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HUMANIDADE
- A ETIOLOGIA DAS EMOÇÕES HUMANAS -
MEMÓRIA
E A ETIOLOGIA DOS SENTIMENTOS HUMANOS
Saiba como, ao evoluir a MEMÓRIA (a aptidão para preencher o cérebro com as lembranças
da nossa vida), nos tornamos HUMANOS; - ou seja, adquirimos a capacidade de exteriorizar
emoções: amor, ódio, dor (psíquica), prazer, trauma, saudade, desejo, culpa, inveja, orgulho,
frustração, bondade, crueldade, indiferença, gratidão, perdão, etc.
ARTE & CIÊNCIA
VEJA a seguir uma síntese do trabalho, que – por sua vez – é constituído basicamente por
ilustrações simples e citações: utilizo trechos de obras conhecidas – literatura, cinema e
música - para explicar todos os argumentos apresentados. Agradeço a paciência e atenção.
AMAURI HIRAKAWA
EMAIL: hirakawa2h@gmail.com
Nos capítulos iniciais, apenas apresento os princípios da teoria. Portanto, é natural que
algumas questões suscitem dúvidas. Mas asseguro que tudo será esclarecido no decorrer do
trabalho. Para entender o nosso CÉREBRO (não é preciso ser neurocientista), basta possui UM,
– tenho certeza que ao longo dos capítulos tudo ficará mais claro e certamente você irá
entender e se identificar com todos os argumentos apresentados.
Peço apenas que mantenha o foco no cerne da questão: demonstrar que o nosso
CÉREBRO é uma fabulosa indústria de LEMBRANÇAS, - e que são estas, as
lembranças pessoais, que definem quem SOMOS; - ou seja...
Como veremos no decorrer do trabalho, cada LEMBRANÇA da nossa vida, - somatiza uma
determinada EMOÇÃO:
Portanto, como veremos no decorrer do trabalho, nós, bípedes, de todas as cores e formas,
Tenho consciência de que alguns capítulos (pela aparente estranheza dos títulos) podem afugentar
muitos leitores. Mas como sei que – muitos ou poucos – até o presente momento eu não possuo leitor
nenhum, sigamos em frente.
Cap. II : O TEMPO É UMA ILUSÃO, ainda que persistente (disse Einstein, com razão)..pag. 028
Cap. XII : QUEM É VOCÊ ? – quem é a pessoa que você chama de EU ? ........................pag. 111
“Uma lição central da ciência é que, para compreender questões complexas, ou até
simples (como é este o caso), devemos tentar libertar a mente dos dogmas e
garantir a liberdade de publicar, contradizer e experimentar.”
Carl Sagan
CAPÍTULO
I
“As ideias não são de ninguém – disse o bispo. Com o indicador, desenhou no ar uma série de
círculos contínuos, e concluiu: andam voando por aí, como os anjos.”
DO AMOR E OUTROS DEMÔNIOS
Gabriel Garcia Marquéz
CÉREBRO
O EXTRAORDINÁRIO TECELÃO DE LEMBRANÇAS
SUPER INTERESSANTE
( junho - 2012)
“O CÉREBRO HUMANO é o objeto mais complexo do Universo. Tem 100 bilhões de neurônios,
que podem formar 100 trilhões de conexões (sinapses). Se fosse possível criar um computador
com o mesmo número de circuitos do cérebro, ele consumiria 60 milhões de watts por hora,
segundo estimativas de cientistas da Universidade de Stanford. É o equivalente a quatro usinas
de Itaipu trabalhando simultaneamente. (...).”
“Dos cinco sentidos, a visão, para mim, sempre foi soberana. Eu poderia perder tudo (os não
menos importantes): audição, paladar, olfato e tato, - desde que mantivesse
a função dos olhos.”
(Comigo no Cinema)
Martha Medeiros
CÉREBRO
- A Incrível Olaria de Lembranças -
- TODAS AS LEMBRANÇAS DA NOSSA VIDA SÃO FORMADAS PELAS IMPRESSÕES DOS SENTIDOS -
LINHA da MEMÓRIA
destaca-se em vermelho na ilustração acima
“O HOMEM é feito de olhos, ouvidos, nariz, língua e tato, (...), Talvez por não se encontrar
igualmente desperto em cada um dos seus CINCO SENTIDOS, se é que, então, nesta época de
que vimos falando, não estavam as pessoas ainda a aprender alguns deles ou, pelo contrário, a
perder outros que hoje nos seriam úteis, JOSÉ olhava-se a si mesmo como se fosse
acompanhando, a distância, a lenta ocupação do seu corpo por uma alma que aos poucos
estivesse regressando, (...).”
O EVANGELHO SEGUNDO JESUS CRISTO
José Saramago
“O Sexto Dia”
VOCÊ preencheu o cérebro com as IMAGENS de tudo que VIU durante a vida; as cores e as
formas do mundo exterior: pessoas, paisagens, objetos, coisas e tudo mais. Portanto...
MEMÓRIA VISUAL
VOCÊ preencheu o cérebro com os SONS de tudo que OUVIU durante a vida; os sons e a
fúria do mundo exterior: vozes, músicas, ruídos, barulhos, explosões e tudo mais. Portanto...
MEMÓRIA AUDITIVA
VOCÊ preencheu o cérebro com os SABORES de tudo que DEGUSTOU durante a vida; o
gosto das coisas do mundo exterior: comidas, bebidas e tudo mais. Portanto...
MEMÓRIA DEGUSTATIVA
VOCÊ preencheu o cérebro com os AROMAS de tudo que OLFATEOU durante a vida; os
odores do mundo exterior : perfumes, fragrâncias, hálitos, fedentinas, miasmas e tudo mais.
Portanto...
MEMÓRIA OLFATIVA
“Mesmo assim, o que ela havia pensado (“você se esquece dos sons que não escuta todos os
dias”) se provou verdadeiro: com o passar dos meses, Poornima foi esquecendo a voz da mãe.
Mas a lembrança que ela conseguiu guardar (em seu cérebro), a única que permaneceu
mesmo, foi a de que, por um momento (“três ou quatro meses antes de morrer”) – enquanto
penteava seus cabelos -, a mãe havia pousado a mão neles. Fora um gesto muito leve, e
mesmo assim Poornima o sentira, e ia sentir para sempre (nossas lembranças – boas ou más -
são indeléveis): o peso da mão de sua mãe, tão delicado e ligeiro como uma garoa depois de
um dia quente de verão. Tão pequeno e tão cansado, mas com força suficiente para abrir
caminho através de suas veias como se fosse sangue. No fim, decidiu a menina, aquele peso (a
lembrança daquela sensação tátil – em seu cérebro) era o mais belo de todos (tornou-se a mais
bela lembrança da mãe). (...). E o peso de sua mão enquanto penteava os cabelos de Poornima
era tudo o que restava da mãe. Às vezes, muitas vezes, ela se agarrava a essa lembrança, a
esse peso, como se por si só fosse capaz de guiá-la através de trilhas escuras e cerradas em
meio à floresta até, a menina esperava, uma clareira. (...).”
O BRILHO DO SOL QUE INVADIU A NOSSA CASA
Shobha Rao
CÉREBRO
- O Império dos Sentidos -
4 – MUNDO, mundo, vasto mundo; Mais vasto é meu CÉREBRO (à Drummond): como já foi
dito, por subestimar a Vastidão Infinita do nosso CÉREBRO, criamos a ilusão de que as
LEMBRANÇAS da nossa vida (infância, juventude, maturidade) estão - fora do nosso cérebro -
distribuídas na inexistente Esteira do Tempo que Passou.
VASTIDÃO INTERIOR
BIOLEMBRANÇAS
(Diário de Recordações)
IMENSIDÃO INTERIOR
1 - Meus Verdes Anos: observe a ilustração acima - ao LEMBRAR de sua infância, por exemplo,
você regressa em sua Linha da Memória (dentro do cérebro – destacada em vermelho na
ilustração) até chegar na época em que você “Era Feliz e Não Sabia”. No entanto, por
subestimar a Vastidão Interior do próprio cérebro, você cria a ilusão de que regressou na
inexistente Esteira do Tempo que Passou.
2 - Sim, O Tempo é Uma Ilusão: seu PASSADO (as lembranças de sua vida: infância, juventude,
maturidade) encontra-se no interior do seu CÉREBRO – e não fora. Portanto, o TEMPO (ou a
Esteira do Tempo) é uma ilusão causada pela evolução da MEMÓRIA (Linha da Memória) – na
cabeça do Homo Sapiens.
3 – O Presente é Absoluto: isto significa que vivemos em um ETERNO PRESENTE. Ou seja:
apenas o PRESENTE realmente existe. Sei o quanto isso pode parecer estranho, - ou
incognoscível; mas, acredite, tudo isso será facilmente esclarecido nos próximos capítulos.
UNIVERSO ESTACIONÁRIO
(Estático no Presente)
“Einstein escreveu, em carta, que a diferença entre passado, presente e futuro é apenas uma
ilusão, ainda que persistente. Que será que ele queria dizer com isso? (...). Hoje nem
mesmo a Passagem do Tempo é garantida pela ciência. (...)
SUPERINTERESSANTE
(30/ABR/1988 – veja a citação completa no cap. 2)
Explicação: a ciência não garante a Passagem do Tempo porque não há Passagem de Tempo (passado-
futuro). O Universo existe em um Eterno Presente. Leia trecho abaixo:
“Retornei sozinha para a Vale Longo. A casa vazia. Apenas eu e minhas recordações*.”
O CRIME DO CAIS DO VALONGO
Eliana Alves Cruz
*Leia mais sobre as lembranças de Muana, Akin Sangokunle e Dona Anolina no cap. 9 e 14.
Peço sua atenção, pois esses trechos resumem – em poucas palavras, - a base da teoria
proposta...
“—Eu também não tive amigos durante muito tempo – disse a Sra. Saeki. Excetuando,
é claro, as LEMBRANÇAS.
– Sra. Saeki, para dizer a verdade, Nakata não tem nenhuma LEMBRANÇA. Porque
Nakata é fraco da cabeça. O que seria exatamente uma LEMBRANÇA?
-- A Sra. Saeki voltou a olhar para as próprias mãos e, em seguida, para Nakata. –
LEMBRANÇAS o aquecem por dentro. Mas, ao mesmo tempo, LEMBRANÇAS são
capazes de estraçalhá-lo internamente.
-- Nakata sacudiu a cabeça. – Que problema difícil. Nakata ainda não entendeu o que é
uma LEMBRANÇA.”
KAFKA À BEIRA-MAR
Haruki Murakami
OBS
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“Tantas vezes te pedi: <<Diz-me que me amas, diz só uma vez. Mesmo que seja mentira.
Diz-me. Só para eu guardar (no cérebro) o som da tua voz a dizer essa palavra.>>.”
Fica Comigo Esta Noite
Inês Pedrosa
As LEMBRANÇAS em nosso cérebro (boas ou más) são indeléveis; temos que carregá-las na
cabeça por toda a vida, e suportar as consequências. Leia a seguir um trecho do belo conto:
UM CÉU AZUL DESSES, - de Mona Awad...
“Só (divorciada-rejeitada) e recuperada de um caso grave de COVID, Julia – no dia do seu
aniversário – encontra-se numa Clínica Estética clandestina (localizou-a na Deep Web).
– Bem – Julia diz, afinal, porque não aguenta mais o silêncio. – Qual o veredito?
-- Está tudo aqui (em seu rosto), infelizmente, -- diz ela, por fim. Seus dedos delineiam os vincos
da testa de Julia, as rugas marcadas entre as sobrancelhas. Os vasos em volta do nariz, os
sulcos ladeando a boca. Rugas naso-labiais, o nome certo delas, Julia fica sabendo. Rugas de
riso que nem de risada nasceram. Ela retira os discos de algodão das pálpebras de Julia e ergue
um espelho à frente do seu rosto.
– As LEMBRANÇAS e a pele são uma coisa só – diz ela. – Boas LEMBRANÇAS, boa pele.
LEMBRANÇAS tristes... (E aí ela se interrompe. Porque o espelho já fala por si). – Preciso te
perguntar uma coisa: o quanto você é apegada às suas LEMBRANÇAS?
-- Julia se olha no espelho. As dores da vida (as LEMBRANÇAS da sua vida: perdas, mágoas,
desilusões...) bem gravadas na sua pele. Seus poros escancarados feito bocas berrando mudas.
Só o peso (das terríveis LEMBRANÇAS da pandemia global) do ano passado já basta para
imprimir uma velhice talvez permanente. E Julia diz ao seu reflexo:
-- Nada apegada. Nem um pouco apegada. Mais tarde (após o procedimento), na rua e sem
máscara, ela diz para si mesma – um céu azul desses! (esperança... talvez.).”
O PROJETO DECAMERÃO
New York Times Magazine
OBS
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“Pareceu ao médico que a ouvia chorar, um som quase inaudível, como só pode ser o de umas
lágrimas que vão deslizando lentamente até às comissuras da boca e aí se somem para
recomeçarem o ciclo eterno das inexplicáveis dores e alegrias humanas”
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
III - AS LEMBRANÇAS NO CÉREBRO DE HOSSI
Ele levanta a seguinte questão: o que faz sebastião SER sebastião? Seria o somatório das
partes do seu corpo (olhos, mãos, braços, orelhas, nariz...)? Ou seria o somatória das
LEMBRANÇAS da sua vida (infância, juventude, maturidade), - registradas em seu CÉREBRO?
“A mim, - disse Hossi, - o que me assusta são esses Buracos na Memória (ausência de algumas
LEMBRANÇAS pessoais em sua Linha da Memória – dentro do cérebro). Alguém avança para
mim, e nunca sei se é um velho amigo a querer me abraçar ou um desafeto com uma pistola na
mão. Então, por uma questão de sobrevivência, trato a todos como inimigos. (...). Vivo no
terror de um dia acordar e não saber quem SOU.
Imaginem um gajo, um gajo qualquer. Vamos lhe dar um nome e uma ocupação, para melhor
expor a questão. Por exemplo, Sebastião Eusébio, camponês. Agora a gente arranca-lhe os
olhos, - pode ser com uma faca, pode ser com uma colher de chá, - e o gajo continua a SER o
Sebastião Eusébio, camponês, embora cego. Agora vamos cortar-lhe uma das mãos, depois
um braço, uma orelha, a seguir o nariz, enfim, vamos desbastando o Sebastião Eusébio, golpe
a golpe, como se fosse a ramada de uma árvore. Mesmo completamente mutilado ele
continuará a SER o Sebastião Eusébio.
Agora experimentemos arrancar-lhe não pedaços do corpo, o que é bastante fácil, exige
apenas mão firme, alguma prática e um certo alheamento do espírito. Vamos arrancar-lhe
LEMBRANÇAS. Primeiro arrancamos-lhe (do cérebro de Sebastião) a imagem (lembrança) da
mãe pilando milho com as outras mulheres, enquanto cantavam; depois a LEMBRANÇA boa
das brincadeiras com os irmãos e os primos entre o canavial, junto ao rio; a seguir, a
LEMBRANÇA do frescor da água tirada do moringue; tiramos também de dentro do CÉREBRO
do Sebastião Eusébio as LEMBRANÇAS das histórias que a avó lhe contava, o cheiro do
cachimbo e as pequenas gargalhadas dela. Agora então respondam-me: aquele homem que
nunca foi menino (pois fora removida - do seu cérebro – as LEMBRANÇAS da sua infância),
aquele homem ainda é o Sebastião Eusébio? (...).
-- Perder LEMBRANÇAS não é o mesmo que perder um braço – disse-me Hossi. – Quando
perdemos um braço sabemos que perdemos um braço. As pessoas olham para nós e sabem
que perdemos um braço. Com as LEMBRANÇAS, não. Não sabemos que as perdemos (que
foram apagadas do nosso cérebro), mas, como as perdemos, alguma coisa no nosso espírito
deixa de funcionar (perde-se a noção da EXISTÊNCIA de vários episódios da nossa vida; ou, em
outras palavras, perdemos um pouco da nossa individualidade, – ou do nosso EU).”
OBS
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“O ser humano tem tudo quanto é tipo de problema, mas há um que me interessa muito:
ele não sabe se medir. Um alfaiate mede uma pessoa por fora sem dificuldade
nenhuma, mas o homem se complica na hora de medir-se por dentro.
Um Alfaiate Interior nos faz falta.”
O LIVRO SELVAGEM
Juan Villoro
Avó Janaína regressa em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e se perde/se acha nas
lembranças de sua infância; - de onde não consegue mais regressar.
“Dora – que é enfermeira – tem conhecimento de que é comum que pessoas idosas com
doenças graves (como é o caso de sua avó Janaína) desenvolva um quadro demencial agudo,
chamado delirium. (...).
-- “Rute, Rute, entra aqui.” Me estende a mão e eu a seguro. (...). -- “Vem, vamo experimentar
aquela calça antes que Mainha e Painho chegue em casa,” e gargalha.
Rute? Já ouvi esse nome. -- “Janaína, Rute é sua irmã? Eu sou a Dora, lembra? Sua neta.” E ela
responde, rindo, -- “Oxe, Rute, que besteira, claro que você é minha irmã, minha irmã mais
querida!”.
O que resta de Janaína sem sua memória? (...). A memória é uma costura fina a alinhavar (em
nosso cérebro) passado e presente. (...). Sem ela não há a sabedoria de Janaína. Sem ela não
há sua história (a história da sua vida: infância, juventude, maturidade). Diante de mim, a
velha Janaína se fez novamente menina Janaína, minha avó voltou no tempo (regressou em
sua Linha da Memória – dentro do cérebro), para muito antes de tudo o que eu soube sobre
ela. Vi no rosto envelhecido uma expressão alegre, um trejeito leve e desobediente de uma
Janaína moça que jamais conheci. Mas, onde estava minha avó? Precisava tanto de sua
orientação... O que faço, Janaína, o que faço se você não voltar a ser você? Se meus pés se
soltarem do chão e eu sair flutuando como um balão sem rumo? Preciso que me ensine. Ainda
tenho que te perguntar tantas coisas... Me conta do seu passado (das lembranças de sua vida),
me conta de sua irmã Rute. - Janaína, quantas são as formas de perder alguém? (...).
(Dora lembra que quando no seu local de trabalho) Na UTI, se ninguém estivesse olhando, me
sentava ao lado dos velhinhos, para assistir seu retorno ao passado (para assistir o paciente
regressar em sua Linha da Memória – dentro do cérebro). Havia beleza naquilo. Eles
mergulhavam no curso de uma vida (nas lembranças de sua vida) e encontravam no fundo um
tesouro esquecido (as saudosas lembranças da infância). Submergiam como velhos e vinham à
tona como meninos que encontraram moedas no chão da piscina. (...).”
“Tudo passa na Terra, como uma flor efêmera derrubada pelo sopro do vento. Mas existe algo
mais forte do que a morte: a lembrança dos ausentes na memória (cérebro) dos vivos”
Valérie Perrin
GAMELEIRA-BRANCA
Sofia Aroeira
OBS
As poucas Lembranças da Infância que sobraram no cérebro (Linha da Memória) da
avó JANAÍNA, eram formadas por:
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GAMELEIRA-BRANCA
Sofia Aroeira
Neste livro (Comigo no Cinema) a escritora e poetiza Martha Medeiros relata suas impressões
(não é crítica, são apenas expressões de sentimentos) sobre sua segunda paixão: o Cinema. A
propósito do filme em questão (Para Sempre Alice – 2015), ela opina sobre um tema médico
polêmico. Qual seria a forma humanamente menos traumática (ou mais aceitável) para
morrer: morte súbita, falência múltipla dos órgãos, câncer, Alzheimer...
“A atriz Julianne Moore ganhou o Oscar ao interpretar uma mulher de 50 anos (Alice Howland)
que sofre do Mal de Alzheimer. Ela perde (esquece o significado dos sons de) palavras, não
reconhece feições (imagens), esquece com quem estava conversando, e sobre o quê. Menos
mal porque ainda consegue produzir flashbacks (regressar em sua Linha da Memória – dentro
do cérebro, e), lembrar a infância e acontecimentos remotos. Porém, nos casos em que a
MEMÓRIA (todas as lembranças da nossa vida: infância, juventude, maturidade) vai inteirinha
para o brejo (são varridas do nosso cérebro), de que adiantou ter vivido?*
*LEMBRO, logo existo – como veremos no cap. XVI (A Origem do mal de Alzheimer), ao perder
nossas lembranças, também perdemos a noção da própria existência.
Não faz sentido atravessar tantos conflitos e amores, ter cometido tantos erros e acertos, e
não poder, mais adiante (ao avaliar-refletir sobre as lembranças dos episódios vividos),
contabilizá-los. No inventário de uma vida, vale o que se fez e o que se sentiu. Se tudo foi
esquecido (se nossas lembranças forem apagadas do cérebro), esvaziam-se nossos setenta
anos, nossos noventa ou cem (Anos de Solidão). Qualquer longevidade passará a valer um
segundo.
Espero um dia olhar para fotos antigas e me reconhecer no sentido mais amplo, recordar o que
vivia naquele momento do click, dizer “parece que foi ontem” sem sofrimento. Quero lembrar
sabores, sorrisos, gestos (imagens, sons, sabores, aromas e sensações táteis), enfim, os flashes
(lembranças) que iluminam a estrada (Linha da Memória) atrás de nós. Quero inclusive
lembrar os arrependimentos e as dores, que vistos de longe parecerão bem menores – e
essenciais. Quero rir muito de mim, me recordando de trás para frente (ao longo da Linha da
Memória – dentro do cérebro).
Porque, se não for assim, nossa vida terá valido para os outros, os que nos lembram, mas não
terá valido para nós mesmos. Seremos (se acometidos pelo Alzheimer) uns desmemoriados
sem alicerces, vagando num presente ilusório, desaparecendo a cada instante que passa. (...).
Morreríamos alienado, sem poder avaliar, através da MEMÓRIA, se valeu ou não a pena. Se
temos que morrer um dia (que jeito), que seja abraçado às nossas recordações.”
COMIGO NO CINEMA
Martha Medeiros
OBS
As Lembranças Pessoais que foram apagadas – assim como as que persistem - no cérebro
(Linha da Memória) de ALICE, eram formadas por:
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De modo que ninguém se preocupa quando ela as deixa, quando responde à sirene do seu
destino. (...). Tia Encarna persegue algo assim como um perfume (um cheiro) ou um ruído (um
som – martelando seu cérebro). Nunca é possível saber quando ela vai atrás de algo.
Paulatinamente, aquilo que a convocou se revela: é o pranto de um bebê. (...). Muita fome e
muita sede. Isso se sente no clamor do bebê e é a causa da atribulação da Tia Encarna, que
entra no bosque com desespero porque sabe que em algum lugar há uma criança que sofre. É
inverno no Parque, e a friaca é tão forte que congela as lágrimas. (...)”
O PARQUE DAS IRMÃS MAGUINÍFICAS
Camila Sosa Villada
“Savitha ficou sentada sozinha diante da charkha, tecendo o prometido sári, presente para o
casamento arranjado da amiga (e antevendo, talvez, uma traumática separação). Poornima,
deitada no tapete ao lado, sentia-se afundar como uma pedra. Ela sabia que estava dormindo,
mas continuava escutando a voz de Savitha, (...), como um murmúrio do vento, a chuva caindo.
E ela a ouviu dizer: -- Não se esqueça de nada, Poornima. Nem uma lembrança sequer. Se você
esquecer, será como se tivesse se juntado à pedra no fundo do mar, aquela à qual todos nós
estamos amarrados. Então, lembre-se de tudo. Prenda. Prenda todas as lembranças
(compartilhadas por ambas) entre as dobras do seu coração (cérebro), como se faz com uma
flor nas páginas de um livro. E então, quando quiser olhar para elas ( relembrá-las), quando
quiser olhar de verdade (recordá-las), Poornima, você só tem que erguer a lembrança contra a
luz.”
O BRILHO DO SOL QUE INVADIU A NOSSA CASA
Shobha Rao
VII - “Precisávamos Lembrar Sobre Lydia”
“Por um instante, a voz de Lydia (16 anos) ficou congelada, mas, quando enfim emergiu,
estava tão alterada que nem ela nem a mãe a reconheceram.
No dia seguinte, Marilyn (mãe de Lydia) esqueceria aquele momento (o pedido de socorro da
filha): o grito de Lydia, o tom estridente de sua voz. Aquilo desapareceria da lembrança que
guardaria de Lydia, do mesmo jeito que as lembranças que guardamos das pessoas amadas
sempre se suavizam (se distanciam em nossa Linha da Memória – dentro do cérebro) e se
simplificam, perdendo complexidade como se fossem escamas. Naquele momento, perplexa
com o tom inabitual da filha, ela o atribuiu ao cansaço de fim de tarde. (...).
Mais tarde, ao recordar aquela última noite, a família não se lembrará de quase nada. Tantas
coisas (as lembranças de tantos episódios) serão diminuídas pela tristeza por vir. Rubro de
excitação, Nath (irmão mais velho de Lydia) tagarelou durante todo o jantar, mas nenhum
deles – incluindo ele próprio – se lembrará dessa loquacidade incomum. (...). Não se lembrarão
da luz do sol, no fim da tarde, derramando-se na toalha de mesa como manteiga derretida, ou
de Marilyn dizendo: “Os lilases estão começando a florir”. Não se lembrarão de James (pai de
Lydia) sorrindo à menção de Charlie’s Kitchen, lembrando de antigos almoços com Marilyn, ou
de Hannah (irmã caçula de Lydia) perguntando: “As estrelas são as mesmas em Boston?” E
Nath respondendo: “É claro que sim”. Tudo isso (todas essas lembranças) terá sumido (do
cérebro da família) pela manhã. Eles (a família) vão dissecar essa última noite (vão vasculhar o
cérebro em busca da lembrança de algum detalhe revelador não percebido – sobre Lydia)
durante anos a fio. O que passou despercebido que deveriam ter notado? Que pequeno gesto,
esquecido, poderia ter mudado tudo? Vão analisar os mais ínfimos detalhes (vão analisar as
mais ínfimas lembranças sobre os últimos momentos de Lydia – antes do suicídio),
perguntando-se como aquilo tudo dera tão errado, e nunca terão certeza de nada. (...)”
TUDO O QUE NUNCA CONTEI
Celeste Ng
7– QUE O DIGA SÃO TOMÉ – “Só acredito vendo!”: no início do trecho acima, o poeta afirma
que não acredita na EXISTÊNCIA DE DEUS porque nunca conseguiu VÊ-LO - ou seja, nunca
conseguiu registrar sua imagem no cérebro.
Essa mesma questão é abordada por Gabriel García Márquez, em seu mais
célebre romance: Cem anos de Solidão, - veja o trecho...
O PAPARAZZO DO CRIADOR
“Enquanto isso, Melquíades acabou de plasmar (fotografar) nas suas placas tudo o que era
plasmável em Macondo e abandonou o aparelho de daguerreotipia aos delírios
de José Arcadio Buendía, que tinha resolvido utilizá-lo para obter o prova científica da
EXISTÊNCIA DE DEUS. Mediante um complicado processo de exposições superpostas, tomadas
em lugares diferentes da casa, estava certo de fazer mais cedo ou mais tarde o
DAGUERREÓTIPO DE DEUS*, se existisse, ou acabar de uma vez por todas com a suposição
da sua existência.”
*Até onde se sabe, sejam eles seguidores ou haters, Deus não costuma enviar selfie.
EXPLICAÇÃO: em outras palavras, o patriarca dos Buendía (por meio dos cinco sentidos)
condiciona a existência de Deus à possibilidade de: ver a imagem de Deus (principalmente), ou
ouvir a voz de Deus, ou tocar em Deus, ou sentir o cheiro de Deus, ou sentir o sabor de Deus.
Delírio dos Sentidos
Mas, alguém pode dizer, há pessoas que juram que já VIU Deus. É verdade, mas a isto
chamamos Alucinação Visual. Mas também há pessoas que afirmam que OUVIU o chamado
de Deus. É verdade, mas a isto chamamos Alucinação Auditiva. E ainda há outros que
afirmam que sentiu o TOQUE de Deus. É verdade, mas a isto chamamos Alucinação Tátil. E
assim segue o mundo... Este mesmo raciocínio é valido para personagens que vão do
inofensivo Papai Noel ao terrível Monstro do Lago Ness; sem esquecer, é claro, o nosso
querido ET de Varginha.
No entanto, o Nono Planeta só passou a existir para nós após VÊ-LO (e registrar sua
imagem em nosso cérebro) em 1929, quando foi finalmente descoberto ...
“Outra ideia fixa do astrônomo americano Percival Lowell era a existência, em algum ponto
além de Netuno, de um desconhecido nono planeta, apelidado de Planeta X. (...). Infelizmente,
ele morreu de repente em 1916. (...). No entanto, em 1929, um jovem do Kansas chamado
Clyde Tombaugh, que não tivera nenhuma educação formal em astronomia, mas era diligente
e perspicaz, após um ano de procura paciente, conseguiu detectar PLUTÃO, um ponto fraco de
luz num firmamento fulgurante. (...)”
BREVE HISTÓRIA DE QUASE TUDO
Bill Bryson
Duas Observações
a - Toda a Luz que não Podemos VER: este mesmo raciocínio é válido para o Descobrimento
da América (Colombo – 1492), o Descobrimento do Brasil (Cabral – 1500), a descoberta dos
Anéis de Saturno (Galilei – 1610), etc. Pois tudo isso, - embora ‘não existisse’ para nós - já
EXISTIA há bilhões de anos.
Além dos demais eventos semelhantes, como por exemplo: as partículas e os elementos
químicos EXISTEM desde o Big Bang - há aproximadamente 15 bilhões de anos.
No entanto, só passaram EXISTIR para nós quando foram descobertos (percebidos pelas
impressões dos nossos sentidos): rádio e polônio (casal Curie, 1898); elétron (J.J. Thomson,
1897); próton (Rutherford, 1919); nêutrons (J. Chadwick, 1932), etc.
b - Ensaio Sobre a Cegueira: por exemplo, um indivíduo invisual (de nascença), obviamente,
não consegue VER sua namorada. No entanto, ele tem a certeza de que ela EXISTE porque:
ALZHEIMER
- O Removedor de Lembranças –
No entanto, ao perder nossas lembranças (ao serem apagadas do cérebro) – como ocorre com
o Mal de Alzheimer, por exemplo – perdemos gradativamente a noção da própria existência.
Tudo isso será esclarecido no cap. XVI.
Enquanto isso, leia as 2 citações abaixo:
“(...) Mas Visitación explicou que o mais temível da doença da insônia não era a
impossibilidade de dormir, (...) mas sim a sua inexorável evolução para uma manifestação mais
crítica: o ESQUECIMENTO. Queria dizer que quando o doente se acostumava ao seu estado de
vigília, começavam a apagar-se da sua memória (CÉREBRO) as lembranças da infância, em
seguida (as lembranças do) o nome e a noção das coisas, e por último (as lembranças da) a
identidade das pessoas e ainda a consciência do próprio SER (perde as lembranças de SI
mesmo), até se afundar numa espécie de idiotice sem PASSADO. (...).”
“Iniciei meu diário há mais de vinte anos, porque me atormentava a ideia de acabar como o
meu pai. O velho Ernesto começou a perder a MEMÓRIA logo após sair de Huambo. O
processo foi rápido. O passado (as lembranças da sua vida: infância, juventude, maturidade)
apagou-se (do seu cérebro) da frente para trás. Primeiro, não conseguia recordar-se do que
fizera na semana anterior. A seguir, do que acontecera cinco ou seis anos antes. Finalmente, só
lhe restava uma ou outra imagem (lembrança) da alegre meninice, em Benguela, nos remotos
anos 30 do século passado. Eu estava com ele quando morreu: -- O mar – murmurou. – Já só
me LEMBRO do mar.”
EXPLICAÇÃO
Não LEMBRO da minha infância, logo ela deixou de EXISTIR para mim;
Não LEMBRO dos episódios da minha juventude, logo ela deixou de EXISTIR para mim;
Não LEMBRO de episódios recentes da minha vida, logo eles deixaram de EXISTIR para mim;
Ver cap. XVI.
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“Uma nova descoberta tem 3 estágios: primeiro ela é ridicularizada; depois
é contestada, e, finalmente, aceita. Se antes não for creditada à pessoa errada.”
ALEXANDER VON HUMBOLDT
CAPÍTULO
II
A EXISTÊNCIA DO TEMPO QUE NUNCA EXISTIU
TEMPO: UMA ILUSÃO PERSISTENTE – EM NOSSO CÉREBRO
TÍTULOS ALTERNATIVOS
Ambos os títulos acima seriam apropriados para este trabalho. Pois, como veremos no
decorrer dos capítulos, ao evoluir a MEMÓRIA (a aptidão para preencher o cérebro com as
lembranças da nossa vida), nos tornamos HUMANOS; ou seja: obtemos a capacidade de
exteriorizar EMOÇÕES.
a – Uma Breve Fábula do TEMPO: Sei que este assunto – a suposta passagem do tempo -
pode parecer algo estranho, ou fora de propósito; mas para entendermos as ENGRENAGENS
DO NOSSO CÉREBRO é essencial solucioná-lo, e explicar como – AO EVOLUIR A MEMÓRIA –
criamos a ilusão do tempo (passado – futuro) em nossos MIOLOS.
“Isto quer dizer que o tempo é um mistério e não é nem mesmo uma coisa,
e ninguém jamais resolveu o quebra-cabeça de como o tempo é
exatamente – conclui Christopher Boone.”
O ESTRANHO CASO DO CACHORRO MORTO
Mark Haddon
“Talvez a ideia correcta seja a de que o futuro é tão somente um imenso vazio,
a de que o futuro não é mais que o tempo de que o ETERNO PRESENTE se alimenta.”
O HOMEM DUPLICADO
José Saramago
c- ”ABOUT TIME” – filme 2013: em todo caso, estou ciente de que, por ser uma nova ideia
(propor mudança na nossa forma de pensar o mundo), essa “Questão de Tempo” pode parecer
algo inextrincável e assustador. Mas, acredite, não há porque se preocupar, pois tudo será
facilmente esclarecido.
1 – SUPER INTERESSANTE
(30/ABR/1988)
2 - SCIENTIFIC AMERICAN
(FEV de 2011 - por Craig Callender)
“O que é, pois, o TEMPO? Quem poderá explicá-lo clara e brevemente? Quem poderá
apreendê-lo, mesmo só como pensamento, para depois nos traduzir por palavras o seu
conceito? E que assunto mais familiar e mais frequente nas nossas conversas do que o TEMPO?
Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos
dizem quando dele nos falam. Então o que é, por conseguinte, o TEMPO? Se ninguém me
perguntar, eu sei o que é o TEMPO; mas se alguém me perguntar, não sei o que dizer.
E de que modo existem aqueles dois tempos – o passado e o futuro – se o passado já não
existe e o futuro ainda não veio? Afinal, onde estão o passado e o futuro, se é verdade que
existem?
Parece-me, então, que o TEMPO é simplesmente uma extensão (criação) da própria mente.
Assim, começo a ponderar que o TEMPO é subjetivo, e, portanto, só existe na mente humana
(cérebro) como um aspecto de nossa maneira de ver as coisas.”
“Nem o futuro nem o passado existem. Nem se pode afirmar que os tempos são três: passado,
presente e futuro. Talvez fosse melhor dizer que os tempos são: o PRESENTE do passado, o
PRESENTE do PRESENTE e o PRESENTE do futuro. E estes só estão em minha mente, não os vejo
alhures. O PRESENTE do passado é a memória, o PRESENTE do PRESENTE é a percepção do
agora, e o PRESENTE do futuro é a expectativa. Então, não seria mais prudente afirmar que só
há o PRESENTE ?”
“Ex-escravo de paixões perniciosas” (foi um adolescente da pá virada – dona Mônica, sua mãe,
que o diga), - Santo Agostinho foi um filósofo e teólogo cristão; é o autor de Confissões (sua
autobiografia – e hino de louvor) -- de onde o trecho acima foi retirado. Fez a mais importante
reflexão sobre o TEMPO na história do pensamento. Sempre pondo em dúvida a sua
existência; - afinal, como é possível apreender algo que não se consegue exprimir por
palavras?
d - A Percepção do TEMPO (?!): a propósito, caro internauta, por acaso você já viu o TEMPO?
Uma esteira contínua com aproximadamente 15 bilhões de anos (originou-se com o Big
Bang?!), contendo passado, presente e futuro?
A resposta é NÃO. Claro que NÃO – POIS O TEMPO NÃO EXISTE. Na realidade, como presume
Graig Callender, no trecho da Scientific American:
“O Universo é, em essência,
totalmente estático; – e o tempo, fundamentalmente, não existe.”
em outras palavras
ou seja
“Uma das escolas de Tlön chega a negar a existência do TEMPO: argumenta que o passado
não tem realidade senão como lembrança; que o futuro não tem realidade senão como
esperança; e que o presente, este, sim, é indefinido.”
“Então estamos no FUTURO, perguntamos nós, é que temos visto por aí uns filmes que tratam
do assunto, e uns livros também. -- Sim, essa é a fórmula comum para explicar algo como o
que aqui parece ter sucedido, -- O FUTURO, dizemos nós, e respiramos tranquilos, já lhe
pusemos o rótulo, a etiqueta, -- Mas, em nossa opinião, entender-nos-íamos melhor se lhe
chamássemos outro PRESENTE, porque a Terra é a mesma, sim, mas os PRESENTES delas vão
variando (o PRESENTE não passa, apenas se TRANSFORMA) , uns são PRESENTES passados,
outros são PRESENTES por vir, é simples, qualquer um perceberá.”
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Nos 3 capítulos a seguir (III, IV e V), explicaremos os fundamentos do Presente Absoluto.
CAPÍTULO
III
A LEI DA CONSERVAÇÃO DA MASSA E O PRESENTE ABSOLUTO
O PRESENTE NÃO PASSA; APENAS SE TRANSFORMA
a - LEI DA CONSERVAÇÃO DO PRESENTE: como já foi dito, antes de abordar o cerne da questão
(como funciona as engrenagens do nosso cérebro), se faz necessário esclarecer os
fundamentos do PRESENTE ABSOLUTO. Como veremos a seguir, essa teoria nada mais é do
que uma reinterpretação da lei da CONSERVAÇÃO DA MASSA. Ou seja, o Casal Lavoisier (Marie
– Antoine) foram os primeiros a perceberem que...
ANTOINE-LAURENT LAVOISIER
(1743 – 1794)
“(...) Durante anos, ele e madame Lavoisier ocuparam-se de estudos rigorosos. Eles
descobriram, por exemplo, que um objeto que enferruja não perde peso, como se acreditava;
pelo contrário, ganha peso – uma descoberta extraordinária. De algum modo, ao se oxidar, o
objeto atraía partículas básicas do ar. Foi a primeira percepção de que a matéria pode ser
TRANSFORMADA, mas não eliminada (e muito menos diluída pelo envelhecimento). Se você
queimasse este LIVRO agora, sua matéria se transformaria em cinza e fumaça, no entanto a
quantidade líquida de matéria no Universo continuaria a mesma (pois a cinza e a fumaça se
Conservaria no Presente). Um conceito revolucionário. Isto se tornou conhecido como a lei da
Conservação da Massa. (...)”
Breve História de Quase Tudo
Bill Bryson
EXPLICAÇÃO
Portanto, já é possível concluir que a teoria do PRESENTE ABSOLUTO é tão somente uma
confirmação da lei de LAVOISIER. Em outras palavras, a lei da CONSERVAÇÃO DA MASSA
conclui que: na Natureza...
1 – VOCÊ: pra facilitar compreensão, digamos q nasceu em 1999, - você tem 23 anos de idade;
3 – A TERRA: a idade estimada da formação do nosso Sistema Solar é de 4.6 bilhões de anos;
“É compreensível que alguém pergunte como foi possível saber que estas coisas sucederam
assim e não doutra maneira, A resposta a dar é a de que todos os relatos são como os da
Criação do Universo, Ninguém lá esteve, ninguém assistiu, mas toda a
gente sabe o que aconteceu.
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
1 - O PRESENTE NÃO PASSA, APENAS SE TRANSFORMA: Você (“nascido em 1999”) é um
PRESENTE que se transforma há 23 anos:
VOCÊ não ENVELHECE ao se deslocar no tempo (passado – futuro), - o tempo não existe;
A VIDA não ENVELHECE ao se deslocar no tempo (passado – futuro); - o tempo não existe;
A TERRA Permanece no Presente há 4.6 bilhões de anos (desde a formação do Sistema Solar);
A TERRA não ENVELHECE ao se deslocar no tempo (passado – futuro); - o tempo não existe;
A TERRA se transforma mas se CONSERVA NO PRESENTE há 4.6 bil. de anos (Lei de Lavoisier);
O COSMOS não ENVELHECE ao se deslocar no tempo (passado – futuro); - o tempo não existe;
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Lavoisier
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“Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, porque tanto a água quanto o homem
mudam (se transformam) incessantemente. Nada existe de
permanente a não ser a MUDANÇA.”
HERÁCLITO
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Admirável Epopeia Imóvel: o mundo se transforma, evolui e se expande – sem sair do lugar
Portanto, VOCÊ – há 23 anos – se transforma SEM SAIR DO LUGAR – ou sem sair do presente;
*BILHÕES E BILHÕES
Carl Sagan
“(...) Se não cuidarmos, podemos aquecer o nosso planeta pelo efeito estufa ou esfriá-lo e
escurecê-lo com uma guerra nuclear, e não podemos ignorar, claro, o perigo causado pelo
impacto de um asteroide ou um cometa. Com a chuva ácida, a diminuição da camada de
ozônio, a poluição química, a radioatividade, a destruição das florestas tropicais, e inúmeros
outros ataque ao meio ambiente, a nossa civilização pretensamente avançada pode estar
alterando o delicado equilíbrio ecológico que a Vida na Terra evoluiu com dificuldade ao longo
de 4 bilhões de anos. (...).
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FELIZ ANIVERSÁRIO
Como estará o mundo no próximo ano, após 365 dias de Permanência no Presente?
A VIDA em nosso planeta luta para Permanecer no Presente, não para sobreviver ao tempo
*METAMORFOSE AMBULANTE
- Toca Raul! -
explicação
tudo que vc come se TRANSFORMA em você; tudo que vc bebe se TRANSFORMA em você;
tudo que vc fuma se TRANSFORMA em você; tudo que vc cheira se TRANSFORMA em você;
tudo que vc respira (inclusive o ar poluído) se TRANSFORMA em você, etc. Entendeu?
Mas, você diria, estou habituado a só comer porcaria, beber porcaria e coisas do gênero. Bom,
nesse caso... nesse caso passemos ao próximo capítulo.
RIOBALDO SE TRANSFORMA
“O senhor... Mire, veja; o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não
estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, - mas que elas vão sempre MUDANDO.
Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão.”
GRANDE SERTÃO – VEREDAS
Guimarães Rosa
OBS: como já dito, este assunto (a ilusão do tempo) será esclarecido no cap. XXIV:
UMA BREVE FÁBULA DO ESPAÇO-TEMPO ,– A INEXISTENTE 4ª DIMENSÃO.
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CAPÍTULO
IV
A EXPECTATIVA DE VIDA – EM UM PRESENTE ABSOLUTO
- Sobre a Brevidade da Vida – em um Eterno Presente -
“(...) Quero crer que este costume nasce da ‘Brevidade da Vida’. Para as rosas, escreveu
alguém, o jardineiro é eterno. E que melhor maneira de ferir o eterno que mofar de suas iras?
Eu passo, tu ficas; mas eu não fiz mais que florir e aromar, servir a donas e a donzelas, fui
letra de amor, ornei a botoeira dos homens, ou expiro no próprio arbusto, e todas as mãos, e
todos os olhos me trataram e me viram com admiração e afeto. Tu não, ó eterno; tu zangas-te,
tu padeces, tu choras, tu afliges-te! A tua eternidade não vale um só dos meus minutos. (...).”
QUINCAS BORBA
Machado de Assis
EXPECTATIVA DE VIDA
Considerando que o Presente é Absoluto, esta expressão deve ser interpretada como...
A - VOCÊ: como a ‘Expectativa de Vida Humana’ é de 80 anos, significa que você, ao nascer –
salvo dos infortúnios da vida – dispõe de 80 anos para Permanecer no Presente, -
independente dos ponteiros do relógio;
B – Efemerópteros: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 24 horas. Significa que esse belo
inseto
aquático, ao nascer, dispõe de apenas de 1 dia para Permanecer no Presente – independente
dos ponteiros do relógio;
C– Borboleta-Monarca: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 40 dias. Significa que esse belo
inseto migratório, ao nascer – salvo do inseticida que envenenam as plantas onde elas põem
seus ovos – dispõe de 40 dias para Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do
relógio;
E - Pernilongo: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 3 meses. Significa que esse querido
mosquito hematófago, ao nascer - salvo da raquete elétrica - dispõe de 90 dias para
Permanecer no Presente (e azucrinar nossas vidas) – independente dos ponteiros do relógio;
F - Abelhas: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 5 meses. Significa que esse inseto (crucial para
o equilíbrio dos ecossistemas), ao nascer, dispõe de 5 meses para Permanecer no
Presente – independente dos ponteiros do relógio;
G - Baratas: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 6 meses. Significa que esse adorável inseto,
ao nascer – salvo das chineladas da vida – dispõe de 6 meses para Permanecer no
Presente – independente dos ponteiros do relógio;
H - Ratos: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 4 anos. Significa que esse mamífero roedor,
ao nascer – salvo das ratoeiras da vida – dispõe de 4 anos para Permanecer no
Presente – independente dos ponteiros do relógio;
I – Boto-cor-de-Rosa: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 7 anos. Significa que esse golfinho
fluvial, ao nascer – salvo da pesca criminosa – dispõe de 7 anos para Permanecer no
Presente – independente dos ponteiros do relógio;
J – Gato-Maracajá: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 13 anos. Significa que esse caçador
noturno de aves domésticas, ao nascer – salvo de atropelamentos e da caça por retaliação –
dispõe de 13 anos para Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do relógio;
K – Ariranha: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 20 anos. Significa que esse carnívoro
semiaquático, ao nascer – caso sobreviva à perda de seu habitat – dispõe de 20 anos para
Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do relógio;
L – Tubarão-Azul: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 20 anos. Significa que esse belo seláquio,
ao nascer – caso escape de transformar-se em sopa de barbatana numa birosca da China –
dispõe de 20 anos para Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do relógio;
N – Jumento do Gonzagão (“que é nosso irmão”): têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 30 anos.
Significa que esse injustiçado quadrúpede, ao nascer – salvo dos açoites e do abandono, pois
foram substituídos por motos – dispõe de 30 anos para Permanecer no Presente –
independente dos ponteiros do relógio.
O – Rinoceronte-de-Java: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 35 anos. Significa que esse raro
mamífero, ao nascer – salvo da matança covarde e criminosa – dispõe de 35 anos para
Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do relógio;
P – Peixe mero: têm uma ‘expectativa de Vida’ de 40 anos. Significa que esse peixe dócil e de
grande porte, ao nascer – salvo da pesca predatória – dispõe de 40 anos para Permanecer no
Presente – independente dos ponteiros do relógio;
S – Molusco Bivalve: têm uma ‘Expectativa de Vida’ de 500 anos. Significa que esse molusco,
ao nascer - graças ao seu extraordinário metabolismo lento - dispõe de 500 anos para
Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do relógio;
T - Chimpanzés: nosso irmão mais próximo em DNA (99.4 % semelhante), têm uma
‘Expectativa de Vida’ de 40 anos. Isto significa que esse quase humano*, ao nascer – salvo da
caça predatória, epidemias, cativeiro, domesticação, cobaia de laboratório, etc. – dispõe de 40
anos para Permanecer no Presente – independente dos ponteiros do relógio.
L. BOB – 5 ANOS: seu cão de rua, portanto, já Permaneceu no Presente por 5 anos.
Considerando que sua ‘Expectativa de Vida’ é de 15 anos, significa que seu querido amigo
rafeiro ainda dispõe de 10 ANOS para Permanecer no Presente – independente dos ponteiros
do relógio.
G1 – 20/12/2016
À Mell
“A Organização Mundial da Saúde (OMS), calcula que no Brasil existam mais de 30 milhões de
animais nas ruas das cidades. Destes, 20 milhões são cachorros. (...).”
OBS: como já foi dito, este assunto (a ilusão do tempo) será esclarecido no cap. XXIV:
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CAPÍTULO
V
DURAÇÃO - PERÍODO DE EXISTÊNCIA - LONGEVIDADE
Veremos a seguir alguns exemplos para demonstrar como se calcula o ‘Período de Duração das
Coisas’ – em um PRESENTE ABSOLUTO...
2. Torres Gêmeas – WTC (1973 - 2001): Permaneceu no Presente por............28 anos (PP=28);
4. Parque Nacional Serra da Capivara (1979): Permanece no Presente há.....43 anos (PP=43);
5. Casa da Ópera – Sydney (1973): Permanece no Presente há..................... 49 anos (PP=49);
10. Igreja Monte Bom Jesus (1902): Permanece no Presente há..................120 anos (PP=120);
15. Ponte Duarte Coelho (1868): Permanece no Presente há......................154 anos (PP=154);
16. Big Ben (1859): Permanece no Presente há....... .................................. 163 anos (PP=163);
17. Caruaru - PE (fundação - 1857): Permanece no Presente há.................165 anos (PP= 165);
19. Taj Mahal (1632): Permanece no Presente há...................................... 390 anos (PP=390);
20. Forte dos Reis Magos (1599): Permanece no Presente há.................... 423 anos (PP=423);
21. Mona Lisa (da Vinci): Permanece no Presente há.............................. + 500 anos (PP=500);
22. Torre de Pisa (1173): Permanece no Presente há................................. 849 anos (PP=849);
23. Coliseu de Roma (70 dC.): Permanece no Presente há quase........... 2000 anos (PP=2000);
25. Árvore do Gen. Sherman*: Permanece no Presente há ................+ 4000 anos (PP=4000);
27. Nosso Planeta: Permanece no Presente há........................4.6 bilhões de anos (PP=4.6 b.);
28. O Milagre da Vida (Big Bith): Permanece no Presente há.............4 bilhões anos (PP=4 b.);
29. Nosso Universo (Big Bang): Permanece no Presente há.......... 15 bilhões anos (PP=15 b.);
30. FÓSSIL: é um fragmento de uma antiga forma que resistiu à Força de Transformação do
mundo, e conseguiu se conservar e PERMANECER NO PRESENTE por milhares, - e até milhões
de anos. Por exemplo: LUZIA*...
*LUZIA
(Scielo, out/2009)
por Verlan valle e Ricardo Ventura
“O crânio de uma mulher escavado em Lagoa Santa, MG, na década de 1970, tornou-se um
ícone científico e cultural do Brasil. LUZIA é tida como um dos mais antigos remanescentes
ósseos humanos das Américas, com aproximadamente 11.500 anos. Neste trabalho, (...) o
espécime foi transubstanciado em um indivíduo dotado de características pessoais próprias,
relacionado à ancestralidade biológica e cultural do povo brasileiro. (...)”.
