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SEMINÁRIO PRESBITERIANO BRASIL CENTRAL

A ESSENCIABILIDADE DA DOUTRINA DA
RESSURREIÇÃO DOS MORTOS
PARA A FÉ CRISTÃ

por

Paulo Sérgio Alves

Monografia Apresentada sob a orientação do Rev.


Joer Batista Corrêa, como Requisito
para Obtenção do Grau de
Bacharel de Teologia

Goiânia-GO
2001
2

PÁGINA DE APROVAÇÃO

Assunto: Ressurreição dos Mortos.


Título: A Essenciabilidade da Doutrina da Ressurreição dos Mortos para a Fé
Cristã.
Autor: Paulo Sérgio Alves

O Seminário Presbiteriano Brasil Central, após examinar a monografia


apresentada pelo teologando Paulo Sérgio Alves

Resolve ..................................................................................................................
.............................................................................................................................................
.............................................................................................................................................
.............................................................................................................................................
.............................................................................................................................................

Goiânia-GO ____/____/2001.

Examinador

Examinador

Examinador
3

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por ter me concedido forças para o

término deste trabalho. Agradeço à minha esposa Angélica por ter

compartilhado comigo todo o processo do trabalho. Agradeço ao

Rev. Joer por ter me orientado nesta monografia ajudando-me a dar

forma a esta. Agradeço ao meu tutor, o Rev. Jadiel por todas as

orientações na minha vida espiritual nas dificuldades enfrentadas

no período de realização deste trabalho. Agradeço ao Rev. Lee que

foi muito importante na minha vida, acompanhando-me e servindo

de modelo pastoral para mim. Agradeço à toda Congregação

Presbiteriana do Jardim Tiradentes, que teve a paciência de estar ao

meu lado em todo o apoio material, espiritual e financeiro na

minha vida. Agradeço à Igreja Presbiteriana União, por ser minha

igreja mãe e por acreditar na minha vocação. E finalmente

agradeço ao POSG que também acreditou em minha vocação

ajudando-me durante este curso.

Paulo Sérgio Alves


4

ÍNDICE ANALÍTICO

AGRADECIMENTOS......................................................................................................3
ÍNDICE ANALÍTICO.......................................................................................................4
INTRODUÇÃO.................................................................................................................6

PARTE 1:
CONSIDERAÇÕES INICIAIS À DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO DOS MORTOS

Capítulo 1:
DEFINIÇÃO DA DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO DOS MORTOS.....................11

Capítulo 2:
INTERPRETAÇÕES DA DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO DOS MORTOS.........16
A. A Rejeição dentro do Sincretismo Religioso..........................................................16
B. Principais Pensamentos Contrários à Doutrina.......................................................17
1. Racionalismo Naturalista.....................................................................................18
1.1. Definição......................................................................................................18
1.4. O Ceticismo Racionalista Naturalista no Empirismo de Hume...................19
1.5. O Otimismo Racionalista Naturalista no Iluminismo..................................21
2. Dualismo Antropológico Espiritualista...............................................................24
2.1. Definição......................................................................................................24
2.2. Dualismo Transcendental Platônico.............................................................25
2.3. Dualismo Imanentista Estóico......................................................................27
2.4. Dualismo Gnóstico......................................................................................28
C. Principais Grupos que Negam Explicita e Implicitamente a Doutrina..................30
1. Cristianismo “Liberal”.........................................................................................30
2. Espiritismo...........................................................................................................33
3. Gnosticismo Moderno.........................................................................................35
4. Espiritualismo Protestante..................................................................................37

PARTE 2:
A ESSENCIABILIDADE DA DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO DOS MORTOS
PARA O CRISTIANISMO

Capítulo 1:
5

A DOUTRINA DENTRO DO KERYGMA CRISTÃO PRIMITIVO.........................41


A. Fé Absurda em Corinto: Cristianismo sem a Ressurreição dos Mortos.................42
B. A Originalidade da Ressurreição de Cristo no Kerygma........................................46
C. A Identidade da Ressurreição de Cristo com a Doutrina........................................53

Capítulo 2:
INDISPENSABILIDADE DA DOUTRINA PARA A VERDADE CRISTÃ..............57

A. O Valor do Testemunho Histórico da Ressurreição de Jesus.................................57


B. Textos Bíblicos do Testemunho da Ressurreição de Jesus....................................60
1 – As Narrativas dos Evangelhos...........................................................................60
2 – As Pregações em Atos.......................................................................................63
3 – 1Coríntios 15:3-11............................................................................................66
C. A Validade do Testemunho Bíblico se não há Ressurreição..................................70

Capítulo 3:
INDISPENSABILIDADE DA DOUTRINA ÀS DOUTRINAS CRISTÃS...............74
A. Teologia: A Identidade e Obra de Deus................................................................74
B. Cristologia: Pessoa de Jesus Cristo.........................................................................78
C. Soteriologia (Objetiva e Subjetiva): A Obra Redentora de Cristo..........................82
D. Pneumatologia: A Doutrina do Espírito Santo.......................................................87
E. Eclesiologia: A Autoridade Apostólica...................................................................91
F. Escatologia: A Volta de Cristo na Consumação.....................................................94

Capítulo 4:
INDISPENSABILIDADE DA DOUTRINA PARA A PRÁTICA CRISTÃ.................98
A. O Efeito da Ressurreição na Vida dos Primeiros Cristãos.....................................98
1. A motivação equivocada dos discípulos de Cristo..............................................98
2. O comportamento dos discípulos na morte de Cristo..........................................99
3. O comportamento dos discípulos pós-ressurreição...........................................101
B. Sentido da Vida: Fé sem Ressurreição versus Fé com Ressurreição...................102
1. A inutilidade da vida cristã sem a fé na ressurreição........................................102
2. A motivação para a vida cristã na doutrina da ressurreição..............................105
C. O Significado da Doutrina para a Espiritualidade Cristã.....................................108
1. Santificação definitiva na ressurreição de Cristo..............................................109
2. A Santificação Progressiva na ressurreição de Cristo..................................111
D. O Significado da Doutrina para o Luto Cristão...................................................112
1. A vitória sobre a morte......................................................................................113
2. A natureza do luto cristão..................................................................................114

CONCLUSÃO...............................................................................................................117
BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................126
6

INTRODUÇÃO

Se a morte é um fato concreto, claro e indubitável, o que se pode dizer da

esperança dos indivíduos sobre o destino do ser humano após a morte? Será que o

indivíduo contínua a existir depois da morte? Ou seja, existe vida após a morte? Estas e

outras, são perguntas que fazem parte da vida humana. São questões de importância

primária para os homens. A religião e a filosofia tratam deste assunto, e este sempre

esteve presente na consciência humana. Porque, por trás de todo temor da morte, está o

temor de deixar de existir.

Dentro de um contexto em que aparentemente reina a morte, a doutrina da

ressurreição dos mortos surge como algo de muita importância para a fé cristã, e

constitui-se parte da resposta para o problema da morte, dentro da doutrina da salvação.

Portanto, será abordado neste trabalho a essenciabilidade da doutrina da ressurreição

dos mortos para a fé cristã.

O cristianismo é uma religião de salvação em Cristo. Seu propósito maior é a

revelação do plano salvador de Deus para os homens. Esta salvação, realmente, inclui

uma vitória sobre a morte e o restabelecimento de uma ordem de vida em que não

impera mais a mortalidade. Porém, muitos cristãos querem manter as verdades de sua

religião prescindindo da doutrina da ressurreição dos mortos e substituindo-a por

elementos filosóficos ou religiosos sincréticos. A maioria dos que negam a ressurreição,

fazem parte de um cristianismo sincrético, cujo objetivo é a conciliação da fé com


7

elementos de um outro sistema de idéias e crenças. Porém, o Cristianismo é uma

religião cuja doutrina exige, em sua própria natureza, exclusividade e singularidade.

Portanto, é impossível haver mediação deste com outras religiões ou filosofias. No

entanto, vivemos num contexto de pluralismo que na teologia tende a um ecletismo. A

história tem mostrado os erros doutrinários dentro do ambiente cristão, que surgiram

sempre que alguém tentou fazer mediação entre o cristianismo e outros pensamentos.

Onde, sempre, alguns elementos fundamentais e essenciais da teologia cristã são

negados, para adequar-se à síntese dos movimentos ecléticos.

A doutrina da ressurreição dos mortos tem sido de certa forma ofuscada e até

mesmo comprometida, indiretamente, dentro do contexto da igreja protestante, onde

está presente em alguns setores, algo que pode ser caracterizado como um tipo de

neognosticismo. Alguns estudiosos chegam a esta conclusão, ao interpretarem o

fenômeno religioso e ao estudarem a natureza da fé e prática de muitos protestantes.

Esta atitude gnóstica tende a uma espiritualização do cristianismo e a uma

desvalorização e desprezo de tudo que diz respeito ao mundo material, que inclui

necessariamente o corpo. Esta atitude caracterizada por um dualismo, típico da

tradição clássica grega e de movimentos gnósticos do passado, entra em confronto com

a doutrina da Ressurreição dos Mortos, porque a verdade de uma, necessariamente

implica na falsidade da outra. Isto acontece muitas vezes, porque muitos crentes não

refletem sobre a fé que têm e aceitam elementos contraditórios dentro desta, como foi o

que aconteceu certamente na igreja de Corinto, quando alguns negavam a doutrina da

Ressurreição dos Mortos, mas sustentavam a fé na ressurreição de Cristo. Por isto, é

intenção deste trabalho chamar a atenção daqueles que tendem a espiritualizar demais fé
8

cristã, que desprezam a realidade corporal e material, para refletirem sobre a

essenciabilidade da doutrina da Ressurreição dos Mortos.

Outro problema, é que o contexto de uma era pós-iluminismo instaurou uma

mentalidade racionalista, materialista, científico e naturalista em muitas mentes dos

cristãos, especificamente de teólogos, que procuram reinterpretar a fé cristã à luz das

categorias racionais, para adequar esta fé à realidade atual e moderna, negando,

portanto, na análise da Bíblia, todo evento sobrenatural, o que inclui a ressurreição de

Cristo e a fé na ressurreição dos mortos.

Diante de um contexto, em que a doutrina da ressurreição dos mortos tem sido

negada ou ofuscada, foi objetivo deste trabalho mostrar que esta é uma doutrina

essencial, presente na fé cristã, que não pode ser negada explicita ou implicitamente em

pensamentos sincréticos, como foi e é negada, sem se comprometer a verdade, a

doutrina e a prática cristã.

Para cumprir o objetivo deste trabalho, será feito, primeiramente, algumas

considerações preliminares sobre o assunto, onde será definido o conceito da doutrina

da ressurreição dos mortos para a fé cristã reformada. Além disso, no capítulo 2, será

abordado descritivamente interpretações acerca da doutrina, onde se mostrará algumas

filosofias e pensamentos contrários a esta, bem como alguns grupos que negam

explicitamente ou não a doutrina.

Na segunda parte do trabalho será trabalhado quatro capítulos, que visarão

mostrar que a ressurreição dos mortos é essencial para a fé cristã. O primeiro tratará da

identificação desta doutrina como sendo uma doutrina dentro da primitiva mensagem

cristã. O segundo capítulo demonstrará como a verdade cristã está associada com a

doutrina da ressurreição dos mortos. O terceiro capítulo identificará como várias


9

doutrinas cristãs são afetadas pela negação da ressurreição de mortos. E por fim, o

quarto capítulo mostrará de que forma a ressurreição está relacionada com a prática da

vida religiosa.
10

PARTE 1

CONSIDERAÇÕES INICIAIS À DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO


DOS MORTOS
11

CAPÍTULO 1

DEFINIÇÃO DA DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO DOS MORTOS

Primeiramente, será definido o que se quer dizer por doutrina da ressurreição dos

mortos, visto que esta pode ser entendida sobre várias hermenêuticas diferentes.

Na língua grega, do Novo Testamento, existem dois tipos básicos de termos

usados para designar a ressurreição, () e (). "Não

são substancialmente diferentes quanto ao significado; a escolha entre o uso deles

depende primariamente de se é o aspecto ativo ou o passivo que é ressaltado."1

O termo () tem seu significado básico de "levante, levantar"

ou "ressurreição do mortos". Outras palavras associadas a este grupo são

(), "Ressurreição"; ()"Levantar" e intransitivo

"levantar-se"; (),"voltar à vida".

Muitos destes termos não são de uso exclusivo para referir-se à ressurreição,

podendo ser usados em vários outros sentidos, portanto, na Bíblia estas palavras tem um

sentido geral. Quanto à ressurreição como volta à vida, este grupo de palavras é usado

no Novo Testamento, em alguns contextos:

Primeiro, em relatos de restauração da vida, ou seja, ressurreição de algumas

pessoas (e.g. Mc 5:42; At 9:40). Pelo contexto, estes milagres assumem um valor de

1
C. Brown e L. Coenen, “Ressurreição”, em C. Brown e L. Coenen, Dicionário Internacional de
Teologia do Novo Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova,2000), 2055.
12

autoridade messiânica e não meramente eventos isolados (e.g. Mt 11:5; Jo 11:25-26; Mt

27:53).2 Em segundo lugar, este termo é usado por Jesus para predizer sua própria

ressurreição (e.g. Mc 8:31; 9:9; 10:34). E a sua ressurreição é considerada como uma

obra do Pai, que exaltou o Senhor Jesus, que foi crucificado, para a glória messiânica

(e.g. At 1:22; Rm 1:4; 1Co 15:1ss).3 Em terceiro lugar, estes termos são usados para

expressar a doutrina de que haverá uma ressurreição escatológica nos últimos dias.

Deste modo Jesus é visto como as primícias da ressurreição (1Co 15:20; Cl 1:18). A

ressurreição final é vista como uma consequência lógica da fé cristã (1Co 15:22; Rm

8:11; Jo 6:39-40). A nova vida é desfrutada como uma dádiva presente, mas o alvo da

vida é a ressurreição (Fp 3:11).4

O termo () tem os significados básicos: "acordar, despertar",

"levantar, ajudar a levantar", "levantar os mortos", "suscitar, dar existência"; no passivo:

"acordado, despertado", "ser levantado, levantar", "aparecer"; no imperativo pode

significar: "venha! levante!" Outros termos que pertencem a este grupo são: 

(), despertamento, i.é, ressurreição. Estes termos têm um uso geral, pois não se

referem somente à ressurreição como volta à vida. É usado para expressar o despertar de

um sono, tanto literal (Mc 4:38) como figurado (Rm 13:11). É também empregado para

expressar a idéia de "levantar", como idéia de acontecimento, de surgimento de algo

(Mc 13:8; Mt 11:11; Mt 12:42). Quando empregado no sentido de um evento, que

descreve a volta à vida, este é usado em algumas formas. 5 Também são usados para
2

?
Gerhard Kittel e Gerhard Friedrich, Theological Dicionary of the New Testament, in one volume (Grand
Rapids-Mich.: Eerdmans / Paternoster, 1985), s. v. “Resurrection”.
3
Ibid, 61.
4

?
Ibid, 61.
5
13

descrever a ressurreição dos mortos, em casos isolados, como um sinal da presença da

era messiânica (Mt 9:25; Lc 7:14; Jo 12:1). Aparece na predição de Jesus de sua

própria ressurreição (e.g. Mt 16:21), nas narrativas (e.g. Mc 16:6) e na proclamação

desta (e.g. At. 3;15). É usada para expressar a aceitação e a glorificação por parte de

Deus em favor de Jesus, com sua ressurreição (Atos; Rm 7:4; Fp 2:9ss). É usada para

referenciar à ressurreição de Cristo como um evento necessário à obra salvadora (Rm 4

e 8; 1Co 15).6 Há um sentido em que a ressurreição é descrita como algo simultâneo à

vida do crente, no momento da união deste com Cristo. Deste modo estes termos são

usados em certos contextos, principalmente em Paulo, para descrever este sentido da

ressurreição dos crentes com Cristo (Rm 6:4 ss.; Gl 2:20; Cl 2:12 ss.; Ef. 21:1,5; 2Co

4:10 ss.). E neste sentido a ressurreição está relacionada com a justificação (Rm 5:18;

8:28 ss.) e expressa a nova situação histórica dos crentes unidos com Cristo (Rm 6). E

esta nova vida é uma realidade da fé (2Co 4:7ss). Não é uma mudança mágica, mas sim,

um estado diante de Deus, esperando consumação (Rm 8:19ss). Estritamente, a

ressurreição não tomou, ainda, lugar, ou seja, não aconteceu literalmente (2Tm 2:18).

Em João, há uma ênfase em mostrar a benção da vida eterna como uma possessão

presente (Jo 3:18; 5:24), mas isto não significa uma espiritualização da escatologia (cf.

Jo 5:28-29; 6:39-40; 21:22; 1Jo 2:18; 4:17).7

Quanto a relação entre () e (), L. Coenem diz

que "embora não a possamos aplicar universalmente, podemos dizer que a regra geral

no NT é que, em contraste com a LXX, a ação de Deus em e através de Cristo é

?
Ibid, 195.
6
Ibid, 195.
7
Ibid, 195.
14

expressada por egeiro, ao passo que anhistemi expressa, por assim dizer, aquilo que

acontece no âmbito da experiência humana."8

Neste trabalho estar-se-á falando da doutrina da ressurreição dos mortos, como

o "resultado principal da segunda vinda de Cristo, do ponto de vista da escatologia

individual”. E essa “é a base da esperança do crente diante da morte. Embora a morte

seja inevitável, o crente espera ser livrado de seu poder." 9 É uma esperança de que as

almas dos que morreram serão restauradas novamente, para uma vida corporal

renovada.10 Este corpo de certa forma será idêntico ao antigo, e ao mesmo tempo

diferente, ou seja, modificado para ser um veículo para a vida na era porvir. 11 E esta

ressurreição é da mesma natureza da ressurreição de Jesus Cristo.

Os cristãos ortodoxos, de forma geral, mostram que a Bíblia ensina "(1) Que o

corpo ressuscitará. (2) Que sua identidade será preservada. (3) Que será tão idêntico e

refinado a ponto de adaptar-se ao sublime estado de existência a que se destina."12

O Teólogo Berkhof concorda com a afirmação acima, quando diz acerca da

doutrina da ressurreição dos mortos, que:

Segundo a Escritura, haverá uma ressurreição do corpo, isto é, não uma criação inteiramente
nova, mas um corpo que será, num sentido fundamental, idêntico ao corpo atual. Deus não vai
criar um novo corpo para cada ser humano, mas vai ressuscitar o próprio corpo que foi
depositado na terra.... Ao mesmo tempo, a Escritura deixa perfeitamente evidente que o corpo
passará por grande mudança.13

8
Brown e Coenem, “Ressurreição”, 2073.
9
Millard J Erickson, Introdução à Teologia Sistemática (São Paulo-SP: Vida Nova, 1997), 502.

10
The Oxford Dictionary of Christians Church, “Resurrection of the dead”, 1158.

11
NDB, 1086.
12
Hodge, Teologia Sistemática (São Paulo-SP: Hagnos, 2001) 1600.
13
Louis Berkhof, Teologia Sistemática (Campinas-SP: LPC, 1996), 728.
15

Para Confissão de Fé de Westminster, no capítulo XXXII, em que trata "DO

ESTADO DO HOMEM DEPOIS DA MORTE E DA RESSURREIÇÃO DOS MORTOS",

encontra-se a seguinte confissão de Fé:

I. Os corpos dos homens, depois da morte, convertem-se em pó e vêm a corrupção; mas as suas
almas (que nem morrem nem dormem), tendo uma substância imortal, voltam imediatamente
para Deus que as deu. As almas dos justos, sendo então aperfeiçoadas na santidade, são
recebidas no mais alto dos céus onde vêm a face de Deus em luz e glória, esperando a plena
redenção dos seus corpos; e as almas dos ímpios são lançadas no inferno, onde ficarão, em
tormentos e em trevas espessas, reservadas para o juízo do grande dia final. Além destes dois
lugares destinados às almas separadas de seus respectivos corpos as Escrituras não reconhecem
nenhum outro lugar. Ref. Gen. 3:19; At. 13:36; Luc. 23:43; Ec. 12:7; Apoc. 7:4, 15; II Cor. 5:
1, 8; Fil. 1:23; At. 3:21; Ef. 4:10; Rom. 5:23; Luc. 16:25-24.
II. No último dia, os que estiverem vivos não morrerão, mas serão mudados; todos os mortos
serão ressuscitados com os seus mesmos corpos e não outros, posto que com qualidades
diferentes, e ficarão reunidos às suas almas para sempre. Ref. I Tess. 4:17; I Cor. 15:51-52, e
15:42-44.
III. Os corpos dos injustos serão pelo poder de Cristo ressuscitados para a desonra, os corpos
dos justos serão pelo seu Espírito ressuscitados para a honra e para serem semelhantes ao
próprio corpo glorioso dele. Ref. At. 24:l5; João5:28-29; Fil. 3:21.14

Finalizando, neste sentido, o termo ressurreição dos mortos difere de muitos

conceitos e interpretações propostos por outros.

14

?
Confissão de Fé de Westminster
16

CAPÍTULO 2

INTERPRETAÇÕES DA DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO DOS


MORTOS

A. A Rejeição dentro do Sincretismo Religioso

A doutrina da ressurreição dos mortos tem sido negada no decorrer dos anos, por

muitos grupos e pessoas, cuja religião é caracterizada pelo sincretismo religioso. E esta

negação da doutrina pode ser, basicamente, de dois tipos: negação explicita e negação

implícita.

A negação explicita ocorre quando se nega clara e conscientemente a doutrina da

ressurreição, substituindo-a, muitas vezes, por outras doutrinas, como por exemplo, a

reencarnação, a imortalidade da alma, a extinção do ser e a ressurreição espiritual.

A negação implícita ocorre quando o indivíduo mantêm certas crenças, como

sendo verdades religiosas da sua vida, mas no entanto, estas crenças logicamente levam

a uma conclusão contrária à doutrina da ressurreição dos mortos.

Destes que negam a doutrina tanto explicita como implicitamente, os que

interessam para o presente estudo, são aqueles caracterizados por sincretismos

religiosos. Pois afirmam serem cristãos, negando uma doutrina, que pelo que vai ser

estudado mais à frente, não tem como ser negada, pois esta é imcompátivel com a fé

cristã.
17

O sincretismo cristão ocorre "quando elementos decisivos ou básicos do evangelho


são substituídos por elementos religiosos da cultura receptora. Resulta
freqüentemente da tendência ou da tentativa de subverter a singularidade do evangelho
conforme é achado nas Escrituras ou no Filho encarnado de Deus." 15

Porém, existem no Cristianismo elementos que não podem ser negados, pois

fazem parte da essência do cristianismo. Todavia o sincretismo invariavelmente nega

estes elementos. Mas neste caso, já não se pode mais dizer que a síntese é o

cristianismo, pois a essência deste foi alterada. A essência de algo, como foi visto, é

aquilo que está presente neste e faz-lhe ser o que é. E quando elementos essenciais são

negados de algo, este é descaracterizado e perde sua identidade e finalidade. Portanto, é

impossível negociar certos aspectos do Cristianismo com outros sistemas de

pensamento.16

Quanto à ressurreição dos mortos, não são poucos os grupos sincréticos, ou

manifestações individuais sincréticas que a negam, em favor de outros princípios que

querem preservar, mas que no entanto não são princípios cristãos.

B. Principais Pensamentos Contrários à Doutrina

Existem dois tipos principais de pensamentos contrários à ressurreição dos

mortos, falando de modo geral. E estes serão estudados, agora, pois são relevantes por

estarem presentes nos principais grupos sincréticos cristãos que rejeitam a doutrina da

ressurreição.

15
S.R. Inbach, Sincretismo, em Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol III (São Paulo-
SP: Vida Nova, 1990), 397.
16
Ver, W.A.Visser’t Hooft, Cristianismo e Outras Religiões (Rio de Janeiro-RJ: Paz e Terra, 1968), 6-25.
18

1. Racionalismo Naturalista

1.1. Definição

O primeiro tipo de negação que se pode identificar, é a negação de cunho

racionalista naturalista. Antes de tratar do assunto, é bom dizer que este tópico não tem

a intenção de demonstrar extensivamente todas as peculiaridades do pensamento

secularizado ocidental, muitos outros expoentes poderiam ser citados e estudados, como

por exemplo, Hegel, que exerceu certa influência na Teologia.

O termo racionalismo, aqui não assume um significado específico, mas sim, um

sentido mais amplo. Usando as palavras de Alan Richardson, pode-se dizer que:

Pela palavra 'racionalismo' entendemos aqui o conceito que considera a verdade como coisa
que se pode descobrir, ou que acha que podem ser averiguados os limites do entendimento, por
meio da operação ou de pesquisa feita somente pela razão humana, sem levar em conta a 'fé', a
'graça', etc. Neste sentido essa palavra pode ser aplicada aos conceitos de Locke e de Hume,
bem como aos de Descartes e Spinoza.17

Colin Brown diz que racionalismo "veio a significar a tentativa de julgar tudo à

luz da razão. Vinculada com ela, há a suposição de que, quando isto é feito, a razão terá

completamente liquidado o sobrenatural, e que não sobra mais nada além da natureza e

dos fatos crus."18

Além disso, o termo racionalismo está associado com o adjetivo naturalista. E a

razão disto é reforçar e enfatizar o elemento do racionalismo que vê a verdade, somente,

por via da natureza, do natural, do experimental e do verificável.

17
?
Alan Richardson, Apologética Cristã (Rio de Janeiro-RJ: JUERP, 1978), 128.
18
Colin Brown, Filosofia e Fé Cristã (São Paulo-SP: Vida Nova, 1983), 37.
19

Definindo, portanto, racionalismo naturalista é uma forma de pensar e buscar a

verdade, considerando somente aquilo que a mente humana é capaz de estudar e

verificar na natureza.

Alguém que tem uma mentalidade racionalista naturalista, é uma pessoa que no

momento em que for confrontada com a religião cristã e ter que tomar uma posição

quanto ao conteúdo da fé desta religião, certamente rejeitará todos elementos

sobrenaturais e revelacionais que fazem parte daquilo que é considerado como doutrinas

ortodoxas do cristianismo. Dentro destas doutrinas ortodoxas, está incluída a doutrina

da Ressurreição dos Mortos, que está apoiada no fato básico, que é a ressurreição de

Jesus Cristo.

