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úcia Santaella

I LIOGRAFIA Winfried Nõth


omentaôa

coleção dirigida a estudantes de graduação e pás-graduação


bem corno a professores e pesquisadores
traz os mais importantes livros sobre o assunto
ÍNDICE

APRESENTAÇÃO 9
Santaella, Lúcia
Semiórica / Lúcia Sanraella ; Winfried r. TÍTULOS BÁSICOS 15
Nõth. - São Paulo : Experimento, 1999.
222 p. ; 21 em. - (Bibliografia com;;ada)
I.l Saussure, Ferdinand,de. Curso de Lingüística Geral 15
v-- '-
1.2 Hjelmslev, Louis Trolle. Prolegõmenos a uma Teoria da
ISBN 85-85597-26-7
Lingl/agelll 18 V
1. Semiórica - Bibliografia. 1.3 Marrinet, André. Elementos de Lingiiística Geral 20 V/
1. Nõerh, Winfried. lI. Série. IA Buyssens, Eric. Senuologia e Comunicação Lingüística 23 [
m. Menezes, Philadelpho 1.5 Priero, Luis]. Mensagens e Sinais 25
1.6 Banhes, Roland. Elementos de Semiologia 28 V .
CDD 302.2016 1.7 Greimas, AIgirdas-Julien. Semântica Estrutural 30 ir ~
1.8 Greimas, AIgirdas-Julien. Do Sentido 32
1.9 Barros, Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto 34
BIBLIOGRAFIA COMENTADA - SEMIÓTICA
I.l0 Peirce, Charles Sanders. Semiótica e Filosofia 36 V .
Coleção dirigida por Philadelpho Menezes I.ll Peirce, Charles Sanders. Escritos Coligidos 38 ~
I.l2 Peirce, Charles Sanders. Senziótica 40 V
© Copyright: Lúcia Santaella e Winfried Nóth I.l3 Sanraella, Lúcia. O que é Semiótica 43 V.
I.l4 Pinro, Julio. 1,2,3 da Semiótica 45 V
l.l5 Sanraella, Lúcia. Teoria Geral dos Signos. Semiose

Revisão: Maria do Socorro Senarore


e Alltogeração 46 V.
I.l6 Morris, Charles W. Fundamentos da Teoria dos Signos : 49
Diagralllação: Alan Cesar Sales Maia
I.l7 Eco, U mberro. A.r Formas do Conteúdo 51
Capa: Ana Aly
I.l8 Eco, Um berro. O Signo : 53 J / >

I.l9 Norh, Winfried. Panorama da Semiótica. De Platãoa Peirce 56 V

Fone (O] 1) 3871-]827 - Fax(Oll) 3051.4312


1.20 Deely, John. lntroduçâo à Semiôtica: Histôria e Doutrina' 59 V
e-mail: exper@/lol.colll.br
1.21 Nõth, Winfried. A Semiótica no sicttlo XX : 61 V .'
1.22 Rodrigues, Adriano Duarre. lntroduçâo à Senziótica 63
1.23 Couro, Hildo Honório do. Uma Introdução à Senziótica 66
1.24 Caronrini, Enrico e Daniel Peraya. O Projeto Semiõtico.
Elementos de Semiótica Geral 68 V
1.25 Teixeira Coelho Nerro, José. Semiôtica, Inf01'111açãoe
Comunicaçâo. Diagrama da Teoria do Signo 71 V'
1.26 Sanraella Lúcia. Percepção. Uma Teoria Semiótica 74 V
Lúcia Santaella e Winfried Nõtb Bibliografia Comentada - Semiática

I.27 Chabrol, C/aude (org.). Semiótica Narrativa e Textual 76 II.11 M~renrin" Juan Margarifios de. El Signo. Las Fuentes V
V I.28 Segre, Cesare. 0.1 Signos e a Critica 79 Teôricas de Ia Semioiogia: Seussure, Peirce, Morns 137
I.29 Pignatari, Décio. Semiótica e Literatura 81 11.12 Merrell, Floyd. Peirce's Semiotics NoUJ. A P~'únel: 140
V 1..')0 Bliksrein, Izidoro. Kaspar Houser 011 A Fabricação da II.13 Houser, Nathan er aI. (orgs.). Essential Peirce, volume I
Realidade 83 (1867-1893). Essential Peirce, uoinme Il (1893-1909) 142 V
1.31 Guinsburg, Jacó, José Teixeira Coelho Netto e Reni II.14 Eco, Umberto. A Estrutura Ausente. Introdução à
Chaves Cardoso (orgs.). Semiologi« do Teatro 85 Pesquisa Semiolâgica 144
Helbo, André (org.). Semiologia da Representação: Teatro, II.15 Eco, U mberto. Tratado Gera! de Semiótica 147
Teleuisâo, Histária em Quadrinhos 88 II.16 Kristeva,Julia.lntrodtlfão à Semanálise 150
Santaella, Lúcia e Winfried Nõth. Imagem. Cognição, lI.17 Schnaiderman, Boris (org.). Semiõtica Russa 152 V
Senuõtica, Mídia 90 11.18 Mukarovsky, Jean. Escritos sobre Estética y Semiótica
1.34 Oliveira, Ana Claudia de e lvana Fechine (orgs.). de! Arte 156
Semiõtic« da Arte. Teortzações, Análises e Ensino 93 11.19 Ferrara, Lucrécia D' Aléssio. A Estratégia dos Signos. .. 159
I.35 Merz, Christian. Significafão no Cinema 96 11.20 Plaza, Julio. n-adllfão lntersemiótica 161 V
U6 Merz , Christian. Linguagem e Cinema 99 11.21 Rodrigues, José Maria er aI. Arquitect1l1-a como Semiâtica 163
1.37 Barthes, Roland. Sistema da Moda 102 lI.22 Tudela, Fernando. Hacia una Semiótica de Ia Arqniteaur« 165
1.38 Gear, Maria do Carmo e Ernesro Cesar Liendo. Semiologi« lI.23 Morenrin, Juan Angel Margarifios de. El Mensaje
Púcanalítica 104 Publicitario: Nueuos Ensayos sobre Semiõtica y Publicidad ..... 166
1.39 Chalhub, Samira. Semiótica dos Afetos 107 11.24 Sanraella, Lúcia. A Assinatura das Coisas. Peirce e a
Literatura 167-
11.25 Saporiti, Elisabeth. A lnterpretaçdo 169
II. TíTULOS PARA PESQUISA AVANÇADA , 111 II.26 Ravera, Rosa Maria. Estética y Semiótica 170
n.27 Sini, Carlo. Semiótica y Filosofia 172 V
lU Marry, C/aude e Robert Marry. La Semiótica: 99 Respuestas 111 II.28 Tatir , Luiz. Mllsicando a Semiótica 173
Deely,John. Semiôtica Básica 113 175
V II.2
11.3 Barros, Diana Luz Pessoa de. Teoria do Discurso: .
II.29
11.30
Tarasri Eero. A Tbeory of MlISical Semiotics
Sebeok, Thomas.A. Signs: An lntroduction to Semiotics 176
Fnndamentos Semiôiicos 116 11.31 Sebeok, Thomas. A Sign isJlIst a Signo 178
IIA Greimas, Algirdas Julien. Semiôtica e Ciências Sociais 118 11.32 Colapietro, Vincenr M. Glossary of Semiotics 180
Greimas, Algirdas Julien. Semiâtica do DisC1l1'SOCientífico. lI.33 Nõrh, Winfried. Handbook of Semiotics 182
·V II.5
Da Modalidade ; 121
11.6 Greimas, Algirdas Julien e Eric Landowski (orgs.),
Análise do DisC/l1'SOem Ciências Sociais 123 II!. TíTULOS COMPLEMENTARES 185
11.7 Landowski, Eric. A Sociedade Refletida. Ensaios de
Sociossemiâtic« 126 III.1 Krampen, Marrin, er aI. (eds.). Classics of Semiotics 185
11.8 Greimas, Algidas J ulien e J acgues Fontanille. Semiótica II1.2 Innis, Robert (ed.). Semiotics: An lntroductory Anthology 187
das Paixões 128 II1..? Deely, J ohn, Brooke Williams e Felicia Kruse (eds.).
11.9 Greimas, Algirdas Julien e J oseph Courtés. Dicionário Frontiers in Semiotics 189
V de Semiôtica 132 1lIA Koch, Walrer A. Evolnnonary Cnltural Semiotics 194
II.10 Parret, Herman. Semiôtica y Pragmdtic«: Una III.5 Nõth, Winfried (org.). Origins of Semiosis: Sign
Comparaciõn Evalliativa de Marcos Conceptuales 134 Evolmion in Natt/re and C"lttll'e 195

6 7
IIL6 Lorrnan, Yuri M. Universe of tbe Mind. A Semiotic
Tbeory ofClIltllre · · 197
m.7 Hoffmeyer, ]esper. Signs of Meaning in tbe Universe 199
IIL8 Noch, Winfried (org.). Semiotics of tbe Media. State of
tbe Arf. Projects, and Perspectiues 202 APRESENTAÇÃO
IIL9 Eco, Umberto. Semiotics and tbe Philosophy of Lang/lage 203
IILl OEco, Umberro. Kant e L'Ornitorinco 206
I IILll Lizska, ]ames ]akób. A General lntroduction to lhe
'v Semiotic of Charles Sanders Peirce 208 Na história humana, as indagações sobre a linguagem
1II.12]ohansen, ]orgen Dines. Dialogic Semlosis: An Essay 017 s signos, sobre seus modos de representar e significar,
· an d tvieensng
IgnJ "f . . .. 210
S são muito antigas. Estavam incluídas nas preocupações dos
LISTA DOS AUTORES POR ORDEM ALFABÉTICA · 213 /-!.regos,que nos legaram muitos textos voltados para esses
LISTA DOS TÍTULOS POR ORDEM
.
ALFABETlCA .
217 t 'mas. Portanto, a serniótica, como reflexão acerca da lin-
APRESENTAÇÃO DOS AUTORES · 221
/-!.uagem verbal e de outros processos sígnicos, começou
muito cedo. Entretanto, se a considerarmos como uma ciên-
.ia no sentido moderno do termo, ela despontou no século
XIX, na obra do cientista, lógico e filósofo norte-arnerica-
110 Charles Sanders Peirce e, no início do século XX, com o
;/lrso de Lingüística Geral, do lingüista genebrino Ferdinand
de Saussure. As obras desses dois autores foram apenas inau-
.L\uraisde um grande movimento intelectual em nível rnun-
(I ial, rumo ao desenvolvimento científico da semiótica e de
s 'U reconhecimento como uma área de conhecimento, que
se instaurou com bastante força a partir dos anos 60.
Desde então, muitos pesquisadores no campo da lin-
.L\i.iística,literatura, artes, filosofia, antropologia e mesmo
nas áreas de matemática, biologia e física passaram a atuar
também como semioticistas; os congressos internacionais,
nacionais e regionais na área se multiplicaram e as publi-
'ações em serniótica se avolumaram a um tal ponto que
um levantamento dos títulos hoje existentes seria, por si
só, uma pesquisa que demandaria muito tempo e pessoal.

9
Lúcia Santaefla e Winfried Nijth Bibliografia Comente/da - Semiótica

Muitas editoras em vários países do mundo abriram cole- Illai fácil, enquanto o 'avançado' pressupõe o básico. En-
ções e séries sobre serniórica, é o caso da editora Mouton de II(' anto, aí começa o problema. Muitas vezes, aquilo que
Gruyter, na Alemanha, a editora John Benjamins, na (,( H como pressuposto do conhecimento avançado não é tão
Holanda, a editora Indiana University Press, nos Estados Lí .il quanto se esperaria. Diante disso, resolvemos estabe-
Unidos, a editora Toronto University Press, no Canadá etc. h 'r uma seqüencialidade que considerou como básicos os
No Brasil, têm-se dedicado à semiótica especialmente as ulos que: (1) funcionam como referências fundamentais ,
111
editoras Culrrix, Perspectiva, Annablume e Experimento. «ndo citados ou estudados por outros autores; (2) funda-
Em vista desse quadro, a seleção de títulos para um 111 .nrarn obras de caráter mais aplicativo, quer dizer,
livro que tem por objeto uma bibliografia comentada de wmióticas especiais da narrativa, do filme, da imagem, da
semiótica não é tarefa simples. Facilitou um pouco essa psi análise etc.;(3) servem de suportes para desenvolvimen-
tarefa o fato de que a seleção deveria privilegiar títulos 10 mais complexos das teorias. Preferimos sempre come-
publicados no Brasil. Mesmo assim, selecionar significa \"1' Com as obras de referência, mesmo quando essas obras
incluir algo em detrimento daquilo que fica de fora. É por '''0 comentadas em outras que, por isso mesmo, apresen-
essa razão que, para não parecer arbitrária e mesmo ilegíti- Ium menos dificuldades para a leitura e compreensão.
ma, toda seleção deve ser capaz de explicitar seus critérios. Na segunda parte, relativa aos títulos avançados, o lei-
É isso que buscaremos fazer no que se segue. IOr encontrará títulos que, na maioria das vezes, represen-
Obras que se aproximam da semiótica, que têm alguns Iam desenvolvimentos das teorias dos autores elencados na
elementos semióticos, enfim, que 'namoram' a semiótica, primeira parte. Quanto à terceira parte, relativa aos títulos
existem a se perder de vista. Essas foram excluídas. Optamos (omplementares, optamos por: (1) títulos fundamentais em
por recolher apenas títulos voltados prioritariamente para inglês; (2) uma amostragem do avanço da semiótica para
a semiótica, cuja intenção explít ica estivesse dirigida d .nrro de territórios que vão muito além do limiar antro-
diretamente para esse campo, sem tergiversações. Em I lógico; (3) algumas publicações fundamentais recentes.
princípio, também evitamos as coletâneas de ensaios com Para facilitar a utilização deste livro, desenvolvemos,
temática multifacetada, dando preferência a títulos mais utravés do recurso de numeração das obras, uma sistemáti-
monográficos. ca de citações cruzadas. Onde quer que uma obra inclusa
Uma outra dificuldade que se apresenta está na deli- 110 volume for citada, seu número aparecerá entre parênte-
mitação precisa daquilo que poderia ser qualificado como ses, imediatamente após a referência.
um título básico em contraste com um título avançado. A Enfim, procuramos oferecer um quadro representati-
primeira vista, essa dificuldade pode parecer absurda, vis- vo da semiótica e de seus desenvolvimentos tão completo
to que 'básico' significa muito simplesmente aquilo que é [uanro possível, buscando sempre evitar tendencialidades ,
10 11
Lúcia Santaella e \Vúifried Nõtb

quer dizer, não privilegiamos algumas escolas no esqueci-


mento de outras. Dessa forma, o leitor poderá aqui encon-
trar um leque aberto de fontes, tendências e caminhos.

Os Autores

BIBLIOGRAFIA COMENTADA

SEMIÓTICA

12
I
TÍTULOS BÁSICOS

1.1 Saussure, Ferdinand de. Curso de Lingüística Geral, tra-


duzido por Antonio Chelini,José Paulo Paes e Isido-
ro Blikstein. São Paulo: Cultrix, 1969,279 pp. Cours
de Linguistique Générale, 1916.

Esse curso de lingüística geral, que Saussure adminis-


trou em três partes, entre 1907 e 1911, é o documento
fundador da lingüística estrutural e do estruturalismo nas
ciências humanas e culrurais do século XX. A semiótica
deste século foi influenciada por essa obra em dois aspec-
tos: (1) na idéia saussuriana de estender o campo de pes- I

guisa lingüística para uma ciência geral dos signos, que


ele chamava de semiologia e (2) na idéia de fundar essa (
semiologia nos princípios da lingüística geral, que deu ori-

tos-chaves
--
gem a uma tradição línguo-semiótica
do estrururalismo
baseada em concei-
saussuriano.
A famosa definição de semiologia dada por Saussure
.ncontra-se na página 24 do capítulo sobre o "Lugar da
I íngua nos fatos humanos". Saussure escreve:

Pode-se, então, conceber uma ciência que estude a vida


dos signos no seio da vida social; ela constituiria uma
parte da psicologia social e, por conseguinte, da psicolo-

15
Lüci« Santaella e Winfried Niith Bibliografia Comentada - Semiõtica

gia geral. Chamá-la-emos de serniologia (do gregosemeion, mente bem por outra seqüência, não importa qual; como
signo). Ela nos ensinará em que consistem os signos, que prova temos as diferenças entre as línguas e a própria exis-
leis os regem. Como tal ciência não existe ainda, não se tência de línguas diferentes" (pp. 81-82).
pode dizer o que será, ela tem direito, porém, à existên- Esse modelo do signo verbal arbitrário foi, para
cia, seu lugar está determinado de antemão. A lingüísti- Saussure, também o modelo padrão para o estudo dos sis-
ca não é senão lima parte dessa ciência geral; as leis gue a temas não-verbais: "Os signos inteiramente arbitrários re- '.
semiologia descobrir serão aplicáveis à lingüística e esta alizam melhor do que os outros o ideal do procedimento
se achará vinculada a um domínio bem definido no con- semiológico; eis porque a língua, o mais completo e mais
junto dos fatos humanos. difundido sistema de expressão, é também o mais caracte-
rístico de todos. Nesse sentido, a lingüística pode erigir-se
Saussure falou pouco sobre sistemas sígnicos não- em padrão de toda semiologia, se bem que a língua não
lingüísticos, mas tentou determinar a relação entre os sis- seja senão um sistema particular" (p. 82).
)
temas verbais e não-verbais,
o:- -
no quadro de uma futura Entre os conceitos saussurianos de grande influência-,\
semiologia: "A língua é um sistema de signos que expri-
mem idéias e é comparável por isso à escrita, ao alfabeto
dos surdos-mudos, aos ritos simbólicos, às formas de poli-
para os estudos semióticos estão os conceitos de estrutura
forma, s..t~stância, yalc)[, !fngua como .sistema, fala como
u~ do sist~I!!a,.~iacroni~ como estudo histórico ~cronia
,..;;;==::===:==: '
J li

dez, aos sinais militares etc. Ela é apenas o principal desses como estudo sistemático.
sistemas" (p. 24). Outros sistemas sígnicos mencionados Saussure rejeita a idéia da existência de um mundo
por Saussure como objetos de estudos semiológicos são o "objetivo". Idéias, para ele, não são "preexistentes às pala-
Braille, o código de bandeiras marítimo, sinais militares vras" (p. 79). Nada existe fora do sistema semiológirn. O
de corneta, códigos cifrados e mitos. pensamento considerado antes da língua "não passa de uma
O modelo do signo lingüístico_de Saussure é diádico e massa amorfa e indistinta" (p. 130). Só as estruturas (for-
r-; menralisra. Os dois lados do signo verbal são: (1) a idéia mas) do sistema, não a substância dos signos, permitem-
(conceito, significado) e (2) a imagem acústica que não é o nos pensar e comunicar sobre o mundo.
fenômeno acústico em si, mas a imagem psíquica acústica O sistema semiológico se baseia em es rr ut uras D

que temos das palavras - o significante - (p. 80). A rela- oposirivas que determinam o valor de qualquer signo in-
ção entre esses dois lados é tipicamente uma relação de dividual. O valor de um signo "resulta tão somente da pre-
arbitrariedade, pois "a idéia de mar não está ligada por re- sença simultânea de outros" (p. 133). Seu conteúdo só é
lação alguma interior à seqüência de sons 11Z-a-l' que lhe verdadeiramente determinado pelo concurso do que existe
serve de significante, pois poderia ser representada igual- fora dele. Fazendo parte de um sistema, está revestido não

16 17
Bibliografia Comentada .. Semiótica
Lúcia Santaella e Winfried Ni/tb

trOS sistemas semióticos como a música, o sistema sígnico ,r)o"


ó de uma significação como também e sobretudo de um
da matemática ou a pintura, por exemplo, Hjelmslev con~~ vi
valor. O valor de um signo, nessa visão, não vem do mun-
do ao qual o signo se refere, mas do sistema ao qual o signo
"dera a lmg~agem verbal rivdegiada ROL ue essa é um It'"{
s~tem~se~co.Rara o ual todos_º-LO~~S odem~ ~~
pertence. Não temos conhecimento do valor da palavra preto
!raduzldo~..: Podemos usar palavras para fala.!:sobre pintura
pelo nosso conhecimento das coisas pretas, mas só pelo fato
o~ música e descrever essas estruturas"em pormenores, mas ( ?
de que o sistema nos diz que preto está em oposição a con-
ceitos tais como branco, cinza e colorido.
nao podemos representar palavras e discursos com a pintu- J v ~

Essa noção saussuriana de valor está na raiz de sua con-


cepção da língua como sistema, concepção revolucionária
ra m~n~~::d:;~:a~; Hje:mslev é radicalmente estrutural
lista. Estrutura e sistema sao os seus conceitos centrais. Uma
?o
~
na época e que muitas conseqüências trouxe para as ciênci-
linguagem, para ele, é uma mera estrutura. As estruturas se
as humanas, sociais e mesmo para filosofia do século XX.
manifestam no texto e a análise começa com i!:..~~gmenta ão
~to em elementos mínimos, determinando as depen-
1.2 Hjelmslev, Louis Trolle. Prolegõmenos a uma Teoria da
dências e as regras de combinação para estabelecer um cál-
Linguagem, traduzido por José Teixeira Coelho Netto.
culo geral e exaustivo das combinações possíveis.
São Paulo: Perspectiva, 1975, 147 pp. Omkring
Em vez do significante e significado saussuriano,
Sprogteoriens Grudlaeggelse, 1943.
Hjelmslev introduz os termos "12lano de expressão e plano
do conteúdo da lin ua ,em". Ambos esses 12lanos consis-
Esses prolegômenos, quer dizer, essa exposição preli-
~ em um nível de forma e ~m nível ele s~bstânc~
v minar dos princípios gerais da teoria da linguagem, se-

f
m~para lij~lmslev, é um sinônimo de estrutura abst~.
li,J' ,j'Jl'
1'( guem e desenvolvem o projeto saussuriano para uma
A substância no nível da eX12ressãoé o potencial fonétic5-
pyJ semiologia geral baseada em uma teoria estrutural da lin-
ue nos permite articular as alavras; a substânciad~ ;;~~
\$uagem (1.1.). O conteúdo dessa obra é denso, extrema-
teúdo são as id{ias,:2.s nossosconceitos, mas esses conceitos
mente abstrato, mas a sua influência foi decisiva para os
-l não existem independentes da língua. Pelo~~rário alé~
y" "semioticistas na tradição do estruturalismo, tais como
das estruturas sígnicas ;ó- ;xis; u~ -:;ontínuo amor~o" n;
\ ~v AlgirdasJulien Greimas.(1.7, 1.8, lI.4, I1.5), Umb~rto_Eco_
qual cada língua coloca os seus limites.
1(1.17.1.18), Christian Metz (1.35,1.36) erc.
~ O signo, portanto, não é uma janela para o mundo,
O conceito de linguagem de Hjelmslev não se refere
li " , . .., um instrumento através do qual nos referimos ao nosso
",II~)j apenas as linguagens naturais, mas inclui qUalqUer.estrutura
meio ambiente, mas é algo que só se refere às estruturas do
,(~ gue seja analógica a essas l~nguagens. Uma linguag~,
sistema semiótico. O signo é então, por mais paradoxal
~ portanto, um sistema semlOtlCO. Em comparação com ou-
J -- '
19
18
Lúcia Santaella e Winfried Nõth Bibliografia Comentada - Semiõiica /

que possa parecer, um signo para uma substância de con- ção entre a lingüística e a semiologia. Porém o livro intro-

? /t.r:'")
teúdo e um signo para uma substância de expressão. O duz ~conceItos fundamentais do estruturalismo ~!le foram -5 y
,( tSigno é uma entidade com dua~faces j!}(~O em duas dire- de grande .infl~uência para a semiótica na França e outros
~es: para fora em_dir~ção_à substância de expressão e_p.am, países:......Limitamo-nos assim a apresentar, de maneira
~ção à su_bstâ.!lcia_de conteúdo. lexicográfica, alguns desses conceitos.
No seu exame dos dois planos da linguagem, Hejlmslev Linguagem: "designa propriamente _a faculdade de Clue~ "u(
enfatiza as homologias estruturais. Nos dois níveis, os seg- os ~l~mens dIspõe~ para =.compreendere~ po~eio_.de ~:rl()
mentos mínimos consistem em subestruturas localizadas signos vocaisl Marriner define a linguagem como uma "ins-
"~,) por baixo do nível perceptível n;;uperfície·articulada. Os tiruição humana" que é essencialmente um instrumento de
segmentos mínimos da expressão, os fonemas, têm como comunicação. A sua função essencial reside na comunicação. J
os seus elementos os traços distintivos da articulação (por Dupla articulação da linguagem: pela primeira articula-
exemplo, bilabial, nasal etc.). Os segmentos mínimos no ção, a linguagem liga unidades possuidoras de uma-"forma
.Al' [1-'" plano do conteúdo, ~s palavra~ou ~s, consistem em vocal
--- e de um sentido", palavras ou morfemas. Martinet
- ----
t)
componentes semânticos elementares (por exemplo: hu- chama de monemas as unidades mínimas desse nível de
\, mano, feminino ou jovem). articulação. Entretanto, a forma vocal das unidades maio-

(I' (\~ç
IJ'.t Hjelmslev cl:.ama de figuras a essas _enti~des !llínima~
da decoIE.e.9.~içãonos dois _plano~,~!l..q.!JantQ_º~seg.!!1en.!.os
res ou monemas também é analisável numa sucessão de
unidades que não significam nada, mas contribuem todas
JY I oJ mínimos do siÂ..tew-ª...são_os
signos. As fi uras são, portanto, para distingui-Ias de outras unidades. Esse é o nível dos
I ,~
.• ' jf1vi' os componentes sígpjcos do sistema. A distinção entre sig- fone.mas ..A diferença entre s e r, por exemplo, serve para J}
JI' nos e figuras foi um elemento central na serniótica discursiva distinguir mesa de mera. O nível dessa articulação de lin-
de Greimas, não só no estudo dos textos verbais, mas tam- guagem se chama segunda articulação. Graças a esse nível,)
bém em estudos de textos visuais (pintura, publicidade etc.) as línguas podem contentar-se com algumas dezenas deJ
elementos (fonemas) que se combinam para obter a forma
1.3 Martinet, André. Elementos de Lingüística Geral, tra- vocal de um número ilimitado de unidades de primeira
duzido por Jorge Morais-Barbosa, 2a. edição revista articulação.
e aumentada. Lisboa: Livraria Sá da Costa Editora, . =: lingiiístico: "comporta um significado que cons- (",'r.;'
223 pp. Élélllents de Linguistique Générale, 1967. nrur o seu sentido ou valor, e um significante graças ao (
qual se manifesta o signo" (p. 12). J
Essa introdução à lingüística estrutural não é um livro Economia: do princípio da dupla articulação resulta o -
de semiótica nem contém qualquer capítulo sobre a rela- princípio de economia. Uma linguagem duplamente arti-

20 21
Liicia Santaefla e Winfried Niith Bibliografia Comentada - Semiâtic«

culada é um sistema econômico porque permite a trans- 1.4 Buyssens, Eric. Semiologia e Comunicação Lingüística,
missão de informação a um baixo preço: poucos elementos traduzido por Isidoro Blikstein. São Paulo: Cultrix,
(fonemas) de segunda articulação permitem a produção de 1972,217 pp. La Communication et f'Articulation Lin-
milhares de elementos de primeira articulação. A segunda guistique.1967.
articulação também é econômica porque toma, indepen-
dentemente do valor do significado, a forma do significa- Esse livro está dividido em duas gra.ndes partes. Só a
do correspondente. primeira é consagrada a temas semióticos, sendo o assunto
Língua: em contradistinção à linguagem, Martinet re- da apresentação a seguir. A segunda parte está dedicada à
sume as características de uma língua do seguinte modo: lingüística e aborda temas como a convenção lingüística e
vários aspectos da fonologia e da morfologia .
Uma língua é um instrumento de comunicação segundo .Os temas apresentados na primeira parte se baseiam
o qual, de modo variável de comunidade para comunida- em estudos semióticos que Buyssens publicou pela pri-
/ ;y de, analisa-se a experiência humana em unidades provi- meira vez em 1943. Nessa época, o autor era um dos
l./.... r das
/\l" }IJri..
~ de conteúdo semântico e de eXI:Jfessãofônica - o~
~,q mon~~s. Essa expressão fônica articula-se por sua vez
primeiros lingüistas
uma extensão da lingüística
a seguir o projeto saussuriano
na direção de uma teoria ge-
para

Y em unidades distintas e sucessivas - os fonemas - de nú- ral dos signos.


mero fixo em cada língua e cuja natureza e relações mú- Buyssens considera o campo semiológico a partir dos
tuas também diferem de língua para língua (pp. 17-18). signos naturais que ele chama de índices. Um índice não
comunica nada, mas pode ser interpretado mesmo assim:
Pertinência: qualquer descrição supõe uma seleção por- uma nuvem indica chuva, a palidez indica uma doença.
que a descrição é necessariamente finita. Qualquer descri- Signos desse tipo têm significação, mas não constituem
ção se baseia, portanto, em um ponto de vista determina- atos comunicativos. A semiótica da significação se restrin-
do. "Uma vez adotado, tal ponto de vista, reter-se-ão certos ge, portanto, aos signos não comunicativos.
traços, ditos pertinentes, enquanto se afastarão outros por A comunicação trata de atos comunicativos ou sêrnicos.
não-pertinentes" (p. 30). Comunicação, para Prieto, nasce de uma intenção de in-
Toda ciência pressupõe a escolha de um ponto de vista fluenciar os semelhantes a fim de obter deles uma colabo-
próprio: em aritmética, só os números são pertinentes, em ração social. Um ato sêrnico é, portanto, portador de uma
geometria, as formas. Na lingüística, o princípio de perti- significação intencional. Buyssens apresenta uma exposi-
nência é o mérodo dê classificação das unidades e da desco- ção sistemática dos atos sêmicos. Qualquer elemento pode
berta dos traços distintivos das unidades. ser parte de uma significação inrencionàl. Grãos de arroz

22 1
2)
Llíâa Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiõtica

atirados sobre um casal de nubenres revestem-se de um número de signos, podemos constituir um número maior
caráter sêmico. de semas. Os elementos de um sema não são sempre sig-
Para evitar qualquer associação com a fala humana, o nos. A bandeira holandesa é azul-branca-vermelha, mas as
autor evita o tema da linguagem no contexto da semiologia cores individuais não têm uma significação, apenas o todo.
geral e introduz o termo semia para designar um sistema Relacionado à dicotornia sema vs. signo, Buyssens in-
de comunicação. Não só a fala, mas também a comunica- troduz a distinção entre significação e significado. Só o sema
ção por assobios, por processos gráficos ou por gestos são tem uma significação porque apenas ele é capaz de consti-
sernias. tuir uma mensagem. O signo (que faz parte de um sema)
O termo, para a mensagem transmitida num ato co- se constitui de um significado e um significante.
municativo, é sema. Um sem a é "qualquer processo con- Outros temas que Buyssens examina são a classifica-
vencional cuja realização concreta, num ato sêmico, per- ção dos signos, o caráter formal dos signos, a distinção en-
mite a comunicação" (p. 34). tre conhecimento e significação, a influência do conheci-
Buyssens distingue várias classificações das semias. Do mento sobre a significação e as propriedades fundamentais
ponto de vista sensorial, há semias auditivas, visuais, olfa- das línguas do ponto de vista da semiologia geral.
tivas, gustativas ou táteis. Das semias relacionadas à lín-
gua humana, Buyssens considera só o discurso (a fala) uma 1.5 Prieto, Luis J. Mensagens e Sinais, traduzido por Anne
semia direta. A escrita, para ele, é uma semia substitutiva Arnichand e Alvaro Lorencini. São Paulo: Cultrix e
do discurso. O código Morse que substitui letras do alfa- Edusp, 1973,153 pp. Message et Signaux, 1966.
beto é uma semia substirutiva de segundo grau. Fórmulas
matemáticas, porém, são sem ias diretas em forma escrita, Esse estudo fundamental de mensagens e sinais se ins-
mas são semias substitutivas quando faladas. creve no projeto saussuriano de estender a lingüística para
As semias também se distinguem na sua organização uma semiologia geral. As fontes são a semiologia lingüís-
econômica. Um código muito econômico é a numeração tica de Saussure (1.1.), Buyssens (1.3.), George Mounin e
escrita: por meio de dez algarismos, podemos representar André Martinet, lingüistas franceses esses dois últimos.
números ao infinito. A economia rodoviária européia con- Apesar desse pano de fundo Iingüístico, Prieto se dedica
siste na sua limitação a cinco cores (preto, branco, verme- mais a uma teoria geral do signo do que a uma semiologia
lho e dois matizes do azul) e quatro formas (circunferência, li nguocêntrica.
retângulo e triângulo em duas posições). Cada elemento A originalidade desse livro em relação a sua tradição
significativo de um sem a é um signo. É nisso que reside o semiolingüística consiste em ter estendido o campo
caráter econômico da articulação: com um determinado semiótico, da área dos signos verbais e arbitrários para os

24 2S
Lücia Santaella e Willfried Niith
Bibliografia C01llentada - Semiótica
signos naturais e indexicais, assim como para muitos códi-
gos não-verbais da vida cotidiana. Para isso, o autor desen- como de Outras alternativas sígnicas. O ruído da chuva
,
volveu também uma teoria geral dos códigos. por exemplo, elimina a possibilidade de não estar choven-

Conforme Pr ie to , as questões fundamentais da do e indica, assim, que é OUtra possibilidade, a possibilida-

semiologia não começam com o signo verbal, mas com os de de estar chovendo, que se realiza. No caso dos atos

índices naturais. Índice, segundo o autor, é o termo gené- semiÓticos, o mecanismo da indicação é mais complexo:

rico para todos os fenômenos sígnicos. Em outras palavras, (1) o sinal indica ao receptor também que um emissor se

Priero chama de índice o que outros semioticistas chamam propõe a transmitir-lhe uma mensagem e (2) o sinal tem a

de signo. O campo semiótico dessa teoria tem, portanto, indicação significativa de pertencer a um código. Um có-

duas grandes áreas: a área dos índices sem emissor e a área digo é um sistema que estabelece relações de indicação entre

dos índices com emissor. Índices sem emissor são os índi- um campo semiótico e um campo poético, quer dizer, en-

ces naturais. Prieto chama esses processos sígnicos indiciais tre um sistema de significantes e um sistema de significa-
dos no sentido saussuriano.
sem emissor de eventos comunicativos. Tal terminologia
está em conrraposição à terminologia usual, que considera Priero continua Com o estudo das condições de Sucesso

processos comunicativos aqueles que pressupõem emisso- e de fracasso do ato sêmico, dos traços pertinentes dos si-

res e receptores. nais e das relações lógicas entre os significados e os signi-


fIcantes dos sinais. Os exemplos examinados são sinais do
Um índice com emissor, que Prieto considera como
um índice artificial, é chamado de sinal. Um processo código de trânsito, do semáforo, códigos de números para
catalogação, redes telefônicas, numeração de quartos de
sígnico que envolve um sinal é um ato semiótico.
A semilogia é, portanto, o estudo dos mecanismos da hotéis ou os sinais das bandeiras dos marinheiros. Na Sua

indicação natural ou artificial. Em conrradistinção a uma teoria dos códigos, Prieto dá atenção especial à questão da
articulação (simples ou dupla como na linguagem) e à eco-
mera percepção que, para Prieto, ainda não indica nada
senão aquilo que é como é, um índice é algo que (1) per- nomia (CUStose redundância) dos códigos. Um código eco-

tence a uma classe de fenômeno chamado universo de dIS- nômico reduz o custo da indicação significativa. Por exem-

curso indicando e (2) está relacionado a um outro fenôme- plo: uma numeração seqüencial de um inventário de mil
objetos exige nada mais do que mil números (sinais). Po-
no que pertence a um ourro universo, o universo de discurso
indicado. rém, qualquer erro que haja no uso desse código não poderá

As estruturas nesses dois universos são estruturas ser resolvido por um receptor. Por isso, a maioria dos códi-

.. (/+ - ) . Um Indice dado sempre implica a possi- gos na vida COtidiana e comercial são códigos menos econô-
oposltlvas .
micos: usam mais elementos indicativos (elementos redun-
bilidade e, ao mesmo tempo, a exclusão do oposto, aSSIm
dantes) para poder evitar ou corrigir erros de transmissão.
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27
Lucia Santaella e Winfried Nõtb Bibliografia C01lZe/1tada- Semiótica

1.6 Barthes, Roland. Elementos de Semiologia, traduzido por temas de signos não-verbais, mas tendo por base descri-
Isidoro Blikstein. São Paulo: Cultrix, 1971, 116 pp. ções verbais. O resultado do exame de tais sistemas é a
Éléments de Semiologie, 1964. descoberta de estruturas análogas ao sistema lingüístico.
Na língua alimentar, por exemplo, há regras de exclusão,
Semiologia, para Barthes, é uma translingüística à qual oposições significantes, regras de associação simultânea ou
caberia estudar as grandes unidades significantes do dis- sucessiva ou até uma retórica alimentar.
curso. As fontes dessa semiologia estão na lingüística es- No segundo capítulo, sobre significado e significante,
trutural de F. de Saussure (I.l.) e nos trabalhos de Hjelmslev Barthes examina a tipologia dos signos e vários aspectos
(1.2.), Roman Jakobson, Émile Benveniste e André do signo lingüístico de Saussure (significante, significado,
Marriner. A extensão semiológica dessa tradição de estu- significação, valor) em comparação a certos signos sernio-
dos Iingüísticos inclui, nesse livro, fenômenos culturais lógicos (objetos, gestos, imagens, farol etc.) para salientar
como o vestuário, a alimentação, o automóvel ou O mobili- outras homologias semiológicas entre os signos lingüísticos
ário. Em contradistinção a Saussure, porém, que postulava e os não-lingüísticos.
a semiologia como estudo dos signos em geral, do qual a Sintagma e sistema é o título do terceiro capítulo:
lingüística seria só um ramo, Barthes chega à conclu- Barthes introduz os dois eixos da língua, o eixo sintagmático
são oposta: "a semiologia é que é uma parte da lingüísti- e o eixo paradigmático e os vários tipos de oposição lin-
ca" (p. 13). güística (privativas, eqüipolentes, constantes, suprimíveis
A razão de uma tal visão logocêntrica da semiótica está ou neutralizáveis) para procurar analogias nos sistemas não-
na convicção de que imagens e ourros objetos culturais lingüísticos. O sistema mobiliário; por exemplo, consiste
nunca significam de uma maneira autônoma: qualquer sis- das variedades estilísticas de um mesmo móvel, tal como
tema semiológico reveste-se de linguagem (p. 12). As ima- uma mesa. O sintagma mobiliário consiste na justaposição
gens publicitárias ou do filme, por exemplo, só confirmam dos móveis em um mesmo espaço (mesa, cadeira, armá-
ou até repetem as mensagens lingüísticas nas quais elas são rio erc).
conrextualizadas, de maneira que "parece cada vez mais Em um capítulo sobre denotação e conoração, Barthes
difícil conceber um sistema de imagens ou objetos cujos introduz suas famosas definições da conotação como um
significados possam existir fora da linguagem" (p. 12). signo denotativo estendido por um segundo significado e
Baseado nesses pressupostos linguocêntricos, Barthes da metalinguagem como um signo denotativo estendido
começa com o estudo da dicotomia língua e fala, em lin- por um segundo significante. Aqui também se encontra a
güística (Saussure, Hjelmslev), antes de examinar a sernio- famosa, mas complicada interpretação sígnica da ideolo-
logia de vários sistemas de objetos culturais, não como sis- gia e da retórica: "A ideologia seria, em suma, a forma dos

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Lúcia Santaelfa e Winfried Nijth Bibliografia Comentada - Semiôtica

significados de conotação, enquanto a retórica seria a for- No universo semântico, os semas formam hierarquias
ma dos conotadores" (p. 97). de sistemas sêmicos. Esse universo tem dois níveis. No seu
nível profundo (nível da imanência), o universo reflete a
1.7 Greimas, Algirdas Julien. Semântica Estrutural. tradu- totalidade das categorias conceiruais do espírito humano.
zido por Hakira osakabe e Isidoro Blikstein. São Pau- É uma espécie de nível lógico que contém todas as combi-
lo: Cultrix. 1977, 330 pp. Sémantique Structurale, 1966. nações de elementos semânticos pensáveis. Numa língua
específica, porém, não há palavras para todas essas catego-
. A semântica estrutural foi o ponto de partida do pro- rias. O nível da manifestação é o nível das palavras realiza-
jeto semiótico de A. J. Greimas. Com base na lexicologia das numa língua. No nível da imanência, por exemplo,
existe a combinação de lesma + masculino, mas no nível da
estrurural,
~struturas
o objetivo desse trabalho é a análise semântica
textua~ O livro começa com uma
---
introdu- manifestação do porruguês, não há a palavra lesmo,

çãõ aos princípios da semântica estrutural na tradição dos Greimas diferencia dois tipos de semas que podem
lingüistas Pottier e Katz & Fodor. ser combinados, a saber, semas nucleares, que caracteri-
Greimas define a estrutura elementar da significação zam o núcleo de uma significação lexical, independente-
como uma relação de oposição entre dois termos que, ao mente do contexto, ao passo que os semas conrextuais
mesmo tempo, têm algo em comum. Por exemplo, os lexe- correspondem aos elementos significativos que estabele-
mas 'filho' e 'filha' se distinguem pelas características se- cem uma relação conrextual. Assim sendo, Greimas, dis-
mânticas 'masculino' e 'feminino'. Nessa oposição, aparece tingue entre o nível semiológico ou figurativo, que é o
(como traço semântico comum a categoria sêmica 'sexo'. ~- nível dos semas nucleares, e o nível semântico do discur-
se modo, toda estrutura semântica se articula de.uma ma- so, que é o nível contexrual. O nível semiológico reflete a
--- - ----
~ ~eira ~inária, possuindo d~is lados: aquele que constitui a ~ssa cogni ão do mundo, enQuanto o nível semântico_~e
) ~p()slçao e aquele que constitui o elemento comuf:!?.Greimas refere às categorias da mente humana. O autor também se
interpreta esses dois lados da estrutura elementar da signi- refere a esses níveis como sendo o da exteroceprividade e
ficação como uma estrutura de dis junção (que articula a opo- da interoceptividade.

sição) e uma estrurura de conjunção (que articula o elemen- Como estrutura específica da texrualidade, Greimas
to comum). O modelo para sua ilustração é o do eixo define o conceito de isoto ia. Essa significa basicamente
( semântico. Os pontos terminais do eixo re resentam os con- ÇQerência texrual devida à recorrência de elementos semân-
~
ceitos elementares o{Jositivos (m~s~ulino vs. feminino), que ticos no contexto. Por exemplo, o lexema 'volume', sem
~o definidos como ~emas. O próprio eixo, que une ambos contexto, é ambíguo, podendo significar intensidade de
os semas, simboliza o elemento semântico comum. som ou livro. No contexto de 'livros' ou 'biblioteca' , essa

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Lúcia Santaelia e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiôtica

ambigüidade se perde: biblioteca e volume são conectados de um nível de linguagem a um outro, de uma linguagem
por uma isotopia que se articula no conceito de 'livro'. para uma linguagem diferente, e que o sentido não é senão
A partir de tais considerações, Greimas avança da se- a possibilidade de transcodificação. Ele continua essa idéia
I:- - -~- -
mântica estrutural para a semântica textual. No nível tex- na afirmação de que a produção do sentido é a transforma-
tl;:~l aparecem, como novos ele~e~tos, as estruturas ção de um sentido dado.
acranciais. O autor se baseia em Propp e reduz as eSfrutu- Sem dúvida, o artigo mais importante da primeira parte
ras ~ciais a categorias básicas de oposição, tais como é o que se chama "Condições de uma semiótica do mundo
sujeito versus objeto, destinador versus destinatário e natural". Para Greimas, uma tal semiótica se baseia numa
adjuvante versus opositor. Numa análise de um texto lite- rede de correlações entre dois níveis da realidade signi-
rário, no último capítulo, Greimas exemplifica seus prin- ficante: as estruturas lingüísticas e os signos ou sistemas
cípios semióticos da análise textual. de significação do mundo natural. Os signos naturais tam-
bém sofrem as interferências de modelos culturais. Por-
1.8 Greimas, Algirdas Julien. Do Sentido. Ensaios Se- tanto, o mundo natural se deixa tratar como um objeto
miôticos, traduzido por Ana Cristina Cruz Cezar et al. semiótico. Exemplo da determinação cultural da natureza
Petrópolis: Vozes, 1975, 295 pp. Du senso Essais está na gestualidade, que pode ser prática, mítica, lúdica e
Sémiotiques. 1970. estética.
Na segunda parte, destaca-se sobretudo o artigo sobre
Esse volume é uma coleção de quinze artigos que re- "O jogo das restrições sernióticas", no qual Greimas de-
fletem o desenvolvimento da semiótica greimasiana até senvolve o "modelo constitucional" do quadrado sernió-
1970. Os textos estão divididos em quatro partes. A pri- tico, baseado em relações lógicas tais como contrário e con-
meira parte, "O sentido", desenvolve elementos da semân- traditório, implicação, conjunção e disjunção.
tica estrutural. A segunda, "História e comparação", tra- Embora o livro contenha estudos exemplares na área
balha as idéias de uma semiótica narrativa apoiada na da mitologia e dos contos populares, fundamentais são os
mitologia. A terceira parte, "A narração", trata dos ele- artigos sobre "Elementos de uma gramática narrativa" e
mentos da gramática narrativa e das estruturas actanciais. "Por uma teoria da interpretação da narrativa mítica",
A última parte, "A manifestação", contém três artigos so- ambos inclusos na terceira parte. Na gramática narrativa,
bre temas diversos: "A poética estrutural", "Palavras cru- são distinguidos os três tipos principais de enunciado: os
zadas" e "Os provérbios". descritivos, os enunciados modais e os translativos. É tam-
No primeiro artigo da primeira parte, Greimas desen- bém nesse artigo que os valores modais são hierarquica-
volve a idéia de que significação não é senão a transposição mente definidos: querer, saber, poder, fazer.

