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Curso elementar

Agricultura
Sustentável
Manual de formação

Código referencial Duração do curso


UFCD 7580 50 HORAS
Autora:
Eliana Barbosa

Título:
Agricultura Sustentável: Manual de formação

Curso:
Agricultura Sustentável (UFCD 7580)

Data da última atualização:


26 de julho de 2022

Propriedade e edição:
Espaço Visual - Consultores de Engenharia Agronómica, Lda.

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Índice
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p. 5 INTRODUÇÃO

p. 7 1. SOLO E CLIMA
8 1.1 Definição, tipos, classificação, funções e constituintes do solos
11 1.2 Estrutura do solo: propriedades físico-químicas
12 1.3 Produtividade do solo
15 1.4 Fertilidade e nutrição mineral
20 1.5 Manutenção e melhoramento da estrutura do solo
21 Erosão
22 Mineralização da matéria orgânica (MO)
24 Compactação do solo
25 Redução da biodiversidade
27 Salinização
28 Cheias e desabamentos de terras
29 1.6 Água no solo
32 1.7 Elementos do clima e principais fatores
35 1.8 Caraterização do clima em Portugal e na região
38 1.9 Aquecimento global

p. 39 2. BOTÂNICA AGRÍCOLA
40 2.1 Noções de morfologia externa
41 Raiz
45 Caule
46 Folha
47 Fruto
49 2.2 Fisiologia vegetal e órgãos das plantas
51 2.3 Fatores de crescimento vegetal, ciclo vegetativo e ciclo de cultura

p. 53 3. ECOLOGIA (relação solo-planta-clima-ambiente)


54 3.1 Ecologia e conceito de população, habitat, comunidade biótica e ecossistema

3
55 3.2 Equilíbrio ambiental
56 3.3 Ecossistema agrícola e o Homem como agente modificador de ecossistemas

p. 57 4. RESÍDUOS E EFLUENTES DAS EXPLORAÇÕES


58 4.1 Resíduos e efluentes produzidos pelas explorações
61 4.2 Tratamento e eliminação de resíduos e efluentes
62 4.3 Caraterísticas dos resíduos e efluentes da exploração, composição e valor fertilizante
65 4.4 Técnicas de tratamento e de eliminação dos resíduos e dos efluentes
67 4.5 Compostagem
69 4.6 Enquadramento legal e código de boas práticas
71 4.7 Licenciamento e plano de gestão de efluentes

p. 73 5. PRODUÇÃO AGRÍCOLA SUSTENTADA


74 5.1 Proteção integrada
79 5.2 Produção integrada
80 Produção integrada vegetal
84 Produção integrada animal
85 Controlo e certificação
86 5.3 Modo de produção biológico

p. 90 CONCLUSÃO

p. 92 BIBLIOGRAFIA

4
INTRODUÇÃO
A insustentabilidade ambiental causada pelo recurso às prá-
ticas agrícolas intensivas, tem vindo a consciencializar a
população mundial para o consumo de produtos suficientes, sus-
tentáveis e saudáveis.

Atualmente, a preservação ambiental e a rápi- Para possibilitar a transição global ao nível da


da mutação tecnológica que as sociedades modernas alimentação e da agricultura sustentável, é impres-
têm enfrentado tornou-se o tema central do setor cindível melhorar a proteção ambiental e a eficiência
agrícola. Fatores como a conservação do solo, da do uso dos recursos. Neste contexto, a agricultura
água, dos recursos genéticos animais e vegetais, a sustentável deve garantir a segurança alimentar
conservação ambiental e o uso de técnicas apropria- mundial e ao mesmo tempo, promover ecossiste-
das, têm sido destacados ao longo dos anos, devido mas saudáveis e apoiar a gestão sustentável do
a tornarem-se temas cada vez mais relevantes. Por solo, da água e dos recursos naturais.
este motivo, o trabalho realizado visa a sua viabilida-
de a nível económico e aceitação do mercado. Ao longo deste documento, serão abordados al-
Neste perspetiva, existe urgência na implemen- guns dos aspetos de maior relevância para a prática
tação e consolidação, a curto e médio prazo, de siste- de uma agricultura sustentável, com impacto positivo
mas de produção sustentáveis e de políticas agrícolas no meio ambiente.
que suportem cada vez mais a segurança alimentar.
Para ser sustentável, a agricultura deve satisfazer as
necessidades das gerações presentes e futuras, as-
sim como dos seus produtos e serviços, garantindo a
rentabilidade, a saúde do meio ambiente e a equidade
social e económica.

6
1. SOLO E CLIMA
1.1 Definição, tipos e
classificação, funções
e constituintes dos solos

E xistem diferentes perspetivas sobre o que se entende por


“solo”, que passamos a enumerar.

Segundo a SSSA (2008), o solo é definido como o Na perspetiva da Estratégia Temática de Prote-
material não consolidado, mineral ou orgânico, exis- ção do Solo da União Europeia, solo é definido como
tente à superfície da terra e que serve de meio natu- “a camada superior da crosta terrestre, formada por
ral para o crescimento das plantas. partículas minerais, matéria orgânica, água, ar e or-
Na ótica da Soil Survey Staff (2014), o solo “é um ganismos vivos. Constitui a interface entre a terra,
corpo natural composto de sólidos (minerais e maté- o ar e a água e aloja a maior parte da biosfera”.
ria orgânica), líquidos e gases que ocorre à superfície Pode-se dizer que praticamente todas as defi-
da terra, ocupa espaço e é caraterizado por um ou nições expressam um consenso global, sobre a de-
ambos dos seguintes critérios: tem horizontes, ou ca- finição de solo.
madas, distinguíveis do material inicial em resultado
das adições, perdas, transferências e transformações
de energia e matéria, ou tem a capacidade para su-
portar plantas enraizadas em ambiente natural”.

A superfície terrestre é composta por diversos tipos de solo, com base na


sua estrutura. Cada tipo possui caraterísticas próprias, tais como densidade,
formato, cor, consistência e formação química. No entanto, na área agrícola é
importante salientar que podemos encontrar os tipos de solos abaixo descritos
(cf. figura 1).

8
SOLO ARGILOSO SOLO FRANCO SOLO ARENOSO
Possuem consistência fina; Possuem consistência fina; Consistência granulosa
como a areia;
Elevado índice de fertilidade; Proporção equilibrada
entre argila, areia e limo; Baixa fertilidade;
Maior capacidade de retenção
de água (baixa drenagem); Boa retenção de água Elevada porosidade;
e matéria mineral que
Reduzido arejamento; Elevada permeabilidade;
as plantas necessitam;
Baixa permeabilidade; Boa drenagem e bom
Solo semipermeável;
arejamento.
Difíceis de trabalhar;
Considerados os melhores
Facilmente compactáveis. solos para a agricultura.

Figura 1
Tipos de solo: argiloso, franco e arenoso

Importa também referir que a classificação dos solos está baseada no grau
de evolução dos perfis, ou seja, quando se observa um corte da superfície até
à rocha-mãe (cf. figura 2), verifica-se, num solo evoluído, uma sobreposição
de camadas que diferem pela cor, tamanho dos constituintes, sua disposição,
etc. Este corte vertical constitui o perfil pedológico e as camadas são os seus
diferentes horizontes.

9
O [Solo maduro] Camada de restos de plantas e animais na superfície do solo

A [Solo jovem] Primeiro horizonte mineral do solo, mais escuro,


por conter mais húmus que os horizontes B e C

B [Saprolito] Horizonte formado por partes bastante desagregadas


da rocha-mãe, estando abaixo do horizonte A

C [Rocha alterada] Horizonte formado por partes pouco desagregadas


da rocha-mãe, com presença de materiais que
ainda estão a transformar-se em solo

R [Rocha-mãe] Rocha-mãe que, submetida ao intemperismo,


se desagrega e decompõe, dando origem ao solo

Figura 2
Perfil pedológico do solo (horizonte)

O solo desempenha uma grande variedade de Relativamente à sua constituição (cf. figura 3),
funções vitais, de carácter ambiental, ecológico, so- podemos salientar que o solo é constituído essencial-
cial e económico, constituindo um importante elemen- mente por matéria mineral sólida, matéria orgânica;
to paisagístico, patrimonial e físico para o desenvolvi- água com substâncias dissolvidas e ar.
mento de infraestruturas e atividades humanas.

De entre essa variedade funcional, destacam-


-se as seguintes: Matéria
Orgânica
• Principal substrato utilizado pelas plantas para 5% Água
25%
o seu crescimento (fornecedor de H2O, O2 e nu-
trientes) e disseminação; Minerais
45%
• Reciclagem e armazenamento de nutrientes
Ar
e detritos orgânicos; 25%

• Controlo do fluxo da água e ação protetora da


qualidade da água subterrânea;
• Habitat para a fauna do solo.
Figura 3
Constituição do solo

10
1.2 Estrutura do solo:
Propriedades físico-químicas

P ara avaliar um solo agrícola deve-se atender ao conjunto das


suas propriedades físicas, químicas e biológicas.

As propriedades físicas do solo influenciam a Esta categorização leva a que a textura seja uma
forma como o solo se integra no ecossistema e a informação importante na agricultura, pois permite
possibilidade de o manipular. O sucesso ou fracasso conhecer a influência direta na infiltração e na re-
dos projetos agrícolas pode estar dependente das tenção de água, no arejamento e na coesão do solo,
propriedades físicas do solo, dado serem as utiliza- bem como na nutrição das plantas. A textura do solo
das na classificação de perfis e em levantamentos é definida pela proporção relativa de partículas mine-
sobre a aptidão do mesmo para projetos agrícolas e rais de várias dimensões que entram na constituição
ambientais. A ocorrência e crescimento de diferentes da terra fina. Ou seja, indica as quantidades relativas
espécies vegetais estão diretamente relacionados às de areia, limo e argila que existem no solo (ou em
propriedades físicas do solo. O movimento de água cada horizonte).
e a deposição ou arrastamento dos nutrientes e po- Conhecer a textura de um solo é essencial, uma
luentes químicos dissolvidos na mesma são igual- vez que o comportamento físico-químico dos solos
mente influenciados pelo tipo de solo. minerais depende fortemente das proporções rela-
As propriedades físicas que caraterizam o solo tivas de areia, limo e argila. Assim, quando houver
são a estrutura, a textura, a porosidade, a permea- predomínio de partículas minerais de maior diâmetro,
bilidade, a coesão e a cor. A textura é a propriedade o solo é classificado como arenoso; quando houver
física do solo que menos sofre alteração ao longo predomínio de minerais coloidais, o solo é classifica-
do tempo, permitindo, desta forma, catalogar o solo do como argiloso.
em tipos.

11
1.3 Produtividade do solo

A produtividade de um solo, está dependente de um conjunto


de fatores intrínsecos ao próprio solo.

POROSIDADE: pH:
Refere-se aos espaços do solo que não são ocu- O potencial hidrogeniónico (pH) é a medida do
pados por partículas. Está diretamente relacionada grau de acidez de uma solução e é definido pelo teor
à textura e estrutura dos solos (capacidade de dre- de iões hidrónio (H3O+) livres, por unidade de volume.
nagem interna e retenção de água de um perfil). De Quanto menor for o valor do pH, mais ácida será a
forma geral, os solos de textura fina têm menor po- solução. Se o pH do solo/substrato for inadequado,
rosidade e solos arenosos têm maior porosidade. a produção pode diminuir significativamente, até ao
ponto de não ser economicamente interessante man-
ESTRUTURA: ter a cultura. Deve-se igualmente ter em conta que
Envolve não só a forma, a natureza, a dimensão
existem águas cujo teor em carbonato ou bicarbo-
e o arranjo das partículas simples e dos agregados
nato pode ser muito elevado (águas alcalinas); a sua
(torrões, na linguagem comum) ou pedes, mas tam-
utilização, por rega ou pulverização, pode acarretar
bém a geometria dos vazios, ou seja, as suas dimen-
problemas significativos se não forem corretamente
sões, formas e distribuição.
aciduladas. Em suma, é possível concluir, que o pH
influencia o solo ou substrato, assim como as solu-
PERMEABILIDADE:
ções nutritivas em vários aspetos, nomeadamente na
É a maior ou menor facilidade com que a água,
disponibilidade de nutrientes e na sua solubilidade (cf.
o ar e as raízes atravessam o solo. Os solos que se
quadro 1). Pelo exposto, verifica-se a importância do
deixam atravessar facilmente denominam-se per-
conhecimento do pH do solo/substrato, o pH da água
meáveis; os que oferecem mais resistência, classifi-
de rega ou o pH da dissolução nutritiva utilizada em
cam-se por impermeáveis.
fertirrigação. Aconselha-se que o produtor disponha
COESÃO: de equipamentos (sondas) que indiquem de forma
É a forma como as partículas do solo se encon- direta o pH.
tram ligadas entre si. Os solos com partículas que
apresentam uma baixa capacidade de agregação são
chamados leves ou soltos, os que verificam o inverso
denominam-se compactos ou fortes.

12
SOLOS MUITO ÁCIDOS SOLOS MUITO ALCALINOS
pH < 5 pH > 8

Intoxicação provocada por micronutrientes Diminuição da absorção do fósforo

Deficiência de praticamente
Deficiente absorção do fósforo
todos os micronutrientes

Deficiente mineralização da matéria orgânica Deficiência de absorção de potássio

Carência de cálcio e de magnésio Bloqueio de certos nutrientes devido ao Ca++

Quadro 1
Efeito do pH na disponibilidade e solubilidade dos nutrientes no solo

É necessário ter em atenção a alguns fertilizan- de adubos ou de corretivos orgânicos, originando as-
tes utilizados em fertirrigação (MAP, MKP, ácido fos- sim problemas de toxicidade. Desta forma, a correção
fórico, ácido nítrico e sulfato de amónio), pois tendem do excesso de acidez do solo torna-se fundamental.
a acidificar a água de rega; outros (nitrato potássico, Para esta correção, recorre-se normalmente ao pro-
nitrato cálcico, nitrato magnésico e sulfato potássico), cesso da calagem, ou seja, da aplicação de um corre-
pelo contrário, tendem a alcalinizá-la; daí a necessi- tivo que permite a subida dos valores do pH do solo.
dade de conhecer a reação dos fertilizantes e as suas
misturas uma vez dissolvidos na água de rega, para
evitar perdas de nutrientes devido à formação de pre-
cipitados (perda de cálcio e magnésio como carbona-
to cálcico ou magnésico; de enxofre como sulfato cál-
cico; de fósforo como fosfato cálcico e de ferro como
sulfato de ferro).
Em solos muito ácidos, é frequente as plantas
apresentarem sintomas de toxicidade ou de carên-
cia em elementos nutritivos. Nestes solos, existe um
elevado risco das culturas absorverem em excesso os
metais pesados incorporados, através da aplicação

13
O calcário é o corretivo de acidez mais usado. Segundo o Manual Prático das
Boas Práticas Agrícolas (MADRP, 2004), na sua aplicação deve-se ter em conta
os seguintes aspetos:

• A quantidade e tipo de calcário a aplicar de- • Em pomares, olivais e vinhas: deve-se fazer
pende dos resultados das análises de solo e a distribuição antes da instalação da cultura
faz parte da recomendação de fertilização in- (metade da quantidade é incorporada com a
dicada pelo laboratório; mobilização profunda e a restante com a re-
gularização do terreno);
• Se a quantidade de calcário recomendada for
superior a 7 t/ha, a aplicação deve ser fracio- • Os estrumes devem ser espalhados no terre-
nada ao longo de 2 ou 3 anos, nunca exceden- no após a aplicação do calcário, os chorumes
do em cada um aquele valor – é aconselhável devem ser aplicados em primeiro lugar;
analisar a terra antes de cada aplicação;
• O efeito da calagem prolonga-se, geralmente,
• A calagem deve ser realizada de preferência por três ou quatro anos, ao fim dos quais deve
no outono, antecedendo a cultura da rotação ser pedida nova análise de terra que indicará a
mais sensível à acidez do terreno. O calcário necessidade, ou não, de efetuar nova correção
deve ser uniformemente espalhado por toda da acidez;
a área a corrigir e bem misturado com a terra,
através de mobilização adequada; • Se o produtor aplicar outro tipo de corretivo,
por exemplo cal viva ou cal apagada, deverá
• Os adubos amoniacais e os superfosfatos, ter em atenção que são muito mais ativos,
bem como os estrumes, não devem ser mis- devendo, por isso, adaptar as doses a utilizar.
turados com o calcário;

14
1.4 Fertilidade e
nutrição mineral

D e acordo com a FAO, a fertilidade do solo é a “capacidade


que o solo apresenta para fornecer às plantas os nutrientes
essenciais e a água nas quantidades e proporções adequadas ao
seu crescimento e desenvolvimento, na ausência de substâncias
tóxicas que os possa inibir”.

