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Negritude resenha para a monografia.

Nós estamos discutindo sobre o termo racismo, as pessoas pela raça, aqui, por um atributo de
cor estão sendo violentadas, estão perdendo seus direitos, estão se tornando matáveis,
executáveis. Isso de acordo com o conceito de Necropolítica levantado pelo filósofo Achille
Mbembe. E pensando dentro destes termos que a gente traz a discussão do professor
Kabengele Munanga, livro Negritude – Usos e sentidos. Através do estudo desse conceito nós
podemos dimensionar como nós chegamos a essa condição, podemos estabelecer parâmetros
para pensarmos como no sec 21 essa mentalidade que é racial, de classificação social, de
hierarquização e exposição de uma superioridade versus uma inferioridade ainda se mostra
veemente, ainda tem força na sociedade e como pode ser combatida. Ainda mais quando
encontramos em movimentos pró governo Bolsonaro indivíduos com a bandeira de
supremacia branca. Dentro desse contexto que a gente levanta a condição de levantar o que é
negritude. Como ela está enraizada na sociedade. Considerando que nossa mentalidade,
nossas ideias, valores, foram forjados dentro de uma tradição histórica patriarcal, de exclusão
social e extremamente racista ao ponto que dentro de uma leitura academicista oriunda do
marxismo onde falava que para eliminar as diferenças dentro da sociedade nós precisaríamos
tratar da economia. Era dissolvendo as diferenças entre as classes que nós poderíamos chegar
a uma sociedade igualitária. Foi olhando para isso que muitos intelectuais negros, autores,
tanto da negritude quanto do panafricanismo ao longo do século 20 falaram que não é apenas
a questão de classe, existe ainda a questão de gênero (“feminismo negro”) e a questão de
raça. A raça é o elemento central de formação do mundo ocidental. Isso desde o sec 15 para o
sec 16 quando há o encontro dos europeus com o território africano e posteriormente a
colonização das Américas. É a raça que sustenta as nossas desigualdades, as nossas diferenças
sociais, as nossas hierarquias, as nossas exclusões. É através da raça que nós definimos valores,
critérios, para atribuirmos status e privilégios. Portanto, esse é um conceito central para
tentarmos diluir ou ao menos tratarmos um pouco da questão do racismo através do conceito
de negritude.

O primeiro ponto para entendermos esse conceito é pensarmos na questão da identidade. O


professor Munanga vai dividir a em três critérios, o primeiro critério é o histórico – Como os
indivíduos criam laços associativos entre si através de uma história comum. Eles se veem como
uma comunidade, como um grupo, como uma coesão, porque eles participaram de um mesmo
processo histórico, eles possuem uma personalidade coletiva. Eles atribuem entre si memórias
em comum. Isso cria um elemento de coesão, de unidade. Esse elemento histórico seria
aquele que foi dissolvido ou exterminado durante o processo de colonização. É retirar a
história daqueles negros, separá-los de suas famílias, desenraizá-los, ensiná-los outra língua,
ensiná-los outra religião, a história forja a identidade, retirar a história de um grupo, aliena-se
este grupo.

O segundo ponto para tratar sobre a identidade seria a questão linguística. É óbvio que não
encontramos no Brasil, sobretudo no Brasil contemporâneo, comunidades específicas que
tragam enraizadas em si a manutenção da língua de seus ancestrais, mas podemos pensar a
questão linguística num campo mais amplo, como: alimentação, vestimenta, danças, religiões
afro-brasileiras e também em comunidades que ainda sobrevivem em condições equivalentes
as condições dos séculos 19 e início do sec 20 que são as comunidades quilombolas (livro
referência: Torto arado).
Um terceiro aspecto para refletirmos sobre a questão identitária é no âmbito da ideologia.
Esses grupos passaram por um processo histórico de desenraizamento, escravização, violência
moral, simbólica, física e exploração econômica. Isso cria em determinado momento situações
de resistência coletiva, há exemplo das revoltas e estratégias utilizadas por escravizados na
tentativa de romper com os grilhões que os aprisionavam e isso é uma forma de tratar a noção
de comunidade por um eixo de racionalidade. Encontramos aí alguns argumentos para falar de
identidade: história, língua, religião, ideologia... mas, um principal aspecto que precisamos
levantar, de acordo com Munanga, é que essa identidade foi aprisionada, foi constantemente
excluída, foi negada para esses sujeitos sobretudo a partir do sec 15 e 16, com o imperialismo
e com as múltiplas formas de colonização, da terra, do corpo e da alma (referência Valter
Miolo e anibal kijano).