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Lúcia Santaelta e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiõtica

Em síntese, para Greimas, a semiótica extrapola o ní- em disjunção) ou unido (em junção com) um objeto-valor.
vel das palavras e enunciados meramente lingüísticos, ins- V ários processos de privação ou de aquisição constituem o
talando-se no nível dos discursos e dos textos. Desde as programa narrativo básico. Da seqüência de programas
estruturas fundamentais até as mais complexas, atraves- narrativos se desenvolve o percurso narrativo em que se
sando diferentes níveis e modelos de discursos e de texto, manifestam as modalidades do saber, poder, dever e fazer
vão-se produzindo modulações do sentido, em todos os dos actantes.
planos do contrato semiótico. O esquema narrativo canônico mostra o sujeito entre
um destinador manipulador, fonte de provocações, sedu-
I.9 Barros, Diana Luz Pessoa de. Teoria Semiótica do Texto. ções, intimidações ou tentações para o sujeito e um
São Paulo: Ática, 1990,96 pp. destinador julgador, actante que propõe ao sujeito um con-
trato e exerce a persuasão para convencê-lo e que o julga
A autora apresenta nesse livro uma introdução à teoria por suas ações.
semiótica do texto de Algirdas J ulien Greimas e de sua O capítulo sobre a semântica narrativa do texto, que é
escola de Paris (I.7, 1.8). De maneira sucinta e clara, com uma dimensão do percurso generativo paralelo ao sintáti-
muitos exemplos, a autora introduz os fundamentos e os co, examina apenas as modalizações do fazer (tais como o
métodos de aplicação dessa teoria textual, declarando que saber-fazer, dever-fazer ou fazer-fazer), do ser e algumas
"o objetivo dessa semiótica é.descrever e explicar o que o paixões resultantes.
texto diz e como ele faz para dizer o que diz" (p. 7). O As modalidades do ser constituem um quadrado semió-
texto é definido como uma dualidade de formas comple- tico com os eixos segredo vs. mentira e verdade vs. falsidade
mentares: de um lado, ele tem uma organização interna, no qual se manifestam as oposições ser vs. não-ser e parecer
que fazdele um objeto de significação; de outro, existe vs. não-parecer. As paixões que resultam dessas modalizações
uma perspectiva externa, o texto é um objeto de comuni- semânticas são definidas na base de combinações lógicas dos
cação entre um destinador (autor) e um destinatário (lei- elementos do modelo semiótico. Cobiça, por exemplo, é uma
tor), num dado contexto sócio-cultural. paixão em que o sujeito quer o objeto-valor, curiosidade é o
O tema desse livro introdutório limita-se à análise in- valor cognitivo do querer-saber e felicidade é um efeito da
terna do texto no plano de seu conteúdo, não se detendo no satisfação pela obtenção do objeto.
seu plano de expressão. Dois capítulos estudam o plano discursivo do texto,
Seguindo o percurso generativo greimasiano, a autora 110 qual se manifestam as opções discursivas do sujeito da
começa com a sintaxe narrativa. No nível mais profundo, e-nunciarão. Os elementos textuais escolhidos pelo sujeito
aparece a constelação de um sujeito em busca (e, portanto, tln enunciação incluem as pessoas, o tempo e as figuras.

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Lucia Santaefla e Winfried Nijth Bibliografia Comentada - Semiôtica

A sintaxe discursiva trata das relações entre o sujeito te-americano Charles Sanders Peirce. O número de ensaios
da enunciação e o discurso-enunciado, além das relações coletados, seis, é mínimo se comparado à extensíssima obra
argumentativas entre o enunciador e o enunciatário. Numa deixada por Peirce: 12.000 páginas publicadas em vida e
narrativa complexa, uma pluralidade de vozes enunciativas mais 90.000 páginas de manuscritos inéditos. Não obstante
se misturam, tais como o enunciador e enunciatário pres- a pequena amostragem de textos, essa edição da Cultrix foi
suposto, o narrador e narratário do discurso e o interlocuror pioneira na publicação da obra peirciana no Brasil.
e o interlocurário. Na introdução ao volume, os tradutores e organizado-
A semântica discursiva trata da disseminação dos te- res, Mora e Hegenberg, apresentam Peirce como pensador
mas no discurso e da sua figurativização. Tematizar o dis- e fornecem algumas pistas para se compreender a especifi-
curso é formular os valores de modo abstrato e organizá- cidade dos ensaios escolhidos contra o pano de fundo da
los em percursos, enquanto na figurativização do discurso vasta obra peirciana.
ocorre a concretização dos conteúdos abstratos por 'figu- O conjunto de ensaios é aberto por uma apresentação
ras', isto é, elementos do mundo natural que transmitem que Peirce faz de si mesmo, uma brevíssima e saborosa
efeitos de sentidos e ilusões de realidade. autobiografia intelectual. O restante dos ensaios escolhi-
Em anexo, o livro apresenta uma bibliografia comen- dos pertence a três partes distintas, mas evidentemente
tada da literatura em língua portuguesa e francesa sobre os inter-relacionadas, se considerarmos o conjunto e o desen-
trabalhos da escola semiótica de Paris e ainda um pequeno volvimento histórico da obra de Peirce. Dois textos sobre
dicionário da terminologia greimasiana. Esse vocabulário o primeiro pragmatismo de Peirce: "Como tornar claras
crítico é um guia muito útil para a terminologia às vezes nossas idéias" e "A fixação das crenças". Três textos sobre a
idiossincrática de Greimas. doutrina dos signos: "Classificação dos signos", "O ícone,
O indicador e o símbolo", "Trechos de cartas para Lady
1.10 Peirce, Charles Sanders. Senziótica e Filosofia, traduzi- Welby" (sobre signos e categorias). Um texto sobre os três
do por Octanny Silveira da Mota e Leonidas ci pos de raciocínio "Dedução, indução e hipótese", tam-
Hegenberg. São Paulo: Cultrix, 1972, 164 pp. En- bém da primeira fase em que Peirce começou a desenvol-
saiosextraídos dos Collected Papers 0/ Charles Sanders ver suas idéias sobre os tipos de argumento ou raciocínio.
Peirce, 8 volumes, 1931-1958. Embora o termo pragmatismo não apareça nenhuma
v .z em "Como tornar claras nossas idéias" e "A fixação das
Esse volume reúne a primeira coletânea de ensaios, tra- rr nças", foi nesses artigos que Peirce lançou a versão po-
duzidos para o português, do cientista, matemático, lógi- pular de sua doutrina pragmatista, que muita influência
co e fundador da semiótica ou doutrina dos signos, o nor- rx rceu sobre seus seguidores, como é o caso de William

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Lúcia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiôtic»

James, John Dewey. Entretanto, essa versão primeira foi, tos do lógico Gottlob Frege. Apesar dessa divisão, essa co-
mais tarde, depois de 1900, criticada pelo próprio Peirce e letânea de ensaios de Peirce já é mais volumosa do que a
revisada em alguns de seus aspectos. anterior, publicada pela Cultrix em 1972 (I. 10).
Os textos sobre os signos são fundamentais e A seleção dos escritos procurou ser representativa, con-
antológicos. Aparecem em quase todas as coletâneas de es- templando alguns artigos extraídos de quatro dentre os
critos de Peirce em todo o mundo. Foram escritos por um oito volumes dos Collected Papers o/ Charles Sanders Peirce.
Peirce maduro, no começo do século XX, quando se dedi- Do volume I, por exemplo, foram selecionados escritos sob
cou ao desenvolvimento de sua teoria dos signos. Nesses o título de "Princípios de filosofia", do volume lI: "Ele-
artigos, podem ser encontradas explanações sobre a relação mentos de lógica", do V: "Pragmatismo e pragmaticismo",
triádica que compõe o signo: (1) signo, (2) objeto e (3) do VIII: "Resenhas, correspondência, bibliografia".
interpretante, também a discussão sobre os tipos de obje- A seleção começa com as "Conferências sobre
tos, as famosas tricotomias dos signos: quali-signo, sin- pragmatismo", nesse caso, o segundo pragmatismo
signo, legi-signo; ícone, índice, símbolo; rema, discente, peirciano, após 1900. O pragmatismo é mostrado na sua
argumento, assim como as dez classes de signos. relação com as ciências normativas (estética, ética e lógi-
O artigo sobre os três tipos de argumento, dedução, ca), com as categorias universais da fenomenologia peirciana
indução e hipótese, foi escrito em 1878. Esses tipos de argu- (primeiridade, secundidade e terceiridade) e à luz das divi-
mento também passaram por uma revisão depois de 1900, sões da filosofia, seguidas dos três tipos de raciocínio, com
especialmente a teoria da abdução, termo que veio substi- ênfase aqui em fragmentos de textos relativos à percepção
tuir o termo hipótese na teoria peirciana dos argumentos. . à abdução.
Numa segunda secção, encontram-se os famosos tex-
I.11 Peirce, Charles Sanders. Escritos Coligidos, seleciona- ( s cognitivos e anti-cartesianos com que Peirce começou
dos e traduzidos por Armando Mora D'Oliveira e Sér- S ia carreira filosófica em 1868: "Questões sobre certas fa-
gio Pomerangblum. São Paulo: Abril Cultural, vol. culdades reivindicadas para o homem" e "Algumas conse-
XXXVI, 1974, pp. 7 -192. Escritos extraídos dos qüências das quatro incapacidades". Esses escritos são segui-
Collected papers o/ Charles Sanders Peirce, 8 volumes, (10 por uma secção dedicada à fenomenologia ou doutrina
1931-1958. (Ia categorias, com artigos que Peirce escreveu na primei-
1,\ década do século XX e na última década dos oitocentos.
Os escritos coligidos de Peirce, selecionados por Ar- Nas correspondências aparecem cartas escritas para
mando Mora D'Oliveira, dividem o espaço desse volume William James, Lady Welby, todas sobre signos, categori-
da coleção Os Pensadores, da editora Abril, com dois esc ri- 1'" nsciência, enfim, temas que Peirce muitas vezes de-

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Lucia Santaelfa e Winfried Nõib Bibliografia Comentada - Semiôtica

senvolveu por meio de cartas. Porém, o texto "Sobre sig- Em ordem cronológica de publicação, essa é a terceira
nos e categorias" já havia sido traduzido na coletânea da coletânea de ensaios de Peirce traduzidos para o português.
editora Cultrix (1.10), o que é uma pena, visto que há uma Ainda mais volumosa do que a segunda coletânea, publica-
enorme quantidade de textos importantes de Peirce para da pela Abril (1.11), essa edição, infelizmente, não corrige
serem traduzidos. Diante disso, não parece justificar-se que os problemas que já apareciam na edição da Abril Cultural,
as coletâneas publicadas numa mesma língua se repitam. ao contrário, os acentua: falta uma introdução orientadora,
Seguem-se fragmentos de resenhas, como a famosa sobre a há excesso de fragmentação nos textos selecionados, ausên-
Edição Fraser das obras de Berkeley. cia de conrexrualização desses fragmentos, descontinuidade
Por fim, na última parte, voltam artigos sobre o prag- cronológica e ternática sem indicações cuidadosas dos volu-
maticismo, ou segundo pragmatismo, nos quais Peirce mes dos Collected Papers dos quais foram extraídos os excertos
desenvolve sua teoria dos interpretantes lógicos. Esses são selecionados. Tanto quanto nas edições anteriores (1.10 1.11),
seguidos de um pequeno texto sobre ciência e completa- também aqui não são apresentados os critérios que norrearam
dos por artigos sob o título de "Elementos de lógica" nos a seleção dos fragmentos de ensaios traduzidos. De todo
quais o autor continua sua elaboração dos tipos de argu- modo, essas coletâneas são importantes por possibilitarem a
mento, nesse caso, sobre a probabilidade e a indução. leitura dos textos originais de Peirce para aqueles que não
Como se pode ver, a seleção prima pela represen- têm familiaridade com o inglês.
tatividade e pela escolha de textos da maturidade de Peirce. A coletânea se divide em duas partes. A primeira apre-
Entretanto, trata-se de fragI!!e!!to.§ de textos que, nos ori- senta três secções: (A) "Princípios de Filosofia", extraída do
ginais (Collect;iP;pe-:S), também já aparecem d~-m;<!(~.f~ag- volume I dos Coltected Papers (CP); (B) "Elementos de Lógi-

t
mentadO. Isso dificulta a compreensão do papelque cada a", extraída do volume II dos CP e (C) "Correspondência",
'texto desempenha no conjunto, especialmente no todo do .xtraída do volume VIII dos CP. Na secção (A), tem-se um
pensamento de Peirce. Faltam, com toda certeza, tanto uma texto sobre os três tipos de raciocínio: dedução, indução ea
introdução sinalizador~ quanto apresentações intermediá- r .crodução, que anteriormente Peirce chamava de hipótese,
rias, nas diversas secções, que sirvam de guias para a orien- e, mais tarde, com a revisão de sua teoria desses três tipos de
tação do leitor. .rrgumento, passou a chamar de abdução. A seguir, é apre-
~ -nrado um fragmento de um ensaio de Peirce chamado
1.12 Peirce, Charles Sanders. Semiótica, traduzido por J. "Uma adivinhação para a esfinge" (que aparece nos CP 1.354-
Teixeira Coelho Netto. São Paulo: Perspectiva, 1977, . 16, isto é, volume 1 dos Coltected Papers, parágrafos 354 et
337 pp. The Collected Papers ofCharles Sanders Peirce, c' IS.). Nesse texto, Peirce aplica suas três categorias - um,
8 volumes, 1931-1958. ,Ioi e três - a uma plural idade de campos. Nessa coletânea,

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Lrícia Santaella e Winfried NiJrh Bibliografia Comentada - Semiótica

foram traduzidos os fragmentos relativos à tríade no raciocí- são discutidas as divisões da filosofia e o bem estético, éti-
nio, na metafísica e na psicologia. co e lógico, "Três tipos de raciocínio", em que os tipos de
Na secção (B), tem-se "Sinopse parcial de uma propos- raciocínio, especialmente a abdução, são discutidos nas suas
ta para um trabalho sobre lógica" e o interessante ensaio relações com a percepção, e "Pragrnatismo e abdução", que
sobre "Ética da terminologia". Nessa mesma secção, estão continua a discussão da abdução e percepção. Porém, mais
traduzidos importantes textos de Peirce sobre os signos, uma vez, essas traduções repetem textos que já estavam
escritos em 1901-2. Infelizmente, entretanto, essa tradu- traduzidos na coletânea dedicada a Peirce na coleção Os
ção repete os mesmos textos que já estavam traduzidos na Pensadores, da Editora Abril (1.11). O mesmo acontece com
coletânea da Cultrix (1.10). O que não havia aparecido lá os textos seguintes da secção (B), os famosos ensaios anticar-
são os escritos sobre "Proposições", "Termos", "A teoria tesianos de Peirce, "Questões referentes a certas faculda-
gramatical do juízo e da inferência" e "A base lógica da des reivindicadas pelo homem" e "Algumas conseqüênci-
inferência sintética". Ainda na secção (B), tem-se a famosa as das quatro incapacidades", que também já estavam
resenha de Peirce "O que é o significado", sobre o livro de traduzidos na edição da Abril. Inédito em português éo
Lady Welby, para quem Peirce escreveu posteriormente último artigo da secção (B), "O que é o pragrnatismo".
importantes cartas expondo sua teoria dos signos. A secção (C), bem menor do que as anteriores, apre-
Na secção (C) está traduzido um pequeno texto sobre senta um texto muito inspirado, escrito por um Peirce ainda
"Signos", cuja importância está no fato de que nele Peirce jovem, "Consciência e linguagem", extraído do volume VII
expõe, de modo muito breve, sua divisão dos objetos do los CP, e a resenha completa da edição Fraser da obra de
signo em objeto imediato e dinâmico e sua divisão dos Berkeley, que já havia aparecido, em um pequeno frag-
interpretantes em imediato, dinâmico e final. mento, na edição de Os Pensadores.
A parte II, quase inteiramente dedicada ao pragma- Como se pode ver, embora extensa, essa edição da Pers-
tismo, também se distribui em três secções: (A) "Apologia 1 ectiva traduz, pela segunda vez, muitos artigos que já
do pragrnarismo", extraída do volume IV dos CP, o volu- estavam traduzidos em edições anteriores.
me mais estritamente lógico e matemático dos CP. Os tex-
tos traduzidos, escritos originalmente em 1906, perten- I. L3 Santaella, Lúcia. O que é Senziótica. São Paulo: Brasi-
cem à obra madura de Peirce. Nesses textos, Peirce discute liense, 1983, 114 pp.
as bases lógicas do pragmatismo na sua teoria dos grafos.
A secção (B), extraída do volume V dos CP, "Pragrna- Embora tenha o nome genérico de O que é semiótica,
tismo e pragrnaricismo" versa sobre "A construção arquite- ~('guindo a orientação editorial dessa coleção, esse pequeno
tônica do pragrnatismo", "Os três tipos de bem", em que livro se limita a apresentar em mais detalhes apenas uma

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Lúcia Santaella e Winfried Nóth Bibliografia Comentada - Semiâtica

das correntes, a visão de Charles Sanders Peirce; discorren- dendo-a nas divisões do objeto, imediato e dinâmico, e na
do panoramicamente e com brevidade sobre outras escolas divisões dos interpretantes, imediato, dinâmico e final, para
de serniótica somente no último capítulo. terminar nas três tricotomias dos signos: (1) relação do sig-
O livro tem seis capítulos e "indicações para leitura" no consigo mesmo, quali-signo, sin-signo, legi-signo; (2)
no final. No primeiro capítulo, a semiótica como ciência, relação do signo com o objeto, ícone, índice e símbolo; (3)
seu objeto e seu campo de abrangência são apresentados relação do signo com o interpretante, rema, discente e ar-
brevemente. gumento. O capítulo termina com reflexões sobre a genera-
O segundo capítulo inicia o leitor na obra de Peirce lidade e abstração lógica da semiótica peirciana quando com-
por meio de uma pequena biografia intelectual que visa parada com outras correntes semióticas, que se constituem
mapear o desenvolvimento da obra na sua ligação com a mais propriamente como sernióticas especiais.
vida desse pensador. O terceiro capítulo, "Para se ler o
mundo como linguagem", discute a construção arquiretô- 1.14 Pinto,Julio.l,2,3 daSemiótica. Belo Horizonte: Edi-
nica da filosofia peirciana, a inter-relação entre as discipli- tora da UFMG, 1995,69 pp.
nas filosóficas, no centro das quais se encontra a semiótica
ou lógica em sentido amplo, com seus três ramos: (1) gra- Esse livro é um guia alfabético de conceitos funda-
mática especulativa ou gramática dos signos; (2) lógica crí- mentais da semiótica peirciana. Em verbetes de uma a três
tica ou estudo dos raciocínios e argumentos: abdução, indu- páginas, o autor pretende criar o "acesso rápido aos termos
ção, dedução e (3) retórica especulativa, também chamada específicos da semiótica de Peirce sem trivializar conceitos
de rnetodêutica, em que os três tipos de raciocínio, agora ou pecar por esquernatização" (p. 9).
em uma nova ordem, abdução, dedução e indução, são re- Precedidos por um guia de consulta aos verbetes, esses
vistos como partes integrantes do método das ciências. ão incluídos, por entrada alfabética, na seguinte ordem:
O capítulo quarto, "Abrir as janelas: olhar para O mun- Abdução, indução, dedução; argumento, categorias,
do", discute em detalhes a fenomenologia peirciana, porta legenerescência, dicissigno, erro, ícone, imagem, índice,
de entrada necessária para entender todo o restante da obra interpretante, inrerpretante dinâmico, interpretanre final,
de Peirce. Não obstanre a brevidade do livro, as categorias interpretante imediato, legissigno, lógica do vago, objeto,
de primeiridade, secundidade e terceiridade são explicadas objeto dinâmico, objeto imediato, primeiridade, qualis-
de maneira mais microscópica do que se costuma encon- si no, rema, réplica, representamen, secundidade, semiose,
trar em outros livros dedicados a Peirce. signo, símbolo, sinsigno, terceiridade, tricotomia.
Sob o título de "Para se tecer a malha dos signos", o De fato, o autor consegue realizar ° que promete: os
quinto capítulo discute a definição de signo de Peirce, esten- . onceitos não são banalizados. Sem cair em reducionismos

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Ltíáa Santaella e Winfried Nõt]: Bibliografia Comentada - Semiôtica

e seguindo muito de perto uma das bibliografias citadas, o semiótica, disciplina central no edifício de sua filosofia.
manuscrito em progresso, ainda inédito, de Joseph Ransdell, Para Peirce, a semiótica tem três ramos: (1) gramática espe-
Peircean Semiotic, o autor consegue ser muito claro na expla- culativa; (2) lógica crítica ou crítica dos argumentos: abdu-
nação dos complexos conceitos peircianos. ção, indução, hipótese e (3) retórica especulativa ou
Embora haja um índice remissivo ao final do volume, metodêutica. Dentro desses três ramos, Santaella fez um
indicando as relações necessárias entre os conceitos, não outro recorte. Limitou-se a selecionar apenas o primeiro
nos parece que a ordem alfabética na apresentação dos ver- ramo da semiótica: a gramática especulativa. Essa funcio-
betes seja a mais coerente. A teoria p~irciana_é muito intri- na como uma propedêutica para a lógica crítica, segundo

í~er
cada, seus conceitos são i nterdependentes
gação hierárquica,
bem compreendidos
, numa interli-
quer dizer, alguns conceitos só P.9_derp
quando têm por suporte a com-
ramo da semiótica,
suas modalidades.
porque estuda os signos em todas as

Para se manter coerente com a sua proposta, a autora


\~ - ......-
preensão de conceitos mais elementares. Esse é o caso do faz, já na introdução, uma breve apresentação da fenome-
(
;igno e~ relação à:C~tego~ias, dos interpretantes em rela- nologia e das categorias peircianas, dedicando os quatro
ção aos objetos, dos tipos de argumento, abdução, indução, capítulos do livro à explanação detalhada e exaustiva de
- em re Iaçao
d ed uçao, ---.~ao ,slgnp, e aSSIm
. por diiante. cada um dos componentes do signo. Assim, o primeiro
O volume ainda apresenta sugestões de leituras e al- capítulo é chamado "Do signo", o segundo, "Do objeto", o
gumas referências bibliográficas. terceiro "Do interpretante" e o quarto traz de volta a dis-
cussão do signo nas suas misturas e classificações, sendo
1.15 Santaella, Lúcia. Teoria Geral dos Signos. Semiose e Auto- chamado de "O signo revisitado".
geração. São Paulo: Ática, 1995, 199 pp. Também na introdução, Santaella alerta para o fato de
que o livro faz uso deliberado de um grande número de
Segundo as palavras da autora, expressas na introdução, citações de Peirce como meio modesto de compensação pela
esse é um livro monográfico e minucioso que segue paciente- tragédia que ainda continua a se abater sobre a obra
mente a construção dos conceitos na convicção de que, "quan- peirciana, a qual não recebeu até hoje "uma publicação
do bem definidos e bem compreendidos na sua formulação, decente que lhe faça jus" (p. 12). Assim sendo, as citações
os conceitos nos oferecem sua eficácia como recompensa" são importantes porque traduzem um grande número de
(p.12). Eficácia para quê? No caso da serniótica de Peirce, passagens dos manuscritos inéditos de Peirce.
para compreender o mundo como ações sígnicas ininterruptas. O primeiro capítulo começa com alguns sinais de aler-
Trata-se de um livro monográfico porque da gigantes- ta contra os equívocos presentes nas interpretações
ca obra de Peirce foi selecionada apenas uma parte, a simplificadoras do conceito de signo peirciano, tal como a

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Lücia Santaella e Winfried Niith Bibliografia Comentada - Semiótica

tão repetida definição de que o "signo é alguma coisa que balha com as menos conhecidas dez rricotomias de signos,
representa uma outra coisa para alguém". Os tópicos que o isto é, sete tricotornias além dessas três mais conhecidas e
capítulo apresenta são indicadores do conteúdo das discus- que ajudam muito na compreensão da dinâmica do signo
sões: "A forma ordenada de um processo", "O fundamento como processo lógico contínuo. Esse capítulo traz muitos
do signo", "O caráter vicário do signo", "A função media- exemplos como auxílio para a compreensão dos conceitos.
dora do signo", "A questão da determinação", O problema A bibliografia não é extensa, limitando-se a citar os
do significado", "A incomplerude-irnpotência do signo", trabalhos com os quais a autora efetivamente dialogou no
"Retorno à infinitude". seu livro.
No segundo capítulo, a questão do objeto do signo,
pesquisada diretamente nos manuscritos inéditos de Peirce, 1.16 Morris, Charles W. Fundamentos da Teoria dos Signos,
é vista nas subdivisões do objeto dinâmico e do objeto traduzido por Paulo Alcoforado e Milton José Pinto.
imediato. Ligada ao problema do objeto do signo, está a Revisão técnica de Nicolau Salum. Rio de Janeiro:
questão da percepção que é tratada nesse capítulo em al- Eldorado e São Paulo: EDUSP, 1976,92 pp. Founda-
gum detalhe (ver também 1.26). tions of the Tbeory of Signs, 1938.
O terceiro capítulo discute minuciosamente a teoria
peirciana do inrerprerante, detalhando suas três divisões: No contexto do neo-positivismo dos anos 30, Charles
(1) a divisão baseada na extensão e profundidade do sím- Morris escreveu esse texto como artigo para a Enciclopédia
bolo; (2) os interpretantes em um processo comunicativo e Internacional da Unificação das Ciências. Pragmaticam~nte,
(3) a mais conhecida divisão, de caráter mais morfogenético, Morris propõe a "unificação das ciências sernióticas" e afir-
~ - -- - I

baseada-nas categorias, que é a divisão dos níveis do inter- ma que "a serniótica não é uma simples ciência entre a~
pretante em imediato, dinâmico e lógico. Esses três ciêrlcias, mas um ~'ga1Zu11Z
o; in;trumento de todas as ciên-
inrerpretanres são analisados em profundidade e seguidos cias;;-(p. 87). A razão desse lugar único da serniótica entre
,- -
da análise da segunda divisão dos inrerprerantes em erno- as ciências vem do fato de que "toda ciência empírica está
cional, energético e lógico. empenhada no descobrimento de dados que podem servir
O último capítulo trata dos signos degenerados, isto como signos fidedignos" e assim "as ciências devem pro-
é, das misturas sígnicas, trabalhando as classificações dos curar na serniótica conceitos e princípios gerais aplicáveis
signos. Diferentemente da grande maioria dos estudo so- a seus próprios problemas de análise de signos" (p. 86).
bre o signo peirciano, que se limitam às conhecidas três A semiótica também tem implicações humanísticas
tricotomias (quali-sin e legi-signo/ícone, índice e símbo- porque "fornece uma base para a compreensão das forma
lo/rema, dicenre e argumento), nesse capítulo, a autora tra- principais da atividade humana e da sua inrerrelação poi

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Lücia Santaella e Winfried Nõt» Bibliografia Comentada, Semiôtica

rodas essas atividades e relações estão refletidas nos signos A semântica, conforme Morris, "trata da relação do
que medeiam essas atividades" (p. 89). signos com seus designata (os objetos que eles designam) e
No seu capítulo sobre "Serniose e serniótica", Morris ~m co~ os objetos que eles podem denotar ou real-
define semiose como "o processo pelo qual algo funciona mente denotam" (p, 38). Nessa visão positivista, a semân-
como signo" (p. 1) e o signos como envolvendo três fato- tica não é, portanto, uma teoria da significação, mas uma
res: aquilo que funciona como signo (S, o veículo do sig- teoria da referência.
no), aquilo a que o signo se refere (D, o designatum) eo Morris distingue entre uma semântica pura (teórica) e
efeito sobre um intérprete (I, o interpreranre). uma semântica descritiva. Nesse contexto, o autor tam-
r> A base dessa concepção de semiótica está no behaviorisrno bém introduz a sua tipologia dos signos em relação ao ob-
~os ~ 30, como fica aparente no exemplo seguinte: "um jeto. Modificando as definições clássicas de Peirce, Morris I
.- - - --
. cão reage a um determinado som (S), pelo tipo de comporta- distiQgu~entre signos-indicadores e caracterizadores: "um]
(~ento (I), próprio de uma caç~da de es~-uilos (D)" (p. 13). sigIlO indicador designa aquilo para que a atenção fo~
Enquanto esses traços cornportamentalistas e a visão dirigida (...) Um signo caracterizador caracteriza aquilo qu~
positivista do designatum como objeto ou classes de objetos ele pode denotar" (p. 42).
parecem ultrapassados hoje, a definição de semiose como ~ O ~timo ramo da semi'ótica, a pragmática é a "ciência í
mediação é ainda atual: "Em semiose, alguma coisa expli- da relação dos signos com os seus intérpretes" (p. 50). A r'
ca a outra mediatamente, isto é, mediante uma terceira. A ~lsão d;intérprete é ampla. Intérpret'es são rodos os orga- ).'~ 1L I

semiose é, pois, um explicar-mediado. Os mediadores são ~smos vivos "de maneira que a pragmática também traia )}l '_
veículos do signo; explicações são interpretantes; os agen- dos aspectos bióticos da semiose, isto é, de todos os fenô- - ,
tes do processo são intérpretes; o que é explicado são menos psicológicos, biológicos e sociológicos que ocorrem
designata" (p. 14). no funcionamento dos signos" (p. 50).
No centro do livro, está a famosa divisão triádica da
semiótica nos seus três ramos: sintático, semântico e prag- 1.17 Eco, Urnberro. As Formas do Conteúdo, traduzido por
Á J,"~{mátiCO:" A sintaxe, para ~orris, é mais do que um ra~o ~a Pérola de Carvalho. São Paulo: Perspectiva, 1974, 184
. )O''i} ~ gramática lingüística. ~ o estudo das "combinações de sig- pp. Le Forme de! Contenuto, 1971.
:v.'J.) "j" nos"~u das relações sintáticas dos sign,2s entre si" (p. 27-
, 28). Nesse sentido amplo, portanto, a sintaxe semiótica No centro desse livro estão dois temas que Urnberto
trata das combinações "dos signos perceptuais, dos signos Eco já havia abordado pela primeira vez em Estrutura Au-
estéticos, do uso prático dos signos e dos signos lingüísti- sente (11. 14): a definição do significado e o.problema do
cos" (p. 31). universo semiótico. Do mesmo modo, Eco reelaborou, mai

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Lticia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiótica

tarde, vários capítulos ou subcapítulos deste As Formas do tiruídas pelos elementos binários A e B. Sem sintaxe, as pa-
Conteúdo, no seu Tratado Geral de Semiótica (11. 15) lavras nessa língua parecem ser coisas e as coisas são pala-
O livro está dividido em seis capítulos. O primeiro de- vras. Eco desenvolve a idéia de que a injunção divina de se
termina o limiar semiótico e os limites da pesquisa serniótica. obedecer a uma nova regra, de que a maçã não é comível,
A essência dessas idéias reaparece no Tratado. Assim também, possa ter estado na origem de um pensamento baseado no
o segundo capítulo, sobre "Os percursos do sentido" - em reconhecimento de que as palavras não são as coisas e que
que é desenvolvida a tese a respeito da necessidade de semio- aquela duplicidade da 'cornibilidade' e, ao mesmo tempo,
tização do referente e a teoria dos componentes semânticos _ da 'incornibilidade' da maçã tenha sido a descoberta da ge-
está essencialmente contido no segundo capítulo do Tratado. ração de uma mensagem estática. Adão descobriu que a or-
O terceiro capítulo, "A semântica da metáfora", versa dem da linguagem não é absoluta e começa o interrogatório
sobre a metáfora em geral. Essa "emerge toda vez que a do código: "Adão descobre que a ordem não existe. Ela é
linguagem - para indicar algo que a cultura ainda não as- apenas um entre os muitos estados de possível quietação que
similou (e esse algo pode ser externo ou interno em relação a desordem de tempos em tempos alcança" (p. 122).
ao círculo da semiose) - deve inventar possibilidades As idéias do quinto capítulo, "Serniótica das ideologi-
combinatórias ou emparelhamentos semânticos não pre- as" antecipa o capítulo 3.9. "Ideologia e comutação do có-
vistos pelo código"(p. 79). É por isso que a metáfora assu- digo", do Tratado. A idéia central é a de que "a ideologia se
me "valor semântico e - mediatamente - cognitivo". Nes- apresenta como um resíduo extra-semiótico (a par da cir-
se ensaio, Eco tem por objetivo definir o peculiar estatuto cunstância) que determina os acontecimentos sernióticos".
da função cognitiva da metáfora, quer dizer, seu aspecto No sexto capítulo, voltado "Para uma análise semân-
semântico. O capítulo trabalha essa questão com vários tica dos signos arquitetõnicos", Eco apresenta um análise
exemplos, associados à idéia de que metáforas são, no fun- componencial do elemento arquitetõnico "coluna" e de suas
do, "juizos metassernióticos" (p. 101). Uma extensão desse conotações. Esse capítulo dá continuidade a idéias já de-
capítulo pode ser encontrada em outro livro de Eco: Semiotics senvolvidas em "Arquitetura e comunicação" e "O signo
and the Pbilosopby 01Language (IlI.9). arquiterônico", presentes em A Estrutura Ausente (11.14).
O quarto capítulo, "Geração de mensagens estéticas
numa língua edênica", é um ensaio sobre a hipótese de 1.18 Eco, Urnberto. O Signo, traduzido por Maria de Fátima
uma língua primitiva de Adão e Eva. Essa língua, cons- Marinho. Lisboa: Presença, 1977, 247 pp. Segno, 1973.
truída por Eco, consiste num plano de conteúdo de seis
eixos semânticos de oposições tais como bem vs. mal ou Esse livro é uma pequena enciclopédia da teoria do sig-
serpente vs. maçã, e um plano de expressão de palavras cons- no desde a antiguidade até o estruturalismo semiótico dos

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Lücia SantaeLla e Winfried NiHh Bibliografia Comentada - Semiôtica

anos 60. Na introdução, pode ser encontrada uma discussão tivos do fonema, sistema e código, expressão e conteúdo,

lexicográfica-terminológica de 20 acepções da palavra sig- substância e forma, componentes semânticos, sistema do

no em três dicionários, o que nos dá uma primeira impres- conteúdo, língua e fala, discurso, denotação e conotação,

são da pluralidade dos conceitos envolvidos nesse campo. A articulação de signos não-Iingüísticos. As fontes para a ela-

seguir, Eco conclui que "a semiótica é hoje uma técnica de boração desse capítulo são: Saussure (1.1), Hjelmslev (1.2),

pesquisa que consegue dizer-nos de um modo bastante exa- Buyssens (1.4), Priero (1.5), Katz/Fodor, Greimas (r. 7,1.8).

to como funcionam a comunicação e a significação. No quarto capítulo, são discutidos problemas filosófi-

O primeiro capítulo trata do processo sígnico, intro- cos do signo. Os temas dessas discussões são: (1) o homem

duzindo o modelo linear da comunicação fonte-emissor- como animal simbólico, com base no filósofo da lingua-

canal-mensagem-destinatário e o triângulo do signo gem Ernst Cassirer e no psicanalista Jacques Lacan; (2) a

(significante-significado-referente) com as suas muitas va- metafísica panssemiótica dos medievais, passando pelos
riantes terminológicas. românticos até o filósofo Jacques Derrida; (3) as relações
O segundo capítulo trata da classificação dos signos. entre signo, pensamento e realidade, com base em
A abordagem enciclopédica de Eco chega a distinguir onze Aristóteles, a escola medieval dos Modistae, a escola de

métodos de classificação conforme os seguintes critérios: Port Royal, Chomsky, Korzybski; (4) o problema do refe-

(1) diferentes fontes (signos orgânicos, animais, humanos rente tendo por base Epicuro, o realismo medieval, Berkeley,

erc.); (2) signos com ou sem emissor (significação vs. Port Royal; (5) iconicidade à luz de Peirce; (6) denotação e

inferência); (3) signos artificiais vs. naturais; (4) signos di- significação com base em Kant, Frege, Strawson; (7) o mito

ferenciados pelo grau de consciência ou intencionalidade: , da univocidade do signo à luz de Morris e os neo-positi-

(5) diferentes canais de transmissão; (6) diferentes signifi- vistas; (8) a semiose ilimitada de Peirce.

cados (signos unívocos, equívocos, vagos et c.); (7) O último capítulo apresenta um "Delineamento de uma

replicabilidade (signos únicos, replicáveis); (8) ligação com teoria unificada do signo", para o qual Eco se baseia muito

o referente (índices, sintomas, homo e hetero-substanciais menos em um modelo semiótico unificador do que em uma

etc.); (9) comportamento estimulado no destinatário (sig- tentativa de redefinição dos conceitos básicos introduzidos

nos prescritores, apreciadores etc.); (10) função (referenci- anteriormente, tendo em vista os resultados de seu estudo

al, fática, ernotiva etc.); (11) as dez classes principais de crítico e avaliativo. O capítulo consiste assim em um peque-

signos em Peirce. no dicionário de 25 conceitos e temas-chaves de semiótica.

O terceiro capítulo é uma introdução à teoria lingüís- Nesse panorama da teoria sígnica de Urnberto Eco se

tica do signo e a conceitos básicos da lingüística estrutu- destacam conceitos centrais que seriam, mais tarde, bas-

ral, entre eles: lexema, paradigma/sintagma, traços disrin- tante utilizados nos seus livros posteriores: sinal, sign ,

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Lucia Santaella e \'?'infried Nõth Bibliografia Comentada - Senziõtica

erniose ilimitada, relacionalidade do signo, convenciona- PIarão, 427-347 AC, até Charles Sanders Peirce no sécul
lidade, interpretante , semiose, referência, índices, unida- XIX e inícios do século XX. Embora cubra um período muito
des culturais, sociabilidade e observabilidade, denotação e longo da história, esse panorama é breve. Ao mesmo tempo,
conotação, semema, definição como artifício metalingüís- é bastante diversificado e cuidadoso no que diz respeito à
tico, código como sistema de sistemas, semema e contex- documentação, explicitando cada uma das contribuições que
to, sentido, cultura como sistema de signos e como seg- se foram acumulando em 25 séculos de semiótica.
menração do conteúdo, produção de signo, decodificação e O livro parte da definição da semiótica, que compre-
interpretação, prática serniótica. ende "todas as investigações sobre a natureza dos signos,
De um ponto de vista prismático, o tema e a concep- da significação e da comunicação" (p. 20), passando por
ção que Eco tem da serniótica nesse livro reflete-se nos seus uma discussão de suas origens. Nesse ponto, é estabeleci da
artigos sobre o signo: "tem-se um signo quando, por con- uma distinção fundamental entre serniótica auant Ia lettre
venção preliminar, qualquer sinal é instituído por um có- ou semiótica implícita e semiótica propriamente dita ou
digo como significante de um significado. Tem-se um pro- explícita. A primeira corresponde a todos aqueles autores
cesso de comunicação quando um emissor intencionalmente que, ao longo da história, trataram de questões semióticas,
transmite sinais. Quando o emissor não emite intencional- sem usar o termo para nomear seus estudos. A segunda se
mente, mas aparece como fonte natural, tem-se um pro- refere às investigações que, a partir de John Locke, filósofo
cesso de significação" (pp. 196-197). ernpirista inglês, século XVII, começaram a ser explicita-
A conclusão do livro afirma que "a serniótica não é ape- mente denominadas de semiótica.
nas uma teoria, mas uma prática comum. É-o porque o sis- Outras questões preliminares tratadas no primeiro ca-
tema semântico muda e ela só pode descrever parcialmente e pítulo são: a história da terminologia da serniótica, de onde
em resposta a acontecimentos comunicativos concretos. É-o veio esse termo, os precursores da semiótica explícita e,
porque a própria prática social apenas se pode exprimir em por fim, a discussão sobre os dois termos que são empre-
forma de serniose. Os signos são, pois, uma força social e não gados para designar essa ciência, de um lado, serniologia
simples instrumentos de reflexo das forças sociais" (p. 226). e, de outro, serniótica. Os dois termos têm a mesma ori-
gem, ambos derivados do grego semeion, que quer dizer
1.19 Nõrh, Winfried. Panorama da Semiótica. De Platão a "signo". Tanto serniologia quanto serniótica etirnologi-
Peirce. São Paulo: Annablume, 1995 0998}, 154 pp. camente significam a ciência dos signos. A tradição do
nome semiologia deriva do lingüista genebrino Ferdinand
Conforme está expresso no próprio título, esse livro apre- de Saussure (1.1) que, no começo deste século, no seu livro
senta um panorama histórico da serniótica que se estende de Curso de Lingüística Geral, chamou de semiologia a ciência

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BibLiografia Comentada - Semiótica
L/leia Santaefla e Winfried Niith

dade diagramática na linguagem, símbolos em estrutura


que estuda os signos no seio da vida social. A tradição do
diagramáticas, diagramas sintagmáticos e paradigmático .
termo serniótica deriva do filósofo ernpiricista inglês J ohn
No caso da literatura, a teoria sígnica de Peirce é aplicada
Locke, no século XVII. Embora os dois termos continuem
às peripécias da personagem Alice, no País das Maravilhas e
a ser utilizados indiscriminadamente, desde 1969, por
Através do Espelho.
iniciativa do lingüista russo, radicado nos Estados U ni-
No quinto e último capítulo, o autor rediscute a teoria
dos, RomanJakobson, o termo oficialmente utilizado pela
peirciana no confronto com as questões colocadas pela ciên-
Associação Internacional de Semiótica passou a ser
cia cognitiva, que tem feito notável presença na conternpo-
semiótica, incluindo sob essa denominação também os
raneidade. As semelhanças e distinções entre cognitivismo
estudos de extração saussuriana.
e serniótica são postas em relevo, por meio de tópicos que
O segundo capítulo do livro é mais nitidamente his-
assim se expressam: história da filosofia da mente, cognição
tórico, estendendo-se dos gregos aos romanos, da Idade
na semiose, cognição, conceicualização e iconicidade, mo-
Média ao Renascimento, passando pelo racionalismo,
delos de cognição como modelos de semioses.
empirismo e iluminismo até chegar à semiótica do século
Enfim, esse livro panorâmico se destina a todos aque-
XIX. O terceiro capítulo, ainda no século XIX e inícios
les que têm interesse em compreender a multiplicidade de
do século XX, é inteiramente dedicado à semiótica de
aspectOs que o mundo dos signos é capaz de exibir.
Charles Sanders Peirce (1.10,1.11,1.12), apresentado como
"o mais importante dos fundadores da moderna semiótica
1.20 Deely, John. Introdução à Semiótica: História e Doutri-
geral" (p. 62). Esse é o capítulo central e mais longo do
na. Traduzido por Vivina de Campos Figueiredo. Lis-
livro. Nele, a complexa rede conceitual peirciana é descri-
boa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1995, 293 pp.
ta a partir das categorias fenomenológicas, base da teoria
Introducing Semiotics: Its History and Doctrine, 1982.
dos signos, até a classificação desses, com ênfase nas mais
conhecidas tríades dos quali-signos icônicos remáticos, sin-
Tendo como propósito introduzir o leitor ao ponto de
signos indiciais dicenres e legi-signos simbólicos argu-
vista serniótico, esse livro defende, antes de tudo, a conflu-
mentais.
ência essencial da lógica e da semiótica, mostrando como
O quarto capítulo é dedicado a uma amostragem da
uma inventa e reformula a outra continuamente, mesmo
aplicabilidade da teoria peirciana dos signos à investigação
que de modo reticular. É certo que essa confluência foi le-
da semiose da língua, de um lado, e da literatura, de outro.
vada ao seu apogeu na doutrina de signos de C. S. Peirce
No primeiro caso, são discutidas questões como: arbitrari-
(1.10,1.11,1.12). Entretanto, Deely demonstra que essa
edade versus iconicidade, o ícone verbal e seu objeto,
confluência já estava presente desde os gregos e latinos.
iconicidade versus autonomia literária, formas de iconici-

59
58
Lúcia Santaelia e \,(/infried Nijth Bibliografia Comentada - Semiótica

o livro se divide em duas partes. Na primeira, históri- Na primeira, o autor propõe que a noção de língua
ca, o autor estabelece um esboço da história da lógica do natural ainda espera por ser adequadamente explorada na
pontO de vista exclusivo de uma doutrina dos signos, como perspectiva semiótica, para tornar-se "progressivamente um
foi definida por John Locke sob a designação de serniótica. foco de pesquisa e análise para se entender a misteriosa
Do mundo antigo, grego e latino, o texto segue para o comunhão e inrerpenetração da natureza com a cultura que
desenvolvimento latino nativo e para a teoria da cognição transparece na antroposserniose" (p. 118).
entre os latinos. Tudo isso culmina na formação de uma Na segunda, Deely busca demonstrar que a cognição é
consciência serniótica no século XVII, na obra do filósofo equivalente a um processo de comunicação por meio de
ibérico Poinsot, mais conhecido como João de S. Tomás, signos, ou semiose, sendo necessário para isso considerar
em cuja obra, Tractatus de Signis, segundo Deely, pode ser que a função da significação é realizada em vários níveis da
encontrado o primeiro tratado sistemático de semiótica. vida cognitiva, começando na sensação e percepção.
De Poinsot, o autor caminha para Locke e Peirce, chegan- Por fim, a semiótica enquanto arquitetônica dos estu-
do até o presente. dos das comunicações é vista como lançando uma nova luz
A segunda parte, mais heurística do que histórica, di- sobre a noção de experiência, clamando, antes de tudo, por
rige-se para a indagação sobre as funções e o destino da uma reconceitualização da própria noção de experiência.
semiótica no século XX. Tenta refletir sobre a reorientação O livro apresenta ainda dois apêndices sobre a noção de
do pensamento possibilitada pelo ponto de vista semiótico, doutrina de signos e sobre a distinção entre palavra e idéais.
não em todas as áreas, mas, pelo menos, na área dos funda- As notas de rodapé são extensas e iluminadoras, co-
mentos do conhecimento e da experiência e na interface brindo quase cem páginas do volume. Também abundan-
dos tempos modernos com os pós-modernos. Deely defen- tes são as indicações bibliográficas.
de a tese de que "a semiótica pode conduzir a uma mudan-
ça de era tão profunda e total como aquela que sepatou os 1.21 Nõth, Winfried. A Semiótica no Século XX. São Paulo:
tempos modernos da era latina". Se lá a mudança foi pro- Annablume, 1996,314 pp.
vocada pela emancipação da ciência moderna, experimen-
tal e matemática, hoje é a atividade interprerativa da men- Esse livro pode ser visto como uma continuação do
te, tornando-se consciente do seu raio de ação, do seu volume anterior do mesmo autor, Panorama da Semiótica.
território e dos seus instrumentos que está produz~ndo a De Platão a Peirce. De fato, seguindo a cronologia das teo-
transição. Para demonstrar que a semiótica está no cerne rias semióticas a partir de Peirce (1.10, 1.11, 1.12), onde o
dessa questão, Deely dedica uma secção à linguagem, ou- panorama havia-se detido, esse segundo volume. começa
tra ao conhecimento e uma terceira à experiência. com Saussure (1.1), no início do século XX.

