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Do trabalho ao prazer

Escolhera-a por razões profissionais mas ia seduzi-la por prazer! Nick


Papaeliou andava sempre com mulheres maravilhosas, por isso era um verdadeiro
mistério que se sentisse atraído pela simples Rose. Talvez o atraísse por não
ter caído rendida aos seus pés. Rose detestava o seu chefe arrogante, todavia
precisava daquele emprego. Então, ele empenhou-se em seduzi-la e Rose começou
a sentir que as forças lhe faltavam. Não parava de recordar a si própria que,
assim que tivesse atingido o seu objectivo, Nick abandoná-la-ia. Porém, Nick
teria uma bela surpresa, porque, por baixo daquela roupa sem formas, escondia-
se o corpo mais incrível que alguma vez imaginara.

Título: Do Trabalho Ao Prazer


Autor: Cathy Williams
Título original: Taken by Her Greek Boss
Género: Romance
Editora: Harlequin
Digitalização: Fátima Tomás
Revisão: Edith Suli
Numeração de página: Cabeçalho
EUROMANCE

Do trabalho ao prazer
Cathy Williams
HARLEQUIN
Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S A © 2007 Cathy Williams Todos os direitos
reservados DO TRABALHO AO PRAZER, N ° 312 - 1 10 08 Título original Taken by
Her Greek Boss - Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd, Londres Todos
os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta
edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV Todas as
personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa,
viva ou morta, é pura coincidência. ®, Harlequin, logotipo Harlequin e
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1 A noite começava a parecer irreal a Nick Papaeliou. Para começar, nunca


gostara de fazer cenas em público, mas fora precisamente o que lhe acontecera
uma hora antes, quando a sua namorada, ou melhor, a sua ex-namorada, Susanna,
a qual bebera alguns copos a mais, iniciara uma discussão e ele acabara com
ela. A verdade era que já deveria tê-lo feito há muito tempo. Ela andava há
meses a insistir que tinham de formalizar a sua relação e a falar-lhe do seu
relógio biológico, mas ele não a ouvira. E o pior era que lhe armara aquela
cena durante o jantar de uma festa para a qual os tinham convidado, em casa de
um casal de estilistas. Tivera oportunidade de confirmar que era verdade que o
álcool soltava a língua. Recordou com desagrado as lágrimas de Susanna, as
suas súplicas, os seus gritos... Tudo diante de quase quarenta pessoas.
Naturalmente, partira, com intenção de voltar para as suas águas-furtadas em
Mayfair, mas... Olhou de soslaio para a jovem loira que estava sentada junto
dele no táxi. Era uma das raparigas que estivera a trabalhar como empregada na
festa e com quem se encontrara ao sair. Depois, deixara-se convencer a
acompanhá-la para beberem um café num pub próximo, onde ela acabara por lhe
falar dos seus sonhos. Era uma história que já ouvira mil vezes: uma rapariga
bonita que sonhava ser actriz. Conseguira ver o optimismo inocente da
juventude no seu rosto e como gesticulava, entusiasmada, enquanto falava.
Fizera-o sentir-se velho e perguntara-se por que razão, apesar da idade que já
tinha, ainda não considerara deixar a sua vida de solteiro. O seu pai morrera
quando ele tinha pouco mais de vinte anos e a sua mãe falecera oito anos
depois. Seria por isso, porque não tinha a pressão de uns pais que insistiam
que tinha de se casar e ter filhos, como era suposto? Não sabia o que pensar.
O que sabia era que aquela aspirante a actriz, aquela tal Lily, despertara
nele um interesse quase paternal. E essa era a razão, concluiu naquele
momento, pela qual estava sentado naquele táxi com ela, a razão pela qual
aceitara acompanhá-la a casa e beber uma bebida com ela. Pelo menos, não
parecia que quisesse nada dele e isso era algo fora do comum. Cerca de quinze
minutos depois, chegavam ao seu destino. O táxi parou e Nick mal conseguiu
reprimir um sorriso divertido quando ela se recusou a deixá-lo pagar, apesar
de, sem dúvida, dever saber quanto dinheiro tinha. - Não foi muito - disse-lhe
ela depois, em jeito de explicação, enquanto procurava as chaves na mala.
Entretanto, Nick passeou a vista pelos arredores. Cerca de dez ou quinze anos
antes, aquele bairro, com as casas novas, devia ter sido outra coisa, mas a
deterioração produzida pela passagem do tempo transformara-o num lugar
deprimente e cinzento, e quando entraram na casa a primeira impressão
acentuou-se. Nick crescera num sítio como aquele. O seu pai fora um emigrante
grego sem estudos, que servira em casa de gente rica e nunca aspirara a
melhorar a sua situação. Ele, pelo contrário, quisera um pouco mais. De
início, apenas quisera arranjar um emprego e poupar o suficiente para poder ir
para a universidade. Depois, fora arranjando empregos melhores e, finalmente,
arriscara-se a iniciar o seu próprio negócio e, com muito esforço, conseguira
erguer um império financeiro. Agora, era ele quem comandava as rédeas e,
quando abria a boca, o mundo calava-se e ouvia. Todo aquele poder e riqueza
tinham vindo acompanhados de uma casa na praia e outra no campo que raramente
visitava, um motorista, um helicóptero para as viagens urgentes e um
apartamento espaçoso numa das zonas mais caras de Londres. Enquanto Lily
tirava as botas, Nick virou-se para fechar a porta. Não ouviu ruído algum de
passos e só se deu conta de que havia mais alguém em casa quando ouviu a jovem
dar um gritinho abafado. - Rosie! Porque estás levantada? - Quem... é este? -
perguntou a outra voz feminina. Nick virou-se e encontrou-se com uns olhos
azuis a olharem para ele com perspicácia. Era uma rapariga, embora alguns anos
mais velha do que Lily, baixa, sobretudo em comparação com ela, e não parecia
ter precisamente figura de modelo, embora as suas formas não se distinguissem
muito bem através do robe, por debaixo do qual usava um pijama. - Rose, és
incrível! Quantas vezes já te disse para não esperares por mim acordada? Já
sou crescidinha, sei cuidar muito bem de mim. A tal Rose, fosse quem fosse,
estava a olhar para ela como se duvidasse. - Não sei como podes dizer isso,
quando acabaste de entrar com um estranho, à uma hora da madrugada. Achava que
tinhas dito que ias voltar cedo. - Bom, era cedo quando acabei de trabalhar,
mas... Rose, apresento-te Nick, Nick Papaeliou. Talvez já tenhas ouvido falar
dele. - Claro que não! - replicou a outra mulher, irritada. - Sabes muito bem
que não sei nada dos modelos com quem sais. - Modelos? - repetiu ele, sem
conseguir acreditar no que estava a ouvir. E porque aquela mulher estava a
olhar para ele com semelhante desdém? Acha que sou modelo? - O que haveria de
ser? - Rosie, pelo amor de Deus! Tens de a desculpar, Nick. Rose tende a ser
muito protectora. Acha que, um dia destes, acabarei por ser devorada por um
lobo mau. Mas, enfim, é o que fazem as irmãs mais velhas, não é? - É tua irmã?
- quase exclamou Nick, olhando, perplexo, para Rose e depois para Lily. - Bom,
na verdade é minha meia-irmã - explicou-lhe Lily, com um sorriso. - Não é
surpreendente? Ouvem-se tantas histórias de meios-irmãos que não se dão bem...
Mas Rose e eu não seríamos mais unidas se fôssemos irmãs a sério -
acrescentou, dando um abraço afectuoso a Rose. Mesmo descalça, era muito mais
alta do que a sua irmã. Nick veio porque o convidei para beber um copo.
Importas-te de o servir? Eu tenho de ir à casa de banho. É claro que se
importava, pensou Rose, mas antes que pudesse replicar, Lily já se dirigia
para o andar de cima, subindo os degraus de dois em dois, como fazia desde que
era uma menina. Quando cresceria e se daria conta de que o mundo não era um
conto de fadas? Lily continuava a pensar que toda a gente era boa. Rose virou-
se para o tal Nick e olhou fixamente para ele. Era bastante mais alto do que
ela e perigosamente bonito. Tinha uns traços bem definidos e sensuais, como se
tivessem sido esculpidos com um cinzel, e tinha os olhos verdes e o cabelo
preto. Provavelmente, não passava de um actor de segunda, disse para si. -
Diz-me, meia-irmã Rose... Esperas sempre acordada por Lily, quando ela volta
tarde para casa? O sarcasmo na sua voz não passou despercebido a Rose, mas
recusou-se a morder o isco e limitou-se 10 a olhar para ele com desdém, antes
de se virar e dirigir-se para a cozinha. Nick seguiu-a e sentou-se numa das
cadeiras que havia à volta de uma mesa redonda de madeira de pinho, enquanto
ela preparava café. Parecia que decidira que não haveria bebidas. - Não vou
desculpar-me por ter sido grosseira consigo, senhor Papaeliou - disse-lhe ela,
- mas Lily já teve muitos desenganos com tipos bonitos e superficiais, e não
vou permitir que voltem a fazer-lhe mal. Abriu um armário e tirou uma chávena.
- Talvez Lily pense que não precisa que ninguém cuide dela e sei que é capaz
de cuidar da sua vida, mas é demasiado crédula. Aparece um homem como você, de
segunda, e... - Um actor de segunda? Ela ignorou-o por completo e continuou a
falar, -...e acaba sempre por lhe partir o coração. - E foi por isso que te
tornaste o seu cão de guarda. Que nobre da tua parte - disse Nick. - E Lily
aprecia esse excesso de zelo da tua parte... ou só fazes estes discursos nas
suas costas? Lamento decepcionar-te, mas não sou um modelo com a cabeça vazia,
que vai para a cama com a primeira mulher bonita que lhe aparece à frente, nem
sou actor. - Modelo, actor, realizador... O que interessa? É tudo o mesmo -
respondeu ela, encolhendo os ombros. Serviu-lhe o café e colocou-lhe a chávena
à frente. - Lily acabou de sair de uma relação que acabou mal, só estou a
certificar-me de que outro homem sem escrúpulos não voltará a enganá-la. 11
Antes que Nick pudesse responder, Lily reapareceu, desculpando-se por ter
demorado tanto tempo, mas estava desejosa de tomar um duche, porque precisava
de tirar o cheiro a tabaco. - Então, estiveram a conhecer-se um pouco? -
perguntou-lhes, alegremente, antes de se servir de um copo de água da
torneira. Depois, virou-se para eles e apoiou-se na bancada. - Oh, sim, é
claro que sim e estamos a descobrir que nos damos às mil maravilhas! -
respondeu Nick, dirigindo um sorriso sarcástico a Rose. - Que bom, fico
contente! - respondeu Lily, antes de se virar para a sua meia-irmã. - Nick
acabou esta noite com a sua namorada, na festa onde eu estava a trabalhar como
empregada, e sabe sempre bem termos companhia quando estamos nas piores
alturas. Rose arqueou o sobrolho. - Não estou nas minhas piores alturas, nem
pouco mais ou menos, Lily - replicou Nick, forçando um sorriso, consciente dos
olhos de Rose fixos nele. - De facto, embora tenha sido ela a dizer-me que
queria acabar, a nossa relação já estava mal há muito tempo. Susanna limitou-
se a fazer o que provavelmente eu teria feito amanhã ou depois. Porque estava
a dar explicações a duas mulheres que não conhecia de lado nenhum? - E porque
foste àquela festa com ela se querias acabar a vossa relação? - perguntou
Rose. - Certamente, a coitada achava que realmente sentias alguma coisa por
ela. 12 Nick apertou os dentes. - Ninguém que a conheça lhe chamaria
"coitada". - Mesmo assim... - replicou Rose, deixando a frase no ar. - Mesmo
assim, o quê? - perguntou ele. - Bom, deve ser terrível acabar com alguém à
frente de um monte de gente. É o que penso sempre que abro o jornal e leio a
história de um daqueles casais famosos que acabam por lavar a roupa suja em
público. Devia estar muito desesperada. Nick levantou-se. Não tinha de ficar
ali a ouvir aquilo. - Acho que já está na hora de me ir embora. - Já? -
perguntou Rose, com cinismo. - Quer que lhe chame um táxi? Na rua, não
encontrará nenhum, este bairro não é muito central - virou-se para a sua meia-
irmã. - Lily, estás exausta. Porque não vais para a cama? Eu espero até o
nosso convidado se ir embora. - Não sejas tola, Rose! - replicou Lily,
contendo um bocejo. - Fui eu quem o convidou. Não posso convidá-lo para beber
um copo e depois livrar-me dele. - Eu já tratei de tudo, como vês. - Sim,
estou a ver - respondeu Lily, divertida, dando uma olhadela à chávena de café
sobre a mesa, na qual Nick nem tocara. - Rose não bebe muito confiou a Nick,
com um sorriso, - pois não, Rosie? - Tenho a certeza de que não interessa ao
senhor Papaeliou, se bebo ou não. - Nick, o meu nome é Nick - disse-lhe ele,
irritado. 13 Rose ignorou-o por completo. - Vá lá, Lily, os teus olhos estão a
fechar-se! Vai para a cama, eu despeço-me do senhor P... de Nick. -Mas... - Eu
posso levantar-me um pouco mais tarde! insistiu Rose. - Tu vais para o ginásio
de manhã. -Eu sei, mas... Rose empurrou a sua irmã para fora da cozinha. -
Nada de mas. Estás cansada e não me custa nada ficar mais um pouco até o táxi
chegar. - Bom, se tens a certeza... Assim que Lily desapareceu escada acima,
Rose voltou para a cozinha. Nick, que tirara o casaco e estava apoiado na
parede, ficou a olhar para ela ao vê-la entrar. De repente, Rose recordou como
estava vestida e sentiu vergonha. Atou mais um pouco o cinto do robe. Por
debaixo, usava um pijama de algodão e a camisa tinha desenhos de renas. Uma
amiga oferecera-lho no Natal e era muito cómodo, mas, se aquele homem o visse,
perderia a imagem de pessoa séria e adulta que estava a tentar transmitir. -
Deixa-me adivinhar - disse ele, aproximando-se dela - estás prestes a
recomeçar a bombardear-me com toda a tua artilharia pesada, agora que mandaste
Lily para a cama. - Não a "mandei" para a cama. - Então, não sei o que lhe
chamas. Enfim, vamos chamar o táxi e acabar com isto - respondeu ele. Rose
tirou um telemóvel do bolso do robe, sentou-se e, depois de procurar o número
do serviço de 14 táxis na agenda do aparelho, carregou num botão e esperou. A
pessoa que atendeu a chamada disse-lhe que o táxi estaria ali daí a quinze
minutos. Quinze minutos, repetiu Rose para si mesma, depois de desligar. Tinha
quinze minutos para pôr as cartas na mesa e não ia desperdiçar um segundo. No
entanto, não conseguiu sequer abrir a boca. Nick dirigiu-se até ela e pôs uma
mão nas costas da cadeira e outra na mesa, encurralando-a. - Antes que digas
alguma coisa, acho que agora é a minha vez de falar, não te parece? -
perguntou-lhe, com um sorriso. Rose recusou-se a deixar-se amedrontar. Quem
achava que era? Respirou fundo, tentando acalmar-se, mas deu por si a admirar,
fascinada, como os seus olhos eram verdes vistos de perto. - Acho que devias
arranjar uma vida e deixar que a tua irmã viva a sua - disse-lhe ele, com
aspereza. Parece-te normal que a esperes acordada, para te certificares de que
volta, sã e salva, para casa? Talvez te pareça, mas para mim, e tenho a
certeza de que a maioria das pessoas pensaria o mesmo, é bastante triste. Rose
corou e durante alguns instantes ficou sem palavras. Uma parte dela sabia que
o que estava a dizer era verdade, mas cuidar de Lily tornara-se um hábito e
custava-lhe ir para a cama sem se preocupar. Os seus pais, a mãe de ambas e o
seu padrasto, tinham falecido quando elas ainda eram muito pequenas, e tinham
ido viver com os seus tios. Estes diziam de si mesmos que eram viajantes em
busca 15 do sentido da vida, mas Rose descobrira durante a sua infância e
adolescência que aquilo, na verdade, significava que tinham uma vida de
nómadas, a andarem de um lado para o outro, sem se preocuparem com a forma
como aquilo a afectaria e a Lily. Rose era quase sete anos mais velha do que a
sua meia-irmã e impusera a si mesma ser a pessoa séria e responsável da
família, alguém em quem Lily pudesse apoiar-se. Cuidava dela desde os dez
anos, mas Lily já tinha vinte e dois. Talvez ele tivesse razão e não fosse
normal que ficasse acordada à espera dela. - Tanto me faz o que pensas -
replicou. - O que achas que a tua irmã diria se soubesse que estás a "sugerir-
me" que me afaste dela? - Tenho a certeza de que compreenderia que o faço
porque me preocupo com ela. - Ou talvez pensasse que estás a limitar a sua
liberdade, que não estás a deixá-la viver a sua vida. - Quem achas que és para
me dizeres o que devo ou não devo fazer? - perguntou-lhe Rose. - Certamente,
não sou um modelo, nem um actor, nem um realizador de cinema - respondeu ele,
aproximando uma cadeira da dela, para depois se sentar - sou empresário. -
Tanto me faz no que trabalhas. A questão é que! tenho a certeza de que és
daquele tipo de homens que acabam sempre por partir o coração das mulheres de
quem se aproximam e depois fazem outra marca no seu revólver. Nick estava
furioso. Nunca fora atacado daquele modo por uma pessoa que nem sequer o
conhecia. 16 Tinha a consciência muito tranquila a esse respeito. Nunca
cometera o erro de fazer promessas que depois não tivesse intenção de cumprir.
Nunca falara de amor, nem de compromisso com nenhuma das mulheres com quem
estivera. Levantou-se e saiu da cozinha com Rose atrás dele. Rose esgotara a
sua munição e já não tinha mais nada para dizer. Nick devia estar a pensar o
mesmo porque, quando chegaram ao hall, vestiu o casaco em silêncio e só se
virou para olhar para ela quando ia partir, quando tinha a mão na maçaneta. -
Obrigado pelo café... e pelo aviso - disse-lhe, com tensão, apesar de não ter
bebido nem um gole. - Se me permitires, aceita também um conselho da minha
parte: arranja qualquer coisa para fazer ao sábado à noite. Assim, talvez não
fiques nervosa, a perguntares-te o que a tua irmã estará a fazer. Dito aquilo,
abriu a porta e felizmente não teve de esperar, porque o táxi estava a chegar.
Ao chegar a casa, ainda furioso com a forma como aquela mulher o insultara,
viu que tinha uma mensagem no atendedor de chamadas. Era de Susanna, que lhe
pedia desculpas pelo sucedido com voz trémula. Nick não se incomodou em ouvir
até ao fim, mas apagou a mensagem e, enquanto tirava o casaco, deu por si a
pensar outra vez em Rose. Quem achava que era? Um anjo vingador? O anjo
vingador estava naquele momento na sua cama. Passara já quase uma hora desde
que aquele homem detestável partira e ainda estava acordada, a 17 olhar para o
tecto. As palavras que pronunciara antes de partir tinham-lhe atingido a alma.
O que mais detestava era que o que lhe dissera era verdade. Tinha vinte e nove
anos e ali estava, a fazer de ama de uma irmã que já não precisava que
cuidassem dela. Quando ia pensar nela? Os seus tios, Tony e Hora, faziam todos
os possíveis para as animarem a ter uma vida despreocupada. Sempre lhes tinham
dito que o mundo era um lugar maravilhoso e fascinante para descobrir, e que
tinham de ser curiosas e deixarem-se educar pela "escola da vida". O problema
era que a existência nómada para a qual os seus tios as tinham arrastado nunca
a fizera feliz. Andar de um lado para o outro, sem permanecer muito tempo em
lado nenhum, só a desestabilizara e a sua forma de protestar fora uma rebeldia
calada. Recusara a comida vegetariana em que os seus tios insistiam,
empenhando-se em que preferia hambúrgueres, pizas e batatas fritas, e
encerrara-se nos seus livros de estudo e de leitura, até a terem considerado
impossível e terem deixado de lhe dizer que tinha de sair mais e divertir-se.
Depois, entrara na universidade e esforçara-se ao máximo para mais tarde
arranjar um bom emprego, poder comprar uma casa, tornar-se independente e
conseguir o que durante todos aqueles anos lhe faltara e a Lily: estabilidade.
Claro que, pelo caminho, perdera muitas coisas e Lily andava a saltar entre
trabalhos temporários, enquanto prestava provas para anúncios e peças de
teatro, para a maioria dos quais não chegavam a seleccioná-la. 18 Sem contar
com todos os homens errados que tinham passado pela sua vida. Tinha de falar
com ela sobre isso, mas sabia que não conseguiria nada, puxando o assunto no
dia seguinte, portanto decidiu que esperaria até encontrar o momento certo.
Esse momento deu-se alguns dias depois, numa daquelas noites raras em que
estavam as duas em casa e em que nem Lily tinha de sair a correr para
trabalhar, nem Rose chegara tarde do escritório. Estavam as duas sentadas na
cozinha, a jantar massa. Sem levantar a vista do esparguete, Rose perguntou a
Lily, num tom o mais desinteressado possível: - Voltaste a ver aquele tipo...
Não recordo como se chamava... Aquele que trouxeste cá a casa há algumas
semanas? Lily, que estava a levar o garfo à boca, baixou-o, olhou para Rose e
sorriu. - Oh, referes-te a Nick, Nick Papaeliou! Na verdade, voltei a vê-lo
duas vezes. Rose quase se engasgou e teve de beber um copo de água. - Duas
vezes?! Mas eu achava que não tinhas voltado a vê-lo. Não me tinhas dito nada.
- Ia dizer-te Rosie, mas... - Mas o quê? - perguntou Rose, espetando um
cogumelo. - Bom, pensei que discutirias comigo. Além disso, Nick tem a
impressão de que não gostaste 19 dele. Contou-me que, depois de pensares que
era modelo, achaste que era actor e que lhe chamaste "actor de segunda" -
comentou Lily, a rir-se. Oxalá estivesse aqui para poder ver a sua cara quando
o disseste! Quando mo contou, estava completamente indignado e já tinham
passado vários dias. - Bom, sim, talvez lhe tenha chamado isso murmurou Rose,
- mas... Lily... não quero alarmar-te, mas não me parece que seja um homem de
confiança. - O que queres dizer? - É natural que te sintas atraída por um
homem porque é bonito ou porque tem dinheiro... mas devias ter cuidado. - Acho
que sei onde queres chegar - disse Lily, com um suspiro. - Dize-lo porque não
tive muita sorte nesse aspecto, não é? Rose assentiu, aliviada por parecer
disposta a ouvi-la. - Mas acho que estás enganada com Nick, Rosie - continuou
Lily. - A sério, não me deixei impressionar pela sua beleza, nem pelo seu
dinheiro, só que... Não sei, é um bom tipo. Um bom tipo? Estavam a falar do
mesmo homem? - Se o conhecesses melhor, tenho a certeza de que pensarias o
mesmo que eu! - insistiu Lily. - De facto... - O que foi? - perguntou Rose,
quando Lily ficou calada. - Bom, ia dizer-te isto mais tarde, mas... É tão 20
simpático, que nos convidou às duas para uma festa que vai dar no próximo
sábado. Apesar de lhe teres chamado "actor de segunda" - disse-lhe entre
risinhos. - E insistiu que queria que fôssemos as duas. Não te parece um
encanto? Claro que teremos de ir às compras, porque a festa vai ser num clube
nocturno muito exclusivo do qual é dono e vai haver um monte de gente
importante: realizadores, produtores... Oh, Rosie, não achas emocionante? -
Não muito - respondeu Rose, sentindo que o pânico se apoderava dela. - Quer
dizer... Não sei, Lily... - Tens de lhe dar uma segunda oportunidade, Rosie -
disse-lhe Lily. E, então, puxou do trunfo que resultava sempre com ela. - Além
disso, se realmente me amas, irás. Nick serviu-se de outra bebida. Sentia-se
inquieto. Já começara há algum tempo a festa que organizara para ajudar Lily a
abrir caminho no mundo do espectáculo, embora isso fosse algo que naturalmente
não lhe dissera. Tinha convidado toda a gente importante do cinema e do
teatro, produtores e várias personalidades das altas esferas interessadas no
mundo da cultura e dispostas a investir o seu dinheiro. Apesar de aquilo ser
um pouco precipitado, nenhum deles declinara o seu convite. Nick não dava
festas todos os dias e as suas festas tinham nome suficiente para atraírem as
celebridades de maior peso. No entanto, a verdadeira estrela da festa ainda
não aparecera, nem a sua irmã. Nick voltou a pousar os seus olhos na porta e
olhou para o seu relógio. Não era preciso ser um génio para imaginar porque
ainda não tinham chegado. Ou Rose se recusara a vir ou estaria a tentar
dissuadir Lily para que não viessem. Teria sido tudo muito mais fácil se não
tivesse dito a Lily que a trouxesse 22 com ela, mas queria demonstrar a Rose
como estava enganada a respeito dele. Naquele momento, a porta abriu-se e viu
entrar em primeiro lugar Lily, muito elegante com um vestido azul-claro, e
viu-a olhar à sua volta, à sua procura, e Nick deu por si a tentar ver se
atrás dela estaria Rose. Acabou a sua bebida antes de se dirigir para ela e,
quando já estava a aproximar-se, viu que Rose viera, embora parecesse estar a
esconder-se atrás da sua irmã. - Já pensava que não virias - disse a Lily, com
um sorriso. - E tu também vieste! -acrescentou, assomando a cabeça atrás dela
para cumprimentar Rose. Lily afastou-se. - Devo dizer que estou surpreendido,
pensava que decidirias não vir, porque este tipo de coisas não te interessa.
Tinha tanta razão! Nos últimos quatro dias, Rose tentara em vão encontrar uma
maneira de se esquivar e não ir àquela festa, como prometera a Lily que faria.
