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1º PERÍODO

ARTE E CULTURA
POPULAR
AUTORAS

Maria Generosa Ferreira Souto


Doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – PUC-SP, mestre em Letras: Estudos Literários pela
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, especialista em Língua
Portuguesa, especialista em Educação Básica, especialista em Educação
Especial Inclusiva. especialista em Literatura Luso-brasileira e graduada
em Licenciatura Plena em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais – PUCMinas. Atualmente é professora titular da Universidade
Estadual de Montes Claros – Unimontes e designada do Instituto Superior
de Educação de Montes Claros. É organizadora da Revista - Vínculo da
Unimontes. É conselheira efetiva do Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão – Cepex da Unimontes.

Mona Lisa Duarte


Mestre em Desenvolvimento Social pela Universidade Estadual de Montes
Claros – Unimontes, especialista em Comunicação, Estratégias e
Linguagens pela Unimontes e graduada em Jornalismo pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais – PUCMinas. Atualmente é
professora do Centro Regional de Estudos em Ciências Humanas - Crecih e
das Faculdades Integradas Pitágoras de Montes Claros – FIPMoc.
SUMÁRIO
DA DISCIPLINA

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 367
Unidade I: Cultura: um signo plural de inesgotável travessia . . . . . 371
1.1 Todo mundo tem cultura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 371
1.2 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 392
1.3 Vídeos sugeridos para debate . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 393
Unidade II: Cultura popular: a festa popular do artesanato e as diversas
manifestações regionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 394
2.1 As festas populares somos nós mesmos . . . . . . . . . . . . . . . 394
2.2 Festas religiosas às margens do Jequitinhonha e do São
Francisco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 404
2.3 Arte popular: mãos modeladoras, corpos que falam . . . . . 411
2.4 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 415
Unidade III: Manifestações do folclore nos Vales do Jequitinhonha e do
São Francisco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 416
3.1 Compreendendo ps signos da “tradição” e do “folclore”. . . 416
3.2 Principais características do folclore . . . . . . . . . . . . . . . . . 424
3.3 O que diz a Constituição de 1988 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 424
3.4 Lendas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 436
3.5 Casos ou “causos”. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 437
3.6 Anedotas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 438
3.7 Folclore poético. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 439
3.8 Folclore Linquístico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 452
3.9 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 464
Unidade IV: Cultura popular: de povo à massa . . . . . . . . . . . . . . . 465
4.1 Povo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 465
4.2 Cultura popular na idade média e no renascimento . . . . . . 468
4.3 A massa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 470
4.4 A intermediação dos meios de comunicação de massa . . . . 471
4.5 Folkcomunicação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 473
4.6 Arte e a indústria cultural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 474
4.7 Adorno e a indústria cultural. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 474
4.8 Walter Benjamin e a responsabilidade técnica da arte. . . . . 478
4.9 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 480
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 483
Referências básica, complementar e suplementar . . . . . . . . . . . . 487
Atividades de Aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 493
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
Unidade I: Cultura: um signo plural de inesgotável travessia . . . . . . 17
1.1 Todo mundo tem cultura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.2 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
1.3 Vídeos sugeridos para debate . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
Unidade II: Cultura popular: a festa popular do artesanato e as diversas
manifestações regionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
2.1 As festas populares somos nós mesmos . . . . . . . . . . . . . . . . 40
2.2 Festas religiosas às margens do Jequitinhonha e do São
Francisco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
2.3 Arte popular: mãos modeladoras, corpos que falam . . . . . . 57
2.4 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
Unidade III: Manifestações do folclore nos Vales do Jequitinhonha e do
São Francisco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
3.1 Compreendendo ps signos da “tradição” e do “folclore”. . . . 62
3.2 Principais características do folclore . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
3.3 O que diz a Constituição de 1988 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
3.4 Lendas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
3.5 Casos ou “causos”. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
3.6 Anedotas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
3.7 Folclore poético. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
3.8 Folclore Linquístico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98
3.9 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110
Unidade IV: Cultura popular: de povo à massa . . . . . . . . . . . . . . . 111
4.1 Povo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
4.2 Cultura popular na idade média e no renascimento . . . . . . 114
4.3 A massa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116
4.4 A intermediação dos meios de comunicação de massa . . . . 117
4.5 Folkcomunicação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119
4.6 Arte e a indústria cultural . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 120
4.7 Adorno e a indústria cultural. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 120
4.8 Walter Benjamin e a responsabilidade técnica da arte. . . . . 124
4.9 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 126
Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
Referências básica, complementar e suplementar . . . . . . . . . . . . 133
Atividades de Aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139
APRESENTAÇÃO

Caro(a) cursista,

Seja bem-vindo(a) à disciplina ARTE E CULTURA POPULAR,


com uma Carga Horária de 90 horas/aula, cuja ementa propõe a
investigação sobre as manifestações populares; busca da compreensão
sobre o folclore e suas diversas manifestações regionais; reflexão sobre a
arte e o povo, e a cultura de massa.
A disciplina tem como objetivo geral desenvolver a percepção e a
sensibilidade do acadêmico a partir da arte, do folclore, da cultura de
massa e da cultura popular, de modo a fazer pleno uso destas
aprendizagens no contexto da sua futura prática pedagógica. É necessário
tecer considerações acerca da Arte e da Cultura Popular, do ponto de vista
antropológico. Procuramos proporcionar-lhe uma visão geral da arte e da
cultura popular, fornecendo-lhe a base que fundamentará e motivará suas
práticas pedagógicas na utilização do rico patrimônio imaterial do Brasil e
da região norte das nossas Gerais. Nela você encontrará noções básicas
para compreender o folclore no Brasil, em Minas Gerais e, principalmente,
o folclore regional, interpretado como manifestações culturais tradicionais,
entendendo a noção de cultura popular definida pelo Centro Popular de
Cultura em termos exclusivos de transformação, revivescendo o norte de
Minas Gerais e o Vale do Jequitinhonha.
Sabemos que a Pluralidade Cultural é um dos temas transversais
propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC). Como a
sociedade brasileira é formada por diversas etnias, a pluralidade cultural é
um tema especialmente importante. O desafio é respeitar os diferentes
grupos e culturas que compõem o mosaico étnico brasileiro, incentivando
o convívio dos diversos grupos e fazer dessa característica um fator de
enriquecimento cultural. Com base nos PCNs, a disciplina objetiva estudar
os temas da cultura e da arte popular, dos mais variados, desde a
representação do sagrado e místico, como nas figuras de santos e ex-votos,
passando por cenas do cotidiano, como nas esculturas de cerâmica ou
madeira, até nas indumentárias e artefatos de festas folclóricas, como no
Bumba-meu-boi, Festa dos Reis dos Temerosos (ou Cacetes); Festa do
Divino Espírito Santo; Festas de Agosto, Festa dos Catopés e Festa de São
Gonçalo de Amarante, no Vale do São Francisco.
Trataremos, ainda, de apresentar as manifestações populares
enquanto um conjunto de costumes, de tradições, de usos da arte do povo,
das festas religiosas, das danças, dos mitos, dos causos, das lendas, das

367
Apresentação UAB/Unimontes

paremiologias, dos provérbios, dos ditados, das quadrinhas, das


mnemonias, dos desafios e repentes, do artesanato e das manifestações
artísticas regionais, tudo isso que ainda se encontra preservado através da
tradição oral, por um povo de um país ou região.
Dentro do estudo da arte, a arte popular tem sido encarada como
a “prima pobre” da arte erudita, devido à sua origem junto a comunidades
consideradas “sem instrução”. As manifestações da arte popular como o
artesanato, a cerâmica em argila, as peças de madeira, as xilogravuras na
literatura de cordel etc. têm sido consideradas como “artes menores” em
relação à arte erudita e as pessoas que produzem esse tipo de arte não são
reconhecidas como artistas e, sim, como artesãos. Porém, Roger Chartier
(1995) defende que a cultura popular é uma categoria erudita,
ressaltando que “Queira-se ou não, esta categoria leva a perceber a
cultura que ela designa como tão autônoma quanto as culturas longínquas
e como situada simetricamente em relação à cultura dominante, letrada,
elitista, com a qual forma um par” (CHARTIER, 1995, p.13).
As informações abordadas serão fundamentais na discussão dos
principais conceitos de cultura e de folclore, elaborados pela Antropologia.
É indiscutível que o conhecimento científico estimula a atitude crítica e, por
isso, mesmo, em boa medida, contribui para o exercício da cidadania nas
sociedades contemporâneas. Ao assim proceder, a Arte e a Cultura
Popular, como código simbólico, apresenta-se como dinâmica viva. Todas
as culturas estão em constante processo de reelaboração, introduzindo
novos símbolos, atualizando valores, adaptando seu acervo tradicional às
novas condições historicamente construídas pela sociedade. Dessa forma,
no sentido antropológico do termo, afirmamos que todo e qualquer
indivíduo nasce no contexto de uma cultura e, ao longo de sua vida, ajuda
a produzi-la, cada qual a seu modo, no jeito simples de ser da coletividade.
Por isso, chamaremos de pluralidade cultural, que sem dúvida, todos
vivemos, ensinamos e aprendemos. É trabalho de valorização de
características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que
convivem no território brasileiro
Quanto à Metodologia, significativamente você vai perceber que a
temática das Artes e da Cultura Popular é muito importante para a
investigação do processo educacional. Evidentemente, buscamos
evidenciar nesta disciplina que o conhecimento da Pluralidade Cultural na
escola habilita o educador a compreender a sua função e, sobretudo, a
orientar convenientemente a análise do patrimônio imaterial, dos valores,
da alteridade, da sensibilidade, da intencionalidade, da memória, da
cidadania e do respeito.
Assim, você, acadêmico de Artes Visuais, deverá ter em mente que
a disciplina é muito importante para sua formação humanística/
artística/científica, para compreensão da relevância de se estudar, valorizar
e respeitar a diversidade sociocultural no processo educativo perpassado
pelos ensinos fundamental e médio. Várias sugestões serão oferecidas em

368
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

cada unidade a ser desenvolvida, tais como: orientações de estudo, leituras


para aprofundamento, temas para os fóruns e chat's, vídeos, links para
sites relacionados com o tema da disciplina, atividades a serem realizadas
na semana presencial, atividades práticas, atividades para os seminários.
Esta disciplina apresenta quatro unidades. Cada unidade está
dividida em subunidades:

Unidade I: Cultura - um signo plural de inesgotável travessia


Unidade II: Cultura Popular - a festa popular do artesanato e as
diversas manifestações regionais
Unidade III: Manifestações do folclore nos Vales do Jequitinhonha
e São Francisco
Unidade IV: Cultura Popular - de Povo à Massa

Quanto às Avaliações, você realizará: Avaliação de Aprendizagem


(AA), ao final de cada unidade; Avaliações On-line (AO) e Avaliações
Semestrais (AS), através de questões reflexivas ao longo do período,
observando os temas tratados e os objetivos propostos. Você deverá
perceber que as questões para discussão e reflexão são muito importantes,
e acompanham o texto, bem como as sugestões para o ambiente de
aprendizagem, ao fórum, acesso a bibliotecas virtuais na web, etc. As
sugestões e dicas estão localizadas junto ao texto, aparecendo com os
seguintes itens:

DICAS PARA REFLETIR

B GC
ATIVIDADES GLOSSÁRIO E
A F
A leitura dos textos complementares indicados também é
importante, uma vez que indicam os possíveis desenvolvimentos e
ampliações para o estudo e a discussão. São recursos que podem ser
explorados de maneira eficaz por você, pois visam a promover atividades
de observação e de investigação que permitam desenvolver competências
e habilidades próprias da análise antropológica e exercitar a leitura e a
interpretação de fenômenos sociais e culturais.
Nessa discussão estamos interessados em sua valorização
profissional e em incentivá-lo(a) a aplicar o apreendido em sua prática
imediata, além de utilizar vídeos e TV para a sua formação continuada. Ao
planejar esta disciplina consideramos que estas questões e sugestões
seriam fundamentais, de forma que familiarize o acadêmico,
gradativamente, com a visão e os procedimentos próprios da disciplina.

369
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Desejamos a você sucesso no estudo e na sua prática pedagógica.


Esperamos que você tenha êxito nos estudos e que possa integrar cada vez
mais a cultura à prática pedagógica. Leia tudo, abra espaços para a
interação com os colegas, faça questionamentos e construa leituras
críticas.
Agora é com você. Bom estudo!

As autoras.

370
1
UNIDADE 1
CULTURA: UM SIGNO PLURAL DE
INESGOTÁVEL TRAVESSIA

1.1 TODO MUNDO TEM CULTURA

Caro cursista, nesta primeira unidade você conhecerá uma vasta


discussão em torno do signo “Cultura” e os seus diferentes significados,
importantes para a sua travessia, nesta disciplina que ora se inicia. São
tecidas algumas definições de cultura, para que você possa compreender
no que consiste a disciplina, e melhor relacioná-la à Cultura Popular, e
compreender as relações com a cultura de massas e a indústria cultural,
que serão estudadas nas próximas unidades. Acompanhe a leitura
atentamente e verá que na lateral do texto há dicas de estudo, glossário,
reflexão e atividades propostas. Nessa discussão estamos interessadas em
sua valorização profissional e em incentivá-lo(a) a aplicar o aprendido em
sua prática imediata.
Objetivos específicos:
apreender os vários conceitos de cultura;
?
avaliar as concepções de culturas erudita, popular e de massa;
?
compreender a tradição X transformação das mafinestações
?
de arte;
analisar os signos povo, arte, folclore e cultura popular; e
?
perceber o caráter estético da produção artística na sociedade
?
contemporânea.
Toda disciplina acadêmica possui conceitos essenciais que devem
ser bem assimilados pelos estudantes a fim de que compreendam melhor
os temas propostos. Para que o diálogo sobre “arte e cultura popular” seja
mais produtivo, você deve apreender alguns assuntos associados a essa
discussão, tais como: os conceitos de cultura, folclore, tradição, cultura de
massa e outros. Após conhecer os estudos produzidos sobre os temas
relacionados à disciplina, você deverá ser capaz de construir e reconstruir
problematizações próprias.
O primeiro conceito a ser apresentado será o de “cultura”. A
palavra deriva do verbo latino colere, sendo inicialmente o ato de cultivar e
cuidar da terra, agricultura. Por extensão, associa-se aos cuidados com a
criança e sua educação. Também se estendia ao cuidado com os deuses, o
culto (CHAUÍ, 1986, p. 129).
Há uma flagrante analogia entre as etapas do cultivo de um
terreno e a formação da cultura humana. Com efeito, a cultura de um
terreno pressupõe sua limpeza de toda sujeira e ervas daninhas, a aragem
e o cultivo dos vegetais desejados. Algo análogo se passa com a formação
da cultura dos homens e dos povos.
Antes de mais nada, a boa cultura exige que se limpem as
inteligências de todos os erros e falsas opiniões - ervas daninhas de nossas

371
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

mentes - que comprometem tudo o que nelas venha a ser plantado. Após,
será preciso "arar" nossas inteligências, habituando-as a pensar.
Gradativamente, a “cultura” vai se distanciando da natureza e se
aproximando dos atos humanos. Essas ações humanas elevam o homem a
estágios civilizacionais superiores. Por isso, a “cultura” é vista como
conhecimentos adquiridos através de indagações racionais para que se
“evolua” cada vez mais. Nesse sentido é que se diz que “fulano tem
cultura”, e “sicrano não tem”; ou que “os índios estão num estágio cultural
atrasado”, enquanto a “Europa é culturalmente superior”. É fácil perceber
o quanto existe de preconceito na utilização do termo com esse sentido, no
qual se percebe sentimentos de superioridade entre os povos e as pessoas.

Figura 01: Lavradores.

O significado de cultura mais antigo aborda o refino, a boa


educação, a formação intelectual e humana, tem a sua correspondência
nos gregos e latinos, ligado a educação do homem como tal, isto é, a
educação às “boas artes” próprias do ser humano e que o diferenciam de
todos os outros seres animados. A cultura na Grécia antiga é a procura e a
realização que o homem faz de si, fortemente filosófica.
B GC A busca por um novo sentido para a “cultura” partiu
GLOSSÁRIO E
principalmente da antropologia e é fundamental para os estudos da
A F cultura popular. Sob esta perspectiva não há homens sem cultura. Além
Antropologia é um campo
disso, “permite comparar culturas e configurações culturais com entidades
de estudo das ciências
iguais, deixando de estabelecer hierarquias em que inevitavelmente
sociais que busca
existiriam sociedades superiores e inferiores (DAMATTA, 1986, p. 127)”.
compreender o homem. A
Ao iniciarmos o debate, é interessante que você atente-se à
antropologia social é o
definição pioneira de Edward Burnett Tylor, sob a etnologia, (ciência
estudo do Homem
relativa especificamente do estudo da cultura). A cultura, no entanto, seria
enquanto produtor e
“o complexo que inclui conhecimento, crenças, arte, morais, leis, costumes
transformador da natureza.
e outras aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como membro da
(DAMATTA, 1987, p. 32)
sociedade”. Portanto, corresponde, neste último sentido, às formas de
organização de um povo, seus costumes e tradições transmitidas de

372
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

geração para geração que, a partir de uma vivência e tradição comum, se


apresentam como a identidade desse povo. O comportamento dos
indivíduos depende de um aprendizado, de um processo chamado
endoculturação ou socialização.
Pessoas de raças ou sexos diferentes têm comportamentos
diferentes não em função de transmissão genética ou do ambiente em que PARA REFLETIR
vivem, mas por terem recebido uma educação diferenciada. Assim,
podemos concluir que é a cultura que determina a diferença de Na verdade, Tylor
comportamento entre os homens. formalizou uma idéia que
O homem age de acordo com os seus padrões culturais, ele é vinha crescendo desde o
resultado do meio em que foi socializado. Para Edward Tylor iluminismo. John Locke, em
(1871),Cultura é o todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, 1690, afirmou que a mente
moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos humana era uma caixa
pelo homem enquanto membro de uma sociedade.Tylor foi o primeiro a vazia no nascimento,
formular o conceito de cultura do ponto de vista antropológico da forma dotada de capacidade
como é utilizado atualmente. Ele enfatizou a idéia do aprendizado na sua ilimitada de obter
definição de cultura. conhecimento, através do
Para Burke (1989), houve uma ampliação do conceito em tempos que hoje chamamos de
mais ou menos recentes. Escreve o historiador que até o século XVIII, o endoculturação.
termo cultura tendia a referir-se à arte, à literatura e música (...), hoje
contudo seguindo o exemplo dos antropólogos, os historiadores e outros
usam o termo "cultura" muito mais amplamente, para referir-se a quase
tudo que pode ser apreendido em uma dada sociedade, como comer,
beber, andar, falar, silenciar e assim por diante (BURKE,1989:25). DICAS
O tempo passa e Malinowski (1965) afirma que a cultura não é
estática e que acompanha as modificações da sociedade; desta forma
conclui-se que a organização formal é dinâmica e assim se transforma de Acesse o Núcleo de
acordo com as interações sociais. Antropologia Urbana da
A necessidade de encontrar os significados das relações entre os Universidade de São Paulo
elementos da cultura de uma organização e que dão sentido ao quotidiano (USP):
das mesmas justifica o apelo ao estruturalismo, do qual Geertz (1989) é um www.n-a-u.org/indexb.html.
dos representantes. Para Geertz (1989: 15) o conceito de cultura é
essencialmente semiótico, que vem de encontro com o pensamento de
Max Weber, quando diz "que o homem é um animal amarrado a teias de
significados que ele mesmo teceu". Geertz concebe a cultura como uma
"teia de significados, ressaltando " que o homem tece ao seu redor e que o
amarra. Essa teia orienta a existência humana.
A cultura, segundo Geertz (1989), é pensada como sistema
simbólico, claramente possível pelo isolamento histórico de grupos
humanos, expressa as relações próprias da comunidade, passando por
gerações, até caracterizar-se por um sistema integrado de ações conjuntas,
identificadas por sua ideologia, crenças, expressões, formas de ser e estar.
Já Bourdieu (1989) sustenta a construção coletiva totalmente
influenciada pela representação explícita e da expressão verbal. Interpretar
as culturas significa interpretar símbolos, mitos, ritos.

373
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

À luz da Filosofia, a cultura é o resultado dos modos como os


diversos grupos humanos foram resolvendo os seus problemas ao longo da
história. Cultura é criação. O homem não só recebe a cultura dos seus
antepassados como também cria elementos que a renovam. A cultura é
um fator de humanização. O homem só se torna homem porque vive no
seio de um grupo cultural. A cultura é um sistema de símbolos
compartilhados com que se interpreta a realidade e que conferem sentido
à vida dos seres humanos.
Em Ciências Sociais, cultura apresenta-se como o aspecto da vida
social que se relaciona com a produção do saber, da arte, do folclore, da
mitologia, dos costumes, bem como à sua perpetuação pela transmissão
de uma geração à outra.
Para a Sociologia, o conceito de cultura tem um sentido diferente
do senso comum. Sintetizando, simboliza tudo o que é aprendido e
partilhado pelos indivíduos de um determinado grupo e que confere uma
identidade dentro do seu grupo de pertença. Não existem culturas
superiores, nem culturas inferiores pois a cultura é relativa, designando-se
em sociologia por relativismo cultural, isto é a cultura do Brasil não é igual à
cultura portuguesa, por exemplo: diferem na maneira de se vestirem, na
maneira de agirem, têm crenças e valores distintos. Enquanto que na
Antropologia, entende-se a cultura como o totalidade de padrões
aprendidos e desenvolvidos pelo ser humano.
Nessa visão antropológica, pode-se definir a cultura como rede de
significados que dão sentido ao mundo que cerca um indivíduo, ou seja, a
sociedade. Essa rede engloba um conjunto de diversos aspectos, como
crenças, valores, costumes, leis, moral, línguas, etc. Nesse sentido, pode-
se chegar à conclusão de que é impossível que um indivíduo não tenha
cultura, afinal, ninguém nasce e permanece fora de um contexto social,
seja ele qual for. Apesar da dificuldade que os antropólogos enfrentam
para definir a cultura, não se discute a sua realidade.
A cultura se desenvolveu a partir da possibilidade da comunicação
oral e a capacidade de fabricação de instrumentos, capazes de tornar mais
eficiente o seu aparato biológico. Isto significa afirmar que tudo o que o
homem faz, aprendeu com os seus semelhantes e não decorre de
imposições originadas fora da cultura.
As culturas são diferentes e sinalizam para as diversas maneiras
que os povos e as pessoas encontram para se relacionar, resolver seus
problemas, conviver entre si e com o ambiente, cultuar os seus deuses,
produzir seus materiais simbólicos de identificação e os instrumentos
necessários à comunidade em questão.
Todas as culturas possuem códigos de identificação que vão sendo
assimilados desde o primeiro ano de vida. Eles são impostos às pessoas e
compreendidos naturalmente. Um dos códigos de identificação mais
importantes de uma cultura é a língua. Quando se aprende uma língua
naturalmente, no processo de socialização, aprende-se a dominar uma

374
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

complexa estratégia lingüística desenvolvida para que cada povo se


entenda e se comunique. Sendo a língua um código/ produto cultural, o
português do Brasil e de Portugal tem particularidades que dizem respeito
às suas culturas e por isso não são iguais. De outra maneira, quando se
inicia o aprendizado de uma língua estrangeira, inicia-se também o
aprendizado de uma nova cultura porque não é possível uma tradução
literal de palavras. A língua traduz como pensa um povo e os povos pensam
diferente. Assim com se alimentam diferente, rezam diferente e dão
diferentes significados para as ações.
É exemplar a história de um professor alemão que num
intercâmbio cultural ficou muito impressionado com os laços de amizade
mantidos no Brasil entre professores e alunos. Interpretou a atitude de
aproximação das alunas como abertura para poder “namorá-las”. Do
outro lado, as alunas perceberam que este professor estava “excedendo” e
comunicou suas atitudes à coordenação do curso. Ele interpretou mal o
código de convívio daquela cultura.
Veja que Arantes (2004, p. 24) diz que “significação e valores são
da essência da cultura.” Verificamos, também, que, simplificadamente,
“no sentido antropológico, a cultura é um conjunto de regras que nos diz
como o mundo pode e deve ser classificado (DAMATTA, 1986, p. 125).”
Como se vê, mesmo dentro de uma cultura nacional que têm na língua sua
identificação maior, existem vários códigos de identificação particulares.
Por isso, fala-se em culturas regionais, cultura de periferia, cultura
popular etc. que significa que cada um desses segmentos tem redes de
significação e identificação próprias. A produção de cultura se dá em todos
os níveis, basta que ajam pessoas querendo construir significações sociais
juntas.
Carlos Rodrigues Brandão, em entrevista concedida à Rede Brasil,
Salto para o Futuro, esclareceu qual o sentido de cultura e de cultura
popular.
Segundo Brandão, cantos, danças, pinturas rupestres ou então,
fotografias digitais, crenças, filosofias, visões de mundo, tudo aquilo que
nós construímos com as imagens, com os símbolos, com os significados,
com os sentidos, com os saberes, os sentimentos, que nós, inclusive,
partilhamos quando habitamos uma cultura. Para ele, tudo isso faz parte
de uma outra dimensão da cultura que nos acompanha e nos torna
humanos. Nós não apenas criamos cultura enquanto seres humanos,
quando aprendemos a nos colocarmos frente a natureza e a transformá-la.
Mas também estamos rodeados, cercados, o tempo, todo, de símbolos, de
significados.
Para Brandão, as culturas não têm todas o mesmo destino e não
devem seguir todas a mesma trajetória, assim como as pessoas que nós
convivemos não estão todas condenadas a viverem de um modo
semelhante ou igual, a estudarem de um único modo, a crerem num único
Deus, e da mesma maneira. O que faz a imensa riqueza da experiência

375
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

ATIVIDADES Cruzar as pernas

Observe os hábitos No código das boas maneiras no Brasil velho era proibido cruzar as
pernas, uma sobre a outra. Denunciava claro abandono às normas
culturais da sua região.
essenciais da educação severa e nobre, dando a impressão
Compare-os com hábitos desfavorável de uma intimidade que ultrapassa os limites da
de outras regiões e outros confiança familiar. As meninas e mocinhas do meu tempo
países. recebiam a recomendação expressa e categórica de jamais pôr
uma perna em cima da outra. Valia um ultraje para os preceitos
fundamentais dos Bons Modos. Se alguma, mais espevitada e
trepidante, fingia esquecer o dogma e punha a perna cruzada, era
fatal o bombardeio dos olhares reprovativos e, sempre que possível,
um bom e discreto beliscão, avisador da infringência. Fui educado
com essas exigências. Menino e rapaz, “não passava a perna”
diante de gente de fora, visitantes ilustres, convidados de categoria
solene. Minha mãe, afável e simples, nos dias serenos dos seus
oitenta anos, nunca se atreveu a tomar essa posição,
delirantemente delituosa. Um dos elogios comuns ao Presidente
Arthur Bernardes (1922- 1926) era jamais violar essa regra no
Catete ou fora dele. Não se recostava no espaldar da poltrona e não
era capaz de descansar uma perna, cruzando-a na outra. Os
antigos ficavam encantados com essa obediência ao estilo de
outrora, quando havia gente bem-educada. As meninotas e
mocinhas sentavam-se hirtas, verticais, durinhas como bonecas de
Nuremberg, os pezinhos juntos, os joelhos unidos, omoplatas sem
esfregar nas costas da cadeira. Sabiam estar, sem assumir atitude
de quem se aninha para fazer sono.

CASCUDO, Luís da Câmara. História dos nossos gestos. São Paulo:


Global, 2003, p. 198.

humana é que, ao contrário dos gorilas, ou dos chipanzés, nascemos seres


de uma mesma espécie com diferenças inexistentes, dentro daquilo que,
antigamente, se chamava de raças.
Brandão indaga: “O que eu tenho de meu? O que nós temos de
nosso para mostrar como o que é nosso, como aquilo que nós criamos e
que nos faz iguais a ingleses, a iranianos, a mexicanos e argentinos, porque
todos de uma mesma espécie humana, mas diferentes, porque é uma
gente de um lugar, socializada dentro de uma língua, com costumes, com
gramáticas sociais, com visões de mundo, com tradições culturais próprias.
O que nós temos para mostrar, em grande medida é, primeiro: a cultura do
lugar, a cultura paranaense, cultura mineira, cultura carioca e, depois,
dentro de cultura do lugar, as diferentes culturas que eu posso vivenciar, em
Belém do Pará, em São Luiz, no Rio de Janeiro e em qualquer outra
cidade”.
Ele ressalta que somos seres únicos, somos absolutamente
idênticos do ponto de vista de identidade, do ponto de vista de inteligência
e de desenvolvimento, somos potencialmente de uma mesma espécie. Por
outro lado, nós hoje em dia compreendemos que, cada pessoa, isso vale

376
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

inclusive para as crianças e os jovens de uma turma de estudante, cada


pessoa, cada uma de nós, quem quer que seja, independentemente de
quem seja, do ponto de vista de qualquer classificação ou preconceito, é
uma fonte absolutamente original, peculiar e única de conhecimento, de
saber, de vivência, de experiência. E se isso é verdadeiro com uma pessoa,
diante de outra pessoa, na relação entre as culturas é mais ainda.
As culturas não são desiguais, não há uma hierarquia, as culturas
indígenas não são culturas rústicas, ou sertanejas, empobrecidas e as
culturas rústicas e sertanejas não são culturas civilizadas empobrecidas.
Elas são culturas diferenciadas, a relação entre elas é uma relação entre
diferenças. As nossas culturas populares, que também são plurais, muitas
vezes nós usamos essa palavra no singular, como uma espécie de um
grande guarda-chuva para falar do povo brasileiro em oposição a essas
culturas eruditas, acadêmicas, e assim por diante. Mas, na verdade, tal
como acontece com as línguas, que são uma dimensão da cultura, dentre
outras, elas são plurais, elas são múltiplas. Diz que a grande riqueza da
experiência humana é que somos iguais, mas somos absolutamente
diferentes naquilo que nos iguala.

Figura 02: Dança de São Gonçalo em São Francisco.

1.1.1 O eu e o outro
PARA REFLETIR

A partir do momento em que se aprende a ser membro de uma


Observe as atitudes
determinada cultura, os hábitos culturais do “outro” serão no mínimo
etnocêntricas das pessoas
estranhos ao “eu”. Um brasileiro ficaria chocado de saber que na Coréia é
que convivem com você.
comum comerem carne de cachorro, já que no Brasil, dependendo da casa
Discuta em grupo.
ele é quase um membro da família. Por outro lado, o churrasco do

377
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

brasileiro não seria possível na Índia, porque lá a vaca é um animal


sagrado. Apesar de diferentes, não é possível classificar uma ou outra
maneira de viver como correta ou errada. Ao se julgar a cultura do outro a
partir dos nossos parâmetros estaremos agindo de forma etnocêntrica.
Os antropólogos chamam de etnocentrismo “a visão do mundo
onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os
outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos
modelos, nossas definições do que é a existência”(ROCHA, 1994, pág. 7).
Acreditar que o “outro” está errado porque pensa e vive diferente
do “eu” é colocar-se numa posição de superioridade no contato cultural.
Isso destrói culturas, até mesmo povos inteiros que não tem como se
defender da imposição cultural.
Ocorreu com os índios no Brasil e ocorre diariamente, não da
mesma forma, mas com a mesma força simbólica, quando se escuta que é
necessário abandonar hábitos atrasados e adotar o estilo de vida dos
países “desenvolvidos”. O problema do etnocentrismo é que o “outro” é
pensado sempre como melhor ou pior do que o “eu”, nunca como igual.
Na visão etnocêntrica, o “eu” não se coloca no lugar do “outro” para ver
como o seu mundo funciona; ele olha para o outro, a partir daquilo que
aprendeu nos grupos culturais que freqüenta e julga se este “outro” é
melhor ou pior do que ele.
A visão etnocêntrica não se restringe ao contato entre povos
diferentes. Ela também está presente no cotidiano, em atitudes de
preconceito e intolerância. Fatos como espancamento de homossexuais e
prostitutas demonstram como é difícil a aceitação das ações e escolhas do
“outro”.
Qual é a alternativa ao etnocentrismo? Aprender a relativizar.
Como diz Rocha, compreender que “as verdades da vida são menos uma
questão de essência das coisas e mais uma questão de posição (1994, pág.
20)” Relativizar é “não transformar a diferença em hierarquia, em

Figura 03: Menino negro de tradições africanas.

378
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

superiores e inferiores ou em bem e mal, mas vê-la na sua dimensão de


riqueza por ser diferença (ROCHA, 1994, pág. 20)”.
Analisar qualquer cultura que seja diferente da cultura do “eu”
exige um trabalho constante de relativização. Deve ser feito na
compreensão da cultura popular. Para além dos trabalhos acadêmicos,
nas relações sociais, relativizar é o único caminho para que os homens
possam viver em paz.

ATIVIDADES

Assistindo e sendo humilhado


Leia o texto e discuta sobre
Ferréz as atitudes etnocêntricas
descritas pelo autor.
Na verdade, eu já pensava em escrever este texto uns quatro anos
atrás, desde que fui ao cinema com dois amigos, um deles era o Alex, assistir ao
filme Um Dia de Treinamento, com Denzel Washington.
Quando acabou o filme, eu tava tão nervoso, tão irritado, que na hora
que o Alex elogiou o filme eu simplesmente saí andando.
Os caras já sabem como sou e foram perguntar o que tinha
acontecido, disse que, como o Alex sendo um cara negro num tava revoltado
vendo um filme, onde o único cara bom é o branco de olho azul, que passa um dia
inteiro com outro policial negro que o ensina a bater em latinos e em outros
negros.
Mas na verdade ele tinha gostado tanto do filme, que junto com o
outro parceiro nem ligaram pro que eu tava falando.
Depois disso, foram inúmeras vezes que abandonei sessões pela
metade, filmes que me davam nojo, vontade de pegar meu dinheiro de volta no
cinema ou na locadora, assim como alguns filmes feitos atores negros que
passam na TV, estereotipando o povo negro como se todos bebessem e
fumassem maconha, além de incentivar a violência e desvalorizar as mulheres.
Oh! Malcolm, ainda bem que você não está vendo isso.
O seriado que passa no SBT, a família tem sete jovens estadunidenses
(todos loiros), um olha pro outro e fala como o irmão é burro e completa:
- Desse jeito, você não passa de ser presidente do México.
Já no filme O Exorcismo de Emily Rose, o ajudante da advogada de
defesa fala em certa parte do filme:
- A maioria dos casos de exorcismo é no Terceiro Mundo, claro, gente
primitiva e supersticiosa!

Ferréz é escritor. Acesso em http: //ferrez.blogspot.com.


Fonte: Revista Caros Amigos / fevereiro de 2008.

379
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Campeões do mau gosto

Ferréz

E não pára por aí, até em desenhos a gente é contaminado, no desenho


Super Amigos, os maiores heróis da Terra (todos eles estadunidenses) enfrentam a
grande Rainha Negra Vudu, com todo tipo de colar, magia e tudo que tem direito.
Agora, um dos filmes campeões em preconceito e no mau gosto é Um
gigolô por Acidente na Europa.
Quando o personagem principal (estadunidense) amarra outro
personagem (europeu) num poste com a frase: “Viva a América, a Europa fede a
bosta.”
Em seguida, os europeus passam e jogam coisas nele, o chamando de
porco.
E o filme segue pregando a guerra étnica.
No mesmo filme, num ônibus, quando o personagem principal vê um
senhor tocando acordeom, sai com uma das mãos no nariz e a outra coçando a
cabeça e diz:
- É a dança dos negros sujos.
Já no filme Dois é bom, três é demais, o personagem Dupret,
interpretado por Owen Wilson, quando vai dar uma palestra na escola, no trecho
que fala das profissões, toda vez que cita uma profissão a câmara mostra uma
criança branca, quando fala na parte do esporte, a câmara focaliza um menino
negro.
Mas o pior ainda vem, quando, ao se referir a não gostar de trabalhar,
ele cita a Europa e a América do Sul, dizendo que “nós entendemos bem isso”,
depois diz que conheceu uma mina argentina e lá todo mundo fica à toa na vida.

Ferréz é escritor. Acesso em http: //ferrez.blogspot.com.


Fonte: Revista Caros Amigos / fevereiro de 2008.

380
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

O rato e o sapo

Ferréz

De volta aos desenhos animados, a Dreanworks é campeã no


preconceito, vou pegar só um exemplo que já basta, o desenho Por água
abaixo, que traz a história de um ratinho rico que morava sozinho e descobre
um mundo muito mais divertido no esgoto (alusão à solitária elite e a tão
superlotada favela?). A história se passa, até que aparece um assassino, que
é um sapo e francês. Quando o grande vilão, que também é um sapo, conta
sua história triste, sobre como ele era um sapo muito querido do príncipe
Charles e acaba sendo jogado na privada, antes de terminar a história ele
nota o rosto de chacota do assassino francês e pergunta: “Você está
zombando do meu sofrimento?” E o francês responde: “Claro, desde que
não seja o meu sofrimento, afinal sou francês”.
Em seguida, o francês toma um gole de vinho francês e cospe no
chão, desdenhando do vinho. O desenho segue com dezenas de tiradas
sobre os europeus.
Depois, seguindo a trilha de desgosto, ainda posso citar a série
The Shield, sobre o cotidiano de policiais americanos, que passa no AXN.
Numa das cenas, o policial entra na casa de um latino e vê que todos os
mantimentos estão podres, e logo diz: “Vocês do Terceiro Mundo não têm
geladeira em seu país, não? Que nojo!”
Ou o trecho do seriado recém-lançado Jericho, que trata de uma
explosão nuclear em alguns Estados americanos, e de alguns sobreviventes
numa pequena cidade.
Em um capítulo recente, o ex-prefeito aparta uma briga de dois
moradores e grita algo como: “Nós não nos tornaremos selvagens como os
animais de Terceiro Mundo em suas vilas”.
Será que, além de não poder escolher ao que assistir, em
nenhuma grade de programação, em nenhum canal, pago ou não, apesar
de todos os canais serem somente “concessões”, não poderemos sequer
deixar de ser humilhados todo tempo?
Isso, sem mencionar o tanto de bandeira estadunidense que a
gente já engoliu nos filmes, toda hora tem que ter algo para nos lembrar que
eles são “superiores”. Como uma verdade absoluta, a gente vinha engolindo
legenda atrasada, legenda errada, falta de legenda e por aí vai, que numa
eterna tradução a gente vai aprendendo à força que ou fala e lê em inglês, ou
não sabemos qual lanche pedir, em que loja está sale, ou em promoção, ou
como vamos arrumar um work, ou trabalho, e parece mesmo que deixamos
de ser colônia de um, para ser do outro.
Este texto na verdade é infindável, porque, sempre que estou
assistindo a algum filme ou seriado, identifico o preconceito nele e corro para
somar mais no texto, mas, como todo filme, tudo tem um fim.
Espero mais filmes nacionais, mais seriados, mais produções
honestas, que, ao contrário da produção deles, somente traga histórias para
entreter, sem maldade, sem querer fazer ninguém de fantoche, nem magoar
nenhuma etnia.
Só espero que os bilhões gastos nas produções hollywoodianas
sirvam para lago além de tentar provar que eles são superiores a nós o tempo
todo.

Ferréz é escritor. Acesso em http: //ferrez.blogspot.com.


Fonte: Revista Caros Amigos / fevereiro de 2008.

381
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

1.1.2 Os níveis de cultura

Uma das maneiras de estudar a cultura das sociedades modernas


é através da sua classificação em níveis diferentes. A divisão se dá
basicamente em três níveis: alta, média e baixa cultura ou erudita, de
massa e popular.
Louis Porcher diz: “Não há duvida de que até uma época recente a
arte (vista aqui não como produto, mas sim como cultura), sempre teve na
sociedade uma conotação aristocrática, enquanto exercício de lazer e
marca registrada da elite”. A alta cultura é representada por produtos
culturais de vanguarda, de difícil fruição: livros de linguagem elaborada e
inovadora, como Guimarães Rosa; músicas complexas como às de Bach e
Beethoven. O circuito da alta cultura é dos “letrados”, dos intelectuais.
Associando-se à classe social, a alta cultura é a cultura de elite.
Contrapondo-se à alta cultura estaria a cultura popular, que
representa a produção artística e cultural do “povo”. O povo não tendo
acesso a redes complexas de elaborações de sentidos – diga-se escola e
valores hegemônicos produz uma arte mais simples, porém autêntica e
voltada para o seu universo social. Batuques, lundus, repentes podem ser
aqui identificados.
Historicamente, a oposição sempre foi entre a cultura erudita e a
cultura popular, ou a cultura dos pobres e a cultura dos ricos, ou a cultura
dos exploradores e a cultura dos explorados. O desenvolvimento dos meios
de comunicação de massa e o acesso facilitado ao consumo originaram
uma nova categoria de análise dentro dos estudos sobre a produção e o
consumo cultural nas sociedades modernas. A cultura média ou cultura de
massa absorve tanto a cultura de elite quanto à cultura popular e difunde-
as aleatoriamente através dos meios de comunicação de massa para um
público mediano. Nesse contexto, a cultura de massa tenta produzir
objetos que sejam acessíveis a um público médio, a todas as classes. Uma
das críticas que se faz é quanto à homogeneização, ao nivelamento por
baixo que formaria opiniões superficiais, pessoas superficiais.
Particularmente, rebaixa a alta cultura, a medida que a simplifica para
uma fruição maior entre a massa. Segundo Tinhorão (2001),“a indústria
procura refletir não a verdade de cada uma das camadas sociais, mas
produzir – através da diluição de informação cultural – uma média capaz
de ser apreciada e compreendida por uma maioria de pessoas englobadas
sobre o nome de massa [...] Não satisfaz de maneira profunda, mas
garante a aceitação geral” (TINHORÃO, 2002, p. 159).
A cultura de massa surgiu com o capitalismo com a divisão de
burgueses e proletários. Contudo é onde começa o consumismo irracional,
que através da Indústria Cultural permitiu que nos tornássemos 'escravos
da mídia'. É importante sabermos sobre cultura de massa, quem faz parte
dela, de que maneira nos atinge e como nos tornamos massa ao invés de
público. O que a indústria cultural percebeu mais tarde e Adorno constatou

382
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

que ela possuía a capacidade de absorver em si os antagonismos e


propostas críticas, em vez de combatê-lo. Desta forma, sim, a cultura de
massa alcançaria a hegemonia: elevando ao seu próprio nível de difusão e
exaustão qualquer manifestação cultural, e assim tornando-a efêmera e
desvalorizada.
A “censura”, que antes era externa ao processo de produção dos
bens culturais, passa agora a estar no berço dessa produção. A cultura DICAS
popular, em vez de ser recriminada por ser “de mau gosto” ou “de baixa
qualidade”, é hoje deixada de lado quando usado o argumento
mercadológico do “isto não vende mais” — depois de ser repetida até O capitalismo dos séculos
exaurir-se de qualquer significado ideológico ou político. XVIII e XIX passa por uma
Podemos dizer que, por sua vez, a cultura de massa tem o seu grande mudança, já que se
habitat no campo da comunicação de massa (teatro, biblioteca, museu...) caracteriza pelo sistema de
em parceria com a mass media (áudio, audiovisual,), que são os veículos produção, onde a mão de
da propaganda, os quais manipulam a cultura de massa ou sociedade de obra é forçada a vender a
consumo. sua força de trabalho. A
Veja você, a distinção entre arte e cultura de massa, pois admite Revolução Industrial
clareza em diversos exemplos. Compare-se um concerto de violinos e uma iniciada na Inglaterra
partida de futebol. fortalece o sistema
capitalista e solidifica suas
raízes na Europa e em
outros países. O
consumismo vem logo após
com “a conduta capitalista
e não– capitalista que
respeita o consumo”
(citação de Weber).

Figura 04: Dínamo Esporte Clube, cedida pelo ex-jogador Juca


Brandão.

No contexto da indústria cultural — da qual a mídia é o maior


porta-voz — são totalmente distintos e independentes os conceitos de
“popular” e “popularizado”, já que o grau de difusão de um bem cultural
não depende mais de sua classe de origem para ser aceito por outra. A
grande alteração da cultura de massa foi transformar todos em
consumidores que, dentro da lógica iluminista, são iguais e livres para
consumir os produtos que desejarem. Dessa forma, pode haver o
“popular” (produto de expressão genuína da cultura popular) que não seja
popularizado (“que não venda bem”, na indústria cultural) e o
“popularizado” que não seja popular (vende bem, mas é de origem
elitista).

383
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Além das diferenças de instrumentos e da extensão, algo os


distingue mais fundamentalmente: o primeiro foi feito para valer como
uma obra culturalmente elevada, exigindo do espectador uma
concentração e uma sobriedade tal, que é necessário travar um diálogo
vivo com a obra para que ela seja entendida, o que significa gostar dela
pelo que a faz ser uma obra de arte, pois ela se coloca como um enigma a
ser desvendado.
A arte é sempre um desafio, não se colocando nunca como algo
que possa ser fruído de modo imediato, uma vez que requer certa
frequentação, uma preparação em termos de comprometimento histórico,
um processo analítico e interpretativo.
Já um jogo de futebol ou hit de sucesso, no entanto, é algo
concebido para render dinheiro, como uma mercadoria, da qual se
pretende obter aceitação dos usuários. Estes não se situam em uma classe
específica, nem precisam ter uma determinada formação ou estar
concentrados para compreender o sentido da obra em questão.
O público-alvo dessas obras é o que se caracteriza como massa:
uma quantidade indefinida e cada vez maior de pessoas. Estamos falando
de uma indústria cultural, de uma fabricação em série de produtos
consumidos de modo a provir um prazer que não se liga diretamente à
sobrevivência ou à melhoria das condições materiais de vida, mas, sim, ao
divertimento, à distração, ao lazer. O que a indústria cultural promete com
todas as letras, explicitamente, é propiciar entretenimento, o que significa
para o público a oportunidade de se livrar da premência do trabalho
cotidiano. Ela é uma indústria que coloca em seus produtos o rótulo
“distração e liberdade”, mas cujo conteúdo é, in vero facto, um prazer
narcisista, uma promessa de readquirir a identidade individual, a inteireza
do ego perdida na vida cotidiana.
Todos os produtos da cultura de massa têm como seu valor
estético mais próprio uma relação de espelho para o espectador. O slogan
para a venda da boneca Barbie explicita muito do que se procura
(in)conscientemente em todos os produtos da indústria cultural: “Barbie:
tudo o que você quer ser”. O que os consumidores pretendem é, no fundo,
não apenas recuperar as energias despendidas no cotidiano, ou se
distraírem, etc., mas, também, recobrar algo de sua auto-estima, ou seja,
querem ter, nas coisas, o reflexo sublimado daquilo que eles gostariam de
ser. Busca-se nos objetos a próprio identidade.
A cultura de massa é, então, um exercício continuado e
progressivo de narcisismo. Quando experimentamos essa fase na infância,
tudo era imediatamente positivo. Todas as fontes de prazer externas eram
imediatamente incorporadas ao ego, sem espaço para contradições,
rupturas ou isolamento do ego perante as coisas. Na medida em que os
objetos são delineados pelo ego, se eles são causa de prazer, são
incorporados, se de desprazer, são odiados. Somente aquilo que aumenta
e estabiliza o ego é amado; o que coloca dificuldades para tal inteireza é

384
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

rejeitado.
É precisamente esse processo de absorção egocêntrica imediato,
sem esforço ou contradição, glorificador da auto-imagem, que a indústria
cultural vende sistematicamente em seus produtos. Ela justifica a produção
de suas mercadorias dizendo que é isso o que o público quer, mas dever-se-
ia dizer que tais produtos são apenas uma determinada maneira de
satisfazer uma carência inconsciente, e que tem a péssima característica
de reforçar essa mesma carência, pelo fato de viciá-los no consumo de
bens imediatos.
É preciso dizer que a distração e o lazer, em si mesmos, não têm
nada de ruim, nem de condenável. O desejo de produzir associações livres
de idéias e de sentimentos não caracteriza, por si só, uma carência que faz
o ser humano menor. O impulso lúdico, de jogo, de deixar-se atrair por um
empreendimento descolado da seriedade da vida já existe claramente até
nos animais, como nos cães, que se comprazem em buscar objetos e
brincar um com o outro. O problema que se pode detectar no lazer
pretendido pelos consumidores da indústria cultural é que essa distração
está mesclada à finalidade específica de resgatar um sentimento de
identidade integral perdido durante a vida esforçada no cotidiano.
É de suma importância relatar que a massa, de certo modo sofre
sem ter reação e nem sabem que sofrem ao ataque da mass media, através
da manipulação da indústria e dos governos, de fato é extremamente
favorável a eles que exista a cultura de massa. Deixar o intelecto
empobrecido, sem críticas e sem reação é uma das opções do sistema da
Indústria Cultural. Ela surgiu com a revolução industrial no século XIII e
trouxe consigo o capitalismo e o conseqüente valor do consumismo. É nele
que se sustenta o conceito de cultura de massa. No Brasil não podemos
dizer que a cultura é homogênea, pois no nosso país ainda existe uma
desigualdade de classes sociais. É necessário destacar uma o conceito de
massa e público. Esse último irá se destacar de acordo com o grau de
conhecimento e escolaridade da população.
Sabe o que disse certa vez Marx? Que “os homens fazem sua
própria história, mas não sabem que a fazem”. Ele bem que estava certo,
pois a nossa população não sabe por que assiste tal canal ou por que ouve
tal música ou ainda, por que usam tal roupa que está na moda e por que
consome tal bebida.
A população é fortemente influenciada pela mídia, mas não
percebe o porquê, e principalmente por onde ela (mídia) a manipula.
A indústria cultural, muitas vezes, usa este apelo ao conjunto de
idéias que é colocado explicitamente em suas obras como uma espécie de
isca para enganar aqueles que estão sedentos por lições de vida,
conteúdos filosóficos, morais, religiosos, ou outro qualquer que se
considere elevado, crítico, valioso em termos culturais e de formação
humana. O reconhecimento da existência de tais conteúdos “nobres” nos
produtos da cultura de massa tem o sentido mais próprio de narcisismo, ou

385
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

seja, da satisfação de perceber que somos suficientemente inteligentes


para discernir tais valores nas obras, os quais desejamos que façam parte
de nossa própria pessoa. Massa, ao contrário, não passa de um amálgama
de indivíduos que não se movem, mas são movidos por paixões.
A massa é sempre, e necessariamente, passiva. Ela não age
racionalmente e por sua conta, mas se alimenta de entusiasmos e idéias
não estáveis. É sempre escrava das influências instáveis da maioria, das
modas e dos caprichos que passam. A massa é como a areia movida pelo
vento, ou o rebanho nas mãos do pastor. Movem-na apenas veleidades: o
dinheiro, a facilidade, o luxo, o prazer, o prestígio.
Duas características diferenciam a cultura de massa das outras
categorias de análise: 1ª) seus produtos e consumidores não se encontram
no mesmo nível social. A cultura de massa não é feita pela massa, mas
para a massa. 2ª) os produtos são produzidos com a única finalidade de
serem comercializados. Absorvem o imaginário de ricos e pobres para criar
produtos que sejam consumíveis por todos.

1.1.3 Arte produzida no Brasil também é cultura

A arte exprime a vida e assume a sua complexidade, seja


considerada erudita ou popular. Seja em qualquer olhar, em qualquer
sopro, em qualquer pulsação é pura linguagem em que se manifesta o
máximo esforço realizado a fim de se expressar do modo mais belo e
original. A emoção que sentimos diante de uma manifestação popular é
chamada de emoção estética. Essa emoção estética consiste num
momento de felicidade e de simpatia, decorrente do acordo entre o
pensamento e a sensibilidade com a arte.

Figura 05 :Reprodução da obra “A


primeira Missa no Brasil”, de Vítor
Meireles, 1861.

Através da arte, o homem se expressa e se comunica o universo


pleno de signos e de significantes, cada qual com seu formato singular. Um
objeto de arte, em si mesmo, como produto cultural, tanto pode servir a
esta ou aquela camada da população. Se exposto graciosamente, temos

386
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

uma repercussão. Se em exposição num museu, posto que se cobre um


ingresso, temos uma menor acessibilidade. Mudou o veículo, o
intermediário. Porém, não se perde, na alteração de um veículo para um
outro, a sua essência popular. Afinal, ocorreu a intenção de se exteriorizar
uma idéia ou conteúdo ideológico, determinado por uma demanda difusa,
independentemente do alcance.
A Arte brasileira é o termo utilizado para designar toda e qualquer
forma de expressão artística produzida no Brasil, desde a época pré-
colonial até os dias de hoje. Dentro desta ampla definição, estão
compreendidas as primeiras produções artísticas da pré-história brasileira
e as diversas formas de manifestações culturais indígenas, bem como a
arte do período colonial, de inspiração barroca, e os registros pictóricos de
viajantes estrangeiros em terras brasileiras.
Com a chegada da Missão Artística Francesa, ensaia-se pela
primeira vez a criação de uma escola nacional de arte, consolidada por
meio do estabelecimento da Academia Imperial de Beleas Artes no Rio de
Janeiro. Posteriormente, sob a influência do expressionismo europeu, o
Brasil assistirá ao desenvolvimento do Modernismo Brasileiro, que será
progressivamente incorporado ao gosto da sociedade e da arte oficial, até
que a assimilação das novas tendências surgidas no pós-guerra contribua
para o florescimento da Arte Contemporânea brasileira.
No tocante às mais antigas manifestações de Arte Rupestre no
Brasil encontram-se na Serra da Capivara, no Piauí, datando de cerca de
13000 a.C. Em Pedra Pintada, na Paraíba, foram encontradas pinturas
com cerca de 11 mil anos de idade e, em Minas Gerais, chamam atenção
os registros de arte rupestre localizados em várias cavernas do vale do
Peruaçu, que se distinguem por seus raros desenhos de padrões
geométricos, executados entre 2.000 e 10.000 anos atrás. São igualmente
dignas de menção as pinturas de animais descobertas em grutas calcárias
no vale do Rio das Velhas, em Lagoa Santa, Minas Gerais.
Fonte: sergiosakall.com.br/primitiva/rupestre

Figura 06: Selo da França, que


compreende uma série emitida
em 16/04/1968 (Scott: 1204/1207).

Na documentação arqueológica brasileira, predominam o uso de


materiais como osso, chifre, pedra e argila, para a confecção de objetos

387
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

utilitários (recipientes, agulhas, espátulas, pontas de projétil), adornos


(pingentes e contas de colar) e cerimoniais, atestando uma preocupação
estética observável, sobretudo, na extraordinária variação de formas
geométricas e no tratamento das superfícies e dos retoques.
Acerca da arte indígena, no Brasil, do período entre 5000 a.C. e
1100, há vestígios de culturas amazônicas com alto grau de sofisticação na
fabricação e decoração de artefatos de cerâmica, como as da Ilha de
Marajó e da bacia do rio Tapajós, onde se registra a presença de complexos
vasos antropomorfos e zoomorfos, com suportes e apliques ornamentais.
Ainda no contexto amazônico, são dignos de nota as estatuetas de
terracota, sobretudo com representações femininas e de animais, e os
objetos de pedra, como os pingentes representando batráquios
(muiraquitãs). São igualmente importantes as cerâmicas encontradas na
costa maranhense (tradição Mina, c. 3200 a.C.) e no litoral baiano
(tradição Periperi, c. 880 a.C.), com difusão ampla e diversificada,
atingindo certas áreas meridionais já em plena era cristã. Mais simples em
sua composição do que as cerâmicas amazônicas, essas peças
sobressaem pela diversidade de técnicas decorativas da pintura. De forma
genérica, a arte plumária indígena e a pintura corporal atingem grande
complexidade em termos de cor e desenho, utilizando penas e pigmentos
vegetais como matéria-prima. Por fim, destaca-se a confecção de adornos
peitorais, labiais e auriculares, encontrados em diversas culturas diferentes
espalhadas por todo o território brasileiro.

Figura 07: Arte indígena de palha


– detalhes.

Já a arte erudita refere-se àquela produzida e apreciada pela elite


de uma sociedade. Mas não necessariamente uma elite econômica,
compreendida pelas pessoas ricas, e sim por uma pequena parcela, uma
minoria de pessoas que conhecem vários estilos artísticos e que são bem
informadas, ou seja, a elite cultural. Os artistas eruditos são reconhecidos
por grande parte da população, possuem estudos refinados de diversas
técnicas, materiais, estudos e de história da arte. Geralmente esses artistas
são homenageados postumamente com seu nome na História cultural de
um povo, como é o caso de Sandro Botticelli, Leonardo da Vinci,
Michelangelo, Salvador Dalli, Pablo Picasso, Cândido Portinari, Di

388
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Cavalcanti, Tarsila do Amaral, Almeida Júnior dentre outros.


Almeida Jr. (1850-1899) ficou conhecido como o primeiro pintor
erudito nascido no país a registrar o “outro brasileiro”, o homem do interior ATIVIDADES
do estado de São Paulo, representante das camadas pobres do Brasil. Sua
produção foi recuperada e valorizada por artistas e intelectuais ligados ao Você pode perceber que
Modernismo, como Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Cândido há várias manifestações de
Portinari. arte.Estabeleça
Fonte: Livro Didático História do Brasil, 2003.
aproximações e
distanciamentos entre a
erudita, a tradicional, a
popular e a de massa.
Em que outros momentos
da vida cotidiana as artes
tradições imperam? Pense
nisto e discuta no Ambiente
Virtual de Aprendizagem
com seus colegas.

Figura 08: Ilustração de Caipira picando


fumo, 1893, de Almeida Júnior.

A arte erudita é facilmente encontrada em grandes museus e


galerias e possuem um valor artístico e qualidade estética incontestável
pelos críticos e pelos apreciadores mais exigentes. Ela caracteriza-se por
apreender o significado da existência humana através da arte; instigar o
público apreciador a mudar sua visão de mundo; envolver o
desenvolvimento dos códigos artísticos; compreender a expressão
individual do artista.

1.1.4 Crítica aos três níveis de cultura

Apesar de pertinente e relevante para efeito de análise social, a


divisão da cultura em níveis sempre suscitou críticas. A primeira diz respeito
ao processo de hierarquização da cultura. Considerar que existe um nível
superior e outro inferior de produção cultural é cair nos riscos do
etnocentrismo e negar a circulação natural que existe no interior das
culturas.
Além disso, deve-se lembrar que a cultura, hoje dita como erudita,
era na verdade a cultura popular de nossos colonizadores. Shakespeare
era representado na Inglaterra, para o povo e pelo povo e lá ele era popular, DICAS
era mestre como é mestre os nossos artesãos, nossos brincantes de
reisados, coco-de-roda e de outros folguedos populares.
A comédia Del'Arte era popular no sul da Itália e na França (vejam Veja o filme Shakespeare
o filme “Ciranu de Bejerac”), até mesmo no momento em que Mollière Apaixonado.

389
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

assume a sua paternidade e a entregou à aristocracia francesa; Lopes de


Veja era popular na Espanha, na época do teatro de ouro Espanhol; Gil
Vicente e seus autos eram popular em Portugal e até recentemente, nesse
século que se finda, Garcia Lorca era popular na Espanha com o teatro La
Barraca se opondo ao Governo ditatorial e facista de Franco e Bertold
Brecht era popular na Alemanha combatendo a força nazista.
Essas grandes potências nos colonizaram e nos colonizam até os
dias atuais, e se no passado histórico se fecharam em espaços excludentes
para ritualizar e perpetuar suas culturas, enquanto os negros dançavam na
senzala a capoeira e os índios festejavam suas guerras, caças e deuses da
natureza, hoje usam a força dos meios de comunicação e se reúnem nos
grandes supermercados culturais, que são as majestosas casas de
espetáculos, teatro, casas de shows, arenas de rodeios, financiados e
garantidos pelo poder público, restando ao povo, poucos deles por sinal, os
sítios, beiras de praias, bairros periféricos, sem apoio, nem moral, para
expressar a sua cultura.
É necessário relativizar a hierarquia entre alta e baixa cultura para
se compreender o quão complexo é o processo de aprendizado e criação
de cultura e arte. A produção popular pode ser tão rica e complexa quanto
à erudita. Os artistas populares não se distinguem dos artistas eruditos em
termos de uns serem inferiores aos outros. Os artesãos possuem
habilidades e capacidade de criar peças originais e criativas na mesma
proporção dos artistas plásticos, o domínio da técnica pode ser apreendido
na tradição acadêmica ou na tradição popular, mas para além do domínio
da técnica, o artista é aquele que consegue transferir para algum tipo de
material (barro, papel, instrumento musical) sensações, sentimentos,
desejos ou qualquer realidade transmutada naquilo que ele quer.
A técnica se aprende, mas a arte é um dom. As diferenças entre os
artistas populares e os artistas de tradição acadêmica não devem ser
hierarquizadas, sendo uma pior e outra melhor. Devem ser apenas
sentidas, assim como toda obra de arte.
E tem outro trabalho meu que chama DESAFORO. (...) É uma
cabeça grande, uma boca muito grande, nessa boca do meio
está escrito DESAFORO e em volta da cabeça tem outras
cabeças. Então, eu queria mostrar essa barreira que existe,
dessas outras cabeças, que são as pessoas chatas e que não
deixam a gente ter vez; (...)E tem outra peça que chama O
PODER, em que fiz uma pirâmide onde tem pessoas que dão
sustento ao rei que fica lá em cima; (...) E tem um outro
trabalho meu, sem nome.
(...) São duas pessoas unidas numa só, onde a cara da frente
mostra estas carinhas boas que as pessoas nos mostram e tem
aquela cara feia atrás, que é o que a pessoa realmente é. Tem
outra, que também quero mostrar, ela é uma cara muito feia,
com um olho só e este olho é doente, é furado; você vê isto
perfeitamente aí, de muita gente que nunca quer saber do que
está se passando à sua volta, adiante dele na realidade, se ele
está bem não quer saber de nada! Então, como esta pessoa
nada vê que está passando ao redor dele, seu olho está furado.
(FIGUEIREDO, 1983, p. 36)

390
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Em segundo lugar, deve-se observar que no processo social, as


culturas se influenciam mutuamente, Muitas vezes, a cultura erudita se
apropria da cultura popular e vice-versa na produção dos seus materiais
simbólicos e artísticos. Apesar de toda a originalidade dos livros de
Guimarães Rosa, sabe-se que muitos dos seus relatos, causos e expressões
lingüísticas são traduções do modo de vida do povo sertanejo. A todo o
ATIVIDADES
momento, pessoas de diferentes grupos sociais se encontram,
estabelecem relações e se influenciam mutuamente. Compare as entrevistas de
Lira Marques e Yara
OPINIÃO - Ô Yara, o que você mostra nesse trabalho Ícones de Tupinambá, artista
Minas? “popular” e “erudita”
respectivamente, sobre o
YARA – Eu tentei somar tudo aquilo que é simbólico para nós,
processo de produção
que é um ícone. O que é um ícone? É um sinal muito forte de uma
cultura. Então, o que é um sinal muito forte pra Minas? São as artístico. Quais são as
pequenas cidades; as pequenas vilas espraiadas entre conclusões que você tira
montanhas; as montanhas; as flores do sertão, que estão muito desta comparação.
presentes no meu trabalho; os santos; os oratórios; e,
Pesquise sobre outros
ultimamente, as bandeiras de São João. Eu tive uma surpresa e
uma emoção grande quando eu vim expor aqui, agora, no artistas populares e
Centro Cultural... eu tinha feito essa série de bandeiras (a noite eruditos.
de São João), que vem surgindo aos poucos, num trabalho,
noutro, você vai encontrar, ali, balões, noites etc. Então, eu tive
um susto quando cheguei na Praça (Dr. Chaves) e encontrei as
bandeiras flutuando e balançando ao vento, como eu havia feito,
as cores como eu havia feito, entendeu? Então, ali, eu vi como
que a minha infância ficou gravada na minha memória e como
quem isso tudo me remete aqui mesmo a Montes Claros, à
minha adolescência em Itaúna, onde havia as festas de São
João, onde eu via essas bandeirinhas, esse encantamento que eu
tinha pela cor, pelo movimento, por tudo aquilo que fica
incorporado na memória.

