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FACULDADE INAP AVALIAÇÕES:

CURSO: DESIGN GRÁFICO 1ª Avaliação:

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. Valor: 40 pontos.

CRONOGRAMA: Trabalhos: Aula d Abstração, Aula do Tangram, Aula dos Búzios, Aula
do Tapete Mágico.
Aula Conteúdo
1 Introdução ao Curso de Expressão Gráfica e Criação.
2 Aula da Abstração.
3 Aula de Produção.
4 Aula do Tangram 2ª Avaliação: 02 de Julho.
5 Aula de Produção.
6 Aula dos Búzios Valor: 40 pontos.
7 Aula de Produção.
8 Aula do Tapete Mágico Trabalhos: Aula do Arcimboldo Aula dos Cadáveres Exquis, Aula do
9 Aula de Produção
10 Aula do Arcimboldo.
Paul Klee e Aula da Heráldica.
11 Aula de Produção.
12 Aula dos Cadáveres Exquis Trabalho Interdisciplinar: 10 pontos.
13 Aula de Produção.
14 Aula do Paul Klee Auto Avaliação: 10 pontos.
15 Aula de Produção.
16 Aula da Heráldica
17 Aula de Produção
18 Entrega dos Trabalhos e auto-avaliação.
19 Avaliação.
20 Banca do Iinterdisciplinar.
Trabalho: Os praticantes deverão produzir uma ilustração através do pro-
cesso de abstração de uma determinada imagem e aplicá-la em um projeto gráfico
FACULDADE INAP (página de revista, capa de agenda, estampa de camisa, etc.).

CURSO: DESIGN GRÁFICO


Especificações Técnicas: A4 (apresentação), 4x1 cores.
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.
Música: Stravisnk.
AULA DA ABSTRAÇÃO
Sugestões:
Objetivos:
1 – Produzir uma ilustração através do processo de abstração de uma determi- Livro: KANDINSKY, Vassily. Do Espiritual na Arte. Tradução de Alvaro
nada imagem e aplicá-la em um projeto gráfico (página de revista, capa de agenda, Cabral e Antônio de Pádua Danesi. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. (Coleção
estampa de camisa, etc.). a).
2 – Desenvolver a percepção visual através da desconstrução das imagens e re- Filme:
elaboração de seus aspectos estruturais.
3 – Trabalhar os conceitos de linha, formas geométricas, ritmo, equilíbrio.
4 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
des de produção.

Materiais: papel sulfite formato A4, lápis HB, régua, esquadro, compasso e
materiais para arte final.

História da Arte: Abstracionismo e Neoplasticismo.


Apreciação: Kandinsky e Mondrian, entre outros.
Composição: Linhas, harmonia, construção do espaço pictórico.

Roteiro:
1 – Exposição do tema e exibição de imagens (conceito de abstração).
2 – Exibição de Imagens figurativas.
3 – Croquis das imagens exibidas.
4 – Análise e processos de abstração1.
5 – Reelaboração das imagens, arte-final e aplicação.

1
Ao analisar os croquis feitos a partir de pinturas figurativas, os praticantes deverão evidenciar as formas
geométricas das figuras, a dinâmica linear da composição, a distribuição dos elementos no plano e, a partir
destes dados, reelaborar a pintura de forma abstrata, ou seja, não figurativa.
FACULDADE INAP argumentos que Seuphor, em seu livro sobre L’art abstrait2, expôs para rejeitar essa
substituição são, sem sombra de dúvida, válidos. De resto, o uso da palavra abstracio-
CURSO: DESIGN GRÁFICO nismo já se generalizou a tal ponto, que não há motivos para mudá-la. Ao se dizer
abstracionismo logo se entende algo muito bem definido em sua história e em seus
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. diversos aspectos, algo que a palavra concreto certamente não permite entender com
igual clareza. Portanto, nós também, adequando-nos ao uso, utilizamos esse termo
AULA DA ABSTRAÇÃO nestas páginas.
Já no capítulo dedicado ao expressionismo tivemos oportunidade de enfrentar
MICHELE, Mario de. As Vanguardas Artísticas. Tradução de o tema do abstracionismo. Tratava-se, porém, do primeiro abstracionismo kandinski-
Pier Luigi Cabra. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004. ano, um abstracionismo feito de impulsos líricos, relacionados ao princípio de inspira-
ção romântica entendida como efusão do espírito. O abstracionismo de que queremos
(Coleção a). p. 229 – 231.
nos ocupar agora, entretanto, é o abstracionismo do rigor intelectual, da regra, da
geometria. Isto não significa, portanto, que essas duas tendências não tenham em
A REGRA DO ABSTRACIONISMO
comum a mesma raiz idealista ou, pelo menos, mística, ainda que o misticismo de um
Mondrian é de natureza mental, em vez de emotiva como no primeiro Kandinsky. Se,
Duas tendências
de fato, no primeiro Kandinsky, encontramos uma forma de asceticismo que se liberta
do peso da realidade material através de um êxtase repentino, que o relaciona com a
O abstracionismo surgiu por volta de 1910, quase ao mesmo tempo, em diver-
substancia espiritual do universo, em Mondrian encontramos, ao contrário, um asce-
sas partes da Europa. O problema das datas é relativamente difícil, mas não é um
tismo de origem rigorosa ou calvinista, que tende superar a flutuação das paixões, as
problema fundamental. Quem foi o primeiro artista a fazer uma escultura ou um qua- perturbações e as incertezas sentimentais através de um rigorosos processo de desper-
dro abstrato? Existem desenhos abstratos de Picabia que remontam a 1907, mas talvez sonalização de si mesmo, de libertação dos estímulos individuais. No mundo futuro de
o alemão Hoelzel o tenha precedido. Como quer que seja, apenas entre 1910 e 1914 o Mondrian, o homem não será “nada em si, será apenas parte do todo; e, então, tendo
abstracionismo adquire uma fisionomia específica e entra pra a história da arte con- perdido a vaidade da sua pequena e mesquinha individualidade, será feliz nesse Éden
temporânea como movimento. Mais do que a primazia de uma nação ou de um artista
que terá criado”3.
na sua invenção, é importante sublinhar este fato e demonstrar que o nascimento do
Este Éden nada mais é que a cidade futura, construída segundo os padrões do
abstracionismo era, então, a conseqüência inevitável de uma série de premissas histó- neoplasticismo. Há um marca profunda dessa concepção utopista no III Manifesto,
ricas e estéticas que se determinaram no começo do novo século.
publicado com o título Rumo de uma nova formação do mundo: “As ridículas I, II, III
Por volta de 1930, alguns dos protagonistas da história abstracionista imagina-
Internacional Socialista foram apenas exterioridades; feitas de palavras. O internacio-
ram substituir o termo abstracionismo pelo termo concretismo, tendo percebido que
nal do espírito é interior, intraduzível em palavras. Longe de ser uma redundância de
falar de arte abstrata era, no mínimo, impróprio. De fato, uma imagem enunciada vocábulos, constitui-se de atos plásticos e de força vital interior. Força espiritual.
numa tela ou realizada num material plástico, por mais abstrata que seja, já é por si Assim, esquematiza-se o novo plano do mundo. Não fazemos apelo aos povos: unam-
mesma concreta; além disso, o abstracionismo puro, não se inspirando de maneira se! ou unam-se a nós! Não fazemos nenhum apelo os povos. Nós sabemos que aque-
alguma na realidade natural e, portanto, não obtendo dela nenhum elemento, isto é, les que se unirão a nós já pertencem ao novo espírito. Somente Junto com eles será
não sendo resultado de uma abstração, mas a proposta de uma nova realidade, co-
possível modelar o corpo espiritual do novo mundo. Ajam!”4
loca-se logicamente fora de tal denominação. Todavia, essa substituição do termo
abstracionismo feita com mais de vinte anos de atraso, depois que manifestos, escri- 2
M. Seuphor. L’art abstrit. Maeght: Paris, 1949. p. 12 -14.
tos, títulos de obras, haviam-no utilizado com orgulho, só pode gerar confusão. Os 3
Cf. O. Morisani. L’astrattismo di Piet Mondrian: con appendice di scritti dell’artista. Neri Pozza: Veneza,
1956. p. 119. As palavras são de Mondrian. Exceto onde será indicado, todas as citações de Mondrina são
extraídas deste volume.
4
De Stijl, 1921.
Como se vê, da mesma maneira que Kandinsky, em Mondrian não falta nem JAPIASSÚ, H.; MARCONDES, D. Dicionário básico de
mesmo o profetismo, o acento inspirado de quem acredita na regeneração do mundo Filosofia. 3ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996. p. 1 – 2.
pela virtude taumatúrgica do espírito liberto dos limites precários do contingente.
Todavia, entre as duas posições, que representam as tendências fundamentais do abs-
Abstração (lat. Tardio abstractio, de abstrahere: separar de) 1. Operação do
tracionismo, há uma diferença bastante profunda. No primeiro Kandinsky, nota-se a
espírito que isola, para considerá-lo à parte, um elemento de uma representação, o
repulsa, de claro sabor expressionista, de toda aparência positivista; em Mondrian, ao
qual não se encontra separado na realidade. Ex.: a forma de um objeto independente-
contrário, o chamamento o cientificismo é constante. Em 1867, por ocasião da Expo-
mente de sua cor.
sição Universal de Paris, Ravaisson, em seu famoso Rapport sur la philosophie, pre-
2. Processo pelo qual o espírito se desvincula das significações familiares do
conizara o advento próximo de um “positivismo espiritualista”. Talvez se possa afir-
vivido e do mundo das percepções para construir conceitos.
mar que, em arte, Mondrian é exatamente o representante mais conseqüente dessa
3. Na filosofia hegeliana, o momento da abstração ou do universal abstrato, por
concepção, ou seja, é aquele que levou à conclusão as idéias de uma arte inspirada n
oposição ao universal concreto, constitui a etapa do entendimento no devir do espírito.
perfeição das leis científicas e matemáticas no sentido já preconizado pela ala cubista
A atitude filosófica que lhe corresponde é a do dogmatismo.
de Gleizes e Metzinger.
4. Na linguagem corrente, as palavras “abstrato” e “abstração” possuem uma
certa conotação pejorativa. Assim, dizemos de alguém que “ele se perde em abstra-
ção”, dá preferência às “idéias abstratas” e não se atém aos “fatos concretos”. Note-
mos o sentido paradoxal da expressão “fazer abstração de”, que significa “afastar, não
se levar em conta”. Há idéia de separação (algo é isolado de seu conjunto), mas com o
objetivo de não se ocupar dele. No sentido filosófico, quando algo é isolado por abs-
tração, é para se fixar nele a atenção.
FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DA ABSTRAÇÃO
THEO VAN DOESBURG. Objeto esteticamente modificado, c. 1917. DE
THEO VAN DOESBURG, princípios de arte neoplástica, Bauhausbucher n° 6,
1925, Bauhaus-Archiv, Berlim.
Especificações Técnicas: Formato A5, em cores.
FACULDADE INAP
Música: músicas tradicionais chinesas.
CURSO: DESIGN GRÁFICO
Sugestões:
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.
Livro: RIEDEL, Diaulas (org.). Maravilhas do Conto Chinês. São Paulo:
AULA DO TANGRAM Cultrix, 1961.
Filme: HERÓI. Direção: Zhang –Yimou. China: 2002. 96 mim.
Objetivos:
1 – Produzir ilustração para um conto utilizando as figuras do tangram ou de-
senvolvidas a partir delas.
2 – Desenvolver a percepção visual através da solução dos quebra-cabeças
propostos pelo tangram.
3 – Trabalhar os conceitos de forma e contra-forma, fundo e figura.
4 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
des de produção.

