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REVERENCIANDO PALMARES
RESUMO
ABSTRACT
The purpose of this paper is to describe the contribution of the 6th February - Honor and Reverence to the
ancestors - Quilombo dos Palmares extermination vigil contributed to the understanding about the
aphrodiasporic consolidation in Alagoas lands, through the most diverse warriors who arrived at the
northeast as black and enslaved black women. To contribute to the understanding of the motivation of
participation in the vigil, as well as to elucidate the historical, political and ancestral perspective that occurs
at dawn on February 6, five years in a row. Supported in the history of Quilombo dos Palmares, with its
heroes and heroes, bring to light the local culture, as well as the identification process, which contributes to
the Serra da Barriga in the city of Union dos Palmares to be a reference in the diaspora. To provoke the
opening and expansion of a discursive field on the visibility and the preservation of the memory of the
different motifs of the geographical itineraries traveled by the black men who participated in the constitution
of Quilombo.
Introdução
O presente trabalho tem como objetivo avaliar o processo da vigília na Serra da Barriga, a
partir de nossa observação durante o dia 06 de Fevereiro, nos anos de 2017, 2018 e 2019,
considerando algumas questões que nos inquietaram sobremaneira, dentre elas, o fato gerador da
atividade, que começa a despontar como um movimento de vigília, aos moldes do que acontece
com santos da igreja católica. Honra e Reverência aos antepassados – Vigília ao extermínio do
Quilombo dos Palmares é um evento cultural que remete os participantes a uma imersão in loco,
vivenciando os passos históricos dos antepassados que constituíram o mocambo dos Macacos.
Passamos para a pesquisa de campo a fim de mostrar como os fatos passados ainda estão
presentes em nossa sociedade e como são tratadas as questões relativas à religiosidade em nosso
estado, avaliando e trazendo para a academia aspectos que estão, ainda, submersos no universo da
militância política. A derrubada do maior quilombo das Américas, para além do patrimônio material,
contribuições para minimizar os conflitos existentes no estado que avança no genocídio negro.
Contexto da Vigília
Em forma de vigília, liderada por uma religiosa atuante no movimento negro alagoano, Mãe
Neide Oyá D’Oxum, Yalorixá Mestra do Patrimônio Vivo que, congregou representantes dos
diversos segmentos da cultura negra partilhando momentos reflexivos, oportunizando a
compreensão, acerca do extermínio daquele que foi o maior quilombo das Américas. A visibilidade
da data está diretamente ligada às questões de intolerância, racismo e demais perseguições aos
afrodescendentes, embora estudos comprovem que índios e brancos fugitivos também foram
acolhidos nos Quilombos.
Esse ano, em sua quinta edição consecutiva, a vigília reuniu mais de 200 pessoas incluindo
religiosos, estudiosos e capoeiristas, na madrugada do dia 06 de fevereiro, na Serra da Barriga, com
diversos segmentos de matriz africana. De nossa participação e inquietação, até a divulgação da
Vigília pelo Extermínio do Quilombo dos Palmares, que acontece na madrugada do dia 06 de
fevereiro, coletamos depoimentos que aqui vão transcritos ou citados pelos agentes culturais que
fizeram parte das edições, registramos por fotografia buscando captar a magia que nos impulsiona e
caminhar, refletir e transmitir.
Mais tarde, em 1667 foi organizada uma grande expedição para exterminar Palmares, sob o
comando de Zenóbio Accioly de Vasconcelos, financiada pelo governo de Pernambuco que
Com o reforço recebido em janeiro de 1694, Jorge Velho e seus homens avançaram contra
Palmares, 22 dias consecutivos os palmarinos lutaram até o dia 06 de fevereiro, quando o forte
armamento das tropas matou mais de 400 homens e aprisionou muitos, selando a derrubada do
Mocambo do Macaco, dizimando o Quilombo dos Palmares. No dia 06 de fevereiro de 1694 podia
ser avistado de longe o céu avermelhado do fogo que queimava o Mocambo do Macaco, enquanto o
sangue escorria pela terra, como forma de simbolizar, por porte do governo a extinção da
confederação dos rebelados. Mas eles não foram extintos apesar de muitos terem morrido e sido
capturados de forma violenta, a resistência estava dissolvida mas não extinta pois, o líder Zumbi e
outros negros conseguiram fugir pela região das serras. Zumbi, o último líder de Palmares,
sobreviveu à queda de Macaco, mas foi emboscado e assassinado em 20 de novembro de 1695.
