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DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA

REVISTA
MARÍTIMA
BRASILEIRA
(Editada desde 1851)

v. 132 n. 01/03
jan./mar. 2012

FUNDADOR COLABORADOR BENEMÉRITO

Sabino Elói Pessoa Luiz Edmundo Brígido Bittencourt


Tenente da Marinha – Conselheiro do Império Vice-Almirante

R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 132 n. 01/03 p. 1-320 jan. / mar. 2012
A Revista Marítima Brasileira, a partir do 2o trimes-
tre de 2009, passou a adotar o Acordo Ortográfico de 1990,
com base no Vocabulário Ortográfico da Língua Portugue-
sa, editado pela Academia Brasileira de Letras – Decretos nos
6.583, 6.584 e 6.585, de 29 de setembro de 2008.

Revista Marítima Brasileira / Serviço de Documentação Geral da Marinha.


–– v. 1, n. 1, 1851 — Rio de Janeiro:
Ministério da Marinha, 1851 — v.: il. — Trimestral.

Editada pela Biblioteca da Marinha até 1943.


Irregular: 1851-80. –– ISSN 0034-9860.

1. M A R I N H A — Periódico (Brasil). I. Brasil. Serviço de Documentação


Geral da Marinha.

CDD — 359.00981 –– 359 .005


COMANDO DA MARINHA
Almirante de Esquadra Julio Soares de Moura Neto

SECRETARIA-GERAL DA MARINHA
Almirante de Esquadra Eduardo Monteiro Lopes

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA


Vice-Almirante (Refo -EN) Armando de Senna Bittencourt

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA


Corpo Editorial
Capitão de Mar e Guerra (Refo) Milton Sergio Silva Corrêa (Diretor)
Capitão de Mar e Guerra (RM1) Carlos Marcello Ramos e Silva
Jornalista Deolinda Oliveira Monteiro
Jornalista Manuel Carlos Corgo Ferreira

Diagramação
Artífice de Artes Gráficas Celso França Antunes

Assinatura/Distribuição
Terceiro-Sargento-RM1-ES Mário Fernando Alves Pereira
Cabo-PD Franklin Marinho de Castro
Artífice de Artes Gráficas Celso França Antunes

Departamento de Publicações e Divulgação


Primeiro-Tenente (RM2-T) Luiz Cesário da Silveira do Nascimento

Apoio Administrativo e Expedição


Suboficial-CN Maurício Oliveira de Rezende
Suboficial-MT João Humberto de Oliveira
Segundo-Sargento-SI José Alexandre da Silva
Cabo-DA Mariana Rodrigues de Souza
Artífice de Artes Gráficas Ilda Lopes Martins

Impressão / Tiragem
Mangava Comércio Ltda / 8.400
A REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA é uma publicação oficial da MARINHA DO BRASIL desde
1851, sendo editada trimestralmente pela DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMEN-
TAÇÃO DA MARINHA. A opinião emitida em artigo é de exclusiva responsabilidade de seu autor, não
refletindo o pensamento oficial da MARINHA. As matérias publicadas podem ser reproduzidas. Solicitamos,
entretanto, a citação da fonte.

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for do exterior, por vale postal
Editorial
VALIOSO LEGADO

Há 161 anos, a Revista Marítima Brasileira (RMB) surgiu no ce-


nário nacional – uma publicação com oito páginas, materializando dese-
jo de um ministro e alguns oficiais, representando toda uma categoria –
para prestar relevante serviço.
“À Armada fazemos especial apelo, na sua inteligência está a espe-
rança, e de seus esforços dependem os destinos do País, sobre os quais
exercerá a Marinha poderosa e irresistível influência. E a todos os brasi-
leiros nos dirigimos também, porque a todos interessa o progresso da
Marinha, tanto Mercante como de Guerra, ambas elementos perduráveis
de grandeza e prosperidade.”
Desde então, foi mantido o programa definido por Sabino Elói Pes-
soa, fundador da Revista Marítima Brasileira, com pequenas variações,
fruto de tradição e perseverança dos editores, autores e colaboradores.
Reflexões publicadas em importantes artigos, teses apresentadas,
invenções divulgadas, traduções e adaptações trazidas, notícias registradas,
que induzem à pesquisa e apoiam trabalhos pessoais ou acadêmicos.
E assim continuamos... buscando contribuir para o pensamento ade-
quado à grandeza e à prosperidade.
Os anos passaram, e eis que fomos reconhecidos com a inclusão
no Qualis/Capes (sistema de avaliação de periódicos mantido pela
Coordenação de Aperfeiçoamento e Pessoal de Nível Superior no
Brasil), que nos considerou como periódico qualificado para servir de
fonte aos alunos de cursos de graduação e pós-graduação.
Este reconhecimento muito nos honra, porque fomos avaliados nas
áreas de ciência política, relações internacionais, engenharia, ciências
biológicas, história, direito, zootecnia e recursos pesqueiros.
Cabe agradecer aos nossos articulistas, colaboradores e assinan-
tes, que, por seu prestígio e auxílio, são os maiores responsáveis pelo
reconhecimento ora obtido pela RMB.
Revista Navigator

A Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha publica, além da


Revista Marítima Brasileira, a Revista Navigator.
A finalidade da Navigator é estimular a produção de subsídios para a História Ma-
rítima Brasileira. É uma revista de qualidade reconhecida pela Coordenação de Aperfeiçoa-
mento de Pessoal de Nível Superior (Capes) do Ministério da Educação, o que incentiva a
participação de pesquisadores e professores de universidades, que publicam artigos, con-
tribuindo para a disseminação da consciência marítima no País.
A Navigator é semestral, e a assinatura custa R$ 18,00 por ano.

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SUMÁRIO

5 EDITORIAL – VALIOSO LEGADO

6 REVISTA NAVIGATOR

10 NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS


Mucio Piragibe Ribeiro de Bakker – Contra-Almirante (Refo)
O uso do mar. As origens: navegação e pesca. Oceanografia – conhecimento sistemático
– as expedições – fins militares. Fonte de riquezas – política e ciência. O esforço da Marinha.
Perspectivas – Fundação Oceano

44 PRÊMIO REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA – AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO


DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS
Alvaro Augusto Dias Monteiro – Almirante de Esquadra (RM1-FN)
Conceito doutrinário – pensamento militar. Cerceamento da iniciativa pela doutrina
prejudicando o pensar, o intuir. A arte e a ciência da guerra. Influência da tecnologia

59 VISITANDO A ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA – ESG, A TODO PANO!


Wilson Pereira de Lima Filho – Contra-Almirante
A nova ESG – seus cursos. Fórum democrático e aberto ao debate. Quadros de ex-
comandantes e assistentes da Marinha

73 O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte 1


Paulo Rui de Menezes Capetti – Capitão de Mar e Guerra
Evolução da abordagem logística – tipos de obtenção. Sistemas de defesa

86 ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO


ATLÂNTICO SUL
Eduardo Italo Pesce – Professor
Considerações estratégicas. Áreas de interesse para o Brasil. Uma Marinha para o
Atlântico Sul. A cooperação marítima regional

96 O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)


René Vogt – Engenheiro
Planejamento e processos de aquisição. Futuros navios: fragata, patrulha oceânico, apoio
logístico. A descontinuidade dos programas de construção. Custos dos ciclos de vida

114 A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO


Sylvio dos Santos Val – Professor
Ciclos tecnológicos. Aviação naval – implantação, tecnologia. A montadora no Galeão.
O debate sobre a aviação

123 SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO


NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES
João Cesar Soares – Engenheiro
Isaac José Antonio Luquetti dos Santos – Engenheiro
Estrutura metodológica. Análise do trabalho em espaço confinado. Identificação de ações
humanas com pouca segurança
136 O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO
Jonas Soares dos Santos Filho – Advogado
Aspectos institucionais – regulamentação. Papel da Antaq – nas instalações portuárias
e na navegação marítima, de apoio e interior

145 A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA


FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS NA MARINHA DO BRASIL
Nelson Márcio Romaneli de Almeida – Capitão de Fragata (IM)
Aspectos conceituais. Análise das avaliações na Marinha portuguesa, no Ministério do
Planejamento e na Marinha do Brasil

157 O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER


UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE FN EM UMA OPERAÇÂO DE PAZ
Alberto Rodrigues Mesquita Junior – Capitão de Fragata (FN)
Preparação logística para a missão: abastecimento, manutenção, salvamento, saúde,
recursos humanos, transporte, engenharia. Providências na chegada à área de operações.
Manutenção da capacidade operativa. Inspeções da ONU

173 REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO


DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL
Regina Boanerges Siqueira – Capitão de Fragata (T)
As redes de bibliotecas universitárias e militares. Integrações das bibliotecas na Marinha
e no Exército. Rede no Ministério da Defesa. Suporte ao ensino

180 TERRORISMO MARÍTIMO


Alexandre Arthur Cavalcante Simioni – Capitão de Corveta (FN)
Principais ataques a ameaças no mar. Utilização de equipamentos e tecnologias.
Organizações terroristas. Sequestro. Regiões mais vulneráveis. Combate ao terrorismo

205 O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO


ATUAL
Marilene Lima Ferreira Espíndola – Capitão de Corveta (T)
Evolução do pensamento com valores antigos sobre a liderança. Processo de capacitação.
A ética

213 ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA


METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS DOS ÓRGÃOS DO PODER
EXECUTIVO FEDERAL
Stella Regina Reis da Costa – Professora Doutora
Jeison de Melo Fajardo – Capitão-Tenente (IM)
Conceituação. Princípios da boa governança. O setor público e seus elementos

220 ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE


NAVIO DEVIDO A CORROSÃO
Thyago de Lellys Faria Monção – Capitão-Tenente (RM2-QC-CA)
Histórico de avarias – pesquisa – análise. Coleta de dados e inspeções
228 ARTIGOS AVULSOS
228 INDÚSTRIA BRASILEIRA DE CONSTRUÇÃO NAVAL: UM ESTUDO
COMPARATIVO DE QUATRO CASOS
Renato Santiago Quintal – Capitão-Tenente (IM)
Leonardo Portugal Bercello – Analista
Robson Augusto Dainez Conde – Auditor-Fiscal
Luiz da Costa Laurencel – Diretor e Professor
Investigação do nível de internacionalização de empresas do setor naval e impactos nos
seus sistemas de controle de gestão. Aplicação de questionário e análise das respostas das
empresas filiadas ao Sinaval

229 A IMPORTÂNCIA DO SETOR DE COMPRAS NA QUALIDADE DO


SERVIÇO AOS CLIENTES INTERNO E EXTERNO
Esley Rodrigues de Jesus – Segundo-Tenente (FN)
Necessidade de aperfeiçoar o processo de tomada de decisão dos ordenadores de
despesas. Bem qualificar o setor para melhor negociação – utilizar indicadores econômicos.
Melhorar planejamento

229 A ATUAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NO BRASIL


Rozalina Tady de Mattos de Souza – Servidora Pública Federal
Análise de atuação. Falta de autonomia para edição de normas. Abusos cometidos pelas
agências no exercício de suas atribuições delegadas pelo Estado

230 NECROLÓGIO

241 CARTAS DOS LEITORES


Correspondência do Vice-Almirante Luiz Edmundo Brígido Bittencourt sobre a Força
de Minagem e Varredura
Correspondência do Capitão de Mar e Guerra Ronald dos Santos Santiago sobre o
desenvolvimento das embarcações ao longo dos séculos, até os nossos dias

249 DOAÇÕES À DPHDM

252 ACONTECEU HÁ CEM ANOS


Seleção de matérias publicadas na RMB há um século. O que acontecia em nossa
Marinha, no País e em outras partes do mundo

265 REVISTA DE REVISTAS


Sinopses de matérias selecionadas em mais de meia centena de publicações recebidas do
Brasil e do exterior

272 NOTICIÁRIO MARÍTIMO


Coletânea de notícias mais significativas da Marinha do Brasil e de outras Marinhas,
incluída a Mercante, e assuntos de interesse da comunidade marítima
NOSSA CAPA

O MAR E SEUS RECURSOS


“La mer, la mer toujours recommencée...”
Paul Valéry

MUCIO PIRAGIBE RIBEIRO DE BAKKER


Contra-Almirante (Refo)

SUMÁRIO

Apresentação
Introdução
O uso do mar: um panorama histórico
Os interesses iniciais: a navegação e a pesca
A origem da Oceanografia: navegação e correntes marítimas
O conhecimento sistemático do mar: as expedições oceanográficas
As consequências econômicas da Oceanografia para fins militares
O mar como fonte de riquezas: as possibilidades de hoje
Os recursos do mar: seus aspectos principais
Os recursos vivos: a pesca e a maricultura
Os recursos minerais: o petróleo, outros minerais e
os nódulos polimetálicos
Os recursos energéticos
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

Os recursos do mar no Brasil: o horizonte político e técnico-científico


As limitações existentes
O novo Direito do Mar: a delimitação da margem continental. Os
recursos biológicos da Zona Econômica Exclusiva (ZEE)
A Política Nacional para os Recursos do Mar: uma tentativa de
eliminação de carências
A Marinha do Brasil: o esforço inicial
Os requisitos básicos
Considerações finais
As perspectivas do futuro
A participação do Brasil
O papel da Marinha
Uma instituição nacional para os oceanos
O uso do mar: um imperativo de sobrevivência
ANEXOS:
A – Os principais organismos e pesquisa no mar em oito países
B – Ideias sobre a atuação futura do Brasil no Atlântico Sul
C – Uma instituição para o Brasil: a Fundação Oceano, incluindo
um anteprojeto para o seu estatuto
D – O Brasil e o oceano: em busca de uma atuação consistente

APRESENTAÇÃO INTRODUÇÃO

E ste trabalho representa um esforço no


sentido de enfatizar a importância de se
preparar o Brasil para os desafios deste sécu-
Novamente, ao escrevermos sobre o mar
como fonte de riquezas, voltamos a insistir
na necessidade de se atribuir maior priori-
lo, entre os quais se inserem, indubitavelmente, dade à atuação nacional no setor dos recur-
a explotação dos recursos dos oceanos. sos do mar, tanto para permitir que os recur-
As perspectivas de emprego nos ocea- sos existentes na área marítima brasileira, a
nos da tecnologia que rompeu o átomo e curto prazo, possam ser integrados à vida
criou a Física Nuclear, da tecnologia espa- econômica e social do País, a exemplo do
cial e de satélites, da bioengenharia, da que vem ocorrendo com a explotação de
microeletrônica e da informática, da hidrocarbonetos na Plataforma Continental,
nanotecnologia e da robótica, sem dúvida, como também para preparar o Brasil para os
irão incentivar uma “Revolução Marítima” grandes desafios do futuro, dentre os quais
que, provavelmente, transformará as soci- o uso do mar se sobressai, provavelmente,
edades industriais e afetará sensivelmente como o maior e o mais significativo.
as relações entre as nações desenvolvidas Nos anexos, incluímos uma relação das
e as em processo de desenvolvimento. mais importantes organizações responsá-
Urge, portanto, que o Brasil retome as veis pelas atividades de pesquisa no mar
suas características de nação marítima, de oito países, em três continentes; uma
consequência natural de sua posição geo- cópia das notas que escrevemos anos atrás
gráfica e formação histórica, por meio de para a Revista do Clube Militar sobre uma
vigorosa atuação nas áreas oceânicas que possível atuação futura do Brasil no Atlân-
lhe são fronteiras. tico Sul; algumas considerações sobre a
A ideia da criação de uma organização fle- organização que consideramos a mais ade-
xível e suficientemente ampla em seus pro- quada para liderar a caminhada do Brasil
pósitos constitui, talvez, a resposta principal para o Leste: a Fundação Oceano; e final-
e inadiável para enfrentar esses desafios. mente, um documento com uma síntese dos

RMB1 o T/2012 11
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

caminhos já percorridos pelo Brasil e as (1583-1645)1, “como a expressão do imen-


sugestões que poderiam ser adotadas para so, do infinito, limitado apenas pelos céus,
que o País possa entrever no mar o cenário pai de todas as coisas e que realmente mais
principal da atividade humana e da preser- possui a Terra do que é por ela possuído”.
vação do planeta nas décadas vindouras. A navegação e suas necessidades foram
os motores iniciais da busca sistemática de
O USO DO MAR: UM PANORAMA entendimento do ambiente, que, então, se
HISTÓRICO começava a explorar. Não se buscava en-
tender a grande mecânica desse ambiente,
Os interesses iniciais: a navegação e a mas apenas dele extrair os conhecimentos
pesca que permitissem uma navegação capaz de
fazer chegar aos destinos desejados, onde
As perspectivas de utilização dos re- se obtinham as mercadorias e os alimentos
cursos do mar é a expressão, no Brasil de necessários à complementação das exigên-
hoje, de um processo na verdade milenar. cias da vida nas sociedades da época.
Refiro-me ao processo Portulanos, cartas de
de interação homem- marear, roteiros, bús-
meio ambiente e, de A navegação e suas solas e astrolábios fo-
modo particular, à necessidades foram os ram expressão e resul-
interação homem-ele- tado dessa busca
mento marinho. motores iniciais da busca pragmática de conhe-
Escrever ou falar sistemática de cimento, mais orienta-
sobre o mar e seus re-
cursos implica reviver
entendimento do ambiente, da para a familiarida-
de imediata com a re-
esse processo, que se que, então, se começava a alidade oceânica do
iniciou praticamente explorar que propriamente
com as atividades de para atingir as causas
navegação e de pesca, que a determinavam.
formas naturais e quase instintivas de con-
vívio e de aproveitamento do mar, que se A origem da Oceanografia: navegação e
afigurava, então, diante da terra, como via correntes marítimas
de comunicação e troca entre grupos soci-
ais, ao mesmo tempo que fonte suplemen- Dominadas as técnicas básicas da nave-
tar de alimentos. Tais formas de uso do mar, gação oceânica e garantida a possibilidade de
entretanto, apesar de desenvolvidas du- se chegar diretamente aos pontos desejados,
rante séculos, levaram apenas a um conhe- surgiu a preocupação em fazê-lo mais rapida-
cimento aleatório do meio marinho e do mente, encurtando derrotas e diminuindo tra-
meio oceânico, então encarados com o vessias. Procurou-se depois utilizar os fenô-
mesmo grau de curiosidade e mistério que menos, não apenas evitando aqueles que fos-
cerca atualmente os limites do Universo e sem perigosos, mas aproveitando seus efei-
definido, nas palavras de Hugo Grotius tos quando favoráveis à navegação.

1 N.A.: Grotius – Hugo de Groot, dito – jurista e diplomata holandês. Em seu livro Sobre o Direito da
Guerra e da Paz (1625), esforçou-se para prevenir e regulamentar as guerras. É considerado o
fundador do Direito Internacional.

12 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

Aparecem aí os primeiros estudos mais As consequências econômicas da


direcionados para o que se chamaria hoje Oceanografia para fins militares
de pesquisa oceanográfica, isto é, aquela
que visa ao conhecimento dos fenômenos A fase posterior à Segunda Guerra Mun-
e de sua mútua interação, mas sem perder dial e a confrontação soviético-americana
de vista uma finalidade imediata: no caso, restauraram o primado do pragmatismo no
o aumento da rapidez das travessias oceâ- campo da Oceanografia. Entretanto, trata-
nicas. Por exemplo, a rapidez das travessi- va-se agora de finalidades militares, relati-
as entre a Inglaterra e suas colônias na vas principalmente à guerra submarina e
América do Norte pôde ser diminuída em às operações antissubmarino, suscitando
cerca de 15 dias, por meio do conhecimen- rápidos progressos no domínio da Física
to da Corrente do Golfo, conhecimento este e, mais particularmente, no seu ramo da
que foi possibilitado inicialmente pelo fato Acústica, essencial àqueles tipos de ope-
de os pescadores de baleia acompanharem ração. O aparecimento dos submarinos
suas presas, que normalmente se desloca- nucleares veio intensificar essa tendência
vam nas bordas dessa corrente. do estudo e da exploração dos oceanos.
No entanto, do pró-
O conhecimento prio incremento da
sistemático do mar: A curiosidade científica, Oceanografia para fins
as expedições entretanto, adquiria o militares resultou, no
oceanográficas seu conteúdo, uma
caráter de motivação visualização mais per-
O nascimento da principal, em desfavor da feita das potencialida-
Oceanografia, como abordagem pragmática que des econômicas do
hoje é entendida, pode mar, e foi assim que, fi-
ser caracterizado pela marcara os primeiros nalmente, no início da
expedição do navio estudos sobre o mar década de 60 do sécu-
inglês Challenger, lo passado, despontou
que deixou o território o interesse pela possi-
britânico em 21 de dezembro de 1872 e de- bilidade de exploração dos seus recursos,
morou cerca de três anos e meio em viagem passando o estudo dos oceanos a ter prefe-
de circunavegação, durante a qual realizou rencialmente uma finalidade nitidamente
estações de pesquisa que abrangiam não econômica, a par dos propósitos militares e
somente a superfície do mar, mas também a científicos que já se encontravam presentes
massa d’água subjacente e o solo oceâni- e que continuam até hoje.
co, daí resultando, inclusive, a descoberta
dos primeiros nódulos polimetálicos. O MAR COMO FONTE DE RIQUEZAS:
Outras expedições oceanográficas suce- AS POSSIBILIDADES DE HOJE
deram-se, e as amostras recolhidas em esta-
Os recursos do mar: seus aspectos
ções subsidiaram estudos voltados para o
principais
conhecimento do mar e suas possibilidades.
A curiosidade científica, entretanto, ad- As riquezas oceânicas podem ser abor-
quiria o caráter de motivação principal, em dadas segundo três aspectos principais:
desfavor da abordagem pragmática que os recursos vivos, os recursos minerais e
marcara os primeiros estudos sobre o mar. os energéticos.

RMB1 o T/2012 13
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

As perspectivas da utilização econômi- devido ao declínio da produção do Peru.


ca de tais recursos levaram, inclusive, a Apesar dessa queda, há possibilidade de
uma profunda alteração do quadro jurídico uma retomada do ritmo anterior, o qual,
de uso do mar que, após inúmeras discus- entretanto, depende, entre outros fatores,
sões, culminou com a codificação de uma da estreita cooperação internacional para
Lei do Mar, consubstanciada na nova Con- a manutenção de estoques por meio de
venção das Nações Unidas sobre o Direito medidas que possam evitar a sobrepesca.
do Mar (CNUDM), Jamaica, 1982. A determinação dos níveis ótimos de
captura exige, por outro lado, o conheci-
Os recursos vivos: a pesca e a mento das diversas espécies marinhas, dos
maricultura seus hábitos migratórios e de sua reprodu-
ção, ao mesmo tempo que a diversificação
A pesca constitui uma das mais antigas da pesca, por meio do uso de espécies ain-
atividades do homem da não aproveitadas
em relação ao mar. normalmente, poderá
O crescente desen- Em terra o homem representar não só
volvimento da tecno- uma nova fonte para o
logia da pesca, por meio
desenvolveu processos incremento da contri-
de novos métodos de criativos para a utilização buição alimentar pres-
detecção e do uso ade- das espécies animais e tada pela atividade
quado dos métodos de pesqueira, mas, sobre-
captura, fez com que o vegetais para a sua tudo, uma maneira de
volume da pesca mun- alimentação, no mar ele permitir a reposição
dial triplicasse em mea- dos estoques mais
dos do século passado,
continuou caçador procurados e submeti-
pulando de 21 milhões dos à pesca predatória.
de toneladas para 63 milhões. Por outro lado, parece residir na
Julgava-se, entretanto, que a possibili- maricultura, criação artificial de peixes e al-
dade do oceano para o balanço alimentar gas, a solução para aumentar substancial-
da humanidade fosse ilimitado, o que na mente a produção dos recursos vivos dos
realidade não ocorreu, pois, desde o início oceanos, pois tal atividade tenderia a subs-
da década de 70, a produção mundial de tituir a pesca, do mesmo modo que, em ter-
pescado vem aumentando muito lentamen- ra, a criação extensiva ou intensiva substi-
te (em 1980, o volume total atingiu cerca de tuiu a caça, mudando totalmente as pers-
70 milhões de toneladas), em grande parte pectivas da produção de alimentos2.

2 N.A.: Nos últimos anos, a pesca extrativa marinha alcançou índices recordes de produção, chegando
aproximadamente a 85 milhões de t/ano. O Brasil, apesar de seu extenso litoral, participou com
pouco mais de 0,5% do total, o que equivale a algo em torno de 422 mil t/ano (“O Brasil e o Mar no
século XXI – A Pesca-1988). A maricultura, criação de espécies marinhas em áreas específicas,
também está atravessando um período de franca expansão e constitui excelente alternativa à pesca
predatória, podendo ainda ajudar a recompor populações de espécies submetidas à pesca excessiva.
No Brasil, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte, principalmente, vêm desenvolven-
do projetos de criação de moluscos (ostras e mexilhões) e de camarões. Aliás, o Brasil poderia
aproveitar suas lagoas para projetos de criação de espécies marinhas. No início da década de 80, um
grupo de japoneses interessou-se pela Lagoa de Araruama para a criação de tainhas. As autoridades
locais, no entanto, não manifestaram vontade em levar adiante o assunto.

14 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

Enfim, se em terra o homem desenvolveu manutenção da vida marinha. De outra parte,


processos criativos para a utilização das es- e o que também é muito importante, a implan-
pécies animais e vegetais para a sua alimenta- tação de projetos como o exemplificado ante-
ção, preservando-as da caça predatória e até riormente levaria naturalmente ao controle do
alterando as suas características primitivas, uso dos locais onde eles seriam desenvolvi-
com vistas a aumentar a oferta de alimentos, dos, exercendo-se, por conseguinte, uma ação
no mar ele continuou caçador. As técnicas preventiva que evitaria, consequentemente,
desenvolvidas visaram mais ao aperfeiçoa- toda sorte de atividade poluidora e predatória.
mento dos métodos de captura do pescado e Estima-se que a produção biológica dos
ao conhecimento da ocasião mais oportuna oceanos seja da ordem de 240 milhões de
economicamente para fazê-la do que propria- toneladas. Certamente, mais de 80% de suas
mente o estudo de processos que possibili- riquezas biológicas estão contidas no mar
tassem a criação no cativeiro de determinadas epicontinental, o mar raso que recobre a
espécies marinhas, preferidas para a alimenta- plataforma continental e que é bastante di-
ção humana, o que só verso do oceano pro-
nas últimas décadas priamente dito. A exis-
vem acontecendo. Mal- A maricultura, se propõe tência das plataformas
grado tais esforços, o também ao repovoamento, continentais possibili-
homem, no mar, man- ta a formação de uma
tém-se um predador, com vistas à recomposição zona de vida intensa,
sem maior preocupação dos estoques mais atingidos que é, talvez, uma das
preservacio-nista ou mais densamente po-
ecológica (para cada to- pela sobrepesca, voadas do planeta.
nelada de camarão pes- preservando-se assim a Uma enorme massa de
cada por um barco cadeia ecológica, o que é animais pulula por es-
camaroneiro, por meio sas águas, nadando
da pesca de arrasto, for- indispensável para a ou rastejando, alimen-
ma predatória de pesca, manutenção da vida tando-se de uma po-
cerca de aproximada- pulação ainda maior
mente cinco toneladas marinha de algas que a zona
de peixes são devolvi- produz. Essa zona cos-
das ao mar e, portanto, desperdiçadas). teira representa cerca de 10% da área oce-
Um intenso esforço de pesquisa e de pre- ânica, e a ela se acrescenta 0,1% da área em
servação de áreas costeiras é, porém, exigido que condições naturais fazem subir as
para se atingir os objetivos da maricultura, de águas profundas (ressurgência), extrema-
modo a que se consiga, conforme estimativas mente ricas em nutrientes. O grosso dos
existentes, dobrar a produção dos recursos oceanos, portanto, cerca de 90%, são as
vivos, mediante o aproveitamento de apenas regiões centrais sobre as profundidades
10% da extensão do litoral apropriado para abissais, virtualmente estéreis, pela ausên-
essa atividade. Além disso, a criação artificial cia de mecanismos naturais que façam su-
de espécies marinhas, isto é, a maricultura, se bir as águas profundas, com os elementos
propõe também ao repovoamento, com vistas necessários à vida marinha. Entretanto, elas
à recomposição dos estoques mais atingidos poderiam ser fertilizadas por meio do
pela sobrepesca, preservando-se assim a ca- bombeamento, para a superfície, da água
deia ecológica, o que é indispensável para a profunda, fria e fértil, expondo-a à luz solar.

RMB1 o T/2012 15
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

Indubitavelmente, estamos no limiar de de obra empregada, em um total próximo de


uma nova revolução alimentar, como foi a 400 mil pessoas que trabalham no setor, res-
revolução agrícola há cerca de 10 mil anos, à ponsável talvez por algo ao redor da metade
medida que a ciência e a tecnologia aplica- da produção, deve-se à pesca artesanal. Con-
das aos oceanos permitam utilizá-los em to- vém mencionar, no entanto, que a pesca
das as suas potencialidades na alimentação artesanal perde parcela significativa da captu-
humana, reduzindo ou mesmo anulando o ra devido à manipulação defeituosa do produ-
imenso atraso tecnológico, que advém da to. Se considerarmos que o Atlântico tem os
maneira com que o homem explora o mar, em maiores cardumes de águas rasas do mundo e
relação à tecnologia com que explora a terra. que a nossa produtividade ótima está longe
Apesar de a maricultura representar, de ser alcançada, verificamos o quanto há que
indubitavelmente, a solução futura para au- se fazer para dar ao setor pesqueiro a posição
mentar a oferta de alimentos provenientes do que a extensão da nossa costa requer. Aliás,
mar, ela ainda será, pelo menos durante algum um aumento substancial no consumo do pes-
tempo, um complemento da pesca extrativa, e cado poderia até levar, a médio ou longo pra-
o apelo à criação de grandes frotas pesqueiras zo, a uma redução significativa no consumo
modernas ainda se fará de carne de bovinos e
presente, inclusive em suínos, permitindo, as-
relação às regiões antár- Indubitavelmente, estamos sim, uma certa diminui-
ticas, onde o krill repre- no limiar de uma nova ção na criação desses
senta uma possibilidade animais, reduzindo os
alimentar, em constante revolução alimentar, como seus rebanhos e,
pesquisa e avaliação foi a revolução agrícola há consequentemente, a
pela comunidade cien- área por eles ocupada,
tífica internacional. cerca de 10 mil anos a qual poderia ser cober-
Ressalte-se, final- ta por vegetação, que,
mente, que o Atlântico Sul, sobretudo na sua naturalmente, absorve carbono. Além disso,
porção ocidental, era, no final do século pas- para alimentar os animais, há uma ampliação
sado, a área de maior potencial inexplorado no cultivo de grãos, o que geralmente deman-
de pesca, e essa situação não mudou sensi- da o uso de energia geradora de emissões
velmente até o presente. Quem se refere ao poluentes. Ainda, e não menos importante, há
Atlântico Sul também se refere ao Brasil, e a questão da flatulência. O principal gás expe-
mais ainda quando se trata da parte que lhe é lido pelos extensos rebanhos mundiais é o
contígua. Reflexões dessa ordem pedem um metano, um dos principais responsáveis pelo
posicionamento dos brasileiros. efeito estufa.
Não é nossa intenção descrever o setor da
pesca no Brasil, que ocupa um modesto 24o Os recursos minerais: o petróleo, outros
lugar entre as nações pesqueiras. O consumo minerais e os nódulos polimetálicos
interno do pescado é pouco expressivo, com
exceção de algumas áreas. O brasileiro prefere Recursos minerais
o churrasco à peixada; o filé ou bife à posta de
peixe. Somente durante a Semana Santa, o con- De um modo geral, os recursos mine-
sumo do pescado aumenta razoavelmente. O rais marinhos podem constituir três agru-
fator mais apreciável da atividade pesqueira pamentos distintos, em função da origem
refere-se ao fato de que cerca de 95% da mão e localização:

16 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

– minerais associados com as rochas cinco vezes maior, passando de 8 milhões


dos fundos, que são formações geológi- para 38,9 milhões de barris. Atualmente,
cas preexistente, agora cobertas pelo mar; no mar, a produção brasileira de petróleo
– minerais de superfície, cujos depósi- já suplantou a produção em terra. Hoje, o
tos estão em formação ou que tenham sido Brasil caminha para a sua autossuficiência,
constituídos no ambiente marinho; por meio da produção petrolífera de ori-
– minerais em solução nas águas mari- gem marinha. Aliás, com as novas desco-
nhas, normalmente de origem terrestre, car- bertas, nos chamados campos de pré-sal,
regados pelo escoamento superficial, e o Brasil passará a ocupar uma posição
consequente descarga dos rios. destacada entre os dez países com maior
No tocante aos dois primeiros grupos, é reserva de petróleo do mundo e, breve-
preciso considerar os recursos da plata- mente, deverá passar da posição de
forma, do talude e da elevação continen- autossuficiência para a de exportador.
tais, além dos situados nos fundos oceâni- Convém ressaltar que 90% dessa produ-
cos (abissais). ção é realizada no mar, em especial na pla-
Nas formações geológicas continentais, taforma continental.
as rochas estratificadas incluem depósitos O petróleo, portanto, transformou-se,
de petróleo, gás, enxofre, carvão, potassa, em curto prazo, no mais importante dentre
certos minerais ferrosos e distintos mine- os setores de exploração dos oceanos.
rais metálicos. Neste setor, o alto custo de prospecção e
exploração tem sido compensado pela ele-
O petróleo – Se sempre foi grande e co- vação dos preços e relativa escassez do
nhecida a possibilidade de utilização da produto, em face das crises que abalam
oferta alimentar proveniente do oceano; é os países produtores, sobretudo no mun-
muito mais recente e mais espetacular o cres- do árabe.
cimento da produção mineral de origem ma- Por outro lado, convém ressaltar que a
rinha. A produção de petróleo3 provindo exploração de petróleo em poços subma-
de poços marítimos quadruplicou entre rinos tem produzido grande incremento da
1960 e 1973, data em que representava 18% indústria marítima, especializada na cons-
da produção mundial. A partir de então e trução de plataformas e no ramo de trans-
até 1979, essa participação passou a 20%, porte e apoio, constituindo um poderoso
embora tivesse havido um aumento da or- estímulo para as atividades marítimas
dem de 50% na produção marítima. como um todo, exigindo uma ampla
No Brasil, entre 1970 e 1978, a produ- infraestrutura, além de plataformas de pro-
ção marítima de petróleo tornou-se quase dução e perfuração, navios, aeronaves,

3 N.A.: Petróleo e carvão – são chamados combustíveis fósseis (como também o é o gás natural) e
constituem, finalmente, matéria orgânica – organismos vivos que escaparam à oxidação pela
imersão em bacias líquidas de águas paradas e soterramento, sob pressão e aquecimento e sob novos
depósitos sedimentares. No caso do petróleo nas bacias, sobretudo marinhas, e, no caso do carvão,
em charcos e alagadiços. O grosso do carvão teve como matéria-prima a exuberante vegetação
tropical típica que, em determinada era geológica (carbonífera), explodiu nas bacias existentes nas
regiões equatoriais de chuvas intensas e, por isso mesmo, alagadas. Já o petróleo e o gás são produtos
da decomposição parcial do fitoplâncton, sobretudo do fitoplâncton marinho sedimentado junto
com areia fina (como lama orgânica), na margem de uma bacia ou mar, em fundo de águas pouco
movimentadas e, por isso mesmo, com pouco oxigênio e vida animal, e lenta decomposição por
bactérias anaeróbicas, que vai transformando o resíduo planctônico.

RMB1 o T/2012 17
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

oleodutos e gasodutos e bases de apoio Atualmente, o carvão e os minerais dis-


no continente4. solvidos na água do mar constituem os prin-
A extração de petróleo e gás das pla- cipais recursos explotados e, embora re-
taformas continentais constitui, portan- presentem ainda pequena parcela da pro-
to, uma evidência concreta das possibili- dução mundial, já desempenham papel eco-
dades de exploração desses recursos em nômico importante para determinados paí-
áreas marítimas de águas cada vez mais ses. Assim, parcela importante da produ-
profundas, além das plataformas conti- ção japonesa de carvão provém de minas
nentais. Em um Brasil que tem buscado submarinas situadas em áreas de peque-
no mar as suas pró- nas profundidades
prias fontes de próximas à costa, e a
hidrocarbonetos, Dos recursos minerais quase totalidade de
cabe indicar e apro-
veitar essa possibili-
encontrados nos fundos magnésio nos Estados
Unidos é extraída da
dade de expansão marinhos, além dos água do mar.
das atividades com- hidrocarbonetos (petróleo e Outros minerais,
plementares à explo- como o estanho, são
ração petrolífera, a gás), os de maior recuperados do fundo
fim de se conseguir importância econômica são do mar com o empre-
que elas acompa-
nhem esse bem-suce-
os nódulos polimetálicos, go Dos de dragas.
recursos mine-
dido avanço em dire- com perspectivas de rais encontrados nos
ção ao oceano. próxima explotação por fundos marinhos, além
dos hidrocarbonetos
Outros minerais e os meio de avançada (petróleo e gás), os de
nódulos polimetálicos tecnologia maior importância eco-
– O carvão é outro mi- nômica são os nódulos
neral estratificado, polimetálicos, com pers-
aparecendo desde a costa até o limite exteri- pectivas de próxima explotação por meio de
or do talude continental. Os filões submari- avançada tecnologia. Os conhecimentos atu-
nos de carvão, atualmente explotados por ais sobre essas formações estão mais relaci-
meio de procedimentos tradicionais de mi- onados com o Oceano Pacífico, onde se con-
neração subterrânea, são extensões de jazi- centram pesquisas de natureza acadêmica e
das situadas em zonas costeiras ou em ilhas. tecnológica.
Os principais recursos minerais em so- A composição média dos nódulos de
lução nas águas marinhas são o cloreto de manganês, em relação ao seu peso seco, é a
sódio, o magnésio metálico, os compostos seguinte: 26,9% de manganês; 1,5% de níquel;
de magnésio e o cromo. 1,3% de cobre; 0,24% de cobalto, além das
4 N.A.: O Brasil deverá considerar que, em futuro próximo, o petróleo, como matriz energética, poderá
ser substituído por outra fonte de energia não poluente, como o hidrogênio, de modo a liberar a
atmosfera da dramática poluição causada pelos gases resultantes da queima do petróleo, do carvão e
de seus derivados. As principais fábricas de automóveis em todo o mundo (Alemanha, França, Itália,
Estados Unidos, Japão, Coreia do Sul) estão testando atualmente veículos movidos a combustível de
hidrogênio ou a pilha de hidrogênio (com motor elétrico) sem emissão de poluentes. No Brasil, o
Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC) contém um programa de incentivos ao uso de
energia eólica e ao aquecimento solar, que prevê uma redução de 820 mil toneladas de CO2.

18 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

quantidades menores de outros elementos nais, em vez de problemas relacionados


metálicos, como alumínio, magnésio, titânio, com a capacidade técnica.
zinco, vanádio, zircônio, lítio, molibdênio, chum- Outro importante mineral, de emprego
bo, estrôncio etc. O ferro também aparece, altamente estratégico, atualmente com ex-
combinado com outros metais. pectativas de explotação é o urânio, exis-
Adiante são transcritas, de importante tente não só em dissolução na água do mar,
documento das Nações Unidas mas também nos sedimentos dos fundos
(Polymetallic Sulphides: more riches from marinhos.
the sea?, 1982), as seguintes observações Agências governamentais estrangeiras já
relativas aos recursos minerais e às pers- investiram milhões de dólares para identifi-
pectivas de explotação dos nódulos de car e avaliar possíveis métodos de minera-
manganês, as quais merecem destaque: ção e processamento desses nódulos no lei-
– o volume máximo teórico de nódulos, to marinho. No Brasil, esses nódulos vêm,
de acordo com critérios de teor e abundân- em sua maioria, sendo identificados por na-
cia, para a primeira geração de projetos vios de pesquisa de instituições estrangei-
mineradores será da ordem de 175 bilhões ras. Aliás, desde 1964, com a criação do Pro-
de toneladas de nódulos secos; grama de Perfuração Oceânica (Ocean Drilling
– as reservas potenciais são estimadas Program-ODP) por um consórcio de institui-
em 23 bilhões de toneladas de nódulos se- ções norte-americanas, que pesquisas cien-
cos para a primeira geração de projetos tíficas no assoalho oceânico vêm sendo rea-
mineradores, que correspondem a 290 mi- lizadas. Em 1974, para ampliar os recursos do
lhões de toneladas de níquel, 240 milhões de programa, ele foi aberto à participação de
toneladas de cobre, 60 milhões toneladas de outros países, como associados, e conta hoje
cobalto e 6 bilhões toneladas de manganês; com o Canadá, a Alemanha, a França e o Ja-
– as reservas terrestre desses metais são pão. A coleta de amostras de sedimentos em
estimadas em 54 milhões de toneladas de grandes profundidades e de rochas ígneas
níquel, 498 milhões de toneladas de cobre, subjacentes proporcionou novas informações
1,5 milhão de toneladas de cobalto e 5 mi- sobre a evolução da Terra e, pode-se dizer,
lhões e 400 mil toneladas de manganês; inaugurou uma nova disciplina nas ciências
– os impactos de mineração marinha da Terra: a Paleoceanografia. Assim, por
sobre os mercados de cobalto, níquel e exemplo, descobriu-se que o Mediterrâneo
manganês poderão ser significativos, en- secou completamente há cerca de 7 milhões
quanto que o mercado de cobre será muito de anos. Os países participantes do ODP
pouco afetado; pagam uma determinada quota e têm direito a
– já se encontram identificados os po- ter cientistas a bordo e a receberem todos os
tenciais depósitos que serão explotados dados. Em 1983, o Brasil foi admitido como
pela primeira geração de projetos observador nas reuniões de planejamento, a
mineradores, todos situados no norte do fim de poder julgar sobre a viabilidade de
Oceano Pacífico; ingressar no programa, não chegando, na-
– as técnicas de processamento e os quela ocasião, a uma decisão, tendo em vista
problemas metalúrgicos de recuperação principalmente a contribuição a ser paga para
dos metais contidos nos nódulos estão admissão no ODP.
praticamente resolvidos; Os oceanos constituem, ainda, um imen-
– as atuais preocupações concentram- so reservatório de água, que, naturalmente,
se nos aspectos econômicos e operacio- não pode ser considerada como minério, mas

RMB1 o T/2012 19
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

que possui, evidentemente, importância eco- – a exploração dos gradientes de


nômica fundamental. Eles contêm 97,5% da salinidade (por exemplo) na foz dos rios:
água do Planeta, sendo os 2,5% restantes de 1,4 bilhões de megawatts;
água doce, assim distribuída: 79% congelada – a exploração das correntes marinhas:
em mantos de gelo e geleiras, 20% em baixo 5 milhões de megawatts;
da terra e apenas 1% disponível na superfí- – a exploração das marés: 2,7 milhões
cie. Também a água doce poderia ser obtida de megawatts; e
por destilação da água do mar5. – a exploração das ondas: 2,5 milhões
No Brasil, excetuando-se os hidrocarbo- de megawatts.
netos, o que se pode afirmar é que não existe A oscilação produzida pela maré tem sido
termo de comparação entre o grau de co- usada como fonte de energia, sobretudo por
nhecimentos mineralógicos do continente França e Rússia. Também, sob o ponto de
e do mar que lhe é fronteiro. Portanto, mui- vista energético, o potencial das ondas vem
to será necessário fazer para se sair desse sendo estudado em projetos no Japão, na
nível superficial de conhecimentos e reali- Inglaterra e nos Estados Unidos.
zar os levantamentos necessários de pla- Por outro lado, convém mencionar como
taforma e margem continentais, em escala a mais importante fonte de energia do mar,
de detalhe, com vistas a delinear os recur- se bem que ainda em potencial, o deutério
sos minerais nelas existentes. existente em suas águas. Como os ocea-
nos contêm cerca de 97,5% da água da Ter-
Os recursos energéticos
ra, eles são, efetivamente, a grande reserva
Ainda não foram superados todos os de deutério, representando em energia po-
aspectos relativos à tecnologia necessária tencial realizada pela fusão, aproximada-
à utilização das fontes de energia dos oce- mente, 1026 megawatts-hora, cerca de 1012
anos para os fins práticos da atividade vezes a reserva total de todos os combus-
humana, bem como aqueles ligados à tíveis fósseis. Quando o homem vier a rea-
economicidade dos empreendimentos. En- lizar a fusão controlada, o fará em reações
tretanto, é fora de dúvida que, ultrapassa- que envolvam o deutério, isto é, o hidrogê-
das tais dificuldades, as grandes energias nio pesado (o deutério, isótopo do hidro-
utilizáveis da massa oceânica serão empre- gênio, tem o seu átomo com um próton e
gadas em benefício da humanidade. um nêutron no núcleo, enquanto o hidro-
Citado pelo Almirante Paulo de Castro gênio tem só um próton; o outro isótopo
Moreira da Silva em seu livro Usos do Mar, o do hidrogênio é o trício, com dois nêutrons
Dr. John D. Isaacs, da Scripps Institution of no núcleo). Obtendo a fusão controlada e
Oceanography, classificou, pelo potencial, as superando o obstáculo e confinamento de
grandes energias utilizáveis do oceano: altíssimas temperaturas, haverá necessida-
– a exploração do gradiente térmico en- de de uma energia em forma portátil, que
tre a superfície e o fundo: 40 bilhões de será certamente o hidrogênio líquido, tam-
megawatts; bém extraído por eletrólise da água do mar.

5 N.A.: O interesse da humanidade sobre o mar não se refere apenas aos seus recursos. Muitas vezes na
História, o mar foi lembrado como fonte de medicamentos e de tratamento. Platão, quatro séculos
a.C, ao ser curado com banhos de mar por sacerdotes egípcios, teria proclamado: “O mar lava todos
os males dos homens”. Atualmente, a “talassoterapia” parece renascer na medicina moderna, da
mesma forma que os elementos contidos na água do mar e nos organismos marinhos, como as algas,
vêm tendo, cada vez mais, aceitação e uso na farmacologia.

20 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

O Brasil já pertence ao grupo de países que Paralelamente a essa nova situação e às


integram o International Thermonuclear Ex- suas perspectivas, foram observadas no Brasil
perimental Reactor (Iter), que pretende não diversas limitações a serem superadas.
só investigar a fusão termo nuclear con- O simples conhecimento da existência
trolada, mas, principalmente, verificar a de recursos pesqueiros inexplorados nas
possibilidade de obtenção de nova fonte águas adjacentes ao litoral brasileiro faz
de energia (o deutério). antever o pouco aproveitamento dos re-
Outra forma de energia do mar é o hi- cursos vivos no País, consequente das
drogênio líquido, extraído por eletrólise de carências do setor pesqueiro, a serem su-
suas águas, que está sendo empregado peradas por meio da pesquisa e da ação
como combustível para projetos espaciais. ordenada. Ao mesmo tempo, verifica-se que
Provavelmente, o hidrogênio líquido será o setor de pessoal ligado às atividades de
a energia portátil que exploração dos recur-
substituirá os com- sos do mar ressente-
bustíveis fósseis, à se de várias deficiên-
medida que os obstá-
Provavelmente, o cias, sendo talvez a
culos tecnológicos, hidrogênio líquido será a mais grave a falta de
para o seu emprego energia portátil que perspectivas que tais
generalizado, forem atividades ainda têm
sendo superados. substituirá os combustíveis no Brasil, onde são
fósseis, à medida que os sempre encaradas em
OS RECURSOS DO
MAR NO BRASIL:
obstáculos tecnológicos, termos de baixa priori-
dade, o que, por sua
O HORIZONTE para o seu emprego vez, gera também ou-
POLÍTICO E generalizado, forem sendo tras deficiências,
TÉCNICO- como, por exemplo, as
CIENTÍFICO superados que se verificam no
setor do apoio ocea-
As limitações existentes nográfico, onde se pode registrar a quase
inexistência de material técnico de origem
É possível vislumbrar para o Brasil um nacional e a total falta de meios flutuantes
grande campo de atuação em relação aos modernos e adequados aos trabalhos de
seus recursos marinhos. pesquisa no mar, situação inadmissível
De fato, o incremento das atividades e para um país como o Brasil, de uma exten-
das perspectivas do uso do mar e do seu são litorânea da ordem de 8 mil km e com
solo e subsolo podem modificar totalmen- uma área marítima adjacente de cerca de
te o tipo de convivência entre a nação bra- 4,5 milhões de km2, a qual poderá ser acres-
sileira e o meio oceânico em que está cida de uma área de até 963 mil km2, confor-
inserida, como modificou a visão mundial me pretensão brasileira na Comissão de
dos problemas marítimos, desde o Limites da Plataforma Continental (CLPC).
desencadeamento da III Conferência das Constitui exceção a esse quadro apenas o
Nações Unidas sobre Direito do Mar, que trabalho da Petrobras na pesquisa de no-
criou uma ampla estrutura jurídica para re- vas fontes de hidrocarbonetos. É possí-
gular as situações que poderão advir da vel, no entanto, que a criação do Ministé-
nova conjuntura marítima. rio da Pesca venha ajudar na superação de

RMB1 o T/2012 21
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

certas limitações e carências, sobretudo as Marinha (Diretoria de Hidrografia e Nave-


que se referem ao pessoal do setor pes- gação – DHN), com especialistas da
queiro, e, ainda, no incentivo ao aumento Petrobras e pesquisadores universitários
do consumo do pescado no Brasil. (Projeto Leplac – Levantamento da Plata-
forma Continental), coletaram os dados ne-
O novo direito do mar: a delimitação da cessários para a determinação do limite ex-
margem continental. Os recursos terior da Plataforma Continental, em atendi-
biológicos da Zona Econômica mento aos requisitos técnicos definidos pela
Exclusiva (ZEE) CLPC. Em linhas gerais, o Brasil determinou
uma extensa área oceânica além das 200 mi-
A nova realidade jurídica criada pela lhas, onde, de acordo com os termos da Con-
CNUDM condiciona o exercício da jurisdi- venção, serão exercidos direitos de explora-
ção nacional sobre a ção e aproveitamento
plataforma continental dos recursos naturais
à determinação dos do solo e subsolo ma-
seus limites, o que re- O Brasil está construindo rinhos. Essa área oce-
quer a caracterização as bases para o traçado ânica compreende
da margem continental
até a base do talude.
definitivo da sua fronteira duas grandes porções:
uma ao norte, abran-
Assim, a soberania leste no Atlântico Sul, ao gendo o cone do Rio
brasileira sobre os fun- incorporar uma área de Amazonas, e outra ao
dos marinhos que lhe 2 sul, que se estende
couberem, fora da ZEE, mais de 4,5 milhões de km . desde o litoral do Es-
veio exigir a execução É a Amazônia Azul pírito Santo até a fron-
de um amplo levanta- teira marítima com o
mento da margem con- Uruguai. Assim, o Bra-
tinental, que inclui a plataforma continental sil poderá anexar às suas fronteiras maríti-
e o talude, cujo acúmulo de sedimentos em mas no Atlântico Sul uma área de no mínimo
sua base ou sopé poderia ter levado bem 773 mil km2 ou, no máximo, de 963 mil km2,
mais para leste o limite exterior da margem em valores aproximados. Em qualquer caso,
continental (o que foi comprovado), ampli- seja qual for o resultado final, o Brasil estará
ando significativamente a extensão ou con- construindo as bases para o traçado defini-
tinuidade do território brasileiro submerso. tivo da sua fronteira leste no Atlântico Sul6,
Tal levantamento foi submetido à Comissão ao incorporar uma área de mais de 4,5 mi-
de Limites da Plataforma Continental da ONU lhões de km2. É a Amazônia Azul.
(CLPC) com as características do limite plei- De outra parte, a otimização do uso dos
teado, juntamente com as informações téc- recursos biológicos da ZEE, conforme re-
nicas e científicas necessárias à sua avalia- comendação da Convenção, deverá reque-
ção pela CLPC. Durante um período de cer- rer um amplo e minucioso levantamento das
ca de dez anos, de 1987 a 1996, navios da espécies marinhas existentes na ZEE bra-

6 N.A.: O Editorial da Revista do Clube Naval no 343, de jul/ago/set de 2007, do então presidente do
Clube, Almirante Jose Júlio Pedrosa, foi muito oportuno e elucidativo, e também muito feliz, ao usar
a expressão “bandeirantes das longitudes salgadas” para referir-se aos especialistas da Marinha, da
Petrobras e da comunidade científica que permitiram alargar as fronteiras do Brasil para o leste,
como o fizeram para oeste os antigos bandeirantes.

22 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

sileira e uma sensível ampliação da capaci- cução desses objetivos e visando a uma
dade nacional de explotação desses recur- ação efetiva e coordenada do esforço na-
sos, tarefas de notável complexidade e cional para alcançá-los, o governo federal
magnitude, para as quais o Brasil deverá conta com a Cirm, cuja presidência cabe ao
se preparar com a devida urgência. comandante da Marinha, na qualidade de
coordenador para os Recursos do Mar.
A Política Nacional para os Recursos Além do órgão de coordenação e orienta-
do Mar: uma tentativa de eliminação de ção da Política Nacional para os Recursos
carências do Mar, a Cirm constitui-se ainda em órgão
normativo e de assessoramento direto da
A partir da década de 60 do século pas- Presidência da República, relativamente à
sado, alguns países já haviam sentido a Política Nacional para os Recursos do Mar.
necessidade de criar organismos coorde- A Cirm possui, em caráter permanente,
nadores e executores de suas atividades uma Secretaria, que é responsável pela
científicas e tecnológicas relacionadas com implementação das ações aprovadas pelo
o uso do mar. Cirm. Além dos programas relativos aos re-
O Reino Unido, os Estados Unidos, a cursos do mar, a Cirm executa o Programa
França, a Alemanha, o Japão, a então União Antártico Brasileiro (Proantar), empreitada
Soviética, a Índia e a China possuem orga- de vulto que, em curto prazo, possibilitou a
nismos responsáveis pela execução de ati- inclusão do Brasil no grupo restrito de paí-
vidades científicas e tecnológicas relativas ses que toma as decisões sobre a Antártica.
ao conhecimento do meio ambiente mari- Outra iniciativa importante da Cirm foi le-
nho e ao aproveitamento econômico de vantar a questão do gerenciamento costei-
seus recursos, organismos que verificamos ro, cuja finalidade, entre outras, relaciona-
ser, todos eles, de caráter eminente civil se com a proteção dos estuários, muitos dos
(ver Anexo A). No Brasil, a falta de órgão quais constituem verdadeiros berçários de
específico para tratar de tais assuntos, a espécies marinhas. Também merece desta-
nível nacional, motivou que a Marinha, em que a atuação excepcional da Cirm pertinen-
visão estratégica mais ampla, viesse a pre- te à realização do extenso programa desti-
ocupar-se com a situação nacional perti- nado a estabelecer os limites exteriores da
nente aos recursos do mar, ocupando até Plataforma Continental – o Levantamento
um espaço alheio às suas atribuições. Tais da Plataforma Continental (Leplac), traba-
preocupações resultaram no Decreto no lho que orgulha todos os brasileiros. A Ma-
74.675 de 12 de setembro de 1974, que criou rinha, portanto, merece todas as nossas ho-
a Comissão Interministerial para os Recur- menagens pelos trabalhos realizados, mui-
sos do Mar (Cirm), com a finalidade de co- tos dos quais alheios à sua própria missão
ordenar os assuntos relativos à consecu- específica.
ção da Política Nacional para os Recursos
do Mar (PNRM). A Marinha do Brasil: o esforço inicial
Por meio da Política Nacional para os
Recursos do Mar, aprovada em 1980, fo- Evidentemente, se a Marinha assumiu
ram fixados os objetivos básicos do setor responsabilidade nesse campo, alheio à
de recursos do mar, enfocando aspectos sua atividade principal, ela o fez principal-
jurídicos, educacionais, científicos e mente como elemento catalisador e coor-
tecnológicos, entre outros. Para a conse- denador de um esforço, que deverá ser cada

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

vez mais desenvolvido por organizações tecnologia e, finalmente, à administração e


civis específicas. gerência desses recursos.
Existem atualmente no Brasil mais de 30 Portanto, ciência e tecnologia constitu-
instituições voltadas para o estudo do mar em o binômio indispensável para a
e dos seus recursos, e um número cada vez explotação dos recursos do mar necessári-
maior de doutores e mestres em ciências li- os a aumentar a oferta de alimentos, maté-
gadas ao mar estudam, em ambiente propí- rias-primas e energia. Binômio que, no Bra-
cio a essa atividade, temas que, mais cedo sil, como já ocorreu em tantos outros paí-
ou mais tarde, irão contribuir para que o Bra- ses, poderia ser desenvolvido por uma ins-
sil venha retirar dos seus domínios maríti- tituição nacional central dedicada ao estu-
mos a contribuição total que estes possam do do mar, em sua acepção mais ampla. Tal
oferecer ao progresso do País. Estão, por- instituição serviria como elemento de pon-
tanto, caminhando para o passado, tempos ta no desenvolvimento das pesquisas oce-
em que as únicas instituições ligadas de for- anográficas, e ser-lhe-ia confiada a conse-
ma confiável ao estudo do mar pertenciam à cução das grandes metas das pesquisas
Marinha do Brasil. É marinhas exigidas pe-
forçoso reconhecer los interesses nacio-
tanto a dificuldade Ciência e tecnologia nais, quer por meio da
quanto a falta de sen- constituem o binômio atuação direta em cam-
so prático e pretender pos de maior amplitu-
que organizações mili- indispensável para a de e elevada comple-
tares navais transfor- explotação dos recursos do xidade, quer coorde-
mem-se em centro nando pesquisas mais
multidisciplinar de ci-
mar necessários a restritas, atribuídas a
ências do mar. aumentar a oferta de outras instituições
alimentos, matérias-primas menores, formando um
Os requisitos básicos todo harmônico, em
e energia função das possibili-
A explotação dos dades de cada institui-
recursos do mar, nos seus três aspectos fun- ção e perfeitamente articulada com os su-
damentais (alimentos, matérias-primas e ener- periores interesses marítimos do País.
gia), somente poderá ser alcançada racional-
mente mediante a obtenção de dois requisi- CONSIDERAÇÕES FINAIS
tos básicos:
– o conhecimento científico, que se ma- As perspectivas do futuro
nifesta nos estudos das ciências do mar,
com o propósito de descrever os oceanos As perspectivas de utilização plena dos
e entender seus fenômenos, suas recursos do mar, de seu solo e subsolo, sem
interações, ecologia, preservação e avalia- dúvida, irão acarretar um “revolução maríti-
ção dos seus recursos; e ma”, que transformará profundamente as so-
– o desenvolvimento tecnológico, que ciedades industriais, afetando significativa-
envolve aspectos diretamente ligados ao mente as relações entre as nações desenvol-
aproveitamento dos recursos biológicos, vidas e as em processo de desenvolvimento.
minerais e energéticos, aos estudos eco- No mundo de hoje, em que o oceano constitui
nômicos decorrentes, à difusão de a última fronteira a ser explorada e para onde

24 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

convergem todos os grandes interesses inter- Por outro lado, no que se refere à utilização
nacionais, as possibilidades de interação am- dos recursos biológicos da Zona Econômica
pla dos recursos do mar à vida econômica das Exclusiva, a Convenção recomenda que o Es-
nações nos permitem antever o meio ambiente tado ribeirinho proceda à utilização ótima des-
marinho como o grande cenário dos princi- ses recursos. A determinação dos níveis óti-
pais eventos que irão ocorrer neste século. mos de captura exigirá amplo e minucioso le-
As necessidades de alimentação para uma vantamento oceanográfico e biológico da ZEE.
população em constante expansão, assim O atendimento das recomendações da
como de matérias-primas e energia para a ma- Convenção implica, por conseguinte, a aqui-
nutenção e ampliação de toda a atividade eco- sição de recursos materiais, entre os quais
nômica mundial, necessidades estas funda- os meios flutuantes adequados, que consti-
mentais para o desenvolvimento e melhoria tuem a ferramenta básica indispensável.
da qualidade de vida de todos os povos, so-
mente poderão ser atendidas por meio da O papel da Marinha
explotação dos recursos encontrados nas áre-
as marinhas do planeta, inclusive do seu solo A Marinha, por sua presença tradicional
e subsolo, com o apoio do excepcional e indispensável nessa área, deverá estar pre-
patrimônio jurídico consubstanciado na Con- parada para acompanhar esse processo, no
venção sobre o Direito do Mar. sentido de possibilitar o dimensionamento
de um poder naval condizente com essa nova
A participação do Brasil realidade, uma vez que a expansão da pre-
sença humana nos oceanos poderá acarre-
É indispensável, portanto, que o Brasil se tar aumento das possibilidades de conflito.
integre na nova visão mundial dos problemas De outra parte, o deslocamento das ativi-
marítimos, de modo a poder participar decisi- dades econômicas e técnico-científicas para o
vamente da exploração e explotação dos re- mar e as responsabilidades que advirão para o
cursos do mar, inclusive nas áreas marítimas País, em decorrência de sua atuação nesse
sob jurisdição internacional. Diante do relati- campo, irão consolidar novos e significativos
vo vazio que ainda reina no Atlântico Sul, cabe interesses marítimos e, consequentemente, a
ao Brasil, por sua posição geográfica, aceitar necessidade de protegê-los.
o desafio do mar que lhe é veementemente Sem dúvida, isto beneficiará a Marinha,
apresentado. A busca de recursos, sobretudo como ocorreu com a exploração do petróleo
alimentares e minerais, é parte substancial da na Plataforma Continental, quando uma par-
resposta a esse desafio. Além disso, o desen- cela dos ganhos auferidos pela Petrobras,
volvimento do País exige a pesquisa imediata, sob a forma de royalties, coube à Marinha,
na área marítima nacional, de fontes alternati- com o propósito de reforçar os meios na-
vas de minerais e matérias-primas que permi- vais necessários a proteção e defesa dos
tam manter a demanda do parque industrial campos petrolíferos daquela área marítima.
brasileiro e as necessidades da vida econômi-
ca da Nação, substituindo as fontes existen- Uma instituição nacional para os
tes no território emerso do País, que forem se oceanos
aproximando do estado de esgotamento ou
de exaustão ou, ainda, que devam ser preser- Muito acertadamente, o Brasil possui o
vadas como reservas estratégicas, para uso Instituto de Pesquisas Especiais (Inpe) e
em situações de emergência. uma Agência Espacial, cuja base está

RMB1 o T/2012 25
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

sediada em Alcântara, no Maranhão, além sociedade, e não um esforço exclusivo do


de participar de atividades de pesquisas no Governo. Tal Fundação teria o nome de
Continente Antártico e de outras iniciativas Fundação Oceano, nome abrangente e su-
arrojadas no campo da pesquisa científica ficientemente amplo para englobar todas
propriamente dita, inclusive no da energia as atividades relacionadas com o mar e suas
nuclear e, mais recentemente, integrando o áreas de influência.
International Thermonuclear Experimental A criação do Centro de Excelência para
Reactor (Inter). Então, por que não criar tam- o Mar Brasileiro (Cembra) constitui uma ini-
bém uma organização destinada a estudar ciativa louvável, porém não tem a amplitu-
os oceanos, seus sistemas e suas interações de que se pretende para a Fundação Ocea-
com os sistemas antártico, atmosférico e no (além do Mar Brasileiro), nem as condi-
costeiro, especialmente para um país com ções de gerência dos meios de apoio (ins-
uma área marítima tal- titutos, departamen-
vez maior que a da tos, embarcações, na-
Amazônia terrestre, Por que primeiro o espaço vios e outros).
isto é, quase a metade e o austro e não também Talvez a Fundação
de suas terras emer- de Estudos do Mar
sas? Por que primeiro os oceanos? Um caminho (Femar) pudesse ser
o espaço e o austro e adequado seria o estabele- utilizada para o esta-
não também os ocea-
nos, principalmente o
cimento de uma fundação. belecimento da nova
Fundação, para isso
Atlântico, que lhe é Fundação Oceano, nome alterando seus obje-
fronteiro e cujos recur- abrangente e suficiente- tivos (na realidade,
sos constituir-se-ão ampliando-os), de
no mais importante fa- mente amplo para englobar modo a englobar
tor de desenvolvimen- todas as atividades relacio- aqueles requeridos
to econômico e social,
à medida que forem,
nadas com o mar e suas para a nova Funda-
ção e, se for o caso,
paulatinamente, subs- áreas de influência trocando-lhe o nome
tituindo os que atual- para Fundação Oce-
mente são obtidos dos ano, nome mais con-
continentes? Com a exceção honrosa da dizente com a amplitude e a abrangência
Petrobras, as atividades nacionais em rela- de atribuições que se pretende para o
ção ao uso do mar, quando comparadas com novo órgão (ver Anexo C).
outras áreas de atuação, são ainda modes-
tas e, em alguns setores, quase inexistentes. O uso do mar: um imperativo de
Em face das dificuldades de se criar uma sobrevivência
nova organização governamental, um ca-
minho adequado seria o estabelecimento Muito se tem falado no sentido de se pre-
de uma fundação, com o apoio da iniciati- parar o Brasil para enfrentar os desafios do
va privada, considerando que a capacitação século XXI, especialmente no que se refere
científica e tecnológica voltada especifica- ao aproveitamento dos recursos oceânicos.
mente para o ambiente oceânico deveria Em um mundo cada vez mais ávido de
ser fruto da mobilização de um somatório recursos e onde os espaços terrestres vão
de interesses e capacidades globais da sendo gradativamente ocupados e exauri-

26 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

dos, a integração plena dos recursos do mar e, em decorrência, as limitações institu-


à vida econômica e social das nações surge cionais e organizacionais sejam superadas,
como um imperativo de sobrevivência. assim como as carências existentes, sobre-
Para que o Brasil possa ocupar o lugar tudo as que se referem a meios flutuantes
que lhe cabe entre as nações marítimas, adequados. Assim, o Brasil estará devida-
consequência natural de sua posição geo- mente preparado não somente para enfren-
gráfica e formação histórica, torna-se in- tar os desafios do século, mas, sobretudo,
dispensável que os esforços de integração para participar de seus principais eventos,
à vida nacional dos recursos de sua área os quais, inevitavelmente, ocorrerão nos
marítima sejam considerados prioritários; oceanos.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<CIÊNCIA E TECNOLOGIA>; Estudo do oceano; Recursos do mar; Oceanografia; Política
nacional; Poder marítimo; Mar;

REFERÊNCIAS

BAKKER, Mucio Piragibe Ribeiro de. “A humanidade conquista um patrimônio comum”. Revista
Brasileira de Tecnologia. Vol. 15 no 6, nov/dez 1984.
BAKKER, Mucio Piragibe Ribeiro de. “O mar: uma nova fronteira”. Revista Brasileira de Tecnologia.
Vol. 18 no 2, fev 1987.
BAKKER, Mucio Piragibe Ribeiro de. “O hidrogênio, perspectivas e desafios”. Revista Marítima
Brasileira. Vol. 129 no 01/03 – jan/mar 2009.
BAKKER, Mucio Piragibe Ribeiro de. “A Terra, o oceano e a atmosfera. O clima e o aquecimento
global (Apontamentos sobre)”. Revista Marítima Brasileira. Vol. 131 no 01/03 jan/mar 2011.
COMISSÃO NACIONAL INDEPENDENTE SOBRE OS OCEANOS. O Brasil e o mar do século
XXI – 1998.
COMISSÃO NACIONAL INDEPENDENTE SOBRE OS OCEANOS. Os usos dos oceanos no
século XXI. A contribuição brasileira – 1998.
CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE O DIREITO DO MAR. Reproduzido na Direto-
ria de Hidrografia e Navegação – 1990.
GUIMARÃES, Luiz Filipe de Macedo Soares. “Um Brasil ignorado. O espaço marinho nacional”.
Revista Brasileira de Tecnologia. Vol. 17 no 1, jan/fev 1986.
MOREIRA DA SILVA, Paulo de Castro, Vice-Almirante. Oceanografia Física. Instituto de Pesqui-
sas da Marinha, 1972.
MOREIRA DA SILVA, Paulo de Castro, Vice-Almirante. Usos do Mar. Comissão Interministerial
para os Recursos do Mar (Cirm) – 1978.

RMB1 o T/2012 27
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

ANEXO A
OS PRINCIPAIS ORGANISMOS DE PESQUISA NO MAR EM OITO PAÍSES
1. O Reino Unido criou, em 1965, o Natural Environment Research Council, como órgão de
coordenação política, o qual possui como entidades executoras o Institute of Oceanographic/Sciences, o
Institute for Marine Environmental Research e o Institute of Marine Biochesmistry. No setor de
Geologia Marinha, possui como órgão autônomo o British Geological Survey, o qual está vinculado ao
Marine Geophysics Research Programme. Além desses organismos, existem no Reino Unido vários
outros dedicados ao estudo do mar, uns ligados às universidades, outros autônomos, como fundações.
2. Os Estados Unidos, em 1966, criaram o National Council on Marine Resources and Engineering
Development, que assessora, desde 1971, o National Advisory Committee on Oceans and Atmosphere na
formulação da National Ocean Policy. Como órgão de execução dessa política, os Estados Unidos possuem,
desde 1970, o National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), entidade vinculada ao Departa-
mento de Comércio e que tem como atribuições principais as seguintes: gerenciamento costeiro; proteção do
meio ambiente marinho; pesca oceânica; exploração e mapeamento dos oceanos; gerenciamento, utilização
e preservação dos recursos do mar; descrição, monitoramento e previsão das condições oceânicas e atmosfé-
ricas; ambiente espacial; expedição de avisos relativos a fenômenos naturais que possam ocasionar catástro-
fes. Possuem também cerca de 30 instituições dedicadas a assuntos marítimos vinculadas às universidades, além
de inúmeros outros organismos estaduais, regionais e privados ligados a esses mesmos assuntos.
3. A França, em 1967, criou o Centre National pour l’Exploitation des Oceans (Cnexo), que, ao lado
do Institut Scientifique et Technique des Pêches Maritimes (ISTPM), é um dos organismos oficiais de
execução de atividades científicas e técnicas relativas ao aproveitamento econômico dos recursos do mar.
Posteriormente, em 1982, criou o Ministère de La Mer, com as seguintes áreas de atribuições: Marinha
Mercante e Equipamento Naval; Direção de Portos e Vias Navegáveis, Direção das Pescas Marítimas e de
Culturas Marinhas; Missão Interministerial do Mar e Missão de Pesquisas. Dois anos após, em 1984, criou
o Institut Français de Recherche pour l’Exploitation de La Mer (Ifremer), por fusão do Centre National
pour l’Exploitation des Oceans (Cnexo) e do Institut Scientifique e Technique des Pêches Maritimes
(ISTPM). Tal instituto, colocado sob a dupla subordinação do Ministère de la Recherche et de la Technologie
e do Ministère de la Mer, tem por finalidade conduzir e promover não só as pesquisas científicas fundamen-
tais como também as aplicadas às atividades de desenvolvimento tecnológico e industrial, com vistas ao
aproveitamento econômico dos recursos do mar e à preservação do meio ambiente marinho.
4. A Alemanha possui, desde 1875, um Instituto para Pesquisas do Mar, Institut Für Meeres For
Shung, vinculado atualmente ao Ministério Federal de Pesquisas e Tecnologia.
5. O Japão exerce suas atividades de pesquisas e exploração dos recursos do mar por meio da Agência
de Ciência e Tecnologia, que constitui um órgão autônomo, e do Ministério da Agricultura, Floresta e Pesca.
6. A antiga União Soviética dispunha de um Comitê Estatal da Ciência e Tecnologia, que coordena-
va toda a pesquisa cientifica e tecnológica do País, conforme a política então estabelecida pela Academia
de Ciência da URSS. Especificamente, possuía, ainda, os seguintes órgãos relacionados com o Poder
Marítimo: Ministério da Frota Marítima (Marinha Mercante), Ministério da Pesca, Ministério da Geo-
logia (na parte relativa às pesquisas no meio ambiente marinho) e o Comitê Estatal da Meteorologia (que
também atua na parte referente à interação oceano-atmosfera [é provável que, com a extinção da União
Soviética, os organismos indicados tenham passado para a jurisdição da Federação Russa]).
7. A Índia possui, desde julho de 1981, o Department of Ocean Development, em nível de ministério,
com a função de planejar e coordenar toda a pesquisa relacionada com o aproveitamento dos recursos do
mar, incluindo o levantamento e a cartografia dos recursos biológicos e minerais, a administração e gerência
de tais recursos, tecnologia marinha e desenvolvimento do potencial humano. Subordinados a tal Departa-
mento, a Índia possui dois grandes Institutos: o National Institute of Oceanography e o Central Marine
Fisheries Institute, cada um equipado com moderno e sofisticado navio para pesquisas oceanográficas. O
Department of Ocean Development é também o responsável pelo programa antártico indiano.
8. A China possui um Bureau de Recursos Marítimos, vinculado a uma Coordenadoria de Assuntos do
Exterior, que constitui o órgão responsável pelas pesquisas relacionadas com o aproveitamento econô-
mico dos recursos do mar. Possui, ainda, o Ministério da Agricultura, Piscicultura e Pecuária, com
responsabilidades no desenvolvimento de pesquisas no setor pesqueiro.
Observação – Em face da importância que a exploração e aproveitamento dos recursos dos oceanos vem
assumindo em todo o mundo, sobretudo entre as nações mais desenvolvidas, é possível que as organizações
mencionadas neste Anexo tenham sido alteradas ou ampliadas e que novos organismos tenham sido criados.

28 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

ANEXO B

IDEIAS SOBRE A ATUAÇÃO FUTURA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

A ideia de o Brasil estabelecer um laboratório oceanográfico na mais remota fronteira marítima do


País, envolvendo o Ministério da Defesa, o da Ciência e Tecnologia e o do Meio Ambiente, conforme
noticiou a imprensa em 10 de janeiro de 2011, é muito oportuna. Porém, para que o País possa atuar em
áreas sob jurisdição internacional, no Alto-Mar e na Zona, certamente necessitará de pontos de apoio.
Por conseguinte, o Brasil deveria entrar em entendimento com o Reino Unido com o propósito de
estabelecer programas conjuntos, usando como base de apoio as ilhas oceânicas de Ascensão, Santa
Helena, Tristão da Cunha e Geórgia do Sul.
Sobre tais assuntos é interessante reler o artigo publicado na Revista do Clube Militar no 276, de 1986, com
o mesmo título deste anexo, cujas ideias, ainda hoje, permanecem totalmente válidas, e que abaixo é transcrito.

O BRASIL E O ATLÂNTICO SUL

O Brasil ocupa a mais destacada posição geoestratégica no Atlântico Sul. É o único país cuja fronteira
marítima é voltada para os dois segmentos do Atlântico, fisicamente definidos pelo estreitamento
existente entre os salientes do Nordeste brasileiro e do Noroeste africano, passagem marítima natural
para o Atlântico Norte.
O Atlântico Sul, antes uma área marítima de relativa importância estratégica, atualmente passou a
focalizar as preocupações das grandes potências marítimas, em face da vulnerabilidade e das limitações dos
canais de Panamá e de Suez, que induziram uma ampla reformulação do tráfego marítimo mundial e do
posicionamento de suas rotas principais, entre as quais sobressaem as que contornam o Cabo da Boa
Esperança, para o acesso ao Índico, e as que passam pelo Cabo de Horn ou pelo Estreito de Magalhães, para
o acesso ao Pacífico. É, portanto, o Atlântico Sul a via marítima para onde afluem as crescentes necessida-
des de insumos básicos e de petróleo por parte dos países industrializados e de uma ponderável parcela de
bens de toda espécie para as trocas comerciais, indispensáveis ao crescimento da economia mundial.
O desenvolvimento crescente do comércio exterior brasileiro exigirá, certamente, uma expansão
proporcional das atividades marítimas. Por outro lado, a exploração e a explotação dos recursos do mar,
notadamente dos recursos minerais, como os hidrocarbonetos (petróleo), e dos biológicos, como a pesca,
farão aumentar as atividades nacionais relacionadas com o uso do mar, deslocando cada vez mais os
interesses econômicos do País para as áreas oceânicas, especialmente para o Atlântico Sul, que constitui um
espaço vital para o Brasil e em relação ao qual o País ocupa posição privilegiada. Por conseguinte, qualquer
estratégia nacional para o uso do mar ou para o desenvolvimento do seu Poder Marítimo não se deve limitar
apenas às faixas de mar próximas às costas brasileiras – o Mar Territorial, a Zona Econômica Exclusiva
(ZEE) e a Plataforma Continental –, onde o predomínio nacional já se encontra reconhecido pela Conven-
ção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. É importante que tal estratégia, levada a médio prazo, possa
permitir ao País um deslocamento para o leste, buscando ocupar o relativo vazio que ainda reina no
Atlântico Sul, em termos de explotação de seus recursos, inclusive no que se refere à participação nacional
em programas de mineração oceânica e de pesquisa científica levada a efeito naquele oceano.

A NOVA REALIDADE ECONÔMICA E O PODER NAVAL

O incremento das atividades e das perspectivas de uso do mar e de seu solo e subsolo irá alterar
gradativamente a visão mundial dos problemas marítimos, prevendo-se o início de uma nova ordem
econômica internacional, quando a explotação dos recursos do mar, sobretudo dos recursos minerais, atingir
a escala comercial e passar a repercutir no mercado internacional. É indispensável, portanto, que o Brasil
se integre nessa nova visão, modificando totalmente o tipo de convivência que até agora tem mantido com
o meio oceânico em que se acha inserido, de modo a poder participar decisivamente da exploração e
explotação dos recursos do mar, inclusive nas áreas marítimas sob jurisdição internacional.
Evidentemente, a exploração e a explotação dos recursos marinhos irão gerar novos e importantes
interesses econômicos, que, por sua vez, irão afetar substancialmente os tradicionais problemas de
segurança e desenvolvimento. Por outro lado, tais interesses farão aumentar a presença humana nos
oceanos e se converterão, provavelmente, em novos campos de competição de poder e influência,
aumentando, assim, as possibilidades de conflito entre nações e as ameaças à paz mundial.

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

O deslocamento das atividades econômicas e técnico-científicas para o mar e as responsabilidades que


advirão para o País em decorrência da atuação nacional nesse campo irão provocar, inevitavelmente,
repercussões significativas sobre as atribuições do Ministério da Marinha (atualmente, Ministério da
Defesa, Comando da Marinha), especificamente no que se refere à construção de um Poder Naval
condizente com essa nova realidade. À proporção que a presença brasileira for se tornando efetiva no
Atlântico Sul, novos interesses irão surgindo para o País, e, quanto mais importantes eles forem, tanto
mais forte deverá ser o Poder Naval necessário para protegê-los ou mantê-los, e até mesmo para ampliá-
los, se esta for a vontade nacional.
Aos que visualizam esse futuro, e Ruy Barbosa já o previa desde o fim do século passado (Cartas da
Inglaterra, 1895), será, portanto, no mar que o país deverá enfrentar os óbices que forem se antepondo
aos seus interesses. O uso do mar impõe ao País, como corolário, uma necessidade inevitável: ser forte no
mar.

Mucio Piragibe Ribeiro de Bakker


Contra-Almirante (Refo)

AS POSIÇÕES ESTRATÉGICAS NO ATLÂNTICO SUL

O desenvolvimento das atividades marítimas nacionais no que se refere à pesquisa científica e à


exploração e explotação dos recursos do mar, à medida que se for deslocando para as áreas oceânicas no
Atlântico Sul, irá necessitar de novos pontos de apoio naquele oceano, a fim de receber pessoal e material
indispensáveis à expansão da tais atividades. Essas posições oceânicas, que são as ilhas existentes no
Atlântico Sul (Ascensão, Santa Helena, Tristão da Cunha e Geórgia do Sul), são de extrema importância
para o Brasil, tanto para o desenvolvimento das atividades acima referidas quanto sob o aspecto estraté-
gico, como defesa avançada do País ou como ponto de apoio para projeção de poder.
Em conferência na Escola de Guerra Naval, em setembro de 1980, sob o título “Estratégia do Brasil
no futuro”, o Vice-Almirante Paulo Irineu Roxo Freitas já afirmava: “As posições dessas ilhas, e mais a
de Fernando de Noronha, formam uma linha natural de defesa avançada para as costas brasileiras e da
América do Sul, a partir do saliente do Nordeste até a Antártica”.
Em números aproximados, a maior distância entre essas ilhas é de cerca de 1.500 milhas, entre
Tristão da Cunha e Geórgia do Sul, o que corresponde à distância entre o porto do Rio de Janeiro e o de
Fortaleza, seguida da que separa Santa Helena de Tristão da Cunha, aproximadamente 1.400 milhas. A
linha que liga estas duas últimas passa a cerca de 1.900 milhas da costa do Brasil, o que equivale à distância
entre o porto do Rio de Janeiro e o de São Luís, e é o setor mais afastado do continente, no conjunto. Por
dentro dessa linha, a WSW de Santa Helena e a uma distância de cerca de 1.300 milhas, ficam as ilhas de
Trindade e de Martins Vaz.
O conhecimento das condições oceanográficas (físicas, químicas e biológicas) e meteorológicas do
Atlântico Sul, assim como das características do solo oceânico e do seu subsolo e todo o entendimento
desse grandioso ecossistema e de sua interação com as causas antárticas irão requerer a instalação de
postos científicos, com equipamento e pessoal adequados, nas ilhas oceânicas referidas, como já ocorre
com a Ilha da Trindade, ocupada em caráter permanente pela Marinha do Brasil desde o Ano Geofísico
Internacional (1957) e onde funciona um posto oceanográfico e meteorológico.
Sob o ponto de vista de uso militar, não será exagerado imaginar a possibilidade de que, afirmava ainda
o Almirante Freitas na aludida conferência, “no futuro, possam ser instalados nessas ilhas sistemas de
detecção e de defesa, de superfície, submarinos e aéreos, que, alcançando a metade da distância entre cada
duas delas, e entre seus extremos e o continente, constituam um Sistema de Defesa Avançada para toda
a costa leste da América do Sul, ao sul do seu saliente nordeste”. Ainda sob tal ponto de vista, convém
recordar a importância que teve a Ilha de Ascensão para o Reino Unido durante a crise motivada pela
ocupação argentina das Ilhas Malvinas (Falklands). O uso daquela ilha como ponto de apoio permitiu à
Inglaterra projetar seu poder a mais de 13 mil milhas de distância, expulsando os argentinos das Malvinas
e suas dependências e consolidando a soberania britânica sobre essas ilhas.

ALGUMAS INFORMAÇÕES SOBRE AS ILHAS OCEÂNICAS NO ATLÂNTICO SUL

As ilhas oceânicas de Ascensão, Santa Helena, Tristão da Cunha e Geórgia do Sul pertencem ao Reino
Unido, como resíduos do Império britânico.

30 RMB1 oT/2012
A Ilha de Ascensão foi descoberta pelo navegador português João da Nova Castella no Dia da
Ascensão, em 1501. É de origem vulcânica, com 88 quilômetros quadrados de superfície, e permaneceu
inabitada até a chegada de Napoleão Bonaparte a Santa Helena (1815), quando uma pequena guarnição
britânica ali ficou estacionada. Atualmente, a Ilha de Ascensão é considerada, juntamente com as Ilhas de
Tristão da Cunha, dependência da Ilha de Santa Helena, que é a sede do governo desse conjunto de ilhas.
A administração da Ilha de Ascensão é exercida por um representante do governador de Santa Helena.
Ascensão é um importante centro de telecomunicações, possuindo uma estação de grande potência para
comunicações por satélite. A ilha é também utilizada pelo governo dos Estados Unidos, que lá mantém
uma estação de acompanhamento de mísseis balísticos, assim como instalações para observações de voos
espaciais e para pesquisas no espaço exterior. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Ilha de Ascensão teve
significativa importância estratégica, como ponto de apoio para operações aeronavais, importância essa
novamente demonstrada no recente episódio anglo-argentino sobre as Ilhas Malvinas. Sua população é
de cerca de 1.700 habitantes, dos quais apenas 700 são nativos; o restante é composto de ingleses e
americanos em serviço na ilha.
A Ilha de Santa Helena foi também descoberta pelo navegador português João da Nova Castella, em 21
de maio de 1502, dia do aniversário de Santa Helena, quando de seu regresso da Índia, e permaneceu sob o
domínio de Portugal até 1645, quando foi ocupada pelos holandeses. Os ingleses, após breve disputa com os
holandeses, ocuparam a ilha em 1673 e a declararam propriedade da Companhia das Índias Orientais. Santa
Helena teve grande destaque por ter sido escolhida pelo governo britânico para o local de exílio de Napoleão
Bonaparte, em 1815. É de origem vulcânica, situada a cerca de 2 mil milhas da costa do Brasil, com 122
quilômetros quadrados de superfície, e sua capital é a cidade de Jamestown. A população é constituída, em sua
maioria, de mestiços de europeus, asiáticos e africanos, perfazendo um total de cerca de 5 mil habitantes,
dos quais 1/3 vive na capital e no porto. Santa Helena, assim como Ascensão, foi de grande importância
estratégica por ocasião da Segunda Guerra Mundial e, atualmente, forma, com Ascensão, um centro de
telecomunicações de excepcional importância para o mundo ocidental.
As Ilhas de Tristão da Cunha foram descobertas em 1506 pelo navegador português Tristão da Cunha,
em seu caminho do Brasil para montar o Cabo da Boa Esperança. A maior das três ilhas que compõem o
arquipélago, com 41 quilômetros quadrados de superfície, permaneceu com o nome do descobridor,

RMB1 oT/2012 31
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

Tristão da Cunha, e é, na verdade, a parte emersa de um grande vulcão, cuja cratera se abre a 2.100 metros
acima do nível do mar. Depois dos portugueses, os holandeses também estiveram na ilha. Porém ela só foi
ocupada definitivamente em 1816, quando os ingleses ali estabeleceram um acampamento constituído de
elementos da Marinha Real. Durante a última Guerra Mundial, uma estação naval de rádio e de meteorologia
foi instalada em Tristão da Cunha. Atualmente, a ilha possui uma estação meteorológica operada pela
África do Sul. O arquipélago tem despertado considerável interesse científico, pois, em virtude de seu
isolamento, a flora e a fauna lá existentes são compostas de espécies muito raras. As ilhas são considera-
das dependências de Santa Helena, para efeito administrativo, e possuem uma população inferior a 500
habitantes, incluído o pessoal necessário para a operação da estação radiometeorológica.
As Ilhas Geórgia do Sul podem ter sido descobertas pelo cosmógrafo florentino Américo Vespúcio
quando, no ano de 1501, a serviço do rei de Portugal, comandou uma expedição exploratória à costa do
Brasil e, depois de ter atingido São Vicente e Cananeia, tomou o rumo do sul, chegando “à altura do polo
antártico a 53 graus”, aí descobrindo “uma inóspita e grande terra muito frígida e coberta de névoa e onde
as noites eram muito longas”, conforme assinala em seu relato da viagem, tendo dela tomado posse, em
nome de El-Rei, a 7 de abril do mesmo ano. Pela posição registrada – 53 graus –, alguns historiadores
julgam que a terra descoberta tenham sido as Ilhas Malvinas; outros, as Geórgias do Sul. A Corte portugue-
sa registrou seus direitos de propriedade sobre as terras descobertas, em Lisboa, no ano de 1503, na
notaria de Valentim Fernandes e no tabelionato do alemão Wigenhoist.
Posteriormente, já no fim do século XVI, em 1599, o explorador holandês Dirk Gherritz avistou as
Geórgias e, no século seguinte, em 1675, o navegador português Antônio da Rocha ali desembarcou,
chamando a maior das ilhas do arquipélago (hoje Ilha de São Pedro) de Ilha Grande da Rocha. Um século
mais tarde, em 1775, o explorados inglês James Cook visitou as Geórgias e formalmente anexou o
arquipélago ao Império britânico. Nessa mesma época, Cook descobriu as Ilhas Sandwich do Sul e delas
também se apossou. A principal ilha do arquipélago das Geórgias do Sul é a Ilha de São Pedro, com cerca
de 3.755 quilômetros quadrados. Sua população, em grande parte, é composta de pescadores de baleia e
varia de 20 a 500 pessoas, de acordo com a estação de pesca.
Em 1917, as Ilhas Geórgias do Sul, juntamente com as de Sandwich do Sul, passaram à subordinação
das Ilhas Malvinas, constituindo, com essas últimas, uma unidade administrativa cuja sede do governo é
Port Stanley, capital das Malvinas. As Geórgias do Sul distam do litoral da Argentina mais do que o Brasil
dista da África, entre os salientes do Nordeste brasileiro e do Noroeste africano, e não pertencem à
Plataforma Continental daquele país, mas constituem pontos emersos de prolongamento meridional da
cadeia central do Atlântico Sul. É bem provável que as reivindicações argentinas com relação às Geórgias
do Sul e Sandwich do Sul decorram do fato de os ingleses terem considerado aquelas ilhas dependências das
Malvinas. Assim, os argentinos, que reclamavam unicamente a posse das Malvinas, passaram, atualmen-
te, a reivindicar a posse de todo o conjunto: Malvinas, Geórgias do Sul e Sandwich do Sul, que constituem,
para os ingleses, The Falkland Islands Dependencies. Durante o recente conflito anglo-argentino sobre
as Malvinas/Falklands, as Geórgias foram também ocupadas pelos argentinos e, posteriormente, recupe-
radas pelos ingleses.
As Ilhas Geórgias do Sul, sob o ponto de vista estratégico, são de suma importância para o controle do
acesso à Antártica pelo Atlântico Sul e às passagens marítimas do Sul da África e da América do Sul. Sob
o ponto de vista científico, sua posição é do maior interesse, pois situa-se exatamente na área da
convergência antártica, posição ideal sobretudo para apoio às pesquisas oceanográficas, físicas, químicas
e biológicas relativas àquele fenômeno e às suas interações com o ecossistema antártico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A participação do Brasil no que se convencionou chamar de Revolução Marítima, que é a integração


dos recursos do mar à ordem econômica internacional, como parte significativa da Terceira Revolução
Industrial, levará inevitavelmente o País a necessitar de posições oceânicas para o desenvolvimento de
seus projetos de pesquisas ligadas às ciências marinhas e às atividades de exploração e explotação dos
recursos do mar. Por conseguinte, uma ação do setor responsável pela Política Nacional para os Recursos
do Mar (PNRM) deverá ser exercida nesse sentido, de modo a permitir que o Brasil possa desenvolver
projetos científicos com apoio logístico baseado nas ilhas oceânicas de soberania britânica, se possível
por meio de acordos científicos bilaterais com o Reino Unido. Da mesma forma, o Brasil deverá procurar
atuar em projetos conjuntos com as nações da Europa Ocidental, com os Estados Unidos e com o Japão,
relativos à exploração e explotação dos recursos do mar na área do Atlântico Sul, a fim de absorver, em

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

curto prazo, a tecnologia necessária ao aproveitamento econômico de tais recursos, principalmente os


de origem mineral.
A Marinha do Brasil deve acompanhar esse processo, incentivando-o e procurando desenvolver um
Poder Naval que garanta ao País usar com segurança os recursos do mar, sobretudo os que se inserem na
região marítima que lhe foi outorgada pela nova Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar,
e que permita, ainda, ao Brasil ir deslocando gradativamente seus interesses para o Atlântico Sul, fora das
áreas de jurisdição nacional, em cooperação, se for o caso, com a autoridade internacional a ser estabelecida
pelas Nações Unidas para o gerenciamento dos recursos dos oceanos, nas áreas consideradas patrimônio
comum da humanidade.
Com relação às disputas anglo-argentinas pelas Ilhas Malvinas/Falklands, o apoio do Brasil às reivin-
dicações argentinas sobre aquelas ilhas não deverá incluir apoio às reivindicações daquele país sobre as
Geórgias e as Sandwich do Sul. Na realidade, não existem argumentos de natureza histórica, geográfica ou
geológica, nem jurídica, que justifiquem as pretensões argentinas sobre aqueles dois últimos grupos de
ilhas.
Finalmente, a excepcional importância das posições oceânicas do Atlântico Sul, demonstrada e
reafirmada no decurso de mais de cinco séculos de história, deverá estar sempre presente no pensamento
das elites nacionais responsáveis pela condução dos destinos do País, especificamente daquelas responsá-
veis por sua segurança e defesa.

BIBLIOGRAFIA

1. BAKKER, Mucio Piragibe Ribeiro de. “Direito do Mar: a humanidade conquista um patrimônio
comum”. Revista Brasileira de Tecnologia, Brasília, V-15(6) nov/dez 1984.
2. CÂMARA, V.Alte Ibsen de Gusmão. “O pensamento estratégico brasileiro – projeção de nossa
maritimidade na estratégia nacional”. Política e Estratégia. São Paulo, out/dez 1983, vol. 1 no 1,
p. 164-174.
3. FREITAS, V. Alte Paulo Irineu Roxo. “Estratégia do Brasil no futuro”. Conferência para o Curso
Superior de Guerra Naval. Escola de Guerra Naval, Rio de Janeiro, set 1980.

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

ANEXO C

UMA INSTITUIÇÃO PARA O BRASIL: A FUNDAÇÃO OCEANO

1. BRASIL – POTÊNCIA MARÍTIMA

Constitui, neste início de século, um grave entrave ao desenvolvimento do País não ter ainda o Brasil
realizado o ideal de potência marítima para o qual é natural e geopoliticamente vocacionado.
O que uma potência marítima aspira é à utilização otimizada do mar para o transporte de carga e de
passageiros e à exploração econômica dos seus recursos (pesca, energia, petróleo, minérios etc.), respei-
tando a preservação ambiental. Para atingir tais objetivos, são necessários informações e meios. A
garantia desses interesses e a utilização com segurança e independência exigem, ainda, uma Marinha
moderna e aparelhada.

2. SITUAÇÃO ATUAL
– Navegação de Longo Curso brasileira perdendo a sua participação no comércio exterior.
– Exportadores perdendo competitividade pelo alto custo operacional de nossos portos.
– Navegação de Cabotagem desaparecendo pelos altos custos operacionais (legislação de marítimos,
portos etc.) e burocracia de documentação, em favor do transporte rodoviário, o que economicamente
é ruinoso para o País.
– Construção naval em declínio.
– Baixa utilização de nossa rede de vias navegáveis interiores.
– Baixo nível de eficiência da pesca, tanto para o mercado interno quanto para exportação.
– A Marinha do Brasil, segmento militar do Poder Marítimo, essencial para a segurança, proteção e
defesa da área marítima de interesse do Brasil, tem tido alocação de recursos percentualmente inferior à
sua importância no contexto da Nação.
– Desconhecimento da dimensão precisa das riquezas superficiais e geológicas existentes na chamada
Amazônia Azul.
– Desconhecimento das características oceanográficas dos ambientes oceânicos e de suas interações
com a atmosfera, ambientes costeiros e sistema antártico, inclusive no que se refere aos aspectos físico-
químicos das águas de interesse imediato do Brasil.
– Desconhecimento das reais perspectivas e possibilidades concernentes à exploração mineral e à
utilização da energia do mar, sobretudo do emprego do hidrogênio, como combustível.
– Gerência de Banco de Dados Integrado, tanto para os dados econômicos e operacionais do transpor-
te marítimo como para os dados de condição do mar, meteorologia, correntes etc., que afetam a
exploração dos recursos do mar.
– Falta de segurança (pirataria, banditismo) para os navios nos portos e costas e para as plataformas
off-shore.
Podemos observar, ainda, que todos os assuntos e interesses pertinentes às atividades relativas ao
desenvolvimento de um Poder Marítimo à altura da posição a que o Brasil aspira no cenário mundial são
promovidas de forma independente e desordenada, quando não conflitante, por instituições e entidades
de classe representativas dos diversos segmentos envolvidos. Essas ações de promoção têm se caracteri-
zado por abordagens setoriais, descoordenadas, resultando em prejuízo para o todo.

3. SOLUÇÃO PROPOSTA
Visando sanar tais deficiências, a solução proposta seria a criação de uma fundação, que teria como
objetivo a promoção de estudos técnicos legais, econômicos e políticos necessários à formulação de uma
política integrada e abrangente, de utilização dos mares, das águas interiores e também da Antártica e das
Ilhas Oceânicas.
A existência dessa fundação apresenta as seguintes vantagens:
– independência e credibilidade de uma fundação que visa à concepção global do Poder Marítimo, em
lugar de instituições e entidades setoriais usualmente movidas por interesses conflitantes;
– possibilidade de concentrar massa crítica de recursos humanos de alto nível para apoiar com
credibilidade as ações de alteração da conjuntura junto aos poderes Executivo e Legislativo, auxiliando
estes poderes nas ações de âmbito regional e nacional;

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

– possibilidade de estabelecer o ambiente ideal para abrigar uma das Universidades Marítimas Mundiais
(WMU), prevista pela Organização Marítima Internacional (IMO), nos moldes semelhantes à primeira,
já implantada em Malmöe, Suécia;
– possibilidade de, por meio de uma coordenação em nível superior, apoiar as instituições e entidades
de cada setor específico, trabalhando também na captação de recursos para essas organizações;
– possibilidade de estabelecimento e manutenção de um banco de dados confiável, acima das suspeitas
setoriais; e
– estabelecimento de um fórum para discussão das discrepâncias setoriais, visando obter soluções
globais.

4. ESTRUTURA DA FUNDAÇÃO
A fundação teria a sua estrutura constituída de quatro institutos e três departamentos:
Instituto de Transporte Aquaviário – Para as atividades relativas à utilização dos mares e águas
interiores no transporte de carga e passageiros. Inclui navegação de longo curso, cabotagem, interior, portu-
ária e off-shore, portos, agências de navegação, seguro marítimo, sociedades classificadoras, construção naval,
estaleiros de construção e reparos, indústria de navipeças e equipamentos portuários, exportadores.
Instituto de Recursos do Mar – Para as atividades relativas à utilização dos mares e águas interiores e
da Antártica como fonte de recursos econômicos. Inclui empresas e frotas de pesca, complexos portuá-
rios pesqueiros, maricultura, exploração de petróleo off-shore, empresa de apoio marítimo, outros
recursos da plataforma e margem continentais, Amazônia Azul, Zona Econômica Exclusiva (ZEE),
inclusive em alto-mar e na zona sob jurisdição internacional, Antártica, ecologia e poluição marítima,
coordenação com universidades e entidades de pesquisas correlatas.
Instituto de Pesquisas Energéticas – Para as atividades relativas ao estudo das energias do mar: do
gradiente térmico, do gradiente de salinidade, das correntes marinhas, das marés, das ondas e do hidrogê-
nio da água do mar. Inclui a elaboração de programas para o aproveitamento do hidrogênio extraído da
água do mar, como possível substituto do petróleo e outros combustíveis fósseis e o acompanhamento
das pesquisas efetuadas sobre o deutério, como nova fonte de energia.
Instituto Naval – Para as atividades relativas à defesa da soberania, segurança e socorro da navegação
nos mares e águas interiores. Este instituto faria a interface da fundação com a Marinha do Brasil, dentro
da concepção maior do Poder Marítimo (poderia ser atribuição da Guarda Costeira e dos Rios, no caso de
sua criação).
Esses institutos serão operados por um pequeno núcleo permanente, que procurará obter a colabora-
ção de universidades e instituições afins, com o apoio dos seguintes departamentos:
Departamento de Apoio Especializado – Para apoio dos quatro institutos da fundação, nas áreas de
Economia, Estatística e Legislação. Incluiria o banco de dados da fundação.
Departamento de Apoio Externo – Para tratar especificamente do relacionamento com entidades
afins nacionais e estrangeiras.
Departamento de Apoio Administrativo – Para apoio dos serviços gerais comuns a todos os setores da
fundação acima descritos.

5. ESTRATÉGIA DE IMPLANTAÇÃO
Para viabilizar a fundação, objeto deste estudo, são consideradas as seguintes etapas:
– Consolidação do Grupo dos Principais Mantedores da fundação – Por meio de um processo de
aglutinação sucessiva, seria formado o Grupo dos Principais Mantedores (GPM). Este GPM custearia as
atividades necessárias para se atingir a etapa de implantação da fundação e continuaria a ser o principal
núcleo de mobilização e agregação dos agentes econômicos e sociais (associações e sindicatos incluídos)
ligados aos interesse do mar, em torno da fundação. A liberação de recursos obedeceria a cronograma a ser
estabelecido na etapa do anteprojeto da fundação.
– Discussão com a Femar, visando determinar a viabilidade de ser a fundação concretizada a partir da
Femar, por meio de adaptação dos seus estatutos, e definir as condições básicas para essa transformação.
Como esta transformação pode constituir um caminho para a Femar ampliar seu nível de atuação, pode-
se considerar que todos os óbices na utilização da Femar como base da nova fundação poderão ser
removidos de maneira satisfatória para todos os envolvidos.
– A Fundação Oceano poderá abranger o Instituto Superior do Mar (Insumar), conforme previsto nos
estatutos da Femar.

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

6. ANTEPROJETO DA FUNDAÇÃO

Esta etapa seria realizada por um Grupo de Trabalho designado pelo Grupo dos Principais Mantedores.
O anteprojeto estabeleceria os principais itens que o projeto deveria conter, o cronograma do projeto, o
pessoal a ser contratado para a execução e seu custo.

ANTEPROJETO DE ESTATUTO

FUNDAÇÃO OCEANO

CAPÍTULO I
Da Denominação, Regime Jurídico e Duração
Artigo 1o – A FUNDAÇÃO OCEANO é pessoa jurídica de direito privado, de fins não lucrativos, com
autonomia administrativa e financeira.
Artigo 2 o – A FUNDAÇÃO reger-se-á pelo presente Estatuto, por seu Regimento Interno e pela
legislação aplicável.
Artigo 3o – O regime jurídico da FUNDAÇÃO não poderá ser alterado, nem suprimidos seus objetivos
institucionais.
Artigo 4o – O prazo de duração da FUNDAÇÃO é indeterminado.
Parágrafo Único – A FUNDAÇÃO extinguir-se-á nos casos previstos no Código Civil.

CAPÍTULO II
Da Sede e Foro
Artigo 5o – A FUNDAÇÃO tem sede e foro na cidade do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro, e
poderá manter representações na Capital Federal e em outros Estados da Federação.

CAPÍTULO III
Dos Objetivos
Artigo 6 o – A FUNDAÇÃO tem por objetivo a execução de estudos e pesquisas necessários ao
conhecimento e utilização dos sistemas oceânicos, incluindo as águas interiores, o fundo e as camadas
subjacentes, e suas interações com os sistemas costeiros, atmosféricos e antárticos.
Parágrafo 1o – Classificam-se como águas interiores aquelas abrangidas por bacias, lagoas e rios, até
onde houver influência do mar.
Parágrafo 2o – As atribuições básicas da FUNDAÇÃO consistem na realização de trabalhos de pesqui-
sas, com desenvolvimento de tecnologia resultante; no incentivo ao ensino, em todos os níveis, em
setores ainda inexistentes no País; e na coordenação de ações, em seu campo de atribuições.
Parágrafo 3o – Os objetivos da FUNDAÇÃO serão atingidos mediante atuação nas áreas de:
I. recursos vivos;
II. recursos minerais;
III. recursos energéticos;
IV. produtos industriais;
V. utilização de ambientes costeiros;
VI. ambientes oceânicos;
VII. interação oceano-atmosfera;
VIII. interação com o sistema antártico;
IX. poluição;
X. formação pessoal; e
XI. intercâmbio com outros países e entidades afins.
Parágrafo 4o – Para a consecução de seus objetivos, a FUNDAÇÃO poderá celebrar convênios,
acordos ou contratos com pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado.
Parágrafo 5 o – A FUNDAÇÃO, além dos Órgãos Estatutários, terá na sua estrutura 4 (quatro)
Institutos e 3 (três) Departamentos:
I. Instituto de Transporte Aquaviário;
II. Instituto de Recursos do Mar;
III. Instituto de Pesquisas Energéticas;
IV. Instituto Naval;

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

V. Departamento de Apoio Especializado;


VI. Departamento de Apoio Externo; e
VII. Departamento de Apoio Administrativo.
Parágrafo 6o – A FUNDAÇÃO não visará à obtenção de lucros, nem os distribuirá, a qualquer título.
P arágrafo 7o – O exercício das atividades previstas neste Artigo, especialmente as que forem atribu-
ídas aos Institutos e Departamentos, será regulamentado pelo Regimento Interno da FUNDAÇÃO.

CAPÍTULO IV
Do Patrimônio
Artigo 7o – O patrimônio da FUNDAÇÃO será constituído pela dotação inicial e por bens e valores
que vierem a ser adicionados por meio de:
I. Doações, legados, auxílios, subvenções, contribuições e outras aquisições proporcionadas por pes-
soas físicas ou jurídicas, públicas ou privadas;
II. Rendas de bens ou serviços de qualquer espécie.
Parágrafo Único – A FUNDAÇÃO aplicará integralmente seus recursos na manutenção e no desen-
volvimento dos objetivos institucionais.
Artigo 8o – A alienação, sob qualquer forma, arrendamento, oneração ou gravame de bens móveis e
imóveis, bases flutuantes, navios e embarcações e equipamentos da FUNDAÇÃO, deverá ser autorizada
pelo Conselho Curador, ouvindo sempre o Ministério Público.

CAPÍTULO V
Dos Órgãos Estatutários
Artigo 9 o – São órgãos da FUNDAÇÃO:
I. Conselho Curador;
II. Diretoria; e
III. Conselho Consultivo.
Parágrafo Único – Além dos órgãos a que se refere este Artigo e os mencionados no Parágrafo 5o do
Artigo 6o, a FUNDAÇÃO poderá ter, na sua estrutura funcional, outros órgãos, fixados no Regimento
Interno, que auxiliarão a FUNDAÇÃO no desempenho inerente às suas atividades.
Artigo 10 – O exercício das funções de membro do Conselho Curador e da Diretoria não será
remunerado, a qualquer título.
Parágrafo 1o – Sem embargo da proibição constante deste Artigo, não haverá incompatibilidade de
prestação de serviços profissionais, desde que aprovadas pelo Conselho Curador e atendidas as disposições
do Artigo 3o deste Estatuto.
Parágrafo 2 o – Os membros da FUNDAÇÃO não respondem subsidiariamente pelas obrigações
sociais.
Artigo 11 – O Regimento Interno regulamentará as atividades e o funcionamento do Conselho
Curador e da Diretoria, em complementação a este Estatuto.

CAPÍTULO VI
Do Conselho Curador
Artigo 12 – O Conselho Curador é o órgão de julgamento dos atos administrativos e técnicos da
direção da Fundação, exercendo seu controle interno.
Artigo 13 – O Conselho Curador será composto de 7 (sete) membros, com mandato de 4 (quatro)
anos.
Parágrafo 1 o – A indicação dos membros acima referidos será feita por um colegiado composto dos
instituidores da FUNDAÇÃO, sendo 2 (dois) membros indicados pelos órgãos pertencentes ao Comando
da Marinha, 2 (dois) membros indicados pelos órgãos do Ministério da Ciência e Tecnologia e 3 (três)
membros pelos demais instituidores.
Parágrafo 2 o – Um dos membros indicados pelo Comando da Marinha deverá ser o diretor de
Hidrografia e Navegação, como membro nato, dada a condição que tem a entidade que dirige de exercer
atividades que se coadunam com a da FUNDAÇÃO.
Artigo 14 – A renovação dos mandatos dos membros do Conselho Curador far-se-á por partes, uma
de 3 (três) e outra de 4 (quatro) membros, de dois em dois anos.
Parágrafo Único – Os membros do Conselho Curador não poderão ser reeleitos para o mandato
subsequente.

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

Artigo 15 – A designação dos membros substitutos daqueles cujos mandatos expirar-se-ão será feita
pelo Colegiado referido no Parágrafo 1o do Artigo 13 em reunião que anteceda de, no mínimo, 30 (trinta)
dias o término dos mandatos.
Parágrafo Único – Na hipótese de vacância de cargo no Conselho Curador, o Órgão Instituidor que
o indicou elegerá o substituto para completar o mandato correspondente.
Artigo 16 – Na primeira reunião posterior à renovação de cada uma de suas partes, o Conselho
Curador elegerá, dentre os membros, o seu presidente, para um mandato de 2 (dois) anos.
Parágrafo Único – O presidente do Conselho Curador poderá ser reeleito, caso conserve a qualidade
de membro do Conselho.
Artigo 17 – Compete ao Conselho Curador:
I. observar e fazer cumprir este Estatuto, o Regimento Interno da Fundação, os Regulamentos e as
Resoluções das autoridades competentes;
II. eleger, 1 (um) mês antes do término do mandato de uma Diretoria, os membros da Diretoria para
o mandato seguinte, podendo destituí-los;
III. prover cargo vago da Diretoria, até o fim do respectivo mandato;
IV. deliberar sobre a aceitação de doações com encargos;
V. aprovar o plano de trabalho e o orçamento da FUNDAÇÃO para cada exercício;
VI. deliberar sobre os relatórios finais de atividades e a prestação de contas da FUNDAÇÃO em cada
exercício;
VII. autorizar a alienação, o arrendamento, a oneração ou o gravame de bens móveis e imóveis, bases
flutuantes, navios, embarcações e equipamentos da FUNDAÇÃO;
VIII. determinar, ao fim de cada exercício, a parte dos rendimentos líquidos a ser incorporada ao
patrimônio da FUNDAÇÃO;
IX. aprovar o Regimento Interno da FUNDAÇÃO;
X. alterar este Estatuto e deliberar sobre a extinção da FUNDAÇÃO, conforme previsto no Artigo 43
deste Estatuto; e
XI. deliberar sobre os casos omissos neste Estatuto.
Artigo 18 – Compete ao presidente do Conselho Curador:
I. convocar o Conselho, ordinária e extraordinariamente;
II. dirigir os trabalhos do Conselho, cabendo-lhe, no caso de empate, o voto de qualidade; e
III. enviar ao Ministério Público cópia das atas das reuniões do Conselho Curador.
Artigo 19 – O Conselho Curador reunir-se-á, ordinariamente, de três em três meses, e, extraordina-
riamente, quando convocado por seu presidente ou pelo diretor-presidente da FUNDAÇÃO.
Parágrafo 1o – O Conselho Curador reunir-se-á:
1. em primeira convocação, com a presença de, no mínimo, quatro de seus membros;
2. em segunda convocação, com qualquer número.
Parágrafo 2o – A deliberação sobre as matérias a que se referem os incisos II, III, VII e IX do Artigo
17 deste Estatuto dependerá do voto da maioria absoluta dos membros do Conselho Curador.

CAPÍTULO VII
Da Diretoria
Artigo 20 – A Diretoria será composta de 3 (três) membros, sendo um diretor-presidente, um vice-
diretor e um assessor para Assuntos Especiais.
Parágrafo Único – Os membros do Conselho Curador não poderão ser eleitos para a Diretoria.
Artigo 21 – Os membros da Diretoria serão eleitos pelo prazo de 3 (três) anos.
Artigo 22 – Os membros da Diretoria permanecerão no cargo até a investidura de quem os substitua.
Artigo 23 – A Diretoria reunir-se-á 1 (uma) vez por mês, ordinariamente, e sempre que necessário,
extraordinariamente.
Parágrafo 1o – As reuniões da Diretoria serão convocadas pelo diretor-presidente, ou em conjunto,
pelo vice-diretor e assessor para Assuntos Especiais.
Parágrafo 2 o – A Diretoria somente deliberará com a presença de, no mínimo, 2 (dois) de seus
membros, cabendo, no caso de empate, ao diretor-presidente o voto de qualidade.
Artigo 24 – Compete à Diretoria a prática de todos os atos necessários para assegurar o funciona-
mento regular da FUNDAÇÃO, especialmente:
I. submeter à deliberação do Conselho Curador projeto de Regimento Interno da FUNDAÇÃO;
II. indicar os membros da Secretaria Executiva da FUNDAÇÃO;

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

III. aprovar o plano de cargos e salários e o quadro de pessoal da FUNDAÇÃO, de acordo com as
necessidades administrativas e as condições existentes no mercado de trabalho;
IV. aprovar as normas sobre aquisição e alienação de bens móveis e imóveis, bases flutuantes, navios,
embarcações e equipamentos;
V. aprovar normas para contratação e execução de obras e serviços;
VI. submeter à deliberação do Conselho Curador, até novembro de cada ano, plano de trabalho e
proposta orçamentária para o exercício seguinte;
VII. submeter à deliberação do Conselho Curador, até abril de cada ano, os relatórios finais de
atividades e a prestação de contas da FUNDAÇÃO referentes ao exercício findo;
VIII. aprovar a instalação de representação na Capital Federal e em outros Estados da Federação; e
IX. escolher os membros do Conselho Consultivo na forma estabelecida neste Estatuto.
Artigo 25 – Compete especialmente ao diretor-presidente:
I. representar a FUNDAÇÃO ativa e passivamente, em juízo ou fora dele;
II. constituir procuradores, devendo, do instrumento respectivo, constar o prazo de validade para uso
dos poderes conferidos, salvo nos mandatos ad judicia;
III. convocar e presidir as reuniões da Diretoria;
IV. solicitar a convocação extraordinária do Conselho Curador;
V. autorizar admissões, transferências, reenquadramento, promoções, remanejamento, alterações
salariais, punições e demissões de pessoal, de acordo com as normas e regulamentos em vigor e os limites
do Quadro de Pessoal aprovado, podendo delegar, no todo ou em parte, suas atribuições, observado o
Artigo 24, item III deste Estatuto;
VI. autorizar a aquisição, alienação, arrendamento, cessão, oneração ou gravame de bens móveis e
imóveis, bases flutuantes, navios, embarcações e equipamentos;
VII. emitir, aceitar, endossar e avaliar letras de câmbio, duplicatas, notas promissórias e cheques;
VIII. autorizar a celebração de cauções, transações, acordos e renúncia de direitos;
IX. promover, contratar e superintender estudos, projetos e demais serviços técnicos; e
X. praticar todos os demais atos de gestão que não sejam atribuídos por este Estatuto ao Conselho
Curador ou à Diretoria, propondo a esses órgãos as medidas que dependam de sua aprovação.
Parágrafo Único – Em caso de impedimento eventual, o diretor será substituído pelo vice-diretor.
Artigo 26 – Compete, especialmente, ao vice-diretor e ao assessor para Assuntos Especiais, desem-
penhar as atribuições que lhes sejam conferidas no Regimento Interno da FUNDAÇÃO.
Artigo 27 – É terminantemente defeso a todos e a qualquer dos membros da Diretoria, e ineficaz em
relação à FUNDAÇÃO, o uso da denominação desta em negócios estranhos aos objetivos institucionais,
inclusive em fianças, avais ou quaisquer outras garantias de favor.
Artigo 28 – Nos atos que acarretarem responsabilidade para a FUNDAÇÃO, deverá ela ser represen-
tada pelo diretor-presidente, pelo vice-diretor ou pelo assessor para Assuntos Especiais, ou ainda por
bastantes procuradores, observadas as condições deste Estatuto e os limites que forem estabelecidos pelo
Conselho Curador.

CAPÍTULO VIII
Do Conselho Consultivo
Artigo 29 – O Conselho Consultivo – Consult – será constituído por 5 (cinco) membros, represen-
tantes das instituições de caráter público e privado com as quais a FUNDAÇÃO mantenha convênio.
Artigo 30 – Os representantes referidos no Artigo anterior e seus suplentes serão escolhidos pela
Diretoria, dentre os nomes relacionados pelas instituições conveniadas.
Artigo 31 – Os mandatos dos membros do Consult e de seus suplentes terão a duração de 2 (dois) anos,
permitindo a recondução, na forma do Artigo anterior.
Artigo 32 – A cessação do convênio com a instituição a que pertença o representante implicará o
término do mandato deste e de seu suplente.
Artigo 33 – A função do membro do Consult não será remunerada.
Artigo 34 – O Consult será presidido pelo diretor-presidente da FUNDAÇÃO.
Artigo 35 – Compete ao Consult:
I. eleger seu vice-presidente;
II. elaborar seu Regimento Interno, a ser baixado por Portaria do diretor-presidente, ouvida a Diretoria;
III. reunir-se ordinariamente nas datas estabelecidas no Regimento Interno do Conselho e extraordi-
nariamente, quando convocado pelo presidente ou pela maioria de seus membros;

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NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

IV. propor medidas visando ao aprimoramento do desempenho da FUNDAÇÃO;


V. assessorar a Diretoria e o diretor-presidente no desempenho de suas atribuições, sempre que
solicitado;
VI. promover a ampliação de relacionamento da FUNDAÇÃO com o meio empresarial e instituições
públicas; e
VII. desempenhar as demais atribuições que ficarem estabelecidas no próprio Regimento Interno ou
no Regimento Interno da FUNDAÇÃO.

CAPÍTULO IX
Do Exercício Financeiro
Artigo 36 – O exercício financeiro da FUNDAÇÃO coincidirá com o ano civil.
Artigo 37 – Apresentados pela Diretoria, ao Conselho Curador, a proposta orçamentária e o plano
de trabalho para o exercício seguinte (inciso V do Artigo 24), terá este o prazo de 30 (trinta) dias para
deliberar a respeito.
Parágrafo Único – Esgotado o prazo previsto neste Artigo, sem deliberação, a proposta orçamentá-
ria e o plano de trabalho serão considerados aprovados.
Artigo 38 – Apresentados pela Diretoria, ao Conselho Curador, os relatórios finais de atividades e a
prestação de contas referentes ao exercício findo (inciso VII do Artigo 24), terá este o prazo de 30
(trinta) dias para deliberar a respeito.
Parágrafo Único – Esgotado o prazo previsto neste Artigo, os relatórios finais de atividades e a
prestação de contas serão considerados aprovados, ficando a Diretoria autorizada a publicar os documen-
tos correspondentes, bem como enviá-los ao Ministério Público.
Artigo 39 – Aos resultados líquidos provenientes das atividades da FUNDAÇÃO em cada exercício,
parte será lançada em seu Fundo Patrimonial e parte será utilizada para atividades do exercício seguinte.

CAPÍTULO X
Das Disposições Gerais
Artigo 40 – O Regime de Trabalho dos empregados da FUNDAÇÃO, incluindo pessoal administrati-
vo, docente e técnico, será o da Consolidação da Leis do Trabalho ou o estabelecido por contrato de
locação de serviços.
Artigo 41 – A alteração do presente Estatuto poderá ser feita dentro das seguintes condições:
I. deverá ser aprovada por, no mínimo, 4 (quatro) membros do Conselho Curador;
II. não poderá contrariar os objetivos da FUNDAÇÃO; e
III. deverá ser aprovada pelo Ministério Público.
Artigo 42 – A ausência de um membro do Conselho Curador ou da Diretoria a três reuniões ordinárias
sucessivas, sem justificativa por escrito, implica a perda de seu mandato e, consequentemente, vacância
do cargo.
Artigo 43 – Extinguindo-se a FUNDAÇÃO, nos casos previstos em Lei ou por decisão unânime da
totalidade dos membros do Conselho Curador, será nomeada uma Comissão liquidante, pelo referido
Conselho, que decidirá sobre a destinação do patrimônio da FUNDAÇÃO.

CAPÍTULO XI
Das Disposições Transitórias
Artigo 44 – O primeiro Conselho Curador, designado pelos Instituidores da Fundação, é composto
por sete membros.
Parágrafo 1o – Três membros são designados para um mandato de 2 (dois) anos, contados da data da
instituição da FUNDAÇÃO, após os quais ocorrerá a primeira substituição de parte dos membros do
Conselho Curador, para um mandato de 4 (quatro) anos.
Parágrafo 2o – Os demais membros são designados para um mandato de 4 (quatro) anos, após os quais
ocorrerá a segunda substituição de parte do Conselho Curador, para um mandato de 4 (quatro) anos.
Parágrafo 3o – As indicações e substituições reger-se-ão pelos dispostos nos Parágrafos 1o e 2o do
Artigo 13 deste Estatuto.
Artigo 45 – A primeira Diretoria, indicada pelos instituidores da Fundação, com um mandato de 3
(três) anos, é composta por: Diretor-Presidente, Vice-Diretor e Assessor para Assuntos Especiais.
Artigo 46 – O Regimento Interno da Fundação deverá ser apresentado pela Diretoria do Conselho
Curador no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data de aprovação deste Estatuto pelo Ministério Público.

40 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

7. PROJETO DA FUNDAÇÃO
Compreenderia o detalhamento dos itens definidos, resultando nos seguintes capítulos:
– Estatutos;
– Programa de Trabalho;
– Estrutura de Organização e Cronograma de Implantação;
– Recursos Humanos; e
– Custo de Investimento e Custo Operacional.
O projeto usaria como base a elaboração de programa de trabalho de cinco anos de duração, com revisão
e atualização anuais. Assim, o primeiro ano seria detalhado e os outros quatro estimados em menor detalhe.

