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Preservação da saúde e prevenção de acidentes de

trabalho: a urgência da Psicologia nesse contexto


Publicado em : 05/08/2016
Autor : Profª Drª Magda Macedo Madalozzo* – Universidade de Caxias do
Sul

Os avanços tecnológicos desenvolvidos nas últimas décadas têm


proporcionado melhorias inquestionáveis nas condições de vida no
planeta. Todavia, as mudanças comportamentais não acontecem na mesma
velocidade das mudanças tecnológicas. Um exemplo pode ser observado
nos avanços técnicos relativos a métodos e procedimentos ligados a
sistemas de gestão de segurança no trabalho. Eles parecem acontecer
numa velocidade maior do que aqueles que investigam fatores ligados à
subjetividade humana nesse contexto, quer em nível individual ou coletivo.
Em pleno século XXI ainda é possível escutar a expressão: -“É psicológico;
então não existe”, em referência ao psicológico como mera fantasia. No
entanto, trata-se de uma crença que, além de leiga, é perigosa, pois
evidencia o poder da negação de riscos a que todos continuamos sujeitos.
Nesse sentido, os conhecimentos desenvolvidos na (e pela) Psicologia são
valorizados, pois, as modernas tecnologias de proteção, para serem
efetivas, dependem das formas de utilização por parte dos indivíduos.

Compreender a complexa interação entre as variáveis do sistema sócio-


técnico, especialmente em contextos organizacionais, tanto na dimensão
individual e intrapessoal, quanto nos processos de interação interpessoal,
intergrupal, organizacional e ambiental, constituem objetos de estudo e de
intervenções da Psicologia.

Estudos e práticas de intervenção como aqueles desenvolvidos por Edgar


Schein (1928-), psicólogo organizacional, ampliam conhecimentos quanto
a suposições, crenças e valores junto às organizações. A compreensão
desses processos psicossociais pode contribuir para a construção de
intervenções a serem utilizadas pela Psicologia da Saúde Ocupacional, ou
por qualquer outra área que tenha como interesse a promoção da saúde
integral.

No cotidiano do trabalho, essas ações devem passar pela identificação dos


verdadeiros valores e pressupostos que sustentam as formas de pensar,
sentir e agir em determinado contexto, identificando em que medida
estimulam efetivamente práticas de cuidado uns com os outros e a
perpetuação organizacional sustentada na preservação da saúde
individual e coletiva. Para compreendê-los, é necessário conhecer os
aportes teóricos referentes à cultura organizacional e suas possíveis
relações com cultura de segurança.

Os estudos e as pesquisas desenvolvidas nessa área auxiliam a identificar,


compreender e intervir em níveis que estão além do manifesto no
cotidiano organizacional (como é o caso das crenças e valores relativos à
segurança) e descrevem etapas para a implementação de ações que
fortaleçam culturas de segurança nos contextos de trabalho reforçando a
necessidade de uma abordagem científica para a identificação da influência
de aspectos subjetivos ligados à saúde e segurança. Os estudos auxiliam a
obter maior clareza com relação a complexa cadeia de fatores facilitadores
e/ou dificultadores da ocorrência de comportamentos seguros por parte
dos integrantes de uma organização. Também possibilitam explicitar e
fazer refletir sobre as graves consequências dos processos de negação ou
percepção empobrecida de riscos, tanto em nível individual quanto grupal,
organizacional e social. Para se ter uma ideia dessas influências, basta
recordar as sequelas deixadas pelo incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria,
em janeiro de 2013, ou pelo rompimento da barragem de rejeitos de
minério de ferro de Fundão, em Minas Gerais, em novembro de 2015
(dentre outros), ambos ocorridos em consequência de uma série de
eventos e processos de incubação de erros, ao que tudo indica, acumulados
e repetidos há anos. E continuam a acontecer em um funcionamento social
de negação de riscos. Será preciso mais motivos e evidências para justificar
ações e estudos que explicitem, questionem e trabalhem as crenças que
sustentam modos doentios de agir social, político e econômico?

*Doutora em Psicologia das Organizações e do Trabalho pela Universidade


Federal de Santa Catarina, possui Mestrado em Administração de Empresas
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Pós-Graduação Lato Sensu
em Psicologia Organizacional pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul , Graduação em Psicologia pela Universidade de Caxias do Sul
(CRP-07/02626) e Graduação em Administração de Empresas pela
Universidade de Caxias do Sul. Atualmente é docente na Universidade de
Caxias do Sul (RS) e outras IES, em cursos de Graduação e Pós-Graduação.
Consultora organizacional. É autora do livroSegurança no Trabalho: A
construção cultural dos acidentes e catástrofes no cotidiano das
organizações. Uma perspectiva da Psicologia, publicado pela editora Juruá,
em parceria com o prof. José CArlos Zanelli.

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