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v
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais Joaquim e Marly pela vida, pelo exemplo e pela presença amorosa todos os
dias. Aos meus irmãos Gustavo e Renato pelo amor e confiança.
À Cynthia Borgani por me apresentar novas abordagens para o estudo do canto popular e
pelo incentivo aos primeiros rascunhos deste projeto.
À minha orientadora Mirna Rubim, por acreditar neste trabalho, pelo apoio durante o
processo e por me ensinar, na prática, como chegar mais perto de uma emissão vocal livre.
Ao Departamento de Música da UNIRIO, por aceitar o meu projeto de pesquisa e por todo o
auxílio prestado durante a realização deste mestrado.
Aos professores Lúcia Barrenechea e Silvio Merhy pelas observações valiosas em meu
exame de qualificação.
À Luciana Oliveira, minha fonoaudióloga, pelo cuidado eficaz que teve com a minha voz.
Ao violonista e compositor Marco Pereira pela partitura de Sambadalu e pelas dicas valiosas
durante curso de Harmonia na UFRJ, o qual assisti como aluna ouvinte em 2009.
Aos queridos músicos: Fernando Corrêa, por me acompanhar no exame de seleção em 2007;
Thiago Trajano, Glauber Seixas, Marcus Thadeu e Gabriel Menezes por me acompanharem
nos concertos de 2008; e Vitor Gonçalves por me acompanhar nos registros de 2009.
À Escola Portátil de Música, em nome das professoras de canto Amélia Rabello e Anna Paes,
por permitirem o estágio de observação durante suas aulas nos anos 2008 e 2009; e por me
apresentarem a obra inédita Costura de Choro.
Aos meus familiares representados por tia Maria Ângela, primas Mariana e Fátima; e aos
amigos queridos representados por Ana Paula, Paulets e Janá, muito obrigada pelas orações,
pelos esforços de ordem prática, e pela presença amiga durante esta trajetória.
vi
REZENDE-FERRAZ, Daniela Silva de. A VOZ E O CHORO: Aspectos técnicos vocais e o
repertório de choro cantado como ferramenta de estudo no canto popular. 2010. Dissertação
(Mestrado em Música) – Programa de Pós- Graduação em Música, Centro de Letras e Artes,
Universidade Federal do Estado Rio de Janeiro.
RESUMO
Palavras-chave: canto popular; técnica vocal; pedagogia vocal; choro cantado; repertório de
choro.
vii
REZENDE-FERRAZ, Daniela Silva de. THE VOICE AND THE CHORO – Vocal technique
aspects and the sung choro repertoire as a tool to study vocal Brazilian jazz. 2010. Master
Thesis (Mestrado em Musica) - Programa de Pós- Graduação em Música, Centro de Letras e
Artes, Universidade Federal do Estado Rio de Janeiro.
ABSTRACT
The objective of this dissertation is to present results of the technical study of 8 choros that
were analyzed through vocal technique aspects based on specific literature and found relevant
evidences to the teaching-learning processes of Brazilian jazz vocal studies in an academic
context of music teaching. Based on theoretical work of the vocal pedagogue Richard Miller
we proceeded with three steps. The first step is described in Chapter 1 and corresponds to the
literature review from where we selected the vocal aspects considered relevant to the study of
choros based on concepts of Miller (1996) and other authors mentioned in our theoretical
framework. The second stage corresponds to the teaching assistantship experience held at the
Federal University of Rio de Janeiro State (UNIRIO) with 20 undergraduate music students
enrolled in the class Complementary Singing. The theoretical concepts were applied from the
literature and the results are explained in Chapters 1 and 2. In Chapter 3 findings from the
literature, along with the teaching assistantship experience formed the basis of my own study
of the 8 choros vocal repertoire. Supplements I, II, III and IV are presented respectively:
audio CD with records of three different stages of the study of the song Choro pro Zé; audio
CD with studio recordings of vocal performances of 3 of the 8 choros here selected; copy of
an article on teaching assistantship experience published in the journal Fio da Ação –
Monographic Series of UNIRIO, scores of the 8 choros selected and updated tables of the
International Phonetic Alphabet.
Keywords: 1. popular singing; 2. vocal technique; 3. vocal pedagogy; 4. sung choro; 5. choro
repertoire.
viii
SUMÁRIO
LISTA DE EXEMPLOS.........................................................................................................xi
LISTA DE FIGURAS............................................................................................................xiii
LISTADE QUADROS...........................................................................................................xiv
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................1
Formulação do problema.......................................................................................................1
Objetivo, delimitação e relevância.........................................................................................2
Referencial teórico..................................................................................................................8
Metodologia..........................................................................................................................10
Organização da dissertação.................................................................................................12
CAPÍTULO 1 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E APLICAÇÃO PRÁTICA.........15
1.1 ATAQUE E FINALIZAÇÃO DO SOM................................................................17
1.1.1 Questões estéticas do ataque e finalização....................................................20
1.1.2 Fisiologia do ataque e finalização..................................................................22
1.1.3 Estudo sistematizado para ataque e finalização...........................................23
1.2 CONTROLE RESPIRATÓRIO E APOIO...........................................................25
1.2.1 Fisiologia da respiração, fonação e apoio......................................................25
1.2.2 Polêmicas sobre respiração e apoio................................................................31
1.2.3 Estudo sistematizado para respiração e apoio .............................................33
1.3 RESSONÂNCIA VOCAL.......................................................................................38
1.3.1 Ressonadores....................................................................................................40
1.3.2 Timbre e ressonância.......................................................................................41
1.3.3 Abertura da cavidade oral durante o canto..................................................45
1.3.4 Impostação vocal.............................................................................................48
1.3.5 Estudo sistematizado de ressonância vocal...................................................49
1.4 ESTUDO DAS VOGAIS E CONSOANTES.........................................................51
1.4.1 Alfabeto Fonético Internacional (AFI) .........................................................51
1.4.2 Formação das vogais.......................................................................................52
1.4.3 Estudo sistematizado para emissão equilibrada das vogais........................56
1.4.4 Consoantes nasais e não-nasais......................................................................58
1.4.5 Função das consoantes nasais e não-nasais...................................................60
1.4.6 Estudo sistematizado a partir das consoantes...............................................67
1.5 AGILIDADE E SUSTENTAÇÃO NO CANTO....................................................71
1.5.1 Agilidade ou sustentação? ..............................................................................71
1.5.2 Agilidade e sustentação...................................................................................76
1.5.3 Estudo sistematizado de agilidade e sustentação..........................................77
1.6 UNIFICAÇÃO DOS REGISTROS........................................................................82
1.6.1 Estudo sistematizado para unificação de registros.......................................85
CAPÍTULO 2 - METODOLOGIA E FERRAMENTAS INTERPRETATIVAS........90
2.1 METODOLOGIA....................................................................................................90
2.1.1 Estágio docente e outras vivências.................................................................90
2.1.2 Critérios para escolha do repertório.............................................................95
2.1.3 Instrumentos de coleta de dados....................................................................97
2.2 FERRAMENTAS INTERPRETATIVAS.............................................................98
2.2.1 O uso do microfone e outras tecnologias.......................................................98
2.2.2 Controle de dinâmica vocal..........................................................................100
2.2.3 Vibrato no canto popular.............................................................................101
2.2.4 Canto saudável..............................................................................................105
ix
2.2.5 Técnica x arte................................................................................................106
CAPÍTULO 3 - ESTUDO PRÁTICO DO CHORO CANTADO...............................110
3.1 PROCEDIMENTOS PARA EDIÇÃO DAS PARTITURAS...........................112
3.1.1 Tico-tico no fubá............................................................................................112
3.1.2 Apanhei-te Cavaquinho.................................................................................116
3.1.3 Um a Zero.......................................................................................................118
3.1.4 Ingênuo...........................................................................................................120
3.1.5 Rosa.................................................................................................................122
3.1.6 Costura de choro.............................................................................................123
3.2 LEVANTAMENTO DAS DIFICULDADES TÉCNICAS NOS CHOROS...123
3.2.1 Primeira análise.............................................................................................124
3.2.2 Segunda análise..............................................................................................125
3.3 ESTUDO DETALHADO DE TRÊS CHOROS................................................133
3.3.1 Apanhei-te cavaquinho..................................................................................136
3.3.2 Choro pro Zé..................................................................................................139
3.2.3 Sambadalú......................................................................................................142
CONCLUSÃO................................................................................................................146
REFERÊNCIAS............................................................................................................150
Material da Internet...............................................................................................153
Discos.......................................................................................................................153
ANEXOS.........................................................................................................................155
I - CD de áudio com 3 exemplos diferentes do estudo de Choro Pro Zé...................155
II - CD de áudio com gravação resultante de 3 choros estudados pela autora.........155
III - Artigo publicado na Revista Fio da Ação sobre experiência de estágio docente
e Bolsa-REUNI........................................................................................................156
IV - Partituras dos 8 choros estudados e Tabelas atualizadas do AFI.......................170
x
LISTA DE EXEMPLOS
xi
EXEMPLO 1.24 – Exercício 10.29 traduzido de Miller (1996, p. 146) e
exercício 6 de Rubim (2007)..................................................................................................87
EXEMPLO 1.25 – Vocal fry proposto por (Boone & Mcfarlane, 1988
apud Behlau, 2008, vol II, p.463)...........................................................................................88
EXEMPLO 2.1 – Exercício 14.2 traduzido de Miller (1996, p. 191).................................105
EXEMPLO 3.1 – Edições feitas nas partituras de Ingênuo e versão resultante..................122
EXEMPLO 3.2 – Vocalizes de aquecimento em aula com Rubim em (30/03/2009).........135
EXEMPLO 3.3 – Adaptação do exercício 4 de Rubim
(Ver ex. 1.17, p. 69)
para treinamento da dificuldade técnica no compasso 27 em Choro pro Zé........................140
EXEMPLO 3.4 – Mudança de acentuação sugerida por Rubim como possibilidade de
solução para a dificuldade técnica identificada no compasso 27 de Choro pro Zé..............141
EXEMPLO 3.5 – Exercício 13.3 traduzido de Miller (1996, p. 176) e
trecho com nota longa em Sambadalu..................................................................................144
xii
LISTA DE FIGURAS
xiii
LISTA DE QUADROS
xiv
INTRODUÇÃO
Formulação do problema
primeiro curso de música popular com a opção de instrumento voz surgiu na UNICAMP em
1989. Como aluna da 9a turma deste curso tive a oportunidade de participar de um ambiente
popular, devido à escassez de graduação nesta área no Brasil, fez com que eu buscasse outras
tais como o jazz, encontrei novas ferramentas para realizar um estudo mais aprofundado sobre
No início do levantamento bibliográfico para esta pesquisa, foi possível perceber que a
pedagogia vocal no Brasil, até mesmo a orientada para o canto erudito, ainda sofre com a
escassez de publicações em português, razão que nos levou a adotar como referencial teórico
principal os trabalhos publicados pelo conceituado pedagogo vocal professor Richard Miller
(1996). Tendo como base o seu livro The Structure of Singing1 selecionamos oito aspectos
vocais mais relevantes para este estudo e as soluções técnicas propostas por Miller a fim de
validar o uso do repertório de choro cantado como uma ferramenta auxiliar e eficaz no estudo
técnico vocal. Os demais autores consultados em nossa pesquisa são incluídos no item
1
A Estrutura do Canto – tradução nossa.
1
O interesse em selecionar choros2 como material de estudo para esta pesquisa se deu
após o contato que tivemos com alguns fonogramas realizados por Ademilde Fonseca, cantora
brasileira do Rio Grande do Norte, que com suas interpretações consagrou-se como a “Rainha
A primeira hipótese que lançamos é que para se cantar choros é preciso um grande
cantado é uma opção para aquisição de domínio técnico vocal aplicado ao repertório de
choros nos quais foram analisados aspectos vocais com base na literatura e constatados
pedagogo vocal Richard Miller procedeu-se a três etapas: (1) na revisão bibliográfica
selecionou-se os parâmetros vocais considerados relevantes para o estudo do choro com base
nos conceitos de Miller (1996) e de outros autores como Behlau (2008), Pinho e Pontes
(2008); (2) os conceitos teóricos obtidos na literatura foram explorados durante estágio
2
O termo choro será definido no item Delimitação a seguir
2
somados à experiência de estágio docente constituíram a base do meu próprio estudo vocal do
repertório de 8 choros.
apresentar, pontualmente, a aplicação didática dos aspectos técnicos vocais estudados, a fim
Quando optamos por realizar um estudo técnico vocal orientado para o canto popular,
deparamo-nos com uma questão inicial que era apresentar uma definição clara do que
voz na canção popular brasileira: um estudo sobre a Vanguarda Paulista foi uma excelente
referência para apontar a discussão de canto popular que atendia às nossas expectativas. Sua
diferentes momentos estéticos do canto popular no Brasil bem como relata uma série de
pontuadas por Machado (2007), mas outras mudanças estilísticas ocorreram até os dias atuais.
Hoje, o universo da canção popular brasileira engloba uma grande variedade de timbres,
menciona a existência de uma tradição que define elementos fundamentais do canto popular
3
como o uso acentuado de parâmetros da fala gerando uma emissão vocal mais coloquial e
quase sem vibrato (p. 21). É através desse olhar histórico para a tradição que iniciamos nossa
pesquisa.
partida, não é pretensão deste trabalho, de forma alguma, atrelar o processo de ensino-
aprendizagem discutido aqui a uma única corrente estética do canto popular brasileiro.
canção popular brasileira, a primeira preocupação desta pesquisa é apontar caminhos que
sua voz em qualquer corrente estética musical em que ele pretenda atuar.
voz do cantor sob dois enfoques principais: (1) o da fisiologia vocal, apoiado no referencial
teórico já citado, e (2) a partir deste primeiro, tomou-se a voz como um instrumento possuidor
de sonoridades múltiplas que foram exploradas através da análise crítica dos conceitos
fisiológicos aplicados à prática. Desta maneira, durante o trabalho não serão adotados termos
como certo e errado mas sim termos como adequado e inadequado quando se tratar das
faz-se necessário justificar o choro e sua coerência com o recorte adotado. O leitor pode, por
instrumental e que possui sua origem do final do século XIX, pode ser uma ferramenta de
estudo vocal que auxilie o desenvolvimento técnico do cantor que pretende fazer um uso livre
4
Em 1936, o primeiro livro de registro da história do choro, escrito por Alexandre
primórdios e aquele feito em sua época: “apesar de os choros de hoje não serem como os de
(Pinto, 1978, p.11). Na referida obra também é possível encontrar vários significados
diferentes para a palavra choro num mesmo período histórico, o que dificulta definir
Marília T. Barboza da Silva (1986) em seu artigo “Pelos Caminhos do Choro”, dentre
várias fontes, analisa também o livro de Pinto em busca de significados para o termo. Neste
pequeno trecho selecionado de seu artigo, Silva apresenta três possibilidades diferentes para a
1) A acepção de conjunto está bem documentada por Alexandre: “Indo daqui da Capital, o
competente choro, que eram: Henriquinho de flautim; Lica de bombardão; Galdino de
Cavaquinho; Luiz Brandão, Neco, Alfredo de cavaquinho; Felisberto da flauta”, etc. 2) Está
documentado, também, o fato de que a palavra não designava um gênero musical definido:
“tocava os choros fáceis como fosse: polka, valsa, quadrilha, chotes, mazurka, etc”. 3) Há
ainda no livro de Alexandre o emprego da palavra “choro” no sentido de baile popular, festa
familiar com música. “Nos choros da Cidade Nova, sempre apareciam os poetas, que
variavam as festas com os recitativos” (Silva, 1986, p.22).
Ary Vasconcelos (1999), jornalista, crítico e musicólogo relata ainda uma quarta
definição para o termo choro, que segundo ele, ocorre durante seu desenvolvimento histórico:
Nascido por volta de 1870, ainda como um jeito brasileiro dos conjuntos à base de violões e
cavaquinhos tocarem os gêneros dançantes europeus em voga na época (valsas, polcas,
schottisch e mazurcas), o choro acabaria por se impor como um fascinante gênero
musical...(Vasconcelos, 1988 apud Sève, 1999, p.6).
Henrique Cazes (1998), em acordo com Vasconcelos, diz: “Choro foi primeiro uma
maneira de tocar. Na década de 1910, pelas mãos geniais de Pixinguinha, passou a significar
choro apontada por ela, como a mais adequada ao desenvolvimento dessa pesquisa:
3
O livro O Choro de Alexandre Gonçalves Pinto foi escrito em 1936, mas a edição que tivemos acesso foi
publicada em 1978. Isso explica a contradições de datas citadas no texto e nas referências.
5
Também está vivo ainda o emprego da palavra choro para designar, não um gênero musical
definido, mas um repertório de “músicas de choro” que inclui vários ritmos. Quem vai hoje a
um recital de choro ouvirá uma polca de Calado, uma valsa de Nazareth, uma chótis de
Anacleto ou até mesmo um... choro de Pixinguinha. (Silva, 1986, p.23).
Como não é pretensão deste trabalho aprofundar a discussão sobre o que é realmente o
choro, essa polêmica fica destinada aos musicólogos e para este trabalho será adotada a
definição de choro proposta por Silva como sendo um repertório consagrado, o que neste caso
inclui vários gêneros musicais tradicionalmente executados nas “rodas de choro”4 até os dias
de hoje.
Embora essa definição de choro adotada amplie o leque de possibilidades quanto aos
gêneros da música brasileira que, eventualmente, serão abordados neste trabalho, ela não
responde à ocorrência de outras questões possíveis como, por exemplo, o fato do choro ser
prática vocal. Entretanto, mesmo se o choro fosse considerado somente como música
instrumental, ele, ainda assim, seria um material de pesquisa relevante, posto que neste
Gonçalves Pinto (1978), nota-se que a voz sempre esteve presente no ambiente onde se
faziam os choros5 como confirma o trecho a seguir: “Aqui neste livro vou tentar descrever
uma modinha, que além de muitas outras, era bastante apreciada nos salões daquele tempo,
onde houvesse um chôro (sic)”. (Pinto, 1978, p.106). A ocorrência da música cantada,
Nos choros da Cidade Nova, sempre apareciam os poetas, que variavam as festas com os
recitativos (...) Isso era uma brecha, para os cantadores de modinhas, que manhosamente,
4
Encontros de músicos amadores e profissionais que, com instrumentos acústicos, passeiam por vasto repertório
de polcas, valsas, maxixes, sambas etc.
5
Tenha aqui como definição de choro: baile popular, festa familiar com música.
6
recolhidos á (sic) sua modéstia, instigavam os amigos para que “insistissem” que cantassem
(Pinto, 1978, p.118).
de pelo menos 285 chorões6 atuantes, compreendidos entre o período de 1870 a 1935, é
Um outro fato que reforça a presença da voz no choro é que, no decorrer da história,
muitos choros passaram a possuir letras originais ou póstumas. E embora as letras para
famosos choros instrumentais tenham gerado polêmica entre músicos e musicólogos, elas
possibilitaram a carreira de alguns intérpretes que optaram por cantar este repertório, como foi
o caso de Ademilde Fonseca, Orlando Silva, Aracy de Almeida, Carmem Miranda, dentre
outros.
O fato da voz estar presente na história do choro é muito interessante para este
trabalho porque, sendo o choro um dos movimentos mais antigos da música popular
nacionais como as modinhas e os lundus. Junto ao fato do choro carregar consigo a herança
histórica das origens de nossa música, soma-se o caráter instrumental e virtuosístico que ele
possui e isso resulta na combinação perfeita de uma ferramenta rica em recursos para auxiliar
Antes de Ademilde, cantoras como Camem Miranda e Aracy de Almeida já tinham cantado
Choro e samba-choro. A meu ver, o que deu a Ademilde o título de “Rainha do Chorinho” foi
o fato de ter se projetado a partir de gravações com letra de sucessos chorísticos instrumentais.
Isso, fora o domínio técnico para cantar em alta velocidade. (Cazes, 1998, p.184, grifo
nosso).
Não fez parte deste estudo a investigação de como Ademilde Fonseca solucionou as
dificuldades técnicas encontradas nas melodias dos choros que interpretou. O foco principal
deste trabalho foi buscar um caminho de estudo com base no conhecimento aprofundado da
6
Chorões: “músico de ‘choro’, aquele que vivia para compor, tocar e cantar” (Neves, 1977, p.18).
7
pedagogia vocal proposta por Richard Miller (1996). A partir do referencial teórico foi
levantada a sua aplicabilidade aos diferentes desafios trazidos pelo repertório de choro.
Referencial teórico
Adriana Piccolo (2006) que realiza em seu trabalho uma análise acústica e interpretativa do
canto popular brasileiro. Além das pesquisas citadas por Piccolo, foram acrescentadas às
referências trabalhos que apontaram lacunas para grande parte dessa pesquisa: (1) a
estudo analítico das vozes na Vanguarda Paulista dos anos 1980; (2) a dissertação de
mestrado da pesquisadora Maria Consiglia Latorre (2002) que, ao traçar um histórico da voz
na canção brasileira, formata uma proposta de ensino do canto popular a partir da escuta de
Guilherme Hollanda Azevedo (2008), que consiste em um trabalho híbrido na medida em que
realiza um estudo comparativo entre objetivos estéticos da voz no universo do canto erudito e
popular.
na revisão da literatura realizada por Piccolo, merece destaque uma vez que se apresenta
da fisiologia vocal e por esta razão, apesar de ser direcionada ao desenvolvimento do cantor
7
Pedagogia vocal desenvolvida por Valborg Werbeck-Svärdström que entende o estudo do canto como
libertação e não formação da voz, e associa o processo ao desenvolvimento espiritual, encontrando elementos
comuns na Ciência Espiritual Antroposófica (Rudolf Steiner). “O Canto Weberck não se preocupa apenas com o
resultado final artístico, mas sobretudo com o processo pelo qual se chega a esse resultado, abrindo assim um
espectro de possibilidades na esfera pedagógica, terapêutica e artística. Ele não submete o cantor a um modelo
externo mas faz com que descubra suas possibilidades fisiológicas, sensíveis, mentais e espirituais, levantando
os véus que podem encobrir a voz de cada um.”(idem)
8
erudito, atende essa pesquisa como uma referência essencial de uma proposta de abordagem
análise dessas entrevistas identificou conceitos vocais que foram agrupados em categorias que
estudo de técnica vocal são semelhantes para cantores populares e eruditos. Entretanto, no
momento em que a técnica é aplicada ao repertório, a utilização dos recursos vocais deve
variar de acordo com o caráter estético da peça e a intenção dos intérpretes. Por causa da
carreira.
Oberlin nos Estados Unidos; concomitantemente, por 28 anos ensinou canto na Academia
sobre a voz cantada; e apresentou palestras e deu aulas na Austrália, Canadá, Inglaterra,
França, Alemanha, Nova Zelândia, Noruega, Portugal, Suécia, Suíça, e em 38 estados dos
Estados Unidos.
A proposta de estudo técnico vocal apresentada por Miller, por ser baseada em
diminui as inconsistências encontradas nos discursos divergentes até o momento e além disso,
9
brasileiro na medida em que para Miller “o objetivo da técnica vocal é estabilizar e coordenar
são: (1) Mara Behlau (2008), fonoaudióloga brasileira pioneira em estudos da voz, diretora do
Centro de Estudos da Voz de São Paulo (CEV) com extenso currículo reconhecido e o maior
número de publicações de estudos em sua área; (2) Pinho e Pontes (2008) respectivamente
titular da UNIFESP; (3) Jeannette LoVetri (2009), professora de canto norte americana,
Metodologia
(enfoque bibliográfico) à duas atividades práticas distintas. Dentro dessa linha de raciocínio, a
docente durante 2 semestres nos anos 2008 e 2009 e (3) meu estudo individual como
intérprete de choros.
Miller e aos exercícios vocais realizados em minhas aulas individuais de canto com Rubim. O
8
Technique represents the stabilization of desirable coordination during singing.
9
Contemporary Commercial Music (CCM) - termo criado por LoVetri para denominar cantores de todos os
estilos não clássicos como rock, pop, jazz.
10
Revista do Canto - publicada em Nova York pela Associação Nacional dos Professores de Canto dos Estados
Unidos. (NATS – National Association of Teachers of Singing)
10
conjunto desses saberes foram as bases da minha prática individual, enquanto intérprete-
pesquisa.
didáticos aplicados à seleção de 8 choros de caráter variado sendo eles: 1) Tico-tico no fubá
Maurício Carrilho e letra de Paulo César Pinheiro; 7) Choro pro Zé de Guinga e letra de Aldir
Os critérios de seleção dos choros foram baseados nos seguintes fatos: (1) o três
primeiros, Tico-tico no fubá, Apanhei-te cavaquinho e Um a Zero, são de choros rápidos que
agilidade no canto, articulação e emissão equilibrada das vogais; (2) os quatro subsequêntes,
Rosa, Ingênuo, Costura de choro e Choro pro Zé, são choros de andamento mais lento que
melodias com notas longas de forma que pude reunir em uma única peça todos os aspectos
composto por Marco Pereira para a cantora brasileira Luciana Souza, radicada nos Estados
Unidos. Sambadalu, embora tenha sido composto para voz, não possui letra e o enfoque vocal
11
da peça é completamente instrumental. O alto grau de dificuldade técnica identificado neste
samba-choro11 junto ao fato dele ter sido composto especialmente para a execução vocal
justifica sua presença no repertório de uma pesquisa direcionada a estudar e observar a voz
como um instrumento.
O estudo sistemático de alguns dos choros selecionados para esta pesquisa teve início
Com início em agosto de 2007, fui orientada por Mirna Rubim em aulas particulares de canto
semanais durante o período de 28 meses. Todas as aulas foram gravadas em áudio ou vídeo e
estudo com o repertório de choro. A exemplo desta experiência e com o intuito de registrar as
Os aspectos vocais elencados nas questões de estudo desta pesquisa devem ser
realizar a análise interpretativa dos choros selecionados para a esta pesquisa, conforme os
que facilitam ou exigem mais o estudo de uns aspectos vocais do que outros.
Organização da dissertação
aspectos técnicos vocais (ver p. 16) considerados mais relevantes para o estudo dos choros,
11
“...samba-choro que, como o próprio nome já sugere, é o resultado da fusão dos aspectos rítmicos do samba
com a linguagem do choro tradicional”. (PEREIRA, 2007, p.41)
12
procedeu-se a uma discussão dos exercícios propostos por Miller e sua aplicabilidade prática
aspectos interpretativos considerados relevantes durante este estudo sendo eles: o uso de
microfone, o uso do vibrato, o controle de dinâmica e cuidados com a saúde vocal. Ainda no
docente, cujos detalhes são encontrados no Anexo III, que traz a cópia do artigo produzido
sobre essa vivência e que foi publicado recentemente na edição especial de lançamento da
revista Fio da Ação – Série Monográfica da UNIRIO com o título: Experiência Inovadora no
Ensino do Canto.
partes: (1) apresentação do procedimento utilizado para a edição das partituras dos choros que
não possuíam letra inicialmente; (2) análise interpretativa dos choros na partitura; e (3) o
estudo detalhado de três choros: Apanhei-te cavaquinho como exemplo dos choros de
agilidade, Choro pro Zé como exemplo dos choros de andamento lento, e Sambadalu
trechos de sustentação.