Primeiro, tentara a desculpa de que não tinha nada para vestir, mas Lily
dissera-lhe que iriam às compras e que encontrariam alguma coisa. Depois,
tentara a desculpa do sacrifício pessoal, de "só estorvaria". "Tolices!",
respondera-lhe Lily. Finalmente, dissera-lhe que aquele tipo de festas não lhe
agradava, que se sentiria como um peixe fora de água, mas a sua irmã insistira
que tinha de ir, que seria uma descortesia para Nick se não fosse. Nick era o
verdadeiro problema. Dissera-lhe para se afastar da sua irmã, mas ele não lhe
fizera caso e isso só aumentara a antipatia que lhe tinha. 23 Sentiu-se
irritada consigo mesma ao pensar, de repente, em como estava incrivelmente
sexy naquela noite. A sua roupa, uma camisa branca e umas calças pretas, não
era absolutamente sofisticada, mas ficava-lhe como se tivesse sido feita à
medida e enrolara as mangas até aos cotovelos, deixando a descoberto os seus
antebraços fortes e bronzeados. - E não me interessa - assentiu - só vim
porque Lily insistiu. - Bom, pois já que estás aqui, não te escondas disse-lhe
ele. - Vamos, quero que desfrutem da festa! Há imensa gente interessante aqui
- acrescentou, oferecendo um braço a cada uma. Lily agarrou-se, entusiasmada,
a ele, mas Rose ignorou-o. Já se sentia suficientemente incomodada naquele
ambiente ao qual não pertencia, para que as pessoas a olhassem ao passar,
perguntando-se quem era aquela mulher baixa e gordinha, de vestido preto, que
ia de braço dado com o anfitrião. Lily não destoava daquela gente, mas ela
sim. - Vou buscar-vos algo para beberem - disse-lhes Nick, quando pararam no
meio da sala. - O que querem? Champanhe, Lily? - Sim, obrigada, um copo de
champanhe. - E tu? O que queres beber? - perguntou Nick a Rose. - Não quero
nada, obrigada. - Vá lá, mulher, não sejas assim! Trago-te um copo de vinho.
Ajudar-te-á a relaxar. - Estou muito relaxada - mentiu Rose. Nick sorriu,
divertido. 24 - Nesse caso, estás a fazer uma imitação excelente de alguém
que, neste momento, preferia estar em qualquer outro sítio, menos aqui. Nick
afastou-se para o bar e, quando regressou, encontrou Rose sozinha. - E Lily? -
Viu alguém que conhecia e foi cumprimentá-lo. - Isso foi bastante grosseiro da
sua parte, podia ter-te levado com ela e ter-vos apresentado. - Queria fazê-
lo, mas disse-lhe que não se preocupasse comigo e que passeie um pouco, e fale
com as pessoas - replicou Rose. - Não sei muito do mundo do espectáculo, mas
parece que, se não se tiver contactos, não se chega a lado nenhum. Não se pode
vir para uma festa destas e ficar num canto acrescentou, segurando o copo que
lhe estendia. - Sim, é verdade. É como... uma rede dentro da qual tem de se
entrar e interagir - assentiu. - Os actores e os argumentistas tentam
reconciliar-se com os realizadores, por sua vez os realizadores douram a
pílula para os produtores, que podem financiar os seus projectos... - E tu
dedicas-te a observá-los - concluiu Rose, antes de beber um gole de vinho. - O
que tem isso de mal? - Nada, só que te comportas como um cientista a observar
os outros através de um microscópio, como se fossem pequenas bactérias. Nick
semicerrou os olhos. - Talvez seja melhor não te movimentares pela festa com
esse dom inato que pareces ter para incomodares as pessoas. 25 Rose desviou o
olhar incomodado e bebeu outro gole do seu copo. - Não pensei que as minhas
palavras fossem incomodar-te, só estava a fazer um comentário. - A única forma
de se ter sucesso na vida é desenvolvendo a habilidade de se entender os
outros, de se compreender a forma como agem para se ir sempre vários passos à
frente deles - disse-lhe Nick. E a verdade era que Rose o intrigara. Talvez
fosse só um indicador de que estava enfastiado, de que precisava de uma
novidade na sua vida. Ficaria mais um pouco a conversar com ela, decidiu.
Assim, além disso faria uma boa acção, poupando-a a ter de se misturar com as
pessoas. - Vamos concentrar-nos em ti, por exemplo disse Nick. E, tal como
imaginava, aquilo fez com que ela o olhasse, nervosa: - Detestas estar aqui e,
se vieste, foi, como disseste antes, porque Lily to pediu. - Onde queres
chegar? Não estás a contar-me nada que não... - Pensas que estás acima desta
gente toda, mas sentes-te incomodada e deslocada. Estou enganado? - Não é
verdade - replicou ela, imediatamente. Na verdade, era, mas não via que
necessidade tinha de falar daquilo. - E, de qualquer modo, porque disseste a
Lily para vir com ela, se pensavas que não iria sentir-me à vontade? - É
sempre bom enfrentarmos os nossos medos. - Oh, portanto, por outras palavras,
achas que estás a fazer-me um favor! - Mas tu não pareces muito agradecida. 26
Rose soprou e bebeu o vinho que tinha no seu copo. Aquela conversa estava a
irritá-la cada vez mais e, embora não estivesse habituada a beber, naquele
momento disse para si que o que precisava era de mais um pouco de álcool para
esquecer a presença daquele homem insuportável. Pegou no copo de champanhe que
ele deixara sobre a mesa e esvaziou-o com dois goles. - Devia ir cuidar do
resto dos convidados - disse Nick. - E do que estás à espera? Não quero ser eu
a impedir-te de cumprires as tuas obrigações como anfitrião. - Sim, mas receio
que não seja isso o que estás a fazer - respondeu ele, reparando no ligeiro
rubor que o álcool fizera aflorar às suas faces. - É meu dever certificar-me
de que ninguém fica sozinho num canto, a beber até cair redondo. Rose olhou,
furiosa, para ele. - Não vou beber até cair redonda - replicou. Calma, não vou
envergonhar-te diante dos teus convidados selectos. Nick suspirou e aproximou
dois bancos para que se sentassem. Aquela mulher não poderia ser mais difícil
e não sabia porque tinha de se preocupar com ela, mas sentia que tinha de o
fazer, e não porque lhe importava que desse um espectáculo, mas porque sabia
que seria Lily quem se sentiria muito mal se a visse bêbeda e a fazer uma
figura ridícula. Por isso, disse para si, faria um esforço e ficaria mais um
pouco com ela, mesmo que isso significasse desatender os outros convidados. De
qualquer modo, 27 a festa estava a correr bem e parecia que Lily estava a
aproveitar ao máximo aquela oportunidade, travando conversa e apresentando o
seu encanto pessoal. - Achava que ias cumprir os teus deveres de anfitrião -
disse-lhe Rose. Baixou a vista para o copo vazio na sua mão e suspirou. -
Suponho que não estou a ser muito afável, pois não? Como resposta, Nick
estalou a língua e abanou a cabeça. - Bom, tu também não estás a sê-lo comigo
- reprovou-o ela. Nick riu-se, com incredulidade. - Essa é a pior desculpa que
ouvi em toda a minha vida. - Não era uma desculpa. - Oh! Portanto,
simplesmente estavas a fazer uma observação sobre ti. É isso? Rose decidiu que
era melhor mudar de assunto. - Este sítio não é mau - comentou. - Lily disse-
me que és o dono deste clube. - Não me digas que agora vais armar-te em
educada comigo. Rose optou por ignorá-lo. - Diz-me, como raios se consegue
juntar tanto dinheiro? - Ah, essa é a Rose que eu conheço: a Rose que não se
preocupa com o que chamam "tacto" e que não fala com rodeios! - Achava que não
querias que fosse educada contigo. Rose, que não estava habituada a seduzir,
começava a sentir-se um pouco desassossegada com 28 aquele antagonismo,
irritante e excitante ao mesmo tempo, que havia entre eles. Para não falar de
como aqueles olhos incríveis a faziam estremecer por dentro, os quais estavam
a olhar, pensativos, para ela naquele momento. - E então? - insistiu. - É uma
história muito chata. - Tu podes observar os outros através do teu
microscópio, mas não gostas que os outros façam o mesmo contigo. Finalmente,
Nick vacilou. - O meu pai era um imigrante grego. Chegou aqui com pouco mais
do que o que tinha vestido. Conheceu aquela que seria a minha mãe, uma jovem
inglesa, apaixonaram-se e casaram-se - disse-lhe. Os dois esforçaram-se muito
para que eu pudesse estudar numa escola privada. - Isso é maravilhoso! -
murmurou Rose, admirada. Gostaria que os seus tios se tivessem preocupado com
que tivesse tido uma boa educação. - Já faleceram? Nick assentiu. - Há vários
anos - murmurou, desviando a vista, algo incomodado, perguntando-se porque
estava a contar-lhe aquilo. - Bom, tenho de ir falar com os outros convidados
- disse-lhe, depois de pigarrear. Podes vir comigo e apresentar-te-ei algumas
pessoas ou, se preferires, posso deixar-te à vontade, a escolha é tua. Sem
saber muito bem porquê, Rose sentiu-se um pouco decepcionada com aquele fim
tão abrupto da sua conversa, mas, por outro lado, também aliviada. 29 - Oh,
não, não te preocupes comigo! Vou procurar Lily - disse, com um sorriso de
cortesia. - Lamento ter-te roubado parte do teu precioso tempo. Quando Nick se
afastou, ela também se levantou e começou a passear pelo local, à procura de
Lily. Enfim, pelo menos parecia que ninguém reparava nela. Encontrou a sua
irmã no meio de um pequeno grupo de homens. Mais do que falar, estava a ouvir,
mas estava sóbria. Ainda bem. Era uma boa oportunidade para se dar a conhecer.
Decidiu que seria melhor deixá-la sozinha e continuou a passear entre as
pessoas. Depois de mais dois copos de vinho até conversou com algumas pessoas
e deu-se conta de que não era assim tão difícil como pensara que seria. À
meia-noite decidiu que já estava na hora de, tal como a Cinderela, voltar para
casa. Parecia que era a única disposta a retirar-se cedo. Àquela hora a festa
estava no apogeu e Lily estava a conversar com uns tipos. Depois de quase dez
minutos à espera que se desse conta de que estava ali, finalmente Rose deu-se
por vencida e decidiu que lhe daria mais alguns minutos antes de voltar a
tentar, para lhe dizer que, pelo menos, ela ia-se embora. Continuou a andar
sem rumo entre as pessoas e acabou por entrar num corredor que havia ao fundo
do local, para fugir do ruído das conversas, do fumo e da música de fundo. Dos
dois lados havia portas fechadas, provavelmente escritórios. Ao fundo, uma
estava entreaberta e através da fresta via-se luz. 30 Movida pela curiosidade,
Rose aproximou-se e empurrou a porta. Não sabia o que esperava encontrar ali,
mas certamente não imaginara que encontraria Nick sentado a uma secretária,
com um computador portátil à frente. - Desculpa - murmurou, dando um passo
atrás. No entanto, quando Nick levantou a cabeça e os seus olhos se
encontraram com os dela, foi como se tivesse ficado paralisada. - Procuravas
alguma coisa? - perguntou ele, arqueando um sobrolho, divertido. Rose
pigarreou. -Não. Só estava... - A fugir da diversão e das gargalhadas? Entra e
fecha a porta - disse-lhe ele. Ao vê-la hesitar, acrescentou: - Não vou
morder-te, entra. Rose sabia que devia agradecer-lhe por a ter convidado e à
sua irmã, e partir, mas, em vez disso, obedeceu. No entanto, depois de ter
fechado a porta atrás de si, as suas pernas pareciam recusar-se a mexer-se
para a cadeira que ele estava a oferecer-lhe. -Vá, senta-te! - Eu... Na
verdade, já estava de saída. Recuperara o controlo sobre as suas cordas
vocais, graças a Deus! - Vi que havia luz aqui e... O que se supõe que estás a
fazer? Assim era muito melhor, disse para si. Finalmente, também recuperou o
controlo sobre as suas pernas e sentou-se. - O que te parece que estou a
fazer? 31 - Não é descortês que o anfitrião da festa esteja a trabalhar, em
vez de a falar com os convidados? - Toda a gente está a divertir-se, não
sentirão a minha falta - respondeu ele, encolhendo os ombros. Nick tinha a
impressão de que Rose estava incomodada com aquele vestido que usava, como se
usar vestidos não fosse algo que fizesse com frequência, como se se tivesse
visto obrigada a comprar um e tivesse comprado o menos favorecedor. Todas as
mulheres que tinham vindo à festa tinham-se esforçado por escolher um modelo
que as fizesse destacar. Rose, pelo contrário, vestira um fato de camuflagem
para que ninguém reparasse nela. Nick perguntou-se como seria o corpo que
existia por debaixo daquele vestido escuro, mas afastou imediatamente aquele
pensamento, bastante surpreendido por sequer lhe ter ocorrido. - Além disso
era algo urgente. Recebi uma chamada da Austrália, a pedirem-me uma certa
informação, e tinha de a enviar o quanto antes. - Nunca descansas? - De vez em
quando - respondeu ele, baixando a vista. Havia algo na forma dos seus seios,
apenas definida sob o corpete do vestido, que fez com que a sua imaginação
disparasse novamente. - Parece que Lily está a desfrutar da festa - comentou.
- Sim, parece. - Mas, pelo contrário, tu estás a aborrecer-te. - Não, claro
que não - replicou ela, só por cortesia. - Cada vez que olhei para ti,
pareceu-me que estavas a aborrecer-te tremendamente. 32 - Estavas a observar-
me? Nick não gostou da entoação que deu à pergunta. - É minha obrigação
certificar-me de que os meus convidados estão a divertir-se. - Se os teus
deveres como anfitrião te preocupam tanto, não sei como pudeste deixar a festa
para vires trabalhar para aqui! - insistiu ela. - Enfim, foi interessante
conhecer pessoas de outras áreas. - E a qual pertences tu? - perguntou Nick,
curioso. - Desculpa? - Ao que te dedicas? - À informática - foi a resposta
vaga de Rose. Comparada com a gente tão heterogénea de que se rodeava,
certamente aquilo devia soar-lhe muito chato. - E o que fazes exactamente? -
Nada interessante. Chegados àquele ponto, Nick sabia que devia dar-se por
vencido. Tentar descobrir mais um pouco sobre aquela mulher era tão agradável
como arrancar um dente a alguém. No entanto, a curiosidade foi mais forte e
desligou o computador. - Porquê? Rose suspirou, enfastiada. - Ouve, eu sei que
provavelmente sentes pena de mim e que... - Porque teria de sentir pena? -
Porque sei que não estou dentro da categoria de mulheres com que costumas
lidar. - Bom, como disseste antes, é enriquecedor conhecer pessoas de áreas
diferentes. 33 Rose suspirou novamente. - Está bem, se realmente tens algum
interesse em sabê-lo, faço um pouco de tudo: programação, actualização de
sistemas operativos, desenho de páginas Web... - Rose sentiu-se como se
estivesse a recitar de cor o seu currículo e pensou novamente que Nick devia
considerar aquilo tudo muito chato. - É um trabalho muito absorvente. -
Imagino - respondeu ele, assentindo com a cabeça. - É curioso que a tua irmã e
tu tenham acabado em dois mundos tão diferentes: a informática e o mundo do
espectáculo. Rose encolheu os ombros e levantou-se. - Tenho de ir à procura de
Lily, temos de nos ir embora. Rose não era a primeira mulher inteligente e
dedicada à sua carreira que Nick conhecia. Frequentemente, encontrara-se
sentado à frente de uma advogada ou de uma executiva, a discutirem os
pormenores para fecharem um negócio. Algumas delas, inclusive tinham tentado
seduzi-lo, mas Nick nunca se interessara por aquele tipo de mulheres. Podia
soar machista, mas, quando queria passar um bom bocado ou relaxar, preferia
uma rapariga tola e com um bom corpo a uma mulher com quem discutir questões
metafísicas. Ou, pelo menos, fora o que sempre achara. Não sabia porquê, mas
começava a sentir curiosidade de saber o que fazia aquele génio da informática
no seu tempo livre. - É tarde para ti? - perguntou-lhe. Rose, tal como seria
de esperar, ficou à defesa. 34 - Não particularmente - mentiu. - Mas já
ultrapassei largamente o limite de tempo que sou capaz de estar a falar de
coisas que não conheço e que não me interessam muito. Não tenho nada contra os
teus convidados, mas pertencem a um mundo muito diferente do meu. - E se não
estivesses aqui, o que estarias a fazer neste momento? - Estaria a ir para a
cama. - Com alguém em particular? Rose ficou a olhar, boquiaberta, para ele,
sem poder acreditar que lhe tivesse perguntado algo do género. O próprio Nick
não sabia o que o levara a fazer aquela pergunta. As palavras tinham escapado
da sua boca e já não podia fazer nada. Ficaram a flutuar no ar, no meio de um
silêncio tenso. - Não acho que isso te diga respeito - respondeu Rose,
finalmente, com o rosto corado. Virou-se e dirigiu-se para a porta com a
cabeça bem erguida. O facto de ter dinheiro não lhe dava o direito de dizer o
que queria. No entanto, antes de chegar à porta, Nick colocou-se à frente
dela, a bloquear-lhe a saída. Rose apertou os punhos e tentou controlar a sua
raiva. - Eu gosto de me meter nas coisas que não me dizem respeito - disse-lhe
Nick. - Diz-me, o que fazes no teu tempo livre? O que fazes quando sais até
altas horas da madrugada? Estaria a gozar com ela? Provavelmente, sim, porque
era impossível ter o mínimo interesse em saber algo referente a ela. Tudo o
que tinha de bonito tinha de desprezível. 35 Certamente, utilizava o seu
encanto para transformar as mulheres em robôs dispostos a fazerem o que ele
lhes pedia. - Quando saio com os meus amigos, conversamos - respondeu-lhe, com
aspereza. - Não preciso de me embebedar, nem de música de fundo muito alta
para sentir que estou a divertir-me. O sarcasmo implícito na sua resposta fez
com que Nick esboçasse um meio sorriso. - Parece um plano divertido. -É. - E o
que fazes depois? - O que queres dizer? - Depois de tu e os teus amigos
resolverem os problemas do mundo. - Não é isso que fazemos - replicou ela,
apertando os dentes. Não devia dar-lhe a satisfação de responder às suas
provocações. - E, mesmo que fosse, continuaria a ser muito mais divertido do
que beber copos atrás de copos e falar de frivolidades, e criticar toda a
gente. - Dizes isso, falando de alguém em particular? - De várias pessoas, na
realidade - respondeu Rose, com ironia. - Estão todas aqui e acho que são tuas
amigas. Se achara que iria ofendê-lo com aquilo, Rose não poderia estar mais
enganada, porque Nick desatou a rir-se. Rose sentiu-se confusa e fraca. - Fico
contente que o consideres tão engraçado disse-lhe, perguntando-se se Nick
teria reparado no ligeiro pânico na sua voz. 36 Não sabia porquê, mas, de
repente, havia algo no seu interior que a urgia a sair dali. - Oh, é claro que
sim, mas não respondeste à minha pergunta... sobre o que fazes quando já não
restam assuntos transcendentais para discutires com os teus amigos, enquanto
tomam copos de água mineral - disse ele, com um sorrisinho malicioso. - Não
sei onde queres chegar e acho que devias voltar para a festa, antes que mandem
alguém à tua procura. - Duvido que alguém tenha sentido a minha falta e o que
quero saber é o que fazes quando as noites loucas com os teus amigos acabam;
se voltas para casa com algum deles e têm uma sessão de sexo selvagem ou... -
Como te disse antes, não te diz respeito - respondeu ela, nervosa. Tinha de
sair dali. Estava a acontecer alguma coisa e não sabia muito bem o que era,
mas era qualquer coisa... perigosa. Felizmente, Nick afastou-se e inclusive
abriu-lhe a porta, mas, antes que tivesse posto um pé fora do escritório,
inclinou-se para ela e sussurrou-lhe ao ouvido, fazendo-a estremecer: - Devo
interpretar isso como um não? Rose teria querido pôr-se a correr, mas não o
fez. Saiu com passo tranquilo e firme, e com a cabeça bem erguida, sem se
dignar a responder à sua pergunta insolente. Rose não conseguia concentrar-se
no trabalho. Passara quase uma semana e ainda continuava a lembrar-se daquele
homem exasperante. Era uma sorte que a Fedco, a empresa para a qual já
trabalhava há cinco anos, não fosse uma empresa pequena, daquelas em que os
empregados trabalham numa sala comum e em que todos podem ver o que os outros
estão a fazer. Se fosse assim, ter-se-iam dado conta de que estava há mais de
quinze minutos a olhar para o ecrã do computador. Felizmente, estava tapada
pelos painéis que a separavam dos seus colegas. Desejava que chegasse a hora
de ir para casa, para poder deitar-se no sofá a ver televisão e esquecer, pelo
menos durante algumas horas, o amigo arrogante de Lily. Quando só faltavam
quinze minutos para que, finalmente, pudesse partir, de repente apareceu a sua
colega, Maggie, muito excitada e disse-lhe em voz baixa que havia um homem a
perguntar por ela na recepção. 38 - Que homem? - perguntou Rose, perspicaz,
aproveitando a interrupção para desligar o computador e começar a arrumar as
suas coisas. - Um que é um pão. - Não conheço nenhum homem que... - começou
Rose. De repente, ficou calada e sentiu que as suas faces se tingiam de rubor.
- Espera, que aspecto tem? - É moreno, alto... e é muito atraente. - Meu Deus,
eu sabia! O que raios terá vindo fazer aqui? - Mas... Quem é? Como o conheces?
- Anda a sair com a minha irmã - respondeu Rose, irritada, colocando alguns
papéis na sua pasta antes de a fechar. - É o tipo mais arrogante à face da
terra, é insolente, é... é detestável. - Oh! Bom, mas isso não muda o facto de
ser de cair para o lado - disse Maggie, com um suspiro. Lily fica sempre com
os melhores. Deve ser difícil ter de competir com uma irmã como ela. Eu...
Quer dizer... Enfim, não é que tu não... - Sei o que querias dizer, Mags, e
tens razão - interrompeu-a Rose, levantando-se. Vestiu o casaco, e sentiu um
aperto no estômago perante a ideia de voltar a ver Nick. - Embora deva dizer
que aquele tipo não é precisamente o tipo de homem pelo qual uma mulher no seu
juízo perfeito queira competir. É daqueles que vêem as mulheres como objectos
para usar e deitar fora - explicou-lhe. Os outros também estavam a começar a
levantar-se para partir e desfrutar do fim-de-semana. - O que quero dizer é
que é o tipo de homem do qual qualquer mulher deveria fugir... 39 Maggie
emitiu um gemido abafado e recuou. - Meu Deus, obrigado por falares tão bem de
mim! - comentou Nick, atrás de Rose. Esta sentiu-se empalidecer e virou-se
para ele, tentando manter a compostura. Maggie desculpou-se atabalhoadamente e
afastou-se para o seu lugar. - O que fazes aqui? - perguntou Rose a Nick,
decidindo que a melhor defesa era o ataque. - Lily veio contigo? -Não. - Então
o que estás a fazer aqui? Era evidente que fora para ali directamente do
trabalho e estava incrivelmente sexy depois de, certamente, ter passado horas
sentado atrás de uma secretária, tal como ela. Rose, pelo contrário, no fim de
um dia de trabalho, tinha um aspecto terrível: o coque que fizera para ir para
o escritório meio desfeito, o batom praticamente desaparecera e o rosto pálido
sob as luzes fluorescentes. - Vim porque temos de falar da tua irmã. - Porquê?
- perguntou Rose, sentindo que o pânico se apoderava dela. Por experiência,
quando alguém lhe dizia que tinham de falar de Lily, tratava-se de más
notícias. - O que se passou? - Podemos falar noutro sítio? - perguntou-lhe
Nick, consciente dos olhares curiosos dos outros empregados. - Não vou a lado
nenhum contigo. O que tiveres para dizer, diz-me aqui - respondeu-lhe ela. Meu
Deus, no que se metera Lily? Drogas? Talvez lhe devesse dinheiro? Tê-la-ia
engravidado? 40 Talvez tivesse ficado grávida e lhe desse vergonha dizer-lhe.
-Rose, por favor...! - Já te disse, não vou a lado nenhum contigo. - Teimosa
como uma mula...! - murmurou Nick, abanando a cabeça. - Mas não te preocupes,
eu vou-me embora, já que parece que não queres ouvir nada do que tenho para te
dizer. - Isso não é verdade. Só que... ainda não posso ir. Tenho um monte de
trabalho. - Com o casaco vestido e o computador desligado? Rose corou e, ao
desviar a vista, viu que a única coisa que estava a conseguir ao discutir com
ele era aumentar o interesse dos poucos empregados que ainda não se tinham ido
embora. - Porque Lily não veio? Aconteceu-lhe alguma coisa? - Não, não lhe
aconteceu nada. A questão é que parecia um pouco reticente em contar-te...
Bom, o que eu vim contar-te, portanto ofereci-me para o fazer no seu lugar. E,
agora, se não te importares, vamos sair daqui e falar noutro sítio. Rose
olhou, irritada, para ele, mas finalmente concordou e alguns minutos depois
estavam fora do edifício. - Tenho o carro estacionado a alguns quarteirões
daqui - disse-lhe Rose. - O meu motorista está à nossa espera - respondeu ele,
assinalando um veículo que estava a alguns metros, junto do passeio. - Depois,
se quiseres, trago-te de volta ao sítio onde tens o teu carro. 41 Rose abriu a
boca para protestar, mas, ao dar-se conta de que era precisamente o que ele
esperava, respondeu: - Está bem. - Está bem? - repetiu ele, com uma gargalhada
incrédula, enquanto se punham a andar. - Isso significa que não vais fazer um
discurso feminista sobre tu saberes conduzir? - Eu não faço discursos
feministas - replicou ela, acaloradamente - simplesmente defendo as coisas em
que acredito. - Ou seja, descarregas toda a tua artilharia contra quem tem uma
opinião diferente. - Isso não é verdade e incomoda-me que me acuses de coisas
que não são verdade. Tinham chegado junto do veículo e, quando Nick lhe abriu
a porta e Rose entrou, não lhe passou despercebido como se enrolou no seu
casaco, como se a protegesse de algum modo, e não conseguiu reprimir um
sorrisinho. Não era habitual sair do escritório às cinco menos um quarto, mas
não se arrependia. Estava a fazer um favor a Lily, mas, além disso, tinha de
admitir que a sua irmã o divertia. Não estava habituado a que nenhuma mulher
se mostrasse beligerante com ele. - Conheces algum sítio por aqui onde
possamos falar com calma? - perguntou-lhe. O simples facto de estar dentro de
um espaço fechado com aquele homem fazia-a sentir-se incomodada, porque,
apesar de como mulher não conseguir evitar sentir-se atraída por ele, sabia
que pertencia a Lily e ao seu mundo. 42 Depois de dar instruções ao motorista,
Nick recostou-se novamente e lançou-lhe um breve olhar. - Pareces tensa -
disse. - Porquê? Ficas nervosa por estares sentada ao meu lado? - Porque
haveria de ficar nervosa por causa disso? Estou tensa porque não sei o que
vais dizer-me, mas tenho o pressentimento de que não vou gostar. - Nesse caso,
não penses nisso e fala-me do teu trabalho. Não imaginei que trabalhasses numa
empresa tão grande. Rose encolheu os ombros. - Não me importa que seja grande.
