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Artes Visuais / Cinema

Midsommar: explicação e
análise do filme
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e
Interartes

Midsommar: O mal não espera a noite é um


filme de terror norte-americano e sueco,
dirigido por Ari Aster e lançado em setembro
de 2019, que está disponível na plataforma de
streaming Amazon Prime.

A narrativa se foca em um grupo de amigos que


viajam até a Suécia para participar numa
celebração pagã. Contudo, as festividades se
revelam muito mais bizarras e assustadoras do
que eles poderiam imaginar.

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Entre os visitantes estão os protagonistas, Dani


e Christian, um casal que enfrenta sérios
problemas no seu relacionamento.

Midsommar - O Mal Não E…

Atenção: a partir deste ponto, você vai


encontrar spoilers!

O final do filme explicado


O percurso atribulado de Dani e Christian na
comunidade de Harga culmina com a coroação
da protagonista como rainha de Maio. Depois
de todos os outros visitantes terem sido
mortos em circunstâncias misteriosas, apenas
os dois sobraram.

É aí que Dani precisa tomar uma decisão: a


última pessoa a ser sacrificada no ritual pode
ser o seu namorado ou um elemento da
comunidade. Se até ali era Christian que
detinha o poder no relacionamento,
subitamente os papéis se invertem.

Ao longo da narrativa, vamos assistindo ao


modo como a união entre os dois vai se
tornando cada vez mais precária e a separação
é adiada, mas parece inevitável. Enquanto
Dani vai sufocando as suas emoções depois da
morte dos pais, o seu parceiro se mostra
negligente e totalmente desinteressado.

Desse modo, é quase inevitável que Christian


acabe se tornando, de certa forma, o
antagonista do enredo e seja alvo da antipatia
do espectador. E agora, pela primeira vez, era
ele que se encontrava numa posição de total
vulnerabilidade perante a companheira, não o
contrário.

Assim, quando a rainha escolhe sacrificar o


homem que amava, percebemos que esta se
trata de uma história de vingança. Se até
chegar a Harga, ela se sentia isolada, naquele
local acabou se integrando e achou o que mais
necessitava: uma família.

Como se de repente compreendesse e se


adaptasse aos costumes locais, a sua
expressão vai mudando enquanto o corpo de
Christian arde e um sorriso surge no seu rosto.
Para a comunidade, aquela era uma forma de
purgar o mal.

Para Dani, o mal era simbolizado pelo


namorado que a abandonou. Ele era o último
elo que a ligava ao passado. Por isso, a sua
morte também funciona como uma libertação
para a protagonista, que tem a oportunidade
de começar uma vida nova.

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Tranquilidade

Esta parece ser uma metáfora violenta sobre


cura e superação após um relacionamento
tóxico ou uma grande perda. Depois de chorar
e gritar junto dos novos companheiros, a
rainha chega ao final de um ciclo.

Alguns críticos chegaram a categorizar a


história como "horror positivo", já que Dani
acaba encontrando o seu final feliz de forma
inusitada.

Análise de Midsommar: temas e


simbologias
Midsommar é um filme que joga com as nossas
expectativas o tempo todo, misturando
imagens encantadoras da natureza com cenas
brutais de terror psicológico e até gore. A
beleza do lugar e o espírito acolhedor da
comunidade contrastam diretamente com seus
rituais sanguinários.

O diretor declarou que o seu objetivo era


mesmo confundir o espectador. Aliás, ele vai
fornecendo várias pistas para o desenlace da
história, mas só conseguimos percebê-las em
retrospectiva. Também existem rostos
escondidos durante o longa, que podemos
detetar se estivermos atentos.

Inspirado em inúmeros elementos do folclore


pagão, o filme segue o modo como o
relacionamento de Dani e Christian vai se
deteriorando com o tempo. Ari Aster contou
que estava vivendo uma separação difícil
quando começou a produção.

Luto e relacionamento conturbado

Desde a primeira vez que surge na história,


Dani está chorando pelo seu namorado, que
ignora as suas ligações enquanto está com os
amigos. Sozinha em casa, ela manda várias
mensagens para a família e não recebe
nenhuma resposta.