1.4. O Ceticismo Racionalista Naturalista no Empirismo de Hume.

O Empirismo surgiu em solo inglês e seus expoentes principais foram Francis

Bacon, Hobbes, Locke, Berkeley e Hume.19 No Empirismo, o racionalismo naturalista,

chegou, em Hume, a um estado de absoluto ceticismo. "Empregava a razão até aos

limites para demonstrar as limitações da razão. Levou adiante a teoria representativa do

conhecimento até às últimas conseqüências."20 Seu ceticismo colocou em dúvida a

certeza de conhecimento real de todo tipo de conhecimento.

Hume trata acerca do milagre em sua obra e nesta pode-se perceber o princípio

fundamental do racionalismo naturalista, de que o milagre é uma violação das leis da

natureza, e por isso, é impossível de se crer. Hume diz:

Um milagre é uma violação das leis da natureza; e como uma experiência constante e
inalterável estabeleceu estas leis, a prova contra o milagre, devido à própria natureza do fato, é
19
Battista Mondin, Introdução à Filosofia (São Paulo-SP: Paulus, 1976), 201.
20
Brown, Filosofia e Fé Cristã, 48.
20

tão completa como qualquer argumento da natureza que se possa imaginar. Por que é mais do
que provável que todos os homens devem morrer; ... Nada é considerado um milagre se ocorre
no curso normal da natureza. Não é um milagre que um homem, aparentemente de boa saúde,
morra subitamente, pois verifica-se que tal gênero de morte, embora mais incomum que
qualquer outro, ocorre frequentemente. Mas é um milagre que um morto possa ressuscitar,
porque isto nunca foi observado em nenhuma época e em nenhum país.21

Hume não ataca, somente, a credibilidade dos milagres, mas também, coloca em

dúvida o critério de autoridade, quando fala acerca da natureza dos testemunhos

humanos acerca dos milagres. Ele diz que:

Quando alguém me diz que viu um morto ressuscitar, considero imediatamente comigo
mesmo: é mais provável que essa pessoa procure enganar-me ou esteja equivocada, do que o
fato que relata possa realmente ter ocorrido. Peso um milagre contra o outro e, de acordo com a
superioridade que descubro, pronuncio minha decisão e rejeito sempre o milagre maior. Se a
falsidade de seu testemunho fosse ainda mais miraculosa que o evento que relata, agora e
somente agora, pode pretender orientar minha crença e minha opinião.22

Ele discorre extensamente sobre o assunto dos milagres e do testemunho acerca

deles.23 Hume não acredita que se possa confiar nos testemunhos humanos, para ele "a

velhacaria e a leviandade humanas são fenômenos tão normais, que prefiro acreditar que

os eventos mais extraordinários tenham aí sua origem, a admitir uma violação tão

marcante das leis da natureza."24

Para concluir o pensamento de Hume, é bom, também, dizer que ele rejeitava

juntamente com os milagres, todo tipo de profecia. Para Hume, ser Cristão é um

verdadeiro milagre.25

21
Hume, Investigação Acerca do Entedimento Humano, em Os Pensadores (São Paulo-SP: Nova
Cultural, 1992), 120.
22
Ibid, 120-121.
23
Ibid, 121-126. Para entender melhor o argumento de Hume.
24
Ibid, 127.
25
Ibid, 128.
21

1.5. O Otimismo Racionalista Naturalista no Iluminismo.

Hume tinha uma visão muito pessimista da razão. No entanto, o racionalismo

naturalista chegou a um extremo inverso, em vez de pessimismo, a um otimismo

fabuloso sobre os poderes da razão. Isto deu-se com o movimento Iluminista, no século

XVIII.

O Iluminismo foi um movimento intelectual durante o século XVII, que elevou a

razão humana para perto de um status divino e atribuiu a esta, a habilidade para

discernir a verdade de todos os tipos, sem no entanto, apelar para o sobrenatural. 26 Este

"é essencialmente um antropocentrismo, um ato de fé apaixonado pela natureza

humana. É um novo evangelho de progresso e felicidade. O iluminismo preconiza um

novo messianismo, uma nova era, em que o homem, vivendo conforme a sua natureza,

será perfeitamente feliz."27

No Iluminismo havia uma desconfiança geral da tradição, dos costumes, da

antiguidade e da autoridade, e eram premiados o ceticismo, a razão e a análise."28

Neste período houve uma forte ênfase e interesse pela ciência 29. E por isto,

"sempre que a Escritura retrata o universo de modo contrário ao conceito mundial do

cientismo ou descreve eventos que são sobrenaturais, o homem moderno deve escolher

a ciência em preferência à Escritura."30

26

?
James Sawyer, "Liberalism" [http://www.bible.org], Julho, 2001.
27
Mondin, Introdução à Filosofia, 202.
28
Stanley Gundry, Teologia Contemporânea - Coleção Pensadores Cristãos (São Paulo-SP: Mundo
Cristão, 1983), 14.
29
Ver Battista Mondin, Curso de Filosofia, vol II (São Paulo-SP: Paulus, 1981), 154.
30

?
Gundry, Teologia Contemporânea, 14.
22

Juntamente com a ciência, há a exaltação do método empírico, que é o principal

meio pelo qual a ciência trabalha.

Tudo o que está além da experiência é sem interesse e sem valor como problema.
Obviamente, esta é a sorte da metafísica e da religião revelada; a essência metafísica das
coisas e do espírito, a transcendência e tudo o que ela implica cessam de ser problema e
transformam-se em puras superstições, sem o mínimo fundamento na razão e na
realidade.31

Nesta cosmovisão, a razão é um única forma de conhecer-se a verdade, é uma

confiança inocente acerca do poder desta, que impera na mentalidade moderna.

A igreja e as doutrinas desta, foram duramente atacadas no pensamento

iluminista. E a principal arma foi a crítica histórica e literária. Todas as obras e escritos

antigos foram estudados à luz de princípios científicos. E nesta crítica "as Sagradas

Escrituras são sujeitadas ao mesmo escrutínio." 32 Com isto, ignora, o dogma da

singularidade da Bíblia, na doutrina da inspiração e inerrância. E os resultados foram

desastrosos.33

Portanto, no campo da religião e da ética, o cristianismo, teve que ser substituído

por um tipo Teologia Natural. E um dos porta-vozes principais desta, e de todo o

Iluminismo foi Immanuel Kant, um alemão "que personifica a confiança no poder da

razão para tratar das coisas materiais e na sua incompetência para tratar de qualquer

coisa além delas."34 Na Crítica da Razão Prática (1788), "fez a tentativa de fundamentar

sobre a razão, e a razão somente, a validez dos conceitos de Deus, da liberdade, e da

imortalidade."35 E constitui-se uma expressão clássica da Teologia Natural. "Ao assim

31
Mondim, Curso de Filosofia, 155.
32
Gundry, Teologia Contemporânea, 15.
33
Ibid, 15.
34
?
Brown, Filosofia e Fé Cristã, 61.
35
Gundry, Teologia Contemporânea, 16.
23

fazer, deu à religião uma forte interpretação ética, que tem sido uma característica do

liberalismo religioso a partir de então até o tempo presente.36

O racionalismo "levou os pensadores católicos e protestantes a reduzirem os

elementos milagrosos e sobrenaturais e a construir uma 'teologia natural' que seja aberta

diante da razão e comum a todos os homens."37 No lugar da Ortodoxia Revelada, três

princípios fundamentais foram pressupostos para a natureza da religião: O conceito

deísta de Deus; o conceito de imortalidade da alma; e o conceito de liberdade humana.

Portanto, pelos princípios do racionalismo naturalista, pode-se notar que a

crença na doutrina da Ressurreição dos Mortos é algo totalmente sem credibilidade.

Pois é uma doutrina baseada na Ressurreição de Jesus, que é um fato histórico, com

implicações escatológicas e é uma resposta para o problema da vida após a morte, no

entanto o racionalismo naturalista crê que a natureza é a fonte primária para responder

às questões fundamentais da existência humana. 38 A mentalidade racionalista com a

crítica literária e histórica, procura determinar a legitimidade do nosso legado histórico.

Sendo que a pressuposição básica é a de que milagres não existem. O racionalismo

naturalista tem uma "suspeita e hostilidade para toda verdade que clama estar

alicerçada em algum outro tipo de autoridade, que não seja a razão, e.g. tradição ou

revelação divina."39 E por isto, tem sido substituída por um tipo de doutrina, chamada

imortalidade da alma, que crê que a alma humana sobrevive mesmo fora do corpo.

36

?
Ibid, 16.
37
J.Van Engen, “Teologia Natural”, em ELWELL, W.A., Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja
Cristã, Vol. III (São Paulo-SP: Vida Nova, 1990), 491.
38
?
Sawyer, "Liberalism", Julho, 2001.
39

?
Ibid.
24

2. Dualismo Antropológico Espiritualista

2.1. Definição

Foi estudado acima, um pouco acerca do racionalismo naturalista. E em

consequência deste racionalismo, não em ordem cronológica, mas lógica, as pessoas

partem muitas vezes, para um tipo de religiosidade mais natural e espiritual, distinta do

Cristianismo bíblico.

Depois de ter renunciado à direção que a Bíblia lhe aponta, o mundo se sentirá obrigado a
seguir a voz de um instinto cego, porém, imorredouro, que o conduzirá a uma era de fantasmas
e duendes. Quando o Deus de Samuel fôr esquecido , e houver sido dissolvido em especulações
precipitadas e corrosivas de "redações" e "redatores", recorrer-se-á à bruxa de Endor, ou,
talvez, pode ser que as multidões fujam para a supertição da infabilidade papal, a quem John
Henry Newman recorreu, para pedir que destruísse os espectros que surgiam na sua própria
mente.40

Este termo, dualismo antropológico espiritualista, é um termo um pouco

complexo, mas foi o melhor encontrado para expressar um tipo filosofia comum

encontrado entre vários grupos, dos quais os principais serão vistos um pouco mais à

frente.

Para definir este termo, deve-se entender o significado pretendido por cada

palavra deste. Dualismo quer dizer algo composto de duas partes. Antropológico,

significa aqui, conceitos acerca da natureza humana. E espiritualista significa algo

relativo a espírito ou alma.

Estas palavras combinadas, tem a intenção de compreender a seguinte idéia:

Uma atitude que vê a natureza humana dividida em duas partes, corpo e alma/espírito,

Warren A. Candler, Verdade ou Mito - Evidências do Cristianismo (Teresópolis-RJ: Casa Editora


40

Evangélica, 1961), xv.


25

ou seja, uma parte material e outra imaterial. Sendo esta última, vista como uma parte

superior do homem em detrimento do corpo (parte material) que é visto como algo

inferior.

2.2. Dualismo Transcendental Platônico

No sistema de Platão havia uma distinção entre a realidade material e a realidade

eterna. “A característica dominante do pensamento platônico é o dualismo. Platão

considera o mundo material como um mundo decaído e alienado, uma reprodução

imperfeita, uma imitação mal feita, uma participação limitada de um mundo ideal,

perfeito, eterno, incorruptível, divino, o mundo das Idéias.”41

Neste pensamento, a alma pertence ao mundo das idéias perfeitas, o corpo,

porém, pertence ao mundo da matéria. No platonismo a essência do homem é reduzida

"a uma só alma, espiritual e imortal, considerando o corpo uma prisão e um obstáculo às

atividades da alma."42

No dualismo platônico existe um desprezo total para com a existência corporal.

Isto fica claro, por exemplo, no dialogo escrito por Platão, chamado Fédon. Para Platão,

nas palavras de Socrátes, o "trabalho do filósofo consiste em se ocupar mais

particularmente que os demais homens em afastar sua alma do contato com o corpo." O

corpo atrapalha a alma de encontrar a verdade, pois "enquanto a procura com o corpo é

enganada por ele, que a induz a erro". E por esta razão, o corpo é tratado como

corrupção, pois ele diz que "enquanto tivermos corpo e nossa alma estiver absorvida

nessa corrupção, jamais possuiremos o objeto de nossos desejos, isto é, a verdade." O

41
Mondin, Introdução à Filosofia, 195.
42
Ibid, 195.
26

corpo atrapalha a alma porque "nos oferece mil obstáculos pela necessidade que temos

de sustentá-lo, e as enfermidades perturbam nossas investigações." Por isso, é

necessário "que abandonemos o corpo e que apenas a alma analise os objetos que deseja

conhecer." Ele fala do corpo como um fardo, "é preciso que não se conheça a verdade

ou então que se a conheça após a morte, pois então a alma se pertencerá, livre desse

fardo, e não antes."43

Por este motivo, Platão não poderia conceber uma ressurreição dos mortos, tal

como é concebida no Cristianismo. E por isso, no platonismo o que é encontrado é a

doutrina da imortalidade da alma (Platão formula algumas argumentações, para

provar-se a imortalidade da alma.44), e portanto, via a morte como algo bom. E aquele

que não quer morrer, ama o corpo e não a sabedoria45.

Ao crer na imortalidade da alma, Platão ensina um tipo de ensino, já presente

nas religiões órficas da Grécia antiga, que é a doutrina da metempsicose, que ensina "a

transmigração da alma em vários corpos e, por conseguinte, propõe o 'renascimento' da

alma em diferentes formas de seres vivos. Platão retoma essa doutrina do orfismo, mas

a amplia de várias maneiras."46 Esta doutrina também encontra expressão no termo

"reencarnação" tão divulgado e pregado nos dias atuais. Platão ensina esta doutrina

através de vários mitos.

43

?
Platão, "Fédon", em Os Pensadores (São Paulo-SP: Nova Cultural, 2000), passim.

44
Sobre a imortalidade da alma ver Platão, Fedro (São Paulo-SP: Martin Claret, 2001); Platão, "Fédon";
Giovanni Reale e Dario Antiseri, História da Filosofia, Vol 1 (São Paulo-SP: Paulus, 1990), 156.
45
Platão, Fédon, 129.
46
Reale e Antiseri, História da Filosofia, Vol 1, 157.
27

2.3. Dualismo Imanentista Estóico

Outra expressão do dualismo antropológico espiritualista é o estoicismo, que

nega a ressurreição por meio da crença panteísta, não atribuindo individualidade a

nenhuma alma, vendo a imortalidade no âmbito da generalidade. E o motivo de citá-la

aqui, é porque expressa um tipo de misticismo e religiosidade que corresponde a muitos

movimentos sincréticos religiosos.

E embora sua visão de mundo leve a um ateísmo e a uma crença na extinção da

individualidade, este grupo pode ser enquadrado dentro do escopo do dualismo

antropológico espiritualista. Pois, este faz uma distinção na estrutura do universo.

"Quanto à estrutura do cosmo, ela resulta, segundo os estóicos, de dois elementos, a

matéria e o Logos. A primeira, indefinida e inerte, representa o princípio passivo; o

segundo, animado e cheio de energia, representa o princípio ativo."47

E para eles, o homem "como todos os seres, é constituído de um fragmento do

Logos (alma) e de uma parte de matéria (corpo)." 48A morte constituí a separação entre o

fragmento do Logos e o corpo. Para eles não há ressurreição do corpo, pois o homem tal

como é, é um ser mortal. Mas o "fragmento do Logos não será jamais destruído." 49 E

portanto acreditam num tipo de imortalidade inconsciente. 50

Portanto, o estoicismo, que mesmo sendo monista e panteísta, se caracteriza por

uma visão dualística do homem, identificando nele algo imortal e impessoal, e também

algo mortal e pessoal, ligado à esfera deste mundo, que era vista como algo indesejável.

47
?
Mondin, Curso de Filosofia, Vol 1, 110.
48
Ibid, 111.
49
Ibid, 111.
50
Mondin, Curso de Filosofia, Vol I, 111.
28

O corpo como sendo parte desta realidade mundana, era algo ligado às paixões e vícios

que deveriam ser evitados.

2.4. Dualismo Gnóstico

Por último, tem-se aqui, o pensamento gnóstico, que desafiou a fé cristã, com

seu dualismo antropológico espiritualista que rejeitava explicitamente a doutrina da

ressurreição dos mortos.

O pensamento gnóstico não é algo relativo somente ao cristianismo do século II.

Estudiosos concordam que havia um gnosticismo anterior ao cristianismo, e até mesmo

um pré-gnosticismo cristão51.

Quanto ao significado, o gnosticismo têm sua origem no termo "gnose" que

literalmente significa "conhecimento". De um modo específico e técnico, "tornou-se

indicador daquela particular forma de conhecimento místico própria de algumas

correntes religiosa-filosóficas do tardio paganismo, sobretudo de algumas seitas

heréticas inspiradas no cristianismo."52 Pelo que pode-se perceber acerca do

gnosticismo, este não "se trata, propriamente, de uma seita, mas de uma tendência, de

uma corrente de pensamento embebida de gnosticismo que esvaziava a humanidade de

Jesus."53

Quanto ao pensamento gnóstico cristão do século II, pode-se dizer que por terem

um conceito tão pessimista e negativo da realidade material, rejeitaram também a


51

?
Bengt Hagglund, História da Teologia (Porto Alegre-RS: Concórdia Editora, 1995, 5a.), 27; Ver
também, G.L. Borchert, “Gnosticismo”, em ELWELL, W.A., Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja
Cristã, Vol. II (São Paulo-SP: Vida Nova, 1990), 203.
52
Reale e Antiseri, História da Filosofia, Vol 1, 405.
53
Roque Frangiotti, História das Heresias: séculos I-VII (São Paulo-SP: Paulus, 1995), 27.
29

encarnação de Jesus, como o Verbo que se fez carne, e portanto eram chamados

docetistas54. Desta forma negaram a doutrina da ressurreição dos mortos..

Os gnósticos ridicularizavam a idéia da ressurreição corporal porque ela, implicitamente,


valorizava o corpo e lhe dava um "status" que precisava ser negado. Oposta a esse princípio, a
concepção ortodoxa da ressurreição expressa, em linguagem simbólica, a convicção de que a
vida humana é inseparável da experiência corpórea. Quando um homem volta à vida depois da
morte, o faz em corpo físico.55 (44,184)

Para os gnósticos, a salvação consistia em:

sair deste mundo material, mau, voltado à destruição, e voltar ao mundo espiritual do Pai.
Portanto, a salvação está assegurada somente aos "espirituais" gnósticos, àqueles que têm, em
si mesmos, a centelha divina originária. Esta centelha é despertada por um processo de
conhecimento através da revelação feita ao espírito, através do qual a alma do gnóstico toma
consciência da sua verdadeira natureza: sufocada pela matéria, aspira libertar-se dos liames do
corpo e do mundo material.56

A morte é para o pensamento gnóstico, à semelhança do platonismo, um tipo de

libertação, e não a consequência do pecado. Para eles, a ressurreição, "seria um

retrocesso à vileza da corporeidade, uma nova entrega à prisão que o corpo exerce."57

C. Principais Grupos que Negam Explicita e Implicitamente a Doutrina

Alguns grupos tem negado explicita ou implicitamente a doutrina da

ressurreição dos mortos, e mesmo assim se consideram cristãos, ou querem manter parte

do Cristianismo. Será apresentado os principais grupos gerais.

54
Frangiotti, História das Heresias: séculos I-VII, 28.
55
Samuel Vieira, O Império Gnóstico Contra-Ataca (São Paulo-SP: Editora Cultura Cristã, 1999), 184.
56
Frangiotti, História das Heresias: séculos I-VII, 34-35.
57
?
Vieira, O Império Gnóstico Contra-Ataca, 29.
30

1. Cristianismo “Liberal”

Vários grupos e igrejas que dizem-se cristãos tem negado a doutrina da

ressurreição dos mortos, com bases em pressupostos do Liberalismo Teológico.

O Liberalismo Teológico surgiu num contexto onde o racionalismo naturalista,

dominava o cenário intelectual. O Liberalismo, no sentido mais especifico, surgiu no

contexto do Iluminismo, e foi uma tentativa de fazer mediação entre o Cristianismo

Ortodoxo e a mentalidade racionalista. Nesta mediação surgiu uma nova religião, que

retinha terminologias da ortodoxia, porém, redefiniu radicalmente estes termos dando-

lhes um novo significado.58 Quanto a definição do termo, pode-se falar de um

Liberalismo num sentido mais amplo, englobando grupos opostos entre si, mas tendo

em comum o abandono da ortodoxia, por isto pode-se considerar como cristianismo

liberal, todo e qualquer grupo que se fundamenta numa teologia que nega a

hermenêutica ortodoxa das Escrituras e dos fatos por ela relatados.

O problema quanto à doutrina da ressurreição dos mortos, é que as doutrinas

ortodoxas dentro do pensamento teológico liberal perderam totalmente seu significado,

sendo assim consideradas como parte acidental da religião, dispensável para a fé. Estas

foram trocadas por princípios tais como a “paternidade universal de Deus” e

“irmandade universal do homem”59 Passou-se a considerar somente os princípios éticos

do Cristianismo, o sobrenatural passou a ser explicado por outras categorias de

entendimento, que não a da ortodoxia. O Cristianismo passou a ser uma religião mais

terrena do que transcendental.

58

?
M. James Sawyer, “Liberalism”, Julho/2001.
59
J. Gresham Machen, Cristianismo e Liberalismo (São Paulo-SP: Os Puritanos, 2001), 28.
31

Nesta preocupação com este mundo, perdeu-se totalmente o sentido de lutar-se

e viver-se com vistas a um futuro Reino de Deus, para o estabelecimento dum Reino

aqui mesmo na terra, através da transformação social. Destes princípios surgiram várias

teologias e movimentos de libertação. O Evangelho Social é um exemplo deste

ativismo social e político. Por traz deste ativismo está um princípio que nega a realidade

da “nova criação” segundo as Escrituras. Negam a realidade do pecado e crêem de

forma otimista na cura do pecado de forma natural. O Reino de Deus é algo a ser

estabelecido na ordem social. Tal ordem seria feita à medida que as vidas humanas

expressassem Seu amor em todas as esferas de seus relacionamentos e das instituições

da sociedade. E porque o homem era essencialmente bom e aperfeiçoável, marcado pelo

pecado que era um egoísmo perfeitamente curável, o reino realmente viria.60

O Evangelho Social morreu com o passar do tempo, mas seus princípios gerais

tem aparecido em várias teologias, e.g., Teologia da Libertação e em suas variadas

formas que tem aparecido61, e que tem interpretado a Bíblia em termos de um ativismo

social, tentando contextualizar a fé Cristã à perspectiva das opressões sociais. Onde se

tem enfatizado principalmente “uma escatologia terrestre, muitas vezes em detrimento

da dimensão escatológica transcendente da Escritura." 62 No esforço de contextualizar o

Cristo com a realidade presente de injustiça social, perde-se totalmente o significado do

Cristo Ressurreto.

60
?
N.A.Magnuson, “Evangelho Social”, em ELWELL, W.A., Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja
Cristã, Vol. II (São Paulo-SP: Vida Nova, 1990), 203.
61
?
Nicodemus Lopes, “A Hermenêutica da Teologia da Libertação: Uma Análise de Jesus Cristo
Libertador, de Leornardo Boff”, em Fides Reformata III:2 (Julho-Dezembro 1998): 67.
62
Pontifícia Comissão Bíblica, A Interpretação da Bíblia na Igreja (São Paulo-SP: Paulinas, 1994) ,77.
32

Além desta preocupação social, dentro do cristianismo liberal, existem grupos

que defendem um tipo de religiosidade existencialista, que tem desprezado o caráter

histórico do Evangelho em prol de uma fé funcional para a existência humana. O

principal nome aqui, deste tipo de cristianismo é R. Bultmann. “O que importa não é

alguma coisa que Jesus fez objetivamente fora de nós e por nós. Nem sequer há uma

coisa tal como uma palavra objetiva de Deus. Jesus é um pregador da Palavra, que

conclama os homens à decisão e, assim, nos capacita a ‘interpretar nossa própria

existência’.”63

Bultmann rejeita a possibilidade de que Jesus pudesse realmente ter ressuscitado

fisicamente. Assim rejeita por completo a doutrina da ressurreição dos mortos, bem

como toda visão doutrinária bíblica. A salvação é entender melhor a si mesmo à luz do

que Cristo foi.

Não podemos saber como era Jesus; sabemos, apenas, que viveu e morreu. Mas isto não
importa. “A própria ressurreição não é um evento da história passada... Mas o problema
histórico tem pouca relevância com a crença cristã na ressurreição. O evento histórico do surto
da fé da Páscoa, pois, significa para nós aquilo que significava para os primeiros discípulos – a
saber: a auto-manifestação do Senhor ressurreto, o ato de Deus em que o evento redentor da
cruz é completado.64

Concluindo, o movimento liberal é muito complexo, e por falta de espaço não é

possível citar todas manifestações deste, que negam a doutrina da ressurreição dos

mortos. Uma observação pertinente a fazer sobre estes grupos ou igrejas fundamentadas

em algum tipo de Teologia Liberal, é que estas estão comprometidas com um tipo de

hermenêutica naturalista, que rejeita a visão transcendental da história em sua relação

com Deus. Negam assim, a realidade da “nova criação”, em que a doutrina da

ressurreição é fundamental.

63
Brown, Filosofia e Fé Cristã, 125.
64
?
Ibid, 127.
33

2. Espiritismo

Alguns grupos religiosos têm tentado harmonizar conceitos filosóficos do tipo

naturalista racionalista mais o pensamento dualista do homem, com a Bíblia e

ensinamentos de Cristo. Dentre estes grupos, o principal destes é o Espiritismo

Kadercista, mas outro tipo bem frequente no Brasil é o chamado “baixo espiritismo”,

e.g. umbanda, quimbanda e candomblé. Um resumo básico das suas crenças pode ser o

seguinte:

Crença na sobrevivência das almas e na comunicação com as mesmas após a morte, através do
fenômeno da mediunidade; crença em um Deus Criador e sustentador do universo; crença na
lei da reencarnação que possui um caráter expiatório quanto aos erros do passado, regendo
também a evolução dos espíritos; crença na lei do carma, a qual, teoricamente, garante a justiça
de se ter agora uma vida segundo os atos praticados na vida anterior, e a lei da pluralidade dos
mundos que apresenta todo o universo como um grande palco no qual se processa a evolução
de todas as criaturas.65

Fica claro que dentro deste sistema de crenças não sobra espaço nenhum para a

ressurreição dos mortos, principalmente, por causa da crença na reencarnação da alma.