Materiais: papel sulfite formato A3 ou A4, papel cartão ou cartolina for-


mato A4, lápis HB, régua, esquadro, tesoura.

História da Arte: A Estética da Arte Pictórica Chinesa5.


Apreciação: Pinturas tradicionais chinesas.
Composição: Triângulos, quadriláteros, forma e contra-forma, fundo e fi-
gura, plano bidimensional.

Roteiro:
1 – Exibição das imagens e comentários sobre a estética da arte chinesa.
2 – Demonstração do tangram, sua construção e proposta da atividade.
3 – Construção dos tangrams.
4 – Solução dos quebra-cabeças e transcrição para o papel.

Trabalho: Produção de uma página contendo a ilustração de um trecho do


conto Melodia Maravilhosa6. O trecho selecionado deverá fazer parte da peça gráfica.
6
LING, Pu Song. Melodia Maravilhosa.Tradução de Alda de Carvalho In: RIEDEL, Diaulas (org.).
5
In: OSBORNE, Harold. Estética e teoria da arte. São Paulo: Cultrix, 1978. Maravilhas do Conto Chinês. São Paulo: Cultrix, 1961.
FACULDADE INAP A pintura promove a cultura e fortalece os princípios da conduta reta. Repassa todos os
aspectos do espírito universal. Compreende integralmente o sutil e o abstruso, servindo assim ao
mesmo propósito a que servem os Seis Clássicos, e repete-se com as quatro estações. Originou-se
CURSO: DESIGN GRÁFICO da natureza e não de decretos nem obras de homens.

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. A concepção da pintura como cultivo do Tao está expressa no seguinte trecho
dos Analectos de Confúcio, citado no início do Hsüan-ho hua-p’u, o Catálogo da Co-
AULA DO TANGRAM leção Imperial de Pinturas (1119-25):

Dirigi os vossos esforços para o Tao, apoiai-vos sobre a sua força ativa, segui a
OSBORNE, Harold. A Estética da Arte Pictórica Chinesa. In: humanidade altruísta e entregai-vos às artes. Quanto a estas artes, o estudioso que forceja por
OSBORNE, Harold. Estética e Teoria da Arte. 3.ed. São Paulo: alcançar o Tao nunca deve desprezá-las, mas cumpre-lhe apenas deleitar-se com elas e nada mais.
Pintura é igualmente uma arte. Quando atinge o nível da perfeição, não se sabe se a arte é Tao ou
Cultrix, 1978. P. 95-100. se Tao é arte.

Durante toda a Antiguidade clássica e toda a idade média, o artista era classifi- Essa idéia de pintar como atividade que une de pronto o artista ao princípio
cado como trabalhador manual e artesão numa estrutura social que não reconhecia a cósmico do Tao, e o manifesta, encontrava-se no âmago do pensamento chinês sobre a
dignidade do trabalho manual. O artista amador teria sido uma coisa tão estranha arte, quer se descreva como cultivo do caráter, a expressão da personalidade, quer se
quanto o pedreiro amador. Na China, em compensação, a partir da dinastia Han (mais defina como a busca da essência das coisas. Trata-se, essencialmente, de uma
ou menos 206 A.C. – A.D.), a pintura, a poesia e a música foram consideradas como concepção não naturalista da arte. O pintor chinês não se ocupava, senão
ofícios dignos do cavalheiro e do erudito numa estrutura social que conferia altíssimo acidentalmente na busca de outras metas, de “imitar” as aparências das coisas nem de
prestígio à erudição e à cultura. O cavalheiro-erudito confuciano acreditava que no representar as coisas idealmente como gostaria que fossem ou como elas “deviam ser,
cultivo das boas relações entre um homem e outro consistia a meta suprema da vida e nem mesmo de revelar alguma realidade metafísica oculta por detrás das aparências
dava muito valor às virtudes da retidão, do decoro, da sinceridade e da sabedoria. As das coisas. Encaravam-se cultivação e prática da pintura como atividade ritualística,
classes administrativas e a pequena nobreza eram recrutadas através de exames, feitos criadora de uma encarnação da força cósmica da ordem que impregna toda a
pelo Estado, em que a pintura e as demais artes figuravam com grande destaque. Con- realidade, a sociedade humana e a personalidade individual. Enquanto o artista
siderava-se a boa ordem social como reflexo ou encarnação do Tao, concebido como ocidental visava tipicamente a produzir uma réplica da realidade, real, imaginada ou
ordem quase moral do universo. Na introdução que fez para a sua tradução do Manual ideal, o artista chinês – embora pudesse, de fato, fazê-lo – colimava, em primeiro
de Pintura do Jardim da Semente de Mostarda (1679-1701), Mai-mai Sze assinalou lugar, colocar a própria personalidade em harmonia com o princípio cósmico, de
que, segundo o ponto de vista chinês tradicional, a pintura é modo que o Tao se expressasse através dele e, assim, em sua pintura, ele agisse em
não uma profissão, mas uma extensão da arte de viver, pois a prática do tão da pintura é
uníssono com a ordem natural e a sua obra, inspirada pelo Tao, o refletisse. As
parte do tradicional tao da conduta e do pensamento, da vida em harmonia com as leis do Tao. Em atitudes básicas e as ilações mais profundas, traduzidas em pronunciamentos
tais circunstancias, a pintura chinesa tem sido, por via de regra, uma expressão de maturidade: aparentemente simples de arte em chinês, são tão diferentes das que conhecemos no
quase todos os grandes mestres se distinguiram primeiro como funcionários, eruditos ou poetas e Ocidente que não se podem formular com facilidade n linguagem a que nos
muitos foram calígrafos habilidosos antes de se voltarem para a pintura... ao adquirir a educação
prescrita pelo tao da pintura, um pintor se submetia a rigorosa disciplina intelectual e a um
habituamos.
treinamento intensivo de memória. Adquiria uma reserva de conhecimento coroados pela essência
do pensamento chinês – os ideais e as idéias da pintura compreensíveis a quantos tiverem o mesmo A diferença de ponto de vista explica o caráter diferente que assumiram as re-
treinamento, bem como a todos aqueles cuja educação se completou pelo costume e pela tradição. flexões e escritos chineses sobre as artes. Até a pouco tempo, na arte ocidental, quase
A antiga sabedoria lhe modelava o caráter e lhe alimentava os mais secretos recursos. toda a crítica era técnica ou dedicada à descrição e à apreciação do tema do artista, ou
se ocupava das diversas funções ulteriores – de educação, propaganda, decoração,
No primeiro capítulo de Li Tai Ming Chi (845) sobre a origem da pintura,
devoção, etc. – que as obras de arte se destinavam a exercer. Esses temas também
Cheng Yen-yüan escreveu:
aparecem na crítica de arte chinesa, mas jamais ocuparam lugar central ou preponde- cujas excelências residem na sutil variação e mistura de tons e no estilo apropriado da
rante. A crítica de arte chinesa também era, em grande parte, técnica, mas os termos e pincelada, foi aperfeiçoada até atingir um nível altíssimo, tanto que se dizia comu-
categorias da crítica técnica chinesa diferiam daqueles a que nos avezamos na crítica mente: “Se você tiver tinta, terá as Cinco Cores”.
ocidental. No Ocidente, as categorias e conceitos, bem como os critérios, derivam do
interesse naturalista por uma representação vívida e convincente de algum tema di- O connoisseur chinês cultivava uma sensibilidade singularmente sutil às quali-
verso da obra de arte propriamente dita. Posto que esse interesse não esteja ausente da dades intrínsecas da linha, e as habilidades físicas indispensáveis precisavam de anos
crítica chinesa, mantém-se subordinado à exigência de que a obra de arte encarne, na de prática e autodisciplina para se aprimorarem. À proporção que passou o tempo, os
estrutura e nos ritmos, o espírito do Tao, que vitaliza toda a natureza, tanto orgânica estilos de pinceladas foram minuciosamente classificados: luan ma ts’un, pinceladas à
quanto inorgânica. Em razão disso, a linguagem e os conceitos da crítica chinesa dife- maneira do cânhamo entrelaçado; ho yeh ts’un, pinceladas à maneira das veias da
rem dos que nós empregamos e talvez seja necessário um esforço considerável para folha de lótus; chieh so ts’un, pinceladas de corda destrançada; tsuan tsien, pincelada
pô-los em conexão com a arte de que derivam e para apreender o que eles significam empenachada e salpicada, e assim por diante. As circunstanciadas classificações, tanto
em função das categorias com que estamos mais familiarizados. das pinceladas quanto do emprego dos tons de tinta, se afiguram enfadonhas aos que,
alheios à tradição esotérica, são incapazes de apreciar as sutilizas em que elas se ba-
Como a atitude do naturalismo não teve muita influência na arte e na teoria seiam. Mas atestam a delicadeza de apreciação generalizada entre pessoas cultas na
orientais, a espécie de crítica que hoje denominamos “estética” – nascida do interesse China, através dos séculos. A caligrafia no sentido oriental – a encarnação de Tao na
pela própria obra de arte como objeto de contemplação – surgiu um pouco mais cedo manipulação do pincel- pouco tem em comum com os estilos “caligráficos”, como o
na China do que no Ocidente. Encontramo-la no Ku Hua P’in Lu (Registro d classifi- gótico internacional ou o art nouveau.
cação dos pintores) de autoria do pintor retratista Hsien Ho cerca de 500 A.D., conti-
nuado no princípio do século sexto pelo crítico Yao Tsui no Hsü Hua P’in Lu. Obras Duas coisas se destacam importantíssimas, para a compreensão dos conceitos
sobre a estética da caligrafia precederam as obras sobre a estética da pintura e, em estéticos implícitos nos escritos chineses acerca das artes visuais. A primeira é o pro-
todo o correr da literatura crítica chinesa os princípios estéticos da pintura caligráfica fundo enraizamento da linguagem da apreciação e da crítica chinesas na estética da
constituíram o ponto principal da apreciação da pintura. Os Seis Cânones da Pintura, caligrafia, no sentido chinês e não no sentido ocidental desse termo. A segunda é o
que, com várias interpretações e modificações de uma geração para a outra, domina- fato de que, ao falarem sobre emoção e expressão na pintura, os autores chineses as-
ram a crítica chinesa através dos séculos, já tinham sido formulados por Hsien Ho e, sociam mais essas coisas às técnicas caligráficas do que ao tema d obra. Isto se opõe
segundo se supõe, chegaram a ele provindas de uma época anterior. tão frontalmente à tradição naturalista ocidental que é preciso dizer mais alguma coisa
sobre o expediente mental necessário à compreensão das idéias e atitudes apreciativas
Durante a dinastia Han, a escrita ideográfica chinesa surgiu, autônoma, como chinesas. No Ocidente, a técnica tem sido tipicamente considerada apenas como ins-
uma das belas-artes, e as primeiras classificações estéticas e estilísticas vão encontrar- trumento, um instrumento que proporciona ao artista o equipamento mecânico para
se nas obras críticas sobre as técnicas de caligrafia. O dicionário de Shuo Wen (apro- comunicar a sua mensagem, expressar a sua personalidade, concretizar o apelo emo-
ximadamente 100 A.D.) enumerava as seis categorias de ideogramas, baseadas na cional através da escolha e manipulação do tema. Foi pouco antes dos vários movi-
maneira pela qual se formam os caracteres em contraposição aos estilos de pinceladas mentos pós-impressionistas, que tiveram origem em Gauguin, Denis, nos simbolistas
usadas ao escrevê-los, e Chang Huai-kuan, no período T’ang (618 – 906 A.D.) esta- e nos fauves, que a cor e formas “abstratas” principiaram a ser deliberadamente usa-
beleceu uma classificação dos dez estilos de escrita, que se haviam desenvolvido no das para imprimir significação emocional alheia ao assunto do tema. E por infelici-
transcurso dos séculos. Requintada apreciação das qualidades estéticas da caligrafia dade da arte e da estética ocidentais, esse expressionismo abstrato tem carecido de
precedeu e fixou o padrão para a estética da pintura. Desde um período muito primi- uma tradição herdada de expressão e de um público capaz de apreciar, experimentado
tivo, a pintura e a caligrafia foram consideradas artes aliadas, virtualmente identifica- e refinado, que só a tradição pode criar. Na tradição chinesa, o encanto emocional de
das pelos cavalheiros pintores e literati, os pintores de bambus, plantas, etc. As duas uma pintura, seu conteúdo expressivo, a personalidade dos artistas, residem na técnica
artes utilizavam o mesmo equipamento, dependiam das mesmas técnicas, compartiam da pincelada. As pinturas mais “emocionais” para o connoisseur chinês são aquelas
das mesmas metas e eram apreciadas pelos mesmos padrões. A pintura monocrômica, em que o tema, para o contemplante ocidental, é principalmente neutro – pinturas de
bambus, lótus, pássaros, flores, etc. Enquanto no Ocidente o desenho da forma hu- A nossa tarefa, como leitores e entusiastas de puzzles, consiste em recriar as
mana sempre foi fundamental, as situações dramáticas e emocionais sempre constituí- silhuetas utilizando as sete peças – nem mais nem menos. Se pensarmos que é fácil, o
ram um tema básico da representação naturalista, e a paisagem pura um desenvolvi- melhor é reconsiderar. As silhuetas não têm linhas que nos indiquem onde podemos
mento serôdio e secundário, na China a paisagem foi inicial e básica. Conforme um encaixar as peças. Começamos com uma figura compacta e compete-nos decidir onde
truísmo da crítica chinesa, o pintor que houvesse senhoreado a arte da paisagem seria colocar cada uma das peças.
capaz de desenhar o corpo humano, e o bambu oferece possibilidades mais sutis de
expressão do que as cenas dramáticas ou anedóticas. Os mesmos princípios de expres- Com o passar do tempo vamos perceber – com alguma imaginação – que as li-
são emocional através da técnica do pincel, que se desenvolvem em primeiro lugar na nhas entre as peças estão realmente lá. O problema é que são mesmo invisíveis! A
pintura do bambu ou da natureza morta, são fundamentais em pinturas mais minuden- princípio não as conseguindo ver. Mas à medida que formos resolvendo os puzzles
ciosas de paisagens. São o ritmo e a qualidade da pincelada, a técnica do pincel, que tornam-se progressivamente mais visíveis aos nossos olhos e à nossa mente.
encarnam o espírito de Tao.
Vamos acabar por descobrir que o quadrado preto possui certa energia que nos
... dá o poder de ultrapassar as nossas capacidades mentais e a atingir um visão de nível
mais elevado.
FACULDADE INAP
Sem dúvida que o tangram, ao estimular a criatividade e aumentar a consciên-
CURSO: DESIGN GRÁFICO cia perceptiva, se transforma numa experiência que aumenta as capacidades mentais.
Com alguma sorte, talvez venhamos a sentir uma leve sensação de transcendência à
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. medida que formos dominando a linguagem das peças do tangram.