Quando o Munanga trata da questão de raça, ele vai falar que ela está associada diretamente
ao conceito de racismo. A raça não existe como uma forma abstrata, apenas como
classificação, a raça foi utilizada como uma forma de relacionamento social, ela é uma
categoria que modela o comportamento dos sujeitos, é uma categoria ideológica, é uma
categoria que tem reverberação nas situações políticas do cotidiano, é uma categoria de
dominação, exclusão e controle social. Ao mesmo tempo que raça pode ser utilizada como
uma espécie de folclorização, a ideia de democracia racial, miscigenação, onde se nega os
conflitos, as divergências e os contrastes do encontro entre o mundo do homem branco e o
mundo do homem negro para falar de um encontro mais amistoso, um encontro mais
consensual, que teria reverberado em uma nação que não corresponderia a ideia de racismo.

E um principal aspecto para pensarmos a relação raça x racismo é como a raça tem um ponto
objetivo de ataque que é a cor da pele. Ela se utiliza da biologia para tentar classificar os
indivíduos através da sua inferiorização e esse modelo foi utilizado pelos europeus nesse longo
processo de colonização. Um modelo que retirava o aspecto negativo da cor da pele e traduzia
esse aspecto negativo dentro da personalidade, da mentalidade, da história e da cultura dos
negros. Então, essa inferioridade vinculada a raça saía do corpo, mas tendo como seu principal
aspecto o corpo para alcançar também o espírito dos indivíduos ou toda a condição humana
nas diversas esferas.

Conceito de Negritude.

Para pensar esse conceito de negritude, inicialmente, ele vai pensar sobre as condições
históricas. Como surgiu a ideia de que o negro era inferior ao branco? Para Munanga, isso já
começa surgir a partir do sec 15 para o sec 16 e isso através do discurso, para tomarmos aqui
um conceito de michael Foucault, através da literatura, dos escritos, das imagens, da forma
como o olhar europeu construiu a imagem do outro dentro dessa relação conflituosa de
alteridade. O europeu tendo maior domínio técnico e de armamentos, maior domínio bélico,
conseguiu se utilizar de um álibi, de uma justificativa ideológica para tentar garantir também a
sua dominação simbólica sobre o outro. Era um mecanismo para tentar ensinar que o outro
era inferior. Portanto, esse outro deveria aceitar seu papel social de escravizado e seu novo
papel de receber a religião cristã. Isso acontece desde o sec 15 para o 16 através da
construção, do que nas ciências sociais nós chamamos de representação, é uma representação
eurocêntrica sobre o negro e essa representação se faz nos quadros, nas literaturas, nas
cartas... Essa determinação da inferioridade começa por uma justificativa que utiliza o clima, os
negros são inferiores porque viviam em clima tropical, também se justifica na ideia de
linhagem, a linhagem do europeu é a linhagem do homem branco e uma da mais fortes
justificativas é a ideia das missões cristãs, mito de Cam – filho de Noé, onde diz que os negros
foram amaldiçoados a se tornarem escravos de seus irmãos. Fundo de justificativa religiosa.
Munanga demonstra como essas justificativas vão se alterando ao decorrer do tempo. No sec
18, a gente encontra as ideias iluministas, que pensa o mundo dos nativos como o mundo do
natural, o mundo do ingênuo, que ao mesmo tempo encontraríamos nos escritos de Voltaire a
ideia de evolução, os nativos da terra das Américas eram os mais ingênuos, os mais primitivos,
posteriormente passaríamos para a fase do bárbaro, fase do negro, que também iria se
desenvolver até chegar ao estágio de civilização que é o estágio do europeu, estágio do
branco. Essa leitura será capturada no sec 19 pelo filósofo alemão Hegel que vai falar sobre
um processo de evolução da história onde se sai do mundo selvagem e chega ao mundo
civilizado e o negro está dentro dessa história num estágio inferior ao branco. Quando
chegamos ao séc 19, um século de produção industrial, desenvolvimento de novas tecnologias,
o século do cientificismo, nós encontramos o racismo científico através das teorias da
evolução. É o estudo do corpo e também do crânio dos negros para tentar identificar razões
científicas que explicassem o seu atraso, sua barbárie e sua falta de desenvolvimento técnico e
econômico. Isso foi utilizado como justificativa de colonização ou neocolonialismo no sec 19.
Aquilo que era a missão cristã do sec 16 de salvar a alma dos selvagens é substituída pela
missão civilizadora. “Nós vamos levar o progresso a esses povos”. “Eles necessitam da nossa
religião, da nossa ajuda, do nosso apoio”. O fardo do homem branco é ensinar o negro a se
desenvolver. Quando falamos de racismo no mundo ocidental contemporâneo estamos
falando das múltiplas estratégias ideológicas de construção, de representações do outro, que
ainda se sustentam e são internalizadas constantemente por múltiplas imagens, discursos e
múltiplas formas de expressão de comunicação.

