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BIOLOGIA COMO IDEOLOGIA

A DOUTRINA DO DNA

R.C. Lewontin

Tradução e Revisão:

F.A. MOURA DUARTE


FRANCINE MUNIZ
JOSÉ TADEU DE SALES
Copydght © 2010 by FUNPEC-Editora

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Lewontin, Richard C., 1929-


Biologia como Ideologia: a doutrina do DNA I
R.C. Lewontin; tradução e revisão F.A. Moura Duarte,
Francine Muniz, José Tadeu de Sales. --
Conteúdo
Ribeirão Preto: FUNPEC-RP,200tl.
Título original: Biology as Ideology.
Bibliografia.
ISBN 85-87528-20-3
1. Biologia - Aspectos sociais 2. Biologia-
Filosofia 3. DNA 4. Genética r. Título
Prefácio 1
00-4292 CDD-570.l
Um Ceticismo Racional 5
Índices para catálogo sistemático:
1. Biologia: Teoria 570.1 Está tudo nos Genes? 23

As Causas e seus Efeitos 45


Editor: Prof.Dr. Francisco A. Moura Duarte
o Sonho do Genoma Humano 65
Editor Associado: David De Jong
Editora de Arte/Editoração Eletrônica: Luciana de Meio e Silva Uma História nos Livros de Texto 93
Coordenação Editorial: Francine Muniz
Ilustração de Capa: Malcolm Tarlofsky A Ciência como Ação Social 115
Projeto de Capa: Drenttel Doyle Partners
Notas 135

Todos os direitos desta edição reservados à

FUNPEC - Editora
Rua Hudson, 655 / Jardim Canadá
14024-000 Ribeirão Preto, SP
Tel./Fax: (16) 620-1251/621-4006
e-mail: funpecrp@uol.com.br

2010, Impresso no Brasil


Prefácio

Para uma grande parte da história da cultura ocidental, as fon-


tes principais da consciência popular sobre a sociedade foram a
tradição e a Igreja Cristã. Mesmo os revolucionários da Indepen-
dência norte-americana, com seus ideais sociais, apelavam para a
providência divina para justificar suas ações políticas. No presen-
te século, porém, a sociedade ocidental tornou-se mais secular e
mais racional, e as fontes principais de teoria social transforma-
.ram-se em intelectuais, cientistas, economistas, teóricos políticos
e .filósofos profissionais que trabalham, em sua maioria, nas w1Í-
versidades. sses nte ectua s salie o o e~g~u:ee~=::=~:::;:
'1'"ar a consciência olític2[, e -les consranicn ente ouscan c
1 or on 12 elll dic 'ULg s s' é a. rota comum é r-
,I ar-se uma celel5ri a e secundána, conheci a or a guma "Eles-
c~tã" geralmente mais a rangen e o ue sunp - sta so re I

s gredo da existência social e esplri ua ao home . É tudo sexo,


dinheiro ou genes. Uma única e dramática teoria que explique
tudo faz bem para a imprensa, rádio, TV, e para a venda de li-
vros. Qualquer um com autoridade acadêmica que tenha uma
idéia simples e poderosa, e que saiba escrever razoavelmente com
ldecência e estilo, é facilmente reconhecido pelo público.
Por outro lado, se a mensagem de alguém for aquela mostran-
do que as coisas estão complicadas, incertas e confusas, que ne-
nhuma lei ou força explicará o passado e nem antecipará o futuro
da existência humana, essa mensagem terá bem menos divulga-
ção. As alegações moderadas sobre a complexidade da vida e a
nossa ignorância de suas determinantes não são Wl1 show biz.
Felizmente, existe uma tradição, da qual as Preleções de
PREFACIO PREFACIO 3
2

