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MÓDULO
Organizadoras:
Débora Dupas Gonçalves do Nascimento
Sandra Maria do Valle Leone de Oliveira
Sílvia Helena Mendonça de Moraes
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
MÓDULO
Unidade 1
Unidade 3: Tecnologias de Trabalho
Sociedade e Trabalho Contemporâneo
em Tempos de Epidemia/Pandemia na Perspectiva da Vigilância em Saúde
3.1 Territorialização em Saúde
Unidade 2 3.2 Geoprocessamento em Saúde
3.3 Informação em Saúde
Políticas Públicas no Enfrentamento 3.4 Educação em Saúde
das Doenças Virais
Unidade 4
Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia
Aline Priscila Batista • Aline Siqueira Fogal • Cesar Augusto Orazem Favoreto • Ísis Eloah Machado
James Venturini • Larissa Fernanda Fonseca Guedes • Luciane Bresciani Salaroli
Renata Cristina Rezende Macedo do Nascimento • Olívia Maria de Paula Alves Bezerra
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Formato: PDF
Inclui bibliografia
ISBN: 978-85-66909-34-0
CDD: 614
CDU: 614.4
Í
Índice para catálogo sistemático:
Saúde Pública 614
© 2021. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Fundação Oswaldo Cruz Mato Grosso do Sul (Fiocruz MS) Apoio técnico-administrativo
Isabela Pereira da Cunha
Saúde. Fundação Oswaldo Cruz Mato Grosso do Sul. Rua Gabriel Abrão, 92 – Jardim das Nações, Campo Grande/MS
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fonte e é vedada sua utilização comercial. Felipe Vieira Pacheco
Margeci Leal de Freitas
CRÉDITOS
Ministério da Saúde Designers Gráficos
Coordenação Geral Hélder Rafael Regina Nunes Dias
Marcelo Antônio Cartaxo Queiroga Lopes Humberto Nadeu Bijos
Débora Dupas Gonçalves do Nascimento
Ministro Sandra Maria do Valle Leone de Oliveira Renato Silva Garcia
Sílvia Helena Mendonça de Moraes
Secretaria de Vigilância em Saúde – SVS Coordenadoras de Desenvolvimento
Arnaldo Correia de Medeiros Coordenador Acadêmico Janaína Rolan Loureiro
Leonardo Cançado Monteiro Savassi Regina Beretta Mazaro
Secretário
Coordenadora Pedagógica Desenvolvedores
Departamento de Saúde Ambiental, do Trabalhador e Adélia Delfina da Motta Silva Julio César Coimbra de Oliveira
Vigilância das Emergências em Saúde Pública Larissa Mendes Ribeiro
Daniela Buosi Rohlfs Autores Leandro Koiti Oguro
Alberto Mesaque Martins Marcos Felipe Reis Barroso
Diretora Paulo Henrique Wosniak Franco Ferreira
Aline Priscila Batista
Aline Siqueira Fogal Rebeca Beatriz Lopes Cruz
Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz Celina Maria Modena Thiago Fernandes de Oliveira
Nísia Trindade Lima Cesar Augusto Orazem Favoreto
Presidente Isis Eloah Machado Editor de Audiovisual
James Venturini Luciana Ferreira Nantes
Larissa Fernanda Fonseca Guedes
Fundação Oswaldo Cruz Mato Grosso do Sul – Fiocruz MS Luciane Bresciani Salaroli Ilustrador da capa
Jislaine de Fátima Guilhermino Olivia Maria de Paula Alves Bezerra Everton Ferreira Lemos
Coordenadora Renata Cristina Rezende Macedo do Nascimento
Revisor
Consultora Davi Bagnatori Tavares
Coordenação de Educação da Fiocruz MS
Janaína Sallas
Débora Dupas Gonçalves do Nascimento Assessoria de Comunicação
Vice- coordenadora de Educação Avaliadores Técnico-científicos Bruna Karla Bezerra da Cruz
Janaína Sallas Thayssa Maluff de Mello
Secretaria-Executiva da Universidade Aberta do SUS – Jonas Lotufo Brant de Carvalho
Apoio acadêmico
UNA-SUS Claudia Stutz Zubieta
Conteudista (questões de avaliação)
Maria Fabiana Damásio Passos James Venturini Gisela Maria Azambuja de Oliveira
Secretária-executiva
SUMÁRIO
Ficha técnica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
Apresentação do módulo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
Para promover a qualificação dos trabalhadores da saúde em vigilância e cuidado em saúde para o enfrentamento da COVID-19 e
de outras epidemias de doenças transmissíveis por vírus no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), neste Módulo do Programa
Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde no Enfrentamento da COVID-19 e de outras Doenças Virais, intitulado Fundamentos e
Tecnologias para o Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais, estudaremos as seguintes unidades: “1 Sociedade e Trabalho
Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia”, “2 Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais”, “3 Tecnologias de
Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde: 3.1 Territorialização em Saúde; 3.2 Geoprocessamento em Saúde; 3.3 Informação em
Saúde; e 3.4 Educação em Saúde” e “4 Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia”.
Nesse processo educativo, com os conteúdos programáticos propostos, esperamos que você, trabalhador estudante, possa
compreender a sociedade contemporânea de forma articulada com os pressupostos da saúde coletiva, considerando as políticas
públicas que incidem sobre o SUS e as tecnologias e ferramentas do campo da Vigilância em Saúde, visando a uma melhor efetividade
das ações de enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais.
Nosso foco aqui é abordar as principais estratégias e políticas públicas que envolvem a organização do SUS em toda a sua complexidade
e potencialidade, para que possamos entender qual é a nossa real capacidade de enfrentamento de epidemias ou pandemias, do
ponto de vista da integralidade, da equidade, da seguridade e da justiça social.
Bons estudos!
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 1
Olá, trabalhador estudante. Seja bem-vindo à Unidade 1! Nesta unidade, você conhecerá diferentes conceitos de saúde, assim como o
processo saúde-doença e sua determinação social e biológica, além do contexto social e econômico global e do país antes e durante
a pandemia. Também fará parte do processo de ensino-aprendizagem um histórico da pandemia de COVID-19 no contexto global e
no Brasil, baseado em dados epidemiológicos referentes à situação de casos, óbitos e da cobertura vacinal.
Queremos proporcionar a você a possibilidade de identificar as novas configurações do trabalho durante a pandemia e seus
desdobramentos atuais e futuros no emprego, na saúde e na segurança da classe trabalhadora, além de refletir sobre o impacto da
pandemia de COVID-19 nos indicadores de saúde da população brasileira durante e no pós-pandemia, com destaque aos acometidos
por doenças, e sobre os impactos nos serviços de saúde, em especial na Atenção Primária à Saúde (APS).
Por isso, convidamos você para uma profunda reflexão sobre o reconhecimento da importância do SUS pela população brasileira,
além dos desafios e perspectivas das políticas públicas e do SUS.
Desejamos a você um excelente aproveitamento desta unidade!
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM DA UNIDADE
1. Compreender diferentes conceitos de Saúde, processo saúde-doença e sua determinação social e biológica;
2. Compreender o contexto social e econômico global e do país antes e durante a pandemia;
3. Descrever o histórico da pandemia de COVID-19 no contexto global e no Brasil;
4. Identificar as novas configurações do trabalho durante a pandemia e seus desdobramentos atuais e futuros no emprego,
na saúde e na segurança da classe trabalhadora;
5. Refletir sobre o impacto da pandemia de COVID-19 e de outras epidemias nos indicadores de saúde da população
brasileira durante e no pós-pandemia, com destaque aos acometidos por doenças, e sobre os impactos nos serviços de
saúde, em especial na Atenção Primária à Saúde.
O presente conteúdo-base foi cuidadosamente planejado e elaborado pelas autoras visando a oferecer
a você, trabalhador estudante, um conjunto de informações atuais, fidedignas e baseadas em evidências
científicas, na tentativa de contribuir para a compreensão das principais transformações ocorridas na
sociedade e, especialmente, no mundo do trabalho durante a pandemia de COVID-19 em curso.
Não se pretendeu, contudo, esgotar o assunto proposto para essa unidade, e isso nem seria possível, pois
a história da pandemia ainda está sendo construída por todos nós, atores sociais envolvidos, verdadeiras
testemunhas oculares deste momento sem precedentes na história recente da saúde pública mundial e
brasileira. Este momento histórico que estamos vivendo, e sobre o qual muito ainda temos a aprender,
certamente representará um divisor de águas na história da humanidade.
Portanto, aqui apresentamos tão somente o “caminho das pedras” para que você, trabalhador estudante,
possa explorar outros caminhos e se orientar em suas reflexões e ações, guiado pelas políticas públicas que
serão implementadas em seu trabalho cotidiano. Cabe ao coletivo de trabalhadores da saúde se empenhar
para ampliar cada vez mais o seu conhecimento sobre essa temática tão desafiadora. Vamos em frente!
1.2 CONCEITOS DE SAÚDE: REFLEXÕES SOBRE A DETERMINAÇÃO SOCIAL E BIOLÓGICA DA SAÚDE-DOENÇA
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 17
Falar em saúde no Brasil passa inevitavelmente pela VIII Conferência Nacional da
Saúde, realizada em 1986, considerada um marco na história da saúde no Brasil.
Das amplas discussões e reflexões coletivas realizadas naquela conferência, que O conceito ampliado de saúde traz em si o potencial
contou com mais de 4000 participantes, emergiu um novo conceito de saúde, mais de orientar as políticas públicas em diferentes
abrangente e de acordo com a nossa realidade, baseado na determinação social do níveis e setores de governo (como educação,
processo saúde-doença. Na nova concepção, a saúde seria não apenas um “estado saúde, habitação, saneamento básico, segurança,
de completo bem-estar físico, mental e social” (e não a ausência de enfermidades), alimentação, meio ambiente, entre outros), de
como havia preconizado a Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1946, mas, modo que sua implementação promova melhores
sim, “a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio condições de saúde e melhor qualidade de vida
ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e para toda a população.
acesso a serviços de saúde”. Esse conceito foi ratificado na Constituição Federal de
1988 e, junto com outras importantes diretrizes elaboradas durante a VIII Conferência,
constituiu a base para a criação do Sistema Único de Saúde, o SUS (BRASIL, 2019).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 18
Por ultrapassar as fronteiras de distintos campos do conhecimento e
atuar nas interfaces entre elas, é fundamental que você entenda que
a abordagem da Saúde Única requer, necessariamente, uma visão
multiprofissional e inter-transdisciplinar, que envolve saberes e
profissionais de diferentes áreas do conhecimento, como a medicina
veterinária, a zootecnia, a medicina, a enfermagem, a nutrição,
a biologia, a engenharia ambiental, a engenharia agrícola, entre
outras (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA, 2021). Nesse sentido, somos desafiados a refletir:
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 19
FIGURA 1 – USO DE MÁSCARA INADEQUADA DURANTE A PANDEMIA
Fonte: AP (2020).
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FIGURA 2 – COMPARAÇÃO DOS VALORES ANUAIS DO AUXÍLIO EMERGENCIAL
Vale lembrar que a maioria dos trabalhadores e trabalhadoras
ENTRE 2020 E 2021
brasileiros depende do transporte público, geralmente
superlotado e em condições precárias de higienização e
ventilação, para acessar diariamente o seu local de trabalho,
especialmente nos grandes centros urbanos. Essa necessidade
torna ainda mais grave o risco de contrair a COVID-19, pois nessas
2020
condições é praticamente impossível evitar aglomerações. Além
Montante autorizado (em R$) 295
disso, você não pode esquecer que muitos desses trabalhadores
exercem seus ofícios nas ruas, em condições precárias de bilhões
segurança, expostos a intempéries e em contato direto com Valor inicial em 2020: 3 parcelas de 600 reais.
grande quantidade de transeuntes. Eles estão impedidos de
permanecer em isolamento domiciliar, pois necessitam manter
o seu trabalho ativo para sobreviver, ainda que em condições de
risco elevado para a doença.
2021
Nesse contexto, visando a minimizar os impactos Montante autorizado (em R$) 44
socioeconômicos da pandemia e viabilizar o isolamento e o
distanciamento social, o governo federal instituiu, em abril de
bilhões
Valor médio em 2021: 4 parcelas de 250 reais.
2020, o Programa Emergencial de Preservação do Emprego e da Fonte: elaboração das autoras.
Renda (Medida Provisória – MP nº 936/2020) e o da Renda Básica
Emergencial (RBE) (Lei nº 13.982/2020). O auxílio financeiro Tudo isso, associado à exclusão, em 2021, de 22,6 milhões de beneficiários iniciais do
emergencial, inicialmente no valor de R$ 600,00 mensais, foi programa, dificultou ainda mais a obtenção das condições mínimas de sobrevivência
direcionado à população de baixa renda que teve o cadastro para que os trabalhadores pudessem permanecer em isolamento domiciliar, e vimos,
aprovado para se tornar beneficiária do programa (BARBOSA; assim, a doença atingir níveis alarmantes no país (BRASIL, 2021a).
PRATES, 2020).
A pandemia de COVID-19 explicitou e agravou ainda mais as já profundas e persistentes
Inicialmente, o auxílio emergencial abrangeu um contingente desigualdades sociais presentes no Brasil: em agosto de 2021, cerca de 61 milhões de
de 68,2 milhões de brasileiros. No entanto, boa parte da habitantes se encontravam em situação de pobreza e 19,3 milhões em situação de
massa trabalhadora não teve acesso a esse auxílio. Além extrema pobreza (SANTOS, 2021), em um país que volta, nesse momento, a fazer parte
disso, o montante autorizado pelo Congresso Nacional para do Mapa da Fome.
o auxílio emergencial, que em 2020 foi de R$ 295 bilhões, em
2021 foi reduzido para R$ 44 bilhões (Figura 2). O valor pago
inicialmente, que consistia em três parcelas de R$ 600,00, foi
alterado em 2021 para quatro parcelas com valor médio de SAIBA MAIS
R$ 250,00 (R$ 150,00 para pessoas que moravam sozinhas, R$
250,00 para domicílios com mais de uma pessoa e R$ 375,00 Para você saber mais sobre o Mapa da Fome, elaborado pela
para mães solo), instituído pela Medida Provisória nº 1.039, de Organização das Nações Unidas (ONU), e o risco que o Brasil corre
18 de março de 2021 (BRASIL, 2021a). de retornar a ele, acesse o vídeo Brasil pode voltar para o mapa
da fome da ONU, do Jornal da Cultura. Nele, temas importantes
como o da insegurança alimentar e nutricional e a produção de
alimentos no Brasil e no mundo são abordados. Disponível em:
https://youtu.be/GTbHYF7yv7M.
Nota dos Autores: Os vídeos de YouTube indicados neste módulo são complementares ao conteúdo e podem ser retirados do
ar a qualquer momento e sem aviso prévio, não havendo qualquer responsabilidade das instituições envolvidas.
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1.3 CONTEXTUALIZAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA NO PERÍODO PRÉ-PANDEMIA
SAIBA MAIS
Se você quiser conhecer mais sobre a história
do SUS, seus fundamentos e organização,
bem como seus avanços e impactos,
sugerimos a leitura do livro Desafios do
SUS, de autoria do Professor Eugênio Vilaça
Mendes (2019), disponível em:
Blocos econômicos mundiais. Fonte: Wikimedia Commons
https://www.conass.org.br/biblioteca/
desafios-do-sus/
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A pandemia nos obrigou a refletir sobre os impactos das nossas ações
(especialmente as corporativas) no planeta e sobre a necessidade de fortalecer “a Convidamos você a ouvir a música O dia em que a Terra
consciência de que a saúde é um bem indivisível, e de que o gênero humano está Parou, de Raul Seixas. Nela, o compositor imagina
vinculado por um destino comum” (BERLINGUER, 1999, p. 23). uma situação futura de caos planetário, em que as
Ou seja, você pode perceber que estamos "sentindo na carne" como um vírus novo pessoas não podem sair de suas casas e interrompem
que surge em algum lugar no mundo é capaz de, em poucos meses, se espalhar as suas atividades cotidianas. Para ouvir a música,
e causar grande destruição e sofrimento em praticamente todos os cantos do clique no link:
planeta, a ponto de alterar totalmente os rumos da história da humanidade e https://youtu.be/H8zbYY41Vus
fazer o planeta literalmente parar, como cantou Raul Seixas.
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Recentemente, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)
divulgou dados alarmantes sobre o aquecimento global. No relatório do Grupo de
Trabalho 1 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC – ONU)
(INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE, 2021), especialistas constataram
que, se o aquecimento global causado pela emissão de gases responsáveis pelo efeito
estufa não for limitado a 1,5 grau centígrado até 2030, o planeta sofrerá impactos sem
precedentes, como calor e frio extremos, degelo do Ártico, aumento do nível do mar,
redução de corais e cardumes, extinção de vertebrados, insetos e espécies vegetais,
escassez de alimentos, aprofundamento da miséria, da pobreza e da fome, entre outros.
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Abdicar da visão antropocêntrica e cuidar bem da Mãe Terra e de tudo que nela habita ou existe, como nos ensinaram nossos ancestrais, é
também evitar novas epidemias e pandemias, é cuidar de nossa saúde e a das gerações futuras (KRENAK, 2020b). A esse respeito, o Grupo
de Trabalho 2 do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC – ONU) está preparando um documento a ser divulgado em
breve, no qual alertará fortemente para a relação entre os impactos das mudanças climáticas, da exploração da vida selvagem e da perda
de habitats naturais e a emergência de epidemias e pandemias. Alertará também para o risco de ruptura social caso o cenário de destruição
dos ecossistemas não seja radicalmente modificado (INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE, 2019).
SAIBA MAIS
Se você quiser conhecer um pouco mais sobre os impactos ambientais e suas consequências nas condições
de vida e de saúde das populações, sugerimos a leitura da entrevista realizada com o líder indígena Ailton
Krenak, publicada no jornal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) (KRENAK, 2020c). Nela,
o autor expressa suas ideias a respeito da crise ambiental global e a ocorrência de epidemias e pandemias
como a que estamos vivenciando no momento:
https://www.ufrgs.br/jornal/ailton-krenak-a-terra-pode-nos-deixar-para-tras-e-seguir-o-seu-caminho/
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1.4 A PANDEMIA DE COVID-19: HISTÓRICO, CONTEXTO GLOBAL E BRASILEIRO
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Você, caro trabalhador estudante, saberia dizer quais medidas de saúde pública devem
ser adotadas quando estamos vivenciando uma pandemia como a da COVID-19?
A seguir apresentamos algumas medidas de saúde pública a serem adotadas no atual
contexto de pandemia.
• Isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens,
meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de
maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus (BRASIL, 2020);
• Quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de
contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres,
animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de O número elevado de infectados pela COVID-19 e de óbitos decorrentes
maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus da doença provocou colapsos pontuais nos sistemas de saúde. Problemas
(BRASIL, 2020); de saúde mental se tornaram mais frequentes devido às medidas de
confinamento, ao medo de se contaminar e adoecer gravemente ou mesmo
• Distanciamento social: limitar o contato próximo entre pessoas infectadas e outras
de falecer ou perder entes queridos em decorrência da doença. Assim, como
pessoas para reduzir as chances de transmissão do SARS-CoV-2 (BRASIL, 2021b).
trabalhador estudante, você deve ter percebido o impacto ocupacional e
psicológico dos envolvidos diretamente no enfrentamento da COVID-19,
quanto às mudanças introduzidas na rotina de trabalho, como aumento
SAIBA MAIS da jornada de trabalho, criação de espaços de isolamento e reforço das
recomendações para uso dos Equipamentos Proteção Individual (EPI).
Caro trabalhador estudante, para saber mais sobre as medidas No Brasil, um país com dimensões continentais, uma desigualdade social
de proteção da COVID-19, consulte o Guia de Vigilância acentuada, com populações vivendo em condições precárias de habitação e
Epidemiológica COVID-19 (BRASIL, 2021b) do Ministério da saneamento, sem acesso sistemático à água e em situação de aglomeração, e
Saúde do Brasil, que está disponível no link a seguir. altos índices de desemprego, os desafios foram e ainda são maiores (OLIVEIRA
https://w w w.gov.br/saude/pt-br/coronavirus/ et al., 2020; WERNECK; CARVALHO, 2020). Assim, o conceito físico de onda
publicacoes-tecnicas/guias-e-planos/guia-de-vigilancia- se tornou uma ferramenta importante para análise do desenvolvimento da
epidemiologica-covid-19/view pandemia, caracterizado pelo número de casos e óbitos.
No link a seguir, que está dentro do site da OMS, você pode observar o
comportamento da pandemia no Brasil, com destaque para as ondas
epidemiológicas ocorridas ao longo do seu desenvolvimento e o surgimento
de novas variantes do novo coronavírus (WORLD HEALTH ORGANIZATION,
2021b): https://COVID19.who.int/region/amro/country/br.
SAIBA MAIS
Se você tem interesse, pode acessar o link disponibilizado pelo
Ministério da Saúde do Brasil para acompanhar a síntese de
casos, óbitos, incidência e mortalidade pelo novo coronavírus
no país (BRASIL, 2021c). Disponível em:
https://COVID.saude.gov.br/
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A necessidade de contenção da pandemia com
medidas não farmacológicas, como isolamento SAIBA MAIS
social, uso de álcool em gel, higiene e uso de
Se você, trabalhador estudante, quiser saber mais sobre a evolução da vacinação no Brasil,
máscara, tendo em vista a cobertura vacinal ainda
basta acessar o link a seguir. Nele você pode selecionar o estado ou clicar no mapa do Brasil
em andamento diante das ondas de contaminação
para acompanhar o número de doses aplicadas em cada unidade da federação (BRASIL, 2021d).
e novas variantes do vírus, revela ainda mais a
Disponível em:
exposição de grupos vulneráveis, como motoristas
de ônibus, caixas de supermercados, profissionais da https://www.gov.br/saude/pt-br/vacinacao/
limpeza urbana, profissionais de saúde envolvidos Você pode acompanhar a situação epidemiológica atual de número de casos, óbitos e cobertura
diretamente no enfrentamento da doença, além dos vacinal no Brasil e no mundo. Basta clicar no mapa disponibilizado pela OMS (WORLD HEALTH
povos indígenas e quilombolas. Além disso, verifica- ORGANIZATION, 2021c). Disponível em:
se o incremento de adoecimento mental das pessoas
em confinamento, indivíduos em home office e temor https://COVID19.who.int/
pelo risco de adoecimento e morte.
No início da pandemia, permanecemos em isolamento social, esperando que a sociedade, pois revela uma cultura participativa e organizativa local e o grau de
rotina normal fosse restabelecida em poucos meses. No entanto, ao longo do empoderamento e autonomia de seus membros, o que contribui sobremaneira
tempo percebemos a necessidade de nos adaptar às medidas de segurança e para a melhoria dos indicadores de saúde e de qualidade de vida (ANDRADE;
de enfrentar os desafios e as possibilidades dessa nova forma de viver, que se VAITSMAN, 2002).
prolonga por mais tempo.
Assim, podemos afirmar que, quanto maior a quantidade e o alcance das redes de
Mesmo com a vacinação avançando no país, é importante replicar para o público solidariedade, mais organizada e mobilizada uma sociedade se encontra, o que é
a importância de manter as medidas não farmacológicas de proteção. indicativo da participação voluntária (individual ou coletiva) enquanto exercício
da democracia, da autonomia e da cidadania. Você deve ter verificado que, tanto
A evolução do Plano Nacional de Vacinação tem alcançado êxito no enfrentamento
no Brasil quanto em outros países, no momento de enfrentamento do novo
da COVID-19. Porém, já são conhecidas variantes do coronavírus que podem
coronavírus, a solidariedade se tornou um instrumento importante para ajudar
provocar novas ondas da doença, e o reforço das medidas de isolamento,
indivíduos em estado de vulnerabilidade, o que certamente garantiu a eles maior
distanciamento social, uso de máscara e higiene pessoal impactam fortemente a
conforto, segurança e tranquilidade do que teriam na ausência dessas redes.
redução da disseminação do novo coronavírus.
Estabelecer esses cuidados na rotina de trabalho e na orientação dos usuários dos
serviços de saúde é fundamental para o enfrentamento da pandemia. SAIBA MAIS
Destaca-se também a importância das redes de apoio e solidariedade no Se você quiser saber mais sobre as redes de solidariedade,
enfrentamento de emergências e catástrofes. Essas redes, geralmente formadas sugerimos a leitura do boletim disponível no link: https://
por Organizações Não Governamentais (ONGs), movimentos sociais, organizações w w w.unicamp.br/unicamp/sites/default/files/
da sociedade civil, empresas, universidades e grupos de indivíduos, são capazes Boletim%20Covid-19%20do%20DPCT-IG%20n19%20
de responder em momentos de crise, ainda que parcialmente, às demandas (2).pdf
emergenciais dos atingidos relacionadas, por exemplo, à alimentação, vestuário,
medicamentos, água, higiene pessoal e ambiental, até que o poder público possa Nele, você poderá se informar sobre o funcionamento, durante
se organizar minimamente para assumir o provimento e coordenação das ações a pandemia, de algumas dessas redes em comunidades
(HE; HARRIS, 2020). A estruturação de redes de apoio e solidariedade como as indígenas, quilombolas e de outros povos tradicionais (SILVA;
citadas pode ser considerada um dos indicadores de desenvolvimento de uma GITAHY; BALDASSA, 2020).
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1.5 O MUNDO DO TRABALHO NA PANDEMIA DE COVID-19: NOVAS CONFIGURAÇÕES DO TRABALHO
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No Brasil, a crescente desregulamentação da legislação trabalhista já vinha alterando
profundamente as formas de organização, contratação, remuneração e gestão do
trabalho, com o agravamento do desemprego, da pobreza e da fome, associado à
fragilização das condições de trabalho, à superexploração da força de trabalho e à
desproteção previdenciária aos trabalhadores e trabalhadoras, essencial em casos
de afastamentos por acidentes e adoecimentos relacionados ao trabalho (ANTUNES,
2018). Porém, a pandemia explicitou e aprofundou ainda mais as desigualdades
econômicas e sociais, que já eram alarmantes.
A reestruturação produtiva, delineada a partir da década de 1990 e intensificada
nos anos recentes, ganhou impulso no cenário pandêmico, no qual o trabalho
humano presencial, considerado importante fator de risco para a COVID-19, passou
a ser percebido em determinados contextos não apenas como perfeitamente
substituível por novas tecnologias de informação e comunicação, mas também
Nesse contexto, destacam-se os processos conhecidos como
como desnecessário ou até mesmo indesejável. A “nova morfologia do trabalho” é
“uberização” e “pejotização” do trabalho. Na uberização, o
baseada nos chamados “sistemas flexíveis” de produção capitalista (ANTUNES, 2012),
trabalhador, geralmente denominado de empreendedor,
que incluem novas tecnologias de informação e comunicação (TICs) e de produção
parceiro ou prestador de serviços, cadastra-se em plataformas
(Indústria 4.0: inteligência artificial, robótica, internet das coisas e computação em
digitais e oferece o seu trabalho. A função dessas plataformas
nuvem), redução numérica da força de trabalho, exigência de maior qualificação do
é conectar o prestador de serviços aos consumidores. Se
trabalhador, reorganização do controle social do trabalho (terceirização, flexibilização
aprovado, o trabalho passa a ser executado conforme a
da forma e duração dos contratos, trabalho intermitente, remuneração por horas
demanda dos consumidores, porém sem qualquer vínculo
trabalhadas ou por produção, entre outras), e, ao mesmo tempo, na superexploração
formal de trabalho e de forma totalmente independente,
do trabalhador e da trabalhadora, com perda de direitos sociais e baixíssimos níveis
com horários e jornadas de trabalho variáveis, remuneração
de remuneração.
imediata e sem qualquer tipo de responsabilidade por parte
da empresa em caso de acidentes ou adoecimentos dos
trabalhadores. Já são bem conhecidas do público as atividades
SAIBA MAIS “uberizadas” de transporte, alimentação e segurança
Se você quiser saber mais sobre a nova organização da patrimonial, por exemplo, mas esse processo vem ocorrendo
produção, o que é a indústria 4.0 e como ela vem ocorrendo em vários segmentos, inclusive na área da saúde (UCHÔA-DE-
no Brasil, sugerimos que acesse os links a seguir (PORTAL DA OLIVEIRA, 2020).
INDÚSTRIA, 2020; ANTUNES, 2012):
http://www.portaldaindustria.com.br/industria-de-a-z/ SAIBA MAIS
industria-4-0/
Se você quiser saber mais sobre como
https://nuso.org/articulo/a-nova-morfologia-do- essa forma de organização do trabalho
trabalho-no-brasil-reestruturacao-e-precariedade/ impacta a saúde dos trabalhadores
e trabalhadoras, sugerimos que
leia o artigo de Uchôa-de-Oliveira
(2020), disponível em: https://doi.
org/10.1590/2317-6369000012520
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 30
Já a pejotização deriva do termo Pessoa Jurídica (ou PJ) e, como o próprio
nome indica, refere-se à contratação do trabalhador não como pessoa
física, mas como empresa, constituída por ele (pessoa jurídica), que será
denominada de prestadora de serviços. Assim, a relação contratual
passa a ocorrer entre duas empresas, não mais entre uma empresa
contratante e o trabalhador físico por ela contratado. O trabalhador,
agora transformado em PJ, trabalhará mediante demanda, perdendo
não só parte do valor da sua remuneração, mas também direitos Como mencionado anteriormente, durante a pandemia muitos trabalhadores passaram
trabalhistas essenciais, como férias, décimo terceiro salário, cobertura a trabalhar de forma remota, em sistema de home office, e, para garantir a execução
previdenciária, FGTS, remuneração por horas extras, auxílio-transporte ágil e segura desse processo, novas tecnologias de informação e comunicação para
e auxílio-alimentação, assistência à saúde e todos os demais direitos utilização simultânea de grande número de usuários foram aperfeiçoadas e passaram
trabalhistas. Mas, no discurso empresarial, passa a ser “independente”, a ser amplamente utilizadas. Os aparelhos celulares e notebooks particulares se
“seu próprio chefe”, uma empresa “parceira”, um “empreendedor”, dando transformaram em ferramentas essenciais de trabalho a serviço dos empregadores, e o
ao trabalhador a impressão de que está sendo reconhecido e valorizado, espaço domiciliar se transformou em espaço laboral. Houve uma invasão do trabalho
e não explorado (ANTUNES, 2018). nos horários de cuidados com os filhos, de refeições e de descanso, aumentando as
Essas novas formas de organização do trabalho ditas “flexíveis”, além de despesas domiciliares e trazendo para dentro de casa fatores de risco relacionados ao
agravarem o subemprego e aprofundarem ainda mais as desigualdades trabalho, como os riscos ergonômicos e psíquicos.
sociais, também provocam impactos muito negativos no setor Saúde, pois As reuniões de trabalho passaram a ocorrer de forma remota em praticamente todos os
remetem ao SUS toda a responsabilidade pelo acolhimento, prevenção, setores; as aulas e atividades escolares passaram a ocorrer da mesma forma, trazendo
cuidado, tratamento e reabilitação dos trabalhadores e trabalhadoras grande desgaste e sofrimento para estudantes, professores e pais; consultas médicas
acidentados e cada vez mais adoecidos física e mentalmente no exercício remotas, quando possível, passaram a ser incentivadas; as compras pela internet e por
do trabalho dito “flexível”. aplicativos e plataformas digitais (e-commerce) foram intensificadas; e o transporte
solicitado por aplicativo se tornou opção mais segura que os transportes coletivos.
Aos poucos essa rotina foi se incorporando mais e mais à vida das pessoas, e situações
como trabalho remoto, uberização e pejotização foram, em inúmeros casos, as únicas
alternativas de trabalho para os trabalhadores tentarem sobreviver de alguma forma
em um contexto socioeconômico e sanitário adversos. Por fim, nada indica que, em um
cenário pós-pandêmico, essa nova forma de trabalhar será abandonada para retorno
da forma presencial.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 31
Além disso, chamam a atenção os casos de violência doméstica contra mulheres, adolescentes,
crianças e idosos, desencadeada pela maior permanência deles no ambiente domiciliar, junto com
seus agressores. No Brasil, uma em cada quatro mulheres foi vítima de algum tipo de violência
durante a pandemia, e, em 2020, foram registrados 230.160 boletins de ocorrência por lesão corporal
no contexto do domicílio, sendo 1.350 deles decorrentes de assassinatos de mulheres devido ao
gênero (FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2021).
Antes mesmo que a adoção de medidas não farmacológicas e a campanha de imunização para
contenção da COVID-19 avançassem no Brasil, o retorno ao trabalho presencial e a abertura do
comércio já haviam sido praticamente restabelecidos em muitas regiões do país, contribuindo para
uma nova onda epidêmica da doença. Com o avanço da vacinação, em meados de julho de 2021, o
percentual de ocupação de leitos de UTI para COVID-19 começou a baixar. Em 11 de agosto de 2021,
nenhum estado ultrapassava 80% de ocupação de leitos de UTI para COVID-19, aliviando um pouco
o sistema de saúde pública e também o privado.
No entanto, o número de trabalhadores e trabalhadoras que se contaminaram e ainda se contaminam
nos ambientes de trabalho é elevado, embora as estatísticas relacionadas a isso não tenham sido
capazes de retratar fielmente essa realidade até o momento, pois o reconhecimento da COVID-19
como doença relacionada ao trabalho sofreu alguns revezes em termos legais e administrativos, e
os casos registrados no país com emissão de Comunicação de Acidentes de Trabalho (CAT) foram
relacionados principalmente a trabalhadores do setor Saúde. O Observatório Nacional de Segurança
e Saúde no Trabalho, do Ministério Público do Trabalho (MPT), evidenciou o baixo índice de casos de
COVID-19 considerados como doença ocupacional: apenas cerca de 20,8 mil CATs foram emitidos
para mais de 19 milhões de casos de COVID-19 registrados até julho de 2021. Ressalta-se que a
CAT é emitida somente para trabalhadores formais com cobertura previdenciária. Até setembro SAIBA MAIS
de 2021, no Brasil, os casos de COVID-19 efetivamente considerados como ocupacionais foram
Se você quiser conhecer os dados de
os que ocorreram em setores de alto risco, como os trabalhadores da saúde na linha de frente do COVID adquirida em decorrência do
enfrentamento da doença. Nesses casos, ocorre a presunção de que a contaminação ocorreu no trabalho em seu município, em seu
ambiente ou em decorrência do trabalho, sem a necessidade de comprovação. Para os trabalhadores estado e no país, visite o Observatório
de outros setores, é necessário o estabelecimento do nexo causal, ou seja, estabelecer a relação de Segurança e Saúde no Trabalho/MPT
inequívoca entre o adoecimento e o exercício do trabalho. Poucos casos nessas condições foram (OBSERVATÓRIO DE SEGURANÇA E SAÚDE
reconhecidos até o final de agosto de 2021. Em Minas Gerais, por exemplo, apenas dois casos foram DO TRABALHADOR, 2021). Disponível em:
reconhecidos no período; ainda assim, mediante decisão judicial. https://smartlabbr.org/sst
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1.6 AS CONDIÇÕES DE SAÚDE DA POPULAÇÃO BRASILEIRA NO PÓS-PANDEMIA: COVID-19 CRÔNICA OU COVID-19
LONGA, E SEQUELAS DA DOENÇA COMO DESAFIOS AO SUS
SAIBA MAIS
Convidamos você, trabalhador estudante, a assistir ao vídeo do programa jornalístico intitulado Boletim Corona, que fala sobre as sequelas causadas
em pacientes recuperados de COVID-19, classificadas por alguns especialistas como COVID-19 crônica ou COVID-19 longa. Disponível em:
https://portal.fiocruz.br/video/sequelas-em-pacientes-recuperados-da-COVID-19-boletim-corona
Você também pode ouvir o podcast CoronaFatos – Episódio 63, cujo tema é a COVID-19 longa. Produzido pelo Canal Saúde/Fiocruz, o episódio
conta com a participação da pesquisadora da Fiocruz, professora da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz) e membro
do Observatório COVID-19 Fiocruz Margareth Chrisóstomo Portela. O programa aborda os principais sintomas da COVID-19 longa (COVID-19
crônica ou COVID-19 longa), quem tem mais risco de desenvolver a síndrome pós-COVID e o desafio que isso representa para o sistema de saúde.
Disponível em:
https://portal.fiocruz.br/noticia/coronafatos-episodio-63-covid-longa
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 33
Além disso, esse cenário de enfrentamento dessa nova realidade demandará
maiores investimentos do governo, bem como intervenções de saúde pública
para conter a disseminação viral durante e no pós-pandemia e para se preparar
para novas pandemias no futuro. Assim, tornam-se necessários planejamento
e investimentos significativos de recursos financeiros e humanos no SUS e
fortalecimento dos sistemas de informação e da Vigilância Epidemiológica.
Além disso, um esforço interdisciplinar e coletivo torna-se fundamental para
minimizar o impacto da COVID-19 crônica ou COVID-19 longa nos estados e
em todo o Brasil (THE LANCET, 2021).
Deve-se destacar que, além dos problemas adicionais de saúde decorrentes
da COVID, há ainda a demanda reprimida de cirurgias eletivas, exames
diagnósticos e terapêuticos e consultas de diferentes especialidades que foram
suspensas nos períodos de picos da COVID-19 para não sobrecarregar ainda
mais os serviços de saúde. Além disso, doenças emergentes e reemergentes,
como dengue, sarampo, influenza, chikungunya e zika, se somam aos
agravos crônicos e causas externas e demandam também maior atenção e
financiamento dos diferentes níveis de atenção à saúde. O Programa Nacional
de Imunizações (PNI) do Ministério da Saúde também foi afetado no período
de pandemia, tendo em vista que a cobertura vacinal, principalmente infantil,
foi inferior ao esperado. O ideal é que essa cobertura fique entre 90% e 95%
da população infantil (OCKÉ-REIS, 2020; BRASIL, 2015b).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 34
1.7 RECONHECIMENTO DA IMPORTÂNCIA DO SUS PELA POPULAÇÃO BRASILEIRA: DESAFIOS E PERSPECTIVAS
DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E DO SUS
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 35
Será necessário sistematizar e analisar todas as iniciativas e ações implementadas Equipamentos de Proteção Individual e insumos: as indústrias e as redes de
– ou não – na atual pandemia para, na eventualidade de outras, talvez em breve, distribuição de EPIs e insumos (como oxigênio) devem estar articuladas com o
podermos atuar de forma imediata e resolutiva no controle da transmissão e na setor Saúde para garantir o abastecimento imediato e constante em situações
proteção da população, iniciando pelos grupos mais vulneráveis (trabalhadores de emergência sanitária.
da linha de frente, idosos, portadores de comorbidades, gestantes, nutrizes,
Medicamentos essenciais: a indústria de medicamentos também deve estar
puérperas, trabalhadores dos serviços essenciais, etc.). Essas ações podem ser
estrategicamente articulada com o setor Saúde para a rápida produção e
mais bem compreendidas considerando alguns aspectos dos sistemas de saúde
distribuição de medicamentos em casos emergenciais, preferencialmente com
na iminência de novas epidemias e pandemias, como:
autonomia nacional.
