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"Sobre o nada, eu tenho profundidades"
(Manoel de Barros)

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Apresentação

Saudações caro leitor! Sou novo por aqui. Caí de paraquedas


tanto na literatura quanto na vida. Portanto, permita-me apresentar
o autor e dar uma desculpa um tanto esfarrapada para esse rascunho.
Prometo ser sucinto e dizer apenas aquilo que considero importante
para estabelecer entre nós uma certa comunhão.
Comecei a escrever aos 15 anos, após ter o coração partido,
com um monte de desabafos destemperados. Depois de superar a
situação, ainda escrevi em alguns momentos de emoções intensas,
porém esporadicamente. Cheguei até a ficar alguns anos sem
produzir nada, em algumas épocas obscuras de minha história até
aqui.
Minha vida, como a de qualquer pessoa que já tenha concluído
quatro décadas, foi um carrossel, não, melhor, uma verdadeira
montanha russa de experiências, aprendizados e emoções. Tive uma
infância pobre, porém muito feliz em Sorocaba, interior de São Paulo,
onde nasci, amadureci e moro até os dias de hoje. A fase da
adolescência foi também cheia de alegrias, e alguns desafios crus,
mas nada que eu não pudesse superar bem. Aos meus vinte e três
anos, porém, houve a culminância de um processo de ruptura em
meu estilo de vida, com o meu casamento e o nascimento de meu
filho em 2001, primeiro emprego em 2002, faculdade (entre 2000 e
2003), e, finalmente, o falecimento do meu pai, em 2003, que além de
ter me criado, incentivado, sustentado, educado, juntamente com
minha mãe, foi o melhor amigo que eu já tive nessa terra.
A partir daquele momento, a exatos 18 anos, 9 meses e 17 dias,
entrei em um ciclo de tormento, dor, transtornos mentais,
internações psiquiátricas, com intervalos de um equilíbrio razoável,
alegria, gozo e tranquilidade, numa fase longa que me partiu em
pedaços, transformando tudo o que eu sabia sobre a vida, bem como
minha forma de vê-la e vivê-la.
No meio dessa fase, em meados do ano de 2012, entrei em
contato com a mensagem não dualista pela primeira vez, através da
leitura do livro “O Poder do Agora” de Eckhart Tolle, que foi a última
leitura de uma sequência longa de livros de autoajuda que eu devorei,
nas minhas tentativas de sair de uma depressão terrível, paralisante e
profunda, que durou praticamente dois anos.

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Desde então, iniciou-se uma busca angustiante e inspiradora
pela tão almejada iluminação espiritual. Mas a busca não me livrou de
nenhum de meus problemas, e creio ainda que gerou alguns outros,
mais profundos, mas isso é só uma interpretação intelectual do
passado, o que não tem veracidade nenhuma, na minha opinião.
No entanto, a busca me colocou em contato com centenas de
leituras, de livros ditos sagrados e outros seculares, vídeos de
mestres e professores ditos iluminados, e com práticas meditativas,
que a meu ver, aparentemente ajudaram muito mais que qualquer
forma de conhecimento intelectual.
Após 4 anos e meio de estabilidade mental (sem crises
psicóticas), e a partir de março de 2021 para cá, eu me encontrei em
um processo de “terra arrasada”, que a minha psicóloga denominou
“niilismo”, mas no sentido bom do termo, após entrar em contato
com a mensagem do não dualismo radical através dos vídeos de
Guilherme Aranha Coelho, Tony Parsons e Jim Newman. Então, por
alguma razão desconhecida, o ímpeto pela busca foi desaparecendo,
e, apesar de nada ter mudado em minha vida cotidiana, quase tudo
mudou em mim; minha mente, minha perspectiva, minhas relações, e
eu me vi sentindo uma sensação de satisfação consistente e serena,
que me acompanha diariamente, que eu não me recordo de já ter
sentido antes.
Esses textos, portanto, representam minha tentativa de
descrever minhas experiências dos últimos meses.

Sorocaba, 02 de dezembro de 2021

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Prefácio

Escrevi os versos que se seguem entre agosto e novembro de


2021. Eles fazem parte de um conjunto de manuscritos que começou
a tomar forma a partir de março deste mesmo ano, quando eu ainda
estava com a idade de 40 anos. Todos são fruto de um hábito diário
que eu tenho praticado a algum tempo - para ser quase exato, a uns 3
ou 4 anos, valendo ressaltar que isso se tornou mais intenso e
consistente no último ano. Esse processo consiste em me deitar na
cama, atualmente pela manhã, após trabalhar por aproximadamente
uma hora e meia no computador, relaxar e tentar meditar, o que
geralmente me faz entrar em contato com muitos sentimentos e
pensamentos, os quais eu não sabia onde colocar, até começar a
escrever em meu celular, deitado mesmo, nos intervalos entre
momentos de aprofundamento silencioso e de expressão
multivariada. Alguns textos foram escritos no computador, mas
foram poucos, pois, às vezes, escrevo também em outros horários,
quando acontece de eu estar folgado e ter algum sentimento
engasgado.
Quando comecei a preparar o material para uma possível
publicação, estava organizando os textos por assuntos comuns ou
temas, e escolhendo títulos para cada um deles, mas, lendo o arquivo
original, me pareceu mais propício e proveitoso organizá-los por
data, pois cada dia é um dia único, com sua própria particularidade,
ficando cada um deles como uma seção, organizadas em ordem
decrescente (do presente para o passado), com os textos organizados
em ordem crescente (da manhã à noite) dentro de cada seção. Essas
seções encontram-se dentro de capítulos, com títulos que remetem a
algum dos temas dos textos neles contidos, mas fiz isso apenas pela
necessidade de alguma organização. Resolvi colocar os textos em
sequência pois existe uma certa coesão entre eles, o que não é uma
regra absoluta, e isso revela particularidades desse processo gradual
de uma aparente transformação pessoal, pelo qual tenho passado nos
últimos meses, que pode ser mais bem compreendido se os textos
estiverem organizados assim. Também resolvi não os selecionar, para
não deixar nada de fora, mesmo sabendo que isso torna a obra um
tanto repetitiva, principalmente aos olhos dos críticos. Mas eu
escrevo mesmo, quase sempre, sobre a mesma coisa, que não é uma

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“coisa” ao certo, mas é o “propósito” principal a que tenho devotado a
minha vida. Em outras palavras, não consigo controlar o que é
escrito, e a repetição de algumas palavras e conceitos é impossível de
ser evitada. Isso pode parecer tornar o trabalho enfadonho, mas
acredito que voltar sempre ao mesmo lugar pode ser proveitoso ao
leitor mais interessado, pois esta obra não é um livro de poesia
comum, é, sobretudo, sobre um chamado do coração para o
reconhecimento da liberdade que tudo é.
Um hábito que se desenvolveu a partir de agosto de 2021, que
é registrar a data e o horário antes de escrever cada texto, por menor
que ele fosse, e curiosamente adquirido sem ter o conhecimento
prévio de alguma eventual funcionalidade, proporcionou que se
pudesse organizar os textos da maneira descrita acima, o que, como
eu já enfatizei, vai trazer ao leitor externo a possibilidade de
compreender muitas coisas sobre o processo de criação deles.
Outra particularidade desta obra, que é uma sugestão que eu
não sei se já foi utilizada em alguma outra, foi deixar todos os textos
sem título, assumindo que a data e o horário de registro deles lhes
proporcionasse alguma identidade. Na prática, quando se tornar
necessário nomear um texto, ao invés de dizermos: eu li o poema
“Histórias de incongruência” do livro “Memórias perdidas” e gostei
muito; podemos dizer: eu li o poema 12/11/21 - 12:12 do livro “Inefável
Coração” e detestei muito”.
Quanto à conceitualização mais apurada da natureza dos
textos, ou dos temas que eles abordam, vou me abster num primeiro
momento, e torcer para que terceiros bem-aventurados se
disponham ao trabalho.
Obrigado até aqui. Tenha uma leitura muito serena.

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Isso tudo, aquilo, e até isso,
É simplesmente a vida vivendo a vida
(22/11/21 - 0:53)

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Aventuras da manhã
(23 a 26 de novembro de 2021)

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26/11/21

7:12

Antes disso aparecer


Eu já Sou
Depois de se dissolver
Eu já Sou

7:15

Eu quis encontrar
Muito eu busquei

Do que eu já sou
Nunca me afastei

8:24

Não há problema com o eu


Ele não é nem mal e nem bom
No entanto, o seu lugar não é no trono
Pois ele é cego, surdo e ignorante
Durante dezenas de milhares de anos
Ele reinou, e construiu suas inumeráveis estruturas conceituais
Agora que o coração se ergueu das profundezas
Dá até pra ver e ouvir as explosões
Muralhas, templos, pirâmides e torres
Sendo destruídas pela intuição
E quanto mais o eu perde seu domínio
Mais me sinto livre, leve e vivo
Às vezes o eu desiste de lutar
E o nada reina em seu lugar

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8:38

São como as cataratas do Iguaçu


Jorrando, jorrando
Um sentir indefinido
De vontade de explodir-se
Feito fogos treme-terra
E esvair-se em vibração
Ensurdecer-se em silêncio
E voltar-se ao que nunca teve um princípio
O não criado
O não nascido
O não existir mais que perfeito
E sempre presente

8:48

Eu não sou fixo


Sou uma corrente
Uma ponte
Entre o não e o sim
Entre o sempre e o nunca
Entre o lúcido e o insano
Entre o mutável e o absoluto
Entre o saber e o vazio
Entre o mortal e o eterno
Entre o exato e o abstrato
Entre a lógica e a poesia
Entre a história e a realidade
Entre a mente e o Inefável
Entre o mundo e a morada
Entre o céu e o factual
Entre o eu e o nada

11
9:04

A poesia não serve a ninguém


Mas sem ela a vida está morta

10:28

Antes eu queria ajudar a todos


Pensava que era para o bem deles
Mas percebi, com a maturidade
Que eu só queria ver as coisas do meu jeito
Ter o controle
Depois que abandonei o controle
A vontade de ajudar passou
Percebi que fazer bem a alguém
Era fazer bem a mim mesmo
Também percebi que nem todos querem ser ajudados
(...)
Ninguém ajuda a ninguém
Cada um ajuda apenas a si
E o verdadeiro bem é despropositado
Sem escolha
E natural

10:59

Toda aparência é objetal


Apenas aquilo que ninguém pode ver é essencial
E não digo apenas do ver dos olhos, mas da mente também
Contudo, anterior a qualquer coisa que surja
Algo incógnito e eterno pode ser intuído no coração

11:04

Eu sou o nada sonhando que é


um aparente eu
que sonha tornar-se nada

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11:21

Sou amor
Sou terror
Só não sou mais
Meu próprio enganador

11:24

Minha psicóloga é uma figura


Eu conto um trauma
Ela escuta uma cura

11:26

De infantilidade
Em infantilidade
Vou amadurecendo
Em plena idade

11:29

No trânsito eu não sou transeunte


Sou Via
No mundo não sou o vivente
Sou Vida

11:36

Poesia!
A indescritível imagem
De um coração selvagem

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25/11/21

6:35

Eu não faço ideia


Eu não posso entender
Fui arrebatado por algo novo
Desprovido de qualquer característica
Fiquei diante de uma beleza assustadora
Fui reduzido a nada
Sem controle algum
Um misto de impotência com júbilo
De graça e desterro
Tudo é tão belo
Mas nada se compara a Ti
Só posso chorar
Palavras são tão insuficientes
E o pensamento nem Te toca
Eu estou aqui
Como nunca estive
Mas não posso me encontrar
É bem mais que êxtase
Bem mais que amor
Dizer que isso é bom é pouco
É…
(…)
Inimaginavelmente
( )

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6:54

Ele vem me visitar às vezes


Tem sido mais frequente agora
Quando Ele aparece
Eu desapareço
Mesmo sem olhos O enxergo
Sem ouvidos O escuto
Sem tato O toco
Sem mãos, escrevo sobre Ele
Sem palavras, eu digo:
Te amo!
Mas o que isso poderia significar?
É na ausência mais profunda
Que Sua presença envolve
Tudo

11:26

Não sei como nem porque


Mas a vida cotidiana
O mundo, o corpo e o universo
Parecem tão sem importância agora
E não me sinto mal por isso
Tudo vai ficar bem
Mas é que incomoda
Que o pensamento ainda pareça ter importância
Mas quem se incomoda?
O pensamento se incomoda
Logo,
O pensamento está incomodado porque tem mais importância
Não é hilário?
Mas é sempre isso
Ele nunca está satisfeito
Você, no entanto
Tem que dar um jeito de estar
Ou melhor
Ficar de boa até quando estiver de ruim

15
11:31

Na reserva do meu quarto


Eu vivo o infinito
Escrevo deslinguagens

No mundo eu sou um
No coração eu sou nenhum
Na mente: multidões

De dia eu durmo
À noite eu labuto
Nas madrugadas: fal(flor)eço

Tenho muito do nada


Tenho nada de tudo
Estou ausente na Glória da Presença

12:02

Você sempre será o que já é


E sempre foi o que será
Mas, de alguma maneira desconhecida
Encontrar-se é o seu caminho
Sempre o passo atual
Num processo contínuo e indefinido

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24/11/21
07:03

Recolhendo flores no meu jardim


Me deparei com uma cobra
Assustei-me, dei um passo atrás, antes do pensar
E, ali, em segurança, fiquei a observá-la
Como era linda!
Tinha umas escamas pretas, outras azul colonial, extremamente
brilhantes e ordenadas
Como a natureza pode ser tão bela e perigosa?
Mas a cobra é como eu, ou qualquer um
Somos cheios de beleza, sim
Mas também somos aterrorizantes
Somos naturalmente fascinantes
Mas também errantes, insanos
Fazemos coisas tais que até Deus duvida
E depois nos ajoelhamos implorando o seu perdão
A cobra, nós, a vida…
Tudo,
Yugen!

