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A demolição da construção
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no Brasil sombrio
Autores
Adriano Correia Afonso Celso Lana Leite
Alex Degan Artur Nogueira Santos e Costa
Christian Laval Clayton Cardoso Romano
Daniel França Oliveira Daniele Cristina de Souza
Edemilson Antunes de Campos Idalice Ribeiro Silva Lima
Ileizi Fiorelli Silva Ira Shor
Jacqueline Sinhoretto Janaina Francisca de Souza Campos Vinha
Jean Pablo Guimarães Rossi Larissa Brito Ribeiro
Lorene Figueiredo Lúcio Marques
Luis Felipe Miguel Márcio Ferreira de Souza
Marilena Chaui Michel Oliveira
Natália Aparecida Morato Fernandes Peter McLaren
Rafaela Cyrino Régia Cristina Oliveira
Ricardo Fernandes Pátaro Ricardo Musse
Wagner da Silva Teixeira
Conselho Editorial
A demolição da construção
7;lo1uࢢޣ1-7-;71-2ޥo
no Brasil sombrio
2021
1ª edição
Porto Alegre
© 2021 Idalice Ribeiro Silva Lima; Régia Cristina Oliveira
D383
A demolição da construção democrática da educação no Brasil sombrio
/ organizado por Idalice Ribeiro Silva Lima, Régia Cristina Oliveira. - Porto
Alegre, RS : Zouk, 2021.
524 p. ; 16cm x 23cm.
Inclui bibliografia.
ISBN: 978-65-5778-032-9
www.editorazouk.com.br
Dedicamos este livro a Paulo Freire, in memória, e a todos
e todas que lutam pela educação democrática no Brasil e
noutras partes do mundo.
A tradição dos oprimidos nos ensina que o ‘estado de exceção’
em que vivemos é na verdade regra geral. Precisamos construir
um conceito de história que corresponda a essa verdade. Nesse
momento, perceberemos que nossa tarefa é originar um verdadeiro
estado de exceção; com isso, nossa posição ficará mais forte na
luta contra o fascismo.
Walter Benjamin
Sumário
Apresentação
Idalice Ribeiro Silva Lima e Régia Cristina Oliveira
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Prefácio
A escola democrática e seus inimigos
Christian Laval
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Introdução
Democracia e a educação como direito
Marilena Chaui
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Posfácio
A educação no governo Bolsonaro
Ricardo Musse
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Idalice Ribeiro Silva Lima
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Apresentação
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Idalice Ribeiro Silva Lima
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1 Projeto de livro este que se iniciou no término da segunda edição das Jornadas de Discussão
intituladas Educação, Ideologias e Movimento Escola Sem Partido, realizadas na Universidade
Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Política, Trabalho,
Educação e Cultura (Gepptec), vinculado ao Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão em
Filosofia e Ciências Sociais (Lafics) do Departamento de Filosofia e Ciências Sociais do Instituto
de Educação, Letras, Artes, Ciências Humanas e Sociais (Ielachs).
2 Por exemplo, as Jornadas de Discussão já mencionadas.
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Apresentação
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Apresentação
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Idalice Ribeiro Silva Lima
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Apresentação
As organizadoras
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Prefácio
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Christian Laval
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Prefácio
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Essa educação só tem sentido se estiver ancorada num ideal e num pro-
jeto de soberania popular. Só se torna concebível a partir do momento em que
se afirma que são os cidadãos comuns, “os de baixo”, isto é, o maior número de
pessoas, que devem escolher seu próprio destino, não para o colocar nas mãos
dos mais poderosos, mas para determiná-lo, por eles mesmos, em órgãos so-
beranos ao seu alcance nos lugares onde vivem e trabalham.
Todavia, deparamo-nos com uma nova dificuldade: como os pode-
res instituídos poderiam aceitar uma educação orientada para um objetivo
tão radical quanto o que consiste no exercício do poder pelos “de baixo”?
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Prefácio
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Introdução
Democracia e a educação como direito
Marilena Chaui
I.
Pesquisas do CPDOC e do Iser, realizadas em 2018, buscaram verificar
o que a população brasileira entende por direitos do cidadão e, entre estes,
quais são considerados por ela como os mais fundamentais. Os resultados
foram alarmantes:
– 45% dos entrevistados não tinham ideia do que é um direito do cida-
dão e tendiam a identificar “direito” com “o que é correto” ou “o que é certo”,
dando uma interpretação moral para um conceito sociopolítico;
– dos 55% restantes, que entendiam, mesmo que vagamente, o que é
um direito do cidadão, praticamente todos colocaram a segurança pessoal
como o primeiro dos direitos e apenas 11% consideraram a educação como
um direito do cidadão;
– desses 11%, apenas 5% disseram que o direito à educação deve ser
assegurado pelo Estado por meio da escola pública gratuita.