• Avaliação do conhecimento científico já produzido sobre o tema;
Recursos humanos no SUS: adequação do dimensionamento das equipes locais
• Prevenção e identificação de surtos, epidemias e pandemias; de saúde às necessidades locais/regionais e qualificação para o atendimento de
demandas imediatas devido à emergência sanitária.
• Preparo do SUS local para o enfrentamento de uma possível emergência
sanitária; Comunicação em saúde: estabelecimento imediato de diálogo franco e
baseado em dados científicos e oficiais com a população, diretamente ou por
• Comunicação do risco à população;
meio de campanhas midiáticas de esclarecimento, informação e orientação
• Planejamento das ações para o controle/mitigação; sobre as condutas preventivas e curativas a serem adotadas.
• Preparo dos serviços para a prevenção, acolhimento, tratamento e Fortalecimento da vigilância epidemiológica: aprimoramento do sistema de
reabilitação dos indivíduos acometidos e da demanda reprimida, informações em saúde para identificação e notificação de suspeitas e casos da
especialmente das doenças crônicas, durante a fase de emergência; doença.
• Notificação eficaz das suspeitas e casos ao sistema de vigilância; Fortalecimento da vigilância sanitária: melhoria das condições de saneamento
• Implementação imediata de cuidados não farmacológicos; básico locais e dos processos de vigilância sanitária em observância ao RSI e às
normas sanitárias nacionais e locais.
• Estruturação, organização e implementação do plano de imunização em
âmbito local; Educação permanente em saúde: adoção de hábitos de vida saudáveis, com
estímulo ao consumo de alimentos e preparações locais/regionais seguras do
• Mensuração e informação dos resultados das ações; ponto de vista quantitativo e qualitativo, com respeito à soberania alimentar
• Avaliação da eficácia dos mecanismos de controle adotados. e à cultura alimentar local, boas práticas de escolha e preparo dos alimentos
e higiene dos locais e de equipamentos e utensílios de preparo dos alimentos
Ao serem notificados pelas autoridades sanitárias do primeiro surto, os serviços (inclusive na alimentação escolar e institucional); realização de higiene corporal
de saúde devem acionar o sinal de alerta e algumas medidas imediatas de e das vestimentas dos manipuladores de alimentos; estímulo à prática de
contenção da transmissão da doença devem estar disponíveis, entre elas: atividade física regular e, na medida do possível, redução do tempo de tela;
Fortalecimento do SUS: deve ser viabilizado sempre, reconhecendo que, implementação de programas de cessação do tabagismo e etilismo; entre outros.
embora tenhamos boa estrutura para, por exemplo, a imunização, muito ainda é Educação ambiental: estímulo da população, especialmente de crianças, jovens
necessário melhorar em outros aspectos, e é preciso garantir o financiamento do e o empresariado do entorno, a cuidar dos ambientes de vida, de trabalho e de
sistema e a formação de recursos humanos suficientes e capacitados para atuar lazer, de modo a proteger e preservar os biomas.
em todos os níveis de atenção em situações de emergência sanitária.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 36
Educação para o trabalho: empoderamento da população trabalhadora para a entre pessoas em salas de espera e locais de exames e atendimentos. É preciso
identificação de riscos ocupacionais nos ambientes de trabalho, com destaque melhorar também a ventilação natural e os espaços de circulação de pessoas
para os riscos biológicos e acidentes com materiais perfurocortantes; implemen- nas unidades de saúde, permitindo maior distanciamento entre as estações de
tação e treinamento de equipes para uso correto de EPIs e Equipamentos de Pro- trabalho e o estabelecimento de fluxos de trabalho e de pessoas que permitam
teção Coletiva (EPC). evitar cruzamentos e aglomerações.
Educação permanente para a prescrição e utilização consciente de Higiene e organização das estações de trabalho: as estações de trabalho
medicamentos: feito sempre sob cuidados e prescrição médica, seguindo precisam ser higienizadas diariamente ou até mais de uma vez por dia, na medida
os preceitos científicos recomendados pela OMS e pelo Ministério da Saúde. das necessidades, ainda que estejam aparentemente limpas. A organização dos
Valorizar e acreditar na ciência e contribuir com o conhecimento científico pode materiais, instalações (com destaque para sanitários e cozinhas/refeitórios),
salvar muitas vidas. mobiliários e equipamentos e sua permanência em boas condições de uso deve
ser prioridade das equipes de saúde e dos gestores. Sugere-se a elaboração de
Aprimoramento dos mecanismos de vigilância em saúde em âmbito local:
um manual local de prevenção e controle de riscos biológicos nos ambientes
qualificar as equipes de saúde para identificação e notificação de casos-índice
de trabalho das unidades de saúde, com destaque para o enfrentamento das
e surtos locais, que precisam ser ágeis e eficazes, e para a adoção de medidas
doenças transmissíveis.
adequadas e imediatas de contenção da multiplicação de casos. Deve-se
proceder ao treinamento permanente das equipes para notificação de casos/ Segurança e saúde dos trabalhadores e dos usuários: devem-se elaborar
suspeitas nos prazos estabelecidos pela vigilância epidemiológica, com especial mapas de risco locais (poucas unidades de saúde possuem, embora seja
atenção aos casos de notificação compulsória. A população também deve ser obrigatório), destacando os pontos de risco biológico e treinando os servidores
alertada a procurar o serviço de saúde tão logo apresente sintomas compatíveis e usuários a compreendê-los para que, utilizando esses mapas, evitem se expor
com doenças infecciosas potencialmente graves. desnecessariamente.
Melhoria dos sistemas de comunicação/tecnologias de informação: adequação Proteção de grupos vulneráveis contra a violência domiciliar (crianças,
e capacitação para a comunicação eficaz e tempestiva intra e extra equipes e com idosos, mulheres, trabalhadoras domésticas, entre outros): fortalecer
as comunidades, incluindo suas representações, ONGs e lideranças locais. o sistema de vigilância dos casos de violência domiciliar e os sistemas de
informação/notificação e de acolhimento e cuidados, com amparo psicológico,
Adoção de modalidades de trabalho remoto: com relação ao trabalho em
médico e policial.
saúde, é preciso treinar e equipar adequadamente, com softwares/aplicativos
e hardwares, os profissionais da saúde que podem exercer algum trabalho Pesquisas, ciência e tecnologia e extensão: as universidades e os centros de
em sistema de home office e em outras modalidades de trabalho remoto, na pesquisa e de produção de vacinas devem estar estrategicamente preparados para
eventualidade de ocorrer novas epidemias/pandemias como a atual. É preciso a produção de informações científicas, testes e imunizantes em casos emergenciais,
atentar para a saúde e segurança do trabalhador em sistema remoto. e tanto os gestores quanto a população precisam entender a sua importância.
Cabe à gestão pública aportar recursos financeiros suficientes para tal.
Prevenção de riscos ocupacionais no domicílio: ao migrar do trabalho
presencial para o trabalho remoto, o trabalhador leva para – ou cria em – seu Aprendizado com o passado e com o presente: é preciso que as unidades de
domicílio alguns riscos ocupacionais inerentes à execução do seu trabalho, saúde em todos os níveis façam reflexões coletivas de forma crítica e honesta,
como os ergonômicos, físicos, psíquicos e até mesmo biológicos (como livros, usando estratégias metodológicas adequadas, sobre a pandemia atual e
documentos mofados e empoeirados, matérias-primas, entre outros), o que estabeleçam interlocuções com outros serviços para elencar as dificuldades
aumenta os riscos de adoecimentos não só do trabalhador, mas também de vivenciadas, avaliar a eficácia das soluções adotadas e os indicadores locais de
outros membros de sua família. Cabe aos serviços de saúde adotar medidas para saúde-doença antes, ao longo e posteriormente ao período pandêmico e, com
eliminar ou minimizar esses riscos. base no aprendizado obtido e nas informações colhidas, elaborar estratégias
locais sistematizadas de detecção e enfrentamento de um provável evento
Adequação de espaços físicos: os espaços físicos das unidades de saúde
futuro. Em outras palavras, é preciso desenvolver e ter bem estabelecido um
precisam ser melhorados ou mais bem organizados, desde o acolhimento até o
plano de enfrentamento para ser colocado em prática ao primeiro sinal de uma
atendimento, especialmente prevendo a necessidade de distanciamento físico
possível epidemia-pandemia.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 37
Em um contexto pandêmico como o que atravessamos, já está bem claro que, se quisermos alcançar
o controle dessa ou de qualquer outra epidemia/pandemia, será imprescindível que o poder público
assuma efetivamente a responsabilidade pela condução das ações e também que cada indivíduo siga
rigorosamente os cuidados individuais possíveis, mediante a adesão às medidas já cientificamente
comprovadas como eficazes – as não farmacológicas já referidas e o esquema completo de
imunização. Em outras palavras, cuidar de si é também cuidar de todos: dos familiares, dos colegas de
trabalho, dos vizinhos e amigos, dos trabalhadores dos quais necessita, da sociedade como um todo.
E, para cuidar de si e do outro, o indivíduo precisa ser um sujeito de direitos e também de deveres,
ciente do seu papel crítico perante a vida e da necessidade de contribuir para a transformação do
planeta em um local melhor para as atuais e futuras gerações.
No entanto, o cuidar de si direcionado ao bem-estar coletivo pressupõe uma postura ética e moral
dos diferentes atores envolvidos no processo, além de empatia, solidariedade e responsabilidade para
com a sociedade, o que nem sempre ocorre. Infelizmente, a sensibilização e a mudança de postura
por parte da população para a questão do cuidar de si e do outro é mais um desafio que se coloca
para os serviços e aos profissionais de saúde nesse momento crucial da história da humanidade.
SAIBA MAIS
Leitura sugerida: se você quiser conhecer mais sobre a questão do
cuidado individual como estratégia de cuidado coletivo, sugerimos
a leitura do artigo O cuidado de si em Michel Foucault (GOMES;
FERRERI; LEMOS, 2018) e a leitura do livro História da Sexualidade: o
cuidado de si, de Michel Foucault (FOUCAULT, 2009), que deu origem
ao artigo.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 38
ENCERRAMENTO DA UNIDADE
Nesta unidade foi possível compreender diferentes conceitos de Saúde, processo saúde-doença e sua determinação
social e biológica, além do contexto social e econômico global e do país antes e durante a pandemia.
Além disso, foi apresentado o histórico da pandemia de COVID-19 no contexto global e no Brasil baseado em dados
epidemiológicos nacionais e internacionais referentes à situação de casos, óbitos e da cobertura vacinal.
Também foi possível identificar as novas configurações do trabalho, seus desdobramentos atuais e futuros no
emprego, na saúde e na segurança da classe trabalhadora e refletir sobre o impacto da pandemia de COVID-19 nos
indicadores de saúde da população brasileira e nos serviços públicos e privados de saúde, em especial na APS.
Destacou-se o reconhecimento da importância do SUS pela população brasileira, além dos desafios e perspectivas
das políticas públicas e do SUS.
Esperamos que você tenha aproveitado os conhecimentos compartilhados e que possa utilizá-los no enfrentamento
dos desafios atuais e que estão por vir. Boa sorte!
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 39
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Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 43
MINICURRÍCULO DAS AUTORAS
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 1 - Sociedade e Trabalho Contemporâneo em Tempos de Epidemia/Pandemia 44
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 2
Ao longo dos estudos, tenha em mente que esses pontos serviram de base para a
construção dos princípios do nosso Sistema Único de Saúde (SUS), que está em
constante construção.
2.2 MOMENTOS-CHAVE NA FORMAÇÃO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE PÚBLICA
Analisando a evolução das políticas públicas de saúde no Brasil, podemos É compreendida como a ação ou omissão do Estado, enquanto resposta
destacar vários períodos, cada qual com características marcantes que foram social, diante dos problemas de saúde e seus determinantes sociais,
influenciadas pelo momento político e econômico da época. Para trabalhar ambientais e culturais, bem como em relação à produção, à distribuição
com esse tema, é prático construirmos, juntos, uma linha do tempo que nos e à regulação de bens, serviços e ambientes que afetam a saúde dos
ajudará a entender as características e a tomada de decisão de cada momento. indivíduos e da coletividade (PAIM; ALMEIDA-FILHO, 2014, p. 70).
Então, vamos à nossa linha do QUADRO 1 – PRINCIPAIS FATOS HISTÓRICOS LIGADOS AO DESENVOLVIMENTO DAS POLÍTICAS
tempo para melhor entendimento PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL
de onde cada um dos pontos citados
se encaixa (Quadro 1). ANO/PERÍODO FATO
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 50
QUADRO 1 – PRINCIPAIS FATOS HISTÓRICOS LIGADOS AO DESENVOLVIMENTO DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NO BRASIL (CONTINUAÇÃO)
ANO/PERÍODO FATO
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 51
Como visto no vídeo, o SUS passou a ser o
Sistema Público de Saúde Brasileiro nascido dos
anseios da sociedade para contrapor o modelo
antigo, que separava a saúde individual da
saúde coletiva e era extremamente excludente.
E quais são as principais normativas QUADRO 2 – MOMENTOS E LEGISLAÇÕES IMPORTANTES NA ESTRUTURAÇÃO DO SUS
que estruturam e organizam o SUS?
Veja o Quadro a seguir com alguns
Art. 198 da Constituição de 1988: organiza e estrutura o SUS em todo o território nacional.
momentos e legislações importantes
na estruturação do SUS: Lei nº 8.080/1990 e Decreto nº 7.508/2011: regulamentam as bases da
organização e funcionamento do SUS (BRASIL, 1990a, 2011a).
Lei nº 8.142/1990 e Resolução nº 453/2012: participação da comunidade e
parte do financiamento e recursos (BRASIL, 1990b;2012a).
Dê uma olhada nessas normativas
1991: estruturação da rede de atenção básica em saúde com o Programa de (em especial no Decreto nº 7.508,
Agentes Comunitários de Saúde. que traz algumas definições
1992: aprovação da Norma Operacional Básica (NOB 01/1992) (BRASIL, 1992a). importantes, como a organização
do SUS por Regiões de Saúde) e
1993: descentralização e municipalização dos serviços. relembre os princípios doutrinários
1994: estruturação da Saúde da Família, com equipes multidisciplinares atuando e organizativos do SUS, que são
nas comunidades. a essência das políticas que se
desenvolveram a partir dele. Ao
2002: publicação da Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS 01/2002), longo da nossa unidade também
que define a regionalização e a assistência à saúde (BRASIL, 2002a). veremos as políticas importantes
que fortalecem a construção e a
Fonte: elaborado pela autora a partir da adaptação de Paim e Almeida (2014) e Aguiar (2015).
organização do SUS.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 52
Que bom que você chegou até aqui! Viu quanto a chegada do SUS foi uma
grande vitória para a Saúde Pública no Brasil? Agora você pode construir a
linha do tempo da evolução das políticas públicas de saúde à sua maneira,
criando destaques e fazendo sua própria análise crítico-reflexiva.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 53
2.2.2 Modelos conceituais em saúde e determinação do
processo saúde-doença
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 54
POR QUE CONHECER ESSES MODELOS É IMPORTANTE PARA O FORTALECIMENTO DO SUS?
Em 1986, o relatório final da VIII
Considerando os modelos apresentados e o conceito de saúde elaborado na VIII CNS,
Conferência Nacional de Saúde
você pode observar que, ao longo do tempo, o entendimento do processo saúde-doença
(CNS) definiu: “Saúde é a resultante
passou a ser mais amplo, em que a saúde e a doença atuam como componentes dinâmicos
das condições de alimentação,
dentro do modo de viver individual e coletivo. Portanto, a situação de saúde e de doença de
habitação, educação, renda, meio
cada indivíduo ou de um grupo envolve vários fatores determinantes, que podem ser, por
ambiente, trabalho, transporte,
exemplo, o contexto social, histórico e econômico, bem como os hábitos provenientes de sua
emprego, lazer, liberdade, acesso e
cultura e, por fim, o próprio fator biológico de cada um. Esse entendimento oferece suporte
posse da terra e acesso a serviços de
para as ações de promoção da saúde, importante ferramenta que fortalece a atuação do SUS
saúde” (BRASIL, 1986a, p. 4).
e permite melhores condições de vida e redução das vulnerabilidades e riscos oriundos dos
determinantes da saúde-doença.
2.2.3 Determinantes Sociais da Saúde FIGURA 2 – MARCO CONCEITUAL DOS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 55
Observe o modelo, seus determinantes FIGURA 3 – DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19 NO BRASIL
estruturais e intermediários e veja que as
intervenções devem ser coordenadas de modo
que atinjam cada setor para que as iniquidades
em saúde sejam combatidas de forma eficiente. I - CONTEXTO POLÍTICO
O interessante aqui é apontar que o modelo Sistema de
deixa claro que temos um círculo virtuoso, E SOCIOECONÔMICO
no qual a saúde, o Sistema de Saúde e os seus Saúde
determinantes de cada tipo se retroalimentam e
se beneficiam mutuamente. Cenário Político IV - IMPACTO SOBRE A
Instabilidade Política;
No contexto das doenças e síndromes virais, os
enfraquecimento das instituições; DESIGUALDADE NA SAÚDE E
DSS influenciam o risco de infecção, a morbidade NO BEM-ESTAR (COVID-19)
e a mortalidade das populações em grupos mais
vulneráveis. A pandemia de COVID-19 evidenciou, Cenário Macroeconômico
especialmente no Brasil, as fragilidades em saúde Crise econômica e baixa taxa de II - POSIÇÃO
impostas pelas desigualdades sociais. Vamos crescimento;
contextualizar os DSS na pandemia de COVID-19? SOCIOECONÔMICA
Veja a Figura 3:
Política Social III - CONDIÇÕES
Alta taxa de desemprego e Classe Social MATERIAIS
informalidade; ampliação da -Trabalhadores
pobreza; Gênero
-Mulheres Circunstâncias Materiais
- Condições de Moradia
Política Pública Cor/Raça
Nesse modelo proposto por Silva (2020), - Acesso à água
Redução do orçamento na área da -Negros, indígenas
considerando a base da Figura 4, observamos três Educação, Saúde e Proteção Social;
conjuntos de determinantes: 1. Conjunturais e Educação: Comportamentos e
sociais; 2. Estruturais e sociais; e 3. Intermediários baixa escolaridade Fatores Biológicos
e sociais. O primeiro conjunto influencia tanto -Obesidade
o segundo quanto o próprio Sistema de Saúde. Cultura e Valores Sociais Ocupação: informalidade
Polarização política; Condições de Trabalho
Observe que as condições socioeconômicas, -Estresse
renda, educação, gênero, cor/raça, que compõem desinformação;
Renda: baixa renda -Ambiente de trabalho
os determinantes estruturais, influenciam as
condições de moradia, de trabalho, biológicas,
comportamentais e de acesso à água, o que DETERMINANTES DETERMINANTES DETERMINANTES
cria um forte impacto na saúde e no bem-estar
e cria maior risco de infecção por COVID-19. Veja
CONJUNTURAIS E SOCIAIS ESTRUTURAIS E SOCIAIS INTERMEDIÁRIOS E SOCIAIS QUE
bem a importância do Sistema de Saúde diante DA VULNERABILIDADE À DA VULNERABILIDADE À AMPLIAM A VULNERABILIDADE
dos determinantes que expõem e aumentam a COVID-19 COVID-19 À COVID-19
vulnerabilidade de vários grupos sociais durante
a pandemia. Fonte: adaptado de Silva (2020).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 56
SAIBA MAIS
O Brasil e a Agenda Internacional dos DSS. Disponível em:
https://dssbr.ensp.fiocruz.br/o-brasil-e-a-agenda-internacional-dos-dss/
PARA REFLETIR
Caro trabalhador estudante, pensando em sua realidade profissional e pessoal e considerando
o que acabou de estudar:
• Quais DSS são mais expressivos na sua região de atuação?
• Como você avalia a influência dos DSS na evolução da pandemia de COVID-19 na sua
comunidade?
2.2.4 Intersetorialidade
A CNDSS elegeu, em seu relatório final, a intersetorialidade como um pilar básico para o desenho de intervenções
viáveis e sustentáveis nos DSS. Em sua definição:
[...] a intersetorialidade constitui uma concepção que deve informar uma nova maneira de
planejar, executar e controlar a prestação de serviços. Isso significa alterar toda a forma de
articulação dos diversos segmentos da organização governamental e dos seus interesses
(JUNQUEIRA, 2005, p. 18).
A intersetorialidade é uma abordagem tão importante quanto desafiadora de se realizar,
pois requer que atores de diferentes cenários – como governos, segmentos da sociedade e
comunidade – se comuniquem e ajam em conjunto para garantir a equidade e saúde para todos.
De maneira geral, a intersetorialidade das políticas públicas culmina com “melhora das condições
de vida da população, na otimização e utilização dos recursos (financeiros, materiais e humanos)
e nos ganhos de escala e de resultados” (WANDERLEY; MARTINELLI; DA PAZ, 2020, p. 9).
Na pandemia de COVID-19, a atuação intersetorial se apresenta como estratégia valiosa na implementação de ações
efetivas de combate. Na seção anterior, apresentamos alguns dos DSS que foram mais influentes na incidência
da COVID-19, como a distribuição desigual de renda e o adensamento domiciliar. Podemos falar também no
desemprego, insegurança alimentar, ausência de saneamento básico, acesso à água potável, entre outros.
E como as ações intersetoriais podem atuar no contexto dos DSS e da pandemia? Vamos ver alguns exemplos em
que os setores governamentais, da saúde, segmentos da sociedade e grupos da comunidade podem atuar?
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 57
Exemplos: dar orientações sobre
prevenção e distribuir máscaras
e álcool em gel; dar orientações
sobre o que é o isolamento social e
sobre os benefícios concedidos pelo
governo no contexto da emergência
de saúde, como o auxílio
emergencial; facilitar o atendimento
em situações de violência doméstica
contra mulheres, crianças,
adolescentes e idosos; promover
atividades de comunicação por
meio de elaboração de cartazes,
videoconferências, entre outros;
transmitir informações pelas redes
sociais oficiais; incentivar a criação
de grupos on-line de acolhimento
para escuta terapêutica e para
usuários com demanda de saúde
mental.
Fonte: Unsplash.com
SAIBA MAIS
Atuação intersetorial da equipe do NASF-AB na pandemia de COVID-19: relato de
Jaboatão dos Guararapes/PE, disponível em:
https://apsredes.org/atuacao-intersetorial-da-equipe-do-nasf-ab-na-
pandemia-de-covid-19-relato-de-jaboatao-dos-guararapes-pe/
PARA REFLETIR
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2.2.5 Conceitos e atribuições dos níveis de atenção à saúde
Até aqui, caro trabalhador estudante, vimos a construção das políticas públicas e
a evolução do conceito de saúde, até chegar aos DSS. Agora, vamos avançar no
sentido de compreender como se organizam os níveis de atenção à saúde e qual é a COMO ATUA CADA UM DOS NÍVEIS DE ATENÇÃO?
sua importância na atualidade.
A atenção primária é a porta de entrada do SUS, representada
Os modelos de atenção à saúde surgiram para suprir a necessidade de organização do
principalmente pelas Unidades Básicas de Saúde (UBSs).
SUS como uma rede de serviços organizada de forma hierarquizada e regionalizada.
Tal organização permite que os gestores e equipes de saúde conheçam os problemas Por aqui, temos as ações de promoção e proteção da saúde e, portanto,
relacionados à saúde de cada população. Os modelos de atenção podem atuar no um caráter preventivo. A atenção secundária é compreendida pelos
atendimento de condições de saúde agudas ou crônicas. Segundo Mendes (2010), a serviços especializados que estão nos hospitais e ambulatórios. As
definição dos modelos de atenção é a seguinte: Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) se encaixam nesse nível. A
atenção terciária envolve os atendimentos complexos prestados em
Sistemas lógicos que organizam o funcionamento das redes hospitais de grande porte.
de atenção à saúde, articulando, de forma singular, as relações
entre a população e suas subpopulações estratificadas por
riscos, os focos das intervenções do sistema de atenção à saúde
e os diferentes tipos de intervenções sanitárias, definidos
em função da visão prevalecente da saúde, das situações
demográfica e epidemiológica e dos determinantes sociais da
saúde, vigentes em determinado tempo e em determinada
sociedade (MENDES, 2010, p. 2302).
Fonte: Flickr.com
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 59
É importante dizer que um nível não apresenta maior importância que outro. Eles
devem funcionar de forma integrada. A Figura 4 apresenta duas visões de organização
desses níveis: o modelo de pirâmide hierarquizado e regionalizado e a rede horizontal
integrada, organizada com a Atenção Primária à Saúde (APS) em seu centro.
ALTA
COMPLEXIDADE
APS
MÉDIA
COMPLEXIDADE
ATENÇÃO BÁSICA
SAIBA MAIS
Quer entender melhor as principais características de cada modelo? Veja a tabela
da página 5 do seguinte material: Modelos assistenciais - Sistemas, modelos e
redes de atenção à saúde (MODELOS..., 2013). Disponível em:
https://www.nescon.medicina.ufmg.br/biblioteca/imagem/4120.pdf
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 60
No contexto da COVID-19, as ações de enfrentamento por grande parte dos países
foram centradas no nível de alta complexidade, seja ampliando os leitos, seja
ofertando respiradores pulmonares. Essa ação é de grande importância, tendo em vista
a necessidade de cuidados com os casos mais graves. Entretanto, dada a parcela de
resolubilidade dos problemas de saúde e o seu papel de porta de entrada do usuário
no Sistema de Saúde, a APS também é uma importante protagonista nessa luta.
Veja os aspectos que devem ser considerados para fortalecer a atuação da APS no
território no enfrentamento da pandemia:
• A população a ser acompanhada (casos leves de COVID-19 e
outros problemas de saúde);
• A adequada proteção dos profissionais de saúde, com condição
segura à realização do seu trabalho, evitando, também, que
sirvam de fonte de contaminação;
• As mudanças organizacionais compatíveis com a realidade local;
• As necessidades de apoio logístico e operacional (incluindo
transporte, material e equipamentos de segurança e proteção);
Fonte: Freepik. • Formação e educação permanente dos profissionais de saúde;
• Mapeamento de potencialidades e dificuldades de cada território;
• A retaguarda necessária a uma ação coordenada da APS com
outras instituições e serviços de saúde no território de abrangência
das equipes ou fora dele;
• Parcerias com as organizações comunitárias, potencializando
habilidades e estimulando a solidariedade (MEDINA et al., 2020,
p. 1-2).
PARA REFLETIR
Tudo bem até aqui? Para fechar o assunto desta seção, reflita: a atuação da APS
no seu território conseguiu minimizar a transmissão ou o agravamento dos
casos de COVID-19 ou o colapso dos serviços de saúde? Existem ações que não
foram realizadas que poderiam ter sido implementadas para enfrentamento
da COVID-19?
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 61
2.3 TRABALHO EM SAÚDE
Você sabia que o tema trabalho em saúde no Brasil foi ganhando espaço ao longo
do tempo? Vamos entender: no contexto das CNS, as políticas públicas com enfoque
no trabalho foram alvo de maiores discussões a partir da 3ª edição (1963) e somente
na 8ª edição (1986a) é que o tema se consolidou (BRASIL, 1963, 1986a). Na 10ª CNS
(BRASIL, 1996), foi feita uma proposta de uma Política de Recursos Humanos para a
Saúde e uma Norma Operacional Básica de Recursos Humanos (NOB/RH), contribuindo
com princípios regulatórios para a ação e relação das esferas de governo voltadas para
a gestão do trabalho no SUS, atualmente em sua terceira versão (BRASIL, 2005a, 2005b).
Aqui já podemos compreender a importância que o trabalho em saúde tem para a
consolidação do SUS, não acha? E como as políticas de gestão do trabalho em saúde
funcionam na prática? Elas criam ferramentas para valorizar o trabalhador e permitir
a fidelização de equipes com o trabalho interdisciplinar e multissetorial. Além disso,
elas aumentam o vínculo dos trabalhadores com a população e com os serviços de
saúde pública. A formação de comissões para elaboração de diretrizes para combater a Fonte: Freepik.
precarização do trabalho, a criação e as melhorias nos Planos de Carreira, o incentivo e
a implementação de medidas voltadas à Educação Permanente dos profissionais, entre
outros, são bons exemplos da atuação das políticas no trabalho em saúde.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 62
2.3.2 Organização do processo de trabalho em saúde e especificidades do trabalho na
vigilância em saúde
O processo de trabalho em saúde se pauta pelo coletivo, ou seja, a organização dele é feita
em conjunto para dar conta das necessidades de saúde do usuário. A essência da equipe
multidisciplinar é o trabalho de um membro dar suporte ao trabalho de outro membro. O
trabalhador sempre depende dessa troca. Observe que assim temos uma base sólida para
o trabalho em saúde.
Essa ideia de pautar o processo de trabalho por ações articuladas foi construída com base
nos estudos de Gonçalves (1992), que analisou os seguintes componentes: o objeto do
trabalho, os instrumentos, a finalidade e os agentes. O autor propõe que a relação recíproca
desses componentes configura um processo de trabalho adequado (GONÇALVES, 1992).
O conceito de processo de trabalho em saúde atualmente serve de embasamento para
práticas sociais, e não somente para áreas profissionais especializadas. Também apoia
pesquisas e intervenções sobre atenção à saúde, gestão em saúde, modelos assistenciais,
trabalho em equipe de saúde, cuidado em saúde, entre outros. Fonte: Freepik.
SAIBA MAIS
Quer aprofundar a leitura no tema? Veja a sugestão de leitura complementar:
Processo de trabalho em saúde (PEDUZZI; SCHRAIBER, 2009). Disponível em:
http://www.sites.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/protrasau.html
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Vamos falar um
pouco do processo de
trabalho voltado para a
vigilância em saúde?
Fonte: Flickr.
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2.3.3 Precarização das relações de trabalho na saúde
PARA REFLETIR
Caro trabalhador estudante, pensando sobre a Precarização do trabalho na saúde e
pandemia, reflita sobre a sua realidade: Quais são os principais entraves que você identifica
como decorrentes da precarização do trabalho e em qual intensidade influenciaram o
combate à COVID-19 ou podem influenciar ações futuras de combate a epidemias?
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 65
2.4 POLÍTICA NACIONAL DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 66
Vamos conhecer também as diretrizes da PNVS? São as
seguintes:
I – Articular e pactuar responsabilidades das três esferas
de governo, consonante com os princípios do SUS,
respeitando a diversidade e especificidade locorregional.
II – Abranger ações voltadas à saúde pública, com
intervenções individuais ou coletivas, prestadas por
Fonte: Flickr.
serviços de vigilância sanitária, epidemiológica, em
saúde ambiental e em saúde do trabalhador, em todos É importante ressaltar, caro trabalhador estudante, que essa política incide sobre todos
os pontos de atenção. os níveis de atenção à saúde. Ela contribui para a integralidade na atenção à saúde –
pressupõe as ações de vigilância em saúde dentro das redes de atenção à saúde do SUS
III – Construir práticas de gestão e de trabalho que
para alcançar a oferta do serviço voltado para a necessidade da população residente em
assegurem a integralidade do cuidado, com a inserção
uma determinada localidade. Portanto, busca priorização para alcançar territórios, pessoas
das ações de vigilância em saúde em toda a Rede de
e grupos em situações de maior risco e vulnerabilidade (regionalização das ações). Com
Atenção à Saúde e em especial na Atenção Primária,
isso, há a perspectiva de diminuir as desigualdades sociais e de saúde e de alcançar a
como coordenadora do cuidado.
equidade na atenção, o que inclusive deve compreender as intervenções intersetoriais
IV – Integrar as práticas e processos de trabalho para o sucesso.
das vigilâncias epidemiológica, sanitária, em saúde
Além disso, a análise de situação da saúde e as ações laboratoriais são consideradas
ambiental e em saúde do trabalhador e da trabalhadora
essenciais e transversais à PNVS. Falando em transversalidade, sabe qual a importância
e dos laboratórios de saúde pública, preservando
dela? É um termo-chave que sumariza a soma dos esforços de união da PNVS com a Política
suas especificidades, compartilhando saberes e
Nacional de Humanização (PNH) e a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB).
tecnologias, promovendo o trabalho multiprofissional e
interdisciplinar. Você sabia também que a PNVS estimula a comunidade, entidades, instituições e
organizações não governamentais a participar do controle social para acolher as demandas
V – Promover a cooperação e o intercâmbio técnico
da população? Dentro da PNVS também cabem ações voltadas à gestão do trabalho, ao
científico no âmbito nacional e internacional.
desenvolvimento e à educação permanente dos profissionais de vigilância e de todos os
VI – Atuar na gestão de risco por meio de estratégias para níveis de atenção, além do apoio ao desenvolvimento de estudos e pesquisas por meio de
identificação, planejamento, intervenção, regulação, parcerias entre o SUS e as instituições e do uso do Sistema de Informação em Saúde para
comunicação, monitoramento de riscos, doenças e coletar, consolidar e analisar os dados para gerar informações. As informações devem ser
agravos. comunicadas oportunamente pela Vigilância em Saúde para alertar sobre risco sanitário
e divulgar as informações para os órgãos competentes e para a população. Viu quanto é
VII – Detectar, monitorar e responder às emergências
abrangente essa política? Vamos para a próxima seção para conhecer uma parte importante
em saúde pública, observando o Regulamento
da PNVS: os seus componentes. Até já!
Sanitário Internacional, e promover estratégias para
implementação, manutenção e fortalecimento das
capacidades básicas de vigilância em saúde.
VIII – Produzir evidências a partir da análise da situação
da saúde da população de forma a fortalecer a gestão e
as práticas em saúde coletiva.
IX – Avaliar o impacto de novas tecnologias e serviços
relacionados à saúde de forma a prevenir riscos e
eventos adversos (BRASIL, 2018a, p. 5).
Fonte: Flickr.
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2.4.2 Componentes da Vigilância em Saúde
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 68
Vale destacar que as 4 QUADRO 3 – PONTOS DE ARTICULAÇÃO ENTRE OS COMPONENTES DA VIGILÂNCIA EM SAÚDE
vigilâncias se complementam
e se integram na atenção à
Saúde do Trabalhador. Tudo Planejamento conjunto com identificação de prioridades para atuação integrada,
bem até aqui? Vamos falar um com base na análise da situação de saúde, e no mapeamento das atividades de
pouco da articulação entre as produção, consumo e infraestrutura e com potencial impacto no território.
vigilâncias? Veja o Quadro 3 Produção conjunta, sempre que necessário, de protocolos, instrumentos, normas
com as estratégias: técnicas e atos normativos, com harmonização de parâmetros e indicadores no
desenvolvimento das ações de vigilância.
Harmonização e, no que couber, unificação dos instrumentos de registro e
notificação de doenças, agravos e eventos de interesse comum aos componentes
da vigilância.
Proposição e produção de indicadores conjuntos para monitoramento e avaliação
da situação de saúde.
Investigação conjunta de surtos e eventos inusitados ou situação de saúde
decorrentes de potenciais impactos ambientais de processos e atividades
produtivas nos territórios, envolvendo as vigilâncias epidemiológica, sanitária,
em saúde ambiental, em saúde do trabalhador e da trabalhadora e a rede de
Você conseguiu compreender laboratórios de saúde pública.
quanto a articulação entre as
vigilâncias pode ser efetiva para Produção conjunta de metodologias de ação, investigação, tecnologias de
a PNVS? Vamos compreender intervenção, monitoramento e avaliação das ações de vigilância.
um pouco a integração da
Revisão e harmonização dos códigos de saúde, com inserção de disposições
vigilância em saúde com os
sobre a vigilância em saúde e atribuição da competência de autoridade sanitária
níveis de atenção? Falaremos
às equipes de vigilância em saúde nos Estados, Municípios e Distrito Federal.
na próxima seção. Até já!
Fonte: Brasil (2018a, p. 6).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 69
2.4.3 Ações integradas com os níveis de atenção
PARA REFLETIR
SAIBA MAIS A vigilância em saúde deve ter uma atuação muito forte na
identificação e produção de conhecimento sobre novas
Para exemplificar as questões abordadas nesta seção, vamos assistir à videoaula doenças. Como ela pode atuar no combate a epidemias?
com Guilherme Franco Netto gravada no contexto da 1ª Conferência Nacional Analisando o comportamento epidemiológico das
de Vigilância em Saúde, de 2017. O tema é tratado de forma clara e objetiva: doenças: detecção precoce de surtos e epidemias,
https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/21077 distribuição espacial da ocorrência dos casos, gravidade
dos casos e vulnerabilidades nos âmbitos individual e
Guia de Vigilância em Saúde - recomendações relacionadas às ações de
coletivo. Quais são as ferramentas para isso? Lembre-
vigilância em saúde, disponível em:
se dos conceitos epidemiológicos: indicadores, boletim
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_vigilancia_saude_4ed. epidemiológico, notificação compulsória, entre outros.
pdf Como seriam úteis para você?
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 70
2.5 POLÍTICA NACIONAL DE SAÚDE DO TRABALHADOR E DA TRABALHADORA
Fonte: Freepik.
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Observe o Art. 7º da PNSTT: “A Política Nacional de Saúde do
Trabalhador e da Trabalhadora deverá contemplar todos os
trabalhadores priorizando, entretanto, pessoas e grupos em
situação de maior vulnerabilidade, como aqueles inseridos em
atividades ou em relações informais e precárias de trabalho,
em atividades de maior risco para a saúde, submetidos a formas
nocivas de discriminação, ou ao trabalho infantil, na perspectiva de Ela está alinhada com o conjunto de políticas de saúde no âmbito
superar desigualdades sociais e de saúde e de buscar a equidade do SUS, considerando a transversalidade entre as ações de saúde
na atenção” (BRASIL, 2012b). do trabalhador e o trabalho como um dos determinantes do
processo saúde-doença. Veja bem! Nesse sentido, a produção do
A PNSTT (Art. 5º) segue os mesmos princípios cuidado aos trabalhadores ganha ênfase na APS, já que, como porta
estruturantes do SUS, que incluem: de entrada preferencial do sistema, ela é a organizadora de qual
encaminhamento eles terão dentro do sistema. Como colocado
• Universalidade; anteriormente nesta unidade, a questão da precarização do trabalho
• Integralidade; reforça a vulnerabilidade social dos trabalhadores. Em especial, na
situação do trabalho informal, desde o trabalho no domicílio até
• Participação da comunidade, dos trabalhadores e o trabalho na rua, a APS tem a possibilidade de dar visibilidade às
do controle social; condições de saúde e trabalho desses trabalhadores, possibilitando a
• Descentralização; intervenção e proteção em saúde.