Quanto à cultura de massa, deve-se lembrar que mesmo inserida


no circuito comercial da cultura, ela não é uma simples reelaboração dos
materiais simbólicos da cultura erudita e da popular (que ocorre
realmente). Ela reúne novas ações, interpretações e assimilações do
ambiente que não podem ser chamadas nem de eruditas nem de
populares. Dispositivos tecnológicos como o videoclipe ou o videogame
possuem uma linguagem inovadora, não é uma simples reelaboração,
implicam mudanças culturais. Mesmo no âmbito do cinema ou da
televisão é possível criar uma estética nova, que fuja da simples releitura de
um livro.
Além disso, o que a cultura de massa possibilita é uma maior
circulação dos produtos culturais por todos os setores da sociedade. Sendo
assim, “as culturas já não se agrupam em grupos fixos e estáveis e portanto
desaparece a possibilidade de ser culto conhecendo o repertório das
'grandes obras', ou ser popular porque se domina o sentido dos objetos e

391
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

mensagens produzidos por uma comunidade mais ou menos fechada


(uma etnia, um bairro, uma classe).
Agora essas coleções renovam sua composição e sua hierarquia
com as modas, entrecruzam-se o tempo todo, e, ainda por cima, cada
usuário pode fazer sua própria coleção. As tecnologias de reprodução
permitem a cada um montar em sua casa um repertório de discos e fitas
que combinem o culto com o popular, incluindo aqueles que já fazem isso
na estrutura das obras: Piazzola, que mistura o tango com o jazz e a música
clássica” (CANCLINI, 1998, p. 304).
Canclini propõe um conceito – descolecionar; e um novo tipo de
cultura – híbrida. Segundo ele, as culturas não podem mais ser
organizadas por referência a coleções de bens simbólicos, onde se
distingue o repertório erudito, do massivo e do popular. No contexto pós-
moderno, cada pessoa faz a sua coleção particular entrecruzando diversos
repertórios diferentes. Significa que uma coleção de cds particular pode
ATIVIDADES conter música clássica, sertanejo, mpb e rock, sem problema algum. O
gosto eclético, a não-fidelidade a uma coleção é um traço dessa cultura
Em grupo, discuta como híbrida: artesanatos e obras de arte valiosas no mercado de arte convivem
cada aluno organiza sua no mesmo ambiente de decoração da casa; diversidade no modo de se
própria coleção de bens vestir, que deixa a identificação por classe ou cultura cada vez menos
simbólicos. latente. Parte-se para a formação de uma cultura cada vez mais híbrida,
múltipla e intercultural. Uma cultura que no sistema capitalista pode ser
dividida entre os consumidores e os não-consumidores.

REFERÊNCIAS

BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1998.


BURKE, Peter. Cultura popular na Idade Moderna. Trad. Denise
Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
CANCLINI, Nestor. Culturas híbridas. São Paulo: Edusp, 1997.
CASCUDO, Luís da Câmara. Literatura Oral no Brasil. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1978.
CASCUDO, Luís da Câmara. História dos nossos gestos. São Paulo:
Global, 2003.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1978.
DAMATTA, Roberto. A Casa e a Rua: espaço, cidadania, mulher e morte
no Brasil, 1983.
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo:
Martins Fontes, 2004.
LÉVI-STRAUSS, C. Antropologia estrutural. Rio de Janeiro:Tempo
Brasileiro, 1993.

392
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

LOTMAN, Iuri. La semiosfera de la cultura, Del texto de la conducta y Del


espacio. Madrid: Cátedra, 1998.
SANT’ANA, Affonso Romano de. Carnavalização. In: Paródia, Paráfrase &
Cia. São Paulo: Ática, São Paulo(série Princípios), 1985.
VOVELLE, Michel. Ideologias e Mentalidades. São Paulo: Brasiliense,
1987.

VÍDEOS SUGERIDOS PARA DEBATE


1 O filme A missão, dirigido por Roland Joffé, apresenta bem as relações
etnocêntricas que foram estabelecidas na colonização das Américas.

2 Outra sugestão é Casamento Grego, dirigido por Joel Zwick. Um filme


divertido sobre tolerância e respeito à diversidade cultural.

393
2
UNIDADE 2
CULTURA POPULAR: A FESTA POPULAR DO ARTESANATO
E AS DIVERSAS MANIFESTAÇOES REGIONAIS

Nesta Unidade procuramos proporcionar a você, caro cursista,


uma visão geral da arte moldada pela fé e pela voz do povo, através das
narrativas tradicionais orais, sejam cantadas ou re-citadas, fornecendo-lhe
a base das discussões que fundamentam todas as manifestações da fé,
principalmente as festas populares, que consideramos, todas, religiosas,
sem exceção, e que não são profanas. A festa somos nós, estão em nós.
Trabalhamos os conceitos vário de festas e seu significado perante uma
comunidade. Você terá, também, um panorama das artes manifestadas na
pré-história, no Brasil, na cultura indígena, na tradição popular e na
chamada erudita. Ao longo do texto você verá subtítulos para cada tema
exposto, dicas de livros e de textos para enriquecer os seus estudos, o
glossário para auxiliar você na interpretação dos textos, tudo isso a fim de
facilitar as suas reflexões diariamente.
Objetivos específicos:
apreender o conceito de festa popular;
?
analisar narrativas míticas;
?
compreender
? a importância das narrativas tradicionais da
cultura popular;
refletir sobre as artes pré-histórica, indígena, erudita e popular;
?
e
estudar
? a cultura popular nos Vales do Jequitinhonha e do
São Francisco.

Figura 09: Festa Popular.

2.1 AS FESTAS POPULARES SOMOS NÓS MESMOS

Teceremos, aqui, ancoradas na teoria de Mikhail Bakhtin (1996),


que contempla e explica as imagens da festa popular, a tradição, a cultura,
o riso desmedido que remetem às instâncias transformadoras de alegria e
de liberdade. Por mais que se tenha lido e discutido o memorável A cultura
popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François
Rabelais, não cessa de repercutir o eco de suas formulações.

394
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Na Idade Média, até os limites do Renascimento, as festas eram


momentos de diversão irrestrita. Seus elementos e ritos compunham
intenção ampliada de inversão de valores, da troca de papéis sociais, da
carnavalização, que leva a descobrir o novo e o inédito, dando ênfase
especial às sucessões e à renovação.
Não se pode deixar sem referência a literatura medieval,
DICAS
folclórica, oral e carnavalizada. As oralidades que tinham no corpo a
própria mídia passam de voz viva aos meios acústicos, eletrônicos, ou em
rede. E isto tem a ver com a modernização e é inevitável. Apresentava uma
visão parodística do mundo, onde as figuras cotidianas apareciam Ver Tese de Doutorado de
invertidas e aí se dava a ruptura dos preceitos éticos e até mesmo estéticos. Generosa Souto - As
Nesses textos carnavalizados rompe-se a lógica do cotidiano e funde-se o Transformações da
real ao imaginário e aproximam-se elementos contraditórios: sabedoria e Festadança de São
burrice, loucura e razão, o certo e o errado, o velho e o moço, o gordo e o Gonçalo de Amarante nas
magro, o sublime e o grotesco, a vida e a morte. Barrancas do São
Bakhtin divide as manifestações da cultura popular medieval em Francisco: tradição e mídia.
três categorias fundamentais: Ritos e Espetáculos (carnaval, festa dos PUCSP, 2005. (Disponível
tolos, teatro cômico em praça pública), Obras Cômicas Verbais (em versos, em
peças, trovas...) e Diversas Formas e Gêneros do Vocabulário Familiar e www.santoagostinho.edu.br
Grosseiro (insultos e ofensas, gírias/blasões populares). Do primeiro tipo, /teses).
Bakhtin lista: o Carnaval, a Festa dos Tolos, o Risco Pascal, a Festa do Asno,
as Festas do Templo, etc. Nesses ritos públicos, eram parodiados a liturgia
e o cerimonial das classes dominantes (Igreja e Nobreza). Havia, por
exemplo, a eleição de “reis” dos foliões, geralmente avaliados por sua face
mais horrenda ou grotesca. Por isso, o carnaval não é considerado um
espetáculo de arte, e sim uma forma de viver a realidade, ainda que
provisória. Os bufões tomavam o lugar das autoridades eclesiásticas ou
aristocráticas e, por algumas horas ou alguns dias, a ordem repressora era
subvertida e dava lugar à paródia, para que logo em seguida tudo voltasse
ao status quo anterior. Essa capacidade de conviver normalmente com os
dois tipos de ordem, e aceitar sua superposição, era o que Bakhtin
identificou como a dualidade da visão-de-mundo que se tinha na cultura
da Idade Média.
O carnaval como exemplo de manifestação através de rito e
espetáculo também se utiliza do grotesco para desmistificar, desestruturar,
ainda que por alguns dias, as formas pré-concebidas de se entender o
mundo. Ele cria a oportunidade de o indivíduo mais desvalorizado dentro
de um círculo social sentir-se agente de modificação da realidade,
passando da posição de espectador para a de ator do espetáculo."O
carnaval é essencialmente igualitário e, nos seus três dias, transpõe para o
mundo da "rua" os ideais das relações espontâneas, afetivas, e
essencialmente simétricas que são a contrapartida das paradas.

395
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Figura 10: Máscaras na vitrine.

B GC A negação que o carnaval faz das estruturas de poder e


GLOSSÁRIO E autoridade é corporificada no malandro. O malandro, ao contrário do
A F herói, não busca dominar a estrutura do poder e a ela se sobrepor - e, nesse
Carnavalização: segundo processo, terminar por ser reabsorvido por ela. Ele vive nos interstícios do
Bakhtin, pode ser um sistema, de seus absurdos e de suas contradições. Se o herói sai das
desvio e também uma paradas e o malandro dos carnavais, outro personagem - o místico
inversão dos costumes renunciador - sai das procissões. Ele rejeita o sistema como um todo, nem o
consagrados, como fez a aceita nem se aproveita dele, mas cria seu próprio espaço de vida e seus
geração hippie, que próprios valores."Assim como existem ritos que libertam as pessoas, há
sobrepôs o sacro e o aqueles, chamados de oficiais, que servem para reforçar e manter o regime
profano, o velho e o novo, em vigor, como os ritos da Igreja e do Estado feudal na Idade Média.
sem atender a certas O carnaval, para Roberto DaMatta (1983) “é essencialmente
normas de interdição igualitário e, nos seus três dias, transpõe para o mundo da "rua" os ideais
social. A carnavalização é das relações espontâneas, afetivas, e essencialmente simétricas que são a
de alguma maneira o contrapartida das paradas”. Como se vê, é válido dizer que a negação que
mundo às avessas e pode o carnaval faz das estruturas de poder e autoridade é corporificada no
ter a leitura de uma malandro, como é o exemplo do Pedro Malasartes, que não respeita nem
parodização. 3. A história crê nos valores da autoridade e do poder, mas os conhece, e aproveita
nos mostra momentos de deles em seu próprio benefício. O malandro, ao contrário do herói, não
carnavalização. Esse busca dominar a estrutura do poder e a ela se sobrepor - e, nesse processo,
mundo às avessas está na terminar por ser reabsorvido por ela. Ele vive nos interstícios do sistema, de
Idade Média, na pintura "O seus absurdos e de suas contradições. Se o herói sai das paradas e o
velho" de Breughel como malandro dos carnavais, outro personagem - o místico renunciador - sai
na de Jerônimo Bosch e das procissões. Ele rejeita o sistema como um todo, nem o aceita nem se
pode ser interpretado, aproveita dele, mas cria seu próprio espaço de vida e seus próprios valores.
conforme os casos, como E os ritos que inicialmente eram repudiados pelas classes
desvio, como paródia, dominantes (carnaval, capoeira, funk carioca, samba etc, como exemplo
como estilização, como de ritos brasileiros contemporâneos) são aglutinados em verdadeiros
apropriação, como contra- movimentos “antropofágicos culturais”, tornando-os intrínsecos e
estilo e até como contra- “naturais” da própria sociedade.
cultura.

396
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

A festa é, também, carnavalização. Ela se manifesta na


DICAS
linguagem; é um procedimento textual, oralizado. A apreensão do real,
pela ótica carnavalesca, é obtida por uma singular conjunção de
sucessivas (e não excludentes) superposições da realidade aparente
(imediata) e da realidade paralela (mediatizada). Affonso Romano Sant'Ana
Ao passar dos séculos, como bem trabalha Mikhail Bakhtin no capítulo
(1996), as pulsões carnavalizantes dos festejos, concatenadas em "Carnavalização" do livro
símbolos e rituais, foram gradativamente extirpadas de sua composição, "Paródia, Paráfrase & Cia.",
com destaque nas celebrações religiosas, migrando para uma versão publicado pela Ática, São
compacta do carnaval, persistente no calendário contemporâneo. Paulo (série Princípios), em
1985.
Bakhtin contrapõe a perspectiva de que a cultura popular é
resultado do dogmatismo e da seriedade da cultura dominante, sobretudo
no período da Idade Média. Segundo ele, a dicotomia cultural é apenas um
lado da questão. É preciso perceber a circularidade e o influxo recíproco da
obra de François Rabelais, explorando a distinção de níveis, sua natureza
relacional e interativa. Ao analisar a cultura popular na Idade Média e no
Renascimento, procurou traçar uma multiplicidade das manifestações da
cultura popular, tais como festa, ritos, espetáculos, carnavalizando o
popular.
Bakhtin afirma, ainda, que Rabelais foi um gênio pelas suas idéias
e pela sua arte, porque soube recolher sabedoria na corrente popular dos
provérbios, dos dialetos, dos refrões utilizados pelos antigos, no
conhecimento que vinha dos simples e dos loucos. Rabelais, na concepção
de Bakhtin, foi “o mais democrático” dos mestres modernos da literatura,
pois o que amarrou sua obra foi o uso de fontes populares, fontes DICAS
específicas, o que lhe confere o caráter peculiar e o que determina a
construção do seu conjunto de imagens e sua visão artística.
O rito não se define somente pela repetição, que é um dado de Leia Roberto DaMatta,
toda a vida social, nem por uma fórmula rígida, pois existem rituais que pois discute o resultado do
abrem o mundo, pulverizando valores e ideologias e, ainda, partilha o discurso em que a pessoa,
discurso acerca das festas religiosas afirmando que elas conciliam o povo a rua, a casa e suas
com o Estado por meio do culto a Deus (ou ao Santo), permitindo o simpatias constituem a
encontro e a convivência dos diversos elementos descontínuos da estrutura moldura de todo o sistema,
social sob a égide da Igreja. Diz, também, que as festas religiosas, por se criando uma ilusão de
colocarem lado a lado e num mesmo momento o povo e as autoridades, os presença, honestidade e,
santos e os pecadores, os homens sadios e os doentes, atualizam em seu sobretudo, de bondade,
discurso uma sistemática neutralização de posições, grupos e categorias generosidade e
sociais. Afirma que as festas da rua unificam o mundo por meio de uma compromisso com o povo.
visão onde a rua e a casa se tornam espaços contíguos, reunidos por uma Em certo sentido,
convivência temporariamente utópica de espaços rigidamente divididos no surpreende a observação
mundo diário. de que, no Brasil, há
Devemos pensar no aspecto subversivo da festa. Festa que momentos rituais — festas
configura a reação mais profunda da consciência popular oprimida, à qual — em que o ponto de
é recusado um lugar legítimo na sociedade. A festa significa, portanto, a partida é um desses
irrupção da lei e da ordem, contudo, que o dia seguinte das festas é o de espaços.

397
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

uma nova ordem social. As classes sociais dominantes utilizam os


transbordamentos da festa como remédio preventivo contra os males da
rebelião e deste papel, instituições como o Estado moderno, a burguesia e
a Igreja estão cientes. E o que se vê, na maior parte das vezes, não são
apenas explosões de espontaneidade e transgressão.
A festa popular realiza-se envolta numa rede de significados que
se expressando por meio de símbolos, ritos, alegorias, gestos e imagens,
são tanto ou mais diversificados, ambíguos ou ambivalentes quanto
múltiplas sejam a divisão social do trabalho e a procedência étnica e
histórica dos indivíduos e grupos que compõem o conjunto da sociedade.
Significados que muitas vezes escapam ao controle e sentido dos que se
afirmam como idealizadores, ou mesmo patronos da festa.
Num sentido profundo, as festas ligam-se ao universo da
socialização. Tendo suas origens nos ritos que buscavam interferir nos
ciclos naturais para o provimento da subsistência, eram momentos de
agradecimentos ou de súplicas à natureza, elos de ligação entre o
imponderável, visto como divino, sagrado e o homem imponente. Por isto,
ele pede e agradece.
Sabe-se que elas se ligam, principalmente, à economia e que a
periodicidade da economia agrária, ligada aos ciclos da natureza,
estabelecem em todas as culturas um calendário de festividades, em que a
comunidade se congregava para celebrar, agradecer ou pedir proteção.
Essas formas de culto a divindades protetoras da natureza estão na origem
das festas portuguesas, transplantadas mais tarde para o Brasil.
Há, no Brasil, inúmeras festas com um caráter bastante profundo,
em relação aos ritos propiciadores de chuvas, fertilidade, germinação,
boas colheitas, do sol e do calor. Elas implicam na necessidade dos seres
humanos viverem em grupo, implicando, muitas das vezes, renúncias,
tensões, competições e conflitos. Desse modo, as festas constituem
importante espaço de sociabilidade, tornando possível a vida em
comunidade, através de alegrias e representações.
Enquanto representações, as festas, as folgas, seriam a quebra da
normalidade, da rotina das obras servis, da produção, que geraria o ócio e
em tempos modernos: (neg)ócio.
As festas celebradas pela Igreja, até então marcadas pelo tempo
designado como tempo forte de experiência de cada rito, favorecia a
continuidade do espírito lúdico na população. Na história das religiões, a
festa é parte integrante, pois não tem como celebrar sem festejar. A
comemoração traz a alegria e investe na animação dos que participam do
momento de festança.
A vida é uma festa. Basta olhar para a própria vida e verá como ela
é uma seqüência de celebrações. Partindo de situações como o
nascimento e a morte, pode-se chamar de festas únicas. O casamento e o
nascimento dos filhos, festas raras. Os vários aniversários na família, a
reunião dos parentes, dos amigos, da vizinhança, dos colegas de trabalho,

398
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Fonte: Arquidiocese de São Paulo, 2007.

Figura 11: Padre Palmiro com imagem de Nossa


Senhora Aparecida durante procissão fluvial no rio
Tietê em SP.

são as festas repetidas. A festa deve ser solenizada enquanto passagem,


pois dessa forma comemora a memória e fica demarcada na comunidade,
sendo sempre re-encenada.
Algumas comunidades comemoram, com maior ênfase, certos
acontecimentos; enquanto outras os deixam em segundo plano. Nas
cidades médias e grandes comemoram-se as festas cívicas, históricas e
políticas. Nos povoados e vilarejos essas festividades ocupam um plano
menos importante; e os festejos locais e religiosos povoam meses, anos,
décadas. Eles festejam o Dia de Natal, Dia de Santos Reis, a festa do
padroeiro, a Semana Santa (todos ficam quietos e com medo de pecar), as
festas juninas, o dia de São Sebastião, o dia de São Judas, o dia de Nossa
Senhora Aparecida, o Dia de Finados, e a qualquer momento, a
Festadança de São Gonçalo de Amarante, a única festa em que não há no
calendário, pois é festa votiva, ou seja, para pagar promessas.
Na cidade, a família urbana comemora os ritos de passagem: os
aniversários, a primeira comunhão, o crisma, o ingresso dos filhos na
faculdade, as formaturas, a casa nova, a nova praça, a vitória do Atlético
Mineiro, a vitória do prefeito. Da economia passa-se à prodigalidade; da
discrição à exuberância. Surgem as manifestações de excesso, nos mais
ricos por ostentação, nos mais pobres por compensação. Dessa forma,
mais uma vez comprova a festa como expressão de um desejo ou de uma
necessidade coletiva.
Entre as famílias rurais ou das pequenas cidades ribeirinhas, as
principais comemorações continuam sendo as do batizado, do
matrimônio, da formatura, do velório, do enterro de uma pessoa
conhecida. Vale notar que as cerimônias urbanas oscilam no sentido do
universal, do individual e, em contrapartida, no campo, valem mais as
cerimônias de reconhecimento de um nós local, ao ritmo e ao sentido da
vida comunitária.

399
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

A partir das celebrações, individuais ou coletivas, emerge a idéia e


os momentos de festejar. O ser humano é símbolo. Precisa festejar e ser
festejado. Dessa forma, a festa restabelece laços e joga com a metáfora,
rompendo o excesso de significante, a ordem social da vida e a ordenação
lógica do significado. A festa exagera o real como uma necessidade de
transpor umas para outras esferas de trocas, que nem por serem mais
motivadamente simbólicas deixam de ser tão socialmente rurais.
Em algumas festas mais tradicionais, preserva-se o costume
herdado da Idade Média portuguesa de uma distribuição farta e generosa
de comida a todos os presentes, completando-se o ciclo dos gestos, de
sorte que uma festa popular é a mistura, ao mesmo tempo espontânea e
ordenada, de momentos de contar, dançar, ver, desfilar, torcer, rezar. Enfim,
de “festar”. Palavra brasileira que, deliciosamente, resume tudo o que se
deve fazer em uma festa popular.
A festa é uma viagem, no dizer de Carlos Rodrigues Brandão
(1989). Vai-se a ela e ali se transita entre seus lugares. Por isso o desfile, o
cortejo, a procissão, a folia e tudo o mais que possibilite fazer deslocar entre
as pessoas e pelos lugares que a própria festa, simbolicamente, reescreve e
redefine: sujeitos, cerimônias e símbolos. É uma mistura muito rica de
contrários. Brandão (1989) confirma que outros espantos devem ter
ocorrido muitas vezes, uma vez que são muitos os depoimentos de
viajantes a respeito da representação carnavalizada do cerimonial em
festas populares e até mesmo oficiais. Ali tudo se festeja.
É através dos ritos coletivos que os desejos são tornados públicos,
mas também a efusiva alegria de sentir-se salvo e até santo livre com a
festa da poeira do pecado, piedoso da salvação pessoal, diante da
majestade terrível de um deus ao mesmo tempo distante e paternal, senhor
do mundo, porém amigo das festas.
É notório observar a exigência de que todos os participantes da
festa sejam devotos confessos e atores ao papel que ali desempenham:
cantar, tocar instrumentos, recitar, dançar, beber e comer.

400
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Quando Claude Lévi-Strauss (1989) diz que “os mitos se pensam


B GC
GLOSSÁRIO E
através dos homens”, iguais ou diferentes, irmanados ou em conflito, A F
percebo que é na festa que os homens aprendem a trocar com excessos
Sabença: surge na teoria
seus bens, seus significados, seus mitos. Em nome de santos, de anjos, de
de Mário de Andrade para
antepassados, de heróis, mas também em nome de pássaros, de flores, de
se referir ao que ele
desejos, de esperança, enfim, homens barranqueiros do Velho Chico se
entende ser o “difícil saber
intercambiam os seus mitos e suas sabenças, com grande fervor.
saber”, que se obtém na
paciência sábia de não
aceitar nem “a contribuição
milionária de todos os
erros”, nem os conceitos
“preconceituosos pró ou
contra erudição”. Para
Mário de Andrade, sabença
é, pois um saber que
alcança e sabe escolher o
que há de melhor nas
manifestações de arte
Figura 13: Festa de São Gonçalo do Amarante. popular para torná-las
sábias.
Saberia o povo festejar de outro modo? Aqui, no Brasil, festejam-
se as procissões e os cortejos, a morte de pessoas famosas, artistas e
políticos, a celebração piedosa de “nós mesmos” através dos santos e
padroeiros, revivescidos como folguedos modernos e transformados, os
leilões e concursos, desde os “arvoredos com balas e bolachas
penduradas” até os altos desfiles do concurso de Miss Brasil; a farta orgia
do comer-e-beber e as buscas do desejo do amor e do prazer entre homens
e mulheres em qualquer espaço e em qualquer ocasião. Com isso, é
notório que a festa faz lembrar. Ela se faz memória daquilo que os homens
teimam em esquecer, porém não conseguem.
Mais humana do que o trabalho, a festa se faz exageros. Ela
revela o ser mais denso do homem, posto a nu, como nunca. É assim que
os homens de todos os povos criam e se contam, através dos mitos, no dizer
de Brandão (op. cit). A festa, séria e necessária, apenas brinca com os
sentidos e o sentimento. E isso é humano. É por esta razão que continuam
sendo re-encenadas as mesmas missas, os mesmos cortejos, as danças de
praça, servindo para louvar o padroeiro comunitário, festejar uma boa
colheita, a súplica pela chuva, a identidade do negro ou do padre, o
aniversário da cidade, e até mesmo a vitória do time de futebol favorito.
Sabe-se que a lembrança de um acontecimento merece uma festa.
Com isso, vale ressaltar que o circo, o rodeio, o leilão, o forró, o
desfile, o concurso, tudo isso invadiu as festas de tradição religiosa católica
no Brasil, e agora, as missas, as procissões menores, mas ainda com fé, no
Vale do São Francisco, os pequenos ritos de devoção ao santo padroeiro,
também, já invadem com a mesma desenvoltura, as festas modernas de

401
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

produto e produtor.
Nenhuma região do Brasil, quer rural ou urbana, vive, hoje, sem
suas festas. São situações e cerimônias que apenas fazem passar de um
DICAS círculo a outro, de símbolo e sujeitos homenageados, os mesmos gestos e
os mesmos propósitos das humildes ou das grandiosas velhas “festas de
santo”.
RIBEIRO JÚNIOR. A festa Posso dizer que as festas populares representam o mundo como
do povo: pedagogia e teatro e prazer. É sabido, como explanei anteriormente, que todas as
resistência. Petrópolis: sociedades alternam suas vidas entre rotinas e ritos, entre trabalho e festa,
Vozes, 1982. os rituais e muitas outras comemorações, também já mencionadas. E o
mais importante é que tudo isto é visto por um novo ângulo e uma nova
perspectiva, depende do “olhar estrangeiro” que impregna, de um jeito
novo, sem romantismo.
Jorge Cláudio Noel Ribeiro Júnior (1982) estabelece uma relação
entre festa e celebração nos mesmos moldes que lembra muito a
importância dada pelo povo da cidade de São Francisco à dimensão
familiar e comunitária daquela festa. Ele diz que a festa é uma forma de
celebração, que tem como ponto de partida e de referência um evento
histórico, passado ou possível, cujo significado é vivenciado ritualmente por
um grupo. Diz, ainda, que celebrar é fazer a afirmação da vida e da alegria,
a despeito do fracasso e da morte; e que ao transformar em símbolos
determinados eventos, a celebração ritual manifesta um alto teor
pedagógico, além de provocar a participação e integração grupal,
componentes importantes na afirmação da identidade.
Como se vê, o povo transforma o modo de relação individual em
relação comunitária, de forma a facilitar a afirmação da identidade no que
diz respeito ao fato celebrado e à vida da população em torno de um
objetivo, como é o caso do Vale do São Francisco, com a Festadança de
São Gonçalo.
Tomamos de empréstimo as palavras de Homi Bhabha (1998),
DICAS quando ressalta que “o reconhecimento que a tradição outorga é uma
forma parcial de identificação”. Diz, ainda, que ao re-encenar o passado, o
povo introduz outras temporalidades culturais incomensuráveis na
Leia o livro O local da invenção da tradição. Com isso, ele assegura que esse processo afasta
cultura, de Homi Bhabha, qualquer acesso imediato a uma identidade original ou a uma tradição
Editoria UFMG, 1998. “recebida”, ou seja, a voz viva da tradição passa aos meios acústicos com a
modernização e se transforma para continuar. Assim, remete à
transmissão oral de mitos, fatos e valores religiosos e espirituais, através
das gerações, o que confirma a visão da tradição enquanto mobilidade,
sistema sujeito a significações outras, em seu espaço e em seu tempo,
“intercambiando experiências”, como diz Walter Benjamin (1987), acerca
da festa popular.
A cultura popular tradicional é produzida regionalmente e
ajustada às necessidades de cada comunidade. Dessa forma, ao dotar o
fato folclórico como algo da cultura popular, deve-se ter o cuidado para
que esse fato não seja confundido ou reduzido à chamada indústria

402
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

cultural, que fabrica produtos, cuja finalidade é a de serem trocados por


moeda, promovendo a deturpação e a degradação do gosto popular;
simplifica ao máximo seus produtos, de modo a obter uma atitude sempre
passiva do consumidor; assume uma atitude paternalista, dirigindo o
consumidor ao invés de colocar-se à sua disposição.
A Festa passa a representar não uma fonte de recreação, uma vez
que a diversão traz consigo a medida de homens sérios que promovem a fé,
também elevando a consciência ao plano de ação de algumas distinções
fundamentais para o comportamento social dinâmico, pois o que foi
assimilado foi absorvido das antigas festas, que perpetuam, ainda, como
as festas no Vale do São Francisco.
Néstor García Canclini (1997) procurou compreender a dinâmica
das festas populares na América Latina a partir de um registro que absorve
a idéia da transposição das antigas festas no momento em que elas estão
sendo construídas, conforme alguns pressupostos da indústria cultural,
conservando os traços da tradição e que, no dizer de Émile Durkheim
(2000:409), o que exprime a tradição, cuja lembrança ela perpetua, é a
maneira pela qual a sociedade concebe o homem e o mundo; trata-se de
uma moral e de uma cosmologia, ao mesmo tempo que de uma história.
É certo que tradição é cultura. E dentre as inúmeras definições que
você conheceu sobre cultura, basearemos em Iuri Lotman, para quem
cultura é “o conjunto de informações não hereditárias, que as diversas DICAS
coletividades da sociedade humana acumulam, conservam e
transmitem”. Deste pressuposto, ancoramos, também, na leitura crítica
de Luís da Câmara Cascudo, numa discussão acerca do universo da
Leia os livros:
cultura tradicional popular, a ampla e irrestrita variedade do uso da palavra
CANCLINI, Nestor. Culturas
povo na literatura, e sobre a necessidade de refletir sobre as
híbridas. São Paulo: Edusp,
multiplicidades de espaços das experiências históricas. Dessa forma,
1997.
instiga a perceber os lugares de cada abordagem, a problematizar as
noções de povo, de cultura, de tradição, de modernidade, de raça, DURKHEIM, Émile. As
presentes em diversos prismas. formas elementares da vida
religiosa. São Paulo:
De agora em diante, verá que coletamos um material de festas,
Martins Fontes, 1996.
do pagamento de promessa, da importância da casa, da rua, do ritual,
tudo isso se fazendo valores locais e universais para “matutar” por muito LOTMAN, Iuri. La
tempo. Utilizamos largamente o método da antropologia social. semiosfera de la cultura,
Del texto de la conducta y
Enfim, tecer considerações sobre o termo festa sugere alegria,
Del espacio. Madrid:
sugere encontro, sugere reunião, celebração de um acontecimento, tendo
Cátedra, 1998.
também como objetivo o divertimento. Assim, as festas populares
propiciam um clima que permite atitudes informais e a possibilidade de CASCUDO, Luís da
diminuir as distâncias sociais, pois tanto a festa quanto a rotina são modos Câmara. Literatura Oral no
que a sociedade tem de exprimir-se e renovar-se . É o continuum do “nada Brasil. Rio de Janeiro: José
se perde, tudo se transforma” nos Vales do Jequitinhonha e São Francisco. Olympio, 1978.

403
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

2.2 FESTAS RELIGIOSAS ÀS MARGENS DO JEQUITINHONHA E DO


SÃO FRANCISCO

Herdado do branco, do negro e o do índio, o folclore nos Vales do


São Francisco e do Jequitinhonha apresenta grande número de
manifestações típicas locais, que se mantêm, ao longo dos anos em
decorrência do isolamento da região, puras e livres da influência da mídia,
tão comuns em centros de mais fácil acesso, onde acabaram por se
transformar unicamente em espetáculos para turistas.

Figura 14: A Festa do Boi.

O “Boi-de-reis”, no Jequitinhonha, é um bailado dramático,


organizado em cortejo, no qual os principais personagens são o Boi, o
Cavalo Marinho, Mateus e o Médico. Também o congado é um bailado
popular dramático, no qual os negros representam, entre cantos e danças,
a coroação de um Rei do Congo. Ricas em coreografia e colorido, essas
manifestações folclóricas já atravessaram as fronteiras da região,
encantando a todos que as viram. Em todo mês de Janeiro ocorre em Pedra
Azul/MG uma tradição de mais de 50 anos: O Boi-de-Janeiro, uma
homenagem aos "Santos Reis", que faz parte da Festa do Reinado. O boi
percorre as ruas, praças e casas da cidade acompanhado pelos Reseiros,
que definem o ritmo. A música é tipicamente Afro, com sanfona, pandeiro,
triângulo, caixa, bumbo e gaitas. Uma atração marcante na festa é a
presença da boneca gigante Maria Tereza. A boneca sai no dia seis de
janeiro, último dia de festa, e provoca brigas admiráveis entre os bois.
Somente um grupo leva a boneca que fica sob seu domínio até o próximo
ano.
A festa do boi em Minas e no Brasil recebe vários nomes, como
Reis-de-boi, Boi-de-mamão; Boi-de-reis, Bumba-meu-boi. Em São
Francisco/MG há o Boi-de-reis, que percorre as ruas da cidade, arrastando
multidão. Os homens vestem-se de mulheres (as Catirinas), usam
máscaras e vendem o Boi de porta em porta. Quem compra o Boi recebe
toda a comitiva dançando e cantando, louvando o dono da casa. É uma
alegria só a Dança do Boi. É um folguedo que ocorre ao longo do mês de

404
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

janeiro no Vale do São Francisco e no Vale do Jequitinhonha. O grupo é


composto pelo Boi da Manta, pela Mulinha de Ouro, pelo Bicho
Tamanduá, e os vaqueiros, que fazem brincadeiras e piruetas pelas ruas,
acompanhados dos caixeiros e de um bom criador de versos ou mulheres
cantadeiras. A participação de crianças e jovens neste folguedo é bastante
significativa. A narrativa da festa é toda igual: diz que Mãe Catirina,
durante a gravidez, teve desejo de comer a língua do boi mais bonito da
fazenda onde vivia. Seu marido, o peão Francisco, desesperado em
atender ao pedido da esposa mata o animal de estimação de seu patrão,
porém, o feito é descoberto e o homem é preso. Com o intuito de salvar o
boi o amo chama um médico e um padre, que acabam conseguindo
ressuscitar o animal. Pai Francisco é perdoado e todos iniciam uma festa.

Figura 15: Boi-de-Reis.

Todo o Vale apresenta também variedade bastante apreciável em


seus aspectos religiosos. A religiosidade do povo do Jequitinhonha
encontra sua maior expressão na Festa do Divino, realizada anualmente na
cidade de Diamantina e Turmalina, com a presença de turistas. Na cidade
de Virgem da Lapa, com a participação de milhares de romeiros há a festa
de Nossa Senhora da Lapa. Já em Araçuaí, a festa do Rosário atrai
multidões do Jequitinhonha e do vizinho Vale do Mucuri. Em toda a região
vêem-se, ainda, batuques, sapateados, mitos, lendas e crenças.

Figura16: Apresentação do Coral das Lavadeiras de


Almenara.

405
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Fundado pelo cantor e pesquisador Carlos Farias, em 1991, o


Coral das Lavadeiras é composto por um grupo de mulheres que exercem o
duro trabalho na lavanderia comunitária em Almenara-MG, na beira do
Rio Jequitinhonha, e registram nas canções que entoam e em suas
conversas a cultura popular de uma riquíssima região. São cantigas,
toadas, afoxés, cantigas de roda, num linguajar corriqueiro, autêntico,
resultantes de heranças indígenas, portuguesas e africanas, recolhidas e
adaptadas pelo maestro Carlos Farias. Em suas apresentações, dirigidas
por Carlos Farias e banda de apoio, as lavadeiras-cantoras mostram toda a
beleza da cultura popular brasileira, num espetáculo que reúne teatro,
música, dança e contação de histórias.
As festas populares e religiosas confirmam a cultura e a tradição
da população comprovada nas cerimônias, festivais e rituais religiosos.
Essas celebrações reafirmam vínculos sociais ao aproximar as pessoas e
resgatar suas procedências. Exprimem cultura e tradição dos povos, tanto
pelas cerimônias festivas quanto pelos rituais religiosos. Essas celebrações
reafirmam laços sociais, e raízes que aproximam os homens, movimentam
e resgatam lembranças e emoções. Têm características semelhantes
mesmo com enfoques diferenciados, como as manifestações do canto, da
dança, da música e, principalmente, o espírito de troca e fortificação, tão
bem expressos no dito popular "lavar a alma". As festas populares e
religiosas traduzem a cultura popular, a linguagem do povo, tudo que vem
dele e de sua alma.
Ainda que possuam enfoques diferenciados, apresentam
similitude nas exposições de canto, dança, música e, principalmente, no
espírito de troca e fortificação de suas raízes. Estas manifestações
explanam a cultura popular, a linguagem do povo, tudo que vem da
essência de suas origens.
Em Montes Claros/MG, há mais de um século, nos dias 17 a 21 de
agosto são realizadas as festas religiosas em homenagem a Nossa
Senhora do Rosário, São Benedito e ao Divino Espírito Santo. Além das
celebrações genuinamente religiosas, como missas, bênçãos e
levantamento de mastros, realizam-se ainda as "Marujadas", "Cabocladas"
e "Catopês". A "Marujada" é a teatralização de uma epopéia marítima,
exaltando os feitos dos marinheiros portugueses e os princípios cristãos da
Religião católica, com características regionais. A encenação conta com a
participação de 18 a 24 "Marujos", com vestimentas enfeitadas com
rendas e cetim, metade em azul e outra em vermelho.
Os "Marujos" saem dançando pelas ruas, entoando canções
suaves, que agradam a todos. Em formação de colunas, com instrumentos
musicais, dirigem-se em cortejo até a igreja de Nossa Senhora do Rosário,
a fim de participar das festividades do mês de agosto.
Os "Catopês" ou "Dançantes" correspondem aos "Zumbis" ou às
"Congadas" de outros lugares, mas com adaptações regionais. Os
participantes agrupam-se em "ternos", contendo cada um deles cerca de

406
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

vinte pessoas, entre adultos e crianças, todos homens. Com vestimentas


simples, os "Catopês" nos dias das festas saem pelas ruas cantando ao
ritmo de tambores, e formam um cortejo com o rei, a rainha, membros das
famílias dos festeiros, o povo da cidade e a banda de música, que
acompanham o séqüito até a igreja de Nossa Senhora do Rosário.

Figura 17: Mestre Zanza-Catopê de Montes


Claros.

As "Cabocladas" ou "Caboclinhos" constituem um divertimento de


origem indígena. Seus figurantes são dez a quinze pares de crianças entre
sete e dez anos, vestidas com saiotes vermelhos, enfeitados com plumas.
Usam também capacetes de penas e carregam arcos e flechas. Além
desses "Caboclinhos", o grupo é completado por uma figura infantil, o
"Caciquinho", por seis figuras adultas, dois porta-bandeiras e os músicos.
Os adultos envergam roupas enfeitadas de penas e muitos balangandãs,
sem qualquer semelhança com trajes indígenas. Todos os componentes
desse conjunto assistem à Missa e acompanham silenciosos os festejos.
Nas Festas Votivas, em São Francisco/MG, a cantiga das
dançadeiras rege as palavras da reza, no pagamento de promessas. É um
narrar cantado, contado e dançado, fazendo-se energia e sopro de vida,
presentificando São Gonçalo de Amarante. O santo violeiro. No canto, as
palavras têm a força de trazer consigo os signos da tradição em que são, já
que dali advém o poder que gera e dirige o canto e a dança. As
dançadeiras de São Francisco, da Dança de São Gonçalo, partilharam
suas palavras e sua memória, e com elas contemplam todos os devotos
uma caminhada, construída por muitas vozes. E as principais vozes que me
deram o consentimento para gravar, fotografar e matutar sobre elas são as
de João Pomba-triste, Maria de Rosa e Adão Barbeiro, já falecido.
Conta a lenda que São Gonçalo reunia em Amarante, Portugal,
várias mulheres que durante uma semana dançavam até a exaustão. O
objetivo do santo era extenuar as mulheres para que no Domingo, dia do
Senhor, elas ficassem em repouso e isentas de pecado. A lenda conta ainda
que o santo tocava viola para as mulheres dançarem.
No Brasil, a devoção a São Gonçalo vem desde a época do
descobrimento. O seu culto deu origem à dança de São Gonçalo, cuja

407
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

referência mais antiga data de 1718, quando na Bahia assistiu-se a um


festejo com uma dança dentro da igreja. No final, os bailarinos tomaram a
imagem do santo e dançaram com ela, sucedendo-se os devotos. Essa
dança foi proibida logo em seguida pelo Conde de Sabugosa, por associa-
lá às festas que se costumavam fazer pelas ruas em dia de São Gonçalo,
com homens brancos, mulheres, meninos e negros com violas, pandeiros e
adufes dando vivas a São Gonçalo.
São Gonçalo tem, para os seus devotos, a tradição de santo
casamenteiro. Inicialmente, a dança tinha um caráter erótico, que com o
tempo foi desaparecendo, permanecendo apenas o aspecto religioso. É
interessante ressaltar que existem muitos fenômenos da cultura popular
que não estão catalogados como indústria cultural. E esta Festa de São
Gonçalo, em São Francisco, ainda, não se transformou em uma festa de
massas.
Nossas incursões na história da festa sempre foram muito
modestas. Deparamo-nos com batuques, folganças, bailados, carnavais.
Mas a festa que se constitui no meu arcabouço principal é a Festa de São
Gonçalo de Amarante, a exemplo de Michel Vovelle (1985), quando diz
que “a festa é um campo maravilhoso de observação para o historiador,
porque filtra metaforicamente todas as tensões de uma dada sociedade”.
Talvez seja um exagero do historiador francês, o que não significa
desmerecer a festa como problema valioso para uma comunidade. Todos
sabem que a festa está na moda. Sabem, também, que muitos
historiadores encontram a vantagem de um público mais receptivo às
pesquisas e encontram, ainda, uma teia complexa de idéias, que tornam a
interpretação da festa mais difícil. Assim sendo, é forçoso notar que a festa
somos nós mesmos.
Dessa forma, na Festadança de São Gonçalo, procura-se sugerir
que, no universo narrativo da reza mostra todas as coisas vivem na fronteira
do seu contrário: o amor corteja o ódio, conhece-o e o entende; tudo se
passa da mesma maneira com o amor e a fé em Gonçalo se sobrepondo ao
pecado; a fé que se desenvolve nas imediações da esperança, mas
também do ateísmo, vendo-o e compreendendo-o, enquanto a descrença
vai, aos poucos, se avizinhando da fé no Santo, que não sabiam que o era.
Aqui, neste texto, a Festadança de São Gonçalo de Amarante
possui um nítido caráter tradicional, ao menos no âmbito dos atores,
percebendo-se, mais uma vontade consciente, uma organização
minuciosa, uma extrema codificação e ritualização de discursos, de gestos
e de seqüências rituais.
E em se tratando da Festadança de São Gonçalo de Amarante
dois tipos de espaços são predominantes: o espaço confinado e o espaço
expandido. Essas duas formas se reproduzem em correspondências: o
espaço do corpo, individual, em oposição ao espaço da relação, onde
figuram a sociedade e a nação.

408
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

A Festadança de São Gonçalo de Amarante , originalmente


portuguesa e que agora plenamente brasileira, possui um caráter
puramente religioso. É realizada na rua, em frente à casa do pagador da
promessa, na cidade de São Francisco, norte de Minas Gerais, nas
barrancas do rio São Francisco.
Ao celebrar por mais de 70 anos os pagamentos de promessas
dançantes em louvor a São Gonçalo de Amarante, a população de São
Francisco passa a se identificar com os rituais: músicas, violas, a dança, o
encontro das famílias e a comida.
Homens, mulheres, jovens, velhos, todos, na cidade
desempenham um papel relevante na construção de um corpo narrativo
em torno da Festadança de São Gonçalo. Os narradores, enquanto seres
sociais, projetam seus desejos ao mesmo tempo em que delineiam um
espaço e um tempo contraditórios. E nessa narrativa polivalente,
movimentam-se, dialogicamente, a tradição e a modernidade, elementos
que, simultaneamente, transformam os corpos daqueles que narram em
guardiães do tempo e do espaço paradoxais, outorgando a tradição
barranqueira.
Faremos uma tentativa de
compreender a intricada teia de relações que
forma o universo local e universal, partindo
da dança, da casa, da rua, do pagamento de
promessa, da festa religiosa.
São Gonçalo tocava viola e se
utilizava da dança para fins religiosos, daí
chamarem-no de “santo folgazão”, que Figura 18: Dança de São
gosta de divertir-se, e dizerem que a primeira Gonçalo em São Francisco.
música que Jesus ouviu, na terra, foi São
Gonçalo quem dançou para ele, embora haja grande intervalo de tempo
entre essas duas existências.
Para o povo de Barra do Guaicuí, São Gonçalo de Amarante é
santo casamenteiro, patrono da fecundidade humana e, ainda, padroeiro
dos violeiros. Já em São Francisco, segundo confirmou a narradora D. B GC
Maria de Rosa, ele é sempre o santo milagreiro, o padroeiro dos violeiros; GLOSSÁRIO E
nunca casamenteiro, pois quem o é, de fato, é Santo Antônio da Serra das A F
Araras, mas aí é uma outra história. Rodas: nomes da
O número de rodas depende da promessa feita, que pode variar coreografia, que também
entre seis, doze, vinte e quatro e, ainda, trinta rodas, porém é bastante são conhecidas por Voltas
comum as doze rodas. O número de “Rodas” e arcos vai depender da ou Langues. É uma espécie
promessa feita ao santo. A “Roda” inclui “trocados” e “formas de movimentos em círculos,
dançantes”, em que o Guia procura não se repetir. onde as dançadeiras fazem
A partir do exposto, vê-se o ponto fundamental da trajetória dos as evoluções com seus
barranqueiros, chamar a atenção para a festa popular-sagrada, pois não arcos brancos, recobertos
consideramos, em nenhum momento, que a festa popular seja profana ou de papel de seda em
que tenha elementos profanos, ainda que há dança diversa, batuques, franjas.

409
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

A Reza cantada

8
Pai e filho, Espírito Santo
Ora viva e reviva
Pai e Filho, Espírito Santo
Ora viva e reviva
Nas horas de Deus eu Canto
Viva São Gonçalo! Viva
Nas horas de Deus eu Canto
Viva São Gonçalo! Viva
2
9
Ora viva e reviva
O preso estava doente
Ora viva e reviva
O preso estava doente
Viva São Gonçalo! Viva
Doente para morrer
Viva São Gonçalo! Viva
Doente para morrer
3
São das primeiras toadas
10
São das primeiras toadas
Ora viva e reviva
Que nesta vitória eu canto
Ora viva e reviva
Que nesta vitória eu canto
Viva São Gonçalo! Viva
4
Viva São Gonçalo! Viva
Ora viva e reviva
11
Ora viva e reviva
São Gonçalo disse ontem
Viva São Gonçalo! Viva
São Gonçalo disse ontem
Viva São Gonçalo! Viva
Hoje tornou a dizer
5
Hoje tornou a dizer
Mandei fazer minha casa
12
Mandei fazer minha casa
Ora viva e reviva
Com as janelas para o mar
Ora viva e reviva
Com as janelas para o mar
Viva São Gonçalo! Viva
6
Viva São Gonçalo! Viva
Ora viva e reviva
13
Ora viva e reviva
Que tratasse do enfermo
Viva São Gonçalo! Viva
Que tratasse do enfermo
Viva São Gonçalo! Viva
Senão havia de morrer
7
Senão havia de morrer
Para ver meu São Gonçalo
14
Para ver meu São Gonçalo
Ora viva e reviva, Ora viva e reviva
Que vem lá de Portugal
Viva São Gonçalo! Viva. Viva São Gonçalo!
Que vem lá de Portugal
Viva

sapateados e muita pinga. É lá, no que chamam profano, que o sagrado


volta a beber para fortalecer e revivescer os laços da tradição, da ruptura e
da continuidade. Para mim, toda festa é sagrada.
É interessante conhecer o significado do sagrado e profano,
conforme o que se expõe a seguir. O Sagrado é a descoberta inicial do
centro, onde o homem sente-se igual a si mesmo, diferente do informe, do
estranho, ponto fixo onde o humano descansa, cria e trabalha. É uma ação
impura de humanidade, onde tudo é novo, molhado de sangue e água,
espanto e vida. Tudo em volta da coletividade ainda é Sagrado, mas nesse
momento o Sagrado é o muito próximo, é ação humana viva de criação por
puro exercício diferenciado de vida. O Sagrado faz nascer o sentido e o

410
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

significado no momento em que exclui o informe, o inumano, o animal, o


desarticulado. O campo de significados nasce antes de tudo como
sentimento e pratica da diferença, da estranha e única identidade
humana.
Já o que chamam de Profano, que será a outra face do Sagrado, é
uma criação do próprio Sagrado, seu equilíbrio, sua garantia, seu medo.
Será através do Profano que o Sagrado conquistará sua moldura perfeita,
não mais o Caos, que voltará somente como componente do Sagrado. O
Profano que será a outra face do Sagrado, é uma criação do próprio
Sagrado, seu equilíbrio, sua garantia, seu medo. Será através do Profano
que o Sagrado conquistará sua moldura perfeita, não mais o Caos, que
voltará somente como componente do Sagrado.
Por fim, a arte, as danças, as músicas, os folguedos, tudo é
imprescindível para a formação global do ser humano. A criança e o jovem
deverão ser conduzidos desde cedo à apreciação da beleza como
realidade, na natureza e na arte, para que possam compreender a sua
importância e o seu significado na vida e na história.

2.3 ARTE POPULAR: MÃOS MODELADORAS, CORPOS QUE FALAM

Em cada canto das gerais encontra-se a arte popular, desta vez


manifestada pelas mãos modeladoras do barro, da linha, da madeira ou
da palha, aquela feita pelo povo e para o povo. O artista popular mantém
raízes com a comunidade que faz parte sendo grandemente influenciado
na sua criação pelos seus motivos e significados simbólicos e estéticos. O
artesanato faz referência a uma herança cultural das diferentes etnias que
consistem um povo, como no caso do Brasil.
O Vale situa-se no norte do Estado de Minas Gerais-MG sendo
banhado pelo rio Jequitinhonha e seus afluentes. Ocupa uma área de mais
de 85 mil km² onde vivem 1 milhão de pessoas, aproximadamente,
distribuídos em cerca de 80 municípios sendo considerada uma das
regiões mais pobres do Brasil. A maior parte do solo é árido sendo
castigado regularmente por secas e enchentes. 75% de sua população vive
na área rural praticando uma rudimentar agricultura e pecuária. A região
no passado era formada por florestas e habitada por tribos indígenas. O
que mais contribuiu para a degradação da região foi a atividade predatória
da mineração e extração do diamante.
No Vale do Jequitinhonha, produz-se um excelente e criativo
artesanato em Cerâmica, Tecelagem, Cestaria, Esculturas em Madeira,
Trabalhos em Couro, Bordados, Pintura, Desenho, Música. Os principais
pólos da atividade cerâmica são as cidades: Itinga, Araçuaí, Santana do
Araçuaí, Turmalina, Caraí, Itaobim, Taiobeiras, Padre Paraíso, Joaíma e
Minas Novas. Os mais famosos ceramistas são: Isabel Mendes da Cunha;
João Pereira de Andrade, seu genro casado com sua filha Glória Maria,
também ceramista; Ulisses Pereira Chaves; Noemisa Batista da Silva;
Raimunda da Silva (Dona Mundinha); João Alves e Dona Pedra.

411
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Figura 19: Cerâmica do Jequitinhonha/Casario.

Os trabalhos com barro no Vale iniciaram-se com a confecção de


peças utilitárias que eram feitas pelas mulheres chamadas de paneleiras. A
tradição manteve-se através das gerações- bisavós, avós, mães e filhas.
Faziam moringas, vasilhas, panelas, potes etc, tudo com uma marcante
influência indígena. Produziam também figuras para adornar Presépios e
brinquedos utilizados pelas crianças. Com o passar do tempo passaram a
produzir peças decorativas “de enfeite” como dizem. Figuras humanas,
animais, cenas do cotidiano, tipos, usos e costumes da região.
Uma das várias identidades de um povo é a sua cultura, o seu
folclore e o seu artesanato. Então, sabes o que é artesanato? O Artesanato
é um conjunto de trabalhos manuais que requer destreza e habilidade
artística. São peças funcionais ou decorativas que simbolizam a cultura e o
folclore de um povo. Então, qualquer trabalho manual que tu fazes pode
ser considerado artesanato, embora com a mecanização da indústria o
artesão é identificado como aquele que produz objetos pertencentes à
chamada cultura popular. O artesanato é tradicionalmente a produção de
caráter familiar, na qual o produtor (artesão) possui os meios de produção
(sendo o proprietário da oficina e das ferramentas) e trabalha com a
família em sua própria casa, realizando todas as etapas da produção,
desde o preparo da matéria-prima, até o acabamento final; ou seja, não
havendo divisão do trabalho ou especialização para a confecção de algum
produto. Em algumas situações o artesão tinha junto a si um ajudante ou
aprendiz.
Folclore significa o “saber do povo”, ou seja, é o que o povo diz, o
que o povo faz e o que povo sente. É uma cultura tipicamente popular.
Vamos falar mais sobre o artesanato. Esse tipo de arte que não é somente
popular, mas que tem vários elementos da arte clássica e que começou
com o homem pré-histórico, modernizou-se através dos anos, ou melhor,
dos séculos, ganhou características regionais de cada grupo de pessoas e
hoje, é o artesanato que conhecemos, rico em variedades, formas,
tendências e estilos.
Uma curiosidade: os homens das cavernas já faziam artesanato.
Foi quando aprenderam a polir a pedra, a fabricar a cerâmica e a usar peles
de animais para se aquecerem. Os primeiros objetos eram pratos, tigelas e
copos bem rudimentares que eram usados no dia-a-dia. Os artefatos são
símbolos, sinais portadores de referenciais que dão sentido e norteiam seus

412
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

modos de estar no mundo, são uma trama onde se torna possível


apreender o sentido dos acontecimentos vividos. Como o sistema de
significado e de símbolos culturais que operam nos discursos e nas práticas
da reprodução do simbolismo de gênero estão nos acontecimentos vividos,
ou seja, difusamente, disseminados por todos os níveis do social (família,
idade, status, prestígio, trabalho, linguagem, classe), tentamos relacionar
o simbolismo de gênero a outros símbolos e significados culturais, assim
como à forma de vida e das experiências sociais na região do Vale do
Jequitinhonha.
Esta diferenciação acontece, principalmente, pela maneira e
intenção que a arte popular é produzida já que, na maioria das vezes, a
pessoa que cria a peça aprendeu seu “ofício” com os pais ou outra pessoa
mais experiente. O que tem se discutido em arte é que a arte popular, assim
como a arte erudita, tem seus valores estéticos próprios oriundos da
maneira como é produzida, dos materiais e técnicas empregados e da
intenção do criador. De fato, as peças facilmente são encontrada e
comercializadas nos centros das comunidades a que pertencem, sendo,
também, exportadas para os apreciadores da arte, tida como erudita.

Figura 20: Cerâmicas do Jequitinhonha.

Podemos afirmar, no entanto, que a arte popular é atribuída à


produção estética de uma parte da população que não é formalmente
intelectualizada, nem urbana, nem industrial. A arte popular possui como
principais características: ser anônima, pois é resultado de várias
colaborações que passam de geração em geração ao longo do tempo,
geralmente feita oralmente; apresenta visão de mundo de um
determinado grupo social, ou seja, o conteúdo da tradição cultural e
folclórica expressa os sentimentos comuns de uma coletividade;
desenvolve-se dentro de convenções tradicionais; tem como maior público
apreciador pessoas de seu próprio grupo ou comunidade; resiste às
influências dos modismos ditados pela elite dirigente.
A arte popular pode ser considerada o retrato de uma nação, pois
guarda características peculiares e genuínas do povo que formou esse
grupo durante anos. Muitas pessoas acreditam que esse tipo de arte é
produto apenas de pessoas que vivem na zona rural ou de povos
imigrantes. No entanto, grande parte da população que vive na zona
urbana, de grandes cidades, é composta de pessoas que vieram do interior
ou de outros países, incorporando à cidade manifestações de sua cultura.

413
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Figura 21: Carrancas de Pirapora/MG.

No Brasil, a produção de arte popular é muito rica. Esse tipo de


produção atrai a atenção de muitas pessoas e, de modo especial, os
turistas. Em cada região do país existe um tipo de arte popular que se
destaca, e por isso mesmo pode ser vista como uma peculiaridade dos
costumes desse lugar, a característica cultural e folclórica desse povo. Essas
manifestações artísticas populares compreendem além de artes visuais, a
música, a dança, artes cênicas e até mesmo a arquitetura. A verdade é que
a arte popular engloba todas as manifestações típicas, sejam elas
artesanais, culinárias, musicais, teatrais e de danças, um universo mais
amplo, também denominado "culturas populares" sempre no plural,
exatamente por não ter uma unidade. O que tem unidade é a cultura
dominante, pois esta tem um sistema de transmissão: as universidades, os
meios de comunicação, o poder público, aquilo que, a partir da elite, tenta-
se passar para o conjunto da população.
Essa visão sobre a cultura popular, segundo Burke (1988), tornou-
se bastante aceita e rapidamente os setores cultos da sociedade passaram
a se interessar por coleções de poesia popular, contos populares e música
popular. Esse movimento foi denominado pelo historiador inglês como "a
descoberta do povo", e ele via uma série de razões para que isso estivesse
acontecendo naquele momento histórico. Apesar da dificuldade que os
antropólogos enfrentam para definir a cultura, não se discute a sua
realidade. A cultura se desenvolveu a partir da possibilidade da
comunicação oral e a capacidade de fabricação de instrumentos, capazes
de tornar mais eficiente o seu aparato biológico. Isto significa afirmar que
tudo o que o homem faz, aprendeu com os seus semelhantes e não decorre
de imposições originadas fora da cultura. A comunicação oral, portanto,
torna-se um processo vital da cultural: a linguagem é um produto da
cultura, mas ao mesmo tempo não existiria cultura se o homem não tivesse
a possibilidade de desenvolver um sistema articulado de comunicação oral.

414
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento.


Brasília: UnB, 1996.
BENJAMIN, Walter. O narrador. In: Magia e Técnica, arte e política. São
Paulo: , 1987.
BHABHA, Homi. O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1998.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues.
BURKE, Peter. Cultura popular na Idade Moderna. Trad. Denise
Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
CANCLINI, Nestor. Culturas híbridas. São Paulo: Edusp, 1997.
CASCUDO, Luís da Câmara. Literatura Oral no Brasil. Rio de Janeiro: José
Olympio, 1978.
DAMATTA, Roberto. A Casa e a Rua: espaço, cidadania, mulher e morte
no Brasil, 1983.
DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo:
Martins Fontes, 2004.
LÉVI-STRAUSS, C. Antropologia estrutural. Rio de Janeiro:Tempo
Brasileiro, 1993.
LOTMAN, Iuri. La semiosfera de la cultura, Del texto de la conducta y Del
espacio. Madrid: Cátedra, 1998.
RIBEIRO JÚNIOR. A festa do povo: pedagogia e resistência. Petrópolis:
Vozes, 1982.
SANT'ANA, Affonso Romano de. Carnavalização. In: Paródia, Paráfrase
& Cia. São Paulo: Ática, São Paulo(série Princípios), 1985
SOUTO, Generosa. As Transformações da Festadança de São Gonçalo
de Amarante nas Barrancas do São Francisco: tradição e mídia. São
Paulo: PUCSP, 2005. (Tese de Doutorado). Disponível em
www.santoagostinho.edu.br/teses.
VOVELLE, Michel. Ideologias e Mentalidades. São Paulo: Brasiliense,
1987.

415
3
UNIDADE 3
MANIFESTAÇÕES DO FOLCLORE NOS VALES
DO JEQUITINHONHA E SÃO FRANCISCO

Caro cursista, nesta unidade você visitará as Manifestações


Folclorísticas Tradicionais que abrangem a criação literária popular,
constituída por mitos, contos, fábulas, estórias, anedotas, “causos”,
provérbios, adivinhas, poesia popular, quadrinhas, lendas, literatura de
cordel e pára-choques de caminhão. Você conhecerá, a partir de agora,
o Folclore Literário, um cabedal de conhecimentos merecedores de nossa
atenção e que se subdivide em dois grandes eixos Folclore narrativo e
Folclore poético, um leque imenso de sabedoria; e , ainda, o Folclore
Lingüístico, lições de sabenças populares magnificamente sintetizadas
nos provérbios, nas frases feitas, nas adivinhas e trava-línguas, nas
parlendas, nos pára-choques de caminhões. E até mesmo através de
gestos, linguagem universalmente conhecida do ser humano.

3.1 COMPREENDENDO OS SIGNOS DA “TRADIÇÃO” E DO


“FOLCLORE”

A palavra tradição significa, literalmente, transmissão; do latim (:


traditio, tradere = entregar). Em grego, na acepção religiosa do termo, a
expressão é paradosis (ðáñáäïóéò) . Tradição mais precisamente é uma
transmissão oral de lendas ou narrativas ou de valores espirituais de
geração em geração. Uma crença de um povo, algo que é seguido
conservadoramente e com respeito através das gerações. Uma
recordação, memória ou costume. Conhecimento ou prática proveniente
da transmissão oral ou de hábitos inveterados. Tem-se por tradição no
sentido amplo tudo aquilo que uma geração herda das suas precedentes e
lega às seguintes.
A tradição e sua presença na sociedade baseiam-se em dois
pressupostos antropológicos: a) as pessoas são mortais; b) a necessidade
de haver um nexo de conhecimento entre as gerações. Os aspectos
específicos da tradição devem ser vistos em seus contextos próprios:
tradição cultural, tradição religiosa, tradição familiar e outras formas de
perenizar conceitos, experiências e práticas entre as gerações, que,
certamente, sofrerá transformações para continuar a existir e nunca
morrer.
Há, no Brasil, a Ação Griô Nacional que representa uma iniciativa
concreta, envolvendo ONGs e poder público, no sentido de promover a
aproximação entre educação e cultura. O principal objetivo seria fortalecer
a identidade de crianças e jovens brasileiros, sobretudo através de vínculos
entre as diferentes gerações, mediados pela tradição do saber popular. A
ação visa à divulgação e revivescência de lendas, contos, ritos, mitos, a
oralidade com suas transformações, porém viças porque se
transformaram.