São duas doutrinas totalmente antagônicas. A idéia de reencarnação esta intimamente

ligada com a crença grega platônica de imortalidade da alma, que vê a natureza humana

essencialmente como alma ou espírito.

O maior problema é que dentro de muitos destes grupos há a tentativa de

conciliar-se a mensagem Bíblica com as mesclas de filosofias usadas pelo Espiritismo.

Assim é o que acontece com o Kardecismo, em que este “pretende fazer uma espécie de

sincretismo entre as idéias espíritas por excelência e algumas idéias extraídas da Bíblia,

65
?
L.A.T. Sayão, “Espiritismo”, em ELWELL, W.A., Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã,
Vol. II (São Paulo-SP: Vida Nova, 1990), 50.
34

sobretudo do Novo Testamento”66 Eles julgam-se cristãos e tentam demonstrar que

vários textos bíblico comprovam práticas espiritas. Eles assim dizem que o

“Espiritismo, quanto seu aspecto reencarnacionista e objetivos desencadeantes,

desde sempre fez-se presente em todas grandes religiões do passado, inclusive do

judaísmo e cristã, através de algumas seitas de mais ou menos importância no

contexto histórico, quando não fator determinante primeiro em algumas delas.”67

A reencarnação é para eles a doutrina mais razoável dentre todas as outras

alternativas, veja a seguinte declaração:

A reencarnação, uma das pilastras do espiritismo, é a mais próxima da razão humana dentre
todas hipóteses religiosas. Annie Besant refere-se à reencarnação como: “não há doutrina
filosófica, que tenha atrás de si passado tão magnífico, tão repassado de intelectualidade , como
a doutrina da reencarnação. Não se há, que tenham por si, como ela, o peso da opinião dos
homens mais sábios; não há nenhuma, como declarou Max Müller, à cerca da qual tão
completamete tenham concordado os maiores filósofos da humanidade”. (Maurício Maeterlink,
A Morte, edição de 1924, páginas 78/79)68

O maior problema é que muitos cristãos, principalmente composto de nominais,

acreditam na reencarnação, desconsiderando totalmente o ensino bíblico da

ressurreição, negando assim a fé de Cristo foi ressuscitado. Pesquisas da Gallup em

1982, comprovam que 23% dos americanos, um em cada quatro, acreditam na

reencarnação, onde, neste mesmo perfil, nove de cada dez aponta o cristianismo como

religião preferida. A proporção é maior entre universitários, jovens de dezoito a vinte e

quatro anos, onde o percentual é de 30%. Cerca de 17% dos que acreditam frequentam

com regularidade as igrejas. Triste, porém, são os dados que dizem que cerca de 21%

dos protestantes e 25% dos católicos acreditam na reencarnação. 69 No Brasil, 60 % já


66
Ibid, 50.
67

?
Argon, Espiritismo X Bíblia [http:\\www.Argon.com.br\Espiristmo versos Biblia.htm], agosto/2000.
68
?
Ibid.
69
Norman L. Geisler e J. Yutaka Amano, Reencarnação (São Paulo-SP: Mundo Cristão, 2000)
35

tiveram ligações com o espiritismo, e cerca de 30-35% são espíritas, mesmo sendo

católicos. E 14% são espíritas confessos.70

3. Gnosticismo Moderno

Outros grupos religiosos que tem negado a doutrina da ressurreição dos mortos,

são os gnósticos modernos, que tem trazido à tona o pensamento gnóstico dualista que

rivalizou com o Cristianismo no passado.

O interesse pela gnose tem aumentado, principalmente, depois da descoberta “de

uma biblioteca gnóstica em Nag Hammadi, Egito, 1945”, onde dentre várias obras

“mais um grupo de documentos originais foi encontrado e cresceu muito o interesse por

desvendar os meandros de tal movimento e analisar suas implicações históricas.” 71

Passou-se então a ter informações primárias do gnosticismo, que até então se limitava

somente às que estavam registradas nos Pais da Igreja.

Várias igrejas gnósticas tem sido fundadas, e um dos nomes principais é de

Samael Aun Weor, que foi o “criador da Igreja Gnóstica Cristã Universal, na década de

70, no México, hoje com ramos e derivações em diversos países.” 72 Além disso,

produziu uma enorme quantidade de material sobre o gnosticismo. No Brasil a igreja

gnóstica existe desde 1972.

L.A.T. Sayão, “Espiritismo”, em ELWELL, W.A., Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã


70

Vol. II (São Paulo-SP: Vida Nova, 1990), 50.

Samuel Vieria, O Império Gnóstico Contra-Ataca, 10.


71
72
FundaSaw, “Igreja Gnóstica do Brasil” [http://www.fundasaw.org.br/igrejagnostica/index.htm],
Outubro/2001.
36

Um dos princípios do gnosticismo moderno é “Fundamentar a divulgação do

cristianismo antigo em sua forma gnóstica primogênita para o bem das almas.” 73 Eles

próprios definem as principais características da gnose como “o conhecimento do que

fomos (vidas passadas), do que somos (ontologia), de onde viemos (cosmologia), de

onde estamos (conhecimento científico) e para onde iremos (escatologia).”74

Livros tem sido escritos, e.g., de livros traduzidos no Brasil: Elaine Pagels (Os

Evangelhos Gnósticos) e de Joan O'Grady (Heresia - o jogo de poder das seitas cristãs

nos primeiros séculos depois de Cristo). Estes fazem uma defesa do gnosticismo, e ao

mesmo tempo, procuram demonstrar que à luz das descobertas de Nag Hammadi, o

Cristianismo Ortodoxo, com o seu cânon, representava somente uma parte pequena do

complexo fenômeno cristão primitivo. O cânon ortodoxo é para estes, fruto da escolha

arbitrária dos pais da igreja, com funções políticas e sociais para o estabelecimento

institucional da igreja. E deste modo tem argumentado, que a doutrina da ressurreição

dos mortos tem esta função, de legitimar o poder eclesiástico. E é assim, que tem se dito

que a doutrina da ressurreição dos mortos na concepção ortodoxa tem implicações

políticas de legitimação de autoridade espiritual, que os gnósticos se opuseram a elas.75

Portanto, este gnosticismo moderno é uma negação de toda a ortodoxia cristã, e

assim sendo, rejeitam a doutrina da ressurreição dos mortos. Há uma defesa de um

acesso imediato a Deus, sem a mediação da Palavra de Deus, e como se sabe, a doutrina

73
FundaSaw, “Ritos, Tradições e Escrituras” [http://www.fundasaw.org.br/igrejagnostica/ritos.htm],
Outubro/2001.
74

?
FundaSaw, “A Gnose Ontem e Hoje” [http://www.fundasaw.org.br/gnose/gnoseontemhoje.htm],
Outubro/2001.
75
Wayne S. Flory, “The Gnostic Gospels: A Review Article”, Journal of the Evangelical Theological
Society 24:3 (September 1981): 251-255.
37

da ressurreição dos mortos exerceu papel importante na eclesiologia ortodoxa, limitando

a espiritualidade cristã, a tradições tidas como revelações divinas.

4. Espiritualismo Protestante

Outro grupo que têm de certa forma desprezado a doutrina da ressurreição dos

mortos, pode ser percebido nalgumas manifestações religiosas dentro do protestantismo.

Estes embora não rejeitem explicitamente a doutrina da ressurreição dos mortos,

implicitamente a negam através da prática, e de certas tendências teológicas.

Antes de tudo, é necessário esclarecer que o termo protestantismo é muito

amplo, e abrange grupos radicalmente distintos entre si, mas que porém estão muito

distantes de serem considerados católicos.76

A questão principal de alguns grupos protestantes, é o falso conceito de

espiritualidade que tem aparecido em vários movimentos, em várias épocas e lugares.

Vários estudiosos tem demonstrado que dentro da prática e de certos conceitos de

alguns protestantes, existem elementos que se caracterizam mais com o gnosticismo do

que com o Cristianismo ortodoxo.

Quanto à ressurreição dos mortos, muitos crentes tem uma alta valorização do

que é relativo à alma em detrimento do que é relativo ao corpo, que é uma visão grega e

gnóstica, mas não cristã, cuja implicação é o desprezo da matéria, que torna sem sentido

a doutrina da ressurreição dos mortos.

A Igreja Brasileira tem, de forma equivocada, se aproximado mais da visão grega que
da semita ao rejeitar o físico em favor do espiritual.... A consequência resultante desse abismo
artificial é que os pecados da carne se tornam mais importantes do que os do espírito... O
corpo é lugar maldito! Essa ética exige, de forma subliminar, a depreciação do
corpo.77
76
Ver Vieira, O Império Gnóstico Contra-Ataca, 68-69.
77
38

O estudioso Michel Horton escreveu um livro onde mostra os perigos da

espiritualidade moderna, e também concorda que dentro da religiosidade protestante,

principalmente pentecostal e neopentecostal, a ênfase pneumatológica e sensacionalista,

tem demostrado uma espiritualidade mais gnóstica do que bíblica. E dentro desta

espiritualidade o conceito de que o Espírito está acima da matéria tem sido um

obstáculo para se defender algum tipo de redenção do corpo, bem como de uma

ressurreição.78

Um exemplo deste grupo dentro do protestantismo, são aqueles que defendem

um evangelho da prosperidade, onde se percebe em sua doutrina um dualismo entre

corpo e espírito. Um dos expoentes desta teologia fez algumas afirmações que mostra

uma concepção dualista, em que vê o homem espiritual como o verdadeiro homem.

Hagin ensina que “há um homem interior. E há um homem exterior. O homem exterior

não é o eu verdadeiro. O homem exterior é apenas a casa que você habita. O homem

interior é o eu verdadeiro.”79 Para esta teologia, fica claro que a essência do homem, não

inclui o corpo, o que não é uma visão antropológica bíblica.80

Outro exemplo, são os grupos protestantes que se tornaram adeptos do

movimento espiritual do G-12, cujo método e prática religiosa, conduz a um

subjetivismo e misticismo, reduzindo o homem ao seu interior, igualando a sua natureza

à de Deus, levando a um panteísmo, típico da antropologia romântica. Além disto, na

soteriologia, trabalham com o pressuposto de que o crente pode viver sob o domínio do

?
Ibid, 185.
78
Michel Horton, A Face de Deus (São Paulo-SP: ECC, 1999), 1-90.
79
Alan B. Pieratt, O Evangelho da Prosperidade (São Paulo-SP: Vida Nova,1952), 160.
80
Ver mais, Pieratt, O Evangelho da Prosperidade, 157-199.
39

pecado81. O que é incompatível com a idéia bíblica de nova criação, em que o crente

morre para a antiga ordem do mal e ressuscita em Cristo, para uma nova vida. O que

seria contrariar a doutrina bíblica da ressurreição.

Concluindo, dentro do protestantismo, existem teologias e tendências, que

implicitamente obscurecem a doutrina da ressurreição dos mortos com toda as suas

implicações. Isto frequentemente ocorre dentro de grupos que entendem a

espiritualidade em termos subjetivistas, e não em termos de uma mediação pela Palavra

de Deus.

81

?
Joêr Corrêa Batista, Movimento G-12: Uma Nova Reforma ou Uma Velha Heresia?, Fides Reformata
V:1 (Janeiro-Junho 2000), 33-36.
40

PARTE 2

A ESSENCIABILIDADE DA DOUTRINA DA RESSURREIÇÃO


DOS MORTOS PARA O CRISTIANISMO
41

CAPÍTULO 1

A DOUTRINA DENTRO DO KERYGMA CRISTÃO PRIMITIVO

Na parte 1 do trabalho, no segundo capítulo, foi mostrado como alguns grupos e

pessoas têm negado direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente,

reconhecida ou irreconhecidamente a doutrina da ressurreição dos mortos, e mesmo

assim, consideram-se cristãos. Porém, a partir de agora estar-se-á demonstrando nas

Escrituras, mais especificamente no Novo Testamento, a essenciabilidade da doutrina da

ressurreição dos mortos.

Tendo como termo médio, o fato bem estabelecido do Novo Testamento, a

ressurreição de Cristo, o argumento trabalhará com duas premissas básicas: a premissa

maior, que transmite o juízo universal de que a Ressurreição de Jesus tem uma relação

de identidade teológica e lógica com a futura ressurreição dos mortos; e a premissa

menor, que transmite o juízo universal de que dentro do conteúdo do Evangelho

autêntico e primitivo, é pregado o fato e significado da ressurreição de Jesus Cristo.

Diante destas duas premissas, portanto, pode-se inferir validamente que a doutrina da

ressurreição dos mortos é parte essencial do Kerygma Cristão Primitivo. Lembrando,

que a maior parte deste capítulo se baseará em 1Co 15, onde Paulo, combate um tipo de

negação da doutrina da ressurreição dos mortos.


42

A. Fé Absurda em Corinto: Cristianismo sem a Ressurreição dos Mortos

Paulo tratou de um problema teológico na igreja em Corinto, especificamente

em 1Co 15, acerca da ressurreição dos mortos. O texto que estará sendo analisado, neste

tópico, é o texto de 1Co 15:12, que é um verso importante para a temática deste

trabalho. Mas, antes de tratar deste, é bom mencionar o contexto no qual se deu a

problemática abordada por Paulo.

A carta de 1Coríntios é destinada a uma igreja problemática na cidade de

Corinto, cidade próxima à capital da Grécia, Atenas. Corinto era um grande centro

urbano da época, e tinha um grande valor comercial por sua localização estratégica.

Esta carta foi escrita mais ou menos em 55 82 e por isso, é considerada uma carta de

grande valor, na discussão da polêmica da ressurreição, pois foi escrita num período

onde muitos dos contemporâneos de Cristo, ainda estavam vivos.

A igreja estava enfrentando muitos problemas. Na carta existem evidências de

que havia oposição (parcial ou geral) dentro da igreja contra Paulo, e estes oponentes,

também, estavam divididos entre si mesmos. Há também, indícios de que os crentes

daquela igreja tinham um conceito de espiritualidade distorcido, que afetava seus

comportamentos e atitudes com relação à várias áreas da vida cristã. Alguns têm visto

nesta igreja, uma influência de um tipo de especulação sapiencial do judaísmo

helenístico. Outros identificam uma influência da filosofia sofistica grega. Porém,

alguns vêem a presença de um novo tipo de judaizantes, um tipo helenizado. Foi até

82
Ver A.D. Carson et. alli, Introdução ao Novo Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova, 1997), 315.
43

mesmo cogitado a presença de um tipo de gnosticismo. 83 Pela carta percebe-se que

havia “problemas de ordem moral, doutrinária e litúrgica”84.

O verso de 1Co 15:12, está num contexto remoto, situado após uma seção

onde Paulo aborda assuntos relativos ao culto cristão (1Co 11-14). O contexto mediato

é o capítulo 15, logo depois dos versos onde Paulo fundamenta seu argumento para

acusar o erro de alguns crentes da igreja. Este é importante, porque evidência um

problema teológico, dentro da igreja de Corinto, com respeito à ressurreição dos mortos,

cuja resposta de Paulo, mostra que a doutrina da ressurreição é essencial para a fé

cristã.

Em 1Co 15:12, Paulo, por meio de uma oração condicional, estabelece um

argumento no qual questiona a posição de certos crentes em Corinto. Na parte principal

ele coloca uma pergunta condicionada por uma afirmação subordinada, cujo conteúdo

proposicional foi por ele, anteriormente, demonstrado e confirmado nos primeiros onze

versos. Sendo que a presença da conjunção () , pode ser entendida como uma

adversativa, contrastando, o que Paulo passa a falar, com aquilo que já falou

anteriormente.

Desde modo, Paulo estabelece a seguinte condição, confrontando os crentes de

Corinto: “Se está sendo pregado que Cristo foi ressuscitado dentre os mortos”

(

). Onde o uso de  mais o infinitivo, indica que a afirmativa é considerada como algo

verdadeiro, e não duvidoso ou hipotético, é uma condição real. O conteúdo básico desta,

é que de forma contínua e presente tem sido pregado (o verbo “pregar” está no
83
Ver Carson et. alli., op. cit., pg. 310-315;
84
Augustus Nicodemus Lopes, O Culto Espiritual (São Paulo-SP: EPC, 1999), 26.
44

presente) o fato histórico que é a ressurreição de Cristo dentre os mortos. Este é um fato

elementar, presente no kerygma da igreja primitiva, que os crentes da igreja de Corinto,

teoricamente e não há motivos no texto para duvidar, tinham como certo.

Depois de estabelecer a condição, faz um questionamento que pelo contexto

chama a atenção para a inconsistência teológica de alguns dentro da igreja, no qual

pode-se perceber os seguintes pontos:

Primeiro, havia na igreja, uma negação da crença na ressurreição dos mortos

(). “A

ressurreição dos mortos está assim no grego, sem artigo (AV: ‘ressurreição dos

mortos’). Afirma-se a ressurreição em termos inteiramente gerais.”85

Segundo, esta descrença na ressurreição dos mortos, não era generalizada, mas

sim, peculiar a alguns dentre os crentes da igreja de Corinto. Pois é usado o pronome

indefinido, na expressão (), “alguns dentre vocês”. Estes

estavam (), dizendo que não há ressurreição dos mortos.

No entanto, o motivo pelo qual alguns destes crentes estavam negando a

ressurreição dos mortos, não é mencionado explicitamente no texto. O verso 35 indica

que a objeção quanto a esta, poderia ser um tipo de descrença na ressurreição literal do

corpo, fruto de um mal entendimento sobre a doutrina da natureza do corpo ressurreto.

Algumas alternativas tem sido sugeridas: Poderia ser uma influência do tipo grego-

platônica que pregava uma doutrina da imortalidade da alma; tem sido proposto um

conceito teológico, na qual se defendia uma “escatologia super-realizada”, que crê numa

ressurreição espiritual no presente estado de vida, descartando a ressurreição

escatológica no futuro; poderia, também, ser uma combinação de ambas; Outro motivo

85
Leon Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário (São Paulo-SP: Mundo Cristão, 1986, 3ª ed.), 168.
45

associado à rejeição poderia ser uma atitude grega dualista que negava o valor do

corpo; alguns conseguem ver com base no verso 35, um tipo de ceticismo racionalista;

alguns até mesmo afirmam a presença de um elemento judeu, do tipo saduceu, que não

parece ser provável.86

Terceiro, Paulo usa uma partícula interrogativa (), que neste contexto

pode denotar uma interrogação acerca do “como é possível que...?”87 O que indica que

Paulo estava interrogando sobre a possibilidade da ação descrita na oração. Paulo está

perguntando, mais ou menos o seguinte, “Como é possível negar a ressurreição dos

mortos, se está sendo pregado que Cristo foi ressuscitado dentre os mortos?” Em outras

palavras, Paulo indaga a possibilidade de negar a ressurreição diante da mensagem do

Evangelho pregado. E para esta pergunta, fica claro pelo contexto literário, já existe

uma resposta lógica, “não é possível”. É impossível logicamente que alguém que crê no

Evangelho, não acredite na ressurreição dos mortos.

Redefinindo o conteúdo deste verso, Paulo está falando para a igreja que é um

“absurdo” que alguns dentre eles, pudessem estar falando que não há ressurreição dos

mortos, pois a mensagem do evangelho recebida por eles (e que tem sido pregada)

contêm a crença de que Cristo foi ressuscitado dentre os mortos (1Co 15:1-11), que

segundo Paulo é também uma ressurreição escatológica, cf. 1Co 15:20s.

86

?
Ver Carriker, “A Hermenêutica Escatológica de Paulo: 1Co 15:23-28”, Fides Reformata V:1 (Janeiro-
Junho 2000), 121-122; ver também, Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 168.

87
?
F.W. Gingrich e F.W.Danker, Léxico do N.T. Grego/Português (São Paulo-SP: Vida Nova, 1984), s. v.
“”.
46

No entanto, embora seja clara a negação da ressurreição dos mortos, pelo

contexto infere-se que aqueles que negavam a doutrina acreditavam na ressurreição de

Jesus Cristo. Isto significa inconsistência e ignorância doutrinária.

É importante levar as pessoas a perceberem a lógica de sua crença, seja ela


ortodoxa, ou herética. Muitos cristãos nunca aplicaram sua fé aos seus
pensamentos corriqueiros ou ao seu comportamento diário. Da mesma forma, aqueles
que desviam da verdade bíblica devem enfrentar as implicações daquilo que
afirmam e negam.88

Este verso mostra que o argumento de Paulo fundamenta-se na doutrina cristã

de que a ressurreição de Cristo é um evento escatológico e redentor, que implica

necessariamente, em nível teológico, numa ressurreição dos que morreram. A posição

dos que negavam a ressurreição era incoerente, justamente porque não levavam a sério

as conseqüências daquela posição.

É por isto que Paulo a partir do verso 13, mostra as consequências lógicas da

negação da possibilidade dos mortos ressurgirem. E a consequência mais desastrosa é

“se não há ressurreição dos mortos nem Cristo ressuscitou” (1Co 15:13). Nos próximos

tópicos, estar-se-á tratando do fundamento do argumento de Paulo contra aqueles que

estavam negando a ressurreição dos mortos.

B. A Originalidade da Ressurreição de Cristo no Kerygma

No texto de 1Co 15:12, Paulo evidência a contradição dos crentes corintos que

negavam a ressurreição dos mortos. Mas, para chegar a esta conclusão ele fundamenta

seu argumento explicando sobre a natureza, origem e conteúdo daquilo que estava

sendo pregado nas igrejas, e deste modo, na igreja de Corinto. Este Evangelho, na visão

de Paulo, deve ser necessariamente crido por alguém que se julga cristão.
88
?
David Prior, A Mensagem de 1Coríntios (São Paulo-SP: Ed. ?, 1993)
47

No texto de 1Co 15:1-11, Paulo apresenta o fundamento, pelo qual estaria

apoiando-se ao combater a negação da ressurreição dos mortos. E por isto, ao falar do

Evangelho, neste contexto, pode-se perceber a grande ênfase dada na ressurreição de

Jesus, porquanto apresenta uma lista razoável de testemunhas acerca desta.

Paulo, primeiramente, dirige-se aos irmãos da igreja, chamando a atenção deles

para o (), ou seja, o Evangelho. E para isto ele faz uso de um

verbo, que transmite não a idéia de novidade, mas de trazer ao conhecimento algo já

conhecido, (), “venho trazer ao conhecimento” ou “venho trazer à mente”

ou também, “faço conhecido”. Alguns vêem aqui “uma gentil censura. Alguns estavam

longe de apreciar o que o Evangelho significava.”89

Este () tinha algumas características importantes, que são

dadas nestes versos. E para elucidar a origem deste Evangelho será apontado três delas.

A primeira característica, é que este  () foi “anunciado” pelo próprio

Paulo àquela igreja, (). A segunda característica importante

para este ponto, é que além de ter sido um Evangelho entregue pelo próprio Paulo, este,

ainda por cima, tinha sido o mesmo evangelho recebido pela igreja,

(). A terceira, é que até então, a igreja estava firme neste evangelho.

Pois Paulo dirige àqueles crentes de Corinto com a expressão,

() “e no qual estão firmes”, onde o pronome

relativo aponta para Evangelho. O verbo no perfeito indica que a ação estava ainda

presente.

89
?
Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 163.
48

Em suma, isto quer dizer, que ao tratar do assunto da ressurreição dos mortos, o

apóstolo parte do pressuposto daquilo que ele próprio tinha transmitido àquela igreja. E

daquilo que esta própria tinha recebido e permanecido até então. Ou seja, ao tratar da

ressurreição dos mortos, Paulo faz referência ao Evangelho, que não era algo

desconhecido por parte da igreja, mas, que estava sendo trazido à memória deles

(). Isto na apologética seria considerado o “ponto de conexão”, um

ponto de partida em comum entre os dois lados antagônicos.

No verso 3, Paulo explica aos crentes corintos, a origem daquilo que pregou à

igreja. E constatamos isto quando ele faz uma afirmação na seguinte expressão,

(

), “Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi” (NVI).