Como mostra final dos resultados obtidos neste estudo de Práticas Interpretativas,
encontra-se em anexo dois CDs de áudio: (I) contém exemplos de três momentos diferentes
do meu estudo individual de Choro pro Zé, e (II) contém gravação da minha interpretação de
3 dos 8 choros estudados ao longo da pesquisa. A gravação do Anexo II foi feita em estúdio
concretos para a análise crítica quanto a eficácia do estudo realizado no período de dois anos.
13
Fecham este trabalho as CONSIDERAÇÕES FINAIS, as REFERÊNCIAS, e os
14
CAPÍTULO 1
Uma vez que o ensino do canto popular nas universidades brasileiras é bastante
dos trabalhos acadêmicos disponíveis, assuntos como fisiologia vocal e exercícios técnicos
e imitação de referenciais históricos do canto popular brasileiro, e a partir da análise das letras
das canções estudadas, são feitas algumas indicações de exercícios para o treino da respiração
(2006) as orientações para a prática vocal limitam-se a sugestões de estudo através da escuta e
intérpretes consagrados da Música Popular Brasileira (MPB) e a partir dessa análise catalogou
um grupo de características observadas nas emissões vocais de suas performances que ela
Vanguarda Paulista do início dos anos 1980, apresenta transformações técnicas e estéticas
12
Ver nota de rodapé no7, p.10 desta dissertação.
15
professora e aluna de canto e em informações sobre o funcionamento fisiológico da voz
No desenvolvimento deste primeiro capítulo são discutidos oito aspectos vocais que
foram mencionados na introdução (ver p. 12): (1) ataque e finalização, (2) controle
respiratório e apoio, (3) ressonância vocal, (4) emissão das vogais, (5) usos das consoantes
nasais e não-nasais, (6) agilidade vocal, (7) sustentação do som e (8) unificação dos registros.
A partir de Miller (1996); Behlau (2008); e de trabalhos de outros autores citados em nosso
Os itens 1.1, 1.2 e 1.3 correspondem respectivamente a (1) ataque e finalização; (2)
controle respiratório e apoio; e (3) ressonância vocal. No item 1.4 foram compilados os
aspectos (4) emissão das vogais e (5) usos das consoantes nasais e não-nasais uma vez que
razão da complementaridade verificada entre eles, compilamos dois aspectos que também
correspondem a capítulos independentes no livro de Miller, são eles (6) agilidade vocal e (7)
sustentação do som. Por fim, o item 1.6 corresponde ao último aspecto selecionado - (8)
unificação dos registros - que em Miller está divido em dois capítulos, um para a unificação
de registro das vozes masculinas e outro para a unificação de registros das vozes femininas.
profundidade com que ele abordou a fisiologia vocal e o funcionamento do aparelho fonador,
fez de seu trabalho uma referência fundamental para qualquer estudo sério sobre a voz que
13
AFI corresponde ao IPA, ou seja, International Phonetic Alphabet.
16
Com base na experiência de estágio docente realizado durante 2 semestres na UNIRIO
aluna de canto, para cada aspecto selecionado foi incluída uma discussão, correlacionando
release encontrados na literatura norte-americana sobre técnica vocal para descrever o início e
a finalização de um determinado som cantado. Embora existam outras traduções para os três
tipos possíveis de onset e release apresentados por Miller (1996), optou-se neste trabalho
(2008): hard attack = ataque brusco; soft onset = ataque soproso; balanced onset = ataque
isocrônico; hard release = finalização brusca; soft release = finalização soprosa; balanced
Tanto Behlau (2008) quanto Miller (1996), defendem o ataque isocrônico como sendo
Espera-se que um falante utilize na maior parte do tempo o ataque vocal isocrônico (iso =
mesmo, cronos = tempo), também chamado de ataque suave, equilibrado ou normal, no qual a
fase expiratória da respiração coincide com o início da vibração da mucosa das pregas vocais,
o que representa um mecanismo econômico, sem perda de ar ou excesso de tensão e
fisiologicamente equilibrado. (Behlau, 2008 vol. II, p. 106)
Behlau afirma que estudos recentes revelam que este não é o modo mais habitual entre os
do ataque brusco na fala (Behlau, 2008 vol. II, p. 107). Nesta direção, Miller apresenta
17
Embora, dentre os três tipos de ataque um seja o mais eficiente em termos fisiológicos (o
ataque balanceado) e esteticamente seja o mais agradável para a maioria dos ouvintes, ótimos
benefícios pedagógicos podem ser obtidos através dos outros dois tipos de ataque14 (Miller,
1996, p. 7).
Para exemplificar esses benefícios pedagógicos Miller (1996) sugere àqueles que
normalmente realizam o ataque brusco que pratiquem o exercício 1.1 de seu livro The
Structure of Singing cujo objetivo é estimular ataques levemente soprosos a fim de atingir o
equilíbrio desejado do ataque isocrônico (ver Ex. 1.1, nesta página). Da mesma maneira, aos
indivíduos que apresentam ataque soproso, Miller indica o exercício 1.2 no qual é solicitado
uma sucessão de ataques levemente bruscos também como meio de se encontrar o equilíbrio
(ver Ex. 1.1). É importante ressaltar no exercício 1.2 que a indicação do “uh” corresponde ao
EXERCÍCIO 1.1
Repita a seqüência falada [ha, ha, ha, ha, ha] várias vezes, lentamente e deliberadamente como uma
unidade fraseológica, demorando no [h] aspirado inicial de cada sílaba. É possível perceber quando o
sopro, ao passar pelas pregas vocais, é seguido pelo som que resulta da aproximação das pregas vocais
(isto é, quando o verdadeiro som começa).
EXERCÍCIO 1.2
Repita a seqüência falada “[uh, uh, uh, uh, uh]” várias vezes, lentamente e deliberadamente como uma
unidade fraseológica, demorando no som glótico inicial [!]. É possível perceber o momento exato no
qual a glote é liberada para produzir a fonação.
EXEMPLO 1.1: Exercícios 1.1 e 1.2 traduzidos de The Structure of Singing (Miller, 1996, p. 5).15
início da fonação pode ampliar a percepção do cantor sobre a sua própria prática vocal.
14
Although one of the three forms of onset is physiologically most efficient (the balanced onset) and
aesthetically pleasing to most, but not all, listeners, pedagogical benefits may derive from the other two.
15
Exercise 1.1 – Repeat the spoken sequence “HA, HA, HA, HA, HA” several times, slowly and deliberately as
a phrase unit, lingering over the initial aspirated [h] of each syllable. It is possible to sense when breath passing
over the vocal folds is followed by sound that results from vocal-fold approximation (that is, when actual tone
commences). Exercise 1.2 - Repeat the spoken sequence “UH, UH, UH, UH, UH” several times, slowly and
deliberately as a phrase unit, lingering over the initial glottal plosive [!]. One can sense the moment at which the
glottis has been sufficiently released to produce phonation.
18
Segundo Miller (1996) o início do som é um momento de grande importância pois poderá
definir a qualidade da emissão e finalização. “Neste ataque controlado está a origem de toda
exercícios práticos para alcançar o ataque isocrônico em minha voz falada. O exercício 1.3,
sessões como paciente. Entretanto, enquanto o exercício 1.3 de Miller sugere apenas a prática
do ataque isocrônico com o uso da vogal [a], o estudo de ataque nas sessões de fonoterapia foi
realizado com apoio de um texto elaborado pelo Centro de Estudos da Voz (CEV) contendo
vocal em pacientes (Behlau, 2008 vol. I, p. 107). No entanto, o treinamento prático da leitura
isocrônico.
EXERCÍCIO 1.3
Repita a seqüência falada [a, a, a, a, a] várias vezes, lentamente e deliberadamente como uma unidade
fraseológica, imaginando um curto [h] aspirado antes de cada sílaba mas não permitindo que este seja
audível. Esforce-se por perceber uma sensação subjetiva de que com o começo da frase o processo de
inalação não tenha sido alterado; não deve ocorrer a sensação de expulsão do ar (embora, obviamente,
o fluxo de ar esteja começando), e nenhuma sensação de ar em movimento antes da emissão (Miller,
1996, p. 5).
16
In this regulated onset lies the germ of all good vocalism.
17
Exercise 1.3 – Repeat the spoken sequence “AH, AH, AH, AH, AH” several times, slowly and deliberately as
a phrase unit, imagining a brief [h] before each syllable but not allowing it to take on audibility. Strive for the
subjective felling that with the beginning of the phrase the process of inhalation has not been altered; there
19
Verificamos em nossa prática pedagógica que o estudo isolado da vogal [a] proposto
percepção de alunos iniciantes em estudo vocal. O exercício com uma única vogal diminui a
compreender o que vem a ser um ataque isocrônico. Quando ele adquire domínio em realizar
ataques isocrônicos sucessivos, ainda que com uma única vogal, poderá então, transpor esta
Miller tende esteticamente à Escola Italiana, na qual nem o som do ataque brusco nem
o som do ataque soproso são adotados. No entanto, quando se trata de canto popular
brasileiro, tanto o som do “grunhido” originado no ataque brusco quanto o som do “sussurro”
originado do ataque soproso, podem ter um uso estético interpretativo aceitável ou até
Behlau (2008) observa ainda que os ataques bruscos e soprosos podem ocorrer em
popular brasileiro, e muitas de suas referências históricas consagradas, acredita-se que o uso
de desvios discretos tanto do ataque brusco como opção para imprimir agressividade quanto
do ataque soproso para expressar sensualidade, por exemplo, seja um recurso interpretativo
que não causa grandes danos a saúde vocal. Entretanto, é válido destacar que o mau uso vocal
“Do mesmo modo que o ataque brusco favorece a hiperfunção de certos músculos
participantes da ação, o ataque soproso pode resultar na hipofunção deste mesmo grupo
should be no sensation of breath expulsion (although, of course, airflow commences), and no sensation of breath
moving before tone.
18
Just as the hard attack produces conditions favorable to hyperfunction on the part of certain muscles, so the
soft onset may result in hypofunction in the same muscle group.
20
Em acordo com Miller, Behlau confirma a presença do ataque brusco como sinal de
uma fonação com tônus excessivo comumente observada entre pessoas disfônicas. Já o ataque
soproso sugere normalmente baixo tônus dos músculos da laringe e pode, até mesmo ser
resultado de alguma paralisia nas pregas vocais (Behlau, 2008 vol. II, p. 106).
ataque isocrônico como ponto de partida para o uso saudável da voz. Posteriormente, este
uma discussão esclarecedora sobre golpe de glote que era adotado por Garcia ainda no século
XIX. Ao apresentar a polêmica em torno do tema, Austin (2005) faz uma revisão de suas
condutas pedagógicas, questionando o que seus alunos teriam perdido até aquele momento
por ele ter escolhido ensinar somente o ataque equilibrado como o mais adequado. Este artigo
tendem a escolher padrões estéticos mais precisos e delimitados. Embora a discussão a favor
ou contra o golpe de glote não seja um objetivo deste trabalho, é valido destacar a observação
[Vennard...] disse que sempre esperou até que houvesse uma liberdade fundamental na técnica
antes de introduzir a qualidade agressiva que é necessária para dar o passo ao mundo
profissional. Esta é uma observação profunda. O golpe de glote deve ser utilizado dentro da
estrutura de uma técnica que está livre das tensões externas20 (Austin, 2005, p. 528).
Assim como Vennard (1967), nós defendemos o pressuposto de que o aluno deve
primeiro conquistar uma técnica livre e estável para depois aventurar-se em experimentações
19
Revista do Canto - publicada em Nova York pela Associação Nacional dos Professores de Canto dos Estados
Unidos. (NATS – National Association of Teachers of Singing)
20
[Vennard...] said that he always waited until there was a fundamental freedom in the technique before he
introduced the aggressive quality that is necessary to take the step into the professional world. This is a profound
21
arriscadas, pois o domínio adquirido em uma técnica livre de tensões ajudará o aluno a ser
Vários termos já foram utilizados para descrever o ataque brusco, como por exemplo,
ataque glótico, ataque duro e até “grunhido”. Fisiologicamente, o ataque brusco acontece
quando as pregas vocais são aduzidas com muita força desde a região anterior até as
infraglótica e quando o ar consegue vencer a oclusão das pregas vocais, elas são afastadas
insuficiente gerando um triângulo aberto com a base na comissura posterior da laringe. “Este
comum em indivíduos normais quando passam por situações adversas de comportamento. Por
no grito” (Behlau, 2008 vol. II, p. 106); e o ataque soproso comum “em situações de susto ou
medo, ou ainda, nas situações de afetividade ou sensualidade.” (Behlau, 2008 vol. II, p. 106).
Quando se trata de música popular ou teatro musical, é comum que os ataques bruscos e
soprosos descritos sejam utilizados como efeito dramático interpretativo para expressar as
observation. The coup de la glotte must be used within the structure of a technique that is free from extraneous
tensions.
21
“whispering triangle”
22
diversas emoções recorrentes do texto da canção e, de certa forma, esta característica
vocal no estúdio de ensaio e de gravação, fala sobre os riscos que alguns gêneros musicais
populares trazem para a voz do cantor. Segundo Abreu, o heavy metal, o rock mais pesado, o
axé, o flamenco, o belting, estão entre os estilos mais importantes que “exigem um
desempenho de grande resistência vocal” (Abreu, 2008, p.124). Aos cantores que optam por
atuar neste grupo que Abreu classificou como canto “de risco”, ele recomenda o auxílio de
No que concerne ao estudo prático de ataque e finalização Miller (1996) sugere três
grupos de exercícios (ver Ex. 1.3, p. 24), em staccato (sons destacados, não ligados) que são
praticados antes dos exercícios do grupo 3, apresentam pela primeira vez alguma variação
compreensível para um último estágio de estudo vocal, uma vez que, frequentemente, as
linhas melódicas ascendentes apresentam maior grau de dificuldade técnica para o cantor.
23
EXEMPLO 1.3: Exercícios 1.9, 1.12 e 1.25 transcritos de The Structure of Singing (Miller, 1996, p. 12, 13 e 17)
seguidos de justificativas nossas.
Sobre a finalização do som, após a descrição dos três tipos existentes, Miller sugere
apenas um exercício para observação do que ocorre numa finalização isocrônica. Segundo ele,
“Exercícios exclusivos para a finalização são desnecessários porque, como tem sido
observado, a preparação para o ataque seguinte requer a mesma atenção exigida para a
Miller afirma ainda que o tipo de ataque não determina necessariamente a finalização
do som, entretanto, um ataque instável tende a uma finalização também instável. Na medida
em que Miller adota a finalização isocrônica como a única adequada ao canto artístico, ele
também do choro, o que ele chama de sons primais, para o desenvolvimento inicial da voz
22
Separate exercises for the release are unnecessary because, as has been seen, preparation for succeeding onset
requires giving equal attention to the release.
24
1.2 CONTROLE RESPIRATÓRIO E APOIO
fonação, ele sofre diversas alterações adquirindo maior complexidade. Entende-se como
fonação a combinação da expiração com o movimento de vibração das pregas vocais gerando
a chamada freqüência fundamental. [A fonação é um...] “ato físico de produção do som por
meio da interação das pregas vocais com a corrente de ar exalada. Os puffs23 de ar são
trato vocal (filtro)” (Aronson, 198524 apud Pinho e Pontes, 2008, p. 8).
expansão corporal que provoca a entrada do ar (pressão intratorácica negativa). Essa expansão
é formada por uma cadeia de reações musculares que inclui diversos músculos torácicos e
canto é importante observar principalmente a expansão das costelas como ponto de partida
movimento expansivo bem controlado, a inspiração mais adequada ao canto deve ser
23
Puffs – Jatos
24
Aronson A. E. Clinical voice disorders: an interdisciplinary approach, 2 ed. New York: Thieme Verlag, 1985.
25
deliberadamente silenciosa: “O ruído [...] resulta de uma resistência na garganta ao se inspirar
o ar. Acima de tudo, a respiração para o canto deve ser inaudível”25 (Miller, 1996, p. 29).
fonatório como, por exemplo, o efeito Bernoulli: “o aumento da velocidade das partículas de
ar, quando passam pela laringe, reduz a pressão entre as pregas vocais, desencadeando o
efeito de sucção, que aproxima as pregas vocais entre si, seguidas por um retrocesso elástico.”
(Behlau, 2008 vol. I, p.35). No início da fonação, quando as pregas vocais são aduzidas
abaixo delas. Uma vez que essa pressão de ar excede a tensão muscular que as mantém
aproximadas, uma brecha de ar escapa através das pregas vocais. Este primeiro jato que
escapa adquire uma velocidade tal que provoca a diminuição de sua pressão interna na glote e
então, pelo princípio de Bernoulli em associação com a ação muscular da laringe, ocorre uma
Esta adução intercalada pela passagem de ar produz a vibração das pregas vocais. A
variação de velocidade deste ciclo vibratório é um dos fatores principais que irá definir a
processo fonatório:
25
Noise […] results from resistance of the throat to inspired air… Above all, the breath for singing must be
inaudible
26
This principle is of major importance in understanding the mechanics of phonation. In exhalation, the velocity
of the air stream increases as it passes through the constriction of the glottal chink, results in a sudden decrease
in pressure, and “the elasticity of the vocal-fold tissue, plus the Bernoulli effect, causes the vocal folds to snap
back again into an adducted posture”.
26
Uma vez compreendido o mecanismo da inspiração-fonação, entende-se que o
coordenação fono-respiratória.
Outro aspecto relevante a ser discutido é a diferença dos tempos respiratórios entre
fala e canto. O comprimento de uma frase durante a fala varia de acordo com as emoções,
contrapartida, no canto, a inspiração é curta com fases expiratórias longas de acordo com a
frase musical e o controle expiratório é que será treinado (Behlau, 2008 vol. II, p. 301). Tal
canto, justifica a relevância dos exercícios 2.9 a 2.11 extraídos de seu livro e apresentados no
EXEMPLO 1.4: Exercícios 2.9, 2.10 e 2.11 traduzidos de The Structure of Singing (Miller, 1996, p.35).
27
Esta seqüência de vocalizes, embora pareça muito simples, visa o controle da
inspiração lenta e inaudível até a conquista de uma inspiração rápida e ainda silenciosa em
coordenação com a fonação. Os exercícios do Exemplo 1.4 propostos por Miller foram
primeiro semestre de 2009 e foi verificado nesta prática que, além de possibilitar ao aluno
função de trabalhar o ataque equilibrado. Verificou-se ainda que esta prática de observação
polêmicas, dúvidas e discursos contraditórios sobre o que vem a ser o apoio ou appoggio.
Como ele deve ser feito ou onde ele deve ser sentido no corpo?
Italiano como modelo para realizar uma emissão vocal livre de tensões desnecessárias e plena
de ressonância:
Appoggio não pode nem de longe ser definido como “apoio de ar”, como é pensado algumas
vezes, porque appoggio inclui fatores de ressonância assim como o controle de ar... A histórica
Escola Italiana não separou os aspectos motores e ressonantais da fonação como outras
pedagogias o fizeram. Appoggio é um sistema para combinar e equilibrar os músculos e órgãos
do tronco e do pescoço, controlando sua relação com os ressonadores supraglóticos, para que
assim nenhuma função exagerada de nenhum deles comprometa o todo27 (Miller, 1996, p. 23).
Embora a técnica do appoggio defendida por Miller seja muitas vezes associada à
técnica de apoio chamada “belly in” (barriga pra dentro), este pedagogo explica, ao ensinar
sua técnica do appoggio, que não se deve orientar o aluno a contrair a área pubiana e muito
27
Appoggio cannot narrowly be defined as “breath support”, as is sometimes thought, because appoggio includes
resonance factors as well as breath management… The historic Italian School did not separate the motor and
resonance facets of phonation as have some other pedagogies. Appoggio is a system for combining and
balancing muscles and organs of the trunk and neck, controlling their relationships to supraglottal resonators, so
that no exaggerated function of any one of them upsets the whole.
28
menos a distender a barriga durante a inspiração ou fonação. O que se busca é uma sensação
a pressão intrapleural (dentro dos pulmões) viabilizando a entrada do ar. O diafragma, como
pode ser observado na Figura 1.1 a seguir, tem formato de cúpula quando está em repouso.
Durante a inspiração ele sofre uma retificação de sua abóbada, as costelas se expandem e a
caixa torácica aumenta para que o ar entre em conseqüência da pressão intrapleural negativa.
controle que se pode imprimir no músculo do diafragma está ainda sem resposta. Ele descreve
canto tende a variar de uma técnica de respiração para outra. Ele ainda relata que “A subida
diafragmática é consideravelmente mais lenta (e, logo, mais desejável) durante as fases
28
Contrary to the views of many professional teachers of singing… the diaphragm is relaxed during the whole
of the phonatory process associated with singing… except during each interphrase inspiration, and therefore
makes no contribution to the so-called “support of the voice” [Emphasis added].
29
expiratórias do ciclo respiratório quando a técnica do appoggio é utilizada” 29 (Miller, 1996,
p.265).
costelas expandidas “como se” ainda estivesse inspirando. É claro que não é possível impedir
completamente o fechamento das costelas, mas através desta prática aponta-se um caminho
expiratória da respiração, que é o momento em que o cantor deve fazer uso do apoio para
sustentar a saída do ar de forma que a emissão seja a mais estável e contínua possível.
29
Diaphragmatic ascent is considerably slower (and therefore more desirable) during the expiratory phases of the
breath cycle when the appoggio technique is used.
30
In appoggio technique, the sternum must initially find a moderately high position; this position is then retained
throughout the inspiration-expiration cycle… Although the lower abdomen (hypogastric, or pubic, region) does
not distend, there is a feeling of muscular connection from sternum to pelvis. However, to move out the lower
abdomen either during inspiration or during the execution of a phrase, as some singers are taught to do, is
foreign to appoggio technique. Equally alien is the practice of pulling inward on the pubic area as a means of
“supporting” the voice.
30
Segundo Behlau (2008), existem duas correntes principais no ensino da técnica da respiração
que são resumidas nas expressões norte-americanas “belly in” (barriga pra dentro) e “belly
out” (barriga pra fora) que significam respectivamente contrair e expandir a cintura
“barriga pra dentro” enquanto que a técnica da “barriga pra fora” é comumente associada a
escola alemã. Mais importante que o posicionamento a favor ou contra uma delas, é o relato
encontrado em Behlau (2008) sobre um estudo que investigou possíveis diferenças entre as
duas técnicas:
Sundberg (1987) relata um estudo realizado com cantores treinados que executam tarefas com
as duas técnicas, cujos resultados mostram efeitos similares na produção do som, sugerindo
que não é a técnica respiratória utilizada que determina a qualidade do som, mas sim a
influencia de outros fatores [...] (Behlau, 2008 vol. II, p.302)
Neste sentido, uma questão sem resposta exata, comumente trazida pelo aluno logo
nas primeiras aulas é: “Qual é o jeito certo de respirar para o canto?”. Segundo LoVetri, se o
aluno já passou por vários professores de canto essa dúvida pode ser ainda maior. LoVetri
(2009), professora americana se que dedica principalmente ao ensino de canto para intérpretes
de música comercial contemporânea (CCM), como ela mesma denomina seu trabalho,
defende quatro tópicos principais e desconstrói a importância dada aos conceitos “belly in” e
“belly out” para o apoio. Para LoVetri, o fundamental é: (1) Manter o alinhamento postural;
(2) Expandir a parte inferior das costelas e do abdome na inspiração, ao mesmo tempo que a
parte alta do tórax não deve apresentar movimentação; (3) Manter as costelas expandidas
durante a expiração e o abdome pode mexer para fora, para dentro, pra cima, pra baixo ou
ainda qualquer combinação dessas; 4) Adquirir uma boa coordenação para fazer a fase
31
Rubim (2009), sugeriu durante estágio docente que o apoio apresenta uma dinâmica
relacionada ao timbre que se quer obter. Vozes agudas e leves em geral utilizam apoio com
tendência para “belly in” enquanto vozes graves e pesadas tendem ao “belly out”. Isso se dá
por questões acústicas; (a) para que a laringe suba e o trato vocal se encurte para produzir
sons agudos e/ou estridentes o apoio deve tender “para dentro”; (b) nos casos de sons pesados
e escuros, o apoio “para fora” tenderá a abaixar a laringe aumentando o espaço faríngeo.
curto, enquanto sons pesados e escuros se comportam como uma tuba, larga e longa. O apoio
serve para estabelecer essa conexão acústica e obter-se o som desejado, preservando-se a
O controle respiratório eficiente para o canto pode ser treinado a partir de exercícios
com e sem fonação. Os exercícios silenciosos tem a função de preparar o cantor para a
posição pré-fonatória mais adequada e podem ser repetidos muitas vezes sem causar fadiga
vocal. Na série de exercícios apresentada por Miller no capítulo 2 de seu livro The Structure
of Singing, oito dos quinze exercícios propostos não possuem fonação. Os exercícios 2.1 e 2.2
(ver Ex. 1.5, p. 33) evidenciam diferenças do processo respiratório quando o indivíduo está
posição alta do esterno, desejável à técnica do appoggio como ponto de partida no estudo de
respiração.
32
EXERCÍCIO 2.1
- Levante os braços acima da cabeça. Retorne os braços ao longo do corpo enquanto mantém-se uma
postura relativamente alta do esterno e da caixa torácica. Se o peito não puder ser erguido nesse ponto
a uma posição mais elevada com um impulso do esterno, então a posição torácica básica está muito
alta; se o peito afundar durante a inspiração ou expiração, a postura torácica inicial não estava alta o
suficiente.
- Inspire e expire, facilmente e silenciosamente, garantindo que o esterno não caia e que a caixa
torácica não entre em colapso. A região epigástrica e umbilical, assim como a caixa torácica, movem-
se para fora durante a inspiração. No início da expiração, um leve movimento para dentro é sentido na
região umbilical, mas nem o esterno e nem as costelas devem mudar de posição. O exercício deve ser
feito com a respiração pelo nariz. Depois de fazer vários ciclos de inspiração-expiração pelo nariz, o
mesmo ciclo deve então ser praticado com a respiração feita pela boca. É essencial que o suporte
estrutural (postura) e um trato vocal tranqüilo e silencioso permaneçam estáveis, quer a respiração seja
feita pelo nariz quer seja feita pela boca. Deve haver completo silêncio durante a inspiração e a
expiração.
EXERCICIO 2.2 - Deite sobre uma superfície plana. Certifique-se de que a cabeça não está inclinada
para trás e o queixo elevado (a cabeça e os ombros devem estar alinhados). Normalmente,
dependendo de como a cabeça se posiciona sobre os ombros, é necessário colocar um livro sob a
cabeça para evitar que ela incline para trás. Respire silenciosamente com os lábios entreabertos, a
palma da mão faz uma ponte entre a região epigástrica e umbilical (a área entre o umbigo e o esterno);
observe que a área epigástrico-umbilical se move para fora, mas que a região do abdômen inferior
(área púbica, hipogástrica) não, a não ser que o movimento para fora seja proposital. (por um
momento, mova a parede abdominal inferior para fora; observe o colapso da caixa torácica para dentro
quando se tenta empurrar o abdômen inferior para fora. A falsa impressão de que a distensão do
abdômen inferior faz parte da inspiração se torna evidente de uma vez.) A região peitoral não se eleva
nem cai durante o ciclo respiratório (ou apenas sutilmente), por causa do alinhamento postural do
corpo nesta posição deitada. A entrada do ar é totalmente silenciosa, assim como a saída. Mantendo
esta relação cabeça, pescoço, e ombros levante-se e assuma uma posição “nobre”. Embora o diafragma
não fique exatamente na mesma posição quando se está em pé e deitado, o alinhamento axial do corpo
é semelhante em ambas as posições.