Além disso, não vais dizer-me que os teus escritórios são pequenos e
acolhedores. Nick riu-se. - No mínimo, o design é mais humano. - E como se
consegue isso? - perguntou ela, virando-se, curiosa, para ele. Não imaginava
como um edifício de betão podia tornar-se algo menos frio e impessoal do que a
Fedco. - Bom, com uma iluminação mais quente, tons mais agradáveis nas
paredes... e, sobretudo, plantas. - E tudo isso é obra tua? - Não, mas aprovei
os pormenores todos. Suponho que isso choca com a ideia que certamente terás
de mim, a fustigar os meus empregados com um chicote, acorrentados aos seus
postos de trabalho. - Sim, na verdade, sim. Nick desatou a rir-se novamente.
De todas as mulheres com quem saíra, não recordava nenhuma que o tivesse feito
rir-se. 43 Minutos depois, chegaram ao restaurante, que estava bastante
concorrido, para alívio de Rose. Depois de os terem levado até uma mesa e lhes
terem servido o que pediram: um sumo de laranja para ela e uma cerveja para
ele, Rose foi directa à questão: - E então? O que tens para me dizer sobre
Lily? Nick olhou um instante para ela, antes de responder com outra pergunta.
- O que te contou a respeito da nossa relação? - Não falámos de ti. - Isso é
estranho, tendo em conta a liberdade com que falas de mim com outras pessoas.
Rose corou, mas sustentou-lhe o olhar. - O que quero dizer é que não falámos
de ti porque não quero que sinta que tem de ficar do teu lado ou do meu. - Ah,
que gesto tão nobre da tua parte! - Sei que andaram a ver-se - disse Rose,
respondendo à pergunta que lhe fizera, - mas não sei quão séria é a vossa
relação. É sobre isso que queres falar comigo? Que a vossa relação é a sério?
- Oh, sim, muito a sério! - respondeu Nick, antes de beber um gole da sua
cerveja. - Acho que é agora que me avisas a respeito de não lhe tocar nem num
cabelo; sabes que sou o lobo mau. - Se só se tratava disso, Lily podia ter-me
dito. - Bom, talvez tenha medo de defender o que quer para si, porque tu nunca
lho permitiste. - Ela disse-te isso? - Não, só o li nas entrelinhas. - Duvido
que possas fazê-lo, não sabes nada de nós. 44 - Não preciso de saber nada para
ver o que tenho diante do nariz. É evidente que és tu quem impõe as regras e
que é Lily quem obedece. - Se estiver grávida, espero que faças o correcto e
que te cases com ela. Pela primeira vez na sua vida, Nick ficou sem saber o
que dizer e ficou a olhar, surpreso, para ela. - Achas que...? - abanou a
cabeça, com incredulidade. - Alguma vez pensas no que dizes antes de falar? -
O que se supõe que devo pensar? - perguntou-lhe ela. - Apresentas-te no meu
escritório e dizes-me que tens de falar comigo sobre algo que a minha própria
irmã não se atreveu a contar-me. Naturalmente, pensei o pior. - E achas que o
pior que pode acontecer a uma mulher é ficar grávida? - É claro que não!
Quando duas pessoas se amam e têm uma relação estável, a gravidez é a coisa
mais bonita que pode acontecer a uma mulher, mas no caso de Lily... -
Surpreendes-me. Nunca diria que acreditas em "felizes para sempre" e tudo
isso. - Não vem ao caso no que eu acredito ou deixo de acreditar - respondeu-
lhe ela, que começava a perder a paciência. - Se Lily estiver grávida... - Oh,
pelo amor de Deus! Não está grávida - interrompeu-a Nick. Quando apoiou os
antebraços na mesa e se inclinou para ela, Rose teve de fazer um esforço para
não se afastar. - Vamos esclarecer uma coisa, Rose - disse-lhe 45 Nick. - Não
sou estúpido. Sempre que tenho relações com uma mulher, certifico-me de usar
preservativo, porque, acredita em mim, a última coisa que quero é ver-me preso
por uma mulher que fez com que a engravidasse para me sacar dinheiro. - Isso é
a coisa mais cínica que já ouvi na minha vida! - exclamou Rose. - Estás a
dizer-me que achas que a única razão pela qual uma mulher teria uma relação
contigo seria para te sacar dinheiro? É assim que vês as mulheres, como bruxas
ávidas de dinheiro? Nick olhou, furioso, para ela. - Vives no mundo real,
Rose? Ou és daquelas pessoas que passam a vida coladas ao computador e não
fazem ideia de como é a vida? Deves ser muito ingénua, se não sabes que é o
dinheiro que move o mundo. Surpreender-te-ia saber a quantidade de mulheres
que estiveram comigo só por causa do meu dinheiro. - Meu Deus, lamento por ti!
Nick abanou a cabeça. - Lily não está grávida, é só isso que precisas de
saber. - Alivia-me sabê-lo - respondeu ela. - E peço desculpa se te ofendi -
acrescentou, contrariada. Sim, era verdade que para muitas mulheres um homem
com dinheiro era mais atraente do que um que não o tinha, mas tinha a certeza
de que, bonito como era, mesmo que não tivesse um cêntimo continuaria a ter
imensas mulheres atrás dele. - Desculpas aceites - respondeu ele, contrariado.
- Bom, e porque não me dizes de uma vez por todas sobre o que querias falar
comigo? 46 Nick respirou fundo. - Ouve, Rose, gosto muito da tua irmã, mas,
antes que te chateies comigo, deixas-me dizer-te que não temos nenhuma
relação, pelo menos não no sentido que tu pensas. - O que queres dizer? Nick
revirou os olhos. - Precisas que te faça um desenho? - perguntou-lhe,
irritado, afrouxando o nó da gravata para depois desabotoar alguns botões da
camisa. Seria imaginação sua ou estava ali um calor dos diabos? Lily e eu não
vamos para a cama. Não é o tipo de relação que temos. - Então, que tipo de
relação têm? - perguntou Rose. - Gosto de Lily e conheço um monte de gente na
indústria do cinema, e... Enfim, a única coisa que fiz foi ajudá-la. - Ajudá-
la no quê? Queres dizer que a puseste em contacto com gente que pode dar-lhe
uma oportunidade? Isso... foi muito amável da tua parte murmurou Rose, um
pouco aturdida. - Era só isso? Porquê todo este secretismo? E porque Lily não
podia dizer-mo? -Alguma vez ouviste falar de Damien Hicks? -Não. - É um dos
produtores mais importantes do momento - explicou-lhe Nick. - Conheci-o há
cinco anos, quando estava a rodar um anúncio nas Maldivas para uma das minhas
empresas. Nessa altura, Damien estava a começar. Fez aquela campanha de
publicidade para mim e eu financiei o seu primeiro 47 filme. Era apenas uma
curta-metragem, mas depois a sua ascensão foi meteórica e gosta de trabalhar
com novos talentos. - E Lily é um - assentiu Rose, com um sorriso. Mas... não
entendo. Depois das desilusões que apanhou todas as vezes que a têm rejeitado,
imaginei que estaria desejosa de me contar algo do género. - A questão é que
Damien precisa de uma protagonista para o seu novo filme e, para que não
penses que o ofereci a Lily, quero que saibas que a única coisa que fiz foi
pedir a Damien que lhe fizesse um teste, tal como a todas as outras actrizes
que se apresentaram para o papel. Damien escolheu-a porque lhe pareceu
perfeita para o papel, eu não tive nada a ver com a sua decisão. - Porque
tenho a impressão de que há um "mas"? Nick suspirou. - Há, e isso é o que Lily
não se atrevia a contar-te. O filme vai ser rodado nos Estados Unidos e há
mais de cinquenta por cento de hipóteses de que, uma vez lá, seja apanhada
pela indústria de Hollywood. Lá, existem mais oportunidades e quando se der a
conhecer com um papel de protagonista num filme de Damien Hicks... Rose
sentiu-se empalidecer. - E Lily quer ir viver para a América? - Quer
experimentar. - Estou a ver. - Mas quer ir-se embora com a tua bênção. - Pois!
- comentou Rose. Lily e ela estavam juntas desde sempre, nunca se tinham
separado. - Claro que tem a minha bênção! Eu... Eu só quero o melhor 48 para
ela e se tem uma possibilidade de fazer com que os seus sonhos se tornem
realidade... Enfim, quem sou eu para me interpor no seu caminho? Sabia que
deixá-la partir era o correcto, mas, mesmo assim, sentia-se terrivelmente
vazia por dentro. - Vamos embora. Rose respirou fundo e levantou-se. - Estou
bem, a sério. - Vê-te ao espelho e diz isso a ti mesma. Rose vestiu o casaco e
pendurou a mala ao ombro, com mãos trémulas. Enquanto saíam do local, não
conseguiu evitar pensar que tuclo aquilo era culpa de Nick. Sabia que deveria
sentir-se feliz por Lily e agradecida por ele lhe ter dado aquela
oportunidade, mas... Meu Deus, era tão egoísta que preferiria que Lily ficasse
com ela, em vez de ir atrás dos seus sonhos? Apesar dos seus protestos, Nick
pediu para que o seu motorista a levasse a casa e, ao chegarem, insistiu em
entrar e ficar um pouco com ela. - Senta-te - disse, quando entraram na sala.
Vou buscar-te uma bebida. - Não tenho sede - replicou ela. - E não tens de
ficar, estou bem, a sério. - Lily voltará daqui a pouco. Queres que chegue e
te veja neste estado? - Não estou em nenhum estado! - insistiu ela, esboçando
um sorriso. No entanto, o lábio inferior começou a tremer-lhe e nem sequer
fechar os olhos com força a ajudou a conter as lágrimas. 49 Nick dirigiu-se
imediatamente para o seu lado e rodeou-a com os seus braços. Ele nunca tivera
irmãos e imaginara, tal como Lily, que aquilo seria algo difícil de digerir
para Rose, mas não esperara que a afectasse àquele ponto. As suas lágrimas
estavam a molhar-lhe a camisa, mas Rose chorava em silêncio, como se lhe desse
vergonha. Enfiou a mão no bolso das calças e tirou um lenço lavado que lhe pôs
contra a face. Rose agarrou-o e agradeceu-lhe entre soluços. - Eu devolvo-to,
prometo-te - disse-lhe, esboçando um sorriso. Nick secou-lhe uma lágrima com o
dedo e ela recuou. - E obrigada por me trazeres - acrescentou, olhando para
ele um pouco sobressaltada. - Sei que fiquei um pouco sentimental, mas
realmente estou muito contente por Lily. Merecia esta oportunidade. - Vou
preparar-te uma chávena de chá. - Na verdade, preferia ficar sozinha. - Não
sejas tola! Vá, senta-te! - ordenou-lhe Nick, assinalando-lhe o sofá com um
gesto. - Não demoro nem cinco minutos. Demorou inclusive menos, porque, em vez
do chá, lhe serviu uma coisa um pouco mais forte. - Ajudar-te-á a acalmar os
nervos - disse-lhe. - O que é? - perguntou Rose, agarrando no copo que lhe
estendia. - Um velho remédio caseiro. Rose cheirou a bebida. - E o que leva? -
Vodka e um pouco de sumo de ananás que tinhas no frigorífico - respondeu ele,
sentando-se ao 50 seu lado. Observou-a em silêncio, enquanto Rose bebia um
gole, e disse-lhe: - Lily está a pensar em recusar o papel. Acha que te irás
abaixo se ela se for embora. - Não vou deixar que o faça, seria uma loucura
disse Rose. Bebeu outro gole e olhou novamente para Nick. - Não posso
acreditar que tenha passado menos de um mês que nos conhecemos e que tenhas
virado as nossas vidas de pernas para o ar. Nick franziu os lábios. -
Perguntava-me quando me culparias. - Não estava a culpar-te - replicou Rose. -
Era apenas uma observação. Sentira-se fraca e vulnerável nos seus braços, algo
que achava que deixara para trás quando os seus pais tinham morrido e os seus
tios se tinham encarregado delas. Era uma sensação estranha. - Alguma vez
pensaste em como poderás enriquecer a tua vida se saíres um pouco daquilo a
que estás habituada? - Não - foi a resposta brusca de Rose. - Quando era
pequena, vi-me obrigada a fazê-lo quase constantemente e não me enriqueceu
absolutamente. - Referes-te aos anos que viveram com os vossos tios? -
Andávamos de um lado para o outro, como se fôssemos nómadas. Experimenta mudar
o teu lugar de residência de seis em seis meses e depois diz-me como é bom
saíres daquilo a que estás habituado respondeu-lhe Rose. - Bom, talvez Lily
seja um pouco mais aventureira do que tu. 51 O tom afectuoso com que
pronunciou aquelas palavras não passou despercebido a Rose. A maioria das
pessoas gostava de Lily porque era alegre, doce, menina. Pela primeira vez na
sua vida, sentiu uma pontada de ciúmes. - Sim, nisso tens razão - assentiu num
tom calmo. Provavelmente, aos seus olhos era muito entediante, porque as
mulheres que povoavam a sua vida eram mulheres borbulhantes, mulheres
atrevidas, mulheres que brilhavam com luz própria. - Enfim, se não te importas
preferia que não estivesses aqui quando ela chegar - disse, levantando-se.
Quero falar com ela em privado, embora não precises de te preocupar, prometo-
te que não vou tentar fazê-la mudar de ideias. Nick também se levantou.
Vislumbrara uma parte da verdadeira Rose, uma Rose vulnerável, e, embora a
vulnerabilidade nunca lhe tivesse parecido um traço atraente numa mulher, de
repente queria saber mais dela. - Bom, suponho que não voltaremos a ver-nos
disse-lhe, quando chegaram ao hall, enquanto ele vestia o casaco. - Porque
dizes isso? - Quando Lily se for embora, já não terás nenhum motivo para vir
aqui - respondeu ela. - É verdade, a respeito de Lily... Por favor, não lhe
digas que... - Que choraste? Que te foste abaixo? - perguntou Nick, ao vê-la
hesitar, como se não soubesse que palavra empregar. - Que perdi um pouco o
controlo - respondeu 52 Rose, finalmente, levantando o queixo, orgulhosa, e
olhando para ele nos olhos sem pestanejar. Nick não queria partir, ainda não,
mas Rose abriu a porta e afastou-se. - Não lhe direi nada, dou-te a minha
palavra. Rose assentiu e, depois de ele atravessar a soleira, fechou a porta
sem fazer ruído. , 53 Escrever e-mails a Lily começava a tornar-se um
exercício de escrita criativa para Rose. Lily já estava há três semanas no
estrangeiro e era evidente que estava encantada. Falava muito bem de Damien,
dos seus colegas e até das maquilhadoras, dos operadores de câmara e do resto
da equipa. O apartamento que partilhava com mais quatro raparigas não era
grande coisa, dissera-lhe, mas o edifício tinha piscina. Além disso, a palavra
"alucinante" parecia ter-se tornado a sua palavra preferida. Tudo era
alucinante: desde o filme que estavam a fazer até ao estilo de vida americano.
Rose alegrava-se por ela, como é claro, mas parecia que a casa estivera à
espera da partida de Lily para que começassem a surgir avarias. Primeiro,
começara a pingar na casa de banho. O canalizador dissera-lhe que
provavelmente poderia fazer o arranjo com um "remendo", mas que a canalização
já era bastante antiga e que, mais cedo ou mais tarde, teria de pensar em
substituí-la. 54 Depois, fora a máquina de lavar roupa, que se estragara sem
conserto possível e tivera de comprar uma nova. E, naquele momento, sentada na
cozinha, estava a ver no tecto o que parecia uma mancha de humidade. Gemeu e
perguntou-se como poderia dizer a Lily que precisava de dinheiro, sem que esta
se sentisse culpada e começasse a preocupar-se. Lily já se desculpara por
ainda não ter podido enviar-lhe nada e prometera-lhe que o faria assim que
pudesse. Naquele momento, o que ganhava só lhe chegava para pagar a sua parte
da renda do apartamento onde vivia. Uma semana mais tarde, Rose estava
novamente sentada na cozinha, enquanto os canalizadores trabalhavam no andar
de cima. Nem queria subir. Horrorizava-a a ideia de ver o chão levantado e as
paredes cobertas de pó. Não tivera outro remédio, senão chamá-los para que lhe
mudassem a canalização. Precisamente naquele momento, tocaram à campainha e
Rose perguntou-se que nova "surpresa" o destino lhe proporcionava. Um vizinho
que viria dizer-lhe que lhe tinham furado os pneus do carro? Levantou-se e
dirigiu-se para o hall, vestida com a sua "melhor" roupa: uma camisola velha,
umas calças de fato de treino e os chinelos de andar por casa. No entanto,
quando abriu a porta encontrou Nick. O seu coração disparou e teve de fazer um
esforço para manter a compostura. - Olá! O que estás a fazer aqui? 55 -
Directa como sempre. O que é esse ruído todo? - Eh? Oh, tenho os canalizadores
no andar de cima, a fazer alguns arranjos - respondeu ela, encolhendo um
ombro. - Não vais convidar-me para entrar? - Lily disse-te para vires ver-me?
- perguntou Rose, perspicaz. Tivera o cuidado de não mencionar os seus
problemas financeiros nos e-mails que lhe enviara, mas... Que outra razão
podia haver para que Nick estivesse ali? Talvez Lily tivesse lido nas
entrelinhas que se passava alguma coisa e o tivesse mencionado a Nick, que
tanto fizera por ela, e lhe tivesse pedido para se certificar de que a sua
irmã estava bem. A ideia de que aquilo fosse uma visita de caridade fê-la
sentir-se tremendamente irritada. - Estava nas redondezas. - A sério? Nunca me
tinhas dito que era uma zona que frequentavas. - Rose, pára de discutir e
deixa-me entrar! - respondeu-lhe ele. E, sem lhe dar tempo para reagir,
empurrou a porta e entrou. As últimas duas semanas não tinham sido
precisamente calmas, mas pensara em Rose em mais de uma ocasião, sem motivo
aparente. Depois, Lily telefonara-lhe, preocupada, a dizer-lhe que lhe parecia
que a sua irmã estava estranha, e pedira-lhe que fosse visitá-la. Aquela
desculpa para ver Rose fora para Nick como se, depois de semanas com um ardor
tremendo, 56 tivesse descoberto onde lhe picava e finalmente pudesse coçar-se.
Não tinha a certeza de por que razão queria voltar a ver uma mulher que o
tratara mal desde o início, mas não conseguira tirá-la da cabeça e achara que
a melhor forma de o resolver seria vendo-a. - O que disseste que estão a
arranjar? - perguntou, olhando para o tecto. - É uma coisa pequena, nada
importante - respondeu ela. - Com este ruído todo que estão a fazer, não
parece uma coisa pequena. - Ainda não me disseste porque vieste - recordou-lhe
ela. - Se foi Lily quem te pediu para vires, podes ir-te embora e dizer-lhe
que não precisa de se preocupar, está tudo bem. - Embora a casa esteja a cair
aos bocados? - Não está a cair aos bocados! - protestou ela, irritada. Nick
esquecera-se da facilidade com que se alterava e também de como era divertido
provocá-la. - Porque não me convidas para um café e me contas qual é o
problema? Pareces stressada. Rose soprou. Era óbvio que estava stressada.
Tinha um exército de canalizadores no andar de cima e a última pessoa que
queria ver naquele momento acabara de entrar porque a sua querida e bem-
intencionada irmã lhe pedira que fosse ver como estava. E, ainda por cima, ela
estava horrível, enquanto ele, embora vestisse um pólo e umas calças de ganga,
tinha um aspecto fantástico. 57 - Estou mais stressada agora que estás aqui
disse-lhe. - Então, admites que estás stressada. Lily disse-me que, da última
vez que falou contigo ao telefone, lhe pareceu que estavas estranha. Rose
estrangulou mentalmente a sua irmã. - E pediu-te que viesses cá para te
certificares de que não ia atirar-me de nenhuma ponte. - Bom, também não foi
isso - respondeu ele. Naquele momento, ouviu-se uma pancada tremenda no andar
de cima e Rose gemeu, angustiada, esperando ouvir a voz de Andy, o chefe dos
canalizadores, a chamá-la para lhe pedir que subisse. Antecipou-se, mas,
quando estava a subir as escadas, Andy apareceu no patamar com cara de más
notícias. - Lamento, Rose. Nick subira atrás dela e Rose sentiu-o a
bisbilhotar por cima do seu ombro. - Encontrámos uma coisa que não
esperávamos. Rose não se atrevia a perguntar, portanto ficou em silêncio,
enquanto o homem abanava a cabeça e olhava para ela, como que dando-lhe os
pêsames. - Amianto. - Mas... Como é possível? - Está debaixo das tábuas do
chão - explicou-lhe o canalizador. - Não está em todo o lado, mas receio que,
por enquanto, teremos de voltar a pôr as tábuas no sítio até o retirarem.
Terás de contactar uma empresa especializada para que o faça. - Por favor,
diz-me que estás a brincar! - Lamento, mas receio que não. 58 - E não sabes
quanto custa que o retirem? Andy virou-se um momento para olhar para os seus
homens, que estavam a voltar a pôr as tábuas, e encolheu os ombros. - Sabes
como o amianto é tóxico, Rose? Tendo em conta que não tens outra opção, senão
pedires para que venham retirá-lo, mais vale não pensares nisso. Rose
acompanhou-os até à porta, demasiado angustiada com os seus problemas para se
preocupar com Nick, que ia atrás dela. Quando partiram, fechou a porta e
virou-se para ele. - Tinhas razão: a casa está a cair aos bocados, não tenho
dinheiro e, sim, estou muito stressada, mas não quero que Lily saiba. Quero
que aproveite as oportunidades que está a ter na América, sem que tenha de se
preocupar comigo. - Há quanto tempo começaram estes problemas? Rose encolheu
novamente os ombros. - Desde que Lily se foi embora - respondeu ela, com um
suspiro cansado. Nick levou-a para a cozinha e preparou chá. - Realmente não
falaste disto a Lily para não a preocupares? - perguntou Nick, quando se
sentaram. - Do que teria servido? Está a milhares de quilómetros e não queria
que voltasse para cá a correr, e que arruinasse o seu esforço. - De modo que
preferiste carregar com tudo concluiu ele, olhando, pensativo, para ela. - Só
que agora tens despesas que não podes enfrentar sozinha. 59 - Farei algumas
horas extraordinárias no trabalho - respondeu Rose, que não queria que
sentisse pena dela. - Vão ter de ser mais do que "algumas" - respondeu ele,
levantando os olhos para a mancha no tecto. - Eu desenvencilho-me! - insistiu
Rose. - Imagino que no teu mundo seja completamente diferente, que ao
estalares os dedos os problemas se resolvam. De facto, provavelmente não
conheces nenhuma mulher que tenha de fazer malabarismos para chegar ao fim de
mês e que não pode permitir-se o tipo de luxos que para ti são normais. - O
facto de me atacares não vai fazer com que os teus problemas se resolvam. -
Bom, se não te importares, gostava que te fosses embora, tenho de telefonar
para o banco. - Ao sábado? - Não sei como não me tinha ocorrido antes murmurou
Rose, que não estava a ouvi-lo. - Posso ir ao banco e pedir um empréstimo. -
Que depois terás de pagar. - Mas, pelo menos, poderei pagar as obras -
respondeu ela. - E se vais ficar aí sentado a dizer coisas óbvias, podes
acabar o chá e ir-te embora. - Muito bem, imaginemos que pedes um empréstimo e
que to concedem. Onde vais viver enquanto fazem as obras? -Aqui, é claro! -
Com pó em todo o lado? Com um mineral tóxico debaixo do chão? E o que vais
fazer quando vierem retirá-lo? Porás uma máscara? 60 Rose sentiu que os seus
olhos se enchiam de lágrimas de raiva e de frustração. - Podes fazer o favor
de te ir embora e deixar-me sozinha? - Para que possas ficar aqui, a sentir
pena de ti própria? - Não estou a sentir pena de mim própria - resmungou ela.
- Sei como vou resolver isto e na segunda-feira irei ao banco logo de manhã. -
Sim, mas não podes ficar aqui. - E o que sugeres que faça? Oh, já sei, pedirei
ao meu mordomo que me reserve uma suíte no Palace até estar tudo resolvido! -
respondeu ela, com sarcasmo. Nick reprimiu um sorriso. - Tenho uma ideia
melhor: tu precisas de dinheiro e eu tenho-o. - Esquece, Nick! Agradeço-te que
tenhas ajudado a minha irmã, mas eu não preciso de nada de ti - respondeu-lhe
ela. Haveria mulher mais teimosa do que aquela?, perguntou-se Nick, sentindo
um desejo repentino de derrubar os muros que erguera à volta dela. - Estás a
deixar que as emoções te controlem e assim não resolverás nada. Se fores ao
banco e pedires um empréstimo, passarás vários anos a matares-te a trabalhar
para pagares o dinheiro e os juros. - E, em vez disso, sugeres que aceite o
teu dinheiro? E o que ganhas em troca? Uma imagem dela nua na sua cama
apareceu na mente de Nick, mas apressou-se a afastá-la. 61 - Ouve, Rose, a
questão é que não podes esconder da tua irmã um problema desta magnitude.
