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Introducao Ao Esoterismo Ocidental Livro
Introducao Ao Esoterismo Ocidental Livro
O ESOTERISMO OCIDENTAL
E SUAS INICIAÇÕES
INCLUINDO
Seguido de uma
LISBOA, 2013
À Carla,
Mais tarde, depois de ter exercido uma actividade, durante cerca de 20 anos, de
criminalista químico no Laboratório de Polícia Científica da P.J., e de ter continuado uma
actividade docente, durante 18 anos, no Departamento de Antropologia da Faculdade
de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH/UNL) – tendo
leccionado durante dois anos, no final desse período, a cadeira de Antropologia da
Religião e do Ritual -, acabei, já depois de deixar a docência na FCSH/UNL, por me
Doutorar nessa mesma Faculdade e Universidade em Antropologia (Social e Cultural) da
Religião, particularmente no domínio dos Novos Movimentos Religiosos e das
Espiritualidades Alternativas e concretamente estudando os grupos que praticam a
alquimia em finais do século XX e princípios do século XXI – Tese que foi publicada em
2009 na Ed. Ésquilo com o título “A Alquimia, os alquimistas contemporâneos e as novas
espiritualidades”. Devo dizer, neste contexto, que sou membro (desde praticamente a
sua fundação) da ESSWE – European Society for the Study os Western Esotericism,
criada pelo Prof. Wouter J. Hannegraaff da Universidade de Amsterdão e por outros
académicos como o veterano destes estudos, o Prof. Antoine Faivre da parisiense EPHE
(Sorbonne).
O presente livro segue o formato dos diversos cursos que dei, dedicados a estes
temas, de entre os quais saliento os primeiros, de 1989 a 2008 no ex-ISER (Instituto de
Sociologia e Etnologia das Religiões) da FD/UNL, fundado e dirigido pelo Professor
Moisés Espírito Santo, e alguns desde 2000 no Centro Nacional de Cultura presidido pelo
Dr. Guilherme d’Oliveira Martins, mas foram estes cursos no Âmbito Cultural do El Corte
Inglês que atingiram uma audiência maior, com um total de cerca de 1000 alunos ao
longo destes últimos 6 anos, dando-me ainda uma maior experiência para atingir um
público mais alargado, grande parte do qual sem grande preparação e sintonia com
estas áreas. No entanto, devo dizer que a exposição oral destes temas pode ser mais
fácil de digerir que a leitura de um livro, por menos “universitário” que ele pretenda ser,
com este. Mesmo assim procurei, neste livro, dar um tom coloquial possível e ao mesmo
tempo apresentar a minha visão do esoterismo que decorre não só dos meus estudos
académicos, como também dos meus interesses e da minha vivência pessoal nestes
mundos – cada vez mais a aproximação “reflexiva” e autobiográfica está presente nos
estudos actuais das Ciências Sociais e Humanas.
Agradeço por fim à Editorial Arranha Céus a publicação deste livro e a paciência
com que esperaram por ele, mas não só continuo a ter uma vida muito ocupada como
os anos vão cada vez mais pesando… Felizmente que tive a possibilidade de ter livre o
mês de Agosto deste ano e dediquei as minhas “férias” a escrever este livro, grande
parte de memória, já que o conteúdo destas aulas, com dois cursos por ano nos últimos
5 ou 6 anos, estão bem presentes no meu espírito.
Notas:
3 – Uma vez que estão esgotados os meus livros sobre a Quinta da Regaleira (em
2ª. Edição) e sobre o Esoterismo de Fernando Pessoa (em 3ª. Edição) decidi incluir as
ideias essenciais do primeiro, tendo dado mais espaço ao esoterirmo pessoano pois
Fernando Pessoa foi um profundo conhecedor e entusiasta das diversas correntes do
esoterismo, sendo interessante fazer uma revisitação a estes temas pela visão genial –
ao mesmo tempo histórica e mítica - do Poeta; sobre o esoterismo pessoano daremos
conta da nossa perspectiva actualizada, ultrapassando algumas dúvidas iniciais, face às
importantes descobertas de jovens investigadores da “arca de Pessoa”, especialmente
Jeronimo Pizarro e Stephan Dix.
- Introdução
Bibliografia
Bio-bibliografia do autor
Iª. P A R T E
- O que é o esoterismo?
Esoterismo é uma palavra que indica “interior”, por contraste com exoterismo
que remete para o exterior, logo doutrina interna, reservada a alguns, os “iniciados”,
por oposição aos “profanos”, comunicada, discreta ou secretamente – “sub rosa”, sob o
silêncio iniciático, que transcende o silêncio profano -, aos membros ou discípulos dessa
organização ou corrente, através de uma linguagem simbólica e mítica.
Podemos avançar, desde já, com a aproximação de Jean-Pierre Laurent (cf. “Le
regard ésotérique”), para o qual o esoterismo é uma doutrina interior acerca da
constituição oculta do Homem, da Natureza e do Cosmos, nos diversos planos da
realidade.
Mas, vejamos de seguida as definições mais estruturadas, que têm feito carreira
na abordagem académica do tema – a chamada esoterologia. No que diz respeito à
doutrina, temos duas definições principais, a de Faivre e a de Riffard:
Definição de Antoine Faivre (cf. “L’Ésotérisme”, 1ª. Edição, 1992, 5ª. Edição,
2012; já foi publicada uma edição em português).
Este académico (agora jubilado) da École Pratique des Hautes Études/ Section de
Sciences Réligieuses (Sorbonne) – meu amigo e mestre que já tive a oportunidade de
convidar para dois colóqiuios em Portugal, ambos sobre o Esoterimo em Fernando
Pessos, um no ano de 2000, em Cascais e o outro na Casa Fernando Pessoa, em 2008 -
,estruturou o conceito de esoterismo assentando-o em quatro componentes principais,
a saber:
Para além das quatro características principais, a definição de Faivre apresenta mais
duas características acessórias:
- O número e a sua simbólica; a simbólica dos números e das letras não existe
apenas na cabala hebraica e é um processo cifrado para conservar e comunicar
conhecimento
- As artes e as ciências ocultas e a hermenêutica; desde logo a hermenêutica, a
interpretação das coisas – hermenêutica, de Hermes, o instrutor e o mensageiro dos
deuses – e artes e ciências ocultas para ocultar os conhecimentos àqueles que não estão
preparados para os receberem
No que diz respeito, já não à doutrina (de que ocupam as doutrinas anteriores),
mas sim à estrutura do grupo esotérico, há que considerar a definição (estrutural) de
Olaf Hammer (“Claiming Knowledge. Strategies of Epistemology from Theosophy to the
New Age”, 2001), para o qual o esoterismo, com as partições iniciados/profanos,
conhecimento reservado/conhecimento aberto, etc., assegura um poder simbólico ao
grupo, ao seu líder e seus membros, reforçando ao mesmo tempo a coesão do grupo
face à sociedade exterior - comportamento que poderíamos denominar de “sectário” e
que não é, na sua forma extrema, típico de todos os grupos esotéricos.
Não posso deixar de dizer que a definição de esoterismo mais aceite pelo mundo
universitário, a de Faivre, está muito centrada na perspectiva hermetista e alquímica do
esoterismo. E – porque sou discípulo que o respeita e o admira muito, mas que guarda
a sua independência intelectual - ouso incluir e explicitar nela, sem a contradizer, mas
em homenagem ao Mestre, a dimensão gnóstica, a outra coluna do esoterismo
ocidental, particularmente no que diz respeito a dois temas fundamentais:
Por outro lado, faremos ainda referência a símbolos e mitos, pois se é verdade
que nem todos os mitos e símbolos são esotéricos, também é verdade é que alguns o
são explicita ou implicitamente, tendo havido ao longo dos séculos interpretações
esotéricas deles – darei como exemplo as obras setencentistas “Fables égypciennes et
grecqes” e “Dictionnaire mytho-hermétique” do Abade Dom Pernety, dando apenas
dois exemplos portugueses: os mitos do Sebastianismo e o Quinto Império que em
Portrugal tiveram leituras esotéricas, alquímicas, como veremos.
As iniciações
Este caminho das iniciações através de símbolos e mitos foi o que Dionísio o
Aeropagita denominou de via positiva – por contraste com a via negativa, a via da
transcendência absoluta. A primeira, como salienta Arthur Versluis (op. cit., p. 11) está
ptesente nas tradições dos mistérios egípcios e os greco-romanos que lhe sucederam. A
“via positiva”, acrescentaremos, está ainda presente nas iniciações esotéricas ocidentais
e nos respectivos rituais elaborados ao longo dos séculos – rosacrucianos, maçónicos,
etc.
Nota:
Sigo assim Arthur Versluis (in Magic and Mysticism – an Introduction to Western
Esotericism, cap. I) – autor que Faivre me apresentou na Cidade do México em 1996, no
Coingresso da Academia Internacional das Religiões, que pela primeira vez incluiu uma
secção sobre esoterismo - o qual considera que as mais remotas “raízes das tradições
esotéricas ocidentais” são:
Falemos sobretudo das primeiras, mas em nosso entender é preciso referir que
existe uma ainda tradição anterior a esses Mistérios que os influencia, assim como
influenciará mais tarde, num plano simbólico, os “mistérios” das fraternidades
iniciáticas, tradição essa que é o Xamanismo.
RELIGIÕES DE MISTÉRIOS
- Mistérios de Osiris
Osiris é raptado pelo seu irmão Seth – no final de um banquete em que este se
propunha oferecer uma caixão finamente decorado a quem nele coubesse, sendo Osiris
o verdadeiro destinatário, pois Seth já lhe tinha tirado as medidas…Osiris- acaba por ser
morto pelos esbirros de Seth e o seu corpo dividido em 14 pedaços os quais foram
espalhados pelo Egipto – tema de decomposição que remete para o xamanismo das
origens. Foi Isis, irmã e esposa de Osiris que andou a recolher os 13 pedaços do seu
corpo, reintegrando-o de certa maneira – o Feminino integrador - mas faltando o 14º.,
o falo de Osiris, que simboliza a virilidade iniciática e também a fecundidade da “terra
negra” (Chem), o Egipto e as suas margens banhadas pelo Nilo.
- Eleusis/Demeter
- Dionísio
Dionísio – equivalente grego do romano Baco - foi morto pelos Titans que o
cortaram em 14 pedaços, conseguindo reintegrar o seu corpo, ressuscitando – outra vez
uma clara referência ao desmembramento xamânico e à
recomposição/reintegração/”ressurreição”. De notar o desmembramento em 14
pedaços em Osíris e em Dionísio e também, significativamente, que o processo sacrificial
do Deus-Filho Jesus o Cristo se desenrola em 14 estações da Via Sacra.
Os mistérios dionisíacos – celebrados nas montanhas, à noite e com archotes -
tinham uma clara raíz xamânica, e utilizavam o vinho para atingir os estados extáticos,
mas a importância dos tambores e do ritmo, dos canticos e dos gritos, da dança, das
corridas e dos saltos era decisiva para atingir esses mesmos estados. De salientar a
presença de um falo gigante que desfilava nesses mistérios numa carruagem e a
presença maioritária de mulheres, sendo conhecida a domensão orgiástica de alguns
mistérios, não numa dimensão profana (em que mais tarde caíram), mas num contexto
de evocação da força e da energia de Dionísio/Baco.
É evidente que a Magia pela qual o esoterismo se interessa não é essa magia das
sociedades primitivas e longínquas no tempo, no espaço e na cultura – estudada por
célebres antropólogos como Malinowski, Evans-Pritchard ou Griaule, entre outros, mas
sim a mais recente e com uma dimensão filosófica. Há, no entanto, uma zona de
transição entre esses dois universos, a qual merece a atenção do Esoterismo e dos seus
estudos (esoterologia), como por exemplo a magia caldaica e mesopotâmica, a magia
egípcia, a magia grega, a magia do hermetismo de Alexandria, a magia cristã copta, etc..
Astrologia
IIIº. CAPÍTULO
AS DUAS CULUNAS DO ESOTERISMO OCIDENTAL: Gnosticismo e hermetismo
- Orfeu
Orfeu é um herói que ama Eurídice a qual morre, “desce aos infernos”. Armado
de coragem espiritual e física, desencadeada pelo amor, Orfeu desceu aos infernos em
demanda da sua amada e conseguiu resgata-la parcialmente, mas não totalmente pois
ela olhando para trás, sofre uma segunda morte. Lembremo-nos o que sucedeu à
mulher de Lot que, por isso, ficou transformada numa estátua de sal. Lição: quando se
sai dos infernos devemos olhar para a Luz e abandonar as Trevas….
E na libertação da alma medita sobre cada coisa exercendo o teu juízo (…)
- Platão e os neo-platónicos
- GNOSE E GNOSTICISMOS
As correntes gnósticas são diversas e os seus principais nomes vão desde Simão
de Samaria – gnóstico não cristão -, a Valentino – gnóstico cristão.
Contra os gnósticos
Foi Justiniano quem escreveu o maior ataque contra os gnósticos não cristãos,
concretamente contra os “gnósticos licenciosos”. Os Padres da Igreja viam com maus
olhos as correntes gnósticas não cristãs e denunciavam as práticas orgiásticas dos
grupos radicais minoritários, fazendo-as passar por toda a Gnose não cristã. No célebre
texto de Justiniano ele refere que para além das orgias sexuais estes pequenos grupos
gnósticos extremos, tentando não trazer a este mundo mau mais seres humanos,
comiam os fetos.
A GNOSE CRISTÃ
HERMETISMO DE ALEXANDRIA
“Eis porquê, único de entre todos os seres que vivem na terra, o homem é duplo, mortal
pelo corpo, imortal pela sua própria essência. Imortal e soberano sobre todas as
coisas….”
“Porquê, oh homens nascidos da terra, vos abandonais à morte, quando vos é permitido
obter a imortalidade?... Afastai-vos da luz tenebrosa, tomai parte da imortalidade,
renunciando à corrupção”
“Pois o homem é um animal divino que deve ser comparado, não aos outros animais
terrestres, mas aos do céu que nós chamamos deuses. Ou melhor, não receemos dizer
a verdade, o homem verdadeiro está acima deles, ou pelo menos igual a eles….Assim,
ousamos dizer que o homem é um deus mortal e um deus celeste é um homem imortal”
“Não há nada mais divino e mais activo que o intelecto, nada de mais apto para unir os
homens aos deuses e os deuses aos homens. Feliz a alma que está plena deste intelecto,
infortunada a que está totalmente desprovida dele”.
“(Deus) está pois na matéria, meu pai? pergunta Tat a Hermes, ao que este responde: A
matéria, meu filho, está fora de Deus, se tu quiseres atribuir-lhe um lugar especial; mas
a matéria que não está posta em acção não será apenas uma massa confusa? E se ela
está posta em acção não será por meio das energias, e nós dissemos que essas energias
são partes de Deus. De quem recebem os vivos a vida e os imortais a imortalidade? O
que produz as transformações? Quer seja a matéria, corpo ou essência, essas são as
energias de Deus… Todo este conjunto é Deus e no universo não existe nada que não
seja Deus.”
- a crítica dos herméticos, optimistas, aos gnósticos, pessimistas, pois para estes o
mundo é uma obra má, ao mesmo que distinguem o Criador do Deus supremo.
IVº. CAPÍTULO
- O Nome de Deus/YHWH
- Bereschit/Génese
Ezequiel tal como Enoch e Elias transcendem a morte, ascendendo aos céus sem
passar por ela. A ascensão de Ezequiel aos céus num carro de fogo é tema de meditação
para uma imitação da ascensão luminosa, “em glória”, de cada um – a palavra “glória”
neste contexto, veio da Pérsia.
- Os Hekhaloth ou Palácios
Junto ao Mar Morto, em Qumram, foram descobertos logo a seguir à 2º. Grande
Guerra (por um pastor que perseguia cabras que se haviam perdido dentro de uma
gruta), rolos de cobre e em outros materiais, dentro de âmforas de barro, onde estavam
descritos as regras da comunidade essénia de homens e mulheres e os textos entre os
quais os do seu Mestre da Justiça. Os textos essénios são profundamente apocalípticos
e messiânicos e a regra da comunidade era ascética. Estes textos estão publicados e os
rolos podem ver-se no Santuário do Livro no Museu de Israel em Jerusalém. Note-se que
a Biblioteca gnóstica de Nag-Hammadi (Alto Egipto) também foi encontrada em
circunstâncias semelhantes no mesmo período (1945-46).
Foram vários os que, antes de Cristo e durante e depois da sua vida, fugiram das
cidades e foram para os campos, para o deserto. João Baptista foi um deles, mas não o
único. Coberto de pelas de cordeiro, alimentando-se de gafanhotos e de mel, este primo
de Cristo foi quem o baptizou, anunciando que “ele teria de diminuir para quo o outro
(Cristo) crescesse”. Alguns grupos religiosos – os primitivos baptistas, os mandeanos e
sabeanos do Iraque, Síria, etc. – consideram que o Baptista é que era o Mestre e que
Cristo era apenas um discípulo.
- Os Terapeutas de Alexandria
A Cabala hebraica
Trecho do S. Yetzirah
Trecho do Bahir
“Quais são as dez palavras (os dez “sefirot” de que fala o “Sepher Yetzirah”))? A
primeira é a Coroa (Kether) suprema, Bendita e Glorificada seja o Seu Nom (YHWH)
assim como o seu povo (Israel)… A segunda palavra é a Sabedoria (Hockmah)….
Trecho do Zohar
O primeiro deles é o:
Os quatro sentidos das Escrituras são: Peshet, o literal, cuja inicial é P; Remetz, o
sentio alegórico, com inicial R; Derasha, sentido talmúdico, moral, com inicial D; Sod,
sentido secreto, cuja inicial é D. Ora PRDS são as iniciais de Pardés, Paraíso, o que quer
dizer que quando lermos os textos sagrados unindo todos eles no último, no mais
profundo deles, atingiremos o Paraíso.
Vº. CAPÍTULO
- Gnose cristã
Um exemplo de gnóstico cristão do século IVª., heterodoxo – tendo pago por isso
com a vida, como veremos adiante no capítulo sobre o esoterismo em Portugal - foi
Prisciliano, Bispo de Ávila que toinha sido iniciado por uma mulher Agapê, que por sua
vez tinha sido iniciada por um gnóstico do Egipto, Marcos de Menfis. O prestígio de
Prisciliano como mestre cristão atingiu todo o Noroeste peninsular (incluindo o norte do
futuro Portugal), tendo proposto, entre outras coisas que adienante veremos, que a
leitura dos Evangelhos Gnósticos era tão importante como a dos Canónicos.