AULA DO TANGRAM7

ELFFERS, Joost; GABOR, Mark. Introdução. In: ELFFERS,


Joost; SCHUYT, Michael. Tangram: um antigo quebra-cabeças
chinês. Köln: Taschen, 2006.

O que é o Tangram?

O tangram é um simples jogo de origem chinesa na forma de um quadrado. É


constituído por sete peças – cinco triângulos, um quadrado e um paralelogramo – que
podem ser organizados de forma a constituírem um sem-número de formas diferentes.

Neste livro apresentam-se mais de 1600 silhuetas que deverão ser construídas
com base nas sete peças. Estas imagens variam desde figuras representativas – pes-
soas, animais, plantas, barcos, casa – a desenhos e formas geométricos.

7
Segundo Ronald C. Read, a origem da palavra tangram vem, da junção de das palavras tang, sinônimo de
chinês, e gram, sufixo que denota algo escrito ou desenhado. READ, R. C. Tangrams: 330 puzzles. New
York: Dover, [s.d.]. p. 08.
FACULDADE INAP do sapato (214) é bastante conhecido para ser recontado, todos sabem que a história
termina com sinos de casamento dobrando (215 e 216) por Cinderela e sue príncipe.
Uma das silhuetas que deveria ter sido inclusa nesta seqüência é a carruagem
CURSO: DESIGN GRÁFICO
de Cinderela (depois de a abóbora ter sido transformada). Sam Loyd não apresentou
nenhuma em seu livro, e não fui capaz de inventar uma carruagem satisfatória em
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. tangram; todos eles se pareciam mais com carrinhos de bebês! Aqui novamente o
leitor poderá ser mais bem sucedido. Em compensação, inclui o cocheiro de Cinderela
AULA DO TANGRAM entre os tangrams duplos mais adiante neste livro.
Na página seguinte nós temos a figura de H. E. Dudeney intitulada “A Game
READ, R. C. Histórias e Figuras8. In: READ, R. C. Tangrams: of Billiards”. Dudeney diz: “ os jogadores estão considerando uma delicado movi-
mento sobre a mesa.”
330 puzzles. New Tork: Dover, [s.d.]. p. 43 – 50. A segunda figura de Dudeney consiste em nove silhuetas (221 a 229) e não ca-
berá em uma só página deste livro, então foi separada em duas. É melhor deixar sua
Duas inovações introduzidas por Sam Loyd e H. E. Dudeney para expandir o descrição ao próprio Dudeney:
conjunto e o interesse do tangram foi a construção de uma série de silhuetas para
ilustrar uma história, e juntar uma série de silhuetas para produzir uma figura mais “Minha segunda figura se chama “The Orchestra”, e foi projetada para a decoração de
detalhada. Neste capítulo temos duas histórias ilustradas por Sam Loyd, e duas cenas uma grande sala de música. Aqui nos temos o maestro, o pianista, o gordinho tocador de trompete,
por Dudeney. contrabaixista canhoto, cuja atitude é vivaz, embora não esteja a uma distância habitual de seu
O primeiro conjunto de tangrams ilustra o conhecido poema infantil9 “The instrumento, e o tocador de bumbo, com sua imponente estante de partitura. O cão próximo o
piano não late; ele é um ouvinte atencioso.”
House That Jack Built.” Nas silhuetas de número 189 até 199 nós vemos:

... the farmer sowing his corn,


That kept the cock that crowed in the morn,
That waked the priest all shaven and shorn,
That married the man all tattered and torn,
That kissed the maiden all forlorn,
That milked the cow with the crumpled horn,
That tossed the dog,
That worried the cat,
That ate the malt,
That lay in the house that Jack built.

Para preencher a página10, três outras figuras são dadas, representando animais
que poderiam ser facilmente encontrados na vizinhança da “Casa que Jack construiu”.
A segunda história (adaptada da versão de Loyd) é Cinderela. Nos vemos Cin-
derela chorando em frente à lareira (204 e 203); as duas irmãs feias (205 e 206), e a
fada madrinha com a abóbora que se tornou carruagem e dois dos ratos que se torna-
ram cocheiros (207 a 210). Cinderela dança com o príncipe (211 e 212), despreocu-
pada com o relógio (213) que está prestes há marcar doze horas. O episódio da perda

8
Tradução de Eduardo Bernardes.
9
No original:“...well-know nursery rhyme...”
10
A distribuição das silhuetas nas páginas não correspondem ao original embora a numeração tenha sido
mantida.
FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DO TANGRAM

Construção do Tamgram:

1 – Construir um quadrado de 10cm de lado.

2 – Marcar os pontos médios dos lados AB (E) e AC (F).

3 – Traçar dos seguimentos FE e CB.

4 – Traçar o seguimento DG (G= ponto médio de FE).

5 – Traçar o seguimento GH, perpendicular ao lado AC.

6 – Traçar o seguimento FI, perpendicular ao seguimento FE.

7 – Recortar as formas geométricas.


FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DO TANGRAM – Puzzles.


FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DO TANGRAM – Soluções.


FACULDADE INAP Algo melindrado, Wen pediu ao tauísta que demonstrasse suas habilidades.
Este, colocando o instrumento sobre as pernas, preludiou: uma suave brisa começou a
soprar. Continuou, e as aves do Céu desceram e se aninharam nas árvores do pátio.
CURSO: DESIGN GRÁFICO
Wen, profundamente encantado, quis aprender a singular e preciosa melodia.
De bom grado a repetiu o tauísta três vezes. Wen era todo ouvidos. Escutava com toda
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. a atenção, e não tardou a aprender-lhe o ritmo e a melodia. Seu benévolo professor
pediu-lhe então que a tocasse. Foi-lhe corrigindo os erros e explicando as particulari-
AULA DO TANGRAM dades do compasso.