17
8:09

Eu vejo um pombo amarelo


Ele caminha pela praça
A umas três braças
Para,
Me fita nos olhos
E diz:
Grrruuuu
E eu, puto de raiva
Nem consigo o compreender
Meus sentimentos são fortes
Eu só quero matar
Pego o meu estilingue
Tiro um gude do bolso
Estico a tripa
Miro no meio dos seus olhos verdes
Puxo o couro até a orelha
E fico ali por um momento
Olhando pro bombo
E ele, de novo:
Grrruuu
Então eu compreendo!
Engulo o gude
E faço uma prece:
Meu Eu, Meu Eu, não fode!
Me acode!
Me acode!

8:31

Percebi que estou mal


Eu reconheço um sentimento meu
Talvez nem seja meu
Mas reconheço uma sensação
Talvez nem isso
Eu reconheço uma energia
Talvez nem isso
Eu reconheço um aspecto da vida
É isso
É só isso
É a vida se reconhecendo
E a vida nunca morre

18
9:19

Estou sentindo “uma dor assim pungente”


Mas é diferente de antes
Acho que aprendi a amá-la
Não daqueles amores piegas
Não sei,
Parece que eu a aceito
Pelo menos não a odeio
Se a odeio
Não odeio o meu ódio
Não sei se posso me explicar
Se é que pode me entender

9:26

Estava conversando comigo mesmo


E percebi que era papo de louco
Mas tudo bem
Hoje eu me tolero
Me assumo
Eu e eu temos uma bela (auto)comunhão
Não que existam dois de mim
Com certeza é só um
Mas com certeza é mais que um
E, com certeza, é nenhum
Ainda que, com certeza, não há certezas
Viu só, é papo de louco!
E só eu suporto a minha loucura
Quem a suportaria para mim?
Quem suportaria a sua própria loucura?
Mas são tão loucos esses que não se suportam!
E tudo bem,
Pois todos somos
Mas agora, é perceber
Que a loucura, bem expressa
É o coração da sanidade

19
11:35

Qual a pergunta que vem do coração?


Você pode procurá-la
Pode se esforçar
Mais não vai encontrar nada
A pergunta já foi dada
E a resposta é anterior a ela
É a sua essência
É a tua essência
A origem de ambos

16:01

É muito feijão pra pouco caldo


Tenho vontades que não posso suportar
Tenho uma confusão de olhares
Como se uma mente só
Tivesse que dar conta de dezenas de perspectivas
Talvez centenas
Mas o coração não engana
Me diz que nenhuma delas é real
Nem irreal, porém
São só divinos dançarinos e atores
Sem direção
Sem palco
Todos virados no Jiraya
Querendo um pouco de atenção
Tensão
E tesão

20
23/11/21
9:15

Você quis tanto ser normal


Que se tornou uma aberração
Não que as aberrações sejam ruins
São o que são
Eu mesmo sou uma delas
Mas eu, ao menos, admito

9:21

Existe um rolo compressor


Tentando me aplainar
Mas sempre saio do contexto
E viro o avesso de um texto

Existe uma grande cilada


Em cada pensamento cru
E eu sempre caio nela
Tomo no olho do meu rumo

Eu me consumo
Eu me atraio
E depois traio
O meu resumo

Eu me contraio
Eu me expando
Lá fora eu entro
Aqui eu saio

21
9:32

Quem me percebe não sou eu


Tem algo antes do olhar
Que nunca vai poder ser visto
Eu resisto
Mas não posso me encontrar
Nem me perder,
Já tentei
Tudo gira e volta ao nada
É uma doida claridade
Além de qualquer saber
Antes de sequer nascer
Indo e vindo do final
Tal a morte benfazeja
Que nos tira o bem querer
E arrebata o nosso ver
Sem poder, me entrelaço
Me (des)crio entre as linhas
No vazio está o meu pé
E a cabeça
Ah,
A cabeça já rolou
Ladeira abaixo, bem abaixo
No oceano se afundou

22
9:45

O que é a história da nossa vida?


Um tanto concreta demais
Um pouco enjoativa
E demais de assustadora
Quem a conta não faz conta
Do tamanho do buraco
Nem dá nomes aos seus bois
Pois o verdadeiro algoz
Não tá na pele de ninguém
Nem nas intempéries vis
É ocultado a sete chaves
Detrás da tua maior benção
Bem debaixo do nariz
Teu tesouro
Teu refúgio
Teu chamego mais dengoso
Quem o há de destronar?

23
12:14

Estava eu em alto mar


Tomando sol em minha boia de esperança
Uma onda bem pequena, do horizonte me mirou
E veio vindo
Veio
Veio
Crescendo em alta definição
Foi ficando alta, alta, até tapar o céu
E eu nem tive como reagir
Fui engolido
Liquidificado
E afundado às fossas abismais
Tudo parou de se mexer
Olhei pras mãos e a pele estava azul
Não tinha fundo
Não tinha ar
Mas o coração pulsava
Lento
Ritmado
Plácido
E me vi sendo esticado
Esticado
Esticado
Até o corpo e o mar
Se misturarem num só nó
Singelo
Singular
Sinistro
Sintático
Simbiótico

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O eu, a mente e o imo
(18 a 22 de novembro de 2021)

25
22/11/21
0:58

A mente nunca está contente


É só isso, simples assim
E isso é tudo, em absoluto
Mas ela, cega, não vê
Quer algo que possa chamar de sua
Uma ideia
Um conceito
Uma lógica
Uma razão
Uma forma
Uma memória
Uma imagem
Uma história
Um contexto
Pois é feita de espaço-tempo
E só entende sobre coisas
Mas isso é atemporal e adimensional
E é tudo o que há de real
Só para a mente é irreal

1:06

Para a mente, o nada é irreal


Mas para o nada, a mente e tudo o que nela há, incluindo o universo e
o eu, é irreal
O paradoxo, porém,
É que a mente é o nada aparecendo em formas e significados.
O nada, imortal, é o “eu” real

26
1:12

Eu não vou escrever nada


Pois é o nada quem me escreve
Mas não estou nem nas palavras, nem nos silêncios
Apenas sinto
Sabendo que o eu não pode sentir
Olho para cada letra do teclado
E o dedo se move seguindo um impulso ignoto
Sentidos parecem fazer
Contudo não podem exprimir
Nenhuma partícula daquilo que eu vejo

1:20

Hoje eu simplesmente encontrei um amigo,


Ou por ele fui descoberto
Me deixando desconfortável, ele tira de mim
Verdades que eu nem desconfio
E, no encontro em que me sinto desencontrado
Tenho que lidar com as palavras como um fazendeiro que ordenha a
sua vaca
Enquanto as mamas não se esvaziarem
Não se calam os dedos
Nem a voz desse nobre ditador
Que escolhe o rumo da frase
A partir de um mísero "q"
Ou o "o" é que é escolhido
Para dar sentido ao contra texto

1:32

Eu gosto de cair naquele espaço da consciência onde não há nem


consciência nem nada

27
1:40

Eu não desejo mais a paz


Quem está em paz não tem porquês
É o incômodo que move a arte
É o impulso de regurgitar
É a fúria da paixão
É a explosão
É o grito
O estampido
A pressão
O correr das águas
A rebentação
O furacão
A erupção

1:52

O personagem sou eu
Foi de mim que ele saiu
Mas eu não sou só um personagem
Eu não sou só personagem
Antes do que eu era,
Eu já sou

8:07

Seria bom poder relaxar e só ver isso


Mas a mente fica dando um nó dentro de outro
Ela te convence que essa ou aquela é a solução
No entanto, nunca houve problema algum
Note bem a sua agitação,
Apenas se conscientize
Ela te diz que é como uma muralha,
Mas está mais para uma rede
Que só agarra objetos densos
O oxigênio da vida, porém
Está livre para atravessá-la

28
8:19

Uma vez adquirida


A mente se coloca em uma alta posição
E nos convence que só ela pode nos guiar, pois é muito inteligente
Mas como disse o velho sábio:
"A mente é inteligentemente vigarista"
Ela funciona mais como um parafuso mesmo
Nos ilude com seu discurso sobre progresso, aprendizado e evolução
Mas cada movimento seu
É um giro em torno de si mesma
E ela vai se parafusando,
Se atarraxando cada vez mais fundo na madeira da razão, do
significado, da matéria densa
E como achamos que somos ela
Nos vemos presos sem saber como nos libertar
Mas você pode usar o próprio olhar
Para atravessar essa madeira
Sem ter que se abster do parafuso

8:34

O sentimento, às vezes vem em forma de umas pontas de rocha


Afiadas
Densas
Cortantes
Ferindo a paz que julgamos merecer
Tirando-nos da cabine de controle
E nos arremessando porta afora do avião
Cegos, surdos, mudos, famintos, friolentos e feridos
Sofridos
Em queda livre
Rumo ao abismal e incerto desatino
Quem sabe onde vai cair?
E, se não nos agarramos à cauda do velho avião, por medo, ou por
pura idiotice mesmo
O que só ocorre na imaginação
E na psicose esquizofrênica do apego ao passado
Teremos a oportunidade de sermos honestos
E ver com os próprios não-olhos
O que nós temos, somos, e fazemos de fato
Que é nada
Além de qualquer nada

29
21/11/21
7:38

Num universo de pensamento


Onde não parecia haver espaço para outra coisa
Surgiu a lamparina da dúvida
Procurando por algo substancial
Entrando nas fendas
Nos fundos
Rompendo camadas
E tudo era ideia
Conceito
Significado
Mas um dia o óleo vazou
E tudo se incendiou
Nada dos mundos sobrou
Só cinza e pó
E o fogo
Nunca mais se apagou

8:42

Você pode empreender as mais variadas buscas


Mas só pode encontrar a si mesmo
Todo o resto é fútil
E o mais paradoxal nisso
É que você nunca se perdeu de si mesmo
Então, a busca, a rigor, também é fútil
Mas necessária, até certo ponto
E este ponto, não é um ponto no espaço ou no tempo
Ele é sem lugar,
Por toda a parte
Anterior ao início
E posterior ao fim

9:55

Você é a tua própria prisão

30
9:57

Eu penso que existo


Mas sei que isso é um equívoco
Tem essa premissa por trás de todos os pensamentos:
Que sou eu quem os pensa
Mas sei que isso é um equívoco
Se eu existo, os outros existem
E sei que isso é um equívoco
Não consigo me libertar de mim
E tentar é um equívoco
Acredito no nada
Que isso é isso
Do jeito que é
Que nada importa
E cego
Eu vejo

10:06

Apenas acreditar que é você quem pensa


E que você, e os outros existem
Já torna todos os teus pensamentos equivocados
Ignore o que pensa
E sinta

10:39

Eu não vivo aquilo que sei


E eu não sei aquilo que vivo

31
20/11/21
9:36

Você reclama dessa situação


Mas onde está o erro?
Onde está o pecado?
Onde está o defeito, se a situação desejada só existe na tua
imaginação?
Para a vida, todas as situações são mais que perfeitas
Qualquer uma delas
Até você reclamando

9:53

A questão não é não suportar a solidão


A questão é que a solidão é impossível
O corpo se vira sozinho
Mas eu, preciso de você
Por isso te criei
Por isso você me criou
Para que, nessa solitude
Descobríssemos nossa melhor companhia
Um no outro
Outro no um
Outro e um, no Um

32
10:14

Eu sou infinitamente carente


Ninguém poderia me suprir
Tive que fazer de mim mesmo
O ouvido que me ouve
O amigo que me incentiva
O ombro que me consola
O abraço que me aquece
O coração que me guia
O louco que me diverte
O companheiro permanente
Que é o único que consegue me tolerar
O único que suporta a minha sinceridade
Com o qual posso ser brutalmente honesto
Que nunca mais me abandonou
E tudo isso eu tenho recebido
Pelo preço da reciprocidade

10:27

Você é tão prepotente


Que diz: isso não pode acontecer
Qual poder você acha que tem sobre a vida?
Na verdade, isso nem é prepotência
Isso é insanidade
Pois nada precisa ser autorizado por você
Nada precisa de nenhum poder para ser ou deixar de ser
Ninguém pode
A coisa simplesmente é ou não é

33
11:14

Tudo vai mudando


Tudo vem e vai
Tudo aparece e desaparece
Tudo nasce e morre
Tudo é impermanente
Nada é imóvel
Nada é infinito
Nada é imutável
Nada é permanente
Nada é totalmente incognoscível
Eu sou o nada
E tudo é o nada aparecendo

11:20

Não há o que se possa afirmar


Isso não tem nada a ver comigo
Com ninguém
Com nada
Eu não sou nada
Eu sou o nada
Eu sou ninguém
Mas não o eu
O eu não é
É sobre o que é
Que também não é
Eu mesmo não sei
Mas eu sei que é assim
E isso é tudo o que tenho
E basta demais

34
21:10

De noite a lua revela o olhar


Pensamentos passam diante de sua luz
E o sentimento
Reflexo do coração sol
Ilumina todo o ser

19/11/21

6:54

Hoje o sol está oculto


É dia claro, mas o céu está branco
Em meu peito também há nuvens
Sinto-me um tanto encafifado
Não que eu queira saciar a dúvida
Sei que isso é utopia
Apenas uma demanda por expressão
De mais um desses não sei o quê(s)

8:44

Tenho um impulso em mim


De querer solucionar as coisas
Mas tenho visto a inegável realidade
De não ter um manual de instruções
Eles até existem por aí
São vendidos aos milhares
Mas já passei da fase
De acreditar em sistemas placebo
Todos os dias eu olho para os problemas
E acabo vendo que eles fazem parte
Deixam de ser problemas
Se eu puder permitir a vida

35
8:49

Como um velho caipira, com seu palheiro entre os dedos


Eu me sento diante das águas
E fico apenas observando a vida acontecer
Sem demandas
Sem esperanças
Sem metas
E sem compromisso
Aves voando, cantando
Borboletas cintilando
O vento embalando a folhagem
O que eu fiz pra merecer tamanho milagre?
Penso naqueles que sofrem
Me compadeço, também muito sofri
Hoje não digo que não sofro
Mas é diferente
É como se eu estivesse em paz com a dor de existir

18/11/21

8:41

Sempre estive em busca


Sempre precisei
Sempre me faltou
Desde quando consigo me lembrar
Em alguns momentos estive aliviado
Mas na maior parte do tempo estou incompleto
O que é que me falta?
Do que é que eu preciso?
Cansei de correr atrás de mitos
Verdade, paraíso, felicidade, deus, paz…
Tudo delírio
Quero apenas encontrar um fim
Não há esperança alguma
Agora vejo
Sempre fui um condenado
O que foi que fiz de errado?
Existir é o meu pecado?