Vejamos então algumas passagens dos Evangelhos Gnósticos cristãos (da escola
valentiniana), descobertos a seguir à 2ª. Guerra Mundial, no Alto Egipto, em Nag-
Hammadi, tudo indicando que pertencesse à biblioteca de um antigo mosteiro copta da
região:
“Aqueles que dizem que o Senhor primeiro morreu e depois ressuscitou estão
enganados, pois ele primeiro ressuscitou, depois morreu. Se a pessoa primeiro obtem
ressurreição não morrerá…”
“Enquanto existirmos neste mundo devemos adquirir ressurreição, a fim de que ao
despirmos a carne nos encontremos em repouso e não entremos no ponto do meio,
pois muitos se perdem ao longo do caminho”
“Três mulheres costumavam andar sempre com o Senhor - Maria, sua mãe, sua irmã, e
a Madalena, que é chamada sua companheira. Pois Maria é o nome de sua irmã e de
sua mãe e é o nome de sua parceira”
“Mas o Reino está dentro de vós. E está fora de vós. Qundo vos tornardes conhecidos
de vós mesmos então sereis reconhecidos. E compreendereis que vós é que sois filhos
do Pai vivente”
”Seus discípulos disseram-lhe: Quando virá o Reino? (Jesus disse): Não é por ser
esperado que ele virá. (…) O Reino do Pai está espalhado pela terra e as pessoas não o
vêm”
“Além disso, Jesus tendo sido gerado de uma virgem mediante intervenção de Deus, era
mais sábio, mais puro e mais justo que todos os outros seres humanos. O ungido (Cristo),
combinado com a Sabedoria (Sofia) desceu nele e assim foi feito Jesus Cristo
Mas a maior parte das correntes gnósticas eram cristãs e não tinham esse tipo
de comportamentos “licenciosos” dessas correntes minoritárias que – Ofitas,
Carpocratianos, etc. Pelo contrário, as comunidades gnósticas cristãs, maioritárias a
partir do 3º. século, eram ascéticas.
Evangelho de Filipe
É este Evangelho que refere que “Jesus costumava beijar Maria…” (alguns
perguntam-se se na boca) o que dará pretexto a muita especulação – desde a mais
feliz à menos feliz… - sobre a relação entre Jesus Cristo e Maria de Magdala (localidade
junto ao Lago Tiberíades ou Mar da Galileia). Maria Magdalena, era sem dúvida uma
mulher extraordinária que Jesus admirava – ela foi a primeira testemunha da
ressurreição de Cristo, o que é altamente significativo da sua qualidade espiritual e da
sua proximidade com Cristo - e amava. Sabemos pelo Credo cristão que Jesus era
“verdadeiro Deus e verdadeiro Homem”, pelo que pessoalmente admitimos, sem
escândalo, que o Filho de Deus pudesse amar Maria também fisicamente.
Ev. Tomé
O ISLÃO e os 5 pilares
Quando o Profeta morreu, sucedeu-lhe Abu Bakr e depois Omar, Osman e por
fim Ali que deveria ter sido o primeiro – era casado com a filha de Maomeh, Fátima –
mas foi preterido perante a indignação dos seus partidários, os “shia”. Ainda maiores
motivos de indignação foram dados aos “xiitas” quando Ali assumiu o califado e foi
morto, pouco depois, juntamente com o seu filho Hussein. Todos estes acontecimentos
para além da indignação que geraram, provocaram uma cisão que perdura até hoje
entre os Sunitas (maioritários) e os Xiitas (minoritários); além disso anualmente nas
cidades iraquianas, santuários dos xiitas, já que contêm os túmulos de Ali e seu filho,
são celebradas até hoje o seus martírios, com procissões de fiéis flagelando-se com
objectos metálicos e deitando sangue das feridas neles próprios assim povocadas.
O Xiismo já admite uma interpretação das escrituras sagradas, isto é, para ele a
revelação corânica não está fechada. O Xiismo tem dois temas importantes: o imame
escondido, ocultado e o mahdi (uma espécie de messias)
- Al-Hallaj: proclamou a sua interioridade divina, “eu sou Deus” e por isso foi morto pela
ortodoxia muçulmana.
- Ibn’Arabi (natural de Murcia) foi considerado o Sheik Al-Akbar, o “maior dos Cheiques”
e deixou uma obra considerável que foi estudada magistralmente por Henry Corbin (cf.
“L’Imagination créatrice dans le Soufisme d’Ibn Arabi”). Arabi refere que aprendeu com
um livro do silvense Ibn’Cassi – que adiante referiremos.
Ibn´Cassi foi um herói libertador do povo do Sul daquilo que seria Portugal,
lutando contra os tiranos Almoadas, acabando por ser morto no Castelo de Silves com a
acusação de que era o “mahdi dos cristãos”, ele que segundo a tradição promovia o
chamamento para a oração de 6ª. F Santa do Islão, numa dimensão ecuménica, através
de duas personagens no minarete, Jesus e João Baptista. A sua morte trágica e
extremamente injusta para os seus seguidores deve ter deixado nestes a esperança de
que ele regressasse não como o mahdi do fim dos tempos mas como um mahdi
intercalar. Em nossa opinião a morte de Ibn’Cassi e a esperança do seu regresso é uma
das raízes do nosso sebastianismo – mas uma raíz histórica, ao contrário das raízes
céltica e judaica que também devem ser consideradas.
Há um enigma histórico em torno deste grande rei e sufi pois enquanto que os
livros muçulmanos coevos afirmam que D. Afonso Henriques, o “Ibn’ Anrique”, lhe
ofereceu um cavalo, uma lança e um escudo, nenhum dos livros cristãos menciona esse
eventual e subtil gesto de oferta de uma aliança entre o rei de Portugal e o rei de Silves
contra um inimigo comum, os Almoadas.
- Rumi e os Mawlanyia
Rumi – conhecido como o Mawlana - nasceu no Afeganistão mas veio com o seu
pai para ocidente instalando-se por fim na Turquia onde fundou a confraria dos
Mawlanyia. Esta confraria tem uma vertente de música e dança sagradas que é praticada
pelos Derviches rodopiantes, a qual pretende simular a dança das esferas cósmicas e a
harmonia e a energia do Cosmos com a qual devemos estar em sintonia. A sede da
Confraria é em Konya, na Turquia central.
Atribuem a Rumi a seguinte história: quando ele era jovem apaixonara-se por
uma bela rapariga, mas sendo ele muito tímido, não tinha coragem para lhe dirigir a
palavra, até que um dia transcendendo a sua timidez bateu à porta da casa da jovem na
esperança de a ver e de lhe falar. Bateu e logo ouviu a sua voz feminina que perguntou
“Quem bate?” ao que ele respondeu: “Eu sou Ibn’Arabi e gostaria de falar um pouco
contigo”, mas a porta não se abriu. Anos mais tarde e tendo crescido espiritualmente,
ele regressa e decide saber se ela ainda estava viva pois gostaria de a rever. Bateu,
então, à porta e uma voz feminina perguntou “Quem é?”, ao que ele respondeu “Eu,
que sou tu” e a porta abriu-se finalmente ao fim de tantos anos de aprendizagem
espiritual.
- Nashroddin
O Dihkr (Zihkr)
- Magia
Tem uma vertente, que á a sua origem, popular, rural e arcaica que é estudada
pela antropologia e a etnologia e outra, erudita mas também antiga, mais ligada ao
universo das religiões e da filosofia. Pode ser individual ou colectiva, benéfica ou
maléfica.
- Alquimia
Na Idade Média a maior parte dos textos alquímicos referem-se a uma prática
laboratorial de evolução da matéria através do despertar do “fogo secreto” contido no
seu interior. Para isso alguns sais serão adicionados à matéria primeira da Obra, a fim
de captarem o Espírito Universal.
- Astrologia
Há quem afirme (p.e., Robert Ambelain) que estas corporações cristãs medievais
de construtores tinham como antecedentes os Collegia Fabrorum romanos e as
Confrarias de ferreiros do Monte Sinai.
- Os Templários
É de referir que a ordem papal – e nessa altura havia dois papas, o de Roma que
o rei de França declarou como herético (!), e o de Avignon que era seu familiar e que
por isso o rei controlava, apesar dos esforços deste papa -, ordem de proibição dos
Templários, não foi cumprida pelo rei de Portugal, D. Diniz, esse grande Rei, nem em
Castela nem em Aragão. Os três reis da Península decidiram não acatar a ordem do Papa
e pedir a constituição de novas Ordens que substituíssem a do Templo. Em Portugal foi
a Ordem de Cristo que se constituiu em 1318 e que teve sede nos seus primeiros
quarenta anos, não em Tomar mas em Castro Marim, regressando sim a Tomar
posteriormente.
De notar que D. Diniz, para além de ter mandado plantar o Pinhal de Leiria – que,
para além de fixar as areias, daria madeira para a construção naval – contratou um
almirante genovês, Pessanha, ainda nós não tínhamos uma frota naval. A tradição diz
que vieram, na noite da prisão dos templários em França, alguns barcos templários da
frota que estava fundeada em La Rochelle, uns para Portugal, outros para a Escócia. Uns
dizem que o tesouro dos templários – outra tradição que não deixa de estar presente
em Tomar com a história de uma certa “louca”, referida por Maurice Guingand em “O
Tesouro dos Templários – Tomar ou Gisors?” - que mais provavelmente veio para
Portugal terão sido as cartas de marear da frota templária que navegava no Atlântico
norte e no Mediterraneo.…
De notar ainda que a Ordem de Cristo – que contou como Mestres como Rodrigo
Anes, Gil Martins, entre outros - teve um período de ouro em Tomar com a
administração do Infante D. Henrique que, congregando as competências técnico-
científicas e financeiras das outras comunidades, a judaica - em Tomar havia a Judiaria
e ainda há a Sinagoga, a mais antiga de Portugal - e a muçulmana, ambas com os seus
cartógrafos, navegadores e financeiros, planeou a empresa dos Descobrimentos. Cada
caravela era capitaneada por um Cavaleiro da Ordem de Cristo (nunca houve muitos, o
seu número nunca ultrapassou os cem).
Infelizmente no começo do século XVI, D. João III (que sucedeu a D. Manuel I),
ordenou a Frei António de Lisboa que procedesse a uma reforma da Ordem de Cristo,
que consistiu numa “castração” da mesma (a expressão é de António Quadros em
“Portugal, Razão e Mistério”), passando os monges-guerreiros a serem apenas monges,
rejeitando a acção e centrando-se exclusivamente na comtemplação e na oração. Além
disso, na senda de um Filipe o Belo, dando corpo a um indisfarçável ódio pela Ordem do
Templo, mandou retirar os túmulos dos Mestres dos Templários portugueses que
estavam sepultados na Igreja de Santa Maria do Olival (ou dos Olivais), ainda em Tomar,
do outro lado do rio Nabão., que era um verdadeiro panteão templário. A única lápide
tumular que subsiste é é a de Gualdim Pais, mas entretanto e recentemente, uma
organização templária, a Templanima, numa bela homenagem, decidiu colocar nesta
Igreja uma placa metálica com os nomes dos Mestres templários que lá estavam
sepultados
Há uma anedota histórica que é referida amiúde e que nos conta que um cruzado
ao chegar a uma vila ou cidade cátara terá perguntado ao Bispo que acompanhava a
tropa: “Eminência dizei-nos, de entre a população, quais são os cátaros para que
podermos prendê-los ou mata-los? Ao que o bispo respondeu: Mata-os todos, Deus
reconhecerá os seus!”.
- Os Fiéis do Amor
As Cantigas de Amigo têm a ver com este universos e dentre elas lembremos
uma de D. Dinis, com o seguinte trecho:
“Leonoreta fin roseta bela sobre toda a flor/ fin roseta não me meta em tal coi
vossa amor…”
Leonor de Aquitânia era uma Fiel do Amor e organizava na sua corte saraus de
poesia trovadoresca e Cortes do Amor, provas de amor em que os amantes eram
julgados e condenados, se não amavam devidamente as/os suas/seus amadas/os.
- A Demanda do Graal
VIIIº. CAPÍTULO
Este autor retoma o tema do Deus interior, tão caro à Gnose toda ela e ao
Cristianismo gnóstico em particular, e que S. Paulo foi o primeiro a afirma-lo no Novo
Testamento, “o Cristo em nós”, promessa da ressurreição espiritual que está acessível
ao Cristão.
Assim, Ângelus Silesius proclama (ver versão portuguesa intitulada “A Rosa sem
porquê”, traduzida, entre outros por José Augusto Mourão), numa grande e salutar
provocação:
“Que te importa a ti que Cristo nasça mil vezes em Belém, se ele não nascer uma
vez que seja no tu coração?”
- Jacob Boheme,
A Rosa-cruz histórica
“Não tínhamos ainda visto o cadáver de nosso Pai prudente e sábio. Por isso
afastamos para um lado o altar. Então pudemos levantar uma chapa forte de metal
amarelo, e ali estava um belo corpo célebre inteiro e incorrupto (…), e tinha na mão um
pequeno livro em pergaminho, escrito a oiro, intitulado T., que é, depois da Bíblia, o
nosso mais alto tesouro nem deve ser facilmente submetido à censura do mundo”
- os Rosa-cruz deviam reunir-se pelo menos uma vez por ano, na Quinta-feira Santa, na
Casa do Espírito Santo – expressão que revela a importância que a Terceira Pessoa da
Trindade cristã tinha para eles;
- os seus textos referiam por vezes a esperada vinda de Elias Artista, uma espécie de
Paracleto que viria tutelar a transmutação da sociedade, da natureza e do Cosmos.
Lema da Rosa-Cruz:
Sem que existisse uma organização mas apenas pessoas que aderiram ao seu
ideal, a Rosa-Cruz expandiu-se muito por acção de uma inteligente, mitificadora e subtil
propaganda. Essa expansão desenvolveu-se sobretudo nos meios intelectuais
protestantes mais ligados ao esoterismo. Em Paris surgiram cartazes afixados nas ruas
que diziam; “Nós, o Colégio invisível da Rosa-Cruz…”. Na Alemanha temos um grande
nome como o médico e alquimista Michael Maier, médico do Imperador Rudolfo II, de
Praga. Em Inglaterra Robert Fludd foi um dos eminentes seguidores desta corrente, mas
devemos destacar um “antiquário” inglês – pois estudava as tradições antigas, havendo
mesmo a Sociedade dos Antiquários -, Elias Ashmole de seu nome, que foi um dos
primeiros maçons aceites em Lojas operativas (as do pedreiros).
- Emanuel Swedenborg
A sua obra “A nuvem sobre o Santuário” (17…) afirma a existência de uma Igreja Interior,
no seio do Cristianismo e a possibilidade de desenvolvimento de um órgão de visão
espiritual interior ao homem, o “sensorium”, para acesso a realidades espirituais.
IXº. CAPÍTULO
- Origem templária – aqui ainda é mais difícil estabelecer uma ligação histórica
entre estes e os maçons modernos. No entanto é de referir que por vezes em tempos
medievais os templários foram patrocinadores de obras sagradas e outras construídas
por corporações de pedreiros. Mas a única pista que se encontrou, segundo temos
conhecimento, foi a presença do esquadro e compasso (para além da cruz templária e
da espada) em túmulos templários no cemitério de Kilmartin na Escócia. De resto
quando o Cavaleiro Ramsay afirma que os “cruzados” são os “antepassados” dos
maçons modernos, trata-se apenas do desejo de filiação espiritual com uma instituição
tão prestigiada como foi a Ordem do Templo. E o facto de os templários terem sido
extintos pela Igreja Católica não trazia nenhum problema para os criadores da
maçonaria, em grande parte protestantes – só a partir de meados do século XVIII é que
muitos maçons tiveram cuidado com esse problema, devido à entrada de muitos
católicos (alguns dos quais sascerdotes), como por exemplo a Estrita Observância
Templária do Barão Carl von Hund e o Regime Escocês Rectificado dos alemães Duque
de Brunswick e Príncipe Carlos de Hasse-Cassel e os católicos franceses Jean-Baptiste
Willermoz e Joseph de Maistre que incluíam muitos católicos nas suas fileiras. O Prof.
Ferrer-Benimelli, jesuíta e historiador refere, na sua obra “Les archives secrets du
Vatican et de la Franc-Maçonnerie”, a existência de milhares nomes de padres e monges
católicos, maçons, desde meados do século XVIII até à Revolução francesa, incluindo em
Abadias como a de Citeaux (França) e a de Melk (Áustria)
A dimensão social do iluminismo inglês assenta quer nos “Bill of Rights” quer no
“Acto de Tolerância”, documentos que asseguravam os direitos dos cidadãos e dos seus
representantes no Parlamento – e isto em 1691, cem anos antes da Revolução francesa!
Portanto, promovendo a “virtude social” e a crença em Deus – qualquer que fosse a
ideia que tivéssemos dele – a maçonaria nascente em começos do século XVIII foi um
factor de progresso social e da democracia, de tal modo que Voltaire e Montesquieu
viveram refugiados vários anos em Inglaterra, na altura país do “progresso e das luzes”,
pois pelo contrário a grande França da cultura não o era no domínio político-social, com
a sua monarquia absoluta, era pelo contrário e simbolicamente um país das “trevas”.
Desde logo em França, onde se constituiu a Grande Loja de França que nas
vésperas da Revolução Francesa tinha como Grão Mestre o Duque Philippe de Orléans,
o “Filipe Égalité” que será uma das primeiras vítimas da guilhotina. É importante dizer
que a primeira Revolução Francesa, a de 1789, corresponde aos ideais da maçonaria e
nela se empenharam os maçons. Já a época do Terror, também chamada de segunda
Revolução Francesa, a qual começa em 1791, a maçonaria é perseguida e dizimada por
ultra-revolucionários radicais e intolerantes.
Maçon foi sem dúvida Wolfgang Amadeus Mozart que foi iniciado numa Loja de
Viena de Àustria – a mesma a que pertencia o nosso Gomes Freire (que no registo ou
quadro de loja aparece com o nome de Gomes Freire de “Entrada” e também com a
denominação de Conde e de Comendador da Ordem de Cristo, enquanto que Mozart
aparece como “Capelmeister!). Em Viena aparece depois um segundo Telles da Silva,
Duque de Tarouca, filho do primeiro que já referimos e que sendo amigo do Marquês
de Pombal, este o vai visitar na sua Loja. Ora o Marquês parece ter sido iniciado quando
era Embaixador em Londres numa Loja da City (onde estavam homens da indústria, com
os quais ele terá aprendido algo de útil para o desenvolvimento da indústria portuguesa,
quando foi primeiro ministro de D. José I) e iniciado pelo próprio Príncipe de Gales da
época, segundo refere Daniel Ligou no seu “Diccionaire de Franc-Maçonnerie”.