Entendo que queiras protegê-la e que queiras evitar-lhe desgostos, mas tem o
direito de saber a verdade, de saber pelo que estás a passar. Devias confiar
nela. Não acho que vá fazer a tolice de voltar a correr, quando certamente
saberá que não vai resolver nada com isso. Se souber que estiveste a esconder-
lhe isto, sentir-se-á traída. - Não queiras conhecer a minha irmã melhor do
que eu. - Não quero nada, mas tens de lhe contar. É claro que, quando lhe
contares, quererá voltar e certificar-se de que estás bem, mas as coisas
seriam diferentes se... - Se o quê? - perguntou ela, quando ficou calado. - Se
soubesse que eu estou a cuidar de ti - respondeu Nick. Porque lhe dissera
aquilo? Nunca na sua vida cuidara de nenhuma mulher. As regras do jogo pelas
quais se regia eram sempre muito simples: nada de dependências, nada de
compromissos. No entanto, Rose despertava uma ternura inusitada nele, uma
necessidade de a proteger. Não correspondia absolutamente ao seu ideal de
beleza feminina e, sim, de certo modo sentia-se atraído por ela, mas tinha a
certeza de que o que sentia não era desejo. Claro que, fosse o que fosse,
indiscutivelmente era uma novidade para ele e para o seu paladar enfastiado,
um sabor novo que tinha um encanto especial. - Oh, por favor! 62 - Ouve, só
estou a oferecer-te ajuda - disse-lhe ele, irritado. - Porque não podes
aceitá-la? - Porque não me pareces o tipo de homem que ande por aí a ajudar
desinteressadamente raparigas em apuros - respondeu-lhe Rose. A menos que se
parecessem com Lily ou que quisesse alguma coisa delas. - Estás a oferecer-me
ajuda porque te sentes culpado, porque, por uma coincidência do destino, isto
tudo começou a acontecer quando apareceste nas nossas vidas. Tens pena da
meia-irmã feia e patética que ficou sozinha e tem dificuldades em seguir em
frente. - Não estou a dizer que vou dar-te o dinheiro sem mais nem menos -
indicou ele.- Parece-me que te esqueces que, acima de tudo, sou um homem de
negócios. - Então, o que sugeres? Não é que vá considerar sequer a tua oferta,
claro! - Porque és uma teimosa. - Não, porque eu não gosto de estar em dívida
com ninguém. - Excepto com o banco. - Isso é diferente - respondeu Rose,
incomodada com a forma como dava a volta a tudo o que dizia. Para Nick, aquela
"novidade" estava a tornar-se um desafio e os desafios eram sempre
estimulantes. - Tira alguns meses de férias. - Tiro alguns meses de férias? -
repetiu ela. Ficara louco ou quê? - Ouviste uma única palavra do que te disse?
- Rose abanou a cabeça, levantou-se e levou as duas chávenas para o lava-
loiça. - Como vou fazer isso? - perguntou-lhe, virando-se. - Como vou pagar as
contas? 63 - Quanto cobras? Rose corou. Não discutiria as suas finanças com
aquele homem, mesmo que a sua vida dependesse disso. - Então? Não precisas de
ser tímida. - Não te diz respeito! - respondeu-lhe Rose. Andava há meses a
dizer a si mesma que devia pedir um aumento, que era boa no seu trabalho e que
o merecia, mas não se atrevera a fazê-lo. Finalmente, dando-se conta de que
Nick não iria desistir, respondeu-lhe. Não se riu, como esperara que fizesse,
mas ficou a olhar alguns segundos para ela, como que a ponderar algo. - Estou
a tentar entrar no negócio do turismo disse-lhe, - e quero construir um hotel
de luxo. - Um hotel de luxo? - Um hotel pequeno e exclusivo - assentiu ele. -
Deixa-me adivinhar: só para gente que possa pagá-lo. Nick encolheu os ombros.
- Como te disse, sou um homem de negócios. Estou a pensar em construí-lo no
Bornéu. - Bornéu - repetiu ela, com certo cepticismo. - Tenho a certeza de que
será um sucesso. Quero que respeite o ambiente e que seja algo diferente, que
ofereça algo que não possa encontrar-se noutros lugares, nem noutros hotéis. E
é aí que tu entras. - Eu não sei nada de hotéis. Nem sequer recordo quando foi
a última vez que me hospedei num hotel. - Não podes continuar a viver aqui até
retirarem o amianto e as obras acabarem - disse-lhe Nick. Com o que vou
oferecer-te, não terás de acampar 64 com um saco-cama em casa de uma amiga.
Pagar-te-ei a estadia em três dos melhores hotéis de Londres durante os
próximos dois meses. Assim, poderás ver como são e como funcionam. A tua
missão consistirá em descobrir porque têm o sucesso que têm. Além disso,
pagar-te-ei o dobro do que estás a ganhar agora e será uma oportunidade de
fazeres algo diferente, em vez de passares o dia sentada à frente de um
computador num escritório. - Não tens ninguém que possa fazer esse trabalho? -
E tu és incapaz de dizer simplesmente obrigado, em vez de arranjar sempre um
"mas" para tudo? - É que... Não sei... Porque tenho a sensação de que há algum
motivo por detrás da tua oferta? - perguntou Rose. Sim, talvez arranjasse um
"mas" para tudo, mas o seu lado racional estava a ponderar a proposta que
estava a fazer-lhe. Trabalhava há tempo suficiente na empresa para saber que
lhe dariam sem problemas uma licença de alguns meses sem vencimento e a
verdade era que a ideia de fazer algo diferente a atraía, apesar de também a
assustar um pouco. - Queres saber porquê? Porque és desconfiada por natureza -
respondeu-lhe Nick, encolhendo os ombros antes de se levantar. - Se não estás
interessada, vou-me embora e deixo que resolvas os teus problemas com a ajuda
do banco - disse-lhe, enquanto saía da cozinha. - Não, espera! - chamou-o
Rose, indo atrás dele. Quando o alcançou, Nick já chegara ao hall. - E se não
servir? Não tenho experiência. 65 - Tem um pouco de fé em ti mesma. Devo
interpretar isso como um sim? - Bom, antes terei de falar com o meu chefe. -
Claro que... se aceitares... - disse Nick, olhando para ela de cima a baixo
-... terás de fazer algo a respeito da tua roupa. Rose sentiu que corava. -
Não vou trabalhar assim vestida - disse-lhe, irritada. - Vesti esta roupa
porque me parecia estúpido vestir-me bem para receber os canalizadores. Mas se
te parece que não sou suficientemente "decorativa" para trabalhar para ti,
diz-me já, porque não vou comprar roupa nova para um trabalho de dois meses.
Além disso, se aceitar a tua oferta... acrescentou, levantando o queixo e
olhando, desafiante, para ele -... quero que fique bem claro que não é por ter
mudado de ideias a teu respeito. Continuo a não gostar de ti. - Adoro como és
diplomática. - Só estou a ser sincera. - Sim, estou a ver e acredita que é uma
coisa que aprecio, porque, pela minha experiência, posso dizer-te que é uma
qualidade pouco frequente nas mulheres - respondeu ele. - É verdade, este
trabalho talvez requeira que tenhas que fazer algumas viagens. Tens o teu
passaporte como deve ser? Rose assentiu, entre nervosa e excitada perante as
possibilidades que se abriam diante dela. - E já que vais trabalhar para mim,
vou montar-te um escritório no meu apartamento. - Ouve...! Pára! Não acho que
isso seja uma boa ideia. 66 - Porquê? - Porque... Porque seria muito mais
profissional se... Bom, se trabalhasse num ambiente laboral normal, num
escritório, e não na tua casa. Nick reprimiu um sorriso, divertido com a forma
como parecia incomodada perante a ideia de trabalhar no seu apartamento. -
Rose, isto é um projecto particular que não tem nada a ver com a minha
empresa. Não posso levar-te para lá e dar-te um escritório de um dia para o
outro, sem que desperte uma certa curiosidade nos outros empregados. -
Importas-te de me explicar que...? - Uma curiosidade perigosa - explicou Nick,
num tom sensual que fez com que Rose abrisse muito os olhos. - As pessoas
pensariam que te levei para lá porque há algo entre nós. E não é que me
importe o que os outros pensam de mim, mas não gosto de misturar o pessoal com
o profissional. - Mas não há nada entre nós! - protestou Rose, corando
novamente. - Nós sabemos, mas as pessoas começariam a falar e isso é algo que
minaria a minha autoridade. - Bom, eu... Compreendo o teu ponto de vista, mas
tu também tens de compreender o meu. - Que é...? - perguntou ele, apoiando-se
na porta e enfiando as mãos nos bolsos. -Eu... Pois... Rose tentou pensar em
como dizer o que queria dizer, sem parecer louca. Se o simples facto de estar
junto dele na sua própria casa fazia com que se sentisse nervosa e incomodada,
como não iria ser difícil trabalhar na casa dele? 67 - A tua virtude está a
salvo comigo - disse-lhe ele, adivinhando os pensamentos dela. - Durante o
dia, estarei no escritório e, se tens medo que nos encontremos no meu
apartamento no fim do dia para falarmos de como vai o trabalho, podemos sempre
encontrar-nos num sítio neutro, como um pub ou algo do género. - É claro que
não tenho medo! - Ainda bem, porque não há razão para que tenhas e também para
que te sintas incomodada na minha presença. Rose interpretou o sorriso
brincalhão que se desenhou lentamente nos seus lábios como a sua forma de lhe
dizer que não se aproximaria dela, mesmo que fosse a última mulher à face da
terra. Disse para si que não lhe importava, que assim era melhor, mas não
conseguiu evitar sentir-se um pouco magoada. - Telefono-te depois de falar com
o meu chefe. Meu Deus, no que estava a meter-se? Um mês depois, Rose alegrava-
se de ter aceitado a oferta de Nick. O seu primeiro "projecto de observação"
fora um hotel de cinco estrelas em Covent Garden. Precisara de falar com
vários elementos do pessoal do hotel e apresentar a Nick um relatório diário
de todos os pormenores possíveis. Embora, de início, Rose tivesse pensado que
se sentiria desconfortável a trabalhar no seu apartamento, não estava a ser
assim. Imaginara que estar rodeada das suas coisas lho recordaria
constantemente, 68 mas o seu apartamento era enorme e impessoal. Não havia
fotografias emolduradas, nem nenhum tipo de lembranças nas estantes. As
empregadas chegavam às oito horas da manhã e iam-se embora às dez horas,
deixando tudo reluzente, e no quarto onde lhe instalara o escritório havia
poucas distracções. Nick costumava chegar às seis e meia, quando ela já estava
a preparar-se para se ir embora. Rose ouvia a porta da entrada, o tinido das
chaves quando as deixava sobre a bancada de granito da cozinha e depois ele
aparecia a desfazer o nó da gravata, apoiava-se na ombreira da porta e ficava
a olhar alguns segundos para ela em silêncio, enquanto ela desligava o
computador. Era o momento do dia que Rose mais receava e mais ansiava ao mesmo
tempo, e aquele dia não foi uma excepção. Quando se aproximou a hora, sentiu
ansiedade no estômago quando o ouviu entrar. - Já tenho a tabela de custos que
me pediste disse-lhe, quando Nick chegou ao seu escritório improvisado. Todos
os dias, esforçava-se para desviar a vista quando ele afrouxava a gravata e
desabotoava os dois primeiros botões da camisa, mas os seus olhos lançavam
sempre um ou outro olhar às escondidas. - E eu tenho uma coisa para ti -
disse-lhe ele, aproximando-se da secretária com um envelope na mão. - O que é?
- Abre-o. Enquanto o fazia, Nick contornou a mesa para se 69 pôr atrás dela.
Quando Rose viu que dentro do envelope havia dois bilhetes de avião, virou a
cabeça e levantou o rosto para ele. - Vamos viajar - disse-lhe Nick, com um
sorriso. - Vamos ver um terreno no Bornéu - inclinou-se para ela, apoiando as
mãos nas costas da cadeira, e Rose sentiu o seu fôlego quente no pescoço. -
Portanto, prepara a tua roupa de Verão, Rose, porque lá faz muito, muito
calor. Nick convidou Rose para ficar para jantar, para lhe dizer o que iriam
fazer exactamente no Bornéu. Pediram comida chinesa e, vinte minutos depois,
estavam a jantar na sua cozinha ultramoderna. Nick começou por lhe explicar
porque estava a pensar na Malásia para construir o seu hotel de luxo. Começou
por lhe falar de um antigo colega de universidade que era de lá e que iria ser
o seu sócio no negócio, e confiou-lhe que tinha a certeza de que, em breve, o
turismo excessivo em Kuala Lumpur e Penang faria com que o Bornéu se tornasse
o novo destino de luxo. Rose tentou disfarçar o seu entusiasmo, como se uma
viagem assim fosse uma coisa que lhe acontecesse diariamente. Ouviu-o com
atenção e fez perguntas sensatas, mas não conseguia parar de pensar em praias
virgens, selvas tropicais... e em que iriam fazer aquela viagem sozinhos.
Aquilo era o que mais a assustava. Como iria controlar a atracção que sentia
por ele, quando estariam 71 juntos vinte e quatro horas por dia? Quanto tempo
demoraria a cair-lhe a máscara de mulher séria e profissional, e a fazer uma
figura ridícula? Até àquele momento, parecia que Nick não se dera conta de
como o devorava com os olhos quando ele não estava a olhar, como desfrutava de
o ouvir rir-se, como reparava em todos os seus gestos masculinos, como... -
Rose, estás a ouvir-me? A jovem deu um salto. - O quê? Oh, sim, claro que
estou a ouvir-te! - Parecia que estavas a milhares de quilómetros daqui -
replicou ele. Inclinou-se para a frente e, semicerrando os olhos, perguntou-
lhe: - Há alguma coisa que queiras dizer-me? O coração de Rose disparou.
Conseguiria ler o pensamento? - Alguma... Alguma coisa que queira dizer-te?
balbuciou. - Não tens medo de andar de avião? - sugeriu ele, recostando-se. -
Não precisas de ter vergonha, sei que não viajaste muito para o estrangeiro. -
Não, na verdade, não - respondeu ela, profundamente aliviada. - Percorremos o
Reino Unido quase todo com os nossos tios, mas na verdade não viajei muito de
avião. - Sabes, segundo as estatísticas, tens mais possibilidades de morrer
atropelada por um carro do que num acidente aéreo. - Oh, agora fico mais
descansada ao saber que aqueles pássaros enormes de metal conseguem manter-se
no ar! - respondeu ela, com sarcasmo. Assim, estava melhor. 72 - Então, se não
tens medo de andar de avião... Qual é o problema? - Não há nenhum problema,
Nick - replicou ela. Exacto, não havia nenhum problema... para além de não
saber como iria conseguir não fantasiar que era a protagonista de um romance
numa ilha paradisíaca com um milionário atraente e que estava a começar a
preocupar-se com o fato de banho que teria de levar. Nem a brincar iria usar
um biquini à frente dele. Teria de levar um fato-de-banho recatado que
mostrasse o menos possível e... - Já estás outra vez - disse Nick, afastando-a
dos seus pensamentos. - Já estou outra vez o quê? - Acabaste de ficar outra
vez com aquela cara, como se a tua cabeça estivesse noutro lado. E agora estás
a franzir o sobrolho. Estendeu o braço e tocou-lhe na testa com a ponta do
polegar, e Rose, que não o esperava, deu um salto. - Pode saber-se o que se
passa? Estás muito nervosa. Se não é medo de andar de avião, então o que é?
Medo do desconhecido? - Sim, sim, é isso - apressou-se a responder ela medo do
desconhecido. - Precisamente o que eu pensava - murmurou ele, - embora não
entenda porquê. Como tu mesma me contaste, tu e a tua irmã tiveram uma vida
quase de nómadas com os vossos tios. - Sim, bom, há coisas a que uma pessoa
nunca se habitua - respondeu ela, num tom distante. Levantou-se e começou a
levantar a mesa. 73 - O que queres dizer? - perguntou Nick. Depois de várias
semanas a trabalhar com ela, a sua curiosidade não diminuíra, como seria de
esperar, mas antes pelo contrário. - Como podes ter medo do desconhecido
quando passaste anos da tua infância e adolescência a teres de o enfrentar? -
insistiu. Rose, que estava de costas para ele a enxaguar os pratos e os
talheres que tinham usado, encolheu os ombros e disse-lhe, mal-humorada: -
Devias ser tu a fazer isto, esta é a tua casa e estes são os teus pratos. -
Sim, mas tu és uma mulher e eu sou um homem. Vocês não adoram fazer essas
coisas? Rose virou-se, furiosa, para ele. Estava prestes a acusá-lo de ser um
"porco machista" quando viu o sorriso travesso nos seus lábios e se deu conta
de que só estava a tentar provocá-la. Sem pensar, atirou o pano da cozinha
para o chão, mas Nick apanhou-o e estalou a língua, divertido. - Devia
aplicar-te uma sanção por causa disso disse-lhe - atentado contra a
integridade física do chefe... Rose sentiu a garganta seca ao ouvir o tom
sensual que empregara. Sabia que não passava de um dos seus truques baratos de
sedução, mas, mesmo assim, surtia sempre efeito sobre ela. - Com um pano de
cozinha? - respondeu-lhe, depois de engolir em seco. - Deves ser muito mais
delicado do que aparentas, se um pano de cozinha pode fazer-te mal. 74 -
Deveria considerar isso como um elogio de que me vês como um homem forte e
viril? - murmurou ele, no mesmo tom provocador. Rose ficara vermelha como um
tomate e parecia querer que a terra a engolisse. Pela primeira vez desde o dia
em que começara a trabalhar para ele, sentiu-se verdadeiramente irritado com
ela. Estava a dar-lhe uma oportunidade pela qual qualquer pessoa no seu lugar
mataria e ela mostrava-se altiva e desdenhosa. Brincava com ela, mas Rose
tratava-o com indiferença e como se fosse um estranho. Tentava encontrar um
ponto fraco naquele muro que erguera à sua volta, mas ela só o repelia. E,
naquele momento, olhava, espantada, para ele, como se acabasse de dizer uma
blasfémia. - Esquece o que disse - murmurou, enfastiado, virando-se para a
mesa. Rose sentiu-se mal. Nick não podia saber que tentava manter a distância
porque receava que, caso contrário, acabaria por se atirar nos seus braços.
Certamente, devia estar a pensar dela que era uma ingrata ou talvez uma louca
sem sentido de humor. - Desculpa - murmurou. - O quê? - perguntou ele, com
certa aspereza, ainda de costas para ela. - Estou muito emocionada por ir para
o Bornéu, mas também me assusta um pouco. O seu tom hesitante fez com que Nick
se virasse. - Porquê? Rose suspirou e foi sentar-se. Apoiou o queixo na palma
da mão e a sua mente recuou anos atrás. 75 - Os meus tios sempre pensaram que
andar de um lado para o outro no país me tornaria uma pessoa valente e
aventureira, que me pegariam um pouco a sua maneira de ser, mas não foi assim.
Quando mudas constantemente de escola e nada é permanente na tua vida, sentes-
te deslocada e receias cada vez mais a próxima mudança. É por isso que eu
gosto de trabalhar na Fedco, porque é uma empresa grande onde me sinto segura
- explicou-lhe. - A ideia de ir ao Bornéu... - riu-se e levantou a vista para
ele. - Enfim, é outro mundo, literalmente. Nick também se riu. - Certamente,
aquele calor tropical... -... e os insectos... - E os insectos - assentiu ele.
E num lugar como o Bornéu, longe da realidade de ambos, poderia passar-se
algo. Esteve prestes a dizer-lho, mas mordeu a língua a tempo. - Enfim, os
teus tios alegrar-se-iam se soubessem que vais lançar-te numa aventura. Rose
sorriu. - Oh, sim, é claro que sim! Devias ouvi-los a falarem de Lily. Estão
entusiasmados por ter atravessado o Atlântico atrás dos seus sonhos. Acho que
pensam que, de algum modo, contribuíram para isso com o modo como nos criaram
- confessou-lhe, a rir-se. - E tu? Estás realmente contente por Lily estar a
tornar os seus sonhos realidade? - Bom, ainda estou a habituar-me à ideia.
Tenho imensas saudades dela, mas ajuda-me saber que está feliz e que agora se
sente realmente realizada. 76 - E tu? Também estás feliz com a tua vida e
sentes-te realizada? - perguntou Nick. Talvez não devesse ter feito aquela
pergunta. - Bom, neste momento estou bastante contente com a forma como vão as
obras da casa - respondeu ela, fugindo à pergunta. - Já te disse que penso
redecorá-la de cima a baixo? A casa está uma desgraça, portanto decidi que, em
vez de fazer alguns consertos, vou arranjá-la para que fique como sempre quis
que fosse. Mas, ouve, conta-me mais coisas sobre o Bornéu. O que mais preciso
de saber? O que mais precisava de saber? Que o voo até lá durava imensas
horas. Isso fora algo que Nick não lhe dissera e, de certo modo, era melhor
que não lho tivesse dito. De outro modo, teria passado os três dias anteriores
a angustiar-se, a pensar que iria passar imensas horas sentada ao seu lado no
avião. Já se angustiara o suficiente a perguntar-se que roupa iria levar para
a viagem. E depois, como é claro, havia a questão do que se supunha que a
levava exactamente lá. Podia ser um génio da informática, sim, e durante o mês
anterior aprendera muito sobre hotéis de luxo e o seu funcionamento, mas... O
que esperava Nick que fizesse num país que mal podia assinalar-se no mapa? -
Muito bem, fala - disse Nick, ao seu lado, afastando-a dos seus pensamentos. -
O quê? - Sei que estás a pensar nalguma coisa. Conta-me - disse-lhe Nick,
fechando o seu portátil para lhe dedicar toda a sua atenção. 77 - Não sei ao
que te referes. - Refiro-me a que mal abriste a boca desde que descolámos há
quatro horas, estás há meia hora na mesma página desse livro e não paras de
morder o lábio. O que se passa? - Não se passa nada. - Então, relaxa e
desfruta do voo, como disse a assistente de bordo - respondeu ele. Depois, com
um sorriso brincalhão, perguntou-lhe: - Ainda não me disseste o que achas de
viajar em primeira classe. - Oh, é... É incrível! - respondeu Rose, que
tentara que não se notasse como estava impressionada. - Estou-te... Estou-te
muito agradecida por... Enfim, por isto e por tudo o resto. Nick franziu o
sobrolho. Não era aquilo o que queria ouvir. Nos últimos três dias, Nick dera
por si impacientemente à espera daquela viagem. Ele, que estava farto de
viajar pelo mundo inteiro e que podia permitir-se ir a qualquer lugar com a
mulher que escolhesse, esperara impacientemente pelo início de uma viagem de
negócios com uma mulher que o fazia cerrar constantemente os dentes de
frustração. - Não quero que me agradeças, nem quero a tua gratidão - disse-
lhe, com aspereza, fazendo com que Rose o olhasse, sobressaltada. - Vais
dizer-me no que estavas a pensar ou não? - Está bem, já que insistes, não sei
o que se supõe que tenho de fazer quando chegarmos ao Bornéu admitiu ela,
contrariada, - Trabalho com computadores, não sei nada de licenças de
construção, nem de terrenos para construção, nem... 78 - Não se trata só de
terrenos e licenças de construção. Digamos que tu vens para contribuíres com o
toque feminino para o projecto. - O toque feminino? - Já reparaste que não
paras de discutir? - Só contigo - replicou ela. Ficaram a olhar-se nos olhos,
mas Rose apressou-se a desviar a vista. - Vou encará-lo como um elogio - disse
Nick. Lisonjeia-me saber que consigo tirar-te do sério. Rose apertou os dentes
e Nick soltou uma gargalhada que fez com que os passageiros que estavam
sentados mais perto deles olhassem, curiosos, para eles. - Só tens de pensar
nas coisas que te impressionaram dos hotéis onde estiveste hospedada em
Londres - disse Nick a Rose. - E, depois, tentar imaginar como poderíamos
adaptar essas coisas a um hotel situado na área equatorial. Tenho consciência
de que é uma coisa que requer muita imaginação, mas sabes o que quero...
"Quero-te a ti", acrescentou uma voz dentro da sua cabeça. Curiosamente, não o
surpreendeu. Talvez durante aquele tempo todo soubesse que Rose era algo mais
do que um desafio ou uma novidade para ele. Sim, desejava-a, e não apenas por
se sentir atraído por ela a nível intelectual, mas também físico. Baixou a
vista para os seus lábios, suaves e rosados, e depois para os seus seios, que
eram pouco mais do que formas vagamente definidas sob a camisa de algodão às
riscas que usava. 79 - Pensei em comprar um guia - disse-lhe Rose, mas depois
achei que era melhor não formar uma ideia preconcebida antes de ver o lugar. -
Boa ideia! - respondeu ele, com um meio sorriso, satisfeito de a ver um pouco
mais relaxada. - O que te parece se dermos uma olhadela às despesas
preliminares em que estiveste a trabalhar? Como podia ter pensado que poderia
ser feliz com uma vida sem mudanças e aventura? Quase não podia acreditar que
estava sentada em primeira classe, num avião que os levava a Kuala Lumpur, e
de onde se dirigiriam depois para Kota Kinabalu, a capital de Sabah, lugares
dos quais nunca nem sequer ouvira falar. E, sim, era emocionante. Lançou um
olhar às escondidas a Nick, que adormecera. Ela também reclinara a sua
poltrona, mas não conseguia dormir. Pela primeira vez na sua vida, compreendeu
a paixão de viajar dos seus tios, Tony e Flora. O desconhecido não a assustava
tanto como pensara. Ou melhor, sim, assustava, mas também era excitante,
porque oferecia um mundo de possibilidades. A maior possibilidade que havia
naquele momento era que não conseguisse pregar olho durante o resto do voo e
estivesse desfeita ao chegar ao seu destino, mas finalmente, no meio dos seus
pensamentos, adormeceu. Quando aterraram, tal como Nick lhe dissera, um todo-
o-terreno estava à sua espera para os levar a Kota Kinabalu, que ficava a
cerca de duas horas e 80 meia dali. Já estava a anoitecer, mas ainda fazia
muito calor. Rose, apesar do cansaço, estava a tentar permanecer acordada e
atenta a tudo o que via, e Nick, que reparou, disse-lhe: - Mal consegues
manter os olhos abertos, Rose. Não tentes absorver os pormenores todos agora.
Quando chegarmos ao hotel, vais para o teu quarto para dormires. - Mas...