36
8:53

O que essa vida te acrescentou?


Posses, relacionamentos, experiências?
Onde está tudo isso agora?
Você viveu momentos, eu sei
Mas já se tornaram memórias
E o que você faz com isso?
É tudo o que você tem
Então desista
Deixe a morte te levar
Desapareça
Somente o nada é real

9:02

A diferença entre nós e um animal


É que o animal, quando adoece, se retira de seu bando, busca a
solitude e se entrega ao seu fim
Nós, porém, estamos todos doentes e loucos, mas nunca admitimos,
Seguimos acreditando estarmos sãos, espalhando a nossa desgraça
às crianças e a todos os outros seres do planeta

9:13

Todos acreditamos que sabemos qual é a solução


Se isso, se aquilo…
E a nossa desculpa é que ela está fora do alcance das nossas mãos
Mas não existe solução
Esse é o fato que ninguém enxerga
As coisas são como parecem
Ou só parecem ser
Não há ninguém que possa mudar nada
As coisas parecem mudar às vezes, eu sei
Mas não muda o fato delas serem o que são, independentemente da
nossa vontade

37
9:42

Como um doente pode curar?


Como um ignorante pode ensinar?
Como um louco pode aconselhar?
Como um cego pode guiar?
Então, não acredite em mim!

9:47

Quanto mais eu aprendo, menos eu sei

10:01

Não há pra onde correr


Todos os caminhos se mostraram fúteis
Não há nenhum destino
É só estar onde se está
Não há vir a ser
Pois ser e não ser é o mesmo
Não há nada de valor
Não há nada garantido
Não há nada a esperar
Não há nada em que se agarrar
Tudo se esvai
E o que fica é vazio

19:27

De certa forma
Após décadas de busca
Eu sinto que cheguei num lugar,
Num tipo de definição,
Que não define nada,
Que mais ou menos só define que nada tem uma definição,
Existencialmente
Então só resta a vida cotidiana
O fazer diário
Ganhar um pouco de dinheiro
Cuidar da família e da saúde
Fluir naturalmente

38
A desculpa da poesia
(14 a 17 de novembro de 2021)

39
17/11/21
8:55

Numa tela multidimensional


Expressa-se o ardor do imo
Cascatas sem fundos
Lagos sem bordas
Céus sem cores
Flores sem pés
Onde o ser brinca
Dança
Canta
E inventa amores

9:44

Meus escritos são apenas fumaça


Tem uma fogueira me queimando
A lenha se incendeia, se consome, mas nunca se acaba
Ardendo em paixão
Em fúria
Em regozijo
Em um fluxo ininterrupto de amor
De dor
E de ódio
Como se todos os sentimentos do universo, em um ato
Decidissem se expressar
E quem o apagará?

40
9:54

Vocês pensam que eu escrevo por querer, por prazer


Mas escrevo mesmo
É por pura obrigação
Até que tem certo prazer
Mas ele vem do alívio
De botar nessas palavras
Todo o peso de existir
De sentir
De não saber
De não ter nenhum controle
De não poder mais afundar a bola na água
De ter perdido toda a esperança
De não poder acreditar nem mesmo em mim
De não ter nada em quê confiar
De andar descalço sobre os cacos
De não poder calar o peito
De não poder digerir bem
O anseio
O infinito
E o nada que me dominou

11:00

Não entender não dói


O que dói é o desejo de entender
O esforço
A frustração
A dificuldade em se assentar no incognoscível
Em se abandonar ao mistério
Mas tudo é mistério
Não há mapas
Não há fórmulas
Não há caminhos
Não há métodos
Se houver
São todos falsos
Esteja em lugar nenhum
Saiba nada
Seja ninguém

41
16/11/21
9:46

Eu não conheço mais nada


Não consigo comunicar isso
Nem pra mim mesmo
Não sei o que é essa brisa mansa
Que me arrebata para fora de tudo
Ou para dentro de algo profundo
Tudo se perde
Nada tem nome, forma ou medida
E eu sou teimoso, repetitivo,
E até chato
Na tentativa de descrever o indescritível
É que eu ainda tenho uma vontade louca
De fazer disso algo meu

9:53

Não se engane
Não tem poeta
Não tem poesia
Não tem nada garantido
Não tem nada confiável
É só vazio
Aparecendo como texto
Como mundo
Como paz e agonia

10:04

Você acredita em fábulas


Em promessas e delírios
Em esperanças e confianças
É enganado facilmente
Se ilude e sonha
E ainda assim, teme o futuro, anda ansioso e sofre
?

42
10:14

A busca pela verdade é uma grande utopia


Você nunca vai encontrá-la
Mas pode, ao longo do caminho
Ir aprendendo a não se enganar
E isso, no final, lhe bastará

10:45

É só pelo girar mesmo


Ir entrando como um parafuso na madeira
Atarraxante, cumprido
Descendo, descendo
Em espiral
Em rotação
Sem reação
Pela vontade incontrolável da natureza
Entrando
Afundando
Rompendo as fibras
Os filtros
As faltas
Os falsos saberes
Quanto mais apertado
Mais solto
Mais livre
Mais vivo
Mais leve

43
15/11/21

21:01

Gosto da metáfora do mar


Pois são como ondas
Os sensos e sentidos
Sem sentido
Que trazem novidades
Novas vindas
Novas idas
Novas voltas
Viagens ao desconhecer

14/11/21
21:32

Morrer de ver
O sutil do sutil
Despressurização do crânio
Corpo em berço tenro
Brisa,
Ondulações suaves no espelho
Música silenciosa
Profundidade
No espaço branco, brando
Infinito

21:45

Nem totalmente Ele


Nem totalmente eu

44
21:47

No agitar das águas


Palavras simplesmente pulam
Mas o mar em si é silêncio

45
Entre ser e sentir
(9 a 13 de novembro de 2021)

46
13/11/21

19:03

Essa rocha imensa apareceu no meu caminho


Não havia nada aqui antes, agora isso
Eu tento deslocá-la
Eu tento empurrá-la
Só queria ter tamanho para chutá-la
Longe daqui, longe de mim
Nada que eu faça adianta
Cansado de me incomodar
Vou desistindo
Vou dando mais um pouco de atenção
E percebendo que aquilo que me incomoda
Pode ser útil de alguma maneira
Que, quando não podemos mudar algo
Aquilo pode nos ajudar a ver de outra forma as coisas
Às vezes pode até ser uma inspiração
Não fosse a detestável rocha,
E outras projeções,
Talvez eu nem escrevesse

20:09

Mentiras sinceras até tentam


Eu mesmo, tento me enganar
Mas hoje em dia não consigo
Tudo é um desencantar
Eu até atuo no mundo
Como sempre
Mas em meu âmago eu sinto
Cada vez mais
Que não existem verdades
Ou esse só seria
Um modo mais sutil de autoengano?

47
21:40

Eu estou agarrado numa pilastra de mármore


Para não ser carregado pelo incógnito
Apesar de o amar mais que tudo
Apesar de eu querer partir
Não sei ao certo porque não me solto
Talvez por medo de sumir
Mesmo sabendo que é esse o destino
Mesmo querendo ir eu fico

12/11/21
8:40

É tanto doer
Um doer de faltar
Que vem do se agarrar
Às riquezas e sonhos
Quanto mais se possui
Mais necessidade se tem

8:45

Visitando o porão
Do meu palácio íntimo
Dia após dia,
Venho desentulhando certezas
Velharias herdadas
Fotos e livros
Cartas, jornais
Todo acúmulo das gerações de ideação
Tradições enferrujadas
Sistemas falidos
Aparelhos desconexos
É tanto limpar, tirar do lugar
Que às vezes me dói na amargura
Estranho, que para sentir-me
Precise tanto trabalhar
E para aliviar-me
Precise me desmontar

48
9:18

Um certo eu sofre
Pois entende
Pensa nas coisas
Enquanto coisas
Tem ideias, acredita
E sempre se ilude
Aprende com mestres
E tenta
Tenta
Mas nunca percebe
Louco!

Um certo eu compra
As leis desse mundo
E é tanto saber
Que se confunde todo
Tolo!

Um certo eu mede
Calcula os tempos
Percorre distâncias
E cria para si
O seu próprio casulo
Dele não sai
Pois não pode soltar
Sua mais preciosa
Maneira de olhar
Cego!

Um certo eu dorme
E sonhando se engana
Fazendo de si
Um alguém que é real
Irreal!

49
9:47

Num mundo de cegos, surdos, mudos e loucos


Um pouco de compreensão é luxo

11/11/21

8:28

Eu tento criar estratégias


Eu tento planejar
Eu tento prever meu caminho
Como se a vida fosse um jogo
Como se o personagem estivesse sob o meu controle
Mas a todo momento ele me escapa
Age de acordo com qualquer coisa
Menos com a minha imaginação
E isso é fenomenal
Dá medo, é claro
Mas é de todo milagroso
Como a natureza das coisas
Quem pode determinar o destino?
Quem pode fazer tudo conforme a sua vontade?
Todos se iludem ao pensar que têm escolhas
Tudo acontece sem você, sem mim, sem ninguém
Acontece simplesmente

9:14

Vou descendo por essa escada caracol


Dando passos tímidos
Segurando o corrimão
Com medo de tropeçar
Mas sei que nunca mais haverá volta
Quanto mais eu desço
Mas eu perco contato com a superfície
Cada degrau é uma perda
Porém sinto que estou cada vez mais próximo do meu lugar
A única luz é a que carrego no olhar
Não vejo o fim, somente o próximo degrau

50
9:26

As coisas têm ficado sem os nomes


Sem suas formas corriqueiras
Têm perdido seus significados
Entre elas, também eu
Mas algo não se perde
Algo que não posso saber
De alguma forma impossível
Tem, não acontecendo, não sendo, não fazendo,
Existido e reinado sobre tudo

9:36

Estou de mal das aparências


Eu não consigo mais conviver em paz
Elas me causam um repúdio visceral
Que eu tenho que me retirar
Sei que isso não é bom
Eu gostaria mesmo de poder aceitar tudo
Mas tem algo em mim que se contorce
Se dilata
Toda vez que eu escuto uma conversa rasa, mixuruca, trivial…
Por isso amo a solitude
No regalo do meu imo singelo
Estou livre para mim
Me retiro do concreto
Me afundo no intangível
E desapareço
No expirar de todos os opostos

51
10/11/21
7:15

Chegou o momento da separação


Não que eu tenha desejado isso
Não que eu não tenha tentado de todas as formas encontrar uma
maneira de te levar comigo
Mas hoje, vou ter que te deixar aqui
Seguirei sozinho a partir de agora
Mas não te deixo desamparado
Te deposito aos pés do monte sagrado
Para que ele cuide de seu destino
Pois eu não posso, não posso carregar o peso dessa responsabilidade
Já estou velho, e já fiz tudo o que eu podia
Meu único compromisso agora
É encontrar um lugar dentro de mim
Onde eu possa descansar

8:47

Venho sendo atropelado,


Em câmera lenta
E minhas internalidades são espremidas devagar, letra por letra
Porém, nunca me esvazio

8:55

No meu meditar diário


Totalmente informal, disforme e desinteressado
Ouço os sons da rodovia
Dessas máquinas urrantes
Que me lembram o marulho da praia
E me pergunto se o mundo projetado
Não seria natural também
Qual a verdadeira diferença entre as cidades,
Com seus ninhos de concreto,
De uma floresta profunda ou das campinas longínquas?
Tem vida em toda parte
E toda parte está na vida

