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RESPONSABILIDADE DOS COMANDANTES DE NAVIOS MERCANTES NOS CASOS

DE CLANDESTINOS A BORDO: APLICAÇÃO DO CÓDIGO ISPS

Iaroslav Moraes Blaschikoff

RESUMO

Por meio de estudo das normas previstas no Código ISPS ("International Ship and Port
Facility Security Code") inseridas na Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana
no Mar de 1974, o presente estudo trata da responsabilidade do Comandante do Navio sobre o
embarque clandestino de jovens, que em fuga de uma situação socioeconômica desfavorável,
sobretudo em países da África ocidental, abordam os mercantes e se escondem em compartimentos
insalubres, extremamente apertados e de difícil acesso. Previsto e delineado no ISPS CODE, o
Plano de Proteção do Navio se bem elaborado e rigorosamente aplicado durante a inspeção pré-
suspender afasta a responsabilização, mesmo nos casos em que o ingresso irregular tenha se
consumado quando decorrente da ação furtiva dos clandestinos.

PALAVRAS-CHAVE: RESPONSABILIDADE. SEGURANÇA. PESSOAS. EMBARQUE.


TRANSPORTE. NAVIO.

ABSTRACT

Through study of the rules contained in the ISPS Code ("International Ship and Port Facility
Security Code") entered in the International Convention for the Safety of Life at Sea, 1974, this
study is the responsibility of the Commander of the ship on the clandestine shipment of youths
fleeing an unfavorable socioeconomic conditions especially in West African countries, addressing
the merchant and hide in compartments unhealthy, extremely tight and difficult to access. Planned
and outlined in the ISPS CODE, the Ship Security Plan is well designed and rigorously applied
during the pre-inspection to stay away from accountability, even in cases where the ticket is
consummated when irregular due to the clandestine stealth.

KEYWORDS: RESPONSIBILITY. SECURITY. PEOPLE. SHIPPING. TRANSPORT. SHIP.


INTRODUÇÃO

Aluno do curso de Pós-Graduação em Direito Marítimo e Portuário, da Universidade Católica de Santos
Em uma breve análise acerca da aplicação do Código ISPS ("International Ship and Port
Facility Security Code") nos casos de ingresso de clandestinos a bordo de navios mercantes de
carga, o presente artigo busca identificar as situações em que o Comandante do mercante pode ou
não ser responsabilizado por este Fato da Navegação.
De forma rotineira, muitos clandestinos, em sua ampla maioria, jovens do sexo masculino,
negros, com idade entre 18 e 25 anos que por condições socioeconômicas tem o seu acesso
emigratório bloqueado por caminhos regulares, abordam navios cargueiros, quando estes se
encontram atracados em operações de carga e descarga, sobretudo em terminais portuários de países
como Lagos, Gana, Nigéria, Serra Leoa, Somália, Costa do Marfim, entre outros. Na maioria dos
casos, o destino que imaginam são países do continente Europeu ou América do Norte e quando
ingressam nos navios e se escondem em compartimentos do casco, 1acreditam que essa é a derrota
deles. Já em alto mar, quando possuem a certeza de que não há mais possibilidades de o navio
regressar ao porto de origem, se apresentam a tripulação, com fome, sede, cansados e entregues a
própria sorte. Não raras às vezes, após esses navios chegarem ao Brasil, ao serem ouvidos pelas
Autoridades Portuárias, sobretudo a Polícia Federal e a Marinha brasileira, por meio de suas
Capitanias e Delegacias, descobre-se tratar de um “profissional” dessa prática, identificado por
ingressar clandestinamente em várias outras ocasiões. Há registros de casos de clandestinos que
insistentemente já embarcaram irregularmente até 19 vezes e em todas houve a necessidade de ser
deportado2 para o seu país de origem. Há ainda, casos de clandestinos que após serem descobertos
pela tripulação, são simplesmente lançados ao mar, a própria deriva.