Porque é que eu estou a cair de sono e tu não? - Eu estou habituado a viajar -
respondeu ele, divertido. Quando chegaram ao hotel, o sol já se pusera
completamente. - Custa-me ir para a cama, quando não passa das nove horas -
disse Rose a Nick, enquanto atravessavam o hall enorme para se dirigirem para
o balcão da recepção. - Talvez, se tomar um duche, consiga encontrar-me
contigo para que me contes os planos que temos para amanhã. Nick insistiu que
devia descansar e um empregado sorridente conduziu Rose até ao seu quarto, que
era decorado ao estilo colonial, com móveis de madeira branca laçada, uma
poltrona de vime, persianas de bambu... Depois de uma breve inspecção, Rose
lavou-se um pouco e mudou de roupa entre bocejos, antes de se meter na cama,
que estava coberta por uma rede mosquiteira fina em jeito de dossel. Quando
acordou com um ruído, como se alguém estivesse a bater com os nós dos dedos na
janela por 81 trás das persianas de bambu, de uma porta que imaginava que
daria para a varanda, pareceu-lhe que tinham passado só cinco minutos, mas os
raios de sol filtravam-se no quarto. Ao olhar para o seu relógio, viu,
espantada, que passava das oito e meia. Dormira quase dez noras. Saiu da cama,
vestiu o seu robe e dirigiu-se para a porta, pensando que certamente se
trataria do serviço de limpeza. Não tinha a certeza de em que quarto Nick
estava, mas iria pedir à recepção que lhe passassem ao quarto dele, para lhe
dizer que, dentro de quinze minutos no máximo, estaria pronta para começar a
trabalhar. Não seria preciso. Quando subiu a persiana de bambu, descobriu que
a porta era de vidro e que não dava, como pensara, para uma varanda, mas para
um pequeno alpendre de madeira. Num lado, havia uma rede e, no outro, uma mesa
e cadeiras. À frente, havia uma extensão ampla de relva verde e coqueiros que
conduziam a uma praia e a esquerda podia vislumbrar uma piscina. A sua mente
tomou nota daquilo tudo em apenas alguns segundos, que foi o único tempo que
aquele ambiente exótico e idílico conseguiu distrair a sua atenção de Nick,
que estava do outro lado da porta. Estava incrivelmente sexy com um pólo e
umas bermudas caqui. - És tu - disse, enquanto abria a porta, sobressaltada
por estar vestida com a camisa de dormir e o robe. - Quem achavas que era? - O
serviço de limpeza. Eu... ia... ia telefonar-te 82 agora para te dizer que
estava quase pronta para começar a trabalhar. - Não precisas do telefone -
disse-lhe Nick. Estou no quarto do lado. Só precisas de contornar aquela
divisória - disse-lhe, virando-se para assinalar uma divisória coberta de
flores que havia lá fora. Ao ver Rose com as faces rosadas do sono e o cabelo
despenteado, Nick disse para si que estava simplesmente adorável e, pela
primeira vez, não tentou arranjar nenhuma desculpa para o facto de se sentir
atraído por ela. Se Rose fosse uma das empregadas da sua empresa, teria feito
todos os possíveis para tirar da cabeça qualquer pensamento de tentar seduzi-
la, mas felizmente não era. Rose tentou não mostrar o nervosismo que lhe
provocava a simples ideia de que estivesse no quarto do lado. - Bom, vou
arranjar-me e dentro de quinze minutos encontramo-nos no hall. - Não há
necessidade de ser tão formais disse-lhe ele, apoiando o ombro na ombreira da
porta. - Pedi que nos tragam o pequeno-almoço para o tomarmos no meu alpendre.
Oh, e pensei que hoje podíamos ver um pouco o hotel e os arredores! Tu sabes,
desfrutar da praia, ir dar uma olhadela à piscina... O meu sócio, Lee Peng,
está em Kuala Lumpur e virá amanhã, portanto amanhã começaremos a trabalhar.
Várias das coisas que disse fizeram com que o pânico invadisse Rose: tomar o
pequeno-almoço com ele, desfrutar da praia, irem para a piscina... 83
Pigarreou, perguntando-se como poderia recusar sem que parecesse que estava a
reagir de um modo desproporcionado, mas, antes que pudesse dizer alguma coisa,
Nick despediu-se com um "até já" e afastou-se. Depois de tomar um duche
rápido, Rose vestiu uma t-shirt larga para disfarçar a sua figura e umas
calças, apesar de que com elas acabaria por suar imenso. Quando contornou a
divisória, minutos depois, encontrou Nick sentado no alpendre do seu quarto a
beber café. - Não devias ter vestido umas calças, Rose, vai fazer muito calor
- disse-lhe, levantando a vista para ela. - É que... Ainda não desfiz a mala -
respondeu ela, enquanto se sentava. - Vesti a primeira coisa que encontrei ao
abrir a mala. - Bom, não faz mal. Como depois vamos à praia e terás de vestir
o fato-de-banho, podes aproveitar para mudar de roupa e procurar alguma coisa
mais fresca - respondeu ele, que desejava vê-la em fato de banho. Tinha a
certeza de que, por debaixo daquela roupa larga que costumava usar, havia uma
figura cheia de curvas. - Pediremos toalhas na recepção. - Mas... Não viemos
para cá para trabalhar? perguntou Rose, desesperada. Tirou um croissant e
partiu-o ao meio para o barrar com doce, enquanto tentava acalmar-se, dizendo
para si que certamente Nick já teria visto centenas de mulheres em fato-de-
banho e que nem olharia para ela. 84 Nick limpou os lábios com o guardanapo. É
claro que tinham vindo para trabalhar, mas também tinha intenção de aproveitar
a oportunidade para relaxar um pouco e desfrutar. Além disso, tinham dez dias
pela frente. - Bom, vamos passar a maior parte do tempo a fazer "trabalho de
campo", trabalho de investigação - respondeu. - Achava que teríamos um monte
de reuniões. Não temos de falar com os arquitectos e com o inspector das
obras? - insistiu Rose. - Haverá tempo para tudo - respondeu ele, recostando-
se e entrelaçando as mãos atrás da cabeça. - Sabias que o Bornéu é a terceira
maior ilha do mundo? E que Sabah tem algumas das selvas mais antigas do
planeta? Há um monte de sítios que quero que visitemos, antes de decidir qual
será o lugar idóneo para construir o hotel. Por exemplo, seria melhor perto da
praia ou da selva? Deveríamos pensar no turista que quer relaxar ou no que
procura um pouco de aventura? Oh, e sabias que há orangotangos nesta zona? -
Vamos ver orangotangos? - É claro que sim, mas primeiro vamos ver a piscina e
a praia! - exclamou Nick, levantando-se. Enfiou as mãos nos bolsos e olhou
para o mar. - Sim, é um lugar fascinante! Na praia, havia pouca gente.
Provavelmente, era demasiado cedo para a maioria dos outros hóspedes do hotel,
disse para si Rose. Ao longo da praia havia sombrinhas, postas aqui e ali,
para além de espreguiçadeiras. Parecia o Paraíso, com a areia fina e/branca,
os coqueiros e o azul deslumbrante do mar. Rose parou um instante e admirou a
beleza do lugar, protegida pelos seus óculos de sol. Usava um vestido de praia
para esconder a sua figura e, apesar de ser fino, estava a dar-lhe um calor
tremendo. A alguns passos dela, estava um casal madrugador que se sentara em
espreguiçadeiras, providos de chapéus de palha e que estavam a ler. Não via
Nick em lado nenhum e estava a olhar para longe quando uma mão pousou no seu
ombro. - Mas... O que tens vestido? - perguntou a voz atrás dela, como se a
sua roupa o divertisse. Rose virou-se e olhou, irritada, para ele. - É para me
proteger do sol. Tu és moreno, mas eu queimo-me com facilidade. 86 Era um
exagero, é claro, porque àquela hora da manhã era impossível que se queimasse.
Nick tinha pendurada sobre os ombros nus uma toalha para ele e trazia outra na
mão para ela, a qual lhe estendeu com um sorriso brincalhão. - Também devias
ter posto um chapéu, como aquelas pessoas dali. Rose agarrou na toalha e
começou a afastar-se, mas abrandou ao pensar que Nick poderia estar a rir-se
do seu rabo grande. Rose parou ao chegar a umas espreguiçadeiras livres, perto
de outra ocupada por uma idosa que estava a dormir com um livro aberto ao meio
sobre o rosto. - Não vais tirar esse vestido? - perguntou-lhe Nick. Afastou a
espreguiçadeira para o lado e estendeu a sua toalha na areia, junto da outra
espreguiçadeira onde Rose estava a acomodar-se. - Já está a começar a fazer
calor e daqui a pouco vai ficar ainda pior. - Trouxe um bloco - disse Rose,
ignorando-o. Pensei que podíamos tomar nota do que vá acontecendo e que seja
importante. Nick deitou-se na toalha e, caso isso não fosse distracção
suficiente para Rose, a seguir tirou do seu saco um frasco de protector solar
e começou a aplicá-lo no corpo. - Eu também me queimo, não penses! - comentou
a Rose, em jeito de explicação. Conseguia sentir os seus olhos sobre ele, a
observá-lo. Nick estava habituado a que as mulheres o olhassem, mas o modo
como Rose estava a fazê-lo, às escondidas, estava a excitá-lo. 87 Quando
acabou de espalhar o protector, recostou-se, fechou os olhos e ficou calado, à
espera que o silêncio fizesse com que Rose se sentisse incómoda e começasse a
falar. Não demorou a acontecer. Passado um momento, Rose tentou pela enésima
vez desviar o olhar do corpo bronzeado e praticamente nu de Nick, e perguntou-
lhe: - O que te fez decidir meteres-te... Bom, nisto do turismo? - Pareces uma
jornalista. - É só curiosidade - respondeu ela. - Toda a gente faz o que faz
por alguma razão. - E o que fez com que tu te dedicasses à informática? - Não
estamos a falar de mim - replicou ela. O calor do sol estava a começar a fazer
com que se sentisse relaxada e sonolenta. Não tinha vontade de discutir. -
Tenho a certeza de que quando estás num hotel é por causa de uma viagem de
negócios e não por prazer. Ao descer a vista para Nick, deu-se conta de que
continuava com os olhos fechados e de que mal estava a ouvi-la. Tirou o
vestido e começou a colocar protector, olhando-o de soslaio de vez em quando
para se certificar de que continuava com os olhos fechados. Quando acabou,
recostou-se e protegeu o rosto do sol com uma revista que trouxera do quarto.
- Bom, sim, talvez este seja o motivo pelo qual embarquei em algo em que não
tenho nenhuma experiência: um hotel pensado para gente que quer relaxar e
esquecer tudo - respondeu Nick, finalmente. 88 Rose vira pelo canto do olho
que se virara para ela e não se mexeu, nem desceu a revista. - Ganhei uma
fortuna suficiente para poder viver desafogadamente para o resto da minha vida
sem ter de trabalhar. Por isso, estou sempre à procura de novos desafios. -
Pois, se eu fosse a ti reformava-me e desfrutava do que a vida tem para
oferecer - respondeu Rose. Claro que, sem alguém ao teu lado com quem a
desfrutares, suponho que a vida deve ser bastante cinzenta. Nick endireitou-se
e estendeu o braço para lhe afastar a revista da cara, o que fez com que Rose
também se endireitasse e se virasse, de modo que se encontrou a olhar para ele
de frente. - Desculpa - murmurou. - Este comentário saiu-me sem querer. -
Parece-me que trabalhares com computadores não está a fazer-te muito bem,
Rose. - Porque dizes isso? - Porque não tens nenhum tacto. A qualquer outra
mulher, Nick teria deixado bem claro que não gostava que pensassem na sua
vida, mas, por muito que Rose o irritasse, não era que tivessem uma relação e,
além disso, não tinha vontade de começar a discutir com ela com o sol a
brilhar e o mar a tentá-lo com as suas águas reluzentes. - Vou tomar banho -
disse, levantando-se. Vens? - perguntou-lhe, virando a cabeça para olhar para
ela por cima do ombro. - Não, obrigada, acho que ficarei aqui a apanhar sol -
respondeu Rose, voltando a deitar-se e a tapar o rosto com a revista. 89 Nick
afastou-se e Rose ficou a pensar na conversa que tinham tido e na acusação que
lhe fizera. Entretanto, apercebeu-se de que tinham passado quase quarenta
minutos desde que Nick partira. Endireitou-se e passeou o olhar pela praia e
pela água, mas não o via em lado nenhum. Preocupada, levantou-se, foi até à
borda e entrou na água. Era uma boa nadadora. Aprendera a nadar em menina,
porque os seus tios se tinham empenhado em inscrevê-la e à sua irmã em aulas
de natação, e fora uma das poucas coisas em que não tentara ir contra eles
quando descobrira como gostava de nadar e como se sentia relaxada na água.
Perguntou-se se deveria ter procurado um nadador-salvador na praia, mas
rejeitou imediatamente aquela ideia, pois não queria armar uma cena para
depois descobrir que estivera a preocupar-se à toa. Tinha a certeza de que
simplesmente se afastara mais da costa do que os outros banhistas. Assim que o
visse, voltaria para a praia. Quando lhe pareceu que já estava a afastar-se
muito e continuava sem ver Nick, começou a sentir um pouco de medo porque...
Quem sabia o que podia existir naquelas águas? Talvez houvesse tubarões,
talvez um tivesse atacado Nick. A ideia bastou para a convencer de que era
melhor voltar para a borda para pedir ajuda. Não se deu conta de uma sombra
que estava a aproximar-se dela dentro da água e, quando sentiu que algo lhe
rodeava a cintura, deu um salto e começou a espernear, assustada. Precisamente
naquele momento, Nick veio à superfície, a rir-se. 90 - Estavas preocupada
comigo? - perguntou-lhe, pondo-se à frente dela. O alívio de Rose deu lugar ao
aborrecimento e sentiu-se tentada a dar uma chapada na cabeça de Nick, que
estava a sorrir-lhe como um menino travesso, mas conteve-se. - Não, tinha
calor - mentiu. - Caso estivesses a perguntar-te porque não conseguias
encontrar-me, é porque estava ali - disse-lhe Nick, assinalando-lhe uma zona
estreita de areia ao longe, onde havia alguns coqueiros. - Vi-te a nadar e
decidi vir ter contigo. - Caso me metesse em confusões? - Bom, não posso
permitir que uma empregada minha se afogue, pois não? - Sou uma boa nadadora.
- Já me dei conta. Rose não achava muita graça que tivesse estado a olhar para
ela enquanto nadava. - Queres nadar até lá comigo? Podíamos voltar para a
borda e ir a pé, mas assim fazemos mais exercício. Rose duvidava que lhe
fizesse falta fazer exercício, ao contrário dela, mas, de repente, quis
demonstrar-lhe que era boa nadadora e assentiu. Começou a nadar naquela
direcção e animou-a ver que Nick ia bastante atrás dela. No entanto, acabou
por a ultrapassar e chegar primeiro à praia estreita. Para seu espanto, Rose
saiu da água com ele sentado na areia, a observá-la, e ela não tinha com o que
se tapar. De repente, sentiu-se mais consciente do que nunca dos defeitos da
sua figura: os seus seios não 91 eram pequenos como os das modelos, não havia
quem domasse o seu cabelo encaracolado, era baixa, as suas ancas eram muito
largas... Ele, pelo contrário, parecia um modelo tirado de uma revista de
fatos de banho, ali sentado, à sombra de um coqueiro. Rose, que se sentia como
se, de repente, o fato-de-banho recatado que usava tivesse encolhido, rodeou-
se com os braços, fingindo frio. Não passou despercebido a Nick que Rose se
sentou o mais longe que pudera dele, sem que fosse demasiado óbvio. Há algum
tempo atrás, quando pensara que jamais poderia sentir-se atraído por uma
mulher como ela, teria achado graça àquilo, mas não agora. Ao seu lado, as
mulheres com quem saíra até então não tinham personalidade nem curvas.
Gostaria de dizer a Rose que não devia envergonhar-se do seu corpo, da sua
voluptuosidade, mas tinha a certeza de que se incomodaria, portanto desviou os
seus olhos dela e decidiu que tentaria conquistá-la com um pouco de conversa
trivial. - O que te parece este sítio? Rose, que estava à espera que lhe
dissesse alguma coisa sarcástica sobre o seu físico, suspirou, aliviada.
Aquilo era um assunto de que podia falar e, quando começaram a conversar sobre
a praia e o hotel, cada vez que ficavam calados começava a perguntar-lhe o que
achava do Bornéu. Num dado momento, quando não lhe ocorria mais nada, ficou
calada e Nick, que ficara a olhar para ela, disse-lhe, de repente,
assinalando-lhe a cara: 92 - Afinal, queimaste-te. - O quê? Onde? - perguntou
ela, virando-se e levando automaticamente as mãos ao rosto. Ao fazê-lo, deixou
a descoberto o decote do fato-de-banho, que, apesar de não ser muito
pronunciado, mostrava uma vista generosa e tentadora dos seus seios. - Aqui -
disse Nick, passando o dedo pela ponta do seu nariz. Rose deu um ligeiro
salto. - Devíamos voltar para onde deixámos as toalhas e os nossos sacos. -
Oh, não! Até agora, não me tinha lembrado dos nossos sacos - murmurou ele. -
Não devíamos tê-los deixado sozinhos. - Não te preocupes, estão perfeitamente
seguros onde estão - disse-lhe Nick, enquanto se levantava. Estendeu-lhe uma
mão para a ajudar a levantar-se e Rose sentiu-se envergonhada. Nick não
conseguiu evitar reparar em como os seus seios se mexeram e perguntou-se
quando se tornara um pervertido que olhava para as mulheres às escondidas e
que se excitava com isso. - Não chegaste a responder-me ao que te perguntei
quando chegámos à praia - disse Rose, enquanto regressavam onde tinham deixado
as suas coisas. - O que me perguntaste? - perguntou ele, tentando controlar a
sua imaginação. - Porque decidiste meter-te no negócio do turismo. Começaste a
dizer-me que precisavas de novos desafios, mas... Porque te lembraste de
construir um hotel? - Considerando que sou um homem triste e solitário, 93 que
ainda continua à procura da mulher perfeita? - Eu não disse que eras um homem
triste e solitário - replicou ela, corando. - Não. Só insinuaste que sou o
tipo de homem que nunca tira férias e que não sabe divertir-se. - Não é
verdade, tenho a certeza de que te divertes tanto como qualquer um - respondeu
Rose, perguntando-se como tinham acabado a falar outra vez de questões
pessoais. - Divertia-me - explicou Nick. - Não estive com uma mulher desde que
conheci a tua irmã. Rose, que acreditara nele quando lhe dissera que não havia
nada entre ele e Lily, perguntou-se se o que acontecera era que não se
atrevera a dizer-lhe que se sentia atraído por ela. A ideia de que pudesse
estar apaixonado pela sua irmã fez com que sentisse um nó no estômago. - Bom,
Lily costuma ter esse efeito nos homens - murmurou, baixando a vista. - Que
efeito? Rose encolheu os ombros. - Muitos homens não se atrevem a confessar-
lhe os seus sentimentos, por receio de que os rejeite. - Quem disse que eu
sinto alguma coisa pela tua irmã, querida? - perguntou Nick, com
incredulidade. - Disse-o porque, precisamente na noite em que nos conhecemos,
eu tinha acabado com a mulher com quem estava e desde então mantive-me
afastado do sexo feminino. Todos os homens precisam de descansar de vez em
quando desse tipo de complicações. 94 Chamara-lhe "querida"? Como é claro,
dissera-o num sentido coloquial, mas o coração disparara no peito de Rose ao
ouvi-lo. Entretanto, deu-se conta de que, não sabia muito bem porquê, Nick
decidira partilhar com ela uma confidência: não praticava sexo há quase três
meses. - E, além disso, é um erro pensar que o sexo pode ser a resposta para
tudo - comentou Rose. Um sorriso de satisfação desenhou-se lentamente nos
lábios de Nick. Conseguira conduzir a conversa para a direcção que queria:
sexo. - Mas isto tudo não tem nada a ver com a razão pela qual estamos aqui,
claro está! - apressou-se a dizer Rose. - Como tu me disseste, viemos fazer um
trabalho de investigação e não importa qual foi o motivo que te levou a querer
embarcar nisto - acrescentou, sentindo-se muito satisfeita com a forma como
conseguira reconduzir a conversa, que estava a tornar-se perigosa. Um passo em
frente, dois passos atrás, pensou Nick, apertando os dentes, cheio de
frustração. Tinham chegado ao sítio onde tinham deixado as toalhas e as suas
coisas. Rose pegou no seu vestido de praia e apressou-se a enfiá-lo pela
cabeça. Era interessante, aquela sensação de se levar com um balde de água
fria na cabeça, disse para si Nick. Interessante... mas não muito agradável!
Passaram os dias seguintes a visitar vários lugares na companhia de Lee Peng,
o sócio de Nick, que lhes serviu de guia. Também assistiram a reuniões, 95
tiveram vários jantares na companhia de amigos e conhecidos de Nick... Mal
tiveram tempo para respirar e muito menos para estarem a sós. Parecia a Nick
que passara uma eternidade desde que tinham estado juntos na praia. Além
disso, nunca conhecera uma mulher que, estando apenas a alguns passos dele,
fosse capaz de manter a distância como ela fazia. Uma noite, ao regressarem ao
hotel, convidara-a para uma bebida, mas ela recusara educadamente,
acompanhando a sua recusa com bocejos convincentes, aduzindo que estava
cansada. Tomava sempre o pequeno-almoço no seu quarto porque, dissera-lhe com
um sorriso em jeito de desculpa, gostava de aproveitar aquele tempo para
responder aos e-mails da sua irmã e dos seus amigos. Nick, cada vez mais
frustrado, começava a sentir-se como um adolescente. Não conseguia parar de
olhar para ela às escondidas, nem de fantasiar com ela de noite. Aquela noite
não era uma excepção. Rose retirara-se cedo, dando a desculpa mais velha do
mundo, que lhe doía a cabeça, e ele estava deitado na sua cama a olhar para o
tecto e incapaz de adormecer. Deu uma olhadela ao relógio. Passava da meia-
noite. Nick considerou as opções que tinha: ficar ali e continuar sem pregar
olho ou levantar-se e tomar um duche frio. Saiu da cama, mas apetecia-lhe
tanto tomar um duche frio como ligar o computador e começar a trabalhar, que
era o que costumava fazer quando não conseguia dormir. 96 Vestiu uns calções,
saiu para o alpendre e começou a andar descalço pela relva, a desfrutar do
toque fresco da erva sob os seus pés. De repente, pareceu-lhe ver algo pelo
canto do olho, através da divisória que separava o seu alpendre do de Rose.
Semicerrou os olhos e voltou a vê-lo. Uma figura vestida com algo de uma cor
clara. Rose... Nick sentiu que a adrenalina lhe disparava nas veias. Sem parar
para pensar, deixou-se levar pelo instinto de predador e contornou a divisória
de madeira. - Tu também não consegues dormir? - perguntou, aproximando-se
antes que ela conseguisse fugir- Fosse o que fosse o que Rose usava, era
evidente que não estava vestida para um encontro inesperado com o seu chefe.
De facto, parecia uma camisa de dormir bastante fina e semitransparente, que
mal lhe chegava a meio da coxa. Além disso, a luz do quarto batia contra ela e
realçava a silhueta arredondada dos seus seios. Com um pouco de imaginação,
Nick quase conseguia distinguir as auréolas e os mamilos. Rose estava a olhar,
espantada, para ele. - O que raios estás a fazer aqui? - exigiu saber,
demasiado alterada com o seu aparecimento para pensar em como estava vestida.
- Pergunto-te o mesmo. Eu não conseguia dormir - disse Nick, sentando-se numa
das cadeiras do alpendre, com um sorriso. - Claro que eu sei porque não
consigo dormir. E tu? 97 Rose sentia-se tão cheia de frustração que lhe faltou
pouco para começar a chorar. Gerira tão bem a situação nos últimos dias!
Conseguira manter a distância, mostrando-se sempre correcta. Não fora fácil e
implicara muita tensão, mas, pelo menos, tinha as noites para estar a sós e
relaxar. E agora, de repente... Como se atrevia a invadir o seu tempo privado?
Claro que o pior era aquele sorriso brincalhão nos seus lábios, que dava a
entender que se achava com todo o direito de o fazer. - Parece-me que devia
ir-me embora - disse-lhe, num tom frio. Tirou da mesa o copo de água que
deixara ali e ia voltar para dentro, quando Nick lhe pediu: - Espera! Antes
que pudesse reagir, ele levantara-se e pusera-se à frente dela, agarrando-a
pelo braço. - O que estás a fazer? Larga-me! - Diz-me porque estás sempre a
fugir de mim. - Eu não fujo de ti - replicou ela. Gostaria que a sua resposta
tivesse sido convincente, mas a sua voz fora um pouco estridente e as pernas
tremiam-lhe. - Quer dizer que, de repente, te deste conta de que estás muito
cansada e tens de ir imediatamente para a cama? Rose respirou fundo, tentando
acalmar-se. Aquela situação era demasiado íntima: os dois sozinhos, a olharem-
se nos olhos, enquanto o resto dos hóspedes do hotel dormia. Além disso, o
peito nu de Nick não a deixava pensar com clareza. - O que quero dizer é que
este tempo é meu e que 98 não te quero nele. Talvez trabalhe para ti, mas
mereço ter privacidade, como qualquer pessoa. Não tens o direito de chegar
aqui a discutir, como se fosses o dono do lugar. - A discutir? Simplesmente,
vi-te através da divisória e aproximei-me para ver se estavas bem. - Como vês,
estou muito bem. - Não me parece, estás a tremer. Tens frio? Com o que tens
vestido... - Desculpa, mas estou mais tapada do que tu. Nick esboçou um
sorriso travesso. - Peço desculpa por isso, mas, tal como tu, eu também não
esperava companhia a esta hora. Era isto ou sair nu. Rose engoliu em seco. -
Não tenho nenhum pijama - acrescentou Nick. - Toda a gente tem pijamas -
replicou ela. - Entra no meu quarto e procura nas gavetas, se quiseres. - O
quê? - Porque não vamos para dentro? Não queremos que as pessoas falem, pois
não? - perguntou-lhe Nick. E sem esperar que lhe desse permissão, entrou no
seu quarto, que era praticamente idêntico ao seu, salvo dois ou três
pormenores na decoração. Rose entrara atrás dele e era evidente que estava
prestes a explodir. Tinha os braços à volta do corpo, numa tentativa de se
tapar, e ficara perto da porta. Certamente, estava a perguntar-se que táctica
poderia empregar para o expulsar dali. - É uma loucura estarmos levantados a
esta hora 99 - disse, rindo-se, nervosa. - De manhã, estaremos a cair de sono
e vai ser um dia muito ocupado. Nick caminhou lentamente para ela e parou a
apenas alguns centímetros. O coração de Rose palpitou com força, mas ao mesmo
tempo disse para si que estava a reagir de um modo ridículo e que não tinha
nada a recear. Afinal... O que esperava que fosse fazer? Beijá-la? Não, os
homens como Nick não andavam por aí a tentar seduzir mulheres sem o menor
encanto, como ela. - Às vezes, fazer loucuras pode ser divertido murmurou
Nick. - Nunca cometeste nenhuma loucura na tua vida, Rose? - Não - respondeu
ela e da sua garganta escapou outro risinho nervoso. - Não, claro que... -
pigarreou e tentou recuperar a compostura. - Essas coisas não combinam comigo.