LING, Pu Song. Melodia Maravilhosa. Tradução de Alda de Car- - Não existe na terra – disse – melodia que se lhe possa comparar.
valho Ângelo. In: RIEDEL, Diaulas (org.). Maravilhas do Conto Na viagem de regresso, encontrando-se ainda a muitas léguas de casa, Wen foi
Chinês. São Paulo: Cultrix, 1961. p. 163-196. (Maravilhas do surpreendido, ao anoitecer, por uma violenta tempestade. Não muito longe do cami-
Conto Universal). nho, avistou uma aldeiazinha. Para lá se dirigiu. Ao acaso, entrou na primeira casa
que encontrou aberta; a sala estava vazia. Nisso, abriu-se uma cortina e apareceu uma
formosa rapariga, da qual se irradiava graça que parecia sobrenatural. Teria, quando
muito, dezoito anos. Ao deparar com Wen, fugiu assustada. Em seguida, apareceu um
MELODIA MARAVILHOSA mulher idosa, a quem ele contou o que lhe acontecera e a quem pediu pousada par
noite.
Pu Song Ling.
- Podereis ficar, - consentiu a mulher – mas tereis de dormir no chão, sobre a
palha, porque temos todas as camas ocupadas.
Wen Ju Ch’uen, mais conhecido com Wen, o Primaveril, era um jovem de boa
família, natural de Chen-si. Sua paixão pela música era tamanha que, mesmo quando
Satisfeito com tão amável acolhimento, Wen, enquanto o criado lhe preparava
em viagem, levava consigo o alaúde.
o leito de palha, pôs-se a conversar com a hospedeira. A moça era sobrinha dela e
Certo dia, dirigindo-se à vizinha província de Chang-si, parou para descansar
chamava-se Huang-niang. Wen era rico e solteiro. Julgou ter encontrado, naquela
em local próximo de um templo. Deixou o cavalo amarrado lá fora e penetrou no
pobre morada, a esposa que lhe convinha, e deu-o a entender à mulher. Esta se calou,
recinto. Ali viu, sentado sobre os calcanhares, segundo o costume tauísta, e trajando
uma túnica de linho, um religioso. Junto dele, no chão, havia uma pequena cítara com perplexa. Passado alguns instantes, declarou:
sua palheta de bambu, e, encostado à parede, um estojo de alaúde ricamente traba-
- Não posso consentir com tal matrimônio.
lhado. Não mais podendo conter-se, Wen perguntou ao estranho se ele tocava alaúde.
- E por que não?
- É difícil de explicar – concluiu, e, sem mais dizer, retirou-se mal-humorada.
- Muito mal – replicou o religioso. – Gostaria de aprender, ouvindo-vos tocar.
E, tirando o instrumento da caixa, entregou-o a Wen. Este examinou-o como
Despeitado, Wen não quis deitar-se, pois a palha estava úmida. Passou a noite
entendido. O alaúde estava admiravelmente bem afinado. Bastava roçar-lhe uma
sentado, tocando alaúde para passar o tempo. Quando a chuva abrandou, pôs-se de
corda para que dele se evolasse um som de maravilhosa pureza.
novo a caminho.
Muito contente, Wen se pôs a tocar uma arieta. O tauísta sorriu: escutava como
Ao chegar em casa, uma das primeiras visitas que fez foi ao amigo chamado
quem não esperava por aquilo. Voltou a sorrir quando Wen terminou.
Ho, secretário do Tribunal, homem muito dedicado às letras e às artes. Queria fazê-lo
ouvir a nova melodia que aprendera.
- Muito bem, muito bem!- exclamou. – Embora ainda não possais considerar-
Tocou-a. O amigo ficou maravilhado. A certo momento, pareceu a Wen que a
vos um mestre.
cortina ao fundo da sala se movera. Uma linda moça deixou-se ver, por uns instantes,
retirando-se, a seguir, envergonhada. Era a filha de Ho. Wen nunca a vira antes. Cha-
mava-se Leang-kung. Era muito instruída, e tinha muito talento para a poesia. O som
do alaúde atraíra-lhe atenção. Não pudera resistir à curiosidade de ver quem o tocava.
Wen, dia por dia mais desejoso de casar-se, ficou impressionado com a jovem. Floriam, no jardim de Ho, uns crisântemos azuis, que eram todo o seu orgulho.
Falou dela à mãe, e esta, de acordo com a vontade do filho, encarregou-se de ir ter Dessa cor, só ele tinha. Eram um verdadeiro prodígio. A ninguém, a não ser a Leang-
com Ho para pedir-lhe a mão da moça. Recebeu, porém, uma resposta negativa. Ho, kung, dava ele mudas ou sementes. A moça plantara algumas em seu aposento parti-
homem de rígidos princípios, achava que um homem sem profissão com Wen não cular. Ora, Wen também cultivava crisântemos. No seu jardinzinho, sob a janela, tinha
podia ser digno de confiança. Desgostoso, Wen deixou-lhe de freqüentar a casa. crisântemos da espécie comum. Certa manhã, qual não foi seu espanto ao ver, em um
Não fora contudo, em vão que a jovem ouvira a encantadora melodia; seu co- ou dois caules, crisântemos azuis! Desceu ao jardim para certificar-se. Na vereda, o
ração havia sido conquistado e, como não soubesse nada do ocorrido, dia após dia vento brincava com uma folha de papel. Apanhou-: era o mesmo poema que aparecera
esperava pelo regresso do hábil músico. E nele pensava sem cessar. Certa feita, es- no jardim de Leang-kung.
tando a passear sozinha no jardim, viu, caída junto à cerca, uma folha de papel. Um Donde teria vindo aquela folha de papel, não saberia dizer, mas, como o título
poema em versos brancos, intitulado Tristeza da Primavera Inútil, estava nele escrito do poema parecia aludir ao seu apelido, Primaveril, sua curiosidade foi despertada.
e assim dizia: Sutil para o quarto e escreveu, à margem da folha, um pequeno e fútil comentário.
Entre a vizinhança e os amadores de flores, correu rápida a notícia da inespe-
rada floração azul, e não faltaram curiosos. Ho, embora de relações cortadas com o
“Martiriza-me a tristeza. Tortura-me um pensamento, que se apoderou de mi- jovem, não pode conter-se e foi ver também. O caso interessava-lhe particularmente.
nha mente. Consome-se o amor, dia por dia. Embriaga-me o damasqueiro com seu Wen recebeu-o cortesmente e mandou-o entrar no pavilhão onde ficava sua
perfume; os salgueiros simbolizam minha triste primavera dolorida. No meu coração, sala de estudo. A folha de papel em cima da mesa atraiu imediatamente a atenção do
sempre o mesmo sofrimento; renova-se a cada instante, minha dor, como a grama que, visitante. Notando-lhe o olhar perscrutador, Wen apressou-se a ocultar com a mão o
cortada, renasce. Depois que o vi – para onde teria ido? Sob que céu vive meu ado- comentário que escrevera. Tentou apagá-lo, esfregando-o, pois dele se envergonhava
rado? Quantos dias e quantas noites devem ter passado pela montanha, quantas pri- na presença de um senhor assim tão grave. Mas, por mais rápido que fosse seu gesto,
maveras? Quantos outonos pelas turvas águas passarão antes de eu tornar a vê-lo? Se não conseguiu evitar que o Ho lesse e reconhecesse os primeiro versos do poema. Não
deixo de pensar, morre-me também o canto. Se durmo em cama perfumada, é só para tinha ele, pois, mais dúvidas de que tivesse sido Leang-kung quem oferecera a Wen o
me encerrar com meus sonhos, como o avarento com seu tesouro. Mas logo desperto e poema e as mudas de crisântemos. Encurtou a visita. Chegou em casa furioso. Contou
não posso mais dormir. Uma noite solitária, dizem, é tão longa quanto um ano; e não é à mulher o que sucedera e ambos concordaram que era preciso interrogar Leang-kung.
exagero, penso, pois uma noite de vigília é muito mais longa ainda. Por isso, temo, Esta, a todas as perguntas que lhe faziam, respondia apenas com copiosas lá-
com tanto tempo, envelhecer depressa.” grimas. Não havia, pois, maneira de esclarecer o assunto. Os pais viram, então, que, se
continuassem a opor-se ao amor da jovem, escândalo maior podia desencadear-se.
Leang-kung gostou muito dos versos, tanto mais que condiziam com o seu Melhor seria consentir no casamento com o moço a quem ela amava, ponderou a mãe,
sentir. Leu-os em voz alta muitas vezes seguidas e, ao voltar para casa, escondeu a e o pai, que amava ternamente a filha, achou mais acertado render-se. Comunicaram a
folha na capa de um livro que estava sobre a mesa. Dias depois, procurou-a, mas não decisão a Wen. Este, mais contente do que surpreendido com a inesperada reviravolta,
consegui achá-la. A verdade era que seu pai, ao passar pelo quarto, encontrara a folha imediatamente fixou o dia do casamento.
caída no chão. Leu o poema e pensou, naturalmente, que havia sido escrito pela filha. Na mesma noite em que receber to boas novas, Wen convidou uns amigos para
O ardor com que nele eram expressos os sentimento desgostou-o. Chegou à celebrarem a florada dos crisântemos azuis. A reunião foi muito alegre e prolongou-se
conclusão de que era preciso casar Leang-kung. Reduziu a cinzas os versos compro- até noite alta, entre nuvens de incenso e acordes de alaúde. Wen tocava com mais
metedores e, dias depois, quando lhe foi pedida mão da rapariga pelo filho de um alto sentimento do que nunca. Depois de ter saído o último convidado, e Wen ter-se reti-
magistrado da cidade, teve grande alegria. Todavia, por força de costumeira prudên- rado para a parte principal do edifício, a fim de repousar, o criado de guarda no pavi-
cia, quis, antes de tomar uma resolução, ver o pretendente, que se chamava Liú. lhão ouviu o alaúde tocar sozinho! Julgou, a princípio, que era brincadeira de algum
O rosto jovial e as maneiras elegantes de Liú agradaram a todos. A conversa outro criado, mas logo verificou que tais sons não poderiam ser produzidos por ne-
entre ele e Ho foi muito cordial e prolongada. Depois que partiu, encontrou-se sobre a nhum ente humano.
cadeira em que estivera sentado, nada mais nada menos do que a fivela de um sapati- Correu a prevenir o amo. Este, saltando da cama, foi certificar-se do que se
nho de mulher. Indignado, e com razão, Ho, apesar do grande desejo de casar a filha, passava. O alaúde continuava a tocar. Os sons eram ásperos e entrecortados, como os
mandou dizer a Liú que não era decente pedir em casamento uma jovem honrada produzidos por um principiante que não dominasse ainda o instrumento. Wen acendeu
quando se traz consigo semelhante recordação. Em vão protestou o rapaz, alegando uma tocha e precipitadamente entrou na sala de estudo. Não viu ninguém. Devia ter
engano ou equívoco. Ho, que não admitia brincadeiras em assuntos de moralidade, sido, pensou, alguma feiticeira, das que costumam visitar as casas e os homens. Levou
mostrou-se, porém, inflexível. consigo o alaúde e, tornando a deitar-se, dormiu sem mais nada ouvir.
Na noite seguinte, devagarinho como um professor que ensinasse um discí- - Já aprendi quase todas as notas da melodia, mas falta-me ainda dar-lhe ex-
pulo, correu a escala e teve o cuidado de afinar cuidadosamente o alaúde. Deixou-o na pressão. Quereis, por favor, tocá-la novamente?
sala e ficou à escuta, atrás da porta. A manobra foi repetida durante várias noites. Na
sétima, teve a satisfação de ouvir, corretamente executada por mãos invisíveis, a me- Muito comovido, Wen empunhou o alaúde e começou a tocar; enquanto to-
lodia que aprendera do tauísta. cava, ia-lhe explicando o colorido musical.
Chegou, enfim, o dia do casamento. Os dois esposos relataram um ao outro os
singulares acontecimentos que haviam precedido esse dia. Compreenderam que ti- - Agora – acrescentou ela, sorrindo – compreendi. – E levantou-se para partir.
nham recebido um favor muito especial, mas não sabiam a quem agradecê-lo. Lean- Reteve-a, contudo, Leang-kung, que estava menos comovida que o esposo, dizendo-
kung foi também ouvir o alaúde e percebeu que este produzia sons estranhos. Conti- lhe:
nuou à escuta, e disse, finalmente:
- Também toco cítara. Gostaria que me tocásseis algumas melodias.
- Estas notas, de melancolia profunda, não são produzidas por feiticeira, mas
por alguma alma penada. Huang-niang assentiu: nem as escalas, nem as melodias que tocava se pare-
ciam com as que se ouvem na terra. Leang-kung escutava, marcando o compasso,
Wen não quis acreditar. como se quisesse aprender. Huang-ning, condescendente, ditou-lhe as notas, para que
ele as pudesse escrever. Mas tinha de partir.
- Em casa de meu pai – continuou ela – temos um espelho mágico, que faz apa- - Pertencei-vos um ao outro – disse ela. – vossa união é firme. Tal felicidade
recer os fantasmas. não podem gozar aqueles que morreram prematuramente. Se assim quiser o Destino,
voltaremos a nos encontrar noutra existência.
No dia seguinte, mandaram buscar o espelho e, à noite, quando o alaúde come-
çou a tocar, marido e mulher entraram, de repente, nos aposentos, ele conduzindo uma Dirigindo-se, depois, a Wen, entregou-lhe uma pintura enrolada:
tocha e ela o espelho. Apareceu, então, uma forma feminina, que procurou esconder-
se, correndo por toda a casa. Wen foi atrás dela. Olhando-a de perto, reconheceu-a. - É o meu retrato. Para que não vos esqueçais daquela que realizou vosso ca-
Era Huang-niang, a sobrinha da velhota em casa de quem se havia refugiado na samento, pendurai-o em vossa casa. Quando vos sentirdes felizes, queimais um barri-
noite da tempestade. Comovido, quis interrogá-la, mas ela começou a chorar. nha de incenso, e tocai, diante dele, uma melodia de alaúde. Os sons e os perfumes
- Fui eu quem realizou vosso casamento – exclamou – Não estais ainda con- chegarão a mim.
tentes? Para que me atormentais assim?