416
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Como se vê, as transformações situam-se no centro do estudo da B GC


cultura popular. A transformação cultural é um eufemismo para o processo GLOSSÁRIO E
pelo qual algumas formas e práticas culturais são expulsas do centro da A F
vida cultural e ativamente marginalizadas. Em vez de simplesmente cair Popular: segundo o
em desuso, através da longa marcha para a modernização, as coisas Aurélio, guarda cinco
foram ativamente descartadas para que outras pudessem tomar seus possíveis variantes, sem que
lugares. Contudo, as transformações situam-se no centro da cultura , entretanto, nenhuma
popular e são a chave de um longo processo de moralização das classes delas lhe esgote o
trabalhadoras e de reeducação do povo. conteúdo em definitivo.
Partindo de uma acepção de cultura no sentido mais amplo Vejamos o vocábulo
possível - ou seja, cultura não só como o produto ou construção cultural, Popular: 1- Do, ou próprio
mas também as relações e as diversas maneiras de pensar realidade – do povo; 2- Feito para o
chegaremos a uma primeira conclusão inequívoca: toda cultura é, por povo 3- Agradável ao povo,
definição, popular. A cultura popular, em verdade, mistura-se com a que tem as simpatias dele;
própria noção inesgotável de identidade nacional. 4- Democrático; 5- Vulgar,
Infere-se, contudo, que o adjetivo popular, quando adotado em trivial, ordinário, plebeu.
parceria com o vocábulo cultura restringe, aparentemente, o teor desta,
toldando-lhe a própria abordagem conceitual. Em outras palavras,
podemos situar cultura popular apenas como uma cultura relacionada ao
povo.
Essa observação, porém, é uma das muitas falácias próprias ao
terreno movediço de quem lida com arte no seu cotidiano. Separar uma
cultura popular de uma lendária cultura de elite é seccionar algo
naturalmente atomizado.
Não existe cultura impopular, ou pertencente a uma única casta. PARA REFLETIR
Por mais que se equipare o termo popular ao seu viés plebeu ou vulgar, não
subsiste cultura sem adesão de uma parcela significativa do meio social. A palavra povo, por sua
Isto porque o próprio pensar é impregnado de fatores e substâncias vez, possui diversas
histórico-sociais, as quais operam na formação cultural e implicam implicações ideológicas.
aceitação tácita de costumes e valores que permeiam as populações Pode-se compreender povo
politicamente organizadas. como nação e até mesmo,
Em linhas gerais, as abordagens contemporâneas tendem a como querem alguns,
considerar a cultura popular como 1) um processo plural, em constante como sinônimo de plebe ou
criação e recriação, 2) uma forma de resistência à ideologia dominante ou, simplesmente multidão.
ao contrário, 3 ) como fruto dessa mesma dominação, entendida como o Dessa forma, o mais usual,
resultado de uma relação de tensão entre o interesse do dominante e o quando nos dirigimos à
interesse do dominado e, portanto, ambígua e dissimulada; finalmente, 4) expressão cultura popular, é
como o espaço no qual se reproduzem simbolicamente as relações de um olhar tencionando
poder vigentes na sociedade, ou onde se invertem, temporária e desprestigiá-la, isto é,
ritualmente, essas mesmas relações - a cultura popular é concebida torná-la mais próxima de
sempre do ponto de vista de suas relações com o poder. cultura proveniente das
Tal conjunto normalmente é passado de geração a geração por classes menos favorecidas
meio dos ensinamentos e da participação real dos festejos e dos costumes. (não que estas sejam
De origem inglesa, o folclore é uma palavra originada pela junção das desmerecedoras, apenas
palavras folk, que significa povo; e lore, que significa sabedoria do povo. não é o caso).

417
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Formou-se, então, a palavra folclore que quer dizer sabedoria do povo.


Onde há um povo, há folclore. Devemos lembrar de que Câmara Cascudo
(2002) disse que nem toda produção popular é folclórica, mesmo vinda
do povo.
A idéia pegou e o termo folclore passou, ao mesmo tempo, a
designar o conjunto das manifestações da cultura popular e a ser um
campo de estudos dessas manifestações.
B GC Mas a visão de que o folclore e os folcloristas têm das culturas
GLOSSÁRIO E populares é alvo de críticas de pesquisadores que se debruçam sobre o
A F assunto. Segundo eles, o principal problema é que os estudos folclóricos
Folclore: no Dicionário registram e “imortalizam” as manifestações populares em uma forma fixa,
Houaiss de Língua quando essas manifestações são naturalmente dinâmicas e mutantes.
Portuguesa, entende-se Enquanto transmitidas oralmente de geração para geração através da
como um conjunto de memória popular, que não são exatas e estão constantemente sujeitas a
costumes de um povo, tais diversas influências, os mitos, as lendas, as crendices, as brincadeiras, as
como de crenças, de mitos, festas e os costumes ganham variações, adaptações e são modificadas
de lendas, de festas, de freqüentemente. Ao registrarem essas manifestações orais em livros e
danças, superstições, filmes, os estudos folclóricos tendem a criar um estereótipo delas e a
provérbios, manifestações caracterizar a cultura popular como algo imutável e conservador.
artísticas em geral,
preservado, através da
tradição oral, por um povo
ou grupo populacional;
cultura popular, populário,
sendo a ciência das
tradições, dos usos e da
arte popular de um país ou
região .

Figura 22: Catopés/ Festas de Agosto


em Montes Claros.
Outra corrente de estudos que discorda da abordagem do
PARA REFLETIR folclore, mas de forma bem menos radical, surgiu nos anos 60. Mas tanto o
folclore como o folklife concentram seus estudos em quatro campos: na
O folklife entende que o expressão oral, que inclui as narrativas, poemas e canções populares, na
folclore concentra seus cultura material, que inclui a fabricação de roupas, técnicas de trabalho,
esforços no estudo da mobiliário e culinária popular, nos costumes sociais, como os ritos de
tradição oral e deixa em passagem e as interações sociais nos grupos, e nas manifestações
segundo plano elementos artísticas, como a música, a dança e o teatro.
materiais como os produtos Ao ler o texto Conceito de Folclore, de Roberto Benjamin,
e as habilidades dos Presidente da Comissão Pernambucana de Folclore, é válido ressaltar que
artesãos populares, por as características atribuídas ao folclore se transformaram e é justamente
exemplo. por que se transformaram é que as manifestações culturais continuam
vivas, com novas roupagens.

418
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Segundo Benjamin, quando pesquisadores que estudavam


tradições populares aceitaram - no século passado – a palavra folk-lore
para denominar a sua área de estudos pensavam que a palavra - criada
artificialmente por William John Thoms, em 1846, sintetizava o seu
conceito e, portanto, estaria isenta de controvérsias.
Começaram as discussões. Questionou-se o sentido de saber e os
seus limites. Para alguns, a cultura material estava excluída - artesanato,
técnicas populares como a culinária, a arquitetura, a confecção de
instrumentos musicais, tudo estaria fora do conceito e do campo de
estudo. Para outros, a cultura material somente estaria integrada ao
folclore quando estivesse ligada à cultura não-material - estudos da música
folclórica incluiriam os instrumentos musicais; o estudo das festas
tradicionais incluiria a sua culinária etc.
Para Benjamin, o outro foco de discussão é povo e popular, que
têm muitas acepções. Originalmente, o sentido de povo, no conceito de
folclore, indicava os integrantes das camadas sociais mais baixas das
sociedades camponesas tradicionais. Não existiria um folclore urbano, já
agora aceito. A cultura dos povos primitivos - entre eles os nossos índios -
estava também fora desses estudos.
Por fim, os limites e sentidos semânticos da palavra povo e a
inserção da idéia de sociedade de classes, implícita no conceito de folclore,
atrairia para a discussão intelectuais marxistas, com análises, posições,
idéias e teorias próprias, em geral divergentes do que se havia
estabelecido, aumentando a controvérsia. No Brasil, durante muitos anos,
prevaleceu o que ficou estabelecido na Carta do Folclore Brasileiro,
adotada no I Congresso Brasileiro de Folclore, realizado em 1951.
A Carta do Folclore Brasileiro estabelecia o seguinte: “(...)
reconhece o estudo do Folclore como integrante das ciências
antropológicas e culturais, condena o preconceito de só considerar como
folclórico o fato espiritual e aconselha o estudo da vida popular em toda
sua plenitude, quer no aspecto material, quer no aspecto espiritual”.
“Constituem o fato folclórico as maneiras de pensar, sentir e agir de um
povo, preservadas pela tradição popular e pela imitação e que não sejam
diretamente influenciadas pelos círculos eruditos e instituições que se
dedicam ou à renovação e conservação do patrimônio científico e artístico
humanos ou à fixação de uma orientação religiosa e filosófica”. São
também reconhecidas como idôneas as observações levadas a efeito sobre
a realidade folclórica, sem o fundamento tradicional, bastando que sejam
respeitadas as características de fato de aceitação coletiva, anônima ou
não, e essencialmente popular.
A releitura da Carta, realizada em 1995, durante o VIII Congresso
Brasileiro de Folclore, para a sua atualização, considerando a
incorporação das contribuições de estudos das ciências humanas e de
letras, bem como a adoção de novas tecnologias, especialmente na
comunicação, e das transformações da sociedade brasileira, decidiu re-

419
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

conceituar, considerando que: “Folclore é o conjunto das criações culturais


de uma comunidade, baseado nas suas tradições expressas individual ou
coletivamente, representativo de sua identidade social. Constituem-se
fatores de identificação da manifestação folclórica: aceitação coletiva,
tradicionalidade, dinamicidade, funcionalidade.
O folclore está fortemente ligado a várias ciências que dele
carecem para melhor interpretação dos fatos, devido ao seu caráter
dinâmico, psicológico e social. Dentre estas podemos citar, por exemplo:
a história: que se auxilia do conhecimento popular, pois sem
?
este seria apenas um amontoado de fatos áridos enumeração de dados
sem significação;
? a geografia: também não dispensa o folclore, pois fatores
físicos, climáticos e lingüísticos também influem na formação de um fato
folclórico. Além do que o artesanato, a culinária e as vestimentas
dependem diretamente dos fatores geográficos da região;
a sociologia: o fato folclórico é um fato estritamente social,
?
pois está definido como maneira de pensar, sentir, agir e reagir de um povo;
? a psicologia: não prescinde do conhecimento folclórico para
melhor interpretação do comportamento humano, além de interpretar
fenômenos mitológicos, lendários e simbólicos;
? a religião: também recorre ao folclore para vincular em seus
adeptos, a necessidade da fé, da ética e da moral;
a pedagogia: que tem o objetivo de fazer a criança
?
compreender melhor a sua comunidade, e, o estudo do folclore contém
preciosos ensinamentos de inestimável valor para a educação do povo;
a música, literatura artes plásticas: é indiscutível a influência
?
do folclore nas artes, é ele que lhes dá o caráter nacionalista, sem o qual
elas não sobreviveriam; e
a educação física: também recorre às danças folclóricas,
?
brincadeiras e jogos que proporcionam à criança agilidade, resistência,
senso de responsabilidade, iniciativa e socialização.
Diante da nova conceituação, várias características que haviam
sido atribuídas ao folclore desaparecem, ou são relativizadas:
anonimato - isto é, o fato folclórico não teria autor conhecido.
?
Esta característica colocada em termos absolutos tem sido
progressivamente relativizada. Deixava de fora o artesanato e a poesia dos
repentistas, cujos autores são identificados no ato da sua criação;
? aceitação coletiva - isto é, que seja do gosto, do agrado
coletivo, de prática generalizada. Esta característica tem sido usada na
reinterpretação do anonimato. Para alguns folcloristas, a criação de um
autor conhecido passa a ser folclórica quanto há aceitação coletiva,
quando passa a ser considerada patrimônio comum do grupo e ocorrem
adições, variações e reinterpretações. É também a aceitação coletiva que
torna possível considerar folclóricos os fatos originários da cultura de elite

420
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

que tenham sido aceitos e reinterpretados pelo povo;


transmissão oral - o aprendizado no folclore ocorreria,
?
exclusivamente, por esta forma de transmissão. Tomada em termos
absolutos, esta característica também exclui o artesanato e as técnicas
populares. Exclui ainda a literatura de cordel e outras manifestações
escritas. Renato Almeida considera que a transmissão oral deve ter um
sentido simbólico, por ela somente poder-se realizar no que diz respeito à
palavra, deixando de lado outros aspectos da cultura, onde o aprendizado
se dá de outras formas. Estudos, no âmbito da literatura popular, vêm
redimensionando o conceito de oralidade, a partir da constatação da
existência de matrizes escritas na produção oral, isto é, o que se presumia
que houvesse sido transmitido oralmente, teve uma fase de transmissão
através da escrita. Por outro lado, tem sido documentado, também, a
escrituração da produção oral e até mesmo o aproveitamento deste
material escrito em novas produções orais;
? antiguidade - ser antigo foi condição do fato folclórico, para
folcloristas mais tradicionalistas. A sua significação era entendida ao pé da
letra: velho, vetusto, entrado em anos. Como lembra Paulo Carvalho Neto,
antiguidade chegou a ser sinônimo de ciência folclórica, negando-se o
reconhecimento de novos fatos folclóricos - “folclore nascente”, no dizer
daquele estudioso. Aceitar a condição da antiguidade é negar às pessoas
do povo a capacidade criativa. Certamente, ninguém duvidará que um
escritor erudito crie um conto ou um poema novo. Ao criador popular, se
deveria negar tal possibilidade?
tradicionalidade e dinamicidade - é talvez a característica
?
básica dos fatos folclóricos, é a linha divisória que se coloca entre o popular
urbano, como as canções populares que tocam no rádio, e o folclórico. O
entendimento do tradicional é também sujeito a discussões. Quando se
coloca o que é tradicional em oposição ao que é novo, chega-se à negação
da dinamicidade. A dinâmica cultural, a evolução constante a que todos os
fatos culturais estão sujeitos não permite a admissão do entendimento do
folclore meramente como uma sobrevivência do passado. Há fatos novos
no folclore, pela criação contemporânea do povo e folclorização de fatos
ou manifestações eruditos que estão merecendo a aceitação coletiva. Por
outro lado, há fatos tradicionais que não são folclóricos - como certas
tradições cívicas, religiosas, etc. A tradicionalidade é entendida hoje como
uma continuidade, onde os fatos novos se inserem sem uma ruptura com o
passado, mas que se constroem sobre esse passado - são, por exemplo,
materiais novos com que se refazem peças de vestuário cuja matéria prima
tornou-se escassa ou inacessível; são gírias que se agregam a velhos
contos; são lendas reinterpretadas; é o automóvel e o avião substituindo o
cavalo e a carruagem em narrativas tradicionais; é a fotografia
substituindo a escultura do ex-voto etc.;
? espontaneidade - os fatos e manifestações folclóricos nascem
da comunidade, não são institucionalizados, não surgem de decretos e

421
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

portarias; não se aprende nas escolas através de um exercício sistemático,


mas com a convivência, de forma quase inconsciente e progressiva;
? funcionalidade - os fatos folclóricos integram sistemas
culturais, exercendo funções e, portanto, não se constituindo em traços
isolados. O fato folclórico deve ser entendido na configuração do social, do
econômico, do político etc.; e
regionalidade - a manifestação folclórica é localizada, é
?
própria de uma comunidade, de uma localidade, de uma vila, de um
DICAS povoado. Às vezes, o mesmo tipo de manifestação pode ser encontrado em
localidades diferentes e distanciadas, mas a documentação e análise do
fato vai mostrar que se trata de uma variante, isto é, manifestações que
Acesse o site do Ministério tiveram origens comuns, mas que foram sendo recriadas e/ou
da Cultura: reinterpretadas em cada lugar e se diferenciaram.
www.minc.gov.br. O folclore é universal e tradicional em seus temas e motivos, que
devem ser considerados invariantes. É regional e atualizado na ocorrência
das variantes, que são o resultado da criatividade do portador do folclore e
de sua comunidade, como tem sido demonstrado nos estudos
comparativos do romanceiro e do conto popular por Bráulio do
Nascimento. As formas de conceituar folclore e as metodologias
empregadas em pesquisas e documentação vêm mudando ao longo do
tempo. Desde os anos 80 é comum se orientar pelas concepções da
Antropologia para interpretar o folclore brasileiro, afastando-se da visão
idealizada que marcou os primeiros anos de pesquisa folclórica no país e
que continua sendo veiculada, de forma resumida e padronizada, pelos
textos didáticos.
O folclore no Brasil é muito variado e as diversas regiões
costumam apresentar manifestações especificas, de acordo com a
formação cultural de seu povo. Basicamente, apresenta três heranças
culturais principais: a dos povos indígenas, a dos colonizadores
portugueses e a dos negros africanos trazidos para o país como escravos.
Assume grande importância na história de todos os povos, pois por meio
desse conjunto pode-se conhecer a antiga cultura dos mesmos e a
formação da cultura presente nos dias de hoje. Dentre as características
que possui é possível identificar os fatos folclóricos a partir do anonimato,
juma vez que todos os componentes folclóricos são de autoria
desconhecida; da aceitação coletiva, já que cada pessoa passa a ser sujeito
da sua crença e absorve a essência folclórica, repassando aos outros a
partir de seu entendimento próprio; e da transmissão oral, pois
antigamente não havia meios de comunicação como na atualidade. Para
manter vivo o folclore típico de cada região existem datas específicas para
a realização das rezas, festas e danças.
No Dia Mundial do Folclore, 22 de agosto, são realizados por
todo o Brasil vários eventos temáticos revivescendo a situação do folclore.
Afinal, em pleno século XXI, com mudanças atingindo vários segmentos,
como o folclore resiste ao tempo?

422
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Em vez de tentar definir o que é certo ou errado em matéria de


folclore, o que queremos é compreender os muitos caminhos pelos quais
permanece vivo e se transforma. Que encontros e combinações de tão
distintas tradições são praticados pelos brasileiros? Que criações resultam
das tantas misturas culturais que esse povo é capaz de fazer? Como o
popular e o erudito se combinam? Que relações são possíveis entre folclore
e cultura de massa?
É importante que você saiba de algumas informações errôneas
que se propagaram por todo o país. Para início de conversa, temos de levar
em consideração que não existe um folclore mineiro, brasileiro, ou
qualquer outro folclore nessa linha. Há sim, manifestações folclóricas
localizadas, mas nunca se pode afirmar, com exatidão, a real origem de
um costume. Por isso, o correto é dizer folclore em Minas Gerais ou folclore
no Brasil. Uma característica do folclore é ser espontâneo, ou seja, ele não
é ensinado, é aprendido no convívio diário e transmitido de geração a
geração.
As pessoas não se dão conta de que estão cercadas diariamente
por elementos folclóristicos. Os provérbios são exemplos latentes do
folclore. Quando alguém diz “filho de peixe peixinho é”, ela está re-
citando uma expressão folclórica. Outro aspecto da cultura popular
folclorizado são as festas e celebrações. Uma das mais universais
dessas manifestações e que ainda sobrevive é o Carnaval. Outras, porém,
foram completamente transformadas, como as ligadas aos ciclos das
estações e da agricultura. A celebração do solstício de inverno era comum
nas culturas nórdica, romana e celta, que o celebravam com festas que
duravam dias, como as Saturnálias Romanas, com seus banquetes, orgias
e sacrifícios.
Com a imposição do Cristianismo, essas celebrações profanas
deixaram de existir ou se adaptaram aos princípios cristãos. As festas do
solstício de inverno, por exemplo, foram substituídas pelo Natal.
Celebrações do solstício de verão europeu se transformaram no Dia de São
João, com o predomínio da tradição católica. Trazidas ao Brasil pelos
portugueses e outros imigrantes europeus, elas viraram as festas juninas.
Agora, infelizmente o uso adjetivado do termo folclórico foi sendo
disseminado como referência pejorativa. É preciso atenção, porque todo
folclore é popular, mas nem tudo que é popular é folclore. O candomblé,
por exemplo, não é folclore, é uma religião. O futebol e a música sertaneja
são manifestações populares. Com a intensa profissionalização, a escola
de samba também está deixando de ser folclórica para ser de cultura de
massa.
Os mitos, os ritos, as crendices, as lendas, os folguedos, as danças
regionais, as cantigas de rodas, as loas, os abecês, as histórias populares, a
literatura de cordel, as crendices, os costumes populares, as superstições,
a religiosidade popular ou cultos populares, a linguagem típica de uma
região, a medicina popular, o artesanato em madeira, cerâmica ou palha,

423
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

as adivinhas, a fraseologia popular, as frases de pára-choque de


caminhões, as parlendas, mnemonias, trava-línguas, os apelidos,
xingamentos, as rezas e benzeções, as anedotas, as piadas, as
quadrinhas, as promessas, os ex-votos, , tudo isso é folclore, é vivo, nunca
morre, apenas se transforma para continuar existindo.

3.2 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO FOLCLORE

É popular.
?
Emana do saber cultural.
?
Constitui-se em uma tradição.
?
É transmissível notadamente pela oralidade e pela prática.
?
Faz parte do conhecimento coletivo.
?
Espelha uma situação ou ação.
?
Tem caráter universal.
?
É anônimo, pois desconhecem-se seus criadores.
?
É criatividade livre e espontânea de um povo.
?

3.3 O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988

No Art. 215 da CF/1988 diz que "o Estado garantirá a todos o


pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional,
e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações
culturais". No Art. 216 diz que "Constituem patrimônio cultural brasileiro os
DICAS bens materiais e imateriais, tomados individualmente ou em conjunto,
portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes
grupos formadores da sociedade brasileira nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
Bens Imateriais – segundo
a Unesco, Patrimônio II - os modos de criar, fazer e viver;
cultural imaterial III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
compreende “as práticas, IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços
representações, expressões, destinados às manifestações artístico-culturais; e
conhecimentos e técnicas V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,
junto com os instrumentos, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico".
objetos, artefatos e lugares Transmitido de geração em geração, esse patrimônio é mantido e
culturais que lhes são permanentemente recriado pelas comunidades e grupos em função de sua
associados e que as interação com o meio em que vivem e com a sociedade mais ampla.
comunidades, os grupos e, Exemplos de manifestações da cultura popular: carnaval, danças
em alguns casos, os e festas folclóricas, literatura de cordel, provérbios, samba, frevo, capoeira,
indivíduos reconhecem artesanato, cantigas de roda, contos e fábulas, lendas urbanas, etc.
como parte integrante de Portanto, as crenças, lendas, tradições, costumes , tradições e danças, são
seu patrimônio cultural”. bens imateriais, que compõem o patrimônio cultural, estão protegidos
Ver IPHAN - juridicamente pelo texto constitucional citado. Tratam-se assim de bens
www.iphan.gov.br. imateriais difusos de uso comum do povo e que podem ser protegidos pela

424
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

ação civil pública. Quando manifestações ou representações do folclore


são proibidas por autoridade, lei ou ato administrativo, podem ser
defendidas juridicamente.

3.3.1 Folclore Literário

O Folclore Literário divide-se em narrativo e poético, como se pode


perceber pelo que se segue:
o folclore narrativo abrangendo os contos, os mitos, as
?
lendas, as fábulas, os casos e o anedotário popular; e
? o folclore poético que engloba o cancioneiro materno, com os
seus acalantos, as cantigas infantis, com uma gama imensa de
brincadeiras cantadas, os romances, as quadras, os desafios e a literatura
de cordel.
Iniciando a nossa travessia, selecionamos os mais expressivos
contos barranqueiros do norte de Minas Gerais para este trabalho. Eles
fazem parte de um corpus maior, constituído de muitas horas de gravações
realizadas nos municípios que foram objeto desta pesquisa. Este trabalho
significou a busca de contadores, como também a nossa participação nos
movimentos culturais populares, para o melhor entendimento das
características e contradições da região são-franciscana. Ouvimos
contadores diversos que nos forneceram tecidos de causos, contos,
conversas, versos, cantigas e cantorias.
Escolhemos quatro contadores de diferentes cidades do Vale, e
destacamos da produção suas narrativas, cuja riqueza reside no
movimento dialógico que encetam entre si, o que nos permitiu estudar
elementos marcantes da cultura popular ribeirinha, seu desenvolvimento,
na medida em que os escolhidos registram em velhas formas e “causos”,
gradualmente, as mudanças que ali vão ocorrendo, justamente para evitar
a morte-da-história, re-atualizando os mitos.
Procuramos transcrever os “causos” respeitando, entretanto, a
fala dos contadores, colaborando, dessa forma, para uma continuidade
oral da identidade cultural dos barranqueiros do rio São Francisco.

3.3.2 O tecido desfiado

O tecido é aqui desfiado, exercendo uma função social. O


absurdo e a fantasia apresentados pelos narradores não são gratuitos,
nem desprovidos de sentidos. Trata-se de narrativas que acalentam
crianças e adultos, proporcionando-lhes curiosidades e gargalhadas,
imprescindíveis aos agitados movimentos da modernidade. Nesse largo
tecido, o natural e o sobrenatural coexistem pacificamente; as multifaces
das cenas e das personagens permitem o prazer, gratificando os ouvintes
com uma “única possibilidade que se tem de estarmos seguros de que

425
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

deixou de existir a imoralidade da realidade”, segundo André Jolles (1976).


As narrativas que “prestamos assunto ” , no Vale do São Francisco,
mesclam os mitos universais (sereias, duendes, monstros marinhos e
ciclopes) com as características da região, para que, nessas
transformações, se expressem os desejos dos grupos que ali vivem. Essas
narrativas são reelaboradas, recontadas conforme o modo particular de
ver e agir daquele que narra. Nunca são repetidas as letra, sofrem
variações de acordo com o espaço, o tempo e a experiência de seu
contador. Contar histórias, segundo Walter Benjamin, sempre foi a arte de
saber contá-las de novo.
Daí, a narrativa mergulha na vida do contador e é dela extraída
como informação útil ou como ensinamento. A experiência espontânea
do narrador-barranqueiro de ontem continua a falar pela vivência
semelhante; entretanto, o jovem narrador-barranqueiro de hoje é diferente
do velho narrador, porque possui uma aquiescência passiva ao presente e
se alastra em novas formas de comunicação. Buscam maneiras de
adequação à nova realidade.
A construção episódica é evidente tanto nos causos fantasmáticos
e sobrenaturais quanto nos depoimentos pessoais, o que pode mostrar o
trabalho do narrador-barranqueiro enquanto alfaiate de vozes,
entrelaçador de “cantos” diferentes – patrimônios da coletividade que ele
representa. Artesão que cria e, em sua enunciação, mostra uma textura
particular e única, apesar dessa textura ir sendo moldada, à medida que é
enunciada. Por isso, adquire as luzes e as cores que lhe empresta o
narrador, tão diversificadas quantas forem as infinitas vezes em que sejam
narradas. Daí que a narrativa seja poiesis, o trabalho artesanal com a
palavra.
O narrador é dependente da matéria com que trabalha — a
palavra - e isso se evidencia, inclusive, através do nível formal de sua
enunciação que, nessas narrativas, não só espelha um determinado
imaginário, como também contribui para constituí-lo e conservá-lo ana
memória coletiva.
As narrativas do Vale são constituidoras de identidade, na medida
em que adquirem autonomia no momento de sua enunciação viva, que
parte do social, passa pela recriação individual (em que a poiesis ocupa
lugar fundamental), e volta de novo ao social. Nesse movimento, a própria
identidade que é constituída é também reatualizada.

3.3.3 Mitos

Mitos são narrativas de fatos que transcendem a natureza


humana. E o Benjamim transcende, no dizer dos barranqueiros. Dizem que
ele tem “alma”. Falam que naquele Vapor Benjamim Guimarães,
conforme a foto, residem seres encantados e que o seu apito é um grito de
socorro, em noite de lua cheia. Fica lá no cais, sozinho.Afirmam que seus

426
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

personagens seriam entes sobrenaturais ou divinizados: deuses, gênios,


demônios, totens, duendes, caboclo d'água, mãe d'água.

Figura 23: Vapor Benjamim Guimarães em


Pirapora/MG.

Mitos são histórias que apresentam um fato natural, histórico ou


filosófico, funcionando como ponto de equilíbrio entre aquilo que chamam
de sagrado e profano. O mito é a mais antiga forma de conhecimento, de
consciência existencial e ao mesmo tempo, de representação religiosa
sobre a origem do mundo, sobre os fenômenos naturais e a vida humana.
Deriva do grego mythos, palavra, narração ou mesmo discurso, e dos
verbos mytheyo (contar, narrar) e mytheo (anunciar e conversar), conforme
o Aurélio (1986). Sua função, portanto, é a de descrever, lembrar e
interpretar todas as origens, seja ela a do cosmo(cosmogonia), dos
(teogonia) , das forças e fenômenos naturais (vento, chuva, relâmpago,
acidente geográfico, seja ela a da causas primordiais que impuseram ao
homem as suas condições de vida e seus comportamentos. Em síntese, é a
primeira manifestação de um sentido para o mundo.
O mito não é uma simples narrativa, nem uma forma de ciência,
nem um ramo de arte ou de história, nem uma narração explicativa. O mito
cumpre uma função sui generis, intimamente ligada à natureza da
tradição e à continuidade da cultura. A função do mito é, em resumo, a de
reforçar a tradição e dar-lhe maior valor e prestígio, unindo-a à mais alta,
melhor e mais sobrenatural realidade dos acontecimentos iniciais.
Segundo Eliade (1972), o Mito conta uma história sagrada, narra as
façanhas de seres sobrenaturais.
Na perspectiva funcional, o mito é conhecimento que fundamenta
e consolida a convivência humana. Nele e por ele acontece a vida
associada. Ele amalgama os indivíduos. Convence-os a participar juntos da
origem e do destino de suas vidas. E é por isso que a narração mítica tem
como cenário a vida comunitária. Ao narrar os mitos, a comunidade narra
os acontecimentos de sua vida: o nascimento, a morte, a família, o
parentesco, o uso das coisas, crenças, as práticas religiosas, as festas, as
danças, as atividades de sustento e de ocupação do solo, os conflitos de
guerra, as alianças de paz.

427
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Podem-se classificar os mitos em: teogônios (a origem dos


deuses); Cosmogônicos (origem e evolução da Terra) - Ex.: Na primeira
parte do Livro do Gênesis, a criação do mundo se dá a partir do nada
(creatio ex nihilo). Astronômicos (origem e atuação do mundo astral);
culturais (origem dos seres e explicação de uma prática, uma crença);
naturais (os fenômenos físicos); etiológicos (origens das coisas).
As vozes narradoras que compõem esta pesquisa aparecem para
indicar possibilidades várias de apreensão do real. Os narradores atuam
como 'caçadores', fazendo da curiosidade um estímulo para se inquietar
pelas verdades explicitadas nos monólogos. Essas vozes narram os
acontecimentos de maneira sincrônica, remontando as cenas e
descobrindo, talvez inconscientemente, a liberdade temporo-espacial,
“reiterando um agenciamento sígnico entre a voz e o gesto”
(ZUMTHOR,1993), com liberdade e maestria.
Outrossim, surge a grande voz da cantoria do Vale, o Côro, que se
faz semente inaugural de toda a comunicação com São Gonçalo,
inscrevendo-se no universo da voz e integrando-se no que Paul Zumthor(
2001) chama de “oralidade secundária”, ou seja, aquela oralidade própria
dos textos que mesmo sendo escritos para não se perder, conservam
acentuadas com profundas marcas orais.
Abordarei adiante a narrativa mítica do barranqueiro Edvalson,
codnome “Galinha Tonta”, que contribuiu com sua sensibilidade,
incorporando o pensamento no imaginário religioso, mesclando a
linguagem e o tempo. A partir de agora, passarei a mostrar a estratégia
desta narrativa.
Este mito foi colhido entre um grupo de barranqueiros.
Iniciaremos nossa análise, preservando o jeito oralizado do narrador,
observando que desde o título já se delineia o tom enigmático da narrativa
“Os mergulhos do Galinha”, que analisaremos mais adiante. “Galinha
Tonta” é o apelido de Edvalson Bispo dos Santos, um rapaz solteiro,
poliglota auto-didata, de 50 anos, residente na cidade de São Francisco
(MG).
Edvalson ganhou esse codinome porque rodopiava até cair,
quando criança, como uma galinha tonta. É um poliglota. Fala, lê e
escreve, fluentemente, em inglês, japonês e alemão. Segundo o narrador,
aprendera a falar através de sonhos, que envolviam três crianças dos países
das línguas em questão. Este fenômeno pôde ser comprovado pelo vigário
da cidade, Pe. Vicente, alemão que vive em São Francisco há mais de
quarenta anos; o inglês foi comprovado pela professora Mariléia de Souza,
da Universidade Estadual de Montes Claros, que travava diálogos quase
sempre com ele, quando ministrava um curso na cidade de São Francisco.
Estudou apenas o MOBRAL( Antigo Programa de alfabetização
de adultos do Governo Federal) e concluiu a quarta série primária do
Ensino Fundamental. A língua portuguesa do Brasil, para ele, é língua
materna, mas acha uma complicação as suas várias concordâncias na

428
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

OS MERGULHOS DO GALINHA TONTA


Narrador: Edvalson Bispo dos Santos, 50 anos, de São
Francisco/MG.

Figura 24: Edvalson, o poliglota


Galinha Tonta, traduzindo.

Os mergulhos é o seguinte: Eu tinha o costume de ir nadar no


rio, né? De mergulhar. Minha mãe dizia:
“- Minino, você não vai nadar no rio que é muito pirigoso.”
Então, eu mergulhava iscondido, pegava aqueles “carizinhos”
e tudo. E depois chegava:
- Ó, mãe, o que eu peguei!
“- Eu num já falei com você que não mergulhasse no rio? Uma
vez cê vai arrepender, que é muito pirigoso!”
Aí, certa vez, fui mergulhar nas pedreiras, onde tem a
Copasa. Aí eu peguei, mergulhei, dei o primeiro mergulho. Quando eu
mergulhei a primeira vez, tinha uma... uma pessoa estranha lá na
minha frente, uma moça. E eu falei:
- Meu Deus! Como é que é isso?
Aí ela começou dançar ni meu rumo. Aí eu falei assim:
- É uma moça e é bunita! De longe dava pra ver os cabelão,
mas num dava pa vê o rosto direito. Aí eu peguei e fui lá em cima, tomei
folgo, fui até a superfície para tomar o ar. Tornei mergulhar, aí ela
chegou mais perto de mim, cada vez mais perto de mim, dançando,
rebolando... aí, minino, quando foi no terceiro mergulho, aproximou
bem perto de mim. Aí deu pra mim ver aquele rosto feio. Tinha um só
olho no meio da testa e... assim... era careca e dos lados assim era
cabeludo... aquele cabelo grande... aí... aí quando eu peguei aquilo,
quando ela abriu a boca pra mim e fez assim: “nhááá...” fez assim... e
eu vi os dente, aquela presa inorme, eu me assustei, fui duma vez pra
superficie, quando eu falei assim, ne minha cabeça vei “eu vô imbora,
eu vô imbora”. Quando eu fui pra subir, ela ainda tentou pegar meu pé.
Levou aquela unha inorme no meu pé, tentou pegar e aí eu iscurreguei
e subi. Aí eu peguei, saí na superfície assim, cumo coisa qui eu tava
afogano, apavorado. Aí no alto do barranco tinha um senhor, chamado
Beneco, né? Um velho aqui da cidade, muito cunhecido meu, me

429
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

chamava de Nego. Aí quando ele viu que eu saí apavorado, nadando


pra fora, pra fora do rio, ele perguntou:
“- Nego, o que foi? O que é qui cê saiu cum esse olho desse
tamanho, o que foi? Parece que viu uma assombração?”
- É, seu Beneco. Realmente. Eu vi uma mulher ali, nadando.
Mas quando eu fui vê no terceiro mergulho, num é mulher não, é um
bicho. Um trem cabeludo, com uns dente cumprido, um trem mais
feio. Tem um oio no meio da testa.
Aí seu Beneco num acreditou, né? Aí ele ficou olhando pra lá
e eu falei:
- Foi bem ali. Quando eu mostrei, aquele negócio saiu, fez
uma mareta, vei, deu aquela mareta grande e fez uma zuada no rumo
lá. Quando seu Beneco olhou pra lá, aquele bicho mostrou primeiro a
cabeça inorme com aquela cabelaça toda e em seguida o rabo
cumprido, um rabo de peixe. Aí tinha mãos, como mãos de humanos,
né? Mas o corpo de peixe assim. E o rabo bateu “pá” e... e... foi. Aí eu
Beneco ficou tão atordoado, tão assim... que ele falou:
“- É, Nego, vou pra casa.”
Me chamava de Nego, né? Como eu disse. Ele pegou e...
Gali... Nego, vou pra casa. Aí ele foi descendo e invés dele ir pra casa
dele que é rumo do Peixe-Vivo, uma buate que temos aqui, que era
próximo à residência dele, não, ia desceno pro rumo da minha casa,
né? Aí eu disse assim:
- Não, seu Beneco, a casa do sinhô é por aqui.
Foi priciso eu pegá na mão dele, né? Peguei na mão e levei
até a residência dele. Aí cheguei lá, Dona Nedina:
“- Uai, Beneco, que qui cê tem?”
“- Uai, muié, vi um trem ali... qui num deu pra incará não.
Nego viu um trem lá, qui eu num sei o que era aquilo, era uma mistura
de gente cum peixe. Eu num acreditei não, mas ele falou cumigo,
quando eu oiei eu vi, mas eu tô assim, sintino mei istranho.”
Aí, chegou lá e pediu uma cadeira, sentou todo atordoado, aí
ele começou contar a história lá para o pessoal e eu fiquei. Aí depois
eu fui pra casa, cheguei, contei minha mãe e ela falou assim:
“- O que qui eu falei pra você, que não fosse pro rio?”
Eu gostava de ir no rio. A partir desse momento eu num fui
mais merguiá no rio. E mãe: “uai, minino, cê parô de ir no rio?”, pois é,
é pur isso... até hoje, essa idade que eu tô, eu num tenho coragem de
mergulhá no rio, por conta desse fato. Eu num sei o que eu vi lá, se era
Caboclo d'água, se era Mãe d'água, sei lá qui mistura era, mas que
realmente eu vi, eu vi. Eu tenho certeza que eu vi. Era isso que eu tinha
pra dizê.

430
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

variante culta. Por onde passa, Galinha Tonta deixa visível o seu carinho
com as crianças. Automaticamente, as crianças dele se aproximam,
independente de serem chamadas ou não. O seu maior sonho é construir
uma escola de línguas estrangeiras para ensinar crianças carentes de São
Francisco.

Análise do mito

Vamos à análise do mito. Inicia-se a narrativa confirmando a


intencionalidade do narrador/locutor que quer mais do que divertir ou
entreter. Ele quer apresentar uma narrativa moralizante, que faça seu
auditório reconhecer os valores éticos. Poderíamos, também, já pelas
primeiras linhas, perceber que, em nossa narrativa, o locutor será do tipo
narrador coletivo, aquele que utiliza a moral social como referência para
direcionar sua fala.
Sua voz nos transmitirá a visão e os valores da sociedade à qual se
dirige. Veremos ainda que, sendo a voz do locutor a voz social, ela assimila
à sua, a voz da mãe, que desconfia e repreende, com medo de que algo lhe
aconteça. O narrador inicia o “causo” contando que era costume seu
nadar e mergulhar no rio São Francisco, mesmo a contragosto da mãe, que
o protegia das águas do imaginário: “Minino, você num vai nadar no rio
que é muito perigoso.” Galinha Tonta mente, peca mais pelo prazer que
sente, do que pela ação em si de nadar e mergulhar profundamente.
Delineia-se, principalmente, a imagem do mergulhar, do insaciável, capaz
de, sem culpa, agir contra o estabelecido pela mãe.
Eis a imagem da mãe repressora, armazenada na memória
coletiva e acionada na memória do narrador: “Eu mergulhava iscundido,
pegava aqueles carizinhos (...) e dizia: Ó, mãe, o que eu peguei ”. A mãe,
segurança e abrigo, repreendia o filho. Simboliza a sublimação mais
perfeita do instinto e a harmonia mais profunda do amor. Mas às vezes,
conforme Gheerbrant é o lobo, o grande lobo mau, que pode conter uma
alusão à imagem materna, inquietante, feroz, voraz quando repreende
desejando, ou “rogando uma praga”: (“uma vez cê vai arrepender, que é
muito pirigoso!”). Ouvindo isso de sua mãe, o narrador se vê diante do
caráter contraditório dos instintos, pois seu desejo de ser mimado e
acarinhado por sua mãe vai de encontro ao seu exato oposto, a fúria
indomável e o rigor da mãe. Mãe castradora, mas que conhecia o perigo de
se mergulhar profundamente nas águas do opará.
No sétimo parágrafo, o Galinha Tonta desobedece à mãe e
mergulha: “Quando eu mergulhei a primeira vez, tinha uma uma pessoa
estranha lá na minha frente, uma moça.”. Era, naquele momento, um rio.
O narrados imerge assustado e ao mesmo tempo curioso.Não
conseguiríamos entrar duas vezes no mesmo rio. De fato, era um outro rio,
era um outro momento para o Galinha. Existe um rio para cada homem
que mergulhar em suas águas. No sentido simbólico do termo, penetrar

431
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

(ou mergulhar) num rio significa, para a alma, entrar num corpo.
O rio toma o significado do corpo. O corpo tem uma existência
precária, escoa-se como a água. A alma seca é aspirada pelo fogo; a alma
úmida é sepultada no corpo; e cada alma possui seu corpo particular, a
parte efêmera de sua existência – seu próprio rio. O simbolismo do rio e do
fluir de suas águas é, ao mesmo tempo, o da possibilidade universal e da
fluidez das formas, o da fertilidade (plantações nas vazantes), o da morte (a
esterilidade em que se transformou o sertão vai sendo carregada para
dentro do Chico) e da renovação (novas águas, desovas dos peixes e a
piracema). O curso das águas é a corrente da vida, mas também da
morte.
O Chico grita, responde a tanto aperto. Supita, deixa seu leito,
avança pelos barrancos, toma outras trilhas e vai carregando casas, roças,
pontes... Não faz de maldade maior e precipitada, dá muitos avisos,
enquanto se avoluma, não é para machucar ninguém. É só protesto por
tanta dor guardada, sem resposta. O homem continua voraz na vontade de
acabar com o sertão e matar o Chico (MELO, 1998, p. 93).
Fonte: Dr. Daniel Souto.

Figura 25: Desenho mimético da Mãe


d´Água do São Francisco .

O narrador estava vivo, era um exímio mergulhador. Com certeza,


vira “uma moça bunita”! “De longe dava pra ver os cabelão, mas num
dava pa vê o rosto direito. Aí eu peguei e tomei folgo, fui até a superfície
para tomar o ar”. Neste exato momento nascia um conto maravilhoso, no
dizer de Propp .Da forma como conta o narrador, os elementos estão na
origem das formas mitológicas. Uma vez contados, essas formas
ritualizam-se, convertendo-se em símbolos. A maneira em si, pela qual
uma função ou ação se realiza, pode mudar, é um valor variável, mas a
função em si é um valor constante, é um símbolo constante, é um símbolo
do São Francisco. O rio São Francisco já não era o mesmo, nesse segundo
momento de imersão do Galinha “Tornei mergulhar, aí ela chegou mais
perto de mim, cada vez mais perto de mim, dançando,
rebolando...”.Curiosidade, encanto, medo, fascinação e magia. O
narrador busca sua fonte no imaginário e na memória coletiva, de forma

432
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

que todo ouvinte ou leitor possa se identificar, dando sentido ao que ouve
ou lê.
Darnton nos mostra, trabalhando com contos populares do século
XVIII, que, por trás das tramas padronizadas e temas convencionais, entre
fantasias, ogres e duendes, os contos revelam elementos de realismo. Vale
dizer, com isso, que a narrativa em questão traduz bem as verdadeiras
razões para não se mergulhar profundamente no Velho Chico, não
enquanto narrativa fotográfica, mas permitindo que se localize um
substrato de realismo social barranqueiro. O narrador descreve uma moça,
sem ver o rosto, que dança e rebola dentro d'água.
Percebemos aí uma relação com as Ondinas, “fadas das águas,
geralmente maléficas, que se oferecem para conduzir viajantes pescadores
no meio de rios e pântanos, mas que os extraviam e os afogam”. As
Ondinas têm uma cabeleira verde-mar que elas vêm graciosamente
pentear na superfície das águas; são todas belas, maliciosas e às vezes
cruéis. Têm prazer em atrair para junto delas o pescador ou belo cavaleiro
que passa perto do rio; raptam-no e o transportam para o fundo de seu
palácio encantado, onde os dias passam tão rápidos como os minutos...
As lendas barranqueiras são mais sombrias e mais apaixonadas: o
belo jovem arrastado pelas Ondinas para o fundo das águas não mais revê
o dia e morre exaurido entre seus braços, lembrando Ulisses. Simbolizam,
também, os sortilégios da água e do amor ligados à morte; os perigos de
uma sedução. No terceiro mergulho, o narrador viu aproximar de si uma
moça, não como sempre ouvira dos velhos pescadores, mas uma moça de
rosto feio: “tinha um só olho no meio da testa e... assim... era careca e dos
lados assim era cabeludo... aquele cabelo grande... e quando ela abriu a
boca pra mim e fez assim: nhááá... e eu vi os dente, aquela presa inorme,
eu me assustei e fui duma vez pra superfície...”
Baseando na descrição do Galinha Tonta, a Ondina, a moça, o
monstro, aquilo que ele vira, possuía um corpo grotesco, cuja imagem
pode ser lida segundo a concepção de Bakhtin, “uma imagem grotesca do
corpo”, isto é, desfigurada, monstruosa, horrenda.

3.3.4 O estilo grotesco

Em que consiste a representação grotesca? Segundo Bakhtin, o


termo "grotesco" deriva do substantivo italiano grotta que significa gruta.
Informa-nos o autor que o termo refere-se a um certo tipo de pintura
decorativa, encontrada, em fins do século XV, em escavações realizadas
em Roma. Afirma Bakhtin que essa descoberta surpreendeu os
contemporâneos pelo jogo insólito, fantástico e livre das formas vegetais,
animais e humanas que se confundiam e transformavam entre si
(BAKHTIN: 1993, 28). O quanto este tipo de imagem distancia-se dos
padrões clássicos pode ser avaliado pelas palavras iniciais da Arte Poética,
de Horácio, um dos teóricos mais influentes da poética clássica:

433
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Suponhamos que um pintor entendesse de ligar a uma cabeça humana um


pescoço de cavalo, ajuntar membros de toda procedência e cobri-los de
penas variegadas, de sorte que a figura, de mulher formosa em cima,
acabasse num hediondo peixe preto; entrados para ver o quadro, meus
amigos, vocês conteriam o riso?
Com o tempo, o sentido de grotesco alarga-se, passando a referir-
se não somente àquele tipo de pintura, mas a um estilo de representação
que se caracteriza pelo exagero, o hiperbolismo, a profusão, o excesso
(BAKHTIN: 1993, 265). Como resultado do procedimento grotesco de
mostrar a mistura de corpos, encontramos também, em geral com fins
satíricos, a fusão do corpo humano com o corpo animal, como nas pinturas
de Bosch e no conjunto de desenhos intitulado "Caprichos", de Goya. Outra
característica do grotesco é a ênfase, pela hipérbole, naquilo que Bakhtin
denomina de baixo corporal: orifícios, protuberâncias, ramificações e
excrescências, tais como a boca aberta, os órgãos genitais, seios, falo,
barriga e nariz (BAKHTIN: 1993, p. 23).
Pois bem. Após o esclarecimento do termo grotesco, reparem que
as imagens do corpo grotesco daquela criatura vista pelo Galinha Tonta,
estavam disseminadas por todo o rio São Francisco naquele momento,
mas não eram imagens habituais, eram imagens rabelaiseanas, que
constituem uma verdadeira galeria de imagens do corpo híbrido,
personagem dotada de anomalia física: com um olho só na testa.
Conforme Bakhtin, tudo isso constitui as fantasias anatômicas de um
grotesco descabelado, que gozavam de imenso favor na Idade Média; mas
que ainda vivem, pensamos, no imaginário do povo barranqueiro em
plena era contemporânea.
Galinha Tonta sentiu medo pela primeira vez em seus mergulhos e
pensou: “eu vô imbora, eu vô imbora”. Nesse momento lembrou-se dos
conselhos da mãe, da sua desobediência, e as imagens se multiplicavam,
ainda dentro do rio, numa íntima imensidão de água, numa íntima
imensidão interior. Bachelard(1997) diz que “por paradoxal que pareça, é
freqüentemente essa imensidão interior que dá sua verdadeira significação
a certas expressões referentes ao mundo que se oferece à nossa vista”. A
imensidão, entendida aqui, como grandiosidade na produção de sentidos,
de lembranças, de limites, seja do construto do medo ou da culpa. Está
presa a uma espécie de expansão do ser que a vida (ou o momento) refreia.
A imensidão é o movimento do homem imóvel. Imóvel pelo medo
ou pela culpa da desobediência. Ainda no décimo parágrafo, retoma com
a “volta” do corpo híbrido rabelaiseano. “Quando eu fui pra subir, ela
tentou pegar meu pé. Levou aquela unha inorme no meu pé e aí eu
iscurreguei e subi apavorado”. Seria uma Ondina? Seria uma Sereia? Seria
a Mãe d'Água? Elas simbolizam a autodestruição do desejo, ao qual uma
imaginação pervertida apresenta apenas um sonho insensato, ao invés de
um objeto real e uma ação realizável. Conforme Chevalier e Gheerbrant
(2000), Sereias/Mães d'Água são monstros da água, com cabeça e tronco

434
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

de mulher e o resto do corpo igual ao de um pássaro ou, segundo lendas


posteriores e de origem nórdica, de um peixe. Representam os perigos da
navegação marítima e a própria morte.
A Sereia foi considerada a alma do morto que perdeu o seu
destino e transformou-se em vampiro devorador. Na imaginação
tradicional, o que prevaleceu foi o simbolismo da sedução mortal. Foi
justamente o que aconteceu ao Galinha Tonta, quando conseguiu escapar
da “morte” e confidenciar ao seu amigo, que não acreditou
imediatamente, acerca daquela assombração. A assombração possuía
metade peixe (com rabo comprido) e metade humana.
De repente, os dois olharam para a imensidão das águas e, juntos,
viram pela última vez emergir aquele corpo grotesco que o narrador não
deixou claro tratar-se de Mãe d'Água ou Caboclo d'Água. A partir do
décimo-quarto parágrafo, o narrador deixou explícito que Seu Beneco
havia acreditado nele e ficou numa espécie de hipnose, calado, atônito,
boquiaberto e conseguiu reafirmar à sua esposa que vira um ser mistura de
gente com peixe. Era, naquele instante, o mito ressurgindo,
surpreendentemente, através de um jogo de palavras, a fala matreira
produzindo um efeito comum à construção do respeito às águas do Velho
Chico, que nos assombram e nos encantam.
O penúltimo parágrafo nos apresenta a seqüência final: o filho
desobediente que retorna à sua casa e comenta com a mãe o acontecido,
momento em que reconhece que não deverá ir mais ao rio e promete que
a partir daquele momento jamais voltará a mergulhar no rio e reconhece
que a mãe sempre esteve certa. E ela, ironicamente, diz: “Uai, minino, cê
parô de ir no rio?”. A enunciação irônica da mãe apresenta um ponto de
vista que o próprio filho considera absurdo, mas obedece porque viu e
acredita nos fenômenos sobrenaturais aquáticos. A partir desse momento,
o narrador assume responsabilidade sobre ele, mas faz esse ponto de vista
ser atribuído à sua mãe. A ironia da mãe do narrador não está localizada
numa forma específica, mas é um efeito de sentido apreendido ao nível do
discurso.
Retomando a fala de Darnton, que reforça os pressupostos
básicos de uma análise discursiva, concluiríamos, confirmando a estreita
relação entre a arte de narrar e o contexto no qual a narração ocorre: “É
preciso passar do texto para o contexto e depois voltar para o texto,
examinando a maneira como o narrador adapta o tema herdado à sua
audiência, de modo que a especificidade no tempo e lugar apareça através
da universalidade do motivo.” Segundo Propp, os contos maravilhosos
sempre atribuem as mesmas ações a personagens diferentes.
E isto nos permite estudar os contos a partir das funções das
personagens. As mesmas ações aparecem num enredo, mudando,
apenas, o nome e atributos dos que executam as funções, desenvolvendo-
se a partir de uma falta ou injustiça.
Assim, o objetivo primordial do ato de contar contos é desenvolver
a cooperação da linguagem oral, através das narrativas e promover o

435
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

respeito aos valores humanos, considerando a diversidade sócio-cultural.

3.4 LENDAS

Lenda, segundo Luís da Câmara Cascudo (1989) é uma narrativa


de cunho popular que é transmitida, principalmente de forma oral, de
geração para geração. As lendas não podem ser comprovadas
cientificamente, pois são frutos da imaginação das pessoas que as criaram.
Lendas são histórias fantásticas que possuem origem histórica, narrando
feitos de heróis, personagens sobrenaturais, fenômenos naturais, vida de
santos, etc. A lenda é sempre considerada com um fundo de verdade. O
universo imaginário popular possui muitas lendas. No folclore brasileiro, as
lendas mais conhecidas são: Curupira, Saci-pererê, Iara, Mula-sem-
cabeça, Boto cor-de-rosa, Boitatá, entre outros. A lenda do lobisomem é
conhecida e reproduzida mundialmente.

A Lenda da Origem do Rio

Viviam os índios nos chapadões, em várias tribos, felizes. Entre


esses estava uma linda mulher, a doce Iati. Era noiva de um forte guerreiro,
quando houve uma guerra nas terras do norte e todos os guerreiros se
foram para a luta. Eles eram tantos que os seus passos afundaram a terra
formando um grande sulco. Entre eles se foi o noivo da formosa índia que
tomada de saudades pelo seu amado chorou copiosamente. Suas lágrimas
foram tantas que escorreram pelo chapadão despencando do alto da serra
formando uma linda cascata, e caindo no sulco criado pelos passos dos
Guerreiros, escorreram para o norte e lá muito longe se derramou no
oceano, e assim se formou o rio São Francisco.

O Rio São Francisco dorme

Há uma lenda em todo o Médio São Francisco sobre o sono do rio.


A meia noite as águas adormecem, o rio se aquieta por alguns minutos, e
todos os seres de suas águas adormecem. Nesses poucos momentos não
se pode despertá-los, pois acordados as águas se enfurecem virando as
canoas e inundando as terras. Não se deve, portanto desrespeitar o leve
sono das águas. Quando o rio dorme as almas dos afogados se dirigem
para as estrelas, a mãe d 'água sai e se senta nas pedras no meio do rio e
enxuga os longos cabelos, os peixes param no fundo do rio, as cobras
perdem o veneno. Se alguém despertar as águas ficam tulmutuadas e
bóiam todos os cadáveres dos afogados e não há quem possa navegar.

436
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Figura 26: Pescador do Velho Chico.

3.5 CASOS OU “CAUSOS”

São narrativas rústicas de acontecimentos ocorridos com uma


determinada pessoa, que pode ser o próprio narrador, ou assistido por ele
ou até mesmo contado a ele. Tudo é enfeitado pela fantasia e chegando,
por vezes, às raias do absurdo, com a intervenção de supostas influências
sobrenaturais. Caçadores, tropeiros, vaqueiros, motoristas, viajantes e
pescadores são famosos por seus casos incríveis. Todos têm as suas estórias
para contar, na volta de suas viagens, caçadas e pescarias. Neles,
misturam-se elementos míticos, místicos, lendários e contos tradicionais.

O Pescador

Messias, morador da Ilha do Bom Jardim, pescava bem próximo à


ponte do Rio São Francisco, quando foi surpreendido por aquela fisgada de
dar suspiros e suar bastante; com uma linha de número 0,80 e anzol barra
6, fisgou tal peixe, que pelo peso, notou ser muito grande. A linha bem
esticada, preocupava o pescador, pois a linha era fina para tanto peso, por
isso começou a perder as esperanças pois o "Bruta Monte" não sairia fora
d'água. Porém a experiência falou mais alto, a labuta continuou, cansando
o tal peixe, foi descendo rio abaixo. Notando que ao recolher a linha estava
mais fácil, tratou logo de ser rápido e numa distância de cinco metros da
embarcação, eis que flora a cabeça de um grande surubim. Pois bem, meio
trêmulo, pernas bambas, e com o coração acelerado, Messias pulou no rio
e foi de encontro ao "Barbado", isto porque esquecera a fisga em sua casa.
Lutou bastante com o peixe, onde finalmente conseguiu tirar o surubim de
70 kg., dois mil metros abaixo de onde fisgara, em frente ao Clube do
Pescador. Essa não é somente uma história de Pescador! Aconteceu
mesmo!

437
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

3.6 ANEDOTAS

Anedota ou piada é uma narrativa curta, caracterizada por seu


desfecho inesperado, para provocar o riso. Seu anonimato lhe garante
circulação veloz, principalmente quando satiriza governantes e qualquer
outra autoridade: política, militar, religiosa, escolar ou familiar. Câmara
Cascudo (1989) considera-a como uma pintura de costumes, refletindo as
tendências e orientações da sociedade. Ela satiriza o comportamento
social. Satiriza, em vários ciclos, o português, o bêbado, o caipira, o louco,
o papagaio, a religião, a escola. Enfim, nada escapa da vingança popular
contra todas e quaisquer imposições que lhe fazem, levando a toda parte
sua mensagem satírica, chistosa, desopilante. Relato, geralmente breve,
com o objetivo de motivar o riso. Por ser uma forma de expressão oral por
excelência, o êxito de uma anedota depende também em muitos casos dos
dotes oratórios do seu intérprete, já que a entoação investida no relato
deverá ser tanto quanto possível original e até teatralizada. O riso do
interlocutor completa o prazer do relator que, de alguma forma, se
encontra dependente dessa relação para poder ser libertado. A teoria
freudiana sobre as anedotas prescreve que a técnica que assiste à sua
construção e o seu próprio conteúdo assemelham-se à atividade que tem
lugar nos sonhos: a anedota e o sonho representariam um desejo
inconsciente ou reprimido. A matriz discursiva de uma anedota está
sempre sujeita a grandes variações, dependendo dos grupos por onde
circula e da imaginação criativa dos seus intérpretes. Talvez em mais
nenhum outro tipo de texto seja tão pertinente falar de estética da
recepção como no caso da anedota, pois, sem o leitor, sem a adesão
(silenciosa ou em sonoras gargalhadas) do interlocutor, uma anedota não
se atualiza. Porque em muitos casos é a memória coletiva ou individual que
funciona como autora dos textos anedóticos, torna-se difícil falar de
copyright neste campo de expressão literária, até porque a etimologia da
palavra anedota (do gr. anékdota) nos remete para o não publicado.

O bêbado

Numa festa popular, começou a música e o bêbado se levantou:


- A madame me dá o prazer desta dança?
- Não!
- Mas por que não?
- Primeiro, porque o senhor está bêbado; segundo, porque não se
dança o Hino Nacional; e terceiro, porque eu não sou mulher, eu sou o
vigário da paróquia.

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Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

O papagaio manco

Um homem entrou em uma loja para comprar um papagaio e


perguntou ao dono: Quanto é aquele papagaio ali? O dono respondeu: Cinco
mil reais, ele fala italiano, francês e inglês. O homem, horrorizado, perguntou: E
aquele outro? O dono respondeu: Três mil e quinhentos, ele fala francês e inglês.
O homem, abobalhado, perguntou: E aquele outro? O dono disse: Mil reais, ele
só fala inglês. Aí o homem vê um papagaio mancando no chão e pergunta: E
aquele papagaio manco ali? O papagaio responde: manco é a sua avó, eu pisei
no cocô do pato e vou ali lavar a pata, pô!

O português com o carro batido

Num belo dia, Manuel estava indo ao banco com sua esposa Maria,
com sua bela BMW, que acabara de sair da concessionária.Ao chegar ao banco
Maria entrou, e deixou Manuel no carro.Quando de repente um brasileiro com
sua Brasília velha bate na BMW, Manuel louco sai de seu carro, o brasileiro com
muita esperteza e malandragem se desculpa rapidamente, e explica que seu
chefe tem uma igual, e pergunta:
- O senhor já leu o manual do carro?E responde Manuel:
- Não. O manual está em alemão e não entendo nada. E o que isso tem
a ver?
Então o brasileiro diz:
- Pois então, meu chefe quando ele bate o dele, ele me manda soprar
pelo escapamento porque o carro tem um dispositivo que o faz voltar ao
normal.Manuel desculpa o brasileiro, e começa a soprar pelo escapamento,
quando está quase azul de soprar chega sua mulher, e pergunta:
- Manuel o que estás a fazer? Ele se explica e conta toda a história, daí
Maria diz furiosa:
- Não é a toa que brasileiro diz que português é burro! Como vais a fazer
isso com os vidros abertos Manuel?

3.7 FOLCLORE POÉTICO

Cantigas de roda: Cantigas de roda, Cirandas ou Brincadeiras de roda


são brincadeiras infantis, onde as crianças formam uma roda de mãos dadas e
cantam melodias folclóricas, podendo executar ou não coreografias acerca da letra
da música. É uma grande expressão folclórica e, acredita-se que pode ter origem
em músicas modificadas de um autor popular ou nascido anonimamente na
população. São melodias simples, tonais, com âmbito geralmente de uma oitava e
sem modulações. O compasso geralmente utilizado é o binário, outras vezes o
quartenário. Entre as cantigas de roda mais conhecidas estão Roda pião, Escravos
de Jó, Rosa juvenil, Sapo Jururu, O cravo e a rosa e Atirei o pau no gato. As letras
das canções podem sofrer variações regionais, comuns em manifestações de
transmissão oral

439
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

FONTE: Dr. Daniel Souto, 2008.

Figura 27: Desenho mimético “Brincando de Roda.

Atirei o pau no gato


Atirei o pau no gato, tô, tô
mas o gato, tô, tô
não morreu, reu, reu
dona Chica, cá, cá
admirou-se, se
do berrô, do berrô que o gato deu
MIAU!

Não atire o pau no gato (Versão ecológica)


Não atire o pau no ga-to,to
porque isto-to,to
não se faz, faz, faz
O gatinho,nho
É nosso amigo,go
Não devemos maltratar os animais
jamais!

Capelinha de melão
Capelinha de melão
É de São João
É de cravo,
é de rosa,
É de manjericão
São João está dormindo
Não acorda, não
Acordai,
acordai,
Acordai, João!

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Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Caranguejo
Caranguejo não é peixe
Caranguejo peixe é
Caranguejo só é peixe
Na enchente da maré.
Palma, palma, palma,
Pé, pé, pé
Roda, roda, roda
Caranguejo peixe é.

Escravos de Jó (versão "tira-põe")


Escravos de Jó jogavam caxangá
Tira, põe, deixa o caxanga ficar ...
Guerreiros com guerreiros fazem zigue-ziguezague;
Guerreiros com guerreiros fazem zigue-ziguezague.

A brincadeira

Sentadas em roda, cada criança deve ter um objeto à mão (caixa


de fósforo, copo, pedra etc.). Enquanto canta, cada criança passa o objeto
para o colega ao lado, fazendo movimentos conforme a letra: Os escravos
de Jó jogavam caxangá (vai passando para o colega ao lado o objeto que
foi posto à sua frente ); Tira (levanta o objeto), põe (põe na sua frente na
mesa), deixa ficar (aponta para o objeto na frente e balança o dedo);
Guerreiros com guerreiros fazem zigue (passa seu objeto para o colega ao
lado), zigue (volta o objeto para sua frente), zá (passa seu objeto para o
colega). Na primeira vez, a letra é cantada normalmente. Na segunda vez,
a letra é substituída por lálá lálálá... e, por último, as crianças fazem todos
os movimentos da brincadeira, porém sem cantar a música. Sai da
brincadeira aquele que errar um movimento.

Ficarás sozinha
Ó Fulanazinha,
Ó Fulanazinha,
Entrarás na roda,
Ficarás sozinha.
A menina cujo nome é citado entra para o meio da roda e
canta:
Sozinha eu não fico,
Nem hei de ficar
Uma de vocês (em outra versão: Porque Fulaninha)
Há de ser meu par.
Tira pela mão a escolhida, que atende ao convite e dançando

441
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

com ela, canta:


Tira, tira seu pezinho,
Põe (Bota) aqui ao pé do meu,
E depois não vá dizer
Que você se arrependeu.

Fonte do Tororó
Fui no Tororó
beber água não achei
achei bela morena
que no Tororó deixei
Aproveite, minha gente,
que uma noite não é nada
Se não dormir agora,
dormirá de madrugada
Ó dona Maria,
Ó Mariazinha,
entrarás na roda
e dançarás sozinha
Sozinha eu não danço
nem hei de dançar
porque eu tenho o fulano
para ser meu par

A brincadeira

Forma-se uma roda em torno de uma pessoa, e fica-se andando e


cantando. quando chegar à última estrofe, a roda para e a pessoa do
centro canta sozinha, escolhendo o próximo a ficar no centro. Essa
brincadeira surgiu na cidade de santos pela fonte do Tororó

O cravo e a rosa
O cravo brigou com a rosa,
Debaixo de uma sacada.
O cravo saiu ferido,
E a rosa despedaçada.
O cravo ficou doente.
A rosa foi visitar.
O cravo teve um desmaio,
E a rosa pôs-se a chorar.

