta de nos deixar a ver navios, nos precisamos continuar
nossa missão. E você era o ombro do meu padrinho. Então ninguém melhor
25
No projeto da presente pesquisa, tivemos como objetivo a análise de álbuns de família guardados por seus
afilhados de santo bem como de seus familiares. Não conseguimos entrevista com seus filhos de sangue nem
com a família.
26
Segundo sacerdote da casa de Umbanda. Mantinha seus próprios clientes e ajudava em trabalhos mais
complexos na falta do chefe do centro.
87
do que você! Tem que ficar conosco. Aí foi que falei, não tem jeito de tirar
esse título de Mãe Pequena. Não tá fácil. Foi então que eu abri essa casa.
José Fernandes morreu com 56 anos no ano de 1975. Mãe Duca começou com os
atendimentos antes da morte de José Fernandes, no centro Nossa Senhora Aparecida. Com o
cargo de Mãe Pequena, segundo ela Ombro dele ajudava nos atendimentos e tinha os seus
próprios clientes. Ele havia doado o peji 27, para ela montar seu próprio centro, pouco tempo
antes da morte. Antônio Rabelo, prefeito de Montes Claros, costeou a passagem dos afilhados
da casa de José Fernandes para seu velório em Belo Horizonte.
Guardado no arquivo do seu Centro Umbandista, designado “Senzala Pai Felipe”, Mãe
Duca, disponibilizou cinco fotografias que remetem as suas memórias de seu Padrinho José
Fernandes. Destas imagens, apenas duas o contém presente. Todas elas são em Preto e
Branco, e três delas estão fixadas em papel branco A4, com legendas datadas no ano de 1960.
Sobre os fotógrafos que fizeram a imagem, ao ser questionado, o nome de por Valdevino
Fátimo. Profissional que foi responsável pela matéria “Nos Terreiros de Candomblé e
Umbanda” da Revista Encontro, retratada no presente trabalho no capítulo anterior.
Por ser um templo religioso, ao lado de sua residência, as imagens guardadas por ela
apresentam um destaque familiar, mas que somado a postura de sua casa, torna-se propriedade
do seu centro Umbandista, estando no arquivo, qualificando-se assim lembranças que fazem
parte não somente da sua memória quanto pessoa, mas como sacerdote. A presença das
imagens no arquivo de sua casa de Umbanda soma-se aos documentos guardados sobre a
história de seu templo, isso se faz perceber que as memórias do seu Padrinho, são parte de sua
casa e da sua vida espiritual.
Ambas as fotografias estão presentes no formato 24X35 cm apenas a última de forma
horizontal. Com poucos grãos na imagem, apesar de todas serem feitas durante o período
noturno. Isso se dá ao fato de serem feitas todas em momentos festivos, a primeira e a última
foram no Terreiro “Filhos de Pai Gonzaga”. A segunda imagem foi explicada por Mãe Duca,
como uma apresentação do Evento “Noite na Bahia”, no qual seu Padrinho foi produtor e
decorador. Sobre esse evento, trataremos no próximo capítulo do trabalho.
Compondo as três imagens, elas aparecem em ritmo parado em equilíbrio dinâmico.
Os elementos que compões a imagem não estão em tensão, apresentando uma organização
com relação a cena no qual foram representados. Os trajetos visuais dos elementos se
constituem diretamente com o objetivo de visão do interlocutor da imagem. Na primeira e
última imagem as poses dos sujeitos estão diretamente fixas para a câmera, em pose natural.
27
Altar na Umbanda apresentado na página ???
88
Já a segunda imagem, a baiana retratada está parada, mas não olha fixamente para a objetiva,
estando assim posando dentro da apresentação que foi representada.
Com sujeitos que estão retratados em plano geral, destacando todo o corpo do
personagem, uma caracterização de toda cena está presente no documento. Como uma forma
de apresentar a imagem e seus personagens. Somente na última imagem, é que vemos um
enunciativo mais descontraído onde as pessoas posam de forma familiar e reflete uma
coletividade. Ambas imagens, por retratares elementos específicos, para Mãe Duca tem um
significado importe por estar presente nas duas imagens. Todas além de estarem refletindo
suas ligações com José Fernandes, lembranças de sua juventude e que reproduzem quando
ainda era “menina” como ela nos informou.
Na última imagem, encontramos em uma Festa no Terreiro dos filhos de Pai Gonzaga,
presente Joãozinho da Gomeia de xadrez e “Pai Gitander” de São Paulo, ao lado e no fundo
dos dois Pais de Santo do Candomblé, estão os frequentadores do terreiro de José Fernandes.
O destaque para as duas personagens, ilustra como essas pessoas foram muito
influentes no ambiente religioso da Umbanda de José Fernandes dentro da década de 1960. A
sua amizade com Miguel grosso, mãe menininha, Pai Gitader, Joãzinho da Gomeia, João de
Ogum era algo muito presente no cotidiano de sua vida, para Mãe Duca. Por conta disso ele
frequentava os terreiros de Candomblé da Bahia e do Rio de Janeiro.
Seu padrinho não aparece em nenhuma das três imagens apresentadas por ela que
retratavam as lembranças tanto do terreiro, festas e outras atividades. Mãe Duca mantinha
apenas duas imagens que apareciam o seu Iniciador. Essas lembranças estavam vinculadas
principalmente ao terreiro dos Filhos de Pai Gonzaga e fazem parte dos poucos resquícios do
templo religioso que foi encontrado no decorrer da pesquisa.
“Meu Padrinho era Caprichoso, tudo dele era muito bem feito”, Mae Duca, rememorar
a figura do seu mentor religioso reforça ainda mais as representações que encontramos sobre
o Sacerdote. Como, dedicado, organizado em bem-disposto, seu terreiro destacou-se por conta
de toda uma carga dada aos modelos “cariocas” que ele manteve por conta do contato com
outros pais de Santo do Candomblé do Rio de Janeiro. Para isso, um dos objetos guardados
era de sócio do terreiro, que ela apresentou como uma lembrança.
Datada de 1961, isso confirma que as atividades do terreiro ganharam grandes
proporções por volta desse momento, entre os anos de 1958, conforme a reportagem da
revista Mironga, do Rio de Janeiro, e se estende ao longo dos anos de 1960, conforme as
reportagens do Jornal local Gazeta do norte.
90
Figura 31. Carteirinha de sócio do terreiro dos Filhos de Pai Gonzaga assinada pelo sacerdote
José Fernandes. Sócia: Maria do Carmo P. Santos.
Figura 32. Fotografias guardadas de José Fernandes Guimarães, lembranças de Mãe Duca
Conforme o historiador, os pretos velhos são conhecidos por meio de sua característica
paternalista, que os associam com dons e aconselhamentos que transbordam para uma
necessidade mediúnica de tratar, curar e revelar aos seus seguidores aflições e medos de sua
vida. Isto dá a eles um lugar “privilegiado na família de santo, como são chamados os
membros dos rituais umbandistas, ou seja, aqueles que nos próprios nomes demonstram
experiência e por isso devem ser respeitados” (ANDRADE,2013. p.8).
Compreendendo um lugar muito relevante no panteão das entidades do Terreiro de
José Fernandes, a sua própria casa detém o nome de seu Preto Velho guia. Este que foi um
espírito que conforme Mãe Duca, o acompanhou desde sua jornada como Umbandista, ainda
quando criança, iniciando sua mediunidade, até sua morte. O valor dado ao Pai Gonzaga
esteve ligado também as justificativas de sua vidência, que sua afilhada dizia ser a origem de
sua “fama” na cidade.
92
Para ela,
No caso do meu padrinho, o diferencial do Pai Gonzaga é porque a pessoa
do meu padrinho tinha clavidência, ele puro aqui conversando com você, ele
tinha essa clarividência, acontecia isso. Na incorporação, era mais seguro,
mais tranquilo, assegurar essa clarividência. O pai Gonzaga, ele, ele,
conseguia entrar no, nu na situação de uma pessoa. Tomar um passe, se
benzer, e ele descobrir algo que tinha ali. Por causa do médium, que vem
com o dom de clarividência. Não é por causa do preto velho.
Esse papel dado a sua vidência que premeditava os acontecimentos da vida, garantiu
parte das construções discursivas colhidas nas narrativas orais sobre o sacerdote. Tanto Eva
Rodrigues, como Rilson Santos também afirmavam que “o dom de prever acontecimentos” o
fez ganhar proporção que detinha.
Parte da iconografia atual, correspondente ao sacerdote José Fernandes estava atrelada
a figura do Pai Gonzaga. Pois as imagens recuperadas no decorrer da pesquisa, que retratavam
as festas e outras atividades da Umbanda, sempre encontrou a incorporação de seu preto
velho, sobre uma mesma posição comum as expressões facial da entidade, bem como de sua
identidade específica. Na Umbanda é comum o culto aos espíritos que tem em sua maioria,
pretos velhos, pretas velhas, caboclos, baianos, boiadeiros, ciganos e outras entidades. 28
As características desta entidade foram listadas por Andrade (2013) como
normalmente curvado para frente, andar lento e pesado, fala baixo, usa alguns objetos (p.4).