Afastando o espelho, Wen lhe disse que, se ela prometesse não fugir, ele o
guardaria no estojo.
Sentando-se longe do espelho, ela contou-lhe sua história:

- Há cem anos não pertenço mais a este mundo. Sou filha de um governador de
província. Quando criança, deleitava-me com o estudo do alaúde e da citar. Cheguei a
tocar muito bem a cítara, mas quanto ao alaúde... Minha mãe não tinha ainda acabado
de me ensinar a tocá-lo quando morri. Isso me deixou muito triste, no país das fontes
subterrâneas. Quando despertei vossa atenção, acabara de ouvir a melodia maravi-
lhosa e todo meu coração tendia para vós. Mas, dada minha condição de alma desen-
carnada, era-me impossível estar a vosso serviço como desejaria. Por isso, procurei
dar-vos um casamento feliz, em sinal de gratidão pelos bons sentimentos que mos-
trastes para comigo. A fivela de sapato feminino encontrada na cadeira onde se sentou
Liú, e o poema Tristeza da Primavera Inútil, foram obras minhas. Não retribuí eu,
pois, devidamente ao professor de alaúde?
3 – Jogo dos búzios e transcrição dos pontos obtidos para o papel.
4 – Desenvolvimento de figuras inspiradas nos pontos obtidos no jogo de bú-
FACULDADE INAP zios.

CURSO: DESIGN GRÁFICO Trabalho: Os praticantes deverão desenvolver pesquisas sobre os aspectos
simbólicos das figuras encontradas, selecionar uma e criar um pop-card contendo a
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. ilustração e um breve resumo de sua simbologia.

AULA DOS BÚZIOS


Especificações Técnicas: Formato 10x15, 4x1 cores.
Objetivos:
1 – Produzir ilustração para um pop-card11 utilizando as figuras desenvolvidas Música: Cantos iorubás.
a partir de pontos fornecidos ao acaso pelo jogo búzios.
2 – Desenvolver a percepção através da busca de figuras na ligação entre os Sugestões:
pontos fornecidos pelo jogo de búzios de modo semelhante ao passatempo “liga-pon-
tos”. Livro: DÄNIKEN, Erich von. Eram os Deuses Astronautas?: enigmas inde-
3 – Trabalhar os conceitos de ponto, linha, plano, nivelamento, aguçamento, cifrados do passado. 28.ed. Tradução de E.G. Kalmus. São Paulo: Melhoramentos,
atração, agrupamento e equilíbrio12. 1978.
4 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
Filme: ERAM OS DEUSES ASTRONAUTAS?. Direção: Harald Reinl.
des de produção.
Alemanha: 1972. 98 mim.

Materiais: papel sulfite formato A4, lápis HB, régua, esquadro, compasso e
cinco tampinhas de garrafa ou búzios.

História da Arte: Diferentes maneiras de perceber a arte rupestre13.


Apreciação: Pinturas rupestres.
Composição: Atração e agrupamentos de elementos na percepção das ima-
gens.

Roteiro:
1 – Exibição das imagens e comentários sobre a arte rupestre.
2 – Demonstração do jogo de búzios14.