Massey são uma importante parte, de fornecer um fórum públi- Por fim, estou em débito com Rachel Nasca pela sua produ-
co para uma visão mais complexa e menos espalhafatosa do ção das diversas versões das palestras e textos a partir das gra-
mundo. Assim, fiquei lisonjeado e contente por ser convidado a vações e rabiscos inelegíveis. Nada seria produzido sem ela.
conduzir as Preleções de Massey de 1990 na CBC iCanadian
R.C. LEWONTIN
Broadcasting Corporation) e transformar as palestras neste li-
Cambridge, Massachusetts
vro. Esse convite ofereceu a oportunidade de se lutar contra a
16 dejulho de 1991
idéia de que a ciência consiste de verdades objetivas simples, de"J
Marlboro, Vermont
que basta ouvir os biólogos que saberemos de tudo que é preciso
27 de agosto de 1992
para conhecermos a existência humana. ,/
A retórica da ciência, e especialmente a retórica escrita, é muito
diferente das formas comuns de comunicação, portanto foi parti-
cularmente dificil criar um conjunto de palestras de rádio que fos-
se acessível para os ouvintes em geral. Depois houve uma difi-
culdade ainda maior de pronunciar aquelas palestras de uma
maneira vívida para um público de rádio que não era visível. Ao
longo de todo o sucesso que tive nesse trabalho, devo tudo ao
julgamento crítico de Jill Eisen da CBC, que me obrigava a fa-
zer tudo novamente até que estivesse certo. Sem o trabalho e o
. encorajamento dela, as palestras teriam sido um fracasso total.
Ao transformar as palestras neste livro, resisti à tentação de
escorregar de volta para a retórica formal da produção intelectu-
al escrita, e ao invés disso, mantive as palestras de rádio bem do
jeito que estavam. Inevitavelmente, isso resulta em alguma di-
vagação e falta· de clareza. Estou tremendamente em débito com
Shaun Oakey por editar o texto com um toque que foi luminoso
e infalível. Essa pessoa fez grandes melhoras.
Para essa edição de Biologia como Ideologia acrescentei às
originais Palestras de Massey uma versão editada de um recente
ensaio que apareceu no The New YorkReview ofBooks. Embora
a estrutura para o ensaio fosse aquela da revisão de um livro, é
na verdade, uma discussão das importantes conseqüências da
crença no poder do DNA. A retórica de tal ensaio é o estilo mais
estudado do inglês escrito, mas que estava voltado para a mes-
ma audiência das palestras originais de Massey. Fiquei agrade-
cido por Wendy Wolf ter estimulado o acréscimo desse capítulo
bem como por ter ajudado a fazê-lo.
UM CETICISMO
RACIONAL
A ciência é uma instituição social a respeito da qual
existe uma grande dose de equívocos, mesmo entre aqueles que
dela fazem parte. Achamos que a ciência é uma instituição, um
conjunto de métodos, um conjunto de pessoas, um grande corpo
de conhecimento que chamamos de científico, e que está de al-
guma forma separada das forças que regem nossas vidas do dia-
a-dia e que governam a estrutura de nossa sociedade. Achamos
que a ciência é objetiva. A ciência nos trouxe todos os tipos de
boas coisas. Ela aumentou tremendamente a produção de ali-
mentos. Ela aumentou nossa expectativa de vida de meros 45
anos de idade no começo do último século para mais de 70 anos
em lugáres ricos como os Estados Unidos. Ela colocou pessoas na
lua e tomou possível ficarmos em casa e vermos o mundo passar.
Ao mesmo tempo, a ciência, como outras atividades produ-
tivas, tais como o Estado, a família e o esporte, é uma instituição
.social completamente integrada e influenciada pela estrutura de
todas as nossas demais instituições sociais. Os problemas que a
r ciência trata, as idéias que. ela usa na investigação desses pro-
blemas, mesmo os chamados resultados científicos que surgem
I da investigação científica, são todos profundamente influencia-
dos pelas predisposições que originam-se da sociedade na qual
vivemos. Afinal, os cientistas não começam a vida como cientis-
tas, mas como seres sociais imersos numa família, num Estado,
numa estrutura produtiva, e eles enxergam a natureza através de
lentes que foram moldadas pelas suas experiências sociais.
Acima desse nível pessoal de percepção, a ciência é molda-
da pela sociedadeporque trata-s~ de u~v~d~de ~odutiva hu-
mana que toma tempo e dinheiro, e portanto é orientada e guia-
da por essas forças num mundo que possui o controle do di-
nheiro e do tempo. A ciência faz uso das facilidades e é parte do
processo da produção das mesmas. A ciência faz uso do dinhei-
ro. As pessoas ganham suas vidas através da ciência, como con-
seqüência, as forças sociais e econômicas dominantes na socie-
dade determinam em grande parte o que a ciêIiCia faz e como

-- --- -----.-
faz. Mais do que isso, essas forças têm o poder de apropriarem-
se das idéias da ciência que são parfQarmente adequadas para
.---
8 BIOLOGIA COMO IDEOLOGIA UM CETICISMO RACIONAL 9
(