O FÓSSIL DE LUZIA
AS LEMBRANÇAS DA TERRA
“Tornar-se um fóssil não é fácil. O destino de quase todos os organismos vivos – mais de 99.9%
deles – é reduzir-se a nada. Quando sua chama se apagar, cada molécula sua será arrancada
ou fluirá de você para ser posta em uso em outro sistema (como parte de uma folha, outro ser
humano ou uma gota de orvalho, - por exemplo). É assim que as coisas funcionam. Mesmo que
você consiga fazer parte do pequeno grupo de organismos, inferior a 0,1%, que não são
devorados, as chances de ser fossilizado são ínfimas. Para um organismo tornar-se fóssil,
muitas coisas precisam acontecer. Primeiro, é preciso que ele morra no lugar certo. Somente
15% das rochas conseguem preservar fósseis, de modo que não adianta perecer num local de
futuro granito. Em termos prático, o falecido precisa ser enterrado em sedimento, onde possa
deixar uma impressão, como uma folha em lama úmida, ou decompor-se sem exposição ao
oxigênio, permitindo que as moléculas de seus ossos e das partes duras (e, muito
ocasionalmente, das partes mais moles), sejam substituídos por minerais dissolvidos, criando
uma cópia petrificada do original. Depois, à medida que os sedimentos em que jaz o fóssil
forem indiferentemente pressionados, dobrados e sacudidos pelos processos da Terra, o fóssil
precisará, de alguma maneira, preservar uma forma identificável (e se Conservar no Presente).
Finalmente, mas acima de tudo, após permanecer (no PRESENTE por) dezenas, ou talvez
centenas, de milhões de anos oculto, ele precisa ser encontrado e reconhecido como algo que
vale a pena conservar. (...). Os fósseis são, em todos os sentidos, raríssimos. (...)”
Antes de concluir este breve capítulo, falaremos mais um pouco sobre o RELÓGIO...
O OVO DE NUREMBERG
- PRIMEIRO INVENTAMOS O TEMPO; EM SEGUIDA CONSTRUÍMOS O RELÓGIO –
“(...). No velho radinho de pilha, a canção chegou ao fim, e o locutor disse, Atenção, ao terceiro
sinal serão quatro horas. Uma das cegas perguntou, rindo, Da tarde, ou da madrugada, e foi
como se o riso lhe doesse. Disfarçadamente, a mulher do médico acertou o relógio (que havia
parado) e deu-lhe corda, as quatro eram as da tarde, Ainda que, na verdade, a um relógio
tanto lhe faz, vai da uma às doze, o mais são ideias dos humanos.”
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
Portanto, nós NAÕ vivemos nos limites dos ponteiros do relógio; NÃO vivemos no limite da
passagem do tempo; NÃO vivemos no tempo; NÃO existe tempo.
“O tempo é uma construção artificial que sobrepomos a nós e à qual nos submetemos (...).
É quando perdemos a noção do tempo que medimos bem o seu artificialismo.”
VERGÍLIO FERREIRA
- escritor e professor português -
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“Diz Afonso da Maia que – ao contrário do neto, Carlos – o pequeno Eusebinho passava o dia
nas saias da titia a decorar versos, páginas inteiras do Catecismo de Perseverança. Ele por
curiosidade um dia abrira este livreco e vira lá << que o Sol é que anda em volta da Terra -
como antes de Galileu , - e que o nosso Senhor todas as manhãs dá as ordens ao Sol, para
onde há de ir e onde há de parar, etc., etc. >>. E assim lhe estavam arranjando uma almazinha
de bacharel...”
-- Não posso fazer parar o Sol (respondeu Deus) porque parado já ele está; sempre o esteve
desde que o deixei naquele sítio,
-- Tu és o Senhor (insistiu Josué), tu não podes equivocar-te, mas é isso que os meus OLHOS
veem (cérebro – vemos no cérebro), o Sol nasce naquele lado, viaja todo o dia pelo céu e
desaparece no lado oposto, até regressar na manhã seguinte, (...).
– Não, homem, os teus olhos (cérebro) iludem-te, (respondeu Deus) a Terra move-se, dá voltas
sobre si mesma (rotação) e vai rodopiando pelo espaço (translação) ao redor do Sol,
-- Então, se assim é, manda parar a Terra, (...), a mim é-me indiferente desde que possa acabar
com os amorreus,
OBS: como já foi dito, este assunto (a ilusão do tempo) será esclarecido no cap. XXIV:
----------------X-----------------
Considerando que a arte prescinde de atualizações, finalizaremos este capítulo citando 11 composições
que abordam o TEMPO. Pois, parafraseando o Poeta...
TIME
Pink Floyd
“O “tic-tac” vai marcando cada momento de mais um dia monótono; E você ainda perde
tempo gastando as horas de modo descuidado; Perambulando por aí, em sua terra natal;
Esperando alguém ou algo que te mostre o caminho; (...). Cada ano vai ficando
mais curto; Parece não haver mais tempo (...); Planos que dão em nada; Ou meia página de
linhas rabiscadas; Esperar em quieto desespero... O tempo se foi, a música chega ao fim (...).”
ORAÇÃO AO TEMPO
Caetano Veloso
“Por seres tão inventivo; E pareceres contínuo; TEMPO, tempo, tempo, tempo; És um dos
deuses mais lindos; E quando eu tiver saído; Para fora do teu círculo; TEMPO, tempo, tempo,
tempo; Não serei nem terás sido; Ainda assim acredito; Ser possível reunirmo-nos; TEMPO,
tempo, tempo, tempo; Num outro nível de vínculo;
TEMPO REI
Gilberto Gil
“Não me iludo; Tudo permanecerá do jeito que tem sido; Transcorrendo; Transformando;
Tempo e espaço navegando todos os sentidos; Pães de Açúcar, Corcovados; Fustigados pela
chuva e pelo eterno vento; Água mole, pedra dura; Tanto bate que não restará nem
pensamento; Não se iludam, não me iludo; Tudo agora mesmo pode estar por um segundo;
Tempo Rei! Oh, Tempo Rei! Oh, Tempo Rei! Transformai as velhas formas do viver; Ensinai-me,
oh, Pai! O que eu ainda não sei; Mãe Senhora do Perpétuo socorrei!
“Disparo contra o Sol; Sou forte, sou por acaso; Minha metralhadora cheia de mágoas; Eu sou
um cara; (...); Dias sim, dias não; Eu vou sobrevivendo sem um arranhão; Da caridade de quem
me detesta; A tua piscina tá cheia de ratos; Tuas ideias não correspondem aos fatos; O tempo
não para; Eu vejo o futuro repetir o passado; Eu vejo um museu de grandes novidades; O
tempo não para; Não para, não, não para; (...);
TEMPO PERDIDO
Legião Urbana
“Todos os dias quando acordo; Não tenho mais o tempo que passou; Mas tenho muito tempo;
Temos todo o tempo do mundo; Todos os dias antes de dormir; Lembro e esqueço como foi o
dia; Sempre em frente; Não temos tempo a perder; Nosso suor sagrado; É bem mais belo que
esse sangue amargo; E tão sério; E selvagem; Selvagem; Selvagem; (...); Temos nosso próprio
tempo; Temos nosso próprio tempo; Temos nosso próprio tempo; (...);
TEMPOS MODERNOS
Lulu Santos
“Eu vejo a vida melhor no futuro; Eu vejo isso por cima de um muro; De hipocrisia que insiste
em nos rodear; (...); Eu vejo um novo começo de era; De gente fina, elegante e sincera; Com
habilidade pra dizer mais sim do que não, não, não; Hoje o tempo voa, amor; Escorre pelas
mãos; Mesmo sem se sentir; Que não há tempo que volte, amor; Vamos viver tudo que há pra
viver; Vamos nos permitir.”
“O tempo vai passando, E com ele eu vou, Não deixo para trás, Nada do que eu sou, Me lembro
claramente, De tudo que eu vivi, Até a fase negra, Dela não esqueci, Será que chegarei, Na
terra prometida? Ou atravessarei, O túnel de luz, (...).”
TEMPOS INSANOS
Karol Conka
“— (...). Nem preciso dizer que eu tô no comando; Nesse barco só fica quem estiver remando;
Carta na manga, já tenho os meus planos; Eu tô deslizando em Tempos Insanos; (...). Minha
proteção começa pela manhã; Me preparo pro que vem amanhã; Minha proteção começa pela
manhã; Me preparo pro que vem amanhã; (...).”
O TEMPLO DO TEMPO
Flaira Ferro
“Eu sou o templo do tempo; O tempo acontece em mim; No meu rosto, na minha pele; No meu
modo de vestir; Sou um rio de horas; E um mar de segundos; Sou vazio agora; Amanhã eu sou
profundo; Revejo o passado; Anseio o futuro; Procuro um relógio; Pra não ser vagabundo; (...).”
SOBRE O TEMPO
Pato Fu
“Tempo, tempo, mano velho; Falta um tanto ainda, eu sei; Pra você correr macio; Como zune
um novo sedã; Tempo, tempo, tempo, mano velho; Vai, vai, vai – Vai, vai, vai; Tempo amigo,
seja legal; Conto contigo pela madrugada; Só me derrube no final; (...).”
RESPOSTA AO TEMPO
Nana Caymmi
“Batidas na porta da frente; É o tempo; Eu bebo um pouquinho; Pra ter argumento; Mas fico
sem jeito, calado, ele ri; E ele zomba do quanto eu chorei; Porque ele sabe passar; E eu não sei;
(...). Respondo que ele aprisiona, eu liberto; Que ele adormece as paixões, eu desperto; E o
tempo se rói com inveja de mim; Me vigia querendo aprender; Como eu morro de amor; Para
tentar reviver. (...).”
“O tempo é como farinha numa peneira: não se pode impedir que escorra rápido até sobrar
apenas o que não pode passar em seus orifícios. E ele seguiu o seu curso implacável para os
que cumpriam as tarefas braçais da vida (como por exemplo: “cortar cerca de 15 toneladas
diárias de cana, do alvorecer ao anoitecer, em jornadas de mais de 12 horas” – de
Permanência no Presente*); mas esse mesmo tempo fluía em seu passo lento para os que
desfrutavam do ócio nada produtivo (“viagens, festas, futricas, conchavos políticos, conluios
comerciais”). A maioria dos Senhores apenas arrumavam formas de (*Permanecer no
Presente, e) não fazer nada. Maneiras inventivas certamente, mas mesmo assim inúteis.
É possível especular que alguns se convencessem de que aquela era o ordem natural das
coisas, que a gente preta havia nascido para aquilo mesmo, e destas tarefas jamais sairiam;
mas também é provável que outras nunca se conformassem com esta ordem. (...)”
*A Percepção da Permanência no Presente é pessoal, e, portanto, diferente para cada indivíduo. Por
exemplo: a sensação de quem Permanece no Presente – durante 12 horas – cortando cana é
completamente diferente da sensação de quem Permanece no Presente – durante 12 horas –
fofocando.
ÁGUA DE BARRELA
Eliana Alves Cruz
OBS: como já foi dito, este assunto (a ilusão do tempo) será esclarecido no cap. XXIV:
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“FANTASMA DO PAI: (...). Adeus, devo agora partir! Os pirilampos anunciam que a madrugada
se aproxima. Adeus! Adeus, Hamlet! LEMBRA-TE DE MIM!
HAMLET: Ó legiões do céu! Ó Terra! Que mais? Invocarei o inferno? Não, aquieta coração! Não
fiqueis arruinados de súbito, músculos; aguentai-me! QUE ME LEMBRE DE TI? Sim, pobre
fantasma, sim! Enquanto minha MEMÓRIA tiver sede neste mundo desvairado, NÃO ME
ESQUECEREI DE TI! Sim, pois hei de varrer das PÁGINAS DA MEMÓRIA todas as reminiscências
frívolas, as vãs sentenças poéticas, os vestígios da juventude que aí ficaram; e apenas a página
do teu mandamento hei de preservar no LIVRO DO MEU CÉREBRO, - limpo de reles lembranças.
Sim! Sim! Por Deus! Jurei-o. Assim seja. “
SHAKESPEARE
(trecho do filme de, e com Laurence Olivier – 1948)
Neste capítulo veremos que, ao evoluir a MEMÓRIA (aptidão para preencher o cérebro com as
lembranças da nossa vida: Infância, juventude, maturidade), criamos a ilusão passado, e,
consequentemente, A ILUSÃO DO TEMPO - em nossos miolos.
CAPÍTULO
VI
CÉREBRO
A FANTÁSTICA FÁBRICA DO PASSADO - DE CADA UM
(Cada cabeça – um Passado)
“A vida é igual um LIVRO. Só depois de ter lido é que sabemos o que encerra. E nós quando
estamos no fim da vida é que sabemos como nossa vida decorreu. A minha, até aqui,
tem sido preta. Preta é a minha pele. Preto é o lugar onde eu moro.”
QUARTO DE DESPEJO
Carolina Maria de Jesus
O Livro Selvagem
1 – Uma Breve História de um Livro em Branco: o Presente é Absoluto - ou seja, vivemos em
um Eterno Presente. Nesta condição, VOCÊ – como um livro a ser escrito – nasce com o
cérebro VAZIO: sem conteúdo, sem história, sem passado.
--“Vejo que o senhor jornalista não acredita que uma pessoa possa refazer a sua vida com
uma identidade diferente e um genuíno sentimento de pertencimento relativo ao país que o
acolheu (diz o agora Paulo Costa Pinto, brasileiro, - outrora Jean Mpuanga, congolês).
-- Não, não consegue. – Diz categórico Daniel Benchimol. Uma pessoa é o seu PASSADO; e o
PASSADO não muda. “
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2 – Mundo, Mundo, Vasto Mundo – mais vasto é meu CÉREBRO (à Drummond): por
subestimar a Vastidão Infinita do nosso CÉREBRO, criamos a ilusão de que as LEMBRANÇAS da
nossa vida (infância, juventude, maturidade) estão - fora do nosso cérebro - distribuídas na
inexistente Esteira do Tempo que Passou.
BIOLEMBRANÇAS
- AUTOBIOGRAFIA CONSTRUÍDA COM NOSSAS LEMBRANÇAS – NO INTEROR DO CÉREBRO -
BRAIN TIME
3 – O Passado em Nossos Miolos: observe a ilustração acima... o PASSADO ( as lembranças da
nossa vida: infância, juventude, maturidade) só existe em nosso cérebro; o TEMPO, portanto,
é uma ilusão causada pela evolução da MEMÓRIA - na cabeça do homem.
“A Infância (boa ou má) há de ficar para sempre na memória de todos, nítida e insuperável,
muito acima de qualquer outra fase da vida.”
Sérgio Porto
“Por que sou capaz de (regressar na Linha da Memória – dentro do cérebro, e) relembrar assim
fatos de épocas longínquas? Por que a qualquer momento uma história qualquer se presta à
ressurreição de (...) coisas que nenhum retrato guardou e que tomaram parte ativa na minha
vida passada? Por que está tudo assim tão gravado em mim (as lembranças são indeléveis)?
Nem sequer preciso fechar os olhos para encontrar figuras (lembranças de episódios) de minha
infância. (...). O que relembro hoje é realmente minha infância ou colaboro com minha
imaginação atual? Estou vestindo agora com roupagens novas minhas velhas lembranças ou
estão elas com a mesma roupa do momento em que ocorreram? Vivi tudo o que relembro?
(...). Sim, sim, recordo muito bem; vestia sempre azul-claro e branco e, de início, minha infância
turbulenta e sadia não prestou nenhuma atenção ao fato. (...).”
CRÔNICA: PROMESSA EM AZUL E BRANCO
Eneida Costa de Morais
“Eu já estivera ali, não estivera, muito tempo atrás? Tinha certeza que sim. As memórias
de infância às vezes são encobertas e obscurecidas pelo (outras lembranças de episódios)
que vem depois, como brinquedos antigos esquecidos no fundo de um armário
abarrotado de um adulto, mas nunca se perdem por completo.”
O OCEANO NO FIM DO CAMINHO
Neil Gaiman
6 – LEMBRANÇAS – nossa maior e mais fiel companheira: cada indivíduo carrega – em sua
cabeça – o peso de suas lembranças; ou o fardo do seu passado; ou ônus da existência; ou o
filme da sua vida.
E não importa onde esteja ou aonde vá, dia e noite, dormindo ou acordado,
transportamos NO CÉREBRO o fardo das nossas recordações.
“Por mais que você corra, seu passado sempre te alcança.”
“Cada um arrasta seus medos. Só que alguns pesam mais que outros. (...). Por mais que você
caminhe, por mais que se afaste, seu inferno pessoal (as boas e más lembranças)
sempre vai junto (dentro do cérebro).”
Como Poeira ao Vento
Leonardo Padura
Fantasiando o Passado
“Em geral, Lavínia detestava abordar seu passado (as lembranças de sua vida: infância,
juventude, maturidade). Significava reabrir feridas, revisitar um mundo de privações e
violências. Para contentar clientes que perguntavam sobre sua vida pregressa, ela costumava
mentir. Inventava biografias falsas ao sabor de seu estado de espírito na hora. Uma de suas
mentiras prediletas: apresentava-se como a ovelha negra de uma família capixaba tradicional,
uma família arruinada, que a obrigava a prostituir-se para pagar dívidas. Fantasias que
serviam para protegê-la da lembrança dos episódios de uma dureza absurda de seu (real)
passado. Um pântano pegajoso que ainda a atormentava. (...).”
EU RECEBERIA AS PIORES NOTÍCIAS DOS SEUS LINDOS LÁBIOS
Marçal Aquino
Cuspindo o Passado
“Na minha boca, a pasta tinha endurecido, formando uma espécie de espuma leitosa, e estava
começando a escorrer pelos cantos. Cuspi tudo. -- Escovar. Escovar. Cuspir. – Escovar. Escovar.
Cuspir. Por que será que meu pai nunca me disse para não coçar o saco? Por que será que meu
pai nunca me ensinou a escovar os dentes com aquela espuma leitosa? Por que será que ele
me criou para viver feito um bicho? Por que será que todos os pobres vivem desse jeito, na
sujeira e na feiura? – Escovar. Escovar. Cuspir. – Escovar. Escovar. Cuspir. Se, pelo menos , os
homens pudessem cuspir assim o seu passado (as lembranças de sua vida), com essas
facilidade...
O TIGRE BRANCO
Aravind Adiga
Espanando o Passado
“Devíamos ter vendido o piano também. Deslizo meu dedo pela tampa. Fazendo uma linha na
poeira. Mamãe suspira e vai embora, porque sabe que não vou poder descansar até não haver
mais nada de poeira na superfície do piano. Vou até o armário de suprimentos e pego alguns
panos. Que ótimo se eu pudesse limpar nossas memórias (nosso passado) assim. (...).”
MINHA IRMÃ, A SERIAL KILLER
Braithwaite Oyinkan
Ensaboando o Passado
“O tecido leve e acetinado já começava a amarelar com o tempo (com o longo tempo de
Permanência no Presente). A falta de ar, de sol e principalmente de movimento tem o poder de
estragar as coisas e faz sem dó o mesmo com a gente. Dalva desenterrou no armário seu
vestido de noiva. Lavou o forro relendo com a ponta dos dedos cada nome ( dos familiares e
amigos – presentes no casamento), Lembrando cada história bordada ali. Não era um gesto de
saudade, a saudade que tinha de tudo o que não aconteceu depois de seu casamento não
cabia nem nos gestos nem na falta deles. Lavou o vestido como um ritual de passagem. Uma
boa Ensaboada no Passado (nas lembranças das graças e desgraças de sua vida), queria ir
embora. (...).”
TUDO É RIO
Carla Madeira
Fugindo do Passado
“Madame Gaelle queria encontrar um homem para se casar, que o convenceria a levá-la para
longe, para Port-au-Prince, ou até para outro país. Havia (em seu cérebro) lembranças demais
naquela cidade (sobretudo as lembranças das perdas: marido, filha...) para segurá-la ali, e,
ao mesmo tempo, fazer com que tivesse vontade de fugir de Ville Rose.”
CLARA DA LUZ DO MAR
Edwidge Dantcat
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Neste capítulo faremos uma reconstituição da sua existência, – em um PRESENTE ABSOLUTO:
desde seu nascimento até o dia atual. A coisa é mais simples do que imagina; contudo, como já
foi acordado, e por não saber sua idade real, consideremos que “VOCÊ NASCEU EM 1999”
CAPÍTULO
VII
- VIVEMOS EM UM ETERNO PRESENTE -
Considerando que nasceu em 1999, e estamos em 2022, - significa que VOCÊ Permanece no
Presente há 23 anos. Portanto, perguntado sobre sua idade, você deve responder:
Permaneço no Presente há 23 anos (PP = 23).
você – como um saco vazio que não para em pé – nasceu com a cabeça oca
O FARDO DA EXISTÊNCIA
VOCÊ , POR ENQUANTO, CARREGA – EM SEU CÉREBRO – UM PASSADO COM 23 ANOS DE LEMBRANÇAS
-- Bonecos, exclamou o pai em tom de escandalizada surpresa, Bonecos, nunca ouvi uma ideia
mais disparatada,
-- Sim, senhor meu pai, bonecos, estatuetas, manipanços, monos, bugigangos, sempre-em-pés,
chame-lhes como quiser (...).
-- Também acabou mal a que não era aventura, meu pai. (...).
A CAVERNA
José Saramago
4– A ILUSÃO DO TEMPO – na sua cabeça: o seu PASSADO (as lembranças da sua vida: infância,
juventude, maturidade) só existe dentro do seu CÉREBRO. O tempo, portanto, é apenas uma
ilusão causada pela evolução da MEMÓRIA – em nossa cabeça.
Observe a ilustração
o PASSADO (as lembranças da sua vida: infância, juventude, maturidade) só existe em seu
cérebro; o TEMPO, portanto, como já foi dito, é tão somente uma ilusão causada pela
evolução da memória – na cabeça dos bípedes
“Viver é fácil: até os mortos conseguem. Mas a vida (as lembranças dos caminhos que
percorremos durante a vida) é um ônus que precisa ser carregado (no cérebro) por todos os
viventes. A vida, caro senhor, a vida é um beijo doce em boca amarga. (...). Uns não vivem por
temer morrer; eu não morro por temer viver. Entende, o senhor?
O ÚLTIMO VOO DO FLAMINGO
Mia Couto
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, você criou a ilusão de que suas lembranças
pessoais (seu passado) estão – fora do seu cérebro – distribuídas na inexistente ‘Esteira do
Tempo que Passou’.
“Mas, dirás tu, se você não guardou na Retina da Memória (cérebro) a imagem (lembranças)
do que fui, como é que podes assim discernir a verdade daquele tempo, e experimentá-la
depois de tantos anos? Ah! Indiscreta! Ah! Ignorantona! Mas é isso mesmo (a evolução da
memória) que nos faz senhores da Terra, é esse poder de restaurar o passado (reviver as
lembranças da nossa vida – arquivadas dentro do cérebro), para tocar a instabilidade das
nossas impressões e a verdade dos nossos afetos.”
MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
Machado de Assis
“Como o tempo (de Permanência no Presente) custa a passar quando a gente espera!
Principalmente quando venta. Parece que o vento maneia o tempo”.
O TEMPO E O VENTO
Érico Veríssimo
8. VOCÊ HUMANO – Sentimental: cada lembrança da sua vida, somatiza uma determinada
emoção (veremos tudo isso no cap. XIX). Portanto, ao regressar em sua Linha da Memória
(dentro do cérebro) e LEMBRAR de um determinado episódio da juventude, por exemplo, você
pode SENTIR: saudade, trauma, afeição, aversão, orgulho, frustração, revolta, perdão, etc.
“Algumas coisas são grandes demais para serem vistas; algumas emoções
intensas demais para serem sentidas”.
SANDMAN
Neil Gaiman
“O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não
tenhamos, nisso, um dia a menos nela”.
Fernando Pessoa
O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas: como já foi explicado, você já PERMANECEU NO
PRESENTE por 23 ANOS. Isto significa que VOCÊ, - salvo dos infortúnios da vida, - ainda dispõe
de 57 ANOS para Permanecer no Presente.
Assim sendo, pergunto: VOCÊ já pensou o que fará com o período de Permanência no
Presente que ainda lhe resta?
“Toda a diversidade, todo o encanto, toda a beleza da vida é feita de sombra e luz.”
Anna Kariênina
Liev Tolstói
10. ACASOS DA VIDA – Permanecer ou não Permanecer; eis a questão!: como já foi dito,
nós, bípedes, ao nascermos, dispomos de aproximadamente 80 ANOS para Permanecer no
Presente – independente dos ponteiros do relógio.
Mas é evidente que não podemos contar com esse número (80 anos) para programar a nossa
vida. Não há certezas nesse mundo; tudo é imprevisível. A cada momento nos deparamos com
as casualidades da vida: às vezes trágicas; outras vezes radiantes.
“Ao que, digo ao senhor, pergunto: em sua vida é assim? Na minha, agora é que vejo (“ao
refletir sobre as lembranças da minha vida”), as coisas importantes, todas, em caso curto de
acaso foi que se conseguiram, - pelo pulo fino de sem ver se dar, - a sorte momenteira, por
cabelo por um fio, um CLIM de clina de cavalo. Ah, e se não fosse, cada acaso, não tivesse sido,
qual é então que teria sido o meu destino seguinte? Coisa vã, que não conforma respostas”.
GRANDE SERTÃO: VEREDAS
Guimarães Rosa
Obs: caso o mundo fosse previsível, nós já teríamos morrido de tédio. Pois – enquanto a
certeza é paralisante e gera o comodismo – são justamente as dúvidas, incertezas e
descontentamentos que nos levam adiante.
“DEVEMOS TORCER PELA CHEGADA DE UMA CRISE
SEMPRE QUE FOMOS AMEAÇADOS POR UMA ERA DE ESTABILIDADE”
Homens e Chimpanzés?
“Os vestígios de hominídeo mais famosos do mundo são de um australopitecino, com 3,18
milhões de anos (de Permanência no Presente), encontrados em Hadar, na Etiópia, em 1974,
por uma equipe liderada por Donald Johanson. (...). O esqueleto tornou-se mais familiarmente
conhecido como LUCY, por causa da canção dos Beatles “Lucy in the sky with Diamonds”.
Johanson nunca duvidou de sua importância. “Ela é o nosso ancestral mais antigo, o Elo
Perdido (?!*) entre o macaco e o ser humano”, ele disse. “
BREVE HISTÓRIA DE QUASE TUDO
Bill Bryson
Explicando a Diferença
LUCY – ao Permanecer no Presente – não preenche o CÉREBRO com lembranças da sua vida;
ou seja
Você LEMBRA de episódios recentes da sua vida; Lucy não LEMBRA de episódios recentes;
conclusão
Você possui um boa MEMÓRIA; um chimpanzé, por enquanto, ainda não a EVOLUIU.
Como veremos no decorrer do trabalho, uma espécie não substitui uma outra no TEMPO – o
tempo não existe. Na realidade, uma espécie substitui uma outra no ESPAÇO. Por exemplo:
com a extinção dos dinossauros, o ESPAÇO antes ocupado por eles foi gradativamente sendo
ocupado por outras espécies, e, entre elas, pequenos mamíferos – nossos ancestrais.
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CAPÍTULO
VIII
CÉREBRO
A FANTÁSTICA FÁBRICA DO FUTURO - DE CADA UM
“Cada segundo que passa é como uma porta que se abre para deixar entrar o que ainda não
sucedeu, - Isso a que damos o nome de futuro, porém, desafiando a contradição com o que
acabou de ser dito, talvez a ideia correcta seja a de que o futuro é tão somente um imenso
vazio, a de que o futuro não é mais que o tempo de que o ETERNO PRESENTE se alimenta.”
O HOMEM DUPLICADO
José Saramago
Até agora vimos que – ao preencher nosso CÉREBRO (Linha da Memória) com as lembranças
da nossa vida – criamos a ilusão do PASSADO em nossa cabeça. A partir de agora, para
concluir o argumento, veremos também como criamos a ilusão do FUTURO em nosso cérebro.
A – VOCÊ SEM METAFÍSICA – como um pastel de vento : como foi explicado, o PRESENTE É
ABSOLUTO, ou seja: vivemos em um Eterno Presente. Nesta condição, VOCÊ – como um pastel
de feira – nasceu (“em 1999”) com o cérebro OCO: sem conteúdo, sem essência, sem história,
sem passado. No entanto...
EM SEU CÉREBRO
VOCÊ, POR ENQUANTO, CARREGA UM PASSADO COM APENAS 23 ANOS DE LEMBRANÇAS PESSOAIS
EM SEU CÉREBRO
(VOCÊ CRIA O PASSADO COM SUAS LEMBRANÇAS: 23 ANOS -- E CRIA O FUTURO COM A ESPERANÇA: 57 ANOS)
PEDIDO DE DESCULPA – ILUSTRAÇÃO DESATUALIZADA
Peço desculpas, mas, por ser um completo analfabeto digital (e não ter como pagar por uma
assistência técnica) , não consigo retirar e atualizar a ilustração acima.
CÉREBRO
- o cofre que contém o que passou – e espera o que está por vir –
“O destino, quantas vezes será preciso dizê-lo, é um COFRE como não existe outro, Que ao
tempo é aberto e fechado, olhando dentro dele (dentro do cérebro), podemos ver o que já
aconteceu, a vida passada, tornada destino cumprido (23 anos de LEMBRANÇAS), Mas do que
está para suceder (57 anos de ESPERANÇAS), não alcançamos mais do que uns
pressentimentos, umas intuições....”.
O EVANGELHO SEGUNDO JESUS CRISTO
José Saramago
“Uma das superações mais importantes que Buda nos apontou é exatamente a do passado (23
anos de LEMBRANÇAS), porque já foi vivido, bem ou mal, já transcorreu e não é reparável. E,
ao mesmo tempo, não tentar projetar o futuro (57 anos de ESPERANÇAS)... pois ainda não
ocorreu, e querer predizê-lo é fonte de ansiedade, e a ansiedade gera sofrimento. (...).
Portanto, Loreta (ou seria Elisa?), a travessia espiritual significa tentar encontrar a plenitude
do presente. Disse o Indicador de Caminhos – o iluminado Chaq. (...).”
COMO POEIRA AO VENTO
Leonardo Padura
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AMARCORD – Io Mi Ricordo
Belas ou trágicas, neste capítulo veremos as sempre marcantes Lembranças da Infância –
eternizadas em nosso cérebro – através de 20 citações literárias.
CAPÍTULO
IX
AS LEMBRANÇAS DA INFÂNCIA – EM NOSSO CÉREBRO
“ Pois esse era o único sonho de nossa mãe: voltar ao lugar onde fôramos felizes e onde
vivêramos em paz (Makomani – junto ao mar Índico – terra natal de Imani Cinza, a Viva).
Aquela saudade era infinita. Haverá, a propósito, saudade que não seja infinita?
MULHERES DE CINZAS
Mia Couto
Como foi explicado, VOCÊ não regressa na inexistente Esteira do Tempo para LEMBRAR da
infância, - o tempo não existe. Na realidade, VOCÊ regressa em sua Linha da Memória (dentro
do cérebro) para LEMBRA (reviver, rememorar, recordar) a aurora da sua vida.
“São sempre enormes as coisas da infância, as maiores (lembranças) que teremos na vida, eu
penso. As mais inesquecíveis. Talvez, as mais sentidas como verdadeiras. Passamos o resto da
vida (o resto de nossa Permanência no Presente) atrás dessa sensação – disse o professor
Jardim, comovido. A lembrança de sua mãe, de quem se separara muito cedo para ir estudar,
sempre o deixava engasgado. (...). Abel (“que deixou-se arrastar por suas palavras
nostálgicas”) sentiu aquelas palavras (do professor) entrarem dentro dele (dentro do cérebro)
e tudo (as lembranças de sua infância com Caim: o saudoso abacateiro, Foguete – o cão do
vizinho...), tudo parecia mesmo enorme. (...).”
VÉSPERA
Carla Madeira
Veja a seguir, 20 CITAÇÕES que evocam a infância, - começando pelo grande Charles Dickens...
1– DAVID COPPERFIELD
Nesse trecho, que inicia o livro (cap. II), David Copperfield (ou Charles Dickens – por que não?)
regressa em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e chega até as LEMBRANÇAS da sua
infância; - dando início, assim, ao relato da história da sua vida...
“Os primeiros objetos que assumem presença distinta diante de mim, quando olho para trás
(vemos nossas lembranças – dentro do cérebro), para o vazio de minha infância, são minha
mãe com seu belo cabelo e formas jovens (uma boneca de cera, - segundo a srta. Betsey), e
Peggotty, a criada da família, com seus olhos tão escuros que parecem escurecer até o que os
cerca em seu rosto, faces e braços tão firmes e vermelhos que eu me perguntava por que os
passarinhos não preferiam picar a ela em vez de maçãs. (...).
Tenho em minha mente (cérebro) uma impressão (lembrança tátil de Peggotty) que não
consigo distinguir da lembrança de fato, do contato do indicador de peggotty, que ela
costumava estender para eu segurar, e que era áspero pelo trabalho com agulha, como um
pequeno ralador de noz-moscada (memorizamos sensações táteis – no cérebro).
Isso pode ser fantasia, embora eu ache que a MEMÓRIA da maioria de nós é capaz de recuar
(regressar na Linha da Memória – dentro do cérebro) a esses tempos mais do que muitos
supomos; assim como acredito que o poder de observação (memorização) dos detalhes em
crianças muito novas seja bem mais admirável por sua atenção e precisão. (...)
Eu deveria ter escrúpulos de estar “divagando” ao me deter para falar disso, mas é o que me
leva a observar que cultivei essas conclusões em parte na experiência do meu próprio EU; e se,
por qualquer coisa que eu ponha nesta narrativa (“das lembranças da minha vida”), vier a
parecer que fui uma criança muito observadora, ou que, como adulto, tenho uma forte
LEMBRANÇA de minha infância, eu sem dúvida admito ambas essas características.
Olhando para trás (“para as lembranças do meu passado – dentro do cérebro”), como eu dizia,
para o vazio de minha infância, os primeiros objetos de que me lembro destacados por si
mesmos da confusão das coisas (das demais lembranças da infância) são minha mãe e
Peggotty. De que mais me LEMBRO? Vamos ver. (...).
“Vim. Não nego que, ao avistar a cidade natal, tive uma sensação nova. Não era efeito da
minha pátria política, era-o do Lugar da Infância, a rua, a torre, o chafariz da esquina, a
mulher de mantilha, o preto do ganho, as coisas e cenas (lembranças) da meninice, buriladas
na MEMÓRIA (cérebro). Nada menos que uma renascença. O espírito, como um pássaro, não
se lhe deu da corrente dos anos, arrepiou o voo na direção da fonte original (regressou em sua
Linha da Memória – dentro do cérebro), e foi beber da água fresca e pura (lembranças
cândidas da infância), ainda não mesclada do enxurro da vida (ainda não ‘contaminadas’ pelas
conflituosas lembranças da vida adulta)”.
MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
Machado de Assis
“E, aí, Nhô Augusto (estropiado, - após sobreviver por um triz à tocaia do major Consilva)
LEMBROU da mulher e da filha (que o haviam abandonado para escapar à sua má índole). Sem
raiva, sem sofrimento, mesmo, só com uma falta de ar enorme, sufocando. (...). Até que pôde
chorar, e chorou muito, um choro solto, sem vergonha nenhuma, de menino ao abandono. E,
sem saber e sem poder, chamou alto soluçando: -- Mãe... mãe... Tudo perdido! (arrependido –
ao lembrar que durante toda a vida sempre foi um grande fdp!). E ele teve uma vontade
virgem, uma precisão de contar a sua desgraça (de regressar em sua Linha da Memória –
dentro do cérebro, - e), repassar as misérias (lembranças) da sua vida. Mas não desabafou
(estava, então, na casa de um desconhecido casal de camponeses pobres – que o socorrera ).
Também não rezou. Porém a luzinha da candeia, a tremer, com brilhos bonitos no poço de
azeite (o fez lembrar da meninice), contando histórias da infância de Nhô Augusto, histórias
mal lembradas, mas todas de bom e bonito final. Fechou os olhos. Suas mãos, uma na outra,
estavam frias. Deu-se ao cansaço. Dormiu.
SAGARANA
Guimarães Rosa
“Dantés seguiu adiante; cada passo que dava oprimia seu coração (cérebro) com uma nova
emoção (cada lembrança – em nosso cérebro – somatiza uma determinada emoção; –
veremos no cap. XIX); todas aquelas lembranças da infância, lembranças indeléveis,
eternamente presentes no pensamento (cérebro), estavam lá; afloravam em cada canto de
praça, em cada esquina de rua, em cada cruzamento. (...). Nada mais o LEMBRAVA do
aposento do seu pai: não era mais o mesmo papel de parede, todos os velhos móveis, amigos
de infância de Edmond, presentes em sua lembrança (cérebro) em todos os detalhes, haviam
desaparecido.”
O CONDE DE MONTE CRISTO
Alexandre Dumas
“—Não te acontece às vezes pensar – disse Natacha ao irmão -, não te acontece pensar que
nada mais terás, absolutamente mais nada, que toda a felicidade que podias usufruir já te foi
concedida? E isto não é tão triste?
-- Naturalmente! – volveu Nicolau – Às vezes, quando me sinto feliz, quando toda a gente está
alegre em volta de mim, de repente sinto uma espécie de desgosto de tudo e vem-me à ideia
que todos temos de morrer. (...).
-- Oh!, sei muito bem o que isso é! Como te compreendo! – ocorreu Natacha. – Eu era ainda
muito pequena quando isso aconteceu. Lembras-te? Tinham- me castigado por eu ter comido
ameixas. Enquanto todos vocês dançavam, eu fiquei fechada na sala de aula. E o que eu
chorava! Nunca me esquecerei desse momento! (...). E o principal é que não tinha culpa.
Lembras-te?
-- Sim, lembro-me – volveu Nicolau. – Lembro-me de que depois fui ter contigo e quis consolar-
te, e, queres saber?, não sabia como. Muito patuscos éramos! Eu tinha nessa altura um boneco
e quis oferecer-to. Lembras-te?
-- E tu lembras-te? Voltou Natacha com um sorriso sonhador. – Muito, muito antes, quando
nós ainda éramos muito pequeninos e o tio nos chamou ao gabinete. (...). Entramos, e que
vimos nós?
-- Um preto – concluiu Nicolau, sorrindo alegremente. Pois então não me havia de lembrar? E
ainda hoje não tenho a certeza se era realmente um preto ou se nós o teríamos visto apenas
em sonhos ou se nos teriam contado uma história assim. (...). – Lembras-te, Sonia?
-- E lembras-te de uma vez, estávamos nós a fazer rebolar ovos no salão. (...). Lembras-te? Que
engraçado era! (...).
Sorridentes, iam fazendo desfilar diante deles (no cérebro de cada um) não recordações
tristes, mas esses quadros (lembranças) poéticos da infância, essas impressões do mais
longínquo passado (lembranças que se distanciaram na Linha da Memória – dentro do
cérebro), em que os sonhos se confundem com a realidade.
SÓNIA, como sempre, mantinha-se à margem, se bem que as suas reminiscências fossem
comuns (menos por ser prima, e mais por ser pobre – Sónia nutria uma paixão sem esperança
por Nicolau; – a Condessa Rostova não o permitiria). De resto, as suas (lembranças da infância
– em seu cérebro) eram mais pobres, e as que porventura recordava não lhe despertavam na
alma as mesmas impressões poéticas. No entanto, já era muito para SÓNIA contentar-se com a
alegria dos dois e poder vibrar ao mesmo diapasão.”
GUERRA E PAZ
Liev Tolstoi
“É um aroma quente, que toca em alguma fibra íntima da sua MEMÓRIA (cérebro) e a devolve
à infância (o aroma da sua terra natal, República Dominicana – Santo Domingo, a faz
regressar em sua Linha da Memória – dentro do cérebro – até chegar nas lembranças da sua
infância), às buganvílias multicoloridas penduradas nos tetos e nas sacadas, a esta avenida
Máximo Gómez. O Dia das Mães! É claro. Maio de sol radiante, chuvas diluviais, calor, (...). O
colégio Santo Domingo, nos domingos em que ia com tia Adelina e as primas às sessões
infantis do Cinema Elite. (...). Sua casa também não mudou muito, embora em sua MEMÓRIA
(nas lembranças – em seu cérebro) o cinza das paredes fosse mais intenso e agora está
desbotado, cheio de manchas, descascado. O jardim se transformou num matagal, folhas
mortas e grama seca. (...). Lá está a mangueira. O flamboiã era este? Possivelmente, quando
tinha folhas e flores; agora, é um tronco de braços cortados e raquíticos. (...).”
A FESTA DO BODE
Mário Vargas Llorsa
“Desceu do comboio na estação de San Lucas. Era um lugar miserável. A essa hora não se via
vivalma no cais de madeira, com o telhado arruinado pela intempérie e pelas formigas. (...).
Dali podia ver-se todo o vale através de uma neblina ténue que subia da terra molhada pela
chuva da noite. (...). Olhou à volta (e regressou em sua Linha da Memória – dentro do
cérebro). Na sua infância, a única época feliz que podia recordar, antes que o pai acabasse por
arruinar-se e abandonar-se à bebida e à própria vergonha, tinha andado a cavalo com ele por
aquela região. Recordava que em Las Tres Marias tinha brincado no verão, mas isso tinha sido
a tantos anos que a MEMÓRIA (as lembranças em seu cérebro) quase se desvanecia e não
podia reconhecer o lugar. “
A CASA DOS ESPÍRITOS
Isabel Allende
- Mas, para isso, ele explica como funciona sua Linha da Memória – dentro do cérebro –
“Minha MEMÓRIA é como um filme (o filme da sua vida – produzido por suas lembranças –
dentro do cérebro). É por isso que eu sou tão bom em LEMBRAR coisas: como as conversas que
anotei neste livro, o que as pessoas estavam usando (memorizamos imagens – no cérebro),
como elas cheiram (memorizamos aromas – no cérebro), mas isso porque minha MEMÓRIA
tem uma trilha de registro farejadora, que é como uma trilha de registro de sons
(memorizamos sons – vozes, músicas, barulhos – no cérebro).
E quando me pedem para LEMBRAR alguma coisa, posso simplesmente pressionar Rewind, FF
ou Pause como num videocassete, só que mais como num DVD, porque não tenho que Rewind
(regressar na Linha da Memória) tudo para trás para acessar a LEMBRANÇA de uma coisa de
algum tempo atrás. E não há botões, também, porque é uma coisa que está acontecendo na
minha CABEÇA. Se alguém diz pra mim: - Christopher, como era sua mãe? ... eu posso dar um
Rewind (regressar na Linha da Memória – dentro do cérebro) e parar em diferentes cenas
(diferentes lembranças) e dizer como ela era.
Por exemplo, eu podia dar um Rewind direto para (as lembranças de) 4 de julho de 1992,
quando eu tinha 9 anos de idade (*vemos nossas lembranças – dentro do cérebro), e era
sábado, e nós estávamos de férias na Cornualha e, à tarde, estávamos numa praia, num lugar
chamado Polperro. E a mãe estava usando shorts de algodão, (...), sutiã de biquíni azul-claro
(...), e estava fumando (...), tomando banho de sol (...), e lendo um livro (...), e ela disse: - Que
merda, está um gelo! . (...).
Só que não me LEMBRO de nada de antes dos meus 4 anos porque eu não olhava ( não
registrava no cérebro) as coisas do jeito certo, e daí não consigo me LEMBRAR de nada
direito.”
O ESTRANHO CASO DO CACHORRO MORTO
Mark Haddon
*Como explicaremos a seguir (cap. X), VEMOS nossas lembranças – dentro do cérebro.
(...).Baixei, mas fui ponteando opostos (como amor e ódio). Que isso foi o que sempre me
invocou, o senhor sabe: eu careço de que o bom seja bom, e o ruim ruim, que dum lado esteja
o preto e do outro o branco, que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da
tristeza! Quero todos os pastos demarcados... Como é que posso com este mundo? A vida é
ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero. A que,
este mundo é muito misturado (*o CÉREBRO que ama, também odeia; exprime saudade e
trauma; alegria e tristeza; esperança e desespero, etc.).
GRANDE SERTÃO – VEREDAS
Guimarães Rosa
EXPLICAÇÃO
*A Culpa é das Lembranças: como veremos no cap. XIX (CÉREBRO – A fantástica Fábrica de
Emoções), cada lembrança da nossa vida, somatiza uma determinada emoção. Portanto,
RIOBALDO pode afirmar:
LEMBRO do líder dos jagunços Joca Ramiro, logo sinto admiração e respeito;
LEMBRO de Diadorim, logo sinto (além da dor da perda e da saudade) afeição e amor.
-- Papai, por que você dança quando anda? Você dança assim quando você anda, está vendo?
(...). Os antigos nômades que compõem minha árvore genealógica dizem que a verdade sai da
boca das crianças e a gratidão, dos olhos da vaca que acaba de parir. Esse proverbio nunca me
pareceu tão exato quanto naquela manhã. Você, minha filhinha, você me remetia à verdade
com uma dose de afeição não desprovida de firmeza. (...).
TUDO me veio à lembrança (a pergunta o fez regressar em sua Linha da Memória – dentro do
cérebro – até chegar nas LEMBRANÇAS da sua infância, - no Djibuti, sua terra natal, país
africano, localizado na costa do Mar Vermelho).
Eu sou essa criança que nada entre o presente e o passado. Basta que eu feche os olhos ( e
voltá-los para dentro do cérebro) e tudo me vem à lembrança. LEMBRO do cheiro da terra
molhada depois da primeira chuva (memorizamos aromas – no cérebro), LEMBRO da poeira
dançando nos raios de luz (memorizamos imagens – no cérebro). E me LEMBRO da primeira
vez que fiquei doente. Eu devia ter seis anos (de Permanência no Presente). A febre me
castigou uma semana inteira (memorizamos sensações táteis – no cérebro). Calor, suor e
calafrios. Meus primeiros tormentos datam daquela época.
Uma madrugada no início da década de 1970, em Djibuti. A Memória (sua Linha da Memória –
dentro do cérebro) me leva sempre a esse ponto de partida. Hoje em dia, minhas lembranças
estão menos turvas porque eu soube mobilizar esforços para recuar no tempo (regressar em
sua Linha da Memória – dentro do cérebro) e pôr um pouco de ordem na confusão (das
lembranças) da minha infância. (...).”
POR QUE VOCÊ DANÇA QUANDO ANDA?
Abdourahman A. Waberi
“Fechei os olhos para ver as imagens (lembranças) dentro de mim (dentro do cérebro) e elas
surgiram límpidas como cristal fino (...). Como diz um provérbio da minha terra “é melhor
perder a vista que a alma” e sempre nesta mesma hora eu desperto, pois esse céu de escuridão
quase clara faz meu espírito enxergar meu povoado num momento mágico em que apenas três
coisas havia (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro): a imensidão úmida da planície
verde, o silêncio de doer os ouvidos e o monte dominante na paisagem. Posso sentir o ar fresco
depois de uma das muitas chuvas abundantes que caem no sopé do monte Namuli. Nunca
mais esquecerei essa sensação e o cheiro de natureza misturado com a terra encharcada
(memorizamos aromas – no cérebro).
O verde que domina a paisagem no meu local encantado impressiona. Todo o povoado
transborda com uma abundância de espécies de plantas e animais que só existem lá. O solo
fértil onde minha família plantava milho e criava cabras abrigava dezenas de casas circulares
de terra batida e telhado de palha. Havia um rio, o Ligungo, com milhares de pedregulhos em
sua extensão onde nós, crianças, nos divertíamos, (...). Nos trechos em que as mulheres
lavavam as roupas, as pedras ficavam cobertas pelos panos estampados secando ao sol, o que
dava um colorido especial e inusitado à paisagem. Eu dizia que eram “pedras-flores”. Eu, meu
melhor amigo – Umpalla – e muitos outros meninos e meninas do povoado éramos felizes nas
cachoeiras que sangram as pedreiras e formam aquelas nuvens de vapor quando a água se
acaba em espuma... Tudo isso me refresca a mente e os olhos do espírito nesta lida em que me
encontro deste outro lado. Lembro-me de cada detalhe como se fosse hoje... e veja que já faz
muitos anos (de Permanência no Presente) que saí de lá! Como poderia esquecer? (...).”
O CRIME DO CAIS DO VALONGO
Eliana Alves Cruz
Akin Sangokunle – em 1888, quando estava finalmente liberto – regressa em sua Linha da
Memória (dentro do cérebro) até o ano de 1849 (quando tinha 9 anos de idade) para
descrever a sua maior e mais traumática lembrança da infância...
Depois de uma espera que parecia uma eternidade naquele depósito (“de escravos
provenientes de todas as partes – uma Babel negra cheirando a fezes, urina e a outros
dejetos”), foram acordados no meio da noite e caminharam cerca de dois quilômetros até o
embarque. Akin olhou ligeiramente para trás. Esta seria a última imagem (lembrança) daquele
continente que sua retina (cérebro) registraria. Um vento levantava redemoinhos de folhas
secas. Olhou para o alto das palmeiras iluminadas pela lua e sentiu o peito apertar. Todas as
lembranças da infância em Iseyin vieram como numa única tela (em seu cérebro), que
entendeu ser preciso apagar (as saudosas lembranças: pai, mãe, irmãos – todos mortos) ao
menos momentaneamente se não quisesse morrer. Embora esta última ideia, a de morte, já
não lhe parecesse tão má assim. (...).
Firmino não fazia concessões para nada e alimentava sistematicamente a revolta que o
acompanhou desde a África, quando foi capturado e embarcado, até aquele momento.
Reconstituia (no cérebro) cada detalhe (cada lembrança de sua vida) em relatos, sonhos e
pesadelos. Não, ele não iria ESQUECER, e por isso avivava o carvão em brasa do ressentimento
com muita paciência, persistência e zelo. (...).”
Cicatrizes Interior
“Quando Firmino virou de costas para pendurar as roupas num cabideiro, Martha (sua
sobrinha neta) não conseguiu conter uma exclamação de assombro. As cicatrizes salientes e
escuras tomavam quase toda a extensão da pele. Eram queloides, cicatrizes de uma vida de
guerras.
– Não se assuste, filha (disse Firmino), cada uma é um troféu, e as que estão por dentro (as
lembranças da guerra por liberdade, e pós-liberdade) são ainda maiores.”
ÁGUA DE BARRELA
Eliana Alves Cruz
“Nunca quis. Nem muito, nem parte. Nunca fui eu, nem dona, nem senhora. Sempre fiquei
entre o meio e a metade. Nunca passei de meios caminhos, meios desejos, meia saudade. Daí o
meu nome: Maria Metade. (...).
Pois lhe confesso (senhor escritor): aqui, penumbreada nesta prisão, não sofro tanto quanto
sofria antes. É que aqui, sabe, acabo saindo mais que lá em minha casa natal. Vou onde? Saio
pelo pé de meu pensamento (viaja em seu Universo Interior). Por via de lembrança eu retorno
(regressa em sua Linha da Memória – dentro do cérebro) ao Cine Olympia, em minha cidade
de outro tempo (no Presente Anterior). Sim, porque depois de matar o Seis (seu esposo – “que
nunca ascendeu a pessoa”) reganhei acesso a minhas lembranças. É assim que, cada noite,
volto à matinê das quatro de minha meninice. (...).