No caso do Pai Gonzaga, o cachimbo, a muleta e rosários eram presentes dentro da sua
incorporação. Parte das indumentárias que o padronizam em todas as imagens recolhidas
durante a pesquisa. Captando assim, um arquétipo de ancião africano presente na mitologia da
religião vindas do processo escravista.
Dentre elas, estão uma imagem disponível por Mãe Duca, outras recolhidas nos álbuns
de Família de Dona Neusa, filha de Mãe Alcina, que era afilhada de José Fernandes. Fotos
retiradas de festividades, que o Pai Gonzaga aparece. Temos também como exemplo, a
matéria da revista ilustrada Encontro de 1964, apresentado no primeiro capítulo do trabalho,
que contém representado o preto velho no qual se refere.
28
É importe perceber que ao tentar conceituar a Umbanda e de seus espíritos cultuados, nosso intensão não foi
estabelecer uma homogeneização dos rituais. Pois a própria diversidade ritualística é uma das mais importantes
marcas desta formação religiosa. “A Umbanda, entre outras, está neste campo de múltiplas interpretações. Seu
ritual se altera de tempos em tempos e mesmo num mesmo espaço religioso (terreiro, centro espírita, entre outras
designações) existem enormes possibilidades de percepção das mediunidades e das formas de se dedicar aos
Orixás e entidades” (ANDRADE,2013.p.8)
93
Destacada por Mãe Duca como uma fotografia de autoria de Valdevino Fátimo, esse
documento apresentado em preto e branco, em formato 24X35 realizado com objetiva normal,
comum a realidade da época. O flash foi utilizado, por conta do evento noturno, presente
ainda por conta do período do dia, a granulação aparece. Sobre personagens ao fundo, o
primeiro plano da imagem destaca a entidade sentada onde a visão impulsiona para a figura
central da construção narrativa da fotografia: O preto Velho.
O formato retangular da imagem consegue identificar um plano aberto de todo o
personagem, e ao fundo, as baianas compõe a cena, com características de festividade. Isso
aparece com bastante frequência nas imagens apresentadas no primeiro capítulo do trabalho,
onde a reportagem da revista ilustrada de Montes Claros foi analisada. Sobre a luz que incide
diretamente no Pai Gonzaga incorporado em José Fernandes, a sua postura exibe destaque
diante a narrativa imagética.
Estático e parado, a movimentação da cena ao fundo dinamiza o acontecimento,
embora o ponto central, fixo, parado e sentado coloca essa movimentação oposta na cena. O
que torna a imagem simples em primeiro momento mais complexa ao entender todos os
elementos compositivos da cena. A pontualidade no qual foi representado o evento ainda
contrasta com essa movimentação.
Sobre um plano horizontal, as representações elencadas do Preto Velho curvado,
descalço e com um gestual típico da entidade, como foram apresentadas anteriormente. Essa
visão do Pai, anciã, sábio posto ao santo representado refaz tanto o interlocutor da imagem,
como ainda adiciona a sua postura de uma carga espiritual, sobrenatural devido aos olhos
fechados do personagem.
. Parte da iconografia sobre o Pai Gonzaga aparece ainda no junto de álbuns de
Família de Dona Neusa de Oliveira, filha de uma afilhada iniciada na casa de José Fernandes
Alcina Nunes. O terreiro de Dona Alcina foi fundado com a ajuda do Sacerdote, e por volta da
década de 1960 já realizava atividades no Bairro Santa Rita de Montes Claros.
95
José Fernandes não foi o primeiro a desenvolver a Umbanda em Montes Claros. Esse
percurso foi apresentado na tese de Ângela Cristina Borges (2014) Tambores do Sertão, onde
a autora apresenta desde o século XIX, em imprensa da época relatos imaginativos sobre a
magia e curandeirismo que para ela configura o campo que propicia o aparecimento dessas
96
Brasileiros do Norte de Minas Gerais, 2019). Sempre trabalhos voltados aos toques e festas
que diferenciavam das sessões mediúnicas que ocorriam com os trabalhos de José Fernandes.
A sede atual do terreiro está situada no mesmo espaço que foi inaugurado a 60 anos. E
com orgulho, Dona Gelza (Jesuína Porto) mantém uma fotografia dos seus pais
acompanhados do amigo e pai de Santo Ilizário. A fotografia permanece no álbum da família
e ainda em um banner médio dentro do seu terreiro, a direita da entrada e do Pegi, ou altar.
Informações sobre o fotografo que produziu a imagem bem como o ano com exatidão
a sacerdote não deixou disponível. Por conta de suas lembranças, acredita-se que ela remonta
à um período anterior ao ano 1955, quando a construção de seu terreiro já havia se concluído.
Com uma iluminação diurna e poucos grãos na imagem, sobretudo ao seu suporte, em
formato de cartão médio. Presente um alinhamento na imagem proporcionado pela pose dos
personagens retratados. Esses mesmos se encontram organizados onde a profundidade da cena
foi quebrada com a natureza representada ao fundo. O primeiro sentado na direita, Seu
Waldemar Pereira Porto encontra ao lado de sua mulher à sua esquerda. O outro homem
sentado, seu Ilizário que também era sacerdote e mantinha uma própria casa.
Vemos na imagem apresentada uma pose comum ao momento histórico no qual ela
representa e uma fileira horizontal de frequentadores do terreiro Divino Espírito Santo. As
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vestimentas próprias das necessidades da religião ainda exaltam o caráter espiritual que ele
evoca. Para além do que a imagem transmite com relação à época onde está inserida é
também uma lembrança que do Dona Gelza, ao ancorar suas memórias sobre os Pais ainda a
coloca como relíquia do seu terreiro atestando assim a longevidade de sua casa, que desta
forma é vista por ela com um maior grau de importância com relação à outros terreiros.
O espaço apresentado na fotografia foi registrado no local onde estava o terreiro, que
foi onde segundo sua proprietária, foi descrito com orgulho “o primeiro toque de Umbanda de
Montes Claros”. O local se encontrava em uma região afastada e periférica da cidade.
Conforme Borges (2011) e (2014) esses foram os motivos pelo qual a falta de terreiros com
atabaques dentro da zona urbana pelo incomodo e receio dos sacerdotes com a polícia e os
sons ocasionados pelos instrumentos. Pois então, todos os três terreiros foram no início
construído fora das áreas urbanas por conta do transtorno que poderia gerar.
Esse também pode ser um fator para entender por que existia a separação em duas
áreas dos trabalhos de José Fernandes em Montes Claros. O seu terreiro somente começou a
manter atividades de “toque” depois de 1958 em outro local de onde aconteciam suas sessões
mediúnicas e atendimentos alternativos.
Apesar das variedades de casas e centro que iriam desde a participação de espiritismos
kadercista, Umbanda de mesa e Umbanda de Terreiro não se pode confundir que a maioria da
população protestava o catolicismo. Um meio religioso extremamente católico e cheio de
referências da cultura popular existia na cidade. O contraste com relação às religiões de matriz
africana era pequeno e que as práticas de José Fernandes fizeram com que houvesse um
estreitamento das relações.
Os três sacerdotes apresentados até o momento não mantinham atividades exclusivamente
com a Umbanda (BORGES, 2011) diferentemente do médium que tinha como profissão sua
vida de médico espiritual. O que é importante para entendemos que sua vida voltada ao
mundo espiritual era muito mais presente e destacada que os outros pelas suas relações e
intencionalidades de ser visto como médium da Umbanda.
Desta forma, destacaremos tudo aquilo que foi trabalhado de dentro e fora de sua
atividade de Umbandista para demonstrar para a sociedade dos terreiros de Montes Claros
bem como os externos a religião na intenção de ser amplamente conhecido pelo seu ofício e
como um “embaixador” de matriz africana na região.
99
29
Segundo Campos (2004) tradicional nome dado após iniciado no Candomblé de Angola. Sendo que esse passa
a ser utilizado pela comunidade do terreiro.
