Você está na página 1de 5

PELO REMÉDIO CONHECEMOS A GRAVIDADE DA DOENÇA

Qual o preço do “vá e não peques mais”?

Marcio,

Chegamos ao V Domingo da Quaresma e, com ele, inicia-se  um tempo


novo na Igreja.

Na realidade, nós encerramos uma fase da Quaresma e vamos começar


outra. No início deste tempo litúrgico, nos voltamos mais para a questão da
penitência e do pecado. Neste final, a Igreja começa a voltar o seu olhar de
forma mais específica para a Paixão de Cristo.

Hoje, portanto, meditamos não somente no que devemos fazer para nos
arrependermos de nossas faltas, mas naquilo que Deus fez para nos livrar
dos nossos pecados.

Deus se dispôs a sofrer na Cruz para nos livrar do pecado.

Vamos refletir sobre o Evangelho deste domingo (São João 8, 1-11): é o


famoso episódio em que Jesus perdoa a mulher adúltera que foi descoberta
em flagrante. Ela foi arrastada até os pés de Jesus pelos fariseus, que
colocaram a pecadora diante de Nosso Senhor e pediram que Ele
pronunciasse o juízo.

O juízo, aqui, era meio óbvio: quem cometia adultério devia morrer
apedrejado. Então, os fariseus queriam aqui “pegar” Jesus. Por quê?
Porque eles não podiam condenar ninguém à morte.

Os romanos tinham tomado conta da Terra Santa, e só quem podia dar


esse tipo de condenação era Pilatos, que era a autoridade romana local.
Então, os judeus estavam impedidos de aplicar a Lei e, aqui, eles colocam
Jesus numa encruzilhada, numa “sinuca de bico”.

Imagine: caso Jesus, seguindo a lei judaica, ordenasse o apedrejamento,


Ele acabaria contrariando os romanos. E se Ele dissesse, simplesmente,
“Não podemos apedrejar, temos que perdoar misericordiosamente”, os
fariseus diriam, então: “Você está contra a Lei de Moisés”.

Além dessa situação controversa, havia, evidentemente, a realidade interior


de Jesus. Nosso Senhor olhava para aquela mulher com o mesmo olhar que
dirige a nós, pecadores.

Enquanto estamos vivos e ainda temos tempo, Deus olha para


nós, convidando-nos ao arrependimento.

Você vai dizer: “Padre, quer dizer que depois da morte Deus não é mais
misericórdia?”

Não é isso!

Deus continua sendo misericórdia depois da morte, mas, quando você


morre, se torna incapaz de se arrepender. Essa é a grande tragédia, as
pessoas não se dão conta disso. O tempo de se arrepender é aqui,
enquanto você está neste mundo.

Quando você morre, você fica, digamos assim, “solidificado”. O seu


verdadeiro “eu” se revela no instante da sua morte.

Quem morre em pecado mortal — e aqui o julgamento para definir isso cabe
exclusivamente a Deus — escolhe, com toda a convicção de seu ser,
separar-se definitivamente da misericórdia divina.

Jesus — que é o Juiz dos juízes e vê os corações — está olhando para


aquela mulher pecadora, sabe que ela está arrependida e, por isso, quer
perdoá-la.

“Mas Jesus, inclinando-se, começou a escrever com o dedo no chão. Como


persistissem em interrogá-lo, Jesus ergueu-se e disse: 'Quem dentre vós não
tiver pecado, seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra.' E tornando a inclinar-se,
continuou a escrever no chão.”

— São João 8, 6b-8

Santo Agostinho, comentando essa página, diz: “os fariseus, olhando para


si mesmos, e encontrando que eles mesmos eram culpados, foram embora
um por um”. Ou seja, “Deram no pé”!

E, numa conclusão típica do grande poeta e contemplativo que era, Santo


Agostinho completa:

“Ficaram ali os dois: a mísera e a misericórdia.”

Ou seja, ali houve o encontro da miséria humana e da misericórdia divina. E


é isto que nós mesmos queremos receber neste domingo, para que nos
convertamos!

Mas, para isso, voltemos o nosso olhar para a Paixão, para a Cruz de
Cristo. Precisamos entender o que está realmente acontecendo.
Nós, seres humanos, não temos noção do que seja o pecado. Pense na
situação desse Evangelho: se a pessoa comete adultério — um pecado
mortal — isso é uma coisa muito pior do que morrer. Ela perde a vida
eterna!

Só que nós não vemos isso.

Nós, seres humanos, nunca vamos entender realmente o que é o mal,


porque quem inventou o pecado foram os anjos. Não existia pecado, mas
uma parte dos anjos desobedeceu a Deus e pecaram, e ali se tornaram
demônios.

E é por isso que nós, seres humanos, não entendemos plenamente a


gravidade de nossa desobediência. Porque o pecado é uma realidade
espiritual.