Curiosamente, porém, ao serem indagados sobre suas aspirações e de-
sejos, 60% dos entrevistados colocaram a instrução, juntamente com o empre-
go, entre suas aspirações principais.
Na mesma época, uma outra pesquisa, dessa vez circunscrita ao estado
de São Paulo, feita pelo jornal O Estado de S.Paulo, indagava a opinião da
população sobre a escola pública de Ensino Fundamental. As respostas foram
de dois tipos: os entrevistados pertencentes às classes populares afirmaram
que a escola já havia sido melhor, mas que a violência, de um lado, e a apro-
vação automática dos alunos, de outro, haviam prejudicado a qualidade do
ensino; por sua vez, os entrevistados pertencentes à classe média, que haviam
ou perdido o emprego ou tido uma redução salarial, explicaram que os filhos
sempre haviam frequentado escolas particulares e que somente pela força das
circunstâncias adversas estavam sendo obrigados a cursar a escola pública, o
que para eles era um verdadeiro castigo, uma humilhação e um infortúnio,
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II.
Estamos acostumados a aceitar a definição liberal da democracia como
regime da lei e da ordem para a garantia das liberdades individuais. Visto que
o pensamento e a prática liberais identificam liberdade e competição, essa de-
finição da democracia significa, em primeiro lugar, que a liberdade se reduz à
competição econômica da chamada “livre iniciativa” e à competição política
entre partidos que disputam eleições; em segundo, que há uma redução da lei
à potência judiciária para limitar o poder político, defendendo a sociedade
contra a tirania, pois a lei garante os governos escolhidos pela vontade da
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III.
Conservando marcas da sociedade colonial escravista, patriarcal e pa-
trimonialista, a sociedade brasileira é marcada pelo predomínio do espaço
privado sobre o público e, tendo o centro na hierarquia familiar, é fortemente
hierarquizada em todos os seus aspectos: nela, as relações sociais e intersub-
jetivas são sempre realizadas como relação entre um superior, que manda, e
um inferior, que obedece. Isso explica o fascínio pelos signos de prestígio e
de poder, que aparece, por exemplo, na manutenção de criadagem doméstica
cujo número indica aumento de status, ou no uso de títulos honoríficos sem
qualquer relação com a possível pertinência de sua atribuição, o caso mais
corrente sendo o uso de “Doutor” quando, na relação social, o outro se sente
ou é visto como superior, de maneira que “doutor” é o substituto imaginário
para os antigos títulos de nobreza.
Na sociedade brasileira, as diferenças e assimetrias são sempre trans-
formadas em desigualdades, e estas, em inferioridade natural (no caso das
mulheres, dos trabalhadores, negros, índios, migrantes, idosos) ou como
monstruosidade (no caso dos LGBTQIA+), reforçando a relação de mando
e obediência. O outro jamais é reconhecido como sujeito nem como sujei-
to de direitos, jamais é reconhecido como subjetividade nem como alteri-
dade. As relações entre os que julgam iguais são de “parentesco”, isto é, de
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Democracia e a educação como direito
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Introdução
Democracia e a educação como direito
IV.