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Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Pai Francisco
Pai Francisco entrai na roda,
Tocando seu violão.
O menino que faz de Pai Francisco entra na roda
que continua a cantar de mãos dadas:
Quem dirá, meu bem, quem dirá?
Pai Francisco está na prisão.
Pai Francisco, fingindo tocar violão, dança e
requebra:
Como ele aí vem,
Todo requebrado,
Ganhando dinheiro
Com o seu melado (em outra versão: Pedindo
vinténs)

(outra versão: Ai como ele vem, todo requebrado, parece um


boneco desengonçado)

Poesia popular: quadrinhas

A poesia popular é feita geralmente em quadrinhas ou sextilhas,


entretanto, as primeiras são mais comuns, talvez pela simplicidade de sua
forma. São compostas de quatro versos de sete sílabas com acento na
terceira e na última, duas rimas geralmente perfeitas, às vezes apenas
toante no segundo e quarto verso. Ela se manifesta de várias maneiras, nas
quadrinhas, nas serenatas, nos romances, nos desafios, nas modas de
viola, nas cantigas folclóricas, etc., e brota do próprio povo, refletindo a
mentalidade coletiva de nosso homem da roça, seu modo de ser, suas
lamentações, misturadas com o cômico e o burlesco.

Quadrinhas

A vida de gente pobre O pobre agarra a vara


Padece, não tem artura E sai na noite às escura.
A vida de gente rica
Arregala e tem fartura. A perna de moça rica
É bonita e tem grossura
O rico levanta cedo Cambito de moça pobre
Toma café com mistura Inda perde pra saracura.
O pobre bebe garapa
Quase sempre sem doçura. Quando gente pobre morre
Vai gozá lá nas artura
O rico qué comê pexe O rico vai pros quinto
No mercado ele procura Fervendo na fervedura.

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Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Esta noite tive um sonho, Atirei um limão n'água


Mas que sonho atrevido ou De pesado foi ao fundo
Sonhei que era babado Os peixinhos responderam

Fonte: Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Figura 28: Pintura de José Ferraz de Almeida Júnior:


O violeiro, óleo sobre tela, 141 X 172 cm, 1899.

Aparecem também algumas quadrinhas, geralmente satíricas e


com desfecho inesperado, que possuem três versos de sete sílabas cada um
e o último de quatro, que são denominados pé quebrado, pois chamam o
verso de “pé”.

Quem quer bem dorme na rua Subi num pé de canela


Na porta de seu amor Pra ver você passar
Das estrelas faz anzol ou Você não passou
E pipoca. Eu desci.

Sextilhas

A sextilha de sete sílabas, de rimas simples, é muito usada na


literatura folclórica oral, principalmente nos desafios, nos cantos de
folguedos populares, assim como na literatura de cordel, que é escrita:

Sou filha de Maceió


Capital alagoana
Me chamo Chica Esporão
Meu nome ninguém engana
Pra vencer-me na cantiga
Ou canta muito ou se dana.

444
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

A-B-C
DICAS

Forma antiga de exprimir cantigas, conceitos, doutrinas, história,


biografia e até amor. É um processo mnemônico para facilitar a decoração.
Livro O ABC do Rio São
Caracteriza-se por apresentar no início das estrofes ou versos letras do
Francisco, de Sávia
alfabeto em ordem natural, terminado por vezes com referência ao “til”.
Dumont.
ABC. São quadras ou sextilhas que começam com cada uma das letras do
alfabeto. Os ABCs são muito antigos no mundo todo. Usados na literatura
popular em versos, contam a vida de heróis populares, estórias de
cangaceiros valentes, de santos, de estadistas famosos.
Fonte: Sávia Dumond, 2000.

Figura 29: Capa do Livro ABC do


São Francisco.

Literatura de Cordel

Literatura de cordel é um tipo de poesia popular, originalmente


oral, e depois impressa em folhetos rústicos ou outra qualidade de papel,
expostos para venda pendurados em cordas ou cordéis, o que deu origem
ao nome que vem lá de Portugal, que tinha a tradição de pendurar folhetos
em barbantes. No nordeste do Brasil, herdamos o nome (embora o povo
chame esta manifestação de folheto), mas a tradição do barbante não
perpetuou. Ou seja, o folheto brasileiro poderia ou não estar exposto em
barbantes. São escritos em forma rimada e alguns poemas são ilustrados
com xilogravuras, o mesmo estilo de gravura usado nas capas. As estrofes
mais comuns são as de dez, oito ou seis versos. Os autores, ou cordelistas,
recitam esses versos de forma melodiosa e cadenciada, acompanhados de
viola, como também fazem leituras ou declamações muito empolgadas e
animadas para conquistar os possíveis compradores.
A história da literatura de cordel começa com o romanceiro luso-
espanhol da Idade Média e do Renascimento. O nome cordel está ligado à
forma de comercialização desses folhetos em Portugal, onde eram
pendurados em cordões, lá chamados de cordéis. Inicialmente, eles
também continham peças de teatro, como as de autoria de Gil Vicente
(1465-1536).Foram os portugueses que trouxeram o cordel para o Brasil
desde o início da colonização. Na segunda metade do século XIX

445
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

começaram as impressões de folhetos brasileiros, com características


próprias daqui. Os temas incluem desde fatos do cotidiano, episódios
históricos, lendas, temas religiosos, entre muitos outros. As façanhas do
cangaceiro Lampião (Virgulino Ferreira da Silva, 1900-1938) e o suicídio
do presidente Getúlio Vargas (1883-1954) são alguns dos assuntos de
cordéis que tiveram maior tiragem no passado. Não há limite para a
criação de temas dos folhetos. Praticamente todo e qualquer assunto pode
virar cordel nas mãos de um poeta competente.
No Brasil, a literatura de cordel é produção
típica do Nordeste, sobretudo nos estados de
Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e
do Ceará. Costumava ser vendida em mercados e
feiras pelos próprios autores. Hoje também se faz
presente em outros Estados, como Rio de Janeiro,
Minas Gerais e São Paulo. O cordel hoje é vendido
em feiras culturais, casas de cultura, livrarias e nas
Figura 30: Literatura
apresentações dos cordelistas. de Cordel. Banca de
Todavia, este tipo de literatura apresenta jornal em São Paulo.
vários aspectos interessantes e dignos de destaque:
as suas gravuras, chamadas xilogravuras, representam um
?
importante espólio do imaginário popular;
? pelo fato de funcionarem como divulgadoras da arte do
cotidiano, das tradições populares e dos autores locais (lembre-se a
vitalidade deste gênero ainda no nordeste do Brasil), a literatura de cordel é
de inestimável importância na manutenção das identidades locais e das
tradições literárias regionais, contribuindo para a manutenção do folclore
nacional;
? pelo fato de poderem ser lidas em sessões públicas e de
atingirem um número elevado de exemplares distribuídos, ajudam na
disseminação de hábitos de leitura e lutam contra o analfabetismo; e
? a tipologia de assuntos que cobrem, crítica social e política e
textos de opinião, elevam a literatura de cordel ao estandarte de obras de
teor didático e educativo.
Fonte: Arlequim Discos-
ASIN: 7898422680312
Téo Azevedo: cantador popular de Alto
Belo, no Norte das Minas

Téo Azevedo, violeiro, pesquisador


de cultura popular, autor de cordéis, produtor
musical, compositor e cantor, nascido em
Alto Belo, distrito de Bocaiúva, Norte de
Minas, no ano de 1943. Há 50 anos, Téo está
Figura 31: Capa do Disco na trincheira, em defesa da cultura popular.
Ano: 2005. Gênero: Caipira
Trabalha desde muito cedo, sempre mistu-
Raiz. Procedência: Nacional.

446
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

rando arte e trabalho. Aos 9 anos, já engraxava sapatos e recitava versos


de improviso para atrair clientes em Montes Claros, Minas Gerais. Fazendo
isso com sucesso, atraiu a atenção de muitas pessoas, dentre elas um
camelô pernambucano, chamado Antônio Salvino, seu "descobridor", que
o levou a várias feiras pelo Nordeste, onde se apresentavam juntos. A
função de Téo era se apresentar com uma jibóia enrolada no pescoço,
cantando calango de improviso em quadras, também para atrair a
clientela para o parceiro.

Figura 32: Capa do Cordel.

Encontro de Lampião com Kung Fu em Juazeiro do Norte, de Abraão


Batista - Juazeiro do Norte, julho de 1975

Meu leitor, meu amiguinho


Permita a imaginação
Desse encontro imaginário
De Kung Fu com Lampião
Na cidade de Juazeiro
De Padre Cícero Romão...

Pois bem, eu vou dizer


Como foi que aconteceu
Dizendo quem se feriu
Quem matou e quem morreu
Depois diga por aí
Quem contou isso foi eu

Mas se lembre esta história


É livre e imaginária
Vem do direito do poeta
Que tem na indumentária
Do infinito astucioso
Que não tem medo de pária

447
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Lampião, todos conhecem


Mas não sabem interpretar
Só sabem falar mal dele
Porque não quiseram indagar
A causa que ele abraçou
E o que o forçou a matar

Se Lampião foi cangaceiro


Foi que o forçaram a matar
Ele era bom e justiceiro
Antes de o incriminar
Pois a justiça dos homens
Às vezes não sabe julgar

No entanto, o meu assunto


O que agora vou descrever
É de Lampião, o cangaceiro
Com Kung Fu do caratê
E se você não o conhece
Vai agora o conhecer

Eu já falei de Lampião
Que é um herói invisível
Nesse momento de Kung Fu
Nas grandes lutas de morte
Sempre foi o imbatível

Kung Fu fez uma promessa


Para no santo Juazeiro
Visitar padrinho Cícero
Que é santo por primeiro
Veio a pé, veio a cavalo
E de navio, como romeiro

Desembarcou em Fortaleza
Do Ceará, a capital
E o resto desse percurso
Fez a pé, e não fez mal
Porque ele é um atleta
Cuja força é sem igual

Lampião, por esse tempo


O mesmo ato resolveu
Só não sei onde estava
Se no inferno, ou no céu
Eu só sei que no mesmo dia
Por aqui, apareceu

448
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

E no túmulo do "meu padrinho"


Os dois valentes se encontraram
Parecendo, no mesmo instante
Ao mesmo tempo, se ajoelharam
Quando nos ares, os seus olhares
Como relâmpagos se entrechocaram

Lampião olhou esquivo


Para Kung Fu, e indagou
Onde moras, ó meu irmão?
E Kung Fu lhe afirmou:
— Sou habitante desse mundo
E com capricho suspirou

Os dois se levantaram
E saíram pela igreja
Mas, por fora no patamar
Tinha um soldado com inveja
E gritou para Lampião:
— Tu não perdeste a peleja

Lampião não quis conversar


Depressa meteu-lhe a faca
Dando um só golpe certeiro
E inteiro, cortou-lhe a maca
Que o soldado caiu rolando
Gritando como macaca

Kung Fu vendo aquilo


Depressa se indignou
Com força pra Lampião
Num tom grave assim falou:
— Procedimento igual a esse
Nesse momento terminou!

Lampião sorriu pra ele


E com um punhal na mão
Despalitou a dentadura
Pra depois cuspir no chão
Respondendo pra Kung Fu:
— És atrevido, tenho impressão

449
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Kung Fu ouvindo isso


Parece que não gostou
Fez um gesto de caratê
Que Lampião lhe apontou
Disparando duma só vez
Seis descargas mas não acertou

Lampião disse: — Oxente


Quem já se viu coisa assim
Mas Kung Fu de repente
Malhou seu espadachim
E Lampião pulou gritando:
— Hoje tudo está pra mim

Com uma espada grande


Kung Fu nele malhou
Lampião com uma peixeira
Seus planos atrapalhou
Mas Kung Fu com sua espada
A peixeira dele cortou

Lampião: — Virgem Maria


Que espada desgraçada!
E do meio da cintura
Puxou a faca lombada
E partindo desse momento
Teve a briga recomeçada

Quando a espada de Kung Fu


Batia na faca de Lampião
Com quarenta léguas se via
Aquele enorme clarão
Que o povo de Pernambuco
Pensou que era ilusão

Se Lampião saltava alto


Kung Fu também saltava
Naquela briga feroz
O fogo azul que faiscava
Tinha um brilho tão grande
Que o dia ofuscava

450
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Kung Fu deu um pulo alto


Para confundir Lampião
Mas ele fez um rodízio
Rodando que nem pião
Que Kung Fu quando baixou
Quase que perdia a mão

Nessa luta eles passaram


Sem dormir sem descansar
Sete noites e sete dias
É o que posso lhe contar
Suavam como chaleiras
Mas não queriam se entregar

Duma faísca da espada


Com aquele grande punhal
Provocou enorme incêndio
Em cem tarefas de canavial
Chamando logo a atenção
De Kung Fu e seu rival

Lampião disse assim:


Kung Fu, você está vendo
Esse fogo no vegetal
Que por nós está ardendo
É algo que a natureza
Para nós está dizendo

Kung Fu disse: — Falou!


A guerra não tem sentido
O homem brigar com o homem
Me causa dor no ouvido
As conquistas e os massacres
São atos de tempo ido

Neste momento Kung Fu


E Lampião se abraçaram
Dando fim a um duelo
Que sem morrer terminaram
E eu peço aos meus leitores
Mil desculpas se não gostaram

451
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

3.8 FOLCLORE LINGUÍSTICO

Paremiologia popular

Provérbio, adágio, ditado, anexim, brocado, refrão, axioma,


aforismo, apotegma, sentença – seu conjunto se chama paremiologia –
forma a síntese da sabedoria popular. Pequena comédia que tem por
entrecho o desenvolvimento de um provérbio. É máxima sentença,
popularizada ou consagrada pelo uso, a qual é menos vulgar, que o adágio
e de moral mais segura e severa. Pode ser de autor desconhecidos ou
conhecidos como os do "Salomão"- "Até o insensato passará por sábio se
estiver calado, e por inteligente se conservar os lábios fechados".

Ditados populares : de onde surgiram?

Ditado, como o próprio nome diz, é a expressão que através dos


anos se mantém imutável, aplicando exemplos morais, filosóficos e
religiosos. Os provérbios e os ditados populares constituem uma parte
importante de cada cultura. Historiadores e escritores já tentaram
descobrir a origem dos ditados populares, mas essa tarefa não é fácil.Eles
nos chegam da mais remota antiguidade, emanados de pensamentos ou
sentenças de utilidade prática, ou de frases popularizadas da história, da
literatura, das artes e das ciências.

FRUTA azeda e mulher feia só com cachaça.


FAÇA da sua vida uma canção de amor.
FALAM de mim, mas não comem do meu pudirm.
FALAM de mim por inveja.
FALAM de ti por despeito.
FALAR é fácil, fazer é que é difícil.
FÉ EM DEUS e pé na taboa.
FELIZ foi Adão que não teve sogra nem caminhão.
FELIZ quem não tem sócio.
FIADO é com o diabo, aqui não é inferno.
FRACASSAR é triste, mais triste ainda é não tentar vencer.
FRANGUINHA, eis aqui o teu poleiro.
GOSTAR de mulher é herança do meu pai.
GUIADO por Deus e dirigido por mim.
HOMEM é como fósforo, sem cabeça não vale nada.
HOJE vejo chorando quem riu de mim no passado.
ADORO as rosas, mas prefiro as trepadeiras.
ALGUM dia a terra cobrirá o teu orgulho.
A LUZ dos teus olhos ilumina o meu caminho..

452
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

MAIOR vingança é o desprezo.


ANTES sonhava. Hoje, não durmo…
AMAR sem ser amado é ser castigado sem ter pecado.
AMAR-TE sempre; implorar-te nunca.
A MEDICINA não cura a dor da separação.
AMOR e dinheiro não querem parceiro.
AMOR é fumaça, sufoca e passa.
AMOR só de mãe.
A MORTE é um bem quando a vida se torna um mal.
A MULHER é como rosa: formosa, mas tem espinho.
A MULHER ri quando pode e chora quando quer.
ANTES causar inveja do que dó.
ANDO todo arranhado, mas não largo minha gata.
ANTES de falar de mim, pensa no teu passado.
ARTIGO nacional, a mulher é o melhor.
A SAUDADE é companheira de quem não tem companhia.
A SAUDADE não mata, mas sepulta o coração em vida.
A SAUDADE torna presente o passado.

Frases feitas

A frase feita evita o circunlóquio. Ela nada tem de perífrase,


porque com poucas palavras, diz tudo, ou melhor, faz entender o que se
queria dizer... entretanto há os que não "entendem patavina" ou "não
sabem pataca de qualquer coisa".

Maria vai com as outras.


No dia de São Nunca.
Não sou pau de amarrar égua.
Segurando vela.
Fazer de gato e sapato.
Isto tem dois v (vai e volta).
Um pé lá outro cá (rapidamente).
Ficar com água na boca.
Mora onde Judas perdeu as botas.
Ver com os olhos e lamber com a testa.
Jogar verde para colher maduro.

Adivinhas

As adivinhas, também conhecidas como adivinhações ou "o que é,


o que é" são perguntas em formato de charadas desafiadoras que fazem as

453
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

pessoas pensar e se divertir. São criadas pelas pessoas e fazem parte da


cultura popular e do folclore brasileiro. São muito comuns entre as
crianças, mas também fazem sucesso entre os adultos.

Alguns exemplos de adivinhas:

- O que é que é... é surdo e mudo, mas conta tudo?


Resposta: o livro.
- O que é o que é que sempre se quebra quando se fala?
Resposta: o segredo.
- Ele é magro pra chuchu, tem dentes, mas nunca come e mesmo
sem ter dinheiro, dá comida a quem tem fome?
Resposta: o garfo.
- O que é que passa a vida na janela e mesmo dentro de casa, está
fora dela?
Resposta: o botão.
- O que é o que é feito para andar e não anda?
Resposta: a rua.
- O que é o que é que dá muitas voltas e não sai do lugar?
Resposta: o relógio.
- Qual é a piada do fotógrafo?
Resposta: ninguém sabe, pois ela ainda não foi revelada.
- O que é o que é que sobe quando a chuva desce?
Resposta: o guarda-chuva.
- Você sabe em que dia a plantinha não pode entrar no hospital?
Resposta: em dia de plantão.
- O que é um pontinho verde brilhando na cama de um hospital?
Resposta: uma ervilha dando à luz.
- O que é o que é que esta sempre no meio da rua e de pernas para
o ar?
Resposta: a letra U.
- O que é o que é que anda com os pés na cabeça?
Resposta: o piolho.
- É um pássaro brasileiro e seu nome de trás para frente é igual.
Resposta: a arara.

Campeonato de adivinhas

Assim como as quadras, o repertório de adivinhas é enorme. Por


isso, quando estamos trabalhando com a cultura popular, é sempre bom
começar vendo o que o grupo de alunos já conhece e, a partir daí, e da
troca do grupo, ampliar com leituras e outras versões. Assim, você cria
espaço na sala de aula para que uns possam perguntar as adivinhas para

454
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

os outros, como se faz fora da escola.


E que tal fazer um campeonato de adivinhas? Você pode, por
exemplo, dividir a turma em dois grupos e propor que cada integrante do
grupo 1 pergunte para um do grupo 2 responder. Ganha ponto quem der a
resposta certa. E ganha, é claro, o grupo que somar mais pontos. As regras
de qualquer jogo ou campeonato devem ser discutidas previamente com o
grupo. Portanto, antes de começar você deve perguntar a todos: Vai haver
uma segunda chance? Ou quantas chances serão dadas? Se errar o que
acontece? E se a adivinha for mal formulada, quem ganha e quem perde o
ponto? Todo mundo tem que perguntar? E todos podem responder?
Depois de explorar as adivinhas oralmente, você pode propor à
turma fazer um livro de adivinhas. Cada aluno ou grupo fica responsável
pela escrita e ilustração de uma ou mais adivinhas e, depois, você pode
organizar as produções em forma de livro. Lembre-se que as respostas
podem ser escritas na última página do livro, para serem consultadas só
em último caso. É bom ressaltar que, além das adivinhas conhecidas, os
alunos podem inventar outras.

Trava-línguas

Podemos definir os trava línguas como frases folclóricas criadas


pelo povo com objetivo lúdico (brincadeira). Apresentam-se como um
desafio de pronúncia, ou seja, uma pessoa passa uma frase difícil para um
outro indivíduo falar. Estas frases tornam-se difíceis, pois possuem muitas
sílabas parecidas (exigem movimentos repetidos da língua) e devem ser
faladas rapidamente. Estes trava línguas já fazem parte do folclore
brasileiro, porém estão presentes mais nas regiões do interior brasileiro.
São formas de divertimento, e para que as frases funcionem a pessoa deve
repetir a frase por muitas vezes seguidas criando, assim, uma
impossibilidade de comunicação, travando a sua língua e causando risos e
alegria. Exemplos:

Tinha tanta tia tantã.


Tinha tanta anta antiga.
Tinha tanta anta que era tia.
Tinha tanta tia que era anta.

O sabiá não sabia.


Que o sábio sabia.
Que o sabiá não sabia assobiar.

A lontra prendeu a
Tromba do monstro de pedra
E a prenda de prata
De Pedro, o pedreiro.

455
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Maria-Mole é molenga, se não é molenga,


Não é Maria-Mole. É coisa malemolente,
Nem mala, nem mola, nem Maria, nem mole.

A aranha arranha a rã.


A rã arranha a aranha.
Nem a aranha arranha a rã.
Nem a rã arranha a aranha.

Um Tigre, dois Tigres, três Tigres tristes.

Se o papa papasse papa


Se o papa papasse pão,
Se o papa tudo papasse
Seria um papa –papão.

O Padre Pedro tem um prato de Prata.


O Prato de Prata não é do Padre Pedro

Parlendas

As Parlendas são formas literárias tradicionais, rimadas com


caráter infantil, de ritmo fácil e de forma rápida. Não são cantadas e sim
declamadas em forma de texto, estabelecendo-se como base a
acentuação verbal. São versos de 5 ou 6 silabas recitadas para entender,
acalmar, divertir as crianças, ou mesmo em brincadeiras para escolher
quem inicia a brincadeira ou o jogo, ou mesmo aqueles que podem brincar.
O motivo de uma Parlenda é apenas o ritmo como ela se desenvolve, o
texto verbal é uma série de imagens associadas e obedecendo apenas o
senso lúdico, ela pode ser destinada a fixação de números ou idéias
primarias, dias da semana,cores,dentre outros assuntos. Muitas parlendas
são usadas em jogos para melhorar o relacionamento entre os
participantes ou apenas por diversão. Elas são muito antigas e, algumas
delas, foram criadas, há décadas. Elas fazem parte do folclore brasileiro,
pois representam uma importante tradição cultural do nosso povo.
Veja alguns exemplos:

Uni, duni, tê O cochicho

Uni, duni, tê, Quem cochicha,


Salamê, mingüê, O rabo espicha,
Um sorvete colorê, Come pão
O escolhido foi você! Com lagartixa.

Rei Capitão Os dedos

Rei, capitão, Dedo mindinho,


Soldado, ladrão. Seu vizinho,
Moça bonita Pai de todos,
Do meu coração. Fura bolo,
Mata piolho.

456
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

O piano Um, dois, feijão com


arroz
Lá em cima do piano
Tem um copo de veneno -Um, dois, feijão com
Quem bebeu morreu arroz,
Ainda bem que Três, quatro, feijão no
Não fui eu. prato,
Cinco, seis, falar inglês,
Sete, oito, comer
biscoito,
Nove, dez, comer
pastéis.
Palminha Batatinha quando
nasce
Palma, palminha,
Palminha de Guiné Batatinha quando nasce,
Pra quando papai vié, Se esparrama pelo chão,
Mamãe dá a papinha. Mamãezinha quando
dorme,
Põe a mão no coração.

Mnemonias
Segundo Luís da Câmara Cascudo (1989), Mnemonias são
parlendas que se destinam a fixar ou ensinar algo às crianças as primeiras
noções de números ou idéias, nomes de coisas de seu pequeno mundo. O
ritmo e a rima facilitam-lhes a memorização desses simples com os quais
travam o seu primeiro contato.

Um, dois, feijão com arroz,


Um, dois, feijão com arroz Três, quatro, feijão no prato
Três, quatro, feijão no prato Cinco, seis, cala a boca Português
Cinco, seis, feijão pra nós três Sete, oito vá comer biscoito
Sete oito, feijão com biscoito Nove, dez vá lavar os pés
Nove, dez, feijão com pastéis... Na cachoeira nº10
Pra ganhar 500 réis
ou...
Touro é valente
Hoje é Domingo
Bateu no tenente
Pede um cachimbo
Tenente é fraco
Cachimbo é de ouro
Cai no buraco
Dá um estouro
Buraco é fundo
Acabou-se o Mundo

Fórmulas de fiado: fraseado de botequim


Também são muito interessantes. Antigamente as fórmulas de
não vender fiado eram pintados à mão nos botecos e nas casas comerciais.
Hoje elas geralmente são impressas e colocadas em lugar visível ao
freguês:
Fiado só se faz a um bom amigo e um bom amigo nunca pede
?
fiado; e

457
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Fiado só a maiores de 100 anos acompanhados de seus avós.


?

O fiado já morreu Se vem por bem, entre


Com o dono foi enterrado Esta casa é sua
Quem quiser beber cachaça Mas se pedir fiado
É só no dinheiro contado. Não entre, fique na rua.

Frases de pára-choques de caminhões


São frases curtas, de tom satírico, religioso, lírico e humorístico,
escritas nos pára-choques dos caminhões. Assim o “irmão de estrada” vai
levando sua filosofia por todo o Brasil:

Figura 33: Foto na estrada – pára-choque


de caminhão.

Montado na morte à procura da sorte;


?
Feliz foi Adão que não teve sogra nem caminhão;
?
O homem nasce, cresce, fica bobo e casa;
?
O amor é cego, o vizinho não; e
?
Sogra não é parente, é castigo, etc.
?

Pregão
É a forma de linguagem com a qual os trabalhadores anunciam
sua mercadoria.
Pode ser também cantado:

Aproveita minha gente A Bahia é boa terra


Aproveita e não demora Ela lá e eu aqui
A laranja tá acabando Quem quisé comê cocada
O caminhão vai-se embora. Não vá lá, que tem aqui.

Apelidos
Numa comunidade em que quase todos se conhecem, as
identificações por meio de apelidos, tornam mais fácil localizar pessoas do

458
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

que pelo próprio nome ou sobrenome. Uma alcunha ou apelido aqui no


Brasil é a designação não-oficial criada através de um relacionamento
interpessoal, geralmente informal, para identificar uma determinada
pessoa, objeto ou lugar, de acordo com uma característica que se destaque
positiva ou negativamente, de forma a atribuir-lhe um valor específico.
São também sinônimos de alcunha as palavras apodo,
antonomásia, cognome e epíteto. A designação apelido pode causar
potencialmente alguma confusão de sentido, visto que em sua origem
significa o nome de família, ou seja, o que no Brasil chama-se de
sobrenome. De fato, em Portugal a palavra apelido é usada como uma
equivalente ao sobrenome no Brasil.
As alcunhas mais comuns normalmente têm origem em
características físicas do indivíduo, como aleijadinho, manco, caolho,
quatro-olhos. Também são fontes de inspiração para os apodos alguns
ofícios (padeiro, leiteiro, roceiro) e o local de origem (alemão, japonês,
baiano, carioca).
Seguem exemplos de apelidos:
Zé Comedor de queijo;
?
João Para-goiaba;
?
Cabelo de bombril;
?
Zé cabeção;
?
Maria-chuteira; e
?
Maria-bistur.
?

Orações e benzeções
Apesar dos avanços verificados na medicina, as práticas de
benzeções não ficaram enterradas no passado nem foram totalmente
substituídas pelos preceitos científicos. Acreditando ou não no poder da
reza, tem sempre aqueles que procuram nas benzeções, uma cura para a
sua doença. O que é esta prática religiosa tão permeada em nosso
cotidiano? Que maneira é esta de resolver problemas tão fincados na
solidariedade, tão diferentes da cultura dominante? O que significa
benzer?
Quebranto, cobreiro, mau-olhado, espinhela caída, erisipela,
vento virado, peito arrotado. Quem quer que percorra os povoados da zona
rural mineira, as pequenas cidades do interior ou mesmo as periferias das
grandes cidades vai se deparar, em um momento ou outro, com alguns
desses nomes que fazem parte de um mundo mágico-religioso, povoado
de rezas, crenças, simpatias e benzeções.
Na cultura popular, corpo e espírito não se separam, tampouco
desliga-se o homem do cosmos, ou a vida da religião. Para todos os males
que atingem o corpo e a alma do homem sempre há uma reza para curar. É
por isso que, apesar do tempo e dos avanços da medicina, a tradição dos
benzedores ainda persiste na nossa moderna sociedade mineira.

459
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Música: Benzedeiras Guardiãs, de Martinho da Vila


Composição: Rosinha de Valença/Martinho da Vila

As rezadeiras usam
Águas da chuva e do rio
Curam as dores do corpo
Cisco no olho, espinhela caída

As benzedeiras vão
Com fé na oração
Curando nossas feridas
Como obaluaê

As rezadeiras quebram
Quebranto, mal olhado
Males que vem dos ares
Nervos torcidos, ventres virados

As benzedeiras são
As estrelas das manhãs
As nossas anciãs
Nanás buruguêis
Afastam a inveja
E o mal olhado
Com suas forças
Com suas crenças
Com suas mentes sãs

As rezadeiras são
As nossas guardiãs
Por dias, noites, manhãs Nanás

Esta canção é uma oração


Para as benzedeiras
Do coração mando este som
Para as rezadeiras

As rezadeiras são
As nossas guardiãs
Por dias, noites, manhãs
Nanás

460
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Medicina popular: remédios e beberagens

O uso de plantas medicinais no Brasil existe mesmo antes dos


portugueses chegarem aqui. O conhecimento indígena muito apurado
contribuiu com a grande maioria de plantas para serem utilizadas como
medicamento. Pode-se utilizá-las de várias maneiras: em chás,
garrafadas, xaropes, cheiros e defumadores, em banhos e em banhas. No
preparo dos remédios é comum a classificação como: remédio fino,
remédio fresco e remédio quente:

Figura 34: Foto de remédios naturais


“Mercado de Montes Claros/MG”.

Remédio fino: provoca transpiração excessiva, por isso o


?
doente não pode se molhar na água fria. Os remédios fino são: gendiroba
(torrada e moída) tomada sem dieta, é bom para dores de cólica e de
estômago, guiné (raiz na pinga) bom para dor e reumatismo, alho (chá)
contra dor de dente;
? Remédio fresco ou frio: o chá fresco, refresca o corpo por
dentro. Cura mal-estar da vista, dos rins, fígado e intestino. São os
seguintes: açafroa, quina, quebra-pedra, salsa, jalapa, picão, poejo,
peroba rosa, tiuzinho, limão, folha de abacate, água-de-colônia (raiz),
cipó-de-são-joão (raiz), pimenta malagueta, tomate, limão e caju;
Remédio quente: o remédio quente põe a doença e o calor
?
para fora do corpo. Usado em doenças como: sarampo, febre, catapora,
coqueluche, bexiga, gripe, asma e outros. São os seguintes: carro santo,
pimenta-do-reino, raiz de fedegoso, cravo, amendoim, alfavaca, unha
danta, sabugueiro, gengibre, agrião, hortelã, limão (assado), laranja
tanja, levante, anador e outros. O remédio quente incomoda o fígado, os
rins e o intestino;
? Remédios Populares : existem outros produtos que não são
plantas ou que se misturam a elas para formar alguns Remédios Populares,
estes Remédios podem ser associações de ervas a material animal,ou
apenas o material de origem animal,ou ainda Remédios que não têm
origem nem animal nem vegetal e é muito difundido nos meios rurais; e
? Banhas: tipo de pomada da medicina popular é a gordura de
alguns bichos. Banha de jibóia: muito utilizada para combater o
reumatism. Banha de capivara: para coceira nos peitos. Banha de canela

461
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

de Ema : para surdez. Banha de galinha: para cicatrizar pequenas feridas e


tumores. Banha de porco: para desinflamar o nariz e, derretida na pinga,
cura embriaguez.
Existem ainda outros tipos de Remédios que não são oriundos de
animais:
? Cordão umbilical: em alguns locais ele é guardado e usado
para remédio,como chá é usado contra epilepsia;
Cinza de lenha (do fogão): também bastante utilizado diluído
?
na água para dor de barriga oriunda de gazes;
? Riscado de cinza de fornalha: Beber a água e passar a borra
em cruz no umbigo. Na maioria dos locais o remédio sempre acompanha a
reza;
Leite materno: usado como colírio;
?
? Pedra do bucho (formada no estômago dos ruminantes): é
usada, entre outros, contra a lepra (no Vale do Jequitinhonha -MG);
Rapé: pó de fumo de rolo acrescentado a outros produtos que é
?
inalado para desobstruir as narinas em caso de resfriados; e
? Asma: remédio contra asma: toma-se três raízes de erva
cidreira(socadas) e três casas de “maria barreira” (tipo de um
marimbondo). Depois de tudo fervido e coado, tomar o chá.
Encerrando a viagem, este estudo visa a revivescer, no âmbito do
ambiente escolar, as manifestações tradicionais do povo, compreendendo
os mitos, as lendas, as cantigas de roda, a fim de promover o encontro do
contexto histórico cultural das crianças com a infância dos seus pais, na
qual estas brincadeiras se faziam presente. Com o ato de brincar e se
divertir, a criança aprende, descobre o mundo à sua volta e se relaciona
com os colegas. Desse modo é papel da escola garantir espaço apropriado
para atividades lúdicas, tanto dentro da sala como ao ar livre. Enquanto se
pensa na formação de cidadãos dentro da escola, torna-se de
fundamental importância a identidade cultural de cada aluno, respeitando
e resgatando suas particularidades.
Quanto a esta questão, segundo Paulo Freire “A questão da
identidade cultural, de que fazem parte a dimensão individual e a de classe
dos educandos cujo respeito é absolutamente fundamental na prática
educativa. Pois bem. O respeito é importante tanto quanto a valorização da
cultura individual, pois esta se faz presente na vida dos alunos e os ajuda a
se encontrarem como sujeitos históricos que criam e recriam sempre uma
nova história. Vale ressaltar também que as aprendizagens acontecem em
atividades e experiências informais. Para tanto é que se faz importante o
uso das brincadeiras, especialmente as que fazem partem do repertório
cultural da classe. Dessa forma, os significados são alcançados através do
lúdico, em diversos ambientes e mesmo em salas de aula que muitas vezes
são organizadas fora do padrão, de forma natural no convívio e experiência
com outras pessoas adultas ou crianças.
Vale destacar que, na alfabetização de jovens e adultos, trabalhar

462
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

a diversidade cultural é uma estratégia das mais importantes uma vez que
contribui na construção identidade nacional. O desafio do Programa é
tratar a diversidade cultural. Nesse sentido, a escola pode ser o local de
diálogo, de aprender a conviver e vivenciar a própria cultura, respeitando
as diferentes formas de expressão cultural. Significa considerar as
diferenças como fator de enriquecimento e não como obstáculo para a
alfabetização.
Desta mesma forma, devemos acordar do romantismo e perceber
que para a continuidade das manifestações populares tradicionais
continuarem existindo, elas precisam ser transformadas, ainda que se
apresentem através da mídia tecnológica.
O incentivo à divulgação das tradições populares pelos meios de
comunicação de massa (televisão, rádio, jornal, revista, celular, internet, e-
mail, autdoor entre outros) pode ser um benefício para a continuidade,
como por exemplo facilita a comunicação e o acesso ao maior número de
pessoas;resgata os produtos e objetos da cultura popular que foram
danificados; serve como subsídio em projetos educacionais e políticos; s
surgimento de um novo olhar sobre as culturas populares; o aumento da
criatividade do povo, que faz surgir grupos alternativos de folguedos e
danças populares; possibilita a sobrevivência de certos grupos que
estavam fadados a desaparecer.
Como malefícios do uso da tecnologia nas tradições populares,
podemos pensar na deformação e a deturpação exercidas pelos meios de
comunicação de massa. Na estilização do produto e objetos.Na
espetacularização dos folguedos e das danças.Na padronização do
produto, que faz perder a qualidade nas manifestações populares.Na
aceleração do processo de desaparecimento de certos grupos das
tradições populares que não acompanham a dinâmica da informação.
Sabemos que à luz da globalização, Softwares avançados, novos
ships para celulares, a quebra das fronteiras desencadeiam um processo
de transformação nas tradições populares. Com isso, encontramos como
saída a refuncionalização nos produtos das tradições populares para
sobreviverem no mundo da concorrência, automação e tecnologia da
informação.
É importante analisar a cultura popular e, para isso, pensar a
melhor maneira de revivescer tradições baças, cansadas e
incompreendidas. Para isso, na busca de retomar através da história oral as
tradições populares no contexto capitalista, teremos que utilizar a
tecnologia como maneira de aprimorar, resgatar e facilitar a vida do povo,
pois isso nunca matará o jeito tradicional de ser do povo. Podemos ver na
tela do computador o que as pessoas faziam num tempo antes de nossa
existência. São esses argumentos que fazem com que a gente acredite na
união perfeita entre as tradições populares e tecnologia.
Pois é, amigo(a) acadêmico(a), é preciso acordar do encanto e,
por alguma razão, encerrar a travessia. E travessia ilustra bem o que

463
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

procuramos fazer aqui: percorrer um pedaço do “caminho das águas” do


Velho Chico e do Jequitinhonha, em Minas Gerais, viajando nos interlúdios
das Culturas, seja erudita, popular ou de massa e vimos lugares, povos,
costumes, danças, tradição e fé. São as facetas da oralidade se fazendo
escrita, num sopro de vida...
Esperamos que você tenha êxito nos estudos, que possa integrar
cada vez mais a linguagem audiovisual ou escrita à sua prática pedagógica
e que sua escola consiga estruturar-se cada vez mais e melhor para essa
sua travessia, com a cooperação de toda a comunidade.
Até a próxima unidade!

REFERÊNCIAS
ADORNO, Theodor Adorno e Max Horkheimer. Brasil ou Dialética do
Iluminismo.
ARANTES, Antonio Augusto. O que é cultura popular. São Paulo:
Brasiliense, 1986
AYALA, Marcos; AYALA, Maria Ignez Novais. Cultura popular no Brasil.
São Paulo: Ática, 2003.
BAKHTIN, Mikhail. A Cultura Popular na Idade Média e no
Renascimento. Brasília: UnB, 1996.
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo:
Perspectiva, 2003.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é folclore. 5. ed. São Paulo:
Brasiliense, 1985.
BURKE, Peter. Cultura popular na Idade Moderna. Trad. Denise
Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
CANCLINI, Néstor García. Cultura y Comunicación: entre lo global y lo
local. La Plata: Ediciones de Periodismo y Comunicación, 1997.
CASCUDO, Luís da Câmara. Antologia do Folclore Brasileiro. Global,
2002.
CASCUDO, Luís da Camara. Literatura Oral no Brasil. Belo Horizonte:
Itatiaia, 1989.
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário Folclórico Brasileiro. INL, 1954.
CHARTIER, Roger. Cultura popular: revisitando um conceito
historiográfico. Estudos Históricos. n. 16 (1995).
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1986.
DAMATTA, Roberto. Carnavais, malandros e heróis. Rio de Janeiro:
Rocco, 1978.
EAGLETON, Everardo. A idéia de cultura. São Paulo: UNESP, 2005.
GARCÍA CANCLINI, Néstor. As culturas populares no capitalismo.
Tradução de Cláudio Novaes Pinto Coelho. São Paulo: Brasiliense, 1982.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1978.

464
4
UNIDADE 4
CULTURA POPULAR: DE POVO À MASSA

O objetivo desta unidade é analisar o conceito de “cultura


popular” desde seu surgimento, no século XVIII, até os dias atuais, quando
o crescimento das cidades e a invenção dos meios de comunicação de
massa deslocam a cultura popular para o cenário urbano. É importante
frisar que o popular, muitas vezes, é utilizado como base de criação de
símbolos nacionais, redimensionados para a formação de uma cultura
nacional.

4.1 O POVO

Assim como o folclore, a noção de cultura popular também se


origina no Movimento Romântico, a partir dos meados do século XVIII,
fortalecendo-se no século XIX. Segundo Cavalcanti (2001, p.70), ao longo
desse período, marcado pelos movimentos da Reforma e da Contra-
reforma, “as elites européias afastaram-se de um universo cultural do qual
até então haviam participado na condição de bi culturais”. Um rico senhor,
por exemplo, que participasse de uma peregrinação não se veria
participando de um movimento 'do povo', pois sua participação era parte
integrante de uma cultura que, embora diferenciada, era integralmente
vivida como sua.
A fragmentação da cultura em dois pólos inaugura-se quando se
torna necessário estabelecer uma distância entre os modos de vida das
elites e do povo. Vemos nascer, então, uma antinomia no interior da cultura
de uma sociedade, pela criação da oposição entre a cultura popular e a
cultura de elite. Segundo Elias (1993, p. 249) “é a necessidade de
distinguir-se de tudo que é burguês que aguça” novas formas de
sensibilidade entre a elite. Da mesma forma que iam também tomando
“asco do vulgar”, do pouco refinamento das classes baixas. O “medo
social” fazia com que “os membros da classe superior” mantivessem uma
“intensa vigilância com que observavam e poliam tudo o que os distinguia
das pessoas de categoria mais baixa; não apenas nos sinais externos de
status, mas também na fala, nos gestos, nas distrações e maneiras. A
pressão constante exercida a partir de baixo e o medo que induzia em cima
foram, em uma palavra, algumas das mais fortes forças propulsoras –
embora não únicas – do refinamento específico civilizado que distinguiu os
membros dessa classe superior das outras e, finalmente, para eles se
tornou como que uma segunda natureza (ELIAS, 2003, p. 251)”.
Consequentemente à separação dos estratos sociais, vê-se surgir
os discursos que colocam em lados opostos, os grupos sociais internos de
uma sociedade, fazendo que aja uma oposição entre cultura popular e
cultura de elite. Todavia, a revolução industrial e o desenvolvimento cada
vez maior de uma cultura de massa, na qual os meios de comunicação têm

465
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

um papel fundamental fizeram com que as pesquisas sobre “apropriação”


e “circulação” entre as classes voltassem à tona num cenário que às vezes
lembra a Idade Média. Hall (2003) afirma não haver um estrato
“autêntico” na cultura popular, saturada que está de imperialismo popular.
Chartier (1990) propõe que as “distinções primordiais expressas na
maioria das vezes em pares de oposição” – high culture e popular culture
tornaram-se objeto de problematizações (1990, p.54).
Apesar de trabalhar enquanto pares de opostos, a contribuição
dos marxistas e anarquistas aos estudos sobre o popular foram muito
importantes para a evolução dos estudos nessa área. Eles politizaram o
conceito de povo e trouxeram avanços para a compreensão da cultura
popular. A temática gira em torno da opressão: o povo, historicamente, é
oprimido, mas pode se rebelar. A opressão é aceita devido a um processo
lento de aceitação da ideologia e da hegemonia das classes superiores.
A cultura popular fica sendo, segundo Gramsci (citado por BOSI,
1996, p. 63 e 64), a cultura criada pelo povo, com formas progressistas e
conservadoras. Existe uma dialética no fazer cultural, uma dinâmica entre
resistência e acomodação. Na formação da cultura popular estão
presentes também valores que pertencem a outra classe social,
obviamente a hegemônica. Esses são interiorizados e apreendidos como
sendo seus próprios. É por isso que se observa o mesmo conservadorismo
nas classes populares e dominantes. É assim que se dá o processo de
aceitação da dominação através da hegemonia. Esse é um processo
complexo feito mais de negociações do que de imposições. Neste aspecto
é oportuna a frase de Hobsbawn: “a paixão ou adesão do povo ao jazz não
acontecia porque as pessoas gostavam do som, mas por ser uma conquista
cultural de uma minoria dentro da ortodoxia cultural social das quais elas
tanto diferiam. (citado por ROCHA, 2001, p. 133)”.
De acordo com Hall (2003), a tentativa de escrever a história da
cultura popular somente a partir do seu interior, “sem compreender como
elas são mantidas em relação às instituições da produção cultural
dominante, não é viver no século vinte”. Para ele, é necessário relacionar o
povo, a concentração e a expansão dos novos aparatos culturais,
considerar a “monopolização das indústrias culturais, por trás de uma
profunda revolução tecnológica (HALL, 2003, p. 253)”. Isto não significa
que o povo assuma uma posição passiva em relação aos aparatos
dominantes, nem que, possa existir fora da lógica dominante da indústria
cultural, uma cultura popular autêntica, que não se deixa enganar por
propagandas comerciais. O poder cultural – dominação e subordinação –
é um aspecto intrínseco das relações culturais [pois] não existe uma
'cultura popular' íntegra, autêntica e autônoma, situada fora do campo de
força das relações de poder e de dominação culturais. Em segundo lugar,
essa alternativa subestima em muito, o poder da inserção cultural.
Percebe-se que, muitas vezes, o estudo da cultura popular desloca-se entre
“dois pólos inaceitáveis: da autonomia pura ou do total encapsulamento

466
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

(HALL, 2003, p. 254)”.


Cultura popular é freqüentemente entendida como folclore ou até
como cultura de massa, porque os três signos são expressões de um
processo contínuo de mútuas influências e transformações, no qual
chegam a se confundir. Folclore é definido, habitualmente, como a cultura
popular transformada em norma pela tradição.

B GC
GLOSSÁRIO E
70 A F
Signo lingüístico: pode ser
desembrado em duas
Figura 35: Ilustração dos Foliões de São Gonçalo. faces: o significante, que é
a parte concreta do signo,
Para tratar da questão da cultura popular é preciso, de início, como sons ou letras e
saber que se está lidando com um termo esquivo, dado a muitas definições percepetível através dos
e repleto de ambigüidades. Tentaremos, portanto, circunscrever essa sentidos; e o significado,
expressão de modo a não deixá-la demasiadamente ampla e vaga. que é a idéia formada, a
É necessário reforçar, antes de tudo, que o conceito de cultura imagem que se tem em
popular é amplo, gelatinoso, objeto de muitas polêmicas e repleto de mente.
contradições. O termo popular é proveniente de povo. Mas o que seria um
“povo”? Não há consenso na resposta, porém a acepção mais comum é
considerar povo como o conjunto dos cidadãos de um país, excetuando-se
os dirigentes e os membros da elite socioeconômica. Se não há consenso DICAS
em torno do termo “povo”, o que dizer do conceito de “cultura”? Peter
Burke julga que esse conceito parece ser ainda mais controverso. Antes,
era usado para se referir à “alta” cultura, mas, hodierno, o uso do termo foi
Acesse o site do Centro
ampliado, incorporando a “baixa” cultura, ou cultura popular. Em outras
Nacional de Folclore e
palavras, o termo cultura normalmente se relacionava à literatura
Cultura Popular:
(acadêmica), música (clássica), ciência.
http://www.cnfcp.com.br/int
erna.php?ID_Secao=16

467
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Figura 36: Terno dos Catopés de Montes Claros/MG.

Depois, o conceito passou a ser empregado para caracterizar os


seus correspondentes populares – literatura de cordel, canções folclóricas,
medicina popular. Atualmente, o conceito de cultura tem um sentido
bastante dilatado, abrangendo praticamente tudo que pode ser
apreendido em uma sociedade – desde uma variedade de artefatos
(imagens, ferramentas, casas e assim por diante) até práticas cotidianas
(comer, beber, andar, falar, ler, silenciar), segundo Burke(1989).
Quando falamos, hoje, sobre cultura popular estamos nos
referindo não apenas às manifestações festivas e às tradições orais e
religiosas do povo brasileiro, mas ao conjunto de suas criações, às
maneiras como se organiza e se expressa, aos significados e valores que
atribui ao que faz, aos diferentes modos de trabalhar, aos jeitos de falar, aos
tipos de música que cria, às misturas que faz na religião, na culinária, na
brincadeira.

4.2 CULTURA POPULAR NA IDADE MÉDIA E NO RENASCIMENTO

Mikhail Bakhtin, em seu estudo sobre o grotesco em A Cultura


Popular na Idade Média e no Renascimento: o Contexto de François
Rabelais (1996), apresentou a originalidade da cultura cômica popular
que ainda não tinha sido inteiramente revelada. No entanto, sua amplitude
e importância na Idade Média e no Renascimento foram consideráveis. O
mundo infinito das formas e manifestações da festa popular, do grotesco,
do cômico, do riso opunham-se à cultura oficial, ao tom sério, religioso e
feudal daquela época.
Para contextualizar o leitor na problemática do autor
renascentista, Bakhtin elabora uma teorização do cômico e da cultura
popular da Idade Média e do Renascimento. Assinala que o riso e o aspecto
jocoso das manifestações culturais populares tinham a capacidade de
produzir uma “dualidade do mundo”, configurando-se uma oposição à
cultura oficial. Mais ainda. Disse que a cultura cômica popular expressou a

468
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

visão de mundo peculiar das camadas inferiores da sociedade. Mas,


apesar disso, esta manteve um permanente orgânico e dinâmico contato
com a cultura oficial, influenciando e sendo influenciado por ela. A relação
entre a cultura erudita (ou da elite intelectual) e a cultura popular passa
tanto pelas formas quanto pelos conteúdos dos sistemas de
representações.
Por isso, o cruzamento entre ambos os domínios não pode ser
entendido como uma relação de exterioridade envolvendo dois conjuntos
estabelecidos aprioristicamente e sobrepostos (um letrado, o outro
iletrado). Pelo contrário, esse cruzamento - ou zonas de fronteiras - entre o
chamado "erudito" e "popular" produz encontros e reencontros, espécie de
fusões culturais. Segundo Bakhtin, em determinados momentos o
Renascimento se traduzia na cultura popular codificada nas obras da
cultura letrada ou erudita. Aliás, foi na cultura popular que todo aquele
sistema cultural encontrou a sua máxima coerência e revelou de forma
mais cabal seu princípio. A obra de Rabelais, nesse sentido, é
paradigmática, justamente porque penetra na essência da "cultura cômica
popular", ou seja, na verdadeira "enciclopédia" da cultura popular. O que se
qualifica de “erudito” e o “popular” está em permanente processo de
ajustes, desajustes, reajustes, em suma, em movimento, em
transformação.
Em Bakhtin, múltiplas manifestações dessa cultura carnavalesca
podem subdividir-se em três grandes categorias: 1. As formas dos ritos e
espetáculos (festejos carnavalescos, obras cômicas representadas nas
praças públicas etc); 2. Obras cômicas verbais (inclusive as paródicas) de
diversa natureza: orais e escritas, em latim ou em língua vulgar; 3. Diversas
formas e gêneros do vocabulário familiar e grosseiro (insultos, juramentos,
blasonarias populares, etc.). Essas três categorias estão estreitamente
interrelacionadas e se combinam de diferentes formas.
Os festejos de carnaval ocupavam um lugar muito importante na
vida do homem medieval. Além dos carnavais propriamente ditos, que
eram acompanhados de atos e procissões complexas que enchiam praças
e ruas durante dias inteiros, celebravam-se também a festa dos tolos e a
festa do asno, além do riso pascal muito especial, livre e de cunho
tradicional. Quase todas as festas religiosas apresentavam aspecto cômico
popular e público, também assentado na tradição.
O riso era proibido, em praça pública, na Idade Média, mas
mesmo assim acompanhava as cerimônias e os ritos civis da vida cotidiana:
os bufões e os bobos assistiam sempre às funções do cerimonial sérios e
parodiavam seus atos (proclamação dos nomes dos vencedores dos
torneios, cerimônias de entrega do direito de vassalagem, iniciação dos
novos cavaleiros, etc). Nenhuma festa se realizava sem intervenção dos
elementos de organização cômica de alguma espécie. Para Bakhtin,
pareciam ter construído, ao lado do mundo oficial, um segundo mundo ou
segunda vida aos quais os homens na Idade Média pertenciam em maior

469
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

ou menor grau e nos quais viviam em ocasiões determinadas.


Muitas formas carnavalescas, de fato, são formas de paródia do
culto religioso e todas exteriores à Igreja e à religião, pertencendo à esfera
particular da vida cotidiana. Os espectadores não assistem ao carnaval,
eles o vivem, uma vez que o carnaval, pela sua própria natureza, existe para
todo o povo. Durante a realização da festa, só se pode viver de acordo com
as suas leis, isto é, as leis da “liberdade”. O carnaval não era uma forma
artística de espetáculo teatral, mas uma forma concreta, embora
provisória, da própria vida.
Observa-se que as diferenças sociais continuam existindo, mas o
complexo jogo de “apropriação” e “circularidades” entre as culturas faz
com que seus materiais simbólicos naveguem e por vezes, materiais
simbólicos vindos da indústria cultural, sirvam a diferentes culturas. A
oposição entre cultura popular e cultura de elite não está nos materiais
simbólicos que utilizam, mas nos discursos proferidos em relação a eles. É
possível, ainda, interpretar que essas diferenças podem ser lidas nas
oposições hierárquicas por meio da condição subalterna que a primeira
exprime em relação à segunda, construindo sua subalternidade.

4.3 A MASSA

A problematização da cultura popular deve incluir também a


constante produção cultural bem como todos os dilemas sociais que o
popular vai enfrentar nas migrações do campo para a cidade. À medida
que as cidades vão crescendo, novas formas de sociabilidade e produções
culturais vão surgindo entre as classes populares. Cada vez mais distantes
do mundo rural. Para muitas pessoas, a cultura popular continua sendo a
cultura dos grotões, do “sertão”. Às vezes é difícil denominar as culturas
das classes populares das cidades de cultura popular. Utiliza-se cultura da
periferia, cultura popular urbana, cultura subalterna. A partir de influências
românticas constrói-se um discurso de que “na periferia das cidades não
tem cultura, é só lixo cultural e miséria”. “Cultura popular verdadeira é
aquela produzida no campo” (Como se existisse uma verdadeira cultura
popular!). Nas palavras de Barbero (1997), “diante do popular urbano a
concepção mais freqüente é negar pura e simplesmente sua existência
cultural. Trata-se de um mito tão forte que falar em popular
automaticamente evoca o rural, o camponês (BARBERO, 1997, p.265)”.
Num país que possui a maioria de sua população morando nas
cidades, não é justo que o popular seja exclusividade da zona rural. No
Brasil inteiro, a “modernização” expulsou o trabalhador da terra,
mandando para a cidade um contingente de famílias marginalizadas. As
classes populares urbanas têm sua origem no campo, nas pequenas
cidades, mas o ambiente que as rodeia já é outro. Mesmo no interior ou na
zona rural existe uma “modernização” da cultura popular. Ela não se
alimenta mais apenas dos meios tradicionais de transmissão cultural, mas

470
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

também do rádio, da televisão, da escola etc. que se constituem como


novas formas de adquirir conhecimento e material simbólico.
Existe nessa desvalorização da cultura suburbana, preconceito e
medo, ideologicamente transmitidos pela classe que se mantém no poder.
Os pobres das cidades estão mais próximos, anônimos no que podemos
chamar de massa. Se no campo estão espalhados, aqui se concentram na
multidão. Podem-se mais fortes no anonimato. A construção de um
imaginário negativo sobre as massas, a “ralé”, é necessária para a
manutenção da hegemonia.
E, como nos informa Zaluar (1985), “[passa a existir] uma
permanente necessidade por parte dos sujeitos da pobreza de se
comprovarem como trabalhadores honestos para não serem punidos ou
marginalizados como criminosos” (CARNEIRO, p. 19).
A produção cultural popular nas cidades se pulveriza, mas
encontra uma possível identidade na fala, no bairro, nas redes de
solidariedade, na produção artística. Entender como se estrutura esse
popular é tão importante quanto entender o popular rural.

4.4 A INTERMEDIAÇÃO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

Até o final dos anos 50, o rádio foi um grande companheiro das
classes populares no processo de assimilação dos valores e da vida urbana.
“Conservando suas falas, suas canções e não poucos traços de seu humor,
o rádio mediará entre tradição e modernidade (BARBERO, 1997, p. 267)”.
Além disso, o Estado se utilizou do rádio (e depois da televisão)
para construir uma identidade nacional, um sentimento de nação entre os
brasileiros. O rádio possui o papel de unificador nacional. Os símbolos
dessa união são buscados na cultura popular, como Luiz Gonzaga, que se
transformou no Rei do Baião, conhecido e prestigiado em todo o país
através da Rádio Nacional – a primeira com alcance em todo o estado
Brasileiro.
Nesse contexto, ocorre uma mudança: o popular deixa de ser
sinônimo de periferia e classes subalternas e passa a ser visto como aquilo
que atinge muitas pessoas – o popular massivo. Sendo assim, o futebol é o
esporte mais popular do Brasil, não porque é o esporte preferido das
classes populares, mas dos brasileiros. Assim, ocorre a identificação do
popular com o nacional: carnaval, samba, feijoada...
Segundo Barbero (1997), “a partir dos anos 60, a cultura popular
urbana passa a ser tomada por uma indústria cultura urbana cujo raio de
influência se torna cada vez mais abrangente, transpondo modelos em
larga medida buscados no mercado transnacional. A proposta cultural se
torna sedução tecnológica e incitação ao consumo (p. 268)”.
Assiste-se a uma crescente popularização dos filmes e das
músicas americanas, bem de toda a sua cultura. O consumo também
chega à periferia, como não poderia deixar de ser num sistema capitalista.

471
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

A cultura popular passa a ter referências transnacionais (bares com nomes


em inglês ou misturado inglês/português) e se distancia ainda mais do
imaginário rural.
É oportuno o depoimento de Souza (2000, p.40):
lembro-me de um fato que observei quando fazia
uma pesquisa sobre música folclórica e música
caipira numa região tradicional e bem típica da
agricultura de subsistência, a pouco mais de cem
quilômetros da cidade de São Paulo. Eu entrevistava
antigo e famoso violeiro do bairro rural, conhecido
mestre da dança de São Gonçalo, exímio tocador da
chamada viola caipira. Num certo momento chegou
seu filho, ainda jovem. Perguntei-lhe se ele também
tocava viola. Disse-me que não, que viola é coisa de
caipira, de gente da roça, embora também ele
vivesse e trabalhasse na roça. Quis saber se não
tocava nenhum outro instrumento. Respondeu-me
que tocava violão. Como sabemos, de certo modo no
Brasil a viola é um signo do rural e o violão um signo
do urbano. Mostrou-me seu violão. Para que não
houvesse dúvida de que seu gosto musical não se
confundia com o gosto musical “atrasado” e caipira
do pai, havia colocado na parte da frente do
instrumento um decalque de Nossa Senhora
Aparecida e ao lado mandara gravar a fogo: 'Ai love
iú bêibi' (I love you baby)!
São traços de uma “inautenticidade”. A apropriação indevida da
língua inglesa diferencia o popular urbano do rural, mas reafirma a sua
subalternidade frente a outros setores na sociedade.
Mas, a apropriação de produtos estrangeiros também pode
contribuir para uma “inautenticidade” enriquecedora como se observa em
todas as experiências de hip hop e basquete de rua das periferias do Brasil.
Deve-se considerar como afirma Hall (1997) que as sociedades
periféricas têm estado abertas às influências culturais externas. “A idéia de
que esses são lugares 'fechados' – etnicamente puros, culturalmente
tradicionais e intocados até ontem pelas rupturas da modernidade – é uma
fantasia ocidental sobre a 'alteridade'. “ (Hall, 1997, p. 86)
Outra perspectiva de análise de Hall (1997), diz respeito ao
impacto do “global” sobre o “local”. Segundo o autor, “a globalização (na
forma da especialização flexível e da estratégia de criação de 'nichos' de
mercado), na verdade, explora a diferenciação local.” (Hall, 1997, p. 83)
O global se articula ao local, cede aos gostos e valores culturais locais para
se manter como dominante. Mesmo que haja circularidade entre as
culturas nesse processo, observa-se que as apropriações ainda são muito
desiguais.

472
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Hip Hop – a periferia grita

Em meio a tantas armas de que esses jovens podem lançar


mão, escolheram a mais eficaz: a cultura. A cultura hip hop (...)
Então se constata um fenômeno sociocultural em que, rejeitando a
sedução do “ouro de tolo” oferecido pelo monopólio da indústria
cultural fonográfica fabricante de modismos comportamentais,
muitos desses jovens organizam-se em posses, Brasil afora,
realizando estudos e eventos, produzindo arte, interferindo na
linguagem e na metodologia educacional, reivindicando políticas
públicas e propondo resistência, independência, autenticidade,
atitude.
Isso porque o hip hop não foi inventado pela mídia. Nasceu
naturalmente, nas ruas, forjado em sangue, suor e lágrimas.
Qualquer garoto ou garota que se proponha a trilhar seus caminhos
conhece muito bem sua história e a de seus personagens-
referência. Dos bairros periféricos norte-americanos às favelas
brasileiras, foi ganhando forma e conteúdo, com o ritmo e as
sonoridades que emanam das pick-ups dos DJs e das letras
contundentes dos MCs, a quebradiça e envolvente dança de b. boys
b. girls e os loquazes traços multicoloridos dos grafiteiros.
Como a maioria das manifestações artísticas que nascem
da sofrida alma humana, tem auxiliado um número significativo de
adolescentes e jovens adultos a encontrar uma identidade e a elevar
sua auto-estima. A vergonha da vida discriminada da favela dá
lugar à altivez própria dos que se descobrem capazes de fazer arte,
de mudar a própria vida e as daqueles a quem amam. E de
transformar a falta de uma perspectiva existencial na saudável e
transformadora consciência da cidadania. Talvez seja isso que se
possa chamar “ideologia do hip hop”.

Fonte: Rocha, Janaína; Domenich, Mirella; Casseano, Patrícia. Hip


hop – a periferia grita. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo,
2001.

4.5. FOLKCOMUNICAÇÃO

O termo folkcomunicação foi utilizado por Luiz Beltrão para


denominar “os meios de comunicação de que se vale o povo para impor, às
vezes de um modo inesperado, palpável, o seu pensamento e sua vontade.
(BELTRÃO, 2007, p. 30)” Sendo assim, “é o processo de intercâmbio de
informações e manifestações de opiniões, idéias e atitudes da massa,
através de agentes e meios ligados direta ou indiretamente ao folclore.

473
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

(ibidem, p. 40)”
ATIVIDADES
São considerados sistemas de folkcomunicação, meios de
Pesquise quais são os expressão como a “queima do Judas”, o carnaval, a música de tradição
sistemas de oral, o mamulengo, o bumba-meu-boi, o artesanato e as artes plásticas
folkcomunicação presentes populares, os folhetos, almanaques, bem como a informação oral
na sua cidade. transmitida pelos cantadores, rezadeiras, benzedeiras etc.
Fonte: Marcelo Júnior, 2007.

DICAS

O filme Uma onda no ar


dirigido por Helvécio Ratton
mostra a trajetória da
Rádio Favela e o seu papel
junto à comunidade. É Figura 37: Carnaval em Januária.
importante observar no
filme que “a
inautenticidade”, ou seja, a 4.6. ARTE E A INDÚSTRIA CULTURAL
apropriação de uma cultura
estrangeira, no contexto da Para finalizar a disciplina, é necessário sair do âmbito da cultura
favela, é positiva. popular e analisar a produção e o consumo de produtos culturais de
maneira mais ampla, no contexto da produção cultural para as massas.
Atualmente, a lógica do consumo de mercadorias culturais se aplica a
todas as classes sociais.

