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20/09/2022 15:35 Espaço e diferença: abordagens geográficas da diferenciação étnica, racial e de gênero

GÊNERO E DIVERSIDADE NA ESCOLA


ESPAÇO E DIFERENÇA: ABORDAGENS GEOGRÁFICAS DA DIFERENCIAÇÃO ÉTNICA, RACIAL E DE GÊNERO

2 Relações de gênero no espaço

Corpos e marcadores de desigualdades na análise geográfica: gênero, sexua-


lidade e racialidade
Joseli Maria Silva
Marcio Jose Ornat
Tamires Regina Aguiar de Oliveira Cesar
Alides Baptista Chimin Junior
Grupo de Estudos Territoriais – GETE- UEPG

Introdução

Este capítulo tem por objetivo contribuir com a história científica da Geografia Brasileira, trazendo alguns elementos como gênero, sexua-
lidades e raça para o registro epistemológico nacional. Mesmo desconsiderados nas narrativas oficiais expressas em disciplinas e livros da
área de geografia, houve pesquisadores brasileiros que estiveram preocupados com os marcadores sociais dos corpos, realizando várias
análises capazes de tensionar os tradicionais limites da análise geográfica e trazer para o debate científico brasileiro as relações entre cor-
pos e espaços.

Para elaboração deste capítulo utilizamos o banco de dados que vem sendo construído pelo Grupo de Estudos Territoriais – UEPG, desde
2008. Atualmente fazem parte do acerto do referido banco de dados 6.904 artigos coletados de 35 periódicos científicos brasileiros dispo-
níveis na internet e mantidos por instituições de cunho geográfico 46 . As revistas que fazem parte do universo pesquisado cobrem um pe-
ríodo temporal de 1981 a 2012 e estão classificadas, segundo o Sistema Qualis-CAPES do triênio 2010-2012, como pertencentes aos estra-
tos A1, A2, B1 e B2. Os artigos que fazem parte do banco de dados do GETE são classificados por palavras-chave, o que permite o resgate
das informações por termos de busca 47 . Além desse procedimento foi realizado um levantamento no Banco de Teses da Capes e na bibli-

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oteca digital do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), tomando como base os mesmos critérios de busca uti-
lizados para o levantamento dos artigos no banco de dados do GETE.

Os resultados obtidos estão organizados em três seções. A primeira explora a emergência do corpo na análise geográfica, tomando como
base um contexto internacional, a fim de instigar pesquisadores brasileiros por meio de caminhos geográficos já trilhados, mesmo que
em outros contextos. Na segunda parte do texto estão registradas algumas trajetórias de pesquisas geográficas no Brasil sobre gênero e
sexualidades, sendo que a terceira aborda a produção científica de raça/etnia. Esses temas estão profundamente relacionados com mar-
cadores sociais dos corpos que hierarquizam os seres humanos e incidem nas suas experiências espaciais.

Corpo e Espaço: algumas trajetórias geográficas

A imaginação geográfica capaz de questionar a relação entre corpo e espaço emergiu apenas no final do século XX e início do século XXI.
Os corpos são materiais, possuem forma e tamanho e inegavelmente, 'ocupam' um espaço físico. Por meio de ações os corpos produzem
mercadorias. Sendo assim, o estado corpóreo como saúde, doença, força física, capacidade reprodutiva e habilidades manuais são ele-
mentos de intensa associação entre corpo e sociedade e, portanto, espaço. Toda energia despendida e sua incorporação ao maquinário,
bem como a divisão de tarefas que cada corpo executa, contém espaço, como propõe Callard (1998), ao examinar as contribuições do pri-
meiro volume de O Capital de Marx aos estudos do corpo.

No entanto, mesmo tendo uma expressão material e incorporado pela teoria marxista, amplamente utilizada na Geografia, o corpo man-
teve-se como uma perspectiva irrelevante para o meio científico geográfico durante muito tempo, ganhando gradativamente importância
na última década do século XX. McDowell (1999) alude para o fato de que o corpo recebeu atenção por parte da sociedade e também do
meio científico devido às transformações materiais que foram produzidas, notadamente nos países industriais avançados.

A transformação da natureza do trabalho e do ócio, conforme McDowell (1999), situou o corpo no centro do interesse das pessoas e da so-
ciedade, de modo que ele é tanto o motor do desenvolvimento econômico como fonte de prazer e dor individuais. O argumento da refe-
rida autora é de que com a transformação da economia industrial para uma economia de serviços, a corporeidade do trabalhador deixou
de ser força muscular para ser convertida em produto de intercâmbio. Os trabalhos corporais relacionados com o setor de serviços for-
mam parte de processos de intercâmbio que converte o 'corpo produtor' em um 'corpo desejante', capaz de dar vazão ao consumo cres-
cente. O ócio nas sociedades pós-industriais desenvolveu várias atividades para criar e cultivar corpos esbeltos, saudáveis e desejantes,

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como as academias de ginásticas, clínicas de medicina genética e de estética, que realizam intervenções cirúrgicas para adequar os cor-
pos aos padrões desejados de cada lugar. Além disso, a relação entre as indústrias de alimentos e farmacêuticas, ligadas aos distúrbios
alimentares e ao sobrepeso da população, passou a ser alvo de discussões em torno da relação entre corpo e espaço.

As vertentes geográficas que realizaram esforços em problematizar a relação entre corpo e espaço foram as Feministas, Queer, Nova Geo-
grafia Cultural e a Fenomenológica. Foi justamente a desconstrução da herança moderna da oposição entre corpo e mente que construiu
um caminho investigativo jamais visto antes. Longhurst (1997) no artigo '(Dis)embodied geographies' publicado na Progress Human
Geography,realiza uma reflexão em torno das abordagens sobre o corpo e examina a contribuição da Geografia nesse processo, defen-
dendo a ideia de que essa literatura emergente tem um imenso potencial para ampliar a compreensão do conhecimento sobre o poder e
as relações sociais entre pessoas e lugares.