Em Portugal a maçonaria entrou nos anos 20 do século XVIII através de duas lojas de
estrangeiros (ingleses, escoceses, irlandeses, franceses…), a Casa Real dos Pedreiros
Livres da Lusitânia, que reunia os católicos nos fundos de um restaurante na Rua dos
Remolares, ao Largo de S. Paulo, junto ao Cais do Sodré, em Lisboa. Os protestantes
reuniam-se numa outra loja, para os lados da Cruz-Quebrada, perto de Algés, cuja
denominação se desconhece mas que era chamada pela Inquisição a “Loja dos hereges
mercadores”. Eram sobretudo comerciantes, padres e monges que integravam esses
lojas, mas também e progressivamente oficiais dos regimentos ingleses estacionados
em Portugal. Em diversas alturas a repressão exerceu-se sobre os maçons que viviam
em Portugal, tendo havido um caso célebre e dramático acontecido com Jean Coustos
que foi preso e condenado pela Inquisição tendo dado relato do seu sofrimento num
livro publicado em Londres – de que existe um exemplar da edição original no Museu
do Grémio Lusitano, no Bairro Alto, em Lisboa. No domínio das lojas militares, saliência
ainda para as lojas que o oficial prussiano e maçon, o Conde de Lippe – que veio a
Portugal reformar o exército português e dar-lhe um regulamento disciplinar –
estabeleceu dedsde Caminha até Elvas. Para além dos Tarouca, pai e filho, do Marquês
de Pombal e de General Gomes Freire de Andrade, foram tantos os nomes ilustres de
maçons portugueses que, no século XIX se perguntava quem é que não era maçon (assim
com hoje se pergunta quem é…). Destacaremos desde logo o Abade Correia da Serra,
natural de Serpa, secretário da Academia das Ciências e Embaixador nos EUA, tendo sido
iniciado em Filadélfia, e amigo e conselheiro científico (minas e florestas) do segundo
Presidente norte-americano, Thomas Jefferson – que não sendo maçon tinha grande
apreço pela Ordem – sendo visita de casa dele em Monticello na Virgínia, onde existe o
quarto onde ficava o “Abée Correia” (como era conhecido em França e noutros países).
Referência também para Hipólito José da Costa que figura na história do esoterismo do
século XIX – ver o segundo capítulo do livro de Joselyn Godwin, “The Theosophical
Enlightenment” – em virtude do seu livro, publicado em Inglaterra, “Sketches for the
History of the Dionysian Arttificers” (“Esboço para a História dos Artífices Dionisíacos”)
que se egastava da “egiptofilia”, quase uma “egiptomania”, do século XVIII e seguintes
– que considerava (e bem) o Egipto como origem de muita da nossa tradição religiosa,
mas não toda; exemplo desta “egiptofilia” é a sublime ópera iniciática A Flauta Mágica
dos Irmãos da mesma Loja de Viena, Mozart e Shikaneder, Da Costa sustenta no seu
livro que as nossas tradições filosóficas, religiosas e iniciáticas se radicam na Antiga
Grécia, particularmente nos mistérios dionisíacos – recordemos que segundo o mito
Dionísio morreu e ressuscitou.
Rémi Boyer, num livro que eu tive o prazer e a honra de prefaciar – “La Franc-
Maçonnerie comme voie d’éveil” -, afirma a necessidade de uma vivência iniciática em todos os
graus e em todos os ritos maçónicos. Nesta perspectiva é indispensável a aquisição de um
estado de Presença, de presença consciente aquando da prática ritualística em Loja, sem
o qual o rito não é transformador do maçon.
- a Estrita Observância Templária do Barão de Hund criado cerca de 1750 por iniciação
– segundo reza a tradição – transmitida pelos Stuarts, escoceses refugiados em França.
Trata-se de um rito maçónico templário. Embora extinta influenciou a criação de outros
ritos, de entre os quais o Regime Escocês Rectificado.
- O Rito Sueco
O Rito Sueco deriva da Estrita Observância Templária alemã e foi desde cedo protegido
pela Coroa, quer na Suécia, quer na Noruega, sendo o Rei também Grão-Mestre como
Carlos XIII da Suécia ou então alto protector da maçonaria, sendo Grão Mestre um
membro da família real. O rito sueco é estritamente cristão e templário, sendo o seu
último grau (11º.) apenas conferido ao rei.
- Rito de York
O rito de York espalhou-se com grande êxito pelos futuros E.U.A. sendo actualmente o
segundo rito em número de praticantes.
- Rito de Zinnendorf
É o rito que existe na Grosse Landslodge des Freimaurer von Deustchland (Grande Loja
National alemã) que é uma das cinco Grandes Lojas da Grande Loja Federal Alemã.
- O Rito Escocês Antigo e Aceite (“Scotish Rite”) que é o mais divulgado no muno, sendo
o primeiro mundial em efectivos e também nos EUA.,
- o Rito Francês que tem uma versão mais antiga, rosa-cruz, cristã e outra mais moderna,
descristianizada, mesmo dessacralizada;
- o Rito “egípcio” de Cagliostro (que esteve em Lisboa onde foi recebido na residência
do Conde de Sobral, ao Calhariz, tendo partido apressadamente pois arriscava-se a ser
preso por Pina Manique), rito mágico-alquímico, não cristão, mas sagrado no contexto
o Hermetismo e do Gnosticismo, o qual dará origem a dois ritos “egípcios” no século XIX
nas versões:
Xº. CAPÍTULO
Devido à pisão de Hipólito José da Costa e à apreensão, por Pina Manique, dos
documentos que ele trouxera de Inglaterra, os maçons portugueses voltaram-se para o
Grande oriente de frança, outra fonte de regularidade maçónica, e constituiram uma
obediência denominada de Grande Oriente Lusitano, cujo primeiro Grão mestre foi o
neto do Marquês de Pombal, o Juiz Sebastião Sampaio de Melo e Castro Lusignan.
Depois assumiu o Grão mestrado o General Gomes Freire de Andrade, o qual tendo sido
iniciado na Loja da Estrita Observância Templária de Mozart em Viena e recebido o 4º.
Grau de Mestre Escocês de Santo André na Loja de Lyon de Jean-Bptiste Willermoz,
fundador do Rito Escocês Rectificado, aparece depois como membro da loja militar
napoleónica dos Cavaleiros da Cruz – ele que era oficial do exército de Napoleão, no
contexto da Legião portuguesa – o que leva a supor que ele tivesse acedido ao 6º. Grau
do R.E.R., o de Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa (o 5º. Seria apenas um grau de
passagem, o de Escudeiro Noviço). O conflito entre franceses invasores do território
português, entre os quais havia vários maçons como por exemplo Soult e os ingleses
que estavam em Portugal auxiliando a Coroa portuguesa - de entre os quais havia
também mitos maçons ,entre os quais Beresford -,, mas que para alguns eram vistos
como tropa de ocupação, atinge a maçonaria portuguesa já que esta fica dilacerada
entre os dois partidos, a maior parte dos quais empenhados na resistência contra o
invasor, mas Gomes Freire está no epicentro desse conflito, sendo acusado de
conspiração e traição e em consequência disso é condenado e morto, juntamente com
outros oficiais. Refere a tradição que Beresford terá oferecido ao seu Irmão Gomes
Freire a possibilidade de fuga para escapar à morte, mas este recusou com aquele
espírito de honra e de militar que o caracterizava.
Nota: Referiremos em anexo uma cronologia da história da maçonaria em Portugal
continuando com o que aqui escrevemos e entrando nos séculos XIX e XX.
Não pode deixar de referis-se um rito português criado por Miguel António Dias,
o Rito Lusitano ou da Maçonaria Eclética, que celebrava ritualmente, nos seus mais altos
graus – Português e Perfeito Português –, o martírio de Gomes Freire.
Fundada no começo do século XIX por maçons do Grande Oriente de França esta Ordem
promoveu, logo no seu começo, cerimónias espectaculares em Igrejas em Paris, mas
para além destas características que a situam como uma “ordem de aparato” – que
permanece até hoje sob a denominação de OSMTJ, Ordem Soberana e Militar do
Templo de Jerusalém, ordem de grande dimensão internacional cujo Grão Mestre actual
é um português, D. Fernando Campelo de Sousa Fontes – estava associada a este
templarismo um joanismo, a Igreja Joanica dos Cristãos Primitivos, isto é uma Igreja
gnóstica que, cremos, terá desaparecido muito cedo, abandonando assim a Ordem de
Palaprat a sua dimensão esotérica.
Esoterismo ocultista
- Espelhos e bolas de cristal
Algum preferem chamar de “ocultismo” a este esoterismo do século XIX. Mas nomes
como Fabe d«Olivet – “La langue hébraique restituée” – , Eliphas Lévi (“A Chave dos
grandes mistérios”, “A Hisória da magia”, etc. - Saint-Yves d’Alveydre – com “La
Synarchie”, “L’Archéometre”, “Mission des Indes”, “Mision des ouvriers”, etc. – Stanislas
de Guaita – com “A Serpente da Génese” e a sua “Ordem Kabalística da Rosa-Cruz”
sendo típicos de uma tentativa de visão global do esoterismo que é mais sincrética do
que sintética, não deixam de ter uma presença destacada na história do esoterismo. No
final do sélo XIX tremos de acrescentar Papus (Dr. Gérard d’Encausse) que animou o
Martinismo nessa mesma perspectiva, formando a Ordem Martinista.
- A Sociedade teosófica de Helena Petrovna Blavatsky
Em 1877, a russa Helena Petrovna Blavatksky fundou em Nova Iorque, com o seu
companheiro, o Coronel Olcott, a Sociedade Teosófica, com o objectivo de estabelecer
um núcleo comum de todas as religiões e de todas as raças, desenvolver as
potencialidades ocultas do homem e aproximar a Ciência da Religião.
grande viajante (Europa, Egipto, Índia, Tibet e América do Norte) e uma incansável
estudiosa das Tradições espirituais da Humanidade. Em 1875 ela funda em Nova Iorque,
juntamente com H.S.Olcott e W.Q. Judge, a Sociedade Teosófica (S.T.) que, mais tarde,
mudará a sua sede para Adyar (Madras), na Índia, em 1883 e cujos objectivos (traçados
em 1886) são:
pela sua obra “Isis sem véu” (1877), vai dar origem a uma doutrina orientalizante,
viagem à Índia de H.P.B. e Olcott, em 1878. Desta segunda e última fase da doutrina
máximo.
espiritualidades “new age” foram influenciadas pela Teosofia, mito em particular o tema
instruem a Humanidade.
O caso Coulomb afectou Blavatsky pela injustiça e pelo vexame e teve nefastos ecos no
ocidente, de que salientaremos René Guénon, com o seu livro “La Théosophie, histoire
1
Sincretismo esse que iremos encontrar em correntes do “new age”, algumas fortemente influenciadas
pela teosofia de Blavatsky.
2
Não só Gandhi foi fortemente influenciado pela S.T., como a discípula e continuadora de Blavatsky,
Annie Besant, deu um importante contributo a esta luta, assim como à da emancipação da mulher.
d’une pseudo-religion” – preferido a denominação “teosofismo” à de Teposofia - e
Fernando Pessoa com textos do espólio – que se seguem ao seu grande fascínio inicial -
de reserva e de crítica face a Blavatksky, embora deixando escapar uma indisfarçável
admiração, como este: “Madame Blavatsky era um espírito fraldoso mas também é
verdade que recebera uma missão dos Suiperiores Incógnitos”.
Fundada em 1888, por esoteristas maçons britânicos – e nada tendo a ver com um actual
partido político grego neo-nazi com igual nome, “Aurora Dourada”- , esta Ordem
rosacruciana – pois pretende descender de documentos rosacruzes alemães de um
século antes – baseia-se na Cabala hebraica. De facto, esta rosacruciana e cabalística
Ordem Hermética da Aurora Dourada (“Golden Dawn”) foi criada por W.W. Wescott, W.
R. Woodman e S.L. Mc Gregor Mathers, tendo sido, mais tarde dirigida pelo célebre
escritor W. Yeats (1865-1939), mas veremos adiante quem foi A. Crowley (1875-1947)
que, neste domínio, mais influência terá tido em Pessoa - muio provavelmente, através
da sua organização a A.A..
Os seus Graus correspondem aos 10 sefirot da Árvore da Vida cabalística, um por cada
sefira, os 4 mundos
- O Raio flamejante é um exercício em que se visualiza um raio de luz e energia que vem
rapidamente das regiões superiores, não manifestadas, da Árvore da Vida, o qual desce
por todos os Sefirot até chegar ao mais baixo, Malkuth. Assim as partículas de luz
espalham-se na matéria obscura, permitindo a sua reintegração – Tikkun – posterior.
- O Caminho da Serpente da Sabedoria é um caminho inverso e mais lento do que o
anterior que parte de Malkut e ascende por todos os Sefirot até Kether, passando além
dele – como escreveu Fernando Pessoa, que recebeu esta tradição via a A.A. de Crowley,
no seu texto “O Caminho da Serpente”, “ (ela) quando chega a Deus não para, vai além
Deus…”. Esclareça-se que Pessoa não assenta o seu caminho serpentino na Árvore da
Vida, como a Aurora Dourada, mas sim num losango, embora com uma função simbólica
equivalente.
Será interessante referir uma das várias guerras entre ocultistas, ocorrida na
circunstância entre o grande poeta e futuro Prémio Nobel irlandês Yeats, que encabeçou
a resistência dos membros da HOGD contra a tentativa de Crowley – que eles não
achavam digno de pertencer e muito menos dirigi-la, devido às suas posturas
provocatórias, com incursões pela magia sexual - para tomar de assalto a Ordem.
Crowley, vai formar outra Ordem, a AA – Astrum Argenteum ou Silver Star (SS), com
ensinamentos semelhantes, embora num espírito diferente, de que Pessoa receberá
pelo menos um exemplar das circulares que eram enviadas aos seus membros (vide o
interessantíssimo “Um Encontro Magick – Fernando Pessoa/Aleister Crowley”, de Luís
Roza, na verdade Luís Miguel Rosa Dias, sobrinho do poeta). Isto prova que Crowley
iniciou Pessoa na AA.
XIº. CAPÍTULO
ESOTERISMO NO SÉCULO XX
Ordens neo-rosacrucianas
Correspondendo àquilo que os especialistas de esoterismo denominam de “3ª.
Rosa-Cruz” – depois da “1ª.”, com os Manifestos do começo do século XVII e da “2ª”.
Com a Ordem Rosa-Cruz de Ouro de finais do século XVIII – o começo do século XX
apresenta uma bo presença deste tipo de Ordens.
Aleister Crowley após ter falhado o seu plano de tomar de assalto a HOGD, com
a cumplicidade de McGregor Mathers, funda a A.A. – uma GD “thelemita”, já que a
Abadia de thelema de Rabelais era um dos seus modelos de comunidade livre – e
também uma ordem que se dizia neo-templária, a OTO – Ordo Templi Orientis que
conferia graus maçónicos de base, Aprendiz, Companheiro e Mestre e depois o de Arco
Real, Holy Royal Arch (o Sacro Real Arco de que fala Pessoa que o terá recebido de
Crowley), seguido de Rosa-Cruz e Templário. Este edifício iniciático – até aqui um
exemplo típico de uma “fringe freemasonry”, uma “maçonaria lateral”, como qualificam
os ingleses – era encimado por graus de magia sexual heterossexual, mas depois de
Crowley ter tomado conta da Ordem ele criou, segundo ele, um “nec plus ultra”
iniciático, um último grau de magia homossexual.
Ordens neo-templárias
- Os três grandes intelectuais do esoterismo: René Guénon, Carl Gustav Jung e Julius
Evola.
GUÉNON
JUNG
EVOLA
O italiano Julius Evola é tão conhecido pela sua dimensão de grande especialista
de esoterismo, como de adepto militante da extrema-direita (fascismo e cripto-
nazismo). Tendo escrito obras notáveis como “A tradição hermética”, “O Mistério do
Graal e a tradição imperial gibelina”, “A Metafísica do sexo”, “O Yoga tântrico”, Evola
escreveu também “Revolta contra o mundo moderno” e “Um homem entre ruínas” que
dão conta da sua postura ao mesmo tempo militante e angustiada de homem de
extrema-direita que o levou a Berlim, por solidariedade com Hitler, numa altura onde
era iminente a queda do nazismo, tendo Evola sido atingido por um bombardeamento
aliado que lhe provocou uma paralisia de que nunca mais recuperou
Paul LeCour foi o fundador, nos anos 30, da revista francesa “Atlantis” – “revista
de arqueologia tradicional” – que dura até aos nossos dias. Escreveu um livro que um
estudioso como o padre Jean Vernette (in “New Age”, Ed. Eiropa América) considera
que é um livro percursor do New Age, ao considerar – e a provar - que estamos a entrar
na Era do Aquário – recordemos a música do musical Hair (do começo dos anos 70), this
is the dawning of the Age of Aquarius, “esta é a alvorada da era do Aquário”.
Alice Bailey é uma teósofa na linha de Blavatsky que pretende fazer a síntese do
hinduísmo e do cristianismo. Anuncia no seu livro “O retorno de Cristo” que está para
breve esse acontecimento, assim como o regresso do Buda Maitreya. Propôs ainda a
criação de Tríades de oração para que esses “avatares” possam vir até nós e
manifestarem-se. Criou ainda a “Boa Vontade Mundial” para o mesmo efeito.
NEW AGE
O New Age – que nasce da contra-cultura dos anos 60 com a recusa e a crítica da
sociedade capitalista vigente e as suas dimensões militaristas (a guerra do Vietnam),
“Make love nt war”, “Peace and Love” -. não é uma corrente mas sim um conjunto muito
diversificado de espiritualidades, religiões e filosofias. O começo do New Age deu-se em
dois locais diferentes: em Esalen na Califórnia Nova Ciência defendendo e promovendo
a síntese da Ciência e Religião, o estabelecimento de uma Nova Psicologia que
favorecesse a “expansão da consciência” e em Findhorn na Escócia. Com o tema, posto
em prática, do regresso à Natureza, uma ecologia sagrada que vai ter desenvolvimento
futuroa como a Hipótese Gaia.
Estes dois movimentos cedo entraram em contacto entre s, sendo uma das
características do New Age, a formação de pequenas comunidades e o trabalho em
redes, pelo que para além da dimensão de psicologia e de ciência alternativas, o retorno
à natureza marcou profundamente esta(s) nova(s) corrente(s).
(quadro)
De todas as tipologias que pretendem fazer uma distinção mais fina no interior dos NMR,
i.e., entre as suas diversas manifestações, parece-nos que a apresentada na excelente obra
de Christopher Partridge, Encyclopedia of New Religions, – com prefácio de J. Gordon
Melton, da Universidade de Santa Barbara, EUA, que também esteve em 2000, em
Cascais, no Congresso sobre o esoterismo de Fernando Pessoa que eu organizei -, é a
mais adequada à descrição deste fenómeno complexo que são os NMR. Assim, nesta
tipologia proposta, teremos as seguintes divisões (seguida dos exemplos mais
significativos):
- NMR com raízes no Cristianismo: Mormonismo, Testemunhas de Jeová, Ciência
Cristã, Pentecostalismo da Unicidade, Igreja Universal de Deus, Igreja da
Unificação/”Moonies” (Coreia do Sul), Rastafarianismo, Igrejas Africanas Independentes
(África sub-sariana), Kimbanguismo (Congo ex-Zaire), Igreja do Senhor/Aladura
(Nigéria), Igreja Celestial de Cristo/Aladura (Benin), Igreja Cristã de Sião (África do Sul),
Templo do Povo do Ver. Jim Jones (EUA/Guiana), Ramo dos Davidianos (waco, Texas),
A Família/Meninos de Deus, Espiritualidade da Criação de Matthew Fox, Igrejas
Internacionais de Cristo/ICOC, Fraternidade de Jesus/Exército de Jesus, etc.