- Como podes saber se nunca experimentaste? Enquanto falavam, Rose começara a
caminhar para trás, numa tentativa de se afastar dele, mas Nick avançara cada
passo que ela recuara e, de repente, viu que tinha as costas contra a parede e
que os braços dele estavam ao lado dela, impedindo-a de fugir. - Neste
momento, estou a sentir-me tentado a cometer uma loucura - sussurrou-lhe Nick,
com voz rouca. - Queres que te diga qual? "Não!", exclamou, desesperada, para
dentro. -Qual? - Esta... Nick inclinou-se para ela e deslizou a mão por detrás
da sua nuca. 100 - Não...! - protestou Rose, num fio de voz. Nick sorriu,
sabendo imediatamente que não tentaria lutar e também que as suas suspeitas
estavam certas: Rose desejava-o tanto como ele a desejava. O simples
pensamento fez com que uma rajada de calor o sacudisse e, quando os seus
lábios pousaram sobre os de Rose e esta emitiu um gemido abafado, e fechou os
olhos, sentiu que se excitava ainda mais. Rose pôs as mãos contra o seu peito
e sentiu os músculos tensos contra as palmas. Deveria empurrá-lo, afastá-lo
dela, mas, em vez disso, esfregou as mãos para cima e para baixo-entre
suspiros, enquanto ele continuava a devorar os seus lábios. Quando finalmente
se afastaram e pôde respirar fundo, em vez de protestar, perguntou-se o que
estava a acontecer-lhe. Até então, as relações que tivera tinham sido relações
de parâmetros controlados, com homens com os quais lhe parecia ser compatível.
Pelo contrário, Nick e ela eram tão diferentes como a noite e o dia, e ele era
o tipo de homem que não tinha nenhum interesse em comprometer-se. - É a tua
última oportunidade, Rose - disse-lhe, afastando-se e olhando para ela nos
olhos. - Para quê? - perguntou ela, embora soubesse perfeitamente do que
estava a falar. - Para tomares uma decisão. Quando chegar a alvorada, não
quero que me acuses de me ter aproveitado de ti. - Eu nunca faria isso! - Não
estás a entender-me: ou vamos para a 101 cama agora de mútuo acordo ou dizes-
me para me ir embora. E o que faria ele se lhe dissesse para se ir embora?,
perguntou-se Nick. Tomaria um duche frio, como pensara antes de ir ali? Iria
nadar para a praia até ficar exausto? Ligaria o seu computador e esperaria que
o trabalho pudesse distrair a sua mente para não pensar nela? Nunca se
encontrara naquela situação, à mercê de uma mulher, e teve de fazer um esforço
para não tentar persuadi-la. Rose mordeu o lábio. O que devia fazer? O bom-
senso dizia-lhe que deveria rejeitá-lo, mas, por uma vez na sua vida, queria
deixar-se levar pelas suas emoções e fazer uma loucura. Meu Deus, estava tão
excitado como um adolescente na sua primeira vez!, pensou Nick, enquanto
conduzia Rose para a cama. Os seus calções de algodão mal conseguiam disfarçar
a sua erecção, mas estava decidido a ir devagar para que os dois desfrutassem
plenamente. - Tens a certeza disto? Ainda estás a tempo de voltar atrás -
disse a Rose, que já abrira a rede mosquiteira e se sentara na cama. - Não,
tenho a certeza. Todos precisamos de fazer loucuras de vez em quando. - Então,
porque pareces estar morta de medo? Rose corou. - É essa a impressão que te
dou? Nick, que estava prestes a tirar os calções, hesitou e subiu para a cama
com ela, antes de fechar a rede mosquiteira atrás dele. Rose estava a olhar
para ele de um modo apreensivo, com os lábios entreabertos e as mãos apertadas
contra a camisa fina de dormir. 103 - Do que tens medo? Não estávamos de
acordo em que os dois queremos o mesmo? - perguntou Nick. Levantou uma mão e
seguiu com as pontas dos dedos a linha do queixo de Rose. - Não precisas de te
preocupar, iremos devagar. - Tu não compreendes, Nick... - Não és virgem, pois
não? - É claro que não! - exclamou ela, indignada. Claro que também não podia
dizer-se que tivesse muita experiência. - Porque não me falas dos homens com
quem estiveste? - O que estás a dizer? Nem pensar! - exclamou ela, olhando
para ele com os olhos muito abertos. Nick riu-se. - Não precisas de ficar
escandalizada. - Suponho que para ti isto seja algo normal. - O sexo? Bom, sou
um homem, Rose. - Não referia a isso. Ouve, Nick, o que estou a tentar dizer-
te é que não sou muito atrevida na cama - admitiu ela. Pigarreou e, levantando
o queixo, disse-lhe: - Podes rir-te, se quiseres, mas sou assim. Não passei a
vida a saltar de cama em cama. - Eu gosto disso - murmurou Nick,
surpreendendo-se. A verdade era que nunca se encontrara numa situação assim.
De facto, algumas das mulheres com quem estivera eram mais atrevidas na cama
do que ele. - E, além disso... - continuou Rose, hesitante. - E, além disso? -
repetiu ele, para que ela continuasse. 104 Incapaz de resistir, inclinou-se
para ela para a beijar no pescoço e sentiu-a estremecer. - Eu... Quero dizer
que tu não... - balbuciou ela, nervosa. - Enfim, não és o tipo de homem que...
Bom, as raparigas como Lily... - Rose, o que estás a tentar dizer? - perguntou
ele, a rir-se. - Estás a confundir-me. - Deixa-me falar! - respondeu-lhe ela,
irritada. - Assim está melhor, agora estás a ser tu, a Rose com carácter de
que tanto gosto - disse ele, a sorrir. - És linda! Rose corou e sorriu como
uma parva. - Sim, está bem! - Tens de parar de te desvalorizar - disse-lhe
Nick, agarrando suavemente as suas mãos para que largassem a camisa de dormir.
Depois, empurrou-a suavemente pelos ombros e, quando Rose caiu sobre o
colchão, a sua cabeleira castanha frisada espalhou-se sobre a almofada. O que
vira naquelas mulheres magras sem curvas?, perguntou-se Nick, enquanto lhe
levantava a camisa de dormir e lha tirava lentamente pela cabeça. Depois de
lha tirar, Rose ficou nua diante dele, em todo o seu esplendor voluptuoso, e
devorou-a com os olhos. As dúvidas que Rose tivera a respeito de que pudesse
não a considerar atraente desvaneceram-se naquele instante. De repente, as
inibições que sentira também desapareceram e relaxou. Nick inclinou a cabeça e
esfregou o seu rosto contra os seios generosos de Rose, antes de os massajar,
extasiado. 105 Não eram como os seios pequenos das mulheres com quem estivera
antes, eram frutos maduros com mamilos grandes e bem definidos, que
endureceram quando começou a lambê-los e a sugá-los, enquanto Rose se remexia,
excitada, por baixo dele. A sua pele era tão macia e tão suave como imaginara.
Passado um momento, afastou-se dos seus seios para a beijar novamente nos
lábios com sensualidade. Rose respondeu-lhe, laboriosa, gemendo e suspirando.
- Toca-me outra vez - pediu-lhe, num sussurro. - Onde? - Onde me tocaste
antes... Nunca se sentia cómoda com o tamanho dos seus seios e sentia-se...
liberta, de algum modo, ao ver que excitavam Nick. - Gostaste, não foi? -
murmurou, beijando-a no pescoço. - A minha boca a devorar os teus seios...
estes seios espectaculares... Nunca tinha visto uns mamilos tão suculentos.
Rose corou ao ouvi-lo falar do seu corpo naqueles termos, mas também sentiu
que a sua excitação aumentava. Nick estava a esfregar-se contra ela enquanto
falava e Rose sentiu o seu membro erecto contra a sua barriga. Desceu uma mão
para lhe tocar, mas Nick impediu-a. - Ainda não, querida. Temos de ir devagar
ou isto acaba antes sequer de ter começado. - Não compreendo. - Estou
demasiado excitado, Rose. Temos de ir devagar. 106 Rose entendeu o que queria
dizer-lhe e sorriu. Nunca imaginara que pudesse ter um efeito semelhante sobre
aquele homem. Suspirou de prazer quando ele recomeçou a massajar os seus
seios, levantando-os para os beijar, lambê-los e mordiscar suavemente os
mamilos. Rose arqueou-se para ele, ofegante, e abriu os olhos quando sentiu
que os lábios de Nick desciam pelo seu corpo, até chegarem à união entre as
suas coxas. Inclinou a cabeça para trás, incapaz de acreditar que fosse
permitir-lhe explorar a parte mais íntima do seu corpo. Nenhum outro homem lhe
fizera aquilo antes e não sabia o que esperar, mas quando a língua de Nick
começou a lambê-la e depois a penetrou, Rose sentiu-se entrar numa espiral
crescente de prazer. Sentia-se cada vez mais perto do orgasmo, mas não queria
que aquilo acabasse tão depressa, queria-o dentro dela. Estendeu os braços,
agarrou Nick pelo cabelo e puxou-o suavemente, para lhe indicar que queria que
parasse. Nick interrompeu aquele assédio que ameaçava fazê-la perder o
controlo, levantou a cabeça e riu-se. - Isso foi... - sussurrou Rose, quase
sem fôlego. - Incrível? Antes que pudesse responder, Nick abriu-lhe as pernas
e murmurou: - Foi apenas o início. Penetrou-a com um movimento certeiro. Rose
nunca imaginara que um membro tão impressionante pudesse introduzir-se até ao
fundo da sua vagina com tanta facilidade. 107 Nick começou a mexer-se devagar,
com movimentos rítmicos das suas ancas, e parecia que sabia exactamente como
funcionava o seu corpo, porque cada vez que Rose sentia que estava a roçar o
limite, abrandava o ritmo para que descesse das alturas e, a pouco e pouco,
subisse novamente. Num dado momento em que Rose estava demasiado perdida no
prazer que estava a experimentar para se dar conta, Nick rodou-a com ele de
modo que ela ficou por cima. As mãos fortes e grandes de Nick tinham agarrado
as suas nádegas e naquela posição os seios de Rose ficavam ao alcance da sua
boca ávida. Rose emitiu um gemido intenso, deleitando-se com o facto de o ter
dentro dela enquanto lambia e sugava os seus mamilos. Finalmente, atingiram o
orgasmo e, quando saiu de cima dele, Rose sentia-se completamente satisfeita.
Nunca sentira nada tão intenso. - Devíamos dormir um pouco - disse a Nick, com
desinteresse - ou amanhã pareceremos zombies. Aquilo parecia um sonho, estar
ali aninhada contra ele e que, de repente, tudo tivesse feito sentido, porque,
naquele momento, acabava de se aperceber de que se apaixonara por ele. Só uma
coisa afectava a felicidade que sentia: o facto de que teria de lhe esconder o
amor não correspondido só era suportável quando se mantinha em segredo. No
entanto... por um instante, Rose permitiu-se sonhar. E se Nick acabasse por se
apaixonar por ela, por mais impossível que parecesse? Sabia que não era o seu
tipo, mas, mesmo assim, sentia-se atraído por ela, não sentia? 108 - Estamos
juntos na cama... e falas-me de dormir? - murmurou Nick, acariciando-lhe a
coxa. Dormir era a última coisa em que conseguia pensar naquele momento,
fossem que horas fossem. Rose sorriu e esticou os braços por cima da cabeça,
provocando-o com os seios que tanto pareciam agradar-lhe, e sentiu uma
satisfação intensa quando os olhos de Nick escureceram de desejo. Fizeram
novamente amor sem pressa, desfrutando de cada momento. Nick explorou cada
centímetro de Rose e ela, animada por ele, fez-lhe o mesmo. Bateram as cinco
horas antes de finalmente, adormecerem, nos braços um do outro, e quando Rose
acordou na manhã seguinte o sol já enchia o quarto. O lugar ao seu lado estava
vazio, mas logo a seguir Nick entrou pela porta, com uma chávena de café na
mão. Rose endireitou-se, tapando-se com o lençol, e sorriu. - Para ti - disse-
lhe Nick, estendendo-lhe a chávena. - Há quanto tempo te levantaste? -
perguntou-lhe Rose, agarrando-a. Um pouco de cafeína era precisamente o que
precisava. - Há algumas horas. - Devias ter-me acordado - disse ela, com um
bocejo. - E deixava de te ver a dormir com essa expressão angelical no rosto?
- murmurou ele, sentando-se ao seu lado. 109 Rose maravilhou-se com o facto de
alguém conseguir estar tão sexy com umas bermudas e uma t-shirt. - Na verdade,
não me sinto muito angelical esta manhã - confessou-lhe. - De facto, sinto-
me... - Decadente? Sensual? - perguntou ele, puxando-lhe o lençol. - Ainda
melhor. Rose corou e sorriu, antes de beber um gole de café. Rose Papaeliou...
não soava mal, nada mal, pensou. - Mais ou menos - respondeu. - Nunca tinha
tido uma aventura de uma noite. Não sou desse tipo de raparigas. - Quem disse
que isto foi só uma aventura de uma noite? O coração de Rose palpitou com
força, mas conseguiu manter uma expressão neutra. Não devia iludir-se. - Dá-me
quinze minutos para me arranjar e estou pronta - disse-lhe, mudando de
assunto. - O que planeaste para hoje? - Pois...! Gostavas de fazer mergulho?
Rose disse para si que qualquer coisa que pudesse fazer na sua companhia lhe
pareceria bem. Lee Peng, o seu sócio, partira para a Indonésia para
inspeccionar outro projecto em que estava a trabalhar, de modo que estariam
sozinhos. - Adorava. Nick achara que ao passarem as vinte e quatro horas do
dia juntos acabariam por se aborrecerem 110 um do outro, mas, para sua
surpresa, não foi assim. Rose provocava-o sem misericórdia e ele desfrutava
disso. A sua companhia era refrescante e revitalizante. Nos dias seguintes,
foram mergulhar e foram a um mercado local ao ar livre, onde compraram frutas
e legumes de todas as cores e tamanhos, muitos dos quais nunca tinham visto.
Também comeram figos em miniatura que eram doces como o mel e beberam água de
coco. Um dia, foram passear pela selva e desafiaram-se a atravessar uma ponte
suspensa que não parecia absolutamente segura, embora lhes tivessem assegurado
que era. Finalmente, fizeram-no e celebraram-no a fazerem amor num canto
afastado da vegetação densa que contornava o rio. Rose começava a ver uma
faceta de Nick que não vira até então. Ria-se muito e estava completamente
relaxado. Inclusive, deixara de estar constantemente atento ao trabalho. Só
atendia as chamadas verdadeiramente importantes que recebia no telemóvel. A
maioria das vezes, simplesmente olhava para o número no visor e voltava a
guardá-lo no bolso. Rose encarou aquilo tudo como um bom sinal, um sinal de
que queria passar mais tempo na sua companhia e que se sentia tão bem com ela
que inclusive estava disposto a esquecer um pouco o trabalho, mas, tratando-se
de Nick, era dizer muito. E o sexo... Meu Deus, o sexo era incrível! Às vezes,
Nick mostrava-se terno, outras, apaixonado e criativo... mas, de qualquer
forma, sempre irresistível. 111 Rose sentia-se feliz, plena e queria mais
daquilo, queria continuar a deixar-se levar, mas também queria saber se Nick
sentia o mesmo que ela sentia por ele. Por isso, na sua última noite na ilha
deu por si a tentar decidir como abordar aquele assunto delicado e descobrir
quais eram as intenções de Nick com ela. - O jantar desta noite foi fantástico
- disse, escolhendo a maneira mais indirecta de puxar o assunto de que a sua
estadia ali estava prestes a acabar. - De facto, a comida em geral neste lugar
é deliciosa, não te parece? Os sabores são únicos e, na verdade, sempre gostei
de provar novos pratos, e... - Rose, Rose... pára - interrompeu-a Nick, rindo-
se suavemente. - Vá, deita-te e desfruta das estrelas, e do barulho das ondas!
Rose obedeceu e deitou-se ao seu lado na toalha que lhes tinham emprestado na
recepção do hotel. Tentou deixar-se envolver por tudo o que os rodeava, mas
não conseguia parar de pensar, portanto voltou a tentar. - Isto tudo supõe uma
mudança tão grande, não é verdade? Em relação a Londres, quero dizer. - Oh,
sim, é claro que sim! - Vai parecer-me estranho ter de voltar amanhã. - Sim, a
mim também. - Vais ter saudades... de estar aqui... comigo? - Infelizmente,
mais cedo ou mais tarde, tudo o que é bom acaba - respondeu ele. Passou o
braço por debaixo do pescoço de Rose e rodeou-lhe os ombros. - Enfim, é a
vida! 112 Rose decidiu ser directa. Não podiam passar a noite toda com
metáforas, pois não chegariam a lado nenhum. - Mas... Onde é que isso nos
deixa? Bom, pensou Nick, decepcionado, mais cedo ou mais tarde tinha de
acontecer. Fora parvo ao ponto de achar que Rose, por ser diferente das
mulheres com quem estivera até então, também seria diferente naquele aspecto.
Achara que, ao contrário de todas elas, não começaria a fazer perguntas a
respeito do futuro, nem a tentar arrancar-lhe promessas que não tinha intenção
de cumprir. - Pois...! O prazo que estabelecemos durante o qual trabalharias
para mim está quase a acabar - começou a responder-lhe. - E eu diria que
cumprimos as metas a que nos tínhamos proposto, não achas? E... Bom, imagino
que estarás desejosa de voltar para a tua antiga rotina, não estás? - Sim,
claro, é claro! - assentiu ela, embora não fosse verdade. A verdade era que
naqueles dois meses mal sentira falta do seu emprego na Fedco e não estava
absolutamente ansiosa de voltar para a rotina, depois de ter sido tão
interessante e instrutivo trabalhar para ele. Algo lhe dizia que Nick estava a
defender-se com evasivas para não responder à pergunta que lhe fizera e que só
podia haver uma razão: sentisse o que sentisse por ela, não era amor. O que
achara? Que o modo como os seus olhos escureciam quando a via nua era amor? Ou
que o facto de se sentirem confortáveis um com o outro 113 significava alguma
coisa? De repente, sentia-se tão magoada que não suportava ter o seu braço à
volta dos ombros. - Claro que, devido ao facto de os dois meses estarem
prestes a acabar, não implica que tenha de acabar... o que há entre nós -
murmurou Nick. "O que há exactamente entre nós?", queria perguntar-lhe.
Certamente, para ele não passava de mais uma relação baseada em sexo, que
estaria disposto a prolongar até se fartar. Pelo contrário, para ela suporia
mais falsas esperanças, mais dor e acabaria com o coração partido. - Eu acho
que sim. - Oh, vá lá, Rose! Não estás a falar a sério? perguntou Nick,
virando-se para ela para a beijar no pescoço. Rose afastou-se dele e levantou-
se. - Foi tudo óptimo - disse, assinalando à sua volta com um gesto. - As
paisagens idílicas, o ambiente exótico, passar alguns dias longe do
quotidiano, mas agora está a chegar ao fim. - Perguntaste-me onde é que isto
nos deixava murmurou Nick, endireitando-se para ficar sentado. - Isso
significa que consideras que temos uma relação? - Estava a falar do trabalho -
mentiu ela. - Estava a pensar que seria bastante embaraçoso termos de
continuar a ver-nos e fingirmos que não aconteceu nada entre nós. Nick
levantara-se e pusera-se à frente dela. - Ouve, Nick, foi realmente tudo
maravilhoso. Eu nunca achei que... Quero dizer que a minha primeira 114
impressão de ti não foi precisamente lisonjeira, mas desfrutei de cada minuto
que passei aqui contigo. Divertimo-nos, não foi? Nick não podia acreditar no
que estava a ouvir. Não deveria ser ele a ter aquela conversa? Não deveria ser
ele a dizer-lhe de uma maneira suave que não queria compromissos? - Sim,
claro, foi bom - assentiu, enfiando os polegares nos bolsos das suas calças de
ganga e olhando para ela. Enfim, afinal a decisão era sua e, certamente, era a
correcta. - E fico contente que estejas a encará-lo com... Bom, com tanta
calma. - O que esperavas? Que me pusesse a chorar e a gritar? Nick encolheu os
ombros e puseram-se a andar de volta para o hotel. Aquele não era o modo como
esperara passar a sua última noite no Bornéu. - Algo tão extremo, não -
respondeu - não és desse tipo de mulheres. Pelo menos, não em público, disse
para si Rose. - Enfim, como estava a dizer, fico contente que o tenhas
encarado tão bem - continuou Nick. - Não me perdoaria se te tivesse magoado.
Além disso, sabes como sou, - acrescentou, com uma gargalhada que soou
terrivelmente falsa aos seus ouvidos - teriam de me apontar uma pistola à
cabeça para que me comprometesse e assentasse a cabeça. - Pois! De qualquer
modo, eu também não queria esse tipo de compromisso da tua parte - apressou-se
a dizer ela. - Damo-nos bem na cama, mas numa relação há coisas muito mais
importantes do que o sexo. 115 Nick sentiu uma pontada ao ouvir aquilo, mas
assentiu. - Na verdade, nunca pensei que diria isto - acrescentou Rose, - mas
sinto-me muito agradecida a ti e não só por me teres tirado de um apuro
financeiro, mas também porque me deste mais confiança em mim mesma e me
fizeste ver que não tenho de me conformar com o que tenho, que o mundo está
cheio de possibilidades. - Fico contente por ter sido útil - respondeu ele,
sem o menor entusiasmo. - Oh, e em relação aos relatórios que me pediste que
escrevesse...! Estarão prontos na próxima segunda-feira. - Não será
necessário. - O que queres dizer? - Que já não estou muito convencido de que
queira construir o hotel aqui no Bornéu. - Porquê? - perguntou Rose, perplexa
com a sua mudança repentina de ideias. - Este lugar é incrível. E investiste
tanto tempo a conhecê-lo! - Sim, é um lugar incrível e é precisamente por isso
que não quero ser eu a estragá-lo. As pessoas daqui vivem tranquilamente e
atrair mais turismo só alteraria as suas vidas - respondeu ele. Sem contar,
pensou, que o Bornéu lha recordaria para sempre. Rose começou a responder-lhe,
falando-lhe dos benefícios que um turismo controlado poderia ter para a
comunidade local. - Não digo que não tenhas razão, Rose, mas a minha decisão
já está tomada - interrompeu-a ele. 116 Depois, para suavizar a sua resposta
abrupta, acrescentou, num tom mais amável. - Bom, já fizeste as malas? Rose
franziu o sobrolho perante a mudança repentina de assunto, mas depois
assentiu. - Sim, já tenho tudo pronto. - Incluindo aquelas recordações
ridículas que insististe em comprar, há alguns dias, no mercado? provocou-a
ele. - Não são ridículas! Quando voltarmos para Inglaterra, arrepender-te-ás
de não teres comprado algumas e aperceber-te-ás de como ficariam bem nas tuas
paredes - respondeu ela, entrando no seu jogo. Não queria que se desse conta
de como estava magoada. - Diz-me um único sítio onde aquelas máscaras às cores
ficariam bem no meu apartamento. - Em qualquer sítio, bastava tirares um
daqueles quadros abstractos ultramodernos que ninguém entende. Rose ouviu-se
pronunciar aquelas palavras num tom quase natural e despreocupado, mas era
como se não fosse ela, era como se fosse outra pessoa. Quando chegaram aos
seus quartos, pararam no corredor para desejarem boa noite e Rose esboçou um
sorriso, e estendeu-lhe a mão. - Oh, por favor, Rose! - exclamou ele, fazendo
com que a baixasse. - Sim, estamos de acordo que isto foi apenas um romance
passageiro e que é melhor pormos-lhe um ponto final, mas parece-me que
apertarmos a mão seria um pouco ridículo - acrescentou, antes de se inclinar
para a beijar nos lábios. 117 Não foi um beijo intenso, como os que tinham
partilhado nos dias anteriores, mas um beijo meramente afectuoso, um beijo de
despedida, e Rose sentiu que lhe partia o coração. No dia seguinte,
comportaram-se da mesma maneira: afáveis e educados, e Rose sentiu, mesmo
antes de aterrarem no aeroporto de Heathrow, que o abismo entre eles era cada
vez maior. Perguntou-se como seria quando se separassem, mas o momento foi
bastante surrealista. Nick viu alguém que conhecia e, antes que Rose tivesse
tido tempo de se preparar para o adeus final, beijou-a na face e desculpou-se.