Os nutrientes essenciais que um solo deve apre- A falta ou excesso de qualquer um dos macro
sentar e de que as plantas necessitam dividem-se ou micronutrientes poderá provocar anomalias no
em três grupos, sendo os primeiros e segundos ne- crescimento e desenvolvimento da planta. A resposta
cessários em maiores quantidades e os últimos em da planta à falta ou excesso de nutrientes aparece
pequenas doses: geralmente nas folhas, onde é possível notar o apa-
recimento de zonas claras (clorose) ou zonas escuras
Macronutrientes principais: (necrose), podendo também atingir outros órgãos.
Azoto (N), Fósforo (P) e Potássio (K).
A capacidade de fornecimento destes nutrientes
Macronutrientes secundários: está dependente de vários fatores, entre os quais:
Cálcio (Ca), Magnésio (Mg) e Enxofre (S). • Quantidade de nutrientes presentes no solo;
• Reação do solo (valor de pH);
Micronutrientes: • Reações observadas entre os nutrientes com
Boro (B), Ferro (Fe), Zinco (Zn), Manganês (Mn), as partículas do solo e matéria orgânica;
Cobre (Cu), Molibdénio (Mo) e Cloro (Cl). • Grau de salinização do solo;
• Caraterísticas do solo: textura e estrutura;
• Microrganismos presentes no solo.

15
A prática de uma fertilização racional pressupõe, por conseguinte, a exis-
tência de informação técnico-científica que permita responder com segurança
às seguintes questões:

• Que nutrientes são necessários aplicar ao so- • Quais as épocas mais apropriadas para pro-
lo e/ou à cultura? ceder à sua aplicação?
• Quais as quantidades mais adequadas des- • Quais as técnicas de aplicação a adotar de
ses nutrientes? forma a obter uma melhor eficácia no apro-
• Quais os fertilizantes tecnicamente mais fa- veitamento desses nutrientes pela cultura?
voráveis para aplicar esses nutrientes tendo
em conta as condições de solo, de clima e da
própria cultura?

A fim de dar resposta a todas estas questões, é Nos planos de fertilização que se estabeleçam
necessário proceder à avaliação do estado nutricio- a nível de uma exploração agrícola, deverão procurar
nal das plantas. utilizar-se de forma sistemática todos os subpro-
dutos da exploração que possuam valor fertilizante,
Para determinar a deficiência ou excesso de nu- tais como estrumes, resíduos das culturas, lamas e
trientes nas plantas, existem várias metodologias: águas residuais, entre outros. Poderá recorrer a ou-
• Observação visual: observar sintomas de de- tros fertilizantes obtidos no exterior, nomeadamente
ficiência nutricional junto das culturas; adubos químicos, adubos orgânicos e adubos orga-
• Análise do solo: avaliar a fertilidade do solo e nominerais, para satisfazer o défice da exploração
o estado nutricional da planta; em nutrientes.
• Análise foliar: isolada ou complementar, de- O cálcio (Ca), potássio (K) e magnésio (Mg) são os
termina o teor de nutriente da folha. primeiros nutrientes a esgotar, dando lugar a óxidos
prejudiciais às plantas. O sódio e os óxidos de alumí-
A formulação das recomendações de fertilização nio são os compostos mais prejudiciais ao desenvol-
deve ser feita através de laboratórios credenciados, vimento das raízes. Para corrigir problemas de solos
responsáveis pela realização de análises de terra pobres em nutrientes, deve-se procurar adubar com
e/ou análises foliares. Tais recomendações poderão, matéria orgânica. Os macro e os micronutrientes são
localmente, ser melhor detalhadas, adaptadas ou absorvidos e transportados pelos tecidos vegetais de
complementadas com o contributo de técnicos agrí- diferentes formas.
colas em função de um conhecimento mais completo
das realidades locais e do agricultor.

16
A mobilidade desses elementos diz respeito à sinais de deficiência em boro, cálcio, manganês ocor-
facilidade com que chegam aos tecidos mais apicais rem geralmente nos ramos mais jovens, enquanto o
da planta, ou seja, nas partes mais jovens, em cres- magnésio, potássio e fósforo apresentam sintomas
cimento. A mobilidade é um fator variável entre nu- nas folhas mais velhas. As funções e sintomas de
trientes e se os mesmos se encontram na planta ou deficiência dos macronutrientes é representada no
não. Por este motivo, os sintomas de deficiência po- quadro seguinte (cf. quadro 2).
dem ser detetados em partes diferentes na planta:

NUTRIENTES, FUNÇÕES E SINTOMAS DE DEFICIÊNCIA:


MACRONUTRIENTES

Elemento Funções Deficiência

Componente essencial Folhas amareladas;


N de todas as proteínas; Crescimento lento;
(azoto) Promove a formação da clorofila. Folhas menores.

Essencial no ciclo de energia da Folhas velhas com


P célula; Formação de raízes e sem manchas pardas;
(fósforo) sementes; Auxilia na floração Gemas laterais dormentes;
e maturação dos frutos. Atraso no florescimento.

Importante na produção de Clorose e depois necrose das


K carboidratos e fotossíntese; margens e pontas das folhas;
(potássio) Vital na relação água-planta; Diminuição do crescimento
Importante na produção de frutos. vertical.

Regula o transporte Manchas entre as nervuras


Ca de outros nutrientes; da folha;
(cálcio) Ativa enzimas. Crescimento irregular das folhas.

Componente de aminoácidos Clorose nas folhas novas;


S e vitaminas; Folhas pequenas e enroladas
(enxofre) Atua na formação dos cloroplastos. na margem.

Mg É o componente central Clorose nas folhas velhas;


(magnésio) da molécula da clorofila. Folhas de coloração alaranjada.

Quadro 2
Funções e sintomas de deficiência dos macronutrientes nas plantas

17
O azoto é o nutriente geralmente mais consu- Por outro, as transformações a que são sujei-
mido pelas plantas. Dado o seu comportamento bio- tos os nutrientes altamente solúveis, como o azoto,
químico, a sua gestão no sistema solo-cultura ou e sem capacidade de serem retidos no complexo de
solo-rotação de culturas é difícil de realizar com se- adsorção do solo, faz com que sejam arrastados nas
gurança. Por um lado, não é possível determinar com águas de escoamento superficial e nas águas de per-
rigor a quantidade de azoto que um solo é capaz de colação, perdendo-se para a produção agrícola. Além
fornecer a uma cultura ao longo do seu período de disso, contribuem para a poluição das águas superfi-
vegetação ativa, sendo, daí, difícil calcular a quanti- ciais e subterrâneas.
dade a aplicar através da fertilização.

Figura 4
Progressão da folha por deficiência de azoto

No solo, os micronutrientes (cf. quadro 3) existem em teores muito baixos.


Nas plantas são necessários em quantidades muito pequenas.

Dependendo do tipo de substrato utilizado nas A disponibilidade dos micronutrientes para as


culturas, poderá ou não haver a necessidade de fer- plantas é influenciada pelas caraterísticas do solo,
tilização com micronutrientes. Substratos inertes ge- como a textura, teor de matéria orgânica, humidade,
ralmente exigem a adição de todos os nutrientes que pH e interação entre nutrientes. Devido à ação das
a planta precisa; no entanto, se já houver mistura de chuvas, vento e sol, o solo perde os seus nutrientes,
matéria orgânica (húmus, turfa, terra vegetal, estru- num processo chamado intemperismo.
me, etc), a fertilização com micronutrientes poderá
não ser.

18
À medida que as águas das chuvas penetram Este fenómeno é mais comum em solos desco-
nas camadas mais profundas, podem ocorrer vários bertos. Caso esta perda seja superior à reposição dos
fatores, como o vento e temperatura, que podem le- nutrientes arrastados, as plantas podem começar a
var ao arrastamento dos nutrientes. mostrar sinais de deficiência.

NUTRIENTES, FUNÇÕES E SINTOMAS DE DEFICIÊNCIA:


MICRONUTRIENTES

Elemento Funções Deficiência


Importante no transporte Folhas novas deformadas
B de açúcares; e quebradiças;
(boro) Atua na divisão celular e no Raízes escuras com pontas
crescimento da planta. grossas e necrose.

Atua em vários processos Folhas novas encurvadas;


Cu enzimáticos; Nervuras salientes;
(cobre) Componente da parede celular. Clorose e quebra das folhas.

Fe Altamente necessário Clorose em folhas novas


(ferro) para a fotossíntese. seguidas de manchas brancas.

Folhas novas murchas


Mo Cofator enzimático importante
e encurvadas;
(molibedénio) na produção de aminoácidos.
Floração suprimida.

Mn Necessário na produção Folhas amareladas a partir da


(manganês) de cloropastos. nervura para a extremidade.

Necessário para a fixação de N; Folhas amareladas;


Co Participa na composição Sintomas parecidos
(cobalto) da vitamina B12. com a falta de N.

Diminuição do tamanho
Cl Atua nos processos de osmose; das folhas; Necrose;
(cloro) Necessário para a fotossíntese. Folíolos do ápice das folhas
velhas tornam-se murchos.
Quadro 3
Funções e sintomas de deficiência dos micronutrientes nas plantas

19
1.5 Manutenção
e melhoramento
da estrutura do solo

O s processos de degradação do solo constituem um grave


problema a escala mundial, com consequências a nível am-
biental, social e económico significativas.

À medida que a população mundial aumenta, a A degradação do solo, traz inúmeros inconve-
necessidade de proteger o solo como recurso vital, nientes para o solo agrícola, nomeadamente, por-
sobretudo para produção alimentar, também cresce. que reduz a sua disponibilidade e viabilidade a longo
prazo, reduzindo ou alterando a sua capacidade para
No território português assiste-se a dois perío- desempenhar funções a ele associadas. A perda de
dos temporais: capacidade do solo para realizar as suas funções, dei-
xando de ser capaz de manter ou sustentar a vege-
1) Estação seca e longa proporciona taxas de tação, é designada por desertificação.
formação do solo relativamente baixas;
É importante salientar as principais ameaças
2) Concentração da precipitação no outono/in- sobre o solo. São elas:
verno, favorece a perda de solo por erosão • Erosão;
(agravada pelo relevo dobrado da maioria do • Mineralização da matéria orgânica;
território) e cria condições favoráveis para a • Compactação do solo;
lixiviação dos nutrientes, que se vão libertan- • Redução da biodiversidade;
do dos minerais constituintes da rocha mãe, • Salinização;
durante a sua longa meteorização. • Cheias e desabamentos de terras.

20
Erosão
A erosão resulta da remoção das partículas mais atividades humanas (cf. figura 5), principalmente a
finas do solo por agentes edáficos como a água e o gestão inadequada do solo, podendo este ter tam-
vento, que as transportam para outros locais. Deste bém algumas caraterísticas intrínsecas que o tor-
fenómeno resulta a redução da espessura do solo, nem propício à erosão (possuir camada arável fina,
perda de funções e, em caso extremo, extinção do pouca vegetação ou teores reduzidos de matéria or-
próprio solo, podendo ainda resultar na contamina- gânica). No entanto, este fenómeno pode ser desen-
ção de ecossistemas fluviais e marinhos, assim co- cadeado por uma combinação de fatores, dos quais
mo danos em reservatórios de água, portos e zonas salientam-se: fortes declives dos terrenos agrícolas;
costeiras. Esta é a principal ameaça ambiental para o clima territorial (por exemplo, longos períodos de
a sustentabilidade e capacidade produtiva do solo e seca seguidos de chuvas torrenciais) e as catástrofes
da agricultura. A erosão tem sido intensificada pelas ecológicas (nomeadamente incêndios florestais).

Figura 5
Erosão/degradação em solos agrícolas

21
Mineralização da
matéria orgânica (MO)
A matéria orgânica (MO) tem o capacidade de melhora a infiltração e retenção da água, aumenta a
influenciar positivamente as caraterísticas do solo capacidade de troca e, assim, contribui para o acrés-
físicas (densidade, porosidade...), químicas (libertação cimo da produtividade agrícola.
e fixação de nutrientes, regulação do pH...) e bioló- O controlo da matéria orgânica do solo é um pro-
gicas (fonte de alimento e substrato para o desen- cesso complexo, devendo ser conduzido com vista a
volvimento de microrganismos...). Embora a MO se reduzir as perdas. Estes objetivos podem ser facilita-
encontre em quantidades reduzidas (± 2 a 4%) nos dos pela racionalização das práticas agrícolas, com a
solos minerais, tem um papel fundamental na me- oportunidade das épocas de intervenção, mobiliza-
lhoria de sua fertilidade e no aumento da produti- ção reduzida, sementeira direta, agricultura biológica,
vidade vegetal. A manutenção da matéria orgânica  introdução de prados/pastagens e incorporação de
do solo é bastante importante, do ponto de vista físi- resíduos (estrume/chorume).
co-químico, dado que contribui para a sua estrutura,

Figura 6
Matéria orgânica

22
São várias as funções da matéria orgânica presente no solo. Destacam-se
algumas das principais:

• Diminui a fixação e a insolubilização do fósfo- • As reações químicas da matéria orgânica pro-


ro, aumenta as doses de matéria orgânica no duzem elementos capazes de reter nutrientes
solo e a disponibilidade desse nutriente para no solo, tais como: o potássio, cálcio, amónio,
as plantas (a matéria orgânica evita o maior ferro, zinco, cobre, manganês – dessa forma,
contato do fosfato solúvel com óxidos e hi- evita a perda destes nutrientes durante a la-
dróxidos que o insolubiliza); vagem do solo pelas águas das chuvas.
• É uma importante fornecedora de enxofre pa-
ra o solo – do enxofre total encontrado nos
solos, aproximadamente 50 a 70% estão na
forma orgânica;

A mineralização da matéria orgânica do solo é particularmente preocupante


nas zonas de ecologia mediterrânea.

