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A FARSA DE INÊS PEREIRA

SÁTIRA (crítica aos costumes e à conjuntura socioeconómica – mulher preguiçosa que


pretende ascender socialmente através do casamento)

. personagens tipo: personagens que corporizam as características de um grupo social ou


profissional (membros estão ligados por traços de carácter idênticos) ex: judeus gananciosos,
moça do povo pretenciosa e preguiçosa, frade devasso, escudeiro fanfarrão e pelintra, o
homem bom enganado pela mulher, ...

- Inês não é uma personagem tipo ( é modelada) pois ela vai evoluindo
psicologicamente ao longo da peça. No início surge como representante da rapariga ambiciosa
e rebelde que pretende pelo casamento, escapar da situação em que vive. Vivia como
prisioneira sem puder sair e “escrava” pela mãe. Revela a sua angústia e desejo de liberdade. O
primeiro casamento só lhe traz infelicidade e a atitude tirânica do Escudeiro obriga-a a mudar
de comportamento. Inês sofre e aprende a lição. Na cena final representa a mulher adúltera
que, conscientemente, é infiel ao marido e que o ridiculariza.

. cómicos: situação- situação/ circunstâncias em que as personagens se inserem (atitudes


desajeitadas de Pero, morte do escudeiro por um pastor, cena final, falas dos judeus
interesseiros)

carácter- comportamentos e atitudes das personagens (Pero e Escudeiro)

linguagem- desadequação da linguagem das personagens ao contexto em que se


encontram (ironia- sugere-se o contrário do que aquilo que pensamos/sentimos, sarcasmo-
troça das personagens pretendendo ridicularizá-las, ...) (Pero cena inicial e judeus)

NOTA: Gil Vicente satiriza: mentalidade das jovens raparigas que optam por casamentos de
conveniência; escudeiros bem falantes, fanfarrões e pelintras que dizem ser o que não são;
ingenuidade e os comportamentos dos desajeitados;alcoviteiras e judeus gananciosos; clérigos
devassos e ermitões oportunistas; infidelidade conjugal; valorização das falsas aparências.

CARACTERIZAÇÃO DAS PERSONAGENS

. Inês: cansa-se da vida que leva e quer casar e escolher um marido que tenha boas qualidades
(discreto e que saiba tanger). É uma jovem fantasiosa e leviana que vê no casamento uma
forma de escapar da sua vida e à sua mãe. 1º casamento- tem de acatar um conjunto de
restrições 2º casamento- por vingança e com a intenção de viver à sua vontade

- solteira: ambiciosa, deseja ascender, leviana, preguiçosa, teimosa, insensata,


resmungona, fantasiosa. Não quer casar com alguém da mesma condição social

-casada com escudeiro: reconhece a culpa da sua má escolha, desencantada,


arrependida, deseja libertar-se e vingar-se

-casada com pero: vinga-se do 1º marido no asno e ingénuo pero, torna-se uma figura
vingativa, infiel e fingida. Abusa da confiança do marido, dissimulada e astuta.
A moça fantasiosa e irrefletida acaba por se ver obrigada a ajustar os seus sonhos por força da
experiência que vivenciou.

. Mãe: confiante, conselheira, amiga, realista, queria que a filha tivesse segurança económica
quando casasse, exalta as qualidades da filha quando a elogia, garante o interesse de Lianor. Faz
um presságio da má escolha de Inês mostrando que cantar e tanger não mata a fome. Aconselha
Inês a casar com um homem simples que ofereça estabilidade.

. Lianor Vaz: alcoviteira, apresentou a 1ª proposta de casamento, o pero. Combinava


casamentos.

. Pêro Marques: lavrador rico mas ignorante, honesto mas rude e deselegante. É generoso,
ingénuo, obediente, bom marido, respeitador, mas demasiado ingénuo (torna-se marido traído)

. Judeus: interesseiros, falsos e materialista cujo único objetivo era o negócio (lucros)

. Ermitão: servia-se da religiosidade das pessoas para atingir fins menos dignos, fazia propostas
ousadas às mulheres tentando seduzi-las, tem função de concretizar as intenções de traição da
mulher casada com pero, é uma censura aos clérigos que esqueciam os deveres e a moral

. Escudeiro: pobre, pelintra, hipócrita, cobarde tendo fugido da batalha

-antes de casar: gentil, discreto, bem falante, vaidoso, esperto, conquista Inês

-depois de casar: desleal, mentiroso, autoritário, cruel, egoísta, não dá liberdade a Inês

Representante da nobreza endividada, sem valores e prestígio que vive do estatuto. Era comum
a ostentação social e o culto das aparências. É o cavalo que derruba Inês, depois de a ter
enganado com as suas aparências galantes.

NOTA: Inês contrasta com Mãe/Lianor no que diz respeito à mentalidade e ao conceito de bom
casamento; Escudeiro e Pero contrastam nas maneiras e nas intenções e comportamentos.

OS TIPOS DE FALA:- Pêro Marques: expressa-se de forma rústica, singela e direta com uma
atitude sincera e leal

-Escudeiro: linguagem cheia de artifícios, cativante, falsa. É uma lingiagem de sedução que lhe
permite esconder as suas verdadeiras intenções.

RECURSOS EXPRESSIVOS:-comparação (aproxima dois conceitos distintos)

-interrogação retótica (reflexões; ex: críticas da mãe ao comportamento da filha)

-ironia (expressar o contrário do que se pensa)

-metáfora (transposição de uma palavra para um campo semântico diferente)

-metonímia (designa uma realidade por outra realidade que lhe é próxima por contiguidade) ex:
renego deste lavrar, antes que venha o escuro, e cerra-se-m’a a garganta, de casar com parvoíce

-alegoria (expressão de uma ideia abstrata através da sua materialização, tornando-a mais clara
ex: anjoi-bem, diabo-mal, pomba branca-paz

A FARSA
. características: -ação trivial e com poucas personagens (retratam tipos sociais e
profissionais)

-retraro do cotidiano e da vida familiar

-provoca o riso e destaca o ridículo através de personagens caricaturadas e


cenas inusitadas

-linguagem de características populares

. estrutura externa (atos e cenas), estrutura interna (exposição-personagens, conflito-


acontecimentos e desenlance-conclusão)

NOTA: didascálias importantes para encenadores e atores- instruções ou indicações cénicas


para a representação

REPRESENTAÇÃO DO QUOTIDIANO

-oportunismo

-desprezo pela vida camponesa

-ignorância e ingenuidade dos camponeses

-casamentos arranjados, feitos como forma de ascender socialmente,como libertação

-luxúria e devassidão dos frades e mentira e leviandade da alcoviteira

-atitudes hipócritas e tiranas (escudeiro) e provocatórias e ilibidinosas (ermitão)

-culto da aparência

NOTA: quotidiano feminino- as personagens vincentinas retratam a angústia, contradições,


sofrimento, desejo de mudança, de igualdade, de respeito e de liberdade da mulher. Ela vivia
como prisioneira: não podiam sair de casa, mulher casada era escrava do lar, dependia
economicamente do marido e não podia sair desacompanhada, se o marido não estivesse
presente, deviam agir como viúvas.

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