60 61
L/feia Santaefla e Winfried Notb
Bibliografia Comentada - Semiâtica

o livro se compõe de estudos monográficos das mais superestruturalismo. A semiologia barthesiana é explora-
importantes teorias semióticas deste século. Partindo de da desde as mitologias até a crítica professada por Barthes
Saussure (1.1), Hjelmslev (1.2), Jakobson, o autor se detém contra a semiótica estruturalista. O projero greimasiano é
na avaliação das influências desses estruturalistas sobre o acompanhado no seu desenvolvimento histórico, da narrato-
pensamento francês, na antropologia de Claude Lévy- logia às estruturas modais e aspectuais do discurso. A
Strauss, na psicanálise de Jacques Lacan, na história do co- semiótica culturalista de Eco é discutida à luz das conven-
nhecimento de Michel Foucault e na filosofia da lingua- ções e sistemas de códigos, limites que Eco impõe aosig-
gem de Jacques Derrida. Esses são seguidos pelo no. A ciência tridimensional dos signos de Morris, com
desenvolvimento da obra de Barthes (1.6), da semiologia à sua famosa divisão nos níveis sintático, semântico e prag-
semioclastia, pelo projero da narrativa do discurso de mático, é discutida nos paralelos evidentes de Morris com
Greimas (1.7, 1.8, lI.4, lI.5, lI.8), passando, então, pelo Peirce, de quem Morris sofreu grande influência, ainda que
campo semiótico do italiano Umberto Eco (1.17,1.18,11.14, não confessasse.
II .15, II1. 9) para terminar no projeto behaviorista de uma No penúltimo capítulo, em franca oposição a quais-
ciência serniótica unificada do norte-americano Charles quer tendências logocêntricas e antropocêntricas da
Morris (1.16). Tudo isso é arrematado por dois capítulos semiótica, de que as concepções de Umberto Eco são exem-
que substituem o teor monográfico dos capítulos prece- plares, o conceito semiótico das oposições é empregado para
dentes por uma discussão atual acerca da expansão das fron- a leitura das raízes da evolução e da vida, enquanto no úl-
teiras antropossemióticas para a investigação da semiose timo capítulo são exploradas as relações entre signo e meio
no cosmo e na biogênese, finalizando numa proposta da ambiente e entre organismo e meio ambiente.
eco e biossemiótica.
Um dos pontos altos desse livro está na extensa listagem
Escritos em 1996, esses estudos são bastante atual i- bibliográfica nacional e internacional, bastante atualizada
zados, evidenciando o desenvolvimento por que passaram que é apresentada no final do volume.
as teorias semióticas, seus desdobramentos recentes e re-
percussões, tudo isso em diálogo com os principais comen- 1.22 Rodrigues, Adriano Duarte. Introdução à Senziótica.
taristas dessas teorias. Os conceitos lingüísticos de Saussure Lisboa: Editorial Presença, 1991, 126 pp.
são analisados do ponto de vista de sua expansão semio-
lógica. Hjelmslev é avaliado em termos de suas contribui- Com a intenção de apresentar alguns conceitos bási-
ções para a semiótica. Jakobson é visto como criador de cos, seguidos das mais importantes correntes da semiótica
uma semiótica funcionalista. O legado do estruturalismo é moderna, esse livro se inicia com uma apologia à lingua-
discutido no seu reaparecimento através do pós-neo e gem verbal, uma vez que a coloca como sistema semiótico

62 63
Lucia Santaella e Wil1fried Nijth Bibliografia Comentada - Semiótica

privilegiado: "todos os fenômenos que o homem percepciona, como o signo é enunciado. Por fim, os signos possuem tam-
concebe, comunica e interpreta têm na linguagem [verbal} bém uma significação. Essa corresponde ao conceiro, à
o seu ponto de partida e o seu ponto de chegada" (p. 10). convencionalidade dos sistemas de signos.
O segundo capítulo trata das fronteiras da semiótica, Os capítulos subseqüentes são dedicados às diferentes
aqui definida como o estudo do conjunto das significações. escolas da semiótica, começando pela tradição européia, com
Nitidamente inspirado nas concepções semióticas de Ferdinand de Saussure (1.1). Os principais conceitos dico-
Urnberto Eco (1.17, 1.18, II.14, 11.15), o autor localiza o tômicos da lingüística estrutural saussuriana (significante
campo da serniótica entre um limiar inferior e um limiar vs. significado, mutabilidade vs. imurabilidade, sincronia
superior. Abaixo do limiar inferior da semiótica estão os vs. diacronia) são explicitados, sendo seguidos pelos con-
fenômenos não-semióticos que o homem partilha com o ceitos também dicotômicos da teoria da linguagem do lin-
restante dos seres vivos, fenômenos estudados, por exem- güista dinamarquês Louis Hjelmslev (1.2): processo vs. sis-
plo, pela física, neurofisiologia, biologia e genética. É o tema, expressão vs. conteúdo, forma vs. substância.
mundo dos sinais que se distinguem dos signos, esses o Um outro capítulo é dedicado aos dois movimentos
verdadeiro objeto da semiótica. Acima do limiar superior de jovens universitários que, nas duas primeiras décadas
do campo semiótico, situa-se o indizível e inomeável, quer deste século, criaram na antiga União Soviética os dois cír-
dizer, as chamadas concepções de mundo, o mítico, o ideoló- culos literários e estéticos que marcaram "decisivamente o
gico e os aspectos funcionais ou utilitários das obras cultu- quadro teórico e metodológico não só da serniótica, mas
rais (p. 19). Limitado por essas duas balizas, o campo semió- do conjunto das ciências humanas do nosso século" (p. 46):
rico propriamente dito caracteriza, segundo o autor, os o Círculo Moscovita de Lingüística, fundado por Roman
processos que fazem intervir agentes humanos, referindo- Jakobson, mais tarde ampliado no Círculo Lingüístico de
se ao domínio dos objetos e das manifestações culturais. Praga e a Sociedade para o Estudo da Língua Poética, mais
O terceiro capítulo, ainda preliminar, trata das questões conhecida por Opoiaz. Sob a denominação genérica de
da referência, manifestação e significação. O projeto semiótico formalismo, em sincronia com a emergência criativa do
começa pelo questionamento da referencialidade dos signos. futurismo russo, a Opoiaz se projetou pela Europa e Esta-
Quer dizer, como e por que um signo é capaz de se referir às dos Unidos, juntamente com as descobertas fonológicas
coisas e estados de coisas do mundo real ou fictício? Mas os do Círculo Lingüístico de Praga.
signos também manifestam nossa relação com aquilo que Um brevíssimo capítulo é, então, dedicado ao tema do
exprimem: "crença, convicção, dúvida, interrogação, apelo, alargamento da teoria européia do signo, quando aparece o
paixão, indiferença, etc." (p. 25). O valor da manifestação nome do ensaista francês Roland Barthes (1.6) como res-
do signo depende de sua estratégia enunciativa, do modo ponsável pela divulgação da proposta hjelmsleviana para o

64 65
Bibliografia Comentada - Semiâtica
Lúcia Santaella e Winfried Nõtb

um "Cenário" que é seguido pela introdução à teoria, ca-


alargamento da teoria da linguagem numa arquitetura
minhando para aplicações na sua segunda metade. Por fim,
conceitual formada por encaixes superpostos de um siste-
em um breve apêndice, o autor introduz a questão da "refe-
ma denotativo, um metassemiótico e um conotativo. Essa
rencialidade" .
arquitetura, segundo do autor, é tomada como modelo para
O "Cenário" apresenta definições da semiótica, o tri-
a constituição de semióticas especializadas (literária, nar-
ângulo de Odgen e Richards (de 1923) e uma discussão
rativa, do espaço, do cinema, da moda, da publicidade erc.)
sobre a diferença entre linguagem objeto e metalinguagem.
no âmbito da escola semiôtica da Paris, fundada nos anos 60
Uma breve história da semiótica inclui passagens curtas
por Greimas (1.7,1.8).
sobre Saussure (1.1), Hjelmslev (1.2), Barthes (1.6), Peirce
O tema a seguir é o da semiótica narrativa, que teve
(1.10, 1.11, 1.12), Morris (1.16) e Sydney lamb, finalizan-
seu primeiro inspirador no estudioso da literatura popular,
do com comentários acerca de uma lista de disciplinas afins
o russo Vladimir Propp. Na esteira de Propp, o narratólogo
à semiótica (pp. 21-22).
francês Claude Bremond propôs a modelização lógica das
O tópico sobre "O movimento semiótico atual" é ba-
estruturas narrativas. Também inspirado em Propp,
sicamente uma bibliografia de obras mais conhecidas na
Greimas configurou sua semântica estrutural, gradativa-
semiótica até 1980. Segue-se um tópico sobre "Dois clás-
mente alargada para manifestações culturais mais vastas.
sicos: Saussure e Peirce", em seguida "Generalidades sobre
Um capítulo mais longo é dedicado, por fim, ao que o
a função sem iótica" e, por fim, uma discussão sobre "O
autor chama de tradição da semiótica anglo-saxônica, quan-
imperialismo sem iótico" na qual o autor anuncia sua preo-
do a semiótica de C. S. Peirce (1.10, 1.11, 1.12) é inserida
cupação com a abrangência da semiótica, ocupada com um
no contexto da filosofia pragmatista. A explanação das ca-
número excessivo de temas.
tegorias fenomenológicas é seguida da classificação dos sig-
O segundo capítulo do livro sobre "Teoria" tem início
nos. Ainda dentro desse mesmo capítulo, o filósofo da lin-
com uma introdução ao conceito de signo que toma por
guagem inglês,John Austin, e os lingüistas Oswald Ducrot
base definições de lingüistas como Pottier, Bloomfield e
(francês) e Émile Benveniste (belga) são também discuti-
Sydney Lambo Essa apresentação inclui reflexões sobre a
dos dentro de um contexto pragmático.
natureza do código.
Os tópicos seguintes tratam do texto CCodificação e
1.23 Couro, Hildo Honório do. Uma Introdução à Semiótica.
decodificação"), aprofundando a visão do lingüista S. lamb
Rio de Janeiro: Presença, 1983, 162 pp.
sobre a estratificação dos textos e signos, do conceito de
ódigo, sistema e dos signos, incluindo uma discussão acer-
O pano de fundo dessa introdução à semiótica é a lin-
a dos "Graus de sernioticidade", baseada na idéia de que
güística estrutural. O livro começa com a apresentação de

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66
Lucia Santaelfa e Winfried Nõtb
Bibliografia Comentada - Semiótica

existe uma" escala que vai de 0% a 100% de semioticidade. Esse projeto funciona como uma introdução à serniótica
No extremo 0% de semioticidade estariam os dados bru- em um nível elementar. A introdução apresenta alguns
tos da natureza. No extremo 100% estaria a língua. Pode- princípios da lingüística da semiologia de F. de Saussure
ríamos pôr nesse extremo o macro-código cultural como (1.1), cuja obra é apreciada como "um salto à frente na his-
um todo. No entanto, como a sisremaricidade é um ingre- tória da lingüística geral". Os autores tiram essas conclu-
diente para que determinado fenômeno seja considerado sões do ensino saussuriano (p. 9): "Cada indivíduo é antes
alto na escala de semioticidade, parece mais correto colo- de tudo um sujeito social: a tal título, está ele submetido
car aí a língua" (p. 63). inteiramente às leis da evolução histórica. Mas a realidade
Depois de mais um tópico introdurório sobre "Sernió- lingüística e sua primeira extensão ao domínio das práti-
rica e teoria da comunicação" (no qual aparecem Saussure, cas significantes lembra-nos com insistência que o sujeito
Jakobson e Shannon/Weaver até Jakobson, o livro se abre falante, que o sujeito significante só pode inserir-se nas
para as "Aplicações". estruturas significantes que estão à sua disposição. Ele não
Nessa parte, o autor expõe que, na sua visão, a semiótica pode, pois, obedecer senão às leis do significante. E essas
inclui a lingüística. Uma grande parte, dedicada à "Sernió- são por si mesmas formas sociais, codificadas, historica-
tica da língua", trabalha com os subcódigos lingüísticas mente determinadas."
da semântica, sintaxe, morfologia e fonologia. Mais uma No capítulo seguinte sobre o "Projeto serniótico", re-
vez aqui, O autor dá atenção especial à obra do lingüista S. velando pouco conhecimento da obra peirciana, os autores
Lamb. fazem afirmações estranhas sobre Peirce (1.10,1.11,1.12)
"Serniórica da cultura", "Serniótica da arte" e "Sernióti- como um "estudioso de axiomática" que quis "elaborar uma
ca rnetacientffica" são os tópicos restantes. A discussão in- doutrina formal das condições que um discurso deve satis-
clui referências às semióticas francesa e russa e à erologia fazer para ter um sentido" (pp. 13-14).
nas suas conexões semióticas. Muitos temas si ruam-se em Émile Benveniste, Umberto Eco (1.17, 1.18, II.14,
um território fronteiriço entre a lingüística e a teoria da II .15), J ulia Kristeva (lI 16) e Charles Morris (1.16) são
cultura: toponímia, antroponímia, sociolingüística e introduzidos como fundadores da semiótica. Os escritos
semiótica do texto literário. de Morris, dizem os autores, prolongaram os trabalhos de
Peirce, imprimindo-lhes uma inflexão behaviorista (p, 16).
1.24 Carontini, Enrico e Daniel Peraya. O Projeto Semiâtico. O comentário que se segue a uma das definições de
Elementos de Semiótica Geral, traduzido por Alceu Dias signo de Peirce é que o modelo peirciano "poderia fazer
Lima. São Paulo: Cultrix/EDUSP, 1979, 134 pp. Le pensar no triângulo de Odgen & Richards". Entretanto, a
Projet Sémiotique, 1975. diferenças entre as duas tríadas (signo-abjeto-interpretam"

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Lúcia SantaeLla e Winfried Noth
Bibliografia Comentada - Semiótica

de Peirce vs. símbolo-referente-referência de Odgen &


de Barthes sobre o vestuário. Nesse capítulo, o conceito
Richards) não são um tema a ser explorado no livro.
aparentemente tautológico de "signo serniólogico" é in-
Da semiótica de Peirce é apresentada a tríade ícone,
troduzido para se referir a signos não-lingüísticos. Apesar
índice, símbolo. Os autores acham que, apesar das diferen-
do título, esse capítulo também inclui a discussão de algu-
ças entre Peirce e Saussure, esses dois fundadores "encon-
mas idéias semióticas de Urnberto Eco.
tram-se numa intenção comum: tornar possível a apreen-
O último capítulo, sobre a semiótica e a teoria das ideo-
são de todo fato de cultura e de toda prática social como
logias, começa com uma introdução a idéias neo-marxistas
uma linguagem" (p. 24). Outros fundadores, discutidos a
de Louis Althusser. A ideologia, para esse autor, "interroga
seguir, são Kristeva (Il.16), Barthes (1.6), Buyssens (1.4),
o real sob o modo da desfiguração e da mistificação, servin-
Mart inet (1.3) e Prieto (1.5). A discussão em torno desses
do assim aos interesses de uma classe. Ela toma forma num
autores se concentra na questão da relação entre lingüísti-
processo especular em que se enunciam respostas a pergun-
ca e semiótica e a aplicabilidade do modelo lingüístico ao
tas que só existem para suscitar mais respostas" (p. 107).
estudo de sistemas não-lingüísticos.
A segunda parte desse último capítulo trata da "des-
Num longo capítulo que examina mais pormeno-
construção radical da noção do signo e a sua substituição
rizadarnente o modelo da lingüística saussuriana e o mo-
pela noção do texto" na semanálise de Kristeva, pois, para
delo fonológico, os autores entram, felizmente, numa
esta, a semiótica é uma "produção de modelos" e um "lu-
temática com a qual, certamente, têm mais familiaridade
gar de contestação". A semiótica, enfim, "só pode fazer-se
do que têm com a semiótica de Peirce. Os elementos do como crítica da serniótica" (p. 113).
modelo saussuriano incluídos na introdução são: língua/
fala, signo-significante-significado, arbitrariedade/motiva-
I.25 Teixeira Coelho Netto, José. Semiótica, Informação e
ção, valor, segunda articulação (conceito extraído de Comunicação. Diagrama da Teoria do Signo. São Paulo:
Marrinet) e sintagma/paradigma. A discussão fica restrita Perspectiva, 223 pp.
às estruturas lingüísticas, sem indicação das possibilidades
de transferência dos conceitos para outros sistemas sígnicos. Em um nível introdutório, esse livro apresenta um dia-
O exame dessas possibilidades começa no capítulo se-
grama da teoria do signo em quatro partes principais: (1) a
guinte sobre "A semiologia como translingüística: o pro-
serniologia na tradição saussureana (1.1); (2) a semiótica de
jeto semiótico de Roland Barthes". Um novo princípio
,. S. Peirce (1.10,1.11,1.12); (3) a teoria da informação e
línguo-semiótico é introduzido, o princípio estruturalista
(4) uma breve teoria da comunicação.
de pertinência, seguido pelo exame das extensões dos con-
A apresentação da semiótica na tradição da lingüística
certos lingüísticos para sistemas não-verbais nos estudos (' emiologia saussuriana começa com definições dos con-

70 7l
Lzici« Santaella e Winfried Nijth
Bibliografia Comentada - Semiótica

ceitos básicos do Curso de F. de Saussure e de seus sucesso-


Numa comparação entre Hjelmslev e Peirce, Teixeira
res (Buyssens (1.4), Prieto (1.5), Barthes (1.6): língua/fala,
Coelho chega à conclusão de que a preocupação formalista
código/mensagem, signo, símbolo e sema, significação e
e irnanenre da semiótica bjelmsleviana "foi a causa de sua
valor, denotação/conotação, paradigma/sintagma.
fraqueza e a razão para os ataques contra uma semiótica da
Da semiótica de Hjelmslev (1.2) o autor inttoduz os
qual se dizia, com razão, não ser outra coisa senão um estu-
conceitos de esquema/uso, signo/figura, função semiótica:
do formal de relações abstratas a excluir o homem e a rea-
expressão/contéudo e semiologia/semiótica.
lidade" (p. 65).
No contexto de uma introdução à semiologia de
Outros elementos da serniótica peirciana introduzidos
Mounin, segue-se uma discussão sobre a distinção entre
nesse capítulo são o conceito e a divisão do objeto e do
semiologia da comunicação e a semiologia da significação.
interpretante do signo. Nesse contexto, surge uma breve
A semiologia da comunicação nessa tradição trata de si-
discussão dos conceitos de sentido, significado e significa-
nais, "fatos perceptíveis ligados a estados da consciência e
ção de Lady Welby, a correspondente de C. S. Peirce, de-
produzidos expressamente para dar a conhecer esses esta-
pois de 1900.
dos", enquanto a semiologia da significação trata de fatos
Entre o capítulo sobre Peirce e a teoria da informação, o
que se evidenciam "como sustentados por índices ou mei-
autor insere uma série de ensaios sobre temas como a ideolo-
os não produzidos voluntariamente por um emissor e não
gia do signo, o discurso burocrático, a semiótica e a semiofania
reconhecidos como meios que tentam exercer aquela influ-
(que permite ao signo aparecer em vez de escamoreá-lo).
ência" (pp. 41-42). O autor critica essa distinção entre si-
O capítulo sobre a teoria da informação introduz como
nal e índice visto que ela é superada pela classificação de
instrumental necessário os conceitos de informação, men-
signos proposta por Peirce.
sagem, repertório, audiência, originalidade, entropia, inte-
A introdução à semiótica de C. S. Peirce começa com
ligibilidade e redundância, código e informação, quanti-
sua conrexrualização no quadro da filosofia. Depois de uma
ficação da informação, forma e estética.
definição do signo peirciano, segue-se a divisão dos signos
Na sua discussão desses instrumentos e modelos teóri-
em: (1) ícone, índice e símbolo; (2) quali-signo, sin-signo e
cos, o auror roma posições críticas e ideológicas contra o
legi-signo; (3) rema, dicenre e argumento. As bases catego-
objetivismo problemático da teoria da informação e adver-
riais dessa classificação (primeiridade, secundidade e
te, por exemplo, no contexto da teoria informacional da
terceiridade) são apresentadas e seguidas de um resumo que
estética, contra "um novo mundo programável" e "um uni-
introduz as dez classes de signos peircianos. O autor consi-
verso concentracionário nos mesmos moldes de outros já
dera que, ao esboçar a fundação do signo nas três categorias,
existentes ou que já existiram, construídos pelos facismos
Peirce chegou a "um segundo conceito de signo" (p. 64).
de variada coloração" (p. 191).

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73
L/teia Santaella e \Vinfried NiJth Bibliografia Comentada - Semiótica

A introdução à teoria da comunicação é breve. Com à lógica ternária de sua serniótica, quer dizer, uma serniótica
referência ao modelo de Shannon e Weaver, o autor ques- construída dentro do modelo lógico ternário do signo, a
tiona a idéia de uma engenharia humana e critica a con- teoria da percepção peirciana evidencia o papel que a per-
cepção paternalista da comunicação. Por fim, são discuti- cepção desempenha nos processos cognitivos.
das algumas noções de comunicação e ideologia sob a Nesse livro, Santaella busca transmitir, numa lingua-
influência de Julia Kristeva (11.16), seguidas de um mo- gem acessível ao leitor, como se arma o processo triádico
delo para a comunicação que enfariza a necessidade da da percepção no qual se destacam três componentes bási-
análise da comunicação dentro de algum domínio da psico- cos: (1) o percepto, (2) o percipuum e (3) o julgamento
logia, ou melhor, da psicanálise e da sociologia, história, perceptivo. O percepto se refere àquilo que costuma ser
economia, filosofia, da matemática e, até mesmo, da físi- chamado de estímulo, àquilo que se apresenta para ser per-
ca, pelo menos como método de investigação (p. 211). cebido, o elemento de compulsão e insistência na percep-
ção. O percipuum se refere ao modo como o percepto é
1.26 Santaella Lúcia. Percepção. Uma Teoria Semiótica. São filtrado pelos sentidos, adquirindo características próprias
Paulo: Experimento, segunda edição, 1998, 120 pp. ao sistema sensório do perceptor. O julgamento de percep-
ção se refere ao modo como o percipuum é imediatamente
Nesse livro o leitor encontrará um estudo monográfico colhido e absorvido nos esquemas mentais interpretativos
sobre a teoria da percepção como parte integrante da de que o perceptor está dotado. Esses conceitos são discuti-
semiótica de C. S. Peirce (1.10, 1.11, 1.12). Todas as conhe- dos nos capítulos IV e V do livro: "Teoria da percepção I:
cidas teorias da percepção, tanto na filosofia quanto na psi- uma síntese" e "Teoria da percepção II: passado e presente".
cologia, são teorias assentadas sobre bases binárias, quer São também trabalhados nesses capítulos os papéis da
dizer, sobre o binômio de (1) um sujeito que percebe e (2) iconicidade, indexicalidade e simbolicidade na percepção,
um objeto percebido. Em oposição a essa pretensa aparên- junto com o exame da questão da continuidade da per-
cia binária, Peirce desenvolve sua original teoria triádica cepção e as funções que a memória e antecipação nela de-
da percepção. sempenham.
Nos textos anticartesianos, escritos em sua juventude, Tudo isso foi precedido de um panorama da semiótica
Peirce já desenvolvera a idéia de que todo pensamento se I ara familiarizar o leitor com os conceitos que estão tam-
dá em signos. Sua semiótica, concebida como lógica num bém implicados na percepção. Além disso, antes de apre-
sentido amplo, é o estudo da natureza e da função dos sig- sentar a síntese de seu próprio entendimento da teoria da
nos, o que são e como operam os signos e, através deles, percepção peirciana, a autora dialoga com todos os outros
como opera o próprio pensamento. Mantendo a fidelidade Intérpretes e comentadores que trabalharam com a teoria

74 75
Ltaia Santaella e Winfried Nõth
Bibliografia Comentada - Semiótica

da percepção de Peirce, tais como Richard Bernstein, Robert


digas. "O que nos importa é mostrar as partidas de senti-
Almender, Carl Hausman, Joseph Ransdell e Sandra
dos, não as chegadas. O que fundamenta o texto não é uma
Rosenthal.
estrutura interna, fechada, contabilizável, mas o desembo-
car do texto em ourros textos, outros códigos, outros sig-
1.27 Chabrol, Claude (org.). Semiótica Narratiua e Textual,
nos; o que faz O texto é o interrextual" (p. 39)
traduzido por Leyla Perrone-Moisés et al. São Paulo:
Dessa maneira, Barthes chega a associar as lexias com
Cultrix, 1977 ,239 pp. Sémiotique Narrative et Textuelle,
um número indeterminado de códigos culturais, dividi-
1973.
dos em científicos, simbólicos, narrativos, cronológicos,
retóricos, metalingüísticos e comunicativos.
Em oito artigos, essa coletânea apresenta vários temas
da semiótica narrativa na tradição de Propp e do estrutura-
A própria palavra código não deve ser entendida aqui no
lismo discursivo dos anos 60 e 70.
sentido rigoroso, científico de termo. Os códigos são sim-
No primeiro artigo, Chabrol examina "alguns proble-
plesmente campos assoc iar ivos , uma organização
mas de gramática narrativa e textual", esboçando o cami-
supratextual de anotações que impõe certa idéia de es-
nho da lingüística estrutural e frasal até a lingüística e prag-
trutura: a instância do código, para nós, é essencialmen-
mática do discurso e à semiótica discursiva de Greimas.
te cultural: os códigos são determinados tipos de já-vis-
A contribuição de Barthes está voltada para a "Análise
to, de já-lido, de já-feito. O código é a forma desse já
textual de um conto de Edgar Poe". Num ensaio clássico
constitutivo da escrita do mundo (p. 58).
de análise estrutural e textual, o autor começa com o mé-
todo estruturalista de recortar o texto em 15 O segmentos
Sorin Alexandrescu, no artigo seguinte, estuda um tex-
curtos , de um até três frases. O autor introduz o termo
.
to de Maupassant numa abordagem mais estruturalista,
lexia para essas "unidades de leitura" ou "significanres tex-
distinguindo entre a enunciação e o enunciado do texto e
tuais". Em seguida, uriliza um método bem menos estru-
estabelecendo oposições semânticas que se articulam em
turalista: para cada lexia, determina os sentidos (lexicais e
eixos semânticos tal como natureza, O cósmico, espaço ou
gramaticais), as conotações (associações) e as relações tex-
tempo. Inspirado pelo modelo sígnico de Hjelmslev (I.2) e
tuais para chegar até uma explicação do texto. Num ter-
pela teoria greimasiana (I. 7, I.8) das isotopias textuais, o
ceiro passo metodológico, Barthes vai bem além de uma
autor chega a um modelo do conjunto textual.
explicação estrutural do texto, estendendo a interpretação
"A morfologia do conto maravilhoso francês", de
por meio de um "infinito cornbinarório" com associações
Claude Bremond, a seguir, é um estudo clássico na história
que se referem a elementos culturais que ele chama de có-
da semiótica narrativa. Partindo da idéia básica de que o

76
77
Bibliografia Comentada - Semiâtica
Lucia Santael/a e Winfried Nõtb

1.28 Segre, Cesare. Os Signos e a Crítica, traduzido p r


contO maravilhoso é esrrururado com base nas três seqüên-
Rodolfo Ilari e Carlos Vogt. São Paulo: Perspectiva,
cias (1) degradação - melhoria, (2) meriro - recompensa e
1974,295 pp. I Segni e Ia Critica, 1969.
(3) demérito-castigo, Bremond desenvolve uma ripologia
complexa das combinações e inter-relações entre essas se-
Esse volume documenta a transição da fase do estrutu-
qüências básicas, na sincronia e diacronia dos textos ,
ralismo para a serniórica na teoria literária italiana. O livro
exemplificando com um grande número de contos.
consiste de duas partes. A segunda parte, que trata da aná-
No quinto estudo do volume, Pierre Maranda analisa
lise de textos de autores como Gonçalves Dias, A. Macha-
o conto 'Cinderela', examinando as relações entre os ele-
do, V. Chklóvski, Garcia Marques etc. não será abordada
menros centrais (personagens, motivos) com o método da
nesta apresentação, visto que a fatia de mais interesse para
teoria dos grafos, dando ênfase especial a relações metafó-
ricas e metonírnicas. a semiótica da literatura se concentra na introdução e na

"Teoria e prática do estudo da narrativa literária" é o pflmelra parte.


No prefácio, Segre fala do "horizonte semiológico" nos
tema da contribuição de Siegfried J. Schmidt que se apoia
estudos literários na era do estruturalismo dos anos 60:
em Wittgenstein, a teoria da ação e a lingüística estrutural
e textual. Um texto literário, para ele, é "um jogo de atos
Este livro quer mostrar que não só a semiologia não subs-
de comunicação" no qual a função do ouvinte é a de um co-
titui o estruturalismo, mas o continua e completa. Dei-
produtor.
xando de lado o interesse meramente lingüístico das es-
O artigo seguinte, "Os atuantes, os atores e as figuras", é
uma introdução a alguns dos elementos da semiótica narrati- truturas, fonéticas, sintáticas, lexicais etc., interessam ao
leitor e ao crítico os significados que essas estruturas des-
va e discursiva de Greimas, que já estão descritos em mais
detalhes em outras obras de referência sobre Greimas inclu- prendem. A crítica conreudísrica interessa-se, certamen-

sas nesse volume de bibliografia comentada (ver 1.9 e lI.3) te, por esses significados, mas o faz prescindindo do modo

A última contribuição, "Gramáticas textuais e estru- como eles são instituídos, e portanto prescindindo da ati-

ruras narrativas" é de Teun A. van Djik. Sua abordagem vidade significativa que constitui a verdadeira natureza

segue modelos da lingüística textual e gerativa, com apli- da obra literária. Em vez disso, a crítica semiológica de-

cações de fórmulas da lógica proposicional e da lógica de veria realizar um contínuo vaivém entre as estruturas (vis-

ação, focalízando na "rnacroestrutura textual" da narrativa tas como signos, blocos de signos e superposições de sig-

que caracteriza a estrutura profunda do texto narrativo como nos) e os significados, que são duas faces da mesma

uma seqüência mínima de proposições sobre atores huma- realidade: deixando entrever uma possível superação da

nos, ações e processos. velha antinomia forma-conteúdo (p. 13).

78 79
Lúcia Santaella e Winfried Nõth Bibliografia Comentada - Semiótica

Os estudos da primeira parte estão voltados para os se capítulo destacam-se, sobretudo, a iconicidade da litera-
seguintes tópicos: "Crítica e estruturalismo", "A crítica tura (p. 115), a conotação e as normas e hábitos literários.
estruturalista", "A síntese estilística", "Rumo a uma críti- Na conclusão, Segre, mais uma vez, sublinha a
ca serniológica", "O estruturalismo na Itália", "Entre es- complementaridade do esttuturalismo e da semiologia li-
truturalismo e serniologia". A seqüência desses capítulos terária: "A semiologia completa a análise estrutural por-
marca a passagem do estruturalismo italiano para a que reivindica o objeto finalmente sêmico, nela implícito,
semiologia literária. No início, Segre apresenta a aborda- mas ameaçado de sacrifício em face das observações de or-
gem estruturalista nos estudos literários desde Jakobson e dem gramatical. Ela reconstitui, portanto, a solidariedade
Mukarovsky (11.18), com os seus fundamentos na obra de de expressão-significado e até insiste para que a interpre-
Saussure (LI). Em Saussure, Segre vê a origem da semiologia tação não privilegie nunca uma das duas faces da comuni-
literária. O seu artigo "Rumo a uma crítica serniológica" cação artística" (p. 127).
introduz a semiologia dos anos 60. Barthes (1.6), Buyssens
(1.4), Eco (1.17, 1.18) e Metz (L 3 5) são os semioticistas 1.29 Pignatari, Décio. Semiótica e Literatura. São Paulo:
apresentados. Perspectiva, 1974, 183 pp.
Em "O estruturalismo na Itália", o autor fornece um
panorama da crítica italiana dos anos 60, apresentando vá- Marcado pela 'perseguição' a Charles Sanders Peirce (1.10,
rias análises de obras literárias italianas à luz dos princípi- 1.11, 1.12), perseguição a que o autor deu início já em 1959,
os da estilística e da crítica estruturalista. Segre faz um este livro é pioneiro, no Brasil, na aplicação da fenomenologia
percurso que parte do estruturalismo até desembocar na e semiótica peircianas ao universo da literatura. Tomando
semiologia. Sobre isso, o autor afirma: "O estruturalismo, partido de Peirce em oposição à semiologia, Pignatari afirma
aceito como método descritivo, continua sendo instrumento que "Peirce é o Marx da linguagem" (p. 10).
seguro para a descrição dos sistemas significativos, de suas O livro, que teve edições subseqüentes, revistas e au-
relações e deslocamentos; a semiologia oferece um quadro mentadas, na editora Cultrix, abre-se com uma discussão
conjunto, um modelo para colher com a maior completude obre o método. Inspirado em Valéry ("O método de Leo-
essas relações e esses deslocamentos" (p. 102). nardo") e em Peirce, o autor propõe um método por exce-
O capítulo "Entre estruturalismo e semiologia'' come- lência criativo: o heurfstico-serniótico, um quase método.
ça com uma pequena história da semiótica desde Saussure capítulo seguinte apresenta a semiótica de Peirce, to-
(1.1) e Peirce (1.10,1.11,1.12), antes de focalizar os semioti- mando como ponto de referência sua proro-estérica. Aí são
cistas da literatura e dos mitos: Lévy-Strauss, Barthes (1.6), apresentadas as categorias fenomenológicas, primeiro, se-
Jakobson e Eco (1.17,1.18). Entre os temas semióticos des- gundo e terceiro, seguidas da definição da relação triádi a

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Lúcia Santaella e Winfried Nijth
Bibliografia Comentada - Semiótica

ou sígnica, que se demora na questão do ícone para explo- 1.30 Bliksrein, Izidoro. Kaspar Houser ou A Fabricação da
rar, a seguir, as inferências associativas: contigüidade e se- Realidade. São Paulo: Cultrix/Edusp, 1983,99 pp.
melhança. Depois de encontrar no "chá com madeleines" o
modelo exemplar das "inferências associativas e da nature- Inspirado pela perplexidade no olhar de Kaspar Houser,
za gerativa e generativa do signo icônico-poérico", o autor personagem de um filme de Herzog, Blikstein revisita nesse
trabalha a "preto-estética de Peirce como uma racionalidade ensaio o tema clássico da relação entre linguagem, percep-
concreta". O capítulo é finalizado com "um breve aceno à ção, conhecimento e realidade. Kaspar Houser foi criado
teoria do quali-signo" e uma leitura de "Peirce como artis-
num sótão, sem nenhum contato humano até os 18 anos.
ta quirográfico" (Peirce realizou quirogravuras do poema
Privado das funções semióticas, Kaspar é um estranho em
O Corvo de E. A. Poe),
um mundo que lhe é estranho. "Procurando desvendar os
O capítulo seguinte, dedicado ao tema da "Revolução enigmas do filme", Blikstein situou-se "num entroncamen-
industrial", interpreta esse fenômeno fazendo menções a to por onde passam a lingüística, a semiologia, a antropo-
obras literárias de poetas e escritores (principalmente Poe logia, a teoria do conhecimento etc." Munido da hipótese
e Carroll) que incorporaram a revolução na própria lingua- eminentemente semiótÍSa de gue "a si _nifica ão do mun-
gem, transfigurando-a.
do deve irromper antes mesmo da codifição lingüística com
O capítulo quatro tem o sugestivo título de "Decifra-
que o recortamos (o~ignificados já vão sendo desenhados
ções sernióticas". Voltam leituras de contos de Poe rentes
na própria percep\~o/cognição da realidade),', o autor bus-
ao significante e à letra (decifrações), seguidas por análises -- ---
ca responder às seguintes questões: "Até que ponto o uni-
do Brás Cubas machadiano e dos processos de multis-
verso dos signos lingüísticos coincide com a realidade
significação do "Lance de Dados" mallarmaico.
"extralingüística? Como é possível conhecer tal realidade
Os capítulos que vêm a seguir constituem uma espé-
por meio de signos lingüísticos? Qual o alcance da língua
cie de segunda parte do livro sob o título de "Outros códi-
sobre o pensamento e a cognição?" (p. 17).
gos". O primeiro deles é o cinema novo, visto pelo ângulo
As perguntas são de fato enfrentadas e respondidas de
da criação de uma linguagem. O segundo são "Dez jingles
modo saboroso no decorrer no texto, entremeado, como
para Oswald de Andrade", seguido pela leitura do "tempo
não poderia deixar de ser, por reproduções das enigmáticas
e da têmpera" em Volpi. Um breve texto sobre Antonio
telas de Magritte.
Manuel, uma saudação_pós-tropicalista ao tropicalisrno,
Após a apresentação, o segundo capítulo discorre, à
comentários-relâmpagos sobre encontros com artistas-
luz de Saussure (LI), sobre "Signo, significação e realida-
músicos e a interrogação "Você sabe ler objetos"? finali-
de". No terceiro capítulo, Ogden e Richards tomam o lu-
zam o livro.
gar de Saussure como suporte teórico. O célebre triângulo

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83
Bibliografia Comentada - Semiôtica
Lúcia Santaella e Winfried Notb

na dimensão da práxis vital, o homem cognoscente de-


de Ogden e Richards (símbolo, referente e referência ou
senvolve, para existir e sobreviver, mecanismos não ver-
pensamento) é colocado sob exame para ser comparado, no
bais de diferenciação e de identificação: para mover-se no
capítulo seguinte, aos triângulos de Ullmann, Baldinger e
tempo e no ~~o de sua c~munidade, o indivíduo esta-
ao trapézio de K. Heger.
belece e articula traços de diferenciação e de identifica-
O capítulo V discute as questões semiológicas trazen-
ção, com os guais passa a discriminar, reconhecer e sele-
do de volta Ogden e Richards em diálogo com Umberto
cionar, por entre os estímulos do universo amorfo e
Eco (1.17, 1.18, 11.14), com ênfase na 'profissão de fé'
contínuo do real, as cores, as formas, as funções, os espa-
semiológica de Eco sobre a falta de pertinência do referen-
ços e tempos necessários à sua sobrevivência (p. 60).
te. Para Eco, a semiologia passaria muito bem sem a dis-

hipertr~f~
-
cussão do referente. (Não é de se espantar, a partir disso, a
das funções dOS....
-
LÓdigQse do inté~prete na obra
- . O livro termina com três capítulos sugestivos sobre
de Eco!). - --- "Serniose não verbal e pensamento visual", "Língua e re-
produção da práxis" e "Língua e subversão da práxis''.
Tomando uma posição contrária a Eco ("o fato de o
referente ser extralingüístico não significa que deva ficar
1.31 Guinsburg,Jacó,José Teixeira Coelho Netto e Reni Cha-
fora da lingüística", p. 39), Blikstein reflete sobre "A mo-
ves Cardoso (orgs.). Semiologia do Teatro. São Paulo: Pers-
delagem lingüística do universo" no capítulo VI. Essa
pectiva, 2a. edição revista e aumentada, 1988,380 pp.
reflexão se amplia no capítulo seguinte, dedicado especi-
almente à "Captura do referente". Sob o título "Praxis ,
Esse volume reúne perto de vinte artigos sobre a
referente e linguagem", o oitavo capítulo interpreta com
semiótica do teatro de autores tchecos, poloneses, franceses,
segurança os 'enigmas' de Kaspar: "o sistema erce tual"
italianos e brasileiros. As abordagens são múltiplas, mas o
de Kaspar "está desaparelhado de uma prática social", pois
estruturalismo serniótico, desde os anos 60 até os 70, é um
"é nessa prática social ou práxis que residiria o mecanis-
dos denominadores comuns. "A linguagem do teatro", resu-
mo gerador do sistema perc~tual que, a seu turno, vai
me Teixeira Coelho, no prefácio ao volume, é uma mistura
(fabncar o referente" (p. 53) YSegundo o autor, essa fabri-
" de linguagens distintas "que se serve de uma série de outras
cação passaria pelos seguintes passos: (1) realidade/estí-
,! - - ~ --- -' linguagens particulares (a do gesto, do cenário, da ilumina-
l'\ f ,"C ~ulos; _22
prática social ou práxis; (3) percepção/inter-
t·,~7. pretação~pon,~o de vista/sistema perceptual; (4) referente"
ção, do traje) de tal modo que se pode falar, com Barthes,
que a teatral idade é uma espessura de signos" (p. 12).
/ (p~ll
Y "Corredores isotópicos e estereótipos" coloca em dis-
O projeto da semiologia do teatro, portanto, não se
aracterizou pela procura de um código homogêneo com
cussão a suposição de que

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84
Lticia Santaella e Winfried Nifth Bibliografia Comentada - Semiótica

unidades mínimas e suas regras de combinação, mas uma A terceira secção tem o título de "Texto escrito" e con-
discussão pluralista de vários aspectos da inter-relação dos tém artigos de R. Ingarten ("As funções da linguagem no
signos de diferentes códigos. teatro"), de J. Veltruski ("O texto dramático como compo-
O livro está dividido em sete secções. A primeira trata nente do teatro"), Lucrécia D. Ferrara Ç'Literatura em
das condições da análise semiológica e apresenta contri- cena"), J. Mukarovski ("Sobre o diálogo cênico") O. G.
buições de U rnberto Eco, Richard Demarcy e J eanne Marie Karpínskaia e L L Revsin ("Análise semiótica das primei-
Machado de Freitas. Eco constata que a semiologia do ci- ra peças de Ionesco"). Os temas não se restringem ao texto
nema precedeu à do teatro pelo menos de dez anos, dando verbal e às estruturas dialógicas, mas estão também volta-
para isso a seguinte explicação: "No cinema, há uma signi- dos para o espaço teatral, a música e outros elementos não-
cidade dominante, a da filmadora, que restitui o fotograma verbais no teatro (Velrruski), assim como para a intersernio-
(. ..) No teatro, qualquer pessoa pode ainda acreditar en- tização dos signos no teatro em relação às figuras e aos
contrar-se diante da realidade bruta, sem mediação de sig- espectadores (Ferrara).
nos" (p. 19). Os sistemas sígnicos não-verbais são o tema da secção
Os temas de Demarcy são o universo de signos do tea- seguinte com dois artigos sobre o gesto e a eloqüência no
rro, a linguagem teatral, o signo e o distanciamento, a re- teatro de M. H. Pires Martins eM. Angenot. Os três arti-
lação entre signo teatral e sociedade. Machado de Freitas gos da secção seguinte tratam da semiologia da comunica-
apresenta uma introdução a três modelos para uma sernió- ção teatral, e os temas são "A forma no teatro popular"
tica do teatro, as personagens dramáticas conforme Propp (Bogatyrev), "Abordagem semiológica de um texto dra-
e Souriau, a serniórica hjelmsleviana do teatro de Steen mático" (M. Corvin) e "Yerna e a comunicação teatral" (E.
Johansen e o modelo matemático das estratégias das per- Pefiuela Cafiizal).
sonagens dramáticas de Solomon Marcus. Os três últimos capítulos estão inseridos em duas di-
A segunda secção contém textos clássicos sobre a natu- ferentes secções sobre "A produção do significado no tea-
reza do signo teatral de P. Bogatyrev, T. Kowsan e J. Honzl. tro-ato" e "O teatro no gesto", com artigos de K. Brusak
Bogatyrev examina o traje como portador de uma estrutura ("Signos do teatro chinês"), Teixeira Coelho e J. Guinsburg
de signos, os objetos como signos e signos de signos de uma ("A significação no teatro") e J. Guinsburg ("O teatro no
coisa, e o ator como uma esttuturação dos signos mais diver- gesto"). "A significação no teatro" é um texto programático
sos. Os temas de Kowsan são a palavra, o tom, a mímica rumo à elaboração de uma semiótica teatral. O artigo dis-
facial, o gesto, o movimento cênico, a maquilagem, o pente- tingue vários modelos triádicos de constelações teatrais e
ado, o vestuário, o acessório, o cenário, a iluminação, a mú- dramáticas e examina as possibilidades de descrever sig-
sica e o ruído como fontes sígnicas no teatro. nos, figuras, semas, signos e hipersignos no código teatral.

