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Segundo o mito grego, Narciso era um belo jovem tespiano por quem a ninfa
Eco se apaixonou. Eco fora privada de fala por Hera, a esposa de Zeus, e só podia
repetir as últimas sílabas das palavras que ouvia. Incapaz de expressar seu amor por
Narciso, foi por este rejeitada e morreu de desgosto, com o coraçao dilacerado. Os
deuses puniram então Narciso por seu tratamento desalmado para com Eco, fazendo-o
apaixonar-se por sua própria imagem. O vidente Tirésias profetizara que Narciso viveria
até ver-se a si mesmo. Um dia, quando se debruçava sobre as àguas cristalinas de uma
fonte, Narciso viu sua própria imagem refletida na àgua. Ficou perdidamente
enamorado de sua imagem e recusou-se a abandonar o local. Morreu de debilidade e
metamorfoseou-se numa flor — o narciso que cresce à beira das fontes e mananciais.
[Consciência sistêmica...]
Dr. Fernando Freitas CS
Parte 1
Meu Rei Maravilhoso
Capítulos 1-4
Yared estava amargando um luto há quase oito meses pela perda da esposa. No geral, para ser
mais exato, aquele martírio pessoal já vinha se arrastando por mais de um ano e meio – tempo que lhe
parecia uma eternidade. Isso o forçara a suportar todas as vicissitudes e inconveniências de contínuas
visitas e prolongadas permanências em hospitais, clínicas e laboratórios. Muitas vezes, executara vários
projetos nas alas da enfermaria, ao lado da sua mulher, usando para isso apenas seu sistema Android num
Motorola tristemente ultrapassado.
Despesas médicas constantes e elevadas, na casa de três dígitos, aliadas a uma angústia e
ansiedade mortificadoras passaram a ser suas companheiras inseparáveis.
O peso de toda aquela dinâmica insidiosa o arrastava, dia a dia, semana a semana, mês a mês,
cada vez mais, para uma depressão profunda.
Estivera segurando a mão magérrima da sua esposa no seu último suspiro. Testemunhou ela se
despedir desse mundo enquanto jazia entorpecida à morfina injetada diretamente na veia – aparência
esquálida, olhos encovados, porém ainda cheios de amor, como sempre tinham sido.
Sem mais conseguir se mover, sobre uma cama de ferro pintada com um frio branco hospitalar, a
senhora Lovingdale piscou o olho direito pela última vez. Aquela fora a única forma que ela pôde usar
para dizer adeus ao seu marido. Sua respiração esvaeceu. Seu batimento cardíaco despencou para o zero
absoluto – pôde-se ouvir o ruído do sinal contínuo do monitor multiparâmetro a anunciar sua saída desse
mundo.
Em particular, as pessoas que alguma vez tenham assumido o papel de cuidador de um paciente
gravemente enfermo conhecem o sofrimento excruciante envolvido nesse processo. Acima de tudo, se
esse paciente for um familiar. Num grau extremo, se a pessoa doente for algum ente querido. E nada é tão
atroz como perder alguém que tiver passado a maior parte da sua vida ao seu lado. É um sofrimento
humanamente inconcebível!
As incertezas da vida e as vicissitudes da existência sempre mais cedo ou mais tarde batem à
nossa porta. Intrometem-se na nossa vida mesmo sem serem convidadas. Como tal, somos assediados por
certas inevitabilidades. O falecimento com seu terrível golpe parece ser o pior, no entanto! Queiramos ou
não, envelhecemos, sofremos perdas e vivemos à sombra da morte. Essa é uma fatalidade inerente à
condição humana – sem exceção. Ninguém pode salvar ninguém da arrepiante garra da morte, quando na
sepultura, coberto de vermes!
Paradoxalmente, devemos tentar viver feliz num mundo onde a alternativa da dor e a
probabilidade de aflições são possibilidades experienciais reais sempre a nossa espreita.
“Este é um tipo de câncer maligno. Ela tem de ser operada o mais rápido possível. Por favor,
tome as medidas necessárias!” – advertiu o médico sem papa na língua. No estilo Super Sincero. O tom
da sua voz foi fatídico.
Aquela informação, numa fração de segundos, causou em Yared uma vertigem e mal estar
indizíveis. Ele ficou deveras assustado, e começou a se perguntar como aquela maldita enfermidade
poderia ter acometido sua esposa desavisadamente – logo ela que era bastante atenta à sua saúde e à da
sua família.
Os dois estavam juntos num casamento harmonioso por mais de três décadas. A construção
sólida do relacionamento com sua admirável esposa havia sido inteiramente feita em pedaços e ruíra em
questão de minutos!
“Já pedi uma biópsia de emergência para certificar o tamanho e o tipo do tumor.” – comentou
o médico de forma técnica.
“Tudo bem doutor, vou providenciar.” – respondeu-lhe Yared com a voz embargada.
Yared sentiu uma pontada aguda nas têmporas ao ouvir aquela verdade impalatável. Ficou
apático e gélido diante da perspectiva da sua vida conjugal bem-aventurada não poder perdurar por muito
tempo mais. A sentença final parecia ter sido decretada. E quem a teria decretado? As maiores verdades
da vida são as mais desagradáveis de ouvir.
Yared foi invadido por uma dor lancinante. Seu coração pareceu estar sendo transpassado lenta e
repetidamente por um punhal. Uma avalanche de imagens de sua vida pretérita de casado assaltou o seu
cérebro erraticamente. Precisava reorientar seus pensamentos para agir da forma certa.
Quando se recuperou do choque, pediu licença ao médico e caminhou com passos largos até à
área externa da clínica. Buscou mais ar nos pulmões. Respirou fundo. E decidiu procurar um ombro
amigo em que se apoiar. Ligou para o seu irmão.