e
a manutenção e ros eridade
_-...!---"'---";'~:";'::": --' contínua das estruturas
- - sociais das
j
Contudo, é extraordinário como a ciência prática tem sido
quais fazem Qarte. Portanto.jis dem.?~instituições sociais apre- tão independente da teoria. No capítulo 3, eu abordarei um dos
sentam uma entrada para dentro da ciência em termos do que é mais famosos exemplos de mudança científica na agricultura: a
feito ed como é pensado, e elas tiram da ciência conceitos e introdução do milho híbrido em todo o mundo. Dizem que o
- idéias que depois as sustentam e as tornam aparentemente legí- milho híbrido é um dos grandes triunfos da moderna genética
timas e naturais. Trata-se de um duplo processo - por um lado, em ação, ajudando a alimentar a população e aumentando o seu
da influência social e do controle daquilo que os cientistas fa- bem-estar. Contudo, o desenvolvimento do milho híbrido do jeito
zem e dizem, e por outro lado, do uso daquilo que os cientistas que é praticado atualmente, assim como de quase toda reprodu- .
fazem e dizem para sustentar aind; mais as instituições da socie- ção vegetal e animal, tem sido realizada de uma forma comple-
dade - é isso que imaginamos quando falamos da ciência como tamente independente de qualquer teoria científica. Na verdade,
ideologia. uma grande quantidade da reprodução vegetal e animal tem sido
r A ciência serve a duas funções. Primeiro, ela nos fornece no- produzida de forma indistinguível dos métodos dos séculos pas-
Ivas maneiras de manipularmos o mundo material ao produzir um sados 'onde ninguém jamais havia ouvido falar da genética.
r / conjunto de técnicas, práticas e intervenções onde as novas coisas O mesmo é verdadeiro nas nossas tentativas de lidar com
são produzidas e a qualidade de nossas vidas é mudada. Estes são assassinos como o câncer e a doença cardíaca. Muitas curas para
\o. os aspectos da ciência para os quais os cientistas apelam quando o câncer envolvem a remoção do tumor em crescimento bem
tentam conseguir dinheiro dos governos ou quando aparecem na , como a destruição do mesmo com poderosas radiações ou subs-
primeiras páginas dos jornais, num esforço de relações públicas, a tâncias químicas. Virtualmente nenhum desses progressos na
fim de manterem a prosperidade. Lemos repetidamente sobre como terapia contra o câncer tem ocorrido por causa da falta de uma
. a "ciência descobriu" algo de novo, mas muito menos freqüen- profunda compreensão dos processos elementares do crescimento
temente do que aqueles anúncios escondidos pelos classificados. e desenvolvimento celular, embora quase todas as pesquisas so-
Os biólogos descobrem "evidências de" genes que "algum dia po- bre o câncer, acima do nível puramente clínico, estejam volta-
dem" levar à "possível" cura do câncer. Embora seus relatos super- . dos exatamente para compreender os mais íntimos detalhes da
otimistas reproduzam um certo cinismo, entretanto é verdadeiro o biologia celular. A medicina permanece sendo essencialmente
fato de que os cientistas realmente mudam a maneira de confron- um processo empírico onde se conserta o que funciona, apesar
tarmos o mundo material. de toda a conversa da medicina científica.
A segunda função da ciência, que algumas vezes é indepen- ~Também no capítulo 3, abordarei o relacionamento entre a
dente e outras vezes está intimamente relacionada com a pri- biologia científica e as mudanças na expectativa de vida. De modo
meira, é a função da explicação. Mesmo se os cientistas não algum uma compreensão correta de como o mundo funciona é
estiverem mudando realmente o modo material de nossa exis- fator básico para uma manipulação bem sucedida do mesmo. Mas
tência, eles estão constantemente explicando por que as coisas as explicações de como o mundo realmente funciona servem a
são do jeito que são. Freqüentemente é dito que essas teorias um outro propósito, um em que tem sido de notável sucesso, in-
sobre o mundo devem ser produzidas a fim de, em última análi- dependente da verdade prática das alegações científicas. Trata-se
se, mudar o mundo através da prática. De qualquer modo, como da legitimaçãose
podemos curar o câncer sem compreendermos o que o causa? Independentemente do ponto de vista político de alguém,
Como podemos aumentar a produção de alimentos sem compre- todos devem concordar que vivemos num mundo onde o bem-
endermos as leis da genética e da nutrição vegetal e animal? estar espiritual e material é distribuído de forma muito desigual.
10 BIOLOGIA COMO IDEOLOGIA UM CETICISMO RACIONAL· 11