DICAS
4.7. ADORNO E A INDÚSTRIA CULTURAL

O conceito de indústria cultural foi desenvolvido por Adorno e


Leitura do livro O queijo e
Horkheimer para explicar a estrutura de funcionamento da cultura de
os vermes de Carlo
massa. Segundo eles (2002), são características inerentes, a
Ginzburg – Editora
estandardização e a produção em série. A lógica da produção das
Companhia das Letras. Ele
mercadorias aplicada aos produtos culturais, cria produtos padronizados,
apresenta bem os conceitos
feitos em grande escala para atingir um grande público. Da mesma forma,
de apropriação e
os grandes divulgadores e produtores de cultura – rádio, televisão, cinema
circularidade entre as
– também são vistos e funcionam a partir da lógica da indústria.
culturas a partir da história
de um moleiro perseguido Indústria cultural é o nome genérico que se dá ao conjunto de
pela inquisição. empresas e instituições cuja principal atividade econômica é a produção de
cultura, com fins lucrativos e mercantis. No sistema de produção cultural
encaixam-se a TV, o rádio, jornais, revistas, entretenimento em geral; que
são elaborados de forma a aumentar o consumo, modificar hábitos,
educar, informar, podendo pretender ainda, em alguns casos, ter a
capacidade de atingir a sociedade como um todo.

474
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

No mundo contemporâneo torna-se impossível escapar dos B GC


efeitos da industrialização sobre a cultura. Isto é, vivemos cercados pelos GLOSSÁRIO E
produtos industrializados e pelas estratégias de comercialização que nos A F
fazem permanentemente selecionar, dentre milhares de produtos em A expressão "indústria
oferta, aqueles produtos que iremos “consumir”. Nada mais “natural”, cultural" foi utilizada pela
portanto, que um dos prazeres oferecidos em maior abundância pela primeira vez pelos teóricos
cultura popular seja o de transformar consumidores (espectadores) em da Escola de Frankfurt
críticos, juízes e comentaristas: falar a respeito desses produtos culturais Theodor Adorno e Max
tornou-se uma das moedas correntes das relações humanas Horkheimer no livro
contemporâneas. Dialektik der Aufklärung
Assim, atribui-se valor, julga-se e selecionam-se as relações que se (Dialética do
faz com o mundo, a partir das escolhas de consumo: tais e tais produtos Esclarecimento, no Brasil
são "adequados", tais e tais são dispensáveis. Chega-se até mesmo a ou Dialética do Iluminismo,
considerar a escolha dos amigos com base nos produtos consumidos por em Portugal). Nessa obra,
cada um deles, pois é a cultura das massas. Adorno e Horkheimer
Atualmente, numa época em que a industrialização está mais do discorrem sobre a
que consolidada em quase todo o mundo, que produtos podem ser ou não reificação da cultura por
considerados industriais? E quanto à cultura: pode ela, agora, ser vista meio de processos
como fruto de um processo industrial? Que tipo de relações podem-se industriais.
estabelecer entre produtor industrial e produtor cultural? E entre produtor
cultural e público consumidor de cultura? Que fronteiras existem entre a
cultura chamada erudita e a considerada popular? São essas fronteiras
espontâneas ou foram definidas pela mídia, tendo em vista os objetivos dos
PARA REFLETIR
produtores culturais? Temas controvertidos como esses são delineados por
Adorno no texto "A Indústria Cultural", baseado em conferências radiofôni-
cas proferidas na Alemanha, em 1962. A massa é uma formação
Adorno chama de indústria nova, que não se baseia na
cultural ao que anteriormente conce- personalidade dos seus
bia-se como "cultura de massas". Não membros, mas apenas nas
é um tipo de cultura que surja esponta- partes que reúnem um a
neamente do povo; tampouco o que se todos os outros e equivalem
pode conceber como cultura popular. às formas mais primitivas e
A indústria cultural é uma produção ínfimas da evolução
dirigida para o consumo das massas orgânica . A massa
segundo um plano preestabelecido, também é composta por
seja qual for a área para a qual essa pessoas que não se
produção se dirija. Em outras palavras, conhecem, que estão
deve-se ter em mente que há uma espacialmente separadas
estreita inter-relação entre a produção e o consumo, a primeira determi- umas das outras, com
nando o deve ser consumido e vice-versa. poucas possibilidade de
Em termos culturais, essa inter-relação faz com que aquilo que é interagir. Por fim, a massa
culturalmente produzido assemelhe-se a qualquer produto industrializado, não dispõe de tradições,
incluindo toda uma estratégia de marketing objetivando levar esse produto regras de comportamento,
ao público consumidor. Para a indústria cultural, tanto faz que esse produto liderança e estrutura
seja um espetáculo lírico difundido pela mídia eletrônica globalizada ou organizacional.

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Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

B GC um show de dupla sertaneja ou uma partida de futebol, como outro


GLOSSÁRIO E produto qualquer, que tenha gerado nas massas a necessidade de
A F consumo. O que importa é que esse produto chegue às massas.
Marketing E assim como toda indústria, a cultura de massa precisa agradar o
idiomaticamente, no uso cliente. Isto se traduz em produtos de fácil assimilação, com os sentidos
diário, significa: conhecidos de antemão. Por isso a indústria cultural abusa dos clichês.
"comercialização", mas Adorno e Horkheimer (2002) chamam esta estratégia de esquematismo
tambem realizaçao. da produção. Desde o começo é possível perceber como terminará um
Engloba todo o conjunto de filme, quem será recompensado, punido ou esquecido; para não falar da
atividades de música leve em que o ouvido acostumado consegue, desde os primeiros
planejamento, concepção e acordes, adivinhar a continuação, e sentir-se feliz quando ela ocorre.
concretização, que visam a Mesmo a novidade, que também é uma necessidade, está ligada
satisfação das necessidades ao velho esquema. “Tudo o que surge é submetido a um estigma tão
dos clientes, presentes e profundo que, por fim, nada aparece que já não traga antecipadamente as
futuras, através de marcas do jargão sabido, e não demonstre, à primeira vista, aprovado e
produtos/serviços existentes reconhecido (ADORNO e HORKHEIMER, 2002, p. 19)”.
ou novos. Para esses autores, a indústria cultural provoca “a atrofia da
imaginação e da espontaneidade do consumidor cultural (p. 17)”. Tudo
não passa de simples entretenimento. e diversão, num ciclo de apatia e
conformismo. Adorno e Horkheimer não têm dúvida de que observando o
campo dos consumidores, os produtos que estes consomem são péssimos.
Simplificada mente, Adorno acredita que de tanto ouvir música ruim, o
ouvido do homem moderno se atrofiou ao ponto dele não conseguir mais
apreciar uma música mais elaborada.
Segundo Teixeira (1999), Adorno e Horkheimer juntamente com
os outros estudiosos da Escola de Frankfurt foram muito criticados por
tratarem a indústria cultural como corruptora “das estruturas culturais
existentes”. Ela seria “como um instrumento de tradução e desbastamento
dos modos culturais eruditos, num processo cujo objetivo era alcançar um
mercado passivo de consumidores ao qual não se oferecia nada além de
um entretenimento facilmente digerível (TEIXEIRA, 1999, p. 218)”.
Os autores criticavam ainda o uso da expressão “cultura de
massa”, alegando-se que não era uma produção das massas, mas “um
modo de cultura para as massas (ibidem, idem)”. Teixeira também discute
a argumentação de Bobbio. Segundo ele, “a indústria cultural é vista não
como veículo de difusão da cultura, mas, pelo contrário, como modo de
impedir o acesso à cultura por destruir formas culturais populares e filtrar a
produção passível de entrar em seu mecanismo, impedindo a crítica aos
modos culturais dominantes (ibidem, idem)”.
A partir dos anos 80, os estudos sobre a indústria cultural
começam a aceitar que “os produtos dessa indústria transmitem
mensagens que correspondem a sistemas específicos de significação
(ibidem, idem)”. Ou seja, eles se direcionam para um público específico e
tentam corresponder ao modo de vida e entendimento de mundo de uma
cultura específica – a cultura de massa. A estereotipização do nordeste ou

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Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

a “tradução” de alguma grande obra literária em novela se dão para


adequá-los a uma outra cultura, não é uma simples banalização. As
preocupações com a audiência e o consumo sempre vão existir, por causa
disso a referência é sempre o gosto e os modos de vida do público atingido.
Isso significa que por trás da produção da indústria cultural há muita
pesquisa e mesmo interpretação psicológica da cultura para que assim,
seus produtos possam ser vendidos.
A indústria cultural é uma das fontes para se entender as
produções culturais da atualidade.
Além disso, a indústria cultural possibilitou acessos a produtos
culturais que, de outra forma, não seriam nunca
conhecidos e apreciados. A circulação dos
produtos tanto eruditos quanto populares se dá,
de maneira mais abrangente, pela indústria
cultural. Transmissão de concertos, divulgação
da produção artística. Além disso, o número de
filmes e documentários produzidos sob um olhar
relativizador da cultura popular tanto das
cidades quanto da zona rural é muito grande.
Filmes que muitas vezes, chegam ao grande
público – como por exemplo “O Auto da
Compadecida” e “Carandiru”, que apresentam
uma realidade social “autêntica” e uma estética
criativa.

Televisão
ATIVIDADES
Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Tony Belloto

A televisão me deixou burro muito burro demais Analise a letra da música


Agora todas as coisas que eu penso me parecem iguais “Televisão”, considerando a
O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida discussão de Adorno e
E agora toda a noite que eu deito é boa noite, querida Horkheimer sobre a
O cride, fala pra mãe
indústria cultural.
Que eu nunca li num livro
Que um espirro fosse um vírus sem cura.
Vê se me entende pelo menos uma vez criatura!
O cride, fala pra mãe!
A mãe diz pra eu fazer alguma coisa mas eu não faço nada
A luz do sol me incomoda, então deixo a cortina fechada
É que a televisão me deixou burro muito burro demais
E agora eu vivo dentro dessa jaula junto com os animais
O cride, fala pra mãe
Que tudo que a antena captar meu coração captura
Vê se me entende pelo menos uma vez criatura
O cride, fala pra mãe

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Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

4.8 WALTER BENJAMIN E A REPRODUTIBILIDADE TÉCNICA DA


ARTE

Walter Benjamin (1994) integrou o grupo de pesquisadores da


Escola de Frankfurt. Todavia, a análise cultural que faz é diferente da
proposta por Adorno e Horkheimer. O texto que será discutido a seguir A
obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica (1994), publicado
originalmente em 1936, é considerado “um dos ensaios mais originais
sobre arte popular do século XX” (STRINATI, 1999, p. 87). Deve-se
observar que em muitos países europeus e nos Estados Unidos, a cultura
popular tornou-se sinônimo de cultura de massa. O popular é
exclusivamente o massivo, o que às vezes é mal interpretado nas traduções.
O que muitas vezes, consideramos cultura popular no Brasil, nos Estados
Unidos é chamado de “cultura folk”. O sentido da cultura popular nos
textos de Walter Benjamin é dado pelo popular-massivo.
Benjamin observou que a reprodutibilidade técnica, ou seja, a
possibilidade da reprodução trouxe uma realidade nova para a obra de
arte. A reprodutibilidade do som e da imagem desloca a obra de arte do
seu contexto de produção para contextos diversos de apreciação. Mais do
que isso, a reprodutibilidade técnica tira da obra de arte, a sua
autenticidade. “Mesmo na reprodução mais perfeita, um elemento está
ausente: o aqui e agora da obra de arte, sua existência única, no lugar em
que ela se encontra. (BENJAMIN, 1994, p. 167)”.
Por isso, “a esfera da autenticidade (...) escapa à reprodutibilidade
técnica (ibidem, idem)”. A reprodução destrói aquilo que Benjamin
considera que seja “a aura” da obra de arte. “Na medida em que ela
multiplica a reprodução, substitui a existência única da obra por uma
existência serial (ibidem, p. 168)”. Uma reprodução do quadro da Mona
Lisa por mais idêntico que seja ao original, não tem a sua “aura”, a
autenticidade que possui o original.
Os contextos de exposição também são diferentes porque a
“aura” confere a obra um caráter sagrado, traz de volta toda a tradição que
está por trás de sua produção. A relação
estabelecida com a cópia é muito
diferente.
Veja a cópia do quadro famoso
da Mona Lisa.
O quadro pode servir para
decorar uma sala, está ali mais para
compor o ambiente do que para ser
apreciada a obra. Considere-se também
que muitas pessoas que passam por esta
sala nem sabem quem foi Leonardo Da
Vinci e sua importância para a arte. Ao
Figura 40: Reprodução do quadro
ser descontextualizada, a obra perde o
A Mona Lisa, de Da Vinci.

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Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

seu caráter sagrado e transforma-se num simples produto de exposição.


Não é a toa que gravuras de Van Gogh, Picasso, Miró são vendidas em
supermercados e lojas de departamentos, juntamente com outros
produtos quaisquer.
No dizer de Benjamin, “a exponibilidade de uma obra de arte
cresceu em tal escala, com os vários métodos de sua reprodutibilidade, que
a mudança de ênfase de um pólo para o outro [valor de culto para valor de
exposição] corresponde a uma mudança qualitativa comparável à que
ocorreu na pré-história (BENJAMIN, 1994, p. 173)”. Todavia, deve-se
considerar uma outra novidade dessa mudança na arte: o acesso da obra
de arte às massas. O acesso irrestrito que a reprodução possibilita
aproxima a arte de pessoas que de outra forma nunca teriam como
conhecê-la. De alguma maneira, a arte passa por um processo de
redemocratização, à medida que deixa de fazer parte apenas do cotidiano
de um grupo restrito. Diz, ainda, que “a reprodução técnica pode colocar a
cópia do original em situações impossíveis para o próprio original. Ela
pode, principalmente, aproximar do indivíduo a obra, seja sob a forma de
fotografia, seja do disco (...) o coro, executado numa sala ou ao ar livre,
pode ser ouvido num quarto (ibidem, p.168)”.
Vale dizer que a indústria cultural traz outra novidade: produtos
artísticos que já nascem sem “aura”, como no sentido estudado acima.
Produtos que têm na reprodução a sua própria condição de existência.
Dentre eles, Benjamin destaca o cinema. Para Benjamin, “o filme é uma
forma, cujo caráter artístico é em grande parte determinado por sua
reprodutibilidade (...) O filme acabado não é produzido de um só jato, e
sim montado a partir de inúmeras imagens isoladas e de seqüências de
imagens entre as quais o montador exerce seu direito de escolha –
imagens, aliás, que poderiam, desde o início da filmagem, ter sido
corrigidas, sem qualquer restrição (ibidem, p.175)”.
ATIVIDADES
Soma-se que o cinema, ou a novela ou o CD são produzidos para
serem adquiridos/vistos por pessoas que realmente não estão no contexto Pesquise sobre a Escola de
de produção da obra. O objetivo é alcançar grandes públicos, pessoas Frankfurt: principais
distantes. Mas nesse caso, as pessoas não sentem nem um tipo de integrantes, origem,
constrangimento por estarem tendo acesso à cópia ao invés do original. contribuição para os
Cópia e original são idênticos. E não há nada de errado nesse novo tipo de estudos sociológicos,
consumo de arte. Talvez tenha sido esta a grande contribuição de legado atual.
Benjamin: entender a produção cultural dos tempos modernos sem
nenhum tipo de etnocentrismo.

479
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

REFERÊNCIAS
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COELHO, Teixeira. Dicionário crítico de política cultural. 2ª ed. São Paulo:
Editora Iluminuras, 1999;
COLARES, Mona Lisa Campanha Duarte. A tradição no mundo
contemporâneo: análise dos caboclinhos montesclarences – terno do
congado das festas de agosto. (dissertação de mestrado não publicada);
-------------------. Notas sobre o popular e o folclórico. In: Funorte
Humanidades: Revista dos Cursos das Ciências Humanas / Soebrás. V. 1,
n. 2 (2006), Montes Claros – MG;
-------------------. A representação do Vale do Jequitinhonha nas canções
dos Festivales. (monografia não publicada);
DAMATTA, Roberto. Explorações – ensaios de sociologia interpretativa.
Rio de Janeiro: Rocco, 1986.
___________Relativizando – uma introdução à antropologia social. Rio
de Janeiro: Rocco, 1987;
ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
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FERNANDES, Florestan. O folclore em questão. São Paulo: Martins
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480
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

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mulher do Jequitinhonha. Belo Horizonte: Editora ás próprias custas S/A,
1983;
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fazendo de nós. Rio de Janeiro/ São Paulo: Record, 2003;
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Janeiro: DP&A Ed., 1997;
MAUSS, Marcel. Ensaios de sociologia. São Paulo: Editora Perspectiva,
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ORTIZ, Renato. Românticos e folcloristas. São Paulo: Editora Olho
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ROCHA, Everardo. O que é etnocentrismo. 11ª ed. São Paulo: Ed.
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RODRIGUES, Adriano Duarte. Comunicação e cultura – a experiência
cultural na era da informação. Lisboa: Presença, 1994.
SOUZA, José Martins de. A sociabilidade do homem simples. São Paulo:
Editora Hucitec, 2000;
STRINATI, Dominic. Cultura popular – uma introdução. São Paulo:
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THOMPSON, John. A mídia e a modernidade – uma teoria social da
mídia. Petrópolis: Editora Vozes, 1998;
TINHORÃO, José Ramos. Cultura popular – temas e questões. São Paulo:
Editora 34, 2001.

481
RESUMO

Na primeira unidade você conheceu uma vasta discussão em


torno do signo “Cultura” e os seus diferentes significados, importantes para
a sua travessia, nesta disciplina que ora se inicia. Foram tecidas algumas
definições de cultura, para compreender no que consiste a disciplina, e
melhor relacioná-la à Cultura Popular, e compreender as relações com a
cultura de massas e a indústria cultural, que serão estudadas nas próximas
unidades. O significado de cultura mais antigo aborda o refino, a boa
educação, a formação intelectual e humana, tem a sua correspondência
nos gregos e latinos, ligado a educação do homem como tal, isto é, a
educação às “boas artes” próprias do ser humano e que o diferenciam de
todos os outros seres animados. A cultura na Grécia antiga é a procura e a
realização que o homem faz de si, fortemente filosófica. A busca por um
novo sentido para a “cultura” partiu principalmente da antropologia e é
fundamental para os estudos da cultura popular. Sob esta perspectiva não
há homens sem cultura.
A festa popular realiza-se envolta numa rede de significados que
se expressando por meio de símbolos, ritos, alegorias, gestos e imagens,
são tanto ou mais diversificados, ambíguos ou ambivalentes quanto
múltiplas sejam a divisão social do trabalho e a procedência étnica e
histórica dos indivíduos e grupos que compõem o conjunto da sociedade.
Num sentido profundo, as festas ligam-se ao universo da socialização.
Tendo suas origens nos ritos que buscavam interferir nos ciclos naturais
para o provimento da subsistência, eram momentos de agradecimentos ou
de súplicas à natureza, elos de ligação entre o imponderável, visto como
divino, sagrado e o homem imponente. Por isto, ele pede e agradece.
Sabe-se que elas se ligam, principalmente, à economia e que a
periodicidade da economia agrária, ligada aos ciclos da natureza,
estabelecem em todas as culturas um calendário de festividades, em que a
comunidade se congregava para celebrar, agradecer ou pedir proteção.
Essas formas de culto a divindades protetoras da natureza estão na origem
das festas portuguesas, transplantadas mais tarde para o Brasil. Há, no
Brasil, inúmeras festas com um caráter bastante profundo, em relação aos
ritos propiciadores de chuvas, fertilidade, germinação, boas colheitas, do
sol e do calor. Elas implicam na necessidade dos seres humanos viverem
em grupo, implicando, muitas das vezes, renúncias, tensões, competições
e conflitos. Desse modo, as festas constituem importante espaço de
sociabilidade, tornando possível a vida em comunidade, através de
alegrias e representações. Enquanto representações, as festas, as folgas,

483
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

seriam a quebra da normalidade, da rotina das obras servis, da produção,


que geraria o ócio e em tempos modernos: (neg)ócio. A comemoração traz
a alegria e investe na animação dos que participam do momento de
festança. A vida é uma festa. Sabemos que à luz da globalização,
Softwares avançados, novos ships para celulares, a quebra das fronteiras
desencadeiam um processo de transformação nas tradições populares.
Com isso, encontramos como saída a refuncionalização nos produtos das
tradições populares para sobreviverem no mundo da concorrência,
automação e tecnologia da informação.
É importante analisar as manifestações da cultura tradicional
popular e, para isso, é importante pensar a melhor maneira de revivescer
tradições baças, cansadas e incompreendidas sem romantismo. Assim, na
busca de retomar, através da história oral, as tradições populares no
contexto capitalista, teremos que utilizar a tecnologia como maneira de
aprimorar, resgatar e facilitar a identidade do povo do interior do Brasil,
principalmente nos Vales do Jequitinhonha e São Francisco, pois isso
nunca matará o jeito tradicional de ser daquelas gente. Podemos ver na
tela do computador o que as pessoas faziam num tempo antes de nossa
existência. São esses argumentos que fazem com que a gente acredite na
união perfeita entre as tradições populares e a tecnologia. As
Manifestações Folclorísticas Tradicionais que abrangem a criação literária
popular, constituída por mitos, contos, fábulas, estórias, anedotas,
“causos”, provérbios, adivinhas, poesia popular, quadrinhas, lendas,
literatura de cordel e pára-choques de caminhão. Você conhecerá, a
partir de agora, o Folclore Literário, um cabedal de conhecimentos
merecedores de nossa atenção e que se subdivide em dois grandes eixos
Folclore narrativo e Folclore poético, um leque imenso de sabedoria; e,
ainda, o Folclore Lingüístico, lições de sabenças populares
magnificamente sintetizadas nos provérbios, nas frases feitas, nas
adivinhas e trava-línguas, nas parlendas, nos pára-choques de caminhões.
E até mesmo através de gestos, linguagem universalmente conhecida do
ser humano.
A partir dos anos 80, os estudos sobre a indústria cultural
começam a aceitar que “os produtos dessa indústria transmitem
mensagens que correspondem a sistemas específicos de significação
(ibidem, idem)”. Ou seja, eles se direcionam para um público específico e
tentam corresponder ao modo de vida e entendimento de mundo de uma
cultura específica – a cultura de massa. A estereotipização do nordeste ou
a “tradução” de alguma grande obra literária em novela se dão para
adequá-los a uma outra cultura, não é uma simples banalização. As
preocupações com a audiência e o consumo sempre vão existir, por causa
disso a referência é sempre o gosto e os modos de vida do público atingido.
Isso significa que por trás da produção da indústria cultural há muita
pesquisa e mesmo interpretação psicológica da cultura para que assim,
seus produtos possam ser vendidos. A indústria cultural é uma das fontes

484
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

para se entender as produções culturais da atualidade.


Além disso, a indústria cultural possibilitou acessos a produtos
culturais que, de outra forma, não seriam nunca conhecidos e apreciados.
A circulação dos produtos tanto eruditos quanto populares se dá, de
maneira mais abrangente, pela indústria cultural.

485
REFERÊNCIAS

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SUPLEMENTAR

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490
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1977.

VOVELLE, Michel. Ideologias e Mentalidades. São Paulo: Brasiliense,


1987.

VOVELLE, Michel. Ideologias e Mentalidades. São Paulo: Brasiliense,


1987.

491
ATIVIDADES DE
APRENDIZAGEM
- AA

UNIDADE I

Questão 01 – Reflita sobre os vários significados de “Cultura” e emita


comentários sobre a cultura erudita, popular tradicional, popular e de
massas.
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________

Questão 02 – Comente a importância da tradição e das


transformações da arte e da cultura do seu município.
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________

Questão 03 – Analise a importância de se trabalhar a diversidade


cultural como prática pedagógica. Depois elabore conceitos próprios
dos signos povo e folclore.
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________

UNIDADE II

Questão 04 – Reflita sobre o significado das Festas populares


considerando o sentido da tradição e opine a respeito do fenômeno
cultural.
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________
___________________________________________________________

493
Arte e Cultura Popular UAB/Unimontes

Questão 05 – Comente a importância das narrativas orais, dos mitos e dos


ritos folclorísticos.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

Questão 06 – Analise a importância de se trabalhar a diversidade cultural


como prática pedagógica.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

UNIDADE III

Questão 07 - O folclore está fortemente ligado a várias ciências que dele


carecem para melhor interpretação dos fatos, devido ao seu caráter
dinâmico, psicológico e social. Dentre estas cite as influências
transdisciplinares com a história, geografia, sociologia, psicologia,
religião, pedagogia, educação física, literatura, musica e artes.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

Questão 08 - Como podemos classificar o Folclore Literário e suas


especificidades?
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

Questão 09 – Qual é a função do Mito?


______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

494
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

UNIDADE IV

Questão 10 – Construa um texto interpretando como Bakhtin analisou as


manifestações culturais do povo na Idade Média e no Renascimento.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

Questão 11 – Explique de que maneira, a reprodutibilidade técnica diminui


o valor de culto dos objetos artísticos e aumenta o seu valor de exposição.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

Questão 12 - Todas as afirmações a seguir confirmam o pensamento de


Adorno e Horkheimer sobre a indústria cultural, exceto:

A) ( ) A reprodução destrói aquilo que os autores consideram que seja a


“aura” da obra de arte.
B) ( ) São características da indústria cultural, a estandardização e a pro-
dução em série.
C) ( ) A indústria cultural aplica ao mundo da cultura, a lógica do merca-
do de consumo capitalista.
D) ( ) A indústria cultural utiliza bastantes clichês para que seus produtos
sejam mais facilmente assimiláveis.

495
1º PERÍODO

HISTÓRIA DA
EDUCAÇÃO
AUTORES

Carla Cristina Barbosa


Doutoranda em História da Ciência pela Pontíficia Universidade Católica de São Paulo -
PUCSP, mestre em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU, especialista em
Docência para Educação Profissional e graduada em História pela Universidade Estadual de
Montes Claros – Unimontes. Atualmente, é professora do Departamento de História e
coordenadora geral do Núcleo de História e Cultura Regional – Nuhicre desta Universidade.

Huagner Cardoso da Silva


Mestre em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU, especialista em
Docência para Educação Profissional e graduado em Pedagogia pela Universidade Estadual
de Montes Claros – Unimontes. É professor do Departamento de Estágios e Práticas Escolares
da Unimontes.

Maria Cristina Freire Barbosa


Mestre em Educação pelo Instituto Superior Enrique José Varona-Cuba/Universidade de
Brasiília – UnB e graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Montes Claros –
Unimontes. Docente da disciplina Estrutura e Funionamento da Educação Básica pelo
Departamento de Educação da Unimontes, coordenadora de Apoio ao Estudante e membro
do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação na Diversidade e Saúde desta Universidade.

Maria Nadurce Silva


Mestre em Educação pela Universidade Católica de Brasília – UCB e especialista em
Sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professora do Departamento
de Educação da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes.
SUMÁRIO

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 501
Unidade I: A educação antiga e medieval . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 505
1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 506
1.2 Povos primitivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 507
1.3 Educação egípcia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 511
1.4 Educação grega . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 514
1.5 Educação romana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 522
1.6 Educação medieval . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 527
1.7 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 535
Unidade II: A educação no período do renascimento . . . . . . . . . . . 536
2.1 O Renascimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 537
2.2 O renascimento cultural, científico e artístico . . . . . . . . . . . . 538
2.3 O renascimento humanista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 540
2.4 A reforma e a contra-reforma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 541
2.5 O iluminismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 544
2.6 O pensamento pedagógico renascentista iluminista . . . . . . . 546
2.7 O surgimento dos sistemas escolares . . . . . . . . . . . . . . . . . . 548
2.8 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 551
2.9 Vídeos sugeridos para debate . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 552
Unidade III: Brasil: a educação no período colonial . . . . . . . . . . . . 554
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 554
3.2 Para um começo de história. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 555
3.3 Período Jesuítico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 556
3.4 A Influência Jesuítica na Educação Brasileira . . . . . . . . . . . . 557
3.5 A educação no Brasil na era pombalina . . . . . . . . . . . . . . . . 561
3.6 A educação brasileira no Brasil imperial . . . . . . . . . . . . . . . . 562
3.7 Educação no Brasil Colônia: fim da visão iluminista? . . . . . . . 570
3.8 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 572
Unidade IV: A educação no Brasil: o período republicano . . . . . . . . 573
4.1 A reforma educacional de Bejamim Constant . . . . . . . . . . . . 574
4.2 A educação na 2º república. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 579
4.3 A educação superior no Brasil pós LDBEN 9.394/1996 . . . . . 586
Referências básica e complementar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 589
Atividades de Aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 593
APRESENTAÇÃO

Prezado(a) acadêmico(a), a disciplina HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO


é obrigatória para os alunos dos diferentes cursos de licenciatura. O
objetivo desta disciplina é contribuir para que os acadêmicos dos cursos de
licenciatura compreendam os aspectos históricos da sociedade brasileira
que fundamentam o atual sistema educacional.
Você iniciará, agora, seus estudos de História da Educação. Essa
disciplina conduzirá você a uma análise histórica das principais
características dos processos educativos e sua interação com o contexto
sócio-econômico e cultural em diferentes períodos históricos da civilização,
relacionando-os ao contexto educativo brasileiro.
Com os autores clássicos da historiografia da história da
educação, buscaremos identificar a educação nos diferentes contextos
históricos.
A disciplina tem como objetivos:
?
examinar a educação em diferentes contextos históricos;
?
compreender a história da educação da civilização ocidental;
?
identificar as transformações ocorridas no período
renascentista e suas contribuições na educação ocidental;
? caracterizar os vários aspectos da realidade educacional nos
diferentes contextos históricos por que passa a sociedade;
? identificar os valores, idéias e organização da educação
brasileira nos diversos períodos; e
?
destacar o papel da escola, do professor e do aluno, assim
como o enfoque dos conteúdos e da avaliação nos diferentes períodos da
educação brasileira.
Assim, você, perceberá que esta disciplina é muito importante
para sua formação humanística/artística/científica assim como para sua
atuação docente.

Experiências de aprendizagem

Atividades e Fórum: os textos propõem leituras e atividades que


devem ser desenvolvidas individualmente pelo acadêmico, discutidas com
o Tutor e socializadas com a turma, isto é, colocadas no FÓRUM para
leitura e apreciação de todos os acadêmicos.

501
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Nas Unidades serão apresentadas


Leituras

(Texto-base) (Saber mais)


Temas a serem estudados Indicação de leitura
e debatidos. Complementares.

(Referências)
Para aprofundamento de subtemas,
serão indicadas obras ou páginas na
Internet.

Momento de Interação: para discussão dos textos e das


atividades, o acadêmico contará com o apoio do tutor, recorrendo a
diferentes ferramentas.
As sugestões de textos, pesquisas e filmografias também são
importantes, uma vez que amplia os conhecimentos e discussões. Também
serão apresentadas discussões fundamentadas nos estudos de outros
autores que citaremos como referências complementares.
Para que haja aproveitamento nos seus estudos é preciso que
realize as atividades propostas, ao longo dos textos, pois estas o(a)
ajudarão a compreender e a fixar os conteúdos abordados.
Atenção! Não esqueça de realizar as atividades sugeridas após a
leitura dos textos são fundamentais para sua compreensão.

Prezado(a) acadêmico(a), desejamos que sua caminhada nesta


disciplina seja prazerosa e enriquecedora.
Essa apostila foi organizada em quatro unidades. Cada uma está
dividida em subunidades, com o objetivo de facilitar a compreeesnão das
discussões propostas.

Unidade I: A educação antiga e medieval


1.1 Introdução
1.2 Povos primitivos
1.3 Educação egípcia
1.4 Educação grega

502
História da Educação UAB/Unimontes

1.5 Educação romana


1.6 Educação medieval

Unidade II: A educação no período renascentista


2.1 Introdução
2.2 Renascimento
2.3 O renascimento cultural, científico e artístico
2.4 O renascimento humanista
2.5 A reforma e a contra-reforma
2.6 O iluminismo
2.7 O pensamento pedagógico renascentista iluminista
2.8 O surgimento dos sistemas escolares

Unidade III: Brasil: período colonial


3.1 Introdução
3.2 Para um começo de história
3.3 Período Jesuítico (1549-1759)
3.4 A influência jesuítica na educação brasileira
3.5 A educação no Brasil na era pombalina (1760-1808)
3.6 A educação brasileira no Brasil imperial
3.7 Educação no Brasil Colônia: fim da visão iluminista?

Unidade IV: A educação no Brasil: o período republicano


4.1 A educação na 1ª república
4.2 A educação na 2ª república
4.3 Aspectos educacionais na Nova República
4.4 A educação na década de 1930

503
1
UNIDADE 1
A EDUCAÇÃO ANTIGA E MEDIEVAL

Esta é a primeira unidade da disciplina História da Educação.


O objetivo central é proporcionar uma reflexão da educação em
diferentes contextos históricos e compreender a história da educação
antiga e medieval.
Ao ler o texto, você vai encontrar temáticas que são abordadas
com base em uma perspectiva histórica mostrando que tudo na Educação;
dos conhecimentos, às relações entre sujeitos escolares, espaços,
metodologias e materiais, tudo isso foi inventado, produzido pelo ser
humano em circunstâncias sociais e históricas determinadas.
Com base nos autores, Maria Lúcia Aranha, Paul Monroe, Tomas
Giles, Luciano Farias Filho e Maria Monacorda, buscaremos os
fundamentos teóricos para que você compreenda a educação antiga e
medieval.
A História da Educação tem como uma das suas funções de
desnaturalizar as práticas educativas, estabelecendo uma relação com o
contexto no qual estão inseridas. Para isso, esta unidade explicitará os
elementos da história da educação ocidental.
Esta primeira unidade abordará a importância da história da
educação e o processo sócio-histórico das práticas educativas no Egito, na
Grécia, na Roma e nas Escolas Medievalistas.
Considerando nossa proposta de trabalho, a unidade foi
organizada da seguinte maneira:

Unidade I: A educação antiga e medieval


1.1 Introdução
1.2 Povos primitivos
1.3 Educação egípcia
1.4 Educação grega
1.5 Educação romana
1.6 Educação medieval

Venha conhecer a história da educação antiga e medieval.

505
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Figura 1

1.1 INTRODUÇÃO

B GC Para entendermos a História da Educação é importante conhecer


GLOSSÁRIO E a educação no contexto histórico.
A F Na verdade, faz-se necessário compreender que o homem é
Ideologia: resultante de sua prática social dentro de determinado contexto histórico,
Ciência que trata da social.
formação das idéias e da É a partir das relações sociais que os homens criam padrões,
sua origem; conjunto de instituições e saberes. Portanto, é a educação
que mantém viva a memória de um povo e dá condições
idéias, crenças e doutrinas,
para sua sobrevivência. Por isso dizemos que a educação é
próprias de uma sociedade, uma instância mediadora que torna possível a
de uma época ou de uma reciprocidade entre indivíduo e sociedade. (ARANHA,
classe, e que são produto 1998, p.15).
de uma situação histórica e A educação está envolvida nas relações sociais que os homens
das aspirações dos grupos estabelecem e sofre influência ideológica por estar ligada com a política.
que as apresentam como Portanto, o fenômeno educacional não é neutro, está ligado as questões
imperativos da razão; culturais, políticas e sociais de seu tempo (FILHO, 2002).
sistema organizado e A escola faz parte de um mundo marcado por desigualdades e
fechado de idéias que serve lutas sociais, neste sentido, devemos refletir que a escola é um instrumento
de base a uma luta política. de transformação da sociedade.
Dicionário da Língua Nesta perspectiva, é importante entender que as transformações
Portuguesa On Line. políticas, econômicas e sociais contribuem para a constituição dos
www.priberam.pt/ DLPO sistemas públicos de ensino na Antiguidade e na Idade Média.

506
História da Educação UAB/Unimontes

1.2 POVOS PRIMITIVOS

A educação primitiva se caracteriza pela sua forma simples, onde


a criança é inserida no meio social através da experiência de vida das
gerações passadas.
Neste período a atividade educacional pode ser entendida pela
educação prática e pela educação teórica.
A educação prática não é organizada, compreende a busca de
alimentos, abrigo e vestuário, se dividindo em dois estágios.
O primeiro estágio baseia-se na aquisição de conhecimento por
imitação, ou seja, a criança imita inconscientemente as atividades dos
adultos.
No segundo estágio da educação prática, a criança participa das
atividades dos adultos aprendendo conscientemente por imitação.
Neste momento passa-se a exigir das meninas e meninos o B GC
trabalho. GLOSSÁRIO E
A educação teórica consiste na transmissão dos adultos às A F
gerações mais jovens os conhecimentos das cerimônias, danças e rituais Animismo:
que caracterizam o culto religioso dos povos primitivos. Para entender o significado
Essas cerimônias tinham caráter educativo, pois por meio delas educativo da vida primitiva
que as gerações mais jovens eram instruídas a partir da tradição do é preciso compreender o
passado, isto é da vida intelectual e espiritual desses povos. animismo.
Entre as cerimônias dessas comunidades as cerimônias de
iniciação tinham papel educativo especial por possuem valor moral. É a interpretação do
As meninas eram orientadas pelas mulheres e os meninos pelos ambiente. Para os povos
homens. primitivos, não existia
Foram essas danças que deram ao homem primitivo a explicação diferença entre a sua
do universo, ou seja, é das crenças animistas que originaram as ciências, a existência e a existência
filosofia e as religiões naturais (MONROE, 1976). das outras coisas animadas
Podemos dizer que, a educação primitiva caracterizou-se pelo seu ou inanimadas.
caráter estacionário e imitativo onde o processo educativo era o único meio
de perpetuar os padrões culturais aos jovens que eram moldados para
atuarem na manutenção do sistema vigente.

1.2.1 A escrita

A educação baseada na linguagem escrita era ministrada pelo


sacerdócio e compreende a instrução formal e o treino prático representa
estágio avançado dos povos primitivos.
Assim, Paul Monroe descreve:
Do animismo provêm as religiões naturais, as primeiras
filosofias e as ciências rudimentares. Com a formulação
destas, criam se as linguagens escritas e se desenvolve um
corpo especial de conhecimento, acessível apenas a
poucos. Isto constitui matéria para um estádio superior de

507
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

educação.Juntamente desenvolve-se um sacerdócio


especial que se diferencia dos curandeiros ou exorcistas, de
DICAS
um lado, e do povo comum do outro. O sacerdócio torna-se
uma classe especial de professores para todos. Logo que se
organizam para ensinar os futuros membros de sua própria
ordem, surge a primeira escola. Com a formação de um
A primeira forma de escrita
currículo definido, de um magistério e da escola, encerra-se
são riscos que representam o estádio primitivo na educação, e atingem-se os primeiros
a numeração. estágios da civilização. (MONROE, 1976, p.11).
Neste estágio da invenção da escrita através de símbolos aumenta
Tomas Giles. a comunicação e informações disponíveis ao indivíduo e à sociedade
permitindo à sociedade o registro de sua história.
A Mesopotâmia é considera a primeira civilização a produzir à
escrita. O deus escriba Nabu era o responsável pela escrita, tinha caráter
místico (GILES, 1987).
Fonte:www.webeduc.mec.gov.br/midiaseducacao/modulo4/e1_assuntos_a1.html - Acesso 10/09/2008

Figura 2: Escrita Pictográfica Figura 3: Escrita Pictográfica

ATIVIDADES Homens e mulheres utilizam figuras para representar cada objeto.


Esta forma de expressão é chamada pictográfica.
Acesse o site: A fase pictórica apresenta
www.webeduc.mec.gov.br/ uma escrita bem simplificada dos
midiaseducacao/modulo4/e objetos da realidade, por meio de
1_assuntos_a1.html. desenhos que podem ser vistos nas
Assista o vídeo: A Evolução inscrições astecas presentes em
da Escrita: do Pictograma cavernas, ou nas inscrições de
ao Texto Digital. cavernas do noroeste do Brasil.
Faça uma análise da Primeiro surgiram os
história da Escrita silabários, conjunto de sinais
específicos para representar as
sílabas, isto é, os sinais representa-
vam sílabas inteiras em vez de
letras individuais. Os fenícios
inventaram um sistema reduzido
de caracteres que representavam
o som consonantal, característica
das línguas semíticas encontrada
hoje na escrita árabe e hebraica. Figura 4: Escrita Ideográfica

508
História da Educação UAB/Unimontes

Fonte: www.webeduc.mec.gov.br/ Em seguida, os gregos


midiaseducacao/modulo4/e1_assuntos_a1.html
adaptaram o sistema de escrita
fenícia agregando as vogais e
criando assim a escrita alfabética.
(Alfabeto, palavra derivada de alfa
e beta, as duas primeiras letras do
alfabeto grego.)
Posteriormente, a escrita
Figura 5: Escrita Alfabética grega foi adaptada pelos romanos,
constituindo-se o sistema alfabéti-
Fonte: www.webeduc.mec.gov.br/
midiaseducacao/modulo4/e1_assuntos_a1.html co greco-romano, que deu origem
ao nosso alfabeto. Esse sistema
representa o menor inventário de
símbolos que permite a maior
possibilidade combinatória de
caracteres, isto é, representação
dos sons da fala em unidades
menores que a sílaba.
Com a invenção da escrita
o processo educativo é mais ATIVIDADES
formalizado, exigindo uma classe Acesse o site:
de especialista, neste caso, a http://www.webeduc.mec.g
transmissão e a escrita fica ov.br/midiaseducacao/mod
entregue a responsabilidade da ulo4/e1_atividades-2.html.
casta sacerdotal. Debata com seus colegas
Figura 6: Escrita Alfabética
Esta casta tem a função de no Fórum sobre A Escrita e
transmitir a tradição coletiva, os costumes, os hábitos, valores e o estilo de a Leitura no Hipertexto e
vida da sociedade. responda as questões da
Assim a casta sacerdotal, implantou o primeiro sistema de ensino atividade 2.
formal, para a formação do sacerdote escriba, que era considerado o
guardião da ordem religiosa e responsável pela administração da socieda- Fonte: www.mec.gov.br
de.
Este período se caracteriza pela teocracia absolutista onde não
existia diferença entre a esfera política e religiosa.
A formação era centrada nos rituais e tinha o templo como centro
controlar da distribuição dos alimentos. O sacerdote era o mediador entre
os deuses e o homem.
Entretanto, o novo sistema escolar não era universal, destinava-se
somente aos filhos dos detentores de poder.
Neste contexto surgem às primeiras bibliotecas com escritos de
mitologia, história, astronomia, astrologia, magia, poesia e gramática.
Como o sacerdote era o mediador entre o homem e os deuses, a
formação será centrada nos rituais. Portanto, o processo educativo se destina
a conservação e continuidade do sistema político e social do período.

509
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Assim, a base de todo o processo educativo vai ser a escrita,


destacando o ditado e a caligrafia. A aprendizagem era individual e o
conteúdo do ensino era vocacional, moral e didático.
Nesse sentido, a base educativa foi a obediência e o castigo físico
foi um instrumento utilizado.
Podemos dizer que, a obediência era considerada um a virtude
fundamental para conseguir sucesso social e econômico.
Este sistema vigora desde o período dos sumérios, babilônios,
assírios, caldeus e persas.
Entre os povos mesopotâmicos, o ensino dos caldeus era para os
filhos das classes altas não sacerdotais, mas responsáveis pelo serviço
administrativo burocrático.
fonte: http://www.hyperhistory.com/online_n2/History_n2/a.html

ATIVIDADES

Acesse o site:
http://www.hyperhistory.co
m/online_n2/History_n2/a.h
tml
Localize as primeiras
civilizações.

Fonte: www. mec.gov.br

DICAS

Figura 7: Mapa das Primeiras Civilizações

Para compreender melhor


Os persas se destacam por ser considerado entre os povos da
esta temática, assista ao
mesopotâmia responsáveis pelo elo entre o arcaico e a evolução da
filme - A Escrita da História
civilização ocidental, isto se dá, principalmente pela sistematização do
- E para saber mais
processo educativo.
sobre evolução da escrita:
Desta forma, as classes que não se destinavam a carreira
www.webeduc.mec.gov.br/
burocrática administrativa ou ao serviço militar tinha um processo
midiaseducaçao/modulo4.
educativo informal, herdados dos povos primitivos.
A educação de massa era inexistente. A escola formal destinava-
se aos filhos dos escribas e dos chefes religiosos. Somente no Egito, a
exclusividade de acesso a educação formal irá ser diferente.

510
História da Educação UAB/Unimontes

1.3 EDUCAÇÃO EGÍPCIA

1.3.1Um pouco de história do Egito

Fonte: http://www.discoverybrasil.com/egito/brasil_dc_egito_home/index.shtml

Figura 8: Egito

A civilização egípcia antiga desenvolveu-se no nordeste africano


(margens do rio Nilo) entre 3200 a.C (unificação do norte e sul) a 32 a.c
(domínio romano).Como a região é formada por um deserto (Saara), o rio
Nilo ganhou uma extrema importância para os egípcios. O rio era utilizado
como via de transporte (através de barcos) de mercadorias e pessoas. As
águas do rio Nilo também eram utilizadas para beber, pescar e fertilizar as
margens, nas épocas de cheias, favorecendo a agricultura. A sociedade
egípcia estava dividida em várias camadas, sendo que o faraó era a
autoridade máxima, chegando a ser considerado um deus na Terra.
Sacerdotes, militares e escribas (responsáveis pela escrita) também
ganharam importância na sociedade. Esta era sustentada pelo trabalho e
impostos pagos por camponeses, artesãos e pequenos comerciantes. Os
escravos também compunham a sociedade egípcia e, geralmente, eram
pessoas capturadas em guerras.Trabalhavam muito e nada recebiam por
seu trabalho, apenas água e comida. A economia egípcia era baseada
principalmente na agricultura que era realizada, principalmente, nas
margens férteis do rio Nilo. Os egípcios também praticavam o comércio de
mercadorias e o artesanato. Os trabalhadores rurais eram constantemente
convocados pelo faraó para prestarem algum tipo de trabalho em obras
públicas (canais de irrigação, pirâmides, templos, diques). A religião
egípcia era repleta de mitos e crenças interessantes. Acreditavam na
existência de vários deuses (muitos deles com corpo formado por parte de
ser humano e parte de animal sagrado) que interferiam na vida das
pessoas. As oferendas e festas em homenagem aos deuses eram muito
realizadas, acreditavam na vida após a morte, mumificavam os cadáveres
dos faraós colocando-os em pirâmides, com o objetivo de preservar o
corpo para a vida seguinte A civilização egípcia destacou-se muito nas
áreas de ciências. Desenvolveram conhecimentos importantes na área da
matemática, usados na construção de pirâmides e templos. Na medicina,
os procedimentos de mumificação, proporcionaram importantes
conhecimentos sobre o funcionamento do corpo humano

511
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

A educação egípcia não se limitava a elite, ao contrário da


Babilônia e de outros povos que somente a classe dos sacerdotes escribas
eram alfabetizados.
No Egito existia a possibilidade das classes interiores de aprender
a ler e escrever e inclusive poderiam subir de nível social.
Fonte: www.discoverybrasil.com/egito/alfabetizacao

Figura 9: Alfabetização (escrita chamada hieróglifo)


ATIVIDADES O processo educativo egípcio caracteriza-se pela palavra escrita.
Assim, a capacidade de ler e escrever conferiu aos que detinham esse saber
Acesse os sites: certo mistério, pois, apoiada pela religião a autoridade da palavra escrita
Google Earth - se torna inviolável (GILES, 1987).
www.earth.google.com A escrita egípcia também foi algo
Fonte: www.suapesquisa.com/egito/
Cartographic - www.henry- importante para este povo, pois permitiu a
davis.com/MAPS/carto.html divulgação de idéias, comunicação e
Osshe Historic Atlas controle de impostos. Existiam duas
Resource Library – formas de escrita: a demótica (mais
www.uoregon.edu/~atlas simplificada) e a hieroglífica (mais
Geohistory – complexa e formada por desenhos e
www.geohistory.com símbolos). As paredes internas das
Atlas of the biosphere – pirâmides eram repletas de textos que
www.sage.wisc.edu/atlas falavam sobre a vida do faraó, rezas e
Maps of world – Figura 10: Hieróglifos:
mensagens para espantar possíveis
a escrita egípcia
www.mapsofworld.com saqueadores. Uma espécie de papel
Procure nos sites os mapas chamado papiro, que era produzido a partir de uma planta de mesmo
da localização e nome, também era utilizado para registrar os textos.
coordenadas geográficas A presença da religião configura-se também como uma
do Egito. Copie as imagens característica marcante da educação e de todos os aspectos da vida
para seu trabalho. egípcia.
Depois elabore um álbum, O faraó era o sumo sacerdote dos cultos oficiais e chefe de Estado.
em texto ou virtual, Este Estado apoiava-se na forma teocrática de governo, onde a
utilizando imagens que administração burocrática era ligada a casta sacerdotal.
retratem as cidades do Pode-se observar que, a flexibilidade da sociedade egípcia se deu
Egito. pelo fato de que qualquer menino talentoso poderia ser um escriba.
Discuta com seus colegas No Egito os sacerdotes eram responsáveis pela manutenção da
no Fórum cultura e sustentáculos da ordem política. A hierarquia social era:
A integração da sociedade era o meio que a burocracia sacerdotal
Fonte: www.mec.gov.br adotava fornecendo administradores e funcionários para o governo. Assim
Giles relata:

512
História da Educação UAB/Unimontes

Era o meio ao qual a escola dava acesso, isto é, o ensino


oficial, formal. Junto à tesouraria real sempre havia uma
escola pública, equipada para a formação de escribas,
cujos serviços eram indispensáveis para a manutenção de
todo o aparato burocrático do Estado. Mesmo não
conseguindo emprego junto ao governo, o escriba era
sempre procurado para a administração das grandes
fazendas e junto aos grandes comerciantes do reino. A
instrução nessas escolas era gratuita, custeada pelo próprio
Estado. O instrumento de mobilidade e de estabilidade
social é a escola. Trata-se de aprender a ler e escrever para
subir socialmente. (GILES, 1987).

Fonte: www.suapesquisa.com/egito/

Figura 11: hierarquia social.

No Egito no período depois de 3.000 a.c, observamos três tipos de


escolas; as escolas do templo eram direcionadas para treinamento do
clero; as escolas da corte destinadas à formação dos burocratas e as
escolas provinciais destinadas na formação de funcionários para o setor
privado e para governo.
Neste período observamos que há indícios da existência de
escolas militares para formação dos filhos da nobreza que pretendiam
seguir à carreira de oficial do exército. Além disso, existiam os colégios
sacerdotais de estudos superiores.
Aos cinco anos iniciava-se a formação dos jovens nas escolas da
aldeia, sob a orientação do templo local onde podiam aprender os
fundamentos de determinada profissão.
Aos dezessete anos, os jovens que se destacavam continuavam os
estudos no templo central ou nas escolas superiores de instrução escribal,
durante três ou quatro anos.
A atividade principal dentro dessa escola, era a memorização da
hieroglífica e o domínio da escrita hierática cursiva, utilizada para fins

513
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

comerciais.
A escola egípcia consistia na manutenção da literatura de
inspiração divina. A técnica predominante no ensino era a memorização e
repetição.
As virtudes consideradas neste período eram o silêncio, a
obediência, abstinência e reverência ao passado.
A criatividade e originalidade deveriam ser evitadas e o castigo era
aplicado ao aluno como forma para conseguir as virtudes.
Evidentemente, para se tornar escriba, o aluno tinha que alcançar
perfeição na reprodução dos textos antigos e modelos de escrita. Assim
poderia ter acesso à mobilidade social.
O processo educativo do Egito consistia na conservação das
instituições existentes na sociedade sem que elas fossem modificadas. Essa
educação que formava os guardiões funcionou durante 3000 anos.

1.4 EDUCAÇÃO GREGA

Fonte: http://www.suapesquisa.com/grecia/

Figura 12: hierarquia social

1.4.1Um pouco da história da Grécia

A civilização grega surgiu entre os mares Egeu, Jônico e


Mediterrâneo, por volta de 2000 AC. Formou-se após a migração de tribos
nômades de origem indo-européia, como, por exemplo, aqueus, jônios,
eólios e dórios. As pólis (cidades-estado), As pólis (cidades-estado), forma
que caracteriza a vida política dos gregos, surgiram por volta do século VIII
a.C. As duas pólis mais importantes da Grécia foram: Esparta e
Atenas.Expansão do povo grego (diáspora) Por volta dos séculos VII a.C e V
a.C. acontecem várias migrações de povos gregos a vários pontos do Mar
Mediterrâneo, como conseqüência do grande crescimento populacional,
dos conflitos internos e da necessidade de novos territórios para a prática
da agricultura. Na região da Trácia, os gregos fundam colônias, na parte
sul da península Itálica e na região da Ásia Menor (Turquia atual). Os
conflitos e desentendimentos entre as colônias da Ásia Menor e o Império
Persa ocasionam as famosas Guerras Médicas ou Púnicas (492 a.C.-448
a.C.), onde os gregos saem vitoriosos.Esparta e Atenas envolvem-se na
Guerra do Peloponeso (431 a.C. a 404 a.C.), vencida por Esparta. No ano
de 359 a.C., as pólis gregas são dominadas e controladas pelos

514
História da Educação UAB/Unimontes

Macedônios. Sociedade da Grécia Antiga. A economia dos gregos


baseava-se no cultivo de oliveiras, trigo e vinhedos. O artesanato grego,
com destaque para a cerâmica, teve grande a aceitação no Mar
Mediterrâneo. Com o comércio marítimo os gregos alcançaram grande
desenvolvimento. moedas de metal. Os escravos, devedores ou prisioneiros
de guerras foram utilizados como mão-de-obra na Grécia. Cada cidade-
estado tinha sua própria forma político-administrativa, organização social
e deuses protetores.Foi na Grécia Antiga, na cidade de Olímpia, que
surgiram os Jogos Olímpicos em homenagem aos deuses. Os gregos
também desenvolveram uma rica mitologia. Até os dias de hoje a mitologia
grega é referência para estudos e livros. A filosofia também atingiu um
desenvolvimento surpreendente, principalmente em Atenas, no século V
(Período Clássico da Grécia). Platão e Sócrates são os filósofos mais
conhecidos deste período. A dramaturgia grega também pode ser
destacada. A Poesia, a história , artes plásticas e a arquitetura foram muito
importantes na cultura grega. A religião politeísta grega era marcada por
uma forte marca humanista. Os deuses possuíam características humanas
e de deuses. Os heróis gregos (semi-deuses) eram os filhos de deuses com
mortais. Zeus, deus dos deuses, comandava todos os demais do topo do
monte Olimpo. Podemos destacar outros deuses gregos. A mitologia grega
também era muito importante na vida desta civilização, pois através dos
mitos e lendas os gregos transmitiam mensagens e ensinamentos
importantes. Na arquitetura, os gregos ergueram palácios, templos e
acrópoles de mármore no topo de montanhas. As decisões políticas,
principalmente em Atenas, cidade onde surgiu a democracia grega, eram
tomadas na Ágora (espaço público de debate político).
A educação grega teve como particularidade a oportunidade do DICAS
desenvolvimento individual. Os gregos atingiram um grau de consciência
de si mesmo. As explicações religiosas são substituídas pelo
reconhecimento da razão autônoma, pela inteligência crítica, pela O conceito grego do
personalidade livre, capaz de formular o ideal de formação do cidadão. homem, da personalidade
Assim, Aranha relata que: era tão amplo como os de
Uma nova concepção de cultura e do lugar do indivíduo na hoje. Os gregos foram os
sociedade repercute na educação bem como nas teorias primeiros a formular o
educacionais. De fato, os filósofos gregos refletiram a esse
conceito de liberdade
respeito, para que a educação pudesse desenvolver um
processo de construção consciente de que o homem fosse '
política no Estado. Foi dos
constituído de modo correto e sem falha, nas mãos, nos gregos que surgiu a idéia
pés e no espírito. (ARANHA, 1998). de que a educação é a
A organização da sociedade grega fez florescer o progresso social, preparação para a
a liberdade estimulou o desenvolvimento de todos os aspectos da cidadania e também o
personalidade e de todas as formas de expressão do valor individual. primeiro esforço para
Assim, surgiu o conceito de educação liberal, considerada digna assegurar o
do homem livre. A educação digna do homem livre, que possibilita tirar desenvolvimento intelectual
proveito de sua liberdade ou fazer uso dela. da personalidade.
No entanto, Aranha descreve que: Paul Monroe

515
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

B GC Trata-se de uma 'democracia escravista', onde só são


GLOSSÁRIO E considerados cidadãos os homens livres: Atenas tinha cerca
A F de meio milhão de habitantes, dos quais trezentos mil eram
escravos e cinqüenta mil metecos (estrangeiros).
Paidéia: o termo Paidéia Excluídas ainda as mulheres e as crianças, apenas os 10%
“foi criado por volta do restantes tinham o direito de decidir por todos! Atentando
para o número de escravos, percebemos que nesse período
século V a.c que significava
a escravidão grega atingiu seu apogeu. Em todas as
“criação dos meninos”(pais atividades artesanais encontramos o braço escravo '
paidós). Na educação libertando' o cidadão para as funções, teóricas, políticas e
intelectual, a noção de de lazer, consideradas mais nobres.
paidéia amplia de simples A Grécia tinha a missão de aplicar a inteligência a todas as fases
educação da criança para da vida. O saber deixou de ser servo da teologia e a pesquisa não era mais
à contínua formação do privilégio especial do sacerdócio.
adulto, capaz ele mesmo O conflito em torno dos ideais filosóficos irão influenciar o mundo
de repensar a cultura do ocidental. A influência de Sócrates se dá no método que enfatiza a análise
seu tempo. Para Aranha a crítico -dialética, o que se torna indispensável para a formação do homem
Grécia Clássica é o berço culto.
da pedagogia. Já Isócrates ( 436-338 a.c), defende o ideal da retórica como
A palavra paidagogos principal conteúdo no processo educativo. Em 392 a.c funda sua própria
significa aquele que escola de oratória e retórica, tendo como objetivo do processo educativo, a
conduz a criança , no caso formação do homem total, onde sua conduta na vida como cidadão
o escravo que acompanha privado ou público seja baseado na virtude.
a criança à escola. Com o No entanto, Platão (427-347 a.c), criticava o ideal de Isócrates.
tempo, o sentido amplia Platão era a favor da aristocracia e contra a democracia como sistema
para designar a teoria da político e como processo educativo. O filósofo defende o ideal de Sócrates,
educação. Os gregos ao onde insiste na existência de um bem superior à vontade popular; esse
discutirem o fim da Paidéia, ideal que se manifesta na justiça.
esboçam as primeiras Para Platão, a retórica ofusca a visão e a procura do bem. O
linhas da ação pedagógica, pensamento dele o processo educativo depende da cronologia dos
que irão influenciar a diálogos.
cultura ocidental. A metodologia de inspiração socrática estava na procura do
sentido essencial da realidade, a classificação de termos, a exposição de
opiniões e os preceitos à luz de verdades e valores absolutos.
Nesta perspectiva, o processo educativo e sua eficácia dependem
DICAS da constituição do Estado. Assim, a primeira finalidade do Estado é
formular e executar o processo educativo que visa, antes de tudo, formar o
bom cidadão (GILES, 1987).
Para saber mais sobre a A base então deste processo educativo defendido por Platão será
Grécia é importante estudar a disciplina de caráter, através do estudo da música e da saúde, através da
Sócrates, Isócrates, Platão ginástica. Trata-se de formal o cidadão ideal para uma sociedade ideal.
e Aristóteles O Estado é um organismo análogo do homem, onde para poder
desempenhar sua função política, o estado deve oferecer ao cidadão uma
educação que corresponda à sua capacidade e função social. Para tanto:
Em A República, Platão analisa demoradamente o
processo educativo. Este visa, antes de tudo, à formação do
guardião, que é quem deve exercer liderança e garantir a
subsistência do Estado na sua forma ideal. Platão é menos

516
História da Educação UAB/Unimontes

explícito no que diz respeito à formação dos guerreiros e


dos artesãos. Porém, a escolha do candidato para cada tipo DICAS
de educação será baseada no talento, ou seja, na
capacidade natural. (GILES, 1987, p. 21).
Platão acredita que o processo educativo consiste em despertar
no aluno a visão que já possui. Pode-se dizer que esse filósofo foi o primeiro As Universidades do mundo
a sistematizar o processo educativo em bases filosóficas. grego originaram-se das
O processo educativo e o ideal racional de Aristóteles, colaborador escolas filosóficas e retóricas.
Mesmo com diversos grupos
de Platão, fundamenta-se na idéia de que o conhecimento é o modelo
de escolas, somente duas
intelectual do mundo fenomenal.
receberam o título de
As ciências normativas constituem a aplicação prática dos Universidade: Universidade de
princípios aprendidos nas outras ciências, que incluem a ética, a política e Atenas e Universidade de
a retórica. Alexandria.
O problema dos teóricos educacionais, na Grécia eram idêntico A Universidade de Atenas
aos dos teóricos da educação moderna. originou-se da combinação de
3 escolas; a Academia, a
Assim, na sociedade grega, cada individuo encontrava na
Peripatética (fundada por
natureza racional o direito de determinar os seus próprios fins da vida; na
Aristóteles) e a estóica.
natureza moral o conceito desses fins era determinado pelo próprio ser.
A Universidade de Alexandria
Cada um dentro da sua própria natureza executaria o que a vida foi considerada como centro
valeria para ser vivida; a ciência, a arte, a filosofia, a religião são meios intelectual do mundo nos
para esse fim. primeiros séculos cristãos
A responsabilidade moral e a liberdade moral foram concebidas superando a Universidade de
pelos gregos e significava liberdade sob a lei e pela lei, contida na nossa Atenas. O propósito de
Alexandre de tornar
própria natureza.
Alexandria em um centro de
Para Paul Monroe, a contribuição trazida pelos gregos foi a
influência grega de poder e
liberdade política, a liberdade e capacidade intelectual, a liberdade moral saber no Oriente foi efetivado,
e o conceito de vida, de apreciação estética, na realidade a expressão sob a influência dos Ptoloneus
estética da personalidade foi modificada nos dias atuais pela realização (323-30 d.c). Foi fundado
material. museu e biblioteca, juntou-se
Dentre a finalidade da educação: uma extensa coleção de
Como acontece nas escolas americanas de hoje, elimina o manuscritos gregos, hebreus,
elemento religioso, não se pode encontrar fim mais elevado egípcios e orientais. Alexandria
do que o de determinar para cada indivíduo, as coisas que foi a única instituição de
nesta vida constituem a razão de viver. Conseqüentemente ensino superior que aplicou o
nenhuma outra fase da história da educação tem maior método aristotélico de
importância para o estudante, nenhuma outra
investigação, foi também a
recompensará melhor a análise que fizemos dos meios e
única que possuía manuscritos
métodos adotados para garantir essa finalidade.
(MONROE, 1976).
de Aristóteles. Nesta
Universidade, foram educados
A educação grega deve suas limitações, sobretudo na ética,
os primeiros Padres da Igreja e
costumes e privilégios. Pode-se dizer que essa educação dividiu-se entre
foi onde procedeu dos centros
antigo (Idade Homérica) e novo período (educação espartana e intelectuais do norte da África
ateniense). a formulação da doutrina
Entre a educação grega o fator dominante que irá prevalecer em cristã aceita até hoje como
todos os períodos, é o aspecto social, institucional e o aspecto ortodoxa.
individualista. Paul Monroe

517
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

O novo período compreende as idéias educacionais, religiosas e


PARA REFLETIR
morais, neste momento se desenvolve o novo pensamento filosófico e as
novas práticas educativas.
O período clássico- séculos No segundo período estende-se desde a conquista da Macedônia
V e IV a.c , considerado o IV século a.c até a fusão completa da cultura grega com a vida romana;
apogeu da civilização compreende principalmente as escolas filosóficas e a vida intelectual
grega, observa-se na cosmopolita.
política o ideal grego de fonte: http://www.suapesquisa.com/grecia/

democracia representado
por Péricles. Além disso, as
artes, literatura e filosofia
contribuíram
definitivamente para
herança cultural do mundo
ocidental.