30
Deve- se lembrar que a África é um continente gigantesco em extensões territoriais e as maneiras de
comunicação não eram como na atualidade. O homem desde cedo observou que há energias presentes em tudo
que o rodeia e que elas na maioria das vezes têm o total controle sobre os acontecimentos e os ciclos da vida ,
essas energias são o Orixás, Inkices ou Voduns como são chamados. Cada pedaço daquele território tinha seu
reino e ele cultuava as Divindades de formas díspares, embora todos reconhecessem a presença de cada uma
delas. Assim surgiram as nações do Candomblé. Quando esses povos foram atacados brutalmente e tirados à
força de suas nações para serem escravos, eles espalharam pelo mundo uma mistura de tradições, que deu origem
a outras vertentes do Candomblé (como os presentes no Brasil) e levaram a sua própria cultura às demais
localidades do planeta. Essa forma de vida das religiões que eles mostraram ao mundo, deve-se ao fato de que
com o fim de seus grandes reinos e suas autonomias, os africanos foram obrigados a se fortalecerem ainda mais
na fé em sua religião e propagar por meio da memória e da fala a sua cultura. Essas eram as únicas maneiras de
acreditarem que toda sua história não morreria ali e que pudessem ter um fio de esperança em um amanhã
melhor. Fonte: https://www.iquilibrio.com/blog/espiritualidade/umbanda-candomble/nacoes-do-candomble/
acessado dia 21/04/2019 às 19:14
100
regionais tornando o Candomblé não unanime entre os seus praticantes. Apesar dessas
diferenciações o que torna tão importante os seus sacerdotes ressaltarem tanto a sua diferença
diante dos outros? O que o Nagô-Vodum de Terezino Nery pode dizer sobre as outras
designações, a ponto de o próprio corrigisse as memórias do seu Pai de Santo?
Ao ser questionado sobre a origem do nome de sua nação do Candomblé, o sacerdote
justificou através de alguns personagens importantes que definiram sua formação. Miguel
Grosso, que para a memória dele foi seu Pai de Santo no qual passou por sua iniciação. Desta
forma, Miguel foi iniciado por Ilizário de Oxum, ambos aparecem na nossa pesquisa com
ligação aos dois terreiros aqui estudados. Eram conhecidos como os “mais formosos” e
“importantes” do País. (colocar qual a ligação dos dois com José Fernandes) O termo Nagô-
Vodum é regional e corresponde à nação do qual o Candomblé de Teresino foi destacado por
ele. No seu depoimento, o Nagô-Vodum, corresponde à uma mistura entre o Candomblé de
Nação Angola e Ketu, correspondendo ao que era feito no terreiro do seu Pai Miguel Grosso.
A partir de 1957, o funcionamento do terreiro “Oxóssi Caçador” começa na cidade. No
ano seguinte, em reportagem para revista Umbandista, de publicação nacional noticiou o
cotidiano do terreiro, juntamente com os trabalhos de José Fernandes. O periódico foi
apresentado na página ???? e a notícia acompanha com uma fotografia;
Figura 36. “No Terreiro Filhos de Pai Gonzaga, em Montes Claros, vê-se,
manifestando com Ôxossi, o babalorixá Theresinho, chefe do Terreiro.
Presente na revista Mironga, no ano de 1958, essa imagem apresenta-se como gênero
de Fotografia de imprensa e subdivide ainda dentro de um contexto social, pois representa um
ambiente de convívio religioso, ou seja, o terreiro. Com um texto estabelece uma relação de
colaboração, pois as duas instâncias da mensagem revelam um sentido que emerge da relação
entre os dois. Devido à uma informação que excede o representado na fotografia.
Em um formato retangular, ainda nas cores preto e Branco, foi produzida sobre uma
grande angular e normal. Entre 50 à 60 mn. A iluminação está presente por meio do uso do
flash, sendo, portanto, realizado o registro no período noturno. Com relação a forma como a
fotografia se apresenta existem uma maior presença do grão fotográfico, devido a pouca
iluminação existem uma saturação a imagem por meio do aumento da sensibilidade sobre o
filme fotográfico. As linhas que foram destacadas na perspectiva do fotógrafo, não são
uniformes e transmite uma relação de movimento, que centraliza na figura orixá. A textura da
imagem revela um grão fotográfico menor com pequena profundidade, com um desempenho
dos objetos fotografado nítido, mas ainda assim, com pequenas sensações oneroso. A
sensação geral que o flash transparece é uma proposta frontal que não focaliza em apenas um
sujeito ou ponto específico da imagem, mais revela uma ligação mais suave e uniforme sobre
o quadro representado. O contraste revela uma gama tonal de cinzentos ampla com uma
tonalidade que expressa uma possível espetacularização.
A composição geral da cena revela uma relativa perspectiva sobre o espetáculo que
cria um ritmo de movimento. Um equilíbrio dinâmico sobre a presença da dança e da roda que
os sujeitos presentes podem destacar. Há também um destaque para o contraste de luz,
sobretudo diante a tonalidade das roupas que os sujeitos utilizam uma padronização que não
se aplica ao personagem principal, o santo incorporado no Babalorixá Teresino. O trajeto
visual em direção a cena é destacado por uma dinamicidade estática que a quadro fotográfico
transmite. A pose dos sujeitos revela uma instantaneidade com relação ao evento fotografado,
pois a dança foi retratada em seu momento de acontecimentos. Dentro do interior de um local
fechado, a representação acaba por se plana com poucas distorções na imagem. Perfazendo
assim uma habitabilidade que a fotografia sugere dentro de sua composição central. A
duração do trabalho pode ser percebida como um instâneo rápido e momentâneo.
O Ponto de vista físico atinge altura dos olhos, onde as atitudes dos personagens
revelam uma semelhança entre eles que se diferenciam apenas do sujeito enunciativo
principal que é o orixá. O sujeito principal demonstra tal ligação principalmente pelas vestes
que configuram um grau de excepcionalidade sobre os seus acompanhantes que onde os
olhares das personagens se concentram para o centro do evento enunciando assim um
102
Ambrósia Cardoso Maria de Jesus, ou como é conhecida Dona Vanju passou problema
de saúde que nas palavras dela “só o espiritismo que me curou” saiu da região de Gorutuba, e
Terezino acabou de educá-la mantendo em sua casa. Narrativo também presente no
depoimento de Mãe Duca, durante sua história com José Fernandes. Ela foi a alguns outros
lugares, mas todos indicaram o seu Pai de Santo. Ela procurou uma outra curandeira da
região, aconselhando assim o desenvolvimento com Terezino.
E assim, ela herdou sua casa e terreiro, mas não exerce a função de sacerdote depois
da morte de seu Pai. Segundo ela “os filhos dele não continuaram com os toques dos
terreiros”, afirmando ainda condições de assumir porque segundo ela “deve ter
conhecimento”.
O edifício onde era executado as festas e seu terreiro, junto com seus mobiliários e sua
casa construída ainda em vida são hoje mantidas. Acerca dessa situação Dona Vanju, diz que
todo o seu atual patrimônio foi doado por seu pai ainda em vida.
Partes das memórias sobre o Candomblé são mantidas quantidade de fotografias
guardadas por ela. Juntamente com todos os utensílios do terreiro Oxosse Caçador e
documentações. Em uma mala, ao qual pertencia ao próprio Terezinho, estão guardadas como
relíquias do passado, uma forma de recorrer as lembranças. Com cerca de 265 fotografias, que
datam desde a década de 1950, as imagens são um fiel retrato não linear das memórias da vida
do Pai de Santo, associadas assim a sua vida religiosa. É um aspecto comum aos sacerdotes
do Candomblé, que moram em seu próprio terreiro e mantém uma vida dedicada a esse ofício.
Dentre de todas as imagens que constam no arquivo, guardado por dona Vanju, 202
destas imagens são de ambientes e temáticas diretas ao terreiro Oxóssi. As outras fotografias,
104
foram outros momentos corriqueiros do sacerdote como viagens, fotos familiares e outras
imagens
Dona Vanju se lembra dessas fotografias, justificando o valor de seu Pai diante a
externalidade. Nas imagens acima vemos duas representações de algumas atividades que eram
feitas no Parque Municipal de Montes Claros. Não encontramos nenhuma outra i informação
de como era esses espetáculos, pois a entrevistada justificou que a participação da sua casa
não estava condicionada ao ritual religioso, mas eram apresentações mantidas para a
população da cidade. Isso ainda confirma a construção social e peso que o Pai de Santo foi
incluído em algumas das memórias na Imprensa e Literatura que trabalhamos no próximo
capítulo da Dissertação. No verso da fotografia aparece “ Lembrança da festa de Mãe Jussara
no 7 de Julho de 1977. Vanju e Célio, 02/07/1977. 15 de agosto de em noites de Iemanjá
festejamos essa data flor e laricó”.
Ao que tudo indica, a legenda que aparece no verso estabelece uma relação de
revelação sobre a Imagem, sendo ela o veículo preponderante. Mas do que isso, ao está escrito
três datas diferentes com letras diferenciadas, o documento representa esse vínculo com várias
outras memórias que elas carregam.
