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ou preciso está ainda para ser construído, porém algumas balizas metodológicas
podem ser emprestadas das Ciências Humanas, desde que provenham dessas
frentes contemporâneas de crítica do conhecimento, com a qual os estudos
feministas têm um compromisso fundamental e iniludível (Hawkesworth, 1989, p.
327).
Nesses estudos, o que decididamente não deve ser tentado é a inclusão de
métodos tradicionais, apropriados a sociedades estáveis, bem assentadas, e cuja
permanência esses métodos tradicionais pretendem reforçar. É o risco no qual
incorrem trabalhos de história das familias, quando são tomadas como
instituições e não processos em permanente mudança. Da mesma maneira, o
estudo do processo de construção das normas culturais da Igreja Católica, do
Direito ou do próprio senso comum por vezes incorre no erro de aceitar sua
funcionalidade, incorporando sem querer as premissas universais em que se
baseiam. Essa é uma armadilha sutil e amplamente presente na bibliografia de
estudos da mulher, que compromete às vezes seus resultados.
A abordagem historista e historicizante é profícua justamente pelo fato de
incorporar o estudo de conjunturas de mudanças, de rupturas, na medida em
que aceita a transitoriedade do conhecimento, dos valores culturais em processo
de transformação no tempo. Sergio Buarque de Holanda em seu estudo sobre
Ranke sugeriu a substituição da palavra historicismo, que vem associada à ideia
de determinismo e de evolução pelo termo “historismo”. (Holanda,S.B. (1979).
Meinecke,F.(1936).
Para tanto, convém criar conceitos adequados, deconstruí-los para que possam
servir de balizas instáveis, porém críticas, renegadas todas e quaisquer categorias
universais, abandonados quaisquer parâmetros fixos ou permanentes, pois trata-
se de posturas teóricas que se constroem enquanto processo de conhecimento
movediço num mundo transitório.
O conhecimento histórico tornou-se relativo tanto a uma determinada época do
passado como a uma dada situação do historiador no tempo. Aceitou o
engajamento do historiador em sua contemporaneidade e a relativização de sua
objetividade no decifrar a linguagem das suas fontes, a necessidade de abarcar
com os conceitos de seu próprio tempo a especificidade dos conceitos peculiares a
outros momentos históricos. Em vez de ter em mente leis ou etapas de
desenvolvimento, o historiador passou a interpretar processos de mudança
através de um conhecimento antes relacional, dialético, do que "científico".
Esse conhecimento aderiu aos limites de sua própria historicidade. Como
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ritmo de tempo.
Estrutura e disrupção de eventos foram coincidentemente os conceitos com os
quais se trabalhou a crítica da modernidade linear e dos determinismos finalistas.
Em vez de categorizar a realidade como objeto do conhecimento, procurou-se
interpretá-la em seu devir, tendo como objetivo precípuo documentar a
materialidade social dos conceitos e das palavras, sobrepor uma a outra história
social e história dos conceitos, tornando uma dependente da outra(Koselleck,R).
Este propósito implica em pôr de lado quase tudo o que existe como dado na
historiografia atual, que em geral reflete o projeto social das elites dominantes.
Este projeto dificilmente coincide com a vivência concreta de indivíduos,
principalmente quando se trata de mulheres, mesmo que de elite pois, enquanto
projeto, aparece necessariamente impregnado por toda uma ideologia normativa
e institucionalizante. Quer seja na maneira como podem ser resgatados nas
fontes, quer ao se apresentarem ao historiador enquanto intérprete, normas e
estereótipos culturais impõem-se com a necessidade de ofuscar. As ideologias do
poder que marcam o advento do capitalismo industrial na Europa ocidental
(liberalismo, nacionalismo, romantismo e costumes burgueses do dia a-dia)
reafirmaram o potencial transformador do processo histórico, marcadamente
explicitado na nova historiografia com o método dialético e a utopia
revolucionária de Marx. Entretanto, nem na filosofia liberal do Iluminismo, nem na
crítica marxista enquanto matrizes essencialmente totalizantes,abriram-se
parâmetros para apreensão do quotidiano, ou da história social das mulheres
enquanto historicidade, concretude e espaço de transformação ou resistência
social..
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