Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Uma Narayan
ele não é nosso único inimigo e de que as estruturas não positivistas não são,
por força dessa simples condição, mais dignas de nossa tolerância. A maior
parte das estruturas tradicionais que as feministas não-ocidentais conside-
ram como opressivas para as mulheres não são positivistas e seria errado ver
a crítica da epistemologia feminista ao positivismo como tendo a mesma
importância política para as feministas não-ocidentais como tem para as fe-
ministas ocidentais. As tradições como a minha, nas quais a influência da
religião é penetrante, são completamente inundadas por valores. Precisamos
combater não as estruturas que afirmam a separação entre fato e valor, mas
aquelas que são permeadas por valores contra os quais nós, como feminis-
tas, nos opomos. No Ocidente, o positivismo floresceu na epistemologia ao
mesmo tempo que o liberalismo na teoria política. A visão do positivismo
sobre o valor como algo individual e subjetivo correspondia à ênfase políti-
ca do liberalismo nos direitos individuais que deveriam proteger a liberdade
de cada indivíduo para viver de acordo com os valores por ele desposados.
As feministas não-ocidentais podem se encontrar num curioso beco sem
saída, ao confrontarem as inter-relações entre o positivismo o liberalismo
político. Como povo colonizado, estamos bem conscientes do fato de que
muitos conceitos políticos liberais são suspeitos e confusos e que a prática
do liberalismo nas colónias foi marcada por brutalidades inexplicadas por
sua teoria. Todavia, como feministas julgamos que alguns de seus concei-
tos, como os direitos individuais, são às vezes muito úteis para nossas tenta-
tivas de combater problemas enraizados em nossas culturas tradicionais.
As feministas não-ocidentais certamente se mostrarão sensíveis ao fato
de que o positivismo não é nosso único inimigo. As feministas ocidentais
também precisam aprender a não considerar acriticamente como aliada qual-
quer estrutura não-positivista; apesar dos pontos em comum, pode haver
muitas diferenças. Uma opinião equilibrada sobre algumas posições que
desposamos como aliadas é necessária, pois o princípio "o inimigo do meu
inimigo é meu amigo" é provavelmente tão enganoso na epistemologia como
o é no domínio da Realpolitik.*
Os teóricos críticos da Escola de Frankfurt servem bem para ilustrar
esse ponto. Surgindo como um grupo de jovens intelectuais durante a Repú-
blica de Weimar, após a Primeira Guerra Mundial, seus membros foram
significativamente influenciados pelo marxismo e seus interesses variavam
da estética à teoria política e à epistemologia. Jiirgen Habermas, seu mais
eminente representante hoje, atacou, em seus trabalhos, o positivismo e a
exigência de que as teorias científicas apresentem um valor neutro ou "de-
*Do alemão: realismo político, politica baseada no poder e não em ideais. (N. daT.)
282 Género, Corpo, Conhecimento
NOTA
Gostaria de agradecer a considerável ajuda que Alison Jaggar e Susan Bordo me prestaram
neste ensaio. Allison foi extremamente influente tanto ao opinar sobre a natureza do proje-
290 Género, Corpo, Conhecimento
to, como ao sugerir mudanças que eliminaram pequenas falhas na escrita. A leitura cuidado-
sa de Susan propiciou valiosas mudanças na estrutura do trabalho, tendo sido muito útil em
relação a referências bibliográficas. Agradeço a ambas pelos comentários criativos e pela
delicadeza com que os fizeram. Gostaria também de agradecer a Dilys Page por sua cuida-
dosa leitura e pelos comentários sobre a primeira versão deste artigo; e a Radhika
Balasubramanian, Sue Cataldi, Mary Geer, Mary Gibson, Rhoda Linton, Josie Rodriguez-
Hewitt e Joyce Tigner por compartilharem seus trabalhos comigo, por se interessarem pelo
meu e por me proporcionarem uma comunidade de mulheres que me apoia de muitas, mui-
tas maneiras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Bordo, S. 1986. "The Cartesian Masculinization of Thought." Sings 11:439-456.
Gilligan, C. 1982. In A Different Voice: Psychological Theory and Women's Development.
Cambridge, Mass.: Harvard University Press.
Harding, S. 1986. The Science Question in Feminism. Ithaca, N.Y.: Cornell University Press.
Harding, S., and M. Hintikka. 1983. Discovering Reality: Feminist Perspectives on
Epistemology, Metaphysics, Methodology, and Philosophy of Science. Dordrecht:
Reidel.
Harding, S., and J. 0'Barr, eds. 1987. Sex and Scientific Inquiry. Chicago: University of
Chicago Press.
Keller, E. F. 1985. Reflections on Genderand Science. New Haven, Conn.: Yale University
Press.
Lloyd, G. 1984. The Man ofReason. Minneapolis: University of Minnesota Press.