8. IMPLANTAÇÃO DA FUNDAÇÃO
Feita de acordo com o cronograma a ser definido na etapa anterior.
Os programas de trabalho deverão ter um horizonte de planejamento de cinco anos e seriam revistos
anualmente. Existiria a necessidade de um comprometimento do Grupo de Principais Mantedores pelo prazo
mínimo de dez anos, para consolidar a fundação por meio da credibilidade dos trabalhos desenvolvidos.

9. RECURSOS PARA A FUNDAÇÃO


Inicialmente, a fundação utilizaria os recursos dos mantedores, buscando, em seguida, complementar
e ampliar seus recursos por meio da utilização de verbas e financiamentos (inclusive a fundo perdido)
disponíveis, nacional e internacionalmente (IMO), para estudos e investimentos na área marítima.
Além dos recursos financeiros provenientes dos mantedores e do uso de verbas disponíveis, a funda-
ção geraria recursos através da prestação de serviços pertinentes a seus objetivos.
A fundação procuraria incentivar, ao máximo, as instituições e entidades afins já existentes, apoiando
no possível suas atividades e contribuindo para a formação de recursos humanos qualificados.

FUNDAÇÃO OCEANO

Possível agenda para reunião dos Principais Mantedores.


1. Propósito da Reunião
1.1 Convencer os Principais Mantedores (PM) da necessidade da Fundação; e
1.2 Estabelecer a rede de convencimento dos demais possíveis instituidores/mantedores. O primeiro
nível da rede seria composto dos presentes convidados para esta reunião. A cada um seriam alocados quais
instituidores ou empresas que eles deveriam entrar em contato. Um cronograma seria acertado. Um
coordenador dessa fase de aliciamento seria designado, o qual manteria estreito contato com os PM.
2. Pontos a serem mencionados para atingir o propósito exposto no item 1.1 acima:
– Independência e credibilidade provenientes de uma fundação global que harmonizaria interesses
legítimos das entidades setoriais, que poderiam ser conflitantes.
– Concentração da massa crítica de técnicos especializados, que apoiariam as ações de alteração da
conjuntura, junto ao Executivo e ao Legislativo.
– Banco de dados compreensivo, coerente e de confiabilidade, acima de suspeitas setoriais.
– Fórum para discussão das discrepâncias setoriais, visando obter uma solução global.
– Os técnicos e o banco de dados da fundação apoiariam as entidades de cada setor específico nos
estudos de aperfeiçoamento interno desse setor.
– A Fundação teria as condições ideais para abrigar uma das Universidades Marítimas Mundiais
(WMU) previstas pela IMO. A primeira já foi implantada em Malmöe, Suécia, em 1983, e existe um
protocolo entre o Brasil e a IMO, de 1988, com relação a este assunto.
– Necessidade de um comprometimento pelo prazo mínimo de dez anos para consolidar a Fundação,
com a credibilidade dos trabalhos desenvolvidos.

POSSÍVEIS ÓRGÃOS INSTITUIDORES DA FUNDAÇÃO OCEANO


(Pessoas Jurídicas Públicas e/ou Privadas)

– Comissão Interministerial para os Recursos do Mar – Cirm


– Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico – CNPq
– Financiadora de Estudos e Projetos – Finep
– Instituto de Pesquisas Espaciais – Inpe

RMB1 o T/2012 41
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

– Petróleo Brasileiro S/A – Petrobras


– Diretoria de Hidrografia e Navegação – DHN
– Instituto de Pesquisa da Marinha – IPqM
– Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo – Iousp
– Ministério da Educação (diversas universidades)
– Ministério dos Transportes (Marinha Mercante)
– Ministério da Pesca
– Ministério da Ciência e Tecnologia
– Ministério das Relações Exteriores
– Ministério do Meio Ambiente
– Associação Nacional de Empresas de Aerolevantamento – Anea
– Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC
– Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – Fiesp
– Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul – Fiergs
– Fundação Bradesco
– Fundação Roberto Marinho
– Sociedade Brasileira de Cartografia – SBC
– Empresas de mineração
– Empresas de pesca
– Empresas de engenharia
– Observatório Nacional – ON/CNPq
– Clube Naval
–Fundação de Estudos do Mar – Femar
– Departamento Nacional da Produção Mineral – DNPM

ANEXO D

O BRASIL E O OCEANO: EM BUSCA DE UMA ATUAÇÃO CONSISTENTE

O Brasil tem no mar interesses e direitos a serem exercidos, explorados e defendidos.


Diante do imenso território continental e de seus desafios, o mar, tradicionalmente, despertou menos
atenção que os desafios continentais.
Assim, só na segunda metade do século passado é que começaram a surgir iniciativas como:
– a do Alte. Paulo Moreira da Silva, que veio a resultar na criação do instituto que hoje tem seu nome;
– a da Universidade de São Paulo, com a criação do Instituto Oceanográfico e a aquisição de um navio
de pesquisas;
– a criação da Femar, pelo Alte. José Santos Saldanha da Gama;
– a criação de cursos de Oceanografia em diversas universidades;
– a criação da Cirm e a ativação da sua secretaria, no âmbito do então Ministério da Marinha, do que
resultou a elaboração do Plano Setorial Para os Recursos do Mar e do Programa Antártico Brasileiro.
Em paralelo com esses esforços, a Petrobras obteve resultados concretos e espetaculares na explora-
ção dos poços submarinos, culminando com a exploração em águas profundas.
Esse desenvolvimento, em seu conjunto, levou o Brasil a completar com sucesso o levantamento da
plataforma continental exigido pela Convenção das Nações Unidas Sobre o Direito do Mar, assegurando
a jurisdição brasileira sobre uma imensa área marítima e abrindo a porta para novos empreendimentos,
montados sobre uma base sólida sob os aspectos jurídico e tecnológico.
Uma análise, ainda que superficial, de toda essa trajetória bem-sucedida leva a perguntar sobre sua
continuidade e ampliação no futuro, com um firme olhar para o oceano em seu aspecto mais global, a
partir do Atlântico Sul.
Olhando mais pormenorizadamente para esse panorama, veremos que já existe uma estrutura
institucional, formada ao longo do tempo, compreendendo organizações de pesquisa, gerenciamento e
coordenação.

42 RMB1 oT/2012
NOSSA CAPA – O MAR E SEUS RECURSOS

O que faltaria então para que esta estrutura agisse de maneira mais produtiva, buscando desde agora
identificar demandas e criar uma plataforma capaz de atendê-las na hora devida?
Nota-se que, no progresso realizado até recentemente, a atividade não governamental, movida por
interesses econômicos imediatos (Petrobras), atingiu resultados extremamente significativos, pouco se
utilizando dos mecanismos existentes na esfera do governo e das universidades.
No entanto, os conhecimentos e a experiência colhidos foram colocados a serviço do País no
levantamento econômico da plataforma continental (Projeto Leplac)
O vulto dos empreendimentos futuros em alto-mar, em uma área cada vez mais ampla, nos aponta
esse caminho de união de esforços como o mais viável.
No entanto, torna-se necessária a identificação das lacunas de conhecimento, sem desprezar os
esforços internacionais de pesquisa, mas tendo em vista, em primeiro lugar, os interesses do Brasil, em
termos de desenvolvimento econômico e de sustentabilidade dos recursos.
Para que esse processo se desenvolva, é necessário juntar a comunidade científica e o discernimento
político-diplomático em seu nível mais alto, capaz de vislumbrar o mar como o cenário relevante da
atividade humana e da preservação do planeta nas décadas vindouras.
Cabe, então, verificar se a Cirm e a Femar, com sua configuração atual e estreitíssima vinculação à
Marinha, têm condições para exercer esse papel e se uma participação privada nessas organizações seria
viável. Nelas, a participação da Marinha teria a virtude de afastar injunções político-partidárias, mas, por
outro lado, limitaria possivelmente o escopo da sua jurisdição e de seus interesses. Tal situação viria a
ocorrer caso a estrutura desejada viesse a ser implantada em qualquer ramo do governo, com a exceção,
talvez, do MRE.
Um caminho mais consistente seria a criação de uma fundação, com recursos governamentais e
privados e com uma estrutura de controle operada por servidores de Estado (militares e diplomatas), por
cientistas e técnicos especializados das empresas que tivessem interesses ligado ao mar. Caberia a essa
fundação propor as linhas de pesquisa e lhes conseguir o apoio logístico indispensável a sua realização.
A Fundação Oceano, constituída segundo estatutos adequados a partir dos que estão anexos, concen-
traria uma elite intelectual e técnica à altura dos desafios que se apresentam ao País e gradualmente
poderia absorver algumas funções gerenciais atualmente exercidas por outras instituições e fortalecer,
com uma visão integrada, as ações nos campos científico, político, econômico e de defesa capazes de
levar o Brasil a fazer frente aos desafios marítimos que a sua posição mundial certamente lhe trará em
ritmo crescente.
As ações necessárias no momento seriam:
– a identificação de instituições dispostas a constituir um núcleo capaz de exercer uma atuação forte
no estabelecimento da fundação. O Ministério da Defesa (Comando da Marinha), o Ministério da Ciência
e Tecnologia, o Ministério das Relações Exteriores e a Petrobras poderiam ser convidados para esse fim;
– a elaboração por esse grupo, possivelmente no âmbito da Cirm, de um cronograma para a execução
dos passos necessários a concretizar o estabelecimento da fundação, se possível a partir da estrutura da
Femar.

RMB1 o T/2012 43
PRÊMIO REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA DE 2010

Instituído em 11 de junho de 1907 pelo de maior utilidade para a Marinha. A partir


Decreto no 6.510, o Prêmio Revista Maríti- de 1950, o Prêmio RMB passou a ser con-
ma Brasileira tem o propósito de estimu- cedido a cada três anos, republicando-se o
lar o estudo e a pesquisa de assuntos téc- artigo premiado. Os autores já distingui-
nico-navais, sendo concedido, desde 1910, dos com o prêmio estão relacionados na
ao autor do trabalho que for considerado segunda capa desta revista.

ESTADO-MAIOR DA ARMADA
PORTARIA No 117/EMA, DE 23 DE AGOSTO DE 2011

O chefe do Estado-Maior da Armada, – Almirante de Esquadra (RM1-FN) Alva-


no uso da delegação de competência que ro Augusto Dias Monteiro, pelo trabalho “As
lhe confere o inciso X, art. 1o, Anexo A da Operações de Paz, o erro de Descartes e os
Portaria no 93/2009, do CM, resolve: pressupostos do imaginário de Castoriadis”,
Art. 1o – Conceder a Medalha “Revista publicado na RMB do 3o trimestre de 2010.
Marítima Brasileira”, relativa ao triênio 2008, Art. 2o – Outorgar o diploma de “Hors
2009 e 2010, ao seguinte autor de trabalho Concours” (in memoriam), relativo ao
abaixo mencionado: triênio 2008, 2009 e 2010, ao Vice-Almirante
PRÊMIO REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA

(Refo) Armando Amorim Ferreira Vidigal, – Contra-Almirante (RM1) Reginaldo


pelo trabalho “O Brasil na América do Sul Gomes Garcia dos Reis, pelo trabalho “A
– uma análise político-estratégica”, publi- Terra controlada na Terra ou a Quarta Di-
cado na RMB do 3o trimestre de 2008. mensão Estratégica: uma continuação da
Art. 3o – Outorgar o diploma de “Men- Geopolítica?”, publicado na RMB no 2o tri-
ção Honrosa”, relativo ao triênio 2008, 2009 mestre de 2010.
e 2010, aos seguintes autores de trabalhos Art. 4o – Esta Portaria entra em vigor na
abaixo mencionados: presente data.
– Contra-Almirante (RM1) Adalberto
Casaes Júnior, pelo trabalho “O Submari- LUIZ UMBERTO DE MENDONÇA
no Nuclear Brasileiro. Uma visão”, publi- Almirante de Esquadra
cado na RMB no 2o trimestre de 2009; e Chefe do Estado-Maior da Armada

ALVARO AUGUSTO DIAS MONTEIRO

Nomeado guarda-marinha em 13 de de- comandá-lo e, depois, exerceu mais sete


zembro de 1968, foi promovido a capitão- comandos: Centro de Reparos e Suprimen-
tenente em agosto de 1974, a capitão de tos Especiais do CFN, Tropa de Reforço,
mar e guerra em abril Centro de Instrução
de 1991, a contra-al- Almirante Sylvio de
mirante em novembro Camargo, Material de
de 1998 e a almirante FN, Força de Fuzilei-
de esquadra em 25 de ros da Esquadra, Pes-
novembro de 2006. soal de FN e Geral do
Transferido para a re- Corpo de Fuzileiros
serva remunerada em Navais. Além dos cur-
25 de novembro de sos de carreira da Ma-
2010. rinha, completou os
Como tenente, ser- cursos de Guerra na
viu nos Batalhões Selva, de Paraquedis-
Humaitá, Tonelero e mo de Combate, de
no Comando da Tro- Salto Livre, de Mestre
pa de Reforço da For- de Salto “A” e de
ça de Fuzileiros da Es- Avançado de Opera-
quadra. Cursou o ções Anfíbias. Possui
Royal Navy Staff Course na Inglaterra e, diversas condecorações, entre as quais a
em seguida, foi instrutor na Escola de Guer- da Ordem do Mérito Naval (Grã-Cruz) e a
ra Naval. Voltou ao Batalhão Tonelero para Medalha Naval de Serviços Distintos.

RMB1 o T/2012 45
AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES
E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE
CASTORIADIS
ALVARO AUGUSTO DIAS MONTEIRO
Almirante de Esquadra (FN)

SUMÁRIO

Introdução
Uma ligeira digressão
As operações de paz

INTRODUÇÃO de Católica do Rio de Janeiro (PUC/Rio), nos


dias 14 e 15 de abril de 2010.

E ste artigo é uma adaptação de uma con-


ferência que proferi no encerramento do
Seminário Europe and Latin America in Peace
Como um dos propósitos do seminário
era o de estabelecer laços entre os militares
e a Academia, julguei que não deveria abor-
Operations: Comparative Perspectives and dar tema estritamente técnico, relacionado à
Practices, realizado na Pontifícia Universida- doutrina ou aos procedimentos do emprego
AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

militar. Melhor faria se abordasse algo co- to militar cometeu ao aplicar seu método
mum aos militares, executantes por excelên- dedutivo, racional, baseado no rigor da
cia das operações de paz, e aos civis da Aca- evidência e na precisão da lógica matemá-
demia, estudiosos e intelectualmente inte- tica para encontrar soluções para quais-
ressados nessas operações e que, por sua quer problemas militares, a despeito de suas
vez, também, são executantes, na medida diferentes naturezas.
em que delas participam, por intermédio das Subordinando-se incondicionalmente ao
diversas agências e organizações civis que racionalismo cartesiano, o pensamento mili-
atuam nas operações de paz. tar parece ter abandonado completamente
Assim, na busca do tema a comentar, qualquer sentido de intuição, embora ele
optei por uma abordagem mais ampla, mais mesmo, Descartes, tenha atribuído o insight
superficial do que detalhada, com o intuito que resultou no desenvolvimento de seu
de, no tempo destinado à conferência, ser método a uma intuição, a uma revelação da
capaz de trazer à ponderação dos partici- natureza que cria, mas que não foi criada.
pantes do seminário De tal forma assimi-
algumas influências lamos o método de
que, a meu ver, as ope- Somos, os militares, por Descartes que nos tor-
rações de paz estão definição, cartesianos; namos talvez uma de
trazendo ao pensa- suas maiores expres-
mento militar. Por isso somos reconhecidamente sões. Somos, os mili-
o tema: “As opera- dotados de mentalidade tares, por definição,
ções de paz, o erro de cartesianos; somos re-
Descartes e os pres-
cartesiana conhecidamente dota-
supostos do imaginá- dos de mentalidade
rio de Castoriadis”. cartesiana.
Embora esse tema tenha mais pompa que A submissão ao rigor intelectual de Des-
circunstância, mais título que conteúdo, cartes, que, de certo modo, privilegia o
decidi abordá-lo porque julgo interessantes método em detrimento do talento, certa-
as influências das operações de paz sobre o mente contribuiu para as interpretações e
pensamento militar, particularmente os im- aplicações equivocadas de suas ideias ao
pactos que as novas modalidades de opera- pensamento militar, cuja total e irrestrita
ções de paz, denominadas robustas, com obediência aos ditames doutrinários cris-
certeza trarão a esse pensamento1. talizou-se com o passar do tempo, trans-
Uma dessas influências incide no erro de formando o estamento militar em uma insti-
Descartes, expressão que “roubei” do título tuição doutrinariamente dogmática, plena
de um dos livros de Antonio Damásio, em de verdades consideradas absolutas. Uma
que este renomado neurobiólogo aborda a instituição que, como toda instituição
emoção, a razão e o cérebro humano. dogmática, muitas vezes define ela própria,
Talvez, no caso militar, o erro não tenha para si mesma, tanto novas maneiras de
sido propriamente de Descartes, mas da responder às suas necessidades como no-
equivocada generalização que o pensamen- vas necessidades, enquadrando-se no
1
Operações de paz ditas “robustas” seriam operações de paz complexas e críticas, como aquelas que se
destinariam à proteção de civis “sob ameaça iminente de violência física”, nas quais há limitado, ou
nenhum, consentimento dos partidos no terreno e em que o uso do armamento não estaria restrito
à proteção individual do combatente e sim, também, ao efetivo cumprimento da missão.

RMB1 o T/2012 47
AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

modelo de sociedade, no sentido de orga- em 2003, quando, ao planejar o emprego de


nização, tão criticado por Castoriadis. sua Divisão na Fase IV da Guerra – Fase de
Já me encontro, portanto, no terreno Estabilização –, que estava prestes a se iniciar,
perigoso de Castoriadis e seu imaginário inconformado com a postura de alguns co-
social. Imaginário que para ele, Castoriadis, mandantes que se escudavam inflexivelmente
não é imagem e sim criação. Sendo que o em preceitos e princípios doutrinários para
essencial da criação não é a descoberta do nortear suas ações, declarou: “A doutrina é o
que já existe, mesmo que ainda seja desco- último refúgio dos sem imaginação”.3
nhecido, muito menos Ainda que para
o mero desenvolvi- muitos, principalmen-
mento ou a evolução A doutrina não pode ser te para estudiosos e
do que já existe.
Para Castoriadis, cri-
considerada um dogma; analistas militares da
América do Sul, as
ação é a constituição do portanto, imutável, operações no Iraque e
novo, é o rompimento inflexível, rígida. Ela não no Afeganistão não
com parâmetros e devam ser enquadra-
paradigmas institu- deve cercear a iniciativa, das como operações
cionais para alcançar ela não pode justificar a de paz (embora todos
um novo patamar de os palestrantes euro-
atuação. Processo que
inação. peus do seminário as
ele viveu, não sem an- O racionalismo cartesiano considerassem como
gústia, quando rompeu da supremacia do pensar, tal), é forçoso, pelo
com o marxismo. Rom- menos, constatar que
pimento que justificou da absoluta supremacia da as condicionantes da-
como uma decisão, da razão, não pode, de modo queles ambientes
qual não pôde fugir,
“entre a fidelidade a
algum, anular por completo operacionais não dife-
rem muito das que se
uma doutrina que há o sentir, não pode anular o espera encontrar nas
muito tempo já não es- intuir operações de paz fu-
timula nem uma reflexão turas, ditas robustas
nem uma ação e a fide- pelo menos no que
lidade ao projeto de uma transformação radi- concerne à sua natureza, embora possam
cal da sociedade”.2 diferir no grau de intensidade.
Este pensamento síntese de Castoriadis São justamente essas operações (Afe-
está, de certo modo, refletido também com muita ganistão e Iraque) que, atualmente, estão pon-
clareza e, por que não, com idêntica angústia do em cheque o pensamento militar e sua dou-
nas já notórias palavras do Major-General trina de emprego, previamente estabelecida
Fuzileiro Naval James Mattis, comandante da para atuação nesses cenários, que não tem
1a Divisão de Marines (Fuzileiros Navais dos conseguido responder, como se esperava, ao
Estados Unidos), durante a invasão do Iraque ambiente operacional que condiciona essas
2
Castoriadis. A Instituição Imaginária da Sociedade, página 25.
3
Esta frase do General James Mattis logo se tornou notória e vem sendo frequentemente citada. Uma boa
visão do contexto em que foi pronunciada pode ser obtida no paper preparado por Frank G. Hoffman
para o Foreign Policy Research Institute, em 2006, possível de ser acessado no sítio http://www.fpri.org/
books/Hoffman. Changing Tyres on the Fly. The Marines and Postconflict Stability Ops.

48 RMB1 oT/2012
AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

operações. Para tanto, para fazer face adequa- O combatente, como ser sensível, é o pro-
damente às ameaças ali presentes, o pensa- tagonista da manobra, enquanto o técnico,
mento militar deve não apenas evoluir, mas com base no que é inteligível, busca o desen-
sim, como ensina Castoriadis, romper com a volvimento do armamento, das munições, en-
linearidade cartesiana para formular outros fim, dos sistemas de armas; busca o aprimo-
patamares, outros modelos de atuação. ramento da acurácia do seu emprego, o au-
A doutrina não pode ser considerada mento letal de seus efeitos, em um conjunto
um dogma; portanto, imutável, inflexível, de ações e medidas que neste artigo vou sin-
rígida. Ela não deve cercear a iniciativa, ela tetizar como o fogo. Manobra e fogo com-
não pode justificar a inação. põem, portanto, as ações militares.
O racionalismo cartesiano da suprema- Embora avanços tecnológicos, por mais
cia do pensar, da absoluta supremacia da simples que hoje possam parecer, tenham in-
razão, não pode, de modo algum, anular por terferido na arte da guerra, introduzindo no-
completo o sentir, não pode anular o intuir. vos procedimentos e técnicas, a manobra
Não foi outro o propósito do General sempre preponderou sobre o fogo. Sempre
Petraeus ao divulgar sua nova doutrina de se aplicou o fogo para facilitar a manobra.
enfrentamento. Em síntese, essa doutrina é Ninguém talvez tenha elevado tão alto a
uma tentativa de rom- arte da guerra quanto
per com a inflexível Napoleão, que privile-
aplicação do modelo A arte da guerra clama giava sobremaneira a
convencional de com- pelo combatente, enquanto manobra. Quanto me-
bate a um ambiente lhor a manobra, menos
não convencional, em a ciência da guerra, pelo combate. Houve situ-
que as ameaças exis- técnico. A arte da guerra é ações em que o sim-
tentes (e são terríveis!) ples perceber da mano-
são, ou estão, difusas.
a expressão do que é bra francesa levou as
Penso, portanto, sensível, a ciência da tropas oponentes à
que as novas opera- guerra do que é inteligível rendição, como ocor-
ções de paz vão levar- reu com os austríacos
nos ao resgate de uma em Ulm (1805); quan-
concepção de ação militar, outrora mais co- do não se renderam, foram destruídas,
mum, caracterizada pela supremacia da ma- como aconteceu com os prussianos em
nobra sobre o fogo, do combatente sobre Jena (1806).
o técnico, do existir sobre o pensar, do sen- Após sua fragorosa derrota para Napo-
sível sobre o inteligível. leão, na Batalha de Jena, a Prússia iniciou a
reestruturação do seu Exército, tarefa que,
UMA LIGEIRA DIGRESSÃO
inicialmente, ficou a cargo de dois gene-
As guerras, as ações militares, em suma, rais: Scharnhorst e Gneisenau.
sempre foram conduzidas apoiando-se em Em meados do século XIX, Bismarck, na
dois pilares: a arte da guerra e a ciência (a condução da unificação da Alemanha, sob a
tecnologia) da guerra. liderança da Prússia, em que sobremaneira exal-
A arte da guerra clama pelo combatente, tou o espírito nacionalista alemão, logo perce-
enquanto a ciência da guerra, pelo técnico. A beu que a consecução do seu projeto não
arte da guerra é a expressão do que é sensí- seria possível sem a derrota militar da Áustria,
vel, a ciência da guerra do que é inteligível. o que demandaria um Exército poderoso.

RMB1 o T/2012 49
AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

Todavia, como era tradição que os prínci- retrocarga, a artilharia de retrocarga, a me-
pes, particularmente os filhos do imperador, tralhadora, os sistemas de comunicação a
fossem designados para comandar os exérci- fio e, particularmente, o trem, que passou a
tos prussianos, foi necessário criar um staff possibilitar o deslocamento de grandes efe-
capaz de assessorar os príncipes em suas tivos, antes inimagináveis, para as frentes
decisões quanto ao emprego das tropas que de combate, a matematização da guerra foi,
comandavam, dando origem, assim, ao Esta- então, questão de tempo.
do-Maior, organização consagrada posteri- Desse modo, no limiar da Primeira Guer-
ormente em todas as forças armadas do mun- ra Mundial, o combatente, o ser pensante
do, particularmente após as retumbantes vi- e a manobra tinham sido completamente
tórias prussianas contra a Áustria, em 1866 dominados pelo inteligível, pelo técnico e
(Königgrätz), e a França, em 1871 (Sedan). pelo fogo. A equação invertera-se: ao in-
É interessante registrar que o Estado- vés de se empregar o fogo para facilitar a
Maior Geral alemão e sua respectiva Esco- manobra, manobrava-se para oferecer me-
la de Estado-Maior, paradigma de todos os lhores condições para aplicação do fogo,
demais, adquiriu tanta principalmente o de
notoriedade que uma artilharia, chegando-
cláusula do Tratado Ultrapassado o limiar se ao paradoxo dos
de Versailles, assinado movimentos da infan-
ao final da Primeira nuclear, não havia mais taria serem limitados
Guerra Mundial, deter- lugar para a manobra, tudo pela extensão dos fios
minava sua extinção.
Os estados-maiores
seria resolvido pelo fogo de comunicação da ar-
tilharia de campanha.
passaram a adotar A guerra, ou melhor,
como modelo para a solução dos problemas sua percepção tornara-se uma questão mate-
militares o método cartesiano, que, em sín- mática, como procuraram demonstrar as fa-
tese, parte do princípio que todo problema mosas equações de Lanchester, publicadas
pode ser decomposto em suas partes mais em 1916. A guerra passara a ser mera questão
simples, as quais, estudadas detalhadamen- de superioridade de efetivos, como deixa
te de per si, levam a uma solução global transparecer Lanchester em uma de suas
para o problema. Com a irrestrita obediência equações, na qual o resultado de uma bata-
ao princípio da evidência, o método de Des- lha estaria na razão direta do quadrado dos
cartes procura conferir uma abordagem pre- efetivos empregados (Lei dos Quadrados de
cisa, rigorosa, quase matemática, a todos os Lanchester).4
aspectos humanos. Nesse contexto, não causa espécie que,
Em decorrência do impacto das grandes em 1916, o General Von Falkenhain, coman-
inovações tecnológicas provenientes da dante do Exército alemão, apoiando-se no
revolução industrial, tais como o fuzil de fato de possuir maiores efetivos mobiliza-

4
A Lei dos Quadrados de Lanchester estabelece que o poder combativo de uma força é resultante do
produto do quadrado dos efetivos empregados pelo coeficiente de eficácia da força (um coeficiente
decorrente de vários aspectos, tais como: treinamento, armamento, cultura militar etc.). Assim,
sempre será mais fácil incrementar-se o poder combativo de uma força pelo aumento de seu efetivo
(valor que é elevado ao quadrado) do que pelo aumento de seu coeficiente de eficácia. Ainda hoje se
encontram muitas aplicações das Leis de Lanchester na doutrina militar. A razão de 3 x 1 entre o
atacante e o defensor talvez seja a mais famosa delas.

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

dos e considerando que a França defende- sível reduzir o intangível a uma simples
ria Verdun até o fim, pelo simbolismo histó- questão matemática, como se fosse possí-
rico daquela localidade, tenha decidido vel “modelar” a alma humana.
“sangrar” a França em Verdun até a última Sob a batuta desses princípios matemá-
gota de sangue. ticos, os americanos travaram a Guerra do
Em nove meses de luta, 770 mil mortos Vietnã, na qual, em regra geral, a estatística
de ambos os lados. Perdas incomensurá- e a razão entre perdas passaram a guiar as
veis e inaceitáveis, só superadas por outra operações militares.
bestialidade humana: a Batalha do Somme, A derrota americana no Vietnã permitiu
também em 1916. Em cinco meses de lutas, que pensadores militares como Boyd, Lind
1 milhão e 200 mil baixas, 76.710 mortos e Friedman, posteriormente denominados
somente no primeiro dia dos combates, o “os reformadores”, tentassem romper com
fatídico dia 1o de julho de 1916. esse modelo de atuação militar, condicio-
O ser humano, inteiramente desprovido nado pelo rigoroso planejamento detalha-
de sua condição humana, passara a ser do e cuidadoso, pela tentativa de se prever
contabilizado como se todas as ações, com
fosse mero item do in- pouca ou nenhuma
ventário militar. A estatística, a pesquisa margem de erro, pela
A Segunda Guerra operacional e a análise busca do monitora-
Mundial, embora nela mento e controle de
não tenha havido tan- matemática substituíram a todas as ações, inde-
ta imobilização nas arte do general – a pendentemente do es-
frentes de combate,
terminou sob total do-
estratégia –, como se fosse calão considerado,
fato que o avanço
mínio do fogo, repre- possível reduzir o intangível tecnológico das comu-
sentado pelos cogu- a uma simples questão nicações passara a
melos atômicos de possibilitar.
Hiroshima e Nagasaki. matemática, como se fosse A tentativa de rom-
A própria decisão de possível “modelar” a alma per com a linearidade
lançar as bombas atô- do pensamento militar
micas resultou, em últi-
humana cartesiano, com a mu-
ma instância, de uma dança do paradigma de
razão entre perdas. Para conquistar o Japão, comando, que segundo Van Creveld passa-
previa-se um total de 10 milhões de baixas ria a ser exercido por influência, em que as
americanas; então, que morressem uns tan- ações correntes e a iniciativa dos coman-
tos milhões de japoneses e, de preferência, dantes de campo indicariam a linha de ação
nenhum americano. a adotar, ao invés de ser exercido por meio
Ultrapassado o limiar nuclear, não ha- de planos e ordens de operação resultantes
via mais lugar para a manobra, tudo seria de rigorosos planejamentos prévios que per-
resolvido pelo fogo. O técnico e o inteligí- mitem pouca flexibilidade, esbarrou, contu-
vel passaram a dominar integralmente o do, no avassalador avanço da tecnologia
pensamento militar. que levou ao movimento denominado “re-
A estatística, a pesquisa operacional e volução dos assuntos militares”.
a análise matemática substituíram a arte do Esta é uma revolução que, no entanto,
general – a estratégia –, como se fosse pos- não se enquadra exatamente no tipo de que

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

nos fala Castoriadis, pois se trata basica- Raciocinando por absurdo, poderíamos
mente de uma evolução, embora substan- chegar à seguinte conclusão: na medida em
cial, do pensamento militar dominante, e que cada vez mais os altos escalões passam
não efetivamente do rompimento com esse a controlar as ações, o corpo pensante tende
pensamento, uma vez que a revolução dos a zero, e o corpo não pensante ao infinito.
assuntos militares está quase que inteira- Ao analisar as instituições, Castoriadis
mente focada na tecnologia e nos seus im- também se refere às divisões, às separações
pactos na doutrina militar, e não nos as- que lhes são inerentes. Todavia, não em ter-
pectos menos tangíveis da arte da guerra. mos de res cogitans e res extensa e sim en-
A revolução dos assuntos militares con- tre os que ordenam e os que obedecem.
duz, em todos os níveis, ao aumento do Dentre as iniciativas que integram a re-
controle e do monitoramento sobre as volução dos assuntos militares, penso que
ações dos escalões mais inferiores, inclu- a concepção de guerra centrada em redes
sive das ações dos próprios soldados, que tende a restringir o grupo dos que orde-
assim se veem cerceados em suas iniciati- nam aos altos escalões.
vas individuais, uma vez que, constante- Como a iniciativa normalmente pertence a
mente supervisionados pelos escalões quem ordena, esses escalões mais elevados,
mais elevados, habituam-se a aguardar as por não se encontrarem fisicamente no cená-
decisões vindas desses escalões. Perdem, rio da ação, embora possam visualizá-lo,
assim, a sua já limitada autonomia e habi- dissociam-se de suas condicionantes factuais.
tuam-se à falta de iniciativa individual. Decidem com base nas incontáveis informa-
Acentua-se, portanto, e drasticamente, a ções que chegam, e que chegam em números
separação estabelecida por Descartes entre tais que impossibilitam seu correto proces-
o “corpo pensante”, a res cogitans, que nas samento, o que os leva a decidir com base em
instituições militares seria representada pelo dados distorcidos ou equivocados.
corpo de oficias, do “corpo não pensante”,
a res extensa, representada pelo corpo de AS OPERAÇÕES DE PAZ
praças, cuja formação é eminentemente téc-
nica, na qual não há preocupação em ofere- É contra essas tendências que as ope-
cer-lhes (às praças) uma consciência de so- rações de paz contrapõem-se, e o fazem por
ciedade, uma consciência cultural, ferramen- diversos fatores.
tas que lhes possibilitariam discernir, que Primeiro, porque alijam grande parte da
lhes possibilitariam agir com propriedade. tecnologia representada pelos sofisticados
Essa situação agrava-se na medida em sistemas de armas que, em princípio, não são
que, diante das possibilidades oferecidas autorizadas nas operações de paz, nas quais
pelos extraordinários avanços nos sistemas os capacetes azuis contam apenas com seu
de comunicações, cada vez mais os altos armamento individual para defesa própria.
escalões controlam as ações dos escalões Segundo, porque normalmente as opera-
inferiores, inclusive as ações dos oficiais ções de paz desenvolvem-se em centros urba-
que comandam esses escalões, estabelecen- nos de toda ordem, os quais, por sinal, a dou-
do a fronteira entre a res cogitans e a res trina militar convencional considera como obs-
extensa, não mais entre oficias e praças e táculos a evitar pelas dificuldades que trazem
sim entre os escalões de comando mais ele- ao controle das operações, em virtude da des-
vados e os escalões táticos, que são, efeti- centralização que impõem à tropa, obrigando
vamente, os executores das ações militares. à pulverização das organizações táticas bási-

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

cas, que se veem forçadas a operar, na maioria nentemente incerto. Se o ambiente


das vezes, em pequenas frações, atuando iso- operacional é incerto, os sistemas nele en-
ladamente. Embora as comunicações tenham volvidos são não lineares, são sistemas
chegado ao nível individual, ao nível do sol- adaptativos complexos, que, por definição,
dado, a pulverização dessas frações sobrema- não podem ser controlados, embora pos-
neira dificulta (em certas circunstâncias impe- sam sofrer algum grau de interferência.
de) o efetivo controle de sua atuação pelos Nesses ambientes, a abordagem carte-
escalões mais elevados. siana, própria para sistemas lineares, não
Por fim, e talvez por mais importante, as encontra espaço para aplicação plena.
operações de paz requerem dos militares, A abordagem desses ambientes de in-
ou porque eles são os primeiros a chegar à certeza requer a flexibilização da rigidez de
área de operações ou porque, devido a ques- ideias, das atitudes e dos comportamentos
tões de segurança, só fundamentados em
eles chegam em certas modelos tradicionais e
áreas, a execução de Se o ambiente operacional em ensinamentos dou-
um sem-número de ta- é incerto, os sistemas nele trinários dogmáticos.
refas e atividades, tan- A abordagem desses
to no campo cívico- envolvidos são não ambientes deve pau-
social como no da re- lineares, são sistemas tar-se também, e obri-
construção de infraes- gatoriamente, na auto-
trutura, que, de modo
adaptativos complexos, nomia individual, pois,
algum, relacionam-se que, por definição, não nesses ambientes in-
com o emprego militar. podem ser controlados, certos, a ação indivi-
Essas atividades obri- dual entrelaça-se com
gam os militares a embora possam sofrer todo o sistema.
interagir, sem estarem algum grau de A clássica divisão
convenientemente do pensamento militar
preparados para tal,
interferência cartesiano entre os ní-
com diversos e dife- veis de emprego tático,
rentes atores, inclusive com agências e or- operacional e estratégico torna-se difusa;
ganizações civis que atuam nos cenários às vezes, inexiste, pois a ação equivocada
das operações de paz, as quais nem sempre de um simples soldado pode ter implicações
veem com bons olhos a atuação militar. Mui- estratégicas que comprometam não só a
tas possuem regulamentos e normas que operação de paz em curso, mas a própria
proíbem qualquer contato ou até mesmo instituição que patrocina a operação.
qualquer ajuda do setor militar, a fim de não Esta é uma preocupação que a própria
perderem sua isenção, sua imparcialidade. Organização das Nações Unidas (ONU) já
Ora, em qualquer sistema a quantidade manifestou no seu documento, denomina-
de interações é aproximadamente igual à do New Horizon,5 sobre as operações de
metade do quadrado do número de atores paz futuras, em que identifica claramente
envolvidos, o que torna o ambiente esses ambientes de incerteza e ressalta que
operacional de uma operação de paz emi- tais incertezas, presentes no cumprimento
5
“A New Partnership Agenda: Charting a New Horizon For UN Peacekeeping” é um documento oficioso
da ONU, lançado em 2009, o qual, simplificadamente denominado de “New Horizon”, vem sendo
considerado o documento norteador das futuras operações de paz.

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

das missões de paz, tendem a multiplicar- lação do país hospedeiro e que as forças de
se quando a força de paz é constituída por paz são a garantia de seu bem-estar e da
estrangeiros que não falam o idioma local, tranquilidade da população, que não seriam
que não conhecem os hábitos, a cultura e alcançados sem a presença das forças de paz.
os costumes da população que pretendem Essa é uma recomendação que leva a pro-
proteger, ou, se os conhecem, é apenas funda reflexão, pois constitui meta de muito
muito superficialmente. difícil consecução, particularmente quando
As incertezas tendem a multiplicar-se tam- a operação de paz dura além do previsto,
bém se os motivos para a presença da força sem alcançar os propósitos de estabilidade
de paz não estão inteiramente claros ou per- política e social, de fortalecimento das insti-
feitamente compreendidos. Ou, o que é pior, tuições e instâncias estatais, de melhoria da
se há desconfianças quanto à real intenção infraestrutura para os quais foi estabelecida.
da presença da tropa no país considerado. Não se pode esquecer que, com o passar
Esta é uma situação que se torna ainda do tempo, os capacetes azuis, por mais amis-
mais crítica à medida que as operações de tosos que sejam, assumem conotação de
paz não mais signifiquem a mera interposição tropa de ocupação, uma vez que tropa es-
de forças entre dois partidos antagônicos trangeira será sempre tropa estrangeira, por
que aceitam essa mediação, que concordam mais afinidade que se obtenha com a popu-
que a força interposta supervisione a paz lação local. Os procedimentos doutrinários
ou o armistício assinado, como ocorreu na adotados pela força de paz para sua própria
primeira operação de paz da ONU, em 1948, segurança, o ostensivo portar do armamen-
entre árabes e israelenses. to diante da população, a prioridade para
As operações de paz que se avizinham seus deslocamentos, o deslocar de suas vi-
serão robustas, multidimensionais, terão aturas blindadas que, por si só, já conotam
outros propósitos principais, inclusive o certa agressividade, tudo leva à degrada-
de proteger populações civis, ameaçadas ção do seu ambiente operacional, aumen-
ou atacadas por grupos armados. tando significativamente a possibilidade e a
Nessas circunstâncias, muito provavel- probabilidade de conflitos com a população
mente com alguma frequência, os capacetes que pretendem proteger, gerando distúrbi-
azuis terão que recorrer ao emprego de seu os e inquietudes, facilmente manipuladas por
armamento não com o propósito de prote- grupos com interesses antagônicos.
ger-se, mas com o intuito de assegurar o cum- Nesses ambientes operacionais, parece
primento da missão para a qual forem desig- óbvio que o excessivo, desproporcional ou
nados. Situação que poderá ensejar, inclusi- desnecessário emprego da força para a ma-
ve, o emprego de armamento mais pesado. nutenção da ordem pública claramente tra-
Como ressalta o documento New Horizon: rá consequências negativas. Mas, por ou-
“No nível tático uma abordagem robusta sig- tro lado, pareceria tão óbvio que a inabili-
nifica que os contingentes podem ser obri- dade, a excessiva aversão ao risco que im-
gados a usar força em defesa do Mandato”.6 pede a ação, mesmo que necessária ou
Nesse contexto é relevante considerar que requerida, poderá igualmente causar iguais
as forças de paz tudo devem fazer para asse- danos negativos?
gurar que o armamento empregado destina-se Ora, estamos diante de um tênue estado
a garantir a segurança e o bem-estar da popu- de equilíbrio, diante de um dilema, no qual

6
New Horizon, seção III. A Robust Approach to Peacekeeping.

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

o acerto da decisão torna-se crucial para o e fracassos. Ao mesmo tempo, eles devem
sucesso da própria operação de paz. ter autonomia para implementar os manda-
Mas a quem caberá tomar essa decisão? tos da missão de acordo com sua experiên-
Na maioria das vezes, provavelmente, ao cia e conhecimento (grifo meu)”.7
cabo ou ao sargento, pois, em decorrência Normalmente, o treinamento dos milita-
do emprego descentralizado das forças de res que se preparam para integrar contin-
paz, normalmente são eles, os cabos e os gentes que serão empregados em opera-
sargentos, que lideram as frações táticas ções de paz concentra-se em aspectos téc-
desdobradas nas diversas patrulhas ou nos nicos, em procedimentos de conduta indi-
pontos fortes. Sem terem tempo suficiente vidual e em noções genéricas sobre hábi-
para submeter suas intenções aos escalões tos, tradições e cultura locais, que são, con-
superiores, são obrigados a decidir, em am- tudo, insuficientes para assegurar-lhes o
bientes de extrema tensão, se devem ou não embasamento cultural adequado.
(e em que nível de vio- Mesmo em relação
lência) empregar seu aos oficiais, durante
armamento. É necessário, pelo menos, sua formação muito
Cabe aqui uma pouco lhes é formal-
questão: os atuais mo- equilibrar o conhecimento mente apresentado
delos de treinamento do sensível com o sobre as instâncias
das forças de paz pre- paradigmáticas do ser,
param os graduados conhecimento do inteligível, sobre as instâncias
para decidir com pro- a fim de possibilitar que o paradigmáticas da
priedade? Levam es- militar seja capaz de sensibilidade do ser.
sas circunstâncias em Literatura, arte, po-
conta? Talvez não, reconhecer e definir o esia e música, com ra-
uma vez que não há limite de sua própria ras exceções, não in-
como o militar decidir tegram os currículos
com propriedade sem autonomia das escolas de forma-
que lhe seja conferida ção de oficiais e pra-
autonomia. ças, que, desta forma, não conseguem de-
A autonomia é a condição básica para senvolver uma competência cultural que
que se possa conviver com riscos e com os permita lidar convenientemente com os
incertezas, para que se possa atuar em am- aspectos humanos dos conflitos presen-
bientes complexos nos quais a quantidade tes nas operações de paz. A formação de
de possíveis interações é imensa, nos quais nossos oficiais e praças está excessivamen-
é impossível prever todas as circunstâncias te lastrada na tecnologia e nos seus des-
intervenientes e muito menos controlá-las. dobramentos, o que nos torna autocráti-
Ensinamento que a embaixadora Regina cos, críticos, controladores, excessivamen-
Maria Cordeiro Dunlop, representante per- te centralizadores e, sobremaneira, orien-
manente do Brasil junto às Nações Unidas, tados para a execução de tarefas, portanto
com muita propriedade assinalou: “Líderes focados mais nos aspectos específicos do
no terreno são responsáveis por sucessos que na visão geral do conflito.

7
Discurso proferido pela embaixadora Regina Maria Cordeiro Dunlop no Debate-Geral da Comissão
Especial de Operações de Paz, Assembleia-Geral – IV Comitê, Nova York, em 22 de fevereiro de 2010.

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

Obviamente, refiro-me às Forças Arma- Pois, como apontou Castoriadis, o indi-


das brasileiras, embora se eu generalizar víduo não é separável de sua sociedade, a
talvez não cometa um equívoco muito gran- qual cria seu próprio significado, cria sua
de, uma vez que a significativa maioria dos própria estrutura. Nesse sentido, o militar,
países contribuintes de forças de paz se- o soldado, precisa ser tanto autônomo
gue semelhante padrão de adestramento. como capaz de conviver e integrar-se har-
A tomada de decisão em ambientes com- moniosamente na sua instituição, o que,
plexos, incertos e competitivos, nos quais penso, só será possível mediante uma mu-
vontades antagônicas se fazem presentes, dança no enfoque de sua formação militar,
impõe que os militares empregados nesses que deverá deixar de ser primordialmente
ambientes tenham autonomia. voltada para a tecnologia para focar-se tam-
Porém, como nos alerta Castoriadis, a bém nos aspectos humanos e intelectuais
condição fundamental para a autonomia é a da guerra.
possibilidade de questionar tradições; algo Há necessidade, portanto, de alterações
que, por definição, exclui todas as socieda- na formação, no preparo e no treinamento
des fundamentadas em dos militares a serem
sistemas fechados de empregados em mis-
princípios doutrinários, A formação militar deverá sões de paz. Altera-
em verdades consagra- deixar de ser ções que começam
das, dentre as quais, muito antes de eles
sem dúvida, enqua- primordialmente voltada serem selecionados
dram-se as instituições para a tecnologia para para tais missões.
militares. Sem dúvida, o alvo
Assim, se é absolu-
focar-se também nos primeiro dessa trans-
tamente necessário aspectos humanos e formação deve ser o
conferir ao soldado intelectuais da guerra Corpo de Praças, cuja
mais autonomia, faz-se formação, como já res-
necessário também que saltei, não só é emi-
a instituição aceite pelo menos algum grau nentemente técnica como restrita aos ní-
de questionamento de seus dogmas doutri- veis técnicos das funções que normalmen-
nários. Não se trata simplesmente de descum- te irão desempenhar, sem maiores preocu-
prir normas e preceitos doutrinários, mas sim pações com o estímulo à reflexão e ao dis-
de poder debatê-los, de poder analisá-los, cernimento. Mudança que também, ainda
embora obedecendo-lhes. que em menor grau, deve ser estendida à
Por outro lado, para que tais questio- formação dos oficiais, cuja base acadêmi-
namentos não sejam levianos ou incon- ca terá que encontrar um equilíbrio entre
sequentes, para que o soldado possa ques- as ciências exatas e as ciências humanas.
tionar com algum grau de razoabilidade, é Ora, esta transformação da instituição
indispensável oferecer-lhe mais cultura, militar, tão necessária para a adequada con-
mais conhecimento. É necessário, pelo me- dução das operações de paz robustas que
nos, equilibrar o conhecimento do sensí- se avizinham, fascina e amedronta; talvez
vel com o conhecimento do inteligível, a mais amedronte que fascine.
fim de possibilitar que o militar seja capaz Fascina pela busca de novas capacida-
de reconhecer e definir o limite de sua pró- des, fascina pelo desafio de identificar quais
pria autonomia. novas capacidades serão capazes de pro-

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

porcionar ao soldado o discernimento e a realizar operações de paz; elas existem para


autonomia que dele se o cumprimento de seu
esperam. dever constitucional
Por outro lado, As Forças Armadas não de defesa e manuten-
amedronta pela neces- ção da soberania ple-
sidade, talvez, de rom-
existem para realizar na da Pátria, da pre-
per com as atuais es- operações de paz; elas servação e garantia
truturas de ensino e existem para o cumprimento dos interesses nacio-
treinamento de que nais diante de amea-
tanto nos orgulha- de seu dever constitucional ças, externas ou inter-
mos. Nunca é demais de defesa e manutenção da nas, decorrentes dos
lembrar que, normal-
mente, nossas escolas
soberania plena da Pátria, da diferentes conflitos
inerentes à conjuntu-
gostam de ensinar so- preservação e garantia dos ra internacional.
mente aquilo que ob- interesses nacionais diante de Uma conjuntura na
jetivamente podem qual o estado moderno,
avaliar. ameaças externas ou internas como concebido após
Amedronta por- Westfália, tornou-se
que as Forças Armadas não existem para pequeno para enfrentar as grandes questões

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AS OPERAÇÕES DE PAZ, O ERRO DE DESCARTES E OS PRESSUPOSTOS DO IMAGINÁRIO DE CASTORIADIS

globais, o que o obriga a coligar-se ou inte- cumprimento da missão e não apenas uma fun-
grar-se regionalmente em blocos – e não se ção acessória, pois, como ressalta Castoriadis,
pode perder de vista que integração traz, ne- é necessário que se compreenda primeiro aqui-
cessariamente, conflitos de interesse. Por lo que se quer transformar.
outro lado, os blocos regionais assim forma- Julgo que nesse aspecto reside o valor
dos tornam-se grandes demais para resolver maior do encontro entre os militares e a Aca-
os problemas das comunidades que passam demia. Encontro que, atualmente, vem sen-
a englobar, o que, por sua vez, também pode do insistentemente buscado por esses dois
gerar conflitos, embora de diferentes vieses. atores em todos os países atualmente en-
Amedronta porque não sabemos se, ao volvidos com operações de paz, indepen-
prepararmos adequadamente nossas tro- dentemente de suas diferentes naturezas.
pas para emprego em operações de paz, as Encontro que enseja a perfeita compreen-
estaremos preparando também para as ope- são das possibilidades e limitações das ins-
rações militares ditas convencionais. Ou tituições militares e civis que participam das
será que, à medida que as operações de operações de paz, cujo sucesso não pode
paz se robustecem e o uso da força torna- prescindir da ação coordenada e do enten-
se mais previsível, os treinamentos para dimento mútuo desses dois vetores.
ambas as operações se assemelham? Nós – o vetor militar – e a Academia, as
Amedronta porque teremos que corrigir o agências e as organizações não governamen-
pseudoerro de Descartes e eliminar, ou ate- tais – o vetor civil – das operações de paz
nuar significativamente, a separação, o fos- precisamos identificar os pontos de contato
so hoje existente entre oficiais e praças, inte- entre as funções militares e as funções civis,
grando todos em um mesmo corpo pensante. a fim de fortalecê-los, ao invés de apartá-los,
Amedronta porque não sabemos se nós, pois, como nos lembra Castoriadis, o modo
militares, seremos capazes de identificar e de como as sociedades são organizadas impede
introduzir as alterações necessárias na forma que seus integrantes possam ver que as coi-
como os planejamentos das operações de paz sas podem ser diferentes.
deverão ser conduzidos, de modo que aspec- Nós, militares, certamente não consti-
tos culturais tenham peso preponderante no tuímos a exceção dessa regra...

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<ARTES MILITARES> Pensamento militar; Doutrina; Estratégia; Estudo; Arte da guerra;

BIBLIOGRAFIA

Castoriadis, Cornelius. A Instituição Imaginária da Sociedade. Editora Paz e Terra.


Czerwinsk, Tom. Coping With The Bounds. Speculations on Nonlinearity in Military Affairs. National
Defense University Washington, DC.
Damásio, António R. O Erro de Descartes. Emoção, Razão e o Cérebro Humano. Companhia de
Letras.
Van Creveld Martin. Command In War. Harvard University Press.
Waldrop, M. Mitchel. Complexity – The Emerging Science at the Edge of Order and Chaos.
Thouchstone.

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VISITANDO A ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA –
ESG, A TODO PANO1!

WILSON PEREIRA DE LIMA FILHO


Contra-Almirante

SUMÁRIO

Introdução
ESG, uma marca nacional
Conhecendo a ESG
Os cursos da ESG
A nova ESG
Considerações finais
Anexo A – Quadro dos ex-comandantes
Anexo B – Quadro dos ex-subcomandantes
Anexo C – Quadro dos ex-assistentes da Marinha

INTRODUÇÃO crever este artigo, principalmente por ter


constatado que muitas pessoas, seja no

T endo em vista a experiência que viven-


ciei nos últimos dois anos na Escola
Superior de Guerra (ESG), inicialmente como
ambiente militar ou no civil, fundamentam
seus comentários em pensamentos muitas
vezes equivocados, demonstrando desco-
estagiário2 do Curso de Altos Estudos de nhecimento das atuais atividades da ESG e
Política e Estratégia (Caepe) e posteriormen- suas perspectivas. O propósito do presente
te como assistente da Marinha, decidi es- artigo é apresentar de forma sucinta o histó-
1
N.A.: Expressão de origem náutica, originária de Portugal, “A todo pano” significa utilizar todas as
velas de que se dispõe, visando obter o máximo de força e velocidade. A expressão já era popular no
século XVI.
2
N.A.: Os integrantes do corpo discente da ESG são denominados estagiários, visando a estimular a
perspectiva de aplicação e vivência dos conhecimentos adquiridos durante os diversos cursos.
VISITANDO A ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA – ESG, A TODO PANO!

rico da ESG, suas características, seus prin- nais, com atenção especial aos temas rela-
cipais cursos e as transformações que es- cionados à Defesa Nacional. O debate é
tão em processo visando à consolidação da aberto e livre, sendo o foco da ESG estudar
ESG como centro de excelência nacional de o Brasil para melhor servi-lo (ESG, 2011).
referência internacional nos estudos relaci- Assim, inicialmente, apresentarei os as-
onados a segurança, desenvolvimento e pectos que levaram a ESG a ser considera-
defesa (ESG, 2011). da uma marca nacional; posteriormente
A Escola Superior de Guerra é uma das serão enfocadas as características da ESG,
mais tradicionais escolas de altos estudos sob um cunho tanto administrativo como
de política e estratégia do Brasil. Sua origem acadêmico. Nas duas seções seguintes,
remonta ao período da Segunda Guerra serão abordados os cursos em andamento
Mundial, quando, em 1942, foi criado o Cur- e as transformações que estão em fase de
so de Alto Comando, destinado, à época, implantação. Ao final, como conclusão,
apenas a generais e coronéis do Exército. serão apresentadas considerações sobre a
Esse curso ficou em análise até 1948, quan- atuação da ESG na atualidade e sua
do o General Salvador César Obino, então reafirmação como patrimônio brasileiro e
chefe do Estado-Maior das Forças Arma- instrumento impulsionador do sentimento
das, e um grupo de militares liderados pelo de brasilidade, constituindo-se numa ins-
General Oswaldo Cordeiro de Farias e tendo tituição dinâmica, que se renova e se adap-
como referência a estrutura do National War ta a cada época de nossa história recente.
College dos Estados Unidos da América É importante sublinhar que se existem pes-
(EUA) estabeleceram os alicerces de um Ins- soas que, em algum momento, tiveram falsas
tituto Nacional de Altos Estudos direcionado notícias de que a ESG estaria em decadência,
para o binômio Segurança e Desenvolvimen- estou convicto de que as informações conti-
to. Aquele instituto deveria tornar-se um das neste artigo provarão o contrário e atua-
centro de pesquisas e de debates de pro- lizarão os seus conhecimentos.
blemas brasileiros. Assim, em 20 de agosto
de 1949, pela Lei no 785/49, foi criada a Esco- ESG, UMA MARCA NACIONAL
la Superior de Guerra, que hoje está direta-
mente subordinada ao Ministério da Defesa Desde a sua criação, a ESG vem acom-
(MD). O seu propósito maior é desenvolver panhando todas as nuances tanto da vida
e consolidar os conhecimentos necessários nacional como do cenário internacional: o
ao exercício de funções de direção e pós-guerra, a guerra fria, a queda do Muro
assessoramento de alto nível para o plane- de Berlim, os conflitos armados localiza-
jamento da Defesa Nacional, nela incluídos dos, o ataque terrorista de 11 de setembro
os aspectos fundamentais da Segurança e de 2001 e as inúmeras crises econômicas e
do Desenvolvimento. Trabalha como um políticas no Brasil e no mundo.
centro de estudos e pesquisas, a ela compe- Uma análise das centenas de trabalhos
tindo planejar, coordenar e desenvolver os arquivados na Biblioteca da ESG permite
mais variados cursos instituídos pelo MD avaliar quantos homens e mulheres, sejam
(ESG, 2011). militares ou civis, se dedicaram ao estudo e
A Escola possui um ambiente exclusi- ao debate de complexos temas de interesse
vamente acadêmico, constituindo-se em um nacional e buscaram soluções para os mais
fórum democrático para o debate constru- diversificados problemas do País. Acadê-
tivo dos mais variados problemas nacio- micos e estudiosos de renome, como

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Teresinha de Castro, Golbery do Couto e pensamentos nela estudados e difundidos.


Silva e Carlos de Meira Mattos, entre ou- A título de exemplo, a Turma do Caepe de
tros, tiveram a ESG como ágora para debater 2010 escolheu “Amazônia Azul” como seu
e aprofundar os seus conhecimentos sobre nome representativo, contribuindo para a
temas relevantes, inclusive a Geopolítica, consolidação de uma mentalidade maríti-
assunto que por muito tempo foi quase que ma, ao realçar a importância do mar para o
exclusivamente estudado na ESG. Brasil (LIMA FILHO, 2010).
Nestes 62 anos de existência3, a ESG No momento em que se debruça sobre o
formou mais de 8.250 estagiários em seus rol de personalidades que passaram pelos
mais variados cursos. Caracteriza-se e di- bancos acadêmicos da ESG, depara-se com
fere de qualquer outro estabelecimento de nomes como Brigadeiro Eduardo Gomes,
ensino nacional por possuir em seu corpo Ministro Golbery do Couto e Silva, Acadê-
discente, em um mesmo curso, militares da mico Belarmino Austregésilo de Athayde,
ativa das Forças Armadas4 e das Forças Doutor Tancredo de Almeida Neves, Bri-
Auxiliares, servidores públicos civis dos gadeiro Délio Jardim de Mattos, General
três poderes (Executivo, Legislativo e Ju- Leônidas Pires Gonçalves, Engenheiro Jor-
diciário), representantes do clero e do ge Burlamaqui, Embaixador Renato Bayma
empresariado e, enfim, de todos os seg- Denys, Almirante Henrique Saboia, Dr.
mentos do poder nacional juntos, pensan- Mário Henrique Simonsen, Embaixador
do e discutindo o Brasil. Vale ressaltar que, Affonso Arinos de Mello Franco, entre
além de estagiários nacionais, a ESG pos- outras autoridades civis e militares5.
sui também estagiários de nações amigas A procura por cursos da ESG é cons-
(ENA), fomentando a integração com mili- tante e intensa. Por inúmeras vezes, a Es-
tares de outros países, os quais agregam cola ficou impossibilitada de atender à to-
conhecimentos importantes nos diversos talidade das demandas. O currículo de um
debates realizados nas atividades acadê- funcionário de alto nível, atuando tanto
micas da escola. A título de exemplo, no na área governamental como na iniciativa
ano letivo de 2011, 16 estagiários de dez privada, se torna enriquecido pelo fato de
nações amigas (Argentina, Colômbia, Equa- o mesmo ter um curso da ESG em sua ba-
dor, EUA, Guatemala, Guiana, México, gagem acadêmica.
Nigéria, Peru e Venezuela) integraram o Nesse sentido, é possível afirmar que a
corpo discente do Caepe. marca ESG está ligada à nacionalidade, à
É oportuno comentar que a ESG atua brasilidade, ao debate democrático, à defe-
também como um instrumento de fomento sa, à segurança e às expressões do poder
das mentalidades nacionalistas de defesa nacional6, formando um mosaico de linhas
e marítima, em virtude da diversidade de de pesquisa que se resumem em uma única
estagiários que passam por aquela Escola ideia-força: bem conhecer o Brasil. Desta
e se tornam vetores de disseminação dos forma, ESG é uma marca que está direta-

3
N.A.: No dia 20 de agosto de 2011 a ESG completou 62 anos de criação.
4
N.A.: Além de oficiais superiores, alguns cursos da ESG possuem estagiários oficiais-generais (Caepe e
CSUPE).
5
N.A.: O leitor poderá conhecer todo o rol de ex-estagiários da ESG e constatar a plêiade de cidadãos
notáveis que passaram por aquela Escola no endereço eletrônico: http://www.esg.br/wordpress/a-esg/.
6
N.A.: De acordo com a doutrina da ESG, as expressões do Poder Nacional são cinco: Econômica,
Política, Militar, Psicossocial e Científica e Tecnológica.

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mente ligada à história do nosso país e que um oficial-general de três estrelas, sempre
há de ser cada vez mais respeitada e reco- de uma Força diferente da do comandante,
nhecida por todos os brasileiros como um seguindo-se um sistema de rodízio similar.
patrimônio nacional. Por exemplo, a partir de março de 2011 o
comandante da ESG passou a ser o Gene-
CONHECENDO A ESG ral de Exército Túlio Cherem, e o subcoman-
dante o Vice-Almirante Nelson Garrone de
A ESG funciona como um centro de es- Palma Velloso. Em condições normais, em
tudos e pesquisas, em que planeja, coor- 2013, por ocasião de suas substituições, o
dena e desenvolve os cursos instituídos comandante será um almirante de esqua-
pelo ministro de Estado da Defesa, e atua, dra e o subcomandante um major-brigadei-
essencialmente, nas áreas de desenvolvi- ro, e assim por diante. Ao final deste artigo
mento, segurança e defesa, permeando as há três quadros, onde o leitor poderá co-
expressões do Poder Nacional. nhecer todos os ex-comandantes, ex-
Os trabalhos desenvolvidos na ESG são subcomandantes e ex-assistentes militares
de natureza exclusivamente acadêmica, sen- da ESG, desde a sua criação.
do a Escola um fórum A direção da Escola
democrático e aberto é composta por coman-
ao livre debate. Para Os trabalhos desenvolvidos dante, subcomandante
tanto, promove estu- e quatro assistentes do
dos e pesquisas com- na ESG são de natureza comando: três oficiais-
preendendo o ensino, exclusivamente acadêmica, generais duas estrelas
a extensão e o inter-
câmbio de conheci-
sendo a Escola um fórum (um de cada Força) e
um representante do
mentos, por meio de democrático e aberto ao Ministério das Rela-
cursos, simpósios, ci- livre debate ções Exteriores (embai-
clos de estudo, entre xador). O comandante e
outras atividades aca- o subcomandante são,
dêmicas. A metodologia de ensino da ESG respectivamente, o diretor e o chefe de estu-
busca propiciar em seus cursos uma ade- dos da ESG. Sua estrutura organizacional é
quada fundamentação teórica e a possibi- composta por divisões e setores que são su-
lidade de os estagiários compreenderem as bordinados ao subcomandante/chefe de Es-
conjunturas, construindo ferramentas para tudos (ESG, 2011):
uma análise crítica da realidade nacional, a) Diretores dos Cursos;
por intermédio do aprimoramento e da di- b) Departamento de Administração (DA);
versificação das bagagens individuais de c) Divisão de Planejamento e Orienta-
conhecimento. Suas diretrizes pedagógi- ção Didático-Psicopedagógica (DPOD);
cas preconizam a promoção de estudos in- d) Divisão de Assuntos Científicos e
tegrados e participativos, focados no de- Tecnológicos (DACTec);
senvolvimento de um pensamento crítico e) Divisão de Assuntos de Logística e
e abrangente. Mobilização (DALMob);
O comando da ESG é exercido por um f) Divisão de Assuntos Geopolíticos e
oficial-general da ativa do último posto, em Relações Internacionais (Dagri);
sistema de rodízio a cada dois anos entre g) Divisão de Assuntos Econômicos
as Forças Armadas. O subcomandante é (DAE);

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h) Divisão de Assuntos de Fundamen- Não se pode deixar de mencionar o im-


tos, Planejamento e Gestão (DFPG); portante papel desenvolvido pelo Centro
i) Biblioteca; de Estudos Estratégicos e de Extensão
j) Divisão de Assuntos de Inteligência (CEE/EXT), que, além de concentrar e co-
Estratégica (Daie); ordenar os mais variados estudos sobre
k) Divisão de Assuntos Políticos (DAP); temas de interesse nacional, organiza co-
l) Divisão de Assuntos Psicossociais lóquios, simpósios, seminários, workshops
(DAPs); e etc. Ele está associado à coordenação das
m) Divisão de Execução de Cursos (DEC). atividades externas e também potencializa
É digno de nota que os diretores dos as relações com as escolas congêneres no
cursos são designados pelo comandante e, Brasil e no exterior, bem como com univer-
normalmente, são os assistentes de Coman- sidades nacionais, estabelecendo o neces-
do, nada impedindo, porém, que seja outro sário vínculo entre a ESG e o meio acadê-
integrante do Corpo Permanente da ESG. Vale mico. Este setor, por sua importância, está
ressaltar que é feito um rodízio também nas em fase de reestruturação.
designações destes diretores. A título de Outra atividade importante do CEE/EXT
exemplo, o Curso de Altos Estudos de Polí- é a coordenação do relacionamento e de
tica e Estratégia (Caepe), considerado um intercâmbios com escolas congêneres de
dos cursos de maior expressão da Escola, outras nações amigas. A título de exemplo,
teve como diretor, em 2010, o Brigadeiro no ano de 2011 a ESG recebeu visitas de
Eduardo Zotti Justo Ferreira; em 2011, foi o comitivas de escolas de Defesa dos seguin-
General de Brigada José Orlando Ribeiro tes países: Colômbia, China, Coreia do Sul,
Cardoso. Em 2012, em condições normais, o Espanha, EUA, Israel, México, Paraguai,
diretor do Caepe será um contra-almirante, Suécia e Uruguai, tendo sediado, ainda, a
o assistente da Marinha na ESG (ESG, 2011). XII Conferência de Diretores de Colégios
Outro ponto importante é que as divi- de Defesa Ibero-Americanos8.
sões atinentes às atividades acadêmicas É por intermédio do CEE/EXT, também,
estão diretamente ligadas aos temas rele- que se estabelecem as ligações com as
vantes que são ministrados, debatidos e Associações dos Diplomados da ESG
pesquisados na ESG, tendo como base as (Adesg)9. É importante registrar que a
cinco expressões do Poder Nacional, de Adesg é uma entidade que atua sem
acordo com a doutrina da escola, bem como vinculações com partidos políticos, enti-
o amplamente conhecido Método de Pla- dades, grupos, associações ou organiza-
nejamento Estratégico da ESG7. ções de qualquer natureza. A Adesg existe

7
N.A.: A ESG possui um método de planejamento estratégico internacionalmente conhecido. O método
foi concebido para buscar maior racionalidade nas decisões nacionais e se divide em quatro fases
principais: Diagnóstico, Política, Estratégica e Gestão.
8
N.A.: A Conferência de Colégios de Defesa Ibero-Americanos foi criada por ocasião da VIII Cúpula de
Chefes de Estado e de Governo, realizada em 1988, na cidade do Porto (Portugal), quando os
participantes resolveram que a partir do ano seguinte, como marca de cooperação e entendimento
em matéria de Defesa, os países ibero-americanos deveriam iniciar reuniões periódicas materializa-
das pelos organismos acadêmicos encarregados desses estudos.
9
A Adesg foi fundada em 7 de dezembro de 1951. Trata-se de uma sociedade civil e sem fins lucrativos.
Um de seus propósitos é estimular a solidariedade de seus integrantes. A Adesg congrega os diplomados
da Escola Superior de Guerra (ESG) e os concludentes dos cursos ministrados pelas Adesg que desejem
a ela se filiar.

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para divulgar a Doutrina da ESG e para aten- cursos. Esses trabalhos são divulgados
der aos diplomados tanto pela ESG como para setores de interesse do poder nacio-
pelos seus Ciclos de Estudos. A Adesg nal e estão disponíveis na biblioteca da
possui delegacias e representações em todo Escola para consulta.
o território nacional (ADESG, 2011). A Biblioteca da ESG, denominada Gene-
Apesar das ligações tradicionais entre ral Cordeiro de Farias, possui um impor-
a ESG e as Adesg, é importante que o leitor tante acervo nas áreas política, econômi-
entenda que as ações e declarações das ca, militar, psicossocial, científica e
Adesg são independentes da ESG, pois tecnológica, abrangendo livros, folhetos,
esta se limita a fornecer parte de seus as- monografias, periódicos e multimídia.
sociados e, eventualmente, palestrantes Em todas as suas atividades, a ESG
para os Cursos de Política e Estratégia cultua os seus valores, que são claros e
(Cepe) que são ministrados nas Adesg por expressam o espírito da escola como único
todo o Brasil. A concepção de criação das estabelecimento de ensino diretamente
Adesg preconiza que todas as ações e de- subordinado ao MD. Os valores da ESG
cisões das Adesg nacional e regionais es- são: o ser humano, o conhecimento, a di-
tejam sempre alinhadas com a ESG, princi- versidade de pensamento, a liberdade de
palmente em virtude do seu comprometi- expressão, a ética, a democracia, a Nação e
mento em ter embutido em seu nome a mar- o orgulho de ser ESG. Estes valores são
ca ESG. É importante ressaltar a importân- permanentemente cultuados por docentes
cia e o efeito multiplicador das Adesg, as e discentes.
quais, por sua abrangência, se tornam uma
ferramenta espetacular de disseminação de OS CURSOS DA ESG
nacionalidade, mentalidade de defesa e
outros temas julgados importantes para o Levando-se em conta que este trabalho
Brasil, visto que em 2011 já se pode se propõe a ser sucinto, o autor não apre-
contabilizar 74.918 adesguianos espalha- sentará os aspectos históricos de cada um
dos por todo o Brasil (ADESG, 2011). dos cursos, pois os mesmos foram evolu-
Outra preocupação da ESG é a produ- indo através dos tempos em termos de no-
ção acadêmica. A Escola publica dois peri- menclatura, conteúdo curricular, integran-
ódicos: semestralmente é editada a Revista tes e duração. Assim, nesta parte do traba-
da Escola Superior de Guerra, onde são lho, serão apresentados os cursos tradici-
publicados trabalhos sobre os mais varia- onais ministrados em 2011, excetuando-se
dos temas, cujos autores estão, normalmen- o novel Curso Superior de Política e Estra-
te, ligados à Escola; e os Cadernos de Es- tégia (CSUPE), que será abordado dentro
tudos Estratégicos, publicação de circula- do escopo da nova ESG, na próxima seção
ção nacional que concentra trabalhos se- deste artigo.
lecionados sobre vários assuntos10. Além Curso de Altos Estudos de Política e
dos periódicos, há que se destacar a pro- Estratégia – Caepe
dução de monografias e trabalhos em gru- O curso tem a duração de 40 semanas e
po sobre temas de interesse nacional pro- destina-se a preparar civis e militares do
duzidos pelos estagiários dos diversos Brasil e de nações amigas para o exercício

10
N.A.: As publicações podem ser baixadas gratuitamente no endereço http://www.esg.br/producao-
intelectual.

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de funções de direção e assessoramento executivos da Logística e Mobilização Na-


de alto nível na administração pública, em cionais, e de assessoramento aos órgãos
especial nas áreas da segurança e da defe- responsáveis pelo Sistema Nacional de
sa nacional, desenvolvendo planejamen- Mobilização (Sinamob).
tos estratégicos nas expressões do Poder Curso de Gestão de Recursos de Defe-
Nacional. Vale ressaltar que este curso é sa – CGERD
equivalente aos três cursos de altos estu- O CGERD destina-se a propiciar conhe-
dos militares11 das três Forças Armadas, cimentos a civis e oficiais superiores das
tendo a característica peculiar de incluir Forças Armadas e das Forças Auxiliares
também integrantes das Forças Auxiliares dos conceitos de defesa no Estado moder-
e civis das mais variadas profissões. no e de processos de gestão de recursos
Curso Superior de Inteligência Estra- de defesa, no âmbito da administração pú-
tégica – CSIE blica e privada. O curso tem a duração de
O curso tem a duração de 22 semanas e nove semanas. Os últimos cursos têm sido
se destina a preparar civis e oficiais superi- realizados em São Paulo, com o importante
ores das Forças Armadas e das Forças Au- apoio da Federação das Indústrias do Es-
xiliares para o exercício de funções de inteli- tado de São Paulo (Fiesp).
gência estratégica na administração pública Curso de Direito Internacional dos
e, em especial, nos órgãos ligados ao Siste- Conflitos Armados – CDICA
ma Brasileiro de Inteligência (Sisbin). Destina-se a capacitar e atualizar ins-
Curso de Estado-Maior Conjunto – trutores de Direito Internacional dos Con-
CEMC flitos Armados e comandantes de opera-
Com a duração de 15 semanas, o CEMC ções de combate a aplicar, respeitar e ga-
destina-se a preparar oficiais superiores das rantir o respeito às normas internacionais
Forças Armadas para o exercício de funções para conflitos armados. Vale comentar que
nos Estados-Maiores Combinados/Conjun- este curso, a partir de 2012, será ministrado
tos e o desempenho de atividades que en- no campus da ESG em Brasília.
volvam o planejamento e o emprego estraté- Estágio em Assuntos de Defesa – EADef
gico-operacional de forças militares em ope- O EADef destina-se a proporcionar aos
rações combinadas/conjuntas ou executadas civis lotados no Ministério da Defesa (MD)
sob orientação e supervisão do Ministério conhecimentos essenciais da Defesa Na-
da Defesa. Para este curso é requisito que o cional para a compreensão e a análise dos
militar já tenha concluído o Curso de Estado- assuntos afetos à área de atuação MD. O
Maior para oficiais superiores. estágio tem a duração de até dez semanas.
Curso de Logística e Mobilização Na- Programa de Atualização da Mulher –
cional – CLMN PAM
O curso tem a duração de 15 semanas e O PAM destina-se a proporcionar, por
se destina a preparar civis e oficiais superi- meio de um programa flexível de palestras,
ores das Forças Armadas e das Forças conferências, painéis, visitas e outras ativi-
Auxiliares para atuar nos níveis gerenciais dades de caráter cultural, social e informati-
11
N.A.: Os três cursos de altos estudos das Forças Armadas são: Curso de Política e Estratégia Marítimas
(C-PEM) na Escola de Guerra Naval; Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército
(CPEAEx), realizado na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme); e o Curso de
Política e Estratégia Aeroespaciais (CPEA). Estes cursos são realizados no último posto de oficial
superior (capitão de mar e guerra ou coronel).

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vo, a participação da mulher de forma Estratégia Nacional de Defesa, que enten-


consentânea com o papel cada vez mais re- de ser atribuição da ESG organizar o deba-
levante que lhe cabe na sociedade, bem te permanente entre as lideranças civis e
como divulgar informações atualizadas so- militares. Após diversos estudos e discus-
bre o Brasil e sua inserção no mundo. O sões técnicas e proativas entre a ESG e o
estágio, normalmente, é conduzido no se- Ministério da Defesa, decidiu-se que a cri-
gundo semestre, com atividades às quar- ação do Campus Brasília terá uma implan-
tas-feiras à tarde. O PAM tem sido frequen- tação por fases (BRASIL, 2008).
tado por senhoras indicadas por renomadas 1a fase: ativação do Núcleo do Campus
instituições e por esposas de oficiais gene- Brasília (julho de 2011), em instalações pro-
rais e superiores ligados à ESG. (ESG, 2011) visórias no antigo anexo do Exército em
Os cursos acima apresentados foram os Brasília, com as atividades acadêmicas de-
cursos efetivamente praticados no campus senvolvidas no Auditório do MD ou de
da ESG no Rio de Janeiro. Neste ponto do outra instituição conveniada, a critério do
artigo, passaremos a falar sobre a nova ESG, comandante da ESG. A princípio são três
que desde julho de 2011 iniciou de forma cursos: CSUPE, CDICA e EADef;
efetiva um processo de transformação, que 2ª fase: ativação do Curso de Formação
culminou com implantação do núcleo do de Analista de Defesa12, com ampliação da
campus da ESG em Brasília, inclusive com estrutura curricular, em instalações ainda
um curso já ministrado em suas instalações provisórias.
provisórias, mas que atendem de forma ade- 3ª fase: estabelecimento de uma estru-
quada às atuais demandas. (BRASIL, 2010) tura definitiva, que só poderá ser implanta-
da quando estiverem conclusas as instala-
A NOVA ESG ções próprias da ESG em Brasília.
Na atualidade, a totalidade das relações
Por determinação do Ministério da De- institucionais da ESG só pode ocorrer no
fesa, em 2010 foram iniciados os estudos Rio de Janeiro. A Escola recebe visitas cons-
preliminares para a criação de um campus tantes de delegações das Adesg e de insti-
da ESG em Brasília. A partir do início de tuições congêneres de todas as partes do
2011, especificamente no mês de julho, o Brasil e do mundo, sendo, portanto,
comandante da ESG, General de Exército mandatório, pelo menos a curto e médio
Túlio Cherem, criou o Núcleo do Campus prazo, que o Comando e a Direção da ESG
da ESG em Brasília. Essa medida contribui estejam sediados no Rio de Janeiro, com a
para maior projeção da ESG, pois possibili- eventual presença do comandante ou de
ta uma participação crescente nos estudos integrantes da Direção no campus Brasília
e debates sobre temas afetos ao desenvol- quando se fizer necessário.
vimento e à segurança nacional, atuando Entre as inovações da ESG, é importante
no epicentro das grandes decisões nacio- mencionar a previsão de criação de dois
nais, que é a capital federal. institutos dentro da estrutura administrati-
Vale ressaltar que a criação do campus va da Escola. Estes institutos vêm
Brasília vem atender ao preconizado na potencializar dois temas que, na atualida-
12
N.A.: Estão prontos, na ESG, os estudos para a implantação do Curso de Formação para Analistas de
Defesa destinado à formação de profissionais para atender a interesses específicos do Ministério da
Defesa. A sua criação está na dependência de inúmeras providências administrativas, especialmente,
a realização de concurso público.

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de, têm uma grande importância: as opera- talmente focado nas OpCj e terá uma diuturna
ções conjuntas e a pesquisa de temas rela- interação com o Idoc, por intermédio da Di-
cionados à defesa. Os dois institutos já visão de Assuntos Militares da ESG. Outro
possuem seus núcleos criados. São eles: o aspecto fundamental que está sendo bus-
Instituto Pandiá Calógeras (IPC), no cado é a necessária interação da ESG com
campus Brasília, e o Instituto de Doutrina as escolas congêneres: Escola de Guerra
de Operações Conjuntas (Idoc), no campus Naval (EGN), Escola de Comando e Estado-
Rio de Janeiro. Todavia, esses institutos Maior do Exército (Eceme) e Escola de Co-
não foram ativados de forma definitiva, em mando e Estado-Maior da Aeronáutica
virtude de ainda não terem sido oficializa- (Ecemar). Essa troca de conhecimentos e
das as suas criações pelo MD (BRASIL, experiências na área de OpCj será funda-
2010). mental, especialmente no tocante ao papel
O IPC, quando efetivamente criado, fun- catalisador e indutor que terá o Idoc, que
cionará em Brasília e, a princípio, estará está em fase de implantação na ESG.
subordinado ao diretor de Estudos da ESG Outra novidade foi a criação do Curso
e se proporá basicamente a atuar como um Avançado de Defesa (CAD), que se desti-
agente indutor de conhecimentos e com na a capacitar civis e militares que atuam
foco na interação com o meio acadêmico na área de defesa nos países da União das
nacional, especialmente nas áreas de se- Nações Sul-Americanas – Unasul13, pro-
gurança, estratégia e defesa. Atuando de porcionando-lhes conhecimentos que pos-
forma matricial com o Departamento de sibilitem o desenvolvimento de um pensa-
Estudos da ESG, poderá contribuir de for- mento sul-americano de defesa, com base
ma prática para o desenvolvimento e apri- na cooperação e na integração regionais.
moramento das atividades acadêmicas da A duração do curso será de cerca de 19
Escola. O maior detalhamento de suas atri- semanas, e ele acontecerá no campus Rio
buições ainda será motivo de estudos mais de Janeiro, provavelmente a partir de 2012.
aprofundados no âmbito do MD e da ESG. Cabe destacar que, nesta perspectiva
O Idoc, cujo núcleo já está estabelecido de transformação, um dos eventos mais
no campus Rio de Janeiro, se destinará ao relevantes da ESG em 2011 foi a abertura
estudo e à pesquisa de temas relacionados da primeira edição do Curso Superior de
à doutrina de operações conjuntas (OpCj), Política e Estratégia (CSUPE), marcando o
a qual já está em fase final de atualização no início das atividades do campus da ESG
MD. O Instituto contribuirá para a consoli- em Brasília. O CSUPE destina-se a propor-
dação de uma mentalidade conjunta, cionar a servidores civis do alto nível da
potencializando, em consequência, a neces- administração pública e a militares das For-
sária interoperabilidade entre as três Forças ças Armadas elementos para a macroaná-
Armadas e, quando necessário, com outros lise dos cenários nacional e internacional,
setores dos governos Federal, Estadual e de modo a possibilitar a avaliação de polí-
Municipal. É importante mencionar que o ticas e estratégias, em especial na área da
próprio CEMC, que é ministrado na ESG e já Defesa Nacional. O Curso está focado na
mencionado neste trabalho, é um curso to- geração de debates entre lideranças civis e

13
N.A.: A União de Nações Sul-Americanas (Unasul) é formada pelos 12 países da América do Sul. O
tratado constitutivo da organização foi aprovado durante Reunião Extraordinária de Chefes de
Estado e de Governo, realizada em Brasília, em 23 de maio de 2008.

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militares em assuntos relacionados à defe- constante atualização, bem como uma cres-
sa nacional, no diapasão do binômio defe- cente interação com o meio acadêmico na-
sa x desenvolvimento propalado na Estra- cional e internacional. Outro ponto impor-
tégia Nacional de Defesa (BRASIL, 2008). tante é a motivação para maior participa-
O público-alvo do CSUPE é constituído ção de civis em suas atividades docentes e
por funcionários dos 1o e 2o Escalões do discentes, culminando com a inauguração
Governo Federal. A organização do curso do posto avançado da ESG em Brasília em
foi pensada de forma a não se exigir uma julho de 2011, com a inserção da Escola no
dedicação exclusiva. Assim, as atividades centro de decisões do País.
acadêmicas ocorrem três vezes por sema-
na e apenas em meio período (manhã ou CONSIDERAÇÕES FINAIS
tarde), permitindo, assim, a participação de
estagiários do mais alto escalão do gover- Por mais que se debata, o papel da ESG
no, sem interferências significativas em na história do País é incontestável. A Es-
suas atividades laborais. O Curso foi con- cola vem se amoldando à realidade nacio-
cebido para ser atrativo, abordando sem- nal e funcionando como uma espécie de
pre temas atuais e de interesse e focado no caixa de ressonância de valores relaciona-
debate intenso e na diversidade de pensa- dos à defesa, ao desenvolvimento, à naci-
mentos, com uma participação efetiva dos onalidade e à lealdade ao Governo Federal
estagiários (CHEREM, 2011). em todas as fases de sua existência, inclu-
A primeira edição do curso encerrou-se sive na atualidade. É falaciosa a afirmação
em 18 de novembro de 2011 e pode ser con- de alguns acadêmicos de que a ESG ainda
siderada um sucesso total. Os 56 estagiári- é um reduto de militares radicais. Muito
os do CSUPE 2011 assistiram a palestras pelo contrário, vivemos novos tempos.
proferidas por representantes de vários Após dois anos servindo naquela Escola,
ministérios sob temas atuais e relevantes, pude constatar que, em todas as suas áre-
com intensos e produtivos debates. O pro- as, há uma perfeita integração entre milita-
pósito do curso foi plenamente atingido. res e civis de todos os setores do Poder
Este pequeno trecho do discurso da ora- Nacional, sendo a liberdade de expressão
dora da turma, a estagiária Ana Luiza a tônica em todos os debates. Ressalto que
Vasconcellos, representante da Caixa Eco- a “diversidade de pensamentos” é um dos
nômica Federal, permite constatar o alcan- valores mais respeitados e cultivados na-
ce dessa primeira turma CSUPE, que marca quela Escola.
a presença da ESG em Brasília: Assim, é de se esperar que cada vez mais
“Estivemos juntos por sete semanas que, a ESG tenha o seu lugar de destaque man-
com absoluta certeza, marcaram nossas tido tanto no âmbito do Ministério da De-
vidas para sempre, fazendo-nos mais fesa como no seio das Forças Armadas,
conscientes de nossas obrigações en- por meio da crescente valorização tanto da
quanto ocupantes de nossos cargos em instituição ESG como daqueles militares
nossas respectivas organizações e, es- que são indicados para conduzir os rumos
pecialmente, enquanto cidadãos brasi- daquela Escola. É igualmente importante
leiros preocupados com a Defesa Nacio- que, no meio civil, a Escola seja reconheci-
nal e com o futuro da Nação.” (ESG, 2011) da como centro de excelência na formação
Ao visitar a nova ESG, verifica-se uma de recursos humanos ligados aos assun-
série de ações proativas visando a sua tos de Defesa. Neste mesmo diapasão, os

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diversos segmentos do Poder Nacional mental o entendimento de que Defesa Na-


devem buscar uma crescente interação com cional é tema de interesse de todos os bra-
a ESG, de forma a conhecê-la cada vez mais sileiros (grifo nosso), pensamento ampla-
e melhor, divulgando o importante traba- mente difundido na ESG.
lho desenvolvido naquela Escola do saber Os integrantes da ESG, militares, civis e
nacional, que é um patrimônio, às vezes voluntários, liderados por seu comandante,
desconhecido, de todos os brasileiros. estão entusiasmados e confiantes na rele-
É tempo de estarmos unidos todos os vância e no futuro promissor da instituição,
brasileiros, civis e militares, focados na que, como uma altiva nau com suas velas
busca diuturna de um futuro cada vez me- enfunadas, navega em trajetórias de glória,
lhor para o nosso povo e do engrandeci- com rumos seguros e bem traçados, seguin-
mento do Brasil. Nesse sentido, não se do firme e mantendo a posição de destaque
pode olvidar que esse crescimento traz em que lhe é merecida no cenário nacional.
seu bojo riquezas e cobiças, sendo funda- ESG, a todo pano!

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<EDUCAÇÃO>; Escola;

REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO DOS DIPLOMADOS DA ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA - ADESG (2011).


Instituição, Missão e Delegacias. Disponível em http://www.adesg.net.br Acesso em: 10 nov.
2011.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de
outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 25 ago. 2011.
______ (2010). Ministério da Defesa. Portaria No- 1.567/MD, 8 de outubro de 2010. Diário Oficial
da União. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 13 out.
2011.
_______._______. A Estratégia Nacional de Defesa. Brasília/DF, 2008. Disponível em: <https://
www.defesa.gov.br>. Acesso em: 20 jun. 2011.
ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (Brasil). Manual Básico. Elementos Fundamentais. Rio de
Janeiro, 2009.
_______._______. Histórico e Missão. Disponível em: <http://www.esg.br>. Acesso em: 18 out.
2011.
CHEREM, Túlio. In: A Nova ESG. Rio de Janeiro, Palestra. XII Conferência de Diretores de Colégios
de Defesa Ibero-Americanos. Escola Superior de Guerra, Rio de Janeiro, 2011.
LIMA FILHO, Wilson Pereira de. A Amazônia Azul e os Desafios para a Defesa Nacional do Século
XXI. 2010. 70 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Altos Estudos de Política e
Estratégia) – Monografia. Escola Superior de Guerra, Rio de Janeiro, 2010.

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ANEXO A – QUADRO DOS EX-COMANDANTES

POSTO NOME PERÍODO

General de Divisão OSWALDO CORDEIRO DE FARIAS 01/09/49 a 11/12/52


General de Divisão JUAREZ DO NASCIMENTO FERNANDES TÁVORA 11/12/52 a 20/08/54
Brigadeiro do Ar ANTONIO AZEVEDO DE CASTRO LIMA 26/08/54 a 28/09/54
Vice-Almirante ERNESTO DE ARAUJO 29/09/54 a 23/11/55
Brigadeiro do Ar ANTONIO AZEVEDO DE CASTRO LIMA 23/11/55 a 13/12/55
Major-Brigadeiro do Ar AJALMAR VIEIRA MASCARENHAS 14/12/55 a 05/04/56
Brigadeiro do Ar ANTONIO AZEVEDO DE CASTRO LIMA 05/04/56 a 18/04/56
Major-Brigadeiro do Ar VASCO ALVES SECCO 19/04/56 a 23/03/59
General de Exército ARTHUR HESCKET HALL 23/03/59 a 05/01/60
General de Divisão ARMANDO VILLA NOVA PEREIRA DE VASCONCELLOS 05/01/60 a 08/03/60
General de Exército JOSÉ DAUT FABRÍCIO 09/09/60 a 16/10/61
General de Divisão EMILIO MAURELL FILHO 16/10/61 a 29/11/61
Almirante de Esquadra LUIZ TEIXEIRA MARTINI 29/11/61 a 03/02/65
Tenente-Brigadeiro do Ar HENRIQUE FLEIUSS 03/02/65 a 28/09/66
General de Exército AURELIO DE LYRA TAVARES 28/09/66 a 13/03/67
General de Divisão ARTHUR DUARTE CANDAL FONSECA 13/03/67 a 30/03/67
General de Exército AUGUSTO FRAGOSO 30/03/67 a 17/03/71
General de Divisão LAURO ALVES PINTO 17/03/71 a 28/05/71
General de Exército RODRIGO OCTÁVIO JORDÃO RAMOS 28/05/71 a 08/10/71
General de Divisão LAURO ALVES PINTO 08/10/71 a 23/02/72
General de Exército JOÃO BINA MACHADO 23/02/72 a 24/04/74
General de Exército FRITZ AZEVEDO MANSO 24/04/74 a 31/05/74
General de Exército WALTER DE MENESES PAES 31/05/74 a 14/04/76
General de Brigada ALACYR FREDERICO WERNER 14/04/76 a 06/05/76
General de Exército AYRTON PEREIRA TOURINHO 06/05/76 a 10/01/78
General de Exército JOSÉ FRANGOMENI 10/01/78 a 28/12/78
Almirante de Esquadra CARLOS HENRIQUE REZENDE DE NORONHA 28/12/78 a 19/03/81
General de Exército ALACYR FREDERICO WERNER 19/03/81 a 13/08/81
Vice-Almirante JOSÉ MARIA DO AMARAL OLIVEIRA 13/08/81 a 02/09/81
General de Exército ALZIR BENJAMIM CHALOUB 02/09/81 a 09/09/83
General de Exército EUCLYDES DE OLIVEIRA FIGUEIREDO FILHO 09/09/83 a 13/11/85
Tenente-Brigadeiro do Ar LUIZ FELIPPE CARNEIRO DE LACERDA NETTO 13/11/85 a 20/08/86
Almirante de Esquadra BERNARD DAVID BLOWER 20/08/86 a 20/04/88
General de Exército OSWALDO MUNIZ OLIVA 20/04/88 a 03/04/90
Tenente-Brigadeiro do Ar PEDRO IVO SEIXAS 03/04/90 a 20/08/91
Almirante de Esquadra HERNANI GOULART FORTUNA 20/08/91 a 12/04/93
Tenente-Brigadeiro do Ar SERGIO XAVIER FEROLLA 12/04/93 a 10/04/95
Tenente-Brigadeiro do Ar MASAO KAWANAMI 10/04/95 a 06/02/97
General de Exército PAULO NEVES DE AQUINO 06/02/97 a 30/04/97
General de Exército EXPEDITO HERMES REGO MIRANDA 30/04/97 a 15/12/98
Tenente-Brigadeiro do Ar FERNANDO DE ALMEIDA VASCONCELLOS 15/12/98 a 09/04/99
General de Divisão CARLOS PATRÍCIO FREITAS PEREIRA 09/04/99 a 17/12/99
General de Divisão THÉO ESPINDOLA BASTO 17/12/99 a 18/12/00
Vice-Almirante ADILSON VIEIRA DE SÁ 18/12/00 a 20/12/02
Major-Brigadeiro do Ar PAULO JORGE BOTELHO SARMENTO 20/12/02 a 13/02/04
Major-Brigadeiro do Ar ANTÔNIO LUIZ RODRIGUES DIAS 13/02/04 a 22/04/05
General de Exército JOSÉ BENEDITO DE BARROS MOREIRA 22/04/05 a 05/04/07
Almirante de Esquadra JOSÉ ANTONIO DE CASTRO LEAL 05/04/07 a 07/12/07
Almirante de Esquadra LUIZ UMBERTO DE MENDONÇA 07/12/07 a 05/02/09
Tenente-Brigadeiro do Ar CARLOS ALBERTO PIRES ROLLA 05/02/09 a 30/07/10
Tenente-Brigadeiro do Ar ANTONIO GOMES LEITE FILHO 30/07/10 a 28/03/11
General de Exército TÚLIO CHEREM 28/03/11

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ANEXO B – QUADRO DOS EX-SUBCOMANDANTES

POSTO NOME PERÍODO

Tenente-Coronel ALFREDO SOUTO MALAN 06/10/1949 a 25/02/1950


Brigadeiro VASCO ALVES SECCO 27/02/1950 a 12/02/1951
General de Brigada TASSO DE OLIVEIRA TINOCO 12/02/1951 a 10/03/1952
Brigadeiro ISMAR PFALTZGRAFF BRASIL 10/03/1952 a 02/03/1953
Contra-Almirante BENJAMIM SODRÉ 02/03/1953 a 30/12/1953
General de Brigada OSCAR DE BARROS FALCÃO 30/12/1953 a 07/03/1955
Contra-Almirante FERNANDO ALMEIDA DA SILVA 07/03/1955 a 19/01/1956
Contra-Almirante LUIZ FERNANDES BARATA 19/01/1956 a 26/12/1956
General de Brigada HUMBERTO DE ALENCAR CASTELLO BRANCO 26/12/1956 a 01/09/1958
Coronel JOSÉ SINVAL MONTEIRO LINDENBERG 01/09/1958 a 30/09/1958
General de Brigada ARMANDO VILLA NOVA PEREIRA DE VASCONCELLOS 30/09/1958 a 22/12/1959
Contra-Almirante LUIZ OCTÁVIO BRASIL 22/12/1959 a 09/03/1960
General de Divisão ARMANDO VILLA NOVA PEREIRA DE VASCONCELLOS 09/03/1960 a 18/08/1961
General de Divisão EMILIO MAURELL FILHO 18/08/1961 a 04/04/1962
General de Divisão IGNÁCIO DE FREITAS ROLIM 04/04/1962 a 13/09/1963
General de Divisão ALBERTO RIBEIRO PAZ 13/12/1963 a 22/07/1964
General de Divisão ALUIZIO DE MIRANDA MENDES 22/07/1964 a 10/11/1964
General de Divisão MILTON BARBOSA GUIMARÃES 03/12/1964 a 24/10/1966
General de Divisão ARTHUR DUARTE CANDAL FONSECA 27/12/1966 a 04/04/1967
General de Divisão HUMBERTO DE SOUZA MELLO 23/05/1967 a 23/08/1968
General de Divisão IDÁLIO SARDENBERG 01/09/1968 a 02/12/1969
General de Divisão LAURO ALVES PINTO 31/12/1969 a 23/04/1973
General de Divisão FRITZ AZEVEDO MANSO 23/04/1973 a 23/04/1974
General de Brigada JOÃO DE ALVARENGA SOUTTO MAYOR 23/04/1974 a 31/09/1974
Major-Brigadeiro CLOVIS LABRE DE LEMOS 31/09/1974 a 19/03/1976
Major-Brigadeiro EDIVIO CALDAS SANCTOS 31/05/1976 a 18/10/1977
Major-Brigadeiro LUIZ CARLOS ALIANDRO 18/11/1977 a 21/09/1979
Major-Brigadeiro PEDRO FRAZÃO DE MEDEIROS LIMA 21/09/1979 a 14/11/1980
Vice-Almirante JOSÉ MARIA DO AMARAL OLIVEIRA 14/11/1980 a 08/11/1983
Vice-Almirante LUIZ FERNANDO DA SILVA SOUZA 08/11/1983 a 24/09/1984
Major-Brigadeiro MARCIO TEREZINO DRUMMOND 25/09/1984 a 08/04/1985
Major-Brigadeiro MARIO DE MELO SANTOS 11/04/1985 a 11/11/1985
Vice-Almirante JOSÉ DO CABO TEIXEIRA DE CARVALHO 12/11/1985 a 19/08/1986
General de Divisão JOSÉ EDUARDO LOPES TEIXEIRA 19/08/1986 a 26/02/1987
General de Divisão OSWALDO MUNIZ OLIVA 26/02/1987 a 04/04/1988
Brigadeiro SERGIO XAVIER FEROLLA (Interino) 04/04/1988 a 23/05/1988
Major-Brigadeiro MARIO FERNANDO CECCHI 23/05/1988 a 11/01/1990
Vice-Almirante DOMINGOS ALFREDO SILVA 11/01/1990 a 12/07/1991
General de Divisão ROMULO NUNES CAMARGO 12/07/1991 a 18/12/1992
General de Divisão JOSÉ ENALDO RODRIGUES DE SIQUEIRA 18/12/1992 a 23/04/1993
Vice-Almirante MAURO ANGELO MAIA 23/04/1993 a 08/05/1995
Vice-Almirante LUIZ SANCTOS DÖRING 08/05/1995 a 20/03/1997
Major-Brigadeiro FERNANDO DE ALMEIDA VASCONCELLOS 20/03/1997 a 09/04/1999
Contra-Almirante ANTONIO CARLOS DA CÂMARA BRANDÃO 13/04/1999 a 10/04/2000
Brigadeiro Eng PAULO ROBERTO DE CARVALHO FERRO 10/04/2000 a 19/12/2001
Major-Brigadeiro Eng FRANCISCO MOACIR FARIAS MESQUITA 19/12/2001 a 29/12/2002
General de Brigada EDUARDO RAMALHO DOS SANTOS 29/12/2002 a 27/01/2005
Contra-Almirante MAURO FRANÇA DE ALBUQUERQUE LIMA 27/01/2005 a 24/03/2005
Vice-Almirante PEDRO FAVA 08/04/2005 a 20/03/2007
Major-Brigadeiro NILSON PRADO GODOY 04/04/2007 a 17/02/2009
General de Divisão HÉLIO CHAGAS DE MACEDO JÚNIOR 17/02/2009 a 05/01/2010
General de Divisão CELSO JOSÉ TIAGO 05/01/2010 a 07/01/2011
Vice-Almirante NELSON GARRONE PALMA VELLOSO 07/01/2011

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ANEXO C – QUADRO DOS EX-ASSISTENTES DA MARINHA

POSTO NOME PERÍODO

Contra-Almirante BENJAMIN SODRE 1950 a 1953


Contra-Almirante FERNANDO ALMEIDA DA SILVA 1954 a 1955
Contra-Almirante LUIZ FERNANDES BARATA 1956 a 1957
Contra-Almirante LUIZ PHELIPPE DE SALDANHA DA GAMA 1957 a 1958
Contra-Almirante LUIZ OCTAVIO BRASIL 1959 a 1960
Contra-Almirante MURILLO VASCO DO VALLE E SILVA 1961 a 1962
Contra-Almirante JURANDIR DA COSTA MULLER DE CAMPOS 1963 a 1965
Contra-Almirante HILTON BERUTTI AUGUSTO MOREIRA 1966 a 1967
Contra-Almirante ÁTTILA RODRIGUES NOVAES 1967 a 1968
Contra-Almirante EDDY SAMPAIO ESPELLET 1969 a 1970
Contra-Almirante PEDRO THEDIM BARRETO 1971 a 1972
Contra-Almirante JOSÉ CALVENTE ARANDA 1973 a 1974
Contra-Almirante LUIZ LEAL FERREIRA 1975 a 1976
Contra-Almirante ODILON LIMA CARDOSO 1977 a 1978
Contra-Almirante DIMAS LOPES DA SILVA COELHO 1978 a 1979
Contra-Almirante AMÉRICO LOBATO MAIA 1980 a 1981
Contra-Almirante WANDYR DAS NEVES SIQUEIRA 1981 a 1982
Contra-Almirante JOÃO BAPTISTA PAOLIELLO 1982 a 1983
Contra-Almirante LYSIAS RULAND KERR 1983 a 1984
Contra-Almirante FERNANDO L.P.L. FURTADO DE MENDONÇA 1984 a 1985
Contra-Almirante GERALDO ALÃO DE QUEIROZ 1985 a 1986
Contra-Almirante PAULO RONALDO DALDEGAN MOREIRA 1986 a 1987
Contra-Almirante MANOEL VAN DER HAAGEN DA SILVA 1987 a 1988
Contra-Almirante MAURICIO HALPERN 1988 a 1989
Contra-Almirante ROBERTO DE LORENZI FILHO 1989 a 1990
Contra-Almirante AYRTON DE MEDEIROS CABRAL 1990 a 1991
Contra-Almirante MAURO VIANNA DE ARARIPE MACEDO 1991 a 1992
Contra-Almirante CELSO MELLO DE FIGUEIREDO 1992 a 1993
Contra-Almirante RAUL PEREIRA BITTENCOURT 1993 a 1994
Contra-Almirante LUIZ SERGIO SILVEIRA COSTA 1994 a 1995
Contra-Almirante MARIO UBIRAJARA HOFKE 1995 a 1995
Contra-Almirante LUIZ MARIO CURTY GIFFONI 1995 a 1995
Contra-Almirante EUCLIDES DUNCAN JANOT DE MATOS 1995 a 1996
Contra-Almirante (FN) CARLOS ROBERTO DE OLIVEIRA CÂNDIDO PEREIRA 1996 a 1997
Contra-Almirante ROBERTO CIMINELLI 1997 a 1997
Contra-Almirante CARLOS AUGUSTO VASCONCELOS SARAIVA RIBEIRO 1997 a 1998
Contra-Almirante OSCAR DE SOUZA SPINOLA NETO 1998 a 1999
Contra-Almirante ANTONIO CARLOS DA CÂMARA BRANDÃO 1999 a 1999
Capitão de Mar e Guerra LUIS CARLOS CUNHA COUTO 1999 a 1999
Capitão de Mar e Guerra LUIZ ANTONIO PEREIRA 1999 a 2000
Contra-Almirante LUIZ UMBERTO DE MENDONÇA 2000 a 2001
Contra-Almirante EVANDRO CARLOS ALVES SANTOS 2001 a 2001
Capitão de Mar e Guerra (FN) CELSO SOARES LOPES 2001 a 2002
Capitão de Mar e Guerra PAULO HENRIQUE DE CARVALHO 2002 a 2003
Contra-Almirante EDUARDO MONTEIRO LOPES 2003 a 2004
Contra-Almirante SERGIO ANTONIO DA CONCEIÇÃO FREITAS 2004 a 2005
Contra-Almirante MAURO FRANÇA DE ALBUQUERQUE LIMA 2005 a 2006
Contra-Almirante GUILHERME MATTOS DE ABREU 2006 a 2007
Contra-Almirante GENER MARTINS BAPTISTA 2007 a 2008
Contra-Almirante ILQUES BARBOSA JUNIOR 2008 a 2009
Contra-Almirante LUIZ HENRIQUE CAROLI 2009 a 2010
Contra-Almirante CARLOS AUGUSTO DE MOURA RESENDE 2010 a 2011
Contra-Almirante WILSON PEREIRA DE LIMA FILHO 2011 a 2012

72 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE
DEFESA*

Parte I

“A logística é tudo, ou quase tudo, no campo


das atividades militares, exceto o combate.”
Antoine-Henry Jomini

PAULO RUI DE MENEZES CAPETTI


Capitão de Mar e Guerra

SUMÁRIO

Parte I
Introdução
Objetivo do trabalho
A evolução da abordagem logística
A base da abordagem da Logística de Obtenção
Os tipos de obtenção
Os sistemas de defesa
Parte II
Como a logística de obtenção atinge seus propósitos
A implantação nas Forças Armadas brasileiras – políticas e estratégias
Preparação de pessoal
A normatização
Necessidade de modificação da estrutura do MD
Limites da atuação do MD
Conclusão

INTRODUÇÃO sistemas em uso, que, por várias razões, se


tornam incapazes de atender às demandas

D e tempos em tempos, as Forças Arma-


das se deparam com a necessidade de
incorporar novos sistemas de defesa aos
do setor operacional.
Quando isso ocorre, a alta administração
militar inicia um processo de obtenção com
seus inventários. Tal necessidade deriva o propósito de incorporar um novo sistema
das lacunas operacionais deixadas pelos que irá preencher a lacuna existente.

* N.R.: Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Estudos da Escola Superior de


Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia, em
2008. Orientador: CMG (EN-RM1) Claudio José Martins Filho.
A parte II do trabalho será publicada na próxima edição.
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

Entretanto, uma vez em operação normal, é Diante de tantas circunstâncias negati-


possível que o sistema não se comporte con- vas do ponto de vista operacional e
forme esperado ou surjam problemas que não logístico, a alta administração militar pode
foram antecipados durante o processo de ob- optar por desincorporar o sistema e obter
tenção. Por exemplo, o sistema pode apresen- outro que seja mais eficiente no cumpri-
tar avarias com uma frequência considerada mento das suas funções.
excessiva, fazendo com que seus usuários ou Mas até nesse momento podem surgir pro-
aqueles cuja segurança depende do seu bom blemas. Pode ser que o sistema empregue di-
funcionamento não tenham confiança nele, versos materiais de difícil manuseio, tais como
uma vez que será grande a probabilidade de os radioativos, os tóxicos ou os altamente
falha em um momento crítico. poluentes, o que exigirá instalações e pessoal
Pode ser também que o tempo que o devidamente preparados para manuseá-los e
sistema requer para a realização de servi- descartá-los. Caso não existam, será necessá-
ços de manutenção preventiva ou ações rio dotar a Força com tais capacidades ou con-
de manutenção corre- tratar um prestador de
tiva a cada ciclo de serviços, o que gera
operação seja por de- Em períodos de paz, gastos muitas vezes
mais elevado em rela- não previstos.
ção às expectativas da
sistemas de defesa que Apesar da diversi-
Força. permanecem longos dade de casos, em li-
Pode ser ainda que períodos impossibilitados nhas gerais essas si-
os manuais de manu- tuações acarretam
tenção se mostrem de serem empregados dois problemas: nem
inadequados para uso levam à compra de várias sempre o sistema se
por estarem escritos mostra pronto para
em um idioma diferen-
unidades para que um uso quando o usuário
te do idioma nativo número mínimo esteja necessita; ou o custo
das equipes de manu- disponível para emprego total do ciclo de vida,
tenção ou podem fal- aumentado em decor-
tar elementos essenci- rência dos problemas
ais, tais como ferramentas, oficinas, equi- apresentados, se mostra incompatível com
pamentos de testes e outros. o orçamento militar existente.
Mesmo com todos os recursos à disposi- Esses casos não são meramente hipoté-
ção, o usuário pode constatar que o reparo é ticos. São exemplos ilustrativos de situa-
uma tarefa que possui um grau de dificulda- ções que ocorrem com frequência em mui-
de tal que, com frequência, sua execução acar- tas Forças Armadas. Nesses casos, as
reta o surgimento de novas avarias que irão consequências são deficiências logísticas
consumir mais horas de trabalho e mais com- que redundam em prejuízo do desempenho
prometimento da capacidade operacional. operacional e aumento dos gastos com os
Pode ser também que, devido a sua com- sistemas de defesa, sendo desastrosas tan-
plexidade, o sistema não possa ser repara- to em tempo de paz quanto em um conflito.
do pelo pessoal de campo, requerendo o Em um teatro de operações, tais ocor-
envio para um parque, uma base ou para o rências poderiam ter consequências bas-
próprio fabricante, que poderão estar mui- tante graves. Um sistema de mísseis que
to distantes do teatro de operações. falhe no instante de engajar com uma vaga

74 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

de aeronaves atacantes; aeronaves que bricação de um navio-aeródromo nuclear


cumprem parte de uma missão e precisam da classe Nimitz ou de uma aeronave B-2 é
permanecer longos períodos em manuten- da ordem de alguns bilhões de dólares, e
ção até ficarem em condições de concluí- isso representa apenas uma fração do cus-
la; e torpedos que atingem o alvo, mas suas to total do ciclo de vida desses sistemas.
cabeças de combate não explodem em de- Com tal grandeza de valores em jogo, a
corrência de falhas de montagem são cir- questão da eficiência de um sistema de
cunstâncias que comprometem seriamente defesa no cumprimento das tarefas para as
a possibilidade de sucesso de uma força quais foi projetado passa a ser uma ques-
militar e, consequentemente, o próprio es- tão de extrema importância.
forço de guerra de um país. Assim sendo, os planejadores militares
Por seu turno, em períodos de paz, siste- precisam enfrentar o desafio de evitar ou
mas de defesa que permanecem longos perío- reduzir tais ocorrências, garantindo que o
dos impossibilitados de serem empregados sistema atenderá à necessidade surgida
levam à compra de várias unidades para que com o maior desempenho e menores cus-
um número mínimo esteja disponível para em- tos possíveis.
prego. Sistemas que quebram com muita Uma forma de evitar, ou pelo menos re-
frequência exigem grandes dotações de so- duzir, a incidência de tais ocorrências é in-
bressalentes, que permanecem imobilizados cluir as preocupações com as questões
em paióis sofrendo desgaste pela ação do tem- logísticas nos primeiros instantes da con-
po e que podem acabar sendo descartados cepção de um sistema de defesa, quando
como sucata quando o sistema é ele não passa de uma formulação teórica.
desincorporado, em um evidente desperdício Dessa forma, o sistema passa a ter qualida-
de recursos. As ferramentas de teste e reparo des que contribuem para que ele possa ser
e os equipamentos de manuseio podem ter mantido em funcionamento por mais tem-
um custo relativamente elevado em decorrên- po e que reduzem os gastos com a sua ope-
cia do uso de materiais perigosos, poluentes ração e manutenção.
ou excessivamente complexos. Manuais in- Dentro desse contexto, a logística mili-
compatíveis com as qualificações das equi- tar, inicialmente voltada para o fornecimen-
pes de manutenção podem ser a causa princi- to de recursos em benefício da tática e da
pal da não observância de procedimentos pre- estratégia, transforma-se e amplia seu
conizados pelo respectivo fabricante. campo de atuação para muito antes dos
Todas essas dificuldades requerem re- limites estabelecidos pelo início de uma
cursos financeiros, técnicos e tempo para campanha militar, uma vez que as esco-
serem evitadas. Em um mundo onde a com- lhas feitas pelos projetistas são relevan-
plexidade dos sistemas de defesa se tra- tes na utilização de um sistema de defesa.
duz em custos cada vez mais altos e onde Por exemplo, a disposição de compo-
os governos são cada vez mais pressio- nentes e a previsão de emprego de certos
nados a reduzir os gastos com defesa, tipos de materiais, aspectos tratados du-
esses problemas podem atingir dimensões rante o projeto de um sistema, são caracte-
inaceitáveis. rísticas que interferem com a duração e a
A importância dessas questões pode ser frequência dos serviços de manutenção.
avaliada pelos valores envolvidos na aqui- Por sua vez, tais características também são
sição e na operação de um moderno siste- determinantes para a identificação das mo-
ma de defesa. Por exemplo, o custo de fa- dificações que devem ser executadas no

RMB1 o T/2012 75
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

sistema de apoio logístico da Força potencialidade dessa postura, fornecendo


(Sialog1). um indício da pertinência da sua adoção.
Ainda em relação ao Sialog, outro aspec- Em 1975, na Marinha dos EUA, estava
to importante a ser destacado é que o pro- sendo desenvolvida a aeronave F/A-18
cesso de identificação e incorporação de Hornet para substituir outros modelos que
modificações precisa ser iniciado com ante- operavam embarcados, entre eles o A-4
cedência. Atividades tais como formação de Skyhawk, o F-14 Tomcat e o A-6 Intruder.
pessoal, preparação de oficinas, compra de Uma das diferenças desse processo de
equipamentos de teste e reparo, preparação obtenção em relação aos já realizados pe-
de manuais técnicos e muitas outras reque- los norte-americanos foi que as especifi-
rem um grande tempo de execução e, por isso, cações da aeronave não incluíam apenas
precisam ser trabalhadas o quanto antes, sob requisitos operacionais. Os altos escalões
pena de deixar o sistema inoperante ou com militares estabeleceram, concomitantemen-
restrições no momento da incorporação. te, requisitos logísticos.
É importante destacar que as atividades Essa nova exigência decorreu do fato
de apoio logístico a um sistema de defesa de que os F-14 Tomcat e A-6 Intruder re-
nem sempre estão restritas ao ambiente in- queriam extensos serviços de manutenção
terno das Forças Armadas. Muitas serão depois de menos de uma hora de operação
executadas por empresas civis, devido a e, em consequência, deixavam sérias lacu-
fatores tais como ganhos de escala e ou- nas operacionais. Eram boas aeronaves
tros. Assim sendo, é preciso estimular o desde que tudo funcionasse a contento,
desenvolvimento da capacidade civil de mas nem sempre estavam aptas a cumprir
apoio logístico, o que pode ser feito, por uma missão até o fim.
exemplo, por meio da garantia de um fluxo Por intermédio de um processo de ob-
mínimo e estável de encomendas de pro- tenção no qual todos os interessados tra-
dutos e serviços. A questão fundamental balharam em conjunto para encontrar o equi-
dessa preocupação está no fato de que o líbrio ideal entre qualidades logísticas e
fortalecimento da expressão militar do Po- operacionais, o F/A-18 Hornet foi dotado
der Nacional passa, necessariamente, pela de características que o diferenciava das
consolidação de um complexo industrial demais aeronaves. Ele é confiável, ou seja,
militar genuinamente nacional. desempenha suas tarefas até o fim sem fa-
Uma avaliação preliminar dos benefícios lhas ou panes que o incapacitem, e exige
que a inclusão de considerações logísticas menos da metade da força de trabalho ne-
nos primeiros instantes da concepção de cessária para a manutenção das outras ae-
um sistema de defesa pode trazer às Forças ronaves. Assim, ele pode realizar uma mis-
Armadas brasileiras pode ser feita a partir são, regressar para bordo e depender ape-
da observação da experiência de Forças Ar- nas do reabastecimento de combustível e
madas estrangeiras. Verificar um caso de munição para uma nova sortida, enquanto
sucesso pode dar uma boa ideia da os outros modelos precisavam ser submeti-

1 N.A.: Sialog será usado consoante a definição constante da Doutrina de Logística Militar. Lá, um
sistema de apoio logístico é uma estrutura sistêmica de uma Força Armada “destinada a prover uma
força dos recursos humanos, materiais e animais e dos serviços destinados a atender às suas neces-
sidades, visando ao cumprimento da missão” (DEPARTMENT OF THE NAVY. OPNAVINST 3000.
12A Operational Availability Handbook – A Practical Guide for Military Systems, Sub-Systems and
Equipment. Washington, DC, EUA, 2003 – p. 34).

76 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

dos a extensas rotinas de manutenção pre- “O tema é bastante atual, haja vista as
ventiva e ações de manutenção corretiva substanciais revoluções no processo de
para que pudessem voar outra vez. Mesmo obtenção dos sistemas de defesa de paí-
no caso do surgimento de avarias, ele é me- ses, tais como os Estados Unidos
lhor que os outros modelos de aeronaves (Acquisition Logistics) e Inglaterra (Smart
que operavam embarcadas, uma vez que Acquisition Philosophy), demonstrando
consume menos tempo para ser reconduzido sua importância e a sensibilidade aos di-
à condição normal de operação. versos fatores conjunturais.” *
O segredo do F/A-18 Hornet reside no
fato de que ele possui características que Assim, os administradores militares pre-
facilitam o apoio logístico no teatro de ope- cisam enfrentar o desafio de encontrar for-
rações. Por exemplo, a troca de uma turbina mas de evitar que tais problemas aconte-
de um A-4 Skyhawk consumia várias horas çam, garantindo que seus equipamentos
de serviço que começavam com a funcionarão a contento e que os custos de
desmontagem completa da empenagem da operação serão mantidos nos níveis con-
aeronave, enquanto o F/A-18 Hornet preci- siderados aceitáveis.
sa de menos de 18 minutos de serviço para
ter um daqueles componentes substituídos. OBJETIVO DO TRABALHO
O F/A-18 Hornet só pode ser mantido
com menos recursos e em menos tempo A logística militar procura responder a
graças à atenção dada pelos seus projetis- tais desafios de várias formas, entre elas com
tas às características logísticas. Sem essa a disseminação de conceitos logísticos e de
preocupação, esse modelo de aeronave métodos sistematizados para a realização
estaria condenado a ter as mesmas limita- das suas atividades típicas.
ções que outras aeronaves empregadas Considerar as questões logísticas desde
pelas Forças Armadas dos EUA. a fase de concepção produz um impacto sig-
Os problemas identificados pela Mari- nificativo sobre a capacidade de estar pron-
nha dos EUA com suas aeronaves to para ser empregado e sobre os custos do
embarcadas podem ser encontrados em ciclo de vida de um sistema de defesa.
qualquer outro sistema de defesa. Dificul- No Brasil, o processo de obtenção de
dades para a realização de serviços de ma- sistemas de defesa ainda não atingiu um
nutenção, necessidade de manutenções grau de aperfeiçoamento condizente com
preventivas ou corretivas frequentes e a os problemas apontados. Embora existam,
demanda por recursos consideráveis para os documentos reguladores da atividade
tais serviços, entre outros, são problemas logística não descrevem um modelo desen-
comuns nesses sistemas. volvido para assegurar que as considera-
Apesar de o caso do F/A-18 Hornet ter ções logísticas existirão desde a concep-
ocorrido há mais de 30 anos, a importância ção do sistema.
da abordagem das questões logísticas du- Em decorrência disso, acentua-se o ris-
rante a fase da concepção de um sistema co de as Forças Armadas incorporarem sis-
de defesa mantém-se como um tema em temas incapazes de responder adequada-
evidência. Sobre isso, pode-se dizer que: mente às solicitações de emprego ou que

* CAPETTI, Ruy. “Importância do Processo de Obtenção de Sistemas Navais de Defesa na Marinha do


Brasil”. Revista Marítima Brasileira. Rio de Janeiro, v. 127, no 04/06, abr./jun. 2007 (p. 109).

RMB1 o T/2012 77
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

possuem custos incompatíveis com os or- do e, eventualmente, pouco familiarizado com


çamentos existentes. os temas relacionados com a Logística Militar.
O objetivo deste trabalho é comentar a Espera-se com isso despertar a curiosida-
evolução da logística até o surgimento da de da comunidade militar brasileira para um
abordagem da Logística de Obtenção, citar tema que, a julgar pela quantidade de traba-
os tipos de obtenção de sistemas de defesa lhos e manuais existentes nas Forças Arma-
mais comuns, comentar a necessidade de es- das de países militarmente mais poderosos
tabelecer requisitos para determinar quais os que o Brasil, pode trazer enormes benefícios
sistemas que devem ser objeto dessa abor- para as nossas Forças Armadas.
dagem, mostrar como a abordagem da
Logística de Obtenção atinge seu propósito A EVOLUÇÃO DA ABORDAGEM
e, por fim, propor medidas a serem adotadas LOGÍSTICA
para que um processo sistematizado e pa-
dronizado de obtenção pautado na referida Segundo Clausewitz (Da Guerra. Brasília:
abordagem seja adota- Editora UnB, 1979 – p. 138), a arte da guerra
do pelo Ministério da compreende o emprego
Defesa (MD). em combate dos meios
É importante desta- Acentua-se o risco de as disponíveis, aquilo que
car que o foco das dis- Forças Armadas chamou de “condução
cussões neste trabalho da guerra”. Esse pro-
não são os processos
incorporarem sistemas cesso se desenvolve
internos das Forças Sin- incapazes de responder segundo dois grandes
gulares. Sabe-se que adequadamente às ramos: a estratégia e a
elas possuem suas sis- tática. O primeiro, vol-
temáticas próprias de solicitações de emprego ou tado para as questões
obtenção e que é possí- que possuem custos relativas ao planeja-
vel que empreguem, em mento e execução de
maior ou menor grau, al-
incompatíveis com os movimentos de forças
guns dos conceitos e orçamentos existentes militares. O segundo,
ferramentas típicas da para as questões de
abordagem da Logística de Obtenção. como travar um combate.
O objetivo maior é propor um caminho Mesmo admitindo apenas esses dois ra-
para a inclusão do MD nos processos de mos, Clausewitz reconheceu que existe algo
obtenção de sistemas de defesa no Brasil. mais em uma campanha militar. Para ele, “a arte
Acredita-se que essa participação poderá tra- da guerra, no seu sentido mais amplo, englo-
zer ganhos substanciais para o incremento ba todas as atividades que a guerra suscita,
da interoperabilidade entre as Forças Singu- por conseguinte, toda a criação das Forças
lares e para a redução dos gastos militares. Armadas, ou seja: o recrutamento, o armamen-
Este trabalho não se propõe a ser um ma- to, o equipamento e o treino” (Clausewitz, Carl
nual técnico de Logística de Obtenção volta- Von. Da Guerra. Brasília: Editora UnB, 1979 –
do para os profissionais especializados. Ao p. 138). Portanto, Clausewitz acreditava que
contrário, a profundidade da análise e a termi- uma guerra não era feita apenas com movi-
nologia empregada foram dimensionadas com mentos de tropas e o emprego do armamento
o propósito de levar conhecimentos básicos durante os confrontos. Havia outras questões
sobre o tema para um público não especializa- a serem consideradas.