86 87
Lúcia SantaeLla e Winfried Nõtb Bibliografia Comentada - Semiâtica

1.32 Helbo, André (org.). Semiologia da Representação;Tea- pesquisas feitas através de empréstimos anacrônicos não
tro, Televisão, História em Quadrinho, traduzido por poderiam cobrir inteiramente" (p. 21).
Eduardo Pefiuela Cafiizal, Diana L. Pessoa de Barros O segundo artigo, "O oráculo e a comédia" tem uma
e Anna M. Balogh. São Paulo: Cultrix, 1980, 189 primeira parte de Helbo sobre "A representação no relato"
pp. Sémiologie de Ia Représentation, 1975. e uma segunda parte de Urnberto Eco sobre "Parâmerros
da semiologia do teatro". Helbo levanta a questão da re-
Essa coletânea contém elementos para a semiótica do presentação, da mímese e do vínculo entre a linguagem ea
teatro, das mídias televisivas e da história em quadrinhos. realidade, concluindo: "O fenômeno teatral não é a reali-
As abordagens sern iór icas se baseiam em modelos dade: oráculo e comédia ao mesmo tempo, a cena empresta
conceptuais inspirados tanto na lingüística geral de Saussure do mundo seu referente e o designa num paragrama cujas
(1.1), quanto na semiótica de Peirce (1.10, 1.11, 1.12). normas importa descrever" (p. 28).
Apesar da tríade temática: teatro, televisão e quadri- Eco também examina o tema da distância entre teatro
nhos, problemas do teatro estão no centro de interesse dos e realidade, chegando à seguinte conclusão: "O signo tea-
diferentes artigos. Helbo justifica a extensão temática além tral, porém, é fictício, não só porque comunica coisas ine-
do teatro com o fim "de reagir contra esse terrorismo do xistentes, mas porque finge não ser um signo" (p. 29). Os
texto que tem obnubilado, até o momento, os estudos con- parâmetros da representação teatral que Eco estuda em re-
sagrados à semiologia teatral", defendendo, assim, uma lação a outras situações comunicativas são os códigos não-
abordagem favorável "a uma pluridisciplinaridade sem li- verbais, a intencionalidade do emissor e a atribuição de
mites" (p. 1). intencionalidade do lado do receptor.
O livro está dividido em três partes: (1) representação As constelações actanciais em "Esperando Godor" são o
e teatralidade: a experiência do texto; (II) representação e tema de Jean Alter. Seu alvo é reduzir o texto a um sistema
teatralidade: a especificidade da representação; (III) repre- de unidades dramáticas e descobrir um código das relações
sentação e mídia. "O código teatral" é o primeiro ensaio do no sistema de acrantes. Identidade vs. diferença, interioridade
livro. Nele, Helbo examina o "processo de codificação/ vs. exterioridade, permanência vs. mudança e superioridade
descodificação" e o papel das funções fática e rnecalingüística vs. inferioridade são alguns dos parâmetros desse estudo das
no teatro moderno. "O teatro - conclui Helbo - "merece estruturas, tensões, transgressões dramáticas.
ser o objeto de uma análise que exponha os métodos e A contribuição de Solomon Marcus também trata das
modelos semióticos, tanto o texto quanto o fenômeno tea- estratégias das personagens dramáticas. A abordagem des-
tral apresentam, em todos os níveis, funções específicas que se trabalho é lingüístico-matemática. Entre os instrumen-
fazem da linguagem cênica o território de uma relação que tos de análsie das situações dramáticas estão o cálculo e a

88 89
Lüci« Santaella e \'(Iinfried Notb Bibliografia Comentada - Semiótica

probabilidade, a teoria dos grafos e a teoria dos jogos. Dis- Estruturado como uma coletânea interligada de ensai-
tância e proximidade, equilíbrio dramático, densidade das os, esse livro apresenta um panorama amplo das variadas
falas de uma personagem, mobilidade das personagens e os acepções, categorias e estados dós signos visuais. Passando
confrontos entre elas são os temas sob cálculo. em revista as principais correntes teóricas que examinaram
A especificidade do teatro com o código de represen- a visualidade e a representação por meio de imagens, o li-
tação, a tipologia dos signos teatrais, o papel do espectador vro também se abre para a discussão de problemas filosófi-
e o modelo da comunicação teatral são os temas de três cos, especialmente aqueles que se inserem no debate con-
outras contribuições de Helbo, P. Campeanu e R. Durand. temporâneo do cognitivismo e nas controvérsias sobre a
Na última secção sobre as mídias não-teatrais, P. representação e crise da representação.
Frenault-Deruelle examina o espaço na história em qua- Na apresentação, os autores esclarecem que
drinhos, não como um espaço absoluto, mas como um es-
paço interpessoal que se manifesta visualmente, assim como as investigações das imagens se distribuem por várias dis-
numa dimensão acústica e tátil. A perspectiva de R. Berger ciplinas de pesquisa, tais como a história da arte, as teori-
na sua contribuição sobre "A TV, banco de emissões" per- as antropológicas, sociológicas, psicológicas da arte, a crí-
tence menos à semiótica do que à economia política. O tica de arte, os estudos das mídias, a semiótica visual, as
autor defende teses do tipo "emitir signos é pôr em circu- teorias da cognição. O estudo da imagem é, assim, um
lação uma imagem da realidade" , examinando a midiaesfera empreendimento interdisciplinar. É também dentro de
como um espaço da emissão e da recepção de uma "moeda- perspectivas interdisciplinares que esse livro pretende
informação-fiduciária" para chegar à conclusão de que no elucidar o tema das imagens. Seus objetos de estudo são
código televisivo os signos suplantam as coisas e que "o tanto os gêneros imagéticos tradicionais, a pintura e a
código preponderante é, pois, aquele que simboliza o mai- fotografia, quanto as novas mídias imagéticas, como a holo
or número de coisas para o maior número de pessoas. e infografia, incluindo a fotografia computacional (p. 13).
O livro conclui com a contribuição de Pierre Schaeffer
sobre "Representação e comunicação", ensaio que se situa O primeiro capítulo, o mais filosófico e cognitivista
no campo da comunicação de massa e comunicação de todos, versa sobre "Imagem como representação visual
inrerpessoal. e mental", enquanto o segundo capítulo, sob o título de
"S~miótica da imagem" discute o estado da arte das pes-
1.33 Santaella, Lúcia e Winfried Nõth. Imagem. Cogni- quisas nesse campo.
fão, Semiótica, Mídia. São Paulo: Iluminuras, 1998, O terceiro e quarto capítulos, interligados ternati-
222 pp. carnenre, estão voltados para a "Imagem, texto e contexto"

90 91
Bibliografia Comentada - Semiôtica
Lrícia Santaella e Winfried Noth

transições entre os paradigmas, a perspectiva artificial e


e "Palavra e imagem". O primeiro explora as relações da
gravura como transições do pré-fotográfico para o fotográ-
imagem com o texto que a acompanha e com o contexto
fico e a arte moderna como transição do fotográfico para o
no qual ela se insere, enquanto o segundo explora "as se-
pós. São ainda discuridas, ao final do ensaio, as misturas
melhanças e diferenças entre palavra e imagem, indagando
entre paradigmas como característica central da imagem
sobre os atributos imagéticos que existem na própria pala-
contemporânea. O capítulo doze identifica a relação desses
vra, assim como seu oposto, o que a imagem tem em co-
três paradigmas da imagem com os três registros psicana-
mum com a palavra" (p. 59).
líticos: o imaginário, real e simbólico.
O quinto capítulo discorre sobre "Imagem, tempo e
No último capítulo, "As imagens podem mentir?", essa
percepção", em tópicos como: "O tempo intrínseco: dispo-
interrogação é respondida numa pluralidade de ângulos.
sitivo, fatura e estilo", "O tempo extrínseco: desgaste, re-
ferente e atemporalidade", "O tempo intersticial: fisioló-
1.34 Oliveira, Ana Claudia de e Ivana Fechine (orgs.).
gico, biológico e lógico (perceptivo)". A questão do tempo
Semiôtica da AI'te. Teorizações, Análises e Ensino. São
é retomada no ensaio seguinte sobre "Computação gráfica
Paulo: Hacker, 1998,302 pp.
e música".
Também interligados estão os capítulos sobre "Sernió-
Essa coletânea reúne 22 trabalhos, em português, es-
tica da pintura" e Semiótica da fotografia" que discutem o
panhol e francês, apresentados por ocasião do IV Congres-
estado da arte dessas semióticas especializadas. Também
so da Associação Internacional de Serniótica Visual, reali-
sobre fotografia é o capítulo nove, que discorre sobre a
zado em São Paulo, em 1996. Trata-se do segundo entre os
questão da morte e da eternidade. Esse capítulo apresenta
três volumes temáticos que apresentam os resultados desse
um diálogo com os grandes teóricos da fotografia, Flusser,
congresso. Os outros dois volumes, também publicados no
Banhes, Sontag, Arthur Omar, exemplificando a questão
mesmo ano e pela mesma editora, são: Imagens Técnicas,
discurida nos textos "Las babas del diablo" de] ulio Cortazar
vol. 1, e Visualidade, Urbanidade, Intertextualidade, vol. 3.
e "La invención de Morel", de Adolfo B. Casares.
Os trabalhos estão divididos em três partes: (1) buscas
No capítulo dez, a imagem, a pintura e a fotografia
teóricas, (lI) buscas analíticas e (III) buscas pedagógicas. A
são discuridas num estudo comparativo à luz da serniótica
primeira secção contém os trabalhos de J. Fontanille:
de Peirce (1.10, 1.ll, 1.12).
"Reflets, transparences er nuages: les figures du visible";
O capítulo onze apresenta os três paradigmas da ima-
de Rosa Maria Ravera: "La fascinación de Ia imagen en Ia
gem: (1) a imagem pré-fotográfica (artesanal), (2) fotográ-
filosofia de Wittgenstein"; de Estelle Lebel: "Contribuirion
fica (eletro-mecânica e eletrônica) e (3) pós-fotográfica (ima-
à l'etude de plagiat visuel"; de Oscar Steimberg: "Periodi-
gem de síntese ou infoimagem). São também discutidas as
93
92
Lúcia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiótica

zación y deshistorización en las histórias de los géneros de Cattani, "Série e repetição na arte moderna e contemporâ-
imagen"; de Hardarik Blühdorn: "Imagem e realidade"; nea"; de Lúcia Teixeira, "Imagens de mulher"; de Maria
de M. Thereza Strôngoli: "Do signo à retórica do imaginá- José Sanches, "Mondrian, a natureza forjada por Gervane
rio"; de Katya Mandoki: "Aplicación de un modelo de de Paula; de Sréphane Huchet, "Será a instalação um dis-
análisis visual desde una serniótica heterodoxa: el caso de positivo alegórico?"; e de Gisela Belluzzo de Campos, "Três
dos portadas"; de Elaine Caramella: "Imagem: material e diferentes modos de construção do espaço em obras
procedimento"; de José Luis Caivano e Mabel A. Lopes: minimalistas e sua relação com o local da exposição".
"El movimiento como signo en el proceso de visión". As Nessa parte predominam as análises de exemplos con-
bases teóricas desses autores são bem diversas. Fontanille, tidos na história da pintura e das artes plásticas. Young-
um dos sernioticistas da escola de Paris, apresenta e desen- Hae estabelece um quadrado greimasiano na sua interpre-
volve idéias contidas em seu Sémiotique du Visible (Paris tação do iconismo e da iconicidade na escultura budista.
1995), baseadas na serniótica greimasiana (lI 4, 1I.5, 1I.8) A. C. de Oliveira se interessa pela moda na pintura da Re-
e na semântica da teoria das catástrofes. Ravera examina a nascença. A gramática narrativa e aspectual, no sentido de
filosofia das cores de Wittgenstein. Lebel estuda os meca- Greimas (1.8), de uma pintura de da Vinci é o tema do
nismos do plagio visual no spot publicitário e no hipertexto. trabalho de Moreno. Cattani examina estruturas repetitivas
Glinberg estuda os critérios de periodização na história das e seriais na arte moderna. Teixeira aplica elementos da
artes visuais. Blühdorn desenvolve uma tipologia das fun- semiótica das paixões de Greimas (11.8) no seu esrudo de
ções da imagem e do campo do designado ao qual a ima- pinturas de mulheres. Sanches, nas suas reflexões sobre
gem se refere. Srrôngoli examina alguns aspectos míticos e Mondrian e a arte abstrata, baseia-se em semioticistas como
imaginários da imagem. Mandoki faz uma interpretação Guiraud, Greimas, Peirce e Santaella, enquanto Huchet
comparativa de duas capas da revista Time, distinguindo se baseia em teóricos como Benjamin, J. L. Schefer e
entre um nível semiótico e simbólico. Caramella faz consi- Meschonnic, no seu estudo das instalações da vanguarda
derações básicas sobre a natureza das imagens e Caivano e dos anos 70 a 80. O espaço, no trabalho de três artistas
Lopes examinam a representação dos elementos dinâmicos minimalistas, é o tema de Campos.
em imagens estáticas (desenhos). As buscas pedagógicas da última parte do livro come-
As abordagens na segunda parte não são menos diver- çam com considerações sobre a imagem fixa na sala de aula,
sas: De Kim Young-Hae, "L'aniconisme dans la sculpture de Anamélia Bueno Buoro. "Visual idade, cognição e leiru-
bouddhique"; de Ana Claudia de Oliveira, "Aspectos da ra" é o tema de M. Helena Wagner Rossi sobre o desenvol-
tradução intersemiótica: a moda na pintura de Piero"; de vimento estilístico de crianças e adolescentes. Analice Dutra
Luisa Ruiz Moreno, "La acción observada"; de Idéia B. Pilar continua com um tema similar em "Desenho e cons-

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Lúcia Santaella e YVinfried Notb Bibliografia Comentada - Semiótica

rrução de conhecimento na criança" . Maria Lúcia B. Duarte dizer e o dito no cinema: Acaso de um verossímil?" Apesar
estuda, à luz dos aspectos sócio-culturais, imagens produ- do título, essa secção também contempla temas semióticos
zidas por pré-adolescentes. O último artigo do volume, de em digressões sobre a iconicidade (p. 200) e a sintaxe cine-
Maria José Palo, não parece estar relacionado com o tema matográfica (pp. 204-2l0).
pedagógico, pois, em seu "Arte são hábitos: hábitos são No posfácio, o tradutor do livro e teórico do cinema,
artes", apresenta a arte do ponto de vista da estética de C. J ean-Claude Bernardet, apresenta uma interpretação do
S. Peirce (1.11, 1.12). trabalho de Metz, conrextualizando sua obra no quadro da
estética do filme neste século.
1.35 Metz, Christian. Significação no Cinema, traduzido por "Cinema: língua ou linguagem" é o primeiro texto
Jean-Claude Bernarder. São Paulo: Perspectiva, 1972, explicitamente semiótico do livro. Metz examina várias
295 pp. Essais SUl' Ia Signification au Cinéma, 1968. facetas da teoria do cinema sob um ângulo lingüístico. Para
se situar entre as duas posições opostas - "o cinema é uma
Essa coletânea de estudos escritos entre 1964 e 1968 linguagem" e "o cinema é infinitamente diferente da lin-
exerceu grande influência na história da semiótica do cine- guagem verbal" (p. 60) - o autor desenvolve as seguintes
ma. No âmbito do esttuturalismo e da semiologia francesa teses: (1) "o cinema é uma linguagem sem língua" (p. 60);
dos anos 60, Merz elaborou esses trabalhos com grande "a especificidade do cinema é a presença de uma lingua-
sistematicidade, criando de maneira exemplar uma abor- gem que se torna arte no seio de uma arte que quer se
dagem estruturalista aos estudos de cinema à luz do mode- tornar linguagem; (2) o que a língua perde vem enriquecer
lo das estruturas da língua. a linguagem" (p. 65), porque o filme não tem "obrigação
O livro se divide em três secções. Apenas a segunda de manusear as imagens como palavras e de organizá-Ias
contém três artigos explicitamente dedicados aos "proble- conforme as regras de uma pseudo-sintaxe" (p. 57).
mas da semiologia do cinema". A primeira secção, sob o A base dessas teses está na distinção saussuriana entre
título de "Abordagens fenomenológicas do filme" contém língua como sistema Iingüístico e langage (linguagem), quer
"Apontamentos para uma fenomenologia da narração" e dizer, a faculdade semiótica e o hábito para gerar mensa-
um trabalho sobre a "Impressão de realidade no cinema" gens. Metz estende ainda mais a concepção de linguagem,
que inclui uma discussão sobre algumas idéias de Barthes pois, para ele, linguagem é também um discurso signi-
sobre a semiótica da fotografia. ficante. Assim sendo, o cinema não é uma linguagem por-
A terceira secção versa sobre" Alguns problemas teó- que é um sistema que usa poucos signos específicos, não
ricos do cinema moderno" e contém trabalhos sobre "A possuindo nada que corresponda à segunda articulação da
construção em abismo em Oito e Meio de Fellini" e "O língua em fonemas (ver Martiner 1.3). Também não é um

96 97
Bibliografia Comentada - Semiótica
Lúcia Santaella e Winfried NÓlh
Em contrapartida, os métodos lingüísticos - comutação,
sistema sígnico usado para a intercomunicação unidi- decupagem, distinção estrita entre significante e signifi-
recional. Em vez da lingüística, é a translingüística, a cado, substância e forma, pertinente e irrelevante etc. -
semiologia das "grandes unidades significantes" que serve oferecem ao semiólogo do cinema uma ajuda constante e
como instrumento para estudos cinematográficos. preciosa para estabelecer unidades que continuam sendo
Metz continua a desenvolver essas idéias básicas em ainda muito grosseiras, mas que o tempo pode tornar
"Algumas questões de semiologia do cinema" e "Proble- progressivamente mais complexas (p. 128).
mas de denotação no filme de ficção". Esses estudos são
ia
dedicados "às grandes figuras fundamentais da semiolog 1.36 Merz, Christian. Linguagem e Cinema, traduzid
M ild . o por
do cinema _ montagem, movimento de câmera, escala dos arr a Pereira. São Paulo: Perspectiva, 1980, 347
planos, relações da imagem com a palavra, seqüências e pp. Langage et Cinéma, 1971.
outras unidades de grande sintagmática" (p. 113).
Muitos de seus instrumentos de pequisa lhe vêm da N~sse segundo volume, Metz continua sua elaboração
lingüística. Metz distingue, por exemplo, entre estruturas do projeto de u~a semiologia do cinema que começou com
paradigmáticas e sintagmáticas, denotações e conotações O
.seudlivro anrerior, A Significação no Cinema (I .35) . O o biJe-
no filme. Estabelece também a sua famosa tipologia dos tJVO o autor agora é ampliar e, ao mesmo tempo, precisar
sintagmas do filme, a "Grande sintagmática da faixa-ima- O debate sobre a questão tradicional: o cinema é ou não é
gem" (pp. 142-17 O) que inspirou o tradutor do livro a uma li ma linguagem.
análise sintagmática do filme "São Paulo Sociedade Anô- Em onze capítulos, o autor desenvolve uma pluralidade
nima", que aparece no apêndice do livro (pp. 248-281). d temas sobre a semiologia do cinema. O primeiro capí-
Entre os resultados da abordagem semiológica de Metz, t ulo oferece uma contextualização histórica do tema no
estão as teses seguintes: (1) a significação cinematográfica qlla~ro da filmologia. Metz conclui que a elaboração da
é sempre mais ou menos motivada, nunca arbitrária (p. «miologia do filme exige "a vontade de tratar os filmes
130); (2) o cinema enquanto tal nada tem que corresponda I orno textos, como unidades do discurso, obrigando-se as-
à dupla articulação das línguas (p. 136) e (3) o cinema é un ~ pesquisar os diferentes sistemas (quer sejam códi os
uma retórica que também é uma gramática (p. 139). 11\1 não)" (p. 2l). g
A conclusão de Metz apresenta-se sob a formulação a Aabordagem de Metz é nitidamente estrutural e visa
segUir: 01 .inalisar a forma, no sentido de Hjelmslev (1.2). "Se se
111'( larar que a semiologia estuda a forma dos filmes, isso
As noções da lingüística não podem ser aplicadas à III'V(' er feno sem esquecer que a forma nã o e/ o que se opoe
-
semiologia do cinema a não ser com a maior prudência.
99
98
Lúcia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiótica

ao conteúdo, e que existe uma forma do conteúdo, tão im- culares (que agrupam os traços de significação que apare-
portante quanto a forma do significante" (p. 21). cem somente em certas classes de filmes) em relação a dois
O autor distingue entre cinema e filme: "Filme se opõe eixos, o eixo do filme e o eixo do discurso. "Do código ao
a cinema como um objeto de linguagem (um discurso signi- sistema, da mensagem ao texto" é o tema do quinto capítu-
ficante) a um conjunto de fenômenos de ordem tecnológi- lo, em que o autor amplia sua teoria dos códigos em distin-
ca" (p. 24). De um pontO de vista semiótico, Metz afirma ção ao conceito de sistema. Na sua definição, um código é
que "filme e cinema se opõem como o enunciado e a lín- um sistema não singular. Um código gera uma mensagem,
gua" (p. 26). Na busca da especificidade do cinema, Metz enquanto um sistema gera um texto, e a estrutura de cada
cbega à conclusão de que texto é um sistema singular. Um exame dessa textualidade
e singularidade continua no capítulo seguinte.
o cinema é uma linguagem compósita desde o nível da As estruturas textuais e as unidades pertinentes e míni-
matéria da expressão. Não só tem possibilidade de com- mas são os elementos de uma gramática cinematográfica que
portar vários códigos, mas várias linguagens, que se dis- Metz desenvolve no oitavo e nono capítulos, enquanto os dois
tinguem entre si pela sua própria definição física: foto- últimos capítulos, com uma fundação na semiótica de
grafia móvel em seqüência, som fonético musical, ruído. Hjelmslev (I.2), examinam a estratificação do código cinema-
O cinema, por isso, difere de outros meios de expressão tográfico em forma, substância e matéria nos dois planos de
que, mesmo que codicamenre heterogêneos, não são expressão e conteúdo, além do terna sobre "Cinema e escrita".
compósitos fisicamente: como a música clássica, onde a Como conclusão Metz faz a seguinte afirmação:
mátéria significante consiste uniformemente em som
musical, a linguagem oral onde ela se reduz a som foné- o problema da significação cinematográfica não pode ser

tico etc. (p. 39). convenientemente tratado se nos ativermos à definição da


linguagem como sistema de signos destinado à comunica-
Assim, o cinema é "profundamente aberto a todos os ção (...) O cinema não é um sistema, mas contém vários.

simbolismos, a todas as representações coletivas, a todas as Parece não ter signos, mas é porque os seus são muito dife-

ideologias", de maneira que "é impossível tratar o conjun- rentes dos da língua; além do mais, o domínio da signifi-

to dos filmes corno se eles fossem diferentes mensagens de cação ultrapassa amplamente o do signo. Ultrapassa igual-

um único código" (p. 41). mente o da comunicação propriamente dita: o cinema, é

A pluralidade dos códigos cinematográficos é um terna verdade, não preenche o jogo imediato da troca bilateral,

que Metz aprofunda no quarto capítulo, no qual distingue mas não é o único conjunto semiológico a se comportar

códigos gerais (comuns a todos os filmes) de códigos parti- dessa formal; ninguém responde diretamente a um miro,

100 101
Lúcia Santaetla e Winfried Niith Bibliografia Comentada - Semiótica

a um conto popular, a um rito, a um sistema culinário ou A análise do código do vestuário, na segunda parte
de vestuário, a um trecho musical (p. 341). do livro, é o capítulo central. Barthes procede em dois
passos: (1) estrutura do significante e (2) estrutura do sig-
1.37 Barthes, Roland. Sistema da Moda, traduzido por nificado. As unidades significantes constituem o inven-
Lineide do Lago Salvador Mosca. São Paulo: Compa- tário dos elementos. O sistema resulta de uma segmenta-
nhia Editora Nacional/Edusp, 1979, 301 pp. Systéme ção e classificação dos sintagmas, os "enunciados
de ia Mode, 1979. sigriificanres". Para designar as unidades mínimas do có-
digo, Barrhes introduz o termo "vesternas". Dos elemen-
o Sistema da Moda é um estudo exemplar para o proje- tos sistemáticos (os vesternas), o autor distingue as vari-
to saussuriano de elaborar uma semiologia dos fenômenos antes. À semelhança das unidades do código lingüística,
culturais não-verbais, tendo por base o modelo lingüístico. à ia Hjelmslev, os elementos do código vestuário têm um
Os fundamentos lingüísticas de Barthes estão, assim, na nível de substância e forma, de contéudo e expressão. Com
lingüística de Saussure (LI), Hjelmslev (1.2) e Martinet sisternaticidade rigorosa, Barthes continua o exame da
(1.3). O objeto de estudo é o vestuário de moda. Tal estudo estrutura do significante em outros capítulos sobre con-
não tem por base o vestuário real (vestidos, camisas ou te~- fusões e extensões, a asserção de espécie, o inventário dos
nos mesmo), nem o vestuário fotografado, mas as descri- gêneros, as variantes do ser e da relação, o sistema e o
ções da moda de uma estação (1959) num corpus de jor- sintagrna.
nais da moda franceses. O exame da estrutura do significado começa com a
O livro se divide em três partes. Na introdução, o autor análise das unidades semânticas e continua com o estudo
explica os elementos do seu método estruturalista: ,ocorpus, (Ias combinações e das neutralização dos significados. As
o vestuário escrito, a semiologia, as funções, o vestuano como I' '[ações não são estáveis porque o léxico da moda muda a
língua e fala. Na determinação das reações de se~ti~o.entre cada ano. "Em suéter de lã grossa, fim de semana de ouro-
os elementos do vestuário, Barthes aplica os pnncipros de no no campo" não há correspondência codificada entre os
pesquisa do estruturalismo lingüístico: a classificação .dos I omponentes do significante e os do significado. O suéter
elementos com base nas provas de comutação, a determma- 11.10remete de modo particular ao fim de semana, a lã ao
ção de equivalências nas relações entre os significant~s ..O IlIll no e a sua espessura ao campo. Lã, pode, aliás, tam-
alvo está na dedução dos sistemas que constituem o código I)(~m significar "primavera na Riviera" (p. 183).
de vestimentas. Barthes distingue vários níveis de análise e Banhes distingue entre unidades usuais e originais e
determina a autonomia dos sistemas, as significações e os II1S L1te o problema dos primi tivos semânticos e das oposi-
significados, a reduções e amplificações dos elementos. IH'S ntre elementos marcados e não-marcados.

102 103
Lúcia SantaelLae \'(Iinfried Noth Bibliografia Comentada - Semiâtica

No capítulo seguinte, o autor chega a uma definição de traduzido por Julio Castafion Guimarães. Rio de Janei-
signo vestimentário como uma união de um significante e ro: Imago, 1976,384 pp. Semiologie Psicanalytique, 1975.
um significado -e examina sua arbitrariedade e motivação,
isto é, o seu duplo fundamento social e material (p. 201). Os autores desse livro partiram do diagnóstico de uma
Na terceira parte do livro, em que trata do sistema crise de impotência instrumental da psicanálise devida em
retórico, Banhes distingue entre a retórica do significante (a grande parte a uma crise da obsolescência de seus modelos.
"poética do vestuário"), a retórica do significado ("o mundo Dando continuidade à aventura intelectual freudiana, o livro
da moda") e a retórica do signo ("a razão da moda"). No sig- pretende preparar novos tipos desses modelos, "tanto intra
nificado retórico da moda, Barthes vê, por exemplo, uma "ne- quanto inrerdisciplinares, que englobam, explicam e resol-
bulosidade" porque um único significado é definido por uma vem do modo mais rigoroso e econômico a realidade atual do
"massa indefinida de conceitos" (p. 220). Na poética do ves- trabalho psicanalítico". Os objetivos metodológicos básicos
tuário, manifesta-se uma "retórica rara e pobre" (p. 224), ba- são dois: (1) "a construção de uma teoria psicanalítica unificada
seada numa inovação contínua entre denotações e conotações. e operante, de uma teoria que cubra de modo satisfatório
A representação do mundo na moda se reflete em referências todos os níveis da ação terapêutica psicanalítica; (2) uma
ao trabalho, a atividades festivas, as férias e fins-de-semana, a meraestratégia metodológica explícita, bem como uma clí-
estadas e viagens. A moda escrita visa a uma "racionalização nica dotada de instrumentos de observação e de intervenção
que faz converter todos os seus signos em razões e realiza esse refinados, de modo a facilitar a melhor operacionalização
paradoxo: ser um fazer falado" (p. 254). I ossível" das hipóteses fundamentais (p. 13).
Por fim, o autor extrai algumas conclusões críticas e A articulação metodológica parte de uma tripla refe-
ideológicas, abordando ainda um novo tema: a economIa rência, a psicanálise, a semiologia e a teoria da comunicação
do sistema. A moda, conforme Barthes, "participa de uma t' O livro se desenvolve em um registro teórico, a formalização
certa alienação e de uma certa razão dos homens" (p. 262). s .miológica dos signos psíquicos, bem como sua patologia
O significado da moda é uma tautologia porque só pode (', em um registro técnico, a sistematização desses signos por
definir-se por si mesma, e assim "a moda propõe esse para- I)) .io de um esquema de comunicação, de acordo com um
doxo precioso de um sistema semântico cujo único fim modelo de ficha clínica psicanalítica (p. 14).
é decepcionar o sentido que ele elabora luxuosamente" Na introdução, o livro apresenta uma minuciosa expla-
(p. 270). 11"<;-0 dos instrumentos conceituais, da construção do mo-
11(-10 teórico e da testagem clínica a serem empregados. De
1.38 Gear, Maria do Carmo e Ernesto Cesar Liendo, com a l.u o, todos os capítulos são precedidos de uma discussão
colaboração de Luis J. Pietro. Semiologia Psicanalítica, I I '()I" i a que é seguida por um exemplo clínico.

104 105
Lúcia SantaeLLa e Winfried NiJth Bibliografia Comentada - Semiõtica

o primeiro capítulo está voltado às "relações objerais est rateg ia psicoterapêutica" e "Doble-bind e esquema
como significantes da angústia". O modelo psicanalítico psicossemiótico estrutural".
dessa questão complexa é seguido por uma reflexão sobre a O capítulo cinco, que tem o título de "O recalque
"semiorização psíquica". Nessa reflexão, "as correlações como inversão entre os significantes verbais e os signifi-
estabelecidas entre as angústias e as relações objetais, bem cados fatuais. A teoria dos três espelhos invertidos", é
como a distribuição de umas e de outras em classes basea- introduzido por uma discussão da pulsão freudiana sob O

das nessas correlações" foram formalizadas poe meio do ponto de vista do signo saussuriano. A questão das pulsões
modelo que J. Prieto (1.5) propõe para o processo de signi- é focalizada em mais dois tópicos e seguida por quatorze
ficação, dentro de uma perspectiva semiológica (p. 88). tópicos dedicados ao recalque, tais como "Primeiro e se-
"Heterossexualidade e função serniótica do ego" é o gundo recalque no código afetivo", "Defesas maníacas e
tema do capítulo dois, fortemente baseado na teoria psica- recalque", "O recalque e a análise estrutural das narrati-
nalítica de W. R. Bion em inter-relação com as idéias de vas" erc.
Melanie Klein. A partir da noção instrumental de classe Por fim, no último capítulo, que está dedicado mais
lógica "falo", o conceito lacaniano de falo como elemento exclusivamente à "Semiologia da interpretação e da situa-
ordenador último da coerência interna do ego é colocada ção terapêutica", são discutidas questões como: "Serniologia
em questão e complementada. do complexo de Édipo", "Semiologia das etapas do proces-
No capítulo três, "Os traços mnésicos como signifi- so terapêutico" etc.
cantes do afeto" são discutidos por meio da comparação Em síntese, pode-se dizer que o livro está fundamen-
da estrutura binária em Freud e Melanie Klein. Central tado nas idéias semiológico-lingüísticas que estavam em
nesse capítulo, a estrutura binária é utilizada para se pen- voga na França entre os anos 60 e 70. Todos os capítulos
sar o complexo de Édipo, o acting out fundamental, a fi- são antecedidos por introduções sinalizadoras e finalizados
cha clínica psicanalítica e o esquema psicossemiótico es- por sínteses mnernônicas do conteúdo do capítulo. Isso aju-
trutural. da muito o leitor na compreensão dessa aplicação das no-
No capítulo quatro, "Os significantes verbais e os signi- ções semiológicas à psicanálise.
ficantes fatuais do afeto", são os seguintes os tópicos discu-
tidos: "O double bind e o acting out fundamental", "Sernio- 1.39 Chalhub, Samira. Semiótica dos Afetos. São Paulo:
logia do conflito narcísico", "A escalada defensiva", "Lógica HackerlCespuc, 1997, 140 pp.
do narcisismo", "Significantes verbais e fatuais na ficha clí-
nica", "A inversão de significantes em Dora", "A interpre- Esse livro tem uma bela apresentação escrita por José
tação da inversão de significantes", "Função semiótica e Luiz Aidar Prado. Vale a pena transcrever aqui um d

106 107
Liici« Santaella e Winfried Ndth
Bibliografia Comentada - Semiõtica

fragmentos dessa apresentação pela visão panorâmica que


O livro termina com dois anexos: "Resenhas sobre a
é capaz de nos fornecer:
obra de Nassar" e "Entrevistas com Raduan Nassar".

Serniórica dos afetos é um envolvente roteiro de leitura


do livro Um COjJode Cólera, de Raduan Nassar. O tema
fundamental do livro de Nassar é a linguagem: aquela
que morde, lambuza, aprisiona os corpos. Não são as per-
sonagens que se encolerizam na lâmina exterior ao dis-
curso: é a lamínula do texto que afunda no copo, incha,
absorve a cólera e escorre. Discurso carregado de uma
potência demolidora, em que Ele e Ela se atiram no trans-
bordamento de linguagem de um jogo hemorrágico nas
diversas cenas esquadrinhadas por Samira Chalhub.

Tendo como objetivo servir de guia para que o leitor


possa realizar o percurso acompanhado dessa novela de
Nassar, a obra de Chalhub tem início com uma apresenta-
ção do auror, seguida por um panorama comentado da cena
dos anos 70, na qual Um Copo de Cólera está contextualizado.
O miolo do livro está na leitura da novela propria-
mente di ta. Essa leitura é antecedida por discussões
sernióticas acerca do binômio "Enunciado e enunciação" e
por um tópico sobre "Ruptura da Iinearidade". A leitura
esquadrinha quatro cenas: a cena amorosa-erótica, a cena
ideológica, a cena colérica e a cena retórica.
No capítulo quatro, os sete pecados capitais são intro-
duzidos como via para a análise mais demorada da cólera e
de suas mitologias. Aqui, entram em cena alguns acenos
psicanalíticos para declarar que a angústia é o grande afe-
to, do qual a cólera é um efeito.

108
109
TÍTULOS PARA PESQUISA AVANÇADA

lI.I Marty, Claude e Robert Marty. La Semiótica: 99


Respuestas. Buenos Aires: Edicial, 1995, 253 pp.

o que é a semiótica? Qual é a diferença entre a


serniótica e a semiologia? Qual é o objeto da semiótica?
Como formar os interpretantes literários? Como analisar
sernioticamenre as consignas? Qual é a importância peda-
gógica dos signos icônicos? Como formar os inrerpretantes
li terários? Como analisar semioticamente as consignas?
Qual é a importância pedagógica dos signos icônicos? são
algumas das 99 perguntas respondidas nesse trabalho.
A estrutura das respostas é bem didática e padronizada,
divindindo-se em três partes. À pergunta principal segue-se
um primeiro comentário ou já uma primeira resposta. Dando
prosseguimento à primeira pergunta, lê-se, por exemplo: "É
lifícil dar uma definição unânime do que é semiótica. Apesar
disso, pode haver acordo sobre a "doutrina dos signos".
Depois da segunda pergunta sobre a semiótica e a
scmiologia, já aparece a seguinte resposta: "Oficialmente
não existe diferença, embora o uso da semiologia esteja vin-
'ulado à tradição européia, enquanto a semiótica à tradi-
~ii anglosaxã. Mesmo assim, o termo serniótica tende a
i' .neralizar-se".