Maria Lúcia de Arruda


Aranha

PARA REFLETIR

O ideal cosmopolita
expansionista de Alexandre
era o ideal de que uma
única cultura abarcasse
todo o mundo civilizado. Figura 12
Este ideal foi importante
para transmissão da 1.4.2 Educação homérica
cultura da Grécia Antiga
às futuras gerações e
Os gregos homéricos eram em grande parte analfabetos. O
civilizações.
processo educativo tinha por base a tradição oral, que concretiza -se em
duas epopéias,Ilíada e Odisséia, atribuídas a Homero considerado por
Thomas Giles Platão 'o educador de toda a Grécia' (MANACORDA, 1989).
Essas obras dominaram todo o processo educativo na Grécia e
depois irão fazer parte do patrimônio romano.
Nessas epopéias, os heróis servem de modelo para a juventude
ATIVIDADES onde Aquiles o guerreiro, será a personificação de um povo bélico; Nestor,
representa o modelo da experiência e maturidade; já Agamenão era o
Que tipo de educação
modelo da liderança e Ulisses da oratória.
surgiu na Grécia?
Aquiles e Ulisses serão também modelos da verdadeira virtude, da
honra e superioridade no cumprimento do dever. Essas virtudes
representam coragem no campo de batalha e perseverança na arena.

518
História da Educação UAB/Unimontes

Desta maneira; 'Homero enaltece a excelência que dota o indivíduo de B GC


superioridade. Ser melhor, superar os demais: é este ideal que inspira todo GLOSSÁRIO E
o processo educativo' (GILES, 1987). A F
Cosmopolita:
Assim, a educação no período homérico se caracteriza pela falta
de organização institucional específica, falta de método e de controle. pessoa que se considera
cidadão do mundo e que
A educação consistia no treino de atividades práticas, com pouco
em toda a parte tem
lugar para a instrução de caráter literário.
conhecimentos adaptando-
O treino voltado para atender as necessidades reais da vida
se facilmente aos costumes
acontecia no seio familiar.
das diferentes terras por
Para deveres superiores da vida como serviço público, o treino era
onde passa;
realizado pelo Conselho (aproximava de uma instituição educativa), na
vivendo em todas
guerra e nas expedições de conquista.
perfeitamente adaptadas
O ideal da educação homérica está na teoria do desenvolvimento
ao meio ambiente.
da personalidade; compreendia o ideal do homem de ação e do homem de
sabedoria.
Fonte:
A primeira virtude do homem de ação e do guerreiro era a bravura.
www.dicionarioonline.com.
Assim Aquiles (o guerreiro) e Ulisses (oratória), foram o modelo de virtude e
br
de honra.
O menino aprendia as proezas dos heróis homéricos. Neste
período, o ensino formal não existia, o conteúdo desse ensino era a retórica
ensinada para falar e a arte militar ensinada para agir. DICAS

1.4.3 Educação espartana

Assista ao filme “300”.


Com a formação da Cidade- Estado (unidades políticas maiores),
faz aparecer à evolução da nova estrutura política acompanhada por
modificações nas formas de governo; de sistema monárquico, depois
PARA REFLETIR
ditadura e por fim democracia republicana.
Entretanto, Esparta aparece como uma exceção a esse processo,
pois, o ideal homérico irá permanecer de maneira atuante e nitidamente O magistério era
militarista. considerado uma profissão
O estado de guerra praticamente permanente impõe uma servil, indigna de um
disciplina que subordina o indivíduo ao Estado. homem livre. A única
Assim, a educação espartana consistia em dar a cada indivíduo a exigência para exercer o
perfeição física, coragem e hábito de obediência às leis para que esse magistério era saber ler. Os
indivíduo tornasse um soldado ideal em bravura e verdadeiro cidadão. professores sobreviviam
O processo educativo é controlado pelas autoridades políticas, com um salário de miséria,
afinal as crianças nascem e são criadas para servir o Estado. pago pelos alunos por meio
Aos sete anos de idade, o menino é entregue aos cuidados da de taxas.
escola oficial do Estado. Todo o ensino destina-se a formar o soldado. Ao
ingressar na escola: Tomas Giles
O menino recebe uma cama de palha, sem cobertor, e uma
camisola curta. Deve andar descalço. Para acostumar-se a
passar fome em tempo de guerra, só recebe um mínimo de
comida. (GILES, 1987).

519
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Desta maneira, o conteúdo da educação espartana era


dominantemente físico e moral. A educação moral valorizava a
obediência, a aceitação dos castigos e o respeito aos mais velhos.

1.4.4 Educação ateniense

A educação em Atenas contrastava com a adotada em Esparta A


inversão da formação física para a espiritual, isto se dará principalmente no
ensino superior ministrado pelos filósofos.
Os atenienses acreditavam que a cidade- estado tornaria mais
forte se cada menino desenvolvesse individualmente suas aptidões.
O governo não controlava os alunos e as escolas. O menino
entrava na escola aos 6 anos e ficava sob a responsabilidade de um
pedagogo.
Todo cidadão ateniense enviava o filho a três tipos de escola
elementar; a palestra ou escola de ginástica, a escola de música e a escola
de escrita.
A música visava o desenvolvimento do senso estético do menino e
o sentido de participação em concursos, festivas e declamações de poesia,
constituía a formação do caráter moral.
A escola de escrita, o menino aprendia a escrever tanto a letra
formal como a letra cursiva. Neste período (século V a.c) que houve
evolução do alfabeto em Atenas, isto foi de extrema importância para o
processo educativo.
O aluno iniciava por copiar as letras individuais, para depois
combiná-las em sílabas e , enfim, decorava palavras
inteiras. A escrita era feita em tábuas de barro cozido com
estilete. As tábuas eram cobertas co uma camada de cera.
Mais tarde, escrevia-se em folhas de papiro. O aluno
traçava as formas das letras, já preparadas pelo instrutor,
até aprender a formá-las ele próprio. (GILES, 1987, p. 15).
A leitura era baseada nas obras de Homero, Hesíodo, Esopo,
Tucídides. Posteriormente, o desenhou e os elementos de geometria foram
introduzidos nos estudos elementares.
Com relação ao nível superior, o ideal da formação do homem
total é substituído pela formação do homem literário.
Os estudos da gramática e da crítica literária ganham importância
e os jovens de quartoze a dezoito anos de idade preferem estudar a nova
tradição literária.
Porém, uma transformação maior acontece no ensino superior
com os sofistas, que surgem para atender ao novo ideal sócio cultural e ao
novo processo educativo que garanta a vantagem política e o êxito nos
assuntos públicos.
Com os sofistas (primeiros mestres profissionais), o jovem
ateniense pode alcançar a capacidade de persuadir e manipular as
massas, afinal Atenas vive a nova experiência política, a democracia.

520
História da Educação UAB/Unimontes

O processo educativo está associado as necessidades práticas


principalmente a eloqüência perante a assembléia dos cidadãos.
ATIVIDADES
A retórica é fundamental, pois é na argumentação, na força de
dicção poética e na ornamentação e estilística que a opinião pública Acesse os sites:
poderá através da persuasão ser manipulado. www.google.com.br ou
Assim, o processo educativo ateniense fundamenta-se na idéia de http://pt.wikipedia.org/wiki
que o conhecimento é o modelo intelectual do mundo fenomenal. Faça uma pesquisa sobre
As ciências aplicativas constituem a aplicação prática dos os principais filósofos da
princípios aprendidos na ética, na política e na retórica. Grécia.
Atenas foi a “escola de toda a Grécia” Tucídides

1.4.5 Educação helenística

O helenismo representa a fase final da especulação filosófica, da ATIVIDADES


atividade estética, de experiências sociais e políticas.
Surge um novo padrão de civilização através da fusão da cultura Assista ao filme:
da Grécia Antiga e das culturas do Oriente. A Grécia Antiga – 31 min-
A astronomia e a geometria iram se destacar. A tradição Faça um debate no Fórum
ateniense, isto é o método empírico - indutivo é seguida tendo como com seus colegas sobre a
objetivo uma maior compreensão do mundo físico. Grécia.
? A observação física, a dedução lógica, as pesquisas
matemáticas, de medicina, de física compõem estudos científicos
importantes.
O processo educativo é baseado em Atenas, ou seja, no modelo
desenvolvido por Sócrates, Platão e Aristóteles.
Compreende cinco etapas; o lar, a escola elementar (dos sete aos
quartoze anos), a escola gramatical (dos quartoze aos dezoito anos), o
ensino efébico ( a cargo do Estado) e o ensino superior ( retórica ou
filosofia) a partir dos vinte e um anos.
Assim Tomas Giles escreve:
A partir da educação elementar, a escola destina-se aos
filhos dos cidadãos. Aliás, é obrigação dos pais mandar os
filhos à escola. A cidade limita-se a nomear o diretor oficial
do ensino, que é quem controla a programação e a
execução do processo educativo.
Com a conquista romana a cultura grega estende-se suas
fronteiras, sem mudar seu caráter, na realidade a educação romana vai ser
apenas um aspecto da educação da Grécia.

521
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

1.5 EDUCAÇÃO ROMANA

Fonte: www.paginas.terra.com.br/arte/mundoantigo/roma/

Figura 13

1.5.1Um pouco da história de Roma

Roma de uma pequena cidade, tornou-se um dos maiores


impérios da antiguidade. Dos romanos, herdamos uma série de
características culturais. O direito romano, até os dias de hoje está
presente na cultura ocidental, assim como o latim, que deu origem a
língua portuguesa, francesa, italiana e espanhola. Origens de Roma :
explicação histórica e Monarquia Romana (753 a.C a 509 a.C)
De acordo com os historiadores, a fundação de Roma resulta da mistura
de três povos que foram habitar a região da península itálica : gregos,
etruscos e italiotas. Desenvolveram na região uma economia baseada na
agricultura e nas atividades pastoris. A sociedade, nesta época, era
formada por patrícios ( obres proprietários de terras ) e plebeus (
comerciantes, artesãos e pequenos proprietários ). O sistema político era a
monarquia, já que a cidade era governada por um rei de origem patrícia.
A religião neste período era politeísta, adotando deuses semelhantes aos
dos gregos, porém com nomes diferentes. Nas artes destacava-se a pintura
de afrescos, murais decorativos e esculturas com influências gregas.
República Romana (509 a.C. a 27 a.C).
Durante o período republicano, o senado Romano ganhou grande
poder político. Os senadores, de origem patrícia, cuidavam das finanças
públicas, da administração e da política externa. As atividades executivas
eram exercidas pelos cônsules e pelos tribunos da plebe.
A criação dos tribunos da plebe está ligada às lutas dos plebeus por uma

522
História da Educação UAB/Unimontes

maior participação política e melhores condições de vida.


Em 367 a.C, foi aprovada a Lei Licínia, que garantia a participação dos
plebeus no Consulado (dois cônsules eram eleitos: um patrício e um
plebeu). Esta lei também acabou com a escravidão por dívidas (válida
somente para cidadãos romanos). Formação e Expansão do Império
Romano.
Após dominar toda a península itálica, os romanos partiram para
as conquistas de outros territórios. Com um exército bem preparado e
muitos recursos, venceram os cartagineses nas Guerras Púnicas (século III
a.C). Esta vitória foi muito importante, pois garantiu a supremacia romana
no Mar Mediterrâneo.Após dominar Cartago, Roma ampliou suas
conquistas, dominando a Grécia, o Egito, a Macedônia, a Gália, a
Germânia, a Trácia, a Síria e a Palestina.Com as conquistas, a vida e a
estrutura de Roma passaram por significativas mudanças. O império
romano passou a ser muito mais comercial do que agrário. Povos
conquistados foram escravizados ou passaram a pagar impostos para o
império. As províncias (regiões controladas por Roma) renderam grandes
recursos para Roma. A capital do Império Romano enriqueceu e a vida dos
romanos mudou.
No ano de 395, o imperador Teodósio resolve dividir o império em:
Império Romano do Ocidente, com capital em Roma e Império Romano do
Oriente (Império Bizantino), com capital em Constantinopla. Em 476,
chega ao fim o Império Romano do Ocidente, após a invasão de diversos
povos bárbaros, entre eles, visigodos, vândalos, burgúndios, suevos,
saxões, ostrogodos, hunos etc. Era o fim da Antiguidade e início de uma
nova época chamada de Idade Média.

1.5.2 Pão e Circo DICAS

Com o crescimento urbano vieram também os problemas sociais


para Roma. A escravidão gerou muito desemprego na zona rural, pois Para saber mais:
muitos camponeses perderam seus empregos. Esta massa de Luta de gladiadores:
desempregados migrou para as cidades romanas em busca de empregos e pão e circo
melhores condições de vida. Receoso de que pudesse acontecer alguma
revolta de desempregados, o imperador criou a política do Pão e Circo. Fonte:
Esta consistia em oferecer aos romanos alimentação e diversão. Quase www.suapesquisa.com/impe
todos os dias ocorriam lutas de gladiadores nos estádios ( o mais famoso foi rioromano/
o Coliseu de Roma ), onde eram distribuídos alimentos. Desta forma, a
população carente acabava esquecendo os problemas da vida, diminuindo Principais Imperadores
as chances de revolta. Romanos : Augusto (27
A educação romana caracteriza-se pela mentalidade prática dos a.C. - 14 d.C), Tibério (14-
romanos. Enquanto na Grécia os sofistas foram os instrumentos para 37), Caligula (37-41), Nero
introdução de novas práticas educativas. (54-68), Marco Aurelio
Os filósofos gregos, particularmente Sócrates, Platão e Aristóteles (161-180), Comodus (180-
tentaram conciliar o conflito existente entre a educação institucional e 192).

523
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

nova educação individualista, o que resultou na formulação de um


DICAS problema da educação atual.
As discussões de fins, métodos e conteúdo educacionais tinha
sofrido influência desta época até o presente, assim a organização
A transição do estado tribal educacional sugerida pelos filósofos gregos não teve impacto imediato.
à monarquia aconteceu em A tendência individualista permaneceu até que fosse reprimida
apenas 300 anos. politicamente pelo Império Romano e moralmente pelo cristianismo.
O ideal romano de educação era baseado na concepção de
Thomas Giles direitos e deveres. Assim;
Todos os deveres de pai e de cidadão reclamavam uma
educação definida, durante os anos da meninice, a fim de
se desenvolverem as aptidões ou virtudes adequadas.
Mesmo nos últimos períodos, esta educação, apenas em
pequena parte, era ministrada na escola. O lar é que
ministrava uma educação definida, de caráter positivo e de
grande valor. (GILES, 1987).
O processo educativo romano tinha a finalidade de formar os
DICAS
filhos pra servirem a Pátria. A aprendizagem consistia nas artes mais
necessárias para o Estado.
Com o ideal prático, os romanos orientavam-se para a lei e a
Para saber mais: ordem, o dever ao Estado, as tradições passadas e a dignidade auto-
Língua, leitura e escrita suficiente.
Na sociedade romana a família é a instituição mais importante e o
Francês, italiano, espanhol, principal agente educativo. O processo educativo é a formação do caráter
português e romeno são moral. Assim as escolas formais tinham menor relevância em comparação
línguas derivadas do latim. com o lar.
A educação é responsabilidade dos pais, que devem dar disciplina
Fonte: severa, autoritária e moral. Thomas Giles revela que:
www.discoverybrasil.com/gu Completados os oito ou nove dias do nascimento o filho é
inspecionado para ver se merece viver ou não. Sendo
ia_roma/
aprovado, a família festeja a ocasião com cerimônia
alfabetizacao/index.shtml religiosa, dando-se nome ao filho. Só então a família
assume a sagrada tarefa de cuidar da criança, educando-a
para o cumprimento da futura tarefa de assumir os deveres
de cidadão.
A partir dessa fase, a criança aprende a referendar as divindades
ATIVIDADES ancestrais, a obedecer às leis e os pais, na realidade aprendem a ser
guerreiro e cidadão.
Acesse os sites: O processo educativo fundamental dos romanos é a tradição, o
www.discoverybrasil.com/gu jovem aprende a ser um homem bom e piedoso a partir da observação dos
ia_roma/alfabetizacao/inde mais velhos, assim a força do exemplo é o instrumento crucial da educação
x.shtml romana. Para Monacorda,
Em Roma a educação moral, cívica e religiosa, aquela que
Faça uma pesquisa sobre a chamamos de inculturação às tradições pátrias, tem uma
história com características próprias, ao passo que a instrução
alfabetização em Roma. escolar no sentido técnico, especialmente das letras, é quase
totalmente grega. Com as palavras de Cícero podemos dizer
que ' As virtudes (virtutes) têm sua origem nos romanos, a
cultura (doctrinae) nos gregos.’ (MANACORDA, 1989).

524
História da Educação UAB/Unimontes

Os ritos da iniciação começam aos dezesseis anos, quando o


adolescente passa para a condição de adulto, aí troca de veste e confirma
o nome.
A educação então é entregue a parentes ou amigos que iram
DICAS
ensinar a arte guerreira e agrícola. Aprende também à ginástica, manejo
de armas e a ler e escrever e, a história da pátria como sinal de identidade
nacional.
O ensino literário limitava-se a transmissão oral de hinos, O mestre providenciava as
religiosos e cantos militares. O filho era moldado pelo pai para formar uma instalações para as aulas,
sociedade de soldados e aristocratas, pois o objetivo dessa educação era normalmente eram
moral e prática e não intelectual e literária. barracas, tendas ou ar livre.
Já no nível superior as
Entretanto com anexação da Grécia, da Macedônia e de outras
salas eram espaçosas com
províncias transforma Roma em uma cidade com bilíngüe, destacando a
bancos e cátedra para o
língua grega que se torna a segunda língua para os diplomatas e
mestre.
aristocratas.
Assim as mudanças em Roma são irreversíveis.
Inicia-se o ideal pragmático utilitário de aceitação e adaptação
dos estudos helenistas por parte de Roma. Somente na segunda metade do
B GC
século II, que surge um curso de instrução formal que tem o ideal E
GLOSSÁRIO
humanista, correspondente à Paidéia. A F
A organização sistemática do ensino se baseia no programa de Pragmatismo:
estudos dominado pela gramática, filologia e retórica e não pela literatura, Doutrina que toma como
estética e filosofia. critério de verdade o valor
Os estudos dividiam–se em três etapas; a primeira consiste a prático.
leitura, a escrita do grego e do latim, a segunda gramática, filologia e
literatura, a última etapa compreende o nível superior, ou seja, o estudo
técnico da filosofia, da dialética e da retórica.
Porém, o elemento comum nessas três etapas é a dimensão
prática (aplicabilidade do que se ensina e aprende à vida). PARA REFLETIR
A estrutura escolar helenista é implantada no sistema escolar
romano vigente. O ensino de literatura, da lógica e da oratória continua
Em Roma como na Grécia,
agora, o menino era entregue aos cuidados do pedagogo.
o instrutor elementar e o
O pedagogo romano tinha como objetivo servir de guardião,
mestre de escola
companheiro e orientador moral. Esse pedagogo era escolhido com muito
gramatical viviam na
critério sendo observado principalmente o caráter moral.
pobreza. Somente o mestre
Aos sete anos o menino aprende a escrever copiando as palavras
de Retórica, que lecionava
ditadas pelo mestre ou traçando as letras sobre as tábuas de cera. Na
no ensino superior recebia
leitura utilizava-se a tradução latina da Odisséia. Assim, a escola elementar
respeito da sociedade.
romana foi substituída pelo modelo grego.
Com doze anos de idade, o aluno vai para a escola gramatical,
Thomas Giles
que se dividia no estudo de língua e de literatura grega e no estudo do latim
e da literatura romana.
Observa-se nessa escola uma réplica das escolas helenistas e a
tentativa de salvaguardar as tradições romanas.

525
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Essas escolas gramaticais tinham a finalidade de dar ao aluno


DICAS uma instrução geral e mínima e prepará-los para os estudos superiores
profissionais.
Em 140 a.c existiam mais de 20 escolas, que estudavam Virgílio,
Horácio, Salusto, Cícero, e tradição latina através do texto gramatical de
A educação por obra de Dionísio.
escravos e libertos. O
A Retórica latina adaptada do grego ganha importância,
escravo pedagogo e mestre
estudava-se também da geografia, música, matemática, geometria e
na própria família ou seja o
astronomia. Entretanto, somente os meninos estudam na escola
escravo libertus que ensina
gramatical, as meninas estudavam no lar.
na sua própria escola.
O processo educativo romano caracteriza – se pela independência
Assim, como na Grécia
do Estado e a falta de controle. Entretanto, a necessidade de formar uma
estes escravos pedagogos
burocracia faz com que o Estado envolva-se gradativamente no processo
foram na sua maioria
educativo, fazendo com que as escolas assumem a forma do sistema
estrangeiros ' bárbaros', isto
estatal.
é falavam mal o grego,
A organização dos estudos e métodos de ensino utilizados em
como também em Roma
Roma provinha das escolas helenistas.
estes escravos foram gregos
Os romanos conseguiram assimilar o essencial do modelo grego.
que falavam ou não o
Assim esse modelo foi transmitido aos períodos posteriores.
latim, ensinaram a própria
língua e transmitiram a Porém com a transição do principado ao império, com a criação
própria cultura aos de um Estado Despótico, aumenta o controle imperial no sistema escolar.
romanos. Agora os mestres das escolas elementares são contratados e
Em Roma, com o pagos com dinheiro público é criada várias escolas de todos os níveis,
desenvolvimento da tornando o ensino quase universal.
sociedade patriarcal a Com a crise do império, Roma é saqueada pelos visigodos e depois
educação se torna um pelos vândalos. Essa situação erradia para o processo educativo.
ofício exercido inicialmente Neste momento, a escola elementar transforma em centro
por escravos dentro da literário, sem qualquer preocupação na formação do aluno.
família, e, posteriormente A escola gramatical, na sua última fase restringia o programa de
por libertos na escola.Estas estudos e o conteúdo.
são as origens da profissão As escolas de retórica foram limitadas, uma vez que não tinha
de educador em Roma. mais abertura para o exercício da oratória política.
O processo educativo volta-se para a sala de aula e não para a
vida real.
Com o declínio do Império Romano, a educação reduz-se ao
aprendizado de memória do conteúdo dos compêndios (material neutro),
ATIVIDADES que estão sujeitos ao controle por parte da burocracia imperial.
Esses compêndios tinham conteúdos das artes liberais que se
Quais são as características dividiam no trivium (gramática, retórica, filosofia) e quadrivium (aritmética,
da educação romana? geometria astronomia e música).

526
História da Educação UAB/Unimontes

Agora:
O que mais caracteriza esta decadência é o fato desta
PARA REFLETIR
educação ser limitada à classe mais elevada. A educação já
não se destinada a ser a educação prática de todo o povo,
mas o ornamento de uma sociedade oca, superficial e
A transição do principado
geralmente corrupta; já não é um estádio de
desenvolvimento possível para um povo inteiro, ou para
não Império é marcado por
indivíduos de dada categoria, mas a simples obtenção ou turbulências políticas, mas
mesmo mera insígnia de distinção de uma classe também é marcado por ser
favorecida.Quando o antigo vigor político e as
um período de cultura
oportunidades para as atividades políticas desapareceram,
o governo municipal se tornou mera máquina para coletar
ímpar na história de Roma.
impostos, quando o exército se encheu de bárbaros, a Houve construção de
classe superior, agora mais numerosa do que nunca, monumentos colossais
voltou-se para o único traço remanescente da primitiva
como Panteão e o Coliseu.
Roma imperial- a cultura. (MONROE, 1976).
Houve grande interesse
Para tanto, na educação romana prevaleceu um sistema
pela ciência e pela
modificado que incluía elementos gregos e romanos.
atividade literária.
A cultura e literatura grega chegaram às classes superiores, na
qual se organizou um sistema de escolas de gramática e de retórica,
fundaram-se então universidades e bibliotecas.
Mas com tempo, essa educação se fez formal e irreal e perdeu sua
a importância social. Surge então uma nova educação ministrada pela
ATIVIDADES
Igreja.
Assista aos filmes:
O Império Romano- SBJ
1.6 EDUCAÇÃO MEDIEVAL Produções
Ou
1.6.1 A Europa medieval Roma Antiga – 3 filmes/
Videopéia Britânica
A Estrutura Política que prevaleceu na Idade Média são as Ou
relações de vassalagem e suserania. O suserano era quem dava um lote de A Queda o Império
terra ao vassalo, sendo que este último deveria prestar fidelidade e ajuda Romano
ao seu suserano. O vassalo oferecia ao senhor, ou suserano, fidelidade e
Ou
trabalho, em troca de proteção e um lugar no sistema de produção. As
Ben- Hur
redes de vassalagem se estendiam por várias regiões, sendo o rei o
suserano mais poderoso. Todos os poderes jurídico, econômico e político
concentravam-se nas mãos dos senhores feudais, donos de lotes de terras Faça um debate no Fórum
(feudos) A sociedade era estática (com pouca mobilidade social) e com seus colegas sobre o
hierarquizada. A nobreza feudal (senhores feudais, cavaleiros, condes, cotidiano, a política, a
duques, viscondes) era detentora de terras e arrecadava impostos dos educação, a cultura dos
camponeses. O clero (membros da Igreja Católica) tinha um grande poder, romanos.
pois era responsável pela proteção espiritual da sociedade. Era isento de
impostos e arrecadava o dízimo. A terceira camada da sociedade era
formada pelos servos (camponeses) e pequenos artesãos. Os servos
deviam pagar várias taxas e tributos aos senhores feudais, tais como:
corvéia (trabalho de 3 a 4 dias nas terras do senhor feudal), talha (metade
da produção), banalidades (taxas pagas pela utilização do moinho e forno
do senhor feudais). A religião era Igreja Católica dominava o cenário

527
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

religioso. Detentora do poder espiritual, a Igreja influenciava o modo de


DICAS pensar, a psicologia e as formas de comportamento na Idade Média. A
igreja também tinha grande poder econômico, pois possuía terras em
grande quantidade e servos trabalhando. Os monges viviam em mosteiros
A Educação Superior em e eram responsáveis pela proteção espiritual da sociedade. Passavam
Roma era a imitação da grande parte do tempo rezando e copiando livros e a Bíblia. A educação
educação da Grécia. Em era para poucos, pois só os filhos dos nobres estudavam. Esta era marcada
167 a.c Paulus, Sila pela influência da Igreja, ensinando o latim, doutrinas religiosas e táticas
trouxeram as primeiras de guerras. Grande parte da população medieval era analfabeta e não
bibliotecas (tomadas dos tinha acesso aos livros.
gregos), depois Augusto A arte medieval também era fortemente marcada pela
fundou duas bibliotecas religiosidade da época. As pinturas retratavam passagens da Bíblia e
públicas. Durante a idade ensinamentos religiosos. As pinturas medievais e os vitrais das igrejas eram
de ouro da literatura latina formas de ensinar à população um pouco mais sobre a religião.
os livros, bibliotecas se
Podemos dizer que, no geral, a cultura medieval foi fortemente
multiplicaram. A partir da
influenciada pela religião. Na arquitetura destacou-se a construção de
biblioteca fundada por
castelos igrejas e catedrais. Porém, no século XI, dentro do contexto
Vespasiano que a surge
histórico da expansão árabe, os muçulmanos conquistaram a cidade
Universidade de Roma no
sagrada de Jerusalém. Diante dessa situação, o papa Urbano II convocou
Templo da Paz.Priorizava-se
a Primeira Cruzada (1096), com o objetivo de expulsar os "infiéis" (árabes)
mais o direito e a medicina,
da Terra Santa. Essas batalhas, entre católicos e muçulmanos, duraram
do que a filosofia. As artes
cerca de dois séculos, deixando milhares de mortos e um grande rastro de
liberais, neste caso, a
destruição. Ao mesmo tempo em que eram guerras marcadas por
gramática e a retórica
diferenças religiosas, também possuíam um forte caráter econômico.
estavam presentes na língua
Muitos cavaleiros cruzados, ao retornarem para a Europa, saqueavam
latina e grega. O trabalho
cidades árabes e vendiam produtos nas estradas, nas chamadas feiras e
da universidade era
rotas de comércio. De certa forma, as Cruzadas contribuíram para o
direcionado para a
arquitetura, matemática e renascimento urbano e comercial a partir do século XIII. Após as Cruzadas,
mecânica, toda a instrução o Mar Mediterrâneo foi aberto para os contatos comerciais.
consistia em uma disciplina A Idade Média compreende um período extenso, de mil anos,
formal, não existia a entre a queda do Império Romano (476) e a tomada de Constantinopla
investigação ou estímulo pelos turcos em (1473).
criativo. A exposição do O período que sucede à queda do Império Romano, chamado de
assunto era como acontecia Alta Idade Média, é caracterizado pela desagregação da antiga ordem e
nas escolas inferiores. pela divisão em diversos reinos bárbaros, formados após diversas invasões.
Diferentemente das escolas Dentro desse contexto, a religião aparece como elemento
de gramáticas e retóricas agregador. Os chefes dos reinos bárbaros são convertidos ao cristianismo e
que estavam espalhadas a Igreja Católica se transforma soberana da vida espiritual.
pelas províncias. Fora das Aos poucos se estabelece uma aliança entre o Estado e a Igreja,
localidades nos centros de que deixa de ser exclusivamente espiritual e se torna efetivamente política.
cultura grega, não havia A herança grego-latina permanece, no período de invasões,
outras universidades sob o
resguardada nos mosteiros,afinal os monges são os únicos letrados.
domínio romano.
A importância e influência exercida pela Igreja na educação e
nos princípios morais, políticos e jurídicos da sociedade medieval são
Paul Monroe fundamentais.

528
História da Educação UAB/Unimontes

Assim, a educação na Idade Média é marcada pela disciplina e


DICAS
pela influência da religião. O Cristianismo tornou-se a religião oficial do
Império Romano.
O romano decadente e os bárbaros godos e vândalos tinha
necessidade de uma preparação de conduta e espírito, só assim poderiam Saiba mais:
enfrentar a substituição de novos ideais de vida e de conduta.
www.suapesquisa.com/impe
Afinal a educação e religião grega e romana não ofereceram essa rioromano/
formação. www.discoverybrasil.com/gu
Com o cristianismo a educação adquire um caráter novo. O treino iaroma/alfabetizacao/index.
físico e retórico foi substituído por uma disciplina rígida de conduta, o shtml
elemento intelectual é trocado pela instrução da doutrina da Igreja e da
Modelos de Escola na
prática ao culto. Idade Média
A educação neste período tornou-se um regime rígido onde todo o
excesso de interesses naturais, deveria ser suprimido, ou seja, tudo que
fosse ligado a este mundo eram um mal.
Como também o desenvolvimento da personalidade e o gosto
pelo estético ou intelectual era considerado um pecado. Assim, Paul
ATIVIDADES
Monroe relata:
Do Século VI até ao XIII as preocupações intelectuais foram
praticamente eliminadas da educação. E quando
Qual era novo ideal
readmitidas mais tarde ao escaparam à concepção
educacional na Idade
disciplinar de educação. Todos os tipos de educação que se Média?
desenvolveram durante o longo período da Idade Média,
antes do Renascimento clássico do século XV, não
passaram de modalidades deste conceito disciplinar. Por
intermédio de um treino rígido, tanto físico como intelectual
e moral, o indivíduo devia prepara-se para um futuro
desligado do presente pelo tempo e pelo caráter. Sob o
domínio da Igreja e do monaquismo este estado futuro
tornou-se a 'outra vida'.Durante todo este período
predominou assim uma nova concepção de educação em
completo antagonismo com a liberal e individualista dos
gregos, e com a prática e social dos romanos. (MONROE,
1976).
O novo ideal educacional era baseado na natureza moral do
homem. Para o cristianismo essa natureza moral era comum a todos,
passível de aplicação universal.
O problema fundamental da educação e da vida moral encontra
uma nova base de vida.
Essa concepção fez com que os cristãos primitivos e medievais
tornassem indiferentes a educação e cultura grega romana. Agora as
preocupações são morais e religiosas e não mais intelectuais estéticas e
físicas.
Como se sabe a religião dos gregos e romanos se enquadrava nos
conceitos políticos. O problema ético estava então associado a filosofia.
A ética e a moralidade tornam-se conexão com a religião,
passando a exercer uma influência sobre as massas.

529
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Porém, os padres gregos que tinham sido filósofos, antes da sua


conversão incentivavam o estudo da literatura.
A um esforço desses padres em mostrar que a literatura grega está
cheia de princípios e verdades, de preconceitos e exemplos instrutivos para
uma vida superior.
Os padres da Igreja latina, especialmente entre os cristãos
romanos, o helenismo se tornou sinônimo de hostilidade da Igreja.
Entre eles, destacavam Gregório, Agostinho, Tertuliano acreditava
que um cristão não poderia ser mestre de uma cultura pagã.
Agostinho foi o mais influente dos pensadores cristãos na
elaboração de um projeto que resolvesse o conflito entre a fé cristã e a
cultura clássica.
Para ele, os clássicos poderiam ser utilizados como instrumentos,
como auxiliares para a compreensão da fé. Agostinho entendia que a
Retórica era útil para reforçar a verdade, porém poderia ser usada para
apoiar a falsidade. A verdade cristã é suficiente pó si só.
B GC Não se deve desprezar a razão humana, que deve ser utilizada
GLOSSÁRIO E para compreender a verdade.
A F No entanto, dentro do incipiente da teoria da educação cristã
Patrística: reflete a tensão entre fé e razão; entre aceitação e rejeição da cultura
A Patrística ou filosofia dos clássica.
padres da Igreja se O fato de o cristianismo levar o indivíduo a descobrir o sentido que
caracteriza pela defesa da deve orientar a sua existência, configura como uma visão pedagógica, um
fé cristã e de conversão dos processo educativo.
não cristãos.
Esse processo é explicado por Agostinho no livro – As Confissões-
que trata da história do crescimento e desenvolvimento do homem. Assim,
Maria Lúcia Arruda Aranha Conhecimento e fé constituem a meta do processo
educativo. A base do processo é inabalável convicção da
realidade de Deus e da divindade de Cristo. O ponto de
partida é o desejo de conhecer Deus. O elo de ligação que
leva do conhecimento deste mundo mutável, instável e
imperfeito ao conhecimento de Deus é a pessoa de Cristo.
(GILES, 1987)
Agostinho defendia que o ponto fundamental no processo
educativo é o fato de o verdadeiro conhecimento ser inato, colocado na
alma de Deus.
Desta maneira, o saber não é transmitido pelo mestre ao aluno, já
que a verdade é uma experiência pessoa que está dentro de cada um.
Na procura de ativar as idéias inatas, o aluno recebe assistência
especial de Deus, independente da iluminação divina. Trata-se de
perceber o reflexo das idéias eternas nas coisas materiais deste mundo.

530
História da Educação UAB/Unimontes

1.6.2 As escolas medievalistas

A vida da Igreja cristã primitiva era em si mesma uma escola de


enorme importância. Durante aproximadamente mil anos a educação ia
caracterizar pela ausência de elementos intelectuais.
A Igreja estava empenhada na reforma moral do mundo, para a
educação moral dos seus próprios membros.
As escolas catecumenatos tinham o aspecto mais primitivo da vida
da Igreja Cristã que aproximava de uma instrução formal, era na verdade a
preparação dos conversos, jovens e idosos; destinava à instrução na
doutrina e prática de vida cristã.
As escolas catequéticas usam o mesmo método das escolas
catecumenatos, porém põem a filosofia e a retórica- o saber grego á
disposição da Igreja Cristã.
As escolas episcopais e as escolas das catedrais são organizadas
pelos bispos para preparar o clero. Os sacerdotes foram submetidos às
regras ou cânone, possibilitando o controle do trabalho dessas escolas.
Com a destruição da cultura romana pelos bárbaros, a educação
ficou nas mãos da Igreja, estas escolas juntamente com os mosteiros eram
as únicas existentes no Ocidente.
Com relação à educação como disciplina moral, o monaquismo,
significa a organização de homens que fizeram votos de vida religiosa e que
vivem de acordo com as regras de conduta.
Assim, tem religiosos ao clero regular (vivem sob regra especial) e
ao clero secular (não vivem sob regra especial), tendo contato com a vida
do povo.
Observa-se que as escolas episcopais destinavam a preparação
do clero secular, as escolas nos mosteiros e a dos frades mendicantes foram
denominadas congregações de ensino, justamente por desenvolverem o
trabalho educativo.
O monaquismo foi um sistema de educação escolar destinado a
formação do caráter moral e religioso.
As escolas nos mosteiros ensinavam-se as artes de leitura, de Esse
ensino era considerado pobre e destinava-se aos meninos que seguiriam a
vida monástica.
Os mosteiros foram os grandes depositários da literatura e do
saber, principalmente da literatura dos antigos.
Os monges produziram materiais se destacando as discussões das
sete artes liberais (trivium - gramática, retórica, filosofia - e quadrivium -
aritmética, geometria astronomia e música), que significava o conjunto do
saber.

531
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

1.6.3 A escolástica
DICAS
A educação como disciplina intelectual foi denomina escolástica,
que predominou do século XI ao século XV.
O nome Escolástica, surge
A escolástica contribui para a criação das universidades e
por ser a filosofia ensinada
dominou o trabalho destas instituições durante 4 séculos, produzindo uma
nas escolas.
vasta literatura com características próprias.
A finalidade do pensamento escolástico foi a atitude de
Maria Lúcia Arruda Aranha obediência, aceitação de todas as doutrinas, declarações da Igreja.
A partir das verdades formais dogmaticamente estabelecidas,
hostilizava todo estado de dúvida, investigação considerada pecaminosa.
O objetivo era apoiar a fé na razão, ou seja, revigorar a vida
ATIVIDADES
religiosa e a Igreja pelo desenvolvimento intelectual.
A fé era considerada superior a razão, agora as doutrinas da Igreja
O que foi a escolástica?
formuladas anteriormente, deveria ser analisada, definidas e
sistematizadas. Para tanto
A educação escolástica estava incluído neste objetivo mais
amplo. A educação escolástica visava desenvolver o poder
B GC de formular as crenças num sistema lógico e de expor e
GLOSSÁRIO E defender tais definições de crenças contra todos os
A F argumentos que pudessem ser levantados contra elas. Ao
mesmo tempo, empenhou-se em evitar o desenvolvimento
Escolástica: de uma atitude crítica de espírito perante os princípios
Para Monacorda, a fundamentais já estabelecidos pela autoridade.
escolástica é uma cultura (MONROE, 1976).

nova, totalmente medieval Na realidade a escolástica deveria sistematizar o conhecimento


e cristã. Esta cultura herda dando-lhe formas científicas, porém o pensamento escolástico acreditava
a língua latina das que o conhecimento era primeiramente de caráter teológico e filosófico.
tradições clássicas. Tendo A forma científica valorizava a lógica dedutiva, assim essa
como característica na sua educação conseguiu elaborar vários sistemas de conhecimento
elaboração a assunção abrangendo a área de seu interesse.
como patrimônio cultural, Para Paul Monroe,
os textos da tradição A escolástica constitui a completa redução do pensamento
religioso a forma lógica. Como esta organização decorreu
hebraica do Velho e do
inteiramente das obras de Aristóteles, a escolástica é
Novo Testamento. definida, freqüentemente, como a união das crenças
cristãs com a lógica aristotélica. Todos os ramos do
Mário A. Monacorda conhecimento eram subordinados à religião. Todo
conhecimento legítimo devia ser sancionado pela Igreja,
devia apresentar a possibilidade de ser situado no sistema
de pensamento escolástico e reduzir-se à forma lógica
adequada. Isto era a tarefa dos escolásticos.
Diferentemente da organização das escolas catequética, de
perguntas e respostas, na escolástica prevalece a forma lógica
sistematizada.
A matéria era dividida em partes, capítulos, subcapítulos; sendo
que cada tópico era rigorosamente analisando conforme a lógica
aristotélica.

532
História da Educação UAB/Unimontes

Entre os grandes escolásticos destacam-se Alexandre de Hales,


DICAS
que foi o primeiro dos escolásticos a ter conhecimento da filosofia de
Aristóteles, Boaventura, Alberto Magno, Tomás de Aquino que foi o mais
importante dos escolásticos.Sua obra representa a culminância da
escolástica. A nova cultura escolástica
Para Tomás de Aquino, a educação é uma atividade que torna proporciona escolas a
aquilo que é potencial em atual. Como o homem tem uma natureza todas as crianças. “É a
corrompida, a atividade de ensino depende das Santas Escrituras e da nova atitude cristã de
providência divina. abertura da educação a
A educação para Tomás era um meio para atingir o ideal da todos (mais aculturação
verdade e do bem, assim superaria as tentações do pecado que instrução)”.

1.5.4 As universidades Mário A. Monacorda

As universidades surgem paralelamente ao surgimento da


economia mercantil das cidades e à sua organização em comunas.
Um novo processo na instrução desponta com o aparecimento
dos mestres livres principalmente os clérigos que ensinam aos leigos.
A confluência espontânea de clérigos de diversas origens, que
afastavam dos mosteiros ou para assistirem aulas de algum doutor
famoso ou aproveitando a licença obtida ou arrancada, constituíram as
associações que posteriormente se tornaram universidades.Conforme
descreve Monacorda:
...Munidos da licencia docendo concedida pelo
magischola, ensinando fora das escolas episcopais e
frequentemente para evitar concorrência, fora dos muros
da cidade ( extra muros civitatis), eles satisfazem as
exigências culturais das novas classes sociais.

Assim, as universidades foram organizadas sob o governo de


natureza democrática, localizavam-se em lugares remotos escolhidos
pelos mosteiros.
O privilégio das universidades era conferido aos mestres e
estudantes e aos subordinados, os privilégios do clero.
Esses privilégios eram a isenção do estudante ao serviço militar, a
jurisdição interna (as universidades poderiam julgar os seus próprios
membros), jurisdição civil e o privilégio da colação de grau que era a
licença para lecionar.
Antes somente a Igreja concedia esse privilégio por intermédio do
arcebispo, do bispo assim, a Igreja controlou o ensino.
Pode-se dizer que a educação universitária era:
Totalmente livresca feita por uma seleção muito limitada de
livros em cada campo, livros que eram aceitos como se suas
palavras fossem a absoluta é a última verdade. Era dirigida
muito mais para o domínio da forma e para o
desenvolvimento do poder de discursos formais,

533
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

especialmente argumentação, do que para a aquisição de


conhecimento ou para a busca da verdade no sentido mais
ATIVIDADES amplo, ou mesmo para familiarizar o estudante com
aquelas fontes literárias do saber que, embora ao seu
alcance, estavam fora da aprovação eclesiástica ortodoxa.
Assista ao filme: (MONROE, 1976).

O Nome da Rosa A influência política das universidades foi importante, devido seu
modelo de organização democrática. Era um ambiente livre para assuntos
Faça um debate no Fórum políticos, eclesiásticos e teológicos.
com seus colegas sobre as Thomas Giles explica que:
bibliotecas, as De todas as instituições educativas que surgiram desde a
universidades e ao acesso Antiguidade, é a universidade que exerce mais influência na preparação
as publicações na Idade da época moderna e contemporânea.
Média
1.6.5 A cavalaria

A cavalaria representa a organização e reconhecimento dos mais


elevados ideais sociais da sociedade secular.Consiste em uma educação
DICAS
voltada para a disciplina social.
A instituição da cavalaria representava o treino em ideais e
atividades da cavalaria que constituía a educação para parte dos
Sugestão de Filmes:
membros da nobreza.
A Idade Média: a
Os ideais eram baseados na concepção de virtude pessoal, nas
mentalidade
palavras de Conrnish abud Monroe 'a cavalaria ensinou ao mundo o dever
do serviço nobre prestado voluntariamente. Exaltou a coragem e a
Em Nome de Deus iniciativa na obediência à regra, consagrou as proezas militares ao serviço
da Igreja'
Saiba mais: No fim da Idade Média, os interesses individualistas encontram
http://www.suapesquisa.co expressão nas literaturas vernácula, no comércio, e nos novos interesses
m/idademedia/ intelectuais que com a influência dos sarracenos e dos frades (Ordem
www.brasilescola.com/histor Franciscana) surgem novos tipos de escolas.
iag/idade-media.htm Essas mudanças tinham a intenção de acabar com a unidade de
http://www.historiadaarte.co pensamento e vida, característico da Idade Média.
m.br/idademedia.htm

Castelos Medievais
Feudalismo
Baixa Idade Média
Cruzadas na Idade Média
Arte Medieval
Trovadorismo
Peste Negra
Igreja Medieval

534
História da Educação UAB/Unimontes

REFERÊNCIAS

ARANHA, Maria Lucia de Arruda. História da educação e da pedagogia:


geral e Brasil. 3 ed. São Paulo: Moderna, 1990.254 p.
MANACORDA, M. A. História da Educação: da antiguidade aos nossos
dias. São Paulo: Cortez/ Editores Associados, 1989.
PETITAT, A. Produção da escola/produção da sociedade: análise sócio-
histórica de alguns momentos decisivos da evolução no ocidente. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1984.
FILHO, L. M. de F. Movimentos e Idéias Educacionais. In: SALGADO,
M.U.C, MIRANDA, G. Coleção Veredas - Formação superior de
professores; módulo 3. Belo Horizonte, SEE-MG, 2002.
GILES. T. R. História da Educação. São Paulo. EPU, 1987.
MONROE, P. História da Educação. Trad. Idel Becker. São Paulo,
Nacional, 1976.

Sites:
http:// portal.mec.gov.br
www.cervantesvertical.com
www.dominiopublico.gov.br
http//rived.mec.gov.br
www.webeduc.mec.gov/educacionais
www.ibge.gov.br

535
2
UNIDADE 2
A EDUCAÇÃO NO PERÍODO DO RENASCIMENTO

Nesta unidade trataremos da educação no período do


Renascimento. O estudo tem como objetivo principal analisar as
transformações políticas, econômicas e sociais e artísticas do período
renascentista, e que influenciaram a educação ocidental.
Na unidade, abordaremos os últimos séculos da idade média,
quando a cultura européia recebeu grande impulso que culminou com pré
– renascimento. Nesse período, a educação retomou os antigos ideais
clássicos que defendiam a conjunção harmoniosa do homem com a
natureza. Os pensadores da época também eram, em sua maior parte,
mestres e percorriam a Europa difundindo suas idéias. Esse primeiro
período Renascentista durou poucos anos, sendo encerrado pelo início da
Reforma. O otimismo renascentista foi paralisado pelas lutas religiosas, e
as instituições eclesiásticas e estatais começaram a se assustar. A liberdade
dos educadores foi cortada e no mundo católico teve início uma profunda
decadência das universidades. Os efeitos da Reforma na educação se
fizeram sentir a longo prazo. Um dos mais importantes efeitos foi a
extensão do ensino primário. Com a Contra-Reforma, os países católicos
ganharam novas instituições de educação: os colégios. Foi criado um
modelo institucional destinada aos filhos das classes privilegiadas, sendo
desenvolvidos métodos de grande refinamento psicológico. O ideal da
educação renascentista tinha sido o de formar o homem capaz de dominar
todos os campos do conhecimento, desde a arte até a ciência. Tarefa
impossível. O desenvolvimento das técnicas, adiantando-se muitas vezes
ao das ciências puras, impôs a especialização dos saberes, num mundo em
que a arquitetura, a arte da guerra, a navegação e as finanças ficavam
cada vez mais em mãos de um grupo reduzido de especialistas.
Ao final deste estudo, pretendemos que você seja capaz de:
compreender as principais transformações ocorridas no período
renascentista e suas contribuições na educação ocidental; conceituar o
renascimento; caracterizar o pensamento humanista; identificar os
principais fatores que provocaram a reforma e contra reforma; refletir
sobre a base do pensamento pedagógico renascentista. Para uma melhor
compreensão, a unidade foi dividida nas seguintes seções:
2.1 Renascimento
2.2 O renascimento cultural, científico e artístico
2.3 O renascimento humanista
2.4 A reforma e a contra-reforma
2.5 O iluminismo
2.6 O pensamento pedagógico renascentista iluminista
2.7 O surgimento dos sistemas escolares
Preparado para iniciar a nossa viagem? Então vamos lá...

536
História da Educação UAB/Unimontes

2.1 O RENASCIMENTO

O renascimento foi principalmente um movimento de


individualismo. Os traços característicos do período são as DICAS
tentativas para derrubar, na igreja, no estado, nas
organizações industriais e sociais, na vida intelectual e
educacional as diversas formas de autoridade dominantes
durante a idade Média. (MONROE, 1985, p.171).
Para saber mais sobre o
O Renascimento clássico dos séculos XV e XVI foi marcado por renascimento acesse o site
um movimento intelectual, estético e social. Período também conhecido http://www.suapesquisa.co
como o fim da Idade Média e nascimento da modernidade, ou seja, a m/renascimento/
maneira moderna de ver o mundo. Os valores dominantes na idade Média
são substituídos por uma mentalidade moderna, tais como: o humanismo,
o racionalismo e o individualismo.
No humanismo desloca-se o eixo de um mundo centrado em Deus
(teocêntrico) para a construção de uma outra maneira de ver o mundo, ou
seja, um mundo centrado no homem (antropocêntrico) denominado
cultura humanista.
O racionalismo retira do centro a visão do mundo focado na fé
para explicá-lo por meio da razão, denominada cultura racionalista.
O individualismo contrapõe o aspecto coletivo e fraternal de
cristandade centrando-o na valorização do individualismo associado ao
espírito de competição e concorrência comercial.
Esse período se configura como transição do Feudalismo para o
Capitalismo, as artes, o pensamento e o conhecimento científico passaram
por um processo de muitas mudanças, que foi denominado Renascimento
Cultural. O termo renascimento deve der entendido como a retomada
(renascer) do estudo de textos da Cultura Clássica.
O Renascimento foi um movimento de exaltação do
homem. Tanto o grego antigo como o homem moderno
esteve preocupado em compreender a origem do homem,
porém chegaram a conclusões diferentes. Ambos se
preocupavam em estabelecer a compreensão do mundo
em bases racionais, porém olhavam o mundo de formas
diferentes. Os renascentistas rejeitaram os padrões
definidos pela igreja católica. Assim surgiu o humanismo
substituído o teocentrismo medieval pelo
antropocentrismo.
Com o Renascimento surge um novo conceito de homem. O
indivíduo passou a ter a sua própria história e a sociedade também. A
relação entre indivíduo e a realidade na qual ele está inserido se
entrelaçam: o passado, o presente e o futuro transformam-se em criações
humanas. O tempo e o espaço se humanizam e o infinito transforma-se
numa realidade social.
Com o Renascimento surge um novo conceito de homem. O
indivíduo passou a ter a sua própria história e a sociedade também. A
relação entre indivíduo e a realidade na qual ele está inserido se
entrelaçam: o passado, o presente e o futuro transformam-se em criações

537
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

humanas. O tempo e o espaço se humanizam e o infinito transforma-se


numa realidade social.
O Renascimento representou a redescoberta do conhecimento e
do estudo fora do âmbito daquelas matérias permitidas pela Igreja. Os
renascentistas preocupavam-se principalmente com as questões ligadas à
vida humana, por isso o movimento é identificado com o humanismo.
O Renascimento estende-se por todos os aspectos da sociedade
sejam eles, políticos, econômicos, culturais, sociais, artísticos, envolvendo
a vida de todos, influenciando nas maneiras de pensar, nas práticas morais,
nos ideais éticos, religiosos, na ciência. Estes aspectos aparecem ligados e
num mesmo período, afetando as estruturas básicas da sociedade e
provocando alterações desta estrutura social e econômica.
(...) o processo de valorização da humanidade não
significou uma ruptura com a religião, as pessoas tornaram
descrentes. O humanismo renascentista não rompeu com a
idéia criacionista, ou seja, manteve a idéia de que Deus
criou a Terra e as pessoas, mas mudou a relação entre esses
elementos. O mundo não era mais pensado como um lugar
de sofrimento e sim um lugar de delícias, onde o ser
humano, a mais perfeita das criações divinas, foi colocado
para ser feliz, para usufruir dos benefícios e das belezas de
tudo o que o rodeia, inclusive do próprio corpo. (PETTA,
1999).

PARA REFLETIR O Renascimento surgiu na Itália, que era o principal pólo


comercial daquele momento. Ricos e poderosos membros da sociedade
italiana despertaram-se primeiramente, para a necessidade de superar a
A classe burguesa: mentalidade feudal. Surgem diversos mecenas, patrocinando artistas,
A maneira de pensar do intelectuais e cientistas, no aprimoramento de sua cultura. As cidades
humanismo associa-se às italianas acabam por atrair inúmeros sábios bizantinos, que por terem
transformações econômicas preservado muito da cultura greco-latina, acabam por contribuir para o
que vinham ocorrendo desenvolvimento renascentista.
desde o final da Idade Partindo da Itália, o Renascimento difundiu-se por diversas nações
Média, com o européias, sendo grandemente favorecido pelo rápido fortalecimento
desenvolvimento das comercial e urbano, que atingiu grande parte da Europa Ocidental entre os
atividades artesanais e séculos XIV e XVI, caracterizado pela retomada dos valores da cultura
comerciais dos burgueses, greco-romana, ou seja, da cultura clássica. Esse momento é considerado
que eram os amigos servos como um importante período de transição envolvendo as estruturas feudo
libertos. capitalistas.
A Revolução Comercial do
século XVI se caracteriza 2.2 O RENASCIMENTO CULTURAL, CIENTÍFICO E ARTÍSTICO
pelo novo modo de
produção capitalista, que No campo da produção cultural esse movimento atingiu a elite
acentua a decadência do das cidades prósperas mudando a qualidade da obra intelectual e o
feudalismo, cuja riqueza aumento da produção cultural. O desenvolvimento quantitativo foi
era baseada na posse de favorecido pela imprensa e ação de mecenas.
terras (ARANHA, 1996, p. O desenvolvimento da imprensa através do alemão Johann
87) Gutemberg (1400-1468) desenvolveu o processo de impressão com tipos

538
História da Educação UAB/Unimontes

móveis de metais, o que facilitou a divulgação da literatura em maior


quantidade. Os mecenas (homens ricos) patrocinaram trabalhos artísticos
e intelectuais renascentistas, os mecenas eram constituídos por
banqueiros, monarcas e até Papas.
No campo artístico o renascimento provocou mudanças nas
técnicas e temáticas. Os artistas passaram a criar obras relacionadas ao
mundo físico e aperfeiçoaram a técnica da perspectiva criando a ilusão de
profundidade e a pintura a óleo, criando também cores vivas, fortes e
bonitas. A arte passou a explorar além dos temas religiosos ou temas tais
como a mitologia, cenas do cotidiano, o corpo humano. Os artistas
passaram a assinar suas obras abandonando o anonimato e humildade
medieval.
No campo cientifico o renascimento contribuiu para o
desenvolvimento do espírito critico racionalista, voltado para a
experimentação das hipóteses e exame dos problemas. Criou-se um novo
perfil de cientista. Dentre os principais cientistas do renascimento científico
destacam-se:
Leonardo da Vinci (1452-1519)
Fonte: http://paginas.terra.com.br/servicos/
lbiagioni/leonardo_da_vinci.htmque desenhou o primeiro mapa do mundo
focalizando a América. Elaborou os
princípios da máquina a vapor,
desenharam a anatomia do corpo
humano e outros animais, projetor
diversos engenhos voadores e máquinas
Figura 14: A Última Ceia
de guerra. Recebe também destaque
outras obras igualmente importantes tais como a última ceia, a Monalisa, a
Virgem dos Rochaedos.
Nicolau Copérnico (1548-1600) que defendia que o universo era
um todo infinito e afirmava que Deus deveria ser visto como um princípio
inteligente que deu origem ao universo. Foi condenado à fogueira por um
tribunal da Inquisição.
Paracelso (1493-1541) realizou estudos no campo da medicina
farmacêutica e dos fundamentos físico-químicos dos processos vitais
Miguel Servet (1511-1553) realizou dissecação de cadáveres e
DICAS
descobriu o funcionamento da pequena circulação sanguínea foi
condenado a fogueira sendo queimado em Genebra.
Galileu Galilei (1534-1662) desenvolveu o telescópio, confirmou
a teoria de Copérnico. Negou suas descobertas científicas para se livrar da Para saber mais sobre os
pena de morte imposta pelo tribunal da inquisição É chamado de pai da cientistas do renascimento
física. acesse:
http://www.tg3.com.br/rena
Em síntese, o Renascimento traz como principais características o
scimento/renascimento_cult
florescimento das artes, e um forte despertar de todas as formas de
ural.htm
pensamento. A redescoberta da antiga filosofia, da literatura, das ciências
e a evolução dos métodos empíricos de conhecimento caracteriza todo

539
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

este período que se inicia no séc. XV e prolonga-se até o séc. XVII. Em


oposição ao espírito escolástico e ao conceito metafísico da vida, busca-se
uma nova maneira de olhar e estudar o mundo atual. Esse naturalismo
vincula-se estreitamente à ciência empírica e utiliza suas descobertas para
aplicá-las nas obras de arte. Os novos conhecimentos da anatomia, da
fisiologia e da geometria são prontamente incorporados, possibilitando,
por exemplo, a representação do volume pelo uso da perspectiva, dos
efeitos de luzes e cores. Do ponto de vista filosófico, surge uma nova
concepção do mundo e do destino do homem, uma visão mais realista e
humana dos problemas morais.
O homem vitruviano de Leonardo da Vinci sintetiza o
ideário renascentista: humanista e clássico. O
Renascimento está associado ao humanismo, o interesse
ATIVIDADES
crescente entre os acadêmicos europeus pelos textos
clássicos, em latim e em grego, dos períodos anteriores ao
Por que a invenção da triunfo do Cristianismo na cultura europeia. No século XVI
imprensa foi importante encontramos paralelamente ao interesse pela civilização
clássica, um menosprezo pela Idade Média, associada a
para o Renascimento?
expressões como "barbarismo", "ignorância", "escuridão",
"gótico", "noite de mil anos" ou "sombrio". (Bernard Cottret).

2.3 O RENASCIMENTO HUMANISTA

O renascimento se caracterizou pelo humanismo, racionalismo e


individualismo. Enquanto o renascimento se manifestou principalmente
nas artes, na literatura e na filosofia, o humanismo representou tendência
semelhante no campo da ciência.
Os humanistas eram homens letrados profissionais,
normalmente provenientes da burguesia ou do clero que,
por meio de suas obras, exerceram grande influência sobre
toda a sociedade; rejeitavam os valores e a maneira de ser
da Idade Média e foram responsáveis por conduzir
modificações nos métodos de ensino, desenvolvendo a
análise e a crítica na investigação científica.
Assim, o homem passa a perceber a sua importância como um ser
racional, deixa de ser dominado pelos senhores feudais. Nesse período o
homem troca os valores dominantes da idade média por novos valores
baseado no homem como o centro de um mundo compreendido de uma
maneira moderna.
O movimento dos humanistas, que se esforçavam para modificar
o padrão de estudos tradicionais das universidades medievais controladas
pela Igreja, voltado para as três carreiras tradicionais: direito, medicina e
teologia, e incluir os estudos humanos como a poesia, a filosofia, a história,
a matemática e a eloqüência.
Os humanistas, portanto, tentavam abolir a tradição intelectual
medieval e construir uma nova cultura inspirada na cultura antiga que
valorizava o individuo, os feitos históricos, a vontade e a capacidade de
ação do homem, sua liberdade de atuação e de participação na vida das

540
História da Educação UAB/Unimontes

cidades (antropocentrismo).
DICAS
Dentro do humanismo houve inúmeras correntes diferentes que se
distinguiam de acordo com a prática a que se dedicavam a temática que
abordavam e a tradição filosófica da Antiguidade a que se ligavam.
Homens e entidades encarregados de preservar a cultura Sugestão de filme:
tradicional se opuseram aos humanistas e passaram a
O Nome da Rosa
persegui-los, Dante e Maquiavel foram exilados,
Campanella e Galileu foram presos e torturados, Thomas Diretor: Jean Jacques
Morus foi decapitado, Giordano Bruno e Dolet foram Annaud
queimados pela Inquisição, entre outros. Esse clima de
Data: 1986
insegurança vivido pelos humanistas fez com que se
estabelecesse entre eles um laço de solidariedade Inspirado na obra
internacional através de toda a Europa. Eles trocavam homônima de Umberto
informações, livros, idéias, hospitalidade e assim, eram Eco. Na península Itálica
estimulados e suas teorias se espalhavam.
medieval, um monge
Na cidade de Florença surgiu o platonismo, uma das mais investiga uma sucessão de
significativas correntes do pensamento humanista, que consistia no crimes em um mosteiro
conhecimento rigoroso das leis e propriedades da natureza para transpô-la benetitino. A partir dessa
com a máxima harmonia nas obras de arte mediante a elaboração trama, o filme mostra as
matemática precisa. diversas posições e
A cidade de Pádua, ligada a corrente aristotélica, tornou-se um correntes de pensamento
centro de estudos voltado principalmente para a medicina e os fenômenos da Igreja às vésperas do
naturais, desligado de preocupações teológicas. Renascimento (século XIV).
No norte da Europa desenvolveu-se a corrente chamada de
humanismo cristão, que condenava a ganância da Igreja, a exploração das
imagens e relíquias, o formalismo vazio dos cultos e a venda de
indulgências.
Os utopistas eram outra corrente do pensamento humanista. Eles
concebiam uma comunidade ideal, puramente imaginária, onde os ATIVIDADES
homens vivem e trabalham felizes, com fartura, paz e mantendo relações
fraternais. Os utopistas desejavam o fim da imprevisibilidade da História e Diferencie as três correntes
dos conflitos sociais. humanistas.

2.4 A REFORMA E CONTRA-REFORMA

A Reforma Protestante foi um movimento religioso,


econômico e político de oposição à Igreja Católica, que
resultou na fragmentação da unidade cristã e na origem do
protestantismo.
Esse período é marcado por uma nova forma de pensar, pela
ascensão da classe burguesa, desenvolvimento nas relações de produção
de capital e trabalho e pela formação dos Estados Absolutistas. O homem é
posto como centro das atenções e o pensamento científico começa a
questionar algumas afirmações vigentes até então, e dentre elas, as
religiosas. Existia naquele contexto a necessidade de uma nova religião
mais sensível e que não fosse tão mal compreendida e mal conhecida
como o catolicismo.

541
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Muitos dos pensadores da época apesar


PARA REFLETIR
de replicarem muitos aspectos do sistema vigente
e até mesmo da igreja ocidental eram religiosos e
A criação de uma rede de tinham fé. Uma vertente do pensamento
ensino público foi humanista leva a uma maior reflexão do papel da
planejada pelos igreja e das verdades que ela pregava. A Europa se
reformadores luteranos a vê envolta numa efervescência contestadora, o
Figura 15: Lutero
pedido de governantes que que acaba chegando às bases da Igreja Romana.
perceberam a urgência de Tradicionalmente diz-se que a Reforma Protestante foi iniciada por
oferecer instrução ao povo. Martinho Lutero, monge agostiniano alemão (1483 – 1546), cujo
O interesse dos príncipes pensamento sofreu profunda influência de São Paulo de Tarso.
era fortalecer seus domínios Foi Lutero, especialmente, quem deu impulso prático e
num tempo de constantes força política à programação de um novo sistema escolar,
voltado também à instrução de meninos destinados não à
hostilidades entre os continuação dos estudos mas ao trabalho. “Mesmo se não
Estados. "Lutero existisse nem alma nem inferno – escrevia ele -, deveríamos
argumentou que o dinheiro ter escolas para as coisas deste mundo”. (MANACORDA,
investido em educação 2004, p. 196).

seria menor que o gasto Em 1517, Martinho Lutero expôs em Wittenberg suas famosas "95
com armas e traria mais Teses Contra a Venda de Indulgências", sendo excomungado e correndo o
benefícios" (ALTMANN, risco de ser martirizado pela Igreja. Lutero encontrou terreno fértil à sua
1994). pregação nas regiões em que era interessante aos nobres se apoderarem
das terras da Igreja Católica. Aliando-se aos príncipes, conseguiu
principalmente o apoio do Imperador do Sacro Império Romano-
Germânico Carlos V. As doutrinas luteranas causaram grande agitação,
principalmente sua idéia subversiva de confiscar os bens da Igreja.
“(...) as classes destinadas à produção são consideradas
não mais como os principais destinatários da catequese
cristã, mas também como participantes ativos no processo
comum da instrução; Lutero se põe o problema da relação
instrução – trabalho. Se a necessidade de ler as Sagradas
Escrituras e a capacidade de cada um interpretar a palavra
divina nelas contida está na base desta nova exigência da
cultura popular, é porém o desenvolvimento das
capacidades produtivas e a participação das massas na
vida política que exigem este processo”. (MANACORDA,
2004, p. 198).
A reforma teve implicações relevantes na educação, Martinho
Lutero insistia em suas pregações que o ensino deveria ser ministrado a
todos, nobre, plebeu rico e pobre. Defendeu que a educação não devia
por mais tempo ser pela religião e pela igreja.
Ainda que não houvesse alma,ou céu, nem inferno, seria
necessário haver escolas para a segurança dos negócios
deste mundo, como a história dos gregos e romanos
claramente nos ensina. O mundo tem necessidade de
homens e mulheres educados, para que os homens possam
governar o pais acertadamente e para que as mulheres
possam criar convenientemente seus filhos, dirigir os seus
criados e os negócios domésticos. (MONROE,
1985,p.179).