78 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

Foi o Barão Antoine-Henri Jomini, teó- mentos às tropas. Naquela época, os EUA
rico militar da primeira metade do século estavam envolvidos em uma competição en-
XIX, um dos primeiros estudiosos que con- tre a quantidade de meios, a abordagem em-
siderou a logística como um ramo da guer- pregada pela URSS para fazer frente aos re-
ra. Em sua obra A Arte da Guerra, Jomini cursos tecnologicamente superiores dos
dividiu a guerra em cinco ramos, entre os seus inimigos, e a qualidade e sofisticação, a
quais estava a logística. escolha norte-americana para enfrentar o nú-
A logística pode ser definida como “o con- mero cada vez maior dos equipamentos mili-
junto de atividades relativas à previsão e à tares soviéticos. Nesse ambiente, questões
provisão de recursos e dos serviços neces- tais como eficiência e eficácia dos sistemas
sários à execução das missões das Forças de defesa e do respectivo Sialog passaram a
Armadas” (BRASIL. Ministério da Defesa. fazer parte das preocupações dos adminis-
MD42-M-02 Doutrina de Logística Militar. 2. tradores militares.
ed. Brasília: MD, 2002 – p. 15). Em meados da década de 60, surgiu uma
O século XX impôs grandes desafios para nova abordagem para a logística nas Forças
o suprimento das forças Armadas dos EUA que
militares nos diferentes mudou o foco da
teatros de operações. O apoio logístico deixava logística tradicional. Ela
Até então, os conflitos de ser visto como um não atribuía ênfase ape-
jamais tinham tido uma nas ao apoio no campo
extensão global. Eram
conjunto de medidas de batalha, mas também
restritos a algumas regi- isoladas visando à visão antecipada da
ões do planeta e a al- precipuamente ao “composição de todas
guns exércitos. as considerações de
Com a Segunda suprimento e à manutenção apoio necessárias para
Guerra Mundial (II GM), e passava a ser tratado assegurar o apoio efeti-
essa realidade começou
a mudar. A abrangência
como atividade sistêmica vo e econômico aos sis-
temas ou equipamentos
mundial dos combates em todos os níveis de
obrigava que tropas fossem deslocadas para manutenção e durante todo seu ciclo de vida”
linhas de frente situadas a milhares de quilô- (Blanchard, Benjamin S. Logistics
metros das fontes de suprimento. Dessa for- Engineering and Management. 6. ed. Upper
ma, era preciso desenvolver formas de apoio Saddle River, EUA: Prentice Hall, 2004 – p. 7).
que vencessem as dificuldades impostas por Essa nova abordagem ficou conhecida como
um conflito de grande amplitude. O exercício Apoio Logístico Integrado (ALI).
das atividades logísticas ganhava, assim, uma As preocupações do ALI incluem consi-
complexidade jamais vista. derações sobre os mais diferentes elementos
Após o fim da II GM, devido à corrida da logística, abrangendo o planejamento da
armamentista decorrente da Guerra Fria manutenção, o apoio logístico, os equipamen-
(DEFENSE SYSTEMS MANAGEMENT tos de apoio e teste, os recursos humanos, os
COLLEGE. Acquisition Logistics Guide. 3. equipamentos de treinamento, os dados téc-
ed. Fort Belvoir, Virginia, EUA, 1997 – p. 1-1), nicos, as ferramentas computacionais, o trans-
as Forças Armadas dos EUA perceberam que porte, o armazenamento, o manuseio e acon-
cabia um papel bem mais amplo à logística dicionamento, e as instalações fixas de apoio,
militar do que simplesmente entregar supri- entre outras.

RMB1 o T/2012 79
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

Dessa forma, o apoio logístico deixava do o sistema se apresentava pronto para o


de ser visto como um conjunto de medidas emprego. Tais limitações deveriam ser con-
isoladas visando precipuamente ao supri- sideradas e trabalhadas desde cedo. As-
mento e à manutenção e passava a ser tra- sim, desenvolveu-se uma nova abordagem
tado como atividade sistêmica. da logística militar conhecida como
A partir das análises proporcionadas Acquisition Logistics, que aqui será cha-
pela implantação dessa abordagem, algu- mada de Logística de Obtenção.
mas constatações sobre os sistemas em- A abordagem da Logística de Obtenção
pregados nas Forças Armadas dos EUA é um conjunto de “atividades técnicas e
foram dramáticas. Muitos foram identifica- gerenciais conduzidas com o propósito de
dos como frágeis, caros para manter e com assegurar que implicações sobre o apoio
um ciclo de vida considerado curto. Um logístico serão consideradas cedo e ao lon-
exemplo desse tipo de equipamento era o go do processo de obtenção para minimizar
General Dynamics F-111, uma aeronave de os custos de tal apoio e dotar o usuário
ataque ao solo multitarefa com capacidade com os recursos para apoiar o sistema em
de voar em velocidades supersônicas e de campo” (Defense Acquisition University
transportar armamento nuclear. Sobre o F- Press. Glossary. 12. ed. Fort Belvoir,
111, diziam os especialistas: Virginia, EUA: Defense Acquisition
“Brilhante no conceito, ele era formidá- University Press, 2005 – p. B-3).
vel nas raras ocasiões quando tudo fun- Dito de outra forma, a abordagem da
cionava e durava a missão completa. A Logística de Obtenção visa fazer com que
quantidade de equipamentos, o número o projeto de um novo sistema de defesa
de pessoal necessário para apoiar a ae- leve em consideração o sistema de apoio
ronave e os custos envolvidos eram cho- logístico necessário a sua operação e que
cantes.” (DEFENSE SYSTEMS o redimensionamento do sistema de apoio
MANAGEMENT COLLEGE. Acquisition logístico leve em consideração as caracte-
Logistics Guide. 3. ed. Fort Belvoir, rísticas do sistema de defesa que está sen-
Virginia, EUA, 1997 – p. 1-1) do projetado.
Isso quer dizer que se busca garantir que
Para superar problemas como esse, a considerações sobre o apoio logístico serão
abordagem logística se voltou ainda mais parte integrante dos requisitos de projeto de
profundamente para as fases mais preco- um sistema de defesa, que o sistema possa
ces da existência de um sistema de defesa. ser apoiado de forma econômica durante seu
Isso foi feito para explorar o fato de que a ciclo de vida e que a infraestrutura necessá-
capacidade de um sistema de defesa para ria para o apoio ao sistema será identificada,
realizar as tarefas para as quais foi projeta- desenvolvida e adquirida oportunamente.
do é fruto, em grande medida, de decisões A conquista desses objetivos se traduz,
técnicas e gerenciais tomadas ainda na fase na prática, no aumento do tempo que o sis-
inicial de concepção. tema se encontra disponível para emprego
Aumentava, então, a crença de que as e na redução do custo do apoio logístico,
preocupações logísticas deveriam estar com a consequente redução do custo do
presentes desde a identificação da neces- ciclo de vida.
sidade militar. Não havia mais espaço para Qual a base do processo que permite
apenas “descobrir” as limitações chegar a esses resultados é o que será vis-
operacionais impostas pela logística quan- to a seguir.

80 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

A BASE DA ABORDAGEM DA (DEPARTMENT OF DEFENSE. MIL-HDBK-


LOGÍSTICA DE OBTENÇÃO 502 Department of Defense Handbook
Acquisition Logistics. Washington, DC,
A abrangência da atuação necessária EUA, 1997 – p. 4-12).
para chegar a esses resultados demanda o Ela busca integrar esforços sob a forma de
emprego de uma ferramenta com capacida- um processo de desenvolvimento estruturado
de de executar uma abordagem sistêmica que vai do conceito à operação do sistema,
tanto das característi- com o propósito de for-
cas do sistema de de- necer um produto que
fesa como do respecti- O processo de Engenharia atenda às necessidades
vo Sialog e da de Sistemas contribui para do usuário.
interdependência en- O processo de Enge-
tre ambos. Isso permi- a abordagem da Logística nharia de Sistemas é
te encontrar soluções de Obtenção na medida em aplicado sequencial-
balanceadas que aten- que, na busca de um mente nos estágios de
dam aos diversos desenvolvimento do
condicionantes envol- sistema de defesa que sistema para transfor-
vidos em um processo preencha uma necessidade mar necessidades e re-
dessa complexidade. quisitos em um conjun-
Uma das ferramen- operacional, ele contribui to de descrições do pro-
tas que possui essa para encontrar uma duto e dos processos,
capacidade é a Enge- configuração que possua o prover informações
nharia de Sistemas. A para os tomadores de
Engenharia de Siste- equilíbrio desejado entre decisão e gerar dados
mas é um ramo do co- desempenho, qualidade, para o próximo nível de
nhecimento humano desenvolvimento do
voltado para o desen- custos e prazos sistema (DEPART-
volvimento e a organi- MENT OF DEFENSE.
zação de sistemas artificiais complexos. Systems Engineering Fundamentals. Fort
Ela pode ser definida como “uma aborda- Belvoir, Virginia, EUA: Defense Acquisition
gem interdisciplinar para desenvolver e veri- University Press, 2001 – p. 6).
ficar um conjunto de produtos e processos O processo de Engenharia de Sistemas
integrados e balanceados que atendem a uma dentro da logística militar ajuda a traduzir ne-
necessidade de um consumidor” cessidades operacionais em requisitos, e re-
Neces- Defina o Investigue as Modele o Integre as Prontifique o Verifique o
Produto
sidade problema alternativas sistema partes sistema desempenho

Reavaliação

Figura 1 – O processo de Engenharia de Sistemas2


2 N.A.: Retirado de <http://www.incose.org/practice/fellowsconsensus.aspx> em 19 out. 2008 (tradução
do autor).

RMB1 o T/2012 81
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

quisitos em características de projeto. Para tal, da Logística de Obtenção na medida em


ele começa a atuar desde o surgimento da ne- que, na busca de um sistema de defesa que
cessidade operacional. preencha uma necessidade operacional, ele
É essa capacidade dos processos da En- contribui para encontrar uma configuração
genharia de Sistemas de realizar uma aborda- que possua o equilíbrio desejado entre de-
gem holística dos sistemas analisados que a sempenho, qualidade, custos e prazos.
torna útil para a abordagem da Logística de Nesse ponto, parece oportuno questio-
Obtenção. nar o que significa o termo obtenção. Ele
As alternativas de configuração para o pode sugerir, à primeira vista, que estamos
sistema como um todo e para os diversos nos referindo à compra de um novo siste-
subsistemas são avaliadas, e os resulta- ma. No entanto, do ponto de vista da Defe-
dos empregados para a escolha da melhor sa, obtenção é mais que isso.
configuração final. O sistema é analisado
em níveis cada vez mais baixos, empregan- OS TIPOS DE OBTENÇÃO
do uma abordagem que vai do geral para o
particular. Assim, a partir da análise dos Obtenção pode ser compreendida como
elementos constitutivos, é possível ter uma qualquer processo desenvolvido com o pro-
visão abrangente do sistema. pósito de incorporar um novo sistema de
Assim sendo, o processo de Engenha- defesa ao inventário das Forças Armadas.
ria de Sistemas contribui para a abordagem Uma obtenção pode se materializar de
diversas formas: pela
modificação de um sis-
Identificação da A Força já Investigue fora tema já existente, pela
necessidade opera um sistema Não da força
candidato à compra de um sistema
solução?
pronto no mercado, pelo
desenvolvimento com-
Sim
pleto de um novo siste-
ma e por muitas outras.
Use ou modifique No caso particular da
o sistema
existente
abordagem da Logística
de Obtenção, o que im-
porta sobre o sistema
que está sendo obtido
não é tanto o processo
que leva à incorporação
Escolha um dos
Avalie desempenho,
custo e apoiabilidade Sim
Existem outros do novo sistema, mas
candidatos candidatos?
dos candidatos sim o espaço para a in-
trodução de modifica-
ções tanto no projeto
Não quanto na estrutura de
Figura 2 – Processo de tomada de decisão da apoio logístico. Dessa
obtenção (DEPARTMENT OF DEFENSE. forma, pode-se dizer
MIL-HDBK-502 Department of Defense Desenvolva
um que, para a abordagem
Handbook Acquisition Logistics. Washington,
DC, EUA, 1997 – p. 4-5)
projeto
da Logística de Obten-
ção, os tipos de obten-

82 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

ção se distinguem pela intensidade das ati- como a incorporação de materiais e proce-
vidades de projeto envolvidas. dimentos que antes não existiam, a exis-
Os melhores resultados da abordagem tência de pessoal com aptidões ou especi-
da Logística de Obtenção são alcançados alizações particulares, a construção de no-
quando ocorre o desenvolvimento comple- vas oficinas e paióis, a elaboração de ma-
to de um novo sistema. Nesse caso, as ati- nuais e outros documentos técnicos, entre
vidades de projeto são desenvolvidas na outras. Assim, é possível que tal aborda-
sua plenitude, tanto o que diz respeito às gem tenha alguma utilidade, já que, no mí-
suas fases quanto o que diz respeito às nimo, ela é capaz de fornecer alguns ele-
partes do sistema envolvidas. Outras for- mentos objetivos sobre o impacto logístico
mas de obtenção, apesar de permitirem o que será produzido.
desenvolvimento de algumas das etapas No caso brasileiro, encontramos uma
típicas de um projeto, permitem ou exigem grande variedade de formas de obtenção
que algumas dessas etapas sejam empregadas para acrescentar novos siste-
desconsideradas e tampouco atuem sobre mas de defesa ao inventário de material em
todos os componentes do sistema. uso nas Forças Armadas. A compra de equi-
Durante a realização de um projeto com- pamentos em processo de desmobilização
pleto, as alternativas de configuração po- em Forças Armadas de outros países; a
dem ser avaliadas quanto às implicações compra de equipamentos novos, mas com
logísticas que irão produzir, permitindo a projetos já existentes; o projeto completo
escolha daquela que apresentar as qualida- de um novo sistema, feito em parceria com
des mais vantajosas segundo os critérios outros países ou de forma isolada; e a mo-
da alta administração militar. Essa vantagem dificação ou modernização de um sistema
é ampliada quando consideramos que, atu- em uso são algumas delas.
almente, as modificações na configuração A obtenção por meio do desenvolvimen-
do sistema podem ser feitas e testadas de to de soluções inteiramente novas ainda é
forma relativamente pouco onerosa com o um processo pouco comum no País devido
emprego de ferramentas computacionais. à falta de uma base industrial de defesa
Em sistemas prontos, os projetos só são capaz de atender às necessidades das For-
realizados quando se pretende executar ças Armadas, tornando mais comum a ob-
modificações significativas no meio. Nesse tenção pela compra de itens disponíveis
caso, o grau de liberdade para alterar a con- no mercado.
figuração é variável e pode assumir um am- Assim, é na obtenção por meio do de-
plo espectro de valores. É possível que as senvolvimento completo do sistema que a
modificações sofram com tantas limitações abordagem da Logística de Obtenção é ca-
que acabem se revelando caras demais ou paz de produzir os melhores resultados. Nos
mesmo inexequíveis do ponto de vista prá- outros casos, ela produzirá ganhos em graus
tico, reduzindo a eficácia dos processos de variados, dependendo da quantidade de ati-
aperfeiçoamento do produto final. vidades de projeto que serão realizadas.
Isso não significa que a abordagem da É importante destacar que os proces-
Logística de Obtenção só é aplicável aos sos típicos da abordagem da Logística de
casos de desenvolvimento completo de um Obtenção são demorados e caros, o que
sistema. Qualquer um dos tipos de obten- faz com que nem sempre seja compensador
ção resultará em um sistema que introduzi- empregá-los. Nos casos em que não há o
rá novas demandas sobre o Sialog, tais desenvolvimento completo do sistema e as

RMB1 o T/2012 83
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

possibilidades de ganhos são reduzidas, é de um critério preciso o bastante para deter-


desejável que seja feita uma avaliação minar quais devem ser considerados como
criteriosa sobre a pertinência de empregar “grandes sistemas”. Para contornar essa
a abordagem da Logística de Obtenção. dificuldade, faz-se necessário recorrer a ou-
Assim sendo, é preciso haver critérios para tros elementos do processo de obtenção.
a seleção dos sistemas de defesa cuja ob- Uma forma de fazer tal distinção é por
tenção é passível de ser objeto de análise. meio do estabelecimento de um valor do
custo total da obtenção do sistema a partir
OS SISTEMAS DE DEFESA do qual a abordagem da Logística de Ob-
tenção será obrigatoriamente empregada.
A necessidade de definir os sistemas- Considerando que os “grandes sistemas”
alvo da abordagem da Logística de Obten- de defesa são, com frequência, sistemas
ção tem suas raízes no fato de que a análi- complexos e sofisticados, os custos envol-
se do impacto logístico de um sistema de vidos nos respectivos processos de ob-
defesa é uma atividade que tem um custo tenção são altos em relação aos sistemas
próprio elevado. Tal abordagem emprega menores. Uma análise mesmo que superfi-
pessoal e métodos bastante sofisticados cial dos valores de obtenção de sistemas
e, por isso, não é uma atividade simples, já incorporados pode levar a um valor ini-
barata ou rápida. cial muito próximo do ideal.
É possível que certos itens cuja com- Como um recurso definitivo para esta-
plexidade, a quantidade ou o custo sejam belecer para quais sistemas a abordagem
considerados pequenos pela alta adminis- da Logística de Obtenção deve ser empre-
tração militar não devam se valer do empre- gada, pode-se recorrer ao estabelecimento
go da abordagem da Logística de Obten- de listas que enumerem claramente quais
ção. Por isso é tão importante limitar preci- os sistemas que a alta administração mili-
samente os sistemas cuja obtenção se va- tar deseja que sejam obtidos com o empre-
lerá de tal estrutura. go de tal abordagem.
A sofisticação da abordagem da Os estudos para a confecção de uma
Logística de Obtenção torna lícito supor lista desse tipo podem se valer da experi-
que o objeto de preocupação de tal abor- ência com obtenções passadas ou recorrer
dagem são os grandes sistemas, com graus à observação das relações empregadas por
de complexidade e custos extremos, de pro- outras Forças Armadas com maior experi-
dução individualizada e não em massa. ência na prática da abordagem da Logística
Poderiam ser considerados como elegí- de Obtenção.
veis para a obtenção por meio de um pro- O importante é que os altos escalões
cesso sistematizado como a Logística de decisórios das Forças Armadas estabeleçam
Obtenção os navios de guerra, as aerona- critérios para o enquadramento dos sistemas
ves, os sistemas de mísseis, os veículos de defesa que devem ter sua obtenção apoia-
blindados, os satélites artificiais, os veícu- da pela abordagem da Logística de Obtenção.
los aéreos não tripulados e outros. Na lite- Uma vez que seja tomada a decisão de
ratura especializada, algumas vezes tais sis- aplicar a abordagem da Logística de Obten-
temas são chamados de supersistemas. ção, um conjunto de processos e ferramen-
No entanto, a diversidade de caracterís- tas será aplicado ao processo de obtenção
ticas dos diversos sistemas de defesa deixa de forma a garantir que o sistema possua
clara a dificuldade para o estabelecimento boas qualidades logísticas e que o Sialog

84 RMB1 oT/2012
O PROCESSO DE OBTENÇÃO DE SISTEMAS DE DEFESA – Parte I

será modificado apropriadamente, sempre Isso indica que existem dois focos de atua-
com vistas ao aumento do tempo no qual o ção para que a abordagem da Logística de
sistema permanece disponível para empre- Obtenção atinja seus propósitos: o próprio
go e à redução do custo do ciclo de vida. sistema de defesa e o Sialog.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<ARTES MILITARES>; Logística; Pensamento militar; Controle; Estratégia;

RMB1 o T/2012 85
ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO
ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL(*)

EDUARDO ITALO PESCE(**)


Professor

SUMÁRIO

Introdução
Considerações estratégicas
Segurança das atividades marítimas
Áreas marítimas de interesse para o Brasil
Uma Marinha para o Atlântico Sul
Cooperação marítima regional
Conclusão
Tabelas
INTRODUÇÃO Panamá (1914) concentrasse o fluxo do co-
mércio marítimo ocidental no Mediterrâneo e

O Atlântico Sul foi rota marítima obriga-


tória rumo ao Índico e ao Pacífico, até
que a abertura dos canais de Suez (1869) e do
no Atlântico Norte. Durante o século XX, o
Atlântico Sul permaneceu como “o mais pa-
cífico dos oceanos”, apesar de ações isola-

(*)
Texto-base para a participação do autor no Seminário “Atlântico Sul: ameaças e oportunidades” – Centro
de Estudos Estratégicos da Escola Superior de Guerra (CEE/ESG) – Rio de Janeiro, 31/10/2011.
(**)
Pós-graduado em Relações Internacionais, professor do Centro de Produção da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (Cepuerj), pesquisador associado do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universi-
dade Federal Fluminense (Nest/UFF), colaborador permanente do Centro de Estudos Político-
Estratégicos da Escola de Guerra Naval (Cepe/EGN) e colaborador assíduo da Revista Marítima
Brasileira, da revista Segurança & Defesa e do jornal Monitor Mercantil.
ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

das de superfície, nas Primeira e Segunda vas, sendo as conclusões e os conceitos


Guerras Mundiais, e da campanha submari- de caráter pessoal.
na do Eixo, na Segunda Guerra Mundial.
O Atlântico Sul voltou a ganhar certa im- CONSIDERAÇÕES ESTRATÉGICAS
portância na época dos “superpetroleiros”,
durante os anos 70 do século passado, em Diante da incerteza atual e da dificulda-
função da primeira crise do petróleo e da de em definir com precisão os interesses
interrupção temporária do tráfego de navi- nacionais e identificar as ameaças externas
os pelo Canal de Suez. Entre abril e junho de a tais interesses, a definição das estratégi-
1982, tornou-se cenário de um conflito ar- as e dos meios militares para a Defesa Na-
mado entre Argentina e Reino Unido pela cional deve basear-se na identificação das
posse das Ilhas Malvinas (Falklands). É pro- vulnerabilidades estratégicas do Brasil.
vável que o isolamento geopolítico desse Isso é válido para o Poder Naval, assim
oceano esteja chegando ao fim. como para os demais componentes da Ex-
Além de examinar as possíveis ameaças pressão Militar do Poder Nacional.
marítimas ao Brasil e as vulnerabilidades As possíveis ameaças marítimas ao Bra-
estratégicas do País no mar, o presente tra- sil e as vulnerabilidades estratégicas do
balho enfatiza a necessidade de um Poder País no mar, no contexto estratégico atual,
Naval polivalente, capaz de atuar em toda são mostradas na Tabela no 1. A extensão
a extensão do Atlântico Sul, bem como no das águas sob jurisdição nacional, assim
Caribe e em parte do Pacífico Sul. O texto como a dependência do tráfego marítimo e
baseia-se em fontes e bibliografia ostensi- de fontes de energia (petróleo) situadas na
Tabela n o 1:
BRASIL, AMAZÔNIA AZUL E ATLÂNTICO SUL
Possíveis ameaças e vulnerabilidades estratégicas
Terrorismo marítimo
Pesca ilegal e predatória
Pirataria marítima
Narcotráfico
Ilícitos transnacionais Imigração ilegal
POSSÍVEIS Tráfico de armas, animais e pessoas
AMEAÇAS Contrabando e descaminho
Ilícitos nacionais Roubo armado a navios
Infrações de tráfego marítimo
Crimes ambientais
Busca e salvamento (SAR)
Emergências Epidemias e pandemias
Catástrofes e crises humanitárias
Forças navais hostis Capacidade dissuasória
Capacidade de emprego dos meios
Instalações críticas e concentrações demográficas ao longo da costa
Grande dependência econômica do mar
VULNERABILIDADES Elevado número de plataformas de extração de petróleo e gás
ESTRATÉGICAS Grandes extensões de mar a serem monitoradas e protegidas
Carência de meios suficientes para garantir a capacidade de reação

FONTE: ÖBERG, Elis Treidler. Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz). Secretaria de Assuntos
Estratégicos (SAE) – Seminário sobre a Amazônia Azul. Rio de Janeiro: Escola Naval, 14 e 15 out. 2010.
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Plataforma Continental ou no exterior, é crí- de de um conglomerado multinacional, en-


tica para a defesa do País. quanto a carga pertence a outro e o seguro
O incremento da produção petrolífera é feito por um terceiro. A tripulação geral-
das reservas localizadas nas bacias mente procede de diversos países. A qual
sedimentares dos litorais da América do Sul desses caberia dar proteção ao navio e sua
e da África Ocidental pode aumentar a im- carga, assim como à tripulação, contra pos-
portância estratégica do Atlântico Sul, con- síveis ameaças?
tribuindo para a redução da dependência
dos Estados Unidos e demais países oci- SEGURANÇA DAS ATIVIDADES
dentais em relação ao petróleo do Oriente MARÍTIMAS
Médio. Tal perspectiva talvez seja acelera-
da pelo possível aumento da instabilidade Em julho de 2004, entrou em vigor um
política naquela região. conjunto de normas internacionais apro-
Sem incluir o potencial do pré-sal bra- vadas pela International Maritime
sileiro, a produção di- Organization (IMO),
ária de petróleo no referentes à proteção
mar na América do O incremento da produção do tráfego marítimo e
Sul pode crescer de das instalações portu-
2,5 milhões de barris petrolífera das reservas árias contra ataques
em 2005 para 6,1 mi- localizadas nas bacias terroristas e outras
lhões de barris até ameaças. Essa regula-
2030 (crescimento de sedimentares dos litorais mentação constitui o
144%). No mesmo da América do Sul e da International Ship and
período, a produção África Ocidental pode Port Facility Security
no litoral da África Code (mais conhecido
pode passar de 4,9 aumentar a importância como ISPS Code).
milhões a 12,4 mi- estratégica do Atlântico Sul A complexidade da
lhões de barris por tarefa de garantir a se-
dia (crescimento de gurança do tráfego
153%). Em futuro breve, a evolução das marítimo e das atividades ligadas ao uso
tecnologias de extração de recursos mi- econômico do mar, em escala global, justi-
nerais do leito marinho permitirá também fica a adoção de soluções cooperativas,
o aproveitamento dos nódulos pois a segurança de cada nação está cada
polimetálicos. vez mais ligada à segurança do sistema in-
O progressivo aumento do comércio in- ternacional e pode ser afetada por qual-
ternacional, cada vez mais dependente do quer ameaça ao uso dos mares.
transporte marítimo, levou à estruturação Atualmente, mais de 2 bilhões de pes-
de um sistema fortemente globalizado e soas vivem a distâncias de até 100 km de
essencialmente transnacional de uso eco- uma linha costeira. Pelos mares circulam
nômico dos mares. O símbolo de tal siste- aproximadamente 50 mil navios de porte
ma é o contêiner de dimensões padroniza- oceânico, que transportam 80% do comér-
das, empregado quase universalmente no cio mundial. Todos os anos, quase 2 bi-
transporte de cargas de diferentes tipos. lhões de toneladas de petróleo (60% de
Qualquer que seja sua bandeira, o na- todo o petróleo produzido) são transpor-
vio mercante frequentemente é proprieda- tados por via marítima.

88 RMB1 oT/2012
ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

A economia mundial respira por via ma- Além da “Amazônia Azul”, a fronteira
rítima, e o Brasil – ao contrário do que pen- marítima Brasil-África e as vias de acesso ao
sam alguns – depende do mar para sobre- Atlântico Sul também são áreas estratégicas
viver. Pelo mar passam 95% de nosso co- de importância fundamental para o País. Se-
mércio exterior e quase todo o petróleo (in- gundo a Política de Defesa Nacional (PDN)
clusive derivados) que importamos, e do aprovada em 2005, o entorno estratégico do
mar são extraídos 83% do petróleo que pro- Brasil abrange a América do Sul, o Atlântico
duzimos. Na última década, nosso país gas- Sul, a África Ocidental e Meridional, a Antár-
tava anualmente com fretes marítimos US$ tica e os países-membros da Comunidade de
7 bilhões, dos quais apenas 3% eram trans- Países de Língua Portuguesa (CPLP).
portados em navios de bandeira brasileira. É essencial que o Brasil disponha de mei-
Após um longo pe- os diversificados para
ríodo sem receber inves- exercer a vigilância e a
timentos adequados, os A economia mundial respira defesa das águas sob
portos brasileiros (com jurisdição nacional,
poucas exceções) torna- por via marítima, e o Brasil – bem como manter a se-
ram-se obsoletos, e a ao contrário do que pensam gurança das vias marí-
Marinha Mercante naci- timas de comunicação
onal ficou praticamente
alguns – depende do mar e promover os interes-
limitada à navegação in- para sobreviver ses nacionais no exte-
terior, ao transporte de  rior. As áreas marítimas
granéis (líquidos e sóli- estratégicas de maior
dos) e ao apoio à indús- Na última década, nosso importância para o Po-
tria petrolífera offshore. país gastava anualmente der Naval brasileiro, em
Isso tornou urgente a
adoção de medidas con-
US$ 7 bilhões com fretes, ordem decrescente de
prioridade, são:
cretas, para reverter ra- apenas 3% eram A – a área vital (que
pidamente tal situação. transportados em navios corresponde à “Ama-
As medidas adotadas zônia Azul”) – inclui o
até agora têm sido rela- de bandeira brasileira Mar Territorial, a Zona
tivamente lentas em Contígua (ZC), a Zona
apresentar resultados. Econômica Exclusiva
(ZEE) e a Plataforma Continental (PC), com
ÁREAS MARÍTIMAS DE INTERESSE largura total de 200 a 350 milhas marítimas;
PARA O BRASIL B – a área primária – abrange o Atlân-
tico Sul, definido como a parte compreen-
Há alguns anos, a Marinha do Brasil vem dida entre o paralelo de 16º N, a costa oes-
chamando atenção para a existência de uma te da África, a Antártica, o leste da América
segunda Amazônia, a “Amazônia Azul”, do Sul e o leste das Pequenas Antilhas (ex-
constituída pelo Mar Patrimonial de 200 mi- cluindo o Caribe);
lhas marítimas (370 km) e pela Plataforma C – a área secundária – abrange o Mar
Continental de até 350 milhas marítimas (648 do Caribe e o Pacífico Sul, definido este como
km) de largura. Esta área representa um total a área compreendida entre o Canal de Beagle,
de quase 4,5 milhões de km2, aumentando o litoral da América do Sul, o meridiano de 85º
em mais de 50% a área do território nacional. W e o paralelo do Canal do Panamá; e

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ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

D – as demais áreas do globo. sando a incluir países como China, Japão,


No desenvolvimento sequencial do Po- Índia, Coreia do Sul e Indonésia.
der Naval brasileiro, a Estratégia Nacional
de Defesa (END), editada em dezembro de UMA MARINHA PARA O
2008, propõe priorizar inicialmente a tarefa ATLÂNTICO SUL
de negação do uso do mar, em relação às
de controle de área marítima e de projeção É comum perguntarem para que o Brasil
de poder sobre terra. O emprego das for- precisa de uma Marinha de guerra com ca-
ças navais, aeronavais e de fuzileiros na- pacidade oceânica. Na verdade, nosso país
vais da Marinha do Brasil visaria às se- possui três Marinhas em uma só: a Mari-
guintes hipóteses: nha oceânica (Esquadra); a tropa anfíbia
I – defesa pró-ativa das plataformas pe- da Marinha (Corpo de Fuzileiros Navais);
trolíferas, das instalações navais e portuá- e a Marinha costeira, fluvial e de ativida-
rias, dos arquipélagos e das ilhas oceâni- des subsidiárias (Forças Distritais e Servi-
cas nas águas jurisdicionais brasileiras; ço Hidrográfico). Estas três ramificações
II – prontidão para (cada qual com suas
responder a qualquer sub-ramificações) são
ameaça, proveniente O Brasil necessita de uma igualmente importan-
de Estados ou de for- Marinha polivalente, capaz tes e necessárias.
ças não convencio- O Brasil necessita
nais ou criminosas, de operar em toda a de uma Marinha
às vias marítimas de extensão do Atlântico Sul, polivalente, capaz de
comércio; e assim como no Caribe e em operar em toda a ex-
III – capacidade de tensão do Atlântico
participar de opera- parte do Pacífico Sul Sul, assim como no
ções internacionais de Caribe e em parte do
paz, fora do território e das águas Pacífico Sul, contando com os meios
jurisdicionais brasileiras, sob a égide das operativos e as instalações de apoio que
Nações Unidas ou de organismos multila- forem necessários. Esta ênfase na capaci-
terais regionais. dade oceânica não dispensa a necessida-
Foram identificadas como críticas para de de meios com características de empre-
a defesa da soberania e dos interesses na- go costeiro ou fluvial. Entretanto, as limi-
cionais a faixa litorânea que vai de Santos tações orçamentárias que dificultam a mo-
a Vitória (onde estão localizadas grandes dernização e o fortalecimento do Poder
reservas petrolíferas na plataforma conti- Naval brasileiro permanecem.
nental), abrangendo os estados de São A carência de meios suficientes pode pre-
Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, e a judicar, de forma concreta, o interesse nacio-
área em torno da foz do Rio Amazonas. nal. Quando um oficial-general da Marinha do
As rotas marítimas de interesse imedia- Brasil assumiu o comando do componente
to para o Brasil incluem a da América do marítimo da Unifil (United Nations Interim For-
Sul, com ramificações para o Pacífico, a ce in Lebanon), que opera no litoral do Líba-
América do Norte e a Europa, e as da Áfri- no, não foi possível destacar nenhum navio
ca Ocidental e do Cabo da Boa Esperança. de guerra brasileiro para aquela área. Uma si-
Nossos interesses comerciais estão cada tuação constrangedora para um país que al-
vez mais se deslocando para a Ásia e pas- meja ocupar um lugar permanente no Conse-

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ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

lho de Segurança da Organização das Nações e munição, além de material para o Corpo
Unidas (ONU). de Fuzileiros Navais (CFN), em quantidade
Para que as perspectivas de renovação suficiente para equipar duas divisões.
do Poder Naval brasileiro, decorrentes da Na prática, o Brasil possui dois litorais,
edição da END no final de 2008 e da divul- delimitados pela cintura Natal-Dacar e for-
gação do Plano de Articulação e Equipa- mando uma cunha apontada em direção à
mento da Marinha do Brasil (PAEMB) em África. A área marítima setentrional (ao
meados de 2009, se concretizem, as metas norte de Natal) defronta-se com o Atlânti-
do PAEMB devem ser aprovadas pelo Con- co Norte e a extremidade sudeste do Caribe,
gresso Nacional, adquirindo força de lei. enquanto a meridional (ao sul de Natal) si-
O novo PAEMB prevê um investimento tua-se inteiramente no Atlântico Sul.
total de US$ 84,4 bilhões, dos quais US$ 68,8 Um horizonte temporal até 2030 talvez
bilhões na moldura temporal 2010-2030 e US$ não seja realista para a concretização do
15,6 bilhões após 2030 (ver Tabela no 2). Além projeto de duplicação do principal núcleo
da expansão dos meios operativos e do efeti- operativo da Marinha do Brasil – atualmen-
vo de pessoal, está prevista a criação de um te constituído pela Esquadra e pela Força
segundo núcleo operativo de Poder Naval, de Fuzileiros da Esquadra (FFE), ambas
sediado no litoral Norte/Nordeste do Brasil. sediadas no Rio de Janeiro. Todavia, não
As ambiciosas propostas do PAEMB há como negar a necessidade urgente de
levaram alguns céticos a classificar tal pla- ampliar os meios navais, aeronavais e de
no como uma “lista de pedidos a Papai fuzileiros navais da Marinha – assim como
Noel”. A versão integral do PAEMB prevê seu efetivo de pessoal militar.
um total de 282 navios e embarcações, 288 O preparo do Poder Naval brasileiro deve
aeronaves e diversos tipos de armamento enfatizar a capacidade de desempenhar múl-
Tabela n o 2:
Meios previstos no PAEMB
Custo total (em US$ milhões)

PLANO DE EQUIPAMENTOS
Distribuição

Meios 2010-2014 2015-22 2023-2030 Após 2030 Total


Navais 6.549,94 22.556,06 22.516,96 12.992,33 64.615,29
Aeronavais 1.011,10 3.039,00 4.230,60 1.340,20 9.620,90

CFN 446,86 867,37 177,60 – 1.491,83


Munição 806,09 2.861,41 3.578,01 1.293,18 8.538,68
Apoio e SSTA 134,47 37,59 – – 172,06

TOTAL 8.948,46 29.361,43 30.503,17 15.625,71 84.438,76

Custo na moldura temporal 2010-2030: US$ 68.813,05 milhões


FONTE: PESCE, Eduardo Italo. “Plano de Equipamento e Articulação da Marinha do Brasil (PEAMB)
2010-2030: Perspectivas”. Revista Marítima Brasileira 130 (04/06): 73-88. Rio de Janeiro, abr./jun.
2010. Observação: A versão integral do PAEMB prevê um total de 282 navios e embarcações, 288
aeronaves e diversos tipos de armamento e munição, além de material de fuzileiros navais em quantidade
suficiente para o equivalente a duas Divisões Anfíbias.

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ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

tiplas tarefas (ver Tabela no 3). O Brasil ne- O oposto disso – a opção por uma força
cessita de pelo menos uma Esquadra balan- naval constituída basicamente por submari-
ceada, nucleada em um ou mais navios- nos e unidades ligeiras de superfície –
aeródromos (NAe) e integrada por navios corresponderia à transformação da Marinha
de combate de superfície, submarinos de do Brasil numa réplica em escala menor da
propulsão nuclear e convencional e uma Marinha soviética do final dos anos 50 do
força anfíbia adequada, além dos indispen- século XX. Isso poderia motivar percepções
sáveis navios de apoio logístico móvel. errôneas no exterior com relação aos objeti-

Tabela n o 3:
SUGESTÕES PARA UMA ESTRATÉGIA NAVAL
Segundo o Almirante de Esquadra (Ref o ) Mauro César Rodrigues Pereira

Objetivo/ Negação do Projeção de Controle de Emprego Político Capacidade de


Tarefa Uso do Mar Poder Área Marítima do Poder Naval Dissuasão
(Poder Efetivo)

Impedir ataques ao
continente desde a   
fronteira leste ou da
Amazônia Azul

Assegurar a
liberdade de
exploração pelo
Brasil dos recursos
de sua Zona 
Econômica
Exclusiva (ZEE) e
de sua Plataforma
Continental (PC)

Manter abertas e
seguras as rotas  
marítimas de
interesse do Brasil

Assegurar a
preservação
ambiental nas 
Águas Jurisdicionais
Brasileiras (AJB) e,
em cooperação, na
“Área”

Manter abertas as  
rotas de acesso à
Antártica

Procurar unidade de
ação naval com os  
países do entorno
do Atlântico Sul

FONTE: PEREIRA, Mauro César Rodrigues. Amazônia Azul: aspectos políticos e estratégicos. Secreta-
ria de Assuntos Estratégicos (SAE) – Seminário sobre a Amazônia Azul. Rio de Janeiro: Escola Naval, 14
e 15 out. 2010.
ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

vos estratégicos do País. O Brasil deve bus- vância para nosso país envidar esforços em
car ser percebido como aliado ou parceiro favor da constituição de uma “Parceria Maríti-
confiável, e não como provável adversário. ma Regional do Atlântico Sul”, envolvendo
as Marinhas de ambos os lados deste oceano.
COOPERAÇÃO MARÍTIMA Do lado ocidental, já existe o coordena-
REGIONAL dor da Área Marítima do Atlântico Sul (Ca-
mas), cargo exercido em rodízio por um almi-
A pirataria é uma grave ameaça ao uso pa- rante brasileiro, argentino ou uruguaio. O
cífico dos mares, que pode tornar necessário Paraguai também participa dessa parceria,
o emprego de forças navais. No Atlântico Sul, decorrente do Tratado Interamericano de
até hoje só foram confirmados ataques a navi- Assistência Recíproca (Tiar). Os países afri-
os no litoral de países africanos situados no canos banhados pelo Atlântico Sul estão
Golfo da Guiné. Nos últimos anos, a maioria excluídos do Tiar e integrados a uma área
dos casos tem ocorrido no Oceano Índico, na marítima diferente.
região conhecida como A consolidação das áreas marítimas do
“Chifre da África” (Gol- Atlântico Sul ocidental
fo de Áden e litoral da e oriental ampliaria con-
Somália). Caberia ao Brasil dar o sideravelmente a cober-
A proteção das ati- primeiro impulso no tura regional e o acesso
vidades marítimas em – pelo Brasil e pelos de-
escala global excede a processo de integração mais participantes – a in-
capacidade de um só marítima dos países das formações referentes ao
país, mesmo se for uma vertentes sul-americana e tráfego marítimo em
superpotência. Por toda a extensão deste
isso, a Marinha dos africana do Atlântico Sul. oceano. Para renovar e
EUA lançou, em 2005, O vácuo de poder modernizar os meios de
a iniciativa denomina- patrulha naval e inspe-
da Parceria Marítima causado pela omissão do ção naval, a obtenção
Global (mais conheci- Brasil, contudo, já está de navios e aeronaves,
da como “A Marinha sendo preenchido em número adequado
dos mil navios”), con- para as Marinhas dos
firmada pela nova Es- países participantes,
tratégia Marítima norte-americana em 2007. seria necessária.
A cooperação marítima internacional Para modernizar os sistemas de Coman-
teve sua utilidade prática demonstrada na do, Controle, Comunicações, Computadores
última década, pela significativa redução e Inteligência (C4I) das Marinhas participan-
da ocorrência de ataques de piratas à na- tes, seria preciso obter novos sensores e
vegação internacional, no Estreito de ampliar a capacidade de processamento de
Málaca e no Oceano Índico, obtida em fun- dados e informações. A Marinha do Brasil já
ção das informações disponibilizadas às conta com o Sistema de Informações do Trá-
Marinhas e guardas costeiras da região. fego Marítimo (Sistram), que está sendo inte-
A interrupção de atividades marítimas vi- grado ao Sistema de Gerenciamento da Ama-
tais pode causar sérios danos à economia do zônia Azul (SisGAAz).
Brasil. Além de incrementar a cooperação com A exemplo do SisGAAz brasileiro, a rede
a Parceria Marítima Global, é de extrema rele- internacional de segurança e proteção ma-

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ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

rítima deveria incluir plataformas fixas e tem de utilizar o mar em benefício de sua
móveis, com sensores instalados a bordo soberania e de seus interesses nacionais.
de navios e aeronaves ou no espaço (em Ao Poder Naval, componente militar do
satélites), bem como em plataformas de ex- Poder Marítimo, compete prover a segu-
tração de petróleo no mar, em instalações rança dos demais componentes deste po-
costeiras ou no leito marinho. A ideia seria der, em tempo de paz ou de guerra.
maximizar o número de nós e sensores da A natureza do Poder Naval é dupla, pois
rede, a fim de aumentar sua eficácia. este é também o componente marítimo do Po-
Além da implantação do SisGAAz pela der Militar. No Brasil, país-continente que tem
Marinha do Brasil, a realização da Operação pouca mentalidade marítima, embora com am-
Atlasur pode ser considerada como outro plos interesses marítimos a defender, é comum
embrião da ideia aqui apresentada. Esta ope- o erro de considerar a Marinha de guerra ape-
ração multinacional de adestramento nor- nas como parte das Forças Armadas.
malmente ocorre a cada dois anos, no litoral Após a abertura dos canais de Suez e do
da América do Sul ou Panamá, no final do sé-
da África, envolvendo culo XIX e início do XX,
unidades das Mari- No Brasil, com amplos a importância geopo-
nhas do Brasil, da Ar- lítica do Atlântico Sul
gentina, do Uruguai e interesses marítimos a foi reduzida. Entretanto,
da África do Sul. defender, é comum o erro o esperado aumento da
Caberia ao Brasil dar produção de petróleo,
o primeiro impulso no de considerar a Marinha em ambas as vertentes
processo de integração de guerra apenas como deste oceano, poderá –
marítima dos países das parte das Forças Armadas em futuro não muito dis-
vertentes sul-americana tante – torná-lo essen-
e africana do Atlântico cial para a segurança
Sul. A ampliação significativa no número de dos principais países ocidentais.
Marinhas participantes na Operação Atlasur O possível aumento da presença naval
seria um importante passo no rumo desejado. ocidental no Atlântico Sul contraria o ob-
O vácuo de poder causado pela omissão do jetivo de “não militarização” (não confun-
Brasil, contudo, já está sendo preenchido. dir com “desmilitarização”) da região. Este
Os EUA instalaram um sistema de teria sido o principal objetivo que levou a
sensoriamento nas Ilhas de São Tomé e Prín- Assembleia Geral da ONU, na década de
cipe, na costa africana, para vigiar parte do 80 do século passado (já no estágio final
Oceano Atlântico e reprimir o tráfego ilícito da Guerra Fria), a criar a Zona de Paz e Co-
de navios. Este aumento do interesse nor- operação do Atlântico Sul (ZPCAS).
te-americano pelo Atlântico Sul e pela Áfri- O Poder Naval brasileiro deve ser capaz
ca é confirmado pela reativação da IV Es- de atuar em todo o Atlântico Sul, assim como
quadra (4th Fleet) e pela criação do Africa no Caribe e em parte do Pacífico Sul. Apesar
Command (Africom). da importância econômica do Canal do Pana-
má e dos portos do litoral sul-americano do
CONCLUSÃO Pacífico, é principalmente pelo Atlântico Sul
que passam as rotas que conduzem as expor-
O Poder Marítimo de uma nação pode tações brasileiras aos mercados consumido-
ser definido como a capacidade que esta res da Ásia Meridional e do Extremo Oriente.

94 RMB1 oT/2012
ALÉM DA AMAZÔNIA AZUL: PROJEÇÃO ESTRATÉGICA DO BRASIL NO ATLÂNTICO SUL

O Brasil deve envidar esforços em favor da O Brasil deve, ainda, desenvolver uma
constituição de uma “Parceria Marítima Regi- estratégia marítima de âmbito mundial, ca-
onal do Atlântico Sul”, envolvendo as Mari- paz de viabilizar um ciclo sustentado de
nhas de ambos os lados do oceano. A inter- crescimento econômico e desenvolvimen-
rupção de atividades marítimas vitais pode to social. Em tal contexto, caberá ao Poder
causar sérios danos à economia dos países da Naval, revitalizado e fortalecido, garantir a
região, e a efetiva proteção de tais atividades segurança dos demais componentes do
exige a adoção de soluções cooperativas. Poder Marítimo brasileiro.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<POLÍTICA>; Estratégia; Poder Marítimo; Segurança; Marinha do Brasil; Amazônia Azul;

BIBLIOGRAFIA

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Assuntos Estratégicos (SAE) – X Encontro Nacional de Estudos Estratégicos. Brasília, 22 set.
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_____. “Uma estratégia naval para o século XXI”. Revista Marítima Brasileira 121 (04/06). 2001.

RMB1 o T/2012 95
O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA
MARINHA DO BRASIL (I)

RENE VOGT*
Engenheiro

SUMÁRIO

Introdução
Planejamento e processos de aquisição
Futuras fragatas
Futuros OPV
Futuros NaApLog
Custos de ciclo de vida dos novos meios: escoltas, OPV e NaApLog
Final da 1a parte

INTRODUÇÃO sobre transferência de tecnologia e os cus-


tos associados.

N a sequência da publicação de seus ar-


tigos na Revista Marítima Brasileira
(RMB) sobre os futuros navio-aeródromo
A Marinha do Brasil (MB) vive um mo-
mento importante, em que os requisitos do
programa e os editais de concorrência
(NAe), navio-escola e fragatas da Marinha enfatizam a transferência de tecnologia.
do Brasil, o autor pretende tratar dos as- Mas esta precisa ser tratada sob uma ótica
pectos de projeto e construção dos referi- profunda e abrangente, qual seja a absor-
dos meios no País, fazendo considerações ção, a fixação, a aplicação e o desenvolvi-

*
Segundo-tenente (RM2), engenheiro civil (Pontifícia Universidade Católica – PUC-Rio/1975), empre-
sário e membro da Sociedade de Amigos da Marinha de São Paulo (Soamar-SP). Colaborador fre-
quente da RMB.
O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

mento de tecnologia no País pelos nacio- Agora é imperativo implantar progra-


nais. Se bem conduzida, será o ponto de mas duradouros e políticas de Estado de
inflexão para nos libertar do atraso longo prazo, com foco no desenvolvimen-
tecnológico e dar continuidade aos pou- to da tecnologia nacional. Convém que
cos, mas importantes, projetos desenvol- decisões sobre programas abrangentes,
vidos no Brasil a partir da década de 1980. embora mais lentas, contem com a partici-
Nota-se nos compêndios de História que pação de civis e militares especializados e
os reparelhamentos da Marinha do Brasil em vários níveis do conjunto Marinha/in-
se deveram à iniciativa de determinadas dústria/universidades/institutos tecno-
personalidades de destaque e no coman- lógicos. As decisões daí resultantes cer-
do. Suas formações e experiências eram tamente serão mais benéficas para a for-
provavelmente apenas as do setor mação de um sólido poder naval em pou-
operativo. Nos últimos 70 anos, Marinhas cas décadas e de uma retaguarda técnica.
de guerra tornaram-se cada vez mais E também tornarão a Marinha um podero-
tecnológicas, e a tecnologia evoluiu e evo- so agente indutor do desenvolvimento
lui cada vez mais velozmente. Ao mesmo nacional.
tempo, o Brasil avançou industrialmente e A Estratégia Nacional de Defesa (END),
tem condições de ascender ao bloco dos em sua 2a edição, afirma claramente: “A
países líderes dentro de poucas décadas. estratégia de defesa é inseparável da es-
Portanto, as grandes decisões sobre tratégia de desenvolvimento”. Portanto,
reaparelhamento da essa afirmação deve
Marinha poderão ser ser o foco das deci-
bem mais frutíferas se A Marinha poderá ser um sões de grande enver-
forem elaboradas com
enfoque não só operati-
poderoso agente indutor do gadura, e o momento
é propício.
vo, mas principalmente desenvolvimento nacional O autor tenta, nes-
tecnológico e industrial. te artigo, relacionar as
Caso contrário, o afã de atender a prementes propostas do Plano de Articulação e Equi-
necessidades operativas poderá ter resulta- pamento da Marinha do Brasil (PAEMB),
dos negativos a longo prazo, comprometen- com as ações necessárias que poderão per-
do a capacidade de o sistema tecnológico in- mitir o efetivo desenvolvimento tecnoló-
dustrial do País vir a apoiar o setor operativo gico nacional durante o processo de proje-
continuamente, atualizá-lo e renová-lo. to e construção de novos meios, sem des-
Em qualquer setor técnico, civil ou mili- prezar eventuais consultorias estrangeiras.
tar, compras de oportunidade ou de paco- Estas, porém, precisarão ser cuidadosamen-
tes fechados no exterior resultam em difi- te avaliadas para que sejam efetivamente
culdades de operação e manutenção, absorvidas, fixadas e, posteriormente,
logística dispendiosa e pagamentos de reengendradas e desenvolvidas.
pesados royalties, fatores que podem im- Todos os nomes e marcas aqui menci-
plicar menor disponibilidade dos meios e onados pelo autor são o resultado de pes-
não satisfazer às expectativas à época das quisa livre e informações públicas osten-
respectivas concorrências. Evitando que sivas. As opiniões emitidas são de sua
tal ocorra, a MB estará se reaparelhando e, exclusiva responsabilidade e não repre-
simultaneamente, estimulando o desenvol- sentam a posição oficial da Marinha do
vimento tecnológico e industrial do País. Brasil.

RMB1 o T/2012 97
O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

PLANEJAMENTO E PROCESSOS DE damente as equipes técnico-operativas-


AQUISIÇÃO gerenciais para participar ativamente da
construção dos meios propostos no exteri-
Transferência de tecnologia não ocorre or, junto aos estaleiros vencedores das lici-
espontaneamente. Como regra geral, o con- tações dos diferentes tipos de meios. Na
tratado estrangeiro terá que necessariamen- sequência, transferência dos desenhos,
te oferecer projetos prontos (senão seria especificações, documentação técnica e as
inviável sua participação numa concorrên- normas de garantia de segurança para o Ar-
cia) e será parcimonioso na liberação dos senal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ)
seus conhecimentos. Normalmente, nós e a Diretoria de Engenharia Naval (DEN),
como clientes é que teremos que extraí-los além da elaboração da logística integrada
resolutamente. Esse processo deveria ser na medida do possível (pois nossos enge-
mais bem chamado de absorção de nheiros não teriam participado do projeto),
tecnologia. É um detalhe, porém crucial, e permitindo às nossas equipes desenvolver
por quê? Vejamos a seguir. e aperfeiçoar autonomamente os futuros
Temos hoje no Brasil engenheiros alta- projetos dos lotes subsequentes dos meios
mente capazes que não têm oportunidade a serem construídos no Brasil. Como os es-
de aplicar seus conhecimentos, pois, his- taleiros concorrentes devem necessariamen-
toricamente, no País, sempre se preferiu a te apresentar ofertas concretas, navios pron-
via mais fácil e cômoda das compras de tos, ver-nos-emos frustrados em participar
oportunidade ou projetos prontos do exte- da elaboração destes projetos, como seria
rior, com todos os seus óbices e desvanta- desejável.
gens. Na série de artigos do Vice-Almiran- Após a primeira fase, ou seja, constru-
te (EN) Elcio de Sá Freitas intitulados “A ção dos primeiros escoltas no exterior, po-
Busca da Grandeza”, publicados na RMB, deria ser iniciado um novo ciclo de traba-
este tema é tratado exaustivamente. Após lho no Brasil com projetos de fragatas no-
longa interrupção nas atividades de proje- vas, sempre com base nos Requisitos de
to e construção de navios de guerra no Estado-Maior (REM) atualizados, e talvez
Brasil, iniciadas na década de 1980, a Mari- até mesmo evoluídas das primeiras, depen-
nha vê-se diante da necessidade de dendo dos resultados das avaliações
reaparelhar a Esquadra num tempo relati- operacionais. Nessa fase inicial do proces-
vamente curto e, simultaneamente, aspirar so de reestruturação da Esquadra, diante
à premente recomposição das equipes téc- das circunstâncias, as nossas equipes téc-
nico-operativas-gerenciais em nível pelo nico-operativas-gerenciais provavelmente
menos equivalente ao da época do projeto ainda seriam insuficientes para abordar to-
e da construção dos submarinos IKL e das dos os assuntos de interesse da MB, obri-
corvetas. gando-nos a priorizar e focar os meios de
Com foco nos primeiros meios a serem alto valor tecnológico agregado e o maior
adquiridos (quatro submarinos convencio- número a ser adquirido.
nais e um submarino de propulsão nuclear, No momento oportuno, o primeiro passo
já em andamento, quatro navios-patrulha a ser dado pelas novas equipes técnicas se-
oceânicos – Oceanic Patrol Vessel (OPV) –, ria elaborar projetos de exequibilidade e con-
um navio de apoio logístico (NaApLog) e cepção de um segundo lote de escoltas a ser
cinco (3 + 2) escoltas, nesta ordem), seria projetado e construído no Brasil. Essas fases
desejável ou recomendável organizar rapi- requerem fundamental interação do setor

98 RMB1 oT/2012
O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

operativo com o técnico-gerencial, indispen- a) curto prazo: os primeiros quatro OPV;


sável em Marinhas avançadas, e nelas come- b) o primeiro de cinco NaApLog, com
çam a surgir nossas dúvidas e pontos fra- incorporação prevista para 2015; e
cos, que serão mais tarde abordados objeti- c) as cinco fragatas, com definição para
vamente com o eventual consultor estran- início de 2014 e incorporações a partir de
geiro contratado, mostrando-lhe que nós so- 2020.
mos clientes que sabem claramente o que Embora uma sugestão ambiciosa para um
querem. Nesse processo, o que seria mera único artigo, temos alguns pontos funda-
“transferência” passa a ser a absorção de um mentais para ressaltar no trato desta maté-
conhecimento novo que complementa o que ria, como os prazos previstos e os recursos
já foi exercitado anteriormente. tecnológicos e financeiros disponíveis. In-
Uma boa medida a ser tomada a curto pra- felizmente, por questões orçamentárias, a
zo seria fazer um levantamento de todos os Marinha do Brasil se viu impotente diante
profissionais especializados que participaram da debandada das equipes formadas na dé-
dos nossos projetos a partir de 1980, alguns cada de 1980 e a descontinuação da compe-
ainda na ativa e outros tência adquirida du-
já aposentados. Al- rante os programas de
guns profissionais apo- Por questões orçamentárias, projeto e construção
sentados certamente a Marinha do Brasil se viu naquela época. Este
gostariam de voltar ao seria o primeiro obstá-
trabalho para ensinar e impotente diante da culo a ser superado.
transmitir suas experi- debandada das equipes No caso dos meios
ências aos jovens que a serem adquiridos em
iniciam suas carreiras
formadas na década de 1980 prazos mais curtos,
técnicas. Não há limite e da descontinuação da como os OPV, o
de idade para resgatar competência adquirida NaApLog e os novos
toda esta experiência e escoltas, o tempo que
aplicá-la por meio dos durante os programas de seria necessário para a
novos profissionais projeto e construção recomposição de no-
motivados. Entretanto, vas equipes técnicas
a maioria, ou até mes-
naquela época não evitará que a MB
mo a totalidade, desses seja obrigada a adqui-
profissionais está com suas vidas profissio- rir os projetos e, provavelmente, fazer cons-
nais consolidadas, e convencê-los a voltar truir os primeiros ou um número maior de
às antigas atividades seria uma tarefa árdua. cada classe pelo(s) estaleiro(s) vence-
Demandaria muita confiança na realização dor(es), dando-nos o tempo necessário
dos projetos vindouros. para recompor as equipes de projeto e cons-
Vamos abordar cronologicamente os te- trução na Marinha. Já os projetos de prazo
mas do PAEMB, considerando que alguns mais longo se beneficiariam desse proces-
já são uma realidade bem encaminhada e so de reestruturação. Seria de suma impor-
outros são ainda estudos de conceito para tância avaliar-se a experiência ainda dispo-
um médio prazo, todos projetados no exte- nível adquirida com a classe Niterói, o Na-
rior, mas alguns construídos já no Brasil e vio-Escola Brasil, a classe Inhaúma e a clas-
outros ainda no estaleiro vencedor, depen- se Barroso. Mas o primeiro bloco do
dendo do nível de complexidade, a saber: PAEMB está prestes a ser definido e en-

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O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

globa os primeiros quatro OPV, cinco es- Concluída a primeira etapa com a aquisi-
coltas e um NaApLog. ção dos primeiros meios, poder-se-iam ini-
Analisando com rigor os escoltas que ciar, ou já se ter iniciado antes da conclusão
estão participando da concorrência, nenhum da primeira etapa, os projetos dos novos
corresponde inteiramente aos REM que fo- meios segundo nossos REM atualizados,
ram usados pelo autor na elaboração do es- derivados dos primeiros meios adquiridos
tudo publicado na RMB 2ot/2011. No caso no exterior ou mesmo totalmente novos. Este
específico da futura fragata, sugerimos um processo já demandaria um certo nível de
projeto derivado da classe F-124 Sachsen competência das novas equipes técnicas.
da Marinha da Alemanha, a mais próxima do No caso dos OPV, os concorrentes in-
desejável. A rigor, tal decisão demandaria, ternacionais estão oferecendo os meios
de fato, um novo projeto de concepção ela- para venda ou construção no Brasil. Os
borado e baseado nos REM, porém calcado REM definem um navio de 1.800 toneladas
num meio altamente aprovado, como a fra- (t), levemente armado. Os Requests for
gata classe F-124 sugerida, e que permitiria Proposals (RFP) estavam para ser entre-
a inserção de inúmeras melhorias e modifi- gues até o final de 2011, e ainda ficaremos
cações oriundas das experiências do setor aguardando a conclusão da licitação. No-
operativo de sua “parent navy” e do pró- tamos claramente as consequências da per-
prio estaleiro construtor. da das equipes técnicas e competências
Essa opção ou sugestão do autor resul- do passado recente do início da década de
ta de pesquisa e minuciosa análise dos 1990, pois aqui a MB poderia ter adotado
meios atuais propostos e pelo fato de a (ou ainda pode adotar) dois procedimen-
Alemanha ser o país estrangeiro com o tos altamente benéficos aos nossos inte-
maior número de indústrias implantadas no resses: retomada do projeto do navio-pa-
Brasil, muitas delas com atividades diretas trulha oceanográfico (NaPaOc) 1200, evo-
ou indiretas na construção naval. Este as- luindo para um OPV 1800, ou um OPV ain-
pecto deve ser considerado sob a ótica da da maior, de 2.300 t, evoluído da classe Bar-
END, que preconiza a nacionalização e o roso, porém menos sofisticado do que a
desenvolvimento tecnológico do maior corveta. Se no momento somos obrigados
percentual possível de componentes dos a considerar a compra de um projeto es-
novos meios navais, consequentemente a trangeiro, será indispensável iniciarmos a
elaboração da logística integrada. formação de novas equipes técnico-
Dada a exiguidade de tempo entre o pre- gerenciais para a continuação do progra-
sente momento e as datas previstas para a ma de construção e novos projetos para o
incorporação dos primeiros lotes dos novos PAEMB a curto prazo e no Brasil.
meios de superfície, além da perda da compe- O navio de apoio logístico previsto nesta
tência que foi adquirida no final da década de primeira fase do PAEMB seria, sem dúvida, o
1980, este procedimento de contratar o proje- projeto menos sofisticado de todos, apesar
to e a construção dos novos meios no exteri- do tamanho. Salvo alguns equipamentos de-
or seria justificado para satisfazer os prazos dicados à função Replenishment at Sea
estabelecidos pelo PAEMB e reduzir riscos, (RAS), no todo é um navio de transporte de
mas necessariamente com intensa participa- cargas líquidas e secas, com tanques, paióis e
ção do nosso pessoal técnico e operativo câmaras frigorificadas, mas cuja tecnologia
nas fases de construção, provas de mar e não deve ser menosprezada. Conforme as atu-
integração de sistemas. ais normas da International Maritime

100 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

Organization (IMO), o NaApLog deve ser ca- sar do tempo, deve-se fomentar a capaci-
paz de recolher os rejeitos sólidos e líquidos tação do AMRJ e de estaleiros privados
dos navios de uma força-tarefa para reciclá- nacionais de construir simultaneamente
los e dar-lhes a devida destinação em respeito mais de dois navios de guerra e com a ca-
à legislação ambiental. Em algumas Marinhas, pacidade de instalar, testar e homologar os
os NaApLog são preparados adicionalmente sistemas de armas, assim como a MB o fez
para desempenhar funções de Comando & com as classes Inhaúma e Barroso, ainda
Controle e servir de base e apoio para helicóp- que com assistência técnica estrangeira,
teros em missões ASW, além de embarcar um mas agora com crescente capacitação na-
hospital e um corpo de saúde reforçado. Sen- cional. Tal escala viabilizaria um robusto
do previstos cinco navios, o primeiro a ser programa de construção naval e geração
incorporado em 2015 e os demais entre 2020 e de milhares de postos de trabalho diretos e
2025, devido à falta de tempo e equipes com- indiretos, com grande efeito de arrasto
petentes, teremos que tecnológico e capaci-
aceitar um projeto es- tação industrial no
trangeiro com o primei- A escala pretendida Brasil, com ou sem a
ro da classe construído colaboração de firmas
no exterior, mas com a viabilizaria um robusto estrangeiras.
participação de nossos programa de construção Já o caso do NAe é
engenheiros e transfe- diferente, pois o prazo
rência do projeto com-
naval e geração de necessário é bem mai-
pleto para a DEN, visan- milhares de postos de or. Seria um trabalho
do às construções trabalho diretos e indiretos, inédito, e ainda depen-
subsequentes no Brasil. demos dos REM e da
Trata-se aqui de avaliar com grande efeito de definição dos parâme-
pragmaticamente as pri- arrasto tecnológico e tros da aquisição des-
oridades. Ou seja, as
competências disponí-
capacitação industrial no tes dois meios previs-
tos. Nunca fizemos
veis a curto prazo devem Brasil, com ou sem a algo semelhante, mas
ser direcionadas para colaboração de firmas isso não significa que
os meios de maior não possamos fazê-lo.
tecnologia e valor agre- estrangeiras Temos que começar
gado, como submarinos logo a “rascunhar” o
e fragatas. projeto. Já estamos atrasados, pois o
Nos três casos acima, a gradual recom- PAEMB prevê o início da construção em
posição dos quadros de engenheiros naci- 2015 e a incorporação em 2025. Contudo,
onais e a respectiva competência técnica nas atuais circunstâncias somos levados a
tanto a nível de projeto como de constru- crer que esses prazos são inviáveis, mes-
ção, com a integração do AMRJ e de esta- mo que o Brasil mantenha um ritmo de cres-
leiros privados nacionais, permitiriam a cimento alto e sustentável. Por ora, temos
construção seriada em lotes no Brasil, em que admiti-los. Trataremos deste assunto
que a cada novo lote seriam inseridas as na segunda parte deste trabalho.
experiências adquiridas com os meios an- Finalmente, na primeira fase do PAEMB
teriores das respectivas classes e, se con- prevê-se a aquisição do primeiro NaApLog
veniente, novas tecnologias. Com o pas- de cinco planejados, que serão provavel-

RMB1 o T/2012 101


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

mente do tipo fleet replenishment ships, com incorporação do S-81 prevista para 2013 e a
capacidade de fornecer diesel naval, quero- das outras três unidades do primeiro lote
sene de aviação, mantimentos, munições e para até o final de 2016. Dependendo das
cargas secas em geral. Fala-se em um navio avaliações do S-81 e da evolução dos cus-
de aproximadamente 22 mil t, que equivale, tos, poderá ser encomendado um segundo
em linhas gerais, às classes EGV-702 (D) e lote de mais quatro submarinos S-80 em 2014.
Fort Rosalie (RN) e ao espanhol Cantabria, Vemos aqui um caso típico de projetos e
somente para citar exemplos. Abordaremos construção naval contínua, com incorpora-
este assunto neste artigo. ção de tecnologia e fixação de mão de obra,
Cumpre lembrar que toda a estrutura in- fornecendo para sua Marinha Nacional e
dustrial para tal programa atende não so- para clientes estrangeiros. (Fonte: MF no 7-
mente à construção dos meios em si, mas 8/2008, 10/2010, 12/2010)
também à manutenção destes. Há manuten- Nesse contexto, é incontornável ter que
ções de rotina e as reformas de meia-vida. comentar as consequências nefastas com as
Ao longo da vida útil dos meios, as deman- quais se penaliza a Marinha do Brasil e a soci-
das mudam e a tecnologia evolui, aliás mui- edade brasileira devido à desarticulação das
to rapidamente. Quando esta “roda” entra equipes formadas a duras penas no período
em movimento, sua entre a aquisição da clas-
inércia beneficia toda se Niterói e a constru-
uma cadeia produtiva, Quando esta “roda” entra ção da classe Barroso,
aperfeiçoando seus em movimento, sua inércia incluídos todos os mei-
produtos, reduzindo os navais no período.
custos e consolidando beneficia toda uma cadeia Hoje somos obrigados
competências. produtiva, aperfeiçoando a comprar navios que
Comparando nossa
situação atual com a de
seus produtos, reduzindo estejam “o mais próximo
possível de nossos re-
um país industrialmen- custos e consolidando quisitos” e não aqueles
te bem menos impor- competências que realmente precisa-
tante do que os Esta- mos e gostaríamos de
dos Unidos, o Japão, a construir. Não tivessem
Alemanha ou a França, e com muito menor os governos dilapidado, a partir do final dos
potencial que o Brasil, no caso a Espanha, anos 1980, os recursos financeiros que davam
vemos que a esquadra espanhola hoje en- suporte às equipes técnicas e a competência
comenda todos os seus navios no país (cin- adquirida, hoje estaríamos projetando e cons-
co fragatas Álvaro de Bazán, dois navios- truindo nossos navios gradualmente e sem
transporte de apoio Galicia, um NaApLog pressa, a custos racionais, sem os óbices de
Cantabria, um LHD Juan Carlos) e que os royalties, e garantindo milhares de empregos
estaleiros locais forneceram (ou estavam em e a pesquisa que formaria nossa retaguarda
fase de fornecimento) cinco fragatas classe tecnológica, solidificando nossa independên-
Fridjof Nansen para a Noruega e fornece- cia e soberania.
rão quatro navios-patrulha BAM (buque de
actión marítima) para a Venezuela e dois FUTURAS FRAGATAS
LHD classe Juan Carlos para a Austrália.
Está em curso um importante projeto de sub- Neste tópico, a abordagem é diferente,
marino convencional classe S-80, estando a pois os prazos são bem mais curtos, a MB

102 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

já definiu o tipo de meio que se deseja e já Brasil, sendo os últimos meios da linhagem
tivemos, nos últimos 30 anos, uma boa ex- os da classe Barroso, o AMRJ precisaria ser
periência com a concepção e a construção modernizado ao estado da arte para se obter
de meios navais no Brasil. Começamos com um nível de qualidade e de eficiência indus-
a construção das duas fragatas classe trial compatível com os estaleiros estrangei-
Niterói, o projeto e a construção do Na- ros. Durante esse período de modernização,
vio-Escola Brasil e das corvetas da classe diante das circunstâncias tecnológicas e in-
Inhaúma e da classe Barroso e os projetos dustriais nacionais, não teremos opção se-
dos meios NaPaOc 1200, LPD (CPN), na- não admitir a construção dos primeiros navi-
vio-faroleiro (CPN) e outros, somente para os no estaleiro estrangeiro escolhido e fican-
citar os meios de superfície. do a seu encargo a modernização do AMRJ
Na primeira fase do PAEMB, trabalha-se como cláusula de off-set comercial. Este pro-
visando à aquisição dos OPV 1800, e, na cedimento minimizaria os riscos do projeto e
sequência, dos novos escoltas. Como já su- treinaria nossos engenheiros e técnicos tan-
gerido acima, os OPV 1800 poderiam ser to no projeto como na construção do novo
projetados no País a partir do projeto exis- meio. A decisão sobre o momento a partir do
tente (e não executado) qual se iniciará a cons-
do NaPaOc 1200 ou da trução dos escoltas no
corveta classe Barro- Estamos agora amargando Brasil dependerá do
so, caso se desejasse as consequências de um prazo necessário para a
uma classe de OPV de formação das novas
maior deslocamento e ciclo de atraso crônico equipes e da base in-
padronizado com toda imposto à MB com a dustrial no País, além da
uma classe de uma fu- expertise adquirida e
tura corveta derivada
descontinuidade dos atualizada no exterior.
da Barroso. Mas o foco programas de construção Para não se repetir
deste parágrafo são as naval na primeira metade o que ocorreu com as
futuras fragatas. corvetas da classe
A MB busca opções da década de 1990 Inhaúma, ou seja, a
junto a fornecedores construção de quatro
estrangeiros com cláusulas de transferên- “protótipos” com o objetivo de se obter uma
cia de tecnologia. Mas, na tabela relaciona- escala industrial que permitisse a constru-
da no trabalho anterior (RMB 2ot 2011), ve- ção no Brasil, será necessário projetar e
mos que nenhum meio atende exatamente construir os novos escoltas no exterior, mas
aos nossos REM. Na nossa opinião, o ca- com plena participação de nossas novas
minho mais interessante seria a elaboração equipes técnico-operativas-gerenciais.
de um projeto nacional, baseado ou deriva- Quantos seriam, ainda não podemos prever,
do de um meio proposto pelo concorrente mas um prazo maior para a construção das
estrangeiro vencedor da licitação, forman- primeiras fragatas no exterior, incluídos os
do-se uma equipe de engenheiros nacionais, testes de cais e de mar, se impõe, mesmo
militares e civis, que trabalharão com o pes- considerada a experiência do contratado. Em
soal do estaleiro escolhido na elaboração virtude do custo de construção dessas no-
do novo projeto conforme nossos REM. vas fragatas, seria desejável não acelerar a
Diante do atraso ocorrido com a aquisição dos três mais dois primeiros es-
descontinuidade dos programas navais no coltas sem antes testar exaustivamente o pri-

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O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

meiro e fazer as necessárias correções no gerenciais. Acreditamos que esta opção


projeto, pois, em engenharia, sabemos que para os meios de superfície não constitui-
sempre há imprevistos, por melhor e mais ria um desafio intransponível, posto que a
detalhado que seja o projeto. Contudo, pre- MB decidiu investir primeiro numa
midos pelo tempo e pelas demandas da Es- tecnologia muito mais sofisticada, que é o
quadra, teremos que repensar este critério, desenvolvimento e a construção no Brasil
como comentaremos mais adiante. de submarinos convencionais e nucleares.
Antes de prosseguir, o autor gostaria de O PAEMB menciona a construção de 30
salientar que já hoje o número de escoltas escoltas até 2034, sendo 18 para a Esquadra
igual a 14 é insuficiente e distribuído em qua- sediada no Rio de Janeiro e 12 para a segun-
tro classes diferentes. Some-se a isso a bai- da Esquadra, a ser criada e implantada numa
xa disponibilidade destes meios em virtude nova base naval no litoral norte do Brasil,
do aperto orçamentário da MB. Os navios em local ainda indefinido. Além disso, o pro-
das classes Niterói e Greenhalgh já têm grama prevê as primeiras incorporações a
idades que variam de 30 a 35 anos, tendo as partir de 2020 e um prazo de construção de
Niterói sido submetidas ao Modfrag – ain- seis anos para um escolta, desde o batimento
da assim não no nível necessário e deseja- de quilha até a incorporação. Donde faze-
do – e com as Greenhalgh sendo moderni- mos duas considerações:
zadas com grande esforço. A questão cen- a) Como exemplo de prazos de cons-
tral é: por quanto tempo poderemos manter trução, citamos: as classes DDG-51 (flight-
esses meios eficientemente operacionais e I) Arleigh Burke, DDG-72 (flight-II) Mahan
a que custo? Embora a manutenção da MB e DDG-79 (flight-II A) Oscar Austin, todas
seja exemplar, chegará inexoravelmente o mo- da US Navy, e os escoltas classe Fridtjof
mento em que a baixa se impõe, e receamos Nansen construídos na Espanha para a
que isso possa acontecer em menos de dez Marinha norueguesa. Todos foram
anos, ou seja, no máximo até 2022. Supo- construídos numa prazo de 30 a 39 meses,
nhamos, por absurdo, que fiquemos desfal- contando do batimento de quilha até a in-
cados desses nove meios e reduzidos a cin- corporação. A nossa deficiência técnico-
co corvetas, estas também carentes de uma construtiva atual certamente é um argumen-
manutenção e modernização urgente. Como to para o prazo estipulado de 72 meses, pois
substituir esses meios a tempo? Estamos a montagem de equipamentos e a integração
agora amargando as consequências de um de sistemas são o ponto crítico e o que de-
ciclo de atraso crônico imposto à MB com a manda mais tempo. Entretanto, este prazo
descontinuidade dos programas de cons- pode ser encurtado para os primeiros meios
trução naval na primeira metade da década a serem construídos no exterior, mas as pri-
de 1990. Veremos a seguir o que julgamos meiras fragatas construídas no Brasil sem
ser uma análise realista dos prazos de re- dúvida demandarão um tempo maior.
composição da Esquadra. b) Outro argumento para o prazo de
Nas próximas linhas, o autor deseja abor- construção de 72 meses poderia ser a ques-
dar alguns pontos de vista pessoais sobre tão orçamentária, ou seja, um cronograma
o futuro programa de construção naval en- de desembolso financeiro mais distendido
volvendo particularmente as fragatas, as ao longo dos anos em que durará o progra-
corvetas e os OPV, com o desenvolvimen- ma de construção dos novos escoltas.
to da respectiva competência e a recompo- Segundo entrevista (Segurança & Defe-
sição das equipes técnico-operativas- sa no 100/2010) do comandante da Marinha,

104 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

Almirante de Esquadra Julio Soares de Moura primeiros navios. Em 2020 poderia ser feita
Neto, deseja-se a definição do novo escolta uma avaliação sobre a conveniência de se
até o final de 2013, donde podemos supor um construir mais duas unidades no exterior ou
início para os estudos e o projeto (caso se de, em 2022, começarmos a construir um ou
modifique um modelo atual ofertado) do novo dois escoltas simultaneamente, ainda no ex-
meio segundo os nossos REM, digamos, a terior ou já no Brasil, fechando o primeiro
partir do início de 2014 no exterior. Com a ciclo de incorporações em 2026 (2x)/2028 (1+1)
experiência do estaleiro vencedor baseada (exterior) ou 2028 (2x)/2030 (1+1) (Brasil).
num meio existente e aprovado, o prazo de Note-se o hiato de tempo perigoso que
projeto de dois anos nos parece realista. Nes- poderia se formar entre as baixas dos nove
sa fase de 24 meses, desde o início dos traba- meios atuais – a partir de 2020, por exemplo –
lhos, seriam continuamente melhorados os e a finalização da aquisição dos cinco primei-
requisitos e a logística integrada, visando à ros novos escoltas no período 2028/2030, fi-
operação e à manutenção dos novos meios cando a Esquadra eventualmente reduzida a
pela MB. cinco escoltas novos.
Admitamos, pois, o Sem a interrupção dos
início da construção do programas de constru-
primeiro escolta em Note-se o hiato de tempo ção que a MB se viu
2016 e um prazo inicial perigoso que poderia se obrigada a aceitar na
de cinco anos até a in-
corporação, em 2021,
formar entre as baixas dos década de 1990, tería-
mos, nestes últimos 20
contando com a nove meios atuais, a partir anos, estabelecido uma
expertise do estaleiro de 2020, ficando a sólida competência téc-
contratado. Devido à nica de projetos e cons-
urgência em recompor Esquadra eventualmente trução naval, e demais
os meios de superfície, reduzida a cinco escoltas tecnologias correlatas,
mas balanceando o rit- consolidando uma reta-
mo de construção no
novos guarda técnica com o
exterior com o orçamen- apoio das universida-
to e o cronograma de desembolso financeiro des e da indústria nacional e, atualmente, es-
disponibilizados, poderíamos prever gradu- taríamos substituindo gradualmente e sem
almente a redução dos prazos de construção pressa os antigos meios por navios novos e
para quatro anos, considerando a possibili- modernos, projetados e construídos no Bra-
dade de justapor mais de uma fragata no sil, expandindo e consolidando o poder na-
cronograma com uma defasagem de dois anos val da nossa Esquadra e a nossa soberania.
entre o início da construção das mesmas. Comentário: como medida paliativa, no
Para as primeiras três fragatas teríamos: presente momento a MB está mais uma vez
2016-2021, 2018-2023 e 2020-2024. A partir de precisando negociar uma compra de opor-
2016 seriam formados e treinados os enge- tunidade com a Inglaterra, visando às qua-
nheiros e técnicos da construção, iniciando- tro fragatas da classe F-22 Batch 3 que
se a modernização do AMRJ e do(s) darão baixa em breve, o que é lógico, pois
estaleiro(s) privado(s) nacional(ais) que já temos três destes exemplares, porém mai-
faria(m) parte do programa de construção no ores e de incorporação mais recente, entre
Brasil. Seria parte do contrato como cláusula 1988 e 1990. A outra oportunidaade é o na-
comercial de off-set pela importação dos três vio de suprimentos de esquadra Fort

RMB1 o T/2012 105


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

George, incorporado em 1993, de 32.500 t, Não seria prudente descartar essa hipó-
um meio inédito na MB. (Fonte: Naval For- tese, pois a nossa história e a tradição re-
ces IV/2011, p. 96). cente relativa aos gastos públicos no Brasil
Na nossa opinião, a solução se resume implicam cautela quando falamos de proje-
a três pontos: tos de longo prazo. No Brasil, o orçamento
a) incontornável ajuda estrangeira, da União não é impositivo, mas autorizativo,
com a construção dos cinco primeiros mei- ou seja, as verbas podem ser realocadas em
os no exterior e completando as suas in- função das prioridades do Governo Fede-
corporações em 2026/2028; ral. Portanto, a opção de meios menores e
b) recomposição acelerada das equi- mais baratos (corvetas) para completar o
pes técnico-operativas-gerenciais; número de meios de superfície necessários
c) o Governo Federal prover a dispo- à Esquadra, formando um high-low mix, é
nibilidade orçamentária à MB para acelerar uma possibilidade real que deverá ser con-
o programa de construção e dobrar o nú- siderada ao longo do tempo.
mero de incorporações até 2030, chegando
a dez novas fragatas. FUTUROS OPV
Em 2020, nossa nova equipe técnico-
operativa-gerencial já teria seis anos de tra- Embora não se conheçam detalhes de
balhos e experiência para contabilizar, e os natureza classificada, sabe-se que os no-
engenheiros e técnicos de construção qua- vos OPV deverão deslocar 1.800 t a plena
tro anos, todos com mais um período de carga e ser levemente armados, com um ca-
quatro anos pela frente no exterior. nhão de médio calibre e duas metralhado-
Em algum momento, seriam então gra- ras e com uma suíte de radares para busca
dualmente repatriados os mais experientes de superfície e limitada busca aérea.
para iniciar a formação das equipes aqui no Na década de 1980, a DEN projetou o
País. A partir de 2020, as equipes já poderi- NaPaOc 1200, conforme os REM da MB à
am contar com os primeiros testes de mar época. Tivesse a MB logrado sucesso em
do primeiro escolta, que seriam incorpora- manter e desenvolver as equipes técnico-
dos no projeto do quarto escolta em dian- operativas-gerenciais, hoje estaríamos em
te. Entretanto, com os modernos recursos condições de desenvolver, a partir desse,
de estudo e projeto, além da expertise do um meio maior, o NaPaOc 1800, e um me-
contratado, seria admissível construirem- nor, o atual NaPa 500, sem os óbices da
se os três primeiros navios segundo o mes- compra de tecnologia estrangeira.
mo projeto ainda sem experiência de mar. Entretanto, somos da opinião que uma
Devemos considerar que, no futuro, a opção ainda melhor seria um projeto evolu-
MB venha a ser confrontada com novas ído da Corveta Barroso, juntamente com a
demandas e requisitos operacionais que im- continuação da evolução e a construção de
pliquem a necessidade de projetar uma novas unidades deste meio. A construção
nova corveta derivada da Barroso, e, na- de dois tipos de meios a partir de um casco
turalmente, estas equipes encarregadas do e propulsão comuns representaria uma gran-
programa das escoltas estariam perfeita- de economia de recursos para a MB. Um
mente habilitadas para realizar este traba- OPV desse porte, com cerca de 2.300 t seria,
lho no Brasil e de forma autônoma. E, tal- obviamente, um meio muito mais capaz e
vez, mesmo a elaboração de um novo OPV preparado para um upgrade de armamento
derivado da nova corveta. ao nível das corvetas numa situação de cri-

106 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

se. Não menos importante seria a optar por novas versões da referida
consequente menor estratificação dos tipos corveta para compor o número mínimo ne-
de meios, reduzindo os custos e facilitando cessário de meios para a consecução das
a operação, o treinamento e a logística. missões da Esquadra.
Embora a missão de um OPV seja a de pa-
trulha e presença, com equipamentos especí- FUTUROS NaApLog*
ficos para resgate no mar e combate a incêndi-
os, entre outras atribuições, modernamente A capacidade de uma Marinha de con-
ele é encarado como um meio que deve ser duzir operações, tanto em tempos de paz
integrável à Esquadra num cenário de guerra como na guerra, depende amplamente da
e, portanto, deve ter uma suíte de sensores e qualidade de sua logística. Entre as princi-
comunicação que o torne capaz de operar pais funções da logística naval estão: su-
integradamente com meios navais de fato. primento, manutenção, transporte, enge-
Neste caso, funções de vigilância, coleta de nharia civil, serviços de saúde e outros ser-
informações, enlace de viços logísticos. Os
dados e guerra eletrôni- processos de logística
ca seriam parte das atri- A capacidade de uma aplicados em cada
buições de um OPV, por área funcional são os
isso estes equipamentos Marinha de conduzir seguintes: a) aquisi-
deveriam ser padrão. operações, tanto em ção – compras e pro-
Como um bom dução de bens; b) dis-
exemplo de um OPV
tempos de paz como na tribuição – transporte,
maior e mais capaz, guerra, depende controle de inventário
podemos citar o da amplamente da qualidade e informação logística;
nova classe Holland c) sustentabilidade
da Real Marinha ho- de sua logística logística – manuten-
landesa, que regula em ção do potencial
tamanho com a nossa classe Barroso. Bem combativo das forças navais no decurso
equipado e com ótimas qualidades náuti- de uma operação/campanha; d) abasteci-
cas, deverá cumprir missões longe de casa, mento – recepção, armazenagem, escoa-
nas Antilhas holandesas, entre outras atri- mento e reabastecimento das forças navais.
buições no âmbito da Organização do Tra- Navios de apoio logístico podem tornar
tado do Atlântico Norte (Otan). realidade alguns dos pontos fulcrais de
Mas como programas navais são muito qualquer doutrina naval: grande raio de
dinâmicos e os REM podem mudar em fun- ação e autonomia, sustentabilidade persis-
ção da conjuntura mundial, o NaPaOc 1800 tente na área de operações e independên-
que ora deverá ser adquirido poderá, no cia de bases estrangeiras. O tamanho e o
futuro, dar lugar à opção de um meio maior número de meios navais de uma Marinha,
derivado da Corveta Barroso, opção que a frequência de deslocamento de forças-
devemos ter em mente, inclusive porque o tarefa e a variedade de missões, distâncias
autor acredita que limitações orçamentári- das bases e períodos de permanência nas
as poderão levar a uma limitação do núme- áreas operativas definem o número e tipos
ro de escoltas de 6 mil t, obrigando a MB a de meios logísticos, suas capacidades de

*
N.A.: Fonte: Milan Vego, NAFO I/2010.

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O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

carga e velocidades sustentadas necessá- maneira: AO – navios-tanque; AOE ou AOR


rias para garantir a condução das opera- – navios de suprimento de esquadra; AKE
ções navais. Os navios de apoio logístico – navios de suprimento de cargas secas; e
podem operar de dois modos: como parte JSS (Joint Support Ship) ou JSBLS (Joint
integral de uma força-tarefa ou navios on Sea Base Logistic Ship) para transporte de
station (underway replenishment ship), ou cargas e veículos em geral, além de apoio
então como ressuprimento (shuttle) entre em áreas de operação, seja esta puramente
as forças-tarefa e as bases. naval ou anfíbia.
As principais tarefas dos navios No programa atual estão previstos cinco
logísticos são: abastecer os navios da es- navios de apoio logístico, para abastecer a
quadra com combustíveis para os navios e esquadra no mar com combustíveis, muni-
suas aeronaves embarcadas, lubrificantes, ções e mantimentos. O seu tamanho prevê
água potável, mantimentos secos, refrige- um deslocamento carregado de aproxima-
rados e congelados, munições, peças so- damente 22 mil t. Como exemplo comparati-
bressalentes e produtos médicos; trans- vo, esse tamanho equivale ao das classes
bordo de pessoal; recolher excedentes de EGV-702 alemã (20 mil t) e Cantabria espa-
dejetos líquidos e sólidos para alívio dos nhola (19 mil t) atuais e Fort Rosalie inglesa
meios de combate e reciclagem a bordo; (23 mil t), que será desincorporada breve-
serviços de apoio de manutenção, inclusi- mente. Este tipo é classificado pela Otan com
ve de aeronaves; serviços hospitalares; e, a sigla AOE, ou underway replenishment
em alguns casos, embarque de uma Esqua- ship. Normalmente, este tipo de navio acom-
dra com facilidades de C4 & ISR. Navios panha a força-tarefa em missões, sendo cha-
logísticos também podem embarcar helicóp- mado de station ship, abastecendo-a com
teros ASW e, com sistemas de vigilância, todos os produtos necessários. Contudo,
comunicação e armas, podem ser comba- pode ser utilizado também como elo de su-
tentes integrados à força-tarefa. Durante primento entre as bases/portos e a força-
uma faina de abastecimento, o NaApLog tarefa, ou shuttle ship, recompletando os
deve transferir (e receber) o máximo de car- navios de combate e o NaApLog on station
ga no menor tempo possível. Portanto, se- em cada viagem.
ria desejável que este meio tivesse pelo Notamos que está havendo uma evolu-
menos três estações em cada bordo (Unrep ção nos tamanhos desses meios, citando a
– underway replenishment –, segundo de- classe Fort Victoria de 32 mil t, da RFA
finição da USN, ou RAS – replenishment (Royal Fleet Auxiliary); a proposta do JSS
at sea –, segundo a RN), uma para transfe- (Joint Support Ship) de 28 mil t, do Canadá
rência de cargas sólidas e duas para líqui- e da Holanda; e a futura classe Brave, de
dos. Para cargas sólidas, temos adicional- 30 mil t, da França. Na Inglaterra, está em
mente a opção da faina Vertrep. curso uma renovação da RFA, o chamado
Modernamente, há uma tendência na programa Mars (Maritime Afloat Reach &
uniformização ou redução dos tipos de Support), em que os navios Fort Rosalie e
meios logísticos. No caso da USN, com a Fort Austin serão substituídos pelos FSSS
introdução dos AKE, os meios logísticos (Fleet Solid & Support Ships), da ordem
se reduzirão de cinco para três classes. Num de 30 mil t.
futuro próximo, podemos dizer com razoá- Não menos importante é a proporção
vel certeza que os tipos empregados ao entre navios-tanque AO e os NaApLog
redor do mundo se resumirão da seguinte AOE ou AOR, segundo classificação nas

108 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

Marinhas que fazem parte da Otan. Nor- tante. Os navios mencionados no PAEMB
malmente, os navios-tanque se igualam (ou como transportes de apoio poderiam ser
superam) ao número de AOE. Quando uma similares ao conceito JSS ou JSBLS, funci-
componente logística é mais modesta, en- onando como fornecedores de cargas se-
tão o que se vê frequentemente são mera- cas, como os AKE da USN.
mente alguns AO de vários tamanhos.
Contudo, devemos considerar os NAe CUSTOS DE CICLO DE VIDA DOS
previstos no PAEMB, pois estes alteram NOVOS MEIOS
drasticamente o equilíbrio dos meios
logísticos. Um NAe como o estudado pelo Escoltas
autor (RMB 1o/t 2011) demanda um navio-
tanque da ordem de 30 mil t dedicado. Na- Modernamente, o custo de obtenção de
quele artigo sobre o NAe, preparamos uma um meio naval reflete o custo total do ciclo
tabela para ilustrar o apoio de um AOE de vida do navio. Cobre desde projeto, cons-
acompanhando a força-tarefa – demanda trução, operação, logística industrial e
apoio de navios shuttle. Este dimensiona- operacional, manutenção de rotina e moder-
mento será revisto num próximo estudo. nizações de meia-vida até a desmobilização
Na opinião do autor, os cinco NaApLog e o sucateamento. Para navios da classe de
talvez devam ser divididos nas duas clas- fragatas ou destróieres, considera-se um ci-
ses (AO e AOE), mas a proporção fica em clo de vida de 30 a 35 anos e uma moderniza-
aberto, pois depende de muitos fatores que ção de meia-vida. No entanto, com a evolu-
fogem ao escopo deste texto. A vantagem ção cada vez mais rápida de sistemas eletrô-
brasileira é a de ter uma costa extensa com nicos, é provável que os navios ora em fase
várias bases e portos, em que é possível de projeto venham a ter mais de uma moder-
abastecer os NaApLog da Marinha, redu- nização de meia-vida do sistema de armas.
zindo-se os tempos de trânsito do AOE. Custo de Ciclo de Vida: É o custo que
Contudo, é preciso prever uma eventual cobre o ciclo de vida do meio, desde o iní-
necessidade de singrar mares distantes, por cio do projeto até sua desincorporação e
isso o tamanho passa a ser muito impor- sucateamento.

CUSTO DE CICLO DE VIDA

CUSTO DE CONSTRUÇÃO CUSTO OPERACIONAL CUSTO DE PROJETO


47% 50% 3%

PESSOAL & LOG. APOIO MANUTENÇÃO & LOG. IND. LOGÍSTICA SUPRIMENTO
35% 50% 15%

PLATAFORMA & PROPULSÃO SISTEMAS & ARMAS


65% 35%

(Fonte: Naval Forces, Eng. Stephan Deucker, gerente de Pesquisa & Desenvolvimento da TKMS)

RMB1 o T/2012 109


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

Custo de Projeto: Engloba os estudos e Outro bom exemplo recente é a constru-


os projetos do novo meio, a avaliação da ção da nova classe de escoltas Iver Huitfeldt
base industrial e tecnológica (universida- para a Marinha dinamarquesa. A Odense
des e empresas civis) a ser envolvida na Steel Shippyards fez uma combinação de
construção e o suporte de ciclo de vida, produção deste meio militar com os progra-
gerando os planejamentos logísticos de mas correntes de navios civis para otimizar
apoio e operacionais. custos. Muitos dos blocos estão sendo fa-
Custo de Construção: Refere-se à cons- bricados em suas subsidiárias na Estônia e
trução do meio propriamente dito, com to- Lituânia e a montagem está sendo feita na
dos os custos que cobrem o que é neces- Dinamarca. Foi escolhido seguir uma classi-
sário para a construção do navio, incluin- ficação comercial até o momento da instala-
do sistemas, equipamentos, materiais, pro- ção dos sistemas militares. Esse processo
cessos, gerenciamento, mão de obra, tes- resulta numa redução de 46% do custo quan-
tes e provas. Demanda uma estrutura téc- do comparado à construção anterior da clas-
nico-gerencial para a consecução do pro- se Absalon. As plataformas custarão 212
jeto, a logística industrial de compras e tes- milhões de euros a unidade. Considerando
tes de cais e de mar até a aprovação e en- que geralmente a plataforma representa 40%
trega final do meio à Esquadra. do custo de obtenção do meio, total incorri-
Custo Operacional: Diz respeito ao apoio do até sua incorporação, mas pelo processo
logístico integrado, elaborado na fase de adotado talvez mesmo 30%, podemos infe-
projeto do navio, cobrindo itens como: rir que a nova fragata custará ao contribuin-
– Pessoal & Logística de Apoio – sol- te dinamarquês cerca de 530 a 707 milhões
dos, alimentação, saúde, treinamento, de euros ou 720 a 960 milhões de dólares.
fardamento e equipamento de uso pessoal. Lembremos que estes meios terão uma con-
– Logística de Suprimento – combustí- figuração antiaérea com uma suíte de
veis, lubrificantes, mantimentos, munição e sensores sofisticada com Apar (Active
mísseis, material seco em geral, centros de Phased Array Radar) + Samrt-l, como as fra-
abastecimento e navios de apoio logístico. gatas F-124 da Alemanha, LCF da Holanda.
– Manutenção & Logística Industrial – Avaliar quanto custaria uma F-6000M
peças, manutenção em geral, moderniza- construída no Brasil é bastante difícil. Em-
ções, reformas de meia-vida, arsenais, es- bora se diga que nossos custos são meno-
taleiros e indústria, contratos de manuten- res, hoje nossa mão de obra especializada
ção de fornecedores. Estes custos são ra- rivaliza com a estrangeira, mormente devido
teados entre Plataforma & Propulsão e Sis- à sua escassez. Contudo, é sabido que a
temas & Armas. produtividade dos americanos e dos euro-
Segundo dados do Congressional peus é superior à nossa, além da disponibi-
Budget Office (USA) do FY-2010, a cons- dalide de tecnologia avançada e automação,
trução de cada navio de escolta da classe o que não temos em nosso estado de atraso
DDG-51 série Flight II-A deverá custar cer- e obsolescência. A nacionalização de itens
ca de US$ 1,484 bilhão, o que corresponde também custará além do desejado, mas deve
a 49% do seu respectivo custo de ciclo de ser vista como investimento em tecnologia
vida. Entretanto, lembremos que esta clas- e obtenção de escala industrial nacional.
se ultrapassa em tamanho e não atende aos Sejam quais forem as razões, vamos supor
nossos REM, sendo mais cara em relação à aqui meramente como um exercício
F-6000M sugerida. especulativo, mas razoavelmente realista,

110 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

que a construção no Brasil da F-6000M fi- Já no caso de uma verdadeira corveta


que entre US$ 750 milhões e 1 bilhão. armada como tal, tomando por base um
Ainda segundo o Congressional Budget meio evoluído e aperfeiçoado da classe
Office, o custo de operação anual da classe Barroso, e comparando-o às classes
DDG-51 monta a US$ 42,4 milhões, que, Braunschweig (Alemanha), Milgem (Tur-
extrapolado para um ciclo de vida de 35 anos, quia), Kedah (Malásia) ou Khareef (Oman),
representa um total de US$ 1.486 milhões. chegaríamos a valores de aquisição situa-
Somados os custos de construção e dos entre US$ 250 milhões e 300 milhões.
operacional, temos um total de US$ 3.042 Grosso modo, a conclusão seria que,
milhões, sendo este último aproximadamen- partindo-se de um projeto evoluído da Bar-
te 48% do custo total do ciclo de vida do roso, um mesmo casco e propulsão, a ver-
meio. Obviamente que os custos compara- são corveta custaria o dobro da versão
dos entre a USN e a MB são diferentes, mas OPV. Mas um OPV seria configurado se-
o que importa aqui é a proporção. gundo o princípio fitted-for-but-not-with,
Admitamos por hipótese que, conside- ou seja, potencialmente um meio naval de-
rando que os nossos custos de pessoal são pendendo de um upgrade, mas por um cus-
inferiores aos da USN e que o regime de ope- to inicial menor.
ração também é menos intenso, digamos 70%
do custo operacional da DDG-51, com refle- NaApLog
xos no consumo de combustíveis, podemos
supor que o custo opera-cional anual da F- Segundo informações (Marine Forum, 5/
6000M seria algo em torno de US$ 29,8 mi- 2010 ), o estaleiro Nassco (National Steel
lhões. Se mantida a proporção média de 47% and Shipbuilding Company), San Diego,
para este item, então, por regra de três, o cus- grupo General Dynamics, firmou, em 26 de
to de construção da nossa futura fragata se- fevereiro de 2010, contrato para o forneci-
ria algo em torno de US$ 750 milhões, consi- mento dos 13o e 14o navios da classe AKE
derando o ciclo de vida de 35 anos. Lewis & Clark, fechando a série. O 14o na-
vio será entregue em 2012. O atual programa
OPV* T-AKE (Marine Forum, no 5/2010 ) custará
ao contribuinte americano cerca de 4,5 bi-
Quanto aos custos de aquisição, fare- lhões de euros, ou 321 milhões de euros/
mos aqui duas considerações: a) uma unidade. Trata-se de um navio sofisticado
corveta evoluída da Barroso e b) um OPV com dez estações RAS (6x BE, 4 x BB), pai-
evoluído da Barroso. óis sofisticados e automatizados, transpor-
Não temos informações sobre os cus- tando um total de 11 mil toneladas de supri-
tos previstos para os NaPaOc 1800, mas, mentos a uma velocidade sustentada de 20
comparando-os com outros meios simila- nós para um raio de ação de 10 mil n.m. (sem
res, como os das classes Cyde (UK), usar cargo fuel), cobrindo a distância em
Sentinel (TKMS) e Knud Rasmussen (DK), 500 horas (teoricamente 20 dias de mar). Para
podemos admitir um valor em torno de US$ uma disponibilidade de 65% ou 5.694 horas/
50 milhões. Já um OPV derivado da Barro- ano, podemos considerar dez viagens de
so e similar à classe Holland custaria cerca suprimento, transportando 110 mil t e per-
de US$ 170 milhões. correndo 100 mil n.m. Considerando uma

* N.A.: Fonte: Combat Fleets of the World, Warships-Cost.

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O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

vida útil de 35 anos, a fração anual do custo gamos a um resultado anual de 0,52 euro/t/
de aquisição a ser amortizado será de 9,17 mil n.m.
milhões de euros, o que, dividido pela tone- Falando da Royal Navy, vale a pena te-
lagem transportada e milhas náuticas per- cer rápidos comentários sobre o custo do
corridas, teremos o resultado de 0,83 euro/t/ Programa Mars (Maritime Afloat Reach &
mil n.m. Support). Esse programa (Marine Forum,
Na classe de navios logísticos de 20 mil 5/2008), orçado em 3,5 bilhões de euros,
t, no limite inferior desta classe de navios, prevê a construção de 11 navios: seis navi-
analisaremos o novo EGV-702 batch 2 Bonn. os-tanque, dois FSSS (Fleet Solid Support
Seu custo está orçado em 280 milhões de ship) e três JSBLV (Joint Sea-Based
euros (Marine Forum, 4/2009), desloca Logistics Vessel). Os navios deverão ser
20.200t carregado e transporta um total de incorporados entre 2011 e 2021, sendo que
8.370 t de cargas diversas e até 78 CTRs 20’ do inventário atual serão mantidas apenas
no convés, com velocidade máxima susten- as classes 1 x AOE Fort Victoria e 2 x AO
tada de 20 nós e autonomia de 10 mil n.m. ou Wave. Todos os meios logísticos novos
500 horas de mar. Para uma disponibilidade aproximadamente do mesmo porte da or-
de 65% ou 5.694 horas/ano, podemos con- dem de 30.000 t a plena carga, resulta numa
siderar dez viagens de suprimento, trans- média de € 318 milhões por navio. Curioso
portando 83.700 t e percorrendo 100 mil n.m. observar que os custos de aquisição na
Considerando uma vida útil de 35 anos, a Inglaterra são sempre mais elevados do que
cota anual do custo de aquisição a ser amor- os americanos ou europeus continentais.
tizado será de 8 milhões de euros, dividido Para as duas versões estudadas pelo
pela tonelagem transportada e milhas náuti- autor, inferimos os custos de aquisição por
cas percorridas anualmente – resultando em regra de três. Assim, um AOE nacional de 31
0,96 euro t/mil n.m. mil t custaria cerca de 300 milhões de euros
Temos notado que, nos últimos tempos, e um AOE 24 mil t derivado do EGV-702,
tem havido uma tendência de se conceber aproximadamente 288 milhões de euros. Apli-
meios de apoio logístico da ordem de 30 mil t, cando-se os mesmos critérios acima para os
como as classes Brave da DCNS, França, e cálculos de eficiência de custo de aquisição
JSS (Join Support Ship), da ordem de 28 mil t (amortização), chegamos a 0,54 euro/t/mil
para as Marinhas do Canadá e da Holanda. n.m. e 0,73 euro/t/mil n.m., respectivamente.
Eles se situam no meio entre os “pequenos” Concluímos, pois, que os meios com deslo-
da maioria das Marinhas e os “grandes” da camento carregado ao redor de 30 mil t com
USN. Não entraremos nos detalhes de cada DWT entre 15 mil t e 18 mil t mostram a
navio, mas no geral eles são classificáveis melhor eficiência de custo anual de aquisi-
como AOE ou AOR. Vamos tecer rápidos co- ção (amortização) relacionada à tonelagem
mentários sobre a classe Fort Victoria da transportada e milhagem percorrida.
RFA - Royal Fleet Auxiliary. Com 32 mil t e
velocidade sustentada de 20 nós, considera- FINAL DA 1A PARTE
remos os mesmos parâmetros adotados aci-
ma como denominador comum para cálculo Na segunda parte faremos considera-
da eficiência de custos, este navio transpor- ções sobre os demais meios de superfície
tando 18.700 t de produtos para abastecimen- oceânicos previstos no PAEMB, como o
to das forças-tarefa. Com um custo de aquisi- navio-aeródromo, o navio de propósitos
ção atualizado de 337 milhões de euros, che- múltiplos, o navio de transporte de apoio

112 RMB1 oT/2012


O FUTURO E OS NOVOS MEIOS NAVAIS DA MARINHA DO BRASIL (I)

e, ainda, um tema sobre NE/NAeH ( René Diretoria de Sistemas de Armas da Mari-


Vogt, RMB 1ot/2010). nha, DTCM, CCEMSP, a Associação Bra-
Juntaremos comentários sobre a forma- sileira das Indústrias de Materiais de Defe-
ção de uma retaguarda técnica nacional en- sa e Segurança (Abimde) e a indústria na-
volvendo a MB por meio da Diretoria de cional e a estrangeira radicada no Brasil,
Ciência e Tecnologia como indutor, DEN, além de universidades.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<POLÍTICA>; Política nacional; C&T; C&T na Marinha;

BIBLIOGRAFIA

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RMB1 o T/2012 113


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

SYLVIO DOS SANTOS VAL1


Professor

SUMÁRIO

Os ciclos tecnológicos
A aviação naval
Implantação
Parâmetros tecnológicos
Montadora do Galeão
O Debate da aviação naval e o fim

OS CICLOS TECNOLÓGICOS rante a Segunda Guerra Mundial; e 3) a aqui-


sição das fragatas inglesas Vosper MK-10

S egundo Martins Filho (2010), que


periodizou pelos saltos tecnológicos,
seriam três períodos: 1) os programas na-
na década de 1970, que originou o programa
das fragatas nacionais (classe Niterói)2.
Martins Filho ainda define a construção do
vais de 1906-10, pela aquisição dos submarino nuclear binacional (francês-bra-
dreadnoughts (encouraçados Minas Gerais sileiro) como um salto mais além, salto po-
e São Paulo); 2) a incorporação dos tencial (p. 69), pois representaria um cho-
contratorpedeiros Cannon, dos EUA, du- que institucional profundo.

1
Professor de História, mestre em Ciência Política, doutorando do Programa de Pós-Graduação em
Ciência Política (PGCP), da Universidade Federal Fluminense (UFF).
2
MARTINS FILHO (2010, p. 59).
A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

O foco dessa cronologia foi a revolução Marinha a determinar a verba de custeio para
tecnológica por meio de um choque de ló- a aviação naval. Com novos aviões, princi-
gica operacional. A aquisição desses ar- palmente dos EUA, foi instalado o Comando
tefatos representou desde a mudança na de Defesa Aérea do Litoral, em 1922. Então
formação do conhecimento e preparação existiam duas divisões aéreas: a do Exército,
do pessoal até conhecimentos correlatos com os aviões “terrestres” (decolavam do
importantes para a operação dos navios. solo), enquanto a Marinha tinha apenas os
Entretanto, nessa lógica, deixa-se escapar aeroboats (hidroaviões) e os catapultados
um item em especial, o mais audacioso, e (de navios sem convés de voo).
que, contraditoriamente, serviu mais ao País “Já no fim da década de 1920 e início de
do que à força e aos agentes que o arquite- 1930, a aviação naval contava com apreci-
taram: a Aviação Naval. ável número de aviadores e técnicos e dis-
punha de aviões de vários tipos, capazes
A AVIAÇÃO NAVAL de executar diversas missões de guerra.”4

Implantação Entretanto, apesar


das mudanças institu-
Sem dúvida, o “fa- “No fim da década de 1920 cionais e do aparente
tor belonave” é o e início de 1930, a aviação apoio político, a avia-
vetor-chave para en- ção naval teve uma
tender a tecnologia naval contava com vida contrastante na
naval, porém nem só apreciável número de década de 1920. A mai-
de navios vive uma oria dos aviadores era
Marinha moderna. O
aviadores e técnicos e de voluntários, pois
Programa Naval de dispunha de aviões de não existia a carreira
1906 incluiria, por ini- vários tipos, capazes de de aviador naval na
ciativa do Almirante Armada. Havia um
Alexandrino, a forma- executar diversas missões conflito entre o ope-
ção de uma aviação de guerra” racional e o institucio-
naval. Não se tinha nal, porque o Coman-
ideia de que aviões do da Marinha, que
precisaria ou como o corpo aéreo funciona- chegou a obrigar no currículo dos oficiais
ria, mas em 1910 foi formada a primeira turma o cumprimento de horas de voo, não
de alunos-aviadores, que teria instrução reformulou o sistema de promoções que
numa escola de aviação privada3. Em 22 de ainda privilegiava o “serviço a bordo”. A
agosto de 1916, por decreto do Presidente maioria dos postos de aviadores era com-
Wenceslau Brás, foi organizada a Escola de posta por subalternos; havia muitos aci-
Aviação Naval, com sede na Ilha das Enxa- dentes e escassez de pessoal de apoio e
das, Rio de Janeiro. Esta tornou-se a data de manutenção.
fundação da Aviação da Marinha. Ao mesmo tempo, a estrutura de manu-
Em 1920, o Congresso aprovou uma série tenção era escassa. Apesar de alguns ofi-
de medidas para ampliar o orçamento da ciais serem treinados no exterior, não havia

3
LINHARES (1971, p. 7).
4
COSTA (1996, p. 87).

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A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

pessoal, nem peças fabricadas no Brasil. A Savoia entrariam em operação duas vezes
oficina da manutenção, estruturada na Es- durante a Revolução de 1932.
cola Naval, foi transferida para a Praia do Até 1932, os pilotos eram treinados na
Galeão, mas carecia de recursos para insta- sua especialidade (bombardeio, caça e pa-
lar os equipamentos adquiridos. trulha naval). Os pilotos passaram a realizar
A aviação naval sofreu um golpe com o mais raides (missões) conjuntas e noturnas,
levante paulista de 1924 e com o levante e foi formada uma Reserva Aérea de pilotos.
tenentista, pois seu principal e mais desta- Entre 1931 e 1938, foram brevetados 48 pilo-
cado líder, Capitão de Mar e Guerra tos e mais 51 da reserva ativa. O fato signifi-
Protógenes Pereira Guimarães, apoiou a cativo foi que, com a expansão, veio a ne-
revolta e foi preso após articular uma cons- cessidade de montar uma estrutura de apoio
piração de oficiais no Distrito Federal. A adequada. Na administração de Protógenes,
organização da aviação sofreu uma parali- a estrutura operacional cresceu, e pouco a
sia solvida apenas em 1930. de manutenção.
“A Revolução (de Desse modo, a Ma-
1930) encontrou a rinha decidiu pela
aviação naval des- O Coronel do Exército construção de um con-
provida de organi- Antônio Guedes Muniz era junto de novas ofici-
zação, sem pessoal nas. Porém essa inicia-
e material, com seus engenheiro graduado na tiva refletiu um amplo
postos de comando École Nationale Supérieure debate político e ideo-
entregues a oficiais
leigos em aviação,
de l’Aéronautique (Ensa) e lógico que circundou o
futuro da indústria ae-
reinando o desâni- foi o idealizador do ronáutica nacional.
mo como fruto ime- primeiro avião de desenho
diato da inércia ad- Parâmetros
ministrativa.”5 nacional, o M-5 (Muniz-5) tecnológicos
A Revolução de 1930 e a Revolução Em 1934, foi realizado I Congresso de
Constitucionalista de 1932 reavivaram a avi- Aeronáutica Nacional, em São Paulo. Reu-
ação militar, que participou ativamente nos nindo entusiastas, acadêmicos e
conflitos – ainda que a aviação naval com incentivadores da nova indústria, além de
meios escassos. Protógenes foi trazido da representantes de agências de governo,
reserva como almirante e nomeado ministro ficou evidente que duas propostas genéri-
da Marinha (1931-1935). Em 3 de outubro de cas se colocavam à mesa para o futuro da
1931, foi criado o Corpo de Aviação da Ma- indústria aeronáutica, ambas desenvolvi-
rinha e o Quadro de Aviadores Navais. Em das no seio do Estado.
1932 são incorporados cinco bombardeiros A “perspectiva centralista” era defen-
italianos de longo alcance, aeroboats dida pelo coronel aviador do Exército An-
Savoia MS 55, e, progressivamente, uma tônio Guedes Muniz, que advogava a cons-
coleção de aparelhos de várias origens6. Os trução de grandes fábricas nacionais sob
5
Relatório do ministro da Marinha (Almirante Protógenes Guimarães), Ano de Referência 1931, Balan-
ço. SDGM, Ilha das Cobras, RJ.
6
Em 1933, a aeronáutica naval operava 83 aviões das seguintes procedências: Itália, EUA, Reino Unido
e França. (LINHARES, p. 71).

116 RMB1 oT/2012


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

um grande órgão gestor e de fomento da cava a prática corrente de primeiro se


nascente indústria de aviação. Muniz era importar maquinaria sofisticada e se
engenheiro graduado na École Nationale construir fábricas grandiosas. Recomen-
Supérieure de l’Aéronautique (Ensa) e foi dava, enfim, o apoio à pesquisa, o envio
o idealizador do primeiro avião de desenho de estudantes ao exterior e o estabele-
nacional, o M-5 (Muniz-5). O coronel avia- cimento de cursos especializados.”7
dor parece ter sido de grande influência,
pois, em 1935, o Ministério da Guerra (Exér- Ele citava como exemplo o caso japonês
cito), onde ele estava lotado, ordenou o ao afirmar que a prioridade deveria ser o
financiamento da fábrica de Henrique envio de estudantes ao exterior, e depois a
Lages para que se construísse um protóti- montagem de estruturas industriais.
po, o M-7. O império do Japão, sem nenhuma tradi-
A “visão da Marinha”, se é que pode- ção industrial até a segunda metade do
mos assim chamar, foi propugnada pelo século XIX, deu significativos saltos de
Capitão de Fragata Raymundo Vasconce- inovação e, com um parque industrial inici-
los de Aboim, uma legenda na aeronáutica al bem inferior ao Brasil, nos 40 anos desde
naval. Em 15 de agosto de 1919, realizou o a Revolução Meiji (1867), tornou-se uma
voo pioneiro do Correio Aéreo da Esqua- potência industrial média em vias de ex-
dra, inaugurando o serviço criado pela pansão. A indústria naval japonesa pas-
Marinha naquele mesmo ano. Graduou-se sou de compradora, principalmente de es-
em 11 de fevereiro de 1920. Em 1922, foi taleiros ingleses, a construtora já na déca-
enviado à Inglaterra para o curso de pós- da de 1890, valendo-se de modelo que in-
graduação em Engenharia Aeronáutica no fluiu em Aboim.
Imperial College of Science and Em 1935, repetia os mesmos resultados
Technology, tornando-se o primeiro enge- com a aviação. Organicamente distribuída nas
nheiro aeronáutico sul-americano. Exerceu duas forças, Marinha e Exército, a aviação
inúmeros cargos, e em 1934 era diretor de japonesa era tocada por fábricas fundadas
Material da Aviação Naval, cargo que ocu- por engenheiros como Nakajima (que foi avi-
para desde 1928. ador naval), Aichi e Mitsubishi, que estuda-
Aboim defendia o investimento primei- ram no Ocidente e implementaram plantas
ro em capacitação de pessoal, recomendan- com proteção estatal, primeiro copiando de-
do o apoio à pesquisa básica (P&D), antes senhos e trazendo protótipos e aparelhos do
de compra de equipamentos e construção exterior – principalmente dos EUA – para,
de fábricas. após uma certa engenharia reversa, implan-
“Defendia o envio de pessoal ao exteri- tar modelos novos e nacionais: os NB5 Kate,
or para obter treinamento tecnológico e M-5 e M-6 Zero, e Aichi D3A1 Val.
formar uma mentalidade capaz de dirigir O interessante é que não havia diver-
a organização da futura indústria no gências sobre a necessidade de um órgão
País, reconhecia plenamente a importân- central para a indústria aeronáutica, ainda
cia da pesquisa e do desenvolvimento que as concepções fossem claramente di-
previamente à implantação da indústria, vergentes. O modelo de Aboim advogava
citando a experiência japonesa, e criti- por laboratórios estatais, ou de fomento

7
BOTELHO (1999, p. 41).

RMB1 o T/2012 117


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

estatal, além de incentivar as escolas poli- cepção industrial, originadas de insulamento


técnicas de engenharia existentes, enquan- burocrático de agências de pesquisa locali-
to Muniz defendia o uso da expertise naci- zadas nas estruturas militares.
onal que havia no setor produtivo privado
e que apenas necessitava de financiamen- MONTADORA DO GALEÃO
to central e aprimoramento.
Entusiasta da aviação, Getúlio Vargas faz Quando o Almirante Guilhem assumiu o
seu primeiro voo em 1929, no trajeto entre ministério da Marinha, em 1935, substituindo
Rio de Janeiro e Porto Alegre, a bordo do Protógenes, eleito para o governo do Estado
Atlântico, o primeiro avião a voar comerci- do Rio de Janeiro, manteve Raymundo
almente no Brasil e que pertence ao sindica- Vasconcellos de Aboim à frente da Diretoria
to Condor. Na ocasião, o trajeto pelo ar en- de Material da Aviação Naval. A frota aérea da
tre esses dois Estados era feito em oito ho- Marinha havia crescido muito, porém enfren-
ras, contra quatro dias tava problemas de per-
de navio. Na época, já das e de falta de sobres-
existia a preocupação Em junho de 1936 era salentes e pessoal trei-
na formulação de uma nado8. Aboim chefiou
política nacional de
lançada a pedra um grupo que esteve
aviação, inclusive com fundamental das Oficinas nos EUA para viabilizar
uma legislação em que Gerais da Aviação Naval, a construção de ofici-
ficava estabelecido nas de manutenção e o
que os serviços do- na Praia do Galeão. A obra envio de técnicos para
mésticos deviam ser foi realizada pelas o treinamento de pesso-
operados por compa- al. A missão retornou
nhias sediadas no País.
indústrias de Henrique sem resultados.
O governo Vargas, Lage, que atuava como Nessa época, o Pro-
como era típico da po- procurador da Focke Wulf grama de Reapare-
lítica conciliatória e lhamento da Marinha
clientelista do seu no Brasil (Programa Naval de
“Estado de compro- 1932) estava a pleno
missos”, permitia a competição entre as es- vapor. O Almirante Antônio Augusto
truturas burocráticas, nesse caso entre os Schortz estava no comando da aviação na-
ministérios da Guerra, da Marinha e da In- val e fazia contatos com Eric Lange, que era
dústria, Viação e Obras Públicas, pela de- genro de um dos engenheiros estrangeiros
terminação do modelo de indústria aero- do programa, e trabalhava na fábrica Focke
náutica. Seu objetivo era, sem dúvida, uma Wulf. Em 1936, Aboim foi enviado, a convite
grande estrutra gestora, mas para a avia- dos alemães, para conhecer as facilidades
ção civil, de preferência de composição da fábrica em Bremen. Fabricante de aviões
mista (civil/militar). treinadores e de pequeno transporte, a Wulf
Assim, as fábricas militares de aviões estava em plena expansão desde a ascen-
surgiram por necessidades diversas, mas são do nazismo e tinha vários modelos de
espelhando modelos particulares de con- produção e experimentais. Aboim pretendia

8
Em 1935, dos 143 aviões da Marinha (o Exército tinha 553), 60 estavam imobilizados por falta de
mecânicos, sobressalentes e oficinas (SILVA, 1996, p. 55).