• Hierarquização;
• Equidade;
• Precaução (BRASIL, 2012b).
2.5.2 Rede de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador e o papel dos Centros de A RENAST veio para organizar e colocar
Referência em Saúde do Trabalhador em prática ações assistenciais, de
vigilância e de promoção da saúde na
perspectiva da saúde do trabalhador.
Ao observar todo o documento que compõe a PNSTT, você conhecerá uma série Sua atual formatação é orientada pela
de estratégias dessa política. Entre elas está a estruturação da Rede Nacional de Portaria nº 2.728, de 11 de novembro
Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST), a qual foi criada em 2002 pela de 2009 (BRASIL, 2009a), a qual indica
Portaria nº 1.679/GM (BRASIL, 2002b), com o objetivo de difundir ações de saúde que ela deve integrar a rede de serviços
do trabalhador, articuladas às demais redes do SUS. Mas veja bem! Apesar de do SUS por meio dos Centros de
sua existência prévia à PNSTT, a RENAST ganhou espaço e ênfase nessa política, Referência em Saúde do Trabalhador
pressupondo as seguintes ações: (CERESTs) e das redes sentinelas (serviços de média e alta complexidade
que são capazes de diagnosticar agravos relacionados ao trabalho e
a) Saúde do trabalhador na APS;
registrá-los no Sistema de Notificação de Agravos de Notificação – SINAN).
b) Saúde do trabalhador na urgência e emergência; Além disso, é de sua alçada elaborar protocolos, linhas de cuidado e
c) Saúde do trabalhador na atenção especializada (ambulatorial e hospitalar). instrumentos que permitam a integralidade das ações, envolvendo todos
os níveis de atenção, serviços e municípios sentinelas.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 72
A RENAST mostra-se complexa, uma vez que sua implementação deve ser de forma
articulada entre o Ministério da Saúde, as Secretarias de Saúde dos estados, o
Distrito Federal e os municípios, além de ser necessário o envolvimento de outros
setores também participantes na execução das ações. Observe que mais uma vez o
foco nas ações transversais mostra-se presente para garantir produção e gestão do
conhecimento.
Mas o que é o CEREST? De forma geral, é a retaguarda técnica especializada voltada
para a promoção de ações para melhorar as condições de trabalho e a qualidade
de vida do trabalhador, tendo a prevenção e vigilância como norteadores. Tem
como modelo a APS, oferecendo suporte matricial às equipes de referência,
suporte técnico, educação permanente, assessoria ou coordenação de projetos de
assistência e promoção e vigilância da saúde dos trabalhadores no âmbito da sua
área de abrangência. São atuantes os dois tipos: estadual e regional. O que não cabe
ao CEREST? Atendimentos de emergência, exames admissionais e demissionais,
exames periódicos e exames para mudança de função.
SAIBA MAIS
Caso tenha interesse, você pode consultar a lista atual de CERESTs estaduais e
regionais habilitados por localização, bem como as notícias relacionadas a eles
no seguinte endereço:
https://renastonline.ensp.fiocruz.br/cerests
Quer saber mais sobre os aspectos regulatórios do RENAST e do CEREST? Veja
as sugestões de leitura complementar na Plataforma RENAST online:
https://renastonline.ensp.fiocruz.br/temas/rede-nacional-atencao-
integral-saude-trabalhador-renast
https://renastonline.ensp.fiocruz.br/temas/centro-referencia-saude-
trabalhador-cerest
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 73
2.5.3 Saúde do Trabalhador no SUS: aspectos conceituais, Destacam-se ainda a publicação da primeira Lista de Doenças
organizacionais e marcos regulatórios Relacionadas ao Trabalho (LDRT), em 1999, e a criação da Política
de Saúde Ocupacional para o Trabalhador do SUS, inserida na
NOB/RH-SUS, trazendo os “Princípios e Diretrizes para a Gestão do
Tudo bem até aqui? Agora vamos nos ater à regulamentação das políticas de
Trabalho no SUS”, em 2005 (BRASIL, 2005a). A LDRT só veio sofrer
Saúde do Trabalhador no SUS. Após a Constituição de 1988 e a implantação
atualização em 2020 (Portaria GM/MS nº 2.309, de 28 de agosto
do SUS, houve avanços e desafios. Na década de 1990, ocorreram
de 2020), e as modificações se centraram tanto na Lista A (agentes
movimentos no sentido de viabilizar políticas de Saúde do Trabalhador em
e/ou fatores de risco com respectivas doenças relacionadas ao
estados e municípios, o que nem sempre teve sucesso.
trabalho), quanto na Lista B (doenças relacionadas ao trabalho
Em 1992, foi realizada a 9ª CNS, um momento em que houve o entendimento com respectivos agentes e/ou fatores de risco). O número de
de que a municipalização das ações era necessária, o que levou ao emblema códigos diagnósticos passou de 182 para 347.
“Municipalização é o caminho” (BRASIL, 1992b). No ano seguinte ocorreu a
II Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador (CNST) que trouxe o tema No dia 2 de setembro de 2020, foi publicada a Portaria nº 2.345
central "Construindo uma política de saúde do trabalhador” (BRASIL, 1994). (BRASIL, 2020a), que tornou sem efeito a atualização 2020
devido à inclusão da COVID-19 na lista, e, em 8 de setembro de
Ainda na década de 1990, vinculada à CNS, instituiu-se a Comissão Intersetorial
2020, foi publicada a Portaria nº 2.384, que retoma a vigência
de Saúde do Trabalhador (CIST). A CIST nacional se consolidou nesse período
da versão 1999. Consulte as respectivas portarias para maiores
participando de forma proativa nas políticas de Saúde do Trabalhador.
informações e esteja atento às atualizações que porventura
Atualmente ajustada à PNSTT, acrescenta-se à CIST o termo trabalhadora, sendo
venham a ser feitas.
denominada Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora
“CISTT” (BRASIL, 2017a). Alguns exemplos de normativas na área são citados a As conquistas da década de 2000 em diante referem-se à
seguir: criação da Instrução Normativa da Vigilância em Saúde do Trabalhador formulação da RENAST pela área técnica de saúde do trabalhador
(VISAT) no SUS e da Norma Operacional de Saúde do Trabalhador (NOST/SUS). do Ministério da Saúde. Apesar da relevância dessa conquista, o
sistema RENAST/CEREST apresenta dificuldades para funcionar
A VISAT é um componente do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde,
devido a dificuldades políticas e administrativas. Mais uma vez
definida pela Portaria GM/MS nº 3.252, de dezembro de 2009 (atualizada
ressalta-se a importância de inserir a APS, os ACS e a equipe
pela Portaria nº 1.378/2013), que visa “à promoção da saúde e à redução
de saúde na atenção à Saúde do Trabalhador no SUS, de forma
da morbimortalidade da população trabalhadora, por meio da integração
articulada com os CERESTs. A maioria dos profissionais da APS
de ações que intervenham nos agravos e seus determinantes decorrentes
não conhece os CERESTs e muito menos o perfil produtivo dos
dos modelos de desenvolvimento e processos produtivos” (BRASIL, 2009b,
trabalhadores de seu território. Para fechar nosso assunto, pense
2013a). Lembre-se de que sua estrutura se baseia no modelo de Atenção
e reflita: é preciso inserir efetivamente a Saúde do Trabalhador
Integral em Saúde do Trabalhador e ela constitui-se de saberes e práticas
na APS, oportunizando a vigilância dos trabalhadores que estão
sanitárias, articulados intra e intersetorialmente.
em situação de risco.
SAIBA MAIS
Veja a sugestão de leitura complementar: PARA REFLETIR
Diretrizes de implantação da Vigilância em Com base no material apresentado, reflita sobre os
Saúde do Trabalhador no SUS. Disponível em: desafios das políticas de Saúde do Trabalhador ao longo
ht t p s : / / re n a s to n l i n e. e n s p. f i o c ru z . de sua construção até os dias atuais.
br/recursos/diretrizes-implantacao-
vigilancia-saude-trabalhador-sus
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 74
2.6 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE: MARCO REGULATÓRIO,
ASPECTOS CONCEITUAIS E DESAFIOS PARA SUA IMPLEMENTAÇÃO E ATUALIZAÇÃO
Nesta seção, caro trabalhador estudante, abordaremos FIGURA 6 – PRINCIPAIS MARCOS REGULATÓRIOS DA POLÍTICA NACIONAL DE
a Política Nacional de Educação Permanente em EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE
Saúde (PNEPS), trazendo um pouco da sua formação,
regulação e seus desafios. Bons estudos! 2003 Criação da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES) do
Ministério da Saúde, a qual possibilitou a implementação da PNEPS (BRASIL, 2003).
A PNEPS representa um importante marco da
2004
construção de transformações nos serviços, trazendo
Portaria GM/MS nº 198 – instituição da PNEPS (BRASIL, 2004a).
uma proposta de trabalho em que o aprender e o
ensinar fazem parte dos processos realizados no
cotidiano, promovendo melhorias no serviço dos
trabalhadores do SUS, tornando-os mais aptos a 2007 Portaria GM/MS nº 1.996 – reformulação das diretrizes da PNEPS (BRASIL, 2007).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 75
Nesse contexto, vive a lógica da educação permanente, a qual
deve estar inserida nos processos rotineiros. Ao mesmo tempo
deve ser planejada com temas pautados pela equipe sem
esperar que as demandas apareçam. E qual método utilizar?
Rodas de conversas, discussões de caso, oficinas e simulações,
entre outros, a depender do contexto.
A PNEPS aponta que a metodologia apropriada é a crítica reflexiva A atualização da PNEPS também foi debatida em 2018 e estimulou
pautada pela problematização, a qual precisa ser participativa, a intensificação da utilização das novas tecnologias para o ensino
propiciando espaços de discussão e reflexão em torno de: “O que na saúde e estabeleceu o compromisso com as novas demandas
se faz?”, “Por que faz?”, “Como faz?”, “Para quem faz?” e “Contra de saúde pública. Uma estratégia debatida nesta oportunidade foi
quem faz?” (FREIRE, 2013). o fortalecimento da Educação Interprofissional (EIP) no campo da
educação permanente, sendo considerada uma estratégia potencial
para o fortalecimento do SUS.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 76
2.7 PROGRAMA NACIONAL DE IMUNIZAÇÕES: MARCO REGULATÓRIO, ASPECTOS
CONCEITUAIS, TRAJETÓRIA ATÉ O RECONHECIMENTO INTERNACIONAL E PONTOS
IMPORTANTES PARA SEU FORTALECIMENTO NO SUS
Caro trabalhador estudante, no início desta unidade, abordamos momentos O século XX teve seu começo marcado por conflitos devido à política da vacinação
importantes para a consolidação da prática da imunização no Brasil, a qual obrigatória, mas também houve muitos avanços que culminaram com a pressão
começou por aqui com a chegada da vacina contra a varíola no início do século social e política ao Ministério da Saúde para criar o PNI em 1973, tão necessário
XIX (volte nesse ponto caso necessário). Nesta seção, vamos ver os marcos para padronizar técnicas de administração de vacinas e soros. Observe alguns
regulatórios do Programa Nacional de Imunizações (PNI) e os pontos importantes fatos marcantes na história da imunização no Brasil (Figura 7).
para o seu fortalecimento. Bons estudos!
FIGURA 7 – [LINHA DO TEMPO] PRINCIPAIS MARCOS DA HISTÓRIA DAS POLÍTICAS DE IMUNIZAÇÃO NO BRASIL
1ª vacina no Brasil – Criação de Institutos que deram origem Revolta da Vacina. Eliminação da febre amarela Campanha de erradicação da Criação do PNI.
antivaríolica. posteriormente ao Butantan e Fiocruz. urbana no Brasil. varíola com certificação em 1973.
Expansão do PNI. Último caso de Primeiro calendário básico de vacinação Criação do Instituto de Tecnologia Proposição da criação de um sistema de vigilância epidemiológica para o país, por ocasião da 5ª
poliomielite no Brasil. obrigatória para menores de 1 ano em Imunobiológicos – Bio- CNS – Instituição do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica e Imunizações, formalizando
(tuberculose, poliomielite, sarampo, difteria, Manguinhos. o PNI e o estabelecimento das normas técnicas relativas ao seu funcionamento: Lei nº 6.259/1975,
tétano e coqueluche). posteriormente regulamentado pelo Decreto nº 78.231/1976 (BRASIL, 1975;1976).
Instituição da Comissão Nacional de Erradicação do Calendário de vacinação Introdução da vacina contra rotavírus Campanha Nacional Calendário de Campanha Nacional de vacinação contra
Sarampo e Controle da Rubéola, no âmbito da Funasa. da criança, do adolescente, e eliminação do tétano neonatal como de Vacinação para vacinação para os influenza incluindo vários grupos (gestantes,
Confirmação do último caso autóctone de sarampo no país. do adulto e do idoso. problema de saúde pública no Brasil. Eliminação da Rubéola. Povos Indígenas. idosos, trabalhadores da saúde, indígenas e
crianças de 2 meses a 6 anos).
Plano Nacional de Vacina contra HPV Introdução das vacinas contra hepatite A para crianças Inclusão da vacina contra Introdução da vacina pentavalente (DTP, Hib e hepatite B) e
Operacionalização ampliada para (15 meses de idade), contra o HPV (Papilomavírus a varicela (catapora) e da da VIP (pólio com vírus inativo) no calendário da criança. A
da Vacinação meninos de 11 a Humano) para meninas de 9 a 13 anos e dTpa (tétano, vacina tetra viral (tríplice VIP substituiu as duas primeiras doses da vacina oral (VOP) –
contra COVID-19. 15 anos. difteria e coqueluche acelular) para gestantes. viral + varicela). mantida em duas doses de reforço.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 77
Zé gotinha: a mascote, Destacam-se os pontos principais para entender melhor normas e políticas que
criada na década de 1980 funcionam em torno do PNI:
para encorajar as crianças
• Calendário básico de vacinação: sempre disponível no site do Ministério da
a se vacinar contra a
Saúde – é revisado sempre que necessário. Observe o Calendário de Vacinação
poliomielite, traz uma
2020. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-
figura representativa das
a-z/c/calendario-de-vacinacao. Acesso em: 16 ago. 2021;
campanhas de vacinação
até hoje. • Centro de Referência em Imunobiológicos Especiais (CRIE): dá suporte a
pacientes que precisam de vacinas que não estão no calendário de vacinação.
Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_
centros_imunobiologicos_especiais_5ed.pdf. Acesso em: 16 ago. 2021;
• Vigilância epidemiológica dos eventos pós-vacinação: preconiza as
orientações para ações e fluxogramas de notificação voltadas a qualquer
problema no processo de vacinação como um todo. Disponível em: https://
Fonte: Brasil (2014). bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_vigilancia_epidemiologica_
eventos_adversos_pos_vacinacao.pdf. Acesso em: 16 ago. 2021;
• Rede de Frio: normatiza todo o processo para garantir a conservação das
O PNI tem como função a organização de toda a política nacional de vacinação da vacinas desde a produção e transporte até a sala de vacinação. Disponível
população brasileira, sendo sua missão: reduzir a morbimortalidade de doenças em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2017/dezembro/15/
imunopreveníveis, bem como a erradicação dessas doenças em alguns contextos, rede_frio_2017_web_VF.pdf. Acesso em: 13 ago. 2021;
com fortalecimento de ações integradas de vigilância em saúde para promoção, • Sistemas de informação do PNI (SI-PNI): possibilita aos gestores uma avaliação
proteção e prevenção em saúde (BRASIL, 2013b). dinâmica quanto à ocorrência de surtos ou epidemias e o controle do estoque.
Dentro da estrutura do Ministério da Saúde, o PNI faz parte do Departamento de Disponível em: http://pni.datasus.gov.br/. Acesso em: 16 ago. 2021;
Imunização e Doenças Transmissíveis, que, por sua vez, faz parte da Secretaria de • Sala de vacinação: regulamentada pela RDC Anvisa nº 197/2017. Disponível
Vigilância em Saúde. As diretrizes e responsabilidades para a execução das ações em: https://sbim.org.br/legislacao/867-rdc-anvisa-n-197-26-de-dezembro-
de vigilância em saúde são compartilhadas pela União, estados, Distrito Federal e de-2017. Acesso em: 16 ago. 2021;
municípios. As ações devem ser pactuadas na Comissão Intergestores Tripartite (CIT)
e na Comissão Intergestores Bipartite (CIB), tendo como base a regionalização, a rede • Atualizações sobre modificações em doses e tipos de vacina: Sociedade
de serviços e as tecnologias disponíveis. Brasileira de Imunizações. Disponível em: https://sbim.org.br/informes-e-
notas-tecnicas. Acesso em: 16 ago. 2021;
• Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra COVID-19:
documento elaborado de acordo com a Portaria nº 28, de 3 de setembro
de 2020. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/coronavirus/
publicacoes-tecnicas/guias-e-planos/plano-nacional-de-vacinacao-
covid-19/view. Acesso em: 16 ago. 2021;
• Livro Vacinas e vacinação no Brasil: horizontes para os próximos 20 anos.
Documento organizado em 2020 pela Iniciativa Saúde Amanhã, no contexto
da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030. Disponível em: https://www.arca.
fiocruz.br/bitstream/icict/45003/2/Livro%20Vacinas%20no%20Brasil-1.pdf.
Acesso em: 2 out. 2021.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 78
Não poderíamos deixar de mencionar que o Brasil é um dos grandes exemplos de
sucesso na implantação de um programa nacional de imunizações, reconhecido
internacionalmente. O país já erradicou, por meio da vacinação, doenças de alcance
mundial, como a varíola e a poliomielite (paralisia infantil), e há de se considerar
que a implantação do SUS foi um importante fortalecedor deste programa,
fornecendo acesso gratuito a todas as vacinas recomendadas pela OMS a toda a
população, sem distinção de qualquer natureza, buscando a inclusão social.
O PNI está próximo de completar 50 anos, e quais são as preocupações com seu
futuro? Observe alguns pontos levantados na comemoração dos 40 anos do PNI
(BRASIL, 2013b):
• Vacina como atenção primária, ou seja, que ela ganhe relevância no nível
primário dentro da prevenção, classificando-se como uma ação de proteção
específica;
• Incorporação de novas vacinas e novos grupos populacionais;
• Vacinação segura;
• Vigilância dos eventos adversos associados à vacinação;
• Rede de Frio de imunobiológicos mais eficiente, capaz de identificar situações
de risco e de garantir um produto com qualidade, do começo ao fim da cadeia;
Fonte: Flickr.
• Coberturas amplas e homogêneas: compromisso do Ministério da Saúde.
Acrescenta-se a esses tópicos a questão da disseminação de notícias falsas
(popularmente conhecidas como fake news) a respeito da vacinação, o que tem
causado uma grande repercussão negativa, pois promove o aumento da taxa de
abandono e, por consequência, a diminuição da taxa de cobertura vacinal. Um
exemplo claro disso foi o retorno de casos de sarampo entre 2018 e 2019. PARA REFLETIR
Com base no conteúdo desta unidade, quais
aspectos você acredita que necessitem de
fortalecimento na sua realidade?
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 79
2.8 POLÍTICAS PÚBLICAS DA ASSISTÊNCIA SOCIAL NO ENFRENTAMENTO DE EPIDEMIAS/
PANDEMIAS: HISTÓRICO, DIRETRIZES E ATUAÇÃO NO CONTEXTO DE DOENÇAS INFECCIOSAS
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 80
A PNAS trouxe para a realidade brasileira Em 2005, houve a implementação do Sistema Único de área assistencial e instituir, efetivamente, as políticas
os seguintes olhares: Assistência Social (SUAS), conforme determinações da públicas ligadas à Assistência Social, além de consagrar
LOAS e da PNAS. O SUAS proporcionou uma forma de os direitos de cidadania e inclusão social. Vamos
• Uma visão social inovadora, dando
interromper a fragmentação vigente nos programas da resumir os principais marcos regulatórios no Quadro 4:
continuidade ao inaugurado pela
Constituição Federal de 1988 e pela QUADRO 4 – PRINCIPAIS MARCOS REGULATÓRIOS VOLTADOS PARA A ÁREA SOCIAL
Lei Orgânica da Assistência Social de
1993, pautada na dimensão ética de
incluir “os invisíveis”, os transformados 1988 A Constituição Federal prevê, em seus Arts. 203 e 204, a assistência social a quem dela necessitar,
independentemente de contribuir ou não à seguridade social.
em casos individuais, enquanto de
fato são parte de uma situação social
coletiva; as diferenças e os diferentes, 1993 Lei nº 8.742, de 7 de dezembro: dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências
(BRASIL, 1993).
as disparidades e as desigualdades.
• Uma visão social de proteção, o
que supõe conhecer os riscos, as
2004 Resolução nº 145, de 15 de outubro: CNAS institui a PNAS (BRASIL, 2004b).
com menor dano pessoal e social Resolução nº 109, de 11 de novembro: CNAS aprova a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais,
possível. Isto supõe conhecer os riscos
e as possibilidades de enfrentá-los.
2009 conforme anexos, organizados por níveis de complexidade do SUAS: Proteção Social Básica e Proteção
Social Especial de Média e Alta Complexidade (BRASIL, 2009d).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 81
SAIBA MAIS
Caso tenha interesse em conhecer mais detalhes
das normativas adotadas na pandemia, acesse o
Guia completo: o SUAS na Pandemia (LUCHESI, 2020).
Disponível em:
https://www.gesuas.com.br/blog/guia-suas-na-
pandemia/
Fonte: Freepik.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 82
Vamos falar um pouco do contexto social na pandemia de
COVID-19. Essa emergência de saúde pública afetou e tem afetado
toda a população, mas não podemos deixar de enfatizar que as
populações já expostas a vulnerabilidades e em risco social antes
da pandemia foram afetadas de forma mais grave.
Vamos remeter aqui também ao que foi falado anteriormente
sobre a precarização das relações de trabalho, que fez emergir
um contingente de trabalhadores e trabalhadoras que se viram
sem renda nenhuma de forma abrupta. Diante desse cenário, a
atuação do SUAS torna-se de suma importância para proteger
as famílias e indivíduos em situação de maior vulnerabilidade
social. O Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020, colocou a
assistência social e o atendimento à população em estado de
vulnerabilidade social na listagem de atividades essenciais que
não deviam ser interrompidas na pandemia para não colocar em
perigo a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população
(BRASIL, 2020h).
Por meio da Portaria nº 100, de 14 de julho de 2020, houve
uma série de recomendações que orientam o funcionamento
e o trabalho social nas redes de apoio CRAS, CREAS, Centro de
Referência para a População em Situação de Rua (Centro POP),
Centro-Dia e outras (BRASIL, 2020i). Além disso houve o apoio da
Estratégia Saúde da Família para mapeamento de situações de
maior vulnerabilidade.
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ENCERRAMENTO DA UNIDADE
Finalizando a Unidade 2, esperamos que você tenha adquirido conhecimentos básicos capazes de provocar novas
buscas e complementações, que, neste tema, devem ser permanentes. Além disso, esperamos que seu olhar sobre a
temática seja mais crítico.
O assunto é denso. Falar de políticas públicas envolve um emaranhado de normativas que estão em constante
mudança, mas que são fundamentais para pautar as conquistas do SUS até aqui. Tendo isso em vista, sabemos que
não foi possível esgotar todo o tema nesta unidade, pois temos uma riqueza de literatura que não cabe em uma
unidade. Por isso, recomendamos fortemente o retorno às leituras e materiais complementares sugeridos, sempre
que necessário.
Como muito bem colocado pelo nosso mestre Jairnilson Paim:
Conhecer o SUS, sua utilidade, suas possibilidades e seus desafios é um dos passos necessários para o exercício do
direito à saúde. Essa é uma responsabilidade dos profissionais de saúde, que têm como missão assegurar a melhor
atenção e os mais elevados níveis de saúde (PAIM, 2019, p. XIII).
Portanto, exerça seu direito como usuário e trabalhador do SUS, como cidadão brasileiro: sucesso nessa caminhada!
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 84
REFERÊNCIAS
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de Monitoramento. Atuação da Política de Assistência Social no contexto da pandemia do novo coronavírus. Brasília, 2021. 77 p. Disponível em: https://www.gov.br/cidadania/
pt-br/servicos/sagi/relatorios/DE_OLHO_NA_CIDADANIA_v6_12.05.pdf. Acesso em: 18 ago. 2021.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.345/2020, de 02 de setembro de 2020. Torna sem efeito a Portaria nº 2.309/GM/MS, de 28 de agosto de 2020. Brasília: Ministério da Saúde,
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coronavírus responsável pelo surto de 2019. Brasília, DF: Presidência da República, [2020]b. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13979.htm.
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BRASIL. Ministério da Cidadania. Portaria nº 337/2020, de 24 de março de 2020. Dispõe acerca de medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância
internacional decorrente do coronavírus, COVID-19, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social. Brasília: Ministério da Cidadania, 2020c. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/
redesuas/portaria-no-337-de-24-de-marco-de-2020/. Acesso em:17 out. 2021.
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(SUAS) dos Estados, Municípios e do Distrito Federal. Brasília: Ministério da Cidadania, 2020d. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/portaria-no-54-de-1o-de-abril-de-2020/.
Acesso em: 17 out. 2021.
BRASIL. Ministério da Cidadania. Portaria conjunta nº 01/2020, de 02 de abril de 2020. Dispõe acerca da utilização de recursos do Cofinanciamento Federal no atendimento às
demandas emergenciais de enfrentamento ao Coronavírus (Covid-19) no âmbito do Sistema Único de Assistência Social. Brasília: Ministério da Cidadania, 2020e. Disponível em:
https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-conjunta-n-1-de-2-de-abril-de-2020-251067584. Acesso em: 17 out. 2021.
BRASIL. Ministério da Cidadania. Portaria nº 369/2020, de 29 de abril de 2020. Dispõe acerca do atendimento do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal -
Cadastro Único, disposto pelo Decreto nº 6.135, de 26 de junho de 2007, no Distrito Federal e nos municípios que estejam em estado de calamidade pública ou em situação de
emergência reconhecidos pelos governos estadual, municipal, do Distrito Federal ou Federal, inclusive a Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional declarada pela
Organização Mundial da Saúde, em 30 de janeiro de 2020, em decorrência da Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19). Brasília: Ministério da Cidadania, 2020f. Disponível
em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-369-de-29-de-abril-de-2020-254678622. Acesso em: 17 out. 2021.
BRASIL. Ministério da Cidadania. Portaria nº 330/2020, de 18 de março de 2020. Estabelece o adiamento dos procedimentos em razão do não cumprimento do cronograma de
inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal para fortalecer o enfrentamento da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional decorrente do
Coronavírus (COVID-19). Brasília: Ministério da Cidadania, 2020g. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-330-de-18-de-marco-de-2020-248809190. Acesso
em: 17 out. 2021.
BRASIL. Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020. Regulamenta a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para definir os serviços públicos e as atividades essenciais. Brasília, DF:
Presidência da República, [2020]h. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10282.htm. Acesso em: 17 out. 202.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 85
BRASIL. Ministério da Cidadania. Portaria nº 100/2020, de 14 de julho de 2020. Aprova as recomendações para o funcionamento da rede socioassistencial de Proteção
Social Básica - PSB e de Proteção Social Especial - PSE de Média Complexidade do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, de modo a assegurar a manutenção da oferta
do atendimento à população nos diferentes cenários epidemiológicos da pandemia causada pelo novo Coronavírus - COVID-19. Brasília: Ministério da Cidadania, 2020i.
Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-100-de-14-de-julho-de-2020-267031342. Acesso em: 17 out. 2021.
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Permanente em Saúde: o que se tem produzido para o seu fortalecimento? Brasília, 2018b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_
educacao_permanente_saude_fortalecimento.pdf . Acesso em: 20 ago. 2021.
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parou de girar. Brasília, 2018c. Disponível em: https://apsredes.org/wp-content/uploads/2018/07/NavegadorSUS-WEB-INTER.pdf. Acesso em: 8 out. 2021.
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Social -NOB/SUAS. Brasília: Conselho Nacional de Assistência Social, 2012c. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/resolucao-no-33-de-12-de-dezembro-de-2012/.
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www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/decreto/d7508.htm. Acesso em: 17 out. 2021.
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bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/MatrizesConsolidacao/comum/13150.html. Acesso em: 17 out. 2021.
BRASIL. Conselho Nacional de Assistência Social. Resolução nº 145/2004, de 15 de outubro de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Social. Brasília: Conselho
Nacional de Assistência Social, 2004b. Disponível em: https://www.mds.gov.br/webarquivos/legislacao/assistencia_social/resolucoes/2004/Resolucao%20CNAS%20no%20
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Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 87
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NOAS-SUS 01/2002 que amplia as responsabilidades dos municípios na Atenção Básica; estabelece o processo de regionalização como estratégia de hierarquização dos serviços
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Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 90
MINICURRÍCULO DA AUTORA
E-mail: alinepriop@ufop.edu.br
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8305-1011
Lattes: http://lattes.cnpq.br/4718575032342485
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 2 - Políticas Públicas no Enfrentamento das Doenças Virais 91
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 3
Olá, trabalhador estudante. Seja bem-vindo à Unidade 3 do Módulo – Fundamentos e Tecnologias para o Enfrentamento
da COVID-19 e de outras Doenças Virais.
A noção de território em saúde envolve aspectos sociais, econômicos, culturais e ambientais existentes e compartilhados
pelos residentes de um determinado espaço geográfico. Por isso, trata-se de um conceito dinâmico e relacional, que
amplia o diagnóstico e a vigilância sobre os riscos e vulnerabilidades relacionados ao desenvolvimento dos agravos à
saúde individuais e coletivos. Além disso, tal noção permite a identificação das condições de promoção da resiliência das
pessoas, famílias e comunidades no enfrentamento desses processos.
Portanto, é inegável que a compreensão dos aspectos socioeconômicos, culturais e ambientais da população de um
território localiza e potencializa a vigilância, a prevenção de agravos e a promoção em saúde. Tal abordagem territorializada
da vigilância em saúde, associada às intervenções de educação em saúde, pode promover a maior participação e o
engajamento da população nas atividades realizadas pelas unidades e equipes da atenção primária. Então, vamos
aprender mais sobre territorialização em saúde? Vem com a gente!
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM DA UNIDADE
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 96
Você pode observar que o Brasil FIGURA 1 – PIRÂMIDES ETÁRIAS DOS GRUPOS EXTREMOS, POR FAIXA DE RENDA FAMILIAR PER CAPITA EM
tem vivenciado um processo de SALÁRIOS-MÍNIMOS, BRASIL, 2000 (%)
mudança do perfil de adoecimento
e morte da população, como pode Pirâmide etária, renda familiar per capita de Pirâmide etária, renda familiar per capita de
ser visto na Figura 1. Ocorreu uma 0 a 0,5 salário-mínimo, Brasil, 2000 mais de 10 salários-mínimos, Brasil, 2000
queda acentuada da mortalidade
por doenças transmissíveis, da 75 a 79 75 a 79
mortalidade de menores de cinco
anos e a redução significativa das 60 a 64 60 a 64
causas evitáveis de morte. Esses
Grupos etários
Grupos etários
45 a 49 45 a 49
resultados sanitários contribuem
para que as pessoas vivam mais. 30 a 34 30 a 34
Nesse cenário de transição
15 a 19 15 a 19
epidemiológica e demográfica,
emergiu o aumento das Doenças 0a4 0a4
Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), -0,09 -0,06 -0,03 0,00 0,03 0,06 0,09 -0,09 -0,06 -0,03 0,00 0,03 0,06 0,09
como diabetes, hipertensão
arterial sistêmica e outras doenças
Homens Mulheres Homens Mulheres
cardiovasculares, câncer, depressão,
entre outras, e das mortes por
violência (BRITO, 2007).
Fonte: IBGE (2000 apud BRITO, 2007, p. 12).
Deve-se alertar que esse é um cenário epidemiológico As diferenças das condições sanitárias no Brasil ocorrem entre suas regiões e
geral, em que se observa que as mudanças e melhorias entre grupos sociais de diferentes áreas de uma mesma região ou município.
nos indicadores de saúde não ocorreram de modo Com relação às diferenças regionais, Leite (2015) observa que:
homogêneo. O quadro sanitário brasileiro de antes da
pandemia de COVID-19 mostrava que o perfil demográfico e A comparação entre as regiões indica uma carga global
epidemiológico das parcelas mais vulneráveis da população mais elevada no Norte e Nordeste, refletindo mortes mais
ainda se caracterizava por pirâmides etárias mais jovens precoces e maior carga de incapacidade por problemas
de saúde. A maior carga deve-se não apenas aos
devido à menor expectativa de vida e à redução não tão
agravos [infectoparasitários e perinatais], mas também
expressiva – como em outros grupos da sociedade – da às doenças crônicas. A carga elevada deste grupo de
mortalidade infantil (BRITO, 2007). doenças pode ser reflexo de piores condições de vida e
Observa-se que há grandes diferenças epidemiológicas de acesso aos serviços de saúde para controle dos fatores
de risco (como a hipertensão) e para tratamento das
entre as regiões brasileiras e entre os grupos sociais. Esses
doenças, determinando mortes mais precoces e maior
coletivos populacionais convivem com uma tripla carga incidência de sequelas. Ressaltam-se, ainda, as maiores
de doenças. Tomando como base o indicador “anos de taxas de homicídios no Norte e Nordeste, refletindo o
vida saudável perdidos (DALY)”, verifica-se a coexistência aumento da violência verificado na última década nessas
do aumento das doenças crônico-degenerativas com regiões (LEITE, 2015, p. 1560-1561).
elevados índices de morbimortalidade por doenças
infectoparasitárias e por causas externas (LEITE, 2015).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 97
Um reflexo da diferença na carga de doenças entre grupos sociais no Brasil
pode ser observado no forte impacto das doenças psiquiátricas no DALY,
principalmente a depressão e a dependência do álcool. Os transtornos
mentais são fortemente influenciados pela precarização das condições de
vida e de trabalho e representam um grande desafio para os serviços de
saúde, na medida em que apenas uma pequena parcela das pessoas tem
acesso e/ou procuram atendimento.
Outro fenômeno que reflete a desigualdade e a vulnerabilidade de diversos
grupos sociais são os agravos por causas externas. A presença dos homicídios/
violência na segunda posição do DALY de homens brasileiros chama a
atenção para esse grave problema de saúde pública. Esse é um padrão
que expressa a perpetuação de diferentes formas de violência (estrutural,
policial, doméstica, de gênero, entre outras) a que estão expostas, mais Até esse ponto, é fundamental que você reflita sobre a importância das
intensamente, famílias que vivem em territórios em conflito permanente. condições políticas, sociais, econômicas e culturais para o desenvolvimento
Esse é um quadro que diferencia o Brasil de outros países de baixa e média das condições de saudabilidade das populações.
renda, nos quais esse agravo não figura entre as dez primeiras doenças do Nesse cenário, observa-se que a disponibilidade desses recursos é crucial
DALY (LEITE, 2015). para compreender o processo de saúde e adoecimento, assim como para
entender como a carência destes impacta negativamente no modo e na
qualidade de vida individual e coletiva. Contudo, analisamos que, mais do que
constatar a existência de recursos naturais, tecnológicos e socioeconômicos,
é necessário compreender como esses bens e serviços são distribuídos para
as pessoas e apropriados por elas e seus grupos sociais de modo a atender
às necessidades da vida digna e da saúde da população.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 98
Na base do processo de criação do SUS, encontram-
se o conceito ampliado de saúde, a necessidade de
criar políticas públicas para promovê-la, o imperativo
da participação social na construção do sistema e
das políticas de saúde e a impossibilidade de o setor
A concepção ampliada da saúde suscita a necessidade de um novo paradigma que
sanitário responder sozinho à transformação dos
dê conta da abrangência do processo saúde-doença e dialogue com a concepção da
determinantes e condicionantes para garantir opções
determinação social da saúde e doença que procura articular as diferentes dimensões da
saudáveis para a população.
vida que configuram uma determinada realidade sanitária.