Não entrava no cinema que me estava interdito. Eu tinha a raça errada, a idade errada. Mas
ficava no outro lado do passeio, a assistir ao riso dos alheios. Ali passavam as moças belas,
brancas, mulatas algumas. Era lá que eu sonhava. Não sonhava ser feliz, que isso era
demasiado em mim. Sonhava para me sentir longínqua, distante até do meu cheiro. Ali, frente
ao Cinema Olympia, sonhei tanto até o sonho me sujar. (...).”
O FIO DAS MISSANGAS
Mia Couto
“Meteu as mãos nos bolsos das calças e começou a caminhar lentamente pela beira de uma
das piscinas, a cabeça inclinada, os ombros caídos. Leni (16 anos) mirou as costas encurvadas
do pai e sentiu um pouco de pena. Supôs que estivesse recordando dias mais felizes, os dias da
infância, as tardes de verão passadas naquele lugar. Mas logo deixou de sentir dó. Pelo menos
ele (que teve uma infância plena) podia voltar a lugares cheios de lembranças. Podia
reconhecer uma árvore e (ao regressar em sua Linha da Memória) reconstituir o dia em que ele
e os amigos tinham subido até a copa. Podia lembrar-se da mãe desdobrando uma toalha
quadriculada sobre uma daquelas mesas agora destruídas. Ao passo que ela (Leni), por sua
vez, não tinha nenhum paraíso perdido (dentro do cérebro) para onde pudesse voltar. Fazia
muito pouco que deixara a infância, mas sua MEMÓRIA (cérebro) estava vazia. Graças ao pai,
ao Reverendo Pearson e à sua (itinerante) santa missão, (para Leni) suas lembranças de
infância resumiam-se ao interior do próprio carro, aos quartos miseráveis de centenas de
hotéis todos iguais, ao rosto de dezenas de crianças com que ela não chegara a conviver por
tempo suficiente para já sentir saudade na hora de ir embora, a uma mãe de cujo rosto quase
não lembrava mais. (...).”
O VENTO QUE ARRASA
Selva Almada
“(Ao regressar em sua Linha da Memória – dentro do cérebro). Uma de minhas mais
estranhas recordações de infância tem a ver com o abate de galinhas não Kosher, em que a
cabeça era simplesmente decapitada. Zaz-trás! Então punham a galinha num cano afunilado,
(...), onde o sangue escorria para um grande barril. Vez por outra as pernas das galinhas ainda
se moviam e, mais raramente, uma delas caia do cano, quando então, começava a correr sem
cabeça de um lado para outro. (...). A sangueira, a matança... Meu pai já estava calejado, mas
no começo eu (“tinha uns 6 ou 7 anos”) naturalmente fiquei perturbado. (...). Mas aquele era o
nosso negócio e bem cedo eu o aceitei. (...).”
INDIGNAÇÃO
Philip Roth
17 – DAMARIS LEMBRA DE SUA INFÂNCIA CULPADA
“Iam completar oito anos. (...). Damaris e Nicolasito chegaram sozinhos ao seu destino, um
ponto baixo e cheio de rochas onde as ondas lambiam o rochedo. (...). A princípio ficaram
observando tranquilamente umas formigas-saúvas que desciam em fila por uma árvore,
carregando pedaços de folhas. (...). Então ele se aproximou dos rochedos dizendo que queria
que os respingos das ondas o molhasse. Damaris (por ser local, fazia as vezes de guia) tentou
impedi-lo. Explicou que era perigoso, disse que naquele lugar os rochedos eram escorregadios
e o mar, traiçoeiro. Mas ele não lhe deu ouvidos, se deteve na pedra e a onda que arrebentou
nesse momento, violenta, o levou. (...). – A imagem (lembrança) ficou gravada na MEMÓRIA
(cérebro) de Damaris assim: um menino branco e alto diante do mar, em seguida uma golfada
branca da onda, e depois nada, as rochas vazias sobre um mar verde que, de longe, parecia
tranquilo. E ela ali, junto às saúvas, sem poder fazer nada. (...).
A CACHORRA
Pilar Quintana
“Eu estava em chamas. É a minha lembrança mais antiga (gravada em seu cérebro). Eu tinha
3 anos de idade e vivíamos em um estacionamento de trailers em uma cidade do sul do
Arizona. Estava de pé em uma cadeira diante do fogo, usando um vestido rosa que minha avó
havia comprado (...). Eu gostava de girar em frente ao espelho, pensando ser uma bailarina.
Mas naquele momento usava o vestido para preparar cachorros-quentes. (...). Podia ouvir
mamãe cantando na sala ao lado, (...). Juju, nosso vira-lata preto, me observando (farejando o
petisco*). (...). Quando senti um calor no lado direito do corpo. Virei e percebi que meu vestido
estava pegando fogo. (...). Dei um berro. Senti a queimadura e ouvi estalos horríveis enquanto
o fogo queimava meus cabelos. Juju latia. Berrei de novo. Mamãe chegou correndo, (...).”
CASTELO DE VIDRO
Jeannette Walls
*Visão & Faro: nós, bípedes, possuímos um CÉREBRO com grande aptidão para registrar imagens. Já os cães – os
quadrúpedes – possuem um CÉREBRO com grande aptidão para registrar adores. Por ex: você reconhece seu cão
pela aparência (cor, tamanho, raça, etc.); já seu cão o reconhece pelo cheiro. – Veremos essa questão ao longo do
trabalho.
-- Sim, filho.
-- Antigamente é um lugar.
“Acho que as lembranças são cócegas invisíveis que ficam dentro das pessoas.
E quando me lembro dessas coisas começo a rir sozinho.”
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Neste capítulo explicaremos – através de 9 citações literárias – que, na realidade, VEMOS NO
CÉREBRO, - não com os olhos.
Janela da Alma*
“Dos cinco sentidos, a visão, para mim, sempre foi soberana. Eu poderia perder tudo: audição,
paladar, olfato e tato, - desde que mantivesse a função dos olhos. (...). O imperdível
documentário (*de J. Jardim e W. Carvalho – 2001) mostra depoimentos de pessoas que têm
algum problema de visão ou que estão totalmente cegas. É um ensaio sobre a cegueira (aliás,
José Saramago está entre os depoentes), mas não só a cegueira concreta, e sim da cegueira
abstrata, a cegueira da mente e dos sentimentos. (...)”
COMIGO NO CINEMA
Martha Medeiros
CAPÍTULO
X
VEMOS NOSSAS LEMBRANÇAS – DENTRO DO CÉREBRO
CINEBIOGRAFIA INTRACRANIANA
(Drama, Comédia, Fantasia, Aventura, Romance, Espionagem, Terror, Trash, ...)
“O Filme da Minha Vida Passou Diante dos Meus Olhos”
Provavelmente você já ouviu esta frase em algum momento da vida. A explicação é muito
simples: diante de uma situação em que há grande estresse e/ou risco de morte, o nosso
CÉREBRO entra em colapso, e a nossa Linha da Memória (que contém as lembranças de todos
os episódios da nossa vida – ou filme da nossa vida) desmorona sobre si mesma – e passam
diante dos nossos olhos.
Rotten T, S das 7, PH Santos, Redatora de M, Getro, Super 8, Refúgio Cult, I Boscov, Meus 2 cent , 16 mm, Adoro C, IMDb...
A propósito, caso fosse avaliado por algum site de críticas, qual seria a nota atribuída ao
*Filme da sua Vida? Então... Como ele só existe em nossa cabeça (e só nós o vemos),
só quem pode julgá-lo somos nós mesmos, concorda?
*Plano 9 do Espaço Cerebral – de Alan Smithee: o FILME da minha vida, modéstia a parte, seria digno do Framboesa de Ouro.
*OLHO INTERNO
VEMOS NOSSAS LEMBRANÇAS – DENTRO DO CÉREBRO
Ao fechar os olhos, imediatamente os voltamos para dentro do próprio cérebro – e assim,
conseguimos VER todas as lembranças da nossa vida: infância, juventude, maturidade. Faça o
teste e comprove-o você mesmo. Portanto, o homem é o único animal capaz de enxergar a si
mesmo. Consequentemente...
A trama desse célebre romance aborda não uma epidemia de cegueira concreta, mas sim a
cegueira abstrata: o véu negro da estupidez que acomete quem vê a realidade à sua volta, mas
não consegue refletir sobre as IMAGENS desta realidade, - no cérebro. Isso fica bem claro nos
trechos a seguir:
-- “Se queres ser cego, sê-lo-ás; – Já éramos cegos no momento em que cegámos; -- Cegos
que, vendo, não veem; -- Os cegos estão sempre em guerra, sempre estiveram em guerra; --
Isto é uma loucura, -- Deve de ser, estamos num manicómio;”
Apesar disso, no trecho abaixo, o médico, que é oftalmologista e um dos protagonistas, explica
exatamente – cientificamente - como o nosso CÉREBRO é que realmente VÊ...
“Quando o médico terminou o seu relato (sobre tudo que investigara nos livros antes de ter
cegado) o motorista, que escutava com atenção, disse de lá,
-- Aposto que o que sucedeu foi terem-se entupido os canais que vão dos olhos até aos miolos,
-- Quem sabe, o médico sorriu sem querer, na verdade os olhos não são mais do que umas
lentes, umas objectivas, o CÉREBRO É QUE REALMENTE VÊ, tal como na película a IMAGEM
aparece, e se os canais se entupiram, como disse aquele senhor...”
EXPLICAÇÃO
“No Egito faraônico dos tempos de Akhenaton, segundo uma religião monoteísta extinta que
adorava o Sol, a LUZ era considerada o olhar de Deus. Naqueles tempos remotos (no Presente
Anterior), imaginava-se que a VISÃO fosse uma espécie de emanação que partia do olho.
A VISÃO seria parecida com um radar. Prolongava-se para fora do olho e tocava
no objeto que estava sendo visto. (...).
BILHÕES E BILHÕES
Carl Sagan
A – Cabeça de VISÃO: ao contrário das crenças do antigo Egito, o processo de VER ocorre de
maneira oposta: primeiro você OLHA um determinado objeto: um umbuzeiro, por exemplo;
em seguida, a IMAGEM da árvore (o reflexo da luz sobre ela) singra o espaço e penetra em
seus OLHOS; e por último, - após registrar a IMAGEM em seu cérebro, - finalmente você pode
VÊ-LA, - em seus MIOLOS.
B – A dinâmica do OLHAR: você não percebe todo esse processo porque tudo acontece na
velocidade da LUZ. Ou seja, as IMAGENS (do mundo exterior) singra o espaço, penetra em seus
olhos e chega ao seu cérebro a uma velocidade de 300.000 km/seg.
C- Écran nos MIOLOS: na realidade, não VEMOS um palmo à nossa frente; só enxergamos
quando as IMAGENS (do universo ao nosso redor) chegam ao nosso CÉREBRO. Por exemplo:
neste exato momento, você NÃO está vendo a tela do seu computador sobre a mesa; na
realidade, você está vendo a IMAGEM da tela dentro do seu CÉREBRO.
2 - OLHOS D’ÁGUA
Conceição Evaristo
3 – O LEITOR
Bernhard Schlink
No trecho a seguir, o protagonista, Michael Berg, explica como ele, apesar da distância,
permanece vendo – EM SUA TELA INTERIOR (cérebro) – as lembranças da bela e angustiada
HANNA (uma personagem que carrega, em silêncio, o peso da culpa – de todos)...
“Estava em pé no escritório do meu pai. Observei-a. Ela deixou vaguear o olhar pelas estantes,
como se lesse um texto (ela era analfabeta). Ficou parada à janela, olhou para a escuridão,
para o reflexo das estantes e para o seu reflexo. É uma das imagens (lembranças) que me
ficaram da Hanna (em seu cérebro). Memorizei-as, e consigo projetá-las numa TELA INTERIOR
(cérebro) e olhá-las, imutáveis, sem desgaste. (...). E pode então acontecer de as projetar
(outras lembranças da Hanna) repetidamente uma atrás das outras na minha TELA INTERIOR
(cérebro), e ter que as olhar (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro).
Uma delas é a Hanna (a lembrança da Hanna) que calça as meias na cozinha. Outra é a Hanna
(a lembrança da Hanna) em pé diante da banheira, segurando o toalhão com os braços
afastados. Uma outra é Hanna (a lembrança da Hanna) de bicicleta, com a saia flutuando ao
vento. Depois, a imagem (a lembrança) da Hanna com um vestido de riscas azuis e branca...
Olhou-se de alto a baixo, voltou-se, dançou alguns passos, olhou-se no espelho, (...), e
continuou a dançar. (...). Depois... Hanna (a lembrança da Hanna), na piscina, em calções e
blusa atada com um nó na cintura. Da adolescência, esta foi a última imagem (lembrança) da
Hanna que permaneceu em meu CÉREBRO. – Então ela sumiu.”
(...). Demorou um certo tempo até que meu corpo (cérebro – ao lembra de Hanna) deixasse de
ter saudades do seu... Sua recordação (embora permanecesse no cérebro) parou de me
acompanhar por todo o lado. Ficou para trás (se distanciou em sua Linha da Memória – dentro
do cérebro), como fica uma cidade quando o comboio parte. Só a reencontrei no tribunal.
4 – NAÇÃO CRIOULA
José Eduardo Agualusa
Na enregelante Paris, de dezembro de 1872, “onde o nevoeiro cobre tudo como uma noite
branca”, Fradique Mendes LEMBRA E VÊ A IMAGEM de Ana Olímpia – em seu cérebro.
E assim, atormentado pela saudade da “sua doce Princesa” – que a havia deixado na
ensolarada Luanda - decide escrever-lhe...
“Nesta cidade anoitecida é a MEMÓRIA da tua luz (da tua lembrança – em meu cérebro) que
me guia e conforta. VEJO-TE, constantemente te VEJO (tua lembrança – em meu cérebro),
como pela primeira vez te vi, rodando belíssima nas voltas da rebita ou meditando gravemente
na Muxima, sozinha na capela, enquanto lá fora o rio imóvel sob o largo sol, pareciam em
silêncio meditar contigo. VEJO-TE (tua lembrança – em meu cérebro) depois atravessando a
galope a Praia dos Veados. VEJO-TE (tua lembrança – em meu cérebro) rir ao longe e o teu riso
chegar até a mim trazido pela brisa (vemos e ouvimos nossas lembranças – dentro do
cérebro), salgado e fresco, húmido e forte, e eu volto a sentir, como então senti, a viva
presença da Vida. (...). Escreve, diz-me o que decidiste. Condena-me ao Inverno ou salva-me
dele. (...). Não me lamentes – condenado a viver no Inverno, trago comigo (em meu cérebro) a
MEMÓRIA do sol. Amo-te, hei-de amar-te sempre.”
Christopher Boone, de 15 anos, com seu jeito peculiar e detalhista (ele sofre de um tipo de
autismo), explica como VÊ AS LEMBRANÇAS, - EM SEU CÉREBRO.
E é dessa forma que ele consegue identificar as pessoas; saber como agir em situações difíceis;
e, nas horas vagas, investigar a morte do cachorro da vizinha, - crime do qual fora
injustamente acusado...
“E é assim que reconheço alguém, (...). Eu vejo o que está vestindo, se usa bengala, óculos, (...),
- e eu uso o Search em minhas MEMÓRIAS (regressa em sua Linha da Memória – dentro do
cérebro – e procura uma determinada lembrança), para ver se eu já as encontrei antes. E é
assim também que decido como agir em situações difíceis (...). Por exemplo: se vejo alguém
deitado no chão da escola, uso o Search (regressa e procura na Linha da Memória – dentro do
cérebro) para passar todo minha MEMÓRIA até achar uma IMAGEM (lembrança), e então
comparo-a com a que está acontecendo na minha frente e decido se a pessoa está deitada por
brincadeira, tirando uma soneca, ou tendo um ataque epiléptico. Caso seja este o caso, eu
afasto os móveis (...), para evitar que bata a cabeça, tiro minha jaqueta e ponho debaixo da
cabeça dela e vou e chamo um professor.
Outras pessoas também têm IMAGENS (lembranças) em sua cabeça. Mas elas são diferentes
porque as IMAGENS na minha cabeça são IMAGENS (lembranças) de coisas que realmente
aconteceram. E outras pessoas têm IMAGENS (lembranças) em suas cabeças de coisas que não
são reais e que não aconteceram (aficionado por ciências exatas, o CÉREBRO de Christopher
não comporta a imaginação de um Dom Quixote – personagem que veremos no cap. XVIII).
E a avó (senil) tem IMAGENS (lembranças) em sua cabeça, também, mas suas IMAGENS (as
lembranças no cérebro da avó) são todas confusas, como alguém que misturou um filme e ela
não pode dizer o que aconteceu na ordem em que aconteceu, e assim ela pensa que as pessoas
mortas ainda estão vivas e ela não sabe se alguma coisa aconteceu na vida real ou se
aconteceu na TV. “
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OBSERVAÇÃO
O QUE É O AUTISMO? : não sendo especialista, darei uma explicação superficial. Uma pessoa
dita “normal” – através dos seus sentidos: visão, audição, paladar, olfato e tato – registra em
seu cérebro as impressões do mundo ao seu redor, que, por sua vez, é composto por: imagens,
sons, sabores, aromas e sensações táteis.
Em seguida, de posse dessas informações – contidas em seu cérebro – ela as utiliza para
interagir com esse mundo exterior: questionando, refletindo, criando, fofocando, maldizendo,
jogando conversa fora, enfim, aporrinhando todos em sua volta, etc.
Uma pessoa AUTISTA registra em seu cérebro as impressões do mundo ao seu redor: imagens,
sons, sabores, aromas e sensações táteis. O problema é que em lugar de usar essas
informações contidas em seu cérebro para se comunicar com o mundo exterior, ele “opta” por
guardá-las todas para si; e, numa espécie de egoísmo inconsciente (sem maldade), passa a
viver exclusivamente dentro do seu Mundo Interior, - imerso nas profundezas do próprio
cérebro.
AUTISMO x HIPERATIVIDADE
“Você ainda se LEMBRA da primeira topada sua, Raymundão? – perguntou o Major Saulo. –
Ah, seô Major, foi um boi retaco, que caminhava na gente por gosto e investia de olho aberto e
cabeça alteada, feito vaca... O senhor sabe, esse é o pior que tem pra se escorar... (...). Se tive
medo? Só na horinha em que o bicho partiu em mim, eu achei que ele era grande demais, e
pensei que, de em-antes, eu nunca tinha visto um boi grande assim... Mas isso foi assim num
átimo, porque depois as mãos e o corpo da gente mexem por si, e eu acho que até a vara se
governa... Quando dei fé, a festa tinha acabado. (...). O pior foi que eu piscava, e afundei a
cabeça nágua fria, mas sem valer, porque fiquei o dia com aquele boi ( imagem, lembrança do
boi) dentro das minhas vistas (dentro do cérebro), QUE NEM UM RETRATO, que doía até...
7 – DESONRA
J. M. Coetzee
Expulso da universidade por se envolver com uma aluna, o agora ex-professor, David Lurie,
numa súbita explosão, mergulha nas profundezas do cérebro e VÊ AS LEMBRANÇAS (imagens)
de todas as mulheres que conheceu durante a vida (e olha que não foram poucas – ô,
inveja!)...
“Numa súbita explosão, como se entrasse de repente em um sonho acordado, uma torrente de
IMAGENS (enxurrada de lembranças) começa a fluir, IMAGENS (lembranças) de mulheres que
conheceu em dois continentes, algumas tão distantes (em sua Linha da Memória – dentro do
cérebro) que mal as reconhece. Como folhas sopradas pelo vento, misturadas, elas passam
diante dele (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro). Um claro campo coberto de
criaturas: centenas de vidas ligadas à dele. Prende a respiração, querendo que a visão
(procissão de lembranças – em seu cérebro) prossiga. O que aconteceu com elas, todas essas
mulheres, todas essas vidas? Haverá momentos em que elas também, ou algumas delas, são
mergulhadas, sem aviso prévio, num oceano de lembranças? A menina alemã: será possível
que nesse mesmo instante ela esteja lembrando do homem que lhe deu uma carona em uma
estrada da África e que passou a noite com ela? (...). Com todas ele saiu enriquecido. (...). E
como uma flor que se abri em seu peito, seu coração (seu cérebro – por preservar tais
lembranças) se enche de gratidão.
“A mente (cérebro) é como um objeto que pode ficar empoeirado (impregnado por lembranças
indesejadas). O objeto não sabe, assim como a mente. Por isso, depois daquela tarde ( do
incidente com Fonny) na loja de legumes, eu (Tish) via Bell (o policial branco - e posterior algoz
de Fonny) em toda parte, o tempo todo (Tish via a lembrança do policial em seu cérebro –
constantemente). (...). Ele tinha cabelos ruivos e olhos azuis. Caminhava igual ao John Wayne,
com passadas largas como se quisesse varrer o mundo. Como seus heróis, ele tinha cabeça
pequena, barrigão e bunda grande, e seus olhos eram tão vazios quanto os de George
Washington. Mas eu estava começando a aprender alguma coisa sobre o vazio daqueles olhos.
E o que estava aprendendo me deixava morta de medo. (...). No fundo daquele azul que não
pisca, há uma crueldade infinita, uma malevolência gélida. Naquele olho, você não existe – se
der sorte. Mas se for forçado a reparar, você estará marcado, marcado, marcado... (...).”
9 – BLADE RUNNER
ROY BATTY, O REPLICANTE
Ao fim de sua busca por respostas – e momentos antes de morrer – , o Replicante regressa em sua Linha da
Memória, relembra as lembranças mais significativas de sua breve vida, e as descreve...
“Eu VI coisas que vocês homens jamais imaginariam. Naves de guerra em chamas ao largo da
constelação de Órion. Eu VI (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro) raios-C
resplandecerem na escuridão próximos ao Portal de Tannhäuser... Agora todos esses
momentos (lembranças de episódios vividos) se perderão para sempre, como lágrimas na
chuva. Hora de morrer! “
RIDLEY SCOTT – PHILIP K. DICK
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Neste capítulo veremos como, ao evoluir a MEMÓRIA (ao desenvolver a aptidão para
preencher o cérebro com as LEMBRANÇAS da nossa vida: infância, juventude, maturidade),
nos tornamos HUMANOS. Ou seja: adquirimos a capacidade de exteriorizar EMOÇÕES.
“A ideia de que os brancos europeus podiam sair colonizando o resto do mundo estava
sustentada na premissa de que havia uma Humanidade Esclarecida (essa coisa é esclarecida
no cap.13) que precisa ir ao encontro da Humanidade Obscurecida, trazendo-a para essa luz
incrível (“a doença branca”). Esse chamado para o seio da civilização sempre foi justificado
pela noção de que existe um jeito de estar aqui na Terra, uma certa verdade, ou uma
concepção de verdade (branca), que guiou muitas das escolhas feitas em diferentes períodos
da história.”
(AILTON KRENAK – TRECHO DO LIVRO – IDEIAS PARA ADIAR O FIM DO MUNDO)
As Doenças do Brasil
Valter Hugo Mãe
CAPÍTULO
XI
A CONQUISTA DO HUMANO
AS LEMBRANÇAS EXPLICAM A ETIOLOGIA DOS SENTIMENTOS EXCLUSIVAMENTE HUMANOS
TUTOR DE MIOLOS
VOCÊ, então, regressa em sua Linha da Memória (dentro do seu cérebro) e descreve a
lembrança de uma perda; ou a lembrança de um trauma; ou a lembrança de uma mágoa; ou a
lembrança de uma desilusão amorosa, etc.
B – ‘Sessão de Terapia’ – de lembranças: por serem indeléveis, não é possível remover uma
Lembrança Aflitiva do CÉREBRO. Mas o Terapeuta de Recordações pode fazer com que você a
“aceite”. Afinal, o sofrimento é inerente a toda forma de vida que foi capaz de evoluir a
MEMÓRIA – que, como será explicado, é uma aptidão restrita a nós, BÍPEDES.
“Julia pergunta, - Quanto tempo você (U Ba, o sábio) demorou para superar essa perda (a
morte dos pais)? – Superar? Não acho que eu diria isso. Quando superamos alguma coisa, nós
avançamos, deixamos isso para trás. Deixamos os mortos para trás ou os levamos conosco?
Acho que nós os levamos conosco (levamos as lembranças dos entes queridos – em nosso
CÉREBRO). Eles nos fazem companhia. Eles permanecem conosco, ainda que de outra forma.
Temos que aprender a viver com eles (com as lembranças deles – em nosso cérebro) e com a
sua morte. (...). A vida é um dom repleto de mistérios no qual o SOFRIMENTO (lembranças de
episódios dolorosos) e a FELICIDADE (lembranças de episódios exultantes) são entrelaçados
inextricavelmente (em nosso cérebro). É vã qualquer tentativa de ter um sem o outro. “
A ARTE DE OUVIR O CORAÇÃO
Jan-Philipp Sendker
HOMO EMOJIS
( HUMANO – EMOJI, DEMASIADO EMOJI )
C – HUMANO – Cada lembrança, uma emoção: cada lembrança da nossa vida, somatiza uma
determinada emoção. Portanto, ao evoluir a MEMÓRIA (a aptidão para preencher o CÉREBRO
com as lembranças da nossa vida), nos tornamos HUMANOS. Ou seja, conquistamos a aptidão
para exteriorizar EMOÇÕES: amor, ódio, dor, prazer, culpa, indiferença, revolta, perdão,
saudade, trauma, orgulho, frustração, inveja, etc.
“Nada pode fazer murchar; Nem apagar a esperança; Desta linda flor chamada lembrança.”
Água Fresca Para as Flores
Valérie Perrin
HOMO EMOCIONAL
Este assunto será abordado no CAP XIX (CÉREBRO – A Fantástica Fábrica de Emoções), onde
cada sentimento será explicado separadamente, - através de citações literárias.
Que, como todo mundo (todos os bípedes: ricos ou pobres, doutos ou iletrados, vermelhos ou
amarelos), - pudéssemos sofrer o inferno e que, à medida que a dor devastava nossa
existência, acabássemos de nos decompor em nós mesmos, em meio ao tumulto do medo e do
horror que a morte inspira em qualquer um, - não aflorava no espírito de ninguém naquele
prédio. (...).”
A ELEGÂNCIA DO OURIÇO
Muruel Barbery
“Eu estava como o prisioneiro que encontra no carcereiro o único ser com quem trocar as
Humanidades. E pergunto: por que nos ensinaram essa merda de Sermos Humanos?
Seria melhor sermos bichos, tudo instinto. Podermos violar, morder, matar (sem exteriorizar
emoções). Sem culpa, sem juízo, sem perdão. A desgraça é esta: só uns poucos (apenas os
bípedes – para o bem e para o mal) aprenderam a lição da Humanidade.”
2 – SUÍTE FRANCESA
Irene Nemirovisk
“Sabemos muito bem que o SER HUMANO é complexo, múltiplo, dividido, imprevisível, mas é
preciso o Tempo da Guerra ou de grandes mudanças para o vermos. É o espetáculo mais
apaixonante e terrível”.
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“A centrífuga separa o mel.” – Explica August sobre o funcionamento do seu apiário. “Tira a
parte ruim e deixa a parte boa. Eu sempre achei que seria ótimo ter centrífugas assim para
os seres humanos. Era só jogá-los aí dentro e pôr a máquina para funcionar.”
A VIDA SECRETA DAS ABELHAS
Sue Monk Kidd
3 – JUDAS
Amos Oz
“Após muitas hesitações, Jesus e seus seguidores subiram para Jerusalém. Mas aqui de novo
foi assolado por dúvidas. E não apenas dúvidas, mas também um temor mortal. Tão simples
quanto isso, como o de um SER HUMANO. Um temor mortal e HUMANO, muito HUMANO, se
apoderou de seu coração (cérebro – “LEMBRO que sou humano e mortal, logo sinto medo”):
‘Se puderes, rezou Jesus a Deus, afasta de mim esse cálice’.
4 – MOBY DICK
Herman Melville
“Muito esforço e poucos ganhos para os que pedem ao mundo que lhes dê uma explicação; o
mundo não pode explicar-se. (...). De tempestade em tempestade! Que assim seja, então.
Parido com dores, é certo que o SER HUMANO viva com sofrimento e morra em agonia! Que
assim seja, então. Eis um bom material para o infortúnio. Que assim seja, então. “
5 – O LEITOR
Bernhard Schlink
“Ah, o senhor quer entender o que é que faz com que os homens possam cometer coisas tão
medonhas. (...). – O que é que quer entender realmente? Compreende que se mate por paixão,
por amor ou por ódio, pela honra ou por vingança? – Michael Berg assente com a cabeça.
– Compreende, também, que se mate para enriquecer, ou para ter poder? Que se mate
durante as guerras ou numa revolução? – Voltei a assentir. – Mas... Mas aqueles que foram
mortos nos Campos de Concentração não tinham feito nada aos que os mataram. É isso que
quer dizer? (...). – Tem razão, não havia guerra e nem nenhum motivo para o ódio. Mas o
carrasco também não odeia aquele que vai executar e, contudo, executa-o. Porque lho
ordenaram? (...). – Não, não estou a falar de ordens e da obediência. (...). – O carrasco faz o
seu trabalho porque são-lhe totalmente indiferentes, tanto os pode matar como não matar.
(...). Vá lá, diga que um homem não deve ser tão INDIFERENTE em relação a outro. Não foi isso
que aprendeu? A ser solidário com tudo que tenha feições humanas? O respeito pela vida? A
dignidade humana? (...)”
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O CIO DO CARRASCO
“Eu sabia. – Diz Riobaldo. - Nunca, mesmo depois, eu nunca soube tanto disso, como naquele
tempo. O Hermógenes, homem que tanto tirava seu prazer do medo dos outros, do sofrimento
dos outros. Aí, arre. Foi que de verdade eu acreditei que o inferno é mesmo possível. Só é
possível o que em homem se vê, o que por homem passa. Longe é, o “Sem-olho” (longe é o
diabo; perto é o homem).”
GRANDE SERTÃO – VEREDAS
Guimarães Rosa
6 – MULHERES DE CINZAS
Mia Couto
“Sorte a dos que, deixando de SER HUMANOS, se tornam feras. Infelizes os que matam a
mando dos outros e mais infelizes ainda os que matam sem ser a mando de ninguém.
Desgraçados, enfim, os que, depois de matar, se olham ao espelho e ainda acreditam serem
pessoas. (...). É para isso que servem as fardas: para afastar o soldado da sua HUMANIDADE.”
7 – TRILHAS
Robyn Davidson
- A INCRÍVEL JORNADA DE UMA MULHER PELO DESERTO AUSTRALIANO –
“Depois de 160 anos de guerra tácita contra os aborígenes, tempo durante o qual o
assassinato em massa era praticado em nome do pregresso, e enquanto o último massacre
brutal estava acontecendo no Território do Norte em 1930, o governo colonial havia criado
esta (Aldeia Areyonga) e outras reservas aborígenes em terras que nem os fazendeiros de gado
nem ninguém mais queria. Como todos acreditavam que o povo nativo terminaria morrendo
aos poucos, permitir que eles habitassem pequenas áreas de suas próprias terras era
considerado uma medida temporária. (...). Os negros foram todos reunidos como gado pela
polícia e por cidadãos a cavalo, portando armas de fogo. (...). O governo permitiu que
missionários administrassem muitas dessas reservas e lá confinassem e controlassem o povo.
As crianças mestiças eram tiradas das mães à força, pois os brancos achavam que elas, por
serem mestiças, tinham ao menos uma pequena chance de se tornarem HUMANAS.
“Neste livro, partilhei de meu sofrimento com vocês. É apenas um pequeno vislumbre das
dificuldades e da dor que suportam refugiados do mundo todo. Represento apenas uma entre
os milhões de vozes que se arriscam diariamente para ter uma vida de dignidade. A perigosa
jornada feita pelos refugiados para alcançar a segurança na Europa costuma levar ao
desespero e morte. Mas colocamos nossas vidas nas mãos de contrabandistas cruéis e
impiedosos porque não temos alternativas. Enfrentamos os horrores da guerra e a indignidade
da perda de nossos lares. Nosso único desejo é viver em paz. Não somos terroristas. SOMOS
SERES HUMANOS COMO VOCÊS. Temos um coração que sente (CÉREBRO – cujas lembranças
expressam): desejo, amor, mágoa, esperança... (...).”
“Entalado entre dois carros, o corpo de um homem apodrece. A ‘Mulher do Médico’ desvia
os olhos (não suporta registrar a imagem da morte – em seu cérebro). O ‘Cão das Lágrimas’
aproxima-se, mas a morte intimida-o (atormenta-o sentir o odor da morte – em seu cérebro),
ainda dá dois passos, de súbito o pêlo encrespou-se-lhe, um uivo lacerante saiu-lhe da
garganta, o mal deste cão foi ter-se chegado tanto aos HUMANOS, vai acabar por sofrer como
eles.”
“Amanhã vamos ter um enterro às quatro da tarde. Um novo residente para o meu cemitério
(diz Violette, a zeladora). Um homem de 55 anos, que morreu por ter fumado demais. Enfim,
isso foi o que os médicos disseram. Eles nunca dizem que um homem de 55 anos pode morrer
por não ter sido amado, não ter sido ouvido, ter recebido contas demais, ter solicitado
empréstimos demais, ter visto os filhos crescerem e irem embora, sem se despedir de verdade.
Uma vida de críticas, uma vida de caras feias. Então ele gostava muito do seu cigarrinho e seu
charuto para ‘Desembrulhar o Estômago’ (para suportar as lembranças das desilusões da
vida). (...).”
11 – AS DOENÇAS DO BRASIL
Valter Hugo Mãe
“Meu nome é Honra, sagrado Honra (“meu nascimento é um golpe inimigo no corpo de minha
mãe [abaeté] que foi atacada sem permissão pelo branco”), teu nome é Meio da Noite,
sagrado Meio da Noite. Justifica tua sorte para que eu acredite. E Meio da Noite respondeu:
sou negro, conseguir fugir, só entendo isto. De onde venho só havia dor. Meus povos morrem a
trabalhar, espancados sem razão, estuprados. Meus povos negros morrem. Eu fujo de morrer e
mais aceito ser mordido por uma besta, devorado pela fome de algum predador, do que perder
a vida inteira a trabalhar sem descanso, debaixo dos insultos e das batidas. A fome dos bichos
é mais digna do que a ganância (doença) do branco. Meus povos começam a fugir. A minha
fuga traz meus povos. (...). Mataram meu pai, mataram minha mãe, mataram meu irmão.
Agora só vivem no que lembro (LEMBRO das perdas, logo sofro: a evolução da memória
estabelece a aurora das emoções humanas), e eu lembro pouco, menos a cada vez, para
conseguir viver. (...). Não me odeies, rapaz branco (mameluco – caboclo). Sou apenas um rapaz
negro que pede para viver. Não sou um animal. Sou alguém, sim. Eu sou alguém (humano). E
só lamento talvez a possibilidade de ser feio (diferente da cor, assim como Honra – “o feio
branco”). Não sei ser bonito, talvez. Eu não sei. (...).
Desse abismo (“que o animal branco fizera na ideia e que chamara de futuro – A Palavra
Abissal”), o negro haveria de ser resgatado. O mais imenso mar não o esconderia para sempre.
(...). Honra chamava: irmão, meu irmão, sagrado Meio da Noite, onde estás. Nossos povos em
toda a parte nos pedem ajuda. (...). Agarra minha mão. Não largues nunca.”
O Ritual do Chá
“Lá fora o mundo ruge ou dorme, as guerras se inflamam, os homens vivem e morrem, as
nações perecem, outras surgem e breve são tragadas, e em todo esse barulho e todo esse
furor, nessas erupções e nessas ressacas – enquanto o mundo vai, se inflama, se dilacera e
renasce -, agita-se a Vida Humana.
-- Então, bebamos uma xícara de chá. – Diz Renée à sua amiga (única) Manuela.”
A ELEGÂNCIA DO OURIÇO
Muriel Barbery
HOMO SENTIMENTALIS
Como já foi dito, este assunto será abordado no cap. XIX (CÉREBRO – A Fantástica Fábrica de
Emoções), onde cada sentimento será explicado separadamente, - através de citações
literárias.
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Neste breve capítulo explicaremos quem realmente VOCÊ É - POR DENTRO. E não esqueça que
este assunto (QUEM É VOCÊ ?) será complementado no cap. XXIII
“A pele aliás, a PELE é tudo quanto queremos que os outros vejam de nós, por baixo delas
nem nós próprios conseguimos saber QUEM SOMOS”.
TODOS OS NOMES
José Saramago
CAPÍTULO
XII
QUEM É VOCÊ ?
SUPER INTERESSANTE
(pub. 18 out 2009 – atu. 18 out 2017)
Rodrigo Rezende
QUEM É VOCÊ?
“COMO VOCÊ VIROU VOCÊ? Essa pessoa que você chama de EU nem sempre esteve aí.
Entenda a formação da sua consciência. (...). Estudar o EU é um desafio para a ciência. Afinal,
como usar evidências científicas para explicar o filme (feito com as lembranças da nossa vida)
que se desenrola dentro do seu CÉREBRO. Ainda mais se a única poltrona nessa sala de cinema
mental já está ocupada por você (apenas nós vemos nossas lembranças – dentro do cérebro).
(...).”
1- Antes de ser VOCÊ: como já foi dito, o Presente é Absoluto, - ou seja: vivemos em um
ETERNO PRESENTE. Nesta condição, você – como uma panela de barro vazia – nasceu com o
cérebro OCO: sem conteúdo, sem história, sem passado.
Entretanto, no decorrer da sua Permanência no Presente, você foi gradativamente
preenchendo sua cabeça (Linha da Memória) com as LEMBRANÇAS da sua vida: infância,
Juventude, maturidade.
E assim, finalmente – com o cérebro preenchido com lembranças pessoais – você passou a ser
a pessoa que você chama de EU. E agora, sim, você já tem condições de responder a
desconcertante e muitas vezes enigmática pergunta inicial.
2 – QUEM É VOCÊ? : esta pergunta costuma gerar paralisia ou desconforto, mas é muito
simples respondê-la. Para isso basta que VOCÊ regresse em sua Linha da Memória (dentro do
cérebro) e descreva as LEMBRANÇAS da sua vida: infância, juventude, maturidade. Ou seja...
Descrevendo Lembranças
“As pessoas me recebem e relatam suas experiências (descrevem as lembranças da sua vida)
de formas diferentes... Umas começam a relatar imediatamente: “Eu me LEMBRO... Guardo
tudinho na MEMÓRIA (cérebro), como se fosse ontem...”. Outros postergam o encontro:
“Preciso me preparar... Não quero mergulhar naquele inferno novamente (“não quero
mergulhar nas entranhas do cérebro e relatar/reviver as angustiantes recordações da
guerra”).
-- Valentina Pávlovna é uma dessas que passou muito tempo com medo, e só a contragosto
me deixou entrar em seu Mundo Inquieto (cérebro - construído com as aterradoras
lembranças da 2ª Guerra Mundial).”
A GUERRA NÃO TEM ROSTO DE MULHER
Svetlana Aleksiévitch
“O passado (as lembranças da nossa vida) não é tão fértil quanto o esterco que coloco na terra
(diz o bondoso Sasha – jardineiro-zelador do cemitério). Ele se parece mais com cal.
O veneno que queima os brotos. É, Violette, o passado é (muitas vezes) o veneno
do presente. Remoê-lo (relembrá-lo) é morrer um pouco.”
Água Fresca Para as Flores
Valérie Perrin
SOMOS FEITOS DE LEMBRANÇAS
- Cada Lembrança, Uma emoção -
OBS
Este assunto será esclarecido no cap. XIX: CÉREBRO – a Fantástica Fábrica de Emoções.
“Por quê? – (responde U Ba à indagação de Julia) – Todos têm que conhecer o mundo? Neste
vilarejo, em todas as casas, em qualquer casebre, você conseguirá encontrar todos os gêneros
de emoções humanas: amor e ódio, medo e ciúmes, inveja e alegria. Eu não precisaria sair à
procura deles (o mundo está todo aqui).”
A ARTE DE OUVIR O CORAÇÃO
Jan-Philipp Sendker
4 – LEMBRO, logo sinto: como vimos no item acima, cada lembrança da sua vida, somatiza
uma determinada emoção. Portanto, ao DESCREVÊ-LAS, nós passamos a saber quais são: suas
afeições, seus desafetos, suas vitórias, seus fracassos, suas dores, suas alegrias, suas
frustrações, suas saudades, seus traumas, etc . – E assim, saberemos quem é VOCÊ. Ou seja...
“Posso passar o resto da minha vida falando do PASSADO (descrevendo as lembranças da sua
vida – contidas em seu cérebro), - disse tio Hakim, com uma voz mais descansada. (...). Na
manhã de segunda-feira continuava falando, e só interrompia para rever os animais e dar uma
volta no pátio da Fonte, onde molhava o rosto e os cabelos; depois retornava com mais vigor,
com a cabeça (cérebro) formigando de cenas e diálogos (de lembranças de episódios vividos),
como alguém que acaba de encontrar a Chave da Memória. “
RELATO DE UM CERTO ORIENTE
Milton Hatoum
5 – LEMBRANÇAS – a maior e mais fiel companhia do homem: como foi explicado, cada
indivíduo carrega – em sua cabeça – o peso de suas lembranças; ou o fardo do seu passado; ou
ônus da existência; ou o filme da sua vida.
Portanto, não importa onde esteja ou aonde vá, dia ou noite, dormindo ou acordado, sejam
elas boas ou más, VOCÊ carrega em seu cérebro o peso das suas recordações.
“Quando amanheceu e Irving abriu os olhos (após 15 anos de exílio na Espanha), fugiu de sua
casa (decrépita – onde sobrevivem mãe e irmã) numa tentativa de fugir de si mesmo para se
perder na cidade (Havana), própria e alheia ao mesmo tempo, o território de
suas melhores e suas piores lembranças.”
Como Poeira Ao Vento
Leonardo Padura
“Por que as pessoas têm de ser tão sós? Qual o sentido disso tudo? Milhões de pessoas neste
mundo, todas ansiando, esperando que outros as satisfaçam, e contudo se isolando.
Por que? A terra foi posta aqui só para alimentar a solidão humana?
MINHA QUERIDA SPUTNIK
Haruki Murakami
A CONQUISTA DO EGOÍSMO
-- SENTIMOS a nossa dor, não a dor dos outros;
-- SENTIMOS a nossa sede, não a sede dos outros;
-- SENTIMOS o nossa fome, não a fome dos outros;
-- SENTIMOS...
QUINCAS BORBA
Machado de Assis
“(...) Sobejam Exemplos; mas basta um contozinho que ouvi em criança, e que aqui lhes dou
em duas linhas. Era uma vez uma choupana que ardia na estrada; a dona, - um triste molambo
de mulher, - chorava o seu desastre, a poucos passos, sentada no chão. Senão quando, indo a
passar um homem ébrio, viu o incêndio, viu a mulher, perguntou-lhe se a casa era dela.
O padre que me contou isto certamente emendou o texto original; não é preciso estar
embriagado para acender um charuto nas misérias alheias. Bom padre Chagas! – Chamava-
se Chagas. – Padre mais que bom, que assim me incutisse por muitos anos essa ideia
consoladora, de que ninguém, em seu juízo, faz render o mal dos outros. (...). Tudo ideias
consoladoras. Bom padre Chagas!”
“Tão certo é que a paisagem depende do ponto de vista, e que o melhor modo de
apreciar o chicote é ter-lhe o cabo na mão.”
7 - “Raio Que o Parta!”: a individualidade (o egoísmo nosso de cada dia) cria a ilusão de que
os raios (as coisas ruins) só caem na cabeça dos OUTROS; e esquecemos que para os demais
indivíduos (para o restante da humanidade), nós é que somos O OUTRO. Portanto, muito
cuidado com os raios!!!
“Oh! O homem; o mais egoísta de todos os animais; o mais personalista de todas as criaturas,
que continua a acreditar que a Terra gira, que o Sol brilha, que a Morte ceifa (os outros),
apenas para ele; formiga que amaldiçoa Deus do alto de uma haste de capim.”
O CONDE DE MONTE CRISTO
Alexandre Dumas
7 – QUEM É VOCÊ ? : portanto, como já foi dito, para responder à questão proposta no título
da SUPER INTERESSANTE, basta que VOCÊ regresse em sua Linha da Memória (dentro do
cérebro) e descreva as LEMBRANÇAS de todos os episódios da sua vida: infância, juventude,
maturidade.
Mas é preciso deixar claro que não pode MENTIR (tentar omitir, inventar ou falsear suas
lembranças). E aí, vai encarar? Não é uma tarefa das mais fáceis, pois o nosso cérebro é...
AUTOBIOGRAFIA
Que Diabo de Filme Ruim é Esse?!
O problema é que este tipo de narrativa (autobiográfica) costuma conter a maior quantidade
de mentiras por parágrafos escritos. Adoramos mentir em causa própria: nossos erros são
disfarçadamente justificados; enquanto nossos êxitos são discretamente, quando não
descaradamente enaltecidos; - e tudo escrito sob a névoa sórdida do natural egoísmo humano.
“(...) De qualquer modo, foi esse o motivo de minha lorota; pela primeira vez, sucumbi à
tentação que ronda todo autobiógrafo, à ilusão de que, como o passado só existe na nossa
memória (cérebro) e nas palavras que tentam em vão encapsulá-lo, pode-se criar
acontecimentos pretéritos simplesmente por dizer que ocorreram. (...)”
OS FILHOS DA MEIA-NOITE
Salman Rushdie
A seguir veremos 4 CITAÇÕES que abordam o tecido de que são feitos o
homem, - e a mulher: AS LEMBRANÇAS...
1 - GUERRA E PAZ
Liev Tolstoi
“Toda (as lembranças da) sua vida lhe aparecera por muito tempo como que projetada por
uma lanterna mágica através de um vidro e a uma luz artificial. E agora via ( realmente,
nitidamente as lembranças da sua existência), de súbito, sem qualquer interposição de vidros,
à clara luz do dia, esses quadros (lembranças pessoais) grosseiramente coloridos. Sim, sim,
aqui estão elas, essas miragens enganosas (lembranças ilusórias) que tanto me emocionaram,
exaltaram e me fizeram infeliz; -- dizia a si próprio, fazendo perpassar pela imaginação toda a
fantasmagoria da sua existência e vendo-a agora à branca e fria luz da nítida proximidade da
morte. Ei-las (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro), essas figuras mal iluminadas que
então me pareciam tão belas e misteriosas. A glória, o bem público, o amor de uma mulher, a
própria pátria... Quão grandes pareciam essas belas coisas (quão grandes e belas pareciam
essas lembranças), com que profundo sentido elas se me apresentavam! E afinal como tudo
isso é mesquinho, pálido, miserável! (...).
Retinham-lhe no pensamento (cérebro) sobretudo as três grandes dores (as lembranças das
três maiores desilusões) da sua existência: seu romance... (paixão por Natacha), a morte do pai
e a invasão francesa (por Napoleão), que alcançara já metade da Rússia. << O amor!... Aquela
garotinha que se me afigurava rica de forças misteriosas! Sim! E eu amava-a. Entretinha com
ela poéticos sonhos de amor, de felicidade mútua. Pobre rapaz! E depois? Acreditava em não
sei que de amor ideal que me conservaria fiel todo o tempo que estaria ausente. E ela acabaria
por se consumir, como a meiga pomba da fábula, esperando, esperando sempre. Ai de mim! É
tudo muito mais simples... Tudo é muito mais simples e muito mais repugnante!>>”.
2 – PACHINKO
Min Jin Lee
“O que o surpreendeu foi que, sentindo a proximidade da morte, ficou aterrorizado com o seu
caráter definitivo. Havia muitas coisas que não conseguira fazer e ainda mais coisas que nunca
deveria ter feito. LEMBROU dos pais, que não deveria ter abandonado; LEMBROU do irmão,
que não deveria ter trazido para Osaka; LEMBROU do trabalho em Nagasaki, que não deveria
ter aceitado. Ele não tinha filhos. Por que Deus o mantinha vivo? Estava sofrendo e, em certo
sentido, podia lidar com isso; mas estava causando sofrimento nos outros e não sabia por que
tinha que continuar vivendo e RELEMBRANDO (refletindo sobre as lembranças de sua vida, e,
sobretudo) a sucessão de decisões terríveis que não haviam parecido tão terríveis assim
quando foram tomadas. Será que a vida era assim para a maioria das pessoas? Desde o
incêndio (bomba atômica sobre Nagasaki), nos poucos momentos em que se sentia lúcido e
grato por respirar sem dor, Yoseb tentava enxergar o que havia de bom em sua vida, mas não
conseguia. Ficava deitado no colchão, repassando mentalmente os erros que (reavaliando –
dentro do cérebro - as lembranças dos erros que), em retrospecto, pareciam tão óbvios. Não
sentia mais raiva da Coreia nem do Japão; acima de tudo sentia raiva da própria estupidez. Ele
orava para que Deus o perdoasse por ser um velho tão ingrato. (...).”
-------x---------
“A culpa foi minha, chorava ela (a rapariga de óculos escuros – pela morte do ladrão de
carros), e era verdade, não se podia negar, mas também é certo, se isso lhe serve de
consolação, que se antes de cada acto nosso nos puséssemos a prever todas as consequências
dele, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis,
não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar.
(...).”
3 - HEREGES
Leonardo Padura
Nesse trecho, vemos que Daniel Kaminsky carrega – em seu cérebro - não só as LEMBRANÇAS
dos seus entes queridos mortos, mas também as LEMBRANÇAS, mesmo que difusas, dos seus
algozes, - ambas indeléveis...
“A partir daquele dia (1958), Daniel começou a viver outra das etapas de sua vida que gostaria
(em vão) de apagar de sua persistente MEMÓRIA (cérebro). (...). Podia atenuá-la, nunca sua
cura definitiva.
Aos 27 anos, aquele rapaz nascido polonês e judeu, convertido ao catolicismo, essencial e
legalmente cubano, já tinha uma ligação traumática com a morte. Mas os rostos específicos
(as lembranças das pessoas - em seu cérebro) que se relacionavam com essa ferida eram
apenas os mais amorosos: os de seus pais e de sua irmã, dos avós e tios Kellersteins, o de
monsieur Sarusky, seu primeiro professor de piano, lá em Cracóvia, e da belíssima esposa do
mestre, madame Ruth, (...). Todos devorados pelo Holocausto.
Os algozes (as lembranças dos carrascos – em seu cérebro), por outro lado, eram sombras
difusas, espectros diabólicos, aos quais nem valia a pena tentar dar o rosto, (...). Porque nas
imagens (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro) transmitidas por seu consciente, para
Daniel era impossível conectar as feições conhecidas dos grandes responsáveis pelo massacre
(Hitler e seus jagunços), com o rosto do homem real dedicado a ameaçar, surrar, cuspir, sujar
os judeus, gozando de seu enorme poder para provocar pavor: o homem sem feições precisas
que muitas vezes em suas recordações (cérebro) apertava o gatilho de uma pistola encostada
na nuca. (...)”