- NMR com raízes no Judaísmo: Movimento Lubavitch, Cabalismo (The Kabbalah
Learning Center, de Rav Berg, etc.), Aleph/Aliança para a Renovação do Judaísmo,
Judaísmo Reconstrucionista, Judaísmo Humanístico, Gush Emunim, Meshihistim, etc.
- NMR com raízes no Islão: Ordem Sufi Turca/ Odem dos Derviches Halveti-Jerrahi,
Ordem Sufi dos Naqshbandis Haqqani, Fé Baha’i, Movimento Internacional Sufi, A
Nação do Islão (de Louis Farrakhan, EUA), Subud, etc. 260
- NMR com raízes no Zoroastrismo: Mazdeísmo reformado, Filosofia Parsi, etc.
- NMR com raízes nas Religiões Indianas: Missão Ramakrishna, Brahma Kumaris,
Movimento Meher Baba, Sociedade Satya Sai Baba, Ananda Marga, MT/Meditação
Transcendental (de Maharishi Mahesh Yogi), ISKCON/Movimento Hare Krishna, Yogas
e Tantrismos diversos, Movimento Osho (ex-Rajneesh), Fundação Krishnamurti, Elan
Vital, do Guru Maharaji, NKT/Tradição do Kadampa, Shambala International, etc.
- NMR com raízes no Extremo Oriente: Tenrikyo (Japão), Soka Gakkai (Japão), Reiki
(Japão), Aum Shinrikyo (Japão), Taoismo moderno (Mantak Chia, etc.), Kyodan/Perfeita
Liberdade (Japão), Cao Daí (Vietnam), Falun Gong (China), Tai Chi (China), Artes
Marciais diversas, Meditação budista Chan/Zen, Feng Shui (China), etc.
- NMR com raízes nas Tradições indígenas e Pagãs: Cultos “cargo” (Melanesia,
Polinesia), Druidismo/Celtismo, Santeria/Regla de Ocha (Cuba), Umbanda (Brasil),
Candomblé (Brasil), Vudu (Haiti), Brujeria (México), Palo Maiombe (México), Igreja
dos Nativos Americanos (EUA), Xamanismos diversos (Castaneda, Michael Harner,
etc.), Wicca, Eco-paganismo, Heathenismo e Tradição Norse/ Paganismo germânico e
nórdico/Federação pagã, etc.
- NMR com raízes no Esoterismo Ocidental (EO) e nas Tradições “New Age”(NA):
a) EO: Teosofia cristã (Swedenborg, Jacob Boheme, etc.), Rosacricianismo (AMORC,
Rosicrucian Fellowship, Lectorium Rosacrucianum, etc.), Neo-templarismo (OSTS,
OTS, ORT, OCTCND, OVDT, OSMTJ, etc.), (Franco-) Maçonaria (Judaico-cristã,
Cristã, “egípcia”, etc., de Ofício, de Altos graus, Regular, liberal, etc.), Teosofismo
(Sociedade Teosófica de H.P. 261
Blavatksky, Antroposofia de Rudolf Steiner, Escola Arcana de Alice Bailey, etc.), outras
escolas: HOGD/Hermetic Order of the Golden Dawn, de W. Wynn Wescott, AA, de
Aleister Crowley, OTO/Ordo Templi Orientis, de Karl Kellner, Theodor Reuss e A
Crowley, Grupos Gurdjieff e Ouspensky, Igrejas Gnósticas, Satanismo (Igreja de Satã, de
LaVey, Templo de Set, de M. Aquino), Vampirismo (Templo do Vampiro), etc.
b) NA: Instituto Esalen (California), Fundação Findhorn (Escócia), Summit
Lighthouse/Igreja Universal e Triunfante, “O Curso de Milagres”, “A Profecia
Celestina”400, etc.
- NMR com raízes em Culturas Ocidentais Modernas: Espiritualidade centrada nas
Celebridades (Elvis Presley, Princesa Diana, etc.), Psicologias transpessoais (Stanislav
Grof, Pierre Weil, etc.), URANTIA, Ufologia (Raelianos, Heaven’s Gate, etc.), Controle
Mental de Silva, Igreja de Cientologia/Dianética de Ron Hubbard, Espiritualidades
Feministas, Movimento do Potencial Humano (Abraham Maslow), NLP/Programação
Neuro-linguística, Doofs e Raves, etc.
(fim do quadro)
Iiª. P A R T E
Ibn’ Cassi é o segundo grande nome da tradição esotérica no espaço que depois
foi Portugal. Nascido em Silves, descendente dos Cassius romanos peninsulares que,
sendo arianos, estavam em boas condições para aceitar a unicidade de Deus que a
conversão ao islão exigia. Convertido ao fatimismo ismaelita – não esqueçamos que o
Cairo foi sede do ilustrado Califado fatimida que se espalhou pelo Norte de África. Rei
do Sul do Alentejo e do Algarve de 1141 a 1151, Ibn’ Cassi foi também chefe de uma
confraria de monges-cavaleiros, os Muridines, os “discípulos” ou “adeptos” cuja sede
em Djilla, foi localizada recentemente em Arrifana, Aljezur, procedendo-se actualmente
a explorações arqueológicas pelo casal Varela Gomes.
A este propósito cite-se a acção dos monges de Alcobaça – Frei Bernardo de Brito
à cabeça - em torno de uma escola de (diremos hoje) propagando de muita qualidade,
em torno dos temas do Sebastianismo e do Quinto Império que deu à luz
sucessivamente ao longo de anos os volumes da “Monarquia Lusitana”..
(caixa)
A QUINTA DA REGALEIRA, OS MISTÉRIOS E AS INICIAÇÕES
A Quinta da Regaleira, com os seus jardins, poços, grutas e capela, sugere, através
da sua arquitectura nos jardins, fortemente, um percurso iniciático (simbólico ou real) que
une, de um modo coerente e evolutivo, os diversos locais simbólicos e míticos nela
presentes, na perspectiva da Iniciação aos Mistérios em geral e de diversas iniciações
esotéricas em particular: todas as que seguem esse «arquétipo», isto é, o de o caminho
que vai das Trevas à Luz.
Sendo a inspiração literária principal dos jardins a da Divina Comédia de Dante,
isto não exclui outras tradições religiosas, literárias e iniciáticas, também presentes - e de
que maneira! - na obra de Carvalho Monteiro e de Luigi Manini. A solução arquitectónica
dos jardins da Regaleira oferece uma estrutura universal onde assentam todas as outras
referências, como referi anteriormente no meu livro Os jardins iniciáticos da Quinta da
Regaleira (Ésquilo, 2ª. Ed. , 2006, cuja 3ª. Edição revista. sairá em breve), fazendo a
síntese do Cristianismo e do Paganismo e de diversas tradições esotéricas e inciáticas.
A Quinta da Regaleira em Sintra foi mandada construir na sua forma actual, de
1900 a 1910, por António Augusto Carvalho Monteiro (Rio de Janeiro, 1848 - Sintra,
1920) tendo tido como arquitecto o italiano Luigi Manini, natural de Cremona e cenógrafo
em S. Carlos, o Teatro lisboeta de ópera. Manini foi também o arquitecto do Palace Hotel
do Buçaco, mas se existe alguma semelhança entre o neo-manuelino de ambos os
Palácios, já nos jardins a diferença é notória quanto à dimensão simbólica e religiosa, a
saber, cristã-católica no Buçaco – com destaque para a sua interessantíssima Via Sacra,
infelizmente em muito mau estado - e ecuménica na Regaleira, onde o Cristianismo e o
Paganismo convivem harmoniosamente, de tal modo que os seus dois santuários, o pagão,
a Gruta de Leda e o cristão, a Capela “templária”, dizem por linguagens diferentes a
mesma verdade simbólica e mítica, isto é, que o Espírito divino fecunda a matéria e esta
vai gerar filhos: na Gruta de Leda, uma mulher, esta é fecundada por Zeus, disfarçado de
cisne - Zeus é o maior dos deuses do paganismo grego e é equivalente ao Júpiter romano
. e dará à luz os Gémeos, Castor e Pollux, De igual modo simbólico, o Espírito Santo – o
Espírito do Deus Pai – desce, sob a forma de pomba, sobre Maria, a Mater, a Matriz, a
Matéria que recebe o Espírito e dará à luz Jesus o Cristo, Filho de Deus. Uma diferença
é de assinalar entre ambas as tradições religiosas, pois enquanto que os deuses das
mitologias viviam na lenda e no mito, para o cristão Cristo encarnou e viveu entre nós
num história e numa geografia determinadas.
Ora, sendo o arquitecto dos Palácios do Buçaco e da Regaleira o mesmo e se no
primeiro caso há apenas revivalismo nacionalista e cristianismo católico, no segundo há
a registar elementos esotéricos e míticos quie passamos a enumerar:
- o hermético uroboros (serpente que morde a cauda) à entrada do Palácio da
Regaleira;
- um medalhão com o Pelicano alimentando os filhos, utilizado por fraternidades
iniciáticas cristãs, como os rosa-cruzes, também à entrada do Palácio;
- o gibelino e paraclético “515” de Dante, na sala da caça, encimando a figuração
do Milagre de Santo Huberto – e no centro do 515 , il messo di dio, está um monteiro
com uma arma e dois cães de caça, provavelmente dizendo que Carvalho Monteiro quis
deixar na Regaleira a sua mensagem, o seu testamento espiritual -, e nesta mesma sala a
Oriente está uma figura feminina, o Feminino iluminador, iniciador;
- as três Graças maçónicas, Força Sabedoria e Beleza no tecto do escritório do
proprietátrio no 2º. Andar;
- a referência simbólica ao culto popular do Espírito Santo numa varanda virada a
sul, no Palácio da Regaleira,
- a referência ao Encoberto que estava num grande cadeirão numa das salas do
rés-do-chão do Palácio e que o sebastianista Carvalho Monteiro reservava para o Rei que
há-de vir.
- o facto de na Sala dos Reis as efígies dos sobreranos portuguses terminarem em
D. João V, poderá significar que este seria o último a quem se poderia dizer que era o
Monarca do Quinto Império português – como aliás refere Anselmo Caetano Castelo
Branco no seu Tratado de Alquimia, ENNOEA.
- a presença de um forno no terraço do palácio que – omo asinali no meu primeiro
artigo sobre a Regaleira – poderia ser para secar as peças (conchas, borboletas, etc.) desse
grande coleccionador que foi Carvalho Monteiro, como para actividades espagíricas e
alquímicas.
A quinta da Regaleira tem pois duas componentes essenciais, o palácio neo-
manuelino – celebração da grande dimensão histórica e mítica de Portugal – e os jardins
– celebração das tradições religiosas, espirituais e iniciáticas que informaram, e informam
muito da cultura ocidental e que foram inspiradas por tradições anteriores vindas da
margem sul e oriental do Mediterrâneo, tradições essas que passamos a referir:
- Religiões de Mistérios, em que os deuses morriam e ressuscitavam: Osiris –
morto e cortado em 14 pedaços pelo seu irmão Seth -, Attis, Adonis, Dionísio – também
morto pelos Titans e dortado em 14 pedaços. De referir que o chamado Patamar dos
Deuses da Regaleira tem vários deuses da mitologia greco-romana: Mercúrio/Hermes,
Vulcano, Baco/Dionísio, etc. mas com referência também uma deusa Ceres/Deméter -
cuja filha foi arrastada pela os mundos inferiores pelo rei dessas regiões, Hadés, mas que
finalmente acabou por passar uma parte do ano debaixo de terra e a outra à superfície - e
um herói e semi-deus, Orfeu, que também desceu aos infernos em demanda da sua amada
Euridice.
- O próprio Cristianismo – a Quinta da Regaleira tem nos jardins uma Capela cristã
- em que Cristo, depois da Paixão – em 14 estações da Via Sacra -, “morreu, desceu aos
infernos, ressuscitou ascendeu aos céus onde está sentado à direita de Deus-Pai todo-
poderoso…”.
- Este arquétipo de descida e ascensão e de morte e ressurreição vai estar presente
na grande literatura de antanho, como as Metamorfoses de Ovídio, a Eneida de Virgílio e
a já referida Divina Comédia de Dante.
- Por fim, as sociedades iniciáticas – rosacrucianas, templárias, maçónicas, etc. -
criaram rituais de iniciação em que os neófitos viviam, simbolicamente, um processo de
morte e ressurreição. Dessas sociedades iniciáticas mencionaremos a presença
iconográfica, na Regaleira, de:
- Athanor (forno) alquímico nas traseiras da capela – uma torre com guela, “tour
de gueles”, torres rubra, torre ao rubro, sendo o Athanor o forno onde a matéria se
espiritualiza e o espírito se corporifica.
- Logo à entrada da Capela, por debaixo do coro, o Delta Radiante ou Triângulo
Luminoso maçónico, com a cruz templária (na versão da Ordem de Cristo), provável
referência a uma corrente maçónico-templária portuguesa. Em torno Delta encontramos
uma corda contornando o rectângulo, provável referência à corda que contorna o tecto
dos templos maçónicos e que simboliza a Cadeia de União universal, a fraternidade
universal.
- Cruzes templária, cruzes da Ordem de Cristo e pentagramas no chão da capela,
refeencia à tradição templária – note.se que a Igreja de Santa Maria do Olival em Tomar,
que foi panteão dos Mestres templários, tem um pentagrama à entrada e outro no interior
sob o altar. A cripta da Capela tem quadro janelas para a superfície com cruzes templárias
(na variante teutónica, referência à Estrita Observância Templária?) e o seu chão é o
ladrilhado branco o preto – o “xadrez do cjão ritual”, como escreve Pessoa num seu
poema -, o “ladrilhado maçónico” inspirado no estandarte templário, o Beaucéant.
- Para além do maior Poço iniciático ter nove níveis, simbolizando os nove círculos do
Inferno da Divina Comédia de Dante, não deixa de ser curiosa a coincidência de o grau maçónico
(13º. do REAA) de Cavaleiro do Arco Real de Enoch mencionar um conjunto de 9 câmaras
sucessivas, horizontais ou verticais (consoante os rituais), onde se desenrola a iniciação.
Para terminar esta breve incursão pelos mistérios simbólicos e míticos da Regaleira deve
referir-se que estas descobertas e indentificações que fiz nos primeiros trabalhoa partir de 1990
(inclusive) e que revelavam um enorme interesse por parte do proprietário e construtor (com
Manini) da Quinta, foram confirmadas quando me foi oferecido (por Paulo Pereira) o catálogo
da Biblioteca do Congresso, em Washington, sobre os manuscritos de Carvalho Monteiro, e onde
estão listados manuscritos sobre Alquimia, Sebastinismo, Quinto Império, Templários,
Maçonaris, etc.
Mas, não estaria completa uma referência à Quinta da Regaleira sem mencionarmos o
facto de nos poemas explicitamente esotéricos que Fernando Pessoa escreveu de 1930 até
1935, estarem referências, em nosso entender, explícitas à Regaleira - “Estalagem do
assombro”, “o muro da estrada”, “o xadrez do chão ritual” (a que asiste…) na cripta da capela,
o “atro poço”, os “degraus” do mesmo, etc. etc. E os poemas “Na Sombra do Monte Abiegno” e
“Do vale à montanha”, ambos de 1932 e o poema “O último sortilégio”, publicado na revista
coimbrã “Presença” nº. 29, de 1930, são em qualquer caso uma bela descrição da geografia e
da atmosfera simbólica e mítica da Regaleira, podendo ser também referências à sua dimensão
iniciática e mesmo ritualistica. Vejamos o poema “Eros e Psique” publicado na revista
“Presença”, n~.41/42 de Maio de 1934, em que o Poeta apresenta em exergue um trecho do
que ele nos diz ser o “Ritual do Grau de Mestre do Átrio na Ordem Templária de Portugal”:
Sonha em morte a sua vida,/E orna-lhe a fonte esquecida,/Verde, uma grinalda de hera.
Mas cada um cumpre o Destino -/Ela dormindo encantada,/Ele buscando-a sem tino/
E falso, ele vem seguro,/E, vencendo estrada e muro,/Chega onde em sono ela mora.
Não tens vestes, não tens nada: tens só teu corpo que és tu,
Teu corpo cessa, alma externa,/Mas vês que são teus iguais (…)
(poema sem data publicado na revista “Presença”, nº. 35, em Maio de 1935)
Salientemos que António Augusto Carvalho Monteiro morreu em 1920 e que em 1930
o seu filho Pedro já era proprietário da Quinta (embora com muitas dificuldades financeiras, de
tal modo que depois vende a Waldemar D’Orey) onde que provavelmente acolhia um pequeno
cenáculo iniciático, a “Ordem Templária de Portugal”, eventualmente maçónico-templária,
cenáculo que incluiria, além de Pedro Monteiro, Pessoa e o seu companheiro de andanças
esotéricas Augusto Ferreira Gomes (jornalista e autor do livro “Quinto Império” que o Poeta
prefaciou) e ainda Álvaro Ribeiro, nome importante da Filosofia portuguesa – que António
Telmo refere, em entrevista à revista “Ler”, aquele lhe ter dito que A. Ferreira Gomes era “o
companheiro de Pessoa da Loja do Arco Real”.
Mas, repito, a Quinta da Regaleira é fruto de dois espírito universais, o proprietário
Carvalho Monteiro e o arquitecto Luigi Manini, que souberam oferecer-no um verdadeiro
testamento filosófico, espiritual e iniciático, numa dimensão ecuménica onde convivem o
Paganismo e o Cristianismo e onde florescem diversas – não uma, mas várias - referências a
tradições literárias e iniciáticas.
(fim da caixa)
FERNANDO PESSOA
Mas é em Fernando Pessoa que o esoterismo atinge uma grande dimensão espiritual e
filosófica não só em muitos dos seus poemas (exiplicitamente naqueles escritos de 30 a 35, mas
implicitamente em outros anteriores), como também em vários textos do espólio – publicados,
entre outros, por Ivette Centeno e António Quadros. Este último, ensaiou uma periodização da
sua obra ensaística m três “estádios”: após um estádio filosófico que durará, segundo este
estudioso, de 1905/6 a 1915/6, começa, para Pessoa um estádio neo-pagão que durará até
1920, findo a qual começará um estádio gnóstico que acompanhará o poeta até ao fim da sua
vida, em 1935. (cf. António Quadros, Obras de Fernando Pessoa). A dimensão esotérica do Poeta
da “Mensagem” é tão grande, variada e profunda que ele merece neste livro um capítulo inteiro
– como mereceu da minha parte um livro, “Fernando Pessoa e os Mundos esotéricos” (Ésquilo,
Lisboa, 3ª. Edição, 2006) que espero reeditar brevemente, numa edição revista e aumentada.