118 RMB1 oT/2012


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

negociar a instalação de uma oficina de ma- montar e treinar o pessoal da fábrica. Já


nutenção de aviões e, a longo prazo, obter em 1936 foi criado o Curso de Aprendiz de
licenças para a produção de aeronaves com Operário, que, na sua fase inicial, formaria
alguma transferência tecnológica. todas as especialidades da construção
Em junho de 1936 era lançada a pedra dos aviões, excetuando instrumentos de
fundamental das Oficinas Gerais da Avia- precisão e armas: torneiro mecânico, sol-
ção Naval, na Praia do Galeão. A obra foi dador, carpintaria especializada, chapea-
realizada pelas indústrias de Henrique mento, serralheria, ajustagem, montagem,
Lage, que atuava como procurador da pintura, fuselagem, funilaria, montagem
Focke Wulf no Brasil. Apesar de finalizada parcial, ferramentaria, ferreiro, instrumen-
em 1939, os primeiros protótipos foram tos, eletricidade, delineamento, hélices,
montados um ano antes nas oficinas já fundição, inspeção parcial e geral e o
completadas. almoxarifado.
A Fábrica do Galeão, que inicialmente Cada seção de produção estaria sob a
faria apenas reparos, teria 19 mil metros qua- supervisão de engenheiros alemães e bra-
drados de área cons- sileiros, que também
truída e seria o incu- eram treinados. A pri-
bador de um curioso meira turma de 1937
processo de reorgani- Foram fabricados 25 contava com 75 alu-
zação. O convênio aparelhos pela Fábrica do nos, selecionados pe-
com Focke Wulf
Flugzeugbau em 1936
Galeão, entre 1938 e 1942. los alemães entre 200
voluntários. Na mes-
não apenas previa a Duas séries do aparelho 2 ma época, a Diretoria
venda, mas também a FG (designação nacional Geral de Material de
montagem, sob licen- Aviação recebeu a au-
ça, de quatro modelos Fw-44j) se sucederam torização do ministro
de aviões alemães: Guilhem para um con-
Focke Wulf-44 e Focke Wulf-56, de treina- trato de mais 40 FW-58.
mento; Focke Wulf-58, de bombardeio; e o Os primeiros Focke Wulf-44j cons-
gigantesco quadrimotor de transporte FW truídos no Galeão, denominados aqui de
200 Condor. O empreendimento era extra- Pintassilgos, saíram da linha de montagem
ordinário para um país como o Brasil, por em 1938, seguidos dos FW-58.
diversos aspectos. “Após a montagem dos dez primeiros,
“Faltava tudo no Brasil: não havia a aviação naval iniciou a construção de
torneiros mecânicos em número sufici- uma segunda série de 15 aviões idênti-
ente, existiam poucos carpinteiros com cos aos da série anterior”.10
habilidade e praticamente nenhum sol-
dador capaz de fazer a delicada solda de Foram fabricados 25 aparelhos pela Fá-
peças de alumínio.”9 brica do Galeão, entre 1938 e 1942. Duas
séries do aparelho 2 FG (designação naci-
O “modelo Aboim” entrou em prática. onal FW-44j) se sucederam. A primeira, de
Técnicos alemães viriam ao Brasil para dez aeronaves, incorporou poucos compo-

9
SILVA (1996, p. 57).
10
SILVA (1996, p. 61).

RMB1 o T/2012 119


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

nentes de fabricação local. A segunda, de quisas Tecnológicas (IPT) em São Paulo e


15 aeronaves, produzidas entre 1940 e 1942, do Instituto Nacional de Tecnologia (INT)
apresentou maior índice de nacionalização, no Rio de Janeiro, para ambos os casos a
empregando estruturas das asas, freios, falta de uma política de educação
pneus, hélices, telas e contraplacados (es- tecnológica foi um dos pontos de estran-
truturas em madeira compensada) nacio- gulamento à frente da experiência aeronáu-
nais. Os aparelhos 2 FG eram dotados de tica brasileira nessa fase.
motores Argus alemães de 240 cavalos e Apesar do sucesso da aviação naval,
levavam quatro tripulantes em missões de pelo menos como implantação de serviço,
combate. Pretendia-se que fossem fabrica- o debate da aviação no Brasil caminhou
dos sob licença no País. para longe de uma aviação embarcada. Em
A organização de adestramento também 20 anos da sua implantação, não existiam
sofreu impacto da expansão. Foram forma- aviões a bordo das belonaves, nem mesmo
das sucessivamente duas esquadrilhas de nas maiores. É claro que o emprego natural
treinamento avançado: a 1a Esquadrilha de seria o do navio-aeródromo, mesmo que
Adestramento Militar, fosse um de escolta.
em 1938, operando já Porém, mesmo nessas
com os Focke Wulf-44 O EMA, sem estrutura ou dimensões, navios de
bimotor da oficina do decolagem horizontal
Galeão, para treino de burocracia montadas, a eram de custo elevado
patrulha e bombar- não ser uma série de de operação e manu-
deio; e a 2a Esquadri- tenção. Na Marinha do
lha de Adestramento, oficiais antigos, deitou um Brasil, esse debate
em 1939, com aviões parecer sobre o futuro das não passou do nível
North-American NA- operações navais que teórico.
46, monomotor Apesar de vários
biposto (dois lugares liquidava com o argumento líderes da reforma na-
escalonados) para por uma aviação naval val do período Vargas
missões de tiro de serem também expo-
combate (caça). entes da aviação,
como Protógenes e Aboim, a cultura da
O DEBATE DA AVIAÇÃO NAVAL E aviação não ganhou as hostes de todo o
O FIM oficialato. O Ministério da Aeronáutica
estava na rua com vários defensores de
Como se notou de imediato, a Marinha peso, como Virgínius De Lamare, um dos
obteve o melhor resultado em relação ao pilotos brasileiros que estagiou na Força
Exército, que, com a Fábrica de Lagoa San- Aérea Real (RAF), em 1918, em plena Pri-
ta (MG) pretendia realizar o mesmo feito meira Guerra Mundial. Advogava-se por
que o da fábrica do Galeão, usando aviões um grande Ministério do Ar, aos moldes
dos EUA, os NA-T6. Porém, quando da britânicos, com a unificação de todos os
criação do Ministério da Aeronáutica, nem serviços, mesmo os embarcados, sob au-
montadora a “fábrica” era. A Marinha in- toridade única.
vestiu logo no preparo de pessoal, mesmo Nesse contexto, a ideia teve a colabora-
quando havia escassez de recursos. E, ção insuspeita de quem deveria advogar
mesmo com a presença do Instituto de Pes- pela manutenção de uma força embarcada

120 RMB1 oT/2012


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

e sua evolução, o Estado-Maior da Arma- “Não, esta não é a minha opinião! A se-
da (EMA). meadura da desconfiança começou nos
O EMA, à época, muito se assemelhava meados da década dos anos 20 e, pela
ao Gunji-Senji-In (Conselho Supremo Mili- não absorção da nova arma por parte
tar) do Japão. Não tinha qualquer função do ambiente naval brasileiro, os cami-
diretiva no planejamento naval, a não ser nhos foram se afastando.”11
aconselhar e assessorar nas operações em
caso de guerra, e influía na Escola de Guer- A “perda” da Fábrica do Galeão para o
ra Naval – que na época era localizada em novo Ministério da Aeronáutica (1941) foi
algumas salas no prédio do Ministério da interrupção de uma mudança corporativa
Marinha. Sem estrutura ou burocracia mon- importante para a evolução da pesquisa e
tadas, a não ser uma série de oficiais anti- da inovação navais. Tirante o debate so-
gos, deitou um parecer sobre o futuro das bre os benefícios ou não para a pesquisa e
operações navais que liquidava com o ar- a indústria aeronáutica, a Marinha ficou
gumento por uma aviação naval: desprovida de um instrumento de autono-
“Este plano de operações da Marinha mia militar e importante laboratório de ex-
indica que não carecemos de navios- perimentos. A experiência da fábrica foi li-
aeródromos. A aviação que necessita- mitada por conta da duplicidade de esfor-
mos para a realização de nossas opera- ços – a insistência com a fábrica de Lagoa
ções navais não precisa ter como base Santa – e a falta de interesse do governo
o navio-aeródromo; com maiores van- em “dar um passo” adiante no modelo, “per-
tagens táticas e estratégicas consoan- dendo-se” a chance de absorver a expertise
tes com o caráter de nossas operações, germânica. Entretanto, não seria a concep-
ficará a Aviação Naval localizada em ção de Muniz e de seus adeptos no Minis-
bases terrestres no litoral.” (Parecer do tério da Guerra que prevaleceria.
EMA sobre a criação do Ministério da Em 1941, as funções de pesquisa e pro-
Aeronáutica, 1940) dução aglutinadas no Ministério da Guer-
Evidente que a criação do Ministério da ra foram separadas. Foi criada uma Direto-
Aeronáutica se deveu menos à subserviên- ria de Material para a nova pasta, e a ela
cia de certas lideranças navais ante o poder subordinada a Subdiretoria de Técnica Ae-
instalado da ditadura varguista desde 1937 ronáutica (STA), sendo Muniz exonerado
– que inclusive caçou o mandato de da sua função*. Em 1942, foi fechada a Es-
Protógenes de governador do Rio de Janei- cola Técnica do Exército (ETE), de 1939,
ro – do que às injunções de política externa que funcionava como uma pós-graduação.
(aliança com os EUA) e interna (redistribuir Aboim foi transferido para a Aeronáutica,
as bases do apoio político-militar). Em seu onde desempenhou várias missões de au-
depoimento a respeito da surpresa e contra- ditoria e avaliação – inclusive da Fábrica
riedade do meio naval pela centralização da da Lagoa –, até ser nomeado diretor-geral
Aeronáutica e a perda dos aviões, o Almi- de Material da Aviação (1946-1951).
rante de Esquadra Oliveira, um dos primei- O Centro Técnico Aeroespacial (1945) e
ros aviadores navais, registrou: o Instituto de Tecnologia da Aeronáutica

11
OLIVEIRA (1996, p. 33-34).
* N.R.: O Coronel Antonio Guedes Muniz foi transferido para o Ministério da Aeronáutica, chegando ao
posto de Tenente-Brigadeiro.

RMB1 o T/2012 121


A P&D NA MARINHA DO BRASIL: O ELO PERDIDO

(ITA), de 1950, inspiração de esforço de 1934 de que, antes de uma grande indús-
Casimiro Montenegro Filho e seus cole- tria nacional, deveriam vir pesquisa e pes-
gas da extinta ETE, mesmo que mirando na quisadores. Seria do Instituto Tecnológico
experiência do Massachusetts Institute of da Aeronáutica (ITA), 15 anos depois, o
Technology (MIT), estavam consoante as projeto de uma empresa nacional de avi-
ideias de Raymundo Aboim publicadas em ões que redundaria na Embraer, em 1969.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<CIÊNCIA E TECNOLOGIA>; Ciência e Tecnologia na Marinha; Aviação; Pesquisa; Mis-
são das Forças Armadas;

BIBLIOGRAFIA

BOTELHO, Antonio José Junqueira. Da Utopia Tecnológica aos Desafios da Política Científica e
Tecnológica: O Instituto Tecnológico da Aeronáutica (1947-1967), Anpocs, Revista Brasilei-
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___________ “A Marinha na Era Vargas”, RJ, Revista Marítima Brasileira, v. 110, 1/3, jan-mar 1990,
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no 7/9, jul-set, 1996, p. 55-62.

122 RMB1 oT/2012


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS
CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO
DE EMBARCAÇÕES*

JOÃO CESAR SOARES


Engenheiro
ISAAC JOSÉ ANTONIO LUQUETTI DOS SANTOS
Engenheiro

SUMÁRIO

Introdução
Trabalho em espaços confinados
Estrutura metodológica
Resultados
Identificação dos serviços realizados em
espaços confinados
Identificação do serviço em espaço confinado com maior
risco para a segurança dos trabalhadores
Análise do trabalho no ambiente confinado
Identificação dos trabalhadores envolvidos na
edificação dos blocos
Análise das atividades dos trabalhadores em espaço
confinado
Identificação das potenciais ações humanas não seguras
Considerações finais

INTRODUÇÃO trução das primeiras embarcações, deno-


minadas bergantins. O Arsenal de Marinha

A construção naval foi uma das primei-


ras atividades desenvolvidas no terri-
tório brasileiro. Em 1531 registra-se a cons-
da Bahia, fundado por Tomé de Souza,
construiu os maiores navios de guerra de
seu tempo. Em 1670, foi construída no Rio

* O título original do artigo é “Método para identificação dos fatores que influenciam na segurança do
trabalho em espaços confinados: Estudo de caso na construção de embarcações”. Os autores estão
fazendo o mestrado no Programa de Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

de Janeiro a maior nau da época, denomi- ção do petróleo e da nova política governa-
nada Pai Eterno. mental, acontece a retomada do crescimento
Ao longo da história, o transporte maríti- da indústria naval. Nesse novo cenário de
mo tem sido de vital importância para o co- crescimento, novas frentes de trabalho fo-
mércio mundial. Atualmente, movimenta em ram geradas, dando oportunidade a uma gran-
torno de 75% das mercadorias do planeta. de massa de trabalhadores de retornar às ati-
No Brasil, em torno de 95% das exportações vidades e a outros de ingressar nesse novo
são realizadas por via marítima. Tal fato se mercado de trabalho. Com isso, se intensifi-
dá pelo baixo custo do transporte marítimo cam os riscos associados ao trabalho de cons-
agregado ao produto final e pela boa trução, reformas e modernização dessas em-
navegabilidade existente em nosso país. barcações, principalmente com relação ao tra-
Ao ápice atingido na década de 70, quan- balho em espaços confinados.
do a construção naval contava com uma força Dessa forma, atendendo à nova deman-
de trabalho de 160 mil trabalhadores, entre di- da do mercado, foi publicada em 21 de janei-
retos e indiretos, seguiu-se um acentuado ro de 2011, no Diário Oficial da União (DOU),
declínio na década posterior, que resultou no a Portaria no 200, que aprova a Norma
fechamento de muitos estaleiros e Regulamentadora no 34 (Condições e Meio
sucateamento do parque fabril no início dos Ambiente de Trabalho na Indústria da Cons-
anos 90. As descobertas de petróleo na Bacia trução e Reparação Naval), a qual estabele-
de Campos, no final da década de 70, que ce os requisitos mínimos e as medidas de
alavancou a produção brasileira de 200 mil proteção à segurança, à saúde e ao meio
barris diários para mais de 2 milhões de barris ambiente de trabalho nas atividades da in-
em 2008, deu novo fôlego à indústria naval. O dústria de construção e reparação naval. Um
parque industrial existente foi remodelado no fato relevante, que difere de outras normas,
final da década de 90 para atender à constru- é que são consideradas atividades da in-
ção de plataformas de petróleo e navios de dústria da construção e reparação naval to-
apoio marítimo. A indústria naval hoje gera das aquelas desenvolvidas no âmbito das
aproximadamente 230 mil empregos diretos e instalações empregadas para este fim ou nas
indiretos, detém uma carteira de encomendas próprias embarcações e estruturas, tais como
invejável e um futuro ainda mais promissor navios, barcos, lanchas, plataformas fixas
com as descobertas de petróleo abaixo da ca- ou flutuantes, entre outras.
mada salina, atraindo investimentos vultosos, Apesar da existência das normas e proce-
com a construção de novos estaleiros, alguns dimentos de segurança, sua efetiva
já em operações, assim como a revitalização implementação, pelo menos nos estaleiros,
de antigos estaleiros sucateados. tem enfrentado uma série de dificuldades e
A nova política governamental, a partir resistências tanto pelo empregador e por con-
dos programas Promef I e Promef II, tem tratados como pelos próprios trabalhadores.
alavancado as encomendas e, consequen- Recentemente, acidentes fatais ocorreram
temente, incentivado a construção de novas dentro de espaços confinados. Diversos fato-
embarcações (petroleiros, porta-contêineres, res contribuíram para a ocorrência desses
graneleiros, plataformas petrolíferas, barcos eventos, tais como negligência, erros huma-
de apoio, navios de pesquisa, barcos pes- nos e violação de normas e dos procedimen-
queiros, barcos patrulha, submarinos etc.). tos de segurança. Com o crescimento da cons-
Como consequência, por esses constantes trução naval e o consequente aumento dos
incrementos do tráfego marítimo, da explora- trabalhos em espaços confinados, torna-se

124 RMB1 oT/2012


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

imperativa uma análise mais criteriosa desses TRABALHO EM ESPAÇOS


acidentes e a identificação dos fatores que CONFINADOS
contribuem para a deterioração da segurança
e das condições de trabalho neste setor. Segundo a Norma Regulamentadora NR
A segurança no trabalho aborda a pre- 33 (2006), espaço confinado é qualquer área
servação da vida e a saúde dos trabalha- ou ambiente não projetado para ocupação
dores, sendo uma aliada nos cuidados com humana contínua, que possua meios limi-
o meio ambiente. Um dos grandes proble- tados de entrada e saída, cuja ventilação
mas do trabalho em espaços confinados é existente seja insuficiente para remover
que nem todos os trabalhadores sabem contaminantes ou onde possa existir a de-
avaliar corretamente o risco envolvido nas ficiência de oxigênio.
tarefas efetuadas nesse ambiente. A NBR 11.350 (1990) – Controle dos
Nesse cenário em que, apesar da existên- Riscos de Gases e Vapores em Embarca-
cia de normas e procedimentos de segurança ções –, antiga NB 1.214/89, estabelece como
específicos, os acidentes acontecem, é impe- objetivo fixar as condições exigíveis e as
rativo entender o contexto desse setor in- informações mínimas necessárias para exe-
dustrial e analisar a ati- cução de trabalhos
vidade de trabalho em especificamente em
espaços confinados. O A segurança no trabalho espaços sujeitos a
desafio é propor reco-
mendações que impli-
aborda a preservação da concentrações de ga-
ses, vapores ou con-
quem melhorias nas vida e a saúde dos dições perigosas em
condições de trabalho trabalhadores, sendo uma embarcações durante
e diminuam os riscos construção, alteração,
inerentes a esse tipo de aliada nos cuidados com o inspeção, reparo ou
atividade. Alguns prin- meio ambiente desmontagem.
cípios básicos devem A NBR-1.318 (1990)
ser adotados: conhecer – Prevenção de Aci-
os riscos das tarefas a serem executadas; dentes em Espaço Confinado – menciona
conhecer o trabalho a ser feito; conhecer os em seu objetivo as condições exigíveis a
procedimentos e equipamentos de seguran- serem observadas quando da entrada e
ça; receber todos os equipamentos de segu- consequente permanência de pessoas em
rança necessários para a execução da ativi- espaços confinados, de forma a evitar-se
dade; e conhecer os procedimentos e equi- sufocação ou asfixia por deficiência de oxi-
pamentos de resgate e primeiros socorros. gênio, intoxicação por inalação de vapores
A elaboração deste estudo tem como tóxicos, lesões por quedas ou impactos,
objetivo propor um método para identifi- dermatites e/ou doenças por contato com
cação dos fatores que afetam o desempe- produtos químicos perigosos ou explosões
nho dos trabalhadores em espaços confi- por concentração de gases inflamáveis.
nados na construção de embarcações e que A NR 15 (1978) – Atividades e Operações
contribuem para a deterioração das condi- Insalubres – considera trabalhos em ambien-
ções de trabalho. Dessa maneira, será pos- tes confinados como condições perigosas.
sível adotar medidas para eliminar ou con- A NR 18 (1978) – Condições e Meio Am-
trolar os riscos que possam afetar a segu- biente de Trabalho na Indústria da Constru-
rança e saúde desses trabalhadores. ção – determina que para as atividades que

RMB1 o T/2012 125


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

exponham os trabalhadores a riscos de asfi- normas, bem como suas alterações poste-
xia, explosão, intoxicação e doenças do tra- riores, ou seja, as mudanças normativas
balho devem ser adotadas medidas especi- que ocorrerem ao longo do tempo devem
ais de proteção. Menciona, ainda, medidas ser incorporadas como prática legal.
de controle, tais como: treinamento e infor- Com definições muito semelhantes às
mação dos riscos envolvidos, utilização cor- da NBR 14.787, a NR 33 (2006), item 33.1.2,
reta dos equipamentos de proteção indivi- informa que espaço confinado é qualquer
dual (EPIs), inspeção prévia e elaboração área ou ambiente não projetado para ocu-
de ordem de serviço, monitoramento pação humana contínua, que possua mei-
ambiental permanente, ventilação do ambi- os limitados de entrada e saída, cuja venti-
ente atmosférico, sinalização com informa- lação existente é insuficiente para remover
ções claras e permanentes, proibição do uso contaminantes ou onde possa existir a de-
de oxigênio como ventilação e uso de equi- ficiência ou enriquecimento de oxigênio. A
pamento de resgate, entre outras. NR 33 (2006) estabelece em seu objetivo
A Associação Brasileira de Normas Téc- os requisitos mínimos para identificação
nicas (ABNT) revisou, em dezembro de 2001, de espaços confinados e o reconhecimen-
a NBR 14.787 – Prevenção de Acidentes, to, a avaliação, o monitoramento e o con-
Procedimentos e Medidas de Proteção – que trole dos riscos existentes, de forma a ga-
tem como objetivo estabelecer os requisi- rantir permanentemente a segurança e a
tos mínimos para proteção dos trabalhado- saúde dos trabalhadores que interagem
res e do local de trabalho contra os riscos direta ou indiretamente nesses espaços.
de entrada em espaços confinados. Em sua Apesar da existência das normas anteri-
definição, a NBR 14.787 (2001) menciona que ormente mencionadas, por motivos quais-
espaço confinado é qualquer área não pro- quer estas não foram suficientes para alertar
jetada para ocupação contínua, a qual tem empregados e empregadores sobre os ris-
meios limitados de entrada e saída e na qual cos existentes nesses ambientes, evitando
a ventilação existente é insuficiente para re- os acidentes.
mover contaminantes perigosos e/ou efici- Conforme mencionado por Moraes
ência/enriquecimento de oxigênio que pos- Junior (2011), um dos grandes problemas
sam ali existir ou se desenvolver. dos espaços confinados é que nem todas
Em outubro de 2000, foi elaborada a NBR as pessoas sabem como identificá-los, dis-
14.606 – Postos de Serviço – Entrada em tinguindo-os dos demais locais de trabalho
Espaço Confinado –, que estabelece proce- e, principalmente, avaliar o risco envolvido
dimentos de segurança para a entrada em nas tarefas efetuadas nesses ambientes.
espaço confinado em postos de serviço. Para o inexperiente, trabalhar neste ou na-
Neste caso, esta norma é aplicada a entrada quele lugar não faz muita diferença, princi-
em tanque subterrâneo, ou seja, a própria palmente no que diz respeito aos riscos ali
norma menciona que sua aplicação se res- presentes. Uma das questões a serem con-
tringe a tanques instalados no subsolo. sideradas quando se realiza um trabalho em
A NBR 14.787 e a NBR 14.606 são espaço confinado é se ter em mente que,
referenciadas na NR 33, na qual o legisla- embora haja riscos potencialmente eleva-
dor menciona que, nos estabelecimentos dos, estes riscos, por suas características,
onde houver espaços confinados, devem não são notados e nem percebidos pela
ser observadas, de forma complementar à maioria dos trabalhadores, provocando aci-
NR 33, os atos normativos dessas duas dentes, na maioria das vezes fatais.

126 RMB1 oT/2012


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

A NR 33 (2006) estabelece em seu objetivo As médias e pequenas empresas, devido à


os requisitos mínimos para identificação de ausência desse corpo técnico, não conhe-
espaços confinados, o reconhecimento, a ava- cem o mínimo necessário que a legislação
liação, o monitoramento e o controle dos ris- estabelece. Muitas vezes, quando ocorre um
cos existentes, de forma a garantir permanen- acidente fatal, é que vão se deparar com a
temente a segurança e a saúde dos trabalha- real situação e com o problema estabelecido.
dores que interagem direta ou indiretamente É evidente a necessidade de comprometimen-
nesses espaços. A realização de trabalhos em to da alta gerência e do corpo técnico com
espaços confinados em construções de em- uma política de segurança.
barcações, nos últimos anos, tem sido motivo Petit (1979) relata que, em um estudo rea-
de preocupação para lizado pelo National
empresas e instituições Institute Occupational
no Brasil e no mundo. Um dos grandes aliados Safety and Health –
Dessa forma, a primeira dos acidentes ocorridos em Niosh, foram computa-
dificuldade a ser vencida dos mais de 20 mil aci-
é a de desenvolver uma
espaços confinados é a dentes num período de
atividade laboral segu- desinformação. Tanto dos três anos, com 234 mor-
ra em um local inóspito. empregadores como, tes e 193 feridos relaci-
Para a execução dessas onados a 276 acidentes
atividades em um espa- principalmente, dos em espaços confina-
ço confinado e de modo trabalhadores envolvidos dos. Este estudo reve-
a garantir a segurança e la que 60% das vítimas

a saúde dos trabalhado- em espaços confinados
res, faz-se necessária a No Brasil os trabalhadores são resgatadores. Os
adoção de sistemática não estão morrendo apenas supervisores, que apa-
eficaz para identificar os rentemente deveriam
perigos de entrada e exe- por falta de oxigênio, ser os mais informados
cução dos trabalhos, le- inalação de produtos sobre os riscos destes
vando em conta o co- locais, na verdade não
nhecimento dos critéri-
tóxicos, quedas ou são, pois 50% dos aci-
os de preparação, anali- explosões, mas, dentes investigados
sando a atmosfera inter- essencialmente, por falta pelo Niosh envolviam a
na e certificando-se de morte de, no mínimo,
que as condições de se- de informações um supervisor.
gurança, bem como as Vale; Alves (2000)
condições físicas e de saúde do trabalhador, menciona que, para Francisco Kulcsar Neto,
se manterão constantes durante todo o perío- pesquisador da Fundacentro, no Brasil os
do de permanência no local. trabalhadores não estão morrendo apenas
Um dos grandes aliados dos acidentes por falta de oxigênio, inalação de produtos
ocorridos em espaços confinados é a tóxicos, quedas ou explosões, mas, essen-
desinformação. Essa desinformação é tanto cialmente, por falta de informações.
dos empregadores como, principalmente, dos Neto (2007) fortalece esse conceito com
trabalhadores envolvidos. De modo geral, so- seu relato: as pessoas não estão morrendo
mente grandes empresas, por possuírem um apenas pelas causas frequentes atribuídas aos
corpo técnico, têm acesso ao conhecimento. acidentes em espaços confinados – falta de

RMB1 o T/2012 127


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

oxigênio, inalação de produtos tóxicos ou, ain- Neto (2007) acrescenta que são altas as
da, quedas e explosões. Os especialistas são estatísticas sobre mortes de resgatadores, o
unânimes em apontar um fator determinante: a que evidencia também o cenário de total des-
falta de informação sobre os riscos. conhecimento sobre o tema. Estima-se que,
Lima (2007) confirma tal conceito: no Bra- por cada vítima fatal, dois socorristas (pseu-
sil, em linhas gerais, podemos afirmar que a dorresgatadores) morrem tentando salvá-la.
maioria dos trabalhadores desconhece os ris- “Quando o espaço confinado faz uma vítima,
cos provenientes dos trabalhos em espaços logo em seguida fará múltiplas vítimas que
confinados. Não resta dúvida de que a falta de tentarão realizar resgates desastrados, agindo
informação, na maioria das vezes, é motivada emocionalmente e não racionalmente.”
pela ignorância dos próprios empregadores. Além de não terem conhecimento sobre
Garcia (2007) cita um exemplo verídico de os riscos, os socorristas geralmente não
um acidente ocorrido possuem nenhuma
em espaço confinado, aptidão física e mental,
em que fica evidente a O treinamento é indispen- formação, qualifica-
falta de informação das sável, o objetivo é dar con- ção e capacitação nas
pessoas envolvidas. No áreas de salvamento,
Rio Grande do Sul, o dições para que o trabalha- resgate, primeiros so-
dono de um pequeno ar- dor identifique os riscos e corros e reanimação
mazém de benefi- cardiopulmonar. São
ciamento de grãos pediu as medidas de prevenção trabalhadores que
à própria filha, de 10 agem por impulso de
anos, que entrasse no    solidariedade e deci-
local para retirar água. O A informação é, sem dúvi- dem ajudar as vítimas
líquido deveria ser co- que estão nos espa-
locado em um balde que da, a melhor arma no com- ços confinados.
ele puxaria por uma cor- bate aos acidentes Neto (2007) informa
da. “Mas a menina se que essa falta de infor-
negou, e o próprio dono, mação converte peque-
ao fazer o trabalho, acabou morrendo. Isso nos erros em catástrofes. “O desconhecimen-
comprova que há desconhecimento do risco. to gera outro efeito: esses espaços tornam-
Ninguém iria expor um filho se conhecesse se traiçoeiros, pois o trabalhador acha que
essa possibilidade.” não há risco algum em adentrar. Ação sim-
Suruda et al. (1994) mencionam que nos ples, como a entrada para resgatar uma ferra-
Estados Unidos, entre os anos de 1980 e 1988, menta que caiu ou foi esquecida no interior
ocorreram 89 casos de morte em espaço con- do espaço confinado, pode se transformar
finado por ano, e aproximadamente 23 des- numa tragédia.”
sas vítimas eram pessoas tentando realizar Carvalho (2006) nos diz que o treina-
um resgate. Apesar de existirem profissionais mento é também uma área de atuação im-
de serviços de emergência ou segurança pú- portante, em que os trabalhadores são in-
blica capacitados para realizarem resgates formados sobre os riscos inerentes ao tra-
nestes ambientes, esta pesquisa mostrou que balho e sobre as medidas preventivas ne-
as vítimas, na maioria, são os colegas de tra- cessárias. O treinamento objetiva também
balho. A asfixia por falta de oxigênio foi a uma mudança comportamental em relação
principal causa das mortes. à prevenção de acidentes (ação proativa).

128 RMB1 oT/2012


Serrão et al. (2006) relatam que é uma
obrigação legal do empregador informar ao
empregado sobre os riscos inerentes ao lo-
cal de trabalho e sobre as medidas de pre-
venção necessárias para minimizar ou neu-
tralizar a exposição. O treinamento é indis-
pensável, pois o principal objetivo é dar
condições para que o trabalhador identifi- Etapa 8: Identificação das potenciais
que os riscos e as medidas de prevenção e ações humanas não seguras.
informe e desenvolva habilidades referen- Etapa 9: Identificação dos diversos fa-
tes aos procedimentos operacionais apro- tores que têm influência nas potenciais
priados que garantam a eficiência das me- ações humanas não seguras.
didas de controle adotadas. Etapa 10: Desenvolver estratégias de
Na verdade, são poucas as empresas e, prevenção.
consequentemente, os trabalhadores que Etapa 11: Incorporar os resultados obti-
sabem reconhecer um espaço confinado e dos nos procedimentos de segurança e nas
distingui-lo dos demais locais de trabalho, práticas de trabalho.
processo que requer também informação
específica. RESULTADOS
A informação é, sem dúvida, a melhor
Durante a construção de embarcações, os
arma no combate aos acidentes.
seguintes serviços são realizados (figura 1):
ESTRUTURA METODOLÓGICA Identificação dos serviços realizados
em espaços confinados
A metodologia utilizada para alcançar os
Durante o processo construtivo de em-
objetivos pretendidos é constituída das se-
barcações, foram identificados os serviços
guintes etapas, conforme diagrama de blocos.
realizados em espaço confinado:
Etapa 1: Identificação e descrição de um
processo de construção de embarcações. – Serviço 9 (Montagem de Blocos de
Etapa 2: Identificação dos serviços rea- Estrutura)
lizados em espaço confinado. Nesta etapa é executada a soldagem dos
Etapa 3: Confecção de um questionário blocos, promovendo a geração de
para identificação do serviço realizado em particulados (fumos metálicos), que em um
espaço confinado com maior risco para os ambiente confinado torna o risco mais eleva-
trabalhadores. do, devido à ausência de ventilação natural.
Etapa 4: Identificação de um grupo de Eventualmente, riscadores e maçariqueiros
especialistas. podem adentrar no espaço confinado, sendo
Etapa 5: Aplicação do questionário para os riscadores para a marcação da localização
o grupo de especialistas. Análise dos da- de peças metálicas e os maçariqueiros para
dos obtidos. pequenos cortes de ajuste no processo de
Etapa 6: Escolha do serviço em espaço con- montagem, contribuindo com a geração de
finado com maior risco para os trabalhadores. mais particulados. Na finalização dessa ativi-
Etapa 7: Análise do trabalho (atividade) dade, são realizadas inspeção e aprovação
no ambiente confinado: identificação dos final do bloco pelo Controle de Qualidade,
trabalhadores e ferramentas utilizadas. pela Classificadora e pelo Armador.

RMB1 oT/2012 129


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

– Serviço 10 (Tratamento dos Blocos) tados, sempre ajustando o posicionamento


Os blocos provenientes do serviço 9 já por meio dos esticadores mecânicos. Fi-
montados, constituindo um ambiente con- nalmente é realizada a soldagem em todos
finado, são submetidos a jateamento com os locais de contato entre os blocos. No
granalha e pintados com tinta de proteção. decorrer desse serviço, em alguns blocos
Esses serviços geram contaminantes podem ser instalados alguns trechos de
(particulados e vapores orgânicos) aos tra- tubulações de maiores dimensões e unida-
balhadores que ali laboram. des principais. Nesse serviço, a montagem
e a soldagem surgem como fatores de risco
– Serviço 13 (Edificação dos Blocos)
no interior do espaço confinado.
Os blocos que anteriormente receberam
o tratamento são transportados até a em- – Serviço 14 (Montagem de Equipamentos)
barcação, onde serão edificados, ou seja, Nesta etapa são realizadas a montagem e
esses blocos serão emendados em outros a soldagem da rede de tubulações assim como
blocos previamente edificados. Nesse pro- o acabamento final. Também são trabalhadas
cesso contínuo, a embarcação vai se for- a montagem da parte mecânica (motores, ge-
mando. Primeiramente, esses blocos são radores, bombas etc.) e a parte elétrica do
unidos pela fixação de esticadores mecâni- navio (instalações). Os equipamentos neces-
cos, de modo a ajustá-los precisamente na sários à navegação da embarcação são mon-
sua posição final. Posteriormente, são mon- tados e instalados. Os acessórios de casco
Figura 1 – Processo de construção de embarcações são montados e soldados, tais como esca-
das, escotilhas, guarda-corpos, elipses etc.
– Serviço 15 (Pintura de Acabamento)
Nesta etapa são realizados os tratamen-
tos mecânico (lixamento) e químico (solu-
ção de solvente com água), de modo a re-
mover as impurezas depositadas nas super-
fícies metálicas de toda a embarcação. Após
esse tratamento, é aplicada a pintura final.
Somente o fundo da embarcação, tendo em
vista que ela se encontra atracada no cais,
será pintado quando houver a docagem.
Nessa atividade, o acesso dos supervisores
da pintura é feito de forma esporádica.

– Serviço 16 (Teste dos Equipamentos)


São testados todos os equipamentos e sis-
temas instalados em toda a embarcação. Os
equipamentos e ferramentas utilizados nesta
etapa são a cuba de teste (banco de cargas), o
anemômetro, o voltímetro, o amperímetro, o
megôhmetro e ferramentas diversas. Também
são testados os próprios equipamentos das
embarcações, tais como sistema de combate a
incêndio e radares, entre outros.

p. 130 – RMB1oT/2012
SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

Identificação do serviço em espaço decompondo-a em aspectos mensuráveis e


confinado com maior risco para a registráveis da realidade laboral. São elemen-
segurança dos trabalhadores tos observáveis a postura, os deslocamen-
tos dos trabalhadores, atos registráveis que
Tendo em vista a inexistência de estatís- tomam significado no contexto de ações que
ticas de acidentes ocorridos nas atividades reúnem habilidades e conhecimentos numa
laborativas em espaço confinado, foi reali- sequência operatória. Os resultados obti-
zada uma pesquisa com o objetivo de iden- dos geram informações sobre a variabilida-
tificar o serviço nesse ambiente com maior de e sobre as estratégias utilizadas, identifi-
risco para a segurança dos trabalhadores. cando os problemas que afetam o desempe-
Foi aplicado um questionário para um gru- nho dos trabalhadores. Ao iniciar a análise
po de 20 especialistas, sendo que houve o do trabalho, os problemas a serem observa-
retorno de 19 respostas. O grupo de especi- dos são definidos e as observações são
alistas é formado por diferentes profissio- direcionadas, sendo realizada uma filtragem
nais (auditores fiscais, gerentes em SMS, das informações disponíveis. O registro da
engenheiros e técnicos de segurança) que atividade pode ser feito por meio de vídeos,
atuam na área de segurança naval com ex- fotos e gravações das conversas entre os
periência no segmento da construção e re- trabalhadores, facilitando a obtenção de um
paro naval, conhecimento das legislações grande número de informações e permitin-
de segurança, experiência na investigação e do a fusão entre os diálogos, deslocamen-
análise de acidentes, fiscalização nas em- tos, direção do olhar e tomadas de decisão
presas e dos acidentes fatais ocorridos em dos trabalhadores. Posteriormente, esses re-
espaços confinados. A tabela 1 apresenta gistros devem ser explicados pelos resulta-
os resultados obtidos, sendo que o Serviço dos das observações feitas. A análise do
13 (Edificação dos Blocos) foi o escolhido. trabalho mostra a comunicação entre os vá-
rios trabalhadores que exercem sua ativida-
Análise do trabalho no ambiente de em um serviço. O conteúdo dessas infor-
confinado mações constitui uma fonte esclarecedora
da aprendizagem no trabalho e da importân-
A ergonomia aborda a complexidade do cia e contribuição do conhecimento dife-
trabalho por meio da análise da atividade, renciado de cada trabalhador na resolução
de incidentes, revelando aspectos impor-
Tabela 1 – Identificação do serviço em espaço
tantes do coletivo do trabalho.
confinado com maior risco

Serviço com maior risco Percentual Identificação dos trabalhadores envolvidos


em espaço confinado na edificação dos blocos

Serviço 9 10,5% Os seguintes trabalhadores estão en-


volvidos na edificação dos blocos:
Serviço 10 15,8% – Riscador – Esses trabalhadores, utili-
zando-se de suas ferramentas (semitubo,
Serviço 13 42,1% esquadro, prumo, palheta, trena, nível), mar-
ca o posicionamento preciso dos blocos a
Serviço 14 10,5% serem edificados. Os blocos são posiciona-
dos com equipamento de guindaste, seguin-
Serviço 15 21,1%
RMB1oT/2012 – p. 131
Serviço 16 0%
SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

do as marcações elaboradas pelos riscado- do bloco, de modo a viabilizarem o seu corre-


res. Após os blocos serem depositados em to posicionamento no processo de edificação.
seus locais de edificação, os riscadores A tarefa do desempeno pode ocorrer em dois
acessam esse local e verificam se o bloco ali momentos distintos da edificação do bloco.
depositado está em conformidade com o Ao longo do processo construtivo do bloco,
espaço a ele destinado. Caso algum bloco falhas na execução e na armazenagem, ten-
possua excesso de material, os riscadores sões geradas e impactos mecânicos podem
fazem a devida correção, realizando nova ocorrer, gerando empenos no bloco. A essa
marcação no bloco, para que os maça- situação desfavorável, ocasionando um fu-
riqueiros realizem cortes a quente, de modo turo desalinhamento no momento da
a retirarem o excesso do material, ajustando edificação do bloco, o desempenador, com
o bloco. Dessa forma, o bloco está devida- seu trabalho, reposicionará as partes empe-
mente ajustado nas dimensões e pronto para nadas, realinhando-as para uma edificação
ser iniciado o processo de montagem. Por correta. O outro momento se realiza após a
questões construtivas, algumas vezes es- soldagem de todo o bloco, onde também são
sas remarcações são realizadas no interior geradas tensões, que empenam partes desse
do bloco em edificação. bloco. Os desempenadores utilizam
– Maçariqueiro – Estes trabalhadores au- maçaricos diferentes dos de corte, de modo a
xiliam na edificação, ajustando os blocos que executarem essa tarefa.
possuem excesso de material, realizando cor- – Encanador – Esses trabalhadores mon-
tes a quente, de modo a retirarem esse ex- tam as tubulações, conferindo as dimensões
cesso, viabilizando o posicionamento pre- e inclinações, conforme especificações em
ciso. Eventualmente, auxiliam pelo mesmo projeto. Nas tubulações metálicas, a monta-
motivo os encanadores, ajustando as redes gem consiste em pontos de solda, realizadas
de tubulações realizadas nesta etapa. Ainda pelo encanador, de forma a garantir a sua es-
neste processo, auxiliam na execução dos tabilização temporária. Nesse cenário, as fi-
serviços de corte a quente na montagem de xações nos suportes são realizadas pelo en-
unidades especiais. canador, pois fazem parte do processo de
– Chapeador – São os trabalhadores que montagem. Nas tubulações de fibra de vidro,
executam a montagem dos blocos, alinhando- tanto a montagem quanto a soldagem, reali-
os, fixando-os e soldando-os. Após os blocos zadas por um processo químico, são execu-
estarem posicionados nos locais predetermi- tadas pelo encanador, pois se trata de um
nados de edificação, suportes metálicos, processo muito específico da tubulação. De
esticadores, pequenas barras metálicas e uma forma geral, as partes das tubulações
cunhas são colocados de modo a viabilizarem estão previamente prontas quando da sua
pequenos ajustes no posicionamento desses instalação, ou seja, as mesmas chegam ao
blocos. Os chapeadores, sob a orientação pré- local da edificação dos blocos com os flanges
via dos riscadores, soldam suportes metáli- e luvas colocados, necessitando apenas fixá-
cos, permitindo a fixação dos esticadores. Os las em seus suportes (pré-montadas). Essas
esticadores, por meio de seu movimento tubulações, em sua maioria, têm presença no
rotacional, deslocam parte do bloco, interior de um espaço confinado, o que resul-
posicionando-o, precisamente e definitivamen- ta na exposição desses trabalhadores a um
te, em seu local de edificação. confinamen-to na execução de suas tarefas.
– Desempenador – São os trabalhadores – Soldador – São os trabalhadores que exe-
que executam a tarefa de desempenar partes cutam os serviços de soldagem, sejam eles

132 RMB1 oT/2012


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

realizados nas chapas ou tubulações metáli- zadas pelos trabalhadores envolvidos no ser-
cas. Após a conclusão dos serviços de mon- viço de edificação de blocos. Posteriormente,
tagem, os soldadores adentram nos espaços serão identificados e avaliados os potenciais
confinados executando os serviços de solda. modos de falhas humanas e os respectivos
O serviço de solda, principalmente os realiza- efeitos gerados por esses modos de falha. Na
dos em espaço confinado, devido à geração última fase serão identificadas estratégias de
de contaminantes e radiações, é de extremo melhorias para cada modo de falha e respecti-
risco à saúde e segurança do trabalhador, po- vas medidas corretivas. A tabela 2 apresenta a
dendo ocasionar graves doenças e acidentes, estrutura a ser utilizada nesta fase.
caso não sejam elaboradas as medidas pre-
ventivas de controle à situação dos riscos.
– Rebarbador/esmerilhador – São os tra-
balhadores que, por meio dos seus equi-
pamentos rotativos de esmerilhamento, re-
tiram as rebarbas das peças metálicas e tra-
tam mecanicamente as soldas. As rebarbas
surgem após a execução do serviço de cor-
te a quente, em que a peça metálica cortada
apresenta irregularidades em suas superfí-
cies, prejudicando a boa solda. Após a exe-
cução do serviço de soldagem, o Fig. 2 – Soldador gerando contaminantes no
esmerilhamento retira os excessos de sol- processo de soldagem
da e eventuais porosidades, dando um bom
acabamento na superfície soldada.
Análise das atividades dos trabalhadores
em espaço confinado
Para analisar a atividade dos trabalhadores
em espaço confinado, estão sendo realizadas
observações sistemáticas do trabalho feito
pelos riscadores, maçariqueiros, chapeadores,
desempenadores, encanadores, soldadores e
rebarbadores/esmerilhadores. A figura 2 apre- Fig. 3 – Corte com maçarico no interior do
senta um soldador gerando contaminantes no espaço confinado
processo de soldagem. A figura 3 mostra a
utilização de um maçarico dentro de um espa-
ço confinado, e a figura 4, a postura inadequa-
da de um trabalhador, realizando a sua ativida-
de laborativa, no espaço confinado.

Identificação das potenciais ações


humanas não seguras

Nesta etapa serão identificadas as tarefas


críticas e respectivas ações de alto risco reali- Fig. 4 – Postura inadequada de um trabalhador

RMB1 o T/2012 133


Descrição das Potenciais Descrição das Oportunidades de Modos de redução Fatores que
etapas das falhas consequências recuperação das falhas humanas afetam o
tarefas humanas dos riscos desempenho
críticas humano
(AHT) (FADs)

Tabela 2 – Estrutura para identificação das tarefas críticas e ações humanas não seguras

CONSIDERAÇÕES FINAIS da intensidade do acidente, um trabalha-


dor poderá ajudar outro trabalhador a sair
A segurança no trabalho aborda a preser- do espaço confinado. Poderá, ainda, em
vação da vida e a saúde dos trabalhadores, condições de maior severidade, informar
sendo uma aliada nos cuidados com o meio ao vigia. Enfim, poderá providenciar medi-
ambiente. Um dos grandes problemas do tra- das de atendimento ao acidentado, impri-
balho em espaços confinados é que nem to- mindo maior eficiência e eficácia;
dos os trabalhadores sabem avaliar correta- – o supervisor, antes do início das ativi-
mente o risco envolvido nos trabalhos dades, deverá reunir todos os envolvidos
efetuados neste ambiente. Neste cenário, em e garantir informações atualizadas sobre
que apesar da existência de normas e procedi- os riscos e as medidas de controle, ou seja,
mentos de segurança específicos, os aciden- informar sobre o trabalho a ser executado e
tes acontecem, é imperativo entender o con- seus riscos;
texto desse setor industrial e analisar a ativi- – colocar, na entrada do espaço confina-
dade de trabalho em espaços confinados. Al- do, a plaqueta de identificação, ou crachá
guns princípios básicos devem ser adotados: de identificação, ou qualquer outra identifi-
– antes da entrada dos trabalhadores nos cação, de modo a informar que existem cola-
espaços confinados, avaliar os índices de boradores trabalhando em seu interior. Ao
inflamabilidade, toxicidade e oxigenação; sair, mesmo que temporariamente, retire a
– independentemente dos resultados identificação e informe ao seu vigia. Essa
obtidos na avaliação ambiental atmosféri- medida preventiva de grande importância
ca, ventilar, exaustar e iluminar os espaços tem por objetivo proporcionar a exatidão do
confinados; número de trabalhadores ingressos no inte-
– somente trabalhadores capacitados e rior do espaço confinado. No caso de um
autorizados podem adentrar em espaços acidente, é de vital importância para a retira-
confinados, ou seja, trabalhadores que ti- da de todos os trabalhadores, evitando a
veram a capacitação, em conformidade com exposição desnecessária da equipe de res-
o treinamento da NR 33, e que tenham au- gate aos perigos do acidente;
torização formal; – uso correto dos EPIs e dos equipa-
– em hipótese alguma é permitida a en- mentos de proteção coletiva (EPCs). É obri-
trada em espaços confinados e a realização gatória a utilização de equipamentos de
de qualquer tipo de trabalho nesses locais proteção individual, levando em conside-
sem a Permissão de Entrada e Trabalho; ração a natureza do risco da atividade
– não é permitido o trabalho individual laborativa. Muitas das vezes, os EPIs são
em espaços confinados. De certa forma, a diferença entre a vida e a morte. Manter
esse procedimento minimiza os perigos, na em funcionamento os EPCs, de modo a evi-
medida em que, dependendo da origem e tar a formação de atmosferas explosivas e

134 RMB1 o T/2012


SEGURANÇA DO TRABALHO EM ESPAÇOS CONFINADOS: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES

remover os contaminantes. É de vital im- tos de segurança e do uso correto dos equi-
portância a divulgação dos procedimen- pamentos de resgate e primeiros socorros.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<ADMINISTRAÇÃO>; Precauções de segurança; Gerência; Construção naval;

REFERÊNCIAS

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Acidentes em Espaço Confinado. 1990. Rio de Janeiro.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT. NBR 11.350 – Controle dos
Riscos de Gases e Vapores em Embarcações. 1990. Rio de Janeiro.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT. NBR 14.606 – Postos de
Serviço – Entrada em Espaço Confinado. 2000. Rio de Janeiro.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT. NBR 14.787 – Prevenção de
Acidentes, Procedimentos e Medidas de Proteção. 2001. Rio de Janeiro.
CARVALHO, Sérgio Américo Mendes de. Material didático da disciplina Proteção Contra Incêndio.
LATEC-UFF, 2006.
GARCIA, S. A. L. A Galinha dos Ovos Seguros. Revista ALCOOLbras, no 108 – 2007. Disponível
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KULCSAR NETO, F. A Galinha dos Ovos Seguros. Revista ALCOOLbras, no 108 – 2007. Disponí-
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ções Insalubres. 1978. Brasília.
MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Norma Regulamentadora 18 – Condições e Meio
Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção. 1978. Brasília.
MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Norma Regulamentadora 33 – Segurança e Saúde
nos Trabalhos em Espaços Confinados. 2006. Brasília.
MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Norma Regulamentadora 34 – Condições e Meio
Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção e Reparação Naval. 2011. Brasília.
MORAES JUNIOR, C. P. Espaços confinados. 2011. CP Soluções em Prevenção. Disponível em:
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VALE, A.; ALVES, S. “Espaços Confinados: Por que os acidentes acontecem”. Revista CIPA, São
Paulo, no 245, p. 48-69, 2000.

RMB1 o T/2012 135


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

JONAS SOARES DOS SANTOS FILHO*

SUMÁRIO

Disposições gerais
Aspectos institucionais da Antaq
Principais desafios do ambiente regulatório no setor marítimo
Papel da Antaq nas instalações portuárias
Portos públicos
Terminais de Uso Privativo – TUP
Meio ambiente
Papel da Antaq na navegação marítima e de apoio
Papel da Antaq na navegação interior
Realização de estudos sobre desenvolvimento e regulação
do setor de transporte aquaviário e de infraestrutura
portuária
Conclusão

DISPOSIÇÕES GERAIS Canadá, China e Estados Unidos têm exten-


são territorial maior). Nosso litoral é privile-

O nosso país tem um território de exten-


são continental – 8.514.876 km², sendo
o quinto maior do mundo (apenas Rússia,
giado, com 7.367 km de extensão (aumenta-
dos para aproximadamente 9.200 km, se con-
sideradas suas saliências e reentrâncias)1.

* Especialista em Regulação de Serviços de Transportes Aquaviários da Agência Nacional de Transportes


Aquaviários (Antaq). Pós-graduando em Regulação de Serviços Públicos pela Fundação Getúlio
Vargas (FGV).
1 Conforme o site UOL Educação, disponível em: <http://educacao.uol.com.br/geografia/litoral-
brasileiro.jhtm>.
O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

Nosso Produto Interno Bruto (PIB) em entidade integrante da administração pú-


2010 ficou na casa dos R$ 3,675 trilhões2, e blica federal indireta, vinculada ao Minis-
nossa população bate, aproximadamente, tério dos Transportes, responsável por
na casa dos 190 milhões de pessoas. desempenhar a função de entidade regula-
No contexto acima abordado, e analisa- dora e fiscalizadora das atividades portuá-
dos os números em conjunto com as vanta- rias e do transporte aquaviário.
gens comparativas de nosso país – tais como A Antaq, assim como as outras agências
terras abundantes e commodities como pe- reguladoras em geral, é caracterizada pelo
tróleo e minérios –, o Brasil se transformou, chamado regime autárquico especial, que
nos últimos anos, num significativo e estra- deveria trazer em seu bojo a independência
tégico player da economia mundial. administrativa, a autonomia financeira e fun-
Esse crescimento de importância do País cional e o mandato fixo de seus dirigentes.
faz com que a demanda por Logística (em Sua criação vem de encontro à necessida-
especial na área de transporte – seja ele ter- de do Estado brasileiro de regular e fiscalizar
restre, marítimo ou aéreo) seja aumentada os serviços públicos passíveis de delegação
exponencialmente, surgindo diversas neces- ao setor privado, criando condições para que
sidades e, por consequência, oportunida- as novas pessoas jurídicas delegadas pos-
des de negócios. Contudo, haja vista esta sam produzir da melhor forma possível (as-
movimentação da economia, o Estado – den- segurando, assim, a qualidade na prestação
tro do seu objetivo de buscar o interesse dos serviços públicos), criando, por exem-
público – deve regular e fiscalizar (vejam plo, regras de acesso ao mercado regulado e
que não é utilizado o vocábulo “executa- punições às empresas operadoras. Ou seja, a
das”) essas atividades econômicas, sob Antaq desempenha seu papel no âmbito fe-
pena de ocorrerem situações assimétricas deral, basicamente, fixando diretrizes de atu-
na economia, prejudicando empresas e con- ação, exercendo o controle e fiscalizando o
sumidores – logo, embaraçando, de forma mercado regulado de transporte aquaviário
geral, o desenvolvimento do próprio Brasil. (que é uma das atividades econômicas do
setor marítimo nacional).
ASPECTOS INSTITUCIONAIS DA As agências reguladoras fazem, em ge-
ANTAQ ral, o contraponto entre o poder concedente
(o Estado), os interesses dos operadores
Por isso, considerando o aumento do
privados (pessoas delegadas) e as neces-
comércio corrente do País (lembrando que
sidades do consumidor (usuário).
mais ou menos 95% do comércio exterior
do Brasil – nossas importações e exporta-
PRINCIPAIS DESAFIOS DO
ções – é realizado pelo mar3), bem como a
AMBIENTE REGULATÓRIO NO
demanda por serviços de qualidade e com
SETOR MARÍTIMO
baixo custo (serviços, por exemplo, de
transporte marítimo ou de infraestrutura As oportunidades de novos negócios
portuária), foi criada, pela Lei no 10.233, de criadas pela demanda nos sistemas
5 de junho de 2001, a Agência Nacional de logísticos nacionais trazem uma atratividade
Transportes Aquaviários, a Antaq. É uma ao capital, seja ele nacional ou internacio-

2 Conforme o site do jornal O Globo Economia, disponível em: <http://oglobo.globo.com/economia/


pib-brasileiro-fecha-2010-com-crescimento-de-75-maior-desde-1986-aponta-ibge-2815938>.
3 Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

RMB1 o T/2012 137


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

nal, que necessita, neste último caso, para exemplo, dos Planos Gerais de Outorga – PGO5,
aportar em nosso país, do estabelecimento Planos de Desenvolvimento e Zoneamento
de marcos regulatórios estáveis. dos Portos – PDZ, entre outros), a valorização
E essa estabilidade fortemente pressu- da integração multimodal de transportes (di-
põe – transformando-se numa cristalina minuindo os custos da logística brasileira –
exigência ao ente regulador –, inicialmen- um dos principais fatores do chamado “custo
te, o estabelecimento de regras claras e a Brasil”) e a defesa do uso múltiplo das águas
previsibilidade das ações, visando à ga- (por intermédio das eclusas nas hidrelétricas,
rantia dos direitos dos investidores e, não por exemplo) como fator do desenvolvimento
menos importante, à garantia da prestação econômico e ambiental também são desafios a
de serviços adequados aos usuários. serem enfrentados na regulação do mercado
Um marco regulatório estável pressupõe aquaviário.
também um estímulo à concorrência e um equi-
líbrio na arbitragem de conflitos4, demonstran- PAPEL DA ANTAQ NAS
do um comprometimento com a susten- INSTALAÇÕES PORTUÁRIAS
tabilidade econômica do setor aquaviário con-
jugado com o interesse público. Podemos destacar dentre as mais impor-
Além disso, a realização de fiscalizações tantes operações portuárias a movimenta-
contribui para um setor estável (e, por ção de carga (e seu armazenamento) e o
consequência, atrativo ao capital), ratifican- atendimento a navios. No Brasil, está em
do que essa atividade de fiscalização é ím- vigor a Lei no 8.630, de 25 de fevereiro de
par para verificação da qualidade da presta- 1993, a chamada Lei dos Portos. Essa lei
ção de serviços dos operadores privados dispõe sobre o regime jurídico da explora-
delegados, bem como para inibir e coibir in- ção dos portos organizados e das instala-
frações ou práticas ilegais no desenvolvi- ções portuárias.
mento das atividades do setor regulado. A Lei dos Portos procurou trazer ao se-
Já num aspecto mais abrangente, a valori- tor portuário brasileiro reformas de moder-
zação do planejamento (por intermédio, por nização, com o principal objetivo de pro-

4 No caso da Antaq, vide a Lei nº 10.233/01, em seu Art. 20, II, b: “São objetivos das Agências Nacionais
de Regulação dos Transporte Terrestre e Aquaviário:
...
II – regular ou supervisionar, em suas respectivas esferas e atribuições, as atividades de prestação
de serviços e de exploração da infraestrutura de transportes, exercidas por terceiros, com vistas a:

b) harmonizar, preservado o interesse público, os objetivos dos usuários, das empresas concessi-
onárias, permissionárias, autorizadas e arrendatárias, e de entidades delegadas, arbitrando conflitos
de interesses e impedindo situações que configurem competição imperfeita ou infração da ordem
econômica...”
5 Lei no 10.233/01, Art. 27. Cabe à Antaq, em sua esfera de atuação:

III – Propor: (Redação dada pela Lei no 11.518/2007)
a) ao Ministério dos Transportes o plano geral de outorgas de exploração da infraestrutura
aquaviária e portuária fluvial e lacustre, excluídos os portos outorgados às companhias docas, e de
prestação de serviços de transporte aquaviário; e (Incluído pela Lei no 11.518, de 2007)
b) à Secretaria Especial de Portos da Presidência da República o plano geral de outorgas de
exploração da infraestrutura e da superestrutura dos portos e terminais portuários marítimos, bem
como dos outorgados às companhias docas. (Incluído pela Lei no 11.518, de 2007)

138 RMB1 oT/2012


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

mover, além da entrada da iniciativa priva- assunto (poderia, inclusive, ensejar a pro-
da nos investimentos, a melhoria da quali- dução de um trabalho monográfico, livro
dade e a eficiência operacional. etc.). Mas podemos citar a própria Lei no
Pela lei6, cabe à União, diretamente ou 8.630/93; a Lei que rege as licitações na Ad-
mediante concessão, explorar o chamado ministração Pública (Lei no 8.666, de 21 de
Porto Organizado7, fazendo, por intermédio junho de 1993); a Lei 10.233/01; o Decreto no
do concessionário, a sua subconcessão, 6.620, de 29 de outubro de 200810; e a nova
chamada de arrendamento. Faz também a Resolução no 2.240-Antaq, de 4 de outubro
autorização para exploração e/ou constru- de 2011 (que veio a substituir a antiga Reso-
ção, por intermédio do órgão competente, lução no 055-Antaq, que tratava do tema).
dos terminais de uso privativo (Exclusivo8, Este tipo de arrendamento tem como pe-
Misto9 ou de Turismo), a Estação de Trans- culiaridades a cessão do uso do bem públi-
bordo de Cargas (ETC) e a Instalação Portu- co, prazo de até 50 anos, a reversibilidade
ária Pública de Pequeno Porte (IP4). de bens para a União ao término da conces-
são e a utilização de mão de obra do Ogmo11.
Portos públicos
Também existe previsão, na legislação em
No caso dos portos públicos (quais se- vigor, para a concessão de portos organiza-
jam, o Porto Organizado e o IP4), a conces- dos para o setor privado, tendo como base
são se dá às Companhias Docas, aos Esta- legal as Leis no 8.630/93; no 10.233/01; e no
dos e Municípios (diretamente ou por meio 8.987, de 13 de fevereiro de 199512, e o Decre-
de convênio de delegação) ou à iniciativa to no 6.620/08. Aqui, há a outorga de explora-
privada (mediante licitação). ção para pessoa jurídica de direito público
Já no caso da IP4, temos a Resolução no ou privado, mediante licitação pública
1.590-Antaq, de 9 de fevereiro de 2010, que conduzida pela Antaq, observadas as diretri-
trata da outorga de autorização para cons- zes do Plano Geral de Outorgas, por um pra-
trução, exploração e ampliação desse tipo zo de 25 anos, prorrogável por igual período.
de instalação portuária.
Terminais de Uso Privativo – TUP
Para o arrendamento (subconcessão) de
áreas dentro do Porto Organizado para em- Já no caso dos Terminais de Uso Priva-
presas privadas, há uma base legal bastante tivo (TUP), a base legal para a autorização
diversificada, devido à alta complexidade do à iniciativa privada encontra-se na Lei no

6 Arts. 1o e 4o da Lei no 8.630/93.


7 Pela Lei no 8.630/93, em seu Art. 1o, §1o, I: “Porto Organizado: o construído e aparelhado para atender
às necessidades da navegação, da movimentação de passageiros ou da movimentação e armazena-
gem de mercadorias, concedido ou explorado pela União, cujo tráfego e as operações portuárias
estejam sob a jurisdição de uma autoridade portuária. (Redação dada pela Lei no 11.314 de 2006)”.
8 TUP Exclusivo: para movimentação de carga própria.
9 TUP Misto: para movimentação de carga própria e carga de terceiros.
10 Decreto no 6.620/08: Dispõe sobre políticas e diretrizes para o desenvolvimento e o fomento do setor
de portos e terminais portuários de competência da Secretaria Especial de Portos da Presidência da
República, disciplina a concessão de portos, o arrendamento e a autorização de instalações portuá-
rias marítimas e dá outras providências.
11 Órgão Gestor de Mão de Obra que, entre outras atribuições, administra o fornecimento da mão de obra
do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso, bem como mantém seu cadastro: vide
Capítulos IV e V da Lei no 8.630/93.
12 Lei no 8.987, de 13/02/95: Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços
públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal e dá outras providências.

RMB1 o T/2012 139


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

8.630/93, na Lei 10.233/01, no Decreto no ambiental na área marítima/portuária, acom-


6.620/08 e na Resolução no 1.660-Antaq, panhando a elaboração, a implantação e o
de 8 de abril de 2010 (para TUP Exclusivo e desenvolvimento dos planos de gestão, bem
Misto). Tem como peculiaridades a possi- como do sistema integrado de gestão no
bilidade de operação em consórcio, a auto- setor aquaviário. A Gerência de Meio Ambi-
rização para estaleiro e bases de apoio ente (GMA) da Antaq, que é a responsável
offshore13 e prazo de até 50 anos. pelas ações pertinentes ao assunto no
Para os TUP de Turismo, temos a Reso- organograma interno da agência regulado-
lução no 1.556-Antaq, de 11 de dezembro ra, aponta as diretrizes relacionadas ao meio
de 2009 (alterada pela Resolução no 2192- ambiente, promovendo a implantação da
Antaq, de 28 de julho de 2011). Tal ativida- Agenda Ambiental Portuária.
de econômica é importantíssima para nos- Os Conselhos de Autoridade Portuária
so país, haja vista o incremento de mais de são apoiados na monitoração dos planos
38% no turismo marítimo entre 2009-2010, de gestão ambiental das autoridades por-
com previsão de aumento de 22% para a tuárias. Além disso, a Antaq participa ati-
temporada 2011–201214. vamente de foros, seminários, debates etc.,
Para a Copa do Mundo a ser realizada juntamente com os demais órgãos, contri-
no Brasil em 2014, foram escolhidos sete buindo na elaboração de procedimentos e
portos para arrendamento de áreas para normas afetas ao setor marítimo.
movimentação de passageiros, a saber:
Manaus, Fortaleza, Natal, Recife, Salvador, PAPEL DA ANTAQ NA NAVEGAÇÃO
Rio de Janeiro e Santos. MARÍTIMA E DE APOIO

Meio ambiente Dentro de sua competência reguladora


e fiscalizadora na área de navegação marí-
A atividade portuária em si é potencial- tima e de apoio – que inclui a navegação
mente poluidora. Por isso, torna-se mister, de longo curso, de cabotagem, de apoio
dentro do processo de consciência marítimo e de apoio portuário15 –, o marco
ambiental mundial atualmente em curso, que regulatório da Lei no 10.233/01 é consolida-
sejam minimizadas as chances de que ocor- do pela Resolução no 843-Antaq, de 14/8/
ra qualquer tipo de agressão ao meio ambi- 2007 (alterada pela Resolução no 879-Antaq,
ente nas operações relacionadas aos por- de 23/9/2007).
tos, por intermédio de medidas apropriadas Nesta norma, temos disposto que a autori-
de prevenção e combate à poluição. É ne- zação para que empresas possam operar na
cessário conciliar o desenvolvimento eco- navegação marítima e de apoio depende16 do
nômico com a preservação da natureza. atendimento a certos requisitos técnico-
Pensando nisso, a Antaq também desen- operacionais, econômico-financeiros e jurídi-
volve atividades relacionadas à gestão co-fiscais. Ela também estabelece, em seu Ca-

13 Art. 7o da Resolução no 1.660-Antaq, de 8/4/2010.


14 Fonte: Associação Brasileira de Empresas de Cruzeiros Marítimos – Abremar.
15 Para outros esclarecimentos sobre os regimes de navegação, indicamos o artigo “Comentários sobre
os Regimes de Navegação da Lei no 9.432/97”, RMB Volume no 131, 1o trim/ 2011, p. 121.
16 Além do disposto na Lei no 9.432/97, em legislação complementar, normas regulamentares pertinen-
tes e, quando for o caso, nos Tratados, Convenções e Acordos Internacionais, enquanto vincularem
a República Federativa do Brasil.

140 RMB1 oT/2012


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

pítulo V (Arts. 20 a 23), as penalidades ao Tempo de Serviço (FGTS), além de não pos-
descumprimento de quaisquer disposições suir qualquer registro de processos de falên-
legais ou regulamentares, bem como as infra- cias ou recuperação judicial e extrajudicial19.
ções na área da navegação marítima e de apoio. Atualmente destacam-se, na área de
A empresa que solicitar sua outorga de navegação marítima e de apoio, as navega-
autorização para operar na navegação marí- ções de cabotagem e de apoio marítimo. A
tima e de apoio deve ser proprietária de uma navegação de cabotagem se sobressai, ou
embarcação ou apresentar um contrato de pelo menos deveria se sobressair20, por
afretamento a casco nu de embarcação de conta da extensa costa marítima brasileira,
bandeira brasileira, bem como um documen- em conjunto com a concentração dos se-
to referente à segurança da embarcação fir- tores produtivos e consumidor brasileiro
mado com a Autoridade Marítima (Marinha ao longo da costa e com a grande vanta-
do Brasil) e um seguro de responsabilidade gem comparativa da cabotagem em relação
civil em vigor, para atender aos requisitos ao modal rodoviário (tanto em termos fi-
técnico-operacionais17. nanceiros quanto ambientais).
Na parte econômico-financeira, deve a em- Mas, notadamente, com o incremento das
presa ter patrimônio líquido de acordo com a atividades de exploração de petróleo21 e, nos
navegação pretendida e apresentar Índice de dias de hoje, com o chamado pré-sal22, po-
Liquidez Corrente maior do que 1 (um)18. Já demos afirmar que as operações de navega-
quanto à parte jurídico-fiscal, deve a empresa ção de apoio marítimo estão com forte de-
apresentar documento comprobatório de re- manda e com perspectivas de crescimento.
gularidade perante as Fazendas (União, Esta- A navegação de apoio marítimo carac-
dos e Municípios) e ao Fundo de Garantia por teriza-se pelo apoio logístico a embarca-

17 Para outros esclarecimentos sobre o tema, sugerimos o artigo “Análise dos requisitos técnico-
operacionais da Resolução no 843-Antaq”. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/
?artigos&ver=2.30920>.
18 Para outros esclarecimentos sobre o tema, sugerimos o artigo “Comentários acerca dos requisitos
econômico-financeiros previstos na Resolução n o 843-Antaq”. Disponível em: <http://
www.webartigos.com/artigos/comentarios-acerca-dos-requisitos-economico-financeiros-previstos-
na-resolucao-n-843-antaq/56052/>.
19 Para outros esclarecimentos sobre o tema, sugerimos o artigo “Os requisitos jurídicos-fiscais necessários
para acesso ao mercado de transporte aquaviário na navegação marítima”. Disponível em: <http://
www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8940>.
20 Não é objetivo do presente artigo (será num próximo, com certeza) o debate acerca do desenvolvi-
mento da cabotagem brasileira, mas apenas expor uma breve lembrança sobre suas possibilidades. A
Antaq, nesse sentido, desenvolve importantes seminários sobre o tema, dos quais destacamos o 1o
Seminário sobre o Desenvolvimento da Cabotagem Brasileira, realizado em Brasília, DF, em agosto
de 2009, em que são abordados os diversos pontos de vista das pessoas envolvidas no processo.
21 A Lei n o 9.478, de 6 de agosto de 1997 – a Lei do Petróleo –, dispõe sobre a política energética
nacional e as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de
Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências.
22 “A descoberta de petróleo na camada de pré-sal do litoral brasileiro iniciou um novo capítulo na
história econômica brasileira e, em particular, na exploração, pela Petrobras, de petróleo em águas
profundas e ultraprofundas (…), a cerca de 300 quilômetros da costa brasileira, o triplo da distância
da Bacia de Campos, (…) Com o surgimento de outros campos numa área que se estende por 800
quilômetros do litoral brasileiro, entre os estados de Santa Catarina e o Espírito Santo, o pré-sal
consolidou-se como potencial empreendimento e desafio para a Petrobras e seus parceiros...”.
Fonte: Petrobras S/A. Disponível em: < http://www.petrobras.com.br//rs2010/pt/relatorio-de-
sustentabilidade/atuacao-corporativa/estrategia/descobertas-no-pre-sal/index.asp>.

RMB1 o T/2012 141


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

ções e instalações em águas territoriais com afretamentos para a navegação de apoio


nacionais e na Zona Econômica, que atu- marítimo, que cresceram substancialmente em
em nas atividades de pesquisa e lavra de 2010 em relação a 2009: 66%. Foram gastos
minerais e hidrocarbonetos, de acordo com de aproximadamente 1 bilhão de reais com
a lei que ordena o transporte aquaviário no contratos de afretamentos por tempo 24
Brasil23, traduzindo-se, basicamente, no (registrados25 e autorizados26) no ano de 2010.
atendimento às demandas das plataformas
de exploração e produção (E&P) de petró- PAPEL DA ANTAQ NA NAVEGAÇÃO
leo em áreas marítimas. INTERIOR
Outra atividade relacionada à área de na-
vegação marítima e de apoio refere-se aos Não poderíamos deixar de citar a nave-
afretamentos de embarcações, normatizados gação realizada em hidrovias interiores, em
pela Lei no 9.432/97. Ímpar destacar que, den- percurso nacional ou internacional, pois
tre outras particularidades, as embarcações apesar de não estar exatamente incluída,
estrangeiras somente poderão participar das strictu sensu, no setor marítimo, ela faz, lato
navegações de cabotagem, apoio marítimo e sensu, parte do referido setor como um todo.
apoio portuário quando afretadas por Empre- Senão, vejamos: por exemplo, o porto de
sas Brasileiras de Navegação (EBN), e apenas Manaus é considerado um porto marítimo.
nos casos de inexistência – ou indispo- No Brasil, temos um total de 63 mil km de
nibilidade – de embarcação de bandeira brasi- extensão total das águas superficiais
leira, quando em substituição a embarcações fluviolacustres, dos quais 29 mil km natural-
em construção em estaleiro brasileiro ou quan- mente disponíveis para exploração no trans-
do verificado o interesse público. porte. Desses, somente 13 mil km são eco-
Pela Lei no 10.233/01, a Antaq é o órgão nomicamente utilizados27, o que demonstra
público competente para a análise de tal a baixa importância dada ao transporte
matéria (afretamento de embarcações), dis- hidroviário – o que se constitui num tre-
ciplinando-a pela Resolução no 195-Antaq, mendo desperdício, pois o modal hidroviário
de 16 de fevereiro de 2004 (alterada pela é mais econômico e menos poluente em com-
Resolução no 493-Antaq, de 13 de setembro paração aos outros modais.
de 2005); Resolução no 192-Antaq, de 16 de A matriz de transporte brasileira está atu-
fevereiro de 2005 (alterada pela Resolução almente baseada no modal rodoviário – 60%
no 495-Antaq, de 13 de setembro de 2005); e de participação. Nos EUA, por exemplo, a
Resolução no 191-Antaq, de 16 de fevereiro participação do modal rodoviário é de 25%,
de 2004 (alterada pela Resolução no 494- enquanto na Alemanha é de apenas 18%28.
Antaq, de 13 de setembro de 2005). Este fato contribui para – novamente lem-
Nesse diapasão, importante destacar o con- brando – um aumento de custos da logística
trole da Antaq em relação aos gastos das EBN brasileira (mais uma vez, o “custo Brasil”).

23 Lei no 9.432, de 8 de janeiro de 1997.


24 Contratos de Afretamento por Tempo: contrato em virtude do qual o afretador recebe a embarcação
armada e tripulada, ou parte dela, para operá-la por tempo determinado (cf. Lei no 9.432/97, em seu
Art. 2 o , II).
25 Contratos de Afretamento por Tempo Registrados: referem-se a embarcação de bandeira brasileira.
26 Contratos de Afretamento por Tempo Autorizados: referem-se a embarcações estrangeiras.
27 Fonte: Ministério dos Transportes.
28 Fonte: Associação Brasileira de Transporte, Logística e de Carga – ABTC.

142 RMB1 oT/2012


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

Hoje, no Brasil, o modal hidroviário re- lhões de toneladas de minério de ferro na


presenta 13% de sua matriz de transportes, navegação interior32.
contra 25% nos EUA e 29% na Alemanha. Semelhante ao que ocorre na navegação
Além disso, na questão ambiental, temos marítima e de apoio, a Antaq desenvolve, na
uma proporção de emissão de gás carbônico navegação em áreas abrigadas, as ativida-
(CO2) entre os transportes rodoviário, ferro- des de outorga de autorização (Resolução
viário e hidroviário, respectivamente, de 4,9 no 1.558-Antaq, de 11 de dezembro de 2009
: 1,4 : 1. Ou seja, por exemplo, enquanto no – para serviço de transporte de cargas na
modal rodoviário ocorre a emissão de 160 navegação interior de percurso longitudi-
gramas de CO 2 por TKU 29 , no modal nal interestadual e internacional –, Resolu-
hidroviário é de apenas, vejam só, 33,430. ção no 1.274-Antaq, de 3 de fevereiro de 2009
Por isso, no PNLT temos uma previsão
31
– para serviço de passageiros, veículos e
de aumento da participação do modal cargas na navegação interior de travessia –
aquaviário para 29% de e Resolução no 912-
nossa matriz de trans- Antaq, de 23 de no-
portes, o que vai con- Temos uma previsão de vembro de 2007 – para
tribuir para uma melho- aumento da participação serviço de transporte
ra da logística brasilei- misto na navegação
ra – pode não terminar do modal aquaviário para interior de percurso
com o “custo Brasil”, 29% de nossa matriz de longitudinal interesta-
mas com certeza vai transportes, o que vai dual e internacional),
contribuir decisiva- fiscalização e afreta-
mente para diminuí-lo. contribuir para uma mentos de embarca-
Em todo caso, mes- melhora da logística ções (Resolução n o
mo com possibilidade 1.864-Antaq, de 4 de
de grande crescimento, brasileira novembro de 2010, al-
podemos destacar no terada pela Resolução
Brasil alguns importantes corredores no 2.160-Antaq, de 22 de julho de 2011).
hidroviários, tais como a hidrovia do Ma-
deira, a hidrovia Solimões-Amazonas e a REALIZAÇÃO DE ESTUDOS SOBRE
hidrovia Teles-Pires Tapajós (ambas na Re- DESENVOLVIMENTO E REGULAÇÃO
gião Norte do País, destacando-se em rela- DO SETOR DE TRANSPORTE
ção aos outros corredores de escoamento AQUAVIÁRIO E DE
por hidrovias pelo seu volume de transpor- INFRAESTRUTURA PORTUÁRIA
te de cargas na navegação interior e cabota-
gem por vias interiores), bem como a Observamos anteriormente que as com-
hidrovia Paraná-Tietê (considerada a mais petências legais da Antaq na regulação
desenvolvida do País, em função dos in- econômica do mercado de transporte
vestimentos realizados). aquaviário (inseridas nesse conceito –
Foram transportadas, em 2010, mais de “mercado de transporte aquaviário” – a
4 milhões de toneladas de soja e 3,84 mi- infraestrutura portuária, a navegação marí-

29 TKU: Toneladas Transportadas por Quilômetro Útil.


30 Fonte: I Seminário Portuário Público Privado Latino-Americano (Brasília, agosto de 2010).
31 PNLT: Plano Nacional de Logística e Transportes, lançado pelo Governo Federal em 2007.
32 Fonte: Antaq.

RMB1 o T/2012 143


O PAPEL DA ANTAQ NO SETOR MARÍTIMO

tima e de apoio e a navegação interior) re- CONCLUSÃO


ferem-se, bem resumidamente, a fixar dire-
trizes de atuação, exercer o controle e fis- Portanto, sem a mínima pretensão de es-
calizar. Mas ainda existe uma outra ativida- gotar a análise do tema, mas sim de trazer
de realizada pela Antaq com relevância para ao debate um assunto tão fascinante e, ao
a sociedade brasileira: os estudos sobre mesmo tempo, tão importante para o Bra-
desempenho e regulação do setor. sil, esperamos, com essas breves linhas,
Estabelecidas basicamente na Gerências estar iniciando o aprofundamento do en-
de Desenvolvimento e Regulação da Antaq33, tendimento da questão em pauta.
essas atividades são fundamentais para a Certamente, considerando a importância
obtenção e a divulgação de dados, do transporte marítimo para o desenvolvi-
alavancando a aquisi- mento econômico, so-
ção de conhecimentos cial e ambiental brasi-
e contribuindo para a Considerando a importância leiro, torna-se funda-
formação do substrato mental que, cada vez
básico cultural do setor do transporte marítimo para mais, os aspectos per-
marítimo. o desenvolvimento tinentes ao papel da
Acompanhar e ana- Antaq no setor maríti-
lisar atos e legislação
econômico, social e mo sejam estudados e
– nacional e internaci- ambiental brasileiro, torna- compreendidos, en-
onal – referentes à se fundamental que os frentando os desafios
infraestrutura portuá- da regulação econômi-
ria e ao transporte aspectos pertinentes ao ca deste setor.
aquaviário, o desem- papel da Antaq no setor Por isso, todos –
penho das EBN, pre- sejam advogados na
ços e tarifas dos por-
marítimo sejam estudados e defesa de seus clien-
tos, bem como a elabo- compreendidos, enfrentando tes, administradores
ração de estudos para os desafios da regulação na gestão de suas em-
subsidiar as políticas presas, contadores no
públicas implantadas econômica deste setor planejamento contá-
(ou a serem implanta- bil-tributário de seus
das no futuro) são importantes atividades contratantes, ou a própria Administração
desenvolvidas na área de estudos da Antaq. Pública, na sua busca do interesse público
Além disso, essas gerências, em especi- – devem estar atentos ao exame minucioso
al na navegação marítima e de apoio e na que se faz da questão em pauta, visando
navegação interior, acompanham as prerro- evitar qualquer tipo de embaraço às ativi-
gativas específicas do Comando da Mari- dades econômicas desenvolvidas no setor
nha do Brasil relativas à Marinha Mercante. marítimo nacional.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<PODER MARÍTIMO>; Navegação; Política marítima; Administração (governamental);

33 Conforme Regimento Interno da Antaq, são elas: Gerência de Estudos e Desempenho Portuário
(GED), Gerência de Regulação Portuária (GRP), Gerência de Desenvolvimento e Regulação da
Navegação Marítima e de Apoio (GDM) e Gerência de Desenvolvimento e Regulação da Navegação
Interior (GDI).

144 RMB1 oT/2012


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE
TALENTOS NA MARINHA DO BRASIL

NELSON MÁRCIO ROMANELI DE ALMEIDA*


Capitão de Fragata (IM)

SUMÁRIO

Introdução
A avaliação de desempenho – aspectos conceituais
A avaliação do mérito dos militares da Marinha Portuguesa
Metodologia de avaliação do Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão do Brasil
Normas para avaliação periódica de oficiais da
Marinha do Brasil
Considerações finais

INTRODUÇÃO nistração Pública, em que pese não ter suas


atividades voltadas ao lucro financeiro, tam-

N o mundo contemporâneo, onde ocor-


rem mudanças a cada minuto e em que
as empresas privadas devem ter a capacida-
bém deve estar atenta às inovações que con-
tribuirão para o lucro social, uma vez que este
deve ser a maior fonte de inspiração.
de de se adaptar a estas mudanças a fim de De acordo com Hansen e Silva (s.d.),
permitir suas sobrevivências em um mercado “uma organização pública não difere muito
agressivo e altamente competitivo, a Admi- de uma empresa em termos de responsabi-

* O autor atualmente realiza pela Marinha o curso de “Mestrado em Gestão” na Universidade do Minho,
em Braga – Portugal.
A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

lidade social, em relação aos desafios que Hansen e Silva (s.d.) afirmam que a AD
enfrenta, na complexidade da organização é uma potente ferramenta de auxílio ao pro-
do trabalho, estrutura organizacional e fun- cesso de tomada de decisão, tendo como
ção do administrador”. Temos a convicção objetivos: melhorar as relações dentro da
de que o “ramo de negócio” é diferente, empresa; melhorar a relação entre servidor
mas as consequências pela não adequa- público e contribuinte (atendimento); iden-
ção às novas normas impostas pela socie- tificar necessidade de treinamento ou cur-
dade podem ser danosas à Administração so e de suas potencialidade; e promover a
Pública, uma vez que “as organizações carreira. Estas afirmações podem ser
públicas têm sido cobradas a prestar servi- extrapoladas para o meio militar na medida
ços com maior efetividade”. em que podem melhorar as relações supe-
Vaz (s.d) assevera que “os serviços pú- rior/subordinado nos quartéis e navios,
blicos, em regra sem concorrência no seu além de possibilitar a melhoria contínua da
domínio de atividade, e com a subsistência capacitação dos militares durante suas car-
assegurada pela parcela que lhes cabe do reiras, de forma a extrair o que o homem
Orçamento de Estado, têm-se acomodado tem de melhor de suas competências.
numa postura de contínua sonolência nes- Inspirado por essa realidade, o presente
te âmbito (o destaque é meu), mantendo artigo tem o propósito de compreender e
modelos e esquemas de gestão ultrapas- analisar suscintamente o funcionamento das
sados e manifestamente inadequados”. metodologias e critérios de AD praticadas
Contrariamente a este posicionamento na Marinha de Portugal (MP), na Marinha
estão inseridas as Marinhas de Portugal e do Brasil (MB) e em um órgão civil da admi-
do Brasil, que, mercê da especificidade de nistração direta do Governo Federal, no
suas tarefas, apresentam um processo caso o Ministério do Planejamento, Orça-
evolutivo contínuo na busca da excelência mento e Gestão do Brasil (MPOG), além de
na avaliação do desempenho (AD). Pode- identificar os pontos de convergência/di-
mos afirmar que está presente o modelo vergência destas metodologias na tentativa
gestionário, “caracterizado pela gestão pro- de, se for o caso, apresentar considerações
fissional, pela fragmentação e o reforço das que possam contribuir para a melhoria do
competências das unidades administrati- processo de avaliação adotado pela MB.
vas, pela adoção dos modelos de gestão
empresarial, pela definição estratégica de A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO –
índices de desempenho, pelo enfoque co- ASPECTOS CONCEITUAIS
locado nos resultados a atingir e pela im-
portância dada ao uso racional e eficaz dos A AD é uma sistemática apreciação do
recursos disponíveis”. (Vaz, s.d.:1) comportamento do indivíduo na função
Bons gestores públicos, estando aí inse- que ocupa, suportando a análise objetiva
ridos os oficiais das Forças Armadas (FFAA), (o destaque é meu) do comportamento do
devem estar preparados, ou seja, com as ap- homem no trabalho, e comunicação ao co-
tidões comportamentais necessárias e sufi- laborador de seu resultado (Rocha
cientes, para acompanhar o desenvolvimen- 1997:120). Se lermos com desatenção, esta
to de seus subordinados, entender suas ne- afirmação, erroneamente, pode nos induzir
cessidades e promover, se necessário, a alte- a concluir que somente aspectos objetivos
ração de rumo das coisas no sentido de bus- do comportamento do indivíduo podem ser
car a excelência dos resultados. passíveis de análise (assiduidade, pontua-

146 RMB1 oT/2012


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

lidade etc.). Cabe mencionar que, quando avaliando superiores, os próprios funcionári-
estamos falando de AD, referimo-nos a se- os avaliando-se uns aos outros e uma possí-
res humanos, e muitos aspectos compor- vel combinação de formas diferentes de avali-
tamentais são de caráter subjetivo (lealda- ação. Entretanto, aparentemente, o referido
de, e confiabilidade, entre outros). autor olvidou-se de mencionar duas formas
Segundo McGregor, citado por Caeta- citadas por Robbins (2007:233), que na visão
no e Vala (2002:360), as organizações são deste investigador merecem destaque. São
impelidas a desenvolverem um processo elas: a autoavaliação, que permite o autogeren-
de AD para satisfazer a três necessidades/ ciamento e confere um grau de confiança da
objetivos: auxiliar as decisões administra- organização para com o subordinado, além de
tivas ligadas a transferências e remunera- “atenuar a postura de defesa dos subordina-
ções; permitir ao avaliado conhecer o que dos em relação à AD proposta por seus che-
a organização pensa dele; e permitir ao ava- fes”; e a abordagem mais abrangente, deno-
liador aconselhar o colaborador em seu minada avaliação 360 graus, que permite a to-
percurso profissional. dos aqueles que interagem com o avaliado
Esta perspectiva pode ser corroborada (subordinados, pares, supervisores, bem como
na medida em que Cowling e Mailer clientes internos ou externos) colocar suas
(1998:122) descrevem como objetivos das opiniões acerca de seu desempenho, deno-
AD os seguintes: avaliação sistemática das tando maior amplitude na coleta de dados.
necessidades de formação individual; Mais especificamente quanto ao meio
encorajamento e recompensa de esforço militar, cabem algumas ressalvas quanto a
individual; comunicação do nível de de- quem deve ser o avaliador. As FFAA têm
sempenho e progresso; fornecimento de como seus pilares a hierarquia e a discipli-
dados sobre competências e capacidades na, e um subordinado avaliar seu coman-
essenciais para o planejamento de recur- dante parece ser uma postura que iria de
sos humanos; fornecimento de informação encontro ao pilar hierarquia.
objetiva para fins de promoção e planeja- De posse das ferramentas e formas de
mento de sucessões; e crítica e revisão re- avaliação, deparamo-nos com um fator que
gular de descrições dos postos de traba- foge ao controle do avaliador – o fator hu-
lho e dos objetivos do trabalho. mano – que está intrínseco ao processo.
De posse dos objetivos da avaliação, As avaliações são executadas por homens
devemos ter em mente o que avaliar dos e, em face de tal premissa, estão sujeitas a
subordinados . Robbins (2007:231-232) afir- falhas, desvios e até mesmo erros. Muitos
ma que as três categorias de critérios mais são os erros de cotação, que têm sido alvo
comuns são os resultados da tarefa (por de investigações. De uma forma resumida,
exemplo, quantidade individual produzida podem ser vizualizados na figura a seguir.
e volume de rejeição); comportamentos Outros muitos erros poderiam ser incor-
(como rapidez na entrega de um relatório e porados à lista acima, como, por exemplo, a
estilo de liderança); e traços (mais fraca, má preparação dos avaliadores e o erro
considerando que “ser mais confiável” ou “parecido comigo”. Os avaliadores muitas
parecer “ocupado” não tem ligação direta vezes entendem que a tarefa de AD é uma
com os resultados positivos do trabalho). atividade que não agrega valor à empresa.
No que concerne a quem avaliar, Rocha Como observamos até agora, estão redon-
(1997:121) elenca as seguintes formas: superi- damente enganados. Quanto à tendência
ores avaliando subordinados, subordinados de muitos superiores de acreditar que suas

RMB1 o T/2012 147


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

Efeito Semelhança – Tendência para


sobrevalorizar os comportamentos que mais se
identificam com as concepções ou com os pa-
drões de comportamento do avaliador. O que está
em causa não é a pessoa do colaborador mas o
trabalho e o modo como este se produziu;

Efeito de Hallo – Tendência para que a opi- Tendência Central – Atração pelos pontos
nião global sobre o avaliador influencie a médios. Para que a ficha de avaliação atin-
apreciação pontual em cada atributo. Deve
considerar-se cada atributo independente-
Erros – Tipo ja os objetivos propostos é necessário que
se identifiquem claramente os aspectos po-
mente dos outros, partindo do princípio que sitivos e negativos do avaliado;
o avaliado pode ser bom num aspecto e me-
nos bom a outro aspecto;

Proximidade Temporal – Tendência para Fuga ao Conflito – Com o objetivo de não


sobrevalorizar, negativamente ou positiva- despolarizar possíveis reações adversas por
mente, os comportamentos observados mais parte do avaliado, o avaliador tende a
perto do fim do período a que se reporta a sobrevalorizar os níveis reais de desempe-
avaliação. Para evitar este tipo de erro deve- nho apresentado pelo colaborador;
se documentar as apreciações;

Erros de cotação (Manual de Apoio de Avaliação de Desempenho.


Ministério das Finanças de Portugal)

posturas são indubitavelmente as mais próximo dos avaliados; tratar a tarefa de


corretas, convém frisar que estes incorrem avaliar como uma via “de duas mãos” de
no erro de avaliar bem somente aqueles que modo a permitir que os avaliados se pro-
se parecem com eles. nunciem acerca de suas avaliações como
Por fim, segundo Robbins (2007:235- forma de incutir em suas mentes que este é
236), existem formas de minimizar o impac- um processo justo; e, por fim, capacitar os
to da tarefa de avaliar. Podem ser resumi- avaliadores a fim de que eles tenham a cons-
dos em: ter atenção aos comportamentos e ciência de que o processo de AD é impor-
não aos traços, devendo o avaliador foca- tante não só para o avaliado, mas para a
lizar as atitudes dos subordinados em empresa como um todo, devendo, portan-
contrapartida dos seus traços, uma vez que to, ser levado a sério e não ser mais uma
a presença dos traços não implicará neces- incumbência subsidiária.
sariamente aumento de produtividade; cri-
ar uma espécie de “dossiê” dos subordi- A AVALIAÇÃO DO MÉRITO DOS
nados para registrar as principais ocorrên- MILITARES DA MARINHA
cias ao longo do tempo; utilizar múltiplos PORTUGUESA
avaliadores para evitar que se incorram nos
erros apresentados acima; utilizar a avalia- A avaliação dos militares da MP é reali-
ção seletiva para evitar que o avaliador não zada com base na Portaria no 502/95, de 26
conheça seu avaliado, ou seja, recomen- de maio, com as alterações introduzidas
da-se que os avaliadores estejam o mais pela Portaria no 1.380/2002, de 23 de outu-

148 RMB1 oT/2012


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

bro. De acordo com estes normativos, o Da leitura deste artigo depreendemos a


sistema de avaliação do mérito “visa a as- busca pela excelência na gestão de recur-
segurar a caracterização do merecimento sos humanos na MP. Nesse sentido, cabe
dos militares, de modo a possibilitar a sua mencionar que, como consequência dos
correta gestão no que tange a recrutamen- processos de AD, a MP poderá identificar
to e seleção, formação e aperfeiçoamento, ações de formação requeridas, além de pos-
promoção e desempenho de funções”. sibilitar a identificação de implementação
Esse sistema de avaliação é composto de ações que permitam a melhoria de de-
pelos subsistemas de avaliação individu- sempenho e eficácia dos avaliados.
al, de avaliação da formação, de avaliação Um ponto singular é que na MP os milita-
disciplinar e de avaliação complementar. res são, em regra, apreciados por dois avalia-
Especificamente quanto à avaliação in- dores, “o primeiro e o segundo avaliador,
dividual, cabe ressaltar que esta consiste sempre que possível pertencentes à unidade
na apreciação das aptidões reveladas pelo ou ao organismo onde o avaliado presta ser-
avaliado e do nível do desempenho das viço”. Esta questão parece ser uma maneira
funções exercidas. Já a avaliação da forma- com que a MP consegue gerir, de forma jus-
ção consiste na apreciação dos conheci- ta, os processos de avaliação de desempe-
mentos, perícias e ati- nho, na medida em que
tudes específicas dos existe um “duplo grau
militares enquanto su- Um ponto singular é que na de jurisdição” nos pro-
jeitos a ações de for- Marinha de Portugal os cessos, em que “as ava-
mação. A avaliação liações dos primeiros
disciplinar consiste na militares são, em regra, avaliadores são apreci-
apreciação do compor- apreciados por dois adas pelos segundos
tamento do militar à luz avaliadores, que devem
dos louvores, recom- avaliadores pronunciar-se quanto
pensas e condecora- ao modo como o primei-
ções atribuídas e, ainda, das sanções apli- ro avaliador apreciou o avaliado”.
cadas. Por fim, a avaliação complementar Já em se tratando da avaliação do de-
diz respeito à apreciação do militar feita com sempenho, podemos mencionar que esta
base no conjunto dos demais elementos envolve o desempenho de cargos e fun-
curriculares do militar. No âmbito deste tra- ções no âmbito do conteúdo funcional da
balho, focalizaremos somente as avaliações classe a que pertence, abreviadamente de-
individuais e complementar. signado por desempenho específico; e o
As avaliações individuais dos militares desempenho de cargos e funções fora do
da Marinha destinam-se a: atualizar o co- âmbito do conteúdo funcional da classe a
nhecimento do potencial humano existen- que pertence, abreviadamente designado
te, contribuir para a seleção dos mais ap- por desempenho não específico. A
tos para o exercício de determinados car- gradação destas avaliações acompanhará
gos e funções, avaliar a adequabilidade dos a seguinte escala: Insuficiente, Com Defi-
recursos humanos aos cargos e funções ciências; Regular; Bom; Muito bom. Apa-
desempenhados, compatibilizar as aptidões rentemente, esta escala parece não permi-
do avaliado e os interesses da Marinha, tir ao avaliador efetuar um escalonamento
incentivar o cumprimento dos deveres mi- entre os militares subordinados, vez que,
litares e o aperfeiçoamento técnico-militar. desta forma, ou o militar é bom ou é muito

RMB1 o T/2012 149


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

bom, não havendo a possibilidade de nho têm forte tendência de traços em detri-
escalonar entre dois militares bons o que é mento de comportamentos em face das
o melhor, mas apenas é bom. especificidades das tarefas executadas pelos
Sempre que o avaliado não concorde, militares. Outro ponto que não foi observado
no todo ou em parte, com o teor da avalia- é a inexistência da autoavaliação e a avaliação
ção individual, pode apresentar reclamação “paralela”, ou seja, realizada por pares.
ou interpor recurso hierárquico, nos termos Quanto à periodicidade das AD (12 me-
da legislação em vigor. Tal postura é adota- ses), esta parece ser demasiado longa para
da por toda a Administração Pública de Por- uma carreira em que existe um alto grau de
tugal, aí inserida a MP, na medida em que rotatividade tanto do próprio militar quan-
permite que um subordinado, mesmo sendo to de seu superior.
apreciado por dois avaliadores, recorra da A MP na avaliação complementar leva
AD. Tal fato poderia denotar dois aspectos: em conta aspectos que poderiam ser com-
o cunho excessivamente democrático na putados por meio de uma escala de valores
gestão de Recursos Humanos da MP e, ao parametrizada que permitisse aos avalia-
mesmo tempo, uma espécie de afronta aos dos saberem, de pronto, suas notas nesta
princípios de hierarquia e disciplina. parte da avaliação (trabalho publicado = 1
A avaliação complementar leva em con- valor; prêmios recebidos = 2 valores, etc.).
ta os elementos curriculares de avaliação. Esta metodologia parece ser demasiado
São alguns exemplos: dados biográficos e longa, uma vez que o responsável tem que
elementos respeitantes ao desenvolvimen- avaliar ponto a ponto.
to de carreira, designadamente idade, da- Em que pese que a MP seja baseada na
tas de promoção e posicionamento em an- hierarquia e na disciplina, os subordinados
teriores ordenamentos para promoções; que não se sentirem satisfeitos poderão in-
situação relativamente ao quadro; tempos terpor recurso e reclamação da mesma. Esta
de serviço militar, efetivo e prestado ao prática parece contrariar os pilares acima
Estado; tirocínios de embarque e em terra; descritos, considerando que a MP já tomou
cursos, instruções e exames, na Marinha a competente salvaguarda quando atribuiu
ou fora do seu âmbito, no país ou no es- não a um, mas a dois avaliadores, a tarefa de
trangeiro; prêmios recebidos; cargos exer- avaliar o mesmo militar. A possibilidade de
cidos por períodos superiores a seis me- erro de cotação cai sensivelmente.
ses, designadamente comandos, chefias ou Em uma breve comparação com a MB,
direções; cargos desempenhados fora do podemos inferir que os pressupostos base
âmbito da Marinha; realização de trabalhos em termos de aptidões e competências
ou participação em reuniões, comissões ou que devem ser objeto de avaliação são
grupos de trabalho ou de projeto, no âmbi- convergentes.
to militar ou fora dele, decorrentes de des- Por fim, para reforçar a ideia de que a
pacho superior; trabalhos realizados no MP, enquanto integrante da Administra-
âmbito civil e com eventual interesse para ção Pública de Portugal, busca a excelên-
a instituição militar. Observamos que a MP cia na gestão de recursos humanos na me-
utiliza a avaliação complementar como uma dida em que realmente se utiliza desta im-
fonte de informações dos militares durante portante ferramenta de gestão de pessoas,
suas carreiras navais. ressaltamos que são ministradas palestras
De uma breve análise deste normativo po- para todos os militares envolvidos no pro-
demos observar que os fatores de desempe- cesso de AD.

150 RMB1 oT/2012


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

METODOLOGIA DE AVALIAÇÃO DO para conduzir as atividades inerentes às


MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, avaliações de desempenho institucional e
ORÇAMENTO E GESTÃO DO individual; definição de equipe de trabalho
BRASIL – servidores que assumem, em conjunto, a
responsabilidade pela condução de uma ou
Nesta parte do trabalho procuramos abor- mais ações definidas no Plano de Trabalho;
dar a questão da AD em um ministério civil e definição de chefia imediata como sendo o
do Brasil. Em 10 de setembro de 2010, o MPOG responsável pela coordenação da avaliação
emitiu a Portaria no 399/2010, em que aprova de desempenho individual do servidor que
os critérios e procedimentos específicos para lhe seja subordinado.
o monitoramento sistemático e contínuo do Observa-se a preocupação do adminis-
desempenho individual do servidor (o desta- trador público em definir previamente as “re-
que é meu), para efeito de pagamento da Gra- gras do jogo” para os futuros avaliados ao
tificação de Desempenho do Plano Geral de especificar que as chefias imediatas das
Cargos do Poder Executivo (GDPGPE) e da equipes de trabalho detalharão, nos seus
Gratificação de Desem- respectivos âmbitos
penho de Atividade de atuação, a sistemá-
Técnica de Planejamen- No MPOG, fato tica de avaliação de
to (GDATP). desempenho individu-
Nesse documento
interessante são as al aí inseridos os crité-
estão expressas as re- ponderações das avaliações rios, as normas, os
gras para o cálculo da no cômputo da avaliação procedimentos, os me-
avaliação individual canismos de avaliação
dos servidores, que individual: autoavaliação – e os controles neces-
possui a seguinte com- 15%; equipe – 25%; e sários ao processo.
posição: desempenho A portaria em lide
das atribuições do ser-
chefia – 60% enumera as fases como
vidor e sua contribuição o processo deverá ser
para o cumprimento das metas de desempe- conduzido: autoavaliação, avaliação da equi-
nho individual; média resultante da avaliação pe e avaliação da chefia imediata. Cabe res-
efetuada pela equipe de trabalho em que está saltar o surgimento da componente
inserido; e avaliação da chefia imediata. autoavaliação, até então não mencionada.
Depreendemos que, como não existem Fato interessante são as ponderações
avaliações dos subordinados em relação a das avaliações no cômputo da avaliação
seus chefes, avaliações de méritos comple- individual: autoavaliação – 15%; equipe –
mentares (tempo de serviço, afastamentos do 25%; e chefia – 60%. Aduz-se que mais da
trabalho, prêmios recebidos, entre outras) e metade da nota final provém da avaliação
nem avaliação de clientes internos ou exter- do chefe, sendo que a avaliação que o ser-
nos, não está presente a avaliação 360 graus. vidor faz de si mesmo corresponde ao me-
Observamos que são explicitadas as nor- nor score na pontuação geral.
mas para as avaliações individuais, nomea- O MPOG também concedeu o direito ao
damente: ciclo de avaliação – doze meses; servidor de recorrer, em duas instâncias,
responsável pela avaliação – servidor pú- caso se ache injustiçado com sua avaliação.
blico, com perfil estratégico, designado pelo Concluindo esta parte do trabalho, da
dirigente máximo da unidade administrativa análise breve deste normativo podemos ti-

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A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

rar algumas conclusões que serão porme- porta em relação aos processos de AD.
norizadas abaixo. Concluímos que esta sistemática de AD
Alguns fatores de desempenho poderão atua como instrumento de gestão de recur-
ensejar um tratamento subjetivo na avalia- sos humanos, pois possibilita não só a
ção por estarem mais relacionados com os avaliação das pessoas como dos proces-
traços do que com comportamentos. sos de trabalho, o que permitirá, latu sensu,
A variação dos pontos a serem atribuí- o acompanhamento e, se necessário, a cri-
dos (zero = insuficiente, um = satisfatório e ação de planos contingentes que concor-
dois = excelente) aparentemente não pare- ram para o avanço da qualidade dos servi-
ce efetuar uma gradação plena entre os ços públicos, além de poder atuar como
avaliados. Se o colaborador não é excelen- um “termômetro” em termos de melhoria
te é simplesmente satisfatório? Não está na capacitação do pessoal.
presente a avaliação 360 graus. Um ponto
positivo do processo acima descrito resi- NORMAS PARA AVALIAÇÃO
de no fato de que os servidores devem ter PERIÓDICA DE OFICIAIS DA
sempre em mente o Plano de Metas com MARINHA DO BRASIL
que se comprometeram.
Comparando-se com a MP e a MB, per- No que concerne à legislação, a MB, para
cebemos nitidamente que não há a preocu- normatizar internamente a questão de AD,
pação deste ministério civil em relacionar recorreu ao Decreto no 107, de 29 de abril de
nos fatores de desempenho aptidões como: 1991, que regulamenta, para a Marinha, a
disciplina, lealdade, capacidade para con- Lei no 5.821/72, que dispõe sobre as Promo-
duzir pessoas (liderança), senso de justiça, ções dos Oficiais da Ativa das Forças Ar-
equilíbrio emocional, ética, coragem moral, madas – RPOM; ao Decreto no 95.480, de 13
entre outras. Todos os itens a serem avali- de dezembro de 1987, que aprova a Orde-
ados referem-se tão somente à produtivi- nança Geral para o Serviço da Armada; e ao
dade, deixando de fora as condutas éticas Plano de Carreira de Oficiais da Marinha.
e morais subjacentes ao ser humano. A Folha de Avaliação dos Oficiais (FAO)
Como a AD em tela é necessária para uma será aplicada a todos os oficiais, exceto os
percepção pecuniária, a periodicidade de ava- almirantes, tem o grau de sigilo confidenci-
liação (12 meses) poderá acarretar prejuízos al após preenchida e é o “documento regu-
financeiros ao servidor que melhorar seu de- lamentar que serve de base para a avalia-
sempenho, uma vez que deverá aguardar 12 ção dos oficiais. Ela tem por propósito iden-
meses para ser, então, novamente avaliado e tificar perfis morais, profissionais e de de-
poder ter direito à gratificação em causa. sempenho dos avaliados, visando sub-
A composição ponderada da avaliação sidiar as decisões relativas à carreira e à
individual pode ser um fator que contribuirá promoção dos oficiais”.
para a redução dos erros de cotação menci- A FAO terá periodicidade semestral,
onados anteriormente. Isso não significa havendo apenas uma avaliação a cada se-
dizer que acabarão os erros. Simplesmente mestre, sem superposição de períodos de
poderão ser minimizados, uma vez que exis- avaliação. A variação dos graus é de zero a
te um universo maior de avaliadores. dez valores. Nas grandes organizações, o
Finalmente, releva mencionar que resol- titular da OM poderá delegar o preenchi-
vemos estudar este ministério brasileiro mento da FAO, que será por ele ratificada
para entender como um órgão civil se com- pela aposição de rubrica e carimbo. Dife-

152 RMB1 oT/2012


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

rentemente da MP, há somente um avalia- Mais uma vez, fazendo-se uma breve
dor, que é o comandante do militar. análise desta sistemática de avaliação, po-
A FAO é composta pelo conceito moral, demos inferir que não está presente a autoa-
conceito profissional e pela avaliação de valiação. Por experiência própria, algumas
desempenho no cargo ou na função. Exis- vezes é utilizada de maneira informal por al-
te ainda o conceito relativo à “Avaliação guns avaliadores, mas sem cunho decisório.
do Potencial Profissional”, destinado a sub- A MB utiliza-se de uma avaliação 360
sidiar a futura inclusão em Quadro de Aces- graus “customizada” na medida em que ob-
so por Escolha (QAE) dos oficiais no pos- tém a avaliação de superiores e pares. Não
to de capitão de mar e guerra. Estes atribu- há hipótese de se obter a avaliação dos su-
tos são destinados a avaliar os futuros ofi- bordinados, em face da especificidade das
ciais-generais da Força Naval. tarefas executadas por uma Força Armada,
Os oficiais poderão, em qualquer oca- baseada na hierarquia e na disciplina.
sião, tomar conhecimento de suas FAO nos Os parâmetros de avaliação possuem
Órgãos Controlado- uma forte tendência
res. Quanto a eventu- para traços em detri-
ais ponderações acer- Na Marinha do Brasil, a mento de comporta-
ca da nota obtida nas mento. Essa situação
AD, cabe ressaltar avaliação individual é obtida pode ser interpretada
que não cabe recurso por meio de uma média no sentido de que, em
ou pedido de reconsi- situações reais de
deração (o destaque é ponderada entre as FAO e combate, os militares
meu), pelo caráter sub- as FAC, o que pode também devem possuir, além
jetivo envolvido no contribuir para minimizar os das competências
processo. profissionais reque-
A MB executa, ain- efeitos decorrentes dos erros ridas para o exercício
da, uma avaliação de cotação da função, caracterís-
complementar de ofici- ticas pessoais (equilí-
ais por meio de uma brio emocional, lealda-
Folha de Avaliação Complementar (FAC). de, coragem moral, entre outras) que lhes
Trata-se de uma forma distinta da qual a permitam tomar decisões em situações de
MP aborda o tema “complementar” em ter- crise. A disposição dos graus entre zero a
mos de avaliação. “A FAC é um documen- dez valores permite maior gradação entre
to regulamentar que serve de base para os militares avaliados.
complementar a avaliação dos oficiais.” Ela Ponto interessante é que a avaliação
tem por propósito identificar o conceito do individual é obtida por meio de uma média
oficial, em uma faixa selecionada de ofici- ponderada entre as FAO e as FAC, o que
ais mais antigos. Trata-se de uma forma pode também contribuir para minimizar os
adotada pela MB de conhecer a AD dos efeitos decorrentes dos erros de cotação.
oficiais não pela ótica dos superiores, mas Observamos que não há a possibilidade
sob o ponto de vista dos pares, ou seja, de interposição de recursos ou reclama-
daqueles oficiais mais antigos (duas ou três ções. Na verdade, esta questão deve ser
turmas à frente do avaliado). Esta avalia- tratada com muito cuidado, uma vez que
ção é composta por uma nota que varia de não podemos comparar um ministério civil
zero a dez valores. com uma Força Armada.

RMB1 o T/2012 153


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

CONSIDERAÇÕES FINAIS mos, poderão ser um ponto crucial até mes-


mo no alcance de altas produtividades. São
Da leitura deste trabalho, onde foram eles fatores intrínsecos do ser humano, como
apresentados exemplos de sistemáticas de a liderança, a coragem moral, a ética e o sen-
avaliação de desempenho adotadas por so de justiça, entre outros. A MP e a MB
Forças Armadas congêneres de dois paí- estão atentas a estes fatos.
ses, bem como por um ministério civil do Reiteramos que, da literatura pesquisa-da,
Brasil, podemos aduzir que a AD é uma não conseguimos obter uma “fórmula mila-
importante ferramenta que é, e deve ser, grosa” que atenuasse os efeitos das AD nos
utilizada sempre, como forma de gerir os talentos das organizações. Motivação, em-
talentos1 que as instituições possuem. penho e produtividade são aspectos que sem-
Entretanto, as AD, como pudemos obser- pre serão diretamente influenciados pela per-
var, devem ser customizadas não só devido às cepção que o avaliado tem de sua AD. Crité-
especificidades das tarefas requeridas pelos rios são estudados pelas organizações e
cargos, como também pela peculiaridade das implementados de forma a se obter a máxima
carreiras. Nesse sentido, efetividade da utiliza-
convém ressaltar que as ção desta ferramenta
Marinhas do Brasil e de Podemos aduzir que a para a gestão de seus
Portugal estão buscan-
do o aperfeiçoamento
Avaliação de Desempenho talentos. Pudemos ob-
servar que existem prós
das suas estruturas de é uma importante e contras em todas as
AD, procurando as ferramenta que é, e deve óticas apresentadas,
abordagens que mais se que vão desde o perío-
ajustam à realidade de ser, utilizada sempre, como do de avaliação até a
cada momento. forma de gerir os talentos escala de gradação de
Podemos afirmar
que, nas últimas déca-
que as instituições possuem valores a ser atribuída
ao avaliado.
das, a cultura organi- O tema avaliação
zacional das instituições públicas, aí de desempenho, por sua complexidade, tem
inseridas as tradicionais FFAA, acabou por demandado diversos estudos e discus-
experimentar mudanças que são necessá- sões. Desta forma, entendemos que a
rias para que pudéssemos acompanhar a metodologia de AD, nos moldes em que
evolução das coisas que provocaram a ne- estão ora em vigor tanto na MP, na MB e
cessidade de alterações nos status quo em no MPOG, constituem-se excelentes instru-
matéria de Recursos Humanos, corroboran- mentos institucionais para a normatização
do o fato de que as AD são ferramentas e o planejamento de gestão adequado a
indispensáveis nas organizações. cada realidade cultural e organizacional. En-
Depreendemos do estudo que o exemplo tretanto, como contributo desta breve pes-
civil estudado de AD focaliza mais os fatores quisa são apresentadas algumas conside-
de desempenho na produtividade, deixando rações que podem servir de ponto de parti-
de lado alguns pontos comportamentais que, da para estudos mais aprofundados no
em um contexto de globalização em que vive- tema, com o fito de possibilitar à MB uma

1
A partir deste momento do trabalho, a denominação de subordinados e colaboradores passa a ser talentos.
Talentos porque o maior patrimônio de qualquer instituição, quer civil ou militar, é o seu ativo humano.

154 RMB1 oT/2012


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

oportunidade de aperfeiçoar a gestão de contas, os avaliados também serão, em algum


seus talentos. momento da carreira, avaliadores.
Entendemos que a postura de dois avali- Não temos a pretensão de esgotar nestas
adores parece ser uma forma de minimizar os breves considerações o tema “avaliação de
erros de cotação e eventuais injustiças no desempenho” na MB. Os eventuais resulta-
processo. Diferentemente da MP, a avalia- dos advindos da implementação de inovações
ção final poderia ser ou uma média das duas em matéria de AD somente serão observados
avaliações, ou aqueles pontos em que ocor- ao longo do tempo, não são imediatos. Caso
reu discordância seriam objeto de discussão não haja o convencimento de que estamos
pelos avaliadores. diante de uma potente
A autoavaliação se- ferramenta de gestão de
ria uma outra maneira de Releva mencionar que a talentos, poderemos in-
envolver os subordina- AD deve se apresentar correr na continuidade
dos na AD. Inicialmen- de aplicação dos proce-
te, até que a cultura do como um fator de gestão e dimentos em vigor, que,
autogerenciamento e não de punição ou à luz dos fatos apresen-
autocontrole já estives- desestímulo, a fim de tados e da constante di-
se sedimentada nos nâmica em que o assun-
avaliados, seria utilizada possibilitar que os atores to se encontra, podem
somente como uma for- envolvidos no processo ser considerados como
ma de feedback do ava- sendo ações contrapro-
liado. Em um momento tenham em mente que, ducentes.
futuro, poderia, até mes- quanto maior for a Finalmente, releva
mo, compor a avaliação fiabilidade nas avaliações, mencionar que a AD,
individual em termos em qualquer dimensão,
percentuais. maior será a sensação de deve se apresentar
A implementação justiça para com a como um fator de ges-
da avaliação 360 graus
de forma plena seria
instituição e, sobretudo, tão e não de punição
ou desestímulo, a fim de
um passo muito “arro- para com os avaliados possibilitar que os ato-
jado” em se tratando res envolvidos no pro-
de FFAA. Contudo, a MB já se utiliza de cesso tenham em mente que, quanto maior
uma forma de avaliação “360 graus for a fiabilidade nas avaliações, maior será a
customizada”. Para melhorar esta sensação de justiça para com a instituição e,
“customização”, poderia se pensar em in- sobretudo, para com os avaliados. Avaliar
serir a componente de avaliação de clien- com propriedade os subordinados implica ter
tes internos e externos dos militares. consciência de que temos em mãos uma im-
Uma boa política adotada na MP para ca- portante ferramenta de gestão dos nosso ta-
pacitar o seu pessoal que tange à AD foram as lentos, e, portanto, aqueles que já foram ou
palestras. Capacitar significa formar todos os serão avaliadores devem ter a preocupação
militares no assunto, não somente aqueles que de implementar melhorias e aperfeiçoamen-
estão em condições de avaliadores. Afinal de tos dos métodos e instrumentos avaliativos.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<EDUCAÇÃO>; Avaliação; Marinha de Portugal; Marinha do Brasil;

RMB1 o T/2012 155


A AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: UMA FERRAMENTA DE GESTÃO DE TALENTOS
NA MARINHA DO BRASIL

REFERÊNCIAS

Barañano, A.M. Métodos e técnicas de investigação em Gestão: Manual de apoio à realização de


trabalhos de investigação. 1a ed. Lisboa. Sílabo. 2008.
Caetano, A. – Avaliação de Desempenho. Metáforas, Conceitos e Práticas. 1a ed. Lisboa. RH. 1991.
Cowling, A.G. e Mailer, C. – Gerir os recursos humanos. 1a ed. Lisboa. Dom Quixote. 1998.
Robbins, S. P. – Fundamentos de Comportamento Organizacional. 7a ed. São Paulo, Prentice Hall.
2004.
Vala e Caetano. Gestão de Recursos Humanos. Contextos, Processo e Técnicas. 2a ed. Lisboa. RH.
2002.
Rocha, J.A. Gestão de Recusros Humanos. 1a ed. Lisboa. Editorial Presença. 1997.
Hansen e Silva (s.d.). Avaliação de desempenho nas organizações públicas. Acesso em 1o de março
de 2011em Hansen http://www.ead.fea.usp.br/semead/9semead/resultado_semead/
Vaz, R.P. Gestão por objectivos e avaliação de desempenho: a administração pública em mudança.
Acesso em 1o de março de 2011 em http://www.uc.pt/depacad/gee/AP_muda
Portugal (1995) – Estabelece instruções para a execução do sistema de avaliação do mérito dos
militares da Marinha. Portaria No 502/1995. Acedido a 01 de março de 2011 em http://
diario.vlex.pt/vid/portaria-maio-33189855.
Marinha do Brasil (2001) - DGPM-313. Dispõe sobre a avaliação de militares da Marinha do Brasil,
1a revisão. Rio de Janeiro. 112p.
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Portaria nº 399/2010. Aprova os critérios e
procedimentos específicos para o monitoramento sistemático e contínuo do desempenho
individual do servidor. Acesso em 1o de março de 2011 https://conlegis.planejamento.gov.br/
conlegis/Downloads/file?PORTARIA%20399%20-%202010.pdf

156 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR,
OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO
OPERATIVO DE FUZILEIROS NAVAIS EM UMA
OPERAÇÃO DE PAZ

ALBERTO RODRIGUES MESQUITA JUNIOR*


Capitão de Fragata (FN)

SUMÁRIO

Introdução
Preparação logística para a missão
Abastecimento
Manutenção
Salvamento
Saúde
Recursos humanos
Transporte
Engenharia
Operacionalização dos meios na chegada à área de operações
Manutenção da capacidade operativa
Inspeções de verificação das Nações Unidas
Conclusão

INTRODUÇÃO cessidade de uma tropa preparada para al-


ternar o modus operandi de acordo com o

A s Operações de Paz (OpPaz) revestem-


se de grande complexidade em função
do ambiente multinacional da operação, das
tipo da tarefa recebida, da forte dependên-
cia do ramo administrativo (civil) da mis-
são e da diversidade de fontes de supri-
incertezas provenientes da natureza do ter- mentos, tendo em vista o abastecimento
reno e de forças adversas difusas, da ne- durante a missão ser proveniente da pró-

* Serve no Departamento de Pesquisa e Doutrina do Comando Geral do Corpo de Fuzileiros Navais.


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

pria Organização das Nações Unidas sarmamento, desmobilização e reintegração


(ONU), do país a que pertence a Força Ar- e na preservação dos direitos humanos, sen-
mada ou por meio de aquisições no comér- do o Brasil convidado para chefiar o braço
cio local. militar da missão.
A permanência de um contingente mili- Tendo o Brasil aceitado o convite da
tar com plena capacidade operativa em uma ONU, foi definido que a Marinha do Brasil
OpPaz (normalmente períodos de seis me- integraria o contingente brasileiro na mis-
ses) requer um planejamento logístico de- são com um Grupamento Operativo de Fuzi-
talhado, uma preparação minuciosa da tro- leiros Navais (GptOpFuzNav), tipo Unidade
pa, do seu material, equipamentos e supri- Anfíbia (UAnf), com 235 militares, comporia
mentos, assim como um apoio logístico os estados-maiores da brigada brasileira no
continuado. Segundo o Marine Corps Haiti (Brigada Haiti) e do componente mili-
Doctrinal Publication 4 – Logistcs (1997, tar da Minustah, assim como mobiliaria duas
p.6), “logistics establishes limits on what Unidades Médicas Nível Uno (UMNU), com
is operationally possible1”. dois médicos e seis enfermeiros em cada
A primeira participação do Brasil em or- uma. A Força Naval constituiu o Grupo-Ta-
ganismos voltados para a manutenção da refa Haiti, composto pelo Navio de Desem-
paz data de 1933, quando, ainda sob a égide barque de Carros de Combate Mattoso
da Liga das Nações, o País foi representa- Maia, Navio de Desembarque-Doca Cea-
do por um oficial da Marinha do Brasil (MB) rá, Fragata Rademaker, o Navio-Tanque
em uma comissão para mediar um litígio Almirante Gastão Motta e dois helicópte-
entre a Colômbia e o Peru, na região de ros, com a tarefa de transportar o material
Letícia. Em 1965, o Corpo de Fuzileiros Na- do CFN e parcela do material do contingen-
vais (CFN) participou pela primeira vez de te do Exército Brasileiro (EB) e realizar parte
uma OpPaz, quando integrou a Força do apoio logístico ao contingente brasilei-
Interamericana de Paz (FIP), tendo uma ex- ro, especialmente nos momentos iniciais da
pressiva atuação com o envio de tropas operação.
para a República Dominicana. No período Em 2005, o contingente brasileiro no
entre 1995 e 1998, o CFN participou da Haiti teve sua estrutura de comando
United Nations Angola Verification redimensionada, reduzindo o escalão de
Mission (Unavem), enviando contingen- brigada para batalhão, e passou a ser de-
tes de tropa de valor Companhia de Fuzi- nominado Batalhão de Infantaria de Força
leiros Navais (CiaFuzNav) para Angola. de Paz (Brabatt).
Tendo em vista a grave crise política, eco- Assolado por um terremoto catastrófi-
nômica e social em que se encontrava o Haiti, co em 2010, o Haiti sofreu severos danos,
o Conselho de Segurança das Nações Uni- acarretando na necessidade de aumento
das, por meio da Resolução 1.542/2004, ins- dos contingentes, fato que originou o 2o
tituiu a Operação Mission des Nations Unies Batalhão de Infantaria de Força de Paz
pour la Stabilisation en Haiti (Minustah) para (Brabatt 2), tendo os Fuzileiros Navais au-
garantir segurança e estabilidade ao pro- mentado seu efetivo para 302 militares. Em
cesso político e constitucional daquele país função da estabilização do país, está pre-
e ajudar o governo transitório na reforma de vista para 2012 a redução dos efetivos dos
sua polícia nacional, em programas de de- contingentes na ordem de 15%.

