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Carlos Vogt
Rachel Soihet
Mulheres entram
em pauta As contribuições recíprocas decorrentes da explosão do feminismo e das
Mariluce Moura transformações na historiografia, a partir da década de 1960, foram
fundamentais na emergência da História das Mulheres. Nesse sentido,
Reportagens
ressaltam-se as contribuições da História Social, da História das
Nas humanas, elas
Mentalidades e, posteriormente, da História Cultural, articuladas ao
s�o maioria. Mas crescimento da antropologia, que tiveram papel decisivo nesse
chegar ao topo processo, em que as mulheres são alçadas à condição de objeto e
ainda � dif�cil
sujeito da História. Fato relevante, se considerarmos a despreocupação
F�sicas enfrentam
da historiografia dominante, herdeira do iluminismo, com a participação
preconceito em diferenciada dos dois sexos, já que polarizada para um sujeito humano
�rea universal.
predominantemente
masculina
A partir da década de 1970, "gênero" tem sido o termo usado para
Pesquisas revelam teorizar a questão da diferença sexual. Foi inicialmente utilizado pelas
a generaliza��o feministas americanas, sendo inúmeras as suas contribuições. A ênfase
da informalidade
entre as mulheres
no caráter fundamentalmente social, cultural das distinções baseadas
ocupadas no sexo, afastando o fantasma da naturalização; a precisão emprestada
à idéia de assimetria e de hierarquia nas relações entre homens e
Delegacias da mulheres, incorporando a dimensão das relações de poder; o relevo ao
mulher extrapolam
fun��es legais
aspecto relacional entre as mulheres e os homens, ou seja, de que
nenhuma compreensão de qualquer um dos dois poderia existir através
Fisiologia feminina de um estudo que os considerasse totalmente em separado,
ainda � constituem-se em algumas dessas contribuições. Acresce-se a
atravessada por
enigmas
significação, emprestada por esses estudos, à articulação do gênero
com a classe e a raça/etnia. Interesse indicativo não apenas do
Mulher pode ter compromisso com a inclusão da fala dos oprimidos, como da convicção
rea��o diferente a de que as desigualdades de poder se organizam, no mínimo, conforme
medicamentos
estes três eixos.
Artigos
Todas essas reflexões das mais fecundas não excluem, porém, críticas à
No que o mundo da continuidade nos estudos de gênero dos dualismos, especialmente, da
ci�ncia difere dos divisão binária da humanidade, a partir das construções baseadas no
outros mundos?
L�a Velho e
sexo. Reflexões e pesquisas têm se desenvolvido com vista a
Maria Vivianna ultrapassar tais impasses, questionando-se a utilização de uma
Prochazka categoria que tem como referência a diferença sexual quando as
discussões 'politicamente corretas' parecem exigir, cada vez mais
As mulheres na
ci�ncia regional:
privilegiar outras marcas na explicação das desigualdades. Uma
diagn�stico e proposta seria partir de uma perspectiva pluralista, considerando-se
estrat�gias para a uma multiplicidade identitária.
igualdade
Mar�a Elina
Claudia Fonseca
outra versão das mesmas relações, talvez invertidas de poder, já que o
saber teórico implicaria, também, num sistema de dominação. Sugere
G�nero e ci�ncias partir de conceitos provisórios e assumir abordagens teóricas parciais.
no pa�s: Scott argumenta que, no seu uso descritivo, o gênero é apenas um
exce��es �
regra?