A vertente feminista volta sua atenção para o corpo apenas quando foi superada a tendência tradicional de não reconhecer a importância
corporal ao pensar o ser humano. A tradição em negar o corpo nas análises de geógrafas feministas esteve fundamentada na ideia da su-
premacia da cultura na construção dos papéis de gênero e que o corpo, entendido até então enquanto algo estático, biológico e essencia-
lizado, era uma barreira ao avanço das lutas sociais, na medida em que os argumentos sobre a inferioridade feminina em relação aos ho-
mens esteve, em grande parte, sustentados pelo discurso médico e biológico, em torno das características corporais.

No editorial escrito por Kirsten Simonsen (2000) sob o título 'The Body as Battlefield', no periódico Transactions of the Institute of British
Geographers, a autora estabelece um interessante fio condutor para analisar a emergência do corpo como uma abordagem na Geografia,
afirmando que, apesar de outros campos geográficos também terem contribuído para a abordagem do corpo, a contribuição feminista
tem sido substancial. Ela realiza sua análise reunindo as contribuições de geógrafos em três eixos: 'As geografias do armário', 'Outros cor-
pos' e 'Transcendendo dualismos'.

O primeiro eixo de abordagem geográfica exposto por Simonsen (2000) explora a forma como os corpos são constituídos e usados, tendo
como preocupação a inscrição do poder e a capacidade de resistência dos corpos envolvendo as questões de performatividade 48 , a polí-
tica do corpo e o corpo como um local de contestação. Em particular, a luta feminista em torno do direito ao corpo-espaço envolvendo a
sexualidade, aborto, gravidez e o medo da violência.

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O segundo eixo baseado nas ideias do feminismo, do pós-estruturalismo e do pós-colonialismo aborda a necessidade de reconhecer as
diferenças e as relações de poder corporificadas, ligadas à sexualidade, racialidade e origem étnica. A cultura dominante classifica e ro-
tula valores e significados em torno de minorias étnicas, idosos, mulheres, negros, homossexuais, deficientes físicos, obesos, sempre con-
siderados 'outros'. Os grupos dos 'outros' são definidos por seus corpos e normas sociais que os designam de formas degradantes como
desviantes, impuros, feios, repugnantes, doentes, fora de ordem. Ao aprisionar o 'outro' em seu corpo, os grupos dominantes (tendo
como referente o homem, branco, ocidental) estão aptos a tomar sua posição como sujeitos desincorporados, sem marcas, porque se
constituem na referência positiva em que todos os demais são comparados. Essa abordagem tem evidenciado os espaços de dominação
e de possibilidades de apropriação espacial por meio de lutas e movimentos para reconhecimento social.

O terceiro eixo de trabalhos tem tido a preocupação de desconstruir as dicotomias mente/corpo, mas também outras como
cultura/natureza, essencialismo/construtivismo. A separação teórica entre mente e corpo é historicamente sexualizada. O feminino foi o
polo corporal do dualismo, representado pela natureza, emocionalidade, irracionalidade e sensualidade, contrastando com o polo da
mente, metaforicamente representado pelo masculino, que evoca o intelecto, racionalidade e autocontrole das emoções. Na relação dual
e oposicional entre corpo (polo feminino) e mente (polo masculino), o corpo precisa ser comandado pela razão.

As reflexões em torno do desmantelamento da dicotomia corpo-mente, além de possibilitar estudos sobre a representação cultural dos
corpos em diferentes contextos, também permitiu a emergência das ideias de instabilidade e fluidez das identidades corporais, ultrapas-
sando a ideia de corpo, entendido tradicionalmente como algo fixo, para a ideia de corporeidade, a fim de produzir a perspectiva de mu-
tabilidade e movimento.

Uma relevante contribuição metodológica da superação da dicotomia mente-corpo foi a concepção de que o cientista, ser humano pro-
dutor de conhecimento, é corporificado e, assim, aquilo que é produzido como ciência se realiza de um determinado ponto de vista, de
alguém que tem um corpo generificado e racializado. Novas formas de 'conhecer o conhecimento', ou seja, de novas epistemologias fo-
ram possíveis, notadamente o reforço da necessidade de que o 'conhecimento é sempre situado', conforme argumenta Haraway (1991). O
conceito de 'conhecimento situado' tem sido um caminho teórico-metodológico bastante promissor nas Geografias Feministas, evidenci-
ando que a pesquisa concreta se faz por cientistas que tem cor, gênero, corpo, sexualidade, posição politica e assim por diante. A posicio-
nalidade de quem questiona o mundo é fundamental para conceber as perguntas passíveis de serem realizadas e, sendo assim, os resul-
tados de uma trajetória de pesquisa deve conter a autoavaliação de como a posicionalidade da pessoa que investiga influencia nos resul-
tados obtidos.

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Obviamente, a abordagem do corpo na Geografia não ficou restrita às questões relativas à sexualidade. Os estudos são ricos e suas temá-
ticas variadas. Houve pesquisas sobre o corpo e espaços de trabalho (MCDOWELL, 1995), nacionalidade e corpo (SHARP, 1996),
saúde/doença, espaço e corpo, como em Moss e Dyck (2002), espaço e corpos gestantes (LONGHURST, 1996), corpo, raça e espaço como
em Anderson (1996) e Gottschild (2003). Há ainda várias análises envolvendo corpo e cidade como os trabalhos de Pile (1996), Nast e Pile
(1998), Jonhston (1996) e Smith (1992). Este pequeno número de referências certamente não reflete a totalidade de trabalhos na área e
nem mesmo é fruto de um levantamento sistemático. Tem apenas a intenção de ilustrar alguns caminhos analíticos já explorados, evi-
denciando que a Geografia já percorreu longa trajetória de abordagem da relação entre corpo e espaço.