1
A logística estabelece os limites para o que é operacionalmente possível.

158 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

A partir da doutrina para emprego de PREPARAÇÃO LOGÍSTICA PARA A


tropa em OpPaz que vigora no MISSÃO
Peacekeeping Training Manual2 das Na-
ções Unidas e no COE Manual3, dos docu- Observando o quadro de convulsão
mentos inerentes à Minustah (Status of político-social instalado no Haiti, o Coman-
Force of Agreement – Sofa4, Memorandum do de Operações Navais (ComOpNav) de-
of Understanding – MOU5 e Guidelines6) sencadeou, em março de 2004, por meio da
e, principalmente, das experiências Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE), a
vivenciadas durante o emprego de 15 con- Operação Albatroz, de forma a testar o grau
tingentes de Fuzileiros Navais na de prontificação dos meios da sua Força
Minustah, este artigo visa ressaltar os as- de Emprego Rápido (FER) e, principalmen-
pectos relacionados a planejamento e em- te, antecipar-se a um possível emprego
prego de um GptOpFuzNav em uma OpPaz, naquele país.
apresentando aspectos logísticos passí- “O Albatroz alçou voo.” Quando o Mi-
veis de serem utilizados pela MB, particu- nistério da Defesa (MD) confirmou a parti-
larmente pelo CFN, na preparação para fu- cipação da MB na missão, a FFE já havia
turas operações. determinado as necessidades iniciais, ten-
Dessa forma, o artigo abordará a prepa- do apenas que ajustar seu planejamento
ração para a missão, enquadrando aspectos para o efetivo autorizado e desencadear,
de cada função logística, assim como as prin- tempestivamente, os processos de obten-
cipais providências para operacionalizar os ção e preparação dos meios e equipamen-
meios na chegada à Área de Operações tos a serem embarcados.
(AOp) e para manter o GptOpFuzNav com Segundo Fontoura (1999, p. 245), a pre-
sua capacidade operativa durante toda a paração e a prontificação de um contingen-
missão, considerando que em todo esse pro- te não são instantâneas:
cesso são realizadas inspeções pelo [...] o prazo de tramitação interna dos
Department of Peacekeeping Operations7 pedidos de cessão gira em torno de três
(DPKO) da ONU. meses, em razão da necessidade de apro-

2
Peacekeeping Training Manual – Manual de Treinamento. Apresenta aspectos operativos quanto à
preparação e ao emprego de uma tropa em uma OpPaz.
3
Manual on Policies and Procedures Concerning Reimbursement and Control of Contingent-Owned
Equipment of Troop-Contributors Participating in Peacekeeping Missions (COE Manual) – Manu-
al de Políticas e Procedimentos para Reembolso e Controle de Contingentes participantes de
Missões de Manutenção da Paz. Apresenta aspectos administrativos, logísticos e financeiros dos
equipamentos que o contingente leva para uma OpPaz, detalhando os critérios técnicos para
reembolso.
4
Sofa – Acordo sobre o status da Força. Firmado entre o organismo internacional, que implementa a
OpPaz e a nação hospedeira, detalhando as obrigações do governo do país, assim como os privilé-
gios, imunidades, facilidades ou concessões acordadas à missão e a qualquer de seus membros.
5
MOU – Memorando de Entendimento. Trata das responsabilidades administrativas e logísticas entre a
ONU e os países participantes da OpPaz.
6
Guidelines – Diretrizes Gerais. Estabelecem orientações de caráter operacional, administrativo, finan-
ceiro e logístico para cada missão.
7
Department of Peacekeeping Operations (DPKO) – Departamento de Operações de Paz. Departamen-
to da Organização das Nações Unidas responsável por planejamento, preparação, gerenciamento e
direção das Operações de Paz da ONU.

RMB1 o T/2012 159


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

vação legislativa e da alocação de re- sistemática de reembolso, para que sejam


cursos pela área econômico-financeira minimizadas as perdas nos acordos, assim
do governo. Outrossim, há ainda a ne- como sejam bem definidos os direitos, as
cessidade de mais 60 a 90 dias para ad- responsabilidades e as obrigações na rela-
quirir equipamentos e mobiliar a tropa. ção Brasil-ONU.
Tendo a FFE recebido o recurso finan-
Nesse contexto, a capacidade expedici- ceiro destinado à preparação para a
onária8 dos Fuzileiros Navais e sua total Minustah, a necessidade de material foi
integração à Força Naval permitiram à MB reavaliada e ajustada ao montante alocado,
empregar um Conjugado Anfíbio9, que foi dando início ao processo de obtenção em
imprescindível para o sucesso no desdo- caráter emergencial. A Base de Fuzileiros
bramento inicial do GptOpFuzNav no Haiti. Navais do Rio Meriti providenciou a aqui-
O planejamento preliminar desenvolvi- sição dos gêneros e do material comum, e
do pelo 1o Contingente considerou os mei- as Organizações Militares (OM) integran-
os previstos no United Nations Stand-by tes do GptOpFuzNav solicitaram seus res-
Arrangements System10 (Unsas) e aqueles pectivos itens por meio do Sistema de In-
que integram a FER. Em função das peculi- formações Gerenciais de Abastecimento
aridades da AOp, das tarefas e do efetivo (Singra). A FFE transferiu os créditos às
de Fuzileiros Navais impostos à MB e, prin- Diretorias Especializadas (DE), tendo o
cipalmente, das orientações do COE Ma- Comando do Material de Fuzileiros Navais
nual, o GptOpFuzNav foi estruturado, e os (CMatFN) fornecido o material específico
meios, equipamentos e suprimentos do CFN, disponibilizando os itens existen-
dimensionados para a missão. Quando da tes no Centro de Reparos e Suprimentos
assinatura do MOU com a ONU, o Brasil Especiais do Corpo de Fuzileiros Navais
optou pelo sistema de reembolso denomi- (CRepSupEspCFN), realizando os remane-
nado wet lease11. jamentos necessários entre as OM e ad-
Analisando o COE Manual, observa-se, quirindo o restante no comércio.
por exemplo, que as atividades relaciona- O processo de preparação foi dificulta-
das ao emprego de militares especializados, do pelo fato de que a dotação de certas
tais como de aviação, de engenharia e de OM, principalmente do Batalhão Logístico
unidades médicas, são as que proporcio- de Fuzileiros Navais (BtlLogFuzNav), não
nam maiores retornos financeiros. Ressal- contemplava alguns dos itens requeridos
ta-se a importância de os militares da área ou as quantidades necessárias para a reali-
de logística envolvidos no planejamento e zação da OpPaz. Atualmente, o CMatFN
na execução de uma OpPaz conhecerem a dispõe de norma que especifica e quantifica

8
A capacidade expedicionária é caracterizada pela existência de uma tropa de pronto emprego,
autossustentável e adequadamente aprestada para cumprir missão por tempo limitado, sob condi-
ções austeras e em área operacional distante de sua base.
9
O Conjugado Anfíbio é constituído por um GptOpFuzNav embarcado em uma Força Naval, juntamente
com os meios aeronavais adjudicados, em condições de cumprir missões relacionadas às tarefas
básicas do Poder Naval.
10
A MB informa às Nações Unidas que tem disponível um Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais
(BtlInFuzNav) e uma Unidade Médica Nível Dois (UMND) para pronto emprego em OpPaz.
11
No sistema wet lease, o país contribuinte se compromete a fornecer tanto o equipamento, assim como
realiza sua manutenção, diferentemente do sistema dry lease, em que a manutenção fica sob
responsabilidade da ONU.

160 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

o material individual e coletivo de um atender aos requisitos de segurança da


GptOpFuzNav, do tipo empregado no Haiti. ONU, possuindo estrutura blindada e con-
Em maio de 2004, o GptOpFuzNav estabe- trole interno de temperatura e umidade.
leceu a Base de Fuzileiros Navais no Haiti Atualmente, a ONU tem empregado lar-
Acadêmica Rachel de Queiroz (BFNHARQ). gamente os Corimec, de fabricação italia-
A Base teve sua estrutura dimensionada, con- na, como alojamentos, escritórios, banhei-
siderando-se os requisitos de segurança e ros e cozinhas. Apesar de oferecer exce-
operacionais da ONU, buscando estabelecer lente conforto para a tropa, este material,
as melhores condições de habitabilidade pos- se comparado aos contêineres, tem custo
síveis e a autossuficiência na produção de mais elevado, demanda mais tempo para
energia elétrica e de água potável. O planeja- montagem, não proporciona a mesma se-
mento inicial aproveitou a disponibilidade de gurança e possui menor resistência às mu-
três construções na área selecionada para a danças de posição.
Base, utilizando-as para alojamentos e refei- O gabião é outra estrutura bastante uti-
tório, sendo as demais lizada pela ONU. Tra-
instalações estabeleci- ta-se de uma cesta
das em barracas e
contêineres.
De acordo com as normas metálica forrada por
tecido e preenchida
De acordo com as da ONU, a partir do sexto com terra, que serve
normas da ONU, a mês do desdobramento para formar paredes de
partir do sexto mês do contenção, utilizadas
desdobramento inicial inicial de uma Força de para definir o períme-
de uma Força de Paz, Paz, cabe a ela prover a tro de segurança das
cabe a ela prover a aco-
modação para a tropa.
acomodação para a tropa bases.
Apesar disso, somen- Abastecimento
te a partir do 15o mês de operações o
GptOpFuzNav teve seus alojamentos pré- As incertezas na AOp e o tempo neces-
moldados instalados, conhecidos como sário para a ONU iniciar seu fornecimento
hard wall (Corimec). regular de suprimentos impõem que o pla-
As dificuldades vivenciadas nos primei- nejamento do Componente de Apoio de
ros contingentes do Haiti ratificam o con- Serviços ao Combate (Casc) preveja níveis
ceito de que os contêineres facilitam a mínimos de estoques que proporcionem
operacionalização da Base, pois flexibilizam autossuficiência12 para o GptOpFuzNav
a seleção do local, permitem a rápida monta- cumprir sua missão.
gem das instalações, assim como proporci- A disponibilidade de estoque inicial de
onam segurança em condições climáticas gêneros secos e frigorificados e de utensí-
adversas. A disponibilidade das versões lios para confecção do rancho é fundamen-
escritório, banheiro, alojamento, refeitório, tal para a manutenção do moral da tropa
lavanderia e paiol flexibilizam a estrutura das elevado, especialmente quando da chega-
bases dos GptOpFuzNav. Quanto ao da na AOp. Rações de combate assegura-
contêiner para armazenar munição, este deve ram autossuficiência ao GptOpFuzNav du-

12
O 1o Contingente do GptOpFuzNav no Haiti levou para a AOp 90 dias de suprimentos, e a ONU iniciou
fornecimento de gêneros a partir do segundo mês.

RMB1 o T/2012 161


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

rante os primeiros dias e em necessidades para fazer face a possíveis atrasos no for-
operativas e emergenciais. A partir do for- necimento. No caso do Haiti, o emprego
necimento regular de gêneros, a ONU pas- dos tanques Saac13 mostrou-se eficaz, au-
sa a disponibilizar 15 dias de rações (combat mentando a capacidade de estocagem do
rations) para atender às necessidades GptOpFuzNav. As instalações utilizadas
operativas. para armazenagem e manuseio de CLG de-
O suprimento de água é de responsabili- vem ser cuidadosamente preparadas para
dade da ONU, normalmente sob forma de água evitar danos ambientais.
a granel e mineral em garrafas. A partir do Os geradores são equipamentos que
fornecimento contínuo de água, em condi- viabilizam a sustentabilidade da operação
ções de ser tratada pelo próprio contingente, da base, pois a distribuição da água depen-
a entrega de água mineral é interrompida. de de bombas elétricas, os fogões e panelas
É indispensável dotar a tropa com são elétricos, as geladeiras e frigoríficos
Equipagem Individual Básica de Combate dependem de energia, além da necessidade
adequada. A postura da tropa bem equipa- de manter toda a rede de computadores em
da, por si só, constitui fator de credibilidade funcionamento, entre muitas outras. Em vir-
junto à população local, contribuindo para tude disso, o planejamento dos sobressa-
sua visibilidade e dissuasão, além de afe- lentes deve atender rigorosamente às
tar o moral do próprio combatente. especificações dos fabricantes.
Independentemente de se tratar de uma Deve ser levada para a AOp toda a gama
OpPaz, a tropa deve estar bem apresentada, de ferramentas e máquinas necessárias à rea-
preparada e aparelhada para o combate, sen- lização de serviços em instalações hidráuli-
do imprescindível o uso do capacete e do cas, elétricas e de construção civil que me-
colete balístico nível III em determinadas lhorem as condições de operacionalidade,
tarefas. Atualmente, no Haiti, tendo em vis- habitabilidade, conforto e segurança da Base.
ta as condições de segurança estabelecidas Não obstante se tratar de uma OpPaz, res-
no país e visando melhorar o relacionamen- salta-se a importância do fornecimento de
to com a população, a tropa está utilizando fuzis de assalto para oficiais e fuzis de preci-
durante o dia colete tático e gorro azul, per- são para atiradores. As lunetas (mira telescó-
manecendo o uso de colete e capacete pica) e os equipamentos de visão noturna
balísticos nas atividades noturnas. são importantes para a efetividade do
Com relação aos combustíveis, lubrifi- GptOpFuzNav, tendo em vista a atuação em
cantes e graxa (CLG), a ONU fornece al- ambiente urbano e em condições de carência
guns produtos universais, devendo ser de iluminação pública. O emprego do fuzil
planejado o embarque de itens para aten- com luneta aumenta a precisão no tiro, dimi-
der a necessidades específicas dos meios nuindo a possibilidade de danos colaterais.
da MB. Para o planejamento da capacida- Atualmente, no Haiti, a quantidade e os
de de estocagem de CLG do GptOpFuzNav, tipos de munição alocados para o
deve ser observada a demanda para o cum- GptOpFuzNav baseiam-se na dotação de
primento das tarefas e o tempo de paz, o que, normalmente, atende às neces-
ressuprimento da ONU, sendo ainda ne- sidades. Equipamentos para controle de
cessária a previsão de um estoque de CLG distúrbios civis, assim como equipamen-

13
Saac – Sistema de Abastecimento de Água e Combustível, composto por tanques flexíveis de diversas
capacidades.

162 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

tos e munições não letais, mostram-se im- EP-450, não militarizados, tem contribuído sig-
prescindíveis para o cumprimento da mis- nificativamente para o controle das opera-
são, particularmente com a evolução posi- ções, a despeito da inexistência de seguran-
tiva nas condições de segurança. ça. A montagem de repetidoras na AOp am-
A estrutura do sistema de comunicações, pliou o alcance desses equipamentos.
baseado em comunicações militares eficien- No Haiti, o uso de celulares tem
tes, é vital para a efetividade do GptOpFuzNav complementado as comunicações militares,
que, normalmente, é empregado em um ambi- tendo em vista que o país já dispõe de co-
ente operacional onde prevalecem atividades bertura satisfatória desse serviço público.
descentralizadas e em área urbana. A instala- Porém cabe ressaltar que as redes de comu-
ção da ETT-Siscomis, compatível com o canal nicações militares devem ser mantidas, pois
Retelma, com a participação da Diretoria de estas sofrem menor interferência de fenô-
Comunicações e Tecnologia da Informação menos meteorológicos, a exemplo do ocor-
da Marinha, proporcio- rido após o terremoto
na o trâmite de comuni- de 2010, em que so-
cações, dados, voz e fax Equipamentos para mente elas se mantive-
com o Brasil, além de controle de distúrbios civis, ram em funcionamento
permitir a ligação com a e possibilitaram o con-
telefonia pública. A assim como equipamentos trole das ações.
internet agiliza o trâmite e munições não letais, O planejamento do
de informações e de do- material de saúde para
cumentos operativos e
mostram-se imprescindíveis uma OpPaz deve con-
administrativos do para o cumprimento da siderar os parâmetros
GptOpFuzNav. A insta- missão, particularmente estabelecidos no COE
lação de equipamentos Manual para as unida-
para videoconferência com a evolução positiva des médicas. Necessi-
permite uma comunica- nas condições de dades adicionais de
ção interativa entre o equipamentos e medi-
GptOpFuzNav e sua ca-
segurança camentos devem ser
deia de comando no solicitadas pelo
Brasil. GptOpFuzNav. Cabe ressaltar que deve ser
No Haiti, inicialmente, o Centro de Men- planejado o embarque de produtos para
sagens e o Paiol de Comunicações foram ins- combater a proliferação de ratos, moscas e
talados em barracas, sujeitos a condições cli- outros vetores de doenças endêmicas.
máticas adversas, com temperaturas acima O planejamento do estoque de sobres-
dos 40º C. A instalação de um contêiner para salentes para a manutenção preventiva das
o Serviço de Comunicações melhorou a fun- viaturas (Vtr) deve considerar as normas
cionalidade dos equipamentos. Atualmente, estabelecidas nas CMatBoTec14, o tempo de
o equipamento Gateway tem sido emprega- ressuprimento a partir do Brasil e a análise
do com sucesso como meio alternativo, utili- dos consumos de cada contingente. Esse
zando o link HF com o apoio da Estação consumo varia de acordo com as condições
Radiogoniométrica da Marinha em Belém. A de emprego dos meios e com a confiabilidade
utilização dos equipamentos VHF Motorola do material, que decai com o decorrer do

14
Boletim Técnico do CMatFN, para cada tipo de Vtr.

RMB1 o T/2012 163


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

tempo de uso do meio. A manutenção de um material. Apesar de esses 10% de meios em


estoque mínimo de 25% dos sobressalentes reserva não serem reembolsados, eles são
previstos para consumo durante todo o pe- cobertos pelo seguro das Nações Unidas.
ríodo da missão do GptOpFuzNav contribui
para sua prontidão operativa. Salvamento
Ressalta-se a importância da logística
de sustentação desenvolvida pela FFE, O planejamento da Base deve conside-
adquirindo materiais de boa qualidade, que rar a necessidade de um sistema de combate
suportem regimes ininterruptos e sob con- a incêndio eficaz, com alarmes de incêndio
dições adversas, assim como em quantida- (sonoro), detectores de fumaça e extintores
de excedente. Esse procedimento garante em todos os compartimentos (observando
maior vida útil dos equipamentos e minimiza a classe apropriada dos materiais),
as dificuldades de reposição do estoque, consubstanciando um Plano de Controle de
em decorrência do tempo de ressuprimento Avarias do GptOpFuzNav. O Plano deve
a partir do Brasil e das condições de aqui- prever, por exemplo, a manutenção dos ex-
sição de material no exterior. tintores sempre dentro da data de validade.
Apesar de as Vtr possuírem seus extin-
Manutenção tores orgânicos, deve ser considerada a
possibilidade da aquisição de extintores
Todas as Vtr designadas para compor o reservas, para o caso de agravamento das
GptOpFuzNav de uma OpPaz são apresen- condições de segurança e da possibilida-
tadas ao CRepSupEspCFN para pintura, de de a tropa ser atacada com dispositivos
com as especificações de cores e padrões explosivos ou incendiários, como o coque-
exigidos pela ONU, e revisão mecânica, elé- tel molotov. Nessa situação, devem-se em-
trica e da suspensão. barcar extintores adicionais nas Vtr.
O planejamento do Casc para a manu- Normalmente, em uma OpPaz, o
tenção das Vtr na AOp deverá considerar a GptOpFuzNav dispõe de Vtr cisterna d’água,
estrutura de apoio a ser instalada na Base. em condições de serem empregadas nas fai-
Essa estrutura deve dispor de local para nas de combate a incêndio, assim como Vtr
reparo, paiol de sobressalentes, borracharia socorro e Munck, que apoiam tarefas de re-
e posto de lavagem e de lubrificação, bem boque e de remoção de material.
como equipamentos e ferramental neces-
sários à manutenção de 1o e 2o escalões, Saúde
previstos nas CMatBoTec.
No caso do Haiti, como o Brasil adotou Os integrantes do contingente de uma
o sistema wet lease, as Vtr indisponíveis OpPaz devem ser submetidos a inspeção de
por um período superior a 24 horas deixam saúde, vacinação e inspeção odontológica
de ser reembolsadas pela ONU, sendo ne- antes do movimento para a AOp. Atualmen-
cessária a manutenção de, no mínimo, 90% te, para a missão no Haiti, estão sendo apli-
de disponibilidade de cada tipo de meio. cadas as vacinas para hepatites A e B, febre
Para viabilizar tal condição, é mantida na amarela, dupla bacteriana (difteria e tétano),
AOp uma quantidade de meios 10% supe- meningite meningocócica A e C, dupla viral
rior ao estabelecido no MOU, em condi- (sarampo e rubéola), febre tifóide e cólera.
ções de substituir o material avariado e No Haiti, a UMNU presta, prioritariamen-
manter o percentual de disponibilidade do te, atendimento médico ambulatorial e de

164 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
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emergência aos militares do GptOpFuzNav, pela FFE, pois, a partir da definição dos in-
possuindo uma farmácia, uma enfermaria tegrantes do contingente, são desenca-
com cinco leitos, uma unidade de pronto- deadas todas as outras providências. Os
atendimento, com capacidade de militares são apresentados ao BtlInfFuz-Nav
ressuscitação e manutenção da vida, até a que nucleia o GptOpFuzNav, iniciando o
estabilização do paciente para evacuação, Programa de Adestramento dos respectivos
um paiol de medicamentos e um laboratório. componentes e o desencadeamen-to das
A implementação da atividade de fisiotera- atividades administrativas.
pia contribuiu para acelerar a recuperação Em virtude de o efetivo do GptOpFuzNav
de lesões. Na parte operativa, observou-se ser normalmente reduzido, a lotação de milita-
que a UMNU deve estar capacitada para res dificilmente englobará todas as especiali-
apoiar com socorristas as peças de mano- dades necessárias. Assim, é fundamental a
bra do Componente de Combate Terrestre seleção de militares com aptidões para realizar
(CCT) e participar das Ações Cívico-Sociais diversas tarefas, tais como: barbeiros, marce-
(Aciso). São também neiros, pintores, lanter-
realizadas palestras so- neiros, borracheiros etc.
bre higiene e estresse São ministrados cursos É imprescindível a pre-
para os militares do sobre Direito Internacional sença de militares com
contingente. elevado grau de capaci-
Outro aspecto im- Humanitário, Direito tação técnica em refrige-
portante refere-se às Internacional dos Conflitos ração, hidráulica, eletri-
ambulâncias, que de- Armados, Conduta Militar cidade, informática e
vem dispor de equipa- manutenção de Vtr, sen-
mentos de oxigênio e nas OpPaz, Regras de do ministrados cursos
demais sistemas esta- Engajamento, Asilo sobre operação de ge-
belecidos no COE Ma- radores e frigoríficas,
nual, de modo a serem Político e Abuso Sexual, equipamentos de osmo-
classificadas como que contribuem para a se reversa, padaria,
“ambulância”, pois, preparação da tropa borracharia e informá-
caso contrário, serão tica para determinados
consideradas Vtr para integrantes do Casc.
transporte de feridos, cujo reembolso é me- Comandantes e oficiais de contingentes
nor. No caso do Haiti, verificou-se também a anteriores ministram palestras sobre suas res-
necessidade de os blindados terem a capa- pectivas missões, apresentando a conjuntu-
cidade para operar como ambulância, prin- ra político-social do país e as condições ad-
cipalmente em áreas de engajamentos mais ministrativas e operativas da missão. São tam-
intensos. O GptOpFuzNav tem recebido bém ministrados cursos sobre Direito Inter-
esse apoio do Brabatt, que dispõe de uma nacional Humanitário, Direito Internacional
Vtr Urutu ambulância. dos Conflitos Armados, Conduta Militar nas
OpPaz, Regras de Engajamento, Asilo Políti-
Recursos humanos co e Abuso Sexual, que contribuem para a
preparação da tropa.
O processo de seleção deve ser iniciado O Sistema de Lições Aprendidas do CFN
o mais breve possível, observando-se as é uma fonte relevante de informações na
orientações e os requisitos estabelecidos preparação para uma OpPaz, pois armaze-

RMB1 o T/2012 165


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

na entrevistas e relatórios de fim de comis- Poder Naval. A possibilidade de explora-


são de outras operações, disponibilizando ção da liberdade de navegação nos mares
valiosos ensinamentos. permite o posicionamento de forças navais
Os Núcleos de Assistência Social reali- nas proximidades de áreas críticas, em
zam entrevistas psicossociais com os mili- águas internacionais, para intervir, quan-
tares e seus familiares, com o caráter de do e como necessário, sem comprometer
orientação, apoiando as famílias até a juridicamente a soberania do país-alvo, fa-
desmobilização do contingente. cilitando a instalação do contingente na
Todos os integrantes do contingente AOp, o apoio durante a missão e a corres-
devem chegar na AOp com seus passapor- pondente desmobilização.
tes e vistos necessários à permanência no Assim, no caso da Minustah, a utiliza-
país e ao trânsito para o Brasil, os quais ção de navios para o transporte de pessoal
devem ter validade superior ao período e material para a AOp foi fundamental para
estipulado para a missão. Nesse contexto, a tropa que se instalava em terra. A perma-
a possibilidade de se empregar uma tropa nência do Navio-Desembarque de Carros
tempestivamente em de Combate (NDCC)
uma missão de paz, Mattoso Maia no
fora do País, sugere Nas OpPaz, o contato com Haiti, nos primeiros 30
que militares que inte- a população local é intenso, dias de operação,
gram o setor operativo constituiu-se na prin-
disponham de passa- sendo imprescindível cipal fonte de apoio
portes de serviço den- conhecimento dos costumes logístico do contin-
tro da validade, sendo e da cultura local, assim gente brasileiro, parti-
necessária apenas a cularmente enquanto a
prontificação dos vis- como de expressões BFNHarq estava sen-
tos exigidos. básicas da língua do preparada. Duran-
Independentemente te esse período, o na-
do idioma local, é reco- predominante vio disponibilizou
mendável que os ofici- suas oficinas e apoiou
ais em geral e os militares em funções de Es- com água, rancho, alojamento e CLG.
tado-Maior tenham o domínio da língua in- A título de lição aprendida, o Plano de
glesa, que é o idioma predominante na ONU. Carregamento dos navios que integram a
Nas OpPaz, o contato da tropa com a popula- Força Naval em uma OpPaz deve ser reali-
ção local é intenso, sendo imprescindível que zado com a maior antecedência possível,
os integrantes dos GptOpFuzNav tenham co- de modo a aproveitar toda a capacidade de
nhecimento dos costumes e da cultura local, transporte. Caso haja material do EB a ser
assim como de expressões básicas da língua embarcado, deve haver coordenação com
predominante, que devem ser praticadas na a unidade do Exército, de modo a orientá-la
fase de preparação dos contingentes. quanto aos procedimentos a serem obser-
vados no carregamento.
Transporte A relevância do emprego dos navios é
constatada quando são comparados os da-
A MB é a Força mais apta a realizar dos a respeito das cargas transportadas a
OpPaz, em virtude de capacidades intrín- bordo das aeronaves C-130 da Força Aérea
secas que o Conjugado Anfíbio confere ao Brasileira (FAB). Em sete voos de Apoio

166 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

Logístico (ApLog), durante todo o período Engenharia


do 2o Contingente do GptOpFuzNav no Haiti,
foi transportado o correspondente a ape- O GptOpFuzNav deve possuir relativa
nas 0,985% e 3,813% em termos de peso e capacidade para realizar pequenos serviços
volume, respectivamente, do que foi trans- gerais. A ONU apoia os contingentes nas
portado pelo NDCC Mattoso Maia quando melhorias e conservação das instalações,
do rodízio entre o 1o e o 2o Contingentes. realizando tarefas que extrapolem suas ca-
As Vtr empregadas inicialmente na OpPaz pacidades, sendo que nos primeiros seis
no Haiti atenderam parcialmente às necessi- meses da missão esse apoio é restrito.
dades da missão. Foram instalados reparos Os equipamentos de engenharia trabalham
para as metralhadoras Minimi nos caminhões ininterruptamente durante toda a missão, de-
Unimog e nas Vtr leves, assim como bancos vendo ser dimensionados de forma a permitir
centrais nas carrocerias dos caminhões, per- o rodízio do material, principalmente os relaci-
mitindo que os militares fossem transporta- onados aos serviços vitais da Base, tais como
dos voltados para o exterior das Vtr. Como tratamento d’água e geração de energia.
essas Vtr não oferecem proteção balística No caso da Minustah, somente a partir
para a tropa, o CFN adquiriu Vtr blindadas de do 3o Contingente o GptOpFuzNav alcan-
transporte de pessoal sobre rodas (SR) Pira- çou a autossuficiência na produção e tra-
nha, que passaram a apoiar as ações do 9o tamento d’água, quando da incorporação
Contingente, ampliando a capacidade dos do equipamento de osmose reversa, que
GptOpFuzNav no Haiti. Atualmente, o possui elevada capacidade de purificação,
GptOpFuzNav no Haiti está sendo apoiado eliminando principalmente a salinidade.
por um Seção de Vtr Blindadas Piranha, com Todos os equipamentos que utilizam água
sete Vtr. Cabe ressaltar a capacidade de tratada pelo sistema convencional devem
trafegabilidade dos caminhões Unimog, am- ser manutenidos com maior frequência, ten-
plamente empregadas após o terremoto, per- do em vista que a salinidade depositada
mitindo o acesso a regiões impraticáveis para neles diminui seu rendimento.
a maioria dos meios SR. Além da preocupação em produzir água
Ao chegar na AOp, são confecciona- tratada, devem ser planejados sua estocagem
das UN driver’s license para todas as pra- e seu transporte. Para estocagem, podem ser
ças que possuem o Curso de Motorista utilizadas, além dos tanques Saac, caixas
Militar (C-Exp-MoMil) e oficiais, sendo pré- d’água. Deve ser previsto um sistema de dis-
requisito a Carteira Nacional de Habilita- tribuição para interligar a área de armaze-
ção, com validade até o final da missão. namento e tratamento com os pontos de uti-
A condução de Vtr à noite na cidade de lização d’água. Um aspecto crítico a ser con-
Porto Príncipe é extremamente dificultada siderado é a produção de dejetos, que é
pela má iluminação das vias e pela impru- grande e ininterrupta e impacta diretamente
dência de alguns motoristas haitianos, o nas condições sanitárias da Base. O planeja-
que ressalta a importância de instrução e mento deve contemplar, pelo menos, uma Vtr
prática de direção defensiva. As Vtr têm e um reboque cisterna para transportar a água
que estar com seus sistemas elétricos em necessária ao apoio da tropa, quando reali-
perfeitas condições, tendo sido adaptados zando tarefas fora da Base.
holofotes para melhorar a iluminação e pro- A capacidade dos geradores é fundamen-
ver melhores condições de segurança para tal para o bom funcionamento da Base, que
a tropa transportada. opera com cargas elevadas, em função da

RMB1 o T/2012 167


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

grande quantidade de equipamentos elétri- devem ser mantidos em funcionamento até


cos. O 1o Contingente do GptOpFuzNav no que fossas sejam construídas e o sistema
Haiti dimensionou a necessidade de três ge- de limpeza da ONU esteja funcionando com
radores de 340 kVA, em contêiner, o que se regularidade. Cabe ressaltar a grande im-
mostrou inicialmente adequado, tanto em ter- portância dada pela ONU à gestão
mos de carga elétrica gerada como em quan- ambiental, particularmente no tocante ao
tidade de geradores, possibilitando o rodízio manuseio de lixo e esgoto.
para manutenções preventivas e corretivas. Durante a operacionalização inicial, é
Atualmente, os geradores estão sendo contratada mão de obra local e reconheci-
redimensionados para 450 kVA, tendo em vis- do o comércio da cidade. O processo de
ta o aumento da demanda, para atender à edificação da Base é contínuo, buscando
exigência da ONU de que a cozinha seja to- melhorar as condições de segurança e con-
talmente elétrica. Foram, ainda, levados para forto para a tropa, e simultâneo às tarefas
a AOp geradores portáteis de menor capaci- operativas. No caso da BFNHarq, atingiu-
dade, que flexibilizam o se um nível de urbani-
apoio aos destacamen- zação e eficiência que
tos, cumprindo tarefas a tornou referência na
distantes da Base e por Cabe ressaltar a grande Minustah, possuindo,
períodos de tempo pro- importância dada pela inclusive, um ambien-
longados, como ocorri-
do em apoio às eleições
ONU à gestão ambiental, te arborizado que ame-
niza as características
do país. particularmente no tocante áridas da AOp.
ao manuseio de lixo e
OPERACIONALIZAÇÃO MANUTENÇÃO DA
DOS MEIOS NA esgoto CAPACIDADE
CHEGADA À ÁREA OPERATIVA
DE OPERAÇÕES
Observando que os primeiros contingen-
Encerrada a faina de desembarque dos tes no Haiti tiveram dificuldades para manter
meios e o transporte do material para a área da suas respectivas capacidades operativas, o
futura Base, deve ser atribuída prioridade ao Comando da FFE promoveu uma reestru-
estabelecimento das comunicações e à mon- turação interna e estabeleceu setores especí-
tagem das instalações de saúde, seguidas dos ficos para tratar de assuntos relacionados às
equipamentos do rancho. Para tal, os gerado- OpPaz, de forma a aprimorar o apoio aos
res de energia devem ser prontamente posi- GptOpFuzNav e otimizar recursos.
cionados e colocados em funcionamento. Ao ativar esse sistema de apoio logís-
Os contêineres são posicionados no tico de sustentação, foram criados: a Se-
terreno com equipamento orgânico ou alu- ção de Apoio à Operação de Paz (F-70),
gado na AOp, sobre blocos de cimento, de para exercer a supervisão geral da OpPaz
forma a facilitar a limpeza e a manutenção no Haiti; o Grupo de Apoio Logístico, com
das instalações elétricas e hidráulicas. representantes da FFE e do setor Coman-
Deve ser solicitada a instalação de ba- do Geral, para acompanhar a situação
nheiros químicos pela ONU, de forma a pre- logística e coordenar as medidas necessá-
servar o meio ambiente e proporcionar con- rias à solução de pendências existentes no
dições salubres à tropa. Estes banheiros GptOpFuzNav; o Grupo de Recebimento,

168 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

Triagem e Ressuprimento do material des- cidos pela ONU, as entregas devem ser ri-
tinado ao GptOpFuzNav no Haiti, para co- gorosamente checadas, cabendo a rejeição,
ordenar todas as atividades relacionadas caso os parâmetros de qualidade não se-
ao envio e recebimento da carga; e o Paiol jam satisfatórios.
Brasil, nas instalações do BtlLogFuzNav, No caso do Haiti, para o controle do
onde é concentrado todo o material desti- material permanente, a BFNHarq foi subdi-
nado à missão no Haiti. vidida em setores e incumbências, com os
Essas medidas da FFE foram imprescin- materiais distribuídos sob a responsabili-
díveis para o acompanhamento, em tempo dade dos respectivos encarregados. O con-
real, da situação logística do GptOpFuzNav trole passou a ser executado de acordo com
e, principalmente, para o comprometimen- a sistemática da MB, sendo enviadas as
to de todos os setores envolvidos com a listas das incumbências, com o respectivo
OpPaz. Passou-se a definir as prioridades material, para o Batalhão Logístico de Fu-
inerentes a cada necessidade e o setor res- zileiros Navais (BtlLogFuzNav), OM res-
ponsável por cada pendência, agilizando a ponsável pelo lançamento dos itens no Sis-
solução dos problemas. tema de Gestão de Bens da Fazenda Nacio-
Atualmente, o material necessário ao nal (Sisbenf).
GptOpFuzNav no Haiti é adquirido, prepa- Na AOp, é imperioso que o Programa de
rado e segregado no Paiol Brasil. A Seção Manutenção de Viaturas seja cumprido, re-
de Logística da FFE, em coordenação com alizando as rotinas básicas de sistemas, com
o 1o Depósito de Suprimentos do EB, é res- ênfase na manutenção pré e pós-exercícios.
ponsável pelo envio da carga para a AOp. Qualquer avaria no material deve ser
Na AOp, o manuseio do material, parti- comunicada ao Brabatt, haja vista ser ele o
cularmente os vitais para o funcionamento responsável pelo contato com a ONU, in-
da Base e o apoio ao CCT, é rigorosamente dependentemente das medidas administra-
acompanhado, de forma a antecipar-se a tivas a serem adotadas. Caso envolva ma-
problemas futuros. Nesse sentido, é impres- terial enquadrado como major equipment15,
cindível a troca de informações com a FFE, é obrigatório que seja encaminhado o res-
para garantir a continuidade dos pectivo inquérito técnico, circunstanciando
ressuprimentos e a constituição de esto- o ocorrido. Todo o material substituído,
ques balanceados. incluído ou repatriado, deve ser objeto de
O GptOpFuzNav executa o controle ri- informação para os inspetores do DPKO,
goroso de todo seu acervo, informando de forma que seja mantida atualizada a re-
periodicamente ao Brabatt e à FFE sua si- lação dos itens classificados como major
tuação logística: a disponibilidade de Vtr e equipment ou self sustainment16 junto à
equipamentos, o consumo ou avaria de ONU.
itens e o recebimento de materiais. Com relação aos meios, o ressuprimento
Gêneros, munição e medicamentos me- efetuado pelos voos de ApLog atende às
recem especial atenção, tendo em vista necessidades emergenciais, eventuais e de
possuírem prazos de validade relativamen- rotina, que demandam pequena cubagem.
te curtos em relação ao período da missão. O emprego de navios possibilita o rodízio
Com relação à água, gêneros e CLG forne- e a substituição seletiva dos meios pesa-

15
Material enquadrado como equipamento fundamental de grande porte, sujeito a reembolso específico.
16
Equipamento orgânico do contingente, intrínseco a sua capacidade operativa básica.

RMB1 o T/2012 169


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

dos. Os voos de manutenção, realizados soal, que deve manter uma capacidade
periodicamente com apoio da FAB, possi- operacional superior a 70% do seu efetivo
bilitam o envio de pessoal técnico para a durante todo o período da missão.
AOp, com a finalidade de sanar deficiênci-
as do material. INSPEÇÕES DE VERIFICAÇÃO DAS
O planejamento para o rodízio de pes- NAÇÕES UNIDAS
soal dos contingentes deve ser cuidado-
samente elaborado, observando-se as ori- Antes de qualquer contingente embar-
entações emitidas pelo MD e pela FFE, de car para uma OpPaz, o DPKO realiza a ins-
forma que os dois contingentes troquem peção pré-desdobramento no país de ori-
informações e transfiram as responsabili- gem, para checar a existência do material
dades, sem que haja comprometimento nem informado no MOU e, principalmente, se o
solução de continuidade nas tarefas do pessoal tem capacitação para operá-los.
GptOpFuzNav. Quando da chegada na AOp, o contingen-
Durante uma OpPaz, o exercício da lide- te sofre uma inspeção (Arrival Inspection)
rança deve ser estimu- para confirmar se foi
lado em todos os ní- levado para a missão
veis, com o desenvol- Cabe ao contingente o o material informado,
vimento de atividades
que contribuam para a
controle do seu pessoal, ocasião em que o
DPKO cataloga todos
manutenção do moral que deve manter uma os equipamentos e as
elevado da tropa e capacidade operacional Vtr.
para evitar o estresse Durante a missão,
inerente à missão. No superior a 70% do seu os contingentes so-
caso do Haiti, desta- efetivo durante todo o frem, mensalmente,
cam-se: a implemen- inspeções operacio-
tação da fonia social,
período da missão nais pelo DPKO, com
com Discagem Direta o propósito de verifi-
Internacional grátis, que permite o contato car se o material encontra-se operacional.
com os familiares no Brasil; o suprimento Em particular, é realizada uma inspeção ri-
reembolsável (cantina); a apresentação de gorosa de prontidão operativa (Opera-
seções de filmes; o acesso aos canais aber- tional Readiness Inspection – ORI), no
tos de televisão da Globo Internacional e meio do período da missão. Baseado nes-
da Bandeirantes, graças à instalação de sas inspeções, a ONU reembolsa os equi-
uma antena de TV da Embratel; a dis- pamentos disponíveis. As deficiências
ponibilização para a tropa de internet (Na- apontadas nas inspeções devem ser sana-
val-net); e a operacionalização da mala pos- das e informadas, de modo a não interrom-
tal. Além disso, desenvolveu-se o serviço per o reembolso. Quando do rodízio dos
de apoio às viagens de leave17 e de areja- materiais dos contingentes, somente é au-
mento18, facilitando o descanso e reduzin- torizado o emprego operativo dos meios
do o estresse dos militares. Ressalta-se que após a inspeção da ONU, quando esta pas-
cabe ao contingente o controle do seu pes- sa a controlar esses itens.

17
Leave – licença de 2,5 dias para cada 30 dias trabalhados, podendo se ausentar da área da missão.
18
Arejamento – licença de três dias na área da missão para cada 30 dias trabalhados.

170 RMB1 oT/2012


O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

CONCLUSÃO A rapidez e efetividade na operaciona-


lização dos meios na chegada à AOp devem
A possibilidade de a MB empregar um ser objeto de preocupação quando do plane-
Conjugado Anfíbio de natureza expedicio- jamento da missão. Nesse contexto, enfatiza-
nária, credencia o Poder Naval como vetor se que a seleção de materiais que proporcio-
de pronta-resposta do Brasil às solicita- nem flexibilidade, a priorização do funciona-
ções de Organismos Internacionais para a mento de equipamentos vitais e o apoio dos
realização de OpPaz. navios são fundamentais para a edificação da
A criação, na FFE, de uma estrutura ad- Base, de forma que o GptOpFuzNav seja ca-
ministrativa totalmente voltada para a paz de desencadear suas atividades
logística de sustentação de um operativas o mais cedo possível.
GptOpFuzNav que participa de uma OpPaz Com a operacionalização da Base, o es-
proporciona a integração dos setores en- forço passa a residir na manutenção da
volvidos com a operação. Tal estrutura capacidade operativa do GptOpFuzNav. As
otimiza recursos e concentra esforços no ligações permanentes e estreitas com o
desencadeamento das providências rela- escalão superior da missão, com os órgãos
cionadas à preparação e à manutenção dos da ONU responsáveis pelo apoio ao setor
contingentes durante a missão. militar e, principalmente, com a FFE são
O entendimento das normas das Nações imprescindíveis para que o contingente
Unidas, principalmente aquelas relaciona- receba apoio adequado e contínuo, e que
das à logística, é fundamental para que se- pendências logísticas sejam eliminadas.
jam realizadas as negociações entre o Bra- Ressalta-se a importância do GptOpFuzNav
sil e a ONU, evitados prejuízos nos reem- exercer um controle rigoroso de seu acer-
bolsos e compreendidos os direitos e de- vo e de seus estoques, de forma que sua
veres decorrentes do emprego de contin- capacidade operativa seja mantida duran-
gentes militares em OpPaz. te toda a missão.
Por se tratar, normalmente, de uma ope- Assim, a despeito da complexidade de
ração real e de longa duração, ressalta-se que se revestem as OpPaz, observando-se
que o planejamento do Casc deve ser mi- as particularidades intrínsecas às ativida-
nucioso e contemplar o estabelecimento de des logísticas de OpPaz, contingentes de
uma Base eficiente e autossustentável, GptOpFuzNav serão preparados com o
possibilitando que o GptOpFuzNav desen- material adequado e pessoal qualificado,
volva suas tarefas. permitindo o cumprimento de sua missão.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<FORÇAS ARMADAS>; Operação de Paz; Fuzileiros Navais; Organização Internacional;
Haiti; ONU;

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O ESFORÇO LOGÍSTICO PARA PREPARAR, OPERACIONALIZAR E MANTER UM GRUPAMENTO OPERATIVO DE
FUZILEIROS NAVAIS EM UMA OPERAÇÃO DE PAZ

REFERÊNCIAS

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172 RMB1 oT/2012


REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE
APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA
MARINHA DO BRASIL

REGINA BOANERGES SIQUEIRA*


Capitão de Fragata (T)

SUMÁRIO

Introdução
Redes de bibliotecas
Redes de bibliotecas universitárias
Redes de bibliotecas militares
Bibliotecas Integradas da Marinha (Rede BIM)
Bibliotecas Integradas do Exército (Rede BIE)
Rede de Bibliotecas do Ministério da Defesa (Rebimd)
Redes de bibliotecas como suporte ao ensino na MB
Conclusão

INTRODUÇÃO nos mais variados recursos documentais.


Seguindo o que Levacov (1997) afirma, o au-

H oje, uma biblioteca não trabalha isola-


da, seu acervo poderá estar fisicamente
em um lugar e as informações desse acervo
mento da procura por fontes, eletrônicas ou
não, reforça a necessidade de desenvolvi-
mento de novas estruturas para organizar as
estarão disponíveis para consulta em termi- informações contidas em bibliotecas, basea-
nal remoto para quem necessitar. Como rela- das no aprimoramento crescente e na dispo-
ta Marchiori (1997), uma série de catálogos nibilidade de novas tecnologias.
de bibliotecas já está acessível para que o Atendendo à demanda de uma bibliote-
usuário, de qualquer lugar, possa pesquisar ca, provavelmente, além dos dados dispo-

* Formada pela Universidade Federal Fluminense. Participou da implantação da Rede de Bibliotecas da


Marinha. Serviu na Biblioteca da Marinha e atualmente na Escola de Guerra Naval.
REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL

níveis em catálogos on-line, esta fará parte dade. A biblioteca que emprega as
de alguma rede de cooperação entre bibli- tecnologias de rede surgiu a partir da refle-
otecas com suas características de funcio- xão sobre a necessidade de informação rá-
nalidade, instituição, público-alvo e área pida e da vontade de mudanças de
de conhecimento, entre outras. paradigmas solidificados na área de
A Marinha do Brasil (MB) acompanha Biblioteconomia e estabelecidos durante
os avanços tecnológicos na área de muitos anos. A evolução da tecnologia da
Biblioteconomia, tendo sua Rede de Bibli- informação levou os administradores de
otecas Integradas, a Rede BIM. Suas bibli- bibliotecas a reavaliarem os produtos e
otecas cooperantes são de Organizações serviços, visando a um melhor atendimen-
Militares (OM) pertencentes ao Sistema de to ao usuário (Benine; Zanaga 2009).
Ensino Naval (SEN): Com o desenvolvimento das tecnologias
O ensino na Marinha possui característi- de informação, o termo cooperação ga-
cas próprias e obedece a um processo nhou novo alento entre as bibliotecas;
contínuo e progressivo de educação, os programas de cooperação começaram
constantemente aprimorado e atualiza- a ganhar forma no final dos anos 80 e
do, estendendo-se desde afirmação ini- consolidaram-se definitivamente em me-
cial até os níveis elevados de qualifica- ados dos anos 90 (Pinto, 2007, p. 2).
ção, visando a prover o conhecimento Para Robredo (2005), o Brasil, na primeira
básico, profissional e militar-naval neces- década do século XXI, não estava comple-
sário ao cumprimento da missão consti- tamente inserido na revolução das redes de
tucional da Marinha. (BRASIL, 2009). bibliotecas e dos catálogos cooperativos
O presente estudo fundamenta a impor- virtuais. Isso não significa que o crescimen-
tância que uma rede de bibliotecas e seus to não tenha ocorrido nos últimos anos, prin-
serviços podem ter no apoio ao ensino na cipalmente na área de ensino, incentivando
MB, resultando também em outros fatores a cooperação e a acessibilidade.
de relevância para o ensino naval, como As maiores redes de bibliotecas perten-
intercâmbio de informações e produção ci- cem ao meio acadêmico, universitário e de
entífica com instituições civis e de outros apoio ao ensino, conforme será tratado na
comandos militares. próxima seção.
Para esse fim, descreve-se um breve per-
fil das redes de bibliotecas, das redes de Redes de bibliotecas universitárias
bibliotecas universitárias e de seu valor no
contexto atual. Apresenta-se um pequeno Dziekaniak (2009) afirma que a bibliote-
histórico da implantação das redes de bi- ca deve assumir e desempenhar a função
bliotecas dos comandos militares e no Mi- de ator no processo educacional com uma
nistério da Defesa (MD), identificando os adequada estrutura. A mesma afirmação
recursos relevantes desta ferramenta está relacionada com o ensino superior, que
tecnológica para o ensino naval. tem na biblioteca universitária o instrumen-
to de disseminação da informação e troca
REDES DE BIBLIOTECAS de conhecimento. A biblioteca universitá-
ria, por ser também uma biblioteca pública,
De acordo com Tammaro e Salarelli promove e preserva ideias e o fluxo de in-
(2008), a rede como sistema de organiza- formações, sendo um suporte de investi-
ção tem uma característica peculiar: a agili- gação e educação dentro da sociedade.

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REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL

Segundo esses conceitos, a biblioteca uni- madas (FA)2 a criarem suas redes e uma rede
versitária evoluiu a partir das possibilidades de bibliotecas que comportará todas as ins-
criadas com os novos recursos tecnológicos, tituições militares em um futuro próximo.
criando-se nos últimos anos diversas redes
de cooperação de bibliotecas universitárias Bibliotecas Integradas da Marinha
em instituições públicas e privadas. Como (Rede BIM)
instituições públicas citam-se, por exemplo,
a Rede Minerva, da Universidade Federal do Como exposto anteriormente, a MB pos-
Rio de Janeiro (UFRJ); a Rede Sirius, da Uni- sui a sua rede de bibliotecas. A Rede BIM é
versidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ); gerenciada e coordenada, hoje, pela Diretoria
e a Rede de Bibliotecas da Universidade de do Patrimônio Histórico e Documentação da
São Paulo (USP)1. E, em redes de instituições Marinha (DPHDM). O projeto de implantação
privadas, pode-se citar a Rede Pergamum da da Rede começou em 2003 e disponibiliza, atu-
Pontifícia Universidade Católica do Paraná almente, 38 bibliotecas de diversas OM. Utili-
(PUCPR). za o Sistema Pergamum, software de
Como descreve Benini (2009), os siste- gerenciamento de bibliotecas, desenvolvido
mas de bibliotecas oferecem produtos pela PUCPR. Essa universidade gerencia mais
como catálogos on-line, bases de dados, de 110 bibliotecas centrais e suas subordina-
lista de novas aquisições e orientações para das, de instituições em sua maioria relaciona-
a normalização de trabalhos acadêmicos. das com o ensino superior3, solidificando, en-
Isso demonstrando que cada vez mais uma tão, a importância de uma tecnologia que aten-
rede de bibliotecas tem a função de apoiar da às necessidades dessa área.
o ensino, de forma ampla e significativa. O Manual de Procedimentos para cata-
logação da Rede BIM (2010) descreve como
Redes de bibliotecas militares
seus objetivos: integrar as bibliotecas das
Apesar de as instituições dos coman- diversas OM numa única base de dados,
dos militares possuírem em sua estrutura disponibilizar a consulta à base pela
organizacional uma biblioteca, estas, durante Internet/Intranet e promover a cooperação
anos, trabalharam de forma isolada ou com de dados e itens bibliográficos.
pouca cooperação entre elas. Mesmo pos- Esta iniciativa de implantação da rede ge-
suindo um público em potencial, militares rou nas OM de ensino uma nova ferramenta
da área de ensino e civis do meio acadêmi- de apoio. Informações foram disponibilizadas,
co, as bibliotecas eram pouco exploradas e para serem acessadas rapidamente e com qua-
divulgadas. Com a iniciativa de criação de lidade. Destaca-se que esse projeto foi pre-
uma rede de bibliotecas militares, tomada miado, em 2005, no 10o Concurso de Inova-
pela MB, as instituições perceberam que era ção na Gestão Pública Federal4. Enquadrado
necessário evoluir com os avanços no projeto de homologação de sistemas na
tecnológicos. Percebe-se, a seguir, que o MB, foi reconhecido como uma experiência
comprometimento e a experiência adquirida tecnológica que reduziu gastos orçamentári-
pela MB incentivaram todas as Forças Ar- os no setor público.
1
N.A.: Os acessos a estas redes de bibliotecas podem ser realizados pelos sítios das universidades citadas.
2
N.A.: Este artigo não descreve a Rede de Bibliotecas da Força Aérea Brasileira (FAB). Até a conclusão
deste trabalho, não havia disponibilidades técnicas sobre o projeto de criação de sua rede.
3
N.A.: Outras informações do software podem ser obtidas no site: http://www.pergamum.pucpr.br.
4
N.A.: Resultado disponível no site: http://inovacao.enap.gov.br.

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REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL

Bibliotecas Integradas do Exército tecas/centros de documentação do Minis-


(Rede BIE) tério da Defesa e dos comandos militares.
A Rede de Bibliotecas do Ministério da
Criada em 2007 pelo Departamento de Defesa (Rebimd) planejava disponibilizar
Educação e Cultura do Exército (Decex), a seus produtos e serviços no segundo se-
Rede de Bibliotecas do Exército utiliza o mestre de 2011, com a criação de um portal
mesmo software de gerenciamento de bi- de informações da Rebimd. O portal incluirá
bliotecas adotado pela MB, o Sistema os acervos das redes de bibliotecas da MB
Pergamum. Reúne acervos de mais de 60 e do EB, já existentes, e diversas outras in-
bibliotecas de OM em todo o País. Inclui formações das áreas de conhecimento do
em sua rede acervos de instituições de en- MD. Futuramente, a rede de bibliotecas da
sino como a Academia Militar das Agulhas FAB também será inserida neste portal. O
Negras (Aman), Escola de Sargentos das projeto de criação dessa rede surgiu a partir
Armas (Essa), Escola de Comando e Esta- da possibilidade de aproveitar as redes de
do-Maior do Exército (Eceme), colégios bibliotecas da MB e do EB. Utiliza-se o mes-
militares, entre outras (PORTAL..., 2011). mo software de gerenciamento de bibliote-
As bibliotecas integradas do Exército cas das redes existentes, o Sistema
apoiam diretamente todo o ensino, poden- Pergamum. Dentre seus objetivos, desta-
do ser, também, uma ferramenta de inter- cam-se a disponibilização de catálogos do
câmbio com outras instituições civis e mili- acervo das instituições participantes e a con-
tares. Essa rede possui procedimentos si- tribuição para o desenvolvimento
milares ao adotado na Rede BIM. A rede tecnológico e científico, bem como para a
do EB apresentou, igualmente, redução de capacitação profissional na área de Defesa
gastos orçamentários no serviço público Nacional (Brasil, 2011).
ao proporcionar às suas bibliotecas ape- Percebe-se, então, que essa rede de bi-
nas um sistema de gerenciamento. Maior bliotecas será mais uma contribuição ao
incentivo aos seus profissionais de acesso à informação, disponibilizando pro-
Biblioteconomia também ocorreu, devido dutos e serviços que também atenderão ao
à necessidade de pessoal qualificado para ensino dos comandos militares.
gerenciar a sua rede. E a grande procura de
seus serviços, mais diretamente relaciona- REDES DE BIBLIOTECAS COMO
dos aos setores de ensino do EB, compro- SUPORTE AO ENSINO NA MB
meteu a atuação do profissional de
Biblioteconomia dentro da instituição. As bibliotecas procuram se adequar às
necessidades das instituições de ensino.
Rede de Bibliotecas do Ministério da Como parte integrante de uma universida-
Defesa (Rebimd) de, escola etc., são avaliadas pelo Ministé-
rio da Educação (MEC)6. Portanto, os admi-
Por Portaria Ministerial do Ministério da nistradores dos sistemas de gerenciamento
Defesa (MD)5, em 2010 foi instituído um Gru- de bibliotecas têm a preocupação de inserir
po de Trabalho para integração das biblio- módulos relacionados com a biblioteca da

5
N.A.: Portaria no 918/Seori-MD, de 4 de junho de 2010, publicada no Diário Oficial da União n o 106,
Seção 2, de junho de 2010.
6
N.A.: Informações disponíveis em www.mec.gov.br.

176 RMB1 oT/2012


REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL

instituição, que auxiliem na avaliação do no, tomando o papel de um instrutor. Como


MEC. Um desses sistemas com essas carac- instrutor, estará mais preparado para apoi-
terísticas é o Sistema Pergamum. ar o aluno e incentivar a pesquisa acadêmi-
Os sistemas de gerenciamento apoiam o ca, gerando um novo fluxo de conhecimen-
ensino de forma organizada e em cooperação: tos e atualização profissional. Dentro des-
A estrutura em rede melhora o processo te quadro, o instrutor deve saber lidar com
de aprendizagem pelo fato de aproximar a ferramenta de acesso à informação com
indivíduos que, embora atuem distantes seus produtos e serviços, para que possa
um dos outros, são conectados por es- divulgar aos alunos suas possibilidades de
truturas que intensificam a comunicação busca de conhecimento.
e a troca de conhecimento (GONZALEZ; Entre os serviços oferecidos pela rede
MARTINS; TOLEDO, 2009). da MB, está o intercâmbio de bibliotecas,
As redes de bibliotecas estão surgindo muito utilizado pelas instituições de ensi-
para o aluno, o professor, o instrutor e o no, tanto no formato de empréstimo entre
pesquisador, como grandes fontes de pes- bibliotecas, como em troca de produção
quisa e de divulgação de produção acadê- acadêmica. Esses serviços, já solidificados
mica. Os serviços das redes não se restrin- na Rede BIM, são de muita importância e
gem apenas aos catálogos de seus acer- visam auxiliar na capacitação de pessoal
vos. As bibliotecas da MB, acompanhan- nos diversos cursos da MB. O serviço de
do esse segmento, por meio da sua rede, empréstimo entre bibliotecas, antes da cri-
apresentam diversas informações de inte- ação da Rede BIM, era pequeno e restrito,
resse para seus usuários. São mostrados devido à dificuldade de acessar acervos e
nas páginas das bibliotecas em questão à falta de pessoal qualificado. Hoje, com o
endereços eletrônicos em diversas áreas aumento de pessoal e a facilidade na con-
do conhecimento, bases de dados, portal sulta aos acervos, tornou-se um serviço
de periódicos, catálogos de teses, disser- cotidiano e simples para o usuário.
tações e trabalhos acadêmicos, uma estru- Orientar os corpos docente e discente
tura que tem o objetivo de selecionar e sobre a possibilidade de trazer o material
qualificar o conhecimento para o usuário. documentário até o usuário é um procedi-
Investindo em processo de busca compar- mento de rotina nas OM de ensino, pro-
tilhada, ou seja, na estrutura em rede, o cesso que acontece, inclusive, com OMs
usuário, com rapidez e eficiência, poderá de ensino denominadas fora de sede, que,
escolher a biblioteca que mais se asseme- utilizando o serviço postal da MB, conse-
lhe ao seu perfil para a busca de determina- guem encaminhar o material. Este serviço
do documento. não é restrito à rede da Marinha; a coope-
A biblioteca torna-se uma extensão do ração se faz em intercâmbio, com diversas
conhecimento adquirido nas salas de aula instituições civis, como universidades e
físicas ou virtuais, como é o caso do ensi- fundações, além de bibliotecas do Exército
no a distância, muito utilizado nos cursos e da Força Aérea.
do SEN. O usuário realiza suas pesquisas e A conexão entre as bibliotecas militares
adquire informações, alterando seu estado e civis de ensino acarretou maior colabora-
de conhecimento. Tal fato pode repercutir ção entre profissionais, mudanças de com-
na vida profissional desse usuário. Em de- portamento e a ultrapassagem dos limites
terminado momento de sua carreira naval, físicos de uma biblioteca. Contribui para
o militar poderá deixar de ser usuário/alu- que imagem de uma instituição militar de

RMB1 o T/2012 177


REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL

ensino possa ser inserida dentro do con- está participando do Sistema de Ensino
texto universitário e ser reconhecida como Naval, sendo este aluno ou instrutor.
fonte de conhecimento para vários segmen- Complementando: em todo esse proces-
tos da sociedade. so, cabe ao profissional bibliotecário rea-
Com a possibilidade de troca de infor- lizar esta conexão de produtos e serviços
mação entre as bibliotecas, os acervos das para apoiar o ensino. Um fator de desta-
bibliotecas de ensino tornaram-se trans- que na MB foi que, com a criação de sua
parentes e identificou-se que a aquisição e rede de bibliotecas, a instituição conse-
a permuta de material bibliográfico poderi- guiu aumentar seu efetivo de bibliotecári-
am ter melhor aproveitamento. Com o co- os, principalmente nas OM de ensino, de-
nhecimento dos acervos, as bibliotecas monstrando que esse é o ator principal
conseguiram trocar material de acordo com para que a tecnologia possa ser bem apli-
suas necessidades, ou seja, um item bibli- cada e utilizada e para que tenha resulta-
ográfico estaria armazenado e sem uso em dos efetivos.
um determinado acervo, mas se fosse des-
locado para outro acervo estaria próximo CONCLUSÃO
do usuário que efetivamente necessita. Isso
repercute em redução de custos na aquisi- As redes de bibliotecas surgiram e fo-
ção de material documental, fundamental- ram evoluindo de acordo com os avanços
mente nas bibliotecas de ensino que ne- tecnológicos disponíveis. A MB, em deter-
cessitam de investimento para qualificar e minado momento, percebeu a necessidade
quantificar seu acervo para avaliações de de se adequar à atualidade, acompanhan-
ensino. do as mudanças ocorridas em bibliotecas
Considerou-se, acima, a relevância dos de instituições de ensino civil. A estrutura
serviços oferecidos pela Rede BIM como de redes de bibliotecas da MB atende, com
ferramenta tecnológica na capacitação de seus produtos e serviços, a todo o ensino
pessoal. Destaca-se como um dos mais im- naval. O intercâmbio entre bibliotecas se
portantes, entre outros serviços, o emprés- apresenta como grande destaque dessa
timo entre bibliotecas, com o conhecimen- estrutura, bem como a redução de custos
to sendo encaminhado ao aluno. orçamentários a partir do melhor aprovei-
Contudo, outras redes de bibliotecas tamento dos acervos e serviços das biblio-
militares e civis já estão disponíveis para tecas, tendo como apoio e participação o
apoiar o ensino. O intercâmbio com outras profissional bibliotecário, o qual, hoje, está
bibliotecas promove a divulgação da MB e nas OM de ensino disponibilizando e
projeta a qualidade das bibliotecas do sis- gerenciando informações de qualidade
tema de ensino naval e a troca de produ- para seus usuários.
ção acadêmica de interesse. Isso oferece Portanto, com os recursos humanos e
ao aluno possibilidades de busca de co- tecnológicos disponíveis, considera-se
nhecimento em outras instituições, além do que as bibliotecas estão preparadas para
reconhecimento no meio civil de nossas atuar na capacitação de pessoal na MB.
instituições de ensino e pesquisa. Na Rede BIM, a biblioteca cooperante tor-
As bibliotecas da MB, por meio de seus nou o seu produto a informação, um pro-
bibliotecários, procuram auxiliar nesse duto de qualidade, relevante e rápido para
processo de intercâmbio, atuando na ge- o usuário, refletindo diretamente no apoio
ração de conhecimento do usuário que ao ensino naval.

178 RMB1 oT/2012


REDES DE BIBLIOTECAS: NOVAS TECNOLOGIAS DE APOIO NA CAPACITAÇÃO DE PESSOAL NA MARINHA DO BRASIL

Atualmente, o ensino naval tem recur- do à valorização do profissional, seja alu-


sos informacionais e tecnologia, com pou- no ou instrutor, dentro da instituição de
co investimento orçamentário, para utilizar ensino naval. Na visão de um bibliotecá-
em suas bibliotecas, gerando uma mentali- rio, comprova-se, com o texto, que os avan-
dade acadêmica, mentalidade de pesquisa ços tecnológicos podem afetar diretamen-
e de produção científica de qualidade nos te a capacitação do pessoal na MB, sendo
cursos da MB. Os recursos informacionais necessário apenas ensinar como utilizar os
tornaram-se acessíveis e confiáveis, visan- recursos tecnológicos existentes.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<EDUCAÇÃO>; Biblioteca; Ensino; Preparo do homem;

REFERÊNCIAS

A APLICAÇÃO das modernas ferramentas de gerenciamento no setor público: a implantação da


Rede de Bibliotecas das Forças Armadas. 24 f. (Monografia do Curso Superior da Escola de
Guerra Naval). Rio de Janeiro: Escola de Guerra Naval, 2009. Disponível em: http://
www.egn.mb/biblioteca/monografias/CSUP2009.htm. Acesso em: 10 jun. 2011.
BENINE, Fabiana; ZANAGA, Mariângela Pisoni. “Organização da informação em portais de bibli-
otecas universitárias”. Revista ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina, Florianópolis, v. 14,
no 2, p. 451-467, jul./dez. 2009.
BRASIL. Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha. DGPM-101: Normas para os cursos e estágios do
Sistema de Ensino Naval (SEN). 6. rev. Rio de Janeiro, 2009.
BRASIL. Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha. Manual de procedimentos
para catalogação da Rede BIM. Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://
www.dphdm.mar.mil.br/redeBim/download>. Acesso em: 13 jun. 2010.
BRASIL. Ministério da Defesa. Regimento Interno da Rede de Bibliotecas do Ministério da Defesa
(Rebimd). Brasília, DF, 2011. Em aprovação.
DZIEKANIAK, Cibele Vasconcelos. “Sistema de gestão para biblioteca universitária (SGBU)”.
TransInformação, Campinas, v. 21, no 1, p. 33-54, jan./abr. 2009.
GONZALEZ, R.V.D.; MARTINS, M.F.; TOLEDO, J.C. “Gestão do conhecimento em uma estrutu-
ra organizacional em rede”. Ciência da Informação, v. 38, no 1, p. 57-73, jan./abr. 2009.
LEVACOV, Marília. “Bibliotecas virtuais: (r)evolução?” Ciência da Informação, Brasília, DF, v. 26,
no 2, p. 125-135, maio/ago. 1997.
MARCHIORI, Patrícia Zeni. “‘Ciberteca’ ou biblioteca virtual: uma perspectiva de gerenciamento
de recursos de informação”. Ciência da Informação, v. 26, no 2, p. 115-124, maio/ago. 1997.
PORTAL de Educação do Exército Brasileiro. Redes de Bibliotecas do EB. Disponível em: http://
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PINTO, Ilda Maria Soares; CORREIA, Zita. “Bibliotecas militares portuguesas: um recurso negli-
genciado”. Revista Militar, jun. 2007. Disponível em: http://www.revistamilitar.pt/modules/
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ROBREDO, Jaime. Documentação de hoje e de amanhã... 4a ed. rev. e ampl. Brasília, DF: edição do
autor, 2005.
TAMMARO, Anna Maria; SALARELLI, Alberto. A biblioteca digital. Brasília, DF: Briquet de
Lemos, 2008.

RMB1 o T/2012 179


TERRORISMO MARÍTIMO*

ALEXANDRE ARTHUR CAVALCANTI SIMIONI1


Capitão de Corveta (FN)

SUMÁRIO

Introdução
Principais ataques terroristas no mar
Principais organizações terroristas com capacidade de
realizar ataques no mar
Principais ameaças ao setor marítimo
Navios militares como alvos compensadores
(ícones/alta repercussão na mídia)
Navios, portos e plataformas como alvos econômicos
Navios sendo empregados como armas
Navios como transporte de pessoas, cargas perigosas e
armas de destruição em massa
Sequestro de navios ou de membros da tripulação para
fins diversos
Principais equipamentos e tecnologias que contribuem
para o terrorismo marítimo
Principais estreitos e canais vulneráveis a ataques terroristas
Iniciativas legais internacionais
Outras iniciativas dos EUA para combater o terrorismo marítimo
Principais sistemas de segurança empregados na segurança de
navios e portos
Considerações finais

* Artigo publicado inicialmente na Revista da Escola de Guerra Naval, vol. 17, no 2/2012.
1
Mestre em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ (Programa Pró-
Defesa – área de estudo em terrorismo), mestre em Operações Militares pelo Exército Brasileiro;
Certificate in Terrorism Studies pela St. Andrews University – Reino Unido. Atualmente, exerce a
função de chefe da Divisão de Trabalhos Acadêmicos do Centro de Estudos do Corpo de Fuzileiros
Navais. E-mail para contato: tensimioni@hotmail.com.
TERRORISMO MARÍTIMO

INTRODUÇÃO Diante deste cenário, conclui-se que a


diversidade de meios empregados por or-

C ontrariando as expectativas otimistas


no pós-Guerra Fria em relação à segu-
rança2, o mundo se vê perplexo pela esca-
ganizações terroristas tem ampliado o con-
ceito de guerra/conflito armado, sobretu-
do a ambiência das atividades relaciona-
lada da violência expressa pelas novas ame- das à guerra. Ou seja, as guerras deste iní-
aças globais, como o narcotráfico, o crime cio de século poderão ser caracterizadas
organizado, ameaças ecológicas, ameaças pelo uso da força das armas, mas também
aos direitos humanos, ameaças financei- com o emprego de outros meios. Os novos
ras, pandemias globais e o terrorismo in- princípios não prescrevem mais “o empre-
ternacional, por colocarem em risco a inte- go da força armada para compelir um inimi-
gridade dos povos, a estabilidade dos Es- go à nossa vontade”, e sim, “a utilização
tados e os esforços pela paz e pela segu- de todos os meios, militares e não milita-
rança mundial. res, letais e não letais, para compelir um
Os atentados ao World Trade Center e inimigo aos nossos interesses”. (LIANG e
ao Pentágono em 11 de setembro de 2001, XIANGSUI, 1999)
nos Estados Unidos da América (EUA), le- As organizações transnacionais, tam-
vando à morte cerca de 3 mil pessoas de 88 bém denominadas “Estado-Rede” por Ma-
nações, bem como as imagens inesquecí- nuel Castells (1999), caracterizam-se por não
veis da destruição de dois ícones (capita- possuírem território, população ou
lista e militar) do Estado norte-americano, infraestrutura, mas sim “armas” e ativida-
abriram um novo capítulo na história da des de inteligência, e empregarem ações
humanidade, marcando de forma contun- de “guerra não militar” para atacar a comu-
dente este tipo de terrorismo com ações de nidade internacional. Nesse caso, as fron-
proporções globais e ilimitadas, expresso teiras nacionais, as legislações, as regras
sob múltiplas formas, meios e métodos de de combate e os princípios éticos não têm
ataque e nutrido por motivações políticas, qualquer efeito restritivo sobre suas ações.
étnicas e religiosas. Ao se deparar com este tipo de oponente,
Uma das consequências desses ataques não há como realizar uma declaração for-
diz respeito à multiplicidade de meios em- mal de guerra, assim como não haverá um
pregados neste tipo de ação, que podem campo de batalha definido. Contudo, sabe-
ser: explosivos, homens-bombas, vírus de se que a destruição e os danos sofridos
computador, aeronaves como mísseis, ou, não serão, de forma alguma, inferiores àque-
até mesmo, em um futuro próximo, navios les de uma guerra militar tradicional: a mai-
sendo empregados como bombas, transpor- oria desses ataques não será de ações mi-
te de terroristas ou armas Nucleares, Bioló- litares, porém de força destrutiva idêntica
gicas, Químicas ou Radiológicas (NBQR). ou superior à das guerras militares.

2
No imediato pós-Guerra Fria, acreditava-se em uma era de paz e prosperidade, pois, como na visão
idealista de Francis Fukuyama (1992), “um mundo feito de democracias liberais teria menor incen-
tivo para as guerras”. Porém essa esperança de um mundo sem guerras “catastróficas” de caráter
global, como as vivenciadas no século XX, foi dissolvida ao presenciarmos conflitos como os de
Somália, Ruanda, Bósnia, Kosovo, Chechênia, Afeganistão e Iraque. Donald Kagan (apud SILVA,
2004) já apontava que “há mais de dois séculos, a única coisa mais comum que as previsões sobre o
fim da guerra tem sido a própria guerra, (...) [uma vez que,] estatisticamente, a guerra tem sido mais
comum que a paz” na história da humanidade.

RMB1 o T/2012 181


TERRORISMO MARÍTIMO

Essas características do terrorismo inter- Verifica-se, então, que o terrorismo con-


nacional ensejam um novo conceito que ex- temporâneo4 distingue-se das outras for-
plora a correlação entre guerra e terrorismo, mas de violência organizada não apenas
prescrevendo o aprestamento de todos os pela severidade de seus ataques, com um
meios disponíveis, a informação em tempo maior potencial de letalidade, mas pela sua
real e a presença do campo de batalha em amoralidade e pelo desrespeito às legisla-
todos os lugares. Segundo Fialho (2002), os ções vigentes, repudiando qualquer com-
ataques de 11 de setembro deram origem a prometimento com a ética e a moralidade,
um novo cenário mundial em que a luta con- possuindo, ainda, como característica
tra o terrorismo passou a representar um marcante a indiscriminação de alvos, com
verdadeiro estado de guerra permanente, ações programadas de forma a surpreen-
descaracterizando a clara distinção anterior der e aterrorizar a população.
entre guerra e paz. Diversos Estados, entre eles o Brasil,
Neste contexto, o terrorismo surge, nes- têm procurado adequar os instrumentos de
te início de século, como um dos fenôme- segurança e de defesa colocados à sua dis-
nos políticos3 de maior impacto na seguran- posição para o enfrentamento da ameaça
ça internacional e à paz mundial, em função terrorista, tanto no âmbito interno, por meio
da natureza de suas ações, tendo a capaci- de preparo e adequação de suas institui-
dade de tornar qualquer pessoa um alvo em ções, quanto no âmbito externo, por meio
potencial, disseminando, dessa forma, a in- da cooperação internacional, concretizada
timidação coletiva. Sua imprevisibilidade e pelas convenções, resoluções, acordos e
a violência provocam o sentimento de inse- protocolos.
gurança, vulnerabilidade e impotência a to- Analisando-se as medidas de seguran-
dos os Estados e cidadãos. ça adotadas pelos Estados no pós-11 de

3
Aqui, o conceito contemporâneo de terrorismo segue a abordagem de WHITTAKER (2005), segundo a
qual as ações terroristas possuem um objetivo político, com o propósito de conquistar o poder para
atingir alguma mudança política. Ou seja, o que se busca, em última análise, é uma mudança do status
quo de seus países com uso indiscriminado da violência, amplificado, atualmente, pelas facilidades
da globalização e pelo uso dos meios de comunicação.
4
Diante de um fenômeno de tamanha complexidade, não existe, ainda, um consenso sobre a definição de
terrorismo na literatura. Diversos autores, entre eles Laqueur, Jenkins, Shmid e Jongman, têm
trabalhado sobre esta questão, sem, contudo, chegar a uma definição formal sobre o conceito do
terrorismo, em função de suas diferentes motivações, e fatores políticos, sociais e econômicos,
entre outros.
A noção do que pode ser considerado terrorismo possui alguns aspectos polêmicos. O que pode ser
considerado terrorismo na Europa, predominantemente cristã, pode não o ser no Oriente Médio,
predominantemente muçulmano, ou em outras regiões do mundo, com diferentes culturas. Essas
divergências explicam o insucesso da Organização das Nações Unidas (ONU) em tentar achar uma
definição universal de terrorismo, visto que o terrorismo de Estado poderia ser imputado até mesmo
a alguns dos países-membros daquela Organização. Segundo Shimid e Jongman (apud AKPAN,
2007), em 1988 havia 109 definições sobre terrorismo. Laqueur (2002) também apresentou em
seus estudos mais de 100 definições sobre o tema, concluindo que “somente a violência ou a ameaça
de violência apresenta-se como uma característica comum às definições de terrorismo”. Apesar
desta indefinição generalizada, para atingir o propósito deste estudo utilizar-se-á a definição de
terrorismo empregada pelo governo dos Estados Unidos da América (EUA, 2001 apud WHITTAKER,
2005): “Violência premeditada e politicamente motivada, perpetrada contra alvos não combaten-
tes por grupos subnacionais ou agentes clandestinos, normalmente com a intenção de influenciar
uma audiência”.

182 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

Setembro, principalmente nos EUA e na monstram como navios são potencialmente


Europa, verifica-se que foram priorizadas vulneráveis aos terroristas.
as questões de segurança contra a possi- Após os eventos de 11 de setembro de
bilidade de atentados provenientes de ter- 2001, a 22a sessão da Assembleia da Organi-
ra, por meio de explosivos, e pelo ar, com o zação Marítima Internacional (International
emprego de aeronaves, como observado Maritime Organization – IMO), em novem-
nos ataques de 2001. bro de 2001, concordou unanimemente em
Diante deste fato, surgiu uma nova pre- desenvolver novas medidas relativas à pro-
ocupação de que organizações terroristas teção de navios e a instalações portuárias.
estivessem desenvolvendo tecnologias, No ano seguinte, em 12 de dezembro, foi
técnicas e procedimentos para valer-se do adotado o Código Internacional para a Pro-
ambiente marítimo, a fim de conduzir seus teção de Navios e Instalações Portuárias
ataques neste meio, por ser, em tese, me- (International Ship and Port Facility Security
nos protegido e de difícil controle. Code – ISPS Code), que tem como propósi-
Essas preocupações foram confirmadas to estabelecer uma estrutura internacional
durante as ações dos EUA no Afeganistão envolvendo a cooperação entre governos
contra a Al Qaeda no pós-11 de Setembro, contratantes, órgãos governamentais, ad-
ocasião em que foram encontrados 241 ministrações locais e as indústrias portuária
vídeos sobre procedimentos de operações e de navegação, a fim de detectar ameaças à
navais, com ações defensivas e ofensivas, proteção e tomar medidas preventivas con-
desenvolvidos por Marinhas e guardas cos- tra incidentes de proteção que afetem navi-
teiras, assim como táticas empregadas por os ou instalações portuárias utilizadas no
piratas e outras organizações terroristas e comércio internacional5.
separatistas. Além desses vídeos, foram en- Esse Código entrou em vigor no âmbito
contrados, ainda, manuais de treinamento, internacional em 1o de julho de 2004, con-
bem como planejamentos prontos para se- tando atualmente, no Brasil, com a partici-
rem executados, especificamente, para alvos pação ativa da Autoridade Marítima6 nas
no mar da Ásia, no Golfo e no Mediterrâneo. águas jurisdicionais brasileiras. No que
Alguns desses manuais mostraram que or- tange às instalações portuárias, estas fi-
ganizações terroristas estão em estágio bem cam a cargo da Comissão Nacional de Se-
avançado de treinamento para desencadear gurança Pública nos Portos, Terminais e
ataques tanto pela superfície quanto ataques Vias Navegáveis (Conportos), auxiliada pe-
com o emprego de mergulhadores ou ho- las Comissões Estaduais de Segurança
mens-bombas-torpedos (RICHARDSON, Pública nos Portos, Terminais e Vias Nave-
2004). Exemplos como os ataques ao USS gáveis (Cesportos). Ainda em 2002, a IMO
Cole, MV Limburg e ao Super Ferry 14 de- instituiu dois outros sistemas visando re-

5
O Código Internacional para a Proteção de Navios e Instalações Portuárias (ISPS) é constituído de uma
Parte A, de cumprimento obrigatório, e de uma Parte B, com caráter recomendatório, de acordo
com o Capítulo XI da Convenção Solas. O Código foi adotado em 12/12/2002 pela Resolução no 2
da Conferência Diplomática dos Governos Contratantes da Convenção Solas-74 e entrou em vigor,
internacionalmente, em 1/7/2004. No Brasil, o Diário Oficial da União n o 137 de 21/7/09 (Seção1,
Pág. 30) publicou a Portaria no 7 de 20/7/09, dando publicidade ao texto em português consolidado
da Parte A, incluídas as emendas até 1o de janeiro de 2009. Para mais informações, ver: www.imo.org.
6
Autoridade Marítima: designação dada ao comandante da Marinha, pela Lei Complementar 97, de 1999,
para o trato das atribuições subsidiárias particulares da Marinha do Brasil.

RMB1 o T/2012 183


TERRORISMO MARÍTIMO

forçar a segurança a bordo dos navios, nos interesses nacionais, livre de pressões
portos, terminais e plataformas de petró- e ameaças de qualquer natureza, e a ga-
leo: o Sistema de Identificação Automática rantia aos cidadãos do exercício dos di-
(Automatic Identification System – AIS) e reitos e deveres constitucionais.
o Sistema de Alerta de Proteção de Navio
(Ship Secure Alert System – SSAS). Já a Organização das Nações Unidas
Embora o percentual de incidentes ter- define Segurança como:
roristas no mar represente apenas 2% do [...] a condição de proteção em que se
total de ataques realizados ao longo dos considera que os Estados ou os indiví-
últimos 30 anos7, somente a possibilidade duos estejam expostos, em pequena
de organizações terroristas conseguirem medida, ao perigo de um ataque militar,
realizar ataques a navios, plataformas de a penúrias econômicas, pressão políti-
petróleo ou de transportar uma arma NBQR ca ou injustiças sociais.
em um contêiner para ser detonada ao atin-
gir um superporto (megaport) localizado Alguns Estados complementam o en-
em uma cidade-alvo, por si só, já merece tendimento do que seja a Segurança com
atenção de governos, pois o impacto de alguns parâmetros objetivos. Entre eles,
um ataque dessa natureza em termos de destacam-se: determinação do agente hos-
vidas humanas e sobre a economia mun- til, seu risco ou ameaça e os interesses na-
dial é incalculável. cionais, entre outros.
Em meio a esses acontecimentos, ob- O estabelecimento desses parâmetros
serva-se que o Brasil, por meio de suas permite a base de estudos para a coorde-
ações da política externa, vem procuran- nação das políticas e estratégias subordi-
do, nestes últimos anos, projetar o País nadas ao Estado, priorizando os bens a
de forma a angariar maior inserção na are- proteger, segundo os riscos e as ameaças
na das decisões mundiais. Porém, ao bus- atuais, o que, atualmente, torna-se cada vez
car esta posição no concerto internacio- mais difícil, em função das ameaças
nal, é preciso que o Estado esteja prepa- transnacionais, características deste mun-
rado para a entrada em um mundo de com- do globalizado do século XXI.
petição global e sujeito a qualquer tipo de Verifica-se, portanto, que a Segurança
retaliação, inclusive terrorista. Nesse sen- do Estado deve ser flexível, de forma a se
tido, a partir do momento em que o Brasil adequar a qualquer tipo real ou potencial
elevar sua participação na arena competi- de hostilidade, bem como estar preparada
tiva, necessitará de mais segurança, pois, para a possibilidade de um risco se trans-
conforme as palavras de Kissinger, “[...] formar em ameaça. Isso implica possuir uma
política sem o respaldo da força é mero estrutura realmente capaz de planejar, pre-
exercício de retórica”. parar, coordenar e executar ações eficazes
A Política de Defesa Nacional (2005) e eficientes para enfrentar os desafios des-
define Segurança como: te século.
[...] a condição que permite ao País a Em relação ao emprego das Forças Ar-
preservação da soberania e da integri- madas para fazer frente ao terrorismo, a
dade territorial, a realização dos seus temática apresenta aspectos controversos,

7
RAND Corporation’s Terrorism Chronology Database e RAND-MIPT Terrorism Incident Database (In:
Murphy, 2007)

184 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

pois, após o 11 de Setembro, observou-se participativo de todas as Marinhas do mun-


a presença dos meios militares na luta con- do no combate ao terrorismo, ao tráfico de
tra o terrorismo, principalmente pelo fato drogas e à pirataria nos mares, bem como
de a Organização do Tratado do Atlântico na promoção da estabilidade econômica e
Norte (Otan) ter evocado o contido no Ar- política, de forma a assegurar a liberdade
tigo V do Tratado de Washington de 1949, de navegação, o fluxo do comércio maríti-
que trata da solidariedade entre os seus mo e a proteção de recursos marinhos.
membros em caso de agressão8. Nessa visão, a força naval norte-america-
Nesse contexto, observa-se que os Es- na de 313 navios, prevista para 2020, seria
tados alinhados à causa da Guerra Global complementada com as unidades navais
Contra o Terrorismo, desencadeada pelos das nações amigas e parceiras dos EUA10
EUA no pós-11 de Setembro, têm revisado para atingir este propósito. (ROTH, 2010)
suas estratégias de Defesa e Segurança No Brasil, o emprego da Marinha do Bra-
para adaptá-las ao terrorismo internacio- sil (MB) na consecução de suas atribuições
nal, estabelecendo papéis e responsabili- subsidiárias, relacionadas às ações preventi-
dades além daqueles tradicionalmente es- vas e repressivas do Poder Naval contra os
tabelecidos para as Forças Armadas. No delitos de repercussão nacional ou internaci-
que concerne à segurança marítima, o co- onal, como o narcotráfico e o terrorismo, é
mandante de Operações Navais dos EUA, regulamentado pela Lei Complementar no 97,
Almirante Mike Mullen, apresentou em de 9 de junho de 1999, com as alterações
2006 a ideia da criação de uma “Marinha de introduzidas pela Lei Complementar no 117,
Mil Navios” (1.000 Ship’s Navy)9. O pro- de 2 de setembro de 2004, e Lei Complemen-
pósito dessa iniciativa visava ao emprego tar no 136, de 25 de agosto de 201011. Desta

8
Existe uma grande discussão sobre o emprego ou não das Forças Armadas no combate ao terrorismo.
Uma vertente defende que o terrorismo é uma questão de ordem interna dos Estados, devendo,
portanto, ser combatido por meio das instituições domésticas como as forças de segurança, as
alfândegas, as repartições de emigração e, sobretudo, a justiça. Uma outra vertente identifica as
organizações terroristas como grupos que operam a partir do exterior e, portanto, admite o uso das
Forças Armadas, incumbidas por definição da defesa externa. (DIAMINT, 2003)
9
O conceito da “Marinha de Mil Navios” tomou a forma da chamada “Parceria Marítima Global”
(Global Maritime Partnership).
10
Para aprofundar o tema sobre a nova estratégia dos EUA e os conceitos da “Marinha de Mil Navios”
e “Parceria Marítima Global”, ver: http://www.usnwc.edu/getattachment/72712d53-8ef1-4784-
925b-93c765c94e89/Perspectivas-sobre-Estrategia-Maritima-(1).
11
Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999. Art. 16-A. Cabe às Forças Armadas, além de outras
ações pertinentes, também como atribuições subsidiárias, preservadas as competências exclusivas
das polícias judiciárias, atuar, por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa de fronteira
terrestre, no mar e nas águas interiores, independentemente da posse, da propriedade, da finalidade
ou de qualquer gravame que sobre ela recaia, contra delitos transfronteiriços e ambientais, isolada-
mente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, executando, entre outras, as
ações de (incluído pela Lei Complementar no 136, de 2010):
I – patrulhamento (incluído pela Lei Complementar no 136, de 2010);
II – revista de pessoas, de veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves (incluído pela Lei
Complementar no 136, de 2010); e
III – prisões em flagrante delito (incluído pela Lei Complementar no 136, de 2010).
Art. 17. Cabe à Marinha, como atribuições subsidiárias particulares:
I – orientar e controlar a Marinha Mercante e suas atividades correlatas no que interessa à defesa
nacional;
II – prover a segurança da navegação aquaviária;

RMB1 o T/2012 185


TERRORISMO MARÍTIMO

forma, verifica-se que, atualmente, a MB pos- 460 nos próximos dois anos. A Transpetro
sui o amparo legal (poder de polícia) para opera uma frota de 50 navios e deverá al-
atuar contra os crimes transfronteiriços, por cançar 112 navios nos próximos três anos.
meio das operações de Patrulha Naval Em relação à infraestrutura portuária,
(Patnav)12, cujas atividades são conduzidas o Brasil possui 34 portos públicos maríti-
por meios navais e aéreos, com o propósito mos e 129 terminais de uso privativo. So-
de implementar e fiscalizar o cumprimento de mente o porto de Santos possui uma área
leis e regulamentos, em águas jurisdicionais de 7,7 milhões de m², mais de 500 mil m²
brasileiras, na plataforma continental e no em armazéns, com uma hidrelétrica loca-
alto-mar, respeitados os tratados, convenções lizada dentro do porto capaz de produzir
e atos internacionais ratificados pelo País. 15 mil kVA. Em 2010, 5.748 navios atraca-
Os números apresentados pelos ram nesse porto, movimentando mais de
palestrantes durante a Conferência Nacio- 76 milhões de toneladas de cargas, re-
nal de Segurança e Proteção Marítima, rea- presentando ¼ de toda a balança comer-
lizada no Rio de Janeiro em 2011, confir- cial brasileira (US$ 289,7 bilhões de dóla-
mam a importância de segurança e defesa res em 2009)14.
das riquezas presentes na Amazônia Azul Embora, atualmente, a “real” ameaça à
para o País, que podem, em última análise, segurança e ao comércio marítimo tenha
ser alvos de ataques terroristas. Mais de sido a pirataria, em face do aumento sig-
90% do comércio exterior são feitos pelo nificativo de ataques a navios nas últi-
mar. Somente a Petrobras produz mais de mas décadas, há uma grande preocupa-
2,34 milhões boe/d13, sendo 87% da produ- ção, por parte dos governos e estudio-
ção localizada no mar (mais de 2 milhões sos, com a relação entre pirataria e terro-
boe/d). As reservas comprovadas de óleo rismo marítimo.
e gás do País somam 15,28 bilhões de boe, A pirataria na costa da Somália, por exem-
sendo que 91% dessas reservas estão lo- plo, já é capaz de realizar seus ataques em
calizadas na plataforma continental. A em- alto-mar, empregando navios maiores e
presa possui, atualmente, 120 plataformas tecnologias disponíveis no mercado, como
de petróleo, com previsão de serem 130 até o Sistema de Identificação Automática e o
2013. Além disso, conta com 250 embarca- Sistema de Posicionamento Global, na iden-
ções contratadas que prestam apoio às pla- tificação de seus navios-alvo, por exemplo.
taformas e com previsão de serem mais de Da mesma forma, há indícios de que algu-

III – contribuir para a formulação e a condução de políticas nacionais que digam respeito ao mar;
IV – implementar e fiscalizar o cumprimento de leis e regulamentos, no mar e nas águas interi-
ores, em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, federal ou estadual, quando se fizer
necessária, em razão de competências específicas;
V – cooperar com os órgãos federais, quando se fizer necessário, na repressão aos delitos de
repercussão nacional ou internacional, quanto ao uso do mar, águas interiores e de áreas portuárias,
na forma de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e de instrução (incluído pela Lei
Complementar n o 117, de 2004).
Parágrafo único. Pela especificidade dessas atribuições, é da competência do comandante da
Marinha o trato dos assuntos dispostos neste artigo, ficando designado como “Autoridade Maríti-
ma” para esse fim.
12
Decreto n o 5.129/2004.
13
Barris de óleo equivalente/dia.
14
Números apresentados durante a Conferência Nacional de Segurança e Proteção Marítima, 2011.

186 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

mas organizações terroristas, motivadas por Diante deste cenário, este artigo pretende
seus objetivos políticos e ideológicos, po- apresentar, sumariamente, algumas conside-
deriam estar desenvolvendo suas táticas, rações sobre o terrorismo marítimo. Inicial-
meios e capacidades para executar ataques mente, será discutida a importância no
por via marítima. Além disso, poderia haver aprofundamento dos estudos deste tema,
uma aproximação entre o crime organizado haja vista os indícios de que algumas organi-
da pirataria e terroristas, de forma a aumen- zações terroristas, motivadas por seus obje-
tar os lucros e levantar fundos com o pro- tivos políticos e ideológicos, poderiam estar
pósito de financiar ataques futuros15. desenvolvendo suas táticas, meios e capaci-
Comparado com a pirataria, o terroris- dades para executar ataques por via marítima
mo marítimo é um campo relativamente no pós-11 de Setembro de 2001. Posterior-
novo nos estudos do terrorismo e mente, serão apresentados os principais ata-
contraterrorismo, haja vista que, como ci- ques terroristas efetuados no mar, assim
tado anteriormente, apenas 2% de todos como, as organizações com capacidade de
os ataques terroristas realizados nas últi- realizá-los. Além disso, serão mencionadas
mas décadas foram caracterizados como as principais ameaças e os locais mais vulne-
terrorismo marítimo. ráveis ao setor marítimo na atualidade. Por
Desta forma, os especialistas em terro- fim, serão indicadas algumas iniciativas le-
rismo, ao analisarem os piores cenários de gais internacionais e os principais sistemas
terrorismo marítimo, os classificaram como de segurança contra atentados terroristas.
sendo de “alto impacto, porém de baixa
PRINCIPAIS ATAQUES
probabilidade”. No entanto, desde o caso
TERRORISTAS NO MAR
do sequestro do navio Achille Lauro, em
1985, e a prisão de dois principais mem- De acordo com o National Consortium
bros da Al Qaeda, Khalid Sheikh for the Study of Terrorism and Responses
Mohammed (em 2003) e Abd al-Rahim al- to Terrorism (Start)18, houve, entre 1970 e
Nashiri (em 2002), terem expressado a real 2010, 181 incidentes de terrorismo marítimo,
intenção de realizar terrorismo marítimo, conforme apresentado no gráfico:
18
esta é uma possibilidade que não pode ser
desprezada pelos governos. Estima-se que 15

quase 90% de todo o comércio mundial são 12


transportados pelo mar, empregando pelo
9
menos 50.054 navios16 e 4.571 portos17, ha-
6
vendo, ainda, inúmeras rotas marítimas ain-
da desprotegidas e suscetíveis a ataques 3
terroristas, suscitando, portanto, uma gran-
de preocupação de que a indústria maríti-
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19

ma torne-se um provável alvo do terroris- Fig.1: Incidentes de terrorismo marítimo entre


mo transnacional. 1970 e 2010 – Fonte: Start, 2011
15
Universidade St. Andrews.
16
http://www.marisec.org/shippingfacts/worldtrade/number-of-ships.php
17
http://www.worldportsource.com/index.php
18
Para outras informações sobre incidentes terroristas marítimo, ver: http://www.start.umd.edu/gtd/
search/Results.aspx?start_yearonly=&end_yearonly=&start_year=&start_month=&start_day=
&end_year=&end_month=&end_day=&asmSelect0=&asmSelect1=&target=11&dtp2=all&success=
yes&casualties_type=b&casualties_max=

RMB1 o T/2012 187


TERRORISMO MARÍTIMO

Não obstante, organizações terroristas ataque, 17 membros da tripulação morre-


e grupos guerrilheiros/separatistas têm ram e 39 ficaram feridos. Estima-se que o
demonstrado interesse em desenvolver atentado ao USS Cole tenha custado à Al
suas capacidades de conduzir ataques no Qaeda US$ 50 mil, enquanto o reparo do
mar em termos de armamento, tecnologia e navio somou as cifras de US$ 350 milhões.
táticas, como observado nos ataques aos Este foi o segundo atentado a navios
navios Achille Lauro, em 1985; Petro Ran- da Marinha dos EUA. O primeiro foi reali-
ger, em 1998; Our Lady Mediatrix, em 2000; zado em janeiro daquele ano contra o USS
USS The Sulivans, em 2000; USS Cole, em The Sullivans, porém a lancha estava mui-
2000; M/V Ocean Silver, em 2001; M/V to pesada e afundou antes de colidir com o
Sintel Marine 88, em 2002; M/V Limburg, navio.
em 2002; M/V Trimanggada, em 2003; M/V
M/V Limburg
Penrider, em 2003; M/V Dong Yih, em 2003;
Em 6 de outubro de 2002, o superpe-
e o Super Ferry 14, em 2004.
troleiro francês M/V Limburg, carregado
Dentre esses incidentes, quatro casos
com aproximadamente 400 mil barris de pe-
na história recente chamaram a atenção da
tróleo bruto, foi atacado por um pequeno
comunidade internacional para a emergên-
bote carregado com explosivos por ho-
cia do terrorismo marítimo: os ataques aos
mens-suicidas da Al Qaeda, próximo ao
Achille Lauro, USS Cole, M/V Limburg e
porto de Mina AL-Dabah, no Iêmen. O im-
Super Ferry 14.
pacto da explosão foi suficiente para per-
Achille Lauro furar o casco duplo do navio. Aproximada-
Primeiro atentado terrorista no mar de mente 90 mil barris de petróleo foram espa-
grande repercussão na mídia. Em 7 de ou- lhados pelo Mar da Arábia. Os rumores do
tubro de 1985, o cruzeiro italiano Achille incidente foram suficientes para elevar o
Lauro foi sequestrado por quatro membros preço do petróleo em 1,3% nas primeiras
da organização terrorista Frente de Liber- horas após o ataque, assim como o seguro
tação da Palestina, no Egito. A exigência para os navios com destino ao Iêmen
dos terroristas era de que 50 palestinos triplicou um dia após o incidente.
presos em Israel fossem libertados. Após
Super Ferry 14
Israel não aceitar esta demanda, os terro-
No dia 26 de fevereiro de 2004, a organi-
ristas mataram um passageiro norte-ameri-
zação Abu Sayyaf Group (ASG) realizou
cano. Depois de prolongada negociação
um ataque a bomba no Super Ferry 14,
com autoridades italianas, egípcias e sírias,
empregando oito libras de TNT. Este navio
os terroristas concordaram em finalizar o
do tipo roll on/roll off, com capacidade de
sequestro, em 9 de outubro daquele ano.
até 1.747 passageiros, era usado como
USS Cole transporte de passageiros entre Manila e
Em 12 de outubro de 2000, o USS Cole Davao. Após as explosões, 116 passagei-
foi atacado por uma lancha com dois ho- ros morreram e o navio afundou.
mens-bombas suicidas da Al Qaeda. Acre-
PRINCIPAIS ORGANIZAÇÕES
dita-se que a embarcação estava carrega-
TERRORISTAS COM CAPACIDADE
da com, aproximadamente, 500 libras de
DE REALIZAR ATAQUES NO MAR
explosivos C4. Esta carga foi suficiente para
abrir uma avaria de 12 por 12 metros no Os ataques do 11 de Setembro confir-
costado do navio norte-americano. Nesse maram a hipótese da natureza indiscrimina-

188 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

da e imprevisível dos ataques perpetrados tecnologias primárias de stealth para redu-


pelas organizações terroristas. Diante des- zir a capacidade de detecção de suas em-
sa premissa, é factível que tais organiza- barcações. Quando o grupo foi desestru-
ções desenvolvam técnicas, táticas e ca- turado pelas Forças Armadas do Sri Lanka,
pacidades para atacar pelo mar. Contudo, projetos de minissubmarinos, minas flutu-
são relativamente poucos os grupos que antes, torpedos e explosivos submarinos
têm a capacidade de realizar operações foram descobertos em suas instalações.
marítimas, destacando-se entre eles: Áreas de Atuação – Basicamente na
Liberation Tigers of Tamil Eelam (LTTE), costa nordeste do Sri Lanka e sul da Índia.
Al Qaeda, Abu Sayyaf Group (ASG), Moro Principal ataque – Em 23 de outubro de
Islamic Liberation Front (MILF), Palestinian 2000, quatro embarcações com tripulações
Islamic Jihad e Jemaah Islamiyad (JI) 19. suicidas conseguiram penetrar a zona de
segurança do porto de Tricomalee, no Sri
Liberation Tigers of Tamil Eelam (LTTE) Lanka. Os terroristas conseguiram destruir
Informações gerais – Este grupo lutava um navio de transporte de tropa da SLN.
pela independência do Estado de Tamil, no Aproximadamente 40 marinheiros foram fe-
norte do Sri Lanka, até encerrar suas ativi- ridos neste ataque.
dades em 2009. Em seu braço marítimo, tam-
bém conhecido como Sea Tigers, chegou a Abu Sayyaf Group (ASG)
possuir 3 mil membros e entre 100 e 200 Informações gerais – Categorizada
embarcações. O grupo realizou diversos como um grupo separatista, esta organi-
ataques no mar, muitos deles considera- zação está baseada no sul das Filipinas e
dos sofisticados, com emprego de mergu- é influenciada ideologicamente pela Al
lhadores e com equipamentos similares aos Qaeda. Conduziu seu primeiro ataque em
usados por mergulhadores de combate. 1991. Para financiar suas atividades, este
Acredita-se que as técnicas suicidas utili- grupo realiza sequestros, assaltos e pira-
zadas nos ataques ao USS Cole e ao taria, incluindo incursões em resorts para
Limburg foram as mesmas desenvolvidas praticar sequestros de ocidentais, como
pelo Black Sea Tigers, seção do Sea Tigers observado nas ações em Sabah – Malásia,
especialmente treinada para conduzir mis- em 2000 – e em Palawan – Filipinas, em
sões suicidas. 2001. Além da Al Qaeda, o grupo tem co-
Táticas – Ataques marítimos suicidas, nexões com o Jemaah Islamiyad (JI) e
assim como táticas de perfídia para realizar Kumpulan Mujahedeen Malaysia (KMM).
seus ataques a navios mercantes ou a na- Acredita-se que possua entre 200 e 500
vios da Marinha do Sri Lanka (SLN)20. integrantes.
Meios – Estima-se que o grupo chegou Táticas – Principalmente ataques de pi-
a possuir quase 200 embarcações, incluin- rataria, assassinatos e sequestros. O gru-
do algumas de até 50 pés, equipadas com po tem ameaçado atacar a indústria do pe-
metralhadoras .50. Desenvolveram, ainda, tróleo e o comércio marítimo regional.

19
Informações retiradas do módulo sobre Terrorismo Marítimo do curso Terrorism Studies da St. Andrew’s
University. Para aprofundar as informações sobre estas organizações, ver também: http://
www.start.umd.edu/start/data_collections/tops/
20
Em uma de suas ações, esta organização chegou a pintar seus navios com as mesmas cores dos navios
da SLN, assim como usar uniformes militares para conduzir seus ataques a navios comerciais,
simulando uma inspeção oficial.

RMB1 o T/2012 189


TERRORISMO MARÍTIMO

Meios – Estima-se que a organização pos- ção islâmica, formada na década de 1970, e o
sua pelo menos 300 fuzis, incluindo fuzis de seu objetivo é a luta pela independência da
assalto M-16, explosivos, morteiros e equipa- minoria étnica moro, nas Filipinas. Há suspei-
mentos de comunicações de última geração. tas de que esta organização esteja vinculada a
Áreas de Atuação – Basicamente na outras duas organizações terroristas: o Jemaah
costa da Malásia e Filipinas. Islamiyad (JI) e o Abu Sayyaf (ASG).
Principal ataque – Ataque a bomba no Táticas – Guerrilha e ataques suicidas.
Super Ferry 14, em fevereiro de 2004. Este Meios – Explosivos.
navio do tipo roll on/roll off era usado como Áreas de Atuação – Filipinas.
transporte de passageiros entre Manila e Principal ataque – A organização foi res-
Davao. Após as explosões, 116 passagei- ponsabilizada pelos ataques ao Ferry Our
ros morreram. Lady Mediatrix, em 2000, e ao cais em
Davao, em 2003, onde havia dois ferries
Anti-Israel Groups interilhas ancorados. Nestes ataques mor-
Informações gerais – Desde 1966, o con- reram 16 pessoas e 55 foram feridas.
flito entre Israel e palestinos possui uma
dimensão no mar. Porém, desde o 11 de Jemaah Islamiyad (JI)
Setembro, analistas apontam para o aumen- Informações gerais – O Jemaah
to de atentados a navios israelenses por Islamiyad é uma organização islâmica ter-
organizações terroristas palestinas no Es- rorista localizada na Indonésia. Seu objeti-
treito de Málaca, semelhantes aos ataques vo é o de unificar o sul das Filipinas com
realizados ao USS Cole e Limburg. Como Indonésia, Malásia, Singapura, Brunei e os
exemplos de organizações palestinas que muçulmanos denominados deep south da
incluem o terrorismo marítimo como moda- Tailândia, para formar uma República
lidade de ataque estão: Hamas, Hezbollah islâmica na região. Acredita-se que o gru-
e Paletinian Islamic Jihad (PIJ). po tenha conexões com o ASG e o Milf.
Táticas – Entre as táticas usadas, incluem Táticas – Principalmente ataques por
ações suicidas com o emprego de embarca- terra. Porém, em dezembro de 2001, o De-
ções, mergulhadores e a tática da perfídia. partamento de Segurança de Singapura
Meios – Não confirmados. descobriu o planejamento de um ataque
Áreas de Atuação – Não confirmadas. coordenado contra vários alvos, incluindo
Principal ataque – Em 22 de novembro de um ataque suicida, semelhante ao realiza-
2002, um barco pesqueiro foi preparado com do ao USS Cole, e a um navio norte-ameri-
bombas para explodir ao entrar na área patru- cano atracado na base naval de Xangai.
lhada pelas forças de Israel. Quando uma pa- Meios – Armas automáticas, explosivos
trulha israelense se aproximou para identificar e lança-granadas.
a embarcação, as bombas foram detonadas. Áreas de Atuação – Filipinas, Indonésia,
Felizmente, a bomba foi acionada prematura- Malásia, Singapura, Brunei e Tailândia.
mente, causando pequenas avarias ao navio Principal ataque – A organização foi res-
israelense; contudo, quatro membros da tri- ponsabilizada pelo planejamento de aten-
pulação israelense foram feridos neste ataque. tados a navios norte-americanos ancora-
dos no porto Sembawang Wharf e na Base
Moro Islamic Liberation Front (Milf) Naval de Xangai. Porém tais ataques não
Informações gerais – Categorizado como foram executados por falta de experiência
um grupo separatista, o Milf é uma organiza- na condução de ataques. No entanto, este

190 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

incidente aponta para possibilidades futu- Khawr Al Armaya (Abot e Kaaot) em abril
ras desta organização conduzir ataques a 2004. Atentados, sem êxito, aos USS
instalações portuárias. Kearsarge e USS Ashland, localizados no
porto de Aqaba em agosto de 2005. Aten-
Al Qaeda tado suicida, sem êxito, ao petroleiro japo-
Informações gerais – Estima-se que a Al nês M Star, em 28 de julho de 2010, no Es-
Qaeda possua mais de 20 organizações treito de Hormuz.
filiadas, espalhadas em mais de 60 países.
Desde os ataques do 11 de Setembro, as me- PRINCIPAIS AMEAÇAS AO SETOR
didas de segurança desenvolvidas pelos pa- MARÍTIMO
íses têm tornado extremamente difíceis as
ações por parte das organizações terroristas Os atentados do 11 de Setembro de 2001
por terra ou pelo ar. Diante desse fato, espe- ao World Trade Center e ao Pentágono de-
cialistas em terrorismo passaram a estudar a monstraram como aeronaves civis, sem qual-
possibilidade de que a Al Qaeda passasse a quer tipo de alteração em sua estrutura ou
desenvolver técnicas para realizar ataques preparadas com explosivos, foram empre-
pelo mar. Essas previsões foram confirmadas gadas para atingir os ícones capitalista e
na ação de captura de Osama Bin Laden no militar dos EUA, além, é claro, de terem cau-
Paquistão, em que as análises dos computa- sado um grande impacto na economia e se-
dores confirmaram as intenções do grupo em rem alvos considerados de alta letalidade
realizar terrorismo marítimo como estratégia (mass casuality). Transportando este cená-
para atingir a economia ocidental, conforme rio para o mar, surgem algumas possibilida-
apresentado anteriormente. des de ameaças que o setor marítimo pode
Táticas – Ataques marítimos suicidas enfrentar em futuro próximo:
com embarcações e mergulhadores. Porém – navios militares como alvos
a maior preocupação é que a organização compensadores (ícones/alta repercussão
empregue armas NQBR em seus futuros na mídia);
ataques. No que concerne ao terrorismo – navios, portos e plataformas como al-
marítimo, a preocupação é que essas ar- vos econômicos;
mas sejam transportadas em contêineres e – navios sendo empregados como armas;
detonadas ao atingir algum superporto. – navios como transporte de pessoas,
Meios – Não confirmados. cargas perigosas e armas de destruição em
Áreas de Atuação – A organização ain- massa;
da tenta manter suas conexões em todo o – sequestro de navios ou de membros
globo, mesmo após a morte de Osama Bin da tripulação para fins diversos.
Laden. Em relação ao terrorismo marítimo,
as principais preocupações recaem sobre Navios militares como alvos
as conexões no sudeste da Ásia, particu- compensadores (ícones/alta
larmente na Malásia, nas Filipinas, na repercussão na mídia)
Indonésia e em Singapura. O grupo possui
ligações com o ASG, o Milf e o JI. Navios de guerra podem ser considera-
Principal ataque – Ataques suicidas ao dos alvos em potencial para organizações
USS Cole e ao M/V Limburg em 2002, am- terroristas, como a Al Qaeda e o LTTE. O
bos na costa do Iêmen. Ataques suicidas LTTE executou mais de 40 ataques suicidas
aos terminais de petróleo em Al Basrah e contra navios da Marinha do Sri Lanka en-

RMB1 o T/2012 191


TERRORISMO MARÍTIMO

tre 1990 e 200921. Os atentados ao USS Cole região, causando um caos nas bolsas de
e ao USS The Sullivans em 2000, no Iêmen; valores mundiais e interrompendo o merca-
os atentados ao USS Ashland e USS do de petróleo temporariamente.
Kearsarge na Jordânia, em 2005; os planos Em relação às instalações de petróleo e
descobertos de ataque a navios dos EUA gás, verifica-se que a Al Qaeda realizou al-
em Singapura e no Estreito de Hormuz, as- guns ataques por terra a instalações de pe-
sim como os planos contra navios do Reino tróleo na Arábia Saudita e no Iraque, de-
Unido no Estreito de Gibraltar, apontam para gradando, sensivelmente, a produção de
a possibilidade de ataques futuros a navios óleo e a economia local. No entanto, aten-
de guerra como um alvo compensador. tados a terminais ou ataques a plataformas
de petróleo por via marítima são raros. Há
Navios, portos e plataformas como relato de apenas uma tentativa de ataque,
alvos econômicos por mar, a um terminal de petróleo iraquiano.
Em abril de 2004, três embarcações da Al
Em um vídeo divulgado em 2004, Osama Qaeda estavam a seis milhas da costa de
Bin Laden demonstrou sua vontade de fa- Basra, navegando em direção aos terminais
zer com que os EUA falhem economicamen- de petróleo. Um navio-patrulha norte-ame-
te. Não há dúvidas de que o petróleo é uma ricano foi enviado para realizar a identifica-
fonte de energia de vital importância para o ção e a inspeção destas embarcações. Ao
desenvolvimento de qualquer país, como se aproximar, uma das embarcações foi ex-
também o é para a economia norte-america- plodida pelos terroristas suicidas, matan-
na. As consequências econômicas do ata- do três marinheiros norte-americanos. As
que ao MV Limburg, em 2002, fez com que o outras duas embarcações iniciaram o des-
preço do petróleo subisse nas primeiras locamento na direção do terminal, porém
horas após a divulgação na mídia sobre o explodiram antes de atingir o alvo. Não há
ataque, assim como fez com que triplicassem relatos de que incidentes desta natureza
os valores de seguros de navios para aque- tenham se repetido até então; contudo, as
la região. Contudo, por meio de uma análise consequências econômicas no mercado
mais aprofundada, verifica-se que as mundial serão altíssimas caso um ataque
consequências econômicas desse ataque desses seja bem-sucedido.
ficaram limitadas à região do Oriente Médio Em termos de análise das probabilidades
e foram rapidamente superadas. de ameaça, a Universidade de St. Andrew’s
No entanto, após Abd al-Rahim al- considera que a probabilidade de um navio
Nashiri ter anunciado que a Al Qaeda plane- ser empregado como arma para atingir um
java atacar, simultaneamente, vários navios porto é baixa, porém com um alto impacto
petroleiros no Estreito de Hormuz, com o para a economia caso se concretize. Esta
propósito de causar o maior dano possível análise fundamenta-se na dificuldade de
à economia ocidental, as medidas de segu- manobrar navios e na necessidade de se ter
rança contra o terrorismo marítimo foram in- um planejamento detalhado das instalações
tensificadas. O planejamento a ser executa- portuárias, a fim de que o navio atinja um
do pela organização seria o de afundar vári- local que possa maximizar os danos, como,
os navios petroleiros, de forma a bloquear o por exemplo, armazéns com produtos infla-
estreito e impedir o comércio marítimo na máveis ou depósito de combustíveis.

21
St. Andrew’s University, 2011.

192 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

Navios sendo empregados como armas Como citado anteriormente, outra possi-
bilidade é que organizações terroristas em-
Navios poderão ser empregados, em preguem os navios para obstruir a passa-
similitude com as aeronaves usadas nos gem em algum estreito ou canal, afundan-
ataques do 11 de Setembro, como armas do-os ou utilizando a sua carga para fazê-lo,
para atacar terminais de petróleo e gás, pla- como, por exemplo, despejando óleo ou
taformas, portos, outros navios ou espa- contêineres no mar. Em 2005, relatórios de
lhando cargas ou substâncias no mar que segurança apontavam para a possibilidade
afetem o meio ambiente e o comércio marí- de ataques terroristas a navios no Canal de
timo. Um pequeno bote, rebocador ou trai- Suez, na tentativa de afundá-los e impedir o
neira, por exemplo, pode ser preparado com tráfego marítimo. (ibidem, 2007)
explosivos para uma missão suicida. Em termos de análise das probabilidades
Um exemplo histórico demonstra o po- de ameaça, a Universidade de St. Andrew’s
der destrutivo de um navio carregado considera que a probabilidade de que um na-
com material inflamável ou explosivo. Em vio de grandes proporções seja empregado
6 de dezembro de 1917, o navio francês como arma é baixa, porém com alto impacto.
Mont Blanc, transportando 2.500 tonela- Esta análise fundamenta-se na dificuldade de
das de benzol, TNT e ácido pícrico, ex- manobrar navios maiores e, em termos de des-
plodiu no porto de Halifax, Nova Escó- truição, o impacto é alto, em face da quantida-
cia, Canadá. Mais de 1.600 pessoas mor- de de combustível e outros materiais trans-
reram imediatamente com as explosões. portados em um navio deste porte.
Posteriormente, as mortes chegaram a Para o caso de pequenos botes, a proba-
mais de 2 mil pessoas e mais de 9 mil feri- bilidade é alta, porém com um baixo impac-
dos. (MURPHY, 2007) to. Esta análise fundamenta-se na facilidade
Fazendo um paralelo com os ataques do de aquisição e manobrabilidade de embar-
11 de Setembro, o potencial destrutivo que cações de menor porte e, em termos de des-
navios carregados com substâncias peri- truição, o impacto é baixo, em face da quan-
gosas, como nitrato de amônia (utilizado tidade de combustível e explosivos que uma
para produzir fertilizante, porém altamente embarcação pequena pode transportar
explosivo), cargas voláteis (como gás na- (exceto se empregado contra um alvo ícone,
tural, LNG ou LPG) ou petróleo é enorme, em face da repercussão na mídia).
podendo se tornar um meio para que orga- Para a situação de uso de navios para po-
nizações terroristas empreguem esses na- luir um canal ou estreito, a Universidade con-
vios como bombas. sidera a probabilidade alta, porém com um bai-
Outro fator preocupante recai no furto xo impacto. Esta análise fundamenta-se na te-
de embarcações com o propósito de usá- oria de que é necessário apenas um único na-
las em ataques terroristas. Em 2 de outubro vio para espalhar grande quantidade de óleo,
de 2002, o jornal The Economist reportou a porém o impacto no meio ambiente e na eco-
preocupação de especialistas ingleses ba- nomia pode ser considerado apenas local.
seados na Aegis Defense Services (ADS) Já para o caso de afundar navios, a fim
de que rebocadores estariam sendo furta- de bloquear um estreito ou canal, conside-
dos no Estreito de Málaca e que poderiam ra-se a probabilidade baixa, porém com um
ser usados por terroristas a ataques a por- alto impacto. Esta análise fundamenta-se na
tos ou para rebocar grandes navios a se- dificuldade de afundar vários navios para
rem usados como bombas. atingir este objetivo, porém, caso seja con-

RMB1 o T/2012 193


TERRORISMO MARÍTIMO

cretizado um ataque dessa natureza, o im- cadastro de tripulantes dos navios. Uma
pacto será alto para o comércio marítimo. pesquisa realizada em 54 administradoras
marítimas pelo International Maritime Bureau
Navios como transporte de pessoas, (IMB) revelou mais de 12 mil irregularidades
cargas perigosas e armas de destruição no cadastro de pessoas que trabalham no
em massa setor marítimo. Diante desse fato, alguns
especialistas em terrorismo marítimo acredi-
As maiores preocupações no pós-11 de tam que pode haver algumas células terro-
Setembro em relação ao terrorismo interna- ristas “adormecidas” atuando legal ou ile-
cional recaem sobre a possibilidade de or- galmente no comércio marítimo, esperando
ganizações terroristas terem acesso a ma- apenas uma ordem para entrar em ação.
terial NBQR. A preocupação de terroristas estarem
Não obstante, especialistas apontaram sendo transportados em contêineres foi
para a possibilidade de armas de destrui- confirmada em outubro de 2001, pratica-
ção em massa, principalmente bombas ra- mente um mês após os ataques ao World
diológicas, conhecidas como bombas su- Trade Center. Autoridades portuárias itali-
jas (dirty bombs), e terroristas serem trans- anas do porto Gioia Tauro descobriram um
portados em contêineres. passageiro clandestino dentro de um
A revolução na logística mundial, contêiner, o qual possuía cama, comida e
provocada pela movimentação de cargas água suficiente para uma longa viagem. O
por meio de contêineres, em face da veloci- passageiro de nacionalidade egípcia, po-
dade nas operações de carga e descarga e rém com passaporte canadense, possuía
à proteção às mercadorias, proporcionou dois telefones celulares, telefone satelital,
também um grande risco à segurança, ten- laptop, diversas câmeras, credenciais de
do em vista que não há como autoridades segurança e certificados de mecânico de
portuárias e aduaneiras realizarem a inspe- voo de quatro grandes companhias aéreas
ção em 100% dos contêineres. dos EUA. Além desse caso, foi declarado
Somente em 2010, estima-se que houve a pelo chefe do Comitê de Inteligência do
movimentação de mais de 20 milhões de Senado dos EUA, senador Bob Graham,
contêineres em todo mundo, sendo que que 25 “extremistas” entraram em solo nor-
menos de 2% deles foram inspecionados te-americano por meio de viagens em
fisicamente ou escaneados por equipamen- contêineres. (RICHARDSON, 2004)
tos com a tecnologia de raio X e raio gama Em termos de análise das probabilida-
(X-ray e gamma ray scanners). De acordo des de ameaça, a Universidade de St.
com a Universidade de St. Andrew’s, 7 mi- Andrew’s considera que a probabilidade
lhões de contêineres entram nos EUA anu- de transportar cargas perigosas e terroris-
almente, sendo que menos de 5% são fisi- tas em contêineres é alta, porém com um
camente inspecionados ou escaneados. No baixo impacto em termos de destruição.
Brasil, 70 milhões de toneladas foram movi- Essa análise fundamenta-se na dificuldade
mentadas em contêineres em 2010, com pre- em inspecionar 100% dos contêineres e o
visão de atingir 200 milhões até 2030. impacto ser apenas local.
Navios e contêineres poderiam também Já para o caso de transporte de armas
ser empregados para transporte de cargas de destruição em massa, considera-se de
perigosas e terroristas. Atualmente, verifi- probabilidade baixa, porém com alto impac-
ca-se que uma das grandes dificuldades é o to. Esta análise fundamenta-se na comple-

194 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

xidade de adquirir e esconder uma arma ganharem experiência na manobra de na-


NBQR, porém, em caso de detonação, os vios de grande porte naquele estreito.
impactos em vidas humanas e para a eco- Em termos de análise das probabilidades
nomia são altíssimos. de ameaça, considera-se que a probabilida-
de de sequestros a navios e tripulações de
Sequestro de navios ou de membros da navios é alta, porém de baixo impacto.
tripulação para fins diversos
PRINCIPAIS EQUIPAMENTOS E
Segundo a Universidade de St. TECNOLOGIAS QUE CONTRIBUEM
Andrew’s, o sequestro de navios pode ser PARA O TERRORISMO MARÍTIMO
perpetrado por diversas razões, entre elas:
pirataria com fins políticos, “escola de na- Segundo estudos desenvolvidos pela
vegação”, tomada de reféns e, obviamen- Universidade de St. Andrew’s, há diversas
te, terrorismo marítimo. tecnologias e equipamentos vendidos li-
– Pirataria com fins políticos: a linha que vremente no mercado e de difícil controle
separa a pirataria e o terrorismo, neste caso, que poderão ser empregados por organi-
é tênue. Geralmente, o objetivo de piratas é zações terroristas, como, por exemplo:
o ganho financeiro, fruto do seu roubo, po- – Lanchas rápidas, como as lanchas pneu-
rém o dinheiro arrecadado do sequestro de máticas e de casco rígido – Encontradas fa-
navios e sua tripulação poderá ser utilizado cilmente no mercado e de simples operação,
para financiar organizações terroristas. as quais poderão ser empregadas em ataques
– “Escola de Navegação”: no pós-11 suicidas, como visto anteriormente.
de Setembro, especialistas em terrorismo – Equipamento de mergulho de circuito
alertaram para a possibilidade de organi- fechado – Recicla o oxigênio e não produz
zações terroristas estarem desenvolven- bolhas, o que dificultaria a identificação
do suas capacidades marítimas, entre as dos mergulhadores. Apesar do mergulho
quais a possibilidade de sequestro de tri- ser limitado a aproximadamente 10 metros
pulações com o propósito de aprender de profundidade, é o suficiente para que
como manobrar navios. Um caso em espe- organizações terroristas realizem um ata-
cial chamou a atenção da comunidade in- que submerso.
ternacional: no dia 26 de março de 2003, – Veículos de propulsão submarina (sea
quando o navio Dewi Madrim estava na- scooters) – Não são difíceis de operar, são
vegando na costa da Sumatra, sua tripu- de baixo custo e, dependendo do tipo, per-
lação foi surpreendida pelo ataque de um mitem uma autonomia de 90 minutos a uma
“grupo de piratas” bem armados. De acor- velocidade de 3,5 km/h, operando entre 20
do com o jornal The Economist de 2 de e 30 metros de profundidade.
outubro de 2003, os “piratas” navegaram – Minissubmersíveis (Swimmer
por uma hora pelo Estreito de Málaca e Delivery Vehicles) – Não são facilmente
depois deixaram o navio, sequestrando o encontrados no mercado civil, porém há
comandante e o imediato do navio, sem firmas que constroem este equipamento
deixar qualquer pedido de resgate. Espe- para fins turísticos (geralmente para duas
cialistas de Londres, baseados na Aegis pessoas), podendo ser empregados por ter-
Defense Services (ADS), acreditam que roristas. O Departamento de Segurança dos
esse sequestro foi realizado por terroris- EUA já adicionou o minissubmersível em
tas e não por piratas, com o propósito de seu boletim, com instruções para que es-

RMB1 o T/2012 195


TERRORISMO MARÍTIMO

colas de mergulho e lojas reportem qual- pontos de passagem de elevado valor es-
quer atividade suspeita em relação à com- tratégico, como estreitos e canais de grande
pra e/ou uso desse tipo de equipamento. circulação de navios, chamados de choke
Um fato que chamou a atenção de especi- points. Nesses locais, os navios estão mais
alistas foi o sequestro de um instrutor de mer- vulneráveis a ataques de piratas e terroris-
gulho em junho de 2003 pela organização ter- tas, em função de serem obrigados a nave-
rorista Abu Sayyaf. Por ocasião de sua liberta- gar em velocidade reduzida. Entre esses
ção, o instrutor reportou que o grupo estava choke points vulneráveis a ações terroris-
interessado em que ele ensinasse técnicas de tas, destacam-se: Estreito de Gibraltar,
mergulho. Experts em contraterrorismo apon- Bósforos, Canal de Suez, Estreito de Málaca,
tam que a Al Qaeda pode estar treinando seus Canal do Panamá, e estreitos de Hormuz,
membros para realizarem ataques empregan- Bab el-Mandeb, Sunda e Lombok22.
do técnicas de mergulho, com sea scooters e – Estreito de Málaca: possui 805 km de
homens-bombas-torpedo. extensão e 2,8 km (1,5 milha náutica) de
– Equipamentos de navegação, como o largura no seu ponto mais estreito. Este
Global Positioning System (GPS), e o estreito é considerado a rota mais perigosa
Automated Identification System (AIS) – O aos ataques. Um quarto de todo comércio
GPS poderia, por exemplo, ser usado para mundial, incluindo metade de todo o tráfe-
acompanhar o deslocamento de um contêiner go de óleo bruto do leste da Ásia e dois
que está transportando uma bomba suja (radi- terços de todo o comércio de gás natural
ológica) e detoná-la a distância no local dese- liquefeito, passa por este estreito. Aproxi-
jado. Já em relação ao AIS, este é um sistema madamente 600 navios passam por este
que informa o nome do navio, seu rumo, seu choke point por dia.
destino, sua velocidade e detalhes sobre a – Estreito de Bab el-Mandeb: extensão
carga transportada. Organizações terroristas de 30 km e largura de 2,8 km no seu ponto
de posse de um equipamento-receptor AIS mais estreito. Aproximadamente 3,3 milhões
podem empregá-lo para selecionar seus alvos. de barris de óleo são transportados por dia
por este estreito. Principal entrada dos na-
PRINCIPAIS ESTREITOS E CANAIS vios ao Mar Vermelho.
VULNERÁVEIS A ATAQUES – Estreito de Hormuz: estreito de 280 km
TERRORISTAS de extensão e 2,8 km de largura no seu pon-
to mais estreito. Aproximadamente 15 mi-
A presença de algumas características lhões de barris de petróleo são transporta-
da geografia marítima cria condições favo- dos por dia por esta rota. Conecta o Golfo
ráveis ao terrorismo marítimo, tais como os Pérsico ao Mar da Arábia.