1- BREVE APRESENTAÇÃO SOBRE O CÓDIGO INTERNACIONAL PARA PROTEÇÃO DE


NAVIOS E INSTALAÇÕES PORTUÁRIAS (International Ship and Port facílity Security Code) -
ISPSCode

A Conferência Diplomática sobre Proteção Marítima realizada em Londres em dezembro de


2002 adotou novas disposições na Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no
Mar de 1974 e inseriu o Código ISPS, com vistas a intensificar a proteção marítima após os atentados
terroristas ao World Trade Center (WTC) em 11 de setembro de 2001. Esses novos requisitos formam
1
Fonseca, Maurílio Magalhães, Arte Naval, 7. Ed., Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha,
2005, seção D – subdivisão do casco, subitem 1.57. define compartimento: São assim denominadas as subdivisões
internas de um navio.
2
Procedimento administrativo para a retirada do território brasileiro de estrangeiro em situação irregular, por
entrada ou estada, depois de esgotado o prazo da notificação para, voluntariamente, deixar o país. Também é aplicada
como pena administrativa em algumas das infrações no Estatuto.

2
a estrutura internacional através da qual navios e instalações portuárias devem cooperar para detectar
e dissuadir atos que ameacem a proteção no setor de transporte marítimo3.

Na definição do professor Agripino (2011, p.279): ISPS CODE (International Ship and Port
facílity Security), uma codificação em nível mundial sobre o incremento da proteção de embarcações
e instalações portuárias.

O Brasil como Estado-membro da Convenção SOLAS, desde 25 de maio de 1980 por força
do Decreto Legislativo nº 11/80, promulgado pelo Decreto nº 87.186, de 18 de maio de 1985,
assumiu o compromisso de implementar o Código ISPS, em vigor desde julho de 2004.
Dividido em Partes A (com cumprimento obrigatório) e B (caráter recomendatório), no
subitem daquela, o Código ISPS, define propósito e traça objetivos, conforme se transcreve a seguir:

1. estabelecer uma estrutura internacional envolvendo a cooperação entre Governos Contratantes,


órgãos Governamentais, administrações locais e as indústrias portuária e de navegação a fim de
detectar ameaças à proteção e tomar medidas preventivas contra incidentes de proteção que afetem
navios ou instalações portuárias utilizadas no comércio internacional;
2. estabelecer os papéis e responsabilidades dos Governos Contratantes, órgãos Governamentais,
administrações locais e as indústrias portuária e de navegação a nível nacional e internacional a fim
de garantir a proteção marítima;
3. garantir a coleta e troca eficaz de informações relativas a proteção;
4. prover uma metodologia para avaliações de proteção de modo a traçar planos e procedimentos
para responder a alterações nos níveis de proteção; e
5. garantir que medidas adequadas e proporcionais de proteção sejam implementadas.
Dentre as modificações apresentadas ao texto da Convenção SOLAS na Conferência
Diplomática sobre Proteção Marítima de 2002, mencionada acima, podemos destacar as seguintes:

- A necessidade de implementar de um Sistema de identificação automática – AIS;

- Inserção de número IMO4 de identificação do navio;

- Registro contínuo de dados dos navios;

- Estabelecimento de maior controle de entrada e saída de pessoas e veículos nas instalações


portuárias;

- Delimitação do perímetro do porto;


3
V. SOLAS, Preâmbulo, parágrafo 1º
4
Segundo COLLYER 2002, p.139 apud AGRIPINO, 2011, p.278): A IMO ou OMI é agência da ONU que tem
por escopo “facilitar a cooperação entre governos relativa ao comércio marítimo internacional com vistas a se
alcançarem os mais altos padrões de segurança marítima e eficiência da navegação”

3
- Instalação de sistema de vigilância dos limites do perímetro do porto e do cais; e

- Necessidade de cadastramento das pessoas e veículos que entram na instalação portuária.56

2 - DA INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO MARITIMO

O Inquérito Administrativo sobre Acidentes e Fatos da Navegação (IAFN) que guarda muita
semelhança com o Inquérito Penal comum deverá ser iniciado logo que a Autoridade Marítima tiver
conhecimento do ingresso de clandestino a bordo de navios mercantes em águas territoriais
brasileiras. Com tolerância de até 5 (cinco) dias para sua abertura, possui como objetivos, coletar as
provas necessárias para apuração da causa determinante desse fato da navegação, sua extensão,
conseqüências e identificar possíveis responsáveis, devendo ser concluído no prazo máximo de 90
(noventa) dias, permitida a prorrogação desse prazo em casos excepcionais, prescindidos de
respectiva justificativa.