AGOSTINHO DA SILVA
Também a ideia de Quinto Império cativou Agostinho da Silva que reviu e a desenvolveu
num plano espiritual, pois se para o Padre António Vieira - e também para o autor do Tratado
alquímico ENNOEA, Anselmo Caetano - esse Império era “imperial”, português e ctólico e não
poderia deixar de o ser na época, já para Fernando Pessoa o Quinto Império, uma vez perdido o
Brasil, era um império da Lingua portuguesa, “a nossa pátria é a língua portuguesa”. Ora
regressado do Brasil, para onde fora mandado por Salazar por motivos políticos – e onde foi
Professor universitário, ajudando a fundar universidades – depois da Revolução de 25 de Abril e
da Descolonização, o Quinto Império de Agostimnho da Silva é não imperialista, pois como ele
diz: “agora que já não temos Império material, podemos enfimconstruir o Quinto Império do
Espírito Santo”!
Não posso deixar de referir o que António Telmo refere em entrevista, relativamente à
ocupação do Mundo pelo Quinto Império português, projecto – financiado por um capitalista -
que levou alguns portugueses a Brasília para receberem a “ordem de marcha” dada pelo
Professor. Perante um mapa-mundi, Agostinho distribuiu as áreas geográficas a cada um, após
o que António Telmo (que iria segundo me lembro patra Granada) perguntou: “e o que teremos
de fazer?”. “Nada, absolutamente nada!” disse o “coordenador” do Quinto Império português.
“Basta estar nesses diversos pontos do globo e assim procederemos à ocupação quinto-imperial
do mundo”. Ora esta é outra clara referência ao esoterismo chinês, concretamente ao Taoismo,
pois a sua doutrina do Wu Wei, diz que “a mais eficaz das acções é a não-acção”. SE por um lado,
na Inglaterra de Cromwell os ultra-puritanos “Men of the Fifth Monarchy” andavam aos tiros,
mais tarde em Portugal planeava-se uma ocupação do mundo, pacífica, diremos mesmo,
poética…
Obras de Agostinho da Silva: “Um Fernando Pessoa”, “Sete cartas a uk jovem filósofo” e diversos
volumes de Ensaios.
NATÁLIA CORREIA
Poetisa, melhor, poeta, muito voltada para os temas simbólicos e míticos, numa
perspectiva heterodoxa, ela assume uma dimensão expressamente esotérica no seu magnífico
livro de poesia “Sonetos Românticos” e com as “Núpcias”, ambos claramente inspirados pela
alquimia.
LIMA DE FREITAS
estrangeiros de nomeada, alguns deles universitários como Gilbert Durand – para além dos seus
quadros exemplares da uma visão estética simbólica e mítica, incluindo temas como “O 515”, o
Prestes João, O Encoberto, O Jardim das Hespérides, etc., fez o resumo dos temas míticos,
simbólicos e esotéricos que estão presentes na tradição portuguesa, nos seus painéís “da
Estação do Rossio” (13 dentro da estação e mais 1 no acesso ao Metro), cujo conjunto é visita
de estudo indispensável para os que se interessam por estas dimensões. De entre estes temas
destacamos os que tem a ver com o culto do Espírito Santo, o Quinto Império e o Sebastianismo
e dois painéis de grande valor eotérico, um sobre o neo-pitagorismo de Almada e outro sobre
Outras obras: “515, o lugar do espelho” (tradução da edição francesa “515, le lieu du
ANTÓNIO TELMO
António Telmo ganhou notoriedade, merecida, pelo seu trabalho pioneiro, logo
a seguir ao 25 de Abril, o seu livro “A História Secreta em Portugal” – reeditado como
título de “O Horóscopo de Portugal”. Mas outros livros se seguiram, de entre os quais
“O Desembarque dos maniqueus na ilha de Camões”, “O Bateleur”, “A gramática secreta
da língua portuguesa”, “Filosofia e Kabalah”, “O Mistério de Portugal na História e n’Os
Lusíadas”, “Congeminações de um neo-pitagórico”, “A Aventura maçónica”.
- Dalila Pereira da Costa, mística portuense, destacou-se com vários livros que
aliam o mito e o símbolo ao esoterismo, dos quais destaco, para além do já citado
“Introdução à Saudade” (com Pinharanda Gomes), “O Esoterismo de Fernando Pessoa”
– o primeiro livro sobre este tema publicado ainda antes do 25 de Abril -, “A Nau e o
Graal”, “Da Serpente à Imaculada”
Adalberto Alves é um estudioso arabista que publicou vários livros sobre esta
tradição portuguesa, de entre os quais “O meu coração é árabe”, “Al-Mutamid: poeta
do destino”, “Portugal e o Islão iniciático”, etc. e o notável estudo sobre o sufi Ibn’Cassi
de Silves, com o título “As sandálias do Mestre”, publicado primeiro na Hugin e depois
na Ésquilo.
Paulo Loução, dirige a Editora Ésquilo, onde publiquei vários dos meus livros – e
é responsável também pela associação “Nova Acrópole”. Mais recentemente criou
ainda a Editorial Eranos. De entre a sua obra destacam-se livros sobre as raízes arcaicas
de Portugal e sobre os templários e os descobrimentos: “A Alma secreta de Portugal”,
“Os templários na formação de Portugal”, “Dos templários à Nova Demanda do Graal”,
“Portugal terra de mistérios”, etc.
Fiama Hasse Pais Brandão, destcada escritora e poetisa publicou nas páginas da
revista “História” alguns textos sobre história mítica portuguesa, dos quais destaco um
sobre a interpretação simbólica e esotérica das Capelas Imperfeitas da Batalha.
Luís Carlos Matos, co-fundador (com Jorge Matos) da revista Quinto Império é
autor de um livro sobre Maçonaria regular cristã.
O “Fecho da Abóbada”:
Como chamou a atenção Jorge de Sena (no “Diário de Notícias” de Março de 1957 e
depois no “Estado de S. Paulo” de Março de 1963 e no “Comércio do Porto” de Janeiro de 1964)
“O capítulo das relações e convicções esotéricas de Fernando Pessoa é, ainda hoje, com ser
fundamental, um dos menos compreendidos. Não é possível compreender-se aquilo que não se
toma a sério (…) É porém, indispensável tomarmos a sério, criticamente, aquilo que Pessoa
assim tomava. Porque grande equívoco é (…) não situar no seu contexto europeu um interesse
pelo Oculto que Pessoa partilhou com quase todos os grandes pares do post-simbolismo. Ele,
Yeats, George, Rilke, Milosz, e tantos outros, não podem ser compreendidos e valorizados, se
forem pudicamente amputados do que, com características várias, foi parte integrante das suas
visões do muindo” (citado por Vítor Belém in “O Mistério da Boca do Inferno”, p. 43). De facto,
é conhecido o interesse de vários escritores e artistas pelo esoterismo, Referiremos, de
passagem, Goethe, com o conto da “Serpente Verde” e o “Fausto”, Edward Bullwer-Lytton e os
seus livros “Zanoni” e a “Raça Futura, Yeats e a sua pertrença à H.O. Golden Dawn, os já
mencionados “ Salons de la Rose Croix” de Sâr Péladan com Èric Satie e Gustave Moreaux, a “Ars
Magna” de Oscar Milosz e ainda o interesse de nomes como Rimbaud, Baudelaire e Gérard de
Nerval (este com Voyage en Orient, Les initiés), os Surrealistas (Breton, Max Ernst. Kandinski,
etc.) e ainda obras como o “Golem” de Gustav Meyerink, “O Mago” de Sommerset Maugham,
“Aleph” de Jorge Luís Borges. etc., etc.
Esta importante faceta de Pessoa que dura quase a sua vida toda, de jovem adulto até
à sua morte, mereceu a atenção de livros de estudiosos como Dalila Pereira da Costa, António
Quadros e Yvette Centeno e de outros académicos como Teresa Rita Lopes, Robert Bréchon,
Manuela Parreira da Silva, Richard Zenith, Jeronimo Pizarro, Stephen Dix, etc. que publicaram e
estudaram os diversos temas que mereceram sucessivamente a atenção do Poeta: Espiritismo,
Astrologia, Teosofia, Gnosticismo, Hermetismo, Magia, Alquimia, Cabala, Rosacrucianismo,
Templarismo e Maçonaria, dando também atenção a mitos nacionais com ressonância esotérica
como o Sebastianismo e o Quinto Império. Para além dos poemas o Poeta escreveu trechos e
obras esotéricas, de grande interesse (mesmo que incompletas), como o “Ensaio sobre a
Iniciação”, “Átrio”, “Subsolo” e o notável “O Caminho da Serpente” – “o livro que não o é”… -
mas os poemas explicitamente esotéricos – onde a literatura se cruza com o esoterismo -
escritos entre 1930 (ano da visita do mago inglês Aleister Crowley a Lisboa, para o conhecer e
iniciar) e 1935 (ano da sua morte), como “O último sortilégio”, “Na sombra do Monte Abiegno”,
“Eros e psique” - -apresentanto em exergue um trecho do “ritual do grau de Mestre do Átrio na
Ordem Templária de Portugal” -, “No túmulo de Christian Rosencreutz”, “Iniciação” e “S. João”.
A TEOSOFIA EM PESSOA
A teosofia criada por HPB em 1875 (ver o nosso capítulo sobre o esoterismo no século
XIX) desempenha em Pessoa um papel de grande importância, pois é ela que - com a sua
concepção de um Tradição Primordial, núcleo comum a todas as tradições religiosas e iniciáticas
- vem sustentar, de algum modo, o neo-paganismo essencial de Pessoa, pois todos os deuses
são iguais quanto à sua dignidade espiritual, visto que têm um tronco comum. Por outro lado,
ao poder ser lida como um sistema ultra-cristão (como ele diz), é ela que curiosamente vai
permitir a Pessoa, a passagem do estádio neo-pagão para o estádio gnóstico, que começará em
1920 (utilizando as denominações de António Quadros - cf. Obra de Frnando Pessoa, Vol III).
Numa carta a Mário de Sá Carneiro, datada de 6 de Dezembro de 1915, escreve o Poeta,
em plena fase de fascínio pela doutrina blavatskiano: ”A (crise intelectual) que apareceu agora
deriva da circunstância de eu ter tomado conhecimento das doutrinas teosóficas (...) conheço a
essência desse sistema. Abalou-me a um ponto que eu julgaria hoje impossível (...) O carácter
extremamente vasto desta religião-filosofia (...) perturbou-me muito (...)”. E depois de ter
confessado que “cousa idêntica” lhe acontecera “há muito tempo com a leitura de um livro
inglês sobre “Os Ritos e os Mistérios da Rosa-Cruz”, Pessoa afirma que está perturbado ou
mesmo assustado (“hanté”) pela “possibilidade de que ali, na Teosofia, esteja a verdade real”.
Nessa mesma carta, Pessoa explicita a razão da sua perturbação ou “crise”, pois ao considerar a
Teosofia como um “sistema ultracristão - no sentido de conter os princípios cristãos elevados a
um ponto onde se fundem não sei em que além-Deus”, ela estaria em contradição com o seu
“neo paganismo essencial”. Mas, por outro lado, ao admitir “todas as religiões”, a Teosofia teria
“um carácter inteiramente parecido com o do paganismo que admite no seu panteão todos os
deuses”, o que constituiria “o segundo elemento” da “grave crise de alma” de Pessoa (ibidem).
É sabido que Pessoa critica posteriormente a Teosofia, mas deixemos esse tema para os
interessados que poderão encontrar elementos no meu livro “Fernando Pessoa e os Mundos
Esotéricos” (3ª. Ed.) e no meu prefácio à “Voz do Silêncio” de Blavatsky, traduzido por Pessoa e
publicado em Portugal prla Assírio e Alvim. Após essa crítica da Teosofia – e também da
mediunidade e do Espiritismo, quer numa quer noutra, com argumentos semelhantes aos que
Guénon expressa nos seus livros – Pessoa entra em peno estádio gnóstico, claramente o mais
interessante e fecundo sob o ponto de vista esotérico, “empenhando-se”, como escreve A.
Quadros, “a fundo, no estudo das chamadas ciências ocultas ocidentais” (ibid.), ito é esotéricas,
chegando ao ponto de se afirmar como cristão gnóstico.
No entanto, e apesar das reservas formuladas pelo Poeta-esoterista, muito do
pensamento doutrinário de Blavatsky persistirá em Pessoa, aflorando aqui e além nas suas
reflexões esotéricas posteriores. Desde logo, nos poemas “O Guardador de Rebanhos” e mais
tarde, por exemplo, no seu Ensaio sobre a Iniciação, onde o Poeta escreve que «o significado
real da iniciação é que este mundo visível em que vivemos é um símbolo e um sombra, que esta
vida que conhecemos através dos sentidos é uma morte e um sono, ou, por outras palavras, que
o que vemos é uma ilusão. A iniciação é o dissipar – um dissipar gradual e parcial – desa ilusão
(in Y. Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, op. cit, pp 60-61; o sublinhado é nosso).
Ora, esta doutrina do desvendar dos véus, que se encontra, é certo, no Ocidente, quer na Cabala,
quer na Gnose, em muito a ver, ate pelo modo como é exposta por Pessoa, com a afirmação do
Hinduísmo de que o mundo é maya (“ilusão”) – Hinduismo veiculado até ao Poeta pela teosofia
blavatskiana. Então poderemos dizer que, em Pessoa, apesar de Blavatsky, ainda Blavatsky, o
que se poderá aplicar também a muitos dos que, no campo do esoterismo, criticam e
distanciam-se desta mulher ímpar, não deixando, no entanto, de ser fortemente influenciados
por ela e pelas suas ideia, apesar de contraditória e polémica.
“Não tenho ambições nem desejos,…” – o “desapego” hindo-budista, que não significa
indiferença, é um dever, uma via do discípulo, um método iniciático.
“Creio no mundo como num malmequer,/ porque o vejo. Mas não penso nele/ porque
pensar é não compreender…/ O Mundo não se fez para pensarmos nele (…)/Mas paranolharmos
para ele e estarmos de acordo… - pensar, conceptualizar as coisas é não as compreender, pois
só a percepção directa delas nos dá esse entendimento.
Gnose e gnosticismo
A Gnose é um movimento religioso e iniciático do começo da nossa era, que
preconiza a salvação pelo Conhecimento. Não se trata de um Conhecimento intelectual
ou especulativo, mas sim de um Conhecimento espiritual que libertará o Homem e o
conduzirá aos planos divinos. Por vezes, utiliza-se (indevidamente) o termo gnóstico
para qualificar toda a corrente esotérica ou oculta, mas na realidade não se pode aceitar
essa denominação para identificar uma corrente hermética ou alquímica - o Hermetismo
e a Gnose são duas correntes contemporâneas mas distintas, mantendo, no entanto
algumas características comuns, sendo a primeira mais optimista que a segunda já que
admite a salvação do mundo através da sua espiritualização enquanto que a Gnose é
pessimista em relação ao mundo, já que só admite a salvação fora dele.
Fernando Pessoa afirmou o postulado gnóstico da Queda do Homem - Ser
espiritual, caído na Matéria e, portanto, estando nesse estado, dividido, separado,
exilado, afastado da “casa do Pai”, do mundo celestial de onde proveio e no qual ele era
Inteiro, mas para onde deve regressar -, quer em textos, como por exemplo, «O homem
não estava destinado a ser o que é: foi pela Queda que se tornou tal.» (in Teresa Rita
Lopes, Pessoa por conhecer, II, op. cit., p. 97). Mas Pessoa abordou também a temática
gnóstica em poemas como No Túmulo de Christian Rosencreutz: «Quando, despertos
deste sono, a vida, / Soubermos o que somos, e o que foi/ essa queda até Corpo, essa
descida/ Até à Noite que nos a Alma obstrui.» (F. Pessoa, op. cit., Vol.I, p. 1131), mas
ainda do poema sem data “Iniciação” mas publicado na revista “Presença” nº. 35, em
Maio de 1935: “O corpo é a sombra das vestes/Que encobrem teu ser profundo”. Clara
referência ao tema gnóstico da interioridade divina do homem é ainda o poema de
Pessoa datado de 1932 em que ele refere esse “germe da divindade”: “A Presença Real
sob o disfarce da minha alma presente sem intento”, “presença que pode ser
descoberta e revelada com a “técnica dos intervalos” (divisão da consciência, por
exemplo, mas também técnicas de meditação), como diz o Poeta (poema também de
1932): “Sou entre mim e mim o intervalo…”.
Além disso, ele declarou, no final da sua vida, num texto em tom anti-clerical
muito típico da época, que era «Cristão gnóstico, e portanto oposto a todas as igrejas
organizadas e sobretudo à Igreja de Roma. Fiel, por motivos que mais adiante estão
implícitos, à Tradição Secreta do Cristianismo, que tem íntimas relações com a
Tradição Secreta em Israel (a Santa Kaballah) e com a essência oculta da Maçonaria»
(in Quadros, op. cit. Vol. III, p. 461). Além disso, como refere Yvette Centeno, «Nos
documentos do espólio (ele) alude muitas vezes à via hermética que através da chamada
Igreja Gnóstica é transmitida aos Templários (Esp. 54-10). Esta é, para ele, a verdadeira
Igreja, e a via hermética, a verdadeira via». Mas esta estudiosa do esoterismo pessoano
acrescenta que «já na documentação publicada em Páginas Íntimas e de Auto-
Interpretação e Sobre Portugal, existem referências à Gnose e aos gnósticos» (Y.K.
Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, p.12), sendo um exemplo destes
textos, o seguinte: «Esta heresia não desapareceu nunca. Opressa, esmagada
exteriormente, essa seita de ocultistas tornou-se secreta, desapareceu da evidência
histórica, mas não da vida. Não é impossível encontrar, aqui e ali, evidência da sua
permanência secreta. E essa permanência oferece aspectos de conflito com o
cristianismo oficial e sobretudo com o católico. A par do cristianismo oficial, com os
seus vários misticismos e ascetismos e as suas magias várias, nós notamos,
episodicamente vindo à superfície, uma corrente que data sem dúvida da Gnose (isto
é da junção da Cabala judaica com o neoplatonismo) e que ora nos aparece com o
aspecto dos cavaleiros de Malta, ou dos Templários, ora, desaparecendo, nos torna a
surgir nos Rosa-Cruz, para, finalmente, surgir à plena superfície na Maçonaria (...)». -
aqui, Pessoa utiliza claramente a designação Gnose, quer para a Gnose antiga quer para
as suas manifestações tardias (gnosticismos diversos).