O g�nero na das mulheres provar que as mulheres tiveram uma história, ou que as
ci�ncia: os mulheres participaram das mudanças políticas principais da civilização
interesses da ocidental. Após um reconhecimento inicial, a maioria dos historiadores
medicina na mulher
Fab�ola Rohden descartou a história das mulheres ou colocou-a em um domínio
separado. Esse tipo de reação encerra, segundo Scott, um desafio
As mulheres e a teórico. Ele exige a análise não só da relação entre experiências
filosofia como masculinas e femininas no passado, mas também a ligação entre a
ci�ncia do
esquecimento
história do passado e as práticas históricas atuais. Scott ressalta, ainda,
Marcia Tiburi que as análises de gênero, no seu uso descritivo, tem incidido apenas
nos trabalhos sobre temas em que a relação entre os sexos é mais
Hist�ria das evidente: as mulheres, as crianças, as famílias etc. Aparentemente,
mulheres e
rela��es de temas como a guerra, a diplomacia e a alta política não teriam a ver
g�nero: debatendo com essas relações. O gênero parece não se aplicar a esses objetivos e,
algumas quest�es
portanto, continua irrelevante para a reflexão dos historiadores que
Rachel Soihet
trabalham sobre o político e o poder. O resultado é a adesão a uma
O futuro da f�sica visão funcionalista baseada sobre a biologia e a perpetuação da idéia
depende das das esferas separadas na escrita da história: a sexualidade ou a política,
mulheres
a família ou a nação, as mulheres ou os homens.
Marcia Barbosa
Poema Por outro lado, a polêmica entre Joan Scott e as historiadoras Louise
Tilly e Eleni Varikas oferece um panorama da pluralidade de concepções
Par�bola de Mulher acerca da questão do gênero. Ao reforçar a necessidade de se
Carlos Vogt ultrapassar os usos descritivos do gênero, buscando a utilização de
formulações teóricas, Scott afirma a impossibilidade de uma tal
conceitualização efetuar-se no domínio da história social, segundo ela,
Cr�ditos marcado pelo determinismo econômico. Salienta a necessidade de
utilizar-se uma "epistemologia mais radical", encontrada, segundo ela,
no âmbito do pós-estruturalismo, particularmente, em certas
abordagens associadas a Michel Foucault e Jacques Derrida, capazes de
fornecer ao feminismo uma perspectiva analítica poderosa. Nesse
sentido, segundo Scott, os estudos sobre gênero devem apontar para a
necessidade da rejeição do caráter fixo e permanente da oposição
binária "masculino versus feminino" e a importância de sua
historicização e "desconstrução" nos termos de Jacques Derrida -
revertendo-se e deslocando-se a construção hierárquica, em lugar de
aceitá-la como óbvia ou como estando na natureza das coisas (Scott,
1994, 16) .
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14/01/2022 15:04 Com Ciência - Mulheres na Ciência
estudos feministas não esperaram o pós-estruturalismo para sublinhar a
importância das representações e dos sistemas simbólicos na análise e
na compreensão da construção do gênero e das relações sociais que os
sustentam.
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desigual que pode desvendar engrenagens e marcar especificidades de
diferentes sistemas históricos.
Voltando à proposta de Scott, esta não abre espaço para que emerjam
as diversas sutilezas presentes nas relações entre os sexos, das quais
não estão ausentes as alianças e consentimentos por parte das
mulheres. Nesse particular são muito adequadas as considerações de
Roger Chartier, pautado em Pierre Bourdieu, que destaca na dominação
masculina o peso do aspecto simbólico, que supõe a adesão dos
dominados às categorias que embasam sua dominação. Utiliza-se
Chartier do conceito de violência simbólica que ajuda a compreender
como a relação de dominação - que é uma relação histórica, cultural e
lingüisticamente construída - é sempre afirmada como uma diferença de
ordem natural, radical, irredutível, universal. Outrossim, alerta Chartier,
uma tal incorporação da dominação não exclui a presença de variações
e manipulações, por parte dos dominados. O que significa que a
aceitação pelas mulheres de determinados cânones não significa,
apenas, vergarem-se a uma submissão alienante, mas, igualmente,
construir um recurso que lhes permita deslocar ou subverter a relação
de dominação. As fissuras à dominação masculina não assumem, via de
regra, a forma de rupturas espetaculares, nem se expressam sempre
num discurso de recusa ou rejeição. Definir os poderes femininos
permitidos por uma situação de sujeição e de inferioridade significa
entendê-los como uma reapropriação e um desvio dos instrumentos
simbólicos que instituem a dominação masculina, contra o seu próprio
dominador.
Atualizado em 10/12/2003
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� 2003
SBPC/Labjor
Brasil
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