“Nos ombros (cérebro) de Tereza, os MORTOS (as lembranças dos entes queridos) pesam,
carga ruim. Até agora ela os conduziu sem demonstrar desânimo. Aguentou o peso dessas
mortes (as lembranças das perdas) na cacunda, delas ressuscitando por três vezes. Mas Janu
pesa demais, com esse defunto Tereza não aguenta. Januário Gereba, marinheiro, Janu do
bem-querer, morri em tua morte, me acabei de vez.”
TEREZA BATISTA CANSADA DE GUERRA
Jorge Amado
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“Esse é o problema com as coisas vivas, - disse Lettie. Não duram muito. Jovens num dia,
velhos no outro. E depois ficam só as lembranças (em nosso cérebro). E as lembranças
desvanecem (se distanciam em nossa Linha da Memória – dentro do cérebro) e
se confundem, viram borrões.
O OCEANO NO FIM DO CAMINHO
Neil Gaiman
OBS
REVISTA VEJA
(junho – 2003)
“Cientista americano, Morris Goodman, demonstra que homens e chimpanzés apresentam
99.4 % de semelhança em seu DNA, e reabre um debate da época de Charles Darwin.”
SARTRE SÍMIO: caso os chimpanzés evoluam a MÉMÓRIA (algo absolutamente possível – pois
nós também já fomos quadrúpedes e vivíamos trepados nas árvores, lembram?), mas caso
evoluam a MEMÓRIA, um chimpanzé poderá preencher o CÉREBRO com as lembranças da sua
vida: infância, juventude, maturidade. E assim, ao refletir sobre elas (ter a consciência de si
mesmo), poderá, quem sabe, vir a se tornar um... EXISTENCIALISTA (!?). – Deus é pai, ninguém
merece; vade-retro, Antoine Roquentin e sua Náusea – porra, sujeito chato!!!
------------------------x----------------------
“Os brancos se dizem inteligentes. Não o somos menos. Nossos pensamentos se expandem em
todas as direções (na imensidão do cérebro – ver cap. 18) e nossas palavras são antigas e
muitas. Elas vêm de nossos antepassados. Porém, não precisamos, como os brancos, de peles
de imagens (não precisam da escrita) para impedi-las de fugir da nossa mente. Não temos de
desenhá-las, como eles fazem com as suas. Nem por isso elas irão desaparecer, pois ficam
gravadas dentro de nós (dentro do cérebro). Por isso nossa MEMÓRIA é longa e forte.”
DAVI KOPENAWA – TRECHO LIVRO – A QUEDA DO CÉU
As Doenças do Brasil
Valter Hugo Mãe
CAPÍTULO
XIII
PREENCHENDO O CÉREBRO COM CONHECIMENTOS
SUPER INTERESSANTE
24 set 2018
(Eduardo Szklarz – Bruno Garattoni)
1 – Miolos Brilhantes: esqueça a desmiolada citação acima (da Super Interessante), pois, na
realidade, não é possível medir, calcular, mensurar a INTELIGÊNCIA. E a razão é muito simples:
2 – Como um Livro a Ser Escrito: a questão é que nascemos com o CÉREBRO vazio. Em outras
palavras, todos nós nascemos analfabetos, - ou “burros”, se quisermos usar o termo corrente.
Assim sendo, apenas no decorrer da nossa vida (da nossa Permanência no Presente) podemos
nos tornar “inteligentes”.
Mas para isso se faz necessário preencher gradativamente nossos MIOLOS (Linha da Memória)
com conhecimentos: educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, Enem,
universidade, doutorado, etc.
Biblioteca Interior
3 - Biblioteca de Babel: Imagine que seu cérebro seja uma BIBLIOTECA – viva e infinita.
O problema é que ela nasce vazia. Ou seja, no decorrer da sua existência você terá que
preenchê-la com LIVROS.
4 – HOMEM: um ser dotado de inteligência? Presumo que a princípio a resposta é NÃO. Pois,
como já foi dito, o mais correto seria afirmar que o HOMEM, ao nascer, é um ser
dotado de um CÉREBRO. Em seguida, - após preenchê-lo com informações – este tornar-se-á
apto a desenvolver: intelecção, sapiência, lucidez, discernimento, perspicácia, raciocínio,
sagacidade, destreza, sutileza, engenho, habilidade, senso, talento, apreensão, compreensão,
percepção, etc.
Quociente de Conhecimentos
Portanto – voltando à citação inicial da Super Interessante – só é possível medir tão somente o
Quociente de Informação que um indivíduo absorveu (memorizou em seu cérebro) no
decorrer da vida.
5 - Cabeças de Vento: nascemos com a cabeça OCA. No entanto, como foi explicado, no
decorrer da nossa existência (Permanência no Presente), devemos preencher o CÉREBRO
(Linha da Memória) com conhecimentos. E assim, podemos transformar os nossos MIOLOS, e
torná-lo apto a ser o que é: um Prodígio da Natureza. Veja a ilustração...
“Quando eu era criança, queria ser um LIVRO quando crescesse. Gente se pode matar como
formigas, mas LIVRO sempre há uma chance de sobrar algum, a continuar a sua vida de
prateleira, eterna e silenciosa, em uma estante esquecida de um país remoto.”
AMÓZ OZ
“Mais tarde, aprendi que os livros acontecem dentro de nós. Claro que eles podem ser bonitos
de ver, mas são sobretudo incríveis de pensar. Eu disse que ler é como caminhar dentro de
mim mesmo. E é verdade. Quando lemos estamos a percorrer o nosso próprio interior.
(...). Todos os livros são infinitos. Começam no texto e estendem-se pela imaginação.
CONTOS DE CÃES E MAUS LOBOS
Valter Hugo Mãe
Salvar um LIVRO significa retirá-lo da estante e, através da leitura, transportá-lo para o interior
do nosso cérebro; – onde ele ganha vida ao se transformar em Lembranças Animadas.
DESIGUALDADE INTECTUAL
Todos os Cérebros Nascem Iguais – Pois todos nascem Vazios
6 - Igualdade Mental: todo CÉREBRO é uma maravilha da natureza; Mas, como nascem
VAZIOS, significa que todos nós nascemos ANALFABETOS. Ou seja, - além de careca,
desdentado e desnudo, - viemos ao mundo como um completo iletrado, inculto, apedeuto e
ignaro.
Paulo Freire
Portanto, não importa se o indivíduo é branco ou preto, homem ou mulher, rico ou pobre, e
muito menos a quantidade de neurônios; - nada disso possui qualquer relevância. Na
realidade, assim como não existem raças superiores ou inferiores, também não há pessoas (ou
povos) mais inteligentes nem menos inteligentes.
O que existe são CÉREBROS que foram cuidadosamente aproveitados (preenchido com
conhecimentos), enquanto outros CÉREBROS foram irresponsavelmente
negligenciados (não preenchidos com conhecimentos).
7 - ESCOLHAS: apenas para reforçar tudo que já foi dito, digamos que seus pais escolhessem
(certas ou desastradas, somos a única espécie capaz de fazer escolhas), mas digamos que seus
pais optassem por não educá-lo (não preencher seu cérebro com conhecimentos). Hoje,
portanto, você seria um analfabeto como outro qualquer, e não teria condições intelectuais
de LER o que acaba de LER.
Felizmente seus pais foram diligentes e acertadamente escolheram educá-lo. Portanto, como
já foi dito, todo CÉREBBRO é um Milagre da Natureza; mas para fazê-lo ser o que é, tudo
dependerá de uma simples escolha:
“Eu já disse que os livros são como espelhos: cada pessoa encontra (desperta) neles aquilo que
está em sua própria mente (cérebro). (...). Os livros são espelhos indiscretos e arriscados:
fazem com que as ideias mais originais saiam da sua cabeça e trazem à tona outras
novas que você não sabia que tinha. Quando você não ler, essas ideias ficam
presas dentro da sua cabeça e não servem para nada.
O Livro Selvagem
Juan Villoro
UGWU é um garoto pobre que saiu da sua aldeia para trabalhar, como criado, na casa do prof.
ODENIGBO, – que o incentiva a preencher o CÉREBRO com conhecimentos...
“Este aqui é o mundo – disse o Patrão --, se bem que as pessoas que desenharam o mapa
resolveram pôr a terra deles em cima e a nossa, embaixo. Mas não existe um em cima e um
embaixo, entende? (...). Nosso mundo é redondo, e nunca termina. Nee anya, isto aqui é tudo
água, os mares e oceanos, aqui é a Europa e, aqui, o nosso continente, a África, e o Congo fica
no meio. Um pouco mais para cima é a Nigéria, e Nsukka é aqui, no Sudeste; é aqui que nós
estamos. (...). Você frequentou a escola?
-- “Já faz muito tempo, sah. Mas eu aprendo (memorizo conhecimentos - no cérebro) tudo
muito rápido”.
-- “Seu pai devia ter pedido dinheiro emprestado!”, retrucou o Patrão , de mau humor: “A
educação é prioridade! Como é que podemos resistir à exploração se não temos as
ferramentas para entender o que é exploração? (...). Vou matricular você na escola primária
(...). A única forma de obter o respeito dos outros é ser o melhor, entendeu?
-- “Existem duas respostas para as coisas que eles vão lhe ensinar sobre a nossa terra: a
resposta verdadeira e a resposta para passar de ano. Você tem que LER LIVROS (preencher o
cérebro com informações) e aprender as duas versões. (...). Eles vão lhe ensinar que um
homem branco chamado Mungo Park descobriu o rio Níger. Besteira! Nosso povo pescava no
rio Níger muito antes que o avô dele tivesse nascido. Mas, no seu exame, escreva que foi
Mungo Park.
-- “Pois não, sah”. Ugwu desejou que esse Mungo Park não tivesse ofendido o Patrão tanto
assim.”
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“T. Ray (pai de Lily) achava as pessoas de cor pouco inteligentes. Como quero dizer a verdade,
incluindo as piores coisas, confesso que eu achava que podiam ser inteligentes, mas não tanto
quanto eu, que era branca. Deitada ali, no catre do apiário, fiquei pensando como August era
inteligente e fina, e fiquei surpresa com isso. Foi assim que eu soube que tinha algum
preconceito enterrado dentro de mim.”
SOBREVIDAS
Abdulrazak Gurnah
--“Você nem sabe o que é matemática, não é verdade? Nós (alemães) viemos trazer isso a
vocês, a matemática e tantas outras coisas inteligentes que vocês não teriam sem nós. Essa é a
nossa Zivilisierungmission,” – disse o oficial (da Schutztruppe), e com o braço esquerdo fez um
gesto na direção da janela, para o boma, seu rosto magro e os lábios finos vincados num
sorriso sardônico. “Esse é o nosso plano ardiloso, (...). Nós viemos civilizar vocês. Unafahamu?”
TERRA SONÂMBULA
Mia Couto
“O velho Tuahir, ignorante das letras, não lhe despertara a faculdade da leitura. (...). Ele pede
então que o miúdo dê voz aos LIVROS. Dividissem aquele encanto como sempre repartiram a
comida. Ainda bem que você sabe LER, Miudinga, - comenta o velho. Não fossem as LEITURAS
eles estariam condenados à solidão. Seus devaneios caminhavam agora pelas letrinhas
daqueles escritos”.
-- O senhor dizia que a única coisa mais perigosa que um preto com uma arma, era um preto
com um livro. Isso aí (a biblioteca) deve ser uma pilha enorme de pólvora preta, então!”
UNDERGROUND RAILROAD
Colson Whitehead
2 - VIDAS SECAS
Graciliano Ramos
CONHECIMENTOS
Seu Tomás preencheu o CÉREBRO – Fabiano não preencheu o CÉREBRO
“Seu Tomás da bolandeira falava bem, estragava os olhos (preenchia o cérebro com
conhecimentos) em cima de JORNAIS e LIVROS, mas não sabia mandar: pedia. (...). Mas todos
obedeciam a ele. (...). Certamente aquela sabedoria inspirava respeito. (...). Em horas de
maluqueira, Fabiano desejava imitá-lo: dizia palavras difíceis, truncando tudo, e convencia-se
de que melhorava. Tolice. Via-se perfeitamente que um sujeito como ele não tinha nascido
para falar certo. (...).
Ninguém tinha culpa de ele haver nascido com um destino ruim. Que fazer? (...). Tinha vindo ao
mundo para amansar boi brabo, curar feridas com rezas, consertar cercas de inverno a verão.
Era sina. O pai vivera assim, o avô também. (...). Cortar mandacaru, ensebar látegos, - aquilo
estava no sangue. Conformava-se. Era um desgraçado, era como um cachorro, só
recebia ossos. (...).
Sempre que os homens sabidos lhe diziam palavras difíceis, ele saía logrado. Mas eram bonitas
as palavras. (...). Muito bom uma criatura ser assim, ter recursos para se defender ( com conhe-
cimentos acumulados no cérebro). Ele não tinha. Se tivesse não viveria naquele estado. (...).”
OBS
Não existe sina, destino e muito menos herança genética; não há cérebro predefinido a ser
“SECO”, levando o seu portador a uma “Vida Seca”. Apenas o CÉREBRO de Fabiano – assim
como dos pais e avós – não foi preenchido com conhecimentos, - embora estivesse apto a
acumular um ‘Mundo de Saber’.
Uma Odisseia a Ser Escrita
nosso CÉREBRO é como se um LIVRO que nasce em branco. Se você nada escrever nele (não
memorizar conhecimentos), este permanecerá vazio; e você não terá condições intelectuais de
– através da imaginação – idealizar e construir: uma piroga; ou uma caravela; ou um ônibus
espacial.
“- Atenção peço, senhores, Para esta breve leitura: Somos ciganas do Egito, Lemos a sorte
futura. Vou dizer todas as coisas, Que deste já posso ver, Na vida desse menino, Acabado de
nascer: Aprenderá a engatinhar, Por aí, com aratus, Aprenderá a caminhar, Na lama, como
goiamuns, E a correr o ensinarão, Os anfíbios caranguejos, Pelo que será anfíbio, Como a gente
daqui mesmo. Cedo aprenderá a caçar: Primeiro, com as galinhas, Que é catando pelo chão,
Tudo que cheira a comida; Depois, aprenderá com outras espécies de bichos: Como os porcos
nos monturos, Com os cachorros no lixo. Vejo-o uns anos mais tarde, Na Ilha do Maruim,
Vestido negro de lama, Voltar de pescar siris; E vejo-o, ainda maior, Pelo imenso lamarão,
Fazendo dos dedos iscas, Para pescar camarão. (...).”
INTELECTO SEVERINO?
Não existe “CÉREBRO SEVERINO” (predestinado a uma ‘Vida Severina’), apenas as ciganas
“previram” que a criança – durante a vida - não preencherá o CÉREBRO com conhecimentos.
A criança não tem culpa nenhuma, claro. Pois se ela não frequenta a escola, é por total
irresponsabilidade do Mundo Adulto que a cerca: os pais, os vizinhos, o padeiro, o quitandeiro,
o gari, o motoboy, o padre, o delegado, o juiz, o prefeito...
Enfim, todos os adultos são os culpados pela tragédia. A propósito, não educar uma criança
(não preencher seu cérebro com conhecimentos) é um Crime Contra a Natureza.
4 - POR QUE VOCÊ DANÇA QUANDO ANDA?
Abdourahman A. Waberi
No início dos anos 1970, no Djibuti – país africano, na costa do Mar Vermelho, e colônia
francesa até 1977 – Aden Robleh preenche o CÉREBRO com conhecimentos...
“Como eu já disse, Béa, minha filhinha, Madame Annick (a professora) era uma francesa da
França. Ela não só sabia ler e escrever, como conhecia bem essa língua, suficientemente bem
para vir ao nosso país e transformar bisnetos de pastores nômades, como eu, - em crianças
que sabem ler, contar e escrever. Era necessário que eles entrassem no mundo moderno e que
tivessem uma vida melhor que a de seus pais. A República Francesa lhe dera essa missão
sagrada. Todas as crianças, louras ou negras (pois todos nascem com o CÉREBRO VAZIO),
devem receber instrução (preencher o cérebro com conhecimentos) para depois conseguir uma
boa posição na vida. Liberdade, igualdade e fraternidade para todos. (Apesar do jugo colonial
– dos males o menor).
Encarcerado no Castelo de If, Edmond Dantès, por meio do amigo e preso político Abade Faria,
preenche o CÉREBRO com conhecimentos – o verdadeiro tesouro....
“De qualquer forma, meu verdadeiro tesouro, acredite, meu amigo, não é o que me esperava
sob as escuras rochas de Monte Cristo; é, a despeito dos carcereiros, sua presença, nosso
convívio; são esses raios de inteligência que o senhor pôs em meu CÉREBRO; essas línguas que
plantou em minha MEMÓRIA e que até crescem com todas as suas ramificações filológicas;
essas ciências diversas que me proporcionou a profundidade e importância do conhecimento;
eis o meu tesouro, amigo, eis em que o senhor me fez rico e feliz. Esta fortuna não é nada
quimérica; é bastante concreta, e todos os soberanos da terra, mesmo os Cesar Bórgia, não
conseguiriam me roubá-la (pois um Tesouro Intelectual ninguém consegue removê-lo do
cérebro).”
6 - FILHA DA FORTUNA
Isabel Allende
“Passava horas acocorada atrás da cortina da sala, devorando uma a uma as obras clássicas
da biblioteca de Jeremy Sommers, os livros românticos de Miss Rose, os jornais atrasados e
qualquer leitura a seu alcance, por mais enfadonha que fosse. Conseguiu que Jacob Todd lhe
oferecesse uma das suas bíblias, (...). Mergulhava no Antigo Testamento com um fascínio
mórbido pelos vícios e paixões dos reis que seduziam esposas alheias, profetas que castigavam
com raios terríveis e pais que geravam descendência nas suas filhas. No quarto dos armários,
onde se acumulavam velharias, encontrou mapas, livros de viagens e documentos de
navegação do seu tio John, que lhe serviram para precisar os contornos do mundo. Os
preceptores contratados por Miss Rose ensinaram-lhe francês, escrita, história, geografia e um
pouco de latim, bastante mais do que incutiam (no cérebro) às raparigas nos melhores colégios
da capital onde, no fim de contas, a única coisa que aprendiam (memorizavam no cérebro)
eram orações e boas maneiras.
O Sr. Joe Gargery, cunhado de Pip, explica e aconselha ao mesmo sobre a importância da
aprendizagem, - sobre a necessidade de preencher o CÉREBRO com conhecimentos...
“- Sou, sim, Joe. – Disse Pip. - Sou muito ignorante (vulgar – como disse a orgulhosa e esnobe
Estella). – Bem Pip, disse Joe (“sem entender bem essa questão metafísica”), seja ou não seja
verdade, o fato é que tens que começar sendo vulgar em matéria de ESTUDO pra depois poder
ser invulgar, a meu ver! (TODOS – REIS E VASSALOS - NASCEM COM O CÉREBRO VAZIO) O rei
lá, sentado no trono dele, com a coroa na cabeça, não pode escrever as leis do Parlamento em
letra de imprensa sem antes começar, quando ainda era príncipe, antes de ser promovido, a
APRENDER as letras do alfabeto (a preencher o cérebro “real” com conhecimentos) – Ah!, -
acrescentou Joe, com um meneio de cabeça repleto de significados, - e tem que começar no A,
e seguir até o Z. E eu sei o que é fazer isso, mesmo não tendo feito muito direitinho. – Havia
alguma esperança nessa sabedoria, - pensou Pip, - e ela me animou um bocado. “
8 - MEMORIAL DO CONVENTO
José Saramago
Bartolomeu Lourenço de Gusmão (1685 / 1724) – inserido como personagem nessa grande
fábula-épico de Saramago, – foi um sacerdote, cientista e inventor brasileiro. Apesar de que,
para o autor, o fato de ele ter nascido aqui, no Brasil, não lhe parecesse algo muito canônico
(verossímil – comum). Mas, enfim, apócrifo que seja, ele nasceu aqui, na capitania de São
Vicente.
Padre Bartolomeu criou, entre outros artefatos, o primeiro balão aerostático da história. No
trecho a seguir, fica claro que o nosso “Padre Voador” possuía um CÉREBRO (“sublime
engenho”) com uma espantosa capacidade de memorização. Veja...
“Têm ambos a mesma idade, vinte e seis anos, como de Baltasar Sete-Sóis já sabíamos, porém
são duas diferentes vidas, a de Baltasar trabalho e guerra, uma acabada, outra que terá que
recomeçar, a de Bartolomeu Lourenço, que no Brasil nasceu e novo veio pela primeira vez a
Portugal, de tanto estudo e MEMÓRIA que, sendo moço de quinze anos, prometia, e muito fez
do que prometeu, dizer de cor (de memória) todo Virgílio, Horácio, Ovídio, Quinto Cúrcio,
Seutónio, Mecenas e Séneca, para diante e para trás, ou donde lhe apontassem, e dar a
definição de todas as fábulas que se escreveram, e a que fim as fingiram os gentios gregos e
romanos, e também dizer quem foram os autores de todos os livros de versos, antigos e
modernos, até o ano de mil e duzentos, (...), e prometia também justificar e defender toda a
filosofia e os pontos mais intricados dela, e explicar a parte de Aristóteles, ainda que extensa,
com todos os seus embaraços, termos e meios-termos, (...), e responder a todas as dúvidas da
Sagrada Escritura, tanto do Testamento Velho como do Novo, repetindo de cor (de memória),
quer a fio corrido, quer salteado, todos os Evangelhos dos quatro Evangelistas, para trás e para
diante, e o mesmo das epístolas de S. Paulo e S. Genónimo, (...), e o mesmo de todos os reis da
Escritura, e o mesmo, para baixo e para cima, para a esquerda e para a direita, dos Livros dos
Salmos, (...), e que não são canónicos os dois Livros dos Esdras, como afinal não parecem muito
canónicos, diga-se aqui para nós e sem outras desconfianças, este sublime engenho, estas
prendas e MEMÓRIA nascidas e criadas em terra de que só temos requerido o ouro e os
diamantes, o tabaco e o açúcar, e as riquezas das florestas, e o mais que nela ainda virá a ser
encontrado, terra doutro mundo, amanhã e pelos séculos que hão de vir, sem contar a
evangelização dos Tapuias, que só ela nos faria ganhar a eternidade.”
OBSERVAÇÃO
a - TESTE DE QI: esse teste não mede inteligência, pois , como foi dito, todo CÉREBRO é
um ‘Sublime Engenho’. O teste mede tão somente a Capacidade de Memorização de
Conhecimentos – que é variável, claro.
b – Boa Retentiva: alguém capaz de memorizar (registrar no cérebro) e repetir de cor, quer a
fio corrido, quer salteado, os dois volumes de calhamaço de Tolstoi, GUERRA E PAZ, não é mais
inteligente do que aquele que não consegue repetir de cor ( de memória) a primeira estrofe do
“Parabéns Pra Você”. Apenas o primeiro tem uma capacidade maior de MEMORIZAÇÃO; - ou
boa Retentiva Cabedora, como diria o grande Riobaldo, de Guimarães Rosa.
RAHIMA – nossa protagonista, a pérola do título - ouve o diálogo entre a sua mãe, Raisa, e a
sua desbocada e adorável tia, KHALA SHAIMA. Esta alerta à irmã sobre a necessidade de
EDUCAR as meninas (Shala, Parwin, Rahima, Rohila e Sitara); sobre a importância de preencher
o CÉREBRO delas com conhecimentos...
É por isso que é importante que essas meninas frequentem a ESCOLA, Raisa. Caso contrário,
nunca terão nada. Seja sensata. Olhe para mim e pense no que pode acontecer com Parwin
(que assim como Khala Shaima, também possui uma deficiência física).
– E com razão. Apesar de tudo o que Madar-jan fez, eu fui preterida. (...). E agora olhe para
mim, enrugada e sozinha. Sem filhos. Às vezes acho que foi melhor seu marido ( contrário à
educação das meninas) passar tanto tempo ausente (combatendo russos, Talibã e disputas
tribais), aquele inútil. Pelo menos assim tenho mais oportunidades de vir aqui e passar algum
tempo com suas filhas. (...). Seja realista: antes que você se dê conta, terá que considerar
seriamente os pretendentes. Exceto para Parwin. Terá sorte se aparecer alguém interessado
nela. (...). Parwin-e-lang (Parwin, a manca. - Apelido, comum no Afeganistão, de acordo com a
deficiência física de cada indivíduo). É o que ela é. Alá é testemunha de que eu a amo tanto
quanto você, mas é assim que as pessoas a chamam, (...). Assim como eu sou Shaima-e-Kup.
Sempre fui Shaima, a corcunda. Se Parwin for à ESCOLA, pelo menos poderá pegar um LIVRO E
LER (e preencher o cérebro com conhecimentos). Pelo menos terá a chance de conhecer algo
diferente destas quatro paredes e do cheiro do ópio do pai (vício comum aos soldados afegãos,
como uma forma de “fugir” do peso das lembranças das guerras – fixadas no CÉREBRO).
(RAHIMA – casada e infeliz – conversa com a tia kHALA SHAIMA). – Eu só gostaria que eles
mandassem as duas (Rohila e Sitara – as mais jovens e ainda solteiras) à ESCOLA. - Khala
Shaima suspirou. – Isso era tudo o que eu queria para cada uma de vocês. Um pouco de
instrução que pudessem levar com vocês (no cérebro) para o resto da vida. (...). Você vai
compreender mais tarde, Rahima. Cada gota de conhecimento (acumulado no cérebro: inglês,
computação, etc.) faz algum bem. Olhe para mim. Tenho sorte de saber LER. É como uma vela
em um quarto escuro. O que eu não sei, posso descobrir sozinha (nos LIVROS - e promover uma
odisseia em seu Espaço Interior). “
“Por intermédio dos livros você viaja a outros mundos. Um livro é o melhor meio de transporte:
leva você a lugares distantes, não polui, é pontual, barato e não causam enjoo.”
O LIVRO SELVAGEM
Juan Villoro
“Porque Eurídice, vejam vocês, era uma mulher brilhante (nasceu com um cérebro brilhante –
mas vazio). Se lhe dessem (se preenchesse seu cérebro com) cálculos elaborados ela projetaria
pontes. Se lhe dessem um laboratório ela inventaria vacinas. Se lhe dessem páginas brancas
ela escreveria clássicos. Mas o que lhe deram foram cuecas sujas para lavar. (...). Eurídice
jamais seria uma engenheira, nunca poria os pés num laboratório e não ousaria escrever
versos, mas essa mulher se dedicou à única atividade permitida que tinha um quê de
engenharia, ciência e poesia: a Culinária. (...).”
OBS
BÍPEDES Analfabetos – QUADRÚPEDES Alfabetizados:
Todos os mamíferos, sem exceção, nascem com o CÉREBRO vazio – e aprendem através do
mesmo processo: Memorização de conhecimentos.
Portanto, assim como acontece conosco, para que o seu CÃO receba um canudo
de formatura, é preciso preencher o CÉREBRO dele com conhecimentos.
“Um CÃO pode (ao memorizar conhecimentos no cérebro) ser adestrado para caçar;
pastorear rebanhos; proteger residências ou pessoas; auxiliar policiais; conduzir
pessoas cegas; salvamento de pessoas afogadas, soterradas em escombros
ou avalanches; exibições circenses, etc.
Fonte Wikipédia
“Desde menino eu tinha dois encantamentos: um era a leitura. O pessoal hoje me diz: ‘olha,
Ariano, a juventude não está mais lendo não’. Eu não acredito... Mas... Vocês não ficam
preocupados não? Eu fico com pena. Porque eu vou dizer uma coisa... Leitura, que coisa boa!
Olhe, vocês não imaginam que alegria que eu tinha não! Eu assim que me alfabetizei, eu
comecei a ler. Outro dia um jornalista de São Paulo me perguntou se eu tinha o hábito da
leitura. Eu falei: o hábito, não; eu tenho a paixão da leitura. Pois bem, eu me deitava numa
cama, botava um bolinho de bolacha aqui e abria um livro. Menino, que coisa! Que alegria! Era
como um mundo novo que se abria diante de mim. O livro... Que coisa boa... O outro
encantamento era o circo... (...).”
“Agora não há outra música senão as das palavras, e essas, sobretudo as que estão nos livros,
são discretas, (...), este longo fio de som (murmúrio solitário da leitura) que poderá
infinitamente prolongar-se, porque os livros do mundo, todos juntos,
são como dizem que é o universo, infinitos.”
OBS
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL x HUMANIDADE ARTIFICIAL
HAL 9000 – Eu, Robô: o que determina o humano não é a inteligência; pois, como já foi dito,
todo CÉREBRO é natural e potencialmente inteligente: basta preenchê-lo com conhecimentos.
Na realidade, como veremos no cap. XIX (CÉREBRO – A Fantástica Fábrica de Emoções), o
que caracteriza o HUMANO é a capacidade de exteriorizar EMOÇÕES. Assim sendo, lanço um
desafio (amistoso, claro): VOCÊ seria capaz de imaginar um ROBÔ capaz de amar, odiar,
mentir e sentir MEDO?
“Não somos ROBÔS nem pedras falantes, senhor agente, disse a Mulher do Médico (durante o
interrogatório), em toda a verdade HUMANA há sempre algo de angustioso, de aflito, Nós
somos, e não estou a referir-me simplesmente à fragilidade da vida, somos uma
pequena e trêmula chama que a cada instante ameaça apagar-se,
e temos MEDO, acima de tudo temos MEDO. (...)”
ENSAIO SOBRE A LUCIDEZ
José Saramago
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CAPÍTULO
XIV
A BAGAGEM DO VIAJANTE - SOLITÁRIO
( carregamos no cérebro o peso das nossas recordações)
37 CITAÇÕES
LEIA a seguir 37 citações retiradas da literatura e do cinema, onde é posto em evidência...
Brás Cubas, apesar de morto (“seria longo e desnecessário explicar o processo”), regressa em
sua Linha da Memória – dentro do cérebro – e descreve as LEMBRANÇAS da sua vida:
infância, juventude, maturidade e morte. Suposto o uso vulgar seja iniciar o relato pelo
princípio (seu nascimento), algumas considerações o levaram a adotar diferente método, e
decidiu começar pelo fim (sua morte):
“Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na
minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns 64 anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía
cerca de 300 contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. (...).”
“(...). Obra de finado. Eu, Brás Cubas, escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia,
e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que a gente grave achará no
livro umas aparências de puro romance, ao passo que a gente frívola não achará nele o seu
romance usual; ei-lo aí fica privado da estima dos graves e do amor dos frívolos, que são as
duas colunas máximas da opinião.
2 - MEMORIAL DO CONVENTO
José Saramago
“(...) A JOÃO FRANCISCO foi Baltasar Sete-Sóis dizer aonde iam, -- Meu pai, vou com Blimunda
Sete-Luas à Serra do Barregudo, ao Monte Junto, ver como está a máquina em que voámos de
Lisboa, a Passarola, LEMBRA-SE, quando aí se disse que o Espírito Santo tinha passado pelos
ares, por cima do convento, não foi Espírito Santo nenhum, fomos nós, com o padre
Bartolomeu Lourenço, o Voador, LEMBRA-SE dele, aquele padre que esteve cá em casa quando
a mãe ainda era viva, e ela quis matar o galo, mas ele não deixou, que muito melhor que
comer o galo era ouvi-lo cantar, nem seria coisa que se fizesse às galinhas. Ouviu estas
RECORDAÇÕES João Francisco, e ele, que costumava não falar, disse, LEMBRO-ME DE TUDO,
meu filho, (...)”
OBS: como veremos no cap. XXII, quanto mais se Permanece no Presente (quanto maior for a
nossa idade), maior será o peso das lembranças que somos obrigados a carregar – no
CÉREBRO.
3 - VIDAS SECAS
Graciliano Ramos
Boas ou más, exultantes ou aflitivas, as LEMBRANÇAS são indeléveis – não podemos apagá-las
do cérebro. No entanto, Fabiano – não sabendo disso – esforça-se por esquecer suas
infelicidades...
Fabiano sentou-se desanimado na ribanceira do bebedouro. (...). Tinha ali comida para dois ou
três dias; (...). Como andariam as contas com o patrão? Estava ali o que não conseguiria nunca
decifrar. Aquele negócio de juros engolia tudo, e afinal o branco ainda achava que fazia favor.
O soldado amarelo (que o havia espancado e humilhado)... Fabiano, encaiporado, fechou as
mãos e deu murros na coxa. Diabo. Esforçava-se por esquecer uma infelicidade, e vinham (as
lembranças de) outras infelicidades. Não queria lembrar-se do patrão e do soldado amarelo.
Mas lembrava-se, com desespero, enroscando-se como uma cascavel assanhada. Era um
infeliz, era a criatura mais infeliz do mundo.
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EXPLICAÇÃO
A – Cada Lembrança, Uma Emoção: como veremos no cap. XIX (CÉREBRO – A Fantástica
Fábrica de Emoções), cada lembrança da nossa vida, somatiza uma determinada emoção. Ou
seja, a evolução da MEMÓRIA (a aptidão para preencher o CÉREBRO com as lembranças da
nossa vida) determinou a origem dos sentimentos exclusivamente HUMANOS: amor, ódio,
saudade, trauma, prazer, pesar, orgulho, frustração, culpa, inveja, etc.
B – “SENTIR É VIVER”: — Com efeito – disse Carlos ao velho amigo Alencar, o poeta – pareces-
me um pouco murcho... Falta-te o ar aureolado. O poeta encolheu os ombros. – O evangelho lá
diz bem claro... Ou é a Bíblia que o diz?... Não; é São Paulo... São Paulo ou Santo Agostinho?...
Enfim, a autoridade não faz o caso. Num desses santos livros se afirma que este mundo é um
Vale de Lágrimas... – Em que a gente se ri bastante, disse Carlos alegremente. O poeta voltou a
encolher os ombros. – Lágrimas ou risos, que importava?... Tudo era SENTIR, tudo era VIVER!”
OS MAIAS
Eça de Queirós
4 - GABRIELA, CRAVO E CANELA
Jorge Amado
Sem saber que GABRIELA – por ser uma força da natureza – não seria posse de ninguém, o
negro Clemente se apaixona e não consegue tirar a lembrança dela da cabeça...
-- Tou com ela (a lembrança dela) metida em meu juízo; mesmo querendo, não posso esquecê-
la.
– Tu tá maluco. Ela não é mulher pra se viver cum ela.
– Que é que tá dizendo?
-- Num sei... Pra mim é assim. Tu pode dormir cum ela. Fazer as coisas. Mas ter ela mesmo, ser
dono dela como é das outras, isso ninguém vai nunca ser.
– E por quê?
– Num sei, o diabo é que sabe. Num tem explicação.
-- Tem certas flores, você já reparou? que são belas e perfumadas enquanto estão nos galhos,
nos jardins. Levadas pros jarros, mesmo jarros de prata, ficam murchas e morrem.
Assim era Gabriela - nasceu para ser livre; amar e florir a céu aberto.
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EXPLICAÇÃO
“Gostar é fácil, acontece quando menos se espera, um olhar, uma palavra, um gesto e o fogo
lavra queimando peito e boca; difícil é ESQUECER (a lembrança do bem-querer – incrustada
nas entranhas do cérebro), a saudade consome o vivente; amor não é espinho que se arranca,
tumor que se rasga, é dor rebelde e pertinaz, matando por dentro.”
“Nos primeiros tempos de viuvez, permanece Dona Flor em preto e em silêncio, numa espécie
de devaneio, nem sonho nem pesadelo, entre os crescentes murmúrios das comadres e as
memórias dos sete anos de casamento (que permaneceram em seu cérebro). (...) Trancada em
sua aflição e anseio, fluía em meio àquele mundo de lembranças (compartilhadas com o
falecido Vadinho), recordando os momentos de risos e as horas de amargura. (...). Ai, nunca
mais! Só o desejo a sustenta, e a MEMÓRIA.”
3 - LEMBRANÇA ESFUMAÇADA
- TERRAS DO SEM FIM -
“Antonio Vitor prometera voltar para Ivone, um dia, rico, bem vestido, de botinas
rangedeiras. Agora, esses pensamentos (lembranças apaixonadas) já não existiam na sua
cabeça. Agora ele é um capanga de Juca Badaró, conhecido pela rapidez do seu tiro. A
Lembrança de Ivone (que antes expressavam afeição e saudade) se esfumaçou na sua
MEMÓRIA (cérebro).”
4 - LEMBRANÇAS PECAMINOSAS
- TIETA DO AGRESTE -
“Ricardo cometerá pecado mortal, com certeza, se espiar a tia. Mas quando acontece de VER
(e registrar a imagem da tia – no cérebro) sem querer, por acaso? Por mais que faça,
impossível não enxergar tão expostos atributos. Pior que ver, é PENSAR (na lembrança de
Tieta). (...). Queira ou não, de olhos fechados ou abertos, ele lembra, imagina (vendo as
lembranças de Tieta – em seu cérebro). A gente LEMBRA sem querer; é a maneira de Deus
provar a fé, o zelo dos eleitos.”
5 - PONCIÁ VICÊNCIO
Conceição Evaristo
Como nós não tivemos o privilégio de conhecer o Vô Vicêncio, temos que pedir a sua neta,
Ponciá Vicêncio, que regresse em sua Linha da Memória (dentro do seu cérebro) e descreva
as saudosas LEMBRANÇAS do seu querido avô...
O primeiro homem que Ponciá Vicêncio conhecera fora o avô. Guardava (no cérebro) mais
imagem (lembranças) dele, do que a do próprio pai. Vô Vicêncio era muito velho. Andava
encurvadinho com o rosto quase no chão. Era miudinho como um graveto. Ela era menina, de
colo ainda, quando ele morreu, mas se lembrava nitidamente de um detalhe (vemos nossas
lembranças – dentro do cérebro). Vô Vicêncio faltava uma das mãos e vivia escondendo o
braço mutilado para trás. Ele chorava e ria muito. Chorava feito criança. Falava sozinho
também. O pouco tempo em que conviveu com o avô, bastou para que ela guardasse ( no
cérebro) as marcas (lembranças) dele. Ela reteve na memória (cérebro) os choros misturados
aos risos (ouvimos nossas lembranças – no cérebro), o bracinho cotoco e as palavras não
inteligíveis de Vô Vicêncio. Um dia ele teve uma crise de choro e riso tão profunda, tão feliz, tão
amarga que desse jeito adentrou-se no outro mundo. Ela, menina de colo, viu e sentiu o odor
das velas acesas durante toda a noite, (...), sentiu o cheiro de biscoito frito, de café fresco
(memorizamos ODORES e SABORES - no cérebro) dado para as mulheres e as crianças que
estavam fazendo quarto ao defunto. (...). Ponciá Vicêncio, mesmo menina de colo ainda, nunca
esqueceu (reteve em seu cérebro – como uma lembrança marcante) o derradeiro choro e riso
do avô.”
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OS 5 SENTIDOS - DO CÉREBRO
Não esqueça que, além de IMAGENS, principalmente IMAGENS, também memorizamos no
CÉREBRO: sons, sabores, aromas e sensações táteis.
3 – Cardápio de Lembranças: você seria capaz de – com olhos vendados – identificar todos os
ingredientes que compõem sua pizza favorita (muçarela, calabresa, catupiry...)? Claro que sim.
Pois você já havia Memorizado os Sabores (no cérebro), e consegue identificá-los de olhos
fechados.
5 - Desenhando Sensações Táteis no Cérebro: você seria capaz de – com os olhos vendados –
identificar todos os objetos sobre sua mesa de trabalho (tela, teclado, mouse, impressora,
documentos, livros, cadernos, canetas, etc.)? Claro que sim. Pois à medida tateia um objeto,
você vai gradativamente desenhando suas formas no CÉREBRO – e o identifica.
CONCLUSÃO
vemos no CÉREBRO, não com os olhos;
ouvimos no CÉREBRO, não com os ouvidos;
sentimos os sabores no CÉREBRO, não com a boca;
sentimos os aromas no CÉREBRO, não com o nariz;
percebemos as sensações táteis no CÉREBRO, não com as mãos.
7 - FILMADORA ORGÂNICA: devemos entender o nosso CÉREBRO como sendo uma Filmadora
Viva, capaz de registrar: imagens, sons, sabores, aromas e impressões táteis.
“Às vezes parece que a nossa MEMÓRIA (as lembranças em nosso cérebro) sofre um processo
análogo aos das FOTOS tiradas por polaróides. Durante cerca de 30 anos (de Permanência no
Presente), quase não LEMBREI de Jansen (fotógrafo e amigo). (...). Ele deixou a França no mês
de junho de 1964, e escrevo estas linhas em abril de 1992. Nunca mais tive notícias dele e não
sei se está vivo ou morto. Sua LEMBRANÇA ficara hibernando (em seu cérebro), mas eis que
ressurge no início desta primavera”.
PRIMAVERA DE CÃO
Patrick Modiano
6 - ALIÓCHA KARAMAZOV
QUEM É ALIÓCHA? Para responder a essa questão, temos que pedir ao mesmo que regresse
em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e descreva uma marcante, comovente
LEMBRANÇA da sua infância. – E assim, sabendo um pouco quem ele FOI, podemos saber um
pouco quem ele É agora...
“Já contei que, tendo perdido sua mãe aos quatro anos, dela se lembrou por toda a sua vida,
de seu rosto (memorizamos imagens – no cérebro), de suas carícias (memorizamos impressões
táteis – no cérebro), “como se eu a visse viva” (em suas lembranças – dentro do cérebro).
Semelhantes recordações podem persistir (cada qual o sabe), mesmo numa idade mais tenra,
mas não permanecem como pontos luminosos nas trevas, como o fragmento de um imenso
quadro que tivesse desaparecido. Era o caso para ele: lembrava-se de uma suave noite de
verão, da janela aberta aos raios oblíquos do Sol poente; a um canto do quarto, uma imagem
santa com a lâmpada acessa e, diante da imagem, sua mãe ajoelhada, soluçando como numa
crise de nervos, lançando gemidos e exclamações(vemos e ouvimos nossas lembranças –
dentro do cérebro). Ela o tomara em seus braços, apertando-o a ponto de sufoca-lo, e
implorava por ele à Santa Virgem, afrouxando seu amplexo para empurrá-lo para a imagem
como a pô-lo sob sua proteção... Tal era a cena! (Tal era a lembrança da mãe -- em seu
cérebro). Aliocha lembrava-se do rosto de sua mãe, exaltado, mas sublime, segundo suas
recordações. (...). Na sua infância e na sua mocidade, era antes concentrado e até mesmo
taciturno, não por timidez, (...), mas por uma espécie de preocupação interior tão profunda que
o fazia esquecer-se dos que o cercavam. Mas gostava e tinha fé em seus semelhantes, sem
passar jamais por simplório ou ingênuo. (...). Parecia mesmo resignado a admitir tudo sem
reprovação, embora muitas vezes com profunda melancolia. (...)”.
OS IRMÃOS KARAMAZOV
- Fiódor Dostoiévski -
CALPURNIA, que era uma das quatro na Alforria que sabia ler, filosofa sobre
a memória dos homens e das mulheres...
-- Sou mais velha que o Sr. Finch – disse Calpurnia sorrindo. – Quantos anos ao certo, não sei.
Uma vez, tentamo-nos LEMBRAR, tentamos descobrir quantos anos eu tinha... sei é que me
LEMBRO de mais coisas do que o patrão, algumas, não muitas, por isso não devo ser muita
mais velha, isto sem contar que as mulheres têm mais MEMÓRIA que os homens.
-- Quando é que faz aniversário, Cal? – Só festejo no Natal. Assim é mais fácil de LEMBRAR...
8 - TERRA SONÂMBULA
Mia Couto
-- Tio, eu aprendi (memorizei no cérebro) tudo de novidade: andar, falar. Meus olhos (cérebro)
se LEMBRAM das leituras, meus dedos (cérebro) não ESQUECERAM as letras. Mas eu não sei
LEMBRAR nada do meu passado. Por quê, tio?
Tuahir então resolve lhe dizer a verdade. O miúdo tinha sido levado ao feiticeiro. O velho lhe
pedira para que tudo (todas as lembranças da guerra) fosse retirado da cabeça de Muidinga.
-- Pedi isso por causa é melhor não ter LEMBRANÇA destes eventos que passou. Ainda tiveste
sorte com a doença, Muidinga. Pudeste ESQUECER tudo. Enquanto eu não, carrego esse peso
(o peso das lembranças da guerra – dento no cérebro).”
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“-- Aquele homem, - disse Miserinha, vai carregado de sofrimento (com o cérebro repleto de
lembranças amargas).
– Como sabe?
– Não vê que só o pé esquerdo é que pisa com vontade? Aquilo é peso no coração (peso das
lembranças – dentro do cérebro).
Miserinha explica-me que sabe ler a vida de um homem pelo modo como ele pisa no chão.
Tudo está escrito em seus passos, os caminhos por onde ele andou (nas lembranças dos
caminhos por onde ele andou).
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EXPLICAÇÃO
O velho Tuahir LEMBRA dos horrores da guerra, logo sente estresse pós-traumático;
Solvente Removedor de Lembranças: caso fosse possível retirar - do cérebro do velho Tuahir -
as lembranças trágicas da guerra, findaria seu sofrimento. Mas, lamentavelmente, as
LEMBRANÇAS – boas ou más – são indeléveis; não se pode apagá-las do CÉREBRO.
9 - CIDADÃO KANE
Orson Welles
O repórter Jerry Thompson (William Alland), na tentativa de reconstituir a vida do Sr. Charles Foster
Kane, entrevista seu ex-secretário, agora aposentado, o Sr. Bernstein (Everett Sloane):
--“Sr. Bernstein, o senhor afirma que ROSEBUD – a última palavra dita pelo Sr. Kane no leito de
morte, – poderia, talvez, se referir à lembrança de uma garota que o mesmo conheceu na
juventude. Mas seria mesmo possível ao Sr. Kane lembrar-se desse evento após tantos anos?
-- Bem, você é muito jovem, Sr. Thompson, talvez por isso não seja capaz de imaginar o quanto
um sujeito é capaz de lembrar das coisas do seu passado (das lembranças da sua vida –
contidas no cérebro). Tome a mim como exemplo. Um dia -- e isso aconteceu em 1896 – eu
estava indo para Jersey de balsa, quando avistei uma outra balsa. Nela havia uma garota que
usava um vestido branco e carregava um guarda-sol (vemos nossas lembranças – dentro do
cérebro). Eu só a VI por um segundo (ela não o viu), enquanto ela passava em seu passeio de
barco por mim.
E desde então eu nunca mais avistei aquela garota de cabelo ruivo novamente ( mas a
lembrança dela permaneceu – em seu cérebro); mas sabe de uma coisa? Em todo esse tempo
não houve um único dia em que eu não lembrasse dela. Portanto, meu caro repórter, não
subestime a MEMÓRIA de um velho.”
Obs: na verdade, ROSEBUB possui um outro significado; mas para isso é preciso que você assista ao filme com
muita atenção – até o último take.
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“Florentino Ariza, por outro lado, não deixara de LEMBRAR dela um único instante desde que
Firmina Daza o rechaçou sem apelação depois de uns amores longos e contrariados, e haviam
transcorrido a partir de então cinquenta e um anos, noves meses e quatro dias (de
Permanência no Presente). Não tivera que manter a conta do esquecimento fazendo uma risca
diária nas paredes de um calabouço, porque não se havia passado um dia sem que
acontecesse alguma coisa que o fizesse LEMBRAR-SE dela. (...).”
O AMOR NOS TEMPOS DE CÓLERA
Gabriel Garcia Marquez
EXPLICAÇÃO
- A Culpa é das Lembranças -
a – Lembrança Visguenta: como veremos no cap. XIX, - o AMOR não passa da somatização de
uma lembrança que permanece fixa, obsessivamente fixa - em nosso CÉREBRO.
O Sr. Bernstein VIU beldade ruiva, e registrou sua bela imagem no CÉREBRO. E desde então
ela tornou-se uma LEMBRANÇA constante, recorrente. Em outras palavras, o Sr. Bernstein
apaixonou-se por toda a vida por uma garota que viu uma única vez na vida.
b – O Cérebro Tem Razões Que a Própria Razão Desconhece: a propósito, nós AMAMOS NO
CÉREBRO, não no coração. O coração – desculpem-me os poetas – o coração é apenas um
músculo, órgão central responsável pela circulação sanguínea.
“Agora, depois que envelheci, sou assaltado por memórias, incrivelmente nítidas, de coisas
passadas. Como se alguém, dentro da minha cabeça, se entretivesse
a folhear um velho álbum fotográfico.”
TEORIA GERAL DO ESQUECIMENTO
José Eduardo Agualusa
10 - AS ÚLTIMAS TESTEMUNHAS
(Crianças na Segunda Guerra Mundial)
Svetlana Aleksiévitch
“Essas cenas, esses fogos (vemos nossas lembranças - dentro do cérebro)... São a minha
riqueza. É um luxo eu ter sobrevivido... Ninguém acredita em mim, nem mamãe acreditava.
Quando começamos a recordar depois da guerra, ela se surpreendia: “Você não pode se
lembrar disso, era muito pequeno, alguém te contou...”. Não, eu mesmo lembro... As bombas
explodiam (ouvimos nossas lembranças – dentro do cérebro), e eu me agarrava ao meu irmão
mais velho: “Quero viver! Quero viver!”. Tinha medo de morrer, mas o que eu podia saber
sobre morte na época? O quê? Eu mesmo lembro... (...). Lembro que os adultos falavam: “Ele é
pequeno. Não entende”. E eu me surpreendia: “Como esses adultos são estranhos, por que eles
decidiram que eu não entendo nada? Entendo (lembro) tudo!”. A guerra é meu livro de
história. Minha solidão... Perdi a época da infância, ela fugiu da minha vida. Sou uma pessoa
sem infância, em vez de infância (em lugar das lembranças comuns da infância – no cérebro),
tenho a guerra (tenho lembranças das atrocidades da guerra – no cérebro).
“Bruno Von Falk (oficial alemão) Tirou a boina militar, pegou-lhe nas mãos. Antes de a beijar,
apoiou a face contra elas, num gesto a um tempo suave e imperioso, talvez numa tomada de
posse, talvez numa tentativa para imprimir nela, como um selo, A QUEIMADURA DE UMA
LEMBRANÇA (tatuou a lembrança de Lucille – em seu cérebro). – Adeus, - disse a Lucille. –
Adeus. Nunca a ESQUECEREI.”
EXPLICAÇÃO
VINICIUS: quando o poeta afirmou “O amor é eterno enquanto dura”, – entenda-se: o AMOR
será eterno enquanto a lembrança do objeto da afeição permanecer viva – em nosso
CÉREBRO. Mas até quando isso é possível ?
Nas 4 citações abaixo temos alguns exemplos sobre a persistência das lembranças,
- ou sobre a persistência da paixão....
“Se eu tivesse (diz o Negro sobre sua amada, Shekure, - há muito distante), - Se eu tivesse
levado comigo um retrato à veneziana de Shekure, acho que não teria sentido tanto a sua falta
durante o meu longo périplo, por não conseguir me LEMBRAR direito da minha amada, cuja
fisionomia eu havia ESQUECIDO em algum lugar que ficara para trás (se distanciou em sua
Linha da Memória – dentro do cérebro). Porque se a IMAGEM do ser amado fica viva no seu
coração (no seu cérebro), O MUNDO INTEIRO É SUA CASA.