EXEMPLO 1.5: Exercícios 2.1 e 2.2 traduzidos de The Structure of Singing (Miller, 1996, p. 29 e 30)31.
31
Exercise 2.1 – Raise the arms above the head. Return the arms to the sides while retaining the moderately high
posture of the sternum and rib cage. If the chest, at this point, cannot be raised somewhat higher with an upward
thrust of the sternum, the basic thoracic posture is too high; if the chest sinks during either inspiration or
expiration, the initial thoracic posture was not sufficiently high. – Breath in and out, easily, making certain that
the sternum does not fall and that the rib cage does not collapse. The epigastrium and the umbilical region, as
well as the rib cage move outward with inspiration. At commencement of expiration, a slight inward movement
is experienced in the umbilical area, but neither the sternum nor the ribs should change position. The exercise
should be accomplished by breathing through the nose. Following several inspiration-expiration cycles of nose
breathing, the same cycle should then be practiced by breathing through the mouth. It is essential that the
structural support (posture) and the quiescent vocal tract remain unchanged, whether breath is taken through the
nose or through the mouth. There should be complete silence during both inhalation and exhalation. Exercise 2.2
– Recline on a flat surface. Be certain the head is not tilted backward with elevated chin (head and shoulders
should be in line). Usually, depending on how the head sits naturally on the shoulders, it will be necessary to
place a book under the head to avoid backward tilting. Breath quietly through parted lips, the flat hand bridging
the epigastric and umbilical regions (the area between the navel and the sternum). Observe that the epigastric-
umbilical area moves outward but that the lower abdomen (hypogastric, or pubic area) does not, unless
purposely pushed outward. (For a moment, move out the lower abdominal wall; notice the inward collapse of the
rib cage when one thrusts out the lower abdomen. The falseness of low abdominal distention as a part of
inhalation will be apparent at once.) The chest neither rises nor falls during the breath cycle (or only slightly),
because of the postural alignment of the body in this recumbent position. Breath intake is totally quiet, as is
33
O exercício 2.3 tem o objetivo de prolongar o ciclo respiratório tanto da inspiração
quanto da expiração. Embora não haja nenhuma prova conclusiva deste fato, muitos
professores de canto erudito acreditam que este exercício tenha sido praticado diariamente
pelo famoso castrato Farinelli. Sua reputação como possuidor de um controle respiratório
reduzindo o tempo de duração de suas etapas, para que ele fosse mais acessível ao nosso
grupo de alunos. No Exemplo 1.6 que segue, é apresentada uma tradução do exercício 2.3
como deve ser feito tradicionalmente e a adaptação que foi utilizada com os alunos.
breath expulsion. Maintaining this relationship of head, neck and shoulders, rise to a “noble” standing position.
Although the diaphragm is not in exactly the same position in standing and lying, the axial alignment of the body
is similar in both positions.
34
EXERCÍCIO 2.3
INSPIRE contando mentalmente de 1 a 5 em tempo moderado, mantendo silêncio absoluto. Marque
um tempo preciso com o estalo dos dedos ou batendo com um lápis em uma superfície. Um
metrônomo pode ser útil. Os lábios devem estar ligeiramente abertos durante as três etapas do
exercício. Deve ocorrer uma expansão completa, mas não forçada, das costelas e dos músculos da área
epigástrico-umbilical e da área lombar.
SUSPENDA o ar sem nenhuma sensação de segurá-lo (a glote se mantém aberta, ação às vezes
chamada de “manobra van den berg” na área da foniatria), sem nenhuma tensão muscular na área do
trato vocal e do tronco. A posição das costelas a da parede abdominal é mantida enquanto conta-se
silenciosamente de 1 a 5 no tempo original.
EXPIRE silenciosamente, mantendo o máximo possível a posição das costelas e do esterno, contando
de 1 a 5. Deve haver uma continuidade rítmica entre as três frases do exercício (inspiração, suspensão,
expiração). Imediatamente após completar o ciclo inspiração, suspensão, expiração contando de 1 a 5,
pratique o ciclo aumentando a contagem de 1 a 6 e assim sucessivamente até atingir a contagem de 9,
10, ou talvez até 12.
O exercício 2.3 pode ser ilustrado assim:
Inspire Suspenda Expire
12345 " 12345 " 12345
123456 " 123456 " 123456
1234567 " 1234567 " 1234567
12345678 " 12345678 " 12345678
etc.
Adaptação de 2.3 para alunos iniciantes:
Inspire Suspenda Expire
123 " 123 " 123
1234 " 1234 " 1234
12345 " 12345 " 12345
somente até 5.
EXEMPLO 1.6: Exercício 2.3 traduzido e adaptado de The Structure of Singing (Miller, 1996, p.31 - grifos
nossos)32
primeiro exercício desta série sugere que o executante expire durante 40 ou 50 segundos, no
entanto, embora não seja explicitado por Miller, é importante ressaltar que as mulheres,
geralmente, tem capacidade respiratória menor que a dos homens e assim é perfeitamente
32
Exercise 2.3 – Inhale while mentally counting from 1 to 5 at a moderate tempo, maintaining absolute silence.
Keep precise rhythm by tapping a finger or pencil. A metronome also may be helpful. Lips should be parted
throughout the three parts of the exercise. Complete but unforced expansion of the ribs and of the muscles of the
umbilical-epigastric area and of the lumbar area should be realized. – Suspend the breath without any sensation
of holding it (glottis remains open, an action sometimes termed “the Van Den Berg maneuver” in the field of
phoniatrics), without any muscular tension in either the vocal tract or the torso. The position of the rib cage and
the abdominal wall is retained while silently counting from 1 to 5 at the original tempo. – Exhale silently,
maintaining as far as possible the same posture of sternum and rib cage, counting 1 to 5. There should be
rhythmic continuity between the three phases of the exercise (inhalation, suspension, and exhalation).
Immediately following completion of the three-part breath cycle of 1 through 5, move without pause to a cycle
35
natural que elas, ou mesmo homens pouco treinados, comecem este exercício a partir de uma
respiração com consoantes sibilantes e fricativas. A exemplo deste fato, durante estágio
Os exercícios 2.9 a 2.11 (ver Ex. 1.4, p. 27), sugeridos por Miller, para o treinamento
capítulo 2 de seu livro Miller propõe exercícios que são um pouco mais complexos com o
cantor faça inspirações rápidas e silenciosas entre os staccati seguidos de frases longas ou
of 1 through 6, passing through the three successive phases of the exercise; in this fashion, increase the numbers
until 9, 10 or perhaps 12 counts.
36
Latorre (2002) ainda em 199933, esta atividade foi adotada como o primeiro item do
aquecimento vocal nas aulas coletivas da disciplina de Canto Complementar durante estágio
docente. A “expansão corporal lúdica”, descrita a seguir, foi uma forma integrada que
labial sonorizada a partir da consoante /b/ (como faz uma criança ao imitar o som de um
carrinho). Inicia-se com a expansão dos braços a partir do centro do corpo e segue-se fazendo
o movimento de “abrir” 3 vezes cada parte do corpo. A lista a seguir descreve cada parte do
corpo a ser “expandida”. A sonorização da vibração labial deve ocorrer, primeiramente, com a
sustentação de uma única nota para cada parte do corpo, partindo da região aguda e
modulando de meio em meio tom para o grave, faz-se a sequência da cabeça até a cintura. A
partir da região das pernas, à exceção dos movimentos da “britadeira” e de “encerar os chão
com as mãos” que devem ser sonorizados levemente com notas longas na região médio/grave
da voz, a sonorização das outras partes é feita com glissandos descendentes sempre sem
• Topo da cabeça
• Testa
• Olhos passando atrás das orelhas
• Boca e nariz
• Pescoço
• Peito
• Costelas
• Umbigo (cintura)
• Quadril
• Pernas (como se fosse uma saia)
• “Gola de palhaço no pescoço” – glissando do agudo para o grave
• “Desamarrar o avental” – glissando do agudo para o grave
• “Britadeira” (pulando pelo espaço)
• “Encerar o chão com as mãos” (caminhando pelo espaço)
• “Tirar a roupa suja” (inspirar trazendo os braços pelo centro do
corpo e expirar abrindo os braços)
• “Ducha gelada” (inspirar subindo os braços abertos ao longo do
corpo e expirar descendo os braços pelo centro)
33
Em 1999, ano em que a autora desta dissertação cursava graduação em Música Popular na UNICAMP, Maria
Consiglia Latorre era professora de canto popular na mesma instituição.
37
• “Pendurar roupa no varal e despencar”
• “Subir desenrolando” (a partir da postura invertida com os pés no
chão e a cabeça para baixo) soltar a cabeça, braços, alongar as pernas
(dobrar primeiro o joelho direito, depois o esquerdo), flexionar os
dois joelhos e subir desenrolando e a cabeça é a última que chega.
Miller afirma que o sistema de ressonância vocal tem uma relação direta de
caixas ressonadoras e também o mecanismo de articulação utilizado para a fala e para o canto.
Segundo Miller (1996), as estruturas que compõem o trato vocal são a faringe, a
cavidade bucal e às vezes a cavidade nasal. Behlau (2008), ao definir os elementos que
constituem o sistema de ressonância apresenta mais elementos que Miller e para ela estruturas
como: pulmão, laringe, cavidades nasais e seios paranasais também fazem parte do trato
vocal.
Quando Behlau delimita o que considera por principais ressonadores, ela chega a uma
da boca e do nariz. Lembrando que a cavidade da boca contém lábios, língua, palato,
no canto, o resultado é uma emissão tão equilibrada que traz ao ouvinte a sensação de ajuste
perfeito. Segundo Behlau, a voz emitida nessas condições ideais parece realmente pertencer
34
The movements of the tongue, lips, palate, cheeks, and mandible alter the dimensions of the resonator tract.
38
ao emissor e não há concentração excessiva de energia em nenhuma região específica do trato
(chamada de fonte) e seus diversos harmônicos serão reforçados ou abafados no trato vocal
(chamado de filtro). O trato vocal em seus diversos formatos, alterados pelos articuladores e
paredes, vai permitir que o som adquira diferentes nuances. Neste processo de filtragem do
som ocorre o reforço de alguns harmônicos, que são chamados formantes. Os formantes são
partes específicas dos ressonadores e alguns destes formantes podem definir as vogais e
definição das vogais, enquanto o F3 muitas vezes pode ser chamado de “formante do
cantor”35. No entanto, Sundberg afirma que o “formante do cantor” não é sempre o F3.
Segundo ele, esta definição vale para as vozes masculinas em que o “formante do cantor”
localiza-se entre as freqüências 2500Hz à 3.200Hz. Nas vozes de sopranos, por exemplo, o
“formante do cantor” pode ocorrer até na freqüência 4000Hz e por isso ele aponta que o
terceiro, quarto e quinto formantes estão relacionados com o timbre pessoal da voz, o que
ele ter sido considerado o responsável pela projeção da voz do intérprete acima do som de
uma orquestra (Gusmão, Campos e Maia, 2010; Behlau, 2008; Kiesgen, 2006; Miller, 1996;
Sundberg, 1981, 1991; etc.). Em razão das prioridades desta pesquisa, este tópico não será
formante do cantor.
39
1.3.1 Ressonadores
que ela pontua quando o foco de ressonância está excessivo em um dos ressonadores (laringe,
cavidade oral e cavidade nasal). Uma vez que a emissão vocal no canto popular em muito se
pesquisa.
identificado como baixo e a emissão resultante é tensa de forma que a voz parece estar presa
uma emissão tensa semelhante à da laringe mas, na faringe, o foco de ressonância vertical já
não é tão baixo e observa-se a presença de certa estridência metálica. Quando ocorre esse
articulação exagerada das frases e a emissão vocal soa artificial. Já o uso excessivo ou
insuficiente das cavidades nasais resulta em um foco de ressonância alto, mas que pode ser
velofaríngica” (Behlau, 2008 vol. I, p. 105). Descartada a presença de patologias, a opção por
um foco de ressonância nasal pode ocorrer em situações em que se quer exprimir afetividade
complementa Behlau.
35
O “formante do cantor” corresponde a uma emissão de som mais metalizada e com maior projeção. Num
concerto erudito para voz e orquestra, que historicamente não são amplificados, é este tipo de emissão que
permite que a voz do cantor se destaque acima da orquestra.
40
É possível que Miller considere a cavidade nasal somente às vezes como um
ressonador e não sempre pelo fato de que seu estudo é orientado para a formação do cantor
erudito onde os padrões estéticos, de forma alguma, admitiriam uma emissão rica em
ressonâncias nasais. Miller inclusive sugere para o estudo de ressonância exercícios como o
4.6 (ver Ex. 1.8, p. 50) em que o estudante é levado a identificar qualquer nasalidade
indesejada: “Este é um antigo exercício para checar a presença de uma nasalidade indesejada,
mas é também um excelente recurso para alcançar equilíbrio de ressonância ideal entre a boca
vogais (Behlau, 1993, p. 36). Esta discussão merece um estudo detalhado e, portanto,
Miller aponta a confusão entre timbre e ressonância vocal como sendo um equívoco
comum entre os cantores. A dúvida é agravada quando se busca uma definição clara entre a
fonte do som e a sensação do som. Mesmo na pesquisa de Rubim (2000), que apresentou a
evidente a falta de consenso nos seus discursos ao tratarem do tema ressonância. A pesquisa
de Rubim certifica ainda que o ensino deste aspecto vocal, pelo menos nas universidades
Mais complexo que a realidade múltipla apresentada por Rubim (2000), Miller (1996)
36
This exercise is an ancient one for checking on the presence of unwanted nasality, but it is also an excellent
41
As pedagogias vocais não estão em acordo sobre que sensações deveriam ser essas.
“Colocação frontal” é a linha de alguns professores: “coloquem na masque (máscara),” “na
boca,” “na parte superior da mandíbula,” “pra fora e na frente,” “atrás dos olhos,” “dentro dos
sinus37,” “no final do nariz,” “nos lábios,” etc. Outros professores acreditam que o som deveria
ser direcionado posteriormente: “descendo a espinha dorsal,” “No fundo da parede da
garganta,” “na parte de cima do fundo da parede da garganta, e então seguindo por cima em
direção à testa,” “dentro do corpo,” “dentro da metade posterior da cabeça”, etc. 38 (Miller,
1996, p. 61).
fechadas apresenta-se como uma ferramenta viável. Neste sentido a maioria dos professores
citados por Rubim (2000) orienta seus alunos através de sensações trazidas pelo som mas
feedback do aluno. Ainda que alguns professores apresentem discursos levemente vagos ou
maior em entender o que o aluno está sentindo ao invés de induzi-lo a algo que seria o correto
sentir: “[Keenze...] ele não se preocupa com o lugar, mas principalmente com a sensação,
como o aluno a percebe. (Rubim, 2000, p. 79). Na mesma linha, Helen Swank, professora da
Universidade Estadual de Ohio39, estimula seus alunos a construírem seu próprio repertório de
sensações: “[Swank...] utiliza a expressão “sinta como se...” para orientar os alunos a
desenvolver certas sensações vocais de modo que o aluno construa seu sistema de
estabelecer um diálogo claro no qual o aluno efetivamente compreenda o que está sendo
device for achieving proper resonance balance between the mouth and the pharynx.
37
Sinus é um termo anatômico que se refere aos seios da face. Merriam-webster online diz que é “a cavity in the
substance of a bone of the skull that usually communicates with the nostrils and contains air” (Disponível em:
<http://www.merriam-webster.com/dictionary/sinus> Acesso em: 15 dez. 2010)
38
Vocal pedagogies are not in agreement as to what this sensation should be. “Forward placement” is the aim of
some teachers: “into the masque (mask),” “into the mouth,” “into the upper jaw,” “out in front,” “behind the
eyes,” “into the sinuses,” “at the end of the nose,” “on the lips,” etc. Other teachers believe the tone should be
directed posteriorly: “down the spine,” “at the back of the throat wall,” “up the back of the throat wall, then over
into the forehead,” “into the body,” “into the back half of the head,” etc.
39
Ohio State University
42
pedido. O uso de imagens e sugestões criativas podem ser ferramentas eficientes desde que
Tão ou mais importante que entender a diferença entre timbre e ressonância, é a busca
emancipatório do aluno. Em casos onde não é possível realizar uma investigação com base
em dados científicos, ou mesmo quando os dados científicos parecem ser insuficientes para
descrever uma experiência de forma clara, a opção de considerar o discurso de aluno é sempre
Segundo Miller, a maioria das vezes que um cantor se refere à ressonância, ele está na
fundamental produzido pelas pregas vocais é a fonte vibracional que pode ser ampliada e
modificada pelas estruturas que compõem o trato vocal. O timbre, neste caso, pode ser
entendido como o resultado sonoro deste conjunto de vibrações, ou seja, a percepção auditiva
da ressonância. Assim como a ressonância pode variar também o timbre vocal pode ser
modificado.
na garganta e qualidades vocais associadas43 apresenta o timbre como uma qualidade do som
vocal que resulta das alterações dos espaços de ressonância. Esta publicação é uma tentativa
de Titze em mapear algumas qualidades vocais que ele mesmo selecionou relacionadas à
40
Differences in timbre have corresponding location of resonance sensations.
41
Sympathetic vibrations, where the effect of the source vibration is magnified by synchronous vibration
42
Revista do Canto - publicada em Nova York pela Associação Nacional dos Professores de Canto dos Estados
Unidos. (NATS – National Association of Teachers of Singing).
43
variação de espaços no trato vocal. Para isso ele partiu do estudo científico realizado por Jo
descrição de cada uma das qualidades vocais é interessante observar que para Titze a emissão
do bocejo corresponde a postura ideal para o canto erudito devido a sua grande amplitude do
trato vocal. Mais adiante, entretanto, será descrita a posição de Miller radicalmente contra à
Titze aponta as diversas emissões observadas em sua pesquisa: (1) a emissão apertada
ou constrita que corresponde a alguns estilos de rock, alguns cantos de oração árabe, e alguns
cantos do extremo oriente; (2) a emissão de alta estridência com aspecto nasal, conhecida
em alguns casos da ópera chinesa, especialmente nas vozes masculinas; (3) a emissão com
giro, termo utilizado por cantores líricos para classificar uma voz rica de ressonâncias, que no
artigo de Titze não está relacionada a nenhum estilo musical e que ele discorre apenas sobre a
complexidade de sua execução; (4) a emissão do bocejo contém muito das qualidades “escura
e quente” que é a chave para o canto erudito ocidental – segundo ele, esta emissão engloba a
expansão de todo espaço aéreo do trato vocal; e, por fim, (5) a emissão soprosa, que é mais
43
Space in the Throat and Associated Vocal Qualities
44
E. Yanagisawa, L. Mambrino, J. Estill, and D. Talkin, “Supraglottic Contributions to Pitch Raising:
Videoendo-scopic Study with Spectral Analysis,” Annals of Otology, Rhinology, Laryngology 100 (1991): 19-
31. E. Yanagsawa, J. Estill, T. Kmucha, and S. B. Leder, “The Contribution of Aryepiglottic Constriction of
'Ringing' Voice Quality-A Videolaryngoscopic Study with Acoustic Analysis,” Journal of Voice 3 (1989): 342-
50. - apud Titze, 2005, p. 500)
45
I. R. Titze, C. C. Bergan, E. J. Hunter, and B. H. Story, “Source and Filter Adjustments Governing the
Percep-
tion of Vocal Qualities Twang and Yawn,” Logopedics, Phoniatrics, and Vocology 28 (2003): 147-155. C. C.
Bergan, I. R. Titze, and B. H. Story, “The Perception of Two Vocal Qualities in a Synthesized Vocal Utterance:
Ring and Pressed Voice,” Journal of Voice 18, no. 3 (2004): 305-17. - apud Titze, 2005, p. 500 e 501)
44
comum aos vários estilos que se utilizam de microfone, geralmente cantoras do pop norte-
americano se apegam a este tipo de emissão. Titze afirma ainda que cantores clássicos de
Lieder usam a emissão soprosa com cautela (Titze, 2005, p. 499). Para compreender melhor o
Quadro 1.1 o leitor deve saber a definição dos seguintes termos utilizados (Behlau, 2008):
qualidade do timbre ou “cor do som” na emissão das vogais. Quando a boca é aberta
a qualidade do timbre é aguda com bastante brilho. Quando a boca é aberta na vertical, a
emissão vocal prioriza as ressonâncias graves e a qualidade do timbre é grave e escuro. Para
LoVetri, uma abertura neutra, em que a boca não está excessivamente nem na horizontal, nem
45
conceito de chiaroscuro (claro-escuro) da técnica da Escola Italiana, que preconiza um som
grande parte de sua argumentação gira em torno de explicitar porque estão equivocadas as
práticas pedagógicas baseadas na postura do bocejo como meio de orientar o aluno a uma
Miller explica que apesar da postura do bocejo parecer uma posição ideal para o canto,
levando em conta que ela permite uma maior distensão faríngea, este pensamento, segundo
ele, é equivocado. No bocejo a laringe está mais baixa e o véu palatino está mais alto o que
descreve claramente um aumento de espaço na cavidade oral, mas a estrutura toda do trato
vocal está em fase de alongamento, de maneira que fica impossível produzir um som que não
seja distorcido.
Nós não nos submeteríamos a uma atividade física de sustentação com braços e pernas ao
mesmo tempo em que os alongamos. Nem teríamos a intenção de manter longos períodos de
conversação com esta dimensão de expansão oral e faríngea, embora nós possamos
eventualmente fazê-lo entre amigos e pedimos desculpas por isso46 (Miller, 1996, p. 58).
Para Miller, pensar na postura do bocejo para o canto é tão inaceitável que ele
discorda até mesmo de professores de canto que sugerem adaptações da postura do bocejo
antes de indicá-la para uma prática vocal livre. Segundo ele o comando para a abertura de
boca ideal não precisa originar-se na região laringofaríngea ou da orofaringe mas deve sim
surgir de uma inspiração tranqüila, como se o indivíduo inalasse uma fragrância agradável, e
este movimento traria uma sensação de abertura a partir da região nasofaríngea que seria
suficientemente estendida na medida certa para as outras regiões. Neste tipo de atitude
inspiratória:
A posição da língua não se altera (irá alterar-se se o ar for inalado ruidosamente), a mandíbula
não fica pendurada, a laringe não está radicalmente abaixada e o véu palatino não está
radicalmente levantado. Embora as relações de espaço entre os ressonadores tenham sido
46
We would not attempt physical activity of a sustained sort with the arms and legs while also stretching them.
Nor would we aim at this dimension of oral and pharyngeal distention for extent periods of speech, although we
may occasionally lapse among friends, with apologies.
46
alterados em relação ao espaço da “fala normal”, nenhum dos ressonadores principais (boca e
faringe) torna-se subserviente ao outro em sua relação47 (Miller, 1996, p. 58).
Além das vantagens evidenciadas pela citação anterior, Miller ainda destaca que este
jeito de atingir a abertura ideal para o canto evita a ocorrência de tensões desnecessárias,
favorece a abertura das fossas nasais, promove a elevação do véu palatino e o canal de
Ainda sobre a abertura bucal, durante um workshop com LoVetri (2010), pude
observar sua atuação com um aluno que não conseguia abrir muito a boca durante um
vocalize com a vogal [a]. LoVetri se utilizou de uma rolha que o aluno deveria prender entre
os dentes (mordendo levemente a borda curva) de forma que a abertura da boca se mantivesse
estável do começo ao fim do vocalize. O resultado sonoro foi muito melhor que o anterior ao
uso da rolha, quando o aluno apresentava certa tensão maxilar e pequena abertura bucal.
Técnicas semelhantes à utilizada por LoVetri têm sido recomendadas por muitos
professores da Escola Italiana desde o século XVIII como bem observamos em Austin (2006)
que; entretanto, na conclusão de seu artigo sobre abertura bucal e leis da acústica, explica o
seguinte:
“[...] cantores que cantam em estilos que normalmente se utilizam de sistemas de amplificação
são propensos a usar estratégias diferentes daqueles que têm que cantar sobre um grande
número de instrumentos e outras vozes. [...] O que eles mais precisam é soar natural48 (Austin,
2006, p. 215 e 216).
Certamente que casos de tensão exagerada tanto para o excesso quanto para a falta de
abertura bucal implicam diretamente na distorção da qualidade do som vocal e por isso
técnicas como as de LoVetri muitas vezes são bem vindas no processo pedagógico. Mas em
acordo com Austin (2006) acreditamos que para interpretar choros o princípio de soar natural
47
The position of the tongue does not alter (it will, if the breath is grabbed noisily), the jaw does not hang, the
larynx is not radically depressed, and the velum is not rigidly raised. Although spatial relationships among the
resonators now have changed from those of “normal speech,” neither of the chief resonators (mouth and
pharynx) has become subservient to the other in this coupling.
48
singers who sing in styles that typically use amplification systems are likely to use different strategies than
those who have to sing over large numbers of instrument and other voices. […] What they need most is to sound
natural
47
é a atitude mais adequada para a busca de uma abertura de boca que se aproxime da fala. No
caso do choro, entretanto, deve-se considerar as peças de extensão mais ampla, nas quais é
principalmente no caso da voz feminina. Com isso não defendemos a sonoridade do canto
lírico em si, mas alguns recursos de ajuste de agudo que podem colaborar para o aumento da
Para Miller uma boa ressonância está atrelada a um bom controle respiratório. “Tanto
embora imposto, ou impostazione, refira-se a sensações de colocação, essas sensações não são
respiratório sem o uso de tensões desnecessárias como pode ocorrer em outras técnicas que
estimulam o cantor a forçar o abdome para fora ou para dentro. De maneira semelhante, para
o estudo de ressonância, Miller defende a técnica italiana da Impostazione como uma solução
som, sem abuso de ressonância de máscara, som estridente e alto, e sem abuso de peso com
O equilíbrio da ressonância (colocação) não se encontra na faringe nem tão pouco na boca
como um principal ressonador, mas sim na combinação de ambos. O centro de sensação não
está nem na garganta nem na face. O encaixe ressonantal se torna equilíbrio ressonantal sem
violação funcional ou acústica de uma única parte do trato vocal. Pendurar a mandíbula e
expandir a faringe irá produzir sensações marcantes de abertura da garganta, mas também um
desequilíbrio do tubo ressonador com a queda das frequências altas em algumas vogais; o
conceito de colocação na máscara irá produzir o resultado oposto, um estreitamento do timbre
desnecessário e um aumento dos harmônicos superiores. A técnica do Imposto evita tanto
49
Both breath management and resonance factors are included in the term appoggio; although imposto, or
impostazione, refers to placement sensations, these sensations are not considered apart from breath management.
48
produção vocal pesada, entubada quanto a produção estridente, achatada50 (Miller, 1996, p.