É de competência das Capitanias dos Portos e suas Delegacias a instauração do IAFN. Sendo
a competência para instauração definida no art. 33 da LOTM nos seguintes termos e ordem de
preferência: (Matusalém Gonçalves Pimenta, 2013, p.56)

Art. 33, Lei 2180/54 - Sempre que chegar ao conhecimento de uma capitania de portos qualquer
acidente ou fato da navegação será instaurado inquérito.
§ 1º - Será competente para o inquérito:
a) a capitania em cuja jurisdição tiver ocorrido o acidente ou fato da navegação;
b) a capitania do primeiro porto de escala ou arribada da embarcação;
c) a capitania do porto de inscrição da embarcação;
d) qualquer outra capitania designada pelo Tribunal.
§ 2º - Se qualquer das capitanias a que se referem as alíneas a, b e c, do parágrafo precedente, não
abrir inquérito dentro de cinco dias contados daquele em que houver tomado conhecimento do
acidente ou fato da navegação, a providência será determinada pelo Ministro da Marinha ou pelo
Tribunal Marítimo, sendo a decisão deste adotada mediante provocação da Procuradoria, dos
interessados ou de qualquer dos Juízes.
Qualquer dúvida sobre competência para instauração de IAFN será dirimida, sumariamente,
pelo TM (art. 34, parágrafo único da Lei 2180/54), a seguir:

5
Texto extraído do site do Porto de Vitória. Disponível em: www.portodevitória.com.br, acesso 21 de março de
2012 às 16h30;
6
V. Portaria ALF/STS 200, Porto de Santos, publicada no DOU de 14 de abril de 2011, que disciplina os
procedimentos de autorização pela Autoridade Portuária e Autoridade Aduaneira para o ingresso, a permanência e a
movimentação de pessoas e veículos, nos locais e recintos alfandegados, ou a bordo de embarcações de viagem
internacional, em toda a área sob jurisdição da Alfândega da Receita Federal do Brasil do porto de Santos, sejam feitos
por meio de sistemas eletrônicos;

4
Art. 34. Verificar-se-á a competência por prevenção desde que, sendo mais de uma capitania
competente, houver uma delas em primeiro lugar, tomado conhecimento do acidente ou fato da
navegação, iniciando, desde logo, o inquérito.
Parágrafo único. Qualquer dúvida sobre a competência para a instauração de inquérito será
dirimida, sumàriamente, pelo Tribunal Marítimo.
O “IAFN” no caso em estudo é iniciado com o fim de apurar esse Fato da Navegação e tem
por fundamento reunir provas para eventual representação da Procuradoria Especial da Marinha
perante o Tribunal Marítimo.

Sendo um fato da navegação7, por prejudicar ou colocar em risco a incolumidade e segurança


da embarcação, as vidas e fazendas de bordo, o ingresso de clandestinos a bordo, enseja a abertura de
um “IAFN”, que após ser concluído no prazo definido em lei8, deve ser encaminhado ao Tribunal
Marítimo para julgamento conforme artigos 10, alíneas “a” e “b”, 13, inciso I, da Lei federal
2180/54, a seguir:

Art. 10 - O Tribunal Marítimo exercerá jurisdição sobre:


a) embarcações mercantes de qualquer nacionalidade, em águas brasileiras;
b) embarcações mercantes brasileiras em alto-mar, ou em águas estrangeiras;
(...)