Claro que, às vezes, acontece de a podridão da alma repercutir no corpo: a


pessoa, cometendo pecados, pode destruir o corpo dela contraindo
doenças, se mutilando. Às vezes, uma pessoa pode ter uma vida tão
arraigada no pecado que o mal pode até transparecer em seu olhar. Mas,
geralmente, as pessoas cometem pecados e não se vê isso no corpo.

O fato é que o pecado é uma realidade da alma, e a gente tende a ficar


horrorizado só quando uma pessoa morre e perde a vida do corpo. Mas,
para nós, é um “nada” quando a pessoa peca e perde a vida da alma...

Para a gente ter noção, então, do que é a gravidade do pecado, vamos


olhar para o remédio, porque olhando para o remédio veremos a
gravidade da doença.

Se você está com dor de cabeça, vai ao médico e ele diz: “Olha, vamos ter
que começar quimioterapia”... opa! Você se assusta. É muito diferente de
quando você está com dor de cabeça e o médico diz: “Aspirina!”

Ora, qual foi o remédio que Deus arranjou para o pecado? Ele
próprio vir a este mundo e morrer por nós. Essa é a gravidade
do pecado!

Estamos no tempo da Paixão, nos preparando para a Semana Santa, que já


está às portas!

Nós temos de parar para meditar: se a única solução que Deus


encontrou para nos livrar do inferno é Ele vir aqui e morrer, se o
pecado custou o sangue de Deus, se é este o remédio desta doença
chamada pecado, então, o pecado não pode ser uma trivialidade, não
pode ser uma banalidade, uma coisa corriqueira.

O pecado é algo muito sério. Não vamos olhar só para a “quimioterapia”,


vamos olhar para o “câncer”: o que o pecado faz conosco?

Veja, Marcio, Deus é a fonte da nossa vida. Ele é o nosso Criador e


Salvador. Então, Deus está nos sustentando no próprio ser, Ele é a
fonte do nosso ser.

Agora, você imagina as consequências de quando você corta a relação com


a fonte da vida? Se você tem uma lâmpada e corta a relação dela com a
corrente elétrica, ela se apaga. Se você apertar o seu braço até cortar a
circulação sanguínea e deixá-lo assim, o que vai acontecer? Seu braço vai
começar a apodrecer, a gangrenar e vai morrer, porque você cortou a
relação do membro com o corpo.

Assim somos nós quando cortamos a nossa relação com Deus:


nós apodrecemos!

Quando você peca gravemente, está dizendo assim: “Deus, eu não estou
nem aí para você! Você é o meu criador, está dizendo para mim que esse
jeito que estou me comportando está errado e vai me fazer mal, mas eu vou
virar as costas para você, vou fazer o que eu quero”.

Deus não precisava fazer isso, mas, por bondade, nos revelou o que
era pecado.

Por exemplo, no caso do adultério, Deus está revelando e dizendo assim:


“Se você fizer este ato, você está gangrenando, você está apodrecendo a
sua alma”.

Mas aí você diz: “Ah, não, não confio em você, prefiro confiar no meu
julgamento, na minha ideia, no meu jeito de pensar. Não é tão grave assim,
não é desse jeito. Ah, não é pra ser tão radical, pra que ser tão radical?”

Imaginemos, porém, que você está com câncer e ainda tem uma chance de
se salvar com a quimioterapia. Aí o médico diz: “Olha, essa doença é
maligna, tem de haver uma cura radical”.  Só que você prefere dizer: “Ah, eu
não acredito, esse médico é muito radical, eu tenho uma benzedeira lá na
esquina de casa que faz uma garrafada, ela vai fazer lá uma pajelança e
essa dor de cabeça vai passar”.

Os médicos humanos podem falhar, mas o Médico Divino não


se engana e não engana ninguém.

Pode até ser mais confortável pensar que o adultério não leva as pessoas
para o inferno, mas o fato de pensarmos assim não vai mudar a
realidade das coisas.

Muitos dizem: “A Igreja é muito rígida, proíbe tal e qual pessoa de


comungar...”. Mas na verdade é justamente o contrário: a Igreja é bondosa e
proíbe que comungue quem está em pecado mortal para que essas
pessoas abram os olhos e percebam que tem algo de muito grave na
própria alma, que elas precisam resolver o quanto antes!

“Ah, não, porque desse jeito, padre, o senhor está se comportando como os
fariseus que ficam jogando pedras nas pessoas”. Não! Eu estou me
comportando como Jesus, porque Jesus chega e diz: “Vá e não peques
mais”.

Jesus nos convida a não pecar mais. Essa é a grande realidade que nós
precisamos enxergar no Evangelho de hoje: o perdão custou o sangue de
Cristo, e se você está se confessando já com a “bala na agulha para dar
um outro tiro” e pecar outra vez, você não está levando a sério o preço que
foi pago pela sua salvação.

É tempo da Paixão de Cristo. É tempo de refletirmos sobre o preço da


nossa salvação.

“Vá e não peques mais.”

Tenha uma santa semana, com o olhar fixo na Cruz!

Você também pode gostar