Existem pessoas ricas e pobres, pessoas doentes e saudáveis, pes- a sociedade onde vivem é justa e honesta, ainda que assim não o .
soas que possuem controle das condições de suas próprias vidas, seja, e que é bastante inútil recorrer à violência. Estas são as
ocupações e tempo (como professores que são convidados a dar instituições da legitimação social Elas são parte da luta social
palestras no rádio e transformar essas palestras em livros) e aque- assim como a queima de feno e a estruição de máquinas duran-
las que têm suas tarefas designadas para elas, que são ignoradas, te os tumultos ocorridos na Inglaterra por conta do capitão Swing
que têm pouco ou nenhum controle sobre qualquer aspecto espiri- no século XIX. Mas eles usam armas muito diferentes - armas
tual ou material de suas vidas. Existem países ricos e pobres. Algu- ideológicas. O campo de batalha é dentro das cabeças das pes-
mas raças dominam outras. Homens e mulheres têm poderes soci- a
soas, e se a batalha é vencida neste campo então a paz e tran-
ais e materiais muito desiguais. ' qüilidade da sociedade estão garantidas.
Cada sociedade conhecida tem sido caracterizada por algum Em quase toda a história da sociedade européia desde o im-
tipo de disparidade de.status, riqueza, saúde e poder. Isso signi- pério de Charlemagne, a principal instituição da legitimação so-
fica que em cada sociedade conhecida tem havido alguma for- cial foi a Igreja Cristã. Era pela graça de Deus que cada pessoa
ma de luta entre aqueles que têm e aqueles que não têm, entre possuía um lugar determinado dentro da sociedade. Reis regiam
aqueles com força social e aqueles privados dessa. A ascensão Dei gratia. Ocasionalmente a graça divina podia ser conferida a
dos negros nos Estados Unidos nos anos 60 e 70, em. que houve um plebeu que fosse enobrecido, e a graça poderia ser removida.
vasta destruição de propriedades e uma redistribuição radical A graça foi removida do Rei Charles I, como Cromwell observou,
dos bens de consumo, e a luta armada dos Mohawksno Canadá e a prova disso foi a cabeça cortada de Charles. Mesmo o mais
.para evitar a usurpação de suas terras pelo poder comercial e revolucionário dos líderes religiosos insistiam na reivindicação
governamental, são apenas os mais recentes eventos numa lon- da legitimação em nome da ordem. Martin Luther gostava que
ga história de violentas confrontações entre aqueles com status, seu rebanho obedecesse seus senhores, e em seu famoso sermão
riqueza e poder e aqueles que nada têm. As repetidas revoltas de sobre o casamento, ele declarava que a justiça fosse feita em nome
camponeses na Europa nos séculos XVI e XVII resultaram na da paz e não que a paz fosse feita em nome da justiça. A paz é o
destruição de colheitas e prédios e perda de centenas de milha~ bem social definitivo, e ajustiça é importante apenas se ela sub-
res de vidas. Os feitos de rebeldes camponeses como Pugachev
e Sténka Razin vivem na canção e na história. Nos Estados Uni-
dos, logo depois da independência da Inglaterra, os fazendeiros
,=-
verter a paz.
Para uma instituição explicar o mundo de forma a torná-Io le-
, gítimo, ela deve possuir diversas características. Primeiro, a
de Massachusetts ocidental, liderados por Daniel Shays e ainda instituição como um todo deve parecer que tem sua origem a
na posse de seus mosquetes, ocuparam os tribunais gerais para partir de fontes que estejam fora da habitual luta social do ho-
evitar que os banqueiros obtivessem sentenças de confisco das memJEla não deve parecer uma criação das forças políticas,
fazendas para cobrir os débitos. Os banqueiros em Boston fo- econômicas, ou sociais, mas atingir a sociedade a partir de uma
ram bem sucedidos obtendo tropas 'para eliminar tal rebelião, fonte supra-humana. tfegundo, as idéias, os pronunciamentos, l'
mas tudo à custa de considerável convulsão social. É obviamen- as leis e os resultados da atividade da instituição devem ter uma
te do interesse daqueles que possuem o poder dentro da socieda- validade e uma verdade transcenden~~e vá além; qualquer
de evitar tais conflitos violentos e destrutivos através da força possibilidade de comprometimento ou erro numan . ,.suas ex-
policial do Estado, mesmo se estiverem certos de vencer. planações e..J2LQ!l.unciament01...devem parecer verdade~~
r Na medida em que essas lutas ocorrem, instituições são cri- tro de um absoluto sentido e ori inar-se de-J.lma fonte ahsoluta.
, adas para impedir a luta violenta ao convencer as pessoas de que
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Elesd~v~ ~~r7t;;;~ente v~rdadeiros e o~sentes.
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E por