Essas três imagens estão em posição vertical, formato tradicional e foram retiradas de
apresentações e eventos externos as práticas espirituais no terreiro. Com o uso do flesh em
todas as imagens, pois se tratam de acontecimentos noturnos os personagens posam para a
captura em de forma tradicional e de corpo cheio. Montando assim a impressão de
caracterização de sujeito, justamente de forma mais idealizada e expositiva. Ao que tudo
indica as imagens das criações não correspondem a um trabalho espiritual ou gira, e nem que
elas foram iniciadas na religião, principalmente por conta dos pés calçados, ao que seria
impossível conforme Vanju afirmou, que no terreiro de Seu Pai os trabalhos eram realizados
todos descalços.
Nas primeiras imagens, se trata de Vanju, com as vestimentas de Muzenza, junto outro
frequentador do local. Nas duas imagens subsequentes, são crianças não iniciadas com roupas
de orixás Omolu e Oxóssi, na primeira e na próxima imagem, se repete o primeiro Orixá
representado e Xangó. Questionada sobre as crianças, Vanju afirmava que isso era comum,
principalmente em dias de apresentações no parque e que as crianças eram filhos dos
frequentadores do Local.
A figura sagrada dos Orixás para o andamento do mundo, no Candomblé se dá ao
valor mitológico e narrativo do mundo que os cerca. Para entender tal questão, as imagens
presentes no conjunto de guardado por Vanju apontam para o grau de importância destes no
107
cotidiano religioso do terreiro Oxóssi Caçador. Das 264 imagens que foram retiradas do local,
135 delas tiveram alguma ligação com os Orixás. Seja em incorporação, saídas de Santo,
apresentações culturais e festas eles estavam presentes como parte concreta do culto.
Parte da cosmovisão do povo Ioruba, (nota) que são a ligação direta a religião estudada
demostra-se neles a forma como o entendimento do percurso humano e da prática na vida
adere-se a entidades sagradas. Conforme Reginaldo Prandi os Orixás “alegram-se e sofrem,
vencem e perdem, conquistam e são conquistados, amam e odeiam. Os humanos são apenas
cópias esmaecidas dos orixás dos quais descendem” (p.24)
Desta forma, a narrativa mitológica proposta sobre os seus panteões sagrados evoca
para um condição do sagrado próximo a condutas humanas que transparecem para a vivencia
do iniciado no candomblé. Mas não se deve relocar aos Orixás uma postura humana, como
são os santos para os católicos. Míticos e valiosos, os orixás representam mais do que isso,
eles são mais do que humanos, são poderosos e mágicos, formas e aparecias que dão o poder
da força da natureza e do ensinamento, por isso as formas do tempo-espaço-natureza são
associadas a eles em um ritual que o colocam como necessários para o andamento do mundo.
A cosmologia iorubana expressa nos mitos apresenta-se tanto como princípio quanto
como meio e como fim: está na origem do mundo e é instrumento tanto para interagir com o
mundo como para mantê-lo tal como descrito nos mitos. Ao afirmar que “para os iorubás
antigos, nada é novidade, tudo o que acontece já teria acontecido antes” (18), Prandi enfatiza
esta força ontológica intrínseca à concepção mítica dos iorubas. Eles são forma de expressar e
dizer sobre o mundo, “são causas e efeitos ao mesmo tempo” (p. 19)
É no cotidiano ritualístico, por meio da atualização contextualizada dos mitos e
incorporação desses, que se afirmar e se articula o mundo dos valores para os
candomblecistas. Nisso, ao ter a postura dos orixás como tão presentes a prática religiosa,
entendemos que é por meio deles que existe, o mundo, as pessoas e a religião. São por meio
deles que o ritual acontece, e não por causa deles que se existe a religião.
Ao ser questionada sobre o seu orixá de cabeça, Vanju explica que as festas eram
compostas por todos os santos, e que seu poder era importante para fazer do Pai de santo
presente na vida das pessoas que ali frequentavam. 31
31
É importante ressaltar que, aos referir se a mitologia Iorubana, exemplificada por Regilnaldo Prandi,
procuramos trazer explicações próximas para entendimento da liturgia candomblecista. Como nossa pesquisa
aborda um fenômeno religioso local, e no período anterior existem algumas variações. Exemplificando, no
terreiro estudado, existem outros elementos sagrados como Caboclos, Êres e Pretos Velhos que foram
comumente associados ao panteão Umbandista. Acontece que existem variações nas práticas, e muito foi
mudado com uma influência a “africanizado” na religião. Coisas que identificamos, no ritual de Terezino Nery,
esses elementos ainda existiam, não constando apenas a fé nos orixás.
108
Nas imagens subsequentes identificamos a figura sagrada de três orixás são eles
Oxum, Obaluaê e Iemanjá. Figuras importantes no panteeão da casa, dona Vanju diz que
todos tinham festas específicas durante o tempo dedicado a eles. As suas lembranças são mais
claras no que tange a festa de Oxóssi e Caboclo que foram realizados todas de uma única fez
em fevereiro.
As próximas imagens foram datadas por Vanju como sendo na década de 1960,
período do auge do terreiro que recebia muitos frequentadores e que colhia os frutos dos
grandes investimentos realizados pelo Pai de Santo na década passada. Presente em
fotografias em preto e branco, elas se encontram e posição horizontal. Com grandes contrastes
que fazem as cores pretas erem grande destaque na imagem, algo a ser explicado pela luz
noturna e uso do flash que foram usados.
As poses dos personagens foram retratadas em movimentação, principalmente junto ao
papel sagrado dos orixás. A primeira, Iemanjá acompanhada de duas muzenzas que guiam a
divindade no ritual que auxiliam na dança sagrada. Na imagem, Obaluaé está acompanhado
com o chefe da casa Terezino que professa os cânticos da gira (nota sobre o cântico e a gira
no candomblé.
Figura 40. Moça em Oxalá, e Obaluaé
Nessa imagem, o verso acompanha uma legenda “Oxum ladeada de lata” datada em
dia 23 de julho de 1977, já o período de consolidação do terreiro. Em posição horizontal, as
imagens contêm um formato 24X30 maior do que as outras apresentadas anteriormente
proporcionando um campo de visão muito maior e com mais nitidez sem a granulada que as
fotos noturnas tinham. Aqui a posição dos sujeitos reforça a movimentação do terreiro que
tanto foi destaca por Dona Vanju, questão importante para entendermos como as
representações construídas sobre a movimentação foi mantida.
Sobre o orixá, Oxum tem em seu seio de feminino a proteção das águas doces e a
paixão e amor. Por sua grande devoção, a posição está serena e com pouco dinamismo,
acompanhado do Pai Santo, chefe da casa que a guia. O conjunto ao fundo a observa, sendo o
ponto central da narrativa da imagem. O grau forte a vestimenta e as performances ficam
nítidos diante a o brilho de sua vestimenta diferenciada das outras pessoas.
Os orixás são performáticos, e para isso são destaques em todas as imagens. Mais do
que apenas materiais expositivos para as narrativas visuais, eles carregam em si um mistério
sagrado, que os evocam que os codificam como algo superior. Para entendê-los não são
apenas as roupas as posições e movimentos, mas o conjuto todo que os tornam míticos e
inacessíveis. Diferentemente do Preto Velho de José Fernandes, que foi analisado
110
anteriormente, os Orixá na mitologia são forças da natureza, divindades que não foram
humanos e por isso a sua devoção passa a ser diferenciada que no culto Umbandista.
Na próxima imagem, vemos em tamanho horizontal em preto e Branco, a
representação de Obaluáe com uma guia ao seu lado. O movimento do santo contrasta com a
muzenza que se une tornando uma pose dinâmica. A face da “catingé”, nome do senhor
representado conforme Vanju está transparecendo uma fala e movimentação, isso diz que a
foto foi realizada durante a gira, e por isso o destaque dado a esse movimento o torna
diferenciado com as outras imagens apresentadas.
A última imagem que representa os Orixás, temos mãe Oxum e Mãe Iemanjá juntos.
Em posição horizontal, a imagem foi realizada na década de 1960, e contém vários elementos
diferenciados com relação as outras imagens. Aqui todos os personagens participam do ritual,
com as mãos voltadas para os santos estando os participantes mais próximos do ocorrido.
Desta forma, ao centro da narrativa, Oxum, que está incorporada em Terezino acompanha
Iemanjá de lado abrindo espaço para sua irmã. Como todas as cenas de Orixás, ao fundo
elementos e objetos do terreiro enfeitam todo o salão.
A seguir duas imagens de saídas de Sando de iniciados ou Yaôs. A iniciação no
Candomblé corresponde ao ponto principal de uma casa, pois é por meio desse ritual que
aumenta o número de adeptos e filhos de santo do Sacerdote. Por isso, é o ponto central onde
conforme Toni Preto, atual presidente da associação das religiões de Matriz Africana na
Cidade inicia-se uma nova vida dentro do terreiro. São por meio de novos Yaôs, que a casa se
expandiu. O nome mais comum entre os entrevistados é o processo de Saída de Santo, bem
como a s palavras “fez santo” e meu “pai de santo”. A seguir duas fotografias de saídas que
constavam nos álbuns de Terezino. Uma correspondente a década de 1960 e ao outra no final
de 1970. A última (figura 44) foi a única imagem colorida selecionada para o trabalho.