Art. 13 - Compete ao Tribunal Marítimo:

I - julgar os acidentes e fatos da navegação:

a) definindo-lhes a natureza e determinando-lhes as causas, circunstâncias e extensão;

b) indicando os responsáveis e aplicando-lhes as penas estabelecidas nesta lei;

c) propondo medidas preventivas e de segurança da navegação;

Assim, deverão ser notificados para prestar depoimento 9, o Comandante do navio, os


7
Consideram-se fatos da navegação: a) o mau aparelhamento ou a impropriedade da embarcação para o serviço
em que é utilizada e a deficiência da equipagem; b) a alteração da rota; c) a má estivação da carga, que sujeite a risco a
segurança da expedição; d) a recusa injustificada de socorro à embarcação em perigo; e) todos os fatos que prejudiquem
ou ponham em risco a incolumidade e segurança da embarcação, as vidas e fazendas de bordo; f) o emprego da
embarcação, no todo ou em parte, na prática de atos ilícitos, previstos em lei como crime ou contravenção penal, ou
lesivos à Fazenda Nacional. Art. 15, LOTM;
8
O prazo para a conclusão do inquérito marítimo é de noventa dias, a serem contados a partir da data de sua
instauração até a data de sua homologação pelo Capitão dos Portos ou Delegado. Havendo necessidade de prorrogação,
o encarregado do inquérito deverá solicitá-la ao Capitão dos Portos, em pedido devidamente fundamentado. O Capitão
dos Portos, por sua vez, se deferir o pedido, deverá participar sua decisão ao Distrito Naval, à Diretoria de Portos e
Costas, ao TM e à PEM. Na hipótese excepcional de o IAFN não terminar no prazo de um ano, o Capitão dos Portos
deverá, em petição fundamentada, solicitar sua prorrogação ao Comandante do Distrito Naval, ao qual se subordina,
sendo prerrogativa exclusiva dele a decisão de prorrogá-lo ou não. (Matusalém Gonçalves Pimenta, 2013, p.63);
9
Nos casos de depoentes estrangeiros que não se comuniquem na língua portuguesa, exige-se a presença de
intérprete oficial juramentado;

5
tripulantes que localizaram o clandestino (ou aquele que o viu primeiro nos casos de apresentação
voluntaria ao longo da viagem), o próprio clandestino e principalmente o Oficial de Proteção do
Navio.

O Oficial de proteção é a pessoa a bordo do navio, responsável perante o Comandante e


designado pela Companhia de navegação como o responsável pela proteção do navio 10,
implementação, manutenção do plano, e pela ligação com o funcionário de proteção da companhia e
os funcionários de proteção das instalações portuárias. Suas diretrizes obrigatórias estão previstas no
subitem 9.4, Parte A, do Código ISPS, a seguir: (...) O plano deverá incluir, pelo menos, o seguinte:
1. medidas para prevenir que armas, substâncias perigosas e dispositivos destinados ao uso contra
pessoas, navios ou portos, e cujo transporte não seja autorizado, sejam introduzidos a bordo do
navio;
2. identificação de áreas restritas e de medidas para prevenir o acesso não autorizado;
3. medidas para prevenir o acesso não autorizado ao navio;
4. procedimentos para responder a ameaças de proteção e a violações de medidas de proteção,
incluindo disposições relativas à manutenção de operações críticas do navio ou da interface
navio/porto;
5. procedimentos para atender a quaisquer instruções de proteção que os Governos Contratantes
possam dar no nível 3 de proteção;
6. procedimentos para evacuação no caso de ameaças de proteção ou de violações da proteção;
7. deveres do pessoal de bordo com responsabilidades de proteção e deveres de qualquer outro
pessoal de bordo relativos a aspectos de proteção;
8. procedimentos para auditorar as atividades de proteção;
9. procedimentos para formação/treinamentos, simulações e exercícios relacionados ao plano;
10. procedimentos para a interface com atividades de proteção das instalações
portuárias;
11. procedimentos para a revisão periódica e atualização do plano;
12. procedimentos para reportar incidentes de proteção;
13. identificação do oficial de proteção do navio;
14. identificação do funcionário de proteção da companhia, incluindo informações para contato 24
horas;
15. procedimentos para assegurar a inspeção, teste, calibração e manutenção de qualquer