Na Constituição de 1988 (BRASIL, 1988), essa
perspectiva ampliada da saúde emerge com a
afirmação contida no Art. 196 da saúde como direito
de todos e dever do Estado, que aponta para a saúde
CONCEITO AMPLIADO DE SAÚDE
enquanto resultante das condições de alimentação,
habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho,
transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse O processo saúde-doença é um processo social caracterizado pelas relações dos
da terra e acesso aos serviços de saúde. Como você já homens com a natureza (meio ambiente, espaço, território, entre outros) e com
viu na Unidade 2, essa definição explicita a importância outros homens (por meio do trabalho e das relações sociais, culturais e políticas)
das dimensões econômica, social e política na num determinado espaço geográfico e num determinado tempo histórico.
produção da saúde e da doença nas coletividades, e
contrapõe-se a uma perspectiva de saúde limitada
à ausência de doença. Essa última representa uma
concepção restrita à racionalidade biomédica, em que O conceito ampliado de saúde, além de incorporar os determinantes sociais e ambientais,
há a primazia do conhecimento anatomopatológico expande as noções de uni ou multicausalidade ao apontar para uma relação de
e da abordagem mecanicista do corpo, dos quais determinação entre os aspectos coletivos e individuais na explicação da saúde e da
deriva um modelo assistencial centrado na atenção doença.
individual, na doença, no hospital e nas intervenções
médicas. Propõe-se, então, que as intervenções em saúde ampliem seu escopo. Elas precisam
tomar como objeto os problemas e necessidades de saúde e seus determinantes e
Nesse sentido, o SUS, como política do Estado brasileiro condicionantes. Desse modo, busca-se que a organização da atenção e do cuidado
para a melhoria da qualidade de vida e afirmação do envolva, ao mesmo tempo, ações e serviços que operem sobre os efeitos do adoecer e
direito à vida e à saúde, dialoga com as reflexões e os aqueles que visem ao espaço para além dos muros das unidades de saúde e do Sistema
movimentos no âmbito da promoção da saúde. de Saúde, incidindo sobre as condições de vida e favorecendo a ampliação de escolhas
O consenso sobre um conceito ampliado de saúde foi se saudáveis por parte dos sujeitos e coletividades no território em que vivem e trabalham
consolidando ao longo das conferências internacionais (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007).
de saúde promovidas pela Organização Mundial da Nessa direção, a promoção da saúde estreita sua relação com a vigilância em saúde,
Saúde (OMS), como a Conferência Internacional sobre numa articulação que reforça a exigência de um movimento integrador na construção de
Cuidados Primários de Saúde, reunida em Alma-Ata consensos e sinergias e na execução das agendas governamentais, a fim de que as políticas
(1978), e a Primeira Conferência Mundial de Promoção públicas sejam cada vez mais favoráveis à saúde e à vida e estimulem e fortaleçam o
à Saúde de Ottawa (1986). A perspectiva de ampliar a protagonismo dos cidadãos em sua elaboração e implementação, ratificando os preceitos
compreensão do processo saúde-doença representa, constitucionais de participação social.
ainda hoje, uma imagem-objetivo para a organização
dos sistemas e das intervenções em saúde.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 99
3.1.1.3 Os Determinantes Sociais da Saúde (DSS) e sua importância na FIGURA 2 – MODELO DE DETERMINAÇÃO SOCIAL DA SAÚDE PROPOSTO POR
vigilância em saúde DAHLGREN E WHITEHEAD EM 1991
GE
CO
proposta pelo conceito ampliado de saúde, os modos e as condições de vida
RA
AMBIENTE
compreendem não apenas as escolhas individuais, mas as relações e influências IS E COMU DESEMPREGO
IS
DE TRABALHO IA
SOC NIT
sobre elas das condições sociais, econômicas e culturais que ocorrem no plano
D ES ÁR
das coletividades (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007). RE I
ÁGUA E
AS
IDA DOS IND
Como você já sabe, ao superarem a concepção biologicista linear de simples causa-
EDUCAÇÃO EV I ESGOTO
efeito, os DSS incluem as condições socioeconômicas, culturais e ambientais de uma
VÍ
SERVIÇOS
DU
sociedade e se relacionam com as condições de vida e trabalho de seus membros,
ESTIL
IDADE, SEXO SOCIAIS
OS
como habitação, saneamento, ambiente de trabalho, serviços de saúde e educação, DE SAÚDE
PRODUÇÃO E FATORES
incluindo também a trama de redes sociais e comunitárias. Esses determinantes AGRÍCOLA E DE HEREDITÁRIOS
influenciam os estilos de vida, já que as decisões relativas, por exemplo, ao hábito de HABITAÇÃO
ALIMENTOS
fumar e de praticar exercícios e a hábitos dietéticos estão, também, condicionadas
por esses determinantes (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007).
Fonte: Fiocruz (2011).
Por outro lado, a percepção de
pertencer a grupos sociais excluídos da Esse modelo situa os estilos de vida individuais entre os condicionantes
maioria dos benefícios da sociedade sociais e comunitários e os fatores biogenéticos individuais. Desse
gera sofrimento e sentimentos de modo, relativiza os comportamentos adotados, relacionando-os com
inferioridade e discriminação. Essas os aspectos coletivos existentes nos grupos sociais a que as pessoas
percepções influenciam a formação pertencem, como: acesso a informações, propaganda, pressão de
de padrões de comportamento e a pares, possibilidades de acesso a alimentos saudáveis e a espaços de
vulnerabilidade desses grupos sociais lazer, entre outros.
na promoção da saúde e na busca por Na camada mais externa da Figura 2, o modelo destaca os fatores
cuidado às situações de adoecimento. relacionados a condições de vida e de trabalho, disponibilidade de
Vale a pena, nesse momento, resgatar, alimentos e acesso a ambientes e serviços essenciais, como saúde e
na Figura 2, o esquema proposto pelos educação. Nessa perspectiva, indica-se como a carência desses aspectos
pesquisadores Dahlgren e Whitehead relativos às condições de vida (condições habitacionais inadequadas,
que permite visualizar as relações exposição a condições mais perigosas ou estressantes de trabalho e
hierárquicas entre os diversos DSS. acesso menor aos serviços) podem representar diferenciais de exposição
e de vulnerabilidade aos riscos à saúde. No último nível, estão situados
os macrodeterminantes que possuem grande influência sobre as
demais camadas e estão relacionados às condições econômicas,
culturais e ambientais da sociedade, incluindo também determinantes
supranacionais, como o processo de globalização (BRASIL, 2008).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 100
Em alguns contextos, os DSS continuam a ser compreendidos como características apenas
do indivíduo, como a rede de apoio social da pessoa, o seu salário ou sua função. No
entanto, a população não é meramente uma coleção de indivíduos. As causas da má saúde
se agrupam em padrões sistemáticos e, além disso, os efeitos sobre um indivíduo podem
depender das relações com outras pessoas na família e na comunidade onde vivem.
Quando se trata de DSS, portanto, é essencial que você compreenda como as causas dos
casos individuais estão relacionadas às causas da incidência nas populações.
Nesse modelo explicativo, ainda, é necessário observar a diferença entre o que se concebe
por determinantes sociais da saúde e por determinação social da saúde. Limitar a ideia
de determinantes seria permitir uma concepção restrita a identificar os fatores causais
sem considerar as relações estabelecidas no tempo e espaço. Essa seria, portanto, uma
percepção de modo isolado e atemporal, e não representa o processo histórico.
A reversão dos determinantes implica, portanto, a identificação dos grupos sociais mais
vulneráveis e a promoção da equidade no acesso a bens e serviços que possibilitem maior
qualidade de vida a essas pessoas, famílias e comunidades. Esses grupos ocupam territórios
em que são condicionados e condicionam os aspectos ambientais, socioeconômicos e
culturais desse lugar.
Sob esse aspecto, a dimensão socioespacial dos DSS ganha importância, na medida em
que a categoria território é apreendida para além de sua dimensão geográfica e, portanto,
compreendida enquanto “território usado”, um conceito aplicado pelo geógrafo Milton
Santos que integra às características físicas de um território o processo relacional entre
as famílias, seus modos de vida e suas condições sociais como sendo, ao mesmo tempo,
condicionada e condicionante do processo saúde-doença (GONDIM; MONKEN, 2008).
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3.1.1.4 Compreensão e ação territorializada em saúde
Podemos refletir, por exemplo, sobre como foi a urbanização no Brasil a partir da metade
do século XX. Essa ação histórica, geográfica e social decorreu, entre outros motivos, da
industrialização ocorrida predominantemente na região Sudeste do país naquele período. Foi
também influenciada pelas desigualdades socioeconômicas, pelas diferenças na distribuição
dos investimentos públicos entre as regiões do país, pelas disputas por posse de terra e por
fenômenos climáticos que acentuaram a pobreza nas comunidades nordestinas. Como
consequência, ocorreram intensos movimentos migratórios da população residente em áreas
rurais para as cidades e a mobilização de pessoas e comunidades inteiras das regiões nordeste
e norte para os centros urbanos da região Sudeste do país.
Devido a esse movimento migratório, houve o adensamento populacional nos centros urbanos
e em suas periferias (área metropolitana) e a acentuação das desigualdades na ocupação do
solo urbano, assim como no acesso a recursos materiais e sociais para a promoção da qualidade
de vida dessas famílias (habitações, ruas, saneamento, saúde, escolas, etc.). Esse processo
provocou uma diferenciação de áreas nas grandes cidades (Figura 3). Ele diferenciou as partes
mais centrais e desenvolvidas de outras, periféricas, nas quais grandes parcelas da população
são marginalizadas da posse do solo, de moradias adequadas, de acesso à água e saneamento,
além de serem obrigadas a se deslocar por grandes distâncias entre a residência e o trabalho
em meios de transportes precários.
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FIGURA 3 – FOTO DA FAVELA DE PARAISÓPOLIS, EM SÃO PAULO-SP
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2015,
a maior parte da população brasileira (85%) vive em áreas urbanas.
Já 15% dos brasileiros vivem em áreas rurais (IBGE, 2016). A grande
região com maior percentual de população urbana é o Sudeste, com
93% das pessoas vivendo em áreas urbanas. A região Nordeste é a que
conta com o maior percentual de habitantes vivendo em áreas rurais:
27% (Figura 4). Esse processo de urbanização no território nacional se
caracterizou pelo crescimento desordenado e grandes disputas pelo
solo nas cidades. Como consequência, observa-se a desigualdade
entre as realidades dos diferentes territórios que formam as cidades
quanto ao perfil socioeconômico dos seus habitantes, acesso aos
serviços e exposição às condições de violência estrutural.
Fonte: Vieira (2004).
15%
Áreas urbanas
Áreas rurais
93%
27%
85%
Região Sudeste Região Nordeste
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Além do processo de urbanização, também podemos exemplificar outros processos de
constituição de territórios que resultaram das intervenções desiguais nos ambientes
naturais e sociais, como a construção das barragens para construção de hidrelétricas ou os
latifúndios do agronegócio. Ambas impingiram o deslocamento das populações residentes
em pequenas vilas, antes localizadas nas áreas alagadas, e de pequenos agricultores, que
foram removidos nos processos de grilagem das terras para outros locais, geralmente
distantes geográfica e culturalmente dos seus lugares originários.
Essas mudanças e reconfigurações do espaço físico, quer sejam elas frutos de um
desenvolvimento intrínseco dos seus habitantes, quer sejam elas resultados de intervenções
impingidas a coletividades com menor poder político e econômico, interferem no modo
de viver individual, familiar e comunitário e vão constituindo novos territórios e realidades
de vida para os grupos sociais.
Bem, como você pode ver, tudo isso reforça a importância de compreender a estrutura e as
relações de uma determinada sociedade considerando os aspectos dos territórios em que
as pessoas vivem, trabalham, se divertem, exercem seus direitos políticos e comungam
valores e culturas. Isso implica reconhecer a constituição e o desenvolvimento do território
usado e os significados partilhados pelos atores que deles comungam. É fundamental
que você o perceba como um “lugar” palpável, isto é, como espaço da existência e da
coexistência, do acontecer solidário, sede da resistência da sociedade civil, espaço real e
efetivo da comunicação, da troca de informação e da construção política.
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3.1.1.4.2 Território como espaço histórico em construção FIGURA 5 – O TERRITÓRIO USADO E SEUS COMPONENTES
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3.1.1.4.3 Território e a territorialização em saúde
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Um segundo passo seria o reconhecimento pelas equipes de suas áreas
adscritas e o estabelecimento das microáreas sob responsabilidade dos
Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Contudo, observamos, nos últimos
anos, principalmente a partir da PNAB 2017 (BRASIL, 2017), a redução
Identifiquem o perfil demográfico, epidemiológico,
do número de ACS por eSF em diversos municípios e a mudança das socioeconômico e ambiental;
suas atribuições, devido ao deslocamento do trabalho no território para
atividades assistenciais dentro das unidades de saúde. Levantem problemas e necessidades, barreiras e a acessibilidade
Essa desproporção na cobertura pelos agentes impacta, constantemente,
o reconhecimento e o acompanhamento do território, pois são esses dentro da sua área de abrangência;
profissionais que realizam o cadastramento das famílias, a identificação
inicial de suas condições de vida e sanitárias, o acompanhamento Conheçam as condições de infraestrutura e recursos sociais;
longitudinal e, por conseguinte, a avaliação contínua de riscos/
vulnerabilidades e das dificuldades de acesso da população residente nas Analisem os elementos e relações existentes em uma comunidade;
microáreas aos serviços de saúde.
Assim, o diagnóstico da comunidade possibilita que as equipes Identifiquem e assessorem-se de lideranças formais e informais;
compreendam os papéis das configurações territoriais na produção de
condicionantes sociais e individuais que prejudicam ou potencializam Potencializem os resultados e os recursos presentes nesse território.
a saúde e a qualidade de vida. Desse modo, o cadastramento e
acompanhamento das famílias de um território possibilita que as equipes:
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O diagnóstico, associado à FIGURA 7 – OBJETIVOS DA TERRITORIALIZAÇÃO PARA A ATENÇÃO E VIGILÂNCIA EM SAÚDE
mobilização e participação social
da população em conselhos
gestores das unidades de saúde,
pode possibilitar, por outro lado, Definição de prioridades em termos Escolha das ações mais adequadas de
um direcionamento das políticas
públicas (educação, saúde, moradia, de problemas e grupos acordo com os problemas identificados
saneamento básico, transporte,
etc.) locais de acordo com as
necessidades e as percepções dos Equidade e
moradores locais. Essa direção
leva a uma visão estratégica para efetividade
a otimização dos recursos e dos
esforços públicos, possibilitando o
atendimento de um número maior
Mobilização e participação social Priorização das intervenções
de pessoas para evitar os riscos nas ações de vigilância nos grupos mais vulneráveis
e as iniquidades em saúde como
exposto na Figura 7.
3.1.1.5 Diagnóstico do território trabalho, são destacados os elementos fixos, representados pelas casas,
ruas, fábricas, igrejas, entre outros, e, por outro lado, identificar as situações
como doença, os ciclos de vida de uma família, a exposição à violência, etc.
O ponto de partida para a organização dos serviços e das práticas de vigilância No entanto, é preciso identificar que, além desses aspectos, que a princípio
em saúde é a territorialização do sistema local de saúde segundo a lógica das parecem fixos, existem também fluxos e relações. Esses objetos fixos só têm
relações entre condições de vida, ambiente e acesso às ações e serviços de razão de ser se tiverem fluxos, pois são esses fluxos que lhes dão vida.
saúde. Reconhecer o território sob responsabilidade dos trabalhadores de
Ressalta-se que os mapas, como recurso para o diagnóstico comunitário,
cada setor como estratégia para o planejamento de ações já é uma evidência
devem ser pensados e produzidos por meio de um processo educativo por
consolidada. O que tem se apresentado como desafio são os métodos
parte dos profissionais e população, na busca de um melhor conhecimento
utilizados para o processo de desvelamento do território (MONKEN, 2017).
sobre o território, os determinantes e os condicionantes ambientais e sociais
Esse movimento busca fazer com que o território, na práxis da APS, seja e sua influência no desenvolvimento dos agravos de saúde da população.
desvelado pelos profissionais e pelas comunidades, mas não apenas por
Mapear os principais problemas de saúde em um determinado território
meio de um registro físico das áreas adscritas e dos agravos que alteram a
é um importante passo realizado pelas equipes, mas também é
vida das pessoas, como casos de pessoas com doenças como hipertensão,
necessário que os profissionais e os gestores da ESF compreendam as
diabetes ou famílias com gestantes ou crianças menores de um ano.
relações, perspectivas e percepções dos moradores sobre a vida nesse
É comum, nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) ou Unidades de Saúde lugar. Identificar os processos de disputas políticas internas e externas,
da Família (USF), a presença de mapas que delineiam as áreas adscritas, e as características e identidades culturais, os valores morais e religiosos,
neles são plotados os casos que exigem maior vigilância. Contudo, quando entre outros aspectos que estão em movimento e constituem o território
se elabora um mapa, ou quando simplesmente se observa o campo de vivo, é fundamental (PESSOA et al., 2013).
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As experiências locais de unidades e equipes também têm fundamentado
o desenvolvimento de estratégias de reconhecimento do território,
como os mapas falantes e os mapas vivos, que, em síntese, são formas de
escutar e registrar de modo gráfico e narrativo o que a população de uma
área percebe sobre seus problemas. Podem ser construídos em reuniões A ERP apoia-se em três princípios conforme a Figura 8:
de grupo e/ou de mobilização dos moradores nos espaços comunitários
preexistentes (como escolas, igrejas, associação de moradores, entre FIGURA 8 – PRINCÍPIOS DA ERP
outros). Esses encontros visam à escuta, registro e reflexão dessas pessoas
sobre suas percepções relacionadas aos problemas daquela coletividade, à
construção de propostas e à busca pelos meios de implementá-las. Coletar dados Coletar Envolver a
Outro método utilizado para obter essas informações e articulá-las pertinentes e informações comunidade
em um Diagnóstico Situacional do território é o da Estimativa Rápida necessários; que reflitam na definição
Participativa (ERP). Essa metodologia de diagnóstico comunitário abarca
não só os elementos físicos, os aspectos demográficos e epidemiológicos
as condições de seus
da população residente, mas também suas relações, suas percepções locais e as próprios
e movimentos. Em uma UBS, a ERP pode ser um importante passo no situações problemas e
planejamento, envolvendo trabalhadores e usuários na definição das
intervenções necessárias para o enfrentamento dos problemas de saúde. específicas; na busca de
soluções.
A ERP valoriza as dimensões dialógica, pedagógica
e participativa do diagnóstico comunitário, pois
compreende o pressuposto de que a doença é uma
manifestação do indivíduo, e a situação de saúde Permite, dessa forma, conciliar o conhecimento teórico com o saber prático,
envolve o lugar onde se mora, trabalha ou busca o de modo a facilitar a tomada de decisão e desenvolver o planejamento
lazer. Compreende que os lugares e seus diversos local em conjunto com a própria comunidade que recebe e avalia o serviço
contextos sociais, dentro de uma cidade ou região, (SANTOS, 1998).
são resultado de situações e relações históricas,
A ERP trabalha, fundamentalmente, com as seguintes etapas:
ambientais, sociais e políticas que promovem
condições particulares para a produção de saúde e • Busca de dados sobre o território em fontes primárias e secundárias;
doença (TANCREDI; BARRIOS; FERREIRA, 1998).
• Reconhecimento do espaço por meio da observação de campo;
A ERP vem sendo aplicada como um método que
• Realização de entrevistas com informantes-chave;
apoia o planejamento participativo das UBSs e das
eSF no sentido de contribuir para a identificação • Análise dos temas e das percepções das entrevistas;
das necessidades de saúde de grupos distintos, • Devolutiva dos resultados encontrados.
inclusive daqueles menos favorecidos, pela própria
população, em conjunto com os profissionais de
saúde. Esse método de análise reúne algumas
vantagens: simplicidade; baixo custo; rapidez e
informações específicas de populações definidas
(TANCREDI; BARRIOS; FERREIRA, 1998).
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3.1.1.5.1 Busca de dados sobre o território em fontes 3.1.1.5.2 Reconhecimento do espaço por meio da 3.1.1.5.3 Realização de entrevistas com informantes-
primárias e secundárias observação de campo chave
No processo de diagnóstico, caro trabalhador Na observação do território, é aconselhável Na escolha dos informantes-chave, a equipe
estudante, você deve, inicialmente, buscar as primeiro percorrer a área munido de um mapa. Esse buscará identificar indivíduos que, por sua inserção
informações sobre a região e a área a ser conhecida reconhecimento inicial dará uma ideia, mesmo que na comunidade, sejam capazes de representar
pela unidade de saúde. Em geral, você deve buscar superficial, importante para uma divisão empírica os pontos de vista da coletividade. Exemplos de
os dados censitários e os registros epidemiológicos do território em microáreas, que na próxima etapa informantes são: funcionários da saúde formais e
dos sistemas de informação, como o Sistema de será aprimorada. Sem isso, o trabalho de observação informais – benzedeiras, curandeiros, entre outros –,
Informações sobre Mortalidade (SIM), o Sistema de de campo, propriamente dito, torna-se mais difícil, professores, crecheiras, líderes comunitários, dono
Informação de Agravos de Notificação e o Sistema assim como a divisão do território (TANCREDI; da farmácia local, moradores antigos, moradores
de Vigilância Epidemiológica (SINAN e SIVEP), o BARRIOS; FERREIRA, 1998). que participam ativamente da vida da comunidade,
Sistema de Informação do Programa Nacional de entre outros. É necessário estar atento à situação e à
A observação de campo tem uma técnica
Imunizações (SI-PNI), o Sistema de Informação organização de cada território para definir, em cada
peculiar nesse método de pesquisa. Cada dia
em Saúde para a Atenção Básica (SISAB), o e-SUS caso particular, o elenco de informantes adequado
deve ser previamente planejado, de acordo com
Atenção Primária e o e-SUS notifica, que organizam (PESSOA et al., 2013).
as observações do dia anterior e as pistas das
o prontuário eletrônico e as notificações de
entrevistas que vão sendo realizadas. O objetivo Tenha sempre em mente, trabalhador estudante,
vigilância epidemiológica. Outras fontes de dados
do trabalho de campo é reconhecer os elementos que o objetivo da entrevista não é conhecer a
que podem ser úteis são os registros das empresas
físicos e sociais que constituem determinado opinião pessoal do entrevistado, mas apreender
fornecedoras de serviços públicos (saneamento,
território e, com base nessas observações, identificar seu conhecimento sobre o território. Assim, é
luz, entre outros) ou órgãos de planejamento
microáreas de risco e definir esses riscos. recomendado que cada questão foque em uma
municipais.
única ideia, simples e objetiva, evitando influenciar
Esse processo compreende ações como examinar
Contudo, os dados provenientes desses sistemas são a resposta com estrutura como: “Você não acha
o ambiente físico da área: características locais
agregados e, na maioria das vezes, não conseguem que...”, “Não é verdade que...” e semelhantes. As
de infraestrutura urbana, como rede de esgoto,
expressar as características das populações de perguntas precisam ser feitas em uma linguagem
arruamento, limpeza urbana e condições de
microrregiões. acessível ao entrevistado, portanto é importante
habitação. Também cabe à equipe examinar os
evitar termos técnicos.
tipos de serviço público oferecidos quanto à
acessibilidade, qualidade e adequação à demanda. Não há uma receita pronta do roteiro. Ele deve ser
moldado a cada território. Independentemente
disso, recomenda-se que se incluam algumas
questões gerais, como referências históricas,
características do solo, do meio ambiente,
socioeconômicas e políticas, necessidades de
saúde, doenças identificadas e riscos percebidos.
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3.1.1.5.4 Análise dos temas e das percepções das
entrevistas
CRAS
a equipe valida o que foi encontrado e mobiliza a UPP
população para refletir sobre sua realidade.
Neste processo, a população pode reconhecer e PROINAPE Caliel
hierarquizar seus problemas de saúde, os riscos
e vulnerabilidades que confrontam no cotidiano. Calça Larga
Por outro lado, ao vislumbrar os recursos e Creche
potencialidades comunitárias e as instituições Raízes Cacique
SALGUEIRO
públicas e privadas existentes e sua capacidade de
Quadra
mobilização, os moradores podem compartilhar a EMBGD
construção do plano de ação a ser desenvolvido. Palanque
da Pedra
O resultado da ERP e de métodos como o mapa Tear
falante pode ser o reconhecimento dos serviços, Rádio
equipamentos e agentes públicos e privados que Tocando
podem ser integrados em uma rede de ações Fundação Biblioteca em Você
Leão XIII Associação de
setoriais e intersetoriais de modo a enfrentar os Jurema
moradores
problemas identificados no território e promover a
saúde e a qualidade de vida dos seus moradores. O
ecomapa comunitário, como apresentado na Figura Fonte: Ferraz e Anderson (2021, p. 46).
9, possibilita a visualização e promove a reflexão
sobre as relações existentes entre a comunidade
e os elementos que compõem essa rede (FERRAZ;
ANDERSON, 2021).
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3.1.2 A VIGILÂNCIA EM SAÚDE COM BASE NOS TERRITÓRIOS
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3.1.2.1 A vigilância em saúde na pandemia de COVID-19 e a potencialidade das intervenções
comunitárias com base nos territórios adscritos às Unidades Básicas de Saúde
Nas últimas duas décadas, as eSF vêm sendo um elemento central no enfrentamento e na
vigilância em saúde de emergências sanitárias como a endemia de dengue, as epidemias de
zika e chikungunya, e, a partir de 2020, confrontaram a pandemia de COVID-19.
O surgimento dessas crises sanitárias impactou, diretamente, as condições de saúde individuais e
comunitárias e a desigualdade da população brasileira. Agravou as situações de vulnerabilidade
e a elas se somaram a carga de doença produzida pelas doenças crônico-degenerativas e as
consequências das diversas formas de violência nos territórios mais marginalizados social e
economicamente.
A proximidade e a responsabilidade sanitária com a população obrigaram que as equipes
fossem responsáveis por compatibilizar as ações preventivas e curativas a esses agravos, ao
mesmo tempo em que precisavam manter as atividades voltadas às linhas de cuidado e aos
riscos da população adscrita.
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Foram emblemáticas as dificuldades vivenciadas por grupos mais vulneráveis em favelas no Rio de
Janeiro e em São Paulo, assim como as vividas pelas populações ribeirinhas e comunidades indígenas
no Norte do país. Para esses grupos, as medidas preventivas ou curativas se mostraram insuficientes e
inadequadas às suas realidades. A importância da implementação e do ajuste contínuo das medidas
de saúde pública e sociais é ressaltada pelo relatório publicado em 4 de novembro de 2020 pela OMS
(WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2020).
A proximidade da APS com esses grupos mais vulneráveis, muitas vezes moradores de comunidades
faveladas e violentas, promoveu impacto no acesso aos serviços de saúde dos pacientes sintomáticos
respiratórios, na coleta e contextualização das informações sobre os casos, na busca dos comunicantes,
na estruturação de ações de vigilância e educação em saúde capilarizadas e contextualizadas às
realidades sociais, ambientais e culturais, e, principalmente, no desenvolvimento de redes de proteção
social e atenção à saúde mental factíveis nesses contextos de maior vulnerabilidade e de dificuldades
de acesso à assistência à saúde e ao suporte social.
Nesse período da pandemia, evidenciou-se que a ampliação do acesso e a capacidade de desenvolver
ações preventivas e de educação em saúde, culturalmente e socialmente apropriadas, dependem,
diretamente, de uma APS forte. Exemplos dessas ações foram a incorporação de novas tecnologias
de comunicação ao monitoramento de pessoas e famílias em isolamento em seus domicílios e/ou
investimentos em ações intersetoriais que garantiram a subsistência de famílias empobrecidas com a
pandemia e em situação de insegurança alimentar.
Percebeu-se, nesse sentido, a relevância do trabalho dos ACS e da equipe técnica no contato direto
com as famílias e os territórios. É fundamental realizar ações, que, por um lado, dirijam-se à mobilização
de redes de apoio, de lideranças e de organizações, como igrejas, associações, comércio, transporte e
mídias locais, e, por outro, foquem no planejamento de fluxos e processos de trabalho nas unidades
básicas, de modo a garantir maior acesso, segurança dos profissionais e dos usuários, continuidade e
integralidade do cuidado.
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ENCERRAMENTO DA UNIDADE
Nesta unidade, verificamos a importância da APS, notadamente dos ACS em contexto de pandemias. Da mesma
maneira, é fundamental o entendimento da importância do Território e dos DSS na capacidade dos indivíduos e
famílias seguirem orientações preventivas quanto à mitigação dos riscos de contaminação.
Por outro lado, entender o território como espaço vivo de ação em saúde implica também mapear redes de apoio,
entender as relações entre indivíduos, famílias e instituições, incluindo o terceiro setor, e perceber possibilidades de
construção de caminhos com foco na integralidade da atenção, de forma muitas vezes intersetorial.
Além disso, conhecer os fatores de risco e vulnerabilidade presentes no território ajuda no entendimento da
capacidade de resiliência de famílias e da própria comunidade, contribuindo para uma ação educativa em saúde mais
contextual e, portanto, mais efetiva.
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Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 117
MINICURRÍCULO DO AUTOR
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.1 Territorialização em Saúde 118
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 3
Caro trabalhador estudante, você sabia que as redes urbanas e as dinâmicas de mobilidade influenciam a propagação
e a evolução do número de casos das doenças transmissíveis? Essas características têm sido evidenciadas na
pandemia de COVID-19.
Os desafios para garantir o acesso aos serviços de saúde, as adequadas condições para prevenção e tratamento
e os distintos caminhos da disseminação do novo coronavírus (SARS-CoV-2) no território brasileiro exigem, pela
complexidade do problema, uma abordagem interdisciplinar do tema, que possibilita compreender melhor a
pandemia no país.
Nesta unidade, assim, apresentamos conceitos importantes sobre o geoprocessamento e o uso do Sistema de
Informação Geográfica (SIG) como metodologia estratégica que interliga a epidemiologia e a geografia, para a
realização de análises espaciais. Será abordada também a importância do espaço geográfico e seu significado
político no contexto de saúde. Ao apresentar os elementos da linguagem cartográfica, o objetivo central desta
unidade é instrumentalizar você, trabalhador estudante, para que possa compreender os mapas temáticos e
utilizá-los como ferramenta para a vigilância em saúde, independentemente do local onde você atua. O uso de
tecnologias de geoprocessamento possibilita a caracterização e análise dos dados espaciais para a resolução de
problemas complexos de planejamento e gestão, apoiando a tomada de decisão, especialmente no enfrentamento
de desastres e epidemias.
Vamos aprender mais sobre geoprocessamento em saúde? Vem com a gente!
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM DA UNIDADE
1. Conhecer o conceito de geoprocessamento em saúde, suas principais características e aplicações na avaliação de riscos
e no planejamento de ações de saúde coletiva;
2. Conhecer o conceito de Sistema de Informação Geográfica (SIG) e a sua aplicabilidade à vigilância em saúde;
3. Reconhecer a importância do espaço geográfico e de seu significado político no contexto da saúde;
4. Compreender a linguagem cartográfica e sua aplicação na vigilância em saúde;
5. Interpretar mapas de risco à saúde como ferramenta para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais.
PARA REFLETIR
Você já parou para pensar na relação entre espaço geográfico e saúde? Pois
é, a categoria espaço tem sido utilizada, de forma crescente, no campo
da saúde, e os espaços são territórios e lugares onde fatos acontecem
simultaneamente, mas suas repercussões são sentidas de maneiras
diferentes (GONDIM et al., 2008). Para o geógrafo Milton Santos, o espaço
geográfico é o conjunto de relações realizadas por meio de funções
(produção, circulação e consumo) e formas (objetos geográficos). Os objetos
geográficos são tudo que existe na superfície da Terra, toda herança da
história natural e todo resultado da produção humana que se concretizou,
ou seja, aquilo que se cria fora do homem e se torna instrumento material
de sua vida. Os objetos geográficos possibilitam e potencializam as ações Fatores culturais, econômicos, demográficos e ambientais estão presentes
humanas e podem produzir ou ampliar, em decorrência de sua utilização e em todas as escalas em que o espaço é representado, mas é provavelmente
qualidade, problemas para a saúde humana (BRASIL, 2006; SANTOS, 2006). na escala global que as variáveis culturais apresentam as maiores diferenças.
A utilização de informações veiculadas em mapas para melhor Esses contrastes, porém, são observados na escala nacional, regional e
entendimento da ocorrência de doenças é uma prática que ocorre há local, mesmo que com menor intensidade (BARCELLOS; BASTOS, 1996).
mais de um século. Os mapas podem ser considerados instrumentos Você sabia que aproximadamente 80% das necessidades de informações
extremamente úteis para se conhecer melhor o espaço onde vivem e necessárias à tomada de decisão e formulação de políticas locais de saúde
atuam as pessoas, pois permitem a representação de aspectos concretos estão relacionadas à localização geográfica (PAN AMERICAN HEALTH
do espaço geográfico (BRASIL, 2006). No Brasil, a disciplina Geografia ORGANIZATION, 1996; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2007)? Nesse
Médica influenciou positivamente a análise do espaço geográfico no setor contexto, as análises espaciais tornaram-se um instrumento essencial para
Saúde, institucionalizada pelos croquis de localidade, produzidos pelo a saúde pública, fazendo do uso de tecnologias de geoprocessamento
setor de cartografia da extinta Superintendência de Campanhas de Saúde ferramenta valiosa para resolver problemas complexos e apoiar a
(SUCAM) (BARCELLOS; RAMALHO, 2002). tomada de decisão, especialmente no enfrentamento de desastres e
epidemias (DALEY et al., 2015; REX; BORGES; KÄFER, 2020; WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2007).
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É importante que você saiba que a menor unidade
territorial é o setor censitário, formado por “área O sensoriamento remoto é a “técnica de obtenção de
contínua, integralmente contida em área urbana ou informações acerca de um objeto, área ou fenômeno
rural, com dimensão adequada à operação de pesquisas localizado na Terra, sem que haja contato físico com o
e cujo conjunto esgota a totalidade do território mesmo” (IBGE, 2021a). As informações podem ser obtidas
nacional” (IBGE, 2010, p. 3), o que permite assegurar a pela “radiação eletromagnética, gerada por fontes
plena cobertura do país. Por ser delimitada apenas para naturais (sensor passivo), como o Sol, ou por fontes
critérios operacionais, essas áreas sofrem alterações a artificiais (sensor ativo), como o radar. São apresentadas
cada censo, dificultando análises espaçotemporais (IBGE, na forma de imagens, sendo mais utilizadas, atualmente,
2010; CARDOSO et al., 2020). A definição da unidade de aquelas captadas por sensores óticos orbitais localizados
análise depende de critérios geográficos, cartográficos em satélites” (IBGE, 2021a). Com base nessas imagens,
e da disponibilidade dos dados a serem utilizados, algumas disponíveis gratuitamente na internet, podem
sendo, portanto, fundamental para o entendimento dos ser obtidos dados sobre o uso e ocupação do solo,
fenômenos em saúde. cobertura vegetal, temperaturas e umidade. Dados sobre
Entre as técnicas de geoprocessamento mais utilizadas uso e ocupação do solo, por exemplo, poderiam ser
estão o sensoriamento remoto, a cartografia digital, úteis na identificação de áreas de risco para a presença
a estatística espacial e os Sistemas de Informações de vetores, como o Aedes aegypti, transmissor de vários arbovírus (dengue, febre amarela, zika,
Geográficas (SIGs) (BRASIL, 2006). chikungunya e mayaro) (CHIARAVALLOTI NETO, 2006).
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3.2.3 Sistema de Informação Geográfica (SIG)
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3.2.3.1 Aquisição de dados
Bem, os dados podem ser definidos Os dados podem ser classificados em primários
como símbolos quantificáveis, ou secundários. Os dados primários são aqueles
que representam numericamente que ainda não foram coletados e sistematizados,
FIGURA 1 – DIFERENÇA ENTRE DADOS E INFORMAÇÃO podendo ser obtidos por meio de entrevista,
um fato ou uma circunstância. É o
número bruto, que ainda não sofreu registro em prontuário ou observação in loco.
qualquer espécie de tratamento Os dados secundários já foram coletados por
estatístico, podendo ser considerado outras pessoas ou instituições e organizados em
a matéria-prima para a produção bancos de dados de órgãos oficiais, tais como o
da informação (exemplo: o número Departamento de Informática do Sistema Único
de casos de COVID-19 no último de Saúde (DataSUS) e o Instituto Brasileiro de
mês, no seu município). O dado, Geografia e Estatística (IBGE), ou por sistemas de
por si só, não traduz a realidade, informação implantados em instituições públicas
mas pode expressar algo quando ou privadas.
é adequadamente interpretado e A fase de coleta dos dados e construção das
analisado. Já a informação, por sua vez, bases de dados é a mais onerosa e que demanda
é entendida como o conhecimento maior tempo no processo de implementação
construído com base em dados já do sistema. Apesar da existência de uma
manipulados, ou o resultado da grande quantidade de dados em meio digital,
análise e combinação de vários dados, disponíveis e atualizados, ainda há muitos
o que implica a interpretação por problemas de compatibilização entre bases de
Fonte: Universidade Federal de Santa Catarina (2016).
parte do usuário (COLUSSI; PEREIRA, dados distintas e de georreferenciamento de
2016). A ilustração a seguir (Figura 1) dados, principalmente a baixa qualidade das
é para facilitar sua compreensão da informações de endereços (BRASIL, 2006; SKABA
diferença entre dados e informação. et al., 2004).
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Para a construção da base de dados FIGURA 2 – MODELAGEM DE DADOS POR UM SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA (SIG) Diversas bases e/ou sistemas de
geográficos ser eficiente, é necessário que informação disponíveis podem ser
haja um planejamento cuidadoso, com utilizados como fonte de dados.
a definição prévia dos objetivos a serem Dentre as formas de aquisição,
alcançados, evitando-se a coleta excessiva Mundo real – destacam-se a importação de
ou insuficiente de dados. Assim, ao se iniciar perguntas a serem dados já existentes em outros
um projeto de SIG, é importante ter em respondidas formatos, ou a confecção de dados
mente para quais perguntas se procuram especificamente para introdução
respostas. Em face dessas perguntas, é no sistema, por meio de técnicas
preciso selecionar os dados que serão Aquisição e como sensoriamento remoto,
necessários na busca das soluções para o Planejamento e digitalização de levantamentos
manipulação de
problema. Nessa fase de modelagem de tomada de decisão topográficos, digitação de dados
dados
dados (Figura 2), determinam-se quais em tabela, inquéritos, entre
dados entrarão no sistema (camadas de SIG outros. No entanto, é importante
informação), qual a estrutura em que que você entenda que existe uma
ficarão armazenados (vetorial ou matricial), série de condições às quais esses
qual a maneira de os representar (pontos, dados devem obedecer, no que
linhas ou áreas), quais os relacionamentos diz respeito à sua estrutura, para
que terão entre si e quais os atributos. Essa Análise dos que possam ser utilizados. Por
Saída de produtos
fase de modelagem é fundamental para dados para gerar isso, eles precisam ser analisados,
de informação
o sucesso de implementação de um SIG informações e eventuais incoerências e
(BRASIL, 2006). imperfeições devem ser corrigidas.
Fonte: elaboração da autora.
O gerenciamento de banco de dados envolve o armazenamento Você já viu muitos mapas na sua vida e sabe que são a representação gráfica de aspectos geográficos,
dos dados de forma estruturada, de modo a possibilitar e naturais e artificiais da Terra, em um plano. De forma mais abrangente, pode-se dizer que um mapa
facilitar a realização das análises. A forma como os dados são é um meio de comunicação e organização de conjuntos de dados e informações que utiliza a
estruturados é crucial para o sistema, pois dela dependem linguagem cartográfica. Um SIG necessita de agilidade para utilizar as diversas camadas de dados
os tipos de análise que poderão ser realizados. A um mapa e exibir esse resultado por meio de mapas de síntese, com boa qualidade gráfica (BRASIL, 2006).
armazenado no SIG podem ser associadas novas informações,
Um mapa é, necessariamente, uma abstração da realidade. As variações geográficas do mundo real
provenientes de diversas fontes, permitindo que se incorpore
são infinitamente complexas e, para conter com precisão todos os dados descritivos do mundo real,
o trabalho de diferentes órgãos e instituições. O SIG permite
um SIG teria de ter um banco de dados virtualmente infinito. Dessa forma, os dados armazenados
combinar vários tipos de informação, como dados obtidos em
sobre uma determinada região precisam, de alguma maneira, ser reduzidos a um número finito
campo por GPS ou por topografia convencional, tabelas, mapas,
para poderem ser manipulados, ou seja, é preciso abstrair da realidade e selecionar apenas os
imagens, entre outros (BRASIL, 2006).
dados relevantes para cada estudo (SILVA, 2006).