112
Rodeado de várias pessoas que compões as duas cenas, as narrativas são ricas de
elementos e outros aspectos que tornam o evento dinâmico. Na primeira em preto e branco,
113
formato horizontal, os personagens saem de dentro do quarto “escuro” descrito por Dona
Vanju como “camarinha” espaço onde o iniciado passa um período por orações e rituais que o
consagram como iniciado em algum Orixá no Candomblé. Parte desses detalhes sobre como
ocorre os rituais de iniciação, apesar das diferenças regionais, foram descritos no primeiro
capítulo do trabalho.
Na segunda imagem os iniciados que estão cobertas de uma pintura típica do processo
de iniciação entraram na roda e sobre o transe, começaram fazer os movimentos. As cores
destacam umas fotografias voltadas pelas tonalidades avermelhadas pela saturação das
imagens noturnas e analógicas. A luz que se volta para os personagens principais das duas
imagens os evocam dos yaós para o momento. Mas uma vez, como os orixás o ideal sagrado
presente nas imagens os configura como uma quebra de realidade e os consagra o ambiente
pelo seu valor espiritual. Se trata de duas imagens que reforçam isso, que ganha maior
destaque a partir dos movimentos e semblantes das faces capturadas.
Nas três imagens acima (figuras 45,46 e 47), foram representados o cotidiano, que
mostram o Terezino com seus filhos de Santo e outros frequentadores. Três imagens em
posição horizontal em preto e branco com alto contraste do preto que remontam década de
1960. A primeira com as inscrições no verso “Entrega de Deká, querido filho de Santo, Pai ou
Mãe de Santo”, sobre uma perspectiva reveladora, Vanju disse que esse foi um sinal de
mostrar que o iniciado passa a ser Pai de Santo e podendo abrir sua casa. Esse procedimento
foi realizado por ele depois de suas obrigações de sete anos após serem iniciados. Como a
entrevista disse, foram muitos os seus filhos de santos iniciados.
Juntamente com os filhos da casa Vanju acompanha seus irmãos e ao seu lado direito
encontra Ricardo, que posteriormente seria Pai de Santo consagrado na década de 1990 na
cidade que conforme Cristina Borges ele....
Abaixo, Terezinho encontra-se com seus filhos em conversa após um evento na casa
principalmente juntos e vestidos. O que essas imagens enunciam um cotidiano grandioso que
a casa teve, a multidão, o contato com seus filhos e o grau família dão sentido as imagens que
retratam justamente isso, ao guardar as fotografias que eram de seu Pai, Vanju se sente
importante, pois deixa sua figura viva e destaque a importância do Pai e amigo que o
sacerdote despertou para sua vida. Grande Parte das imagens não conta com legendas nem
foram datadas, mas o que se mostra importante e como ao retratar os acontecimentos do
cotidiano as fotografias imortalizaram o jeito de se fazer e tornam-se relíquias de uma
construção de passado que representa todo ideal construído em cima do sacerdote.
Questionada sobre ser fotografada, a entrevistada disse que eram muito comuns, como
fotografar um batizado na igreja ou um casamento. Que parte da iniciativa de haver fotógrafos
no terreiro vinha de seu Pai que tinha uma mente inovadora. Ela não soube dizer qual era o
fotografo que realizou as imagens, mas que ao que tudo indica, no começo da década de 1960,
Valdevir estava presente.
Escolhida por ela como a mais antiga de todas as fotos, a imagem de formato
horizontal em preto e branco representava Terezino ainda jovem no terreiro de seu Pai Miguel
grosso na Bahia. Essa foi uma representação de seu erê do Candomblé “Crispin” que o
acompanhou por toda a vida. De copo toda expondo todas as vestimentas comuns ao espírito
que esteve incorporado no momento da imagem, ela ainda acompanha inscrições ao verso
nomeando a entidade.
116
Escrever sobre o folclore, não teria sentido se omitisse o que há de mais puro,
mais significativo e de mais sensibilidade, que é o grupo Banzé. Um grupo
genuinamente montesclarense, que tem levado o nome de Montes Claros além
das fronteiras, através dos variados programas. O grupo que vem pesquisando
diversos campos-afrobrasileiros, o que vai pela Macumba, Catopês, Folia,
Guaiano, Quadrilha, Dança de São Gonçalo, Samba, Embola, Lundu e tudo
mais que possa interessar no ramo folclore que se dá na Zona rural. (BRASIL,
1983. p.158)
Parte das representações sobre as religiões de Matriz Africana, que foram objeto de
estudo até o momento surgiram de uma construção discursiva que as enquadravam como
folclore. Essas ligações às colocavam como aglutinada a manifestações populares da tradição
católica mantidas na cidade. Para tal modo, o Candomblé e a Umbanda foram apropriados em
diversos meios onde foi posto como “espetáculos” que o apresentava para a elite da cidade.
Desta forma, dois eventos foram postos a problematizações nesse período estudado:
As apresentações da dança “Macumba” realizada pelo grupo folclórico Banzé e o evento
“Uma noite na Bahia” proposto pela coluna social “Repórter em Sociedade” do Jornal “Diário
de Montes Claros”. Ambos os momentos foram estudados por meio dos relatos orais,
repercussão na imprensa, literatura e a instância maior de nossa pesquisa; a fotografia.
A ideologia regional-modernizadora que vigorava no momento em Montes Claros,
sobretudo na sua elite intelectual, política e econômica contribuiu para que essa visão fosse
mantida sobre essas religiões, perfazendo assim uma forma de entender como as
representações, incluindo os visuais, fossem gestadas e pensadas.
32
Para Rejane Meireles Amaral Rodrigues em Memórias em Disputa (2013) o discurso que revelava uma
necessidade de “modernização” na sociedade da cidade, esteve muito presente na imprensa no começo do século
XX. Ao entender esses discursos, a autora procura no embate que se instaurou em considerar as práticas
“campesinas” como antigas qualificando assim uma mudança no local.
118
até os anos 1980. Conforme o autor, acontece uma intensificação com a criação da Sudene 33
no ano de 1959.
Ao identificar tal alteração, Pereira (2007) percebe que já em meados da década de
1950 e 1960, o governo do estado de Minas Gerais desempenha políticas diferencias para com
a região, que tinha como Montes Claros com polo regional do local. Mais do que isso, esse
tretamento foi preenchido ao fato de a Sudene aderir a região, pois o órgão foi criado para
estabelecer um desenvolvimento do Nordeste. Para o autor, tal ligação da região ao conjunto
nordestino fortalecia ainda mais a ideologia regionalista desenvolvimentista.
A política de desenvolvimento levada a efeito pela Sudene, e pelo Governo do Estado
na região também, para Pereira (2007) contribui para formatar certas dinâmicas próprias na
economia regional. A região do norte de minas começou a ser delimitada ao longo de toda a
segunda metade do século XX, correspondendo a atuação da sudene, ou definida como
nordeste de Minas. Em outros momentos anteriores, ela abrangia outras regiões que eram
conhecidas como sertões das Minas.
Essa diferenciação também é histórica. Diferentemente da corrida mineradora que
abastecia a colônia portuguesa durante o século XVIII, o norte de Minas Gerais fazia parte
dos conhecidos sertões, que tem origem no século anterior e não mantinha atividades
mineradoras. Parte da Historiografia sobre o tema, como aborda Pereira (2007), ora evoca a
contribuição das bandeiras paulistas na colonização da área, ou ainda indica a participação
dos baianos na construção dos grandes currais ao longo do Rio São Francisco. O certo que a
região manteve se próxima tanto das grandes regiões das minas, enviando mantimento
produzidos na região, como um local de grande produção de pecuária extensiva.
33
A primeira tentativa de criação de um órgão de fomento ao desenvolvimento do nordeste do Brasil se deu com
o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN). Em 1958 o GTDN foi transformado em
Conselho de Desenvolvimento do Nordeste (Codeno) Criada originalmente pela Lei 3.692, de 1959, a Sudene
veio substituir o modelo dos dois órgãos precedentes a ela (GTDN e Codeno). Foi idealizada no governo do
presidente Juscelino Kubitschek, tendo à frente o economista Celso Furtado, como parte do programa
desenvolvimentista então adotado. Seu principal objetivo era encontrar soluções que permitissem a progressiva
diminuição das desigualdades verificadas entre as regiões geoeconômicas do Brasil. Para tal fim, foram
engendradas ações de grande impacto, tais como a colonização do Maranhão, os projetos de irrigação em áreas
secas, o cultivo de plantas resistentes às secas, entre outras. Absorvida pelas administrações que se seguiram,
durante a Ditadura militar foi tendo cada vez mais seu uso desviado dos objetivos iniciais, sendo considerada
uma entidade que, além de não realizar os fins a que se propunha, era um foco de corrupção. Por conta disso e
após uma sucessão de escândalos, em 1999 a imprensa iniciou um debate sobre a existência do órgão, extinto
finalmente em 2001 por Fernando Henrique Cardoso. A retomada das propostas de Juscelino e Furtado, porém,
foi defendida pela administração Lula, e finalmente o órgão foi, em 2002, recriado, desta feita com o nome de
Agência do Desenvolvimento do Nordeste e a sigla ADENE, ainda durante o governo Fernando Henrique
Cardoso.