Segundo dados oficiais do Gabinete Europeu do a região de Entre Douro e Minho, apresenta baixos
Solo, cerca de 75% da superfície analisada no sul da níveis de matéria orgânica. Nas restantes regiões, as
Europa tem solos com teores de matéria orgânica condições climáticas (pouca humidade e temperatu-
baixa (3,4%) ou muito baixa (1,7%). Atualmente, há ras elevadas) favorecem a perda de matéria orgânica
uma tendência a favor da adoção de técnicas agrí- através da sua decomposição. O recomendável pelas
colas de conservação, a fim de aumentar o teor de boas práticas agrícolas é que o teor de matéria orgâ-
carbono no solo e evitar as perdas deste e as suas nica do solo seja melhorado para valores não inferio-
emissões adicionais para a atmosfera sob a forma res a 2%. Para tal, dever-se-á atender às seguintes
de CO2. Há, todavia, um limite para a quantidade de práticas agrícolas:
matéria orgânica e de carbono que poderá ser arma- • Incorporação de corretivos orgânicos de for-
zenada nos solos. As práticas agrícolas e silvícolas ma periódica;
têm um impacto importante sobre o solo agrícola, • Corretivos orgânicos provenientes das explo-
podendo também ter em solos adjacentes não agrí- rações agrícolas;
colas e águas subterrâneas, nomeadamente em ter- • Compostos de resíduos sólidos urbanos (RSU);
mos de emissão de substâncias contaminantes. • Lamas provenientes do tratamento de efluen-
A maioria dos solos em Portugal Continental, tes de diferentes origens.
com exceção das áreas de maior pluviosidade, como

23
Compactação do solo
A compactação é uma das principais ameaças Este problema tem vindo a agravar-se nos úl-
da degradação dos solos agrícolas e florestais. Em timos anos com a utilização de máquinas agrícolas
Portugal, pouco é feito para mitigar os seus efeitos na cada vez maiores, sem o aumento da área de con-
sustentabilidade do solo e das importantes funções tato pneu-solo, exercendo uma maior pressão so-
que este desempenha para o ambiente. Segundo o bre o solo, aumentando, assim, a sua compactação.
MADRP (2004), Portugal é dos poucos países da Eu- O grau de compactação do solo que uma máquina
ropa que continua a realizar lavouras profundas na agrícola exerce depende do tipo de pneu, das suas
preparação dos solos, estando este sujeito a uma dimensões, da velocidade de trabalho, do número de
pressão mecânica devido ao uso de máquinas para a vezes que circula sobre no mesmo local e da carga
instalação de vinhas e outras fruteiras; que na agri- suportada. Importa salientar que a compactação do
cultura extensiva pratica o pastoreio e que na inten- solo pode ocorrer em diferentes profundidades e, na
siva é obrigado a regar. Estes fatores são suficientes maioria das vezes, não se distribui de maneira unifor-
para aumentar os riscos de compactação irreversível me ao longo da lavoura (cf. figura 8).
dos solos (cf. figura 7).

Figura 7
Efeitos da compactação
(agregados do solo)

Figura 8
Efeito das máquinas
agrícolas no solo

24
Independentemente da profundidade dos danos causados, as consequên-
cias da compactação são similares:

• Falta de condições de operabilidade e transi- • Dificuldade de penetração e no desenvol-


tabilidade dos solos (com as chuvas torren- vimento das raízes (as plantas não conse-
ciais, as águas não conseguem infiltrar-se guem absorver os nutrientes em função do
no solo compactado); mal desenvolvimento radicular e do arma-
zenamento de água);
• Redução do espaço poroso entre as partí-
culas do solo (redução dos espaços livres do • Dificuldade no arejamento, fertilidade, ativi-
solo que diminuem a quantidade de oxigé- dade biológica e estabilidade;
nio, conduzindo uma redução na percenta-
gem de desenvolvimento da planta); • Os solos compactados tem menor capaci-
dade de aeração – as plantas ficam mais ex-
• Deterioração da estrutura do solo; postas a doenças, principalmente nas raízes.

Redução da biodiversidade
Um dos princípios para termos uma agricultu- São diversos os motivos pelos quais existe preo-
ra consolidada e mais sustentável é a preservação e cupação pela biodiversidade:
ampliação da biodiversidade ou diversidade biológica. • Na natureza, a biodiversidade é uma das suas
Mas afinal como definimos biodiversidade? propriedades fundamentais, responsável pelo
equilíbrio e estabilidade dos ecossistemas;
A biodiversidade é definida como a variedade • A biodiversidade representa um imenso po-
e a variabilidade existente entre os organismos vi- tencial de uso económico.
vos e as complexidades ecológicas nas quais elas
ocorrem. Refere-se à variedade de vida; à varieda- No entanto, nos últimos tempos tem-se vindo
de de espécies de flora, fauna e microrganismos; a assistir a uma redução drástica da biodiversidade,
à variedade de funções ecológicas desempenhadas fruto do aumento da taxa de extinção de espécies
pelos organismos nos ecossistemas; e à variedade causado pelas atividades antrópicas, ou seja, ativi-
de comunidades, habitats e ecossistemas formados dades desenvolvidas pelo homem.
pelos organismos. 

25
A intervenção humana em habitats previamen- Assim, torna-se importante tomar práticas agrí-
te estáveis aumentou significativamente, gerando colas, já anteriormente adotadas na agricultura tradi-
perdas maiores de biodiversidade devido à prática cional, que foram abandonadas ao longo dos tempos.
intensiva da de atividade humana, inclusive a agro- De entre essas práticas destacam-se:
pecuária, através da exploração excessiva de espécies • Rotação de culturas;
de plantas e animais, uso de híbridos, monocultu- • Cultivo em faixas;
ras, contaminação do solo, água e atmosfera por po- • Utilizar variedades com variabilidade genética,
luentes (produtos fitofarmacêuticos, adubos quími- melhoradas e cultivadas ao longo dos tempos
cos, resíduos de indústrias e esgotos domésticos), e conservadas de gerações em gerações;
introdução de espécies e doenças exóticas, mudan- • Consociamento de culturas;
ças climáticas, além de outras atividades desenvol- • Adubação verde;
vidas pelo homem. • Crescimento da vegetação espontânea;
A monocultura (cf. figura 9) representa um dos • Sementeira direta;
maiores problemas do modelo agrícola praticado na • Adição de matéria orgânica (MO) através de
atualidade, pois não permitindo a diversificação de resíduos da exploração.
espécies numa determinada área, as pragas, doenças
e plantas espontâneas ocorrem de forma mais inten-
sa sobre as culturas, tornando o sistema de produção
mais instável e mais sujeito às adversidades.

Figura 9
Monocultura (milho)

26
Salinização
A salinização consiste na acumulação de sais caraterísticas do solo impedem a lavagem de sais),
solúveis de sódio, magnésio e cálcio nos solos, redu- manutenção das estradas com sais durante o inver-
zindo a fertilidade dos mesmos. É um dos principais no e exploração excessiva de águas subterrâneas em
processos de degradação do solo (cf. figura 10). O au- zonas costeiras (provocada pela crescente urbaniza-
mento da área regada e as perspetivas de mudanças ção, indústria e agricultura nestas zonas), conduzin-
climáticas podem levar a um acréscimo da área afe- do a uma diminuição do nível dos lençóis freáticos
tada por este problema. e à intrusão da água do mar.
Este processo resulta de fatores como a irriga- A salinização do solo afeta cerca de 1 milhão
ção (a água das regas tem maiores quantidades de de hectares (ha) na UE, sobretudo nos países me-
sais, em particular em regiões de fraca pluviosidade, diterrâneos, constituindo uma das principais causas
com elevadas taxas de evapotranspiração ou cujas de desertificação.

Figura 10
Efeito da salinização
em solos agrícolas

27
Cheias e desabamentos de terras
As cheias e desabamentos de terras, são consi-
derados acidentes naturais intimamente relaciona-
dos com a gestão do solo.
As cheias podem, em alguns casos, resultar do
facto do solo não desempenhar o seu papel de con-
trolo dos ciclos da água devido à compactação ou à
impermeabilização, podendo também ser favorecidas
pela erosão causada pela desflorestação, abandono
de terras ou até pelas próprias caraterísticas do solo.

Estes acidentes naturais podem levar a:


• Erosão;
• Poluição com sedimentos;
• Perda dos recursos do solo;
• Entre outros.

Figura 11
Cheias e desabamentos de terras em solos agrícolas

A fim de minimizar os impactos negativos nos solos agrícolas, foi desenvol-


vido um um conjunto de práticas agrícolas de conservação dos solos:

• Enrelvamento da entrelinha nas culturas per- • Evitar a compactação do solo;


manentes; • Distribuição das culturas na exploração;
• Uso de rotações culturais adequadas que in- • Racionalizar a mobilização do solo (mobiliza-
cluam espécies que mantenham o solo reves- ção do solo ao mínimo ou sementeira direta);
tido durante a época das chuvas; • Proteger a qualidade do solo da poluição com
• Uso de uma cultura complementar forrageira produtos fitofarmacêuticos;
de outono/inverno; • Fertilizar racionalmente as culturas;
• Adaptar as técnicas de regadio; • Melhorar a fertilidade do solo.

28
1.6 Água no solo

A água tem um papel fundamental no ecossistema agrário.


Atualmente, a agricultura é dos setores de atividade que
mais água consome ao nível mundial.

Para além de ser utilizada na produção de cultu- do nível de atividades metabólicas, do estado hídrico
ras (alimento) para consumo humano, é importante do ar e do solo e de um conjunto de outros fatores.
na produção de pastos e matérias-primas para ra- De modo geral, os tecidos em crescimento ou com
ções animais. alta atividade metabólica não suportam graus eleva-
O conteúdo de água, além de variar com os tipos dos de desidratação, tornando evidente que a água
de células e tecidos, também é bastante influenciado executa funções vitais e, sem ela, a vida como é co-
pelas condições ambientais e pela fisiologia das plan- nhecida poderia não existir.
tas. Assim, o conteúdo de água de plantas depende

Destacam-se as seguintes funções da água nos vegetais:

• Contribui fundamentalmente para a absor- • É responsável pela manutenção da turges-


ção e para o transporte de minerais das raízes cência e, portanto, contribui para o crescimen-
para as folhas (via xilema) e para a transloca- to e para a manutenção da forma e estrutura
ção de substâncias orgânicas e de minerais dos tecidos tenros;
(via floema);
• Influencia a estrutura e a função de macro-
• Forma o ambiente adequado onde a maioria moléculas (proteínas, ácidos nucleicos, polis-
das reações bioquímicas ocorre, participando sacarídeos, etc) e de membranas;
em muitas delas como reagente (hidrólises);
• Contribui para que as plantas não sofram tan-
• É a fonte de eletrões na fotossíntese; to com as flutuações de temperatura.

• Age como solvente para nutrientes minerais


e substâncias orgânicas;

29
Importância do ciclo da água no solo:

O vapor de água na atmosfera em condições es- Como a água que entra possui um potencial su-
peciais forma nuvens, podendo retornar à superfície perior àquela que se encontra no solo, infiltra-se
na forma de chuva (estado líquido), granizo ou neve espontaneamente. Quando a chuva ou rega termina,
(estado sólido). A chuva, principal forma de precipita- a água continua a movimentar-se no solo procuran-
ção em Portugal, ao atingir a superfície do solo, infil- do sempre estados de menor potencial: redistribui-
tra-se, ficando armazenada nos seus poros, com uma ção. No período de infiltração e redistribuição, a água
percentagem da mesma disponível para as plantas. pode ser absorvida pela planta, devido ao potencial
A este processo denomina-se infiltração. de água nas plantas ser menor do que no solo.
Pode, no entanto, ocorrer escoamento super-
ficial. Esse escoamento, pode ser maior ou menor,
dependendo da intensidade da chuva, do declive e
das caraterísticas físicas do solo. Em geral, quanto
maior o escoamento superficial maiores são as per-
das de solo por erosão.

Parte da água consumida pela planta tem ação refrigeradora. Com altas
temperaturas, se a planta mantiver um nível de humidade satisfatório, todas
as partes que a compõem (folhas, caule, flores, frutos) terão capacidade para
manter um nível de temperatura adequado.

Essa ação refrigeradora é possível devido ao flu- Por este motivo, surge a necessidade de gran-
xo de água que passa por toda a extensão da plan- des superfícies radiculares e foliares (de absorção e
ta. Quando atinge a zona apical da planta, a água é de evaporação). Na ligação entre ambos estes ór-
transferida para a atmosfera: transpiração. Do mes- gãos, pelo xilema, o movimento da água é basica-
mo modo, a água retida na superfície do solo pode mente por fluxo em massa, daí a necessidade de va-
passar diretamente para a atmosfera: evaporação. sos condutores especializados, rígidos e desprovidos
O fluxo de água do solo para a atmosfera através de membranas.
da planta é realizado na raiz e nas folhas por difusão,
através das células (via celular) ou embebida nas suas
paredes (via apoplasto).

30
A junção dos processos de transpiração e evapo- A água do solo não permanece estática e, de for-
ração que traduzem a libertação da água na atmos- ma geral, nem todos os poros do solo ficam preen-
fera pelo solo e pelas plantas é categorizado como chidos com água. Em solos não saturados, uma parte
evapotranspiração (cf. figura 12). dos poros fica cheia de ar, constituindo a atmosfera
Quando o volume de água ultrapassa a capaci- do solo, fundamental para a respiração dos microrga-
dade de armazenamento do solo, o excedente é per- nismos e das raízes de plantas. Nos poros cheios de
colado para horizontes mais profundos, podendo água pode-se observar movimento de água em todas
chegar a profundidades abaixo da raiz, levando a que as direções, em geral de regiões mais húmidas para
essa água não possa ser aproveitada pela planta. regiões mais secas. Por exemplo, quando horizon-
A água perdida é responsável pela composição do tes mais superficiais se encontram mais secos que
“lençol freático”, que será o principal responsável na os horizontes mais profundos, é possível observar a
recarga dos aquíferos subterrâneos. ascensão capilar, ou seja, um movimento ascendente
de água que, em alguns casos, pode atingir a super-
fície do solo.

Figura 12
O comportamento da água no solo

31
1.7 Elementos do clima
e principais fatores

O clima pode ser genericamente definido como a média das


condições meteorológicas em determinada região. As con-
dições meteorológicas correspondem ao estado do tempo.

De forma mais precisa, o clima é a descrição es- Importa salientar que as plantas são extrema-
tatística do tempo em termos de médias e desvios mente sensíveis às condições ambientais, em par-
de determinados parâmetros relevantes ao longo de ticular à temperatura. Estas mudanças ao nível cli-
várias décadas, tipicamente três, ou seja, trinta anos. mático são suscetíveis de terem efeitos expressivos
Os parâmetros considerados relevantes são, na mai- sobre o crescimento e desenvolvimento das plantas
or parte das situações, a temperatura, a precipitação, e, por consequência, na produtividade e qualidade
o vento, entre outros. do produto.
No âmbito agrícola, as condições meteorológicas Eventos climáticos extremos (como por exemplo
afetam drasticamente a produtividade. A distribuição granizo, saraiva ou tromba de água) podem causar
geográfica das culturas e pastagens varia em função importantes perdas na produção e na qualidade, en-
do clima e do fotoperíodo. A quantidade total de pre- quanto mudanças climáticas podem, por exemplo,
cipitação, assim como o seu padrão de variação são antecipar o ciclo fenológico  e, por consequência, a
aspetos importantes para os sistemas agrários. colheita, promover o aparecimento de novas e/ou
A agricultura em Portugal poderá ressentir-se intensificar as atuais pragas/doenças ou aumentar a
com as alterações climáticas (não confundir com o variabilidade interanual da produtividade e qualidade.
conceito de variabilidade climática), dado que os mo-
delos climáticos projetam, para este século, um au-
mento da temperatura do ar, uma diminuição da pre-
cipitação na época estival (com consequente redução
da humidade do solo) e um aumento do número e
gravidade das secas e ondas de calor.

32
Os elementos climáticos podem ser classificados em dois tipos: simples
ou complexos.

Os primeiros são considerados elementos me- Os elementos complexos descrevem o efeito cli-
teorológicos, por norma medidos em estações me- mático de causas que estão relacionadas entre si ou
teorológicas, convencionais ou automáticas (tempe- que atuam conjuntamente para produzir certos as-
ratura, precipitação, humidade, vento, nebulosidade, petos particulares da paisagem (aridez do solo, conti-
insolação, pressão atmosférica, entre outros). nentalidade do clima, conforto humano e rendimento
das culturas).

Figura 13
Elementos climáticos: insolação, precipitação, nebulosidade, vento

33
Os fatores climáticos são os elementos naturais e humanos capazes de
influenciar e alterar as caraterísticas ou a dinâmica do clima, em escalas tem-
porais e espaciais diversas.

O clima e a sua variabilidade são o resultado da Os fatores mais representativos são a latitude, a
ação conjunta desses fatores climáticos, que podem altitude, as massas de ar, a continentalidade, as cor-
ser externos ou internos ao sistema climático (cf. fi- rentes marítimas, o relevo e a vegetação.
gura 14).