111
Lucia Santaelfa e Winfried Nifth
Bibliografia Comentada - Semiótica

A terceira resposta para cada pergunta, sob o título de vista de várias abordagens. Algumas das perguntas são: O
"Para saber mais", apresenta uma explicação mais extensa,
que é um texto? O que é uma ilusão referencial? O que é
que varia de uma a três páginas. uma personagem (teatral)? Nessa mesma secção também
Mais de um terço das 99 respostas tratam de concei-
se encontra uma tipologia original do narrador, a qual se
tos-chave da semiótica de Peirce (1.10, Ll1, 1.12, Il.13), baseia na teoria peirciana do interpretante.
mas a serniótica de Greimas (1.7,1.8, II.4, II.S), Hjelmslev
As respostas 93 a 99 tratam de semióticas específicas,
(1.2), Saussure (LI) e questões da semiótica geral são igual- como a semiótica da imagem, e de conexões entre a
mente apresentadas. A razão para a ênfase especial em Peirce semiótica e a pedagogia. O livro apresenta uma breve bib-
deve-se, em primeiro lugar, ao fato de que sua semiótica é liografia com títulos da semiótica básica (em francês) e um
a única que merece o nome de semiórica geral, segundo índice geral de nomes e conceitos, úteis para estabelecer
afirmação dos autores. mais conexões entre as várias respostas.
A divisão temática das respostas assim se apresenta:
respostas de 1 a 8 e 9 a 13 tratam da semiótica em geral e II.2 Deely,]ohn. Se1lZióticaBásica. São Paulo: Ática, 1990,
das suas relações com a filosofia e a lingüística. Os temas 192 pp.
das respostas 16 a 28 são dedicados à história e às escolas
da semiótica, ao campo dos estudos semióticos e à distin-
Embora exiba o título de Semiótica Básica, esse não é
ção entre a semiótica da comunicação (dos signos intenci- um livro para iniciantes em semiótica. As questões trata-
onais) e da significação (dos signos não-intencionais). das são complexas, pressupondo algum conhecimento des-
As respostas 29 a 37 tratam da semiótica greimasiana (. campo.
e oferecem uma introdução a seus conceitos centrais como
O livro é composto de sete capítulos, que apresentam
trajetória generativa, estruturas semionarrativas profundas
lima certa autonomia, podendo ser lidos isoladamente, sem
e de superfície, quadro semiótico e esquema actancial.
11.111 S para a compreensão. Ao mesmo tempo, esses capíru-
As respostas 38 a 73 apresentam um panorama amplo
I1I npreseorarn uma continuidade temática na seqüência
da teoria sígnica e das classificações dos signos de Peirce, 111 lue aparecem.
assim como dos conceitos básicos da lógica peirciana, en-
V .rsando principalmente sobre as possibilidades teó-
tre eles a resposta à pergunta: "O que é um argumento
'11 ,1\ gerais da pesquisa semiótica, o grande tema que per-
abdutivo?" I 1',',.1 I do o livro é a expansão das fronteiras da semiótica.
A orientação da secção sobre a semiótica textual (74 a I '11I1c/O o auror, no contextO europeu, o desenvolvimento
92) é pluralista. Questões da semiótica do texto, da litera- II 'l'llliócica foi predominantemente lingüístico e Iirerá-
tura, da narração ou do teatro são discutidas do ponto d
111' I' 111 contraste, sua proposta é alargar o campo semiótico

112
113
Lúcia Santaella e Winfried Noth Bibliografia Comentada - Semiâtica

para assumir todo o domínio das formas biológicas e a ev~- dos signos, e a semiose caracterizada como o objeto dessa
lução em geral. Dee1y vai ainda mais longe, ao considerar a ciência. A semiose é a ação do signo, um tipo de atividade
extensão das fronteiras da atividade semiótica para além dos que se distingue de outros tipos por ser eminentemente
seres vivos, de modo a incluir o reino do inorgânico (tanto triádica, ou seja, por envolver a ação de três termos. Um car-
em termos de física quanto de química)" (p. 49). Para essa ro não pode colidir com uma árvore sem que a árvore esteja
extensão, o autor sugere alguns caminhos, deixando s~u de- lá, mas um signo numa estrada pode indicar uma ponte que
senvolvimento e refinamento para futuros estudiosos. não mais existe. Esse é um dos vários exemplos com que o
O livro se inicia com um artigo sobre a semiótica lite- autor exemplifica a ação específica dos signos. No final desse
rária e a doutrina dos signos. Ali o autor contrasta aquilo capítulo, Deely diagrama o objeto da investigação semiótica
que ele chama de duas tradições ou paradigmas nos estu- nos seguintes patamares hierárquicos: antropossemiose (lin-
dos semióticos, de um lado, a tradição européia, de extra- guagem e cultura humanas, na sua relação com outros ani-
ção saussuriana, também chamada de semioló~ica; de ou- mais), zoossemiose (modalidades semióticas entre animais,
tro, a tradição filosófica de Poinsot-Locke-Peuce. Sendo animais e plantas, animais e ambiente físico), fitossemiose
um especialista no Tractatus de Signis, escrito em 1632 pelo (entre plantas e o ambiente físico) e fisiosserniose (sistemas
filósofo ibérico João Poinsot, Deely advoga a tese de que a esrelares, planetários e subplanetãrios).
doutrina de signos, mencionada por Locke e desenvolvida No capítulo posterior, são discutidas as respostas para a
por Peirce, teve suas origens nesse filósofo medieval. .~~s- pergunta sobre como se torna possível uma atividade tal como
se mesmo capítulo, é defendida a posição de que a semiouca a semiose. O signo ou veículo da semiose é o responsável por
geral forma um todo de que a semiologia é uma par~e. essa atividade. Várias páginas são então dedicadas à
O capítulo subseqüente versa sobre a discussão da expliciração da natureza, características e função dos signos.
semiótica como método ou ponto de vista. Será que "a Os dois capítulos seguintes desenvolvem as idéias fun-
semiótica continuará a obsessão que a filosofia moderna dadoras da zoa e antropossemiót ica e da fisio e fitos-
tem com o método" ou será que ela "estabelecerá seu emiótica, respectivamente. O último capítulo faz uma
arcabouço teórico com riqueza e flexibilidade suficientes breve retrospectiva da história das fontes teóricas da
para abranger todo o campo dos fenômenos da significação erniótica, desde o mundo antigo até Jacob von Uexküll,
com toda a variedade e flexibilidade de métodos que seu biólogo alemão, nascido na Estônia, em 1899, pioneiro nos
eventual entendimento irá evocar"? Essa é a indagação bá- c rudes de biossemiótica.
sica a que o capítulo pretende responder. . Conforme nos indica Julio C. M. Pinto, prefaciador
Uma distinção importante é desenvolvida no terceiro d .sre livro, Semiótica Básica apresenta uma visão pessoal e
capítulo, aquela que se estabelece entre a semiótica, ciência madura do fenômeno serniótico. De fato, esse amadureci-

114 115
Bibliografia Comentada - Semiôtica
Ltiaa Santaella e Winfried No"t!?
níveis de profundidade, o nível das estruturas lógico-
rnento é fruto não só das décadas de investigação que Deely conceptuais, o nível da gramática narrativa antropomórfica
tem dedicado à semiótica, mas também da sua ampla e e o nível da gramática discursiva da enunciação. Tanto
profunda formação em filosofia. a sintaxe quanto a semântica são baseadas numa lógica
binária.
11. 3 Barros, Diana Luz Pessoa de. Teoria do Discurso: Fun- Oposições semânticas são, de preferência, estendidas
damentos Semióticos. São Paulo: Atual, 1988, 172 pp. para quadrados sernióticos em processos, conhecidos desde
a lógica medieval, que distinguem entre relações de con-
Em um nível avançado, a autora oferece uma visão de
trariedade e de contradição. Assim, na sintaxe fundarnen-
conjunto da teoria semiótica da narrativa e do discurso
tal_de um texto dado como exemplo não só aparecem opo-
desenvolvida por A. J. Greimas e por sua escola de Paris Slçoes tais como vida vs. morte ou ruptura vs. continuida-
(1.7, 1.8, lI.4, II.S, II.6, 11.8, 11.9)· A abordagem é
de, mas também descontinuidade vs. ruptura e não-morte
semiolingüística. As fontes são a teoria do conto de fadas vs. não-vida. A semântica fundamental é uma semântica
do formalista russo V. Propp, o estruturalismo lingüístico,
axiológica. No seu nível mais profundo se manifesta um
especialmente a sintaxe de dependência, de Louis Tesniere
sistema de atrações e repulsões. A categoria tímica, por
e a semântica estrurual de Greimas. exemplo, manifesta-se no eixo semântico euforia vs. disforia.
O primeiro dos três capítulos desse livro trata da
. Subindo do nível fundamental para o nível da gramá-
narratividade como manifestação de uma procura de valo-
tica superficial, essa nos confronta com o sujeito narrativo
res; o segundo, do discurso como lugar da assunção de va-
(o herói, por exemplo) que é ou um sujeito do fazer ou do
lores e o terceiro, da enunciação como instância da mani-
estado à procura de um objeto de valor. Nessa constelação
pulação de valores. Os dois primeiros capítulos refletem a
básica pode haver uma conjunção ou uma disjunção entre
estrutura do percurso gerativo do modelo greimasiano com
sujeito e objeto, que está na origem de situações de satisfa-
seus dois níveis de estrutura narrativa e discursiva. O ter-
ção ou falta. A partir dessas constelações básicas, desenvol-
ceiro reflete uma tentativa de ultrapassar esse modelo, para
vem-se os programas narrativos. No centro do esquema
incorporar elementos da dimensão comunicativa do texto
narrativo canônico, vemos o sujeito na sua relação com o
e seu contexto sócio-cultural. objeto, entre um manipulador e um julgador do sujeito.
A autora também vai além do modelo greimasiano do
Na semântica narrativa, aparecem os primeiros elernen-
percurso gerativo quando incorpora elementos da teoria
tOSda sern iórica das paixões e da semântica modal. Liber-
greimasiana do discurso no seu estudo. d~de, porém, é interpretada como um poder-fazer; irnpo-
A gramática semiótica textual de Greimas se desen-
tencia, como um não-poder-fazer. Independência aparece
volve com uma componente sintática e semântica em três
117
Bibliografia Comentada - Semiâtica
Lúcia Santaella e Winfried Niith
para o discurso literário e narrativo. A semiótica grei ma-
como um poder-não-fazer e obediência, como um não-po- siana, assim ampliada, torna-se uma teoria geral dos textos,
der-não-fazer. abrangendo o "estudo das organizações discursivas da signi-
O estudo das estruturas narrativas das paixões com- ficação", qualquer que seja o campo em que se manifestem.
studo semântico-estrutural do voca-
plexas resu 1ta nu m e <? tema do livro são os modos específicos de manifes-
bulário das línguas francesa e portuguesa. In~eg~rança vs. tação do discurso científico, as condições de sua produção
· - por exemplo são paixões de falta; annpana vs. ran- e seus critérios distintivos em relação a outras formas de
a fi içao, , d f
cor se distinguem como paixões do querer e do po .~r~a- saber. O livro tem cinco partes. A primeira trata do discur-
- vs amor são paixões flduClanas,
zer, enquanto d ecepçao . so científico em ciências sociais. O discurso científico é
isto é, da liqüidação da falta. . _ definido como um discurso taxinôrnico, veridicrório, refe-
. No nível discursivo, a sintaxe trata das relaçoesque se rencial e o autor examina suas dimensões sintáticas e ideo-
estabelecem entre a instância da enunciação e o ~isc~rso lógicas. No discurso científico, Greimas vê "o lugar de um
. d A semântica discursiva estuda a tematlzaçao e fazer taxinômico no qual a organização do universo semân-
enunCla o. .
a figurativização do discurso. Nesse nível, as estruturas mais tico que ele explora, longe de ser um dado, é o projeto
abstratas se concretizam em figuras concretas que se apro- científico desse fazer" (p. 8).
ximam do mundo real. . A análise científica segue um processo de redução e é
O último capítulO sobre a enunciação como marnpu- guiada pelo princípio de pertinência. Esse discurso é
lação amplia o horizonte para algumas consideraç~es ,sobre veredictório, quer dizer, "o saber do sujeito da enunciação
a situação narrativa entre o produtor e o receptor-mterp~e- encontra-se modalizado em verdadeiro ou falso, em secre-
te do texto, o papel da intertextualidade, aspecto~ SOCla~se tO ou mentiroso, e superdeterminado pela modalidade do
ideológicos dos rextos e algumas estruturas textuaiS do nível crer" (p. 11). O discurso é referencial porque quer alcançar
da expressão do texto. um referente exterior (uma realidade extralingüística) ou
um referente interno que consiste na remessa de uma pla-
. Al . das Julien Semiótica e Ciências Sociais,
n.4 Greimas, gir' . .' _ no discursivo que diz a verdade para outro plano que lhe
zido por Alvaro Lorencini e Sandra Nitnnl. Sao serve de suporte.
tra du S .
[tri
Paulo: Cu trrx,
1981 '
193 pp. Sémiotique et ezences Greimas descreve a sintaxe do discurso como uma es-
Sociales, 1976. trurura actancial que comporta um sujeito em busca de
um saber-fazer, de um objeto de desejo nunca atingido,
Com esse livro, Greimas, pela primeira vez, este~d.eu mas sempre visado. O discurso científico é um fazer
- f" 1 1976 a sua semlOtlCa
para O discurso nao iCClOna, em , deôntico (das necessidades), mas também persuasivo.
discursiva, que havia estado, até então, voltada sobretudo
119
118
Lúcia Santaelfa e \'(Iinfried Noth Bibliografia Comentada - Semióti(ct

A segunda parte do livro apresenta, sob o título de "Co- Os capítulos restantes tratam de temas muito diver-
municação social", um artigo sobre "Semiótica e comunica- sos. Por uma semiótica topológica apresenta uma gramáti-
ções sociais", que trata de alguns dos fundamentos para uma ca semântica do espaço urbano. A semiótica da história é O
sóciossemiótica das mídias e da cultura de massas, e um ar- tema de um artigo "Sobre a história factual e a história
tigo sobre "Modelos teóricos em sociolingüística" com o fundamental". Em "Reflexões sobre os objetos etnosse-
subtítulo de "Para uma gramática sociosserniótica''. mióticos", Greimas apresenta uma abordagem semiótica
A terceira parte, com o título "A construção de obje- da etnologia, folclore e mitologia. "Literatura técnica" tra-
tos sernióticos", começa com um artigo sobre a "Análise ta da teoria e da tipologia dos textos, especificamente dos
semiótica de um discurso jurídico", escrito em colabora- gêneros. Com amplitude temática, esse livro, graças aos
ção com Eric Landowski. Conforme os autores, "o discurso seus novos elementos teóricos, foi considerado um avanço
jurídico remete a uma gramática e a um dicionário jurídi- ImpOrtante no desenvolvimento do projeto greimasiano
co e é a manifestação, sob a forma de mensagens-discursos, para uma semiótica integrativa das estruturas e dos pro-
de uma linguagem que é a semiótica jurídica" (p. 76). Na cessos do discurso.
base da gramática jurídica, situa-se um quadrado semiótico
de prescriçõese/proibições/não-proibições/não prescrições. II.5 Greimas, Algirdas ]ulien. Semiótica do Discurso Cientí-
Qualquer discurso jurídico tem de satisfazer dois critérios: fico. Da Modalidade, traduzido por Cidmar Teodoro
gramaticalidade (resultado da aplicação das regras da gra- Pais. São Paulo: Difusão EditOrial/SBPL, 1976. Un
mática) e semanticidade (garantia de que o discurso per- Accident Fréquentdans lesSciences Humaines (Analysed'un
tence, de pleno direito, ao universo jurídico). Texte de Georges Dumézil). Pour une Théorie des Modalités.
O artigo continua com alguns elementos de uma 1976.
sociossemiótica da lei comercial e examina o ser e o fazer
do actanre coletivo jurídico. Desenvolve também uma ló- Essa monografia reúne dois textos que exemplificam o
gica desse actante coletivo, analisando a investidura semân- desenvolvimento da semiolingüística greimasiana em duas
tica do querer e do poder social. Nesse contexto, o sujeito direções diferentes: (1) a extensão do projeto semiótico de
do enunciado jurídico da lei é descrito como um agente uma teoria da narração para uma teoria do discurso em
duplo. De um lado, um sujeito do querer (de uma cultura geral e (2) a extensão do modelo semionarrativo e discursivo
jurídica), do outro lado, o sujeito do fazer dirigido tanto por um componente modal.
para um destinador-instaurador (com um destinatário do O primeiro estudo exemplifica as possibilidades d
querer-fazer) quanto para um destinador-controlador (com generalizar o modelo semio-narrativo que tem suas raíz
um destinatário do poder-fazer). no modelo formalista do COntomaravilhoso de Propp. Ten-

120 121
Lúcia Santaella e Winfried Niith Bibliografia Comentada - Semiótica

do provado sua validade nos estudos de narrativas literári- discurso objetivo e o discurso referencial, que se distin-
as, o modelo é testado na sua aplicabilidade para textos guem nitidamente nos processos da modalização e da
narrativos. O exemplo é um texto científico, o prefácio para enunciação dos resultados.
um estudo mitológico e, portanto, um texto meta-discur- Dessa maneira? conclui Greimas, o discurso de voca-
sivo, de Georges Dumézil. ção científica se apresenta como o discurso de um sujeito-
Nesse prefácio, em que Dumézil apresenta os defeitos enunciador em sua busca do saber verdadeiro.
das pesquisas anteriores sobre o mesmo tema, antes de co- O segundo estudo apresenta a teoria greimasiana das
locar em relevo as qualidades de sua nova abordagem, modalidades. O ponto de partida é a distinção entre os
Greimas descobre as mesmas estruturas profundas que ca- enunciados de fazer e os enunciados de estado (do ser), suas
racterizarn uma narrativa. O pesquisador em busca da so- transformações pelas negações conforme o modelo semiótico
lução de um problema científico é um sujeito narrativo, e pelas operações lógicas de conjunção e disjunção. Esses
um herói de um aventura científica. Semelhante ao herói elementos servem, por exemplo, para descrever as modali-
do conto maravilhoso, o sujeito discursivo do prefácio de dades veredictórias que se manifestam nas oposições entre
Dumézil se encontra em busca de um objeto de valor, com ser e não-ser, parecer e não-parecer, categorias que prome-
a diferença de que esse objeto não é uma princesa, mas um tem a distinção entre verdade, falsidade, segredo, mentira.
conhecimento científico. A segunda estrutura modal simples é a modalidade
A estrutura narrativa do prefácio é complexa. Apre- factiva (do fazer). Greimas vê na modalização factiva um
senta primeiro a aventura do revés, que é a narrativa de um fazer cognitivo que procura provocar o fazer somático , e na
sujeito fracassado em sua busca do saber por ter formulado veredicção uma operação cognitiva que se exerce como um
mal a sua hipótese. A seguir, porém, esse fracasso faz valo- saber sobre os objetos do mundo.
rizar a segunda tentativa do novo sujeito-pesquisador A seguir, Greimas interpreta as modalidades do que-
(Dumézil) que, dotado de uma nova competência, conse- rer, dever, poder e saber como sobremodalizações com o
gue conquistar o objeto buscado. sujeito e o objeto, distinguindo entre a abordagem sintag-
Para Greimas, nesse prefácio, manifestam-se um dis- mática e a organização da competência pragmática.
curso individual de descoberta e um discurso social de pes- A última parte desse estudo trata das compatibilida-
quisa. O discurso de descoberta é um discurso polêmico des e incompatibilidades entre as diversas categorias
que contém as duas narrativas: a do fracasso do anti-sujei- modais.
to e a da vitória do sujeito-pesquisador.
Além disso, Greimas distingue três níveis principais 1I.6 Greimas, Algirdas Julien e Eric Landowski (orgs.).
do discurso em ciências humanas, o discurso cognitivo, o Análise do Discurso em Ciências Sociais, traduzido por

122 123
Bibliografia Comentada - Semiótica
Lucia Santaella e Winfried Natb

rarrva em programas narrativos. A estrutura polêmica re-


Cidmar Teodoro Pais. Rio de Janeiro: Global, 1985,
lata a história do fracasso da pesquisa anterior e do sucesso
283 pp. l ntroduction à I'Analyse du Discours en Sciences
da pesquisa apresentada. A produção do saber pelo sujeito
Sociales, 1979.
operador se desenvolve em enunciados do fazer (constatar ,
observar, examinar, calcular etc.). As condições do saber
Doze artigos de vários aurores estão reunidos nessa
dependem de modalizações como de um poder-fazer ou
coletânea em que são estudadas as estruturas do discurso
saber-fazer e o estatuto do saber se manifesta num nível
científico não só na área das ciências sociais, mas também
veredicrório pelo qual o fazer do sujeito destaca-se como
da teoria literária e da exegese bíblica. O primeiro artigo,
um discurso objetivo.
de Greimas, "Análise de um texto de Georges Dumézil",
A secção "Em busca de certezas" reúne artigos de J.
repete uma publicação que já havia aparecido no Brasil,
Courtés sobre um texto de Lévi-Strauss. Courtés interpreta
em 1976 (Il.5).
as Mitológicas como um discurso que representa uma passa-
Os artigos são representativos para a abordagem
gem do parecer ao ser (do empírico/concreto/particular ao
semiótica da escola greimasiana de Paris. Os discursos ci-
lógico/abstrato/universal). J. Geninasca vê, no discurso ci-
entíficos, 118. interpretação de Greimas e Landowski, pre-
entífico do antropólogo M. Mauss, uma realização de três
sente na introdução do volume, pertencem a três grandes
provas (semelhante às provas do herói dos contos de Propp),
famílias: (1) discursos em busca de certezas científicas; (2)
uma prova qualificante (aquisição do poder-fazer
interrogações sobre o próprio sentido da pesquisa; (3) dis-
interpretativo), principal (o próprio fazer interpretativo) ea
cursos de interpretação. Seguindo esse critério, o livro está
prova glorificante (fazer persuasivo). Na dimensão polêmica
dividido em três partes.
do seu discurso, Mauss se manifesta como um herói-sujeito
Segundo os organizadores, o discurso científico é um
que se vê confrontado com o anti-sujeito (os pesquisadores
"percurso do saber" que encapsula a narrativa de um pro-
anteriores) que não percebe a complexidade do tema. E.
cesso em que um sujeito passa de um primeiro estado de
Landowski discure um tratado sobre a opinião pública e J-
carência, causado por um não-saber, a um estado final de
C. Giroud discorre sobre um texto do filósofo L. Lebvre. Os
conjunção com um objeto de valor, que é o saber, agindo
discurso estudados são discursos de "descoberta".
graças a uma competência cognitiva que garante ao sujeito
A segunda parte, "Interrogações sobre o sentido da
o sucesso nessa procura.
pesquisa", contém artigos de J.-c. Coquet, J .-E Bordron,
Na estrutura profunda dessa narrativa científica, há
P. Goltrain, J. M. Floch e J. Darrault sobre textos filosófi-
uma organização semântica e sintática. Num nível de su-
os e interprerativos de G. Bachelard, M. Merleau-Ponty,
perfície, manifestam-se dois grandes princípios de organi-
P. Ricoeur, P. Francastel e R. Barthes. Os textos científicos
zação: a polemização do discurso e a programação da nar-

125
124
Lúcia SantaeLla e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiõtica

dessa secção representam um discurso de "questionamenro". 'ções da apreensão e da produção do sentido, (...) que está
"Nem triunfalistas, nem prescritivos, eles refletem o que em toda parte, tanto nos discursos como em nossas práti-
se deve reconhecer como um estado de crise das ciências cas, tanto nos objetos culturais que produzimos como
sociais. Longe de pretender regulamentar a reflexão nas realidades naturais que interpretamos" (p. 58).
epistemológica, o discurso se faz, então, interrogação so-
bre as condições do conhecimento" (p. 29). O espaço social, diz Landowski, não reflete, por natu-
Na terceira parte, "Discursos de interpretação", S. reza, algum dado social preexistente. "Ele representa, ao
Alexandrescu escreve sobre o meta-discurso da crítica lite- contrário, o ponto de origem a partir do qual o social como
rária e L. Panier sobre "O dircurso de interpretação no co- sistema de relações entre sujeitos se constitui pensando-
mentário bíblico". Conforme Alexandrescu, uma das se" (p. 14).
especificidades do meta-discurso "crítica literária" consis- Landowski aborda os temas sociossemióticos de duas
te na suspensão do julgamento avaliativo, e Panier exami- perspectivas, ambas greimasianas: de um lado, trata-se de
na o comentário bíblico como um fazer interpretativo com reconstruir os grandes esquemas narrativos, actanciais e
várias dimensões de intertextualidade. rnodais; do ourro, visa à análise das estratégias de enunciação
no próprio ato de comunicação. Persuasão, manipulação e
lI.7 Landowski, Eric. A Sociedade Refletida. Ensaios de outras estratégias discursivas são os temas recorrentes nes-
Sociossemiótica, traduzido por Eduardo Brandão. São ses estudos.
Paulo: EduclPontes, 1992,213 pp. LaSociétéRéfléchie. O livro está dividido em três partes. A secção I trata da
Essais de Socio-Sémiotique, 1989. construção das unidadese da gramática narrativa e discursiva.
A "Encenação" dos elementos assim construídos é o tema da
Esses ensaios de sociossemiótica tratam de temas di- segunda secção, que elabora a sintaxe das relações entre os
versos: alocuções políticas, campanhas publicitárias, escri- elementos. A terceira secção desenvolve a semiótica da
tOSjornalísticos, respostas a um questionário de sondagem, inreração para circunscrever as formas elementares da mani-
questões da prática e da teoria jurídica. A abordagem se- pulação entre sujeitos, individuais e coletivos.
gue o modelo. da semiótica discursiva de Greimas (lI.4,. A primeira secção contém três artigos: urfl sobre "A
lI.5, lI.6). Semiótica, para o autor, opinião pública e seus porta-vozes", ourro sobre a natureza
do discurso social nas gerações e um terceiro sobre a
Não tem por objeto essencial o estudo dos signos, mas serniórica do direito. Conforme o autor, a opinião pública
visa à construção de uma teoria geral da significação (...). tem o papel proto-actancial de um destinador encarregado
O programa do sernioticista é o de dar conta das condi- le fazer agir outros sujeitos e as variações dessa constelação

126 127
Lúcia Santaella e \Virifried Nóth
Bibliografia Comentada - Semiótica

prototípica se manifestam no quadrado semiótico seguin-


os dois acranres, candidato e eleitor: antes bem distintos
te: (1) se a opinião é um mero destinador, os políticos se- ,
os dois aparecem hoje como um actanre dual, quando o
guem a opinião pública; (2) se ela é anti-destinador, os
candidato se funde com o eleitor.
políticos enganam a opinião; (3) se ela é não-antidestinador,
A terceira secção sobre "Interação", tendo como subtí-
os políticos desafiam a opinião e (4) se a opinião pública é
tulos "Fazer crer" e Fazer fazer", apresenta alguns elemen-
um não-destinador, os políticos afrontam a opinião.
tos de uma semiótica da ação (a "teoria do fazer") baseando-
Num capítulo programático, Landowski desenvolve o
se na oposição entre o "fazer fazer" ou "fazer agir" da mani-
projeto de uma semiótica jurídica como o estudo das "ins-
pulação e um "fazer crer cognitivo". "Sinceridade, confian-
tituições e atores, das situações e decisões, de fatos e atos
ça e intersubjetividade" e "Simulacros em construção" são
jurfdicos como um sistema globalmente significanre" (p.
os trabalhos reunidos sob o subtítulo "fazer crer", enquanto
60). O autor examina os actantes e atores jurídicos, as
na sub-secção do "Fazer fazer" se encontram os artigos sobre
modalizações do seu fazer (que resulta num dever-fazer em
"Explorações estratégicas" e "Figuras de autoridade". Um
prescrições e um poder-fazer em permissões) e elaboram
dos insights dessa secção está resumido no quadrado semiótico
um esquema actancial com três níveis, o nível episre-
do fazer estratégico que opõe as duas modalidades de um
mológico das normas metajurídicas, o nível axiológico das
fazer fiduciário (cognitivo) do fazer político ("manipular os
regras do direito e o nível referencial das leis de comporta-
homens") e do fazer mágico ("manipular as coisas" como
mento.
homem) com as duas modalidades de um fazer estratégico
Temas da semiótica das mídias predominam na segun-
do fazer tecnológico ("manobrar as coisas") edo fazer
da secção do livro. Sob o título de "Jogos óticos", Landowski
tecnocrático ("manobrar os homens" como coisas).
analisa a dimensão escópica na representação da oposição
entre a vida privada e a vida pública dos políticos que se
II.8 Greimas, Algidas Julien e Jacques Fonranille.
manifesta em várias modalidades do quadrado "querer ser
Semiótica das Paixões, traduzido por Maria José
visto / querer não ser visto / não querer ser visto/ não que-
Rodrigues Coracini. São Paulo: Ática, 1993,294 pp.
rer não ser visto" (em público). A representação da lógica
Sémiotique des Passions, 1991.
da compra e do contrato na publicidade e a "Serniótica do
cotidiano" na imprensa (Le Monde e Libération) são os te-
A elaboração da semiótica das paixões foi um passo
mas seguintes. Em "Formas de sociabilidade", as imagens
importante no desenvolvimento daquilo que Greimas cha-
dos candidatos e dos eleitores, na propaganda eleitoral fran-
mava de projeto semiótico. O título da obra, entretanto, é
cesa, entre 1965 e 1985, são interpretadas. Nessa interpre-
,ligo enganador. Não se trata de uma investigação de esta-
tação, houve um desenvolvimento de aproximação entre
(10 de alma em si. Greimas e Fontanille não examinam as

128
129
Bibliografia Comentada - Semiôtica

Lúcia Santaella e Winfried Ncith


~o, que ~õe em jogo o saber, a emoção que afeta o poder ea
raízes e as estruturas psíquicas das emoções e afetos huma- inclinação que concerne ao querer.
nos. A análise psicológica, patológica, neutofisiológica, A a.spectualização, que, na gramática verbal, introduz
assim como os insights psicanalíticos de Freud ou Lacan categonas .. como duratividade (durati . .
urat ivo vs. iterativo) ou
sobre os afetos não apresentam nenhum interesse para os pontualidade (incoativo vs. terminativo), serve para des-
autores. Em vez de uma 'psico-Iógica', o tema é a 'verbo- crever o desenvolvimento diinarmco d a VIda
A • . afetiva: por

lógica' do discurso verbal sobre as emoções. e~em~lo, um movimento afetivo pode ser permanente (in-
O estudo examina as categorias semânticas das quais c maça~, temperamento, caráter), durável (sentimento) ou
se compõe o vocabulário das emoções e a lógica do discurso passageIro /
(humor
/.' ç t
ão) A pu 1sação passional
em oçao.» é regida
baseado nesse vocabulário. Desse exame lexico-semióticO o pela tnada clássica incoativo-durativo-terrninativo". En-
estudo se estende até os estudos anal íticos do discurso tre as vanantes
_ / do me d o, por exemplo, o traço distintivo
passional de personagens literárias de Shakespeare, Racine, da apreensao e a anterioridade, a do pavor é a incoatividade
Proust e Robbe-Grillet para chegar a uma gramática e a do terror, a duratividade.
narratológica do inventário discursivo afetivo. . .Depois da apresentação dos elementos do modelo des-
O modelo da investigação das paixões é o modelo sin- critrvo, _ osd autores se dedicam, em dois capítulos ' a' lnter-
.
tático da gramática verbal. Categorias gramaticais tais como pretaçao a avareza e do ciúme . No cam po sernannco da A·

sujeito, objeto, modalidade e aspectualidade do verbo ser- avareza e das suas v anantes,
. aparecem estruturas opositivas
vem como modelo semântico para descrever a relação de entre o verbo tomar (avidez), dar (prodigalidade), guardar
um sujeito na busca de um objeto de valor. A modalização (mesquinhez) e deixar (liberalidade).
pelo querer, dever, poder e saber é a chave para o estudo ' Como modelo das "diferentes posições que o sujeito se
dessa relação. O sujeito afetado pela paixão é um sujeito ( Ia em s eu propno
,.. . /.
Imagmano passional", os autores intro-
modalizado segundo o "ser" (e não o "fazer"). Na pai- duzem . o . quadrad o serruotrco
-Ó» •
realização / atualização /
xão da obstinação, por exemplo, que mostra um sujeito porencialização / VI·r t ua 1·Izaçao
- d O sujeito
.. (p. 128). "Assim o
mantido "em estado de continuidade do fazer", esse sujei- .ivarenro retensivo é um sujeito potencializado (não-disjun:o)
to é caracterizado por três modalidades: (1) um "saber-não- que. ..se transforma, tornando-se u m SUjeIto
. . cumulativo,
. em
ser" porque o sujeito sabe que está disjuntO de seu objeto; IIJCItO
, realizado
. . (conjunto); ,esma
da m 1:
lOrma, .
o desinteres-
(2) um "poder-não-ser" ou "não-poder-ser" porque o su- ,Id 1.e um sujeito virrualizado (não-conjunto) que se torna
cesso da empresa está comprometido e (3) um "querer-ser" .11 \IU izado (disjunro) quando se mostra generoso".
porque o sujeito insiste de todas as formas em ser conjunto ~a basedo percurso passional do ciúme se encontram
e tudo fará para que assim seja. (p. 43). As modalidades I(,h, oes d uaIs entre tres actantes
A , doi ..
OIS sujeitos ..
em rivali-
verbais também servem para distinguir entre o sentimen-

130
Lúcia Santaella e Winfried Nifth Bibliografia Comentada - Semiôtica

dade e um objeto relacionado com os sujeitos por apego. O ficação, que ultrapassa O nível do signo em duas direções.

desenvolvimento do ciúme baseia-se na macrosseqüência: Em um nível inferior ao signo que, aliás, para Greimas,

apego exclusivo - difidência sombria - inquietude/suspei- limita-se ao signo verbal, trata-se dos componentes míni-
ta _ amor ódio. As aspectualizações envolvidas nesse pro- mos dos signos e das relações entre eles. É o nível dos áto-
cesso são o incoativo (na inquietude, suspeita), o derivati- mos da expressão, dos traços fonológicos ou temas, e dos
vo (na investigação e abdução) e o terminativo (na precipi- elementos minimais do conteúdo, dos semas, ambos ainda
não inteiramente signos.
tação da prova e da certeza).
No nível superior do signo, a serniótica greimasiana

11.9 Greimas, Algirdas Julien e Joseph Courtés. Dicioná- esruda as unidades que constituem o texto ou discurso e
rio de Semiótica, traduzido por Alceu Dias Lima et al. que, portanto, vão além do signo.
São Paulo: Cultrix, 1979, 494 pp. Sémiotique. Um dos elementos centrais do dicionário é o modelo
Dictionnaire Raisonné de ia Théol'ie du Langage, 1979. do percurso gerativo do discurso que descreve a produção
de um texto como percurso que vai do mais simples ao
Esse dicionário alfabéticO é, em primeiro lugar, um mais complexo e do mais abstrato ao mais concreto , no
dicionário analítico e terminológico da semiótica greima- componente sintático e semântico. O modelo distingue,

siana do Gl'oupe de Rechel'ches Sémio-Linguistiques. Embora nas estruturas sernio-narrativas, dois níveis profundos de
também tenha querido servir como guia terminológico da unia sintaxe e semântica fundamental e dois níveis de su-
ia perfície da sintaxe e semântica narrativa. Num nível ainda
semiótica geral e das disciplinas vizinhas, como a semiolog
de inspiração saussuriana, hjelmsleviana, a lingüística es- mais próximo da superfície, aparecem as estruturas
rrutural, a sociolingüística, psicolingüística e pragmática, discursivas que transformam as estruturas sernio-narrati-
o alvo principal dessa obra foi o de fazer avançar o projeto vas em componentes de uma semântica e sintaxe discursiva.

serniótico de Greimas e de sua escola de Paris. Outras entradas do dicionário que desenvolvem con-
A semiótica greimasiana tem suas raízes principais na .eiros-chave da semiolingüística greimasiana versam so-
semiótica e semiologia glossemática de Louis H jelmslev (1.2). bre a serniótica (semiótica-objeto, tipologia e teoria), a
Outras fontes são a teoria narrativa do conto maravilhoso de x .miolog ia, o quadrado serniótico, os programas e esque-
V. Propp, o esttuturalismo antropológico de Lévi-Strauss, a IlHlS narrativos, as modalidades, a aspecrualização ou a
antropologia de G. Dumézil, a sintaxe estrutural de L. veredicção. Muitos conceitos-chave da semiótica grei-
Tesniere e a teoria das situações dramáticas de E. Souriau. IIla iana que haviam sido apenas esboçados em trabalhos
O Dicionál'io afirma que a semiótica greimasiana não d ispersos anteriores aparecem nesse dicionário de forma
quer ser uma teoria do signo, mas sim uma teoria da signi- '.tSI mática, e até mesmo alguns conceitos são nele apre-

1~~
»
132
Lúcia Santaella e Winfried Nõsb
Bibliografia Comentada - Semiótica
sentados em primeira mão, o que o torna uma obra in-
dispensável para todos os estudiosos da semiótica Edicial, 1993, 203 pp. Semiotics and Pragnzatics. An
greimasiana. Evaluative Comparison o/ Conceptual Franzeworks, 1983.
Aqueles que não estão familiarizados co~ essa
. /.
SemlOtlCa v êern - se aqui confrontados com uma terrninolo- Os temas desse livro são os fundamentos filosóficos da
gia às vezes idiossincrática cujo valor fica restrito a~~ ~ra- semiótica, o estudo comparativo das semióticas de Peirce
balhos da escola de Paris. Entre tais neologismos sermoncos (1.10,1.11,1.12, II.13) e Hjelmslev (1.2) e alguns aspectos
estão, por exemplo, "categoria tfrnica" (categoria que se das relações entre a semiótica e a pragmática.

articula na oposição euforia/disforia, tendo aforia como ter- Para Parrer, existem três abordagens da semiótica: a
mo neutro), "tensividade" (relação que o sema narrativo de semiótica analítica (Peirce), a semiótica estrutural (Hjelmslev)
um processo contrai com o sema terrninativo). Outros ex~m- e a semiótica normativa. A última, privilegiada pelo autor, é
plos estão em "acrorialização" ou "debreagern". (A prolife- uma abordagem que, segundo ele, transcende os Outros
ração dessa terminologia até resultou em um segundo paradigmas, na medida em que insiste numa visão integrativa
Dictionnaire, publicado em 1986, em Paris, mas não tradu- das três subdisciplinas da semiótica, a sintaxe, a semântica e

zido para o português). . , . a pragmática, permitindo assim a "homologação" das disci-


Esse dicionário, entretanto, não se restnnge a term~- plinas, a descoberta de isotopias teóricas e de analogias
interdisciplinares.
nologia da escola de Paris. Também trabalha com a termi-
nologia da lingüística tradicional, da estrutural e da O primeiro capítulo investiga o lugar da serniótica no
semiótica dos anos 60 e 70 em verbetes como alfabeto, quadro da filosofia e das ciências sociais. Parret vê na
anáfora, analogia, antonímia, arbitrariedade, ato de lingua- semiótica uma nova filosofia primeira, sucedendo as anti-
gem, fonética, fonologia, vocabulário ou vs. (abreviação do gas filosofias primeiras: metafísica (incluindo a ontologia),
latim versus). A atualidade e precisão desses verbetes, por epistemologia e lógica. Enquanto a semiótica abrangeria
vezes, deixa a desejar. No artigo zoossemiótica, por exem- todas essas disciplinas nos seus três ramos - o da sintaxe,

plo, qualquer leitor com conhecimentos tud.imen~ares de semântica e pragmática -, a epistemologia se restringiria à
biologia e ecologia não concordará com a aftrmaça~, sem pragmática, e a ontologia apenas à semântica. Essas idéias
indicação de fontes, de que existem "cerca de 600 língua- são seguidas por meio de referências a Morris (1.16), Grice,
gens animais". amap, Quine, Gadamer e até Hegel, Marx e Heidegger,
.nquanro o autor critica a pobreza de várias semióticas
11.10 Parret, Herman. Semiótica y Pragmática: Una Compa- r .ducionisras incapazes de captutar a riqueza da semiose.
raciôn Evaluativa de Marcos Conceptuales. Buenos Aires: No seu estudo comparativo das semióticas de Peirce e
II jelmslev, que também se estende a filósofos e lingüistas
134
135
Lúcia Santaelfa e Winfi-ied Ndtb Bibliografia Comentada - Semiótica

como Husserl, Austin, Chomsky e Greimas (1.7, 1.8), o modificações da produtividade intencional e racional dos
autor opõe o diadismo de Hjelmslev ao triadismo de Peirce, signos.
a insistência em estruturas, relações e regras de um com a Como conclusão, Parret sublinha que o "pensamento
visão de semiose como ação do signo do outro. O inreresse homologizanre" pressupõe uma norma e que a 'hornolo.
principal, porém, não se dirige tanto às diferenças entre as gização' das disciplinas, em vez de destruir a independên-
semióricas analíticas e estruturais quanro às possibilidades era de cada uma, consegue salientar, colocar em relevo, tanto
de uma "hornologização" das semióricas. Suas semelhanças quanto suas dessemelhanças em relação
Um dos pontos comuns entre Hjelmslev e Peirce, por ao fundamento do projeto normativo.
exemplo, está na abordagem lógica em vez de psicológica.
Outra semelhança está no fato de que ambas se baseiam na lI.ll Morenrin, Juan Margariõos de. EI Signo. Las Fuentes
tese de que "não há objetos que transcendam a serniose", Teól'icas de Ia Semiologia: Saussure, Peirce, Morris. Buenos
de maneira que "não há metassemiótica e os semioticistas Aires: Hachette, 1983, 199 pp.
investigam a sua própria atividade serniótica" (p. 55). Fi-
nalmenre, ambas as teorias visam a uma solução inregrativa O título desse livro já é indicativo daquilo que o leitor
da oposição enrre forma e função, entre significado e co- poderá enContrar no seu conreúdo. O corpo cenrral da obra
municação. Enquanro a semiótica peirciana reconcilia. o efetivamenre, está voltado para a apresenração dos concei.
significado e a comunicação por meio da 'comunalidade', a tos fundamentais desses três autores que podem ser consi-
inregração hjelmsleviana ocorre pela sua teoria da depen- lerados como fundadores da tradição semiológica. Sem
dência conrexrual do significado. desconhecer a dualidade terminológica entre semiologia e
A terceira parte do livro é dedicada a uma comparação ~ .m iór ica, Morentin opta por usar o termo geral
avaliativa e a uma tentativa de "hornologização" da semió- s ·miologia -. para designar a ciência geral. Preferindo con_f
tica, especialmenre da semiótica estrutural com a pragmá- crvar a qualIdade d~ adi etivo dª-Pillavra semiótica, utiliza
tica semiótica (Peirce, Morris) e com a lingüística (Grice, ('ssa última ara ualificar todas a Ja_c.uLdade.s_~atuali;a_
Austin, Searle, Monragne). Os temas dessa comparação são 1,0·' ue imj;2licam a pr.es..ença_do signos. O produto ~~'
subjetividade, racionalidade, intencionalidade, modalida- 1.111 enquanto presença perceptual de seqüências de sig-
,
de e deixis. A subjetividade junto com as condições de pro- IIIIS, é designado pelo termo semiose.

dução de semiose é o fundamenro da "virada pragmática Esclarecidas essas opções terminológicas do autor, o
da serniótica", implicando a racionalidade como estraté- lrvro se compõe de três grandes partes. A primeira é
gia. A inrencionalidade está envolvida na prática serniótica I( ti j ada ao desenvolvimenro e atualização dos conceitos
e as modalidades e a deixis (indexicalidade) determinam as IIII}' ii í ticos e semiológicos de Saussure (1.1): a oposição

136 137
Lúcia Santaella e Winfried NiJth Bibliografia Comentada - Semiâtica

língua e linguagem, a oposição língua e fala, os signos- posteriormente a sua produção; que podem ser interpreta-
língua na sua estrutura interna, valor e significação, das pela atribuição de significações específicas. Todas essas
diacronia e sincronia. Essa seqüência de capítulos é finali- manifestações, para o autor, participam das características
zada por uma discussão sobre a concepção semiológica de fundamentais do signo. Assim sendo, o conceito estendido
Saussure. de linguagem, isto é, o conceito de signo, abarca também
A segunda parte, dedicada a C. S. Peirce (1.10, 1.ll, as manifestações culturais destinadas a servir como víncu-
1.12, 11.13) e a problemática atual da semiologia, discute a lo comunicativo entre os integrantes de uma comunidade.
complexa definição de sig!!Q. eirciana, expandindo-se na- O conceito avança mais ainda para abarcar as instituições
quilo que o autor chama de 9 classes de signos, que são, na culturais de uma sociedade que não são mensagens em si
realidade, as três principais rricotornias de signos (1. quali- mesmas, mas estão destinadas a transmitir determinadas
in-legi signos; 2. ícone, índice, símbolo; 3. rema, discen- seqüências de mensagens, podendo ser consideradas dis-
te e argumento) e que não podem ser confundidas com as cursos significativos. Enfim, as crenças, os mitos, as religi}

U
1 O class~s d~ signo~, resultantes da combinatória lógica ões são também textos, assim como as estruturas de poder,
dessas tres trrcotorruas. as relações familiares, as decisões da justiça. .
Na terceira parte, Morentin apresenta uma análise crí- Onde quer que se faça presente um objeto que não se
tica da teoria dos signos de Charles Morris (1.16), voltada esgota em si mesmo, valendo na medida em que é porta-
especificamente para as condições do signo, os componen- dor de um ausente que não se pode concretizar senão por
tes do discurso, as partes da teoria do signo. meio de uma representação, aí o conceito de signo se apli-
Muito imP.9r~ntes, e~bora não se façam j2ressentir ca. Um tal conceito nos ajudará a estabelecer relações entre

fpel~ítulo jo livro ~~
chamado de "novo J2.fólogQ".
introdu ão ey_el2.í1ogo-,também

- - Na introdução, o autor delineia a vastidão do campo


da linguagem, incluindo nele uma diversificada gama de
as representações, a desentranhar seus mecanismos
cácia e a mostrar sua maior ou menor adequação de con-
teúdo e sua disponibilidade
sinala socialmente
para uma comunidade
suas significações.
de efi-

que as-

manifestações que se caracterizam como objeto da ciência Ainda na introdução, o autor discorre sobre a finalida-
semiológica. Trata-se de manifestações perceptivas que re- de e utilidade da semiologia que está em estabelecer a
presentam algo que é diferente delas mesmas; que podem homogeneidade e a heterogeneidade entre planos sígnicos
identificar-se por oposições de caracteres presentes e au- distantes, enunciar as leis desses signos, estabelecendo as
sentes; que se justapõem em uma relativa liberdade de in- estruturas mais profundas subjacentes aos significados par-
tegração e, simultaneamente, obedecem a determinadas ticulares que cada disciplina especializada designa para seus
regularidades, sejam convencionais, sejam determináveis objetos particulares de estudo.