Alquimia e Hermetismo
A Alquimia é, como vimos, uma sabedoria tradicional (ciência ou arte sagrada) que
aspira à transmutação dos corpos por meio da sua espiritualização, com a concomitante
corporificação do espírito. Tem uma faceta laboratorial - a histórica - em que se pretende a
transmutação dos metais “imperfeitos” em ouro, por meio do pó transmutatório, e a elaboração
do Elixir da Longa Vida, ambos resultantes da Pedra Filosofal, a meta suprema da Obra
Alquímica. A Alquimia, mesmo na sua dimensão física, laboratorial, tem, pelas suas técnicas e
pelo seu simbolismo, uma dimensão sagrada, “espiritual”, que parece difícil separar da sua
dimensão “material”. O psicólogo Carl-Gustav Jung acentuou no entanto, na sua vasta obra, a
dimensão psíquica e espiritual da alquimia.
É muito rica a reflexão de Pessoa sobre a Alquimia (dada a conhecer em grande
parte por Yvette Centeno). A partir dos livros existentes na sua biblioteca, na sua maioria
de origem inglesa (Waite, Mathers) esperar-se-ia uma interpretação exclusivamente
“espiritual” ou “psíquica” da alquimia, aliás de acordo com as concepções da “Golden
Dawn” – e da sua equivalente Cowleiana A.A. criada por Crowley e mesmo da O.T.O.,
“Ordo Templi Orientis” que Crowley chefiou e transfomou e para a qual a alquimia seria
de cariz sexual.
De facto, esta interpretação da alquimia, claramente na perpectiva do
rosacrucianismo da Golden Dawn, existe em Pessoa. Por exemplo, ao referir os quatro
estados da Grande Obra alquímica - na qual, segundo ele, se verifica «a transmutação
do inferior no Superior, sem alteração...» (Esp.54-95), Pessoa refere que: «Os quatro
processos da Obra (são): 1) Putrefacção (...); 2) Branqueamento, a purificação do eu
inferior que se segue à putrefacção (...) branqueamento (que) significa a emergência do
eu superior e verdadeiro, depois de se ter afastado pela putrefacção o eu inferior e
falso; 3) gradação (...) conhecimento gradual do Eu superior. Esta é a verdadeira
iniciação, a obtenção gradual do conhecimento e da Conversação do Santo Anjo da
Guarda; 4) Rubificação, realização completa.» (Esp. 54A- 56). Reforçando esta
interpretação, ele refere noutro texto que na putrefacção, «o iniciado tem que morrer
para si mesmo, ou, antes, que morrer-se» (Esp. 53B-83). Então, para o Poeta, a alquimia
é, nesta perpectiva, «a transmutação do próprio homem», mas a essência e o segredo
desta operação realiza-se «por meio do contacto com os símbolos magicamente
carregados» (Esp. 53-13). E em consonância com isto – o “contacto” íntimo com os
símbolos e os mitos -, voltemos ao fragmento do espólio 53 A-25, onde escreve Pessoa:
«Um mito pode não ser verdade, mas ser verdadeiro (…) Nisto – em que um mito pode
ser Verdade – está uma das chaves da Alta M.(agia) A “alquimia” está nisto» (in P.
Teixeira da Mota, Rósea Cruz, op cit., p. 181).
Ora, este último parágrafo – que refere o “contacto com os símbolos
magicamente carregados” e, com os mitos, quer sejam verdadeiros, ou Verdade - vai
estabelecer a ponte para a interpretação, por parte de Pessoa, da alquimia laboratorial
- que ele conhecia, pelo menos, através do Tratado português do século XVIII, Ennoea,
ou a Aplicação do Entendimento sobre a Pedra Filosofal, de Anselmo Caetano de Abreu
Munhoz e Castelo Branco, livro que pertencia à sua biblioteca. Yvette Centeno - que
patrocinou e apresentou a reedição do “Ennoea” na Gulbenkian, em 1987, ano em que
sai, em Mafra, uma outra reedição, com prefácio de Manuel Gandra - é responsável pela
publicação (entre muitas outras valiosas peças) de um interessantíssimo fragmento do
espólio pessoano, justificativo da alquimia laboratorial: «os elementos que compõem a
matéria têm um outro sentido; existem não só como matéria, mas também como
símbolo. Há, por exemplo um ferro-matéria; há porém, e ao mesmo tempo, e o mesmo
ferro, um ferro-símbolo. Cada elemento simboliza determinada linha de força super-
material e pode, portanto, ser realizada sobre ele uma operação ou acção, que o atinja
e o altere, não só no que elemento, mas também no que simbolo (...) assim o alchimico,
ao operar, materialmente quanto aos processos, mas transcendentemente quanto às
operações, sobre a matéria, visa transformar o que a matéria symboliza, e a dominar
o que a matéria symboliza para fins que não são materiais.» (Esp. 54-84). René Alleau,
no seu livro Aspects de l’Alchimie Traditionelle (1953), afirmará mais tarde - em notável
acordo com a tese pessoana - que a alquimia, ao constatar que tudo o que é observável
é simbólico, afirma que tudo o que é simbólico é observável.
Alguns textos de Pessoa, parecem estar de acordo com a afirmação dos
rosacrucianos de que a Alquimia espiritual e a alquimia material são respectivamente, o
Ergon e o Parergon. Por exemplo, aquele excerto que tem a ver com as proximidades
divina e satânica das duas alquimias:«a alquimia material é satânica, a espiritual é
divina». Neste contexto, cite-se Álvaro de Campos que , na Ode Marítima, irá evocar o
«Deus dum culto ao contrário, /Um Deus monstruoso e satânico, um Deus dum
panteísmo de sangue» (in Álvaro de Campos - Livro de versos, introdução, transcrição,
organização e notas de Teresa Rita Lopes, Lisboa, Editorial Estampa, 1993, p. 116). Mas
ao mesmo tempo Pessoa escreve que «Tudo é um. O satânico é tamsómente a
materialização do divino» (Esp. 54B-19). Esta perspectica global e integradora dos
diversos planos da realidade - bem característica da alquimia - está bem clara no poema
que Dalila Pereira da Costa cita no seu livro pioneiro: «”Sursum Corda” Erguei as almas!
Toda a matéria é espírito,/ Porque Matéria e Espírito são apenas nomes confusos/
Dados à grande sombra que ensopa o Exterior em sonho/ E funde em Noite e Mistério
o Universo excessivo!», como o está no texto anteriormente citado e que atribui como
«verdadeira criação da Pedra Filosofal», o «fazer dentro de si mesmo a união os dois
princípios», o material e o espiritual, o masculino e o feminino, o racional e o emocional,
etc., etc.
Magia, Cabala e vias tântricas
São diversos os livros sobre estes assuntos, que Pessoa possuía na sua biblioteca
(para além dos de A. Crowley, como veremos adiante) dos quais citaremos, a título de
exemplo, os seguintes: (The) Kabbalah unveiled, de Knorr von Rosenroth, traduzido por
Mac Gregor Mathers (um dos cisionistas da “Golden Dawn”, contra o poeta e Prémio
Nobel, W.Yeats, tendo sido acompanhado na sua rebelião por A. Crowley), Magic white
and blak, de Franz Hartman (teósofo e rosacruciano alemão, fundador em 1888, da
“Rosa-Cruz Esotérica”) e Le Kama soutra, de Vatsyayana (o popular tratado de
divulgação de técnicas tântricas).
São de referir as reflexões pessoanas sobre a Magia – sobretudo através dos
textos publicados por Yvette Centeno (in Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética), para
o “Ensaio sobre a iniciação”, dos quais destacámos o seguinte: O Misticismo busca
transcender o intelecto (por intuição). A Magia a transcender o intelecto pelo poder; a
Gnose a transcender o intelecto por um intelecto superior mas, continua Pessoa, para
transcender uma coisa devidamente, é preciso primeiro passar por essa coisa (Esp. 54A-
51). No mesmo “Essay on the Initiation”, podemos ler Há três tipos distintos de iniciação
– simbólica ou exterior, intelectual (exterior à interior) e vital (interior)….Nas iniciações
vitais, que reforçam a emoção e, portanto, conduzem à Alquimia como realização, o
candidato vive aquilo que sente e sabe (Esp. 54A – 52).
Temos aqui que Fernando Pessoa considera uma Magia “vital”, que passa pela
sensação, e além disso, reconhece que “para se transcender uma coisa devidamente, é
preciso primeiro passar por essa coisa” – estes são princípios básicos do Tantrismo
(oriental ou ocidental, gnóstico ou hermético). No entanto, no mesmo Ensaio, mas
noutro fragmento, o Poeta escreve: A primeira tentação a ser vencida, para que sejam
evitados os Erros do Caminho, é o Mundo. A segunda tentação a ser vencida, para que
sejam evitados os Erros da Pousada é a Carne. A terceira tentação a ser vencida, para
que sejam evitados os Erros da Cripta, é o Diabo. As tentações são comuns a todos os
caminhos, mas o místico está mais sujeito à tentação do Mundo, o mágico à tentação
da Carne, o gnóstico à tentação do Diabo. (Esp. 54A – 62) – o dizer-se que o mágico está
mais sujeito à tentação da carne, implica seguramente que ele utilize pelo menos um
tantrismo da mão direita. E, no mesmo fragmento – revelando um bom conhecimento
da história de uma das personalidades fundadoras da “Golden Dawn” – refere Pessoa:
Dificilmente haverá um mágico que não sucumba a coisas que revelam a fraqueza da
vontade. O fim terrível de MacGregor Mathers embrutecido pelo álcool é um caso
pungente. Ele poderia talvez controlar os diabos de Abremalin; não foi capaz de controlar
os seus (- fossem eles a luxúria, a bebida ou a desonestidade).
Portanto, Fernando Pessoa reconhece a Carne como uma “tentação” a ser
“vencida” pelo Mago (a “carne” está perto do mago…), mas – segundo ele próprio afirma
no mesmo Essay - não a evitando, no entanto, mas “passando por ela”, “vencendo-a”,
de modo a transcendê-la, pois, como ele diz, «quem sabe, por exemplo, o significado
místico e transcendente da cópula?(…) isto é mais sério que quanto de sério ´há na
vida aparente» (Hermetic Philosopher – Esp. 27 19 M3 (dt), in P. Teixeira da Mora, op.
cit., p. 30). Ao mesmo tempo reflecte criticamente (e quem sabe com que dor) sobre o
caminho de Mathers que não conseguiu “controlar os seus demónios … a luxúria, a
bebida…”.
No entanto, numa “página solta, sem data”, citada por António Quadros (“A
procura da verdade oculta”), revela uma reflexão complementar – um esclarecimento a
posteriore ou a priori, não sabemos - a esta compreensão de uma Magia integradora do
plano material: Tudo é um. O satânico é tão-somente a materialização do divino. A
magia é uma só; a magia negra não é mais que a magia branca feita materialmente. (O
culto fálico, quando entendido como símbolo, é divino; quando tomado literalmente é
orgíaco, e portanto satânico.) Se conhecermos os processos da magia negra e os
interpretarmos como símbolo, chegaremos ao conhecimento dos processos da magia
branca.
Deus é um espírito, diz a Bíblia: e o divino é (em relação a este mundo) espiritual.
O Diabo é a matéria (corpo) e a Trindade Satânica: o Mundo, a Carne e o Diabo. O Diabo
(Saturno) é a Limitação. . (Note-se que na biblioteca de Pessoa existia um livro de Franz
Hartman, intutilado Magic, white and black). Então, para Pessoa, a Magia “material”,
satânica, é apenas a materialização da Magia divina. Ela é “satânica”, apenas porque
material.
Escreveu Pessoa, num dos fragmentos para o Ensaio sobre a Iniciação, que «O
Misticismo busca transcender o intelecto (por intuição). A Magia a transcender o
intelecto pelo poder; a Gnose, a transcender o intelecto por um intelecto superior.» (in
Y.K.Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, op. cit., p.59). Quem se
distinguiu, na época de Pessoa, pelo poder mágico que possuía e desenvolvia, foi
Aleister Crowley - o Mago Therion, a “Besta 666”, como se denominava a si próprio -
que, vindo da “Golden Dawn” (para onde entrou em 1898), fundou a “Astrum
Argentum” (ou “Stella Matutina”) em 1903 e foi o máximo responsável pela “O.T.O. -
Ordo Templi Orientis”, organização pseudo-templária (criada por Carl Kellner em 1901)
que, na realidade praticava uma magia sexual (particularmente desenvolvida por
Theodor Reuss e depois por A. Crowley).
Pessoa conheceu Crowley, através da sua obra, tendo traduzido o seu poema O
Hino a Pan e citado várias vezes o lema crowleyiano «Faz o que quizeres, é a única Lei»
(Esp. 54 A -38) - o que o levou a dissertar, a propósito e com maior profundidade do que
o Mago: «Descobre aquilo que és; descobre o que aquilo que és deseja; faz o que
desejas enquanto aquilo que és» (ibidem, publicado por Y.K. Centeno). Além disso,
Crowley decidiu vir a Lisboa conhecê-lo pessoalmente, em 1930, acompanhado de (uma
das suas várias) Mulher Escarlate, a sua parceira tântrica, na época, Hanni Jaegger.
Quem descreve todo este enredo à volta da visita do Mago a Lisboa, é Vitor Belém na
sua obra O Mistério da Boca do Inferno - o encontro entre o poeta Fernando Pessoa e o
Mago Aleister Crowley (publicada pela Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, em 1995) onde
faz uma síntese das informações disponíveis até ao momento.
De facto, terá sido uma correcção do horóscopo de Crowley, feita por Pessoa e a
ele comunicada por carta, que parece ter motivado a curiosidade do Mago de conhecer
o poeta-astrólogo (talvez também, uma “mensagem” - a Mensagem ?- que Crowley
refere numa das suas cartas a Pessoa- in Vitor Belem, op. cit., p.19). Crowley esteve em
Lisboa, presumívelmente 23 dias - de 2 a 25 de Setembro de 1930 - durante os quais se
encontra com Pessoa, eventualmente também com o poeta Raul Leal, talvez também
com Augusto Ferreira Gomes, jornalista, amigo e companheiro do poeta no mundo do
ocultismo, e com um “amigo” que Crowley (ou Pessoa) tinha em Sintra. Qual será a
identidade dessa “amigo” que ele parece ter ido visitar várias vezes a Sintra (cf. A.
Quadros, Obra de Fernando Pessoa, Vol. II, p. 1294 e Vitor Belém, O Mistério da Boca do
Inferno, op. cit., pp. 21, 26 e 48)? Terá ele a ver com a Quinta da Regaleira e com o seu
proprietário (de 1920 a 1945), Pedro Carvalho Monteiro, filho de António Augusto
Carvalho Monteiro? E quando é dito que Crowley foi a Sintra “jogar xadrez” isso não terá
a ver com alguma cerimónia realizada no “xadrez do chão ritual” da cripta da Capela
(templária) da Regaleira, denominação que Pessoa usa num seu poema posterior a 30 e
referente a uma cerimónia rtitual?
“Oscila o incensório antigo/Em fendas e ouro ornamental.
Sem atenção, absorto sigo/Os passos lentos do ritual.
Mas são os braços invisíveis/E são os cantos que não são/
E os incensórios de outros níveis/Que vê e ouve o coração.
Ah, sempre que o ritual acerta/Seus passos e seus ritmos bem,
O ritual que não há desperta E a alma é o que é, não o que tem.
Oscila o incensório visto,/Ouvidos cantos stão no ar,/
Mas o ritual a que eu assisto/É um ritual de relembrar.
No grande Templo antenatal,/ Antes da vida e alma e Deus…
E o xadrez do chão ritual/É o que é hoje a terra e os céus…
(poema de F.P. datado de 1932)
De qualquer forma, o acontecimento mais mediatizado (em Portugal, em
Inglaterra e em França) dessa visita, foi o desaparecimento do Mago, ocorrido
simultaneamente com uma simulação do suicídio de Crowley na Boca do Inferno, em
Cascais e no qual parecem ter desempenhado um papel de alguma cumplicidade,
Fernando Pessoa e Augusto Ferreira Gomes - o qual, “por acaso”, encontra um bilhete
de Crowley dirigido à mulher escarlate, no local do suposto suicídio: «Não posso viver
sem ti. A outra “Boca do Inferno” apanhar-me-à - não será tão quente como a tua» (in
Vitor Belem, O Mistério da Boca do Inferno, op. cit., p. 26) e que, também parece ter
“preparado” a notícia sobre este caso, no Notícias Ilustrado, de 5 de Outubro de 1930.
Penso, de facto, que a dimensão mágica em Pessoa assenta, mais
estruturadamente, em reflexões baseadas no esquema iniciático da “Golden Dawn”, e
também, em nossa opinião, na versão “crowleyana” do “A. A. - Argenteum Astrum”,
atingindo a sua máxima dimensão nesse «Livro que não o é», «O Caminho da S.
(Serpente)» (in Yvette Centeno, Fernando Pessoa e a Filosofia Hermética, op. cit, p. 27),
que estudaremos adiante.
Durante a sua vinda a Portugal, em Setembro de 1930 (Crowley e a sua
companheira chegaram a Portugal a 2 desse mês), para além de dois almoços a 7 e a 8,
com a Besta 666 e a sua Mulher Escarlate, e da muito provável iniciação a 9 – com Raul
Leal - Pessoa teria tido, segundo as suas declarações à Polícia, encontros mais
frequentes com Crowley, a partir de 17 de Setembro, data em que Hanni Jaeger terá
fugido para a Alemanha. Sobretudo, participou – juntamente com o seu companheiro
iniciático Ferreira Gomes, que aliás tem palavras muito elogiosas para Crowley na notícia
do “Notícias Ilustrado” que sai em 5 de Outubro do mesmo ano - na simulação do
suicídio de Crowley em relação ao qual é interessante referir, para além dos detalhes da
história já bem conhecida, o que Crowley escreveu no seu diário: Sept 21. I decide to do
a suicide stunt to annoy Hanni. Arrange details with Pessoa (21 de Setembro. Decidi
fazer um suicídio acrobático para aborrecer a Hanni. Arranjar detalhes com Pessoa). E
o seu biógrafo John Symonds comenta, a propósito: Fernando Pessoa did his part of the
job well (Fernando Pessoa fez bem a sua parte do tabalho). Tratou-se, na verdade de
uma cumplicidade solidária que se expressa no triângulo Crowley-Pessoa-Gomes.
É importante referir que Pessoa, tinha na sua Biblioteca três livros de Crowley,
não só o The Confessions of Aleister Crowley (As Confissões de Aleister Crowley) – como
quase todos os pessoanos indicam e que já, por si só revelaria um interesse pela vida e
pela obra do Mago Crowley – mas também outros dois – que ninguém pôs em evidência,
até hoje - que vêm, no entanto, mencionados na mesma lista de livros pertencentes à
Biblioteca pessoal de Fernando Pessoa e que são:
- Magick in theory and practice, being part III of Book 4 (Magia em Teoria e em
Prática, sendo a prte III do Livro 4), de Master Therion, um pseudónimo iniciático
de A. Crowley, numa edição de Paris (Lecram) que só pode ter sido ou a de 1929
ou a de 1930 – referido com a cota 1-151 e incluido na rubrica “Filosofia”;
- 777: Vel Prolegomena symbolica ad systemam sceptico-mysticae viae
explicandae, fundamentum hieroglyphicum sanctissimorum scientiae summae,
London: The Walter Scott Publishing Co., 1910 – referido com a cota 2-1 e
incluido na rubrica “Religião, Teologia”.