“Meu irmão, estou inconformado com o que ouvi do médico agorinha mesmo. Acabo de receber
o resultado do exame de Lovingdale. Ela tá com câncer. No estômago. É maligno. Precisa de cirurgia
com emergência!” – informou falando de forma acelerada e nervosa.
Pôde sentir que ele fez uma pausa no outro lado da linha, antes de responder.
“Brother, você tem certeza?” – perguntou o rapaz.
“Sim, tenho. Tenho que encontrar o tratamento certo para minha mulher, meu irmão.”
“Você quer que eu vá até aí? Posso te apanhar na clínica e a gente pode conversar.” – ofereceu
o seu irmão.
“Muito obrigado, brother! Mas tenho de ir pra sala de repouso ficar com ela. Depois vou levá-
la direto pra casa. Mas quero conversar com você ainda hoje. Me dá essa força aí?” – perguntou a ponto
de entrar em desespero.
“Com certeza, brother! Estamos juntos.” – conformou-lhe seu irmão.
Uma das amigas mais próximas de Yared era psicóloga. Ela o aconselhara a
começar a se envolver com algum tipo de atividade pois percebera que ele estava
prestes a ficar gravemente doente da cabeça.
Ao longo de todos os dias, seus pensamentos e pronunciamentos eram voltados
para a perda da esposa. E pelas noites adentro, chorava amargamente, e não havia quem
o consolasse dentre todos que o amavam. Estava esgotado de tanto gemer. Toda noite
molhava sua fronha com seu pranto, inundando com lágrimas o lugar do seu repouso.
Seus olhos se mostravam consumidos, envelhecidos por causa da tragédia do
falecimento recente.
Depois desse diálogo com essa terapeuta, o professor decidiu ministrar um curso
de inglês gratuito. Em resultado disso, escolheu uma comunidade religiosa carente para
esse propósito. E uma terapia ocupacional para sua cura foi iniciada.
“O tempo e o espaço também são muito importantes como referenciais para o terapeuta, que
deve observar o passado, atuar no presente, mas vislumbrar o futuro, a fim de orientar o novo caminho
de possibilidade que se abre.” – Fernando Freitas CS
Línguas e artes
Cinco meses havia transcorrido desde que sua esposa havia passado para seu
descanso eterno. Numa manhã de setembro daquele fatídico ano de 2017, por meio de
uma conversa no aplicativo de troca de mensagens, Yared teve contato com Ani Lorac
pela primeira vez. Observando atentamente a foto do perfil no aplicativo
multiplataforma de mensagens instantâneas, ele depressa percebeu que ela era uma
mulher bonita. Charmosa. E ruiva!
O dia para a entrega das marionetes foi combinado por meio de uma conversa
entre o empreendedor de idiomas e a profissional de artes via aplicativo de mensagens.
Lorac: No sábado dia 30 nossa Associação vai realizar mais um evento de arte. Ao invés de entregar suas
peças em mãos, gostaria de levá-las para a exposição. Pode ser?
Yared: Sim, claro. Eu vou!!!
Lorac: Vai ter um concurso. Vamos ver se eu vou ganhar....
Yared: Claro que você vai!
Lorac: Obrigada!
Yared: Meu voto é seu!
O recinto se assemelhava a uma casa senhorial enorme com dois andares. Bem
no estilo colonial. A fachada barroca de cor forte colada com os demais prédios numa
mescla multicolorida era o destaque daquela arquitetura clássica.
Situava-se na zona alta da enladeirada cidade turística vizinha. Podia-se ver
muitas peças de arte de todos os tipos dispostas sobre dezenas de mesas por todos os
lados.
Galhos, raízes e troncos de madeira tornaram a ganhar vida nas mãos de artistas
habilidosos, transformando esses galhos em bichos da região, pessoas e instrumentos
musicais. Havia a produção tanto de camponeses em madeira, como também de peças
religiosas e carros de boi. A principal matéria-prima era a madeira umburana, bem
característica da região. Podia-se contemplar carrancas de anjos barrocos alegres e
gordinhos. Havia artista que fizera esculturas humanas, animais e figuras do imaginário.
Produções feitas em raízes e troncos de árvores descartadas. Bonecos de Mamulengo
em madeira também podiam ser admirados. Havia trabalhos maravilhosos por “dar
vida” aos olhos dos bonecos de barro, utilizando o alto-relevo e a pintura.
Ao escanear o interior do salão, de imediato, Yared pôde captar a visão dos seus
bonecos. Estavam trajados e pintados de uma forma admirável. Suas encomendas
artísticas estavam no centro de uma daquelas inúmeras mesas expositoras. Arrodeadas
por outras peças de arte de Lorac, se destacavam pelo brilho e disposição das cores.
Eram verdadeiras obras-primas!
A artista não estava no local naquele momento. Até que... naquele meio tempo,
num intervalo de quinze minutos mais ou menos, os olhos deles se encontraram pela
primeira vez. Finalmente, ele pôde vê-la em carne e osso.
Já à primeira vista, a artesã se apresentou como uma mulher muito bonita e bem
cuidada. Era muito atraente — rosto bem formado, queixo firme, boca bem desenhada,
lábios cheios, olhos espaçados; seu corpo era mais para o tipo mignon, muito esbelto, de
pernas bem torneadas. Seu sorriso era cordial e convidativo.
Aparentava seus trinta e tantos anos de idade. De aparência jovial, do tipo bem
com a vida. Um metro e cinquenta e cinco centímetros de altura. Pequenos olhos
castanhos. Pele muito clara com sardas salpicadas aqui e ali no rosto e pelo pescoço.