138 139
Bibliogrclfia Comentada - Semiôtica
Lücia Santaella e Winfried NiJth

mo modo que interagem e inter-relacionam-se com seus "ob-


o epílogo do livro não é menos importante do que a
jetos sernióricos" e com seus significados. "Não há priorida-
introdução. Nele, Morentin dá continuidade a seu discur-
des nisso, nenhuma hierarquia de valores, mas um processo
so sobre a semiologia em geral, avaliando as teorias do sig-
democrático de signos que se tornam signos" (p. xii). Tam-
no apresentadas no corpo central do livro, estendendo a
bém não há "um objero chamado semiótica para ser contro-
discussão para ~oria do~, da representação signi-
lado, dominado e manipulado pelas mãos e mente de um eu
ficante, da significação e da interpretação.
autônomo e individual: o eu não é nada se não estiver engajado
numa interação incessante consigo mesmo, com outros eus,
Il.12 Merrell, Floyd. Peirce's Semiotics Now. A primer. To-
e com o .mundo físico - todos signos" (p xiii).
ronto: Canadian Scholars' Press, 1995, 254 pp.
Essa apresentação é importante para situar as idéias
sernióricas que o autor defende e que se constituem em
Esse livro traz, já no seu prefácio, explicações sobre o
marca registrada de todos os seus livros. Merrell é um au-
modo como o autor compreende os termos semiótica e
tor prolífico.
semiose. Semiótica seria o estudo da semiose, ainda que
Embora tenha o título de A Semiótica de Peirce Agora,
essa seja praticamente impossível de ser definida, pois con-
esse -livro não faz uma exegese da semiótica peirciana. A
siste de processos e efeitos, do engendramenro e interpre-
grande ênfase está posta no advérbio "agora" que aparece
tação de todas as formas de signos. Merrell enfatiza bas-
no título. De faro, o objetivo primordial do livro é
tante a palavra 'processos' , para sugerir a idéia de mudança
contextualizar o signo peirceano no ambiente cultural con-
ininterrupta. movimento incessante e mesmo a idéia de
temporâneo, oferecendo um conjunto de idéias unificadoras ,
crescimento dos signos. Para ele, também, virtualmente
mesmo que muitas delas não se tenham originado em
tudo que é imaginável é semiose. Até a semiótica, como
Peirce. O autor justifica: "o mundo em que vivemos não é
estudo da semiose, é parte desse processo infinito de sig-
mais o mundo de Peirce, assim como seu mundo diferiu
nos engendrando signos.
radicalmente daqueles que o precederam" (p. x). Sob esse
Todos os signos e todos os agentes semióticos com-
prisma, Merrell apresenta o conceito de signo de Peirce,
põem uma malha inter-relacionada na qual não há separa-
iluminando aspectos desse conceito que ainda são relevan-
ção entre signos e coisas. Trata-se, ao contrário, de pensa-
tes na cena contemporânea.
mentos-signos na mente e signos-eventos fora da mente.
Conhecedor da lógica, ciências da complexidade, arte
Daí o incessante vir a ser dos signos. Contrastando com a
c literatura, Merrell discute as idéias científicas, artísticas
idéia de signos que estão para, referindo-se ou represen-
C literárias à luz da semiose e vice-versa, compondo um
tando algo do mundo físico, mais propriamente, os signos
tecido intrincado e fluido que põe coerentemente em ação
interagem e inter-relacionam-se com outros signos do mes-

141
140
Lucia Santaella e Winfried Ndtb Bibliografia Comentada - Semiótica

a própria idéia de semiose que o autor defende: srgnos mes introduzidos por apresentações lapidares, cuidadosas
reengendrando signos. confiáveis, escritas por Nathan Houser, atual diretor do
Peirce EditiolZ Project em Indianapolis, USA. o ,i
Il. 13 Houser, Nathan et ai. (Org.). Essential Peirce, volume I O prim~iro volume cobre o período de escritos ),\yl~Oj~
(1867 -1893), Essential Peirce, volume II (1893-1909). ~e1rC1anos que vai de 1867 a 1893. Uma vez que a obra de ~f; W )...
Bloomington: Indiana University Press, 1992 e 1998, Peirce passou por transformações significativas a partir de -
399 pp. e 575 pp. ~890, pode-se dizer que o primeiro volume trata da obra
~e Peirce antes da maturidade. Os escritos estão divididos .J' ,

Esses dois volumes sobre o essencial de Peirce constitu- em três grandes grupos. No primeiro deles, o leitor encon-
em a edição mais cuidadosa, autorizada e confiável dos escri- trará os artigos que Peirce publicou noJournalo/Speculative
tos de Peirce. Os 8 volumes dos Collected Papers (Harvard Phzlosopby e que se constituem naquilo que foi cunhado
University Press, 1931-1958), que têm servido como refe- como a série cognitiva de Peirce. Entre eles, estão os ensai-
rência aos leitores da obra de Peirce, são um conjunto de os anticartesianos com os quais Peirce d eu 101ClO
.,. a sua car-
reira lógica e filosófica.
fragmentos ternaticamente reunidos por jovens filósofos JoJ A'-

inexperientes. Trata-se, assim, de uma edição lacuna r, pro- , . No segundo grupo, sob o título de "Ilustrações sobre a 1\';".
c
blemática, elíprica e cronologicamente desordenada. Infe- lógica das ciências", aparecem, os escri~os do primeiro ~ r. ifA
lizmente os 'há muito esperados' W;-itings o/ Charles Sanders ~agmatismo peir~ia,~o ;'A fixação das crenças', 'Como tor- (~H,b:~l'
,~
Jj
Peirce.A Cbronological Edition, em elaboração no PeirceEdition nar cla.ras nossas idéias erc.), assim como os escritos da 1d'L ~ ç.,

Project, na Universidade de Indiana, por uma série de percal- primeira fase dos tipos de raciocínio (hipÓtese, indução e J-...f
dedução, 1878). -- -- -
ços, estão ainda no volume V, dentre os 35 que estavam pro-
jerados. O terceiro grupo se constitui dos escritos metafísicos
Para preencher temporariamente a lacuna de uma pu- conhecidos como 'A série Monist', que vai de 1891 a 1893. Iv- 1- ,

blicação que seja mais justa em relação à obra que foi dei- ~segundo volume, que pode ser caracterizado como - : V.
xada por Peirce, surgiram em boa hora esses 2 volumes de obra de maturidade, está dividido em cin~o grupos d-e~ex-- fi/I)
Essential Peirce. São volumes projetados de acordo com to- to. O primeiro grupo, sem título, apresenta uma seleçâo (I~~?/' /
das as normas de uma edição autorizada: manuscritos de de escrrtos fundamentais que marcaram mu d anças impor-
.
Peirce cuidadosamente catalogados, revistos, comparados tante~ na obra de Peirce.

e datados; escritos agrupados de acordo com o assunto e a O segundo grupo apresenta as çonferências sobre l c

época em que foram redigidos; agrupamentos precedidos I ragmat~smo (o segundo pragmaçismo de Peirce) profi;ri~ y

de notas introdutórias esclarecedoras e orientadoras; volu- Ias na 1!ni:rersidade _de Harvard. Essas conferências que -J

142 143
Lúcia Santaella e \Vinfried Noth Bibliografia Comentada - Semiâtica

or. Esses elementos estão mais estritamente ligados à dis-


cussão do estruturalismo dos anos 60. Estrutura Ausente , o
título do livro, exprime de uma maneira pragramática a
tese central do livro sobre a "aurodestruição ontológica da
estrutura" que, nas palavras do autor, assim se exprime:

Se o código dos códigos é um termo último em perene recuo


à medida que suas mensagens particulares vão sendo idenrifi-
cadas pela pesquisa, então a Estrutura se proporá eminente-
mente como Ausência. Estrutura é aquilo que ainda não exis-
te. Se existisse, eu teria entre as mãos apenas um momento
intermediário da cadeia que me garante abaixo daquela uma
estrutura mais elementar e oniexplicativa (p. 322).

O livro se compõe de cinco partes principais: (1) "O


sinal e o sentido" introduz conceitos básicos da teoria do
signo, da informação, comunicação e retórica, conceitos
esses que foram reelaborados no Tratado, exceco a definição
da mensagem ambígua e auto-reflexiva ~p. 51) com uma
lógica aberta dos significantes (I.). 68).

Il.14 Eco, Umberto. A Estrutura Ausente. Introdução à Pes- (2) "O olhar discreto" contém uma série de estudos
quisa Semiológica, traduzido por Pérola de Carvalho. aplicados sobre códigos visuais, com exemplos de publici-
São Paulo: Perspectiva, 1971, 426 pp. La Struttura dade, de pintura contemporânea e de filmes. Discutem-se

Assente, 1968. aí as possibilidades e os limites de uma codificação dos


signos icônicos à luz da dupla articulação nas mensagens
Essa introdução à semiótica é precursora do Tratado visuais (que, no caso do filme, Eco considera uma tripla
Geral de Semiótica (11.15). O Tratado incorpora vários ele- articulação). Alguns textos publicitários são interpretados
mentos dessa introdução, mas também apresenta novas a partir da distinção de cinco tipos de mensagens.
nuanças. Na apresentação a seguir, daremos mais ênfase (3) A secção sobre a "Função do signo" é uma introdu-
aos elementos que Eco não retomou nesse trabalho ul teri- ção à semiótica da arquitetura, incluindo também refle-

144 145
Lüci« SantaeLla e Winfried Notb
Bibliografia Comentada - Semiótúa
xões sernióricas sobre a arquitetura de Brasília. Eco consi-
dera a arquitetura como fato de comunicação e analis~ o constante da mente humana é um pressuposto fecundíssimo
código arquiterônico como um código icônico espe~l.al. para toda pesquisa semiológica" (p. 380).
Signo, denotação e conotação, função articulação e retonca "As fronteiras da semiótica" é o tema da última secção,
da arquitetura são os seus temas. Distinções são esta/b~leCJ- aliás, melhor elaborada nos primeiros capítulos de seu
Tratado.
das, por exemplo, entre códigos arquitetõnicos sintancos e
semânticos, assim como entre funções primeiras e segun-
das (simbólicas, ideológicas etc.). Eco conclui que "cabe ao lI.15 Eco, Umberto. Tratado Geral de Semiótica, traduzido
arquiteto projetar funções primeiras variáveis e funções por Antonio de Pádua Danesi et al.; revisado por Ge-
segundas abertas" (p. 243). Para ele, raldo Gerson de Souza et al. São Paulo: Perspectiva,
1980,282 pp. A Theory ofSemiotics, 1976 .
Brasília transformou-se, de cidade socialista que devia
.- -
ser, na própria imagem da diferença social. Funções pri- Esse tratado, publicado originalmente em inglês pela
meiras transformaram-se em funções segundas, e estas Indiana University Press, e não em italiano, língua materna
últimas mudaram de significado; a ideologia comunitá- do autor, é a continuação de um projeto de pesquisa semiótica
ria, que devia patentear-se através do tecido urbano e do que começou no âmbito do estruturalismo italiano e francês
aspecto dos edifícios, deu lugar a outras visões da vida dos anos 60. Assim sendo, incorpora em uma nova síntese
associada. E isso sem que o arquiteto nada tenha feito de elementos de trabalhos prévios de Eco, como A Estrutura
errado em relação ao projeto inicial (p. 246). Ausente, de 1968, traduzido para o português pela Perspec-
tiva, em 1971 (lI. 14), e O Signo, de 1973, traduzido em Por-
"A estrutura ausente" ~ o título da secção seguinte com tugal pela Editorial Presença, em 1977 (I. 18).
o subtítulo "Episternologia dos modelos estruturais". Es- O tratado aborda uma pluralidade de temas, mas apre-
.;.f
trutura modelo e objeto do modelo são os temas que Eco
discute' no contexto do estruturalismo dos anos 60 (Lévy-
Strauss, Lacan, Derrida e Foucault). Apesar de sua tese sobre
-
senta três áreas temáticas
conceitos-chave
-
principais: (1) int.!:..odução aos
e ao campo de pesquisa da semiótica;j2)
uma teoria dos códigos e (3) uma teoria da rodu ão sí nica.
_

7
a ausência da estrutura,

márico'".
Eco sublinha a necessidade de se
"aceitar uma noção de estrutura como 'instrumento
A pesquisa semiológica nos sugere a presença de
prag-
A introdução apresenta a semiótica como uma "lógica
da cu~a" e f~ o ~sboço de seu cam o e método ie pes
~ A semió~ca!'par~ Ec(), "estuda todos os processos cultu-
ui- 'J *
j
constantes que podemos aceitar e fazer frutificar "levando rais como processos de_comunicação" (p. 2). O autor distin-
ainda adiante a verificação". Dessa maneira, "o funcionamento gue entre comunicação, que só pressupõe a passagem de um
sinal (e que não significa necessariamente um signo) de uma
146
147
Lúcia Santaelfa e Winfried Nõtb Bibliografia Comentada - Semiótica

fonte até um destinatário, e significação, a qual pressupõe estruturas binárias, e da semântica conexionista, além do
que o destinatário seja um ser humano (p. 5-6). modelo do signo hjelmsleviano (1.2) e da teoria semiótica
O signo, conforme Eco, não pode ser definido em si, de Peirce (1.10, 1.11, 1.12, JI. 13),cSeguindo Hjelmslev, Eco J
mas só no seu contexto comunicativo e inrerpretativo: É chama os ~ois sistemas assoc~ad~~~ c~digo de ~lan~ ( \ Ir
signo tudo quanto possa ser assumido como um substituto 9~expressao e plano de con~e~d~ . Essa dualidade semiótica (
significante de outra coisa qualquer", e, como essa outra ~aractenza a ~bordagem binária que Eco tem dos signos.
coisa qualquer não precisa necessariamente existir, "a Ele considera os signos como correla ões entre sigQjfica&s./
semiótica é, em princípio, uma disciplina que estuda tudo e significados. ncluir nessas correlações o objeto ou a refe-
quanto possa ser usado para mentir" (p. 4). rência do signo seria uma falácia referencial (p. 48) ou
fUm dos fundamentos da semiótica_ de~c~ está na extensional (p. 52).
conv~ncionalidade
-- _--ocomo critério do signo. Como a semió- Elementos novos na sua teoria dos códigos são os seus
tica"é uma disciplina que estuda o con'unto da cultura e conceitos de hiper e hipocodificação, que têm utilidade
-~mo cult~r; éum si~ema de convenções sociais, a natu- para uma interpretação da evolução criativa dos códigos e
.reza do~igno está ligada a convenções semióticas". I ré os das mensagens. Enquanto a hipercodificação está associa-
sintomas naturais de uma doença, que o médico interpre- da aos fenômenos de dejà-vu ou de kitsch, hipocodificações
ta, diz o autor (p. 12), estão baseados em uma convenção incitam a criatividade na ausência de regras.
semiótica, a qual foi devidamente registrada nos tratados O tema de sua teoria de produção sígnica está basica-
de medicina. mente voltado para "o que acontece quando se produz um
No capítulo sobre significação e comunicação, Eco in- signo ou uma seqüência de signos?" Eco desenvolve uma
troduz os conceitos de comunicação, informação, significa- teoria de trabalho requerido pelo processo sígnico que dis-
ção com base em elementos da teoria da informação. ~digº tingue entre trabalho sobre a expressão e o conteúdo eo
é o conceito-chave da semiótica de Eco. São os códigos que trabalho sobre os códigos. Outros elementos da teoria da
~stabelecem ~gras convenci~ para associar os sinais produção sígnica são os juízos semióticos vs. fatuais, refe-
f 50m os ~us significados e si nos. Códigos são descritos como
sistemas de correlações entre sistemas significantes (siste-
rência e menção, a ripologia dos signos, a ripologia dos
modos de produção, invenção estética, o trabalho retórico
mas sintáticos) e sistemas de significados (sistemas semânti- . a ideologia. Na sua tipologia dos signos, o autor examina
cos). Um código associa os elementos de um sistema o verbal vs. não-verbal, os símbolos, índices e ícones, in-
veiculante aos elementos de um sistema veiculado. t roduzi ndo categorias como réplica, ratio facilis e ratio
A teoria dos códigos de Eco se baseia numa síntese de d~(icilis!Desenvolve também uma crítica ao conceito de 1
elementos da semântica estrutural, com seus modelos de í ·one.Jig~do a sua crítica do referente. Tal cdtica se basei~

148 149
Bibliografia Comentada - Semiótica
Lucia Santaella e Winfried NÓlh
4 cia"; (2) "A semiótica como ciência crítica e/ou crítica da
U
,I
em uma- leitura bastante equivocada do ícone
~ - 2eirciano
----- ciência"; (3) "A expansão da serniótica"; (4) "Palavra diá-
,não sendo de estranhar, nessa medida, a conclusão ido au-
logo e o romance"; (5) "Por uma semiologia dos paragr~mas;
tor)
~ de que a tricotomia dos símbolos, índices e -- ícones é-
(6) "A produtividade chamada texto"; (7) "Poesia e
.insustentável (p. 57) e de que a categoria do signo icônico
---- negatividade". A tradução é incompleta pois o original em
sIevesi.?-ser eliminada (p. 189)/ francês tem um maior número de artigos.
Entre os modos de produção sígnica, Eco examina o
A abordagem é própria do pós-estruturalismo. A
reconhecimento, a ostenção, a réplica e a invenção, Como
semanálise não é só uma ciência do texto, mas também
conclusão, fala da ~~ como su'eito (argumento e pro-
uma auto-crítica da própria abordagem. Kristeva vê na
tagonista) do seu livro: "A semiose é o processo pelo qual
semiótica uma translingüística que estuda várias práticas
os indivíduos empíricos se comunicam e os processos de
significantes. O semioricista trabalha para elaborar mode-
comunicação são possíveis devido aos sistemas de signifi-
los dessas práticas significantes, mas como essa elaboração
cação" (p, 257). Mais uma vez, Bco delimita o campo
é, ela mesma, uma prática significante, o sernioticista tem
semiótico dizendo: "Mas a semiótica tem o direito de reco-
de refletir sobre seu próprio fazer semiótico. Assim, a
nhecer esses sujeitos somente enquanto eles se manifestam
serniótica se torna uma ciência crítica e autocrítica ao mes-
mediante funções sígnicas, produzindo-as, criticando-as,
mo tempo.
reestruturando-as" (p. 258), O texto é definido como uma produtividade, Em rela-
ção ao sistema da língua, o texto é construtivo, na medida
Il.16 Kristeva, Julia. Introdução à Sernanálise, traduzido por
em que segue as regras, e, ao mesmo tempo, deconstrutivo,
Lucia Helena França Ferraz. São Paulo: Perspectiva,
na medida de sua criatividade. Na verdade, cada texto é
1974, 199. Recherches pour une Sérnanalyse, 1969, uma permutação de outros textos, uma polifonia de vozes,
um mosaico de citações, não só de fontes literárias, mas
Semanálise é uma teoria semiótica do texto que Kristeva
também de uma plural idade de opiniões, conhecimentos
elaborou tendo por base fontes diversas, a psicanálise de
emprestados ou respostas (ecos) em diálogos. O texto, em
Freud e Lacan, o materialismo dialético na filosofia de Marx
síntese, é um intertexto (a influência de Bahkrine sobre
e Hegel, a fenomenologia de Husserl, a lingüística estru-
Krisreva é aqui evidente),
tural de Hjelmslev (1.2) e a gerativa de Chomsky e
O texto como prática significante e produtividade éo
Shaumyan, a teoria do dialogismo de Bakhtine e a semiótica
produto de um sujeito sempre plural que vive uma dialética
dos estóicos até R. jakobson. de contradições. Essa atividade é indeterminada. Na lite-
A autora desenvolve essa teoria em sete capítulos in-
ratura, essas características aparecem em estruturas plu-
dependentes sobre temas diversos: (1) "O texto e sua ciên-
151
150
Lücia Santaella e Winfried Nijth Bibliografia Comentada - Semiõtica

rais, por vezes plurilinguais, muitas vezes polifônicas, apre- dos com esmero por especialistas brasileiros no assunto,
sentando uma infinidade potencial. Na dinâmica da pro- Boris Schnaiderman, Aurora Bernardini e Lucy Seki, e sob
dução, Kristeva vê um processo de trabalho no sentido de organização do primeiro, os dezenove artigos estão agru-
Freud , um trabalho não de intercâmbio, uso ou valor (Marx), pados em seis partes: 1) Antropologia, etnologia, folclore e

mas de permutação lúdica. estudo das religiões; 2) Poética; 3) Semiótica e psicologia


A autora entende o elemento analítico de sua sema- da percepção; 4) Semiótica e teatro; 5) Serniótica e cinema;
nálise no sentido etimológico da palavra análise, quer di- 6) Semiótica e foniatria.
zer no sentido de dissolução. Trata-se, portanto, da de- Os artigos são precedidos por um ensaio à guisa de
composição do signo e do texto, e o alvo desse processo é a introdução, de autoria de Boris Schnaiderman, sob o título
descoberta de uma dimensão escondida da significação. de "Serniótica na URSS, uma busca dos elos perdidos". Tal
Seguindo Freud e a sua "psico-lógica" do deslocamen- ensaio funciona como um cuidadoso panorama de autores
to e condensação, Kristeva postula uma nova lógica dialética e obras que, desde meados do século XIX, foram fazendo
da contradição nas práticas significantes. Para ela, negação crescenternente surgir "uma consciência serniótica" nos tra-
(que, para Hegel, está na base tanto da diferença quanto da balhos de lingüistas, teóricos da literatura, poetas, cineas-
diferenciação) é o fundamento de qualquer atividade sim- tas, folcloristas e teóricos da cultura. Foi sobre essa tradi-
bólica. Na poesia, o princípio da negação é a lei do texto, ção que os autores dessa coletânea erigiram suas teorias
mas negatividade poética nega tanto a fala (parole) quando semióticas a partir dos anos 50 na Rússia.
o resultado dessa fala, o texto. Na primeira parte, I. M. Lotrnan discorre sobre o pro-
Em resumo, Kristeva conclui: "A constituição de uma blema da tipologia da cultura. Partindo da definição da
semiótica geral, fundada no que denominamos semanálise, cultura como "o conjunto de informações não-hereditári-
suprime o imperativo do modelo do discurso e post~la, as, que as diversas coletividades da sociedade humana acu-
para nossa observação, o estudo da produção do sentido mulam, conservam e transmitem" (p. 31), Lotman estabe-
anterior à palavra dita" (p. 196). lece como objeto da tipologia da cultura

lI.17 Schnaiderman, Boris (org.). Semiótica Russa. São Pau- a descrição dos principais tipos de códigos culturais, em

lo: Perspectiva, 1979, 307 pp. cuja base se formam as línguas de culruras isoladas, a
descrição de suas características comparativas, a deter-

Publicada em 1979, essa coletânea de ensaios conti- minação dos universais das culruras humanas e, como

nua sendo a mais importante amostragem, no Brasil, da resultado, a construção de um único sistema das caracte-

semiótica desenvolvida pelos russos neste século. Traduzi- rísticas tipológicas dos principais códigos culturais e das

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Lúcia Santaelfa e Winfried Noth Bibliografia Comentada - Semiótica

propriedades universais da estrutura geral da cultura da .. Na segunda parte, I. M. Lotrnan reflete sobre algumas
humanidade (p. 33). dIfIculdades de princípio na descrição estrutural de um
texto, propondo a interação necessária entre a construção
E. M. Mielerínski apresenta a análise estrurural como de modelos dinâmicos e de modelos estáticos da obra artís-
uma metodologia que encontra no folclore um de seus ob- tica. Ainda voltado para o tema das estruturas, I. K.
jetos mais pertinentes. Os problemas que advêm da corre- Chcheglóv analisa, nas Metamofoses de Ovídio, como se dão
lação entre os métodos estruturais e a abordagem histórica as transformações de um objeto em OUtro que não se parece
são também discutidos, à luz da metodologia sintagmática com ele e como se pode explicar racionalmente esse pro-
de Propp e da metodologia paradigmática de Lévy-Strauss. cesso inusitado.
Concepções mitológicas sobre os cogumelos são traba-
lhadas por T. L Ielizárenkova e V. N. Toporov, que analisam B. A. Uspênski propõe a obra do escritor inglês G. K.
especificamente a divisão dos cogumelos em masculinos e Chesterton como um rico material para pesquisas
femininos, um dos mais difundidos motivos relacionados semióticas, uma espécie de manual prático para um
aos cogumelos como elemento das concepções mitológicas. curso de "Semiótica Geral". Num Outro artigo, esse
A. M. Piatigórski ocupa-se do modo de serniorização mesmo autor faz um estudo comparativo dos pontos
ou aparelho simbólico da doutrina filosófico-religiosa do de VIsta Interno e externo na literatura e na pintura
budismo, enquanto G. A. Levinton aplica ao rito matri- em diversos níveis de análise.
monial o conceito de enredo e a concepção do texto como
um sistema de representações de determinado modelo do . M. N. Fortunatov redige, em duas páginas, uma espé-
mundo. CIe de manIfesto sobre o ritmo da prosa literária. Também
em ~uas páginas, V. V. Ivanov lança idéias sobre o papel das
A. A. Zalizniák, V. V. Ivanov e V. N. Toporov discutem oposrções binárias na abordagem mitopoética do tempo. Essas
uma questão que deu fama mundial aos sernioricistas mesmas idéias estão desenvolvidas no seu livro Par e lmpar.
russos: a noção de sistemas sernióticos modelizantes. I. I. Revzin confronta duas propostas de introdução de
Nesse artigo, eles apresentam um estudo tipológico- uma medida numérica para a obra artística.
estrutural da língua e da religião como sistemas Na terceira parte, D. M. Segal discute o problema do
modelizantes. D. M. Segal, por seu lado, demonstra, subsrraro psicológico do signo, utilizando como ilustração
no seu artigo, como um tema geral, "o herói réprobo", algumas concepções teóricas de Eisenstein, entre elas, sua
se transforma e como varia o significado do texto em teoria do pathos, baseada na semelhança estrutural entre o
relação a sua estrutura. objeto estético e a reação humana que ele provoca.

154 155
Bibliografia Comentada - Semiõtica
Lúcia SantaeLla e Winfried NiJrh

1.22) do qual Mukarovsky foi membro fundador junto com


Na quarta parte, as funções do cenário no teatro po-
N. S. Trubetzkoy e R. Jakobson.
pular, como determinantes do lugar e tempo da ação, são
O livro conta com um excelente prefácio de Jordi
estudadas por P. G. Bogatirév, enquanto O. G. Karpínskaia
Clovet. A primeira secção versa sobre a estética geral e con-
e!.!. Revzin aplicam às primeiras peças de Ionesco a di-
tém artigos fundamentais como "A arte como fato
visão entre enredo e fábula proposta pelos formalistas
semiológico" (1934), "Função, norma e valor estético como
russos. fatos sociais" (1936), "O lugar da função estética entre as
Na quinta parte, Ivanov estuda no cinema a estrutura
outras funções" (1942), "O significado da estética" (1942),
dos signos tais como: primeiro plano, montagem metafó-
e "Sobre o estruturalismo': (1946).
rica, montagem meconírnica, o som e a montagem rítmi-
Entre os artigos da segunda secção, que versa sobre as
ca, a composição do plano, o enredo no plano-seqüência, a
artes individuais, encontram-se artigos sobre as funções
escolha do ponto de vista e a passagem de um ponto de
na arquitetura, as artes plásticas, a estética e o tempo no
vista a outro, as categorias do tempo. Esse mesmo autor,
cinema, sobre a poesia e valores, a linguagem poética, o
na sexta e última parte do livro discute, num longo ensaio,
homem no mundo das funções. Uma boa bibliografia in-
a relação da lingüística com a afasia.
forma sobre a obra completa de Mukarovsky, as traduções
De fato, não poderia haver amostragem mais rica do
que receberam para várias línguas e estudos internacio-
perfil da semiótica russa do que esse elenco de ensaios tão
nais sobre o autor e sobre a estética estruturalista de
apropriadamente escolhidos pelo organizador do volume.
Praga.
Estrutura e função são os conceitos cenrrais de
Il.18 Mukarovsky, Jean. Escritos sobre Estética y Senziótica dei
Mukarovsky. O estruturalismo de Praga é um estruturalis-
Arte, traduzido do checo por Anna Anthony-Visová.
mo dinâmico. Estrutura não é uma mera oposição no qua-
Barcelona: Gusravo Gili, 1977,345 pp.
dro de um sistema fechado. Estruturas resultam de uma
interação de forças e dependem de funções em situações
Essa antologia reúne perto de vinte artigos de Jean
comunicativas.
Mukarovsky, escritos entre 1932 e 1947, sobre temas de
Uma função, conforme o autor, é o modo da auto-rea-
estética geral e sobre várias artes individuais, da arquitetu-
lização de um sujeito frente ao mundo externo. A inreração
ra e artes plásticas até o cinema e a poesia. A abordagem é
do sujeito com o seu meio ambiente pode ser direta ou
o estrururalismo semiótico no âmbito da Escola de Praga.
indireta, quer dizer, instrumental. Mukarovsky chama os
As raízes incluem a filosofia de Kant, Hegel, a fenome-
modos diretos de interação com o meio ambiente de fun-
nologia de Husserl, o formalismo russo e a lingüística es-
ções imediatas. Na sua visão, não só na prática cotidiana,
trurural-funcional do Círculo Lingüístico de Praga (ver

157
Lücia Santaella e Winfried Nab Bibliografia Comentada - Semiôtica

mas também na teoria predominam as funções práticas: ou II.19 Ferrara, Lucrécia D'Aléssio. A Estratégia dos Signos.
o sujeito visa a uma reorganização do objeto na realidade São Paulo: Perspectiva, 1981, 197 pp.
prática ou, no caso da teoria, a uma "projeção de uma rea-
lidade para a consciência do sujeito". Introduzido como um "texto que outra coisa não é se-
Opostas às funções imediatas, situam-se as funções não um pré-rexrosobre a possível natureza da linguagem
mediatas ou semióticas. Essas funções se dividem em duas na dissolução da sua certeza" (p. IX), esse livro está dividi-
subclasses conforme o papel do sujeito e do objeto na do em duas partes, ambas constituindo "um mosaico de
inreração com o mundo. A função na qual o objeto está no fragmentos textuais como estratégia básica de apoio teóri-
primeiro plano é a função simbólica. Aqui predomina a co (. ..) numa espécie de montagem ideogrâmica de textos
eficiência na relação entre signo e objeto simbolizado. A e autores, salientando os aspectos que mais de perto tocam
situação é diferente no caso de uma função semiótica que o objeto de pesquisa" (p. IX). Os autores de maior apoio
põe o sujeito no primeiro plano. Uma tal função é a função são C. S. Peirce (1.10, 1.11,1.12, 11.13), o forrnalisra russo
estética. V. Chklóvski e o teórico da literatura também russo M.
Os signos com funções práticas, teóricas, simbólicas Bakhrine.
servem como instrumentos, o que não acontece com signo A primeira parte se compõe de quatro ensaios. O pri-
com função estética, pois ainda que não tenha nenhum efeito meiro deles está voltado para a questão da "Arte e lingua-
específico para a realidade, reflete em si mesmo a realidade gem" com os seguintes subtítulos: "Arte: universo e lin-
na sua totalidade. Embora o signo estético seja, portanto, guagem"; "Os paradigmas da revolução modernista"; "A
um signo autônomo, a obra de arte pode, ao mesmo tem- antiestética modernista"; "O documento em mosaico". No
po, ter outras funções, escreve o autor no seu artigo sobre seu todo, o artigo toma, como esteio de suas propostas de
"Arte como fato semiológico". estudo para a arte moderna, as teses dos formalistas russos,
A função da obraartística, por exemplo, é ser um sig- principalmente os conceitos de material e procedimento.
no comunicativo quando expressa idéias ou sentimentos No último tópico do capítulo, "Documento em mosaico",
dos personagens. A soma dessa plural idade de conteúdos e alguns manifestos de arte moderna estão apresentados "sem
funções de uma arte constitui a sua significação. Assim, a preocupação rigorosa com a ordem cronológica nem com
"obra de arte é um signo que está constituído por um sím- ordem alguma", pois esses manifestos foram percorridos
bolo sensorial criado pelo artista e pela significação (o ob- na orientação em que vieram às mãos da autora, tendo sido
jeto estético) que se encontra na consciência coletiva e pela "recortados com a curiosidade de quem, através de um jogo,
relação à coisa designada, relação que se refere ao contexto de uma colagern", tentou manter "cronograficamenre, ao
geral dos fenômenos sociais" (p.37). modo de uma ilustração, a imagem verbivisual de um re-

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Bibliografia Comentada - Semiótica
Lúcia Santaella e Winfried Niith

menor é sua possibilidade de codi ficaçâo, de simbolização.


ceptor que, sorrateiramente, pretende introduzir-se n
Assim sendo, caminhamos, em escala ascendente, do sis-
universo da criação e impor-se à consideração teórica e crí-
tema literário para o sistema ambienral urbano, do ver-
tica" (p. 2l).
bal para o não-verbal, do intertextual para o contexrual
O segundo ensaio penetra ainda mais profundamente
da elite artística para o coletivo art íst ico, do tradiciona;
no legado dos forrnalistas russos, ao desenvolver "A obra
para a vanguarda. Está claro que, em conseqüência, quanto
de arte difícil" à luz do conceito de estranhamento de
maior for a taxa de inrersemiose maior tensão haverá en-
Chklóvski, que é comparado ao conceito de distanciarnenro
tre os reperrórios do emissor e receptor (p. 190).
em Brecht para desembocar em uma teoria da recepção.
O capítulos seguintes são: "Estética e serniótica" e "A
dupla escritura/Leitura: uma dialética". No primeiro, re-
flexões sobre repertório são desenvolvidas com auxílio da II.20 Plaza, Julio. Tradução Intersenziótica. São Paulo: Pers-
pectiva, 1987, 217 pp.
teoria dos interpretantes de Peirce. O segundo trabalha a
dialética à luz do dialogismo bakhriniano.
A segunda parte, mais voltada para a aplicação dos . Esse estudo dedica-se à teoria e prática da tradução

conceitos teóricos à literatura e ao ambiente urbano , abre- lOtersemiótica concebida como forma de arte. Por tradu-

se com: "A linguagem dialógica: da teoria à prática" e "O ção intersemiótica ou transmutação, na esteira de Jakobson,

signo inrerrextual ". Dialogismo, pseudodialogismo e pa- o autor compreende "aquele tipo de tradução que consiste

ródia são temas tratados nesses capítulos, indiciando a dis- na interpretação dos signos verbais por meio de sistemas

cussão de conceitos bakhtinianos. O capítulo seguinte, "O de signos não verbais, ou de um sistema de signos por ou-

signo intrarextual" interpreta cinco produções da arte pop. tro, por exemplo, da arte verbal para a música, a dança, O

cmerna ou a pintura, ou vice-versa".


A seguir, "O signo contexrual" é dedicado ao ambiente
urbano, onde são discutidos conceitos como uso, história e Na introdução, a tradução é proposta no âmbito de

uso aplicados à leitura da Praça da Sé em São Paulo. Re- uma poética sincrônica, "como a forma mais atenta de ler a

cepção através de seu uso", último capítulo, funciona como história porque é uma forma produtiva de consumo, ao

uma conclusão do volume que, nas palavras da autora as- mesmo tempo que relança para o futuro aqueles aspectos

SIm se expressa: da história que realmente foram lidos e incorporados ao


presente" (p. 2). À luz das Teses de Filosofia da História, de

"Quanto mais inrersemiótico menos descritível O signo


Benjamin, Plaza discorre sobre a história como mônada

e, portamo, menos hegemônica a linguagem, logo, quanto


"constelação na qual cada presente ilumina os outros num

menor for a possibilidade de descrição de um sistema,


relacionamento dialético e descentralizado, à maneira de

160 161
Lúcia Santaella e Winfried Nõsb
Bibliografia Comentada - Semiótica

uma rede eletrônica em contraposição à montagem linear


tro, onde é estabelecida uma tipologia das traduções:
da historiografia" (p. 4). Ainda na introdução, a tradução icônica, indicial e simbólica.
inrerserniótica é definida como "via de acesso mais interior
Na segunda parte, ponto alto do trabalho, a oficina
ao próprio miolo da tradição. Tradução como prática críti-
dos signos apresenta o modus operandi dessa tipologia
co-criativa na historicidade dos meios de produção e re-
rradurória, quando exemplos de tradução são expostos e
produção, como leitura, como metacriação, como ação so- postos em discussão.
bre estruturas eventos, como diálogo de signos, como sín-
O livro é finalizado com uma reflexão sobre a "Política
tese e reescritura da história" (p, 14). e poética da tradução intersemiótica".
O livro está dividido em duas partes. A primeira, com
o título de "A semiose da tradução intersemiótica", é mais
II.21 Rodrigues,]osé Maria et al. Arquitectura comoSenziótica.
teórico-conceitual e a segunda, chamada de "Oficina de
Buenos Aires: Ed. Nueva Visión, 1971, 107 pp.
signos", está dedicada ao ofício da tradução e leitura. Architettura come Semiotica, 1968.
Os títulos dos capítulos e subcapítulos da primeira
parte são muito sugestivos já deixando entrever sua estru-
Esse estudo se constitui em modelo exemplar para o
tura diagramática em rnulti-raios, apoiada na lógica das
projeto semiótico que tem por intenção abordar fenômenos
categorias peircianas: (1) "A tradução inrerserniótica como
da Cultura não-verbal Com instrumentos analíticos deriva-
pensamento em signos" (rerceiridade), que se desdobra em:
dos da lingüística estrutural. Em 1968, quando os autores
"Continuidade" (terceiro), "Leitura" (segundo) e "inven-
publicaram o original em italiano, estavam convencidos de
ção" (primeiro). (2) "A tradução intersemiótica como
que a semiologia, embora prognosticada por Saussure, ain-
intercurso dos sentidos" (secundidade), desdobrada em: "Os
da não existia como ciência. Esse ensaio para a elaboração de
sentidos como produtores dos objetos imediatos do signo"
uma semiótica da arquitetura, propunha-se contribuir para
(olho), nível de terceiro; "Os sentidos como produtores dos o sonho saussuriano de uma semiologia geral.
objetos imediatos do signo" (tato), nível do segundo, "Os
No primeiro plano das fontes de estudo estão as cate-
sentidos como objetos imediatos do signo" (acústico), ní-
gorias semiológicas da lingüística estrutural de Saussure
vel do primeiro; (3) "A tradução intersemiótica como (I.l.), Hjelmslev (1.2), Banhes (1.6) e Eco (1.17, 1.18). G.
trascriação de formas" (primeiridade) está desdobrada em:
K. Koeny, autor de um livro, de 1964, sobre a linguagem
"Norma e forma" (terceiro); "Intracódigo" (segundo) e "For-
arquitetônica forneceu as fontes teóricas específicas.
ma" (primeiro). Dentro desse diagrama, a tradução é pen-
O primeiro capítulo "Língua e fala", introduz essa
sada primordialmente como operações sígnicas em suas
dicorornia saussuriana, junto com a oposição código/men-
variadas modalidades. Isso fica sintetizado no capítulo qua-
sagem de Eco e examina as possibilidades de aplicar esses

162
163
Lucia Santaella e Winfried Nifth
Bibliografia Comentada - Semiótúa

conceitos no estudo da arquitetura. Os amores distinguem,


II.22 Tudela, Fernando. Hacia una Semiótica de Ia Arquitectura.
a partir de Eco, códigos sintáticos e semânticos, nas regras
Sevilla: Publicaciones de Ia Universidad de Sevilla ,
de combinação dos elementos arquitetõnicos e na sua in-
1975, 187 pp.
terpretação funcional e social.
A língua arquitetônica exibe analogias com a língua
Essa semiótica da arquitetura apresenta um panorama
verbal, como se pode ver: (1) nas regras de exclusão (por
dessa área até 1974. O estudo está baseado no estruturalis-
razões de geometria, estática, segurança e também ideolo-
mo lingüístico dos anos 60. O auror começa com uma apre-
gia etc.); (2) oposições significantes (de geometria, materi-
sentação de conceitos básicos da lingüística e do tema da
al, distribuição, tecnologia); (3) regras de associação simul-
extensão da lingüística pela semiologia.
tânea (tanto no nível urbano quanto do edifício). Outros
temas abordados nesse contexto são: critérios de pertinência, A divisão da parte especificamente semiótica

os idioletos arquitetônicos, a origem do sistema, as mu- e arquitetõnica se baseia em abordagens temáticas e

danças e a evolução do sistema e o usuário como fator de de autores individuais. A primeira abordagem, baseada
inércia na evolução da linguagem arquitetônica. na "funcionalidade" dos signos arquitetônicos é entre-
Significante e significado é o título do capítulo seguinte meada por idéias de Barthes (1.6), Prieto (1.5) e Eco
(1.17.1.18).
que trata de temas como iconicidade, motivação e arbitra-
riedade dos signos, o princípio da dupla articulação, o va- Em seguida, o autor apresenta, de uma maneira críti-
lor estrurural, as relações simagmáticas e paradigmáticas, ca, várias abordagens para a semiótica arquitetônica, na
significados e significação e forma e função na arquitetura. seguinte seqüência: a semiótica de G. K. Koenig baseada
Simagma, sistema e denotação são os temas dos últi- em C. Morris (1.16); a semiótica de Renato de Fusco, base-
mos capítulos, esses mais influenciados pelos Elementos de ada em Saussure (1.1); a de Emilio Garroni, baseada em
Semiologia de Barthes (I.6). O estudo examina as regras de Hjelmslev (1.2).
combinação na sintaxe arquitetônica, relações entre os ele- O último capítulo busca responder à questão expres-
mentos como se manifestam na implicação ou solidarieda- sa no seu título: "Morte da arquitetura como sistema de
de e nas estruturas de oposição na arquitetura. Entre as significação?" A conclusão reitera o caráter crítico do li-
conotações arquitetônicas, as mais interessantes são as vro: "A semiórica não se ocupa de uma classe especial de
conotações ideológicas. objetos. Trata-se de uma disciplina que pretende funcio-
Na conclusão, os autores enfatizam mais uma vez a nar em um segundo nível: apresenta-se como uma refle-
necessidade de se ver as estruturas arquitetônicas do ponto xão sobre a reflexão, como um olhar cultural sobre a nos-
de vista do conjunto e das leis que as governam. sa cultura" (p. 131).