22
Cabendo aqui um breve questionamento: estariam as organizações terroristas estudando geoestratégia
para atingir seus propósitos? Um dos principais historiadores navais e geoestrategista foi o britâni-
co Sir Julian Stafford Corbett (1854-1922). O construto teórico de Corbett para a Estratégia Naval
estava pautado na proteção das vias de comunicação marítimas. O autor sustentava a teoria de que
o objeto da guerra naval deveria ser o de assegurar o comando do mar ou negá-lo ao inimigo. Segundo
Corbett, o comando do mar estaria relacionado ao controle das vias de comunicação marítimas,
com propósitos comerciais ou militares. Para tanto, o controle dessas vias seria relevante, além do
das bases navais, dos terminais das rotas comerciais e das áreas focais, onde convergem as rotas.
Corbett definiu dois métodos fundamentais para obter o controle das vias de comunicação maríti-
mas: a destruição física ou a captura de navios de guerra ou mercantes inimigos e o bloqueio naval.
(CAGARRINHO, 2011)

196 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

– Bósforos: 30 km de extensão e aproxi- – Convenção para a Repressão de Atos


madamente 700 metros de largura no pon- Ilícitos contra a Segurança da Navegação
to mais estreito. Conecta o Mar Negro ao Marítima (Convention for the Suppression
Mediterrâneo. Anualmente, aproximada- of Unlawful Acts against the Safety of
mente 50 mil navios usam esta rota, sendo Maritime Navigation – SUA).
10% deste total, aproximadamente, de pe-
troleiros transportando óleo russo e Medidas legais pós-11 de Setembro
cáspio. – A Solas sofreu reformas em seu texto
A região sudeste da Ásia é, indiscuti- inicial e recebeu novos suplementos;
velmente, um dos maiores centros de rotas – Criação do Código Internacional de
marítimas, assim como é reconhecida como Proteção de Navios e Instalações Portuári-
um dos lugares mais críticos à navegação, as (International Ship and Port Facility
seja pela sua complexidade nos choke Security Code – ISPS) – 2004.
points, seja em face do risco de ataques
por terroristas e piratas23. Além disso, a re- Unclos
gião é conhecida por fazer parte da área de – Estabelece os princípios fundamen-
operações de algumas organizações terro- tais que regem as liberdades e obrigações
ristas, como o Jemmah Islamiyah e o Abu no alto-mar. Em sua parte VII, “Alto-Mar”
Sayyaf, que possuem apoio logístico e de (artigos 100 a 107), a Convenção foca as
infraestrutura na região. medidas de segurança; contudo, volta-se
especificamente para atos de pirataria.
INICIATIVAS LEGAIS
INTERNACIONAIS Solas
– A Convenção Internacional para a Sal-
Desde o sequestro do navio Aquille vaguarda da Vida Humana no Mar tem por
Lauro, a comunidade internacional mobili- propósito, entre outros, estabelecer a dota-
zou-se na tentativa de estabelecer siste- ção de equipamentos de segurança e prote-
mas e medidas de segurança internacio- ção para os procedimentos de emergência e
nais que prevenissem ataques de piratas e para as inspeções e emissão de certifica-
terroristas a navios e portos. Contudo, em dos. É considerada a mais importante con-
face dos ataques do 11 de Setembro, algu- venção para a segurança de navios mercan-
mas medidas sofreram alterações e outras tes em viagens internacionais. As alterações
medidas legais foram criadas com o propó- realizadas com a ameaça terrorista incluem:
sito de evitar o terrorismo marítimo24. – Sistema de Identificação Automática
(AIS);
Medidas legais anteriores ao 11 de Setembro – números identificadores;
– Convenção das Nações Unidas sobre o – poder aos Estados para realizar inspe-
Direito do Mar (United Nations Conventions ções, controle, retardar/impedir ou expul-
on the Law of the Sea – Unclos) – 1982; sar navios;
– Convenção Internacional para a Salva- – registro contínuo de navios;
guarda da Vida Humana no Mar (Safety of Life – sistema de alerta navio-seguro;
at Sea Convention – Solas) – 1974/1988; – inclusão do código ISPS.

23
Esta região concentra 41% dos índices de pirataria no globo.
24
Para aprofundar o assunto, sugere-se o site da IMO: www.imo.org.

RMB1 o T/2012 197


TERRORISMO MARÍTIMO

SUA uso internacional, sendo aplicáveis a navi-


– Tem o propósito de promover a coo- os e instalações portuárias em um determi-
peração internacional entre os Estados na nado período. Estes são:
formulação e adoção de medidas eficien- – Nível 1 de proteção: significa o nível
tes e práticas para a prevenção de todos para o qual medidas mínimas adequadas
os atos ilícitos contra a segurança da na- de proteção deverão ser mantidas durante
vegação marítima e para o julgamento e a todo o tempo.
punição de seus perpetradores. – Nível 2 de proteção: significa o nível para
o qual medidas adicionais adequadas de pro-
ISPS teção deverão ser mantidas por um período de
– O Código versa sobre as diretrizes da tempo, como resultado de um risco mais ele-
IMO sobre a implementação de medidas de vado de um incidente de proteção.
segurança para prevenir a ocorrência de – Nível 3 de proteção: significa o nível
ações ilícitas contra navios e instalações para o qual medidas adicionais específicas
portuárias ou a utilização dessas instala- de proteção deverão ser mantidas por um
ções e/ou navios para a prática de atos ter- período limitado de tempo quando um inci-
roristas. Os objetivos deste Código são: dente de proteção for provável ou iminen-
1. estabelecer uma estrutura internacio- te, embora possa não ser possível identifi-
nal envolvendo a cooperação entre go- car o alvo específico.
vernos contratantes, órgãos governa-
mentais, administrações locais e as in- OUTRAS INICIATIVAS DOS EUA
dústrias portuária e de navegação a fim PARA COMBATER O TERRORISMO
de detectar ameaças à proteção e tomar MARÍTIMO
medidas preventivas contra incidentes
de proteção que afetem navios ou ins- No pós-2001, os EUA lançaram três ini-
talações portuárias utilizadas no comér- ciativas, especificamente com o propósito
cio internacional; de prevenir e inibir o terrorismo marítimo.
2. estabelecer os papéis e responsabili- O foco principal destas medidas está
dades dos governos contratantes, ór- centrado na prevenção de que possíveis
gãos governamentais, administrações ameaças atinjam o solo norte-americano.
locais e as indústrias portuária e de na- Para tanto, essas medidas visam assegurar
vegação a nível nacional e internacional o transporte seguro de mercadorias em
a fim de garantir a proteção marítima; navios e, principalmente, em contêineres.
3. garantir a coleta e troca eficaz de in- Estas medidas são:
formações relativas a proteção; – Customs-Trade Partnership Against
4. prover uma metodologia para avalia- Terrorism (C-TPAT) – 2001;
ções de proteção de modo a traçar pla- – Container Security Initiative (CSI) –
nos e procedimentos para responder a 2002;
alterações nos níveis de proteção; e – Proliferation Security Initiative (PSI)
5. garantir que medidas adequadas e – 2003.
proporcionais de proteção sejam
implementadas. – C-TPAT: O propósito deste programa
é o de aumentar a segurança na cadeia de
Para tanto, o ISPS Code prevê o estabe- suprimento das companhias privadas que
lecimento de três níveis de proteção para exportam seus produtos para os EUA. Des-

198 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

sa forma, as companhias que aderirem a – Secure-Ship;


este programa serão vistas como de “bai- – Unmanned Aerial Vehicle (UAV);
xo-risco” e terão “facilidades” no acesso – Automatic Identification System
de suas mercadorias em solo norte-ameri- (AIS).
cano, não estando sujeitas às inspeções
de rotina conduzidas pela US Customs and – ANMS: Este sistema provê informa-
Border Protection (CBP), reduzindo os cus- ções aos navegantes sobre a segurança da
tos e o tempo na entrega de mercadorias25. navegação (similar ao “aviso aos
– CSI: O propósito desta iniciativa é o navegantes”). No que concerne ao terroris-
de evitar que organizações terroristas mo marítimo e à pirataria, o sistema informa
transportem armas de destruição em mas- os principais incidentes e áreas de risco à
sa e outras cargas perigosas em contêineres navegação contra possíveis ameaças.
para os EUA. Para tanto, é necessário que – X-Ray and Metal Detection
100% dos contêineres sejam escaneados Equipment: Empregado para verificar o
(raios X e gama) antes de atingirem o solo conteúdo de contêineres, principalmente
norte-americano26. materiais perigosos, como armas NBQR,
– PSI: Iniciativa global proibindo o trans- explosivos e armamentos.
porte marítimo de armas de destruição em – Container Tracking and Tracing
massa ou qualquer material relacionado a Equipment: Sistema empregado para veri-
armas NBQR. Apesar de ser um acordo in- ficar a localização do contêiner, assim como,
formal, há mais de 40 Estados que apoiam a informar se o contêiner foi violado, em tem-
iniciativa27. po real.
– Long Range Acoustic Device (LRAD):
PRINCIPAIS SISTEMAS DE Equipamento acústico que emite feixe so-
SEGURANÇA EMPREGADOS NA noro a uma distância de até 3 mil metros.
SEGURANÇA DE NAVIOS E Porém, a curtas distâncias, poderá ser em-
PORTOS pregado como arma não letal, em face da
potência do equipamento.
Atualmente, os principais sistemas de – ShipLoc: Consiste em um sistema de
segurança empregados para apoiar as me- localização de navios por satélite privati-
didas de segurança e vigilância de navios vo. Possui sistema de alarme que avisa aos
e portos são: proprietários do navio e a autoridades
– Automated Notice to Mariners competentes sobre invasão, ataque, se-
System (ANMS); questro etc., sem poder ser identificado por
– X-Ray and Metal Detection qualquer pessoa que tenha invadido o na-
Equipment; vio ou por outros navios na área.
– Container Tracking and Tracing – Secure-Ship: Consiste em uma cerca
Equipment; elétrica não letal instalada no costado do
– Long Range Acoustic Device (LRAD); navio a fim de evitar que piratas ou terro-
– ShipLoc; ristas subam a bordo.

25
Para aprofundar o tema sobre C-TPAT: http://www.cbp.gov/xp/cgov/trade/cargo_security/ctpat/
apply_ctpat/.
26
Para aprofundar o tema sobre CSI: http://www.cbp.gov/xp/cgov/trade/cargo_security/csi/csi_in_brief.xml.
27
Para aprofundar o tema sobre PSI: http://www.armscontrol.org/factsheets/PSI.

RMB1 o T/2012 199


TERRORISMO MARÍTIMO

– Unmanned Aerial Vehicle (UAV): Ve- ma contundente esse tipo de terrorismo,


ículos aéreos não tripulados que poderão com ações de proporções globais e ilimita-
ser empregados para realizar a vigilância das, expresso sob múltiplas formas, meios
de uma determinada área marítima. e métodos de ataque e nutrido por motiva-
– Automatic Identification System ções políticas, étnicas e religiosas. Alguns
(AIS): Este sistema provê informações en- autores sugerem que esse acontecimento
tre navios, portos, armadores etc., com in- representa o mais importante marco histó-
formações, em tempo real sobre identifica- rico do início do século XXI, pois nenhum
ção do navio, velocidade, posição, deta- outro evento na História teve tamanha re-
lhes sobre a carga e local de destino. Ape- percussão no cenário mundial desde o co-
sar de o sistema contribuir para a seguran- lapso da URSS, representando um ponto
ça no mar, como, por exemplo, contra de inflexão tanto na história dos EUA quan-
abalroamento, o sistema permite que qual- to da própria ordem mundial, pois, ao atin-
quer indivíduo, de posse de um equipa- gir os principais símbolos do poderio eco-
mento AIS, receba todas estas informações, nômico e militar dos EUA, a organização
inclusive terroristas e piratas. terrorista Al Qaeda impôs um fim à “Améri-
ca Inviolável”, “mar-
CONSIDERAÇÕES cando o fim de uma
FINAIS O terrorismo, em função era”. (Booth & Dunne,
da natureza indiscriminada 2002; Chomsky, 2002;
O presente artigo Pecequilo, 2003 apud
teve por finalidade de suas ações, tem a AMARAL, 2008)
apresentar, sumaria- capacidade de tornar Verificou-se que as
mente, algumas consi- medidas de segurança
derações e fatos sobre qualquer pessoa um alvo adotadas pelos Esta-
o terrorismo marítimo. em potencial, dos no pós-11 de Se-
O terrorismo, em disseminando, desta forma, tembro, principalmente
função da natureza nos EUA e na Europa,
indiscriminada de suas a intimidação coletiva priorizaram as ques-
ações, tem a capacida- tões de segurança con-
de de tornar qualquer pessoa um alvo em tra a possibilidade de atentados provenien-
potencial, disseminando, dessa forma, a in- tes de terra, por meio de explosivos, e pelo
timidação coletiva, pois, em última análise, ar, com o emprego de aeronaves. Diante des-
estão todos na rota da morte, sejam os des- se fato, surgiu a preocupação de que orga-
crentes como infiéis, sejam os crentes atu- nizações terroristas estivessem desenvol-
ando como mártires de uma causa. Sua vendo tecnologias, táticas e técnicas para
imprevisibilidade e sua violência provocam empregar no ambiente marítimo a fim de con-
o sentimento de insegurança, vulnerabili- duzir seus ataques, por ser este, em tese,
dade e impotência a todos os Estados e menos protegido e de difícil controle.
cidadãos, sendo consideradas as principais O Brasil, por meio de suas ações da
ameaças à paz mundial. política externa, vem procurando, nestes
Os atentados de 11 de setembro de 2001 últimos anos, projetar o País de forma a
aos Estados Unidos da América, sem dúvi- angariar maior inserção na arena das deci-
da alguma, abriram um novo capítulo na sões mundiais. Porém, ao buscar esta po-
história da humanidade, marcando de for- sição no concerto internacional, é preciso

200 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

que o Estado esteja preparado para a en- Nesse aspecto, mesmo havendo uma
trada em um mundo de competição global baixa probabilidade de ocorrência de ata-
sujeito a qualquer tipo de retaliação, in- ques terroristas em solo brasileiro, existe
clusive terrorista. esta possibilidade, principalmente quando
Nesse contexto, surgem indagações se considera a hipótese de atos terroristas
acerca da possibilidade de atentados ter- contra os alvos tradicionais, como embaixa-
roristas no Brasil, como, por exemplo: O das, empresas multinacionais e delegações
Brasil pode ser palco para ações terroris- oficiais estrangeiras, como serão presencia-
tas contra seus alvos tradicionais? O Bra- das em maior intensidade nos próximos anos,
sil pode ser alvo de ações terroristas? O em face da realização do Rio+20, em 2012;
Brasil pode ser local de obtenção de facili- da Copa do Mundo, em 2014; e das Olimpí-
dades para terroristas? adas, em 2016, entre outros grandes even-
Esses questionamentos foram apresen- tos que o País sediará e que contará com a
tados e debatidos por ocasião do II En- divulgação dos eventos, em tempo real, pela
contro de Estudos sobre Terrorismo, reali- mídia internacional.
zado pela Secretaria de Acompanhamento Após o 11 de Setembro, a postura brasi-
e Estudos Institucionais do Gabinete de leira diante da crise internacional resultou
Segurança Institucional da Presidência da na rediscussão da agenda de segurança
República em julho de 2004. Segundo Diniz internacional, o que impulsionou a
(2004), todas as respostas foram afirmati- reavaliação da política de segurança e de
vas, pois, primeiramente, o Brasil dispõe defesa nacional do País, discutindo as ques-
de inúmeras instalações que são “alvos tra- tões do emprego das Forças Armadas no
dicionais” de organizações terroristas; em combate ao terrorismo, da Tríplice Frontei-
segundo lugar, o Brasil poderia ser alvo de ra e cooperação regional e hemisférica con-
atentados terroristas caso a Al Qaeda, por tra o terrorismo, questões até então
exemplo, encontrasse dificuldades de rea- relegadas a segundo plano, em função da
lizar seus ataques onde vem agindo ou ausência de tensões regionais ou de preo-
devido à necessidade de mostrar aos seus cupações com conflitos de natureza clás-
próprios seguidores que ainda está em con- sica interestatal na região da América do
dições de luta, e pelo fato de o Brasil ser Sul.
um local de fácil entrada e saída; em tercei- Segundo Vidigal (2004a), embora o ter-
ro lugar, pelo País ter dificuldades compro- rorismo seja um problema tipicamente poli-
vadas nas áreas de inteligência e seguran- cial, em alguns casos extremos pode en-
ça, combinadas com as diversas etnias aqui volver a intervenção das Forças Armadas,
presentes, que tornam o Estado brasileiro que, assim, devem dispor de unidades
privilegiado para a obtenção de facilida- contraterror para essa eventualidade. Para
des para ações terroristas. Ou seja, não há Vidigal, apesar do papel tradicional das
nada que exclua o Brasil da possibilidade Forças Armadas ter sido sempre o de en-
de ser alvo de um ataque terrorista28. frentar forças regulares inimigas, “[...] o

28
O Brasil, dentro do concerto internacional, apresentava em 2004 um risco médio de sofrer alguma
ameaça terrorista. Os parâmetros utilizados para classificá-lo neste nível foram desde a percepção
(não testada empiricamente) pelos órgãos responsáveis pela segurança do Estado até a caracteriza-
ção da ameaça terrorista como parte de uma realidade mais complexa: A Guerra Assimétrica.
(CEPIK, 2004)

RMB1 o T/2012 201


TERRORISMO MARÍTIMO

contexto atual indica a necessidade de Além disso, com o propósito de monitorar


ampliação do emprego das Forças Arma- e proteger as águas jurisdicionais brasilei-
das do País em inúmeras situações antes ras, a Marinha do Brasil apresentou ao Mi-
não previstas”. nistério da Defesa, em 2007, a concepção do
Os ataques terroristas de 2001 trouxeram Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul
novas variáveis para o cenário mundial, no (SisGAAz), que contém no seu bojo, entre
qual, em um contexto de ameaças difusas29, é outros, o Sistema de Informações sobre o
indispensável que o Brasil identifique novos Tráfego Marítimo (Sistram), o Sistema de
parâmetros para que possa orientar os seus Identificação e Acompanhamento de Navi-
planejamentos estratégicos de defesa. Nesta os a Longa Distância (LRIT), o Programa
ótica, Vidigal (2004b) propõe que seja empre- Nacional de Rastreamento de Embarcações
gada como parâmetro a identificação das Pesqueiras por Satélite (Preps) e o sistema
vulnerabilidades estra- de Proteção às Insta-
tégicas nacionais. Isto lações de Prospecção
é, os pontos fracos do Verifica-se a imperiosa e e Extração de Petróleo,
Estado, por meio dos de forma a contribuir
quais o País pode ser inadiável necessidade de para neutralização das
facilmente ameaçado. reestruturação e formação atuais vulnerabilida-
Segundo o autor, a par- des existentes no mar.
tir da identificação des- de sistemas de Inteligência, Por fim, apesar de
sas “vulnerabilidades com amplo intercâmbio todas as evidências
estratégicas” será pos- entre os Estados, a fim de obtidas de que não há
sível definir os meios na América do Sul ne-
necessários para dimi- contrapor-se a estas novas nhuma célula terroris-
nuí-las ou eliminá-las, ameaças do cenário ta, inclusive com capa-
de forma que as ações cidade de realizar ter-
de médio e longo pra- internacional rorismo marítimo, não
zos promovam solu- há nada que garanta
ções eficazes para mitigá-las. que isso não possa mudar no futuro próxi-
No que concerne ao papel da Marinha mo. Nesse contexto, a participação em
do Brasil na consecução de suas atribui- fóruns internacionais com o propósito de
ções subsidiárias, a Marinha deve manter fomentar a cooperação internacional, co-
o Poder Naval preparado para que o Esta- ordenar os esforços políticos e os meca-
do possa fazer uso do mar, ou garanti-lo, nismos de segurança e defesa da região,
em prol dos seus interesses nacionais, tor- bem como aumentar o intercâmbio de in-
nando-se imprescindível o aprestamento formações, permitirá conjugar esforços na
dos meios para patrulhar de forma perma- busca da preservação da paz mundial con-
nente toda a Amazônia Azul. tra esta terrível ameaça.

29
Segundo Vidigal (2004), “o fato de considerarmos difusas as ameaças não significa que elas não sejam
concretas, objetivas; o que queremos assinalar é que essas ameaças podem vir de muitas possíveis
direções, sendo um risco desnecessário relacioná-las a um inimigo específico, a um determinado
Estado. O inimigo é qualquer um que possa concretizar as ameaças identificadas. A questão, portan-
to, está em estabelecer critérios para a concreta identificação dessas ameaças. A afirmativa de que
o inimigo precisa ser claramente estabelecido é uma reminiscência da época em que as hipóteses de
guerra eram o marco orientador do planejamento estratégico”.

202 RMB1 oT/2012


TERRORISMO MARÍTIMO

Isto posto, verifica-se que a integração do planejamento e da execução das ações


regional é fundamental para o desenvolvi- baseadas em um consistente e bem
mento desses processos de segurança e de estruturado Sistema de Inteligência, por ser
defesa. Neste aspecto, a atividade de Inteli- considerado o meio mais eficaz de combatê-
gência é um bem vital para o desenvolvi- lo e a primeira linha de defesa dos Estados
mento da integração, podendo se constituir contra esta ameaça. (RIBEIRO, 2006)
no instrumento mais valioso que fortalecerá Diante desta premissa, verifica-se a im-
todo arcabouço de defesa necessário para a periosa e inadiável necessidade de
segurança regional. No que concerne espe- reestruturação e formação de sistemas de
cificamente ao emprego da Inteligência con- Inteligência, com amplo intercâmbio entre
tra o terrorismo, considera-se que um dos os Estados, a fim de contrapor-se a estas
fatores para o seu êxito depende, em muito, novas ameaças do cenário internacional.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<PODER MARÍTIMO>; Terrorismo; Pirataria;

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204 RMB1 oT/2012


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES
COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

MARILENE LIMA FERREIRA ESPÍNDOLA*


Capitão de Corveta (T)

SUMÁRIO

Introdução
Desenvolvimento
Desafio para os gestores
Identificando os profissionais que estão nas organizações
O líder no processo de mudança
O processo de capacitação
A didática para a liderança
Desenvolvimento das competências de liderança militar
Complementando com uma visão holística
A inteligência emocional
Autodesenvolvimento e autoconhecimento
Conclusão

INTRODUÇÃO do pujante e cada vez mais influente, como


o nosso.” (Orcom-2011).
“A Marinha, em plena consonância com Em meio a intensas mudanças na socieda-
a evolução do pensamento moderno, po- de, a Marinha busca cada vez mais estar pre-
rém sem se afastar dos valores de outrora, parada para as exigências e demandas prove-
procura, incansavelmente, construir uma nientes do contexto atual. As orientações do
Força capaz de contribuir para a garantia comandante da Marinha impulsionam a sua
dos interesses e da soberania de um Esta- tropa na busca constante de aprendizado para

* Formada pela Universidade Federal Fluminense e pelas Faculdades Integradas Maria Thereza e pós-
graduada em Educação e Psicologia. Na Fundação Getúlio Vargas, fez o curso MBA em Gestão de
Pessoas. Serve na Diretoria de Ensino da Marinha.
O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

promover inovações tanto na área tecnológica gas não funciona para as novas. O líder que
quanto na área humana, destacando a impor- deixar essa questão de lado poderá sofrer
tância da liderança nesse cenário. vários impactos negativos, tais como:
Um conjunto inesperado de circunstân- desalinhamento de metas e de comprometi-
cias, tais como diversificadas formas de ne- mento; problemas de comunicação; resis-
gócios, novas tecnologias e a globalização tência a mudanças e apatia por parte dos
do mercado, contribuiu para o surgimento mais experientes e grandes frustrações por
de novos tipos de fornecedores, consumi- parte dos jovens; e, por fim, aumento de
dores e colaboradores, impactando o coti- turnover1, o qual gera gastos extras de sele-
diano das empresas. As mudanças ocorrem ção e capacitação de novos profissionais.
com muita rapidez, criando novas realida- Diante desse cenário, o mundo corpora-
des a todo momento, e, com isso, liderar tor- tivo apresenta algumas questões a respei-
na-se um grande desafio. to do comportamento do líder. Essas ques-
Até quase o final do século XX, nenhu- tões convergem para a capacitação das li-
ma ou pouca alteração havia no dia a dia deranças. No meio militar também se perce-
das organizações. As pessoas trabalhavam be um movimento com relação ao desen-
com posições hierárquicas definidas, res- volvimento dos seus líderes e dos que de-
peitavam e eram respeitadas pelo cargo que verão assumir cargos de liderança.
ocupavam. Os líderes não precisavam se pre-
ocupar em se adaptar a diferentes situações, DESENVOLVIMENTO
bastava impor regras e procedimentos pre-
determinados. Era uma postura profunda- Desafio para os gestores
mente autoritária, reflexo do funcionamento
da sociedade daquela época, tendo como Essa nova realidade nas relações
referência as famílias patriarcais, ou seja, os corporativas não permite mais postergar a
líderes mandavam e os demais obedeciam. discussão sobre como liderar as várias ge-
Nas famílias contemporâneas, a voz de rações hoje presentes nas empresas e nas
comando única foi substituída pela negoci- organizações militares.
ação entre os membros da família, incluindo As Forças Armadas, como descrito na
os filhos. Essa mudança na educação gera introdução do Manual de Liderança da Di-
reflexos nas empresas. O jovem que está retoria de Ensino da Marinha (1996), “em
chegando à empresa não acredita em uma razão da natureza da guerra, [...] conferem,
liderança com visão unilateral dos proble- tradicionalmente, a maior importância aos
mas, que impõe fórmulas prontas de atua- assuntos relacionados com a Liderança”.
ção e não consegue variar o seu estilo de A partir dessa premissa, o grande desafio
liderar, de acordo com as diversas situações. está em como administrar as diferenças,
As atitudes, valores e crenças específi- tendo como meta desenvolver nos futuros
cas de cada geração no ambiente de traba- líderes e subordinados a crença nos valo-
lho, se não forem bem orientadas, prejudi- res maiores da instituição, conforme orien-
cam os relacionamentos interpessoais e, ta esse Manual.
com isso, afetam os processos das organi- Mas, antes de assumir qualquer postu-
zações. Diniz (2010) destaca que a liderança ra, é importante que o líder identifique as
que funcionava para as gerações mais anti- principais características que envolvem as

1
Rotatividade de pessoal em uma determinada área ou na empresa como um todo.

206 RMB1 oT/2012


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

gerações que estão atuando no mercado, aprenderam desde cedo a respeitar os valo-
procurando entender como cada membro res familiares e a disciplina nos estudos e
da equipe responde aos estímulos de suas no trabalho. Tais valores garantiam ao jo-
lideranças. Assim, buscar conhecer as re- vem sua aceitação nos círculos sociais, in-
des de relacionamentos que estão se for- dicações para bons empregos ou aprova-
mando no ambiente interno das organiza- ção nas melhores universidades. Em parale-
ções torna-se primordial para a elaboração lo, mesmo com toda rigidez e disciplina, sur-
de estratégias eficazes de liderança. giram manifestações naturais de rebeldia,
apresentando insatisfações com a realida-
Identificando os profissionais que estão de. Sob a influência da música e do cinema,
nas organizações iniciaram-se os “Anos Dourados”, com jo-
vens mais contestadores. Ao chegar à ma-
Hoje, estão presentes nas organizações turidade, essa geração passou a se preocu-
vários tipos de perfis, os quais, como descri- par mais com o seu bem-estar e com a sua
to anteriormente, se não forem identificados saúde. Tal preocupação influenciou as ou-
pelo líder poderão alterar a qualidade dos re- tras gerações, na expectativa de ser eterna-
lacionamentos, gerando conflitos na equipe. mente jovem. Hoje, os Baby Boomers ainda
Baby Boomers, Geração X e Geração Y são trazem paixão, participação e emoção para o
as três gerações que convivem nas ambiente de trabalho. Por isso, não se veem
corporações. E ainda se tem uma forte influ- como problema nas organizações, mesmo
ência da Belle Époque, mais conhecida como que muitas vezes o sejam, por apresentarem
a Geração dos Veteranos. Cada uma delas foi comportamentos mais rigorosos e rígidos.
moldada por diferentes experiências vividas – Já a Geração X, composta por profissio-
durante períodos críticos da sociedade. Se- nais nascidos aproximadamente entre 1961 e
gue abaixo uma descrição sucinta dessas 1979, vivenciou o alto índice de divórcio nas
gerações, de acordo com Oliveira (2010). famílias e o downsizing2 nas empresas. O jo-
– Os Veteranos são profissionais nasci- vem dessa geração tornou-se egocêntrico e
dos aproximadamente entre 1920 e 1940. Por- cético, sendo mais cuidadoso em suas esco-
tanto, conviveram com a Grande Depressão lhas. Submetia-se, ainda, de forma passiva, às
e a Segunda Guerra Mundial. Isso os levou regras estabelecidas, porém sem ter um com-
a considerar a reconstrução da sociedade prometimento rígido com as autoridades. Pro-
como sua grande missão. O dogma social fissionais dessa geração buscam promover a
era a fidelidade à família e ao trabalho. Como igualdade de direitos e de justiça em suas de-
no casamento, o emprego passou a ser “até cisões, gostam do que fazem e, motivados pela
que a morte nos separe”. Devido às suas busca da autorrealização, priorizam mais o seu
características de respeito às autoridades e trabalho do que as relações familiares.
às regras, eles foram uma força estabilizadora – A Y é a geração de múltiplas tarefas, que
nas organizações durante décadas. acaba de entrar nas organizações e já é motivo
– Os Baby Boomers nasceram no perío- tanto de preocupação quanto de satisfação
do pós-guerra, entre 1943 e 1960. É um perí- para seus líderes. Caracteriza-se por jovens
odo de crescimento positivo em todas as que nasceram entre 1980 e 1989. É dinâmica,
áreas, com acentuado índice de natalidade, criativa e inovadora, apresentando diversida-
o que originou o nome desta geração. Eles de de pensamento, transparência, espontanei-

2
Técnica aplicada para eliminar a burocracia corporativa desnecessária.

RMB1 o T/2012 207


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

dade, agilidade na execução das tarefas, além pende da motivação e do autoconhecimento,


de conviver muito bem com os avanços tanto dos líderes quanto dos seguidores”. Isso
tecnológicos. Esses profissionais não espe- significa que, para ser competente nas rela-
ram permanecer no emprego ou na mesma car- ções interpessoais, em meio a esse processo
reira por muito tempo, porque não estão habi- permanente de mudanças, o líder precisa ter
tuados a manter compromissos por longos como propósito pessoal, primeiramente, co-
períodos. Geralmente, já ingressam no merca- nhecer melhor a si próprio para, então, enten-
do de trabalho com elevada formação acadê- der as expectativas dos seus liderados,
mica e, por consequência, não gostam de se direcionando-os para o alcance de objetivos
sujeitar às tarefas subalternas de início de car- comuns.
reira. Ao conviver no imediatismo da internet, O líder não pode apenas desenvolver suas
esses jovens não têm paciência para traba- competências técnicas, mas também deve pre-
lhos muito longos ou demorados: é uma equi- ocupar-se com seu autodesenvolvimento e
pe de resultados e não de processos. Traba- autoconhecimento para ter condições de le-
lhos mecânicos também não os atraem, por- var a sua equipe a ter melhor desempenho. A
que eles estão sempre na busca de oportuni- capacitação do líder deve abranger tanto sua
dade de crescimento e, consequentemente, de formação técnica como pessoal, para de-
novos desafios. monstrar caráter, valo-
A Marinha convi- res e ética em todas as
ve, ainda, com a Gera- Liderar exige coerência suas ações, o que gera
ção Z3. Essa Geração confiança por parte
se encontra no Colégio entre a fala e a ação do dos seus liderados.
Naval e nas Escolas de líder A organização, para
Aprendizes-Marinhei- tornar-se referência no
ros, preparando-se que se propõe a fazer e,
para o oficialato e para seguir a carreira na- consequentemente, ser mais competitiva no
val como praças, respectivamente. mercado, busca ter um líder preocupado não
apenas com as atividades gerenciais de pla-
O líder no processo de mudança nejamento, normas e controle. Para alcançar
esses objetivos estratégicos, requer dos seus
Para Cavalcanti (2009), ao gerenciar mudan- gestores uma liderança, baseada na vontade
ças, o líder está gerenciando pessoas, o que de agir com coragem, integridade e respeito à
pode fazer com que se depare com a questão da diversidade, de acordo com Cavalcanti (2009).
resistência, dificultando a adesão e o compro-
metimento dos liderados com os novos progra- O processo de capacitação
mas. Para isso, o líder precisa desenvolver a
confiança e o respeito – primeiro dele por ele “Não podemos mais correr o risco de im-
mesmo, e depois dos outros pela sua pessoa. provisar chefes.” (PASSARINHO, 1987, p. 21)
Liderar exige coerência entre a fala e a ação do Por muito tempo a liderança foi definida
líder. Essa dinâmica pode ser entendida pela como uma característica de personalidade
expressão “o exemplo do líder”. encontrada somente em pessoas especi-
Leider (1996), citado por Cavalcanti (2009, ais. A liderança era considerada nata. Hoje,
p. 132), afirma que “a verdadeira mudança de- sabe-se que as características do líder po-

3
Pessoas nascidas desde a segunda metade da década de 90 até os dias de hoje.

208 RMB1 oT/2012


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

dem ser desenvolvidas, e que o líder não é, partir do equilíbrio das competências
necessariamente, aquele que possui todas cognitivas e emocionais do indivíduo com
elas. “A circunstância e a personalidade a realidade da organização, dentro de uma
da pessoa se congregam para fazer surgir estratégia de ensino transdisciplinar. Para
o líder.” (LUZ, 2005, p. 232) Cavalcanti (2009, p. 79), “o aprendizado
As organizações estão se conscientizando integral do líder pressupõe a sustentação
de que o desenvolvimento de um líder não de duas dimensões complementares: a do
ocorre em um curto espaço de tempo e, por- saber e a do ser”.
tanto, a necessidade de estar capacitando Esses programas, para serem mais efici-
novos líderes deve ser constante, a fim de entes, devem ser sustentados por pilares.
evitar falta de sucessores para os atuais líde- Um dos pilares é o culto aos valores expres-
res. Essa é uma das principais preocupações sos na cultura da organização. Outro impor-
das organizações que mais se destacam no tante pilar que define o tipo de líder que se
mercado: manter maior número de pessoas ca- quer formar é alinhar as ações de ensino à
pacitadas a assumirem funções de liderança. missão e à visão de futuro que norteiam os
Essa capacitação ocorre por meio de objetivos organizacionais. A partir desses
processos que englobam os gestores, a pilares, forma-se a estrutura metodológica
área de recursos humanos e, atualmente, da capacitação de líderes, em que várias es-
também os profissionais que estão prestes tratégias podem ser utilizadas.
a ser promovidos, pois em muitas empre- As ferramentas mais usuais emprega-
sas é exigência para a promoção que o atu- das são: treinamentos formais, on the job4
al gestor capacite o seu sucessor. e cross-cultural5; programas de coaching6
Com relação às Forças Armadas, Passa- e de feedback7; e e-learning8. Essas estra-
rinho (1987, p. 23) já advertia sobre “a ne- tégias devem ser constituídas de ativida-
cessidade de não deixar que os jovens te- des diversificadas, tais como: estudo de
nentes e os graduados dos primeiros pos- casos, dinâmicas de grupo, dramatizações
tos saiam das escolas ou dos cursos de e outras que promovam uma aprendizagem
formação despreparados para a missão re- significativa.
levante de chefiar pessoas que lhes fica-
rão subordinadas, por força regulamentar”. Desenvolvimento das competências de
liderança militar
A didática para a liderança
O programa de capacitação em liderança
Os programas de desenvolvimento de deve permear toda a carreira militar, com
líderes não podem se restringir apenas a enfoque nas competências essenciais para o
treinamentos tradicionais, com conteúdos alcance do objetivo estratégico da instituição.
pré-formulados e carga horária restrita. A Luz (2005) enumera oito características
base do desenvolvimento integral deve baseadas em princípios, entre as quais,

4
Treinamento constituído de uma parte teórica e uma parte de formação prática no posto de trabalho.
5
Treinamento personalizado com o objetivo de ajudar na adaptação de líderes realocados.
6
Sessões de aconselhamento feitas por um consultor de carreira que acompanha o desenvolvimento
contínuo do profissional e nele se envolve.
7
Prática sistemática e contínua de críticas construtivas sobre os pontos fortes e fracos, visando acelerar
o processo de autodesenvolvimento e capacitação.
8
Aprendizagem realizada através de meios eletrônicos.

RMB1 o T/2012 209


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

aprimorar-se constantemente e fazer exer- me a situação envolvida” (CHIAVENATO,


cícios físicos, mentais, emocionais e espi- 1994, p. 156). Para isso, o líder deve pos-
rituais para a autorrenovação. O mesmo au- suir, de forma integrada, competências téc-
tor também elenca cinco disciplinas que nicas e equilíbrio emocional, para ajudar a
devem ser aprendidas: domínio pessoal, desenvolver o seu liderado.
modelos mentais, visão compartilhada, tra-
balho em equipe e raciocínio sistêmico. Complementando com uma visão
Para França (2006), o momento de lide- holística
rar requer várias atitudes, destacando aque-
las que podem ser aprimoradas nos treina- Diante de tantas diversidades, não cabe
mentos e programas de desenvolvimento: mais ao líder ter uma visão linear, de causa
ter visão clara dos objetivos e transmiti-la; e efeito das situações. O líder que conse-
estimular e criar as condições objetivas para gue alternar-se entre vários comportamen-
o compartilhamento de informações, conhe- tos, sob uma perspectiva holística, conse-
cimentos e experiências; ajudar a equipe a gue integrar melhor sua equipe, levando-a
aprender com a própria experiência; e pre- a alcançar e, até mesmo, a superar os obje-
parar as pessoas para as situações adver- tivos organizacionais.
sas, capacitando-as e criando o suporte da No seu processo de capacitação, além
equipe para cada um de seus integrantes. do enfoque ao desenvolvimento cognitivo,
Tais atitudes se traduzem na importância o líder de hoje deve buscar desenvolver
de desenvolver a comunicação, um dos re- também sua inteligência emocional, além
quisitos da liderança eficaz. de buscar seu autodesenvolvimento e
Passarinho (1987) descreve as caracterís- autoconhecimento, como já mencionado
ticas físicas e atitudes do líder militar e anteriormente. Assim, será capaz de lide-
complementa, acrescentando a necessidade rar, integrando o pensamento racional ao
da cultura geral dos oficiais, do conhecimento sentimento, à sensação e à intuição.
técnico do próprio posto e também das tare-
fas e deveres dos comandados. A inteligência emocional
Essas características relacionadas ao lí-
der e muitas outras, que são enumeradas A inteligência emocional é uma das ca-
por diversos outros autores dessa área, de- racterísticas essenciais para uma liderança
vem ser desenvolvidas para atender à situ- eficaz. Segundo Jones (2008, p. 519), “a in-
ação vigente, de acordo com o contexto teligência emocional pode ajudar os líde-
organizacional. É importante para o líder ter res a desenvolverem uma visão para suas
consciência de que o momento de exercer a organizações, a motivar seus subordina-
sua liderança envolve muitas variáveis, en- dos a se comprometerem com essa visão e
tre elas a motivação dos seus liderados e a dar-lhes energia para trabalharem com en-
maturidade de cada um deles. Esses dois tusiasmo, de modo a atingirem essa visão”.
aspectos são de extrema relevância para a Goleman (1995) afirma que a inteligência
atuação do líder e, portanto, para a defini- emocional é responsável por cerca de 80%
ção da competência a ser desenvolvida. das competências que distinguem os líderes
De acordo com a abordagem situacional espetaculares dos medianos. Essa caracterís-
da liderança, “para um mesmo subordina- tica deve estar presente no programa de
do, o líder pode assumir diferentes padrões capacitação de líderes. No seu conteúdo, de-
de liderança ao longo do tempo e confor- vem estar incluídas as sete competências emo-

210 RMB1 oT/2012


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

cionais e sociais básicas, favoráveis a uma mesmo, terá condições de entender melhor
liderança na contemporaneidade. De acordo a singularidade e a subjetividade de cada
com Goleman (1995), são elas: autoconsciên- um dos seus subordinados.
cia emocional – ser franco e autêntico, capaz O líder, que aprende a se autoconhecer
de falar abertamente sobre suas emoções ou e baseia os seus atos em conformidade aos
com convicção das metas a atingir; valores e princípios éticos que estabele-
autocontrole – sob grande pressão ou duran- ceu para sua existência, desenvolve a con-
te uma crise, permanecer calmo e continuar fiança e o respeito por si próprio e por seus
tomando suas decisões com coerência; adap- liderados. Em contrapartida, o liderado,
tabilidade – diante de novos desafios e mu- vendo coerência entre o discurso e a ação
danças contínuas, ser flexível e rápido para se do seu líder, irá colaborar com mais efeti-
adequar à situação; otimismo – acreditar no vidade para o alcance dos propósitos do
potencial das pessoas e esperar o melhor de- grupo. Ao gerar credibilidade, o líder esta-
las; empatia – estar aberto à escuta e ser capaz rá reforçando as relações interpessoais e a
de colocar-se no lugar do outro; geren- motivação do seu pessoal.
ciamento de conflitos –
conduzir as partes a se CONCLUSÃO
manifestarem e compre-
enderem as diferentes
O desenvolvimento dos Com a intensifica-
perspectivas de cada líderes militares, em ção de mudanças nos
parte envolvida, condu- consonância com as processos organiza-
zindo-as a um acordo; cionais, o capital hu-
trabalho em equipe e diretrizes estratégicas, deve mano passou a ter uma
colaboração – construir atender aos anseios dos relação direta com a
um espaço de solidarie- manutenção das em-
dade, constituir um
liderados, que esperam presas no mercado de
exemplo de respeito, encontrar uma liderança trabalho, sendo res-
cooperação e estar sem- ética que lhes proporcione ponsável por torná-las
pre disponível para fa- mais competitivas.
zer algo por outrem. motivação e orgulho por Essa relevância atribu-
Portanto, incluir in- pertencer à Instituição ída à área de recursos
teligência emocional humanos aumentou a
na capacitação em li- preocupação pela
derança, segundo Jones (2008), significa capacitação de líderes.
ter líderes mais capazes de entender o pro- As Forças Armadas, devido à essência
cesso de criatividade dos seus colabora- de sua missão, sempre se preocuparam com
dores, estimulando-os e apoiando-os. o desenvolvimento dos seus líderes. A partir
da percepção da necessidade de valoriza-
Autodesenvolvimento e ção do seu pessoal, buscam aperfeiçoar o
autoconhecimento seu processo de capacitação de líderes, o
que contribuirá, principalmente, para a atra-
Sob um enfoque humanista, o líder, ao ção e a retenção de seus talentos.
tomar consciência de suas forças e fraque- As competências do líder militar devem
zas, estará mais habilitado a manter o seu ser desenvolvidas de maneira contínua e
equilíbrio interior. Tendo domínio sobre si transdisciplinar, envolvendo desde o co-

RMB1 o T/2012 211


O DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES MILITARES COM FOCO NO CENÁRIO ATUAL

nhecimento profissional até os aspectos e de confiança, motivos de atração dos jo-


relacionais. Sob esse enfoque, a capaci- vens Y para a organização.
tação favorece a quebra de paradigmas li- Cabe, portanto, ao líder com caracterís-
gados à liderança focada apenas na figura ticas das gerações anteriores saber ouvir e
do líder ou nas tarefas, em que não havia ter flexibilidade para aceitar e, ainda, esti-
preocupação de compreender o comporta- mular inovações das novas gerações, por
mento e a atitude de cada geração presente meio de um canal de comunicação pautado
na organização. na confiança nas relações, tendo o
O líder com uma visão holística, primei- feedback como uma rotina constante.
ramente, procura conhecer e respeitar os O desenvolvimento dos líderes militares,
seus subordinados, aproveitando, com em consonância com as diretrizes estratégi-
bom senso, a contribuição das diferentes cas, deve atender aos anseios dos lidera-
gerações que compõem sua equipe. Tal ati- dos, que esperam encontrar uma liderança
tude cria um ambiente de trabalho agradá- ética que lhes proporcione motivação e or-
vel, com redes de relacionamentos sólidas gulho por pertencer à Instituição.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<VALORES>; Liderança; Conduta;

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Defesa. Manual de Liderança. 1a ed. Rio de Janeiro: Diretoria de Ensino da
Marinha, 1996.
______. Ministério da Defesa. Orientações do Comandante da Marinha (Orcom-2011). Brasília-DF:
Gabinete do Comandante da Marinha, 2011.
CAVALCANTI, Vera Lucia. Liderança e motivação. 3a ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009.
CHIAVENATO, Idalberto. Gerenciando pessoas. 3a ed. Revisada e ampliada. São Paulo: Makron
Books, 1997.
DINIZ, Arthur. Liderança e as novas gerações. 2010. Disponível em: <http://www.callcenter.inf.br>
Acesso: 07 ago. 2011, 15:10.
FRANÇA, Ana Cristina Limongi. Comportamento organizacional: conceitos e práticas. São Paulo:
Saraiva, 2006.
GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional: teoria revolucionária que redefine o que é ser inteli-
gente. 52a ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.
JONES, Gareth R.; GEORGE, Jennifer M. Administração contemporânea. 4a ed. São Paulo: McGraw-
Hill, 2008.
LUZ, Celma Ferreira et al. “O Perfil do Líder Petrobras”. In: RODRIGUEZ, Martius; LOUREIRO,
Juliano; VIEIRA, Rita. Gestão Estratégica de Recursos Humanos: compartilhando conheci-
mento para o desenvolvimento dos negócios. Rio de Janeiro: Qualitymark: PETROBRAS,
2005.
OLIVEIRA, Sidnei. Geração Y: o nascimento de uma nova versão de líderes. São Paulo: Integrare
Editora, 2010.
PASSARINHO, Jarbas. Liderança militar. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1987.

212 RMB1 oT/2012


ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA
CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE
TOMADA DE CONTAS DOS ÓRGÃOS
DO PODER EXECUTIVO FEDERAL*

STELLA REGINA REIS DA COSTA1


Professora Doutora
JEISOM DE MELO FAJARDO2
Capitão-Tenente (IM)

SUMÁRIO

Introdução
Conceituação de governança corporativa
Princípios da boa governança corporativa
A governança corporativa no setor público brasileiro e seus elementos
Conclusão

INTRODUÇÃO viços prestados. Assim está sendo proce-


dido com a ferramenta de auditoria gover-

N os últimos 30 anos, novos modelos


gerenciais têm sido aplicados e difun-
didos na gestão pública, com foco em
namental, que, por força das mudanças na
gestão do erário, se aproveita de novas
perspectivas, na forma de benchmarking,
melhorias e alcance da qualidade nos ser- para que seja capaz de não mais corrigir

* Síntese do artigo original que se encontra disponível no site www.dcom.mar.mil.br.


1 Professora doutora pela UFRJ. Docente dos cursos de mestrado em Sistemas de Gestão da UFF e UFRRJ.
Auditora de Qualidade e membro efetivo da Banca Examinadora do Prêmio Nacional da Qualidade
(PNQ).
2 Mestrando em Sistemas de Gestão e MBA em Auditoria e Contabilidade, ambos pela UFF. É auditor
interno nas Áreas de Patrimônio e Desempenho e encarregado da 4a Divisão de Análise de Contas
da Diretoria de Contas da Marinha.
ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS
DOS ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO FEDERAL

erros, mas sim agir de forma preventiva e controle interno das Forças Armadas – ór-
antecipada, assessorando a gestão públi- gãos indiretamente subordinados ao PEF,
ca diante de eventuais crises econômicas encapeados pelo Relatório de Gestão das
e dos desafios de um mundo de crescente Unidades Juridicionadas (UJ) e pelo Relató-
incerteza e de desafios contínuos. Com as rio de Auditoria de Gestão. Na administra-
mudanças gerenciais, nasceram os cami- ção pública, a concepção desta nova
nhos para que os princípios oriundos da metodologia até mesmo se confunde com o
Governança Corporativa (GC), plenamente termo accountability, palavra da língua in-
aplicados no mundo empresarial, pudes- glesa que é usada internacionalmente para
sem tomar parte destas novas perspecti- dar significado ao direito que cada cidadão
vas. Muito embora a linha de procedimen- tem de saber sobre o desempenho de seus
tos tradicionais de auditoria siga os aspec- agentes governantes e a obrigação desses
tos relacionados com a auditoria de con- de prestarem contas de suas ações, mas que
formidade, a preocupação atual com a for- ainda não tem uma tradução literal para o
ma com que gestores português coloquial
do erário desempe- (CFC, 2009).
nham suas funções No Brasil, as boas
passou a reinventar o
Com as mudanças práticas de governan-
modo como se proce- gerenciais, nasceram os ça praticadas na nova
dem as suas ativida- caminhos para que os forma de controle da
des. Diante deste pen- gestão pública foram
samento, e em face das princípios oriundos da utilizadas no processo
incorporações de téc- Governança Corporativa de reforma do aparelho
nicas complementares
trazidas de estudos e
pudessem tomar parte de do Estado e instituí-
ram o conceito de
boas práticas difundi- novas perspectivas accountability geren-
dos na administração cial, que se refere ao
contemporânea, mais conjunto de mecanis-
comumente na Governança Corporativa mos e procedimentos que levam os
privada, o processo de auditoria vem sen- decisores governamentais a prestarem con-
do revisto. tas dos resultados de suas ações, garan-
Com a nova metodologia de avaliação tindo-se maior transparência, além da ex-
das contas implementada pelo Tribunal de posição das políticas públicas (BRESSER
Contas da União (TCU), a execução de au- PEREIRA, 2001). Assim, quanto maior a
ditoria com novo enfoque reinventa a ne- possibilidade de os cidadãos poderem
cessidade da avaliação ampla do desempe- discernir se os governantes estão agindo
nho das instituições, tarefa até certo ponto em função do interesse da coletividade e
inédita em relação aos trabalhos de campo. poderem sancioná-los apropriadamente,
Essa nova temática abordada pelo TCU para maior accountability possui o governo.
exame e julgamento das contas dos entes Dessa forma, se princípios de GC norteiam
governamentais determina que os proces- técnicas de auditoria voltadas à avaliação
sos sejam encaminhados ao TCU pelos ór- do desempenho organizacional, os traba-
gãos de controle interno dos ministérios – lhos ligados à nova metodologia de toma-
órgãos diretamente subordinados ao Poder da de contas estarão estreitamente relacio-
Executivo Federal (PEF) – e pelos órgãos de nados com a accountability. Questiona-

214 RMB1 oT/2012


ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS
DOS ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO FEDERAL

se, na pesquisa a responder, se a proposta os devido à safra de escândalos


de mudança do TCU, ao determinar um corporativos em meados de 2000 – empre-
novo foco de montagem das prestações de sas como Enron, Worldcom e Tyco, para
contas e da auditoria governamental no citar apenas algumas. Nos Estados Unidos,
setor público, pode estar relacionada aos tais escândalos financeiros levaram a uma
princípios e elementos eleitos entre os reforma abrangente da legislação sobre
muitos que permeiam as boas práticas de comportamento empresarial, com a Lei
Governança Corporativa aplicados no se- Sarbanes-Oxley de 2002. A Lei reforça as
tor público em nível internacional e no se- regras para a Governança Corporativa re-
tor privado em nível nacional. lacionadas à divulgação e à emissão de re-
latórios financeiros nos EUA. Um dos as-
CONCEITUAÇÃO DE GOVERNANÇA pectos mais importantes é que este diplo-
CORPORATIVA ma não isenta empresas não americanas de
seu alcance. Ele exige que todas as compa-
A Governança Corporativa tem apresen- nhias de capital aberto, com ações listadas
tado, ao longo dos úl- na Bolsa de Valores de
timos anos, uma cres- Nova Iorque, possuam
cente importância, ten- As boas práticas de um comitê de audito-
do em vista a hipóte- Governança Corporativa ria, com o principal
se, bem aceita e difun- objetivo de supervisi-
dida no mercado, de as têm a finalidade de onar os controles in-
organizações que pos- aumentar o valor da ternos, o aspecto
suem um sistema de contábil da compa-
gestão instituído com sociedade, facilitar seu nhia e seu relaciona-
base nos pilares da acesso ao capital e mento com os audito-
Governança Corpora- contribuir para a sua res independentes.
tiva em geral apresen- Segundo o Institu-
tarem significativa se- perenidade to Brasileiro de Go-
gurança diante das vernança Corporativa
constantes mudanças de mercado, além de – IBGC (2010), a Governança Corporativa
profícuo desempenho e aumento de seu “é o sistema pelo qual as sociedades são
valor. O movimento que perseguiu esse ob- dirigidas e monitoradas, envolvendo os re-
jetivo, iniciado principalmente nos Estados lacionamentos entre acionistas/cotistas,
Unidos, no início dos anos 90, propiciou a Conselho de Administração, Diretoria, Au-
criação de mecanismos e processos com o ditoria Independente e Conselho Fiscal. O
objetivo de regular a forma como as empre- Instituto dos Auditores Internos (IIA) Bra-
sas são dirigidas, administradas ou contro- sil (2010) denomina Governança ao con-
ladas, abordando também a relação entre os junto de práticas, políticas de controle e
diversos atores envolvidos e os objetivos a processos de gestão baseados em pers-
serem alcançados. Nesse caso, os princi- pectivas que garantam o máximo de efici-
pais atores são tipicamente os acionistas, ência em gestão. As boas práticas de
fornecedores, a alta administração, o con- Governança Corporativa têm a finalidade
selho de administração e a sociedade. de aumentar o valor da sociedade, facilitar
Em princípio, a Governança Corporativa seu acesso ao capital e contribuir para a
tornou-se um tema dominante nos negóci- sua perenidade. São usados também como

RMB1 o T/2012 215


ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS
DOS ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO FEDERAL

sinônimos os termos direção, orientação e externa, de modo espontâneo, franco e


gerencialismo, principalmente nos países célere, resulta num clima de confiança, tan-
anglo-saxões (Enap, 2010). Grande parte to interno quanto externo; b) Equidade –
dos autores estudados concorda, porém, caracteriza-se pelo tratamento justo e igua-
que o objetivo da Governança Corporativa litário de todos os grupos de capital ou dos
é colaborar para que a gestão da empresa demais stakeholders; c) Accountability –
alcance níveis internacionais em transpa- conforme comentado anteriormente, e levan-
rência, accountability e equidade. do-se em conta a definição do Conselho
Federal de Contabilidade, os agentes res-
PRINCÍPIOS DA BOA ponsáveis pela gestão devem fundamentar
GOVERNANÇA CORPORATIVA seus atos por meio de uma prestação de
contas perene sobre a sua atuação, respon-
Segundo Andrade e Rosseti (2004), a dendo integralmente pelos resultados e por
Governança Corporativa alinha-se a um con- todos os atos que praticarem no exercício
junto de princípios que se traduzem em re- de seus mandatos, incluindo o paradigma
gras e procedimentos éticos estabelecidos da responsabilização pelo desempenho nos
no processo de melhoria da gestão, com o cargos; e d) Ética e Responsabilidade
intuito de gerar valor para a organização. Corporativa – os conselheiros e executivos
Governança tem tido a ver também com qua- devem zelar pela perenidade das organiza-
lidade da atitude, da ética em uma escala de ções e devem incorporar considerações de
valores no mais puro sentido humano. Daí ordem social e ambiental na definição dos
alguns considerarem que a boa governança negócios e operações.
depende de alinhar o pensamento entre aci-
onistas, controladores e demais interessa- A GOVERNANÇA CORPORATIVA
dos e a preocupação com a avaliação do NO SETOR PÚBLICO BRASILEIRO
desempenho. Os princípios fundamentais E SEUS ELEMENTOS
da boa governança em geral são comuns a
diversos autores nacionais e internacionais. Muito embora o tema tenha repercutido
São eles a transparência (disclosure), a de forma abrangente no setor privado, o
equidade, a accountability, o cumprimento setor público tem desenvolvido pesquisas
das leis (compliance) e a ética (ANDRADE e adaptado muitos dos princípios de
E ROSSETI, 2004; STEINBERG, 2003; ROZO, governança, uma vez que foi verificado que
2003; DUBEUX, 2001). os problemas apresentados pela adminis-
No Brasil, o Código das Melhores Práti- tração pública nas últimas décadas pode-
cas de Governança Corporativa do IBCG rão ser controlados ou amenizados medi-
(2004), inspirado nos principais códigos in- ante a utilização de alguns princípios origi-
ternacionais de governança, está fundamen- nários da Governança Corporativa aplica-
tado na transparência, na equidade, na da no setor privado. Há vários fatores de
accoutability e na responsabilidade pressão a favor das mudanças que ocor-
corporativa. O IBCG trata cada um dos que- rem na administração pública, entre eles as
sitos supracitados da seguinte forma: a) privatizações, o movimento internacional
Transparência – mais do que cultivar a obri- de fusões e aquisições, o impacto da
gação de informar o que ocorre, as organi- globalização, as necessidades de financia-
zações devem cultivar o desejo de informar, mento e, consequentemente, o custo do
sabendo que a boa comunicação interna e capital e a intensificação dos investimen-

216 RMB1 oT/2012


ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS
DOS ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO FEDERAL

tos de fundos de pensão. Independente- de pode ampliar a efetividade e a legitimida-


mente dos padrões teóricos a serem bus- de do governo, mas também introduz pro-
cados e da estrutura de gestão que se pos- blemas de controle e accountability. Dessa
sui, a boa Governança Corporativa requer forma, o desafio da implementação dos prin-
de ambos os setores uma clara identifica- cípios de governança pode começar de di-
ção de objetivos, identificação de respon- versas maneiras, por exemplo, com a divul-
sabilidades e divulgação de informações e gação da Lei de Responsabilidade Fiscal –
resultados. A figura abaixo demonstra que LRF (Lei Complementar no 101/2000), que
a estrutura de governança de um órgão é funcionou como fomento a que, a partir de
talhada para atender às normas e leis que o 2007, o Congresso Nacional, órgão respon-
regulamentam. Ao se romper este sável pelo Controle Externo do Poder Exe-
paradigma, passam o governo e a socieda- cutivo, determinasse ao Tribunal de Contas
de a vislumbrar, num horizonte presente x da União, órgão executor do Controle Exter-
futuro, a necessidade do exercício hábil de no, uma reformulação na metodologia de
quem tem o mando no emprego do erário, apresentação, julgamento e tomada das con-
de forma a instituir-se a prática da tas das UJ subordinadas àquele poder, de
governança plena, que irá se preocupar com modo a reestruturar parte de um dos princí-
o desempenho e captar os anseios sociais pios basilares da governança, que é o dever
de modo a seguir rumo à superação de pro- de prestação de contas.
blemas e atingir as metas planejadas. Mas, somado a isso, a fim de avaliar a
A inclusão da sociedade como partici- gestão pública com foco nos ecos das no-
pante ativa dessas mudanças aumenta, den- vas práticas de gestão contemporânea, o
tro dos aspectos burocráticos, a capacida- desafio para o setor público brasileiro é o
de de governar de forma mais eficiente, fa- de articular outros elementos e princípios
zendo mais coisas com menos recursos comuns, relevantes em cada contexto e que
(TIMMERS, 2000). Com o estreitamento da podem começar a fortalecer a estrutura de
relação Estado sociedade, o governo não é governança. Para validar esse pressupos-
mais um mero ator autônomo na to, nada melhor que a implantação de ava-
implementação de políticas, que cada vez liações e mecanismos fiscalizadores que,
mais estão dependendo do setor privado atualmente, fazem parte dessa reformulação
para cumprir seus objetivos. Segundo na apresentação das contas executadas
Timmers (2000), esta ligação com a socieda- pelos gestores públicos. Slomski (2005) se
aproxima das diretrizes ema-
nadas pelo TCU para a nova
metodologia de tomada de
contas afeta aos órgãos do
Poder Executivo Federal atri-
buindo aos elementos abai-
xo a essencialidade para uma
sólida governança pública: a)
Estrutura de controle admi-
nistrativo – direcionada à re-
alização dos objetivos da or-
A gestão pública atual como a arte de governar o erário ganização por meio do de-
Fonte: Elaborado pelos autores senvolvimento de processos

RMB1 o T/2012 217


ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS
DOS ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO FEDERAL

de trabalho operacionais; b) Ambiente de Portanto, muito provavelmente o Tribunal


controle administrativo – é a base para to- ainda não irá sensibilizar o julgamento da
dos os outros elementos funcionarem, pois gestão com a avaliação advinda dessas
propicia disciplina aos processos primeiras informações. Diante das discus-
organizacionais, influenciando estratégicas sões e perspectivas citadas, observou-se
e políticas. Inclui valores éticos, compe- que esta nova forma de prestar contas,
tência e o desenvolvimento do pessoal; c) inserida no contexto do Poder Executivo
Gestão de riscos – a avaliação de riscos Federal, foi significativamente influencia-
permite que a organização considere até da pelos aspectos trazidos na Governança
que ponto eventos em potencial podem Corporativa empregados no setor público
impactar a realização dos objetivos; d) Con- e privado em nível nacional e internacio-
trole do patrimônio – procedimento esta- nal. Existem correlações do todos os tipos,
belecido visando assegurar um efetivo con- principalmente entre princípios e elemen-
trole sobre todo e qualquer valor sob a res- tos de governança citados e informações
ponsabilidade do gestor; e) Avaliação de gerais a constar dos Relatórios de Gestão
conformidade – qualquer procedimento uti- das UJ e dos Relatórios de Auditoria de
lizado, direta ou indiretamente, para deter- Avaliação da Gestão. Muitas dessas infor-
minar que as ações praticadas estão mações estão evidenciadas na DN no 110/
concer-nentes com as normas e leis que 2010, tais como: a) avaliação dos resulta-
regem a atividade pública; f) Avaliação de dos quantitativos e qualitativos da gestão,
desempenho – realização de comparações em especial quanto a eficácia e eficiência
de desempenho e qualidade com concor- no cumprimento dos objetivos e metas pla-
rentes ou organizações de outros ramos nejados para o exercício, identificando as
(benchmarking) e verificação periódica se causas de insucessos no desempenho da
as estratégias organizacionais de curto, ação administrativa; b) avaliação dos indi-
médio ou longo prazos estão sendo cum- cadores de gestão, pelo menos quanto à
pridas; e g) Responsabilidade em prestar mensurabilidade e à utilidade do indicador,
contas. Segundo Slomski (2005), a trans- utilizados pelas unidades jurisdicionadas
parência total seria alcançada quando os para avaliar o desempenho da gestão; c)
elementos forem estruturados dentro da avaliação sobre o funcionamento do siste-
gestão pública na forma de relacionamen- ma de controle interno da UJ; d) avaliação
tos entre estes e os princípios fundamen- da gestão de recursos humanos; e e) avali-
tais da accountability. ação objetiva acerca da aderência da UJ
Dessa forma, a partir do exercício refe- em relação à adoção de critérios de
rência 2010, cujos relatórios de gestão che- sustentabilidade ambiental na aquisição de
garam ao Tribunal até o final de julho de bens, materiais de tecnologia da informa-
2011, o TCU iniciou a exigência de pronun- ção (TI) e na contratação de serviços ou
ciamento do gestor e do órgão de controle obras. Tais correlações denotam a influên-
interno sobre avaliação de desempenho, cia, em tese, de boas práticas trazidas da
gestão de riscos e estruturas de controles GC para a nova metodologia de tomada e
das unidades jurisdicionadas. Nesse iní- prestação de contas determinada pelo TCU
cio, a intenção do Tribunal é no sentido de aos órgãos da Marinha do Brasil por ele
diagnosticar o quanto os gestores da uni- fiscalizados. Com tais análises, pode-se
dade pensam sobre a necessidade de que evidenciar a força da influência de algu-
os mesmos implementem essa estrutura. mas das características da GC junto às ava-

218 RMB1 oT/2012


ESTUDO SOBRE A INFLUÊNCIA DA GOVERNANÇA CORPORATIVA NA NOVA METODOLOGIA DE TOMADA DE CONTAS
DOS ÓRGÃOS DO PODER EXECUTIVO FEDERAL

liações que foram demandadas por aquele me atesta a Decisão Normativa no 110/2010
Tribunal. De outra forma, as informações (TCU, 2010).
gerais a constar do relatório de Auditoria Na verdade, segundo esse prisma, per-
de Avaliação da Gestão, em relação à avali- cebe-se que essa ainda é uma realidade dis-
ação sobre os controles internos das UJ, tante na administração pública e que é nor-
dependem de divulgações anuais do TCU mal que as instituições, por serem geridas
e, em tese, deverão contemplar os aspec- com dinheiro público, pensem que avalia-
tos ambiente de controle, avaliação de ris- ção de desempenho e presença de contro-
co, procedimentos de controle, informação les nos processos internos é atribuição ex-
e comunicação e monitoramento (TRIBU- clusiva da unidade de auditoria, de controle
NAL DE CONTAS DA UNIÃO, 2010). interno, formalmente constituída, e não como
um conjunto de mecanismos que deve
CONCLUSÃO permear toda a estrutura interna do órgão.
Espera-se, com a nova metodologia institu-
Em princípio, a análise sobre a temática ída, que aos poucos este paradigma
que envolve a nova metodologia de toma- comportamental seja quebrado, pois o que
da e prestação de contas determinada pelo o TCU pretende com a inserção gradativa
TCU seguiu o caminho da comparação desse tema na prestação de contas é justa-
exploratória entre a estrutura de avaliação mente criar uma cultura na administração
determinada por aquela corte de contas e o pública federal quanto à preocupação com
referencial teórico obtido. O TCU, por in- desempenho e com a instituição de uma es-
termédio do chamado Projeto Contas, trutura de controles internos gerenciada
reformulou a estrutura de apresentação de pelos órgãos e entidades, de modo que haja
contas das Unidades Jurisdicionadas, e a a comprovação, ao final das auditorias, de
Auditoria de Avaliação da Gestão está den- que as instituições estão trabalhando com
tro da supervisão a ser feita para aferição altos níveis de desempenho organizacionais,
do nível de adoção de elementos citados na busca pela qualidade e pela excelência.
dentro da estrutura de governança da ges- Observou-se, ainda, que a intenção de se
tão pública brasileira. diminuir o número de UJ a terem suas con-
O Projeto Contas procurou descentrali- tas examinadas foi diretamente proporcio-
zar para cada uma das UJ determinados ele- nal à intenção de se aprofundar o nível de
mentos de GC que propiciassem a criação avaliação que ora se inicia, com a execução
e o fomento à avaliação do desempenho e desta nova prática de auditoria, em que se
aos controles internos organizacionais, tais pretende ir ao âmago das instituições avali-
como a avaliação de indicadores de desem- adas, com análises de grande amplitude for-
penho, o ambiente de controle interno e a mada pela aplicação de indicadores de de-
gestão de riscos organizacionais, confor- sempenho de diversos tipos.

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<ADMINISTRAÇÃO>; Administração governamental; Controle administrativo;

RMB1 o T/2012 219


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM
PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A
CORROSÃO

THYAGO DE LELLYS FARIA MONÇÃO*


Capitão-Tenente (RM2-QC-CA)

SUMÁRIO

Introdução
Histórico das avarias
Pesquisa de avarias
Medidor de nível KDG
Chapa do tanque
Chapa do casco
Análise das avarias
Coleta de dados
Inspeções
Determinação do modo de falha e causa básica
Conclusões e sugestões

INTRODUÇÃO empregado na formação de reservistas na-


vais daquela Marinha.

O Navio Hidroceanográfico Amorim do


Valle, ex-Navio-Varredor HMS
Humber, da classe River, foi construído pelo
Incorporado à Marinha do Brasil em 31 de
janeiro de 1995, teve sua conversão para na-
vio balizador iniciada em 1996, no Arsenal de
Estaleiro Richard’s Ltda, na Inglaterra. Teve Marinha do Rio de Janeiro, sendo tal obra
seu lançamento realizado em 17 de maio de concluída em 1997, no Estaleiro Itajaí SA, em
1984, sendo comissionado na Marinha bri- Santa Catarina. Em 7 de dezembro de 2000, foi
tânica em 7 de junho de 1985. Foi então reclassificado de 4a classe para 3a classe e,

* Foi encarregado de divisão de máquinas do Navio Faroleiro Almirante Graça Aranha; chefe de máqui-
nas do Navio Hidroceanográfico Amorim do Vale e atualmente é encarregado de divisão do depar-
tamento de máquinas da Fragata Bosísio.
ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

quanto ao emprego, de navio balizador para ta parte do texto, as informações podem


navio hidroceanográ-fico. Em novembro de parecer um pouco confusas e desnecessá-
2000, passou a ser subordinado ao rias ao leitor que não está ambientado com
Grupamento de Navios Hidroceanográficos. o navio; entretanto, o que mais importa é a
O navio tem como missão realizar levan- sistemática e a metodologia utilizadas para
tamentos hidrográficos, oceanográficos, se relatar os acontecimentos.
geodésicos, meteorológicos e serviço de Neste artigo, em particular, foi omitida a
sinalização náutica a fim de contribuir para apresentação dos eventos. Com os deta-
a segurança da navegação e apoiar as ope- lhes que puderam ser registrados, entretan-
rações navais de nossa Marinha. to, não foi prejudicado o objetivo do artigo.
É chamado carinhosamente pela tripu- Pelas inspeções de rotina no navio, foi
lação de “Javali dos Sete Mares”. observado um aumento no nível de “água
de porão” da praça de máquinas, com pre-
sença de quantidade considerável de óleo
combustível, perceptível devido ao forte
odor característico presente no ambiente e
à constatação visual de amostras. A papeleta
de sondagem constatava a redução do ní-
vel de óleo nos tanques de serviço. Assim
que possível o acesso, foi detectada uma
avaria no medidor de nível tipo membrana
do sistema KDG em um dos tanques de ser-
Figura 1. Navio Hidroceanográfico viço e, no outro tanque, detectou-se a pre-
Amorim do Valle sença de um furo em uma de suas chapas.
Ambas as avarias encontradas permitiam,
HISTÓRICO DAS AVARIAS sim, a fuga de óleo combustível dos referi-
dos tanques para o porão da praça de má-
Em um relatório de avarias, a descrição quinas. Durante a tentativa de isolamento
dos eventos de maneira cronológica é de da região para sua inspeção, verificou-se a
extrema importância. Sempre que possível, existência de outro furo, desta vez em chapa
deve-se tentar registrar os fatos com a mai- do casco do navio, próximo à quilha, permi-
or clareza e detalhes quanto possível. Nes- tindo entrada de água do mar.

LOWER DECK CLOTMING LOWER DECK


AFT LOWER DECK ENGINEERS STORE ACCOMMODATIONS REDDING & MAGAZINE AND
STORES LOBBY & WORKSHOP Avaria no LOBBY MESSGEAR STORE STORES LOBBY
KDG LOWER
DESK SMALL ARMS
OFFICE STORE
LOBBY
STEERING MINES Furo no
GEAR WEEPING Casco UP
MAIN
COMPARTMENT STORE
COMMUNICATIONS
OFFICE
SMALL ARMS
MAGAZINE

W (M) NAVAL
STORE GUNNERS
STORE
Furo no VEGETABLE
EXPLOSIVE LOWER DECK
CUTTER Tanque MACHINERY GYRO COMPASS
STORE
MAGAZINE CONTROL ROOM ROOM

Figura 2. Esquema da localização das avarias no navio

RMB1 o T/2012 221


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

PESQUISA DE AVARIAS do tanque de serviço de BB para o porão


da praça de máquinas.
No item anterior, todos os dados coletados
Numa inspeção visual posterior e mais de-
foram organizados em ordem cronológica,
talhada no equipamento, pode-se constatar
como numa “história”. Agora, as avarias ocor-
o estado de elevada deterioração em que este
ridas serão descritas em sua individualidade;
se encontra. Os parafusos, que prendem o
entretanto, como poderá ser visto posterior-
flange, estão completamente corroídos.
mente, elas estão intimamente ligadas.

Medidor de nível KDG Diafragma


Rosca com
Selos diafragmas são acessórios essen- Tanque
ciais numa medição de nível remota por
meio de transmissores de pressão diferen-
cial. De maneira geral, pode-se definir este
acessório como sendo uma bolacha de aço,
em que são soldados um diafragma (mem- Flange
brana), e capilares (tubos com pequenos
diâmetros internos). Neste sistema adicio-
Furos (x8) Capilar
namos o fluido de selagem, que será res-
ponsável por transferir a pressão gerada
pelas colunas de líquido nos diafragmas
dos selos até o elemento sensor dos trans- Figura 4. Medidor de nível avariado do tanque de
missores de pressão diferenciais. serviço de BB
Fluido de enchimento
Capilar Chapa do tanque
Armaura helicoidal

Proteção especial
O navio possui oito tanques de óleo com-
(PVC, PE) bustível, com capacidade total de aproxima-
Tubo para manuseio
damente 158 mil litros. Os tanques de serviço
bombordo/boreste (BB/BE), cada um com
Niple
capacidade de 11.830 litros, alimentam direta-
Flange em aço inoxidável mente os quatro motores diesel existentes:
Diafragma (membrana dois motores de combustão principal (MCP)
de metal elástica) para propulsão e dois motores de combus-
Figura 3. Esquema de um medidor de tão auxiliar (MCA) para geração de energia.
nível do tipo diafragma Estes tanques são localizados de tal forma
que a antepara mais a ré (AR) faz fronteira
Logo na primeira observação do medi- com o porão da praça de máquinas.
dor de nível, instalado no tanque de servi- A localização precisa do furo, bem como
ço de bombordo (BB), pode-se perceber sua observação mais detalhada, só foi pos-
que o flange encontrava-se preso somente sível quando completamente esgotado o
pelo capilar, separado da parte que é presa porão da praça de máquinas e esvaziado o
na parede do tanque por rosca. Assim, per- tanque, e quando a atmosfera interna do
mitia a completa fuga de óleo combustível mesmo permitiu a entrada de um militar.

222 RMB1 oT/2012


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

Após, então, foi possível que se registras-


se a situação real em que se encontrava a
chapa do tanque, onde aparecera o furo.

Figura 6. Furos no casco e posterior reparo

nos tanques de serviço e, consequentemen-


te, impossibilitado de ligar seus motores.
Como agravante, apresenta ainda avaria em
uma chapa do casco que, para reparo defini-
tivo, necessitaria de docagem. Tendo em vis-
ta a proximidade do período de docagem du-
rante o período de manutenção geral (PMG)
Figura 5. Furo no tanque de serviço de BE 2009, optou-se por sanar definitivamente to-
visto internamente e externamente das as avarias nesta oportunidade, tendo em
vista que o navio não apresenta nenhuma
Chapa do casco comissão prevista neste meio tempo.
Entretanto, não basta apenas se reparar.
Na prática, a inspeção da avaria no cas-
Há que se evitar novas falhas e, para tal, a
co ficou por conta dos mergulhadores.
identificação das causas básicas destas é
Todas as medidas adotadas internamente
fundamental. Os esforços devem concentrar-
para conter a entrada da água não surtiram
se sempre em evitar alguma quebra ou avaria
o efeito desejado para deixar o navio em
e não em repará-las cada vez mais eficiente-
situação tranquila. Após mergulho para a
mente. A análise de uma avaria deve consistir
primeira análise da situação, optou-se por
em se percorrer a história dos acontecimen-
fazer de imediato reparo com flanges ce-
tos em sentido inverso até atingir um ponto
gos e grampos, para conter a entrada de
em que seja possível implementar ações pre-
água. Somente após este procedimento, foi
ventivas que evitarão a sua repetição.
possível manter o navio em situação de
Devido ao tempo e aos recursos técnicos
maior tranquilidade quanto à avaria.
disponíveis, não foi possível que se fizesse,
Foram verificados pelos mergulhadores
até o presente momento, uma completa análi-
furos próximos na mesma chapa,
se das avarias. Entretanto, nesta análise ini-
registrados por fotografia subaquática. O
cial, vamos nos ater às informações por hora
reparo foi realizado utilizando-se um flange
obtidas e, quando necessário, assumir algu-
cego e massa plástica adequada.
mas premissas para preencher as lacunas.
Um dos fundamentos mais básicos da aná-
ANÁLISE DAS AVARIAS
lise de falhas ou avarias é a observação das
Após todos os reparos, o navio encon- superfícies. A aparência da superfície
tra-se sem poder receber óleo combustível danificada nos diz muito sobre o modo e o

RMB1 o T/2012 223


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

motivo da avaria. O formato das faces de fra- dos tanques de óleo combustível em 2005 e
tura nos dá informações sobre o carregamen- do casco em 2007, não sendo detectado ne-
to atuante, e a aparência de superfícies nhum ponto com desgaste acentuado. Não
desgastadas nos indica a origem do desgaste. existe nenhum registro de que se tenha feito
tratamento ou pintura dos tanques.
Coleta de dados
Registro fotográfico – Foi realizado para
Tendo em mente o descrito acima, po- todas as avarias, conforme pôde ser visto
demos coletar alguns dados para a análise anteriormente, principalmente com o intui-
das avarias: to de permitir um registro acurado da falha,
Fabricação de peça – Todos os materi- principalmente para análises futuras.
ais envolvidos, sejam das chapas do tan- Condições anormais – Neste ponto, cabe
que, do casco ou do medidor de nível, são o ressaltar fato que se observa constantemen-
aço carbono comum. Todas as uniões de te, principalmente com o navio em viagem.
chapas foram feitas por soldagem. Não foi Não é anormal que o navio faça suas pernadas
possível verificar se existia alguma diferen- carregando no porão da praça de máquinas
ça entre o material de fabricação do medidor uma quantidade de água. Tenta-se ao máxi-
de nível e os parafusos utilizados no flange. mo realizar este esgoto por oportunidade do
Histórico operacional – O ambiente em navio atracado, tendo em vista a possibilida-
que ocorreram as avarias era extremamente de de auxílio de suporte externo (chata/cami-
agressivo para qualquer tipo de material, nhão) para retirada dessa “água de porão”.
tendo em vista a presença de água salga- Mesmo com o porão seco, pelo próprio as-
da, gases oriundos da combustão e tempe- pecto construtivo do navio, o local onde ocor-
raturas elevadas. reram as avarias é um ponto de acúmulo de
Histórico de manutenção – Não existe água, como pode ser visto na Figura 7.
registro nenhum de que o sistema de medi-
ção de nível (KDG) tenha sofrido algum tipo Inspeções
de manutenção durante toda a vida operativa
do navio; inclusive o mesmo encontrava-se Todas as partes avariadas foram sub-
inoperante. Foi efetuada medição de espes- metidas a uma rigorosa inspeção visual
sura, por meio de ultrassom, no chapeamento antes de qualquer limpeza.
ENGINEERS
STORE & CLOTMING
AFT LOWER WORKSHOP Região de LOWER DECK BEDDING &
DECK STORES ACOOMMODATION MESS GEAR
LOBBY
acúmulo de água STORE LOWER DECK MAGAZINE
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AND STORES LOBBY

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ENGINE ROOM
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COMPARTMENT

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EXPLOSIVE CUTTER MAGAZINE
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Figura 7. Esquema da localização das avarias e região de acúmulo de água no porão da praça de máquinas

224 RMB1 oT/2012


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

No medidor de nível, foram verificados dade de corrente é muito alta e concentra-


depósitos de resíduos em toda sua parte ex- da num ponto, surgindo perfurações cuja
terna, confirmando sua falta de manutenção. profundidade é maior do que o diâmetro da
Ficou clara a corrosão de todos os parafusos base. Estas perfurações são chamadas de
do flange, que praticamente não existiam. pites ou corrosão alveolar. Um exemplo de
Atenção particular foi dada às regiões corrosão alveolar ou por pites é a que ocorre
corroídas da chapa do tanque. As fotografi- quando uma porção de água salgada com
as registram bem a forma, o tamanho e a cloreto de sódio fica estagnada em conta-
aparência da região da chapa onde ocorreu to com o aço. O íon do cloro rompe a cama-
o furo. Prestar atenção a mudanças de tex- da apassivada e produz uma pequena área
tura e cor e notar a diferença entre as super- anódica que, após algum tempo, se trans-
fícies da chapa observadas internamente e forma em um pite. Este tipo de corrosão
externamente ao tanque. chega a perfurar chapas grossas.
Com relação à união flangeada do medi-
Determinação do modo de falha e causa dor de nível, seria necessário um estudo mais
básica detalhado dos materiais envolvidos, do pa-
rafuso e do flange propriamente. Entretan-
A degradação dos to, em linhas gerais,
materiais geralmente quando um metal é
ocorre via três cami- Uma analise de avarias que conectado a outro me-
nhos bem conhecidos: tal mais nobre e o con-
corrosão, fratura e atri- não serve de subsídio para junto estabelece con-
to. Apesar de apresen- um conjunto de ações tato com um meio
tarem considerações corretivas tem utilidade nula aquoso, observa-se,
particulares, estão in- geralmente, um aumen-
timamente ligados. to de corrosão do pri-
A corrosão é a deterioração das proprieda- meiro, isto é, do metal menos nobre. A ação
des úteis do material por ação química ou aceleradora da corrosão promovida pelo
eletroquímica do meio ambiente. Pode causar metal mais nobre chama-se corrosão
a falha de componentes metálicos diretamen- galvânica. A ação aceleradora se faz sentir
te ou tornar a peça mais sujeita a outros tipos em qualquer uma das formas de corrosão
de falhas. A taxa, o tipo e a extensão do dano apresentadas anteriormente. No conjunto
corrosivo admissível variam muito em função mostrado na Figura 8, o parafuso e as arrue-
do tipo de peça. A água do mar é extremamente las de cobre ou de latão promovem a corro-
danosa para objetos de aço. Ela acelera o pro- são localizada do aço.
cesso de corrosão em, aproximadamente, cin- Casos de corrosão, associados à conta-
co vezes mais do que a água doce e dez vezes minação microbiológica de combustíveis de-
mais do que a umidade normal do ar. rivados de petróleo e à presença de água,
Um dos tipos de corrosão existentes é a têm sido observados em tanques de óleo di-
corrosão alveolar. Esta ocorre quando exis- esel, de gasolina e de querosene para aviões
tem elementos desapassivadores no a jato. Se esses combustíveis estiverem com-
eletrólito, como cloro ou sulfato, por exem- pletamente livres de água, não se observa a
plo, que provocam o surgimento de peque- presença de microrganismos, ou se estive-
nas áreas anódicas em relação a grandes rem presentes, não são ativos nesse meio.
áreas catódicas vizinhas. Por isso a densi- Mesmo com todas as precauções, a água

RMB1 o T/2012 225


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

aderência inicial e a aderência a longo prazo. A


aderência inicial é alcançada pela utilização de
um primário (primer) adequado que promova
a base para as camadas seguintes. A aderên-
cia a longo prazo depende da compatibilidade
das tintas com o revestimento da chapa. A
utilização de tintas incompatíveis e a aplica-
ção direta de acabamentos inadequados, sem
o primário correto ou sem um pré-tratamento
adequado, resultarão na falha prematura da
pintura. Dessa forma, deve-se programar, como
Figura 8. Ilustração de uma corrosão galvânica forma de manutenção preventiva, o tratamen-
to e a pintura das chapas, tanto dos tanques
pode penetrar no combustível e se acumular quanto do casco. Assim, uma sugestão seria:
nas regiões de difícil drenagem. A água que
aparece no diesel pode ser proveniente da
condensação da umidade nos tanques de TRATAMENTO E PINTURA DE
armazenagem, da entrada de água de chuva, TANQUE E PORÃO DE PRAÇA DE
de ação de sabotagem, de manuseio inade- MÁQUINAS
quado, de contaminação acidental ou do pró-
prio processo de produção. Escopo: 1. limpeza ST-2;
2. tratamento mecânico ST-3;
CONCLUSÕES E SUGESTÕES 3. limpeza com solvente; e
4. pintura.
Mas quais os eventos que, se modifica-
dos ou suprimidos, iriam prevenir todas
estas falhas? É possível definir qual será a Por oportunidade do momento desta
medida para evitar repetição do evento? manutenção, aproveita-se para realizar ins-
Uma análise de avarias que não serve peção ultrassônica das chapas. A inspe-
de subsídio para um conjunto de ações cor- ção ultrassônica, ou teste por ultrassom, é
retivas tem utilidade nula. Por outro lado, uma das técnicas de ensaio não destrutivo
se não for possível determinar as causa bá- mais utilizadas, aplicada para se medir uma
sicas da falha, não será possível introduzir variação nas características do material,
melhorias no sistema. tendo sido usada por décadas para medi-
A pintura de chapas de aço constitui uma ção da espessura de objetos sólidos. En-
solução muito favorável para a proteção tretanto, mesmo com os mais sofisticados
anticorrosiva de superfícies expostas a am- equipamentos existentes atualmente, é
bientes corrosivos. Tem sido comprovado inviável o uso desta técnica para monitora-
que nos casos em que materiais como o aço mento em tempo real.
são expostos a ambientes altamente agres- A termografia é uma técnica de inspe-
sivos ou onde o acesso é difícil, requerendo ção emergente que permite o monitora-
períodos muito longos para a manutenção, mento das características térmicas de um
a pintura promove uma boa proteção. determinado objeto quando este está aque-
Dois fatores são críticos para o desempe- cido, resfriado ou mesmo mantido nas con-
nho de uma pintura aplicada sobre o aço: a dições do ambiente. Ela tem se tornado uma

226 RMB1 oT/2012


ESTUDO DE CASO: ANÁLISE DE AVARIAS EM PRAÇA DE MÁQUINAS DE NAVIO DEVIDO A CORROSÃO

nam mais acessíveis para a geração e o tra-


Elemento Transdutor
tamento dos dados obtidos. Os equipamen-
tos comerciais existentes permitem que se
detecte uma variação de 0,2oC em materiais
com temperatura de até 500oC. Os compo-
nentes a serem inspecionados devem ser
termicamente condutivos e apresentar co-
res e textura uniformes.
Em um sistema de medição termográfico
utilizando uma câmera de imagem térmica, a
energia infravermelha irradiada e refletida da
superfície do material sofre uma inspeção.
Onda do ultrassom
O local que apresenta um determinado de-
Superfície feito (ponto de corrosão ou fissura) irá apre-
Figura 9. Esquema de uma medição de sentar emissividade e difusão térmica que
espessura de chapa por ultrassom são diferentes do substrato do material. Es-
sas diferenças na emissividade e na difusão
ferramenta largamente popular à medida térmica serão visualizadas por variações da
que os custos dos equipamentos se redu- claridade na imagem, permitindo que a falha
zem e os recursos computacionais se tor- seja detectada e caracterizada.

Figura 10. Esquema de monitoramento de chapa utilizando câmera termográfica

 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:


<APOIO>; Reparo; Manutenção; Corrosão; Máquinas;

REFERÊNCIAS

1. ROBERGE PR. Handbook of Corrosion Engineering. New York: McGraw-Hill, 2000.


2. BERRY WE. “Water Corrosion”. In: Van Delinder LS and Brasunas Ad, eds. Corrosion Basics,
Houston, TX: NACE International, 1984; 149–176.
3. UHLIG HH. Iron and Steel. In: Uhlig HH, ed. The Corrosion Handbook. New York: John Wiley
& Sons, 1948; 125–143.

RMB1 o T/2012 227


ARTIGOS AVULSOS

Esta seção divulga os artigos que não puderam ser publicados


– na íntegra – na RMB e que passarão a fazer parte do acervo da
Biblioteca da Marinha.
Aqui são apresentados o título, o autor, posto ou título, número
de páginas do trabalho completo, classificação para índice remissi-
vo e o resumo do artigo.

INDÚSTRIA BRASILEIRA DE CONSTRUÇÃO NAVAL:


UM ESTUDO COMPARATIVO DE QUATRO CASOS
RENATO SANTIAGO QUINTAL
Capitão-Tenente (IM)
LEONARDO PORTUGAL BARCELLOS
Analista do TRE-RJ
ROBSON AUGUSTO DAINEZ CONDE
Auditor-Fiscal da Receita do Estado do Espírito Santo
LUIZ DA COSTA LAURENCEL
Diretor e Professor da Faculdade de Administração e Finanças da Uerj

Número de páginas: 11
Identificação: AV 044/12 – # 1974 – RMB 1o/2012
CIR: <APOIO>; Construção naval; Indústria naval; Reparo; Gerência;

O objetivo foi investigar o nível de internacionalização das empresas do setor naval,


bem como os respectivos impactos nos sistemas de controle de gestão dessas empresas.
Foi aplicado um questionário para empresas filiadas ao Sindicato Nacional da Indústria da
Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval).
As empresas podem se estabelecer como nacionais, multinacionais ou globais e podem
migrar de um modelo para outro. Se o sistema de controle gerencial não se modificar pode fracassar
a mudança para se tornar globalizada, já que assim detêm vantagem sobre as demais concorrentes.
Os resultados da pesquisa apresentaram características relevantes das empresas
pesquisadas, tais como: porte, estrutura dos planos de bônus praticados, estratégia compe-
titiva adotada, bem como ferramentas de controle utilizadas. Neste último aspecto, merece
especial menção o uso da ferramenta denominada lucro antes de juros, impostos, deprecia-
ção e amortização (EBITDA) que foi unanimidade entre as empresas pesquisadas.
A contribuição deste estudo foi principalmente, a análise do perfil das empresas que
compõem o setor quanto aos aspectos de controle de gestão, por meio do relato das
especificações encontradas. Pretende-se, assim, estender contribuições e investidores,
gestores e outros pesquisadores no sentido de melhor compreensão dos efeitos gerados
pelo início do processo de internacionalização de uma das empresas do setor vis-á-vis com
as práticas de controle de outras três empresas do mesmo ramo.
ARTIGOS AVULSOS

A ATUAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS


NO BRASIL
ROZALINA TADY DE MATTOS DE SOUZA
Servidora Pública Federal

Número de páginas: 13
Identificação: AV 043/12 – RMB 1o/2012
CIR: <ADMINISTRAÇÃO>; Administração (governamental)

A finalidade do artigo é analisar a atuação das agências reguladoras que exercem


uma função fiscalizadora em nome do Estado, não tendo, contudo, autonomia para editar
normas. Consistem em pessoas jurídicas de direito público que receberam tratamento de
destaque quando foram consideradas como autarquias de regime especial, ou seja, aquelas
a quem a lei instituidora concede privilégios específicos e passam a ter maior autonomia
quando comparadas com as autarquias de regime comum. No entanto, o tema tem grande
relevância, sendo oportuna tal análise quando se leva em consideração a questão da des-
confiança que se instalou nos últimos tempos no País com relação aos abusos cometidos
no exercício de competências normativas delegadas pelo Estado, bem como no setor públi-
co em geral.

A IMPORTÂNCIA DO SETOR DE COMPRAS NA


QUALIDADE DO SERVIÇO AOS CLIENTES INTERNO
E EXTERNO
ESLEY RODRIGUES DE JESUS
Segundo-Tenente (FN)

Número de páginas: 5
Identificação: AV 045/12 – # 1976 – RMB 1o/2012
CIR: <ADMINISTRAÇÃO>; Controle Administrativo; Abastecimento; Aquisição;

O artigo tem como objetivo evidenciar a interface entre compras, logística e produ-
ção, com a tarefa de dotar de melhores informações o processo de tomada de decisão dos
ordenadores de despesas, bem como dos chefes de Departamento/Seção e setores de
caráter operacional.
A função da seção de compras e obtenção, hoje em dia, vai muito além do serviço de
outrora, em que apenas era acionada quando algo era emergencial. O mundo impõe que esta
seção seja ocupada por pessoas qualificadas, não só com habilidades em discernir as
regras e normas em voga, como também com habilidades de negociação, análise de indica-
dores econômicos e os macro e microambientes organizacionais.
O importante é que aumentemos nossa capacidade de planejamento, antevendo
contingências. E isto apenas irá ocorrer quando houver maior integração organizacional.

RMB1 o T/2012 229


NECROLÓGIO

A RMB expressa o pesar às famílias pelo falecimento dos seguintes colaboradores e assinantes:

AE José Julio Pedrosa  01/04/1935 † 18/10/2011


VA Aloysio Mendes Lopes  09/06/1919 † 10/11/2011
CA Max Justo Guedes  06/08/1927 † 08/11/2011
CMG Jerônimo de Xerez Sobral  14/07/1931 † 10/10/2011
CMG Sergio Augusto Rocha Penna  17/02/1936 † 11/12/2011
CMG Djalma da Costa Albuquerque  03/09/1934 † 03/12/2011
CMG Marcílio Dias  30/10/1942 † 28/09/2011
CMG Oswaldo de Castro Silveira Filho  31/05/1942 † 19/12/2011
CMG (EN) Guilherme Henrique Daniel Borba  11/02/1947 † 06/09/2011

11/1965, a capitão de fragata em 30/11/1970,


a capitão de mar e guerra em 31/08/1977, a
contra-almirante em 31/07/1984, a vice-al-
mirante em 31/07/1988 e a almirante de es-
quadra em 25/11/1992. Foi transferido para
a reserva em 08/02/1996.
Em sua carreira, exerceu seis comandos:
Navio-Varredor Juruá, Corveta Bahiana, Fra-
gata Niterói, Esquadra e Operações Navais.
Exerceu três direções: Escola de Guerra
Naval, de Pessoal, de Navegação. Foi Che-
fe do Estado Maior da Armada e Ministro
do Superior Tribunal Militar.
Comissões: Navio-Escola Almirante
Saldanha, Centro de Instrução Almirante
Wandenkolk, Centro de Armas da Marinha,
Escola Naval, Navio-Escola Duque de
Caxias, Comando da Flotilha de Contrator-
pedeiros, Contratorpedeiro Benevente,
JOSÉ JULIO PEDROSA Corveta Imperial Marinheiro, Contratorpe-
Almirante de Esquadra deiro Greenhalgh, Comando da Força de
Minagem e Varredura, Comissão Naval Bra-
Nasceu em Blumenau, SC, filho de sileira em Washington, Escola de Aprendi-
Severino Nicomedes Alves Pedrosa e de zes Marinheiro de Santa Catarina, Comis-
Iracema Franca Pedrosa. Promoções: a se- são de Construção Naval da Marinha do
gundo-tenente em 30/12/1956, a primeiro- Brasil, Escola de Guerra Naval, Comissão
tenente em 13/01/1959, a capitão-tenente Naval Brasileira na Europa, Comando em
em 12/01/1961, a capitão de corveta em 01/ Chefe da Esquadra, Comando da Força de
NECROLÓGIO

Fragatas, Estado-Maior da Armada, e Gabi- Militar – Alta Distinção, Ordem do Mérito


nete do Ministro da Marinha. Ministério Público Militar – Grã-Cruz, Ordem
Em reconhecimento aos seus serviços, re- do Mérito do Trabalho – Grã-Cruz, Medalha
cebeu inúmeras referências elogiosas e as Militar e passador de platina – Quinto Decê-
seguintes condecorações: Ordem do Mérito nio, Medalha Naval de Serviços Distintos,
da Defesa – Grã-Cruz, Ordem do Mérito Na- Medalha Mérito Tamandaré, Medalha Méri-
val – Grã-Cruz, Ordem do Mérito Militar – to Marinheiro – 3 âncoras, Medalha do Paci-
Grande Oficial, Ordem do Mérito Aeronáuti- ficador, Medalha Mérito Santos Dumont e
co – Grande Oficial, Ordem do Rio Branco – Medalha Mérito Judiciário Estado de Santa
Grande Oficial, Ordem do Mérito Judiciário Catarina – Grande Mérito.

ALMIRANTE PEDROSA
O Almirante de Esquadra José Julio val e na Comissão Naval Brasileira na Eu-
Pedrosa deixou o Serviço Ativo da Marinha ropa (CNBE), no desempenho de funções
em 29 de março de 2005, ao se aposentar no ligadas aos projetos de construção do Na-
cargo de ministro do Superior Tribunal Mili- vio-Transporte Marajó, dos navios-
tar (STM), tendo completado 53 anos de varredores e das fragatas, permitiu ao Al-
serviço, dos quais 44 no Serviço Naval e mirante Pedrosa acumular experiência útil
nove no STM. Natural de Blumenau, ingres- à Marinha nas decisões relacionadas ao
sou na Marinha em 16 de abril de 1951, como reparo e à modernização daqueles navios e
aluno do 1o ano do Colégio Naval. Naquela no desenvolvimento de novos projetos.
época, a redução do curso do Colégio Na- Foi eleito presidente do Clube Naval em
val para dois anos e da Escola Naval para 31 de maio de 2005, para o biênio 2005/2007,
três possibilitou que fosse declarado guar- e reeleito, em 2007, para o biênio 2007/2009.
da-marinha em 30 de dezembro de 1955. Após sua posse como presidente do Clu-
Serviu no Contratorpedeiro de Escolta be, tomou conhecimento de alguns proble-
Benevente, na Corveta Imperial Marinheiro mas pendentes, dos quais se destacavam:
e no Contratorpedeiro Greenhalgh e coman- no Charitas, a questão da legalização do
dou os seguintes navios: Navio-Varredor terreno e as dificuldades financeiras para
Juruá, Corveta Bahianna e Fragata Niterói. ampliar suas instalações; o caso da nau
Como almirante, foi chefe do Gabinete do capitânia, que onerava o Clube Naval com
Ministro da Marinha, diretor da Escola de o pagamento de salários da tripulação e
Guerra Naval, diretor-geral do Pessoal da com as despesas de manutenção; os pro-
Marinha, diretor-geral de Navegação, coman- blemas de financiamento entre a Carteira
dante em chefe da Esquadra, comandante de Hipotecária e Imobiliária (CHI) do Clube e
Operações Navais e chefe do Estado-Maior a Caixa Econômica Federal; e, finalmente,
da Armada. Nomeado para o Superior Tribu- as dificuldades de realizar obras na Sede
nal Militar, pôde, mais uma vez, demonstrar Social do Clube Naval, por se tratar de um
seu alto nível intelectual e seu senso de jus- prédio tombado pelo patrimônio público.
tiça, apreciados pelos ministros que com ele Com sua experiência profissional e seus co-
conviveram, qualidade certamente herdada nhecimentos jurídicos, aprimorados duran-
de seu pai, um eminente juiz de direito. te o período em que foi ministro e presi-
A experiência adquirida no período em dente do STM, o Almirante Pedrosa con-
que serviu na Comissão de Construção Na- seguiu, durante sua gestão, adotar solu-

RMB1 o T/2012 231


NECROLÓGIO

ções amplamente favoráveis para os inte- seus chefes superiores. Homem de cará-
resses do Clube. ter firme, educado e respeitoso, sempre
Em relação ao terreno do Charitas, cabe tratou de modo cordial superiores e su-
ressaltar que havia ações na Justiça bordinados, não fraquejando diante de
impetradas pelos herdeiros. O Almirante pressões de quem quer que fosse, man-
Pedrosa, em contato direto com os interes- tendo sua firmeza e dignidade de conduta
sados, conseguiu chegar a um acordo, que, em todos os assuntos de serviço ou de
devidamente homologado pela Justiça, per- caráter particular.
mitiu quitar a dívida do Clube. Além disso, Destacou-se em sua carreira por sua
deu apoio financeiro ao Charitas para a exe- correção de atitudes, sua firmeza, sua total
cução das obras de recuperação do cais da dedicação ao serviço, seu equilíbrio e sen-
marina, reforma do Píer no 5, compra de um so de justiça e sua capacidade e sensibili-
novo guindaste de 20 toneladas para ma- dade em conhecer e avaliar com isenção
nobra de embarcações e muitas outras mu- pessoas que trabalhavam junto com ele.
danças de menor expressão. Seu preparo profissional e sua brilhante
No caso da nau capitânea, a solução foi inteligência garantiram excelentes resulta-
obtida com a transferência da responsabi- dos no desempenho de cargos e frequência
lidade da nau para a Secretaria da Pesca do de cursos, especialmente os realizados na
Governo do Estado do Rio de Janeiro, com Escola de Guerra Naval (EGN). Durante o
a devida aquiescência da Marinha, para que período em que esteve em atividade na
a embarcação ficasse atracada no cais do Marinha, o Almirante Pedrosa deixou um
Espaço Cultural, na área do 1o Distrito Na- legado de importantes obras realizadas e
val (Rio de Janeiro-RJ), onde permaneceria de bons exemplos de caráter e dignidade.
exposta à visitação pública. Destacou-se em todos os cargos e fun-
Na Sede Social do Clube Naval, o Almi- ções que exerceu, pela excelência de seu
rante Pedrosa realizou obras para a restau- desempenho, pela sua dedicação ao servi-
ração da fachada e construiu nova escada ço, pelo amor à Marinha e por suas carac-
de serviço, que teve como propósito prin- terísticas de equilíbrio e bom senso. De in-
cipal melhorar as condições de segurança teligência lúcida e de cristalina capacidade
para escape dos 5o e 6o andares, em caso de de expressão, o Almirante Pedrosa tinha
incêndio. Durante os dois biênios em que como poucos a capacidade de ordenar um
foi presidente do Clube Naval, procurou assunto e dele tirar as linhas essenciais
sempre, em harmonia com os presidentes para a solução de problemas e a tomada de
do Clube Militar e Clube da Aeronáutica, providências. Sua presença marcante con-
manter uma política de excelente relaciona- tribuía de modo especial para alegrar ambi-
mento entre os clubes, inclusive com a entes e cimentar camaradagens, que são
publicação na imprensa, quando e sempre fatores indispensáveis para o funciona-
que necessário, do posicionamento con- mento harmonioso de uma organização.
junto sobre assuntos que envolviam a con- Seu equilíbrio e sua capacidade e sensi-
juntura nacional. bilidade em conhecer e avaliar com isenção
Durante sua carreira na Marinha, em pessoas que trabalhavam com ele torna-
todas as funções e cargos ocupados, o ram-no merecedor da admiração de chefes
Almirante Pedrosa sempre se destacou por e subordinados. Soube sempre manter fir-
seu brilhante e eficiente desempenho, re- meza e dignidade de conduta em todos os
conhecido por seus pares e ressaltado por assuntos de serviço ou de caráter particu-

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NECROLÓGIO

lar. Lutou por um Brasil melhor, para uma amigos de longo tempo, entre os quais
Marinha respeitada e, por fim, pela vida, muito me orgulho de ser um deles.
dando exemplo de rara tenacidade. Contou
sempre com o apoio e o carinho de sua José Ignácio Gomes Pereira
mulher, seus filhos, seus familiares e dos Capitão de Mar e Guerra (Refo)

Em sua carreira, exerceu três comandos:


Contratorpedeiros Baependi e Araguaia e
Cruzador Tamandaré.
Exerceu duas direções: Diretoria de As-
sistência Social e Diretoria de Comunica-
ção e Eletrônica.
Comissões: Base de Navios Mineiros,
Diretoria de Armamento, Navio-Escola Al-
mirante Saldanha, Rebocador Wan-
denkolk, Tênder Ceará, Contratorpedeiro
Maranhão, Corveta Jaceguai, Navio-Au-
xiliar Duque de Caxias, Aviso Oiapoque,
Comando do 3o Distrito Naval, Ministério
de Viação e Obras Públicas, Escola Naval,
Escola de Guerra Naval, Estado-Maior da
Armada, Comissão Naval Brasileira em Wa-
shington, Comando do 5o Distrito Naval,
Comando da Força de Transportes da Ma-
rinha, Comando do 1o Distrito Naval, Esco-
ALOYSIO MENDES LOPES
la Superior de Guerra e Secretaria do Con-
Vice-Almirante
selho de Almirantes.
Em reconhecimento aos seus serviços,
Nasceu no Rio de Janeiro, filho de recebeu inúmeras referências elogiosas e as
Ermelino Mendes Lopes e de Aurélia de seguintes condecorações: Medalha Naval
Melo Mendes Lopes. Promoções: a segun- do Mérito de Guerra – 3 estrelas, Medalha
do-tenente em 08/02/1943, a primeiro-tenen- Força Naval do Sul – Bronze, Ordem do Mé-
te em 24/11/1944, a capitão-tenente em 05/ rito Naval – Grande Oficial, Ordem do Méri-
09/1946, a capitão de corveta em 14/09/1953, to Militar – Comendador, Ordem do Mérito
a capitão de fragata em 04/02/1959, a capi- Aeronáutico – Comendador, Ordem do Rio
tão de mar e guerra em 20/01/1966, a con- Branco – Grande Oficial, Medalha da Vitó-
tra-almirante em 29/12/1970, a vice-almiran- ria, Medalha Militar e passador de platina –
te em 31/07/1975. Foi transferido para a re- Quarto Decênio, Medalha Mérito Tamandaré
serva em 15/06/1977. e Medalha Mérito Marinheiro – 1 âncora.

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NECROLÓGIO

26/03/1971, a contra-almirante em 25/03/1998.


Foi transferido para a reserva em 09/03/1977.
Em sua carreira, exerceu a direção do
Serviço de Documentação e da Diretoria
do Patrimônio Histórico e Documentação.
Comissões: Navio-Escola Almirante
Saldanha, Cruzador Barroso, Contratorpe-
deiro Benevente, Tênder Belmonte, Coman-
do da Força de Contratorpedeiros, Centro de
Instrução Almirante Wandenkolk, Diretoria
do Pessoal Militar, Cruzador Ligeiro Barro-
so, Secretaria-Geral do Conselho de Segu-
rança Nacional da Presidência da República,
Navio-Escola Custódio de Mello, Escritório
Técnico Administrativo de Maceió e Direto-
ria de Engenharia da Marinha.
Em reconhecimento aos seus serviços,
MAX JUSTO GUEDES recebeu inúmeras referências elogiosas e
Contra-Almirante as seguintes condecorações: Ordem do
Mérito da Defesa – Comendador, Ordem
Nasceu no Rio de Janeiro, filho de José do Mérito Naval – Oficial, Ordem do Méri-
Luiz Guedes e de Helvécia Soares Guedes. to Militar – Oficial, Ordem do Rio Branco –
Promoções: a segundo-tenente em 27/12/ Oficial, Medalha Militar e passador de ouro
1951, a primeiro-tenente em 07/04/1953, a ca- – Terceiro Decênio, Medalha Mérito
pitão-tenente em 16/04/1957, a capitão de Tamandaré, Medalha do Pacificador, Me-
corveta em 07/05/1962, a capitão de fragata dalha do Mérito Santos Dumont e Meda-
em 30/08/1966, a capitão de mar e guerra em lha Naval Vasco da Gama.

MAX JUSTO GUEDES


Ao dar como terminada a fase civil de minha experiência neste terreno até então
minha vida, achei que já havia trabalhado fosse, de quando em vez, ler uma passa-
suficientemente para outrem e que chegara gem histórica que me interessara especial-
o tempo de me dedicar a algo que especial- mente e que passara a ser a preferida de
mente me agradasse, prendendo-me a com- minhas leituras.
promissos apenas comigo mesmo. Quando cheguei a essa conclusão, sou-
Estudando como poderia preencher tais be que, na Marinha, houvera um movimen-
condições, concluí que a Marinha, to, dirigido por um oficial ainda relativa-
malgrado os mais de 20 anos de meu afas- mente moderno e do qual faziam parte meia
tamento, ainda possuía o encanto que le- dúzia de oficiais, no sentido de, num esfor-
vara a me juntar a ela aos 15 anos. E, quan- ço heroico, manter uma biblioteca, uma es-
to à atividade intelectual que me afastasse pécie de museu e um arquivo muito ele-
das palavras cruzadas, a História seria a mentar no porão do Ministério e também
que mais me atraía, embora o máximo de de publicar o que chamaram de Subsídios

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NECROLÓGIO

da História Naval, trazendo à luz uma co- realizador. Nos 37 anos que ele dirigiu o Ser-
letânea de documentos primários que pro- viço de Documentação da Marinha, enorme
metiam ser – como foram – de grande valor. foi o número de obras que se alinharam como
Sem fazer muita ideia do que resultaria, pro- sua criação ou seu desenvolvimento: biblio-
curei o Comandante Max Justo Guedes, que teca, revistas, museus, Espaço Cultural, na-
chefiava o Serviço de Documentação da Ma- vios para serem visitados, publicações, ar-
rinha, e lhe perguntei se poderia cooperar com quivo. A lista é grande, mas cabe-lhe uma
seu trabalho. O Max perfilou-se, tratou-me de realização que se subtrai dessa relação, apa-
Excelência, mas pôs-me à prova. Disse-me que recendo pelo seu valor subjetivo, e que tem
estava sendo levada adiante a edição da His- mais valor do que tudo o mais. Deve-se a
tória Naval Brasileira, da qual já haviam pu- Max a criação da memória da Marinha. Por
blicado uma série de volumes, estando, na- sua influência, muitas instituições navais cri-
quele momento, em curso o primeiro tomo da aram suas casas de memória, como a Escola
Marinha republicana – cobrindo do fim da Gran- Naval, o Corpo de Fuzileiros, a Aviação Na-
de Guerra ao fim da Segunda Guerra Mundial val, a Base de Submarinos, a Diretoria de
–, e me perguntava se eu poderia esquematizar Hidrografia e Navegação e o Hospital. E se
o desenvolvimento da publicação. acrescente as revistas por elas editadas, os
Não me sentindo desde logo derrotado, livros cobrindo suas histórias particulares e,
respondi-lhe que iria tentar. Remoendo a ideia, ainda, os importantes arquivos históricos.
era levado a combinações complicadas de ca- Esta é a grande obra de Max Guedes.
pítulos com a cronologia e, não encontrando Se como homem público Max Guedes teve
solução nesse caminho, só me ocorreu a arru- papel de realce na Marinha e no País, pessoal-
mação óbvia da distribuição de assuntos na mente salientou-se pelo caráter firme em suas
Marinha: Organização, Informações, Opera- decisões e por ser leal e veraz com superiores
ções, Logística e Assuntos Complementares. e subalternos. Isso fê-lo ser rodeado por gran-
Receando a simplicidade da esquematização, de número de admiradores, que o respeitavam
mas não imaginando outra, apresentei-a. Mas e o seguiam. Entretanto, era avaro de amiza-
creio que exatamente por esse aspecto tenha des. Extremamente exigente consigo mesmo,
sido aceita a proposta. E Max foi além: per- também o era com quem trabalhava. Não per-
guntou-me se eu queria coordenar e escrever doava facilmente erros profissionais ou quem
a parte do livro que fosse necessária. Seria um falhasse funcionalmente. Daí carrego como um
desafio diferente dos que havia tido até então galardão enobrecedor e raro a exceção que
– aceitei. Com a prontificação do livro, duas abriu para mim quando propus que alterasse
coisas haviam acontecido – tornara-me um es- certo ponto em um dos livros, já que, segundo
boço de historiador e nascera uma amizade ele, comigo “sempre concordava”.
por toda a vida!
Max era pleno de qualidades, não só inte- Helio Leoncio Martins
lectuais, como historiador, mas também como Vice-Almirante (Refo)

MEU QUERIDO “CHEFE” MAX


Você acabou de iniciar uma viagem para história da Marinha já foi feita por você e aí
uma outra dimensão. Que tristeza... Mas você está para torná-lo presente no futuro.
não nos deixou, sempre estará entre nós, seus Até mais, Max.
amigos e admiradores. A obra do registro da Brígido.

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NECROLÓGIO

A Revista Marítima Brasileira tes), Capitão de Corveta Newton Tornaghi,


Max e eu fomos contemporâneos na oficial brilhantíssimo, trabalhado para lidar
Escola Naval; eu entrei em 1944 e ele em com a mocidade, teve uma conversa séria
1946. Não me lembro dele como calouro, com ele e o convenceu a mudar de time. Daí
provavelmente porque ele sempre foi mui- em diante, Max tornou-se outra pessoa: da
to esperto para ser lembrado por alguma gloriosa rabada, em dois anos Max saiu guar-
“calourada” que tivesse feito. da-marinha, fazendo parte da banda.
Nos anos seguintes, o veterano Max e Com a classificação calculada sobre
um pequeno grupo de colegas se faziam pontos cumulativos, um rabada transfor-
notar pela prática de halteres em busca de mar-se em banda em dois anos é algo de-
saúde e de corpos musculosos. Para a tris- veras apreciado.
teza de Max, o seu bíceps, atendendo aos Este foi o Max bom aluno e bom aspiran-
estímulos da prática daquele esporte, era te que, daí em diante, nunca mais deixou de
avantajado, bafejando com alegria seus primar pela excelência em tudo o que fazia.
esforços. Mas as pernas... Nossas vidas profissionais cruzaram-se
Durante o curso da Escola Naval, o Max pela primeira vez no Cruzador Barroso, eu já
foi dois aspirantes, bem distintos um do cursado em Armamento, como encarregado
outro: o de 46, quando ingressou, e o de da Divisão F, e Max cursado em Eletrônica,
1948, quando, em um belíssimo ato de soli- na Divisão E-2 e integrando a mesma divisão
dariedade e coragem moral, pediu baixa por de serviço. Éramos sete oficiais das divisões
não concordar com a injustiça feita aos 50 de convés e de máquinas que a cada quatro
e tantos aspirantes que foram “expulsos dias pernoitávamos a bordo. Os domingos
com direito a voltarem no ano seguinte eram maravilhosos, com banho de sol e de
mediante requerimento”, como responsá- ducha a ré da Torre Três e muitos papos.
veis pela indisciplina ocorrida em julho de Inesquecível! E nesse belíssimo ambiente,
1948. (Esta foi uma figura jurídica nunca minhas amizade e admiração por Max cresce-
vista, nem antes nem depois.) ram e sedimentaram-se. Quanta saudade!
Observações: 1) Eu fui um dos aspiran- Nossas vidas profissionais se cruzaram
tes expulsos. 2) Quando contra-almirante, pela segunda vez no Centro de Instrução
diretor da Escola Naval entre 1977 e 1979, Almirante Wandenkolk (CIAW), eu como
não havia um segundo sequer que eu não instrutor do Curso de Especialização de Ar-
me lembrasse das ocorrências daquele ano, mamento para Oficiais (CEAO), hoje “de
das observações que fiz e que muito me Aperfeiçoamento”, e ele como encarregado
ensinaram sobre o que um diretor e a admi- da Escola de Técnica de Ensino, naquele
nistração naval não devem fazer. tempo a “menina dos olhos” do Ensino da
Bem, águas passadas, sabiamente a alta Marinha. Ele, senhor absoluto do assunto.
direção da Marinha ignorou o passado, e Fui seu aluno.
aqueles aspirantes, os expulsos e os de Max, para mim, era o instrutor perfeito. Não
baixa, voltaram, e nossas vidas continua- ditava uma única norma da técnica de ensino
ram na mesma. Mas o Max não. que ele não fosse o primeiro a cumprir, e com
Contou-me ele, certa vez, que reconhecia naturalidade. Ele ensinava pelo exemplo.
que fora um “mau elemento”, mas que num Seu uniforme era impecável; parecia ter
determinado evento, em 1949, o nosso chefe dúzias deles, de maneira que na sua primei-
de Departamento Escolar (função hoje deno- ra aula do dia, de cada dia, de todos os
minada comandante do Corpo de Aspiran- dias, era engomado com vincos perfeitos,

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NECROLÓGIO

na camisa e na calça, e com sapatos luzin- E foi no Serviço de Documentação


do! E o brilho dos dourados dos distinti- que nossas vidas iriam se encontrar
vos de capitão-tenente? E a fivela do cin- verdadeiramente.
to? Quase ofuscavam a nossa visão. Eu tinha passado para a reserva e saído
As recomendações básicas, como man- de um período de nove meses no meio ci-
ter o contato visual com a turma (mesmo vil, o qual não se afinou nem ele comigo em
quando escrevia no quadro de giz) e a cri- eu com ele. Estava “desempregado” e, coi-
ação do suspense ao fazer uma pergunta, sa que fazia raramente, fui ao Clube Naval
assim como a convicção naquilo que ensi- não sei por que razão. Lá encontrei o Max.
nava, eram características que o faziam um Depois de uma primeira troca de palavras,
instrutor perfeito. Max, de súbito, perguntou-me se eu queria
Suas aulas são inesquecíveis e até hoje “tomar conta” da Revista Marítima Brasi-
estão presentes e bem vivas, ajudando-me leira (RMB). Levei um susto, mas vi aquele
sobremaneira toda vez que tenho de falar desafio com olhos bastante simpáticos,
em público ou quando tenho que explicar pois, lá no fundo, sempre gostei de lidar
uma novidade a um grupo funcional. com publicações. Deu-me 24 horas para
Depois de, talvez, um ano, acumulei mi- pensar. Pensei e, no dia seguinte, informei-
nha instrutoria com o encargo do CEAO, e lhe que aceitaria, porém com uma única
assim fomos colegas lado a lado durante condição. Ele ficou em suspenso... A con-
bem mais de dois anos naquela maravilho- dição era que meu serviço fosse gratuito,
sa Ilha das Enxadas. fosse considerado como uma colaboração
Depois do CIAW, nossas vidas toma- para a Marinha.
ram rumos diversos, eu cumprindo as mar- E assim foi feito e assim passei 20 anos
cas da carreira e Max tendo a incrível cora- felicíssimo à frente da Revista Marítima
gem de abrir mão de uma unânime e pro- Brasileira.
missora carreira para poder se dedicar Dessa maneira, intensificou-se uma amiza-
àquilo que amava: a História. Por isso não de que nascera 30 anos antes. Ele me apoian-
se apresentou para fazer o exame para a do em tudo, dando carta branca para as mi-
Escola de Guerra Naval e permaneceu no nhas ideias, e eu não deixando de considerar
Serviço de Documentação da Marinha que ele era realmente o “chefe”, o chefe for-
(SDM), primeiro como segunda pessoa e malmente responsável por tudo o que seria
depois como encarregado. E desde então publicado na Revista Marítima Brasileira.
o Serviço tornou-se SERVIÇO com letras Foram quase 20 anos de completa har-
maiúsculas e hoje, como Diretoria do monia e felicidade que eu jamais poderei
Patrimônio Histórico e Documentação da esquecer. Era um chefe muito habilidoso,
Marinha (DPHDM), vem sempre melhoran- que sabia lidar com “subordinados mais
do e se firmando não só na Marinha do antigos” (militarmente falando, eu era mais
Brasil como entre os congêneres brasilei- antigo que o Max).
ros e de todo o mundo. A grandeza atual da No finalzinho de sua administração,
DPHDM, no meu julgamento, é decorrente Max recebeu o reconhecimento da Mari-
dos magníficos esforços do Max no passa- nha pelo grande trabalho que realizara à
do. Ele deixou essa Organização Militar frente do Serviço de Documentação da
com massa crítica que facilitou os traba- Marinha. O ministro Mauro Cesar
lhos magníficos da responsabilidade da Rodrigues Pereira, excepcionalmente
atual administração. (como prevê o regulamento), outorgou ao

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NECROLÓGIO

Max as honras de almirante e cobrou dele E aí, Max deixou o SDM e eu a RMB.
a sua presença nas cerimônias da Mari- Pouco nos encontramos depois, mas a
nha com o novo uniforme. admiração e o respeito que sentia por ele
E lá estava o Max, novamente com o continuaram a ser enormes como é a amiza-
uniforme impecável. (Vale dizer que os ter- de que lhe devoto.
nos que usou durante os muitos e muitos
anos de serviço à frente do SDM também Luiz Edmundo Brígido Bittencourt
eram impecáveis e de muito bom gosto.) Vice-Almirante

PALAVRAS DE DESPEDIDA PRONUNCIADAS NA MISSA DE 7o DIA

O Almirante Max Justo Guedes, a quem Terra, Pedro Álvares Cabral e o descobrimen-
daqui em diante nos referiremos apenas to do Brasil e tanta coisa mais que não nos é
como Max e cuja memória reverenciamos oportuno citar agora.
nesta oportunidade, foi sem dúvida algu- Já no Colégio Militar, onde fomos cole-
ma um dos expoentes máximos na pesqui- gas, seu interesse pelo assunto levava-o a
sa, no desenvolvimento, no detalhamento manter conversas longas e curiosas com um
e na divulgação da História do Brasil em dos professores de História, o então Capi-
nosso país e no mundo ocidental. tão Sampaio, que demonstrava também ser
Max, apaixonado por História, acabou um apaixonado pelo assunto, além de ape-
ingressando no campo da cartografia e nes- nas se preocupar em ministrar a matéria.
se campo foi-se aprofundando em pesqui- Ainda como aluno do Colégio, começou
sas nos museus, nas bibliotecas, nos arqui- a desenvolver o gosto pela perfeição do cor-
vos e em inúmeras outras fontes onde du- po e a se dedicar a exercícios físicos que o
rante toda a vida aprimorou seus conheci- levaram a possuir um físico privilegiado até
mentos e seu interesse, ao ponto de se tor- completar bem mais de 70 anos. E, ainda bem
nar um grande conhecedor de História da moço, juntou à elegância física a elegância
Arte, com suas diversas ramificações, e as- no trajar, ao ponto de, durante algumas déca-
suntos que não faziam parte de suas ativi- das, ser, sem dúvida alguma, o oficial mais
dades fins acabaram sendo merecedores de bem trajado da Marinha, tanto no que diz
uma atenção especial, quais sejam literatu- respeito aos uniformes como nos trajes civis.
ra, pintura e até música. Música sim, pois, Como não poderia deixar de ser, essa
afinal, quantas vezes tivemos oportunidade mania de perfeição chegava também à exe-
de assistir a concertos ao vivo com intér- cução de todo e qualquer serviço, fosse na
pretes de renome, graças à sua iniciativa de limpeza e arrumação dos compartimentos,
promover o “Música no Museu”. fosse na redação dos documentos, fosse
Segundo relato dele próprio, seu amor pela no desenrolar das cerimônias civis ou mili-
História nasceu ainda na infância, quando teve tares, preocupando-se com todos os deta-
oportunidade de ler a “História do Mundo para lhes, tais como, entre outros, a maneira de
Crianças”, de Monteiro Lobato. E por meio servir um vinho num coquetel, a colocação
dos personagens Dona Benta, Narizinho, das taças e talheres num almoço, a distri-
Pedrinho e Emília teve seus primeiros conta- buição dos assentos de honra nas cerimô-
tos com Alexandre e o Nó Górdio, Júlio Cesar nias em auditórios e a colocação da Ban-
e o Rubicon, Carlos Magno e seu império eu- deira Nacional nas cerimônias em compar-
ropeu, Cristóvão Colombo e a esfericidade da timentos fechados.

