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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS


BACHARELADO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
BIO547 – ETNOBIOLOGIA
DOCENTE: FABIO PEDRO SOUZA DE FERREIRA BANDEIRA
DISCENTE: VANESSA SOUZA GOMES DA SILVA

RESENHA CRÍTICA
RELAÇÕES E DISSENSÕES ENTRE SABERES TRADICIONAIS E SABER
CIENTÍFICO

O artigo “Relações e dissensões entre saberes tradicionais e saber científico” da


autora Manuela Carneiro da Cunha, publicado na Revista USP (n. 75) em 2007, ressalta
as diferenças e particularidades existentes entre os saberes tradicionais e o saber
científico, bem como suas semelhanças e como essas formas de conhecimento podem se
conectar e beneficiar a humanidade.
De fato, os saberes tradicionais são diferentes do saber cientifico. Uma diferença
marcante observada pela autora entre esses dois tipos de conhecimento refere-se à
verdade absoluta e universalidade que caracterizam o saber científico, enquanto que os
saberes tradicionais são caracterizados por sua tolerância, caráter local, multiplicidade e
acolhimento a explicações divergentes. O conhecimento tradicional opera com unidades
perceptuais, em contraste com o conhecimento científico, que opera com unidades
conceituais e é hegemônica. Assim, esse conhecimento tradicional pode ser visto como
um conjunto de saberes adquiridos e transmitidos (de geração em geração) por indivíduos
que vivem em comunidades tradicionais e que possuem contato direto com a natureza e
são dependentes desta. Segundo Cunha (2007, p. 78), “ambos são formas de procurar
entender e agir sobre o mundo”, então mesmo sendo diferentes, podem ser comparadas e
viverem juntas, mas isso não quer dizer que são idênticas. Outro ponto que a autora
ressalta é que “geralmente argumentam que os conhecimentos tradicionais em nada
contribuem para o “progresso da ciência” porque a atividade que eles apontam, os seus
usos tradicionais, não coincide necessariamente com a atividade que a ciência descobre”
(CUNHA, 2007, p. 80) e um exemplo de que essa argumentação é um equívoco é a
descoberta de certas substâncias com propriedades medicinais em plantas usadas por
povos tradicionais. Os povos e comunidades tradicionais, como os indígenas,
quilombolas, entre outros, trazem consigo um vasto conhecimento que não é reconhecido
como ciência e muitas vezes é desvalorizado. Há vários argumentos que tentam diminuir
o conhecimento tradicional, mas este conhecimento possui um valor insubstituível.
O texto ressalta também que em relação ao conhecimento tradicional, o Brasil
encontra-se entre dois fogos, ou seja, enquanto o Brasil tem protestado e criou leis contra
a biopirataria, o acesso indevido a recursos genéticos e ao conhecimento tradicional
associado, e “incentiva” os povos e comunidades tradicionais para ficarem atentos aos
biopiratas, estes povos, por sua vez, não notam uma grande diferença entre a biopirataria
praticada por estrangeiros e a praticada pelos próprios brasileiros. Desde a época colonial
o Brasil sofre com a biopirataria, os estrangeiros levaram muito da biodiversidade, ainda
mais que não havia uma legislação rigorosa ao acesso do patrimônio genético brasileiro.
O Brasil é um país megadiversificado em recursos genéticos e conhecimentos
tradicionais, e encontra-se em uma posição privilegiada, mas segundo Cunha (2007, p.
84) “se não soubermos construir novas instituições e relações eqüitativas com as
populações tradicionais e seus saberes, estaremos desprezando uma oportunidade única”.
É importante reconhecer que as práticas do conhecimento tradicional são fontes
potenciais de inovação do conhecimento científico e traz benefícios para este. Por isso,
devemos acabar com os preconceitos e com a desvalorização que ainda cercam o
conhecimento tradicional, e para isso, é necessário “achar os meios institucionais
adequados para, a um só tempo, preservar a vitalidade da produção do conhecimento
tradicional, reconhecer e valorizar suas contribuições para o conhecimento científico e
fazer participar as populações que o originaram nos benefícios que podem decorrer de
seus conhecimentos” (CUNHA, 2007, p. 84). Visto isso, a Etnobiologia também pode ser
usada como um meio que valoriza e compreende os saberes tradicionais, sem diminuí-los
diante do saber científico.
Neste artigo, a autora chama atenção para a questão das relações e diferenças entre
os saberes tradicionais e o saber científico, não diminuindo a importância de nenhum dos
dois. Esta obra é de grande valia, com uma linguagem voltada ao meio científico,
contribui para o desenvolvimento da Etnobiologia e outras áreas voltadas ao estudo do
conhecimento tradicional e científico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CUNHA, Manuela Carneiro da. Relações e dissensões entre saberes tradicionais e saber
científico. Revista USP, São Paulo, n. 75, p. 76-84, nov. 2007. Disponível em:
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9036.v0i75p76-84. Acesso em: 18 set. 2022.

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