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Perspectivas de Gerenciamento da Diversidade no

Trabalho Doméstico
Publicado em : 10/03/2017
Autor : Amália Raquel Pérez*

Farei uma paródia do capítulo que escrevemos sobre Diversidade Cultural no


Contexto Organizacional. A relação de desigualdade existe tanto no trabalho
quando no ambiente doméstico. Isto posto. Esta relação tem mudado nos
últimos 10 anos? Muito pouco. Nos últimos 30 anos? Também não, pelo menos
os dados do DIEESE, que datam a partir de 1985 tem se mostrado bastante
estáveis, infelizmente. Não acredito que os espaços de trabalho da mulher
continuam estáveis nos últimos 30 anos, mas as mudanças ainda são pouco
perceptivas por diversos motivos e mostram que a discriminação de sexo ainda
é bastante presente.

Gostaria, assim, de colocar algo que sempre aparece em sala de aula e em


pesquisas (e.g. Instituto Avon) quando vamos falar de sexismo: um viés curioso
chamado “melhor do que a média”, na prática isso quer dizer, todos sabem que
o machismo existe, mas raros se percebem praticando-o, outro ponto é quando
por vezes percebemos discursos reproduzidos onde nós mulheres também
discriminamos, evidentemente não é um comportamento consciente, mas como
todo processo discriminatório, é aprendido de forma muito arraigada e afetiva.
Raras mulheres que trabalham aceitariam se casar com um homem que não
trabalha e quer cuidar da casa. Igualmente, mulheres raramente casam com um
homem que ganha 1/10 do que ela ganha, os homens responderiam sim para
ambas opções. Também não aceitamos bem o trabalho masculino em casa, nem
nos cuidados com as crianças. Resolvemos esta dissonância cognitiva com o
discurso de que “ah, mas ele não sabe, ele não dá conta, ele…” e mantemos os
papéis clássicos do homem e da mulher na casa (arranjo que aparece até em
casais homossexuais), no trabalho… e ainda culpamos os homens ou “a
sociedade” desconsiderando que somos parte dela. Veja, que fique claro que
não estou dizendo que a violência doméstica ou que a discriminação contra nós
é culpa nossa, não é isso (não tenho nenhum instinto masoquista). Estou
dizendo que também devemos refletir sobre pontos.

Portanto, sugiro que comecemos a mudar a perspectiva de gerenciamento da


diversidade doméstica: mudando em casa, se pode mudar fora de casa. O
ambiente familiar é um primeiro e bastante arraigado espaço de relações de
gênero. Não só na relação homem-mulher, mas também mãe-filho, irmãos.
Hoje ainda estamos na perspectiva da Discriminação-e-Justiça. Ou seja, é um
pensamento que está por trás dos tradicionais esforços de ação afirmativa, algo
como: “vamos fazer com que ele faça algo em casa”. Mas esta perspectiva é
limitada, pois ele só joga o lixo fora sem se dedicar às atividades que levam
mais tempo, trabalho e demandam mais treinamento. Poderíamos evoluir para
a perspectiva do Acesso-e-Legitimidade, nela, o mote está na aceitação e
celebração das diferenças. Vamos entender que homens e mulheres são
diferentes e podemos valorizar o jeito de cada um ser, do ponto de vista
doméstico: muitas vezes valorizamos a higiene ao invés da brincadeira, mas em
que nível de fato isso é mais importante? A perspectiva mais contemporânea e
progressiva em diversidade cultural é Aprendizagem-e-Efetividade onde se
pode falar da perspectiva da integração que vai além de reconhecer e valorizar
a diferença. Demanda certo trabalho no início, em especial de planejamento,
entendimento, diálogo e vontade de trabalhar junto para decidir quem faz o quê
e quem quer aprender a fazer o quê (portanto, levará seu tempo e precisamos
estar abertos aos erros). E você? Que perspectiva de diversidade você tem
adotado? Como ela tem funcionado nas suas relações domésticas e fora de casa?

Gostaria de agradecer aos comentários de Hugo Sandall, Marina Kohlsdorf e


Fabiana Queiroga.
*Doutora em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações pela
Universidade de Brasília, com estágio sanduiche na Universidade Autónoma
de Madrid. No Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) sou professora do
Programa de Pós-graduação em Psicologia, na linha de pesquisa de saúde,
onde oriento mestrados, leciono e desenvolvo pesquisas na área de saúde no
trabalho. Atuo nas áreas de psicologia do trabalho, psicologia social aplicada,
organizacional e do consumidor. Meus interesses incluem absenteismo e
presenteísmo, adoecimento e violência no trabalho, bem estar sustentável e
enfrentamento do estresse no trabalho, adotando uma abordagem
metodológica mista (qualitativa e quantitativa). Sou associada à SBPOT desde
a sua fundação e fiz parte da Comissão Científica do VII CBPOT

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