Seus cabelos eram vermelhos como uma brasa incandescente e lhe caíam sobre os
ombros como cascatas de cobre.
Tornou-se de imediato evidente para Yared que aqueles cachos cor de âmbar
avermelhado eram obra exclusiva da natureza, e não resultado de qualquer tintura mal
feita num salão de beleza de terceira categoria.
A mulher tinha feições ainda mais formosas do que ele tinha visto na fotografia
de perfil do aplicativo multiplataforma de mensagens instantâneas.
A linda fornecedora se aproximou do seu cliente com um sorriso encantador e
educadamente perguntou:
“Yared?!”
“Lorac?!” – Yared devolveu-lhe a pergunta e o sorriso.
“Boa noite!” – aquela saudação foi oferecida de uma forma gentil e vibrante.
Trocaram beijinhos nos rostos e se abraçaram.
“Boa noite!” – ele ecoou para a artista, já demonstrando estar embevecido com
aquele encontro, com a primeira impressão que estava tendo da moça de cabelo
acobreado.
Ele pensou:
- Pareceu-me que um fluxo de energia tinha varrido nossos corpos por inteiro.
Ambos tivemos a mesma sensação, sobre a qual conversamos mais tarde.
Ali jazia um mistério – o segredo das raízes. Era notório, por conseguinte, que
havia laços profundos entre as raízes das almas dos dois. Às vezes, dois amigos são
mais intimamente ligados do que dois irmãos.
Aquele raciocínio lógico fora em enorme medida persuasivo para conter seus
sentimentos sobre aquele primeiro encontro com Lorac.
Não obstante, os sentimentos, de maneiras não totalmente compreensíveis, são
fortes o suficiente para insurgir o tempo todo. De forma consistente e persistente! Eles
tomam conta de todo o nosso ser assim que nossa mente controladora descuida apenas
um pouquinho. Como resultado, ela deixa de exercer sua autoridade sobre nós, fazendo
aflorar nossos desejos contidos.
Lorac estava mexendo com sua cabeça. A lembrança constante dela não havia
diminuído seu jugo sobre ele. Tinha achado seu aspecto feminino tão poderoso, tão
atraente e tão insinuante que lhe estava sendo difícil renunciar a ele.
Ele teria que afrontar o dilema: tentar conhecer melhor aquela mulher, ou
simplesmente esquecê-la e levar sua vida como se nunca a tivesse visto antes. Assumi-la
seria uma mudança de atitude radical.
Seria sair do seu mundo ordinário, comum, de sempre, o qual estava adaptado
para um novo mundo fantástico, talvez imaginário, onde não se sentiria seguro, nem no
controle de si mesmo. Como poderia seguir seu coração se isso significava colocar seu
status quo em perigo?
Que fique claro que aquela última alternativa acabou sendo uma iniciativa
inconcebível para Yared. Seu ímpeto e motivação interiores eram de aproximar-se da
artista de cabelos castanhos avermelhados.
Daí, ele elaborou um plano de ação a fim de conciliar as duas alternativas – no
bom inglês fight or flight – traduzindo: lutar ou fugir!
Estava ansiando ardentemente se achegar a Lorac. Queria saber mais sobre ela.
De uma forma ou de outra, daria um jeito de disfarçar a irrupção vulcânica daquele
desejo. Talvez, tudo pudesse começar com uma possível futura parceria profissional.
O professor ficara dividido entre dois valores de vida muito em desacordo entre
si. Dois caminhos irreconciliáveis a seguir.
No entanto, uma decisão obrigatória e pendente precisava ser tomada. Ele não
tinha como ficar indiferente.
“...alguns valores e parâmetros são melhores que outros. Alguns conduzem a problemas bons
(do tipo fácil e simples de resolver), enquanto outros levam a problemas ruins (do tipo difícil e complexo
de resolver).” – Mark Manson
Seu desejo original e real, imergindo do seu id, era conhecer melhor aquela dona
com grande sexy appeal.
Sentiu-se provocado a ver se, por acaso, ou por iniciativa, poderia conquistá-la
amorosamente para si.
A essa altura, estava inteiramente possuído pela ideia de começar uma paquera
com aquela mulher de cabelo de cobre.
“O papel crucial que a sexualidade desempenha na união dos casais evidencia o primado da
carne sobre o espírito, bem como a sabedoria da carne. Somos tentados a desvalorizar a carne em
comparação com o espírito, como se o que se faz a partir da necessidade física, do desejo e do amor
sexual tivesse menos valor que os benefícios da razão e da moralidade.” – Bert Hellinger
Em última análise e na compreensão final, aquela arquitetada proposta de
parceria profissional era tão-somente um pretexto para reencontrar a artista. Em última
instância, ele precisava ficar de bem com sua cabeça.
Sem dúvida nenhuma, essa ideia era capaz de compensar sua mente
disciplinadora sobre o que ele ansiava por fazer.
Estava tudo acontecendo tão rápido, tão fora de controle que Yared estava bem
ciente de que, se não pusesse freio em seus impulsos, e deixasse as coisas correrem
frouxas, poderia acabar tendo um envolvimento amoroso com Ani Lorac.
Sabia que se fosse encarar seus prazeres mais profundos, as consequências
poderiam ser devastadoras por viver um amor proibido.
Por dias a fio lutou contra aquela dualidade. Aquela neurose. Aquela luta titânica
entre o id e o superego. Pensamento e sentimento. Razão e emoção. Aquele binômio se
digladiava no seu universo psíquico.
Ter conhecido aquela mulher de cabelo acobreado lhe colocara diante de uma
nova conjuntura – um desafio.