Tratam-se de dois livros importantes da doutrina e da prática “telemita” –
denominação que Crowley vai buscar à liberal Abadia de Thelema do Gargantua e
Pantagruel de Rabelais -– revelando um interesse ainda mais profundo, da parte de
Pessoa, quanto mais não fosse para se informar mais detalhadamente sobre o tema em
questão - pois o primeiro aborda os aspectos práticos da Magia do “novo aeon” –
incluindo a sexual, “vermelha”, no seu capítulo XX, On the Eucharist, on the Art of
Alchemy (Sobre a Eucaristia, sobre a Arte da Alquimia) -, e o segundo é uma exposição
da doutrina cabalística de Crowley, adaptada a partir da que ele aprendeu na Golden
Dawn - e onde estão referidas, sob a forma de um “diccionário mágico e filosófico” as
diversas correspondências simbólicas (entre as quais as sefiróticas) e iniciáticas dos
graus desta organização rosacruciana, que Crowley transpôs para a sua Ordem, criada
em 1907, a A:.A:. (Argenteum Astrum, Estrela de Prata, em inglês, Silver Star, S.S.).
0º Minerval; Iº Man; IIº Magician; IIIº Perfect Magician; IVº Holy Royal Arch
(correspondendo os graus 1, 2, 3 e 4, aos três primeiros graus da Maçonaria azul,
acrescidos do grau de Maçon do Royal Arch – que Pessoa denominava de Sacro Real
Arco – correspondendo também à Loja de Perfeição – 4º - 14º - do R.E.A.A.)
Vº Soberano Príncipe Rosa-Cruz (18º); VIº Cavaleiro Kadosh (Templário) 30º;
VIIº Soberano Grande Inspector Geral (33º); VIIIº Perfeito Pontífice dos
Illuminati;
IXº Iniciado no Santuário da Gnose; Xº Rex Summus Sanctissimos.
É de notar, em primeiro lugar, que Pessoa, num dos seus textos sobre a iniciação
maçónica e a progressão através dos seus altos graus, refere uma parte importante
desta estrutura da O.T.O. quando diz: «A FM tem essencialmente, ou 3 pontos, ou 5
pontos – 3 se considerarmos os 3 tempos essenciais (Mestre, Real Arco, e Rosa Cruz)
– 5 se incluirmos os dois primeiros graus que são necessários mas só preparatórios»,
ficando aqui de fora (no que diz respeito à componente maçónica) o grau de Cavaleiro
Templário (6º. Na OTO, 3º., no REAA). É de referir que a magia sexual da O.T.O. (presente
a partir do IXº grau) - incluia um tipo de espermofagia, particularmente na “Santa Missa
Gnóstica” – eles próprios se denominavam de “espermo-gnósticos”, admitindo como o
faziam alguns dos gnósticos antigos, que o esperma era o veículo do Logos (cf. o Logos
spermatikos) - e que Crowley introduziu um grau XIº “em vários sistemas da O.T.O”, do
qual existe uma versão “lunar” (usando sangue menstrual) e outra “mercurial”
(homosexual). Já no que diz respeito à sexualidade mágica proposta e realizada por
Crowley é de salientar que ela incluía, para além de práticas homoeróticas, práticas
auto-eróticas e que o onanismo, esse sim (tal como a homossexualidade, pelo menos
em potência e pacialmente), poderia esta em sintonia com o mundo sexual do Poeta -
«és um homem que se masturba e que sonha com as mulheres à maneira dos
masturbadores», Fernando Pessoa, Escritos autobiográficos, automáticos e de reflexão
pessoal, editados por Richard Zenith, p. 227.
Portanto, sendo possível ter havido uma transmissão de Mestre (Crowley) a
Discípulo (Pessoa) pelo menos dos graus maçónicos da O.T.O., incluindo o de Arco Real,
de rosa-Cruz e de Cavaleiro Templário, ou Cavaleiro Kadosh, sem excluir uma eventual
transmissão de magia sexual, que era apenas dispensada aos titulares dos VIIº, IXº e Xº
graus da O.T.O. (e ao grau 7º= 4º da A:.A:., como vimos).
Vamos agora observar o que passou do lado de Pessoa, a fim de descortinarmos
alguma zona comum entre ambos. Quanto a saber se a doutrina “telemita” terá
eventualmente influenciado Pessoa, é importante estudar os textos esotéricos de
Pessoa, tentando encontrar neles reflexos das teorias e práticas de Crowley – apesar de
muitos deles não se encontrarem datados, o que por vezes dificulta a elaboração de
uma sequência evolutiva no seu pensamento. Yvette Centeno escreveu: Na biblioteca
de Fernando Pessoa, encontram-se As Confissões do mago inglês Aleister Crowley, por
quem o poeta se interessou ao ponto de trocar correspondência com ele, lhe traduzir um
longo poema mágico, o Hino a Pã, de escrever outros, como o ùltimo Sortilégio, de nítida
marca ritual e sob sua influência, tudo isto culmina no encontro lisboeta e na farsa do
desaparecimento do mago na Boca do Inferno, a que o nosso poeta deu também
cobertura. Por intermédio de Crowley e da Ordem rosicrucista da Golden Dawn, a que
este pertenceu, juntamente com S.L. MacGregor Mathers (a tradução da Kaballa de
Knorr von Rosenroth encontra-se na biblioteca de Pessoa), se abre a porta da alta magia
para Pessoa. (para nós, a Golden Dawn a que Y. Centeno alude é a A:.A:., como já
referimos).
Para sistematizarmos (embora de um modo não exaustivo) possíveis influências
de Crowley sobre os textos ensaísticos de Pessoa, iremos agrupá-los em três classes:
a) - textos influenciados pela estrutura em graus e pelo conteudo iniciático,
cabalístico a mágico, da Golden Dawn (provavelmente veiculados por
Crowley, via A:.A:.) –são vários e referem à exaustão o gaus da G.D./A.A.:
Adeptus Major, Adeptus Exemptus, Philosophus, etc., etc. ;
b) – textos que revelam a influência do lema “telemita”, “Faz o que queres essa
é a única Lei”, “O Amor é a Lei, o Amor sob a Vontade”; refira-se, desde já que
Vitor Belém foi o primeiro a identificar o lema do Livro da Lei, num texto
pessoano: A principal regra da Ordem Astrum Argentinum era “Do what thou wilt
shall be the whole of the Law”, máxima que está na origem de uma das
considerações esotéricas de Fernando Pessoa;
b) – textos que denotem algum tipo de tantrismo (em Pessoa, mais da “mão
direita”, do que da “mão esquerda”), particularmente os que se intitulam “O
Caminho da Serpente” (que referiremos em detalhe no capítulo final sobre a
Iniciação em Pesoa), introduzido por Yvette Centeno, tendo Lima de Freitas
chamado a atenção para a analogia com a serpente Kundalini do Yoga
tântrico hindu.
Na página 390 do livro de Miguel Roza (Luis Miguel Rosa Dias, sobrinho do
Poeta), initulado Encontro Magick (Hugin, 2001), pode ver-se uma circular dessa mesma
organização, a A.A. (ostentando o carimbo da organização), dirigida aos seus membros
– com a palavra de passe e os exercícios – e que Fernando Pessoa terá recebido
(naturalmente como membro, pois estas instruções confidenciais são restritas aos
membros). Então o Poeta não só estava muito interessado nas doutrinas “telemitas” de
Crowley, como pertenceu (não sabemos durante quanto tempo) »as suas organizações
iniciáticas.
A MAÇONARIA EM PESSOA
Para se ter uma ideia do interesse que Pessoa tinha pela Maçonaria, vejam-se os
títulos de alguns dos livros da sus biblioteca: The Emblematic Freemasonry, de Arthur E.
Waite, The lost keys of Feemasonry, de Manly P. Hall, Manual do Franc-Maçon do
Rit(ual) Francês ou Moderno por um Cavaleiro Rosa Cruz (editado pelo Grande Oriente
Lusitano), (The) scotish workings of craft masonry, sem autor (mas editado pela “Lewis
masonic”, próxima da G.L.U. de Inglaterra), (An) Introduction to Royal Arch Freemasonry
(não indica o autor, mas é da iniciativa da Grande Loja Unida de Inglatera), Les origines
du rituel dans l’Église et dans la Franc-Maçonnerie, de H.P. Blavatsy, Builders of the man:
the doctrine and history of masonry or the romance of the craft, de John G. Gibson, etc.
Com a proliferação de textos pessoanos sobre as mais diversas correntes
esotéricas, parece ser de admitir, como o faz Yvette Centeno, que Pessoa não terá
pertencido a nenhuma delas. Relativamente ao universo maçónico-templário, se ele
afirma, por um lado, que não pertenceu a nenhuma Ordem, a verdade é que não
poderemos esquecer declarações de, no mínimo profunda simpatia - mesmo que
apenas “poéticas” - como a do seu poema dedicado a S. João, publicado por Alfredo
Margarido: «Meu Irmão, se tu és maçon, eu sou mais do que maçon, eu sou
templário(...). Meu Irmão eu dou-te o meu abraço fraternal» mas também, não só
aquela citada por João Gaspar Simões na sua Vida e Obra de Fernando Pessoa: «Iniciado
por comunicação directa de Mestre a discípulo, nos três graus menores da
(aparentemente extinta) Ordem Templária de Portugal.», mas sobretudo a que mais
adiante referiremos e que constitui uma explicação do célebre artigo publicado no
Diário de Lisboa em Fevereiro de 35.
Não é “poética” (nem é fantasia) a sua defesa da Maçonaria (feita nesse artigo),
a propósito do projecto-lei de proibição das “sociedades secretas” da autoria de Costa
Cabral. Pelo contrário, ela constitui um acto de coragem cívica exemplar, mas também
revela uma indisfarçável simpatia por essa Ordem Iniciática, apesar de ele a considerar
como uma Ordem preparatória, ou introdutória, uma Ordem do Átrio («Há duas Ordens
do Átrio, e só duas. Uma delas é a Maçonaria. Não direi qual é a outra» - Esp. 54A-
88/90), ou por uma Baixa Ordem: «A Maçonaria é formada pelas Baixas Ordens todas,
ou, se se preferir, as Baixas Ordens são formadas pela Maçonaria. Baixos ou Altos
Graus que seja, todos são das Baixas Ordens, e para todos é preciso ser maçon. As Altas
Ordens não necessitam todas que se seja ou houvesse sido maçon: em algumas (como
foi a Soc. Ros.) tem que se ser mestre-maçon para ser admitido ou iniciado; em outras
como a G.D. não e exige essa qualificação…» (Esp. 54-94).
António Telmo, que no seu livro A História Secreta de Portugal, se refere a ele
como o “rectificador da Maçonaria” - expressão que lançou alguma perturbação em
estudiosos como Jorge Matos, autor do muito interessante livro O Pensamento
maçónico de Fernando Pessoa - esclareceu-nos recentemente a razão desta sua
expressão. De facto, estando ele no Café Palladium (onde se reunia a tertúlia da
“Filosofia Portuguesa”), entrou alguém que fez uma saudação críptica a Álvaro Ribeiro.
Tendo-lhe António Telmo perguntado quem era, ele respondeu que era Ferreira Gomes,
“companheiro do Pessoa na Loja do Real Arco” (inglês, refira-se, pois também existe o
americano). Acresce o facto de Álvaro Ribeiro (“homem de segredos”) ser maçon e,
segundo António Telmo, “muitos da Filosofia Portuguesa, com excepção de alguns como
António Sardinha, também o eram”.
Tuido indica que essa mesma Loja ou Capítulo seriam “selvagens” (isto é, livre do
toda a Obediência e, pelo menos administrativamente irregular), incluindo o Sacro Real
Arco (Holy Royal Arch) e eventualmente um prolongamento templário (como a Ordem
de Crowley)? E a transm,issão dses graus maçónicos teria vindo de Crowley. O
conhecimento de Pessoa destes graus é sólido. Num texto escrito no último ano da sua
vida, em que ele diz que a Maçonaria inglesa entregou o «Sacro Rial Arco» a «um
Supremo Grande Conselho dos Maçons (?) do Rial Arco - se me perguntarem isso,
estou apto a responder, embora guarde silêncio. Todas estas coisas são da alma e da
essência da Maçonaria e, muito embora haja que colher em livros a indicação dos
factos, não é com uma ciência derivada de livros, que esses factos podem ser
coordenados e devidamente entendida e interpretada a sua coordenação» (in Pessoa
Inédito, op.cit., p.333). Ao mesmo tempo, no mesmo texto Pessoa refere que «Não lhes
ocorreu que houvesse alguém que, não sendo maçon (isto é, não pertencendo a
nenhuma Ordem Maçónica), tivesse todavia motivos para ter com os maçons um
sentimento deveras fraternal, que o movesse a defendel-os; que não sendo presa de
qualquer compromisso de sigilo, pudesse fazel-o; que tendo os conhecimentos
necessários pudesse fazel-o competentemente» (ibidem). Quem poderia ter para com
a Maçonaria uma solidariedade tão “fraternal” que o levasse - com alguns riscos e
incómodos - a defender essa Ordem, num período politicmente tão difícil. Na minha
opiniõ, uma resposta óbvia é a seguinte: quem tivesse recebido graus maçónicos,
mesmo que fosse numa ordem não-maçónica.
Não escreveu Pessoa, num texto datado de 1935, que «é à luz dos
conhecimentos que recebi pelos trez Graus Menores da Ordem Templária que pude ler
com entendimento livros e rituaes maçonicos.» (in Pessoa Inédito, op. cit., p. 334)? De
que Ordem se trata? Num importante e esclarecedor texto - mesmo tendo em conta o
fingimento de um poeta - escrito no último ano da sua vida, publicado por Teresa Rita
Lopes, este explicita a afirmação incluída no seu artigo do Diário de Lisboa, de 4-2-1935
(Não sou maçon, nem pertenço a qualquer outra Ordem semelhante ou diferente):
«(1) Uma Ordem iniciática é verdadeiramente uma Ordem só quando está em
actividade - isto é quando tem abertos os seus templos (...) e realiza sessões e iniciações
em ritual vivido. Quando em dormência, e vida latente e simplesmente transmissa, não
é propriamente uma Ordem, mas tão somente um sistema de iniciação, avanço e
completamento. São os três termos que competem à conferição, por exemplo, dos
três Graus Menores da Ordem Templária de Portugal.
(2) Por isso eu disse, legitimamente, que não pertencia a Ordem nenhuma. Não
podia legitimamente dizer que não tinha nenhuma iniciação. Antes, para quem
pudesse entender, insinuei que a tinha, quando falei de «uma preparação especial,
cuja natureza me não proponho indicar». Essa frase escapou, e ainda mais o seu sentido
possível, aos iledores anti-maçónicos. Só posso pois dizer que pertenço à Ordem
Templária de Portugal. Posso dizer, e digo, que sou templário portuguez. Digo-o
devidamente autorizado. E, dito, fica dito. Ora é á luz dos conhecimentos que recebi
pelos três Graus Menores da Ordem Templária que pude ler com entendimento livros
e rituais maçónicos. Ausentes esses conhecimentos, estaria lendo às escuras (...) »
(texto, “posterior a 2 de Fevereiro de 1935”, in Pessoa Inédito, op. cit. P. 334, os
sublinhados são nossos).
Fernando Pessoa revela num dos “fragmentos de um texto de réplica” às
reacções críticas ao célebre artigo do Diário de Lisboa, ter não só “uma preparação
especial” - «os meus conhecimentos maçónicos derivam-se, não da simples leitura de
livros, mas de certa “preparação especial” cuja natureza me não propunha, nem agora
me proponho divulgar» (in A. Quadros, op. cit., p. 488) – de natureza “cristã gnóstica”,
assente na «Tradição Secreta de Cristianismo (com) laços apertados e ocultos que
ligam essa tradição ao mais íntimo do espírito maçónico» (ibid., p. 492), como “ter
recebido noutro Templo a mesma Luz (maçónica): «Deixe o Sr. José Cabral a Maçonaria
aos maçons e aos que, embora o não sejam, viram, ainda que noutro Templo, a mesma
Luz.» (op. cit., p. 483). É caso para nos intrrogarmos: queTemplo? que Luz?
Mas parece-nos ser impossível elaborar essa reflexão, sem ter em conta os textos
tardios de Pessoa, em particular este que, alás, confirma a declaração biográfica de
Pessoa a João Gaspar Simões: «Iniciado por comunicação directa de Mestre a discípulo,
nos três graus menores da (aparentemente extinta) Ordem Templária de Portugal.»
(acima citada).
No que diz respeito à relação de Fernando Pessoa com a Maçonaria, para além do
notável e corajoso artigo do “Diário de Lisboa” de 1935, de defesa da Ordem maçónica contra o
Decreto de proibição da “sociedades secretas” que o Deputado José Cabral preparava da
Assembleia Nacional, é de referir um “texto de réplica” publicado por António Quadros e que é
extremamente revelador do que terá levado o Poeta (um não maçon, como ele diz) a defender
a Maçonaria:
“Deixe o Sr. José Cabral a Maçonaria aos maçons e aos que, embora o não sejam, viram,
ainda que noutro Templo, a mesma Luz”.
Ora, “receber a mesma luz noutro templo” é ter recebido graus maçónicos, não numa
organização maçónica mas numa organização não maçónica – que as houve várias, aquilo a que
os maçons ingleses chamamde “fringe freemasonry”, maçonaria lateral. Tudo indica que foram
os graus maçónicos, dispensados a Pessoa por Crowley, no contexto da sua Ordem dos
Templários do Oriente – que tinha três níveis iniciáticos, o maçónico, o cavaleiresco e o mágico
– que determinaram da parte do Poeta uma expressão pública da sua solidariedade em relação
à Ordem maçónica, ele que no final da sua vida estava a escrever rituais maçónico-cristãos (que
já reproduzimos em parte neste livro).
De facto, cerca de um ano antes da sua vinda a Portugal, em 1930, Fernando Pessoa e o
poeta “luciferino” Raul Leal estabeleceram correspondência com o mago inglês Aleister
Crowley. Pessoa escrevera a Crowley no sentido de o informar de que o seu horóscopo inserido
na obra Confessions of Aleister Crowley (que o Poeta possuía na sua biblioteca), estava errado.
Esta demonstração de competência numa área do esoterismo terá impressionado o mago que
de seguida pensou expandir a sua “ordem” a Portugal e ao mesmo tempo entregar-lhe a sua
direcção: I was obliged to leave immediately for Lisboa in order to establish there a
headquarter for the Order under Don Fernando Pessoa (eu fui obrigado a partir imediatamente
para Lisboa para estabelecer aí uma sede da Ordem sob a autoridade de Fernando Pessoa).