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12
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:J L o-'k>J (
fim, a instituição deve ter uma certa mística e uma qualidade velada cientista nW1cadeve permitir que uma consideração política ó
para que sua 0~Ç. - mais interna não flgue completamente trans- impeça e ize e e e acre' e adeiro.
arente ara todos. A institui ão deve ter uma linguagem esotérica, Os métodos e instituições de ciência nem sempre são vistos
que precisa ser exp~da para as pessoas com"!:!psor aqueles que acima das relações humanas habituais, mas o iroduto da ciên-
são particularmente reconhecidos e que podem intervir entre ã-'vida cia, é claro, é declarado como um tipo de verdade universal. Os
éotidian e as fontes misteriosas da compreensão e do conheci- segredos da natureza são desvendados. Assim ue a verdade sob
mento. a e-se aceItar os fatos da vida. Quando a
Na verdade, a Igreja Cristã ou qualquer outra religião re- ciência. fala, não deixa nem o cão latir. Por fim, a ciência fala
velada encaixava-se perfeitamenté nessas exigências, e assim, através de palavras mist iosas. Ninguém, exceto um perito, pode
a religião tem sido uma instituição ideal para legitimar a soci- entender o que os cientistas dizem ou fazem, e assim precisamos
edade. Se apenas as pessoas com graça especial, estão em con- da mediação de pessoas especiais - jornalistas especializados em
tato com a divina inspiração através das revelações, sejam elas ciência, por exemplo, ou professores que falam no rádio - para
padres, pastores ou cidadões comuns, então devemos depen- explicat os mistérios da natureza porque caso contrário não existe
der inteiramente delas para aquilo que foi decretado por inspi- nada além de fórmulas indecifráveis. Nem mesmo um cientista
ração divina. pode compreender sempre as fórmulas de um outro. Certa vez,
Mas essa descrição também acomoda a ciência e tomou pos- quando Sir Solly Zuckennan, o famoso zoologista inglês, foi in-
sível para esta substituir a religião como principal força de legi- dagado sobre o que ele fazia quando lia um artigo científico e se
timação na moderna sociedade 6-ciência a regoa um método deparava com fórmulas matemáticas, ele disse, "eu as ignoro".
ue é ob' etivo e a olítico, e e am te ve dadeiro. Os cientistas A e a ciência reivindicar sua posição acima da s . da-
acreditam verdadeiramen e que a ciência está acima da luta so- de, como a..I~' t e a e uma institui - ema-
cial, exceto pelas intrusões indesejáveis de políticos ignorantes. mente social, que reflete e reforça os valores e o iniões dominan-
Theodosius Dobzhansky, um famoso cientista que refugiou-se tes da sociedade en cada é oca histórica, Algumas vezes a fon-
da Revolução Russa de 1917 e que detestava os bolchevistas, te de uma teoria científica dentro da experiência social e a ma-
dedicou muito de sua energia para destacar os graves erros cien- neira pela qual essa teoria científica é diretamente traduzida à
tíficos que estavam sendo cometidos na União Soviética nos partir desta última ficam plenamente evidenciadas, mesmo em
campos da biologia e genética como conseqüência das doutri- detalhes. O caso mais famoso é a teoria da evolução de Darwin
nas biológicas ortodoxas de T.D. Lysenko. Dobzhansky foi ad- através da seleção natural. Hoje, nenhum cientista duvida que a
vertido por causa de suas convicções políticas e por fazer aquela teoria da evolução na Terra tenha evoluído ao longo de bilhões
campanha contra Lysenko. De qualquer modo, ele acreditava de anos a partir de organismos que há muito se extinguiram.
que mais cedo ou mais tarde um conflito global ocorreria entre Além do mais, sabemos que isso é um processo natural que resul-
Estados Unidos e União Soviética e que as falsas doutrinas ci- ta da sobrevivência diferencial de diferentes formas. Neste senti-
entíficas de Lysenko estavam enfraquecendo severamente a pro- do, todos nós aceitamos o darwinismo como sendo verdadeiro.
dução agrícola soviética. Por que então ele simplesmente não Mas a explicação de Darwin para tal evolução é um outro
permaneceu quieto quanto aos erros de Lysenko já que a União assunto. Ele alegava que existia uma luta universal pela existên-
Soviética ficaria enfraquecida e comprometida no conflito que cia, uma vez que os organismos nasciam além da capacidade de
estava por vir? Sua resposta foi que a obrigação de falar a verda- sobreviverem e se reproduzirem, e que no curso dessa luta pela
duo_bre a ciência era superior às demais obrigações e que um existência, aqueles organismos que eram mais eficientes, me-
~
L ~ e -t-l".t...
tA. :Dor W\,faJ
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14

