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AGOGO

DESMANUAL DIÁRIO DE CLASSE

TURMA RIO
AGOGO

Além de ser o instrumento mais antigo do samba, uma percussão


em forma de ferradura, usada para dar cadência e aquela vontade
de dançar como se não houvesse amanhã, também é uma gíria que
quer dizer “avontê”, ou seja “pegue tanto quanto você quer”.

Como naquela música do Roupa Nova que, se tens mais de 25 anos,


deves estar secretamente cantando bem agora.

“Eu perguntava Do You Wanna Dance? E te abraçava Do You


Wanna Dance?”
SE FOR
DE PAZ, Oi, escriba da turma rio.

PODE ENTRAR*
Espero que o primeiro desmanual

te encontre voando com os
pirilampos que dormiam dentro do


teu coração e que foram
acordados com o sacode da aula.

Aqui vais encontrar algumas


anotações do encontro em que
falamos de escrita pública e
significante, de Stephen King e
Pepe Mujica, de Ana C. e também
de Galeano.

O conteúdo não foi revisado


gramaticalmente, no entanto,
pretende ser capaz de acordar em
ti o que foi dito e sentido durante
nossa coexistência. Espero que
seja útil, no sentido utilitário e
reflexivo.

E que te ajude durante travessias.

No mais, gracias pela imensa


honra de permitir a minha entrada
dentro do teu coração.

Que seja uma "Convocação à


ternura"**

Com amor e desejo de te ler.


Cris Lisbôa
NOTAS DA REDAÇÃO

*Frase que está na entrada da


casa de Zélia Gattai e Jorge
Amado, na Rua Alagoinhas, 33, no
bairro do Rio Vermelho, em
Salvador, na Bahia de todos os
Santos. Comprada em 1960, com
o lucro da venda dos direitos do
livro “Gabriela, Cravo e Canela”,
hoje é um museu que entre
outras bonitezas exibe uma sala
com gavetas onde repousam
cartas de amizade a amor.

**”Convocação à ternura" é o
título do prefácio que a escritora
Conceição Evaristo escreveu
para o livro "Carta para minha
filha” de Maya Angelou.

Caso tu queira mandar o


desmanual para alguém, promete
que não faz? Ele foi criado só pra
ti, é parte de nossa jornada
coletiva. Gracias.
ESCRITA

Escrita significante

Aquela que coloca em palavras


nosso “infinito particular”.
Algumas pessoas utilizam as
Morning Pages, (páginas
matinais), técnica de escrita
criada pela escritora e jornalista
americana Julia Cameron.
Particularmente, não recomendo
uma estrutura tão rígida. Desde
que tu escreva todos os dias,
pode ser até na hora do almoço.
O importante é inventar um
tempo para a tua escrita.

Escrita pública
A que vai ser lida por olhos
externos, ou seja, publicada nas
redes sociais, em artigos,
matérias, livros, muros e cartas
de amor. Aqui na Go, writers, a
escrita pública serve quem lê. Ou
seja, é útil. No sentido utilitário e
reflexivo.

O que diferencia uma da outra?


A resposta para a pergunta:
dentro do texto existe uma
estrela capaz de acender o
coração de alguém que não seja
eu? Se a reposta for sim, publica.
Eis o melhor e o pior de mim
No meu termômetro o meu NOTAS DA REDAÇÃO
quilate

Vem, cara, me retrate


Não é impossível
Eu não sou difícil de ler

Faça sua parte


Eu sou daqui, eu não sou de
Marte
Vem, cara, me repara
Não vê, 'tá na cara
Eu sou porta-bandeira de mim
Só não se perca ao entrar
No meu infinito particular
Em alguns instantes
Sou pequenina e também gigante
Vem, cara, se declara
O mundo é portátil
Pra quem não tem nada a
esconder
Olha minha cara
É só mistério, não tem segredo
Vem cá, não tenha medo
A água é potável
Daqui você pode beber
Só não se perca ao entrar
No meu infinito particular

Infinito Particular, música de


Marisa Monte. É também o nome
do primeiro disco totalmente
autoral de Marisa, com músicas
feitas a partir de letras e poesias
que estavam em seus cadernos de
anotações. Uma escrita
significante. Pública.
TEM COISA QUE
SÓ SAI DA GENTE
POR ESCRITO

"Hei de ter uma tabuada e o meu livro queres ler. Vou aprender a
fazer contas e algum bilhete escrever. Pra que a filha do seu Bento
saiba que ela é meu bem querer. E se não for por escrito eu não me
animo a dizer" assoviava meu Vô João na oficina de chapeamento e
pintura que funcionava nos fundos de casa, lá em Uruguaiana. Essa
música do Passarinho era nossa favorita, a gente batia palmas
quando ela tocava no radinho de pilha que ficava perto das
ferramentas. Ele pintando carros. Eu deitada nos galhos da árvore,
cabelo pingando água da mangueira, procurando desenhos em
nuvens e balançando o pé pra manter o equilíbrio do vento.

Quando comecei a ensinar os melindres da palavra escrita, lá por


2013, percebi que em quase toda aula eu dizia “é que tem coisa que
só sai da gente por escrito”. Acabou virando um estandarte da
escola, afinal, em suas entrelinhas dizia: o medo não ensina, letra é
voz de sentimento, ouve teu coração, é com ele que tu escreve.

Por quase dez anos acreditei que esse conhecimento vinha dos
livros, dos cursos, das redações jornalísticas, das pesquisas sobre
comunicação e linguagem. Foi só dia desses que entendi: quem me
ensinou foi o Vô João, lá na oficina, muito antes de eu ter aprendido
a ler ou escrever.

E bordar isso nos corações de gente escriba é meu jeito de abraçar


quem ele ainda é. Aqui dentro. Porque se estou a escrever, publicar
livros e capitanear uma escola livre de criação e escrita é porque ele
um dia me disse: sonho é destino.

Ô se é.
O PROFESSOR

Os alunos do sexto grau, numa escola de Montevidéu, tinham


organizado um concurso de romances.
Todos participaram.
Éramos três no júri. O professor Oscar, punhos puídos, salário de
faquir, uma aluna, representante dos autores, e eu.

Na cerimônia de premiação, foi proibida a entrada dos pais e de


qualquer adulto. O júri fez a leitura da ata final, que destacava os
méritos de cada trabalho. O concurso foi vencido por todos, e para
cada premiado houve uma ovação, uma chuva de serpentina e uma
medalhinha doada pelo joalheiro do bairro.

Depois, o professor Oscar me disse:


– Nós nos sentimos tão unidos que me dá vontade de fazer todos
eles repetirem de ano.

E uma de suas alunas, que tinha vindo para a capital de um povoado


perdido no campo, ficou falando comigo. Contou que, antes, ela não
falava nunca, e rindo me explicou que seu problema era que agora
não conseguia parar. E me disse que ela gostava do professor,
gostava muuuuito, porque ele tinha lhe ensinado a perder o medo de
se enganar.

Eduardo Galeano, no livro Bocas do tempo que reúne história das


recordações ouvidas ou vividas pelo escritor e que vez em quando
davam voltas em seu coração

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