Paulo, através das palavras () e  ()indica

claramente que a mensagem dele, não era original, ou seja, não teve origem em sua

própria pessoa. “A natureza derivativa do Evangelho é acentuada. Paulo não deu origem

à mensagem que lhes transmitiu. Esta era algo que ele próprio recebera.”90

Estas declarações paulinas exprimem um conceito importante, que esclarece a

natureza da origem do Evangelho transmitido à igreja. Este é o conceito de “tradição”,

expresso nos verbos, “recebestes” (v. 1), “transmiti” e “recebi” (v. 3). De modo geral

tradição é “o processo mediante o qual as verdades religiosas normativas são

transmitidas de uma geração para outra.” 91

90
?
Ibid, 165.
91
?
J.Van Engen, “Tradição”, em ELWELL, W.A., Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã, Vol.
III (São Paulo-SP: Vida Nova, 1990), 546.
49

A idéia de tradição deriva do verbo chave (). Este no NT

traz “além do significado de ‘entregar’, ‘livrar para alguém’..., a idéia de ‘legar’ ou

‘transmitir’ tradição"92, muitas vezes, com uma conotação semelhante93 ao modo de

transmissão rabínica, onde seguindo o estilo destes transmitiam e explicavam a tradição

evangélica que tinham recebido do Senhor. No NT, a tradição é geralmente, associada

com o testemunho apostólico, cujo poder “conforme Cullmann e Bruce têm

argumentado, é que aquilo que foram chamados a transmitir não era dos homens, mas

de Deus (Gl. 1:1)”94

Embora a tradição evangélica em certos aspectos seja semelhante à judaica, no

entanto, difere desta, porque a tradição evangélica “não significa meramente aceitar a

veracidade de um relato a respeito de certos fatos históricos nem tampouco

simplesmente receber instrução e iluminação intelectual.”95 Nesta, receber tradição é

receber a Jesus Cristo como Senhor (Cl 2:6). E fala, também, que “na voz da tradição, a

voz do próprio Deus é ouvida.” 96 E seguindo esta linha de raciocínio, Ladd diz que a

tradição, especificamente em Paulo, tem um caráter duplo. Primeiro, é que é uma

tradição histórica, que remonta a fatos da vida terrena de Jesus. Segundo é uma tradição

kerygmático-pneumático.97 E uma das características mais importantes que os

estudiosos tem percebido é que “tradição” na visão paulina, carrega um peso de

autoridade divina. Era assim a forma como a tradição era considerada pelos primeiros
92
K. Wegenast, “Ensinar”, em C. Brown e L. Coenen, Dicionário Internacional de Teologia do Novo
Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova,2000), 647.
93
Ibid, 647.
94
Engen, “Tradição”, 547.
95
George Eldon Ladd, Teologia do Novo Testamento (São Paulo-SP: Exodus, 1997), 364.
96
Ibid, 364.
97
Para entender melhor este conceito ver: Ibid, 364.
50

teólogos do séc. II. O "próprio Deus” era “o derradeiro autor da revelação; mas Ele a

havia entregado a profetas e legisladores inspirados, acima de tudo aos apóstolos, que

foram testemunhas oculares do Verbo encarnado, e estes a transmitiram à igreja.” 98

Dentro desta tradição transmitida99 por Paulo, aqui em 1Coríntios 15, encontra-

se a declaração que Cristo morreu em favor de nossos pecados, segundo as Escrituras; e

que foi sepultado; que foi ressuscitado ao terceiro dia, segundo as Escrituras; e que foi

visto por Pedro e por várias testemunhas, das quais ele é uma, cf. 1Co 15:3ss. O que o

apóstolo cita a partir destes textos, é um resumo do kerygma. Ele clama que seu

Evangelho é o mesmo que o proclamado pelos outros apóstolos. A comparação do

credo que Paulo preservou, aqui, com as outras proclamações primitivas preservadas no

NT claramente indica que este é o caso. 100

O texto mais antigo do NT, que traz um relato sobre as testemunhas da

ressurreição é 1Co 15:4ss. Paulo transmitiu nos anos 50, aos Corintos, o que recebeu

por volta da quarta década do século, e existem boas razões para se crê que foi na

primeira metade desta década. No verso 11, Paulo menciona que sua formula

tradicional concorda com a tradição apostólica, que é a de Jerusalém em particular. E

deste modo, isto leva-nos para um estágio mais antigo da tradição cristã primitiva. E a

natureza desta tradição mostra que sua origem situa-se nos próprios dias em que os

discípulos tornaram certos da ressurreição de Jesus. 101


98
J.N.D. Kelly, Doutrinas Centrais da Fé Cristã (São Paulo-SP: Vida Nova, 1994), 22.
99
Quanto a identificação do que seria tradição ou não nos versos 3 ao 9 ver discussão em Randall C.
Webber, “A Note on 1Corinthians 15:3-5”, em Journal of the Evangelical Theological Society (San
Diego: Evangelical Theological Society 26:3 (September 1983), 265-269; Gerhard Delling, “The
Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, em C.F.D.Moule, The Significance of
the Message of the Resurrection for Faith in Jesus Christ – Studies in Biblical Theology, 2 ª series, vol 8
(Bloomsbury Street London: SCM PRESS LTD, 1968), 77-88.

100
Webber, “A Note on 1Corinthians 15:3-5”, 269.
101
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 78-79.
51

Através de várias passagens, que tratam do conteúdo do Evangelho pregado por

Paulo, em comparação aos sermões apostólicos da primeira parte de Atos, que são

atribuídos à Pedro, pode-se perceber uma grande semelhança entre estas duas

tradições.102

Paulo mesmo, no mínimo, acreditava que a essência de seu kerygma era a dos

apóstolos primitivos. Em Galátas 1:2-18 fala da origem não humana do seu evangelho,

mas, no cap 2 da mesma carta diz que submeteu seu kerygma aos apóstolos. E em 1Co

15:1ss, ele expressamente declara que recebeu sua mensagem da tradição. Na carta aos

Romanos, Paulo concorda com o evangelho que ele e a igreja tinham em comum. Esta

igreja tinha recebido o Evangelho por outros fundadores, porém, Paulo chama o

conteúdo deste de "meu Evangelho".103

Estes documentos de Paulo são valiosos como evidências bem antigas do

conteúdo do Evangelho, considerada a data prematura que elas foram escritas. Para ele a

data em que Paulo entra em contato com estas tradições, não pode ser antes de sete anos

depois da crucificação de Jesus. E é possível que seja mais antiga, se pressupor que

Paulo tivesse conhecimento da doutrina cristã antes da sua conversão. O evangelho que

Paulo pregou, certamente era o mesmo da igreja primitiva mais antiga.104

Paulo, após ter explicado a natureza do seu apostolado em relação ao

testemunho do Cristo ressuscitado (8b-10), no verso 11, fala que a ressurreição é um

fato testemunhado por muitos, inclusive, por ele próprio, e que faz parte do Evangelho.

102
C. H. Dodd, "The Apostolic Preaching and Its Developments" [http://www.religion-online.org/cgi-
bin/relsearchd.dll/showbook?item_id=539], Setembro/2001.
103
?
Ibid.
104
?
Ibid.
52

E que este está sendo pregado, “deste modo” (- ) não somente por ele, mas,

pelos outros pregadores, 

(). E “deste modo” (- ) é que os crentes da

igreja de Corinto tinham recebido o Evangelho pela fé,

().

O advérbio “deste modo”, é importante aqui, porque mostra o modo ou a forma

do Evangelho, que é aquilo que Paulo cita nos versos 3ss. Diz, portanto, que este é o

kerygma da Igreja Cristã. Paulo está demonstrando que há somente um Evangelho.

“Este é o Evangelho autêntico, o Evangelho que todos os apóstolos fazem seu costume

proclamar. E assim crestes lembra aos coríntios que esta é a base da sua fé. Foi nesta

mensagem, e não noutra que eles tinham crido quando se tornaram cristãos. Qualquer

outra coisa é inovação.”105

Concluindo, o conteúdo daquilo que Paulo recebeu e transmitiu à igreja, tem sua

origem no kerygma da igreja primitiva. E que portanto, a mensagem de que Cristo foi

ressuscitado é conteúdo básico da mensagem primitiva, fundamentada no testemunho

apostólico e autenticamente cristã.

C. A Identidade da Ressurreição de Cristo com a Doutrina

Tendo como referencial a ressurreição de Jesus, que é um elemento fundamental

do Evangelho autêntico da igreja cristã primitiva, no qual não se poderia duvidar

razoavelmente, pois muitas testemunhas ainda poderiam até mesmo serem identificadas

e interrogadas. O objetivo a partir de agora é mostrar a partir disto, que a ressurreição

105
Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 167-168.
53

dos mortos esta fundamentada no próprio Evangelho Primitivo. E para este propósito é

fundamental, agora fazer uma relação entre 1Co 15:1-11 e os versos 20-23.

Para Paulo, bem como para os primeiros cristãos, a ressurreição de Cristo tem

um significado escatológico, no qual está envolvido a própria ressurreição dos crentes

no futuro. A ressurreição de Jesus não foi um ato isolado da história, mas sim, um

evento que está inserido num plano teológico bem mais complexo. “É a vida eterna

sendo incorporada no tempo e no espaço. É o começo da ressurreição escatológica. Isto

se torna claro quando se lê o argumento de Paulo em 1Coríntios 15.”106

Paulo, no verso 20, após ter considerado, hipoteticamente, nos versos 12- 19, as

consequências da negação da ressurreição dos mortos, fala da identidade da ressurreição

de Jesus Cristo com a dos crentes que se dará no futuro. E para isto, introduz um

conceito expresso pela declaração de Cristo como as “primícias dos que dormem”,

 ().

As primícias constituem o começo da colheita em si. Embora não sejam sinônimas da colheita
em sua totalidade, as primícias são mais do que flores e folhas e frutos verdes; elas são os
frutos maduros, prontos para a colheita; e, porque são as primícias, são também a promessa e a
garantia de que a colheita total acontecerá brevemente. A ressurreição dos crentes relaciona-se
à ressurreição de Jesus como a colheita total, com os primeiros frutos da colheita. São idênticos
em qualidade; a única diferença é ser quantitativa e temporal.107

Para os cristãos primitivos, a idéia de primícias dos que dormem, era a crença

que o início da ressurreição dos mortos já tinha começado, Cullmann, fazendo uma

distinção entre o pensamento grego de “imortalidade da alma” e a crença cristã da

ressurreição, diz:

deveríamos começar simplesmente a escutar o que ensina o Novo Testamento. “Jesus Cristo,
primogênito dentre os mortos!” Seu corpo, o primeiro corpo de ressurreição, o primeiro corpo

106
?
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 306-307.
107

?
Ibid, 348.
54

espiritual! Toda a vida e todo o pensamento dos que tinham esta convicção deveriam ser
transformadas radicalmente sob sua influência. Tudo o que se sucedeu na comunidade
primitiva explica-se somente a partir daqui108

Outro argumento que demonstra a identidade da ressurreição de Jesus Cristo

com a dos crentes no futuro, é a comparação paulina entre Adão e Cristo. Paulo afirma

no verso 21, que a morte entrou no mundo por meio de um só homem, e que do mesmo

modo, a ressurreição dos mortos, também, veio por meio de um só homem. A “repetida

expressão de Paulo, por um homem, indica a realidade da encarnação. Cristo era tão

verdadeiramente homem como o fora Adão. Era próprio que, como foi por um homem

que a corrupção penetrou a raça, assim por um homem fosse vencida.”109

Semelhantemente, quando trata da natureza do corpo ressuscitado, Paulo

desenvolve, o conceito de Cristo como o segundo Adão, a partir do verso 45.

Antropologicamente, significa que o modo de existência do corpo antes da morte é

determinado pelo primeiro Adão. E o modo depois da ressurreição é determinado pelo o

do segundo Adão, que é Cristo. Primeiro, veio Adão, o físico, depois Cristo, o

pneumático. E como Adão, Cristo representa o começo de um novo modo de

humanidade.110

Em Atos, não explicita, mas implicitamente, a concepção escatológica da

ressurreição de Jesus está, também, presente.111 No texto de Atos 4:2, está registrado

que os apóstolos estavam ensinando ao povo, 

Oscar Cullmann, Das Origens do Evangelho à Formação da Teologia Cristã (São Paulo-SP: Novo
108

Século, 2000), 198.


109
Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 71,172.
110
Riderbous, Paul: An Outline of His Theology (Grand Rapids, 1975), 542.
111

?
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 306-307.
55

(), e também, proclamando em Jesus, a ressurreição dos

mortos, k(kai

). Não está implícito, que a proclamação

da ressurreição de Cristo é do mesmo tipo da ressurreição escatológica. Mas, pelo

efeito causado pela pregação deles sobre os saduceus, que se opuseram aos apóstolos

(), chegando até mesmo à uma preocupação séria com o que

eles ensinavam, pode-se inferir que ensinavam a ressurreição dos crentes em Cristo. A

hostilidade deles é atribuída à sua antipatia contra a mensagem da ressurreição, cf. Lc

20:27-40, e por isto opunham-se de modo especial aos cristãos pelo fato de acreditarem

na ressurreição de Jesus, e apresentarem testemunho e provas sobre esta, e assim se

tornavam diferentes dos fariseus, que também contendiam com os saduceus, pois

acreditavam, também, na ressurreição dos mortos, mas, a um nível mais teórico e

especulativo, que não poderia trazer tanta preocupação para seus oponentes. Porém,

com os cristãos, a “ressurreição dos mortos não era mais uma debatida esperança

teológica com relação ao futuro; era um fato do presente, que colocou toda a matéria em

questão dentro de uma nova perspectiva, de tal forma que não poderia mais ser ignorada

ou mesmo simplesmente tolerada.”112

Portanto, no NT existem várias evidências que mostram que a ressurreição de

Jesus Cristo não é considerada separada da ressurreição futura dos mortos em Cristo.

Sendo assim há uma identidade entre a futura ressurreição dos mortos e a própria

ressurreição de Jesus.

A ressurreição de Cristo e a daqueles que pertencem a Cristo constituem duas partes de uma
única entidade, dois atos em um único drama, dois estágios de um único processo. O
relacionamento temporal não é importante. Não importa quanto demoraria o intervalo de tempo
112
Ibid, 307.
56

entre esses dois estágios da ressurreição. Este fato não afeta a relação lógica ou, seria melhor
dizer, a relação teológica. A ressurreição de Jesus é “as primícias” da ressurreição escatológica
do final dos tempos.113

Portanto, pode-se dizer que a ressurreição dos mortos, era uma doutrina presente

no próprio kerygma da igreja primitiva. Entre a doutrina da ressurreição e a ressurreição

de Jesus, existe uma relação de mútua dependência lógica e teológica. De forma que se

afirmando uma, necessariamente afirma-se a outra, e semelhantemente ao se negar uma,

necessariamente estar-se-á negando a outra. É por isso que Paulo no verso 12 coloca

aquele grande ponto de interrogação: como é possível negar a ressurreição dos mortos

se é pregado a ressurreição de Cristo?

113
Ibid, 309.
57

CAPÍTULO 2

INDISPENSABILIDADE DA DOUTRINA PARA A VERDADE


CRISTÃ

Para mostrar de que forma a doutrina da ressurreição dos mortos é indispensável

para a verdade do cristianismo, estar-se-á seguindo três etapas: 1) Demonstrar que o

testemunho apostólico, especialmente o da ressurreição de Cristo, é o critério pelo qual

se estabelece a verdade do Cristianismo; 2) Mostrar na Bíblia os vários testemunhos 114

acerca da ressurreição de Jesus; 3) Mostrar por meio do argumento de Paulo em 1Co 15,

que negar a ressurreição dos mortos, seria negar o próprio testemunho apostólico, e

assim, seria negar o próprio Cristianismo.

A. O Valor do Testemunho Histórico da Ressurreição de Jesus

A doutrina da ressurreição é tão importante para o cristianismo que a verdade

deste depende da veracidade daquela. Se os mortos não ressuscitam, o cristianismo é

uma mentira ou um engano.

“D.F.Strauss, por exemplo, o mais sarcástico e insensível dentre os críticos da igreja, ao tratar
da Ressurreição, reconhece que ela é o ‘teste decisivo não apenas da vida de Jesus, mas do
próprio cristianismo’, que ‘toca o âmago do Cristianismo’, e que é decisiva para toda a idéia de
cristianismo’ (New Life of Jesus (Nova Vida de Jesus), tradução em inglês, 2 vol. Londres:
1865, vol. 1, p. 41, 397). Se isto se for, tudo aquilo que é vital e essencial ao cristianismo

114
É bom esclarecer que o assunto aqui, não é demonstrar a historicidade do testemunho da ressurreição
de Jesus, mas sim, mostrar que este testemunho existe no Novo Testamento, e que a fé na ressurreição,
sendo verdadeira ou falsa, estava presente na igreja primitiva.
58

também se vai, se ficar, tudo o mais ficará. E assim, através dos séculos, de Celso em diante, a
Ressurreição tem sido o centro tempestuoso que recebe ataques contra a fé cristã.” 115

Muitos rejeitam a ressurreição dos mortos, tal como é pregada pelo Cristianismo

ortodoxo, por causa de ser um fenômeno que viola as leis da natureza. Porém, o

Cristianismo distingue-se das outras religiões históricas por ser uma religião totalmente

fundamentada em elementos históricos miraculosos. E a ressurreição dos mortos, na

pessoa de Jesus, é um destes elementos. O milagre é parte essencial do cristianismo,

“tire o milagroso do cristianismo e terá uma religião totalmente diferente. Isso não

acontece com o islamismo ou com o budismo.” 116 Isto porque, a “Igreja nunca tentou

proclamar sua revelação especial sem apresentar a evidência do milagre divino, única,

que a torna crível aos seres racionais.”117

A maioria dos estudiosos não podem negar que a igreja surgiu como resultado da

pregação, das testemunhas oculares, sobre a ressurreição de Jesus, que é um milagre.

O milagre supremo para o qual a Igreja tem chamado a atenção do mundo desde os primeiros
dias é certamente o da ressurreição de Jesus dentre os mortos. O desenvolvimento dos estudos
ultimamente feitos sobre o Novo Testamento não deixou lugar algum para se duvidar que o
cristianismo teve sua origem na pregação do Cristo ressuscitado. Não saíram eles primeiro para
o mundo com o “evangelho simples” de que Deus é amor, e nem tomaram o Sermão do Monte
como a base das Boas-Novas. Proclamaram, sim, Jesus e a ressurreição. O resto veio depois.118

Um dos argumentos que os teólogos tem usado para falar sobre a historicidade

da ressurreição de Cristo é a própria fé da igreja primitiva. “Poucos negariam, hoje, que

se trata de um sólido fato histórico que os discípulos creram que Jesus ressurgiu dentre

Josh McDowell, Evidência Que Exige Um Veredito: Evidências históricas da fé cristã (São Paulo-SP:
115

Ed. Candeia, 2ª Ed., 1992), 231.


116
Peter Kreeft, O Diálogo: um debate além da morte entre John F. Kennedy, C.S.Lewis e Adous Huxley
(São Paulo-SP: Ed. Mundo Cristão, 1986), 68.
117
Richardson, Apologética Cristã, 135.
118
?
Ibid, pg. 135.
59

os mortos. Os eruditos que são incapazes de crer numa real ressurreição de Jesus

admitem que os discípulos creram nela.”119

O testemunho acerca da ressurreição de Jesus é tão importante para o

cristianismo, que o Novo Testamento sem este testemunho não faria muito sentido.

Caso “se removessem todas as passagens que contêm referência à Ressurreição, ter-se-

ia uma coleção de textos tão mutilados que seria impossível de compreender o que

tivesse restado.”120

O testemunho apostólico tem um grande valor para a verdade do Cristianismo.

Porque se este for falso ou enganoso toda a mensagem cristã, cai por terra. Isto porque o

cristianismo não é uma religião que “nos vem por visões ou descobertas de gênios

religiosos” nem por “conceitos “espirituais” duma “religião ética”, nem “por mística

comunicação ou por divulgação esotérica, como as “revelações” das religiões eivadas de

mistérios. Nem também por especulações filosóficas, como o “conhecimento superior”

das seitas gnósticas. Ela é divulgada e se espalha por proclamação, e é histórica no

sentido em que depende da confirmação de testemunhas históricas que realmente viram

e ouviram aquilo que declararam.121

A palavra do apóstolo Pedro em sua carta fala deste caráter do Cristianismo,

como transmitido por testemunho ocular.

De fato, não seguimos fábulas engenhosamente inventadas, quando lhes falamos a respeito do
poder e da vinda de nosso Senhor Jesus Cristo; ao contrário, nós fomos testemunhas oculares
da sua majestade. Ele recebeu honra e glória da parte de Deus Pai, quando da suprema glória
lhe foi dirigida a voz que disse: “Este é o meu filho amado, em quem me agrado”. Nós mesmos
ouvimos essa voz vinda dos céus, quando estávamos com ele no monte santo. (2Pedro 1:16-18
– NVI)
119

?
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 303.
120
McDowell, Evidências Que Exige um Veredito: Evidências históricas da fé cristã, 230.
121

?
Richardson, Apologética Cristã, 136.
60

Concluindo, a ”grande arma com a qual os discípulos de Jesus começaram a

conquistar o mundo não era uma simples compreensão dos princípios eternos; era uma

mensagem histórica, um relato de algo que havia acontecido recentemente, era a

mensagem, ‘Ele ressuscitou’”122. Este testemunho é fundamental e de grande valor. Se

este for considerado falso em seu conteúdo, todo o cristianismo será comprometido e

perderá sua identidade.

B. Textos Bíblicos do Testemunho da Ressurreição de Jesus

1 – As Narrativas dos Evangelhos

A ressurreição de Jesus tem sido testemunhada em formas de narrativas nos

Evangelhos. E pode-se verificar a presença destas tanto nos sinóticos como no livro de

João.

O quadro123 a seguir mostra uma sinopse das narrativas dos Evangelhos, acerca

da ressurreição de Jesus, e seu aparecimento a certas pessoas.

Mt 28:1-20 Mc 16:1-8 Lc 24:1-53 Jo 20:1-21:25


1 Antes da aurora do Passado o Sábado no primeiro dia da No primeiro dia da
primeiro dia semana semana
2 Mulheres Mulheres Mulheres Mulheres
3 Maria Madalena, a Maria Madalena, Maria Madalena, Maria Madalena
outra Maria Maria a mãe de Maria, mãe de
122
Machen, Cristianismo e Liberalismo, 37.
123
Brown e Coenen, “Ressurreição”, 2091-2092.
61

Salomé Tiago, Joana levando (Sozinha)


especiarias
4 Para ver o túmulo Para ungir o corpo Levando Nenhuma razão
de Jesus especiarias dada (Nicodemos
unge o corpo,
19:39)
5 Um terremoto Acharam a pedra Acharam a pedra Acharam a pedra
Um anjo removeu removida removida removida
a pedra
6 Um anjo um jovem Dois homens dois anjos (20:12)
7 Os guardas caem
como mortos
8 as mulheres entram Não acharam o
no túmulo vazio corpo
9 “Ressuscitou como “Ressuscitou, não “Por que buscais
havia dito” está mais aqui” entre os mortos ao
que vive?”
10 “Ide, dizei ao seus “Ide, dizei aos seu
discípulos” discípulos e a
Pedro”
11 “Vai adiante de vós “Vai adiante de vós
para a Galiléia; lá o para a Galiléia; lá o
vereis” vereis”
12 Retiraram-se Fugiram de temor e Voltaram do Maria corre para
apressadamente assombro túmulo contar a Pedro e ao
com medo e alegria outro discípulo
13 Correram para Nada disseram a Contaram tudo aos
contar aos Seus ninguém; tinham onze e aos demais.
discípulos medo Eles não
acreditavam
14 Jesus encontra-Se
62

com as duas
mulheres
15 Pedro e João
entram no túmulo
vazio; Pedro crê
(21:3-10)
16 Jesus aparece a
Maria (21:11-17)
17 Maria conta aos
discípulos
18 Aparecimento a
dois discípulos
perto de Emaús
19 Aparecimento aos Aparecimento aos
onze em Jerusalém discípulos (20:19-
(24:36-49) 23)
20 Segundo
aparecimento aos
onze, inclusive
Tomé (20:21-29)
21 Aparecimento em
Tiberíades (21:1-
23)
22 a grande comissão
na Galiléia
23 a ascensão de
Betânia

O objetivo, aqui, foi mostrar que há nos Evangelhos o testemunho que Cristo

ressurgiu depois de ter sido morto e apareceu a alguns, físicamente, embora num corpo
63

com algumas características diferentes.124 É um fato básico que dentro das narrativas

dos Evangelhos, o mesmo Jesus que foi morto e sepultado é o mesmo Jesus que

ressuscitou e que apareceu aos discípulos várias vezes em forma corporal.

2 – As Pregações em Atos

Em Atos, o autor registra vários sermões125 da igreja primitiva, onde é

claramente visto e comprovado o testemunho da ressurreição de Jesus, bem como a

consciência de serem testemunhas desta.

O próprio autor de Atos, Lucas no início de sua obra diz sobre a manifestação do

Cristo ressurrecto aqui na terra, quando diz:

A estes também, depois de ter padecido, se apresentou vivo, com muitas provas incontestáveis,
aparecendo-lhes durante quarenta dias e falando das coisas concernentes ao reino de Deus. E,
comendo com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas que esperassem
a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim ouvistes. Porque João, na verdade, batizou com
água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias. (Atos 1:3-5
- ARA)

Na narrativa da escolha de um substituto para Judas, o traidor, para ser um

apóstolo, um dos critérios mais importantes foi o de ter sido testemunha ocular da

ressurreição de Jesus. “É necessário, pois, que, dos homens que nos acompanharam

todo o tempo que o Senhor Jesus andou entre nós, começando no batismo de João, até

ao dia em que dentre nós foi levado às alturas, um destes se torne testemunha conosco

da sua ressurreição.” (Atos 1:21-22 – ARA)

124

?
Para uma discussão mais detalhada: Ibid, 2092-2093.
125
Para a natureza e confiabilidade dos registros de sermões atribuídos a Pedro e a Paulo, bem como
outros, ver Ladd, Teologia do Novo Testamento, Cap. 23: A Teologia de Atos: O Problema Crítico; ver
também, Dodd, "The Apostolic Preaching and Its Developments".
64

No sermão pregado em Jerusalém por Pedro, na ocasião do Pentecostes, donde a

igreja cristã surgiu, parte da argumentação, At. 2:23-36, para a explicação do

fenômeno da descida do Espírito Santo, foi a exposição da ressurreição de Jesus.

Aqueles a quem os judeus haviam assassinado, mas, “ao qual, porém, Deus ressuscitou,

rompendo os grilhões da morte; porquanto não era possível fosse ele retido por ela.”

(Atos 2:24 - ARA). É “este o fato principal, que os primeiros pregadores ressaltaram

repetidas vezes; não tinham necessidade alguma de comprovar o acontecido –

simplesmente o proclamavam e dele testificavam.”126

Quando Pedro e João curaram um mendigo aleijado, At. 3:1-10, eles tiveram a

oportunidade de pregarem no Templo, At. 3:11-26, mas uma vez falaram da

ressurreição de Jesus, e afirmaram serem testemunhas desta. Pedro prega aos judeus:

“Destarte, matastes o Autor da vida, a quem Deus ressuscitou dentre os mortos, do que

nós somos testemunhas.” (Atos 3:15 – ARA) E pelo que o contexto indica, no verso 26

em conexão com Atos 4:1-4, e a natureza da controvérsia com os saduceus, Pedro e

João estavam ensinando por meio da ressurreição de Jesus, que a ressurreição

escatológica dos mortos já havia começado.

Pedro e João foram presos por causa da pregação deles no Templo, e depois de

soltos, foram advertidos a não falarem e nem ensinarem mais nada em nome de Jesus.

Porém, responderam, “Julgai se é justo diante de Deus ouvir-vos antes a vós outros do

que a Deus; pois nós não podemos deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos.”