Pela conversa dos homens, percebemos que


Christian já quer se separar há quase um ano,
mas está adiando a decisão. Tudo muda
subitamente quando a protagonista descobre
que sua irmã bipolar tirou a própria vida e
vitimou também os pais com uma intoxicação
de monóxido de carbono.

A tragédia lança a jovem numa espiral de


desespero e dependência emocional,
encarando o parceiro como o seu único apoio.
Na tentativa de salvar a união, ela vai
reprimindo as emoções e o luto, procurando
fingir que está bem para não incomodar.

Quando descobre que ele e os amigos estão de


partida para um festival na Suécia, a moça
decide acompanhá-los. Lá, com a saúde
mental abalada, ela consume substâncias
psicoativas mesmo sem ter vontade, para
agradá-lo.

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Além dos problemas de comunicação,


Christian não demonstra afeto ou empatia por
Dani, esquecendo até do seu aniversário. Pelle,
o amigo de ambos que tinha nascido em Harga
e os convidou para lá, conversa com ela sobre
isso e desperta a sua consciência. A partir daí,
o seu ressentimento face ao namorado vai
aumentando diariamente.

Outra forma de encarar a vida e a morte

Christian e os amigos Mark e Josh eram


estudantes de antropologia e o último estava
escrevendo uma tese de doutorado sobre
rituais pagãos. Por isso, eles decidem aceitar o
convite de Pelle para conhecer a comunidade
onde nasceu.

Durante o verão, o sol não se punha naquele


local, provocando nos visitantes a sensação de
estarem perdidos no tempo. A realidade
daquele culto também era totalmente
diferente daquilo que eles estavam
acostumados.

Ali, existia um enorme sentido de união entre


todos os indivíduos, que afirmavam ser uma
grande família. Mesmo assumindo
comportamentos bizarros e oferecendo
substâncias misteriosas que alteravam os seus
comportamentos, a comunidade era
estranhamente acolhedora com os
estrangeiros.

Por outro lado, em contraste direto, as ligações


entre os norte-americanos se tornavam cada
vez mais fracas. Além de ignorar a namorada,
Christian decide copiar o tema de doutorado
de Josh, passando por cima da amizade em
nome de interesses acadêmicos.

Aos poucos, o grupo vai descobrindo os modos


como aquela sociedade estava organizada. Até
aos 36 anos, os indivíduos eram considerados
jovens, passando depois a trabalhar até aos 54.
Em seguida, eles se tornavam mentores e, aos
72 anos, a sua vida terminava.

O primeiro grande ritual é o sacrifício de dois


idosos, um casal que se lança de uma
ribanceira diante de todos. Perante o choque
dos estranhos, os habitantes de Harga
explicaram que aquela era uma forma de
controlar a morte, preparando e aceitando o
momento.

Ali, toda a vida é encarada como um ciclo que


culmina com esse ato final, de modo a evitar a
velhice e os seus sofrimentos.

Apesar de Dani querer ir embora quando


começa a estranhar o desaparecimento de
várias pessoas, Christian fala que tudo aquilo é
cultural e a convence a ficar.

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Harga, uma sociedade matriarcal

Logo no começo do filme, quando os amigos


discutem a possibilidade de viajar, Mark faz um
comentário sobre todas as mulheres que eles
vão poder engravidar por lá. No momento,
parece a uma piada machista, mas mais tarde
percebemos que é uma espécie de
premonição.

É interessante reparar que a comunidade é


transparente acerca das suas crenças e
condutas. Para aqueles indivíduos, tudo o que
fazem é natural, está enraizado na sua cultura.

Comandados por Siv, a matriarca que governa


o local, eles precisam receber visitas do
exterior para se reproduzirem, por questões
genéticas. A exceção é Rubin, um jovem com
vários problemas mentais que era produto do
incesto e ocupava a função de oráculo.

Por ter uma visão diferente do mundo, ele


pintava várias telas, que a população
interpretava como premonições do futuro.

Maja, uma das jovens do culto, demonstra que


está interessada em Christian desde a sua
chegada. Inicialmente, ela esconde uma runa
debaixo da cama dele, para provocar a sua
paixão.

Depois, a moça recria aquele que parece ser


um feitiço antigo, colocando algo na comida e
na bebida do americano. Na cena, é notório
que o líquido do copo dele tem uma coloração
diferente dos demais. Esse ritual se encontra
descrito num dos desenhos de Rubin.