10
Plano de proteção do navio significa um plano elaborado com vistas a garantir a aplicação de medidas a bordo
do navio criadas para proteger pessoas a bordo, cargas, unidades de transporte de cargas, provisões do navio ou o
próprio navio dos riscos de um incidente de proteção;

6
equipamento de proteção instalado a bordo;
16. frequência da execução de teste ou calibração de qualquer equipamento de proteção instalado a
bordo;
17. identificação dos locais onde se encontram os pontos de ativação do sistema de alarme de
proteção do navio; e
18. procedimentos, instruções e diretrizes sobre a utilização do sistema de alarme do navio,
incluindo teste, ativação, desativação e reativação do alarme, bem como redução de alarmes falsos.
Para o terminal Portuário, assim como nos navios, também há a obrigatoriedade de haver um
plano de proteção em conformidade com o previsto pelo Código ISPS, exaustivamente disciplinado
no respectivo subitem 16.3, parte A e levando-se em conta, ainda, o previsto na parte B, a seguir:
(...) o plano deverá cobrir, pelo menos, o seguinte:
1. medidas para prevenir que armas, substâncias perigosas e dispositivos destinados ao uso contra
pessoas, navios ou portos, e cujo transporte não seja autorizado, sejam introduzidos em uma
instalação portuária ou a bordo de um navio;
2. medidas para prevenir o acesso não autorizado a instalações portuárias, a navios atracados nestas
instalações e a áreas de acesso restrito das instalações portuárias;
3. procedimentos para responder a ameaças de proteção e a violações da proteção, incluindo
disposições relativas à manutenção de operações críticas da instalação portuária ou da interface
navio/porto;
4. procedimentos para atender a quaisquer instruções de proteção que os Governos Contratantes, em
cujo território a instalação portuária esteja localizada, possam dar para o nível 3 de proteção;
5. procedimentos para evacuação no caso de ameaças de proteção ou de violações da proteção;
6. deveres do pessoal das instalações portuárias com responsabilidades de proteção e deveres de
qualquer outro pessoal das instalações portuárias relativos a aspectos de proteção;
7. procedimentos para a interface com atividades de proteção do navio;
8. procedimentos para a revisão periódica e atualização do plano;
9. procedimentos para reportar incidentes de proteção;
10. identificação do funcionário de proteção das instalações portuárias, incluindo informações para
contato 24 horas;
11. medidas para assegurar a proteção das informações contidas no plano;
12. medidas desenvolvidas para assegurar a proteção efetiva da carga e dos equipamentos de
manuseio de carga na instalação portuária;
13. procedimentos para auditorar o plano de proteção das instalações portuárias;
14. procedimentos para responder caso o sistema de alarme de proteção de um navio localizado na

7
instalação portuária tenha sido ativado; e
15. procedimentos para facilitar a licença em terra para o pessoal de bordo ou para mudanças de
pessoal, bem como para facilitar o acesso de visitantes ao navio, incluindo representantes de
organizações trabalhistas e de instalações para o bem estar de marítimos;
Plano de proteção das instalações portuárias significa um plano elaborado para garantir a
aplicação de medidas criadas para proteger instalações portuárias e navios, pessoas, cargas,
unidades de transporte de cargas e provisões do navio dentro da instalação portuária dos riscos de
um incidente de proteção. Já o Funcionário de proteção das instalações portuárias significa a pessoa
designada como responsável pelo desenvolvimento, implementação, revisão e manutenção do plano
de proteção das instalações portuárias e pela ligação com os oficiais de proteção do navio e os
funcionários de proteção da companhia. (subitem 2.1, parte A, Código ISPS)

3– DA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL MARÍTIMO

O Tribunal Marítimo (TM), órgão autônomo, auxiliar do Poder Judiciário, vinculado ao


Comando da Marinha, com sede na cidade do Rio de Janeiro, possui como principais atribuições,
manter o registro geral da propriedade e da hipoteca naval, bem como dos armadores de navios
brasileiros, além de julgar os acidentes e fatos da navegação, tanto marítima quanto fluvial e
lacustre, além de demais questões relacionadas com a atividade marítima.
Na qualidade de auxiliar do Poder Judiciário, importante ressaltar o valor que a Lei 2180/54
conferiu às decisões do TM. Em seu artigo 18, a lei lhe atribui presunção de certeza e em seguida,
em seu artigo 19, conferiu a qualidade de prova indispensável, a seguir:

Art. 18. As decisões do Tribunal Marítimo, nas matérias de sua competência, têm valor probatório e
se presumem certas, sendo suscetíveis de reexame pelo Poder Judiciário.