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Muitas pessoas confundem, portanto FIGURA 3 – REDE DE ATENÇÃO À SAÚDE DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE-RS
vale esclarecer: mapa não é uma
representação fotográfica da realidade,
mas uma representação gráfica. Ao
contrário da fotografia, em que todos
os elementos visíveis estão presentes,
num mapa é preciso encontrar uma
solução equilibrada entre a quantidade,
a complexidade e o tipo de informação
que será representada (BRASIL, 2006). É
um erro tentar fazer com que um único
mapa responda a diversas questões. Se
existir muita informação importante,
o ideal é que vários mapas sejam
elaborados. Para entender melhor o que
estamos falando, temos um exemplo da
utilização de vários grupos de dados na
elaboração de mapas (Figura 3).
(A) – Rede de atenção à saúde do município de Porto Alegre-RS (B) – Territórios e Unidades da Atenção Primária em Saúde do
município de Porto Alegre-RS
Podemos observar, na Figura 3A, a apresentação de cinco diferentes grupos de dados sobre
o município de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul: Gerências de Saúde, Distritos de Saúde,
Bairros, territórios da Atenção Primária à Saúde e Serviços especializados (hospitais, centros
de apoio psicossocial, unidades de pronto atendimento, farmácias, entre outros). Na Figura
3B, estão apresentadas apenas as unidades de Atenção Primária à Saúde do município. Em
virtude do elevado número de dados inseridos na Figura 3A, o mapa ficou extremamente
poluído, com sobreposição de dados, dificultando sua adequada análise e interpretação. Se
o objetivo fosse avaliar toda a rede de saúde, esse mapa poderia auxiliar, mas a pessoa a
analisá-lo precisaria ter consciência das limitações impostas pelo excesso de dados plotados.
Se o objetivo fosse avaliar a distribuição de equipes de atenção primária pelo município, a
Figura 3B seria a mais adequada. Você percebe a diferença?
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É, você já percebeu que construir mapas interessantes, atrativos e cientificamente
corretos não é tão fácil como parece! Não basta ter os dados e saber usar os programas
de SIG. É preciso ter conhecimento técnico sobre os princípios da representação gráfica,
saber os fenômenos que se quer retratar e dispor de dados, além de ter criatividade, bom
senso e, obviamente, experiência. Ao construir um mapa, é necessário, ainda, ter em
mente os objetivos da representação e o público-alvo. Anota aí: se o mapa é um meio de
comunicação, ao construí-lo é preciso saber como “contar a história” (SILVA, 2006).
As cores têm significado no mapa e, portanto, não devem ser usadas indiscriminadamente
(CASTIGLIONE; PINA, 2004). Algumas cores exercem uma atração mais forte sobre o olhar do que outras,
normalmente aquelas que podem ser vistas a uma distância maior. Os tons quentes são os que mais
atraem o olhar e, por essa razão, são comumente utilizados para destacar algumas informações. Em um
mapa hipsométrico (que representa o relevo), os vermelhos e castanhos estão normalmente associados
às maiores altitudes. Como o olho humano percebe inicialmente essas cores, fica a sensação de terceira
dimensão relacionada ao relevo. Considerando as variações de uma mesma cor, os tons mais fortes são
aqueles que primeiro são percebidos pelo observador e, portanto, devem ser atribuídos às informações
de maior destaque (BRASIL, 2006).
Outro problema que causa confusão é a utilização de um número de classes muito grande, já que,
de modo geral, o olho humano tem dificuldade em distinguir mais do que seis tons da mesma cor
ou mais de 12 cores diferentes simultaneamente, se elas não estiverem alinhadas hierarquicamente.
Isso significa que, ao olharmos uma sequência de cores (ou tonalidades da mesma cor) na legenda,
conseguimos perceber pequenas diferenças, mas, quando olhamos para o mapa, em que as cores (ou
tonalidades) estão misturadas, temos dificuldade em fazer a correspondência entre o mapa e a legenda
(BRASIL, 2006). Dessa forma, é importante: usar cores para realçar, e não para decorar a apresentação
dos dados; testar as cores escolhidas em diversos tipos de mídia: impressão, projeção, monitor de
computador, entre outros (SILVA, 2006).
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3.2.3.4 Consulta e análise
A análise de dados pode ser considerada o principal componente de um SIG, pois possibilita operações de extração e
geração de novas informações sobre o espaço geográfico, de acordo com critérios especificados pelo próprio usuário. As
operações mais comuns são a pesquisa de dados, a busca de informações segundo algum critério de seleção (exemplos:
localização ou proximidade) e a análise espacial, que envolve modelagem e análise de padrões espaciais (BRASIL, 2006).
Um importante fator a ser considerado na utilização dos dados espaciais é a adoção de procedimentos que assegurem a
confidencialidade dos indivíduos. Por exemplo, quando a incidência e/ou prevalência da condição de saúde avaliada for
baixa, cuidados adicionais precisam ser adotados, uma vez que a localização geográfica pode identificar pessoas ou grupos
populacionais específicos, o que fere princípios éticos. Assim, um mapa elaborado para a análise de padrões espaciais
sempre deve ser avaliado antes de sua divulgação, evitando-se uma identificação com potencial de causar prejuízo para as
pessoas e/ou respectivas comunidades.
A partir da análise da distribuição espacial de agravos e seus determinantes, pode-se gerar e analisar hipóteses de
investigação. Os SIGs permitem responder a algumas perguntas frequentes na vigilância em saúde, como:
• A distribuição dos casos de uma doença tem um padrão no espaço?
• Existe alguma associação da doença com possíveis fontes de contaminação ou meios de disseminação?
• Há evidência de uma determinada doença ser transmitida de indivíduo a indivíduo ou por meio de uma fonte comum?
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3.2.4 Fontes nacionais de dados sobre saúde e ambiente
A forma de obter dados da área da saúde é diferente da forma que se obtêm dados
de outros campos em que o SIG pode ser aplicado. Dados sobre as condições
de saúde das pessoas devem ser buscados ativamente, por meio de inquéritos e
censos, ou passivamente, pelos sistemas de informação e vigilância em saúde. A
própria representação das doenças, que será captada por esses instrumentos, é uma
construção histórica e social. Assim, as bases cartográficas digitais, que muitas vezes
são o produto de projetos de geoprocessamento, constituem apenas o ponto de
partida para as análises espaciais de saúde (BRASIL, 2006).
Dentre os diversos Sistemas de Informação em Saúde implantados no Brasil, alguns
destacam-se por sua utilização em análises de dados espaciais para a vigilância em
saúde, como o Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC), o Sistema de
Informação sobre Agravos de Notificação (SINAN) e o Sistema de Informações sobre
Mortalidade (SIM) (BRASIL, 2006). Com o avanço da pandemia de COVID-19 no país e,
consequentemente, com o aumento expressivo no volume de dados de notificação,
houve o fortalecimento e a expansão do sistema de Vigilância Epidemiológica, com
a disponibilização de uma nova plataforma para a notificação de Síndrome Gripal
(SG) suspeita e confirmada de COVID-19, o e-SUS Vigilância Epidemiológica (e-SUS
VE), atualmente denominado e-SUS Notifica. Por ser on-line, possibilita que todos os
níveis de gestão, profissionais e unidades de saúde tenham acesso em tempo real às
notificações realizadas (BRASIL, 2021).
SAIBA MAIS
Para mais informações sobre o e-SUS Notifica, você pode
acessar a página disponível em:
https://datasus.saude.gov.br/notifica/
Nessa página, além de informações gerais do sistema, estão
disponíveis os dicionários de dados e o guia de utilização
de API (Application Programming Interface, que significa,
em português, Interface de Programação de Aplicativos).
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As principais características dos sistemas de informação
utilizados em análises de dados espaciais para a vigilância
em saúde estão apresentadas no Quadro 1.
QUADRO 1 – PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DE SISTEMAS DE INFORMAÇÃO EM SAÚDE UTILIZADOS EM ANÁLISES DE DADOS ESPACIAIS PARA A VIGILÂNCIA EM SAÚDE NO BRASIL
Fonte: elaborado pelas autoras a partir de Santos, Barcellos e Soares (2004) e Brasil (2021; 2006).
Para a adequada utilização desses sistemas de informação • Aumentar a capacidade de análise de dados no nível local;
para a vigilância em saúde, alguns desafios precisam ser
• Integrar as diferentes bases de dados;
superados, como:
• Introduzir variáveis sociais e ambientais nos sistemas de
• Aumentar a cobertura dos sistemas de informação;
informação em saúde;
• Garantir a qualidade dos dados, principalmente o
• Localizar os dados de saúde com exatidão e precisão para
diagnóstico correto de doenças;
permitir seu georreferenciamento.
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No Brasil, há algumas QUADRO 2 – INSTITUIÇÕES QUE SE DESTACAM NA PRODUÇÃO DE DADOS CARTOGRÁFICOS NO BRASIL
instituições que se
destacam na produção Instituição Sigla Responsabilidade
de dados cartográficos, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE Mapeamento sistemático do Brasil em escalas pequenas (1:25000 e menores)
como pode ser observado
Diretoria de Serviços Geográficos do Exército DSG Divide com o IBGE a responsabilidade pelo mapeamento sistemático
no Quadro 2.
Diretoria de Hidrografia e Navegação DHN Geração de cartas náuticas
Instituto de Cartografia da Aeronáutica ICA Geração de cartas aeronáuticas
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais INPE Aquisição e disponibilização de imagens de satélite LANDSAT
Prefeituras - Levantamento cadastral dos municípios
Fonte: Brasil (2006).
FIGURA 4 – DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DOS CASOS DE SÍNDROME GRIPAL POSITIVOS PARA COVID-19, BELO HORIZONTE, 2021
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3.2.5 Espaço geográfico e seu significado político
Enquanto o geógrafo tende a enfatizar a materialidade do território, em suas múltiplas dimensões (que deveria incluir a
interação sociedade-natureza), a ciência política enfatiza sua construção baseada nas relações de poder, ligada, na maioria
das vezes, à concepção de Estado (SANTOS; RIGOTTO, 2010). Conforme Monken e Barcellos (2005), o território deve ser
considerado um espaço não só geográfico, mas também social e político, que se encontra em permanente transformação,
onde vivem grupos sociais definidos, em que se integram e interagem as condições de trabalho, de renda, de habitação, de
educação, o meio ambiente, a cultura e as concepções acerca da saúde e da doença.
A categoria território agrega dimensões específicas – ambiental, política, econômica, cultural e sanitária. Cada dimensão
contribui em maior ou menor intensidade para configurar as condições de vida e a situação de saúde da população que
vive em seus limites (GONDIM; MONKEN, 2017). As delimitações de territórios ocorrem em diversas escalas: desde a escala
do cotidiano, família, grupo e práticas sociais ampliadas (exemplos: trabalho, escola e lazer) até as escalas oficiais de Estado,
que têm como critérios objetivos as relações político-administrativas e de jurisdição (GONDIM; MONKEN, 2017). Dessa
forma, para que uma análise geográfica seja válida, o conceito de território deve ser sempre renovado, considerando-se a
indissociabilidade das dimensões material e imaterial (PEREIRA, 2011).
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O território nunca está pronto, pois está em constante transformação
– o que chamamos de território vivo. Ao mesmo tempo que território
é um resultado, é também condição para que as relações sociais se
concretizem, e, sendo construído no processo histórico, pertence a
uma dada sociedade, de um dado local, que articula as forças sociais
de uma determinada maneira.
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3.2.6.2 Linguagem cartográfica
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3.2.6.2.1 Projeções cartográficas FIGURA 5 – PROJEÇÕES CARTOGRÁFICAS QUANTO À SUPERFÍCIE DE PROJEÇÃO
Para representar o Brasil, utilizamos FIGURA 6 – MAPA DO BRASIL UTILIZANDO A PROJEÇÃO POLICÔNICA
as projeções policônica e cilíndrica
equatorial de Mercator. Em escala
geográfica, o mapeamento
oficial do Brasil é elaborado na
projeção policônica, “que tem
como característica a diminuição
da deformação da convergência
dos meridianos, mantendo uma
melhor representação da Região
Sul do País” (IBGE, 2021b) (Figura
6). O mapeamento na escala
de 1:1.000.000 (lê-se um para
um milhão) segue o padrão do
mapeamento mundial, definido
pela Organização das Nações
Unidas (ONU).
Fonte: IBGE (2021c).
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3.2.6.2.2 Escala
O conceito cartográfico de escala é a relação A escala gráfica é “a representação gráfica de distâncias do terreno sobre uma linha reta graduada”
entre a medida de um objeto ou porção (IBGE, 2021a), ou seja, uma barra com subdivisões semelhantes a uma régua, como apresentado no canto
territorial representada e sua medida real na esquerdo da Figura 7. O tamanho de cada subdivisão representa a relação de seu comprimento com o
superfície terrestre. Isso significa que as medidas valor correspondente no terreno. É bastante utilizada em mapas temáticos, principalmente elaborados em
efetuadas no mapa terão representatividade SIG, pela forma direta que pode ser utilizada para medir distâncias sobre os mapas. “Na escala gráfica, não
direta sobre seus valores reais no terreno. As há necessidade de transformação matemática de centímetros para quilômetros ou metros” (IBGE, 2021a).
escalas “são definidas de acordo com os assuntos
representados nos mapas, podendo ser maiores FIGURA 7 – MAPA FÍSICO DO BRASIL, PARA OBSERVAÇÃO DA
ou menores”, conforme o nível de detalhamento ESCALA GRÁFICA E OUTROS SÍMBOLOS
que se deseja (IBGE, 2021a). Quando se elabora
um mapa usando técnicas de geoprocessamento,
uma das primeiras decisões é a escolha da escala
de trabalho. O conhecimento da escala de um
mapa é um dos elementos fundamentais para seu
adequado uso e interpretação (FITZ, 2000; BRASIL,
2006; IBGE, 2021a).
A escala de um mapa informa quantas vezes as
dimensões do terreno foram reduzidas para que
pudesse ser representado em uma folha de papel
ou uma tela. Por exemplo, se a distância entre os
municípios de Campo Grande, no estado do Mato
Grosso do Sul, e Brasília, Distrito Federal, é de 1050
quilômetros, essa distância será representada no
mapa por apenas 10,5 centímetros. Dependendo
da escala adotada, o mapa terá uma maior ou
menor quantidade de detalhes, o que também
determinará se um tipo de objeto geográfico vai
ser visível ou não.
Há duas formas de apresentação da escala em um Fonte: IBGE (2021c).
mapa: a gráfica e a numérica.
A escala numérica indica “a relação entre as O sistema de coordenadas geográficas é o mais utilizado para a elaboração de mapas. Nesse sistema, a Terra
dimensões do espaço real e do espaço representado, é considerada esférica, e todo e qualquer ponto na superfície terrestre dista igualmente do centro da Terra. As
por meio de uma proporção numérica” (IBGE, coordenadas são latitude (Y) e longitude (X), expressas por meio de unidades angulares: graus (º), minutos (‘)
2021a). Por exemplo, ao adotarmos uma escala e segundos (“). O sistema de coordenada geográfica é bastante usado, principalmente por localizar de forma
1:500.000, 1 centímetro medido no mapa equivale direta qualquer ponto sobre a superfície da Terra, sem a necessidade de qualquer outra indicação (BRASIL, 2006).
a uma distância de 500.000 centímetros ou 1
quilômetro na superfície terrestre. Ou seja, quanto
maior o denominador, menores serão os detalhes
desenhados no mapa (IBGE, 2021a).
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ATENÇÃO!
O olho humano é capaz de distinguir uma linha de 0,1 mm de largura, porém um ponto só
é percebido quando tem 0,2 mm de diâmetro. Por isso, o valor de 0,2 mm é adotado como a
precisão gráfica e caracteriza o erro gráfico vinculado à escala de representação (BRASIL, 2006).
Para facilitar a representação cartográfica, foi criado um O planejamento e a avaliação do setor Saúde pressupõem o conhecimento sobre a distribuição,
sistema de símbolos conhecidos como convenções no espaço geográfico, dos serviços e de sua clientela. O mapa de fluxos permite visualizar as
cartográficas. Os símbolos buscam ser intuitivos, ligações estabelecidas pela presença de um serviço em determinados pontos do território,
possibilitando um certo grau de compreensão de seu destacando regiões de atração. Esse tipo de informação é útil na identificação dos polos, na
significado e a leitura da informação contida no mapa regionalização do atendimento e na verificação das distâncias percorridas pela população
por qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo para acesso aos serviços de saúde. A identificação dos padrões de deslocamento sinaliza
(IBGE, 2021a). áreas com poucas opções de serviços, que podem configurar pontos de estrangulamento ou
oportunidades de desconcentração e regionalizações alternativas (BRASIL, 2006).
Na Figura 7, pode-se verificar a presença de uma escala
de cores, no canto superior esquerdo, para representar Nas redes de atenção à saúde, estabelecidas pelos padrões de deslocamento dos usuários,
a altitude. Nessa escala, a altitude é representada pela o tamanho da área de abrangência do serviço e as distâncias percorridas por seus usuários
hipsometria. As cores não são aleatórias, mas obedecem variam com o nível de complexidade dos tratamentos demandados. Os tratamentos de uso
a uma convenção: o marrom (ou alaranjado) mais escuro mais frequente devem estar disponíveis o mais próximo possível do local de residência dos
representa as maiores altitudes (montanhas, serras, usuários. Questões de eficiência e de qualidade impõem a concentração dos serviços de maior
cordilheiras, chapadas, entre outras), e a tonalidade vai complexidade, resultando em deslocamentos mais extensos (BRASIL, 2006).
clareando conforme as altitudes diminuem; o amarelo
O mapeamento de fluxos pode ser aplicado também para analisar a rede assistencial e auxiliar
representa médias altitudes (geralmente planaltos); e o
no adequado diagnóstico dos desafios para o enfrentamento da pandemia de COVID-19.
verde, as baixas altitudes (planícies). As águas continentais
Por exemplo, em um estudo realizado no estado de Santa Catarina sobre a incidência da
(rios, lagos, entre outros) e marítimas são representadas
COVID-19 e os deslocamentos de residentes para o acesso a serviços de saúde, possibilitou-se
em azul. A linha reta representa o curso de água
a identificação do fluxo dominante e a importância de municípios não integrantes à região
permanente, e a linha pontilhada, o curso intermitente. A
avaliada para o atendimento à população. O fluxo dominante foi definido como o maior fluxo
tonalidade do azul nos mares e oceanos está diretamente
saindo de cada município e permite identificar o arcabouço da rede de ligações.
relacionada à sua profundidade (IBGE, 2021a).
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No caso da região AMAUC (Associação FIGURA 8 – INCIDÊNCIA DA COVID-19 E FLUXOS DE DESLOCAMENTOS PARA SERVIÇOS DE SAÚDE NA REGIÃO
dos Municípios do Alto Uruguai AMAUC – ASSOCIAÇÃO DOS MUNICÍPIOS DO ALTO URUGUAI CATARINENSE, SANTA CATARINA, 2020
Catarinense), observou-se a
centralidade exercida pelo município
de Concórdia, que pode ser explicada
pela maior oferta e diversidade de
serviços de saúde de média e alta
complexidade, atraindo, portanto,
fluxos de praticamente todos os
municípios da região (Figura 8).
Destacou-se, também, a importância
exercida por outros municípios não
integrantes à região, uma vez que suas
cidades centralizam e atraem fluxos de
pessoas necessitadas de tratamentos
de saúde originados na própria região
AMAUC, bem como nos municípios
vizinhos a ela. Dentre esses municípios,
destacaram-se Chapecó, Joaçaba e
Xanxerê, em Santa Catarina, e Erechim,
no Rio Grande do Sul (TALASKA;
TALASKA, 2020).
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Os mapas, de acordo com os objetivos, podem ser classificados em mapas
gerais, especiais e temáticos. Os mapas gerais, como o próprio nome diz, contêm
informações de aspecto geral, como altimetria (arte e ciência da medição de alturas Você deve estar se perguntando, então: quando e como usar as cores? A
ou de elevações, bem como a interpretação de seus resultados). Os mapas especiais primeira questão é saber se queremos mostrar tipos diferentes de eventos
são específicos e técnicos, atendendo a situações muito particulares, como as cartas ou diferenças de intensidade de um mesmo evento. Vejamos dois exemplos.
náuticas e aeronáuticas. Já os mapas temáticos são construídos utilizando os mapas Na Figura 9, estão representados a dinâmica de redução, a estabilização e o
gerais como base e têm como objetivo principal a visualização de um determinado aumento do registro de casos (A) e óbitos (B) novos de COVID-19 na Região
tema, sendo destinados a diversas áreas do conhecimento, com importante aplicação Centro-Oeste do Brasil, em uma dada Semana Epidemiológica.
na Saúde Pública (BRASIL, 2006).
Os resultados mais usuais da utilização de um SIG são mapas que apresentem as FIGURA 9 – REPRESENTAÇÃO DA DINÂMICA DE REDUÇÃO,
informações de interesse ou o resultado de alguma análise espacial. A definição de quais ESTABILIZAÇÃO E INCREMENTO DO REGISTRO DE CASOS (A) E ÓBITOS
as informações serão incorporadas ao SIG e em quais temas e planos de informação (B) NOVOS DE COVID-19 NA REGIÃO CENTRO-OESTE DO BRASIL, NA
serão organizados deve ser de responsabilidade da equipe de implementação (técnicos, SEMANA EPIDEMIOLÓGICA 23
usuários e gestores), levando-se em consideração o objetivo do sistema e os tipos de
análise e resultado esperados (BRASIL, 2006). Assim, para se ter um bom resultado, é
fundamental o conhecimento preciso das características da base cartográfica de origem e
das informações que serão associadas a essa base.
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Por outro lado, quando queremos mostrar diferentes FIGURA 10 – PADRÃO ESPACIAL DE RISCO DE MORTALIDADE DE COVID-19, POR SEXO E MICRORREGIÃO
intensidades de um mesmo fenômeno, o mais correto DO BRASIL, 2020
é utilizar diferentes tonalidades de uma mesma cor,
Mulheres infectadas com 60 anos ou mais Mulheres infectadas entre 40 e 59 anos Mulheres infectadas entre 0 e 39 anos
que nos darão uma impressão de hierarquia. Mapas
desse tipo são os mais utilizados na área da Saúde e
normalmente representam taxas, valores médios,
porcentagens ou outras medidas de intensidade.
Na Figura 10, há a representação do risco relativo
de mortalidade por COVID-19, conforme sexo e
microrregião do país. De acordo com a legenda, o risco
relativo de mortalidade por COVID-19 foi estratificado A B C
em 5 grupos, variando de 0,007 a 0,20 (azul-claro) a De 0,001 a 0,20
De 0,20 a 0,50
3,0 a 9,0 (azul-escuro) (LIMA et al., 2021). Analisando Homens infectados com 60 anos ou mais Homens infectados entre 40 e 59 anos Homens infectados entre 0 e 39 anos De 0,50 a 1,0
os mapas usando a tonalidade de cor como referência, De 1,0 a 3,0
De 3,0 a 5,0
é possível observar um predomínio de tons de azul-
escuro na faixa de 60 anos de idade ou mais, para
ambos os sexos (Figuras 10A e D), indicando maior
risco de mortalidade nessa faixa etária. Por meio da
observação dos mapas para o mesmo sexo (A, B e
C ou D, E e F), é possível verificar uma redução nas
tonalidades, conforme a faixa etária, e também uma D E F
diferença de tonalidade dentro de uma mesma faixa
etária, conforme regiões do país.
Fonte: Lima et al. (2021).
Um mapa temático produzido segundo um indicador social, ambiental ou epidemiológico pode gerar diferentes
padrões espaciais, que sugerem os processos envolvidos na relação entre populações vulneráveis e fontes de
risco. “A dispersão concentrada de pontos, ou de polígonos, com altas taxas em torno de um ponto (núcleo)
sugere que existe uma fonte pontual única naquela região” (BRASIL, 2006, p. 102). Este padrão pode ocorrer,
por exemplo, na presença de uma indústria que emita poluentes com potencial de causar danos à saúde. Outro
padrão observado é a distribuição linear, que pode ser verificada quando as fontes de risco estão relacionadas às
vias de transporte. Contudo, o padrão mais comumente encontrado nos mapas que são produzidos a partir de
indicadores epidemiológicos é o mosaico, caracterizado por apresentar diversos focos (núcleos), “ao redor dos
quais se concentram as maiores incidências de agravos à saúde” (BRASIL, 2006, p. 104). Como exemplo, podemos
citar a leishmaniose visceral, doença transmitida por vetor, onde os núcleos no mosaico sugerem a presença de
condições para a proliferação do flebotomíneo Lutzomyia longipalpis. A distribuição de agravos relacionados à
pobreza também pode apresentar o padrão em forma de mosaico. Isso porque, no caso das desigualdades sociais,
há um padrão de espalhamento das condições de vida. O problema nesse caso é reconhecer se o padrão observado
é justificado por uma distribuição dispersa das fontes de risco, ou se é resultado da flutuação dos indicadores
sociais (BRASIL, 2006).
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Algumas dicas são importantes para ajudar a diferenciar um
padrão espacial de um fator aleatório.
Outra maneira de obter essa
estabilidade, eliminando
as flutuações aleatórias
Em primeiro lugar devemos procurar garantir do valor dos indicadores,
maior estabilidade estatística ao indicador. “Dados é adotando técnicas de
mais agregados, seja no espaço (usando unidades estatística, como as médias
espaciais maiores), seja no tempo (usando maiores móveis, muito utilizadas no
períodos), apresentam maior confiabilidade do contexto da pandemia de
indicador” (BRASIL, 2006, p. 105). COVID-19.
A adoção de camadas de informações também pode ajudar a compreender os fatores que determinam a distribuição
espacial de riscos. Por exemplo, se a incidência de uma doença transmitida pessoa a pessoa, como a COVID-19,
tem um padrão de distribuição em linha, podemos sobrepor a este mapa as estradas, para avaliar se essas linhas
coincidem. Nesse caso, a coincidência pode indicar uma relação entre as vias de transporte e a difusão da doença.
Se as áreas de maior incidência de doenças transmitidas por vetores, como o Aedes aegypti, formarem um bloco de
polígonos com altas taxas, podemos sobrepor a esse mapa uma camada de vegetação e/ou de clima que ajudem a
explicar os locais com maior possibilidade de reprodução desse vetor (BRASIL, 2006).
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ENCERRAMENTO DA UNIDADE
Nesta unidade, trabalhador estudante, você pôde compreender que o geoprocessamento tem grande potencial
para apoiar o gerenciamento de crises, como a pandemia de COVID-19. Foi possível conhecer os principais conceitos
relacionados ao SIG e à linguagem cartográfica.
As análises espaciais refletem a distribuição da doença em diferentes escalas, subsidiando a tomada de decisão em
saúde pública, bem como a adoção de estratégias mais restritivas, priorização de populações mais vulneráveis e
alocação de recursos.
Esperamos que você possa reconhecer a importância do espaço geográfico no contexto da saúde pública e interpretar
mapas de risco à saúde, tendo agora uma melhor compreensão da linguagem cartográfica. O uso das tecnologias de
geoprocessamento para resolver problemas complexos de planejamento e gestão é uma estratégia importante para
a tomada de decisão, especialmente no enfrentamento de desastres e epidemias.
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Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.2 Geoprocessamento em Saúde 146
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MINICURRÍCULO DA AUTORA
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Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 3
Caro trabalhador estudante, diante da emergência e reemergência de doenças infecciosas, como a Síndrome Respiratória
Aguda Grave (SARS, do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome), influenza A (H1N1), zika e, mais recentemente, a COVID-19,
ficou evidente a importância da inteligência da informação em saúde a fim de subsidiar o processo de tomada de decisão
para o controle das doenças nos níveis local, estadual, nacional e global. Por sua vez, a produção das informações em saúde
inclui mais que a mera aplicação de técnicas para transmissão de dados aos serviços de saúde. É preciso compreender os
conceitos, as fontes de dados e as tecnologias envolvidas no processo de coleta, processamento, cálculo de indicadores
e análise. Todos esses conteúdos compõem o campo da Informação em Saúde e permitem estabelecer relações entre o
estado de saúde da população e o contexto em que se vive, para que seja possível construir uma interpretação lógica da
realidade e otimizar os recursos empregados nas ações de saúde.
Dessa forma, esta unidade pretende promover aprendizagens para que você compreenda as tecnologias e ferramentas
do campo da Informação em Saúde, visando à melhoria dos registros e aplicação das informações em saúde nas ações de
enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM DA UNIDADE
Fonte: Freepik.
3.3.2 Informação em saúde: conceito
Conforme Moraes (2014), a
Porém, para que a informação seja útil na tomada de decisão desde o nível de cuidado até
a definição de políticas de saúde, é necessário que seja fornecida de forma e em tempo
adequados. Entretanto, por diversos problemas, que incluem a falta de recursos materiais
e profissionais capacitados, baixa qualidade de registros, acesso limitado aos meios de
comunicação, entre outros, você já sabe que nem sempre a informação flui como deveria.
Assim, embora os serviços de saúde no Brasil produzam uma quantidade imensa de dados,
que são coletados, registrados, processados e disponibilizados na internet, em diferentes
Sistemas de Informações em Saúde (SIS), persiste ainda um baixo uso das informações para
a tomada de decisão nas esferas governamentais (SHARAPIN; LEANDRO, 2020).
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Os dados utilizados na produção QUADRO 1 – PRINCIPAIS FONTES DE DADOS EXISTENTES EM SAÚDE
de informações podem ser de dois
tipos: primários ou secundários. Fonte Instituição Tipos de dado Características
Os dados primários são aqueles responsável
coletados para atingir um objetivo Censos Instituto • Fornece dados demográficos que quantificam grupos • Dados são coletados a cada 10 anos (Rodadas 1990, 2000 e
específico, que fornecem evidências demográficos Brasileiro de populacionais segundo sexo, idade, unidade geográfica, nível de 2010);
diretas de um evento. Por exemplo, Geografia e escolaridade, grupo étnico, etc.;
durante a pandemia de COVID-19, • Por conter dados do universo da população brasileira, é
Estatística
foram realizados inquéritos • Fornece informações sobre educação, emprego, renda, etc.; a única base que fornece a contagem populacional. Uma
(IBGE)
específicos para conhecer a importante limitação é a inexatidão das estimativas nos anos
• Fornece dados sobre as condições ambientais que incluem o
dinâmica de transmissão da doença. intercensitários.
abastecimento de água, coleta de lixo e dejetos, esgotamento
Já os dados secundários são aqueles sanitário, condições de habitação, etc.
originalmente criados para outros Pesquisas IBGE • Fornece dados amostrais referentes à educação, trabalho e renda; • Dados coletados anualmente;
propósitos, mas que permitem a Nacionais de
geração de informações úteis para • Fornece dados sobre as condições ambientais, que incluem o • PNAD contínua – dados coletados continuamente;
Amostragem
a compreensão de determinado abastecimento de água, coleta de lixo e dejetos, esgotamento
por Domicílio • Dados não são universais, mas são representativos do Brasil,
fato ou situação. Dados obtidos sanitário, condições de habitação, etc.
(PNAD) grandes regiões e unidades da federação;
de fontes existentes, como censos,
pesquisas e sistemas de informação, • A PNAD é utilizada na calibração de estimativas populacionais.
são considerados secundários. Sistema de Ministério da • Fornece os dados de nascimentos ocorridos no território • Dados coletados continuamente;
As ações de saúde geram um Informações Saúde nacional, permitindo estratificações segundo sexo, município de
• Apesar de ser um sistema consolidado, ainda apresenta
grande volume de dados, incluindo sobre Nascidos nascimento e características da mãe e do parto.
limitações quanto à sua cobertura.
registros de nascimentos, óbitos, Vivos (SINASC)
agravos, assistência hospitalar e Sistema de Ministério da • Fornece dados sobre internações hospitalares segundo o diagnóstico; • Dados coletados continuamente;
ambulatorial, estabelecimentos Informações Saúde
• Permite desagregações por sexo, idade, escolaridade, raça/cor, • Representatividade nacional, porém inclui apenas
e equipes de saúde, dados Hospitalares do
local de internação e residência, diagnóstico, procedimentos atendimento hospitalar financiado pelo SUS.
financeiros, cobertura de planos Sistema Único de
realizados e custos das internações.
de saúde, entre outros, e grande Saúde (SIH/SUS)
parte deles está disponibilizada Sistema de Ministério da • Fornece informações sobre casos novos e evolução relacionados a • Dados coletados continuamente;
na internet. Entretanto, para uma Informação Saúde agravos de interesse em saúde pública em todo o território brasileiro;
análise completa da saúde de uma • Alimentado, principalmente, pela notificação e investigação
sobre Agravos
população, a depender do problema • Permite desagregação segundo sexo, idade, escolaridade, raça/ de casos de doenças e agravos que constam da lista nacional
de Notificação
a ser analisado, outros tipos de cor, local de notificação e de residência. de doenças de notificação compulsória - Anexo I do Anexo V
(SINAN)
dados são necessários, incluindo da Portaria de Consolidação nº 4, de 28 de Setembro de 2017
as características demográficas, (BRASIL, 2017).
socioeconômicas, culturais, políticas, Sistema de Ministério da • Fornece dados sobre os imunobiológicos, eventos adversos e • Dados coletados continuamente;
ambientais, etc. O Quadro 1 apresenta Informações Saúde população vacinada.
• É atualizado nacionalmente com a inclusão de novas vacinas
as principais fontes desses dados. do Programa
em decorrência do surgimento ou ressurgimento de doenças
Fontes de dados em saúde serão Nacional de
imunopreveníveis.
mais detalhadas na seção seguinte. Imunizações
Vale a pena dar uma olhada! (SI-PNI)
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QUADRO 1 – PRINCIPAIS FONTES DE DADOS EXISTENTES EM SAÚDE (CONTINUAÇÃO)
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3.3.2.2 Sistemas de informação em saúde Segundo Rezende, Soares e Pinto, com base em definições anteriores, os SIS podem ser entendidos como:
a integração e articulação do processo de coleta, armazenamento e processamento dos dados,
com o propósito de transformar dados em informação e, consequentemente, apoiar a tomada
Os Sistemas de Informação em Saúde (SIS) são mecanismos de decisão nos serviços de saúde, não estando obrigatoriamente atrelados à incorporação das
de coleta, processamento, análise e divulgação de dados tecnologias da informação, apesar de hoje se apoiarem fortemente na informática (REZENDE;
e informações, e podem ser considerados um bem SOARES; REIS, 2020, p. 65).
público da população brasileira. Em síntese, um sistema
de informação deve disponibilizar o suporte necessário Nesse sentido, é também importante destacar que os SIS são:
para que o planejamento e as decisões dos gestores em um conjunto de partes articuladas do qual fazem parte os materiais utilizados para coleta e
determinado nível decisório (municipal, estadual e federal) registros dos dados (prontuários, formulários, instrutivos), até os meios utilizados para a divulgação
não se baseiem em dados subjetivos, conhecimentos das informações (tabelas, gráficos, relatórios), passando por todos os recursos necessários para
ultrapassados e conjecturas (DRUMOND JÚNIOR, 2012). a realização de sua finalidade, inclusive os trabalhadores responsáveis pelas diversas fases (coleta,
O quadro ao lado traz a definição de SIS. armazenamento, processamento de dados e difusão), bem como toda a tecnologia utilizada
(computadores, dispositivos móveis, rede, aplicativos) (SHARAPIN; LEANDRO, 2020, p. 45).
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A seguir são detalhados alguns SIS de interesse no contexto da COVID-19 e de outras doenças e síndromes virais.
3.3.2.2.1 Sistema de Informação de Agravos de 3.3.2.2.2 Gerenciador de Ambiente Laboratorial (GAL) 3.3.2.2.3 Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de
Notificação (SINAN) Saúde (SIH/SUS)
O SINAN é alimentado por profissionais de saúde O GAL foi desenvolvido com o objetivo de infor- Criado com o objetivo de organizar o ressarcimento financeiro
da rede pública e privada, por meio da notificação matizar o Sistema Nacional de Laboratórios de dos procedimentos realizados pelas unidades de saúde, o SIH/
e investigação de casos de doenças e agravos Saúde Pública das Redes Nacionais de Labora- SUS apresenta também importantes informações acerca da
que constam da lista nacional de doenças de tórios de Vigilância Epidemiológica e Vigilância morbimortalidade hospitalar no país, uma vez que o Código
notificação compulsória (Portaria de Consolidação em Saúde Ambiental, proporcionando o geren- Internacional é utilizado no campo diagnóstico. É importante
nº 4, de 28 de setembro de 2017, anexo V - Anexo ciamento das rotinas, o acompanhamento das destacar que esse sistema cobre apenas as internações financiadas
I, alterada pela Portaria nº 1.061, de 18 de maio etapas para realização dos exames e a obtenção pelo SUS, realizadas pela rede pública ou conveniada ao sistema
de 2020) (BRASIL, 2017). A Síndrome Respiratória de relatórios nas redes estaduais de laboratórios (REZENDE; SOARES; REIS, 2020).