As geógrafas Lynda Johnston e Robyn Longhurst (2010) dedicaram um capítulo de seu livro sobre o corpo, intitulado 'Geografias íntimas'.
Segundo elas, a Geografia pode analisar o corpo como espaço e o corpo no espaço, argumentando que nossos corpos fazem diferença em
nossas experiências de espaço e lugar. Nosso tamanho, aparência, saúde, vestimenta, comportamento, sexualidade e práticas sexuais
afetam a forma como nós nos apresentamos aos outros e também a forma como os outros nos representam. Assim, os corpos dissonan-
tes das representações hegemônicas de gênero e práticas sexuais foram especialmente estudadas na chamada Geografia Queer, já que os
corpos que não obedecem ao modelo dual da sexualidade heteronormativa constituem vidas 'fora de lugar'.

A relação entre corpo e espaço foi tema central do livro “Pleasure zones: bodies, cities, spaces”. No prefácio elaborado por Jon Binnie,
Robyn Longhurst e Robin Peace, o corpo está claramente identificado com a perspectiva butleriana. Os geógrafos afirmam que embora o
corpo apresente uma materialidade, tal materialidade é sempre constituída pelo discurso, assim como o espaço. Assim, tal como o corpo,
o espaço também é produzido discursivamente. A materialidade do espaço apresenta toda força do discurso heteronormativo, mas tam-
bém não é passível ao exercício do poder regulatório podendo apresentar fissuras pelas quais emergem as forças de subversão das nor-
mas estabelecidas.

O desenvolvimento das concepções de corpo na Geografia teve como grande protagonista os estudos das sexualidades e das racialida-
des. A Geografia atualmente traz a escala corporal como mais uma possibilidade de análise espacial, sendo que aqui no Brasil há vários
estudos que indicam o desenvolvimento da abordagem do corpo, dado o perfil de crescimento de estudos sobre gênero, sexualidades e
raça na geografia brasileira que serão abordados em seguida.

Produção científica sobre gênero e sexualidades na geografia brasileira.

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A estrutura da produção científica brasileira durante muitos anos seguiu centralizada e rigidamente hierarquizada, existindo apenas al-
guns importantes polos de produção de saber científico que estruturavam a pós-graduação brasileira 49 . A falta de pluralidade temática e
também teórico-metodológica era viabilizada pela estrutura de produção científica que sobrepunha um saber produzido por alguns cen-
tros sobre as demais áreas do país. Portanto, não é de se surpreender que durante quase duas décadas a Geografia Brasileira apresen-
tasse um discurso monotônico e coeso, baseado nas lutas de classe. Outras categorias como gênero, raça e sexualidade não fizeram parte
das preocupações da Geografia Brasileira, até os anos 90 do século XX.

O levantamento de dados realizado no Banco de Teses e Dissertações da CAPES e da biblioteca digital do Instituto Brasileiro de Informa-
ção em Ciência e Tecnologia (IBICT) aponta que foi apenas no século XXI que ocorreu um impulso baseado em categorias sociais como gê-
nero, mulheres e sexualidades. O gráfico que se segue evidencia este argumento.

Gráfico 1 – Comportamento Temporal das Defesas de Dissertações e Teses no Brasil sobre


gênero e sexualidades. Fonte: Banco de Teses e Dissertações da CAPES e IBICT.

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Entre 1991 e 2011, houveram 40 trabalhos científicos defendidos nos programas de pós-graduação brasileiros, que envolveram os temas
relativos a gênero e sexualidades 50 . Neste mesmo período, segundo as informações disponibilizadas no Geocapes 51 , foram defendidos
nos programas de pós-graduação em Geografia brasileiros um total de 6.703 trabalhos científicos, sendo 3.992 dissertações de mestrado
e 2.711 teses de doutorado. Os trabalhos na área de gênero e sexualidades no Brasil representam apenas 0,60% do total. Se estratificar-
mos os dados em termos de níveis de doutorado e mestrado, temos 0,87 % de dissertações e 0,18 % de teses defendidas no país. Mesmo
que o número absoluto de trabalhos da área seja pequeno em relação aos totais produzidos no país, o ritmo de crescimento é intenso. Se
comparados os períodos 1996 – 2000 e 2001 – 2005 pode-se observar um crescimento de 400%. A comparação entre o período 2001 – 2005
e 2006 – 2010 apresenta um crescimento de 262,5%. Se for considerado o primeiro período 1996 – 2000 e o último 2006 – 2010 pode-se
apontar um crescimento de 1050% de trabalhos científicos produzidos no campo de gênero e sexualidades na Geografia Brasileira.

Outro traço característico da produção geográfica brasileira em torno do gênero, mulheres e sexualidades é que ela não se constituiu por
hegemonias conceituais que podem ser identificadas em diferentes temporalidades, como apontado no trabalho de Oberhauser et. al.
(2003). Há uma coexistência das categorias mulher, gênero e sexualidades que constituem esse campo de saber e inclusive são interde-
pendentes, embora a categoria 'sexualidades' tenha sido abordada posteriormente as outras duas. A figura 1 ilustra esta tendência.

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Figura 1- Configuração temporal das categorias mulher, gênero e sexualidades na Geografia


Brasileira. Fonte: Banco de Teses e Dissertações da CAPES e IBICT.