Importava-se de apanhar um táxi sozinha? Havia algumas coisas sobre as quais
queria falar com o seu amigo, um tal Ed Duggins. - Cuida de ti - disse-lhe. -
Ah, espero que a casa tenha ficado como esperavas! Depois, afastou-se e Rose
ficou ali, aturdida e com vontade de chorar. Foi directamente para casa. Antes
de ir de viagem, fora lá quase todos os dias para fiscalizar as obras e
deixara Terry, o decorador que contratara, como responsável. Pelo menos, era
algo que a entusiasmava, ver o resultado final. O táxi deixou-a à porta e,
quando entrou, passeou por todas as divisões, reparando em todas as
alterações. Terry fizera um bom trabalho. E estava tudo pago. Rose disse para
si que devia sentir-se feliz, mas a única coisa que a fez sorrir foi telefonar
à sua irmã para lhe dizer que já estava de volta. Além disso, Lily deu-lhe uma
boa notícia que 118 não esperava: ia voltar algumas semanas a Inglaterra,
porque o actor principal magoara-se num tornozelo e tinham adiado a rodagem
das cenas que faltavam filmar. Ouvir a sua voz foi como um bálsamo para Rose
e, quando lhe contou o que acontecera com Nick, não conseguiu reprimir algumas
lágrimas. - Não te preocupes, Rosie - disse-lhe a sua irmã. - Tudo se
resolverá, vais ver. Quando desligou o telefone do outro lado do Atlântico,
Lily sorriu. Rose precisava dela. Era a primeira vez que Rose não era a forte,
mas pelo contrário. Bom, pelo menos todas as desilusões amorosas pelas quais
passara servir-lhe-iam de experiência para consolar a sua irmã e faria tudo o
que estivesse ao seu alcance para a animar. - Já regressaste do Bornéu há
quase duas semanas, Rose - disse Lily à sua irmã, no sábado de manhã, quando
estavam a tomar o pequeno-almoço. Não te parece que já está na altura de
saírmos para nos divertirmos? Eu tenho de voltar para a América na quarta-
feira que vem e não quero ir-me embora a pensar que te deixo aqui, sozinha e
deprimida. Duas semanas... pensou Rose. Não voltara a saber nada de Nick desde
que tinham voltado para Inglaterra. Nem uma chamada, nem uma mensagem no
atendedor de chamadas ou no telemóvel... nada! Era como se não tivesse
existido para ele. Tentara disfarçar a sua tristeza, mas, a julgar pela
expressão preocupada de Lily, parecia que não estava a conseguir. - Não estou
deprimida, Lily, estou cansada. Além disso, não tenho tempo para sair para me
divertir respondeu, olhando para ela por cima do rebordo da sua chávena. - Só
voltei ao trabalho há alguns dias e não acreditas no trabalho que tinha à
minha espera. 120 - Mas é sábado, Rose! - replicou Lily, com um suspiro. - Não
te preocupes comigo, vai sair e diverte-te. Tal como disseste, dentro de
alguns dias regressas à América e deves querer despedir-te dos teus fãs antes
de te ires embora - disse-lhe, com um sorriso. O telefone não parara de tocar
desde a volta da sua irmã: velhos amigos que queriam encontrar-se com ela para
saberem como estava e outros que, conforme Lily lhe confessara com malícia,
não eram assim tão amigos, mas que estavam ansiosos por se darem com ela,
agora que estava na indústria cinematográfica. - Não, não! Tu e eu vamos sair
esta noite. Vou levar-te a um sítio em West End onde tocam jazz. Além disso,
convidarei alguns amigos e algumas pessoas que conheci na América, e que
também estão cá. Vamos divertir-nos muito, vais ver. Quando acabaram de tomar
o pequeno-almoço e se vestiram, Lily levou Rose às compras, garantindo-lhe que
era a melhor terapia quando se estava em baixo. E não só, também a levou a um
cabeleireiro onde, oh, surpresa!, marcara uma hora com antecipação. Lá, o
cabelo de Rose sofreu uma metamorfose espectacular. Não só domaram os seus
caracóis, tornando-os mais definidos, como também lhe fizeram algumas madeixas
muito favorecedoras. Lily declarou-se plenamente satisfeita com o resultado e
voltaram para casa, exaustas, mas carregadas de sacos, e, no caso de Rose, com
uma mudança radical de imagem. Claro que nunca teria uma figura tão esbelta e
121 elegante como a de Lily, mas não se vira tão gorda nos espelhos dos
provadores como das outras vezes. - Perdeste peso - comentou a sua irmã,
enquanto deixavam os sacos sobre a mesa da cozinha. Parecia que lhe lera o
pensamento. - Embora tenha algumas saudades da antiga Rose, gordinha e fofinha
- disse-lhe, com um sorriso afectuoso. Rose também sorriu, mas não conseguiu
evitar perguntar-se se seria assim que Nick a vira, como uma almofada velha e
fofa para se abraçar de noite, quando não tinha nada melhor ao seu dispor.
Felizmente, a conversa alegre de Lily, que começou a falar dos hábitos
alimentares peculiares dos americanos, ajudou-a a dissipar aqueles pensamentos
sombrios. Rose estava quase convencida de que, mais cedo o mais tarde, Lily
voltaria de vez para a Inglaterra. Durante aqueles dias, confessara-lhe que
havia demasiada pressão na América entre a gente do mundo do espectáculo para
se estar magro, demasiada competitividade e também uma obsessão doentia de se
lamber as botas a determinadas pessoas. Lily, que herdara dos seus tios o
desprezo boémio pelo dinheiro, não compreendia porque toda a gente parecia tão
disposta a "entrar na onda" para poder comprar um carro mais caro ou uma casa
maior, se podiam ser felizes com muito menos. - Enfim, devo estar a enjoar-te
com tanta conversa - disse-lhe, a rir-se. - Talvez volte para ficar quando
acabarmos de rodar o filme. Estou muito agradecida a Nick pelo que fez por
mim, mas Hollywood parece-me um pouco grande. 122 Nick. Rose não perguntara a
Lily se tinham voltado a ver-se. Dizia-se que tanto fazia, que Nick pertencia
ao passado, mas no fundo sabia que tinha medo. Medo de que o muro que erguera
à volta do seu coração desabasse e deixasse sair toda a dor que estivera a
conter. À tarde, quando tinham de começar a preparar-se para a sua saída, Lily
deu instruções a Rose para que se vestisse, mas que não se maquilhasse, que
ela o faria. - Não imaginas os truques que-aprendi com as maquilhadoras que
temos na rodagem - disse-lhe. Rose subiu para mudar de roupa e demorou o seu
tempo a ver-se ao espelho. Sim, não havia dúvida de que perdera peso e sentia-
se muito melhor com alguns quilos a menos. De facto, alguns meses antes não se
teria atrevido a vestir o vestido que Lily a convencera a comprar. Tinha um
decote vertiginoso e a saia, que ficava por cima dos joelhos, tinha um pouco
de roda. Quando Lily a maquilhou, Rose sentiu-se mais animada e estava quase a
acreditar no que não parava de repetir a si própria: que estava melhor sem
Nick e que tinha a vida toda pela frente. Apanharam um táxi e, precisamente
quando Rose começava a alegrar-se por Lily a ter convencido a sair, a sua irmã
deixou cair a bomba: Nick estaria no clube onde iam. Bom, era possível que
fosse, não tinha a certeza, porque lhe dissera que estava muito ocupado. Mas
não tinha com o que se preocupar. 123 Além disso, não seria óptimo demonstrar-
lhe que não precisava dele para nada? Rose, nervosa, esteve prestes a pedir ao
taxista que desse a volta e a levasse de volta a casa, mas disse para si que
Lily tinha razão. Porque haveria de ter medo? Afinal, Nick não fazia ideia de
que estava apaixonada por ele. E se aparecesse lá, demonstrar-lhe-ia que
estava muito bem sem ele, como a sua irmã dissera. Apesar de ser cedo quando
chegaram, o lugar já estava a começar a encher e Rose não teve tempo de se
sentir nervosa, porque, durante a hora seguinte, Lily manteve-a ocupada,
apresentando-a aos seus amigos americanos. O vestido estava a ter mais sucesso
do que esperara. Havia vários homens que pareciam considerá-la fascinante. Um
deles, o que estava a ouvir naquele momento, enquanto lhe falava do seu último
filme, que tivera muito sucesso na première de Cannes, até observara o copo
que tinha na mão. Vestia a última moda e usava rabo-de-cavalo. Era o oposto de
Nick, que, naquele sentido, era muito clássico. De facto, uma vez começara a
gozar com os homens que usavam jóias e o cabelo comprido, dizendo que isso era
coisa de hippies. Rose começara a rir-se e provocara-o, acusando-o de
preconceituoso. Aquela lembrança repentina fez com que sentisse um aperto no
coração. Bom, pelo menos parecia que finalmente decidira não vir, disse para
si, e foi então que o viu, no outro lado da sala, tão sexy como sempre, e
vestia apenas umas calças pretas simples e 124 uma camisa branca com as mangas
enroladas até aos cotovelos. Agarrada ao seu braço estava uma ruiva de pernas
compridas, que usava um vestido prateado minúsculo. Parecia que não perdera
tempo, pensou Rose, com amargura. Esperara pouco tempo para arranjar outra das
suas raparigas de capa de revista. Acabou o seu copo e tentou concentrar-se no
que estava a dizer-lhe o tipo que a convidara para aquele martini. Chamava-se
Ted, mas pedira-lhe que lhe chamasse Splite, como os seus amigos. Estava a
falar-lhe dos famosos que conhecera em Cannes, intercalando o seu relato com
todo o- tipo de intrigas suculentas. No entanto, os seus olhos traiçoeiros não
paravam de lançar olhares às escondidas para Nick, que acabava de se desculpar
com a sua acompanhante e se dirigia para o balcão, enquanto a ruiva ficava a
falar com um homem que parecia conhecer. O mundo do espectáculo era muito
pequeno, dissera-lhe Lily, toda a gente se conhecia. Ted "Splice" convidou-a
para outro martini. Rose aceitou, esboçando um sorriso, e, quando ele se
afastou, teve o cuidado de se desviar da vista da ruiva. Não queria que Nick
se virasse e a apanhasse a olhar para ela, como se estivesse ciumenta. De
repente, uma mão pousou no seu ombro e, quando se virou, ali estava Nick. O
seu coração disparou, mas recompôs-se rapidamente e cumprimentou-o com um
sorriso deslumbrante. - Meu Deus, não esperava encontrar-te aqui disse-lhe. -
Como estás? Nick não sorriu. - Estás diferente! Eu é que não esperava
encontrar-te aqui - murmurou ele, olhando para ela de cima a baixo. - Bom,
sabes o que se diz, de que de vez em quando temos de nos arriscar e
experimentar coisas novas. E fico contente de ter vindo, estou a divertir-me
muito. - Sim, já me dei conta - respondeu ele, num tom gélido. Rose perguntou-
se se o seu ego desproporcionado o fizera pensar que estaria em casa a chorar
e a suspirar por ele. - E tu? Estás a divertir-te? - perguntou-lhe ela,
educadamente. - Vieste com alguém? - Sim. A minha acompanhante está ali, a
falar com uma pessoa - respondeu ele, assinalando atrás dela com a cabeça.
Rose virou-se e viu que a ruiva estava a olhar para eles. - Oh! Não parece
muito contente por a teres deixado sozinha. Devias ir ter com ela. E - Não
acho que a incomode que me afaste alguns minutos dela para cumprimentar uma
velha... amiga - respondeu ele, com um sorriso forçado, - Conta-me, como
estás? - Não tenho muito para contar. Apenas que voltei para o meu trabalho e
pouco mais. E, enfim, como vês, segui o conselho que me deste de que, de vez
em quando, todos precisamos de fazer loucuras - disse-lhe Rose, rindo-se
alegremente. - Sim, mas há uma diferença entre a loucura e a estupidez -
disse-lhe ele, irritado. - Uma loucura é 126 fazeres uma coisa que não te
atrevias a fazer por causa dos teus medos e teres vindo com esse vestido é uma
estupidez. Rose olhou, boquiaberta, para ele e soltou uma gargalhada
incrédula. - Estás a dizer que o meu vestido não é decente? Por acaso,
reparaste no que a tua acompanhante tem vestido? - perguntou-lhe. - Isso é
completamente diferente - resmungou Nick. - Não me digas? E porquê? Porque
como ela é alta e magra este tipo de vestidos fica-lhe melhor do que a mim? -
Não. É diferente porque... - começou Nick, tentando conter a sua irritação. "É
diferente porque ela não é tão sexy como tu", disse para si. - Porque poderias
ver-te envolvida numa situação que não serias capaz de gerir. Viste-te sequer
ao espelho antes de saíres de casa? Tens ideia do quanto... estás a mostrar? -
Também adorei falar contigo, Nick. E, agora, se me desculpares, Splice vem aí
com o meu martini. - Splice? - É uma alcunha - respondeu ela, com um sorriso
adoçado. Afastou-se antes de lhe dar tempo para responder, mas, antes que
pudesse chegar onde Ted estava, Lily apareceu com expressão preocupada. - O
que Nick estava a dizer-te? - perguntou-lhe. - Vi-vos a falar e pareceu-me que
estavam bastante tensos. - Não tem importância, Lily, a sério. Não quero 127
estragar-te a noite, repetindo o que teve a desfaçatez de me dizer. No
entanto, Lily insistiu e Rose acabou por lhe contar como criticara o seu
vestido, sugerindo que estava a dar a imagem de ser uma espécie de mulher
fatal e que, se não tivesse cuidado, acabaria por se meter numa situação da
qual não saberia sair. - E vais deixar que as coisas fiquem assim? Devias
estar zangada com ele. Furiosa! - Bom, sim, e estou... - Tens de ir ter com
ele e mostrar-lhe que és mais do que capaz de cuidar de ti mesma. E mostrar-
lhe que não é o único homem interessado em ti - disse-lhe Lily. - De facto, eu
diria que Splice parece muito impressionado contigo. Vai, eu distrairei Cat. -
Quem? - Cat, a sua acompanhante. O seu verdadeiro nome é Nancy, Cat é o seu
nome artístico. Não imaginas como é convencida, conheci-a quando trabalhei
como modelo. - Lily, não penso... - Exacto, isso é o que não deves fazer:
pensar. Pensar só complica as coisas - disse a sua irmã, empurrando-a. Rose
encontrou-se a alguns passos de Nick, enquanto Lily agarrava a ruiva pelo
ombro e a levava. Nick virou-se para ela e Rose sentiu vontade de estrangular
Lily. - A... A minha irmã queria que a tua namorada conhecesse um amigo dela -
foi tudo o que ocorreu a Rose. - Não é a minha namorada. 128 - Oh, bom, a tua
acompanhante! - respondeu Rose, encolhendo os ombros, como se não lhe
importasse minimamente. - Enfim, já me ia embora! Gostei de voltar a ver-te,
Nick, fica bem. Era-lhe indiferente o que Lily dizia. O olhar intenso de Nick
punha-a nervosa e não queria acabar por fazer uma figura ridícula. - Espera! -
resmungou Nick, agarrando-a pelo braço quando estava a virar-se. - Quanto já
bebeste? - O que bebi não te diz respeito. - Ah, não? E como vais voltar para
casa? - De táxi, com Lily - respondeu ela, procurando-a com o olhar. Onde
raios se meteu? Importas-te de me largar? - Eu levo-te. - Nem pensar! -
replicou Rose, soltando-se e dando um passo atrás. - A tua irmã não está aqui
e aquele pervertido que estava a babar diante do teu decote também não. - Não
é um pervertido - respondeu-lhe ela, com um sorriso brincalhão. - De facto,
para tua informação, Splice é produtor de cinema e um tipo encantador. -
Trouxeste casaco? - Não vou deixar que me leves a casa - repetiu-lhe ela. -
Além disso, não podes deixar a tua acompanhante sozinha, seria uma
indelicadeza. Nick não respondeu. Estava a olhar à sua volta, como que à
procura da ruiva. Quando os seus olhos ficaram fixos num ponto, Rose olhou
nessa direcção e viu a tal Cat e a sua irmã. - Espera aqui! - ordenou-lhe
Nick. 129 Rose não tinha a mínima intenção de fazer tal coisa. Seguiu-o e
chegou junto da sua irmã precisamente quando ele estava a dizer-lhe que ia
levá-la a casa, a menos que lhe dissesse que também se ia embora. - Oh, não,
tenho de ficar até todos os meus amigos partirem - disse Lily. - Não seria
educado que me fosse embora tão cedo. Além disso, Cat também não quererá ir-se
já embora, não quando acabei de lhe apresentar Joe Carr, pois não, Cat? Rose
olhou para a ruiva. Era evidente que deitava faíscas perante a ideia de Nick
se ir embora com outra mulher, mas parecia que lhe custava resistir à ideia de
se ir embora e deixar plantado o tal Joe, que devia ser alguém importante na
indústria. - Sim, eu fico. Telefona-me - disse a Nick, antes de se aproximar
para lhe dar um longo e sensual beijo nos lábios. Rose sentiu que se lhe
revolvia o estômago, mas, quando se deu conta de que Lily estava a olhar para
ela, esforçou-se para fingir indiferença. Depois, Nick conduziu-a até ao
bengaleiro e saíram do local. O seu motorista estava à espera deles e, quando
Nick lhe segurou a porta, Rose entrou no veículo sem olhar para ele e sentou-
se em silêncio. Nick deu as indicações necessárias ao motorista e arrancaram.
- Estás muito calada - disse-lhe Nick, passado um momento. - Estou cansada. -
Temos uma conversa para acabar. - Que conversa? - perguntou ela, olhando para
130 ele. Deixou escapar um suspiro enfastiado. - Não temos nada para falar,
Nick. Acabámos a nossa relação de mútuo acordo e seguimos as nossas vidas.
Nick franziu o sobrolho. - Isso não significa que não me importe com o que
possa acontecer-te, Rose. - Oh, por favor, não sejas hipócrita! Já arranjaste
outra para me substituir. E se, por alguma razão te sentes culpado, não há
necessidade. Contrataste-me porque és amigo de Lily e sentias pena de mim.
Agora, também sentes pena de mim, só que por motivos diferentes. - Eu não
sinto pena de ti - replicou ele, com aspereza. - Então, do que se trata? Não
quero que te intrometas na minha vida. - As pessoas não mudam da noite para o
dia, Rose. Não podes transformar-te, de repente, numa mulher que vive ao
limite. - E se tiver mudado e defenido que quero que a minha vida seja assim?
Não te diz respeito. Estavam a chegar a sua casa e Rose pendurou a mala ao
ombro, preparando-se para sair do carro assim que parasse. No entanto, Nick
também saiu e acompanhou-a até à porta. - Não tens de esperar que entre, já
podes ir-te embora - disse-lhe Rose, com um sorriso forçado, enquanto abria a
porta com a chave e a empurrava. - Não vais livrar-te de mim tão facilmente -
resmungou Nick, abrindo totalmente a porta e entrando, antes que pudesse
impedi-lo. 131 Rose fechou a porta, virou-se para ele e cruzou os braços. - Já
te disse: não temos nada para falar. - Promete-me que não voltarás a sair
assim vestida. - Como te atreves a dizer-me o que devo vestir ou não? - É para
o teu próprio bem. - Para o meu próprio bem? - Ouve, Rose, talvez penses que
sabes o que estás a fazer, mas não é assim - disse-lhe. - O que fizeste ao ir
assim vestida esta noite não só foi uma insensatez, porque deste a entender
que és o que não és, como também foi ridículo. Dos homens que havia naquele
local esta noite, metade deixaria de rastos o próprio Casanova, enquanto a
outra metade era homossexual. - Pois! E como tu não és homossexual, já sabemos
a que categoria pertences. - Não estamos a falar de mim. - Já paraste para
pensar que talvez esteja à procura de um homem sem escrúpulos? Se calhar,
decidi que estou farta dos homens insossos com quem estive até agora e que
quero um pouco de perigo. - Não o dizes a sério. -Ah, não? Rose remexeu na
mala e tirou um cartão onde Ted "Splice" lhe anotara vários números de
telefone, caso quisesse telefonar-lhe. Abanou-o diante da sua cara, como se
aquele cartão provasse que estava a falar muito a sério. 132 - Não te disse,
mas Ted e eu combinámos encontrar-nos no sábado que vem - disse-lhe,
acrescentando o nome do primeiro restaurante que lhe passou pela cabeça, um
italiano que ficava perto dali. E quem sabe o que contecerá quando saírmos de
lá? O sítio onde Rose lhe dissera que iria encontrar-se com o tal Splice era
um restaurante italiano e, sendo sábado à noite, estava a transbordar de
famílias. Nick repetira a si próprio que tinha coisas melhores para fazer do
que ir espiar aquela mulher irritante, mas andara a indagar a respeito daquele
tipo e, conforme parecia, estivera em vários centros de desintoxicação. Não
era que aquilo fosse algo fora do comum naquele mundinho, mas não conseguia
imaginar Rose a sair com um tipo assim. De facto, não suportava imaginá-la com
ninguém. Nunca fora um homem possessivo e a simples ideia de estar ciumento
dera-lhe vontade de se rir. Ele, que sempre se orgulhara de como era maduro
nas relações... No entanto, passados seis dias já não achava nenhuma graça.
Pensar nas mãos daquele baboso a despir Rose, a desapertar-lhe o sutiã e a
devorar com os olhos os seus bonitos seios fazia com que sentisse vontade de
vomitar. 134 Não devia ter deixado que Rose pusesse fim à sua relação tão
bruscamente. Esse era o problema. As coisas que acabavam de um modo prematuro
tornavam-se objectos de desejo simplesmente porque não se satisfizera a ânsia
delas. A piza que pedira estava surpreendentemente boa. O vinho nem tanto, mas
bebia-se. Às oito e meia, quando nem Rose nem o seu acompanhante tinham
aparecido, começou a perguntar-se com satisfação maliciosa se talvez o
produtor não a teria deixado plantada. Ou talvez Rose tivesse mudado de
ideias. Talvez se tivesse dado conta de que tinha razão. Estava tão abstraído
naquelas hipóteses que, quando os viu entrar pela porta, quase deu um salto.
Sentindo-se um pouco ridículo ali escondido, num canto atrás de uma planta
enorme de plástico, viu como um empregado os conduzia até uma mesa entre duas
famílias com crianças, que não paravam de gritar e correr. Rose não estava
vestida de um modo atrevido, mas, mesmo com a saia cinzenta simples e a blusa
branca que usava, parecia-lhe sexy. Assim vestida, poderia ter ido
perfeitamente trabalhar, mas desabotoara os dois primeiros botões da blusa e
tinha a certeza de que, se ele reparara nisso, Ted "Splice" também o teria
feito e, naquele momento, estaria a pensar na maneira mais rápida de a
seduzir. Nick acabou o seu copo de vinho e fez um sinal à empregada que o
servira para pedir uma sobremesa. Não tinha fome, mas tinha de fazer tempo.
Não podia arriscar-se a sair dali e que o vissem. 135 Claro que também não se
iria embora antes deles! Rose, por seu lado, estava a perguntar-se o que
estava a fazer ali. Depois de mentir a Nick, dizendo-lhe que combinara jantar
com Ted no Angelo's Piza! Emporium, decidira que o faria afinal de contas,
mesmo que fosse só para demonstrar a si mesma que era uma mulher livre e que
ninguém, nem sequer Nick Papaeliou, lhe dizia o que tinha de fazer. No
entanto, naquele momento, ali sentada, não estava em perigo de ser seduzida
por Ted, mas de adormecer de tédio. Ted não só parecia gostar de ouvir o som
da sua própria voz, como também lhe confessara no táxi, a caminho dali, em voz
baixa, como se importasse minimamente ao taxista, que as suas inclinações
sexuais não se restringiam ao que se considerava a régra. Não era que não
adorasse mulheres, mas... Rose assentira e resignara-se a passar o jantar a
ouvir as histórias de Ted, e a olhar às escondidas para o relógio. No entanto,
uma ou outra vez, enquanto comia a piza e a salada que pedira, deu por si a
rir-se de algumas das suas histórias. Ted até lhe fez outra confissão: que
gostara dela desde o início, porque era um encanto e sabia ouvir. - Se fosses
um homem, estaria a seduzir-te e quando saíssemos daqui convidava-te para o
meu apartamento - disse. Aquele era o elogio mais peculiar que alguma vez
tinham feito a Rose. - Receio que este encontro foi uma perda de 136 tempo
para ti, não foi? - perguntou-lhe Ted, um pouco envergonhado, alguns minutos
depois, quando pediram a conta. - Devia ter-te dito que sou... Enfim, tu
sabes! Rose riu-se e, deixando-se levar por um impulso, estendeu as mãos e
agarrou nas de Ted. - O que não entendo é porque não te decides a "sair do
armário". Afinal de contas, estamos no século XXI e no mundo em que te
movimentas é uma coisa muito normal. - Oh, é por causa da minha mãe, querida!
- respondeu Ted. - Não acho que reagisse muito bem. Além disso, já está
velhota, a coitada, não quero dar-lhe um desgosto. - Bom, se te ajudar em
alguma coisa, na noite em que nos conhecemos eu também estava a interpretar um
papel. - Quer dizer que...? - Oh, não, não é isso! - exclamou Rose, inclinando
a cabeça para trás e rindo-se. Depois, inclinou-se para a frente e confessou-
lhe, em voz baixa: - O que se passa é que sou tímida e no sábado passado
vesti-me assim porque queria acabar com a minha imagem habitual. - Agora que
conhecemos os segredinhos um do outro, tenho a certeza de que seremos amigos
para sempre - disse-lhe Ted. Bom, afinal, o encontro não fora assim tão mau!,
pensou Rose, quando estavam a levantar-se. Ted rodeou-lhe os ombros com o
braço e sorriu-lhe. Afastaram-se, prometendo telefonar-se e voltarem a
encontrar-se um dia para conversarem. 137 Ao chegar a casa, Rose tirou os
sapatos de salto alto, lavou a cara e vestiu umas calças de fato de treino
cinzentas, e uma t-shirt velha com um desenho desbotado da Minnie. Se havia
algo de bom em se sentir o coração partido era que se perdia o apetite, disse
para si, com ironia, enquanto se sentava à frente da televisão. Assim, pelo
menos não começaria a comer chocolate para afogar as suas mágoas, depois da
piza que comera. Passou quinze minutos a mudar de canais, até que encontrou um
decente. Assim, talvez conseguisse esquecer um pouco Nick, porque, todas as
noites, quando ia para a cama, não conseguia evitar ficar a pensar nele e
demorava horas a adormecer. Naquele momento, ouviu a campainha da porta. Olhou
para o seu relógio de pulso e franziu o sobrolho. Eram quase onze e quinze.