164
165
Lucia Santaella e Winfried Nbth
Bibliografia Comentada - Semiótica

II.23 Morentin, Juan Angel Margarifios de. EI Mensaje o livro apresenta um epílogo sobre a prática profissi-
Publicitario: Nuevos Ensayos sobreSemióticay Publicidad. onal da análise semiótica na publicidade, um apêndice bi-
Buenos Aires: Edicial, 2a. edição, 1991, 411 pp. bliográfico e alguns ensaios suplementares sobre "Novas
abordagens à semiótica publicitária".
Nessa introdução à semiótica da publicidade são dis-
cutidos os signos básicos (símbolo, índice e ícone) e defini- II.24 Santaella, Lúcia. A Assinatura das Coisas. Peirce e a
da a semiologia, os seus alvos e limitações. O autor expres- Literatura. Rio de Janeiro: Imago, 1992,211 pp.
sa sua defesa da utilidade da serniótica para o estudo da
publicidade. Esse livro é uma aplicação ao campo da literatura da
A gênese da mensagem publicitária é o tema da se- concepção aberta de ciência professada por C. S. Peirce (I. 10,
gunda parte que tem o título "Do caos à mensagem". O 1.11, 1.12, II.13). Não se trata aqui de algo que se asseme-
processo criativo da significação, sua comunicação e o pa- lhe a comentário, crítica, interpretação ou leitura de textos
pel do emissor e receptor da mensagem publicitária são aí literários. O livro visa a evidenciar o lugar que a literatura
examinados. "O processo da publicidade do ponto de vista ocupa, e o papel que ela desempenha no quadro inrerativo
da serniologia" é o título da terceira parte. O autor começa das ciências que Peirce elaborou. Nesse quadro está inserida
examinando o signo diádico de Saussure (1.1) e várias de a filosofia, também concebida como ciência em cujo edifí-
suas manifestações. Aí aparecem aplicações do modelo cio, ocupando uma posição central, a semiótica é uma das
sígnico e tipologia dos signos de Peirce (1.10, 1.12, I.12) - disciplinas.
ícones, índices, símbolos - a uma série de exemplares de O volume começa com um capítulo de apresentação
publicidade. das experiências literárias de Peirce e dos objetivos do li-
Um outro capítulo é dedicado ao signo e seu contexto vro, que estão assim sintetizados:
na publicidade. O autor introduz o conceito de "signo-
produto", discutindo o tema do "efeito da plenitude" e contextualizar a semiótica peirciana dentro do corpo mais
examinando a estrutura narrativa profunda da mensagem amplo de sua arquitetura filosófica, inserindo essa arquite-
publicitária dentro do paradigma greimasiano (I. 7, I.8). tura no diagrama mais vasto da classificação das ciências.
Um outro capítulo da segunda parte estuda as figuras Nesse diagrama que Peirce pretendeu que fosse o mais pos-
retóricas na publicidade, quando o autor distingue um gran- sivelmente abrangente, flexível e dinâmico, iremos encon-
de número de categorias, fornecendo exemplos pertinentes trar as várias e diferenciadas posições que devem ser oçupa-
para todas. O último capítulo estuda o tema dos textos das pela teoria, a crítica e o fazer literários, assim como as
humanísrico-publicirários. modalidades heuréticas, as de divulgação e as aplicadas da

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Lücia Santaella e Winfried Niith
Bibliografia Comentada - Semiótica

teoria literária, incluindo os níveis conceitual, classificatório


diagrama das ciências elaborado por Peirce e devidamente
e descritivo ou explanatório dessa teoria (p. 26).
ampliado e atualizado por Santaella. O oitavo capítulo dis-
corre sobre a especificidade da semiose literária.
o segundo capítulo discure o estado da questão, quer
dizer, comenta a bibliografia existente que trabalhou so-
11.25 Saporiti, Elisabeth. A Interpretação. São Paulo: Escu-
bre as relações entre a serniótica peirciana e a literatura.
ta, 1995,237 pp.
Tendo por objetivo chamar atenção para a necessidade
de redimensionamento das finalidades a que os conceitos
Esse livro tem como propósito pensar a interpretação
peircianos se prestam, o capítulo três discorre sobre a ge-
analítica sob um ponto de vista lacaniano e dentro do qua-
neralidade dos conceitos da filosofia e semiótica de Peirce ,
dro conceitual e teórico da semiótica de Charles Sanders
propondo que sua arquitetura filosófica constitui-se num
Peirce, também conhecida como teoria geral dos signos
conjunto unificado de e para o pensamento científico, quer
(1.10,1.11,1.12).
dizer, um conjunto capacitado para funcionar como uma
Uma vez que a interpretação psicanalítica aciona uma
fundação fenomenológica, ontológica, epistemológica para
mudança da posição subjetiva, os dois primeiros capítulos
qualquer ciência, área do saber ou disciplina particular,
estão inteiramente dedicados à discussão da noção de su-
inclusive as semióticas especiais, ou seja, mais específicas.
jeito, em Peirce no primeiro capítulo, em Lacan, no se-
Sob o título de "Tempo da colheita", o quarto capítulo
gundo. Embora tratem de um mesmo tema, os capítulos
faz um exame da evolução do pensamento de Peirce, das
são muito distintos. O primeiro penetra na fenomenologia
descobertas e soluções de problemas com que ele se depa-
e semiótica peirceana para dela extrair uma noção semiótica
rou no final do século, que permitiram o amadurecimento
de sujeito. O segundo explora a questão do sujeito psica-
de suas idéias. Isso culminou, entre outras coisas, na elabo-
nalítico numa perspectiva lacaniana.
ração mais consistente do seu quadro classificatório das ci-
A partir do terceiro capítulo, os elos entre as duas teo-
ências. Esse quadro é cartografado no capítulo cinco.
rias, entre Peirce e Lacan, começam a se atar por meio da
O capítulo seis, "O sonho de Peirce", discute em mais
proposta formulada pela autora de "recorrer à matemática,
profundidade a proposta lançada no capítulo três, de que a
à geometria e à lógica para pensar o "objeto-a" de Lacan
filosofia peirciana pode funcionar como uma fundação ge-
em correlação ao interprerante peirciano. É assim que nes-
ral do e para o pensamento científico.
se capítulo são discutidas: (1) a figura topológica do cross-
O sétimo e oitavo capítulos se debruçam especifica-
cap utilizada por Lacan para facilitar a visualização de uma
mente sobre a literatura. No sétimo, a literatura como área
qualidade abstrata; (2) a correspondência do "objeto-a" à
de conhecimento e produção criadora é analisada à luz do
chamada secção áurea ou divina proporção; (3) o triângulo
168
169
Lúcia Santae/la e Winfried Ndt]: Bibliografia Comentada - Semiótica

semiótico com atenção especial voltada para a noção de versos, há fios evidentes de conexão que os unem a todos.
interprerante. O livro parte da fenomenologia para discutir o dualismo
POnto central desse estudo, o capítulo quatro examina das antinomias metafísicas sartreanas e da reversibilidade
o quadranre de Peirce na sua possível relação com a inter- do visível em Merleau-Ponty, chegando ao umbral da
pretação psicanalítica. O quadrante peirciano foi proposto semiose ilimitada.
como uma inovação em relação ao quadrado aristotélico. O segundo capítulo, "Da estrutura ao texto", discute
Nesse trabalho de Saporiti, o quadrante serve para falar o questões como: "Para uma estética serniótica", "Em torno
não-inscrito da psicanálise. Lacan fez uso do quadrante do texto: que texto? (semiótica, herrnenêutica, desconstru-
peirciano para identificar com o zero a falta inerente ao cionisrno)", "Pintura e interpretação", "A arte entre o co-
SUJeIto. municável e o incomensurável". Nesses tópicos, é destacada
O capítulo cinco estuda a interpretação psicanalítica e a passagem da estrutura ao texto, de uma semiolingüís-
a interpretação semiótica nas suas relações com a conotação tica a uma semiopragmática. Aí o signo já não se funda
e a denotação. Nesse capítulo, a interpretação é proposta em um modelo de equivalência mas de inferência,
como um signo remático, quer dizer, hipotético, conjectu- necessitando de um enfoque pragmático capaz de situar o
ral, alicerçado no seu aspecto de sinsigno, signo de existência texto no contexto.
concreta e índice, signo que é parte do objeto que designa. No capítulo seguinte, os jogos de linguagem de
O capítulo final faz uma síntese retomando a topologia Wittgenstein são iluminados como meio de reconhecimen-
do cross-cap na sua relação com o quadranre, a metáfora tO do pluralismo, da multiplicidade e heterogeneidade de
remática e a secção áurea. usos, concretizando-se na análise de obras pictóricas. Se-
É o poder alusivo e evocativo do signo remático, pro- gundo a autora, a filosofia de Wittgenstein promove a no-
pOStO como protótipo da interpretação, que permite a in- ção admirável de "formas de vida", útil para reajustar cer-
vocação do sujeito e a incidência da análise sobre a causa tas formulações semióticas e pós-estruturalistas. O capítulo
do desejo. final junta alguns ensaios e notas tais como "Comunicação
e Mensagem", "Ortega e a pintura", "Nota sobre estética e
II.26 Ravera, Rosa Maria. Estética y Semiótica. Rosario: Edi- colagem", "Arte e violência".
torial Fundacion Ross, 1988,250 pp. Para Ravera, é na pragmática que a correlação entre
estética e semiótica se faz mais palpável. Implementada
Esse volume reúne uma série de ensaios que foram es- em diversas áreas da estética, a metodologia semiótica pode
critos originalmente para congressos, encontros universi- ser avaliada como a mais importante orientação científica
tários , centros de estudos. Embora escritos em tempos di- da estética como disciplina.

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Lüci« Santaella e \Vinfried Nijth Bibliogl~afia Comentada - Semiâtica

II.27 Sini, Cado. Semiôtica y Filosofia, traduzido por Sara objetivamente homogêneos ou, pelo menos, afins (p. 10).
Vassallo. Buenos Aires: Hachette, 1985,231 pp. Entre a semiótica e a hermenêntica, entre Peirce (1.10,1.11,
1.12, II.13) e Nietzsche, Sini encontra um terceiro
o autor desse livro pretende tratar do encontro entre inrerlocuror, representado pela investigação pós-estrutu-
semiótica e filosofia, indagando, desse modo, sobre um ralista de Foucault sobre a linguagem, à qual são agrega-
problema que se situa além dos limites disciplinares já es- das referências importantes à fenomenologia de Ricoeur e
tabelecidos. Uma tal indagação poderia também ser for- o anti-humanismo de Lévi-Strauss.
mulada, nos diz Sini, por meio de uma paráfrase de um O livro apresenta esse horizonte de problemas em cin-
célebre título de Heidegger: "No caminho para o signo". co capítulos. O primeiro, dedicado a Peirce, trata das se-
Com isso, a investigação realizada pelo autor ma~a guintes questões: A semiose infinita, as relações triádicas
melhor sua modéstia, refletindo ao mesmo tem o, a natu- dos signos e as categorias fenomenológicas e as ciências
~agm;~tária do tratamento dad ao tema. norrnativas (estética, ética e lógica ou serniótica).
{
Assim sendo, o termo semiótica não é empregado nes- No segundo capítulo, são discutidos os tópicos O1e-
se livro para designar uma disciplina específica já fundada tzschianos sobre a verdade e a linguagem e o "nosso novo
ou ainda para ser fundada, mas para se referir a um hori- infinito".
zonte de problemas que, de modos dissimilares e basean- Foucaulr e os problemas da verdade e do enunciado
do-se em pontos de vista e pressupostos diferentes, hoje são os assuntos do terceiro capítulo.
em dia colocam em questão o pensamento ou a própria No quarto capítulo o tema da fenomenologia e semió-
filosofia. tica é enfrentado à luz de Ricoeur, enquanto o tema da
Sini esclarece que uma filosofia do signo implica ne- filosofia e semiótica é enfrentado no quinto e último capí-
cessariamente o problema da interpretação, tema que é tanto tulo à luz do anti-humanismo de Heidegger e Lévy-Strauss.
recente, se levarmos em conta a hermenêutica de Heidegger
~ a Gadamer, quanto antigo. Em relação à hermenêutica con- II.28 Tatit, Luiz. Musicando a Semiótica. Ensaios. São Paulo:
temporânea, Nierzsche desempenha a mesma função de Annablume/Fapesp, 1997, 163 pp.
precursor que se deve assinalar a Peirce no que diz respeito
à semiótica. Nessa perspectiva, o encontro entre semiótica Esse conjunto de ensaios reivindica "a presença da por-
e hermenêutica está "destinado", no sentido que esse ter- ção musical necessária a qualquer reflexão conseqüente so-
mo adquire na grande pragmática de Peirce, se é certo que bre a construção do sentido" (p. 7). Trata-se de musicalizar
a "serniose infinita" de Peirce e o "novo infinito" das intepre- a serniórica, "incitando os pesquisadores a incorporar à te-
tações de Nietzsche designam um campo de problemas oria as oscilações tensivas presentes em quase todas as fases

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Lúcia Santaeila e Winfried Nõtb Bibliografia Comentada - Semiôtica

de produção e de compreensão do discurso, seja esse verbal das determinações melódicas e lingüísticas e da compati-
ou não-verbal" (p. 7). bilidade entre elas" (p. 8).
A inspiração para musicalizar a semiótica chegou a Tatit
por meio de uma colocação "sábia e irônica" de Herman Parret, lI.29 Eero Tarasri. A Theory ofMusical Semiotics. Bloomington:
segundo a qual "as virtualidades estruturais peculiares ao texto Indiana University Press. 1994,328 pp.
musical poderiam levar a semiótica a rever seus princípios e
a substituir, assim, a tradicional conduta de semiotização do Eero Tarasti é um dos mais respeitados sernioricistas
objeto pela musicalização da serniótica" (p. 147). da música em todo o mundo. Há alguns anos, aliás, defen-
O volume está dividido em duas partes. A primeira deu tese sobre o compositor brasileiro Heitor Villa Lobos
delas, "Musicando a serniótica", tem por objetivo lançar em cuja obra é evidentemente um especialista. '
objetos de pesquisa que possam contribuir diretamente para O prefácio para esse livro, escrito por Thomas A.
a dinamização do modelo teórico, no caso, o modelo da Sebeok, apresenta o conteúdo do livro de forma tão escla-
semiótica greimasiana (I.7, I.8, lI.4, lI.5, lI.8), aí sob in- recedora que a tomaremos aqui como referência básica.
fluência de Hjelmslev (I.2) e com apoio nas obras de Claude Como o próprio título do livro sugere, Tarasti preten-
Zilberberg. Entre esses objetos, tem-se: o corpo (capítulos de elaborar uma teoria da semiótica musical. Para isso
II e III); a estética (capítulos IV e V), a enunciação (capítu- baseia-se em informações provenientes da história da rnú-

lo VI) e a canção (capítulos I e VII). sica ocidental e em várias teorias de signo. Tomando a
Dando continuidade a sua obra anterior (Semiótica da música como uma arte narrativa, o suporte teórico domi-
Canção: Melodia e Letra, São Paulo: Escuta, 1994), na se- nantemente utilizado por Tarasri vem de A. J. Greimas
gunda parte do volume, sob o título de "Analisando a can- (I.7, I.8, 11.4, 1I.5). Mas o autor considera as tradições de
ção", o autor se dedica inteiramente ao tema da canção. Peirce (I.10, I.l1, I.12, 11.13), Saussure (1.1) ou Lorrnan
Alguns parârnetros descritivos são aí traçados para serem (111.6) como fundações também possíveis para uma
aplicados a casos concretos. Os capítulos dessa parte ver- serniótica da música.

sam sobre: "Elementos para a análise da canção popular", Na primeira parte do livro, são introduzidos os con-
"Valores inscritos na canção popular", "Tempo e tensividade ceitos principais do modelo teórico seguido pelo autor:
na análise da canção" e "Manifestação das categorias tem- isotopias, categorias actanciais tempo-espaciais, modalida-
porais". Tatit afirma que esses dois últimos capítulos, es- des e o quadrado serniótico, que são ilustrados por muitos
pecialmente, apresentam uma certa evolução do enfoque exemplos. A segunda parte do livro coloca esse modelo em
teórico, na adoção "cada vez mais ampla de critérios rítmi- prática, analisando as maiores obras musicais da tradição
cos e temporais para a análise da sintaxe cancional, ou seja, musical do ocidente.

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Lúcia Santaefla e Winfried No/h Bibliografia Comentada - Semiótica

Variando a aplicação do método de acordo com o estilo camenre ou por convenção causa uma reação no receptor;
e o compositor, o modelo teórico se mostra altamente eficaz (2) sintoma, um signo natural, automático e compulsivo;
como ferramenta que capacita o leitor a distinguir minúcias (3) ícone, signo por semelhança; (4) índice, um signo por
que não seriam percebidas sem o artifício da teoria. contigüidade com o seu objeto; (5) símbolo, signo conven-
As classificações peircianas dos signos também são cional; (6) nome, signo designando uma classe exrensional.
aprovei tadas para revelar como os aspectos icônicos, Três capítulos examinam em pormenor os seguintes
indiciais e simbólicos são absorvidos dentro do discurso tópicos: os sintomas, principalmente na medicina; os sig-
musical. nos indexicais nas suas manifestações criminológicas, na-
O narrativo e o antinarrativo e mesmo o performático turais, científicas e lingüísticas; os signos icônicos, da mí-
na música são também explorados pelo autor nesse seu mica dos animais à comunicação cotidiana e verbal.
modelo de análise semiótica para a revelação das estruturas Um capítulo especialmente original trata dos signos
sintáticas e semânticas da música. do fetiche em várias culturas, na vida cotidiana, na sexo-
logia. Sebeok define o fetiche como um signo principal-
n.30 Sebeok, Thomas A. Signs: An lntroduction to Semiotics. mente indexical da categoria pars-pro-toto (sinédoque) mis-
Toronto University Press, 1994, 154 pp. turado a traços icônicos.
Mesmo no capítulo dedicado a signos lingüísticos
Essa introdução à semiótica de Thomas Sebeok não Sebeok não assume o ponto de vista de um lingüista, mas
está voltada para a história da semiótica nem para as suas focaliza em primeiro lugar a definição da semiótica na sua
principais correntes, mas sim para um panorama dos te- relação com a lingüística, e a definição do signo verbal na
mas fundamentais da semiótica como o autor a entende, sua relação com o signo não-verbal. Mais uma vez o autor
quer dizer, uma semiótica que começa na biologia com o enfatiza a necessidade de uma ancoragem dos estudos
código genético, com processos imunológicos e com a co- lingüísticos em uma semiótica geral e biossemiótica.
municação dos animais, que inclui a comunicação verbal e No último capítulo, sobre a "linguagem como um sis-
não-verbal humanas, indo até a evolução da comunicação tema modelizante primário" (conceito extraído da semiótica
humana. russa), Sebeok discute vários modelos de signo e de comu-
A atenção principal do autor dirige-se para a biosse- nicação com ênfase especial no modelo de Uexküll da
miótica. Com base em Peirce, Morris e no biólogo Thure interação serniótica do organismo com o seu meio ambien-
von Uexküll, Sebeok apresenta sua definição de signo e de te. Depois de um breve panorama da evolução da língua
comunicação, desenvolvendo uma tipologia em que dis- humana desde o bomo habilis, há dois milhões de anos, o
tingue seis tipos de signo: (1) sinal, um signo que mecani- autor conclui o livro dando apoio às afirmações de Peirce

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Lúcia Santaella e Winfried Nijth
Bibliografia Comentada - Semiõtica

de que "cada pensamento é um signo" e que a origem do


"a origem do eu está nos processos microbiológicos da
pensamento e da cultura está no mundo orgânico.
imunologia. Recognição e resposta são as duas atividades
elementares na semiose imunológica, mas já nesse nível, a
II.31 Sebeok, Thomas. A Sign isJust a Signo Bloomington:
recognição tem de ser uma recognição dividida, porque o
Indiana University Press, 1991, 178 pp.
genoma tem que distinguir entre os signos do outro que
indicam uma invasão de fora, tendo de ser atacados (ou
Nessa coletânea de estudos sernióricos, Sebeok apre-
não), e os signos do eu, de dentro, aos quais uma tal reação
senta uma introdução a vários conceitos básicos e temas da
não é permitida (para evitar autodestruição)". Sebeok tam-
semiótica geral. Uma ênfase especial é colocada no alvo de
bém estende esse modelo ao nível psíquico para explicar a
Sebeok para a extensão da ciência dos signos, de uma ciên-
origem da ansiedade no eu.
cia antropo ou até logocêntrica para uma ciência mais ge-
A teoria da serniótica russa (II.17), da língua como
ral, que estude os processos sígnicos em todos os organis-
sistema modelizante primário e da cultura como sistema
mos biológicos. O livro contém quinze capítulos que se
modelizante secundário, é o tema do capítulo seguinte. Nes-
seguem sem subesrrururas ou divisões em secções.
se , o autor examina o conceito de modelo na lingüística e
O primeiro, sobre a "Doutrina dos signos", é uma in-
serniótica, chegando às seguintes conclusões: (1) o modelo
trodução ao conceito do signo desde a fórmula medieval
primário semiótico está nos nossos modelos mentais e não-
afiquid stat pro afiquo até a teoria biológica do signo de J. verbais do mundo; (2) língua já é um modelo secundário,
von Uexküll, que situa o conceito de signo na interação de
cujo novo potencial modelizante está na sintaxe. Cultura,
um organismo com seu meio ambiente. Sebeok conclui que
portanto, tem de ser redefinida como modelo terciáriodo
o tema da serniótica não é só comunicação, o intercâmbio
mundo.
de qualquer mensagem, mas também a significação.
As relações entre a lingüística e a serniótica e a evolução
"Comunicação" é o tema do segundo capítulo, no qual
da linguagem são os temas dos capítulos seguintes, nos quais
o autor apresenta uma tipologia das fontes e dos canais
Sebeok critica a visão da relação entre lingüística e semiótica
dos signos, propondo um modelo de comunicação com os
dos estruturalista franceses, apoiando modelos dessa relação
elementos, fonte, destino, mensagem, canal, código e con-
extraídos de Peirce (1.10, 1.11, 1.12, 11.13), Morris (1.16),
texto e colocando em relevo a importância da biorecnologia
]akobson, A contribuição da semiótica para a lingüística,
e da informática para o futuro desenvolvimento da comu-
conforme o autor, está na extensão dos estudos através da
nicação humana.
dimensão do não-verbal e pela dimensão biológica e evolutiva.
Nos dois capítulos seguintes sobre "O eu serniórico" e
A evolução da linguagem humana é delimitada desde
"O eu semiótico revisirado", o autor elabora a tese de que
o bomo habilis, há mais de dois milhões de anos, e continua

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Lúci« Santaella e Winfried Nab Bibliografia Comentada - Semiótica

com uma investigação dos projetos de etólogos america- que a semiótica ironicamente aparece tantas vezes como uma
nos, visando a ensinar linguagens não-verbais a chimpan- corre de BabeI na qual a possibilidade de comunicação e com-
zés. A avaliação de tais projetos é devastadora. Na inter- preensão é frustrada por neologismos (palavras recém cria-
pretação de Sebeok, teriam fracassado completamente. das) e usos idiossincráticos de palavras conhecidas. Vem daí
No capítulo seguinte, a perspectiva evolutiva é ampli- a importância desse glossário, cujo objetivo é definir, de modo
ada, partindo da semiose na origem da vida, que foi prece- claro e direto, os termos-chave do discurso semiótico.
dida por informação, não-semiose. Um amplo panorama A seguir, Colapietro fornece esclarecimentos sobre a
da biossemiose e da biossemiótica é apresentado, tratando seleção dos termos, que tomou por base sua centralidade
dos sistemas imunológicos e metabólicos, a semiose nas no campo semiótico, esse concebido de maneira ampla. As
plantas (fitosserniose) até a semiose verbal. palavras que mais freqüentemente aparecem nos índices
Temas da bio e zoossemiose continuam a ser tratados dos livros de semiótica estão aqui definidas, sem que pers-
nos três capítulos seguintes, os quais discutem os temas da pectivas ou tradições sejam indevidamente privilegiadas.
"Serniose e serniótica", do "Animal em uma perspectiva As entradas variam quanto ao caráter, algumas são muito
serniótica" e da "Serniose com animais treinados". brevemente definidas, outras chegam a atingir a dimensão
A semiótica do fetiche na psicopatologia sexual e na de pequenos ensaios em função da necessidade de apresen-
puberdade é o tema do capítulo seguinte, que enfatiza a tação de um panorama histórico ou das controvérsias que
indexicalidade do fetiche. Esse capítulo é, então, seguido rondam o termo. Cada entrada é auto-suficiente, quer di-
por um ensaio dedicado integralmente ao tema da inde- zer, nela o leitor encontrará a informação básica que procu-
xicalidade em geral, tratando também da deixis lingüísti- ra. Mas há ainda um sistema de referência cruzada. Em cada
ca e dos signos naturais. Depois de uma breve contribui- entrada, há termos que aparecem em negrito. Isso funciona
ção ao tema da semiótica e marketing, o autor, em "A ciên- como indicador de que esses termos podem fornecer infor-
cia do signo e a ciência da vida", mais uma vez sublinha os mações colaterais importantes para o termo daquela entra-
fundamentos biológicos e naturais da serniótica geral. da específica. Por exemplo, na entrada para o termo abdução,
o leitor irá deparar-se com termos em negrito, tais como
II.32 Colapietro, Vincent M. G/ossary of Semioiics . New hipótese, dedução, indução. Esses negritos sugerem que
York: Paragon House, 1993,212 pp. ele deverá procurar também esses outros termos visto que
lhe darão informações complementares para o entendimen-
Esse pequeno glossário de semiótica foi concebido para to do termo que está sendo definido, no caso, abdução.
pessoas que têm pouca ou nenhuma familiaridade com o Um léxico ou glossário não pode, evidentemente, subs-
campo de pesquisa da semiótica. Na introdução, o autor diz ti ruir o conhecimento das obras dos autores das quais os

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Lúcia Santaella e Winfried Noth Bibliografia Comentada - Semiótica

termos foram extraídos. Entretanto, o glossário é sempre artitrariedade e motivação: o signo lingüístico; paralin-
útil tanto para os inicianres quanto para os especialistas, guagem; escrita; linguagem universal; a linguagem dos
pois há situações em que mesmo eses últimos necessitam sinais; substitutos da língua.
de urna definição rápida, clara, precisa e direta. V. Do estruturalismo à semiótica textual: escolas e figu-
Enfim, esse compacto e cuidadoso glossário funciona ras maiores: introdução; estruturalismo, pós-estrutu-
corno urna chave de acesso ao vocabulário especializado da ralismo e neo-estruturalismo; formalismo russo, esco-
serniótica, podendo também ser de grande utilidade para la de Praga, semiótica soviética; a semiótica textual de
filósofos, antropólogos, comunicólogos, psicólogos, psica- Barthes (1.6); a semântica estrutural de Greimas e seu
nalistas ou quaisquer outros que estejam interessados em projeto de serniótica textual (1.7,1.8, 1I.4, 1I.5, II.8); a
realizar um reconhecimento do terreno semiótico. semanálise de Kristeva (11.16); Eco (1.17, 1.18, 1I.14,
II.15,IlI.9).
1I.33 Nôth, Winfried. Handbook of Semiotics. Bloomington VI. O campo da semiótica textual: introdução à semiótica
University Press, 1990, 576 pp. textual; hermenêutica e exegese; retórica e estilística;
literatura; poesia e poeticidade; teatro e drama; narra-
Esse manual de semiótica apresenta um extenso pano- tiva; mito; ideologia; teologia.
rama enciclopédico dos ternas e das escolas da semiótica. Os VII. Comunicação não-verbal: introdução à comunicação não-
seus 64 artigos, divididos em oito secções são os seguintes: verbal; gesto, linguagem corporal e kinésica; sinais
1. História da semiótica e clássicos da serniótica moder- faciais; olhar; comunicação tátil; proxêmica: a semiótica
na. História antiga, medieval e séculos XVI até XIX. do espaço; cronêmica: a semiótica do tempo.
Peirce (1.10, 1.11, 1.12, li. 13), Morris (1.16), Saussure VII!.Estética e comunicação visual: estética; música; arqui-
(1.1), Hjelmslev (1.2), Jakobson. tetura; objetos; imagem; pintura; fotografia; filme;
11. Signo e significação: signo; significação, sentido e re- quadrinhos; publicidade.
ferência; semântica e semiótica; tipologia dos signos: Um índice de matérias e de pessoas permite a orienta-
signo, sinal, índice; símbolo; ícone e iconicidade; me- ção sobre outros ternas da semiótica e as conexões entre
táfora; informação. esses ternas. Nesse índice de assuntos e termos, o leitor
III. Semiose, código e o campo semiótico: zoossemiótica, poderá encontrar respostas para suas dificuldades termino-
etologia e semiogênese; comunicação e semiótica; fun- lógicas. A bibliografia contém perto de 3.000 títulos.
ção; magia; esttutura; sistema; código; ensino.
IV. Língua e códigos baseados na língua: introdução à co-
municação verbal; a língua numa moldura semiótica;

182 183
III
TÍTULOS COMPLEMENTARES

1II.1 Krampen, Martin, et al. (eds.). Classics of Semiotics.


New York. Plenum, 1987,168 pp.

Em oito capítulos, esse livro apresenta os autores con-


siderados, pelos editores, os teóricos clássicos da semiótica:
C. S. Peirce (1.10, 1.11, 1.12, II.13), Charles Morris (1.16),
Ferdinand de Saussure (1.1), Louis Hjelmslev (1.2), Roman
Jakobson, Karl Bühler, Jakob von Uexküll e Thomas A.
Sebeok (II.30, 11.31). O livro contém dois prefácios. No
primeiro deles, T. A. Sebeok lembra que, por limite de
espaço, a obra não poderia suportar a inclusão de todos os
clássicos do século XX e menciona, por exemplo, Roland
Barthes (1.6), Ernst Cassirer, Urnberto Eco (1.17,1.18,11.14,
11.15, II1.9, II1.1 O), Algirdas J. Greimas (1.7,1.8, lI.4, II.5)
e René Thom como clássicos ausentes.
No segundo prefácio, Roland Posner sublinha o cará-
ter interdisciplinar da semiótica, à qual o volume visa ser-
vir como introdução. As conexões interdisciplinares inclu-
em a filosofia, a Iinguística, a psicologia, a medicina, a
biologia. Posner define a semiótica como a ciência dos pro-
cessos sígnicos, que tem por objetivo estudar todos os ti-
pos de comunicação e intercâmbio de informação entre se-
res humanos, animais, plantas, sistemas internos de orga-

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Lúcia Santae/la e Winfried Not]: Bibliografia Comentada - Semiõtica

nismos e máquinas (p. IX). Essa ciência tem um ramo teó- Urnberro Eco fala sobre a influência de Jakobson no
rico e geral, um ramo comparativo e um ramo aplicado. A desenvolvimento da semiótica, enquanto Thomas Sebeok
pesquisa semiótica tem de dererminar tanto o objeto quanto introduz K. Bühler como um precursor da serniórica.
o método de seu estudo. No seu âmbito, também está in- Thure von Uexküll discorre sobre a obra de Jakob von
cluído seu potencial crítico, pois "a semiótica pode ajudar Uexküll, biossemioticista auant-la-Lettre, criador de uma
na mudança de padrões de comportamento na arte, nas teoria dos signos e dos hoje famosos conceitos de umwelt
mídias, nas instituições públicas e em hábitos de compor- (mundo exterior) e inenwelt (mundo interior). O autor fi-
tamento individuais que perderam a sua função original, naliza o texto com uma comparação bastante oportuna en-
tornando-se irracionais" (p. XI). tre as teorias de signos de Uexüll, Peirce, Saussure e Morris.
O primeiro clássico apresentado por Klaus Oehler é C. Por fim, Eugene Baer apresenta a doutrina dos signos
S. Peirce. Aí aparece uma introdução aos fundamentos e de Sebeok e suas contribuições para o desenvolvimento da
desenvolvimentos da serniótica peirciana, com ênfase no antropo e zoossemiótica, para a endo e exossemiótica. O
alto grau de generalidade dessa teoria e na discussão sobre "tomismo" de Sebeok, as formas de vida e as formas da
o conceito de consenso que tem importância fundamental linguagem, totem e tabu e a serniótica em transição são
na filosofia de Peirce. outros assuntos discutidos pelo autor.
A serniótica behaviorista de Charles Morris é apresen- No anexo, o livro ainda apresenta um pequeno dicio-
tada por Roland Posner. Os temas estão aí voltados para o nário muito útil na explicação que fornece dos principais
conceito de ação em Morris, sua tipologia dos signos, a conceitos da semiótica que vão da "ação" até a "zoos-
teoria da significação, a teoria do uso e do valor dos signos. serniótica" .
Martin Krampen contribui com um panorama do de-
senvolvimento da semiologia saussuriana, discorrendo so- III.2 Innis, Robert (ed.). Semiotics: An Introductory Anthology.
bre a biografia de Saussure, a relação entre lingüística e Bloomington: Indiana University Press, 1985,331 pp.
semiologia em sua obra, a generalização semiológica dos
conceitos básicos saussurianos, suas relações com o estru- Essa antologia funciona como um livro-texto que apre-
turalismo e as perspectivas da semiologia. senta passagens ou artigos-chave de quinze sernioricistas
Jürgen Trabant apresenta a glossemática de Hjelmslev desde C. S. Peirce. Na sua introdução, Innis justifica a se-
como uma semiótica geral, que discute os problemas da leção dos artigos e fornece informações suplementares e
língua no seu papel de princípio geral da estrutura semió- biográficas sobre os autores. O alvo do editor foi "juntar
rica, os signos duplamente articulados e a conotação e em um só volume textos cruciais que lidam diretamente
metassemiologia. com temas semióticos de modo que eles possam ser irnedi-

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Lúcia Santaella e Winfried Nõtb Bibliografia Comentada - Semiótica

atamente confrontados uns com os outros" (p. XI). Os cri- comparece com um artigo que se tornou muito famoso ,
térios de seleção adorados foram os seguintes: "(1) impor- sobre a retórica da imagem. Do historiador da arte Meyer
tância histórica; (2) fertilidade heurística; exernplificação Schapiro foi selecionado o texto sobre alguns problemas na
de análise serniótica; e (4) relevância atual" (p. XII). Innis semiótica das artes visuais: campo e veículo nos signos
também faz um breve apanhado crítico de outras introdu- imagéticos. De Émile Benveniste, "A semiologia da lin-
ções à semiótica, tais como: A Theory 01 Semiotics, de guagem". Umberto Eco comparece com um texto que vol-
Umberto Eco, Indiana University Press, 1976; Structuralism tou a ser publicado em uma série de outros lugares, inclu-
and Semiotics, de Terence Hawkes, University of California sive nos seus próprios livros: "A semântica da metáfora".
Press, 1977; The Dimentionality olSigns, Tools, and Models, O volume é finalizado com um texto de René Thom "Do
de]ames Bunn, Indiana University Press, 1981; Semiology, ícone ao símbolo" e um texto de Thomas A. Sebeok sobre
de Pierre Guiraud, tradução de Georges Gross, Routledge zoossemiótica: "Os componentes da comunicação humana".
and Kegan, 1975; lntroducing Semiotics: lts History and
Doctrine, de ]ohn Deely, Indiana University Press, 1982 III.3 Deely, ]ohn, Brooke Williams e Felicia Kruse (eds.).
(ver I.20). Frontiers in Semiotics.Bloomington: Indiana University
Todos os textos do volume são precedidos por uma Press, 1986, 329 pp.
introdução que contextualiza o texto escolhido e o papel
de seu autor na história da semiótica moderna. Em 23 textos de autores diversos, os editores dessa
O primeiro mestre da semiótica a ser escolhido é C. S. antologia exploram especificamente o tema das "fronteiras
Peirce (1.10, 1.11,1.12, II.13) e os textos apresentados são da semiótica". Tendo seu quadro de referência semiótico
extratos do segundo volume dos Colleaed Papers que ver- na filosofia, O volume discute prioritariamente o papel do
sam sobre a definição e a tipologia dos signos. signo como mediador do conhecimento através dos tem-
A seguir, aparece Ferdinand de Saussure (I. 1) com o pos. A coletânea pretende mostrar que a persistente con-
capítulo do seu Curso sobre o signo lingüístico. O próximo tribuição da semiótica contemporânea está enraizada em
na seleção é V. N. Volosinov, com seu artigo sobre a uma tradição filosófica, sempre mencionada sob o título
interação verbal. Karl Bühler comparece com seu artigo de "A tradição de Locke-Peirce-Morris".
sobre o princípio chave: o caráter sígnico da linguagem. O que o volume traz à tona é uma perspectiva trans-
Em seguida, vem Susanne Langer e seu texto sobre formas disciplinar, intrinsecamente unificada, apoiada no todo do
discursivas e presentativas. O texto selecionado de Gregory conhecimenro e da experiência, a despeito da diversidade
Bateson é "Uma teoria do jogo e da fantasia". O de Roman das disciplinas intelectuais e dos métodos lógicos empre-
]akobson é "Palestra final: Lingüística e poética". Barth s gados pelas disciplinas, sejam elas humanísticas ou cienrí-

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Lücia Santaella e Winfried NiJ"th Bibliografia Comentada - Semiôtica

ficas. Desse modo, Frontiers in Semiotics atende à necessida- Krampen C'Firossemiótica"), John Deely ("Sobre a noção
de de uma antologia que funciona como um guia semiótico de fitosserniótica").
e que desenvolve a compreensão desse campo para além da (III) "Temas em desenvolvimento" trata da ruptura com
tradição lingüístico-literária, numa orientação rumo a um os limites impostos pelos vários paradigmas lingüísticos,
horizonte intelectual que é, ao mesmo tempo, um antído- na medida em que a semiótica atinge perspectivas de de-
tO contra as especializações atornizadas das disciplinas aca- senvolvimento mais amplas. As contribuições para esses
dêmicas e uma restauração do pensamento histórico e do temas são de Thomas Short ("A vida entre os legissignos'')
papel central que ele deve desempenhar na investigação e Floyd Merrell ("Para além do estruturalismo: uma crítica
humanística. dos pressupostos").
No prefácio, os autores colocam a serniótica "entre a (IV) "Remodelando esferas tradicionais: algumas apli-
moda e a revolução" e esboçam um ambicioso panorama cações regionais" ilustra a penetração da semiótica em al-
dos esrudos semióticos, no qual aparecem áreas até então gumas das áreas já estabelecidas em termos tradicionais.
(1986) quase inexploradas, tais como a biossemiótica, a Essa secção tem uma função apenas representativa visto
endossemiótica e a fitossemiótica. que a influência da semiótica vai muito além das áreas que
O livro está dividido em cinco partes: (I) "O nome e puderam ser cobertas nessa secção, tais como "O sintoma
seu contexto" explica a origem do termo semiótica em médico", de Eugene Baer; "Sobre os símbolos", de U. Eco;
Locke, numa perspectiva capaz de assimilar o todo da "Serniótica da Cultura", de Irene Portis Winner; "Dis-
epistemologia e da filosofia natural. Nessa parte aparecem sernia", de M. Herzfeld; "Prolegornenos para uma semiótica
contribuições de John Locke ("Cunhando o nome"), John comparativa da lei", de R. Kevelson; "Semiótica, comuni-
Deely ("A coalescência da consciência serniórica") e Thomas cologia e o sofista de Platão", de Richard Laningan; "A
A. Sebeok ("A doutrina dos signos"). história em relação com a serniótica", de Brooke Williams;
(II) "Sistemas semióticos: antropossemiótica, "Heráclito e as fundações da serniótica", de Luigi Romeo.
zoossemiótica, firosserniórica" trata desses três principais (V) "O nome e suas direções" retoma finalmente ao
sistemas semióticos, com indicações de novas fronteiras nome para explorar não suas origens, mas seu futuro. Essa
além e aquém dessas três áreas mais exploradas. Aqui apa- secção poderia também ser chamada de "Prospecrivas
recem textos de Donald Preziosi ("A multimodalidade dos sernióticas". Nela aparece um dos mais belos e importan-
eventos comunicativos"), Jacques Maritain ("A linguagem tes artigos de toda a literatura semiótica, "Objetividade
e a teoria do signo"), Urnberro Eco et al. ("Latl'atus Canis semiótica", de Joseph Ransdell, também publicado na re-
ou O latido do cachorro"), Thomas A. Sebeok ("Falando vista Semiâtica 26-3/4 (pp. 261-288). A secção é finalizada
com os animais: a zoossemiótica explicada"), Martin com um artigo de T. Sebeok sobre "A semiótica e seus

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Lúcia Santaella e Winfried Nõt]: Bibliografia Comentada - Semiótica

congêneres" e um artigo de J. Deely sobre "A serniótica humana (entre duzentos mil e cinqüenta mil anos), en-
como moldura e direção". quanto a iconogênese estuda a evolução da representação
visual há trinta mil anos. A grafogênese trata da evolução
lHA Koch, Walter A. Euolutionary Cultural Semiotics. da escritura há cinco mil anos e a tipografogênese trata da
Bochum: Brockmeyer, 1986,313 pp. invenção da imprensa e seu desenvolvimento desde
Gutenberg. Por fim, a midiagênese começa com a difusão
Processos de semiose na evolução da cultura são estu- da televisão.
dados nesse volume de Walter A. Koch sobre os funda- Todas essas perspectivas cronológicas apresentam tam-
mentos de uma semiótica evolucionista. Com esses estu- bém uma perspectiva complementar que inverte a cronolo-
dos Koch quer ultrapassar, de um lado, o abismo que sepa- gia natural, estabelecendo uma cronologia cultural que co-
ra os estudos do mundo físico (inanimado) dos estudos do meça com o aqui e agora do ser humano. Koch chama essa
mundo biológico (animado), de outro lado, o abismo que perspectiva de metagênese. Uma visão metagenética da evo-
separa a natureza da cultura. O autor defende a tese de que lução encontra-se, por exemplo, na mitologia bíblica. A cri-
há processos de semiose desde o início do universo, exis- ação do mundo começa com a palavra de um ser falante,
tindo uma transição gradual entre a natureza e a cultura, Deus. A perspectiva rnecagenética também predomina ti-
entre a matéria e os signos. picamente no egocentrismo da cognição: para o indivíduo,
O estudo da evolução exige, segundo Koch, que seja o próprio ponto de vista é a origem, o ponto de partida da
feita a distinção entre perspectiva e níveis. Desde o início sua visão de mundo. Na idade da midiagênese e dociberespaço,
do universo até hoje, a perspectiva cronológica predomina fala-se muito da criação do mundo pelas mídias, já que por
na teoria da evolução, e gênese é o seu termo genérico. vezes essas mídias, de fato, não refletem, mas criam a reali-
Várias perspectivas parciais podem aí ser distintas: a dade, de uma maneira metagenética, portanto.
cosmogênese ou fisicogênese estuda a evolução a partir da Além das perspectivas genéticas e metagenéticas, Koch
origem do universo há quinze bilhões de anos. A geogênese distingue também várias outras perspectivas no estudo da
estuda a evolução do nosso planeta desde sua origem há evolução: a onrogênese, evolução do indivíduo e a
quatro e meio bilhões de anos. A biogênese começa com a filogênese, evolução das espécies conectam-se por meio da
origem da vida no nosso planeta (de quatro a 1,7 bilhões ecogênese, o fenômeno descoberto por Haeckel em 1866,
de anos). A sociogênese começa com as origens da organi- conforme o qual existem ecos (semelhanças de estruturas)
zação social da vida há quinhentos milhões de anos. Já a na ontogênese de morfologias que ocorreram na filogênese.
semiogênese humana começa com o homo habilis há dois Tais fenômenos de ecogênese são a razão de uma abor-
milhões de anos. A glotogênese estuda a origem da língua dagem que rejeita a distinção categórica entre gênese e

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Lúcia Santaella e Winfried Notb
Bibliografia Comentada - Semiótica

evolução. Assim sendo, a semiótica evolucionista de Koch


metagenética da cognição começa com as diferenças e des-
também se interessa pelos processos de acrogênese, quer di-
cobre as homologias só mais tarde, enquanto a perspectiva
zer, processos de produção e recepção de signos na semiose
genética começa com as identidades antes de proceder rumo
cognitiva. Outros princípios genéticos são a eugênese, o pro-
às diferenciações. Um bi-perspectivismo é exigência bási-
cesso de simplificação regressiva e complexificação progres-
ca da pesquisa. Assim, a natureza só pode ser entendida
siva na evolução, a anagênese ou complexificação das for-
por meio da cultura e essa por intermédio da natureza.
mas e a catagênese ou sua descomplexificação na evolução.
Nos seus estudos da evolução da cultura, Koch enfati-
III.5 Nõrh, Winfried (org.). Origins ofSemiosis: Sign Evolution
za as homologias entre estruturas em seus vários níveis.
in Nature and Culture. Berlin: Mouton, 1994,509 pp.
Homologias entre natureza e cultura, por exemplo, exis-
tem em estruturas simétricas, binárias, oposicionais ou cir-
Semiogênese, a origem e a evolução dos signos em or-
culares, no código genético etc. Precursores da comunica-
ganismos biológicos na comunicação animal, na cultura e
ção humana existem nos sistemas de comunicação da zoo e
linguagem humana são os temas dessa coletânea de ensaios
biossemiótica. Formas dramáticas na literatura e no teatro
que conta com a contribuição de 22 semioticistas.
têm precursores em estruturas que existem no comporta-
O volume divide-se em quatro secções: A primeira está
mento dos animais. Os fenômenos estudados na cadeia
voltada para "Evolução e biogênese" e trata dos fundamen-
evolucionista são protótipos que têm uma forma evolutiva
tos da semiótica evolucionista, da biossemiótica e da co-
anterior, o catatipo, e uma forma posterior, o anatipo. O
municação não-verbal dos primaras não-humanos como
protótipo cultural da guerra entre as nações tem, por exem-
herança evolutiva da comunicação humana. Os colabora-
plo, catatipos etológicos na defesa territorial dos animais e
dores nessa secção são: Myrdene Anderson ("Soprando vida
anatipos nos jogos computacionais de guerra. Uma seqüên-
nos signos: meios e modos de transição e transformação
cia catatípica da linguagem humana inclui: (1) o código
serniótica"), Udo L. Figge ("Princípios e sistemas semió-
genético; (2) a mímica na morfologia das plantas e dos ani-
ticos: fundações biológicas da serniótica"), Winfried Nõrh
mais; (3) as ritualizações no comportamento animal; (4) a
("Oposições nas raízes da semiose"), Signe e Holger
imitação; (5) o jogo; (6) os rituais na cultura humana.
Preuschoft ("Comunicação não-verbal dos primatas: nossa
Koch sublinha que homologia não significa identida-
herança comunicativa").
de. Se as diferenças nas homomorfias são enfatizadas, isso
Antropossemiose, sociogênese e a semiogênese da cul-
se deve ao fato de que o mesmo fenômeno pode aparecer
tura são os temas da segunda secção, que conta com contri-
heteromorfo sob um outro prisma. Igualdades e diferenças
buições de erólogos, antropólogos, psicólogos e sernioti-
são produtos da perspectiva adotada. A perspectiva
cistas da cultura sobre a evolução da comunicação e da
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Lzí.cia Santaelfa e Winfried Nõth Bibliografia Comentada - Senziótica

cultura, tais como: Peter Meyer ("O problema da certeza genéticas"; de Richard Janney e Horst Arndt, "Pode uma
na comunicação humana: uma visão evolutiva"), Peter imagem dizer mil palavras? Interpretando mensagens
Grzybek ("A cultura da natureza: a dimensão semiótica do seqüenciais vs. Mensagens grãfico-holísticas"; de Gütz
microcosmo, mesocosmo e macrocosmo"), Gordon W. Wienold, "Escrita, inscrição e texto".
Hewes ("A evolução da semiose humana e a leitura das
pegadas de animais"), P. Leyhausen e J. Pfleiderer ("Análi- III.6 Lotman, Yuri M. Universeof tbe Mind. A SemioticTheory
se de um mecanismo humano de descarga"), Susan Vogel . of Culture, traduzido por Ann Shukman. Bloomington:
("Amigos jogos sociais reconsiderados: a cultura em jogo"), Indiana University Press, 1990,288 pp.
Colwyn Trevarthen ("A semiose do infante").
O tema da terceira secção é a evolução da língua hu- Apoiados numa fundamentação teórica muito ampla,
mana no percurso de cem mil anos. As abordagens são bi- os artigos que compõem essa antologia do sernioticista russo 1

ológicas, lingüísticas e neurofisiológicas e os autores e res- Yuri Lotrnan estão divididos em três partes: (1) "O texto I
pectivos títulos são: Robin Allot ("A língua e a origem da como um mecanismo de geração de sentido"; (II) "A (
serniose"), Bernhard Bichakjian ("A evolução da língua: serniosfera"; (lI!) "Memória cultural, história e serniótica" j
um processo darwiniano"), Viraly Shevoroshkin ("Recons- Baseados na tradição estruturalista (Saussure) e
trução profunda das linguagens e semânticas"), Roland formalista (especialmente Jakobson) e tendo como objetivo
Harweg ("Tempo material e tempo formal: genética e correlacionar os conceitos de texto e cultura, os artigos da
metageneticamente"), Yoshihiko Ikegami ("O agente e o primeira parte versam sobre os seguintes temas: "Três fun-
ente sensível: uma dissimetria na codificação lingüística e ções do texto", "Aurocornunicação: eu e outro como emis-
cultural"), Helmut Schnelle ("Língua e cérebro"). sores", "A retórica como um mecanismo de geração de sen-
Antes da quarta secção há um intercapítulo com um tido", "Retórica icônica", "O texto como processo de movi-
belo ensaio fotográfico de Roland Posner sobre "Estrutura mento: autor para a audiência, autor para o texto", "O sím-
como idílio: a gênese do significado na natureza". bolo como gen da trama", "O símbolo no sistema cultural".
A quarta secção trata das origens das imagens e da O conceito que Lotman tem de texto é muito amplo.
escritura na cultura humana e inclui, de Emmanuel Anati, Textos, para ele, representam modelos do mundo e a cul-
uma história da pintura desde as cavernas há quarenta mil cura é um conjunto de textos. Daí vem a necessidade de
anos sob o título de "Constantes em 40.000 anos de arte"; definir uma tipologia da cultura de modo que possam ser
de P~ul Bouissac, "Deixis vs. Modelização na filogênese do descobertos aspectos universais que são comuns a todas as
comportamento artístico"; de Martin Krampen, "O des . ulturas, assim como ser identificados os sistemas específi-
nho e crianças: aspectos ontogenéticos e raízes file os que representam culturas historicamente dadas.