CLIMA TERRESTRE

é influenciado por

Fatores externos Fatores internos

Fatores cósmicos: Processos tectónicos,


variação orbital, atividade solar, erupções vulcânicas
meteoritos

Intevenção humana
Forçamentos radioativos:
composição atmosférica,
Intercâmbio de energia:
albedo-heteogeneidade da
hidrosfera/atmosfera,
superfície (fisografia, vegetação) hidrosfera/litosfera (proximidade do mar)

Correntes planetárias:
circulação geral da atmosfera, correntes
marítimas, fisiografia e vegetação

Figura 14
Fatores do clima (internos e externos)

34
1.8 Caraterização do
clima em Portugal

A s condições meteorológicas constituem um dos principais


fatores que condicionam o desenvolvimento e a produção
agrícola. A informação agrometeorológica é, portanto, importan-
te para o planeamento das atividades agrícolas e para a tomada
de decisões.

O clima em Portugal é considerado temperado Apesar de existirem poucas montanhas em Por-


de feição marítima, ou seja, fortemente condicionado tugal, os terrenos montanhosos podem ser utilizados
pela ação moderadora do oceano e pela chegada fre- para agricultura, apesar das dificuldades apresenta-
quente de massas de ar carregadas de humidade, e, das. O cultivo de terrenos montanhosos leva a que
por isso, muito propício à agricultura. Devido ao clima o solo fique sujeito às chuvas da região, podendo,
quente e seco no verão e frio e chuvoso no inverno, em casos extremos, deixar a rocha “nua”, desprovi-
culturas como a videira, o sobreiro e o pinheiro são da de solo. Uma das formas mais comuns de evitar
consideradas as principais culturas em Portugal, uma esta ocorrência é através da construção de socalcos.
vez que conseguem crescer quer com pouca água Atualmente, certas regiões mantêm alguma dificul-
no verão, quer com as geadas no inverno. No entan- dade na sua adaptação agrícola devido à impossibili-
to, existem formas de adaptar o cultivo de espécies dade da tração de máquinas em determinados locais.
oriundas de países de clima diferente, através, por Os fatores do clima que originam as alterações
exemplo, do uso de estufas, da drenagem de campos climáticas em Portugal são:
e da irrigação. • Latitude (fazendo-se sentir, em particular no
O relevo em Portugal é contrastado: no norte é contraste pluviométrico norte-sul);
mais acidentado, enquanto que no centro e sul mais • Altitude (regiões de maior altitude registam
plano. Por este motivo, a agricultura é mais expres- valores de precipitação mais elevados);
siva no Alentejo, com o norte do país demarcado pela • Proximidade/afastamento do mar;
vinicultura. Nos Açores e Madeira o relevo é mais aci- • Concordância do relevo em relação à linha da
dentado devido à sua origem vulcânica. costa.

35
Por outro lado, pode-se ainda fazer a compara- das principais variáveis climáticas que caraterizam
ção das principais variáveis climáticas em Portugal o território.
continental, ou seja, radiação solar, precipitação, tem- Entre os mais elevados níveis de radiação e tem-
peratura média do ar e evapotranspiração. peratura e a precipitação geram déficits hídricos que,
O potencial produtivo da generalidade das espé- em grande parte do território, são claramente supe-
cies vegetais depende da comparação e conjugação riores a 30% (Silva, 2016) (cf. figura 16).

Temperatura média do ar: Evapotranspiração:


Défice hídrico
7,5º - 17,5º C 400 - 800 mm

Défice hídrico (%)


- 10
10 - 20
20 - 50
+ 50
Radiação solar Precipitação:
140 - 170 kcal/cm2 400 - 2800 mm

Figura 15
Variação dos principais elementos do clima em Portugal Continental (fonte: Silva, 2016)

Em Portugal continental existem quatro conjuntos climáticos (fonte: SNIRH


– Apambiente – cf. figura 16).

Norte Litoral: mediterrânico com influência maríti- Norte Interior: clima temperado/mediterrânico com
ma; amplitudes térmicas anuais baixas, raramente influência continental; maior amplitude térmica anual
ultrapassando os 10ºC; verões relativamente frescos do país, podendo atingir os 20ºC; invernos rigorosos,
e invernos suaves; maioria dos meses são húmidos; frios e longos, com precipitações menos intensas e
precipitação mais ou menos abundante ao longo do frequentes, por vezes, em forma de neve; verões
ano, principalmente durante o outono e inverno. muito quentes e secos; existência de meses secos
no verão.
Sul: clima temperado mediterrânico, ou seja, verões
muito quentes e longos (5 a 6 meses secos); invernos Regiões montanhosas: clima de altitude, isto é, ve-
curtos e suaves, pouco chuvosos e com precipitações rão fresco e húmido; inverno rigoroso; precipitação
escassas e irregulares, concentradas no fim do outo- elevada ao longo de todo o ano, sendo em forma de
no e no inverno. neve no inverno.

36
Figura 16
Especificidade do clima em Portugal Continental: conjuntos climáticos (fonte: SNIRH - Apambiente)

37
1.9 Aquecimento global

E xistem dois tipos de resposta às alterações climáticas e seus


impactos: a mitigação pela redução de emissões de GEE’s
(a par da promoção de sumidouros de carbono) e a adaptação
aos impactos.

Num cenário de alterações climáticas estão pre- Salientam-se as medidas de adaptação:


vistas mudanças significativas na agricultura portu- • Alterar variedades ou culturas para aquelas
guesa. O projetado aumento da temperatura pode com necessidades térmicas e de vernalização
resultar no encurtamento temporal dos diferentes mais apropriadas e/ou com melhor resistência
estados fenológicos das culturas, desde o início do ao stress térmico e hídrico;
ciclo vegetativo até à colheita. • Utilizar pastagens que privilegiem a consocia-
Se, por um lado, as regiões litorais deverão ter ção de diversas espécies;
menores problemas de pragas e doenças, os impac- • Alterar ou adaptar o sistema de produção.
tos negativos ao nível da produção e qualidade de-
verão sobrepor-se devido ao aumento dos efeitos Quanto às medidas de mitigação das alterações
cumulativos de stress hídrico (excessiva secura) e tér- climáticas, apontam-se as seguintes:
mico; por outro, estas mudanças exigiriam a adoção • Gestão das culturas;
de medidas de adaptação a curto prazo (por exemplo, • Gestão/melhoramento das pastagens;
o uso de agentes foto-termoprotetores das folhas • Gestão de solos orgânicos;
e/ou implantação da rega) ou a longo prazo (como a • Restauro de solos degradados;
seleção de porta-enxertos e variedades adaptadas à • Gestão da produção animal;
secura, e culturas plantadas a maior altitude), a fim • Gestão de efluentes em explorações animais;
de manter a produção e a qualidade nos níveis atuais • Culturas bioenergéticas, biocombustíveis só-
(Pinto e Braga, 2009). lidos, líquidos, biogás e resíduos.

38
2. BOTÂNICA
AGRÍCOLA
2.1 Noções de
morfologia externa

A forma e fisiologia das plantas variam instraespecificamente


e o corpo da sua maioria é dividido em duas partes princi-
pais: zona radicular e parte aérea.

A forma e a fisiologia das plantas variam intraes- No entanto, o corpo da maioria das plantas é di-
pecificamente (entre os indivíduos da mesma espé- vidido em duas partes principais (cf. figura 17):
cie) por três causas fundamentais: • Uma localizada sob o solo, constituída pelas
• Variabilidade ontogénica (ou seja, plasticidade raízes (A);
ontogénica); • Outra área constituída pelo caule, folhas, flo-
• Variabilidade ambiental (ou seja, plasticidade res e frutos (B).
fenotípica);
• Variabilidade genética (ou seja, plasticidade
genética).

Folha

Raiz Caule

A
Figura 17
Constituição externa
de uma planta vascular

40
Raiz
A raiz é o órgão vegetal responsável pelo supor- de substâncias de reserva, de modo a formar o que
te da planta e absorção dos nutrientes inorgânicos designamos de seiva bruta. A classificação das raízes
presentes no solo (água e sais minerais); condução do podem ser quanto à forma e quanto à localização.
material absorvido e a acumulação de diversos tipos

Quanto à forma, pode classificar-se em (cf. figura 18):

Tuberculosa: Fasciculada:
Planta com raízes muito grossas, contêm subs- A planta não tem uma raiz principal mas possui
tâncias de reserva (ex: nabo, cenoura, beterraba). muitas raízes (adventícias) de tamanho idêntico, mais
ou menos ramificadas, finas, delicadas com abun-
Aprumada: dantes pelos radiculares fazendo lembrar um feixe
Planta com uma raiz principal espessa e outras (ex: trigo, milho).
raízes mais finas e pelos radiculares que saem da
principal (ex: pinheiro, feijoeiro).

Figura 18
Raízes tuberculosas, aprumadas e fasciculadas

Quanto à localização as raízes podem ser classificadas em: raízes subter-


râneas (raízes imersas no solo); raízes aquáticas e raízes aéreas (cf. figura 19).

41
Raiz subterrânea Raiz aquática Raiz aérea
folha folha

raízes
secundárias
raiz principal

caule

raízes
aéreas
raízes
secundárias tronco hospedeira

Figura 19
Raízes subterrâneas, aquáticas e aéreas

As raízes das plantas podem ainda ser classificadas em:

Tuberosas: (cf. figura 20) Raízes Aéreas: (cf. figura 23)


Funcionam como órgãos de reservas nutritivas, As raízes aéreas, ocorrem em plantas epífitas,
principalmente de amido, sacarose e inulina (ex: be- sem parasitá-las. Algumas apresentam um revesti-
terraba, nabo, batata-doce, cenoura). mento chamado velame ou vel com a capacidade de
absorver a humidade do ar. São raízes que não che-
Tabulares: (cf. figura 21) gam ao solo e retiram o oxigénio do ar (ex: orquídeas).
Raízes achatadas verticalmente, ocorrem so-
bre a superfície do solo antes de mergulharem nele. Respiratórias/Pneumatófotos: (cf. figura 24)
Possuem a função de aumentar a estabilidade das Raízes aéreas, grossas e esponjosas que cres-
plantas de grande porte, aumentam também a su- cem em direção à superfície (geotropismo negativo).
perfície respiratória. Ocorrem em espécies adaptadas a zonas húmidas
tropicais sujeitas a alagamento. Facilitam as trocas
Raízes Escora/Adventícias: (cf. figura 22) gasosas entre o sistema radicular e o ar.
Raízes de suporte aéreas próximas do solo que
contribuem para o processo da fotossíntese emitidas Sugadoras/Haustórias: (cf. figura 25)
da base do tronco (partem do caule) e tem por função São raízes de vegetais parasitas que penetram
aumentar a base de sustentação da planta. Ocorrem até aos vasos condutores (floema) para sugar a seiva
principalmente em terrenos alagados, (ex: milho, cana (ex: erva-de-passarinho; cipó-chumbo).
de açúcar).

42
Figura 20
Raízes tuberosas

Figura 21 Figura 22
Raízes tabulares Raízes adventícias

43
Figura 23 Figura 24
Raízes aéreas Raízes aéreas e respiratórias

Figura 25
Raízes sugadoras/haustórias

44
Caule
O caule é originado a partir do caulículo do em- Os rizomas são caules que apresentam gemas
brião da planta e tem como principais funções dar laterais e crescem sob a superfície do solo emitindo
suporte às folhas, flores e frutos conectando com a algumas folhas, como o gengibre e a samambaia.
raiz; conduzir a água e nutrientes e pode ainda ser Os tubérculos são muito utilizados na alimenta-
órgão de reserva e meio de reprodução assexual. ção porque armazenam substâncias nutritivas, como
por exemplo a batata-inglesa.
Os caules aéreos (cf. figura 26), podem classifi- Formados por caule e folhas modificadas, o cau-
car-se segundo as seguintes tipologias: tronco, haste, le tipo bolbo é geralmente redondo, sendo que na
colmo, espique e estolhão. sua parte inferior há raízes; e na posterior, folhas com
reservas nutritivas. Alguns caules tipo bolbo são mui-
Os caules subterrâneos desenvolvem-se sobre to utilizados na alimentação humana, como o alho
o solo e são ricos em substâncias nutritivas. Eles são e a cebola.
classificados em rizomas, tubérculos e bolbos (cf. fi-
gura 27).

TRONCO HASTE COLMO

ESTOLHO ESPIQUE

Figura 26
Exemplificação de caules aéreos

45
TUBÉRCULO RIZOMA BOLBO

Figura 27
Exemplificação de caules subterrâneos

Folha
As folhas originam-se a partir de protuberân- especializado das plantas especialmente adaptado
cias formadas por divisões periclinais das células nas à transpiração, gutação, respiração e fotossíntese.
camadas mais superficiais localizadas próximas ao Ao nível da constituição, uma folha completa possui:
meristema apical caulinar. É considerado um órgão limbo, pecíolo, bainha e estípulas (cf. figura 28).

Estípula

Pecíolo Limbo

Bainha
Caule

Figura 28
Constituição da folha

46
Fruto
O fruto resulta do amadurecimento do ovário, A partir da fecundação, inicia-se o desenvolvi-
garantindo a proteção e auxiliando a dispersão das mento da semente através de uma série de trans-
sementes surgidas após a fecundação. Ocorre ex- formações no saco embrionário e outros tecidos do
clusivamente nas angiospermas. No sentido mor- óvulo. A parede do ovário desenvolve-se para peri-
fológico, não apenas aquelas estruturas conhecidas carpo, o qual é formado por três camadas: exocarpo
como “frutas” (maçã, laranja, etc.), mas também as (epicarpo), mesocarpo e endocarpo.
conhecidas como “legumes” (feijão, ervilha, etc.) e
“cereais”(arroz, milho, etc.) são frutos.
Os frutos são importantes na classificação botâ-
nica por possuírem uma estrutura constante.

Todo o fruto apresenta uma estrutura básica (cf. figura 29):

Epicarpo: 
É de facto a porção mais externa do fruto, oriun-
Endocarpo Epicarpo
da da epiderme da folha carpelar. Normalmente é
uma camada membranácea e muito fibrosa.

Mesocarpo: 
É a porção intermediária (entre o epicarpo e en-
docarpo). Às vezes armazena alguma substância de
reserva. Oriunda dos parênquimas da folha carpelar.

Endocarpo: 
É a porção (camada) mais interna, geralmente
mais rígida, envolve a semente. Oriunda da epiderme
interna do ovário.

Mesocarpo Sementes

Figura 29
Estrutura básica de um fruto

47
Quanto à abertura, os frutos podem classificar-se em:

Frutos deiscentes:  Frutos indeiscentes: 


São os frutos que se abrem após a maturação São os frutos que não se abrem; podem ser se-
para liberar as sementes; quase sempre são secos cos ou frescos (ex: laranja).
(ex: castanha).

Frutos frescos podem ser:

Baga:  Drupa: 
Frutos que apresentam um ou mais carpelos, Frutos com apenas um carpelo, uma só semen-
com uma ou mais sementes (ex: tomate, uva, laran- te, concrescida com o endocarpo. (ex: ameixa, azei-
ja, abóbora). tona, pêssego).

De acordo com a origem, os frutos são classificados em:

Frutos simples: Frutos múltiplos ou infrutescências:


Derivados de um único ovário de uma flor; po- Frutos que se originam a partir do desenvolvi-
dem ser secos ou frescos, unicarpelares ou multicar- mento de ovários de muitas flores de uma mesma
pelares, deiscentes ou indeiscentes. inflorescência, e crescem juntos, ou seja, unidos (ex:
figo, amora e abacaxi).
Frutos compostos: 
Originários do desenvolvimento do receptácu-
lo de uma única flor, no entanto com muitos ovários
(ex: morango).