“Não me LEMBO da tua cara, meu amor, chego à rua e em todos os homens te reconheço, o
que deve querer dizer que te estou a ESQUECER irremediavelmente.
III - SAGARANA
Guimarães Rosa
“Bem que havia de ser razoável ter podido ao menos dizer à prima (Luísa, - esposa do seu
amigo Ribeiro) que ela era o seu amor... (...). Teria ela adivinhado o seu querer-bem?... E que
bom que seria se ela tivesse ficado sabendo! Ao menos, agora, de vez em quando se
LEMBRARIA dele, dizendo: Primo Argemiro também gostou de mim....”
IV - OS MISERÁVEIS
Victor Hugo
“Marius descia esse declive vagarosamente, com os olhos fitos no que não via. (...). A
LEMBRANÇA de um ente ausente (Cosette) acende-se nas trevas do seu coração (cérebro);
quanto mais completamente desapareceu aquele ente (Cosette), tanto mais brilhante é a
LEMBRANÇA (dela - em seu cérebro); a alma desesperada e obscura vê no seu horizonte aquela
luz, estrela da noite anterior. Ela! Eis a que se reduzia todo o PENSAR de Marius (pensava
obsessivamente na lembrança de Cosette). (...). E dizia consigo: << Se ao menos pudesse tornar
a vê-la antes de morrer! >>.” (...). – Redução do Universo a uma só criatura, expansão de uma
só criatura até o infinito, - eis a definição do amor...
12 - A ESTRADA
Cormac McCarthy
“Atravessaram a cidade ao meio-dia do dia seguinte. Mantinha o seu menino bem perto, ao
seu lado. A cidade estava quase toda queimada. Nenhum sinal de vida. Carros na rua
incrustada de cinzas, tudo coberto de cinza e poeira. Rastros fósseis na lama seca. Um cadáver
na soleira de uma porta seco feito couro. Arreganhando os dentes para o dia. Ele puxou o filho
mais para perto. -- Apenas se LEMBRE que as coisas (Lembranças) que você põe na cabeça
ficam lá para sempre, falou ao filho. Você talvez queira pensar sobre isso. – Você esquece de
algumas coisas, não se esquece? – Sim. Você ESQUECE do que quer LEMBRAR, e se LEMBRA do
que quer ESQUECER”.
13 - O GRANDE GATSBY
- F. Scott Fitzgerald -
“(...) Quase cinco anos! Devia ter havido momentos, mesmo naquela tarde do reencontro, em
que Daisy não correspondera totalmente aos seus sonhos... Não por culpa dela, mas devido à
colossal vitalidade da ilusão que ele (Gatsby) alimentara. Uma idealização que havia crescido e
se tornado maior do que ela, maior do que qualquer coisa no universo. (...). Não há intensidade
de ardor ou de euforia (lembranças de momentos sublimes ou devastadores) que possa
desafiar aquilo que um ser humano é capaz de armazenar em seu fantasmagórico coração
(cérebro).
EXPLICAÇÃO
Gatsby, por sua vez, LEMBRA obsessivamente de Daisy, logo sente ua avassaladora afeição;
Mesmo que idealizada no cérebro de Gatsby, a obsessiva LEMBRANÇA de Daisy – sua grande paixão - foi a
responsável por sua vertiginosa ascensão, e por sua queda abissal.
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O GIGANTE ENTERRADO
Kazuo Ishiguro
“Então Beatrice perguntou ao barqueiro: há pouco o senhor falou de seu dever de interrogar
todo casal que espera fazer a travessia, e assim descobrir se o VÍNCULO DE AMOR entre ambos
é forte o bastante para permitir que eles morem juntos na ilha. Bem, senhor, é só para
satisfazer a curiosidade de uma velha, que tipo de perguntas faz para descobrir o que precisa?
Por um momento o barqueiro pareceu hesitar. Depois disse: bem, boa senhora, se um casal
acredita que o vínculo entre eles é forte o bastante, tenho que pedir a cada um deles,
separadamente, que (regressem em sua Linha da Memória – dentro do cérebro e) me relate
SUAS LEMBRANÇAS MAIS CARAS. Dessa forma, a verdadeira natureza do vínculo entre ambos
logo se revela. (ou pode não revelar vínculo algum – como é o caso de Gatsby e Daisy).”
14 - A MORTE DE IVAN ILITCH
Leon Tolstoi
(O INÍCIO, COMOVIDO, APRESENTA-SE AO FIM)
Solitário, enfermo e desiludido, IVAN ILITCH só encontra alguma “vida” ao regressar em sua
Linha da Memória (dentro do cérebro) e relembrar os singelos episódios da sua infância...
“Ultimamente, na solidão em que se encontrava, (...) – solidão mais completa do que qualquer
outra, seja no fundo do mar ou no centro da Terra -, IVAN ILITCH vivia somente das
lembranças do passado (registradas em sua Linha da Memória – dentro do cérebro). Um após
outro, os retratos (lembranças) do seu passado iam aparecendo para ele (vemos nossas
lembranças – dentro do cérebro).
“Mas não devo lembrar disso, é muito doloroso”, e IVAN ILITCH forçava-se a voltar ao
(amargurado) presente. (...) Mas quanto mais para trás olhasse mais vida encontrava. Houve
mais coisas boas e mais vida em si, lá atrás. (...) << Há um ponto de luz lá longe, no início da
vida, mas, depois disso, tudo foi ficando cada vez mais negro e afastando-se cada vez mais, em
proporção inversa à distancia que me separa da morte >>, pensou IVAN ILITCH. *
EXPLICAÇÃO
*IVAN ILITCH percebe que, enquanto as lúdicas lembranças da sua infância (o início) cada
vez mais se afastam em sua Linha da Memória (dentro do cérebro),
a possibilidade da morte (o fim) cada vez mais se aproxima.
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“Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de
RECORDAR aquela tarde remota (da sua infância) em seu pai o levou para conhecer o gelo”.
CÉLEBRE INTRODUÇÃO DE CEM ANOS DE SOLIDÃO
Gabriel Garcia Marquéz
15 - MELQUIADES, O INOLVIDÁVEL
“Aquele ser prodigioso que dizia possuir as chaves de Nostradamus era um homem lúgrube,
envolto numa aura triste, com um olhar asiático que parecia conhecer o outro lado das coisas.
Usava um chapéu grande e negro, e um casaco de veludo patinado pelo limo dos séculos. (...).
No sufocante meio-dia em que Melquíades revelou os seus segredos, José Arcadio Buendía teve
a certeza de que aquele era o princípio de uma grande amizade. As crianças se assombraram
com os seus RELATOS FANTÁSTICOS (relatos das lembranças da sua vida). Aureliano, que
naquele tempo não tinha mais de cinco anos (de Permanência no Presente), havia de
RECORDAR pelo resto da vida como o viu naquela tarde, sentado contra a claridade metálica e
reverberante da janela, iluminando com a sua profunda voz de órgão os territórios mais
escuros da imaginação, enquanto esguichava pelas têmporas a gordura derretida pelo calor.
José Arcadio, seu irmão mais velho, havia de transmitir aquela imagem maravilhosa, como
uma RECORDAÇÃO HEREDITÁRIA, a toda a sua descendência. Úrsula, pelo contrário, conservou
(em seu cérebro) uma LEMBRANÇA desagradável daquela visita, porque entrou no quarto no
momento em que Melquíades quebrava por distração um frasco de bicloreto de mercúrio. (...).
Aquele cheiro acre ficaria para sempre em sua memória (cérebro) vinculado à LEMBRANÇA de
Melquíades.
CEM ANOS DE SOLIDÃO
Gabriel Garcia Marquéz
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SUPER INTERESSANTE
(pub. 31 mar 1988 – atu. 31 out 2016)
“TUDO MENTIRA - Ninguém gosta de admitir esta dura verdade: TODOS MENTEM. Seja para
agradar a alguém, escapulir de uma encrenca, ser o herói de alguma aventura nunca vivida,
levar vantagem na vida. Com sua pernas curtas, a mentira caminha no passo do homem desde
que o mundo é mundo, e não dá sinal de perder o fôlego, muito pelo contrário. Todos temos
um pouco, ou muito, de Pinocchio. (... ou do Barão de Munchausen; ou de Pantaleão; ou de
Chicó de Suassuna; ou de Jakob, o mentiroso... ).”
EXPLICAÇÃO
a - Os Falaciosos: o assunto aqui tratado nada tem a ver com o grande MELQUÍADES; um dos
personagens mais fascinantes do romance. Apenas arranjei uma brecha para explicar, em
poucas palavras, o que significa a MENTIRA.
Para o bem ou para o mal, MENTIR significar tentar omitir, acrescentar, inventar ou falsear as
LEMBRANÇAS de algum episódio da nossa vida. Somos naturalmente egoístas, portanto, a
nossa “Versão dos Fatos” (Lembranças dos Fatos) quase sempre tenderá àquela que nos
pareça mais vantajosa:
“Já que a MEMÓRIA, que é susceptível e não gosta de ser apanhada em falta, tende a
preencher os esquecimentos com criações de realidade próprias, obviamente espúrias,
mais ou menos contíguas aos fatos de cujo acontecer só lhe havia ficado uma
lembrança vaga, como o que resta da passagem de uma sombra”.
TODOS OS NOMES
José Saramago
b - Se és o Papa; sou Napoleão (III): quando um indivíduo idealiza algo no cérebro e acredita
genuinamente em suas fantasias – como é o caso do nosso RUBIÃO ( do romance Quincas
Borba, de Machado de Assis, - e do qual citaremos mais adiante) – já não se trata de “Mentiras
ou Verdades”, mas de um problema neurológico que necessita de acompanhamento
psicológico.
“— Pois sim, mas eu pergunto. Suponha que você está no seminário e recebe a notícia de que
eu vou morrer... Ou que me mato de saudades, se você não vier logo, e sua mãe não quiser que
você venha, diga-me, você vem ? Deixa seminário, deixa sua mãe, deixa tudo, para me ver
morrer? – Venho, - respondeu Bentinho. Capitu teve um risinho descorado e incrédulo, e com a
taquara escreveu uma palavra no chão; inclinei-me e li: MENTIROSO.
DOM CASMURRO
Machado de Assis
Ficções de Borges
“Nós, de uma olhadela, percebemos três taças em uma mesa; Funes, todos os rebentos e
cachos e frutos que compreende uma parreira. Sabia as formas das nuvens austrais do
amanhecer do dia 30 de abril de 1882, e podia compará-las na LEMBRANÇA (cérebro) aos veios
de um livro encadernado em couro que vira somente uma vez e às linhas da espuma que um
remo levantou no rio Negro na véspera da batalha do Quebracho. Essas LEMBRANÇAS (em seu
cérebro) não eram simples; cada imagem visual estava ligada às LEMBRANÇAS das demais
sensações do evento relatado (sons, sabores, odores e impressões táteis). (...) Então disse:
“Mais RECORDAÇÕES (no cérebro) tenho eu sozinho que as que tiveram todos os homens desde
que o mundo é mundo. Minha MEMÓRIA (cérebro), meu senhor, é um despejadouro de lixos
(lembranças inúteis).”
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“Lembro-me de um linguista que se queixava de não ser capaz de esquecer nenhuma das vinte
e tal línguas que conhecia. Dizia que se sentia enlouquecer por ter a cabeça cheia de
informações de que não necessitava. Sentia-se atalhufado de irrelevâncias.”
NAS TUAS MÃOS
Inês Pedrosa
17 - SVETLANA ALEKSIÉVITCH
(ESCRITORA BIELORRUSSA – MERECIDO NOBEL 2015)
Como veremos no cap. XVII, os SONHOS (e pesadelos) são construídos – em nosso cérebro –
com fragmentos de lembranças da nossa vida.
Antes, porém, utilizaremos 3 citações da escritora bielorrussa para fazer ua breve explicação:
“Por acaso nós entendíamos o que é a guerra? Éramos jovens... Agora eu acordo de noite com
medo quando sonho que estou na guerra... Um avião está voando, meu avião, ganha altura e...
Cai... Então entendo que estou caindo. Nos últimos minutos... Dá tanto medo enquanto não
acordo, enquanto o sonho não se evapora... “
II - MENINOS DE ZINCO
“De manhã você acorda e fica contente se não Lembra dos Sonhos. Não conto meus sonhos
para ninguém, mas eles voltam... Os mesmos sonhos... É como se eu estivesse dormindo e
visse um grande mar de gente. (...). Então entendo que estou deitado num caixão... (...).
Lembro bem disso... Mas estou vivo, lembro que estou vivo, mas estou num caixão. (...). O que
aconteceu? Por que estou no caixão? De repente a procissão para, e escuto alguém falando:
“Me dê o martelo”. Então me vem um pensamento: estou sonhando... É como se fosse
realidade e sonho ao mesmo tempo.
Soldado – comunicações
“Com frequência sonho que passeio com o meu filho pelas ruas ensolaradas de Prípiat (vemos
nossos SONHOS – no cérebro). Hoje é uma cidade fantasma. Caminhamos e comtemplamos as
rosas, em Prípiat havia muitas rosas, grandes canteiros de rosas. Foi um sonho. Toda a nossa
vida já é um sonho. Na época eu era tão jovem, meu filho era pequeno... Eu amava... Agora
tudo que restou foram as recordações (tudo passa; só as lembranças permanecem – em nosso
cérebro).
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EXPLICANDO OS SONHOS
a - A Matéria de Que São Feitos os Sonhos: às vezes suaves (oníricos), às vezes aflitivos
(pesadelos), os SONHOS são apenas pequenas historietas – fabricadas aleatoriamente em
nosso cérebro – com fragmentos de lembranças da nossa vida. Portanto, como veremos no
cap. XVII...
LEMBRANÇAS pessoais são a matéria com a qual são fabricados os nossos SONHOS
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OBS
18 - CRIME E CASTIGO
Fiodor Dostoiévski
Como veremos no cap. XVII, os SONHOS (e pesadelos, claro) são produzidos – em nosso
cérebro – com fragmentos de lembranças da nossa vida.
“Num estado doentio, os SONHOS costumam destingüir-se pelo seu extraordinário colorido e
clareza, e pela estranha semelhança com a realidade. Apresentam-nos às vezes um quadro
maravilhoso; e o cenário e todo o processo de representação são ao mesmo tempo tão
verossímeis e com uns pormenores tão exatos e inesperados, mas em tão artística harmonia
com a totalidade do quadro, que seria em vão que o próprio SONHADOR tentaria evocá-los,
depois de desperto, ainda que fosse um artista como Puchkin ou Turguêniev. Esses SONHOS,
SONHOS DOENTIOS, ficam sempre gravados na MEMÓRIA (cérebro) por muito tempo e
produzem uma forte impressão no organismo alterado e enfraquecido do homem
(principalmente daquele que está premeditando um assassinato – “um espetáculo selvagem e
horrível”.)”.
Após o crime...
“Um cão que sabe matar também tem saber carregar (no cérebro)
a lembrança do que matou”
José Eduardo Agualusa
José EdJ
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“Um animal nunca pode ser tão cruel, tão artística e elaboradamente
cruel quanto o ser humano”
“Ivan Karamázov”
PREMEDITAÇÃO
ATO DE DECIDIR POR ANTECIPAÇÃO – NO CÉREBRO – DECISÃO QUE ANTECEDE A EXECUÇÃO DO ATO
A – Dark Side of the Brain: a crueldade humana se fundamenta na nossa aptidão para
PREMEDITAR. Ou seja, o homem é o único animal capaz de idealizar antecipadamente seus
atos no CÉREBRO, para só em seguida executá-lo com as MÃOS.
Por exemplo, o homem inicialmente premedita no cérebro: quem vou matar, como vou matar,
quando vou matar, onde vou matar. Em seguida ele concretiza a barbárie com as mãos.
B - Do Bestunto do Carrasco às Garras da Besta: Portanto, “Um Cabra Marcado Para Morrer”*,
morre duas vezes: primeiro a vítima é morta no cérebro do carrasco, em seguida é morta pelas
suas mãos .
*Doc. de Eduardo Coutinho
C - O Cérebro e as Mãos do Homem: primeiramente nosso cérebro idealiza (sejam elas coisas
boas ou más), em seguida nossas mãos a executam...
-- APOLLO 11: primeiro a nave espacial foi idealizada no cérebro; em seguida foi construída
com as mãos;
-- A ROSA DE HIROSHIMA: primeiro a bomba foi idealizada no cérebro; em seguida ela foi
construída e arremessada com as mãos;
-- O SUBLIME E O VIL: portanto, como vimos acima, para o bem ou para o mal, a premeditação
é uma aptidão exclusivamente HUMANA.
Caso sua vítima, Aliona, tivesse preenchido seu CÉREBRO com conhecimentos, ela poderia –
em lugar da desprezível e ordinárial velha má do penhor – ter sido gerente de um grande
banco. E assim, o intelectualizado senhor Rodion não se sentiria um ser tão extraordinário a
ponto de matá-la (a ela e a sua simplória irmã, Lisa) a machadada.
E – DI – Design Inteligente: agora deixemos uma questão em aberto para refletir: VOCÊ acha
que o Universo foi primeiramente idealizado no cérebro de um Criador, e só em seguida –
durante seis dias – ele o construiu com suas mãos ?
Criação Premeditada ?
F - Para ficar mais claro: VOCÊ acha que o mundo foi idealizado (num cérebro) antes de ser
construído (com as mãos)? Ou, pelo contrário, VOCÊ acha que tudo independe de um DESIGN
INTELIGENTE (cérebro idealizador), e que uma singularidade e o consequente Big Bang são
coisas que acontecem de vez em quando?
“Não falta mesmo quem sustente que Deus, antes de se pôr a amassar o barro com que depois
nos fabricou, começou por desenhar (idealizar antecipadamente no cérebro) com um pau de
giz o HOMEM e a MULHER na superfície da primeira noite”,
TODOS OS NOMES
José Saramago
20 - GRANDE SERTÃO: VEREDAS
Guimarães Rosa
Nesse trecho, RIOBALDO explica ao seu interlocutor sobre a dificuldade de narrar suas
LEMBRANÇAS de forma “alinhavada”, contínua, sequencial. O mais comum, diz ele, é contá-las
de forma “desgovernada”, com idas e vindas ao longo da sua Linha da Memória. Veja:
“Por tudo, rés-coado, fico pesando. Gosto. Melhor, para a ideia (cérebro) se bem abrir (para
relatar as lembranças da sua vida), é viajando em Trem de Ferro. Pudesse, vivia para cima e
para baixo, dentro dele. Informação que pergunto: mesmo no céu, fim de fim, como é que a
alma vence se esquecer (das lembranças de) tantos sofrimentos e maldades, no recebido e no
dado? A como?...
(...). Sei que estou contando errado, pelos altos. Desemendo. Mas não é por disfarçar, não
pense. (...). Eu estou contando assim, porque é o meu jeito de contar. (...). A lembrança da vida
da gente se guarda em trechos diversos (ao longo da nossa Linha da Memória – dentro do
cérebro), cada um (cada lembrança) com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que
nem não misturam. Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas (lembranças de
episódios) de rasa importância. De cada vivimento que eu real tive, de alegria forte ou pesar,
cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa (interpretamos as
antigas lembranças sob o nosso atual discernimento). Sucedido desgovernado. Assim eu acho,
assim é que eu conto. O senhor é bondoso de me ouvir. Tem horas antigas ( lembranças
antigas) que ficaram muito mais perto da gente do que outras (lembranças), de recente data.
O senhor mesmo sabe. (...).
(...). Ah, mas falo falso. O senhor sente? Desmente? Eu desminto. Contar (descrever as
lembranças da nossa vida) é muito, muito dificultoso. Não pelos anos (de Permanência no
Presente) que já se passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas (certas lembranças)
passadas – de fazer balancê, de se remexerem dos lugares (ao longo da nossa Linha da
Memória). O que eu falei foi exato? Foi. Mas teria sido? Agora, acho que nem não. São tantas
horas de pessoas, tantas coisas em tantos tempos (tantas lembranças de episódios vividos),
tudo miúdo recruzado.
(...). Agora, que mais idoso me vejo, e quanto mais remota aquilo reside (quanto mais distante
em sua Linha da Memória – dentro do cérebro), a lembrança demuda de valor – se
transforma, se compõe, em uma espécie de decorrido formoso.
(...). Só os meus homens. Escutava, olhava – e eram aqueles: que muitas estrepolias ainda iam
decerto agir, e muita má gente matar. Aos dez e dezes, digo, afirmo que me lembro de todos.
Esses passam e transpassam na minha recordação (cérebro), vou destacando a contagem (das
lembranças de tantos episódios). Nem é por me gabar de retentiva cabedora (boa memória),
nome por nome, mas para alimpar o seguimento de tudo o mais que vou narrar ao senhor
nesta minha conversa nossa de relato (das lembranças da sua vida). O senhor me entende?
21 - A METAMORFOSE
Franz Kafka
Nosso trágico amigo Gregor Samsa, há muito metamorfoseado, ainda consegue, de alguma
forma, regressar em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) para relembrar uma época,
não muito distante, em que, em lugar de rastejar, como agora, ainda se locomovia de forma
erecta...
“De dia ou de noite, Gregor mal dormia. Muitas vezes assaltava-o a ideia de que , ao tornar a
abrir-se a porta, voltaria a tomar a seu cargo os assuntos da família, como sempre fizera;
depois desde longo intervalo, vinham-lhe mais uma vez ao pensamento (cérebro) as figuras
(lembranças) do patrão e do chefe de escritório, dos caixeiros-viajantes e dos aprendizes, do
estúpido do porteiro, de dois ou três amigos empregados noutras firmas, de uma criada de
quarto de um dos hotéis da província, uma recordação, doce e fugaz, de uma caixeira de uma
loja de chapéus que cortejara com ardor, mas demasiado lentamente. – Todas (as lembranças)
lhe vinham à mente (cérebro) , juntamente com (as lembranças de) estranhos ou pessoas que
tinha esquecido completamente. Mas nenhuma delas podia ajudá-lo a ele nem à família, pois
não havia maneira de contatar com elas, pelo que se sentiu feliz quando (as lembranças) se
desvaneceram. (...).”
EXPLICAÇÃO
b - Cada Lembrança, Uma Emoção: cada lembrança da nossa vida, somatiza uma determinada
emoção. Como veremos no cap. XIX, a evolução da MEMÓRIA (a aptidão para preencher o
CÉREBRO com as lembranças da nossa vida) determinou a Etiologia das Emoções Humanas:
amor, ódio, saudade, dor, culpa, frustração, esperança, etc.
22 - INFIEL
Ayaan Hirsi Ali
“Minha irmãzinha Quman nasceu quando eu tinha três anos, mas a única lembrança que me
deixou (no cérebro) foi a sua morte. Tenho na mente (cérebro) a imagem de um homem alto
parado à porta (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro), carregando um bebê enrolado
em panos. Todos sussurravam Innaa Lillaahi wa innaa Illaahi raajiuun – “De Alá viemos e a Alá
voltaremos” (ouvimos nossas lembranças – dentro do cérebro). Lembro-me de ter puxado o
xale de mamãe para lhe dizer que aquele homem estava querendo roubar a minha irmã;
Lembro-me dela repetindo muitas e muitas vezes as mesmas palavras, com os demais. Então,
na minha memória (cérebro), o homem parte com Quman, que está chorando, e mamãe o
acompanha, lívida de dor. Anos depois, quando eu já estava grande o bastante para entender
o que era a morte, perguntei como era possível que a pequena Quman chorasse tanto se
estava morta. Mamãe disse que quem estava chorando era eu. Chorara durante horas sem
parar.
EXPLICAÇÃO
a - LEMBRO da perda da minha irmãzinha Quman, logo SOFRO: como veremos no cap XIX, a
evolução da MEMÓRIA (a aptidão para preencher o CÉREBRO com as lembranças da nossa
vida) determinou o origem do sofrimento (dor psíquica), e do ritual do luto. Veja outro
trecho...
“Certa manhã, quando eu estava no colégio, uma súbita rajada de vento me atingiu com tanta
força que quase me derrubou. Com ela, chegou um cheiro gostoso de chuva que me encheu de
saudade da minha terra (memorizamos odores – no cérebro) . O cheiro da chuva era, talvez, o
mais pungente que eu recordava da minha breve existência na Somália”.
EXPLICAÇÃO
b - LEMBRO da minha infância na Somália, logo sinto SAUDADE: o cheiro da chuva a fez
regressar em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) até chegar às lembranças do Cheiro
da chuva da sua terra natal.
23 - EU SOU MALALA
(Malala Yousafzai)
“Venho de um país criado à meia-noite. Quando quase morri, era meio-dia. Há um ano
(9/out/2012 – com 15 anos de Permanência no Presente) saí de casa para ir à escola e nunca
mais voltei. Levei um tiro de um dos homens do Talibã e mergulhei no inconsciente do
Paquistão. (...) Hoje, quando abro os olhos de manhã, anseio por ver o meu velho quarto, com
as minhas coisas, as roupas todas no chão e os troféus que ganhei na escola nas prateleiras.
(...) Fecho os olhos (para voltá-los para dentro do cérebro) e por um momento regresso ao meu
querido vale (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro) – às montanhas de topo coberto
de neve, aos campos verdes ondulantes, aos refrescantes rios azuis. Meu coração ( cérebro)
sorri quando me lembro dos habitantes do Swat. Meu pensamento (Linha da Memória –
dentro do cérebro) me leva até a escola e lá eu me reúno com minhas colegas e professoras.
Encontro Moniba, minha melhor amiga, e nos sentamos juntas, conversando e brincando,
como se eu nunca tivesse saído de lá. (...).”
EXPLICAÇÃO
b - A Bagagem do Viajante: MALALA, por razões óbvias, se viu obrigada a abandonar sua terra
natal. No entanto, ela trouxe em seu cérebro 15 anos de recordações do seu antigo lar – e
nossas lembranças, como já foi dito, são indeléveis, não se pode apagá-las do cérebro.
Nesse trecho de sua autobiografia, YEONMI regressa em sua Linha da Memória (dentro do
cérebro), e relata as primeiras LEMBRANÇAS da sua infância...
“Cheguei a este mundo cedo demais. Minha mãe estava com apenas 7 meses de gestação, e eu
pesava menos de 1.5 kg quando nasci. O médico disse que não havia nada que pudessem fazer
por mim. Eu dependia de mim mesma para viver. (...).
25 - A RAINHA DE KATWE
Tim Crothers
“Não tenho lembrança do meu pai”, diz Phiona. “Eu era tão nova que nem sabia como ele
havia morrido. Depois de seu funeral, ficamos na aldeia algumas semanas, e uma manhã
quando acordei, minha irmã mais velha, Juliet, me contou que estava com dor de cabeça.
Pegamos algumas ervas e as demos a ela e então ela foi dormir. Na manhã seguinte a
encontramos morta na cama. É disso que me lembro.”
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(...). Como é analfabeta, Harriet – mãe de Phiona – não deu um nome à sua filha recém
nascida, apenas um som: FI – OH – NAH. O nome jamais foi soletrado. Quando perguntam a
Harriet como o nome de sua filha é soletrado, ela não compreende a pergunta.”
“— Depois da morte de meu marido eu fiquei sozinha e com um monte de filhos e não
conseguia pagar o aluguel - diz Harriet. – Era tão, tão terrível. Eu não podia pagar suas escolas
e não lhes deixavam fazer provas nem ter boletins. Finalmente, precisei escolher entre EDUCAR
MEUS FILHOS (preencher o cérebro deles com conhecimentos), ou alimentá-los.”
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“Seus olhos acabam de bater nas manchas pretas que formam as letras desta frase e, como
mágica, uma VOZ surge na sua cabeça. Já parou para pensar o quanto isso é estranho? (...).”
EXPLICAÇÃO
Livro de Cabeceira – lendo e ouvindo no cérebro: ao LER sozinho, em silêncio, apenas para si
mesmo, você OUVE a sua própria voz – dentro do cérebro. Da mesma forma que:
ao LEMBRAR da sua cantora favorita, você ouve a VOZ dela – em seu cérebro;
ao LEMBRAR do relato da Criação do Mundo, vc ouve a VOZ do Cid Moreira – em seu cérebro;
A propósito, lemos no CÉREBRO, não com os olhos. Pois o processo de decodificar símbolos
para extrair significados, é realizado, obviamente, pelos nossos MIOLOS.
OUVIMOS NO CÉREBRO
- não com os ouvidos -
“—A rapariga dos óculos escuros ainda lhe pediu que a deixasse OUVIR de vez em quando um
bocadinho de música (no único radinho de pilha que havia em toda a camarata), só para não
perder a lembrança, justificou,
-- Mas o velho da venda preta foi inflexível, dizia que o importante era saber as notícias do que
se ia passando lá fora, quem quisesse música que a OUVISSE dentro da sua própria cabeça,
PARA ALGUMA COISA BOA NOS HAVERÁ DE SERVIR A MEMÓRIA,
-- Tinha razão o velho da venda preta, a música do rádio já arranhava como só uma má
recordação é capaz de arranhar, por isso mantinha-o no mínimo volume, à espera de que as
notícias chegassem.
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
“Foi uma das IMAGENS (lembranças) mais dolorosas da minha infância (a morte trágica da
pequena Soraya); talvez por isso eu tenha insistido em invocá-la em duas ou três cartas que ti
escrevi; na tua resposta me chamavas de privilegiada, porque esses eventos haviam
acontecido quando eu já podia, bem ou mal, fixá-lo na MEMÓRIA (cérebro). Numa das cartas
que me enviaste, escreveste algo assim:
(...). Que privilégio, dizias, o de poder RECORDAR tudo isso! Pois eu, vestido de marinheiro, não
participava sequer do estarrecimento, da tristeza dos outros. Lembro apenas que Soraya
existia; e que , segundo Emilie me diria nos anos seguintes: a tua prima Soraya viajou...”
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EXPLICAÇÃO
LEMBRO da perda, logo SOFRO: como veremos no cap XIX, a evolução da MEMÓRIA (a aptidão
para preencher o CÉREBRO com as lembranças da nossa vida) determinou a origem do
sofrimento (dor psíquica), e do ritual do luto. Pois em nosso CÉREBRO as lembranças dos
mortos permanecem VIVAS.
1- “Uma pessoa está morrendo diante dos seus olhos... E você sabe, vê que não pode ajudar
em nada, que ela só tem alguns minutos. Você beija, faz carinho, diz palavras afetuosas. Se
despede dela. Bom, não podia ajudar com mais nada... Guardo aqueles rostos até hoje na
minha memória (cérebro). Vejo todos, todos os rapazes (vemos nossas lembranças – dentro do
cérebro) . Por algum motivo achei que ia esquecer de algum, nem que fosse de um rosto. Pois
não esqueci de ninguém. Lembro de todos... Vejo todos... (no cérebro). Queríamos fazer
túmulos para eles com as nossas próprias mãos, mas também nem sempre conseguíamos.
Íamos embora, e eles ficavam.
2 – “...O morto está ali, deitado, e no rosto dele vemos certo espanto: como, vou morrer? É
possível que eu tenha morrido? Enquanto ele escutava... Até o último minuto eu dizia que não,
como iria morrer? Beijava, abraçava: o que foi, o que foi? Ele já estava morto, olhos no teto, e
eu ainda estava sussurrando algo... Tranquilizando. Os sobrenomes já se apagaram da minha
MEMÓRIA (cérebro), mas os rostos ficaram gravados... (vemos nossas lembranças – dentro do
cérebro).”
3- “Gosto das minhas recordações... Gosto das minhas recordações porque nelas todos estão
VIVOS. Tenho lá tudo (dentro do cérebro): a mamã... o papá... Vladia... (...). Vivo sozinha, (...).
Talvez eles estejam todos comigo (as lembranças dos mortos permanecem “vivas”- em nosso
cérebro)... (...). Tenho a impressão de que nos tocamos com as mãos...
“A vida é uma sombra que passa, como na oração fúnebre de Yom Kippur. A morte
também é uma sombra que passa. Só a DOR (as lembranças dos nossos mortos)
não passa. Continua e continua (em nosso cérebro). Sempre.
Goershom Wald – JUDAS – Amos Oz
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27 – HISTÓRIA DA MENINA PERDIDA
Elena Ferrante
LENU – ao final da juventude; início da idade madura – regressa em sua Linha da Memória
(dentro do cérebro) e descreve as lembranças de um episódio ultrajante (na época), que
envolveu Nino – sua paixão da infância e adolescência...
“Hoje, que tenho toda uma vida atrás de mim (carrega um longo passado – feito com
lembranças pessoais – dentro do cérebro), sei que reagi àquela notícia de modo exagerado e,
enquanto escrevo, percebo que intimamente sorrio. Conheço muitos homens e muitas
mulheres que poderiam narrar experiências (suas lembranças pessoais) não muito diferentes: o
amor, o sexo, são irracionais e brutais. Mas na época não aguentei. O dado concreto –
Eleonora está grávida de sete meses – me pareceu uma infâmia mais insuportável que Nino
pudesse fazer comigo. Lembrei-me de Lila, do momento de incerteza enquanto ela e Carmen se
consultaram com o olhar, como se tivessem mais coisa a me comunicar. (...). Elas sabiam? E
por que Lila desistira de me contar? Atribuíra a si mesma o direito de dosar a minha dor? Algo
ali se rompeu em meu peito e no ventre. (...). Eu me dobrei em duas de tanto sofrimento, os
braços cruzados, o corpo todo dolorido, sem conseguir falar nem gritar. Então me levantei de
ímpeto. (...). Disse numa espécie de estertor: expulse ele daqui!
“(...) Nelly, não sei como explicá-lo, mas certamente que tu e toda a gente tem a noção de que
existe, ou deveria existir, um outro eu para além de nós próprios. Para que serviria eu ter sido
criada, se apenas me resumisse a isto? Os meus grandes desgostos neste mundo foram os
desgostos do Heathcliff (ambos compartilham as mesmas lembranças, - de episódios
dolorosos), e eu acompanhei e senti cada um deles desde o início; é ele (a lembrança dele – no
cérebro) que me mantém viva. Se tudo mais perecesse e ele ficasse, eu continuaria, mesmo
assim, a existir; e, se tudo o mais ficasse e ele fosse aniquilado, o universo tornar-se-ia para
mim numa vastidão desconhecida, a que eu não teria a sensação de pertencer. (...). O meu
amor por Heathcliff é como as penedias que nos sustentam: pode não ser um deleite para os
olhos, mas são imprescindíveis. Nelly, eu sou o Heathcliff. Ele (a lembrança de Heathcliff) ESTÁ
SEMPRE, SEMPRE NO MEU PENSAMENTO* (cérebro).
*EXPLICAÇÃO
O Que é o Pensamento?
Como veremos no cap XVIII, PENSAR significa meditar, raciocinar, ponderar, cogitar, ruminar,
matutar sobre as LEMBRANÇAS da nossa vida. Ou seja:
a – PENSE você: para exemplificar, pedirei a você que regresse em sua Linha da memória
(dentro do cérebro) e procure uma LEMBRANÇA de um episódio significativo da sua vida...
Encontrou? Sim. Então isto significa que neste exato momento você está:
LEMBRO de toda as humilhações que sofri desde a infância, logo ODEIO HINDLEY;
ou
PENSO em toda as humilhações que sofri desde a infância, logo ODEIO HINDLEY
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b – CATHRINE & HEATHCLIFF - Atração Fatal de Amor e Fúria: como veremos no cap XIX, o
AMOR e o ÓDIO (duas paixões) não passam da somatização de uma LEMBRANÇA que
permanece fixa, obsessivamente fixa – em nosso CÉREBRO.
“Pois os seus bastiões não eram feitos de pedra, nem aliás de carne ou de sangue,
mas daquilo que havia de mais imaterial e, ao mesmo tempo, de mais
invencível do mundo: o amor e o ódio.”
SUÍTE FRANCESA
Irene Nemirovisk
29 – É ISTO UM HOMEM?
Primo Levi
AC – DC
Antes do Campo de Concentração -- Depois de Campo de Concentração
“Ainda guardávamos (no cérebro) a LEMBRANÇA da nossa vida anterior, mas veladas e
longínquas e, portanto, profundamente suaves e tristes, como são para todos as LEMBRANÇAS
DA INFÂNCIA e de tudo que já acabou, - enquanto o momento de nossa chegada ao Campo de
Concentração marcava para cada um de nós o início de uma diferente sequência de
LEMBRANÇAS, recentes e duras, continuamente confirmadas pela experiência presente, como
feridas que tornassem a abrir-se a cada dia. (...).
Chegamos ao fundo. Mais para baixo não é possível. Condição humana mais miserável não
existe. Nada mais é nosso: tiraram-nos as roupas, os sapatos, até os cabelos. Roubarão
também o nosso nome, e, se quisermos mantê-lo, devemos encontrar dentro de nós a força
para tanto (devemos encontrar DENTRO DO CÉREBRO as lembranças do que fomos), para que,
além do nome, sobre alguma coisa de nós, do que éramos. (...)”.
A - EXPLICAÇÃO: tudo pode ser retirado de nós, exceto as LEMBRANÇAS do que fomos. Pois o
nosso PASSADO, enquanto vivermos, permanecerá inalterado – em nosso cérebro. No
entanto... Leia outro trecho:
“Ele é Null Achtzehn. Chamava-se apenas: 018, os três algarismos finais da sua matrícula;
como se todos tivessem compreendido que só os homens têm direito a um nome, e que Null
Achtzehn já não é um homem. Imagino que até ele próprio tenha esquecido seu nome; em
todo caso, comportava-se como se assim fosse. Quando fala, quando olha, dá a impressão de
estar INTERIORMENTE OCO (com o CÉREBRO vazio: despojado de suas lembranças pessoais),
nada mais que um invólucro, como certos despojos de insetos que encontramos na beira dos
pântanos, ligados por um fio às pedras e balançando pelo vento”.
AS MEMÓRIAS DO CÁRCERE
– constroem sonhos pesarosos –
“A viagem levou uns vinte minutos. O caminhão parou; via-se um grande portão e, em cima do
portão, uma frase bem iluminada – cuja LEMBRANÇA (em seu cérebro) ainda hoje me
atormenta nos sonhos: ARBEIT MACHT FREI – O Trabalho Liberta. (...). Quando o pesadelo
mesmo, ou o incômodo nos despertam, tentamos em vão decifrar seus elementos, rechaçá-los
um por um, fora da nossa percepção atual, para defender o nosso sono da sua intromissão.
Mas, logo que fechamos os olhos, percebemos novamente que o nosso CÉREBRO recomeçou a
trabalhar, independente da nossa vontade, zune e martela, sem descanso, constrói fantasmas
e signos terríveis, sem parar os traça e os agita numa névoa cinzenta na Tela dos Sonhos”.
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30 - NORWEGIAN WOOD
- Haruki Murakami -
Nesse trecho, Toru Watanabe regressa 18 anos em sua Linha da Memória (dentro do cérebro),
e chega às LEMBRANÇAS do outono de 1969, quando estava prestes a completar 20 anos...
“-- Eu gostaria que você nunca se ESQUECESSE de mim. Você vai se LEMBRAR para sempre que
eu EXISTIR e estive assim ao seu lado como agora?
“Mesmo hoje, passados 18 anos (de Permanência no Presente), ainda sou capaz de
RELEMBRAR nitidamente a paisagem da pradaria (vemos nossas lembranças – no cérebro). A
superfície da montanha, (...), as espigas das eulálias balançavam por toda parte ao sabor da
brisa de outono e uma nuvem comprida aderia perfeitamente ao domo azul enregelado. (...).
O vento cortava a pradaria (memorizamos sensações táteis – no cérebro) e agitava levemente
os cabelos de Naoko, entrando em seguida bosque adentro. Nos ramos das árvores, as folhas
murmuravam, e ao longe ouvia-se o latido de um cão (ouvimos nossas lembranças – no
cérebro).(...).
Que fascinante é a MEMÓRIA. Enquanto eu estava dentro dessa paisagem, praticamente não
prestei atenção nela. Não poderia imaginar que 18 anos (de Permanência no Presente) mais
tarde a RELEMBRARIA em seus pormenores. Mesmo assim, as LEMBRANÇAS sem dúvida se
distanciam (em nossa Linha da Memória – dentro do cérebro), e eu já me esqueci de inúmeras
coisas. Por vezes, sou assaltado pela imensa apreensão de escrever este relato baseado na
MEMÓRIA. (...). Não teriam todas as REORDAÇÕES fundamentais se acumulado num local
obscuro de meu corpo (cérebro), numa espécie de limbo, transformando-se em lama
inconsistente?
De qualquer forma, no momento isso é tudo que eu tenho. Aperto fortemente contra o peito as
RECORDAÇÕES imperfeitas que se dissiparam a continuam a se dissipar a cada segundo
(continuam a se distanciar em sua Linha da Memória – dentro do cérebro), escrevendo este
livro como um homem faminto chupando ossos. Esse é o único modo de cumprir a promessa
que fiz a Naoko. (...). Entendo também agora a razão de ela ter me pedido para nunca
ESQUECÊ-LA. Obviamente Naoko sabia. Ela sabia que na minha MENTE (cérebro) as
LEMBRANÇAS dela iriam desaparecer gradualmente (iriam se distanciar em sua Linha da
Memória – dentro do cérebro). Pensar nisso me deixa profundamente triste. Porque Naoko
nunca chegou sequer a me amar*.”
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“Ela sentia que essa noite, quando os dois se encontrariam pela primeira vez, seria decisiva
para o seu destino. E, o tempo todo, ela os via em pensamento (via as lembranças de Liévin e
Vrónski - em seu cérebro), ora separadamente, ora juntos. Quando pensava no passado
(regressava em sua Linha da memória), detinha-se com satisfação e com ternura nas
lembranças de seu convívio com Liévin. As lembranças da infância e da amizade entre Liévin e
seu falecido irmão davam um encanto especialmente poético às relações entre Kitty e ele. O
amor de Liévin, do qual ela estava convencida, a lisonjeava e a alegrava. E lembrar-se dele era
leve.
Já em suas recordações sobre Vrónski misturava-se algo de embaraçoso, embora ele fosse, no
grau mais elevado, um homem tranquilo e sociável; como se houvesse algo de falso – não nele,
que era muito simples e gentil -, mas nela mesma, ao passo que, com Liévin, Kitty sentia-se
perfeitamente simples e serena.
Por outro lado, assim que pensava no seu futuro com Vrónski, erguia-se à sua frente a
perspectiva de uma felicidade deslumbrante; com Liévin, porém, o futuro se apresentava
nebuloso.”
ANNA KARIÊNINA
Liev Tolstoi
*o CÉREBRO tem razões que a própria razão desconhece. – Em todo caso, sugiro a Kitty que aguarde o Baile, e
veremos, então, com quem Vrónski dançará a mazurca.
31 - MOBY DICK
Herman Melville
“AHAB, na cabine, em seu solilóquio de vingança ensandecida. (...). Sim, murmurou, foi Moby
Dick quem me desmastreou! (a lembrança de seu infortúnio permanece trovejando – em seu
cérebro). Vou persegui-la até as chamas do inferno! – (...). E conclama aos comandados:
Aquele de vós que sinalizar uma baleia de cabeça branca, mandíbula deformada, fronte
enrugada e três furos na cauda, receberá está moeda de ouro!
(...). STARBUCK: Não tenho medo, senhor, mas vim pescar baleias, e não vingar meu
comandante. Quanto renderás tua vingança, capitão, caso a consigas? Vingar uma besta que
não FALA (não LEMBRA, logo não ama, não odeia: não tem a consciência do bem e do mal –
apenas luta pela sobrevivência)! Gritou Starbuck – Que te atacou simplesmente por um instinto
cego! Loucura! Isso me parece uma blasfêmia! Que Deus nos proteja a todos, - disse com
humildade. (...). – E, junto ao mastro principal: - Oh! Minha alma foi subjugada. Vejo
claramente meu triste papel: obedecer revoltado, odiar com compaixão. Uma alma torturada,
devo ajudá-lo. Ainda há esperança. Deus há de extirpá-lo de seu propósito alucinado. (...). Vou
tentar lutar contra os sombrios acontecimentos por vir. Oh! Fiquem ao meu lado, me deem
amparo, me protejam, influências abençoadas.
(...). Talvez devido aos quase oniscientes navios baleeiros, varando os mais secretos mares do
mundo, e aos milhares de arpões arremessados ao longo de todas as praias continentais,
conseguirá o Leviatã resistir a uma caçada tão implacável? A uma matança tão impiedosa? Se
ele não será afinal exterminado dos oceanos, e a última baleia, como o último homem, fumará
seu último cachimbo e evaporar-se-á na baforada final.
(...). Mas, se o mundo for mais uma vez inundado, a baleia eterna sobreviverá e, alçando-se na
crista mais alta da inundação equatorial, farar jorrar seu desafio espumante aos céus”.
OBS
Este assunto – a vingança – será abordado no cap XIX:
CÉREBRO – A Fantástica Fábrica de Emoções.
32 – ÚRSULA
Maria Firmina dos Reis
(1822 \ 1917 – primeira romancista negra brasileira – livro, obra prima, pub. 1859)
TÚLIO – recém alforriado pelo recente amigo, Tancredo – anuncia sua partida. Ao ouvi-lo, a
Preta SUZANA, sua mãe por afeição, regressa em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e
descreve as LEMBRANÇAS de uma época em que era jovem, feliz - e LIVRE...
-- Mãe Suzana, graças à generosa alma deste mancebo, sou hoje livre. Livre como o pássaro,
como as águas; livre como éreis na vossa pátria. Estas últimas palavras despertaram no
coração (cérebro) da velha escrava uma recordação dolorosa (até então adormecida); soltou
um gemido magoado, curvou a fronte para a terra, e com ambas as mãos cobriu os olhos.
-- Túlio olhou-a com interesse. – Não se aflija, mãe Suzana – disse. – Para que essas lágrimas?
Ah! Perdoe-me, eu despertei-lhe lembranças bem tristes!
A africana limpou o rosto com as mãos, e um momento depois exclamou: Sim, para que estas
lágrimas?!... Dizes bem! Elas são inúteis, meu Deus; mas é um tributo de saudade, que não
posso deixar de render a tudo quanto me foi caro! Liberdade! Liberdade! ... Ah! Eu a gozei na
minha mocidade! (...). Túlio, meu filho, ninguém a gozou mais ampla do que eu. Tranquila no
seio da felicidade, via despontar o sol rutilante e ardente do meu país, (...), eu corria as
descarnadas e arenosas praias, com minhas jovens companheiras, brincando alegres. (...). Ah!
Meu filho! Mais tarde deram-me em matrimônio a um homem, (...), e com o penhor dessa feliz
união veio uma filha querida: (...) que era minha vida, minhas ambições, minha suprema
ventura. (...). E esse país de minha afeições, e esse esposo querido, e essa filha amada, ah,
Túlio! Tudo me obrigaram OS BÁRBAROS a deixar! Oh! Tudo, tudo, até a própria liberdade! (só
restaram as LEMBRANÇAS – em seu cérebro).
-- Ah! Pelo céu! – exclamou o jovem Túlio, enternecido. – Sim, pelo céu, para que essas
RECORDAÇÕES!?
-- RECORDAÇÕES não matam, meu filho. Se matassem, há muito que morrera, pois vivem
comigo (em seu cérebro) todas as horas. – Vou contar-te (descrever as lembranças) do meu
cativeiro.
-- Vai, Túlio, meu filho! Que o Senhor guie o teus passos, e te abençoe, como eu te abençoo.”
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ESCRAVIDÃO
Nas asas do pensamento, o homem remonta-se (regressa em sua Linha da Memória – dentro
do cérebro - até chegar às lembranças de uma época em que era um ‘Django Livre’...) dos
ardentes sertões da África, VÊ* os areais da pátria e procura abrigar-se debaixo daquelas
árvores sombrias do oásis, quando o sol requeima e o vento sopra quente e abrasador: VÊ* a
tamareira junto à fonte; VÊ* a cabana onde nascera, e onde livre vivera! (*vemos nossas
lembranças – dentro do cérebro).
Desperta porém em breve dessa doce ilusão (doces lembranças de liberdade), ou antes sonha
que a engolfara, e a realidade opressora lhe aparece: é escravo e escravo em terra estranha.
Fogem-lhe (as lembranças ‘unchained’) dos areais ardentes, das sombras projetadas pelas
árvores, do oásis do deserto, da fonte e da tamareira. Foge a doce ilusão de um momento;
porque a ALMA (que é feita com as lembranças da nossa vida – dentro do cérebro) está
encerrada nas prisões do CORPO! Ela (a alma) chama-o a realidade, chorando, e o seu choro,
só Deus compreende! Ela (a alma) não se pode dobrar, nem lhe pesam as cadeias da
escravidão; porque é sempre livre, mas o CORPO geme, e ela (a alma) sofre, e chora; porque
está ligada a ele (o corpo) na vida por laços estreitos e misteriosos.”
OBS: esse trecho magistral explica que, sim, é possível aprisionar o CORPO de um homem, mas
nunca, jamais o seu CÉREBRO. Pois em suas lembranças (pensamento – imaginação) ele será
sempre LIVRE.
“Eu poderia viver recluso numa casca de noz e me considerar rei do espaço infinito”
HAMLET
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Alma Agrilhoada
- DODÓ TEM O CORPO LIVRE, MAS SEU CÉREBRO PERMANECE ACORRENTADO -
“Por alguns momentos, Adônis (ao ver sua filha, Dodó, aparentemente conformada e sem
maiores ambições, como uma eterna doméstica de uma família branca - os Tosta) achou que
foi em vão tanta luta. Era como se tivessem escapado de uma gaiola (com a Lei Áurea – 1888)
para cair em outra mais cruel que estava dentro (da cabeça) de cada um deles. Grilhões
pesados.”
ÁGUA DE BARRELA
Eliana Alves Cruz
33 – O MAPEADOR DE AUSÊNCIAS
Mia Couto
Adriano Santiago, o poeta, encantado pela fascinante MANIARA, afirma desejar muito que a
mesma regresse em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), e descreva as LEMBRANÇAS
da sua vida...
“Queria muito ouvir a tua história (as lembranças da tua vida), MANIARA, saber quem tu és –
peço. E advirto Benedito Fungai para que traduza literalmente (MANIARA se expressa no
dialeto Chissena). Pois desconfio que o rapaz esteja embelezando as falas (embelezando as
lembranças) da sua mãe.
-- Quer que fale de mim? – Maniara sacode a cabeça, divertida. – Nunca peça uma coisa
dessas a uma mulher como eu. Essa mulher vai contar-lhe sonhos como se fossem lembranças.
Sorri, com falsa timidez. Maniara entrelaça os dedos nos meus e conduz-me até o lugar onde
esteve a pilar. Aponta para o fundo do almofariz e diz: o que restava ali no fundo, esse farelo
moído, era o que a vida havia feito com ela. -- É assim a minha vida, meu patrão (“O Mundo é
um Moinho” – Cartola).
Esse era o seu destino: a vida nascia e morria nos seus braços. Não era, afinal, muito diferente
das outras mulheres de Inhaminga: transitava de um filho morto para um outro que ia morrer.