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NECROLÓGIO

Entrou para a Escola Naval em 1946, mas na época muitos professores profissionais
antes mesmo disso teve aulas de História iam à Marinha para fazer o excelente curso
da Cartografia com o eminente professor de Técnica de Ensino lá ministrado, no qual,
português Jaime Cortesão. como não podia deixar de ser, Max realçava,
Terminado o curso escolar, na magnífi- entre outras coisas, a necessidade da boa
ca viagem de circunavegação empreendi- apresentação de qualquer professor.
da a bordo do Navio-Escola Almirante Ao longo de sua carreira, durante a se-
Saldanha, Max aproveitava seu tempo nos gunda metade dos anos 60, mergulhou com
diversos portos tocados para visitar mu- ímpeto em sua paixão e ingressou como vice-
seus, exposições, bibliotecas e arquivos diretor do então pequeno Serviço de Docu-
que lhe permitissem incrementar seus co- mentação da Marinha. Naquela organização
nhecimentos de história e cartografia. militar, de luta em luta, foi despertando nos
Como oficial, fez os pequenos cursos chefes navais a compreensão do valor das
que eram ministrados aos segundos-tenen- ideias daquele capitão de mar e guerra que
tes, tendo-se em seguida especializado em batalhava em prol da preservação e do de-
eletrônica e ido exercer funções de oficial senvolvimento das tradições navais e nacio-
de eletrônica a bordo do Cruzador Barro- nais. Conseguiu convencer os então minis-
so, então capitânia da Esquadra. Naquele tros da Marinha da importância de seu servi-
navio, impressionou o comandante por seu ço e realizar o sonho de ter uma sede condig-
porte, sua elegância e sua educação, a tal na para o Museu Naval, um local apropriado
ponto que lhe foi dada a função colateral para o Arquivo da Marinha, um local equipa-
de oficial de Relações Públicas. do para a microfilmagem dos documentos a
Do Barroso foi designado para ser en- serem arquivados e um local adequado para
carregado da Escola de Técnica de Ensino instalar a Biblioteca da Marinha. Ao mesmo
da Marinha, onde se destacou na transmis- tempo em que realizava todas essas tarefas,
são de normas para a boa comunicação en- levava para trabalhar consigo pessoas de alto
tre professores e alunos, ressaltando-se que gabarito que comungavam de suas ideias,
tais como o Almirante Leôncio, o Almirante
Brígido, o Comandante Porto e muitos ou-
tros colaboradores cujos nomes não me vêm
à mente e que ele denominava de “colabora-
dores eméritos” e aos quais peço desculpas
por não mencioná-los nominalmente, mas
que, convém ressaltar, trabalhavam por amor
à causa sem receber qualquer remuneração
pelo precioso trabalho que produziam. Max
também organizou e inaugurou o Espaço
Cultural da Marinha, que, a princípio, teve
como atrações principais um navio-museu
que tomou parte na Segunda Guerra Mundi-
al, o Contratorpedeiro Bauru e outro navio,
o Rebocador Laurindo Pitta, que fez parte
da DNOG, Divisão Naval em Operações de
Guerra, organizada pela Marinha e enviada à
Europa na Primeira Guerra Mundial. Devida-

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NECROLÓGIO

mente modernizado, o Laurindo Pitta fazia, e organizações nacionais e estrangeiras, além


ainda faz, excursões pela Baía de Guanabara. de cinco medalhas comemorativas com os
O acervo do Espaço Cultural desde então respectivos diplomas.
vem sendo aumentado e se constitui numa Foi sepultado, a seu pedido, em São João
atração permanente e disputada do centro del Rei, no jazigo de sua família. Lá ficou
da cidade. Organizou também a Ilha Fiscal, sabendo que um velho casarão usado como
transformando-a num ponto turístico impor- casa de cômodos tinha um grande valor his-
tante desta nossa tão querida cidade do Rio tórico e em épocas remotas havia servido
de Janeiro. No auditório do Museu, promo- como forte na Guerra dos Emboabas, sendo
veu seminários, conferências e debates, aos conhecido como Fortim dos Emboabas. Max
quais compareciam representantes de seto- não teve dúvidas e, com grande esforço fi-
res culturais de vários países. nanceiro, adquiriu a casa, restaurou-a, usou-
O Serviço de Documentação da Marinha a como local para férias e fins de semana
cresceu tanto de importância que foi alçado à prolongados e solicitou a seus herdeiros que
categoria de Diretoria do Patrimônio Históri- a doassem à Fundação Itaú, a qual se com-
co e Cultural da Marinha, tendo como seu prometeu a mantê-la tal como está e abri-la à
primeiro diretor nosso amigo Max, já no pos- visitação pública, constituindo-se em mais
to de contra-almirante que lhe foi outorgado uma atração histórica e turística daquela tra-
já como oficial reformado como reconheci- dicional cidade mineira.
mento pelos excepcionais serviços presta- Como curiosidade, devo mencionar que,
dos durante toda sua permanência na Mari- no subsolo do quintal do Fortim dos
nha. Naquela função permaneceu até novem- Emboabas, alguns moradores das redon-
bro de 2003 e, embora tendo-se retirado, tra- dezas encontraram ouro e, sabedores que
balhou e produziu até poucos dias antes de o subsolo é de propriedade da União, in-
ser levado pela doença que o acometeu. vadiam e esburacavam o terreno do Max
Suas atividades o tornaram conhecido no na tentativa de garimpar algumas pepitas,
exterior, razão pela qual foi convidado para sem que Max se incomodasse ou esboças-
pronunciamentos em Espanha, Holanda, In- se qualquer reclamação.
glaterra, Estados Unidos, Argentina, Peru, Poderíamos ficar horas falando sobre as
Equador e Portugal. Mencionamos Portugal realizações e atividades do Max, o que certa-
por último para realçar que, mesmo lá, um mente seria inconveniente neste momento.
país de enorme atuação e tradição nos gran- Deste modo, em nome de todos aqui pre-
des descobrimentos marítimos, seu prestígio sentes, apresentamos nossas despedidas e
chegou ao ponto de frequentemente ser con- reafirmamos nossa amizade e nossa sauda-
vidado para fazer conferências sobre as gran- de, pedindo a Deus que o receba em paz.
des navegações e os roteiros dos grandes Adeus Max.
navegadores. Pelo imenso cabedal demons-
trado durante toda uma vida, recebeu nada Ronaldo Gabeira Ferreira
menos que 32 condecorações de diversas Capitão de Mar e Guerra (Refo)

240 RMB1 oT/2012


CARTAS DOS LEITORES

Esta seção destina-se a divulgar ideias e pensamentos e incentivar debates,


abrindo espaço ao leitor para comentários, adendos esclarecedores e observa-
ções sobre artigos publicados. As cartas deverão ser enviadas à Revista Maríti-
ma Brasileira, que, a seu critério, poderá publicá-las parcial ou integralmente.
Contamos com sua colaboração para realizar nosso propósito, que é o de dina-
mizar a RMB, tornando-a um eficiente veículo em benefício de uma Marinha
mais forte e atuante. Sua participação é importante.

Recebemos correspondência do Vice-Almirante (Refo) Luiz Edmundo Brígido


Bittencourt a respeito do cinquentenário da Força de Minagem e Varredura, que reproduzi-
mos a seguir:

“No interessante artigo ‘Força de deles assisti bem de perto, ou mesmo deles
Minagem e Varredura de Ontem e de Hoje fiz parte, direta ou indiretamente.
– 50 anos’, publicado na RMB do 2o trimes-
tre de 2011, seu autor, Capitão de Fragata A FLOTILHA JOÃO DAS BOTTAS
Cláudio da Costa Reis de Souza Freitas,
nada mencionou da relação entre o “torpe- Durante meu curso na Escola Naval (1944
do” paraguaio que afundou o nosso a 1949 ), estudamos sobre as minas Sautè-
Encouraçado Rio de Janeiro, em 1865, e a Harlè, de origem francesa, e sobreviventes
criação da Força de Minagem e Varredura, da Primeira Guerra Mundial, observando que
em 1961, contando com os Navios- a Marinha brasileira tinha um bom número
Varredores Javari e Jutaí. em estoque no Centro de Munição da Mari-
Entretanto, muitos fatos importantes nha, na Ilha de Boqueirão, visitado por nós
ocorreram nesse período dizendo respeito aspirantes. Também estudamos uma mina
à guerra de minas na Marinha do Brasil. criada por um oficial da Marinha e que foi
E é à recordação desses fatos que pre- denominada MB-1, a qual era um aperfeiço-
tendo proceder no texto a seguir. A muitos amento da antiga Sautè- Harlè.
CARTAS DOS LEITORES

Flotilha “João das Bottas” – Itacurussá Flotilha “João das Bottas” – Itajaí
(2o com esse nome na Marinha Brasileira)

O Navio-Mineiro Iguape em exercícios na Guanabara

A FLOTILHA JOÃO DAS BOTTAS

Flotilha “João das Bottas” – Itapemirim


(2o com esse nome na Marinha Brasileira) Flotilha “João das Bottas” – Iguape

242 RMB1 oT/2012


CARTAS DOS LEITORES

Menciono estas ocorrências como uma A Flotilha de Navios-Mineiros de Ins-


prova de que a Marinha nunca se descui- trução incluía o Itacurussá e o Itaparica.
dou inteiramente da guerra de minas. Fo- Tive dificuldade de encontrar o docu-
ram várias as abordagens feitas, a maioria mento de criação da Flotilha de Navios-
tênue e sem continuidade, mas ela nunca Mineiros de Instrução, a não ser alguns
foi completamente omissa. documentos que a ela faziam referência,
Voltando ao meu período de aspirante, a como a denominação de Iguape ao ex-Avi-
viagem de instrução para os calouros (minha so Sales de Carvalho, ‘sendo na mesma
turma) no período de férias, em janeiro/feve- data incorporado à Flotilha de Navios-Mi-
reiro de 1945, foi realizada a bordo de alguns neiros de Instrução’ (17/10/1938). Este mes-
navios-mineiros de instrução da Flotilha João mo documento menciona o Itajaí, ex-Re-
das Bottas (nome em homenagem ao célebre bocador Rio Pardo (nesse Aviso consta:
herói baiano da luta pela consolidação da in- ‘Passou a denominar-se Itajaí, sendo na
dependência do Brasil ), a saber Iguape, Itajaí mesma data incorporado à Flotilha de Na-
e Itapemirim, além do Navio Hidrográfico vios-Mineiros dita João das Bottas. Outro
Lahmeyer, e neles navegamos dentro da Baía navio-mineiro de instrução era o Itaparica,
de Guanabara, com algumas saídas até a altu- ex-rebocador (classificado como navio-mi-
ra das Ilhas Cagarras e Redonda. neiro em 1943)’.

ASPIRANTES EMBARCAM NOS NAVIOS-MINEIROS DE


INSTRUÇÃO EM 1945

Reforço ao lanche trazido da EN oferecido


pelo navio Aspirante passa para o CT Santa Catarina

RMB1 o T/2012 243


CARTAS DOS LEITORES

Aspirantes guarnecem o 47mm do Itapemirim (à direita o autor deste adendo)

Na história da Ilha de Mocanguê cons- Caravelas e Camaquã, em setembro de


ta que a Base de Navios-Mineiros de Ins- 1939, e finalizando com o Camocim
trução foi criada em 1940, a fim de atender (construído no Arsenal Velho), em outu-
‘serviços de instrução e treinamento de bro de 1939.
pessoal nas operações de minagem e var- Outro documento, o Aviso Ministerial
redura... que há mais de 15 anos não eram no 682 de 7 de junho de 1940, cria a Flotilha
realizados’. de Navios-Mineiros, constituída dos seis
Cariocas.
OS CARIOCAS Na mesma data, outro Aviso determinou
que a Base de Navios-Mineiros e a respec-
Mesmo antes de entrar para a Escola tiva Flotilha de Navios-Mineiros de Ins-
Naval, tive a ventura de assistir aos lança- trução passassem a ficar diretamente su-
mentos ao mar de cinco dos seis navios bordinadas ao Estado-Maior da Armada.
que formavam a classe Carioca no fim da Com a entrada do Brasil na Segunda
década de 1930, fato que marcaria indele- Guerra Mundial, os Cariocas e os nossos
velmente o renascimento da construção velhos cruzadores Rio Grande do Sul e
naval militar no Brasil. Bahia constituíram os primeiros e únicos
Eram seis elegantes pequenos navios navios disponíveis para combater os sub-
de 500 toneladas de deslocamento e 14 nós marinos inimigos, o que fizeram com cora-
de velocidade máxima. O Carioca e o gem e sucesso, sendo que os Cariocas
Cananéia foram lançados ao mar em outu- foram rearmados para a guerra
bro de 1938 (o fato se revestia de repercus- antissubmarino e reclassificados como
são nacional, largamente divulgado pelos corvetas. Os Cariocas nunca mais volta-
jornais do dia), seguido pelos Cabedelo, ram a ser navios-mineiros.

244 RMB1 oT/2012


CARTAS DOS LEITORES

Metralhadoras antiaéreas Canhão 101.6

OS CARIOCAS

Sra. Julio Regis Bittencourt


madrinha do Cananéia

Cerimônia de incorporação à Armada dos seis navios-mineiros classe Carioca – observar as


paravanas e as minas na popa dos navios

RMB1 o T/2012 245


CARTAS DOS LEITORES

O NV Juruá entra na Baía de Guanabara – o embandeiramento em arco e a flâmula de fim de


comissão permite que se pense tratar da sua chegada ao Brasil

O RENASCIMENTO DE UMA FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA

Após a Segunda Guerra Mundial, a guer- ada pelo Aviso Ministerial no 818 de 12 de
ra de minas na Marinha do Brasil foi lem- maio de 1961, quando tive a ventura de,
brada superficialmente com a chegada das como assistente do primeiro comandante
corvetas classe Imperial Marinheiro, com da Força, o Capitão de Mar e Guerra João
as quais foram feitos alguns exercícios de Luiz Agapito Veiga, participar do
colocação de trilhos e lançamento de mi- renascimento de tão importante setor da
nas de contato. guerra no mar.
A Marinha recebeu um novo e impor- Este texto é um simples adendo ao mag-
tante impulso neste setor de atividades com nífico artigo do Comandante Souza Freitas,
a chegada dos navios-varredores, de alguém que viveu de diferentes formas
construídos especificamente para tal fim, a guerra de minas na Marinha do Brasil e
da classe do Javari, a que se juntaram o tem convicção plena da sua importância.
Jutaí, o Juruá e o Juruena, os quais for- ‘Não há necessidade de se plantar um cam-
maram, após algumas outras denomina- po minado, basta divulgar que plantou para
ções, a Força de Minagem e Varredura, cri- provocar um enorme desgaste ao inimigo’.”

246 RMB1 oT/2012


CARTAS DOS LEITORES

Recebemos carta do Capitão de Mar e Guerra (RM1) Ronald dos Santos Santiago
sobre o desenvovimento das embarcações ao longo dos séculos, até os nossos dias.

O COMANDANTE

No início, as embarcações eram apenas Há pouco tempo o Brasil foi incluído


algo flutuante que servia para ajudar na nos roteiros dos navios de passageiros por
caça, no transporte de exploração, nas pi- ter, entre outras razões, uma variedade de
lhagens etc. Há milênios o homem vem aper- opções de minicruzeiros de baixo custo e
feiçoando as embarcações, chegando aos uma classe média disposta a usufruir desta
dias de hoje com moderníssimos navios, opção de lazer.
tanto para a Marinha de guerra como para Em janeiro, a notícia que correu o mun-
a Marinha Mercante. do foi o acidente com o navio de cruzeiro
No último século, a tecnologia desen- Costa Concórdia, que naufragou nas cos-
volveu-se rapidamente, proporcionando tas da Ilha de Giglio, Itália, após ter rasga-
conforto e segurança para a gente de bor- do o casco ao passar por um alto fundo
do, que também mereceu atenção na for- formado por pedras.
mação e no aperfeiçoamento profissional, Esse acidente, ao envolver um navio
principalmente após a criação, em 1948, da moderno, mortes, desaparecimentos de pas-
Organização Marítima Internacional (IMO), sageiros e tripulantes e possibilidade de
hoje sediada em Londres. Esta é a agência desastre ambiental por vazamento de com-
especializada das Organizações das Nações bustível, estava fadado a ocupar espaço na
Unidas que tem como objetivo instituir um mídia internacional. Mas o que movimentou
sistema de colaboração entre governos no a mídia, na realidade, foi o fato de o coman-
que se refere a questões técnicas que inte- dante do navio não ter permanecido a bor-
ressam à navegação comercial internacio- do para coordenar as ações de salvamento.
nal, encorajar a adoção geral de normas O comandante é a maior autoridade den-
relativas à segurança marítima e à eficácia tro do navio, cabendo-lhe dirigir, coorde-
da navegação, bem como à formação e ao nar e controlar todas as atividades desen-
aperfeiçoamento profissional. volvidas a bordo. Dentre elas destacam-se
Apesar do esforço dessa agência inter- a segurança da navegação e a salvaguarda
nacional e de outros organismos internaci- da vida humana no mar. Obviamente conta
onais, não menos importantes para a nave- com uma oficialidade que lhe dá o suporte
gação marítima mundial, acidentes conti- para tudo isso.
nuam acontecendo. Antigamente passavam A máxima “o comandante é o último a
despercebidos pelos brasileiros. Atualmen- sair” não foi seguida, o que, de certa for-
te, com a mídia mundialmente integrada, ma, decepcionou todas as pessoas que to-
essas notícias se propagam rapidamente. maram conhecimento do ocorrido, princi-
O Brasil tem a sua atividade de comér- palmente aquelas que lá estavam embarca-
cio exterior transportada em mais de 94% das e acreditavam estar seguras sob um
por meio marítimo, mas isso não é capaz de comando competente.
incutir no povo brasileiro uma mentalidade Sem dúvida, o navio contava com os
marítima que demonstre interesse e voca- equipamentos eletrônicos de navegação
ção pelas atividades ligadas ao mar. mais modernos existentes, e o comandante

RMB1 o T/2012 247


CARTAS DOS LEITORES

era uma pessoa muito bem preparada e ex- pensável o abandono, é obrigado a empre-
periente. Infelizmente, quem já teve a opor- gar a maior diligência possível para salvar
tunidade de ser o responsável pela navega- todos os efeitos do navio e carga, e com
ção de um navio encontra muita dificuldade preferência os papéis e livros da embarca-
para explicar tal infortúnio. O fato é que uma ção, dinheiro e mercadorias de maior valor.
derrota noturna segura foi alterada para ou- Se, apesar de toda a diligência, os objetos
tra que apresentava perigo. Tal decisão, pe- tirados do navio, ou os que nele ficarem,
las normas de segurança, requer a presença se perderem ou forem roubados sem culpa
do comandante na manobra e reforço do sua, o capitão não será responsável.
pessoal de serviço no passadiço. – Nas Normas da Autoridade Marítima
A mente das pessoas imagina a fisionomia para Aquaviário (Normam-13/DPC):
de um comandante velhinho de barba branca • item 0401 inciso 17: Ao comandante
tentando salvar o seu navio e posteriormen- compete empregar a maior diligência para
te afundando com ele. Cena comovente como salvar os passageiros e tripulantes, os efei-
a apresentada no filme tos da embarcação e
Titanic. Houve, obvia- carga, papéis e livros
mente, comoção geral
dos passageiros do na-
Ao comandante é vedado de bordo, dinheiro etc.,
devendo ser o último a
vio Costa Concórdia abandonar a embarcação, deixá-lo, quando julgar
ao saberem que o seu por maior perigo que se indispensável o seu
comandante não era um abandono em virtude
velhinho que primava ofereça, a não ser em de naufrágio;
pela tradição dos ho- virtude de naufrágio e após • item 0402 inciso 2:
mens do mar e sim um Ao comandante é ve-
playboy que os aban-
certificar-se de que é o dado abandonar a em-
donou à própria sorte, último a fazê-lo barcação, por maior
como a imprensa o apre- perigo que se ofereça,
sentou. Isto rapidamen- a não ser em virtude
te correu o mundo. de naufrágio e após certificar-se de que é o
Na Europa, alguns especialistas, em resu- último a fazê-lo.
mo, passaram a afirmar que não há legislação
que obrigue o comandante a ser o último a Para concluir, afirmo que navegar é se-
sair de bordo e que isso não passava de mito. guro, e o número de acidentes envolvendo
No Brasil, as normas são claras a esse navios de grande porte é baixo. Um fato
respeito. O comandante será o último a isolado, como o praticado pelo comandan-
abandonar o navio, como descrito a seguir: te do Costa Concórdia, não pode manchar
– Consta no Artigo 508 do Código Co- a reputação dos valorosos homens do mar.
mercial, que data de 1850 e está em vigor: É Estes continuarão aperfeiçoando-se no
proibido ao capitão abandonar a embarca- mister das lides marinheiras, preservando
ção, por maior perigo que se ofereça, fora as tradições navais e, com coragem, en-
do caso de naufrágio; e julgando-se indis- frentando os momentos difíceis.

248 RMB1 oT/2012


DOAÇÕES À DPHDM
DEZEMBRO DE 2011 E JANEIRO A
FEVEREIRO DE 2012
DEPARTAMENTO DE BIBLIOTECA DA MARINHA
DOADORES
Sr. Mauro Fernando Figueroa
Sr. Domingos Diniz
Capitão de Mar e Guerra (Refo) Geraldo Luiz Miranda de Barros
Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ibp)
American Bureau os Shipping (ABS)

University of Florida
Casa da Palavra
Liceu Literário Português
Ministério da Fazenda
Serviço de Seleção do Pessoal da Marinha

Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsã Nuclear


Biblioteca “Aluísio de Almeida”
MPMG Ministério Público do Estado de Minas Gerais
Universidad Francisco de Vitória (Madri)
Universidade Santa Cecília

PERIÓDICOS RECEBIDOS
ESTADOS UNIDOS
Activities – out./2011
Surveyor – Fall/2011

FILIPINAS
International Portfolio – jun./2011

MÉXICO
Politics & Policy – v. 39, no 4, ago./2011; v. 39, no 5, out./2011

PORTUGAL
Revista de Marinha – v. 74, no 964, nov./dez. 2011
DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

BRASIL
Âncora Social – v. 4, no 4, dez./2011
Cadernos do CHDD – v. 10, no 18, 1o semestre/2011
CNT Transporte Atual – v. 17, no 195, dez./2011; v. 17, no 197
Confluência – no 37/38, 2009/2010
Feira de São Cristóvão (livro) – 2011
Manual do Operador de Produção de Petróleo e Gás (livro) – 2011
Mar Oceana – no 29/2011
Navegando com segurança (livro) – 1a edição 2011
New’s – v. 81, no 42 nov./2011
Nossa Marinha – Seus feitos e glórias (1822-1940) (livro) – 1986
O Convôo – v. 18, no 01/2011
Pesquisa Fapesp – no 190, dez./2011; no 191, jan./2012
Portos e Navios – v. 53, no 611, dez./2011; v. 53, no 612, jan./2012
Revista Ceciliana – v. 22, no 32/2011
Revista de Estudos Universitários – v. 37, no 1, jun./2011
Revista do Clube Naval – v. 119, no 359, jul./ago./set. 2011
Revista Jurídica De Jure – v. 10, no 17, jul./dez. 2011
Serviço de Seleção do Pessoal da Marinha 60 anos (livro) – 2011
Tecnologia & Defesa – v. 28, supl. especial no 23; v. 28 no 127, 2011/2012
Considerações sobre Reforma Tributária (livro) – 1999
Governos Revolucionários Difíceis (livro) – 2003
Governo do Presidente Costa e Silva (livro) – 2003
Dois Governos Reformistas (livro) – 2003
Rio São Francisco: Vapores & Vapozeiros (livro) – 2009
Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub) – 2011

250 RMB1 oT/2012


ACONTECEU HÁ 100 ANOS

Esta seção tem o propósito de trazer aos leitores lembranças e


notícias do que sucedia em nossa Marinha, no País e noutras partes
do mundo há um século. Serão sempre fatos devidamente reporta-
dos pela Revista Marítima Brasileira.
Com vistas à preservação da originalidade dos artigos, observa-
remos a grafia então utilizada.

UM PROJECTO DE REORGANISAÇÃO DA NOSSA MARINHA*


(RMB, jan./1912, p. 1.143-1.167)
Américo Silvado

A ntes que a gloriosa esquadra japoneza


tivesse mostrado ao Occidente o quan-
to pode uma reorganisação real, muito antes
reorganisação completa da mesma marinha,
o qual foi discutido e aceito por uma
commissão composta de dois officiais
que na Inglaterra as summidades navaes co- generaes, alguns superiores, um machinista
gitassem da reforma estavel que modernisou e um medico. Sendo idéa nacional, apenas
completamente a marinha ingleza, um mo- estribada na evolução propria da marinha
desto 1o tenente da marinha do Brazil se do Brazil, comquanto approvada por homens
animou a apresentar um projecto de avançados do mundo antigo, não mereceu

* O ilustrado autor do presente artigo, sobejamente conhecido como um dos ornamentos mais conspicuos de nossa classe
para que precisemos enaltecer-lhe aqui os altos dotes intellectuaes e moraes e as invejaveis aptidões profissionaes,
nos pede a sua inserção nesta Revista.
Si bem que o assumpto não seja novo e se ache mesmo, algum tanto antiquado em certos pontos, gostosamente lhe damos
o merecido agasalho quanto mais não seja, como um justo desabafo e – sobretudo – como uma prova tangivel de que
tambem entre os nossos camaradas ha muito quem se preoccupe e se interesse pelo nosso progresso naval, com a maior
somma de applicação e de verdadeiro patriotismo.
ACONTECEU HÁ CEM ANOS

sinão o apoio platonico da commissão que a manidade, embora actualmente muito poucos
estudou e nem siquer hoje é citada, embora assim o julguem, como infelizmente tem acon-
quase todas as propostas tenham sido acei- tecido com tudo de grande que em diversas
tas por autores varios, infelizmente apenas épocas surgio, sinto-me animado a apresen-
no que se refere aos rotulos. É por isso que, tar idéas, capazes de serem aproveitadas e de
estando incandescente a discussão das me- produzirem frutos mais sazonados do que os
didas capazes de despertar a marinha mori- nascidos da organisação que até hoje tem exis-
bunda, me animo a transcrever o que propuz tido. Nesta tem constantemente predomina-
sobre o que, desde 1894, devia constituir a do o empirismo, que por não poder prever é
nossa Escola Naval. Li no ultimo numero da incapaz de regular systematisando.
Revista Maritima ser uma idéa moderna a Em these reprovamos, de accordo com a
fusão das classes de marinha e machina, quan- Doutrina que nos dirige, as instituições
do ha dezessete annos tal idéa foi proposta academicas por desnecessarias ao desenvol-
e aceita, tendo sido o autor da proposta o vimento da sciencia, que já é completo, e ao
modesto autor da presente transcripção. ensino da mocidade, que nellas só aprende
pedanterias de nenhuma utilidade pratica.
ESCOLA NAVAL DE Por outro lado, não comprehendemos o
APPLICAÇÃO internato, especialmente em tenra idade,
porque não podemos admittir que, dadas
“É subordinando-me sempre á eterna lei as condições da natureza humana, um
das classificações que na segunda parte des- funccionario extranho e official possa edu-
te trabalho começo pela Escola e termino car meninos ou rapazes melhor do que seus
pela Administração, passando pelos elemen- proprios paes, especialmente na esphera
tos formados por aquella e dirigidos por esta. social de onde provêm os Aspirantes.
Alem desta razão, ha a importancia mes- Admitida esta maneira de encarar questão
ma do assumpto que já de muito tempo se fez tão importante, continuemos a exposição de
sentir. Filho da revolução, mas felizmente nossas idéas, para finalmente codificarmos
tendo visto o pharol que servirá de marco eter- succintamente as exigencias de admissão.
no ao desenvolvimento systematico da Hu- (...)

REVISTA DE REVISTAS

JANEIRO – 1912 cançar este escopo é a “força”, e portanto o


estudo da guerra deve consistir em verificar
NAUTICAE RES (pelo Capitão de Mar como foi ella operada nos multiplos casos para
e Guerra da Marinha italiana Eugenio Bollati conseguir que o inimigo cedesse.
di Saint Pierre) – Seja qual for o aspecto sob Si neste estudo, por nós limitado ao mar,
o qual se pretenda estudar a guerra, nunca se pode sentir com a mão que a guerra
deve se perder de vista o seu escopo: “impor naquelle elemento foi victoriosa observan-
ao inimigo a nossa vontade”. O meio para al- do-se sempre certos principios, certas nor-

RMB1 o T/2012 253


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

mas, certas regras, não há razão para acre- sufficientemente exacta do que seja a guer-
ditar que se não vencerá ainda seguindo os ra naval e das normas que a regulam para
mesmos principios, as mesmas normas, as obter, presumivelmente, o successo.
mesmas regras; e é por isso que, sem temor Escrevemos para o publico, ignorante,
de errar, estes principios, normas e regras em geral, das questões maritimas: para
podem ser qualificados immutaveis no per- aquelle publico que – como foi acertada-
passar dos tempos, e podem formar, por mente dito – “deve fazer-se exactamente
assim dizer, o Alcorão da guerra maritima. idéa de como se acha o estado de coisas” e
A guerra repousa sobre o conhecido pos- “não vive, a todo momento, como o povo
tulado: “destruir o inimigo no menor tem- japonez, a vida da sua marinha”.
po e com o menor numero de perdas”. Para Com especialidade nos permittimos
isto occorre “discernir melhor que o inimi- appellar para os dirigentes de nossa politica,
go onde é preciso agir e golpear mais de- porque estamos persuadidos de que se go-
pressa e mais fortemente”; o que impõe verna mal quando não se tem uma clara no-
obter “a rapida concentração das forças”. ção, por simples que seja, das questões mili-
Tal é a synthese de estrategia, tanto no tares e navaes; si não se está a par dellas,
mar como em terra, a qual pode resumir-se isto é, de conhecer e comprehender o que
no seguinte enunciado: “apresentar-se no valem exercitos e marinhas, quanto delles se
momento preciso e no ponto devido em mas- possa exigir razoavelmente e quanto se pos-
sa preponderante”. sa pretender e esperar de sua acção.
Hoje em dia trata-se de obter este re- (...)
sultado o mais rapidamente possivel, por-
que pelos meios que dispõem as marinhas, PREPARAÇÃO POLITICA
meios que augmentam dia a dia, o jogo tor-
nou-se extremamente difficil e mais com- A preparação politica é “sciencia de go-
plicado do que outrora. verno”. Consiste no prever o futuro dentro
Carece portanto que o commandante em dos limites humanos, tendo em conta o
chefe seja mais activo, mais intelligente, mais provavel desenvolvimento commercial, in-
perpicaz, mais ardoroso do que o de que se dustrial e moral da nação, para prover a
precisava em tempos passados, porque hoje o tempo, ou com tratados, ou com occupações
tempo que se tem para pensar é extremamen- territoriaes, á posse de algumas posições
te diminuto pela grande quantidade e veloci- situadas nas linhas commerciaes, das que
dade das massas combatentes, emquanto que possam servir como pontos de apoio para
os principaes factores da guerra naval, tem- uma efficaz irradiação das forças navaes e
po, homem e mar, conservaram-se os mesmos e para o seu aprovisionamento.
podem, ás vezes, destruir em um instante o Outrosim lhe compete estabelecer as
mais bem combinado plano preconcebido. bases da preparação militar.
Neste trabalho nos valemos dos conse- Uma intelligente preparação facilita a
lhos consequentes do estudo da historia conquista do dominio do mar, necessidade
naval. O leitor, si o conceito não é muito primordial para o successo da guerra maritima.
pretencioso, poderá formar-se uma idéa (...)

254 RMB1 oT/2012


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

DAS ALLIANÇAS roseos sonhos por causa de momentaneas e


passageiras situações politicas, esquecesse ou
A questão é completamente politica, e descuidasse aquelle seu dever.
como tal poderia deixar de fazer parte de Em questão de preparação militar con-
nosso trabalho, sem que por isso faltassemos vem ter presente que uma nação, quando
ao escopo que nos traçámos, tanto mais que permitte que sua inferioridade, quer por
a muitas outras autoridades pode a opi- terra quer por mar, se torne muito sensí-
nião publica pedir suas luminosas lições. vel, certamente não pode esperar successo
Não obstante exporemos poucas idéas numa guerra. No momento em que esta re-
geraes para ter occasião de fazer resaltar os benta, já é muito tarde para preparar-se.
effeitos das allianças nas guerras maritimas, O proverbio “antes tarde do que nunca”
ahi onde, ou por defeito de preparação, ou não tem agora tanto proposito quanto o
por falta aos compromissos, as operações outro antigo: “si vis pacem para bellum”.
militares tiveram de registrar insuccessos. O “Recorda-vos da Guerra” do mallogrado
Os acontecimentos politicos que se teem almirante Makaroff é o “lembrete” que os ho-
seguido, cingindo-nos somente a uns vinte mens politicos e os administradores militares
annos para cá, tornaram evidente, para quase nunca deveriam esquecer. Deixou Jomini
todas as nações, a necessidade de nunca ficar escripto “que a guerra, longe de ser uma
isoladas, porque nem á todas é permittido sciencia exacta, é um drama terrivel e
affrontar uma guerra conservando-se em posi- passional”; mas, observa Lord Esher no seu
ção invejavel. A propria “splendid isolation” opusculo National Strategy “que elles nunca
da Inglaterra é uma coisa do passado. Faz par- teriam negado que a preparação scientifica
te da preparação politica o estudo do difficil para a guerra contribue largamente ao
problema – quando não seja possivel fazer fren- successo”; e accrescenta: “uma nação, em caso
te isoladamente a provavel adversario – pro- de guerra, deveria ter determinado de ante-
curar uma ou mais allianças que permittam, mão onde golpear e como estar preparada
unidas a outros factores, constrangel-o a ceder para golpear”. A sabedoria militar e a econo-
em caso de guerra. A solução depende, em gran- mia, quer de tempo, quer de dinheiro, aconse-
de parte, da propria força, pois que a alliança lham obter-se uma solução da guerra no mais
dos fortes é desejada, mas nem sempre a dos breve tempo possivel, com a certeza de que a
fracos; principio de que deriva que os beneficios nação que consegue em primeiro logar a su-
de uma alliança estão na razão directa da força premacia, será vencedora afinal; mas não se
de que se dispõe. pode pensar nisto si a preparação militar não
(...) é completa tanto na parte scientifica dos pla-
nos de campanha, como em seus minimos de-
PREPARAÇÃO MILITAR talhes. Um destes, por exemplo, frequente-
mente esquecido, é uma reserva de canhões,
A preparação militar é, em geral, baseada munidos de materiais de qualidade, bem como
na politica que quer seguir a nação, mas deve de pessoal. Ninguem pode predizer o tempo
sempre ser tal que assegure o territorio naci- que durará uma guerra e muito menos dizer
onal. Infeliz da nação que, embalando-se em si as condições modernas do combate poderi-

RMB1 o T/2012 255


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

am estabelecer que, de dois adversarios quase correr todas as forças intellectuaes e


iguaes em poder, fique um tão prostrado des- materiaes ao escopo que se quer alcançar.
de o primeiro encontro, que assegure ao outro O trabalho de uma administração naval
uma decidida vantagem. Neste caso as reser- deve ser silencioso, julgado só pelos resul-
vas de pessoal e material entram em jogo, e tados, não embaraçado pela politica parla-
terá a última palavra a nação que tiver dedi- mentar, e o que mais importa, ninguem deve
cado a estas questões um cuidado meticuloso. fugir á propria responsabilidade.
Os japonezes tinham uma preparação (...)
militar tão perfeita, e a reserva de materi-
ais e homens tão bem disciplinadas, que EDUCAÇÃO MILITAR DA
teriam podido, materialmente, continuar a OPINIÃO PUBLICA
guerra por dez annos.
Uma efficaz preparação militar repousa O povo, geralmente, não gosta de pen-
especialmente sobre uma administração bem sar e prefere viver, como sempre viveu, de
dirigida; mas si esta é complicada, o criterio hoje para amanhã ou, como vulgarmente se
está distrahido da concepção sã e pratica da diz, ao Deus dará.
guerra. Quando porém qualquer acontecimento
Nunca se deveria es- politico de importancia
quecer em primeiro vem perturbar a sua
logar que uma Marinha Nunca se deveria esquecer indifferença – como, por
existe emquanto existir em primeiro logar que uma exemplo, nos aconteceu
uma esquadra. O que no momento da annexa-
quer que seja, pois, que
Marinha existe emquanto ção da Bosnia e da
não vá em beneficio da existir uma esquadra. O que Herzegovina á monar-
esquadra, é dinheiro quer que seja, pois, que não chia austriaca – está en-
perdido. Acompanhar vá em beneficio da esquadra, tão prompto a recordar
com o olho vigilante as os riscos que se corre por
descobertas e invenções é dinheiro perdido despresar os principios
é sã direcção militar; o e a verdade que a
confiar, porém, demasiadamente nellas é dei- historia e a experiencia ensinam. Nesses mo-
xar-se seduzir por enganadora miragem, ás mentos o povo reflecte e pensa; mas passada a
vezes por uma pequenez economica, e esque- borrasca, recahe na sua aphatica indifferença.
cer assim a verdadeira essencia da guerra, Para evitar semelhantes inconvenien-
distrahindo dinheiro que poderia ser mais sa- tes, que poderiam acarretar insucessos na
biamente empregado. guerra, convem que a opinião publica seja
As multiplas rodas e uma engrenagem continuadamente instruida e mantida ao
que movem uma administração maritima corrente das necessidades da guerra.
embaraçam o seu caminho e o retardam. Por Esta educação da opinião publica tem, po-
isto se deveria proceder a uma acurada e rém, o seu fundamento na exacta concepção
estudada simplificação dos organismos ad- da disciplina, não a militar, mas sim das idéas;
ministrativos maritimos a fim de fazer con- porque as qualidades guerreiras de uma na-

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

ção podem ser optimas, mas de nada servirão, da delinear o seguimento e o exito da guerra.
si não estiverem escudadas na convicção de Assim succedeu na guerra russo-japoneza.
que obterão seu desideratum porque a mente Em geral a offensiva representa o di-
directora, que dellas dispõe, sabe, conscien- reito do forte, mas será útil recordar que
temente, qual o meio de empregal-as. nem sempre convem ao fraco esperar o ata-
A coragem, o heroismo, não podem abso- que. O primeiro golpe do jogo depende, ge-
lutamente suprir a ignorancia das coisas ralmente, do mais intelligente.
da guerra e o elevadissimo sentimento de Constitue offensiva para o mais fraco o ti-
honra da patria, que é dever das sãs insti- rar partido dos obstaculos naturaes do proprio
tuições governamentaes fazer rebentar po- litoral, para atacar logo que a occasião se apre-
derosamente e encorajar. sente. Ao mais fraco poderia, em determinados
(...) casos, parecer necessario subordinar o encon-
tro com o inimigo ao successo de operações par-
POLITICA DEFENSIVA ticulares, como a manutenção de pontos
especiaes, e proseguir ulteriores objectivos
A politica defensiva estrategicos; mas seme-
conduz, em geral, a lhante conducta da guer-
deploraveis conse- Convem que a opinião ra, si applicavel algumas
quencias. Mostra tibie- publica seja vezes como excepção,
za, incerteza, frequen- continuadamente instruida e como regra é errada.
temente ignorancia de Isto importa reco-
mantida ao corrente das
parte dos dirigentes. A nhecel-o e aceitar a
melhor defensiva é uma necessidades da guerra. outra como um mal que
decidida offensiva. Isto Esta educação da opinião se supporta.
é um velho aphorismo, publica tem, porém, o seu A concentração de
que é seguidamente es-
quecido, ou, por melhor
fundamento na exacta con- todas as suas forças é sã
estrategia para quem
dizer, não é applicado cepção da disciplina, não a opera offensivamente.
por defeito de prepara- militar, mas sim das idéas Portanto, um com-
ção mental. mandante em chefe não
Assim, o governo que deve hesitar em empe-
tenha por principio a pobre politica de salva- nhar uma batalha, ainda que dispondo de
guardar os navios, por economia do material – forças limitadamente inferiores, porque deve
ordens de Luiz XIV a Tourville – porá sem- pensar que a sua acção prompta e energica
pre os almirantes em posição compromettedora. poderá infligir tal damno ao inimigo que o
(...) impeça de proseguir seus objectivos.
A esquadra inimiga deve para elle
POLITICA OFFENSIVA constituir o objectivo principal e não deve
demorar-se em affrontal-a por conside-
A offensiva, como ficou dito, é sempre a rações secundarias. Não se deve
melhor das defesas, e ella, ás vezes, vem ain- economisar o material proprio, mas des-

RMB1 o T/2012 257


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

truir o do inimigo. É verdade que o ini- O dito de Ferragut: “corações de ferro em


migo póde fazer pagar caro a audaz ini- navios de madeira” será sempre, em qualquer
ciativa, mas é preciso não esquecer que epoca, verdadeiro; mas os corações de ferro
em guerra devem ser pagos os resultados não se improvisam, cumpre sabel-os cultivar.
que se obtem, e afinal os melhores são Diz Kuropatkin: “Simples navios não
tambem os que menos custam. constituem uma esquadra, nem o braço forte
Uma offensiva racional depende da pri- do Imperio, porque a força de uma nação
meira posição estrategica que se toma. Ahi não reside sob as couraças, em seus canhões
está o segredo da situação, de certo não facil; e torpedos, mas sobretudo no animo dos ho-
e eis como apparece a necessidade de que o mens que estão por detrás destas coisas.”
cerebro daquelle que dirige esteja sempre Howe foi certamente um grande almi-
imbebido dos estudos historico-navaes, rante, mas, diz Mahan, “mostrou ignorar a
reflectindo sobre as multiplas combinações verdade fundamental, plenamente
que podem sobrevir em uma guerra. comprehendida pelo seu successor Lord St.
Somente esta incessante preparação Vincent: que a efficiencia de um instru-
scientifica pode dar mento militar consis-
esperança no successo. te mais no methodo de
Para assegurar os A offensiva tem a vantagem empregal-o e na habi-
objectivos ulteriores, o de abreviar a guerra com a lidade pratica do ele-
melhor meio é bater as
forças adversarias.
efficacia da preparação. Pode mento homem que o
usa, do que na perfei-
Geralmente falan- custar mais, mas os fins ção material do
do, a offensiva tem a justificam os meios proprio instrumento”.
vantagem de abrevi- A habilidade pratica
ar a guerra com a do elemento homem re-
efficacia da preparação. Pode custar mais, side no exercicio constante do mister proprio,
mas os fins justificam os meios. e por isso o tirocinio do pessoal de uma esqua-
Si estrategicamente a offensiva prece- dra deve ser no mar. Não é já a questão de
de as vantagens, tacticamente é frequente sommar milhas, mas é a permanencia no mar
resolutiva. que habilita uma esquadra a estar verdadeira-
Nunca, pois, se deve hesitar entre o mente preparada para a guerra.
impor a propria vontade ao inimigo e o (...)
supportal-a.
BASES DE OPERAÇÕES
PREPARO DO PESSOAL
Uma acurada escolha das bases de opera-
O pessoal de uma marinha é o pedestal ções facilita a conquista dos mares. Os
sobre o qual repousa a guerra. É inutil ter arsenaes e os portos fortificados podem,
navios, bases de operações, reservas de gente eventualmente, ser bases de operações, mas
e de navios, etc., si quem deve empregar o é preciso discernir o modo de servir-se delles
todo é deficiente em sua preparação mental. para que não se transformem em ratoeiras.

258 RMB1 oT/2012


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

Si uma nação intenta cumprir uma serie LINHAS DE COMMUNICAÇÃO


de operações contra o inimigo, melhor aviso
é servir-se de pontos opportunamente esco- As linhas de communicação são vitaes,
lhidos, longe dos grandes centros e quer para os exercitos quer para as mari-
susceptiveis de defesa. Estes pontos per- nhas e por isto a estrategia contempla o
dem, porém, de valor si as communicações, defender as proprias e cortar, se possivel,
que a elles estão ligadas, ficam interrompi- as do inimigo.
das. A ligação entre as bases e as forças As esquadras podem a um tempo ser ba-
moveis, entre os portos e a esquadra, é mutua. ses de operações e linhas de communicação,
(...) como, por exemplo, era a esquadra ingleza
em Torres Vedras; e em geral o podem ser
BASES EVENTUAIS DE todas as vezes que tiverem caracter
OPERAÇÕES ultrapotente. Então, quando as
communicações estiverem cortadas, bem fa-
No paragrapho precedente mostrámos a cilmente desapparecem as bases navaes, se-
conveniencia – no caso que uma nação intente jam ellas eventuaes ou permanentes, e em
desenvolver uma serie tal caso o exito da
de opperações offen- guerra não é duvido-
sivas contra o inimigo – O pessoal de uma marinha é o so, ou, ao menos, a sor-
de escolher pontos apro- pedestal sobre o qual repousa te dellas torna-se tan-
priados, longe dos gran- a guerra. É inutil ter navios, to mais precaria para
des centros, susceptiveis a Marinha que as per-
de defesa e ahi estabe-
bases de operações, reservas deu, e os exemplos
lecer bases eventuaes de de gente e de navios, etc., si abundam na historia.
operações. quem deve empregar o todo é Si o inimigo tiver
A escolha de seme- deficiente em sua preparação cortado as linhas de
lhantes pontos depen- communicação, os
de de muitas circums- mental soccorros que eventu-
tancias e considerações almente possam vir
que aqui seria difficil e tambem superfluo correm o risco de ser destroçados antes de
indagar; mas, quaesquer que ellas sejam, é chegar.
indispensavel ter resolvido o problema em É evidente que a questão da segurança
tempo de paz, esmiuçando-o nos seus das communicações assume estrategica-
minimos particulares, para ter prompto o mente immensa importancia, e deve-se
material de defesa para proteger o ponto considerar que o interceptar, por exem-
escolhido, e ter ao mesmo tempo todo o ma- plo, um comboio de munições ou de car-
terial auxiliar para satisfazer a todas as ne- vão, é uma operação de consequencias mui-
cessidades de uma esquadra, como si o ponto to graves e importantes por ter de metter-
eventual fosse, por assim dizer, quasi uma se de momento a destruir um nucleo de
base permanente de operações. navios inimigos.
(...) (...)

RMB1 o T/2012 259


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

O COMMANDANTE EM CHEFE Na guerra obtem-se o maximo resultado


quando a intelligencia e a actividade delles
As funcções do commandante em chefe concorrem á consecução do fim designado
são delicadissimas. A elle está confiada a pelo commandante em chefe.
sorte da guerra, e a pessoa designada para Si a rigida manutenção da subordinação
ser investida desse posto deve possuir do- é a primeira condição para a efficaz coope-
tes excepcionaes militares e profissionaes, ração em uma guerra, não se comprehende,
e sobretudo ser um homem de caracter. porém, que o subalterno deva fazer sómente
Escolhido o chefe, deve elle ter a plena aquillo que lhe ordena o superior, mas sim
confiança do governo e a maxima liberdade que elle deve agir procurando secundar o
de acção. A intervenção do governo no modo espirito das ordens e facilitar as intenções
de proceder do commandante em chefe traz da autoridade superior. Qualquer iniciati-
o enfraquecimento de sua autoridade. va deve, porém, corresponder ás situações
(...) da guerra e servir aos escopos da mesma
guerra. O principio é simples, mas não tão
AUTORIDADE DO facil na sua execução, por isso que é muito
COMMANDANTE EM CHEFE difficil julgar exactamente a situação e
decidir sobre as mais opportunas disposi-
A violação das attribuições do ções a tomar; e é ainda mais difficil pôr em
commandante em chefe é um crime militar. execução tudo que tiver sido decidido, as-
A latitude concedida a um commandante sumindo inteira responsabilidade.
em chefe não deve ser limitada por ordens (...)
peremptorias. Semelhantes ordens enfra-
quecem a sua autoridade; vinculam-no na POSIÇÃO ESTRATEGICA
execução de seus designios; conduzem, ge- INICIAL
ralmente, aos insuccessos. Quem estiver
occupando o logar, é o melhor juiz da situ- Em xadrez o primeiro movimento do jogo
ação militar. Si não tem a confiança de seu decide frequentemente da partida, e pela mes-
governo, e em certos casos de seus superio- ma forma, da posição estrategica inicial pode
res, melhor é demitil-o immediatamente depender no mar o exito de uma guerra.
que dar aos seus subordinados a Isto significa que o commandante em
opportunidade de assistir a tristes chefe, sabido o fim que o governo quer al-
espectaculos. cançar, escolha judiciosamente aquella po-
(...) sição, o que pode ser algumas vezes
summamente difficil, si a preparação para
COMMANDANTES – SUA a guerra é deficiente no momento em que
INICIATIVA esta rebenta.
As questões navaes são por tal forma
Entendamos por commandantes em uma ligadas entre si, que uma não tem valor sem
esquadra os commandantes de grupos de a outra.
navios e os commandantes destes. (...)

260 RMB1 oT/2012


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

PRIMEIRO OBJECTIVO dominio do mar pelo aniquilamento da esqua-


dra inimiga ao successo de operações parciaes,
No mar o primeiro objectivo é a esquadra á manutenção de certos logares, á tentiva de
adversaria. Sua destruição ou paralysação obter desde logo ulteriores fins estrategicos.
podem decidir immediatamente da guerra. (...)
Alguem escreveu que “a Marinha franceza
nos tempos passados preferio sempre a glo- EMPREGO DAS FORÇAS
ria de assegurar e conservar uma conquista
de territorio á talvez mais brilhante, mas na O emprego das forças constitue a tarefa
realidade menos proveitosa, de destruir ou mais dedicada de um commandante em chefe.
capturar ao inimigo qualquer navio; e por Neste encarna-se sua concepção estra-
consequencia aquella Marinha mais se tégica e disso, ligado á posição estrategica
approximou do verdadeiro fim que se exigia inicial, depende quase certamente o exito
da guerra.” Todas as opiniões em materia de do plano de campanha.
guerra naval são dignas de respeito; mas si Antes de tudo incumbe ao commandante
trata unicamente de assegurar uma ou mais em chefe o agrupamento racional de seus na-
posições territoriaes, a Marinha torna-se en- vios em grupos homogeneos, de cuja direcção
tão simplesmente em um ramo do exercito devem ser encarregados commandantes
para o caso particular, e subordina sua acção intelligentes de divisões e de navios, e que
em harmonia com o caso; mas, si o verdadeiro sejam de sua confiança.
fim é o de sobrepujar a Marinha adversaria As forças navaes são bem empregadas
e de dominar o mar, então os navios inimigos quando sua acção se torna simultanea, e por
e as suas esquadras são os verdadeiros isto cumpre que o commandante em chefe te-
objectivos a atacar em qualquer occasião. nha idéas tacticas muito variadas, além das
(...) geraes suggeridas pelos livros de evoluções.
(...)
OBJECTIVOS ULTERIORES
N.R.: Seguem considerações do autor sobre: O Va-
lor do Tempo na Guerra, Serviço de Informações,
Os objectivos ulteriores não se podem A Batalha, Vitórias Estéreis – Perseguição Depois
conseguir, si não for obtido o principal. do Combate, Bloqueio, Das Fortificações, Dos De-
Subordinar este áquelles, já foi dito, é sembarques e do Predomínio do Mar, Cooperação
do Exército e da Armada, O Poder Marítimo e
commetter um erro estrategico difficil de Sobre Alguns Meios Auxiliares na Guerra Naval.
reparar depois. Além desses tópicos, o autor apresenta suas con-
Frequentemente os objectivos secundarios clusões e finaliza com o decálogo a seguir.

hypnotisam a mente de quem dirige; parece á


primeira vista que uma jogada facil, uma con- DECALOGO NAVAL
quista passageira, influe no moral do inimigo,
e não se dá o devido apreço a que o nervo de sua 1o Prepara-te para a guerra si não que-
força está ainda intacto e pode fazer pagar res ser surprehendido por acontecimentos
caro um ephemero successo. É por isso sã imprevistos. Não esqueças a reserva de
estrategia não subordinar a conquista do homens, navios, canhões e munições.

RMB1 o T/2012 261


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

2o Procura as allianças que mais te con- 9o Não sacrifiques a esquadra para de-
venham – quando não possa fazer por ti só fender cidades de um bombardeamento.
– afim de que não fiques isolado no mo- Não te importes com a opinião publica;
mento necessario: não te fies, porém, mui- segue o teu plano.
to nellas, especialmente na desventura. 10o Medita e ousa.
3o Escolhe bem tuas bases de operações.
Fortifica-as em uma boa frente de mar. _____
Accumula ahi provisões e carvão e estabe-
lece todos os meios mecanicos para reabas- O decálogo que acabo de traduzir é uma
tecer rapidamente os navios. Que tenham sabia synthese do trabalho do illustre
officinas e diques. official italiano.
4o Põe todo o cuidado na educação mo- Eu desejaria que me sobrasse tempo
ral e technica do teu pessoal. Prepara os para analysar este trabalho em detalhe e
homens a quem confiar os navios. insistir nos argumentos de valor, que são
Pensa no commandante em chefe e cui- muitos, dos differentes capitulos que o
da ciosamente de sua autoridade e de seu compõem.
prestigio em tempo de paz; nunca lhe di- Desejaria tambem, humildemente, pro-
minuas os poderes durante a guerra. curar obter algumas explicações sobre pon-
5o Estuda os teus typos de navios rela- tos em que, parece, sem haver propriamente
tivamente á guerra naval e procura que se- divergencia do meu modo de pensar, se en-
jam os melhores e os mais fortes. contram assumptos sujeitos a controversia.
6o Escolhe a melhor posição estrategica Estes são muito poucos.
como inicio do jogo. Manobra com o auxilio de Si, porém, uma nova commissão que me
bases eventuaes. Não te deixes influenciar foi confiada tiver alguns momentos de
por objectivos secundarios; no mar o objectivo lazer, prometto applical-os de preferencia
principal é a destruição da esquadra inimiga. a commentar tão valioso trabalho.
7o Na busca do teu inimigo emprega na- Despedindo-me dos leitores, penso fa-
vios que possam cruzar com qualquer tem- zer obra boa aconselhando-lhes a leitura
po e o mais longamente possivel. meditada das lições que o mesmo em tão
8o Assume sempre a offensiva, mesmo grande copia encerra.
defendendo-te. Pensa no tempo, no homem A. SAMPAIO – Capitão de fragata
e no mar, factores supremos na guerra. JANEIRO – 1912

NOTICIARIO MARITIMO

MARINHA NACIONAL por decreto de 30 de novembro do anno


proximo findo.
ALMIRANTADO BRAZILEIRO – Presidio essa sessão inaugural o sr. almi-
No dia 5 de janeiro realisou-se a primeira rante Marques de Leão, ministro da Mari-
sessão do Almirantado brazileiro, creado nha, achando-se presentes os srs: vice-almi-

262 RMB1 oT/2012


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

rantes Antonio Alves Camara, superinten- habituámos e que se originam de um dilatado


dente do material e Francisco Gavião Perei- periodo de centralisação administrativa.
ra Pinto, superintendente do pessoal; con- É isso que o paiz espera de nós; foi para
tra-almirante Antonio Lins Cavalcanti de Oli- essa ardua tarefa que o Governo vos chamou.”
veira, chefe do Estado Maior; Manoel Ignacio
Belfort Vieira, superintendente de portos e FEVEREIRO – 1912
costas; capitães de mar e guerra honorarios
Henrique Rodrigues Nobrega, director da Se- MARINHAS ESTRANGEIRAS
cretaria de Marinha e secretario do Almiran-
tado, e Bento de Carvalho e Souza Junior, INGLATERRA
director geral de Contabilidade.
O sr. almirante Marques de Leão pro- ESTADO-MAIOR DA MARINHA –
nunciou o seguinte discurso: Acaba de ser organisado um Estado-Maior
“Tenho hoje a satis- da Marinha. O primei-
fação de presidir á pri- ro Lord do Almiranta-
meira sessão do Conse- No dia 5 de janeiro do publicou um
lho do Almirantado, realisou-se a primeira sessão memorandum expondo
creado por decreto de do Almirantado brazileiro, os fins do novo depar-
30 de novembro ultimo.
A instituição do Al-
creado por decreto de 30 de tamento naval.
“É o meio, diz elle,
mirantado, ora inaugu- novembro do anno proximo de classificar, desenvol-
rada entre nós, exige findo. ver e utilizar os resulta-
como condição indispen- Presidio essa sessão dos da experiencia e da
sável ao seu perfeito historia, de conserval-os
funccionamento a inaugural o sr. almirante como um repositorio de
nitida comprehensão Marques de Leão, ministro conselhos criteriosos,
das responsabilidades e da Marinha como um auxilio e um
do desenvolvimento do guia para todos que fo-
espirito de iniciativa dos rem encarregados, em
chefes dos differentes serviços da Marinha de tempo de paz ou em tempo de guerra, de fixar
guerra. a política naval do paiz.
Estamos em um momento de transição; Será um cerebro bem mais poderoso do
sahimos de um systema de centralisação que o de qualquer individuo, por mais com-
para um mecanismo em que cada um é cha- petente que elle seja, um cerebro sempre
mado a decidir, dentro da esphera de em actividade incansavel, constantemente
attribuições que lhe é marcada. applicado ao estudo scientifico e theorico
De nada valerá a mudança regulamen- da preparação para a guerra e da estrategia
tar si ella não for acompanhada de uma naval. Será um instrumento capaz de for-
mudança de habitos. mular em termos precisos e minuciosos uma
Precisamos, eu e vós, encaminhar essa trans- decisão a ser tomada por quem esteja in-
formação, modificando costumes a que nos vestido de alguma responsabilidade.

RMB1 o T/2012 263


ACONTECEU HÁ CEM ANOS

O Estado-Maior comprehende tres Ao mesmo tempo que se fazia esta operação


secções: secção de informações, secção de procedia-se semelhantemente nos comparti-
preparo e secção de mobilisação. mentos adjacentes, porém, com uma pressão de
O chefe do Estado-Maior tem funcções me- 7 libras e nos outros compartimentos a pressão
ramente consultivas, não lhe competindo a exe- de ar foi ainda menor, de 3 libras, para evitar
cução de qualquer plano. O poder executivo alguma deformação nas anteparas.
pertence ao primeiro Lord do Almirantado.” O commandante March relatando estas
experiencias disse:
MARÇO – 1912 Os resultados obtidos foram completamen-
te satisfatorios. Possuimos agora um processo
MARINHAS ESTRANGEIRAS que permitte reparar avarias no casco dos navi-
os na parte interna, quer durante um combate
ESTADOS UNIDOS ou depois de um abalroamento. Si o Republica
da Whiti Star tivesse uma installação de ar
NAVIOS INSUBMERSIVEIS – A comprimido não teria ido ao fundo.
bordo do coiraçado North Carolina o Este novo processo vem revoluccionar todo
commandante March fez experiencias para o mecanismo de salvamento maritimo. Tudo
comprovar a possibilidade de manter que é preciso resume-se em installar um
fluctuando um navio inundado, graças a systema de canalisação de ar comprimido apro-
acção do ar comprimido convenientemente priado ao navio e pol-o em communicação com
utilisado. os compressores de ar.
O processo empregado é summamente Todos os navios de nossa esquadra já
simples, consistindo em expellir a agua por possuem canalisação de ar comprimido des-
meio de ar comprimido, a fim de se poder tinada á expulsão dos gazes delecterios pro-
fazer os reparos e concertos na parte ava- venientes da explosão dos projectis, a qual
riada no interior do navio. pode, perfeitamente ser utilisada para
Entre varias experiencias realisou-se a expellir a agua que tende a invadir o navio.
seguinte: abriram-se as portas de um com- O custo total de installação é de 80 Lib.
partimento estanque e inundado este com- para um coiraçado, o que é de uma ridicularia
pletamente, fez se então entrar, por uma em comparação ao valor de qualquer navio.
abertura de pequeno diametro, o ar compri- Varias potencias maritimas da Europa es-
mido com pressão de 12 libras e em dez mi- tão estudando este invento e as vantagens de
nutos toda a agua tinha sido expellida. sua applicação em navios de suas esquadras.

264 RMB1 oT/2012


REVISTA DE REVISTAS

Esta seção tem por propósito levar ao conhecimento dos


leitores matérias que tratam de assuntos de interesse maríti-
mo, contidas em publicações recebidas pela Revista Marítima
Brasileira e pela Biblioteca da Marinha.
As publicações, do Brasil e do exterior, são incorporadas
ao acervo da Biblioteca, situada na Rua Mayrink Veiga, 28 –
Centro – RJ, para eventuais consultas.

SUMÁRIO
(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

APOIO
CONSTRUÇÃO NAVAL
Capacidades produtivas dos estaleiros argentinos – Tradição e modernidade (266)

ARTES MILITARES
ESTRATÉGIA
Marinha, 2025: Guerreiros avançados (267)
Tirem o mercado do campo de batalha (267)

EDUCAÇÃO
ENSINO
Vela à vista ou não à vela? (268)

FORÇAS ARMADAS
MARINHA DO BRASIL
As ambições da Marinha do Brasil para o século XXI (269)

INFORMAÇÃO
CÓDIGO
Desperdiçando evidências e decifrando códigos na Guerra do Pacífico (269)
REVISTA DE REVISTAS

CAPACIDADES PRODUTIVAS DOS ESTALEIROS ARGENTINOS


– TRADIÇÃO E MODERNIDADE
Juan Carlos Cicalesi*
(Tecnologia Militar, número 4/2011, ano 33, p. 7-13)

Este artigo apresenta as capacidades dos


estaleiros argentinos. Cita o grande estalei-
ro Rio Santiago (ARS) e o Complexo Indus-
trial Naval Argentino (Cinar), este compos-
to pelos estaleiros Almirante Segundo Torni,
Ministro Manuel Domecq Garcia e Talleres
Navales Dársena Norte (Tandanor). Faz re-
ferência também a outros que estiveram ati-
vos, mas que vieram a desaparecer com a
Estaleiro Alte Segundo Storni
crise econômica e financeira dos anos 1989/
2001, entre eles o Príncipe Menghi e Penco projeto de desenvolvimento de propulsão
S. A., o Mestrina S. A. e o Astarsa. nuclear para os nossos submarinos”. O mi-
O autor apresenta nistro afirmou que seu
um histórico dos prin- país tem a capacidade
cipais estaleiros, indi- de realizar esse projeto,
ca as capacidades de
“Isso nos leva a que o acrescentando: “Isso
algumas oficinas e submarino ARA Santa Fé nos leva a que o sub-
quantidades e tama- (S-43), que está esperando marino ARA Santa Fé
nhos de seus diques, (S-43), que está espe-
lista navios/equipa- há anos sua prontificação, rando há anos sua
mentos por eles quando estiver pronto, não prontificação, quando
construídos e busca estiver pronto, não saia
identificar as dificulda-
saia com a propulsão com a propulsão origi-
des que enfrentaram/ original, mas sim com nal, mas sim com pro-
enfrentam. propulsão nuclear pulsão nuclear desen-
Cicalesi apresenta volvida na Argentina”.
algumas das obras ora desenvolvida na Argentina” Em conclusão ao ar-
em andamento, como, tigo, Cicalesi cita con-
por exemplo, os complexos reparos pelos vênios existentes com outros países, como
quais passa o Submarino TR 1700 ARA Brasil e Peru. Em relação ao Brasil, ele se refe-
Santa Fé no Cinar, processo esse que im- re ao compromisso com o processo de
plica sua quase completa reconstrução. integração bilateral dentro do GTC (Grupo
Sobre o projeto de submarino atômico do de Trabalho Conjunto de Defesa), ratificado
país, o autor cita o ministro da Defesa da em 2010, que prevê colaboração na manuten-
Argentina, Arturo Puricelli, que afirmou em ção de turbinas navais (turbinas Tyne das
31 de julho de 2011: “A Presidente Cristina fragatas brasileiras da classe Greenhalgh) e
Kirchner nos pediu que apresentássemos um seus acessórios, entre outras atividades.

* Jornalista e analista argentino no setor de Defesa. Autor e coautor de livros e outras publicações.

266 RMB1 oT/2012


REVISTA DE REVISTAS

MARINHA, 2025: GUERREIROS AVANÇADOS


Almirante de Esquadra (EUA) Jonathan Greenhart*
(Proceedings, dezembro 2011, p. 18-23)

Neste artigo, o novo comandante de Em essência, depreende-se do artigo que


Operações Navais da Marinha dos Esta- será mantida a estratégia que vem sendo em-
dos Unidos da América (EUA), Almirante pregada há muito (segundo ele, desde 1825)
Greenhart, apresenta a sua visão de futuro por seu país. Dentro dessa estratégia, sumariza
para a Marinha dos EUA em moldura que o almirante, mesmo com a expectativa existen-
alcança os próximos 15 anos. te de restrições orçamentárias cada vez maio-
O almirante apresenta análise pormeno- res, “a esquadra continuará protegendo o sis-
rizada de emprego de pessoal e material e tema interconectado de comércio, informação
aborda desenvolvimentos tecnológicos e de segurança que é a base de nossa econo-
que se encontram em andamento, em espe- mia, e de nossos amigos e aliados, operando
cial na área de veículos não tripulados (aé- globalmente na linha de frente do esforço na-
reos e submarinos). cional (dos EUA) de guerra e paz”.

TIREM O MERCADO DO CAMPO DE BATALHA


Tenente-Coronel (CFN-EUA) Thomas Beikirch**
Tenente-Coronel (Força Aérea – EUA) Michael Day***
Capitão de Mar e Guerra (EUA) Roger Ullman II****
(Proceedings, novembro 2011, p. 58-62)

“Muitos exemplos recentes da estraté-


gia e da tática evidenciam que a eficiência
mercadológica prejudica o cumprimento de
missões.”
“Eficiência de custos (ou somente efici-
ência) pode ser uma medida de sucesso na
paz, mas é pouco relevante quando há vi-
das na frente de combate.”
“Enfocar eficiência em detrimento de efi-
cácia coloca em risco a própria liberdade
da qual nossa economia e, principalmente,
nossa nação dependem.”
As três afirmativas acima integram este
artigo publicado na revista Proceedings,
da Marinha dos Estados Unidos da Améri-

* Comandante de Operações Navais da Marinha dos EUA (no Brasil, cargo equivalente ao de comandante
da Marinha).
** Comandante do Grupo de Fuzileiros Navais de Segurança de Embaixada na Região 8, Europa Central.
*** Gerente de Programa do Diretório de Planos Estratégicos e Logística, Sincronização Global de
Distribuição do Comando de Transporte dos EUA.
**** Diretor de Operações no Comando de Operações Especiais, África.

RMB1 o T/2012 267


REVISTA DE REVISTAS

ca (EUA), por meio do qual os autores ana- ele apresenta conceitos úteis a administra-
lisam os efeitos do pensamento militar pau- dores de outras Marinhas.
tado por visão de mercado nas operações Os autores analisam os efeitos estrutu-
militares, tanto no nível estratégico como rais desses programas e suas influências no
no tático. nível de estados-maiores e citam exemplos
Apesar de o trabalho publicado abor- demonstrando que “apesar de que numa
dar metodologias norte-americanas república ‘as armas devem se abater à toga’,
(Gerenciamento por Qualidade Total – em elas não devem se enamorar demais do con-
voga nos anos 1990 –, Lean e Six Sigma), tador ou da planilha de custos”.

VELA À VISTA OU NÃO À VELA?


Art Pine*
(Proceedings, outubro 2011, p. 66-70)

Este artigo busca aprofundar o debate minada pelos receptores de GPS e computa-
existente há décadas sobre a importância dores; a vigilância é feita por satélite ou pelos
do ensino de vela nas academias navais, potentes radares; o governo do navio é alta-
especialmente na de Annapolis, nos Esta- mente automatizado e a propulsão nuclear é a
dos Unidos da América (EUA). escolhida do momento. Então por que treinar
Para o autor, apesar de antiga, essa discus- os candidatos a oficiais em barcos a vela?
são se realimenta a cada novo avanço da Pine procura, ao longo de seu texto,
tecnologia embarcada nos navios de guerra. abordar os dois lados da questão. Assim,
Segundo ele, a navegação, por exemplo, é do- cita que existem fortes argumentos contra
o ensino de vela nas academias devido aos
custos envolvidos e a sua associação a
não mais do que um esporte. Para essas
pessoas, os candidatos a oficiais seriam
mais bem preparados se treinassem ape-
nas em navios de guerra. Ele também abor-
da outros pontos de vista que indicam que
a vela oferece oportunidade ímpar de se
ensinar marinharia, manobra, navegação e
liderança em profundidade muito maior do
que a bordo de navios de guerra.
Em acréscimo a este último argumento,
o autor cita a confiança que se adquire ve-
lejando, qualidade muito necessária a líde-
res, como coloca o Contra-Almirante
Wright, velejador do time de vela campeão
de 1977 da Academia Naval de Annapolis:

* Ex-oficial de Marinha, é jornalista veterano e trabalhou como correspondente, nos EUA, dos jornais
Baltimore Sun, The Washington Post, The Wall Street Journal e Los Angeles Times, em Washington.

268 RMB1 oT/2012


REVISTA DE REVISTAS

“A confiança desenvolve o otimismo, o da Escola Naval do Brasil) como acessório


otimismo desenvolve a resiliência, e a para o ensino de manobra.
resiliência desenvolve o sucesso”. O autor faz, ainda, comparação com o
Surge, ao longo da análise de Art Pine, ensino de vela em outras academias e cita
referência à relevância dos embarques em a existência dos grandes navios a vela (tall
navios de guerra para cruzeiros de verão e ships) em mais de 31 academias navais do
a importância, reconhecida por todos, dos mundo, aí incluído o Brasil – o Navio Velei-
YPs (equivalentes aos avisos de instrução ro Cisne Branco.

AS AMBIÇÕES DA MARINHA DO BRASIL PARA O SÉCULO XXI


Giuliano da Frè*
(Rivista Marittima (Itália), outubro 2011, ano CXLIV, p. 41-54)

Este artigo apresenta panorama abrangente Reaparelhamento da MB, os processos de


da evolução da Marinha do Brasil (MB) desde aquisições em andamento e as ambições
seus primórdios até os dias atuais. futuras da Força.
O autor busca avaliar a capacidade do O comandante da Marinha, Almirante
País como potência regional e sua proje- de Esquadra Julio Soares de Moura Neto,
ção como potência global nos planos polí- é citado como sendo o vértice, desde mar-
tico e econômico, considerando que já faz ço de 2007, do processo de racionalização
parte do clube Bric (Brasil, Rússia, Índia e da reorganização da MB que foi colocado
China). Aborda também os meios navais e em curso quando houve a criação do Mi-
aeronavais existentes, o Programa de nistério da Defesa.

DESPERDIÇANDO EVIDÊNCIAS E DECIFRANDO CÓDIGOS


NA GUERRA DO PACÍFICO
Elliot Carlson**
(Proceedings, dezembro 2011, p. 66-71)

Em 7 de dezembro de 1941, apenas dez símbolo do sol nascente em suas asas des-
dias depois de se encontrar com o Capitão truírem sua esquadra.
de Fragata Joe Rochefort, criptoanalista Teria Joe Rochefort, sem que tivesse
talentoso e chefe da Estação Hypo (unida- essa intenção, assessorado incorretamen-
de de criptoanálise em Pearl Harbor), o Al- te o almirante? Essa é a questão que o au-
mirante Kimmel, comandante em chefe da tor deste artigo, centrado no Comandante
esquadra norte-americana no Pacífico, as- Rochefort, busca responder.
sistia incrédulo, do jardim de sua casa, que O tema – o ataque a Pearl Harbor e a
descortinava Pearl Harbor, a aviões com o culpa do Almirante Kimmel – não é novo, é

* Jornalista com graduação em Ciência Política. É colaborador de vários periódicos militares – Rivista
Marittima, Rivista Militare e Rid – e publicou dois e-books.
** Autor de A Guerra de Joe Rochefort: A Odisseia do Criptoanalista que Superou Yamamoto em
Midway (Naval Institute Press, 2011). Fez carreira jornalística escrevendo para o The Wall Street
Journal e para a revista Newsweek.

RMB1 o T/2012 269


REVISTA DE REVISTAS

rentes localidades na Ilha de Oahu, no Havaí,


e que realizava a interceptação de mensagens
de todo o sistema de comunicações japonês.
Os operadores de rádio coletavam men-
sagens criptografadas em todos os tipos
de cifras e códigos, enfocando especial-
mente dois deles, complexos, muito secre-
tos e que ainda não haviam sido decifra-
dos. Por isso, a Estação Hypo baseava suas
estimativas da movimentação de navios
japoneses na Análise de Tráfego (TA, si-
gla em inglês) e não na quebra de cifras.
Ou seja, em vez de se preocupar com o con-
teúdo das mensagens, como faria um
criptoanalista, a TA buscava interpretar o
cabeçalho ou preâmbulo, e, a partir do co-
nhecimento já existente dos indicativos dos
navios da Marinha Imperial, podia-se de-
terminar as entradas e saídas de portos dos
navios. Entretanto, essa abordagem pos-
O Almirante Kimmel, tendo à sua direita o suía um lado negativo: a inferência que ela
chefe de Estado-Maior (CEM), CMG Smith, exigia, ou seja, a adivinhação do futuro em
e à esquerda o CMG Delany, assistente do função das ações do passado.
CEM, em 1941, pouco antes do ataque a Eram essas as ferramentas que Rochefort
Pearl Harbor possuía para responder às várias indaga-
abordado em artigos e livros e já foi alvo ções do Comandante em Chefe Kimmel em
de inúmeras investigações, em especial por 27 de novembro de 1941: Qual a localiza-
comissões do Senado dos Estados Unidos ção das forças japonesas? Qual a direção
da América (EUA). de seu movimento? O que estava ocorren-
Particularmente, a Revista Marítima do no Mar da China Meridional? E os sub-
Brasileira (RMB) publicou uma série de marinos e navios-aeródromos nas Ilhas
artigos do Almirante de Esquadra Mário Marshall? Quantos são? Representam uma
Jorge da Fonseca Hermes sobre o assunto ameaça? Onde estão os navios-aeródromos
(RMB abr./jun. 2003 até a RMB abr./jun. pesados Kaga, Akagi, Hiryu, Soryu,
2009). A argumentação deste novo e inte- Zuikaku e Shokaku? E a principal das per-
ressante artigo da Proceedings vem acres- guntas que Kimmel gostaria de ter feito era
centar mais dados e hipóteses. aquela para a qual Rochefort não possuía
No encontro citado acima, na tarde do dia resposta: “Os japoneses atacarão alguma
27 de novembro de 1941 e que durou cerca de das possessões dos EUA?”
uma hora e meia, Rochefort e Kimmel se en- Muitos oficiais de alta patente em Pearl
contraram pela primeira e única vez. Rochefort Harbor duvidavam dessa última possibili-
era o chefe de uma equipe de cerca de cem dade. O Vice-Almirante Pye, comandante
oficiais e praças que incluía cripógrafos, do Grupo de Batalha da Esquadra do Pací-
linguistas, operadores de interceptação de rá- fico, disse: “Os japoneses não atacarão.
dio e escreventes, que se distribuía em dife- Somos muito fortes e poderosos”. Outros

270 RMB1 oT/2012


REVISTA DE REVISTAS

acreditavam que o ataque não ocorreria Em seu artigo, Elliot Carlson conclui que
porque os japoneses não tinham essa ca- o Comandante Joe Rochefort, dada sua
pacidade, pois “seus aviões são de segun- credibilidade como criptoanalista chefe da
da classe, seus aviadores enxergam pouco Estação Hypo, pode ter inadvertidamente
e não possuem qualificação – os japone- reforçado a opinião que o Almirante
ses são incapazes”. Kimmel já possuía no que se referia à pos-
Entretanto, Rochefort tinha sua própria sibilidade de ataque do Japão. Rochefort,
resposta. Ele havia conhecido a cultura e a ainda segundo Carlson, também teria se
língua japonesas quando lá estudou, de manifestado profeticamente em um momen-
1929 a 1932. Rejeitava estereótipos que to de calmaria durante o ataque japonês a
consideravam os japoneses uma raça infe- Pearl Harbor dizendo: “Este é o fim do Im-
rior, havia estudado a Marinha Imperial ja- pério japonês como o conhecemos”.
ponesa e achava que a entendia completa-
mente. Assim, pensava que o conhecimen-
to das próprias limitações atuaria como for-
ça restritiva das ambições estratégicas do
Japão no Pacífico. Ou seja, os japoneses
seriam racionais e não cometeriam ação iló-
gica, provocando uma guerra que não po-
deriam vencer.
Portanto, no momento do encontro de
Rochefort com Kimmel e mesmo até dez
dias após, não se sabia que os 33 navios
da Primeira Esquadra Aérea da Marinha CMG Rochefort, encarregado da Seção de
Imperial japonesa estavam havia dois dias Inteligência Estratégica do Pacífico em Washing-
navegando em silêncio rádio em direção ton, em 1944. Ele e sua equipe decifraram o
ao Pacífico Norte por ordem do Almirante código que permitiu a vitória em Midway
Isoroku Yamamoto, comandante da Força
Combinada, justificando plenamente a hoje Em 1944, como capitão de mar e guerra e
famosa e profética pergunta feita em 2 de comandando a Seção de Inteligência Es-
dezembro pelo Almirante Kimmel a seu ofi- tratégica do Pacífico em Washington, tra-
cial de Inteligência, em momento de explo- balhando mais do que nunca por se sentir
são de humor: “Quer dizer que eles (os ja- culpado por falhas de julgamento em rela-
poneses) podem estar contornando ção ao ocorrido em Pearl Harbor, Rochefort
Diamond Head (cone vulcânico na Ilha de e sua equipe decifraram o código que per-
Oahu) e vocês não saberiam?” mitiu a vitória norte-americana em Midway.

RMB1 o T/2012 271


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Esta seção destina-se a registrar e divulgar eventos importan-


tes da Marinha do Brasil e de outras Marinhas, incluída a
Mercante, dar aos leitores informações sobre a atualidade e per-
mitir a pesquisadores visualizarem peculiaridades da Marinha.
Colaborações serão bem-vindas, se possível ilustradas com
fotografias.

SUMÁRIO
(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ADMINISTRAÇÃO
BATIMENTO DE QUILHA
Cerimônias marcam batimento de quilha e transferência para o setor operativo (274)
COMEMORAÇÃO
Dia da Marinha Mercante Brasileira (275)
CONTRATO
Firmado acordo para aquisição do Astros 2020 (276)
MB assina contrato de compra de três navios-patrulha oceânicos (277)
Míssil Antinavio Nacional (MAN-SUP) (278)
Termo Aditivo do 7o navio-patrulha de 500 toneladas é assinado (278)
CONTROLE DE QUALIDADE
CPES recebe certificação ABNT NBR ISO 9001:2008 (279)
INAUGURAÇÃO
MB inaugura Unidade Piloto de Hexafluoreto de Urânio e o Centro de Instrução e
Adestramento Nuclear Aramar (279)
NOMEAÇÃO
Brasil é nomeado membro do PACIOSWG (280)
ORGANIZAÇÃO
Reestruturação do Setor SGM (281)
POSSE
Assunção de cargos por almirantes (282)
FTM-Unifil tem novo comandante (282)
Passagem dos cargos de CON e DGN (283)
Transmissão de cargo de Cema (288)
Transmissão de cargo de DGPM (294)
NOTICIÁRIO MARÍTIMO

PRÊMIO
Eampe recebe prêmio da qualidade e gestão de Pernambuco (298)
ERMB recebe Prêmio Melhor Estação da RNIT (298)
Premiação da Operação Cisne Branco 2011 (299)
Prêmio Qualidade Rio 2011 – CRepSupEspCFN é Categoria Prata (299)
Prêmio Revista Marítima Brasileira – 2010 (300)
SOLENIDADE
Outorga de diplomas da Unesco e encerramento do Ano Cultural de 2011 (300)
APOIO
CONSTRUÇÃO NAVAL
Wärtsilä fornecerá projeto para navios de lançamento de linhas (306)
ÁREAS
ANTÁRTICA
Nova estação antártica brasileira será concluída até 2018 (307)
ATIVIDADES MARINHEIRAS
REGATA
Projeto esportivo do Veleiros do Sul é aprovado (312)
SALVAMENTO
Reflutuação de chata na Antártica (312)
CIÊNCIA E TECNOLOGIA (C&T)
C&T NA MARINHA
Instituições científicas e tecnológicas no CFN e na DGPM (313)
ENERGIA
Novos projetos para navios com energia eficiente (315)
PESQUISA
MB e Petrobras assinam Memorando de Entendimentos (315)
Parque dos Corais de Búzios – Projeto Coral Vivo (316)
CONGRESSOS
SEMINÁRIO
Seminário Direito Marítimo e Portuário (317)
EDUCAÇÃO
ESPORTE
Resultados esportivos (318)

FORÇAS ARMADAS
CAPITANIA DOS PORTOS
MB autoriza a abertura da Estação Portuária de Humaitá (318)
CONTAMINAÇÃO
Laboratório móvel para recuperação da fauna (319)

PSICOSSOCIAL
LANÇAMENTO DE LIVRO
Lançado o Atlas Geográfico das Zonas Costeiras e Oceânicas do Brasil (319)

VALORES
PATRONO
Patronos na Marinha do Brasil (320)

RMB1 o T/2012 273


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

CERIMÔNIAS MARCAM BATIMENTO DE QUILHA E


TRANSFERÊNCIA PARA O SETOR OPERATIVO
Duas cerimônias foram realizadas pela inserida no Projeto Cartografia da Amazô-
Marinha do Brasil em Fortaleza (CE), no nia, subprojeto Cartografia Náutica, reali-
início de dezembro de 2011. No dia 5, ocor- zado em parceria com o Exército, a Aero-
reu o Batimento da Quilha do Aviso náutica e o Serviço Geológico do Brasil, e
Hidroceanográfico Fluvial (AvHoFlu) Rio coordenado pelo Centro Gestor e
Xingu e, no dia 6, o Aviso de Patrulha Operacional do Sistema de Proteção da
(AviPa) Tucunaré foi transferido para o Amazônia (Censipam), subordinado ao
Setor Operativo da Marinha. As solenida- Ministério da Defesa e responsável pelo
des foram presididas pelo diretor-geral do repasse dos recursos financeiros.
Material da Marinha, Almirante de Esqua- Construído na Inace, o AviPa Tucunaré
dra Arthur Pires Ramos. será empregado em ações de patrulha e ins-
O Aviso Hidroceanográfico Fluvial Rio peção naval, em manobras de reboque de
Xingu é o segundo de uma classe de qua- embarcações de porte semelhante, em ta-
tro navios com construção a partir do Re- refas de busca e salvamento e em apoio às
latório de Estudo de Exequibilidade reali- operações de mergulho livre e autônomo,
zado pelo Centro de Projetos de Navios, ao longo do litoral sob jurisdição do Co-
que originou a Especificação de Aquisição, mando do 4o Distrito Naval, cuja sede loca-
de acordo com os requisitos técnicos de liza-se em Belém (PA), sob a responsabili-
projeto e de desempenho elaborados pela dade direta do Comando do Grupamento
Diretoria de Engenharia Naval. de Patrulha Naval do Norte.
Os AvHoFlu destinam-se à execução dos A seguir, transcrevemos a Ordem do Dia
levantamentos hidroceanográficos em relativa ao recebimento, ao batismo e à
águas interiores na Bacia Amazônica, sob a transferência para o Setor Operativo do
responsabilidade da Diretoria de Hidrografia Aviso de Patrulha Tucunaré, expedida pelo
e Navegação. A finalidade é a atualização diretor-geral do Material da Marinha, Al-
contínua da cartografia náutica das princi- mirante de Esquadra Artur Pires Ramos:
pais hidrovias na região, sendo de funda- “Em cumprimento às tradições navais,
mental importância o conhecimento preciso finalizada a edificação de um navio é reali-
e atualizado do canal de navegação dos rios
amazônicos, o que possibilitará melhoria na
segurança da navegação.
A Inace (Indústria Naval do Ceará) ven-
ceu a licitação para a construção do lote de
avisos hidroceanográficos, ao qual se in-
tegra o AvHoFlu Rio Xingu, comprome-
tendo-se, com isso, a incrementar sua
capacitação tecnológica na construção de
navios militares e de pesquisa, gerando
empregos e contribuindo para o fortaleci-
mento da indústria naval.
Os outros AvHoFlu serão entregues até
novembro de 2012 e sua construção está Aviso de Patrulha Tucunaré

274 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

zada marcante cerimônia em que o meio é aviso de patrulha da classe, iniciada em


batizado por uma madrinha e recebe seu julho de 2006 pelo Aviso de Patrulha Marlin
nome oficial, costume simbolizado com a e composta pelos avisos de patrulha
quebra em seu costado de uma garrafa Barracuda, Dourado, Albacora e
d’água ou de licor, que representa sorte à Anequim. Após a sua incorporação, irá se
vida do navio. Em seguida é lançado ao unir aos meios do Comando do Grupamento
mar. de Patrulha Naval do Norte para ser empre-
Na Marinha do Brasil, o passo seguinte gado em tarefas de patrulha e inspeção
ao batismo é a incorporação, quando, pela naval, em águas sob jurisdição nacional,
primeira vez, é hasteado o Pavilhão Nacio- devendo também ser utilizado em mano-
nal a bordo. A partir desse momento, sua bras de reboque de embarcações de porte
trajetória passará a ser registrada em livro semelhante, além de realizar fainas de bus-
próprio, onde serão lançados os dados re- ca e salvamento (SAR), dar apoio a opera-
levantes e de interesse da vida de bordo. ções de mergulho livre e autônomo e ou-
Em tempos passados, tais registros termi- tras tarefas subsidiárias.
navam com a frase ‘Deus nos guie’. Nesta ocasião, em que entrego o Aviso
O batismo do Aviso de Patrulha de Patrulha Tucunaré ao Comando do 4o
Tucunaré, respeitoso cumprimento às tra- Distrito Naval, não poderia deixar de regis-
dições navais, se reveste de especial sig- trar os meus sinceros cumprimentos à
nificado, pois consolida os frutos de uma Inace, à Emgepron e às Diretorias
longa e exitosa parceria da Marinha, Especializadas, participantes ativas no pro-
intermediada pela Empresa Gerencial de cesso de acabamento desse meio, bem
Projetos Navais (Emgepron), com a Indús- como aos operários, homens e mulheres
tria Naval do Ceará (Inace). O sucesso dessa que tornaram este sonho uma realidade.
parceria, calcada na capacidade técnica e Aviso de Patrulha Tucunaré, que seja
profissional do Estaleiro e nos laços de rápido, forte e que tenha o seu valor reco-
amizade e confiança entre as duas institui- nhecido, qual o peixe-caçador que lhe dá o
ções, foi comprovado pelos projetos já en- nome, e que Deus permita, doravante, exe-
tregues, entre os quais dois navios-patru- cutar suas tarefas com eficácia, profis-
lha de 500 toneladas. sionalismo, versatilidade e confiança.
Os avisos de patrulha são embarcações Finalmente, rogo ao Senhor dos
rápidas e com autonomia superior à das Navegantes que lhe conceda bons ventos
lanchas que hoje a Marinha emprega nas e mares tranquilos em sua singradura!”
capitanias, delegacias e agências. O Aviso (Fontes: www.mar.mil.br e Bono Especi-
de Patrulha Tucunaré é o sexto e último al no 888, de 6/12/2011)

DIA DA MARINHA MERCANTE BRASILEIRA


Foi comemorado, em 28 de dezembro cujas vida e obras levaram-no a ser reco-
último, o Dia da Marinha Mercante Brasi- nhecido como um dos mais ilustres entre
leira. Na ocasião, o diretor de Portos e Cos- os brasileiros: Irineu Evangelista de Sou-
tas, Vice-Almirante Eduardo Bacellar Leal za, o Visconde de Mauá. Comerciante, ban-
Ferreira, expediu a seguinte Ordem do Dia: queiro, industrial e armador, ele soube, com
“Há 198 anos, nascia na cidade de Ar- rara visão, antever o potencial de desen-
roio Grande, no Rio Grande do Sul, aquele volvimento do Brasil e, homem de ação que

RMB1 o T/2012 275


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

era, laborou intensamente para tornar rea- substancialmente mais significativo e di-
lidade o que, à época, só sua imaginação versificado de navios que fazem nossa na-
dizia ser possível. vegação de longo curso, viabilizando nos-
Em 1845, consciente do valor da Mari- so comércio exterior.
nha Mercante, e com a certeza de que esta O recente crescimento da Marinha Mer-
só poderia desenvolver-se apoiada em só- cante tem imposto desafios à sociedade
lida indústria naval, Mauá, já próspero co- brasileira, cabendo destaque para a forma-
merciante, adquiriu o Estabelecimento de ção do pessoal que guarnece nossas em-
Fundição e Estaleiro Ponta da Areia, em barcações. Existe enorme necessidade de
Niterói. Nascia assim a mola que impulsio- aceleração dessa formação, a fim de fazer
naria o setor naval no País. Na área do frente à forte demanda por profissionais
transporte marítimo, Mauá deu início à ex- bem qualificados e dotados dos atributos
ploração dos rios Guaíba e Amazonas, fun- morais e de força de caráter tão importan-
dando as companhias de navegação a va- tes aos homens e às mulheres do mar. A
por do Rio Grande do Sul e do Amazonas. Autoridade Marítima está consciente des-
A história, desde então, registra a im- ta situação e tem envidado todos os esfor-
portância da Marinha Mercante para o cres- ços, muitas vezes em frutífera parceria com
cimento do País, tal qual vislumbrado por outras organizações e agências governa-
Mauá. Nessa singradura, é certo que mui- mentais e com companhias de navegação,
tas vezes enfrentaram-se mar grosso e bor- para vencer este desafio. Exemplo desses
rascas, geralmente associados a crises eco- esforços são as ampliações e reformas em
nômicas e financeiras que afetaram o co- execução nos centros de formação de pes-
mércio internacional. Momentos houve em soal de Marinha Mercante, o Centro de
que os obstáculos pareciam insuperáveis. Instrução Almirante Graça Aranha (Ciaga)
No entanto, mercê da forte determinação e o Centro de Instrução Almirante Brás de
daqueles que nunca deixaram de acreditar Aguiar (Ciaba).
no País e da imprescindibilidade do mar É, portanto, com grata satisfação que
para a vida nacional, a Marinha Mercante redijo esta Ordem do Dia alusiva ao Dia da
brasileira sempre ressurgiu pronta para Marinha Mercante Brasileira, que tem
concretizar o sonho de Mauá. como data a do nascimento do ilustre com-
Hoje, além da navegação de cabotagem, patriota que deu os primeiros passos para
que aos poucos se recupera e volta a to- o despertar do desenvolvimento nacional.
mar o lugar que lhe cabe na nossa matriz de Desejo expressar os meus votos de conti-
transporte, assistimos ao expressivo de- nuado êxito a toda a comunidade marítima
senvolvimento de outras atividades marí- e termino com a célebre frase registrada no
timas, tais como a navegação de apoio brasão do Visconde de Mauá: Labor
marítimo e a de turismo náutico. Falta-nos improbus omnia vincit – O trabalho hon-
voltar a ver, e com isso sonhamos, a ban- rado sempre vence.”
deira brasileira tremulando em um número (Fonte: Bono Especial no 3, de 4/1/2012)

FIRMADO ACORDO PARA AQUISIÇÃO DO ASTROS 2020


A Marinha do Brasil e a Avibras firma- tiplo de Foguetes (LMF) Astros 2020, con-
ram, em 14 de dezembro de 2011, contrato forme previsto no Programa de Reapare-
para aquisição do Sistema Lançador Múl- lhamento da Marinha.

276 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Do ato de assinatura do contrato, no um meio de apoio de fogo eficaz na satura-


Gabinete do Comandante da Marinha no ção de área, no estado da arte, que será
Rio de Janeiro, participaram o comandante produzido no País.
da Marinha, Almirante de Esquadra Julio Com alcance que varia de nove até 90
Soares de Moura Neto; o comandante-ge- quilômetros, o Astros 2020 é capaz de em-
ral do Corpo de Fuzileiros Navais, Almiran- barcar e desembarcar dos meios navais exis-
te de Esquadra (FN) Marco Antonio Corrêa tentes na Esquadra, o que proporcionará
Guimarães; o comandante do Material de maior flexibilidade de emprego, aumento da
Fuzileiros Navais, Contra-Almirante (FN) mobilidade tática e da concentração de fo-
Alexandre José Barreto de Mattos; e o pre- gos em curto espaço de tempo, represen-
sidente da Avibras, Sami Hassuani. tando uma contribuição significativa do
A aquisição do Sistema LMF Astros CFN para ampliar a capacidade da Marinha
2020, além de atender à Estratégia Nacio- do Brasil no tocante à projeção de poder
nal de Defesa quanto ao fortalecimento da sobre terra e à contribuição para a
Base Industrial de Defesa do País, ratifica dissuasão, fortalecendo cada vez mais o
a disposição da Marinha do Brasil em do- Poder Naval brasileiro.
tar o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) com (Fonte: Bono no 924, de 20/12/2011)

MB ASSINA CONTRATO DE COMPRA DE TRÊS


NAVIOS-PATRULHA OCEÂNICOS

Foi assinado, em 29 de dezembro de


2011, nas instalações da Comissão Naval
Brasileira na Europa (CNBE), em Londres,
o contrato de compra de três navios-patru-
lha oceânicos de 1.800 toneladas, produzi-
dos pela empresa BAE Systems. O contra-
to prevê o fornecimento complementar de
pacotes de munição e sobressalentes, do-
cumentação técnica e treinamento.
Essa aquisição atende ao previsto no
Plano de Articulação e Equipamento da
Marinha, que inclui a necessidade de 12
navios dessa classe, que irão contribuir Da esq. para a dir.: CF (EN) José Luiz Rangel
significativamente para a segurança e a da Silva, Nigel John Stewart, CMG (IM)
proteção da “Amazônia Azul”, bem como Márvio Affonso Rego Gavino e Julian Donald
para o desempenho das atividades subsi-
diárias relacionadas com a Autoridade trato em nome da empresa; e do presidente
Marítima. da CNBE, Capitão de Mar e Guerra (IM)
O ato de assinatura do contrato contou Márvio Affonso Rêgo Gavino, que assi-
com a presença do diretor Brasil da BAE nou o contrato em nome da Marinha do
Systems, Julian Donald; do diretor comer- Brasil.
cial, Nigel John Stewart, que assinou o con- (Fonte: www.mar.mil.br)

RMB1 o T/2012 277


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

MÍSSIL ANTINAVIO NACIONAL (MAN-SUP)


A Marinha do Brasil, por intermédio Esses contratos, somados aos já celebra-
da Diretoria de Sistemas de Armas da Ma- dos com a Fundação Atech, para gerencia-
rinha (DSAM), assinou, em dezembro úl- mento complementar; com a empresa
timo, contratos para o desenvolvimento Omnisys, para desenvolvimento do autodi-
do protótipo do Míssil Antinavio Nacio- retor (seeker); e com a própria Avibras, para
nal (MAN-SUP). Os documentos foram desenvolvimento do motor foguete, permiti-
assinados com as empresas Mectron – rão o desenvolvimento e a fabricação no Bra-
Engenharia, Indústria e Comércio S/A sil de um míssil antinavio de desempenho
(dia 5) e Avibras Divisão Aérea e Naval compatível com o dos existentes no mercado.
S/A (dia 6). (Fonte: Bono no 901, de 12/12/2011)

TERMO ADITIVO DO 7o NAVIO-PATRULHA DE


500 TONELADAS É ASSINADO
A Diretoria de Engenharia Naval (DEN) ção naval e de geração de empregos e tam-
e o Estaleiro Ilha S/A (Eisa) assinaram, em bém com a necessidade estratégica da
16 de dezembro último, no Rio de Janeiro, o capacitação e fortalecimento do parque in-
Termo Aditivo para a construção de mais dustrial de tecnologia militar.
um navio-patrulha de 500 toneladas, o quin- A construção será realizada nas instala-
to navio do segundo lote, que corresponde ções do Eisa, na cidade do Rio de Janeiro
ao sétimo navio-patrulha da classe Macaé. (RJ), e fiscalizada pela DEN.
Essa classe de navios se destina ao As embarcações fazem parte de uma série
patrulhamento das águas jurisdicionais bra- de 27 navios, dentro do preconizado pela
sileiras, cabendo executar diversas tarefas, Estratégia Nacional de Defesa, a partir de um
entre elas: efetuar patrulha para vigilância e projeto desenvolvido pela empresa francesa
defesa do litoral, de áreas marítimas costei- Constructions Mécaniques de Normandie.
ras e das plataformas de exploração/ O primeiro navio da classe, construído
explotação de petróleo no mar e contribuir na Indústria Naval do Ceará (Inace), o Na-
para defesa de porto; promover a fiscaliza- vio-Patrulha Macaé, foi transferido para o
ção que vise ao resguardo dos recursos do
mar territorial, zona contígua e Zona Econô-
mica Exclusiva; repressão às atividades ilí-
citas (pesca ilegal, contrabando, narcotráfico
e poluição do meio ambiente marinho), con-
tribuindo para a segurança das instalações
costeiras e das plataformas marítimas con-
tra ações de sabotagem; e realizar opera-
ções de busca e salvamento na área de res-
ponsabilidade do Brasil.
A decisão pela construção em estaleiro
privado nacional se coaduna com a políti-
ca governamental de incentivo à constru- Assinatura do Termo Aditivo

278 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Setor Operativo da Marinha do Brasil. O Aditivo supracitado, perfaz um total de cin-


segundo, Macau, foi incorporado à Força e co navios-patrulha de 500 toneladas, tem
deverá ser transferido para o Setor Operativo prevista a prontificação do primeiro navio
no início do primeiro semestre de 2012. para dezembro de 2012 e dos demais navi-
O contrato assinado com o estaleiro os em sequência, um a cada seis meses.
Eisa, que, após a assinatura do Termo (Fonte: www.mar.mil.br)

CPES RECEBE CERTIFICAÇÃO ABNT NBR ISO 9001:2008

A Capitania dos Portos do Espírito Santo administrativa, alta direção e processos de


(CPES), após ser auditada, em 9 de dezembro apoio e atestou, ao final desse processo, o
do ano passado, pela Empresa Det Norske esforço da tripulação na busca constante
Veritas Certificadora Ltda. (DNV), recebeu pela excelência e profissionalismo desen-
recomendação para a Certificação ABNT NBR volvidos, principalmente nas atividades
ISO 9001:2008 nas atividades relacionadas relacionadas ao Ensino Profissional Marí-
ao Departamento de Ensino Profissional timo da Capitania. Esta certificação é um
Marítimo (DEPM). O respectivo certificado dos esforços que a Marinha do Brasil,
foi recebido em 13 de janeiro último. como Autoridade Marítima, vem realizan-
A auditoria avaliou a conformidade com do para atender às resoluções da Organi-
os requisitos estabelecidos na norma dos zação Marítima Mundial que visam à
processos de ensino, habilitação, gestão melhoria no Ensino Profissional Marítimo.
da qualidade, gestão de clientes, gestão (Fonte: Bono no 62, de 30/1/2012)

MB INAUGURA UNIDADE PILOTO DE HEXAFLUORETO DE


URÂNIO E O CENTRO DE INSTRUÇÃO E ADESTRAMENTO
NUCLEAR ARAMAR
Foram inaugurados, em 16 de fevereiro trução do primeiro submarino nuclear bra-
último, a Unidade Produtora de sileiro. Além disso, trata-se de um marco
Hexafluoreto de Urânio (Usexa) e o Centro para o País no processo de enriquecimen-
de Instrução e Adestramento Nuclear to de urânio, possibilitando a produção de
Aramar (Ciana), nas dependências do Cen- combustível nuclear para as usinas de ge-
tro Experimental Aramar (CEA), da Mari- ração de energia.
nha do Brasil, em Sorocaba (SP). Com as A Usexa é uma unidade piloto onde se
presenças do ministro de Ciência e converte o minério beneficiado de urânio
Tecnologia e Inovação, Marco Antônio (yellow cake) em hexafluoreto de urânio
Raupp; do comandante da Marinha, Almi- (UF6) gasoso. Em síntese, a conversão de
rante de Esquadra Julio Soares Moura urânio é um conjunto de processos físicos e
Neto; e do diretor-geral do Material da químicos que versam sobre a transforma-
Marinha, Almirante de Esquadra Arthur Pi- ção de compostos de urânio, em que o UF6
res Ramos, o evento representou um pas- é o produto final. Este é a matéria-prima para
so importante no Programa Nuclear da Ma- a etapa de enriquecimento de urânio, poste-
rinha, que, por sua vez, viabilizará a cons- rior à conversão. Isto é, sem a conversão de

RMB1 o T/2012 279


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

urânio, não é possível produzir combustível Já o Ciana foi construído para formar
nuclear para usinas como as de Angra. adequadamente os futuros operadores do
A Usexa é dimensionada para produção 40 Laboratório de Geração Nucleoelétrica
toneladas de UF6 natural/ano, sendo uma das (Labgene) e das futuras tripulações dos
poucas unidades novas em comissionamento submarinos nucleares brasileiros. O
no mundo. Os trabalhos técnicos e projetos Labgene é uma planta nuclear projetada por
de sistemas da Unidade baseiam-se em estu- brasileiros e que está sendo construída em
dos e pesquisas feitas nos anos 90 no Institu- Aramar, com término previsto para 2014.
to de Pesquisas Energéticas e Nucleares No Ciana, os alunos treinados, após terem
(Ipen), acrescendo-se instrumentação, mate- sido aprovados em um conjunto de provas
riais e dispositivos ele- teóricas e práticas, se-
trônicos atualizados e rão capacitados para a
engenharia para aumen- Um passo importante no obtenção da licença
to de escala. Seu índice de operação do Labo-
de nacionalização é de Programa Nuclear da ratório, a ser concedi-
cerca de 80%, gerando Marinha que viabilizará a da pela Comissão Na-
empregos de nível mé- cional de Energia Nu-
dio e superior, a maioria
construção do primeiro clear (CNEN).
nas regiões de São Pau- submarino nuclear Na fase atual, o
lo e Sorocaba. O início brasileiro Centro preparará não
da operação representa, só operadores do
assim, mais um marco al- Labgene, o qual pos-
cançado na solidificação da engenharia nu- sui forte similaridade física e funcional com
clear no campo industrial do Brasil. A Usexa a parte de propulsão do submarino nuclear
serve também como referência à futura unida- brasileiro, mas também os futuros instru-
de de conversão a cargo das Indústrias Nu- tores das tripulações ligadas aos meios de
cleares do Brasil (INB), incluindo-se o propulsão nuclear.
licenciamento ambiental e nuclear. (Fonte: https://www.defesa.gov.br)

BRASIL É NOMEADO MEMBRO DO PACIOSWG


O Brasil, por meio da Marinha do Brasil ganização do Tratado do Atlântico Norte
(MB), foi nomeado, em 23 de janeiro últi- (Nato, do nome em inglês), a partir deste
mo, membro permanente do Grupo de Tra- ano, participará efetivamente como obser-
balho dos Oceanos Pacífico e Índico vadora, por intermédio do Nato Shipping
(Pacific and Indian Oceans Shipping Centre (NSC).
Working Group – PACIOSWG), na cidade A participação da MB no PACIOSWG
de Victoria, Colúmbia Britânica, Canadá. O reforça o respeito que nossa Força adqui-
País passou a ser o 10o membro do grupo, riu ao longo de sua história no que
já integrado por África do Sul, Austrália, concerne ao Controle Naval do Tráfego
Canadá, Chile, Cingapura, Coreia do Sul, Marítimo, bem como permitirá ao Comando
Estados Unidos, Nova Zelândia e Reino do Controle Naval do Tráfego Marítimo
Unido. Ressalta-se que outros países e ins- (ComCoNTraM) acompanhar o desenvol-
tituições requerem o mesmo posto. A Or- vimento e o aprimoramento da doutrina

280 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

NCAGS (Naval Cooperation and Guidance rabilidade e a cooperação com vários paí-
for Shipping) cujos ensinamentos servirão ses importantes em relação às linhas de
para avaliar a necessidade de aprimoramen- comunicação marítimas brasileiras e ao co-
tos nos procedimentos ora adotados na nhecimento de tudo o que ocorre em águas
MB. Além disso, essa participação elevará de interesse do País.
o intercâmbio de comunicações, a interope- (Fonte: Bono no 94, de 9/2/2012)

REESTRUTURAÇÃO DO SETOR SGM

O comandante da Marinha, Almirante Administração da Marinha (DAdM), com o


de Esquadra Julio Soares de Moura Neto, propósito de dirigir as atividades relaciona-
emitiu, em 2 de fevereiro último, as Portari- das com o orçamento da Marinha do Brasil.
as nos 63, 64, 65, 66 e 67, que efetuam altera- A DAdM, além das atividades não
ções previstas para a Reestruturação do transferidas para a DGOM, será responsável
Setor Secretaria-Geral da Marinha (SGM), pelas atividades de apoio às gestorias de
conforme deliberado pelo Almirantado. Material (Sismat) e Municiamento e Caixa de
As citadas portarias criam a Diretoria Economias (Sistema Quaestor), bem como
de Coordenação do Orçamento da Mari- pela administração do Centro de Dados, que
nha (COrM), com sede em Brasília, dirigida atualmente são exercidas pela DFM.
por um vice-almirante A Base de Abaste-
(IM), e a Diretoria de cimento da Marinha
Gestão Orçamentária A reestruturação do Setor no Rio de Janeiro
da Marinha (DGOM), SGM, a ser implementada (BAMRJ) e o Centro
no Rio de Janeiro, de Munição da Mari-
dirigida por um contra- em abril deste ano, busca nha (CMM) passam à
almirante (IM). Além racionalizar a aplicação subordinação da Dire-
disso, transferem a toria de Abasteci-
subordinação da Dire- dos recursos de material e mento da Marinha
toria de Finanças da de pessoal alocados às (DAbM). O Centro de
Marinha (DFM) e da Organizações Militares do Controle de Inventário
DGOM para a COrM. da Marinha será diri-
A Diretoria de Co- Setor gido por um capitão de
ordenação do Orça- mar e guerra (IM).
mento da Marinha terá origem na A reestruturação do Setor SGM, a ser
Coordenadoria do Orçamento da Marinha, implementada em abril deste ano, busca
que atualmente faz parte da estrutura inter- racionalizar a aplicação dos recursos de ma-
na da SGM, e terá como propósito contri- terial e de pessoal alocados às Organiza-
buir para a superintendência das ativida- ções Militares do Setor, a fim de possibili-
des relacionadas com Orçamento, Econo- tar melhorias no desempenho de suas ati-
mia, Finanças e Contabilidade. vidades, bem como contribuir para a
A DGOM será subordinada, inicialmen- integração e a hierarquização vertical das
te, à SGM, até a ativação da COrM, quando ações e do fluxo de informações necessári-
passará à subordinação desta, originando- as à condução do serviço.
se de parte da atual estrutura da Diretoria de (Fonte: Bono no 106, de 15/2/2012)

RMB1 o T/2012 281


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

ASSUNÇÃO DE CARGOS POR ALMIRANTES

– Contra-Almirante (IM) Sérgio Luiz de – Contra-Almirante (IM) Samy Moustapha,


Andrade, presidente da Caixa de Constru- diretor de Finanças da Marinha, em 21/12;
ção de Casas para o Pessoal da Marinha, – Vice-Almirante Edlander Santos, diretor
em 9/12; do Departamento de Pessoal, Ensino e Coope-
– Contra-Almirante Hermann Iberê San- ração da Secretaria de Pessoal, Ensino, Saúde e
tos Boehmer Junior, diretor de Aeronáuti- Desporto do Ministério da Defesa, em 10/1;
ca da Marinha, em 14/12; – Contra-Almirante Wilson Pereira de
– Contra-Almirante (IM) Walter Lucas Lima Filho, comandante da 2a Divisão da
da Silva, diretor administrativo-financeiro Esquadra, em 12/1;
da Empresa Gerencial de Projetos Navais – Contra-Almirante (Md) José Antônio
(Emgepron), em 15/12; Rodrigues Cordeiro, diretor do Centro de
– Contra-Almirante Carlos Henrique Sil- Medicina Operativa da Marinha, em 13/1;
va Seixas, assistente da Marinha na Escola – Contra-Almirante (FN) Cesar Lopes
Superior de Guerra, em 16/12; Loureiro, comandante do Material de Fuzi-
– Vice-Almirante Ademir Sobrinho, co- leiros Navais, em 2/2;
mandante do 4o Distrito Naval, em 19/12; – Contra-Almirante Wagner Lopes de
– Vice-Almirante Rodrigo Otávio Moraes Zamith, comandante da Força-Ta-
Fernandes de Hônkis, diretor de Ensino da refa Marítima da Força Interina das Nações
Marinha, em 20/12; Unidas no Líbano, em 25/2.