Depois disso, já influenciado por poderes


ocultos, o homem é chamado para conversar
com Siv. Numa atmosfera intimidante, a líder
declara que autoriza o seu envolvimento com
Maja.

Pouco depois, Christian é coagido a tomar


outra substância para baixar as suas defesas e
deixá-lo aberto à influência. Debaixo do olhar
atento de todos, ele é pressionado a ir se
encontrar com Maja para engravidá-la.

O ato é, na verdade, um ritual do qual outras


mulheres participam, observando e cantando.
Para elas, trata-se de uma celebração da
fertilidade, algo que faziam para aumentar a
população do culto.

Quando chega no local e vê tudo que está


acontecendo, Dani finalmente liberta toda a
dor que estava guardando desde o começo.
Apoiada pelas companheiras que a abraçam,
gritando e chorando com ela, a protagonista
não precisa mais esconder as suas emoções.

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É aí, manifestando o seu luto pela primeira vez


e encontrando uma reação de apoio, que ela
parece descobrir os sentimentos de união e
sororidade.

História que já estava destinada a


acontecer

Na cena em que descobrimos a morte da


família de Dani, a coroa de flores dos Harga
estava pousada junto dos seus corpos. No
momento, não conseguimos compreender o
significado, mas depois percebemos: ela
estava destinada a ser a rainha de Maio.

Contudo, a "pista" mais importante do enredo


é a ilustração que aparece nos segundos
iniciais do filme. Seguindo o tipo de
composição que representava os contos de
fadas, as imagens narram tudo o que iria
acontecer.

Primeiro vemos a morte dos pais de Dani e o


seu desespero recebido com indiferença pelo
namorado. Em seguida, a chegada do grupo às
festividades e, finalmente, os rituais que
antecedem a coroação.

Em baixo, está também um urso, no corpo do


qual Christian é colocado antes de queimar no
sacrifício final. No seu país natal, Dani tinha um
quadro com uma garota beijando um urso,
pendurado em cima da cama.

Já em Harga, o mesmo animal é retratado


ardendo, nos aposentos de Siv, enquanto o
visitante esperava para falar com ela.

Metaforizado dessa forma como uma ameaça


para a protagonista, ele também parece estar
predestinado a ser o vilão e acabar de forma
trágica.

Tudo isso estaria escrito nos textos religiosos


do culto e veio confirmar a sua fé. Além de
estar apaixonado por Dani, Pelle podia saber
desde o começo, e por isso mostrou os retratos
de outras rainhas de Maio, antes de partirem.

Os seus sentimentos pela amiga aparentam ser


verdadeiros e é possível que a intenção dele
fosse mesmo salvá-la. Ainda sobre a imagem
que surge no início, podemos reparar que
começa com a morte e termina com o sol.
Isso pode ser entendido como um recomeço, a
chance de viver de novo.

Um final feliz para Dani

Quando Dani está prestes a desistir da sua


estadia na Suécia, é Pelle que a convence a
ficar, falando que também é órfão, mas não se
sente sozinho entre a comunidade. Ele
argumenta que todo mundo merece ter
suporte e uma verdadeira família.

Enquanto os outros estrangeiros só


demonstravam um interesse acadêmico pelo
culto, Dani foi se adaptando gradualmente aos
costumes do local. Logo no primeiro dia,
quando consome uma substância
alucinogênica, ela tem a impressão de que os
seus pés estão se fundindo com a vegetação,
como se pertencesse ali.

Mais tarde, durante a competição de dança


que visava escolher a rainha das festividades,
essa imagem retorna. Embora não conheça os
passos e comece bastante perdida, a
protagonista vai imitando as outras e parece
cada vez mais animada.

A partir de um certo momento, ela começa a rir


e a conversar com as companheiras,
percebendo que aprendeu a falar a língua
delas com a convivência. Como é a última a
parar de dançar, a jovem é escolhida como a
nova rainha e precisa abençoar os demais.

Enquanto todos celebram, ela é abraçada por


várias pessoas e até beijada por Pelle, que já
não se preocupa em esconder o seu amor. Pela
primeira vez desde o começo da narrativa, Dani
se sente importante e amada por aqueles que
a rodeiam.

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