(Atos 4:19-20 – ARA) Os apóstolos tinham grande consciência do que estavam

fazendo, ou seja, do que significava “testemunhar”. E estavam tão convictos daquilo

126
?
L. Howard Marshall, Atos: introdução e comentário (São Paulo-SP: Vida Nova, 1982), 75.
65

que testemunhavam que chegaram a desafiar as autoridades judaicas.127 Em Atos 4:33,

pode ser visto que apesar das perseguições “os apóstolos, como aqueles que foram

especialmente chamados para serem testemunhas da ressurreição de Jesus, continuavam

a testificar com grande poder a despeito da proibição dos judeus contra a sua

pregação.”128

O testemunho apostólico não se limitou somente a uma audiência judaica, mas, a

ressurreição de Jesus foi, também, confirmada entre os gentios. O sermão de Cesáreia,

mostra bem esta verdade. Pedro pregando na casa de Cornélio, um centurião romano,

diz:

Nós somos testemunhas de tudo o que ele fez na terra dos judeus e em Jerusalém, onde o
mataram, suspendendo-o num madeiro. Deus, porém, o ressuscitou no terceiro dia e fez que ele
fosse visto, não por todo o povo, mas por testemunhas que designara de antemão, por nós que
comemos e bebemos com ele depois que ressuscitou dos mortos. Ele nos mandou pregar ao
povo e testemunhar que foi a ele que Deus, constituiu juiz de vivos e de mortos. Todos os
profetas dão testemunho dele. De que todo o que nele crê recebe o perdão dos pecados
mediante o seu nome. (Atos 10:39-43 – NVI)

Pedro, mais os apóstolos, mais uma vez estavam testemunhando e falando deles

próprios como pessoas especiais, que puderam comer e beber com aquele que antes

tinha sido morto e sepultado. Eles eram testemunhas escolhidas. “As aparições pós-

ressurreição não foram reveladas ao povo em geral. Parece que a razão era que aqueles

que viram a Jesus foram constituídos como testemunhas diante das muitas pessoas que

não conseguiram vê-lo.”129

Lucas, também, mostra que por várias vezes Paulo também testemunhou e

pregou sobre a ressurreição de Jesus, entre os gentios. No sermão dele em Antioquia da

127
?
ver comentário do verso 19-20, em Marshall, Atos: introdução e comentário, 101-102.
128
Ibid, 107.
129
Ibid, 185.
66

Písidia, segue mais ou menos a mensagem de Pedro. Quanto à ressurreição diz: “Mas

Deus o ressuscitou dentre os mortos; e foi visto muitos dias pelos que, com ele,

subiram da Galiléia para Jerusalém, os quais são agora as suas testemunhas perante o

povo.” (Atos 13:30-31)

Um dos sermões mais interessantes de Paulo, foi o que ele pronunciou em

Atenas. Paulo estava na cidade pregando Jesus e a ressurreição, quando levantou a

curiosidade dos filósofos (At. 17:16-18). Estes o levaram para o Areópago, onde

embora não seguindo o mesmo modelo da maioria das pregações registradas em Atos,

anuncia a Jesus que foi ressuscitado (At. 17:31). Mais uma vez, é visto que o

testemunho histórico é usado, até mesmo, para um diálogo com aqueles que se baseiam

mais nas filosofias e na sabedoria deste mundo.

Poderia, ainda, ser citados outros textos, mas, estes são suficientes para o

mostrar como é que o cristianismo primitivo estava alicerçado no testemunho da

ressurreição de Cristo.

3 – 1Coríntios 15:3-11

Um dos documentos mais importantes que existem, acerca do testemunho

apostólico para a ressurreição de Jesus é o de Paulo em 1Co 15. Dois motivos fazem

com que seja assim: O primeiro, é que a nível histórico, como já foi visto anteriormente,

é que aqui, Paulo preserva uma tradição bem primitiva 130 do Evangelho cristão. O

segundo motivo, é a forma como Paulo usou a tradição e o testemunho para combater o
130
?
Josh McDowell, Ele Andou Entre Nós: Evidências do Jesus Histórico (São Paulo-SP: Ed. Candeia,
1995), 309.
67

erro doutrinário da igreja. Ele tinha consciência do grande valor que significava o

testemunho apostólico para a verdade cristã.131

Paulo após esclarecer a origem do seu Evangelho, “o que eu entreguei a vocês

foi o que também recebi”, introduz o Evangelho segundo a tradição recebida. Ele

apresenta o conteúdo desta por meio de quatro cláusulas introduzidas por ()132,

onde cada uma destas tem função de aposto, ou seja, de enumerar os pontos básicos

daquilo que tinha sido transmitido à igreja.

O primeiro apresenta a declaração da morte de Cristo e seu significado

teológico. O segundo, declara o fato de que Cristo foi sepultado. O que mostra que a

igreja primitiva não tinha dúvida sobre a realidade da morte de Cristo, e o sepultamento

é prova disto.133 O terceiro, declara que a igreja primitiva acreditava na ressurreição de

Jesus, mediante obra de Deus134, o que concorda com o testemunho dos sermões da

primeira parte de Atos. Interessante, é a forma de paralelismo que esta cláusula mantém

para com a primeira. Com estas palavras Paulo, também, faz uma identidade do Cristo

que morreu e com o Cristo que ressuscitou.135

A quarta cláusula, na verdade, é uma lista de testemunhas da ressurreição que

Paulo apresenta à igreja. Ele declara que Cristo foi visto 136: 1) por Pedro; 2) pelos doze;

131
Ver Ibid, 307-310.
132
Ver Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 82.
133
Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 165.

134
O verbo está no passivo.

135
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 81.
136

?
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 84-85; ver também,
discussão: Brown e Coenen, “Ressurreição”, s. t. “A ressurreição na teologia contemporânea”.
68

3) por mais de quinhentos irmãos, em que a maioria vive até agora, porém, alguns já

dormem; 4) por Tiago; 5) por todos os apóstolos; 6) por último por Paulo.

O verbo usado aqui é ().A história semântica de () é

distintiva, especialmente na LXX, embora o significado especial da palavra nas

declarações das aparições do Jesus ressurreto não podem ser derivadas diretamente

desta. Tem sido mostrado que na LXX, o termo pode significar a vinda de Deus a

alguém sem que este se torne visível. Mas, é sempre claro, no caso das aparições da

ressurreição, que o termo não significa meramente revelação de si mesmo como

presença, mas ser manifesto como presença visível. Com respeito a  () de Jesus

ressurreto para Paulo, este diz: "Eu tenho visto o Senhor" (1co 9:1). Nas narrativas da

tumba vazia, é feita a promessa que na Galiléia os discípulos iriam ver a Jesus ressurreto

(Mc 16:7; Mt 28:7,10); Em Jo 20:18,25, a testemunha tem visto a Jesus. Nas

declarações acerca das aparições visíveis de Jesus, "foi visto" é certamente sempre

relacionado a pessoas; de acordo com o entendimento do NT, este "vê" é real, e é

mostrado pelo fato de que o Jesus ressuscitado aparece em forma corporal, e que há uma

identidade pessoal entre o Jesus terreno com o Jesus ressuscitado. 137

Este testemunho é importante, porque, pelo que o contexto indica é o argumento

principal que Paulo usa para combater aqueles que não acreditavam na ressurreição dos

mortos. Um ponto importante a ser destacado aqui, é que Paulo escrevendo mais ou

menos a uns 22 anos após os fatos terem ocorrido, fala que daqueles mais de quinhentos

irmãos, a maioria ainda estavam vivos.

Com essas palavras, ele pôs em risco toda a sua credibilidade; pois o que escreveu era, com
efeito, um convite implícito a todos os que duvidavam de sua declaração poderem comprová-

137

?
Aqui, há divergências entre estudiosos sobre os limites entre a tradição e as próprias palavras de Paulo,
ver, Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 165-167
69

la, desde que a maioria das 500 testemunhas estava ainda viva para ser interrogada. No
mundo antigo não seria uma tarefa assim tão difícil entrar em contato com
algumas delas.138

Outro ponto a ser destacado, é que Paulo coloca-se, também, como testemunha

do Cristo ressuscitado, quando no final da lista diz: “e por último de todos, apareceu

também a mim”. Alguns dizem que Paulo refere-se à experiência dele no caminho de

Damasco e coloca assim, as aparições citadas no mesmo nível da visão que ele teve de

Jesus narrada em Atos 9:1-19a, 22:3-16 e 26:4-18.139 Esta experiência no caminho de

Damasco, foi “um encontro com o Jesus ressurreto”140. O “aparecimento ao próprio

Paulo não era simplesmente uma visão (cf. 1Co 12:4 – sic. “2Co 12:4”; 2Co 12:1) mas

sim, um encontro face a face com o Cristo ressurreto e glorificado”. 141 As únicas

alternativas reais para explicar esta conversão, é o agnosticismo, que não é uma solução,

ou então, “a aparição real de Jesus Cristo aos seus sentidos no caminho para Damasco,

que é a interpretação do próprio Paulo.” Nada “a não ser a certeza da realidade da

aparição de Jesus, poderia tê-lo convencido de que Jesus ressuscitou dentre os mortos, e

era, portanto, o Messias e o Filho de Deus.”142

C. A Validade do Testemunho Bíblico se não há Ressurreição

Depois de ter visto: 1) que o testemunho apostólico acerca de Jesus, e de modo

especial de sua ressurreição, é de suma importância para o Cristianismo. E que a

McDowell, Ele Andou Entre Nós: Evidências do Jesus Histórico, 309.


138

139
Ver Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 166; Clarence Tucker Craig, The Interpreter’s
Bible, vol 10 (New York: Abingdon, s.data), 220.
140
?
Ver Marshall, Atos: Introdução e Comentário, 161-166.
141
Brown e Coenen, “Ressurreição”, 2094.
142
Ibid, 303.
70

veracidade daquele implica na veracidade deste; 2) que não há motivos para negar a

existência do testemunho cristão desde o tempo primitivo da igreja, pois este foi

preservado em vários documentos. Portanto, o objetivo, agora, é mostrar que para Paulo

a negação da ressurreição dos mortos era um absurdo, pois implicaria na falsidade do

próprio cristianismo.

Paulo, depois de apresentar o Evangelho com uma ênfase, neste contexto, na

ressurreição de Jesus, onde apresenta uma lista de testemunhas desta, passa a contrapor

no verso 12 (, uma conjunção adversativa neste contexto) o que estava acontecendo na

igreja (Este verso já foi estudado, no capítulo anterior). Neste verso, Paulo aponta para a

contradição da posição de alguns crentes que estavam negando a ressurreição dos

mortos, dentro de um contexto de fé que não possibilita tal atitude. E para reforçar seu

argumento, Paulo leva a proposição, que nega a ressurreição dos mortos, às suas

consequências lógicas. E dentro destas consequências lógicas, há uma implicação que

pode ser dita assim: Não crer na doutrina da ressurreição dos mortos é comprometer a

veracidade do Cristianismo.

Para Paulo e para os primeiros cristãos, a ressurreição de Jesus não é um ato

isolado, mas sim, um evento que faz parte da ressurreição escatológica, na qual os

mortos em Cristo participarão. E é nesta relação de identidade, já estudada, que é

possível estabelecer a relação entre a doutrina da ressurreição dos mortos e a verdade

Cristã. Porque para Paulo, se não há ressurreição dos mortos, Cristo, também, não foi

ressuscitado. E isto é negar o próprio Evangelho, que significa por sua vez, negar a fé

cristã e o testemunho apostólico, bem como a pregação.

Paulo diz no verso 15, que uma das consequências da negação da ressurreição

dos mortos, é que sendo assim, ele e os demais pregadores do Evangelho, que “daquele
71

modo” estavam pregando, são falsas testemunhas. Em outras palavras, aqueles corintos

que negavam a ressurreição, estavam indiretamente dizendo, que Paulo estava

mentindo, ou na melhor das hipóteses, enganado. Se fosse verdade a não ressurreição

dos mortos, Paulo e os outros seriam comprovados como mentirosos. A negação da

ressurreição implica em considerar o caráter daquelas testemunhas da ressurreição,

como de má índole.

Ele usa o verbo (), e esta palavra “é freqüentemente

usada acerca de julgamentos morais relativos ao caráter, e transmite a idéia de

descoberta ou detecção”143 Este funciona como um verbo de ligação e portanto, a

expressão ()”falsas testemunhas de

Deus”144, é um predicativo que expressa a característica do caráter daqueles apóstolos.

“Tal falsa testemunha tornaria a mensagem um mito, uma composição humana que

surge de desejos humanos, e, ao mesmo tempo, estaria clamando que sua mensagem

era a palavra de Deus (Schlatter)”145

Eles seriam chamados falsas testemunhas, porque tem testemunhado, contra

Deus, que ele ressuscitou a Jesus, o que Ele não fez. Estavam dizendo que Deus fez uma

coisa que na verdade não fez. Se é certo (- ), ou seja, se é verdade

aquilo que os outros dizem que os mortos não ressuscitam.146

143
?
Fritz Rienecker e Cleon Rogers, Chave Linguística do Novo Testamento Grego (São Paulo-SP: Vida
Nova, 1985), 326.
144
Ibid, 326. O genitivo pode tanto ser objetivo “falsa testemunha de Deus”, como subjetiva “falsa
testemunha alegando provir de Deus”
145
Ibid, 326.
146
Morris, I Coríntios – Introdução e Comentário, 169.
72

Pelo o que Paulo diz, fica claro que a crença na ressurreição dos mortos está

intimamente ligada com a própria veracidade do cristianismo. Este é um dos motivos,

pelo qual um cristão autêntico e honesto não poderia descartar a doutrina da

ressurreição dos mortos, do modo que é pregada e entendida pelos cristãos primitivos.

Paulo, aqui, não concorda com a idéia de um cristianismo sem a crença na ressurreição.

Este argumento de Paulo, era pertinente, porque a doutrina da ressurreição dos mortos

está fundamentada sobre o testemunho de algo – que era crido até mesmo pelos que

negavam esta doutrina147 – a ressurreição de Jesus. Para a fé das igrejas cristãs nesta,

existem evidências, mais do que suficientes nas Epístolas do Novo Testamento.

Infere-se, destas Epístolas, que a crença na ressurreição prevalecia universalmente em tôdas as


Igrejas Cristãs, mesmo entre aquelas que estavam muito longe uma das outras, como por
exemplo, as da Galácia, Corinto e Roma. Esta mesma crença é encontrada em Igrejas que
Paulo não estabeleceu, assim como naquelas que foram fundadas por êle, pois, quando
escreveu a Carta aos Romanos, êle não havia estado em Roma ainda.148

Porém, negar a ressurreição, seria dizer que a fé daqueles cristãos primitivos, e

de nós contemporâneos é baseada num testemunho falso. Para Paulo negar a

ressurreição dos mortos, seria dizer que Pedro, que os doze, que aqueles mais de

quinhentos irmãos, que Tiago, que todos os apóstolos, e ele mesmo, estavam sendo

falsas testemunhas, e portanto, a igreja nasceu de uma falsa mensagem. A igreja seria

uma fraude, embora tenha bons ensinos morais.

Para concluir, acerca da essenciabilidade da ressurreição dos mortos, pode-se

dizer, de tudo o que foi estudado neste capítulo, que a fé nesta é indispensável para

manter a fé na veracidade do Cristianismo. E fica a seguinte pergunta, para muitas

pessoas de hoje: como é possível crer na reencarnação dos mortos, na imortalidade da


147
?
Candler, Verdade ou Mito - Evidências do Cristianismo, 67.
148
Ibid, 66.
73

alma, na ressurreição espiritual já realizada e ao mesmo tempo manter-se cristão

autêntico?
74

CAPÍTULO 3

INDISPENSABILIDADE DA DOUTRINA ÀS DEMAIS


DOUTRINAS CRISTÃS

A ressurreição dos mortos é uma das doutrinas cristãs, que se for negada, afeta

de forma significativa vários pontos doutrinários da igreja cristã, tal como é estabelecida

no Novo Testamento. Isto porque, a negação desta doutrina, implica, também, na

negação da ressurreição de Jesus, isto na visão de Paulo, como foi estudado. Porém, a

ressurreição de Cristo é uma questão bem mais ampla do que a própria ressurreição,

pois, não envolve somente esta, mas também, a natureza da fé cristã como um todo 149.

Portanto, neste capítulo, serão estudados alguns pontos doutrinários que seriam afetados

pela negação da ressurreição dos mortos.

A. Teologia: A Identidade e Obra de Deus

Um dos maiores problemas, que a teologia cristã tem enfrentado desde os

tempos mais antigos são as confusões causadas pela ambigüidade do termo Deus. É

mais do que provado que o homem é um ser religioso, não importando o grau de

civilização em que se encontra. Esta é uma tendência natural humana. Da qual surge os

vários conceitos de Divindade, unificados aparentemente no termo “Deus”. Porém, não


149

?
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 302.
75

basta acreditar no termo Deus, para o cristianismo é necessário crer naquele conceito

específico de Deus segundo as Escrituras, que se manifestou fenomenologicamente na

história humana.150

Deus, para o cristão, manifesta-se através de ações especiais, e muitas destas,

são aquelas coisas que o cristão chama de milagres. A Teologia Cristã é a ciência de

Deus e da relação entre Deus e o universo.

Como foi visto, anteriormente, muitos teólogos rejeitam a ressurreição de Jesus,

por que têm um conceito bem limitado de Deus, geralmente deísta ou panteísta. Porém

os primeiros cristãos saíram para o mundo com uma notícia sobre Deus. Isto num

contexto, onde o mundo daquela época era profundamente religioso. Onde havia a

crença em várias divindades, que se tornou clássica no politeísmo greco-romano. Além

disso, havia o culto ao Imperador. Havia várias religiões de mistério com características

esotéricas e espiritualistas. Também, havia adorações a forças ocultas, e uso de magia.

Haviam vários tipos de filosofias para explicar a vida humana, ora místicas ora cépticas.

E destacando-se de tudo isto havia, também, o monoteísmo judaico.151

Além de todas as características de Deus segundo os textos sagrados do

cristianismo, pode-se dizer que os primeiros cristãos anunciavam aos homens da época

em que viviam: “O Deus que Ressuscitou a Jesus dentre os mortos”

(- ). Não um

Deus qualquer, mas um que tinha características bem específicas, que era distinto dos

demais deuses daquele tempo. E por este fato, é que se pode dizer que a negação da

150
?
Ver Francis A.Schaeffer, O Deus Que Intervém (Brasília-DF: Refúgio, 1985), 101-103.

Ver Merrill C. Tenney, O Novo Testamento: Sua origem e análise (São Paulo-SP: Vida Nova, 1995),
151

95-109.
76

doutrina da ressurreição dos mortos envolve uma negação do conceito bíblico do Deus

Cristão.

Neste momento, é importante lembrar, que um estudo das Escrituras, por

teólogos, vai mostrar que Cristo, também, é descrito como autor de sua própria

ressurreição, que esta deu-se por Seu próprio poder. Pois Ele “falou de Si mesmo como

a ressurreição e a vida, Jo 11:25, declarou que tinha o poder de entregar a Sua vida e de

retomá-la, Jo 10:18, e até predisse que reedificaria o templo do Seu corpo, Jo 2:19-

21.”152 Porém, estes mesmos estudiosos, não podem negar que a ressurreição não foi

obra somente da pessoa de Jesus. Esta é uma questão da Teologia Sistemática, que

explica isto através do conceito teológico da Trindade. Berkhof diz:

Mas a ressurreição não foi uma realização unicamente de Cristo; Frequentemente é atribuída,
na Escritura, ao poder de Deus em geral, At. 2:24, 32; 3.26; 5:30; 1Co 6:14; Ef 1:20, ou, mais
particularmente, ao Pai, Rm 6:4; Gl 1.1; 1Pe 1.3. E se a ressurreição pode ser chamada obra de
Deus, segue-se que o Espírito Santo também agiu nela, pois todas as opera ad extra (obras
divinas externas à Trindade) são obras do trino Deus. Ademais, em Rm 8:11 isso também está
implicíto.153

Voltando, novamente, à negação da doutrina da ressurreição, certamente afetará

a concepção teológica da igreja primitiva, de que Deus operou esta obra na vida de

Cristo. Paulo, em 1Co 15:15, diz sobre a condição em que os apóstolos seriam

chamados de falsas testemunhas. Esta condição era a não ressurreição de Jesus. E o

motivo pelo qual seriam assim chamados, está na explicação dada por ele mesmo. O

qual usa um () explicativo (“porque”) em que diz “nós testemunhamos contra

Deus que Ele ressuscitou a Cristo”, o qual Ele não ressuscitou, se é verdade que os

mortos não ressuscitam. O que significaria, que os apóstolos seriam falsas testemunhas,

pois estavam mentindo porquanto pregavam que Deus fez algo que na verdade não fez.
152
?
Berkhof, Teologia Sistemática, 347.
153
?
Ibid, 347-348.
77

O inverso do que Paulo está dizendo aos corintos, conduz a uma verdade bíblica

fundamental: Deus é o sujeito da ressurreição de Jesus. Isto é visto nos sermões de

Atos, onde Paulo e demais apóstolos pregavam que Deus havia ressuscitado a Jesus

Cristo (e.g. Atos 2:24; 13:30). Negar a ressurreição seria negar o conceito apostólico de

Deus.

Este ato de Deus ressuscitar a Jesus, é visto nas Escrituras de uma forma muito

especial. Em que Deus passa a ser caracterizado por esta ação. Algo no NT chama a

atenção, para o fato de que a declaração “que ... ressuscitou”, onde Deus é o sujeito,

frequentemente ocorre nas Epistolas na forma de uma cláusula participial. E esta,

geralmente, é usada para estabelecer expressões. Em Rm 4:24, os Cristãos são descritos

por Paulo, como aqueles que crêem “naquele que ressuscitou a Jesus, nosso Senhor,

dentre os mortos” (-

), onde ressuscitou é um particípio. Isto

significa que os Cristãos confessam o Deus que ressuscitou Jesus dos mortos. Portanto,

aqui, Deus é caracterizado pela sua principal ação decisiva.154

O uso desta expressão indica uma alteração deliberada de um título divino na

forma de uma cláusula participial usada pelo Judaísmo: “O Deus que vivifica os

mortos”, no final da segunda benção do shemoneh ‘esrah (Paulo usa em Rm 4:17, cf.

2Co 1:9). Conforme, este estudioso, o Cristianismo Primitivo fez uma distinção entre si

mesmo e o Judaísmo, neste ponto. Aquele é distinto deste porque crê naquele que

ressuscitou a Jesus dos mortos. Ao passo que o título divino do Judaísmo refere a uma

154
?
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 87.
78

ação de Deus no futuro, o título Cristão significa que a ação escatológica de Deus já

tinha começado, em Jesus Cristo.155

De acordo com o que foi visto, sendo a mensagem evangélica uma proclamação

do que Deus fez ao ressuscitar a Cristo, pode-se concluir que a doutrina da ressurreição

dos mortos é essencial, pois é indispensável para a concepção bíblica de Deus, visto que

se relaciona com uma obra decisiva dEste, que O caracteriza historicamente na fé cristã.

B. Cristologia: Pessoa de Jesus Cristo

A pessoa de Jesus Cristo, desde o início foi alvo de várias interpretações. Houve

quem negasse sua divindade (Ebionismo), outros negaram sua humanidade

(Docetismo). Houve várias buscas do Jesus histórico, como também o reconhecimento

da impossibilidade de encontrar este. Adicionado a tudo isto, existem as várias

interpretações populares e religiosas de Jesus.156 Porém, estes geralmente ignoram que

os “fatos brutos a respeito de Jesus não falam por si mesmos. Exigem uma estrutura de

sentido para ser compreendidos. A pregação de Jesus como o Cristo ressurreto

influenciou a forma da história que foi narrada nos evangelhos.”157

O Novo Testamento fala sobre quem é Jesus. E pode-se ver que Jesus é

considerado como Cristo, Salvador, Senhor, Filho de Deus, et alii. E dentro disto, a

“ressurreição de Jesus é um elemento essencial de todo seu retrato. Ela pertence a sua

história e tem um lado fatual.”158 Para os primeiros cristãos o Jesus terreno e o Cristo
155
Ibid, 87-88.
156
Ver McDowell, Ele Andou Entre Nós: Evidências do Jesus Histórico, 351-367.
157
Carl E. Braaten, “A pessoa de Jesus Cristo”, em Dogmática Cristã, Volume 1 (São Leopoldo-RS:
Sinodal, 1990), 508.
158
Braaten, “A pessoa de Jesus Cristo”, 509.
79

ressurreto são a mesma pessoa. “A identidade pessoal de Jesus Cristo inclui tanto sua

existência terrena quanto seu modo de ser e agir como exaltado.”159

Por esta razão, a ressurreição assume um papel fundamental na estrutura

teológica da fé cristã quanto à pessoa de Jesus. Portanto, uma outra doutrina que seria

afetada pela não verdade da doutrina da ressurreição dos mortos, seria a Cristologia, no

aspecto da pessoa de Jesus. Paulo mostra isto, através de um raciocínio logicamente

válido, que diz: se não há ressurreição dos mortos, nem Cristo ressuscitou (1Co 15:13).

A teologia sistemática vê a ressurreição, como um estágio do estado de

exaltação de Cristo. É uma transição do estado de humilhação para o estado de

exaltação.160 De fato, este conceito de exaltação de Cristo estava presente no

pensamento dos primeiros cristãos da igreja primitiva, em que viam que a ressurreição

de Jesus estava intimamente ligada à natureza de sua morte, formando uma unidade que

se relaciona à Sua obra redentora no Reino de Deus, como o Cristo e Senhor.161 “A

ressurreição de Jesus foi um ato pelo qual Deus pôs fim a sua humilhação e o exaltou

acima de todos os inimigos da humanidade, um ato sem o qual nossa fé é vã (1Co

15:14)”162.

Um dos maiores problemas para os judeus, dos tempos de Jesus, era entender

que este era, de fato, o Messias, o Filho de Deus. Em resposta a isto, os primeiros

cristãos disseram que a ressurreição de Jesus foi uma obra de Deus, como sinal de que

deu sua aprovação àquele, no qual O exaltou. E isto pode ser visto, já no primeiro

159
Ibid, 509.
160
Berkhof, Teologia Sistemática, 347.

Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”; Ladd, Teologia do
161

Novo Testamento, 315.