48
2.2 Fisiologia vegetal
e órgãos da planta

A fisiologia vegetal é o ramo da botânica que estuda os pro-


cessos e as funções do vegetal, bem como as respostas das
plantas às variações do meio ambiente. Nas plantas vasculares
existem tecidos especializados (cf. figura 30) na condução de
substâncias úteis ao vegetal: o xilema (transporte de seiva bruta)
e o floema (que conduz a seiva produzida na fotossíntese).

As plantas precisam de mecanismos para equi- A existência de tricomas brancos (apêndices epi-
librar a entrada e saída de água – fluxo contínuo ao dérmicos formados por uma ou mais células que pro-
longo da planta. No entanto, existem adaptações na movem a proteção do vegetal) impede que a planta
planta para minimizarem a perda de água por trans- eleve a sua temperatura e aumente a sua taxa de
piração de modo a evitar desidratação. transpiração, pois o facto de serem brancos refletem
mais radiação.
Dentro das adaptações estruturais, temos o es- O enrolamento das folhas, perante situações de
pessamento da cutícula (camada de cutina, substância pouca água, leva a uma menor perda de água porque
impermeável resultante da celulose, na epiderme das a área de superfície em contacto com o meio exterior
plantas) e o desenvolvimento de espinhos que dimi- é reduzida. Isto acontece à custa das células bulifor-
nuem a perda de água por transpiração. mes (células epidérmicas em forma de bolha) que
A localização de estomas (estruturas celulares ficam plasmolisadas, isto é, quando existe perda de
responsáveis pela troca gasosa das plantas com o água reagem diminuindo o seu volume, resultando
meio ambiente) em cavidades e na página inferior no enrolamento da folha, caso contrário, a entrada de
minimizam a perda de água, pois quando colocados água nestas células faria com que estas dilatassem
em cavidades, uma pequena quantidade de água na e a folha abriria.
cavidade leva a um aumento da pressão desta nessa
mesma cavidade, levando à diminuição na taxa de
perda de água.

49
Floema Xilema

Figura 30
Tecidos especializados (Xilema e Floema)

Existem ainda adaptações fisiológicas como a O levar a cabo de outros tipos de fotossíntese pa-
abcisão foliar, queda de folhas que leva à diminuição ra além da dita “normal” (C3), como a C4 e a CAM,
da perda de água, visto que esta acontece principal- o estabelecer de ritmos circadianos de abertura dos
mente ao nível das folhas; e a posição foliar, em que a estomas e que são apenas controlados por mecanis-
orientação da folha varia em relação ao sol (condições mos endógenos, e a produção da fito-hormona ABA
de luminosidade) para estabelecer um equilíbrio entre (ácido abcísico) leva à perda de folhas por parte da
as necessidade fotossintéticas e a perda de água. planta para que esta possa entrar num estado de
latência que facilite a resistência a uma situação de
seca extrema.

50
2.3 Fatores de crescimento,
ciclo vegetativo
e ciclo da cultura

O crescimento e o desenvolvimento das plantas estão rela-


cionados com fatores internos, principalmente as hormonas
vegetais e fatores externos, tais como a luz, água, temperatura,
entre outros.

De entre os fatores internos que influenciam o crescimento das plantas,


é importante salientar:

Auxinas: Ácido abscísico:


Oriundas de meristemas de raízes e gomos, as Produzido nas folhas, o ácido abscísico atua es-
auxinas estimulam o crescimento celular, alongando timulando a abscisão das folhas e também agem ini-
as raízes e os caules das plantas e também atuam bindo a germinação das sementes e desenvolvimen-
no desenvolvimento dos frutos. O ácido indolacético to de gomos. O ácido abscísico também promove o
(AIA) é a principal auxina encontrada nas plantas e fecho dos estomas em plantas com défice de água.
controla muitos processos metabólicos das plantas.

Etileno: Citocininas:
É produzido nos tecidos de raízes e folhas enve- Presente em vários tecidos das plantas, as cito-
lhecidas. Estimula a abscisão das folhas, promove a cinas atuam estimulando a divisão celular, promovem
maturação dos frutos e inibe o crescimento das raí- o desenvolvimento de gomos laterais e retardam o
zes e dos gomos laterais. Quando os frutos iniciam envelhecimento das plantas.
o processo de amadurecimento são produzidos os
etilenos, acelerando o processo.

51
Giberelinas:
Oriundas dos cloroplastos e tecidos das folhas,
as giberelinas atuam ao estimular o alongamento de
caules e gomos, e também no desenvolvimento do
fruto. Possuem como funções principais, promover
a germinação das sementes e estimular a floração
de algumas plantas.

Como fatores externos, consideram-se: a intensidade da iluminação, a dis-


ponibilidade de água e a temperatura do ambiente em que a planta se encontra.

Figura 31
Crescimento da planta

52
3. ECOLOGIA
3.1 Ecologia, população,
habitat, comunidade
biótica e ecossistema

A ecologia é o estudo do “lugar onde se vive”, com ênfase sobre


a totalidade ou padrão de relação entre os organismos e o
seu ambiente.

A palavra “ecologia” deriva do grego oikos, com funcionais que a tornam habitável. Neste capítulo,
o sentido de “casa”, e logos, que significa “estudo”. dar-se-á ênfase a determinados conceitos que inte-
Assim, o estudo do “ambiente da casa” inclui todos gram a ecologia ambiental.
os organismos contidos nela e todos os processos

Sendo assim, destacam-se os seguintes conceitos:

População: Habitat:
Seres vivos da mesma espécie que habitam, ao Lugar onde cada organismo vive (aquático, ter-
mesmo tempo, uma determinada área. restre, entre outros).

Comunidade biótica: Ecossistema:


É o conjunto de populações (de diferentes espé- Interação de diferentes comunidades com o meio
cies) que vivem numa determinada região ao mesmo abiótico formado por fatores físicos e químicos.
tempo, estabelecendo relações entre si, formando
uma comunidade biótica.  

54
3.2 Equilíbrio ambiental

A produção agrícola (alimento, fibras e material para abrigo)


é obtida pelo homem a partir de um sistema naturalmente
montado, formado por três partes principais: o solo, a planta e
o clima.

O interesse nas relações solo-água-planta de- A água possui três valores intrínsecos: econó-
corre do facto de constituírem conhecimento essen- mico, social e ambiental. O valor económico da água
cial e suporte indispensável para aplicações em áreas reflete os custos da sua disponibilização, sendo estes
tão diversas como a agricultura, biologia, hidrologia facilmente calculáveis. Já os valores social e ambien-
e hidrogeologia, engenharia dos recursos hídricos e tal são difíceis de determinar e normalmente igno-
engenharia do ambiente. rados. Um “mercado da água” pressupõe a determi-
A agricultura exerce pressão sobre o meio am- nação do preço da água que reflita, por um lado, os
biente, particularmente sobre a água em termos de custos de disponibilização e, por outro, a disposição
quantidade e de qualidade. As medidas de política do agricultor a pagar.
europeias e nacionais tentam promover o uso sus- Cerca de 80% a 95% da massa de uma planta é
tentável da água apoiando as boas práticas agrícolas; constituída por água. Este é portanto o principal fa-
o solo, as plantas e a atmosfera interagem direta- tor limitador do crescimento vegetal. A fotossíntese
mente uns com os outros, influenciando, reagindo e transpiração são mecanismos nos quais a planta
quimicamente e promovendo alterações físico-quí- perde água, sendo, no entanto, esta perda essencial
micas e biológicas. para os processos fisiológicos da planta.
Um dos principais elementos que interage com
o solo-planta-atmosfera e o mais conhecido e estu-
dado é a água. A melhoria da eficiência da utilização
de água pela agricultura depende em larga medida
de investimentos avultados em infraestruturas e da
adoção de métodos de rega mais evoluídos do que os
tradicionalmente utilizados.

55
3.3 Ecossistema agrícola e o
Homem como modificador
de ecossistemas

N um ecossistema agrícola, são diferenciados um conjunto de


componentes estruturais, entre os quais destacamos:

Abióticos: Bióticos:
Em conjunto constituem o biótopo (ambiente Representados pelos seres vivos que compõem
físico e fatores químicos e físicos). A radiação solar a comunidade biótica ou biocenoses. Compreendem
é um dos principais fatores físicos dos ecossistemas os organismos heterotróficos dependentes da ma-
terrestres pois é através dela que as plantas realizam téria orgânica e os autotróficos responsáveis pela
fotossíntese, libertando O2 para a atmosfera e trans- produção primária, ou seja, a fixação do CO2.
formando a energia luminosa em energia química.

Energia:
Caraterizada pela força motriz que aporta nos
diversos ambientes e garante as condições neces-
sárias para a produção primária num determinado
ambiente, ou seja, a produção de biomassa a partir
de componentes inorgânicos.

O ser humano é o principal agente modificador do meio, adaptando-se


rapidamente e modificando para atender às suas exigências e para satisfazer
as suas necessidades primárias.

56
4. RESÍDUOS E
EFLUENTES DAS
EXPLORAÇÕES
4.1 Resíduos e
efluentes produzidos
pelas explorações

O s resíduos de uma exploração agrícola são os objetos e ma-


teriais que foram utilizados na exploração ou resultam de
operações agrícolas, para os quais não se encontra mais utilidade,
agora ou no futuro, e dos quais o agricultor se quer desfazer.

A agricultura apresenta uma situação generali- Perante a lei, o produtor de resíduos é respon-
zada de abandono e queima de resíduos agrícolas. sável pelo seu destino final (Decreto-Lei 178/2006
Estes fatores contribuem para impactos ambientais de 5 de setembro, com alterações do Decreto-Lei n.º
significativos, como é o caso da contaminação dos 73/2011 de 17 de junho). Os resíduos não devem ser
solos e aquíferos, da propagação de maus cheiros e acumulados na exploração nem em quantidades ele-
incêndios, da transmissão de doenças e um impacto vadas, nem por longos períodos de tempo. Logo que
visual negativo. possível, devem ser encaminhados, através de ope-
Considerando todos estes aspetos e tendo em radores licenciados, para destinos adequados, para
conta a legislação existente (Decreto-Lei 178/2006 reciclagem ou para eliminação, e de forma a não pre-
de 5 de setembro, com alterações do Decreto-Lei judicar o solo, a água, a saúde pública e o ambiente.
n.º 73/2011 de 17 de junho) que responsabiliza os Preferencialmente, devem ser procurados destinos
produtores de resíduos pelo destino final, pelos cus- que permitam a valorização de resíduos.
tos de gestão e transporte e proíbe a sua queima a Ao encaminhar os resíduos da sua exploração,
céu aberto, enterramento e abandono pura e sim- o agricultor e o operador a quem entrega, deverão
ples, é necessário que todas as entidades envolvi- ser acompanhados pelo Guia de Acompanhamento
das assumam um compromisso para sensibilização de Resíduos e Certificado de Receção com estado
dos agricultores. “concluída”, respetivamente, onde consta o tipo de
resíduo, qual a quantidade e as identificações do
transportador e do destinatário (cf. figura 32).

58
Figura 32
Guia de Acompanhamento de Resíduos

59
O transporte destes resíduos pode ser efetuado equiparados aos resíduos domésticos e urbanos e
pelo agricultor, desde que se faça acompanhar pela não contaminados com substâncias perigosas. Deve,
Guia de Acompanhamento de Resíduos, anteriormente porém, informar-se previamente na Junta de Fre-
descrito. Ao agricultor constitui a responsabilidade de guesia ou Câmara Municipal sobre as condições de
manter estas guias acessíveis e em boas condições, utilização do contentor de resíduos que pode colocar,
por um período de cinco anos, para futuras ações de quantidades, tarifas, dias e horários de recolha, etc.
fiscalização.
No caso da utilização de contentores de resíduos Aquisição de guia de resíduos
https://siliamb.apambiente.pt/pages/public/login.xhtml
domésticos, o agricultor deve utilizar apenas o que
se encontrar mais próximo da sua habitação ou ex-
ploração para depositar pequenas quantidades, em Manual de utilizador da plataforma SILIAMB
https://apoiosiliamb.apambiente.pt/content/manual
situações esporádicas, de resíduos da exploração, -de-utilizador-do-módulo-e-gar-0?language=pt-pt

Nas explorações pecuárias, são formados outro tipo de resíduos, designados


por “efluentes pecuários” (EP’s).

Os EP’s, sendo resíduos resultantes da atividade que estabelece as regras sanitárias, de sanidade ani-
agropecuária e, em casos de manuseamento inade- mal e de saúde pública relacionadas com subpro-
quado, representam riscos para a saúde pública e dutos animais não destinados a consumo humano
animal. Este facto cria a necessidade de controlar os aplicáveis à recolha, ao transporte, à armazenagem,
seus núcleos de produção e a sua composição para ao manuseamento, à transformação e à utilização ou
que se possa optar por um destino final ambiental- eliminação de subprodutos animais e à colocação no
mente correto. mercado e, em certos casos específicos, à exportação
Relativamente à gestão dos efluentes pecuários e ao trânsito de subprodutos animais e dos produtos
e de forma a integrar a regulamentação das ativida- deles derivados (artigo 1º) limitando possíveis utiliza-
des pecuárias previstas no Decreto-Lei nº 214/2008, ções indevidas na alimentação animal, no consumo
foi criado um quadro de licenciamento para enca- humano ou na sua eliminação.
minhamento dos efluentes pecuários (Portaria nº A Portaria nº 631/2009 complementa as nor-
631/2009), mantendo-se até hoje válido e em arti- mas de exercício pecuário indo mais além, pois inflige
culação com o Novo REAP (Decreto-Lei nº 81/2013), disposições a cumprir no que à gestão de efluentes
sendo objetivo integrar esta nova portaria com a le- pecuários diz respeito (artigo 3º e artigo 4º). Em con-
gislação vigente, nomeadamente, com o Decreto-Lei creto, legisla o encaminhamento que se dá a esses
nº 122/2006 transposto para o ordenamento jurídico mesmos resíduos, que só pode ser assegurado por
português do Regulamento (CE) nº 1774/2002 do utilização própria ou transferência para terceiros para
Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de outubro, efeitos de valorização agrícola.

60
4.2 Tratamento e eliminação
de resíduos e efluentes

O tratamento adequado dos efluentes pecuários permite a re-


cuperação da energia residual (biogás), reduz as emissões de
odores desagradáveis, diminui os níveis de azoto e permite o
transporte fácil e seguro dos efluentes para regiões distantes ou
quando tenham de ser aplicados noutros processos presente no
anexo II da respetiva Portaria.

Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 178/ Pelo exposto, sempre que um produtor de resí-
2006 de 5 de setembro, com alterações do Decreto- duos pretender encaminhar os seus resíduos a um
Lei n.º 73/2011 de 17 de junho (a designada Lei-Qua- operador deverá aceder ao seguinte site:
dro dos Resíduos) foi criada a Autoridade Nacional
de Resíduos, que prevê, no seu enquadramento le- https://siliamb.apambiente.pt/pages/public/login.xhtml

gislativo, a existência de um “Mercado de Resíduos”


em que a sua gestão adequada contribui para a pre-
servação dos recursos naturais, tanto ao nível da pre- Esta operação irá disponibilizar uma lista de ope-
venção, como através da reciclagem e valorização, radores de resíduos (de acordo com o Código LER)
além de outros instrumentos jurídicos específicos. que possuem licença, passível de serem contactados,
Constitui simultaneamente o reflexo da importância podendo posteriormente selecionar o operador con-
deste setor, encarado nas suas vertentes ambiental soante os seguintes parâmetros: localização (distrito/
e económica, e os desafios que se colocam aos res- concelho) e descrição do resíduo.
ponsáveis pela execução das políticas e a todos os
intervenientes na cadeia de gestão: a Administração
Pública, os operadores económicos e os cidadãos em
geral, enquanto produtores de resíduos e agentes in-
dispensáveis da prossecução destas políticas.