11
Denominação genérica aplicada cartões postais no formato 10x15 cm.
12
Segundo Donis A. Dondis, In: DONDIS, D.A. Sintaxe da Linguagem Visual. 2.ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1997. (Coleção a).
13
In: GASPAR, Madu. A arte rupestre no Brasil. 2.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006.
14
Texto de apoio: Prólogo à Mitologia dos Orixás. In: PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São
Paulo: Companhia das Letras, 2001.
FACULDADE INAP pela construção de uma réplica denominada Lascaux II, inaugurada em 1983 e que
recebe cerca de 300 mil pessoas por ano.
CURSO: DESIGN GRÁFICO A análise de carvão recuperado em escavação arqueológica indicou que Las-
caux foi ocupada por volta de 15.000 AP15, e os estudos sugerem que a caverna foi um
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. local de breves visitas periódicas para atividades artísticas ou rituais, não havendo
indícios de ter sido um local de moradia. A caverna é bastante conhecida pelas pintu-
AULA DOS BÚZIOS ras mas, na realidade, a maioria das figuras foi executada através da técnica da gra-
vura. No primeiro salão estão pintados quatro enormes e impressionantes touros e, em
GASPAR, Madu. A arte rupestre no Brasil. 2.ed. Rio de Janeiro: menores dimensões, cavalos e veados. Em uma das galerias ocorre a transição da
Jorge Zahar Ed., 2006. p. 21-32. pintura para a gravura. No interior da caverna está representada a famosa cena do
homem com cabeça de ave e falo ereto acompanhado de bisões e outros animais.
Diferentes maneiras de perceber a arte rupestre. Artefatos relacionados com a decoração das paredes foram encontrados no in-
terior da gruta, além de muitas lamparinas, fragmentos de mineral, alguns com marcas
Distintos pressupostos orientam os estudos sobre arte rupestre ao longo do de retirada, e trituradores com pigmentos. Análises químicas revelam que os vários
tempo. No século XIX, a idéia predominante era que esse tipo de arte era resultado do minerais eram misturados ou aquecidos para que fossem obtidas diferentes tonalida-
prazer puramente estético do homem pré-histórico: A arte pela arte. Com a descoberta des.
de grafismos em locais de difícil acesso e de uma certa coerência interna aos painéis, Com a descoberta de Lascaux e as profundas transformações ocorridas nas ci-
ficou evidente o aspecto restrito desse ponto de vista. Já segundo as reflexões encabe- ências sociais – relacionadas às inovações teóricas do estruturalismo – ,constituiu-se
çadas pelo abade Henri Breuli (1877 – 1961) – uma autoridade em arte do paleolítico uma nova maneira de perceber grafismos rupestres. Essa nova abordagem tem suas
que descobriu inúmeras cavernas e registrou enorme quantidade de grafismos na Eu- origens nos trabalhos do lingüista suíço Ferdinand de Saussure (1857 – 1913), cuja
ropa – ,a arte era tratada em termos de magia simpática. Os desenhos de animais te- teoria revolucionou o entendimento da linguagem ao considerá-la como um sistema
riam sido feitos com o objetivo de controlá-los na vida real. Por exemplo, o que se de comunicação. A tarefa do lingüista passou a ser descobrir regras inerentes ao ato de
chamou de magia da caça pressupunha que o homem do paleolítico decorava as pare- falar. Claude Lévi-Strauss, um dos mais importantes teóricos do estruturalismo, enfa-
des das cavernas com imagens de animais para, através da magia, ser favorecido nas tizou princípios que estruturam a mente humana numa série de oposições binárias, tais
caçadas. A magia da fertilidade também explicava alguns grafismos: os artistas teriam como direita/esquerda, dia/noite e cru/cozido, mediante as quais a cultura é criada e
feito os desenhos para assegurar a reprodução dos animais e garantir alimentos no pode ser entendida. Já para Roland Barthes (1915 -80), um teórico da literatura e da
futuro. Explicações apoiadas nos totemismo também orientavam as interpretações da semiótica, a cultura humana constitui um enorme código simbólico e os métodos da
época, sendo recorrente a elaboração de analogias simplistas com grupos tribais que semiótica seriam o caminho para decifrá-lo. Essa nova perspectiva teórica teve im-
estavam sendo estudados pelos etnólogos. De acordo com esse ponto de vista, os portante repercussão na maneira de se fazer arqueologia.
paredões teriam sido decorados pela simples acumulação de figuras isoladas. Sem De uma perspectiva estrutural, artefatos integram sistemas de signos que co-
planejamento algum. municam significado não-verbal de uma maneira análoga à linguagem. Sem esmiuçar
Em 1940, quatro adolescentes franceses descobriram na Dordogne, região su- o tema, pode-se vislumbrar todo o campo de reflexão sobre arte rupestre que se abriu
doeste da França, a caverna de Lascaux, que apresenta um dos mis famosos e espeta- em decorrência dessas inovações nas ciências sociais. Os painéis passaram a ser vistos
culares conjunto de grafismos do paleolítico. Apesar de sua importância para a ciên-
cia, não foram feitas escavações nas áreas principais da caverna em decorrência de sua 15
AP significa “antes do presente” que, por convenção, é 1950. Trata-se de uma menção à descoberta da
adaptação para o turismo, que atrai um grande número de visitantes. Segundo Paul técnica de datação através do Carbono 14, que se deu em 1952. Assim, um evento ocorrido 500 anos AP
Bahn, é tão intensa a visitação que em 1963 constatou-se um forte impacto ambiental ocorreu 500 anos antes de 1950 – ou seja, 1450. As referências cronológicas obtidas através de métodos
físicos são sempre acompanhadas de suas respectivas margens de erro, que são expressas com o sinal
com bactérias atacando as imagens. Para atender ao público, as autoridades decidiram positivo e negativo (+-). Para muitos, o nascimento de Cristo é a principal referência cronológica e o tempo
é dividido entre antes e depois de Cristo.
como tendo uma organização interna e foram abandonadas as interpretações que se caminho interpretativo ao se deparar apenas com círculo ou borrões pode ser uma
apoiavam em explicações externas aos grupos culturais que executaram os grafismos. armadilha que restringe outras possibilidades analíticas.
O foco deixou de ser a descrição pormenorizada de figuras isoladas, procurando-se Como vimos, ao longo do desenvolvimento das ciências sociais prevaleceram
lidar com o conjunto e sua disposição no espaço. A forma não é o único aspecto a ser diferentes perspectivas de análise da arte rupestre. Cabe ao pesquisador pinçar o que é
estudado, pensa-se em ritmo, combinações de técnicas, luminosidade, hierarquia entre interessante e compor um corpo teórico que balize a interpretação do conjunto de
grafismos, jogo entre forma e fundo e até a acústica das cavernas é considerada. grafismos estudado. Simples modismos passam rapidamente, mas contribuições de
André Leroi-Gourhan e Anette Laming-Emperaire, arqueólogos que se torna- correntes teóricas bem fundamentadas são incorporadas definitivamente na produção
ram os principais pesquisadores de arte rupestre de pois da morte de Henri Breuil e do saber. Muitas inovações trazidas pelo estruturalismo podem estar aquém do pata-
foram fortemente influenciados pelo estruturalismo, buscaram estabelecer uma orde- mar explicativo alcançado pela arqueologia moderna; porém, noções derivadas de
nação das figuras sem recorrer a analogias simplistas com grupos tribais e tentaram seus ensinamentos demonstram que os grafismos devem ser entendidos a partir das
relacioná-las com o próprio modelo de sociedade que as produziu. As contribuições próprias figuras representadas e dos arranjos dos painéis, e não recorrendo-se a expli-
de Anette Laming-Emperaire são especialmente importantes para nós, já que ela teve cações exógenas. Ou seja, é equivocado interpretar grafismos antigos produzidos há
forte influência na formação dos arqueólogos brasileiros. milênios a partir da experiência gráfica de grupos atuais. Mesmo havendo uma clara
Na década de 1950, os dois pesquisadores concluíram que as cavernas tinham filiação cultural, é indispensável levar em conta a dinâmica da cultura e s profundas e
sido decoradas de maneira sistemática, e não ao acaso. Os grafismos foram tratados inevitáveis transformações acarretadas pelo passar do tempo. No caso brasileiro, con-
como composições individuais realizadas em cavernas individuais, e as representa- vém apontar a desestruturação advinda do contato com o europeu e muitas mudanças
ções de animais deixaram de ser consideradas reproduções fieis, sendo interpretadas daí resultantes.
como símbolos. Estudaram-se as relações entre as figuras e foram enfocadas as asso- Da mesma forma, dentre as contribuições definitivas trazidas pela Nova Ar-
ciações entre elementos que se repetiam. Verificou-se que os animais que aparecem queologia – movimento que ocorreu na década de 1960 em países de língua inglesa –
em maior número e com destaque no painel representavam a dualidade básica que ,destaca-se o estudo dos aspectos espaciais das manifestações arqueológicas. A Nova
ordenava a sociedade que os produziu e que esta dualidade era sexual. Para Laming- Arqueologia ou Arqueologia Processual teve como principal destaque o arqueólogo
Emperaire, os cavalos correspondiam à mulher e os bovídeos, aos homens. Esta idéia norte-americano Lewis R. Binford. Um dos postulados que orientou essa linha de
foi estendia aos sinais (geométricos) identificados como representações de homem pensamento sustenta que o comportamento humano é altamente padronizado e que,
(falo) e de mulher (vulva). Muitas críticas foram feitas a esta corrente interpretativa portanto, artefatos produzidos pelos homens seguem um padrão no que se refere aos
em virtude do caráter subjetivo das análises estatísticas realizadas. aspectos formais e às suas propriedades espaciais. Por conseguinte, o registro arque-
Não pretendo aqui esgotar o assunto, apenas ressaltar, como já foi feito por ológico (produto do comportamento humano) também apresenta forte padronização,
André Prous, a existência de várias correntes teóricas e modismos que se sucedem no revelando-se como possibilidade de estudo da organização social. Na agenda pro-
tempo. Não cabe aqui listar todas as perspectivas, apenas mencionar algumas que posta, forte enfoque foi dado à adoção de novos métodos e técnicas de investigação,
norteiam a maneira como os grafismos são estudados. Para alguns pesquisadores, os especialmente as abordagens estatísticas como estratégia para identificar os padrões.
grafismos podem ser explicados através do que se chama de arqueoastronomia, que Essa perspectiva fornece um viés para a análise dos grafismos classificados
pressupõe que grafismos representam fenômenos celestes como parte do céu: estrelas, como geométricos, muito podendo ser dito acerca da distribuição espacial, implanta-
cometas e eventos astronômicos. Para outros, as figuras são expressões de viagens ção ambiental, filiação cultural e demais características desses testemunhos. Esse é o
xamanísticas decorrentes da ingestão de drogas – supostamente responsáveis por caso dos grafismos dos Lajedos de Corumbá, no Mato Grosso do Sul, cuja uniformi-
imagens causadas pelos fosfenos correlacionadas às figuras geométricas. Isso não dade da composição temática e estrutura sugere que as gravações tenham sido realiza-
significa que os fenômenos celestes não tenham sido observados e representados – o das por um mesmo grupo cultural. Considerando a energia gasta na produção dos
Lajedo da Soledade, em Apodi, no Rio Grande do Norte, parece ser um bom exemplo imensos painéis, 510 m2 de área o maior deles, fica evidente o trabalho envolvido em
de tal prática. Tampouco quero negar o uso de alucinógenos por populações nativas, sua produção. Avaliando sua distribuição espacial e de outros tipos de testemunhos
pois esta foi e ainda é uma prática recorrente entre muitos grupos. Porém, trilhar esse arqueológicos na região, sugeriu-se que foram confeccionados pelos construtores dos
aterros que ocuparam as áreas alagadiças. Os longos sulcos sinuosos ligando grafis- res” da sociedade que os produziu, como também os “leitores” da sociedade que pre-
mos circulares sugerem tratar-se de representações do ambiente onde se encontram, tende estudar tais textos – os próprios arqueólogos.
isto é, um emaranhado de rios, canais e lagoas. Segundo Maribel Girelli, em decor- No momento, desenvolve-se um saber estruturado sobre o potencial explica-
rência das dimensões e de sua implantação ambiental, são extremamente visíveis em tivo da cultura material, e diferentes perspectivas teóricas são adotadas. Atlântidas,
áreas abertas. Para a pesquisadora, as formas representadas insinuam trilhas, passo e fenícios e alfabetos são cartas fora do baralho das pesquisas arqueológicas. Por outro
ritmos a serem seguidos. Quando vi as enormes transparências feitas em tamanho lado, muitas vezes o excessivo rigor metodológico que caracteriza esse domínio da
natural, no laboratório do Instituto Anchietano de Pesquisas, tive a clara sensação de arqueologia acaba por engessar interpretações possíveis. Nesse momento, uma ten-
que estava observando um mapa. Mas quem garante que não estamos diante de uma dência prevalece nos estudos de arte rupestre e, independentemente da orientação
parte gráfica de um mito que envolve animais, homens e deslocamentos de espíritos teórica, as pesquisas vêm sendo marcadas por grande rigor técnico no que se refere à
ou seres fantásticos através das águas do Pantanal? descrição de formas, de painéis, à análise de pigmentos etc. Esse movimento soa
Nesse caso, um dos caminhos a seguir é aproveitar os ensinamentos da Nova como uma reação à série de interpretações fantasiosas ou pouco fundamentadas que
Arqueologia e correlacionar os grafismos aos sítios arqueológicos da região e investi- marcou o estudo desse campo.
gar a sua implantação na paisagem, como bem fez a equipe do Instituto Anchietano de
Pesquisa. A arte rupestre foi considerada um aspecto importante de um grupo cultural
que ocupou a região e deixou inúmeros traços de sua passagem.
A Nova Arqueologia foi um importante movimento, e críticas e descontenta-
mentos apontaram novos passos para a arqueologia. Outra vertente é a Arqueologia
Comportamental, de Jefferson Reid, Michael Schiffer e William L. Rathje, da Univer-
sidade do Arizona, que entre outras contribuições aborda os processos de formação
dos sítios arqueológicos pondo em foco fenômenos culturais e naturais que agiram na
formação do testemunho arqueológico. Essa linha de pesquisa salienta que o registro
arqueológico seja qual for (um paredão com pintura rupestre ou um sambaqui), chega
aos dias de hoje marcado por transformações naturais e por ação de outros grupos
culturais. Ressalta que é trabalho do arqueólogo desvendar todos esses processos que
causam modificações profundas nos testemunho pré-históricos. No caso dos grafis-
mos, é preciso investigar o componente dos diferentes pigmentos que compõe o painel
para que não prevaleça uma visão fortemente marcada pela impressão das cores mais
resistentes à ação do tempo. É preciso identificar, também, os grafismos que foram
adicionados por outros grupos para que se possa traçar a “história de vida” de deter-
minado painel.
Porém, a maior reação veio da chamada Arqueologia Pós-Processual, cuja de-
nominação já é uma referência crítica à corrente que a antecedeu. O termo pós-proces-
sual foi utilizado pela primeira vez em 1985, por Ian Hodder, da Universidade de
Cambridge. Ao contrário da corrente anterior, não há uma agenda a seguir, como
também não se buscam leis de comportamento. O foco reside na interpretação: coes e
materiais podem ser percebidos como textos interpretados por aqueles que os fizeram
e os utilizaram. Como um texto admite diversas leituras, isso inclui não só os “leito-
FACULDADE INAP antes. Identificar no passado mítico o acontecimento que ocorre no presente é a chave
da decifração oracular. Os mitos dessa tradição oral estão organizados em dezesseis
CURSO: DESIGN GRÁFICO capítulos, cada um subdividido em dezesseis partes, tudo paciente e meticulosamente
decorado, já que a escrita não fazia parte, até bem pouco tempo atrás, da cultura dos
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. povos de língua iorubá. Acredita-se que um determinado segmento de um capítulo
mítico, que é chamado de odu, contém a história capaz de identificar tanto o problema
AULA DOS BÚZIOS trazido pelo consulente como sua solução, seu remédio mágico, que envolve sempre a
realização de algum sacrifício votivo aos deuses, os orixás. O babalaô precisa saber
PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. São Paulo: em qual dos capítulos e em que parte encontra-se a história que fala dos problemas de
Companhia das Letras, 2001. seu consulente. Ele acredita que as soluções estão lá e então joga seus dezesseis bú-
zios, ou outros instrumentos de adivinhação, que lhe indica qual é o odu e, dentro
Um dia, em terras africanas dos povos iorubás, um mensageiro chamado Exu deste, qual é o mito que procura. Acredita-se que Exu é o mensageiro responsável
andava de aldeia em aldeia à procura de solução para terríveis problemas que na oca- pela comunicação entre o adivinho e Orunmilá, o deus do oráculo, que é quem dá a
sião afligia a todos, tanto os homens como os orixás. Conta o mito que Exu foi acon- resposta, e pelo transporte das oferendas ao mundo dos orixás.
selhado do povo todas as histórias que falassem dos dramas vividos pelos seres huma-
nos, pelas próprias divindades, assim como por animais e outros seres que dividem a
Terra com o homem. Histórias que falassem da ventura e do sofrimento, das lutas
vencidas e perdidas, das glórias alcançadas e dos insucessos sofridos, das dificuldades
na luta pela manutenção da saúde contra os ataques da doença e da morte. Todas as
narrativas a respeito dos fatos do cotidiano, por menos importantes que pudessem
parecer, tinham que ser devidamente consideradas. Exu deveria estar atento também
aos relatos sobre as providências tomadas e as oferendas feitas aos deuses para se
chegar a um final feliz em cada desafio enfrentado. Assim ele fez, reunindo 301 histó-
rias, o que significa, de acordo com o sistema de enumeração dos antigos iorubás, que
Exu juntou um número incontável de histórias. Realizada essa pacientíssima missão, o
orixá mensageiro tinha diante de si todo o conhecimento necessário para o desvenda-
mento dos mistérios sobre a origem e o governo do mundo dos homens, mulheres e
crianças e sobre os caminhos de cada um na luta cotidiana contra os infortúnios que a
todo momento ameaçam cada um de nós, ou seja, a pobreza, a perda dos bens materi-
ais e de posições sociais, a derrota em face do adversário traiçoeiro, a infertilidade, a
doença, a morte.

Conta-se que todo esse saber foi dado a um adivinho de nome Orunmilá, tam-
bém chamado de Ifá, que o transmitiu aos seguidores, os sacerdotes do oráculo de ifá,
que são os babalaôs ou pais do segredo. Durante a iniciação a que é submetido para o
exercício da atividade oracular, o babalaô aprende essas histórias primordiais que
relatam fatos do passado que se repetem a cada dia na vida dos homens e mulheres.
Para os iorubás antigos, nada é novidade, tudo o que acontece já teria acontecido
FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DOS BÚZIOS


Trabalho: Produzir um protótipo de tapete persa utilizando padrões lineares
e geométricos. Os praticantes deverão fornecer dados sobre o aspecto simbólico das
FACULDADE INAP cores e figuras utilizadas na composição dos padrões do tapete. Estes dados deverão
constar em uma etiqueta ou qualquer outro meio que acompanhe o tapete. Sugere-se a
CURSO: DESIGN GRÁFICO utilização do Tangram para a construção figuras. O praticante poderá, se preferir,
aplicar o padrão desenvolvido em peças tais como caixas, capas de livro ou agenda,
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. marcadores de página, etc.

AULA DO TAPETE MÁGICO


Especificações Técnicas: Formato A5, em cores.
Objetivos:
1 – Produzir um protótipo de tapete persa utilizando padrões lineares e geomé- Música: Sherazade, de Rimsk-Korsakov.
tricos, figurativos ou abstratos.
2 – Trabalhar os conceitos de repetição e alternância, figuração e abstração ge-
Sugestões:
ométricas.
3 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
des de produção.
Livro: GALLAND A. (Adapt.). As mil e uma noites. 3 ed. Rio de Janeiro:
Ediouro, 2001.
Filme: SIMBAD E O OLHO DO TIGRE. Direção: Sam Wanamaker. EUA:
Materiais: papel sulfite formato A4, gabarito de formas geométricas e mate-
1977. 114 mim.
riais diversos para a arte final.

História da Arte: Introdução à arte do mundo islâmico16.


Apreciação: Arte islâmica (livros e apresentação de slides).
Composição: Formas geométricas, repetição e alternância.