162
Braaten, “A pessoa de Jesus Cristo”, 532.
80

sermão da igreja, em Atos 2, verso 22, onde Pedro apresenta Jesus como alguém que no

seu ministério terreno tinha dado provas de que tinha a aprovação de Deus, por meio de

milagres, maravilhas e sinais. Os judeus estavam cientes destes fatos, porém, tinham

interpretado de forma errada, e chegaram a atribuir estes poderes à obra de Belzebu (Lc

11:15)163.

Pedro, fazendo relação ao que disse no v. 22, passa a explicar a morte de Jesus,

culpando os judeus desta, embora esta estivesse sob os decretos divinos. Todavia, os

judeus estavam errados em suas interpretações acerca de Jesus, quando o mataram, pois

Deus o ressuscitou dentre os mortos. E no verso 24, um contraste, entre a atitude dos

judeus em relação a Cristo e às suas obras é feito por meio da menção de que este foi

ressuscitado por Deus.

Além de servir como selo do Pai aplicado à obra consumada de Cristo, a

ressurreição tinha um significado mais profundo. Pedro não procura provar a

ressurreição, mas, passa a explica-la em termos da necessidade lógica do cumprimento

das profecias vetero-testamentárias (cf. v. 24-35). E com base nesta explicação,

conclui: “Portanto, que todo Israel fique certo disto:164 Este Jesus, a quem vocês

crucificaram, Deus o fez Senhor e Cristo”165 (Atos 2:36 – NVI)

Para Pedro, a ressurreição foi um ato de Deus, que demonstrou que Jesus era o

Messias e Senhor. J. Stott falando sobre o significado da ressurreição em relação à obra

redentora realizada por Cristo, na cruz, explica a natureza daquela.

163
Marshall, Atos: introdução e comentário, 75.
164
?
 indica a fortaleza da conclusão.
165

?
Para uma maior discussão sobre o significado Senhor () e Cristo () ver Ladd, op. cit., 318-
322.
81

Por outras palavras, a ressurreição foi a inversão divina do veredicto humano. Foi, porém, mais
do que isso. Mediante a ressurreição Deus “glorificou” e “exaltou” a Jesus que havia morrido.
Promovendo-o ao lugar de suprema honra à sua direita, em cumprimento ao Salmo 110:1 e por
causa da realização da sua morte, Deus transformou ao Jesus crucificado e ressurreto em
“Senhor e Cristo” e em “Príncipe e Salvador”, dando-lhe autoridade para salvar os pecadores
concendo-lhes arrependimento, perdão e o Dom do Espírito.166

É bom esclarecer que o contexto indica que Deus não estabeleceu a Jesus,

como Senhor e Messias por meio da ressurreição, mas, que por causa de “ser Ele o

Messias (cf. 2:22; 10:38 e sgs.) que Jesus foi ressuscitado dentre os mortos, e foi

Alguém que já tinha o título de Senhor que foi conclamado a assentar-Se à destra de

Deus.”167 Caso contrário, ter-se-ia uma cristologia “adocionista”. Jesus, na verdade,

passou para um novo estágio de sua missão messiânica. 168

Alguns não concordam que poderia existir tão cedo no ceio da igreja, uma

cristologia tão avançada, porém existem evidências que tornam inconclusivas estas

objeções.169 De fato, o que fica claro, é que a idéia da ressurreição associada à exaltação

de Cristo está presente desde o primeiro sermão da igreja primitiva. 170 “O plano divino

levou Jesus, através do sofrimento, à exaltação como Salvador e Senhor” e a

“ressurreição deve ser entendida como sendo a glorificação de Jesus” e não “meramente

de uma revificação”, mas, sim, “uma ascensão para estar com Deus”171

E foi, justamente, o fato da ressurreição de Jesus não ter sido uma mera volta à

existência ordinária corporal terrena, do tipo da ressurreição de Lázaro, é que esta


166
John Stott, A Cruz de Cristo (São Paulo-SP: Ed. Vida, 1991), 28.
167
Marshall, Atos: introdução e comentário, 79-80.
168
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 318.

169
ver Ibid, 321-322.
170
?
Donald J. Goergen, O.P., The Death and Resurrection of Jesus, Volume 2: A Theology of Jesus
[http://www.op.org/don/resurr/default.htm], Outubro/2001.
171

?
Marshall, Atos: introdução e comentário, passim.
82

torna-se de grande valor para a concepção do novo estado de Cristo. Esta ressurreição

foi um “evento escatológico, a primícia da ressurreição escatológica. A ressurreição de

Jesus foi o aparecimento da vida eterna no meio da imortalidade.”172 Existe boa razão

para se crer que a ressurreição de Jesus foi o momento em que ocorreu a glorificação e

exaltação de Cristo.173

Portanto, negar a ressurreição dos mortos, seria negar a teologia Cristológica que

crê que Jesus está num estado de exaltação, como Messias e Senhor. Porém, não

somente a pessoa de Jesus Cristo seria afetada, mas, também a sua obra redentora, que

será estudada no tópico seguinte.

C. Soteriologia (Objetiva e Subjetiva): A Obra Redentora de Cristo 174

Não somente a pessoa de Cristo seria afetada pela negação da ressurreição dos

mortos, mas também, a obra salvadora de Deus, em Cristo Jesus. Pois se não há

ressurreição dos mortos, pode-se inferir que também não há salvação. Esta é a

conclusão lógica se for analisada sob a perspectiva da estrutura de pensamento do Novo

Testamento.

Não se pode perder de vista que a Teologia Reformada crê, biblicamente, que a

salvação se deu, eficazmente na morte de Jesus. Algumas observações sobre isto são as

seguintes

172
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 317.
173
Ibid, 317.
174
Berkhof, Teologia Sistemática, 415. Ele diz: “Há a mais íntima relação possível entre a cristologia e a
soteriologia. Alguns, como, por exemplo, Hodge, tratam de ambas sob o título comum de “Soteriologia”.
Neste caso, a cristologia se torna soteriologia objetiva, distinguindo-se da soteriologia subjetiva.”
83

A primeira é que Cristo morreu por nós, que é a concepção de que esta morte

tem uma conotação de altruísmo e de valor benéfico. “Ele a empreendeu por nossa

causa, não pela sua, e cria que através dela nos garantia um bem que não poderia ser

garantido de nenhum outro modo.”175

Segundo, Cristo morreu para conduzir-nos a Deus, ou seja, a morte de Cristo é

redentora, visa reconciliar o homem a Deus. E esta salvação é descrita de vários modos.

“Às vezes é concebida negativamente como redenção, perdão ou libertação. Outras

vezes é positiva – vida nova ou eterna, ou paz com Deus no gozo de seu favor e

comunhão.”176

Terceiro, Cristo morreu por nossos pecados, pois sendo estes o obstáculo que

impediam a salvação, necessariamente teriam que ser removidos, portanto, Cristo

“ocupou-se dos nossos pecados, ou os levou, na sua morte.”177

Quarto, Cristo sofreu a nossa morte, pois sendo a morte a consequência do

pecado, o Novo Testamento afirma que “Jesus Cristo, sendo sem pecado e não tendo

necessidade de morrer, sofreu a nossa morte, a morte que nossos pecados mereciam.”178

Porém, a morte de Cristo não teria nenhum significado se não tivesse acontecido

a ressurreição, assim como esta não teria nenhum valor se a cruz de Cristo não tivesse

tal natureza vista acima179. E esta idéia de relação entre a morte e a ressurreição de

Cristo, é vista no Novo Testamento.

175
?
Stott, A Cruz de Cristo, 54.
176
Ibid, 55.
177
Ibid, 55.
178
Ibid, 56.
179

?
Ibid, 28.
84

A ressurreição é importante em vários aspectos. É importante porque esta é uma

vindicação da morte de Jesus. A ressurreição abre a porta para a teologia da cruz, para

uma nova interpretação de morte de Jesus. Esta não significou que Deus abandonou a

Cristo.180 É importante, também, porque ratificou as obras e ensinos de Cristo.

É por meio da ressurreição de Jesus que Deus uma vez por todas identifica todo o ministério
terreno de Jesus como a obra dele que inaugura o reino de Deus pela sua pregação e ações, e
pelas sua palavras atos, redimi o homem e traz-lhe para dentro do reino de Deus. Deus
confirma pela ressurreição de Jesus que suas ações estavam sob a vontade de Deus, e
eram ações de Deus. 181

Além de assumir esta função em relação às obras, aos ensinos e à morte de

Jesus, pode-se dizer que não há teologia da redenção que possa ser completa sem incluir

a teologia da ressurreição.182 O evento da ressurreição de Jesus está associado com, e é

decisivo para, a ação redentora e alguns textos bíblicos comprovam isto. Em 2Co 5:15,

há um uso de , que pode ser associado para a ressurreição de Jesus, juntamente,

com a sua morte. Esta preposição indica uma ação para o bem de alguém. No texto de

Rm 8:34, ()Paulo faz a pergunta”Quem condenará

os cristãos?” E afirma, foi Cristo que morreu e que ressuscitou, e que foi exaltado e

intercede pelos crentes. Em Rm 4:25, existe uma clara declaração de que a ressurreição

de Jesus é diretamente associada com a ação redentora na justificação

(). A base da

justificação enquanto uma reconstituição da vida humana e existência como um todo


180
Goergen, O.P., The Death and Resurrection of Jesus, Volume 2: A Theology of Jesus.
181
?
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 99. "It is through the
raising of Jesus that God once and for all identified the whole earthly ministry of Jesus as the work of him
who inaugurates the kingdom of God by his preaching and actions, and by his words and acts redeems
men and brings them into the kingdom of God; God confirms by raising Jesus that his actions were
carried out under God's command, and were God's actions."; tradução minha.
182
?
Goergen, O.P., The Death and Resurrection of Jesus, Volume 2: A Theology of Jesus.
85

não é somente a morte de Jesus (expiatória), mas também, como o começo de uma nova

existência constituída por Deus, na ressurreição de Jesus Cristo. E é por isto, em Rm

10:9, a fé que Deus ressuscitou a Jesus, é associada à salvação. 183

No capítulo de Rm 6, a idéia de que a ressurreição não pode ser separada da

morte de Jesus, é vista no complexo de declarações acerca do batismo. Neste capítulo a

ressurreição é ligada à crucificação. A idéia de sepultamento (cf. 1Co 15:4) liga a cruz

com a ressurreição, fazendo uma identidade entre estas. E assim como a morte do velho

homem é relacionada com a cruz, a nova vida é relacionada com ressurreição de

Jesus.184

Em 1Co 15:12ss, Paulo fala das consequências lógicas da veracidade da

proposição de que não existe ressurreição dos mortos, que sendo verdadeira, por sua vez

é dizer que Cristo não ressuscitou. A consequência desastrosa disto, seria a de que o

evento da salvação não existiria.185 Seria negar o próprio kerygma, que é a proclamação

de fatos com seus significados teológicos, pelo qual os crentes são salvos (cf. 1Co 15:2).

No verso 17, é afirmado que os crentes ainda permaneceriam nos seus pecados

(- ), o que no

kerygma é anunciado como expiado pela morte de Cristo (cf. 1Co 15:3 – Cristo morreu

pelos nossos pecados). Enquanto que no verso 18, é dito que os que dormiram em

Cristo, ou seja os cristãos que já tinham morrido fisicamente, teriam perecido

().

183
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 94.
184
?
Ibid, 94.
185

?
Ibid, 96.
86

Paulo, certamente, tinha em mente, que se Cristo não ressuscitou, a morte dele

foi como a de qualquer outro, que estava sujeito ao salário do pecado, que é a morte.

“Cristo morto sem ressurreição, seria um Cristo condenado, não justificado. Como

poderia justificar outros?”186 E se Jesus permaneceu morto, “temos apenas duas

conclusões possíveis: ou ele não foi a pessoa sem pecado que todos pensaram que fosse

e sua morte marcou sua separação final de Deus; ou ele poderia não ter nenhum pecado

pessoal, mas sua tentativa de expiar o pecado do mundo com a própria morte não

encontrou a aprovação divina.”187

Quanto à situação dos mortos, estes continuariam sob o poder da morte. Delling

vê a questão da permanência nos pecados, e a perdição dos que dormiram em Cristo,

como complementares e que se interpretam uma à outra. A palavra que denota a

situação dos que dormiram em Cristo é () Esta pode denotar exclusão

da salvação (cf. Rm 2:12; 1Co 1:18; Fp 1:28). Em Cristo ( - ),

significa aqui, como frequentemente noutros lugares, que o destino de alguém é

decidido por meio do Cristo crucificado (e ressuscitado): aqueles que morreram,

confiantes na ação redentora de Deus, em Cristo. Se este não tivesse ressuscitado, os

crentes estariam sujeitos ao julgamento. O verso 17 enfatiza que estes continuariam sob

o poder do pecado, que seus destinos seriam determinados por seus pecados. Sem a

ressurreição de Cristo, não haveria reconstituição da vida e existência humana por Deus,

e toda a vida e existência do homem estaria continuamente implicada aqui. Libertação

da sujeição do pecado (ou pecados) é para Paulo, e no contexto da ação redentora de

Deus para o homem, inseparável do processo de uma nova vida.188


186
Morris, 1 Coríntios: introdução e comentário, 169.
187
Prior, A Mensagem de 1 Coríntios, 282-283.
188
Delling, “The Significance of the Resurrection of Jesus for Faith in Jesus Christ”, 98.
87

O resultado disto tudo, seria que a fé no Evangelho seria vazia, sem significado

assim, como seria, também, a pregação apostólica. Enfim, não acreditar na ressurreição

dos mortos seria crê no evangelho em vão. Sendo assim, não haveria salvação, pois o

evangelho que Paulo anunciou era o mesmo pelo qual os crentes estavam sendo salvos,

a não ser que estivessem crendo em vão, ver 1Co 15:1-2.

Concluindo, a doutrina da ressurreição dos mortos é essencial pois está

relacionada com a obra salvadora de Jesus. De forma que a negação desta, seria negar a

existência da salvação, em Cristo.

D. Pneumatologia: A Doutrina do Espírito Santo

Outra doutrina que seria afetada pela negação da ressurreição dos mortos, seria a

Pneumatologia, que se refere à pessoa e à obra do Espírito Santo.

Vários estudiosos do Novo Testamento que tem estudado a ressurreição de

Cristo e a natureza do corpo ressurreto tem verificado que o Espirito Santo tem um

papel fundamental na doutrina da ressurreição. Hoekema diz que “é dito do Espírito

que ele está ativo tanto na ressurreição de Cristo como na ressurreição dos crentes. No

que toca à ressurreição de Cristo, podemos notar a declaração de Geerhardus Vos: ‘É

pressuposto pelo Apóstolo, embora não expresso em palavras textuais, que Deus

ressuscitou a Jesus através do Espírito’.”189

Em Rm 1:3-4, há uma passagem que mostra, não explicita, mas explicitamente,

que o Espírito teve um papel ativo na a ressurreição de Jesus Cristo.

Porque, se a nova fase, pós-ressurreição, da filiação de Cristo, é vivida “segundo o


Espírito de santidade” então, certamente, esse mesmo Espírito de santidade tem de ter

189
Anthony Hoekema, A Bíblia e o Futuro (São Paulo-SP: CEP, 1989), 86.
88

de estado ativo com o fim de trazer Cristo para este novo estado. Se o Espírito sustenta
Cristo durante seu estado de exaltação, o Espírito também d eve ter inaugurado a
vida ressurreta de Cristo.190

O texto de Rm 8:11, também, fala do papel ativo do Espírito na ressurreição de

Cristo, “Se habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos,

esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificará também o vosso

corpo mortal, por meio do seu Espírito, que em vós habita.” (ARA). Nesta passagem o

Espírito tem um papel instrumental na ressurreição dos mortos. “Certamente, se os

crentes devem ser ressuscitados por meio do Espírito, deve ser correto inferir que o

Espírito também ressuscitou a Cristo dentre os mortos.”191

Um texto importante, que fala sobre o papel do Espírito Santo na ressurreição

dos mortos é 1Co 15:42ss, onde Paulo fala da natureza do corpo ressurreto em contraste

com o corpo atual dos crentes. O corpo presente é caracterizado pelos seguintes

atributos: corrupção192 (), desonra (), fraqueza

() e natural (). Porém, o corpo ressurreto é

caracterizado em contraste ao primeiro, por meio destes termos: incorrupção 193

(), glória (), poder () e espiritual

().194

Dentro deste contraste, é de fundamental importância para o entendimento do

modo de existência após a ressurreição, entender o conceito de corpo natural

190
Ibid, 87.
191
Ibid, 87.
192
Também traduzido por perecível.
193
Também traduzido por imperecível.
194
Para um maior estudo sobre este texto ver, Riderbous, Paul: An Outline of His Theology.
89

() e também o conceito de corpo espiritual

(). E para entender estes, é necessário elucidar o

significado deste contraste.

Pode-se talvez pensar que Paulo tinha em mente algum tipo de dualismo do tipo

grego platônico, ou semelhante, no qual o corpo presente e físico é de natureza ruim

enquanto que a vida espiritual não física é o ideal perfeito de vida.

A antropologia neo-testamentária não é a grega; se aproxima mais da judaica. Para os conceitos


de “corpo”, “alma”, “carne”, “espírito”, para não mencionar outros, os autores do Novo
Testamento se servem dos mesmos termos que os filósofos gregos. Porém estes conceitos
recebem uma significação totalmente distinta para os autores cristãos, e compreendemos
equivocadamente o Novo Testamento quando o interpretamos segundo o sentido grego. Muitos
dos mal-entendidos provém daqui.195

Semelhantemente, Riderbous rejeita a idéia de um dualismo platônico, e trata

deste texto à luz de um dualismo redentivo-histórico, no conceito paulino de primeiro e

segundo Adão. Para ele, Paulo coloca em contraste o primeiro Adão (corpo natural) e o

segundo Adão (corpo espiritual) não segundo a visão grega de dois modos de existência

contrários um ao outro. O contraste seria na verdade histórico-redentivo (cf. Rm 5:14 –

tipo-antitipo), onde Adão é o primeiro e Cristo o segundo na economia da redenção.196

Pode-se, também, entender o termo “corpo espiritual” como se referindo a um

corpo imaterial ou não-fisíco. Hoekema afirma em sua obra que com

() Paulo “não quer significar um corpo que seja não

material, mas, antes, um corpo que esteja, completamente, sob o controle do Espírito

Santo.”197 E acerca do significado de corpo espiritual, Ladd explica este dentro de um

contexto escatológico, elucidando o uso deste termo dentro do pensamento paulino.

195
Cullmann, Das Origens do Evangelho, 193; ver também, 191-197.
196
Riderbous, Paul: An Outline of His Theology, 543.
197
Hoekema, A Bíblia e o Futuro, 88-89.
90

o corpo espiritual será um corpo tão infundido com o Espírito de Deus que dá vida, que será
um corpo imperecível, glorioso, poderoso. Em outras palavras, o gozo total da vida do Espírito
resultará na própria transformação da ordem natural mortal da existência corporal, de modo
que a mortalidade, a fraqueza, serão exterminadas na plenitude da vida eterna. A perfeita
experiência do Espírito significará a redenção do corpo físico (Rm 8:23). É nesta base da
dádiva escatológica do Espírito Santo que Paulo interpreta a presente participação do
Espírito.198

Ao invés de interpretar corpo espiritual à luz de uma antropologia grega ou

espiritualista, a melhor forma de interpretar o conceito é vê este como um corpo que

esteja, completamente, sob controle do Espírito Santo. E interpretado desta maneira, é

sugerido que se traduza o adjetivo de 1Co 15:44, (), por inicial

maiúscula e não minúscula, para deixar claro que o estado da ressurreição é como “um

estado no qual Pneuma [Espírito] governa.”199

Sendo assim, “o Espírito Santo não está ativo apenas ao efetuar a ressurreição do

corpo, mas também continuará (ativo) a sustentar e dirigir o corpo ressurreto, depois da

ressurreição ter acontecido.”200

Conforme 2Co 3:18201, pode-se inferir que o Espírito é o “elo de ligação entre o

corpo presente e o corpo ressurreto.”202 Este último, vê a obra do Espírito Santo, que

renova no presente a vida dos crentes, como o inicio da ressurreição do corpo, descrita

em Paulo (2Co 3:18; 4:10, 11, 16, 17; Ef 5:14; Fp 3:10, 11).203

198
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 349.
199
Hoekema, A Bíblia e o Futuro, 89.
200
Ibid, 89.

Para uma discussão do significado deste texto vê comentário dos versos 17 e 18, em Colin Kruse, II
201

Coríntios: introdução e comentário (São Paulo-SP: Vida Nova, 1994), 106-109.


202
Ibid, 89.
203
Riderbous, Paul: An Outline of His Theology, 551. Para um estudo detalhado do relacionamento entre
a ressurreição e o Espírito Santo, vê todo o tópico (pgs. 537-551).
91

Portanto, diante de tudo o que foi dito acima, percebe-se que dentro do Novo

Testamento, existe uma relação fundamental entre a ressurreição dos mortos e a

doutrina do Espírito Santo. Negar a ressurreição seria negar a obra ativa deste na

ressurreição de Cristo e na futura ressurreição dos crentes.

E. Eclesiologia: A Autoridade Apostólica

Se os mortos não ressuscitam, outra doutrina que seria afetada seria a

Eclesiologia, pois o dom de apostolado, na igreja primitiva, estava intimamente

relacionado com a ressurreição de Jesus Cristo.

O termo apostolo tem um significado geral e um significado mais específico. No

significado específico se restringe a um grupo pequeno de homens. Os doze apóstolos

constituíam “um colegiado de líderes oficiais na igreja... mas parece claro que o círculo

dos apóstolos foi aumentado, para incluir outras pessoas determinadas, como Tiago, o

irmão de Jesus (Gál. 1:19), Andrônico e Júnias (Rm 16:7), possivelmente Silvano

(1Tess. 1:1; cf. At. 17:10), Barnabé e Paulo (At. 14:12,14).”204

Este ofício apostólico tem sido considerado como um ofício extraordinário da

igreja, ou seja, que existiu por um período limitado da história, sendo que o apóstolo

tinha “a incumbência especial de lançar os alicerces da igreja de todos os séculos.

Somente através da sua palavra é que os crentes de todas as eras subsequentes têm

comunhão com Jesus Cristo”205

204
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 357.
205

?
Berkhof, Teologia Sistemática, 589.
92

Um “apóstolo” tinha “a função básica de ser um delegado do Cristo ressurrecto,

indo como seu representante e em sua autoridade”, eram “chamados e incumbidos, por

ele, para, em sua autoridade, pregarem o evangelho e fundarem igrejas.” 206 Os apóstolos

eram pessoas especiais, que na visão de Paulo eram portadores de uma revelação, que é

uma “palavra dada por Deus, que descerra o significado da cruz e revela que um evento

histórico é que realmente é, a saber, a revelação da sabedoria e do poder de Deus.” 207

Isto não significaria que eles seriam um grupo especial e superior de surper-crentes

pois a “revelação concedida aos apóstolos e profetas – cf. Ef. 3:5 – não tinha como

propósito a criação de um círculo de elite de homens elevados acima das fileiras de

crentes; os apóstolos são recipientes da revelação, que eles, por sua vez,

demonstrarão.”208

Para a doutrina eclesiástica, o conceito acima de apostolado é de fundamental

importância para o entendimento de autoridade eclesiástica. O ofício de apóstolo, no

sentido do Novo Testamento, era dotado de uma autoridade divina, que os demais

homens não podem ter. O conhecimento de Deus na igreja, foi mediado através dos

apóstolos, o que excluiria todo e qualquer tipo de revelação estranha à deles. A palavra

que os apóstolos transmitiam como revelação, tinha tanta autoridade para a igreja, que

Paulo ao combater a heresia na igreja da Galácia diz: “Mas ainda que nós ou um anjo

dos céus pregue um evangelho diferente daquele que lhes pregamos, que seja

amaldiçoado! Como já dissemos, agora repito: se alguém lhes anuncia um evangelho

diferente daquele que já receberam, que seja amaldiçoado” (Gl 1:8-9 - ARA).

206
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 357.
207
Ibid, 361.
208
Ibid, 361.
93

Por isto, a doutrina da ressurreição dos mortos é importante, porque a sua

negação, também, colocaria em descredito toda a autoridade apostólica sobre a igreja.

Negar a ressurreição dos mortos, seria negar a ressurreição de Cristo, cuja consequência

lógica seria o que é dito em 1Co 15:15, os apóstolos seriam falsas testemunhas. Em

outras palavras seriam pessoas que não teriam um bom caráter e estariam usando de

uma mentira para legitimar a autoridade deles sobre a igreja.209

A veracidade da ressurreição dos mortos é crucial para o apostolado, pois para

que alguém fosse considerado deste modo, havia alguns requisitos importantes, o que

limitava o número de pessoas para tal ofício. Estas qualificações estabeleciam as

condições para o apostolado, e uma destas seria a condição de terem visto o Cristo

ressurreto, ou seja, de serem testemunhas oculares deste. E por uma destas razões, é

que Paulo reivindicava uma alta autoridade. “Sua experiência no caminho de Damasco

não apenas o fez reconhecer Jesus como o Messias ressuscitado e glorificado; ela

também conteve um chamado de Deus para uma missão particular.” 210 Em 1Co 9:1,

Paulo se considerava um apóstolo por ter visto a Jesus. Em Atos 1:21-22, o substituto de

Judas teria que ser uma das testemunhas oculares do Cristo ressurreto.211

Portanto, a negação da ressurreição dos mortos, implica em negar, também, o

apostolado que estava fundamentado no testemunho do Cristo ressuscitado. E desta

maneira afetaria a doutrina eclesiástica da igreja primitiva, bem como o entendimento

desta na igreja contemporânea.