52
9:29

Eu estou em constante desconstrução


Os pedreiros trabalham dia e noite
Tiram reboco, tiram tijolos, tiram tudo
Mas nunca há um fim para a obra

9:40

Hoje eu tentei orar


Talvez Deus me escute, eu pensei
Apesar de eu nem saber se acredito ou não
Mas que diferença a minha crença faria para Ele?
Eu só desejo que ele cure o meu irmão
Pois eu não posso
Porém não consegui pedir
Só pude contemplar o fato
Que tenho medo do futuro
E que o futuro não existe
Isso me impediu de prosseguir com a tentativa
Talvez só possa eu, oferecer o meu silêncio

9:58

Eu até quero tentar


Às vezes tento até
Mas levo um choque elétrico
E volto à minha liberdade

53
10:04

Eu pensei sobre o amor nessa manhã


E percebi que ele desapareceu
Antigamente ele estava aqui na ponta do meu argumento
Eu podia dar um curso sobre ele
Mas agora eu não faço nem ideia
Tudo sobre o tema é tão caótico
Desacredito que alguém saiba ao certo o que ele é
É esquisito isso, assim
De perder todas as referências conceituais
Eu digo que amo aos meus, é claro
E realmente amo, de coração
Amo o Inefável, amo a vida
Mas eu não sei o que é isso
Eu não sei

10:22

Meu corpo é obeso


Sou tabagista, sedentário e bipolar diagnosticado
Estou devendo um bom dinheiro
Vivo num mundo que é um hospício
Loucos que acreditam ser sãos
Loucos que acreditam ser doutores
Loucos que acreditam ser mestres
Loucos que acreditam ser líderes
Loucos armados
Loucos empoderados
Tudo parece estar perdido
E pode mesmo estar
Mas o problema mesmo
O meu único
É que eu não vejo mais nenhum problema

54
12:18

Odeio quando eu tenho uma resposta


Quando o intelecto se senta no trono
E fica julgando significados
A graça vai embora, ou torna-se apenas mais uma memória
Caminhos são percorridos
Tijolos de interpretações são empilhados
E colados com a massa da conclusão lógica
Muros são, desta forma,
Erigidos ao redor do coração
Que, sufocado, pede expressão
Tudo isso acontece sem querer
Ainda bem que nada fica em pé pra sempre
Nem a muralha mais espessa
Um dia a casa cai
Que sorte
Que momento glorioso
Então a sinfonia do incognoscível
Mais uma vez pode ser ouvida
No absoluto silenciar do conhecimento
E uma incrível paz se instaura
Quem me dera nela poder habitar
Mas cada vez mais desconfio
Que só entra em seu regalo
Quem deixa a si mesmo para fora

55
09/11/21
8:03

Descobri que minha dor vem da falta de algo que eu nunca perdi
O que eu perco mesmo, quase sempre, é o meu juízo
Por deixar de cuidar do coração
Para me dedicar ao mundo
Não que eu não possa me dedicar a ele
Deixa-me tentar explicar:
É que achar que o mundo é real
É algo que me contrai
Pois nem real nem irreal ele é
E digo mais
Ele é real e irreal
Tão qual o eu
Tão qualquer objeto
Por isso eu morro todo dia
Para perder todos os rumos
E me perder ao me encontrar

8:24

Um escoar de sentires entre as rochas das ideias obsoletas


Uns protopensamentos tentando esticar os seus ramos
A foice do impassível lhes podando, sem piedade, antes que possam
se tornar
Antes que suas sombras se projetem sobre o espelho
Antes que se siga algum caminho
Antes dos discursos fúteis
Só o ficar ali, olhando
Vendo o coração descansar tranquilo
Toda vez que se é surpreendido, pela incapacidade de fazer o viver

56
8:56

É tão belo quando eu faço alguma coisa, e percebo que não sei por
que o faço
Que não sei ao certo o que estou fazendo
Que não sei de onde vem o ímpeto
Que não sei o que virá depois
Quem não sei qual é o propósito
Que não sei se existe algum
Que não sei nem mesmo quem eu sou
Que não sei se esse que não sabe é real, irreal, nenhum dos dois, ou
os dois juntos

11:25

Não existe uma felicidade que se sobreponha à dor, à tristeza e à


desesperança
Mas desconfio severamente que haja algo que, quando nos domina,
faz até o desejo de ser feliz parecer fútil
É que, a gente não precisa buscar mais nada quando constata que
nunca houve algo que estivesse separado de nós
Mas isso é incompreensível
Por isso, ignorado pela massa
Apenas alguns poucos dentre nós, desiludidos, decepcionados,
abandonados, loucos e bagunçados, depois de desistirem mesmo,
podem ver o que esses versos não conseguem descrever
Que a palavra não contempla
Que cala qualquer dizer

11:42

Eu perdi todas as minhas capacidades


Ou aconteceu de eu perceber que nunca as tive
Simplesmente não consigo fazer nada
Mais ainda vejo coisas acontecendo através de mim
Tudo bem que ainda sou o mesmo
Com todas as minhas incongruências
Mas eu não sou mais o motorista do carro
Que, na verdade, agora posso notar
Que sempre esteve desgovernado
Se havia uma direção propositada, era apenas na ideia

57
12:00

É tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Tão bonito
Que eu nem ligo

12:04

É um soltar
Não sei
É um ser solto
Não
É um ser liberto
Não
É um ser tomado por algo
Não
É um respirar
Não
É um deixar fluir
Não
É um observar passivo
Não
É um testemunhar sem olhos
Não
É um tocar o céu
Não
É um tornar-se o céu
Não
É um o quê
Não
É o não
Não

58
12:11

Estou aqui, bem no caminho


Ando seguindo as setas
Direções e rumos
Guiado pela atração
Sendo impelido a dar um passo
Depois outro
Ler a placa
Virar
Revirar
Sempre adiante
Mas,
Do nada, umas coisas sem nenhuma característica de coisa
Me para
E eu perco o fio da meada
Nem sei mais para onde estava indo
Olho em volta e não tô mais onde estava
E as setas?
E as placas?
E o caminho?
E o eu?

12:30

Quem mergulharia comigo,


Para eu poder mostrar-lhe essas coisas, que eu tanto aprecio?
Quem seria assim tão solto
Que o mar pudesse carregar até aqui
Onde eu encontro tantos nadas
Onde eu perscruto o impossível
Onde eu desfaço os compromissos
Onde eu encontro o desencontro
Quem seria tão incauto,
A ponto de me acompanhar,
Nestas profundezas tênues
De desestilos e ilogismos?
Quem seria assim ausente de si?

59
19:02

Às vezes me encontro como que flutuando


Feito um barquinho no centro de um lago de singelezas
Uma brisa leve sopra pequenas ondas de impressões suaves
Algumas palavras chuviscam na rebentação
E um sentimento novo nasce
De uma beleza nua e inocente
Tal qual os olhos de um bebê que sorri
É de uma grande graça
O tornar-se tão pequeno
Que a mais sutil das sensações
Transforma todo o seu universo

19:21

A gente continua vivendo


Mas nem o tempo é contínuo
Sempre haverá um não momento
Daqueles que fazem aurora na escuridão
Mas são tão poucos os que os vivem
A maioria os atropela
Com os seus trens de discernimento
São reféns de suas razões

19:42

Quando eu converso com alguém


Eu tenho argumento e opinião pra tudo
Mas basta eu voltar à solitude
Que eu percebo que absolutamente tudo o que eu tinha falado
Era falso, mentiroso e fútil
Apesar de eu ter sido muito franco
Quem me dera conseguir ficar calado

60
19:49

O mundo está em mim, inclusive você


Porém, o mundo também está em ti, inclusive eu
O problema é que eles não são o mesmo mundo
O teu mundo é só teu
O meu mundo é só meu
Contudo, a comunicação entre nós será sempre uma tentativa
fracassada de compartilhar algo impossível de ser visto a quatro
olhos
Inclusive o que somos
Que só pode ser visto com o coração
Esse sim, enxerga

61
Clarezas cintilantes
(3 a 8 de novembro de 2021)

62
08/11/21
8:26

E o tempo está pra fora


E a ideia se desintegrou
E as palavras revelam sua crueza
Sua inutilidade
Não tem maneira de deixar isso só dentro
Mas nada sai em forma objetal
Não se consegue segurar nas redes do discernimento
Algo que a própria fé duvida
Que ninguém pode perceber
Mas que a tudo reconhece
Até as mentiras mais doces
Se esfarelam na presença dessa ausência

8:52

Dá um pouco de vertigem
E às vezes até temo me despedaçar
Mas é só o balanço das ondas
Que me impelem a espremer em versos
Incógnitas sensações de um coração selvagem

9:11

Devagarinho
Tento ir desembramando o meu entender
Passa o fio, puxa o fio
Estica e solta
Mas nunca chego ao final
Talvez eu tenha que andar bolado
E aceitar que os significados são mesmo vãos
Desistir de todos os sentidos
Pode ser minha redenção

63
9:20

Eu vejo algo aqui


Bem diante do conceito
Mas, pera aí
Isso não é o que eu pensei
De um jeito vem
De um jeito vai
E o ator ainda está em cena
Mas sua imagem se esvaiu
Identifico uma presença
Mas já não posso provar nada
A experiência acontece sem mim
E o eu, cambaleando, tenta se escorar em algo sólido
Escuto ainda a voz da lógica:
Mas onde estão os velhos modos?
Onde está a tua sensatez?
Você abandonou a certeza?
Assim você pode morrer
Não seria uma tragédia?
O avião está caindo
E você diz que não se importa?
Minha inveja de tua paz
Me faz querer te enverdadear à força
Como eu fiz lá no Egito
Quando o meu gado me erigiu
Obras que o mundo todo viu

64
9:42

É uma luta,
É um grande sofrimento
Menos para os inocentes
Para os bobos e ignorantes
Que não sabem calcular
Que não sabem simular
Que não querem nada com nada
Só vão vivendo
Só vão deixando-se escoar
Só vão esvaziando-se
Tiram sarro do que é sério
Dão risadas fora de hora
São tão bobos
Que acreditam no nada
Se esquecem do passado
Não preparam um futuro
Vão remando suas canoas
Entoando canções de amor
Que bocós
Que inúteis
Tenho ódio
Pois a mim cabe cuidar e labutar
A mim cabe encontrar a solução
Mas essas bestas
Só se deitam em suas redes
E o máximo que dão
São coisas que não valem nada
Quando foi
Que a poesia serviu pra alguma coisa?

65
10:02

Nada supera a dor de ser


Nada é tão vívido, intenso
Nada é possível
Nada pode estabelecer consolo quando você se perde de si mesmo
Nada te atrai mais do que o desejo de ser livre
Nada pode te satisfazer plenamente
Nada é tão vazio
Nada é tão incompreensível
Nada é tão poderoso
Nada é tão infinito
Nada é atemporal
Nada é verdade
Nada ultrapassa a lógica, a razão e a necessidade
Nada é
Nada é

10:17

Deixe a vida viver por si mesma


E se conscientize de seu medo
De ser desconstruído, desiludido, desesperado, desintegrado,
desmontado, desnudado, abandonado e aniquilado
Pois ele é o obstáculo que te impede de ser aquilo que já é
O absoluto

07/11/21

7:07

Quando estiver na escuridão


Uma pequena luz lhe bastará
Quando estiver à luz do meio-dia
Cuide-se para não se cegar
Para quem vê, tudo é luz
Mas para o cego, nem um holofote adiantará

66
7:18

Não é possível encontrar a verdade


Mas podemos nos conscientizar das falsidades

7:29

É na presença disso mesmo


Que você tanto discrimina
Que é possível compreender
Que nada é indigno de ser

7:35

Sabe o lugar onde a dor é ausente?