“Lembro-me de me sentar recatadamente enquanto me tiraram o retrato. Ainda tenho essa foto.
A imagem é: 'Vejam que menina encantadora eu sou’. Meu pai costumava dizer: 'Tudo o que uma moça
tem que fazer é sorrir, e terá tudo o que quiser’. Assim, continuei a vida sorrindo enquanto meu coração
se despedaçava por dentro.” – Alexander Lowen
2
Mudança de planos
“...te guardes de uma mulher iníqua e de aspecto macio de uma língua estranha. Não cobices
sua beleza em teu coração, e não te deixes cativar pelo piscar de seus olhos, pois por causa de uma
mulher licenciosa se pode ver o homem em situação de implorar por seu pão...” – Shelomo
Propostas indecentes
Aquilo era muito mais do que ele havia previsto. Era tempo de sobra para tratar
ideias de trabalho e planos de marketing. Além do mais, essa chance de um encontro
reacendera sua expectativa de um flerte com a ruiva.
Ambos estavam cientes de sua autojustificativa para a reunião. Era um
analgésico mental para a dor da culpa.
Para ser realista, em certo sentido, os dois tinham o desejo sincero de estudar um
ao outro melhor. E muito mais profundamente – em todos os detalhes possíveis.
Yared não parava de pensar no compromisso. Seus nervos tinham passado a
semana inteira em constante atividade e sua cabeça parecia que ia explodir com tantas
ideias e elucubrações.
Na tarde do seu primeiro encontro com Yared, Ani Lorac estava usando um
longo vestido preto. Seu cabelo ruivo desalinhado estava preso num coque descuidado,
mas ainda assim charmoso no alto da cabeça, deixando à amostra seu pescoço bem
torneado e com sardas. Yared se viu diante de um par de penetrantes olhos azuis. Ela
estava carregando um par de pesadas sacolas reutilizáveis de algodão bege com vetores
logo reciclagem verdes característicos.
A artesã tinha comprado uma abundância de materiais para seus trabalhos de
arte. A grande quantidade de itens era bem perceptível pela protuberância e a projeção
de alguns papeis coloridos pelas bocas das sacolas.
Portando-se com todo cavalheirismo e atenções, Yared pegou seus pertences da
sua mão e assumiu o peso das suas compras.
Cumprimentaram-se cordialmente com um polido “boa tarde!”. Beijaram-se nas
faces e caminharam até à praça da alimentação a convite do gentleman.
O linguista e a artista sentaram-se a uma mesa de café e, na maior parte do
tempo, levaram um papo sobre negócios, família, projetos profissionais e muitos outros
assuntos.
O vestido longo que Lorac estava usando tinha um cavado decote em “V” na
parte da frente que se repetia na parte de trás deixando um palmo das costas da moça à
amostra. Ela o havia colocado sem sutiã. Aquilo era com facilidade discernível aos
olhos atentos e libidinosos de Yared.
Ela estava usando uma corrente fina de prata. E algum tipo de joia dependurada
estava aninhada por dentro da roupa. Seguramente, repousava com delicadeza entre seus
bustos.
Os olhos cautelosos e cobiçosos de Yared, vez por outra, fitavam-nos se
esforçando para obter qualquer vislumbre que fosse da beleza desnuda daquela mulher
desconhecida.
Lorac tinha planos para uma Feira Internacional de Arte que iria acontecer em
breve – num segmento de tempo de poucos meses – talvez três ou quatro.
Ela pretendia aumentar e atualizar suas atividades profissionais, como todo bom
empreendedor.
Yared mantinha uma atitude solícita de apoio naquele colóquio que era uma
mescla de negócios com caso amoroso. Ofereceu-lhe alguma ajuda, caso ela o quisesse
como sócio.
“Você sabe?” – começou ele.
“Tenho algumas economias guardadas para qualquer emergência. Também
para o caso de surgir uma grande oportunidade. E eis que estou diante de uma, e
pretendo mudar meus planos pessoais iniciando um projeto com você.”
“Humm... é mesmo? Como o quê, por exemplo?” – perguntou curiosamente a
artesã.
“Se você não se importar muito eu poderia investir algum valor no evento da
Feira Internacional de Arte. Talvez pudéssemos começar uma parceria de negócios.” –
ofereceu generosamente o coach de idiomas.
Lorac o olhou pensativamente e dirigiu-se a ele aquiescendo:
“Bem, nesse caso, acho essa uma excelente ideia. Além disso, você pode
conseguir um grande lucro com seu investimento.”
Com lisonjas apropriadas, ela pareceu fascinada pelo que ele dissera, por algum
motivo que ele não podia imaginar. Yared percebeu perfeitamente que ambos estavam
abrindo as portas para uma aproximação cada vez maior.
“Fechado! Alegra-me saber que você tem interesse. Pode significar a abertura
para grandes oportunidades e bênçãos!” – assentiu ele com um aceno de cabeça e
sorrindo largamente.
“Tem alguma outra proposta a fazer em prol da minha felicidade financeira,
Yared?” – inquiriu de forma jocosa.
“Não. Por agora, isso é tudo. Quem sabe no futuro?” – comentou ele
igualmente jocoso.
O fetiche da calcinha
A viúva negra
Sem volta
Para ajudar matar o tempo, Yared pegou um livro de uma das fartas estantes e
começou a folhear a capa e a contracapa da obra de Diana Gabaldon – OUTLANDER
– A Viajante do Tempo:
“Ao conhecer Jamie, um jovem guerreiro das Terras Altas, sente-se cada vez mais dividida entre
a fidelidade ao marido e o desejo pelo escocês. Será ela capaz de resistir a uma paixão arrebatadora e
regressar ao presente?”