61).
exercícios de bocca chiusa, termo que significa boca fechada em italiano. Trata-se de
exercícios que se apóiam na consoante [m] e podem ser também chamados de exercícios de
Entre os seis exercícios propostos por Miller no capítulo 4 sobre ressonância em seu
livro The Structure of Singing, quatro deles apóiam-se no fonema nasal [m] para atingir o
objetivo de estabilizar a ressonância. Os dois exercícios que não se utilizam da consoante [m]
baseiam-se numa prática antiga de tapar as narinas durante a emissão da vogal [!] a fim de
Em meu estudo prático sobre ressonância e para aplicação nas aulas individuais
durante estudo de caso, adotei um exercício aprendido em sessão de fonoterapia com Luciana
constatou-se nele um efeito semelhante e maior facilidade de execução por apresentar apenas
confere uma dupla função. O humming contínuo serve para tonificar e alongar o véu palatino
enquanto os estalos de língua servem ao treinamento dos articuladores que são responsáveis
pela produção dos fonemas consonantais e participam ativamente da execução das palavras
50
The resonance balance (placement) relies neither on the pharynx nor on the mouth as chief resonator, but on a
combination of both. Sensation centers neither in the throat nor in the face. Resonator coupling becomes
resonance balancing without functional or acoustic violation of any single part of the vocal tract. Hanging the
jaw and spreading the pharynx will produce marked sensations of openness in the throat, but an imbalance of
resonator tube as the expense of higher frequencies in some vowels; concepts of mask placement will produce
opposite result, unnecessary thinning of the timbre and an increase in upper partials. Imposto technique avoids
both the heavy, dull vocal production and the shrill blatant production.
49
EXEMPLO 1.8: Tradução dos exercícios 4.2 e 4.6 (Miller, 1996, p. 62 e 63)51 e exercício de fonoterapia
51
Exercise 4.2 – Establish the “noble” posture; breathe through the nose as though inhaling the fragrance of a
rose and hum the pattern in several keys of easy range. Be certain that the hum is produced without tension in the
tongue, the velum, or the jaw. Strum the lips lightly and quickly a few times with the forefinger. Unless a distinct
“mum-mum-mum” results, the proper neutral posture of the articulatory mechanism is not present. Exercise 4.6
– Parts of the phrase are sung with the nostrils closed gently by the fingers, other parts without closure of the
nostrils. The singer must be certain that no change in timbre occurs when the nostrils are released in mid-phrase.
Resonance sensations, either with mouth open or closed, or with nostrils occluded or free, remain the same.
50
1.4 ESTUDO DAS VOGAIS E CONSOANTES
canto. Existem sites confiáveis53 que facilitam muito esse estudo pois fornecem as tabelas
símbolos. Além disso, o artigo de produção coletiva, realizado para o volume 13 da Revista
Erudito (Kayama, Carvalho, Castro, Herr, Rubim, Pádua, Matos, 2007). As tabelas do AFI e a
É comum o quadro de símbolos do AFI passar como algo sem importância para o
de cada um dos símbolos podem ser alguns dos elementos desanimadores deste estudo.
acham muito difícil decorar todas as informações, ou simplesmente porque consideram este
estudo realmente desnecessário. O cantor popular no Brasil, de maneira geral, usa o português
e/ou o inglês e com menos frequência o espanhol e o italiano. Entretanto, não é uma
preocupação comum deste intérprete cantar com uma pronúncia impecável como buscam os
cantores líricos.
inclui obras em francês, alemão, italiano, espanhol, latim, português e às vezes idiomas ainda
52
IPA – International Phonetic Alphabet. Cópias da versão atualizada em 2005 estão disponíveis em inglês e
espanhol no anexo IV.
53
Exemplificando <http://www.lfsag.unito.it/ipa/index_en.html> e
<http://www.langsci.ucl.ac.uk/ipa/sounds.html>
51
menos comuns. Para o estudo deste repertório vasto e em diferentes línguas o domínio do
código fonético internacional pode resolver o problema de pronúncia adequada sem que o
cantor precise ser falante de todas as línguas que interpreta. É claro que a compreensão de
interpretação.
AFI poderia até ser considerada irrelevante ou dispensável. Porém, qualquer cantor que se
submeta a um estudo sério de técnica vocal, deveria se interessar pelo estudo das pronúncias
das vogais e consoantes assim como compreender a função que cada fonema pode exercer
Por defender a compreensão dos símbolos fonéticos como uma ferramenta relevante
estudo sobre a formação das vogais, de algumas consoantes mais relevantes e seus respectivos
usos no estudo da técnica vocal. No trecho seguinte serão utilizadas barras inclinadas /x/ para
desta dissertação à luz da literatura temos observado que as vogais com sua configuração
própria do trato vocal podem ser consideradas facilitadoras ou não da produção vocal. Como
relação à sua região de uso (homens cantam uma oitava abaixo das mulheres), é comum a
preferência das mulheres pela vogal [i] (como em ilha) e dos homens pela vogal [a] (como em
mato). Isso acontece principalmente porque os formantes da vogal [a] são naturalmente mais
graves enquanto os formantes da vogal [i] são naturalmente mais agudos. Isso não quer dizer
52
que mulheres não possam cantar a vogal [a] e vice e versa, mas apenas demonstra que as
vogais facilitadoras variam até de acordo com o gênero. No canto popular a vogal [a] é
favorável para o emprego de voz de peito no grave, enquanto no canto lírico ela é mais
favorável para a produção dos agudos e muito inadequada para o registro misto, no qual deve
Miller descreve detalhadamente o que acontece com o trato vocal durante a emissão
das vogais mais utilizadas no estudo de técnica vocal. A ordem de ocorrência destas vogais de
acordo com o movimento da língua é [i, e, ", a, !, #, o, u ] (ver Fig. 1.2, nesta página). Em [i]
a ponta da língua está na posição mais elevada, abaixa-se um pouco para [e, "], chega ao
extremo oposto mais central e grave quando está em [a] e [!] e o fundo da língua começa
elevar-se em transição para emissão das vogais posteriores [#, o] e, finalmente, a língua atinge
a constrição máxima entre seu dorso e o véu palatino para emissão da vogal [u] (Miller, 1996,
p. 52).
FIGURA 1.2: VOGAIS (frontais, centrais e posteriores/ fechadas, semi-fechadas, semi-abertas e abertas).
As diferenças entre homens e mulheres na preferência por uma ou outra vogal foi
verificada durante estágio docente do qual participei e em minha prática individual pude
vivenciar as vantagens da vogal [i]. A prática de um exercício ensinado por Rubim é melhor
53
te cavaquinho (ver p. 135). Uma vez que percebemos os benefícios de emissão frontalizada
trazidos pelos vocalizes com a vogal [i], Rubim sugeriu que eu estudasse peças inteiras como
Apanhei-te cavaquinho e Tico-tico no Fubá substituindo o texto da canção por /piripiri/, onde
a vogal [i] é levada à sua posição frontalizada com a ajuda das fonemas [p] e [r]. A citação a
Na vogal [i], o espaço total do ressonador não está diminuído, mas rearranjado. A natureza
acústica da vogal [i], com seu espaço faríngeo considerável, presta um papel muito importante
nos vocalizes direcionados à diferenciação vocal e ao ajuste ressonantal. Por causa da natureza
da forma da cavidade anterior, posição da língua e aumento do espaço faríngeo, a vogal [i] é
útil no desenvolvimento do timbre pleno da voz. Um número considerável de pesquisadores
comentam que a elevação do palato mole é maior em [i] do que em qualquer outra vogal54
(Hirano ET AL., 1966, p. 377 apud Miller, 1996, p 72).
A vogal [e] é muito próxima da vogal [i] e os benefícios trazidos por ela são
semelhantes também. “Tanto no [e] quanto no [i] a elevação e a posição alta da língua
evocam sensações na máscara. A distribuição dos formantes agudos das vogais são os
Segundo Miller, a razão da preferência de alguns cantores pela vogal [a] se dá porque
ela não constringe o trato vocal. No entanto, seu posicionamento quase neutro é limitado para
lírico ele usa frequentemente o fonema [!] que é o /a/ escuro. No caso do Brasil, nós usamos
54
In the vowel [i], total resonator space has not been diminished, but rearranged. The acoustic nature of the
vowel [i], with its considerable pharyngeal room, plays a significant role in vocalises devoted to vowel
differentiation and to resonance adjustment. Because of the nature of front cavity shape, tongue posture, and
increased pharyngeal room, the vowel [i] is useful in developing the full timbre of the voice. It should be noted
that a number of researchers comment that soft palate elevation is higher in [i] than in any other vowel.
55
With both [i] and [e], the elevation and forward postures of the tongue evoke sensations in the mask. The high
formant distribution of the vowels is mainly responsible for these sensations.
56
Vocalization based solely on [!] does not deal with the more exacting principles of vowel differentiation
encountered in singing both front and back vowels. In any technique of singing, if other vowels are less
comfortable in execution than the vowel [!], articulatory flexibility is lacking.
54
A vogal [#] (como em pó) é considerada a primeira vogal posterior em relação à
posição da língua cujo dorso encontra-se levemente elevado em direção ao véu palatino. O [#]
requer mais arredondamento bucal do que [!] e uma leve protusão labial. “A dimensão oral
para fazer o [#] é menor do que para emitir um [!]”57 (Miller, 1996, p. 73). A presença desta
vogal em vocalizes é muito comum. Por exemplo em Miller [#] é utilizado em alternância
com [e] e às vezes [i] em todos os exercícios do grupo 2 (5.6 a 5.10) no capítulo sobre vogais
Outro uso comum da vogal [#], observado em minha experiência prática como aluna
de canto durante muitos anos, é a substituição da vogal [a] por [!] e por [#] em vocalizes
voz.
As vogais [o] (como em pôr) e [u] (como em Itu) são mais posteriores que [#] e
consequentemente imprimem maior constrição da língua. “Ao executar [o], a língua está
abaixada em sua porção anterior; também está presente a elevação da parte posterior da
língua, característica de todas as vogais posteriores”58 (Miller, 1996, p. 73). A vogal a [u] é o
Como foi mencionado anteriormente que articulação e ressonância são aspectos vocais
intimamente interligados, os exercícios técnicos para diferenciação das vogais são também
um estudo de ressonância. Assim como a sugestão do uso alternado de [e] e o [#], Miller
recomenda que este tipo de combinação seja feita entre outras vogais anteriores e posteriores.
57
The buccal dimension for [#] is smaller than for [!].
58
In executing [o], the tongue is depressed in its anterior portion; elevation of the posterior part of the tongue,
characteristic of all back vowels, is also present.
55
mesma ressonância vocal”59 (Miller, 1996, p. 76). Observa-se no discurso de Miller que o
canto lírico busca idealmente a equalização do timbre, prática que é pouco comum no canto
popular em geral. Entretanto, uma voz equilibrada, estável e com uma técnica sólida poderá
executar os sons que o cantor idealizar, sem restrições, sem quebras de registro ou
O exercício 5.1 de Miller (ver Ex. 1.9, p. 57) é de fácil aplicação para alunos iniciantes
e acreditamos que seria interessante tê-lo praticado com nosso grupo de alunos durante
estágio docente. Em função da orientação das aulas para outras prioridades, não aplicamos
este exercício especificamente, mas fizemos outros semelhantes, tanto no aquecimento vocal
Adriana Kayama60 em 1998 que nos trouxe bons resultados quanto à emissão equilibrada das
vogais. Conforme Exemplo 1.9, o exercício de Kayama propõe a emissão ligada de uma única
nota enquanto vocaliza-se a passagem pelas vogais [i, e, a, o, u]. As orientações do exercício
5.1 de Miller quanto ao posicionamento de mandíbula, boca e lábios devem ser seguidas
59
Subsequent alternation between front and back vowel combinations and changing pitch levels, with the aim of
maintaining the same vocal resonance.
60
Adriana Kayama é Professora Doutora da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). É Bacharel em
Composição e Regência pelo Instituto de Artes - UNICAMP (1985) , Mestre pela University of Washington
(1987) e Doutora em Artes Musicais pela University of Washington (1990).
56
EXEMPLO 1.9: Exercício para equilíbrio da emissão das vogais de Kayama e tradução do exercício 5.1 de
(Miller, 1996, p.76)61.
Outro exercício que utilizei em minha prática individual e apliquei aos alunos durante
seqüência das vogais da letra da canção em estudo, retirando todas as consoantes do trecho.
Após o aprendizado da melodia, era proposto aos alunos que vocalizassem a peça utilizando
uma única vogal do começo ao fim, passando por sete sons de vogais comuns à sonoridade do
português brasileiro [i, e, ", a, #, o, u]. Em seguida, o aluno era orientado a fazer um mapa da
seqüência de vogais que ocorriam ao longo da peça. O Exemplo 1.10 a seguir demonstra o
61
(1) Pronounce these two patterns alternately, at normal speech level, in legato fashion, allowing lips and jaw to
move naturally, without exaggeration. (2) There should be no attempt to hold one position of lips, jaw, tongue,
or mouth. (3) No attempt should be made to differentiate the vowels by excessively mouthing or shaping them.
(4) Observe the limited but discernible movement of the mouth as the vowels are articulated. (5) Increase tempo
so that the vowels must be quickly enunciated, but avoid slurring or transition sounds. The same articulation
occurs, regardless of speed.
57
EXEMPLO 1.10: Exercícios a partir das peças Com que roupa e Choro pro Zé e
exercícios 5.5, 5.7 e 5.9 traduzidos de (Miller, 1996, p. 77 e 78).
compreensão das funções que as consoantes podem exercer no treinamento vocal tanto para
58
condicionamento dos músculos do trato vocal e condicionamento do músculo vocal
propriamente dito.
foco desta pesquisa se concentrará em três fontes: (1) nas referências de Miller (1996); (2) no
boletim da Associação Brasileira de Canto (ABC) apresentado por Cristófaro Silva (2007) e
respectiva atualização publicada em artigo da revista OPUS pelo grupo de autores Kayama,
Carvalho, Castro, Herr, Rubim, Pádua, Matos (2007); e (3) na tabela internacional do código
AFI.
As consoantes [t] e [d] por exemplo, são classificadas por Miller como
define [t] e [d] como linguodentais. No decorrer de seu texto Miller justifica que quando
cantada, a consoante [d], assemelha-se ao símbolo fonético [d!] que é definido como
base na tabela AFI, mas analisamos o uso funcional de cada consoante segundo Miller.
As consoantes nasais contínuas (ou fricativas) são: a bilabial [m], a alveolar [n], a
velar [!], e palatal ["]. O artigo de Thaïs Cristófaro Silva (2007) apresenta uma descrição dos
Encontro Brasileiro de Canto que ocorreu em São Paulo em fevereiro de 2005. A partir da
tabela de Silva (2007) e em acordo com a tabela publicada posteriormente pela OPUS (2007)
a palatal ["] é definida como o encontro consonantal |nh| das palavras |minha| e |sonho|.
Representado somente na tabela de Silva (2007) o som da velar [!] é percebido na junção da a
vogal [i] com as consoantes [n] ou [m] em final de sílabas ou palavras como em |inverno|,
|afinco|, |jardim|.
59
As consoantes não-nasais selecionadas para este trabalho em razão de sua
aplicabilidade ao treinamento técnico do cantor são: a alveolar vibrante simples [!] como em
|caro| e |arara|; a alveolar vibrante múltipla [r] como nos encontros consonantais |prisão| e
|Brasil|, mas que no uso pedagógico é treinada a prolongação da sua vibração tanto quanto
fricativas surda [f]; a bilabial oclusiva sonora [b] e a bilabial oclusiva surda [p]; a alveolar
fricativa sonora [z] e a alveolar fricativa surda [s]; a alveolar oclusiva sonora [d] e a alveolar
oclusiva surda [t]; e oclusiva sonora [g] e da velar oclusiva surda [k].
treinamento vocal nesta pesquisa. Miller apresenta um número de consoantes ainda maior ao
idioma italiano, tido como referência principal no treinamento de cantores líricos, e do idioma
inglês falado por norte-americanos. Para fins de praticidade, será considerada a pronúncia das
diferenciam-se quanto ao seu posicionamento na cavidade oral. “Na produção do [m] toda a
extensão da cavidade bucal é utilizada como uma câmara de ressonância”62 (Miller, 1996, p.
81). Para sua produção, a língua deve estar em posição relaxada e portanto vocalizes com o
Pinho e Pontes (2008) utilizam os mesmos fonemas nasais citados por Miller
62
In the production of [m] the full length of the buccal cavity is used as a resonating chamber.
60
ocorrem no trato vocal para cada fonema, desde uma emissão mais gutural até a sensação
vibratória mais alta obtida com o uso do [!] com palato elevado. A Figura 1.3 a seguir mostra
a localização dos diversos fonemas consonantais com relação à percepção ressonantal óssea
indicadas por Pinho e Pontes. Sugerimos que se desenvolvam pesquisas mais aprofundadas
sobre o uso das nasais com base em Pinho e Pontes (2008) e sua aplicabilidade na técnica
vocal, tanto no canto popular quanto no canto erudito. Neste trabalho o foco é a proposta de
devem ser apertados gerando tensão. A língua está relaxada com a ponta tocando os incisivos
inferiores e qualquer tentativa de retração da língua deve ser evitada. Durante a produção de
[m] a qualidade de som é nasal e essa nasalidade não deve permanecer quando a boca se abre
para emissão da vogal subsequente tanto nos exercícios quanto na letra de uma canção.
Entretanto, a sensação vibratória distinta que é vivenciada nas regiões da faringe, do nariz, da
boca e do sinus (seios da face) deve ser permanente tanto no [m] quanto nas vogais que o
61
mais acima, na região da mandíbula superior e dos seios maxilares”63 (Miller, 1996, p. 84). A
muito relevante no estudo do canto. “Quando um cantor tem dificuldade em vivenciar uma
sensação frontal satisfatória, [n] pode ser uma ferramenta melhor que [m] para adquirir esta
habilidade”64 (Miller, 1996, p. 84). Outra vantagem de [n] é o fato da boca estar semi-aberta
durante sua produção, de maneira que a transição entre consoante e vogal subseqüente é
A consoante nasal [!] é produzida numa posição semelhante a oclusiva [g] mas em [!]
a região nasofaríngea permanece aberta. A função pedagógica de [!], assim como [m] e [n], é
também o equilíbrio de ressonâncias, sendo que [!] é semelhante a [n] quanto a prioridade de
sensação de ressonância na máscara. Alguns foneticistas afirmam que a cavidade bucal não
A quarta consoante nasal ["] assim como [n] e [!], prioriza as sensação de ressonância
frontal, sendo que em ["], segundo Miller, pode ser mais concentrada “no centro da máscara,
ou por trás do nariz, dos olhos, ou em alguma área relacionada com o rosto, dependendo da
A vibrante múltipla prolongada [r] é comumente adotada pela maioria dos professores
de canto e ela é realmente fundamental no treinamento técnico vocal. Seu uso adequado é
muito eficiente no relaxamento da língua para viabilizar uma emissão livre. “A vibração de
63
[it] is located higher, in the region of the upper jaw and maxillary sinuses.
64
When singers fail to experience sufficient frontal sensation, [n] may be a better key to its accomplishment than
[m].
65
in the center of the masque, or behind the nose, the eyes, or in some related area of the face, depending on
subjective responses of the singer.
62
ponta de língua é um dos dispositivos técnicos mais importantes para induzir o relaxamento
Além da vibrante múltipla prolongada [r] Pinho e Pontes (2008) sugerem vários
exercícios de vibração lingual e labial. Sons fricativos sonoros prolongados também podem
ser utilizados como recurso para o treinamento das trocas de registro, e são muito úteis ao
contato entre as pregas vocais que cada prática oferece (ver Quadro 1.2).
Quadro 1.2 – Quociente de Contato (QC%) obtido por EGG (eletroglotografia) para freqüência e
intensidades constantes (Pinho; Pontes, 2008, p. 54)
Fonema ou som sugerido QC Explicação
Vibração de língua /r/ 42,60 Ajuda a relaxar a musculatura lingual com o deslizamento da borda
livre drenando e ativando a circulação das pregas vocais
Vibração de lábio /b/ 47,55 Idem acima e permite acessar regiões mais agudas que a vibração de
língua
Fricativa /v/ de vaca 53,12 Colabora com a adução pela aproximação do músculo vocal e
também trabalha a borda livre
Fricativa /j/ de jato 53,84 Idem acima com mais aproximação
Fricativa /z/ de zebra 56,59 Idem acima com mais aproximação. Maior QC, ou seja, o fonema
que mais colabora para a aproximação das pregas vocais.
canto e à fala, principalmente no que se refere à saúde vocal. É possível realizar as vibrações
sem uma afinação precisa ou em vocalizes com alturas definidas. Observe que exercícios com
/v/, /j/ e /z/ colaboram para a aproximação das pregas vocais o que implica no fortalecimento
dos músculos adutores (que fecham as pregas na parte posterior). Esse tipo de exercício
Quando iniciei meus estudos com Rubim em 2007 eu já tinha muitos anos de estudo
de canto com diversos professores de técnica vocal, e mesmo tendo sido orientada várias
vezes a praticar a vibração de ponta de língua com o [r] prolongado, eu não conseguia fazê-
66
The tongue-point trill is one of the most important of all technical devices for inducing looseness of the tongue
at both its frontal and its hyoidal extremities.
63
lo. Minha língua simplesmente não respondia a este comando e eu, então, fui me dedicando
ao desenvolvimento de outros aspectos técnicos. Após várias aulas com Rubim e sessões de
fonoterapia eu finalmente consegui fazer o prolongamento do [r] vibrado e tive uma melhora
localização física de [v] estimula as sensações na área máscara do rosto”67 (Miller, 1996, p.
96). A consoante [v] assim como [r] é muito especial para o treinamento vocal. Durante meu
estudo dos choros a prática constante de glissandos com [v] foi de extrema importância para o
adução. Os resultados foram a melhora significativa da projeção vocal e uma unificação dos
registros mais equilibrada. Uma citação de Pinho e Pontes (2008) justifica os benefícios de
Exercícios utilizando-se fricativas sonoras prolongadas (“v”, “z”, “j”) produzidas suavemente
e com a laringe baixa parecem auxiliar aumentando a amplitude vibratória da mucosa das
pregas vocais na sua superficialidade, por provável aumento de fluxo e pressão intra-oral
(Pinho; Pontes, 2008, p. 54).
Ainda “na produção de [v], os lábios assumem algo da posição horizontal do sorriso,
evitando qualquer postura vertical bucal”68 (Miller, 1996, p. 96). A postura do sorriso é
eficiente na elevação do véu palatino que no meu caso particular foi diagnosticado como
flácido em primeira seção de avaliação fonoaudiológica: “O seu véu palatino está um pouco
frouxo” (Luciana Oliveira, 2009, sessão I). O trabalho com o [v] entre outros exercícios,
67
The physical location of [v] encourages sensations in the masque area of the face.
68
In the production of [v], the lips assume something of the horizontal smile position, avoiding any vertical
buccal posture.
64
“No canto, é significativo que, na execução de [v] e [z] e de seus companheiros surdos
[f] e [s], a língua não precise sair de sua posição acústica de repouso”69 (Miller, 1996, p. 95 e
96). As fricativas surdas [s] e [f], em especial, são muito utilizadas e conhecidas por sua
Exercícios em staccato com [s] e [f] são amplamente utilizados por professores de canto.
As consoantes [z] e [s] tem funções semelhantes às [v] e [f], mas como nas primeiras o
fechamento é ainda maior “[z] e [s] são especialmente úteis para corrigir uma qualidade vocal
A consoante [p] foi bastante utilizada durante o treinamento vocal para estudo dos
choros. Atrelada a vogal [i] o vocalize [pi, pi, pi, pi] de melodia descendente (8, 5, 3, 1) foi
utilizado para trabalhar uma emissão mais frontalizada, estimulando a sensação de produção
do som na direção do palato duro e da cavidade oral ao invés do som gutural (na garganta).
Este exercício proposto por Rubim é semelhante ao 7.14 proposto por Miller (ver Ex. 1.17 e
1.18, p. 70). Durante estágio docente colhemos resultados satisfatório com o uso deste
A postura dos lábios durante [b] e [p] permanece na posição central, em repouso, porém
fechados, ocasionando um aumento de pressão de ar na boca […] A liberação súbita dos lábios
muitas vezes traz a percepção de que “som” foi produzido diretamente nos lábios, e isso tem
implicações psicológicas (bem como fisiológicas) para as pessoas cuja atenção tem sido
excessivamente voltada para as áreas da faringe e laringe71 (Miller, 1996, p. 96 e 97).
da faringe e o aumento da adução glótica (Pinho; Pontes, 2008, p. 61). Segundo Pinho e
69
In singing, it is significant that in executing [v] and [z], and their voiceless mates [f] and [s], the tongue need
not to move from its acoustic, at-rest posture.
70
[z] and [s] are especially useful in correcting hollow and unfocused vocal quality.
71
Lip posture during [b] and [p] remains in the central, at-rest position, although occluded, occasioning an
increase of air pressure in the mouth […]The sudden release of the lips often brings the perception that “tone”
has been directly produced at the lips, and this has psychological (as well as physiological) implications for
persons whose attention has been excessively directed toward the pharyngeal and laryngeal areas.
65
provavelmente por aumento da atividade intrínseca da laringe” (Pinho; Pontes, 2008, p. 61).
No item a seguir é exemplificado o exercício de prolongamento do [b] (ver Ex. 1.15, p. 70).
Sobre a consoante [d] (como em dói), ao invés de descrever sua função pedagógica,
Miller alerta para o fato de que “em um [d] mal produzido, há muitas possibilidades para a
tensão vocal, pois as pregas vocais são aproximadas, a porta nasofaríngea está,
1996, p. 100).
diferença de que pelo fato de ser surda não promove a aproximação das pregas vocais e então
a tensão de fechamento glótico é menor. Em casos em que a pronúncia de uma palavra com a
consoante [d] se dê com muita pressão glótica, a substituição de [d] por [t] como forma de
exercício pode ser uma solução de alívio de tensão. “Depois de praticar a passagem com [t!]73,
algumas vezes, [d] se torna mais fácil”74 (Miller, 1996, p. 101). Atenção para não usar o som
de /t/ e /d/ palatalizado como em tio e dia que soam /tchiu/ e /djia/ respectivamente, pois esta
Assim como [t] e [d], [g] (como em gato) também é uma consoante que exige cuidado
em razão do fechamento glótico, porém em [g] o fechamento é total e segundo Miller, essa
A parte posterior da língua elevada toca o véu palatino e pressiona contra a parte posterior do
palato duro. No entanto, precisamente por causa desta oclusão, [g] traz recompensas para o
cantor./ O ar, quando é finalmente liberado pela paralisação ocasionada pela consoante [g],
explode diretamente na cavidade bucal, produzindo uma condição de abertura do canal entre a
orofaringe e da cavidade oral. A sensação decorrente deste evento é muito distinta e
extremamente útil. Quando um cantor adota habitualmente uma postura velar baixa, com
consequente nasalidade e qualidade de som fraca, o uso de [g] pode ser um antídoto valioso.
72
In a badly produced [d], there are many possibilities for vocal tension, because the vocal folds are
approximated, the port into the nasopharynx is probably closed, and tongue elevation prevents the escape of air
through the mouth.
73
[t!] é uma variação de [t]. No AFI [t] é somente alveolar e [t!] é dental alveolar.
74
After practicing the passage with [t!] a few times, [d] is made easier.
66
Mesmo quando tais falhas não estão presentes, [g] tem grande valor como um condicionador
de equilíbrio de ressonância adequada75 (Miller, 1996, p. 103).