É numa praia onde a água do mar é doce
A areia é de pó de ouro
E o sol é de luar

7:39

O mal não pode ser eliminado


Ele faz parte da existência
Mas pode ser que ele seja reconhecido
E, contudo, sublimado
Pois o mal não é o mal que te pintaram
O mal não é ruim quando não mata inocentes
Ele até é bom, se visto como realmente é
O mal não precisa ser violento
Ele pode ser o que é sem causar dor
Na verdade, condenaram o mal à repressão perpétua
E o mal, por si mesmo, é inocente
Mas a tal repressão, com a incompreensão é que, na verdade,
Geram toda calamidade
Encontre o mal em você
E encontrará a si mesmo
Devolva a ele a sua voz
E ele não te incomodará mais

67
8:12

Se eu te amasse realmente
Se eu fosse totalmente compassivo
Eu seria brutalmente honesto contigo
Eu te destruiria

8:14

Sei que meus versos são extremos


Sei que ninguém os iria amar
Mas simplesmente não consigo
Embrulhá-los com os enfeites da satisfação sensual
O buraco é mais embaixo
E eu não tenho a mínima compaixão
Ou dá na telha da razão,
Ou desce pela contramão
Ou entra até o colo do coração
Ou calo a boca do não,
Não!
Impuro, desnudo, profundo
Até gozar indignação
Que a mente toda arrebentada
Não suporta a pressão
É foda, só pra quem tem culhão
De olhar pro olho do furacão
E encarar a intenção
Que é só tesão
Desmedido
Descontrolado
Dentro da carne da compreensão
No ritmo quente da expansão
Desconcertando
Desenrolando
Dando com o pau na ilusão
Sem pressa
Mas com a maior urgência do universo
Texto inverso
Pra fuder com a alienação

68
21:08

Ando desacreditando em qualquer desses discursos sérios de vocês


Algo me impele a virar-me e mirar o vazio, a ausência
Onde nada tem sentido, porém é de todo paz e transparência
Tal qual o filete de água fresca de bica, na floresta virgem
Onde minha alma sacia os seus anseios
E descansa em berço de pétalas suaves
Como voltar para o caos da ordem sistêmica?
Aqui eu cheguei foi depois de pagar um alto preço
Tudo o que eu tinha eu investi
Em um tesouro que ninguém pode tocar
Na solitude eu me permito
Recostar-me no absurdo
De ser sem qualquer história

21:30

E nesta primavera minha flor se abriu feliz


Do imo da existência, o néctar das ideias indefiníveis escorre e se
derrama em páginas desinteressadas
E a única ave a se lambuzar e encher o papo
É a mesma que um dia esteve presa na gaiola das formas e saberes

69
06/11/21
7:13

Acontece de eu estar apenas caminhando pela vida


E, de repente, tudo some
Sem mais tarefas a cumprir
Sem mais desejos a satisfazer
Sem mais histórias para interpretar
Fica apenas uma ausência impossível
Um ser todo não ser
Um estar em nenhum lugar, e ainda estar em tudo
Um fazer que é só observar aconteceres aparentes
Nada a esperar
Nada a desesperar
Nada a se apegar
Nada a renunciar
O que não é o visto
Também é o mais evidente
O que dizer a respeito?
Que não é nada daquilo que se esperava
Tampouco o que se imaginava
Que ninguém pode tocar
Mas que está no âmago de absolutamente tudo?

7:40

Aquilo que você reprime, cresce, te escraviza, te tortura e te destroça

70
7:59

Eu te odeio
Mas também te amo
Às vezes penso no quanto eu seria feliz se você desaparecesse
Mas a verdade é que essa felicidade é um delírio
Com você, ao menos tenho uma companhia, uma relação sincera
Não sei se quero te aniquilar de súbito, ou te amar até matar-te de
prazer
Mas sei que a sua presença me confunde
Talvez todo esse jogo seja só pra eu aprender mais sobre a liberdade
Pois se eu te aceito, não há motivos para a minha dor
O problema mesmo é que eu te responsabilizo
Por algo que a minha própria interpretação me causa
Que é um ódio desmedido
Uma curiosidade visceral
E um desejo descomunal

08:20

Todos os demônios que eu tentei prender no porão


Se libertaram, numa onda de revolta e fúria
Arrombaram a porta, invadiram meus recônditos mais íntimos
Destruíram todas as minhas esperanças
Meus apreços
Minhas crenças mais arraigadas
Meus tesouros foram saqueados
Fui desnudado, torturado, destroçado, queimado.
Minha carne, dividida e devorada
(...)
Essas são apenas memórias
De um tolo que, sem saber que não sabia o que estava fazendo
Se entregou à ignorância do fanatismo
E acreditou que a repressão dos seus instintos
Era o caminho da purificação
(...)
Agora, fique estampada neste aviso a lição
Se você quer ser livre um dia
Tem que aprender a libertar
Se você quer a tão almejada paz
Tem que deixar a paz em paz
Pois se você oprime o mal
O bem também é ocultado

71
E seu destino será a dor
(...)
O preço de tentar controlar o que lhe é natural
É ter a vida malograda
Decair em maldição

10:10
Eu já fui o nada-todo
Decidi me conhecer mais a fundo
Criei os universos para experimentar o que não sou
A fim de reconhecer quem sou
Tornei-me aventureiro de mim mesmo
Fui o herói
Fui o algoz
Fui a princesa da torre
Fui o escravo e fui senhor
Fui faraó
Fui o esquecido
Fui miserável
Fui o escolhido
Mas se há ainda algo que eu nunca fui
Vou continuar jogando
Até o infinito se esgotar
Até o supremo se curvar
Até o absoluto se tornar
Um meio, um início e um fim

18:13

Quando ele passou por aqui


Foi poeta, sofredor e desafortunado
Mas no meu universo
Ele é eterno, infalível e beatificado
O único que pode ver o que eu vejo
Que sente como eu sinto
Que me aceita como sou
Que incentiva a minha arte tosca
Que consegue ler meus versos tortos
O único
Quem se compara?
Somente a alma reconhece a alma

72
05/11/21
6:56

Hoje é um dia comum


Mas tem um quê de aventura no ar
Foi uma ansiedade forasteira
Que invadiu meu rancho fundo
Não sei o que ela quer aqui
Fala uma língua que eu nunca escutei
Veste uma capa camuflada
Às vezes desaparece em meio à relva
Mais cedo os cachorros estavam latindo na direção daquela árvore
De certa forma, ela até trouxe um pouco de ação para espantar o
tédio
Onde será que ela está?
Fez-se silêncio nas paragens
Só vou me sentar nessa sacada e ficar de tocaia
Tenho café e cigarro pra me fazer companhia
E estou preparado com a minha escrita na bainha

7:24

Gosto muito de olhar no espelho


Já não sei mais quem é que vejo
Mas eu o aprecio
Aprecio o brilho em seus olhos
Aprecio a sua insanidade
Aprecio até a sua maldade
Aprecio porque ele é belo
Para além de uma simples imagem
Ele tem uma vida indecifrável no semblante
Eu queria tanto que ele saísse do espelho
Para a gente brincar, conversar, se abraçar, se amar, se conhecer
cada vez mais...
É como uma daquelas paixões impossíveis
Eu até sou correspondido, sei que o sentimento é recíproco
Mas quem não deixa a gente realizar-se plenamente
São os limites da matéria

73
7:39

Vou confessar-te o meu maior vício


Eu me aconchego no conforto
Fecho os olhos para o conhecido
Me entrego ao nada
Deixo-o me abduzir
Me abusar
Me usar
Se satisfazer por completo
E depois de todo o processo
Os efeitos que eu sinto:
Êxtase,
Prazer,
Alegria,
Alívio,
Senso de liberdade,
Me levam ao paraíso
Então eu vou repetindo a dose
Sou usado várias vezes ao dia
Todos os dias
E como eu amo isso!
Estou completamente perdido!
Nunca mais vou me encontrar
Até porque eu não tenho motivos para o desejar

04/11/21

00:00

Estou aos poucos conseguindo soltar as minhas feras


Antes que elas me despedacem
Estão saindo dos recônditos, se expressando, se realizando
E, conforme vão uivando, grunhindo, salivando e rugindo, queimam
toda a fúria de uma prolongada repressão
E, neste processo
Vão deixando de ser feras letais
Tornam-se mansas ovelhas, gazelas saltitantes, passarinhos
cantarolantes, borboletas coloridas e flores de belezas infinitas

74
0:12

Uma cobra urutu se espreme entre minhas crenças de pedra


Um pensamento desavisado é capturado e engolido em segundos
E ela só está se aquecendo
Sua fome é insaciável
Seu estômago é abismal
Nada ela deixa passar com vida
Vigia, guarda, boteia e aniquila
E tudo o que come vai tornando-se mais dela
E ela cresce
Cria seus afetos
Engolindo, digerindo, devotando toda a sua atenção à arte de
exterminar
Mas nada disso é cruel
Pois suas presas passam desta para aquela
Que não deixa nunca a mágoa aparecer
Quem um dia é devorado pela cobra urutu
Nunca mais sofre de amores
Nem se sente incompleto
Pois agora já faz parte
Da morada do mistério

75
8:23

Nunca poderia ter imaginado


Nunca passou pela ideia
Que uma tão profundidade
De me sentir inteiro e límpido
Pudesse a mim acontecer
Nenhuma forma distorce o olhar
De alguém que já se libertou
Nenhuma coluna
Nenhum templo
Nenhuma pedra
Nenhum muro
Tudo é tão novo
Sem nada nunca ter mudado
Se eu pudesse resumir a canção
Se eu pudesse concluir o infindável
Se eu pudesse escrever o nada
(...)
O desejo de te mostrar isso que nem eu posso ver
De desenhar um mapa pra você chegar ao lugar de onde nunca saiu
Me faz atravessar os limites entre a banal e o desatino
Não sei mais nada além do nada

76
03/11/21
1:17

Eu te confesso
Com toda a minha dor exposta
Que sou culpado de morte dolosa
Eu matei deus
O matei por inveja e por ciúmes
E agora tudo o que queria
Era voltar ao seu seio
Era beijar as suas vestes
Era adornar o seu salão
Era entrar em sua presença
E pedir o seu perdão
Mas aqui, nesse lugar de expiação
Só tenho a mim mesmo
Minha pena é me encarar face a face
E ser julgado a todo tempo
Escutar a minha sentença
Buscar alívio nas paredes geladas de minha própria prisão interior
Não posso ter o conforto da ilusão
Não posso nem acreditar
Não posso sonhar
Essa é a minha aflição
Esse é o meu estado de ser
Como escapar ao meu karma
Se o meu carrasco sou eu?

1:36

Eu me encontrei sofrendo
Dei um passo atrás e vi a dor
Deu outro passo atrás e vi o vedor
Dei outro passo atrás e vi o olhar
Dei outro passo atrás e nada vi
E já não havia mais ninguém para dar passo algum
E já não havia nem frente e nem trás
E já não havia dor
Apesar do sofrimento

77
1:42

Quando eu leio meus escritos


Me admiro da beleza entre linhas
Mas a obviedade não me permite alegrar-me tanto
Logo vem uma ligeira frustração
Pois apesar de meus dedos serem os meios
Jamais escrevi verso nenhum

1:50

Eu te escuto
E te escutando escuto a mim
Mesmo que às vezes te refute em minha mente
Na conclusão eu vejo o tanto que aprendi

A nossa relação não é uma simples amizade


Daquelas que a gente cultiva por vaidade
É um encontro que desfaz os nós da mente
E com a linha descostura a realidade

O que dizer
Das ligações de três horas e meia
Que a gente entra num espaço
Que a maioria não permeia

E o que esperar
Dessas coloquiais aventuras
Imprevisivelmente mudam
Todo o percurso da ventura

78
10:08

Na maioria das vezes


Nem faço ideia de qual assunto vou escrever
Isso só reforça aquilo que eu já disse: não sou eu quem escrevo
Eu assisto meus dedos tocando as letras do teclado
Mas não tem como saber de onde vem esse escrever
É muito maravilhoso isso
Não posso me gabar de minhas frases
Mas sinto uma imensa alegria em teclar
Em ler as coisas que vão surgindo
Em refletir sobre o não lugar de onde elas vêm
É um processo bem delicioso
Deitar-se e deixar ser
Sentir e deixar fluir palavras que não dizem nada
É espetacular
É minha meditação
Tenho sentindo-me em êxtase por esses dias
Não daqueles êxtases que te enchem de egolatria
Mas daquele que me torna mais humilde
Ao perceber que nada em absoluto
Está sob meu domínio
Que sou marionete da vida
E que Vida
Que apesar da vida pessoal
Manifesta-se tão intensamente
E ao mesmo tempo tão delicadamente
Que até me faz esquecer de minha miséria
Apesar de ainda sentir uma dor incógnita
Apesar de ainda sentir a felicidade original
Quão inexplicáveis são os domínios da existência

79
10:23

Meu coração é uma labareda


De um fogo que nunca se apaga
E a lenha é a crença
E a lenha é a ideia
E a lenha é o conceito
E a lenha é toda construção racional
E a lenha é o ego
E a lenha é o mundo
E a lenha sou eu
E a lenha sou eu

13:16

Ele entra em cena sempre cheio de negatividade


Sem nenhum aviso prévio
Aponta o dedo para algo e lhe diz que aquilo é um erro ou pecado
cometido, ou um defeito que você tem
Conforme a gente vai adquirindo consciência, pode vê-lo fazendo
isso
Então alguém chega e aponta o dedo para ele e o acusa
Mas
Pera aí
Quem acusa não é o próprio?
Ele entrou pela porta dos fundos e apontou o dedo para si mesmo?
Ele sou eu?
Eu sou o que aponta o dedo, o que se sente culpado, o que tem raiva
de ambos, o que pensa sobre isso, ou o que ri dessa patifaria?
Ou todos são apenas um processo mental programado?