209
Wayne S. Flory, “The Gnostic Gospel: A Review Article”, 251-257.
210
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 357.
211

?
Para uma discussão sobre o conceito técnico de apóstolo em Lucas ver, Marshall, Atos: introdução e
comentário, 66; 222; 224-225.
94

F. Escatologia: A Volta de Cristo na Consumação

A Escatologia é a doutrina das últimas coisas. Não é fácil separar a visão bíblica

da escatologia das outras doutrinas, pois são interdependentes. E por isto, muito do que

foi estudado nos tópicos anteriores tocaram em assuntos que dizem respeito também a

esta seção doutrinária da Teologia. Aqui será considerado a Escatologia de uma forma

geral, fundamentada na esperança da obra de Cristo.

A doutrina da ressurreição dos mortos é uma doutrina propriamente pertencente

ao campo maior da Escatologia. Diz respeito a um evento que ocorrerá na ocasião da

Segunda Vinda de Cristo. E por este motivo a Escatologia já é, automaticamente,

afetada pela negação daquela. Ou seja, a negação da ressurreição dos mortos já é uma

negação da doutrina Escatológica, isto porque fundamenta-se na identidade de Jesus,

como o Cristo que um dia voltará. Se “não podem ocorrer a ressurreição e ascensão

física de Jesus, não poderá haver o retorno físico de Cristo vindo do céu.”212

O Velho Testamento tinha uma esperança e “aguardava um redentor, de

maneiras diversas e pelo sentido de várias figuras, que deveria vir em algum tempo

futuro para redimir seu povo”213 e também, aos gentios. Vários elementos podem ser

identificados na esperança do VT: o Redentor vindouro; o Reino de Deus; a Nova

212
?
Berkhof, Teologia Sistemática, 355.
213
Hoekema, A Bíblia e o Futuro, 13.
95

Aliança; a Restauração de Israel; o Derramamento do Espírito; o Dia do Senhor; e os

Novos Céus e Nova Terra.214

Para o NT a era do cumprimento chegou em Cristo, embora não fosse um

cumprimento definitivo. A Ressurreição junto com o Pentecostes, formam “o sinal

supremo do Eschaton”, cf. At. 2; 1Co 15; et. alii.. A Ressurreição de Cristo não é

somente “um sinal que Deus concedeu a favor de Seu Filho, mas é a inauguração, a

entrada na história, dos tempos do Fim.” 215 No Novo Testamento, a Escatologia assumiu

características um pouco diferente da perspectiva do VT, porque embora a Era do

Cumprimento tenha chegado, ainda tem eventos decisivos para acontecer no futuro, no

Dia do Senhor, que é descrita na Segunda Vinda de Cristo. Isto mostra que existe um

elemento presente e um elemento futuro, existe uma escatologia realizada e uma

escatologia não realizada, é o Já e Ainda Não. E por isto existe uma tensão de duas eras,

a velha e a nova era vivendo simultaneamente. 216 Portanto no NT verifica-se que o

“Reino de Deus já está presente, a vida eterna já se realizou em princípio, o Espírito é

o penhor e as primícias da herança celestial, e os crentes já estão sentados nos lugares

celestiais com Cristo.”217 Mas no entanto, nenhuma destas realidades descritas como

presentes não terá sua realização plena até o Dia do Senhor. Abaixo um gráfico mostra o

esquema básico da Escatologia do Novo Testamento.218

214
Ibid, 19.
215

?
Ibid, 23.
216
Riderbous, Paul: An Outline of His Theology, 49-53.
217
Berkhof, Teologia Sistemática, 672.
218

?
Gordon D. Fee e Douglas Stuart, Entendes o que lês? (São Paulo-SP: Vida Nova, 1997), 119.
96

O CONCEITO ESCATOLÓGICO DO NOVO TESTAMENTO

O ESCHATON
Começada Consumada 
ESTA ERA
A ERA DO POVIR (nunca findará)
A Cruz e a A
Ressurreição Segunda Vinda
Já Ainda Não
Justiça Justiça completada
Paz Plena paz
Saúde Nenhuma enfermidade nem morte
O Espírito Com plenitude completa

Porém, se não há ressurreição dos mortos, a noção de cumprimento e de

inauguração dos últimos dias será comprometido, bem como os eventos da segunda

vinda de Cristo. Se Cristo não ressuscitou, não há Messias, nem segundo Adão e Nova

Criação e nem Reino de Deus. E o derramamento do Espírito foi no mínimo mal

interpretado pelos apóstolos, não fazendo nenhum sentido, sem a idéia da ressurreição,

cf. At.2.

Negando todo o esquema da visão escatológica do NT, é obvio que a

Escatologia Geral e a Individual seriam totalmente afetadas. Na Geral não faria sentido

em se falar de uma Segunda Vinda de Cristo, se este na verdade é somente o Jesus de

Nazaré, que continua morto, como os demais. E se não há Segunda Vinda, toda a

Escatologia do Novo Testamento é destruída, sobrando somente uma religião ética. E

para a Escatologia Individual, também, não sobraria nada, cairia por terra todo seu

significado, visto que não haveria uma ressurreição corporal dos crentes, tornando sem
97

sentido a idéia bíblica de imortalidade, sendo a morte o fim desta existência humana, o

salário do pecado.

Portanto, para aqueles que não crêem na ressurreição dos mortos, e ainda assim,

querem manter a fé cristã, teriam simplesmente um cristianismo deturpado sem suas

doutrinas primitivas e autênticas. O cristianismo passaria a ser no mínimo uma

alternativa, dentre vários outros sistemas religiosos, com sua moral exemplar. Sem

esperança de uma vitória final sobre o mal e a morte, o Cristianismo seria uma mera

ilusão.
98

CAPÍTULO 4

INDISPENSABILIDADE DA DOUTRINA PARA A PRÁTICA


CRISTÃ

Este capítulo tratará do aspecto prático da vida cristã, sob a perspectiva da

doutrina da ressurreição dos mortos. Esta doutrina tem uma implicação prática muito

grande. Se é verdade que os mortos não ressuscitam, a vida prática cristã é vazia e sem

propósito, porque a fé que guia esta vida é isto também.

A. O Efeito da Ressurreição na Vida dos Primeiros Cristãos

1. A motivação equivocada dos discípulos de Cristo

Observando os textos bíblicos, pode-se perceber que a esperança que motivava a

vida dos discípulos na companhia de Jesus Cristo, era equivocada. Os discípulos

estavam firmados na esperança do breve estabelecimento do Reino de Deus. Disputaram

sobre quem teria maior status neste (Mat. 18:1), sendo que a mãe de dois discípulos

tentou convencer Jesus a dar aos seus filhos lugares de preferência no Reino vindouro

(Mar. 10:37; Mat. 20:21). Até depois da ressurreição a idéia de reino teocrático terreno
99

para eles, ainda estava presente, “Senhor, é neste tempo que restauras o reino a Israel?”

(At. 1:6).219

A esperança de que Jesus fosse o Cristo, era a principal motivação que levou os

discípulos a seguirem-no e a perseverarem com ele, no meio de um contexto adverso e

de uma alta exigência do Mestre, quanto ao discipulado. O Novo Testamento diz que

eles, embora trabalhadores normais, passaram a consagrar a suas vidas a Cristo. Muitos

seguidores o abandonaram pelas suas duras palavras nas pregação (Jo 6:66), mas isto

não foi o caso do grupo dos doze, a quem Cristo fez a pergunta: “Porventura, quereis

também vós outros retirar-vos?” (Jo 6:67 - ARA), em cuja resposta Pedro interroga:

“Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras da vida eterna; e nós temos crido e

conhecido que tu és o Santo de Deus220” (Jo 6:68-69).

O que motivava o discipulado dos que estavam com Jesus, era a esperança de

que ele fosse o Messias, caso contrário não teriam seguido, nem permanecido com este.

Porém, esta motivação estava baseada numa visão incompleta da pessoa e obra de

Cristo.

2. O comportamento dos discípulos na morte de Cristo

Com uma esperança baseada, numa visão equivocada de Jesus como Messias221,

os discípulos não tiveram fundamento para entenderem e agirem adequadamente no

219
?
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 299.

, Porém alguns manuscritos: ; (Trad. na


220

NEG – la Bible nouvelle edition de Geneve); (trad. na Vulgata e Almeida


Corrigida); (Trad . na King James).

Para um maior estudo sobre as expectativas messiânicas do povo judeu ver: Mcdowell, Ele Andou
221

Entre Nós, 322-325.


100

contexto da morte daquele. Isto porque “a grande causa dos discípulos morreu na cruz.

Jesus certamente não cumpriu as expectativas messiânicas de seus discípulos”222

Vários textos mostram a reação negativa dos discípulos causada pela prisão e

morte de Cristo. A primeira atitude foi o medo e a fuga (Mc 14:50), porque estes

estavam “incapacitados de aceitar o sofrimento como um requisito para a messianidade

e para o discipulado”223. Em Lc 23:49, os seguidores de Cristo o observavam de longe.

Em Jo 19:26, há indícios de que pelo menos um discípulo presenciou a morte de Jesus.

Quando ele foi sepultado, não foi por seus seguidores mais próximos, mas por um

membro do sinédrio (Mc 15:43). O comportamento de Pedro, que dizia estar pronto a

morrer com Jesus, estava diferente e negou por três vezes ao Mestre. Longe de coragem

o que se pode perceber é um clima de medo (Jo 20:19).

Em suma, embora o comportamento dos discípulos após a morte não seja

explicitamente registrado nos Evangelhos, fica claro a reação expressa no medo de

sofrer o mesmo destino do mestre, e por isso não tiveram coragem suficiente de manter

suas identidade com o Cristo.

A morte de Jesus significou a morte de suas esperanças. A vinda do Reino fora um sonho
perdido, aprisionado no túmulo junto com o corpo de Jesus (Luc. 24:21). Muito embora Jesus
tivesse predito sua morte, a idéia de um Messias que morresse era estranha, e a idéia da função
que uma cruz poderia desempenhar na missão do Messias pareceu tão completamente alienada,
que a crucificação de Jesus poderia apenas significar uma desilusão para seus seguidores... Por
definição, o Messias deveria ser um rei em função de reinar, não um criminoso crucificado. 224

A morte de Jesus representou uma morte das esperanças dos discípulos, que

passaram a comportar-se medrosamente diante daquele contexto de adversidade.

Porém, houve uma mudança radical em poucos dias.

222
Ibid, 325.
223
Dewey M. Mulholland, Marcos: Introdução e Comentário (São Paulo-SP: Vida Nova, 1978), 218.
224
Ladd, Teologia do Novo Testamento, 300.
101

3. O comportamento dos discípulos pós-ressurreição

Quem lê o NT, atentamente, não poderá deixar despercebido a mudança radical

no comportamento dos discípulos, evidenciada a partir da primeira pregação da igreja

cristã (At 2).

Em poucos dias, no entanto, tudo isto mudou. Aqueles galileus desiludidos começaram a
proclamar um nova mensagem em Jerusalém. Afirmavam que Jesus era de fato o Messias (At.
2:36), que a sua morte tinha sido da vontade e do plano de Deus, muito embora fosse,
humanamente falando, um assassinato indesculpável (At. 2:23). Com ousadia, asseveraram que
aquele que os judeus tinham assassinado era o autor da vida (At 3:15), e que, através desse
Jesus crucificado, Deus não somente lhes ofereceria o arrependimento e o perdão dos pecados,
mas também cumpriria tudo o que havia prometido pelos profetas do Antigo Testamento (At.
3:21)225

Várias teorias tem sido dadas para explicar a transformação radical dos

discípulos, e estas prescindem da ressurreição histórica e física de Cristo. Porém,

nenhuma desta teorias tem sido conclusivas e adequadas em explicar o fenômeno da fé

cristã primitiva na ressurreição de Jesus. De fato, o que se pode constatar é que todo

aquele medo dos discípulos tinha cedido lugar para uma coragem e intrepidez que

somente poderia ser entendida à luz da ressurreição de Jesus 226. Embora o

derramamento do Espírito Santo seja fundamental, sobre a vida dos discípulos, o ponto

de partida da mudança do cenário da história foi a ressurreição.227

Portanto, a ressurreição de Jesus foi fundamental para a vida cristã daqueles seus

seguidores. De medrosos e ambiciosos passaram a um comportamento totalmente

diferente. Na tradição da igreja existem evidências do modo em que eles morreram em

prol de Cristo: Pedro, André, Tiago – filho de Alfeu, Filipe, Simão e Bartolomeu

225
Ibid, 300.

Ver, McDowell, Evidências Que Exigem Um Veredito, 291-322; ver também, Candler, Verdade ou
226

Mito? Evidências do Cristianismo, Cap. V, VI, VII e VIII.


227

?
Ver Ladd, Teologia do Novo Testamento, 300.
102

morreram crucificados; Mateus e Tiago, filho de Zebedeu, foram mortos pela espada;

Tiago, o irmão de Jesus, morreu apedrejado; Tadeu morto a flechadas; Tomé

transpassado com uma lança; e somente João com uma morte natural.228

Diante desta mudança de comportamento dos discípulos, pode-se afirmar que o

motivo principal que levou aqueles primeiros discípulos a tornarem-se,

verdadeiramente, cristãos, não foi uma fé existencial ou a busca de qualquer beneficio

terreno por parte de Deus, e nem a maravilhosa ética de Cristo. Pois, fica claro que se

este estivesse morto, não haveria razão para aqueles se tornarem cristãos. A ressurreição

foi decisiva para a prática cristã.

B. Sentido da Vida: Fé sem Ressurreição versus Fé com Ressurreição

Que diferença faz, para a vida prática da fé cristã, entre crer e não crer na

doutrina da ressurreição dos mortos? Para responder esta pergunta, lançar-se-á mão do

texto de 1Co 15, onde se pode afirmar que para Paulo a diferença é que quem não crê na

ressurreição dos mortos, necessariamente terá que reconhecer que sua vida religiosa

presente é inútil, sem propósito, ou seja, ilusória. Por outro lado, quem crer tem motivos

suficientes para viver a vida cristã, pois esta tem um propósito que não é em vão.

1. A inutilidade da vida cristã sem a fé na ressurreição

Observando todo o capítulo de 1Co 15, pode-se perceber que para Paulo, uma

vida cristã sem a doutrina da ressurreição dos mortos é uma ilusão, é inútil, é vazia e

sem propósito. Em outras palavras, não vale a pena ser cristão, ou pelo menos, não faz

diferença nenhuma, pois esta vida não faria sentido. E esta idéia é constatada,
228
McDowell, Ele Andou Entre Nós, 133.
103

principalmente pelo conceito enfatizado no texto, expresso por três palavras gregas:

(), ()e ().

Paulo faz uso de () em 1Co 15:2, onde está tratando da salvação obtida

por meio do Evangelho. Esta palavra é um advérbio que acompanha o verbo crer (no

texto ) e portanto se refere à fé daqueles crentes de corinto. O

advérbio pode ser traduzido por “sem causa”, “em vão, futilmente”, “sem propósito” 229.

Paulo fala da possibilidade de se ter uma fé sem propósito, ou seja, sem sentido. A

consequência lógica de uma fé sem a doutrina da ressurreição, levaria a uma fé que não

têm propósito, pois não se efetua em salvação.230

Porém, de uma forma mais clara, Paulo fala sobre a ilusão de uma vida cristã

sem a doutrina da ressurreição dos mortos, quando trata das consequências da negação

desta, onde usa os termos ()e ().

No verso 14  aparece duas vezes como predicativo de “nossa pregação”

() e junto com a expressão “vossa fé”

(). O termo () tem o significado básico de

“vazio”, e figuradamente conota “sem conteúdo, base, verdade ou poder”, “sem

resultado ou proveito”. No uso paulino desta palavra além de significar “aquilo que é

vazio, vaidade e nada” também serve para ressaltar “a falta de frutos, a ‘ineficácia’”, e

também, “emprega a palavra para sugerir que, em certas circunstâncias, certas coisas

seriam sem razão de ser, infrutíferas, ou até vãs.”231 Isto significa que não havendo

229
Gingrich e Danker, Léxico do NT Grego/Português, 64.
230
Fritz Rienecker e Cleon Rogers, Chave Linguística do Novo Testamento Grego, 325.

E. Tiedtke, “Vazio, Vão”, em C. Brown e L. Coenen, Dicionário Internacional de Teologia do Novo


231

Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova,2000), 2582.


104

ressurreição dos mortos, tanto a pregação apostólica e tanto a fé daqueles crentes, ou

seja, toda a vida religiosa deles seria em vão, sem razão de ser e sem nenhum propósito,

em outras palavras não faria sentido ser cristão.

No verso 17, Paulo novamente se refere à fé dos crentes de corinto

(), mas agora, com o predicativo (), que

significa “vazio”, “infrutífero”, “inútil”, “incapaz”, “sem valor”, “futil”232. É derivado

de (), “esforço vão”. É a mesma palavra usada pelos tradutores da LXX, para

“vaidade” em Eclesiastes, em que ocorre mais de 30 vezes. Aqui Paulo “descreve como

sendo vã uma fé que nega a realidade do Cristo ressuscitado. Ainda jaz no poder do

pecado.”233

Portanto, uma fé que não crer na doutrina da ressurreição dos mortos, para

Paulo, é uma fé vã, inútil, sem propósito que não faz sentido de ser. Isto porque

“retirando a ressurreição de Jesus, não há onde colocar a fé – somente o cadáver

putrefato de um carpinteiro judeu que havia se transformado em rabino itinerante.”234

Contudo se alguém que não crê na ressurreição dos mortos, ainda persistir em

ser cristão, é lógico, que teria que ter uma esperança em Cristo, limitada somente a esta

vida terrena. E assim ficam “entregues a um pseudo-evangelho que pretende pelo menos

dar algum significado à vida aqui na terra.”235, o que seria um existencialismo vazio.

Mas agir desta maneira, é para Paulo, em 1Co 15:19, ser o mais miserável ou o mais

digno de compaixão de todos os homens que existem na terra

232
Ibid, 2585.
233
Ibid, 2585.
234
?
Prior, A Mensagem de 1 Coríntios, 282.
235

?
Ibid, 283.
105

(). A idéia de miseráveis

vem de () que é uma das três palavras usadas para “misericórdia,

compaixão”, e especificamente refere-se ao sentimento de misericórdia, ao qual o verbo

desta, dá o sentido de “ajudar”. Traz uma conotação de dó, e também de uma emoção

que se desperta em contato com uma aflição que cai sobre outrém. Paulo aplica a idéia

de misericórdia, numa expressão comparativa, como predicativo daqueles cuja

esperança em Cristo se limita somente a esta vida. Estes são de todos os homens os mais

dignos de receberem ajuda, ou seja, misericórdia. É uma situação lastimável. 236 Refere-

se ao caráter de “homens iludidos que merecem piedade.”237

Concluindo, com base no que foi visto, não há motivo nenhum e nem faz sentido

continuar sendo cristão, se não se acredita na ressurreição dos mortos. Pois uma fé sem

fé nesta doutrina é uma fé destituída de razão. Porém, o contrário acontece com aquele

que tem fé que os mortos ressuscitam.

2. A motivação para a vida cristã na doutrina da ressurreição

Para compreender melhor a afirmação da ressurreição dos mortos e o sentido da

vida cristã para Paulo, é bom lembrar que este tendo sido um bom judeu, certamente,

teria em mente as Escrituras Sagradas do Velho Testamento 238. Sendo assim, pode-se

dizer que tinha uma resposta positiva para a pergunta existencialista e pertinente do

Pregador: “Que proveito tem o homem de todo o seu trabalho (mochthos), com que se

H.H.Esser, “Misericórdia, Compaixão”, em C. Brown e L. Coenen, Dicionário Internacional de


236

Teologia do Novo Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova,2000), 1294-1298.


237
Morris, 1Coríntios: Introdução e Comentário, 170.
238
Para um estudo de Paulo como um Judeu, ver Ladd, Teologia do Novo Testamento, 343-344.
106

afadiga debaixo do sol?” (Ec 1:3; 2:18ss)239 Também tinha, certamente, uma

compreensão, de que a “esperança escatológica”240 de Is 65:17-25, passagem com uma

reflexão semelhante à de Eclesiastes, já tinha começado a se tornar realidade, fazendo

com que as obras dos servos de Deus, não fossem em vão, verso 23

( - LXX). Paulo, também conhecia a

passagem de Isaias 40:30-31, onde está escrito que “até os jovens se cansam e se

fatigam (), e os moços de exaustos caem; mas os que esperam no SENHOR

renovam as suas forças (), sobem com asas como águias, correm e não se cansam,

caminham e não se fatigam”. Todas estas passagens do VT, refletem sobre o “fardo”, a

“labuta”, “a fadiga” das obras humanas à luz da esperança e do sentido de propósito. 241

E para a mentalidade cristã, a ressurreição e toda obra redentora de Cristo, sob os

decretos de Deus, é o que tornaria a vida essencial e não meramente existencial.

Em contraste a uma fé vazia que redunda em uma prática sem sentido,

fundamentada numa esperança limitada em Cristo, que na verdade é uma não-

esperança, Paulo apresenta um quadro bem diferente da vida cristã. Para ele a

ressurreição é uma verdade atestada e que é comprovada aos demais crentes, por meio

do seu testemunho e demais testemunhas oculares de Cristo. Para Paulo o fardo cristão

vale a pena ser levado adiante, ele diz: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes,

inabaláveis e sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso

trabalho não é vão.” (1Co 15:58 - ARA).

M. Seitz, H. G. Link, “Fardo”, em C. Brown e L. Coenen, Dicionário Internacional de Teologia do


239

Novo Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova,2000), 797.


240
?
Para maior informação sobre a escatologia do VT, ver Hoekema, A Bíblia e o Futuro, 9-20.
241
Seitz e Link, “Fardo”, 797-798.
107

Um assunto pertinente no final de 1Co 15, é a idéia de fardo cristão. Paulo

caracteriza este como algo que tem um propósito, e usa, novamente, a palavra

(), porém agora, como predicado negativo de “vosso trabalho”

(). O termo ()significa “trabalho, labor,

labuta” e que traz a idéia de “ferir”, “bater”, “aflição”, “dificuldade” ou “fadiga”. Indica

“o esgotamento que se segue após uso extenso de todas as forças da pessoa” 242. Paulo

emprega a palavra ‘trabalho’ com seu próprio sentido específico de trabalho no

Senhor243. Sendo contexto deste verso o assunto da doutrina da ressurreição dos mortos.

Este é a conclusão de toda exposição doutrinária, que é uma objeção e resposta aos que

negavam esta.

Por isto, com base no fato de que os mortos ressuscitam, e que Cristo

ressuscitou, é que há motivo para viver a vida cristã, que é caracterizada principalmente

pelo o exercício dos dons, com o fim de edificar da igreja, ver 1Co 12-14. O crente que

crer na ressurreição dos mortos, bem como em todo o kerygma, tem uma vida cristã

plena de significado, não é uma vida fútil, nem sem propósito. Assim é que “Edwards

fala da fé na ressurreição como produzindo ‘uma consciência de ilimitado e

interminável poder para agir’”244

E por ser uma vida cujo esforço não é em vão, vale a pena ser cristão, com toda

a dificuldade que isto acarreta. E é por isto, que Paulo estava morrendo diariamente na

obra do Senhor e não hesitava em se expor aos perigos a toda hora. No entanto, deve-

242
Rienecker e Rogers, Chave Linguística do Novo Testamento Grego, 325.
243
Seitz e Link, “Fardo”, 798.
244
Morris, 1Coríntios: Introdução e Comentário, 189.
108

se notar, que este comportamento não faria sentido se não houvesse ressurreição dos

mortos (1Co 15:30-32).

Concluindo, o crente, que crê na ressurreição dos mortos, tem motivo para

abundar na obra do Senhor, por que o esforço dele não é vazio ou sem propósito. A

vida cristã deste não é vaidade de vaidades.

C. O Significado da Doutrina para a Espiritualidade Cristã

A relação da doutrina da ressurreição com a doutrina da santificação poderia ter

sido estudada no capítulo anterior, mas por envolver o aspecto prático da vida do

cristão, foi preferível estudá-la neste capítulo que trata sobre a essenciabilidade da

doutrina da ressurreição dos mortos para a prática cristã. A santificação diz respeito à

espiritualidade verdadeira do cristão.

De várias maneiras, a santificação é a consideração mais importante para o cristão


agora, porque é o ponto em que estamos. É a porção presente da salvação, e neste sentido é a
consideração que interessa ao cristão agora. A justificação é de uma vez por todas; a
santificação é contínua, desde nossa aceitação de Cristo até o ponto da nossa
morte.245

Neste tópico, será abordado esta relação em dois aspectos. Primeiro, a doutrina

da ressurreição dos mortos e seu significado para “santificação definitiva”, como o

ponto de transição da vida em pecado para vida em santidade, por meio do Espírito.

Segundo, a ressurreição dos mortos e seu significado para a vida do aqui e agora do

crente. Se não há ressurreição de mortos, a vida prática de santificação do crente passa a

não fazer sentido algum.

245

?
Francis Shaeffer, Verdadeira Espiritualidade (São Paulo-SP: ECC, 1999), 98.
109

1. Santificação definitiva na ressurreição de Cristo

A doutrina da Ressurreição dos Mortos tem um significado importante para a

espiritualidade cristã, porque a Bíblia mostra, principalmente em Rm 6, que existe uma

relação entre a regeneração histórica do cristão e a morte-ressurreição histórica de

Cristo.

Primeiro, Cristo morreu na História. Segundo, Cristo ressurgiu na História. Terceiro, morremos
com Cristo na História quando o aceitamos como nosso Salvador. Quarto, seremos
ressuscitados na História, quando ele voltar. Quinto, devemos viver pela fé agora como se
estivéssemos mortos, como se já tivéssemos morrido. E sexto, devemos viver agora pela fé
como se já fôssemos ressuscitados.246

Pode-se completar o que foi dito acima, dizendo que a morte e ressurreição do

crente em Cristo é vista numa perspectiva redentiva-histórica, onde em Cristo, “o

corpo de pecado, a carne, o velho modo de existência do pecado” perdeu “seu domínio e

controle sobre aqueles que estão nele”. Na “morte e ressurreição de Cristo” os crentes

“tem sido transferidos a uma nova ordem de vida – a ordem de vida da nova criação, o

novo homem”247. Tudo isto significa que a ressurreição de Cristo afetou toda a realidade

histórica do tempo e do espaço.