Roteiro:
1 – Exibição das imagens e comentários sobre as características da arte islâ-
mica.
2 – Exercícios: criação de padrões lineares e geométricos utilizando o gabarito
de formas geométricas.

16
In: GRUBE, Ernest j. Mundo Islâmico. Rio de Janeiro: José Olympio Ed., [s.d.]. (O Mundo da
Arte: Enciclopédia das Artes em todos os Tempos).
FACULDADE INAP No Alcorão, o livro santo do Islã, que engloba todos os seus ensinamentos, e
no Hadith (tradições), coletânea de seus ditos e decisões não registrados no Alcorão e
CURSO: DESIGN GRÁFICO muitas vezes apócrifos, todo um sistema foi assentado, cobrindo os diversos aspectos
da vida: religioso, social e legal; foi nesses escritos que se basearam a estrutura edu-
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. cacional e toda a administração. Desta forma, o Islã (Eu me submeto à vontade de
Alá) trouxe com seu desenvolvimento uma força unificadora e estabilizadora. Quando
AULA DO TAPETE MÁGICO a Ásia Oriental, Ocidental e Central foram subjugadas pelas campanhas implacáveis
dos árabes, no final do séc. VII e no séc. VIII, aos líderes dos exércitos invasores foi
In: GRUBE, Ernest j. Mundo Islâmico. Rio de Janeiro: José dada autoridade com a qual pudessem trazer ordem política a uma vasta área de países
Olympio Ed., [s.d.]. (O Mundo da Arte: Enciclopédia das Artes e estados.
em todos os Tempos). O período que se seguiu à morte do Profeta foi de sucessivas vitórias para os
generais árabes, que tinham começado por atacar e saquear a Palestina e o Iraque.
OS PRIMÓRDIOS DO ISLÃ Achando a vitória fácil, os exércitos islâmicos continuaram e conquistaram a Síria em
636, a Mesopotâmia em 637, invadiram o Egito em 639 e entraram em Alexandria
A religião do Islã, que deu seu nome a um vasto império, governou desde o três anos mais tarde. Tendo conquistado a síria e o Egito, derrotaram e converteram a
início todos os aspectos de sua civilização. Bastante significativo é o fato de que seu Pérsia, tomaram o Turquestão Ocidental e parte do Pundjab e apoderaram-se do Norte
fundador, Maomé, não era somente um profeta: era também líder, juiz, legislador e da África e da Espanha. Em menos de um século, metade do mundo civilizado então
general e os califas ou “sucessores”, que vieram depois dele, herdaram e desempenha- conhecido, da Espanha às fronteiras da China, estava em mãos dos mulçumanos, uni-
ram todos estes papéis. ficada sob a nova força cultural do Islã.
Maomé fundou o núcleo do império mulçumano não somente por persuasão
religiosa, mas através da força de manobras políticas e habilidade administrativa. COMPLEXA COMBINAÇÃO DE CULTURAS
Inicialmente guia de caravanas, depois mercador em Meca, tornou-se sua meta restau-
rar a religião de Abraão e a crença num Deus e na vida futura, num país em que uma A arte islâmica, portanto, não é a arte de um país ou de um povo em particular.
baixa forma de politeísmo era generalizada, com alguns conversos ao Cristianismo ou É a arte de uma civilização, formada por uma combinação de circunstâncias históri-
ao Judaísmo. Inicialmente reuniu Maomé em torno de si um pequeno grupo de segui- cas: a conquista do mundo antigo pelos árabes, a unificação forçada, sob a bandeira
dores em Meca. À medida que sua influência crescia, os chefes da comunidade de do Islã, de um vasto território, que por sua vez foi invadido por vários grupos de po-
Meca começaram a temer sua autocracia e a ressentir-se da negação de seus deuses e vos estrangeiros. Desde seu início, a orientação da arte islâmica foi em grande parte
deusas. À discórdia sucedeu a força, e os mulçumanos foram sitiados e perseguidos. determinada por estruturas políticas que desconheceram fronteiras geográficas e soci-
Finalmente, Maomé aceitou o convite de Yathrib, conhecida depois como Medina (a ais. Por esta razão, a arte do mundo islâmico é discutida neste livro sob as diversas
Cidade do Profeta), para refugiar-se lá. Sua famosa fuga (hégira), em 622, é tomada dinastias que chegaram ao poder, governaram e fragmentaram o império mulçumano
como a data do início da Era Mulçumana. De Medina, Maomé iniciou uma série de original. Cada seção tem uma breve introdução histórica, a fim de que as linhas gerais
campanhas armadas contra Meca, assegurando o direito de fazer peregrinações à ci- de desenvolvimento possam emergir gradualmente.
dade, o que lhe valeu importantes conversões. Finalmente, invadiu e assenhoreou-se A natureza complexa da arte islâmica desenvolveu-se na base de tradições pré-
de Meca, desde então o centro religioso do Islã. Após destruir todos os ídolos pagãos, islâmicas nos vários países conquistados, e uma síntese perfeitamente integrada de
enviou cartas a todos os soberanos e governantes conhecidos, prometendo-lhes segu- tradições árabes, turcas e persas, manifestou-se em todas as partes do novo império
rança somente no caso de se converterem ao Islã. Na época de sua morte, em 632, mulçumano.
estava organizando uma campanha contra a Síria. O elemento árabe é provavelmente, em todos os tempos, o mais importante.
Ele forneceu a base para o desenvolvimento da arte islâmica através da mensagem do
Islã, a língua de seu livro sagrado, o alcorão, e a forma árabe de escrita. Esta última fica supranacional apenas comparável, na história d cultura humana, por idêntico
transformou-se na mais importante característica isolada de toda a arte islâmica, le- domínio do Mundo Antigo por Roma.
vando ao desenvolvimento de uma infinita variedade de ornamentação abstrata e todo
um sistema de abstração linear, peculiar às diversas formas de arte islâmica e po- INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NA CULTURA
dendo, de uma forma ou de outra e em todas as suas manifestações, ser reconhecido
como de origem árabe. Os árabes eram profundamente versados em Matemática e De todos os elementos da arte islâmica, o mais importante é, indubitavelmente,
Astronomia, aprofundando os conhecimentos que herdaram dos romanos. Eles utiliza- a religião. A multidão de pequenos impérios e reinos que tinham adotado o Islamismo
ram seus conhecimentos de Geometria, aliados a um senso inato de ritmo (que tam- sentiu-se – apesar de orgulhos e ciúmes raciais – antes e sobretudo mulçumana, e não
bém caracteriza sua poesia e música), na formulação dos complexos padrões repetiti- árabe, turca ou persa. Todos sabiam, falavam e escreviam regularmente o árabe, a
vos observados em toda a sua decoração. língua do Alcorão. Todos se reuniam na mesquita, construção religiosa que, com mí-
O elemento turco na arte islâmica consiste principalmente numa tendência na- nimas alterações, tinha a mesma forma em todo o mundo mulçumano, e todos pros-
tiva à abstração que os povos turcos da Ásia Central aplicaram a qualquer forma de travam-se em direção a Meca, o centro do Islã, simbolizada pela Caaba, um santuário
cultura ou arte com que se depararam em sua longa trajetória, dos recônditos da Ásia pré-mulçumano adotado por Maomé como o ponto para o qual todos os mulçumanos
até o Egito. Carregando da Ásia Oriental para a Ocidental uma importante tradição de deviam voltar-se ao fazer suas orações. Em cada sala de oração, havia uma parede de
motivos figurativos e não-figurativos, criaram eles uma inconfundível iconografia orientação (Kibla), voltada na direção de Meca, com um nicho central, o mirhab.
turca. A importância do elemento turco na cultura islâmica pode talvez ser melhor Todos os mulçumanos compartilhavam a crença básica da mensagem de Maomé: o
apreciada levando-se em conta que a maior parte do mundo islâmico foi governada reconhecimento da força onipotente e da absoluta superioridade do Deus Uno (Alá). O
por povos turcos do séc. X ao séc. XIX. A arte do mundo islâmico muito deve ao credo de todos os mulçumanos diz igualmente: “Não há deus além de Alá e Maomé é
domínio dessas dinastias turcas, e a influência do pensamento, gosto e tradição turcos o seu Profeta”. Em todos os mulçumanos, de qualquer raça ou país, há o mesmo sen-
na arte do Islã em geral dificilmente pode ser superestimada. timento de serem iguais perante Alá no dia do Juízo.
O elemento persa na arte islâmica é talvez mais difícil de definir; parece con- A experiência do infinito, por um lado, com a inutilidade da vida terrena pas-
sistir numa atitude poética particularmente lírica, uma tendência metafísica, que no sageira, por outro, é conhecida de todos os mulçumanos e participa de toda a arte
domínio da experiência emocional e religiosa leva a um extraordinário florescimento mulçumana. Encontra expressões diferentes, mas basicamente relacionadas. O mais
místico. As principais escolas de pintura mulçumana desenvolveram-se no Irã tendo fundamental é a criação do padrão infinito, que aparece de forma plenamente desen-
por base a literatura persa. Não somente uma iconografia completa, como também volvida muito cedo e é um dos principais elementos da arte islâmica em todos os perí-
uma imagística específica, abstrata e poética em sua concretização, e sem paralelo em odos. A continuação infinita de um determinado padrão, seja abstrato, semi-abstrato
qualquer outra parte do mundo mulçumano, foram criadas no Irã no fim do séc. XIV e ou mesmo parcialmente figurativo, é de um lado a expressão de uma profunda crença
no séc. XV. A mesma atitude que gera no campo da pintura uma forma artística da na eternidade de todo ser verdadeiro, e de outro o desprezo pela existência terrena.
maior beleza, mas totalmente fantasista e irreal, entra na arquitetura, criando formas Fazendo visível uma parte, apenas, de um determinado padrão que em sua forma
decorativas que parecem negar a própria natureza da arquitetura e os princípios bási- completa só existe no infinito, o artista islâmico relaciona o objeto estático, limitado e
cos de peso e tensão, de compensação e apoio, fundindo todos os elementos numa aparentemente definido, com a própria infinidade.
unidade de fantástica irrealidade, um mundo flutuante de imaginação. Um arabesco baseado num padrão infinito de ramagem que, pela divisão dos
Muito embora esses três elementos da cultura islâmica sejam por vezes clara- elementos (raiz, folha e flor), gera novas variações dos elementos originais, é em si
mente definíveis e distintos, e cada qual contribua mis ou menos em partes iguais para próprio a perfeita aplicação do decorativismo islâmico e pode ser aplicado a qualquer
o desenvolvimento da arte islâmica, quase sempre se acham tão intimamente entrela- superfície, da tampa de uma pequena caixa metálica à curva reluzente de uma cúpula
çados e integrados, que não se pode muitas vezes distingui-los com nitidez. Todas as monumental. Tanto a pequena caixa como a enorme cúpula de uma mesquita são
regiões do mundo mulçumano compartilham numerosas características artísticas fun- encaradas da mesma maneira, diferentes só em forma, mas não em qualidade. A base
damentais, que tornaram a totalidade do vasto território uma unidade étnica e geográ- para uma unidade estilística que transcende limites históricos e geográficos é propor-
cionada por esta possibilidade de dar valor igual a tudo que existe, ou situar num Existem oito tipos diferentes de cúfico, dos quais somente três são aqui mencionados:
mesmo nível de existência tudo que se encontra no domínio das artes visuais. a) o cúfico simples; b) o cúfico folheado, que apareceu no Egito durante o séc. IX e
Um dos princípios fundamentais do estilo islâmico que deriva d mesma idéia que tem traços verticais terminando em folhas lobuladas ou meia-palmas; c) o cúfico
básica é a dissolução da matéria. A idéia de transformação é, portanto, da maior im- floreado, no qual os motivos florais e espirais são adicionados às folhas e meias-pal-
portância. A ornamentação, com padrão infinito, de superfícies de qualquer espécie, mas. Esse tipo parece ter sido também desenvolvido no Egito durante o séc. IX, ali
em qualquer meio expressivo, serve ao mesmo propósito de dissimular e “dissolver” a atingindo seu maior desenvolvimento sob os Fatímidas (969 – 1171).
matéria, seja na arquitetura monumental ou numa pequena caixa metálica. O resultado Do sé. XI em diante, o nashki foi aos poucos substituindo o cúfico. Embora um
é um mundo que não reproduz o objeto real, mas sim o elemento superposto que serve tipo de estilo cursivo fosse conhecido já no séc. VII, a invenção do nashki é atribuída
para transcender a momentânea e limitada aparência individual de uma obra de arte, a Ibn Muqla, que viveu em Bagdá durante o séc. X e foi também responsável pelo
trazendo-a para o domínio maior, e único válido, da existência infinita e contínua. desenvolvimento de outro tipo de escrita cursiva: o thuluth ou thulth, o qual segue de
Esta idéia ganha ênfase no modo como a decoração arquitetônica é usada. Só- perto o nashki, exagerando-lhe alguns elementos, como os traços verticais ou as linhas
lidas paredes são dissimuladas atrás de decorações de gesso e azulejos, abóbadas e horizontais.
arcos são cobertos com ornamentos florais e epigráficos que dissolvem sua função e No Irã, vários estilos cursivos foram inventados e desenvolvidos, entre os quais
solidez estrutural, e cúpulas são decoradas com motivos irradiantes de infinitos pa- o taliq era importante. Do taliq desenvolveu-se o nastaliq, forma de escrita cursiva
drões, sóis em combusto, ou fantásticos dosséis flutuantes formados por uma multidão mais bonita e elegante. Seu inventor foi Mir Ali Tabrizi, que viveu na segunda metade
de mukkarnas (decoração em forma de estalactites), que vencem a solidez da pedra e do séc. XIV. O nastaliq veio a ser o estilo de caligrafia persa predominante durante os
da alvenaria e lhes dá um qualidade peculiarmente efêmera, como se a cristalização sécs. XV e XVI.
dos motivos fora sua única realidade. Outro importante aspecto da arte islâmica, geralmente de todo desconhecido, é
É talvez neste elemento, que não tem paralelo na história da arte, que a arte is- a sua rica tradição pictórica e iconográfica. A falsa impressão de que a cultura islâ-
lâmica se funde à experiência religiosa do Islã, e é neste sentido, e tão somente nele, mica era iconoclasta ou antiimagística, e de que a representação de seres humanos ou
que se pode ser chamada de arte religiosa. Caracteristicamente muito pouco real, a criaturas vivas em geral era proibida, ainda está profundamente enraizada, embora há
iconografia religiosa, em seu senso comum, existe no Islã. quase meio século se conheça a existência da pintura figurativa do Irã. Não há proibi-
Embora uma grande quantidade de conceitos e formas fundamentais se tenham ção contra a pintura de formas vivas no Islã, e nem há menção disso no Alcorão.
mantido mais ou menos estáveis e íntegros através de toda a arte islâmica, especial- Certos pronunciamentos atribuídos a Maomé e recolhidos no Hadith (coleção
mente em arquitetura, a variedade de formas individuais é impressionante, podendo de ditos tradicionais do Profeta) foram talvez interpretados como proibição contra
mesmo ser chamada de excepcional. Quase todos os países, em todos os períodos, atividades artísticas, embora tenham significação puramente religiosa. Quando diz que
criaram formas de arte que não têm paralelo com nenhuma outra, e as variações de um nenhum anjo entrará num casa onde haja imagens, refere-se Maomé a ídolos, e não a
tema comum, levadas de um período a outro, são ainda mais extraordinárias. representações figurativas. A criação artística é talvez incluída como advertência aos
fazedores de imagens de que serão severamente punidos no dia do Juízo, por tentarem
NATUREZA DA DECORAÇÃO ISLÂMICA imitar Deus, único que pode criar seres vivos. Chamados a dar vida às suas criaturas,
e falhando, serão condenados. Mas mesmo esta assertiva parece ser dirigida princi-
Além das formas geométricas naturalísticas, seminaturalísticas e abstratas usa- palmente contra a idolatria, e não contra a criação artística.
das no padrão infinito, a caligrafia árabe teve um papel dominante na arte islâmica e O fato é que em praticamente nenhum período da cultura islâmica representa-
viu-se integrada em toda sorte de projetos decorativos. Existem dois tipos principais ções figurativas ou pinturas foram suprimidas, com a única exceção da esfera estrita-
de caracteres n caligrafia islâmica: o kufic, angular, e o nashki, cursivo. mente religiosa, onde a idolatria era temida. Mesquitas e mausoléus são, portanto,
O cúfico, forma mais antiga, alegadamente inventada em Kufa, ao sul de desprovidos de representações figurativas. Em todos os demais locais, constituem as
Bagdá, acentua os traços verticais dos caracteres. Foi usada extensivamente durante os imagens um dos mais importantes elementos, e uma multidão de outras tradições
primeiros cinco séculos do Islã em arquitetura, cópias do Alcorão, tecidos e cerâmica. pictóricas foi também assimilada durante a longa e complexa história da arte islâmica.
FACULDADE INAP vos orientais; sinople, também chamado de verde profeta, que caracteriza muitos ta-
petes de orações, que depois devem ser enrolados sem jamais ser pisados.
CURSO: DESIGN GRÁFICO As marcas de fabricação transformam-se em elementos decorativos nos tapetes
e possuem, também, uma virtude mágica: um sinal representando um pente, mas com
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. cinco riscos, simboliza a mão de Fátima, que protege do mau-olhado.
Em certas regiões do Marrocos, quando um estrangeiro entra em uma casa
AULA DO TAPETE MÁGICO onde há um belo tapete novo (Zarbiya), a mulher que o fabricou queima um pequeno
pedaço do canto pra afugentar o mau-olhado; entre os Aït Warain faz-se a mesma
TAPETE. In: CHEVALIER, j., GHEERBRANT, A. Dicionário coisa quando se leva um tapete novo ao mercado para vendê-lo.
de Símbolos. 9 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1995. p. 863. Depois da morte de alguém, certos ritos populares se relacionam com os tape-
tes. Assim, em Fez, os tapetes da casa do falecido têm de ser substituídos por esteiras
TAPETE trazidas de uma mesquita. Estas cobrem o chão da casa durante três dias, incluindo o
dia da morte18.
O tapete, para os orientais, não é, como para muitos ocidentais, um fino objeto O tapete das orações é, exatamente, um templum, i.e., um espaço sacralizado,
de decoração. É um elemento importante d vida pessoal, familiar e tribal. A sua or- delimitado em relação ao mundo profano. Às vezes, os santos são representados
namentação não é, em parte alguma, simplesmente acidental: foi condicionada por (como Sidi Uali Dada, na Argélia) navegando sobre um tapete de orações puxado por
idéias e sentimentos milenares17. Sua decoração não é desprovida de um certo valor peixes19.
mágico: o losango e o octógono com pequenos ganchos ou triângulos laterais podem Como símbolo estético, o tapete expressa muitas vezes a noção de jardim inse-
representar o escorpião e a tarântula, contra os quais é preciso proteger-se. parável da idéia de Paraíso. Ali encontram-se flores, árvores, animais, pássaros, reais
São igualmente mágicos e simbólicos, e não somente estéticos: o camelo, que ou míticos. O meio empregado impede uma imitação muito realista... de modo que
representa a fortuna dos nômades e cuja imagem é uma prova de felicidade e riqueza esses tapetes exprimem o jardim em si, suas características formais e universais, não
para o fabricante e o proprietário do tapete; o cão, que afasta da casa em que o tapete é um jardim individual, mas a alegria permanente que oferecem os jardins. É assim que
usado todos os indesejáveis, os feiticeiros, as doenças personificadas, tais como a um criador de tapetes da época islâmica diz num poema: Aqui, no fresco jardim,
varíola; o pavão, ave sagrada na Pérsia como na China; o pombo, símbolo do amor e desabrocha uma primavera eternamente deslumbrante, que nem os ventos do outono
da paz; a árvore da vida, símbolo da eternidade, assim como o cipreste; a romã em nem as tempestades do inverno atacam20. Trata-se de uma abstração destinada,
flor, planta de sol, a cápsula de grãos, símbolos de riqueza e de abundância; o cravo, através do tapete, a fazer com que fossem usufruídas no inverno as delícias da
símbolo de felicidade. primavera.
Quanto à cor dos tapetes, o amarelo ouro é símbolo do poder e de grandeza; O tapete resume o simbolismo da morada, com o seu caráter sagrado e todos os
convêm os tapetes destinados aos palácios e às mesquitas; o branco: pureza, luz, paz – desejos de felicidade paradisíaca que ela encerra.
bandeira primitiva dos árabes até o final das Omíadas; vermelho: felicidade, alegria –
bandeira dos seldjúquidas e das dinastias otomanas; preto: destruição, revolta – ado-
tado pelos abássidas que se revoltaram contra os omíadas; verde: renovação, ressur-
reição – trajes dos habitantes do Paraíso; cor dos adeptos de Ali (xiitas persas), e de-
pois, a partir do séc. XIV, de todos os descendentes do Profeta e dos peregrinos da
Meca; azul celeste: adotado pelos imperadores de Bizâncio, cor nacional do Irã, e, no
entanto, vista em todo Oriente como cor de luto; roxo (violeta escuro, ou mesmo
claro): distintivo de reis, cor de Labarum de Constantino, que influenciou vários po- 18
WESTERMARCK E., Ritual and Belief in Marocco, 2 vols., Londres, 1926. p. 429, 468, 540.
19
DERMENGHEM E., Le cult dês saints musulmans, Paris, 1931. p. 184.
17 20
Van GENNEP Arnold, in Le Tapis, um art fondamental, Paris, 1949. Encyclopédie de l’Islam, 5 vols., Paris, 1908 – 1938.
FACULDADE INAP PADRÕES LINEARES E COMBINAÇÕES.