61
4.3 Caraterísticas dos
resíduos e efluentes da
exploração, composição,
valor fertilizante e
impacto ambiental

N uma exploração agrícola são produzidos resíduos muito


diversos em natureza e quantidade, entre os quais: pneus
usados; óleos usados; plásticos agrícolas não perigosos; papel e
cartão; madeira e cortiça; sucatas; pilhas e acumuladores; restos
de construções e demolição; embalagens de produtos fitofarma-
cêuticos ou embalagens de medicamentos para uso veterinário.

Figura 33
Resíduos agrícolas das explorações

62
No caso dos efluentes pecuários, devemos sa- Os efluentes pecuários, contêm uma gama de
lientar que a sua constituição varia com a propor- microrganismos do trato digestivo variada, sendo
ção de fezes e urina, sendo estas influenciadas pela alguns patogénicos. Desta forma, a caraterização nu-
espécie pecuária, estado reprodutivo, sexo e idade tricional dos efluentes deve ser o mais precisa pos-
do animal, pelo regime alimentar, pela qualidade e sível pois, a sua aplicação em terrenos agrícolas está
quantidade de água ingerida, pelo tipo de instalações, condicionada pelo seu conteúdo nutricional, mais es-
pelo material das camas (palhas de arroz, milho ou pecificamente à quantidade de azoto total, fósforo e
serradura), bem como pelo método de limpeza dos potássio. A aplicação é obrigatoriamente realizada de
pavilhões de acordo com o Anexo II do Código das acordo com as necessidades nutricionais da cultura
Boas Práticas Agrícolas (CBPA) (MADRP, 1997). que serão cultivadas até ao final do ano civil seguinte
e com o estado de fertilidade do solo (Rosas, 2003).

Os efluentes pecuários são de vários tipos:

• Excrementos animais (fezes e urina manti- • Restos de alimentos;


dos nas instalações animais) são considera-
dos, de acordo com o Regulamento (CE) nº • Águas de lavagens das instalações;
1069/2009, subprodutos de origem animal
(SPOA), corpos inteiros ou partes de animais, • Materiais utilizados nas camas dos animais;
produtos de origem animal e outros produtos
que provenham de animais que não se desti- • Materiais acumulados nas instalações das ex-
nam ao consumo humano, incluindo oócitos, plorações pecuárias;
embriões e sémen – no entanto, para efei-
tos de aplicação no solo sem transformação • Subprodutos origem animal (SPOA);
como fertilizantes, podem ser considerados o
conteúdo do aparelho digestivo dos animais, • Produtos Derivados (PD) quando utilizados
do leite, do colostro e dos produtos à base de como fertilizantes orgânicos ou corretivos or-
leite, quando a autoridade competente não gânicos (os PD são obtidos a partir de um ou
considerar que apresentam um risco de pro- mais tratamentos, transformações ou fases
pagação de uma doença grave transmissível); de processamento de subprodutos animais,
podendo ser considerados como fertilizantes
• Estrumes: fezes, urina, mato, palha, acrescido as farinhas de carne e osso e as proteínas ani-
da fração sólida de chorume sem escorrência; mais processadas, entre outros);

• Chorumes: fezes, urina, escorrências de silos • Solo (FOCOS) (conforme Reg. nº 1069/2009).
e nitreiras;

63
Segundo Pinto (2014), uma forma de se verifi- após um determinado período de tempo, observa-se
car o valor fertilizante destes resíduos é comparar o desenvolvimento das duas culturas, onde se apli-
culturas com datas de sementeira aproximadas (cf. fi- caram dois tipos de fertilizante diferentes (ex: lamas
gura 34), em que se apliquem fertilizantes diferentes. versus fertilizante orgânicos – estrume).
Ou seja, sendo a sementeira feita no mesmo período,

Figura 34
Avaliação do valor fertilizante
de culturas de milho

No que respeita ao impacto ambiental, este difere de grau de contaminação


poluente consoante o tipo de resíduo agrícola utilizado.

No caso de utilizar lamas, os poluentes condicio- Com em conta a proteção do ambiente, são tam-
nantes da valorização são os metais pesados, os con- bém regulamentadas as quantidades máximas anu-
taminantes orgânicos e os organismos patogénicos. ais de metais pesados que se podem introduzir nos
Por outro lado, nos efluentes pecuários, a carga solos, de acordo com a alínea b) do ponto 14 do Ane-
poluente centra-se na elevada concentração de azoto xo VI da Portaria n.º 631/2009 (referente aos efluen-
sob a forma de nitrato, podendo também apresentar tes pecuários) e a alínea b) do ponto 2 do Artigo 9.º do
contaminação orgânica e patogénica. Decreto-Lei 276/2009 (referente às lamas). Os efei-
No caso do nitrato, este é libertado através da tos que os microrganismos podem causar em caso
incorporação de fertilizantes azotados para a água e de contaminação levam a que, de acordo com a alínea
para o solo em grandes extensões territoriais, uma b) do ponto 14 do Anexo VI da Portaria n.º 631/2009
vez que o azoto não assimilado pelas plantas lixivia (referente aos efluentes pecuários) e com o ponto 1
muito facilmente. do artigo 9.º do Decreto-Lei 276/2009 (referente às
lamas), as lamas e os efluentes pecuários tenham de
cumprir os valores-limite.

64
4.4 Técnicas de tratamento
e de eliminação dos
resíduos e dos efluentes

A valorização de efluentes pecuários em solos agrícolas é o


destino final mais comum, sendo a opção de praticamente
todos os produtores.

Assim, o tratamento dos efluentes pecuários Segundo o artigo n.º4 da Portaria n.º 631/2009
tem como objetivos: de 9 de junho, o encaminhamento, tratamento e
destino final dos efluentes pecuários, incluindo den-
a) Recuperar a energia residual (biogás) presen- tro da própria exploração, podem ser assegurados
te nos efluentes pecuários; pelos seguintes procedimentos:

b) Diminuir o teor de azoto, com o objetivo de a) Tratamento em unidade técnica de efluentes


prevenir uma eventual poluição do solo e das pecuários, em unidade de produção de ferti-
massas de água superficiais e subterrâneas lizantes orgânicos ou em unidade de trans-
em resultado do espalhamento no solo, bem formação de subprodutos (UTS) animais, nos
como de reduzir o odor desagradável; termos do Regulamento (CE) n.º 1774/2002,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3
c) Reduzir as emissões de odores desagradá- de outubro;
veis durante o armazenamento e ou a valo-
rização agrícola; b) Tratamento e descarga nas massas de água
ou aplicação no solo, nos termos do regime
d) Permitir o transporte fácil e seguro dos eflu- de utilização dos recursos hídricos, aprovado
entes pecuários para regiões distantes ou pelo DL n.º 226 -A/2007, de 31 de maio, bem
quando tenha de ser aplicado noutros pro- como da demais legislação aplicável;
cessos (por secagem).

65
c) Tratamento em unidade de tratamento térmi- Na gestão e tratamento dos efluentes pecuá-
co ou de produção de energia ou de materiais, rios, podem ser aplicadas nomeadamente as seguin-
com ou sem recuperação de energia térmica tes técnicas ou processos:
gerada pela combustão, sendo a componen- a) Separação mecânica;
te das camas dos animais constituída essen- b) Arejamento dos efluentes líquidos;
cialmente por biomassa agrícola ou florestal c) Tratamento biológico;
considerada como resíduo vegetal para efei- d) Compostagem;
tos do regime de licenciamento aplicável; e) Compostagem em conjunto com outras ma-
térias de origem vegetal ou animal;
d) Tratamento em unidade de compostagem ou f) Tratamento anaeróbio;
de produção de biogás, nos termos da pre- g) Lagoas anaeróbias;
sente portaria ou no âmbito do regime geral h) Evaporação e secagem;
de gestão de resíduos, aprovado pelo Decre- i) Tratamento térmico;
to-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro. j) Aplicação de aditivos para redução de odores;
l) Outros reconhecidos como adequados.

Devemos ter atenção que a transferência de efluentes pecuários ou de sub-


produtos de origem animal transformados (SPOAT), da exploração de origem
para outra exploração (agrícola ou agropecuária), ou para uma unidade técnica
de valorização de efluentes, é obrigatoriamente acompanhada de um GTEP,
a ser emitida pelos serviços da DRAPN.

A emissão das Guias de Transferência faz-se


através do aplicativo online do formulário eletrónico
na página referente aos “Procedimentos aplicáveis às
atividades pecuárias” no site da DGDAR:

https://www.dgadr.gov.pt/reap/procedimentos-
aplicaveis-as-atividades-pecuarias

66
4.5 Compostagem

A compostagem é um processo de oxidação biológica atra-


vés do qual os microrganismos decompõem os compostos
constituintes dos materiais libertando dióxido de carbono e va-
por de água.

Os objetivos da compostagem são diversos, dos O local escolhido deve ser próximo daquele em
quais se salientam: que o composto irá ser utilizado. Deverá ter água per-
• Converter o material orgânico que não está to pois a chuva pode não ser suficiente para hume-
em condições de ser incorporado no solo num decer convenientemente a pilha.
material que é admissível para misturar com A forma e o tamanho da pilha também influ-
o solo; enciam a velocidade da compostagem, derivado do
• Destruir a viabilidade das sementes de infes- efeito de arejamento e dissipação do calor da pilha.
tantes e os microrganismos patogénicos; O tamanho ideal da pilha pode ser variável, podendo
• Reduzir e estabilizar a matéria orgânica que se ser considerado um bom volume de 1,5m x 1,5m x
destina ao aterro sanitário. 1,5m para a generalidade dos materiais. No entanto,
o volume deve depender do sistema e das tecnolo-
O processo de compostagem ou o processo de gias de compostagem utilizadas.
digestão anaeróbia seguida de compostagem, quan-
do realizado com resíduos apropriados e sob condi-
ções controladas, permite efetuar a valorização de
resíduos orgânicos biodegradáveis, produzindo um
fertilizante – o composto – com elevado valor agro-
nómico e ambiental (APA, 2008).
Segundo Brito (2003), a pilha de compostagem
não deve ficar exposta diretamente ao sol ou vento
para não secar, nem à chuva para não ficar sujeita à
lixiviação de nutrientes. É, portanto, conveniente um
local levemente ensombrado e com cortinas contra
Figura 35
o vento. Pilha de compostagem

67
A aplicação ao solo de compostos orgânicos, resultantes do processo de
compostagem devem atender a um conjunto de caraterísticas:

Caraterísticas físicas: Caraterísticas químicas:


Como propriedades de manuseamento, humi- Como a percentagem de matéria orgânica, índi-
dade, temperatura, odor e cor, propriedades como ces de humificação, poder tampão, relação carbono/
substrato para crescimento vegetal (por exemplo, po- azoto na fase sólida e em extratos aquosos, pH, cap-
rosidade, capacidade para armazenamento de água, acidade de troca catiónica, condutividade elétrica, sais
densidade aparente e textura), entre outras. solúveis, nitratos, nitritos, amoníaco, etileno, ácido
acético, nutrientes minerais, metais tóxicos, poluen-
Caraterísticas biológicas: tes orgânicos, e outros.
Incluindo efeitos na germinação das sementes,
crescimento e composição vegetal, e capacidade de
melhorar a fertilidade biológica do solo.

Figura 36
Resíduos orgânicos utilizados na compostagem

68
4.6 Enquadramento legal e
código de boas práticas

N o âmbito geral dos resíduos da exploração, incluindo o seu


registo e transporte, deve-se atender ao seguinte enqua-
dramento legislativo:

Resíduos: Para consultar a listagem de operadores de


• Decreto-Lei n.º 178/2006 de 5 de setembro gestão de resíduos não urbanos:
– define regras para Gestão de Resíduos;
• Despacho n.º 25292/04 de 14 de novembro https://www.drapc.gov.pt/servicos/
desenvolvimento/files/ra_folheto_info.pdf
– estabelece medidas destinadas a promo-
ver a eliminação de práticas de deposição e
descarga de toda a espécie de resíduos no es-
https://apambiente.pt/residuos
paço rural).

Registo:
• Portaria 1023/2006 de 20 setembro – defi-
ne os elementos que devem acompanhar o
pedido de licenciamento das operações de ar-
mazenagem, triagem, tratamento, valorização
e eliminação de resíduos.

Transporte:
• Portaria n.º 335/97 de 16 de maio – regras
de transporte de resíduos dentro do territó-
rio nacional;
• Despacho n.º 8943/97 de 9 de outubro – in-
dica as Guias a utilizar para o transporte de
resíduos, em conformidade com o art.º 7º da
Portaria n.º 335/97.

69
No âmbito da produção, encaminhamento, armazenamento, transporte e
tratamento dos efluentes pecuários, devemos atender ao seguinte enquadra-
mento legislativo:

Efluentes Pecuários:

• Decreto-Lei n.º 214/2008 de 10 de novembro • Portaria n.º 631/2009 de 9 de junho – esta-


e suas alterações – estabelecem o Regime do belece as normas relativas a:
Exercício da Atividade Pecuária (REAP) nas ex- a) Gestão dos efluentes pecuários das ati-
plorações pecuárias, entrepostos e centros de vidades pecuárias bem como das nor-
agrupamento, bem como as normas a aplicar mas técnicas a observar no âmbito do
às atividades de gestão, por valorização ou licenciamento das atividades de valori-
eliminação, dos efluentes pecuários, anexas a zação agrícola ou de transformação dos
explorações pecuárias ou autónomas, isto é, efluentes pecuários;
às unidades intermédias, aos entrepostos de b) Condições de produção, recolha, arma-
fertilizantes orgânicos, unidades de compos- zenamento, transporte, valorização, tra-
tagem e de produção de biogás; tamento, transformação e destino final
dos efluentes pecuários;
• Despacho n.º 1230/2018, de 5 de feverei- c) Condições que são aplicáveis a outros
ro – aprova e publica o Novo Código de boas fertilizantes orgânicos, nomeadamente
Práticas Agrícolas (CBPA); produtos derivados de subprodutos de
origem animal transformados (SPOAT).

70
4.7 Licenciamento e plano
de gestão de efluentes

O licenciamento de instalações destinadas à transformação ou


eliminação de efluentes pecuários da respetiva exploração
pecuária, constitui parte integrante do processo de licenciamento
dessa exploração.

O licenciamento da atividade de valorização de EP é exigido apenas a


entidades consideradas “Gestoras de EP’s”, designadamente:

• Explorações pecuárias produtoras de EP’s em • Unidade de tratamento térmico de EP’s;


regime intensivo das classes 1 e 2 , com uma
quantidade de produção de efluentes superior • Unidade técnica de EP, unidade de composta-
a 200 m3 de chorume ou 200 t de estrume gem ou de produção de biogás de EP’s, licen-
por ano; ciados no âmbito da citada portaria (Portaria
631/2009).
• Explorações agrícolas autorizadas a efetuar
valorização agrícola de produtos derivados
de transformação de subprodutos de origem
animal (SPA e PD) ou dos fertilizantes que
os contenham;

• Explorações agrícolas autorizadas a efetuar


valorização agrícola de EP em quantidade su-
perior a 200 m3 de chorume ou 200 t de es-
trume por ano;

71
O Plano de Gestão de Efluentes Pecuários (PGEP) a submeter é elaborado
com os seguintes elementos:

a) A descrição, com base no sistema de infor- d) A estimativa das quantidades de efluentes


mação parcelar (iSIP), das unidades de pro- pecuários a serem produzidos pela ativida-
dução consideradas e das parcelas do reque- de pecuária;
rente ou de terceiros destinadas à valorização
e) A estimativa do destino dos efluentes pecuá-
agrícola do efluente pecuário ou dos fertili-
rios, incluindo as quantidades a encaminhar e
zantes orgânicos que contenham SPOAT;
ou a enviar para cada destino;
b) A descrição dos processos e das estruturas
f) Estimativa da quantidade de efluentes pe-
de recolha, redução, armazenamento, trans-
cuários a serem valorizados na exploração
porte, tratamento e transformação ou elimi-
agrícola, em função das opções culturais pre-
nação dos efluentes pecuários;
vistas nos solos considerados no PGEP.
c) A identificação do sistema de registos a ado-
Nota: para aprovação das DRAP territorialmente competentes
tar, que reporte as operações de manutenção, por parte das atividades pecuárias e das explorações agrí-
colas gestoras de efluentes pecuários, nos termos da pres-
de monitorização e de suporte à elaboração
ente portaria.
de relatórios anuais, se aplicável;

As explorações agrícolas consideradas gestoras de efluentes pecuários de-


vem assegurar o registo em “caderno de campo” (ou outro sistema equivalen-
te) que demonstre as quantidades e os locais onde os efluentes pecuários ou os
fertilizantes que contenham SPOAT foram utilizados, em face das necessidades
das culturas em nutrientes, com os seguintes elementos:

a) A data da aplicação; e) Os registos das aplicações de outras fontes


de nutrientes;
b) A origem e as caraterísticas do(s) efluente(s)
pecuário; f) As condições atmosféricas verificadas antes
e depois da aplicação.
c) A identificação da(s) parcela(s), a respetiva
Nota: no âmbito da valorização agrícola de efluentes pecuários,
área e as culturas beneficiadas;
de SPOAT ou de outros fertilizantes que contenham SPOAT, con-
forme previsto no n.º 11 do artigo 9.º.
d) A quantidade aplicada do efluente pecuário e
método de aplicação;

72
5. PRODUÇÃO
AGRÍCOLA
SUSTENTADA
5.1 Proteção integrada

A Proteção Integrada é um modo de proteção das plantas con-


tra os organismos nocivos (pragas, doenças e infestantes)
que utiliza um conjunto de métodos que têm como objetivo sa-
tisfazer exigências económicas, ecológicas e toxicológicas, dando
prioridade à utilização de mecanismos naturais de limitação e a
outros meios de luta apropriados.