O que chamamos de neoliberalismo nasceu de um grupo de econo-
mistas, cientistas políticos e filósofos, que, em 1947, reuniu-se em Mont Saint
Pèlerin, na Suíça, para se opor contra o surgimento do Estado de Bem-Estar
Social, no qual o Estado regulamenta a economia e o mercado e dirige os fun-
dos públicos para os direitos sociais dos trabalhadores (salário-desemprego,
salário-família, férias, moradia, saúde e educação). Esse grupo elaborou um
detalhado projeto econômico e político no qual atacava o Estado de Bem-Estar
Social, afirmando que esse tipo de Estado destruía a liberdade dos cidadãos e
a competição, sem as quais não há prosperidade. Essas ideias permaneceram
como letra morta até a crise capitalista do início dos anos 1970, quando o ca-
pitalismo conheceu, pela primeira vez, um tipo de situação imprevisível, isto
é, baixas taxas de crescimento econômico e altas taxas de inflação: a famosa
estagflação. O grupo de neoliberais passou a ser ouvido com respeito porque
oferecia a suposta explicação para a crise: esta, diziam eles, fora causada pelo
poder excessivo dos sindicatos e dos movimentos operários que haviam pres-
sionado por aumentos salariais e exigido o aumento dos encargos sociais do
Estado. Teriam, dessa maneira, destruído os níveis de lucro requeridos pelas
empresas e desencadeado os processos inflacionários incontroláveis. Feito o
diagnóstico, o grupo propôs os remédios: 1) Um Estado forte para quebrar o
poder dos sindicatos e movimentos operários, controlar os dinheiros públicos
e cortar drasticamente os encargos sociais e os investimentos na economia; 2)
Um Estado cuja meta principal deveria ser a estabilidade monetária, contendo
os gastos sociais e restaurando a taxa de desemprego necessária para formar
um exército industrial de reserva que quebrasse o poderio dos sindicatos; 3)
Um Estado que realizasse uma reforma fiscal para incentivar os investimentos
privados e, portanto, que reduzisse os impostos sobre o capital e as fortunas,
aumentando os impostos sobre a renda individual e, portanto, sobre o traba-
lho, o consumo e o comércio; 4) Um Estado que se afastasse da regulação da
economia, deixando que o próprio mercado, com sua racionalidade própria,
operasse a desregulação; em outras palavras, abolição dos investimentos esta-
tais na produção, abolição do controle estatal sobre o fluxo financeiro, drástica
legislação antigreve e vasto programa de privatização (Harvey, 1992).
Como podemos observar, o neoliberalismo é decisão de investir o fun-
do público no capital e privatizar os direitos sociais, de maneira que podemos
definir o neoliberalismo como alargamento do espaço privado dos interesses
de mercado e encolhimento do espaço público dos direitos. Seu pressuposto
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Referências
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Luis Felipe Miguel
Michel Oliveira
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Luis Felipe Miguel
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Tudo isso ruiu nos últimos anos. As eleições de 2018 consagraram, pela
primeira vez na história do País, um discurso abertamente hostil à igualdade
e aos direitos.1 Não foi só a presidência. Os candidatos que ganharam os go-
vernos da maioria dos estados aderiram a esse perfil, de maneira menos ou
mais radical. E, se logo após as eleições de 2014, o diretor do Departamento
Intersindical de Assessoria Parlamentar, Antônio Augusto de Queiroz, julgava
que fora eleito o Congresso mais conservador desde 1964 (Sousa; Caram,
2014), quatro anos depois ele precisaria reconhecer que o recorde fora ultra-
passado mais uma vez (Queiroz, 2018).
A eleição de Jair Bolsonaro foi a culminação de um movimento que
ganhara as ruas no final do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff,
tomara corpo na agressiva campanha eleitoral de 2014 e cumprira papel de-
cisivo no golpe de Estado de 2016. A direita brasileira que, constrangida pela
mentalidade dominante, costumava andar disfarçada, passou a se assumir
sem rodeios – e, na ofensiva, anatematizar a esquerda como sendo equivalen-
te à desordem e à corrupção. Numa reviravolta surpreendente, foi a esquerda
que começou a se disfarçar. Candidata à prefeitura de São Paulo em 2016,
Marta Suplicy, que mudara de partido mas fizera toda sua carreira política no
PT, declarava: “Eu nunca me coloquei como alguém de esquerda” (Turollo
Jr.; Reverbel, 2016).
No bojo desta direita que perdera a vergonha de se assumir como tal,
diferentes grupos sociais buscaram forjar uma matriz ideológica, um discurso
que legitimasse suas práticas políticas. Uma das faces dessa empreitada é o
movimento em favor de uma pretensa “Escola Sem Partido”. Ele é importante
não apenas pelo que representa como ameaça às liberdades e à educação crí-
tica, mas também por ter sido uma arena de contestação em que as diversas
correntes da direita brasileira construíram sua união. Na primeira seção do
texto, discutimos possíveis definições de “direita” e de “conservadorismo”, de-
marcando o campo conceitual em que nos movemos, e indagamos o sentido
da “onda conservadora” identificada nos últimos anos no Brasil. Na segunda
seção, apresentamos a agitação em torno do Escola Sem Partido como central
para o processo de criminalização da esquerda – em complemento à Operação
Lava Jato – e, portanto, à emergência de um macarthismo à brasileira. Na
terceira seção, singularizamos a noção de “neutralidade” como dispositivo
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