542
História da Educação UAB/Unimontes

Reforma foi aprofundada por alguns de seus seguidores, com


particular ênfase a João Calvino (1509 – 1564) que dinamizou o
movimento protestante através de novos princípios, como o da
predestinação absoluta.
Diante dos movimentos protestantes, a
reação inicial e imediata da Igreja católica foi punir os
rebeldes, na esperança de que as idéias reformistas
não se propagassem e o mundo cristão recuperasse a
unidade perdida. Atitude que não conseguiu deter a
expansão do protestantismo.
Diante disso, desencadeou um amplo
Figura 16: Calvino
movimento de moralização do clero e de
reorganização das estruturas administrativas da Igreja católica, que ficou
conhecido como Reforma Católica ou Contra-Reforma. Seus principais
líderes foram os papas Paulo III (1534-1549), Paulo IV (1555-1559), Pio V
(1566-1572) e Xisto V (1585-1590).
Para isso, estabeleceu um conjunto de medidas, adotadas pelos
líderes da Contra-Reforma, tendo em vista deter o avanço do
protestantismo. Entre essas medidas, destacam-se a aprovação da ordem
dos jesuítas, a convocação do Concílio de Trento e o restabelecimento da
Inquisição.
No Concílio de Trento (1545 – 1563), a Igreja Católica
estabeleceu um conjunto de medidas defensivas e ofensivas. A fim de
impedir a contaminação pelo protestantismo dos países ainda não
atingidos, criou:
? um Index Librorum Prohibitorum (Índice de Livros Proibidos),
dentre os quais encabeçavam as obras de Lutero, Calvino, etc;
? reativou o Tribunal da Santa Inquisição, com a finalidade de
reprimir heresias;
? criou o catecismo, catequese e os seminários com vistas a
discutir e persuadir os fiéis reconquistando o terreno perdido e
? incentivou as novas ordens de pregadores apostólicos
romanos, responsáveis pela catequese no novo mundo. Neste contexto,
surge a Companhia de Jesus, de Inácio de Loyola, subordinada
diretamente ao papa e que levava sua pregação ao continente americano
e até à Ásia.
O cerne da contra Reforma em relação a educação foi a criação
da companhia de Jesus para fortalecimento da pregação, da confissão e
do ensino. Foi criado a Ratio Studiorum, ou Sistema de Estudo,do qual
originou-se o modelo de educação brasileira .Tinham pouco interesse pela
educação das massas e dedicavam-se a educação dos líderes. Instituíram-
se duas classes de escolas: os colégios inferiores e colégios superiores.
Mantinham as instituições em per feita organização
administrativa. A ordem era dividida em províncias administrativas, no
setor educativo presididas por um provincial subordinado ao geral e chefe

543
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

do reitor, subordinado ao reitor estavam os prefeitos de estudos , os


inspetores de ensino e os professores. O prefeito de estudos e reitor que
fiscalizavam a classe e preparação de todos os mestres para assegurar o
resultado favorável em todas as escolas. Os estudantes também podiam
exercer a fiscalização um sobre o outro, para isso eram divididos em grupos
sob a direção de monitores e aos pares. O ensino era ministrado de
preferência por professores que tinham estudado no colégio inferior e
superior da ordem.
O método de ensino jesuítico caracterizava-se pelas
revisões freqüentes da matéria.Cada dia começava com a
revisão do dia anterior;cada semana que terminava com
uma revisão. Cada ano, com uma revisão do trabalho
anual, e, finalmente, o estudante destinado a ordem via o
curso inteiro, ensinando-o. (MONROE, 1985,p.186).

2. 5 O ILUMINISMO

O iluminismo consiste em um movimento cultural e intelectual,


surgido na Europa, do século XVII, fundamentado no uso e na exaltação
da razão. Abordava o conhecimento, a liberdade e a felicidade como os
objetivos do homem. A visão iluminista defendia a possibilidade de cada
ser humano ter consciência de si mesmo e de seus erros e acertos e de ser
dono do seu destino.
A crítica iluminista foi voltada contra a tradição e a autoridade
daqueles que tomaram para si a tarefa de guiar o pensamento e contra o
dogmatismo. A luta contra as verdades dogmáticas foi na esfera política
em oposição ao absolutismo monárquico. Houve alguns casos que os
monarcas apoiaram e estimularam as novas idéias, atitudes que ficou
conhecida como despotismo esclarecido, pois esse apoio era superficial e
regido por conveniências políticas ou estratégicas.
O movimento iluminista foi marcado pela influência que os
empreendimentos científicos do século XVII e início do século XIII tiveram
sobre as novas idéias, a substituição de um Deus responsável pelos
acontecimentos humanos por deísmo, que valoriza a idéias abstrata de
Deus como princípio ordenador da natureza, criador do mundo, mas que
não intervém diretamente nele.
O pensamento ocidental, antes tão marcado pelo
misticismo religioso, conheceu nos séculos XVII e XVIII,
uma nova possibilidade de construção sustentada no
racionalismo. O mundo físico e seus fenômenos deixavam
de ser justificados pela religião e passavam a ser explicados
pela razão.
Os ideais iluministas eram profundamente otimistas em relação
ao ser humano e à sua capacidade de controlar e conhecer tudo o que o
rodeia. No plano social, esse otimismo se traduziu na crença de que os
homens são agentes históricos, que somos capazes de conduzir a história
de acordo com os nossos interesses. No campo político, o otimismo das

544
História da Educação UAB/Unimontes

Luzes foi a base de sustentação ideológica das revoluções burguesas. Os


preceitos de Igualdade, Liberdade e Fraternidade, presentes na Revolução
Francesa, foram a derivação política das teses racionalistas.
O Movimento das Luzes realizou uma ampla crítica à forma do
poder absolutista vigente e propôs uma nova maneira de entendimento da
vida social. Desse modo, a atuação dos iluministas ultrapassou o campo
científico, e o racionalismo foi aplicado à análise social em aspectos como
o das relações sociais, da relação entre o governante e os governados, da
relação do rei com o Estado e a religião. O pensamento iluminista, a um só
tempo, refletia o panorama histórico do século XVIII e sedimentava o
processo político-revolucionário que teria início no final daquele mesmo
século.
As principais formulações do pensamento político do Iluminismo
são as críticas ao absolutismo; à tese do direito divino dos reis; a à
participação da Igreja na vida pública; e a defesa do contrato como
mediador das relações sociais.
Rosseau em sua obra Contrato Social busca conciliar os
interesses particulares e os interesses públicos, criando um
Estado ideal em que todas as pessoas participam
diretamente do governo, e as decisões são tomadas de
acordo com a vontade geral.
O séculos XVII e XVIII conheceram um grande desenvolvimento
científico em várias áreas do conhecimento. Os iluministas e seus
precursores foram responsáveis por importantes descobertas científicas e
pela reestruturação do pensamento ocidental.
As descobertas e teorias elaboradas durante o transcorrer do
século XVII prepararam o terreno para a revolução no conhecimento que
iria acontecer no século seguinte. Dessa forma, graças à ação dos
intelectuais do século XVII, os filósofos e demais cientistas do século XVIII
foram herdeiros de um campo de análise e de conhecimento muito mais
amplo e menos dogmático, o que lhes permitiu grande avanço nos vários
ramos do conhecimento e resultou no Iluminismo.
Os principais pensadores e cientistas do Século das Luzes foram:
Rosseau - defende o contrato social;
Isaac Newton – deduziu o princípio da gravitação universal;
Fahrenheit e Celsius – descoberta do termômetro;
ATIVIDADES
Benjamim Franklin – percebeu que o raio é uma descarga elétrica
e criou o pára-raios;
Lavoisier – teoria de “que nada se perde e nada se cria”; O que significou o
Iluminismo para a
Montesquieu e Voltaire – defendiam a Monarquia Constitucional;
humanidade?
Kant – entende que o conhecimento do mundo exterior envolve
Descreva as principais
tanto a experiência (Empirismo) quanto o uso de conceitos metafísicos, os
características do
quais não aparecem com a experiência (uso da razão). Assim, sua tese
movimento iluminista.
juntava os dois princípios fundamentais do pensamento do século XVIII.

545
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

2.6 O PENSAMENTO PEDAGÓGICO RENASCENTISTA/ILUMINISTA

O movimento renascentista envolveu uma nova sociedade


e, deste modo novas relações sociais em seu cotidiano. A
vida urbana passou a ter um novo comportamento. Isso
significa que o renascimento não foi um movimento de
alguns artistas, mas uma nova concepção de vida adotada
por uma parcela da sociedade, e que será exaltada e
difundida nas obras de arte. A despeito de recuperar os
valores da cultura clássica, o renascimento não foi uma
cópia, porque se utilizava dos mesmos conceitos, porém
aplicados de uma nova maneira a uma nova realidade.
A partir do século XI, a admirável expansão das universidades
mudou radicalmente as condições de ensino no continente. A universidade
medieval continuava dominada por um sistema ideológico rígido,
tradicional, baseado fundamentalmente na teologia, mas levava em si o
germe da expansão do saber. Quando o pensamento aristotélico foi
incorporado ao acervo cultural dominante, após uma ausência de muitos
séculos, a semente do racionalismo ficou decididamente implantada na
instituição medieval de ensino. O espírito crítico tinha que se desenvolver
até assumir sua forma moderna no Renascimento.
A educação renascentista visava o homem burguês, o clero e a
nobreza. Era elitista, aristocrata e sustentava o individualismo liberal, não
chegando às massas populares. Alguns fatos históricos nos séculos XIV e
XV, unido à revalorização da cultura greco-romana influenciaram o
pensamento pedagógico, favorecendo a superação do próprio homem, o
pioneirismo e a aventura.
Durante o Renascimento surgiram-se três grandes áreas de
interesse: a vida real do passado, o mundo subjetivo das emoções e o
mundo da natureza física. Conseqüentemente, desloca-se o centro de
gravitação, afastando-se das coisas divinas, dirigindo-se para o próprio
homem. Propõe situar o ideal da nova vida nos propósitos e atividades
específicas das disciplinas de humanidades, em oposição a escolástica.
Sendo a literatura dos gregos e romanos um meio para esta compreensão,
o aprendizado da língua e da literatura torna-se o problema pedagógico
mais importante.
PARA REFLETIR Nesse período, a Europa viveu muitas transformações no campo
das técnicas, das artes, da política, do conhecimento, da literatura, entre
outros. As características principais do renascentismo são a valorização
Embora ainda elitista e das potencialidades humanas por meio da experiência, o uso da razão, o
aristocrático, o humanismo desenvolvimento do espírito crítico, o antropocentrismo (homem como
antropocêntrico centro dos interesses de estudo) e racionalismo (a certeza de que tudo
renascentista, ao dirigir-se podia ser explicado pela ciência e a razão). Começam a surgir idéias onde
ao indivíduo, permite características do aprendiz se tornam mais relevantes.
entrever uma maior Feltre (séculos XIV e XV), propunha uma educação
participação do aprendiz na individualizada, o auto governo dos alunos, a emulação. Preocupava-se,
aprendizagem. acima de tudo, com a formação integral do homem.

546
História da Educação UAB/Unimontes

Uma legenda da Casa Giocosa "Vinde ó, meninos aqui se


instruem não se atormenta,", ou seja, aprender deveria ser ATIVIDADES
algo prazeroso e também voltado para a realidade, pois
assim falava:" Quero ensinar aos jovens a pensar, não a Analise as idéias dos
delirar''. Foi considerado um precursor da Escola Nova.
pensadores Vives, Feltre,
Já Juan Luís Vives (séculos XIV e XV), enfatiza as vantagens do Rabelais, Erasmo e
método indutivo, o valor da observação rigorosa e da coleta de Montaigne e identifique os
experiências. Do ponto de vista epistemológico, isto torna o conhecimento aspectos comuns.
um produto do homem, sendo, portanto, passível de crítica pelos seus
semelhantes. Ainda mais, a indução não possui a força lógica da dedução,
o que torna ainda mais fácil a implementação da crítica. Mais um tijolo
para a escola dos aprendizes ativos. Na mesma linha, Rabelais (séculos PARA REFLETIR
XIV e XV), faz os franceses rirem da educação medieval através do gigante
Gargântua. Ressalta a importância da natureza em oposição aos livros.
Claramente contra-hegemônico, criticou a escolástica, valorizando a “(...) O Emílio é um ensaio
cultura popular em resistência à cultura oficial dominante. Erasmo (séculos pedagógico sob a forma de
XV e XVI), pregador do humanismo, no seu Elogio da Loucura investiu romance e nele Rousseau
contra o obscurantismo da cultura medieval. A sua ênfase no livre arbítrio, procura traçar as linhas
embora ligada a uma visão religiosa, abre ao aprendiz uma senda que este gerais que deveriam ser
não ousava antever. seguidas com o objetivo de
fazer da criança um adulto
O ideal educativo de Montaigne é "O homem para o mundo. É
bom. Mais exatamente,
preciso educar o juízo do aluno". Reprova os que tratam alunos como
trata dos princípios para
sujeitos passivos, que recebem o conhecimento como idéias já feitas. Sua
evitar que a criança se
preocupação com um tipo de educação destinada a formar o juízo prático
torne má, já que o
dos jovens para as coisas da vida coincide com as preocupações educativas
pressuposto básico do autor
de nosso tempo.
é a crença na bondade
Quanto ao pensamento pedagógico o iluminismo produziu as
natural do homem. Outro
primeiras teorias sobre a psicologia e a ética e o filósofo John Locke pode
pressuposto de seu
ser considerado o primeiro iluminista. O Francês Voltaire foi o símbolo das
pensamento consiste em
luzes, atacou o absolutismo da igreja, exaltou a razão e defendeu o deísmo
atribuir à civilização a
algumas vezes de forma mística e irracional. Denis Diderot e Jean Lê Roud
responsabilidade pela
d' Alembert produziram o monumento intelectual do iluminismo: a
origem do mal.
Encyclopédia, que versava sobre o homem e suas ciências artes e ofícios.
Conseqüentemente, os
O iluminismo de Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778) aborda
objetivos da educação,
principalmente a relação entre a educação e a política. A partir de
para Rousseau, comportam
Rousseau a criança não mais foi considerada um adulto em miniatura.
dois aspectos: o
Segundo Rosseau, a criança nasce boa, sendo pervertida pelo adulto com
desenvolvimento das
sua falsa concepção da vida. É considerado o precursor da escola nova do
potencialidades naturais da
século XX, suas doutrinas influenciaram educadores como: Pestalozzi,
criança e seu afastamento
Hebart e Froebel. A novidade de Rousseau consiste na relação que ele
dos males sociais (...)
estabelece entre educação e sociedade (MANACORDA, 2004, p. 243).
(ARBOUSSE-BASIDE e
Rousseau classifica a educação em três fases: a infância, a
MACHADO, 1978, p. XVII-
adolescência e a maturidade. Defende a idéia que só na adolescência
XVIII).
deveria haver desenvolvimento científico mais amplo e estacionamento de
vida social.

547
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Pestalozzi (1746- 1827): criou o instituto para crianças órfãs da s


camadas populares na qual ministrava uma educação em contato com o
ambiente imediato. Defendia a reforma da sociedade através da
educação das classes populares. Fracassou no seu intento, no entanto suas
idéias são debatidas até hoje.
Hebart (1776 – 1841). É um dos pioneiros da psicologia científica.
Defende um ensino baseado em quatro passos formais:
Clareza na apresentação do conteúdo;
?
? Associação de um conteúdo com outro assimilado
anteriormente pelo aluno;
Ordenação e sistematização dos conteúdos;
?
Aplicação e sistematização conteúdos adquiridos. Aborda a
?
apresentação dos objetivos mediante os interesses dos alunos e segundo
as suas diferenças dos alunos e segundo as suas diferenças individuais,
por isso seriam múltiplos e variados.
Froebel (1782 – 1852) foi o criador dos jardins de infância.
Concebia o desenvolvimento da criança a partir de atividade espontânea,
valoriza a expressão corporal, o gesto, o desenho, o brinquedo, o canto e a
linguagem.

2.7 O SURGIMENTO DOS SISTEMAS ESCOLARES


Autora: Maria das Graças Mota Mourão

Os questionamentos em relação às concepções e ações da Igreja


Católica deram lugar a importantes transformações ao longo dos séculos
vindouros. Diante de tal cenário, a educação não ficará imune. De um
lado, as diferentes religiões e, em certos casos, a própria Igreja Católica,
continuarão considerando a educação como uma das mais importantes
maneiras de molar / formar o ser humano. De outro, no mundo leigo,
aqueles que defendem a necessidade de conhecer e conquistar o mundo e
a natureza baseados não apenas na fé, mas, sobretudo, no trabalho da
razão, do pensamento, defenderão, também a educação como um
momento privilegiado de expansão de seu ideário. (FARIA FILHO, 2002, p.
129)
Historicamente a maioria das transformações de caráter social
acontecem gradativamente e com a educação do período ocorre o
mesmo. A educação do período medieval que antecede a renascentista vai
aos poucos sendo desestruturada pelos desejos e necessidades que as
sociedades européias traziam com a criação de universidades e a
propagação da educação. Inicialmente destaca-se o humanismo,
movimento que procura afastar o misticismo da Idade Média em benefício
de uma educação racional e cientifica. A educação passou por
modificações profundas, no início da Idade Moderna, tanto na sua
concepção como nos meios usados para a consecução dos seus objetivos.

548
História da Educação UAB/Unimontes

As primeiras iniciativas nessa direção encontram-se nas cortes


DICAS
renascentistas, que se preocuparam em treinar seus membros para um
padrão de civilidade, de tal forma que seu comportamento fizesse parecer
natural o treinamento que adquiriu pela educação.
Para saber mais sobre René
Nos colégios humanísticos presentes sob forma elementar já no
Descartes acesse:
século XV, transformam-se, em sua forma típica entre 1530 e 1550, e
http://www.educ.fc.ul.pt/doc
espalham-se por toda Europa. Esses colégios introduziram uma ruptura
entes/opombo/seminario/de
geral na concepção de educação das faculdades de artes tradicionais
scartes
passando de um espaço individual e artesanal para um espaço coletivo.
Com o subseqüente controle dos estudos, supervisão dos estudantes,
administração centralizada, racionalização e planejamento dos estudos. E
também, sistematizavam o uso do tempo dos alunos com o planejamento ATIVIDADES
das atividades diárias, gradação sistemática dos estudos, divisão das
Faça um paralelo entre a
matérias em intervalos de tempo.
escola moderna e a escola
“(...)esta racionalização acarretava uma certa idéia de
trabalho, uma relação institucionalmente definida entre
atual
matéria e tempo de aprendizagem, entre o ato de ensinar e B GC
a verificação do que era aprendido”. Essa nova estrutura GLOSSÁRIO E
possibilitou uma abordagem educacional baseada em
exames, notas, classificação dos estudantes em
A F
inteligentes, preguiçosos, etc. (PELITAT 1989, p.23)
Contra Reforma:
Nesse cenário de mudanças, constituiu-se também uma nova A Contra-Reforma foi um
autoridade educacional, pois as estruturas corporativas foram substituídas movimento da Igreja
por hierarquias burocráticas de complexidade variável, fazendo com que Católica no século XVI que
os estudantes perdessem o direito de organizar os estudos de forma surge como resposta às
autônoma e os professores tornaram-se financeiramente dependentes, críticas dos humanistas e
supervisionados e passíveis de advertência (PETITAT, 1989, p.24). A de diversos membros da
educação neste período era apoiada e financiada pela burguesia, classe Igreja e de importantes
social em ascendência, e a ela também ministrado. Porém, a ela não Ordens Religiosas, tais
tinham acesso os denominados “gente comum”. Dentre os principais como Franciscanos,
filósofos de maior ascensão nesta época destacam-se Descartes, Dominicanos e Agostinhos,
Comenius, Loke e Bacon. que apelavam à
moralidade e ao regresso à
René Descartes, que escreveu o "Discurso do Método", que
pureza e austeridade
consistia em quatro grandes princípios, tais como: jamais tomar alguma
primitivas. Além disso,
decisão sem conhecê-la evidentemente como tal; dividir todas as
surge também como
dificuldades quantas vezes forem necessários antes de resolvê-las;
resposta ao avanço da
organizar os pensamentos começando pelos mais simples até os mais
Reforma Protestante
difíceis; e fazer uma revisão geral para não omitir nada.
iniciada por Martinho
Descartes distingue três tipos de idéias: inatas, adventícias e
Lutero.
factícias. As idéias adventícias são aquelas que nos chegam a partir dos
sentidos, as factícias são provenientes da nossa imaginação, uma
combinação de imagens fornecidas pelos sentidos e retidas na memória
cuja combinação nos permite representar (imaginar) coisas que nunca
vimos.
O nosso primeiro desejo é que todos os homens possam ser
educados plenamente para poderem alcançar a
humanidade plena. (João Amos Comenius).

549
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

B GC Nesse contexto, João Amos Comenius em 1638, na Suécia,


GLOSSÁRIO E
organiza um sistema de ensino para a escola do país, publicando a
A F Didática Magna considerada como método pedagógico para ensinar com
Humanismo: inicia-se no
rapidez. Dizia que a escola ao invés de ensinar palavras, deveria ensinar o
século XV com a idéia
conhecimento das coisas. Seu fundamento é o sistema dos colégios, que
renascentista da dignidade
inicialmente foram apenas de ordem religiosa (católicos e protestantes),
do homem como centro do
mas depois adquiriram caráter leigo.
Universo. O humanismo não
(...) Comenius tinha como pressuposto uma nova
separa homem e Natureza,
sistematização de todo o saber. Seu projeto foi voltado para
mas considera o homem um temas práticos, pela experimentação concreta das coisas e
ser natural diferente dos pelo uso mecânico e prático das ciências. Na prática
demais, manifestando essa didática a pesquisa e a valorização de todas as
metodologias que hoje são chamadas de ativas.
diferença como ser racional
(MANACORDA, 2004, p.221).
e livre, agente ético, político,
John Loke combateu o inatismo, dizendo que nada existe em
técnico e artístico.
nossa mente que não tenha origem em nossa mente.
Humanistas:
Francis Bacon divide as ciências e ainda diz que saber é poder
Os humanistas eram
sobre tudo. Francis Bacon, divide as ciências e ainda diz que saber é poder
homens letrados,
sobre tudo.
profissionais, normalmente
oriundos da burguesia ou do A educação escolar, a partir da era moderna, não pode ser
clero, que através de suas desligada da sociedade. Uma vez que essa sociedade tem a escola como
obras exerceram grande parte do mecanismo de sua reprodução, sendo reproduzida através da
influência sobre toda a escola. A economia e a educação andam juntas, e é através da escola que
sociedade que rejeitavam os se procurará manter ou implantar o tipo de sociedade que o regime político
valores e a maneira de ser impõe.
da Idade Média. Eles foram A sociedade moderna usa a escola como parte do mecanismo de
responsáveis por conduzir sua reprodução. Através da escola ocorre a manutenção do tipo de
modificações nos métodos sociedade imposto pelo regime político se utilizando, para isso, os conteú-
de ensino, desenvolvendo a dos fragmentados e distribuídos entre as diversas disciplinas que compõem
análise e a crítica na a estrutura curricular dos diversos níveis
investigação científica. e modalidades de ensino.
Reforma protestante: As mudanças sociais ocorridas
consistiu num movimento entre os séculos XVI e XVII conduziram
religioso de renovação da à queda do modo de produção feudal.
Igreja, iniciado no séc. XVI Na educação ocorreram muitas
por Martinho Lutero, monge mudanças: o que era ensinado foi
alemão pertencente à
considerado obsoleto. Alguns filósofos
Ordem dos Frades
fizeram grandes descobertas na área da
Agostinhos e que conduziu à
educação, dando um novo ordenamen-
cisão da Igreja Cristã
to às ciências. Figura 17: Tirinha
ocidental que passou a estar
dividida em Igreja Católica
Romana, por um lado, e em
várias igrejas reformadas ou
protestantes (Igreja
Luterana, Igreja Calvinista e
Igreja Anglicana), por outro.

550
História da Educação UAB/Unimontes

B GC
GLOSSÁRIO E
REFERÊNCIAS A F
Renascimento: foi um
ARANHA, Maria Lúcia Arruda. História da Educação. São Paulo: movimento cultural surgido
Moderna, 1990. em Itália no século XV e
MANACORDA, M. A. História da Educação: da antiguidade aos nossos que, recusando as
dias. São Paulo: Cortez/Editores Associados, 1989. concepções teocêntricas
medievais passa a colocar
PETITAT, A. Produção da escola/produção da sociedade: análise sócio- o homem no centro de
histórica de alguns momentos decisivos da evolução escolar no ocidente. todos os interesses e o seu
Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. bem-estar passa a
ALTMANN, Walter. Lutero e Libertação. São Paulo: Editora Ática, 1994. constituir a principal
preocupação. A principal
CAMBI, Franco. O século XV e a Renovação Educativa; História da característica filosófica do
Educação.Tradução de Álvaro Lorencini – São Paulo,Editora UNESP, 1999. Renascimento é assim a
DOWNS, Robert B. Fundamentos do pensamento moderno. Rio de passagem do Teocentrismo
Janeiro: Biblioteca do Exército/Renes, 1969. v. 76. (Coleção General que considera Deus como o
Benício). centro do Universo para o
Antropocentrismo que
FARIA FILHO, Luciano Mendes. História da Educação. In: Veredas – coloca o Homem como o
Formação superior de professores: módulo 3 – volume 1 / SEE-MG; centro do Universo.
organizadoras: Maria Umbelina Caiafa Salgado; Glaura Vasques de
Miranda – Belo Horizonte: SEE-MG, 2002.

MANACORDA, Mário Alighiero. História da Educação - da Antiguidade


aos Nossos Dias - 12ª edição.

MONROE, Paulo. História da Educação. São Paulo: Companhia Editora


Nacional,1985.v.32.

NUNES, Ruy A da C. História da educação no Renascimento. São Paulo:


ATIVIDADES
EPU, 1980. 1) Estabeleça a diferença
entre a reforma e a
OLSON, Roger E. História da teologia cristã: 2000 anos de tradição e
Contra-Reforma.
reformas. Tradução Gordon Chown. São Paulo: Vida, 2001.
2) Descreva as principais
PETTA, Nicola Luiza de. História - Uma Abordagem Integrada. 1ª Edição. modificações ocorridas no
São Paulo: Moderna,1999. período renascentista no
PILETTI, Nelson. História da Educação. São Paulo: Ática, 1990. campo cultural, científico e
artístico.
Sites 3) Cite as principais
GADOTTI, Moacir: História das idéias pedagógicas. Editora Ática, 1998 características do
http://www.paulofr eir e.or g/Moacir_Gadotti/gadotti_livr os.htm iluminismo e sua
http://www.casadehistoria.com.br/cont_05_01.htm O renascimento contribuição no campo
Cultural. educacional.
4) Destaque os aspectos
http://www.panaceadesign.com.br/downloads/transicoesmedievais.pdf
mais relevantes dos
sistemas escolares.

551
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

LIENHARD, Marc. A Reforma. A rebeldia de Lutero: por Deus, contra a


Igreja. História Viva, São Paulo, n. 22, p. 66-72, ago. 2005. In.:
http://paginas.terra.com.br/servicos/lbiagioni/leonardo_da_vinci.htm

Racionalismo inatista. In.:

http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/seminario/descartes

VÍDEOS SUGERIDOS PARA DEBATE

Lancelot – O Primeiro Cavaleiro


Diretor: Jerry Zucker
Nacionalidade: EUA – 1995
Duração: 133 min
Versão livre do clássico triângulo amoroso envolvendo o lendário rei Artur,
sua amada Lady Guinevere e seu primeiro cavaleiro, Lancelot. O filme
aborda a existência apaixonante, mas fictícia, dos heróis da Távola
Redonda, exaltados nos romances de cavalaria do final do século XII e
começo do século XIII. É possível observar também a política de
vassalagem da sociedade feudal.

Lutero (Luther), Alemanha, 2003, 121 min., direção de Eric Till,


Casablanca Filmes; Título Original: Luther; Gênero: Aventura, Drama,
Épico; Diretor: Eric Till; Duração: 12; Lançamento: Fevereiro/2005
Elenco: Bruno Ganz, Uwe Ochsenknecht, Joseph Fiennes, Alfred Molina,
Claire Cox, Sir Peter Ustinov; Dublado e Legendado
Após quase ser atingido por um raio, Martinho Lutero acreditou ter
recebido um chamado e se juntou ao Monastério. Ainda jovem e
admirado, logo se vê atormentado pelas práticas da Igreja Católica da
época. As tensões se intensificam quando prega suas 95 teses na porta da
Igreja! Obrigado a se redimir publicamente, se recusa a negar os seus
escritos até que a Igreja Católica consiga provar que suas palavras
contradizem a Bíblica. Preso e excomungado, foge. Mesmo vivendo como
um criminoso numa aventura emocionante, mantém sua fé e luta para que
todas as pessoas tenham acesso a Deus.

O Nome da Rosa
Diretor: Jean Jacques Annaud; Data: 1986; Inspirado na obra homônima
de Umberto Eco. Na península Itálica medieval, um monge investiga uma
sucessão de crimes em um mosteiro benetitino. A partir dessa trama, o
filme mostra as diversas posições e correntes de pensamento da Igreja às
vésperas do Renascimento (século XIV)

552
História da Educação UAB/Unimontes

Ladyhawke, o Feitiço de Áquila


Diretor: Richard Donner; Data: 1985; História de amor e magia,
ambientada na Europa medieval, numa trama que opõem um nobre
cavalheiro e um bispo corrupto.

Agonia e êxtase
Diretor: Carol Reed; Nacionalidade: EUA – 1960; Duração: 140 min
Narra a história do conflituoso relacionamento entre o grande pintor do
renascimento cultural, Michelangelo, e seu patrocinador, o Papa Júlio II.
Produção meticulosa e envolvente, com a preocupação de mostrar as
características do período de transição do feudalismo para o capitalismo.

553
3
UNIDADE 3
BRASIL: A EDUCAÇÃO NO PERÍODO COLONIAL

3.1 INTRODUÇÃO

Esta unidade é intitulada “BRASIL: A EDUCAÇÃO NO PERÍODO


COLONIAL”. Nela temos por objetivo compreender a construção do
pensamento pedagógico brasileiro, do descobrimento aos dias atuais;
reconhecer a diferentes formas educacionais e legais na história do Brasil e
identificar características da educação jesuítica e pombalina, quando da
colonização deste país chamado Brasil.
Buscaremos nesta unidade tratar da educação colonial
destacando o período que contou com a hegemonia dos jesuítas (1549 -
1759), uma vez que ele retrata duzentos e dez anos da história da
educação brasileira.
Iniciaremos as discussões apresentando um pequeno contexto
histórico, a seguir buscaremos discutir sobre os conflitos entre as diferentes
posturas de ensino neste período finalizando com uma reflexão sobre as
implicações deste momento histórico e sua relação com a educação
contemporânea.
Para melhor compreensão deste estudo dividiremos o período
colonial em três fases:
1ª fase (1549 – 1759): a do predomínio dos jesuítas a qual
denominamos de fase da implementação do ensino religioso e se estende
até a expulsão dos jesuítas.
2ª fase (1759 – 1808): a das reformas do Marquês de Pombal a
qual denominamos de período pombalino que se inicia após a expulsão
dos jesuítas do Brasil e termina com a transferência da família real para o
Rio de Janeiro.
3ª fase: (1808 – 1821): a do período em que D. João VI, então Rei
de Portugal, trouxe a Côrte para o Brasil.
Faremos este estudo seguindo, tanto quanto possível, os debates e
estudos empreendidos pelos autores apresentados como referência básica
acrescidos de outros autores apresentados como referências
complementares.

Objetivos desta unidade:


? Caracterizar os aspectos políticos econômicos, sócio-culturais
e ideológicos da realidade educacional nos diferentes contextos históricos
por que passa a sociedade brasileira;
? Identificar os valores, idéias e organização da educação
brasileira nos diversos períodos;
? Destacar as políticas educacionais que permeiam a história da
educação brasileira definindo o papel da escola, do professor e do aluno,

554
História da Educação UAB/Unimontes

assim como o enfoque dos conteúdos e da avaliação nos diferentes


períodos da educação brasileira.

3.2 PARA UM COMEÇO DE HISTÓRIA

Fonte: img412.imageshack.us/.../5783/
Para melhor compreender nossa
familiarealbm0.jpg história educacional o convidamos a rever
alguns fatos discutidos anteriormente.
No período compreendido entre os PARA REFLETIR
séculos XV e XVI surge a Renascença que
recebe esse nome por sugerir a retomada
dos valores greco-romanos. Segundo Gramsci
Este período se destaca como o hegemonia é a prática
Figura 18
período das grandes invenções e das grandes dominante, no seio das
viagens marítimas que ocorriam motivadas pela necessidade de ampliação sociedades capitalistas
nos negócios da burguesia e pela busca de enriquecimento da classe avançadas, visando suscitar
burguesa. o conhecimento ativo dos
A expansão marítimo-comercial européia dos séculos XV e XVI foi dominados, através da
um dos mais grandiosos acontecimentos da época moderna. Como elaboração de uma função
resultado dessa expansão, continentes inteiros foram conquistados e ideológica particular que
explorados pelos europeus. visa a constituição da
Vários fatores contribuíram para a expansão marítimo-comercial ficção de interesse geral. È
neste período entre eles podemos destacar: o exercício não coercivo do
? a crise econômica que perturbava a maioria das nações domínio e da dominação
representada pela fome e muitas doenças; de classe, nomeada pela
? a busca de uma nova rota para o comércio do Oriente com o hegemonia ideológica.
objetivo de abastecer, com maiores lucros, o comércio de especiarias Porque a dominação de
(cravo, canela, pimenta, noz-moscada, gengibre) e de artigos de luxo classe pode fazer adotar os
(porcelanas, tecidos de seda, marfim, perfumes); seus valores e suas
convicções pela sociedade
? interesses dos Estados Nacionais que, com governos
restante através de
centralizados e objetivos mercantis impulsionaram a expansão marítima e
instâncias de socialização
?
o desejo dos reis de aumentar o seu poder.
sem ter que recorrer à força
ou à repressão.
Havia também, neste período, um consenso entre a nobreza e a
Para Antônio Gramsci, o
burguesia no que diz respeito ao anseio de crescimento e hegemonia, pois
conceito de hegemonia
a nobreza desejava manter os seus privilégios e a burguesia queria
caracteriza a liderança
aumentar seus lucros.
cultural -ideológica de uma
Os ideais da nobreza e da burguesia podem ser bem retratados na
classe sobre as outras.
descrição que Gramsci faz sobre a hegemonia onde este afirma que “uma
(Coutinho, Carlos Nelson.
massa humana não se distingue e não se torna independente por si, sem
Gramsci. Porto Alegre:
organizar-se; (...) e não existe organização sem intelectuais, isto é, sem
LP&M, 1981, p 94-96)
organizadores e dirigentes...” (GRAMSCI, 1989, p. 21).
Vemos, porém que a expansão marítimo-comercial surgiu como
uma excelente opção para atender a todos esses interesses. Associada as

555
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

questões econômicas aparece o fato de que os líderes políticos justificavam


a necessidade de expansão territorial, alegando ser necessário propagar a
fé cristã e converter os povos não-cristãos de todo o mundo.
Nesta unidade chamamos a atenção para um aspecto inicial
desta questão, o problema metodológico idealizado pelos jesuítas, pois
estudar a ação pedagógica dos jesuítas implica sempre no enfrentamento
de um problema teórico-metodológico de grande importância,
considerando que a hegemonia exercida por estes na educação durante o
período colonial no Brasil é um fato histórico.

3.3 PERÍODO JESUÍTICO (1549 - 1759)

DICAS Chamamos de período Jesuítico o período educacional que


compreende desde a chegada dos jesuítas no Brasil até a sua expulsão
deste país.
Atendendo aos ideais iluministas de difusão do saber, aparecem
Inácio de Loyola obtém a
as instituições escolares, pois no ideal iluminista a educação deveria ser
aprovação do Papa Paulo
realizada em uma instituição diferente da instituição família e da
III para a Companhia de
instituição igreja que já o fazia a muito tempo, pois “a instrução em si não
Jesus, em 1540.
representava grande coisa na construção da sociedade nascente”
(ROMANELLI, 1997, p. 34).
Poderiam os jesuítas ser vistos como os inventores do começo para
a história da educação no Brasil? O ensino pretendido pelas classes
dominantes destinava a formar uma cultura básica, diferente da oferecida
pela família, livre e desinteressada, sem uma preocupação profissional,
uma educação igual, uniforme e orientada a sua extensão. Os jesuítas
surgem inclinados a satisfazer este ideal europeu oferecendo uma
educação clássica aos elementos da classe dominante.
Podemos dizer que neste período houve grande influência dos
iluministas em diversos movimentos surgidos com objetivos revolucionários
e reformadores.
Entre esses movimentos estão compreendidos a expansão e a
defesa da escola enquanto instituição educadora da sociedade que
poderia atingir um grande número de pessoas ao mesmo tempo.
Neste contexto revolucionário o rei de Portugal, Dom João III,
convencido da necessidade de envolver a Monarquia para ocupação e
defesa da nova terra, o Brasil, institui para o Brasil um governo geral,
nomeando para essa função Tomé de Sousa que se tornou o primeiro
governador geral do Brasil.
Foi neste momento histórico, no contexto da reforma e contra-
reforma da igreja católica que tendo como objetivo principal combater a
expansão do protestantismo, a igreja Católica incentivou a criação de
ordens religiosas em todo o mundo.
É neste momento histórico que surge a ordem dos jesuítas
comandada por Inácio de Loyola no ano de 1534.

556
História da Educação UAB/Unimontes

A Companhia de Jesus foi fundada para contrapor ao avanço da


PARA REFLETIR
Reforma protestante, através do trabalho educativo e da ação missionária.
Em março de 1549 juntamente com o primeiro governador-geral,
Tomé de Souza chegaram os primeiros jesuítas ao território brasileiro No Brasil os jesuítas
comandados pelo Padre Manoel de Nóbrega, que tinham como missão integraram-se desde o
principal salvar as almas para a Igreja e ainda o de aumentar os domínios início à política
do reino. colonizadora do rei de
Os jesuítas vieram para o Brasil a serviço da coroa portuguesa que Portugal e foram os
tinha o interesse de explorar o território brasileiro e para isso utilizaram a responsáveis quase
educação como veiculo de dominação. exclusivos pela educação
Tão logo chegaram ao Brasil, os jesuítas criam a primeira escola durante longos anos.
elementar, era assim chamada porque era destinada apenas ao ensino da
leitura e da escrita, ou seja, das primeiras letras como era chamada.
Através dos registros históricos da época temos que a primeira
escola elementar brasileira foi edificada na cidade de Salvador e teve como
mestre o jesuíta Irmão Vicente Rodrigues.
Vimos que a chegada dos padres jesuítas no Brasil marca o início
da história educacional desse país. Observamos também que este fato
inaugura a primeira fase e a mais longa e importante de nossa história
educacional, devido a seus impactos na educação nacional.
Diante das discussões acima podemos inferir que a educação
brasileira teve início com o fim do regime de capitanias no Brasil, fato que
ocorreu no ano de 1549 com a chegada do primeiro governador geral que
traz em sua companhia um grupo de padres jesuítas.

3.4 A INFLUÊNCIA JESUÍTICA NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

B GC
Começaremos essa discussão apresentando a proposta de ensino E
GLOSSÁRIO
criada pelo Padre Manoel da Nóbrega, líder dos jesuítas aqui no Brasil. A F
No Brasil o Padre Manoel da Nóbrega forjou um plano de ensino Canto orfeônico:
adaptado ao nosso país. A história do canto em
A proposta de estudo de Nóbrega se fundamentava: conjunto tem suas raízes
?
no ensino do Português; intimamente associadas à
?
na doutrina cristã e história da música e da
?
a escola de ler e escrever. própria humanidade.
Esta modalidade de ensino era chamada de ensino básico. As primeiras melodias
Após a etapa do ensino básico recomendado pelos jesuítas o foram proferidas durante o
aluno ingressava no estudo da música instrumental e do canto orfeônico. canto coletivo de tribos
Após esta etapa de estudo o aluno se encontrava pronto para primitivas em rituais
prosseguir seus estudos de gramática, completando depois sua formação religiosos para clemência e
nas Universidades Européias. agradecimento aos deuses.
Os alunos que não tinham pretensão ou não tinham condições
poderiam finalizar seus estudos, com o aprendizado de uma profissão
ligada a agricultura.

557
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Aqui no Brasil as escolas jesuítas não se limitaram ao ensino das


primeiras letras; além do curso elementar, mantinham cursos de Letras e
Filosofia, considerados secundários, e o curso de Teologia e Ciências
Sagradas, de nível superior, para formação de sacerdotes.
DICAS No curso de Letras estudava-se Gramática Latina, Humanidades
e Retórica; e no curso de Filosofia estudava-se Lógica, Metafísica, Moral,
Matemática e Ciências Físicas e Naturais.
O canto orfeônico foi
instrumento, de alcançar a Plano de estudo de Nóbrega
parte integrativa e afetiva
dos alunos, ao conquistar
atenção e emoção.

O jesuíta Irmão Vicente foi o primeiro professor nos moldes


europeus que durante mais de 50 anos dedicou-se ao ensino e a
propagação da fé religiosa no Brasil, porém, o noviço José de Anchieta, foi
o mais conhecido e talvez o mais atuante.
Anchieta tornou-se mestre escola do Colégio de Piratininga; foi
missionário em São Vicente, missionário em Piratininga, Rio de Janeiro e
Espírito Santo; Provincial da Companhia de Jesus de 1579 a 1586 e, reitor
do Colégio do Espírito Santo.
Isso mesmo!
Com o movimento da reforma as novas igrejas que se formavam
defendiam a necessidade de que seus fiéis deveriam aprender a ler para
que pudessem ter contato direto com as leituras bíblicas e por sua vez a
igreja católica resolveu adotar a educação como meio de impedir o avanço
das novas crenças, pois viam na leitura uma forma de manter viva a fé
católica de seus fiéis.
No Brasil os jesuítas se dedicaram principalmente a pregação da
fé católica e ao trabalho educativo.
A escola de primeiras letras aqui no Brasil foi um dos instrumentos
utilizados pelos jesuítas para alcance dos objetivos que era a difusão e a
conservação da fé católica entre os senhores de engenho, entre os colonos,
entre os negros, escravos e entre os índios,
Porém a atuação jesuítica no Brasil que contribuiu com a
educação neste período teve um caráter ambíguo, pois, os jesuítas
educavam e instruíam os filhos da elite colonial ao passo que catequizava
os índios.

558
História da Educação UAB/Unimontes

A escolarização proposta e desenvolvida pelos jesuítas aqui no


DICAS
Brasil voltava-se mais para exposição e divulgação da doutrina católica, ou
seja, a catequese, tendo como texto de leitura os textos da bíblia sagrada,
sendo estes também considerados o suporte para as práticas educativas
orais. José de Anchieta, nascido
Vimos nos registros históricos que a na Ilha de Tenerife e
Fonte: http://www.bairrodocatete.com.br/
padrejosedeanchieta.html
tarefa dos jesuítas nesta nova terra não foi fácil, falecido na cidade de
pois os povos indígenas aqui encontrados, Reritiba, atual Anchieta, no
principalmente as crianças não se submeteram litoral sul do Estado do
com facilidade a cultura proposta pela Espírito Santo, em 1597.
companhia de Jesus.
Segundo Aranha (1996) uma das
características mais criticada do ensino proposto
pelos jesuítas foi a separação entre a escola e a
vida, pois os jesuítas se mostravam
Figura 19: Padre José de excessivamente conservadores, mantendo-se
Anchieta catequizando indiferentes às controvérsias do pensamento
os índios brasileiros
filosófico moderno,ou seja não buscavam relação DICAS
do que ensinavam com as questões cotidianas.
Podemos observar que a ação escolarizadora dos jesuítas foi
concretizada, aqui no Brasil, pela criação dos colégios, que se
www.cervantesvirtual.com
direcionavam principalmente à formação da elite dirigente colonial.
No Brasil os jesuítas se
Vimos também que os jesuítas menosprezavam o estudo da
dedicaram principalmente
história, da geografia e da matemática, pois os jesuítas consideravam estas
a pregação da fé católica.
disciplinas como ciência vã.
A forma de ensinar dos jesuítas, ou seja, a metodologia adotada
por eles no desenvolvimento e estudos dos textos não permitia que os
alunos desenvolvessem o espírito crítico.
O ensino universalista e muito formal desenvolvido pelos jesuítas
ATIVIDADES
aqui no Brasil, distanciava os alunos da vida prática, porque era voltado
para a formação do homem erudito. Os jesuítas cultuavam as belas-letras Vá ao ambiente de
e o saber por saber. aprendizagem, acesse o
As escolas jesuítas eram regulamentadas por um documento, FÓRUM que discute sobre
escrito por Inácio de Loiola, o Ratio atque Instituto Studiorum, chamado as conseqüências da
abreviadamente de Ratio Studiorum. educação jesuítica no
Brasil.
Plano de estudo de ratio Você deverá registrar a sua
análise sobre essa questão.
Curso de humanidade
Não se esqueça de
acompanhar o raciocínio
Curso de Filosofia das questões postadas
Curso de Teologia
pelos seus colegas de
turma.
Viagem à Europa

559
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Isto mesmo!
PARA REFLETIR
Observamos através dos relatos históricos que os jesuítas
educavam e instruíam os filhos da elite colonial ao mesmo tempo em que
As escolas jesuítas não se catequizava os índios.
limitaram ao ensino das A ação educacional dos jesuítas sobre os índios se resumia à
primeiras letras; além do cristianização e na sua pacificação para que estes se tornassem dóceis
curso elementar, facilitando o seu engajamento no trabalho agrícola.
mantinham cursos de Com os filhos dos colonos a ação dos jesuítas era diferente, pois
Letras e Filosofia, estes se dedicavam oferecendo aos aprendizes uma educação mais
considerados secundários, ampla, ultrapassando os limites da educação elementar, ou seja, do ler e
e o curso de Teologia e escrever.
Ciências Sagradas, de nível Isso mesmo!
superior, para formação de
Vimos que nesse período a nobreza buscava acentuar ainda mais
sacerdotes. No curso de
o seu poder político e econômico e a nova classe, burguesia busca
Letras estudava-se
aumentar seus lucros.
Gramática Latina,
Vimos também que a expansão marítimo-comercial surgiu como
Humanidades e Retórica; e
uma excelente opção para atender a todos esses interesses.
no curso de Filosofia
A ação jesuítica então surgiu como uma necessidade da
estudava-se Lógica,
manutenção e da propagação da fé cristã e ainda com o propósito de
Metafísica, Moral,
converter os povos não-cristãos de todo o mundo e dessa forma a ação
Matemática e Ciências
catequética dos jesuítas contribuiu para o alcance dessas metas.
Físicas e Naturais.
É preciso observar também que no período jesuítico a educação
primária, aqui no Brasil como em toda a Europa na sua maior parte, ficava
DICAS aos cuidados das famílias, ou seja, as famílias é quem se responsabilizava
pela iniciação da escolaridade da criança.
Porém as famílias mais afortunadas optavam por pagar um
Assista ao filme: preceptor ou por delegar o ensino de suas crianças aos cuidados de um
A MISSÃO. parente mais letrado.
Este filme vai levar você a Isso mesmo!
uma viagem no tempo. Os jesuítas vieram para o Brasil com o principal objetivo de
Ele transportará você para desenvolver o trabalho missionário e pedagógico, tinham como finalidade
o Brasil recém - descoberto, converter o gentil e impedir que os colonos que aqui viviam se desviassem
pois aborda: da fé católica.
- as finalidades da Observa-se que a educação jesuítica assumiu, no Brasil, também
colonização; um papel de agente colonizador.
- o papel da catequese no Podemos também concluir que a educação desenvolvida pelos
processo civilizatório; jesuítas aqui no Brasil, estava voltada a atender aos brancos não muito
pobres e na idade juvenil, ou seja, atender aos jovens já basicamente
- o choque cultural entre
instruídos.
povos com usos e costumes
diferentes; Iniciando na cidade de Salvador a obra jesuítica estendeu-se para
o Sul e, no ano de 1570, vinte e um anos após sua chegada, já era
- e ainda retrata a aliança
composta por cinco escolas de instrução elementar (Porto Seguro, Ilhéus,
e o confronto entre as
São Vicente, Espírito Santo e São Paulo de Piratininga) e três colégios (Rio
posições da igreja e dos
de Janeiro, Pernambuco e Bahia).
donos de terras.

560
História da Educação UAB/Unimontes

No ano de 1759 a educação jesuítica não convinha aos interesses B GC


GLOSSÁRIO E
comerciais emanados por Pombal, pois os jesuítas através da escolarização
tinham por objetivo principal servir aos interesses da fé e o marques de
A F
Enciclopedismo
Pombal, então primeiro ministro de Portugal pensava em organizar a
escola para servir aos interesses do Estado. Enciclopedismo foi um
movimento filosófico-
A ação educativa, que havia sido utilizada pelos jesuítas apenas
cultural desmembrado do
como meio de submissão e domínio político, agora era vista como
ilustracionismo,
responsável pelo descompasso entre o governo português e o resto da
desenvolvido na França e
Europa. O Marques de Pombal, então ministro de Portugal, “cuja linha de
que buscava catalogar todo
pensamento estava estritamente vinculada ao enciclopedismo”
o conhecimento humano a
(ROMANELLI, 1997, p. 36). “Influenciado pelas idéias dos enciclopedistas
partir dos novos princípios
franceses, Pombal pretendia modernizar o ensino, liberando-o da
da razão. Foi impulsionado
estreiteza e do obscurantismo que imprimiram os jesuítas” (WEREBE,
por Voltaire, Diderot e
1967, p. 26). Nesse contexto, Pombal expulsou a Companhia de Jesus do
d'Alembert, alem de
reino e de seus domínios.
Montesquieu, Rousseau e
Com a expulsão dos jesuítas a educação brasileira, vivenciou uma
Buffon.
grande ruptura histórica num processo já implantado e consolidado como
modelo educacional, passou por momentos de crise, o que acabou
provocando um retrocesso no já defasado sistema educacional imperial.
Vimos que com a expulsão dos jesuítas deixam de existir aqui no DICAS
Brasil, dezoito estabelecimentos de ensino secundário e cerca de 25
escolas de ler e escrever.
Em substituição as escolas dirigidas pelos jesuítas foram
Sebastião José de
instituídas, por Pombal, algumas aulas régias, sem nenhuma ordenação
Carvalho, o marquês de
entre elas.
Pombal, então primeiro-
Diante dessas mudanças instituídas por Pombal várias foram as
ministro de Portugal.
conseqüências trazidas para a educação brasileira, entre estas podemos
citar a dificuldade de encontrar profissional preparado para desenvolver o
ensino que rompesse com o ideal da educação jesuítica, pois boa parte dos
professores aqui existente possuía formação jesuítica.
Ao longo dos séculos XVI e XVII e até meados do século XVIII, foi
notável a expansão da educação no Brasil, tendo por base os colégios
subsidiados pela Coroa Portuguesa e construídos em locais diversos como
Salvador, são Luís, São Tiago, Rio de Janeiro e São Paulo.

3.5 A EDUCAÇÃO NO BRASIL NA ERA POMBALINA (1760-1808)


ATIVIDADES
Pombal pensava em reerguer Portugal da decadência que se
encontrava diante de outras potências européias da época e apostou na Podemos dizer que duas
educação como meio para solução desta crise. características marcaram o
A coroa nomeia professores e estabelece planos de estudo e ensino no período imperial.
inspeção. O ensino é modificado para sistema de aulas régias de
disciplinas isoladas. Nesse sistema foi elaborado um mapa com indicação Vá ao FÓRUM e comente
das cidades tipos de aula, e número de professores necessários tendo sido sobre elas:

561
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

criadas 17 aulas de ler e escrever, distribuídas entre Rio de Janeiro, Bahia,


Pernambuco, Minas, São Paulo, Pará e Maranhão.
Cada aula régia era autônoma e isolada, com professor único e
PARA REFLETIR uma não se articulava com as outras. As aulas régias eram avulsas e se
destinavam ao estudo de Latim, Grego, Filosofia e Retórica. Nas aulas
régias os próprios professores é quem organizavam seus locais de trabalho.
As aulas régias
Somente após colocar sua classe para funcionar os professores
compreendiam os estudos
requisitava do governo o pagamento pelo trabalho do ensino.
das humanidades, sendo
pertencentes ao Estado e A situação da educação brasileira somente sofreu mudanças com
não mais restritas à Igreja, a chegada da família real no ano de 1808.
foi a primeira forma do Com a vinda da Côrte portuguesa para o Brasil no ano de 1808, o
sistema de ensino público ensino brasileiro passou por algumas modificações. Pois era preciso
no Brasil. adaptar-se para atender aos cortesãos que chegaram em grande número.

3.5.1 As reformas pombalinas da instrução pública no Brasil colônia

PARA REFLETIR
Voltando um pouco na história podemos dizer que no princípio do
século XIX (anos 1800...), com a expulsão dos jesuítas a educação
O surgimento das aulas brasileira ficou reduzida a praticamente nada.
régias acabava com
Persistia o panorama do analfabetismo e do ensino precário que
qualquer possibilidade do
foi agravado pela democracia da reforma pombalina.
aluno realizar um curso
Neste período a educação brasileira ficou a deriva e esta situação
organicamente articulado,
se arrastou por um longo período, durante o Brasil colônia, ocasião em que
obrigando-o, a montar um
aumentou a distância entre os letrados e a maioria da população que era
curso próprio, o “seu”
analfabeta.
curso.

3.6 A EDUCAÇÃO BRASILEIRA NO BRASIL IMPERIAL

ATIVIDADES
Em 1808 com a chegada da família real portuguesa a estrutura
educacional Brasileira passa por modificações para adequar-se as
Vá ao Fórum e comente necessidades da Corte que aqui se instala.
esta afirmativa dando sua
A primeira medida que D. João VI toma ao chegar ao Brasil foi o de
opinião a este respeito,
instituir o ensino superior não-teológico visando atender essa demanda.
aproveite para refletir sobre
Porém em 1808 surgem cursos profissionalizantes em nível médio
esta possibilidade em
e em nível superior, pois a primeira medida tomada por D. João VI, assim
nossos dias.
que chegou ao Brasil, no que diz respeito a educação, foi criar escolas de
nível superior.
Observa-se que a educação brasileira desde os seus primórdios
busca atender as classes dominantes e aos interesses políticos do governo,
ATIVIDADES
pois D João VI ao criar as primeira escolas de ensino superior visava formar
Qual foi a principal oficiais do exército e da marinha, com o objetivo de defender a colônia.
conseqüência da expulsão Foram então criadas no Brasil Império universidades para formar
dos jesuítas do Brasil, no engenheiros, médicos e militares,
terreno da educação? Foi no ano de 1808 que, na Bahia que implantou-se o Curso de

562
História da Educação UAB/Unimontes

Cirurgia e no mesmo ano na cidade do Rio de Janeiro o Curso de Cirurgia e


Anatomia.
Ainda no ano de 1808, na cidade do Rio de Janeiro, implanta-se o
Curso de Medicina.
Tão logo a corte se instala no Brasil toma uma série de medidas
visando criar as condições para o exercício do governo.
Cria, assim, a imprensa Régia, a Biblioteca Nacional e o Jardim
Botânico.
No que se refere à educação e à cultura de uma forma mais geral,
um momento marcante foi a transferência da família real para o Brasil.

3.6.1 Estrutura da educação no período imperial


PARA REFLETIR
No período imperial o ensino no Brasil foi estruturado em três
níveis:
Analisando a estrutura da educação no período imperial temos A Constituição de 1824,
que: outorgada pela Assembléia
Constituinte, dizia, no seu
?
o ensino primário destinava-se a escola de ler e escrever;
artigo 179, que a instrução
?
o ensino secundário manteve-se dentro do mesmo esquema
primária era gratuita a
das “aulas régias”, mas ganhou uma divisão em disciplinas e
todos os cidadãos.
?
o ensino superior não sofreu alterações.
Somente no século XIX no Brasil se concretiza o ideal nacional da
educação pública, isto se dá com a intervenção gradativa do Estado para B GC
estabelecer a escola elementar universal, leiga, gratuita e obrigatória. GLOSSÁRIO E
Neste século enfatiza-se a relação entre educação e bem-estar A F
social.
O Método Lancasteriano
Na carta que foi outorgada em de 1824, só há referências quanto
propunha um sistema de
à construção de escolas de primeiras letras, assegurado pela lei, em 1827.
ensino mútuo, ou seja, um
A Constituição de 1824 foi a primeira e única lei geral sobre
sistema de ensino baseado
instrução primária no Brasil durante o período imperial.
em monitoria.
Outras mudanças foram observadas no período imperial entre
Nesta proposta o ensino
elas as propostas na Lei de 15 de outubro de 1827.
acontecia por “ajuda
Podemos afirmar que a única lei estabelecida quanto ao ensino
mútua” entre alunos mais
elementar no período de 1827 a 1946, foi a Lei de 15 de outubro de 1827,
adiantados e alunos menos
nesta lei:
adiantados.
?
previa-se a educação como dever do Estado;
falava-se da distribuição racional do ensino por todo o território
?
nacional, mas contemplava apenas as escolas de primeiras letras;
?
propunha-se o uso do método Lancasteriano nas escolas.

Isso mesmo!

563
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

O método Lancasterianos traz traços que observamos até hoje em


DICAS nossas escolas, isto é está presente no sistema de monitoria muito
utilizados pelos professores do ensino fundamental em sala de aula.
Observamos através de uma reflexão histórica que na Lei de 15 de
1824 outubro de 1827, o ensino era bastante limitado, quanto ao grau: (apenas
visite o site: um – primeiro grau); quanto aos objetivos: (alfabetização - primeiras
(www.ufsm.br/direito/artigos letras).
/constitucional/carta-
1824.htm)
3.6.2 Retrospectiva: história da educação brasileira no período imperial
(1822 - 1888)

PARA REFLETIR 1822 O Decreto de 1o de março criava no Rio de Janeiro uma


escola baseada no método lancasteriano ou de ensino mútuo. Ou seja,
Segundo Maria Lúcia de somente um professor para cada escola.
Arruda Aranha (2006) Em 1823, na tentativa de se suprir a falta de professores institui-se
eram muitas as o Método Lancaster, ou do "ensino mútuo", onde um aluno treinado
contradições sociais e (decurião) ensina um grupo de dez alunos (decúria) sob a rígida vigilância
políticas de um país cuja de um inspetor.
economia consolidava o Em 1824 é outorgada a primeira Constituição brasileira. O Art.
modelo agrário-comercial e 179 desta Lei Magna dizia que a "instrução primária e gratuita para todos
fazia as primeiras tentativas os cidadãos".
de industrialização. O quadro geral da instrução pública no período imperial,
Debatiam-se os segmentos enriquecidos com a criação de cursos superiores incentivados
renovadores e as forças principalmente por D. João VI, não se alterou significativamente depois de
retrogradas da tradição outorgada a constituição de 1824.
agrária escravocrata Em 1826 um Decreto institui quatro graus de instrução:
(ARANHA, 2006, p. 233).
Pedagogias (escolas primárias);
Liceus;
?
Ginásios e
?
DICAS Academias.
?
Propõem a criação de pedagogias em todas as cidades e vilas,
além de prever o exame na seleção de professores, para nomeação.
1827:
Propunha ainda a abertura de escolas para meninas.
-São criados os cursos de
O Decreto de 1826 trata-se da primeira Lei Geral relativa ao
Direito de São Paulo e
Ensino Elementar. Este decreto, outorgado por Dom Pedro I, veio a se
Olinda.
tornar um marco na educação imperial, de tal modo que passou a ser a
principal referência para os docentes do primário e ginásio nas províncias.
-É criado o Observatório
A Lei tratou dos mais diversos assuntos como descentralização do
Astronômico.
ensino, remuneração dos professores e mestras, ensino mútuo, currículo
-Uma Lei Geral, de 15 de mínimo, admissão de professores e escolas das meninas.
outubro, dispõe sobre as
Quanto aos estudos primários e médios, algumas escolas de
escolas de primeiras letras,
primeiras letras foram criadas. Todavia, as aulas continuaram avulsas no
fixando-lhes o currículo e
velho estilo das aulas régias.
institui o ensino primário
para o sexo feminino.

564
História da Educação UAB/Unimontes

Lei de 15 de outubro de 1827

Manda criar escolas de primeiras letras em todas as cidades,


vilas e lugares mais populosos do Império.
D. Pedro I, por Graça de Deus e unânime aclamação dos
povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do
Brasil: Fazemos saber a todos os nossos súditos que a
Assembléia Geral decretou e nós queremos a lei seguinte:
Art. 1º Em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos,
haverão as escolas de primeiras letras que forem necessárias.
Art. 2º Os Presidentes das províncias, em Conselho e com
audiência das respectivas Câmaras, enquanto não estiverem
em exercício os Conselhos Gerais, marcarão o número e
localidades das escolas, podendo extinguir as que existem
em lugares pouco populosos e remover os Professores delas
para as que se criarem, onde mais aproveitem, dando conta
a Assembléia Geral para final resolução.
Art. 3º Os presidentes, em Conselho, taxarão interinamente
os ordenados dos Professores, regulando-os de 200$000 a
500$000 anuais, com atenção às circunstâncias da
população e carestia dos lugares, e o farão presente a
Assembléia Geral para a aprovação.
Art. 4º As escolas serão do ensino mútuo nas capitais das
províncias; e serão também nas cidades, vilas e lugares
populosos delas, em que for possível estabelecerem-se.
Art. 5º Para as escolas do ensino mútuo se aplicarão os
edifícios, que couberem com a suficiência nos lugares delas,
arranjando-se com os utensílios necessários à custa da
Fazenda Pública e os Professores que não tiverem a
necessária instrução deste ensino, irão instruir-se em curto
prazo e à custa dos seus ordenados nas escolas das capitais.
Art. 6º Os professores ensinarão a ler, escrever, as quatro
operações de aritmética, prática de quebrados, decimais e
proporções, as noções mais gerais de geometria prática, a
gramática de língua nacional, e os princípios de moral cristã e
da doutrina da religião católica e apostólica romana,
proporcionados à compreensão dos meninos; preferindo
para as leituras a Constituição do Império e a História do
Brasil.
Art. 7º Os que pretenderem ser providos nas cadeiras serão
examinados publicamente perante os Presidentes, em
Conselho; e estes proverão o que for julgado mais digno e
darão parte ao Governo para sua legal nomeação.
Art. 8º Só serão admitidos à oposição e examinados os
cidadãos brasileiros que estiverem no gozo de seus direitos

565
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

civis e políticos, sem nota na regularidade de sua conduta.