A Proteção Integrada tem como finalidade con- culturais, em especial, com a fertilização, instalação
tribuir para o equilíbrio dos ecossistemas agrários e e condução das culturas, regas, podas, mondas dos
impedir que os inimigos das culturas ultrapassem frutos e conservação das colheitas.
intensidades de ataque que acarretem significativos
prejuízos económicos. O grande objetivo é limitar a As normas da produção integrada incluem:
aplicação de produtos fitofarmacêuticos e privilegiar • Os planos de fertilização por parcela e cultura,
os meios de luta biológica, biotécnica, física, genética baseados nas análises de terras e de plantas;
e cultural. • As metodologias de colheita de amostras para
O uso de produtos fitofarmacêuticos como meio análise e determinações laboratoriais;
de luta só pode ter lugar quando o ataque da praga • Os tipos, as quantidades, as épocas e as téc-
ou da doença tenha atingido um nível que provoque nicas de aplicação dos fertilizantes;
prejuízos económicos significativos (nível económi- • Os procedimentos a observar na instalação e
co de ataque), ou quando haja razões tecnicamente condução das culturas (compassos de planta-
válidas, devidamente justificadas, pela importância ção, densidades de sementeira, variedades e
e extensão do inimigo a combater. Nestes casos, só porta-enxertos, podas, monda de frutos, ma-
podem ser utilizados produtos indicados nas “Listas neio da água, condução da rega, conservação
de produtos fitofarmacêuticos aconselhados em pro- dos frutos, etc).
teção integrada das culturas”, publicadas para cada
cultura abrangida. Estas normas incluem procedimentos obrigató-
Os agricultores obrigam-se a articular a proteção rios e facultativos ou de orientação e permitem a sua
integrada com a aplicação correta de outras técnicas atualização ou adaptação periódicas.

74
A publicação da diretiva n.º 2009/128/CE de 21 agroflorestais e incentiva mecanismos naturais de
de outubro, conhecida por “Diretiva Quadro do Uso luta contra os inimigos das culturas”.
Sustentável de Pesticidas” (DUS), veio estabelecer Para a prática da proteção integrada é necessá-
um quadro de ação a nível comunitário para uma uti- rio o conhecimento da cultura, dos seus inimigos, da
lização sustentável dos pesticidas através da redução intensidade do seu ataque, dos diversos fatores que
dos riscos e efeitos da sua utilização na saúde huma- contribuem para a sua nocividade (bióticos, abióticos,
na e no ambiente, promovendo o recurso à proteção culturais e económicos) e dos organismos auxiliares
integrada e a abordagens ou técnicas alternativas, da cultura, de forma a se efetuar, adequadamente,
tais como as alternativas não químicas aos pestici- a estimativa do risco resultante da presença des-
das. Segundo a mesma diretiva, a proteção integrada ses inimigos.
consiste na “avaliação ponderada de todos os mé- De acordo com a diretiva do uso sustentável de
todos de proteção das culturas disponíveis e a sub- pesticidas, os Estados Membros e os utilizadores
sequente integração de medidas adequadas para profissionais devem tomar medidas necessárias pa-
diminuir o desenvolvimento de populações de orga- ra promover uma proteção fitossanitária com baixa
nismos nocivos e manter a utilização dos produtos utilização de pesticidas (compreende a proteção in-
fitofarmacêuticos e outras formas de intervenção a tegrada e o modo de proteção biológico), dando prio-
níveis económica e ecologicamente justificáveis, re- ridade sempre que possível a métodos não químicos,
duzindo ou minimizando os riscos para a saúde hu- e à adoção de práticas e produtos fitofarmacêuticos
mana e o ambiente. A proteção integrada privilegia o de menor risco para a saúde humana, organismos
desenvolvimento de culturas saudáveis com a menor não visados e ambiente.
perturbação possível dos ecossistemas agrícolas e

Desta forma, os utilizadores profissionais devem aplicar obrigatoriamente,


os seguintes princípios gerais de proteção integrada:

1 Aplicar medidas de prevenção e/ou


o controlo dos inimigos das culturas

• Rotação de culturas; • Práticas de fertilização, irrigação, drenagem


• Seleção de parcelas; equilibradas;
• Cultivares resistentes/tolerantes e semen- • Adoção de medidas de higiene;
tes e material certificado; • Proteção dos organismos auxiliares;
• Técnicas culturais adequadas (sementeira • Prevenção dos inimigos das culturas.
direta, mobilização mínima, enrelvamento,
monda química dos frutos);

75
2 Utilizar métodos e instrumentos adequados
de monitorização dos inimigos das culturas

• Observação visual; • Apoio técnico acreditado;


• Informação técnica/científica (com recurso a • Estimativa do risco nas parcelas/culturas.
manuais, e sistemas de aviso);

3 Ter em consideração os resultados da monitorização


e da estimativa do risco na tomada de decisão
Com base nos resultados da monitorização e da Para isso, deve ser disponibilizada toda a infor-
estimativa do risco (em função do número de indiví- mação técnica relativa aos Níveis Económicos de Ata-
duos capturados em armadilha semanal, o modo de que para os principais inimigos/culturas.
atuação e o risco de ataque – não existente, baixo,
moderado, alto), deve-se avaliar a necessidade de
aplicar medidas fitossanitárias e em que momento
do ciclo cultural.

4 Preferir os meios de luta não químicos

Na seleção dos meios de luta, deve ser dada pre- fruta atacada pela mosca da fruta), à luta biológica
ferência aos meios de luta não químicos, sempre que (largada de auxiliares), à luta biotécnica ( reguladores
estes permitam um controlo adequado dos inimi- de crescimento de insetos, feromonas), à luta física
gos das culturas. Neste sentido devemos dar privilé- (mobilização do solo, monda natural de infestantes).
gio, nomeadamente, à luta cultural (enterramento da

5 Aplicar os PF’s mais seletivos atendendo o alvo biológico


em vista e com os mínimos efeitos secundários para a
saúde humana, os organismos não visados e o ambiente

Na tomada de decisão, quando se opta pelos informação para que os utilizadores profissionais de
meios de luta química devem ser selecionados os entre os PF’s mais seletivos escolham aqueles que
produtos fitofarmacêuticos mais seletivos para o al- apresentam menores efeitos secundários para o ho-
vo biológico em causa. A DGAV deve disponibilizar mem, os organismos visados e o ambiente.

76
6 Reduzir a utilização dos produtos fitofarmacêuticos
e outras formas de intervenção ao mínimo necessário

• Evitar tratamentos desnecessários; Estas medidas de redução do risco associadas


• Limitar o uso de PF’s à dose mínima eficaz; ao uso de PF’s devem assegurar que os estragos se-
• Reduzir a frequência de aplicações; jam aceitáveis e permitem evitar o risco de desenvol-
• Recorrer a aplicações parciais ou localizadas, vimento de resistência nas populações dos inimigos
quando aplicável. das culturas.

7 Recorrer a estratégias anti-resistência para manter a eficácia


dos produtos, quando o risco de resistência do produto for conhecido

A problemática da resistência dos inimigos das • Meios de luta alternativos à luta química;
culturas aos PF’s deve ser encarada com alguma • Rotação de culturas;
ponderação e cautela. • Criação de zonas de refúgio;
De entre as várias estratégias para minimizar a • Utilizar dose mínima eficaz (rótulo);
resistência dos inimigos das culturas salientam-se • Respeitar restrições de aplicação do PF im-
as seguintes: postas pelo rótulo;
• Alternância de PF’s com modos de ação;
• Efetuar a monitorização dos níveis de eficá-
cia obtidos.

8 Verificar o êxito das medidas fitossanitárias


aplicadas, com base nos registos efetuados
no caderno de campo

O agricultor deve registar em caderno de campo,


obrigatoriamente todas as operações efetuadas na
parcela no decorrer da campanha.

77
A Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) é a entidade respon-
sável por promover e coordenar as atividades técnicas inerentes à implemen-
tação da proteção integrada das culturas.

Para suportar a aplicação dos princípios gerais a regime das normas técnicas aplicáveis à proteção
DGAV divulgou um documento com o conceito, princí- integrada, produção integrada e modo de produção
pios e componentes de proteção integrada (volume I). biológico, e cria, igualmente, um regime de reconhe-
De acordo com o artigo 55º, do Regulamento cimento de técnicos em proteção integrada, produção
(CE) n.º 1107/2009 de 21 de outubro, os produtos integrada e modo de produção biológico, no âmbito
fitofarmacêuticos devem ser objeto de uma utiliza- da produção agrícola primária, revogando o Decreto-
ção adequada. Este inclui a aplicação dos princípios -Lei n.º 189/95 de 26 de julho.
de boas práticas fitossanitárias e o cumprimento das O Decreto-Lei n.º 37/2013 de 13 de março, pro-
disposições da diretiva 2009/128/CE, em especial os cede à primeira alteração ao decreto-lei n.º 256/2009
princípios gerais da proteção integrada. de 24 de setembro, que estabelece o regime das nor-
Com base nos pressupostos anteriores, todos mas técnicas aplicáveis à proteção integrada, à pro-
os produtos fitofarmacêuticos autorizados em Por- dução integrada e ao modo de produção biológico.
tugal para o combate dos inimigos das culturas são
passíveis de ser utilizados em proteção integrada, A prática da proteção e da produção integradas
devendo ser aplicados os mais seletivos tendo em pressupõe que técnicos e agricultores tenham conhe-
conta o alvo biológico em vista e com o mínimo de cimentos específicos. Para conhecimento dos téc-
efeitos secundários para a saúde humana, os orga- nicos habilitados para tal fim, devemos aceder a uma
nismos não visados e o ambiente. De modo a su- listagem atualizada dos técnicos detentores de for-
portar a escolha do produto fitofarmacêutico mais mação regulamentada para apoio técnico em prote-
adequado, a DGAV divulgou num documento o perfil ção integrada, em produção integrada ou em modo
dos produtos, em particular, a toxicidade para o Ho- de produção biológico no site da DGADR.
mem e organismos não visados, nomeadamente os
organismos aquáticos, aves e outros vertebrados, Para consultar mais informações sobre a práti-
abelhas e outros polinizadores, organismos do solo ca da proteção integrada deveremos consultar o site
e artrópodes auxiliares. da DGAV:
O Decreto-Lei n.º 256/2009 de 24 de setembro
estabelece os princípios e orientações para a práti- https://www.dgav.pt/

ca da proteção e produção integrada, bem como o

78
5.2 Produção integrada

A produção integrada (PRODI) é um “sistema agrícola de pro-


dução de produtos agrícolas e géneros alimentícios de qua-
lidade, baseado em boas práticas agrícolas, com gestão racional
dos recursos naturais e privilegiando a utilização dos mecanis-
mos de regulação natural em substituição de fatores de produ-
ção, contribuindo, deste modo, para uma agricultura sustentável”
[segundo a Organização Internacional de Luta Biológica e Prote-
ção Integrada (OILB), 2004].

A produção integrada tem por base os seguintes princípios:

1. Regulação do ecossistema, importância do 6. Preservação e melhoria da fertilidade intrín-


bem-estar dos animais e preservação dos seca do solo;
recursos naturais;
7. Fomento da biodiversidade;
2. Exploração agrícola no seu conjunto, como
a unidade de implementação da produção 8. Entendimento da qualidade dos produtos
integrada (PRODI); agrícolas como tendo por base parâmetros
ecológicos, assim como critérios usuais de
3. Atualização regular dos conhecimentos dos qualidade, externos e internos;
agricultores sobre produção integrada;
9. Proteção das plantas tendo obrigatoriamen-
4. Manutenção da estabilidade dos ecossiste- te por base os objetivos e as orientações da
mas agrários; proteção integrada;

5. Equilíbrio do ciclo dos nutrientes, reduzindo 10. Minimização de alguns dos efeitos secun-
as perdas ao mínimo; dários decorrentes das atividades agrícolas.

79
Quando aplicados nas explorações agrícolas, os e rastreabilidade, assegurando, simultaneamente, o
princípios da produção integrada visam a obtenção de desenvolvimento fisiológico equilibrado das plantas
produtos agrícolas sãos, de boas caraterísticas orga- e a preservação da qualidade do ambiente.
noléticas e de conservação, de modo a respeitar as
exigências das normas nacionais e internacionais re-
lativas à qualidade dos produtos, segurança alimentar

Produção integrada vegetal


Para a prática da produção integrada encontra- de instalação, material vegetal, técnicas de condução
-se estabelecido, um conjunto de normas técnicas, da cultura, rega, fertilização e regras relativas à pro-
que definem aspetos relativos à produção, designa- teção fitossanitária, entre outros.
damente: escolha e localização do terreno, operações

Quanto à componente vegetal, deve obedecer-se aos seguintes critérios:

1 O material destinado à plantação ou sementeira deve ser certificado


de acordo com as normas oficiais em vigor, garantindo nomeadamente
a sua homogeneidade e estado sanitário

a) É obrigatório o uso de variedades inscritas d) Para as espécies de hortícolas consideradas


no Catálogo Comum de Variedades de Espécies no Catálogo Comum de Variedades de Espécies
Hortícolas ou de Espécies Agrícolas ou no Catá- Hortícolas é obrigatório utilizar sementes da
logo Nacional de Variedades; categoria certificada ou da categoria standard;
b) Para as espécies não contempladas nestes e) Para as espécies agrícolas ou hortícolas não
catálogos recomenda-se a utilização de va- contempladas nestes catálogos recomenda-
riedades inscritas em Listas oficiais dos Esta- -se que as sementes a utilizar sejam de sub-
dos Membros ou em Listas de variedades dos metidas a ensaios de germinação e pureza
produtores; para avaliação da sua qualidade.
c) Para as espécies de fruteiras recomenda-se
a utilização de variedades inscritas em Listas
oficiais dos Estados Membros ou em Listas de
Variedades dos Produtores;

80
2 A densidade de plantação ou sementeira deve ser adequada
às caraterísticas edafoclimáticas da região

a) A utilização de uma variedade bem adapta- c) O cultivo de variedades inadaptadas às nos-


da às condições locais da exploração agrícola sas condições edafoclimáticas, com um ciclo
é essencial ao sucesso da cultura; vegetativo desajustado à irregularidade do
b) A introdução de novas variedades deve ser clima e suscetibilidade a doenças e pragas,
sempre sujeita ao conhecimento das suas ca- contribuem para a quebra da produção e obri-
raterísticas e comportamento agronómico; gam ao aumento da aplicação de PF’s.