Maniara abre as mãos e anuncia: -- Com esta mão abro a luz; com esta outra, fecho o escuro.
-- Minha mãe está a dizer, - explica Benedito – que ela tem dois serviços: é parteira de dia e
enterradeira de noite.
-- Volte à noite, meu patrão – convida Maniara. – Nessa altura falamos mais à vontade. No
escuro as palavras (lembranças) perdem o dono.”
“Obliterar o Passado”
--“Não tenho o teu desejo de visitar o PASSADO (reviver as lembranças da nossa vida). Nós
dois, caro Diogo Santiago (filho do poeta), vivemos em sentidos opostos. Tu queres LEMBRAR.
E eu quero ESQUECER.
Entendo quanto custam as LEMBRANÇAS a Benedito (as lembranças da sua vida - impressas no
cérebro). Foi daqui desta vila que há quatro décadas, ele e Jerónimo, seu irmão, apanharam
um camião que os levou à cidade. Fugiram da guerra. Mas também escapavam da miséria.
34 - DOM CASMURRO
Machado de Assis
(1839 – 1908)
Para entender/explicar o conhecido trecho abaixo, teremos que transferir para o irascível Dom
Casmurro as datas de nascimento e morte do seu criador: 1839 - 1908.
Portanto, quando Dom Casmurro se refere às DUAS PONTAS DA VIDA, significa as duas pontas
da sua LINHA DA MEMÓRIA: 1839, juventude; e 1908, velhice.
“Um dia, há bastantes anos (no Presente Anterior), lembrou-me reproduzir no Engenho Novo a
casa em que me criei na antiga rua de Mata-cavalos, dando-lhe o mesmo aspecto e economia
daquela outra, que desapareceu. (...). O meu fim evidente era atar AS DUAS PONTAS DA VIDA
(as duas extremidades da sua Linha da Memória: 1839 e 1908), e restaurar na velhice a
adolescência. Pois, senhor, não conseguir recompor o que foi nem o que fui. (...). Se só me
faltassem os outros (as lembranças dos outros: familiares e conhecidos), vá; um homem
consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mas falto EU mesmo (falta clareza nas
lembranças de si mesmo – contidas em seu cérebro), e esta lacuna é tudo. (...).
(As lembranças de muitos episódios) daquela vida antiga aparece-me despida de muitos
encantos que lhe achei; mas é também exato que perdeu muito espinho que a fez molesta, e,
de memória, conservo (“em meu cérebro”) alguma recordação doce e feiticeira.
Ora, como tudo cansa, esta monotonia acabou por exaurir-me também. Quis variar, e
lembrou-me escrever um livro. (...). Vou deitar ao papel as reminiscências que me vierem vindo
(das profundezas do cérebro). Desse modo, viverei o que vivi, e assentarei a mão para alguma
obra de maior tomo. Eia, comecemos a evocação por uma (lembrança de um episódio
marcante que ocorrera numa) célebre tarde de novembro (de 1857), que nunca me esqueceu.
Tive outras muitas (lembranças de outros episódios), melhores, e piores, mas aquela (a
lembrança daquela tarde) nunca se me apagou do espírito (cérebro). É o que vais entender,
lendo (lendo o que vem a seguir: sua autobiografia – ou o relato das lembranças da sua
vida).”
Tia NUNU, - apesar da doença e da idade, e contra todas as expectativas – consegue regressar
em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), e relatar, com riqueza de detalhes, as
lembranças dos episódios mais significativos de sua vida...
– Calma, filha. Sempre que você vier aqui, me pergunte alguma coisa. Às vezes, você sai e eu
me LEMBRO de tudo. A cada vez que você me pergunta vou me LEMBRANDO... Quem me
contou tudo foi minha mãe (Damiana), foi minha avó (Martha), minha bisavó (Umbelina)... Eu?
Eu era apenas uma menina...
Tia Anolina, a tia Nunu, que também é personagem desta história, foi sempre um mistério para
mim. Na infância, eu olhava minha tia avó paterna com um misto de curiosidade e medo.
Medo por ouvir casos da fase em que era “louca brava”, (...). Curiosidade porque ela era capaz
de passar dias inteiros dialogando, rindo e chorando, orando e brigando (com suas
lembranças) com personagens invisíveis (que habitam seu Mundo Interior). Tudo baixinho, em
algum canto da casa, num eterno murmúrio. (...). E me batia uma vontade incrível de
perguntar quem eram essas pessoas, o que pensavam, o que estavam dizendo...
Embora tenha sido sempre tratada com o máximo cuidado e carinho, nada do que tia Nunu
falava era levado realmente a sério. Afinal, quem poderia dar crédito à mulher que saíra nua
pelas ruas do bairro e assustava as criancinhas? Quem poderia ver fundamento nos relatos
esquizofrênicos da moça estranha com passagens pelo alcoolismo? Como tomar como verdade
algo dito por uma senhora “carola” louca que perambulava sem rumo o dia inteiro por missas
diversas pela cidade?
No entanto, como a vida gosta de ser irônica e pôr em xeque nossas certezas, a “Pedra da
Roseta” para desvendar nossas origens estava com ela. (...). Em 2010, comecei por distração, a
pesquisar nomes na internet. Qual não foi minha surpresa ao ver as informações surgindo na
tela com muito mais detalhes do que eu poderia supor? Foi então que, depois de tomar notas
básicas, respirei fundo e fui até a “louca”. (...).
Percebi que ela , na verdade, vive quase que noventa por cento do seu tempo entre (as
lembranças dos) os anos 1920 e 1940, quando era criança e jovem. Fala com pais, avós,
parentes e conhecidos (ouvimos nossas lembranças – dentro do cérebro) como se estivessem
vivos (nossos entes queridos permanecem vivos - na memória) e é capaz de descrever cenários
(vemos nossas lembranças – dentro do cérebro) com uma riqueza de detalhes impressionante
para uma idosa de mais de 90 anos (de Permanência no Presente), que passou por
eletrochoques e medicações pesadas a vida toda. Ela não anda sem ajuda e não enxerga, mas
seus olhos parecem abertos para dentro dela mesma (para dentro do cérebro). Comecei a
conversar como se também estivesse vivendo lá (dentro do seu mundo), como se estivesse
convivendo com todos eles. Bingo! Ao conquistar sua confiança, abriu-se o BAÚ de tia Nunu.
Agora, passados cinco anos (de Permanência no Presente), creio que é hora de deixá-la em seu
mundo (Mundo de Lembranças) e com seus queridos. Não pergunto mais nada nem peço que
me revele qualquer LEMBRANÇA, embora, ao sentar ao seu lado, ela sempre me lembre de
quem eu realmente sou.”
ÁGUA DE BARRELA
Eliana Alves Cruz
Fontaine – Oh, todas elas, todos estes últimos dias! Encheriam muitos, muitos frascos.
Olivier – Às vezes, estes pequenos frascos contém demônios... Demônios (lembranças aflitivas)
que de alguma maneira se instalam em você (no cérebro)... justo quando você tenta a todo
custo esquecer.”*
*O personagem se refere a vã tentativa de esquecer (apagar do cérebro) a lembrança do suicídio/assassinato [?] da
sua ex mulher Rebecca — a inesquecível do título.
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“Às vezes, como diz Hamlet, o barulho das coisas (certas lembranças) mais profundamente
sepultadas (no cérebro) sai da terra e, como o fogo do fósforo, corre loucamente pelo ar;
mas são chamas (lembranças) que iluminam apenas por um momento para depois se
extinguirem (apenas param de brilhar – mas permanecem no cérebro).”
Gérard de Villefort – O CONDE DE MONTE CRISTO – Alexandre Dumas
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II - ASAS DO DESEJO
Wim Wenders – 1987
MARION PENSA (e ouve sua voz – dentro do cérebro): “ Está acabado. Nem sequer uma
temporada (o circo faliu). Mais uma vez, sem tempo para terminar algo. Esta noite será a
última do meu velho número. E é lua cheia. E a trapezista vai cambaleante... Quieta. Nunca
imaginei que o adeus ao circo seria assim. Na noite passada ninguém apareceu e nós nos
apresentamos como uns tolos... E eu voei pelo picadeiro como uma pobre galinha. E agora
voltarei a ser garçonete. Merda! Momentos como aquele, como este de agora, serão uma
BELA MEMÓRIA (em seu cérebro) dentro de alguns anos (de Permanência no Presente). (...).
Viver... Uma olhada é o bastante. O circo... Terei saudades”.
“Vou-me embora do meu vale. E desta vez para sempre. Deixo para trás (“mas levo em meu
cérebro”) 50 anos de MEMÓRIA. MEMÓRIA... Estranho que a mente (cérebro) esqueça do que
se passou há instantes, e retenha – de forma clara e viva – a lembrança do que se passou anos
atrás (no Presente Anterior).
(...) Como posso crer que tantos parentes e amigos se foram, quando suas vozes continuam
exultantes em meus ouvidos (ouvimos nossas lembranças – dentro do cérebro)? Não. Não e
outra vez, não. Pois eles continuam vivos em minha mente (as lembranças dos entes queridos
permanecem vivas - em nosso cérebro).
Não há barreira que nos separe do passado. Você pode (ao regressar em sua Linha da
Memória – dentro do cérebro) voltar a reviver o que quiser dele, se puder lembrar. Portanto,
ao fechar os olhos (e voltá-los para dentro do cérebro), meu vale, como é hoje (“triste”), pode
desaparecer, para dar lugar ao vale (“feliz”) que eu vi quando era garoto (vemos nossas
lembranças – dentro do cérebro). Não havia vale tão lindo e tão verde... “.
IV - CINEMA PARADISO
Giuseppe Tornatore – 1988
“-- Alo! Sim. Salvatore Di Vita. Como assim, não o conhece? Sim, isso mesmo. Eu sou a mãe
dele. Estou ligando da Sicília. Tentei o dia todo. Entendi. Não está. Então, por favor, poderia me
dar seu telefone residencial? Obrigada, bom dia.
-- É um telefonema inútil (diz a amiga da mãe de Salvatore). Está ocupado; sabe-se lá onde
está, e pode ser que nem LEMBRE mais. Ouça o que eu digo, desista. Já faz 30 anos (de
Permanência no Presente) que não aparece. Sabe como ele é...
-- Ele se LEMBRARÁ. Tenho certeza. Conheço-o melhor que você. Se descobrir que não o
avisamos, ficará magoado. < Alo! Gostaria de falar com o Sr. Salvatore. Sou a mãe dele... >.”
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OBS: SALVATORE, o Totó, recebe o recado: a morte do querido amigo/pai adotivo ALFREDO – o
projecionista. Essa triste notícia faz com que Salvatore regresse em sua Linha da Memória
(dentro do cérebro) até chegar nas saudosas LEMBRANÇAS da sua infância – e o filme
começa...
V - CONTA COMIGO
Stand by Me -- Rob Reiner – 1986
Gordie Lachance, escritor, regressa em sua Linha da memória (dentro do cérebro) e chega até
as LEMBRANÇAS do verão de 1959, quando ele tinha doze anos e vivia numa pequena cidade
do interior. Então recorda de um episódio em que, juntamente com os seus três melhores
amigos, saíram em busca do corpo de um adolescente que estava desaparecido na mata. Ao
começar a narrar suas LEMBRANÇAS, o filme inicia...
“Eu tinha de 12 para 13 anos, e foi a primeira vez que vi um ser humano morto. Foi no verão de
1959. Foi há muito tempo (no Presente Anterior). Eu morava numa cidadezinha do Oregon.
População de apenas 1281 pessoas; mas para mim era o mundo inteiro. (...). Eu nunca mais
tive amigos como os que eu tive naquela época. Meu Deus! E alguém teve?
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Na citação a seguir, veremos o que é, talvez, o esquete científico ou artigo cômico mais sério e
engraçado já publicado a respeito das Viagens no Tempo...
A bordo da Coração de Ouro - a nave movida a improbabilidade infinita -, ARTHUR DENT VIAJA
NO TEMPO...
“Um dos maiores problemas encontrados em Viajar no Tempo não é vir a se tornar
acidentalmente seu pai ou sua mãe – uma família com mente aberta lida bem
com essas questões. Não há tampouco problema em mudar o curso da
história – pois as peças se juntam como num quebra-cabeça e tudo
dá na mesma no final, acho eu.”
-------------------------------------
OBS
Só mesmo com senso de humor britânico (de Douglas Adams) é possível abordar tal matéria;
muito embora nem todos os ingleses concordem. Leia o trecho abaixo...
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E não esqueça que este assunto – a ilusão do tempo – será abordado e esclarecido no
cap. XXIV: Uma Breve Fábula do ESPAÇO-TEMPO – a inexistente 4ª dimensão.
STEPHEN HAWKING E ARTHUR DENT VIAJAM... NO TEMPO
a – Habeas Corpus Preventivo: antes que eu seja cancelado – por negar a existência do tempo
– peço que me concedam o benefício da dúvida. E para quem acredita no tempo, peço que leia
um trecho do livro O UNIVERSO NUMA CASCA DE NOZ, de Stephen Hawking:
“Meu amigo e colega Kip Thorne (Nobel de Física em 2017, acredite!), não é do tipo que segue
a linha convencional da física. Isso o levou a ter a coragem de ser o primeiro cientista sério a
discutir as Viagens no Tempo como uma possibilidade prática. (...). Afinal, como poderíamos
nos proteger de alguém com uma Máquina do Tempo? Essa pessoa poderia mudar a história e
dominar o mundo! (...).
A questão é: por que as Viagens no Tempo não estão ocorrendo por toda parte? A resposta é
que estão ocorrendo em escala microscópica, mas não as percebemos. (...). Por exemplo: uma
partícula que se desloca acima da velocidade da luz, pode circular sem parar em um ANEL NO
ESPAÇO-TEMPO. Seria como no filme Feitiço do Tempo, em que um repórter tinha de viver o
mesmo dia repetidamente. (...).
b – Capacitor de Fluxo - I’ll Be Back! : até admito ser possível as VIAGENS NO TEMPO, mas só
conheço dois indivíduos que foram capazes de realiza-la: Marty McFly (De volta para o
Futuro), e Arnold Schwarzenegger (Exterminador do Futuro). Peço desculpas pelo tom
agressivo (afinal, tenho que conquistar a sua atenção, não é mesmo?), mas presumo que os
adeptos dessa teoria obteriam mais êxito como roteiristas de Hollywood.
Admito que voltar ao nosso próprio PASSADO (reviver as lembranças da nossa vida - dentro do
cérebro), não é nada se comparada às possibilidades fascinantes proporcionadas por uma
MÁQUINA DO TEMPO: mudar o passado, conquistar o mundo e outras peripécias do gênero.
Mas, como tal geringonça só pode ser concebida através de Efeitos Especiais, melhor é deixá-
la a cargo das delirantes aventuras de HOLLYWOOD, concorda?
A propósito, adoro filmes sobre Viagens no Tempo; – mas é pura fantasia. Em todo caso, se
você é um cinéfilo, como eu, não se preocupe, pois o Hollywood sobreviverá... ao TEMPO:
CINEMATECA TELETRANSPORTADA
d – Autódromo Airton Senna: tomemos como exemplo uma corrida de F1. Caso os pilotos se
deslocassem no TEMPO, no momento crucial em que o líder da corrida ultrapassasse um
retardatário, resultaria num estrupício temporal inimaginável. Seria algo bem sinistro, veja:
ESPAÇO !!!: em qualquer momento da corrida, todos os pilotos estão no PRESENTE; todos
compartilham o mesmo PRESENTE; vivemos em um eterno PRESENTE. Portanto, cada piloto,
em relação aos concorrentes, está à frente no ESPAÇO ou atrás no ESPAÇO: 1 cm; ou 1 m; ou 1
km, etc.
TEMPO???: nenhum piloto, repito, nenhum piloto está à frente no TEMPO ou atrás no TEMPO:
1seg; ou 1min; ou 1h, etc. – o tempo não existe. Como diria o lendário narrador Bueno: Eu já
sabia! Eu já sabia!
CONCLUSÃO
O ESPAÇO É REAL; O TEMPO, UMA ILUSÃO
e – Distância Sideral: apenas o ESPAÇO realmente existe; consequentemente, como já foi dito:
tudo se desloca no ESPAÇO, não no TEMPO, - ou seja...
Pois se tudo viesse com o Passar do Tempo, por que arriscaríamos a pele em busca das coisas?
Bastaria se deitar numa rede e aguardar o futuro chegar, não é mesmo?
Só que NÃO. NÃO mesmo. Lamento contrariá-los, meus caros amigos bípedes; mas nós
ganhamos um CÉREBRO para – ao preenchê-lo com conhecimentos – descobrir a agricultura e
plantar o trigo, e não para ficar aguardando o milagre da Multiplicação dos Pães.
g - Monty Python – Em Busca do Cálice Sagrado: mas, enfim, o TEMPO felizmente não
existe. E o futuro (os benefícios do progresso) não virá de bandeja, - em troca de nada.
Pelo contrário, somos nós que – ao preencher o cérebro com conhecimentos – fazemos o
“nosso tempo” e buscamos a EVOLUÇÃO: o domínio do fogo, ferramentas básicas, a
agricultura, a roda, a caravela, a imprensa, máquina a vapor, telégrafo, raio x, rádio, lâmpada,
fotografia, telefone, cinema, penicilina, televisão, Apolo 11, internet, - e, finalmente, o
fantástico Photoshop: jamais imaginei que poderia um dia ostentar uma barriga de tanquinho
nas redes socias.
“Road to Nowhere”
Talking Heads
h – “Deixa a Vida Me Levar… Vida, Leva Eu! : peço desculpas ao grande Zeca Pagodinho, mas
não existe Esteira do Tempo para conduzir a nossa VIDA para lugar nenhum. Pelo contrário,
somos nós que – ao lutar para Permanecer no Presente – evoluímos e carregamos a VIDA nas
costas.
Caso o TEMPO realmente existisse, e sua esteira (passado – futuro) conduzisse a nossa VIDA, o
Zeca Pagodinho ainda estaria em seu querido Bairro de Xerém – aguardando o futuro chegar,
e o sucesso bater à sua porta. Mas, como o Zeca bem sabe, tudo se consegue com muito
trabalho, pois... “Camarão que Dorme, a Onda Leva”. E como dizia minha avó:
“O único milagre que podemos fazer será o de continuar a viver, - disse a mulher do médico, -
amparar a FRAGILIDADE DA VIDA um dia após outro dia, como se fosse ela a cega, a que não
sabe para onde ir, e talvez assim seja, talvez ela (o milagre da Vida em nosso planetaa)
realmente não o saiba, entregou-se às nossas mãos depois de nos ter tornado inteligentes, e a
isto a trouxemos, (...).”
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
E não esqueça que este assunto – a ilusão do tempo – será novamente abordado e esclarecido
no CAP XXIV: Uma Breve Fábula do ESPAÇO-TEMPO – a inexistente 4ª dimensão.
OBS
A s regras para citações inclui a página que o texto foi extraído. O problema é que quase
todos os livros citados são versões digitais gratuitas. O que torna quase impossível cumprir tal
exigência. Por exemplo, a versão digital de Lima Barreto: O Triste Fim..., apresenta-se,
dependendo da fonte, com 66 págs. a 404 págs. No entanto, se for o caso, posteriormente
farei constar a recomendação. Obrigado pela compreensão.
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Neste breve capítulo falaremos sobre
Vidas Passadas, Viagens Extracorpóreas e outras alucinações...
CAPÍTULO
XV
TERAPIA DE REGRESSÃO ÀS LEMBRANÇAS PASSADAS
SUPER INTERESSANTE
(pub. ago 2003 – atz. out 2016)
1 – Minhas Vidas Passadas – no cérebro: o paciente (crédulo – adepto) submetido a essa dita
terapia (acima citada), regressa em sua própria Linha da Memória (dentro dos seus miolos), e
mergulha inconscientemente na imensidão de seu Universo Particular; que, por sua vez, é
constituído pelas LEMBRANÇAS da sua vida: infância, juventude, maturidade .
‘Imensidão Interior’
No entanto, por subestimar a Vastidão Infinita do próprio CÉREBRO, o paciente acredita na
ilusão de que regressou na inexistente Esteira do Tempo.
Nos Tempos da Roma Antiga
2 - “Ave Cesar – os que vão morrer o saúdam!” : por exemplo, um homem, - machão
femeeiro - sob hipnose, regressa em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e encontra as
lembranças do filme *GLADIADOR (Ridley Scott - 2000); – um filme que assistira na juventude.
Daí conclui erroneamente que, em vidas passadas, teria sido o destemido general
Russell “Maximus”Crowe – na época do Império Romano.
Não quero ferir ou desrespeitar as crenças (fantasias de conveniências) de quem quer que
seja; mas, a bem da realidade, devo afirmar que tudo isso não passa de uma grande bobagem.
Em todo caso, pelo menos a regressão não levou o machão xavequeiro até as lembranças do
filme *PRISCILLA – A Rainha do Deserto. Neste caso, presumo, seria bem mais difícil... expandir
o assunto.
*A propósito, são 2 ótimos filmes, apesar de submetidos a uma experiência esdrúxula.
“Rubião era mais crédulo que crente; não tinha raciocínio para atacar nem para defender
nada: -- terra (cérebro) eternamente virgem para se lhe plantar qualquer coisa. (...). Foi uma
vidente de São João d’Del Rei que lhe meteu (no cérebro), em criança, essa ideia de
metempsicose. Dizia ela que a alma cheia de pecados ia parar num corpo de um bruto; chegou
a jurar que conhecera um escrivão que acabou feito gambá. (...).”
Quincas Borba
Machado de Assis
3 - “Rogai Por Mim”: na realidade, não existe passado e muito menos vidas passadas. No
entanto, como dizia Saramago: “A alegoria chega quando descrever a realidade já não nos
convém.” Ou seja, adoramos legislar em causar própria; e assim criamos fantasias tolas e
egocêntricas: inventamos o paraíso para os nossos, e o inferno para os outros.
EGOÍSMO
- Nossa Segunda Pele -
(...). Com o mal dos outros posso eu bem, Palavras que nenhuma disse, mas que todas
pensaram, Na verdade ainda está por nascer o primeiro ser humano desprovido daquela
segunda pele a que chamamos EGOÍSMO, bem mais dura que a outra (a primeira pele) , que
por qualquer coisa sangra. “
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
4 – Artrópodes Kardecistas: não entendo o porquê as baratas, após a morte (após uma
chinelada), também não têm o direito à... transmigração da alma. Ou será que ela poderia
reencarnar em você, - o autor da chinelada fatal? Duvido que acredite nisso.
“(...). Mas a cozinha estava vazia e escura (nenhuma sombra da bela Atalia), e acendeu a luz a
tempo de ver uma BARATA marrom e gorda fugindo dele (fugindo da luz) numa corrida
enviesada para debaixo da geladeira. Por que está fugindo, riu Shamuel, eu não tocaria em
você, o que tenho contra você? O que você fez contra mim? E em que eu sou melhor do que
você?”
Judas – Amos Oz
5 – O Big Birth: como vimos na citação acima, Shamuel não se considera melhor do que uma
barata. E você, o que acha? Leia a seguir um trecho que descreve o surgimento do Milagre da
Vida em nosso planeta...
“Em um certo ponto em um passado inimaginavelmente distante (no Presente Anterior), uma
pequena bolsa de substâncias químicas nervosamente adquiriu vida. Ela absorveu alguns
nutrientes e pulsou com suavidade (...). Mas esse pacote ancestral (microrganismo) faz algo
adicional e extraordinário: partiu-se e produziu um descendente. Um feixe minúsculo de
material genético passou de uma entidade viva para outra e nunca mais parou. Foi o momento
de CRIAÇÃO para todos nós. Os biólogos costumam chamar esse momento de o Grande
Nascimento (o BIG BIRTH). Aonde quer que você vá no mundo, qualquer que seja o animal,
planta, inseto ou pingo de matéria, se estiver vivo, usará o mesmo dicionário e conhecerá o
mesmo código. TODA A VIDA É ÚNICA (todos os seres vivos possuem uma origem comum).
Somos todos o resultado de um único truque genético transmitido de geração para geração há
quase 4 bilhões de anos (de Permanência no Presente).”
BREVE HISTÓRIA DE QUASE TUDO
Bill Bryson
CONCLUSÃO
A Evolucão das Espécies, graças a deus, serve para que VOCÊ – após preencher o cérebro com
conhecimentos – tome consciência de que um dia já foi uma AMEBA. – E Viva a Evolução!!!
EQM
Experiência de Quase-Morte e Viagens Extracorpóreas
SUPERINTERESSANTE
(maio de 2005 – por Maurício Oliveira)
“Ao final da cirurgia de emergência, para estancar um sangramento cerebral que a deixou à
beira da morte, há 3 anos, a atriz Sharon Stone relatou aos médicos as sensações
perturbadoras que lembrava do período de inconsciência. Disse ter atravessado rapidamente
um túnel (sua Linha da Memória – dentro do cérebro) e mergulhado em uma forte luz branca
(que é a LUZ do nosso nascimento: a luz original; nossa primeira lembrança) que transmitia
uma sensação de paz e serenidade. Contou também que pressentiu a companhia de seus
parentes e amigos mortos, prontos para recebê-la do outro lado (as lembranças dos entes
queridos ‘mortos’ permanecem ‘vivas’ – em nosso cérebro). De repente, contudo, ela fez o
caminho de volta (em sua Linha da Memória – dentro do cérebro), e acordou.”
EXPLICAÇÃO
Cérebro Infinito
No entanto, por subestimar a Vastidão Interior do próprio cérebro, a atriz (mais conhecida
como Srta Catherine Tramell) imagina equivocadamente que está vivenciando uma
jornada mística fora-do-corpo.
“Os únicos fantasmas nos quais acredito são as lembranças. Sejam elas reais ou imaginárias.
Para mim, as entidades, os mortos-vivos, os espíritos, todas essas coisas sobrenaturais só
existem na cabeça dos vivos. (...). A saudade, a dor, o insuportável pode nos fazer ressuscitar e
sentir coisas que superam a imaginação. Quando alguém morre, morre. Menos na alma (nas
lembranças que permanecem no cérebro) das pessoas que ficam. E a alma (cérebro) de um
único homem é muito maior do que o universo.”
ÁGUA FRESCA PARA AS FLORES
Valérie Perrin
OBS
Este assunto – a imensidão interior do nosso cérebro – será esclarecido
no CAP XVIII: CÉREBRO – A Fantástica Fábrica do Pensamento.
7 - O Que é a Verdade? O cérebro foi feito para interpretar a REALIDADE, não para reinventá-
la. Nossas fantasias (crenças) – por mais ensandecidas, iracundas e sanguinárias que sejam –
nunca deixarão de ser o que são: delírios exclusivistas.
“Descobrir o nome e o significado de deus não compete a ninguém (diz Halla à sua irmã
gêmea, Sigrudur, que estar irremediavelmente doente). Deve dar-nos medo a necessidade de o
entender. Deve dar-nos medo a necessidade de entender deus. Ele é o desconhecido, se por
ventura se der a conhecer então é uma falsidade.”
A DESUMANIZAÇÃO
Valter Hugo Mãe
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Neste capítulo explicaremos a origem e as consequências do mal de ALZHEIMER.
CAPÍTULO
XVI
CÉREBRO INFINITO
Revista Época (g1) – 02/03/2018
ALZHEIMER
O MAL REMOVEDOR DE LEMBRANÇAS
“O primeiro diagnóstico, em 1901, foi feito pelo médico psiquiatra alemão Alois Alzheimer
(1864 – 1915). Mais de cem anos depois, continua a busca para desvendar e encontrar
um remédio que cure essa doença tão enigmática. (...)”.
1 - 100 BILHÕES DE NEURÔNIOS – a matéria-prima das recordações: em nosso CÉREBRO há
uma Película de Neurônios convenientemente preparada para registrar/filmar as impressões
dos nossos 5 sentidos: visão, audição, paladar, olfato e tato.
Assim sendo, conectar neurônios (construir sinapses) significa fabricar lembranças no cérebro.
Portanto...
O nome pouco importa, a verdade é que o CÉREBRO do paciente vai sendo gradativamente
esvaziado de seu bem mais precioso: as lembranças. Na prática, e de forma resumida, a
doença se manifesta da seguinte forma:
NÃO LEMBRO dos episódios da minha infância, logo ela deixou de existir para mim;
NÃO LEMBRO dos episódios da minha adolescência, logo ela deixou de existir para mim;
NÃO LEMBRO de episódios recentes da minha vida, logo eles deixaram de existir para mim;
NÃO LEMBRO dos familiares, amigos e conhecidos, logo eles deixaram de existir pra mim;
E em seu estágio mais avançado...
NÃO LEMBRO do meu passado (pois todas as lembranças da minha vida foram apagadas do
cérebro), logo perdi a percepção da própria EXISTÊNCIA – ou perdi a alma.
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA
José Saramago
-- “(...) Então o médico (que é oftalmologista) disse, -- Se eu voltar a ter olhos, olharei
verdadeiramente os olhos dos outros, como se estivesse a ver-lhes a alma,
-- Foi então que, surpreendentemente, se tivermos em conta que se trata de pessoa que não
passou por estudos adiantados (não preencheu o cérebro com conhecimentos aprofundados) ,
a ‘rapariga dos óculos escuros’ disse, DENTRO de nós (dentro do cérebro) há uma coisa que
não tem nome (lembranças), essa coisa é o que SOMOS.
3 - LEMBRO, logo existo: lembro de todos os episódios da minha vida ( infância, juventude,
maturidade), logo tenho a consciência de que existo – e SOU.
No entanto, como foi explicado acima, ao perder (ao serem apagadas do cérebro) as
lembranças da nossa vida – como acontece com o Mal de Alzheimer – perdemos a noção da
própria existência - e deixamos de SER.
“(...) MAS VISITACIÓN explicou que o mais temível da doença da insônia não era a
impossibilidade de dormir, (...), mas sim a sua inexorável evolução para uma manifestação
mais crítica: o ESQUECIMENTO. Queria dizer que quando o doente se acostumava ao seu
estado de vigília, começavam a apagar-se da sua memória (CÉREBRO) as lembranças da
infância, em seguida (as lembranças do) nome e a noção (finalidade) das coisas, e por último
(as lembranças da) identidade das pessoas e ainda a consciência do próprio SER (perde as
lembranças de SI mesmo), até se afundar numa espécie de idiotice sem PASSADO. (...).”
Pilar Ternera foi quem contribuiu quando concebeu o artifício de ler o PASSADO nas cartas
como antes tinha lido o futuro. Com esse recurso, os insones começaram a viver num mundo
construído pelas alternativas incertas do baralho. (...).
José Arcadio Buendía decidiu então construir a Máquina da Memória, que uma vez tinha
desejado para se LEMBRAR dos maravilhosos inventos dos ciganos. A geringonça se
fundamentava na possibilidade de repassar, todas as manhãs, e do princípio ao fim, a
totalidade dos conhecimentos (lembranças essenciais) adquiridos durante a vida. Imaginava-a
como um dicionário giratório que um indivíduo situado no eixo pudesse controlar com uma
manivela, de modo que em poucas horas passassem diante dos seus olhos as noções mais
básicas para viver. (...).”
“Nós, nos primeiros estágios da doença (Alzheimer), ainda não somos completamente
incompetentes (...), mas já não temos competência suficiente para que nos sejam confiadas
muitas demandas e responsabilidades de nossa vida anterior (como por exemplo: um gari
esquece de varrer; um neurocirurgião esquece como operar, – pois a arte, as técnicas
memorizadas foram apagadas do cérebro).
Temos a sensação de não estar nem lá nem cá como um personagem numa terra bizarra. É
um lugar muito solitário e frustrante para se estar (...). Não tenho nenhum controle sobre os
ONTENS que conservo (no cérebro) e os ONTENS que são apagados (do cérebro). (...) O meu
maior receio: deixar de SER eu mesma (perder todas as lembranças da sua vida).
Meus ontens (as lembranças do seu passado) estão desaparecendo (do cérebro) e meus
amanhãs são incertos. Então para que eu vivo ? Vivo para cada dia. Vivo o presente. Num
amanhã próximo esquecerei o hoje, mas não significa que o hoje não tenha importância.
4 – QUATRO CITAÇÕES – sobre lembrar e esquecer: as citações abaixo não se referem
especificamente ao Alzheimer. Apenas demonstram que, às vezes, temos que vasculhar as
gavetas do CÉREBRO até encontrar uma determinada lembrança; outras vezes sentimos que
estamos a perdê-las; outras vezes sentimos que a perdemos definitivamente...
PÁTRIA
Fenando Aramburu
“(Bittori expressa o porquê da mágoa que sente por sua filha). Nerea não foi ao velório nem ao
enterro do pai (Txato – morto pelo ETA). – Posso vir a ter Alzheimer, ESQUECER que mataram
você (o marido), ESQUECER até o meu nome; mas juro que, enquanto houver uma luzinha
acesa na minha MEMÓRIA (cérebro), vou LEMBRAR o que ela fez, vou LEMBRAR que ela não
estava por perto quando mais precisamos.”
1Q84 lll
Haruki Murakami
“Aquela garota parecia alguém que Ushikawa já havia visto em algum lugar. Alguém que vira
recentemente , talvez, (...). Ushikawa acelerou a rotação de sua MEMÓRIA e vasculhou a fundo
todos os arquivos (lembranças) armazenados em seu CÉREBRO. Estreitou os olhos e espremeu
os MIOLOS como um pano de chão. Sentiu uma dor aguda nos nervos. De repente, descobriu
que esse alguém era Eriko Fukada.
A CONTADORA DE FILMES
- Hernan Rivera Letelier -
“A mesma coisa acontecia com as lembranças mais lindas da minha mãe (que até então
conservara – no cérebro). As imagens (lembranças) dos poucos momentos felizes vividos com
ela, iam se desvanecendo em minha memória (cérebro), inapelavelmente, como as cenas de
um filme velho. Um filme em preto e branco. E mudo.”
MEU PAI
(Anthony Hopkins -- Florian zeller)
“Eu me sinto como se estivesse perdendo todas as minhas folhas (as lembranças da sua vida –
contidas em seu cérebro). Os galhos, o vento e a chuva... Não sei mais o que está acontecendo.
(...). Quem sou EU, exatamente?
OBS
MEMÓRIA E A ILUSÃO DE POSSE
‘EU POSSUO E TENHO’ – registrado em meu cérebro – as lembranças de todos os meus BENS:
empresas em vários países, fortunas em paraísos fiscais, fazendas várias, terrenos em áreas
nobres, apartamentos no One Madison, casas de praia nas Bahamas, jato Bombardier Global,
Ferrari 250 GTO, Bugatti La Voiture, etc. - Além de muitos amigos em todos as esferas do
poder.
NÃO LEMBRO DAS MINHAS PROPRIEDADES, LOGO TUDO DEIXOU DE EXISTIR PARA MIM
Portanto, um breve aviso aos poderosos, ditadores, corruptos e congêneres:
“Leia, leia, leia. Leia tudo – bobagem, clássicos, bom e ruim, e veja
como são feitos. Você irá absorver.
WILLIAM FAULKNER
“Fui catar papel, mas estava indisposta. Vim embora porque o frio era demais. Quando
cheguei em casa era 22:30h. (...). Li um pouco. Não sei dormir sem ler. Gosto de manusear um
livro. O livro é a melhor invenção do homem.
Quarto de Despejo
Carolina Maria de Jesus
LEMBRANÇAS HACKEADAS
“(...) a MEMÓRIA fora-me roubada. Enfureci-me com esta ideia. Ninguém tinha o direito de me
arrebatar as minhas RECORDAÇÕES (do interior do cérebro). Era a minha história (“meu
passado; minha essência; minha alma”). Roubar a MEMÓRIA de alguém era o mesmo que
roubar-lhe a vida. À medida que a minha zanga foi aumentando, esqueci-me do medo. Hei de
sobreviver, dê lá por onde der, decidi. Sobreviverei. Vou sair deste louco mundo de trevas e
recuperarei todas as RECORDAÇÕES que me roubaram. Chegue ou não O Fim do Mundo,
renascerei como um SER completo. (...)”
... E NA CIDADE DO FIM DO MUNDO:
Quando o guardião saiu, a (minha) sombra fez um sinal indicando que me aproximasse.
– Tenho uma coisa para te dizer – disse a sombra. – É verdade, já não tenho forças para me
agarrar a ti, mas, se conseguir escapar desta Cidade, poderemos voltar a ser UM. Eu livro-me
de morrer aqui, e tu recuperas as tuas memórias e tornarás a SER o que eras originalmente.
(...) Ei! Alto aí! Não me digas que estás com dúvidas? – A (minha) sombra estremeceu.
-- Sim, estou com dúvidas – reconheci. – Não me lembro de como EU era antes. Valerá a pena
recuperar minhas lembranças e voltar a ser EU mesmo? (...) É que agora eu começo a sentir
algum apego a esta Cidade.
-- O que dizes-me – respondeu a sombra – é que nesta cidade não há lutas, nem ódio, nem
desespero. Magnífico! Olha, se tivesse forças, eu aplaudia. Mas o fato de não haver nem lutas,
nem ódio, nem ambição significa que também não existe o oposto de tudo isso. Ou seja, não
existe alegria, amor ou esperança.
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CAPÍTULO
XVII
SUPER INTERESSANTE
(março – 2006)
CÉREBRO
A FANTÁSTICA FÁBRICA DE SONHOS – E PESADELOS
‘LEMBRANÇAS pessoais são a matéria com a qual são fabricados os nossos SONHOS’
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2 - CÉREBRO – O Tear Encantado dos Sonhos: como já foi explicado, o PRESENTE É ABSOLUTO
- vivemos em um Eterno Presente. Nesta condição, o homem – como uma Lâmpada Mágica
vazia – nasce com o cérebro OCO: sem conteúdo; sem história; sem passado.
E assim, - com o cabeça repleta de lembranças pessoais , - obtém matéria-prima para fabricar
os seus SONHOS.
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3 - DIVERTIDAMENTE – Miolos Insone e Traquinas: os SONHOS ocorrem quando a nossa
imaginação – ao brincar com as nossas lembranças – passa a elaborar historietas disparatadas:
às vezes agradáveis (oníricas), às vezes aflitivas (pesadelos).
A propósito - nunca é demais lembrar - não esqueça que toda essa Viagem Encantada é
perpetrada nas profundezas do nosso CÉREBRO, e não fora.
“Parece que estou tentando contar-lhes um sonho (ou pesadelo) – fazendo uma vã tentativa,
porque nenhum relato de sonho pode transportar-nos à sensação do sonho, aquela mistura de
absurdo, surpresa e atordoamento em meio a um tremor de incontida revolta, aquela noção de
ser capturado pelo incrível que não é nada mais do que a precisa essência dos sonhos...”.
JOSEPH CONRAD
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4 - SONHANDO O QUE PLANTOU – no cérebro: como já foi dito, os SONHOS são fabricados –
dentro do cérebro - com fragmentos de lembranças da nossa vida. Portanto, você certamente
já SONHOU com pessoas, situações e coisas que conheceu durante a vida. Assim sendo,
podemos afirmar que FREQUENTEMENTE...
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5 - CÉREBRO – Eu Sou o Senhor do Castelo: não escolhemos SONHAR. Pelo contrário, é o
nosso CÉREBRO que – autônomo – elabora o roteiro, dirige e determina o nosso papel no
SITDREAM: às vezes somos protagonistas, às vezes coadjuvantes, - mas sempre um
personagem autômato, perdido no próprio Universo Encantado feito de lembranças pessoais.
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Charles Darwin
Evidentemente, o CÉREBRO dos animais (não nós, os outros animais) produzem sonhos
elementares porque são fabricados com lembranças primárias. Por exemplo: seu CÃO
sonha perseguindo o gato do vizinho; sonha brincando com você; sonha que está tomando
banho, etc. Enfim, o cérebro do seu CÃO produz apenas sonhos simplórios.
*LAIKA A
Heroína Involuntária da Conquista Espacial
Em 3 de novembro de 1957, a cadela LAIKA – uma vira-lata das ruas de Moscou – foi escolhida
para viajar a bordo do satélite soviético SPUTNIK 2, tornando-se o primeiro ser vivo a viajar
para o espaço. LAIKA, sozinha, numa viagem sem volta, morreu entre cinco e sete horas após o
lançamento. Caso a cadela LAIKA tivesse sobrevivido e retornado à Terra, traria em seu
cérebro as lembranças de uma Fantástica Odisseia no Espaço – e sonharia com as estrelas.
“Eu realmente fico triste quando lembro da pobre Laika. É terrível mandar um cão para o
espaço sem comida o bastante. Ela teve de fazer isso pelo progresso humano. Ela não
pediu para ir. (...). Eles sabiam desde o início que ela não retornaria.
Então eles a mataram. Eles simplesmente a mataram.”
FALA EM OFF DO MENINO INGEMAR
Minha Vida de Cachorro – filme 1985 – Lasse Hallström
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Como vimos, para o nosso CÉREBRO, tecer um sonho é uma mera recreação;
enquanto que para um mago...
“Então o mago (na tentativa de criar um Adão de Sonhos) compreendeu que o empenho de
modelar a matéria incoerente e vertiginosa de que se compõem os sonhos é o mais árduo
que se pode empreender (...), mais árduo que tecer uma corda de areia ou
amoedar o vento sem rosto.”
Ficções - Borges
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8 - REM – Os Sonhos Que só Existem Quando São Lembrados: só lembramos dos sonhos
quando acordamos durante ou imediatamente após sonhá-los. Caso contrário – ao continuar
nos braços de Morpheus – os sonhos prosseguem em nosso labirinto cerebral (Linha da
Memória) – e perdem-se para sempre.
Com relação ao momento REM (Movimento Rápido dos Olhos), este fenômeno acontece no
exato momento em que estamos vendo nossos sonhos – DENTRO DO CÉREBRO.
Caso sejamos despertados nesta condição, é bem mais provável que lembremos do
Sonho Sonhado.
A Fada do Cine embaralha (em seu cérebro) as lembranças dos filmes que viu, com as
lembranças da realidade vivida, – e fabrica seus sonhos:
“Outra coisa que me acontecia era que – de tanto ver e contar filmes – muitas vezes eu os
embaralhava com a realidade (embaralhava as lembranças – dos filmes e da realidade – em
seu cérebro). E me custava LEMBRAR se determinada coisa eu tinha vivido ou visto projetada
na tela. OU SE HAVIA SONHADO. Porque acontecia que até meus próprios SONHOS eu os
confundia depois com as cenas de filmes. (...)”
A CONTADORA DE FILMES
Henán Rivera Letelier
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9 – Composição dos Sonhos: como foi explicado, os sonhos são feitos com cacos de
lembranças pessoais espalhadas no cérebro. E como nossas lembranças são formadas pelas
impressões dos sentidos, os SONHOS, consequentemente, também são formados por:
imagens, sons, sabores, aromas e sensações táteis.
“Após a independência do país, chegou a Guerra Civil – que é uma cobra que usa os nossos
próprios dentes para nos morder. Seu veneno circulava agora em todos os rios da nossa alma.
De dia já não saíamos, de noite já não sonhávamos. O sonho é o olho da vida.
Nós estávamos cegos.
TERRA SONÂMBULA
Mia couto
*Neste caso o escritor moçambicano, Mia Couto, utilizou a palavra sonho como sinônimo de esperança.
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APENAS para exemplificar: um deficiente visual pode sonhar com sua namorada; no entanto,
como não há lembranças da IMAGEM dela em seu cérebro, ele não consegue VÊ-LA em seus
sonhos. Por outro lado, ele pode...
ÚRSULA, ao perder a visão para a catarata, recorre à memorização dos sentidos que
sobraram (audição, paladar, olfato e tato) para continuar a viver
quando as trevas da doença já não o permitissem:
“Não disse nada a ninguém, pois teria sido um reconhecimento público da sua inutilidade.
Empenhou-se numa calada aprendizagem (memorização de conhecimentos - no cérebro) das
distâncias das coisas (pelo tato) e das vozes das pessoas (audição – memorizamos SONS no
cérebro), para continuar vendo com a MEMÓRIA quando já não o permitissem as sombras da
catarata. Mais tarde havia de descobrir o auxílio imprevisto dos cheiros (olfato – memorizamos
AROMAS no cérebro), que se definiram nas trevas com uma força muito mais convincente do
que os volumes e a cor (imagens) e a salvaram definitivamente da vergonha de uma renúncia.
(...). Conheceu com tanta certeza o lugar em se encontrava cada coisa ( pelo tato –
memorizamos impressões táteis no cérebro) que ela mesma se esquecia às vezes de que estava
cega. “
Cem Anos de Solidão
Gabriel Garcia Marquéz
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11 – Os SONHOS são Multicor ou em Preto & Branco ?: para demonstrá-lo, peço que VOCÊ
feche os olhos e regresse em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e responda: qual a cor
da Terra quando avistada do espaço?
“ A TERRA É AZUL ! ”
à Yuri Gagarin
Sua resposta está correta. Portanto, podemos afirmar que...
nossos SONHOS são coloridos porque são fabricados com LEMBRANÇAS coloridas.
OUTRO EXEMPLO: feche os olhos e regresse em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), e
busque a imagem do nosso Pavilhão Nacional... Encontrou? Agora descreva – “vendo a
imagem em seu cérebro” – quais são as cores da nossa bandeira: verde, amarelo, azul e
branco. Portanto, como nossas lembranças são coloridas, fabricamos sonhos coloridos.
QUARTO DE DESPEJO
Carolina Maria de Jesus
“...Eu dormi. E tive um sonho maravilhoso. Sonhei que eu era um anjo. Meu vestido era amplo.
Mangas longas cor de rosa. Eu ia da Terra para o céu. E pegava as estrelas na mão para
contemplá-las. Conversar com as estrelas. Elas organizaram um espetáculo para homenagear-
me. Dançavam ao meu redor e formavam um risco luminoso. Quando despertei, pensei: eu sou
tão pobre. Não posso ir num espetáculo, por isso Deus envia-me estes Sonhos Deslumbrantes
pra minh’alma dolorida. Ao Deus que me protege, envio os meus agradecimentos.”
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SCIENTIFIC AMERICAN
(NOV – 2008):
“Em 1937, o grande neurocientista sir. Charles Scott Sherrington, expôs o que viria a se tornar
uma descrição clássica do CÉREBRO EM FUNCIONAMENTO. Ele imaginou pontos de luz
sinalizando a atividade das células nervosas (neurônios) e suas conexões (sinapses). Segundo
ele, durante o sono profundo somente umas poucas áreas remotas do CÉREBRO brilhariam.
Mas ao despertar, é como se a Via Láctea iniciasse uma verdadeira dança cósmica.
Rapidamente a massa encefálica se transforma num tear encantado, onde
milhões de agulhas cintilantes tecem (...) uma verdadeira harmonia de
padrões secundários alternantes. (...).”
EXPLICAÇÃO
I - DORMIR significa “Desligar o Cérebro” e apagar temporariamente as lembranças da nossa
vida. É por este motivo que – “durante o sono profundo” – somente umas poucas áreas
remotas do cérebro (poucas lembranças) brilham.
III - O CÉREBRO fabrica os nossos sonhos com essas poucas lembranças que permanecem
“acessas” durante o sono profundo. É por este motivo (a escassez de matéria-prima) que os
nossos sonhos são breves e tênues.
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CAPÍTULO
XVIII
“Havia uma coruja na pista. Atropelada (Savitha narra o episódio à sua amiga Poornima). Eu
agora estava bem perto, entende, debruçada por cima dela, pensando em como poderia
ajuda-la. Mas o que eu poderia fazer? Mas, enquanto olhava, percebi que ela estava tentando
me dar um recado. Eu juro. (...). A coruja disse... e a essa altura ela estava suspirando, quase
morrendo mesmo... ela disse: “Mas essa é a questão com vocês, humanos. Vocês PENSAM
demais, não é mesmo?”
CÉREBRO
A FANTÁSTICA FÁBRICA DO PENSAMENTO
Afinal de contas,
O QUE É O PENSAMENTO ?
“Há certo gosto em pensar sozinho. É ato individual, como nascer e morrer.”
DRUMMOND
Em outras palavras...
PENSAR...
PENSAR numa lembrança de um episódio significativo da sua infância; ou...
PENSAR numa lembrança de um episódio trivial de qualquer fase da sua vida, etc.
“Pensar! Pensar! Pensar!... É bastante tormentoso para um mortal! Pensar é audácia. Só Deus
tem esse direito e privilégio. Pensar é – ou deveria ser – coisa serena e tranquila; e os nossos
corações palpitam e os nossos pobres cérebros pulsam demais para isso.”
MOBY DICK
Herman Melville
EM NOSSO CÉREBRO
Pensamos sobre as lembranças da nossa vida: infância; juventude; maturidade
JANINA DUSHEIKO
encontra, na igreja, o seu lugar preferido para PENSAR em paz – em suas lembranças...
“Às vezes costumava entrar na igreja e ficar em paz. (...). As pessoas todas imersas em seus
pensamentos, revendo aquilo que aconteceu (revendo e pensando – dentro do cérebro – nas
lembranças do que aconteceu) e imaginando o que poderia acontecer.
Às vezes tinha a impressão de que, se quisesse, poderia ler ali os pensamentos das outras
pessoas. Algumas vezes (imaginava que) ouvia os pensamentos alheios em minha própria
cabeça: “Que padrão escolhemos para o papel de parede novo do quarto: seria melhor o liso,
ou talvez com um estampado delicado? – O dinheiro na conta tem uma taxa de juros
demasiadamente baixa, outros bancos dão uma comissão melhor!. (...). – De onde ela tira
tanto dinheiro? Como ela consegue comprar toda essa roupa? – Como ele envelheceu! Olhe
quanto cabelo branco! E pensar que era o homem mais bonito no vilarejo. E agora? Está
acabado... – Nunca, jamais permitirei que os outros me tratem como se fosse uma
criança!...”.
O que haveria de errado nesse tipo de pensamento? Os meus não são muitos diferentes. É bom
que esse Deus, caso exista, ou mesmo que não exista, nos tenha providenciado algum lugar
para poder pensar em paz (em nossas lembranças). Talvez seja esse o objetivo principal da
oração – pensar em paz (nas lembranças da nossa vida), não querer nada, não pedir nada;
simplesmente colocar a sua própria cabeça em ordem. Isso deveria ser o suficiente. (...).”
SOBRE OS OSSOS DOS MORTOS
Olga Tokarczuk,
“-- Me diga, o reverendo Simmers pergunta, faz quanto tempo que trabalha para eles?
– Doze anos, senhor. Responde Lexington, o motorista negro da família Swart.
– E o que é que você pensa deles, daquela família?
– Lexington hesita, sorrindo largo de nervosismo. Eles me tratam bem, senhor.
– Eles te tratam bem, tá, ótimo. Mas o que é que você pensa deles?
– Não, eu não estou pensando neles, senhor. Eu só estou trabalhando, não pensando.
A declaração é uma inverdade, mas Lexington não pode responder sinceramente. Pressente
que o reverendo quer alguma coisa (dos Swart), mas dar-lhe o que ele quer pode colocar sua
posição em perigo. Nem sempre é possível agradar dois brancos ao mesmo tempo. (...)”