Art. 9º Os Professores atuais não serão providos nas cadeiras que
novamente se criarem, sem exame de aprovação, na forma do
Art. 7º.
Art. 10º Os Presidentes, em Conselho, ficam autorizados a
conceder uma gratificação anual que não exceda à terça parte
do ordenado, àqueles Professores, que por mais de doze anos de
exercício não interrompido se tiverem distinguido por sua
prudência, desvelos, grande número e aproveitamento de
discípulos.
Art. 11º Haverão escolas de meninas nas cidades e vilas mais
populosas, em que os Presidentes em Conselho, julgarem
necessário este estabelecimento.
Art. 12º As Mestras, além do declarado no Art. 6o, com exclusão
das noções de geometria e limitado a instrução de aritmética só
as suas quatro operações, ensinarão também as prendas que
servem à economia doméstica; e serão nomeadas pelos
Presidentes em Conselho, aquelas mulheres, que sendo
brasileiras e de reconhecida honestidade, se mostrarem com
mais conhecimento nos exames feitos na forma do Art. 7o.
Art. 13º As Mestras vencerão os mesmos ordenados e
gratificações concedidas aos Mestres.
Art. 14º Os provimentos dos Professores e Mestres serão
vitalícios; mas os Presidentes em Conselho, a quem pertence a
fiscalização das escolas, os poderão suspender e só por
sentenças serão demitidos, provendo interinamente quem
substitua.
Art. 15º Estas escolas serão regidas pelos estatutos atuais se não
se opuserem a presente lei; os castigos serão os praticados pelo
método Lancaster.
Art. 16º Na província, onde estiver a Corte, pertence ao Ministro
do Império, o que nas outras se incumbe aos Presidentes.
Art. 17º Ficam revogadas todas as leis, alvarás, regimentos,
decretos e mais resoluções em contrário.
Mandamos, portanto a todas as autoridades, a quem o
conhecimento e execução da referida lei pertencer, que a
cumpram e façam cumprir, e guardar tão inteiramente como
nela se contém.
O Secretário de Estado dos Negócios do Império a faça imprimir,
publicar e correr. Dada no Palácio do Rio de Janeiro, aos 15 dias
do mês de outubro de 1827, 6o da Independência e do Império.
IMPERADOR com rubrica e guarda Visconde de São Leopoldo.
Fonte: www.direitonet.com.br/artigos/x/48/22/482/

566
História da Educação UAB/Unimontes

Observe que nesta Lei apresentam-se muitos aspectos


discriminatórios em relação ao ensino no que diz respeito aos gêneros DICAS
(feminino X masculino).
A primeira contribuição da Lei de 15 de outubro de 1827 foi a de
determinar, no seu artigo 1º, que as Escolas de Primeiras Letras (hoje, Em 1832 convertem·se em
ensino fundamental) deveriam ensinar para os meninos, a leitura, a escrita, Faculdades de Medicina, as
as quatro operações de cálculo e as noções mais gerais de geometria Academias Médico-
prática. Cirúrgicas do Rio de
Às meninas, sem qualquer embasamento pedagógico, estavam Janeiro e da Bahia.
excluídas as noções de geometria. Aprenderiam, sim, as prendas (costurar,
bordar, cozinhar etc) para a economia doméstica.
Quando promulgada a constituição de 1834 a educação ganha
PARA REFLETIR
um novo olhar das autoridades competentes. Atendendo um número
maior de famílias e regiões. Porém, o golpe de misericórdia que prejudicou
de vez a educação brasileira vem de uma emenda à Constituição, o Ato O Ato Adicional de 1834,
adicional de 1834. da reforma constitucional
Em 1834 o Ato Adicional à Constituição dispõe que as províncias dizia que a educação
passariam a ser responsáveis pela administração do ensino primário e primária e secundária
secundário. ficaria a cargo das
Essa reforma descentraliza o ensino, atribuindo à Coroa a função províncias, restando a
de promover e regulamentar o ensino superior, enquanto que as províncias administração nacional o
são destinadas a escola elementar e a secundária. ensino superior.
Percebe-se que através do Ato Adicional de 1834 a educação da
elite fica a cargo do poder central e a do povo confinada às províncias.
Observamos que a situação da educação básica no Brasil ficou
ainda mais comprometida depois do Ato Adicional de 1834, que delegava ATIVIDADES
às províncias a prerrogativa de legislar sobre a educação primária
comprometendo definitivamente o futuro da educação básica no Brasil, Comente sobre as
pois possibilitou que o governo central se afastasse da responsabilidade de conseqüências quanto a
assegurar educação elementar para todos. estrutura do ensino
Durante a primeira metade do século XIX não houve, no Brasil, advindas do Ato Adicional
uma proposta de educação sistemática e planejada. As mudanças de 1834.
tendiam a resolver problemas imediatos, que servia para diminuir a
defasagem da nova sede do império em relação a outros países e, para
atender as demandas da Coroa.
Com o Ato Adicional de 1834 houve também a criação de
sistemas paralelos de ensino em cada província, numa tentativa de DICAS
solucionar questões que eram centralizadas pela coroa anteriormente.
Começa-se a ter uma preocupação com o ensino básico,
continuando o poder central responsável pelo ensino superior. Em 1835 é criada uma
Tal medida em pouco alterou o quadro do ensino elementar, pois a escola normal em Niterói.
verba destinada às províncias para custeio da instrução pública era ínfima, A primeira do Brasil.
insuficiente para fazer frente a tais responsabilidades.
Podemos citar como conseqüência do Ato Adicional a inexistência
de um sistema único de instrução no país; o que havia era um conjunto de

567
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

sistemas provinciais, muito diferentes e desiguais entre si, já que cada


província podia organizar a instrução elementar como melhor lhe
conviesse.
Foi criada, na cidade do Rio de Janeiro, a Inspetoria Geral da
DICAS Instrução Primária e Secundária, órgão ligado ao Ministério do Império e
destinado a fiscalizar e orientar o ensino público e particular nos níveis
primário e médio.
Leôncio de Carvalho foi Apesar destas medidas o panorama geral do ensino elementar
ministro do Império e continua ruim, e tem como uma das causas a falta de pessoal docente
professor da Faculdade de habilitado.
Direito de São Paulo. Surgiram então, por iniciativa dos governos provinciais, as
primeiras escolas normais das províncias, mas o nível era muito baixo.
A normatização legal constituiu-se numa das principais formas de
intervenção do Estado no serviço de instrução do país, durante o período
imperial.
Podemos dizer que a década de 1850 foi marcada por uma série
de realizações relevantes para a educação institucional no Brasil.
No ano de 1854 foi criada a Inspetoria Geral da Côrte com o
objetivo de orientar e supervisionar o ensino brasileiro.
B GC Era de responsabilidade deste órgão estabelecer regras para o
GLOSSÁRIO E exercício da liberdade de ensino e para a preparação dos professores
A F primários.
ad referendum: Era também de responsabilidade da Inspetoria Geral da Côrte
reformular os estatutos dos colégios preparatórios no sentido de adequá-
Pendente de aprovação. los ao padrão dos livros usados nas escolas oficiais.
No período imperial duas características foram marcantes para o
Toda ação ou atividade de ensino desta época:
competência de O conjunto de ensino existente era carente de vínculos efetivos
determinada autoridade ou com o mundo prático, ou seja, não preparava para a vida;
órgão da administração O ensino desenvolvido nesta época era mais voltado para os
praticada por terceiros jovens do que para as crianças.
através de delegação de Outro elemento marcante do ensino no período imperial foi a
competência. reforma Leôncio de Carvalho ocorrida no ano de 1879.
Na condição de Ministro do Império Leôncio de Carvalho,
promulgou o Decreto nº 7.247, ad referendum da assembléia, instituindo
a liberdade do ensino primário e secundário no município da Côrte e a
liberdade do ensino superior em todo o país.
Por liberdade de ensino a nova lei “Decreto nº 7.247, entendia
que todos os que se achavam por julgamento próprio, capacitados a
ensinar, poderiam expor suas idéias e adotar os métodos que lhes
conviessem.
A freqüência aos cursos secundários e superiores no Brasil, neste
período, era livre, de forma que os alunos poderiam escolher com quem
queriam aprender e, após o término dos estudos, deveriam ser submetidos

568
História da Educação UAB/Unimontes

aos exames de seus estabelecimentos de ensino regulamentado.


O Decreto de nº 7.247/79 permitia que as instituições de ensino se ATIVIDADES
organizassem por matérias, de modo que o aluno poderia escolher as
matérias que cursaria e as que julgassem desnecessárias diante do exame A que fator atribui-se o
final. Porém, as escolas eram aconselhadas a serem rigorosas nos exames. atraso cultural ocorrido na
Em 1879 Leôncio de Carvalho, que segundo Fernando de educação brasileira, no
Azevedo, o inovador de ensino mais audacioso e radical do período período colonial?
imperial, estabeleceu normas para o ensino primário, secundário e
superior em 1879. Nessa lei, defendia a liberdade de ensino, de freqüência
de credo religioso, a criação de escolas normais e o fim da proibição de
matrícula de escravos. (ARANHA, 1996, p. 156).
Isso mesmo!
Os vestígios do ensino imperial estão presentes no modo de DICAS
organizar o ensino secundário que acompanham, para sua estruturação, o
parâmetro oferecido pelos exames vestibulares,
Outro fator, quanto ao ensino no período imperial, que nos chama
Em 1880 surge a primeira
a atenção é o seu caráter propedêutico assumido pelo ensino secundário,
escola normal da Capital
somado ao seu conteúdo humanístico, fruto da aversão ao ensino
do Império, mantida e
profissionalizante, fundamentado numa ordem social escravocrata.
administrada pelos Poderes
Esse caráter propedêutico do ensino se constitui em um fator do
Públicos.
atraso cultural das escolas brasileiras até as décadas recentes.
Em 1882 Ruy Barbosa sugere a liberdade do ensino, o ensino laico
e a obrigatoriedade de instrução, obedecendo as normas emanadas pela
Maçonaria Internacional. B GC
GLOSSÁRIO E
Após a independência, em nome dos princípios liberais e
democráticos, são redigidos planos visando nova política no campo da
A F
instrução popular, mas, na prática, pouco se concretiza. Ensino propedêutico
Através de uma análise histórica da nossa educação observamos
que até a Proclamação da República, em 1889 praticamente nada se fez O ensino propedêutico é
de concreto pela educação brasileira. aquele organizado com o
A instrução primária, a profissional, o ensino normal, ficaram único objetivo de levar o
inteiramente subordinados à iniciativa e possibilidades econômicas dos aluno a um nível mais
estados, da mesma forma que se subordinavam às províncias, no Império. adiantado, isto é, é sempre
Dada a inexistência de instrução básica comum, considerada um ensino preparatório.
necessária à formação da consciência nacional, vários projetos de lei são
elaborados nesse sentido.
Em 1890, logo após a Independência do Brasil, é criado o
Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, porém, este
conforme registros históricos, durou pouco mais de um ano.
Diante das medidas que foram tomadas pela elite política que
governava nosso país no período imperial observamos que uma das
características que marcou a história ensino no Brasil, ao longo do século
XIX, foi o seu caráter elitista e excludente.
Elitista porque estava voltada para a educação de camadas sociais

569
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

mais altas e excludentes, porque excluía os escravos, grande parte dos


PARA REFLETIR pobres, negros ou brancos, e também as mulheres.
No ano de 1910, fundou-se a Academia Real Militar que mais
Em 1889 Ferreira Viana, tarde tornou-se a Escola Nacional de Engenharia.
Ministro do Império dizia
ser fundamental formar 3.7 EDUCAÇÃO NO BRASIL COLÔNIA: FIM DA VISÃO ILUMINISTA?
"professores com a
necessária instrução Se a denominação de escola primária representaria política
científica e profissional". e pedagogicamente a permanência da idéia de um ensino
suficientemente difundido e realmente formativo, a
· Em sua última fala do classificação de escolas de primeiras letras simbolizava
trono Sua Majestade pedia antecipadamente, a tibieza congênita que irá marcar a
empenho para a criação de maior parte dos esforços de educação popular durante o
um ministério destinado império e até mesmo na República. (SILVA, 1969, p. 193)

aos negócios da Instrução


Pública. Observando essa discussão apresentada por Silva (1969) vemos
· Os alunos matriculados que o ideal iluminista da educação ainda neste período, estava longe de se
nas escolas correspondem tornar uma realidade no Brasil.
a 12% da população em Segundo Aranha (1996, p 94) as idéias iluministas presentes no
idade escolar. século XVIII defendia o poder da razão e a capacidade do homem de
discernir o próprio destino e observamos que através de uma educação
oferecida apenas para decifrar e escrever símbolos, desenvolvido pela
ATIVIDADES escola primária está longe de possibilitar tal realização.

Comente no Fórum: Uma 3.7.1 Principais pedagogos deste período


das características que
marcou a história do Brasil, Pestalozzi: considerado um dos defensores da escola popular
ao longo do século XIX, foi extensiva a todos. Reconhece firmemente a função social do ensino, que
o seu caráter elitista e não se acha restrito à formação do gentil-homem.
excludente.
Froebel: privilegia a atividade lúdica por perceber o significado
funcional do jogo e do brinquedo para o desenvolvimento sensório-motor e
inventa métodos para aperfeiçoar as habilidades.
B GC
GLOSSÁRIO E Herbart: segundo o qual, a conduta pedagógica segue três
A F procedimentos básicos:
Tibieza congênita: ?
o governo;
?
a instrução e
Expressão criada pelo autor ?
a disciplina.
para se referir ao ideal de
educação que perdura por Conclusão
vários séculos com toda sua
fortaleza de sentido. Observamos que a História da Educação no Brasil teve inicio no
período colonial, por meio dos jesuítas que chegaram ao Brasil em 1549,
momento em que começaram as primeiras relações entre Estado e
Educação, chefiados pelo padre Manuel da Nóbrega.
Vimos que com as reformas pombalinas no século 18, após a

570
História da Educação UAB/Unimontes

expulsão dos jesuítas provocou um grande retrocesso na educação


DICAS
brasileira. Passou a ser instituído o ensino laico e público, e os conteúdos
curriculares basearam-se nas Cartas Régias.
Vimos que instruir as classes inferiores era tarefa fundamental do
Estado brasileiro e, ao mesmo tempo, condição de existência desse Estado Leia alguns romances de
e da nação e que a educação já defendida, a seu modo, pelas nossas elites autores brasileiros, que
desde o período imperial. conduzirão você para o
Observamos que muitas questões no que diz respeito ao Brasil
direcionamento do ensino secundário acontecem até hoje, principalmente Colonial:
se considerarmos que são as universidades quem determinam os
conteúdos que serão avaliados em seus concursos de vestibulares e que - REGO, José Lins. Menino
desta situação decorre a estruturação, pelas escolas, de sua proposta de engenho.
curricular. - ALMEIDA, José Américo.
A bagaceira.

571
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

REFERÊNCIAS

ARANHA, Maria Lucia de Arruda. História da educação e da


pedagogia: geral e Brasil. 3 ed. São Paulo: Moderna, 1990.

MANACORDA, M. A. História da Educação: da antiguidade aos nossos


dias. São Paulo: Cortez/ Editores Associados, 1989.

PETITAT, A. Produção da escola/produção da sociedade: análise sócio-


histórica de alguns momentos decisivos da evolução no ocidente. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1984.

AZEVEDO, Fernando. A transmissão da cultura. São Paulo:


Melhoramentos, 1976.

GHIRALDELLI JUNIOR, Paulo. História da Educação. 2ed. São Paulo,


Editora Cortez, 2001.

______. História da Educação Brasileira. São Paulo: Cortez, 2006. 272 p.

GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização da cultura. 7 ed. Rio


de Janeiro. Civilização Brasileira, 1989.

PILETTI, Nelson. História da Educação. São Paulo: Ática, 1990.

ROMANELLI, Otaíza de O. História da Educação no Brasil. 19 ed.


Petrópolis: Vozes, 1997.

WEREBE, Maria José G. Grandezas e Misérias do Ensino no Brasil. 2 ed.


São Paulo: Ática, 1997.

572
4
UNIDADE 4
A EDUCAÇÃO NO BRASIL: O PERÍODO REPUBLICANO

Vamos lá! Estamos chegando no final deste estudo, pois esta é a


quarta e última unidade desta disciplina.
O objetivo desta unidade é que você possa conhecer os aspectos
contemporâneos da nossa história educacional, focalizando as questões
sociais, políticas, econômicas que permeiam a história educacional.
Finalizando esta unidade, organizamos os textos da seguinte
GLOSSÁRIO
B GC
A
Decreto-lei

Decreto-lei são atos do


presidente da república
E
F

forma:
com imediata efetividade,
Unidade IV: A educação no Brasil: o período republicano ou seja, logo após
publicada passa a
4.1 A reforma educacional de Bejamim Constant
organizar a administração
4.2 A educação na 2º república
publica. Demonstra
4.3 A educação superior no Brasil pós LDBEN 9.394/1996
centralização de poder nas
mãos do presidente.
Segundo Romanelli (1983), em 1888 o Brasil contava com
apenas 250.000 alunos matriculados para uma população de 14 milhões PARA REFLETIR
de habitantes. A autora afirma ainda que:
...dos liceus provinciais, em cada capital de província dos
colégios particulares em algumas cidades importantes, O caráter elitista da
alguns cursos normais (que formavam os professores), os educação era denunciado:
Liceu de Artes e Ofícios, criado na Corte, em 1856, e mais
- pela composição do
alguns cursos superiores, que foram enriquecidos com a
transformação da antiga Escola Central em Escola corpo docente, nomeado
Politécnica (p. 40). pelo governo e formado por
Percebe-se, a partir desta afirmativa a preocupação com a intelectuais de reconhecida
formação superior em detrimento da formação elementar da população, capacidade nos meios
fato que caracterizava a elitização do ensino. acadêmicos;
Outro fato importante a se registrar do período é a falta de dados - pela seletividade do
precisos do número de matriculados na educação elementar. corpo discente, revelada
Como a educação ainda tinha um caráter elitista, frases como a pelos exames de admissão
do Senador baiano João José de Oliveira Junqueira, senador entre 1873 e e promocionais e pelo
1887, ficaram famosas: “certas matérias, talvez, não sejam convenientes pagamento das anuidades;
para o pobre; o menino pobre deve ter noções muito simples”. - pelos programas de
Esta frase demonstra a falta de uma preocupação política no ensino, de base clássica e
Brasil para a formação de uma cultura educacional que atendesse aos tradição humanística;
interesses de toda a sociedade. - pela disciplina rígida,
A educação popular do período era meramente “propedêutica”, imposta pelos
voltada para o exercício de funções, nas quais “ a retórica tem o papel mais Regulamentos. Essas
importante do que a criatividade” (ROMANELLI, 1983, p. 41). medidas deram ao ensino
A primeira república no Brasil inicia-se no governo do presidente secundário oficial, uma
Marechal Deodoro da Fonseca, que governou em 1889 e 1891 como função formativa dirigida às
governo provisório. elites, através da
Deodoro governou por decretos-leis, até que fosse promulgada a preparação dos alunos
para o ensino superior.

573
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

nova constituição, pois a constituição de 1824 não valia mais.


A partir de 1890 é iniciada a discussão para a criação da nova
constituição que vigoraria durante todo o período da república velha, ou
seja, de sua promulgação em 1891 a 1930.
Ainda de acordo com Romanelli, esta Constituição instituiu o
sistema federativo de governo, consagrou também a descentralização do
ensino, prevista em seu artigo 35, itens 3º e 4º que reservou à União o
direito de:
?
criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados;
?
prover a instrução secundário no Distrito Federal;
? à União cabia criar e controlar a instrução superior em toda a
Nação, bem com criar e controlar o ensino secundário acadêmico e a
instrução em todos os níveis do Distrito Federal;
? aos Estados cabia criar a controlar o ensino primário e o ensino
profissional, na época, este compreendia principalmente escolas normais
(de nível médio) para moças e escolas técnicas para rapazes.
O ensino neste período assume uma dualidade. De um lado
ofereceu oportunidade de formação prática para a população rural e
desfavorecida e, por outro, reforça a preocupação com a educação da
classe dominante, nas escolas técnicas e superiores.
Neste período, prevalece ainda no Brasil, os ideais educacionais
europeus que pensava na formação do homem que controlava o seu
próprio destino, um homem completo de corpo e alma.
Para atingir este objetivo era preciso educar o juízo do aluno ao
invés de encher-lhe a cabeça com palavras e para tanto a prática
pedagógica era voltada ao desenvolvimento da autonomia do aluno, ou
seja, o professor deveria apontar o caminho, ou permitir que o aluno
descubra seu próprio caminho.
Tais ideais trouxeram para o Brasil, segundo Petit (1994, p. 187)
uma “cultura escolar moderna, centrada nas línguas viças, nas literaturas,
nas ciências e nas técnicas”. Para este autor, esta foi a revolução mais
importante vivida na esfera educacional desde o século XVIII.

4.1 A REFORMA EDUCACIONAL DE BENJAMIM CONSTANT

O Grande marco educacional do período foi a reforma


educacional proposta por Benjamim Constant Botelho de Magalhães,
nomeado ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos entre 1889 e
1891.
Militar atuante e adepto aos ideais da filosofia positivista de
Auguste Comte tinha como “orientação a liberdade e laicidade do ensino,
como também a gratuidade da escola primária” (RIBEIRO, p. 73).
Estes princípios seguiam a orientação do que estava estipulado na
Constituição brasileira.

574
História da Educação UAB/Unimontes

Azevedo (1963) apresenta:


As principais intenções desta Reforma eram:
? transformar o ensino em formador de alunos para os cursos
superiores e não apenas preparador;
?
a obrigatoriedade do regime seriado;
?
a duração do curso secundário em 7 anos;
?
a introdução no Ginásio Nacional, antigo Colégio Pedro II,
? toda a série hierárquica das ciências abstratas, segundo a
classificação de Compte;
? a inclusão, ao lado do curso bacharelado em Letras, em 7
anos, no Ginásio Nacional, o ""exame de madureza"", como prova da
capacitação intelectual dos alunos no fim dos estudos.
? outra intenção era substituir a predominância literária pela
científica.
A reforma proposta por Benjamim Constant foi criticada
pelos positivistas pois feria os princípios pedagógicos de
Comte, que defendia a predominância literária, sendo que
na adaptação brasileira o que ocorreu foi o acréscimo de
matérias científicas às tradicionais, tornando o ensino
enciclopédico (CUNHA, 1980).

4.1.1 A lei orgânica Rivadávia de Correa

Esta reforma foi proposta durante o governo de Marechal Hermes


da Fonseca, em 1911. Se caracterizou com insucesso, pois propunha
facultar total liberdade e autonomia aos estabelecimentos de ensino na
sua organização, suprimindo o caráter oficial do ensino.
Destaca-se na sua proposta a liberdada que pretendia dar ao
ensino superior sendo considerada como "liberdade de ensino", que a
mesma adotara, corolário do dispositivo constitucional que assegurava a
liberdade de profissão e a promessa de autonomia dos estabelecimentos
federais de ensino de da extinção da ação fiscalizadoras do Governo
Federal sobre os estabelecimentos particulares.
Propunha, ainda, uma reestruturação no Conselho Superior de
Ensino, então criado, e que, de acordo com a própria lei, substituiria a
função fiscal do Estado, tendo ação sobre os estabelecimentos mantidos
pelo Governo Federal, e assim mesmo respeitando a autonomia a esses
concedida (Decreto nº 8.659, de 05/04/1911).

4.1.2 A reforma proposta por Carlos Maximiliano

Esta reforma, segundo Romanelli (1983, p. 42) representou uma


“contramarcha, reoficializando o ensino” que autorizou a organização de
uma Universidade Federal, constituída de Faculdade de Medicina, de
Escola Politécnica, das duas Faculdades Livres de Direito do Rio de Janeiro,

575
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Universidade essa que só foi criada em 1920 no Governo de Epitácio


Pessoa.
As escolas particulares, que funcionavam sob o regime de
concessão do poder público, deveriam ser previamente autorizadas a
funcionar e, a seguir, reconhecidas e inspecionadas pelos setores
competentes do Ministério da educação ou das Secretarias estaduais de
educação, a fim de que pudessem expedir certificados e diplomas válidos
perante os órgãos oficiais.
A reforma foi promulgada em 1915, e foi conhecida como Lei
Carlos Maximiliano (Dec. 11530) restabeleceu a equiparação dos
estabelecimentos estaduais com os federais e manteve o exame vestibular,
ao mesmo tempo que assegura aos alunos dos colégios particulares o
direito de prestação de exames preparatórios no Colégio Pedro II e nos
colégios equiparados, para fins de inscrição em exame vestibular (SILVA,
1969).

4.1.3 Reforma Rocha Vaz

A reforma proposta por Rocha Vaz, no governo do presidente


Arthur Bernardes, em 1925, representou a última tentativa do período no
sentido de instituir normas regulamentares para o ensino, tendo o mérito
de estabelecer, pela primeira vez, um acordo entre a União e os Estados,
propondo a promoção parceria para a promoção da educação primária e
eliminando os exames preparatórios para acesso a educação – o que
caracterizava um processo excludente para os menos favorecidos
(ROMANELLI, 1983).
PARA REFLETIR Um grande traço social deste período foi a transição do modelo
rural para o modelo social urbano-industrial que começava a tomar fôlego
no Brasil.
O ESCOLANOVISMO é a Por esta característica a reforma proposta por Rocha Vaz foi
concepção baseada nas considerada reacionária, por conter em seu bojo a "Resistência
idéias de John Dewey, que Conservadora" do cenário educacional, retirando em definitivo a
acredita ser a educação o autonomia administrativa e didática concedida pela sua antecedente.
único meio realmente As medidas adotadas por essa
efetivo para a construção reforma concorreram para acentuar o
de uma sociedade período de crise política que resultaria na
democrática, que respeite revolução de 1930; por intermédio dela, o
as características Estado passa a controlar ideologicamente
individuais de cada pessoa, o sistema de ensino.
inserindo-o em seu grupo Outro fato social marcante para o
social com respeito à sua novo cenário educacional que
unicidade, mas, como parte desapontava no país, foi a SEMANA DE
integrante e participativa de ARTE MODERNA, acontecimento entre os
um todo. dias 11 e 18 de fevereiro de 1922, no Figura 20

576
História da Educação UAB/Unimontes

Teatro Central, em São Paulo.


Intelectuais e artistas brasileiros de reconhecimento internacional
propunham uma “redescoberta do país” com a produção de obras de arte
que valorizassem a cultura brasileira sem se diminuir frente às propostas
artísticas européias.
Este movimento acena para a nova elite intelectual brasileira que
se formara e que, anos depois, alteraria a sua história agrário-produtora
com novas tendências produtivas.

4.1.4 As reformas educacionais que influneciaram a década de 1930

A acumulação de capital, ocorrida com a produção agropecúaria


no Brasil, permitiu, à partir da década de 1930, que o Brasil pudesse
investir no mercado interno e na produção industrial. Essa nova situação
econômica exigia a formaçao de mão-de-obra especializada e para tal foi
necessário propor novas alternativas para o setor educacional, como
veremos a seguir.

4.1.5 A reforma de Lourenço Filho

DICAS
Manuel Bergström Lourenço Filho, paulistano de Porto Ferreira
(1897-1970) como um educador escolanovista que, fiel a seu referencial
teórico, procurou intervir na educação brasileira respondendo às questões
de seu contexto histórico. Para ler mais acesse:
Para o movimento escolanovista a educação deixa de ser centrada http://www.centrorefeducaci
no professor e passa a centrar-se no aluno, tendo como foco a questão da onal.pro.br/aniescnova.htm
qualidade do ensino.
Com a Pedagogia da Escola Nova o professor passa a ser um “[...]
estimulador e orientador da aprendizagem.
A escola deixa de ser um ambiente de sujeição, de disciplina, de
silêncio para ser um ambiente de alegria, pesquisa e dinamismo”
(Nogueira, 2001, p.28). DICAS
Psicólogo por formação, Lourenço Filho desenvolveu o chamado
Teste ABC, que verificava a maturidade necessária à aprendizagem da
leitura e da escrita, principalmente no que se refere à reforma educacional Sobre Lourenço Filho
do Estado do Ceará, no ano de 1922, realizada pelo educador. acesse:
Neste estado, promoveu a reforma no curso normal www.dgbiblio.unam.mx
(profissionalização do curso), além do convite para os professores a
realizarem cursos de férias para o aperfeiçoamento da profissão.
Em seu bojo, constava a inovação de todo o processo pedagógico.
Era ainda uma exigência do educador que os professores
aprendessem a forma correta de aplicação dos Testes, para que esses
fossem utilizados de maneira cautelosa e respaldada no conteúdo teórico
defendido por Lourenço.

577
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Por se tratar de um estado em extrema situação de pobreza para o


PARA REFLETIR
período, as propostas de Lourenço Filho foram inovadoras e surtiram
efeitos positivos após a sua atuação.
Em outubro de 1931, ao assumir a Diretoria Geral de Instrução
Anísio Teixeira, na Bahia,
Pública do Distrito Federal, Anísio Teixeira encontra um cenário pouco
em 1925, Anísio Spínola
favorável à educação pública na capital do país.
Teixeira nasceu em Caetité
(BA), em 12 de julho de Naquele ano, segundo dados do Relatório de 1932, para uma
1900, numa família de população escolar mínima – crianças de 6 a 12 anos – de 196.000
fazendeiros. Estudou em indivíduos, só existiam escolas para cerca de 45% das crianças.
colégios jesuítas em Caetité Esse fato era agravado, ainda, pelas condições dos prédios, tanto
e em Salvador. os públicos como os alugados, cuja maioria se constituía de residências
Em 1922, formou-se em particulares, impróprios ou inadequados ao funcionamento escolar.
Ciências Jurídicas e Sociais, Com base nos inquéritos e levantamentos realizados pelo Serviço
no Rio de Janeiro. Com de Prédios e Aparelhamentos Escolares, o Departamento de Educação
apenas 24 anos, foi estabeleceu um plano mínimo de construção, a ser realizado até o ano de
nomeado inspetor geral de 1938, que compreendia, entre outras coisas, a construção de 74
Ensino do Estado da Bahia. edificações novas, ainda assim, insuficientes para abrigar a população
escolar atual. (TEIXEIRA, 1935, p.196).
No Rio de Janeiro, como em todo o Brasil, o problema de
edificações escolares, não havia sido antes objeto de soluções previamente
planejadas e sistematicamente seguidas.
Para resolver o problema da escassez de prédios escolares era
preciso encontrar soluções em que se contrabalançassem as deficiências
em relação ao terreno, a localização, as condições do prédio, a economia
ou ao programa educacional, principalmente quanto às grandes
concentrações escolares.
Assim, já em sua administração no Rio de Janeiro, Anísio concebe
uma proposta inovadora, isto é, um “sistema” escolar com edificações de
duas naturezas: as escolas nucleares, ou escolas classe e os parques
escolares, onde as crianças deveriam freqüentar regularmente as duas
instalações.
No primeiro turno, em prédio adequado e econômico (escola-
classe), receberiam o ensino propriamente dito; no segundo turno, em um
parque escolar aparelhado e desenvolvido, receberiam a educação
propriamente social, a educação física, a educação musical, a assistência
alimentar e o uso da leitura.
Dessa forma, no Rio de Janeiro os prédios foram construídos
obedecendo a cinco tipos:

? a “Escola Tipo Mínimo”, com 2 salas de aula e uma sala de


oficinas, para as regiões de reduzida população escolar;
a “Escola Tipo Nuclear” ou escola-classe, com 12 salas de
?
aula, além de locais apropriados para administração, secretaria e
biblioteca. Esses prédios foram projetados pelo arquiteto Enéas Silva, da

578
História da Educação UAB/Unimontes

Divisão de Prédios e Aparelhamentos Escolares;


de professores, e que deveria ser complementada com o
?
parque escolar;
a Escola Platoon 12 classes (6 salas comuns e 6 salas
?
especiais), a Escola Platoon 16 classes (12 salas comuns e 4 salas
especiais);
? a Escola Platoon 25 classes (12 salas comuns, 12 salas
especiais e o ginásio). O sistema “platoon” era constituído de salas de aula
comuns e salas especiais para auditório, música, recreação e jogos, leitura
e literatura, ciências, desenho e artes industriais; e o seu funcionamento
dava-se pelo deslocamento dos alunos, através de “pelotões”, pelas
diversas salas, conforme horários pré-estabelecidos (DÓREA, 2008).

4.2 A EDUCAÇÃO NA 2º REPÚBLICA


4.2.1 As reformas educacionais no governo de Getúlio Vargas
4.2.1.1 O manifesto dos pioneiros em 1932

No entanto, apesar das primeiras reformas republicanas e das


iniciativas em prol do desenvolvimento do ensino público no país, a
questão do analfabetismo continua representando um sério problema a
ser enfrentado nas décadas de 20 e 30 do século XX.
Nesse contexto diversos educadores se voltam aos problemas
educacionais, com a intenção de “melhorar” a situação do ensino no país.
Embora tivessem interesses e visões distintas acerca do que era a
educação, convergiam quanto à necessidade de sua propagação para
todos. Como expressão desse movimento, pode-se destacar o Manifesto
dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932.
Vale lembrar que este movimento pedagógico era planejado para
uma civilização urbano-industrial.
Participaram desse Manifesto nomes como: Roquete Pinto,
Fernando de Azevedo, Cecília Meireles, Anísio Teixeira, Paschoal Lemme e
Lourenço Filho.
No que diz respeito ao Manifesto
[...] a idéia central que sempre vem à tona é a de que se trata de
um documento de política educacional em que, mais do que a defesa da
Escola Nova, está em causa a defesa da escola pública.
Nesse sentido, o Manifesto emerge como uma proposta de
construção de um amplo e abrangente sistema nacional de educação
pública, abarcando desde a escola infantil até a formação dos grandes
intelectuais pelo ensino universitário (Saviani, 2004, p.184).
Os educadores buscavam a hegemonia educacional do país.
Entretanto, havia também a intenção pela ascensão do grupo aos setores
educacionais referenciados ao poder do Estado.
Entre esses educadores vigoravam as idéias escolanovistas em

579
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

oposição ao ensino tradicional.


A Expressão Escola Nova (escolanovismo) não se refere a um só
tipo de escola ou mesmo a um determinado sistema escolar, mas a um
conjunto de princípios, que resultam em determinadas características, com
o objetivo de reexaminar e rever os problemas didáticos tradicionais de
ensino (Nogueira, 2001, p.25).
A Pedagogia Nova expressa uma preocupação com a formação
do caráter e da personalidade do indivíduo, abrangendo, para tal,
conhecimentos da área da biologia e também da psicologia.
Um dos principais nomes relacionados ao escolanovismo é John
Dewey (1859-1952), educador que “[...] empregou a maior parte dos seus
esforços na aplicação da psicologia a problemas da educação” (SCHULTZ
& SCHULTZ, 2000, p.158).
Ele considerava a educação como um processo social
indispensável, um meio para a continuidade e o progresso ordenado da
PARA REFLETIR sociedade humana.
A Escola Nova foi uma reação à Pedagogia Tradicional, a qual
Em 1911, o engenheiro vigorou até o início do século XX, porém evidenciou resultados
norte-americano Frederick insatisfatórios por não atingir a meta da educação para todo o cidadão,
W. Taylor publicou “Os visto que aproximadamente 50% da população ainda era analfabeta
princípios da administração (FACCI, 1998).
científica”, ele propunha Além disso, uma considerável parcela populacional não
uma intensificação da adentrava ao ambiente escolar não tendo acesso ao conhecimento
divisão do trabalho, ou sistematizado. Estudiosos afirmam que a Escola Nova procurou corrigir as
seja, fracionar as etapas do “imperfeições” deixadas pela Pedagogia Tradicional.
processo produtivo de A proposta de Dewey pode ser encarada como “escola ativa”, ou
modo que o trabalhador seja, o aprendizado é feito à partir do treino – tendência influenciada pelo
desenvolvesse tarefas ultra- Tayloristo e Fordismo.
especializadas e repetitivas. Para o movimento escolanovista a educação deixa de ser centrada
O norte-americano Henry no professor e passa a centrar-se no aluno, tendo como foco a questão da
Ford foi o primeiro a pôr qualidade do ensino.
em prática, na sua empresa Com a Pedagogia da Escola Nova o professor passa a ser um “[...]
“Ford Motor Company”, o estimulador e orientador da aprendizagem.
taylorismo. Posteriormente, A escola deixa de ser um ambiente de sujeição, de disciplina, de
ele inovou com o processo silêncio para ser um ambiente de alegria, pesquisa e dinamismo”
do fordismo, que, absorveu (Nogueira, 2001, p.28). A proposta enfatiza a educação individualizada,
aspectos do taylorismo. por essa característica, pode ser considerada excludente e elitista. Outro
Consistia em organizar a fator preocupante da proposta é a falta de priorização dos conteúdos a
linha de montagem de serem ensinados.
cada fábrica para produzir Para Saviani (1986, p. 13) o pensamento de Dewey “desloca o
mais, controlando melhor eixo da questão pedagógica do intelecto para sentimental: do aspecto
as fontes de matérias- lógico para o psicológico; dos conteúdos cognitivos para os métodos ou
primas e de energia, os processos pedagógicos; do professor para o aluno”. O autor ressalta,
transportes, a formação da ainda, que a teoria pedagógica de Dewey considera que o importante não
mão-de-obra. é aprender, mais aprender a aprender.

580
História da Educação UAB/Unimontes

4.2.2 Criação do ministério da educação

Em 1930, no governo de Getúlio Vargas, é criado o ministério da


Educação e Saúde Pública.
PARA REFLETIR
É notório, pela criação deste ministério, como os governos
entendiam (e muitos hoje ainda assim o consideram!) que educação e
saúde deveriam andar juntos para desenvolvimento da nação.
Neste período era
Francisco de Campos é nomeado o seu primeiro ministro,
obrigatório no ensino a
promovendo inovações para o setor educacional. No mesmo ano, Cria o
realização uma argüição
estatuto das Universidades e organizou o ensino secundário.
mensal; uma prova parcial
Na seqüência de seus atos pela educação, é fundada, em 1934, a
a cada dois meses e um
Universidade de São Paulo e, 1937, a então Universidade Nacional do Rio
exame final. Era o total de
de Janeiro, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro.
130 provas e exames, o
Durante o Estado Novo foram promulgadas as leis orgânicas do que equivalia a uma prova
ensino, dividindo o curso secundário em ginasial e colegial (clássico ou a cada dois dias de aula.
científico).
Neste mesmo período era
Embora as propostas de Francisco Campos tivessem o mérito de criado a função de
serem inovadoras, vários autores denunciam o caráter elitista e “inspetor”, profissional que
enciclopedista de sua proposta. iria “fiscalizar” o bom
Maria Tetis Nunes (citada por Romanelli, 1986) afirma que o andamento das propostas
caráter enciclopedista dos programas curriculares do período, a tornavam educacionais
uma educação para a elite.
Além do rigor avaliativo da proposta, a obrigatoriedade de se
cursar lúnguas como Francês, Alemão, e latim davam à proposta o caráter
excludente denunciado.
Imagine então para acontecia o ensino e a inspeção destas aulas
em locais como o nordeste e a Amazônia?
Outra grande criação do período foi a reforma do ensino
profissional. O primeiro curso profissional a ser criado pela reforma de
Francisco Campos foi o de contabilidade – seguido de sua devida
regulamentação para o ensino superior (conforme decreto 20.158 de 30
de junho de 1931).
Teve grande influência no período, o ensino profissional
ministrado através das empresas e indústrias tais como o Serviço Nacional
da Indústria (Senai) e o Serviço Nacional do Comércio (Senac).

4.2.3 O manifesto dos pioneiros da educação de 1932

Preocupados com uma educação pública de qualidade e que se


desvinculasse totalmente dos dogmas da igreja católica, intelectuais do
período, lançaram, em 1932 o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova.
Tal documento, escrito por Fernando de Azevedo e assinado por vários
intelectuais da época, como Hermes Lima, Carneiro Leão, Afrânio Peixoto, e,
certamente, Anísio Teixeira, grande amigo de Fernando de Azevedo.

581
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

Fonte: (CPDOC/FGV/Arquivo
Lourenço FIlho/LF foto 96-1)
Afirmava o documento que se a
evolução do sistema cultural de um país
depende de suas condições econômicas, é
impossível desenvolver as forças econômicas e
produtivas, sem o prepara intensivo das forças
culturais e o desenvolvimento das aptidões, aos
fatores fundamentais do acréscimo de riqueza
de uma sociedade, a educação seria, portanto,
fundamental tanto para o processo de
Figura 21: Lourenço Filho, desenvolvimento, quanto o definiria numa
um dos signatários do ordem dialética (apud Romanelli, 1983).
Manifesto.
Alegavam os intelectuais que a
educação do período privilegiava as elites – área onde atuava a igreja
católica com cursos pagos – e que a educação popular necessitava de
maior atenção estatal.
Além disso, a classe média ascendente do período clamava por
melhoria do ensino médio, seguidos pelos anseios das classes populares
que reivindicavam escolas com ensino primário de boa qualidade. Fazia
parte das propostas:
Educação de qualidade, pública, gratuita e totalmente laica;
?
? Direitos de todos à educação: assegurados que homens o
mulheres deveria ter acesso às mesmas oportunidades educativas;
Educação
? posta para o desenvolvimento econômico,
financeiro e intelectual de toda nação;
? No início da escolarização, escolas pré-primárias e ensino
primário se configurariam num único bloco; -
O ensino primário deveria ser articulado ao ensino secundário;
?
O ensino superior deveria ser diversificado, proporcionando
?
formação em cursos para as carreiras liberais e para as profissões técnicas.
Afirmava o documento:
“em nosso regime político, o Estado não poderá, de certo,
impedir que, graças à organização de escolas privadas de
tipos diferentes, as classes mais privilegiadas assegurem a
seus filhos uma educação de classe determinada; mas está
no dever indeclinável de não admitir, dentro do sistema
escolar do Estado, quaisquer classes ou escolas, a que só
tenha acesso uma minoria, por um privilegio
exclusivamente econômico. Afastada a idéia do monopólio
da educação pelo Estado num país, em que o Estado, pela
sua situação financeira não está ainda em condições de
assumir a sua responsabilidade exclusiva, e em que,
portanto, se torna necessário estimular, sob sua vigilância
as instituições privadas idôneas, a "escola única" se
entenderá, entre nós, não como "uma conscrição precoce",
arrolando, da escola infantil à universidade, todos os
brasileiros, e submetendo-os durante o maior tempo
possível a uma formação idêntica, para ramificações
posteriores em vista de destinos diversos, mas antes como a

582
História da Educação UAB/Unimontes

escola oficial, única, em que todas as crianças, de 7 a 15,


todas ao menos que, nessa idade, sejam confiadas pelos PARA REFLETIR
pais à escola pública, tenham uma educação comum, igual
para todos” (Manifesto dos Pioneiros, 1932).
A partir do trecho retirado do manifesto, percebe-se o caráter
O ponto detonador das
reivindicatório por uma educação de qualidade, ofertada pelo estado,
críticas do Manifesto dos
admitindo-se cooperação do setor privado. Contundo, o olhar
Pioneiros foi a visão dada
reivindicatório paira sobre a educação a ser ofertada pelo estado,
ao ensino religioso na
principalmente para as classes populares.
Constituições Federal de
1891. As críticas
4.2.4 O banco mundial e a educação brasileira permaneceram sobre o
texto das constituições de
O Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento 1934 e 1937.
(BIRD), conhecido como Banco Mundial foi criado em 1944 e surgiu com a
tarefa de reconstruir os países europeus desestruturados pelo segundo
grande conflito mundial.
Sob um forte domínio dos Estados Unidos, que o preside desde a
fundação, o Banco tinha como objetivo, discutir os rumos das reformas do
pós-guerra, visando impulsionar o crescimento econômico e evitar novas
crises internacionais.
Vale ressaltar que, nesse contexto, ao Banco era dado um papel
secundário: o da reconstrução das economias inviabilizadas pela guerra e
para concessão de empréstimos, a longo prazo, para o setor privado,
recaindo sobre o FMI o maior interesse das nações líderes (TOMMASI,
1996, p. 18).
De sua criação até hoje, o Banco Mundial passou por mudanças
consideráveis, conseqüência das transformações ocorridas no cenário
mundial.
Assim, a partir dos anos 50, paulatinamente, foi adquirindo um
perfil de instituição financiadora de projetos em países emergentes ou em
desenvolvimento, ampliando, inclusive, para cerca de 180, o número de
países membros (FONSECA, 1997, p. 46). Isto lhe deu a condição de ser,
na contemporaneidade, a instituição de maior influência no cenário
político e econômico e educacional do mundo.

4.2.5 A criação das leis de diretrizes e bases da educação nacional

A Constituição Federal de 1946 foi a primeira a trazer no seu texto


a expressão “diretrizes e bases”, associadas à questão da educação
nacional. Porém, as discussões para a efetivação de uma lei que tratasse
especificamente da educação só ocorreu em 1961.
Apesar de ser inovadora, no sentido de propor legalmente uma
estrutura para a educação nacional, esta lei não trouxe significativas
mudanças para o cenário do período.
Destaca-se a sua importância na unificação dos sistemas escolar e

583
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

sua capacidade descentralizadora, transmitindo para os estados membros


da federação a autonomia para exercer a função educadora e o da
distribuição de recursos para a educação.
O Estado buscou com o texto constitucional, no campo da
educação, satisfazer às exigências da época, sem faltar com suas
obrigações e sem desconsiderar as reivindicações do Manifesto dos
Pioneiros (já apresentados no nosso texto), representante de uma
ideologia renovadora próxima da concepção liberal e idealista da
educação, que exigia que o Estado assumisse um programa de educação
nacional, laica, pública e obrigatória para todos, contestando a educação
como privilégio de classe. E, por outro lado, este mesmo Estado ouviu as
exigências da "corrente católica", ainda doutrinária e influente, que queria
estar presente no cenário da educação, do qual foi excluída com a
expulsão dos jesuítas (CARVALHO, 2008).
Para Saviani (1997, p.21), este período foi marcado pelo contexto
político e econômico de um país que fazia as “substituições de
importações” e dava os primeiros passos para o avanço da
industrialização, visando proporcionar o desenvolvimento do país,
condição necessária para a sua libertação nacional.
Com a mudança econômica e a ruptura política provocada pelo
golpe militar de 1964, ao mesmo tempo em que se buscava uma
libertação, se propagava uma política ideológica nacionalista. Isto
desencadeava um plano econômico que levava à industrialização do país,
através de uma progressiva desnacionalização da economia. O Brasil tinha
como opção:
[...] ou compatibilizar o modelo econômico com a ideologia
nacionalizando a economia, ou renunciar ao nacionalismo
desenvolvimentista e ajustar a ideologia política à
tendência que se manifestava no plano econômico.
(SAVIANI, 1997, p.82, apud CARVALHO, 2008).

Em 1965, através da Lei 4.464, o Brasil regulamenta a


organização de órgãos de representação estudantil, e estabelece acordos
como o do MEC e seus órgãos, com a USAID (agência internacional de
desenvolvimento dos EUA), que fazia assistência técnica e cooperação
financeira, gerando o acordo MEC-USAID. Através deste acordo as
reformas no Ensino Superior, acabam incorporando as tendências
modernizantes da economia (CARVALHO, 2008).
A autora afirma, ainda, que no setor econômico, a indústria
buscava ser mais autônoma, porém para isso era necessário o investimento
do capital estrangeiro que se instalava no país, trazendo junto consigo
influências nos vários outros setores, como o político e o social. A educação
novamente foi considerada meio para se estabelecer a ordem e o
progresso, ou melhor, para promover o desenvolvimento que dependia de
uma modernização dos meios de comunicação. Esta preocupação foi
precursora do slogan "Educação direito de todos. Escola para todos”. Esse

584
História da Educação UAB/Unimontes

slogan fez com que as exigências de reestruturação educacional, sob a


ótica do projeto de educação do MEC-USAID, fossem incorporadas na lei
5692/71, segunda lei de diretrizes e bases d educação. Esta traz a idéia de
escola única, com a justificativa de profissionalização universal do ensino
de 2º grau. Assim sendo, o ensino primário, antes organizado em: 1º ao 4º
ano primário e 1ª a 4ª série ginasial, se unifica no chamado 1º grau de 1ª a
8ª série; o 2º grau se profissionaliza e o currículo é reorganizado tendo
como principal objetivo a formação do cidadão nacionalista, que vive na
ordem e que produz para o progresso. Essa reforma trouxe um grande
esvaziamento da qualidade de ensino.
Além disso, por se tratar de uma lei promulgada durante o regime
militar, continha fortes pressões às inovações educacionais que trouxessem
DICAS
qualquer tipo de ameaça para o regime ditatorial. Fortaleceu-se, no
período, a criação de instituições particulares que atendiam plenamente
aos ditames dos militares (CARVALHO, 2008).
Número de Constituições
4.2.6 Da constituição de 1988 à lei nº 9.394/1996 no Brasil

No ano de 1988, é promulgada a atual Constituição que traz no Constituição de 1824;


artigo 3º "... educação é um direito de todos e dever do Estado e da Constituição de 1891;
família..."(BRASIL, 1988) para o estabelecimento do pleno Constituição de 1934;
desenvolvimento. Depois desta data, vários outros documentos são Constituição de 1937;
criados, em âmbito nacional, para fazer valer os seus ideais para a Constituição de 1946;
educação, vejamos: Constituição de 1967;
? em 24 de novembro de 1995, foi aprovada a Lei 9.131, Constituição de 1969 (que
dispondo sobre as atribuições do Conselho Nacional de Educação. Este alterou partes do texto da
órgão vinculado ao MEC tem funções normativas, deliberativas e de C.F de 1969) e
assessoramento ao Ministro de Estado da Educação, no desempenho das Constituição de 1988.
funções e atribuições do poder público federal em matéria de educação,
cabendo-lhe formular e avaliar a política nacional de educação, zelar pela
qualidade do ensino, velar pelo cumprimento da legislação educacional e
assegurar a participação da sociedade no aprimoramento da educação
brasileira (MEC, 2008);
? em 1996, é criada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, Lei nº 9.394/1996. Segundo Segundo Saviani (1997), a LDBEN
surge da mobilização do grupo de educadores que lutaram durante todo o
regime militar e em consonância com as novas necessidades da sociedade
brasileira. Complementa, ainda, que historicamente a nossa educação
caminhou, ora respondendo às políticas, ora indo ao encontro das
necessidades da nossa economia, mas pouco preocupada com um
planejamento a longo prazo;
? em 2001, é aprovado o Plano Nacional de Educação. O Plano
Nacional de Educação (PNE) traça diretrizes e metas para a Educação no
Brasil e tem prazo de até dez anos para que todas elas sejam cumpridas.
Para isso, o governo transformou o PNE em lei, que passou a valer a partir

585
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

do dia 9 de janeiro de 2001. Entre as principais metas estão a melhoria da


qualidade do ensino e a erradicação do analfabetismo. Nem todos os itens
do plano foram aprovados pelo governo federal. Veja aqui o que é o PNE,
suas principais metas e os vetos do governo. As metas devem ser
reformuladas ao final do decênio e proposta para os próximos dez anos
(BRASIL, 2008) e
em 2007, o governo lança o Plano de Desenvolvimento da
?
Educação (PDE 2007), com medidas com as quais o governo espera
melhorar o desempenho das instituições educacionais de todos os níveis.
Embora mais voltado para a educação básica, o Plano tem, no
concernente à educação superior, duas metas principais: a ampliação do
acesso e a articulação entre os programas de financiamento do ensino
superior.

4.3 A EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL PÓS LDBEN 9.394/1996

Em se tratando de ensino superior, o Brasil registra um


crescimento no número de matrícula e na criação de novos cursos,
sobretudo na rede privada. No entanto, segundo Dourado (2002), as
políticas de expansão da educação superior, no país, caracterizam-se por
serem assincrônicas e o nível de ensino por mostrarem-se amplos e
heterogêneos, permeados por práticas de natureza pública e privada, com
predominância destas últimas (ALMEIDA e SILVA, 2007).
Nos últimos anos houve um processo expansionista no setor. Em
1999, por exemplo, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais, Inep, registra que o ensino superior brasileiro cresceu
substantivamente em 11,8% em relação à matrícula do ano anterior.
Para a então presidente do Instituto, Helena Guimarães de Castro,
esta foi a maior taxa das últimas duas décadas (CASTRO, 2000, apud
CATANI, 2002).
Contudo esta expansão ocorreu basicamente por intermédio de
centros universitários, faculdades integradas, instituições de ensino
superior e demais instituições isoladas, amparadas pelo Conselho
Nacional de Educação que, em 1999 aprovou a criação de 567 novos
cursos universitários – mais da metade do que fora aprovado em toda a
história do CNE (Folha de S. Paulo. S. Paulo 26.02.02).
Neste contexto, há, também, um novo delineamento na política
de formação de professores, vinculada ao estreitamento das exigências
postas pelas reformas educativas da educação básica que visam a
formação das novas gerações.
A formação inicial de professores, na ótica oficial, “deve ter como
primeiro referencial as normas legais e recomendações pedagógicas da
educação básica” (Mello, 1999). Constata-se, no setor, a idéia de que é
inviável ao poder público financiar, a preços das universidades tidas como
“nobres”, a formação superior de professores para a educação básica, uma

586
História da Educação UAB/Unimontes

vez que somam mais de um milhão.


Diz-se que, com um volume muito menor de recursos, em tempo e
situações de aprendizagem, também reduzidos, chega-se ao mesmo
resultado, justificando-se a aprovação, pelo CNE, do número de cursos
universitários, citados acima, sobretudo na iniciativa particular,
promovendo, quando não a concorrência ou parcerias entre os setores
público e privado.
Ainda, a esse respeito, o artigo de Helena Costa de Freitas (2002),
citando Freitas (1992), afirma que:
A política de expansão da educação dos institutos
superiores de educação e cursos normais superiores, desde
1999, obedece portanto a balizadores postos pela política
educacional em nosso país em cumprimento às lições dos
organismos financiadores internacionais. Caracterizados
como instituições de caráter técnico-profissionalizante, os
ISE's têm como objetivo principal a formação de professores
com ênfase no caráter técnico instrumental, com
competências determinadas para solucionar problemas da
prática cotidiana, em síntese, um “prático”.
No viés ideológico, o Banco Mundial exerce uma função
exponencial. No entendimento de Coraggio (1996), em estudo publicado
por Dourado (2002 apud ALMEIDA e SILVA, 2007), esta instituição está
por trás da idéia que defende um reducionismo economicista, baseado no
vetor custo-benefício, assim como da descentralização que permite
desarticular setores já organizados e da capacitação docente, em
programas paliativos e rápidos, com os professores em serviço.
Neste último caso, cria-se a ilusão de um movimento de constante
melhoria na capacitação pedagógica, o que na prática se configura por
aparente atualização, muitas vezes desfigurando a realidade onde o
professor atua e alienando-o com mistificações pedagógicas ou conteúdos
vazios de formação acadêmica, causando uma situação inversamente
proporcional ao discurso, pois exclui as populações pobres do mercado, o
qual baseia suas exigências no acúmulo de conhecimentos específicos e
não na educação via amenidades.
O ensino no Brasil enfrenta uma situação singular nas duas
últimas décadas. Fruto de lutas, contradições, adaptações às tendências,
interesses econômicos, se vê numa situação de reestruturação, tanto para
a melhoria de sua qualidade (ideal dos educadores dedicados a uma
proposta de promoção social), quanto para a geração de riqueza aos
capitalistas da educação.
Na lógica de adaptações às tendências contemporâneas,
podemos citar a educação a distância. Modalidade que vivencias agora.
Alternativa para proporcionar educação à pessoas em localidades
distantes ou em horários não convencionais, tem se mostrada como uma
alternativa ascendente e de grande debate no meio acadêmico.

587
REFERÊNCIAS

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592
ATIVIDADES DE
APRENDIZAGEM
- AA

1 – Comente sobre a importância de estudar a educação a partir do


contexto histórico.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

2 – A educação primitiva se caracteriza pela sua forma simples, onde a


criança é inserida no meio social através da experiência de vida das
gerações passadas. Em relação aos povos primitivos marque com (V) as
alternativas verdadeiras e com (F) as alternativas falsas.

a. ( ) A educação prática não é organizada, compreende a busca de


alimentos, abrigo e vestuário, se dividindo em dois estágios.
b. ( ) No primeiro estágio da educação prática, a criança participa das
atividades dos adultos aprendendo conscientemente por imitação.
c. ( ) O segundo estágio baseia-se na aquisição de conhecimento por
imitação, ou seja, a criança imita inconscientemente as atividades dos
adultos.
d. ( ) A educação teórica consiste na transmissão dos adultos às gerações
mais jovens os conhecimentos das cerimônias, danças e rituais que
caracterizam o culto religioso dos povos primitivos.

3 – A educação baseada na linguagem escrita era ministrada pelo


sacerdócio e compreende a instrução formal e o treino prático representa
estágio avançado dos povos primitivos. Com relação a escrita e o processo
educativo, assinale a alternativa CORRETA.

a. ( ) O Egito é considerado a primeira civilização a produzir à escrita.


b. ( ) Com o sacerdote o processo educativo é mais formalizado, exigindo
uma classe de especialista.
c. ( ) A casta sacerdotal, implantou o primeiro sistema de ensino formal,
para a formação do sacerdote escriba, que era considerado o guardião da
ordem religiosa e responsável pela administração da sociedade.
d. ( ) A escrita era mediadora entre o homem e os deuses, a formação
será centrada nos rituais.

593
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

4- Em que consiste o renascimento?


______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
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______________________________________________________________

5 - Estabeleça a diferença entre a reforma e a Contra-Reforma.


______________________________________________________________
______________________________________________________________
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6 - Descreva as principais modificações ocorridas no período renascentista


no campo cultural, científico e artístico.
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______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

7 – A hegemonia que os jesuítas exerceram na ação pedagógica durante o


período colonial é um fato histórico. Em mais de quinhentos anos de
história da educação brasileira, duzentos e dez tiveram a condução da
Companhia de Jesus. Em relação à educação jesuítica no Brasil, marque
com (V) as alternativas verdadeiras e com (F) as alternativas falsas.

a. ( ) Os padres jesuítas contribuíram com a formação da elite colonial.


b. ( ) A companhia de Jesus veio ao Brasil para proteger os povos
indígenas contra a exploração dos colonizadores portugueses.
c. ( ) As crianças e os jovens indígenas se submeteram facilmente à ação
educativa dos padres jesuítas.
c. ( ) A ação missionária e catequética dos jesuítas dirigiu-se, inicialmente,
aos povos indígenas, especialmente às crianças.

8 – No período jesuítico a educação primária, na sua maior parte, ficava


aos cuidados das famílias, ou seja, as famílias é quem se responsabilizava
pela iniciação da escolaridade da criança, porém as famílias mais
afortunadas optavam por pagar um preceptor ou por delegar o ensino de
suas crianças aos cuidados de um parente mais letrado. Em relação à

594
História da Educação UAB/Unimontes

história da Educação no Brasil, ao longo do período colonial, assinale a


alternativa CORRETA.

a. ( ) As práticas educativas desenvolvidas pelos jesuítas baseavam-se no


ideário iluminista amplamente divulgado, naquele momento, na Europa.
b. ( ) Os jesuítas foram importantes divulgadores da doutrina católica nas
terra recém-descobertas.
c. ( ) As ações educativas dos jesuítas eram desenvolvidas a partir de um
grande respeito e diálogo para com a cultura dos povos indígenas.
d. ( ) Os jesuítas pouco se preocupavam com a educação das elites
coloniais, pois estas tinham outros colégios onde estudar.

9 – Completa os espaços em branco, nas alternativas a seguir, com as


palavras indicadas. Não se esqueça de flexioná-las, de modo que as
orações fiquem gramaticalmente corretas.

Excluir inclusivo civilizado menina

pobre imperial jesuíta exclusiva

a. A ação educativa escolar, ao longo do Império, deveria levar os setores


mais _______________ da população a incorporar hábitos ditos
________________________.
b. Apesar de algumas mudanças, a escola _______________se
caracterizava por ser tão ___________________quanto a escola dos
tempos coloniais.
c. Uma das características da educação ministrada pelos _____________
era o fato de ela ___________________ a maioria da população.

10 – Como a educação no Brasil tinha um caráter elitista, frases como a do


Senador baiano João José de Oliveira Junqueira, senador entre 1873 e
1887, ficaram famosas:
“certas matérias, talvez, não sejam convenientes para o pobre; o menino
pobre deve ter noções muito simples”.
Considerando os ideais de educação o que esta frase demonstra?
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________

595
Artes Visuais Caderno Didático - 1º Período

11 – A partir de 1890 é iniciou-se uma discussão para a criação da nova


constituição que vigoraria durante todo o período da república velha, ou
seja, de sua promulgação em 1891 a 1930. de acordo com Romanelli
(1983), esta Constituição instituiu o sistema federativo de governo,
consagrou também a descentralização do ensino, prevista em seu artigo
35, itens 3º e 4º que reservou à União certos direitos. Considerando o
acima exposto todas as questões abaixo estão corretas EXCETO:

a. ( ) Criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados;


b. ( ) Aos Estados cabia criar a controlar o superior e o ensino
profissionalizante, na época, este compreendia principalmente escolas
normais (de nível médio) para moças e escolas técnicas para rapazes.
c. ( ) Prover a instrução secundária no Distrito Federal;
d. ( ) À União cabia criar e controlar a instrução primária em todo o
território nacional, bem como criar e controlar o ensino secundário
acadêmico e a instrução em todos os níveis do Distrito Federal;

12 – O Grande marco educacional do período de 1889 a 1891, foi a


reforma educacional proposta por Benjamim Constant Botelho de
Magalhães, nomeado ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos.
Pode-se afirmar que o ensino neste período assumiu um caráter de
dualidade. Explique que dualidade é esta.
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
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______________________________________________________________

13 – Considerando as mudanças provocadas pela REFORMA


EDUCACIONAL DE BENJAMIM CONSTANT, marque F para as
afirmativas FALSAS E V para as afirmativas VERDADEIRAS.
As principais intenções desta Reforma foram:

a. ( ) duração do curso secundário em 8 anos;


b. ( ) transformar o ensino em formador de alunos para os cursos
superiores e não apenas preparador;
c. ( ) obrigatoriedade do regime seriado;
d. ( ) substituir a predominância científica pela literária.

14 – As estratégias do Banco Mundial, no Brasil como em outras partes do


mundo, é a de apoiar os investimentos “que encorajem o crescimento
econômico e o desenvolvimento social, num contexto de estabilidade
macroeconômica”. Segundo o Banco como em outras partes do mundo, a

596
História da Educação UAB/Unimontes

pesquisa no Brasil mostra que o retorno social do investimento em


educação primária (36%) é consideravelmente maior que o investimento
quer na educação secundária (5%) quer na superior (21%) (Banco
Mundial, 1995 a: 11).
Portanto, para o Banco, no caso do Brasil, é prioritário: Todas as afirmativas
abaixo estão corretas EXCETO:

a.( ) providenciar livros didáticos;


b. ( ) melhorar as habilidades dos professores no que diz respeito a
técnicas de sala aula, preferencialmente, na própria escola e/ou à
distância, num processo de capacitação contínua;
c. ( ) as propostas de capacitação dos professores devem levar em conta
a avaliação das atividades e da eficácia das mesmas na mudança de
comportamento didático-pedagógico dos professores;
d. ( ) desenvolver a capacidade de gerenciamento setorial, incluindo o
monitoramento e assessoramento do desempenho dos alunos.
e. ( ) melhorar a remuneração recebida pelos professores e demais
prestadores de serviço à educação.

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