A pluralidade e coexistência das categorias mulher, gênero e sexualidades na produção científica brasileira evidencia alianças realizadas
entre os pesquisadores da área, notadamente para o fortalecimento do campo frente à disciplina. A abordagem temática é também diver-
sificada, embora o espaço urbano seja claramente privilegiado como referencial de análise As perspectivas teórico-metodológicas tam-

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pouco apresentam uma linearidade temporal como constatado por Oberhauser et. al. (2003) nos trabalhos de língua inglesa, evidenci-
ando que a Geografia brasileira apresenta um caráter plural e de independência de diferentes grupos de pesquisas no país.

A produção científica de teses e dissertações é pulverizada espacialmente no Brasil, embora tenha um claro perfil periférico da produção
científica e esteja concentrada nos cursos de pós-graduação mais jovens, fora dos centros tradicionais, como pode ser visto na figura 2
que segue:

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Figura 2- Distribuição espacial de trabalhos científicos elaborados nas áreas de gênero, mu-
lher e sexualidades no Brasil (1991-2011). Fonte: Banco de Teses e Dissertações da Capes e
IBICT.

A distribuição geográfica das dissertações e teses defendidas e relacionadas aos temas de gênero, mulher e sexualidade, além dos aspec-
tos de descentralização da pós-graduação brasileira e do processo de democratização do país, justifica-se também pelos elementos lo-
cais. Monk (2011), ao analisar a distribuição espacial mundial dos grupos de pesquisa de gênero, chama a atenção para a atuação de lide-

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ranças locais e das relações de poder em torno das tradições acadêmicas como importantes fatores a serem considerados para compre-
ensão do fenômeno.

No Brasil, os centros tradicionais de produção de saber geográfico como a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ) não se constituíram em uma expressão no campo feminista e queer, embora o primeiro trabalho acadêmico na área
de gênero, uma tese de doutorado, tenha sido defendido em 1991 na USP, de autoria de Sonia Alves Calió sob o título 'Relações de gênero
na cidade: uma contribuição do pensamento feminista a Geografia Urbana', orientada por Maria Adélia Aparecida de Souza. Interessante
observar que este trabalho pioneiro não abriu caminho para novas abordagens, pois foi apenas uma década depois que houve a defesa
de outro trabalho, desta vez, uma dissertação de mestrado.

Na UFRJ, o tema também não foi expressivo, pois houve apenas uma dissertação de mestrado defendida no ano 2000 de autoria de Jan
Carlos da Silva sob o título 'Os territórios da Prostituição na cidade do Rio de Janeiro, 1841-1925'. Novamente foi necessário pouco mais
de uma década para que o próximo trabalho fosse defendido na referida instituição. Trata-se da tese de doutorado de autoria de Marcio
Jose Ornat sob o título 'Território Descontínuo e Multiterritorialidade na Prostituição Travesti através do Sul do Brasil', defendida em
2011. Em ambas universidades tradicionais (USP e UFRJ), importantes referências na produção geográfica brasileira, os campos feminista
e queer não prosperaram. Foi nos cursos de pós-graduação mais recentes que tais abordagens foram desenvolvidas, como mostra a figura
2.

Pode-se apontar a Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita – Presidente Prudente (UNESP) e a Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Tal como aponta Monk (2011), em locais
tradicionais, a manutenção da hegemonia de determinadas formas de concepção geográfica e as fortes relações de poder no meio acadê-
mico inibem o apoio para a expansão dos estudos de gênero e sexualidades. Por outro lado, em locais onde as relações de poder são mais
rarefeitas, como em jovens programas de pós-graduação, há maior possibilidade do surgimento e expansão da área. Enfim, a ideia de que
a inovação surge nos grandes centros de produção científica e são reproduzidos na periferia acadêmica não pode ser confirmada no caso
das Geografias Feministas e Queer. Em cada uma destas universidades citadas há um grupo de pesquisa que sustenta o ritmo de produ-
ção como o Grupo de Estudos Territoriais (GETE) na UEPG, o Laboratório de Estudos de Gênero, Étnico-raciais e Espacialidades (LAGENTE)
na UFG, Centro de Estudos de Geografia do Trabalho (CEGET) na UNESP-Presidente Prudente e o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a
Mulher e as Relações de Gênero (GEPGENERO) na UNIR.

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A subversão da ordem de inovação do discurso geográfico tem sido realizada pelos programas de pós-graduação mais recentes com a
abordagem de gênero, mulheres e sexualidades e esta característica periférica da enunciação do discurso geográfico gera resistências à
sua legitimação pela comunidade científica que valoriza a produção científica proveniente dos grandes centros.

Apesar da expansão dos trabalhos acadêmicos na modalidade de dissertações e teses, com abordagem de gênero, mulheres e sexualida-
des, o corpo não despertou interesse da Geografia no Brasil. A dissertação de mestrado de Natália Cristina Alves, defendida em 2010 sob o
título 'A cidade inscrita no meu corpo: gênero e saúde em Presidente Prudente – SP' é pioneira na abordagem da relação entre corpo, gê-
nero e espaço. Sua abordagem escalar da relação entre a cidade e o corpo constrói uma interessante possibilidade de imaginação
geográfica.

Outra forma de análise sobre as transformações do padrão de produção científica na Geografia Brasileira, com base nas abordagens de
gênero, mulher e sexualidades, pode ser realizada por meio das publicações em forma de artigos científicos.