120
2- RELIGIOSIDADE E FOLCLORE
regional e marco no calendário festivo e religioso do local. Elas sempre aglomeram dentro da
cidade festas de Divino Espírito Santo, Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito. Com a
participação dos reinados de cada um santo em acontecimentos de o total de uma semana.
Além da grande festa que envolvem a missa de casa santo, o seu reinado, conta ainda com a
congada, expressão que conta com agrupamento de Catopês, Caboclinhos e Marujos.
As expressões populares da cidade começam então a fazer parte na década de 1960,
berço das modificações políticas e culturais da região, como objeto de resgate das culturas e
“expressões folclóricas” regionais. É nesse seio que parte das elites começam a trabalhar na
valorização das práticas tidas como populares e marcá-las para utilizarem como característica
da cidade de Montes Claros.
Umas valorizações da tradição e dos costumes ganham destaque na obra do
memorialista Hermes de Paula, que em Montes Claros, sua história sua gente e seus costumes
(ano), sintetizam um variado aglomerado de informações de cunho memorial sobre a cidade.
Desde lendas, memórias, nomes políticos, mudanças na cidade e uma caracterização que
passa desde a história como a memória da cidade desde o elencado “Araiar das formigas” no
século XVIII. Ao certo, o memorialista também foi conceituado por Yvone Silveira e Maria
José Colares (1995), como historiador e folclorista.
Ao tratar em seu trabalho sobre as festas de agosto, Paula aponta o seu “surgimento
como elencado em 1839)”. Para o autor, a origem das festas religiosas na região de Montes
Claros inicia-se com a Construção da Capela de Nossa Senhora do Rosário a pedido da
Confraria dos Homens pretos. Como marco de origem, a acentralidade e antiguidade dos
festejos, o classifica como um grande momento de “importância” para a permanecia da festa
par o andamento da cultura e resgate ressaltando assim a permanência
Não, não acabem com a “festa de Agosto”. Ela é a única festa popular de
Montes Claros. Dansem Catopês, teçam cipós, caboclinhos; naveguem
marujos; corram cavaleiros! A diversão não é privilegio de uma só classe –
aquela que detém dinheiro. 434
A poesia traz dos festejos ganha um valor de beleza que corresponde a magia e valor
que a festividade traz. Mas é por meio de várias outras atividades que aparecem nesse
contexto social, principalmente mantida pela elite política e intelectual da cidade que o evento
passa a ser associado com aspecto da manifestação cultural e não apenas como expressão
religiosa.
Essa proposta ganha força anda como a sua vinculação ao ser recolocada como
manifestação cultural, seu conceito se expande nesse período, quando que a secretaria de
122
cultura da cidade passa a valorizá-la como motivo de resgate e cultura de seu povo.
Conceituando o evento, a historiadora Carla (ano) demonstra que,
Uma manifestação folclórico-cultural que acontece nas ruas por meio dos
catopés, marujos, caboclinhos, reinados e também em forma de evento com
apresentações musicais e folclóricas, além da Feira de Artesanato.
A partir disso, vários elementos compõem para tal situação, como a construção da
nova capela do rosário, criação do Conservatório de municipal de música, ambos em 1962,
criação do centro de estudos folclóricos, em 1963, grupo Banzé em 1968, festival folclórico
em 1978 e Centro de Extensão Cultural em 1979.
2.1 Conservatório
Consoante Yvone Silveira e José Colares Moreira (1995) 35 em março de 1961, o então
prefeito de Montes Claros, Simeão Ribeiro Pires, “entregou a chave de uma casa situada na
Rua Dr. Veloso 486”, para que fosse instalado o Conservatório que funcionou como
Municipal até a sua estadualização em 1962, com o nome Conservatório Estadual de Musica
Lourenço Fernandes. Para as autoras, “o edifício tinha como objetivo dar oportunidade para
todos os revelação de muitos, realmente artistas”. Finalizando assim, “ele se constitui um
marco cultural na vida de Montes Claros e oportunidade de muitas donas de casa saírem para
lecionar piano, canto, teoria musical e História da Musica” (pg.32). Dentro alguns nomes que
aprecem como professoras a própria autora citada, Maria José Colares de Moreira como
professora de História da Musica que posteriormente foi o nome principal por traz do grupo
folclórico Banzé.
Segundo as autoras foi por conta do Conservatório, juntamente com os estudos da
Cadeira de Folclore, “fez ressurgir as Festas de Agosto e logo a secretaria de Cultura
organizou o I Festival de Folclore, sob a direção de Clarice Maciel” (pg.34), tornando a fazer
parte do calendário das festas populares. Aglutinando aos festejos de agosto.
35
Como as autoras dizem, o trabalho de História trazia várias referencias de inúmeras divisões da cidade de
forma branda mais que juntamente com toda as fotografias que ilustravam a publicação soava como um conjunto
de produções de memória para a valorização da cidade. Contando história desde a sua origem no século XVII,
com o arraiar das formigas elas passam pelo dito “Montes Claros de ontem” com alguns órgãos como imprensa
e escolas elencadas como antigas e a cidade de “hoje” com outros elementos que circundam a vida social da
cidade como a imprensa, praças, a década de 1940 a sudene. Por último elas adentram o seu tema com maior
propriedade que era a cultura e as artes. Essa publicação do ano de 1995 traxia a intensão de “preservar o arcevo
de fotografias que nos chegou às mãos, doado pelo Sr. Zeca de Joel”. “Fotografias que representam fatos
ocorridos desde a formação do Município, e que serão lembrados, através delas, nesta síntese histórica, dando
destaque aos construtores do progresso”.
124
Uma das autoras que embora sido escrito no 30 anos após o momento estudado
participou das inúmeras instituições citadas anteriormente. Parte da escrita sobre a
necessidade de manter viva as tradições, remetem aos congados e outras manifestações
católicas as religiões de Matriz Africana. Não obstante a cultura, que até então era entendida
como ancestralidade negra e africana, ao poucos eram reduzidos a uma ingenuidade popular
que se tornava-se como uma única coisa a ser resgatada.
Ainda assim parte dessas ideias de preservar o folclore da cidade condicionando sua
ligação ao Candomblé e a Umbanda. Henrique de Oliveira Brasil em 1983, no seu livro de
análise geográfica e espacial sobre a cidade História e Desenvolvimento do de Montes Claros,
aponta,
127
Esse mesmo pensamento foi mantido ainda na década de 1980 com os dizeres do
autor. O candomblé e Umbanda não é ainda religião, mas manifestação popular. E sobre essa
ótica que consideramos a seguir analisar o grupo Banzé e sua participação e contribuição para
tal pensamento.
3-GRUPO BANZÉ
Trazendo elementos escolhidos com base nessas pesquisas, o terreiro Oxóssi Caçador
fez parte dessas apresentações através do espetáculo “Macumba”. Conforme Regina que
participou do projeto, a dança tinha várias referencias a cultura dos orixás que a aproximação
de Zezé Colares com o terreiro de Terezinho. Isso ocorre em meados da década de 1970 e
não explicitando uma data correta para tal evento. O certo é que o espetáculo continua sendo
apresentado até os dias atuais como repertório do grupo.
A entrevista ainda conta que por meio dessa aproximação, vários instrumentos foram
emprestados do terreiro, e que o grupo ainda chegou a ter participação dos Ogãs no seu grupo
de participantes. Somado a isso, o espetáculo era apresentado juntamente com as primeiras
apresentações mantidas durante os 10 anos inicias do grupo de Zezé Colares. Juntamente com
o espetáculo votado aos catopés, Marujos e caboclinhos, Pastorinhas e a Macumba como
repertório. De inicio, o grupo se configurou como apenas ensaios que pretendiam ser
executadas em eventos do conservatório e depois da prefeitura, mas posteriormente com a
exteriorização do grupo as apresentações eram feitas em outras cidades de Minas e depois em
todo o Brasil.
No candomblé de Pai Terezinho, o grupo encontrou uma forma de valorização de
práticas elencadas como “folclóricas” e aproximava-se assim a outros espetáculos que tinham
como a intensão a reprodução de práticas regionais. Como foi o caso das danças inspiradas
nas festas de Catopês, Marujos e Caboclinhos elementos religiosas das festas populares de
agosto na cidade.