Passando esse primeiro momento de tentar explicitar como a imagem do negro é construída,
Munanga vai atentar para as formas de assimilação, ele vai chamar atenção sobretudo para as
colônias africanas do final do sec 19 no decorrer do sec 20 quando ele chama atenção para um
livro do Albert Memmi – Retrato do colonizado precedido pelo retrato do colonizador. O que
acontece no decorrer desse processo de imperialismo, colonização, é a negação da história e
logo da identidade do negro. Cria-se a perspectiva de que a história, a cultura, os valores do
branco são superiores e por isso precisam ser imitados. Tanto que nas colônias africanas, nos
sec 19 e sec 20, existia a técnica da assimilação. O negro que aprende a se vestir, se comportar
e falar a língua do colonizador pode ascender socialmente. Então, essa técnica era usada como
uma forma de embranquecimento. O negro passa a se auto-rejeitar, passa a olhar pra si e
sentir-se inferior ao outro, passa a fazer todo esforço para alienar-se de suas histórias, línguas
e tradições já que são inferiores, “selvagens”, e devem ser substituídas pelas tradições do
branco. O negro passa a se transportar para uma esfera de imitação, é preciso imitar as
vestimentas, é preciso imitar a forma de andar, a alimentação e sobretudo a língua do
colonizador. Essa é uma técnica de negação e alienação do negro no decorrer do processo de
neocolonialismo. Munanga vai chamar atenção para quando essa assimilação vai ser rejeitada?
Quando o negro vai dar conta ou pensar sobre como ele tem perdido as suas raízes, como ele
tem se distanciado da sua história e vai rejeitar essa assimilação?

Munanga conta um pouco de como seria a colonização na África, falando que dentro das
sociedades coloniais quem possuía os melhores cargos, as melhores funções, eram os brancos
oriundos da metrópole, mas nas camadas intermediárias, aquelas famílias negras, mestiças,
que também possuíam propriedades e cargos burocráticos começaram a perceber pouco a
pouco a sua distância social. Por mais que existisse uma imitação, uma tentativa de
assimilação, eles nunca conseguiam se nivelar ao branco porque a personalidade colonial ou
sustentáculo do colonialismo é justamente a manutenção das diferenças de status e privilégios
pela cor da pele, porque é a cor da pele que marca a distância social entre o que seria o negro
e o branco. Esses grupos intermediários da colônia começam a perceber a frustração não
apenas suas mas das massas populares, começam a perceber o desenraizamento, a perda da
história, começam a perceber a ausência da cultura, e a necessidade em recuperar os valores
de seus ancestrais. E é dentro desse contexto que surge, para Munanga, uma mentalidade
coletiva. A ideia de resistência, uma tentativa de desenvolvimento econômico e político ao
ponto de atentarem para um cenário de independência e emancipação.