O Grupo de Estudos Territoriais da UEPG vem organizando um banco de dados em que estão armazenados atualmente 6.904 artigos, co-
letados a partir de periódicos científicos brasileiros disponíveis na internet e mantidos por instituições de cunho geográfico nos estratos
A1, A2, B1 e B2, conforme o Sistema Qualis-capes. A classificação dos artigos por palavras-chave permitiu organizar informações sobre a
produção científica brasileira por meio de termos de busca 52 . Do total de 6.904 artigos, apenas 139 abordam temas sobre mulheres, gê-
nero, sexualidades e raça/etnia, representando 2,05% do universo pesquisado 53 . O gráfico que segue evidencia o movimento temporal
dos artigos publicados.

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Gráfico 2 - Comportamento temporal das publicações geográficas que abordaram questões


de gênero. Período 1996 – 2012. Fonte: Sistema Qualis-capes, triênio 2010-2012 e respecti-
vos periódicos científicos.

A abordagem de gênero é crescente na Geografia Brasileira, como evidenciado no gráfico 2. Em 1998 foi publicado um artigo de autoria de
Rosa Ester Rossini sob o título 'As Geografias da Modernidade – Geografia e Gênero – Mulher, Trabalho e Família. O Exemplo da Área de
Ribeirão Preto – SP' na Revista do Departamento de Geografia – USP. As sexualidades também foram abordadas recentemente pela pro-
dução científica em forma de artigos. O gráfico 3 ilustra esta transformação temporal.

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Gráfico 3 - Comportamento temporal das publicações geográficas que abordaram questões


de sexualidades entre 1990 – 2012. Fonte: Sistema Qualis-capes, triênio 2010-2012 e respec-
tivos periódicos científicos

O primeiro artigo abordando as sexualidades foi de autoria de Rogério Botelho de Matos e Miguel Angelo Campos Ribeiro, publicado em
1995 pelo Boletim Goiano de Geografia sob o título 'Territórios da prostituição nos espaços públicos da área central do Rio de Janeiro'. O
tema torna-se mais frequentemente discutido em periódicos científicos brasileiros na primeira década do século XXI.

A expansão dos temas de gênero e sexualidades ocorreu em grande parte pela criação de um periódico específico em 2010, a Revista La-
tino-americana de Geografia e Gênero. A figura 3 expressa essa configuração.

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Figura 3- Distribuição de artigos científicos sobre gênero e sexualidades em periódicos cien-


tíficos geográficos brasileiros. Fonte: Sistema Qualis-Capes, triênio 2010-2012 e respectivos
periódicos científicos.

A concentração de artigos na área de gênero e sexualidades nos periódicos científicos Revista Latino-americana de Geografia e Gênero,
Revista Terr@ Plural e Revista Pegada, novamente corrobora os argumentos de Monk (2011) sobre a importância das lideranças locais no
desenvolvimento do campo feminista, pois os dois primeiros periódicos são oriundos da Universidade Estadual de Ponta Grossa, sede do
Grupo de Estudos Territoriais e o terceiro periódico é proveniente da UNESP- Presidente Prudente, sede do Centro de Estudos do
Trabalho.

A produção sobre gênero e sexualidades, contudo, está concentrada em periódicos qualificados nos estratos B1 e B2, conforme o Sistema
Qualis-Capes, como pode ser evidenciado no gráfico que segue.

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Gráfico 4- Distribuição de artigos científicos sobre gênero e sexualidades segundo o Sistema


Qualis-capes. Fonte: Sistema Qualis-capes, triênio 2010-2012.

Tal como a abordagem de gênero não tem sido desenvolvida nos centros de maior prestígio acadêmico, os artigos de gênero, mulheres e
sexualidades não tem conseguido acessar os periódicos científicos classificados nos estratos mais altos pelo Sistema Qualis-capes (A1,
A2), o que evidencia uma desvalorização da temática pelos instrumentos legitimadores da academia. Além disso, apesar do crescimento

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de publicações, ela está concentrada em periódico científico específico, o que produz um isolamento na produção científica do grupo de
pesquisadores da temática em foco.

Embora a sede dos periódicos científicos que publicam a maioria dos artigos sobre gênero, mulheres e sexualidades esteja localizada em
cidades sede dos grupos de pesquisa que têm se dedicado à temática, a distribuição espacial das procedências institucionais dos autores
é mais pulverizada e, inclusive, internacional. Isso evidencia que a temática já possui um diálogo internacional, mesmo sem ter aberto
diálogo com os centros hegemônicos no próprio território nacional, tamanha resistência do campo científico brasileiro à temática. O com-
portamento de diálogo científico rompe mais uma vez com o modelo hierárquico nacional de organização da produção científica, consti-
tuindo uma relação entre a periferia acadêmica e o exterior, sem passar pelos centros dominantes nacionais.

A figura 4 que segue é ilustrativa da configuração espacial de produção científica na área de gênero, mulheres e sexualidades 54 . Com
base na procedência institucional dos autores que publicam na área em foco, é possível afirmar que nos locais onde existe maior número
de instituições de nível superior, como é o caso de Rio de Janeiro e São Paulo, a produção é pulverizada, fruto do trabalho de pesquisado-
res isolados, e isso dificulta o apoio e a formação de grupos de pesquisa, o que potencializa a permeabilidade da ciência geográfica aos
temas em pauta. Nos locais onde há um número menor de instituições, a dinâmica de produção é mais concentrada espacialmente e in-
tensiva. Isso tem potencializado o caráter colaborativo que se faz pelas alianças entre pesquisadores. Essa forma de organização espacial
potencializa as discussões teóricas e metodológicas ao mesmo tempo em que a proximidade espacial fortalece os pesquisadores para lu-
tar pela abertura do campo na Geografia Brasileira.