No entanto, uma ou duas horas depois, com um movimento rápido, Lorac sacou
seu celular da bolsa e discou para uma amiga. Segundo ela, uma membra da mesma
igreja que frequentava. Pelo que pareceu do bate-papo, elas haviam combinado de se
encontrar mais tarde naquela noite.
O coração de Yared desfaleceu à perspectiva de ter que deixar Lorac. Afinal,
eles poderiam ficar mais tempo juntos. De maneira especial, agora que tinham bebido e
seus ânimos estavam altos.
Ele teve o leve pressentimento de que aquilo era um teste – um jogo mental.
Lorac não queria parecer fácil demais. Queria elevar em alguma medida o seu valor
sexual de mercado.
Ela tinha pleno conhecimento de seus objetivos e intenções, e sabia que havia
naquele possível relacionamento uma margem boa de realização para encaixar suas
metas e vontades.
Há coisas que se guardam a sete chaves, mas, uma vez que se tenha ciência
disso, o próximo passo fica mais fácil.
A artista disse que não poderia ficar por mais tempo de forma alguma. Aquela
afirmação veio sem qualquer desculpa ou explicação. Mesmo assim, Yared lhe ofereceu
uma carona de táxi até o local onde ela deveria se encontrar com a amiga. Embarcaram
num táxi e partiram.
Por volta das 8:00 da manhã do dia seguinte, Lorac enviou uma mensagem de
texto via WhatsApp. Ela postou uma foto sua em anexo. Parecia apreensiva e esgotada.
Yared perguntou:
“Onde você está agora? Não foi pra casa?”
“Não! Ainda estou na casa da minha amiga. Não estou com vontade de voltar
pra casa. E afinal, sei que a briga vai ser grande!”
Yared lhe deu o seguinte conselho:
“Não! Vá pra casa! Você ainda tem um parceiro. Uma filha pequena. E uma
casa pra cuidar. Diga ao seu companheiro que se atrasou. Diga que não pôde voltar
pra casa tarde da noite. Fala que decidiu dormir na casa de uma amiga. Vai ficar tudo
bem.”
Assim fez Lorac. E mais tarde naquele mesmo dia, ela lhe enviou outra
mensagem. Tudo estava sossegado.
No que dizia respeito a Yared, não havia mais dúvidas. Lorac estava prestes a
terminar com seu companheiro. Ficou evidente, por esta razão, que ela estaria livre para
começar um relacionamento amoroso com ele. Aquilo era apenas uma questão de
tempo. Muito pouco tempo por sinal.
3
Troca de amantes
“A separação leviana é vivenciada como um crime grave, pelo qual alguém tem de pagar.” –
Bert Hellinger
Lábios de mel...propósitos de absinto
Don Juan
Migalhas de prazer
Era quase Natal daquele ano. Yared tinha uma filha morando em outra cidade.
Ela estava vindo com suas netas para vê-lo nas festas natalinas. Pai e filha marcaram um
encontro em um shopping próximo. Eles se encontrariam. Conversariam. Fariam uma
refeição leve, juntos em família. E o avô compraria alguns presentes de Natal para as
meninas também.
Yared aproveitou a oportunidade para marcar um novo e decisivo bate-papo com
Lorac. Eles se encontrariam no mesmo shopping e sairiam para jantar.
Desse modo, após a celebração doméstica, o casal voltaria a se ver.
Lorac estava esperando por Yared numa das lojas de artigos femininos. Tinha
um lindo vestido preto nas mãos.
Como prometido antes, ele pagou por suas roupas novas. Ela também cuidou de
que suas unhas fossem cuidadosamente manicuradas. Além disso, recebera uma
massagem relaxante nos pés naquele final de tarde. Feito isso, foi ao banheiro trocar de
roupa.
Não muito tempo depois, a ruiva apareceu para ele com um olhar sedutor.
Aquele vestido preto estava posicionado no meio das pernas. Era apertado. Sua parte
superior era ainda muito mais justa. Os seios de Lorac estavam espremidos na parte de
dentro insinuando seus pequenos mamilos. O perfil dos seus quadris se destacava.
Ela deu uma rápida voltinha para a apreciação do seu admirador. A artista tinha
uma bunda bem definida. Firme e empinada. Aquela visão acendeu os instintos sexuais
de Yared como eles jamais haviam sido despertos antes.
Havia sido quase dois anos inteiros sem ver uma mulher. Devido à doença de sua falecida
esposa, tratamento e luto, a sexualidade de Yared tinha sido interrompida. Ele estava totalmente abstêmio.
Por conseguinte, estava com uma acentuada vulnerabilidade nessa área – naquela situação, migalhas de
prazer significavam um banquete para ele.
Yared, de forma alguma, tinha sido dado a relações extraconjugais. Sequer tampouco tinha
mantido relacionamentos com amantes durante seu casamento.
Por exceção, tinha havido alguns raros casos de flerte. Pega-aqui-pega-ali. Amassos e beijos
rápidos com algumas alunas mais oferecidas. Todavia, para seu padrão de princípios e valores ele tinha
sido fiel até que a morte os separe. Literalmente. Como de fato acontecera.
Agora, mais do que nunca, lá estava uma mulher só para ele. Bonita. Jovem.
Ruiva. Estava olhando só para ele. Estava vestida só para ele. Estava pronta só para ele.
Estava sensualmente sorrindo só para ele.
Esse fato alvoroçou o sangue em suas veias com uma descara de adrenalina
misturada com dopamina. Quase podia ouvir o TUM-TUM do seu próprio coração
batendo aceleradamente.
Como ele havia imaginado antes – não haveria mais volta a partir dali.