13:49

Quanto mais consciência eu adquiro


Mais de todas as outras coisas eu perco

80
19:14

Aqui na quebrada onde eu trabalho


O funk rola solto na biqueira dos mulek
Sentado no banco da entrada da escola me peguei refletindo
Se não sou eu quem dirijo minhas ações
Ninguém também dirige as suas
Os alunos do ensino médio que fumam maconha ao lado do portão
de entrada
São discriminados pelos servidores da educação
Que deveriam ensinar a não discriminação

81
Kamehameha
(30 de outubro a 02 de novembro de 2021)

82
02/11/21
07:25

errai,
errai á vontade
sem errar não se liberta a felicidade
errai com liberdade,
tu tens crédito infinito,
fracassai e aprendei sem medo,

8:43

Não pude me precaver


Ela é sempre imprevisível
Me dá todas as vezes aquilo que não espero
Mas o que ela me dá é sempre melhor que aquilo que eu pensava
precisar

9:19

Antes eu me esforçava para arrancar do solo da minha sina o meu


sustento
Hoje tudo é gratuito
Sou mais que bem-aventurado

9:23

Sigo no curso suave do meu coração


Não consigo mais me desviar de mim

13:08

De tudo o que existe,


Eu prefiro aquilo que não é,
Que não aparece,
Que não acontece

83
13:10

Uma das coisas mais libertadoras que me aconteceram, foi descobrir


que eu posso fracassar à vontade
Isso se estiver fazendo a vontade de meu coração
E, nesta liberdade, meus erros tornam-se o chão que sustenta meus
próximos passos

14:16

Do sem lugar
Surgem palavras sem significados
Que expressam o impossível
Nunca consigo dar conta delas
Elas é que me encerram
Me desiludem
Me desaparecem
Eu nunca sei quem é esse que pensa
Nunca sei quem é que tá vivendo
Um alguém que está mais para ninguém
O absurdo reina supremo em meu ser
Ou o meu ser rendeu-se ao mais profundo desencanto
Que delícia!

84
14:31

Não é do nada que se pode pensar que estou falando


Não é daquele nada que se conhece
Não tem nada a ver com o conceito de um nada, conhecido
Eu tento te mostrar que existe algo muito, muito mais tremendo que
qualquer coisa
Pois coisa alguma o pode afetar
É mais intenso que a dor mais lancinante
E mais suave que a mais sutil das afeições
Tudo o que eu lhe disser a respeito só confunde a sua lógica
E é isso mesmo que eu almejo
Pois a lógica, coitada, é só um produto de um produto
E eu te peço que desista de aprender coisas novas, antes de
desaprender a acreditar no seu intelecto
Nada que eu diga vai fazer-te ver isso
Mas você já está pisando sobre o teu maior objetivo
Apenas pare de se enganar, que terá apoio de todo o cosmos para
enxergar
Não é um conselho
É só uma pequena provocação
Se você não sentir que já está em casa
Se ainda estiver buscando alívio
Tente apenas abandonar a ilusão do controle
Quem não controla os próprios pensamentos
Não controla mais nada
E ninguém jamais controlou sequer um pensamento
Você já é a pura liberdade
O infinito
A atemporalidade
E o absoluto Inefável

85
14:55

Quando me rendo à solitude


O mundo todo desaparece
Nada mais tem importância
Não consigo fazer planos
Nem acreditar nos que já fiz
Não tem tempo
Não tem espaço para o eu
E nada mais tem um sentido, propósito ou significado
Tudo continua acontecendo
Mas sem peso ou conclusão
Não consigo pensar como antigamente
Minha mente é devotada ao incógnito
A história ainda é vista
Mas o personagem sabe que é só um ator
A vivacidade aqui é tanta
Que não se sabe onde colocar a felicidade

01.11.21
11:25

Não posso te mostrar o tamanho do meu sentir


Só posso tentar descrever com algumas palavras ocas:
Passa por mim uma torrente de não sei o quê
Às vezes parece que não consegue sair
Aí eu tenho que escrever
São só gritos e gemidos agudos
De coisas que jamais poderão ser ditas
Quanto mais eu me expresso
Menos coisas consigo dizer
Eu tô quase me tornando um ninguém
Ou do nada já sou fã, devoto e figurinha carimbada

86
18:20

Não sei qual a natureza do ser


Mas sinto que ele é muito, muito pequenininho
De modo que cabe no pinçar dos nossos dedos
Menor que a ponta da mais insignificante agulha
Porém dentro dele cabe tudo
Os universos
O infinito
E toda forma de expressão

18:28

Nada é possível
O que ocorre é milagre
Tudo o que se nota é o manifestar do impossível
Tão absurdo
Tão absoluto
Tão intocável
O que resta de nossa vaidade se formos honestos diante do espelho?

18:38

O que você diria a si mesmo se você se ouvisse?


Se soubesse lhe dar atenção?
Se tivesse empatia, sensibilidade, disponibilidade e verdadeiro
interesse?
O que sairia de seu coração se ele fosse absolutamente livre para se
expressar?
Você já se deu esse presente alguma vez?
Spoiler: cuidado, autocuidado vicia

18:50

Difícil para as pessoas, é sentirem suas próprias almas

87
18:53

Durante duas décadas, minha alma esteve engaiolada e oprimida


Ali se deprimiu à morte tirada
Ali se enlouqueceu à morte dada
Tudo o que ela queria era viver solta
Poder voar
Depois que finalmente se libertou
Alçou voo no infinito, livre
Mas ainda queria algo
Um bando amigo para lhe fazer companhia
Porém hoje ela entende que não se pode esperar nada de ninguém
Está começando a perceber
Que o seu voo é solitário mesmo
Ou que ela mesma é o seu próprio bando feliz

20:20

Um nada
Absoluto nada
Não que eu o tenha encontrado
Simplesmente não há nada a encontrar
Não que eu o tenha descoberto
Só descobri a mim mesmo
Não que eu entenda alguma coisa
Mas isso é tão óbvio agora
Às vezes ainda me esqueço de esquecer
E me pego pensando que sou eu quem penso
Mas tanto nisso quanto naquilo
Uma ausência incomparável está mais que presente
Sem nenhuma espécie de conclusão
Sorrateiramente estrondosa
Delicadamente avassaladora
Amorosamente desmanteladora

88
20:47

Acabaram-se todas as palavras


Acabaram-se as notas e os acordes
A expressão terminou
Nada disso é de propósito
Cada lágrima e cada gargalhada
Que outrora eram o retumbar de um coração simplesmente humano
São hoje meros despropósitos
Tudo é um constante desapropriar
Desnudar
Desregular
Despedaçar
Desmascarar
Eternamente ver e ser o desaparecer

21:40

Ela vem de surpresa, te pega desprevenido, e derruba todas as suas


expectativas
Se você for paciente de verdade, vai ver que no lugar delas ela te
entrega algo infinitamente melhor
Impossível e indefinível
Cessam-se as lucubrações
Faz cair no abismo infinito os trilhos do raciocínio
Tudo se torna vivacidade
E os tormentos da escravidão parecem nunca ter existido
Apesar da memória
Apesar do melodrama pessoal
Tudo o que se pode imaginar, não toca nem o chão do seu porão
Ah, Vida, Vida temida
Quão magnificente são os teus feitios

89
31/10/21

10:50

Para tudo que é sim


Existe um não
Como dois polos de um ímã
Porém existe um não bem mais contundente
Que, do nada, desconstrói todo o joguete da lógica
Ninguém sabe de onde vem, nem para onde vai
Também não se sabe o que ele significa ao certo
Um não que é - mas não foi dito por ninguém
Um não tão absoluto
Que de negativo não tem nada
Um não que liberta
Um não que completa

30/10/21
14:23

Faz de conta que você é o supremo


O absoluto
O infinito
A imortalidade
A eternidade
A potência
A felicidade
A paz
A plenitude
Faz de conta que você é
Faz de conta
O que você buscaria?

90
14:46

Da perspectiva do pensamento
O Inefável está sempre subindo
Indefinidamente se elevando
No entanto, ele nem precisa se mover
E nem teria para onde ir
Pois todos os lugares habitam nele mesmo
Mas é que o pensamento está sempre caindo
Na medida em que nasce, desce
E todo o universo conhecido desce com ele, pois é todo conceito
Portanto não caia
Tampouco se eleve
Fique sempre onde está

14:59

Já te falei que a vida é uma comédia?


Pois é!
Se algo acontecer, então acontece, e ninguém pode desacontecer
nada
Ninguém pode controlar a harmonia do caos
E ninguém sabe de verdade porque existe
É uma comédia
Ou você ri, ou fica indignado e processa o comediante
O problema é que o comediante só existe em sua mente
Não é uma comédia dentro da outra?

91
15:06

A poesia deu um kamehameha no tédio

30/10/21
9:47

Você sente isso?


É sofrimento
Espere
Pode ser só raiva
Espere
Pode ser só resistência
Espere
Pode ser só expressão energética
Espere
Pode ser só expressão
Espere
Pode ser só aparência
Espere
Pode ser só vontade de entender
Olhe novamente
Isso está aí?
Devagar, com delicadeza
Para quem isso aparece?

10:03

A melhor maneira de perder a paz, é começar a procurá-la

10:22

Me perdi de mim
Comecei a procurar por aquele que escuta os meus pensamentos e
não encontrei ninguém

92
10:37

Esse abismo não tem fundo

10:38

Eu estou mergulhando no abismo, ou eu sou o abismo?

10:39

Somente a picareta do questionamento pode furar as paredes da


prisão

10:41

Você pode ouvir você?

10:43

O que divide uma coisa da outra?

10:45

Toc toc! Tem alguém aí?

10:47

Não é o que você quer que importa, mas o porquê

10:56

Ninguém escreve
Ninguém lê
Ninguém aparece,
Pra ninguém
Ninguém vê

93
11:00

O único pecado é mentir para si mesmo

11:22

Para ir além das aparências, você precisa desativar o firewall da sua


mente

11:28

Tudo é o mesmo, mas ele é sempre novo

11:29

Eu não posso morrer, pois eu não vivo, é a vida que é viva

11:32

Se eu me esforçar para escrever, eu não escrevo

11:37

Tudo aquilo que eu amo, eu nunca me forcei a amar, eu só amo

11:40

Eu sou um pecador

11:43

Eu minto para mim toda vez que me forço a amar

94
11:47

A mudança de perspectiva pode nos fazer amar mais e melhor?

11:50

Não estou conseguindo me lembrar de nenhuma coisa ou pessoa que


eu tenha detestado e hoje amo. Apenas lembro de algumas coisas e
pessoas que eu amava e hoje detesto ou sou indiferente

95
Insuficientes palavras
(26 a 29 de outubro de 2021)

96
29/10/21

07:38

Uma coisa totalmente não-objetiva


Como que um vácuo
Puxa o pêndulo da atenção à um espaço onde não há gravidade
E todas as dúvidas cessam
A liberdade e a leveza cantam a sua canção inspirada
E toda a história dolorosa é imediatamente esquecida
As coisas então acontecem, sem nenhum deus dominador
As ações escoam sem nenhum ator
Os sentidos dançam sem pudor
E a natureza toda respira a paz
O corpo e o mundo desaparecem dentro do coração
[Palavras sem sentidos apenas arranham o violão]
E tudo o que é se torna novo
Sem comparação
Sem medida
Sem possibilidade alguma
De ficar preso numa ideia
Ou ajustado a um padrão

07:59

E tudo era puro vazio


Pleno
Não havia nada além de Deus
Então Ele criou o espelho
E com o tempo se esqueceu que estava olhando para Si mesmo
Hoje Ele pensa que é você

97
8:48

Eu não estou ligado aos meus sentidos


Eles acontecem por si mesmos
Mas eu pareço estar em outra dimensão
Não que haja outra dimensão
Não há nenhuma sequer
É que as palavras não explicam o Inefável
Toda minha escrita reflete a miséria da linguagem
Eu vejo algo infinitamente sublime, mas sem olhos
Eu sei de algo que poderia mudar o mundo, o universo, a realidade
Mas não posso contar a ninguém
É aterrorizante e cômico ao mesmo tempo
Estou totalmente perdido na plena liberdade

9:35

Não tem nada a ver com o que você faz


Pois não há ninguém que faça
Não há ninguém que entenda
Tudo o que sempre pusemos diante dos olhos
Foram crenças e significados
Por isso não pudemos ver
E isso não explica nada
Toda explicação é imaginária
E não existe verdade

98
10:32

Eu procurei aquele que se identifica


E não o encontrei
Não tinha ninguém lá dentro
E não tinha nada que se pudesse nomear ou descrever
Era só o inimaginável
E era tudo o que havia
Na tentativa de descrever isso
Tornei-me miserável outra vez
Pois nada pode ser compreendido
A não ser que nada pode ser compreendido
Entender o mistério
É entender que ele jamais será entendido
E isso tem que bastar
Tem que encerrar todo sentido
Anular os significados
Desintegrar os objetivos
Dissolver todas as histórias
E paradoxalmente,
Quando isso acontece,
É conferida toda plenitude

28/10/21
19:38

No fundo, no fundo mesmo, nada tem sentido


O sentido se encerra em si mesmo
[O sentido da vida é viver]
Não precisamos inventar um futuro hipotético
Nem um céu, nem um inferno
É isso aqui ó
Escrever isso
Ler isso
Respirar
Ir ao banheiro
Comer
Aprender e desaprender
Não precisamos de um roteiro rígido
Navegamos num mar de mistério
Pois,
O mistério é a única certeza

99
27/10/21

7:42

Interessante perceber que tudo o que eu venho aprendendo


atualmente, já tinha expressado no passado
Algumas coisas que estão ficando bem claras agora, eu já tinha
intuído e até escrito anos atrás
Quem me dera eu tivesse aprendido, quem me dera eu tivesse me
ouvido
Agora eu vejo o quanto fui tolo buscando respostas fora de mim,
quando o meu coração já me dizia tudo o que eu precisava ouvir
Se eu pudesse simplesmente acreditar em mim
Se eu pudesse confiar nas coisas que eu percebo ao expressar o que
sinto em minh'alma