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Figura 4- Procedência das autorias dos artigos científicos publicados sobre gênero e sexua-
lidades na geografia

O diálogo internacional é mais forte com os países europeus, notadamente com pesquisadores de instituições espanholas. A configuração
espacial de procedência institucional dos autores na área de gênero, mulheres e sexualidades evidencia que os locais em que se consti-
tuíram alianças, redes e grupos de pesquisa, a produção científica na área frutificou e foi capaz de tensionar as fronteiras teóricas e meto-
dológicas da Geografia Brasileira.

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O corpo aparece nos artigos científicos de periódicos nacionais em 2008, com o artigo de Joseli Maria Silva na Revista Geouerj com o tí-
tulo 'A cidade dos corpos transgressores da heteronormatividade' e, em 2010, a mesma autora publica na Revista Espaço e Cultura o texto
'Geografias Feministas, Sexualidades e Corporalidades: desafios às práticas investigativas da Ciência Geográfica'. Após 2010, a Revista La-
tino-americana de Geografia e Gênero, passou a concentrar a maior parte da produção geográfica sobre corporalidades.

Mesmo frente ao desenvolvimento das abordagens sobre mulheres, gênero e sexualidades, o corpo e sua relação com o espaço é ainda
um vasto campo a ser explorado pela Geografia Brasileira, que deve trazer inúmeros desafios à nossa restrita imaginação geográfica. Afi-
nal, não se pode negar que o corpo ocupa, mas, também, é espaço. Sendo assim, é passível de ser abordado na Geografia. Contudo, é ne-
cessário que sejam levantados os questionamentos e que a comunidade geográfica brasileira construa os caminhos teóricos e metodoló-
gicos capaz de construir a compreensão do corpo e sua geograficidade.

Produção científica sobre racialidades na geografia brasileira

O comportamento do padrão de desenvolvimento da produção científica que envolve raça na geografia brasileira é muito similar ao veri-
ficado nas abordagens de gênero e sexualidades, analisado na seção anterior. Inclusive, há eixos de importantes interseções entre gênero
e raça produzidos no Brasil. Essa produção científica interseccional apresenta-se como uma importante contribuição na complexificação
das análises de gênero, enriquecendo as possibilidades de interpretação e tensionando os limites geográficos estabelecidos até então na
geografia brasileira. A dissertação de mestrado de Antonia dos Santos Garcia, defendida na Universidade Federal da Bahia, sob o título 'As
mulheres da cidade d'oxum: relações de gênero, raça e classe e organização espacial do movimento de bairro em Salvador – BA', é um es-
tudo pioneiro.

O incremento desta perspectiva interseccional entre raça e gênero foi realizado pela Universidade Federal de Goiás, junto ao LAGENTE,
havendo uma série de estudos desenvolvidos de forma sistemática. Em 2007, foi defendida a dissertação de mestrado de Lorena Fran-
cisco de Souza, sob o título de 'Corpos negros femininos em movimento: trajetórias socioespaciais de professoras negras em escolas pú-
blicas'. Em 2008, foi defendida outra dissertação de mestrado de autoria de Renata Batista Lopes, com o título 'De casa para outras casas:
trajetórias socioespaciais de trabalhadoras domésticas residentes em Aparecida de Goiânia e trabalhadoras em Goiânia'. Em 2010, já em
nível de doutorado, houve a defesa da tese de Marise Vicente de Paula, intitulada 'Sob o manto azul de Nossa Senhora do Rosário: mulhe-
res e identidade de gênero na congada de Catalão (GO)'.

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Outras produções científicas sobre a interseccionalidade de raça e gênero também foram produzidas em outros programas, contudo, de
forma esporádica, como é o caso da dissertação de Patrício Pereira Alves de Sousa, defendida em 2011 na Universidade Federal de Minas
Gerais com o título de 'Corpos em drama, lugares em trama: gênero, negritude e ficção política nos congados de São Benedito (Minas No-
vas) e São José do Triunfo (Viçosa) – MG'. Outra dissertação de mestrado envolvendo elementos interseccionais, também defendida em
2011 na Universidade Federal da Paraíba, é de autoria de Jussara Manuela Santos de Santana, intitulada 'Territorialidade quilombola: um
olhar sobre o papel feminino em Caiana dos Crioulos, Alagoa Grande – PB'.

Para além, do campo interseccional da relação entre gênero e raça, os estudos de racialidades tiveram impulso na produção em torno das
negritudes, envolvendo outros elementos que se interceptam pela raça. Na abordagem do espaço urbano, os estudos evidenciam a rela-
ção entre raça, exclusão e pobreza, realizando propostas de enriquecimento na análise das cidades e em espaços intraurbanos. Importan-
tes estudos pioneiros, produzidos nos anos 90, podem ser apontados. Um deles analisa uma realidade externa ao Brasil, que é a disserta-
ção de mestrado de Regina Coeli Zuma De Hoorn, defendida em 1994 na UFRJ, com o título 'Espaço e Segregação Residencial em Harare -
Zimbábue: Passado e Presente'. Sobre o Brasil, há a dissertação de mestrado defendida em 1998 por Andrelino de Oliveira Campos, intitu-
lada 'Do quilombo à favela: o tráfico de drogas enquanto estratégia de sobrevivência ilegal nos marcos de uma ordem segregacionista'.
Posteriormente, nos anos 2000, há uma expansão da abordagem das racialidades, envolvendo os tensionamentos em torno da produção
da cidade e o enriquecimento das abordagens por meio de elementos da cultura negra como festas, ritmos musicais e práticas religiosas.

Outro importante eixo de análise da relação entre espaço e racialidades foi a abordagem das populações tradicionais, incorporando com
mais intensidade os grupos indígenas, além dos negros. Os estudos exploram as tensões em torno dos elementos de sobrevivência e sua
dependência com os elementos da natureza, como o acesso e manutenção da terra, modos de produção e manifestações culturais. Um
estudo pioneiro foi a dissertação de mestrado defendida em 1996 de autoria de Alessandro José Prudêncio Ratts, intitulada 'Fronteiras
invisíveis: territórios negros e indígenas no Ceará' 55 .