E ao falar do momento desta união do cristão na morte e ressurreição de Cristo

deve-se “fazer justiça ao ensino bíblico” e por isso “enfatizar de igual modo” tanto “o

passado histórico”, quanto “o presente existencial”. O que significa que num “certo

sentido, nós morremos para o pecado e ressuscitamos para a nova vida, quando tendo

sido regenerados pelo Espírito Santo, aprendemos pela fé nossa unidade com Cristo em

sua morte e ressurreição”248 Em Rm 6 e em outros textos, percebe-se duas perspectivas

246
Ibid, 57.
247
Riderbous, Paul: An Outline of His Theology, 63.
248
Hoekema, Salvos Pela Graça (São Paulo-SP: ECC, 1997), 211.
110

da união do crente com Cristo: objetiva e subjetiva. A primeira em termos da morte e

ressurreição histórica de Jesus Cristo. A segunda em termos do momento de

regeneração do crente.

De fato, o que importa aqui, é que a ressurreição histórica de Cristo, juntamente

com sua morte, é vista como um elemento decisivo para a santificação do crente, que é

dita como sendo uma obra que é efetuada de forma definitiva.

O ensino bíblico sobre a santificação definitiva sugere que os crentes devam considerar a si
mesmos e uns aos outros como pessoas que morreram para o pecado e são agora novas pessoas
em Cristo. A novidade que os crentes têm em Cristo não é equivalente a uma perfeição
impecável; enquanto estiverem nesta presente vida, terão de lutar contra o pecado e, algumas
vezes, cairão em pecado.249

Portanto, a morte e ressurreição de Cristo para o cristão, significa o ponto de

transição para a nova vida, a vida de espiritualidade, no qual o cristão unido a Cristo

crucifica o velho homem e nasce no Espírito. Ressuscitar com Cristo é entrar em um

novo modo de existência. Se não houve ressurreição de Cristo, se os mortos não

ressuscitam, então não houve um ponto de partida, um início de uma nova criação bem

como a condenação da velha criação.

2. A Santificação Progressiva na ressurreição de Cristo

Além do aspecto definitivo a espiritualidade cristã, a santificação envolve um

aspecto progressivo e existencial. O “importante , depois de ter nascido espiritualmente,

é viver. Há o novo nascimento, e então há a vida para ser vivida. Essa é a área da

santificação, desde o tempo do novo nascimento, por toda a vida presente, até Jesus

249
Ibid, 212.
111

voltar ou até a morte.”250 É progressivo porque envolve luta e aperfeiçoamento em

relação ao pecado. É existencial porque envolve o aqui e agora constante da vida cristã.

E novamente, aqui, a ressurreição de Cristo, junto com sua morte, assume um

significado profundo para a prática cristã. Pois uma vez que Cristo deu início a uma

nova ordem de existência, o crente deve viver pela fé, na força do Espírito Santo, esta

nova realidade de vida.

O processo de santificação envolve duas partes: Uma negativa e outra positiva.

Que é a “mortificação do velho homem, o corpo de pecado” e a “vivificação do novo

homem, criado em Cristo Jesus para boas obras”.251

O aspecto negativo da espiritualidade cristã, é visto nas Escrituras quando o

crente é identificado com a morte de Cristo, cf. Rm 6:4a; Rm 6:6a; Gl 2:19b; e Gl

6:14. Como “cristãos, morremos com Cristo, à vista de Deus, quando nós o aceitamos

como Salvador” e ainda mais fica “evidente a exigência de que, na prática, devemos

morrer diariamente.”252 Para a nova criatura, existe um processo contínuo de negação

de tudo o que pertence à esfera da antiga ordem representada no primeiro Adão. É um

dizer NÃO para o eu, para o pecado e para o mundo. É levar a cruz e enfrentar um

mundo em que, ainda, reina o pecado. Isto porque uma vez morto para o pecado o

cristão deve viver realmente neste estado.253

Semelhantemente, o aspecto positivo é visto nas Escrituras, na identificação do

crente com a ressurreição de Cristo. O crente é descrito como morto para o pecado, mas

vivo para Deus. E este é o motivo para não andar em pecado. Como o pecado está
250
Francis Shaeffer, Verdadeira Espiritualidade, 15.
251
Berkhof, Teologia Sistemática, 537.
252
Shaeffer, Verdadeira Espiritualidade, 31.
253
Ibid, 31-44.
112

presente ainda em nossa vida, o crente necessita, com o auxílio do Espírito Santo

renovar-se e aperfeiçoar-se, ou seja, desenvolver esta nova vida de momento a

momento. O cristão pela fé deve viver interior e exterior, de fato, como uma nova

criatura.

O plano não é só estarmos mortos para certas coisas, mas termos muito amor para com Deus,
sermos vivos para com ele, estarmos em comunhão com ele, neste exato momento da História.
E nós deveremos amar as pessoas, ser vivos para com os indivíduos como pessoas, estar em
comunicação com nossos semelhantes num nível verdadeiramente pessoal, neste exato
momento da História.254

Diante de tudo isto, pode-se concluir que a doutrina da ressurreição é vital para a

prática cristã de santificação. Pois se não há ressurreição para um novo estado de vida,

não é possível entender o motivo da santificação, como algo pertencente a uma vida

cristã. Pois se Cristo não ressuscitou continuamos em nossos pecados, ou seja, não faz

sentido a mortificação do velho homem nem a vivificação do novo homem. Não há

motivo para progresso, pois não há nenhum alvo a ser atingido de forma real. A ética

cristã somente faz sentido à luz da obra de Cristo.

D. O Significado da Doutrina para o Luto Cristão

1. A vitória sobre a morte

A morte é uma dura e triste realidade que demonstra a corruptibilidade da

matéria do corpo humano, nesta existência atual da humanidade. Embora alguns

teólogos tem argumentado que a morte não é consequência do pecado e sim parte

natural da vida biológica, e.g. Celestius e Barth255, as evidência bíblicas são bem claras

254
Ibid, 29; ver também, 45-62.
255
113

em mostrar que a morte em geral, incluindo a morte física é consequência do pecado,

como juízo de Deus pela queda de Adão. Vários textos tanto do Velho como do Novo

Testamento, e.g. Gn. 2:16,17; 3:19, 22,23; Rm 5:12-21; 8:10; 1Co 15:21, leva à

conclusão de que existe uma “conexão necessária entre o pecado e a morte” 256 A morte

não é “algo natural na vida do homem”, nem “mera falha de um ideal”, mas como

“alheio e hostil à vida humana: é uma expressão da ira divina, Sl 90:7,11, um

julgamento, Rm 1:32, uma condenação, Rm 5:16, e uma maldição, Gl 3:13.”257 Deste

modo o Cristianismo a identifica como inimiga dos homens. A morte de forma alguma é

um bem, como tem sido vista por alguns pensadores gregos e modernos. Mas sim o

salário do pecado.

Porém, a doutrina da ressurreição dos mortos, significa que a morte já não tem

um valor negativo para a vida do crente, mas somente, para a vida do incrédulo. Pois a

ressurreição de Cristo foi a “confirmação e o anúncio da conquista” 258 sobre o mal,

incluindo a morte física, que Jesus efetuou na sua morte, cf. Hb 2:14-15. Por isto é que

Paulo é enfático em dizer, que sem ressurreição, estamos sob o pecado, e os mortos em

Cristo pereceram, cf. 1Co 15:17-18. Cristo morreu e ressuscitou, e ele não “redime seu

povo apenas do pecado; ele também o redime dos resultados do pecado, e a morte é um

destes”259.

?
Hoekema, A Bíblia e o Futuro, 106; cf. Paul Tillich, A Coragem de Ser (São Paulo-SP: Paz e Terra,
1976), 35.
256

?
Ibid, 110.
257
Berkhof, Teologia Sistemática, 676.
258
Stott, A Cruz de Cristo, 212.
259
Hoekema, A Bíblia e o Futuro, 111.
114

Portanto, na mensagem cristã de ressurreição existe um canto de vitória sobre o

poder da morte.

Porque é necessário que este corpo corruptível se revista da incorruptibilidade, e que o corpo
mortal se revista da imortalidade. E, quando este corpo corruptível se revestir de
incorruptibilidade, e o que é mortal se revestir de imortalidade, então, se cumprirá a palavra
que está escrita: Tragada foi a morte pela vitória. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está,
ó morte, o teu aguilhão? O aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei. Graças a
Deus, que nos dá a vitória por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo.(1Co 15:53-57)

Para o cristão, na obra redentora de Cristo, a morte assume outro significado, é

algo positivo. A morte significa para o crente um morrer definitivo para o pecado, uma

entrada para a presença de Deus, ficar livre dos atos pecaminosos, que na caminhada

terrena ainda são manifestos.260

2. A natureza do luto cristão

A morte, naturalmente, traz dor aos corações dos seres humanos e causa

lágrimas e choro, porque significa separação, final de existência corporal. Porém, diante

da dor da morte, o luto do cristão deve ser diferente da do homem que não têm

esperança, que é marcado pelo desespero.

Em 1Ts 4:13, Paulo instrui aos crentes acerca da situação dos mortos. O cristão

deve conhecer () o destino

dos que dormiram (), para não se entristecer

() como os demais. A palavra “entristecer”, vem de uma das palavras

gregas usadas para indicar a idéia de tristeza, lamentação, choro e gemido, porém, tem

um significado mais abrangente, expressando tanto a dor física como a dor emocional.

Como o verbo está no passivo, indica algo como “ficar magoado”.261


260
Ibid, 112.

H. Haarbeck e H. G. Link, em C. Brown e L. Coenen, Dicionário Internacional de Teologia do Novo


261

Testamento (São Paulo-SP: Vida Nova,2000), 1141.


115

A Bíblia não fala que o crente não pode chorar ou ficar triste, mas ela diz neste

texto de Paulo, que o cristão não tem motivo suficiente para ficar triste da mesma

forma () que os demais que não têm esperança

(). Quem são estes

demais? Observando o contexto literário e histórico da passagem, “os demais”

(), aqui, são os pagãos, cf. Ef. 2:3. A principal característica destes

é a falta de esperança. Estes não tinham “a certeza de uma vida após a morte” que

poderia ser “digna de ser chamada ‘vida’ e, portanto, de um reencontro entre os vivos e

os mortos”. Certamente, Paulo estava ciente da crença na imortalidade da alma, em

muitas religiões de mistério e em filosofias como a de Platão, mas mesmo assim,

parece que na verdade “não eram universalmente sustentadas, e provavelmente não

afetassem a maioria da população”. As evidências mostram que o desespero é o que

prevalecia, as “inscrições dos túmulos daqueles tempos contam uma história diferente

da esperança diante da morte, e o quadro da vida futura pintado por aqueles que

esperavam por ela geralmente estava longe de ser satisfatório.” O que Paulo fez foi dar

uma caracterização realista da falta de esperança do “pagão mediano” que só tinha uma

coisa a fazer: “era lamentar” 262.

A ressurreição significa que os mortos um dia voltarão à existência corporal. E o

motivo pelo qual os crentes não devem ser como os demais, com respeito aos mortos, é

que eles tem esta esperança. E esta é fundamentada no kerygma cristão, de que Jesus

morreu e ressuscitou, e que da mesma forma Deus, é poderoso, e no final irá trazer os

mortos de volta, com Cristo, cf. 1Ts. 4:18. Esta esperança não era uma filosofia, nem

262
Marshall, I e II Tessalonicenses: Introdução e Comentário (São Paulo-SP: Vida Nova, 1983), 146-147.
116

uma mistificação, nem especulações sobre a vida após a morte e sobre a imortalidade da

alma. Esta esperança é fundamentada em fatos concretos daquilo que aconteceu dentro

do tempo e espaço.

Portanto, no luto cristão, o choro e a dor de coração não pode ser caracterizada

pela falta de esperança, mas somente como reação psicológica pela perda e separação de

alguém querido. É necessário “distinguir entre o luto que lamenta a triste sorte de uma

pessoa que foi cortada do desfrutamento da vida e o luto que é devido ao rompimento

causado na sua própria vida pela perda de um ente-querido” 263. O cristão tem a

esperança que os demais não têm, e sabe que quando chora um dia será consolado, cf.

Mt. 5:4, e que um dia Deus lhe “enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não

existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram”

(Ap. 21:4 – ARA).

Ibid, 147.
263
117

CONCLUSÃO
Concluindo este trabalho, é necessário neste momento parar para refletir sobre a

relevância do tema abordado para a igreja de hoje. E primeiramente, é necessário

recordar, resumidamente, os principais pontos sobre o que foi dito sobre a

essenciabilidade da doutrina da ressurreição dos mortos para a fé cristã:

Primeiro: a doutrina da ressurreição dos mortos não pode ser vista como algo

separado da própria ressurreição de Jesus Cristo, que não é mera doutrina, mas fato

importante da religião cristã. Sendo assim esta é uma doutrina original da fé cristã, e

não mera especulação filosófica sobre o destino dos homens após a morte. Nem

também, é um acréscimo teológico por parte de alguns cristãos depois da era apostólica.

Segundo: É impossível conceber a veracidade do Cristianismo sem a doutrina da

ressurreição dos mortos. Pois a fé cristã não é uma religião abstrata baseada em

conceitos especulativos, mas sim, uma religião concreta que afeta a concepção de tempo

e espaço humano. O cristianismo tem seu fundamento no testemunho de vários

acontecimentos reais e não em meras mensagens e pressupostos teológicos. Dentre

estes eventos históricos, tem-se um fundamental, que é a ressurreição de Cristo, que

teria que ser negado, numa exclusão da doutrina da ressurreição dos mortos.

Terceiro: Praticamente, todo o corpo doutrinário da fé cristã, também, seria

afetado com uma negação da doutrina da ressurreição dos mortos, visto que a
118

ressurreição de Cristo estaria sendo negada também. Afetaria o conceito de Deus, de

Cristo e do Espírito Santo, bem como a obra divina de redenção do homem. O sistema

eclesiástico primitivo, tão fundamental para a concepção de revelação e autoridade

apostólica, também, seria comprometido. E por fim, toda a esperança escatológica cairia

por terra, tornando o cristianismo na piores das hipóteses num tipo derivado de uma fé

judaica, uma religião ainda sem um Messias verdadeiro.

Em quarto lugar, a doutrina da ressurreição negada, afetaria de forma radical a

prática cristã, que diz respeito ao momento presente existencial de cada crente que está

vivendo a vida cristã, que não é fácil. Pois, a ressurreição de Cristo e a esperança de ser

ressuscitado tem um papel fundamental na motivação vivencial cristã. É esta esperança

que torna o Cristianismo diferente de qualquer tipo de existencialismo, tão presente no

mundo religioso e secular. Um Cristianismo sem fé na ressurreição é uma religião do

ponto de vista prático sem sentido e inútil, sem nenhum propósito ulterior. E é esta

esperança que torna, também, diferente o luto cristão, onde a morte que era inimiga,

passa a ser um processo natural da vida cristã, rumo a salvação. Além de tudo isto, a

ressurreição afeta profundamente a realidade prática do crente, em sua espiritualidade

com Deus, transformando a natureza da realidade histórica, em que uma nova criação é

estabelecida nesta esfera fenomenológica, tendo implicação direta na vida de

santificação.

Portanto, uma vez que é demonstrado na Escritura, a palavra infalível de Deus,

que a doutrina da ressurreição dos mortos é essencial para a fé cristã, pode-se então

chegar à conclusão de que esta doutrina é bastante relevante para a igreja cristã hoje. E

com base nisto pode-se tirar várias implicações desta verdade para o contexto atual, que
119

confrontam várias linhas de pensamento teológicos hoje. Estar-se-á, portanto, neste

momento citando algumas destas implicações:

a) A fé cristã não se resume em princípios éticos.

Hoje, como foi estudado anteriormente, existem vários grupos cristãos que

acreditam que o cristianismo é meramente uma religião superior às demais, somente por

conter princípios e valores éticos elevados. E que o objetivo do cristão é seguir o

exemplo dado por Jesus, fazendo o bem ao próximo e à sociedade de um modo geral.

Porém, estes acreditam que isto é tudo o que o cristianismo tem de mais importante para

oferecer ao homem, não acreditam na revelação miraculosa de Deus, nem em milagres,

e consequentemente, nem na ressurreição dos mortos.

Porém os que reduzem o cristianismo a um sistema de ética, estão enganados,

pois foi mostrado que a doutrina da ressurreição dos mortos é essencial para esta

religião. Sendo portanto impossível conceber um cristianismo sem esta doutrina, como

foi mostrado anteriormente.

b) A fé cristã não crer noutro tipo de imortalidade humana, senão a da

ressurreição.

Muitos cristãos nunca pararam para pensar sobre a natureza da imortalidade

prometida pelo cristianismo aos seus fiéis. E por isto, imaginam vagamente o que seria

sobreviver após a morte, gerando muitas vezes conflitos teológicos, pois aderem crenças

incompatíveis com a fé cristã.


120

Em primeiro lugar, a doutrina da ressurreição dos mortos, para a fé cristã, não

significa meramente a existência eterna e necessária da alma após a sua morte, esta é a

conhecida doutrina da imortalidade da alma, tão defendida pela cultura grega antiga.

Em segundo lugar, também não é a crença na reencarnação da alma em vários

corpos. Todo o sistema espiritista cai por terra diante da doutrina da ressurreição dos

mortos. Gasta-se muito tempo desnecessário para refutar o Espiritismo, bem como a

doutrina da reencarnação da alma, perdendo-se em detalhes que em si não são

importantes, nem o cerne da questão. A ressurreição conforme é pregada no

cristianismo é golpe decisivo sobre o Espiritismo. E é a partir deste princípio é que se

deve compreender esta falsa religião. Porém, existem alguns cristãos, muitos nominais,

que acreditam na reencarnação da alma, e a estes pode-se dizer que estão equivocados, e

necessitam refletir sobre que tipo de fé eles estão tendo.

Em terceiro lugar, a doutrina não significa a ressurreição do corpo humano no

mesmo estado em que se encontra nesta vida presente. Não é simplesmente um voltar à

vida, mas sim, uma transição para um novo estado de existência corporal. A

ressurreição é somente o meio pelo qual Deus, trará de volta os que morreram. Os

crentes vivos na ocasião da segunda vinda de Cristo, não passarão pela ressurreição,

mas no entanto serão transformados para um corpo de glória. Muitos pensam que a

ressurreição cristã, é simplesmente a volta dos corpos mortos para esta existência

natural, e portanto, mostram que não compreenderam ainda a mensagem cristã, neste

aspecto.

Em quarto lugar, não significa aqui somente, a ressurreição dos mortos num

sentido espiritualizado, como consequência da união do crente com Cristo. Existem

grupos que pregam um tipo de escatologia realizada, e por isto entendem a ressurreição,
121

como a ressurreição do espírito em Deus. Mas o trabalho foi suficientemente claro para

mostrar que a Escritura crer numa ressurreição literal e não espiritualizada.

c) A fé cristã crer na salvação e no valor integral do homem.

Como foi estudado anteriormente, existe um tipo de pensamento filosófico e

teológico que vê o homem sob categorias dualistas, dividido numa alma e num corpo. E

estes tendem a valorizar a alma em detrimento do corpo. Atribuem à alma qualidades

divinas ao passo que ao corpo atribuem imperfeições infernais. E defendendo este tipo

de pensamento, existem várias manifestações religiosas. E a mais grave é a que ocorre

dentro do seio evangélico, que é por muitos chamado de gnosticismo protestante. Estes

são grupos evangélicos que por meio da prática e muitas vezes também no âmbito do

pensamento negam o valor do corpo, tendo uma fé mais docetista do que cristã. Muitos

cristãos demonstram em práticas ascéticas, ter um ódio a tudo que é relativo ao corpo,

vivendo hipocritamente uma religião espiritualista, baseada mais em experiências que

tocam somente a “alma” humana, que necessita elevar-se e encontrar-se com Deus.

Porém, este tipo de religião “gnóstica” e “espiritualista” é incompatível com a fé

cristã. A Bíblia, por meio da doutrina da ressurreição dos mortos, afirma que o homem

será salvo integralmente, corpo e alma, não somente está última. A doutrina da

depravação total do homem implica na imperfeição tanto de um com de outro, sendo

assim a alma não é pura, como muitos dizem. Tanto esta como o corpo, para serem

salvos necessitam, segundo a fé cristã, serem transformados, ou seja, vivificados.

d) A doutrina da ressurreição deve estar presente na pregação do

Evangelho.
122

Foi mostrado que os primeiros cristãos saíram para o mundo pregando sobre um

Deus que ressuscitou Cristo Jesus, e que também ressuscitará os que estiverem unidos

pela fé com Cristo Jesus. A maioria dos sermões registrados em Atos faz menção da

ressurreição de Jesus, não somente para judeus, mas para romanos e para gregos

também. Em outras palavras a ressurreição dos mortos, era parte essencial da pregação

evangelística dos primeiros cristãos.

Porém, hoje, o centro das atenções não tem sido muitas vezes os fatos básicos do

Evangelho, mas sim, bênçãos materiais que Deus pode dar aos seus filhos aqui na terra.

Hoje falar de céu ou inferno, de ressurreição para a vida ou para a morte, talvez não seja

tão atrativo e popular, como pregar bênçãos e maldições terrenas. Muitas igrejas tem

crescido de forma gigantesca, porém existem muitas pessoas dentro destas igrejas que

tem como motivação principal os bens materiais que Deus pode dar. Muitos se

aproximam de Deus, com a esperança de resolver problemas materiais, todavia, esta não

deveria ser a parte mais importante da fé, mas sim a consequência do amor de Deus. O

objetivo de Cristo aqui na terra não foi “abençoar” a vida terrena do crente, mas sim

salvar a sua vida, para viver em abundância no futuro reino.

Muitas igrejas ignoram a mensagem de salvação e perdição futura, para pregar

aquilo que o homem quer, em suas necessidades naturais. Pode-se tomar por exemplo, a

teologia da prosperidade, que prega uma fé onipotente, uma vida de “prosperidade”

terrena e gozo de saúde física. Quem é que não deseja isto? Porém pouco atrativo teria

aos homens “naturais”, um evangelho que prega a necessidade de morrer e ressuscitar

com Cristo, o que implica em renunciar o velho homem e viver o novo, abandonar

muitas vezes as riquezas, as relações sociais para viver a fé cristã.


123

Outras igrejas pregam um evangelho da experiência, do sentir-se bem

psicologicamente, como se a vida psicológica pudesse ocultar a realidade trágica do

pecado na vida do homem. As pessoas que se convertem a tal evangelho buscam

experiências místicas sem compromisso com a Palavra de Deus. Confundem fé com

sentimento, pensam “eu devo sentir algo por Deus senão alguma coisa vai errado

comigo”. Muitos aderem uma igreja, simplesmente porque é nesta igreja que se sentem

bem, muitas vezes deixam de frequentar uma igreja porque nesta não tem bateria, ou

uma equipe de louvor eficiente!

Vários exemplos podem ser dados para mostrar o como a pregação de hoje, em

muitos casos, tem ignorado o evangelho da morte e da ressurreição de Cristo, que exige

do homem compromisso de todo o coração e fidelidade a Deus. E neste evangelho a

doutrina da ressurreição implica logicamente em morrer para o pecado para viver a nova

vida ressurreta. Morrer é negar o “eu natural pecaminoso” e é negar o mundo com seus

valores contrários aos de Deus. Tudo isto significa que ressuscitar com Cristo é estar

sob a ira de Satanás. Tudo isto significa que o crente deverá também passar por

tribulações, que aos olhos do homem natural é um absurdo, mas que para o crente é

vista como parte da caminhada cristã que é nutrida pela esperança de salvação e vida

eterna, inclusive a ressurreição.

e) A fé cristã é uma fé de que o homem já vive a realidade da nova vida.

A doutrina da ressurreição não é mera teoria, pois Cristo ressuscitou e isto é um

fato. Isto significa que uma nova ordem de existência deu início em Cristo, e a Bíblia

fala de uma nova criação que irrompeu no meio da velha criação. E é neste raciocínio

que se pode entender a necessidade do crente viver esta realidade, em que não mais
124

reina o pecado para aqueles que estão em Cristo. É neste sentido que o crente já

ressuscitou com Cristo Jesus.

Esta ressurreição implica que viver uma vida sem santificação é viver uma vida

não cristã. O crente é nova criatura em Cristo para as boas obras. Por isto a fé

nominalista, que de boca confessa o cristianismo mas na vida diária nega-o, é uma fé vã

e inútil. Hoje existe inúmeros cristãos nominais, que não vivem a realidade da

ressurreição, negando a santificação na vida, e por isto devem refletir sobre sua fé, para

chegar à conclusão de que uma fé nominal não levará ninguém ao Céu, pelo contrário,

levará para o inferno. Pois sem mudança, sem transformação é impossível entrar no

Reino de Deus. E esta mudança só pode ser alcançada pela fé em Cristo Jesus cujo

resultado é morrer e ressuscitar com Cristo. O cristianismo não pode ser reduzido

somente ao seu aspecto ético, porém, este aspecto não pode ser retirado da vida cristã. A

salvação é pela graça, mas o homem em Cristo é nova criatura, está ressuscitado com

Cristo e vive uma nova realidade, que como foi dito, não reina mais o pecado.

Concluindo foi visto a relevância desta doutrina para a vida cristã dos dias

atuais. Que este estudo sobre a doutrina da ressurreição possa servir como uma

contribuição para o crescimento teológico da igreja, em sua busca de compreender cada

dia mais a fé cristã. Muito mais poderia ser dito neste trabalho, e também sobre o

assunto, como por exemplo um estudo da doutrina na história da igreja e de seus

desvios ao longo do tempo, ou então, um estudo sobre a natureza do corpo ressurreto,

ou ainda também, um estudo sobre a veracidade histórica da ressurreição de Cristo.

Porém, estes e outros temas fogem do escopo que este trabalho pretendeu, que é mostrar

ao leitor, que não se pode falar de um cristianismo autêntico sem a fé na ressurreição


125

dos mortos, mostrando que uma fé que nega explícita ou implicitamente a doutrina em

foco é “um outro evangelho” e não o de Deus.


126

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