A velar oclusiva surda [k] promove essa mesma sensação de liberação de [g] com a
vantagem de que pode ser utilizada em exercícios sem adução das pregas vocais. Exercícios
com [g] e [k] associados a vogais como os do Exemplo 1.16 (ver p. 70) que foram sugeridos
por Miller, ampliam a consciência de elevação do véu palatino durante o canto e por isso “são
Miller (1996) afirma que o mesmo princípio de resolução de problemas descrito acima
também pode ser aplicado à qualquer dificuldade de dicção que venha a surgir no repertório
vocal. “Se a língua tropeça em alguma combinação de fonemas, os sons podem ser extraídos e
exercícios criados especialmente para o estudo dos choros, os vocalizes seguintes foram
extraídos dos capítulos 6 e 7 de Miller em comparação com alguns exercícios propostos por
O Exemplo 1.11 apresenta exercícios propostos por Miller para controle de nasalidade
75
The elevated back of the tongue touches the velum and presses against the rear portion of the hard palate. Yet,
precisely because of this occlusion, [g] has merit for the singer./ Air, when finally released from the stoppage
involved in the consonant [g], explodes directly into the buccal cavity, producing a condition of openness in the
channel between the oropharynx and the oral cavity. The sensation from that event is very distinct and extremely
useful. When a singer habitually suffers from a lowered velar posture, with resultant nasality and thinness of
quality, the use of [g] can prove to be a valuable antidote. Even when such faults are not present, [g] has great
worth as a conditioner of proper resonance balancing.
76
They are ideal for eliminating nasality in the singing voice.
77
If the tongue stumbles on some phonemic combination, those sounds may be extracted and made into an
exercise.
67
EXEMPLO 1.11: Exercícios 6.2 e 6.5 traduzidos de (Miller, 1996, p. 82 e 84)
Fillebrown (1911, pp. 58-59 apud Miller, 1996, p. 85), famoso até os dias atuais, em que ele
combina os fonemas [!] e [g]. Outro exercício semelhante adotado por Rubim é o uso da
consoante [!] combinada com sua semelhante em posicionamento [g] como é apresentado no
EXEMPLO 1.12: Exercício 6.7 traduzido de (Miller, 1996, p. 86) e exercício 1 de Rubim (2008)
Durante o meu estudo prático nesses dois anos de mestrado a consoante ["] cuja
prática interessante em que ora o fonema ["] está no meio da palavra e ora ele aparece no
68
início. A combinação proposta de ["] com a vogal [i] se apresentou inusitada diante de minhas
práticas anteriores que se davam principalmente em combinações de ["] com as vogais [a] e
["].
EXEMPLO 1.13: Exercício 6.9 traduzido e adaptado79 de (Miller, 1996, p. 87) e exercício 2 de Rubim (2008)
O exercício de glissando com a vibração contínua da consoante [r] seguida das vogais
alternadas posterior/frontal/posterior [u], [i], [u] (ver Ex. 1.14) foi proposto por Rubim e fez
parte do grupo de vocalizes utilizados para o aquecimento vocal coletivo durante estágio
O exercício a seguir (ver Ex. 1.15, p. 70) foi uma das práticas em minhas sessões de
78
O exercício 2 de Rubim: /uénha,uénha/ foi ensinado a Rubim em 2008 pelo maestro Marcelo Castro, durante
os ensaios do musical A Noviça Rebelde.
69
A retenção da oclusiva bilabial [b] consiste no fechamento dos lábios, preenchimento da cavidade oral com ar
e produção concomitante de sonorização por período curto ou longo (pensar em produzir um /u/ com os lábios
ocluídos)80. A duração da retenção depende das necessidades adutoras (maior duração, maior adução). A vogal
é liberada com suavidade [b+a]. É fundamental certificar-se de que o fechamento velofaríngeo seja completo e
que o som não esteja escapando pelo nariz.
EXEMPLO 1.15: Exercício de retenção de [b] extraído de (Pinho; Pontes; 2008, p. 61)
variadas apresenta-se a seguir exemplos de vocalizes propostos por Rubim (2008) e por
Miller (1996) que foram estudados durante esta pesquisa. O exercício 4 de Rubim, no
Exemplo 1.17 a seguir, foi muito utilizado em minha prática individual para treinar a emissão
vocal mais frontalizada e o exercício 5, também de Rubim, foi adotado para os alunos homens
das vogais.
79
Na tradução do exercício 6.9 de Miller, não conseguimos reproduzir na partitura a imagem do símbolo ["] e
por isso ele foi substituído por sua representação sonora /nh/
80
Pinho SMR. Tópicos em voz. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2001. p. 154
70
EXEMPLO 1.17: Exercícios 4 e 5 de Rubim (2008)
treinamento da emissão equilibrada das vogais enquanto o exercício 7.14, também de Miller,
variados da voz cantada. Em duas edições do final do ano de 2004, Dorothy Warenskojold e
81
Revista do Canto - publicada em Nova York pela Associação Nacional dos Professores de Canto dos Estados
Unidos. (NATS – National Association of Teachers of Singing)
71
Myra J. Brand, foram entrevistadas sobre a seguinte questão: “Por onde começar? Agilidade
ou sustentação?”.
principal em renomadas companhias de ópera dos Estados Unidos além de ter sido professora
professora emérita da Universidade de Western Oregon (WOU) onde ensinou canto e outras
disciplinas relacionadas por trinta e quatro anos. Em 1985 Brand foi premiada como a docente
Sobre a questão apresentada pelo Journal of Singing, Warenskojold não acredita que
começar um estudo vocal com notas longas e sustentadas seja uma boa opção quando se trata
de alunos iniciantes. Para ela esse tipo de conduta inicial pode causar tensão e
Warenskojold apresenta cinco exercícios que ela exemplifica ao longo de seu artigo e ainda
sugere alguns vocalizes dos métodos Italianos Vaccai e Lamperti, os quais foram as
Brand, por outro lado, defende prontamente o uso de exercícios com uma única nota
sustentada logo na primeira aula. Ao longo da coluna Brand explica várias vantagens de um
exercício específico que aprendeu com Hubert Kockritz, quando ela ainda era uma jovem
professora, durante uma semana de curso de pedagogia vocal na WOU onde Kockritz era
O exercício adotado por Brand consiste em sustentar uma única nota numa região
realizar movimentos exagerados com o maxilar e mantendo a língua o mais próximo possível
da posição de repouso, relaxada e com a ponta pra frente. Depois de adquirir certo domínio
desta prática ela sugere variar a tonalidade de meio em meio tom para o agudo e para o grave.
72
Segundo Brand este exercício é também um excelente sinalizador de tensões indesejadas, bem
controle respiratório e do ataque equilibrado são fundamentais para a boa execução deste
Após a leitura das duas entrevistas citadas, foi interessante observar que a adaptação
do exercício sugerido por Brand para resolver problema de falta de ataque equilibrado,
Exemplo 1.19 deste trabalho (ver p. 74). Embora as duas autoras tenham opiniões divergentes
sobre o uso de exercícios de sustentação com alunos iniciantes, ambas tem condutas
semelhantes na medida em que o problema vocal é trazido pelo aluno. Talvez Warenskojold
introduza os pontos de dificuldade com mais cautela que Brand, mas foi possível perceber que
isocrônico, da produção equilibrada das vogais e controle de ressonância estável para obter
exercícios de sustentação e o sucesso de sua prática pedagógica confirma que sua conduta
também traz bons resultados, Miller assemelha-se a Warenskojold na medida em que defende
73
Descrição da adaptação: Se eles (alunos) têm dificuldade em realizar esse desafio (referindo-se ao
exercício original sustentado), deve-se introduzir um exercício que centra a atenção no ataque
inicial. Uma maneira de abordar esta dificuldade é cantar a mesma seqüência de vogais da versão
original, mas com a inserção de um /m/ antes de cada vogal, interrompendo as sílabas com uma
breve respiração entre elas como uma “alegre surpresa”. Isso deve resultar em um canto curto de
sílabas vibrantes - /mi-me-m!-mo mu/82 (Brand, 2004, p. 51).
EXEMPLO 1.19: Comparação dos exercícios propostos por Warenskojold (2004, p. 165) e Brand (2004, p. 51)
(Adotamos a mesma tonalidade e altura para os dois exercícios acima para fins de comparação. Brand, na
verdade, apenas descreve seu exercício e não define uma altura específica para sua execução. Apenas menciona
que deve ser realizado numa região confortável da extensão vocal.)
momento Brand questiona “Por que começar o treinamento de uma voz com exercícios
expansivos para flexibilidade quando a qualidade do som desejável, que seria aceitável tanto
para o aluno quanto para o professor, ainda não foi determinada?”83 (Brand, 2004, p. 51). A
partir desta pergunta Brand justifica o uso do seu exercício de nota sustentada para a
conquista de uma estabilidade mínima antes de avançar para exercícios mais complexos.
estabilidade mínima antes de avançar para exercícios mais complexos, mas para ele, os
exercícios de sustentação fazem parte do grupo de exercícios complexos que ele não
recomenda para cantores iniciantes. “Até que cantores dominem o ataque, a frase curta, a
finalização habilidosa e a capacidade de cantar com agilidade, eles vão enfrentar acúmulo de
82
If they have difficulty accomplishing that challenge, one should introduce an exercise that focuses attention on
the onset it self. One way to approach this is by singing the same vowel sequence mentioned earlier, but
inserting an /m/ before each vowel and disconnecting the syllables with a quick breath between them as though
"happily surprised." This should result in singing short, vibrant syllables - /mi-me-ma-mo-mu/
74
84
tensão e fadiga em frases sustentadas” (Miller, 1996, p. 108). Miller ainda afirma que
último teste que se faz para avaliar a habilidade técnica de um cantor (Miller, 1996, p. 108).
Após avaliação cuidadosa da seqüência de exercícios propostos por Miller para treino
de sustentação em comparação com o exercício apresentado por Brand, verificou-se que eles
parecido com o exercício 5.1 de Miller, apresentado no Exemplo 1.9 (ver p. 74) desta
dissertação, que tem como função principal trabalhar a emissão equilibrada das vogais.
Apesar das diferenças evidentes quanto à conduta pedagógica dos três professores de
canto, a observação analítica feita sobre a prática de cada um deles a partir de seus preceitos
e sustentação – são objetos de grande importância no estudo da técnica vocal. Miller defende,
pedagógica, em acordo com Miller, defendemos que o estudo de agilidade deve anteceder o
de sustentação não apenas pela questão muscular envolvida mas também pelo fato de que os
exercícios de agilidade contribuem para a precisão da afinação, uma vez que desenvolvem a
83
Why begin the training of a voice with more expansive exercises for flexibility when a desirable tone quality,
one acceptable to both student and teacher, has not yet been established?
84
Until singers master the onset, the brief phrase, and the skillful release, and can sing agilely, they will
experience cumulative strain and fatigue on sustained phrases
75
1.5.2 Agilidade e sustentação
parece ser uma prioridade. O repertório mais comum consiste, muitas vezes, da musicalização
de um texto poético e sua execução ocorre em andamentos moderados o que permite uma
inteligibilidade quase natural por sua proximidade com o andamento da fala. Adriana
artigo Fábrica da canção “A melodia vem do acento daquela frase falada, ou lida em voz
alguns sambas mais rápidos, são encontrados desafios melódicos que trazem ao intérprete a
decorrentes desta prática. Ele afirma que o estudo de agilidade vocal trabalha diretamente a
aspecto sustentação, Miller explica o processo fisiológico que ocorre no aparelho fonador
85
A Estrutura do Canto – tradução nossa.
86
The same umbilical-epigastric control that permits the precise onset, the staccato, the pant, and the execution
of velocity or coloratura passages also produces the sostenuto (The sustained line).
87
Idem 85.
76
durante a emissão de frases longas e sustentadas justificando a complexidade destes trechos
para o cantor e a importância de um bom controle respiratório para sua boa execução.
Miller alerta ainda que em função da dificuldade real que existe para produção de um
canto energizado com liberdade na glote alguns cantores tendem a evitar esse desafio optando
por uma emissão mais relaxada e com certo abuso de soprosidade. Outra tendência recorrente
dessa dificuldade pode ser a emissão com excesso de constrição laríngea, muito comum em
alguns estilos de canto popular como os que Abreu (2008) classificou como canto “de risco”
(ver p. 24).
Apesar da estética do canto popular praticamente não ter objeções nem com a emissão
soprosa nem com a emissão que promove a constrição laríngea, é um fato que ambas são
contraproducentes para a sustentação de uma frase longa na melodia, porque todas duas
mais rapidamente enquanto que a emissão com excesso de força propicia um colapso com
fechamento da caixa torácica e conseqüente perda do ar que seria utilizado para a fonação.
Miller propõe 24 exercícios para aquisição de agilidade que podem ser divididos
didaticamente em dois subgrupos: (1) Grupo dos graus conjuntos – formado pelos
exercícios 3.1 a 3.15, 3.17 e 3.20 (ver Ex. 1.20, p. 81) constituídos por sequências variadas
88
The problem in sustained singing is that primitive sphincter action, which ordinarily prevails in such heavy
activities as lifting and pulling, is often carried over into energized singing. During powerful sustained singing,
the larynx is subjected to subglottic pressure. The singer must learn to be schizophrenic, engaging the respiratory
musculature for heavy duty while not pressing the laryngeal valve. Indeed, freedom at the glottis can be present
77
ou vice e versa, combinando agrupamentos a partir de duas notas até escalas de nove notas,
segunda maior ou menor; (2) Grupo dos arpejos e saltos – formado pelos exercícios mais
difíceis deste capítulo, 3.16, 3.18, 3.19 e 3.21 a 3.24 (Miller, 1996, p. 45-47). Miller sugere
que os exercícios 3.21 a 3.24 sejam destinados apenas a cantores avançados tecnicamente;
entretanto, a partir da minha experiência prática com esta série, sugiro que o exercício 3.18
seja acrescentado ao grupo destinado aos cantores mais avançados no estudo técnico vocal.
Com exceção do exercício 3.1 (Miller, 1996, p. 42), que apresenta dois compassos
com staccati de semínimas, todos os outros 23 exercícios são em legato. Segundo Miller, a
nas orientações sobre como realizar os exercícios propostos no capítulo 3 Miller chama a
atenção dos estudantes para que não confundam os fraseados em legato com exercícios de
staccati.
Embora haja uma relação entre o funcionamento das passagens de legato articuladas
adequadamente e a articulação do staccato, qualquer tendência em usar a aspiração como um
artifício de articulação das mudanças de alturas deve ser evitada. O corista amador pode
recorrer à interpolar sílabas “ha-ha-ha-ha” como um meio de executar passagens rápidas
limpas, mas o cantor treinado não89 (Miller, 1996, p. 41).
exercícios, esta sessão 1.5.3 foi pouco trabalhada com os alunos da disciplina de Canto
Complementar, com os quais foi realizado o estágio docente. Foram trabalhados exercícios
seqüência proposta por Miller. De qualquer forma, alunos que durante as aulas coletivas
in the long phrase only if breath emission is controlled in the epigastric-umbilical and costal regions.
89
Although there is a relationship between the function of properly articulated legato passages and staccato
articulation, all tendency toward aspiration as a device for articulating moving pitches must be avoided. The
amateur chorister may resort to interpolated “ha-ha-ha-ha” syllables as means for achieving clean moving
passages, but the skilled singer may not.
78
optaram por peças que traziam desafios de agilidade, indiretamente, treinaram o controle dos
triádicos e tonais, são diretamente aplicáveis ao estudo técnico necessário para o repertório de
choro. O Exemplo 1.20 a seguir (ver p. 81) mostra a inter-relação entre quatro dos exercícios
mencionados de Miller com quatro trechos melódicos de três choros rápidos que foram
O exercício 3.14 (ver Ex. 1.20, p. 81), embora não seja diretamente correspondente à
rápida e ligada do começo ao fim. O exercício 3.18 (ver Ex. 1.20, p. 81) apresenta uma série
trechos, ora ascendentes, ora descendentes. Também é muito comum o arpejo de acordes com
7a dominante. No repertório estudado não foi encontrado nenhum trecho com uma seqüência
choros, no Exemplo 1.20 (ver p. 81) é apresentado um trecho de Um a Zero onde identificou-
O exercício 3.22 (ver Ex. 1.20, p. 81) é bem desafiador tecnicamente porque propõe
uma sequência de saltos de oitava a serem realizados apenas com vogais e em andamento
possuir algumas notas de passagem, este trecho exige destreza do intérprete para realizar dois
saltos de oitava quase em sequência e ainda tentar expressar com clareza o texto da letra
acrescentada ao choro. O exercício 3.23 (ver Ex. 1.20, p. 81) apresenta uma seqüência
79
contrária à da melodia que encontrada em Apanhei-te cavaquinho e, mesmo assim, ele
possibilitou o estudo de saltos variados a partir de uma única nota, e serviu de referência para
Segundo orientação de Miller, os exercícios de sustentação propostos por ele não são
recomendáveis para alunos iniciantes, antes que estes conquistem certo conforto pelo menos
com o primeiro grupo dos exercícios prévios de agilidade. Foi constatada em nossa prática
uma melhora considerável na sustentação de frases longas após o estudo de agilidade somado
No Exemplo 1.21 (ver p. 82) é sugerido o exercício de sustentação 8.5 proposto por
Miller em comparação ao trecho da valsa Rosa de Pixinguinha, que é uma peça com vários
lento para sua execução. Outro fator que aumentou a dificuldade em Rosa no trecho
selecionado foi a escolha de não interromper a frase melódica após a palavra “nuvens”, nem
mesmo com uma breve respiração, como é comum na maioria das versões encontradas em
dissertação.
80
EXEMPLO 1.20: Comparação de trechos dos choros com exercícios de agilidade de
(Miller, 1996, p. 45 a 47).
81
EXEMPLO 1.21: Comparação do exercício 8.5 traduzido de (Miller, 1996, p. 110) com frase longa da valsa
Rosa.
Contrário à conduta didática de LoVetri (2009) que inicia sua abordagem de ensino do
canto a partir da diferenciação e prática dos registros, classificados por ela como sendo peito,
mistura e cabeça, Miller defende que o estudo de registros só deveria iniciar-se depois que os
Registro vocal não é o ponto no qual se começa a construir ativamente uma técnica vocal
sistemática: estudos para treino dos registros pertencem a um trabalho técnico avançado. O
controle básico da respiração, a articulação fonética e ressonância equilibradas devem ser
estabelecidos antes que um cantor direcione grande atenção aos registros da voz cantada90
(Miller, 2000, p. 15).
didático-pedagógica entre Miller e LoVetri quanto ao estudo dos registros é também, de certa
forma, relativa.
criado por LoVetri tive a oportunidade de participar da primeira dinâmica de grupo no qual
ela trabalhou a diferenciação de registros com alunos de canto de diversos níveis de formação.
90
Vocal registration is not the locus at which to begin actively building systematic vocal technique: studies in
registration skill belong to advanced technical work. Basic breath management, phonetic articulation and
resonance balancing must be established before a singer turns extensive attention to the registers of the singing
voice
82
A prática aplicada por LoVetri consistiu basicamente na sensibilização auditiva e corporal
para identificação e emissão dos registros de peito e cabeça separadamente. Em outra prática
arpejos de tétrades perfeitas para unificação de registros, mas é claro que a desenvoltura de
cada aluno nesses vocalizes se dava em acordo com estágio de desenvolvimento técnico de
cada um.
As orientações de Miller para estudo de registros, por outro lado, traz outro nível de
exigência aos estudantes de canto de maneira que exercícios propostos por ele como o 9.19 e
9.20 (ver Ex. 1.23, p. 86) exigem que o aluno tenha adquirido grande estabilidade laríngea
para executá-los de forma satisfatória. Exercícios como 9.19 e 9.20 de Miller assemelham-se
ao 3.22 (ver Ex. 1.20, p. 81) proposto por ele para aquisição de agilidade, quando se observa a
para o equilíbrio entre as passagens de registros. Além disso, Miller também alega que “as
nasais contínuas produzem vibração simpática facial como as que são associadas à ação dos
músculos da laringe equilibrada”92 (Miller, 1996, p. 127). Isso justifica o uso de consoantes
nasais associadas a vogais em vocalizes propostos para unificação de registros. Miller ainda
afirma “A zona di passaggio é a chave para uma escala de registros uniforme”93 (Miller,
1996, p. 126).
primeira e segunda passagens dos registros. Sob orientação de Rubim, dentre outros
vocalizes, foram estudados exercícios com [v] e ["] associados a vogais com o objetivo de
91
Trabalho de voz somático
92
Nasal continuants produce sympathetic facial vibration of the sort associated with the balanced laryngeal
muscle action.
93
The zona de passaggio is the key to evenly registered scale.
83
unificar os registros, mantendo o timbre característico da voz falada desejável para a
Semelhante a LoVetri (2009), Miller classifica os registros da voz cantada como sendo
voz de peito, voz mista e voz de cabeça. Esses três registros encontram-se na extensão da voz
classificada como registro modal pela fonoaudiologia (Behlau, 2008 vol. I, p. 108). O falsete
está presente na extensão aguda das vozes masculinas e a voz feminina apresenta o registro de
flauta ou apito que não é correspondente ao falsete fisiologicamente como alguns tendem a
imaginar. “As vozes agudas femininas não apresentam um falsete, e sim um apito da laringe,
que não é produzido pela vibração das pregas vocais, mas sim pelo escape de ar entre elas”94
Para fins didáticos alguns professores de canto fazem uma equivalência entre o falsete
masculino e a voz de cabeça feminina. Em palestra com LoVetri em março de 2010 ela
justificou que faz uso desta equivalência entre falsete e voz de cabeça especialmente em
cursos breves e com alunos iniciantes para evitar discussões aprofundadas sobre aspectos
fisiológicos que, segundo ela, num primeiro momento, não irão contribuir para o
desenvolvimento técnico do cantor. Rubim concorda com LoVetri que a diferenciação entre
voz de cabeça e falsete não representa mudanças consideráveis nas condutas pedagógicas.
Segundo Rubim, o treinamento para unificação de registros entre voz de peito e cabeça nas
mulheres, e voz de peito, cabeça ou falsete nos homens é basicamente o mesmo. É necessário
distribuir a tonicidade do mecanismo de peso e leveza que perpassa todos os registros. Uma
questão fundamental é jamais forçar um registro mais acima ou abaixo do que ele deve soar,
94
High female voices do not exhibit a falsetto, however, but a laryngeal whistle, which is not produced by
vibration of the vocal folds, but by the whistling escape of air from between them
84
Miller entretanto alerta: “Deve ser salientado que a oclusão das pregas vocais não é a
mesma na voz de cabeça e no falsete; a aproximação das pregas vocais é menos completa na
produção do falsete”95 (Miller, 1996, p. 122). Segundo Miller, se o cantor adquire melhora na
adução das pregas durante a prática de exercícios com o falsete, ele fatalmente passa do
No canto erudito o uso da voz leve (chamada falsetada por sua sonoridade semelhante
ao falsete) é aceitável como exercício de relaxamento até que se atinja a voz de cabeça plena e
também como um recurso para descansar a voz durante ensaios em que se faz uso deste
recurso apenas para marcar a passagem da peça. Já no canto popular no Brasil, além das
funções terapêuticas, a voz suave ou até mesmo o falsete real podem ser usados esteticamente
como um timbre aceitável durante toda a peça ou como um recurso interpretativo em apenas
um trecho, sem que esta escolha estética seja considerada caricata. Cantores da música
popular brasileira como Gilberto Gil e Milton Nascimento dentre outros são famosos pelo uso
Os exercícios 9.4 a 9.11 (Miller, 1996, p. 127 e 128) constituem o grupo 1 proposto
por Miller para treinamento das vozes masculinas na região grave. Miller orienta, entretanto,
que eles podem ser transpostos para trabalhar a região mais aguda e central da voz. Apesar de
terem como objetivo a unificação de registros, são interessantes também pelo conteúdo
intervalar que apresentam. Com o intuito de trabalhar as passagens dos registros para que
sejam imperceptíveis, em exercícios como o 9.4 e 9.5 (ver Ex. 1.22, p. 86), Miller alterna
segundas maiores e menores no ponto mais agudo do vocalize o que facilita a emissão sem
quebra naquele trecho, mas também não deixa de ser um treinamento melódico auditivo
totalmente prático.
95
It should be pointed out that vocal-fold occlusion is not the same in head and falsetto; vocal fold
85
No exercício 9.8 a seguir, Miller parte de um intervalo de terça descendente e
Singing sejam todos destinados ao treinamento de vozes masculinas, encontrou-se nesta série
encontrados nos choros. Os exercícios 9.8, 9.19 e 9.21 (ver Ex. 1.22 e 1.23), em particular,
EXEMPLO 1.22: Exercícios 9.4, 9.5 e 9.8 traduzidos de (Miller, 1996, p. 127 e 128)
e assemelham-se aos exercícios com saltos propostos para aquisição de agilidade (ver Ex.
1.20, p. 81).
86
Verificou-se certa semelhança entre os exercícios 10.29 a 10.33 (Miller, 1996, p. 146 e
147), propostos por Miller para unificação de registros nas vozes femininas, com um
exercício específico com a consoantes [v] sugerido por Rubim logo nas primeiras aulas
regularmente em meu estudo individual nos últimos três anos e também foi um dos vocalizes
propostos aos alunos de Canto Complementar durante o estágio docente. No Exemplo 1.24, a
por Rubim. Também para a unificação de registros foi utilizado o exercício /uénha,uénha/96
EXEMPLO 1.24: Exercício 10.29 traduzido de (Miller, 1996, p. 146) e glissando em [v] (Rubim, 2007)
Behlau (2008) divide a extensão vocal em três registros: basal, modal e elevado de
falsete, mas apenas os dois últimos têm uso mais convencional para a voz cantada, conforme
exemplificado anteriormente. O som basal, também conhecido como vocal fry, pode ser
praticado como exercício terapêutico com finalidades diversas e no canto seu uso adequado
pode condicionar a musculatura adutora e ampliar a extensão vocal para cima e para baixo.
Pinho e Pontes (2008) afirmam que na produção do som basal a “atividade do músculo TA é
de fry relaxado (produzido com a laringe baixa)” (Pinho; Pontes; 2008, p. 42 e 43).
96
O exercício /uénha,uénha/ foi ensinado a Rubim em 2008 pelo maestro Marcelo Castro, durante os ensaios do
87
A utilização do som basal como técnica de terapia consiste na emissão prolongada sem esforço, o que deve ser
feito após expiração de quase todo o ar dos pulmões para não criar uma elevada pressão subglótica. As
cavidades supraglóticas devem estar relaxadas, próximas ao ajuste articulatório da vogal /a/. O som basal é
mantido por um longo tempo, o que é facilmente obtido, pois o fluxo de ar necessário é mínimo.
EXEMPLO 1.25: Vocal fry proposto por (Boone & Mcfarlane, 1988 apud Behlau, 2008 vol. II, p. 463).
ferramenta para o estudo do samba-choro Sambadalu, o exercício do som basal relaxado (com
a laringe baixa) praticado em sessões de fonoterapia foi responsável por ampliar minha
extensão vocal até o Mi2, nota mais grave da peça, sem o qual não seria possível realizar uma
interpretação precisa.
2.1 e no item 2.2 são apresentados quatro aspectos relacionados ao canto que foram
microfone e outras tecnologias para o qual foram consultados outros autores. Os três aspectos
(1996): (2.2.2) controle de dinâmica vocal; (2.2.3) vibrato no canto popular; e (2.2.4) saúde
vocal.
Para o estudo de dinâmica foi tido como referência o capítulo 13 em The Structure of
principalmente aos intérpretes que já adquiriram uma técnica relativamente estável. O estudo
do vibrato é apresentado por Miller no capítulo 14. Como esta pesquisa é orientada para o
classificar o vibrato como um aspecto interpretativo que pode ser utilizado ou não.
cantores líricos, em que a presença do vibrato é quase sempre uma exigência e não uma opção
88
estética, o estudo do vibrato estaria localizado no Capítulo 1 junto aos aspectos técnicos da
voz cantada embora possa também ser considerada uma ferramenta interpretativa.