Para pensarmos o conceito de negritude, nós estamos observando aqui como uma camada de
intelectuais de famílias de grupos sociais começaram a olhar para a perda de suas origens e
começara a refletir sobre o retorno às origens. E essa é uma marca da negritude, é um retorno
às origens. Esse seria o terceiro ponto da obra. Munanga vai terminar o livro sobre o conceito
de negritude partindo para pensarmos quais são os atributos dessa negritude e vai utilizar um
intelectual chamado Aimee Cesaire que vai dizer o seguinte, para nós pensarmos o que é essa
negritude, nós temos que pensar em três aspectos, o primeiro é a identidade – é o negro
reconhecer-se enquanto grupo através da cor da pele e saber que foi através da cor da pele
que ele passou por um processo de dizimação e alienação. Um outro aspecto além da
identidade é a fidelidade, fidelidade que seria a terra mãe, a África, daquele espaço de onde
eles foram desenraizados, de reencontrar essa memória, os símbolos que valorizam as suas
tradições, culturas e suas formas de vida. E por fim, uma solidariedade, que seria uma
mobilização, uma chance de ação, reencontrar-se com seus pares e a partir daí num
sentimento de revolta em comum reafirmar a sua cor negra. Aqui é onde ele chama atenção
para uma inovação do conceito de raça, retirando o seu aspecto de racismo. A raça aqui,
enquanto aspecto de manutenção da cor negra, é de afirmação, proposição, atividade, a raça
se torna um aspecto de mobilização. Ao invés de observarmos a cor negra como atraso, como
inferioridade, a cor negra é para valorizar o que ele chama de originalidade das raízes:
ancestralidade, cultura oral, grandes reinos e impérios, diversas tecnologias, múltiplas formas
de casamento, uma cultura extremamente complexa que existia e existe na África e que
abarca o que seria esse passado ancestral dessas comunidades ao redor do mundo, através da
diáspora africana, começaram a se espalhar pelo planeta. É uma questão de recuperar a
identidade e subverter esse papel da cor-personalidade. O grande aspecto que marcou a
tradição ocidental foi olhar para o negro e através da sua cor marcar a sua inferiorização. A
negritude é um movimento de afirmação, é olhar para a cor e mobilizar essa cor para pensar o
que é a afirmação dessa cultura em seus múltiplos aspectos, rejeitar a imitação, rejeitar a
assimilação e saber que dentro dessa cultura negra existem diversos elementos ao nível
tecnológico, sociológicos, religiosos que são extremamente complexos e não são inferiores aos
elementos da cultura europeia. Pelo contrário, foi através das contradições que os intelectuais
negros encontraram nesse mundo europeu, na primeira metade do século 20, com múltiplas
guerras, crises econômicas, uma civilização da barbárie, que eles puderam observar as
diferenças entre seu mundo e o mundo do outro. Essa relação de alteridade para pensar a
positividade do mundo negro. É essa a afirmação do conceito de negritude.

O conceito de negritude ainda subiste na nossa contemporaneidade porque nós estamos


observando diversos contextos pelos quais subsistem racismos na sociedade. Racismo ao nível
individual - personalístico, institucional – diversas instituições pelas quais o negro acaba não
adquirindo espaços e também ao nível estrutural (Silvio de Almeida).
O racismo é de longa duração, ele está estruturado e é estruturantes da nossa sociedade. Os
combates devem ser múltiplos como forma de abrir brejas e pouco a pouco encontrarmos
caminhos para sairmos ou destruirmos essa estrutura e isso é um caminho árduo, é uma tarefa
que demanda um longo prazo, por isso, é urgente e deve ser tratada agora. Por isso, o
conceito de negritude é extremamente importante. Para percebermos essas diferenças
culturais e alteridade não mais como forma de inferiorização e abertura para a normalização
da dizimação do outro, mas como forma de expor diferenças culturais, as formas como essas
culturas foram tratadas ao longo de 5 SEC e que esse processo histórico ainda sustenta a nossa
sociedade. Então, não basta sermos relapsos como o presidente Bolsonaro dizendo que não
deve nada a escravidão porque não escravizou ninguém. Todos nós carregamos esse fardo.
Fardo da escravização, da exploração econômica, da marginalização social nos pós abolição, na
favelização, na perseguição, encarceramento, drogadição e assassinatos dos negros. Devemos
repensar através da negritude o nosso olhar, criar uma espécie de estranhamento, demonstrar
que a ideia de cor, de raça, não existe biologicamente, mas existe política, ideológica e
socialmente. Por isso, ela deve ser reestruturada. A pigmentação da pele não deve mais dar
conta da exclusão ou marginalização. A negritude aponta para a cor como um mecanismo ou
uma forma de reafirmação, olhar para as origens, valorizar sua originalidade, não mais com
sentido de nostalgia, não mais olhar para o passado melancólico, mas como uma tarefa política
do presente. Os negros possuem tradição, história, múltiplos valores, perpassaram um
processo histórico em comum e é isso que faz com que eles possam se rearticular como uma
comunidade e pensar em formas de resistência social porque o que baliza a nossa sociedade
ocidental é o conceito de raça.

- identidade – assimilação – imitação - recusa da assimilação – objetivos da negritude: -


Identidade -fidelidade e - solidariedade

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