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Bibliografia Comentada - Semiótica
Lúcia Santaella e Winfried Nõth

Na segunda parte, sobre o conceito de semiosfera, que As linguagens que preenchem o espaço semiótico são

trouxe grande notoriedade a Lotman, o autor discorre so- várias e elas estão relacionadas umas com as outras num

bre temas tais como: "Espaço serniótico", "A noção de fron- espectro que vai da completa traduzibilidade mútua à

~ teira", "Mecanismos dialógicos", "A semiosfera e o proble- completa intraduzibilidade mútua. A heterogeneidade é

ma do enredo", "Espaços simbólicos", além de algumas definida tanto pela diversidade de elementos quanto por
suas diferentes funções (p. 125).
aplicações de seus conceitos à literatura e ao urbanismo.
O conceito de semiosfera nasceu do questionamento a
que Lotrnan submeteu o conhecido modelo comunicacional A terceira parte lida com os seguintes temas: "O pro-

de uma mensagem que é transmitida de um emissor a um blema do fato histórico", "Leis históricas e a estrutura do

receptor através de um canal. Para Lotrnan, esse esquema texto", "Uma alternativa: cultura sem alfabelização ou cul-

não se constitui num sistema funcional, pois, para funcio- tura antes da cultura?", "O papel dos símbolos tipológicos

nar, um processo comunicativo tem de "estar imerso num na história da cultura", "Pode haver uma ciência da histó-

espaço semiótico"t~m analogia com a biosfera, "devemos ria e quais são suas funções no sistema cultural?".

, falar da semiosfera, que podemos definir como 0_espaç9 A tese de Lotman sobre história pode ser resumida na
afirmação a seguir:
'r ~ semiótico necessário à existência e funcionamento das lin-
e: / ~9uagens, e não a som! total das diferentes linguagens; C ..)
fora da semiosfera não pode haver comunicação nem lin- o historiador está condenado a lidar com textos. Q texto I
( guagem" (pp. 123-124)/ está entre o evento tal como sucedeu e o historiador, de
modo que a situação científica aí se altera radicalmente.
~ /

Qualquer linguagem está imersa num espaço semiótico Um texto é sempre criado por alguém e para algum pro-

e só pode funcionar na interação com esse espaço. A u~i- pósito e os eventos são apresentados no texto numa for-
ma codificada. O historiador tem de agir como '"
dade da semiose, o menor mecanismo de funcionamen-
-<---- decodificador, e o fato não é um ponto de partida mas o ..,. "
.to, não está numa linguagem separada, mas no todo do
resultado final de muitos trabalhos. O historiador cria
----
espaço semiótico da cultura em questão. Esse é o espaço
- fatos ao extrair do texto realidades não textuais e de uma

i
quechamo d0emiosfera. A semiosfera é o resultado ea
",1. ,
, história um evento (p. 218).
-sondição ~r~ o desenvolvimento da cultura; lustiflco ~~
/ termo ~analogia com biosfera, como Vernadsky o de-
-- -
iiniu, a saber, a totalidade e o todo orgânico da matéria
III.7 Hoffmeyer, ]esper. Signs 0/ Meaning in tbe Universe,

viva e também a condição para a continuidade da vida.


traduzido por Barbara J. Haveland. Bloomington:

(... ) A semiosfera está marcada por sua heterogeneidade.


Indiana University Press, 1996, 165 pp.

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Lucia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiâtica

Em seus mais recentes desenvolvimentos, a semiótica desde os seus primórdios, setecentos mil anos depois do
tem avançado muito além das fronteiras lingüísticas e big bang até os animais e plantas de hoje. Segue também a
mesmo das humanidades, também além da zoossemiótica, semiosfera no coração dos organismos, lá onde enxames de
penetrando no universo da vida em sua totalidade. Um células se aninham numa cacofonia de mensagens. Demons-
dos mais representativos estudos dessa vertente bios- tra ainda corno foi possível que esses enxames de células
semiótica é esse livro do biólogo dinamarquês ]esper finalmente se transformassem em enxames pensantes den-
'Hoífmeyer. ([O dos seres humanos até o ponto de falarem uns com os
No prefácio, o autor avisa que o livro lida com a outros, diferenciando entre o bem e o mal.
semiosfera. Numa definição bem mais abrangente do que Os capítulos, muito bem entrelaçados, aparecem em
a de Lotrnan (III.6), Hoffmeyer diz que ela é ordem crescente de complexidade: (1) "Significando: so-
bre pedaços de nada, sobre o não"; (2) "Esquecendo: sobre
uma esfera semelhante à atmosfera, à hidrosfera e à a história e os códigos: a dialética do esquecimento"; (3)
biosfera. Ela penetra em cada canto dessas outras esferas, "Repetindo: sobre a tendência da natureza de adquirir há-
incorporando todas as formas de comunicação: sons, chei- bitos"; (4) "Inventando: sobre a vida e a auto-referência ,
ros, movimentos, cores, formas, campos elétricos, radia- sobre a subjetividade"; (5) "Abrindo-se: sobre o universo
ção térmica, ondas de todos os tipos, sinais químicos, sensório das criaturas, a liberação da serniosfera''; (6) "De-
toques, e assim por diante. Em suma: signos da vida. (. ..) finindo: o cérebro móvel, a linguagem das células"; (7)
Todas as plantas e animais - todos os organismos, che- "Conectando: sobre a triádica ascendência do dualisrno" ,
gam a isso - a vida, antes de mais nada, num mundo de (8) "Compartilhando: sobre a linguagem, bioantropologia
significação. Tudo que um organismo sente significa algo existencial"; (9) "Unindo: consciência, o governo do corpo
para ele: alimento, vôo, reprodução - ou, ainda, desespe- dentro do cérebro"; (10) "Curando: sobre a ética, reunindo
ro. Pois certamente os seres humanos também habitam a duas histórias em um corpo-mente".
biosfera (p. Vii). O ponto alto do livro é o capítulo seis, sobre o cérebro
móvel, onde o autor discute o alto nível de intercomu-
o autor diz que, nos dez capítulos de que o livro se nicabilidade das células nervosas com as células do sistema
compõe, sua intenção é "mostrar corno nós humanos vive- imunológico, concluindo que é o sistema imunológico, a
mos, do mesmo modo que todos os outros animais, plan- mais íntima rede semiótica do organismo, que assegura a
tas, proristas, fungos e bactérias, dentro da semiofera. A inseparabilidade entre o sistema nervoso e o corpo. É o
biosfera deve ser vista à luz da semiosfera e não o contrá- sistema imunológico que se constitui, assim, em uma es-
rio" (p. Viii). Hoffmeyer segue o crescimento da semiosfera pécie de cérebro movendo-se através do corpo.

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Bibliografia Comentada - Semiõtica
Lúcia Santaella e Winfried NiJth

Nessa mesma secção, aparece ainda um diálogo sobre a


111.8 Noth, Winfried (org.). Semiotics 01the Media. State o/
intermídia do vídeo.
tbe Art, Projects, and Perspectives. Berlin: Mouton d
A quinta secção está voltada para o computador como
Gruyter, 1997, 896 pp.
meio, redes eletrônicas, hipertextos e ciberespaço. Esses arti-
gos lidam com a estrutura semiótica e o design dos signos
Essa coletânea reúne 63 trabalhos selecionados dentre
nos programas computacionais, desde o processamento de
aqueles que foram apresentados durante a conferência in-
textos até a hipertextualidade multimidiática e a realidade
ternacional, que teve o mesmo título do volume, realizada
virtual. Além disso, investigam os processos de interação
na Universidade de Kassel, em março de 1995.
de indivíduos e grupos sociais com os computadores e den-
O livro está dividido em oito secções: a primeira trata
tro das redes eletrônicas.
das fundações sernióticas das mídias. Investiga as mídias e
A sexta secção estuda o tempo, a memória, as mídias e
o conceito de mediam na sua relação com a teoria geral dos
a semiótica dos museus. Explora os processos de reconsrru-
signos. Estuda os processos de mediação nas mídias e dis-
çãoe desconstrução do passado nas mídias e questiona se
cute a natureza da auto-referencialidade na comunicação
essas são a memória de nossa cultura ou instrumentos de
midiática.
aniquilação de sua dimensão temporal.
A segunda secção investiga a serniótica pictórica e grá-
A estética das mídias e a multirnidialidade nas pintu-
fica. Seus tópicos incluem a serniótica das imagens, desde
ras, arquitetura, poesia e música são os temas da sétima
a pintura até as fotografias eletrônicas, metáforas pictóri-
secção.
cas, a semiótica do logos e dos selos postais, assim como
A oitava e última secção discute a sociosserniótica e os
aspectos da semiótica cartográfica.
mitos atuais nas rnídias, em tópicos como informação e
A terceira secção está voltada para os filmes, ação e
manipulação na TV da América Latina, a imprensa euro-
intermedialidade no cinema. Aí aparecem artigos sobre a
péia, o discurso mítico, a vitrine como uma mídia, comu-
história da cinema, sobre auto-referência, inrerrnedialidade
nicação intercultural e negociações mercadológicas.
e intertextualidade em filmes, sobre imagens de estrelas
de cinema e o papel do autor no cinema, além de tópicos
111.9 Eco, Umberto. Semiotics and tbe Philosophy oj Langzcag«.
sobre violência, masculinidade e oralidade nos filmes.
Bloomington: Indiana University Press, 1984,242 pp.
Na quarta secção, o assunto é a televisão, o vídeo e
rádio. Começando com a fenomenologia semiótica da tele-
Em sete capítulos, Eco desenvolve e aprofunda temas
visão, continua com o zapping, respostas da audiência em
semióticos que já haviam sido parcialmente apresentados
sboios de televisão, o logos das estações de TV, realidade
em outras de suas obras. O primeiro capítulo é uma
virtual na TV, jogos de participação da audiência no rádio.

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Lucia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiótica

reelaboração enciclopédica de seu tratado sobre o signo, ção, desde Aristóteles, é discutida nas suas dimensões re-
cuja tradução portuguesa foi publicada em 1976 (ver 1.18). tóricas, poéticas e cognitivas. Os limites da formalização
Dentre os novos elementos apresentados nesse seu capítu- são determinados, e a metáfora e metonímia são compara-
lo, que não haviam aparecido na publicação anterior, estão das. O autor tem por objetivo superar as definições tradi-
a teoria peirciana da abdução, da qual, aliás, Eco faz uma cionais baseadas em substituição, salto (por mudança de
interpretação bem idiossincrática, e sua própria teoria dos categoria), símile abreviado ou analogia porque "por um
códigos. A principal tese defendida no capítulo conclui longo tempo, pensou-se que, para entender as metáforas, é
que "estudar signos não é meramente uma questão de necessário conhecer o código ou a enciclopédia: a verdade é
recognição (de uma equivalência estável), mas também uma que a metáfora é a ferramenta que nos permite entender
questão de interpretação" (p. 43), um processo que envol- melhor a enciclopédia. Esse é o tipo de conhecimento que
ve abdução, dedução e indução. a metáfora traz para nós" (p. 129).
"Dicionário vs. Enciclopédia", o segundo capítulo, é Em outro capítulo enciclopédico, Eco discute o con-
um tratado sobre os limites da semântica esttutural e a ceito do símbolo. Trata-se aí do mesmo artigo que foi de-
extensão dos estudos semânticos em novas tendências ba- pois publicado na coletânea Frontiers in Semiotics, organiza-
seadas não na tradicional decomposição conceitual, mas no da por John Deely et al., em 1986 (IIL3). Eco começa com
conhecimento do mundo. Eco esboça as origens da semân- várias definições de símbolo, sublinha a polissemia do con-
tica estrutural na lógica antiga, na árvore de Porfírio e na ceito e chega a uma tipologia de definições baseada na sua
teoria arisrotélica da definição. Discure ainda os proble- própria teoria dos códigos, o que lhe serve para determinar
mas das molduras (fi'ames), manuscritos e estereótipos como a significação do termo na obra de ourros pensadores (Lacan,
elementos de uma semântica enciclopédica, chegando à Cassirer, Peirce, Todorov, Saussure, Hjelmslev, Freud). O
afirmação surpreendente de que "devemos virar de cabeça modo simbólico em Hegel, os arquétipos de C. G. Jung e
para baixo uma distinção comum entre dicionário (estrita- os símbolos em Danre e na herrnenêurica cristã e cabalística
mente semântico) e enciclopédia (poluída com elementos são outros temas desse exame conceituai.
pragmáticos)". Para Eco, a enciclopédia é um conceito se- O capítulo seguinte trata do conceito de código, cen-
- - - -
I
mântico, enquanto o dicionário está poluído de elementos tral na teoria semiótica de Eco, aliás, esse tema já havia
- - - -- - - ---s- ~
pragmáticos (p. 85). sido apresentado em mais pormenores no seu Tratado Ge- .
,.-- - -
No capítulo seguinte, Eco volta a um de seus temas ral de Semiótica (11 15).
preferidos, repetido com variações em muitos de seus li- Isotopia é o título do capítulo seis, no qual Eco leva
vros, a metáfora. Nesse capítulo, o assunto é tratado de adiante algumas idéias já desenvolvidas no seu livro The
maneira enciclopédica. O conceito é definido; sua rradi- Roie 01 the Reader. Expiorations in tbe Semiotics of Texts (Indi-

204 205
Lucia Santaella e Winfried Notb
Bibliografia Comentada - Semiótica

ana U niversity Press, 1984). O conceito greimasiano de


havia desenvolvido em outras obras, conceitos que, neste
isotopia se refere a recorrências semânticas que garantem a
novo livro, aparecem recheados de exemplificações saboro-
coerência de um discurso. Eco elabora uma ti pologia das
sas, uma grande especialidade de Eco. O próprio autor re-
isotopias que distingue entre 'intensão' e extensão, discur-
conhece que esse livro é uma espécie de continuação do seu
so e narratividade, relações sintagmáticas e paradigmáticas.
Tratado Geral de Semiótica(II.15).
O último capítulo, "Espelhos", versa sobre a semiótica
O primeiro ensaio trata da velha questão do ser na filoso-
das imagens especulares. Muitas dimensões do tema são
fia. No segundo, sob o título sugestivo de "Kant, Peirce e o
exploradas, da fase especular de Lacan até as ilusões e
ornitorrinco", Eco mais uma vez impõe à semiótica peirciana
âistorções óticas especulares. ~f9ando como base !rg~-
uma ~moldura IQgoJ:ênuica, embora saiba tirar bom partido
rnentos de sua teoria semiótica e de várias definições de
dos conceitos peircianos de abdução e julgamento perceptivo.
$Tgnõ, E(o-·chega à estranha conclusão, bem ~ou~o
I -- - . No terceiro ensaio, questões da cognição, tais como:
~~mió~ic~ de que espelhos não produzem sig~os porque
( qualia, tipo cognitivo, conteúdo nuclear, conteúdo molar,
(a) o referente não pode estar ausente, c~mo e o caso do
conceito, referência, são tratadas sob o ponto de vista da
~ (b);"imagem _esp~cular é um produto causal de
interpretação.
seu objeto; (c) es~a im2gem não od~ usa_da ~ra men-
O tema central do livro, os problemas que o ornitor-
;ir; (d)cla-~o~ ~S.2.!!l-eúd.Q;. (e) não pode ser
rinco traz para a semiótica resolver, aparece no quarto en-
distinguida de um token; (D. nãQ.éJ.'2.~pendente d<,?:~anal
saio. O assunto é aí discutido à luz de outros conceitos _
.ou mediam; (g) uma imagem especular não ode ser mter-
dicionário e enciclopédia - caros a Eco e que já haviam

t
...E.etada
p "nfim, to~as ess~~ ~azões só explicitam _qu~o li- \
aparecido em seus outros livros (por exemplo, Semiotics and
mirada é a conce çao SemlOtlCa de Umberto
,----- - -
E..~o._ the Philosophy 01 Language, II I. 9).
A questão da referência é discutida no quinto ensaio,
III.10 Eco, Umberto. Kant e L'Ornitorinço. Milão: Bompiani,
em tópicos como: "A mente divina como e-rnail", "Qui pro
1997, 454 pp.
quoe negociação", "Objeto impossível", "Icb liebe Dicb" etc.
No sexto ensaio, o autor volta ao debate sobre o ico-
esse seu mais recente livro de se~iótica, Urnbertr
nismo e a iconicidade, debate que fez história na Itália, e
Ec~ -retorna com tudo aquilo que lhe deu fama com
que o próprio Eco ajudou a criar. Essa história é comentada
semioticista: mui~Jmaginaçã~ouc(). iálogo com a
por ele e seguida de tópicos como "Semelhança e similari-
fontes de referência. O livro se compõe de cinco longos
dade", "Ainda sobre os espelhos", "Repensar a pintura",
ensaios, sem continuidade entre si, e dois apêndices. Em
"Reconhecimento", "Da semelhança perceptiva à similari-
todos eles, tornam a ecoar idéias e conceitos que Eco j,
dade conceitual" etc.

206
207
Lúcia Santaefla e Winfried Nõth Bibliografia Comentada - Semiôtica

o primeiro apêndice versa sobre a "Denotação" numa um entendimento fragmentado da serniótica peirciana
seqüência de autores que vai de Arisróteles a Hobbes e como se ela se restringisse à teoria e classificação geral dos
Mill, passando por Boezio, Anselmo, Abelardo, Tomás de signos. Felizmente, esse estado de coisas começou a mudar
Aquino, Bacon, Duns Scotus e Ockam, filósofos medievais graças a um crescente diálogo entre filósofos e sernioticistas
com os quais Eco tem melhor familiaridade. de linha peirciana. Vem-se tornando cada vez mais eviden-
O segundo apêndice trata de Croce e a questão da te que, a despeito de sua relevância para a análise de pro-
intuição. cessos concretos de signos, o primeiro ramo da semiótica,
isto é, a gramática especulativa ou doutrina dos signos, é
II1.11 Lizska, James Jakób. A General Introduction to the apenas um estudo propedêutico para a lógica crítica, a qual
Semeiotic 0/ Charles Sanders Peirce. Bloomington: India- é o segundo ramo da semiótica e que, por sua vez, funciona
na University Press. 1996, 151 pp. como fundação da retórica especulativa ou rnetodêutica, o
mais alto ramo da semiótica. Nesse contexto, não há dúvi-
Nathan Houser, um dos maiores especialistas norte- da sobre a importância do livro de Lizska pela oportunida-
americanos em Peirce, afirma, na apresentação que escre- de que oferece para um entendimento mais completo e

veu para esse livro de Lizska, que o leitor pode encontrar aí complexo dos três ramos da semiótica de Peirce, que rnui-
"o melhor e mais equilibrado estudo completo da semiótica tos, infelizmente até hoje, continuam confundindo com os
peirciana que contribui não apenas para a serniótica mas três níveis morrisianos da semiótica, o sintático, o semân-
também para a filosofia". De fato, esse é o primeiro livro a tico e o pragmático, uma mera tradução simplificada dos
nos fornecer um panorama dos três ramos da semiótica: (1) três ramos elaborados por Peirce.
a gramática especulativa ou gramática dos signos; (2) a ló- Lizska inicia seu livro com uma apresentação da
gica crítica, que estuda os tipos de raciocínio ou argumen- semiórica no contexto do sistema peirciano das ciências e
to, abdução, indução e dedução; (3) a retórica especulativa dedica um capítulo a cada ramo da serniótica, num total,
ou metodêutica que estuda o método das ciências e que portanto, de três capítulos. Para facilitar a leitura dos com-
Peirce chamou de "o ramo mais vivo da serniótica''. plexos conceitos peircianos, o autor usou como estratégia a
Até uma ou duas décadas atrás, a maioria dos filósofos divisão do livro em dois níveis. Em um primeiro nível, os
peircianos tendia a negligenciar o papel central desempe- conceitos são apresentados e interpretados de maneira di-
nhado pela semiótica no pensamento científico de Peirce, reta, sem muitas discussões, no texto dos capítulos. Todas
enquanto a maioria dos sernioticistas não demonstrava in- as discussões das controvérsias interpretativas que rondam
teresse em explorar as fundações filosóficas da doutrina esses conceitos foram deixadas para as notas de rodapé que
peirciana dos signos. Essa dupla negligência resultou em são, por isso mesmo, bastante longas, constituindo-se numa

208 209
Lúcia Santaella e Winfried Nijth Bibliografia Comentada - Semiótica

espécie de segundo texto para aqueles que estiverem inte- rem os aspectos referenciais e comunicativos da linguagem,
ressados em se aprofundar no debate. o estruturalismo e a glossemática não são capazes de expli-
Com isso, o volume pode funcionar como um livro- car como a língua significa algo.
texto, tanto para iniciantes quanto para estudantes mais A segunda e mais longa parte do livro está subdividi-
adiantados na serniótica de C. S. Peirce. da em outras duas partes. A primeira, sob o título de "Sig-
no, objeto, interprerante", penetra nas minúcias da tríade
III.12 Johansen, Jorgen Dines. Dia/agic Semiosis:An Essay on peirciana. No lugar das versões estereotipadas e
Signs and Meaning. Bloomington: Indiana University simplificadoras dessa tríade, que se tornaram tão comuns,
Press, 1966, 357 pp. Johansenapresenta definições renovadas e conseqüentes.
A segunda subdivisão da segunda parte é o coração do
Johansen é um grande conhecedor da obra de Peirce livro. Denominada "Um modelo dialógico da serniose",
(1.10, LU, 1.12,11.13), inclusive dos manuscritos ainda depois da discussão dos pressupostos peircianos sobre fala
não publicados. O mais importante, contudo, é aquilo que e diálogo, traz uma teoria do próprio autor sobre a comu-
J ohansen faz com esse conhecimento nesse seu livro sobre nicação humana que termina numa discussão sobre "Cren-
a semiose dialógica. Ele vai além da mera exegese dos tex- ças, retórica e as bases de validação da fala".
tos peircianos, ao colocar esse autor no contexto geral do Na' terceira parte, a teoria é posta em ação por meio da
debate intelectual contemporâneo, confrontando a rede análise de um sistema de signos, os sinais de trânsito. Essa
conceitual de Peirce com o pensamento de figuras como análise começa com os conceitos hjelmslevianos, mas passa
Habermas, Apel, Russell, Piaget, Searle,Jakobson, Sebeok para os conceitos peircianos que, segundo o autor, "dão mais
(II.30, 11.31), Bruner, Eco (1.7, 1.8, n.4,,IL5), Goodman e conta do significado e função dos sistemas de signos".
Tinbergen. Mais do que isso, Johansen coloca em uso os
conceitos de Peirce, criando com eles um modelo dialógico
da semiose baseado numa teoria consistente da comunica-
ção humana, original sem deixar de ser fiel às raízes mais
profundas dos escritos de Peirce.
O livro está dividido em três partes. Na primeira, de-
nominada "Signos sem mundos", o autor apresenta o
paradigma serniórico representado por Saussure (1.1) e
Hjelmslev (1.2), terminando a exposição com uma apreci-
ação crítica dos limites desse paradigma. Por negligencia-

210 211
LISTA DOS AUTORES
POR ORDEM ALFABÉTICA

Barros, Diana Luz Pessoa de. Teo- Eco, Umberto. As Formas do Con-
ria do Discurso: Fundamentos teúdo, 51
Semiõticos, 116. Eco, Umberro. Kant eVOrnitorinco, 206.
Barros, Diana Luz Pessoa de. Teo- Eco, Umberto. O Signo, 53.
ria Semiótica do Texto, 34. Eco, Umberto. Semiotics and tbe
Barthes, Roland. Elementos de Philosophy o/ Langnage, 203.
Semiologia, 28. Eco, Umberto. Tratado Geral de
Barthes, Roland. Sistema da Semiática, 147.
Moda, 102. Ferrara, Lucrécia D'Aléssio. A Es-
Bliksrein, Izidoro. Kaspar Houserou tratégia dos Signos, 159.
A Fabricação da Realidade, 83. Gear, Maria do Carmo e Ernesto
Buyssens, Eric. Semiologia e Comu- Cesar Liendo. Semiologia Psica-
nicação Lingiiística, 23. nalítica, 104.
Carontini, Enrico e Daniel Peraya. Greimas, Algidas Julien e Jacques
O Projeto Semiõtico. Elementos de Fontanille. Semiótica das Pai-
Semiótica Geral, 68. xões, 128.
Chabrol, Claude (org.). Semiótica Greimas, Algirdas Julien e Eric
Narrativa e Textual, 76. Landowski (orgs.). Análise do
Chalhub, Samira. Semiótica dos Afe- Discurso em Ciências Sociais, 123.
tos, 107. Greimas, Algirdas J ulien e J oseph
Colapietro, Vincenr M. Glossary o/ Courrés. Dicionário de Semiô-
Semiotics, 180. tica, 132.
Cout7' Hildo Honório do. Uma Greimas, Algirdas J ulien. Semiótica
Introdução à Semiótica, 66. do Discurso Científico. Da Moda-
Deely, John, Brooke Williams e lidade, 121.
Felicia Kruse (eds.). Frontiers in Greimas, Algirdas J ulien. Semiótica
Semiotics, 189. e Ciências Sociais, 118.
Deely, John. Introdução à Semiótica: Greimas, Algirdas-Julien. Do Se/J-
História e Dorarina.Y'). tido, 32.
Deely, John. Semiâtica Básica, 113. Grei mas, Algirdas-J ulien. Semânti-
Eco, Umberto. A Estrutura Ausen~ ca Estrutural, 3 O.
te. Introdução à Pesquisa Semio- Guinsburg, Jacó, José Teixeira Co-
lógúa, 144 elho Netto e Reni Chaves Car-

213
Lsicia Santaella e Winfried Notb Bibliografia Comentada - Semiâtica

doso (orgs.). Semiologia do Tea- Merz, Chrisrian. Significação no Ci- Pinro,Julio.1,2,3 da Semiôtica, 45. Tude la , Pernando. Hacia una
tro.85. nema,96 Plaza, Julio. Tradução l nt er- Senziótica de Ia A rquitecture, 165.
Helbo, André (org.). Semiologia da Morentin, Juan Angel Margarifios semiótica, 161.
Representação: Teatro, Televisão, de. EI Mensaje Publ icit ario: Prieto, Luis J. Memagem e Sinais, 25.
H istõria em Quadrinhos, 88. Nueoos Ensayos sobre Semiótica y Ravera, Rosa Maria. Estética y
H jelrnslev, Loui~ Trolle. Prolegõmenos Publicidad, 166. Sellliótica,170.
a III/la Teoria da Linguagem, 18. Morentin, Juan Margarifios de. EI Rodrigues, Adriano Duarre. lntro-
Hoffmeyer, J espero Signs of Meaning Signo. Las Fuentes Teóricas de Ia dllção à Semiâtica, 63.
in tbe Uniuerse, 199. S emiologia: Saessnre, Peirce, Rodrigues, José Maria er aI.
Houser, Nathan er aI. (orgs.). MO/Tis, 137. Arquitectltra como Semiâtica, 163.
Essential Peirce, volume I (1867- Morris, Charles W. Fundamentos da Santaella Lúcia. Percepção. Uma Te-
1893). Essential Peirce, volume 11 Teoria dos Signos, 49. oria Semiâtica, 74.
(1893-1909),142. Mukarovsky, Jean. Escritos sobre Es- Santaella, Lúcia e Winfried Nõth,
Innis, Roberr (ed.). Semiotics: An tética y Semiótica dei Arte, 156. Imagem. Cognição, Semiâtica,
l ntrodtiaory Anthology, 187. Nõth, Winfried (org.). Origins of Mídia,90.
Johansen, J orgen Dines. Dialogic Semiosis: Sign Evoliaion in Nature Sanraella, Lúcia. A Assinatllra das
Semiosis: An Essay on Signs and and Cu/ture, 195. Coisas. Peirce e a Literatura, 167.
Afeaning, 210. Nõrh, Winfried (org.). Semiotics of Santaella, Lúcia. O qneé Semiõtica, 43.
Koch, Walrer A. Evolutionary Cal- tbe Media. State of tbe Art, Sanraella, Lúcia. Teoria Geral dos
tura] Semiotics, 194. Projects, and Perspectiues, 202. Signos. Semiosee Atltogemção, 46.
Krampen, Marrin, er aI. (eds.). Nõth, Winfried. A Senziótica no Sé- Saporiri, Elisaberh. A Interpre-
Classics of Semiotics, 185. mio XX, 61. tação, 169.
Kr isr eva , Julia. lntrod/lção à Nõr h , Winfried. Handbook of Saussure, Perdinand de. Curso de
Semanálise, 150. Semiotics, 182. Lingiiistic« Geral, 15.
Landowski, Eric. A Sociedade Refleti- Nõt h, Winfried. Panorama da Schnaiderman, Boris (org.). Semiâ-
da. Ensaios de Sociossemiótica, 126. Semiâtice. De Platão a Peirce, 56. tica Russa, 152.
Lizska, James Jakób. A General Oliveira, Ana Claudia de e Ivana Sebeok, Thomas A. Signs: An
l ntroduction to tbe Semiotic of Pechine (orgs.). Semiótica da Introduction to Semiotics, 1 76.
Cbartes Sanders Peirce, 208. A,·te. Teorizações, Análises e En- Sebeok, Thomas. A Sign ij Jmt a
Lotman, Yuri M. Uniuerse of tbe sino, 93 Sign, 178.
Mind. A Semiotic Tbeory of Parret, Herman. Semiótica y Prag- Segre, Cesare. Os Signos e a Crítica, 79.
Cnlture, 197. mática: Una Comparación Evallla- Sini, Carlo. Semiôtica y Filqsofia, 172.
Marriner , André. Elementos de Lin- tiva de Marcos Conceptuales, 134. Tarasri Eero. A Tbeory of Mmical
giiística Geral, 20. Peirce, Charles Sanders. Escritos Semiotics, 175.
Marry, Claude e Robert Marry. La Coligidos, 38. Tar ir , Luiz. Mltsicalldo a Seniiõ-
Semiâtica: 99 Respuestes; 111 Peirce, Charles Sanders. Semiótica e tica, 173.
Merrell, Ployd. Peirce's Semiotics Filosofia, 36. Teixeira Coelho Net t o , José.
No/(). A Primer, 140. Peirce, Charles Sanders. Semiótica, 40. Semiôtica, Informação e Comunt-
Metz , Christian. Linguagem e Cine- Pignatari, Décio. Semiótica e Litera- cação. Diagrama da Teoria do Sig-
ma, 99. tura, 81. no, 71.

214 215
LISTA DOS TÍTULOS POR
ORDEM ALFABÉTICA

1,2,3 da Semiõtica, 45 (Pinto, Julio), El Mensaje Publicitario: Nueuos


A Estratégia dos Signos, 159 (Ferra- Ensayos sobre Semiótúa y
ra, Lucrécia D'Aléssio). Publicidad, 166 (Morentin,
A General I ntroduction to the Senziotic Juan Angel Margarifios de).
of Cbarles Sanders Peirce, 208 EI Signo. Las Fuentes Teóricas de Ia
(Lizska, James Jakób), Semiologia: S'aussure, Peirce,
A l nterpret ação, 169 (Sapor it i, M01Tis, 137 (Morentin, J uan
Elisabeth). Margarifios de).
A Sociedade Refletida, Emaios de Socios- Elementos de Lingüística Geral, 20
semiótica, 126 (Landowski, Eric). (Martiner, André),
A Tbeory of MZiSical Semiotics, 175 Elementos deSenziologia, 28; Sistema da
(Tarasri Eero). Moda, 102 (Barrhes, Roland).
Análise do Discurso em Ciências Soci- Escritos sobre Estética y Semiótica dei
ais, 123 (Greimas, Algirdas Arte, 156 (Mukarovsky, J ean).
Julien e Eric Landowski (orgs.). Essential Peirce, volume I (1867-
Arquitectul'a como Semiótica, 163 1893). Essential Peirce, volume II
(Rodrigues, José Maria er al.). (1893-1909), 142 (Houser,
As Formas do Conteúdo, 51; O Signo, 53; Nathan et al. (orgs.),
A Estrutura Ausente, Introdução à Estética y Semiótica,170 (Ravera,
Pesquisa Semiolôgica, 144; Tratado Rosa Maria).
Geral de Semiõtica, 147; Semiotics Euoltaionary Cultural Semiotics, 194
and tbe Pbilosopby of Language, (Koch, Walter A).
203; Kant e L'Ornitorinco, 206 Frontiers in Semiotics, 189 (Deely,
(Eco, Urnberto). John, Brooke Williams e
Classicsof Semiotics, 185 (Krampen, Felicia Kruse - eds.).
Marrin, er al. (eds.). Fundamentos da Teoria dos Signos, 49
CII1"50 de Lingiiística Geral, 15 (Morris, Charles W).
(Saussure, Ferdinand de). Glossar» ofSenziotics, 180 (Colapietro,
Dialogic Semiosis: An Essay on Signs Vincem M.).
and Meaning, 210 (Johansen, Hacia una Senúótica de Ia Arquitedura,
Jorgen Dines). 165 (Tudela, Fernando).
Dicionário de Semiôtica, 132 (Grei mas, Imagem. Cognição, Sentiótica, Mídia, 90
Algirdas Julien eJoseph Courtés). (Sanraella,Lúcia e Winfried Nõth).

217
Lúcia SantaeIla e Winfried Niith Bibliografia Comentada - Semiõtica

Introdllção à Semandl ise, 150 ais, 118; Semiótica do Discurso Semiotics: AnInt1'odltctory Allthology,
(Krisreva, J ulia). C ientifico. Da Modalidade, 121 187 (Innis, Robert (ed.).
lntrodnçâo Senuâtica, 63 (Rodrigues, (Greimas, Algirdas-] ulien). Significação 1/0Cinema, 96; Lillguage17l
à

Adriano Duarre). Semiologia da Representação: Teatro, li Cinema, 99 (Merz, Chrisrian).


Introdllção à Semiótica: HistÓ1Ú e Televisão, Histõria em Quadrinhos, Signs of Meaning in tbe Unioerse, 199
Dontrina.Y'); Semiâtica Básica, 88 (Helbo, André (org.). (Hoffmeyer, Jesper).
113 (Deely, John). Semiologia do Teatro, 85 (Guinsburg, Signs: An lntroduction to Semiotics,
Kaspar Houser 011A Fabricação da Jacó,José Teixeira Coelho Netto 17 6; A Sign is Just a Sign, 178
Realidade, 83 (Bliksrein, e Reni Chaves Cardoso (orgs.). (Sebeok, Thomas A.).
Izidoro). Semiologi« e Comunicação Lingiiisti- Teoria Semiótica do Texto, 34; Te01'Ía
La Semiõt ic«: 99 Respllestas, 111 ca, 23 (Buyssens, Eric). do Discurso: Fundamentos
(Marty, Claude e Robert Marty). Semiologi« Psicanalítica, 104 (Gear, Semiõticos, 116 (Barros, Diana
Memagem e Sinais, 25 (Prieto, Luis J.). Maria do Carmo e Er nesro Luz Pessoa de).
Mmicando a Semiõtica, 173 (Tarir, Cesar Liendo). Tradltção lntersemiâtica, 161 (Plaza,
Luiz). Semiôtic« da AI,te. Teorizações, Análises
Julio).
O Projeto Semiâtico. Elementos de li Ensino, 93 (Oliveira, Ana Clau- Uma Introdução à Semiótica, 66
Semiôtica Geral, 68 (Caronrini, dia de e Ivana Fechine - orgs.). (Couro, Hildo Honório do).
Enrico e Daniel Peraya). Semiâtic« das Paixões, 128 (Greimas, Uniuerse of tbe Mind. A Semiotic
O qlle é Semiâtica, 43; Teoria Geral Algidas Julien e Jacques Tbeory of CUltllre, 197 (Lotrnan,
dos Signos. Semiose e AlItoge1'ação, Fonranille). Yuri M.).
46; Percepção. Uma Teoria Semiótica dos Afetos, 107 (Chalhub,
Semiótica, 74; A Assinatura das Samira).
Coisas. Peirce e a Literatura, 167 Semiôtica e Filosofia, 36; Escritos Co-
(Sanraella, Lúcia). ligidos, 38; Semiõtica, 40 (Peirce,
Origins of Semiosis: Sign Eoolraion in Charles Sanders).
Natllre and Cult ure, 195; Semiótica e Literatura, 81 (Pignarari,
Semiotics of the Media. State of the Décio).
Art, Projects, and Perspeaiues, Semiótica Narratiua e Textual, 76
202 (Nõth, Winfried - org.). (Chabrol, Claude - org.).
Os Signos ea Critica, 79 (Segre, Cesare). Semiótica Russa, 152 (Schnaiderman,
Panorama da Semiôtica. De Platão a Boris - org.),
Peirce, 56; A Semiôtica no Século Semiótica y Filosofia, 172 (Sini,
XX, 61; Handbook of Semiotics, Carlo).
182 (Nêirh, Winfried). Semiôtica y Pragmática: Una Comparación
Peirce's Semiotics NoU!. A Primei; 140 Evaluativa de Marcos Conceptuales,
(Merrell, Floyd). 134 (Parrer, Herman).
Prolegõmenos a uma Teoria da Lingua- Semiôtica, Informação e Comunica-
gell!, 18 (Hjelmslev, Louis Trolle), ção. Diagrama da Teoria do Sig-
Semântica Estrutnrel, 30; Do Senti- no, 71 (Teixeira Coelho Netto,
do. 32; Semiótica e Ciências Soei- José).

218 219
APRESENTAÇÃO DOS AUTORES

LÚCIA SANTAELLA é professora titular da PUC-Sp, com


doutoramento em Teoria Literária na PUCSP em 1973 e Livre-
Docência em Ciências da Comunicação na ECA/USP em 1993.
De 1987 a 1995, coordenou oprograma de pós-graduação, mes-
trado e doutorado, em Comunicação e Semiótica da PUCSP. De
1995 até o presente, coordena o doutorado e pós-doutorado desse
mesmo programa. No primeiro semestre de 1987, foi professora
convidada pelo DAAD na Universidade Livre de Berlin, desen-
volvendo pesquisa sobre cultura e meios de comunicação. É pesqui-
sadora associada no Researcb Center for Language and Semiotic
Studies (Centro de Pesquisa em Estudos Semióticos e de Lingua-
gem), em Bloomington, Universidade de Indiana, onde fez inú-
meros estágios de pesquisa de pós-doutoramento. Desde 1996, tem
feito repetidos estágios em Kassel, Berlin e Dagstuhl, Alemanha,
onde tem ministrado palestras e desenvolvido projetos de pesquisa.
De 1982 a 1990, exerceu o cargo de presidente da Associação
Brasileira de Semiótica. De 1991 a 1993, foi secretária da
Associação Nacional de Programas de Pós-graduação em Comu-
nicação. Desde 1988, é membro do Conselho Diretor do Instituto
Internacional de Semiótica com sede na Finlândia. Em 1989,foi
eleita vice-presidente da Associação Internacional de Senziótica,
tendo sido re-eleita para o cargo em 1994. Em 1993, foi eleita
membro do Conselho Executivo da Federação Latino Americana
de Estética com sede na Argentina. Em 1996, foi eleita vice-

221
Bibliografia Comentada - Semiótica
Lúcia Santaella e Winfried Nõtb .

versidade de Kassel. É, ainda, autor de centenas de artigos pu-


presidente da Federação Latino-americana de Semiótica. Tem 18
blicados em revistas especializadas internacionais e de vários li-
livros publicados, dentre os quais, quatro são em co-autoria e dois,
vros, dentre eles: Strukturen des Happenings (1972), Dynamik
de estudos críticos. Entre esses livros, destacam-se: Produção de
Semiotischer Systeme (1977), Literatursemiotische Analysen
Linguagem eIdeologia (Cortes, 1980; 2 ed. 1996); Arte e Cul-
d

(1980), Handbuch der Semiotik (1985), Handbook ofSemiotics


tura, Equívocos do Elitismo (Cortez 1982; 3 ed. 1995); O que
d

(1990), Origins of Semiosis. Sign Evolution in Nature and


é Semiótica (Brasiliense 1983; 12" ed. 1994, seguida de inúme- Culture (org., 1994), Semiotics of the Media. State of the Art,
ras reimpressões); Convergências: Poesia Concreta e Tropicalismo
Projects and Perspectives (org., 1997), Imagem, Co~nição,
(Nobel, 1986); A Assinatura das Coisas, Peirce e a Literatura
Semiótica, Mídia (em coautoria com Lúcia Santaella (Sao Pau-
(lmago, 1992); Cultura das Mídias (Experimento, 1992, 2(1
Io li' ununuras,. 1998) Seu Handbook of'} Semiotics está sendo
ed.1996); A Percepção. Uma TeoriaSemiótica (Experimento
t:aduzido para o italiano pela editora B ompiani epara oportu-
1993,2(/ ed. 1998); Estética. De Platão a Peirce (Experimento,
guês pela EDUSP Atualmente está trabalhando n~ 2a. edição
1994); Semiosee Autogeração. A Teoria Geral dos Signos (Atica, revisada e aumentada de seu Handbuch der Semiotih, a ser pu-
1995); Miniaturas (Hacker, 1996); Imagem. Cognição,
blicado pela editora Metzler.
Semiótica, Mídia (em co-autoria com Winfried Nóth, Iluminaras,
1998). Além dos livros, Lúcia Santaella tem 50 artigos publi-
cados no Exterior e mais de uma centena de artigos publicados no
Brasil.

WINFRIED NOTH éprofessor titular de lingüística esemiótica


na Universidade de Kassel, Alemanha e professor convidado na
pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUCSP Recebeu,
em 1971, oprêmio de melhor tese de doutorado, na Universidade
de Bocbum, Alemanha. De 1985 a 1986, foi professor visitante,
pela Fulbright, na Universidade de Wisconsin, USA. Em 1992,
recebeu o prêmio de melhor livro acadêmico pelo seu Handbook of
Semiotics. Foi diretor da Faculdade de Inglês e Línguas Români-
cas, na Universidade de Kassel, de 1982 a 1983 e de 1995 a
1997. Em 1991, foi eleito membro honorário da Associação In-
ternacional de Semiótica Visual. Atualmente é membro da direto-
ria do Centro de Pesquisa Interdisciplinar de Cultura, na Uni-
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222
~
Impresso nas oficinas da
EDITORA PARMA LIDA
Telefone: (011) 6412·7822
Av. Antonio Bardella, 280
Guaruihos . São Paulo· Brasil
Com filmes fornecidos pelo eoítor

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