Yared pediu um táxi e eles seguiram para um restaurante dançante e elegante ao
sul da cidade.
Por azar, o motorista – com barba por fazer e vestido em andrajos – era um
homem sem modos e um mau condutor. O veículo era velho e estrepitoso. Os assentos
cheiravam vagamente a tabaco e à gasolina. Resolveram trocar de táxi e pediram que o
cara parasse o carro assim que o tráfego de veículos o deixasse. Estavam bem no setor
boêmio do centro da cidade quando Yared deu-lhe o sinal definitivo de parada.
Ao descerem do carro, Lorac olhou em seu entorno e respirou fundo. A rua
estava empesteada com uma fumaça e um fedor pungente característico. E ela disse:
“A maconha tá solta no ar. Você pode sentir o cheiro disso?”
Yared tinha sido policial tempos atrás. Tinha sido treinado para reconhecer narcóticos e pessoas
viciadas em drogas. Fazia parte do seu trabalho naquela fase da sua vida. Sabia muito bem, por
experiência própria, que a fumaça e o odor vinham dos cigarros de maconha. E sabia muito bem que os
supostos inocentes usuários de drogas eram de fato sócios de traficantes.
Havia largado a carreia de policial a pedido da sua mulher. Sua noiva naquela época. A Sra.
Lovingdale tinha um espírito pacífico. Altruísta. Cordial. Abominava violência e conseguira convencer
seu noivo a fazer a migração de carreira.
Desse modo, Yared pediu afastamento do serviço público. E escolheu se dedicar exclusivamente
à educação como professor de idiomas.
É uma dádiva a capacidade singular do ser humano de escolher seu caminho e descobrir um
significado em toda experiência empreendida.
“O vínculo entre parceiros exige que o homem deseje a mulher como mulher e que a mulher
deseje o homem como homem. O vínculo não se estreita completamente quando os parceiros se desejam
por motivos diferentes: por passatempo ou adorno, como provedores, por ser um deles rico ou pobre,
católico ou protestante, judeu ou muçulmano, hindu ou budista; porque um quer conquistar, proteger,
melhorar ou salvar o outro; porque um quer o outro seja, sobretudo, pai ou mãe dos seus filhos.
Parceiros que se juntam com esses objetivos em vista não consolidam uma união capaz de resistir a
crises graves.” – Bert Hellinger
Já no restaurante foram servidos com o prato preferido de Yared – salmão com
salada. O garçom também trouxe cervejas para a mesa. Eles estavam desfrutando de um
magnífico jantar e momento na companhia um do outro.
Yared convidou Lorac para o salão de dança. Dançaram uma. Duas. Três
músicas juntinhos. À queima-roupa. Peito no peito. Coxas nas coxas.
Como a mulher pôde dançar sem a menor dificuldade e com grande prazer
acompanhando muito bem seus passos, ele ficou encantado por ter achado uma boa
dama. Yared era reputado nos arredores como pé-de-valsa: título usado para alguém que
domina a arte da dança.
Parceiro descartado
“Quando alguém se decide por uma coisa, geralmente precisa abrir mão de outra. A coisa pela
qual se decide é aquilo que é, que se realiza. A coisa de que se abre mão comporta-se, em relação ao que
é e que se realiza, como um não-ser.” - Bert Hellinger.
No dia seguinte, Lorac entrou em contato com Yared por telefone. À tarde, lhe
disse que era realmente o dia em que comunicaria o rompimento. Continuou lhe
enviando mensagens até que finalmente desabafou:
“Está feito! Está acabado! Estou livre pra ser sua, meu rei maravilhoso!”
Yared disse que estava tudo certo. Ela não deveria se preocupar com mais nada.
Tudo ficaria bem.
Agora Lorac era uma mulher livre. Ele poderia ews-la como sua companheira.
Poderia começar um love affair com ela. E o mundo os envolveu pleno de novas
possibilidades.
Yared postou uma música no zap de Lorac em homenagem ao início daquele
romance entre as línguas e as artes.
“Você não é produto das circunstâncias, você é produto das suas decisões.” – Viktor Frankl
Na quarta-feira, dois dias depois que Lorac terminara com seu companheiro, o
novo par se encontrou num shopping da zona sul abastada da cidade. Fizeram uma
refeição leve e rápida – ainda estava de tardezinha. Conversaram um pouco – olho no
olho, como um casal apaixonado. Passearam de mãos dadas contemplando as vitrines.
Yared beijou Ani Lorac pela primeira vez. Foi um beijo romântico e com muita
paixão. A ruiva sentiu o membro ereto roçando sobre sua coxa. Sorriu sorrateiramente e
o arranhou, deslizando as unhas sobre as costas do seu homem.
Dali a instantes, depois de trocarem algumas palavras a mais, partiram para um
hotel costeiro da cidade, que de improviso Yared tinha escolhido através do seu celular.
Numa de seus inúmeros bate-papos por meio do aplicativo de mensagens, Yared contara a Lorac
que era um massagista tântrico. A marchand ficara muito excitada em saber sobre essa sua aptidão.
Ela lhe fez muitas perguntas sobre o assunto. E o linguista recheou sua explicação com detalhes
lhe contando os tabus. Prazeres. E deleite das clientes. A partir da qual ele percebeu o grande interesse da
sua namorada pelo tema.
“Bem, esse tipo de massagem é mais terapêutico do que qualquer outra coisa.” – começou o
linguista em sua explanação.
“Para a mulher, se chama ‘massagem yoni’ – ou massagem na área genital. Pode-se usar óleos
relaxantes e aromáticos a gosto e escolha da cliente.” – prosseguiu o massagista.