Aguda Grave (SRAG) foi incluída nessa lista em de saúde pública. O sistema permite também o
2011, em decorrência da pandemia de influenza envio dos resultados dos exames laboratoriais de
A (H1N1) e, desde então, devem ser realizadas a casos suspeitos ou confirmados das doenças de Publicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a CID é
coleta e a notificação de todos os casos de SRAG notificação compulsória ao SINAN. um registro estatístico que reúne e organiza cerca de 55 mil
hospitalizados e/ou óbitos por SRAG causados por códigos únicos para lesões, doenças e causas de morte em
Desde quando foi instalada a transmissão grupos ou categorias, permitindo a análise de uma variável
vírus respiratórios de importância em saúde pública.
comunitária da COVID-19, houve a necessidade tão complexa como as causas de morbimortalidade de uma
Desde 2020, a vigilância dos casos e suspeitas de
de testagem laboratorial em larga escala. Assim, maneira comparável internacionalmente. Atualmente, os
COVID-19 também foi incluída na rede de vigilância
as amostras com suspeita de SARS-CoV-2 países, incluindo o Brasil, se preparam para adotar a 11ª versão
da Influenza e de outros vírus respiratórios.
analisadas pelos laboratórios da rede, bem do documento, que foi lançada na Assembleia Mundial da
Atualmente, o sistema oficial para o registro dos como os resultados dos exames, são registradas Saúde em maio de 2019 e entrará em vigor em 1º de janeiro de
casos e óbitos de SRAG é o Sistema de Informação no GAL. Desse modo, o sistema é uma fonte de 2022 (ALMEIDA et al., 2020).
da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP- dados para a Vigilância Sentinela de Síndrome
Gripe). Além disso, em unidades de Vigilância Gripal e para o monitoramento da pandemia de No contexto de uma pandemia causada por uma doença
Sentinela de Síndrome Gripal, que são definidas COVID-19 e de outras possíveis epidemias no emergente, a OMS definiu novos códigos para a identificação
pelas autoridades municipais, estaduais e país (PAULA JÚNIOR, 2017). da COVID-19. Os novos códigos são U07.1 (COVID-19, vírus
federal, também registram no SIVEP-Gripe casos identificado) e U07.2 (COVID-19, vírus não identificado, clínico-
de síndrome gripal (SG) (BRASIL, 2021a). Essa epidemiológico). Entretanto, pode ser que, em alguns serviços,
organização proporciona a agilidade necessária especialmente no início da pandemia, tenham sido declarados
para que os dados sobre a COVID-19 sejam os códigos B34.2 (Infecção pelo coronavírus de localização não
disponibilizados oportunamente e possam guiar especificada) ou U04.9 (Síndrome Respiratória Aguda Grave –
medidas de controle da pandemia. SARS/SRAG) (BRASIL, 2020a).
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3.3.2.2.4 Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) 3.3.2.2.5 e-SUS Notifica
Você já ouviu falar no sistema
e-SUS Notifica? Com o objetivo de
O SI-PNI foi desenvolvido em 2010 com o objetivo de possibilitar uma avaliação
auxiliar no controle da epidemia
dinâmica do risco quanto à ocorrência de surtos ou epidemias, com base no
no país, ele foi lançado em 27
registro dos imunobiológicos aplicados, dos eventos adversos e do quantitativo
de março de 2020. Inicialmente,
populacional vacinado, que podem ser estratificados por sexo, faixa etária, período
o sistema recebia somente as
de tempo e área geográfica. Por outro lado, o sistema também permite o controle
notificações dos profissionais de
do estoque de imunobiológicos aos gestores
FIGURA 2 – REGISTROS DA VACINA saúde que atenderam casos de SG
do PNI, possibilitando a programação da sua
CONTRA A COVID-19 NO APLICATIVO leve suspeitas ou confirmadas de COVID-19, mas, com o avanço da pandemia,
aquisição e distribuição.
CONECTE SUS CIDADÃO foram incorporados novos módulos, referentes a internações, notificações de
Os dados específicos da campanha de eventos pós-vacinação e monitoramento de contatos (BRASIL, 2021c).
vacinação contra a COVID-19 são concentrados
Assim, estabelecimentos de saúde públicos e privados que prestam serviços
no sistema e incluem o fabricante, dose (única,
ao SUS devem realizar o registro obrigatório de internações hospitalares dos
primeira ou segunda), grupos prioritários, idade
casos suspeitos e confirmados de COVID-19 no módulo Internações (BRASIL,
e informação do estabelecimento de saúde.
2020b). O registro dos eventos adversos associados à vacinação contra a
Além disso, nessa campanha, tem sido exigido
COVID-19 é realizado pelos profissionais de saúde que atenderam ao paciente
o número do Cadastro de Pessoa Física (CPF)
no e-SUS Notifica, formulário – Eventos Adversos (BRASIL, 2021c).
ou do Cartão Nacional de Saúde (CNS) para que
os dados sejam integrados à Rede Nacional de
Dados em Saúde (RNDS), com o objetivo de 3.3.2.2.6 Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM)
criar repositório de informações de saúde dos
O SIM, por sua vez, foi implemen-
cidadãos, com monitoramento adequado das
tado no ano de 1975 com objetivo
doses aplicadas. A integração também permite
de padronizar, em todo o território
que os dados da campanha de vacinação
nacional, o registro de óbitos e dis-
estejam visíveis para o usuário na Caderneta
ponibilizar dados regulares sobre
Nacional Digital de Vacinação, disponível no
mortalidade abrangentes e confi-
aplicativo Conecte SUS Cidadão https://www.
áveis para a realização de análises
conasems.org.br/orientacao_ao_gestor/sipni-
epidemiológicas. O instrumento de coleta de dados do SIM é a Declaração de
campanha-COVID-integracao-de-sistemas-
Óbito (DO), documento necessário para a emissão da certidão de óbito em cartó-
proprios-com-a-rnds/, conforme Figura 2. Mais
rio de registro civil. Essa vinculação possibilita uma maior cobertura do sistema,
informações sobre a Rede Nacional de Dados
constituindo, dessa forma, uma das principais fontes de informação de saúde no
em Saúde (RNDS) estão disponíveis na seção
Brasil, com elevado nível de confiabilidade.
3.3.5.
Os dados dos óbitos disponíveis no SIM podem ser analisados quanto ao
Especificamente no caso da vacina contra a
número e a uma série de variáveis, como sexo, idade, local, profissão e outras.
COVID-19, o Ministério da Saúde construiu um
Uma das principais características do SIM é disponibilizar a informação
fluxo diferente do proposto para outras vacinas.
sobre a causa básica do óbito, que é assinalada pelo médico que assina a
As informações sobre reações adversas estão
DO ao indicar quais afecções mórbidas conduziram diretamente à morte e
sendo registradas no sistema e-SUS Notifica,
ao declarar quaisquer afecções que contribuíram com o evento de acordo
detalhado a seguir.
Fonte: Brasil (2021b). com a codificação da CID. Entretanto, por diversos motivos, esse campo não
é corretamente preenchido na DO, o que faz com que a apresentação da
mortalidade por causas não seja plenamente satisfatória (FRANÇA, 2015).
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3.3.2.3 Coleta de dados e informações epidemiológicas 3.3.2.4 Estudos Epidemiológicos
A avaliação sistemática das condições de saúde da população requer disponibilidade Como você já pôde perceber, os registros de dados e as
de dados coletados pelos SIS em todos os níveis de atuação do Sistema de Saúde. investigações epidemiológicas constituem-se fontes regulares
No entanto, precisam ser corretamente coletados por profissionais devidamente de coleta. No entanto, devido a vários fatores, as informações
treinados e capazes de reconhecer a qualidade de um dado para assim gerar existentes podem ser inadequadas ou insuficientes e, para a
informação que leve à ação apropriada (BRASIL, 2019). Tratando-se, por exemplo, da obtenção de dados detalhados e mais representativos, é necessário
notificação de doenças transmissíveis como a COVID-19, é fundamental a capacitação recorrer a levantamentos ou inquéritos epidemiológicos.
dos profissionais de saúde para o diagnóstico correto e a realização de investigações
epidemiológicas correspondentes. Desse modo, a adequada coleta de dados realizada
no nível municipal tem um papel fundamental na compreensão da situação de saúde Levantamentos ou Inquéritos Epidemiológicos são
nos níveis regional, estadual e nacional. estudos de corte transversal, geralmente realizados
Em virtude de seu caráter de emergência, da severidade e do potencial de em amostras da população. É o método científico de
disseminação, muitas doenças demandam informação complementar e, portanto, investigação dos eventos relacionados com a ocorrência
métodos de investigação rápidos, específicos e apropriados. Nessas circunstâncias, de doenças em populações que fornece informações
a investigação epidemiológica de casos e epidemias constitui atividade obrigatória sobre a prevalência de casos clínicos ou portadores em
de qualquer sistema local de vigilância epidemiológica (BRASIL, 2019; BRASIL, 2011). determinada comunidade (BRASIL, 2019).
Em geral, estudos dessa natureza são realizados quando
as informações existentes nos SIS são inadequadas
A investigação epidemiológica é um método de trabalho utilizado ou insuficientes, relacionado a situações como:
para esclarecer a ocorrência de doenças, emergências de saúde pública, subnotificação ou falhas no preenchimento das fichas;
surtos e epidemias. Consiste em um estudo de campo, realizado com mudança no comportamento epidemiológico de uma
base em casos notificados de uma doença e seus contatos, que tem como determinada doença; dificuldade em avaliar coberturas
principais objetivos: identificar fonte de infecção e modo de transmissão, vacinais ou eficácia de vacinas; necessidade de se avaliar
identificar grupos expostos a maior risco e fatores de risco, confirmar o efetividade de ações de saúde específicas; descoberta de
diagnóstico e determinar as principais características epidemiológicas da agravos inusitados, entre outras (BRASIL, 2009).
doença (BRASIL, 2019; BRASIL, 2011).
De acordo com o Guia de Vigilância Epidemiológica, a investigação
epidemiológica deve ser iniciada imediatamente após a notificação de No caso da COVID-19, os estudos epidemiológicos têm o objetivo
caso isolado ou agregado de doença/agravo, sendo ele uma suspeita de compreender as características e o comportamento da doença,
clinicamente declarada, ou mesmo um contato, para o qual as autoridades seus determinantes biológicos, sociais e ambientais. Também
sanitárias considerem necessário dispor de informações complementares abordam aspectos relativos a fatores de risco, causalidade e à
(BRASIL, 2019). O seu propósito final é orientar medidas de controle para utilização de medidas de tratamento e prevenção. Tais estudos se
impedir a ocorrência de novos casos na comunidade. fazem ainda mais importantes nesse momento de pandemia, pois,
devido à falta de recursos para a realização de testes em todos os
casos de síndrome gripal, independentemente da gravidade, e à
Entretanto, devido à urgência para que sejam instituídas medidas de controle, a investigação carência de testagem em massa da população, não se conhece a
epidemiológica de campo não cumpre o rigor necessário para estabelecimento de relações real contaminação pelo SARS-CoV-2 na população brasileira.
causais. Geralmente é iniciada sem uma hipótese clara e restringe a coleta de dados para
agilizar a análise e obtenção de informação para a ação. Portanto, frequentemente há
necessidade de obter informações adicionais (BRASIL, 2019).
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3.3.3 Indicadores de saúde
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Outros indicadores que também são ferramentas que auxiliam os gestores no processo b.3) Letalidade: é a proporção de óbitos considerando o total de
de tomada de decisão e constituem instrumentos importantes para o controle social: doentes. Esse cálculo evidencia a taxa de letalidade, muito útil
para avaliar a gravidade de uma epidemia.
a) Indicadores ambientais demonstram a inter-relação das condições
ambientais e da situação de saúde. Exemplos: taxa de desmatamento
anual, emissão de gases tóxicos por tamanho da frota de automóveis e
taxa de internação por doenças relacionadas ao saneamento ambiental Exemplo:
inadequado;
Taxa de letalidade para a COVID-19 no Brasil em 2020 =
b) Indicadores de surtos epidêmicos e pandêmicos:
Número de óbitos por COVID-19 no Brasil em 2020
b.1) Incidência acumulada: é a medida do número de casos novos de uma x 100
doença em uma população submetida ao risco de desenvolvê-la, durante Total de casos de COVID-19 no Brasil em 2020
um dado período. Ou seja, é a probabilidade ou o risco de um indivíduo da
população desenvolver a doença durante um período específico.
c) Indicador de testagem oportuna: taxa de positividade é
Exemplo: a proporção de casos positivos considerando todos os testes
realizados em um dia. É considerado um indicador de testagem
Incidência de COVID-19 em adultos de 30 a 40 anos no Brasil no mês de abril de 2021 = oportuna, pois pode identificar grupos populacionais e regiões
prioritárias nos processos de relaxamento ou intensificação das
Número de adultos de 30 a 40 anos que desenvolveram COVID-19 no mês de abril de 2021 x fator medidas de isolamento social contra a COVID-19. Para a OMS,
Número de adultos de 30 a 40 anos residentes no Brasil no mês de abril de 2021 uma taxa de positividade inferior a 5% por 14 dias é um indicador
de que a epidemia está sob controle (FUNDAÇÃO OSWALDO
CRUZ, 2020);
d) Taxa de contágio ou número médio de transmissão por
b.2) Mortalidade: é a taxa que estima o risco absoluto de morrer em um infectado (Rt – “número de reprodução eficaz”): é um número
período de referência em um determinado local. que traduz o potencial de propagação de um vírus. Quando é
superior a 1, indica que cada infectado transmite a doença para
mais de uma pessoa, e a doença avança na população;
Exemplo: e) Taxa de ocupação de leitos de UTI para COVID-19: é um
Taxa de mortalidade para a COVID-19 no Brasil em 2021 = retrato do momento epidêmico. Cada vez que a taxa de ocupação
cai significa que menos pessoas estão adoecendo pela infecção
Número absoluto de óbitos por COVID-19 no Brasil em 2021 do novo coronavírus.
População total estimada no Brasil em 2021* O uso de indicadores de saúde é fundamental para monitorar o avanço
da pandemia de COVID-19, planejar e avaliar ações de controle, bem como
* Todos os indivíduos no Brasil estão expostos ao risco de morrer por COVID-19. realizar comparações entre as regiões do país e com outros países. Contudo,
a qualidade desses indicadores pode ser afetada pelo número de testes
No denominador, estão incluídos os que têm e os que não têm a COVID-19.
realizados e pela estrutura dos sistemas de saúde, principalmente da vigilância
epidemiológica. Portanto, em face das peculiaridades de cada indicador, é
necessário aperfeiçoar o monitoramento dos casos, por meio da ampliação
da capacidade de testagem e do monitoramento de contatos, com o objetivo
de identificar precocemente e limitar a ocorrência de novas ondas da doença
(COELHO; PILECCO, 2020).
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3.3.4 Análise de Situação de Saúde
Você já sabe que a saúde é uma área muito dinâmica. O
adoecimento de populações é muito variável e a demanda é
crescente por novos recursos e tecnologias que, para serem Os dados epidemiológicos são fundamentais na composição da análise para monitorar, planejar
incorporados aos tratamentos, geram altos custos aos governos. e avaliar as condições de saúde da população. A seguir, são destacados alguns métodos de
Considerando que os recursos na saúde são finitos, ou seja, análise desses dados que têm sido fundamentais para o acompanhamento da pandemia de
tanto recursos financeiros como o número de profissionais, por COVID-19 no Brasil e nos demais países.
exemplo, são limitados, há a necessidade de otimizar a utilização
desses recursos. Sabe-se que as doenças apresentam padrões
diferentes de acordo com: 3.3.4.1 Análise de tendências
a) A região: as que são mais frequentes em uma região
podem não ser em outras;
As análises de tendências ou de séries temporais nada mais são que uma forma de organizar
b) Ao longo do tempo: doenças comuns no passado no tempo os indicadores de saúde, como o número de novos casos e óbitos de uma doença.
podem ter sido erradicadas, ao passo que outras surgem Uma análise visual da evolução temporal de indicadores permite uma melhor compreensão das
ou ressurgem ao longo dos anos. características de disseminação da doença, e a comparação com outros locais permite levantar
Diante desse cenário, a Análise de Situação de Saúde (ASIS) hipóteses sobre as medidas de controle adotadas em cada país, conforme podemos observar
facilita a identificação de necessidades e prioridades em na Figura 3.
diferentes regiões, bem como o direcionamento de intervenções
e programas adequados e a avaliação do seu impacto na saúde. FIGURA 3 – EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE NOVOS ÓBITOS CONFIRMADOS DE COVID-19 POR
A ASIS tem como principais objetivos: SEMANA EPIDEMIOLÓGICA, SEGUNDO PAÍSES COM MAIOR NÚMERO DE ÓBITOS
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FIGURA 4 – PROJEÇÃO DO NÚMERO DIÁRIO DE ÓBITOS DEVIDOS À COVID-19 NO BRASIL, REALIZADA PELO INSTITUTE FOR HEALTH
METRICS AND EVALUATION (IHME) E DISPONIBILIZADA EM 28 DE AGOSTO DE 2020, CONSIDERANDO-SE TRÊS CENÁRIOS
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O termo média móvel é utilizado FIGURA 5 – NÚMERO DE REGISTROS DE CASOS NOVOS (A) E ÓBITOS NOVOS (B) DE COVID-19 E MÉDIA MÓVEL DOS ÚLTIMOS 7 DIAS POR
porque, a cada período, a observação DATA DE NOTIFICAÇÃO. BRASIL, 2020-21
mais antiga é substituída pela
observação mais recente, e, sendo
assim, uma nova média é calculada
(MORETTIN; TOLOI, 1981). Por
exemplo, para calcular a MM dos
primeiros 7 dias de um determinado
mês, basta somar o número de casos
ou mortes do dia 7 com o dos 6
dias anteriores e dividir o resultado
por 7. Para calcular a MM do dia 8,
descartaríamos o valor mais antigo
do mês (dia 01) e adicionaríamos o
mais recente (dia 08) ao cálculo. A
utilização desse estimador evita que
sejam feitas análises precipitadas
dos dados das últimas 24 horas,
que podem estar subnotificados
ou represados, pois leva em
consideração a influência de todos
os dias da semana e suas oscilações.
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3.3.4.3 Curva epidêmica FIGURA 6 – CURVA EPIDÊMICA
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3.3.5 Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs)
Em 2019, a OMS iniciou a elaboração da Estratégia Global de
Saúde Digital, cuja proposta unifica, sob o termo Saúde Digital,
todos os conceitos de aplicação das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TICs) em Saúde, incluindo e-Saúde, Telemedicina,
Telessaúde e Saúde Móvel. Além de reduzir a fragmentação
das aplicações da tecnologia em saúde, o conceito de Saúde
Digital amplia o entendimento, caracterizando-a como área de
conhecimento e prática, e absorve os conceitos da utilização
avançada da tecnologia, incluindo o uso de dispositivos pessoais
e de tecnologias emergentes (BRASIL, 2021d).
Nesse sentido, o Brasil elaborou sua própria Estratégia de Saúde Fonte: Freepik.
Digital, cuja vigência será no período entre 2020-2028, e alguns
pontos que se destacam são: a) ações capazes de responder A Estratégia de Saúde Digital para o Brasil, mencionada anteriormente, está alinhada à Política
às necessidades de informação para o SUS, incluindo ações Nacional de Informação e Informática em Saúde (PNIIS), que tem a finalidade de definir os princípios
de integração com a saúde suplementar e a saúde privada; b) e diretrizes norteadores para os setores público e privado efetivarem a integração dos sistemas de
construção do arcabouço organizacional, legal, regulatório e de informação em saúde. Assim, almeja-se a inovação, o apoio à transformação digital dos processos
governança, que viabilize a colaboração efetiva em Saúde Digital de trabalho em saúde e o aprimoramento da governança no uso da informação, das soluções de
entre os atores comprometidos com os propósitos e as metas tecnologia da informação e da saúde digital, bem como a transparência, a segurança e o acesso às
a serem estabelecidos como parte do desenvolvimento desse informações em saúde pela população e melhoria da saúde do cidadão (BRASIL, 2021f).
eixo; c) implementação de um ambiente conceitual, normativo,
educacional e tecnológico que favoreça a colaboração efetiva A COVID-19 impôs um cenário dinâmico e de risco à população, exigindo respostas
entre todos os atores envolvidos (BRASIL, 2020c). contundentes de todo o SUS, principalmente do setor público, ao qual coube a coordenação
das ações nacionais e o direcionamento dos esforços de estados, municípios e, até mesmo, da
saúde suplementar. A principal iniciativa da Estratégia de Saúde Digital, o Programa Conecte
SUS, foi impulsionado a priorizar as ações para que estivessem em pleno alinhamento com as
necessidades nacionais de combate à COVID-19. A Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS)
foi rapidamente alçada à posição de repositório nacional de dados da COVID-19, passando a
integrar as ações de recebimento, processamento e disponibilização de notificações de agravos,
O Conecte SUS é um programa do Governo Federal resultados de exames e ocupação de leitos por coronavírus. O DATASUS se mobilizou para que a
coordenado pelo DATASUS que prevê a integração das RNDS passasse a ser, também, a grande integradora de serviços relacionados à COVID-19, como a
informações de saúde do cidadão em uma rede de dados, teleconsulta, novos aplicativos voltados para autoavaliação de usuários, além da disponibilização
permitindo ao cidadão acompanhar virtualmente sua de informação para o usuário sobre a doença e, também, sobre a situação da pandemia para
trajetória no SUS, saber quais vacinas tomou, consultar cidadãos, profissionais de saúde e gestores (BRASIL, 2021f ).
atendimentos que teve, exames que realizou, internações
e medicamentos que usou. O aplicativo pode ser acessado
por smartphone ou computador e permite a emissão
do Certificado Nacional de Vacinação COVID-19. Estão
previstos ainda a disponibilização de módulos para
profissionais e gestores de saúde, que passarão a contar
com um conjunto de informações que poderão contribuir
na continuidade do cuidado e no processo de tomada de
decisão (BRASIL, 2021g).
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O Programa Telessaúde Brasil Redes, por sua vez, é uma iniciativa nacional, instituído desde 2007, que busca melhorar a qualidade
do atendimento na Atenção Primária no SUS, com resultados positivos na resolubilidade do nível primário de atenção, bem
como expressiva redução de custos e do tempo de deslocamentos, fixação dos profissionais de saúde nos locais de difícil acesso,
mais agilidade no atendimento prestado e otimização dos recursos dentro do sistema, beneficiando cerca de 10 milhões de
usuários do SUS. O Telessaúde Brasil Redes disponibiliza aos profissionais e trabalhadores das Redes de Atenção à Saúde no SUS
os seguintes serviços (BRASIL, 2021h):
• Teleconsultoria: é uma consulta registrada e realizada entre trabalhadores, profissionais e gestores da área de saúde, por
meio de instrumentos de telecomunicação bidirecional, para esclarecer dúvidas sobre procedimentos clínicos, ações de
saúde e questões relativas ao processo de trabalho, podendo ser síncrona ou assíncrona;
• Telediagnóstico: é um serviço autônomo que utiliza as tecnologias de informação e comunicação para realizar serviços de
apoio ao diagnóstico;
• Tele-educação: conferências, aulas e cursos ministrados por meio das tecnologias de informação e comunicação;
• Segunda Opinião Formativa: é uma resposta sistematizada, construída com base em revisão bibliográfica, nas melhores
evidências científicas e clínicas e no papel ordenador da Atenção Primária à Saúde, a perguntas originadas das teleconsultorias
e selecionadas segundo critérios de relevância e pertinência em relação às diretrizes do SUS.
Assim, você pode perceber que a combinação de um sistema de saúde organizado com a experiência de uso de sistemas de
informação possibilita ao Brasil o uso das TICs com abrangência nacional, contemplando uma diversidade de benefícios colocados
à disposição de pacientes, cidadãos, profissionais de saúde, gestores, autoridades e organizações de saúde.
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ENCERRAMENTO DA UNIDADE
Chegamos ao final desta unidade, que abordou a importância da informação para o entendimento e enfrentamento
da COVID-19 e de outras doenças virais. Você viu que há uma série de eventos que ocorrem antes da divulgação
de informações responsáveis para a população e profissionais de saúde. Tais eventos incluem a coleta de dados de
fontes confiáveis; o registro e o processamento desses dados por sistemas de informações seguros; cálculos, análises
e interpretações que utilizam indicadores condizentes com o contexto estudado. Além disso, você conheceu algumas
ferramentas e estratégias de comunicação utilizadas pelo governo e já pode acessá-las para se manter informado.
Dessa forma, esperamos que você compreenda, criticamente, as informações sobre a pandemia no Brasil e tenha mais
segurança para calcular e interpretar indicadores que possam embasar a prática profissional e a tomada de decisão
para o enfrentamento de outras doenças virais. Também desejamos bons estudos! Até uma próxima!
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MINICURRÍCULO DAS AUTORAS
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.3 Informação em Saúde 172
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 3
Caro trabalhador estudante, que bom que chegou nesta unidade! Nela iremos abordar alguns aspectos históricos,
conceituais e metodológicos que perpassam a construção de práticas e ações educativas em saúde. Esperamos que, ao
concluir a unidade, você possa compreender os pressupostos teóricos e éticos que embasam e orientam o processo de
construção de intervenções e materiais educativos em saúde, pautados pelo diálogo e pela interlocução de saberes e
levando em consideração a determinação social do processo de saúde, adoecimento e cuidado.
Para tanto, faremos um breve resgate histórico da construção das diferentes práticas educativas em saúde no Brasil,
considerando as diferentes perspectivas e interesses que as subsidiaram e orientaram. Também serão apresentadas e
discutidas as principais características do Modelo Tradicional de Educação em Saúde, que, apesar de criticado, ainda se
encontra presente no cenário brasileiro, promovendo práticas informativas e transmissionistas, com pouca efetividade
na mudança de comportamentos. Em contraposição e buscando apresentar uma proposta mais coerentes com os
pressupostos da Saúde Coletiva e do Sistema Único de Saúde (SUS), será apresentado o Modelo Dialógico de Educação
em Saúde, reconhecido como uma importante saída que vem demonstrando resultados promissores diante da nossa
realidade social, marcada tanto pela diversidade, como pela desigualdade social.
Por fim, esperamos auxiliar você na construção de intervenções educativas e materiais em saúde que auxiliem no
estreitamento de laços entre os serviços de saúde e as comunidades, auxiliando trabalhadores e usuários do SUS na
invenção de soluções e respostas coletivas e participativas aos desafios impostos pela pandemia de COVID-19. Acreditamos
que essas problematizações irão auxiliar você a discutir a importância da Educação em Saúde para o trabalho desenvolvido
no âmbito da vigilância em saúde, especialmente no que tange ao atual momento desafiador, quando o mundo busca
respostas para o enfrentamento da pandemia de COVID-19 e seus efeitos.
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM DA UNIDADE
1. Descrever os diferentes modelos e propostas de Educação em Saúde, suas bases teóricas, características e aplicabilidades
no âmbito da Vigilância e Cuidado em Saúde;
2. Conhecer preceitos teóricos e metodológicos para a construção de ações e materiais educativos no âmbito da Saúde
Coletiva, na perspectiva da Promoção da Saúde;
3. Compreender os desafios e as possibilidades para a construção de processos educativos em saúde, no contexto da
pandemia de COVID-19.
3.4.1 Introdução
Para compreendermos a articulação das práticas e das ações educativas em saúde,
é preciso discutirmos as diferentes racionalidades que orientam o trabalho em
saúde na contemporaneidade. Apesar das constantes transformações, ainda hoje,
no campo da Saúde Coletiva, discursos pertencentes a diferentes racionalidades
atravessam os modos de pensar de gestores e equipes de saúde, contribuindo
para o delineamento de propostas assistenciais, incluindo aquelas que trazem
consigo o desafio de orientar a população sobre temas relacionados à saúde e ao
autocuidado (LUZ, 2013; NASCIMENTO et al., 2013). Isso também acontece com
os processos educativos, que se encontram atravessados pelas características
e condições socioculturais do contexto no qual encontram-se inseridos e
refletem as marcas da época em que são produzidos (SCHALL; MODENA, 2005;
VASCONCELOS; PRADO, 2017). A seguir, abordaremos, mais detalhadamente,
alguns aspectos importantes dessa história.
3.4.2 Educação em Saúde no Brasil: aspectos históricos
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 177
Ainda no que se refere ao modelo biomédico, cabe ao paciente obedecer,
submeter-se e se adequar aos tratamentos e às propostas assistenciais, que, em
geral, buscam retirar os sintomas e curar as doenças já instaladas no organismo
dos usuários (BARROS, 2002; TERRA; CAMPOS, 2019). Conforme destacam
Merhy e Feuerwerker (2017), no modelo biomédico, valorizam-se as tecnologias
duras, como os equipamentos de última geração, os instrumentos clínicos mais
avançados, assim como as tecnologias leve-duras, representadas pelas evidências
científicas e as disciplinas acadêmicas que se debruçam sobre o adoecimento,
reduzido, como já dito, à sua dimensão biológica. Além disso, nesse modelo, de
modo geral, as ações, incluindo as de educação em saúde, são, prioritariamente,
desenvolvidas no contexto hospitalar ou em outros equipamentos de saúde O modelo biomédico orientou (e ainda vem orientando) propostas
voltados para situações em que sintomas, desconfortos e outros sinais do específicas de Educação em Saúde, também conhecidas como
adoecimento já se mostram evidentes (LUZ, 2013; MERHY; FEUERWERKER, Educação Sanitária ou Educação para a Saúde, uma vez que
2017). Assim, há pouco espaço para o diálogo e para as trocas entre os usuários tinham como principal objetivo transmitir informações acerca das
e os profissionais de saúde, uma vez que, nesse contexto, as evidências e os principais doenças que acometiam as populações e os grupos mais
marcadores dos exames clínicos substituem a escuta das experiências, dos vulneráveis, especialmente as classes populares e as comunidades
sentimentos e dos questionamentos das pessoas que vivenciam, em seus corpos, rurais (SCHALL; MODENA, 2005; SILVA et al., 2010). De modo
a facticidade do adoecimento (LUZ, 2013; MERHY; FEUERWERKER, 2017). geral, essas ações eram planejadas pelos profissionais de saúde,
representados, naquele período, pelos educadores sanitários e, até
mesmo, por uma Polícia Sanitária que buscava controlar e fiscalizar
Conforme destacam Merhy e Feuerwerker (2017), no modelo possíveis situações que comprometessem a saúde da população,
biomédico, valorizam-se as tecnologias duras, como os equipamentos intervindo de forma direta e, muitas vezes, violenta nesses
de última geração, os instrumentos clínicos mais avançados, assim casos, punindo aqueles que descumprissem as prescrições dos
como as tecnologias leve-duras, representadas pelas evidências profissionais de saúde (GAZZINELLI et al., 2006; SILVA et al., 2010).
científicas e as disciplinas acadêmicas que se debruçam sobre o
adoecimento, reduzido, como já dito, à sua dimensão biológica. Nesse sentido, eram usadas estratégias inspiradas por ideologias
militares, contribuindo para a utilização de uma linguagem bélica
(guerra, luta, público-alvo, etc.) e modelos de ações higienistas
(campanhas, propagandas, palestras, etc.), ainda hoje presentes no
campo da saúde (GAZZINELLI et al., 2006; SILVA et al., 2010). Essas
ações mostram-se limitadas, pois, além de enfatizarem apenas o
repasse de informações, acreditando que elas sejam suficientes
para produzir mudanças em saúde, desconsideram os aspectos
subjetivos e sociais que perpassam o processo saúde-doença e
cuidado, assim como a comunicação entre profissionais e usuários
(SCHALL; MODENA, 2005).
Fonte: Freepik.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 178
É importante que você entenda que os saberes biomédicos também trouxeram
contribuições importantes para a compreensão de fenômenos no campo
da saúde, como as epidemias e as pandemias, de modo que não se trata de
combatê-los e/ou desconsiderá-los, certo?
Assim, tratando-se do cenário da pandemia de COVID-19, os estudos acerca
dos aspectos biológicos da nova doença, especialmente no que se refere à
virologia, à infectologia, às pesquisas básicas e aplicadas ao desenvolvimento de
tecnologias de diagnóstico, vacina e tratamentos, são de extrema importância,
como veremos na Unidade 4 deste módulo. Entretanto, também é preciso
reconhecer os limites desses saberes diante da complexidade do processo
saúde-doença e cuidado, sobretudo ao considerarmos os diferentes modos que
os diferentes sujeitos vivenciam a pandemia, especialmente em um contexto
marcado por desigualdades sociais, como o brasileiro (BARROS, 2002; LUZ,
2013; TERRA; CAMPOS, 2019). Esse cenário exige que os serviços e as equipes
de saúde se atentem a outros fenômenos, como os marcadores sociais e os
aspectos relacionados à subjetividade dos usuários, familiares e comunidades,
os quais, de modo geral, passam despercebidos nessa racionalidade (LUZ, 2013;
TERRA; CAMPOS, 2019).
Fonte: Freepik.
SAIBA MAIS
Você poderá aprofundar seus conhecimentos sobre o modelo
biomédico e suas influências no campo da Saúde Coletiva
consultando o texto de Barros (2002) intitulado: Pensando o
processo saúde doença: a que responde o modelo biomédico?,
que faz uma crítica ao modelo biomédico, mecanicista e
hegemônico, ainda tão presente nas nossas práticas:
https://www.scielo.br/j/sausoc/a/4CrdKWzRTnHdwBhHPtj
YGWb/?format=pdf&lang=pt
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 179
A partir das décadas de 1960 e 1970, observam-
se importantes transformações no âmbito do
setor Saúde, sobretudo a partir da construção
do Relatório Lalonde, no Canadá, que teve
grande influência na produção de uma nova
racionalidade que trouxe implicações tanto
na produção científica sobre Saúde Pública,
como na construção de políticas públicas e
ações da Organização Mundial da Saúde (OMS)
(CZERESNIA; FREITAS, 2009).
De modo geral, o documento produzido
pelo Ministério da Saúde canadense
em 1974 avançou ao chamar a atenção
para a necessidade de se atentar para os
comportamentos individuais não saudáveis
e, ainda, para a urgência de construção de Fonte: Freepik.
intervenções que auxiliassem as pessoas
na construção de estilos de vida e hábitos Embora houvesse um importante deslocamento dos aspectos biomédicos para os comportamentais
saudáveis, evitando assim o adoecimento e ambientais, nesse modelo, os educadores em saúde ainda mantinham uma posição de verticalidade
(WESTPHAL, 2006). Nesse contexto, o discurso sobre os indivíduos e comunidades, percebidos como seres desinformados e incapazes de conduzir
da prevenção é potencializado, sobretudo a o cuidado de suas próprias vidas (CZERESNIA; FREITAS, 2009).
partir da reorganização dos serviços de saúde
para a identificação de indivíduos e grupos É fundamental que você se dê conta de que essa racionalidade contribuiu para a produção de
vulneráveis a determinadas doenças e agravos, discursos de culpabilização dos sujeitos pelo próprio adoecimento, desconsiderando, assim
bem como para a construção de estratégias como no modelo biomédico, aspectos sociais, culturais e políticos que contribuem para o modo
que evitassem o adoecimento, incluindo as como os sujeitos experienciam o processo de saúde e adoecimento (WESTPHAL, 2006).
ações educativas. Nesse contexto, têm sido recorrentes as ações educativas que se centram exclusivamente na
Apesar do avanço em relação ao modelo transmissão de informações e na obediência, muitas vezes utilizando o medo e a punição como
biomédico, a perspectiva comportamental, tal estratégias para amedrontamento da população. No entanto, essas estratégias, não raramente,
qual praticada na década de 1970, apresentava afastam a população das práticas de cuidado (LOPES; TOCANTINS, 2012; SILVA et al., 2010).
importantes limitações, sobretudo por dar Ainda nos primeiros meses da pandemia de COVID-19, em todo o país, ações educativas de cunho
grande ênfase nos estilos de vidas e na adoção campanhista difundiam o imperativo “Fique em casa!”, “Lave as mãos!”, “Use máscaras e álcool em
de hábitos saudáveis, muitas vezes percebidos gel”. Jornais e outros veículos de comunicação também se desdobravam para a divulgação de novos
como escolhas e responsabilidades individuais conhecimentos que prescreviam um novo modo de agir, bastante distinto dos hábitos brasileiros,
das pessoas e dos coletivos (SILVA et al., 2010). em que a proximidade e o contato físico fazem parte das interações sociais.
Alinhadas a essa racionalidade, as práticas
educativas em saúde enfatizavam o acúmulo
de informações, sobretudo de prescrições
consideradas como suficientes para a mudança
de comportamentos insalubres e para a adoção
de hábitos saudáveis (CZERESNIA; FREITAS,
2009; LOPES; TOCANTINS, 2012).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 180
Apesar da relevância dessas ações, naquele mesmo período, coletivos e movi-
mentos sociais organizados denunciavam que, apesar de informadas, muitas
comunidades conviviam com a ausência de distribuição de água e esgoto, o
que dificultava a higienização das mãos e das compras de supermercado. Além
disso, a demanda de consumo de álcool em gel levou a um aumento expo-
nencial do preço desse produto, que, apesar disso, estava esgotado em muitos
locais, inviabilizando o acesso de grupos com menor poder aquisitivo ou co- Voltando às reflexões do Relatório Lalonde, já lá em 1974, elas também abriram
munidades mais isoladas a esse produto. Também veio à tona que uma série espaço para importantes problematizações acerca do papel dos fatores
de categorias profissionais, sobretudo os trabalhadores informais e do setor de ambientais na saúde dos indivíduos e das populações, sobretudo a partir de
prestação de serviços, dada a precariedade de suas ocupações, não tinham a estudos que demonstravam a necessidade de construção de intervenções que
possibilidade de aderir ao trabalho remoto, estando esses profissionais expos- considerassem as condições de vida e sociais no cenário de saúde e adoecimento
tos durante o deslocamento das suas casas ao trabalho, recorrentemente feito (CZERESNIA; FREITAS, 2009; LOPES; TOCANTINS, 2012).
por transportes coletivos lotados e insalubres. Em outras palavras, embora mu- Nessa perspectiva, ainda na década de 1970 e em contraposição ao modelo
nidos de informações, esses sujeitos não tinham as condições materiais e sociais biomédico e comportamental, uma nova racionalidade começou a ser
necessárias para a adoção de novos hábitos de vida. delineada e difundida: o modelo biopsicossocial ou de Determinação Social
da Saúde (ALBUQUERQUE; SILVA, 2014). Trata-se de uma nova perspectiva que
busca romper com o discurso medicalizante – ainda hegemônico – e que se
orienta por uma nova compreensão de saúde, que leva em consideração fatores
sociais mais amplos, como os marcadores sociais, políticos, econômicos e
culturais, não mais percebida como ausência de doenças e restrita às dimensões
anatomofisiológicas e comportamentais dos indivíduos (GARBOIS; SODRÉ;
DALBELLO-ARAÚJO, 2017). Assim, a saúde passa a ser compreendida como
uma produção social e política, e os usuários reconhecidos como protagonistas,
junto com as equipes, no processo de construção do cuidado (ALBUQUERQUE;
SILVA, 2014; CZERESNIA; FREITAS, 2009).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 181
Conforme pode ser observado FIGURA 1 – MODELO DOS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE PROPOSTO
no Diagrama desenvolvido por POR DAHLGREN E WHITEHEAD
Dahlgren e Whitehead (Figura 1),
nesse período, pesquisadores e ICAS, CULTUR
NÔM AIS
gestores começam a considerar IO ECO E AM
OC BIE
a importância da sobreposição SS NT
de determinantes sociais (redes ÕE CONDIÇÕES DE VIDA
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sociais e comunitárias, condições N
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de vida e trabalho, condições
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socioeconômicas, culturais e IS E COMU DESEMPREGO
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junto com fatores biológicos (idade, RE I
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sexo e fatores hereditários, etc.) e IDA DOS IND
comportamentais (estilo de vida EDUCAÇÃO EV I ESGOTO
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SERVIÇOS
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dos indivíduos) na constituição dos
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ESTIL
IDADE, SEXO SOCIAIS
OS
cenários de saúde e de adoecimento DE SAÚDE
PRODUÇÃO E FATORES
(BRASIL, 2002).