Miller. Não fizeram parte desta dissertação as discussões apresentadas nos capítulos 11, 12 e
16 e indica-se aqui uma lacuna para pesquisas posteriores. O capítulo 11 - Modificação das
vogais no canto - consiste em uma discussão mais aprofundada sobre o estudo da emissão das
uma discussão aprofundada sobre o domínio integrado dos diversos aspectos vocais
estéticas, escolha de timbres e sua relação com a história e o desenvolvimento do canto lírico.
Os três capítulos omitidos apresentam uma discussão que se aplica mais diretamente às
técnica vocal para o desenvolvimento do canto expressivo, seja ele erudito ou popular. Com
primeira hipótese desta pesquisa (para se cantar choros com expressividade é preciso um
estudo sistemático do choro cantado é uma opção para aquisição de domínio técnico vocal), a
fim de validar o choro como uma ferramenta eficiente para o desenvolvimento técnico vocal
89
CAPÍTULO 2
2.1 METODOLOGIA
Este trabalho apresenta uma abordagem qualitativa cujo objetivo principal é analisar
os fenômenos observados durante a pesquisa. Para isso fez-se uso do método comparativo
para relacionar a fundamentação teórica sobre aspectos técnicos da voz com o estudo prático
docente contribuiu para este estudo, otimizando o aproveitamento dos achados teóricos.
para o estudo dos choros, os critérios de seleção do repertório dos 8 choros que foram citados
com o material de Miller (1996) e ampliando minha capacidade analítica da emissão vocal,
por conta de várias horas de estágio de observação das aulas particulares de Rubim a outros
cantores, adquiri elementos para construir um banco de dados tanto para encontrar soluções
sujeitos ideal. O estágio de 216 horas como professora assistente de Rubim durante o segundo
90
capacitação como docente e principalmente em meu estudo individual de intérprete. Como
professora de canto de 20 estudantes de música com perfil vocal heterogêneo tive contato,
semanalmente, com questões vocais que muitas vezes eu nem imaginava que pudessem
observação das aulas de canto ministradas pela cantora Amélia Rabello na Escola Portátil de
Música97 (EPM) durante um ano e meio, com início no primeiro semestre de 2008 a junho de
2009; (2) conferência com Jeanne LoVetri na Universidade de Dartmouth nos Estados
janeiro de 2009; (3) visita ao New England Conservatory (NEC) em Boston, onde participei
de aulas coletivas de práticas interpretativas com outros cantores e tive aulas particulares de
canto e improvisação com Dominique Eade em janeiro de 2009; (4) gravação em estúdio do
meu primeiro CD autoral com 5 faixas, em outubro de 2008 e (5) a gravação em estúdio de
pesquisa. O modelo de aula que foi criado para a disciplina Canto Complementar, por
exemplo, sofreu forte influência do formato observado na Escola Portátil de Música (EPM).
97
A Escola Portátil de Música, desde a sua criação, tem como um de seus objetivos a realização de oficinas em
espaços diversos, com intuito de expandir e semear o conhecimento musical crítico, através da linguagem do
choro. www.escolaportatil.com.br
98
Trabalho de voz somático.
91
cada aluno interpretando uma peça pré-selecionada seguida por correções e orientações de
Rabello.
um teste. Ao mesmo tempo, verificou-se que ao longo de alguns meses, esta prática trazia
ensino e avaliação dos Estados Unidos, afirma que um caminho para melhorar os resultados
no ensino é repensar o sistema de avaliação para que ele ocorra de forma natural e
O que estou sugerindo aqui é que a avaliação é uma parte de cada ensaio e de cada aula, que os
alunos têm a oportunidade de demonstrar o que sabem e são capazes de fazer de forma
independente cada vez que estiverem em uma aula. Essas oportunidades não devem ser
elaboradas, demoradas ou onerosas, mas devem ser tão frequentes a ponto de se tornarem uma
parte regular do ensino. Isto significa ouvir (muitas vezes) os alunos numa apresentação
individual durante um ensaio, fazer com que eles usem (muitas vezes) as informações e as
habilidades que eles estão desenvolvendo, aplicando-as de maneira que não foram
explicitamente ensinadas99 (Duke, 2009, p. 61).
permitiu que nossa programação incluísse outras atividades além da apresentação musical. A
apreciação musical (10 minutos), (2) aquecimento vocal coletivo que era também um espaço
99
What I’m suggesting here is that assessment be a part of every rehearsal and every class, that students have
opportunities to demonstrate what they know and are able to do independently every time they meet with you.
These opportunities need not to be elaborate, time consuming, or burdensome, but they should be so frequent as
to become a regular part of instruction. This means hearing students playing alone in rehearsal (often), having
students use the information and skills that they’re working to master by applying them in ways that have not
been explicitly taught (often).
92
de exposição e discussão da fundamentação teórica que estava em investigação (40 minutos);
e (3) finalização com a apresentação individual dos alunos seguida de avaliação feita por
Rubim.
Conforme artigo apresentado no anexo III, no primeiro semestre de 2009, além das
alunos matriculados, sendo 30 minutos por aluno, durante 14 semanas. Este atendimento
individual teve como objetivo criar um espaço em que os alunos pudessem tirar dúvidas antes
de apresentarem a peça na aula coletiva e também para que pudessem ouvir as gravações
Esta atividade de ouvir com os alunos, ou simplesmente possibilitar que eles ouvissem
gravações de suas apresentações em aulas anteriores, era semelhante ao meu próprio processo
de estudo técnico vocal quando eu ouvia em casa minhas gravações de aulas particulares com
para os alunos de Canto Complementar que simulasse as atividades presentes na vida diária
de um cantor profissional. Ao mesmo tempo, esse processo permitiu uma troca muito rica na
medida em que eu pude assistir outros cantores tentando enfrentar os desafios que eu havia
Foi solicitado aos alunos que atenderam à disciplina Canto Complementar que
apresentassem pelo menos um choro durante o semestre. A partir da análise das gravações
interpretações de um choro escolhido, verificou-se que, além do choro funcionar como uma
ferramenta para treinamento de aspectos técnicos vocais, como foi suposto inicialmente, ele
93
também provou ser uma ferramenta eficiente para a identificação de lacunas no
classificadas como complementares entre si: (1) para se cantar choros é preciso um grande
domínio técnico vocal; e (2) o estudo sistemático do repertório de choros promove a aquisição
de domínio técnico vocal. A experiência em estágio docente evidenciou uma terceira hipótese
A partir da análise das gravações dos alunos de Canto Complementar verificou-se que
uma dificuldade técnica que parecia ser mínima em uma canção menos complexa, tornava-se
muito evidente quando este mesmo aluno tentava interpretar um choro. Este fenômeno foi
Deste modo, a terceira hipótese relacionada ao uso do repertório de choro como ferramenta no
ensino do canto é que: (3) O repertório de choro cantado funciona como um indicador de
Outro procedimento metodológico desta pesquisa que foi adotado como proposta
didática para os alunos de Canto Complementar foi a tarefa de produzir as partituras das
peças que eles pretendiam cantar, seja a partir da transcrição de uma gravação indicada, ou
graduação em música, o que significa, teoricamente, que são capacitados para produzir uma
partitura musical, a entrega semanal da partitura da peça que seria apresentada em aula era
parte do sistema de avaliação integrada ao qual eles estavam submetidos. O ponto de vista
94
sobre a importância da atividade de transcrição e produção de partituras para os alunos de
canto foi reforçado após visita ao New England Conservatory (NEC), em janeiro 2009.
Como aluna visitante no NEC frequentei algumas aulas e pude observar que a
realização de transcrições era uma prática muito difundida entre todos os estudantes de Jazz,
inclusive os cantores. Uma cantora do 2o ano do mestrado em Jazz no NEC, com a qual tive
contato por alguns dias, mostrou-me o trabalho vocal que estava desenvolvendo a partir de
transcrições dos solos de Charlie Parker100. Na aula de práticas interpretativas cada cantor era
iriam acompanhá-lo. Além disso, em aula particular com Dominique Eade, fui orientada que a
professor que se pode ter. Diante destes fatos, justificou-se para os alunos de Canto
aprendizagem que adotamos. Em minha prática individual, o processo de edição das partituras
Conforme foi descrito na introdução desta pesquisa, os 8 choros escolhidos para este
estudo foram selecionados, de maneira geral, com base no caráter de andamento das peças.
100
Charlie Parker, saxofonista de Jazz que ao lado do trompetista Dizzy Gillespie foi o criador e a principal voz
instrumental do bebop.
101
Esta conferência mencionada refere-se ao curso de formação do modolo I do Somátic Voice Work ministrado
por LoVetri, durante três dias (18h), em Dartmouth nos Estados Unidos.
95
choros. Um fator fundamental que determinou a escolha de um choro em detrimento de outro
melodia do choro. Em acordo com Cazes (1998) o choro Um a zero foi considerado um
exemplo assertivo entre letra e melodia além da enorme quantidade de desafios técnicos
som (ver item 1.1, p. 17), agilidade vocal (ver item 1.5, p. 71), articulação e emissão
equilibrada das vogais (ver item 1.4, p. 51); enquanto os choros de andamento mais lento
(ver item 1.2, p. 25), extensão, estabilização da voz e unificação dos registros (ver itens 1.4 e
1.6, p. 51 e 82), sustentação do som (ver item 1.5, p. 71) e controle de dinâmica (ver item
2.2.2, p. 100). O oitavo choro selecionado, Sambadalu, tem um caráter híbrido apresentando
trechos de agilidade e com notas longas de forma que foram reunidos em uma única peça
Com base nos quadros apresentados no Capítulo 3 a seguir, nos quais são descritos
trechos de dificuldades semelhantes para a maioria dos choros estudados, acredita-se que
todos os aspectos vocais descritos no Capítulo 1 desta pesquisa devam ser observados e
passagens específicas em cada um deles que facilitam ou exigem mais o estudo de uns
em (1) descrição dos procedimentos de edição das partituras e breve levantamento histórico
das peças; (2) apresentação de quadros com a identificação dos trechos de dificuldades
semelhantes encontradas nos choros; e (3) descrição dos procedimentos didáticos aplicados a
96
três choros de caráter variado, sendo eles: Apanhei-te cavaquinho a exemplo dos choros de
As aulas particulares com Rubim que tiveram início em agosto de 2007 até dezembro
de 2008 foram registradas em vídeo com a câmera filmadora digital (Digital Video Camera
Rubim passaram a ser registradas apenas em áudio por conta da aquisição de um equipamento
vídeo, com a mesma filmadora citada, para registrar os movimentos dos exercícios faciais
vídeo das apresentações finais dos alunos. Já no estágio docente do primeiro semestre de 2009
todas as aulas coletivas e individuais foram gravadas na íntegra em áudio com equipamento
digital de alta fidelidade e clareza (Brilliant Stereo Recording Zoom - H2 - Handy Recorder)
e, a partir da 8ª semana de estágio docente, como parte complementar do estudo técnico vocal,
alunos. Com o propósito de melhor investigar esta experiência do uso dos microfones em sala
de aula, além das gravações em áudio, foram realizadas gravações em vídeo com a câmera
estágio docente somada à minha experiência individual como cantora popular. Saber como
fazer uso do microfone é indispensável quando se pretende atuar com intérprete do repertório
popular. Algumas rodas tradicionais de samba e choro muitas vezes exigem que os cantores
97
se apresentem sem amplificação apropriada, mas segundo relatos dos participantes desse
Apesar da revisão bibliográfica não ter sido focada nos aspectos interpretativos,
considerou-se relevante discorrer sobre algumas questões que surgiram durante minha prática
pessoal e durante o estágio docente realizado com a turma de Canto Complementar nesta
instituição. Foi constatada a importância da discussão de aspectos práticos como: (1) o uso do
que incluem: (2) o controle de dinâmica; (3) o uso do vibrato; (4) a importância do repouso
pois acredita-se que esta discussão seja um elemento essencial em uma pesquisa sobre
performance.
uma mesa de equalização, permite a alteração das frequências grave, média e aguda da voz.
criar ambientações diferentes da sala real onde o som é produzido. O uso indiscriminado
desses recursos pode resultar em distorções do som vocal, assim como um equipamento de
102
Durante os anos que freqüentei a Escola Portátil de Choro como aluna e pesquisadora colhi os devidos
depoimentos.
103
A reverberação, ou reverb, é formada quando um som é produzido em um espaço fechado causando um
grande número de ecos sobrepostos seguidos de lenta decadência na medida em que o som é absorvido pelas
paredes e pelo ar. (http://en.wikipedia.org/wiki/Reverb)
98
amplifica as características boas e ruins da produção vocal e portanto não se deve pensar nele
diafragma) tem o formato de um ‘coração’, onde o som é captado principalmente pela frente
do microfone, um pouco pelos lados, e praticamente nada por trás”104 (Waterman, 2008, p.
93). O microfone cardióide de uso mais comum entre cantores populares é o Shure SM58, o
A posição mais adequada do microfone durante a performance do canto não deve ser
apontada diretamente para a boca formando um ângulo de 90o porque essa posição “aumenta a
p. 94). O ideal é que o microfone seja apontado de baixo para cima em direção ao lábio
inferior e o queixo, formando um ângulo de 10o a 15o com um plano horizontal imaginário na
pessoa de acordo com o resultado sonoro que cada uma delas busca. Pessoas que cantam
muito próximo ao microfone geralmente escondem suas expressões faciais por encobrirem a
boca; por outro lado, pessoas que cantam muito distante, dificultam a captação do som. De
maneira geral “se você posiciona sua boca a poucos centímetros de distância do microfone, o
engenheiro de som tem total controle, as pessoas podem ver o seu rosto e você pode se
concentrar apenas no trabalho de fazer um bom show”106 (Waterman, 2008, p. 95). Além de
104
With the cardioid microphone, the pick-up pattern (determined by the diaphragm) is shaped something like a
‘heart’ that is, sound is picked mainly from the front of the microphone, a little from the sides, and virtually
nothing from behind.
105
Increases popping sounds, excessive sibilance, and the sound of your breath.
106
If you have your mouth a few centimeters away from the microphone, the engineer has full control, people
can see your face and you can concentrate only on the job of doing a good gig
99
essa distância estável do começo ao fim da peça, especialmente se estiver segurando o
Outro ponto importante sobre o uso do microfone é que o retorno de som seja eficiente
de forma que o cantor possa sempre se ouvir bem. Uma dica primária e essencial em relação
aos monitores de retorno é nunca apontar o microfone diretamente para eles para evitar
microfonias.
Pesquisas mais avançadas sobre os usos dos microfones, suas possibilidades e seu
canto, mas sim, um recurso para realizar performances ao vivo com o volume de som
amplificado. Ao longo da prática docente verificou-se que o treinamento com microfones nas
aulas melhorou a performance final dos alunos na medida em que eles ficaram mais
familiarizados com o uso do equipamento. Por outro lado, tanto o gravador de áudio de alta
aprendizagem tanto dos alunos durante estágio docente quanto do meu estudo individual
De agosto de 2007 a outubro de 2009 todas as aulas de canto com Rubim foram
capítulo 3.
100
desenho de dinâmica quando está compondo para voz e segundo ele, “os níveis de dinâmica e
No texto de Miller percebe-se que a principal discussão em torno deste tema está
reproduzir ataques soprosos e até mesmo emissões soprosas, é mais difícil que ele tenha
domínio técnico para cantar um fortíssimo e até mesmo um forte. Cantores treinados para
cantar com excesso de volume o tempo todo também podem encontrar dificuldade na
popular encontram sugestões de dinâmica numa partitura para canto e na verdade, a maioria
dos cantores populares no Brasil nem mesmo se utilizam de partituras para estudar uma peça.
Neste caso é ainda mais natural compreender que a dinâmica no canto popular seja uma
populares sigam a dramaticidade das letras das canções e no choro essa tendência se repete.
no canto erudito. Ele “consiste na modulação repetida de frequência e/ou intensidade [...]
107
Vocal coloration and dynamic level are inseparable.
101
2008 vol. II, p. 309). O vibrato tem em média 5 a 7 ondulações por segundo variando de
aproximadamente meio tom. Sundberg (1995) afirma que “um vibrato com menos de 5
ondulações por segundo parece muito lento” (apud Behlau, 2008 vol. II, p. 310). Miller
(1996) defende uma taxa de vibrato ideal para o canto de qualidade em torno de 6,5
A presença do vibrato no canto popular não é uma regra e a voz branca, sem vibrato,
não é tão preterida na estética popular como acontece no canto erudito. Em Miller, foram
encontradas várias orientações para a correção do surgimento da indesejável voz sem vibrato,
e seu material se mostra uma fonte de pesquisa muito interessante para pesquisadores que
pretendam se aprofundar em estudos sobre este tema. Nesta pesquisa, como a ausência de
vibrato não é necessariamente uma falha, apresenta-se aqui o que acontece fisiologicamente
A ausência de vibrato na voz cantada pode ocorrer tanto por falta de apoio quanto em
Quando a tensão muscular trava um ajuste laríngeo específico num determinado lugar, o som
tenderá a soar liso, como ocorre ocasionalmente se o “apoio” estiver muito rígido; a ausência
de vibrato pode também ocorrer como resultado de pouco contato entre as pregas vocais e o
fluxo aéreo108 (Miller, 1996, p. 188).
vibrato durante a execução e além disso ele afirma que o cantor que não tem consciência e
108
When muscular tension locks one particular laryngeal adjustment into place, the tone will tend to go
somewhere straight, as occasionally happens if the “support” is too rigid; absence of vibrato may also result from
too little contact between the approximating vocal folds and the airflow.
102
agudos” (uma expressão infeliz), quando o que nós realmente queremos dizer é que está
faltando vibrato109 (Miller, 1996, p. 188 e 189).
Por outro lado, “a emissão da voz falada, coloquial ou profissional não apresenta
vibrato” (Behlau, 2008 vol. II, p. 309) e este fato talvez justifique a ausência de vibrato em
proximidade com as características da voz de fala. Porém, segundo Miller, “Uma fala
interpretativo bastante relevante, especialmente nos choros de andamentos lentos como Rosa
e Ingênuo. Segundo Miller a presença do vibrato saudável é sinal de uma emissão vocal livre
e portanto, supõe-se que a ausência do vibrato, por uma incapacidade de realizá-lo, seja fruto
habilidade do vibrato a todo cantor que escolheu dedicar-se ao treinamento vocal sério,
mesmo que sua intenção final seja interpretar canções com timbre específico de voz de fala
sem vibrato.
O valor do vibrato como parte do treinamento técnico vocal ultrapassa seu potencial
uma técnica vocal estável. “Mais que qualquer outro aspecto audível do timbre vocal, a taxa
de vibrato é um indicador tanto de uma produção vocal livre quanto ineficiente. Um vibrato
apropriado é sinal de uma voz cantada saudável e bem produzida”111 (Miller, 1996, p.187).
109
To be unaware of the presence or absence of vibrancy in the tone is to be unaware of the nature of one’s vocal
quality. There is a little point in asking the singer devoid of vibrancy to “make the tone a little richer,” to “add
warmth,” to “put in more overtones” (a particularly unfortunate expression), when what we actually mean is that
vibrato is lacking.
110
Emotional or intense speech frequently contains recognizable vibrato. For example, the fundamentalist
preacher, in an impassioned prayer or sermon, may fall into an almost chant-like pattern or vibrated speech.
111
More than any other audible aspect of vocal timbre, vibrato rate is an indicator of either free or inefficient
vocal production. A proper vibrato is a sign of a healthy well-produced singing voice.
103
Além disso uma vez que o cantor adquire a habilidade de realização do vibrato e
consequentemente maior domínio do seu instrumento vocal, ele sempre terá a opção de
utilizá-lo ou não em uma interpretação, podendo assim atender tanto às exigências de padrões
O termo vibrato é utilizado para denominar vários tipos de flutuação do som vocal
sustentado. Miller adota quatro terminologias em acordo com a histórica Escola Italiana sendo
vibrato lento com taxa abaixo de 5 ondulações por segundo e isso ocorre por baixo tônus nas
pregas vocais que pode aparecer em qualquer idade, mas é mais comum em idosos. O tremolo
é um vibrato muito rápido, com taxa entre 8 e 10 ondulações por segundo, que ocorre por
trêmula são uma visível tensão na área da garganta, posição alta da laringe, tensões na língua
qualquer forma é válido dizer que diferente do tremolo ele é feito com liberdade laríngea.
Finalmente, o chamado vibrato saudável, é o vibrato que tem a taxa de flutuação entre 6 e 7
ondulações por segundo e além disso permite liberdade laríngea e uma emissão vocal livre.
Para cantores que não conseguem realizar o vibrato saudável Miller recomenda os
exercícios de agilidade (ver Ex. 1.20, p. 81) propostos no capítulo 3 de seu livro como
facilitadores na diminuição desta lacuna e além desses ele sugere o exercício 14.2
exemplificado abaixo.
112
Characteristics of the tremulous voice are visible tension in the throat area, high laryngeal position, tongue
and jaw tensions, and a rapid shaking of tongue and jaw.
104
EXEMPLO 2.1: Exercício 14.2 traduzido de (Miller, 1996, p. 191)
aspectos da saúde vocal atende muito bem a curiosidades e dúvidas do cantor. Nesse sentido,
este item nesta pesquisa apenas acrescenta algumas sugestões de Miller relacionadas ao
É sabido por inúmeras publicações (Behlau, 2008; Pinho, 2007; Miller 1996; etc.) o
alto risco para o aparelho fonador decorrente do consumo de cigarros e bebida especialmente
para o cantor. Outro fator menos grave mas que também representa risco à saúde vocal é,
principalmente, o abuso por competição sonora. Conversar em ambientes onde existem outros
transporte gera ruído constante, pode ter como conseqüência o desgaste vocal pela tentativa
de se fazer ouvido.
especialmente no dia de uma apresentação. Alguns cantores eruditos exageram nas medidas
preventivas de preservação vocal ficando até dois dias sem falar antes de cantar, mas mesmo
sugestões de Miller para evitar competições sonoras e longas conversas ao vivo ou ao telefone
105
2.2.5 Técnica x arte
no canto depende muito dos aspectos técnicos que às vezes parecem distantes da arte. Por
Cantar uma peça do repertório de choro, certamente, não depende exclusivamente dos
profundos e emocionados se ele não tiver um condicionamento técnico mínimo para realizar
Quanto mais eficiente a habilidade técnica, maior será o potencial de expressão artística.
Desenvoltura no canto não é o produto de pura emoção. A habilidade resulta da programação
física, acústica e de respostas emocionais controladas em uma formatação. Técnica e
comunicação constituem a psicologia da performance artística. Elas estão fundidas em uma
mesma ação. [...] O desenvolvimento sequencial do canto artístico é paralelo à patinação
artística, à dança, e à arte de jogar tênis. O patinador profissional, o bailarino e o campeão de
tênis não alcançam seus objetivos, primeiro assumindo a postura emocional de um artista, mas
por aprenderem as ferramentas necessárias que irão libertá-los para a atividade artística114
(Miller, 2000, p. 160).
década de 1980 pra cá, tem-se notícia de alguns intérpretes conhecidos que buscaram ajuda
profissional para auxiliá-los no treinamento vocal como por exemplo Luciana Souza, Na
Ozzetti, Ney Matogrosso entre outros. Este fato evidencia que não existe apenas o modo
113
Communication in singing is dependent on those very aspects of technique that at times seem most remote
from artistry. For example, vocal coloration and dynamic variation can become integrated into an expressive
whole only if technical facility permits.
114
The more efficient the technical skill, the greater the potential for artistic expression. Skill in singing is not
the product of raw emotion. Skill results from the programming of physical, acoustic, and controlled emotional
responses into one gestalt. Technique and communication comprise the psychology of artistic performance. They
are fused into one action. […] The sequential development of artistic singing parallels that of artistic figure-
skating, artistic dancing, and artistic tennis playing. The professional skater, the ballet dancer and the tennis
106
fazer aulas de canto, faculdade, mestrado, doutorado nem ler dezenas de livros para se obter
respostas satisfatórias com a própria voz. De qualquer forma, quando um intérprete consegue
expressar emoção e convencer o público com a beleza de sua interpretação, isso significa que
ele conseguiu, de alguma forma, unir criatividade e coordenação motora de maneira eficiente
escolhas interpretativas. A presença da poesia nas canções pode ser considerada até mesmo
uma vantagem com relação às peças exclusivamente instrumentais, na medida em que cada
palavra permite maior criatividade expressiva através das imagens e sentimentos específicos
que são gerados no intérprete. Entretanto, deve-se tomar cuidado com os exageros dramáticos
Problemas podem surgir para um cantora se ela, na esperança de alcançar uma comunicação
crível do drama ao qual é convidada a realizar pelo diretor de palco ou preparador vocal,
submergir-se completamente na emoção do texto. Como resultado, vamos encontrá-la aos
prantos ao invés de encontrá-la cantando115 (Miller, 2000, p. 160).
ano de 2007 em aula com Rubim, tive a experiência de cair aos prantos no meio de uma peça
que interpretava. Foi um momento muito rico do meu aprendizado quando Rubim contou
em 2003. Bumbry afirmou que um intérprete não pode imprimir toda a verdade de seus
sentimentos em uma interpretação. Assim como o ator não comete um assassinato em cena
quando interpreta um crime passional em uma peça de teatro, o cantor também não poderá
sofrer de verdade, uma vez que a voz refletirá verdadeiramente aquela emoção. O resultado
será o impedimento total da produção vocal. Um estudo detalhado sobre esse assunto pode ser
champion do not reach their goals by first assuming the emotional stance of an artist, but by learning the tools of
the trade that free them for artistic activity
115
Problems may develop for a singer in the hope of achieving believable communication of the drama she is
urged by the stage director or coach to submerge herself completely in the emotion of the text. As a result, we
find her weeping through, rather than singing.
107
encontrado no trabalho de Guse (2009) na dissertação O cantor-ator: um estudo sobre a
atuação cênica do cantor na ópera. Guse discute as principais tendências interpretativas e seu
impacto sobre o cantor lírico na ópera, o que também se aplica ao teatro musical e em
A memória das emoções vivenciadas ao longo da vida podem ser utilizadas como
idéias musicais e textuais. Um rosto inanimado no canto desmente todas as escolhas de timbre
são a liberdade sobre o tempo e o domínio do legato. Miller também acrescenta que o corpo
deve estar livre da sincronização rítmica quer com o impulso da pulsação ou movimento da
constantemente não é uma indicação de liberdade, mas sim uma escravidão ao impulso
rítmico.
desenvolvimento técnico ao longo dos dois anos de pesquisa e treinamento prático somado ao
116
It is the face that is the chief transmitter of emotion, in partnership with musical and textual ideas. An
unanimated face in singing belies all that vocal timbre and textual nuance may be communicating
108
trabalho de conscientização corporal foram os responsáveis por mudanças mais substanciais
1996, p. 204). Porém, antes de conquistar certa desenvoltura técnica em aspectos vocais
desenvolver competências tais como: (1) o controle de volume da fonte sonora, através do
treinamento respiratório (ver itens 1.1 e 1.2, p. 17 e 25); (2) o controle de ressonâncias para a
emissão de um timbre uniforme e equilibrado (ver itens 1.3 e 1.6, p. 38 e 82); e (3)
das vogais e consoantes (ver item 1.4 e 1.5, p. 51 e 71). E assim, em acordo com Miller,
acredita-se que o desenvolvimento técnico do cantor seja a chave para o canto com arte, pois
somente uma técnica sólida promoverá a liberdade que o cantor precisa para fazer tal arte.