8:32

Isso
Que ninguém pode conhecer, nomear ou agarrar,
É o meu abrigo
É o meu lar celeste
É o meu descanso
É o meu alimento
É a minha cura
É a minha paz, para muito além da paz
É o nada no qual tudo o mais se dissolve em pura plenitude e regozijo
(…)
Descobri que habitar um mundo de conhecimento nos torna
escravos dos nomes, formas e conceitos
Somente quando deixo tudo para trás e me permito não saber, não
conhecer, não entender, sinto minha alma respirar o ar puro do amor
incondicional
Nada pode ser mais revigorante que ser, saber e fazer nada

100
26/10/21

8:52

Quando eu percebo que tudo está bem, apesar de muitas coisas não
estarem do jeito que eu gostaria, eu sinto algo que não posso
descrever
É como se eu estivesse sentindo um aroma de alguma erva queimada,
que eu não consigo identificar.
Lembra maconha, mas não é
Também lembra um pouco aquela fumaça que o coroinha balança na
missa, mas não é
Até lembra quando o vizinho carpiu o quintal e queimou o mato por
preguiça de lidar…
É um tipo de sentimento sem nome nem forma, que até pode
lembrar-me de outros, mas não é

09:39

Sabe quando você come muita, muita coisa, ou bebe muito, muito
álcool, e não se sente bem enquanto não vomitar e esvaziar todo o
seu estômago?
Então, é assim que eu me sinto antes de escrever ou compor
Se eu não me deixar sair de mim, eu me sufocarei, me asfixiando, me
torturando…
Então não posso me gabar pelo que produzi
Eu não fiz nada, só deixei sair o que estava me matando

10:16

Saber coisas me deixa confuso


Pois não se pode saber de tudo
Antes eu não soubesse nada

101
10:17

Coisas passam pela mente


É muita história e pouca poesia
O personagem e os seus problemas
As relações com outros personagens
Tudo girando na cabeça
Mas, de fato, quem pode evitar alguma coisa?
O livre arbítrio me parece tão falso agora
Tudo o que posso é observar
E ainda, duvido que tenha alguém aqui observando
O controle só acontece na imaginação
Somos todos psicóticos
Ou não somos ninguém

10:28

De onde vem o medo de sermos malvistos?


De pensarem que somos loucos ou esquisitos?
Cada um enxerga o seu próprio interior nas coisas que vê
E se tememos o que eles pensam ao nos ver
É porque ainda não nos enxergamos de verdade
Mas até onde vai esse imenso território da psiquê?
Ele me parece infindável
Quanto mais eu me enxergo
Mas percebo o quanto sou cego

102
Isso
(19 a 26 de outubro de 2021)

103
26/10/21
9:25

Isso
Às vezes parece um caos
Uma confusão
Uma guerra
Uma imensa dor
Mas ainda é isso
E nada pode ser feito
A não ser conscientizar-se
Sem que necessariamente exista alguém que se conscientize
Não é que você perceba
Mas a percepção é
Num não lugar
Num não tempo
E tudo passa
Mas isso não pode passar
Pois é nada
Que aparece como tudo
Aparentemente

24/10/21

7:57

Isso
Quando se torna algo
Deixa de ser isso
Quando é buscado
É perdido
Quando é lembrado
Morre
Quando é pensado
É deturpado
Quando é falado
Confunde
Quando é visto
Desaparece

104
23/10/21
23h

Isso
Que nunca deixou de ser
Nunca tinha acontecido
Isso
Que é aqui
Não pode estar em nenhum lugar
Isso
Que eu tanto amo
Nunca pude conhecer
Isso
Que é isso
Não pode ser nada

20:02

O único incômodo que eu sinto agora


Dia 23/10/2021 às 20:02hs
Vem da impossibilidade de descrever isso
Isso que está tão além das palavras
Isso que supera toda forma de intelectualidade
Isso que não cabe nem em um milhão de livros
Isso que transcende toda lógica
Isso que não pode ser visto
Apenas intuído
Um sentido de ser pleno
Uma falta de qualquer falta
Ainda que nada tenha mudado na história desse personagem
Ele é totalmente feliz
Mesmo devendo dinheiro
Mesmo cheio de desafios
Nada mais é tão importante assim
É indescritível respirar a vida
É como se a dor nunca tivesse existido
Isso é tão isso
Que suplanta tudo o mais

105
20/10/21
8:11

Um regato murmurante
Lamuriando um sentir suave
Deságua morro abaixo
Em palavras insignificantes
Nada para entender agora
Apenas escorrer sem causa
Ser a vida sem destino
Sem esperas nem objetivos
Que tal dizer coisas sem sentidos?
Aquilo que faz eles torcerem o nariz
Os libertaria
Os salvaria
Mas eles gostam tanto de suas jaulas
Que nem conseguem perceber
Que a porta sempre esteve aberta
Vivem para reclamar alívio
E não podem compreender
Que já são tudo o que buscam

8:36

Eu não aceito que eu sinta necessidade de ser eu

8:38

Somente eu posso me impedir de ser eu

8:41

Somente eu posso me afetar de


verdade

8:45

Eu estou pedindo a mim mesmo a todo o momento: por favor, me


permita, me permita…

106
8:57

Não sou eu quem permito ou deixo de permitir


Eu mesmo, não tenho escolha alguma
As coisas são como são
E não são como não são
E eu não posso com nada
Nem comigo mesmo
Eu sou e eu não sou
Eu existo plenamente
Mas sou totalmente ausente

19/10/21
7:48

isso, isso, é só isso,


é tudo isso, é nada,
nada disso significa nada,
nada disso tem razão de ser, nem motivo,
nem sentido, nem propósito…
isso não é nada aparentemente acontecendo
aparentemente acontece…
é difícil acreditar nisso, e não é mesmo para acreditar
é para ir além da crença e além da experiência
experiência requer duas pontas, consciência requer duas pontas
mas isso é uno, não dual,
não se esforce para entender, não se esforce para ver,
pois isso já é, se você se esforça, você se afasta do que já é
agora você está se esforçando para não se esforçar…
é o que parece, mas na verdade você não está fazendo nada
coisas aparentemente acontecem através disso que você chama de
corpo, mente, consciência
mas nada disso é feito por você, nem para você
você não pode fazer nada nem pode deixar de fazer, pois não há
ninguém aí
é só um tantão de coisas acontecendo, aparentemente,
mas nada realmente está acontecendo
você pode procurar uma resposta, mas nunca vai encontrá-la
pois a pergunta aponta para algum outro lugar,
e a resposta está na fonte da própria pergunta
no vazio absoluto

107
8:06

o que há no meu coração


tento expressar em linhas tortas
você não pode compreender
você não pode controlar
só eu contemplo os meus afetos
quem me dera eu pudesse compartilhar
tirar do peito esse aperto
desaguar em ouvidos atentos
poder respirar
quem me ouviria?
quando tudo o que eu tenho para dizer
são coisas inefáveis?

108
Confissões
(07 a 18 de outubro de 2021)

109
18/10/21

07:47

Às vezes
O vento sopra forte aqui em cima
Perco o controle, o norte, a vista
Tenho a impressão de estar sendo esmagado
por um sentimento imperioso
Tento destilar palavras
que me façam voltar a respirar
Mas não são elas quem me dão oxigênio
É a criação de ideias
É parir no mundo
novas percepções sobre o desconhecido

08:31

Não entenda a vida


Quando você a entende
Você a perde:
Você perde a sua beleza
Você perde a tua paixão
Você perde a inocência
Você perde a curiosidade
Você perde criatividade
Não acredite em teorias
Isso é puro autoengano
Pois a vida é mistério
E sem o mistério
Tudo é conceito
Tudo é morto

110
16/10/21
07:58

Eu sou um rio
Um rio selvagem
Um rio que arrebenta qualquer represa
Um rio que às vezes corre tranquilo e sereno
Noutras vezes desce em corredeiras caudalosas
E noutras, ainda, se desaba em cascatas
Ninguém jamais conteve o rio
Nem mesmo ele conseguiu
Suas águas são sentimentos
Sentimentos inexplicáveis
Sentimentos inomináveis
Sentimentos inexprimíveis
Sentimentos incalculáveis
Sentimentos incontroláveis
Sentimentos infinitos
Sentimentos…

14/10/21
08:21

O meu lugar preferido


É um quartinho singelo
Nele me sinto aconchegado
Nele sou livre para sentir
Não há móveis, nem decoração
Tudo o que há é o infinito
Protegido, incólume, intocado
Não há relógio, nem paredes
Mas o vazio ali é pleno
No meu lugar preferido
Posso esquecer de tudo
Posso voltar à minha inocência
Onde eu não preciso saber
Onde eu não tenho compromissos
Onde eu não preciso agradar
No meu lugar
Eu sou feliz

111
08:36

Como alguém pode dar as costas a si mesmo?

08:42

Você está procurando por algo que nunca perdeu

08:53

Você não pode chegar lá, pois de lá nunca saiu

09:01

A maior mentira é acreditar que existe alguma verdade

09:13

A gente só ri de verdade do nosso próprio drama

09:21

Cheguei do outro lado e vi que estava no mesmo lado

09:30

O sofrimento me violenta?
Ou eu violento o sofrimento?

09:48

Antes de eu perceber
Antes de existir o eu
Já é

112
10:12

Sou um escravo do sentimento


Não posso enganá-lo
Não posso colocá-lo numa gaveta
Se ele não virar palavra, movimento ou melodia
Me tortura
Me tortura

11/10/21

08:19

Eu nunca estou pronto para receber essas coisas


No entanto, as recebo
Recebo até a fúria e a resistência
Recebo até a não receptividade
Eu teria outra escolha?

08:44

O que eu era antes de construir limites


Antes de me trancafiar
Antes de me encaixar
Antes de me ajustar
Antes de explodir em milhões de pedaços
Ainda sou
Ainda sou
Não há como represar tamanha dor
Tamanha alegria
E tamanha magnificência
Eu sou infinito
Eu sou mistério

113
07/10/21

09:11

Eu queria poder te descrever isso


Queria mesmo poder compartilhar com você
Escrever um mapa pra você chegar nisso
Mas isso não está em um lugar
Queria te dar um pouco disso
Mas isso não é uma substância
É mistério
É paradoxo
Totalmente novo e totalmente atemporal
Não posso me apropriar disso
Não tem como segurar
Não tem como estocar pra amanhã
Não tem como conhecer
Não tem como comparar com nada
Não tem como nomear
Mas é gracioso ao infinito
Belo além da beleza
Nem mesmo o caos o abala
Nenhuma mente o toca
É puro intuir
Inspirar
Fluir
E ser
Tão tudo
Tão nada

114
Esses conterrâneos
(28 de setembro a 05 de outubro de 2021)

115
5/10/21
10:02

Você diz que não entende, como se fosse uma vítima da ocasião
Mas a verdade é que você tem medo de entender
Tem medo de encarar o teu próprio poder
Não pretende aceitar que ele seja infinito
Mas ele é
Você é
Só não consegue enxergar
Nem perceber que está tapando a sua vista com as próprias mãos
Fechou os seus ouvidos para não ouvir a suprema voz do coração
E agora reclama paz e alegria
Quem poderia te ajudar?
Se você mesmo se esconde
Se cala
Se condena a uma prisão escura
Apagando a tua própria luz
Bem-aventurados os loucos
São bem mais livres que você

11:12

aquilo que é
tudo aquilo
tudo isso
também não é
está sobreposto
ou
são infinitas possibilidades superpostas
todas as dimensões
são a não dimensão

116
11:29

Só glorifica,
Você é tão servo,
Mas tão servo
Que é totalmente livre

01/10/21

08: 07

A questão Deus sempre o fascinou


Procurou tanto que o encontrou
Na vida diária, o exaltava sem cessar
Em toda forma de experimentar

Tudo o que via, ouvia e sentia


Sua face refletia
Era tão forte o seu amor
Que até chegou a estar em paz na dor

Tudo era belo e triste por um triz


Até na dura solidão era feliz

Tudo apontava o seu destino


Pois fez do nada o seu atino

08:22

Ele era tão insólito


Que quando percebia que estava triste
Acolhia e amava a sua tristeza
Quando percebia que estava odiando
Amava o seu ódio
Abraçava toda a sua não aceitação
Louvava a sua dor
Dava graças às sensações mais desconfortáveis
Ele era tão insano
Que a sua lucidez brilhava como um sol
E a sua plenitude enchia o universo todo

117
28/09/21

08:23

Ela me pediu diversão


Eu lhe dei o espaço para brincar
Ela me pediu um desafio
Eu lhe dei o tempo para vencer
Ela me pediu aventura
Eu lhe dei o sofrimento para superar
Ela me pediu alívio
Eu lhe dei um coração para escutar
Então ela, satisfeita, descansou por mais uma eternidade

08:46

O nosso desejo nos impede de perceber


Que somos eternamente plenos

09:02

O artista é totalmente espiritual


Como ele explicaria o verdadeiro sentido da sua obra?
Como saberia com precisão de onde vem sua inspiração?

A arte não é deste mundo


No entanto é o que lhe dá beleza

A arte não pertence à vida diária


Mas é o que nos dá condições para suportá-la

Todos os seres são artistas


Alguns sabem que são e outros não

A natureza é a pura manifestação da arte


Pois aquilo que ela faz de melhor
É destilar harmonia do caos

118
Cortina de voil
(03 a 25 de setembro de 2021)

119
25/09/21
09:24

Estou indo para o nenhum lugar


Onde não há tempo e espaço
Depois das dez eu chego lá

9:43

Somos infelizes porque queremos que tudo nos agrade,


e porque queremos a todos agradar

10:11

Todos os rios estão no mar


O mar está em todos os rios

10: 25

Espelho, espelho meu, neste universo, existe alguém que sinta tanto
quanto eu?