AGRÍCOLA E DE HEREDITÁRIOS
HABITAÇÃO
ALIMENTOS
Nessa perspectiva, outros fenômenos, para além das patologias Já na Carta de Ottawa, fruto da I Conferência Internacional sobre
e dos comportamentos não saudáveis, como as violências, as Promoção da Saúde, realizada em 1984, o desenvolvimento de
desigualdades de gênero, a pobreza, o desemprego, entre habilidades sociais, em que se inserem as práticas de educação
outros, passam a constituir o escopo de atuação dos serviços de em saúde, é reconhecido como um dos campos centrais de
saúde, exigindo a construção de propostas interdisciplinares e ação para a garantia e consolidação da Promoção da Saúde
intersetoriais que somem esforços para construções coletivas (BRASIL, 2002). Entretanto, naquele período, reconhecia-se
de saídas (BRASIL, 2002). a necessidade de articulação da Educação em Saúde com
outros campos, também indispensáveis, a saber: a elaboração
Além disso, as intervenções passam a ser concebidas e
e implementação de políticas públicas saudáveis, a criação
desenvolvidas na perspectiva da Promoção da Saúde,
de ambientes favoráveis à saúde, a reorientação do sistema
compreendida como “o processo de capacitação da comunidade
de saúde e o reforço da ação comunitária (BRASIL, 2002).
para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo
Desse modo, reconhece-se, desde então, que apenas a
uma maior participação no controle desse processo”(BRASIL, 2002,
transmissão de informações e o investimento na divulgação de
p. 9). Em outras palavras, trata-se de uma mudança importante no
conhecimentos não são suficientes para produzir mudanças e
setor Saúde, que passa a valorizar os conhecimentos, os saberes
promover saúde. Antes, faz-se necessária a responsabilização
e a participação dos sujeitos e dos coletivos na construção de
do Estado na construção de condições para que a promoção da
respostas e soluções que possibilitem o bem-estar (físico, mental,
saúde se efetive, indo, portanto, além dos esforços e iniciativas
social e espiritual) e a qualidade de vida (ALBUQUERQUE; SILVA,
individuais (BRASIL, 2002; CZERESNIA; FREITAS, 2009).
2014; CZERESNIA; FREITAS, 2009).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 182
Nessa perspectiva, a Promoção da Saúde abre caminhos e perspectivas para um novo modo
de construir as ações e as práticas educativas, especialmente por reconhecer a necessidade de
essas ações considerarem a determinação social da saúde e por romper com as metodologias
prescritivas e verticais (LOPES; TOCANTINS, 2012; WESTPHAL, 2006). No lugar das iniciativas
feitas para a população, a Promoção da Saúde abre espaço para a construção de intervenções
com a comunidade, incentivando o protagonismo dos sujeitos e dos coletivos na análise,
problematização e construção de respostas para os problemas que afetam os seus territórios
(VASCONCELOS; PRADO, 2017; WESTPHAL, 2006). Assim, as práticas educativas em saúde
não mais se restringem aos serviços de saúde, podendo ser desenvolvidas nos diferentes
dispositivos e equipamentos dos territórios, como escolas, instituições religiosas, associações
de moradores, entre outros, na perspectiva da interdisciplinaridade e intersetorialidade
(SCHALL; MODENA, 2005; SILVA et al., 2010).
SAIBA MAIS
Para aprofundar seus estudos sobre a construção histórica das Fonte: Flickr.
práticas educativas em saúde no Brasil, sugerimos consultar o
texto Educação em saúde: uma reflexão histórica de suas práticas,
Mais do que treinadores ou prescritores de comportamentos, os
de Silva et al. (2010), disponível em:
educadores em saúde passam a ocupar um lugar de mediadores,
https://www.scielo.br/j/csc/a/ incentivando a reflexão crítica e o diálogo, por meio de metodologias
J4m8jxD5KNyDyzBsLKLPnvC/?format=pdf&lang=pt participativas que estimulam a problematização da realidade e
do contexto dos quais esses sujeitos fazem parte (FIGUEIREDO;
RODRIGUES-NETO; LEITE, 2010). Assim, as palestras e as cartilhas,
meramente informativas, dão lugar a outras metodologias que
valorizam o trabalho em grupo e a criatividade dos participantes,
Outra mudança importante diz respeito ao papel dos profissionais de saúde, que como as oficinas, as rodas de conversas, as intervenções artísticas
passam a constituir relações em que a hierarquia e a verticalidade dão lugar à e lúdicas, entre outros (SILVA et al., 2010).
comunicação horizontal e ao diálogo, sobretudo a partir da construção de espaços
de livre circulação da palavra, em que todos podem aprender e ensinar (SCHALL;
MODENA, 2005; SILVA et al., 2010).
PARA REFLETIR
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 183
3.4.3 COVID-19 e suas implicações psicossociais no cotidiano
Fonte: Freepik.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 184
Além disso, desde março de 2020, brasileiros, em diferentes contextos,
se defrontaram com uma brusca e repentina mudança de hábitos,
especialmente em razão das medidas de distanciamento físico e social,
exigindo o aprendizado e a adaptação a novas formas de interação social,
as quais passaram a ser substituídas por relações mediadas por tecnologias
digitais ou atravessadas pela exigência de novos comportamentos,
difíceis de serem assimilados (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA
SAÚDE, 2020; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2020). Além disso, outras
medidas de contenção do contágio foram tomadas, como a suspensão
Desde março de 2020, brasileiros, em diferentes contextos, se
de aulas em escolas e universidades, a restrição do comércio a serviços
defrontaram com uma brusca e repentina mudança de hábitos,
essenciais, o fechamento de fronteiras internacionais, a interrupção de
especialmente em razão das medidas de distanciamento físico
eventos de pequeno, médio e grande porte, a suspensão de atividades
e social, exigindo o aprendizado e a adaptação a novas formas
religiosas, entre outros, alterando de forma significativa e repentina a
de interação social.
rotina diária de diferentes grupos (LIMA et al., 2020; ORGANIZAÇÃO PAN-
AMERICANA DA SAÚDE, 2020; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2020).
Apesar da sua importância, as medidas de distanciamento social vêm
afetando diretamente o cotidiano da população, que, inesperadamente,
Para Jodelet (2006), apesar de a experiência de adoecimento ser
se defrontou com a necessidade de produzir mudanças em seus modos
um evento privado e singular, ela também deve ser considerada
de pensar e de agir a respeito de diversos fenômenos cotidianos, como as
como um fenômeno socialmente construído e compartilhado,
interações sociais, a adoção de novos hábitos – especialmente o uso de
sendo necessário considerá-la para além da sua esfera biomédica
álcool em gel e máscaras, o estudo e trabalho mediados por tecnologias
e individualizada. Diversas investigações destacam a importância
digitais, a restrição do contato físico e a adesão às vacinas –, entre outros
da análise do contexto histórico, político e social no estudo das
(AQUINO et al., 2020; ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 2020;
experiências de saúde e adoecimento, tendo em vista que é o
OZAMIZ-ETXEBARRIA et al., 2020).
aporte cultural que fornece elementos para que os sujeitos atribuam
sentidos a essa experiência (GAZZINELLI et al., 2006; HERZLICH, 2005;
SCHALL; MODENA, 2005, VASCONCELOS; PRADO, 2017).
Ainda segundo Jodelet (2005), a experiência de adoecimento possui
duas dimensões fortemente relacionadas: a do vivido/experimentado
e a do conhecimento/cognitiva. A primeira dimensão refere-se
ao modo como o fenômeno da experiência se apresenta para a
pessoa que o vivencia, envolvendo os aspectos emocional e afetivo
(JODELET, 2006, 2005). No âmbito da saúde, essa dimensão está
relacionada aos afetos, às emoções e aos sentimentos de pacientes,
familiares e profissionais de saúde diante do adoecimento, que, em
geral, produz medo, angústia e tristeza (JODELET, 2006; 2005).
Fonte: Unsplash.
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Nessa perspectiva, uma pesquisa realizada em março de 2020 pelo FIGURA 2 – PESQUISA DO INSTITUTO DATAFOLHA (2020) SOBRE O COMPORTAMENTO DA
Instituto Datafolha (2020) revelou que três em cada quatro brasileiros POPULAÇÃO EM RELAÇÃO AO CORONAVÍRUS
(74%) sentiam medo de serem infectados pelo novo coronavírus. Além 81% Acreditam estar sujeitos a contrair a doença
disso, 81% acreditavam estar sujeitos a contrair a doença e 72% avaliavam
que possuíam chances de infectar outras pessoas em algum momento 74% Sentem medo de serem infectados pelo novo coronavírus
(Figura 2). Ainda no mesmo estudo, cerca de metade dos entrevistados
(52%) considerava que a pandemia provocaria, como de fato ocorreu, 72% Avaliam que possuíam chances de infectar outras pessoas em algum momento
a morte de milhares de brasileiros (INSTITUTO DATAFOLHA, 2020). Por
outro lado, apenas a metade dos entrevistados avaliou como positiva a 56% Acreditam que o SUS estava preparado para o enfrentamento da pandemia
atuação dos governadores de estados (54%) e do Ministro da Saúde (55%),
e apenas 35% consideravam positiva a atuação do presidente da república 55% Avaliam como positiva a atuação do Ministro da Saúde
no enfrentamento da pandemia (INSTITUTO DATAFOLHA, 2020). Ademais,
apenas 56% dos entrevistados acreditavam que o Sistema Único de Saúde 54% Avaliam como positiva a atuação dos governadores de estados
(SUS) estivesse preparado para o enfrentamento da pandemia, revelando
a sensação de insegurança, desamparo e vulnerabilidade da população 52% Consideram que a pandemia provocaria a morte de milhares de brasileiros
diante do cenário que vem se revelando mais grave e complexo a cada dia
(INSTITUTO DATAFOLHA, 2020). 35% Consideram positiva a atuação do presidente da república no enfrentamento da pandemia
Fonte: Instituto Datafolha (2020).
Outros estudos, como a pesquisa PNAD COVID-19 (IBGE, 2020), também vêm apontando para os efeitos da
pandemia e das medidas de distanciamento, que provocaram maior afastamento dos postos de trabalho,
aumento do desemprego e diminuição dos rendimentos, sobretudo entre os mais pobres, aumentando
ainda mais a sensação de insegurança entre a população. Em outro estudo, desenvolvido no estado do Ceará,
também se constatou o medo da população de se infectar pelo novo coronavírus, bem como a angústia
que a população brasileira vivenciava diante do aumento de casos e mortes pela COVID-19, gerando o
sentimento de impotência diante dela (LIMA et al., 2020).
Diversos estudos ressaltam a importância de inserir a análise do contexto histórico, político e social no
estudo das experiências de saúde e adoecimento, tendo em vista que é o aporte cultural que fornece
elementos para que os sujeitos atribuam sentidos a essa experiência.
Vale lembrar que, historicamente, em períodos de surgimento de novas doenças e, especialmente, nos
contextos de epidemias e pandemias, é recorrente que os diferentes grupos e sujeitos sejam pressionados
a (re)organizarem seus saberes, individuais e coletivos, de modo a produzirem sentidos, representações e
interpretações que orientem seus comportamentos e afetos diante da nova realidade sanitária (GAZZINELLI
et al., 2006; JODELET, 2005; SCHALL; MODENA, 2005).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 186
Nessas circunstâncias, homens e mulheres procuram amparo em diferentes tipos de
conhecimento, como o religioso, o senso comum e, também, o científico, buscando
explicações e informações que os auxiliem na proteção das novas enfermidades,
assim como na garantia de tratamentos e curas, em casos de contaminação e infecção
(MOTA; TRAD; BOAS, 2012; VASCONCELOS; PRADO, 2017).
Em outras palavras, é preciso levar em consideração que os sujeitos não são passivos
diante das transformações que, de tempos em tempos, envolvem o setor Saúde
(GAZZINELLI et al., 2006; JODELET, 2005; SCHALL; MODENA, 2005). Além disso, é
importante que você reconheça que essas mudanças não são assimiladas de forma
linear e isenta de conflitos, bastando apenas o acesso a novos conhecimentos e
informações (CARNEIRO et al., 2012; VASCONCELOS; PRADO, 2017).
Portanto, faz-se necessário levar em consideração a complexidade dos processos de
comunicação e educação em saúde, uma vez que as novas doenças, assim como as
propostas de tratamentos ofertados às populações, passam a ser compreendidas e Tratando-se da pandemia de COVID-19, novas demandas vêm sendo apresentadas
atravessadas por características do contexto social, histórico, político e cultural no às equipes de saúde, como a necessidade de desenvolvimento de estratégias e
qual os sujeitos encontram-se inseridos e dos grupos dos quais fazem parte (PALÁCIO; materiais educativos em linguagem e formatos acessíveis aos diferentes públicos
TAKENAMI, 2020; SCHALL; MODENA, 2005; VASCONCELOS; PRADO, 2017). (jovens, idosos, indígenas, trabalhadores, escolares, etc.) e que auxiliem a população
A Educação em Saúde ocupa um lugar estratégico e fundamental nesse contexto, na compreensão da nova doença e na adesão a novos hábitos e comportamentos,
contribuindo para o fortalecimento das ações de vigilância em saúde, sobretudo como o uso de máscaras e álcool em gel, e adesão à vacina e ao tratamento,
daquelas que se propõem a considerar os Determinantes Sociais da Saúde (DSS) e desmistificando notícias falsas, entre outros (DUAN; ZHU, 2020; FARO et al., 2020;
a estimular a participação dos diferentes sujeitos e coletivos na sua consolidação, SCHMIDT et al., 2020; WEIDE et al., 2020).
rompendo com as perspectivas medicalizantes e verticais ainda recorrentes no Ainda nessa vertente, também vem sendo constatada a necessidade de investimentos
contexto sanitário brasileiro (CARNEIRO et al., 2012; GAZZINELLI et al., 2006; PALÁCIO; na construção de estratégias de educação em saúde que incentivem a população
TAKENAMI, 2020; SCHALL; MODENA, 2005; VASCONCELOS; PRADO, 2017). a construir novas possibilidades de manutenção das interações e vínculos sociais,
especialmente nos períodos de distanciamento físico e social, e que possibilitem o
acesso a informações que ajudem os sujeitos a manejar sentimentos como o medo, a
angústia, o estresse e a solidão e a buscar suporte comunitário e apoio em saúde (DUAN;
ZHU, 2020; FARO et al., 2020; LIMA et al., 2020; SCHMIDT et al., 2020; WEIDE et al., 2020).
PARA REFLETIR
Pense em quanto sua vida e a de seus familiares e pares mudou desde o início
da pandemia: que novos hábitos passaram a fazer parte do seu cotidiano?
Que novos comportamentos, antes tão rotineiros, foram alterados e até
mesmo abandonados? Que hábitos foram mais difíceis de serem modificados
e por quê? Onde você e seus pares buscaram informações confiáveis para se
orientar diante dessas mudanças?
Fonte: Freepik.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 187
3.4.4 Educação em Saúde: modelo tradicional Como veremos a seguir, o Modelo Dialógico será defendido e incentivado não por se mostrar infalível e perfeito, mas
x modelo dialógico por estar mais alinhado com o discurso da Reforma Sanitária, com o modelo de determinação social da saúde e, ainda,
com os princípios do SUS (VASCONCELOS; PRADO, 2017).
Em outras palavras, acreditamos que, enquanto prática educativa, a proposta de Educação em Saúde que alicerça o Modelo
Conforme apresentado anteriormente, as
Dialógico também contribui para a construção de sujeitos e sociedades mais reflexivos e dialógicos, sendo um instrumento
práticas de Educação em Saúde possuem
poderoso para promoção da cidadania e transformação social, especialmente no que se refere à produção coletiva e
uma historicidade e refletem discursos que
participativa de municípios saudáveis, pautados pela democracia e justiça social (SCHALL; MODENA, 2005).
contemplam tanto as diferentes mudanças
na compreensão da Educação como as
transformações sociais relacionadas às QUADRO 1 – COMPARAÇÃO ENTRE OS MODELOS TRADICIONAL E DIALÓGICO DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE –
concepções de Saúde (GAZZINELLI et al., CONCEPÇÕES, VANTAGENS, DESVANTAGENS E APLICAÇÕES
2006). Ao longo da história, diversos atores
e coletivos, seja no contexto da Educação, MODELO TRADICIONAL MODELO DIALÓGICO
seja no contexto da Saúde, vêm lutando e se Concepções
debruçando sobre a construção de práticas
Educação bancária; Educação Problematizadora;
dialógicas e horizontais que valorizem a
Transmissão de conhecimentos e ampliação de informações; Construção de conhecimentos e competências;
criatividade, a imaginação e os diferentes
Cabeça bem-cheia; Cabeça bem-feita;
saberes das comunidades (SILVA et al.,
Educandos: depósitos de conteúdos, são objetos do educador; Educandos: portadores de um saber, objeto de uma ação educativa e
2010). Entretanto, apesar do avanço desses
Não há estímulo para criação; sujeito da própria educação;
discursos, os quais vêm sendo traduzidos em
Seres passivos; Aprende-se por meio de uma prática reflexiva;
experiências criativas e profícuas no âmbito do
Educação verticalizada; Seres ativos;
SUS, ainda persistem práticas orientadas por
Considera-se a realidade do educador; Educação baseada no diálogo;
modelos que resistem à mudança e que são
Pode não haver mudanças de hábitos e comportamentos; Considera-se a realidade do educando;
pautados por práticas prescritivas e verticais
Proporciona menor autonomia ao educando. Mudanças duradouras de hábitos e comportamentos;
(FIGUEIREDO; RODRIGUES-NETO; LEITE, 2010).
Proporciona maior autonomia ao educando.
Apesar da diversidade de práticas de Educação Vantagens
em Saúde, estudos vêm identificando a
Proporciona à população o conhecimento produzido cientificamente; Construção coletiva do conhecimento;
existência de, pelo menos, dois modelos,
Amplia informações e conhecimentos já existentes; Proporciona ao educando visão crítica e reflexiva da realidade;
bastante antagônicos e que disputam espaço
Produz aquisição de conhecimento. Capacita o educando para tomada de decisões.
na esfera de debates em Saúde Coletiva. Trata-
se do Modelo Tradicional de Educação em Saúde, Desvantagens
também conhecido como Educação Sanitária, Formação de um indivíduo passivo, mero receptor de informações; Falta de conhecimento e capacitação de profissionais para aplicação deste
e do Modelo Dialógico de Educação em Saúde, Não aplicação à realidade dos conteúdos ensinados; modelo.
traduzido em experiências como a Educação Relação assimétrica entre educador e educando.
Popular em Saúde (FIGUEIREDO; RODRIGUES- Aplicação
NETO; LEITE, 2010; SILVA et al., 2010). O Quadro
1 foi desenvolvido por Figueiredo, Rodrigues- Projetos e capacitações de abrangência nacional; Projetos e capacitações de abrangência comunitária;
Neto e Leite (2010) e apresenta as principais Grupos com alto número de participantes; Grupos com menor número de participantes;
características de ambos os modelos de Finalidade de sensibilização, sem necessariamente mudança de prática. Atitudes de promoção de saúde;
Educação em Saúde. Você poderá consultá- Finalidade de produzir autonomia no indivíduo.
lo, sempre que preciso, para comparar ambas Fonte: Figueiredo, Rodrigues-Neto e Leite (2010, p. 120).
as propostas e encontrar uma síntese com as
características de cada um dos modelos.
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3.4.4.1 Modelo Tradicional: a Educação Sanitária
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Dentre as contribuições do Modelo Dialógico destaca-se a promoção da
autonomia dos educandos e dos coletivos, que já não mais dependem
dos educadores e profissionais de saúde e podem atuar de forma ativa
tanto na análise dos fenômenos de saúde dos seus territórios, como
na busca e construção de respostas para os problemas que enfrentam
(FIGUEIREDO; RODRIGUES-NETO; LEITE, 2010). Assim, o conhecimento
é construído de forma coletiva e proporciona aos educandos uma visão SAIBA MAIS
crítica e reflexiva da realidade que contribui para o fortalecimento das Para saber mais sobre a Educação Popular em Saúde e conhecer experiências
comunidades, capacitando os sujeitos para a tomada de decisão, na educativas pautadas pelo Modelo Dialógico no âmbito do SUS, acesse o site da
perspectiva da Promoção da Saúde (FREIRE, 2000; SILVA et al., 2010). Rede de Educação Popular em Saúde: https://www.ufpb.br/redepopsaude, que é
Por outro lado, apesar da sua importância, ainda hoje, as práticas uma proposta que articula e envolve gestores e profissionais de saúde, líderes de
de Educação em Saúde orientadas pelo Modelo Dialógico ainda são movimentos sociais e pesquisadores que defendem a importância da Educação
incipientes (SILVA et al., 2010). Vale lembrar que os modelos biomédico Popular como estratégia profícua para auxiliar na construção de um mundo mais
e comportamental ainda são hegemônicos no contexto da formação saudável e participativo, assim como de um Sistema de Saúde, de fato, democrático
em saúde, de modo que os profissionais e gestores ainda são (de) e que contribua para a melhoria das condições de vida da população, e consulte
formados para atuar de forma diretiva e impositiva, acreditando que o Caderno de Educação Popular em Saúde do Ministério da Saúde. Vale a pena
podem trazer respostas prontas para os problemas de uma realidade conhecer essas práticas!
que não compartilham (FIGUEIREDO; RODRIGUES-NETO; LEITE, 2010).
Contudo, diversas experiências vêm sendo desenvolvidas no âmbito
do SUS pautadas pelo diálogo e pela articulação entre profissionais de
saúde, obtendo resultados promissores e duradouros, como aquelas No contexto da pandemia, destacam-se as ações em saúde que consideram a necessidade
inscritas no que vem sendo denominado de Educação Popular em Saúde de pactuação e interlocução com as lideranças comunitárias, abrindo espaço para
(VASCONCELOS; PRADO, 2017). escuta e discussão dos problemas das comunidades com aqueles que dela fazem
parte, reconhecendo-os como atores-chave para construção do trabalho em saúde
(VASCONCELOS; PRADO, 2017). Nesse sentido, experiências vêm sendo desenvolvidas
com base em metodologias ativas e participativas, como os fóruns de discussão, as oficinas
e os grupos operativos, assim como em outras iniciativas que articulam criatividade,
imaginação e ludicidade, em busca de novos modos de pensar, sentir e agir em saúde
(VASCONCELOS; PRADO, 2017).
PARA REFLETIR
Durante a pandemia de COVID-19 é possível que você tenha visto ou até mesmo
desenvolvido alguma intervenção de caráter educativo voltada para diferentes
indivíduos e grupos; talvez um panfleto, uma propaganda ou algum material
educativo disponibilizado na rede da qual você faz parte. Com base nos seus
conhecimentos sobre a história da Educação em Saúde, faça uma reflexão crítica
sincera acerca de qual dos dois modelos ela mais se aproxima.
Fonte: Freepik.
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3.4.5 Afinal, por onde começar?
Agora que você já conhece um pouco • Descubra o território e mobilize a rede de sujeitos • Esqueça as palestras e invista nos grupos. Você já deve
mais sobre as diferentes perspectivas que que o constituem. Lembre-se de que, ao contrário ter notado que o Modelo Dialógico de Educação em
sustentam a construção de práticas de de outras propostas, o Modelo Dialógico visa romper Saúde exige um novo modo de construir as ações, como
Educação em Saúde, convidamos você com as propostas feitas para a população e busca também de desenvolvê-las. Portanto, as palestras e outras
a refletir e a se debruçar sobre o desafio construir saídas com os atores e coletivos, valorizando a estratégias que visam apenas transmitir conhecimento
de usar a sua imaginação e criatividade interdisciplinaridade e a intersetorialidade. Nesse sentido, e aumentar informações, como produção de materiais
para a construção de ações, materiais e torna-se imprescindível que as ações sejam construídas impressos e virtuais, não são recomendadas. Por outro
outras estratégias que auxiliem usuários, com o apoio das redes de saúde de cada território, que lado, existem diversas metodologias participativas,
profissionais de saúde e controle social podem incluir serviços de saúde, educação, assistência como as rodas de conversas, as oficinas em dinâmica de
na busca de resposta para os desafios social, entre outros, bem como associações de moradores, grupo, os grupos operativos, entre muitas outras, que
impostos pela pandemia de COVID-19. instituições religiosas e do terceiro setor e, ainda, valorizam a informação dentro de um processo dinâmico e
Apresentaremos a seguir algumas lideranças comunitárias locais e regionais. Por meio de participativo que rompe com a hierarquia entre educador
possibilidades de intervenções educativas reuniões (presenciais e/ou virtuais), você pode manifestar e educando. Além disso, é importante que as práticas
em saúde pautadas pelo Modelo o seu interesse em disparar um processo de construção educativas em saúde sejam lúdicas e criativas. Portanto,
Dialógico (FREIRE, 2000; VASCONCELOS; coletiva, reunindo atores e instituições interessadas. você pode se valer da música, da literatura, do teatro e
PRADO, 2017). Portanto, mais do que Também é importante a articulação com outras ações já do cinema, da contação de histórias, da dança e de outras
informar, essas iniciativas dão destaque existentes e potentes, como o Programa Saúde na Escola artes para construir suas intervenções, não deixando
à construção de espaços lúdicos e (PSE), o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção de observar as singularidades dos grupos e do contexto
participativos, em que há livre circulação Básica (NASF-AB), grupos operativos ou outros tipos de em que elas serão desenvolvidas. Você poderá conhecer
da palavra, por meio de técnicas e grupo já existentes nas equipes de Saúde da Família, etc.; um pouco mais sobre essas metodologias assistindo ao
metodologias ativas que estimulam o vídeo disponível no link: https://youtu.be/cy8rxq8xNj8;
debate, as trocas e problematização da • Internet e Redes Sociais: espaço potente para ouvir
realidade e contextos nos quais os sujeitos a comunidade. Conforme discutimos anteriormente, é
• Avalie e, se preciso, recomece. Outro aspecto importante
se constroem, vivem e atuam. muito importante que as ações educativas pautadas pelo
das práticas educativas pautadas pelo Modelo Dialógico
Modelo Dialógico estejam alinhadas com as demandas e
diz respeito à avaliação. Enquanto no Modelo Tradicional
necessidades da comunidade e dos usuários. No entanto,
ela exige a memorização de conceitos e informações,
como ter acesso a coletivos tão numerosos e, ainda, em
rapidamente esquecidos, o Modelo Dialógico propõe
contextos de distanciamento social? Uma das estratégias
uma avaliação processual (que ocorre ao longo de
que vem sendo efetiva para estreitar a comunicação entre
todo o processo) e participativa (envolvendo todos
a comunidade e os profissionais de saúde é o uso da
os participantes). Assim, por meio de metodologias
internet e das redes sociais (Instagram, Facebook, TikTok,
participativas, você poderá dialogar com os participantes
WhatsApp, etc.). Sabemos que, apesar de populares, elas
(educadores e educandos) sobre as suas experiências no
não são acessíveis a todos, mas reconhecemos que se trata
desenvolvimento da intervenção educativa. Lembre-se:
de um veículo potente. Por meio de formulário e enquetes
por se tratar de uma proposta construída com os coletivos,
virtuais, assim como de aplicativos gratuitos, é possível
é importante que a avaliação seja genuína, sincera e
acessar a comunidade, dar voz às suas necessidades e
construtiva. Além disso, sempre que preciso, dialogue e
também mobilizar grandes grupos para fóruns, reuniões
revise os pontos que precisam de ajustes e mãos à obra!
e intervenções. Lembre-se de que é possível que as
instituições e os atores que você identificou já tenham um
canal de comunicação efetivo com os usuários, reforçando,
novamente, a importância do trabalho coletivo;
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ENCERRAMENTO DA UNIDADE
Chegamos ao final da nossa Unidade de Educação em Saúde. Mais do que sanar todas as suas dúvidas e questio-
namentos sobre o assunto, esperamos que nossas reflexões tenham produzido provocações e tensionamentos que
mobilizem você a buscar mais conhecimentos sobre o assunto. A mudança do Modelo Tradicional para o Dialógico de
Educação em Saúde é um processo que leva tempo e exige uma autorreflexão contínua. Por isso, é muito importante
que você revise o conteúdo desta unidade, bem como as reflexões que você possa ter produzido.
Além disso, uma forma importante de aprendizagem, nesse modelo, diz respeito à ação, ou seja, você poderá aprender
ainda mais tentando colocar em prática as ideias aqui apresentadas. Assim, você poderá vivenciar os desafios e a
beleza do diálogo, da aprendizagem mútua e constatar, como tentamos apresentar nesta unidade, que a mudança
social só será possível a partir de uma mudança ética e, sobretudo, a partir da invenção de novos modos de estarmos
com os outros e de trabalharmos, coletivamente, em busca de um mundo mais justo e, portanto, mais saudável.
Parabéns por finalizar mais esta unidade!
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Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 3 - Tecnologias de Trabalho na Perspectiva da Vigilância em Saúde | 3.4 Educação em Saúde 196
MINICURRÍCULO DOS AUTORES
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Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
Unidade 4
James Venturini
APRESENTAÇÃO DA UNIDADE
Olá, trabalhador estudante, seja bem-vindo à Unidade 4 – Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia.
Esta unidade traz aspectos básicos da atuação estratégica de nosso organismo para eliminar estrategicamente microrganismos, em
especial os vírus. Desse modo, será possível identificar os principais mecanismos e as bases imunológicas envolvidas na proteção ao
vírus SARS-CoV-2 e também na gravidade da COVID-19. Além disso, a Unidade 4 apresenta um breve histórico das infecções virais, as
principais viroses circulantes no Brasil e uma introdução aos principais métodos diagnósticos das infecções virais.
Apresentamos também diversos materiais audiovisuais que possibilitam melhor compreensão da resposta imunológica e ajudarão a
enriquecer o conhecimento e a identificação de mecanismos-chaves contextualizando-os com o diagnóstico, a proteção e a gravidade
da COVID-19. Esperamos contribuir, de forma positiva, para sua qualificação, desejando, de antemão, que todos tenham momentos
de muito proveito com o conteúdo elaborado. Viva o SUS e sigamos juntos na sua construção!
OBJETIVOS DA UNIDADE
Você já sabe que, a todo momento, FIGURA 1 – ÓRGÃOS E TECIDOS DO SISTEMA IMUNOLÓGICO
estamos em contato com milhões de
microrganismos. Mas, na maioria das
vezes, só notamos sua presença quando
a infecção já está instalada e os sinais
clínicos são perceptíveis. Como todos os
seres vivos necessitam de nutrientes, água
e temperatura adequada, o organismo
humano é fonte de sobrevivência para
inúmeros agentes microbianos. Só
não adoecemos com mais frequência
porque nem todos os microrganismos
desencadeiam doenças; alguns deles,
inclusive, estabelecem relações simbióticas
com seus hospedeiros trazendo
contribuições importantes para essa
relação. Por exemplo, você pode pensar em
microrganismos que atuam no processo da
digestão, como é o caso da Escherichia coli,
que sintetiza vitaminas B e K, permitindo
o aproveitamento nutricional (VENTURINI;
ARRUDA; SARTORI, 2017).
De qualquer modo, devido a essa enorme
quantidade de microrganismos e da ameaça
persistente de invasão oportunística, é
fundamental que o hospedeiro monitore e
regule as interações entre seu organismo e
os agentes microbianos. E é exatamente para
isso que dispomos do sistema imunológico
(Figura 1). Esse sistema é constituído por
uma rede intrincada de tecidos, células
e mediadores que, ao desempenharem
suas funções, impedem e/ou modulam
a instalação, o desenvolvimento e
a disseminação de microrganismos
(VENTURINI; ARRUDA; SARTORI, 2017).
Fonte: Healthdirect Australia (2021).
4.2 Conceitos básicos em imunologia
Nesta seção, avançaremos no conhecimento de conceitos
básicos em imunologia, compreendendo a organização
do sistema imune, com suas respostas inata e adaptativa,
desvendando seus mecanismos celulares e moleculares,
assim como compreendendo a inflamação enquanto
resposta a danos causados ao organismo e como se dá o
reparo tecidual. Também estudaremos acerca da resposta
imune nas infecções virais e na COVID-19 e sobre as
imunizações e soroterapia. Bons estudos!
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 202
4.2.2 Mecanismos celulares e moleculares Barreiras físicas: os microrganismos estão no ar, na água, nos alimentos e até nos lugares em que se coloca a mão
da imunidade inata (contato físico); assim na pele e nas mucosas (tecidos que revestem o trato gastrointestinal, urogenital e respiratório)
encontram-se a maioria dos microrganismos, sendo essas as principais portas de entrada dos patógenos.
Barreiras mecânicas: o organismo apresenta ainda movimentos que dificultam ou impedem a entrada de
Caro trabalhador estudante, há milhões
microrganismos. Tosse, vômito, lacrimejamento, diarreia, são reações mecânicas que carregam o microrganismo
de anos, quando existiam apenas
para fora do hospedeiro.
animais mais primitivos, começaram a
surgir os primeiros patógenos, que se Barreiras químicas: algumas substâncias produzidas por nosso organismo são prejudiciais para patógenos, como
aproveitavam das células desses animais, o ácido do estômago, as lágrimas e a saliva, e são chamadas de barreiras químicas.
quer para obter alimentos, quer para se
Barreiras biológicas: além das
reproduzirem, beneficiando-se deles e
FIGURA 2 – DIFERENTES BARREIRAS DO SISTEMA IMUNE barreiras naturais, o organismo
deixando-os doentes. Assim, aqueles
também conta com a ajuda de
animais que tinham meios de impedir
outros microrganismos. Nem
a entrada do patógeno ou cujas células
todo microrganismo irá causar
foram capazes de identificá-los e eliminá-
doença e muitos vivem dentro
los sobreviveram, foram selecionados
do organismo, compondo assim
positivamente e deram origem a novas
a microbiota. O intestino conta
espécies com a mesma capacidade.
com bactérias e fungos que fazem
Do mesmo modo, os patógenos que
parte desse órgão, auxiliam na
conseguiam entrar e sobreviver às
digestão e absorção de nutrientes.
células do hospedeiro também se
Esses microrganismos também
reproduziram dando origem a novas - Ácido propiônico
colaboram na proteção contra
espécies de patógenos, mais fortes.
patógenos ao competir com os
Pois é, com o passar dos anos, foi assim
invasores por espaço e alimento, o
que se conformou o complexo sistema
que impede que se multipliquem.
imune que a espécie humana tem hoje,
Ainda nas barreiras biológicas,
assim como os diferentes patógenos
o organismo possui células que
(VENTURINI; ARRUDA; SARTORI, 2017).
atuam contra o microrganismo por
Em animais mais primitivos, o sistema meio de um processo denominado
imune ainda é simples e inespecífico, fagocitose. A fagocitose é o
ou seja, não é feito especialmente para mecanismo pelo qual uma célula
agir contra um tipo de microrganismo, engloba uma partícula externa
mas para agir em tudo que não é próprio a ela, trazendo-a para dentro do
do corpo. Ele é constituído por barreiras citoplasma. Esse mecanismo pode
físicas, mecânicas, químicas e biológicas Fonte: traduzido e adaptado de Karki (2018). ser utilizado por microrganismos
(Figura 2), mantidas também em animais unicelulares na alimentação, mas
mais complexos, que consistem na células do sistema imune utilizam a fagocitose para englobar o patógeno e matá-lo utilizando enzimas digestivas.
parte do nosso sistema denominada
O sangue, por sua vez, possui um grupo de proteínas que atuam biologicamente como mecanismo da imunidade
de “imunidade inata”. A seguir,
inata. Coletivamente, essas moléculas séricas são chamadas proteínas do sistema complemento. Elas ficam inativadas
apresentamos as diferentes barreiras
e, quando entram em contato com o microrganismo se tornam ativas e ativam também outras proteínas, e assim
que constituem essa forma de resposta
sucessivamente, o que é denominado ativação em cascata. Além disso, as proteínas do sistema complemento facilitam
(KAUR; SECORD, 2019).
a fagocitose e amplificam a resposta inflamatória, o que será apresentado mais adiante (NETEA et al., 2019).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 203
4.2.3 Mecanismos celulares e moleculares da imunidade adquirida
Como visto anteriormente, você já sabe que, por uma questão evolutiva de
microrganismos e dos hospedeiros, as barreiras da imunidade inata podem não ser
suficientes para evitar infecção e o desenvolvimento de uma doença. Por isso, foi
necessário que o organismo se reorganizasse para eliminar aqueles patógenos que
também evoluíram. Quando os patógenos superam a imunidade inata, entram
em ação as células e moléculas da imunidade chamada adaptativa (VENTURINI;
ARRUDA; SARTORI, 2017).
