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“Enfim Bachelard faz repousar a sua concepção geral do simbolismo imaginário

sobre duas instituições que faremos nossa: a imaginação é dinamismo organizador, e


esse dinamismo organizador é fator de homogeneidade na representação. Segundo o
epistemólogo, muito longe de ser faculdade de “formar” imagens, a imaginação é
potência dinâmica que “deforma” as cópias pragmáticas fornecidas pela percepção, e
esse dinamismo reformador das sensações torna-se o fundamento de toda vida psíquica
porque as leis da representação são homogêneas”, a representação sendo metafórica a
todos seus níveis e, uma vez que tudo é metafórico, ao nível da representação todas
as metáforas se equivalem. Certamente, essa coerência entre o sentido e símbolo
não significa confusão, porque, porque essa coerência pode afirmar-se numa
dialética. A unidade do pensamento e das suas expressões simbólicas apresenta-se
como uma constante correção, como uma perpétua afinação” (as estruturas
antropológicas do imaginário, Martins fontes, 2002, p.30).

“a psicologia patológica de Minkowski chega mesmo a inverter o esquema


clássico e sartriano do empobrecimento do pensamento pela imagem e retomando a
concepção dos grandes românticos alemães e do surrealismo contemporâneo (que
faremos nossa ao longo desta exposição), considera a passagem da vida mental da
criança ou do primitivo para o ‘adultocentrismo’ como um estreitamento, um
recalcamento progressivo do sentido das metáforas. É esse sentido das metáforas, esse
grande semantismo do imaginário, que é a matriz original a partir da qual todo o
pensamento racionalizado e o seu cortejo semiológico se desenvolvem. É, portanto,
resolutamente, na perspectiva simbólica que nos quisemos colocar para estudar os
arquétipos fundamentais da imaginação humana”. (Ibid, p31)

“precisamos agora voltar a esse trajeto no qual o semântico se desfaz, ou se endurece


em semiológico, no qual o pensamento se coalha e se formaliza. Já tínhamos notado o
lugar que ocupa a linguagem nesse processo de formalização, tínhamos visto que a
sintaxe é, no fundo, inseparável do semantismo das palavras. Mas é agora que podemos
compreender a significação de um tal fenômeno: o discurso aparece-nos entre a imagem
pura e o sistema de coerência lógico-filosófico que ela promove, como um meio termo
constituindo aquilo a que podemos chamar – uma vez adotada uma terminologia
kantiana – um esquematismo transcendental. Por outras palavras, é a retórica que
assegura a passagem entre o semantismo dos símbolos e o formalismo da lógica ou
o sentido próprio dos signos. Mas esse esquematismo, longe de ser, segundo a
definição kantiana, uma determinação a priori do tempo, é, pelo contrario, uma
determinação a priori do antidestino, do eufemismo que vai colorir, no seu conjunto,
todas as tentativas de formalização do pensamento” (ibid, p. 415)

“e, para começar, precisamos ter em conta essa qualidade primeira da retórica que é
exprimir, quer dizer, transcrever um significado por meio de um processo
significante. Ora, essa transcrição não é mais que a degradação do semantismo dos
símbolos. Por isso, toda retórica repousa nesse poder metafórico de transposição do
sentido. Qualquer expressão acrescenta ao sentido próprio a aura, o halo do estilo, e a
retórica encaminha-se para a poesia que é equivoco. É o que aparece nos processos
metafóricos que vão da simples comparação a essas instancias mais sutis que são a
metonímia, a sinédoque, a antonomásia e a catacrese: são todas desvios da
objetividade, todas consistem em voltar para alem do sentido próprio, resíduo da
evolução linguística, à vida primitiva do sentido figurado, em transmutar sem
cessar a letra em espírito” (ibid, p. 416).

“e esta translação elementar de toda retórica não é mais que a propriedade euclidiana
de translação, porque a retórica, como a lógica, exprime-se e pensa-se em ermos de
espaço. Como o espaço é a forma do imaginário, do antidestino, a metáfora é o seu
processo de expressão, esse poder que tem o espírito, cada vez que pensa, de renovar a
terminologia, de a arrancar ao seu destino etimológico” (ibid, p. 417).

E agora, pitacos lacanianos:

“o que se poderia chamar de autonomia das leis do significante, dizer que elas são
primárias em relação ao mecanismo da criação do sentido” (Lacan, o seminário, livro V,
Jorge zahar, 1999, p. 90).

“Desde o começo; o que entra na criação do significado não é uma pura e simples
tradução da necessidade, mas uma retomada, reassunção, remodelagem da necessidade,
criação de um desejo outro que não a necessidade. É a necessidade mais o significante”
(ibid, p. 95)

A metáfora é o “passo-de-sentido” esvaziado de qualquer coisa, ela é o passo em si


mesmo, em sua forma. (Ibid, p. 103)

As conclusões que chegamos a partir das discussões sobre o conceito de metáfora em Durand:

- a metáfora não é simplesmente uma figura de linguagem, mas um processo cognitivo básico
da espécie humana pelo qual interpretamos e significamos o mundo a nossa volta.

- a metáfora é o processo pelo qual a imaginação deforma os objetos da percepção criando os


signos como algo que ao mesmo tempo reflete o real e lhe acrescenta algo, o que permite ao
signo ser sempre reutilizável e re-contextualizado.

- a metáfora é um “desvio da objetividade”, ela é o movimento de des-potencialização do


sentido denotativo do signo e a potencialização dos sentidos figurados do signo.

- a função metafórica de criar os signos como desvios do real cumpre a função imaginária de
nos desviarmos do mais real e concreto para o homem que é a morte, portanto, a metáfora é a
função imaginária do “anti-destino” inscrita como uma estrutura da língua.

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