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Transitando por várias cidades do País, é possível observar seres humanos vivendo e dormindo
nas ruas, a maioria embaixo de viadutos e marquises. Tal constatação, por si só, denota grave
violação aos direitos humanos dessas pessoas, que não possuem moradia, meios de subsistência e
nenhuma ou muito pouca assistência a suas necessidades básicas.
Como é sabido, higiene e saúde estão assaz distantes das pessoas em situação de rua. E para
agravar o problema social evidenciado, grande parte delas consome drogas com frequência,
havendo enorme quantidade de casos de dependência química, fato que leva os viciados a viverem
para as drogas, deixando, inclusive, a própria alimentação em segundo plano, porquanto escravas
do entorpecente.
Nos abrigos oferecidos pelo poder público pode-se constatar pessoas desprovidas de emprego,
família, vítimas de violência, acometidas de doença mental e, sobremaneira, usuárias de álcool e
outras drogas. Neste sentido, mister se faz o atendimento em pequenos grupos, individualizado,
sob pena de ineficácia.
Contrárias às recomendações legais, o que se tem visto é a opção, pelo poder público, de
verdadeiros depósitos humanos, onde as pessoas permanecem misturadas, inclusive com perigo
de contágio de moléstias graves. As operações realizadas pelo Poder Público, no sentido de
conduzir as pessoas em situação de rua para tais abrigos, parecem evidenciar a intenção de
"higienização" dos logradouros públicos, em franco descumprimento às garantias constitucionais.
A idéia de um abrigo único também deve ser afastada. O atendimento em massa dessa parcela da
população que tem em comum a pobreza, porém aliada a variados fatores, impede um
atendimento eficaz. Na Cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, o "abrigão" "Rio Acolhedor I",
situado em Paciência, registrou, ao longo de 2010 a 2012, cerca de 60 mil entradas, muitas delas
por uma mesma pessoa, o que demonstra a má qualidade da política de atendimento.
Vale ressaltar, ainda, que em resposta ao ofício expedido pela Coordenadoria de Direitos
Humanos do Ministério Público, questionando a má localização do "Rio Acolhedor I", o comando
do 27o Batalhão de Policia Militar informou que, no último ano, nas imediações do "abrigão", a
policia capturou mais de 250 marginais, e apreendeu mais de 80 armas de fogo, entre fuzis,
pistolas e submetralhadoras, além de mais de uma tonelada de maconha e 150 kg de cocaína.
Convém assinalar que, no caso de pessoas viciadas em droga, e o tema está em voga diante da
enorme quantidade de pessoas dependentes de "crack", a Lei nº 10.216/2001 autoriza a sua
internação compulsória, desde que determinada pela Justiça, somente mediante laudo médico
circunstanciado que caracterize os seus motivos, quando os recursos extra-hospitalares se
mostrarem insuficientes, e sempre levando em conta as condições de segurança do
estabelecimento quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários. Vale
dizer, a internação compulsória destina-se a casos extremos, quando nenhuma outra medida
mostrar-se eficaz. A hipótese é recomendada como medida excepcional.
A lei também prevê a internação involuntária, aquela que se dá sem o consentimento do usuário
de droga, e a pedido de terceiro. Embora, em tese, prescinda de decisão judicial, a questão também
é cercada de debate, o que não será, aqui, explorado pela Coordenadoria de Direitos Humanos.
A internação voluntária, como o nome já diz, é aquela que se dá com o consentimento do usuário.
A celeuma envolta sobre o tema da internação, entre outros aspectos, reside no fato de o Poder
Público retirar inúmeras pessoas das ruas contra a vontade delas, mesmo as pessoas capazes, o
que esbarra no direito fundamental de liberdade ambulatorial do ser humano, levando-as para um
determinado local desprovido de suporte mínimo assistencial.
De se frisar que, mesmo nas hipóteses de internação, a lei nº 10.216/2001 prevê as seguintes
exigências:
"Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou
responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste
artigo.
II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde,
visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua
hospitalização involuntária;
VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;
VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
Art. 5º O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize situação de grave
dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será
objeto de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob
responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de instância a ser definida pelo
Poder Executivo, assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.
(...)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
(...)
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
(...)
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
(...)
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
(...)".
Deve ser enaltecido que o art. 6º, da Constituição da República, prevê explicitamente a assistência
aos desamparados como direito social.
III - respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de
qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação
vexatória de necessidade;
V - divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos assistenciais, bem como dos
recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua concessão.
(...)
(...)
(...)
Art. 23. Entendem-se por serviços socioassistenciais as atividades continuadas que visem à
melhoria de vida da população e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os
objetivos, princípios e diretrizes estabelecidos nesta Lei.
§ 2º Na organização dos serviços da assistência social serão criados programas de amparo, entre
outros:
I - às crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social, em cumprimento ao disposto no
art. 227 da Constituição Federal e na Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e
do Adolescente);
(...)
(...)
Art. 31. Cabe ao Ministério Público zelar pelo efetivo respeito aos direitos estabelecidos nesta lei."
O Decreto nº 7.053, de 2009, instituiu a política nacional para a população em situação de rua.
Vale conferir algumas de suas normas:
"Art. 1º Fica instituída a Política Nacional para a População em Situação de Rua, a ser
implementada de acordo com os princípios, diretrizes e objetivos previstos neste Decreto.
Parágrafo único. Para fins deste Decreto, considera-se população em situação de rua o grupo
populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares
interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os
logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma
temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou
como moradia provisória.
Art. 2º A Política Nacional para a População em Situação de Rua será implementada de forma
descentralizada e articulada entre a União e os demais entes federativos que a ela aderirem por
meio de instrumento próprio.
(...)
Art. 5º São princípios da Política Nacional para a População em Situação de Rua, além da igualdade
e equidade:
III - articulação das políticas públicas federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal;
V - integração dos esforços do poder público e da sociedade civil para sua execução;
VII - incentivo e apoio à organização da população em situação de rua e à sua participação nas
diversas instâncias de formulação, controle social, monitoramento e avaliação das políticas
públicas;
I - assegurar o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as
políticas públicas de saúde, educação, previdência, assistência social, moradia, segurança, cultura,
esporte, lazer, trabalho e renda;
VII - implantar centros de defesa dos direitos humanos para a população em situação de rua;
X - criar meios de articulação entre o Sistema Único de Assistência Social e o Sistema Único de
Saúde para qualificar a oferta de serviços;
(...)
IV - propor medidas que assegurem a articulação intersetorial das políticas públicas federais para
o atendimento da população em situação de rua;
VI - instituir grupos de trabalho temáticos, em especial para discutir as desvantagens sociais a que
a população em situação de rua foi submetida historicamente no Brasil e analisar formas para sua
inclusão e compensação social;
VIII - organizar, periodicamente, encontros nacionais para avaliar e formular ações para a
consolidação da Política Nacional para a População em Situação de Rua; e
(...)
Art. 15. A Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República instituirá o
Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos para a População em Situação de Rua,
destinado a promover e defender seus direitos, com as seguintes atribuições:
Perfil dos acolhidos referente ao uso de crack e outras drogas, atendidos no período de
Janeiro de 2011 a Abril de 2012
Origem da abordagem dentro do Município do Rio de Janeiro.
Uso de crack e outras drogas e Estado de origem