3 As culturas permanentes devem ser podadas de modo


a obter-se um desenvolvimento uniforme e equilibrado

4 A estratégia de fertilização e rega deve ser


orientada para a nutrição adequada das culturas

a) Deve estabelecer-se, para a exploração agrí- c) Quanto às rotações das culturas anuais, para
cola, um plano de fertilização e um plano de as quais já existam normativos específicos
rega, por parcela homogénea e cultura, no apresentados e discutidos em Conselho Téc-
caso das culturas perenes, ou por rotação, nico, devem aplicar-se os princípios estabele-
no caso das culturas anuais, no qual são de- cidos para essas mesmas famílias.
finidos, os tipos, as quantidades, as épocas
e as técnicas de aplicação dos fertilizantes e
água, os quais devem ser revistos periodica-
mente em função das análises de solo e água
e da planta;
b) A rotação apropriada de culturas constitui um
processo eficaz para a redução substancial da
ocorrência de inimigos das culturas (infestan-
tes, pragas e doenças), bem como de manter
ou aumentar a fertilidade do solo, contribuin-
do para a melhoria do rendimento económico
da cultura;

81
5 Os fertilizantes a aplicar devem obedecer às normas legais vigentes,
devendo, em especial, ser isentos ou possuir teores muito baixos
de metais pesados ou de outras substâncias perigosas para o
ambiente, e ser apenas usados fertilizantes com micronutrientes
quando a sua necessidade for tecnicamente reconhecida

a) Para a prática da fertilização racional é neces- atingir níveis de produção considerados acei-
sário conhecer o teor do solo em nutrientes, táveis, tendo em conta a fitotecnia utilizada.
a par de outras caraterísticas físicas e quími- As amostras para análise foliar, devem ser
cas do solo; colhidas de acordo com os procedimentos es-
b) É necessário conhecer as necessidades da tabelecidos, sendo as determinações analíti-
cultura em nutrientes, a qualidade da água de cas a solicitar aos laboratórios as seguintes:
rega, a composição dos corretivos orgânicos azoto, fósforo, potássio, cálcio, magnésio,
e o comportamento dos fertilizantes quando ferro, manganês, zinco, cobre e boro. Para
aplicados ao solo; decidir sobre as quantidades dos nutrientes
c) Em produção integrada, e no caso das cultu- a aplicar, é essencial conhecer, para além do
ras de ar livre, é obrigatório uma análise de estado de fertilidade do solo, as quantidades
terra de quatro em quatro anos, aconselhan- de nutrientes que são veiculadas pela água
do-se a realização de uma análise anualmen- de rega, sendo necessária a sua análise;
te, para avaliar o estado de fertilidade do solo; g) A análise da água de rega é obrigatória, de
d) Para as culturas protegidas é obrigatória a quatro em quatro anos, salvo nos casos em
realização de uma análise de terra anualmen- que os resultados analíticos indiciem teores
te, aconselhando-se uma segunda análise no de alguns parâmetros que excedam os valo-
fim do ciclo de cada cultura; res máximos recomendados pelo Decreto-Lei
e) O solo fornece nutrientes minerais em for- nº 236/98 de 1 de agosto, caso em que se
mas disponíveis para as plantas – em siste- aconselha a monitorização anual de tais pa-
mas de produção intensiva são, muitas vezes, râmetros. A amostra da água de rega acom-
necessárias quantidades superiores às dis- panhada da respetiva ficha informativa con-
ponibilizadas através da mineralização dos forme os anexos VI e VII do Decreto-Lei n.º
minerais e decomposição da matéria orgâni- 236/98, deve ser colhida de acordo com os
ca, pelo que o nível de nutrientes no solo, em procedimentos estabelecidos, sendo as de-
especial de azoto, fósforo e potássio, tem de terminações analíticas a solicitar aos labora-
ser aumentado através de fertilizações; tórios as seguintes: bicarbonatos, boro, clore-
f) As análises foliares devem ser feitas todos os tos, condutividade elétrica, razão de adsorção
anos e são recomendáveis sempre que a cul- de sódio, magnésio, nitratos, pH e sódio;
tura apresentar aspetos anómalos ou não

82
h) Recomenda-se, além disso, a determinação j) A utilização de lamas de depuração só é per-
do ferro, do manganês, dos sulfatos e dos só- mitida se for proveniente de ETAR’s (Esta-
lidos em suspensão, sempre que se obser- ções de Tratamento de Águas Residuais) tra-
vem entupimentos do equipamento de rega. tadas, de acordo com as normas legais em vi-
Por outro lado, e sabendo que, de um modo gor (Decreto-Lei nº 118/2006 de 21 de junho,
geral, em Portugal, os solos são pobres em anexo VIII – Quadro IV);
matéria orgânica, aconselha-se a sua aplica- l) As amostras dos estrumes, lamas e com-
ção sempre que os seus teores no solo sejam postos preparados exclusivamente a partir
inferiores a 1,0%; de resíduos de origem vegetal e ou animal
i) A aplicação de estrumes e outros corretivos provenientes de explorações agrícolas, agro-
orgânicos deverá ser antecedida da sua aná- pecuárias ou florestais, tal como das indús-
lise, de forma a poderem ser contabilizadas trias agroalimentares e da celulose, deverão,
nas recomendações de fertilização as quan- acompanhadas da respetiva ficha informativa,
tidades de nutrientes veiculadas por aqueles ser enviadas ao laboratório para análise, sen-
produtos e verificada a presença de alguns do as determinações analíticas a solicitar as
metais pesados em teores que, eventual- seguintes: matéria seca, carbono orgânico,
mente, impeçam a sua utilização como ferti- azoto total, fósforo total, potássio total, cálcio
lizantes. As analises só devem ter lugar para total, magnésio total e zinco total.
produtos da exploração porque todos aque-
les que são sujeitos a comercialização estão
obrigatoriamente sujeitos a realizar análises
a pedido do fabricante ou do comercializador.
A amostra de estrumes e outros corretivos
orgânicos acompanhada da respetiva ficha
informativa, deve ser colhida de acordo com
os procedimentos estabelecidos;

6 A proteção fitossanitária das culturas em produção


integrada rege-se pelos princípios da proteção integrada

83
Produção integrada animal
No que respeita à componente animal é neces- e alimentação animal, a profilaxia e saúde animal e a
sária a aplicação de técnicas que estabelecem um gestão de efluentes de origem animal.
adequado equilíbrio e salvaguarda do bem-estar ani-
mal, devendo ter em conta, nomeadamente, o maneio

Nas Normas de Produção Integrada – Componente Animal, são considerados


as seguintes caraterísticas gerais:

• Identificação dos animais rastreabilidade ca- • Profilaxia e cuidados veterinários;


derno de campo;
• Bem-estar dos animais (reprodução, maneio
• Maneio dos animais, conservação do solo e e instalações);
dos ecossistemas;
• Gestão e maneio dos resíduos.
• Alimentação dos animais (no mínimo ¾ da ali-
mentação – matéria seca deve ser de origem
de campos de produção integrada);

O exercício da produção integrada implica de- De acordo com o Decreto-Lei n.º 180/95 de 26
terminadas obrigações e compromissos aos agricul- de julho e legislação complementar, é obrigatório o
tores que devem ser registados em caderno próprio agricultor anexar os comprovativos da aquisição dos
denominado “caderno de campo”. Este deve obe- produtos fitofarmacêuticos e fertilizantes e os bo-
decer ao modelo oficial estabelecido pela entidade letins emitidos pelos laboratórios que efetuaram as
competente. Aconselha-se o registo da ocorrência análises exigidas. É obrigatório o agricultor facultar o
dos estados fenológicos da cultura, das operações caderno de campo às entidades competentes, sem-
culturais efetuadas e as datas em que tenham sido pre que solicitado, de acordo com a legislação em vi-
realizadas, da incidência dos inimigos da cultura, dos gor. Este responsabilizar-se-á, com a sua assinatura,
auxiliares e da aplicação de produtos fitofarmacêuti- pela veracidade das operações registadas no caderno.
cos e fertilizantes. Aconselha-se também atualizar o
caderno de campo semanalmente.

84
Controlo e certificação
O controlo das regras e dos princípios aplicá- A lista de Organismos de Certificação pode ser
veis e a certificação dos produtos obtidos segundo a consultada no site do IPAC (Instituto Português de
produção integrada, antes da colocação no mercado, Acreditação), na secção “Entidades acreditadas” em
encontram-se delegadas em organismos de controlo nas subsecções “Produtos da agricultura, floresta e
e certificação reconhecidos pela DGADR. De forma a pesca” e “Produtos alimentares, bebidas e tabaco”:
assegurar a aplicação uniforme e eficaz do sistema
de controlo, a DGADR dispõe de procedimentos do- http://www.ipac.pt/

cumentados para a delegação de tarefas nos orga-


nismos de controlo e para a respetiva supervisão,
com vista à avaliação do desempenho operacional
dessas entidades de controlo, e ao garante do res-
peito pelas disposições regulamentares.
Para assinalar os produtos agrícolas e os pro-
dutos alimentares obtidos de acordo com as regras
de produção integrada, foi desenvolvido um logótipo
(cf. figura 37) que se destina a assinalar os produtos
oriundos desta modalidade de produção (Despacho
n.º 10935/2005 de 22 de abril).

Figura 37
Símbolo da Produção Integrada

85
5.3 Modo de produção
biológico

A produção biológica é um sistema de gestão das explorações


agrícolas e de produção que combina melhores práticas am-
bientais, a biodiversidade, a preservação dos recursos naturais,
a preocupação pelo bem-estar dos animais e métodos de produ-
ção utilizando substâncias e processos naturais.

De acordo com o Regulamento CE nº 834/


2007 (CE, 2007):
“A produção biológica é um sistema global de
gestão das explorações agrícolas e de produção de
géneros alimentícios que combina as melhores prá-
ticas ambientais, um elevado nível de biodiversida-
de, a preservação dos recursos naturais, a aplicação
de normas exigentes em matéria de bem-estar dos
animais e método de produção, em sintonia com
a preferência de certos consumidores por produtos
obtidos utilizando substâncias e processos naturais.
O método de produção biológica desempenha, assim,
um duplo papel, visto que, por um lado, abastece um
mercado específico que responde à procura de pro-
dutos biológicos por parte dos consumidores e, por
outro, fornece bens públicos que contribuem para a
proteção do ambiente e o bem-estar dos animais,
bem como para o desenvolvimento rural.”
Figura 38
A cobertura do solo com palhas e outros materiais orgânicos
é uma das práticas culturais utilizadas na agricultura biológica

86
Os principais objetivos a cumprir no modo de produção biológico são:

1 Preservação dos recursos 5 Promover o bem-estar


naturais/ecológicos e sanidade animal

• Equilíbrio ecológico;
• Manutenção e aumento da biodiversidade dos
6 Reciclar os resíduos vegetais e
ecossistemas;
animais obtidos na própria exploração
• Reciclagem de nutrientes;
• Não utilização de OGM’s (organismos geneti- • Recorrer ao enterramento direto ou à com-
camente modificados). postagem (preferencial);
• Restituição ao solo dos elementos nutritivos
assimiláveis pelas plantas;
2 Combinação das melhores • Reduzir ao mínimo a utilização de recursos
práticas ambientais não renováveis.

• Utilização de organismos vivos e métodos de


produção mecânicos;
7 Trabalhar o solo
• Prática de cultivo de vegetais e produção ani-
mal adequados. • Cobertura do solo, especialmente em terrenos
com inclinação e no período outono/inverno;
• Evitar mobilizações ao mínimo necessário;
3 Promoção da vida e da fertilidade • Evitar reviramentos das camadas do solo;
dos solos • Não utilizar alfaias que trabalhem a uma pro-
fundidade superior a 20 cm;
• Ecossistemas como alimento;
• Privilegiar práticas que promovam melhora-
• Método de produção com recurso a substân-
mento da estrutura do solo.
cias e processos naturais.

8 Conservação da água de rega


4 Manter, melhorar e controlar
a fertilidade • Correto uso da água e a gestão racional dos
recursos hídricos.
• Fertilização orgânica constitui a base da fer-
tilização do solo;
• Melhoria do solo do ponto de vista físico, quí-
mico e biológico.

87
Na vertente da pecuária biológica, os principais objetivos a cumprir são:

1 Fornecimento de matérias orgânicas 3 Cumprimento das normas


e nutrientes aos solos/culturas bem-estar animal

• Melhoria das propriedades químicas/físicas e • Criação de condições para as necessidades


biológicas do solo; comportamentais inerentes a cada espécie;
• Desenvolvimento sustentável da agricultura. • Gestão da sanidade animal (para prevenção
de doenças);
• Acesso a espaços livres (pastagens).
2 Alimentação animal baseada com
produtos biológicos da própria
exploração ou outras explorações
com mesmo modo de produção

Figura 39
Os animais devem ter acesso a espaços livres como pastagens em Agricultura Biológica

88
No que respeita ao enquadramento legislativo, Quanto ao controlo dos inimigos das culturas,
podemos é imperativo ressalvar que o referencial dever ser dada preferência à aplicação de meios de
europeu da agricultura biológica é constituído pelos proteção preventivos (artigo 12º, do Regulamento n.º
Regulamentos (CE) nº 834/2007 e 889/2008 e suas 834/2007, de 28 de junho), nomeadamente: cultu-
alterações. Estabelecendo o Regulamento (CE) nº rais, biológicos e biotécnicos.
834/2007 as normas relativas à produção biológica e No entanto, sempre que não seja possível, pro-
à rotulagem dos produtos biológicos e o Regulamen- teger adequadamente as culturas, com base nestes
to (CE) nº 889/2008 estabelecendo normas de exe- meios de luta, podem ser utilizados produtos fitofar-
cução do Regulamento (CE) nº 834/2007, no que res- macêuticos homologados, com base nas substân-
peita à produção biológica, à rotulagem e ao controlo. cias ativas constantes do anexo II do Regulamento
Na Europa, a Agricultura Biológica é alvo de le- n.º 889/2008, de 05 de setembro.
gislação específica, estabelecendo normas detalha- Ter em atenção que sempre que o agricultor os
das cujo cumprimento é controlado e certificado por utilizar, deverá justificar no caderno de campo a ne-
organismos acreditados para o efeito. O Eurofolha cessidade de utilizar os referidos produtos. E no caso
(cf. figura 40) é o símbolo que identifica obrigatoria- da utilização de armadilhas ou distribuidores, é de
mente todos os produtos alimentares biológicos pré- realçar que estas últimas, devem impedir a liberta-
-embalados na União Europeia. Este novo logótipo, ção de substâncias no ambiente e o contacto com
obrigatório desde 1 de julho de 2012, veio substituir as culturas.
o tradicional selo circular, que até aqui foi usado de
forma voluntária.

Figura 40
Logotipo europeu de Agricultura Biológica (Eurofolha)

89
CONCLUSÃO
A s discussões sobre os impactos ambientais e sociais da agri-
cultura convencional, juntaram-se às questões de foro am-
biental globais. Para fomentar a atividade é necessário o aumento
de pesquisas integradas sobre as práticas agrícolas sustentáveis
mais adequadas a cada região.

Só adotando métodos agrícolas mais sustentá- Uma mudança desta natureza, exige que se po-
veis, é que os agricultores conseguirão produzir ali- nham de parte os métodos convencionais de agricul-
mentos suficientes para satisfazer as necessidades tura intensiva e se adote o sistema conhecido como
de uma população crescente e responder às altera- agricultura de conservação ou sustentável.
ções climáticas.

Figura 39
Representação de um sistema agrícola sustentável

91
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