117
Without doubt, the most expressive device, the most technically efficient procedure, in singing [and the most
commonly wanting ability] is the legato
109
CAPÍTULO 3
encantamento pessoal com as melodias das peças deste repertório. As dificuldades técnicas
nas primeiras tentativas de vocalizar Tico-tico no fubá e outras dificuldades que surgiram na
execução dos demais choros, foram responsáveis por grande parte das indagações que
resultaram nesse trabalho. A seguir o leitor encontrará uma descrição detalhada do processo
de estudo que foi desenvolvido para dirimir as questões que se apresentaram durante essa
choros estudados nesta pesquisa foi o andamento das peças. As condutas de estudo dos
aspectos vocais confrontados no item 1.5 (ver p. 71) desta pesquisa: “Agilidade ou
sustentação?” são análogas às características que diferem os choros de andamento rápido dos
choros de andamento lento. Em acordo com Miller (1996), que demonstra que o estudo de
prática que o desenvolvimento técnico adquirido na execução dos choros de agilidade trouxe
melhoras significativas para execução estável das melodias dos choros de andamento lento.
Choro e Choro pro Zé; e o oitavo choro, Samdadalu, que apresenta trechos de agilidade e
110
Após a seleção dos 8 choros, a etapa seguinte foi encontrar a partitura mais adequada
para o estudo vocal de cada um deles. Em Choro pro Zé, Costura de choro, Sambadalú e até
mesmo em Rosa não houve grandes dificuldades. À exceção de Rosa, as partituras utilizadas
para o estudo dos outros três choros mencionados foram transpostas ou copiadas de edições
autorizadas pelos próprios compositores. A partitura de Rosa foi retirada de uma edição do
livro O Melhor de Pixinguinha118 (Carrasqueira, 1997, p. 116 e 117) e como não foi
identificado nenhum desencontro entre letra e melodia, nem diferenças entre a melodia
apresentada na edição impressa e a que foi gravada originalmente por Orlando Silva em 1937,
foi realizada apenas a transposição desta edição de Carrasqueira (1997) para dar início aos
estudos.
Cavaquinho, Um a Zero e Ingênuo foram editadas a partir de critérios específicos que serão
descritos a seguir neste capítulo. No item sobre o processo de edição das partituras encontra-
se um breve histórico sobre cada choro e citação de algumas gravações vocais e instrumentais
Resolvida a questão das edições, foram realizadas duas análises de cada choro.
extensão da peça, tonalidade e andamento. Num segundo momento, ao vocalizar cada uma
das melodias dos choros em estudo, foram destacados e marcados os compassos que
apresentados nos Quadros 3.1 a 3.6 no item 3.2 sobre a análise interpretativa dos choros mais
As soluções técnicas para cada um dos choros foram surgindo de diferentes maneiras
na medida em que este estudo foi sendo realizado ao longo de quase três anos. O estudo dos
118
Álbum com 72 obras de Pixinguinha.
111
primeiros choros (Tico-tico no Fubá, Rosa e Choro pro Zé) teve início ainda em 2007, antes
soluções eram as aulas particulares com Rubim e as experimentações que eu fazia a partir da
sua orientação.
São incluídos no final do capítulo excertos mais relevantes do meu processo de estudo
Choro pro Zé, exemplificando os choros lentos; e Sambadalú como exemplo de choro sem
sustentação. Em Choro pro Zé, especialmente porque o estudo teve início em 2007, existem
Para as partituras que não foram escritas originalmente para voz foram feitas edições
Os choros Rosa e Costura de Choro não passaram por processos de edição relevantes
além da simples transposição para a tonalidade adequada à minha extensão vocal. No entanto,
por uma questão de organização, neste item é oferecido um breve histórico que foi levantado
para interpretação destes dois choros. O histórico de Sambadalu e Choro pro Zé será
Muito conhecido em todo Brasil e no exterior, Tico-tico no fubá foi composto por
ganhou letra de Eurico Barreiros. Amigo de Zequinha de Abreu, o dentista Eurico pediu
112
autorização para colocar versos em Tico-tico no fubá para que sua filha Ely, uma criança na
época, pudesse cantá-lo. Embora nem todas as edições publicadas pelos Irmãos Vitale
tivessem essa letra, ela foi aprendida por uma jovem do Rio Grande do Norte que viria a ser
considerada a “Rainha do Chorinho”. Esta jovem cantora era Ademilde Fonseca que, em
1942, em seu disco de estréia, fez uma das primeiras gravações cantadas de Tico-tico no fubá.
Nesta mesma época nos Estados Unidos, Aloísio de Oliveira compunha uma outra letra que
seria gravada por Carmen Miranda e que entre os anos de 1943 e 1946 entrou em nada menos
Para o estudo deste choro foi escolhida a letra de Aloísio de Oliveira, levando-se em
conta alguns aspectos técnicos, como por exemplo, o fato desta letra ser mais percussiva na
combinação das sílabas, o que é mais interessante para o canto de agilidade. Além disso, a
temática desenvolvida por Oliveira é mais cômica, fato que a torna mais adequada ao caráter
menor, a parte B em Lá maior e parte C em Dó maior. Embora sua forma original seja
AABBACCA119, nenhuma das versões cantadas segue este formato. Cada uma das duas
gravações selecionadas para análise apresentam uma forma diferente de arranjar a canção, o
que é perfeitamente aceitável no ambiente de música popular, em que esse tipo de intervenção
acontece o tempo todo, seja por uma opção do intérprete ou por uma decisão do arranjador.
Procedeu-se, a seguir, uma análise de uma versão de Ademilde Fonseca e uma versão de
Carmen Miranda antes de formalizar a versão resultante que foi adotada como base para esse
estudo.
desta está bem melhor que da primeira gravação de 1942. Deste modo foi possível reconhecer
119
Vide partitura editada por Irmãos Vitale – Copyright 1941.
113
mais claramente as qualidades de Ademilde como intérprete deste gênero. Além disso, nesta
Ademilde Fonseca gravou Tico-tico no fubá em Sol menor e o início de sua versão tem
introdução instrumental feita a partir da segunda metade da parte “B” em Sib maior. Ela
executa duas vezes a parte A seguida pela parte C apenas uma vez. Em seguida ocorre no
arranjo uma inserção cantada das partes A e B de um outro choro chamado Dinorah
(Benedito Lacerda e José Ferreira Ramos /e letra de Darci de Oliveira). Depois desta
finalização com breve fraseado instrumental. Após a análise desta gravação foi observado o
instrumental.
A versão de Carmen Miranda, ao que tudo indica120, foi gravada nos Estados Unidos
em 27 de janeiro de 1945. Pode ser encontrada, entre outros relançamentos, no disco The
Brazilian Bombshell, edição norte-americana sem data e sem créditos aos compositores das
somente um pouco mais lento (!= 122) e começa com uma introdução criada a partir da
segunda metade da parte “A”. Após a introdução, Carmen canta a seqüência ACACA, mas
em nenhuma das vezes ela expõe a letra toda conhecida para a parte A, repetindo sempre o
primeiro verso duas vezes e alterando apenas a melodia. Ficam algumas dúvidas sobre essa
questão: Teria Aloísio composto realmente este segundo verso para o tema A? Será que ele só
esta versão, que chegaram até nós através de uma edição francesa, foram compostos por outra
120
http://www.carmenmiranda.hpg.ig.com.br/grv_284.html
114
pessoa? Como esta pesquisa não se propõe a responder essas perguntas, apontamos esta
qual as partes B e A são expostas, nesta ordem, e a intérprete então reapresenta as partes C e
A para concluir a parte cantada. Neste arranjo, portanto, tem-se o seguinte esquema: " A
Para a abordagem desta peça, assim como as intérpretes citadas acima, foi criado um
arranjo final híbrido a partir de duas referências: uma partitura de edição francesa com letra
de Aloísio de Oliveira121, retirada do livro Bossa Nova & Samba (Mellac, 1978), e uma outra
editada por Irmãos Vitale para piano (Abreu, 1941). A partitura que acompanha este trabalho
Thiago Trajano, que me acompanhou durante a primeira apresentação desta peça em aula de
práticas interpretativas durante o mestrado. Conforme partitura no anexa IV, o arranjo final
que criamos manteve a forma original da peça AABBACCA chegando ao seguinte formato:
Apesar de não haver uma letra diretamente composta para a melodia da parte B,
considerando a importância desta melodia na obra e o seu potencial como exercício de técnica
vocal, buscou-se inspiração nos métodos de articulação dos instrumentistas de sopro para
criar uma solução minimamente interessante. Com combinações dos fonemas [t], [d], [r], [k] e
[g] foram criadas articulações duplas, triplas e até múltiplas para cantar os arpejos desta parte.
O resultado sonoro obtido do ruído percussivo dos fonemas consonantais sugeriu que este
arranjo poderia descrever ou ilustrar a “bagunça” que o tico-tico estava a fazer com o fubá.
121
Apesar da dúvida sobre a autenticidade do segundo verso da parte A, optou-se por utilizá-lo considerando sua
adequação à obra como um todo.
115
Além do lado humorístico desta adaptação, essa prática, ou seja a execução da melodia
uma partitura instrumental retirada do Songbook Choro (Sève; Souza; e Dininho, 2007) em
contraste com a transcrição da primeira gravação que Ademilde Fonseca fez deste choro em
1943. Depois de definida a versão final, foi feito um arranjo de Apanhei-te cavaquinho com o
A idéia inicial para este arranjo surgiu durante os primeiros meses de estudos desta
peça entre março e junho de 2009. Como eu não conseguia cantar os saltos da parte B em alta
velocidade, durante aulas com Rubim foi lançada a hipótese de cantar os saltos somente em
saltos. Conforme é descrito no estudo detalhado da peça, após alguns meses de treinamento,
não foi necessário suprimir os saltos. Já a junção de Apanhei-te Cavaquinho ao baião O Ovo
de Hermeto Pascoal foi realizada num segundo momento do estudo, em parceria com o
pianista Vitor Gonçalves. A semelhança rítmica entre as duas peças, o fato de estarem na
uma polca instrumental composta por Ernesto Nazareth em 1915. Gravada por ele em 1930
Apanhei-te cavaquinho foi denominado como choro. A partitura instrumental que tivemos
acesso (Sève; Souza; e Dininho, 2007) confere a autoria da peça a Ernesto Nazareth em
116
parceria com Hubaldo, e quanto à classificação de gênero musical também é denominado
choro.
cavaquinho descobriu-se que o choro de Nazareth ganhou quatro letras póstumas de autores
distintos e Hubaldo Mauricio é um desses autores. As outras letras foram compostas por Darci
de Oliveira, Nara Leão e Paulo Garcia. Como não houve acesso às gravações com as versões
de Hubaldo Maurício e Paulo Garcia não foi possível saber como essas duas letras se
encaixam na melodia do choro. Mas sobre a letra composta por Nara Leão, foi realizada a
transcrição a partir da gravação feita por ela em 1969 no LP Coisas do Mundo. Após estudo
comparativo entre a versão de Nara Leão e Ademilde Fonseca, optou-se pela versão de
Fonseca.
A letra gravada por Ademilde Fonseca foi escrita por Darci de Oliveira, que apesar de
não ter escrito versos para a parte C da peça, ainda assim, ganhou nossa atenção por preservar
que foi desenvolvido durante essa pesquisa. Foram necessárias algumas adaptações entre a
versão cantada por Fonseca e o trecho instrumental da parte B, mas a letra de Oliveira
permitiu a manutenção dos saltos que foram suprimidos na versão de Leão. A partir dessa
tempo todo num andamento em torno de (!= 126), e somente ao final Carrilho faz um solo
117
desenvolvemos um arranjo para a interpretação deste choro alternando três andamentos,
partindo de um início a capela em (!= 83) para exposição das partes A e B, uma mudança
aparente conclusão ao final do B. Após breve pausa, piano e voz finalizam com a parte A em
3.1.3 Um a Zero
letra de Nelson Ângelo retirada do livro Choro do quintal ao municipal (Cazes,1998, p. 186 e
187). A letra, com versos geniais de Nelson Ângelo para Um a Zero, curiosamente, é uma das
poucas elogiadas por Cazes (2008) que tendenciosamente se posiciona contra o choro
cantado, vide o título de seu artigo para o livro Palavra Cantada: “O choro cantado: Um
O choro Um a Zero foi composto por Pixinguinha em 1919 para homenagear o gol do
jogador da seleção brasileira Arthur Friedenreich, que definiu a vitória do Brasil sobre a
Mundo Lusíada, José de Almeida Amaral Jr. afirma em matéria sobre Pixinguinha que,
inicialmente, somente o próprio Pixinguinha era capaz de interpretar este choro: “Durante
anos somente ele tocou esse choro tamanha as dificuldades técnicas para interpretá-lo”
partitura final não foi uma tarefa tão trabalhosa uma vez que os versos de Ângelo encaixam-se
quase perfeitamente nas três partes do choro composto por Pixinguinha. Foram necessários
122
Álbum com 72 obras de Pixinguinha
118
pequenos ajustes na distribuição dos versos para ajustar a letra a melodia original. Como não
tivemos acesso a uma edição do choro Um a Zero acompanhado dos versos de Ângelo, em
três pontos da peça, tomei a liberdade de inserir uma sílaba ou criar versos para preencher
trechos instrumentais. A versão final desta adaptação está disponível no anexo IV desta
dissertação.
primeira nota dó no compasso 36 tinha duração de uma colcheia, mas a fim de criar um som
para a sílaba /ra/ da palavra /primeira/ dividimos o tempo desta colcheia em duas semi-
|coitada da sua mãe|, para que a sílaba /ta/ da palavra |coitada| caísse no tempo forte sem
deixar lacunas em notas anteriores. A partir de uma lógica contrária à intervenção citada
/con/ da palavra |desconto| para preencher todas as notas da melodia, mas a minha escolha
interpretativa, neste caso, foi suprimir a nota Dó3 sustenido que ocorre entre dois Rés3123.
re-exposição do tema traz uma variação da melodia previamente apresentada nos compassos 9
são insuficientes para preencher a quantidade de notas que surgem na variação. Inspirada pelo
texto de Ângelo, criei versos em trocadilhos: /olha lá vai é a bola que rola e enrola, rolando
entre as pernas, lá vai olha a bola direto pro gol/ como uma tentativa de descrever o percurso
123
Ver parênteses na nota Dó3 sustenido que ocorre no compasso 73 da partitura de Um a Zero no anexo IV.
119
Outra intervenção em que houve a criação de um novo verso, se deu no compasso 65
seguido de repetição do mesmo trecho no compasso 81. No compasso 65, a primeira nota
notas introduz a parte C que se inicia no compasso 66. Em acordo com o caráter introdutório
desta pequena frase, criamos o texto /e o ponteiro/, referindo-se aos ponteiros do relógio que
marcam 40 minutos do segundo tempo, conforme descreve o texto de Ângelo para a parte C
do choro.
3.1.4 Ingênuo
O choro Ingênuo, que possui apenas duas partes, característica pouco aceita nos
recolhemos a informação de que este choro ficou consagrado em sua versão instrumental com
foi composta uma letra por Paulo César Pinheiro que tornou-se também consagrada na
Para este estudo foi realizada uma análise comparativa entre a melodia da partitura
análises chegou-se a uma terceira versão de partitura para a execução vocal. O principal
critério utilizado na adaptação realizada para este trabalho foi preservar ao máximo as
124
A Escola Portátil de Música, desde a sua criação, tem como um de seus objetivos a realização de oficinas em
espaços diversos, com intuito de expandir e semear o conhecimento musical crítico, através da linguagem do
choro. www.escolaportatil.com.br
125
Álbum com 72 obras de Pixinguinha
120
A partitura com a versão resultante deste processo de edição é apresentada no anexo
IV. A seguir são apontadas as três primeiras alterações que foram realizadas, demonstrando o
maior com sétima menor (E7) que teve que ser suprimido na versão com letra por não haver
palavras para este trecho. Mais adiante, no compasso 7, apresenta-se a repetição do mesmo
motivo em outro tom e então a omissão do arpejo mais uma vez é necessária pela ausência de
letra.
a melodia original inserindo saltos de quarta à uma seqüência que deveria ser a repetição de
uma mesma nota. Essa alteração diminui extensão ao término da frase na primeira nota do
compasso 10 e omite o salto subsequente entre a primeira e a segunda nota do compasso 10.
adota a mesma solução realizada por Elizeth Cardoso. Para que houvesse um encaixe
adequado entre letra e melodia um Si bequadro foi omitido no compasso 10, foi acrescido no
início do compasso 11 um Ré4 e a ligadura entre dois “Lás”3 foi cancelada para manter o Dó4
na melodia.
121
EXEMPLO 3.1: Edições feitas nas partituras de Ingênuo e versão resultante.
3.1.5 Rosa
somente como peça instrumental, e ela foi uma das faixas em sua gravação de estréia como
solista e compositor ao lado do choro Sofre porque queres (rotulado como tango)
violonistas Donga e Nelson Alves e o ano desta gravação segundo os registros da Casa Edison
foi 1917. Somente mais tarde a valsa ganhou letra de Otávio de Souza e foi gravada por
Antes de selecionar a partitura para o estudo técnico vocal, foram analisadas duas
gravações de Rosa: a versão instrumental original feita pelo próprio Pixinguinha em 1917 e a
gravação com letra realizada por Orlando Silva em 1937. Na primeira versão instrumental
gravada por Pixinguinha observou-se que Rosa é uma composição em três partes como era
comum aos primeiros choros quase sempre compostos em forma Rondó. No entanto, ao invés
da forma mais recorrente AABBACCA, nesta gravação a disposição das partes é ABBACA.
122
O andamento da versão instrumental é bem acelerado, em torno de (!= 193), e neste caso
Na versão cantada por Orlando Silva, observou-se a parte C ausente uma vez que
foram feitos versos apenas para as partes A e B. A melodia cantada sofreu algumas alterações
e a forma da valsa nesta gravação ficou sendo ABA. O andamento bem mais lento adotado
por Silva, em torno de (!=103), não deixou de exigir virtuosismo do intérprete. Porém, neste
segundo caso a dificuldade está na execução das frases longas e na grande amplitude vocal
exigida. Na gravação de Orlando Silva é impressionante observar seu domínio técnico e sua
A partitura adotada para este estudo foi uma cópia feita em computador apenas para
Este choro resultou de um poema de Paulo César Pinheiro musicado pelo violonista
Choro127 em 1996 intitulado com o mesmo nome da revista. Após ser musicado, o nome da
peça foi modificado porque verificou-se existência anterior de uma música com o mesmo
nome. Foi constatado que este é um choro inédito de Carrilho e Pinheiro até o momento desta
pesquisa.
Como foi mencionado anteriormente, com base nas partituras, foram realizados dois
126
Álbum com 72 obras de Pixinguinha.
127
Roda de choro - revista sobre choro editada pelo Egeu Laus e Rodrigo Ferrari desde 1995.
123
primeira análise são apresentados a seguir no Quadro comparativo 3.1. e os resultados da
choros. Os quadros 3.2 a 3.6 apresentam os compassos onde localizam-se: (1) saltos entre
passagens de registro; (2) seqüência de saltos variados; (3) escalas longas ou complexas; (4)
tenham surgindo de diferentes maneiras, em função do estudo das 8 peças ter sido realizado
ao longo de quase três anos, esses dois procedimentos de análise citados foram determinantes
consistiu sempre em identificar a extensão e a tessitura das peças para depois escolher a
tonalidade mais adequada à minha extensão vocal. Esta prática sempre fez parte do meu
processo de estudo individual desde quando eu ainda era uma adolescente, estudante de canto
e violão, em meados dos anos 1993. Porém, neste período minhas ações restringiam-se à
violão até encontrar a tonalidade mais adequada para minha voz. Neste segundo caso, eu
raramente sabia a extensão da peça por não ter contato com a partitura ou por não ter um
melódicas e o conceito de que esta prática é uma ferramenta muito relevante no aprendizado
do canto, foi uma atividade que se intensificou somente alguns anos após a minha graduação
em música. Após a minha mudança para São Paulo, em 2004 iniciei aulas de canto e
124
improvisação com a cantora de Jazz norte-americana Cynthia Borgani que me apresentou uma
vocal de qualquer obra. O Quadro 3.1 abaixo apresenta os dados coletados nas partituras do
anexo IV e as escolhas de andamento para execução das peças neste momento atual.
Durante o estudo vocal dos choros, muitas vezes a variação do andamento ocorreu
como uma estratégia didática, especialmente no estudo de trechos de agilidade (ver item 3.3,
p. 133). Mudanças no andamento também podem ocorrer por uma concepção estética do
aqui selecionadas. A lista com a extensão das obras confirma que os 8 choros selecionados
para este estudo tem melodias que exigem grande extensão do instrumento vocal.
Considerando que a maioria das pessoas com vozes não trabalhadas tem extensão vocal útil
em torno de uma oitava, nem mesmo Apanhei-te Cavaquinho, que apresenta a menor
extensão da lista, poderia ser executado com clareza por este indivíduo.
Com base nas edições finais das partituras foram preparados os Quadros 3.2 a 3.6 para
125
encontradas em cada um deles. No Quadro 3.2 a seguir verifica-se a ocorrência de saltos a
dificuldade por dois motivos: (1) localização do intervalo entre passagens de registros ou em
caminhos de solução correspondentes em estudos propostos no item 1.6 (ver p. 82) desta
trabalhada nos exercícios propostos no item 1.4.3 (ver p. 56) referente ao Estudo
sua localização na extensão da peça. Já a dificuldade técnica com relação à alternância das
126
vogais pode estar presente ou não no intervalo destacado. A exemplo disso, nos comentários
do Quadro 3.2 sobre a valsa Rosa foi indicado que o intervalo de 5a justa descendente
presente entre os compassos 8/9, 24/25 tem sua execução facilitada quando ocorre entre os
compassos 72/73 uma vez que o encontro vocálico /e, ão/ da palavra |per-dão| é mais
favorável que /u, é/ referente a |Tu és| e /[I], eu/128 referente ao texto |Se Deus|.
destacada no intervalo de 5a justa descendente que ocorre entre os compassos 70/71 da valsa
Rosa. Além da alternância das vogais frontal [e] com a posterior [o] na palavra |resplendor| da
localização da segunda nota do intervalo de 5a justa que, em ambos casos, é muito próxima
representação do grau do intervalo é acompanhada das siglas: (d/a) para indicar a ocorrência
somente ascendente; e (d) para somente descendente. Os saltos sequenciais intercalados com
arpejos são representados pelo grau do intervalo e a letra maiúscula /T/ representando a tríade
entre eles. No caso do mesmo intervalo se repetir mais de uma vez na seqüencia (a/d) ou
(d/a), foi repetida a utilização de (a) ou (d) de acordo com o número de ocorrências.
128
O símbolo fonético [I] está substituindo a vogal /e/ da palavra |Se| em acordo com a pronúncia do português
brasileiro deste texto.
127
QUADRO 3.3: SEQÜÊNCIAS DE INTERVALOS QUE EXIGEM EMISSÃO VOCAL EQUILIBRADA
PARA A ARTICULAÇÃO DAS VOGAIS E CONSOANTES
Nome do choro Compassos Seqüência Comentários
Tico-tico no fubá 22-25 T, 8J, T, 7M, T, 6M, T 5J, T, Seqüência de
6M, T, 5J, T, 6M intervalos
30-31 8J, T, 7M, T, 6M, T, 5J descendentes
intercalada por arpejos
55-63 5J, T, 5J
de tríades.
57-65 6M, T, 5J
Apanhei-te cavaquinho 16-17; 24-25 6m (d/a/d/a), 7dim (d) Para a seqüencia do
17-18; 25-26 6M (d/a/d/a), 7m (d) compasso 28 (ver Ex.
18-19 6M (d/a/d/a), 7M (d) 1.20 p. 81) desta
dissertação
20-21 6m (d/a/d/a)
22 7m (d), T, 8J (d), 6M (a/d), 6m
(a)
26-27 6M (d/a/d), 6m (a), 6M (d)
28 6m (d), 5J (a/d), 4J (a/d), 3m
(a/d/a)
Um a zero 1-3; 3-5; 50-52; 8J (d), 7m (a/d), 8J (a/d), 6M (a) O trecho do compasso
52-54 46 é semelhante ao do
19; 27 6m (d), T, 6 (d), T compasso 28 em
Apanhei-te
46 5J (a/d), 3m (a), 5dim (d), 3m
cavaquinho.
(a), 6M (d) Os trechos dos
67-69 8J (d), T, 7m (d), T, 6m (d), T, compassos 67-69 e 75-
5J (d), T, 6M (d), T 77 são semelhantes ao
75-77 8J (d), T, 7m (d), T, 6M (d), T, 22-25 e 30-31 de Tico-
5dim (d), T, 6m (d), T tico no fubá.
Ingênuo 60 4J (a/d/a/d)
Rosa 18-19; 82-83 4J (a/d), 6m (a), 3m (d), 5J (a),
3M (d)
Costura de choro 23-25 6m(d), 5J(a), P, 4J(d), 3m(a), P, Adotamos o uso da
6m (d/a), P, 5J (d/a) letra /P/ para
31-33 5J(a), P, 7M(d), 6M(a), P, 8J(d), representar passagens
5J(a), P, 3m(d), 7m(a), P, 5J(d) de 2M ou 2m
descendentes.
128
Carvalho (1982) apud Rubim (2000) demonstra em seu livro O Processo Didático que
trecho complexo.
Para o estudo das seqüência de intervalos fizemos uso do desdobramento proposto por Rubim
verificou-se na prática que o estudo técnico realizado para solucionar os trechos complexos
do Quadro 3.3 foi mais responsável por trazer melhoras significativas para os trechos do
Foi constatado durante estágio docente e em minha prática vocal individual que o
estudo de um trecho musical simples, como por exemplo, o treinamento de um único salto,
muitas vezes, não funcionava como um estudo preparatório para uma seqüência de intervalos
mais complexa. Verificou-se que este fato específico era análogo à uma tendência geral
recorrente no estudo do canto. Durante a experiência prática notou-se que uma dificuldade
técnica simples permanecia por muito mais tempo na execução de uma peça do que uma
dificuldade técnica complexa. Muitas vezes, somente após decupar um trecho de grande
129
Para a solução dos desafios técnicos apontados no Quadro 3.3, primeiramente foi feito
complexas que foram identificadas como trechos de dificuldade técnica neste estudo.
Bordaduras ou passagens cromáticas são muito comuns neste repertório dos choros mas isso
não representou um desafio técnico muito grande. Entretanto, os trechos cromáticos mais
longos, como aqueles identificados em Tico-tico no fubá e Apanhei-te cavaquinho, são aqui
selecionados como pontos de dificuldade. Outro fraseado melódico que representou grande
desafio técnico neste estudo dos choros foi a escala de tons inteiros presente na melodia de
Para solucionar as dificuldades técnicas dos trechos selecionados no Quadro 3.4 foi
respiratório descritos no item 1.2 (ver p. 25); treinamento da emissão equilibradas de vogais e
consoantes a partir de exercícios propostos no item 1.4 (ver p. 51); treinamento de exercícios
de agilidade para peças como Apanhei-te Cavaquinho e Tico-tico no fubá (ver Ex. 1.20, p. 81)
130
indicados no item 1.5 (ver p. 71); e estudo para estabilização e unificação dos registros vocais
indicado no item 1.6 (ver p. 82). Além disso, estes trechos exigiram melhora da acuidade
vocalizes específicos como o exercício 9.20 de Miller, apresentado no Exemplo 1.23 (ver p.