A PROMESSA
Damon Galgut
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O PENSAMENTO VOA
(Astronautas do Espaço Cerebral)
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No entanto, por subestimar a Vastidão Interior do Nosso Cérebro, temos a falsa sensação de
que, AO PENSAR, ‘voamos’ para fora do nosso cérebro, – ou para fora de nós mesmos.
Na realidade, como podemos ver na ilustração abaixo, toda essa Odisseia Encantada do
PENSAMENTO é perpetrada nas profundezas do nosso cérebro...
O PENSADOR
RODIN DANDO ASAS À IMAGINAÇÃO
(COSMONAUTAS DO ESPAÇO INTERIOR)
Challenger de Neurônios do *Major Tom
À STEPHEN HAWKING
(1942 – 2018)
“Eu poderia viver recluso numa casca de noz (ou numa cadeira de rodas)
e me considerar rei do espaço (interior) infinito.”
´´HAMLET ``
*Citação de Shakespeare extraída do livro de Hawking (cap 3): “O UNIVERSO NUMA CASCA DE NOZ.”
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4 - PENSAMOS E IMAGINAMOS - no cérebro: como já foi dito, PENSAMOS sobre as
lembranças da nossa vida, - contidas dentro do cérebro. No entanto...
No entanto, por subestimar a Imensidão Infinita do nosso CÉREBRO, criamos a ilusão de que,
ao PENSAR, singramos o espaço exterior e – rumo ao infinito e além – navegamos por mares
nunca antes navegados.
Na realidade, ao PENSAR (ou imaginar) perpetramos uma Fabulosa Jornada nas entranhas do
próprio CÉREBRO. No trecho a seguir, Machado de Assis narra uma Viagem Encantada pelo
interior do cérebro do nosso atormentado mas deveras imaginativo Rubião...
“Rubião estava em uma longa cadeira de extensão, ermo do espírito (tragado por sua
imaginação), que rompera o teto e se perdera no ar (numa odisseia pelas entranhas do próprio
cérebro). A quantas léguas iria? Nem condor nem águia o poderia precisar. Em marcha para a
Lua, - não via cá em baixo mais que felicidades perenes, chovidas sobre ele, desde o berço,
onde o embalaram fadas, até à Praia de Botafogo, aonde elas o trouxeram, por um chão de
rosas e bogaris. Nenhum revés, nenhum malogro, nenhuma pobreza; - vida plácida, cosida de
gozo, com rendas de supérfluo. Em marcha para a Lua (viajando em sua Linha da Memória –
dentro do cérebro). (...). Ficando só, Rubião atirou-se a uma poltrona, e viu passar muitas
coisas suntuosas. Estava em Biarritz ou Compiègne. (...). Governou um grande Estado, ouviu
ministros e embaixadores, dançou, jantou, - e assim outras ações narradas em
correspondências de jornais (e livros*) que ele lera e lhe ficaram de MEMÓRIA (que ele lera e
lhe ficaram gravados no cérebro). (...). Sentia-se então imperador dos franceses, incógnito, de
passeio. (...). Napoleão, não; chama-me Luís (Napoleão III). Sou o teu Luís, Sofia; não é
verdade, galante criatura? Ai, se tu soubesses o gosto que me dás quando te ouço essas duas
palavras: Meu Luís! – E tu és a minha Sofia, - a doce Sofia da minha alma. (...). Far-te-ei
duquesa. Ouviste?”
* “tantas frases compôs e ruminou, que acabou por “escrever” todos os livros que lera”.
QUINCAS BORBA
Machado de Assis
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Destemido, Dom Alonso Quijano enfrenta seus Moinhos de Vento: mais de 30 desaforados
gigantes que, embora “reais”, só existem em seu CÉREBRO...
“Enfim, ele se embrenhou tanto na leitura que passava as noites lendo até clarear e os dias até
escurecer; e assim, por dormir pouco e LER muito, secou-lhe o cérebro (pelo contrário, encheu-
lhe o CÉREBRO com as fabulosas aventuras dos Romances de Cavalaria – ou dos HQ e filmes
dos Vingadores dos dias atuais), de maneira que veio a perder o juízo (ou melhor, adquiriu
talento e inventividade). Sua imaginação (cérebro) se encheu de tudo aquilo que lia nos livros,
tanto de encantamentos como de duelos, batalhas, desafios, ferimentos, galanteios, amores,
tempestades e disparates impossíveis; e se assentou de tal modo em sua mente (cérebro) que
todo aquele amontoado de invenções fantasiosas parecia verdadeiro: para ele não havia
história mais real no (seu) mundo (cérebro).”
DOM QUIXOTE
Miguel de Cervantes
Dom Quixote
Um triste doido-de-pedra? Será mesmo?
Pois saibam que Guillermo del Toro, James Cameron, George Lucas, Spielberg, Ridley Scott,
Tim Burton, Peter Jackson, Christopher Nolan, Irmãs Wachowski, Denis Villeneuve, Tarantino,
David Lynch, - entre muitos, também são acometidos por surtos de Alucinações Visuais
(idealizadas - voluntária ou involuntariamente – no cérebro). A diferença é que estes as
transformam em filmes: O Labirinto do Fauno, Avatar, StarWars, Indiana Jones, Blade Runner,
Edward Mãos de Tesoura, Braindead, A Origem, Matrix, Duna, alguns, todos, etc. A Propósito,
Dulcineia de Toboso não fica nada a dever a Jessica Rabbit, de Robert Zemeckis.
“As horas que sou feliz é quando estou residindo nos meus castelos imaginários”.
(construídos na imensidão do cérebro)
QUARTO DE DESPEJO
Carolina Maria de Jesus
“Claro – respondeu o tio Tito. – Vocês (Juanito e Catalina – que liam o livro juntos) estavam
empolgados e queriam ver esse momento. Quando você LÊ, nunca enxerga as LETRAS, e sim as
coisas (imagens) sobre as quais as letras falam: um bosque, uma casa com cara de biblioteca,
uma farmácia. Os livros funcionam como espelhos e janelas: estão cheios de IMAGENS.
O LIVRO SELVAGEM
Juan Villoro
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UNIVERSO INTERIOR
6 - UNIVERSO infinito; CÉREBRO abissal: na citação abaixo, o astrônomo real inglês Martin
Rees, tenta dimensionar a espantosa imensidão do UNIVERSO. No entanto, poderia muito bem
estar a falar da espantosa imensidão do nosso CÉREBRO.
MARTIN REES
- trecho de Breve História de Quase Tudo – Bill Bryson -
“O Universo Visível – o ‘pequeno universo’ que conhecemos e do qual podemos falar – tem 1.6
milhão de milhões de milhões de milhões de quilômetros de diâmetro. Mas o universo geral – o
meta universo – (assim como o nosso cérebro) é ainda mais espaçoso: há mais espaço do que
você pode imaginar, mesmo sem se dar ao trabalho de tentar imaginar algum espaço adicional
além.”
Observe a Ilustração
Você tem todo o universo – e no qual você pode até voar – contido no espaço mínimo de uma
única lembrança, – dentro da sua cabeça.
Bowie, o saudoso Homem das Estrelas, era também o Homem das Lembranças
Assim como o UNIVERSO contém todas as estrelas, nosso CÉREBRO contém todas as lembranças
“O Universo é um lugar muito grande; talvez o maior de todos”.
- ASSIM COMO O NOSSO CÉREBRO -
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HOMO SENTIMENTALIS
CAPÍTULO
XIX
SUPREMACIA HUMANA
HUMANO é todo ser vivo capaz de exteriorizar EMOÇÕES
PORTANTO, TODOS NÓS, BÍPEDES, DE TODAS AS CORES E FORMAS,
“Dora teve uma sensação estranha, um misto de dor e formigamento sob o esterno, agravados
por salvas de palpitações, que iam e vinham. Provavelmente experiências como essa foram
responsáveis pela consagração da ideia de que no coração estão guardados os sentimentos.
Mas como ela bem sabe (lembra das aulas na Faculdade – Dora é enfermeira), o coração é
uma bomba automática, propulsora de sangue, e nada mais. (...).”
GAMELEIRA-BRANCA
Sofia Aroeira
CÉREBRO
A FANTÁSTICA FÁBRICA DE EMOÇÕES
b – Encontrou? Sim. Então agora descreva qual o sentimento que esta lembrança em seu
cérebro somatiza em seu corpo: saudade, trauma, aversão, afeição, frustração, orgulho,
tristeza, alegria, culpa, resignação...
EM NOSSO CÉREBRO
Cada lembrança da nossa vida - somatiza uma determinada emoção
NOVE ESTÓRIAS
- J. D. SALINGER -
O trecho abaixo faz parte do conto “Teddy”. - Alias, Theodore McArdle, de 10 anos, uma
espécie de dalai-lama mirim. O trecho aborda a exteriorização de emoções
como demonstração de humanidade:
“ -- Eu queria saber por que as pessoas acham tão importante ser emotivo”, disse Teddy. “A
minha mãe e o meu pai não acham que uma pessoa é humana a não ser que ela ache um
monte de coisas bem tristes, ou bem irritantes, ou bem – bem injustas, por assim dizer. O meu
pai fica bem emotivo quando lê o jornal. Ele acha que eu sou desumano”.
-- Nicholson (com seus 30 anos, e admirador do guru-mirim) bateu a cinza do cigarro. “E devo
supor que você não expressa emoções”, ele disse.
-- Teddy refletiu antes de responder. “Se tenho, eu não lembro de ter usado”, ele disse. “Eu não
vejo utilidade nas emoções.”
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ÍNDICE
A. LEMBRO obsessivamente do objeto da afeição, logo sinto AMOR......................pág. 225
B. LEMBRO obsessivamente do objeto da aversão, logo sinto ÓDIO.......................pág. 227
C. LEMBRO da perda, logo SOFRO............................................................................pág. 229
D. LEMBRO da ausência, logo sinto SAUDADE..........................................................pág. 236
E. LEMBRO do abuso físico e psicológico, logo sinto TRAUMA de INFÂNCIA............pág. 239
F. LEMBRO imprudência cometida, logo sinto o peso da CULPA..............................pág. 241
G. LEMBRO da infâmia sofrida, logo anseio por VINGANÇA.....................................pág. 243
H. LEMBRO do objeto do prazer, logo o DESEJO......................................................pág. 246
I. LEMBRO da guerra, logo sinto Estresse Pós-Traumático......................................pág. 247
J. LEMBRO das condições indignas em que vivemos, logo sinto REVOLTA...............pág. 251
K. LEMBRO das minhas limitações, logo sinto INVEJA do talento alheio..................pág. 252
L. LEMBRO e reconheço o benefício recebido, logo sinto GRATIDÃO......................pág. 253
M. LEMBRO do erro cometido, logo sinto o peso do ARREPENDIMENTO................pág. 255
N. Somos todos HUMANOS – pois compartilhamos as mesmas EMOÇÕES.............pág. 257
O. O Pináculo da Criação?.........................................................................................pag. 258
AMOR e o ÓDIO, como vimos acima, não passam de uma sequela (reação psicossomática) de
uma LEMBRANÇA que permanece fixa, obsessivamente fixa em nosso CÉREBRO. Para
exemplificar, utilizarei trechos de 2 livros de Gabriel Garcia Marquez:
item A
O PADRE CAYETANO LEMBRA OBSESSIVAMENTE DE SIERVA MARIA
“O padre Cayetano Delaura ficou de olhos fechados para pensar melhor nela (para lembrar
melhor dela) enquanto rezava. Retirou-se para biblioteca mais cedo que de costume, pensando
nela (lembrando dela) e quanto mais pensava nela (quanto mais lembrava dela), mais
aumentava suas ânsias de pensar (ânsias de lembrar dela). (...) E sem dar tempo ao pânico, o
padre libertou-se da matéria turva (limites religiosos) que o impedia de viver. Confessou que
não passava um instante sem pensar nela (sem lembrar dela), que tudo que comia e bebia
tinha o gosto dela (tudo que comia e bebia o fazia lembrar dela), que a vida era ela, a toda
hora e em toda parte (a lembrança de Sierva Maria inunda seu cérebro), como só Deus tinha o
direito e o poder de ser (impotente ao perceber a lembrança de Sierva Maria sobrepondo-se à
lembrança do seu deus), e que o gozo supremo do seu coração (do seu cérebro) seria morrer
com ela (com a lembrança dela – em seu cérebro – para todo o sempre!). (...)”
EXPLICAÇÃO
ou...
“Então o Sr. Euclides disse: Eu não tenho ninguém que gosta de mim... Eu sou aleijado.
Eu gosto muito da senhora, D. Carolina. A senhora (sua lembrança)
tá dentro da minha cabeça”.
Carolina Maria de Jesus
(Quarto de Despejo*)
*Em seu livro – autobiográfico – Carolina não deixa claro se cedeu aos encantos do seu Euclides, mas para mim esta é a
Declaração de Amor mais simples e bela que já li.
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item B
AMARANTA LEMBRA OBSESSIVAMENTE DE REBECA
“A única que não tinha perdido por um só instante a consciência (a lembrança) de que Rebeca
estava viva, apodrecendo na sua sopa de larvas, era a implacável e envelhecida Amaranta.
Pensava nela (lembrava de Rebeca) ao amanhecer, quando o gelo do coração (gelo do cérebro)
a acordava na sua cama solitária, e pensava nela (lembrava de Rebeca) quando ensaboava os
seus seios murchos e o ventre macilento, e quando vestia as brancas anáguas e camisetas de
cambraia da velhice, e quando trocava na *mão a venda negra da terrível expiação
(*queimou-a propositalmente). Sempre, a toda hora, adormecida ou acordada, nos momentos
mais sublimes e nos mais abjetos, Amaranta pensava em Rebeca (Amaranta lembrava de
Rebeca), porque a sua solidão havia selecionado (no cérebro) as LEMBRANÇAS, - e incinerado
as entorpecentes montanhas de lixo nostálgico (lembranças nostálgicas) que a vida acumulara
no seu coração (no seu cérebro) e havia purificado, magnificado e eternizado as outras
(lembranças), as mais amargas. Por ela é que a sua sobrinha (Remédios, a Bela) sabia da
existência de Rebeca. Cada vez que passavam pela casa decrépita (de Rebeca), contava-lhe (à
sobrinha) um incidente ingrato, uma fábula de opróbrio (sobre Rebeca), tentando desta forma
fazer com que o seu extenuante rancor (por Rebeca) fosse partilhado pela sobrinha e, por
conseguinte, prolongada além da sua morte. (...) Ninguém se deu conta de que Amaranta
tecera naquela época uma linda mortalha para Rebeca. (...) Elaborou o plano com tanto ÓDIO
que estremeceu com a ideia de que agiria da mesma maneira se fosse por AMOR. (...)”
EXPLICAÇÂO
ou...
OBS: qual a razão do ÓDIO de Amaranta pela sua irmã adotiva, Rebeca? Seria INVEJA? Rebeca era mais
atraente. Ou seria CIÚME? Pois ambas, aparentemente, se apaixonaram (?) pelo garboso Pietro Crespi.
Ou seria simplesmente AMOR? – uma paixão velada, que, por ser velada, transformou-se em ódio? Não
faço a mínima ideia.
“Ele, então, me mostrou as telas... estava empolgado, orgulhoso; eu implorei pra ele tirar
aquele ódio (do pai) da alma (apagar/aceitar as lembranças do pai – que estavam gravadas
em seu cérebro como desenhos rupestres). Disse que não ia tirar o que sobrara da
vida... as MEMÓRIAS, ele disse. Depois saiu sem avisar. Fugiu...”.
Milton Hatoum
(Cinzas do Norte)
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I – Do Amor e do Ódio – em um só cérebro : no trecho a seguir, fica bem claro que, tamanha é
a semelhança entre ambos os sentimentos que corre-se um sério risco de confundi-los no
cérebro:
“Veja, por exemplo, que quando você AMA alguém ou ODEIA alguém, em ambos os casos, você
está a todo instante (com o CÉREBRO ocupado: lembrando do ser amado ou odiado) ansioso
por saber onde ele está, com quem está, se está ou não está bem, o que está fazendo, no que
está pensando, quais são seus temores. O coração (cérebro) é falso como ninguém, ele é
incorrigível; quem poderá conhece-lo? Assim falou o profeta Jeremias.”
JUDAS
Amos Oz
II - O Cérebro Tem Razões Que a Própria Razão Desconhece: como foi explicado, amamos e
odiamos no CÉREBRO. O coração – desculpem-me os poetas e românticos em geral –, o
coração é apenas um músculo, motor central da circulação do sangue.
A única semelhança entre ambos é que assim como podemos sofrer e morrer do coração,
também pode-se sofrer e morrer por amor, - ou por ódio.
“Não pode existir um coração (cérebro) para odiar e outro para amar.
O ser humano só tem um”.
Tamara Stiepánovna Umniáguina - A GUERRA NÃO TEM ROSTO DE MULHER – Svetlana Aleksievitch
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item C
“Existe algo mais forte do que a morte: a lembrança dos ausentes na memória dos vivos.”
Água Fresca Para as Flores
Valérie Perrin
a - LEMBRO da perda (entes queridos), logo SOFRO: como já foi dito, a evolução da
MEMÓRIA (a aptidão para preencher o cérebro com as lembranças da nossa vida) determinou
a origem da angústia...
RÉQUIEM
- O luto eterno de uma mente com lembranças –
“Nessa noite Pietro Crespi o encontrou (José Arcadio Buendía) no corredor, chorando o
chorinho sem graça dos velhos, chorando por Prudencio Aguilar, por Melquíades,
pelos pais de Rebeca, por seu pai e sua mãe, por todos os que podia LEMBRAR
e que então estavam sozinhos na morte”.
“A porteira (do Convento Santa Clara) se inclinou à razão. Tomou Sierva María pela mão, sem
lhe dar tempo para uma despedida, e a passou pela porta da roda. Como o tornozelo lhe doía
ao caminhar, a menina tirou o chinelo esquerdo. O marquês a viu afastar-se coxeando do pé
descalço e com o chinelo na mão. Esperou em vão que num raro instante de compaixão a filha
se voltasse para olhá-lo. A última lembrança que lhe ficou (no cérebro) foi o da menina
acabando de atravessar a galeria do jardim, arrastando o pé ferido, até desaparecer no
pavilhão das Enterradas Vivas. (...).”
DO AMOR E OUTROS DEMÔNIOS
Gabriel García Marquez
“Ficamos vendo-a descer os degraus da varanda e passar pelas árvores (rumo ao seu Muro de
Lamentações: “estou cansada de carregar o peso do mundo”). Há coisas na vida que a gente
não consegue esquecer, por mais que tente, e aquela cena (aquela lembrança de May – a
última) foi uma delas. May passando pelas árvores com o facho de luz iluminando seu caminho
e depois sendo tragada pela escuridão. (...).
Fechei os olhos e suas melhores imagens (melhores lembranças) vieram à minha cabeça. Vi as
trancinhas dela brilhando no esguicho (vemos nossas lembranças – dentro do cérebro), vi seus
dedos arrumando as migalhas de bolachas, trabalhando com afinco para salvar a vida de uma
única barata. Vi o chapéu que ela usou no dia em que dançou conga com as Filhas de Maria.
Mas vi principalmente a luz de amor e angústia que aparecia tantas vezes no seu rosto. No
final, essa luz acabou queimando-a. (...).”
“É uma longa história, Lily. Eu acho que você notou... que May é (era) especial.” – “Ela se
perturba com facilidade,” eu disse. - “É porque May sente as coisas de forma diferente de nós.”
- August falou, pondo a mão no meu braço. - “Lily, quando você e eu ouvimos falar de uma
desgraça, ficamos tristes por algum tempo, mas não nos desesperamos. É como se tivéssemos
um muro de proteção em volta do coração (em volta do cérebro) para a tristeza (as
lembranças das perdas) não tomar conta de nós. Mas May não tem isso. Tudo entra nela, todo
o sofrimento que existe lá fora (se infiltra por uma fenda no muro de seu cérebro), e faz com
que sinta como se essas coisas estivessem acontecendo com ela. Não consegue ver a diferença.
(...).”
“O fazendeiro (negro) ligou o rádio e a voz das Suplemes invadiu a cabine da caminhonete com
“Baby, baby, where did our love go?”. Não há nada como uma música sobre o amor perdido
para nos lembrar que todas as coisas preciosas podem desaparecer com facilidade de
onde foram postos com tanto cuidado.”
A VIDA SECRETA DAS ABELHAS
Sue Monk Kidd
“Quando choramos nossas perdas, ficamos tão transtornados, que a gente chora, para o bem
ou para o mal, também por nós mesmos. Choramos pelo que nós éramos. Choramos pelo que
não somos mais. Choramos pelo que um dia não seremos de modo algum.”
d - JOAN DIDION* (1934 – 2021): escritora, jornalista e ensaísta americana; a autora do livro
acima citado, foi casada com o também escritor John Dunne, entre 1964 e 2003. - E perdeu
sua filha, Quintana (1966 – 2005), logo após a publicação do mesmo livro. Isto significa que...
I - SEU MARIDO, John, não mais existe. Mas as lembranças compartilhadas com ele (39 anos
de recordações), permaneceram “vivas” em seu cérebro.
II - SUA FILHA, Quintana, não mais existe. Mas as lembranças compartilhadas com ela (39 anos
de recordações), permaneceram “vivas” em seu cérebro.
“O Sol já se foi; agora só nos resta (no cérebro) as memórias daquela luz.”
Naruto Uzumaki
“Mais ainda assim, por muito talento dialéctico que se deite na panela, será difícil de
sustentar que a recordação de um morto (em nosso cérebro) possa ser a
razão para que um vivo decida continuar vivo”
A CAVERNA
José Saramago
Assim sendo, só nos resta aceitar a dor da perda como algo natural, - aos BÍPEDES. Pois o
sofrimento é inerente a toda forma de vida que foi capaz de evoluir a MEMÓRIA.
“Sei também que, se a gente vai continuar vivo, chega uma hora em que a gente tem que
abandonar os mortos (acolher e aceitar viver com suas lembranças – no cérebro),
deixa-los ir, mantê-los mortos.”
O ANO DO PENSAMENTO MÁGICO
Joan Didion
f – PARTE 1 – A Terra dos Mortos: trecho retirado do livro Vozes de Tchernóbil, de Svetlana
Aleksiévitch.
“Vou ao cemitério. A minha mãe está lá. A minha filhinha pequena... O tifo a consumiu
durante a guerra. (...). Também o meu marido está lá. Fídia. Eu me sento perto de todos eles.
Suspiro. E até posso falar com eles, tanto com os vivos quanto com os mortos (pois as
lembranças dos nossos mortos permanecem vivas – em nosso cérebro). Para mim não há
diferença. Ouço tanto uns quanto os outros. Quando você está só... E quando está triste. Muito
triste... (...).”
Zinaída Levdokímovna Kovaliénka
(residente da zona proibida)
“A palavra que usara ? Plantar. Diz-se assim na língua de Luar-do-Chão. Não é enterrar o
defunto. É plantar o defunto. – Disse avó Dulcineusa. – Porque o morto é coisa viva. “
UM RIO CHAMADO TEMPO; UMA CASA CHAMADA TERRA
Mia Couto
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CÉREBROS ENTORPECIDOS
Não LEMBRO dos abusos sofridos na infância, logo não sinto o peso do trauma;
Não LEMBRO do meu passado, logo não sei quem SOU - Dissociação de Personalidade;
Não LEMBRO da dura realidade ao meu redor, logo sou livre e feliz - Dissociação da Realidade;
No entanto, no dia seguinte, o efeito extasiante passa, e você percebe que as duras
LEMBRANÇAS (das perdas, traumas, erros e fracassos, etc.) permanecem todas lá, vivas e
pulsantes - em seu CÉREBRO. A única solução, infelizmente, é continuar alcoolizado ou
drogado.
-------x-------
“Dissociação”, explica ele. “Você tira sua consciência do que está acontecendo à sua volta” (as
lembranças de sua excruciante realidade presente). – E se vê livre de suas terríveis lembranças
(do seu doloroso passado).
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item D
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM A ORIGEM DA
SAUDADE
AMARCORD
(Io Mi Ricordo – Federico Fellini - 1973)
Federico Fellini NÃO regressou na inexistente Linha do Tempo para relembrar sua infância, - o
TEMPO não existe. Na realidade, ele regressou em sua Linha da Memória (dentro do cérebro)
para RELEMBRAR dos episódios que marcaram a aurora da sua vida; - e assim, elaborou o seu
filme magistral. Acompanhe abaixo 7 citações que abordam este sentimento...
“Oh! Que saudades que eu tenho; Da aurora da minha vida; Da minha infância querida; Que os
anos não trazem mais! Que amor, que sonhos, que flores. Naquelas tardes fagueiras; À sombra
das bananeiras; Debaixo dos laranjais! Como são belos os dias do despontar da existência!
(...).”
Caruaru, do meu Bom Jesus do Monte; Pra quem vive tão distante por conta do destino; Ai
Caruaru, do meu tempo de menino; Ainda me lembro das festanças da Matriz; Das noitadas de
retreta e do velho chafariz; Dos roletes de cana-caiana, cocada de coco e amendoim; Da
burrica, das bolas de gude; Dos banhos de açude que não saem de mim (não saem do cérebro,
- as lembranças apenas se distanciaram em nossa Linha da Memória)”.
“Não sei por que você se foi; Quantas saudades eu senti; E de tristezas vou viver; E aquele
adeus não pude dar; Você marcou na minha vida; Viveu, morreu na minha história (as
lembranças dela faz parte da história da vida do poeta); Chego a ter medo do futuro; E da
solidão que em minha porta bate; E eu... Gostava tanto de você... (...).”
V – Cheiro da Saudade
(Alceu Valença)
“Quando te lembras do cheiro da minha carne; Cheiro de mares, cheiro de bares, do Bar do
Trevo; E tuas ventas (cérebro) sentem o cheiro da saudade; Quintais, pomares, cheiro do
cravo, dos meus cabelos; Te dá vontade de beijar a minha boca; E ficas louca, como quem
arde; Tu não te lembras que o meu cheiro acelera o coração? É feito lança, é flor-de-cheiro, É
como brilho da paixão! Ô morena do coração de rubi; Tu não tens pena; Morena, pena de ti ?”
OBS: presume o poeta que o CHEIRO da sua carne, dos mares, bares, quintais, pomares, cravos e dos
seus cabelos – no cérebro da Morena – a faz LEMBRAR dele, e sentir saudade.
“Meu olhar se perde na poeira; Dessa estrada triste; Onde a tristeza e a saudade de você;
Ainda existem; Esse sol que queima no meu rosto; Um resto de esperança; De ao menos ver de
perto o seu olhar, Que eu trago na lembrança (o poeta segue seu caminho pela estrada triste,
mas traz – em seu cérebro – a lembrança do alhar da sua musa); Preciso acabar logo com
isso...
VII – Era Domingo
(ReIginaldo Rossi)
“Essa história se passou; Quando eu deixei o meu grande amor; Naquela estação sorrindo; Um
dia lindo; Era domingo; E lá se foi meu grande amor; Olha o trem nem me avisou; Partiu
levando num vagão; Meu grande amor, meu coração; E eu a deixei ali sorrindo; E aqui fiquei
me consumindo; E se você já teve um amor; Que um certo dia lhe deixou; Deve sentir no
coração (sentir no cérebro – cujas lembranças da amada, além da saudade, também
expressam...); A mesma mágoa e a mesma dor; Do autor que fez essa canção.”
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item E
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM O
As LEMBRANÇAS desse crime horrendo (que permanecerá no cérebro da vítima por toda a
vida) somatizam: vergonha, revolta, repúdio, nojo, insegurança, depressão, etc. Isto ocorre
porque as lembranças desse gênero de crime transformam-se em aterradoras feridas - no
cérebro da vítima.
“A vida (nosso passado = as lembranças da nossa vida) nunca pode ser refeita.
Pegue uma folha de papel e a rasgue. Você pode colar todos os pedaços,
mas os rasgos, as dobras e a fita adesiva ainda vão estar lá.
Água Fresca Para as Flores
Valérie Perrin
Suprimir alguns trechos do relato para tornar essa imundície humana mais suportável.
O homem é capaz de realizar os feitos mais sublimes e os atos mais repugnantes.
“AMANDA tinha uma infância feliz. (...). Tinha onze anos e corria pelos corredores brincando
com duas amigas. (...). Quando se separou delas encontrou o professor de (...), que pediu um
abraço. (...). Ela acreditou num carinho paternal, mas ele a levou para o banheiro e trancou a
porta. A inocência de uma criança roubada. Toda a maldade do mundo revelada.
(...) O medo era tanto que a paralisou. Não reagiu. (...). Durante quatro horas ela foi
violentada. – “Você nunca vai esquecer de mim”. – Dizia o algoz. – “E se contar para alguém,
farei coisas muitos piores com você”.
Teve laceração na vagina, ânus, canal vaginal e colo do útero. Foi para casa tentando esconder
a dor e as feridas. Sangrou e chorou sozinha. Decidiu que nunca contaria nada a ninguém.
Decidiu apagar aquele dia da sua vida. Não sabia que era impossível (pois as lembranças são
indeléveis – não podemos apagá-las do cérebro).
Mudou seu comportamento. Ficou rebelde, agressiva, impaciente, intolerante. Mas seus pais
nunca souberam o real motivo. (...). Nem sempre as crianças conseguem se expressar com
palavras. Nem sempre os adultos querem ou conseguem enxergar os sinais. Teve anorexia.
Teve bulimia. Teve depressão. Tentou tirar sua própria vida para ver se a dor passava. (...)
--------x--------
“A única coisa que em mim não muda é o meu passado: a memória do meu passado humano.
O passado (as lembranças da nossa vida) costuma ser estável, está sempre lá,
belo ou terrível, e lá (em nosso cérebro) ficará para sempre”.
O VENDEDOR DE PASSADOS
José Eduardo Agualusa
“Nada é infinitamente redutível. É possível partir um átomo, mas não se pode transformá-lo
em NADA. As coisas (lembranças despedaçadas) permanecem (em nosso cérebro), agarram-se
a nós, mesmo quando estão partidas. Uma hora ou outra é preciso catar os cacos
(de estilhaços de lembranças espalhadas pelo cérebro).”
ILUMINADAS
Lauren Beukes
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Item F
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM O SENTIMENTO DE
CULPA
ÚRSULA IGUARÁN, jovem e recém casada, por ter sido responsável pelo conflito que levou seu
marido a matar Prudencio Aguilar, compartilha com José Arcadio Buendía um terrível
sentimento de CULPA...
“Numa noite em que não conseguia dormir, Úrsula saiu para beber água no quintal e VIU (em
seu cérebro) Prudencio Aguilar junto à tina. Estava lívido, com uma expressão muito triste,
tentando tapar com uma atadura de esparto o ferimento da garganta. Não lhe produziu medo,
mas pena. Voltou ao quarto para contar ao esposo que o tinha visto, mas ele não ligou. “Os
mortos não voltam”, disse. “O que acontece é que não aguentamos com PESO DA
CONSCIÊNCIA.
Duas noites depois, Úrsula tornou a VER (em seu cérebro) Prudencio Aguilar no banheiro,
lavando com a atadura de esparto o sangue coagulado do pescoço. Outra noite, VIU-O ( em seu
cérebro) passeando na chuva. José Arcadio Buendía, irritado com as alucinações (visuais) da
mulher, foi para o quintal armado com a lança. Ali estava o morto com a sua expressão triste.
– “Vá pro caralho! – gritou-lhe José Arcadio Buendía. – Cada vez que voltar, eu o mato de
novo!”. Prudencio Aguilar não foi embora , nem José Arcadio Buendía se atreveu a arremessar
a lança. (...).
Desde então não conseguiu mais dormir. Atormentava-o (as lembranças do morto – em seu
cérebro) a enorme desolação com que o morto o havia olhado da chuva, a profunda nostalgia
com que se lembrava dos vivos. “Deve estar sofrendo muito”, dizia Úrsula. “Vê-se que está
muito só”. (...). Numa noite em que o encontrou lavando as feridas no seu próprio quarto, José
Arcadio Buendía não pôde aguentar mais. – Está bem, Prudencio – disse-lhe. – Nós vamos
embora deste povoado para o mais longe possível e não voltaremos nunca mais. Agora vá,
fique sossegado”.
“Matar um homem é uma coisa terrível, Kid. Você retira dele tudo que ele foi (‘seu passado’), e
retira tudo que ele poderia ter sido (‘seu futuro’).”
William Munny – do Missouri
- Os Imperdoáveis – Clint Eastwood -
“Para ele o passado era uma doença, e as lembranças um castigo. Ele queria morrer no
esquecimento. Fugiu. Ele queria viver longe da culpa.”
ANTES DE NASCER O MUNDO
Mia Couto
Antes de encerrar este item, vamos recorrer à aparição do fantasma de Prudencio Aguilar, e
explicar as...
ALUCINAÇÕES VISUAIS
Realidade x Imaginação
EXPLICAÇÃO
A. Alucinação Visual 1: Dom Quixote podia avistar um inofensivo moinho de vento, mas
quando a imagem, enfim, chegava ao seu CÉREBRO (vemos no cérebro), - ele a interpretava
como sendo um monstro ameaçador.
C. Alucinação Visual 3: temos a aptidão de VER a realidade (um moinho de vento - ou um galo-
de-briga, etc.). Mas também podemos distorcer a realidade quando a vemos em nosso
CÉREBRO.
D. Cérebro do Espanto – a Residência Hill: é por este motivo que a cabeça do homem
transformou-se no maior castelo malassombrado que já existiu – e tornou-se comuns: o
avistamento de OVNI, aparições de santas e visões do Jack Risonho.
E. A Verdade de Cada Um: como a REALIDADE (quando vista em nosso cérebro) tornou-se
subjetiva, mesmo numa alucinação coletiva cada um enxerga (em seus miolos) o fantasma
que merece.
F. Alucinações Sensoriais: as Alucinações Visuais são as mais comuns (aos bípedes, claro). Mas
também há ALUCINAÇÕES: auditivas, palatáveis, olfativas e táteis.
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item G
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM O SENTIMENTO DE
VINGANÇA
LEMBRO do ato infame, logo anseio voltar ao ‘Covil da Hiena’ e promover a VINGANÇA
Após o estupro coletivo (em troca de comida), a mulher do médico decide voltar à Camarata
dos Malvados para, além da própria (repulsiva e ultrajante) violação que sofrera,
também VINGAR a morte da Cega das Insônias...
-- Mataste para vingar-nos, para vingar as mulheres tinha de ser uma mulher, disse a rapariga
dos óculos escuros, e a vingança sendo justa, é coisa HUMANA, se a vítima não tiver um direito
sobre o carrasco, então não haverá justiça,
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O guerreiro (Altura Verde) abraçou sua feminina (Boa de Espanto) e agradeceu. Ele respondeu:
o teu inimigo mais abeirou. Tua lembrança (do ato atroz) abeira o inimigo. Ele vai ser
encontrado pelo nosso povo e nosso povo vai matar. Quando tombar, o educaremos. Será
inteiro na alegria abaeté. Não haverá mais sofrimento.
AS DOENÇAS DO BRASIL
Valter Hugo Mãe
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Diadorim “Revenge”
“Mas Diadorim repuxou freio, e esbarrou; e, com os olhos limpos, limpos, ele me olhou muito
contemplado. Vagaroso, que dizendo: -- “Riobaldo, hoje-em-dia eu nem sei o que sei, e, o que
soubesse, deixei de saber o que sabia...” -- Demorei que ele mesmo por si pudesse pôr
explicação. E foi ele disse: -- “Por VINGAR a morte de Joca Ramiro, vou, e vou e faço, consoante
devo. Só, e Deus que me passe por esta, que indo vou não com meu coração ( cérebro) que bate
agora presente (motivada não pelas lembranças do presente), mas com o coração (cérebro) de
tempo passado (motivada, sim, pelas lembranças do que passou)... E digo...”
GRANDE SERTÃO – VEREDAS
Guimarães Rosa
----------x----------
Janina “Revenge”
“A ira torna o raciocínio mais claro e perspicaz, faz enxergar com mais nitidez. Concentra as
outras emoções e controla o corpo. Não há dúvida de que toda a sabedoria deriva da ira,
pois a ira é capaz de ultrapassar quaisquer limites.”
SOBRE OS OSSOS DOS MORTOS
Olga Tokarczuk
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item H
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM A ORIGEM DO DESEJO
ESCRAVOS DO DESEJO
comida, bebida, compras, cassino, vídeo game, internet, sexo, drogas e rock and roll, etc.
A COMPULSÃO
Compulsão é uma imposição interna que nasce da ânsia de saciar a lembrança de um prazer
que permanece fixa, obsessivamente fixa - em nosso cérebro.
“O prazer dura uma noite, mas a lembrança (do prazer e do objeto) é para sempre.”
A Cidade Ilhada
Milton Hatoum
SUPER INTERESSANTE
(18/ABR/2011)
EXPLICAÇÃO
5 – LEMBRO obsessivamente do prazer de roubar, logo sou um grande corrupto fdp; etc., etc.
OBSESSÃO
(lembrança fixa – compulsão exagerada)
“A minha ideia, depois de tantas cabriolas, constituíra-se ideia fixa. Deus te livre, caro leitor, de
uma ideia fixa (lembrança fixa); antes um argueiro, antes uma trave no olho.”
MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS
Machado de Assis
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item I
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM O
TRAUMA DE GUERRA
SUPER INTERESSANTE
Public. 30 nov 2008 – Atualiz. 16 mai 2018
(Por Danilo Cezar Cabral)
Faluja, Iraque, 9 nov 2004. No telhado de um prédio, o cabo James Blake Miller tentava
manter os insurgentes o mais longe dele e de seus companheiros. No tiroteio, seus
companheiros quase atingiram Luis Sinco, fotógrafo do L. A. Times que acompanhava a
unidade e que, findo o combate, tirou um retrato de Miller. (...). Virou celebridade.
Feliz por estar de volta, o marine não se preocupou quando a esposa disse que ele estava
apertando o pescoço dela durante a noite. Achou que era passageiro, assim como seus
pesadelos sobre o Iraque (sonhos e pesadelos são fabricados – em nosso cérebro - com
fragmentos de lembranças da nossa vida). Só depois de olhar pela janela e VER o corpo de um
iraquiano na calçada (vemos nossas Alucinações Visuais - no cérebro), Miller resolveu buscar
ajuda psiquiátrica. Diagnóstico: trauma de guerra”.
Um trauma pode se realizar das mais variadas formas: lembranças de um assalto, sequestro,
violações sexuais, acidentes, perdas, etc. No entanto, veremos abaixo 3 CITAÇÕES que
revelam, especificamente, a origem e as consequências de um Trauma de Guerra...
1 - MENINOS DE ZINCO
(Svetlana Aleksiévitch)
O livro em questão – cujo trecho abaixo descreve um típico trauma de guerra – relata
testemunhos reais dos familiares e sobreviventes da guerra Soviética-Afegã (1979 – 1989). O
título faz referência aos Caixões de Zinco, lacrados, nos quais os soldados mortos voltavam
para casa. E como a autora deixa bem claro, no lado afegão também houve mortos, muitos
mortos, - além de lágrimas e traumas de guerra.
“MEU SACHENKA”
“Ele era muito carinhoso, é raro um menino ser tão carinhoso. Sempre beijava, abraçava:
“Mamãe... Mamãezinha...”. Depois do Afeganistão (licença temporária) ficou ainda mais
terno. Em casa, para ele tudo estava bom. Mas havia uns momentos em que ficava sentado,
calado, não via nada. À noite saltava da cama e andava pelo quarto. Uma vez acordei com um
grito: “Está explodindo, está explodindo! Mamãe, estão atirando...” (vemos e ouvimos nossas
lembranças – dentro do cérebro). Outra noite escutei: alguém estava chorando. Quem podia
estar chorando aqui? Não havia crianças pequenas. Abri a porta do quarto dele: ele estava
envolvendo a cabeça com as duas mãos e chorava. -- Sacha, meu Sachenka, filhinho, por que
está chorando? Estou com medo, mamãe. – E nenhuma palavra a mais. (De volta ao
Afeganistão...). Meu Sacha foi ferido por quinze estilhaços de uma vez. Só teve tempo de dizer:
“Está doendo, mamãe. (...).
EXPLICAÇÃO
I - Souvenirs da Guerra – no cérebro: digamos que um indivíduo combateu por cinco anos
numa guerra estúpida (desculpem o pleonasmo bélico). Finda a guerra, ele regressa ao
conforto e a segurança do seu lar. Então qual é o problema? O que saiu errado? Pois o
veterano agora se divorciou, afastou-se dos amigos, tornou-se um alcoólatra e faz
acompanhamento psiquiátrico. A resposta é simples: ele voltou da guerra, é verdade, mas
trouxe - EM SEU CÉREBRO - cinco anos de lembranças da guerra. Portanto...
II - LEMBRANÇAS – nossa mais fiel companheira: portanto, não importa onde esteja ou aonde
vá, seja dia ou noite, dormindo ou acordado, o homem carrega - NO CÉREBRO - o peso das
suas recordações.
NO CÉREBRO DO EX-COMBATENTE
as lembranças da guerra são formadas por...
SONS da guerra: tiros, explosões, gritos do Coração das Trevas: “O horror! O horror!”;
IMPRESSÕES táteis da guerra: frio, calor, pés esfolados, ferimentos, câimbras, cefaleia, etc.
--------x---------
2 – PEQUENA ABELHA
Chris Cleave
Comovente história de uma refugiada nigeriana de 16 anos, que foge de seu país
e consegue entrar ilegalmente na Grã-Bretanha.
“Uma garota africana magricela – que fugiu de sua aldeia e apareceu aqui!”
“Mas o filme na sua memória (o filme da sua vida: formado por suas lembranças), desse não
se pode livrar assim com tanta facilidade. Aonde quer que você vá, ele está sempre passando
dentro da sua cabeça. Portanto, quando digo que sou uma refugiada, você deve compreender
que não existe refúgio. (...). Embarquei como clandestina num grande navio de aço, mas o
terror (as lembranças da guerra) embarcou junto, dentro de mim (dentro do cérebro). Quando
deixei minha terra natal pensei ter escapado, mas em alto-mar comecei a ter pesadelos
(sonhos e pesadelos são fabricados – em nosso cérebro - com fragmentos de lembranças da
nossa vida). Fui ingênua ao imaginar que sairia de meu país sem nada. Era uma carga (de
lembranças das atrocidades da guerra) pesada a que eu levava (no cérebro)”.
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3 – KAFKA À BEIRA-MAR
Haruki Murakami
“Eu dava aulas numa escola na província de Yamanachi. Era responsável pela atividade ao ar
livre do grupo de crianças que entrou em Coma Simultâneo no incidente ocorrido pouco antes
do fim da guerra, naquele longínquo outono de 1944.
A mim, contudo, me parece que o fato (as lembranças do fato) se deu ainda ontem, tão
estranhamente vívido e próximo o sinto de mim. Não consigo afastar da mente (cérebro) a
lembrança daquele dia. Ela está sempre ao meu lado como uma sombra. Me faz passar por
noites de insônia, perturbados por sonhos (que são fabricados com fragmentos de lembranças
da nossa vida). (...) Sinto que o incidente continua a afetar a minha vida até hoje. (...) Nesse
momento vejo-me compelida a perguntar: quais foram as consequências tanto na vida das
crianças quanto na minha? Grave como foi, o caso tem de ter deixado seqüelas físicas e
emocionais.
Pouco a pouco, tanto a monstruosa guerra como a perda irreparável de preciosas vidas vão se
tornando ocorrências de um passado distante (as lembranças vão se distanciando em nossa
Linha da Memória – dentro do cérebro), como estrelas velhas e geladas.
Por outro lado, existem lembranças que, por mais tempo que se passe (por mais que se
Permaneça no Presente), não conseguimos de maneira alguma apagar de nossa memória
(cérebro). Lembranças que não se desgastam. Que resistem em nosso íntimo (cérebro),
irremovíveis como pedras angulares. Para mim, o incidente no bosque é uma delas”.
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item J
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM A
REVOLTA X RESIGNAÇÃO
(revolta dos filhos x resignação dos pais)
O livro citado é TORTO ARADO, de Itamar Vieira Junior, merecido destaque em 2020. No
trecho a seguir, BELONÍSIA, uma das protagonistas, descreve uma lembrança que, - por ser
marcante/traumatizante – tornou-se recorrente em seu cérebro...
“Um dia, meu irmão Zezé perguntou ao nosso pai, Zeca Chapéu Grande, o que era Viver de
Morada. Por que não éramos também donos daquela terra, se lá havíamos nascido e
trabalhado desde sempre. (...). Por que não fazíamos daquela terra nossa, já que dela
vivíamos, plantávamos as sementes, colhíamos o pão. Se dela retirávamos nosso sustento.”
“Meu pai retirou o chapéu, o calor fazia minar de seu corpo um suor grosso que lavava seu
rosto (...). << Pedir Morada é quando você não sabe para onde ir, porque não tem trabalho de
onde vem. Não tem de onde tirar o sustento. Aí você pergunta pra quem tem e quem precisa
de gente para trabalho, --“moço, o senhor me dá morada?”>>
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“Essa cova em que estás, Com palmos medida, É a cota menor, Que tiraste em vida, - É de
bom tamanho, Nem largo nem fundo, É a parte que te cabe neste latifúndio,
- Não é cova grande, É cova medida, É a terra que querias ver dividida.”
MORTE E VIDA SEVERINA
João Cabral de Melo Neto
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“Eles estavam morrendo lentamente – isso era bem claro. Eles não eram inimigos,
eles não eram criminosos, eles não eram nada mais na terra,
além de sombras negras de doenças e fome.”
O CORAÇÃO DAS TREVAS
Joseph Conrad
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item K
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM A
INVEJA
LEMBRO das minhas limitações (física, intelectual, artística, profissional, patrimonial, etc.),
logo sinto INVEJA dos atributos alheios.
CISNES SELVAGENS
(Jung chanG)
“A notícia (morte de Mao Tsé-tung – 9/set/1976) encheu-me de uma tal euforia que, por
instantes, fiquei paralisada. (...). Sabia que o consideravam um filósofo, e tentei perceber que
filosofia tinha sido verdadeiramente a dele. Pareceu-me que o seu princípio básico era a
necessidade de perpétuo conflito. Para ele os conflitos humanos constituíam a força motriz da
história, (...). Talvez a teoria de Mao não fosse mais do que uma extensão de sua
personalidade. (...). Compreendia os mais feios instintos humanos, como a INVEJA e o
RANCOR. E sabia como mobilizá-los para servir aos seus próprios fins. Governava induzindo as
pessoas a odiarem-se umas as outras. (...). Ao fazer vir à tona e alimentar o que de pior havia
nas pessoas, Mao criara um deserto moral e uma terra de ódio. (...).
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OBS: Nunca houve na China, sob o regime de Mao, o equivalente a uma KGB. Pois o ditador transformou
todos os habitantes em censores do regime; cada indivíduo – motivado por inveja, rancor ou pura
maldade – poderia, sem qualquer comprovação, delatar um familiar, vizinho, conhecido, amigo ou
inimigo. Para o bem ou para o mal, a INVEJA move o mundo.
Rivalidade – INVEJA – Evolução
“Dia 28 de julho (1964) os EUA lançarão o Ranger Seven de Cape Kennedy, na Flórida,” disse o
sr. Cronkite na TV. “Um voo de 253 665 milhas para o foguete atingir a Lua. O objetivo será
tirar fotografias da superfície e enviá-las de volta.”
– “Jesus Cristo”, disse Rosaleen. “Um foguete para a Lua.” August sacudiu a cabeça. “Daqui a
pouco eles estão andando por lá.” Todo mundo tinha pensado que o pres. Kennedy estivesse
biruta quando declarou que um dia um homem pisaria na Lua. O jornal de Sylvan chamou essa
ideia de Visão Lunática. (...). Mas nunca se deve subestimar o poder de uma rivalidade
ferrenha (inveja). Nós queríamos ultrapassar os russos (Yuri Gagarin - 1961): foi isso que nos
fez tentar sair da Terra. Parecia que agora conseguiríamos. (...).”
A VIDA SECRETA DAS ABELHAS
Sue Monk Kidd
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item L
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM A
GRADIDÃO
No livro OS DA MINHA RUA, do escritor angolano ONDJAKI, ele regressa em sua Linha da
Memória (dentro do cérebro) e relata as lembranças de alguns episódios que marcaram a sua
infância. E, entre eles...
Nas despedidas acontece isso: a ternura toca a alegria, a alegria traz uma saudade quase
triste, a saudade semeia lágrimas, e nós, as crianças, não sabemos arrumar essas coisas
(emoções) dentro do coração (dentro do cérebro).
A Romina tirou da mochila um bonito frasco cheio de compota de morango. (...). Todos nós
sabíamos que aquela era a nossa prenda de despedida (e gratidão). (...). As mãos da camarada
profa. Maria tremiam ao agarrar as mãos do marido como se, naquele gesto, eles
conseguissem agarrar as mão de todos os seus alunos em Angola. (...).
Quando chegamos lá em baixo, o Sol já tinha ido embora. (...). Um pingo de chuva, sozinho,
caiu-me na cabeça, nessa que foi a última vez que vimos aqueles camaradas professores
cubanos.”
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“Não gosto de despedidas porque elas têm esse cheiro de amizades que se transformam (no
cérebro) em recordações molhadas com bué de lágrimas.”
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Item M
AS LEMBRANÇAS EM NOSSO CÉREBRO EXPLICAM O
ARREPENDIMENTO
LEMBRO do erro cometido, logo sinto o peso do remorso - e do ARREPENDIMENTO.
“O senhor mesmo disse que o erro traz o remorso e que o remorso é o veneno da existência.
(...). E insinuou que ter uma memória (cérebro) maculada (pelas lembranças dos erros)
era uma maldição perpétua”.
JANE EYRE
Charlotte Brontë
OBS: Nixon pode até não ter reconhecido a gravidade do erro cometido, mas certamente se
arrependeu pelas consequências. Ser banido da política e da História de seu país não deve ter
sido uma LEMBRANÇA (fardo) nada fácil de carregar - em seu cérebro.
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EM NOSSO CÉREBRO
CADA LEMBRANÇA DA NOSSA VIDA -- SOMATIZA UMA DETERMINADA EMOÇÃO
Homens e Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos
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item N
E por falar em SER humano...
AS CORES DA HUMANIDADE
Como podemos constatar nos itens acima, as EMOÇÕES (humanidade) são inerentes a toda
forma de vida que foi capaz de evoluir a MEMÓRIA. – E isto inclui os bípedes de todas as cores
e formas. E com relação a tão propagada “Diferenças Raciais” (Supremacia Branca, Raça
Ariana, Eugenia Nazista e outras fuleragens do gênero) , fica bem posto que não passa de mais
uma humanice estúpida que nós inventamos como (mais um) pretexto para nos odiarmos
mutuamente.
“Se ainda não o disse, aí fica. Se disse, fica também. Há conceitos que se devem
incutir na alma (cérebro) do leitor à força de repetição.”
Dom Casmurro
“UMA MENTIRA quando repetida muitas vezes se transforma numa GRANDE MENTIRA.”