Art. 19. Sempre que se discutir em juízo uma questão decorrente de matéria de competência do
Tribunal Marítimo, cuja parte técnica ou técnico-administrativa couber nas suas atribuições, deverá
ser juntada aos autos a sua decisão definitiva.

A seguir apresenta-se, em síntese, dois Acórdãos da Corte, esta que recorrentemente vem
julgando casos análogos, a primeira decisão isenta o Comandante do mercante de responsabilidade,
julgando procedente o pedido de arquivamento formulado pela Procuradoria Especial da Marinha,
pois constata-se a ação furtiva dos clandestinos por abrir forçadamente a grade de proteção do
compartimento da madre do leme11. Já o segundo, aponta responsabilidade do Comandante,
11
Fonseca, Maurílio Magalhães, Arte Naval, 7. Ed., Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha,

8
considerando que apesar de haver um plano de proteção a bordo, este não foi capaz de coibir o
ingresso de pessoas estranhas a bordo. Vejamos:

TRIBUNAL MARÍTIMO - PROCESSO Nº 23.566/08 – ACÓRDÃO - N/M


“GOODFAITH”. Embarque de clandestinos a bordo de navio mercante quando
atracado em porto estrangeiro, colocando em risco as vidas e fazendas de bordo.
Arrombamento da grade de proteção da abertura do compartimento da madre do
leme. Ação furtiva dos clandestinos. Arquivamento. (...) Assim, ACORDAM os
Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade: a) quanto à natureza e extensão do
fato: embarque de clandestinos a bordo de navio mercante quando atracado em
porto estrangeiro, colocando em risco as vidas e fazendas de bordo; b) quanto à
causa determinante: arrombamento da grade de proteção da abertura do
compartimento da madre do leme; c) decisão: julgar o fato da navegação, previsto
no art. 15, letra “e”, da Lei nº 2.180/54, como decorrente da ação furtiva dos
clandestinos, mandando arquivar o inquérito, conforme promoção da PEM.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Rio de Janeiro, RJ, em 16 de dezembro
de 2008. SERGIO CEZAR BOKEL – Juiz-Relator - LUIZ AUGUSTO CORREIA
- Vice-Almirante (RM1) Juiz-Presidente

Decisão da Corte Marítima prestigiando a fundamentação da PEM e julgando o fato da


navegação como decorrente de negligência, a seguir:

TRIBUNAL MARÍTIMO - PROCESSO Nº 23.537/08 – ACÓRDÃO - N/M


“ZINNET METE”. Ingresso de clandestino a bordo de navio mercante estrangeiro
quando atracado em porto estrangeiro, encontrado durante a viagem e
desembarcado em porto brasileiro, colocando em risco a incolumidade e
segurança da embarcação, as vidas e fazendas de bordo. Falha de procedimentos
de controle de entrada e saída de pessoas a bordo e de inspeções para constatação
da presença de clandestinos. Negligência. Condenação. (...) Assim, ACORDAM
os Juízes do Tribunal Marítimo, por unanimidade: a) quanto à natureza e extensão
do fato: ingresso de clandestino a bordo de navio mercante estrangeiro quando
atracado em porto estrangeiro, encontrado durante a viagem e desembarcado em

2005, p.283, seção D – subdivisão do casco, subitem 6.3.4 (1). define madre: Eixo do Leme, em geral de aço forjado.
Sofre grande esforços de flexão e torção. Penetra no casco do navio e por ela é transmitido o movimento ao leme.