Todavia, para além das experiências citadas, existem viajantes turistas e peregrinos que
podem investir em caminhos que não são necessariamente os caminhos religiosos ou turísticos,
embora, estes aspectos possam se embaralhar entre os demais. E, de certo modo, há, ainda, um
outro elemento motivador que é o aspecto político-militante como fazem os muçulmanos em suas
idas à Meca, ou os judeus e cristãos (católicos e evangélicos) à Jerusalém. E mais interessante é
que este aspecto político-militante pode caminhar junto com tradições identitárias e se constituir em
práticas de dádiva ao divino e de formas de entrega e retribuições.
A peregrinação que acompanhamos, é uma celebração marcada pela subida ao platô da Serra
da Barrica, localidade histórica do extinto quartel general da República de Palmares, se encaixa
perfeitamente neste conjunto de vinhetas, sendo ela própria uma alusão sintética àquelas atividades
mentais e corporais imanentes em uma peregrinação.
Especificamente, esta peregrinação em honra e reverência aos guerreiros Quilombolas, que é
fruto de iniciativa local, mas precisamente de decisões de Mãe Neide, que, em persistência e
resistência à pressões, há anos luta pela importância deste evento. Potencializando como ela mesma
diz “a necessidade de lembrarmos da resistência ancestral, a derrota quilombola tem que estar na
memória de todos e precisamos observar o dia de luto anualmente para ter forças para lutar
diariamente”.
E é no fluxo da subida da Serra, marcada por um roteiro repleto de paradas e celebrações,
articuladas em vários pontos diferentes, que remetem às marcantes situações no território Palmarino
e, a específicas vivências naquela comunidade, é neste caminhar que se reitera a experiência pessoal
naquela celebração coletiva. Articulada à movimentação, a ação e a percepção do ambiente, aquele
que faz parte da subida, o peregrino, se vê diante da lembrança da resistência e do luto da derrota
genocida de Palmares. A percepção dos participantes que entrevistamos conduz a emoção e à
elevação da força individual e responsabilidade coletiva.
Embora não possua um santuário, relíquias ou um santo a se reverenciar, esta subida ao topo
da Serra da Barriga é uma travessia no tempo histórico, travessia pelos marcos de um saber etéreo e
imaterial que lá fora instalado como algo sagrado que é o próprio dia 6 de Fevereiro, no qual se
celebra o dia do massacre.
Considerações
O dia 06 de fevereiro não é só a data da derrubada do Quilombo, para a Yalorixá Mãe Neide
Oyá D’Oxum, o dia representa a resistência de anos dos irmãos e irmãs que sofreram e, ainda assim
resistiram, criaram uma república, constituíram uma economia sustentável e atravessaram muitas
dificuldades. O sentimento da religiosa está emanado nos demais presentes, com os quais tivemos
oportunidade de partilhar momentos ímpares, honra e reverência - luta e resistência – sentimentos e
ações históricas e cotidianas.
O lugar de onde escrevemos este trabalho está situado em relações complexas, de jogos de
poderes em que ainda perpetuam velhas práticas políticas, de ideologias de dominação e segregação,
de escolhas baseadas nos padrões patriarcais e de elites brancas, que promovem “um resgate” da
cultura afro-alagoana, “resgate” das manifestações da cultura afro-brasileira, situando muita das
vezes, esses “resgates” nos interesses políticos.
Consideramos que além da preservação da Serra da Barriga, como bem material, os saberes
e fazeres que a compõem, os bens imateriais, vêm ganhando uma dimensão de respeitabilidade às
custas da movimentação e articulação da sociedade.
Precisamos elevar a nossa cultura, mesmo com momentos que não são festivos, como esse
que fizemos parte, pois a complexidade da nossa existência está em mantermos acesa a chama do
conhecimento sem, perder a raiz que nos mantem de pé e na eterna observância e militância.
Referências
ASSIS, Virgínia Maria Almôedo de. Palavra de Rei: Autonomia e Subordinação da Capitania
Hereditária de Pernambuco. Tese de Doutorado em História (Universidade Federal de
Pernambuco), 2001.
CARNEIRO, Edison, O Quilombo dos Palmares. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1947.
LARA, Silvia Hunold, “Com fé, lei e rei: um sobado africano em Pernambuco no século XVII”, in:
GOMES, Flávio (org.). Mocambos de Palmares: histórias e fontes (séc. XVI – XIX). Rio de
Janeiro.
IPHAN. Serra da barriga, Parte mais Alcantilada – Quilombo dos Palmares. Dossiê patrimônio
Cultural do MERCOSUL. Disponível em: < http://portal.iphan.gov.br/bibliografiaPatrimonio >.
Acesso em 14.08.2019.
SODRÉ, M. Claros e Escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1999.
Fotos: 1, 2 e 3 do acervo de SILVA, Igor Luiz Rodrigues da, foto 4 acervo Fundação Cultural
Palmares.