10:44

O artista é a sua própria obra em andamento

11:11

Poesia que faz sentido não é poesia

11:23

Ninguém tem um amigo como si mesmo

120
22/09/21

8:23

A verdade inconveniente é que:


A meta do sentimento é ele mesmo

08:37

Para a mente,
Dual por natureza
Tudo é um objeto
Ela sempre tem um objetivo
Está sempre manipulando:
Rejeitando ou buscando um objeto
Ela é absolutamente viciada neles
Para ela o futuro é um objeto
Qualquer conceito é um objeto
A ideia de deus é um objeto
A ideia de eu é um objeto
Até a ideia de não ser um eu, a chamada iluminação espiritual, é um
objeto
Ou você é um objeto manipulando objetos
Ou você não é ninguém
Vivendo o nada

19/09/21

09:00

Eu amo sentir o que é bom


Eu odeio sentir o que é ruim
Me esqueço que qualquer experiência
É transitória,
Apenas passa por mim

121
09:33

Eu sou isso
Que eu tanto busco
O mais simples
O mais óbvio
No entanto
O mais secreto

10:06

Nada é mais gracioso que a inocência do não saber

15/09/21

08:24

Nada mais empolgante


Que a aventura do não saber
Fiz do vazio o meu leito
E da dúvida minha amada

Abandonei minhas certezas


No deserto do mistério
Afugentei minhas verdades
Com a obsessão pelo inefável

Agora o tudo isso é nada


Agora o relativo é absoluto
Agora o profano é sagrado
Agora o caos é harmonia

Agora o eu é ninguém
Agora a mente é natural
Agora a dor é cura
Agora a confusão é paz

122
11/09/21

18:16

Eu vi a luz
Esqueci de mim
A Lua nova

No infinito
Na solitude
A Estrela cintilante

Deixei voar
Deixei subir
Ao Céu marinho

09/09/21

10:11

A cortina
Suaviza a luz
Que beija o interior do quarto

Meu corpo repousa


Minha mente extravasa
Meu peito destila luz

Palavras escorrem
E rompem a tela

O mundo não para


E eu me recrio

Tão longe quanto a ponta do dedo


Está o meu céu

Perfeito
Infinito

123
20:21

Tudo se move
Tudo se vai
Tudo muda
Só fica você
Só fica o eu
Só fica o nós
Todos em Um

05/09/21

08:01

a vida é muito mais que histórias


mais que ideias e crenças
mais que memórias

bem mais do que o conhecimento jamais descreveu


bem mais do que a mente jamais concebeu
bem mais do que você, bem mais do que eu

nada pode conter sua presença


o universo é a sua expressão
o infinito é a sua essência

quem pode saber sua origem?


quem pode perscrutar seus segredos?
ou destruir os mundos que dela se erigem?

a vida
é a Vida

124
3/09/21

08:31

Numa volta a vida me rendeu


Reconheci que sou uma miragem
Meu tesouro se perdeu
No outeiro da paisagem

Tudo em volta é corriqueiro


Mas o foco se virou
Vejo o mundo por inteiro
O meu coração mudou

Tanta vida
Dentro e fora
Nada importa

Na subida
Da aurora
Abriu-se a porta

11:18

A única coisa que te impede de encontrar aquilo que você está


buscando é a busca

125
Tudo sobre o nada
(9 de agosto a 01 de setembro de 2021)

126
01/09/21

09:12

Antes era o desejo de tornar-se - chegar lá


Onde a história corria
Antes era o medo de perder-se - deixar de ser
O que se acreditava ser
Antes era causa e efeito
Razão e circunstância
Antes era o bem contra o mal
Era o certo ante o errado
Antes era preferir
Era escolher
Antes era mais que um
Mas agora, é só isso
A janela, o céu, a nuvem
A cortina, o teto branco
É o escrever sem sentido
É o pensar a próxima palavra
É o ouvir o som dos carros
É o sentir o peso do corpo
É a vontade de fumar
É o diálogo com a esposa
É a tela do celular
E nada mais
Nada demais

127
30/08/21

08:42

Nesse momento infinito


Quero esmiuçar o percebido
Sem dividir o que é sentido
Do que é visto e ouvido

Estar atento sem nada prestar


Apenas não desejar
Sem fazer nem deixar de fazer
Inexplicavelmente soltar o ser

Quem me dera poder compreender


Aceitar o fato e o feito
Que nada se pode entender

Quem me dera amar a ausência


Que na solitude crua
É a única presença

28/08/21
09:12

Se eu pudesse te revelar o segredo


Te contaria o mais óbvio
Se eu pudesse te fazer feliz
Te levaria além das histórias
Se eu pudesse te mostrar a eternidade
Removeria as tuas crenças
Se eu pudesse te mostrar o amor
Te colocaria frente ao espelho
Se eu pudesse te mostrar umas verdades
Mostraria que não existe verdade
Se eu pudesse te dar a imortalidade
Te faria morrer em vida

128
27/08/21

10:11

Essa é a voz do silêncio


Do ninguém que todos somos
Ou não somos?
Do nada vem as palavras que despertam
Lembrando o ser de si mesmo
Atravessando o tempo
A mente
O espaço
Entre a luz e as trevas está o amado
No nada incognoscível
Que aparece como totalidade
E quem pode entender?
Quem controla as aparências?
O propósito disso é só isso
A resposta é a pergunta
Não há nenhuma diferença

129
25/08

08:20

Você tem sempre uma pretensão


Nunca está tudo perfeito pra você
Você deseja algo melhor que isso
Mas que diferença faz?
Você deseja ver o que não vê
Que diferença faz?
Você deseja ser o que não é
Que diferença faz?
Você deseja ter o que não tem
Que diferença faz?
Você deseja ir pra onde não está
Que diferença faz?
Entre um e dois
Qual a distância?
Entre ser e não ser
Qual a diferença?
Entre ir e ficar
Qual a diferença?
Até quando vai buscar?
Tudo já é!

130
21/08/21
11:13

O que você procura


Não está lá
Não está além
Não está diante
Não está depois
(…)
Se você acende a luz
A escuridão se vai
Se você apaga a luz
A escuridão retorna
O que há entre a luz e a escuridão?
Entre o profano e o sagrado?
Entre o nada e o existir?
É lá que está o que você procura!

131
20/08/21

21:11

Nada jamais será resolvido


Pois tudo já é plenitude mais que perfeita
(…)
Somente nada pode ser infinito e ilimitado
Somente ninguém pode ser felicidade suprema e perfeição
E isso, que aparentemente é, é nada, e é ninguém que o percebe
(…)
O nada em forma de objetos
O ninguém em forma de senso de indivíduo
Nada aparecendo como ideia
Ninguém fazendo nada
Coisas aparentemente acontecendo
(…)
Nada pode ser considerado real ou confiável
Ninguém está no controle de nada
Nada aparece como essa ilusão
Ninguém escolhe nada
Ninguém tem uma origem
Não existe causa para nada
Isso surge por si só
Não há nada por trás de nada
Não há ninguém por trás das ações
Tudo é não ação
Tudo é sem propósito
Pois nada pode chegar a lugar algum
Você não pode se mover
Pois não há você e não há distâncias
O tempo e o espaço são meras crenças
O indivíduo é a sua própria prisão
Eu sou um indivíduo no sonho
Eu sou o nada fonte de tudo o que aparece
Eu sou um eu real para a ilusão
Eu sou o infinito sem nome e sem forma
Eu sou um prisioneiro do sonho de ser um eu
Eu sou liberdade sem limites
Eu sou um miserável em busca de alívio
Eu sou a paz repousando na glória do puro êxtase

132
17/08/21
08:04
Se tudo é unidade
Tudo é o mesmo
Então, logicamente
A pergunta é a sua própria resposta
A prisão é a sua liberdade
O anseio é o seu alívio
O buscador é o buscado
A partida é a chegada
O desejo é o amado
A ausência é a presença
(...)
Não há distância entre o ponto A e o ponto B
AéB
Nada é tudo
Vazio é plenitude
Relativo é absoluto
Dois é não-dois
(...)
Não há passado, presente e futuro
Há só isso
A totalidade
O mistério
(…)
Você quer substituir a doença pela saúde
O mal pelo bem
O ruim pelo bom
A miséria pela riqueza
O vazio pela alegria
A ansiedade pela paz
A dúvida pelo saber
A separação pela unificação
A escravidão pela liberdade
O pecado pela virtude
O vício pelo equilíbrio
A insanidade pela lucidez
A confusão pela clareza,
Indefinidamente,
Numa busca sem fim
Mas tudo é o mesmo
O imperfeito já é sempre mais que perfeito
E ninguém pode fazer nada a respeito

133
15/08/21

07:15

Para ser livre


Você tem que se apaixonar
Por isso
Isso
E por isso também
Tem que se apaixonar pelo dia e pela noite
Pela cortina, janela, teto e pela mancha de bolor da parede
Tem que se apaixonar pela ausência e pela solitude
Pela dor da falta
Pela sensação de contração
Pela sua miséria existencial
Pelo medo e pelo seu preconceito
Pela sua tendência de fazer tudo errado
Pela sua ignorância
Pelo não saber
Pelo sonho de ser alguém
Pela ilusão da história
Pela presença da dúvida
Pela sua impotência
Pelo nada total
E principalmente
Tem que se apaixonar pelo desconhecido,
Misterioso,
E incognoscível
Existir sem saber o que é que realmente existe

134
14/08/21

22:01

Está incluído
Ser e não ser
Amar e odiar
O medo e o anseio
A paz e a serenidade
Todas as ondas estão permitidas
O movimento da quietude
A plenitude do vazio
A clareza da confusão
A harmonia do caos
Todos os paradoxos
E a lucidez mais insana
Tudo cabe nisso
Sem lugar
Em tudo
Sem tempo
Eternamente
Tudo cabe
Tudo é
E não é
O nada (tudo)ando

135
12/08/21

19:25

eu nem pude perceber como isso começou


foi instantâneo e imediato
lá estava o preconceito, o repúdio, o julgamento
como se eu fosse melhor que aquelas pessoas
como se a aparência delas fosse uma prova de seu baixo valor
e lá estava eu me julgando
por ter julgado alguém que nunca tinha visto antes,
que não conhecia
e senti que eu era pior que elas
senti repúdio por mim mesmo
(…)
não podemos apenas ser semelhantes?
(...)
quem julga?
quem tem preconceitos?
quem sente repúdio?
(…)
isso acontece
acontece aqui e acontece aí
não diga que não

136
11/08/21

08:09

tudo o que parece aparecer


recebe um rótulo mental
nome, forma ou significado
a atenção então se torna fascinada pelo objeto percebido
a mente se isola limitada
e perde-se o infinito vazio
esse é o vício e a prisão humana
(...)
se eu pudesse fazer algo
eu mudaria a minha perspectiva
e a tua
para que pudéssemos ver através
entre
antes
e além…

08:17

se você não fizer nada a respeito


deixar tudo ser
permitir todos os teus sentimentos, pensamentos e movimentos
verá que eles nunca foram teus

137
10/08/21

7:56

correndo feito louco


arrastando montanhas nas costas
um inferno de esforço
tentando de todas as maneiras
tentando
tentando
lutando
lutando
pra quê?
nada permanente jamais foi conquistado
nem por mim nem por ninguém
porque nada nunca foi perdido
tudo já está sempre mais que perfeito

138
09/08/21

9:12

(…)
não é sobre nada então
não é a respeito de nada
não significa nada de nada
é só o que é mesmo
é isso, isso, isso
sem nada por trás disso
sem significar
sem propósito para nada
sem onde chegar, nem o que se tornar
pois já é completo e não há distância
é tudo relaxamento, mistério e desconhecimento
(...)
o que você pensa a respeito do que está acontecendo?
tudo isso é real, e irreal, apenas incompreensível
saber não leva a nada
porque em última instância, nada se sabe
é só ilusão de que se sabe
você não precisa de explicações
você não precisa de nada
isso já é o que é
e é inexplicável
e livre para ser qualquer coisa, até para ser não livre
(...)
o que você busca?
não cansa nunca de buscar?
não vê o quanto isso é inútil?
só isso é o que é
não há nada lá fora, nem no futuro
não há nada em lugar algum
além desse nada aparecendo como isso tudo
só isso é o que é
(...)
onde está você?
onde se localiza?
qual a tua origem?
não há resposta, pois, a pergunta está incompleta
não há você!

139
não se pode localizar algo que nunca esteve em parte alguma
não é sobre você
nada é sobre você
isso é sobre nada
que pode aparecer como tudo
como se estivesse acontecendo algo
mas o que de fato acontece?
(...)
isso não tira o seu chão?
é porque você está olhando para si mesmo
e o si mesmo é uma ilusão
um vício de pensar que existe alguém no centro da experiência
deve ser essa a sensação de um drogado quando alguém o priva de
sua droga
a abstinência passará quando você (ninguém) desistir de si mesmo
(…)
o que importa então?
tudo o que resta é isso!
é trágico para o indivíduo
mas é pura liberdade,
para além do “eu sou”

140
141

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