Quem podia ser àquela hora, num sábado? Embora, afinal, o seu encontro com Ted
não tivesse sido assim tão mau, esperava que não fosse ele, disse para si,
enquanto se levantava e ia para o hall. Se quisesse fazer-lhe mais
confidências, dir-lhe-ia, do modo mais educado possível, que o deixasse para
outro dia. No entanto, quando abriu a porta não foi Ted quem encontrou, mas
Nick. Rose ficou tão aturdida que, durante alguns segundos, foi incapaz de
articular palavra. - O que estás a fazer aqui? - perguntou, com aspereza. -
Não podes aparecer aqui cada vez que queres, Nick. 138 - Não vais convidar-me
para entrar? -Não. - Porquê? - Porque tenho coisas melhores para fazer do que
conversar contigo. - E é assim que te vestes quando tens "coisas melhores para
fazer"? - perguntou Nick. Mau começo, pensou este, mordendo a língua assim que
disse aquelas palavras. Não deveria ter dito aquilo. Quando vira Rose sair do
restaurante com o braço daquele tipo à volta dos seus ombros, como se fossem
um casal de namorados, dissera para si que tinha de fazer alguma coisa. - Não
sei do que estás a falar! - respondeu Rose, irritada. - E não gosto da tua
atitude. - Desculpa. - O quê? - Peço-te desculpa. Tens razão, apresento-me
aqui sem que me tenhas convidado e sem avisar, e nem sequer te trago uma caixa
de bombons ou flores. - O que se passa, Nick? Porque haverias de me trazer
bombons ou flores? - Deixa-me entrar, Rose, dá-me uma oportunidade para me
explicar - disse-lhe ele, impaciente. Estava a custar-lhe imenso não levantar
a voz e manter o controlo sobre si mesmo, quando não conseguia deixar de
pensar que Ted devia estar ali, provavelmente no quarto. Certamente, não
estava exactamente vestida para seduzir ninguém, com umas calças de fato de
treino e uma t-shirt velha, mas, ao fim e ao cabo, era Rose e Rose era...
diferente. 139 - Isto não são horas de visita. - Eu sei e também peço desculpa
por isso. - Pára de pedir desculpa, Nick, não combina contigo. Nick sorriu. -
Não, é verdade. Vais deixar-me entrar? Rose soprou e abanou a cabeça, mas
finalmente abriu a porta e afastou-se. Nick entrou e foi directo para a sala,
onde se sentou numa poltrona, como se estivesse em sua casa. - Porque vieste?
- perguntou Rose, sentando-se num canto do sofá. - Como correu o teu encontro?
- Como podes ver, voltei inteira, portanto os teus receios a respeito de Ted
não tinham a mínima razão de ser - respondeu ela. Mal podia imaginar porquê,
acrescentou para si. - Foi por isso que vieste? Por causa desse teu ridículo
sentido de responsabilidade? Sentias-te obrigado a vires certificar-te de que
não se aproveitou de mim e de que eu não estava aqui a chorar? -Não. Rose
olhou, confusa, para ele. - Então, porquê? - Eu... Não sou muito bom a admitir
estas coisas, mas senti-me ciumento quando te vi com aquele tipo no sábado
passado. - Pois, para te dizer a verdade, surpreende-me que tenhas sequer
reparado em mim, com aquela ruiva ao teu lado - respondeu ela. - Eu só tinha
olhos para ti, Rose. - Estás a dizer-me que foste lá com uma mulher na qual
não tinhas nenhum interesse? 140 -Sim. - Porquê? - Porque pensei que me faria
esquecer a atracção que sinto por ti, mas não resultou - respondeu ele,
levantando-se e sentando-se no outro lado do sofá. Porque ainda me sinto
atraído por ti. Não consigo evitá-lo. Diz-me, Rose. Sentiste a minha falta?
perguntou-lhe, com voz rouca. Rose engoliu em seco. - Eu... Isto não vai a
lado nenhum... - Sentiste a minha falta? - insistiu ele. - Eu não consegui
parar de pensar em ti, Rose. Desde o fim-de-semana passado, estive prestes a
enlouquecer, ao imaginar-te com outro homem - murmurou, agarrando-lhe na mão.
Acariciou-lhe a palma com o polegar e depois levou-a até aos seus lábios para
a beijar. Rose sentiu como se aquele beijo a tivesse queimado e um gemido
abafado escapou dos seus lábios. Aquilo era uma loucura, disse para si,
fechando os olhos. Não podia voltar a cair na mesma armadilha, pensar que
sentia alguma coisa por ela, mas com ele ali, a sussurrar-lhe o quanto sentira
a falta dela... Quando Nick lhe subiu as pernas para o seu colo, deixou-o
fazê-lo, mesmo sabendo que deveria afastar-se dele. Não se sentia minimamente
atraído por aquela ruiva, estava a dizer-lho naquele momento. Não voltara a
telefonar-lhe desde sábado passado e também não fora para a cama com ela. Não
o excitava absolutamente. Quem o excitava era ela. 141 - Durante este tempo
todo, não consegui parar de fantasiar com o teu corpo, Rose, com esse corpo
tão sexy, com os teus seios... Rose sentiu como lhe endureciam os mamilos. -
Deixarás que volte a tocar-lhes? - Não - respondeu ela, num fio de voz. - O
que havia entre nós não acabou, Rose, sabes tão bem como eu. - Não resultaria.
- Como não resultaria? Saltam faíscas entre nós cada vez que estamos juntos. -
Não me refiro ao sexo - replicou ela. Queria descer as pernas do colo de Nick,
mas não respondiam às ordens do seu cérebro. Depois, quando lhe acariciou a
parte interior da coxa, sentiu que a pouca prudência que lhe restava se
desvanecia. - Disseste-me que querias ser uma nova mulher, que querias quebrar
os teus compromissos - sussurrou-lhe Nick, num tom sedutor. Deslizou uma mão
por debaixo do elástico das suas calças para lhe acariciar a barriga e Rose
ficou sem fôlego. - Deixa-te levar por mim, quebra esses compromissos. -
Devias ir-te embora. - Se estivesses a dizê-lo a sério, ia-me embora respondeu
ele. A sua mão mudou de rumo, introduzindo-se por debaixo da t-shirt até
alcançar um dos seus seios. Rose não usava sutiã. Aquela era uma das suas
fantasias sexuais tornada realidade. - Mas sei que me desejas tanto como eu a
ti. Sei que queres que faça isto... - murmurou, acariciando com a ponta do
polegar o mamilo endurecido. - Queres 142 que faça mais do que isto? -
perguntou, enquanto lhe levantava a t-shirt. Então, foi ele quem ficou sem
fôlego, ao ter diante de si aquilo em que não conseguira deixar de pensar
desde a última vez que tinham feito amor. -Não... Sim... Não... Não sei! Nick
sabia o que queria. Recordava o quanto Rose desfrutara de cada vez que
acariciara os seus seios. Inclinou-se para a frente e começou a estimular um
mamilo, desenhando círculos à volta dele com a ponta da língua, para depois
puxá-lo suavemente com os dentes e começar a sugá-lo. Rose gemia e suspirava
de prazer. Nick virou-a para ele e ajoelhou-se entre as suas pernas, para
poder dedicar toda a sua atenção aos seus seios. Quando se satisfez, rumou
para baixo com um carreiro de beijos, enquanto lhe tirava as calças e as
cuecas. Abriu-a com os dedos e introduziu a sua língua. Rose ofegou e arqueou
as ancas, sentindo como cada músculo do seu corpo ficava tenso, enquanto ele
lambia a parte mais íntima do seu ser. Desceu as mãos para o afastar e
conseguir assumir novamente o controlo do seu bom-senso, mas, em vez disso, os
seus dedos afundaram-se no seu cabelo escuro e urgiram-no a que não parasse.
Nick, no entanto, queria mais do que isso e não podia esperar. Afastou-se dela
e despiu-se num tempo recorde. Rose sorriu, inebriada de prazer ao vê-lo de
pé, com o seu membro erecto, e começou a acariciá-lo. Ela também sentira falta
daquilo. Sentira falta 143 dele e sentira falta daquela sensação incrível de
poder que sentia quando, apenas com a sua língua e as suas mãos, era capaz de
fazer com que Nick se rendesse por completo a ela. Quando a penetrou, os dois
estavam tão excitados que bastaram apenas alguns movimentos de Nick para que
atingissem o orgasmo. Minutos depois, quando a névoa do prazer se desvaneceu,
limpando a sua mente, Rose deu-se conta de que voltara a cometer o mesmo erro.
- Tenho de ir lavar-me - disse a Nick. Ele reparou pelo seu tom que se passava
alguma coisa - Não te arrependeste do que acabámos de fazer, pois não? - O que
acabámos de fazer leva-nos de volta à casa de partida. - Rose, precisamos um
do outro! - insistiu ele. Quando Rose fez menção de se levantar, impediu-a.
Não ouviste o que te disse? Senti a tua falta, senti a tua falta a partir do
momento em que nos separámos no aeroporto e não consegui deixar de pensar em
ti. - E essa foi a razão pela qual procuraste alguém para me substituir. - Já
te disse, queria esquecer-te e foi um erro. Preciso de ti, preciso disto e tu
também. Podes dizer o que quiseres, Rose, mas o teu corpo diz-me algo muito
diferente. - Sim, Nick, eu também te desejo e sou fraca, sim, mas eu quero
algo mais do que sexo. - Então, vem viver comigo - disse-lhe Nick,
desesperado. 144 Noutros tempos, o simples facto de pronunciar aquelas
palavras tê-lo-ia apavorado, mas, naquele momento, pareceu-lhe que não era uma
coisa assim tão terrível. Rose sabia que aquela proposta não era algo pequeno,
vindo de um homem como ele, mas também sabia que apenas lhe afectava a libido.
Se a amasse, ter-lhe-ia feito uma proposta muito diferente. -Não. - Não? -
perguntou Nick, olhando para ela, enquanto ela se levantava e começava a
vestir-se. Rose... Tens ideia do que supõe para mim o que estou a oferecer-te,
partilhar o meu-espaço pessoal contigo? - Sim, Nick, e agradeço, mas... - Mas,
mesmo assim, queres mais - murmurou ele, com incredulidade. Oferecera-lhe o
que jamais oferecera a qualquer outra mulher, mas para ela aquilo não era
suficiente. - Sim, quero mais - assentiu ela. Respirou fundo e decidiu que não
fazia sentido continuar a jogar ao gato e ao rato. Sentou-se novamente no sofá
e olhou para ele. - Disseste-me que não consegues evitar sentires-te atraído
por mim. Muito bem, Nick... Eu nunca quis apaixonar-me por ti, mas foi o que
aconteceu - disse-lhe, com um sorriso triste. - Tu dizes que nos damos bem na
cama e eu digo-te que a nossa relação poderia resultar a outros níveis,
portanto... Queres casar-te comigo? - perguntou, com o coração a pulsar-lhe
descontroladamente. O orgulho e a dignidade eram importantes, mas, se
voltassem a afastar-se sem que lhe dissesse o que 145 sentia por ele, tinha a
certeza de que passaria o resto da sua vida a perguntar-se o que teria
acontecido se o tivesse feito. Nick ficara petrificado. Casar-se? Nem sequer
conseguia considerar aquela opção. A sua liberdade era algo tão importante
para ele, que a ideia do casamento era simplesmente impensável. Além disso...
Desde quando era a mulher que pedia o homem em casamento? - Não te preocupes,
não precisas de responder disse Rose, magoada, levantando-se e dirigindo-se
para o arco que dava para o hall. - Tens a resposta escrita no rosto. De
costas, ouviu-o vestir-se, antes de se aproximar. - Não sou dos que se casam,
Rose, sempre soubeste. Porque não podes aceitar o que te ofereci? Rose
inspirou e virou-se para ele, a tremer por dentro e com os punhos apertados. -
Porque o casamento é um compromisso, não é só dizer "sim, ficaremos juntos até
nos fartarmos um do outro" - respondeu-lhe. - Rose, o que partilhei contigo
foi mais do que partilhei com qualquer outra mulher, mas o casamento... - É
uma grande palavra, não é? - adivinhou ela, com uma gargalhada amarga, antes
de se dirigir para a porta. Sentia-se vazia por dentro, mas não se arrependia
de nada do que lhe dissera. - Fica bem, Nick - disse-lhe, depois de abrir a
porta. Assim que ele atravessou a soleira, fechou a porta e apoiou as costas
contra a madeira. Ouviu o motor 146 do seu carro e depois o silêncio. Subiu
lentamente para o andar de cima e tomou um duche. Depois, quando estava na
cama, pensou em tudo o que tinham dito. Devia sentir-se aliviada por,
finalmente, aquilo ter acabado, disse para si, mas, em vez disso, sentia-se
como se alguma coisa tivesse morrido no seu interior. A vida continuaria,
disse para si, e assim foi. Pelo menos, aparentemente continuava tudo como
sempre fora: ela era eficiente no seu trabalho, saía com o seu círculo de
amigos... A única coisa que não esperara, fora o quanto a sua ruptura
definitiva com Nick afectara Lily. Comovera-a ouvi-la chorar ao telefone e
dizer-lhe que Nick não merecia alguém como ela ao seu lado. - Sobreviverei,
Lily - dissera-lhe ela. - Daqui a algum tempo, tenho a certeza de que verei
isto como mais uma experiência na "grande aventura da vida", como dizem os
nossos tios. No entanto, seis semanas depois, Rose continuava deprimida e
sentia-se cada vez mais como um robô. Não podia continuar assim, mas... O que
podia fazer? Rose viera ao seu escritório para falar com ele e estava à espera
que a recebesse. Nick não imaginava o que poderia querer dele. Repetira,
inúmeras vezes, na sua mente aquela última conversa que tinham tido, quando
lhe dissera que estava apaixonada por ele. Se realmente estava apaixonada por
ele... Porque não aceitara o que lhe oferecera? Porque o que realmente queria
era domesticá-lo, algo a que ele jamais se prestaria. No entanto, frustrava-o
profundamente o facto de não conseguir tirá-la da cabeça. Até o seu trabalho
estava a ser afectado. Em mais de uma ocasião, sentira-se tentado a telefonar-
lhe, mas não o fizera, pois o seu orgulho impedira-o. E agora a sua secretária
telefonara-lhe pelo intercomunicador, para lhe dizer que havia uma tal menina
Taylor que queria vê-lo. Pela primeira vez em semanas, Nick sentira uma
sensação estranha de paz. 148 Dissera à sua secretária que estava ocupado a
atender uma chamada do estrangeiro e que teria de esperar pelo menos trinta
minutos, mas que depois a receberia. Aquilo fora muito infantil da sua parte,
mas não conseguira evitá-lo e precisava de alguns minutos para se concentrar
antes de a ver. Virou a sua poltrona de couro para a janela e perguntou-se o
que Rose poderia querer. Só podia tratar-se de uma coisa. Tivera tempo mais do
que suficiente para pensar no que lhe propusera e, finalmente, chegara à mesma
conclusão do que ele. Aquele pensamento encheu-o de satisfação. Voltaria a
desfrutar da sua companhia, da sua conversa inteligente e partilharia a cama
com ela, e não voltariam a falar de se casarem. Além disso, estava apaixonada
por ele. Como não daria o seu braço a torcer? Passados vinte e cinco minutos,
telefonou à sua secretária pelo intercomunicador para lhe dizer que Rose podia
entrar. - Perdeste peso - foi a primeira coisa que Nick lhe disse quando
entrou no seu escritório. Rose estivera a preparar-se mentalmente para aquele
encontro, mas, agora que estava ali, só de olhar para ele sentiu que os
batimentos do seu coração aceleravam. Tal era o poder que tinha sobre ela.
Nick disse-lhe que se sentasse e, quando o fez, ele levantou-se e contornou a
secretária para se pôr à frente dela. 149 - E então? - insistiu. - Andas a
comer menos? - Não vim aqui para falarmos da minha dieta! respondeu-lhe ela,
irritada. Deu-se conta de que estava a brincar, nervosa, com a prega da saia e
obrigou-se a parar. Sim, tinha motivos de sobra para estar nervosa. De facto,
passara as duas últimas semanas assim, desde o dia em que se dera conta de que
não lhe tinha vindo o período, desde o dia em que fora à farmácia para comprar
um teste de gravidez e dera positivo. Estava grávida e o bebé que carregava no
seu ventre era de Nick. A última vez que tinham feito amor não tinham
utilizado preservativo. E, sim, perdera peso, porque não andava a comer bem.
Quem precisava de fazer dieta para perder peso? Ter o coração partido fazia
maravilhas. Sentiu um ligeiro enjoo e fechou os olhos. Ainda bem que estava
sentada. Desmaiar diante de Nick não teria sido um bom começo para o que tinha
de lhe dizer. - O que se passa? - perguntou Nick. Por um momento, dera-lhe a
impressão de que estava enjoada e uma sensação de angústia invadiu-o. Estaria
doente? Estava pálida. E se, afinal, não tivesse vindo dizer-lhe que queria
voltar para ele, mas tivesse vindo dar-lhe uma má notícia? - Apetece-te beber
alguma coisa? Um chá, um café...? Posso pedir à minha secretária que te traga
o que quiseres. Só de pensar em chá ou em café, Rose sentiu náuseas.
Empalideceu ainda mais e abanou a cabeça. 150 - Não vou ficar muito tempo -
disse-lhe, pigarreando. Nick estava cada vez mais convencido de que se passava
alguma coisa. Tinha um aspecto terrível. E não era por estar nervosa, embora
fosse evidente que estava. Não, passava-se alguma coisa e, de repente, no meio
daquela angústia, Nick deu-se conta de que, durante aquele tempo todo,
estivera enganado. Interpretara erroneamente o facto de sentir a falta dela,
achando que do que sentia falta era do sexo. Rose estava a tentar ser valente
e olhar para ele nos olhos, mas era incapaz e aquilo assustou Nick. Um suor
frio percorreu-lhe as costas. - Não podemos ter esta conversa aqui disse-lhe,
abruptamente. Rose levantou o rosto para ele. - Mas não sabes o que vou dizer-
te! - Não, mas é óbvio que se trata de algo sério respondeu Nick, contornando
novamente a secretária, para tirar o seu casaco das costas da cadeira. Rose
apertou os punhos sobre o colo. - Não quero ir a lado nenhum, Nick. Prefiro
dizer-te aqui o que vim dizer-te, num sítio impessoal. Nick franziu o
sobrolho, mas voltou a deixar o casaco na cadeira. Depois, virou-se para a
janela e observou a rua, enquanto tentava organizar os seus pensamentos. Tinha
de lhe dizer o que tinha para lhe dizer, antes que ela falasse. - Escuta,
Rose! - começou, virando-se para ela. - Eu... Não sei como dizer isto... -
passou uma mão pelo cabelo e abanou a cabeça. - Nunca disse isto a ninguém...
151 Rose, que perdera em alguns minutos a coragem que reunira para ir até ali,
suspirou, aliviada, em silêncio, por poder adiar mais alguns instantes o que
tinha de lhe dizer. Também sentia curiosidade. Nunca vira Nick hesitante e
quase se esqueceu de qual fora o motivo pelo qual viera até ali, quando ele
contornou mais uma vez a secretária e se sentou na cadeira vazia junto da
dela. - Eu... Nas últimas semanas... - começou Nick, passando novamente uma
mão pelo cabelo, antes de desviar a vista dela. - Não me senti bem. De
repente, Rose achou saber onde queria chegar. Provavelmente, assumira que
viera ao seu escritório para aceitar a proposta que lhe fizera de viverem
juntos e, naquele momento, apesar de ir contra o seu orgulho, estaria a pensar
em repeti-la porque ainda a desejava. Desejo, desejo, desejo! Haveria um homem
mais egoísta do que aquele? - Não vim para falar disso - disse-lhe. - Não
entendes, Rose, eu preciso que falemos disso. Preciso de te dizer que fui um
estúpido - respondeu-lhe ele, agarrando-lhe na mão e acariciando-lhe os dedos.
O coração de Rose palpitou com força. Se soubesse o efeito que tinha sobre ela
algo tão insignificante como aquilo... - Deixei-te partir - continuou Nick,
olhando para ela nos olhos. - Deixei partir a mulher que me ama. Rose não
queria que lhe recordasse como fora estúpida ao confessar-lhe que estava
apaixonada por ele. 152 - Não vim para te culpar de nada, Nick. Não vim para
falar do passado. Tentou afastar a sua mão, mas ele impediu-a. - Sempre pensei
que o amor complicava as coisas, que era algo de que não precisava -
prosseguiu Nick, apesar de tudo. - Desfrutava das mulheres que passavam pela
minha vida, mas não queria que invadissem a minha vida privada. Os meus planos
nunca foram casar-me e ter filhos. Aquilo foi como um balde de água fria para
Rose, que lhe recordou o motivo pelo qual viera até ali. - Não, eu sei -
respondeu-lhe, com aspereza. - Mas... estava enganado. Rose mal conseguiu
assimilar aquelas palavras. - O que disseste? - Estava enganado - repetiu ele,
sentindo como se tivesse tirado um peso de cima. Fosse o que fosse o que Rose
tinha para lhe dizer, pelo menos agora saberia o que sentia por ela. Deveria
ter feito aquilo há muito tempo. Até então, tivera um conceito errado de
coragem. A verdadeira coragem era aquilo, dizer à única mulher que amara em
toda a sua vida que a amava. Rose hesitou. - Nick, por favor, não brinques
comigo! - rogou-lhe, afastando a mão. Não queria voltar a albergar esperanças,
que depois se desvaneceriam. Até onde estaria disposto a chegar para que
voltasse para a sua cama? Estaria a tentar conquistá-la, dizendo-lhe o que
queria ouvir? Não, já chegava! Dir-lhe-ia o que viera dizer-lhe e depois
partiria. 153 - Eu... - respirou fundo e fechou os olhos. - Estou grávida.
Desculpa. Não era minha intenção que isto acontecesse, mas aconteceu. Não tens
de te sentir responsável. Vim aqui porque achei que devias saber, não porque
queira alguma coisa de ti. Um silêncio tenso seguiu-se às suas palavras e,
quando finalmente se obrigou a abrir os olhos e a olhar para Nick, viu que não
parecia espantado, como receara. - Estás grávida? - Desculpa - repetiu ela,
num sussurro. -Estás grávida... - Eu sei que tu não queres isto e que... - Meu
Deus, não posso acreditar! - interrompeu-a Nick, abanando a cabeça. Imaginara
o pior, pensara que estava doente e aquela possibilidade nem sequer lhe
passara pela cabeça. Uma sensação profunda de felicidade invadiu-o e sorriu a
Rose. - Não estás... Não estás zangado? - perguntou ela, hesitante. - Como
haveria de estar zangado? Vais ter um filho meu... - murmurou Nick, sentindo
vontade de a levantar da cadeira, agarrá-la pela cintura e fazê-la rodar com
ele. - Amo-te, Rose. Amo-te e não posso viver sem ti, e agora acabaste de me
dar a melhor notícia que... Oh, meu Deus, quando te sentaste nesta cadeira e
começaste a ficar pálida, pensei...! Pensei que tinhas vindo dizer-me que
estavas doente e que tinha perdido a oportunidade de te dizer o quanto
significas para mim. Rose olhou para ele sem se atrever ainda a acreditar no
que estava a ouvir. 154 - Mas... se me amas... Porque não mo disseste até
agora? - Porque eu próprio não sabia - respondeu ele, envergonhado. - Entraste
na minha vida como um redemoinho e roubaste-me o coração, e eu, idiota, achava
que continuava a ter o controlo. Só agora me dei conta de como estava
enganado. - E se não tivesse vindo? - perguntou Rose, cautelosa. - Terias
deixado que desaparecesse da tua vida? - Não, não, nunca teria feito isso! -
garantiu-lhe ele, tomando o seu rosto entre as mãos, antes de a beijar com
ternura. Não sabia como pudera deixar-se governar pelo seu orgulho estúpido
durante aquele tempo todo. - Oh, meu Deus, vou ser pai...! murmurou, sentindo,
de repente, um nó na garganta. - Vamos sair daqui, temos de comemorar. E,
depois, vamos casar-nos. - O quê? Hoje? - perguntou ela, a rir-se no meio das
lágrimas de felicidade. - Na semana que vem, para que Lily possa vir respondeu
ele, com um sorriso, - mas nem mais um dia. Já te fiz esperar demasiado.
BORNEU Entreposto de relações comerciais com portugueses, espanhóis e
holandeses, reino islâmico até ao século XIX e cenário de batalhas entre
japoneses e ingleses na primeira metade do século XX, o Bornéu continua a ser
uma área de tensão entre a Indonésia, a Malásia e o Brunei. Geografia Uma das
maiores ilhas do mundo, com uma área de 755.000 quilómetros quadrados, o
Bornéu localiza-se no arquipélago malaio e é banhado pelos mares da China, de
Java e das Celebes. Três países independentes dividem o seu território: a
Indonésia, que ocupa quase três quartos da ilha, a Malásia e o sultanato do
Brunei. A população é basicamente composta por daiaques, malaios, islamitas,
chineses e uma pequena minoria de europeus. 156 Flora e fauna Grande parte do
território é atravessada por rios navegáveis e coberta por floresta
equatorial. A flora e a fauna são riquíssimas e abrigam espécies raras, como a
raflésia - uma das maiores flores do mundo, que chega a atingir um metro de
diâmetro e dez quilos - orangotangos, leopardos, rinocerontes e uma variedade
imensa de insectos. Recursos minerais e alimentares O Bornéu possui inúmeros
recursos naturais ouro, diamantes, prata, platina, cobre, ferro, mercúrio,
estanho, chumbo, zinco e manganésio -, mas até ao momento apenas se explora
petróleo e carvão. O solo é geralmente pouco fértil, à excepção das áreas
vulcânicas, onde se cultivam o arroz, alimento básico da população, o milho, a
mandioca, o pepino e a abóbora. Para além de pequenos seringais, há culturas
experimentais de cacau, cânhamo e café. A colónia chinesa cultiva diversas
variedades de pimenta. A ilha exporta sobretudo sagu, copra e peixe. História
As primeiras informações sobre o Bornéu chegaram à Europa no século XIV. Os
portugueses e os espanhóis estabeleceram relações 157 comerciais com a ilha no
século XVI. No século seguinte, foram substituídos pelos holandeses, que
exerceram grande influência nos reinos muçulmanos que dominavam a ilha. Porém,
em meados do século XIX, os ingleses conseguiram diminuir bastante a
influência holandesa na ilha. O sultanato do Brunei foi originalmente um reino
islâmico que até ao século XIX chegou a ter sob o seu domínio grande parte da
ilha. Na Segunda Guerra Mundial, os japoneses invadiram o Bornéu e expulsaram
as forças holandesas e inglesas. Em 1949, a Indonésia anexou as possessões
holandesas ao seu território e, em 1963, os ingleses entregaram Sarawak e
Sabah à Malásia.

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