86) desta dissertação. Os desafios da escala de tons inteiros são discutidos no estudo
O Quadro 3.5 contém arpejos que foram identificados como trechos de dificuldade nos
choros. Os arpejos selecionados são descritos com números que correspondem aos graus do
acorde. Usamos /b/ para representar o abaixamento de " tom em terças, quintas e nonas; o 1
sétima menor e o 7dim corresponde a sétima diminuta. Em acordes com mais de 4 notas em
que aparecem graus repetidos em alturas diferentes - como no arpejo de acordes diminutos de
131
Os estudos dos arpejos selecionados no Quadro 3.5 foram realizados a partir de
adaptações de vocalizes como o exercício 4 de Rubim (2008) (ver Ex. 1.17, p. 71), e os
exercícios 7.14 e 3.18 de Miller (ver Ex. 1.18 e 1.20, p. 71 e 81) que tradicionalmente são
Finalizando o item de análise interpretativa dos choros, o Quadro 3.6 apresenta trechos
de frases longas que tanto nos choros de andamento lento quanto nos choros de agilidade
132
QUADRO 3.6: TRECHOS QUE EXIGEM ESTUDO DE SUSTENTAÇÃO
PARA REALIZAÇÃO DE FRASES E NOTAS LONGAS
Nome do choro Compassos Descrição
Apanhei-te cavaquinho 0-8; 9-16 A parte A divide-se em dois trechos que devem ser
articulados e ligados do começo ao fim. O aumento do
andamento facilita a quantidade de ar necessária, mas
exige mais agilidade para a articulação clara do texto.
Um a zero 34-40; 41-50; Dentre todos os choros, nestes trechos encontramos
74-82 o maior desafio para o domínio do controle
respiratório
Ingênuo 8-12; 12-16; Trechos de frases longas que se tornam mais difíceis
26-30 porque o andamento é lento.
40 Dificuldade específica de emissão estável da nota
final, porque se localiza numa região muito grave da
extensão.
Rosa 20-24; Trechos de frases longas que se tornam mais difíceis
porque o andamento é lento.
Choro pro Zé 32-36 Dificuldade acentuada por conta de um ritardando que
optamos fazer para a finalização do arranjo
Sambadalu 17; 18; 19-22; Sambadalu é a peça com mais ocorrências de trechos
23-25; 37-39; 40; de sustentação de notas longas. Apresentaremos
41-42; 49-50; etc. explicação detalhada no estudo específico sobre a peça
no item 3.3
treinamento avançado do ataque e finalização (ver item 1.1, p. 17); apoio e controle
respiratório (ver item 1.2, p. 25) e treinamento da habilidade de sustentação (ver item 1.5, p.
71) que atenderá tanto os desafios das frases com notas longas quanto os trechos de agilidade
A descrição detalhada do estudo técnico vocal de três choros tem como objetivo
técnico vocal que de certa forma foi aplicado aos 8 choros aqui selecionados. A transcrição de
gravações de aulas com Rubim que ocorreram ao longo do Programa de Mestrado constituem
as bases deste relato sobre o estudo detalhado de Apanhei-te Cavaquinho como exemplo dos
133
A seqüência de aquecimento vocal adotada ao longo dos 28 meses de aula com Rubim
variou de acordo com minha evolução técnica e as necessidades do repertório. Foi transcrito
abaixo a seqüência dos exercícios vocalizados no aquecimento vocal proposto por Rubim
(2009) na aula do dia 30 de março de 2009 que foi também a primeira aula onde se trabalhou
com minha resposta vocal rápida e eu me senti na obrigação de confessar que tinha aquecido a
voz antes de ir pra aula naquele dia. Rubim aprovou minha atitude e surgiu um diálogo
antes de irem para uma aula de canto: “Depois de um certo nível tem que aquecer antes de ir
pra aula, já chegar na aula pronta” (diz Rubim, 2009). Essa atitude permite que o aluno
aproveite o momento com o professor para tirar dúvidas do repertório ao invés de passar
quase a aula toda tentando estabilizar a emissão vocal. É claro que isso não se aplica a alunos
iniciantes que ainda estão descobrindo como funciona a própria voz e os devidos recursos
para treiná-la.
esperada pelo exercício ao atingir a região aguda: “está subindo pra voz de cabeça” (Rubim,
falha busquei manter a qualidade da voz de peito na subida para a região aguda e acabei
estridência”. Tentei mais uma vez aumentando a nasalidade e no meio da escala houve uma
quebra de passagem de registro e fui interrompida por Rubim mais uma vez “isso é peso, isso
machuca” (Rubim, 2009). Finalmente na quarta vez que realizei o vocalize, depois de ouvir
a sílaba /ca/ consegui fazer o exercício original de maneira satisfatória, e em seguida Rubim
134
(2009) comenta: “viu, não pode fazer força, quando faz força não vai pra esse buraco”
Depois de encontrar a colocação adequada fiz o vocalize com mais facilidade algumas
vezes e questionei: “Não está sem volume agora?” (Rezende, 2009) e Rubim respondeu “é pra
ser assim [...] eu não coloco muito volume mas eu coloco muita ponta” (Rubim, 2009)
referindo-se a emissão com ressonância alta e frontalizada promovida pelo uso correto da
consoante ["] (ver item 1.5, p. 71). A descrição desta passagem da aula com Rubim busca
prática eficiente.
135
3.3.1 Apanhei-te cavaquinho
não havia estudado o trecho devidamente, o que quer dizer que eu ainda tinha dúvidas sobre
Quadro 3.3 (ver p. 128). A primeira seqüência identificada [6m (d/a/d/a), 7dim (d)] surge logo
nos primeiros compassos (16-17) e na aula com Rubim, a busca por uma solução técnica
neste momento da aula, enquanto Rubim sugeria soluções para a frase mencionada dos
comentários a fim de esclarecer os diálogos e a letra da frase musical é transcritas entre barras
//.
Rubim (tocando os intervalos no piano) O problema está aqui, você não pode sonorizar ela
(referindo-se a nota grave). Você mira ela e não sonoriza.
Rezende (tento cantar o trecho) /hoje cantando o apanhei-te cavaquinho/ (sou interrompida
por Rubim que alerta sobre a afinação estar mais baixa do que está escrito na partitura)
Rubim Ela (a nota grave) está abaixo do que é.
Rezende (treinamos então somente o trecho) /ei-te ca-va-qui-nho/ (tentando manter a leveza
na emissão das notas graves canto a frase umas duas vezes e na verdade percebo que estou em
dúvida sobre qual é o intervalo que deveria cantar. Tento então marcar quais são as notas do
intervalo vocalizando /ta-ra/ e Rubim interrompe me orientando).
Rubim Não, não pode fazer /ta-rá/ (imitando meu movimento facial referindo-se a queda
brusca do maxilar na ida para o grave e em seguida Rubim exemplifica) é /ta-rã/ (utilizando-se
da vogal nasal /ã/ e movimento facial equilibrado para exemplificar que a emissão deve se
manter estável como se a distância do intervalo entre as notas se alongasse na horizontal e
não na vertical com eventual queda do maxilar).
Rezende (tento mais uma vez) /ei-te ca-va-qui-nho/
Rubim É, você não pode descer a face se não você não volta rápido pro ré (Ré4 da melodia. Na
época da aula eu estava estudando a peça na tonalidade de Ré maior. Atualmente canto este
choro em Dó maior).
Rezende Tá
Rubim Faz pra mim oh /pi-pi-pi-pi-pi-pi/ (substituindo toda a frase musical pela sílaba /pi/)
Rezende /pi-pi-pi-pi-pi-pi/ (faço o exercício proposto mas continuo deixando cair a face na
emissão das notas graves)
Rubim (me corrigindo) Oh, é tudo em cima, oh. (demonstrando o movimento facial)
Rezende (faço mais uma tentativa) /pi-pi-pi-pi-pi-pi/
Rubim Isso, mas olha, você está colocando o ré alto e fá baixo.(referindo-se a afinação
inadequada das notas)
136
Rezende (repito o exercício mais uma vez) /pi-pi-pi-pi-pi-pi/
Rubim Isso.
Rezende (animada por conseguir realizar a frase com a sílaba /pi/ experimento cantar o
trecho com a letra) /ei-te-ca-va-qui-nho/
Rubim Isso, você tem o /nha-tcha-ca-va/ (selecionando os fonemas aproximados das
consoantes a serem articuladas Rubim propõe um novo exercício)
Rezende /nha-tcha-ca-va/ (2 vezes)
Rubim Agora faz /nhe-tche-que-ve/ (Sugerindo uma variação do anterior)
Rezende /nhe-tche-que-ve/ (2 vezes)
[...] (Resumindo, Rubim demonstra um erro na emissão do segundo Ré4 que apresentava uma
afinação um pouco mais alta do que a desejada e então conclui explicando o procedimento
adotado)
Rubim Você viu o que é que eu fiz? Eu botei o /pi-pi-pi-pi/ que é uma sílaba só. Depois eu
pego os fonemas consonantais e coloco uma vogal só porque quando troca tudo o cérebro
enlouquece, ele não tem parâmetro.
Rezende Você diminuiu o S, né? (pergunto fazendo referência ao procedimento de ensino-
aprendizagem descrito na dissertação dela e que foi citado anteriormente nesta dissertação na
explicação do Quadro 3.3) Na verdade você está subdividindo o S, não é?
Rubim Exatamente
[...] (Comentamos várias experiências realizadas com esse procedimento e voltando ao estudo
da peça canto a frase inteira do compasso 16 a 19 num andamento um pouco mais lento)
Rezende /hoje cantando o apanhei-te cavaquinho eu fico louca fico quente fico como um
passarinho a cantar/(mas durante a execução desconfio que somente as notas do primeiro
compasso estão corretas e questiono). Mas está tudo certo isso aqui? (referindo-me as notas da
melodia) Ou estou cantando qualquer nota?
Rubim Na hora de decupar, se o seu foco é a posição de ressonância a nota não importa. Claro
que você está buscando acertá-la mas você está focando neste problema aqui (referindo-se a
emissão frontalizada e equilibrada trabalhada com as sílabas /pi-pi-pi-pi/ anteriormente)
[...](Conferimos a melodia com auxílio o teclado e eu canto a frase inteira duas vezes em
andamento mais lento e Rubim fecha com o comentário)
choro na qual senti dificuldade semelhante à do trecho que havíamos estudado em Apanhei-te
Cavaquinho. Esta observação foi a origem dos Quadros 3.2 a 3.6 apresentados neste Capítulo
137
época encontram-se no Quadro 3.3 (ver p. 128) e correspondem ao compassos (23-25) em
mais consistente nas gravações analisadas de aulas em junho de 2009. Isso se justifica porque
muitas sequências de saltos diferentes, o novo desafio foi cantá-la com precisão num
outubro de 2009 no estúdio Zaga no Rio de Janeiro. A gravação foi realizada com dois
propósitos: (1) registro do meu processo de estudo dos choros; e (2) produção de portfólio
para candidatura em processo seletivo de doutorado nos Estados Unidos. Pode-se dizer que
essa gravação cumpriu as duas funções às quais se destinava. Primeiramente fui selecionada
Boston; e o objetivo de registrar minha evolução no estudo dos choros confirmou, mais uma
vez, que o registro de uma interpretação em áudio de alta qualidade, seguido de uma audição
A gravação de outubro de 2009 permitiu que eu identificasse que, mesmo com toda a
essa lacuna antes da audição do doutorado que ocorreu em fevereiro de 2010. Esse fato
permitiu que eu me preparasse melhor para a audição do NEC e durante o mês de janeiro
138
realizei um estudo diário das peças que iria apresentar na audição. Seguindo sugestão de
Dominique Eade, com quem tive aula preparatória para a audição, fiz um arranjo a cappella
a devida atenção.
Apesar de não ter sido aprovada no programa de doutorado do NEC, após a audição,
recebi um feedback muito positivo de Dominique Eade a respeito da minha apresentação, uma
vez que ela compunha a banca do exame de performance. Além disso, o reconhecimento
tardio de uma dificuldade técnica pequena, muito mais simples do que outras exaustivamente
investigadas e solucionadas logo nos primeiros meses de estudo, apontou ajustes relevantes
para a abordagem metodológica de estudo do canto que esta pesquisa busca desenvolver.
Choro pro Zé foi composto por Guinga especialmente para o saxofonista Zé Nogueira.
Aldir Blanc escreveu os versos interessantes que completam esta obra. A primeira gravação
deste choro é de 1993 e foi lançada no CD Delírio Carioca pela gravadora Velas. Participam
desta gravação: Lúcia Helena (voz); Guinga (violão); Nico Assumpção (baixo acústico);
Paulo Malaguti (teclados); Zé Nogueira homenageado (sax soprano); e Paulo Sérgio Santos
(sax soprano).
consiste na escala de tons inteiros que ocorre nos compassos (17-19) conforme foi apontado
no Quadro 3.4 (ver p. 130). Após análise de gravações de aulas com Rubim comparadas à
minha primeira gravação deste choro realizada em aula com Borgani em outubro de 2007,
pude conferir que um ano e meio depois (maio/2009), eu ainda apresentava certa insegurança
na execução da escala de tons inteiros. Somente na gravação de outubro de 2009 este trecho é
139
Outros pontos de dificuldade considerados significativos durante o estudo da peça
foram: a extensão de duas oitavas (Quadro 3.1, ver p. 125); a sequência de saltos localizada
próximo ao extremo agudo da minha extensão vocal, compassos (20-22 e 28-29) (Quadro 3.3,
ver p. 128); e os arpejos do compasso 27, conforme Quadro 3.5 (ver p. 132), que tem sua
Apanhei-te Cavaquinho no item anterior 3.3.1, trechos selecionados desta transcrição são
pedi supervisão a Rubim sobre como orientar os alunos no estudo de dois trechos de
dificuldade mais evidente em Choro pro Zé: (1) os arpejos do compasso 27; e (2) a escala de
tons inteiros nos compassos (17-19). Para apontar novas soluções Rubim partiu da minha
Mostrei uma adaptação do vocalize com a tríade perfeita (8 5 3 1) e a sílaba /pi/ (ver
Ex. 3.2, p. 135) que realizei como proposta de exercício para o trecho do compasso 27.
EXEMPLO 3.3: adaptação do exercício 4 de Rubim (ver Ex. 1.17, p. 71) para treinamento da dificuldade
técnica no compasso 27 em Choro pro Zé.
presente nos arpejos ao invés de pensar na seqüência inteira de quatro notas. Apoiada na idéia
140
agrupamento de duas em duas notas e esquece o intervalo que está entre os arpejos” (Rubim,
2009). O exemplo 3.4 a seguir demonstra essa mudança de acentuação proposta acima.
EXEMPLO 3.4: mudança de acentuação sugerida por Rubim como caminho de solução para trecho
do compasso 27.
Após a explicação e execução do exemplo acima, consultei Rubim sobre dúvidas que
eu tinha a respeito de insistir ou não com os alunos pela compreensão harmônica presente
cria mais uma dificuldade para o aluno de canto que está treinando trechos como o do
compasso 27.
Rubim você sabe que dependendo da situação você vai fazer uma escolha ou outra. Tem horas
que eu não posso pensar na harmonia e eu tenho que pensar intervalarmente e mapear as
alturas intervalares sinestesicamente. E tem horas que só a harmonia me salva, então não há
uma regra. Então, como professora você prepara as duas opções e dá ao aluno a chance de
escolher.
Rezende (refletindo sobre como escrever a dissertação) Tudo vai ter que entrar como sugestão
de caminho, porque não dá pra afirmar: este é o caminho. Porque o caminho não existe, né?
Cada um recebe a informação de um jeito. Quando eu recebo uma aluna que é baixista, pra ela
pensar em função harmônica é excelente, mas ela tem pouquíssima consciência da própria voz.
Eu parto da vantagem que ela já tem. (Continuo falando exemplificando meu discurso com a
aluna) Você sabe a nota, agora precisamos malhar a sua musculatura para que você seja capaz
de cantar essa nota que você já sabe qual é. (Aula de canto com Rubim, 06/04/2009, RJ).
Ainda na mesma aula, surge a polêmica sobre como estudar a escala de tons inteiros e
mais uma vez Rubim sugere a solução de agrupamento de duas em duas notas com base no
note-grouping (Thurmond, 1981). Na verdade, ela propõe uma solução muito semelhante à
anterior com a única diferença que o fraseado deste trecho é mais longo: “as notas devem ser
acentuadas de duas em duas até que o ouvido se acostume com essa melodia” (Rubim, 2009).
Conversando a respeito dos perigos dessa solução de estudo, Rubim e eu, em acordo com
141
Miller (1996), acreditamos que depois que o aluno tem domínio da relação intervalar presente
nesta melodia ele deve buscar o domínio do legato e liberdade na marcação rítmica, uma vez
que essa acentuação proposta não foi feita por uma escolha estético-interpretativa.
3.2.3 Sambadalú
Sambadalu foi composto por Marco Pereira especialmente para cantora brasileira
Luciana Souza, radicada nos Estados Unidos há mais de 10 anos. A primeira vez que tive
contato com essa peça foi ouvindo a gravação de Luciana Souza no CD Brazilian Duos II
(2005), mas a experiência mais marcante foi quando assisti um show ao vivo no qual ela
SESI em São Paulo, presenciei o depoimento de Souza contando que recebeu a partitura deste
samba-choro, como um presente de Marco Pereira, apenas dois dias antes de realizar a
gravação.
pessoalmente por Pereira quando eu assistia suas aulas de harmonia e improvisação como
aluna visitante na UFRJ em agosto de 2009. E eu fiquei ainda mais impressionada com o
depoimento de Souza, quando comecei a estudar a peça e me deparei com uma infinidade de
desafios técnicos. Durante o estudo desenvolvido, além da gravação de Luciana Souza, tive
Afinidades (2005)
Sambadalu, com o devido apoio da partitura cedida pelo compositor (ver anexo IV), só teve
início após a experiência do estágio docente, momento em que eu já estava mais segura com
meu desenvolvimento técnico. Por esta razão meu estudo melódico desta peça foi mais
independente. A primeira aula com Rubim para mostrar meus progressos em Sambadalu foi
em 07 de julho de 2009. A seguir, são descritos os trechos mais relevantes desse encontro.
142
Como a peça foi composta para violão e voz, depois que Pereira me enviou a partitura
por correio eletrônico, iniciei meu estudo com apoio do violão. Não sou exímia violonista,
mas me acompanho tocando harmonias de várias peças que canto e também utilizo o
instrumento para compor. Até hoje não sou capaz de tocar a parte que foi escrita para o violão
em Sambadalu, mas aprendi e memorizei a melodia vocal na íntegra dobrando voz com o
dedilhado ao violão.
cantando e tocando a melodia no violão. Nesta data eu já era capaz de tocar e cantar a peça até
o compasso 96, mas Rubim me interrompe logo no compasso 25 para questionar aspectos da
ressonância. Segundo Rubim, o som estava muito preso, como se estivesse “engolido”, muito
provavelmente por causa da grande dificuldade técnica implícita em tocar e cantar uma peça
Nesta primeira interrupção Rubim sugere que eu direcione o som para o dente,
referindo-se aos incisivos superiores. Mais precisamente ela estava solicitando que eu
realizasse uma emissão com o foco de ressonância mais frontalizado. Como apresentei
Mais adiante foi trabalhado em aula o trecho do compasso 33-37 em que foi
identificada uma quebra de passagem de registro entre peito e cabeça. Para solucionar o
problema desta passagem, não foram adotados exercícios específicos, mas apenas o alerta de
Rubim foi suficiente para que eu fizesse uma mudança no foco de ressonância buscando
estabilidade.
Depois de apresentar o trecho estudado por completo (1-96) Rubim disse: “É isso
mesmo que você está fazendo. Agora é repetir, repetir, repetir” (Rubim, 2009). Durante o
diálogo de finalização da aula, em que eu perguntava sobre a estabilização vocal, ela ainda
143
explica: “A estabilidade facilita o estudo, não é um elemento a mais para complicar. Ela
É importante destacar que neste momento de estudo com Rubim, praticamente não
utilizou-se o momento da aula para fazer aquecimento vocal ou para corrigir notas erradas na
conquista de autonomia no estudo das peças. Esse fato, na verdade, significa que a estratégia
defendida por Rubim (2000) de ensino emancipado do canto estava funcionando comigo
também.
Além do trabalho para estabilização da ressonância proposto por Rubim, outro aspecto
aprimorado em Sambadalu, com base em Miller (1996), foi o estudo de dinâmica em alguns
trechos da peça. Porém, da mesma forma que Miller defende que o estudo dos vocalizes de
sustentação devem ser realizados após a aquisição de certo domínio técnico vocal, também os
exercícios de dinâmica propostos por ele exigem certa estabilidade. O Exemplo 3.5 apresenta
foi possível em uma fase mais adiantada do treinamento de Sambadalu e considera-se que
este é um dos aspectos da peça que ainda merece ser mais investigado.
EXEMPLO 3.5: Exercício 13.3 de (Miller, 1996, p. 176) e trecho com nota longa em Sambadalu.
144
Em meados de agosto de 2009 Pereira me forneceu uma partitura MIDI129 de um
arranjo que ele havia feito para um quarteto de violões. A partitura MIDI se demonstrou um
elemento facilitador do meu estudo uma vez que eu conseguia tocá-la no programa de
estudo com uma nova instrumentação (piano e voz), e também enriquecer meu portfólio com
a gravação de uma peça instrumental vocal e sem letra. Para escolha das sílabas utilizadas no
scat singing130 transcrevi as sílabas utilizadas por Luciana Souza nos primeiros 100
compassos da sua gravação para ter suas escolhas silábicas como referência e, a partir delas,
129
Musical Instrument Digital Interface (MIDI) – Interface Digital para Instrumentos Musicais
130
Scat singing é uma técnica de improvisação vocal presente no Jazz que utiliza-se de vocábulos sem formação
de palavras.
145
CONCLUSÃO
Esta pesquisa verificou que a aplicação prática dos conceitos teóricos obtidos na
intérprete no estudo vocal de um repertório específico de choros. Embora seja evidente que o
todo intérprete procura um professor de canto e, muitas vezes, não é imprescindível que ele o
aperfeiçoamento técnico vocal consiste no caminho mais seguro para o seu desenvolvimento.
O conhecimento da fisiologia, como o estudo aqui realizado a partir de Miller (1996), pode
proteger o cantor de causar danos ao seu aparelho vocal, além de ampliar sua percepção para
técnicas eficazes.
Partindo desta premissa, neste trabalho foram investigados 8 aspectos técnicos vocais
de canto que ora investigam o funcionamento vocal, ora relatam suas experiências pessoais,
diálogos entre as afirmações de Miller (1996) e as opiniões dos outros autores consultados no
146
Verificou-se neste estudo que a principal diferença entre o canto popular e o canto lírico está
instrumento. Deste modo, o estudo técnico vocal pode ser muito semelhante para os cantores
Outro achado importante desta pesquisa foi a constatação de que existe uma ordem
mais eficaz para a realização dos exercícios técnicos vocais. A partir da prática docente e de
minha experiência pessoal como cantora, foi constatado, por exemplo, que antes de conquistar
uma emissão vocal livre e estável é muito difícil que um intérprete consiga se aprimorar em
outros aspectos interpretativos, tais como o estudo da dinâmica ou do legato. Neste sentido,
aspectos vocais como agilidade e sustentação são amplamente discutidos no item 1.5 do
Capítulo 1 a fim de explicitar porque a execução de uma nota longa pode ser muito mais
A utilização do repertório de choros demonstrou que ele é uma ferramenta ainda mais
eficaz para o estudo técnico vocal do que o que foi previsto inicialmente. O estudo do
duas hipóteses iniciais: (1) para se cantar choros é preciso um grande domínio técnico do
instrumento vocal e (2) o estudo sistemático do choro cantado é uma opção para aquisição de
confirmar as primeiras hipóteses desta pesquisa, a prática deste repertório possibilitou duas
outras constatações: (3) uma dificuldade técnica simples, muitas vezes, pode acompanhar um
intérprete por mais tempo do que um problema complexo, e (4) uma das funções do choro,
do cantor.
A partir da análise das gravações coletadas durante estágio docente, foi evidenciado
147
pouco complexa, realizava, muitas vezes, uma performance desastrosa quando tentava
interpretar um choro. Por outro lado, esta ampliação do problema, promovida pelo uso do
repertório do choro, permitiu a busca por soluções destas dificuldades vocais pouco evidentes
problema técnico simples permanecia por muito tempo na interpretação do aluno, por conta
da sua dificuldade em identificá-lo como uma lacuna no seu desenvolvimento. Neste sentido é
correto afirmar que o choro funciona como uma lente de aumento em cima dos problemas, o
que pode ser muito eficaz no primeiro estágio de desenvolvimento técnico vocal de um
cantor, quando a sua percepção auditiva ainda não está muito apurada para os detalhes da
emissão vocal.
O repertório de choro cantado traz tantos desafios técnicos que raramente um cantor
irá afirmar que consegue cantar tal melodia e ritmo sem um estudo prévio da peça em
instrumentista, vai determinar o tempo de estudo necessário até que a melodia de um choro
possa ser executada com precisão. Ainda é válido ressaltar que, muitas vezes, somente após
resolver os problemas mais difíceis de uma peça é que o intérprete conseguirá localizar
detalhes que ainda precisam ser trabalhados, porém de soluções mais fáceis.
Diante da grande lacuna bibliográfica que existe com relação a este objeto de estudo,
optou-se por enfocar primeiramente a questão da técnica vocal, a fim de atender às demandas
Para isso, o estudo de 8 choros cantados foi realizado sob um enfoque predominantemente
melódico, ou seja, em que a primeira preocupação era indicar caminhos para uma emissão
vocal livre e estável. Por conta desta escolha, são apontadas aqui temas para pesquisas
posteriores sob 3 aspectos considerados relevantes no estudo do choro cantado a saber: (1)
estudo rítmico do choro e as possibilidades vocais relacionadas; (2) estudo das harmonias dos
148
choros, linhas de baixo e sua relação com a melodia cantada; e (3) estudo sobre o improviso
149
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Rosa) São Paulo: CPC-UMES, 2005.
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154
ANEXOS
Na faixa 1: o violão é um playback gravado por Fernando Corrêa especialmente para este
estudo – São Paulo.
Na faixa 3: piano e voz foram gravados simultaneamente no estúdio Zaga – Rio de Janeiro.
Todas as faixas foram gravadas por: Vitor Gonçalves (piano) e Daniela Rezende (voz) no
estúdio Zaga – Rio de Janeiro.
155
ANEXO III
Artigo publicado na Revista Fio da Ação
sobre experiência de estágio docente e Bolsa REUNI
156
157
158
159
160
161
162
163
164
165
166
167
168
169
ANEXO IV
Partituras dos 8 choros estudados
e Tabelas atualizadas do AFI
170
171
172
173
174
175
176
177
178
179
180
181
182
183
184
185
186
187
188
189
190
191
192
193
194
195
196
197
198
199
200
201
202
203
204
205
206
207
208