À Goebbels, com carinho.- Se ele disse, aí fica; se não disse, fica também – foda-se!.
QUARTO DE DESPEJO
Carolina Maria de Jesus
“O BRANCO é que diz que é superior. Mas que superioridade apresenta o branco? Se o negro
bebe pinga, o branco bebe. A enfermidade que atinge o preto, atinge o branco. Se o branco
sente fome, o negro também. A natureza não seleciona ninguém. (...). Preterir o preto é o
mesmo que preterir o Sol. O homem não pode lutar contra os produtos da natureza.”
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Item O
“E criou Deus o homem à sua imagem e semelhança (perfeito, pleno, sábio, belo, eterno...).
Deus os abençoou e lhes disse: -- Sejam férteis e multipliquem-se! Encham e subjuguem a
terra! Dominem sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais
rastejantes. E assim foi. E viu Deus que tudo havia ficado muito bom. (...)”
SÓ QUE NÃO! Não mesmo. Lamento desapontá-los, meus caros amigos bípedes, mas nós não
somos a culminação de p... nenhuma. O que realmente somos é um chimpanzé que evoluiu a
MEMORIA; um reles macaco que LEMBRA, – e não vejo nenhum demérito nisso. Muito pelo
contrário, Viva a Evolução!!!
Nós, humanos, costumamos legislar em causa própria porque a história (e as fábulas – como o
trecho acima) é escrita por quem evoluiu a MEMÓRIA.
“Mas por que, então, deveríamos ser úteis? E para quem? Quem é que dividiu o mundo em
criaturas úteis e inúteis, e quem lhe deu o direito de fazê-lo? Desse modo, o cardo não teria o
direito de viver, nem o rato que devora os grãos nos armazéns, nem sequer as abelhas ou os
zangões, as ervas daninhas ou as rosas. Quem foi o dono da mente que se atreveu a tanta
arrogância para julgar quem é melhor ou pior? (...).
SOBRE OS OSSOS DOS MORTOS
Olga Tokarczuk
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item P
A Soberba Humana
“No charco onde a noite se espelha, o sapo acredita voar entre as estrelas”.
Mia couto
“(...) Aonde quer que você vá no mundo, qualquer que seja o animal, planta, inseto ou pingo
de matéria que você veja, se estiver vivo, usará o mesmo dicionário e conhecerá o mesmo
código. TODA VIDA É ÚNICA. Somos todos o resultado de um único truque genético transmitido
de geração para geração há quase 4 bilhões de anos (de Permanência no Presente). (...)”.
*Matt Ridley - geneticista
“O leniviy mozg de Hoffstetler encontra nas ruas cinzentas e sujas daquela cidade provas da
organização cosmológica presente em toda matéria, dos menores corpúsculos aos
aglomerados de galáxias incomensuráveis. Portanto, ele é apenas um ponto insignificante
interpretando um papel insignificante na história. É por isso, pelo menos, que ele reza.”
A FORMA DA ÁGUA
Guillermo del Toro – Daniel Kraus
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CAPÍTULO
XX
Neste capítulo veremos...
FRAZ KAFKA
O PROCESSO
Para tanto, terá que regressar em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e relatar todas as
LEMBRANÇAS da sua vida. Assim, presume, poderá provar sua inocência ou, quem sabe,
encontrar a lembrança de algum crime – ou pecado.
“Agora K. já não sentia qualquer hesitação; era preciso fazer aquela petição. Se não tivesse
tempo no escritório, iria redigi-la em casa, à noite. (...). A petição constituía um trabalho quase
interminável. Podia facilmente concluir que seria impossível terminá-la algum dia. Não por
preguiça ou previsão calculada, mas porque, no seu desconhecimento da natureza da
acusação e de todos os seus prolongamentos, precisava (regressar em sua Linha da Memória –
dentro do cérebro, e) LEMBRAR-SE de toda a sua vida (infância, juventude, maturidade), nos
menores detalhes, expô-la em todas as suas nuanças, discuti-la sob todos os aspectos. E ainda
por cima, que trabalho triste!
Talvez fosse bom para ocupar o espírito de um aposentado e ajudá-lo a passar os longos dias
vazios. Mas agora que K. tinha necessidade de concentrar todas as suas forças cerebrais no
trabalho, que queria gozar como um jovem as suas curtas noitadas e breves madrugadas... Era
agora que tinha que se ocupar com a redação daquela petição! Não parava de se lamentar!
EXPLICAÇÃO
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, KAFKA criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, -- distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
d - KAFKA E SUA IDADE – de Permanência no Presente: considerando que nasceu em 3 de
julho de 1883, e faleceu em 3 de junho de 1924, significa que KAFKA Permaneceu no Presente
por apenas 40 anos (PP = 40);
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2
A ilusão do tempo na cabeça de
ATAULFO ALVES
“MEUS TEMPOS DE CRIANÇA” – A Saudade de Ataulfo Alves : o grande Ataulfo, ao regressar
em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), pôde rememorar sua saudosa meninice. E
assim, obteve inspiração para compor uma de suas mais conhecidas canções:
EXPLICAÇÃO
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, ATAULFO criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
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3
A ilusão do tempo na cabeça de
GUIMARÃES ROSA
“Armar alçapões para apanhar sanhaços – e depois tornar a soltá-los. Que maravilha! Puxar
sabugos de espiga de milho, feitos boizinhos de carro, brinquedo saudoso. Prender
formiguinhas em ilhas, que eram pedras postas num tanque raso, e unidas por pauzinhos,
pontes para formiguinha passar. Aproveitar um fiozinho d’água, fazendo-o de Danúbio ou de
São Francisco, ou de ‘Sapakral-lal’, com todas as curvas dos ditos, com as cidades marginais
marcadas por grupos de pedrinhas, tudo isso sob o vôo matinal das maitacas de Nhô Augusto
Matraca, no quintal. (...).”
EXPLICAÇÃO
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, GUIMARÃES criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
d - GUIMARÃES E SUA IDADE – de Permanência no Presente: considerando que nasceu em 27
de junho de 1908, e faleceu em 19 de novembro de 1967, significa que GUIMARÃES
Permaneceu no Presente durante 59 anos (PP = 59).
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4
A ilusão do tempo na cabeça de
MARCEL PROUST
“MEUS TEMPOS DE CRIANÇA” – A Saudade de Marcel Proust: numa matéria de Veja (out –
2004), a jornalista Thereza Venturoli, aborda o prêmio Nobel destinado a uma pesquisa
pioneira sobre como o nosso cérebro analisa e arquiva os aromas:
“Acontece com todo mundo: de repente, bate um perfume de mulher ou o aroma de pão
recém-saído do forno, e é o que basta para se volte (regresse na Linha da Memória até chegar,
por exemplo, a) a uma festa da adolescência, ou a uma tarde da infância. O olfato é uma
máquina do tempo poderosa, que rendeu passagens belíssimas da literatura – como aquela em
que o escritor francês Marcel Proust (1871 – 1922), num trecho célebre (transcrito abaixo) de
Em Busca do Tempo Perdido, o autor/narrador vê sua vida de criança se erguer inteira a partir
do aroma de uma simples xícara de chá... “
“... Abatido por um dia sem graça, (...) pus aos meus lábios uma colherada de chá na qual eu
deixara amolecer um pedacinho de Madeleine... Estremeci, (o aroma do chá o faz regressar em
sua Linha da Memória [dentro do cérebro] até chegar às lembranças do aroma do chá da sua
infância) um prazer delicioso me invadira, isolado, sem a noção de sua causa. (...) Não me
sentir mais medíocre, contingente, mortal. De onde vinha esse prazer poderoso? (...). (Proust
VÊ as belas lembranças da sua infância - em seu cérebro - e as descreve) Todas as flores de
nosso jardim e as do parque de Swann, e as ninfas do rio Vivonne, e a gente simples da aldeia,
e toda a cidade de Combray e seus arredores – tudo aquilo que toma corpo e se torna sólido
saiu, cidades e jardins, de minha xícara de chá.”
O TEMPO NO CÉREBRO DE PROUST
(1871 – 1922)
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, PROUST criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
d - PROUST E SUA IDADE – de Permanência no Presente: considerando que nasceu em 10 de
junho de 1871, e faleceu em 18 de novembro de 1922, significa que PROUST Permaneceu no
Presente por apenas 51 anos (PP = 51);
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5
A ilusão do tempo na cabeça de
“Minha mãe cozinhava com lenha. Nós não podíamos comprar, íamos buscá-la no mato.
Reuniam-se várias mulheres: a Maria Preta, a Joaquina e a Maria Triste, minha mãe e
eu. Levávamos um machado. Que suplício andar no mato procurando um pau aqui,
outro ali. Quando encontrávamos um pau seco, que alegria! Era como se
encontrássemos um filão de ouro. Era aquela andança dentro do mato, das sete
ao meio-dia. Eu gostava de ir pra comer frutas silvestres: jatobá, pitanga, gabiroba, araticum,
maracujá e marmelo-de-cachorro.”
EXPLICAÇÃO
No trecho acima, CAROLINA regressa em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) e relata as
lembranças pretas (tristes, árduas) da aurora da sua vida.
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, CAROLINA criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
d - CAROLINA E SUA IDADE – de Permanência no Presente: considerando que nasceu em 14
de março de 1914, e faleceu em 13 de fevereiro de 1977, significa que CAROLINA Permaneceu
no Presente durante 62 anos (PP = 62);
“A minha vida até aqui tem sido preta. Preta é a minha pele. Preto é o lugar onde eu moro.”
Além do peso das lembranças - que por serem pretas,
pesam mais - CAROLINA também carregava...
“Estendi as roupas rapidamente e fui catar papel. Que suplício catar papel atualmente. Tenho
que levar a minha filha, Vera Eunice. Ela está com dois anos. (...). Suporto o peso do saco na
cabeça e suporto o peso da Vera Eunice nos braços. Tem hora que revolto-me. Depois domino-
me. Ela não tem culpa de estar no mundo
QUARTO DE DESPEJO
Carolina Maria de Jesus
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6
A ilusão do tempo na cabeça de
Contador de Histórias é alguém com grande aptidão para – ao regressar em sua Linha da
Memória (dentro do cérebro) – descrever as LEMBRANÇAS da sua vida.
“Por essa época, MELQUÍADES tinha envelhecido com uma rapidez assombrosa. (...) O cigano
parecia estragado por um mal tenaz. Era, na realidade, o resultado de múltiplas e estranhas
doenças contraídas nas suas incontáveis viagens ao redor do mundo.
Conforme ele mesmo contou (relatou as lembranças de sua odisseia na Terra) a José Arcadio
Buendía, a morte o seguia por todas as partes, farejando-lhe as calças, mas sem se decidir a
dar o bote final. Era um fugitivo de quantas pragas e catástrofes que haviam flagelado o
gênero humano.
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, MELQUÍADES criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
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A ORIGEM DA FALA
(HOMO TAGARELUS)
FOLHA DE S. PAULO
(23 JUN 2004)
HOMO LOQUAZ
“Carmo ficou aborrecida e triste (ao lembrar e narrar o episódio com o Aguiar), e eu com ela.
Trocamos os nossos aborrecimentos (descrevemos as lembranças das nossas misérias), quero
dizer que os somamos, e ficamos com o dobro cada um. (...)”.
MEMORIAL DE AIRES
Machado de Assis
AS MÃOS DO HOMEM
Portanto, ao evoluir a MEMÓRIA (ao preencher o cérebro com as lembranças do seu cotidiano: que são
formadas basicamente por IMAGENS), o homem desenvolveu a FALA e a Habilidade Manual.
“O BIPEDALISMO é uma estratégia exigente e arriscada. Significa reformular a pélvis para que
ela se torne um instrumento sustentador de carga. Para preservar a força necessária, o canal
vaginal precisa ser relativamente estreito. Isso tem duas consequências imediatas muito
importantes e outra a longo prazo. Primeiro significa muita dor no parto e um risco de
fatalidade bem maior para a mãe e o bebê. Além disso, para a cabeça do bebê passar por tal
espaço apertado, ele precisa nascer enquanto seu cérebro é pequeno – portanto, enquanto o
bebê ainda é indefeso. Isso requer que a criança receba cuidados por um longo tempo, o que,
por sua vez, implica uma união sólida entre macho e fêmea. Tudo isso já é problemático o
suficiente quando se é o senhor intelectual do planeta, mas quando se é um austrolopitecino
pequeno e vulnerável, com o cérebro do tamanho de uma laranja, o risco deve ter sido enorme.
Um hominídeo erecto conseguia VER melhor (e preencher o cérebro com imagens), mas
também era visto (farejado) com mais facilidade. Mesmo agora, como espécie, somos
absurdamente vulneráveis na selva. Quase todo animal grande que você possa citar é mais
forte, mais veloz e possui mais dentes do que nós. (...) Portanto, por que nossos ancestrais
desceram das árvores e saíram da proteção das florestas para caminhar e se arriscar nas
savanas?
OBS
Por que abandonamos a segurança do quadrupedalismo e optamos pelo arriscado
bipedalismo? Tudo isso será esclarecido na próxima postagem. Mas fica o desafio: qual a sua
opinião a respeito? Por que decidimos descer das árvores e se arriscar nas savanas?
CAIM
José Saramago
“Estarás aqui dia e noite, dissera Lilith, Só não tinha acrescentado, Serás, quando assim o
decidir, o meu Boi de Cobrição, palavra esta que parecerá não só grosseira, como mal aplicada
no caso, uma vez que, em princípio, cobrição é coisa de animais quadrúpedes, não de seres
humanos, mas que muito bem aplicada está porque estes (agora bípedes) já foram tão
quadrúpedes como aqueles, por quanto todos sabemos que o que hoje denominamos braços e
pernas foi durante muito tempo tudo pernas, até que alguém se terá lembrado de dizer aos
futuros homens, Levantem-se que já é hora.”
5 – O Homo Erectus inventou a MEMÓRIA: De acordo as últimas descobertas da
paleontologia, o Homo Erectus (o intrépido bípede errante) tem início entre 7 e 8 milhões de
anos atrás (no PRESENTE ANTERIOR). Este evento determina a Aurora do Homem, pois o
bipedalismo permitiu a evolução da MEMÓRIA.
OBS: sem o BIPEDALIMO não haveria como evoluir a MEMÓRIA, e sem esta não haveria
INTELIGÊNCIA. Tudo isso será esclarecido na próxima postagem.
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CAPÍTULO
XXI
EINSTEIN & HAWKING
A ILUSÃO DO TEMPO EM 2 MENTES RADIANTES
ALBERT EINSTEIN
O MENINO EINSTEIN
(site prof. C. A. dos Santos – Ufrgs)
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, EINSTEIN criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’.
O CÉREBRO DE EINSTEIN
- contém as lembranças de todos os episódios da sua vida: infância, juventude, maturidade –
OBSERVE A ILUSTRAÇÃO
EINSTEIN não regressava na Esteira do Tempo pra lembrar da infância: lições de violino da
mãe, aulas de geometria do tio Jacob ou da bússola presenteada pelo pai – o tempo não
existe;
Ele regressava em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) para lembrar da sua infância.
H – TBT – A máquina Neurológica do Tempo: Einstein pôde, sempre que quisesse, e durante
toda a vida, regressar em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), e refletir sobre seu
fantástico Universo Pessoal (E=mc²) – construído com as extraordinárias lembranças
(conhecimentos) da sua vida.
I – LEMBRANÇAS EFÊMERAS: à medida que as lembranças da infância de Einstein (as mais
antigas) vão se distanciando em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), cria a ilusão de
que se afastam na inexistente Esteira do Tempo que Passou;
LEMBRANÇA
- nossa maior e mais fiel companheira –
não importa onde esteja ou aonde vá, seja dia ou noite, dormindo ou acordado,
EINSTEIN não envelheceu ao se deslocar 76 anos na Esteira do Tempo – não existe tempo;
STEPHEN HAWKING
“Se tivesse uma Máquina do Tempo, voltaria ao ano de 1967, para o nascimento do meu
primeiro filho, Robert. Meus três filhos me trouxeram bastantes alegrias.”
Stephen Hawking
No entanto, por subestimar sua Vastidão Interior, HAWKING criou a ilusão de que suas
lembranças pessoais (seu passado) estão fora do seu cérebro, - distribuídas na inexistente
‘Esteira do Tempo que Passou’;
O CÉREBRO DE HAWKING,
- contém as lembranças de todos os episódios da sua vida: infância, juventude, maturidade –
OBSERVE A ILUSTRAÇÃO
Ele regressava em sua Linha da Memória (dentro do cérebro) para lembrar do filho.
h – TBT – A Máquina Neurológica do Tempo: Hawking pôde, sempre que quisesse, e durante
toda a vida, regressar em sua Linha da Memória (dentro do cérebro), e refletir sobre o seu
prodigioso Universo Pessoal (horizonte de eventos de um Buraco Negro) – formado pelas
extraordinárias lembranças (conhecimentos) da sua vida.
LEMBRANÇA
- nossa maior e mais fiel companheira –
Não importa onde esteja ou aonde vá, seja dia ou noite, dormindo ou acordado,
HAWKING não envelheceu ao se deslocar 76 anos na Esteira do Tempo – o tempo não existe;
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No capítulo a seguir, veremos que quanto mais se Permanece no Presente (quanto maior a
nossa idade), maior será o Peso das Lembranças que teremos que transportar – no cérebro.
CAPÍTULO
XXII
A LONGEVIDADE E O PESO DAS LEMBRANÇAS
“A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER”
Taxidermista de Lembranças
No entanto, à medida que vai memorizando sua Permanência no Presente, você irá
gradativamente preenchendo seu CÉREBRO com as lembranças da sua vida: infância,
juventude, maturidade. – E assim, constrói a sua INDIVIDUALIDADE – ou sua essência, - ou seu
conteúdo, - ou sua alma.
“Na minha opinião, depois da morte, a matéria deveria ser aniquilada. Seria o método mais
adequado para lidar com o corpo (...), essa miséria humana – um torrão de matéria. Assim os
corpos aniquilados voltariam diretamente para os buracos negros de onde vieram. As ALMAS
viajariam para a Luz com a velocidade da Luz. Isso se de fato existir algo como a ALMA.
SOBRE OS OSSOS DOS MORTOS
Olga Tokarczuc
B – O ônus de SER: veja a seguir, 3 exemplos para ilustrar a equivalência entre a nossa IDADE e
o Peso das Lembranças – ou o peso da alma. Pois, como disse o Poeta...
“Fui muito infeliz. Diria, até mesmo, que reduzida a nada. Inexistente. Vazia. Fui como meus
vizinhos (Violette – a Zeladora de Cemitério – mora no local de trabalho), mas pior. Minhas
funções vitais funcionavam, mas sem mim. Sem o peso de minha ALMA, que, segundo dizem
por aí, sejamos nós gordos ou magros, grandes ou pequenos, jovens ou velhos, é de 21
GRAMAS.”
AGUA FRESCA PARA AS FLORES
Valérie Perrin
OBS: segundo um estudo (ou experiência – não sei bem – apenas li numa resenha sobre ótimo
filme de Alejandro Iñárritu: 21 GRAMAS), ao pesar um corpo humano imediatamente após a
morte, este pesará 21 GRAMAS a menos. Não sei a origem do “estudo”, mas devo ressaltar
que quando o cérebro morre, as lembranças (nosso EU ou nossa ALMA) se extingue com ele.
Presumo que esse processo natural não possa ser medido nem pesado.
A BAGAGEM DO VIAJANTE 1
(Quanto mais se Permanece no Presente, maior será o Peso das Lembranças)
1 – Eternamente JOVEM: digamos que você tenha 16 anos de idade. Significa que você
Permanece no Presente há 16 anos, e, portanto – como um Atlas da existência – você carrega
em seu cérebro um PASSADO com apenas 16 anos de LEMBRANÇAS PESSOAIS.
2 – LEMBRANÇA - nossa mais fiel Companheira de Viagem: e não importa onde esteja ou
aonde vá, dia e noite, dormindo ou acordado, você conduz – como uma cangalha no lombo
dos burros – um PASSADO com 16 anos de lembranças – na cabeça;
EM SEU CÉREBRO,
- você carrega, por enquanto, um fardo com apenas 16 anos de lembranças –
3 – Cabeça Peso Pena: é fácil carregar na cabeça um PASSADO com apenas 16 anos de
lembranças, não é mesmo? Seu cérebro ainda encontra-se faminto por MEMÓRIZAR: novos
conhecimentos, novas aventuras, novas experiências, novas descobertas, etc.
“No frigorífico vi uma mocinha comendo salchichas do lixo. Ela disse-me que quer um serviço
para andar bem bonita. Ela está com 15 anos. Época em que achamos o mundo maravilhoso.
Época em que a rosa desabrocha. Depois vai caindo pétala por pétala e surgem
os espinhos. Uns cansam da vida. Sucumbem.”
QUARTO DE DESPEJO
Carolina Maria de Jesus
4 – Expectativa de Permanência: considerando que nossa Expectativa de Vida é de 80 ANOS,
significa que você – oxalá, salvo dos infortúnios da vida – ainda poderá Permanecer no
Presente por mais 64 ANOS – independente dos ponteiros do relógio.
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A BAGAGEM DO VIAJANTE 2
- quanto mais se Permanece no Presente, maior será o peso das lembranças –
1 – A Idade da LOBA: digamos que você tenha 40 anos de idade. Significa que você Permanece
no Presente há 40 anos, e, portanto – como um Atlas da existência – carrega em seu cérebro
um PASSADO com 40 anos de LEMBRANÇAS PESSOAIS.
“Cada um tem seu passado (feito de lembranças) fechado em si (oculto no cérebro), tal como
um livro que se conhece de cor, mas que os outros apenas veem a capa.”
Virginia Woolf
2 – LEMBRANÇAS – nossa mais fiel Companheira de Viagem: e não importa onde esteja ou
aonde vá, dia e noite, dormindo ou acordado, você conduz – como uma cangalha no lombo das
mulas – um PASSADO com 40 anos de lembranças – na cabeça;
EM SEU CÉREBRO,
- você, por enquanto, carrega um fardo com 40 anos de lembranças –
CADA CABEÇA, UM MUNDO DE LEMBRANÇAS
3 – CABEÇA Peso Meio-Pesado: agora já não é tão fácil carregar na cabeça um PASSADO com
40 anos de lembranças (de êxitos e fracassos), não é verdade? Mas, enfim, você já teve seus
bons momentos, e o PRESENTE continua – apesar de tudo;
OBSERVAÇÃO
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A BAGAGEM DO VIAJANTE 3
- Quase Cem Anos de Solidão –
1 – A GRANDE BELEZA – A Cruz dos Anos e a Eternidade e Um Dia: digamos que tenha 99 anos
de idade. Significa que você Permanece no Presente há 99 anos, e, portanto – como um ATLAS
da existência – carrega em seu cérebro um PASSADO com 99 anos de LEMBRANÇAS PESSOAIS.
2 – LEMBRANÇA – nossa mais fiel Companheira de Viagem: e não importa onde esteja ou
aonde vá, dia e noite, dormindo ou acordado, você conduz – como uma cangalha no lombo de
um asno – um PASSADO com 99 anos de lembranças – na cabeça;
EM SEU CÉREBRO
“O que passou, passou. Mas o que passou luzindo, resplandecerá para sempre.”
(em nosso cérebro)
Johann Goethe
4 – CABEÇA Peso Pesado: definitivamente não é nada confortável carregar um PASSADO com
99 anos de lembranças – na cabeça. Portanto, a partir de agora, é mais aconselhável se
dedicar a atividades menos arriscadas, como por exemplo: praticar montanhismo,
paraquedismo, saltar de bungee jumping, estudar física nuclear... Enfim, é bom começar a se
mexer e fazer qualquer coisa, pois...
“O conhecimento torna a alma jovem e diminui a amargura da velhice. Colhe, pois, a sabedoria
(boas lembranças). Armazena (no cérebro) suavidade para o amanhã.”
Leonardo da Vinci
5 - ...E a Real TERCEIRA IDADE: nosso corpo não ENVELHECE com o passar do tempo, - o
tempo não existe. Na realidade, nossa estrutura física tão somente se TRANSFORMA ao
Permanecer no Presente – vivemos em um eterno presente. Portanto...
Não há ENVELHECIMENTO; apenas TRANSFORMAÇAÕ
Como disse Bart Simpson, “os velhos (os mais transformados) odoram falar do passado”. E é
verdade, claro. Pois – me respondam os jovens bípedes – como não falar do PASSADO
se nós o transportamos em nossa cabeça?
“Quando era menino, Tonico fazia esse mesmo caminho na companhia da mãe e das irmãs,
para assistir à missa, não mudou quase nada. (...). Lembra-se de como o povo se apinhava ali,
ele sempre arrepiado de sono e friagem, o menorzinho dos filhos. O padre dava ordem para o
repique do sineiro ainda no escuro e o sino tocava naquele breu, baloiçando para lá e para cá,
no alto da torre, como uma moeda reluz no fundo de um córrego. (...). Acabada a missa, ele
corria para fora da igreja, olhava para a torre e finalmente enxergava o pai lá em cima,
manobrando o badalo, tingido agora pela luz da manhã. Aos treze anos, começou a aprender
com ele a linguagem dos sinos, (...), para substituí-lo um dia no alto da torre. Os sinos. Amava-
os como o pai os tinha amado, (...), mas Tonico envelheceu (se transformou), agora não
consegue mais. Alguém, no entanto, precisa continuar. (...). Minha nossa, terei tempo (de
Permanência no Presente) para ensinar isso tudo? (...). Cadê Josué (seu sobrinho neto – um
desinteressado aprendiz) ? É, talvez devesse ter ensinado antes para outra pessoa, agora é
tarde. (...).”
ERVA BRAVA
Paulliny Tort
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“É impossível viver sem saber o que sou e para que estou aqui, - disse Liévin consigo. (...). Na
matéria infinita, no espaço infinito, surge um organismo-bolha, e então essa bolha se aguenta
um pouco, rebenta, e essa bolha sou eu. (...). Trata-se de uma verdade cruel, mas era o único e
derradeiro resultado dos esforços seculares do pensamento humano naquela direção. (...).”
ANNA KARIÊNINA
Liev Tolstól
No capítulo a seguir, veremos VOCÊ SENDO VOCÊ EM CINCO VERSÕES POSSÍVEIS , ou seja, 5
versões de quem VOCÊ poderia ter sido. O enunciado pode parecer um bocadinho confuso;
mas não se preocupe, - a explicação é muito simples.
Antes, porém, vamos repetir e explicar – em poucas palavras – como VOCÊ virou VOCÊ:
CAPÍTULO
XXIII
SUPERINTERESSANTE – OUTUBRO, 2009
Texto Rodrigo Rezende
QUEM É VOCÊ?
SOMOS FEITOS COM LEMBRANÇAS
LEMBRANÇAS pessoais são os blocos de construção da pessoa que você chama de EU
“(...) Ainda no ventre, uma gelatina, um girino, um troço cabeçudo, É extraordinário como se
formam um homem e uma mulher, indiferentes, lá dentro do seu ovo, ao mundo de fora, e
contudo com este mundo mesmo se virão defrontar, como rei ou soldado, corcunda ou
maneta (...), alguma coisa sempre, que tudo nunca pode ser, e nada menos ainda.
Porque enfim, podemos fugir de tudo, não de NÓS próprios. (...)”.
MEMORIAL DO CONVENTO
José Saramago
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“Pensei que não há grande diferença entre as coisas e as pessoas, Têm sua vida, duram um
tempo, e em pouco acabam, como tudo no mundo, Ainda assim, se um cântaro pode substituir
outro cântaro, (...), o mesmo não acontecem com as pessoas, é como se no nascimento de
cada uma se partisse o molde de que saiu, por isso é que as pessoas não se repetem.
A CAVERNA
José Saramago
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VOCÊ NO MULTIVERSO
POSSÍVEL VOCÊ 1
VOCÊ 1 – O Católico: digamos que VOCÊ fala português, é católico, gosta de futebol, cerveja,
feijoada, samba e... é um Físico das Partículas (ninguém é perfeito! ).
No entanto, é preciso deixar claro que VOCÊ não nasceu assim, e nem fadado a sê-lo assim.
Todos esses conhecimentos e informações foram adquiridas (registrados em seu cérebro) no
decorrer de sua Permanência no Presente – ou no decorrer de sua vida.
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POSSÍVEL VOCÊ 2
VOCÊ 2 – O Xintoísta: digamos que VOCÊ, ao nascer, tenha sido adotado e criado no Japão.
Hoje, portanto, VOCÊ falaria Nihongo, seria xintoísta, adoraria sumô, beberia saquê, comeria
karaage, ouviria enka e... seria um taxonomista (só pode ser Karma!).
Fisicamente VOCÊ seria o mesmo, mas o seu CÉREBRO teria sido preenchido com diferentes
lembranças: outro idioma, outras crenças, outros hobbies, outros hábitos alimentares, outros
gostos musicais, outra profissão, outros conhecimentos, outros conceitos, outros
preconceitos...
EXPLICAÇÃO
VOCÊ nasceu com o HD virgem, - ou com o cérebro vazio. Portanto, você PODERIA...
f) Gostar de ouvir qualquer música: memorizar os sons e vir a apreciar qq estilo musical;
CONCLUSÃO
Você NÃO nasceu católico ou islamita, falando português ou bengali, adorando futebol
ou cricket, apreciando feijoada ou mughlai, fadado a ser engenheiro de software ou gari, etc.
“Conte-nos o que VOCÊ deseja ser e nós lhe implantaremos as MEMÓRIAS equivalentes (em
seu cérebro). Quer ser um policial? Ou ser um atleta de elite? Ou ser um agente secreto?
FALA DO VENDEDOR DA EMPRESA RECALL
( “Total Recall” - Paul Verhoeven – à Philip k. Dick)
A Língua Original
I - IDIOMAS – ouvindo os SONS no cérebro: veremos agora como utilizamos o CÉREBRO para
aprender a FALAR qualquer vernáculo. Primeiro ouvimos o SOM da palavra e a registramos no
cérebro. Em seguida – ouvindo o som da palavra (pa-ra-le-le-pí-pe-do) no cérebro – tentamos
reproduzi-la com a VOZ. Este processo é válido para todas as palavras e para qualquer idioma:
primeiro ouvimos os sons de uma palavra (de qualquer idioma) e a registramos no cérebro;
em seguida, tentamos reproduzi-la com a voz.
II - Surdez – Mudez: é por este motivo que todo surdo também é mudo – embora não tenha
nenhum problema vocal. Ou seja, o surdo – impossibilitado de registrar os SONS das palavras
no cérebro – não consegue reproduzi-las com a VOZ.
III - Mamã, Mamã, Mamã: por ser esta - MAMÃE - a palavra mais repetida pelas zelosas
progenitoras (pequerrucho da mamãe; miúdo da mamãe, pimpolho da mamãe; pirralho da
mamãe, etc.), é natural que seja a primeira palavra balbuciada pelas crianças.
O bebê ouve a palavra e a memoriza; em seguida – ouvindo os SONS (mamãe – mamãe -
mamãe) no cérebro – a criança tenta reproduzi-la com a VOZ: mamã, mamã, mamã. Mesmo
sem saber o seu real significado.
IV – “O Homem que Sabia Javanês”: a propósito, não existe Língua Original (hebraico,
aramaico, grego, tupi-guarani). Nosso CÉREBRO nasce vazio; - podemos aprender (memorizar)
qualquer idioma.
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POSSÍVEL VOCÊ 3
Em outras palavras, seu CLONE, é verdade, seria fisicamente idêntico a VOCÊ. No entanto,
como nasceria com o CÉREBRO vazio (sem conteúdo; sem história; sem passado), o CLONE iria
preenchê-lo com as próprias LEMBRANÇAS: outros idiomas, outras profissões, outros
costumes, outras crenças, outras descrenças, outros gostos, outros desgostos, outras vitórias,
outros fracassos, outros vícios, outras virtudes, outros afetos, outros desafetos - e tudo mais.
E assim, o seu CLONE construiria a sua própria individualidade – que, por sua vez, seria
completamente diferente da sua. Em linguagem figurada diríamos que o livro clonado teria a
mesma capa, porém seu conteúdo seria completamente distinto: pois cada um escreveria a
sua própria história de vida.
Por exemplo, você é um sujeito agitado e gosta da música barulhenta e cavernosa da cantora
ENYA; seu clone seria um sujeito zen e prefere a música calma e contemplativa da banda
SEPULTURA. Entendeu? É por aí...
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POSSÍVEL VOCÊ 4
VOCÊ 4 – O Ignaro: digamos que seus pais tivessem “escolhido” (certas ou desastradas, somos
a única espécie capaz de fazer escolhas), - mas caso seus pais optassem pela
irresponsabilidade de não EDUCÁ-LO (não enviá-lo à escola para preencher seu cérebro com
conhecimentos), hoje VOCÊ seria fisicamente o mesmo, no entanto – com o cérebro vazio de
conhecimentos – VOCÊ não teria condições intelectuais de LER e muito menos entender o que
acaba de LER agora.
EXPLICAÇÃO
I - Miolos Eruditos: diferente do exemplo acima, seus pais foram responsáveis e o educaram
corretamente. O que faz de você um indivíduo ESCOLARIZADO – ou seja: apesar de ter nascido
com a cabeça vazia, hoje você possui um CÉREBRO (Linha da Memória) repleto de
conhecimentos. Observe a ilustração...
SEU CÉREBRO
contém todos os conhecimentos adquiridos no decorrer de sua Permanência no Presente
“O homem nasceu para aprender (preencher o cérebro com conhecimentos).
Aprender tanto quanto a vida lhe permita.”
Guimarães Rosa
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POSSÍVEL VOCÊ 5
VOCÊ 5 – O Herdeiro: digamos que seus pais fossem ambos ganhadores do NOBEL; mas,
apesar disso, optassem por não EDUCÁ-LO (não preencher o seu cérebro com conhecimentos).
Nesse caso, hoje VOCÊ seria um analfabeto como outro qualquer: com pouca instrução e
subempregado.
Isto acontece porque nós HERDAMOS apenas os traços físicos (genéticos) dos nossos pais:
alto, baixo, gordo, magro, careca, gadelhudo, narigudo, vesgo, cabeçudo, feioso,
malproporcionado (vou parar de me descrever), etc. Nós NÃO herdamos as LEMBRANÇAS
(conhecimentos acumulados no cérebro) dos nossos pais.
Portanto – mesmo sendo filho de pais com mentes brilhantes, - como o seu cérebro nasceu
VAZIO (sem conhecimentos), permanecerá VAZIO.
CONCLUSÃO
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CAPÍTULO
XXIV
UMA BREVE FÁBULA DO ESPAÇO-TEMPO
- a inexistente 4ª dimensão -
Ilusões da Verdade
1 - ESPAÇO-TEMPO: este conceito – formulado no início do século passado – só ganhou forma
(e credibilidade) porque na época, mais do que hoje, acreditava-se na existência do TEMPO; e,
por conseguinte, era necessário incluí-lo em algum lugar.
E assim, por pura falta de opção, resolveram associar e interligar o suposto TEMPO às 3
dimensões do ESPAÇO (altura, largura e comprimento), para formar o disparatado e
inexistente espaço-tempo – a fictícia 4ª DIMENSÃO. Leia o trecho a seguir...
SUPER INTERESSANTE
pubc. 31 mai 2007 – atul. 31 out 2016
Salvador Nogueira
“QUANTAS DIMENSÕES EXISTEM NO UNIVERSO? – A teoria de Einstein diz que são 4, mas há
cientistas que falam de 11 ou mais dimensões (Teoria M, Teoria das Cordas, Teoria da
Supergravidade, - e outras bizarrices do gênero). Afinal, quem é que está certo?
No início do século 20, a resposta era tão óbvia quanto velha (contudo correta!). Euclides, lá na
Grécia antiga, já havia sacado que são 3 as direções possíveis para qualquer movimento (em
relação a qualquer objeto): para cima ou para baixo (altura); para a esquerda ou para a direita
(largura) e para a frente ou para trás (comprimento). Portanto, o ESPAÇO possui 3 dimensões:
altura, largura e comprimento. Fácil, não?
Até que, em 1905, Einstein começou a bagunçar tudo (literalmente – lamento, mas é verdade).
Nesse ano, ele fez 3 descobertas importantes e (... uma delas envolve a equivalência entre
tempo e espaço – para formar o destrambelhado espaço-tempo – a equivocada 4ª
dimensão).”
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Amigo Imaginário
2 - Tyler Durden Isn’t Real: como veremos a seguir, essa curiosa 4ª DIMENSÃO (espaço-tempo)
é apenas um involuntário ente imaginário - uma pegadinha cerebral culposa. O problema é
que este conceito serviu para despertar uma espécie de ‘Godzilla Adormecido’: um
tresloucado Chupacabra-de-Sete-Cabeças. Pois, como vimos acima, já existem interpretações
do Universo com DEZENAS DE DIMENSÕES (!!!???), - é mole ou quer mais?!.
Presumo que o ‘raciocínio’ seja o seguinte: se o Einstein inventou a 4ª dimensão, que mal tem
em acrescentar mais um bocadinho? Mas, enfim, pergunto, por que complicar tanto se a Física
não passa da busca da simplicidade final?
*Ele se refere ao Mundo Subatômico – às partículas – mas seu conceito se aplica a toda a Física.
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conclusão
o ESPAÇO é real; o TEMPO, uma ilusão
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Site Esportelandia.Com
“Em 2009, no Campeonato Mundial de Berlim, USAIN BOLT correu os 100 metros em 9,58
segundos, naquele que é o melhor tempo da história até hoje.”
EXPLICAÇÃO
4 – USAIN BOLT: embora um fenômeno, ele apenas se desloca no ESPAÇO, não no tempo.
Caso o BOLT , numa prova de corrida, se deslocasse no tempo, certamente já teria sumido do
PRESENTE, - e estaria perdido “em algum lugar do futuro”.
Sem contar que, seus concorrentes, atônitos, ficariam extraviados “em algum lugar do
passado”. Convenhamos, isso não faz o menor sentido.
Bizarrice Temporal
Sem contar que ainda há uma outra bagaceira temporal para complicar, vejamos: caso o BOLT,
numa corrida, se deslocasse na Esteira do Tempo, e, por alguma razão, parasse na metade do
trajeto, ele ficaria estacionário no TEMPO (?!).
E se BOLT, estacionário na metade da corrida, fizesse uma volta de 180 graus e regressasse ao
ponto de partida, ele voltaria ao PASSADO (?!). É evidente que nada disso ocorre, pois...
Assim como...
Em nosso Sistema Solar, o SOL – com sua grande massa – provoca um arqueamento
(encurvamento) no colchão do ESPAÇO; atraindo, dessa forma, a Terra e os demais planetas
em direção ao seu centro.
Portanto, o nosso SOL provoca tão somente uma DOBRA ESPACIAL; não uma DOBRA
TEMPORAL. Pois, como já dissemos, o tempo não existe.
IMPACTO KT
A Era dos Dinossauros: eles reinaram e conseguiram Permaneceram no Presente por cerca de
160 milhões de anos; até que foram extintos há cerca de 65 milhões de anos (no Presente
Anterior). A extinção em massa fez desaparecer aproximadamente 90% das espécies
terrestres. Mas entre as espécies sobreviventes, estavam os pequenos mamíferos – nossos
“ancestrais”.
ESPAÇO VAZIO
- HÁ VAGAS -
Portanto, o ESPAÇO antes ocupado pelos dinossauros tornou-se vago (com a sua extinção), e
foi gradativamente preenchido pelas espécies sobreviventes. Em outras palavras...
Numa separação amistosa, o ex-casal se distanciam no ESPAÇO, não no tempo. Pois no caso de
uma reconciliação, o casal regressa no ESPAÇO. Ou seja, anula o ESPAÇO que os separavam e
se reencontram. Ou você acha que o casal, ao se reencontrar, regressam no TEMPO. Isso não
faz o menor sentido, concorda? Portanto, o correto seria afirmar:
Deus é um operário, sonhador, talvez; - mas não um mágico excêntrico. Portanto, Ele criou o
mundo com apenas 3 dimensões – e gostou do que viu, dizem.
“Viagens no Tempo. É difícil especular abertamente sobre esse tema, pois corre-se o risco de
provocar protestos contra o desperdício de dinheiro público, ou receber uma solicitação de que
a pesquisa seja secreta para fins militares. (...). Você pode estar pesando que este capítulo faz
parte de uma conspiração do governo para encobrir as Viagens no Tempo. Talvez você esteja
certo. (...). Afinal, como poderíamos nos proteger de alguém com uma Máquina do Tempo?
Essa pessoa (ou grupo terrorista, por exemplo) poderia mudar a história e dominar o mundo.
(...)”
lamento afirmar, mas esse cyberpunk atentado terrorista (“The Time Traveller”), especulado
por Hawking, jamais será posto em prática. Por um motivo elementar:
o tempo não existe – exceto na cabeça dos bípedes.
7 – A Guerra dos Mundos – H. G. Wells: em certa ocasião, HAWKING afirmou que Civilizações
Extraterrestres poderiam ser hostis. Segundo ele, nós seríamos colonizados- escravizados pelos
malvados ET’ S.
”Por isso o nosso avô sempre relembrava: Nem precisamos de inimigos. Sempre nos
bastámos a nós mesmos para nos derrotarmos”.
A CONFISSÃO DA LEOA
Mia Couto
Enfim, são argumentos absurdos; mas nós os abordaremos em outra oportunidade. Peço
desculpas novamente pelo tom hostil, mas não posso defender meu trabalho sem
questionar o trabalho alheio. Afinal, como diria Mark Twain:
“Se as pessoas não tivessem opiniões diferentes, não haveria corridas de cavalos”.
9 - CRIAÇÃO & FX: assim como o Realismo Mágico na literatura, os Efeitos Especiais
funcionam muito bem no cinema – mas apenas no cinema. Portanto, o universo é um
MILAGRE INFINITO, mas possui apenas 3 dimensões: altura, largura e comprimento.
Chroma Key
Afinal de contas, me responda caro internauta: quem você acha que criou o mundo?
Teria sido “Deus”, ou a ‘Industrial Light & Magic’, do George Lucas?
Lamento sua morte (acabei de ver no JN), e peço desculpas pelo tom propositalmente
agressivo que usei para, ao desqualificar seu trabalho, chamar a atenção para o meu. Enfim -
por falta de alternativas, ou de talento - me utilizei de artifícios de um anônimo, que mora
numa região anônima, de um país intelectualmente anônimo.
11 – Minha Teoria Está Correta: no entanto – ao contrário dos meus pares – não sou
diplomado em HARVARD e muito menos em CAMBRIDGE. Em outras palavras, não possuo
‘bons antecedentes’ (credibilidade, claro está). Portanto, divulgá-lo não será uma tarefa fácil –
e é bem provável que permaneça no anonimato. Mas devo pelo menos tentar.
OBS
a – Cacos da Realidade: ISAAC NEWTON não inventou a Gravitação Universal, ele apenas
desvendou uma fração da realidade. CHARLES DARWIN não inventou a Evolução das Espécies,
ele apenas desvendou uma fração da realidade.
EINSTEIN não inventou a equivalência entre massa e energia (E = MC 2), ele apenas desvendou
uma fração da realidade. Descobriu que ambas são duas formas da mesma coisa: massa é
energia concentrada; energia é massa dispersa , - aguardando acontecer.
b – “Lavo Minhas Mãos”: também no meu caso, apenas desvendei uma fração da realidade.
Assim sendo, quem teve a monumental tarefa de criar o UNIVERSO ESTÁTICO (Estacionário no
Presente) só pode ter sido “DEUS”. Eu apenas desvendei esse pequeno detalhe; – fiquei com a
tarefa mais fácil, acreditem.
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Neste último capítulo, veremos que tudo que já existiu se TRANSFORMOU em tudo que agora
existe; nenhum um único átomo foi desperdiçado; tudo é reciclado; todos nós somos feitos
com material retornável. Pois...
“(...) Durante anos, ele e madame Lavoisier ocuparam-se de estudos rigorosos. Eles
descobriram, por exemplo, que um objeto que enferruja não perde peso, como se acreditava;
pelo contrário, ganha peso – uma descoberta extraordinária. De algum modo, ao se oxidar, o
objeto atraía partículas básicas do ar. Foi a primeira percepção de que a matéria pode ser
TRANSFORMADA, mas não eliminada (e muito menos diluída pelo envelhecimento). Se você
queimasse este LIVRO agora, sua matéria se transformaria em cinza e fumaça, no entanto a
quantidade líquida de matéria no Universo continuaria a mesma (a cinza e a fumaça se
Conservaria no Presente – para serem transformadas em outras formas). Um conceito
revolucionário. Isto se tornou conhecido como a lei da Conservação da Massa (ou lei da
Conservação no Presente). Infelizmente, coincidiu com outro tipo de revolução – a Revolução
Francesa -, e nela Lavoisier estava do lado totalmente errado.(...)”
A – FAHRENHEIT 451: o LIVRO, ao queima-se, deixou de existir, evidentemente; mas toda a
matéria resultante da queima (cinza e fumaça) se Conservou no Presente.
Este entendimento deve ser estendido a todo o Universo. Em outras palavras, tudo no mundo
se transforma (vive, morre e se desintegra), mas os despojos se CONSERVAM no PRESENTE –
para serem reaproveitado na formação de outras formas. Veja outro trecho do mesmo livro...
NATUREZA
“Por serem tão longevos, os ÁTOMOS realmente circulam. Cada átomo do seu CORPO já deve
ter passado por várias estrelas e feito parte de milhões de organismos no caminho
(transformações) até VOCÊ.
Cada um de NÓS é tão numeroso atomicamente e na morte é tão vigorosamente reciclado que
é provável que um número significativo dos SEUS átomos – até 1 bilhão, estimou-se – tenha
pertencido a Shakespeare. Outro bilhão veio de Buda e Genghis Khan e Beethoven e qualquer
outra figura histórica que lhe venha à cabeça. (...).
“Disse vó Janaína, - Vê Dora, uma fulozinha, assim que nem você. Dentro dela tem tudo o que é
a vida. Vê como as pétalas estão, em círculo. A vida é círculo, Fia. Cada coisa nesse mundo
nasce para morrer, e morre para nascer. Gente volta a ser terra, a ser chuva, a ser mar. Gente
volta a fazer parte do espírito alumioso de Deus; Gente volta a ser força da natureza; Gente
volta a integrar-se ao espírito alumioso do que transita.”
GAMELEIRA-BRANCA
Sofia Aroeira
ASHES to ASHES
David Bowie
De acordo com citação acima, podemos concluir que...
I – Caso nosso Universo chegue ao fim (com o Big Crunch?), tudo se transformaria em PÓ
(cinza e fumaça), mas toda essa matéria resultante se Conservaria no Presente – para se
transformar (sabe-se lá Deus!) em um outro Universo (?);
II – Caso a Terra (nosso Sistema Solar) chegue ao fim, tudo se transformaria em PÓ (cinza e
fumaça), mas toda essa matéria resultante se Conservaria no Presente – para se transformar
em outros planetas, outras estrelas, outras galáxias;
III – Ao morrermos, nosso corpo se transformará em PÓ (cinza e fumaça), mas toda essa
matéria resultante se Conservará no Presente – para, ao se transformar, fazer parte de uma
folha, outro ser humano ou uma gota de orvalho.
C – O ESCTRANHO CASO DO CACHORRO – Mark Haddon: no trecho desse livro a seguir, nosso
protagonista mirim, Christopher Boone, explica (sem perceber) que tudo se TRANSFORMA
(morre e se desintegra), mas toda essa matéria resultante se Conserva no Presente para
serem reutilizados na FORMAÇÃO de outas formas...
“O que ocorre na realidade quando você morre é que seu cérebro para de trabalhar e seu
corpo apodrece, como aconteceu com o coelho, quando ele morreu, e nós o enterramos na
terra, nos fundos do jardim. E todas as suas moléculas foram partidas em outras moléculas que
se misturaram à terra, que são comidas por vermes e vão para as plantas, e se a gente cava no
mesmo lugar, dez anos (de Permanência no Presente) depois, não vai encontrar nada, exceto o
esqueleto. E mil anos (de Permanência no Presente) depois, o esqueleto também desaparece.
Mas, tudo bem, sendo assim, porque agora ele (o ex- coelho) é parte das flores, da macieira e
dos arbustos. (...).
Mas a mãe foi cremada. (...). Isso significa que ela foi colocada num caixão e queimada e virou
pó, e depois cinza e fumaça (que se Conservou no Presente). Eu não sei o que aconteceu com a
cinza e não pude perguntar no necrotério porque não fui ao funeral. Mas a fumaça sai pela
chaminé, entra no ar e tem vezes que eu procuro no céu e fico achando que há moléculas da
mãe lá em cima, ou nas nuvens sobre a África ou sobre a Antártica, ou caindo como chuva nas
florestas tropicais do Brasil, ou como neve em algum lugar. (...).”
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-- LAVOISIER --
2 - Do que VOCÊ é feito ?: também podemos concluir que os ÁTOMOS (cinza e fumaça –
massa e energia) de tudo que já existiu, se CONSERVOU NO PRESENTE e foi reutilizado para
construir tudo que agora existe.
Portanto, no seu CORPO (sim, estou falando de você), no seu CORPO há bilhões de ÁTOMOS
que pertenceram a todos os organismos que já existiram: Shakespeare, Buda, Beethoven, John
Lennon, Elvis Presley* - e tudo mais.
*CORREÇÂO: nenhum átomo do seu corpo pertenceu ao Rei do Rock. Porque, como todos
sabem, e o Myth Busters comprovou: “ELVIS NÃO MORREU!”
3 - O que será feito de VOCÊ ? : por uma questão de justiça e agradecimento, ao morrer, os
seus ÁTOMOS (cinza e fumaça) se Conservarão no Presente e serão reaproveitados para
compor novas aplicações: como parte de uma folha, outro ser humano ou uma gota de
orvalho.
“E o anjo, se anjo era, disse: do Barro ao Barro, o Pó ao Pó, a Terra à Terra. Nada começa
que não tenha que acabar, tudo o que começa nasce do que acabou”.
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MÃOS À MASSA
ETNIA apresenta...
MARACATU ATÔMICO
“Somos todos juntos uma miscigenação (atômica);
E não podemos fugir da nossa etnia;
Índios, brancos, negros, mestiços;
Nada de errado em seus princípios;
O seu e o meu são iguais; Corre nas veias sem parar (...).”
DOUTRINA HUMANITAS
Quincas Borba
(Vida e Morte – Duas Expansões)
“(...) O encontro de duas expansões (vida e morte), ou a expansão de duas formas, pode
determinar a supressão de uma delas; mas, rigorosamente, não há morte, há vida, porque a
supressão de uma é a condição da sobrevivência da outra, e a destruição não atinge o princípio
universal e comum. (...). Nunca viste ferver a água? Hás de lembrar-te que as bolhas fazem-se
e desfazem-se de contínuo, e tudo fica na mesma água. Os indivíduos são essas bolhas
transitórias. (...). É a vida emendando a morte; a morte emendando a vida.”
ATÉ AQUI CHEGUEI! Por enquanto, é só. Espero, estando você aqui, não ser esta uma jornada
solitária. Obrigado pela atenção.
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