Os anos da primeira década do século XXI foram produtivos no desenvolvimento dos estudos de racialidades que acompanhavam um
crescimento simultâneo dos movimentos sociais em busca de construir políticas afirmativas para promoção da igualdade racial no Brasil.
Além de pesquisas que denunciaram a situação de exclusão espacial e de lutas de negros e indígenas por conquistas sociais, houve ainda
estudos que analisaram as políticas implantadas pelo governo brasileiro para diminuição de desigualdades e do preconceito racial. São
exemplos dessa tendência de estudos geográficos a tese de doutorado defendida em 2006 na Universidade Federal Fluminense por Re-
nato Emerson Nascimento dos Santos com o título de 'Agendas & agências: a espacialidade dos movimentos sociais a partir do Pré-Vesti-

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bular para Negros e Carentes', bem como a dissertação de mestrado de Viviani de Mattos Marcelino, defendida em 2009 na UERJ e intitu-
lada 'Ecos do Atlântico Negro: A Lei 10.639/03 e as atribuições do campo do saber sob a ótica da geografia cultural'.

O total de 50 pesquisas produzidas no âmbito da pós-graduação brasileira, apresenta uma concentração na primeira década dos anos
2000, como pode ser visualizado no gráfico 5, 82 % do total são dissertações de mestrado e 18 % teses de doutorado. Se consideramos o
total de teses e dissertações defendidas no Brasil na área de Geografia, entre 1991 e 2011, ou seja, 6.703 trabalhos, pode-se afirmar que as
pesquisas sobre raça e etnia representam apenas 0,75%.

Gráfico 5 – Dissertações e teses com temas relativos à Raça/Etnia, defendidas no Brasil


(1990-2011). Fonte: Banco de teses e dissertações da Capes e do IBICT.

O papel de figuras de liderança acadêmica e a formação de grupos de pesquisa locais é um elemento fundamental para o incremento de
áreas pouco reconhecidas no âmbito acadêmico, como discute Monk (2011). A força do tensionamento das tradicionais estruturas acadê-
micas é mais intensa quando se verifica a formação de redes de apoio em torno de pesquisadores, possibilitando a construção conjunta

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de conceitos e caminhos metodológicos, bem como proteção contra os tradicionais desmerecimentos de pesquisas que abordam temas
de fronteira científica. Na figura 5, destaca-se o papel da Universidade Federal de Goiás, na qual funciona o LAGENTE.

Figura 5 - Distribuição espacial da produção científica sobre Raça e Etnia nos programas de
pós-graduação em Geografia no Brasil (1994-2011)

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Além da produção científica no formato de teses e dissertações, há ainda que se considerar a produção de artigos científicos. O gráfico 2
evidencia a mesma tendência da publicação de artigos sobre gênero e sexualidades, já tratado na seção anterior, ou seja, uma emergên-
cia nos anos 90 e um incremento no século XXI. Essa semelhança de comportamento do desenvolvimento dos temas raça/etnia, gênero e
sexualidades evidencia que há transformações epistemológicas no campo geográfico que estão tensionando o campo a considerar as di-
ferenças de grupos sociais que vão muito além das estruturas capitalistas, mas a incorporam e constroem maior capacidade compreen-
siva da realidade social.

Gráfico 6 - Publicações de artigos científicos sobre raça/etnia (1990-2012). Fonte: Sistema


Qualis da Capes, periódicos científicos relativos ao triênio 2010-2012.

A produção científica indicada no gráfico 6 na década de 90 esteve concentrada no periódico científico 'Estudos Avançados', mantido pelo
Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo. Esta revista, embora não seja mantida por uma entidade geográfica, foi um
importante veículo para publicações de geógrafos (as) brasileiros(as). Contudo, cabe aqui uma ressalva, pois os artigos sobre raça/etnia
publicados neste veículo, bastante considerado na área de geografia, foram, em sua maioria, de não geógrafos como historiadores, antro-
pólogos e críticos literários. Na década de 90, há apenas um geógrafo que publicou sobre o tema, de origem alemã 56 , e retratou o grupo
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de suábios no Paraná. Portanto, a década de noventa, apesar de apresentar alguns artigos científicos, não se pode afirmar que a produ-
ção seja geográfica.

Foi apenas no século XXI que pesquisadores brasileiros do campo da geografia passaram a publicar suas pesquisas sobre o tema, aumen-
tando gradativamente a intensidade de publicações. A produção científica publicada sobre raça/etnia apresenta-se concentrada em pou-
cos periódicos, tal como verificado na seção anterior quando foi tratado do tema de gênero e sexualidades. Os principais veículos científi-
cos que acolhem artigos desta natureza são a Revista Latino Americana de Geografia e Gênero, Revista Ateliê Geográfico (UFG) e Estudos
Avançados (USP), como pode ser visto na figura 6.

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Figura 6 - Distribuição espacial da produção científica sobre Raça e Etnia no Brasil, segundo
a origem institucional do Periódico Geográfico

Outra importante característica da produção científica sobre raça/etnia é que ela está mais concentrada em periódicos científicos de me-
nor prestígio acadêmico, como pode ser visto no gráfico 7.

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Gráfico 7 - Distribuição de artigos científicos sobre gênero e sexualidades de acordo com o


Sistema Qualis da Capes. Fonte: Sistema Qualis da Capes, periódicos científicos relativos ao
triênio 2010-2012.

A pouca representatividade do tema nos veículos científicos considerados mais qualificados pelo Sistema Qualis-Capes é um importante
sintoma da resistência dos campos consagrados da Geografia em acolher a temática de estudo.