lhor projetados, mais ativos, e geralmente melhor constituídos formas de ex licação e que, por sua vez serve ara refor ar s
para a luta, deixariam mais descendentes do que as espécies in- atitu des.soci
es Q Ia . ~ à uelas sup.osi ões anterio-
am ongem
feriores. Como conseqüência dessa vitória na luta pela existên- :-,.res. ma das Iação do m ivíduo com a coletivi-
cia, há a ocorrência da mudança evolucionária. dade o famoso problema da parte e do todo. Antes do século
Contudo, o próprio Darwin estava consciente da fonte de VIII, a sociedade européia dava pouca ou nenhuma ênfase so-
suas idéias sobre a luta pela existência. Ele alegava que a idéia bre a importância do indivíduo. Além disso, a atividade das pes-
da evolução através da seleção natural ocorreu após ele ter lido soas era determinada em grande parte pela classe social em que
o famoso Essay on Population de.Thomas Ma1thus, um clérigo elas nasciam, e os indivíduos confrontavam-s~omo represen-
e economista do século XVIII. Esse ensaio efa um' argumento tantes de seu grupo social. Por exemplo, numa disputa envol-
contra a antiga Lei dos Ingleses Pobres, que Ma1thus achava vendo uma questão comercial entre um padre e um.inercador, o
demasiadamente liberal, e a favor de um controle mais restrito primeiro apresentaria seus argumentos num tribunal eclesiásti-
dos pobres de forma que eles não se proliferassem e criassem co e o segundo num tribunal de sua própria corte ao invés de
agitação social. Nave dad to.da teor'a d ._ ãwi€IJarwin ambos 'estarem sujeitos ao mesmo julgamento. Os indivíduos
através da ão natural a resenta uma '1 crível semelhar ça" não eram vistos como as causas das disposições sociais, mas
COIlLa tgQWt.e- o ítica elo ca italismo inICIar desen- sim como suas conseqüências.
volvido w~economistas escoceses. Darwin possuía algum Além do mais, as pessoas não tinham liberdade dentro dessa
conhecimento de sobrevivência econômica do mais apto porque .hierarquia econômica. Os camponeses e os lordes similarmente
ele próprio ganhava sua vida a partir dos investimentos que acom- tinham obrigações mútuas e estavam ligados por estas mesmas
panhava diariamente nos jornais. O que Darwin fez foi tomar a obrigações. Não havia força de trabalho livremente competitiva
economia política do início do século XIX e eXRandi-Ia para onde cada pessoa tinha o poder de vender sua força de trabalho
f incluir tudo da economia natural. Além do mais, ele desenvol- dentro de um mercado de trabalho. Essas relações tomaram quase
veu uma teoria da se eçao sexua na evolução (cujo o tema será impossível o desenvolvimento do tipo de capitalismo produtivo
detalhado no Capítulo 4), onde a força principal é a competição que marca a nossa própria era, onde a liberdade para os indiví-
entre machos visando atrair as fêmeas. Essa teoria foi imagina- duos irem de um lugar para outro, de serviço em serviço, de