Essa resposta tem de ser específica para o patógeno. Apesar de ser um mecanismo
complexo e, portanto, repleto de detalhes, é fácil compreender essa especialização
4.2.4 Inflamação e reparo tecidual
quando se observa, por exemplo, o comportamento e o hábitat do patógeno dentro
do organismo. Há microrganismos que necessitam sobreviver e se multiplicar
dentro de células ou têm a maior parte da vida dependente dos mecanismos
A inflamação é, tradicionalmente, definida por quatro palavras do latim: calor,
celulares, como os vírus. Assim, para eliminar esse tipo de microrganismo, a resposta
dor, rubor e tumor, o que reflete os efeitos das citocinas e de outros mediadores
adaptativa irá ativar células capazes de reconhecer uma célula infectada não sadia
inflamatórios nos vasos sanguíneos locais.
e atuar em sua eliminação fazendo com que o microrganismo não seja capaz de
se reproduzir. Por outro lado, há microrganismos que vivem fora das células; mais A inflamação é iniciada quando ocorre algum dano tecidual, infeccioso ou não, e esses
ainda, esses microrganismos geralmente produzem substâncias tóxicas que se mediadores são liberados por células do tecido, como macrófagos e mastócitos. A
espalham pelo organismo. Nesse último exemplo, também vale lembrar que os morte celular do tecido agredido é percebida por essas células que liberam citocinas
venenos atuam do mesmo modo. Assim, para eliminar esse tipo de microrganismo, e outros mediadores que irão ativar as células endoteliais que compõem os vasos
a resposta adaptativa ativará a produção de anticorpos de diversas classes (IgG, sanguíneos. A dilatação e o aumento da permeabilidade dos vasos sanguíneos durante
IgM, IgE, IgD e IgA) que rapidamente irão neutralizar o patógeno ou a substância a inflamação levam ao aumento do fluxo sanguíneo local e ao extravasamento de
tóxica (VENTURINI; ARRUDA; SARTORI, 2017). fluido para os tecidos, causando calor, rubor e inchaço. As citocinas, moléculas ativas
do sistema complemento, produzem mudanças nas propriedades de adesão das
células endoteliais, fazendo a adesão dos leucócitos circulantes nas células endoteliais
e sua migração entre elas para o local da infecção, para onde são atraídos por outras
moléculas sinalizadoras do sistema imune chamadas de quimiocinas. A migração das
células para dentro dos tecidos e suas ações locais causam dor. Os principais tipos
de célula presentes na fase inicial de uma resposta inflamatória são os macrófagos e
neutrófilos, e grande número dos neutrófilos é recrutado para o tecido inflamado e
infectado (MURPHY; WEAVER, 2016).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 204
As moléculas responsáveis QUADRO 2 – PRINCIPAIS CITOCINAS E SUAS FUNÇÕES BIOLÓGICAS MAIS IMPORTANTES
pela sinalização dos processos
inflamatórios e de resposta IL-1β Possui função pró-inflamatória. Induz resposta imune adaptativa dos tipos Th1 e Th17.
imune são diversas, e o IL-6 Possui função pró-inflamatória.
principal grupo desses
mediadores é denominado TNF-α Estimula a função microbicida de fagócitos, ativa células endoteliais e induz síntese de
citocinas (GERMOLEC et al., proteínas de fase aguda.
2018). Exemplos de citocinas INF-γ Induz à resposta imune Th1 e aumenta a atividade microbicida dos macrófagos.
envolvidas na resposta imune IL-4 Induz à resposta imune Th2, diferenciação dos linfócitos B e atua como mediador anti-
inata e adaptativa são descritos inflamatório.
no Quadro 2.
IL-10 Possui função anti-inflamatória e reguladora.
TGF-β Possui função anti-inflamatória, reguladora e atua no processo de reparo tecidual.
IL-17 Possui função pró-inflamatória principalmente em mucosas.
Fonte: elaboração do autor.
A inflamação de um tecido infectado tem Assim que o patógeno é eliminado do tecido, o tecido deve ser reorganizado de modo a garantir o restabelecimento da integridade
vários efeitos benéficos no combate à funcional. Esse processo é denominado de reparo tecidual (Figura 3). Resumidamente, observa-se (MURPHY; WEAVER, 2016):
infecção. Ela recruta células e moléculas • Remoção de células mortas, coágulos e necrose pela fagocitose por neutrófilos e macrófagos;
da imunidade inata da circulação para os
• Dissolução e fluidificação de exsudatos e posterior reabsorção via linfática;
tecidos onde são necessárias para destruir o
patógeno diretamente. Além disso, aumenta • Formação de tecido de granulação, caracterizado pela formação de novos vasos sanguíneos;
o fluxo de linfa contendo microrganismos • Proliferação das células parenquimatosas que possuem capacidade de regeneração;
e as células portadoras de antígenos para • Proliferação de células denominadas fibroblastos, que têm a função de produzir matriz extracelular, como o colágeno.
os tecidos linfoides vizinhos, onde ativam
os linfócitos e iniciam a resposta imune FIGURA 3– REPARO TECIDUAL
adaptativa. Finalmente, uma vez que a
resposta imune adaptativa foi ativada, a
inflamação também recruta os efetores do
sistema imune adaptativo, as moléculas
de anticorpo e as células T efetoras para os
locais de infecção (MURPHY; WEAVER, 2016).
Apesar disso, quando o organismo não
consegue controlar a inflamação e ela é
amplificada, o tecido e/ou órgão afetados Derme
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 205
4.2.5 Resposta imune nas infecções virais e na COVID-19
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Você deve estar pensando: mas e na COVID-19?
Bem, os mecanismos de eliminação do vírus
são os mesmos descritos até aqui.
02 07
Pa ra o co nt ro le a deq u a do da p res s ã o a r ter i a l
momento em que a imunidade du ra nte a ho meo s t a s e, es s e recep to r da
CO V ID - 1 9 , o re ce p to r de E C A- 2 é ex p re sso e m
gran de q uant i dade n o s p n e um ó c i to s. E ssas cé lulas
adaptativa não se encontra EC A- 2 at u a na co nver s ã o da p ro teí na
a ngi o tens i na - 2 em a ngi o tens i na 1 - 7 ;
co m p õ e m as p are de s do s alvé o lo s p ulm o n are s,
q ue são e st r ut uras te r m i n ai s do s p ulm õ e s, e m
organizada. Para a compreensão ETA PA E TA PA fo r m a de p e q ue n o s saco s de ar.;
03 08
As p a re d e s d o s a co a l ve o l a r ( s e p to s
i nc lu i ndo f u nçã o va s o co ns t r i to ra , eleva çã o
receptor por onde o vírus infecta da p res s ã o a r ter i a l e at i va çã o de v i a s
a l ve o l a re s ) e s t ã o e m co nt ato d i re to co m o s
c a p i l a re s s a n g u í n e o s p a ra q u e o co r ra a t ro c a
a célula, a organização do tecido p ró - i nfla mató r i a s. A a ngi o tens i na 1 - 7 at u a na
d o s g a s e s : oxi g ê n i o e g á s c a r b ô n i co ;
ETA PA va s o di lat a çã o e no efei to a nt i - i nfla mató r i o ; E TA PA
pulmonar no qual ocorrem as trocas
gasosas, o processo inflamatório
D ev i do à o c u p a çã o do v í r u s S A R S - Co V- 2 no
04 09
agudo e suas consequências no recep to r da EC A- 2 , há u m des b a la nço
A li g aç ão do v í r us S A R S - Co V- 2 co m um a gran de
q uant i dade do re ce p to r da E C A- 2 n o s p n e um ó c i to s
contexto pulmonar (BOURGONJE et i mp o r t a nte ent re a q u a nt i da de de
a ngi o tens i na - 2 nã o co nver t i da e
de se n c ade i a a te m p e st ade de c i to c i n as q ue,
rap i dam e nte, at i va o p ro ce sso i n fl am ató r i o ag udo
al., 2020), como descrito a seguir. São ETA PA a ngi o tens i na s 1 - 7 nã o fo r ma da ; E TA PA n o saco alve o lar ;
10 etapas.
Assim, a s a ngiotensina s 1- 7, a nti- infla matór ia s, Com o intenso ex travasamento de líquidos dos
05 10
capilares sang uíneos para o espaço alveolar, esse
nã o sã o for ma d a s, e a ma ior d isponibilid a d e d e
acúmulo impede as trocas g asosas. D ependendo da
a ngiotensina - 2 nã o conver tid a d esenca d eia um
ex tensão da área pulmonar comprometida, o déficit
efeito pró - infla matór io exa gera d o, d enomina d o de oxig ênio (hipoxemia) e o excesso do tóxico do g ás
te m p e s tad e d e ci to ci nas , ca ra c ter iza d a por intensa
ETA PA prod uç ã o d a s citocina s TNF- a lfa , IL- 6 e IL- 1beta ; E TA PA car bônico repercutem clinicamente por meio de
insuficiência respiratór ia ag uda grave.
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 207
4.2.6 Imunizações e soroterapia
Quando o organismo não consegue combater o causador da doença e a vacina não é viável
naquele contexto súbito de adoecimento, opta-se pelo uso de anticorpos já prontos contra o
agente causador da doença. Esses anticorpos irão neutralizar rapidamente o patógeno e eliminá-
lo; porém, não há produção de células de memória. Esse fenômeno é chamado de soroterapia
e é temporário. Alguns exemplos do uso de soroterapia são os soros antirrábico, antiofídicos
(contra picadas de cobra) e os anticorpos que o bebê recebe da mãe através da placenta e, após
o nascimento, do leite materno, impedindo que o bebê tenha algumas doenças enquanto seu
sistema imune ainda não está totalmente desenvolvido (VETTER et al., 2018).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 208
4.3 Conceitos básicos em virologia
Bem, agora chegou a hora de, nesta seção, avançarmos no conhecimento de conceitos básicos em virologia. Para tanto, vamos
percorrer a história das doenças virais bem como conhecer as características e propriedades biológicas dos principais vírus
causadores de infecções em seres humanos, identificando as principais viroses de circulação no Brasil. Para fechar a seção,
vamos estudar também sobre métodos diagnósticos moleculares e sorológicos. Vamos lá!
4.3.1 História das doenças virais Na Europa e no Norte da África, os vírus do sarampo e da varíola apareceram pela primeira
vez há milhares de anos. Esses vírus foram posteriormente transportados para o Novo
Mundo pelos europeus durante a época das conquistas espanholas e portuguesas. Como
Incidências de infecções emergentes e/ou reemergentes os povos indígenas não tinham resistência natural aos vírus, milhões deles morreram
afetam significativamente a saúde humana desde os tempos durante as epidemias. De fato, fatores do hospedeiro como idade, fisiologia, imunidade,
antigos quando o comportamento humano mudou durante estado nutricional, histórico de exposição, infecção simultânea com outros patógenos
o Período Neolítico, há cerca de 12.000 anos, momento em e perfil genético são determinantes da suscetibilidade humana a uma infecção viral
que os humanos desenvolveram comunidades agrícolas mais (COURA, 2013).
densamente povoadas. Os vírus de plantas e gado aumentaram
A partir da Revolução Industrial e a subsequente urbanização, associada às péssimas
e, à medida que os humanos se tornaram dependentes da
condições de moradia e higiene, as epidemias tornaram-se mais intensas e as pandemias
agricultura, doenças como a peste bovina emergiram. Mais
mais frequentes. A gripe espanhola ocorrida no início do século XX, na qual 40-50 milhões
comumente, novas espécies surgem como resultado de saltos
morreram em menos de um ano, foi a calamidade natural mais devastadora da história da
de um hospedeiro para outro, cruzando assim a barreira
humanidade (COURA, 2013).
de espécies. Os humanos são, portanto, nada mais do que
hospedeiros incidentais ou indiretos de patógenos. Dentre Mais recentemente, o crescimento das populações humanas, mudanças globais no
os vírus conhecidos que infectam humanos, cerca de 80% uso da terra e a introdução de vetores antropofílicos têm criado pressão seletiva sobre
perpetuam-se naturalmente em reservatórios não humanos, os hospedeiros e reservatórios. A pandemia por influenza voltou em 1957 como gripe
principalmente mamíferos, aves domésticas, animais selvagens asiática e depois, em 1968, como gripe de Hong Kong, que matou cerca de três milhões
e artrópodes. No entanto, apenas uma minoria desses vírus é de pessoas. Com a descoberta do vírus da imunodeficiência humana (HIV) no início dos
capaz de persistir ou de se espalhar entre os seres humanos na anos 1980, observa-se uma das epidemias mais prolongadas da história. A doença que
ausência de um reservatório (SILVA; ANGERAMI, 2008). apresentava 100% de letalidade tornou-se uma doença crônica tratável com a descoberta
dos antirretrovirais (ARV) (VERONESI; FOCACCIA, 2021).
Há relatos históricos de que a varíola, a mais letal e devastadora
infecção viral da história, surgiu, pela primeira vez, entre A infecção por HIV foi um marco importante na ciência, uma vez que deu início à
comunidades na Índia, há cerca de 11.000 anos. Dentre as conscientização mundial e despertou o interesse de pesquisas sobre novos patógenos
civilizações da Antiguidade, há registros de infecção viral por virais emergentes. Nas últimas décadas, novos surtos de infecções levaram à descoberta
poliovírus no Egito em relatos impressos nas estelas egípcias. de uma variedade de vírus altamente patogênicos, principalmente aqueles pertencentes
Algumas múmias enterradas há mais de 3.000 anos mostram às famílias Filoviridae, Arenaviridae, Bunyaviridae, Paramyxoviridae, Coronaviridae,
evidências de varíola. Na Grécia Antiga, há relatos de uma grande Flaviviridae, Togaviridae e Hepeviridae. Alguns exemplos incluem vírus BK (BKV), vírus
epidemia de varíola em 430 a.C., na qual um quarto do exército JC (JCV), poliomavírus de células Merkel (MCV ou MCPyV), febre grave com vírus da
ateniense e muitos civis da cidade morreram com a infecção síndrome de trombocitopenia (SFTSV), hantavírus (HTNV), vírus Lujo, vírus Lassa (LASV),
(SILVA; ANGERAMI, 2008). metapneumovírus humano (hMPV) (SILVA; ANGERAMI, 2008).
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Desde os anos 2000, tem sido registrada a emergência
de diversos vírus que apresentam elevadas taxas de
4.3.2 Características e propriedades biológicas dos principais vírus causadores de infecções em seres humanos
transmissão e/ou elevada gravidade e letalidade.
Em seu curso pandêmico em 2002/2003, um novo
Os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios, com dimensões entre 20 e 300 nm. Eles não têm as enzimas
coronavírus da síndrome respiratória aguda grave
necessárias para a síntese de proteínas e ácidos nucleicos, que podem ser DNA ou RNA. Assim, os vírus são
(SARS-CoV) infectou mais de 8000 pessoas em 27
dependentes da maquinaria sintética das células hospedeiras para sua replicação. Aplica-se o termo vírus
países. Em 2009, a gripe suína (vírus H1N1) ceifou
para identificação de todos os agentes com essas características biológicas, reservando-se o termo vírion
cerca de 20.000 vidas. Em 2013, uma nova cepa de
para as partículas infectantes (COURA, 2013).
influenza aviária A (H7N9), conhecida como gripe
aviária na China, e a síndrome respiratória do Oriente São exemplos de vírus de DNA: vírus de verrugas, varicela-zóster, herpes, varíola e parvovírus (Figura 6).
Médio (vírus MERS-CoV) foram identificados. Em
São exemplos de vírus de RNA: SARS-CoV-2, HIV, hepatites B e C, poliomielite, dengue, febre amarela, vírus
2015, o ressurgimento do vírus ebola e do vírus zika
da raiva, caxumba, sarampo, influenza, ebola, rotavírus (Figura 6).
(ZIKV) colocou o mundo em alerta novamente com
a iminente possibilidade de uma nova pandemia
(SILVA; ANGERAMI, 2008). No entanto, foi em 2020
FIGURA 6 – CLASSIFICAÇÃO VIRAL COM BASE NA MORFOLOGIA E REPLICAÇÃO
que o mundo se deparou com uma pandemia sem
precedentes, a COVID-19, um novo coronavírus, o
SARS-CoV-2 (JIN et al., 2020).
Com início registrado na cidade de Wuhan
(China), a partir de uma transmissão zoonótica
(morcego-humano), o vírus SARS-CoV-2 espalhou-
se rapidamente pelo mundo todo, infectou mais
de 200 milhões de pessoas, provou colapsos na
capacidade de assistência médico-hospitalar
e, consequentemente, mais de 4 milhões de
indivíduos com COVID-19 morreram. Do mesmo
modo ao observado pela epidemia do vírus HIV,
houve uma mobilização global e integrada para
a produção de vacinas. Em menos de um ano,
diversas vacinas foram produzidas e testadas
com sucesso. Com isso, observou-se redução
significativa da mortalidade da COVID-19 a partir
do segundo trimestre de 2021. Apesar disso, o Fonte: traduzido e adaptado de Banerjee (2021).
surgimento de novas variantes do vírus é visto com
extrema preocupação (JIN et al., 2020).
As partículas virais, ou vírion, consistem essencialmente de um ácido nucleico (DNA ou RNA) envolto por
Por fim, presume-se que ainda haja um número um revestimento externo de proteína ou capsídeo. O capsídeo com o ácido nucleico incluído é chamado de
diverso de espécies de vírus humanos a serem nucleocapsídeo. Os vírions podem ser envelopados ou não envelopados. O envelope de vírus é derivado da
descobertos. A composição desse reservatório de membrana da célula hospedeira. Isso ocorre quando o vírus é liberado da célula hospedeira por brotamento.
novos vírus é dinâmica, muda ao longo do tempo, As subunidades de proteínas podem estar presentes como pontas projetadas na superfície do envelope; um
ou seja, enquanto algumas espécies de vírus tendem exemplo é a proteína spike (S1) do vírus SARS-CoV-2. Coletivamente, essas subunidades são chamadas de
a se extinguir, outras continuam a evoluir em seus peplômeros (VERONESI; FOCACCIA, 2021).
hospedeiros naturais (SILVA; ANGERAMI, 2008).
Módulo: Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais | Unidade 4 - Conceitos Básicos de Virologia e Imunologia 210
As estruturas superficiais das partículas virais são fundamentais nos processos FIGURA 7 – CLASSIFICAÇÃO VIRAL COM BASE NA MORFOLOGIA E
de adsorção inicial às células que venham a infectar. Esse processo é complexo e, REPLICAÇÃO
basicamente, envolve um receptor nas células hospedeiras ao qual o vírion deve
se fixar antes de penetrar na célula-alvo. O vírus envelopado do HIV, por exemplo,
utiliza sua proteína gp120 e o receptor CD4 presente em linfócitos T e macrófagos.
Do mesmo modo, o vírus SARS-CoV-2 utiliza a proteína S1 para se ligar ao receptor
ECA-2 expresso principalmente nos pneumócitos. Além disso, os peplômeros são
importantes alvos do sistema imune, permitindo, por exemplo, a neutralização do
vírus pela ligação dessas proteínas com os anticorpos (JIN et al., 2020).
O processo de replicação viral é variado e dezenas de estratégias são utilizadas. Os
vírus de DNA são mais estáveis, portanto ocorrem menos erros nos processos de
replicação: um erro a cada bilhão de nucleotídeos formados. Por outro lado, os vírus
de RNA apresentam um erro a cada 1000 a 10.000 nucleotídeos formados. Assim, a
geração de partículas diversas das amostras infectantes originais pode atingir níveis
elevados, surgindo vírions com modificações importantes. Consequentemente, um
vírus de RNA pode gerar um grande número de variantes de preocupação (Variants
of Concern – VOC). A geração de variantes torna-se preocupante quando o vírus
passa a apresentar maior transmissibilidade, maior gravidade, maior letalidade, mais
resistência a antirretrovirais e/ou torna as vacinas menos eficazes. No contexto da
COVID-19, as variantes gama e delta são mais transmissíveis e, assim, ao infectar um
número maior de indivíduos, observa-se aumento da taxa de mortalidade da doença
(VERONESI; FOCACCIA, 2021).
Após o vírus se ligar à célula hospedeira, entrar no citoplasma e os capsídeos se-
rem removidos, inicia-se a fase de biossíntese. Nessa fase, o ácido nucleico viral e o
capsídeo são sintetizados. Nesse momento, o metabolismo normal da célula hospe-
deira é desligado e se dirige para a produção de componentes virais. A biossíntese
consiste essencialmente nas quatro etapas descritas a seguir (Figura 7) (VERONESI;
FOCACCIA, 2021):
Em seguida, ocorre a fase de maturação, quando se dá a montagem de vírions filhos após a síntese de
ácidos nucleicos e proteínas virais. Pode ocorrer no núcleo da célula hospedeira ou no citoplasma.
A fase de liberação das partículas virais pode ocorrer com a lise ou não da célula hospedeira. A formação
de novas partículas infecciosas em ciclos replicativos rápidos leva à liberação de novos vírions, e as células
são destruídas (exemplos: retrovírus e herpes-vírus). Em quadros de infecção persistente, pode-se gerar,
ao longo do tempo, uma transformação maligna das células hospedeiras, com a formação de carcinomas,
como é o caso das hepatites B e C (VERONESI; FOCACCIA, 2021).
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4.3.3 Principais viroses de circulação no Brasil
Apesar dos avanços na medicina e na saúde pública, as infecções virais ainda determinam um
significativo impacto negativo no Brasil. Além disso, o diagnóstico laboratorial é um fator complicador
no controle dessas doenças, o que dificulta o diagnóstico precoce e as notificações de agravo.
No Brasil, as febres hemorrágicas, principalmente as arboviroses de interesse humano, são
possivelmente todas autóctones, existindo há muito tempo. Esses vírus pertencem ao gênero
Flavivirus e são constituídos por RNA de cadeia simples. Os principais arbovírus que têm determinado
epidemias e surtos no Brasil são febre amarela, dengue, zika e chikungunya (COURA, 2013).
A febre amarela é uma doença infecciosa não A dengue, outra arbovirose, é relativamente A infecção pelo vírus zika (ZIKAV) é transmitida
contagiosa causada por um arbovírus mantido benigna. No entanto, quando se verifica a pelo mesmo vetor do vírus da dengue, o
em ciclos silvestres no centro-norte do Brasil. cocirculação de diferentes sorotipos (DEN-1, DEN- Aedes aegypti, de comportamento benigno,
Os primatas não humanos atuam como 2, DEN-3, DEN-4) do vírus da dengue, a ocorrência baixíssima virulência e letalidade. Apesar de ser
reservatório e ela é transmitida por mosquitos de casos graves hemorrágicos e a taxa de uma infecção conhecida pelos cientistas há pelo
dos gêneros Haemagogus e Sabethes em nosso mortalidade aumentam. Interessantemente, com menos 60 anos, foi no Brasil em 2015 que se
país. A letalidade em indivíduos não vacinados, a erradicação do vetor Aedes aegypti na década associou essa infecção viral à teratogenicidade.
que cursam com sintomas mais graves, é de de 1950, os casos de dengue desapareceram O fortalecimento da possível causalidade entre
cerca de 30%. A febre amarela pode apresentar no Brasil. A partir da década de 1980 houve o vírus zika e os casos de microcefalia deu-se
um ciclo urbano, com transmissão de humano a a reintrodução do vírus, que rapidamente a partir de achados necroscópicos de forte
humano, pelo Aedes aegypti, o mesmo vetor da alcançou os grandes centros urbanos brasileiros. concentração de material viral no tecido nervoso
dengue (VERONESI; FOCACCIA, 2021). Atualmente, com a circulação de dois ou mais de natimortos acometidos pela microcefalia nas
sorotipos e as elevadas taxas de infestação pelo regiões afetadas. A epidemia brasileira de zika e
vetor Aedes, observa-se uma dramática situação microcefalias gerou preocupação mundial, e a
de hiperendemicidade, propiciando a ocorrência Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou
O vírus chikungunya (CHIKV) foi introduzido de epidemias quanto ao maior risco de infecção situação de emergência internacional, que
no continente americano em 2013 e ocasionou por mais de um sorotipo. A dengue é um exemplo foi encerrada em novembro de 2016. A região
expressiva onda epidêmica em diversos países de que as epidemias devem ser prevenidas e não Nordeste apresentou a maior taxa de incidência,
da América Central e ilhas do Caribe. No Brasil, combatidas (VERONESI; FOCACCIA, 2021). seguida das regiões Centro-Oeste e Norte
a doença foi confirmada no 2º semestre de (LOWE et al., 2018).
2014 nos estados do Amapá e da Bahia. A
transmissão desse arbovírus também envolve o
Aedes aegypti, e a ocorrência dessa doença afeta
todas as regiões brasileiras. Diferentemente
das demais arboviroses, essa doença febril
tem repercussão crônica em cerca de 50% dos
casos com apresentação de artralgia (dor nas
articulações) que podem durar meses ou anos
(VERONESI; FOCACCIA, 2021).
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Os hantavirus são robovírus (vírus de roedores) O HIV é um vírus de RNA (retrovírus) do gênero A caxumba, doença provocada por um vírus
cuja transmissão ocorre pela inalação de Lentivirus. A epidemia do HIV teve início no Brasil RNA de cadeia simples, membro do gênero
aerossóis de vírus formados com dejetos de na década de 1980 e atingiu, principalmente, Rubulavirus, também é conhecida como
roedores ou pela manipulação desses. As as regiões metropolitanas de São Paulo e Rio parotidite epidêmica. Apresenta curso agudo,
manifestações clínicas são variáveis, mas, de Janeiro. O contato sexual desprotegido e o benigno, autolimitado com tropismo por
de modo geral, causam uma doença febril uso de drogas injetáveis compartilhadas são glândulas, principalmente salivares e pelo sistema
associada à insuficiência cardiorrespiratória e, os principais meios de transmissão do vírus. nervoso central. No período pré-vacinal, cerca de
às vezes, manifestações renais e hemorrágicas Atualmente, o Brasil ocupa o segundo lugar em 90% dos casos de caxumba eram relatados em
discretas. No Brasil, entre 2007 e 2015 foram notificações de AIDS nas Américas. Apesar de crianças menores de 14 anos. Atualmente, casos
notificados 1060 casos da doença e 410 óbitos, mostrar tendência de estabilidade, os grupos e surtos têm sido observados nas regiões Sul e
com distribuição geográfica ampla. Nesse de 15 a 19 e 20 a 24 anos apresentam as maiores Sudeste afetando principalmente as faixas etárias
levantamento realizado por Fonseca, Oliveira taxas de crescimento na distribuição dos casos de 20 a 49, seguidas de 15 a 19 anos (VERONESI;
e Duarte (2018), a maioria dos indivíduos detectados. O tratamento no Brasil é gratuito, FOCACCIA, 2021).
que morreram morava em zona urbana e foi mas populações vulneráveis com acesso
infectada na zona rural. limitado ao tratamento apresentam elevado
número de óbitos por AIDS (COURA, 2013).
A poliomielite é uma doença sindrômica causada As hepatites virais estão entre as infecções virais A hepatite B (VHB) é uma doença que afeta
por um vírus de DNA do gênero Enterovirus, mais prevalentes e são causadas por diferentes cerca de 350 milhões de pessoas no mundo
que apresenta elevada infectividade e baixa vírus de RNA da família Hepadnaviridae (VHA, todo, segundo a OMS. No Brasil, é mais
patogenicidade, uma vez que apenas 0,1% a VHB, VHC, HVD e VHE) com repercussões clínicas prevalente nas regiões Norte, Centro-Oeste
2% dos infectados desenvolverão a doença na vírus-específicas no fígado. A hepatite A apresenta e Nordeste. A transmissão ocorre por meio
forma paralítica. A transmissão direta ocorre associação muito forte com problemas de dos fluidos corpóreos, incluindo o sangue, o
por secreções nasofaríngeas e a indireta pela saneamento, o que facilita a transmissão do vírus que facilita a transmissão vertical (mãe-filho).
água e alimentos ou objetos contaminados. No VHA pela água e por alimentos contaminados. Medidas preconizadas para evitar infecção
Brasil, a partir da década de 1980 foi instituído Consequentemente, as áreas populacionais com pelo VHB são vacinação, uso de preservativos,
um programa forte de campanha vacinal que menor acesso à rede de esgoto no Brasil (região o não compartilhamento de seringas e
levou a uma abrupta redução do número de Norte) apresentam as maiores taxas de incidência acompanhamento pré-natal (VERONESI;
casos notificados. Nos últimos anos, cerca de e prevalência da doença. A mortalidade por FOCACCIA, 2021).
500 casos por ano de paralisia flácida aguda hepatite A reduziu-se consideravelmente nos
têm sido notificados, com maior prevalência últimos anos e, atualmente, a prevalência está mais
das regiões Norte e Sudeste (COURA, 2013). concentrada na faixa etária de indivíduos acima de
40 anos (PRASIDTHRATHSINT; STAPLETON, 2019).
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A hepatite C (HCV) é uma das infecções virais de As infecções respiratórias agudas virais O HRSV, membro da família Pneumoviridae,
maior impacto na população mundial, pois estima- representam as doenças infecciosas mais é um dos principais agentes etiológicos que
se que 1% dos indivíduos estejam infectados. comuns. Estima-se que mais de 1,5 milhão de acometem crianças de 5 anos de idade. O
Devido a sua característica evolução com mortes ocorram por ano em decorrência dessas HRV, pertencente ao gênero Enterovirus, é o
complicações graves, como a cirrose hepática e o infecções. Os vírus mais associados a essas responsável por 30% a 50% dos casos de infecção
carcinoma hepatocelular, as taxas de mortalidade infecções respiratórias são: rinovírus humano respiratória aguda e apresenta circulação maior
são preocupantes. A transmissão ocorre por (HVR), influenza, vírus respiratório sincicial nas estações chuvosas em regiões tropicais. Os
exposição percutânea ou pela mucosa, por sangue humano (HRSV), vírus da parainfluenza (PIV) coronavírus são vírus pertencentes à família
e seus derivados contaminados pelo HVC. O vírus e, mais recentemente, os coronavírus. Esses Coronaviridae, e três espécies apresentam
também está presente, em menor quantidade, vírus são de distribuição ampla, transmitidos maior repercussão na saúde humana: MERS-
em sêmen e outros líquidos corpóreos. Assim, por secreções respiratórias, e a gravidade está CoV, SARS-CoV e SARS-CoV-2. Esse último é
as seguintes situações constituem os principais relacionada a crianças menores de 2 anos o agente etiológico da COVID-19 que tem
riscos para o contágio: transfusão sanguínea e de com histórico de bronquites, grávidas, idosos, provocado a maior pandemia recente da
seus derivados e transplantes de órgãos sólidos imunossuprimidos e portadores de doenças história. O vírus SARS-CoV-2 apresenta diversas
sem triagem adequada; uso de drogas injetáveis; metabólicas e cardíacas (COURA, 2013). variantes de preocupação responsáveis por
hemodiálise em equipamentos com falhas em elevada taxa de transmissão. A infecção causa
rotinas de biossegurança; acidentes percutâneos doença leve/moderada em mais de 80% dos
por profissionais da saúde; recém-nascidos de indivíduos infectados. Cerca de 5% progridem
mães HCV-positivas; e procedimentos cirúrgicos para a síndrome respiratória aguda grave, com
e estéticos utilizando instrumentos não letalidade de 50%. No Brasil, observou-se até
devidamente esterilizados (VERONESI; FOCACCIA, agosto de 2021, 20,6 milhões de infectados e
2021). 576 mil mortes (VERONESI; FOCACCIA, 2021).
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4.3.4 Métodos diagnósticos moleculares e sorológicos
a) Isolamento e identificação do vírus. São técnicas b) Detecção de ácido nucleico. É um dos testes de c) Sequenciamento de nucleotídeos. O
laboratoriais combinadas que oferecem os melhores melhor acurácia no diagnóstico de infecção ativa. sequenciamento de nucleotídeos é uma técnica
resultados. Para o isolamento são utilizadas linhagens De modo geral, esse ensaio laboratorial permite utilizada para a detecção do vírus e de seu
celulares (HeLa, HEp2, entre outras) cultivadas com a a detecção, por meio de dezenas de ciclos de genoma. Pode ser feito utilizando reações cíclicas
amostra biológica em meio específico que favoreça a amplificação, do ácido nucleico-alvo. O PCR é o ou o pirosequenciamento. Essa técnica oferece
infecção viral das células e elimine fungos e bactérias. exemplo clássico da técnica de amplificação de um informações que podem ser utilizadas com diversas
Essa cultura celular possibilita avaliar indícios de ácido nucleico-alvo, amplificando cerca de 100 a 1000 finalidades, pois dá acesso ao genoma completo do
infecção viral por meio da presença do efeito citopático pares de bases. Consiste em ciclos de desnaturação, vírus. Por meio dessa técnica, é possível identificar
(alterações morfológicas nas células), presença dos ligação do primer (pedaços curtos de DNA de fita mutações virais de resistência a antivirais e identificar
corpúsculos de inclusão, produção de antígenos virais simples que são projetados como um gabarito, de as variantes de preocupação.
e adsorção de hemácias. Contudo, para a identificação modo que se liguem à região genética de interesse)
precisa do vírus utiliza-se a reação em cadeia da e extensão, cada um deles em temperaturas
polimerase (PCR, do inglês polymerase chain reaction). diferentes. Os ciclos sofrem a progressão por meio de
Apesar de esse método ser considerado o padrão- um termociclador, que controla essas temperaturas.
ouro de diversas doenças virais, é uma técnica que Com esses ciclos, ocorre a amplificação do gene-alvo
necessita de condições especiais de elevado grau de de tal modo que o material genético do vírus possa
biossegurança, disponível apenas em poucos centros ser visualizado. Diferentes técnicas de PCR têm sido
de pesquisas no Brasil (RETA et al., 2020). estudadas atualmente, sendo exemplos as técnicas
denominadas PCR em tempo real. Nelas, o produto
viral é detectado no mesmo momento em que ocorre
a reação de cadeia. A vantagem é não necessitar de
métodos de detecção (eletroforese em gel), o que
diminui o tempo necessário para a conclusão do
teste. Além de possibilitar o diagnóstico da infecção
viral, é possível determinar a carga viral da amostra
biológica. Por se tratar de um sistema fechado, o
risco de contaminação dos profissionais é menor.
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4.3.4.2 Sorologias
a) Immunoblotting. É um método que consiste b) ELISA. A sigla ELISA significa, em língua inglesa, c) Imunocromatográfico. O teste imunocromatográfico
na detecção de anticorpos IgG, antiproteínas de Enzyme-Linked Immunosorbent Assay. No Brasil, são de fluxo lateral (EIFL) é uma variante dos ensaios
partículas virais, utilizando uma membrana de conhecidos como ensaios imunoenzimáticos ou ELISA. imunoenzimáticos. A amostra obtida é adicionada
nitrocelulose. Para o preparo dessa membrana, os Esses ensaios possibilitam a detecção de anticorpos de diretamente em uma membrana e levada seguindo
antígenos virais são separados por peso molecular diferentes classes e antígenos. Os ensaios apresentam um fluxo capilar. Os antígenos ali presentes reagem
em uma eletroforese e, em seguida, são transferidos uma fase sólida, que pode ser uma placa de plástico com os anticorpos específicos, sendo o anticorpo
para a membrana de nitrocelulose. A membrana (poliestireno) com poços revestidos do antígeno viral. conjugado a um marcador. Quando esses compostos
é então incubada com o soro do indivíduo, e a Para a detecção de anticorpos, os poços da placa são identificados, uma linha é formada no teste,
presença de anticorpos específicos é detectada por são incubados com soro do indivíduo, e a presença caracterizando o diagnóstico positivo para aquela
reação imunoenzimática. A reação imunoenzimática de anticorpos específicos é revelada por reação suspeita clínica. Os resultados conseguem ser dados
é caracterizada pela reação que ocorre pela adição de imunoenzimática. Para a detecção de antígenos, os de maneira rápida (também conhecidos como
um substrato (cromógeno e peróxido de hidrogênio poços das placas são revestidos com anticorpos que testes rápidos), em torno de 15 a 20 minutos, e não
– H2O2) e a enzima peroxidase conjugada a um se ligam a antígenos dos vírus presentes na amostra necessitam de meios elaborados para sua realização.
anticorpo anti-IgM/IgG humana. Com esse método, biológica. A presença desses antígenos é revelada por É uma boa técnica quando se necessita de um
permite-se identificar, por coloração, a presença de reação imunoenzimática. diagnóstico imediato.
anticorpos específicos para diferentes alvos-virais.
No diagnóstico de HIV, por exemplo, é possível
identificar a presença simultânea de anticorpos IgG
específicos para as proteínas virais gp 160 (HIV-1), gp
120 (HIV-1), gp 41 (HIV-1), gp 24 (HIV-1) e gp 36 (HIV-
2). Com essa estratégia, o teste apresenta elevada
especificidade e, portanto, é um teste confirmatório
para o diagnóstico de infecção viral.
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ENCERRAMENTO DA UNIDADE
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REFERÊNCIAS
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MINICURRÍCULO DO AUTOR
JAMES VENTURINI
Biólogo pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), mestre e doutor em Doenças Tropicais
pela Faculdade de Medicina de Botucatu (UNESP). Realizou estágios de Doutorado-Sanduíche
e Pós-Doutorado Júnior junto a RWTH-Aachen, Alemanha. Atualmente é Professor Adjunto
na Faculdade de Medicina (FAMED) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS),
Coordenador de Cursos do Programa Pós-Graduação em Doenças Infecciosas e Parasitárias
(FAMED/UFMS) e Responsável Técnico pelo Laboratório de Doenças Infecciosas e Parasitárias
(LabDIP/FAMED/UFMS). É docente-permanente do Programa de Pós-Graduação em Doenças
Tropicais da Faculdade de Medicina de Botucatu (UNESP). Possui experiência na área de
imunologia das doenças infecciosas e na avaliação imunoterapêutica de novos compostos
naturais e sintéticos.
E-mail: james.venturini@ufms.br
Orcid: http://orcid.org/0000-0003-0035-2439
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6087443445790715
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ENCERRAMENTO DO MÓDULO
Encerramos este Módulo – Fundamentos e tecnologias para o enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças
virais com a certeza de ter facilitado sua aprendizagem, trabalhador estudante, sobre os temas propostos e que,
com base no estudado e aprendido, você será capaz de articular os pressupostos da saúde coletiva no contexto do
SUS, incorporando às suas práticas tecnologias e ferramentas da Vigilância em Saúde, e, assim, tornar mais efetivas
suas ações e de sua equipe no enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais que possam (res)surgir. O SUS
é potente para atuação em epidemias e pandemias, que por sua vez demonstraram a necessidade da existência de
serviços públicos de qualidade como instrumento de soberania nacional. Parabéns a você, trabalhador estudante que
é fundamental para o enfrentamento dessas situações, com compromisso e qualidade.
Siga em frente!
Programa Educacional em Vigilância e Cuidado em Saúde
no Enfrentamento da COVID-19 e de outras doenças virais
MÓDULO
FUNDAMENTOS E TECNOLOGIAS PARA O ENFRENTAMENTO
DA COVID-19 E DE OUTRAS DOENÇAS VIRAIS
REALIZAÇÃO:
FIOCRUZ MATO GROSSO DO SUL