No histórico feito sobre o sacerdote no livro, Montes Claros ontem e Hoje as autoras
apontam as relações próximas de Terezino com o grupo Banzé e como uma “personalidade”
para a cidade. Conforme tal escrito,
José Fernandes também ganhou espaço, a relatá-lo como famoso “Pai de Santo” que
fez sucesso com seu terreiro de umbanda, muito frequentado pelos montesclarenses e pessoas
da região. O Banzé foi várias vezes ao terreiro, para aprender as danças com as baianas ou
filhas de Santo, e a tocar o atabaque, reconhecendo, por isso a cooperação do “Pai de Santo”
José Fernandes.
Mantidas hoje na Fundação Banzé, ainda pelo neto da Fundadora Maria José Colares
Moreira. Existem algumas fotografias da década de 1970, com a representação do espetáculo
“Macumba” idealizada durante o inicio do grupo.
Parte dessas fotografias foi por muito tempo exposta no museu do folclore e Centro de
Tradições mineiras, que foi administrada pela Zezé Colares em Parceria com a Unimontes.
As duas imagens coloridas, demostram uma visão diferenciada sobre todo o conjunto
de fotografias apresentadas na pesquisa. Por conter cores, presumimos que se trata de
produções um pouco mais elaboradas devidas o uso de cores ser muito mais caro na década de
1970. Com isso, o fator de o Banzé ser um instrumento da elite intensifica tais questões sobre
elas.
Em tamanho médio, no sentido horizontal, o autor das representações da dança foi
Rilson Santos, já apresentado no primeiro capítulo do trabalho mantendo trabalhos como
fotojornalista, estúdio fotográfico e eventos sócias da cidade. Todas as outras fotografias
subsequentes foram feitas no mesmo dia de apresentações da “Macumba”, realizadas no
Centro cultural de Montes Claros, espaço mantido como teatro e atividades culturais.
Parte das imagens serem coloridas serve justamente para ressaltar o que a dança
conduz a ideia de pluralidade que o Candomblé se propõe. É um recurso que foi utilizado
pelas “Baianas”, termo apontado por Regina para apontar alguns dos personagens que
aparecem no espetáculo. Além delas temos a baiana do centro, que representam uma Yaô em
processo de iniciação e os orixás que não foram muito bem delimitados nesse período,
aparecem como figuras diferenciadas nas vestimentas como na primeira imagem como uma
132
“cabocla”, e nas demais fotografias uma figura próxima ao orixá Oxosse, patrono do terreiro
de Terezinho Nery.
Os movimentos se referem a “gira” no Candomblé que apontam para um movimento
muito usual e próprio da liturgia religiosa. Não existe candomblé sem dança, e por isso a
reprodução da dança, transmitida pela fotografia refere-se a esse modo de dançar. Onde uma
roda coesa é criada dançada pela “muzenzas”, no caso do espetáculo, pelas baianas e ao
centro um personagem místico está sendo referenciado como um orixá, caboclos e no caso
específico da primeira imagem, a iniciada.
Para ainda refletir tal postura, a ideia de ritual que o espetáculo causava, elementos
como a vela refletem essa capacidade de “absorver” a tradição religiosa do Candomblé. Tais
elementos foram reproduções de algumas danças da casa “Oxosse Caçador”.
Enunciando um aspecto de ritual as imagens transmitem esse ponto de revelar a
espiritualidade do candomblé a partir de suas representações performáticas do espetáculo.
Logo, a imagem não tem esse peso espiritual trabalhado, sobretudo com as fotografias dos
rituais da casa de Teresino no primeiro capítulo.
O espetáculo foi remodelado durante a década de 1980, que segundo Gustavo Colares,
com uma ajuda de uma coreografa de Belo Horizonte colocou movimentos e outros elementos
que aproximavam da Bahia. O que faz se pensar que aos poucos as lembranças da macumba
estavam ligadas a essas mudanças mais próximas dos dias atuais. Ainda assim, essa nova
“versão” da dança ganhou um prémio estadual, esse nome o manteve com uma apresentação
atual.
As imagens que representam o “espetáculo” apresentados no Museu Folclórico, as
tornam conforme Ivete Batista da Silva Almeida em As religiões de Matriz Africana na Mira
da Imprensa Ilustrada em;
Tomada como testemunha da verdade, a imagem potencializa a
representação do real, permitindo a exposição, ou mesmo a
superexposição dos indivíduos de maneira espetacular, reconstruindo o
mundo e mesmo auxiliando na criação de estereótipos, ou seja, de modelos
reducionistas, a partir de uma intensa oferta de recortes, selecionados,
enquadrados e organizados, a serviço dos princípios ideológicos que
norteiam a elaboração de uma narrativa quase que teatral sobre o outro
(ALMEIDA, 2018. p.5)
Acerca do evento, foi uma proposta do colunista social, Teodomiro Paulino37, que
assinava a coluna “Repórter em Sociedade”, mantida pelo Jornal Diário de Montes 38 Claros ao
longo dos anos de 1960 à 1970. Atuando hoje no periódico “Jornal de Noticias", o jornalista
retratou algumas informações consoantes as suas promoções que tinham como objetivo a elite
da classe média da cidade naquela época. Por isso, ao tratar desse evento, ele rememora que
faziam diversos outros bailes temáticos, sempre no edifício Automove Clube e o Maxmin
Clube, ambos os espaços que eram frequentados pela camada mais alta da região.
A festa era mantida como evento importante para a sociedade, e foi realizada com
algumas modificações ao longo de 10 anos, conforme sua própria fala. Para descrever com
melhor clareza tal evento, a impressa do momento, principalmente os trabalhos do colunista,
surgiram como forma importante para descrever o evento.
Desde sua primeira edição, no ano de 1966 em fevereiro próxima do Carnaval. As
temáticas da Bahia com elemento comumente referido ao estado eram colocadas postos ao
lado de apresentações dos terreiros de José Fernandes e de Terezinho. Conforme o próprio
colunista, os sacerdotes também participavam da curadoria do evento, juntamente com a
decoração realizadas pelos próprios. A proposta das apresentações que recriavam os rituais
era uma forma de associar elementos culturais baianos e ainda uma visibilidade para a prática
da cidade com sua apresentação para o mundo.
Na primeira edição em nota na coluna “Reporter em Sociedade” os preparativos
apontavam para a “autenticidade da festa” desta forma;
José Fernandes Guimarães que muito nos tem ajudado nessa promoção,
seguirá sábado para a Bahia onde assistirá a festa do Bonfim e tratar de
assuntos relacionados a grande noite. PORTANTO, temos certeza que nosso
“top-set” viverá no próximo dia 22, realmente UMA NOITE NA BAHIA.
(DIÁRIO DE MONTES CLAROS, 11 de Janeiro de 1966)
37
Theodomiro Paulino iniciou a carreira de colunista social no Diário de Montes Claros, em 1965, onde
permaneceu até a intuição do mesmo, passando para o Jornal do Norte. No qual continua fazendo comentários
dos acontecimentos sociais promovendo festas famosas como Personalidades do Ano, Glamour Girls, Destaques
Jovens, Brotos do Ano. Tinha como foco as listas sobre “As dez mais elegantes eram famosas, movimentadas a
cidade, esperava, ansiosa, os nomes das escolhidas, publicadas com fotografias, na Revista Montes Claros em
Foco, de Atalília Machado”. Em suas festas, a autora aponta para o destaque de “visitantes ilustres” como
govenador, artistas, empresários e misses. Ganhou medalha da Inconfidência, homenageado pela prefeitura entre
outro prémios. (SILVEIRA e MOREIRA, 1995)
38
Diário de Montes Claros, fundado pelos jornalistas Décio Gonçalves e Júlio Melo Fanco, surgiu no dia 20 de
maio de 1962, que tinha uma periodicidade de 3 vezes por semana. Fazia parte da Empresa S. A. Gráfica Editora
de Jornais /SAGRES. Presidida pelo Sr. Euler de Araújo Lafetá e contava com setenta acionistas. (SILVEIRA e
MOREIRA, 1995)
136
Para ainda despertar no leitor uma valorização do evento, a nota ainda aponta que a
“noitada vem sendo bastante comentada em sociedade prometendo mesmo superar Moc
colonial” 39
. Apontando uma nova festa também promovida pela coluna social, o evento
destaca o cotidiano da cidade, onde parte da visibilidade dada a Umbanda de José Fernandes
transparece a sociedade.
Na mesma edição, mas agora na coluna “Repórter em Sociedade” a o evento foi mais
uma vez noticiado como primeira nota da coluna. Aguardado para o “próximo sábado” a festa
onde “Montes Claros se deslumbrará num ambiente de requinte e originalidade”. Para a nota
do dia 15 de janeiro de 1966, o show “terá como ponto alto uma demonstração de Macumba
com os seus participantes usando riquíssimas trajes de padrões”. Nessa nota, o peso dado as
apresentações da Umbanda foram maiores.