-
da para explicar por que os animais machos freqüentemente exi- posição social em posição social, a fim de confrontarem-se al-
bem cores brilhantes ou complexas danças de acasalamento. Não gumas vezes como arrendatários, outras vezes como produtores
está claro se Darwin est nsciellte.Jia~similaridade de sua e por vezes como consumidores, é uma necessidade absoluta.
idi.la e se eçao sexual com a idéia vi/oriana cOJIen e 0_ elaci- Por exemplo, a servidão teve de ser abolida na Rússia em mea-
onamento entre homens e mulheres da classe média. Ao ler a dos do século XIX porque havia uma escassez de operários e os
teoria de Darwin, pode-se ver a jovem e distinta dama sentada servos eram legalmente proibidos de serem enviados para as fá-
em seu sofá enquanto o pretendente ajoelhado aos seus pés su- bricas. Algumas vezes, de fato, os latifundiários levavam ilegal-
plica por sua mão, já tendo dito ao pai dela quantas centenas de mente seus camponeses para dentro das fábricas, e estes supli-
rendimento anual ele possue. cavam ao czar que os dispensassem.
Boa parte da influência ideológica da sociedade que permeia A ci~ncia qu~ desenvolvia-se na Idade Média e na Renas~
a ciência ocorre de maneira mais súbita. Ela vem na forma de (: cença fOI caracterizada por e a.,Ila~~mQ..um.t.ipQ de toào
~posições cas s quais os ró rios cieJüistas geralmente indissolúvel. Vi a o. te odiam ser transformadas em uma ou
não estão conscientes, mas que apresentam profundo efeito nas o;!tra, desde ~ue se conhecesse a fórmula mística. A natureza
BIOLOGIA COMO IDEOLOGIA UM CETICISMO RACIONAL 17
16

não odia ser com reendida tomando-a empeda os . ue ao fazê- (os organismos eram influenciados.pelo ambie~1t~;ele~ eram os
lo destrUla-se o ue era ess ncial. Alexander Pope disse que era ~bjetos passivos e o mundo extenor era o sujeito atrvo ssa
R. «iõliiÕ acompanhar a vida através das criaturas que você disseca. alienação do organismo de seu mundo exterior significa que o
r-t2'\. ,{J- Você a perde assim que a detecta". !;.. organização s ia 1"avista \ mundo de fora tem suas próprias leis que são independentes dos
\...l. ~<P-' como um todo indissolú si omo a natuwza... \\ organismos e assim não podem ser alterados pelos mesmos. Os
{)~ Com a mudança na organização social que fOIforjada pelo ..' organismos encontram o o do jeito que e, les devem
~~I, .: capitalismo i dustria n des~n:olvimen.to,.uma ~ova visão de ' adaptar-se ou morrer." tureza - ame-a ou deixe-a' Trata-se
te J' j sociedade r iu n. ,d 1 no ll1de endente~ da analogia natural do antigo I a o. combater o
governo. Como mostrarei no capítulo 5, isso é um empobreci-
,)iT p um ti o d .tomo social auto no o que pode mover-se de um lu
• -V'~ " gar para outro oS1'Çãopara outra. Agora acredlt~-se que mento e uma visão errônea do atual relacionamento entre os
t ~s.JI a sociedade seja a conseqüência, e não a causa, ?as propnedades
\~ ",tt- ~ individuais. São os indivíduos que fa.zem a socle,da~e. A econo-
\Q\\\ mia moderna é fundamenta~a n.a~eor~ada preferência d~ consu-
organismos e o mundo que eles ocupam, u.!.!!.mundoem que os
o;:g . nos vivos eralment. 'iam as róprias atividades de
s'!!psistênçia.
j
~.\'o midor. As firmas autônomas individuais competem entre SIe subs- Portanto, a ideologia da ciência moderna, incluindo a biologia
"....t'd\~.(\l tituem umas às outras. Os indivíduos t~m poder sobre seus pró- oderna, toma o átomo ou o indivíduo a fonte de causa de todas as
\,.l. prios corpos e força de trabalho, naquilo que ~acPherson. cha- propriedades de conjuntos maiores. Isso prescreve uma maneira
;;: mou de "individualismo po.s~essivo"l. Essa s?c~e~ad atOllllza de estudar o mundo, que é reduzi-Io em partículas individuais e
é ordenada por uma nova vlsao da natureza. çU!.l.sao ~ ~a. estudar as propriedades dessas partículas isoladas. Isso quebra o
~ ~gora acredita-se que o todo deve ser compreendid~~s to- mU11~o em domínios autônomos indepen.dentes, ou seja, em domíj
7.,~~
. niando-o em partes, que as partí
," 10-- átomos- ~
se edaços ll1díVldums,os
- das propne. da-
1110S mternos e externos. As causas são mternas bem como exter-
/
~,.fI' ,
moléculas , celulas e ge~Eras-€ausas-· nas, e não há qualquer dependência mútua entre elas. .
I ~I~:u.t/'\ des do ob' eto todo e devem ser estudados separadamente se for- , Para a biolo ia essa visão do mundo resultou numa ima-
a (. ~ mos compreender a complexidade da natureza. A teoria da evolu- gem particular dos organismos e de suas atividades na VI a. s
fi,..') I çao oe arwin foi uma teona a axa de reprodução diferencial sqes vivos são ViStoScomo senÓA.orgalllsmosaetenninad~s por
(' dos indivíduos, e todos os fenômenos da evolução eram para f~lternos, ou seja, os genes, Nossos genes e as moléculas
\()~ "..., ser compreendidos neste nível indi'.'~du~l de causa. Toda a bio- de DNA que os constituem são a moderna forma de "graça", e
(l'V\V. logia moderna e, na verdade, toda a clen~la moderna.tomam com~ d~ntro desta visão compreenderemos o g,uesomos depois de sa-