“Essa prática não significa fazer sexo. Não é um coito. Existe técnica e seriedade. O objetivo é
fazer com que a mulher relaxe. Descarregue as tensões nervosas acumuladas. Acima de tudo, se ela tiver
vivenciado períodos de anorexia de intimidade prolongada.” – acrescentou Yared.
“Meu rei!” – exclamou Lorac.
“Você tem tantas habilidades excelentes. Essa me surpreendeu bastante. Não sabia nem que
existia esse tipo de massagem, muito menos que você soubesse aplicar.”
“Sim, sei. Fiz curso para isso. Já atendi várias clientes. Ficaram satisfeitas, viu?” – disse ele
com um sorriso maroto.
“E elas...? Elas...?” – a cabelo ruivo acobreado já bem agitada iniciou a pergunta que Yared
completou:
“Gozaram? É essa sua pergunta, né?” – indagou ele com uma risada.
A artista deu uma gargalhada surpreendentemente profunda e imoral do outro lado da linha.
“Sim. Algumas sim. Outras não.”
“Algumas com gritos de prazer!” – acrescentou ele rindo.
“Seu tarado safado!” – exclamou a artista. Quase gritando.
“Minha querida Lorac, não seja tão preconceituosa. Esse tratamento nada tem a ver com tara
ou safadeza.” – tentou acalmá-la o massagista.
“Este é um método de cura indiano milenar. Seu objetivo é a liberação de tensões
congestionadas. O massoterapeuta apenas serve de instrumento para o alívio da paciente.” – explicou
mais detalhadamente.
“Sei não, viu?! Tenho muita coisa ainda pra aprender na vida.” – se lamentou ela.
“Vivendo e aprendendo minha querida.” – finalizou Yared sorrindo.
Depois de tudo apaziguado no restaurante, o par seguiu para seu quarto no hotel.
Lorac pediu licença e foi até ao toilette. Yared aproveitou sua ausência
momentânea. Tirou a calça comprida e a camisa. Atirou-se na cama, se esticando
relaxadamente de costas sobre aquele leito de casal king size duplo.
Cerca de 30 minutos mais tarde, depois de uma chuveirada quentíssima,
daquelas que deixam os espelhos embaçados por causa do vapor da água extremamente
abrasadora, Lorac voltou devagarzinho para o dormitório da suíte.
Estava vestida num sumaríssimo maiô na estampa plantas do mar com um lindo
detalhe semi transpassado no busto e em tecido de malha resistente e de toque macio.
Trazia na mão direita um pequeno frasquinho de vidro marrom escuro. Os olhos do
coach de idiomas estavam a ponto de saltar para fora das órbitas.
Yared se sentou na cama com um impulso repentino. Ele já havia admirado os
dotes físicos daquela dona arruivada usando roupa. Agora sua forma delineada,
saudável e exuberante se tornara algo que nenhum homem poderia se decepcionar ao
contemplar ao vivo e a cores.
Lorac se aproximou sem pressa da cama. Entregou de maneira delicada o
frasquinho que estava parcialmente oculto na sua mão direita. Deitou na posição de
bruços ao lado do seu massagista. Cruzou os tornozelos no ar, com um brilho malicioso
nos olhos e esboçando um sorriso mal-intencionado, se declarou:
“Estou pronta pra minha primeira massagem yoni, meu rei!”
“Vou lhe dar a melhor massagem que você já teve na vida, sua ruiva gostosa e
tarada!” – respondeu Yared àquele estímulo provocador esboçando um sorriso
libidinoso.
Yared, com o pequeno vidro na mão, tirou a tampa e sentiu o recipiente exalar
um perfume afrodisíaco irresistível. Impresso em letras maiúsculas destacadamente no
rótulo, se lia: ÓLEO PERFUMADO – IDEAL PARA MASSAGEM RELAXANTE.
Daí em diante, não restou nada mais a fazer. Agora tinha que exercer sua função
de massoterapeuta tântrico com a sua cliente de cabelo vermelho acobreado que estava
deitada sensualmente ao seu lado. A sua disposição.
O massagista deixou cair um fino fio daquele líquido oleoso e aromatizado sobre
as pernas da sua namorada.
Começou a massageá-las suavemente. Deslizou suas mãos pelas rijas
panturrilhas sentindo a musculatura malhada. Concentrou a pressão sobre as solas dos
pés, macias e cor-de-rosa. Deu uma firme compressão no estilo shiatsu. Depois
pressionou ainda mais fortemente. Quando seus dedos subiram até a altura da bunda,
Lorac deixou escapar um grito de prazer bem baixinho, porém audível.
Mais óleo foi derramado sobre as costas da ruiva. Yared deslizava com
suavidade. Depois com mais pressão. Em seguida, com mais força. Lorac soltou um
gemido alto.
Ele soltou o fecho da parte de cima do maiô, deixando os seios completamente
livres e expostos. As auréolas eram rosadas e de círculos perfeitos em torno de bicos
pequenos e eriçados.
Agora, a cliente já estava deitada de costas, com as pernas ligeiramente
entreabertas. O massagista derramou mais do líquido do prazer sobre os seios da artista.
Tomou-os em suas mãos. Acariciou os mamilos que já estavam duros pela excitação
provocada pelo frescor e perfume do óleo combinados com o contato físico da pegada
do massagista. A mulher soltou um gritinho enquanto se contorcia com aquelas carícias
extasiantes.
Yared escorregou suas mãos pela barriga e pela pélvis da cliente. Ela estava
trêmula e ofegante. Seu corpo se contorcia com o toque macio. Com o toque lento. Com
o toque forte. Com o toque acelerado. Seus olhos se reviravam. Aquele toque abrasava
sua pele e preenchia suas veias de fogo.