No dia 18 de janeiro, outra nota informa a presença de José Fernandes que havia
“regressado da Bahia” com a decoração e baianas necessárias. O médium tem grande valor
aqui por conta tanto da sua sabedoria como Pai de Santo, como decorador do evento. Após tal
nota, a coluna notícia em mais duas edições o evento, sempre acompanhado de uma
caracterização, e como foi feito em todas as notas do mês de janeiro, era o primeiro assunto
do Colunista no seu espaço do Jornal.
E assim, no dia 27 de janeiro, Quinta-feira 40, Teodomiro informa do sucesso de sua
festa, que ainda aparece na coluna social, e no seu espaço desta mesma, conforme imagem;
Com agradecimentos diretos ao José Fernandes, o colunista demonstra o valor que a
apresentação organizada teve ao mostrar o “Candomblé” de forma discreta e simplicidade e
com muito bom gosto. Isso de fato, demonstra como era essa apresentação do ambiente
religioso festivo feito por José Fernandes para essa sociedade. Confirmando ainda, em relato
mantido tanto pelo colunista em entrevista durante o trabalho, as apresentações não tinham
teor religioso, mas era uma representação do que era feito em Terreiro.
Mãe Duca, afilhada de José Fernandes e sacerdote, apresentada no capítulo anterior
também comentou sobre a “Noite na Bahia” descrevendo como um momento muito
significativo para seu padrinho, e que as apresentações eram feitas pelos frequentadores e
afilhados do terreiro “Filhos de Pai Gonzaga”. Sendo que as apresentações eram feitas por
vestimentas de baianas e sem fins religiosos, mas performático. Acerca de tal evento, Mãe
39
Moc colonial, também foi um baile produzido pelo colunista Teodomiro Paulino. Ao longo das edição do
Periódico “Diário de Montes Claros” de 1966, identificamos outros eventos, como o “Encontro de Jovens” e
“Glamour Girls” . Todas amplamente divulgadas na sua coluna .
40
Não estavam disponíveis as edições de segunda-feira no arquivo procurado. Por isso, não foi possível analisar
a reação ao evento logo após o seu dia de execução, no dia 23 de Janeiro, domingo.
140
Duca contém uma fotografia, que foi apresentada na pagina ????? Onde foi nesses eventos
promovidos no Automóvel Clube, que ocorreu o registro.
Notas sobre a Noite da Bahia aparecem em mais quatro edições do periódico no ano de
1966. Na última delas, no dia 18 de outubro, promovendo o seu novo evento “Moc Colonial”
que segundo a reportagem, remetia a temática colonial brasileira. Rememorava o evento de
janeiro como “a melhor festa de todos os tempos” em Montes Claros, e por isso seria também
decorado pelo sacerdote José Fernandes. Em entrevista, Mãe Duca, confirmou que seu
padrinho fez trabalhos como decorador para além da temática afro-brasileira, e que manteve
essa atividade por muito tempo. Em outros momentos, José Fernandes também aparece na
coluna exaltando seu dom de decoração.
Finalizando o ano de 1966, em uma retrospectiva dos acontecimentos propostos pela
coluna social de Teodomiro Paulino, foi recordado a “Noite da Bahia” como a “melhor já
realizada em Montes Claros em todos os tempos”. Reafirmando ainda a presença de “Baianas
autenticas”, e reafirmando o show de Macumba apresentado pelo Sr. José Fernandes e seu
terreiro.
A festa dedicada ao ano de 1967, já contava com a participação de apresentações
chefiadas pelo sacerdote do Candomblé, Terezino Nery Santana. Isso aumenta assim, nossa
construção da pesquisa onde a figura dos dois se igualavam para uma representação única
sobre o candomblé e a Umbanda na cidade.
A festa continuou sendo realizada até o ano de 1975, de acordo com entrevisto
realizado com o colunista social. Conforme as análises feitas com as publicações do “Diário
de Montes Claros” os anos que obtivemos foram 1966, 1967, 1969 e 1973. Todos aparecem
noticiários sobre o evento, com qualificações e características análogas as apresentadas até o
momento.
Com a coluna do dia inteiramente dedicada as explicações sobre as apresentações
religiosas foram descritas em dois momentos justamente para o evento, no dia 22 de setembro
141
sagradas. Tal ideia remete as temáticas trabalhadas no primeiro capítulo da pesquisa, com a
reportagem ilustrada da revista “Encontro”. Destacando, o ritual em seu lado oculto, a
proposta chama atenção ao “proibido” e exótico, termos constantemente utilizados por muito
tempo ao representar tais religiões.
Após isso, outros elementos foram introduzidos na narrativa, como objetos “garrava
com azeite de dendê, farofa e copo de cachaça” e com o sagrado “Exu” e seu papel de abrir o
ritual, a sua licença. O poder dos atabaques foi descrito, como importante para a dança que foi
o grande destaque dado a cerimônia. Com isso “as filhas cantam para todos os orixás... da sua
mãe que se senta perto da orquestra e sacode o ajjá”.
Com o final de toda essa descrição, somado a imagem que acompanha a matéria
dentro da coluna “Repórter em Sociedade”, estabelece-se assim, uma narrativa que revela ao
público uma dimensão nova sobre as apresentações, que ao serem explicadas renovam as
representações que foram descritas anteriormente com as notas publicadas sobre a festa no
ano de 1966. Agora, se o espetáculo de “Macumba” era parte do acontecimento do evento,
aqui nessa nota, ele se torna o alvo principal do entretenimento que a festa iria proporcionar.
Parte dessas ideias forma ainda ressaltada ao estabelecer que a festa trouxesse toda a
“beleza folclórica do candomblé sendo mostrada”. “Essa narrativa ainda se associa ao fato de
o evento, depois de alguns anos serem feitos foi transformado tradicional no calendário social
de Moc”. Além disso, a associação do Candomblé a baia foi feita, onde o Candomblé e algo
pertencente apenas ao estado, utilizando toda cultura baiana a reduzindo com uma religião
que tem em suas representações diretas a cultura regional deste lugar.
No dia 16 do mesmo mês, outra nota na coluna, agora já apontava para apelativos
elementos tradicionais da Bahia, como o pelourinho, a cidade baixa e o farol da barra que
aparecem com prenúncio do evento. E desta forma o convite se torna variado conforme o
anteriormente descrito. E sempre acompanhado do Show de Macumba, que seria realizado.
Considerações Finais
143
folclore, sobretudo com o ajuda do grupo Banzé e outros elementos que os circulavam. Isso
fez com que essas religiões fossem olhadas mais como símbolos das tradições da cidade e aos
poucos foram aglutinados entre as manifestações populares.
Esse resgate advém do entendimento intelectual do período histórico do qual estudamos.
As manifestações populares eram vistas, que prevaleceu no Brasil, durante muito anos foi
estabelecido a partir da Carta do Folclore Brasileiro, escrita durante o I Congresso Brasileiro
de Folclore, em 1951. O manifesto reconhecia o fato folclórico como “maneiras de pensar,
sentir e agir de um povo, preservadas pela tradição popular e pela imitação”. Esse vínculo não
estava ligado ao que o autor colocava como círculos eruditos. Além de que vários termos os
caracterizavam como tradicionalidade, espontaneidade, funcionalidade e regionalidade.
Esse discurso advém quando o folclore foi relacionado a identidade brasileira, foco de
resgate cultural que a intelectualidade do país procurava ressaltar no início do século XX. O
negro, o indígena, o sertanejo passaram a serem incluídos com o projeto de nação da república
brasileira. Por meio dessa constante preocupação a literatura e intelectuais voltam-se para as
manifestações populares buscando uma “autenticidade” que representasse essa beleza de “ser
brasileiro” (GOMES, 2008).
Assim, como partem de uma transformação de representações, os dois terreiros foram
associados a esses discursos nas apresentações de suas produções fotografias, e por meio
delas que identificamos como essas representações de beleza e requinte foram somadas a
serem tradição, manifestações populares, folclóricas e africanas.
Foi por meio da imagética que se construiu essa visão, elementos que tanto tiveram
ligação a produções nacionais, como eram temáticas constante em revistas ilustras, Cruzeiro,
como em acontecimentos regionais, na festa Noite na Bahia. O que fazem entender que a
Umbanda e o Candomblé foram ligados ao um objeto de “espetáculo” e “entretenimento”. Foi
pela beleza, pelo “requinte” que essas religiões forma lembradas. Ao que entendemos que, por
mais que essas religiões tentaram se reconhecidas em na sociedade de Montes Claros, elas
foram aceitas por meio de seu “requinte” das manifestações, mas não como “sagradas”.
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TACCA, Fernando Cury. O Cruzeiro versus Paris Match e Life Magazine: um jogo
espetacular. 2009.