9
porto brasileiro, colocando em risco a incolumidade e segurança da embarcação,
as vidas e fazendas de bordo; b) quanto à causa determinante: falha de
procedimentos de controle de entrada e saída de pessoas a bordo e de inspeções
para constatação da presença de clandestinos; c) decisão: julgar o fato da
navegação previsto no art. 15, letra “e”, da Lei 2.180/54, como decorrente de
negligência, condenando Ahmet Eyup Eken à pena de multa de R$ 500,00
(quinhentos reais), de cordo com o art. 121, inciso VII, § 5º, da Lei 2.180/54, com
a redação dada pela Lei 8.969/94, e ao pagamento das custas
processuais.Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Rio de Janeiro, RJ, em 2 de
setembro de 2010. SERGIO CEZAR BOKEL Juiz-Relator. LUIZ AUGUSTO
CORREIA Vice-Almirante (RM1) Juiz-Presidente

Infere-se, dos dois acórdãos igual assertiva, a responsabilidade do Comandante sobre a


segurança da tripulação, cargas e demais pessoas a bordo.
Em irrestrita obediência a legislação Pátria: art. 2°, inciso IV da Lei 9537/97 (Lei de
segurança do Tráfego Aquaviário - LESTA): Para os efeitos desta Lei, ficam estabelecidos os
seguintes conceitos e definições: IV - Comandante (também denominado Mestre, Arrais ou Patrão) -
tripulante responsável pela operação e manutenção de embarcação, em condições de segurança,
extensivas à carga, aos tripulantes e às demais pessoas a bordo; E ainda, na esteira da melhor doutrina
Maritimista, in verbis: “Exige-se do Comandante um conjunto de qualidades indispensáveis ao
comando do navio, entre as quais se destacam um alto nível de conhecimento técnico, legal e
operacional, e fortes qualidades de comando.” (Eliane M. Octaviano Martins, 2013, p. 383)

4-CONCLUSÃO

Como se vê, sempre que o navio possuir como derrota, portos de países em que há a
incidência de embarques irregulares a bordo, especial atenção às regras convencionadas pelo Código
ISPS devem ser observadas. Em especial, àquelas relacionadas à verificação pré-suspender do navio,
aplicando-se inspeções criteriosas na busca a clandestinos, que devem ser executadas com eficiência
e conforme Plano de Proteção previamente elaborado.
Nesse sentido é que deve ser observada a diretriz colacionada pelo § 8° do Preâmbulo do
ISPS Code: “A implementação das disposições irá requerer cooperação e entendimento contínuos e
efetivos entre todas as partes envolvidas, ou que utilizem navios e instalações portuárias, incluindo
o pessoal de bordo, pessoal do porto, passageiros, partes envolvidas com a carga, gerenciamento de

1
portos e navios e Autoridades Locais e Nacionais responsáveis por proteção. As práticas e
procedimentos existentes terão que ser revisadas e alteradas caso não propiciem um nível adequado
de proteção. A fim de intensificar a proteção marítima, as indústrias portuárias e de navegação,
assim como as Autoridades Locais e Nacionais terão de assumir responsabilidades adicionais”.
Dessa forma, sempre que o navio estiver em manobra de atracação ou fundeamento em países
onde há registros de embarques não autorizados, os esforços de proteção devem ser redobrados e o
Plano de segurança rigorosamente observado.
Por todo o exposto, deverá ser afastada a responsabilidade do Comandante do mercante nos
casos em que houver a falta de um elemento obrigatório, atitude negligente frente à aplicação das
regras de segurança estabelecidas pelo Código ISPS, este com observância obrigatória para todas as
embarcações que possuem como destino Portos brasileiros.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1
OCTAVIANO MARTINS, Eliane M. Curso de Direito Marítimo, Vol. I. 4ª. Ed. Barueri: Manole,
2013;

PIMENTA, Matusalém Gonçalves, Processo Marítimo, formalidades e tramitação. 2º Ed ver. rev. e


ampl. Barueri: Manole, 2013;

FONSECA, Maurílio Magalhães, Arte Naval, 7. Ed., Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da
Marinha, 2005;

AGRIPINO DE CASTRO Jr, Osvaldo, Direito Marítimo, Regulação e Desenvolvimento, 1º. Ed.,
Belo Horizonte: Fórum.

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