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Considerações finais

Este texto foi escrito com o objetivo de registrar uma produção científica ainda pouco abordada da geografia brasileira. David Bell (2011)
questionou sobre como as comunidades científicas, ao narrarem sua própria história, produzem invisibilidades. Assim, acreditamos que
este texto seja uma contribuição para enriquecer a história do pensamento geográfico brasileiro. Apesar de pouco representativa, há pes-
quisadores que se dedicam aos temas de gênero, sexualidades e raça/etnia e merecem o registro de sua produção na historiografia nacio-
nal. Assim, quem sabe, as disciplinas de História do Pensamento Geográfico ou Epistemologia da Geografia possam olhar para a historio-
grafia da geografia brasileira com um olhar questionador e, ao mesmo tempo, esperançoso de nossas potencialidades de pesquisa.

Ao finalizar este texto, é impossível não deixar de questionar o perfil eurocêntrico e androcêntrico da geografia brasileira. Os negros 57 já
constituem mais da metade da população brasileira tal como as mulheres. O que justifica tamanha expressão social e, portanto, espacial,
frente aos silêncios e ausências temáticas aqui evidenciadas no contexto científico geográfico brasileiro? Certamente, os conceitos e mé-
todos hegemônicos consagrados no campo científico geográfico estão em xeque, necessitam renovação para produzir visibilidades soci-
ais tão urgentes na sociedade brasileira. Um caminho renovador pode ser a compreensão entre corpo e geografia. Certamente, o corpo
não é algo que pertence ao ser humano, mas é o próprio ser, que ganha existência social por meio da experiência corpórea. Toda experi-
ência corpórea é espacial. O corpo é também lugar onde um ser humano desenvolve a noção de limite com os outros seres e a forma que
esse corpo se apresenta e ao mesmo tempo é percebido pelos outros varia de acordo com o espaço e o tempo que o compõem. Nesse
sentido, a Geografia tem um longo e instigante caminho científico a ser percorrido.

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46 Relação de periódicos científicos investigados: Geousp, Revista Brasileira de Geomorfologia, Cidades, Confins, Geografia, GEOgraphia,
Geosul, Mercator, Revista da ANPEGE, Sociedade & Natureza, Terra Livre, Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, Agrária, Bole-

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tim de Geografia (UEM ), Boletim Goiano de Geografia, Campo – Território, Revista Brasileira de Climatologia, Cadernos PROLAM, Espaço e
Cultura, Formação, Geo UERJ, Ra'e ga, Revista do Departamento de Geografia (USP), Estudos Avançados, Hygeia, Ateliê Geográfico, Es-
paço e Geografia, Geografia, Geografias, Geotextos, Pegada, Revista de Geografia, Revista Latino-americana de Geografia e Gênero, Re-
vista NERA, Terra Plural.

47 Foi utilizado o mesmo conjunto de palavras de busca tanto para os artigos como para as teses e dissertações. Para gênero e sexualida-
des foram: 'travesti', 'sexo', 'gay', 'lésbica', 'homossexualidade', 'homoerotismo', 'sexualidade', 'LGBT', 'diversidade Sexual', 'queer', 'prosti-
tuição', 'gênero', 'masculinidade', corpo e 'mulheres' As palavras de busca para raça e etnia foram: 'negros', 'negritude', 'racial', 'racismo',
'afrodescendência', 'raça', 'etnia'.

48 A ideia de performatividade é baseada em Butler (2003 e 2005), entendida como sendo normas socialmente construídas que se im-
põem às pessoas e são incorporadas por elas em atos repetitivos no cotidiano.

49 Conforme a Coordenação de Aperfeiçoamento do Ensino Superior (CAPES), a pós-graduação em geografia no Brasil é muito recente. O
primeiro curso foi criado em 1971 na Universidade de São Paulo e, em 1972, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em meados dos
anos 90 o Brasil contava com 11 cursos de pós-graduação na área de geografia e, em 2011, passou a ter 47.

50 É importante registrar que o banco de dissertações e teses da Capes disponibiliza os dados apenas a partir de 1987.

51 Disponível em http://geocapes.capes.gov.br (http://geocapes.capes.gov.br/geocapesds/)

52 As palavras de busca foram: 'Travesti', 'Sexo', 'Gay', 'Lésbica', 'Homossexualidade', 'Homoerotismo', 'Sexualidade', 'LGBT', 'Diversidade
Sexual', 'Raça e Etnia', 'Queer', 'Prostituição', 'Gênero', 'masculinidade', corpo e 'mulheres'

53 Foram encontrados 101 artigos sobre gênero (sendo 4 sobre masculinidades e 97 sobre feminilidades, 35 sobre sexualidades. Houve-
ram ainda 3 artigos sobre raça/etnia que não tinham relação com sexualidades e gênero, como pode ser visto no apêndice 3)

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54 A escala de intensidade de publicação de artigos para a elaboração da figura foi estabelecida a partir de intervalos naturais dos dados.
Outra informação para a compreensão da figura é que as cidades Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador concentram várias instituições de
procedência dos autores e assim o tamanho das esferas é resultado da somatória dos artigos publicados em diferentes instituições locali-
zadas nestas cidades.

55 Embora pautada em conceitos geográficos, a tese foi produzida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (Antropologia So-
cial) – USP

56 Trata-se do artigo do geógrafo Gerd Kohlhepp, da Universidade Tübingen, intitulado 'Espaço e etnia'.

57 Dado da Secretaria de Assuntos Estratégicos –SAE) (http://www.sae.gov.br/site/ (http://www.sae.gov.br/site/?p=11130#ixzz2WOWEbenu)


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