FTM-UNIFIL TEM NOVO COMANDANTE

O Contra-Almirante Wagner Lopes de A FTM-Unifil, estabelecida em 2006, é a


Moraes Zamith é o novo comandante da primeira força-tarefa naval a ser criada para
Força-Tarefa Marítima da Força Interina das tomar parte de uma missão de manutenção
Nações Unidas no Líbano (FTM-Unifil), em de paz da Organização das Nações Unidas
substituição ao Contra-Almirante Luiz (ONU) e será comandada, pela segunda vez
Henrique Caroli. A cerimônia de passagem consecutiva, por um almirante brasileiro.
de cargo foi realizada em Beirute, naquele O Almirante Caroli manteve sob seu co-
país, em 25 de fevereiro último. O evento mando cerca de 1.100 militares, em nove
aconteceu a bordo da Fragata União, da navios de seis nacionalidades, sendo três
Marinha do Brasil, navio-capitânia da com- da Alemanha, dois de Bangladesh, um da
ponente naval da Unifil. Grécia, um da Indonésia e um da Turquia, e
A Unifil foi criada em 1978 com o propó- a Fragata União.
sito de manter a estabilidade na região du- Para o comandante da Marinha do Bra-
rante a retirada das tropas israelenses do sil, Almirante de Esquadra Julio Soares de
território libanês. Atualmente, possui um Moura Neto, “a participação brasileira na
contingente de aproximadamente 13.500 Força Interina das Nações Unidas no Líba-
pessoas, entre militares e civis de mais de no é motivo de orgulho para a Marinha do
30 países (entre eles o Brasil) e se encontra Brasil, pois esta é a primeira operação de
sob o comando do General Alberto Asarta paz de caráter naval que a ONU realiza e a
Cuevas, da Espanha. primeira vez que o comando da Força-Ta-

282 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

refa Marítima da Unifil está a cargo de um para o Brasil no campo das relações inter-
país não membro da Organização do Trata- nacionais, na medida em que demonstra o
do do Atlântico Norte (Otan). A presença comprometimento do País com a Unifil, com
da Fragata União na região, além de con- a manutenção da paz no Líbano e com a
tribuir para o cumprimento das tarefas atri- estabilidade do Oriente Médio”.
buídas à FTM, tem um grande significado (Fonte: Comando de Operações Navais)

PASSAGEM DOS CARGOS DE CON E DGN


Presidida pelo comandante da Marinha, tou para mim a nomeação para o cargo de
Almirante de Esquadra Julio Soares de comandante de Operações Navais e dire-
Moura Neto, foi realizada, em 1o de dezem- tor-geral de Navegação. Agradeço, pois,
bro de 2011, a solenidade de Transmissão ao comandante da Marinha por essa opor-
de Cargo de Comandante de Operações tunidade, pelo apoio, orientações, liberda-
Navais (CON) e Diretor-Geral de Navega- de de manobra, consideração e atenções
ção (DGN). Assumiu o Almirante de Esqua- com que me distinguiu.
dra Fernando Eduardo Studart Wiemer, em Em minha ordem de serviço de posse,
substituição ao Almirante de Esquadra João procurei demonstrar o meu entendimento
Afonso Prado Maia de Faria. quanto à responsabilidade que assumia e
minha disposição de corresponder à confi-
DESPEDIDA E AGRADECIMENTO DO ança em mim depositada. Minha avaliação
ALMIRANTE PRADO MAIA estava correta. As tarefas nos setores do
Comando de Operações Navais e Direto-
“O Almirante de Esquadra Julio Soares ria-Geral de Navegação foram desafiado-
de Moura Neto, com sua experiência de ras, mas contei com os titulares das OM
carreira e suas origens em nossa Esqua- subordinadas. Recebi de todos o melhor
dra, tem clara a dimensão do que represen- de seus esforços, irrestrita lealdade e com-

RMB1 o T/2012 283


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

petência profissional. Foi um ambiente de mitiu sempre a tomada de decisão a tempo


trabalho sinérgico, produtivo e amigo. O e fundamentada.
resultado foi a contribuição de todos para Nesse mesmo enfoque, gostaria de
o melhor na Marinha. transmitir os meus cumprimentos, o meu
Não alcançaria os objetivos que busquei Bravo Zulu, a minha continência para os
sem a cooperação e o apoio de meus cole- meus mais de 45 mil subordinados e envio
gas de Almirantado, todos com a convicção minha saudação nas pessoas dos:
de que a essência do Poder Naval está no – Capitão de Mar e Guerra Pinto Ho-
Setor Operativo, mas sua capacidade de mem, comandante do Navio Polar Almirante
combate depende, em boa parte, de ações Maximiano, participando atualmente da
com origem nos demais setores. Exemplo Operação Antártica XXX;
disto é a recente incorporação da Fragata – Capitão de Fragata (FN) Eduardo, co-
União à Força-Tarefa Marítima da Unifil – mandante do Grupamento Operativo de
Força Interina das Nações Unidas no Líba- Fuzileiros Navais Haiti;
no –, concretizando um esforço que come- – Capitão de Fragata Ricardo Gomes,
çou com a determinação do comandante da comandante da Fragata União, em patru-
Marinha, autorizados os recursos pela Pre- lha naval no mar territorial libanês;
sidência da República e repassados pelo – Capitão de Fragata Reale, comandan-
Ministério da Defesa. Desse início, diver- te da Fragata Independência, regressando
sas foram as tarefas desempenhadas pelos da operação Atlantic Watch;
setores da Marinha do Brasil, culminando – Capitão de Corveta Marcos Alves,
com a prontificação do navio, em padrões comandante do Navio de Assistência Hos-
que fazem justiça à Marinha e ao Brasil. pitalar Doutor Montenegro, em Operação
Tive a ventura de exercer seis comandos de Assistência Hospitalar no Rio Purus;
no mar: quatro comandos de navio, um es- – Capitão de Corveta Chagas Lima, coman-
quadrão e o Comando em Chefe da Esqua- dante do Navio-Patrulha Fluvial Roraima, em
dra. Ostento com orgulho a Medalha do patrulha naval no Rio Amazonas;
Mérito Marinheiro com quatro âncoras. Te- – Capitão de Corveta Wagner Goulart,
nho como distinção meu início de carreira no comandante do Monitor Parnaíba, em ope-
saudoso Cais Norte, no Contratorpedeiro rações no Pantanal;
Santa Catarina, navio que deixou nome na – Capitão de Corveta Alexandre, coman-
Esquadra. Próximo ao fim de minha carreira dante do Navio de Assistência Hospitalar
naval, despeço-me hoje do Setor Operativo, Carlos Chagas, em Operação de Assistên-
onde ela teve início. Levo inúmeras recorda- cia Hospitalar no Rio Tapajós;
ções, ensinamentos, grandes amizades e uma – Capitão-Tenente Edésio, comandante
enorme saudade das coisas do mar. A vida a do Navio-Patrulha Gurupá, participando da
bordo nos ensina o trabalho em equipe, a Operação Marlim; e
importância de todos e de cada um, a consci- – Capitão-Tenente Simões, comandan-
ência de que estamos no mesmo barco. te do Navio-Patrulha Guaíba, em patrulha
Esse entendimento me leva a registrar e nas Águas Jurisdicionais Brasileiras.
agradecer aos meus chefes do Estado-Mai- São alguns dos marinheiros e fuzileiros
or, meus subchefes e à tripulação do Co- que, em sua maneira anônima e despojada,
mando de Operações Navais e da Direto- estão diariamente na linha de frente de nos-
ria-Geral de Navegação, responsáveis por sa Marinha e de nosso país, e os citados,
correta e tempestiva assessoria, que per- neste momento, navegam na Amazônia Azul

284 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

e nas calhas dos rios da Amazônia e do Pan- felicidades no cargo; votos extensivos a
tanal, preservando nossa soberania, garan- Helena, filhos e netos, pois o sucesso é cer-
tindo a segurança da navegação e a salva- to pelas qualidades que mencionei.
guarda da vida humana; apoiam as popula- Prometi em minha ordem de serviço de
ções ribeirinhas, os ‘navios da esperança’; posse que ‘estaria sempre presente, nos
contribuem para a manutenção da paz no aconselhamentos e nas decisões’, postura
Haiti e no Líbano; sãos os nossos ‘pelotões que espero ter praticado. Ao assumir o
de fronteira’ nos limites ocidental e oriental Comando, tinha a certeza de que se não
do território nacional, alguns jovens capi- fizesse tudo o que devia, faria tudo o que
tães-tenentes com suas tripulações, arvo- pudesse, como afirmava o Almirante Pedro
rando o Pavilhão Nacional, demonstrando de Frontin, e chego ao patim superior da
nossa presença e determinação! escada de portaló com essa certeza.
Agradeço ao General de Exército De Em seguida, será arriado o meu pavi-
Nardi, chefe do Estado-Maior Conjunto das lhão, o mesmo que o Almirante de Esqua-
Forças Armadas; ao General de Exército Sal- dra Newton Braga de Faria usou neste Co-
vador, comandante de Operações Terrestres; mando e do qual, espero, eu tenha sido
e ao General de Exército Vilela, chefe do Pre- digno de arvorar no mastro de meu
paro e Emprego do Estado-Maior Conjunto capitânia nesses 12 meses no cargo.
das Forças Aramadas, pelas constantes gen- Finalmente, que o Nosso Senhor dos
tilezas, atenções e colaboração no propósi- Navegantes abençoe e ilumine os homens
to maior da consecução dos objetivos co- e mulheres que tripulam as organizações
muns que assegurem a concretização das militares do Setor Operativo.
metas da Estratégia Nacional de Defesa. Viva a Marinha!”
Faço um especial agradecimento ao Te-
nente-Brigadeiro do Ar Burnier, comandan- AGRADECIMENTO E BOAS-VINDAS
te-geral de Operações Aéreas, meu parceiro DO COMANDANTE DA MARINHA
de Ministério da Defesa e agora meu corres-
pondente comandante operacional na glori- “Após pouco mais de um ano à frente do
osa Força Aérea Brasileira, por sua perma- Comando de Operações Navais e da Direto-
nente disposição de nos apoiar, de atuar com ria-Geral de Navegação, o Almirante de Es-
nossos meios, de contribuir para a desejada quadra João Afonso Prado Maia de Faria des-
interoperabilidade, por sua convicção, que pede-se, no dia de hoje, desses dois Órgãos
entendo correta, de que devemos transfor- de Direção Setorial, em virtude de ter sido no-
mar nossas diferenças em convergências, e, meado chefe do Estado-Maior da Armada.
com isso, viabilizar as operações conjuntas. Durante esse profícuo período, o Almi-
Ao longo de minha carreira, este é o quar- rante Prado Maia, detentor de uma invejá-
to cargo que passo ao Almirante de Esqua- vel bagagem profissional, conduziu com
dra Fernando Eduardo Studart Wiemer. A destacado brilhantismo todas as tarefas
competência que sempre demonstrou e o atribuídas, que não foram poucas nem sim-
levou ao Almirantado certamente será a ples, principalmente devido aos múltiplos
moldura de seu comando, cuja eficácia será e diversificados compromissos com que a
garantida por sua liderança, seus conheci- nossa instituição tem se deparado nestes
mentos profissionais e experiência de bri- últimos tempos.
lhante chefe naval. Só me cabe desejar ao Seus incontestáveis atributos, dentre os
bom companheiro e belo amigo que tenho, quais destacam-se lealdade, competência, li-

RMB1 o T/2012 285


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

derança, perspicácia, inteligência e objetivi- honroso cargo, registro o meu reconhecimen-


dade, nortearam o seu posicionamento, sem- to pelo esforço empreendido e pelos resulta-
pre ponderado e correto, contribuindo, so- dos alcançados. Ao encerrar o seu ciclo à
bremaneira, para a minha tomada de decisão. frente dos setores Operativo e da DGN, agra-
Dessa forma, e sem a intenção de abranger deço-lhe pelas muitas demonstrações de apre-
o muito que foi realizado, gostaria de ressaltar ço e consideração e pela indispensável as-
algumas de suas principais conquistas: sessoria, apresentando os meus votos de
– no âmbito da Força Interina das Nações felicidade pessoal, extensivos à Sra. Magali e
Unidas no Líbano (Unifil), o planejamento e digníssima família, e de sucesso na condu-
o envio de um almirante para comandar a ção das atividades do Órgão de Direção Ge-
Força-Tarefa Marítima e de oficiais e praças ral, no qual estou certo de continuar contan-
para compor seu Estado-Maior, assim como do com sua importante colaboração.
da Fragata União, para atuar como capitânia Boa sorte e que Deus ilumine a sua
do Comando da Força-Tarefa; singradura. Seja feliz!
– a ativação do Centro de Guerra Eletrô- Ao Almirante de Esquadra Fernando
nica da Marinha, consolidando mais uma Eduardo Studart Wiemer, apresento as mi-
etapa na busca pelo controle do espectro nhas boas-vindas e formulo votos de muitas
magnético na Marinha do Brasil; alegrias e realizações em sua nova comissão.
– em atenção ao Plano Estratégico de Estou seguro de que os seus sólidos
Fronteiras, as Operações Ágata I, nos limi- conhecimentos, aliados às suas reconhe-
tes com a Colômbia; Ágata II, com o cidas qualidades, garantirão pleno êxito na
Paraguai, Argentina e Uruguai; e Ágata III, missão que lhe está sendo confiada.”
ainda em andamento, com o Paraguai, a
Bolívia e o Peru; PALAVRAS INICIAIS DO
– o apoio logístico ao Governo do Rio de ALMIRANTE WIEMER
Janeiro, por meio das viaturas blindadas do
Corpo de Fuzileiros Navais, durante a ocu- “Imensamente feliz ao assumir os car-
pação das comunidades da Penha e Alemão, gos de comandante de Operações Navais
São Carlos, Mangueira, Rocinha e Vidigal; e diretor-geral de Navegação, realizo um
– as ações de Defesa Civil, por ocasião sonho acalentado desde jovem tenente, a
das chuvas na Região Serrana do Rio de
Janeiro, principalmente em Nova Friburgo;
– as diversas comissões realizadas, no
País e no exterior, tais como Unitas,
Tropicalex, Aspirantex, Diplomex, Platina,
Fraterno e Bracolper, entre outras;
– as operações conjuntas Amazônia 2011
e Anhanduí;
– o exercício de guerra cibernética Balu-
arte II, o segundo já realizado; e
– a ativação da Agência de Humaitá e a
elevação, à Capitania dos Portos, das De-
legacias de Brasília e de Santarém.
Prezado Almirante Prado Maia! No mo-
mento em que Vossa Excelência transmite o

286 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

bordo de nossos navios e submarinos, e Alta Administração Naval, em relação aos


amadurecido, mais recentemente, como programas de obtenção e modernização de
comandante da Força de Submarinos, co- meios navais, aeronavais e de fuzileiros
mandante do 2o Distrito Naval e coman- navais, que nos trazem a certeza de poder
dante em chefe da Esquadra. realizar o desejo permanente de todo mari-
Hoje, movido pela magia que encanta nheiro, qual seja estar a bordo de unidades
os marinheiros de poder estar junto ao mar aprestadas e prontas para o combate, onde
e no convés de voo do capitânia, tenho a e quando se fizer necessário.
nítida compreensão da responsabilidade Neste momento muito especial de mi-
maior que me é atribuída de estar à frente nha vida, rogo a proteção do Senhor Bom
dos setores Operativo e de Navegação e Jesus dos Navegantes para me iluminar, de
renovo, mais que sempre, meu fogo sagra- modo a bem cumprir a missão recebida.
do, a crença na Marinha e o amor ao Brasil. Tamanha é a satisfação que julgo oportu-
Nos dias correntes, quando se faz ne- no sejam minhas palavras iniciais, também
cessário e imperioso deter o conhecimento voltadas para agradecer e reconhecer:
de tudo o que ocorre no nosso entorno es- – ao comandante da Marinha, Almiran-
tratégico, de manter uma rigorosa vigilância te de Esquadra Julio Soares de Moura Neto,
sobre a ‘Amazônia Azul’ até os limites das pela minha indicação, prova de confiança
águas jurisdicionais brasileiras, sem negli- que muito me honra, e a quem renovo mi-
genciar, ainda, o controle eficaz das calhas e nha lealdade e asseguro total dedicação,
margens dos nossos principais rios e águas ciente do dever de estar à altura daqueles
interiores, me permitem antever a grandeza que, no passado, exerceram esses cargos;
dos desafios a vencer. De outro lado, a ne- – aos membros do Almirantado, na pes-
cessidade de manter aprestadas as nossas soa do chefe do Estado-Maior da Armada,
forças navais, aeronavais e de fuzileiros na- Almirante de Esquadra Luiz Umberto de
vais, responsáveis pela manutenção dos Mendonça, na certeza de que juntos so-
interesses marítimos, pelo atendimento aos mos mais fortes;
compromissos internacionais assumidos – aos insignes chefes navais, em especi-
pelo País e pela garantia da nossa soberania al aos meus ex-comandantes e ex-diretores,
no mar, me oferecem a percepção do enorme que me sensibilizam com suas presenças,
trabalho a ser executado. pelo legado de exemplos e ensinamentos
Deste modo, gostaria, inicialmente, de me que moldaram a carreira deste marinheiro,
dirigir a todos os meus subordinados, do almi- em vias de iniciar nova singradura. Não po-
rante mais antigo ao marinheiro mais moder- dendo nominar todos, faço menção especi-
no, cerca de 45 mil homens e mulheres, milita- al ao ‘Decano dos Submarinistas’, o ex-mi-
res e civis que integram os setores, para lhes nistro e Almirante de Esquadra Alfredo
transmitir palavras de confiança e alegria. Karam, por tudo que Vossa Excelência re-
Estou seguro, pois sei como são recru- presenta para minha geração;
tados, formados e capacitados os marinhei- – aos bons companheiros da Marinha,
ros, fuzileiros e servidores de nossa Mari- do Exército e da Força Aérea, às autorida-
nha. Conheço suas virtudes morais e com- des presentes ou representadas, aos caros
petências profissionais; e confio, integral- colegas da Turma Ricardo de Moraes, aos
mente, pois sei que são leais, disciplina- prezados amigos, em particular os da Bahia,
dos e determinados. Ademais, estou confi- que muito me prestigiam com a vinda ao Rio
ante, ao ver os esforços desenvolvidos pela de Janeiro, e aos demais convidados, o meu

RMB1 o T/2012 287


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

muito obrigado pela carinhosa participação, lhoso por haver, mais uma vez, seguido suas
que traz especial brilho a esta cerimônia; e águas, para renovar o agradecimento pela
– aos meus queridos familiares, sogra, sempre fidalga acolhida e pela maneira pro-
tios, irmãos, filhos, netos e, afetuosamen- fissional e objetiva com que me passou o
te, à minha mulher Helena, cúmplices de Comando e a Direção-Geral. Ao fraterno ami-
toda uma vida, pelo apoio, amor e compre- go, peço aceitar, em meu nome e no de todos
ensão. Mais uma vez, se oportunidades eu os oficiais, praças e servidores do Comando
tiver, vou largar as espias e me fazer ao mar de Operações Navais e da Diretoria-Geral de
para, saudoso, poder regressar ao nosso Navegação, os votos de muita felicidade, ex-
porto seguro. tensivos à sua esposa Magali, e de pleno
Por fim, dirijo-me ao Almirante de Esqua- êxito como chefe do Estado-Maior da Arma-
dra João Afonso Prado Maia de Faria, orgu- da, cargo que em breve irá assumir.”

TRANSMISSÃO DE CARGO DE CEMA

Foi realizada em 7 de dezembro de 2011, DESPEDIDA DO ALMIRANTE


presidida pelo comandante da Marinha, MENDONÇA
Almirante de Esquadra Julio Soares de
Moura Neto, a cerimônia de Transmissão “Navio em posição; volta ao detalhe
de Cargo de Chefe do Estado-Maior da especial para o mar permanecendo o pes-
Armada. Assumiu o Almirante de Esqua- soal necessário a dobrar a amarração;
dra João Afonso Prado Maia de Faria, em máquinas dispensadas.
substituição ao Almirante de Esquadra Luiz Com estas palavras que por tantas ve-
Umberto de Mendonça. zes ouvi e proferi, começo minha despedi-

288 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

da do Estado-Maior da Armada e do Servi- associado ao fascínio pelo mar, nos deu a


ço Ativo da Marinha. Iço a flâmula de fim dimensão da carreira que abraçávamos.
de comissão na certeza de que esta terá Após quase cinco anos de vida acadê-
sido a mais longa singradura da minha vida, mica, concluídos com o regresso da Via-
pois quase 46 anos se passaram. gem de Guardas-Marinha, estava pronto
Ao completar essa inesquecível jorna- para o exercício do oficialato.
da, levo, revigorada, a crença na Marinha, Iniciei, no Cruzador Ligeiro Barroso, o
por tudo que nela vi, vivi, aprendi, e no que viria a se transformar, nesses 40 anos
futuro promissor que a ela está reservado. seguintes, numa carreira repleta de desafi-
Do jovem ainda imberbe aos dias de hoje, os, superações, alegrias, realizações e re-
quanto aprendizado, quantos exemplos de sultados alcançados.
dedicação, profissionalismo, justiça e ami- Nesse período, conheci e convivi com
zade presenciei na convivência com meus homens e mulheres aos quais devoto um re-
chefes, pares e subordinados. Sem dúvidas, conhecimento especial. Comandantes e co-
todos contribuíram para a construção de mandados, também amigos, que souberam
minha personalidade, que procurei transmi- ajudar-me com compreensão e lealdade, seus
tir a meus filhos e a todos aqueles com os inequívocos valor e inestimável apreço.
quais convivi ao longo da minha carreira, Nunca me deixaram só e comigo partici-
procurando retribuir com isso à Marinha do param de muitos momentos de júbilo e ale-
Brasil pelas oportunidades que me deu de grias. Estiveram sempre solidários nas con-
evoluir como homem e marinheiro. quistas e realizações ajudando-me também
Ao ingressar na Escola Naval, tive sem- a superar frustrações e desafios. Nossa con-
pre como meu objetivo prioritário prepa- vivência foi construtiva, nosso relaciona-
rar-me para bem servir à Marinha; e hoje, mento respeitoso, intenso, profissionalmen-
ao deixá-la, saio realizado e feliz comigo te gratificante, mas sobretudo amigo.
mesmo, pois entendo tê-lo alcançado por Assim, para não cometer injustiças com
ter atingido o mais elevado posto de nossa omissões, permito-me lembrar dois nomes
escala hierárquica e ocupar o cargo de che- com o propósito de reconhecer todos aque-
fe do Estado-Maior da Armada. les com os quais convivi: o do Suboficial de
Oriundo de uma família de oficiais do Exér- Caldeiras Cândido da Silva Menezes, em me-
cito, certamente por influência de meus ir- mória, meu primeiro supervisor, na interação
mão e cunhado, ao concluir o Colégio Mili- com o qual comecei a exercitar minha aptidão
tar do Rio de Janeiro optei pela Escola Na- para o mando e a liderança como encarrega-
val. Lembro-me como se fosse hoje minha do da Divisão de Reparos do nosso saudoso
chegada à Ilha de Villegagnon. Tudo era C-11; e do Excelentíssimo Senhor Almirante
desconhecido, mas, ao conhecer os cole- de Esquadra Julio Soares de Moura Neto,
gas da Turma Grenfell e a eles me integrar, comandante da Marinha e meu atual chefe
pela união desenvolvida, no esforço de cada imediato, a quem externo minha admiração
um para superar o período de adaptação, pela devoção e obstinação com que conduz
percebi que havia feito a escolha acertada. a nossa Força, exemplo para sempre.
Marcante também, nesse período, foram Nesse momento não posso deixar de
a vibração e o interesse que desenvolve- destacar que nesse período conheci minha
mos pelos costumes, tradições marinheiras esposa Tininha e com ela constituí uma
e linguagem próprias dos homens do mar adorável família com nossos filhos Môni-
em tão pouco tempo. Penso que tudo isso, ca e Luiz Márcio, recentemente enriquecida

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

com a presença do neto Miguel, que esti- – aos senhores generais, brigadeiros e
veram sempre a meu lado. almirantes, e demais autoridades civis, mi-
Portanto, esse foi um período muito es- litares e eclesiásticas;
pecial da minha vida, do qual levo indelé- – aos senhores adidos navais das na-
veis lembranças, gratas recordações e ver- ções amigas; e
dadeiros amigos. – às senhoras, senhores e amigos, em
Diante de tudo, só me resta, portanto, especial aos da Turma Grenfell, pela honra
agradecer: que me concedem com suas presenças.
– inicialmente a Deus, que, me dando a Finalmente, ao Almirante de Esquadra
vida, me concedeu a oportunidade de João Afonso Prado Maia de Faria, estimado
vivenciar esses momentos; amigo e companheiro de Turma, a quem trans-
– a meus pais, por terem me transmitido mito o cargo de chefe do Estado-Maior da
os valores fundamentais da minha forma- Armada, desejo renovado sucesso, felicida-
ção sustentados na família, na educação, des e realizações na condução da Direção-
na verdade e na justiça; Geral da Marinha, votos estes extensivos a
– a minha tripulação no Estado-Maior sua digníssima esposa Magali e família.
da Amada, almirantes, oficiais, praças e Mais uma vez, a todos, o meu muito
servidores civis com os quais convivi nes- obrigado.”
ses 12 meses, que, sob orientação segura e
oportuna do meu vice-chefe, Vice-Almiran- AGRADECIMENTO E BOAS-VINDAS
te Paulo Cezar de Quadros Küster, respon- DO COMANDANTE DA MARINHA
deram a tempo e a hora a todas as minhas
demandas, garantindo, com isso, prontidão “Hoje é dia de apresentar os agradeci-
e profissionalismo no assessoramento ao mentos ao Almirante de Esquadra Luiz
comandante da Marinha; Umberto de Mendonça, que, além de pas-
– aos senhores comandantes do Exérci- sar a Chefia do Estado-Maior da Armada,
to e da Aeronáutica, General de Exército após um ano de intensas e profícuas reali-
Enzo Martins Peri e Tenente-Brigadeiro do zações, está deixando o Serviço Ativo.
Ar Juniti Saito, pelo apreço e cordialidade Possivelmente, neste momento de des-
demonstrados durante nossa convivência; pedida, ele deve estar se recordando do que
– ao chefe do Estado-Maior Conjunto viveu em sua extensa caminhada, trazendo
das Forças Armadas, General de Exército à sua mente as boas lembranças das amiza-
José Carlos de Nardi; chefe do Estado-Mai- des construídas, dos chefes, pares e subor-
or do Exército, General de Exército Joaquim dinados com quem se relacionou e dos ser-
Silva e Luna, e chefe do Estado-Maior da viços bem executados. Por outro lado, esta
Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro do Ar Jor- ocasião deixa em todos nós um sentimento
ge Godinho Barreto Nery, pela excelente de tristeza por ver um estimado companhei-
convivência que tivemos ao conduzir os in- ro se afastando do convívio diário.
teresses de nossas Forças, como integran- Dotado de invejáveis capacidade, inteli-
tes do Comitê de Chefes de Estado-Maior; gência, senso crítico, responsabilidade e,
– aos senhores membros do Almiranta- principalmente, bom humor, qualidades as-
do e ministros do Superior Tribunal Militar, sociadas a uma total lealdade e a uma sólida
dentre os quais destaco seu presidente, Al- bagagem marinheira, amealhada durante
mirante de Esquadra Álvaro Luiz Pinto, pela mais de 45 anos de dedicação à instituição,
harmonia em nosso relacionamento; o Almirante Mendonça soube conduzir de

290 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

forma irretocável as difíceis e abrangentes – o Grupo Interministerial da Organiza-


tarefas afetas ao Órgão de Direção Geral. ção Marítima Internacional, responsável
Iniciou sua carreira em 1o de março de por definir as posições a serem defendidas
1966, quando cruzou pela primeira vez o pelas nossas delegações.
portão da Escola Naval, tendo sido decla- Além disso, teve papel muito importan-
rado guarda-marinha em 13 de dezembro te nas gestões que culminaram com a indi-
de 1969. Já como oficial, serviu primeira- cação de um almirante para ser o coman-
mente no Cruzador Barroso, passando por dante da Força-Tarefa Marítima pertencente
diversas outras comissões, cabendo des- à Unifil e com o envio da Fragata União
tacar os comandos do Navio-Varredor Ata- para ser seu capitânia.
laia e do Contratorpedeiro Sergipe. Almirante Mendonça! Ao presenciar a
Como resultado do seu desempenho, re- sua bandeira insígnia ser arriada pela última
cebeu as platinas de almirante em 25 de no- vez, sei que mencionar alguns dos muitos
vembro de 1999, tendo seu pavilhão tremula- passos dados em sua trajetória não permite
do nos topes dos mastros dos 1o, 5o e 6o Dis- traçar um panorama completo dos bons
tritos Navais, da 1a Divisão da Esquadra e do momentos vividos em sua longa singradura.
Centro de Instrução Almirante Alexandrino. Resta-me garantir-lhe a certeza do dever bem
Já como almirante de esquadra, assumiu os cumprido e a satisfação que foi desfrutar de
cargos de diretor da Escola Superior de Guer- sua amizade. A recente designação para che-
ra, inspetor-geral da Marinha, diretor-geral fiar a Representação Permanente do Brasil
do Material, comandante de Operações Na- junto à Organização Marítima Internacional
vais, diretor-geral de Navegação e chefe do espelha a admiração e a confiança que con-
Estado-Maior da Armada. quistou ao longo de sua carreira.
Da sua producente passagem pelo Es- Desejo-lhe os mais sinceros votos de
tado-Maior da Armada, gostaria de ressal- felicidades em sua próxima comissão, ex-
tar a sua decisiva participação na coorde- tensivos à sua família e, em especial, à sua
nação das seguintes atividades: esposa, Sra. Albertina.
– as reuniões de Estado-Maior com as Bons ventos, Almirante de Esquadra
Marinhas da Alemanha, Argentina, Chile, Luiz Umberto de Mendonça, e que Deus o
França, Índia, Itália, Namíbia, Peru, Portu- acompanhe!
gal e Uruguai; Ao Almirante de Esquadra João Afonso
– a IX Conferência Interamericana Es- Prado Maia de Faria, dou as boas-vindas
pecializada de Diretores de Inteligência; ao Estado-Maior da Armada, com a con-
– os estudos para o aprimoramento do vicção de que suas características pesso-
funcionamento do Arsenal de Marinha do ais e seus sólidos conhecimentos, aliados
Rio de Janeiro; à reconhecida liderança junto aos seus
– as discussões, no âmbito da Força, comandados, permitirão dar andamento
para a elaboração do Livro Branco de De- aos trabalhos em curso e alcançar pleno
fesa Nacional e a atualização da Estratégia êxito na missão que ora lhe é confiada.”
Nacional de Defesa;
– a análise e a avaliação de possíveis PALAVRAS INICIAIS DO
locais de atracação, no Rio de Janeiro, para ALMIRANTE PRADO MAIA
os meios que serão incorporados, confor-
me está previsto no Plano de Articulação e “O Estado-Maior da Armada tem o pro-
Equipamento da MB (PAEMB); e pósito de assessorar o Comandante da Mari-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

nha na Direção-Geral da Marinha do Brasil e pode ocupar. Ressaltei todos esses aspectos
no desempenho de suas atribuições no Con- para demonstrar ao comandante da Marinha,
selho Militar de Defesa, e exercer a coorde- Almirante de Esquadra Julio Soares de Moura
nação e o controle das atividades dos Ór- Neto, o motivo de meu reconhecimento pela
gãos de Direção Setorial (ODS). Para a con- honra e pela distinção por ter indicado meu
secução desse propósito, cabem ao Estado- nome para o cargo. Renovo a V. Exa. a minha
Maior da Armada inúmeras tarefas, dentre disposição de plena dedicação às tarefas que
elas as voltadas à produção de documentos me forem cometidas, no limite de minhas pos-
doutrinários de alto nível da Marinha, aque- sibilidades intelectuais e físicas.
las necessárias ao correto assessoramento Essas atividades, apesar de sua dimen-
do comandante da Marinha e as decorrentes são, tornar-se-ão não só exequíveis como
de sua posição em relação aos ODS. Cabe extremamente realizadoras, pois estou cer-
também ao chefe do Estado-Maior da Arma- to de contar com a colaboração, assesso-
da uma série de funções colaterais, tais como ria e participação de meus colegas de Almi-
a participação na Comissão de Promoções rantado. Considero também assegurado tal
de Oficiais, no Conselho de Almirantes, no desempenho pela qualidade de meus su-
Conselho Financeiro e Administrativo da Ma- bordinados no Estado-Maior da Armada,
rinha e no Conselho da Ordem do Mérito do vice-chefe ao marinheiro mais moder-
Naval, e a presidência dos Conselhos do Pla- no, todos imbuídos do mesmo espírito de
no Diretor, de Planejamento de Pessoal, de navio e com a proa voltada para o cumpri-
Ciência e Tecnologia da Marinha e de mento de nossa missão.
Tecnologia e Informação da Marinha, além A Marinha está vivendo tempos impor-
da Comissão de Promoções de Oficiais. tantes e decisivos para o seu futuro. Pla-
Essa longa descrição de atribuições e tare- nos e programas como o de Desenvolvi-
fas dá a correta dimensão do cargo de chefe mento de Submarinos, o Nuclear da Mari-
do Estado-Maior da Armada, que é o mais alto nha e, dentro em breve, o de Obtenção de
que um oficial da Marinha no Serviço Ativo Meios de Superfície, além do planejamen-
to e execução do Plano de Articulação e
Equipamento da Marinha, exigem de todos
nós a máxima dedicação, criatividade, ca-
pacidade gerencial e tecnológica. Tenho
firme convicção de que a nossa meta é uma
Marinha na dimensão correta para a posi-
ção atual e futura do Brasil no contexto
mundial, em sintonia com nossos precei-
tos constitucionais, com nossa política ex-
terna e produzindo a necessária dissuasão
que preconiza a Estratégia Nacional de
Defesa. Nesse contexto, papel importante
cabe ao Estado-Maior da Armada, e deve-
mos nos manter preparados para bem cum-
prir as determinações nesse sentido do
comandante da Marinha.
Destaco o fato de ter sob o meu coman-
do a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ino-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

vação da Marinha, que, com suas organiza- convergências, no propósito da maior


ções militares subordinadas, vem desenvol- sinergia e de obtermos objetivos comuns e
vendo notável trabalho em que, no dia a dia, navegarmos em rumo constante para o por-
são plantadas as sementes que germinarão to seguro da interoperabilidade.
a Marinha do Futuro, importante legado que Mais uma vez, com alegria, destaco a
devemos deixar para os marinheiros de ama- presença de considerável representação da
nhã. Importante ressaltar a crescente inser- Turma Grenfell, que sempre nomeio como
ção de nossa instituição no ambiente de Ci- distante, silenciosa, mas forte torcida pela
ência e Tecnologia brasileiro, aí entendido Marinha e pelos grenfellianos em seu Ser-
no sentido mais abrangente, ou seja, não só viço Ativo. No dia de hoje, com a despedi-
no Ministério da Defesa, no Exército Brasi- da do Almirante Mendonça, fico como seu
leiro e na Aeronáutica, como nas diversas único representante, o que muito me hon-
instituições de Ciência e Tecnologia onde ra, mas estou ciente de que essa responsa-
podemos dar e receber em iniciativas de bilidade será atenuada pela amizade dos
inconteste dualidade. senhores.
Outras duas Organizações Militares a Aos adidos navais e de Defesa, transmito
mim ligadas têm participação direta com o o meu entendimento quanto à importância
presente e o futuro nas carreiras de nossos de seus cargos pela contribuição que trazem
oficiais – a Escola de Guerra Naval e a Co- para o relacionamento entre nossas Marinhas
missão de Promoção de Oficiais. A elas da- e nossos países, o que é também aplicável
rei a minha constante atenção e meu apoio e aos nossos adidos no exterior. Suas presen-
incentivo. Os resultados de suas ações te- ças nesta cerimônia são o testemunho desse
rão decisiva contribuição para a contínua proveitoso intercâmbio, mandatório nesses
construção de uma Marinha melhor. tempos em que a palavra-chave entre as
Não poderia deixar de citar a Represen- Marinhas é a cooperação.
tação Permanente do Brasil junto à Organi- Agradeço às autoridades presentes, ou
zação Marítima Internacional (IMO), que representadas, aos meus familiares e aos
recentemente, em atuação coordenada com componentes da Turma Grenfell, que tra-
o representante permanente junto aos or- zem o calor da amizade, do companheirismo
ganismos internacionais sediados em Lon- e do afeto, sentimentos que me dão a cer-
dres, embaixador Pinta Gama, obteve nova teza do apoio e incentivo de todos.
recondução do Brasil ao Conselho da IMO. Ao Almirante de Esquadra Luiz Umberto
Minha primeira comissão como almirante de Mendonça, agradeço a gentil acolhida,
foi a Subchefia de Organização do Estado- a cuidadosa passagem do cargo e a heran-
Maior da Armada, e pude compreender a ça e exemplo de competência, tirocínio e
importância dessa representação e dos tra- realizações que me deixou, o que somente
balhos realizados no Estado-Maior da Ar- reforça a sua imagem de chefe naval. V. Exa.
mada e na Diretoria de Portos e Costas para me permite assumir as malaguetas do ti-
as atividades marítimas em nosso país. mão do Estado-Maior da Armada procu-
Registro as presenças do chefe do Es- rando, com as mãos firmes, manter o rumo
tado-Maior Conjunto das Forças Armadas, deste navio. Ficou marcante por sua pas-
chefe do Estado-Maior do Exército e chefe sagem na Marinha a sua capacidade, mui-
do Estado-Maior da Aeronáutica, e a eles to necessária nos dias de hoje, de olhar
empenho minha disposição de perseguir a com objetividade, realismo e critério os pro-
meta de que nossas diferenças se tornem blemas e apontar suas soluções. Aplica-se

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

a V. Exa. o ditado que afirma ser a simplici- Representação Permanente do Brasil junto
dade o último patamar da sabedoria. Muito à IMO, expresso os votos de que a nova
obrigado por tudo, e peço permissão para fase de sua vida, que ora se inicia, seja
içar na adriça do mastro do Estado-Maior repleta de felicidades e saúde, que faço
da Armada o sinal Bravo Zulu, que por vá- extensivos a Tininha, filhos e neto.
rias vezes em sua carreira lhe foi destina- Finalmente, que o Nosso Senhor dos
do. Certo de que o sucesso continuará a Navegantes abençoe e ilumine os homens
ser traço marcante de sua atuação no car- e mulheres que guarnecem o Estado-Maior
go que assumirá, em breve, de chefe da da Armada. Viva a Marinha!”

TRANSMISSÃO DE CARGO DE DGPM


Foi realizada, em 28 de novembro último, siasmo e muito trabalho, no limite de nos-
a cerimônia de transmissão de cargo de di- sas competências, saberíamos levar a bom
retor-geral do Pessoal da Marinha. Assu- termo as tarefas atribuídas ou assumidas.
miu o Almirante de Esquadra Luiz Fernando Hoje, me despeço com a inegável satisfa-
Palmer da Fonseca, em substituição ao Al- ção da missão cumprida e, a cada um de meus
mirante de Esquadra Fernando Eduardo comandados, homens e mulheres, civis e mili-
Studart Wiemer. A cerimônia foi presidida tares que compõem o Setor do Pessoal, quero
pelo comandante da Marinha, Almirante de manifestar de público meu reconhecimento e
Esquadra Julio Soares de Moura Neto. compartilhar todas as realizações profissionais
alcançadas, bem como as emoções vividas.
AGRADECIMENTO E DESPEDIDA Foi realmente um privilégio, e motivo de muito
DO ALMIRANTE WIEMER orgulho, ter sido diretor-geral do Pessoal da
Marinha. Foram momentos inesquecíveis em
“Há um ano e dez meses, em igual ceri- que, juntos, fizemos o nosso melhor.
mônia, ao agradecer ao Comandante da É chegada a hora de manifestar os mais
Marinha, Almirante de Esquadra Julio Soa- sinceros agradecimentos. Assim sendo,
res de Moura Neto, pela confiança com que desculpando-me pelas possíveis omissões,
me distinguiu ao indicar-me para o honro- reconheço e parabenizo:
so cargo de diretor-geral, tive a oportuni- – a Diretoria de Saúde da Marinha, em
dade de dirigir-me a todos os meus subor- suas vertentes Assistencial, Médico-Peri-
dinados afirmando estar consciente da im- cial e de Medicina Operativa, que tem se
portância de nossa atividade meio. Disse mostrado imbatível no enfrentamento das
estar seguro em poder contar com a ajuda complexas questões relacionadas ao cres-
e a participação ativa dos titulares das Di- cente custo da saúde. Por outro lado, per-
retorias Especializadas, por conhecer bem manece carreando recursos para constru-
a têmpera que forja o caráter de todos os ção, revitalização e reaparelhamento de
marinheiros, suas qualificações morais e nossas unidades hospitalares e, ainda, para
profissionais, e confiar em suas determina- o aprimoramento técnico de seus profissi-
ção, lealdade e disciplina. Acrescentei, na- onais, tudo isso em busca de um atendi-
quela ocasião que, se existia grande desa- mento eficiente e mais humanizado;
fio, havia também a certeza inabalável em – a Diretoria de Ensino da Marinha, em
sua superação e que, com redobrado entu- seus diferentes segmentos, por perseguir,

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

de maneira incansável, um recrutamento mais a todos os dedicados oficiais, praças e ser-


eficaz. O gerenciamento das obras de ampli- vidores civis desta Diretoria-Geral, pela in-
ação e modernização das escolas e centros cansável busca da qualidade nos trabalhos
de instrução e adestramento, a maturidade e estudos conduzidos, pela assessoria leal
demonstrada no desenvolvimento dos no- e franca que sempre me prestaram, e que
vos modelos de formação e capacitação de possibilitou transpormos eventuais óbices.
praças e oficiais, bem como na elaboração Ao meu Gabinete, manifesto o muito
dos planos de preparo do pessoal para o obrigado pela atenção e cuidado que me
guarnecimento dos novos submarinos; foram dispensados, além da paciência para
– a Diretoria do Pessoal Militar da Mari- com o chefe.
nha, que, com dedicação e profissionalis- Ao Vice-Almirante (RM1) Terenilton Sou-
mo, vem se esmerando para atender aos za Santos, meu assessor especial, que tem a
desafios advindos do aumento de efetivo, seu encargo coordenar a atuação do setor
tanto no aspecto quantitativo como quali- nas ações voltadas ao atendimento dos pro-
tativo. Sempre atenta aos processos de gramas prioritários de Desenvolvimento de
seleção pelo mérito, não tem se descuida- Submarino e Nuclear da Marinha, o meu sin-
do dos fatores motivacionais, bem como cero agradecimento. Como memória viva das
do aprimoramento de seus sistemas ações em curso, sua contribuição será de gran-
informatizados, que contribuirão para a de valor para o meu sucessor.
implementação da Gestão de Pessoas por Tenho a honra de ser subordinado ao
Competências em nossa Força; atual comandante da Marinha, tenaz mari-
– a Diretoria do Pessoal Civil da Mari- nheiro, e de fazer parte de um Almirantado
nha, não tão próxima, mas também muito que trabalha de maneira sinérgica, com ex-
diligente, que realiza um rigoroso controle trema dedicação e em ambiente de camara-
da lotação real, persevera na ação junto aos dagem. Não tenho dúvidas de que seremos
órgãos governamentais para a obtenção dos sempre capazes de manter rumos seguros e
servidores civis necessários à recomposi- velocidades adequadas à concretização dos
ção do Quadro, além de adotar medidas para objetivos maiores de nossa Instituição.
melhor capacitar e motivar essa singular Já de longa data, ao término de cada
parcela de nossa força de trabalho; comando ou direção, me dirijo carinhosa-
– não por fim, a Diretoria de Assistência mente à minha família e, em particular, à
Social da Marinha, que vem contribuindo minha mulher, para agradecer pelo estímu-
de forma efetiva para o incremento do bem- lo sempre presente e me desculpar pelas
estar de nossos marinheiros e marinheiras, constantes ausências, decorrentes dos
com destaque para o desenvolvimento das cargos exercidos. Nesta ocasião, sou leva-
áreas recreativas, esportivas e sociais. O do a mudar a referência. Desta feita, Hele-
aumento expressivo no número de convê- na se fez mais que presente! À frente da
nios, a reestruturação de projetos volta- Seccional Rio de Janeiro das Voluntárias
dos ao público jovem, como também a con- Cisne Branco, ela cumpriu expediente, de
solidação daqueles dirigidos à terceira ida- forma discreta e eficiente, num ato de doa-
de, bem refletem a preocupação com a qua- ção, contribuindo para complementar o tra-
lidade de vida para a família naval. balho assistencial já realizado por nossa
Registro particular reconhecimento ao Marinha. Tenho plena convicção de que, a
meu chefe de Gabinete, o atual Contra-Al- exemplo de outras senhoras voluntárias, a
mirante Marcos Sampaio Olsen, bem como quem faço questão de também reverenciar,

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

ela continuará a fazer parte desta verdadei- ferenciados de seleção, formação,


ra amarra de solidariedade. gerenciamento e incentivo à carreira;
Ao estimado amigo e altamente qualifi- – a prontificação dos Planos de Preparo
cado Almirante de Esquadra Luiz Fernando do Pessoal para o Guarnecimento dos Sub-
Palmer Fonseca, a quem passo o timão desta marinos Convencionais e com Propulsão
Diretoria-Geral, desejo muita felicidade e Nuclear;
serenidade no exercício do cargo, votos – o aprimoramento do nosso Sistema de
que faço extensivos à sua esposa Graça e Recrutamento;
simpática família. – o estabelecimento de critérios e pro-
Que o Senhor dos Navegantes zele sem- cedimentos para o monitoramento do de-
pre pelo nosso maior patrimônio: o pessoal!” sempenho institucional e individual, visan-
do ao pagamento integral da Gratificação
AGRADECIMENTO E BOAS-VINDAS de Desempenho em algumas carreiras de
DO COMANDANTE DA MARINHA servidores civis;
– a implementação da nova sistemática
“Após quase dois anos de intensas e de escolha e seleção de especialidades, a
profícuas atividades, passa hoje a Direto- ser aplicada a partir das turmas de 2011 das
ria-Geral do Pessoal o Almirante de Esqua- Escolas de Aprendizes-Marinheiros, com
dra Fernando Eduardo Studart Wiemer. auxílio da orientação vocacional;
Durante esse período, coube ao Almiran- – a inauguração da Policlínica Naval de
te Wiemer zelar pelo maior patrimônio da ins- Niterói, destinada prioritariamente ao aten-
tituição: os homens e as mulheres que dela dimento dos usuários do Serviço de Saúde
fazem parte e seus dependentes. E, sem som- residentes em Niterói, São Gonçalo e
bra de dúvidas, foi muito bem sucedido. adjacências;
A superação dos desafios inerentes ao – a implantação do Centro de Atenção
cargo, cujas dimensão, complexidade e res- Diária Jutta Batista da Silva, na Unidade
ponsabilidade são indiscutíveis, principal- Integrada de Saúde Mental (Uism), com o
mente ante as necessárias e significativas propósito de promover a reinserção social
mudanças previstas para o atendimento do e o desenvolvimento das habilidades
Plano de Articulação e Equipamento da interpessoais dos portadores de psicoses
Marinha do Brasil (PAEMB), elaborado com graves;
base na Estratégia Nacional de Defesa – a reinauguração dos pavilhões Meireles
(END), apenas corrobora as suas capaci- e Carlos Frederico, incrementando signifi-
dades administrativas e de líder. cativamente a capacidade de atendimento
Dono de indiscutíveis qualidades, en- do Hospital Naval Marcílio Dias (HNMD); e
tre as quais gostaria de elencar a lealdade, – a ativação da Área Recreativa, Espor-
a seriedade, a perspicácia, o denodo, a ra- tiva e Social de São Gonçalo (Ares-SG),
pidez de raciocínio, a inteligência e o dina- visando oferecer às praças e servidores
mismo, o Almirante Wiemer soube condu- civis assemelhados e seus dependentes
zir o seu setor de modo irretocável, logran- facilidades sociodesportivas.
do muitas realizações, dentre as quais faz- Almirante Wiemer! Neste momento em
se mister, neste momento, ressaltar: que Vossa Excelência transmite o honroso
– o estabelecimento de novos Planos cargo, cabe-me reconhecer a dedicação
de Carreira específicos para oficiais e pra- despendida e os resultados alcançados,
ças submarinistas, com procedimentos di- que foram de extrema importância para

296 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

incrementar uma das metas prioritárias da Marinha referentes à gestão do seu pesso-
Força, que, sabidamente, é a elevação do al, integrando de maneira exemplar as ver-
nível de satisfação do pessoal. tentes do pessoal, do ensino, da saúde e
Ao dileto amigo, reitero a minha confian- das assistências social e religiosa.
ça em suas atitudes e decisões e manifesto Devidamente equacionadas ao longo dos
a minha satisfação em permanecer contan- últimos quatro anos, as tarefas que nos per-
do com a sua inestimável colaboração, que mitirão contribuir para a realização do ideal
certamente em muito contribuirá para a mi- de uma Marinha à altura da defesa dos inte-
nha tomada de decisão. Apresento-lhe os resses brasileiros continuarão a demandar
mais sinceros votos de sucesso à frente do de todos nós, da DGPM, criatividade na for-
Setor Operativo e da Diretoria-Geral de Na- mulação de soluções para novos problemas
vegação (DGN), que em breve assumirá, e e obstinação no alcance de objetivos de lon-
de alegrias e realizações, extensivos à sua go prazo, do que é emblemar exemplo a ca-
esposa, D. Helena, filhos e netos. pacidade de operar um submarino nuclear.
Bons ventos, e que Deus o acompanhe! Estejam, portanto, certos os almirantes, ofi-
Seja muito feliz! ciais, praças e funcionários civis do Setor
Ao Almirante de Esquadra Luiz Fernando de Pessoal de que empenharei toda a minha
Palmer Fonseca, dou as boas-vindas e apre- energia e entusiasmo para o atingimento das
sento os meus cumprimentos no momento metas que possibilitem o sucesso no trans-
em que assume o seu primeiro cargo como cendente momento que nossa Marinha vive.
almirante de esquadra, seguro de que seus Estejam certos também da minha completa
reconhecidos atributos profissionais e mo- confiança no trabalho desempenhado por
rais, somados aos seus conhecimentos e cada um, assim como da honra que sinto em
vivência, garantirão a continuidade das ati- poder, junto com todos, dedicar total com-
vidades desenvolvidas pela DGPM, ao mes- promisso para com nossas atribuições, den-
mo tempo em que desejo muitas felicidades tro de um ambiente onde, por óbvio, a hie-
na missão que lhe está sendo confiada.” rarquia, a disciplina, a ética militar e o inte-
resse pelo serviço prevalecerão em todas as
PALAVRAS INICIAIS DO circunstâncias.
ALMIRANTE PALMER Todo marinheiro sente-se honrado com
o desafio que lhe é atribuído. Pela confian-
“Recrutar, planejar, preparar e prover os ça em mim depositada para o exercício do
recursos humanos de uma Marinha que cargo responsável pelo maior patrimônio
cresce quantitativa e qualitativamente em da Marinha, o nosso pessoal, expresso meu
busca da dimensão que a realidade nos agradecimento ao Almirante de Esquadra
impõe e que, para fazê-lo, adequa-se às exi- Julio Soares de Moura Neto, assim como
gências demandadas para o emprego de minha lealdade e integral comprometimen-
tecnologias de ponta, nas quais a gestão to no sentido de ter esta Diretoria-Geral
por competência, a motivação e a capaci- plenamente engajada nas orientações ema-
dade de rapidamente se adequar a mudan- nadas por V. Exa.
ças constantes assumem papéis prepon- Ao Almirante de Esquadra Wiemer, ex-
derantes. Eis o desafio que se me apresen- terno meu sincero muito obrigado pela
ta ao assumir uma Diretoria-Geral do Pes- fidalguia com a qual me recebeu, pela dedi-
soal que por 43 anos vem sendo capaz de cação e precisão com que procurou pôr-
atender eficazmente às necessidades da me a par dos assuntos em andamento no

RMB1 o T/2012 297


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

setor do pessoal e, principalmente, pela Em especial agradeço a presença do


excelência que encontrei nas diversas ati- chefe do Estado-Maior da Armada, Almi-
vidades do setor. Desejo-lhe muito suces- rante de Esquadra Mendonça, e dos de-
so no cargo de comandante de Operações mais membros do Almirantado.
Navais, que assumirá em breve. Muito agradeço a presença de amigos e
Sinto-me extremamente honrado pela colegas de outras singraduras, assim como
presença, nesta cerimônia, tão significativa daqueles da turma Visconde de Ouro Pre-
para mim, do ministro da Marinha e dos co- to. Suas presenças dão um especial signi-
mandantes da Marinha de tempos passa- ficado a este momento que me é tão caro.
dos – os Almirantes de Esquadra Alfredo Agradeço também à minha família, aqui
Karam, Mauro Cesar Rodrigues Pereira, Ser- presente nas pessoas de minha mulher e irmã.
gio Gitirana Florencio Chagasteles e Roberto Suas presenças me fazem sentir, de modo
de Guimarães Carvalho –, assim como de muito mais forte, a alegria e a emoção de as-
ilustres chefes de outrora, aos quais mais sumir este cargo e de poder continuar servir
uma vez expresso a minha gratidão. a Marinha no último posto da carreira.”

EAMPE RECEBE PRÊMIO DA QUALIDADE E


GESTÃO DE PERNAMBUCO
A Escola de Aprendizes-Marinheiros de A Eampe, ao concorrer ao PQGP, permi-
Pernambuco (Eampe) recebeu, em 1o de de- te que os avaliadores apreciem o seu siste-
zembro de 2011, o Prêmio da Qualidade e ma de gestão e, em troca, recebe um diag-
Gestão de Pernambuco (PQGP), no critério nóstico que aponta seus pontos fortes e
Compromisso com a Excelência. A solenida- oportunidades de melhoria.
de de entrega aconteceu no auditório da A Escola tem como meta “ser reco-
Federação das Indústrias do Estado de nhecida como um centro de excelência
Pernambuco (Fiepe), com a participação de no ensino militar-naval até o ano de
mais de 500 pessoas, entre autoridades e 2014”.
personalidades. Esta foi a 9a edição do PQGP. (Fonte: Bono no 924, de 20/12/2011)

ERMB RECEBE PRÊMIO MELHOR ESTAÇÃO DA RNIT


A Estação Rádio da Marinha em Brasília ação nos exercícios, inopinados ou não, na
(ERMB) recebeu, em 30 de janeiro último, o pontualidade das respostas às mensagens
Prêmio Melhor Estação da Rede Naval com prazo a cumprir e na avaliação decor-
Interamericana de Telecomunicações rente da visita de coordenação realizada por
(RNIT) em 2011. A ERMB é a representante militares da Secretaria da RNIT.
da Marinha do Brasil (MB) na RNIT. A pontuação é baseada em critérios ri-
Esta é a oitava vez (1997, 2000, 2003 a gorosos, previstos em instrução regulado-
2007 e, agora, 2011) que a ERMB é agracia- ra. Mais uma vez, a MB se destaca no ce-
da. A premiação resulta de uma acirrada com- nário internacional das telecomunicações
petição entre as Marinhas de 17 países do navais, especialmente ao receber este prê-
Continente Americano componentes da mio no ano em que se comemora o 50o ani-
Rede, sendo concedida à Estação Rádio que, versário de criação da RNIT.
no período de um ano, reunir a maior pontu- (Fonte: Bono no 73, de 2/2/2012)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

PREMIAÇÃO DA OPERAÇÃO CISNE BRANCO 2011

Foi realizada em Natal (RN), em 25 de do Ensino Médio da Escola Estadual de


novembro último, a Cerimônia de Premiação Ensino Fundamental e Médio Professora
da Operação Cisne Branco 2011. A soleni- Luzia Simões Bartoline, da Paraíba; e João
dade foi presidida pelo comandante do 3o Emanuel Oliveira Leite, do Ensino Funda-
Distrito Naval, Vice-Almirante Airton mental do Colégio Gim Wilson, do Ceará.
Teixeira Pinho Filho, e contou com a pre- A Operação Cisne Branco consiste em
sença dos titulares das Organizações Mili- um concurso de redação, realizado em âm-
tares sediadas em Natal, militares bito nacional, envolvendo alunos do 6o ao
palestrantes, alunos premiados, professo- 9o ano do Ensino Fundamental e do Ensino
res, familiares e amigos dos agraciados. Médio. Para disseminar os temas citados,
Os alunos participantes
escreveram redações sobre
os temas: “Navegando na
Amazônia Azul: o mar que
nos pertence” (Ensino Fun-
damental) e “A presença
constante da Marinha do
Brasil até os limites da Ama-
zônia Azul” (Ensino Médio).
Foram vencedores, em âm-
bito estadual, as estudantes
Kamila Maria da Silva, do
Ensino Médio da Escola Es-
tadual Jerônimo Gueiros, e
Thayná de Souza Silva Lima,
VA Airton e alunos vencedores da Operação Cisne Branco 2011
do Ensino Fundamental da
Escola Municipal Dr. Júlio Senna. os oficiais e praças das Organizações Mili-
Na área de jurisdição do Comando do 3o tares subordinadas ao Com3oDN proferi-
Distrito Naval (Com3 DN), as redações clas-
o
ram, em 2011, palestras em 93 escolas, para
sificadas em primeiro lugar foram de autoria aproximadamente 27 mil alunos.
dos alunos Manoel Neto Assis de Oliveira, (Fonte: www.mar.mil.br)

PRÊMIO QUALIDADE RIO 2011 – CRepSupEspCFN É


CATEGORIA PRATA
O Centro de Reparos e Suprimentos Es- aperfeiçoamento constante do seu modelo
peciais do Corpo de Fuzileiros Navais de gestão, alinhado ao Modelo de Excelên-
(CRepSupEspCFN) obteve o diploma PQRio cia de Gestão® (MEG) da UBQ.
– Ciclo 2011 – Categoria Prata do Prêmio Essa foi a segunda candidatura do
Qualidade Rio (PQRio) da União Brasileira CRepSupEspCFN ao prêmio. Ressalta-se que
da Qualidade (UBQ). Isso mostra que o o Centro tem como meta obter a premiação
CRepSupEspCFN, refinando o seu Relató- máxima do certame, a Medalha e Certificado
rio da Gestão Ciclo 2010, vem buscando o Prêmio Qualidade Rio Categoria Ouro. Lan-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

çado em 1999 pelo Governo do Estado do fluminenses que demonstram esforços


Rio de Janeiro e operacionalizado pela União efetivos direcionados à excelência da
Brasileira pela Qualidade – Seccional Rio de gestão, em moldes semelhantes à siste-
Janeiro (UBQ-RJ), o prêmio visa à indução mática do Programa Netuno imple-
da melhoria do desempenho organizacional mentada na Marinha do Brasil. A entrega
das instituições públicas e privadas sediadas do prêmio aconteceu em 20 de dezembro
no Estado do Rio de Janeiro. de 2011, no Theatro Municipal, Rio de
O PQRio representa o reconhecimen- Janeiro.
to do governo estadual às organizações (Fonte: Bono no 924, de 20/12/2011)

PRÊMIO REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA – 2010


Foi entregue, em 20 de dezembro último, propósito de estimular o estudo e a pesquisa
em solenidade na Escola Naval, Rio de Ja- de assuntos técnico-navais, sendo concedi-
neiro (RJ), o Prêmio Revista Marítima Brasi- do, desde 1910, ao autor do trabalho que,
leira de 2010. O premiado foi o Almirante de publicado na revista, for considerado de mai-
Esquadra (FN-RM1) Alvaro Augusto Dias or utilidade para a Marinha. A partir de 1950,
Monteiro, pelo artigo “As Operações de Paz, passou a ser concedido a cada três anos.
o erro de Descartes e os pressupostos do Na ocasião, também foi entregue pelo
imaginário de Castoriadis”, publicado na Diretor do Patrimônio Histórico e Cultural
RMB do 3o trimestre de 2010. O artigo foi da Marinha, Vice-Almirante (Refo -EN) Ar-
selecionado entre os publicados no perío- mando de Senna Bittencourt, o Diploma
do de 2008 a 2010. O prêmio foi entregue ao de Menção Honrosa ao Contra-Almirante
Almirante Monteiro pelo comandante da Reginaldo Gomes Garcia dos Reis, pelo
Marinha, Julio Soares de Moura Neto. artigo “A Terra controlada da Terra ou a
Quarta Dimensão Estratégica: uma conti-
nuação da Geopolítica?”, publicado na
RMB do 2o trimestre de 2010, e ao Contra-
Almirante Adalberto Casaes Júnior, pelo
artigo “O Submarino Nuclear Brasileiro.
Uma visão”, publicado na RMB do 2o tri-
mestre de 2009.
Foi outorgado, ainda, o Diploma Hors
Concours (in memoriam) ao Vice-Almiran-
te Armando Amorim Ferreira Vidigal, pelo
trabalho “O Brasil na América do Sul – uma
Instituído em 1907 pelo Decreto no 6.510, análise político-estratégica”, publicado na
o Prêmio Revista Marítima Brasileira tem o RMB do 3o trimestre de 2008.

OUTORGA DE DIPLOMAS DA UNESCO E ENCERRAMENTO


DO ANO CULTURAL DE 2011
Foi realizada em 2 de dezembro último, na do Mundo da Unesco: Diplomas do Registro
Ilha Fiscal, Rio de Janeiro (RJ), solenidade de Nacional – Mow Brasil 2011, Diplomas do
outorga de diplomas do Programa Memória Registro Regional da América Latina e do

300 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Caribe – Mow Lac 2011 e Registro Internaci- re permanente perigo, por sua relativa fragi-
onal da Unesco 2011. Na mesma ocasião, lidade, pela negligência em prover os cuida-
aconteceu a cerimônia de Encerramento das dos básicos de conservação e salvaguarda,
Atividades Culturais de 2011 da Diretoria do pela obsolescência técnica de suportes e
Patrimônio Histórico e Documentação da até como consequência da ignorância hu-
Marinha (DPHDM), com a leitura das mana, que não lhe dá o devido valor. A pre-
Efemérides Navais correspondentes. servação, a conscientização e o incentivo à
A cerimônia de outorga dos prêmios foi acessibilidade, sem obstáculos, a todos, são,
aberta pelo diretor da DPHDM, Vice-Almi- portanto, objetivos permanentes do Progra-
rante Armando de Senna Bittencourt, tam- ma Memória do Mundo.
bém presidente da Mesa Diretora do Comi- O registro dos conjuntos documentais
tê Nacional do Brasil do Programa Memó- considerados notáveis, no entanto, é a
ria do Mundo da Unesco, que convidou a parcela de maior visibilidade para o públi-
compor a mesa o diretor-geral do Arquivo co. O programa reconhece Patrimônio Do-
Nacional, Jaime Antunes da Silva; o coor- cumental de significado internacional, re-
denador do Setor de Comunicação e Infor- gional e nacional. Para o Brasil, existe um
mação da Unesco, Guilherme Canela Godoi; Comitê Nacional da Mow, criado pela Por-
o presidente do Comitê Regional para Amé- taria no 259, de 2 de setembro de 2004, do
rica Latina e o Caribe do Programa Memó- Ministério de Estado da Cultura. Esse co-
ria do Mundo da Unesco, Vitor Manoel mitê é composto por um máximo de 17 mem-
Marques da Fonseca; e a Sra. Esther Cal- bros, com representantes dos diversos prin-
das Bertoletti. Após, o Almirante cipais setores nacionais referentes à arqui-
Bittencourt proferiu as seguintes palavras: vos ou interessados neles. Participam dele:
“O Programa Memória do Mundo o Arquivo Nacional, a Comissão Nacional
(Mow) da Unesco registra conjuntos no- da Unesco/Ibeec/Ministério das Relações
táveis do Patrimônio Documental, à seme- Exteriores, o Conselho Nacional de Arqui-
lhança da lista do Patrimônio Mundial, tam- vos, a Fundação Biblioteca Nacional, o Ins-
bém da Unesco, que é mais conhecida, por tituto do Patrimônio Histórico e Artístico
nominar cidades e monumentos como Nacional (Iphan), o Ministério da Cultura e
‘Patrimônio da Humanidade’. também representantes dos setores do
Os conjuntos documentais de interesse audiovisual, da história militar, da história
para a memória do mundo podem ser: textu- eclesiástica e religiosa, dos arquivos esta-
ais (manuscritos ou impressos);
audiovisuais (filmes, vídeos ou ar-
quivos sonoros); iconográficos (fo-
tografias, gravuras ou desenhos) ou
cartográficos, tanto em suporte con-
vencional quanto digital, abrangen-
do toda a história da humanidade.
A Unesco criou o programa em
1992, motivada pela conscientização
do mau estado de conservação do
Patrimônio Documental e de seu
acesso deficiente em diferentes par-
tes do mundo. Esse patrimônio cor- Abertura da cerimônia pelo DPHDM

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

duais e municipais, dos arquivos privados, que deve respeitar os limites do fundo ou
das associações de ensino e pesquisa e coleção a que se refere, de maneira que sua
especialistas convidados, com renomado formação orgânica e integridade sejam
conhecimento. identificáveis;
Cabe ao Comitê Nacional da Mow ‘as- – a acessibilidade ao público, ressalva-
segurar a preservação das coleções docu- das as limitações necessárias à sua preser-
mentais nacionais de importância mundial, vação e segurança;
por meio de seu registro na lista do – integridade do documento ou conjun-
Patrimônio Documental da Humanidade, to documental, de natureza arquivística ou
democratizar o seu acesso e criar a consci- bibliográfica.
ência sobre a sua importância e a necessi- Os acervos já constantes do registro
dade de preservá-lo’. Tem, entre outras atri- nacional são de grande relevância para o
buições, a de trabalhar em consonância patrimônio histórico e artístico brasileiro.
com o Comitê Regional da América Latina Não existe prêmio além do Certificado de
e do Caribe (Mowlac) e com o Comitê Mun- Nominação, que é confirmado em portaria
dial, inclusive indicando as nominações do ministro da Cultura, publicada no Diário
que possam ter valor regional ou mundial. Oficial. O Comitê Nacional vem se esforçan-
Todos os anos, o Comitê Nacional Brasil do para obter algum benefício que, sem dú-
da Memória do Mundo vem publicando editais vida, incentivaria maior número de candida-
que estabelecem as regras para a candidatura turas. Mesmo sem prêmio, acredito que o
de acervos de documentos à nominação bra- destaque sinalizado pela nominação facilite
sileira do Mow. Podem propor candidatura, a aprovação de projetos, apresentados a
individualmente ou em grupo, pessoas físicas possíveis patrocinadores, para melhorar
ou jurídicas, de direito público ou privado. condições de preservação e salvaguarda ou
Dos conjuntos documentais candida- possibilitar divulgação.”
tos, são escolhidos os que são julgados Em seguida, após outros membros da
merecedores da nominação, de acordo com mesa proferirem algumas palavras sobre a
as diretrizes do Programa Mow/Unesco, ocasião, foram entregues os certificados
citadas nos editais. Destacam-se entre os aos representantes dos conjuntos docu-
critérios de avaliação: mentais nominados pelo Comitê Nacional
– autenticidade, que significa que sua Brasil da Memória do Mundo em 2011. Re-
fidedignidade e procedência são atestáveis; ceberam os certificados: Arquivo Roquette
– a unicidade e singularidade, o fato de Pinto; Arquivo Rui Barbosa; As Famosas
ser único e insubstituível, ou seja,
algo cuja deterioração ou desaparição
constituiria uma perda para o
patrimônio da humanidade;
– a relevância para a história, a
cultura e para a sociedade, levando-
se em conta as pessoas ou atores
envolvidos em sua geração, os as-
suntos, os temas tratados e sua for-
ma e estilo;
– a organicidade do conjunto do-
cumental de natureza arquivística,

302 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Armadas Portuguesas – 1496-1650; Atas com o tema ‘Rio, Azul da Cor do Mar’, como
da Câmara do Recife – 1761-1892; Fundo decoração. O propósito é aumentar o núme-
Francisco Bhering – a Carta do Brasil ao ro de visitantes anuais do complexo cultural
Milionésimo; Imagens Paulistanas: Álbuns da Marinha de 300 mil para 350 mil.
Fotográficos da Cidade de São Paulo, 1862- Outra exposição, com dois módulos, ‘O
1919; e Matrizes da Gravura da Casa Lite- Poder Naval na Formação do Brasil’ e ‘Ama-
rária do Arco do Cego. zônia Azul’, percorreu oito cidades
Foram os seguintes os conjuntos docu- fluminenses, com patrocínio da Secretaria
mentais que receberam o Registro Regional de Cultura do Estado, propagando a cons-
da América Latina e do Caribe: Arquivo ciência marítima no País.
Abdias do Nascimento; Arquivo do Museu As exposições de longa duração no
de Música de Mariana; Arquivo do Serviço Museu Naval, Ilha Fiscal, Espaço Cultural,
de Proteção aos Índios; Carta Real de Aber- Navios e Helicóptero Museu receberam a
tura dos Portos Marítimos ao Comércio com devida atenção, puderam ser mantidas e
as Nações Amigas; Filme “Limite”, de Ma- até melhoradas. A nova exposição no Na-
rio Peixoto; Fundo Arquivístico Novacap – vio Museu Bauru sobre a participação do
Nova Capital do Brasil – (1892-1980); Fun- Brasil na Segunda Guerra Mundial, princi-
do Carlos Chagas; Fundo Oscar Niemeyer; palmente na Campanha do Atlântico, que
e Viagem Filosófica: Expedição Científica de foi uma das mais importantes e demoradas
Alexandre Rodrigues Ferreira nas Capitani- desse conflito, está em montagem e será
as do Grão-Pará, Rio Negro, Mato Grosso e inaugurada no início de 2012.
Cuiabá (1783-1792). Os projetos de educação progrediram
Os Fundos da Rede de Informações e em 2011. Mantiveram-se os dois teatros,
Contrainformações do Regime Militar no no Museu Naval e no Espaço Cultural, com
Brasil (1964-1985) foram agraciados com o patrocínio externo, e as oficinas com crian-
Certificado de Registro Internacional do Pro- ças; prosseguiu o ‘Projeto Escola’, refor-
grama Memória do Mundo da Unesco 2011. çado pelo ‘Uma Tarde no Museu’, que é
Após a entrega dos diplomas, foi iniciada patrocinado, em que ônibus buscam esco-
a Sessão Solene de Encerramento das Ativi- las públicas e as trazem para visitar o com-
dades Culturais de 2011 da DPHDM, com o plexo cultural todos os dias úteis – este
seguinte discurso do diretor do órgão: ano vieram quase cem escolas; e conti-
“Este ano se mostrou inicialmente muito nuou-se o projeto iniciado em 2010, ‘Uma
difícil. Superaram-se, no entanto, as dificulda- Aula no Museu’, em que colégios trazem
des de recursos financeiros e pode-se afirmar suas turmas para aulas de História do Bra-
que 2011 foi também de grandes realizações. sil lecionadas por servidores desta Direto-
Montou-se a exposição temporária ‘Azul ria que possuem formação universitária em
da Cor do Mar’ no Espaço Cultural da Mari- História, alguns com mestrado, no circuito
nha, mostrando a importância do mar para o da exposição de longa duração ‘O Poder
Brasil e enfatizando a existência da ‘Amazô- Naval na Formação do Brasil’, do Museu
nia Azul’, que, se explorada visando à Naval – este ano, atendeu a aproximada-
sustentabilidade e cuidadosamente defen- mente 1.100 alunos, inclusive de alguns
dida de cobiça externa, trará prosperidade dos melhores colégios do Rio de Janeiro.
para os brasileiros. Buscando originalida- Continuou-se a publicar os periódicos,
de, usaram-se fantasias e alegorias da Esco- com destaque para a Revista Marítima Bra-
la de Samba Portela, que desfilou em 2011 sileira, que já existe desde 1851, e para a

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

revista Navigator, esta com artigos de His- participação em simpósios, no Brasil e no


tória Marítima. exterior, e cursos de pós-graduação.
A manutenção do Patrimônio Histórico Acredito ser muito importante trabalhar
teve muita atenção. A Ilha Fiscal passou com bons profissionais, bem motivados e
por uma boa recuperação. Os danos agra- experientes e atribuo à equipe os bons re-
vados pela grande ressaca de 2010, princi- sultados obtidos.”
palmente no Cais Norte, que estava com Após o discurso, foi entregue a Meda-
risco de desabamento, foram reparados, e lha Colaborador Emérito ao Capitão de Fra-
outras obras restauraram a beleza gata (CA) Eduardo Carvalho da Silva e ao
arquitetônica dos prédios. Deu-se também Primeiro-Sargento (EL) Gilcimar Ayres da
atenção ao conforto dos visitantes, com Silva. A Medalha, criada em 1982 e regula-
novas instalações de cafeteria que serão mentada em 1990 por Portaria do então Ser-
inauguradas em 2012. Houve também obras viço de Documentação da Marinha, tem a
de conservação nos prédios do Arquivo finalidade de agraciar as pessoas físicas e
da Marinha, da Biblioteca da Marinha e do entidades que prestaram serviços relevan-
Museu Naval. Os navios e embarcações, tes à Diretoria do Patrimônio Histórico e
exceto o Submarino Museu Riachuelo, fo- Documentação da Marinha.
ram mantidos adequadamente e estão em Na sequência, encerrando as comemo-
excelentes condições. O submarino passa- rações, foram lidas as Efemérides Navais
rá por um grande período de manutenção, 2011, aqui transcritas:
já em contratação, em 2012. O Laurindo “Nestes últimos anos, os estudos bio-
Pitta realizou mais de 450 viagens este ano. gráficos ganharam nova dimensão e reto-
Duas boas novidades para 2012 são: a maram a importância de outrora, agora não
extensão da Rede de Bibliotecas Integradas mais sob a luz de uma certa visão heroica e
da Marinha para uma nova rede, que englo- literária dos grandes vultos nacionais, mas
ba todas as bibliotecas das Forças Arma- contextualizando histórias de vida dentro
das, sob a orientação do Ministério da De- de uma abordagem conhecida como Nova
fesa; e a edição, pela Marinha, de um atlas História.
digital dos locais de naufrágios de interesse Instituições como a Marinha do Brasil
histórico da costa do Brasil. Esse Atlas pos- têm a sua história e tradições formadas ao
sibilitará uma melhor fiscalização, pela Ma- longo do tempo de maneira indissociável à
rinha, do patrimônio submerso e, possivel- biografia dos que por ela passaram, traje-
mente, uma política de preservação de síti- tórias singulares de vida, que trazem à tona
os arqueológicos submersos, pelo Iphan e não somente a nossa história, mas também
outros órgãos envolvidos. Sobre patrimônio a do nosso tempo e do nosso país.
histórico subaquático, a Diretoria, conjun- A história marítima e naval brasileira bus-
tamente com o Instituto Histórico e Geográ- ca relatar e redescobrir, por meio dos estu-
fico Brasileiro, realizou um seminário, em dos biográficos, personagens marcantes
novembro de 2011, no IHGB, que contou que construíram a Marinha e contribuíram
com a participação da comunidade científi- de forma coletiva para a sua realidade atual;
ca, representada pela Sociedade de Arque- suas histórias são de importância fundamen-
ologia Brasileira; do Iphan; da Marinha e do tal para o presente e para o futuro.
Ministério Público. Assim, estamos reunidos nesta sessão de
O aperfeiçoamento profissional do pes- efemérides para relembrar almirantes do pas-
soal da Diretoria foi bem atendido, com boa sado que prestaram importantes serviços à

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Marinha do Brasil e completaram em 2011 vedo Leite, Vice-Almirante (EN) Ubaltino


centenário e bicentenário de nascimento. Castel Ruiz de Azevedo, Vice-Almirante
– Bicentenário de Nascimento Luiz Gonzaga Döring, Vice-Almirante Sávio
O homenageado deste ano é o Almiran- Duarte Nunes, Vice-Almirante Aureo
te Joaquim Raymundo de Moraes Lamare Dantas Torres e Vice-Almirante Mário Car-
(Visconde de Lamare). Iniciou sua carreira neiro de Campos Esposel.
na Marinha em 1826, com 14 anos de idade. O Almirante de Esquadra Helio Ramos
Durante a Guerra contra Oribe e Rosas de Azevedo Leite iniciou sua carreira na
(1850-1852), comandou o vapor Pedro II, Marinha em 1929, com 17 anos de idade.
que teve papel destacado na Passagem de Durante a Segunda Guerra Mundial, exer-
Tonelero, local de estreitamento do Rio ceu o comando do Caça-submarino
Paraná, onde o inimigo instalara peças de Gurupá, em diversas missões de comboio
artilharia e concentrara 2.800 homens. Este a navios mercantes ao longo do litoral bra-
ponto fortificado fora vencido em 1851, sileiro. Em 1965 alcançou o Almirantado.
possibilitando o desembarque de tropas rio Entre os principais comandos e direções
acima. Na Guerra da Tríplice Aliança con- como oficial general destacamos: Coman-
tra o Governo do Paraguai (1864-1870), já do do 8o Distrito Naval (com sede em São
tendo alcançado o Almirantado, destacou- Paulo), Escola Naval (instituição de ensi-
se na liberação dos rios Paraná e Paraguai, no superior da Marinha do Brasil que for-
permitindo o avanço das forças aliadas. Foi ma oficiais de Marinha, situada na Ilha de
nomeado ministro da Marinha por duas Villegagnon) e Diretoria de Pessoal da
vezes e teve sua reforma no posto de almi- Marinha. Foi ministro e presidente do Su-
rante em 1882. premo Tribunal Militar. Teve a sua reforma
– Centenário de Nascimento no posto de almirante de esquadra, em 1981.
Destacamos os almirantes do Corpo da O Vice-Almirante (EN) Ubaltino Castel
Armada e do Corpo de Engenheiros Na- Ruiz de Azevedo ingressou na Marinha em
vais que alcançaram o posto de Oficial Su- 1929, com 17 anos de idade. Pelo Decreto no
perior em meados da década de 40, período 1.270, de 6 de agosto de 1942, foi transferido
caracterizado pelas tentativas de para o Corpo de Engenheiros Navais. Du-
reaparelhamento naval com o despertar do rante a Segunda Guerra Mundial, serviu no
novo Arsenal de Marinha da Ilha das Co- Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, onde
bras, mas principalmente marcado pelo in- se destacou na implantação de modificações
gresso do Brasil na Segunda Guerra Mun- nas máquinas e na ventilação da Corveta
dial. O Brasil se viu envolvido nessa guer- Cananeia, embarcação que realizou 64 mis-
ra porque submarinos alemães e italianos sões de comboio a navios mercantes. Após
passaram a atacar e afundar navios mer- galgar o Almirantado, em 1960, foi nomeado
cantes brasileiros, com o propósito de in- subdiretor de Engenharia Naval e, mais tar-
terromper o transporte marítimo de merca- de, diretor de Engenharia da Marinha. Des-
dorias para seus inimigos. Nesse conflito, ligou-se do serviço ativo em 1966, no posto
a Marinha de Guerra brasileira cumpriu sua de vice-almirante.
missão de manter nossas linhas de comu- O Vice-Almirante Luiz Gonzaga Doring
nicações marítimas abertas e promover a iniciou sua carreira naval em 1928, com 17
defesa da navegação mercante dos Alia- anos de idade. Durante a Segunda Guerra
dos. Os homenageados deste ano são: Al- Mundial, integrou as Forças de Defesa
mirante de Esquadra Helio Ramos de Aze- Local, como imediato e posteriormente co-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

mandante interino do Monitor Paraguaçu, Guerra Mundial, participou de comboios a


onde realizou diversas missões de patru- navios mercantes, servindo como imedia-
lha e vigilância no Mato Grosso e no inte- to da Corveta Cananeia. Alcançou o Almi-
rior da Baía de Todos os Santos, em Salva- rantado em 1964. Como oficial general, foi
dor. Em 1963, galgou o posto de contra- chefe do Gabinete do Ministro da Mari-
almirante. Entre os principais comandos e nha, diretor de Eletrônica da Marinha e co-
direções no posto de oficial general, des- mandante do 5o Distrito Naval, então com
tacamos: Comando da Força Aérea Naval, sede localizada em Santa Catarina. Desli-
chefe do Estado Maior da Esquadra, co- gou-se do serviço ativo em 1971, no posto
mandante do Adestramento da Esquadra e de vice-almirante.
Comando do 3o Distrito Naval (com sede O Vice-Almirante Mário Carneiro de
em Natal). Desligou-se do serviço ativo no Campos Esposel iniciou sua carreira naval
posto de vice- almirante, em 1968. em 1929, com 17 anos de idade. Durante a
O Vice-Almirante Sávio Duarte Nunes Segunda Guerra Mundial, serviu no Grupo
ingressou na Marinha em 1930, com 18 anos de Patrulha do Sul, atuando na defesa do
de idade. Durante a Segunda Guerra Mun- litoral brasileiro. Após galgar o Almiranta-
dial, participou de comboios a navios mer- do, em 1964, assumiu o comando da Força
cantes, servindo a bordo do Cruzador Rio Aérea Naval, comandou o 7o Distrito Na-
Grande do Sul. Após alcançar o Almiranta- val (com sede em Brasília) e exerceu o car-
do em 1965, foi nomeado chefe do Gabinete go de diretor de Pessoal da Marinha. Des-
do Ministro da Marinha e, posteriormente, ligou-se do serviço ativo em 1970, no pos-
chefe do Grupo Executivo e Coordenação to de vice-almirante.
do Plano Diretor, que é o planejamento ad- As breves palavras ditas aqui não ex-
ministrativo da Marinha do Brasil para o exer- pressam todas as contribuições dos ho-
cício financeiro que permanece em vigor até menageados, nem conseguem retratar toda
os dias atuais. Desligou-se do serviço ativo a herança que esses chefes navais deixa-
em 1968, no posto de vice-almirante. ram para a Marinha do Brasil. A homena-
O Vice-Almirante Aureo Dantas Torres gem prestada, ainda que singela, é um jus-
iniciou sua carreira na Marinha em 1928, to reconhecimento aos que dedicaram gran-
com 17 anos de idade. Durante a Segunda de parte de suas vidas à defesa do Brasil.”

WÄRTSILÄ FORNECERÁ PROJETO PARA NAVIOS DE


LANÇAMENTO DE LINHAS

A empresa finlandesa Wärtsilä, líder glo- capacidade de 550 toneladas em tubos de


bal no fornecimento de motores e presta- alta tensão, serão utilizados para conectar
ção de serviços para embarcações e usi- poços em águas com mais de 2.500 metros
nas termelétricas, desenvolverá o projeto de profundidade às unidades de produção
e o sistema de propulsão de dois navios de flutuantes. Eles irão operar em águas bra-
lançamento de linhas flexíveis (PLVs) que sileiras por meio de um contrato de
serão operados no Brasil por uma joint afretamento de longo prazo para a
venture entre a Odebrecht Óleo & Gás e a Petrobras.
francesa Technip, multinacional francesa O contrato representa um grande avan-
da indústria de energia. Os navios, que têm ço para a divisão de projeto naval da

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Wärtsilä no Brasil e reforça a posição de principalmente para a instalação de umbili-


liderança da empresa na atividade, com a cais e linhas flexíveis do tipo flowline e
concepção de navios para um dos princi- risers.
pais estaleiros do mundo. O projeto do Características das embarcações:
novo VS 4146 PLV foi concebido segundo – Modelo: VS 4146 PLV (Pipe Laying
as rigorosas exigências dos armadores e Vessel)
da Petrobras. As embarcações foram con- – Comprimento: 145,60 m
cebidas com foco na otimização do consu- – Boca Moldada: 30 m
mo de combustível nas condições de pro- – Pontal Moldado: 12,7 m
jeto e para atender à necessidade de efici- (Fonte: Press release da Approach As-
ência nas operações. Elas serão utilizadas sessoria de Imprensa e Comunicação)

NOVA ESTAÇÃO ANTÁRTICA BRASILEIRA


SERÁ CONCLUÍDA ATÉ 2018
A nova Estação Antártica brasileira de- As sugestões para a retomada do pro-
verá ficar pronta até 2018. O anúncio foi fei- grama antártico nacional foram feitas por
to em 6 de março último pelo ministro da representantes da Marinha e do Ministé-
Defesa, Celso Amorim, em audiência públi- rio da Ciência, Tecnologia e Inovação em
ca no Senado Federal. Segundo o ministro, reunião com o ministro da Defesa, em 2 de
a nova estação deverá ser concluída, na março. Segundo divulgou o Ministério, a
melhor hipótese, no verão 2016-2017 ou nova estação terá um projeto arquitetônico
2017-2018. A nova base deverá ser erguida moderno, adaptado às atuais exigências da
no mesmo local da anterior, a Estação An- comunidade científica brasileira.
tártica Comandante Ferraz (EACF), destruída Um dos presentes na reunião foi o se-
em 25 de fevereiro por um incêndio que ma- cretário da Comissão Interministerial para
tou dois militares e deixou um ferido. os Recursos do Mar (Cirm), Contra-Almi-
O governo estima que o custo médio para rante Marcos José de Carvalho Ferreira.
o levantamento da nova estrutura da EACF Segundo ele, os indícios são de que o in-
deve ficar em torno de R$ 100 milhões. O cêndio começou na casa de máquinas, onde
projeto detalhado da nova estação deve ser havia três geradores a diesel. As causas
finalizado no verão 2013-2014 e, em segui- do incêndio só deverão ser conhecidas
da, submetido à aprovação dos membros após a conclusão da perícia, feita por sete
do Tratado Antártico, que engloba os paí- integrantes da Marinha. O resultado do tra-
ses que realizam pesquisas no continente. balho dos peritos deverá integrar o inqué-
rito policial militar instaurado. O prazo para
investigar o incidente é de 40 dias, prorro-
gáveis por mais 20.
O relato feito durante a reunião aponta
que o incêndio na EACF não consumiu os
módulos científicos, os tanques de com-
bustível, o heliponto e os refúgios (que
servem de abrigo de emergência). Essas
estruturas não foram atingidas por esta-
Estação Antártica Comandante Ferraz rem isoladas do prédio principal, onde fi-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

taram apoio. A Força Aérea Brasileira (FAB)


disponibilizou uma aeronave, que seguiu
para Punta Arenas, a fim de trazer de regres-
so ao Brasil o pessoal que estava na EACF.
O secretário da Cirm esteve em Punta Are-
nas coordenando as ações necessárias.
Quando da chegada dos corpos dos
militares vitimados ao Brasil, foi realizada
Imagem do incêndio na EACF uma homenagem póstuma na Base Aérea
do Galeão, Rio de Janeiro, com a presença
cava a parte habitável e os laboratórios de do vice-presidente da República, Michel
pesquisa. Ainda segundo esse relato, tan- Temer; do ministro da Defesa, Celso
to os tanques de combustível como o paiol Amorim; e do comandante da Marinha, Al-
de mantimentos estão em bom estado. mirante de Esquadra Julio Soares de Moura
As atividades da Marinha do Brasil Neto. Este discorreu sobre as carreiras dos
(MB) e de instituições de pesquisa na “dois heróis que realizaram o sacrifício úl-
EACF estão interrompidas desde a ocor- timo, que ofereceram suas vidas no cum-
rência do incêndio na base da MB no “Con- primento do dever”. Os dois militares fo-
tinente Gelado”. ram promovidos, post mortem, ao posto de
Na ocasião do incidente, o Navio-Polar segundo-tenente.
Almirante Maximiano, da MB, que estava
em Punta Arenas, no Chile, partiu de lá em
direção à EACF para prestar a ajuda neces-
sária. Dois navios da Marinha da Argentina
e dois botes da estação polonesa de
Arctowski também se posicionaram nas
imediações da EACF, apoiando as ações.
Vinte marinheiros do navio de pesquisa
HMS Protector, da Marinha britânica, ainda
ajudaram no combate ao incêndio após a
evacuação da Estação. Além disso, três he- A chegada dos militares mortos ao RJ
licópteros da base chilena Eduardo Frei pres-
O Segundo-Tenente Carlos Alberto
Vieira Figueredo tinha 47 anos e ingressou
na Marinha como marinheiro no Comando
do 2o Distrito Naval (Salvador, BA). Ao lon-
go de 30 anos de serviço, exerceu a função
de supervisor eletricista em diversas Orga-
nizações Militares por onde passou, inclu-
indo a EACF.
O Segundo-Tenente Roberto Lopes dos
Santos tinha 45 anos e iniciou sua carreira
na Marinha na Escola de Aprendizes-Mari-
nheiros de Santa Catarina. Marinheiro ex-
A EACF após o incêndio periente, encontrava-se em sua terceira

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

comissão na Estação Antártica Comandan- Os 30 pesquisadores, um alpinista que


te Ferraz, tendo composto o Grupo-Base prestava apoio às atividades de pesquisa,
em outras duas ocasiões – 2001 e em 2007 um representante do Ministério do Meio
–, o que o tornava uma referência, tamanha Ambiente e os 12 funcionários do Arsenal
sua familiaridade com a Estação. de Marinha do Rio de Janeiro que estavam
A Estação Antártica Comandante Ferraz na Estação no momento do acidente foram
marcou a presença brasileira na Antártica e transferidos por helicópteros chilenos para
começou a ser montada em 1983, em uma a Base Eduardo Frei, de onde partiram em
praia da Enseada Martel, ao fundo da Baía aeronave da Força Aérea Argentina para a
do Almirantado, na Ilha Rei George – a cidade de Punta Arenas, no Chile. Todos
maior das ilhas do Arquipélago das chegaram ao Brasil na madrugada do dia
Shetlands do Sul. Antes porém, em 1982, a 27 de fevereiro, transportados por aerona-
Marinha já atuava no continente, inician- ves da Força Aérea Brasileira.
do a sua primeira expedição ao local na No dia do acidente, o chefe da EACF e
Operantar I. mais três integrantes do Grupo-Base
O comandante da Marinha assim se ex- retornaram à Estação para uma avaliação
pressou sobre o assunto, em 29 de feverei- inicial, constatando que aproximadamente
ro, para toda a Marinha: 70% das instalações foram destruídas pelo
“Meus Comandados! fogo. O prédio principal da EACF, onde fica-
Este é um momento de grande pesar para vam a parte habitável e alguns laboratóri-
a Marinha do Brasil e para todos os homens os de pesquisas, foi completamente atingi-
e mulheres que compõem esta Força. O in- do pelo incêndio. Permaneceram intactos
cêndio ocorrido na Estação Antártica Co- os refúgios (módulos isolados para casos
mandante Ferraz, que vitimou o Suboficial de emergência); os laboratórios de
(EL) Carlos Alberto Vieira Figueredo e o Pri- meteorologia, de química e de estudo da
meiro-Sargento (EL) Roberto Lopes dos San- alta atmosfera; os tanques de combustí-
tos; e provocou ferimentos no Primeiro-Sar- veis; e o heliponto da Estação, que são
gento (MO) Luciano Gomes Medeiros, atin- estruturas isoladas da principal.
giu a todos nós. Os peritos da Marinha já embarcaram
O incêndio na praça de máquinas, local para Antártica, a fim de analisar o ocorrido
onde ficavam os geradores de energia da e as causas que originaram o incêndio.
EACF, iniciou-se por volta de 2 horas (ho- Perdemos dois bravos marinheiros, ver-
rário de Brasília) de sábado, 25 de feverei- dadeiros heróis, que se empenharam no
ro. Ao tomarem conhecimento do fato, os combate ao incêndio, com o sacrifício de
15 integrantes do Grupo-Base, militares res- suas próprias vidas. Homenagens póstu-
ponsáveis pela manutenção e operação da mas foram prestadas a esses militares, em
Estação, prontamente iniciaram o combate cerimônia militar realizada na Base Aérea do
ao incêndio. Galeão, na manhã do dia 28 de fevereiro,
O militar ferido foi removido para a Esta- ocasião em que foram promovidos ao posto
ção Arctowski, da Polônia, para receber os de segundo-tenente e admitidos na Ordem
primeiros socorros e, posteriormente, para a do Mérito da Defesa, além de receberem a
Base Eduardo Frei, do Chile. Atualmente, Medalha Naval de Serviços Distintos.
encontra-se no Hospital Naval Marcílio A Marinha tem prestado total apoio aos
Dias, onde permanece em tratamento e ob- familiares dos militares falecidos e do feri-
servação, com estado de saúde estável. do, nesse momento de extrema dor.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

projeto da nova Estação, que a Marinha


pretende construir a partir da próxima Ope-
ração Antártica, a Operantar XXXI.”
Em 12 de janeiro último, havia sido come-
morado o 30o aniversário do Programa An-
tártico Brasileiro (Proantar). O comandante
da Marinha, também coordenador da Cirm,
em visita à Estação Antártica Comandante
Ferraz e ao NPo Almirante Maximiano em
10 de janeiro, durante a Operantar XXX.
Naquela ocasião, o Almirante Moura Neto
proferiu o seguinte discurso:
A homenagem aos mortos na EACF
“O Continente Gelado, dotado de ca-
A Secretaria da Comissão Interministerial racterísticas ímpares, tem influência direta
para os Recursos do Mar (Secirm) começou no clima do planeta e, em especial, no do
o planejamento da reconstrução da nova Brasil, constituindo-se em verdadeiro la-
EACF, importante polo de pesquisas em que boratório natural, onde é possível desven-
o Brasil vem contribuindo de forma significa- dar alguns dos segredos da atmosfera, dos
tiva para o futuro do Continente Antártico. oceanos e da vida na Terra. Esse papel foi
Vale ressaltar que o Programa Antártico evidenciado, mais precisamente, após a
Brasileiro (Proantar) é um Programa de Es- realização do Ano Geofísico Internacional
tado, por isso as pesquisas científicas con- de 1957/1958, quando foram lançadas as
tinuarão, no que for possível, por meio dos bases da sua ocupação pacífica e voltada
recursos disponíveis, no Navio Polar Al- para a ciência, que culminaram com o Tra-
mirante Maximiano, no Navio de Apoio tado da Antártica.
Oceanográfico Ary Rongel, nos laborató- Assinado em Washington, em 1o de de-
rios, abrigos, refúgios e acampamentos, zembro de 1959, o acordo entrou em vigor
que não foram danificados. no dia 23 de junho de 1961, com 12 signatá-
O Brasil, embora sendo um país tropi- rios. Atualmente, conta com 48 partes con-
cal, é respeitado em âmbito internacional tratantes, sendo 28 membros consultivos,
pelo trabalho científico que desenvolve com direito a voto.
naquela região gelada, coordenado pela Decorrente de amplas motivações cien-
Comissão Interministerial para os Recur- tíficas e político-estratégicas, o Brasil ade-
sos do Mar (Cirm), colegiado composto por riu ao Tratado em 1975. Em 12 de janeiro de
18 ministérios e instituições governamen- 1982, foram plantadas as sementes que
tais. Além disso, o Proantar permite à Mari- deram origem ao Proantar, com a assinatu-
nha, com o apoio da Força Aérea Brasilei- ra dos Decretos no 86.829 e 86.830, que re-
ra, realizar anualmente uma das maiores sultaram na criação da Comissão Nacional
operações de apoio logístico em termos de para Assuntos Antárticos (Conantar) e na
complexidade e distância. atribuição, à Comissão Interministerial para
A experiência acumulada durante os 30 os Recursos do Mar (Cirm), do encargo de
anos do Proantar, os 28 anos de operação elaborar o projeto para a implementação
ininterrupta e exitosa da EACF, assim como daquele importante Programa.
o estudo detalhado das causas do incên- Ainda em 1982, a Marinha adquiriu o
dio, certamente serão imprescindíveis no navio dinamarquês Thala Dan, que rece-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

beu o nome de Navio de Apoio Oceanográ- modernizada e ampliada para atender às


fico (NApOc) Barão de Teffé. Em dezembro demandas científicas crescentes, contan-
do mesmo ano, o navio partiu do Rio de do, presentemente, com um espaço de cer-
Janeiro, dando início à primeira expedição ca de 2.600 m2, dotado de instalações e equi-
aos desconhecidos e perigosos mares do pamentos que permitem manter 60 pessoas
sul, na Operantar I, tendo recebido as tare- com conforto e segurança, além de propici-
fas de realizar reconhecimentos hidrográfico, ar o desenvolvimento de uma média anual
oceanográfico e meteorológico no noroeste de 20 projetos de pesquisa.
da região e de selecionar o local onde seria Evidenciando a constante preocupação
instalada a futura Estação. com a preservação do meio ambiente, a
O sucesso alcançado na comissão re- EACF deverá ter o seu Sistema de Gestão
dundou no reconhecimento do esforço Ambiental implantado no corrente ano,
despendido, culminando, no dia 12 de se- segundo padrões internacionais, além do
tembro de 1983, com a inclusão do País no que, fruto de planejamento conjunto com a
seleto grupo de membros consultivos, co- Petrobras, passará a ser abastecida de com-
locando-nos em posição privilegiada no bustível, por meio de dutos ligados aos
cenário global e em condições de partici- navios, oferecendo maior segurança e ra-
par ativamente das importantes decisões pidez na execução das fainas. Soma-se aos
sobre o futuro da Antártica. grandes projetos em curso a instalação de
Estruturado em três vertentes – a da Ci- um motogerador a etanol para fornecimen-
ência & Tecnologia, sob a responsabilidade to de energia. A consecução de tal empre-
do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ino- endimento, que é resultado de uma parce-
vação; a ambiental, inerente ao Ministério ria com a Vale Soluções em Energia (VSE) e
do Meio Ambiente; e a logístico-operacional, com a Petrobras, colocará o Brasil em posi-
coordenada pela Marinha, órgão da estru- ção de destaque tecnológico, pela utiliza-
tura do Ministério da Defesa – o Proantar ção pioneira de biocombustível na região,
vem realizando, ao longo dos últimos 30 com a consequente redução da emissão de
anos, pesquisas científicas de qualidade em gases poluentes.
diversas áreas do conhecimento. Atendendo aos anseios da comunidade
Em agosto de 1983, um quadrimotor C- científica, que estava focada na necessidade
130 Hércules da Força Aérea Brasileira de se dispor de uma plataforma com instala-
(FAB) pousou na base chilena Eduardo Frei ções adequadas e apta a operar em áreas afas-
pela primeira vez, fato que se repete até tadas da Baía do Almirantado, foi adquirido
hoje, uma vez que a Força Aérea desempe- em 1994 o navio norueguês Polar Queen,
nha papel fundamental ao realizar voos de rebatizado como NApOc Ary Rongel, que
apoio durante o verão e o inverno austrais. veio a substituir o Barão de Teffé a partir
Em 6 de fevereiro de 1984, foi inaugura- daquele ano. Dotado de laboratórios de
da a Estação Antártica Comandante Ferraz meteorologia, oceanografia física e biologia,
(EACF), inicialmente composta por apenas com possibilidade de transportar 2.400 m3 de
oito módulos, com 120 m2 no total, que abri- carga e de operar com dois helicópteros, re-
gavam, no máximo, 12 pessoas. Localizada presentou um grande avanço como suporte
na Península Keller, no interior da Baía do logístico e de apoio à pesquisa.
Almirantado, Ilha Rei George, passou a ser A última grande realização ocorreu no iní-
ocupada ininterruptamente a partir de 1986. cio de 2009, com a obtenção do navio Ocean
Desde a sua implantação, ela vem sendo Empress, construído nos Estados Unidos da

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

América e modernizado na Noruega, e que isso, com a mesma dedicação e tenacidade


passou a ser chamado de Navio Polar (NPo) dos seus primórdios. Para tal, durante os
Almirante Maximiano, incrementando, con- anos de 2010 e 2011 a Cirm realizou estu-
sideravelmente, a capacidade de atuação que, dos para reavaliá-lo e propor ações para
àquela altura, já não podia ser atendida inte- orientar os seus próximos dez anos.
gralmente pelo Ary Rongel. O Proantar representa uma grande con-
Transcorridas três décadas de trabalho, quista e é um marco da competência brasi-
a caminhada prossegue e novos desafios leira, gerando conhecimentos inovadores
terão que ser superados, e o Proantar de- e contribuindo de modo relevante para a
verá estar adequadamente preparado para formação de gerações de pesquisadores,
além de garantir que o País será ouvido
quando o mundo voltar a discutir o que irá
suceder com o Continente Gelado.
Assim, salientar a importância desse bem
sucedido programa de Estado é também pres-
tar uma homenagem às pessoas que
envidaram seus maiores esforços para tornar
possível o sonho de ver o Pavilhão Nacional
tremulando no extremo sul do planeta.”
(Fontes: www.mar.mil.br, Bonos Especi-
ais nos 18 e 131/2012, http://www.royal.navy.
navy.uk, http:/ultimosegundo.ig.com.br,
O NPo Almirante Maximiano pronto para http://noticias.terra.com.br e http://
apoiar a nova estação antártica brasileira oglobo.globo.com)

PROJETO ESPORTIVO DO VELEIROS DO SUL É APROVADO


O Projeto Vela Olímpica Veleiros do Sul Por meios de incentivos, o Clube reali-
foi aprovado por Comissão Técnica vincu- zou campeonatos internacionais e fomen-
lada ao Ministério do Esporte, conforme re- tou a formação de velejadores no seu Nú-
solução publicada no Diário Oficial da União cleo de Vela de Alto Rendimento. Com o
em 27 de dezembro de 2011 e de acordo com benefício, também adquiriu, no início do
a Lei de Incentivo do Governo Federal. Um ano passado, seis barcos Elliott 6M, mo-
outro projeto do Clube Veleiros do Sul, lo- delo que será utilizado nas Olimpíadas de
calizado em Porto Alegre (RS), teve o prazo Londres.
de captação prorrogado: o Projeto Treina- (Fonte: Press release da Camejo Comu-
mento de Alto Nível de Match Race. nicação Empresarial)

REFLUTUAÇÃO DE CHATA NA ANTÁRTICA


A Marinha do Brasil (MB) informou, em Ferraz (EACF), quando realizava transpor-
nota oficial divulgada em 3 de março últi- te do óleo gasoil arctic, foi reflutuada e
mo, que a chata de óleo que havia afunda- levada para terra, onde se encontra em se-
do no final do ano passado, nas proximida- gurança, sem causar qualquer dano
des da Estação Antártica Comandante ambiental.

312 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

No terceiro dia, 1o de março, a chata foi


levantada parcialmente para que as equi-
pes pudessem passar as cintas por baixo
de seu casco, de forma que toda a sua es-
trutura fosse içada pelo guindaste do na-
vio Gulmar Atlantis. O trabalho teve que
ser interrompido diversas vezes, tendo em
vista que as condições meteorológicas rei-
nantes não permitiam que os mergulhado-
res executassem suas tarefas com a devida
O Gulmar Atlantis, cedido pela Petrobras, iça a segurança. Essas atividades foram conclu-
chata de óleo ídas na manhã de hoje (3). Após a coloca-
ção deste dispositivo, ela foi içada ao lado
A nota esclarece, ainda: do navio. Uma vez na superfície, os mergu-
“ A reflutuação foi conduzida por mer- lhadores instalaram uma série de
gulhadores embarcados no navio Gulmar flutuadores ao longo de seu casco e, após
Atlantis, cedido pela Petrobras, apoiado isso, iniciou-se o bombeamento do óleo
pelo Navio Polar (NPo) Almirante que estava nos seus tanques, para ser ar-
Maximiano, da MB. A operação levou cer- mazenado em recipientes que foram
ca de cinco dias para ser executada. disponibilizados para o navio. Com a chata
No primeiro dia, 28 de fevereiro, foi feita flutuando em segurança, os botes do NPo
uma inspeção por meio de um Veículo Sub- Almirante Maximiano e da EACF a con-
mersível de Operação Remota (ROV) e mer- duziram até a praia, onde ela se encontra.
gulhadores, quando se observou que as Os recipientes com o óleo serão trazidos
condições da chata eram semelhantes às para o Rio de Janeiro pela MB.
da filmagem realizada em dezembro, por uma Durante toda a operação, foi estabele-
equipe da Marinha. cida uma barreira, com equipamentos da
No segundo dia, 29 de fevereiro, as equi- Petrobras, para conter possíveis vazamen-
pes de mergulhadores se revezaram e fo- tos de óleo, que não ocorreram.
ram feitas diversas excursões à chata, pre- A Marinha do Brasil reconhece que só
parando-a para a reflutuação. Foram retira- foi viável realizar essa complexa operação
dos componentes instalados nela, que po- de reflutuação, no presente verão Antárti-
deriam dificultar seu içamento, tais como: co, com a parceria da Petrobras, que, desde
as rampas de acesso e a barreira de con- o início do planejamento, reconheceu que
tenção de óleo que sempre é colocada evitar qualquer dano ao ambiente antártico
quando é feita uma faina de abastecimen- é um compromisso da nação brasileira.”
to, e que também afundou. (Fonte: www.mar.mil.br)

INSTITUIÇÕES CIENTÍFICAS E TECNOLÓGICAS NO


CFN E NA DGPM
Foram implantadas, em 30 de janeiro úl- e outra na Diretoria-Geral do Pessoal da
timo, duas novas Instituições Científicas e Marinha (DGPM). A seguir, transcrevemos
Tecnológicas (ICT) na Marinha do Brasil, a Ordem do Dia relativa à implantação,
uma no Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) expedida pelo chefe do Estado-Maior da

RMB1 o T/2012 313


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Armada, Almirante de Esquadra João Afon- Pontifícia Universidade Católica do Rio de


so Prado Maia de Faria. Janeiro; Universidade Católica de Santos;
“As duas novas Instituições Científicas Instituto Nacional de Tecnologia; Instituto
e Tecnológicas (ICT), cuja implantação Nacional de Propriedade Industrial;
estamos concretizando, atendem à constante Financiadora de Estudos e Projetos (Finep);
necessidade de aprimorar a inserção da Ci- Conselho Nacional de Desenvolvimento Ci-
ência, Tecnologia e Inovação na Marinha entífico e Tecnológico (CNPq); Coordenação
(CT&I), com o consequente fortalecimento de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Su-
de nossa instituição e, em decorrência, da perior (Capes); Centro de Pesquisa e Desen-
dissuasão estratégica do Brasil. volvimento em Telecomunicações (CPqD) e
É oportuno destacar que a magnitude dos Fundação Conrado Wessel.
desafios político-estratégicos que o ambien- E, para breve, teremos outras parcerias,
te operacional da Marinha enfrenta exige a com a Fundação Oswaldo Cruz e Associa-
ampliação de parcerias de conhecimentos e ção Brasileira de Tecnologia de Luz
de atribuições com as comunidades acadê- Síncroton. Essa longa lista ressalta a dimen-
micas e científicas, o que podemos denomi- são da procura, pela Marinha, de parceiros
nar, no âmbito interno, de ‘empreendimentos e, naturalmente, mostra a notável extensão
modulares’ ou, empregando uma expressão de capacitações, que podemos identificar
conhecida por todos, de ‘matriz estratégica’. na ‘academia e comunidade científica’!
Assim, tivemos, há quase 60 anos, o iní- Os esforços coordenados com empre-
cio da criação de um centro de tecnologia da sas, academia e comunidade e científica e
Marinha, em conjunto com a Universidade outras ICT, civis ou militares, são funda-
de São Paulo e com o importante complexo mentais para que possamos transpor as
industrial daquele estado, que permitiu o barreiras ao acesso a tecnologias que difi-
domínio completo do enriquecimento do urâ- cultam o crescimento do Brasil.
nio, os conhecimentos necessários para sus- Nesse contexto de continuado aprimo-
tentar o projeto e a construção de submari- ramento é que a “matriz estratégica” passa
nos, inclusive de propulsão nuclear. Essa foi a contar, no Corpo de Fuzileiros Navais e
a opção da Marinha para a capacitação de na Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha,
seu pessoal civil e militar, com um notável especialmente nas áreas de desempenho
arrasto tecnológico para outros importantes humano, saúde e ambiente operacional, com
segmentos da sociedade brasileira. adequados componentes para contribuir
Na atualidade, estamos consolidando e tanto para a modernização das capacida-
ampliando a ‘matriz estratégica’, mais uma des do Poder Naval como para a ampliação
vez envolvendo projetos de tecnologia de do arrasto tecnológico decorrente das ati-
duplo emprego, de relevância para a Mari- vidades de CT&I da Marinha.
nha e para o desenvolvimento nacional. Também ressalto que, tradicionalmente,
Além das interações com as ICT das de- as atividades das organizações de C&T com-
mais Forças Armadas, temos parcerias estra- preendem as quatro linhas básicas de ação:
tégicas com a Academia Brasileira de Ciênci- pesquisa, desenvolvimento tecnológico,
as; Sociedade Brasileira para o Progresso da ensino e prestação de serviços.
Ciência; Universidade Federal Fluminense; Até alguns anos atrás, as atividades de
Universidade Federal do Rio de Janeiro; Fun- pesquisa, e em particular a pesquisa bási-
dação Coordenação de Projetos, Pesquisas ca, ofereciam um maior prestígio na esfera
e Estudos Tecnológicos (Coppetec); científica, enquanto que as demais eram

314 RMB1 oT/2012


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

percebidas como atividades que não rece- onar a obtenção de maiores benefícios para
biam um maior comprometimento de tempo a sociedade brasileira, os quais, reitero,
e de recursos. Esta situação vem sendo al- fortalecem a dissuasão estratégica e for-
terada, com a constatação de três impac- mam um círculo virtuoso de valorização das
tos importantes: o envolvimento mais dire- atividades científicas e aumento do prestí-
to das ICT na obtenção de resultados con- gio de nossa instituição.
cretos, a partir das linhas de pesquisas, e Destaco, ainda, que a inserção da CT&I
com a prestação de serviços de suporte na Marinha, além de atender às diretrizes
tecnológico e educacional; a adoção de da Estratégia Nacional de Defesa no cam-
novos princípios no gerenciamento das po estratégico, segue suas orientações
atividades científicas, vinculando o apoio quanto à indústria brasileira, por sua con-
às linhas de pesquisa aos resultados obti- tribuição para a competitividade nas áreas
dos; e a abertura das organizações para e tecnologias de interesse da Defesa Naci-
múltiplas formas de relacionamentos com onal, e, assim, consolidar a Base Industrial
agentes externos, de forma a viabilizar a de Defesa.
transferência de tecnologias. Às novas ICT, desejamos bons ventos,
Na verdade, esses impactos têm como mares tranquilos e muito trabalho.”
pano de fundo a necessidade de proporci- (Fonte: Bono Especial no 063, de 30/1/2012)

NOVOS PROJETOS PARA NAVIOS


COM ENERGIA EFICIENTE
Foi lançada pela Rolls-Royce, empresa do introduzidos, a indústria marítima está,
global de energia, em 1o de dezembro últi- cada vez mais, colaborando para criar embar-
mo, uma variedade de novos projetos para cações altamente eficientes, que reduzem
navios energeticamente eficientes, que se- custos operacionais e impactos ambientais”.
rão produzidos em parceria com a chinesa Os tipos de embarcações incluem carre-
Bestway Engenharia. Os novos projetos gadores de gás natural liquefeito (GNL),
foram criados pensando-se nas futuras exi- porta-contêiner e navios de carga em ge-
gências da indústria mundial de Marinha ral, todos projetados para cumprir, e até
Mercante, onde as baixas emissões de mesmo superar, futuras metas de emissão.
poluentes e custos operacionais reduzidos Os modelos que contam com turbinas a gás
são pontos-chave, e combinam a expertise Rolls-Royce já atendem às exigências da
das duas companhias, contando com avan- Organização Marítima Internacional sobre
çados sistemas de propulsão Rolls-Royce. emissões de dióxido de nitrogênio, dióxido
Segundo o presidente da Rolls-Royce na de enxofre e gás carbônico, que serão obri-
área de Marinha Mercante, Oddbjorn gatórias em 2016.
Eliassen, “enquanto os controles internacio- (Fonte: Press release Weber Shand-
nais de emissões estão gradativamente sen- wick)

MB E PETROBRAS ASSINAM MEMORANDO


DE ENTENDIMENTOS
Maior aproximação e cooperação rando de Entendimentos assinado no dia 2
tecnológica entre a Marinha do Brasil (MB) de dezembro pelo comandante da Marinha,
e a Petrobras. Esse é o propósito do Memo- Almirante de Esquadra Julio Soares de

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

nha é muito importante também para as


nossas operações. Avistar um navio da
Marinha, quando embarcados, nos dá um
grande orgulho e segurança, por sentirmos
a presença do Estado, mesmo estando tão
distantes do costa”, disse.
Também o comandante da Marinha res-
saltou a importância da assinatura do Me-
morando, lembrando que a Petrobras é uma
constante parceira no mar. Segundo ele, se
Moura Neto, e o diretor de Exploração e Pro- hoje a sociedade brasileira enxerga com
dução da Petrobras, Guilherme Estrella, na maior clareza a importância do mar, isso se
sede da empresa, no Rio de Janeiro. deve, em grande parte, à Petrobras e às
O acordo prevê o compartilhamento de tecnologias que ela desenvolveu nas ati-
pesquisas e tecnologias aplicadas ao am- vidades offshore. “As vitórias da Petrobras
biente marítimo. Guilherme Estrella lembrou são as vitórias do Brasil”. Ele destacou,
que a parceria entre as duas instituições ainda, o importante momento de desenvol-
data do início das atividades de explora- vimento nacional do Programa de Desen-
ção e produção no litoral brasileiro, nos volvimento de Submarinos (Prosub). “Ape-
anos 1980. Destacou, ainda, a importância nas cinco países (Estados Unidos, China,
do estreitamento dessa relação, no momen- Rússia, França e Inglaterra), membros do
to em que o Brasil avança de patamar, em Conselho de Segurança da Organização
termos de desenvolvimento nacional. das Nações Unidas – ONU, têm a capaci-
“Atrelado ao desenvolvimento, está o co- dade de construir e operar um submarino
nhecimento. Existem setores que utilizam de propulsão nuclear. O Brasil quer entrar
as tecnologias chamadas duais aplicadas, nesse grupo. Há um interesse mútuo no
tanto na parte civil quanto na militar. Por- desenvolvimento desses equipamentos e
tanto, é interesse nacional o esforço de materiais. Esse memorando fortalece as
desenvolvimento de tecnologias entre portas que já estão abertas”, declarou.
Marinha e Petrobras. A presença da Mari- (Fonte: www.mar.mil.br)

PARQUE DOS CORAIS DE BÚZIOS – PROJETO CORAL VIVO

O Projeto Coral Vivo abriu ao público, Ao pisar no interior da histórica casa


em 9 de dezembro último, no município de Colônia de Pescadores Z23, o visitante é
Búzios (RJ), o Centro de Visitantes do Par- envolvido em uma experiência impactante
que dos Corais de Búzios, que alia lazer e e com interatividade direta: uma grande
informação. O local traz uma inovadora ex- projeção imersiva em alta definição, que o
posição imersiva, multimídia e interativa convida a desvendar o mar de Búzios. Lo-
sobre a biodiversidade da região e o Par- calizado na badalada Rua das Pedras, o
que dos Corais, que fica no fundo do mar, Centro é patrocinado pela Petrobras, por
nos núcleos Bardot, Tartaruga e João meio do Programa Petrobras Ambiental.
Fernandes. A ideia é sensibilizar o público Diante do mosaico de imagens, em frag-
por meio do entretenimento. mentos inspirados em pólipos de corais, o

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

público pode explorar como desejar o es- revertida para as ações do Projeto Coral
paço e descobrir diferentes pontos de Vivo em Búzios.
interação, com o poder de influenciar o lu- O Projeto Coral Vivo pertence à Associ-
gar inteiramente. O projeto cenográfico, ação dos Amigos do Museu Nacional e é
multimídia e interativo para a exposição foi patrocinado pela Petrobras, sendo volta-
criado pela produtora carioca SuperUber, do para pesquisa e educação para a con-
responsável pelo desenvolvimen- servação e uso sustentável dos am-
to de importantes projetos bientes recifais e das comunida-
multimídia interativos, entre des coralíneas brasileiras. A ini-
os quais o do Museu da Lín- ciativa do Centro de Visitan-
gua Portuguesa, em São tes conta com o apoio da Se-
Paulo. cretaria Estadual do Ambien-
Quatro telas interativas te do Rio de Janeiro (SEA),
levam para o Centro de Visi- do Instituto Estadual do Am-
tantes do Parque dos Corais biente (Inea) e da Colônia de
de Búzios experiências de en- Pescadores Z23 de Búzios.
cantamento para que o público O Centro funciona de terça a
se perceba inserido nesse domingo. Até março, o horário é das
ecossistema. Com o Centro de Visitantes, 11h a 0h; de abril a novembro, das 17 às
pretende-se também mobilizar turistas e po- 23h. O ingresso custa R$ 10 (inteira) e R$ 5
pulação local para conservar a (meia). Outras informações podem ser ob-
biodiversidade marinha da região e ressal- tidas pelo telefone (22) 2623-2574 ou no
tar a importância da preservação das co- site www.coralvivo.org.br.
munidades de corais na manutenção da (Fonte: Press release da Influência
vida nos oceanos. A receita da bilheteria é Comunicação)

SEMINÁRIO DIREITO MARÍTIMO


E PORTUÁRIO

Destinado a empresários, advogados e Foram os seguintes os temas debatidos,


outros profissionais que atuam na área de com seus respectivos expositores: “Direito
comércio exterior e de transportes e Marítimo – Linhas Gerais”, por Pedro Calmon
logística, foi realizado em 29 de fevereiro Neto; “Trabalhador Portuário”, por Paula
último, na cidade do Rio de Janeiro, o Se- Leonor Mendes Fernandes Rocha; “Direito
minário Direito Marítimo e Portuário – Re- Administrativo – Controle e Responsabili-
gulamentação e Controle. O evento teve dades”, por Daniel Corrêa Cardoso Coelho;
como objetivo apresentar as atualidades “Contratos e Legislação Portuária”, por
no que se refere às normas e discussões Henrique Nunes Amarante; e “Direito
que vinculam as operações portuárias, uma Ambiental Aplicado”, por Maria Antonia
vez que estas não se encontram organiza- Tigre. A coordenação acadêmica do evento
das em único instrumento legal. Também foi do advogado Mauro Scheer Luís.
foi apresentada uma visão geral de outros (Fontes: www.centralpratica.com.br e
ramos do Direito aplicados ao setor. Cleinaldo Simões Assessoria)

RMB1 o T/2012 317


NOTICIÁRIO MARÍTIMO

RESULTADOS ESPORTIVOS
JUDÔ – GRAND SLAM DE PARIS
Organizada pela Federação Internacio-
nal de Judô nos dias 4 e 5 de fevereiro, em
Paris, França. A competição foi
classificatória para os Jogos Olímpicos de
Londres 2012. As militares atletas da MB
obtiveram os seguintes resultados:
– Categoria até 78 kg: Medalha de Ouro
– MN Mayra Aguiar;
– Categoria até 48 kg: MN Medalha de Mayra Aguiar (Brasil) – 1o lugar, categoria 78 kg
Prata – Sarah Menezes. (segunda da esquerda para a direita)

MB AUTORIZA A ABERTURA DA ESTAÇÃO


PORTUÁRIA DE HUMAITÁ
A Marinha do Brasil autorizou, em de-
zembro último, a Estação Portuária de
Humaitá Admilson Brito Brasil a dar início
às suas operações portuárias. O documen-
to com a autorização foi entregue no dia 17
de dezembro, no município de Humaitá
(AM), pelo Capitão dos Portos da Amazô-
nia Ocidental, Capitão de Mar e Guerra Navio-Patrulha Fluvial Roraima atracado na
Odilon Leite de Andrade Neto. Estação Portuária de Humaitá
O porto dispõe de um cais com ponte flu-
toridade Marítima e pelos órgãos responsá-
tuante e de uma estrutura que suporta a movi-
veis por sua construção e instalação”.
mentação de carga e/ou a atracação de navi-
Estiveram presentes à cerimônia, além
os, com capacidade total de 2 mil toneladas.
da população humaitaense, principal be-
Segundo o capitão dos portos, “o porto pode
neficiada com a entrada em operação da
operar com segurança, uma vez que atende às
estação portuária, o superintendente da
exigências estabelecidas nas Normas da Au-
Administração das Hidrovias da Amazônia
Ocidental (Ahimoc), Sebastião da Silva
Reis; o prefeito de Humaitá, José Cidenei
Lobo do Nascimento; e o vereador Carlos
Evaldo Terrinha Almeida de Souza, entre
outras autoridades.
O Navio-Patrulha Fluvial Roraima, que
fez parte da Operação Madeira II e foi a
Capitão dos Portos da Amazônia Ocidental primeira embarcação a atracar no local, no
(E), prefeito de Humaitá (C) e o superinten- dia 17 de dezembro, recebeu a população
dente da Administração das Hidrovias da para uma visitação pública. Compareceram
Amazônia Ocidental aproximadamente 500 pessoas.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

LABORATÓRIO MÓVEL PARA RECUPERAÇÃO DA FAUNA


A ajuda a animais contaminados em aci- dados adequados em tempo hábil para evi-
dentes com derramamento de óleo ganhou tar a mortandade dos animais afetados.
uma inovação: um contêiner-laboratório que Desde 2000, a HidroClean investe em
permite a atuação mais rápida de profissio- serviços, treinamento e tecnologia com o
nais e voluntários para a despetrolização da objetivo de assegurar que empresas de di-
fauna – como é chamado todo o processo versos setores sejam capazes de desenvol-
de resgate, limpeza e cuidado para que o ver seus negócios em harmonia com o meio
animal contaminado pelo óleo e ferido seja ambiente e de acordo com a legislação
devolvido ao meio ambiente –, processo que ambiental brasileira.
pode levar meses. Durante o evento no Iate Clube do Rio
O equipamento, montado pela de Janeiro, também foi mostrado o navio
HidroClean, empresa do grupo Brasbunker Jean Charcot, usado no passado pelo pes-
para proteção ambiental, foi exposto em quisador Jacques Cousteau e construído es-
evento da empresa em 6 de março último, pecialmente para a pesquisa oceanográfica
no Iate Clube do Rio de Janeiro, onde pro- até 4 mil metros de profundidade, o que per-
fissionais do Instituto Gremar, parceiro da mite o monitoramento do solo oceânico do
HidroClean para prestação de serviço de pré-sal. A HidroClean investiu cerca de R$
despetrolização, fizeram simulações para o 30 milhões no navio e é a primeira empresa
público de como todo processo funciona. privada no País a oferecer uma embarcação
Trata-se de uma estação de lavagem com- especialmente preparada para a pesquisa e
pleta que conta com minilaboratório e am- um equipamento móvel que dará mais mobi-
bulatório veterinário e com autonomia para lidade e rapidez em casos de acidentes com
ser instalada em regiões remotas onde nor- óleo, sejam eles em terra ou offshore.
malmente não seria possível levar os cui- (Fonte: Máquina Public Relations)

LANÇADO O ATLAS GEOGRÁFICO DAS ZONAS COSTEIRAS


E OCEÂNICAS DO BRASIL
A Marinha do Brasil e o Instituto Brasi-
leiro de Geografia e Estatística (IBGE) lança-
ram, em 5 de dezembro de 2011, o Atlas Geo-
gráfico das Zonas Costeiras e Oceânicas do
Brasil. A publicação é voltada para a difu-
são de informações e conhecimentos
atualizados sobre o litoral brasileiro, abor-
dando as dimensões histórica, demográfica,
econômica, social, cultural e natural.
A publicação tornou-se realidade a par-
tir de ideia concebida pela Comissão
Interministerial para os Recursos do Mar
(Cirm) e desenvolvida em conjunto com a
Coordenação de Geografia da Diretoria de
Geociências do IBGE. O objetivo é incenti-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

var a sociedade a pensar, conhecer e valo- Estiveram presentes à solenidade de lan-


rizar o uso racional da biodiversidade e dos çamento do Atlas, na Escola de Guerra Naval,
recursos minerais e energéticos presentes no Rio de Janeiro, o comandante da Marinha,
nas águas oceânicas, solo e subsolo mari- Almirante de Esquadra Julio Soares de Moura
nho, que constituem parte fundamental do Neto, e a presidente do IBGE, Wasmália Bivar.
desenvolvimento socioeconômico e da (Fonte: Centro de Comunicação Social
sustentabilidade ambiental do País. da Marinha)

PATRONOS NA MARINHA DO BRASIL


A Diretoria do Patrimônio Histórico e Prado Maia, Portaria Ministerial no 1.037,
Documentação da Marinha (DPHDM), em de 19 de novembro de 1986;
cumprimento à alínea c do item 3 das nor- – Patrono dos Maquinistas da Marinha:
mas aprovadas pela Portaria no 131, de 29 Vice-Almirante Ary Parreiras, Portaria Mi-
de maio de 2009 do Estado-Maior da Ar- nisterial no 1.037, de 19 de novembro de 1986;
mada (EMA), divulgou, durante a Semana – Patrono do Quadro de Capelães da
da Marinha, em dezembro último, a lista Marinha: Capitão de Corveta (CN) Rodomark
dos Patronos Instituídos na Marinha do Fernandes de Souza – Dom Carlos O. S. B.,
Brasil. Portaria no 653, de 27 de julho de 1988;
1) Patrono da Marinha do Brasil: Almi- – Patrono das Mulheres Militares da Mari-
rante Joaquim Marques Lisboa (Marquês nha: Almirante de Esquadra Maximiano Eduar-
de Tamandaré). Aviso do Ministro da Ma- do da Silva Fonseca, Portaria do Estado-Mai-
rinha no 3.322, de 4 de setembro de 1925. or da Armada no 284, de 6 de julho de 1999;
2) Demais Patronos: – Patrono do Corpo de Intendentes da
– Patrono das Bandas de Música e Mar- Marinha: Vice-Almirante (IM) Gastão
cial da Marinha: Maestro Antônio Francis- Motta, Portaria do Estado-Maior da Arma-
co Braga, Decreto no 62.683, de 10 de maio da no 43, de 13 de março de 2003;
de 1968; – Patrono do Corpo de Engenheiros
– Patrono do Corpo de Saúde da Mari- Navais: Contra-Almirante (EN) João Cân-
nha: Cirurgião-Mor Joaquim Cândido Soa- dido Brazil, Portaria do Estado-Maior da
res de Meirelles, Decreto no 63.684, de 25 Armada no 134, de 8 de julho de 2003;
de novembro de 1968; – Patrono das Comunicações Navais:
– Patrono da Hidrografia da Marinha: Vice-Almirante Tácito Reis de Moraes
Capitão de Fragata Manoel Antônio Vital Rego, Portaria do Estado-Maior da Arma-
de Oliveira, Decreto no 77.070, de 21 de ja- da no 178, de 1o de setembro de 2008;
neiro de 1976; – Patrono do Corpo de Fuzileiros Na-
– Patrono do Servidor Civil da Marinha: vais: Almirante Sylvio de Camargo, Porta-
Mestre Antônio da Silva, Portaria Ministe- ria do Estado-Maior da Armada no 38, de 26
rial no 131, de 18 de janeiro de 1980; de fevereiro de 2009; e
– Patrono dos Artilheiros da Marinha: – Patrono da Ciência, Tecnologia e Ino-
Capitão de Mar e Guerra Henrique Antô- vação (CT&I) na Marinha do Brasil: Vice-
nio Baptista, Portaria Ministerial no 1.139, Almirante Álvaro Alberto da Mota e Silva,
de 31 de dezembro de 1985; Portaria do Estado-Maior da Armada no 28,
– Patrono dos Quadros de Oficiais Au- de 31 de janeiro de 2011.
xiliares da Marinha: Vice-Almirante João do (Fonte: Bono Especial nº 906, de 12/12/2011)

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