Relativamente a Raul Leal a opinião de Crowley não era tão favorável já que no seu
Diário ele escreve em 9/9/30: To Lisbon: Lunch with 4.000 esc. Met Leal; don’t like him. There’s
something very definitively wrong about him. At night initiation. (Marco Pasi, 2006, 223-231) –
“”para Lisboa: almoço com 4.000 Escudos. Encontrar Raul Leal; não gosto dele. Há qualquer
coisa de definitivamente errado nele. À noite iniciação”.
É pois muito provável que Pessoa tenha estado presente nessa iniciação pois:
- ele escreveu, a propósito da sua relação om a Maçonaria – relativamente à qual ele afirma
“não ser maçon”, isto é não pertencer a nenhuma Ordem Maçónica – que, no entanto, tinha
“uma preparação especial cuja natureza me não proponho indicar” e, além disso, que ”recebeu
a mesma luz noutro templo”, o que quer dizer que foi iniciado em graus maçónicos;
- Ctrowley – que escreve no seu diário “à noite iniciação” - não iria perder o seu tempo fazendo
uma iniciação apenas para Raul Leal, relativamente ao qual ele não tinha boa opinião – “não
gosto dele” - ao contrário de Pessoa que ele considerava;
- Crowley escreveu que, em Lisboa, ele ia “estabelecer uma sede da (sua) Ordem sob a
autoridade de Fernando Pessoa”; ora isso só seria possível se Pessoa fosse iniciado; logo a
intenção da vinda a Lisboa do mago inglês era clara e a sua concretização muito provável.
- de que Ordem fala Crowley? Uma vez que ele tinha duas, e sendo uma delas a A. A., uma Ordem
cabalística decorrente da Golden Dawn e cujos ensinamentos eram, em grande parte, dados
directamente por ele, por correspondência, aos seus discípulos, membros da AA – vide a circular
iniciática que Pessoa tinha no seu espólio e que o seu sobrinho Luis Roza (na verdade Luís Miguel
Rosa Dias) publicou em “Um encontro Magick” -, tudo indica que a Ordem de que Crowley fala
seria a OTO-Ordo Templi Orientis que tinha graus maçónicos, graus cavaleirescos e graus
mágicos e que necessitava de uma iniciação para a transmissão desses graus (por mais curta que
fosse).
- A determinação com que Pessoa escreve o artigo do Diário de Lisboa, em defesa da Maçonaria
e de crítica dos que a querem proibir, revela que ele, embora não pertencendo a nenhuma
ordem maçónica, se sente solidário com a Ordem; uma hipótese muito provável reside no facto
da OTO ter graus maçónicos e de Passoa, ao tê-los recebidos – mesmo que em transmissão
resumida – se sentir na obrigação de manifestar publicamente a sua solidariedade com a Ordem
maçónica.
- como refere Stephen Dix, no seu texto, Raul Leal escreveu um carta a João Gaspar Simões em
que ele acusa Crowley de ter realizado “uma certa vingança mágica”, “arrastando porfim o
Fernando para a Morte que poucos anos depois surgiu para ele subitamente (…) e apanhando-
me de ricochete de modo a provocar em mim uma horrível doença que também quase foi
mortal…”; seria mais provável, no dicurso de Leal, que essa influência “negativa” resultasse de
uma iniciação ou transmissão iniciática.
Mas após ter recebido a visita (com uma muito provável iniciação) do mago inglês
Aleister Crowley, em Setembro de 1930, ele – que não foi discípulo de Crowley mas recebeu
dele um impulso para tratar outros temas - e escreve o lema crowleiano “Faz o que queres” e
outro textos como “O Caminho da Serpente” –“o livro que não o é” - , e tratar poéticamente
temas esotéricos como “No túmulo de Christian Rosencreutz”, “Eros e Psique”, etc.
ANEXO
1738 – Bula “In Eminenti” do Papa Clemente XII contra a Maçonaria, invocando razões
seculares.
1743 – Jean Coustos, suíço, Venerável da Loja protestante de Lisboa (que se reunia na Cruz
Quebrada) – cujo nome desconhecemos mas que era deominda pela Inquisição como a “Loja
dos Herejes protestantes” – foi preso juntamente com outro Irmão dessa Loja, Jacques
Mouton, tendo ambos sido torturados. Coustos era comerciante de pedras preciosas e
consegue ser libertado mas escreve depois um livro contando a hoistória da sua prisão e da
sua tortura.
1762 – O Conde de Lipppe, maçon alemão, vem reformar o Exército português e cria Lojas
militares, de Caminha a Elvas. O seu Regulamento de Disciplina sobreviveu até ao século XX.
1797 – as reuniões maçónicas eram feitas a bordo de barcos ancorados no Tejo; a Loja
“Regeneração” - núcleo de cinco outras lojas – reunia-se a bordo da fragata “Fénix”.
1801 – A Maçonaria em Portugal vai crescendo e neste ano há 5 Lojas maçónicas britânicas em
Lisboia – com oficiais do exército, comerciantes, sacerdotes, professores, etc. -, uma das quais
no Regimento dos Dragões Ligeiros ingleses .
1802 - Hipólito José da Costa é enviado a Londres para obter – junto da Maçonaria inglesa,
tendo-se dirigido, não sabemos porquê, à Grande Loja dos Antigos - a carta patente de
constituição da Grande Loja de Portugal (ou da Grande Loja de Lisboa), mas ao chegar a Lisboa
é preso por Pina Manique e depois interrogado pela Inquisição.Desta situação dramática ele
dará conta num livro que publicará em Londres para onde conseguirá fugir, por influência do
Duque de Sussex - então radicado em Lisboa -, futuro Grão Mestre da Maçonaria inglesa.
807 – Primeira Invsão francesa comandada pelo maçon Junot. Embarque da família real
portuguesa para o Brasil, deixando o Comité de Regência em Lisboa. Algumas Lojas reagem
contra a invasão encorajadas pelo maçon Duique de Sussex. O exército francês é derrotado e
expulso pelasopas anglo-portuguesas.
1809 – Segunda Invasão francesa comandada por Soult. Procissão maçónica dos maçons
ingleses em Lisboa. Continua a perseguiçãpo de Pina Manique e em 1810 dá-se a prisão de 30
maçons que logo são libertados por acção do Duque de Sussex. O General Beresford era o
Governador do Exército inglês.
1814 – O General Gomes Freire de Andrade – então oficial das tropas napoleónicas, tendo
constituído nesse contexto, a Loja Militar dos Cavaleiros da Cruz, do Grande Oriente de França
- regressa a Portugal e em 1816 é eleito 3º. Grão Mestre do Grande POriente Lusitano.
Em 1822 D. Pedro IV, Iº. do Brasil é iniciado na Maçonaria no Rio deJaneiro e será o primeiro
Grão Mestre do Grande Oriente do Brasil, que se constitui regularmente em 1823, sendo logo
reconhecido pela Inglaterra – recorde-se que nesse ano o Duque de Sussex, que tinha vivido
em Portugal, procede à unificação dos “modernos” e dos “antigos”, sendo o primeiro Grão
Mestre da Grande Loja Unida da Inglaterra.
1826 – A Carta Constitucional é aprovada por imposição do Duque de Saldanha, futuro Grõ
Mestre do “Grande Oriente do Porto”, exilado em França. Em Inglaterra estará exilado Silva
Carvalho, futuro Grão Mestre do “Grande Oriente de Passos Manuel”.
1871 – São criadas duas Constituições: a Maçónica (de Lisboa) e a Constituição do Norte
(Coimbra e Porto) o que constituiu nova dissidência. Também o Tratado entre o GOLU e o
Grande Oriente de Espanha, acarretou a chamada dissidência patriótica.
1882 – Criação da Grande Loja de Portugal do rito Simbólico, de tendência britânica, que integra
6 Lojas vindas do GOLU. Os seus Grão Mestres foram Dias Ferreira e França Neto. Esta G.L., em
1884, terá 18 Lojas.
1908 – Morte do rei D. Carlos e do Príncipe Luís Filipe. De 1860 a 1910 em pleno
desenvolvimento a acção republicana dentro da Maçonaria, com algumas características de
anti-clericalismo – respondendo segundo alguns ao demasido clericalismo vigente – e uma
afirmação política que conduziu a algumas divisões.
1913 – No ano do seu Congreso nacional, o GOLU – Grande Oriente Lusitano Unido conta 4300
membros com: 156 Lojas do REAA – Rito Escocês Antigo e Aceite, 69 do Rito Francês, 1 do Rito
Simbólico (Emulação?) e 1 do Rio de York.
1914 – O Supremo Conselho do Grau 33º. – organismo que tem a jurisdição dos altos gras do
REAA, proclama a sua independência e defende a Cosntituição de 1871 (face à nova Constituição
demasiado socializante, segundo ele). O Grão Mestre do GOLU é irradiado do SCG33.
1915 – O Grão Mestre Magalhães Lima defnde o princípio “nem reacção, nem revolução”.
Grande actividade maçónica nos domínios da instrução publica e do Registo Civil.
1916 – Criação do Grémio Luso-Escvocês, como cisão do GOLU. O GOLU esteve representado no
Congresso das Maçonarias aliadas e neutrais (16 países).
1918 – O emblema do GOLU perde o “olho de Deus” no centro do triângulo, sendo aquele
substituído por um sol. O número de membros baixa para 2226. Os maçons são acusados de
terem organizado o atentado contra Sidónio Pais (que havia sido iniciado maçon).
1919/20 – Lutas internas não impedem o crescimento do GOLU: 2369 membros e 105 Lojas e
Triângulos.
1921 - Nova Constituição do GOLU que conta com 1826 membros. Nela se afirma que “A
Maçonaria é progressista e que embora possam ser maçons “indivíduios de ambos os sexos”,
“não são permitidas Lojas mistas”. O GOLU está presente no Congresso Internacional de
Genebra, juntamente com 17 países europeus e sul-americanos, grande parte dos quais latinos
e latino-americanos.
1924 – O Grão Mestre Magalhães Lima refere-se às diferenºas entre as duas tendências
maçónicas, a anglo-saxónica – que é “ritualística e crente no Grande Arquitecto do Universo” –
e a latina – que é “política e pouco ritualística”. O G.M. Magalhães Lima está presente em
Bruxelas no 3º. Congreso Internacional Internacional.
1925 – O GOLU tem 2528 membros dos quais mais de 50 membros do Parlamento. Não é esse
facto que levanta reservas à maçonaria anglo-saxónica mas sim o facto de a Maçonaria
portuguesa ser atravessada desde o século XIX por lutas político-partidárias.
1926 – Finalmente dá-se a união do GOLU com grande parte do GLE (alguns ainda ficam de fora).
O relatório do Conselho da Ordem diz que não foi possível restabelecer as relações – “troca de
Garantes de Amizade” – com as Grandes Lojas Estaduais dos EUA e com a Grande Loja Unida de
Inglaterra, “com as quais desde há muitos anos não temos relações”
1929 - Depois da morte do GM Magalhães Lima em 1928, é eleito o novo Grao Mestre,
António José de Almeida. Persiguição e crise na Maçonaria portuguesa. O maçon General
Norton de Matos critica o Estado Novo.
- 1937 – É eleito Grão-Mestre o Dr. Luís Rebordão. As reuniões dos maçons continuam na
clandestinidade.
- Anos 80 – Criação da Grande Loja de Portugal, com membros vindos do GOL: Vitor Marques,
Fernando Teixeira, etc, Este projecto não dura muito tempo. É criada em França (Bretanha), no
âmbito da GLNF-Grande Loja Nacional Francesa, a Loja Fernando Pessoa,maioritariamente
constituída por portugueses (Nuno Nazaré Fernandes, entre outros). Em 1989 é criado o
Distrito Portiguês da GLNF, reunindo três Lojas.
- 1991 – Criação da GLRP-Grande Loja Regular de Portugal, sendo o seu Grão Mestre, Fernando
Teixeira, ao qual sucede em 1996, Luís Nandin de Carvalho que é consagrado numa reunião no
então Hotel Estoril-Sol na presença de mais de uma dezena de Grão Mestres do Obediências
regulares de diversos continentes.
1996/7 – Em 1996 dá-se uma cisão na GLRP ficando o grup+o minoritário com essa denominação
– tendo José Medeiros como Grão Mestre - e constituindo-se a GLLP-Grande Loja Legal de
Portugal, continuando Luis Nandin de Carvalho como Grão Mestre. É esta Grande Loja que vai
receber, em poucos anos, os reconhecimentos da esmagadora maioria das Obediências
estrangeiras regulares.
Anos 2000 – sucedem-se os Grão-Mestres na GLLP: José M. Anes (2001), Trovão do Rosário
(2004), Mário Martin Guia (2007) e José Moreno (2010, reeleito em 2012). Aconteceram
algumas cisões no seio do campo da “regularidade”: a GLNP-Grande Loja Nacional Portuguesa
(vinda da GLRP), a Grande Loja Tradicional Portuguesa, mista, vinda da GLLP -– a qual depois
sofre sua vez uma cisão, formamndo-se o GOI-Grande Oriente Ibérico -. De salientar a criação
recente da Grande Loja Simbólica do Rito de Menfis e Misrim, cujo Grão Mestre é Pedro Rangel.
“Last but not least”, é de registar a criação pela Grande Loja Feminina de França, já depois do
25 de Abril, da Grande Loja Feminina de Portugal, única Obediência Maçónica Feminina em
Portugal – com Grão Mestras como Maria Belo, Júlia Maranha, Feliciana Ferreira, etc.. Já houve,
entretanto, uma cisão protagonizada por uma sua ex-Grã-Mestra, a Prof. Maria Helena Carvalho
dos Santos, tendo criado uma Obediencia mista.
Saliência, ainda, também para uma Obediência histórica mista que existe em França desde 1900,
criada por Marie Desraimes e que é o Direito Humano e que se estabeleceu em Portugal também
depois do 25 de Abril.
Bibliografia:
- L’Ésotérisme – Antoine Faivre – Paris, P.U.F. (Presses Universitaires de France), 1ª. Ed.,
1992, 5ª. Edição acualizada, 2012 – existe tradução em português (que está esgotada)
- L´´Esotérisme – Pierre A. Riffard – Paris, Laffont, 1ª. Ed., 1990 – já existe tradução em
português.
- Nouveau Dictionnaire de l´Ésotérisme – Piere Fiffard – Paris, Payot, 1ª. Ed., 2008
- Hermés Trismégiste – trad. Louis Ménard – Ed. De la Maisnie/Guy Trédaniel, Paris, s.d.
(anos 70)
- Le Soufisme - - L’Originel
- “L’utopie Rose-croix”
Do autor:
BIO-BIBLIOGRAFIA DO AUTOR
José Manuel de Morais Anes, nascido em Lisboa a 21/6/44, licenciou-se - depois de ter
regressado do Serviço Militar Obrigatório em Angola - em Química, em 1974, pela Faculdade de
Ciências da Universidade de Lisboa, tendo-se Doutorado, em 2009, em Antropologia Social e
Cultural pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Foi
Assistente de Biomatemática na Faculdade de Medicina de Lisboa (H.S.M.) e estagiou em Madrid
no Instituto de Química-Física Rocasolano do C.S.I.C. Foi Perito Superior de Criminalística do
Laboratório de Polícia Científica, durante 19 anos (1978-1997) e Assistente convidado da
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, nos Departamentos de Antropologia e de Ciência
Política, durante 18 anos (1986/7-2004/5).
É membro da ESSWE – European Society for the Study of Western Esotericism (fundada
pelos Profs. Wouter Hannegraaf e da Universidade de Amsterdão e Antoine Faivre da
EPHESS/SSR, Sorbonne. Publicou nestes domínios do Esoterismo os seguintes livros: Re-criações
herméticas e “Recreações herméticas II (Hugin, respectivamente, 1995, 1996), Maçonaria
regular (Hugin, 2003), “Fernando Pessoa e os Mundos esotéricos (Ésquilo, 3ª. Ed, 2008), “Os
Jardins iniciáticos da Quinta da Regaleira” (Ésquilo, 2ª. Ed., 2006), “Um outro olhar, a face
esotérica da cultura portuguesa” (Ésquilo, 2008), “A Alquimia, os novos alquimistas e as novas
espiritualidades (Ésquilo, 2009) e, com outros autores, “Portugal misterioso” (Seleccções
Reader’s Digest , 2004), “A Flauta mágica e os mistérios iniciáticos” (Ésquilo, 2007), “O Inferno
de Dante” (Ésquilo, 2013), etc.
Dirigiu na Ed. Hugin a colecção Biblioteca hermética tendo aí publicado livros de autores
como Lima de Freitas, Adalberto Alves, Manuel J. Gandra, Carlos Calvet, etc. Leccionou vários
cursos livres sobre temas esotéricos na FCSH da Universidade Nova de Lisboa, na Universidade
Lusófona, no Centro Nacional de Cultura, no Âmbito Cultural do El Corte Inglês, etc.
- “As Tentações de Bosh e o Eterno Retorno”, Lisboa, Museu de Arte Antiga, 1994;
- “Poesia e Ciência”, Lisboa, Cosmos/GUELF, 1994;
- “Caos e Meta-Psicologia”, Lisboa, Fenda/ISPA, 1994;
- “Religião e ideal maçónico”, Lisboa, ISER, 1995;
- “Seminário sobre Newton”, Évora, Universidade de Évora/CEHFC, 1995;
- "Masoneria y religión", Madrid, Ed. Complutense, 1996;
- “A Vivência do Sagrado”, Lisboa, Hugin, 1998,
- “A Quinta da Regaleira: história, símbolo e mito”, Fundação Cultursintra, 1998;
- “Portugal Misterioso”, Lisboa, SRD, 1998;
- "L'Âme secrète du Portugal", Paris, L'Originel, nº 9, 2000;
- “L’Homme à venir - Mémoire du XXe.siècle – nº.2”, Paris, Rocher, 2000;
- “Discursos e práticas alquímicas - I”, Lisboa, Hugin/CICTSUL, 2001;
- “Esoterismo e Humanidades” –Colibri/Faculdade de Letras de Lisboa, 2001;
- “Discursos e práticas alquímicas – II” – Lisboa, Hugin/CICTSUL, 2002;
- “O Homem do futuro – um ser em construção” – São Paulo –Br., Triom/USP,
2002;
- “A Creação – La Création” – Lisboa, Atalaia/Intermundos, 2003;
- “O Esoterismo da Quinta da Regaleira“ (entrevista conduzida por Vitor
Mendanha), Hugin, Lisboa, 1e éd.1998, 2e éd. 2000; 3ª. Ed., 2002; 4ª. Ed. 2003.
-"Templiers: les yeux du baphomet" - Monts, Rafael de Surtis/Éditinter, 2004
- Préfacio ao livro de Rémi Boyer "La Franc-Maçonnerie comme Voie d'Éveil",Ed.
Rafael de Surtis/Editinter,Monts,França, 2006.