Yared baixou seu traje de banho por inteiro, e deixou de fora a púbis da sua
mulher. Quando os primeiros pingos daquele óleo paradisíaco caíram sobre sua região
genital – devidamente depilada para a ocasião – a artista deu um grito alto de tesão.
Rapidamente, o massoterapeuta aproveitou a oportunidade e começou a esfregar
seu clítoris todo lubrificado e perfumado com a mistura do óleo e do mel vaginal. Lorac,
numa sequência de gritos, gozou loucamente.
Aquele foi o primeiro contato físico íntimo do casal.
Ani Lorac teve um orgasmo intenso e ruidoso com aquela massagem yoni que
seu namorado a havia proporcionado com esmero.
Em frações de segundos desavisadamente chegara a alvorada do dia! Os
primeiros raios dourados de luz do sol se intrometiam pela fresta da janela invadindo a
privacidade do quarto dos amantes.
Por fim, Yared pôde ter a resposta definitiva e prazerosa para aquela
interrogação que viera a sua mente no palco de dança do primeiro encontro:
“Ela é ruiva lá em baixo?”
Os raios ruborizados do sol nascente ao incidir sobre a penugem ruiva de Ani
Lorac deram um toque áureo àqueles fios de cobre íntimos da mulher de Yared. Seus
cabelos cacheados e avermelhados cintilavam à luz quente do astro rei.
Foi uma visão magnífica. Uma imagem artística – digna de um belo quadro.
“Estou admirando a beleza do raio do sol sobre sua pélvis cor de cobre. Muito
bonita essa visão!” – disse ele embevecido a sua namorada.
Ela moveu o rosto em sua direção e passou a olhar para ele com olhos
penetrantes. Segundos passados, lhe disse com lascívia na voz:
“Aproveita, meu rei! Desfruta! Sou toda tua agora!”
Sem dúvida nenhuma, Yared se sentiu um rei ao lado da sua rainha.
“Pela consumação do amor cria-se, entre o homem e a mulher, um vínculo real. Este, por seus
efeitos, é ainda mais forte do que o vínculo real dos filhos aos pais. É absolutamente o mais forte dos
vínculos.” – Bert Hellinger
Natal e Réveillon
Mais uma vez, Lorac teve a ideia de propor que eles se encontrassem em sua
casa em vez de reservar quartos de hotel. Numa conversa do app de mensagens, ela
enviou um texto com uma foto dela de biquini na piscina do condomínio:
- Eu quero você aqui comigo nessa piscina maravilhosa, meu rei!
Recorreu aos mesmos argumentos. Economia de dinheiro. Privacidade. Ficar
mais tempo juntos para o prazer mútuo do casal. Para ela era um argumento muito
sedutor, mas para Yared nem um pouco razoável.
Novamente, o empresário linguista se manteve irredutível e recusou sua oferta.
- Temos as belas praias para explorar. E falando sério, nem gosto de
banho de piscina.
Ela não discutiu e aceitou sua decisão.
“As pessoas são sutis e evasivas, disfarçando suas intenções, fingindo estar a seu lado. Você
precisa de clareza.” – Robert Greene
Fizeram amor a noite toda, e dormiram até bem tarda na manhã seguinte. Yared
sentiu-se como se estivesse no paraíso. Por fim, a felicidade o atingira depois de dois
anos de amargura e falta de uma companhia feminina.
Em sua cabeça, os pensamentos eram de que Lorac estava certa desde o início.
Sua casa era o lugar perfeito para desfrutar de economia, privacidade e prazer.
Um pouco mais tarde, à mesa do café da manhã, Lorac decidiu colocar a questão
financeira em pauta. Ela sabia que não podia esperar o empreendedor de idiomas tomar
a dianteira. A questão financeira era de fundamental importância. E tentou mais uma
vez quebrar o gelo e falar desse assunto com sutileza. Estaria estabelecendo suas
necessidades e expectativas.
“Sabe, o valor que você pode economizar com a gente aqui na minha casa é
muito mais do que eu pago à hipoteca do apartamento e às taxas de condomínio. Se
você pudesse me emprestar esses pagamentos pra esse mês, seria uma grande ajuda,
querido.”
Yared lançou um olhar perscrutador, mas perguntou compreensivamente:
“Quanto você precisa?”
“Serão apenas seiscentos reais! Com isso eu posso pagar as duas contas – a
hipoteca e as taxas de condomínio, meu amor!”
“OK! No entanto, para que não receba esse dinheiro de graça, você poderia
fazer duas peças de arte pra mim? Eu gostaria de ter um unicórnio chinês. Seu nome é
Ki-Lin. E também gostaria que você fabricasse um cavalinho de brinquedo pra meu
neto. Tá certo?”
Ela disse, sorrindo:
“Certo! Isso é fácil! Sem problemas!”
Como tal, Yared pagou as duas contas de Lorac em janeiro daquele ano. O
homem apaixonado ficou enlevado por poder ajudar sua companheira.
Noutra oportunidade, numa conversa com sua namorada, Yared ficou sabendo que ela tinha sido
empregada por quatro anos numa empresa de artesanato.
Depois de um acidente de trabalho, quando precisou fazer cirurgia na perna esquerda e se
afastara do serviço por cerca de 45 dias, a artista foi demitida e ingressara com uma ação na justiça
trabalhista.
Ganhou a causa. O valor que lhe deveria ser indenizado foi dividido em 12 vezes. No mês de
dezembro do ano do primeiro encontro com Yared, Lorac havia recebido sua última parcela do acordo. A
partir de então, ficaria sem renda fixa.