r\'- u:;;;
r' ~

VJ<'
sua metáfora de informação o mecarusmo descrito por Rene
Descartes na parte V de seu Discourses. Descartes, sendo reli-
gioso, havia excluídó a alma humana do bête machine, mas q~e
bermos do ue no ão feitos. O mundo fora de nós'
coloca certos problemas, que não criamos mas que apenas expe-
rimentamos como objetos. Os problemas são: encontrar U111 côn-
~t"'~' logo foi incluída também para tomar o homme mac~ine.da VI- juge, encontrar alimento, vencer as competições com os rivais,
V' \~yI'.~(ro..são atual. A ciência moderna entende o mundo, seja VIVOou adquirir uma grande parte dos recursos do mundo, e se tivermos
y.. ~ ~morto, como sendo um sistema amplo e complicado de engre- os tipos certos de genes, seremos capazes de resolver os proble-
•.1(;4\ f nagens e alavancas. . mas e deixar mais descendentes. Portanto, com essa visão, é re~
r A segunda característica da transformação das idéias cien- almente nossos genes ue estão se ropagando através de nós
tíficas foi a clara distin ão entre causa e efeito. Supõe-se que mesmos. ~ós somos apenas seus instrumemos, seu veIculos
as coisas sejam uma ou outra. Novamen e, na o inião de Darwin, t~porários através dos quais as moléculas auto-reptÍcantes ~
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os formam tanto podem ser bem sucedidas como mal sucedidas ser humano. Eles dizem que quando conhecermos a seqüência
m difundi:-se pelo mundo. Nas palavras de Richard Dawkins, da molécula que constitui todos os nossos genes, saberemos o
um dos principais p:,op~nentes dessa"vi~ão biológica, nós so~~s que é ser um humano. Quando soubermos com que o nosso DNA
"robôs desajeitados cujos os genes cnou-nos corpo e mente . se parece, saberemos por que alguns de nós são ricos e outros
~
Da mesma forma que os genes determinam os indivíduos pobres, alguns saudáveis e outros doentes, alguns poderosos e
num nível, são os indivíduos que determinam as coletividades outros fracos. Também saberemos por que algumas sociedades
em outro nível. Se quisermos compreender por que uma colônia são poderosas e ricas e outras fracas e pobres, por que uma na-
de formigas tem uma divisão particular de tarefas ~u um bando ção, um sexo, uma raça domina a outra. Na verdade, saberemos
de pássaros voa de determinada maneira, precisamos apenas olhar por que existe uma coisa como a ciência da biologia, que em si é
para as formigas e pássaros individualmente, porque o compor- uma das quinquilharias culturais que repousam no fundo do saco. dl1OJ.
tamento do grupo é uma conseqüência dos comportamentos in- Ficamos tão acostumados com a visão atomística do mun- \ú'1(~\
dividuais dos organismos; tal comportamento por sua vez é de- d e esc artes ue es uecemos ue trata- \,
terminado por genes. Para os seres humanos isso significa que a se de uma et' . ão Rensamos mais. como Descartes, o~ o )
estrutura de nossa sociedade não é nada mais do que o resultado mundo é ../ reló io. Pensamos ue é um relógio
do conjunto de comportamentos individuais. Se nosso país entra Não'" podemos imaginar uma idéia alternativa a menos que seja
numa guerra, nos dizem que é porque nos sentimos agressivos uma que retome até a era pré-científica. Para aqueles que estão
pttli'ãnto inâividuos. ~e vivem~a ?oqiedade cO~dr;~tiva e .insatisfeitos com o mundo moderno e que detestam os artifícios
(~reendedora, ue cada um de nos,~ lIL lduos, da ciência, a poluição, o barulho, o mundo industrial e o atendi- ~
tem um lmpulso para ser com etitivo m reendedo mento médico supennecanizado que parece não fazer nos sentir a-9
s genes azem os indivíduos e aos ·lldivíd:Q..o?fazem a so- melhor por mais tempo - EEFa as pessoas que desejam vollar '~LV--
ciedade, e assim sendo,~os genes fazem a sociedad Se uma para a natureza e para as velhas maneira§ osta tem sido a ;-~ tj'J\
sociedade é diferente da outra, é porque os genes dos indivíduos ,volta para uma descnção do mu do c o um todo indissolúvel (5~,
de uma sociedade são diferentes dos genes dos indivíduos da que nós assassinamos ara dissecá-lo. Para eles, não há utilida-
outra sociedade. Pensava-se que as diferentes raças eram gene- de em tentar dividir tu o em partes porque inevitavelmente per-
ticamente diferentes quanto à agressividade, cri atividade ou demos a essência, e o melhor que podemos fazer é tratar o mun-
musicalidade. Na verdade, a cultura como um todo é vista como do holisticamente.
um conjunto de pequenos fragmentos e pedaços de quinquilha- Mas essa Hisã6!ro1" o mundo é insustentável. É sim-
rias culturais, que alguns sóciobiologistas chamam de culturgens. plesmente uma outra forma de misticismo e não toma possível
Dentro dessa visão, a aculturação é um saco de fragmentos e manipular o mundo para nosso próprio benefício. Um holismo
pedaços, tais como preferências estéticas, preferências conju- obscurantista já foi tentado e falhou. O mundo não é um imenso
gais, e preferências de trabalho e lazer. Descarregue o saco e a orgamsmo ue regula a si mesmo visando um fim benéfico como
ltura surgirá na sua frente. Assim, a hierarquia está completa. creem os ue a am na hl otese d Gaia m ora teorica-
Os enes fazem os indivíduos os indivíduosJ.§.m determinadas mente "o tremular de uma flor seja senti a estrela mais dis-
preferências e com~ onj nto de re rências e tante", na prática o meu jardim não tem qualquer efeito sobre a
~mDortamentos forma uma cultura. e.po tanto, os genes fazem órbita de Netuno porque a força gravitacional é extremamente
-;cltura. Eis por que os biólogos moleculares nos apressa a baixa e cai muito rapid ente a distância. Portanto, . ara-
ga~anto dinheiro para descobrir a seqüência do DNA de um ment~ existe uma erdade ?a cLen a ..~e que o mundo pode ser
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dividido em partes independentes. Mas não se trata de urna orienta- e sar coisa belas. Além disso, esses exemplos destinam-se a .
ção universal para o estudo de toda a natureza. Muito da natureza, deixar o leitor familiarizado com a verdade sobre a ciência como
como veremos, ão pi;) e se ·0.didae~ara atividade social e promover um ceticismo racional quanto às
serem estudadas isoladamente, e ~ puramente ideológico supor que impetuosas alegações que a ciência moderna faz acerca da com-
isso aconte a. preensão da existência humana. Existe uma -diferença entre o
problema é construir uma terceira idéia, uma que veja o ceticismo e o cinismo, onde o primeiro pode levar à ação e o últi-
undo por inteiro, nem como um todo indissolúvel e nem com mo somente à passividade. P2E.tanto, essas páginas também apre-
,~ uma visão igualmente incorreta, -mas que é atualn;ente domi- sen um fim olítico ue é encora' ar os leitores a não aban 0-
~ nante de que cada nível do mundo é constituído de Rartículas e narem a ciência para os experts, não serem por ela mistific os,
I~'--;: '-'---' mas exigirem uma compreensão cientr Ica sofisticada onde todos
~ artes que podem ser Isoladas e que possuem propriedades que
podem ser estudadas isoladamente. Ambas as ideologias, uma possam compartilliar.
que espelha o pré-moderno mundo social feudal e a outra que
espelha o moderno mundo competitivo, individualista e empre-
endedor, impedindo-nos de ver a completa riqueza de interação
na natureza. No final, elas evitam uma rica compreensão da na-
tureza e nos impedem de resolver os problemas para os quais a
ciência é supostamente aplicada.
Nos capítulos a seguir, olharemos com algum detalhe deter-
minadas manifestações da ideologia científica moderna e os fal-
sos caminhos a que por ela fomos levados. ideraremos co 10
(w.~Wf- r 't,.:~1)
o detenllinismo biológico tem sido usado ara ex licar e .ustifi- /
car as desi ual a es aentro e entre as sociedade. - R e ar os ~~ (ll~~
que tais desigua da es nunca odem ser mudadas. Veremos como
uma teona a natureza humana foi desenvo vida usando a teona dt\ r:"~S o... o.': •.,.
da evolução de Darwin através da sele ão natural para alegar J"Iõ> ~"WI (>Ol'!...~l-o
que a or alllza ao social tam em é imutá' por ue é natural. .,."'rt'~h\C 7
Veremos como os problemas de saúde e doença têm sido locali-
zados dentro do indivíduo para que este se torne um problema
para a sociedade ao invés da sociedade tornar-se o problema
para o indivíduo. E veremos como os simples relacionamentos
econômicos que se mascaram como fatos da natureza podem
conduzir toda uma orientação de pesquisa biológica bem como
a tecnologia.
Embora esses exemplos sejam destina~ lei-
tor qúanto à objetividade e visão da verdade translúc~ada
Retos cientjstas, eles não visam ser anti-cieuJ;íficos g,erir
que devamos desistir da ciência em favoIJ!.a astJ:Q.!..og~ de

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