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DO TAPETE MÁGICO


PADRÕES GEOMÉTRICOS E COMBINAÇÕES.
Especificações Técnicas: Formato 10x15 (mim), cores.
FACULDADE INAP
Música: Música renascentista.
CURSO: DESIGN GRÁFICO
Sugestões:
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.
Livro: SCHNEIDER, N. Naturezas-mortas: a pintura de naturezas-mortas
AULA DO ARCIMBOLDO nos princípios da Idade Moderna. Köln: Taschen, 2009.
Filme: MOÇA COM BRINCO DE PÉROLA. Direção: Peter Weber. Ingla-
Objetivos: terra: 2003. 95 mim.
1 – Produzir um auto-retrato seguindo a lógica das “cabeças compostas” de
Arcimboldo.
2 – Trabalhar a construção da face através da geometrização.
3 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
des de produção.

Materiais: papel sulfite formato A4, lápis HB e materiais para arte-final..

História da Arte: Arcimboldo, “pintor figurativo”21.


Apreciação: obras de Arcimboldo.
Composição: formas geométricas.

Roteiro:
1 – Exibição das imagens e comentários sobre Arcimboldo.
2 – Demonstração do exercício.
3 – Geometrizar as formas do rosto, tomando como base uma fotografia (3x4)
do praticante.
4 – Tomando como base a geometrização do rosto, os praticantes devem re-
construí-lo com um grupo de elementos (flores, frutas e legumes, etc.) à maneira das
“cabeças compostas” de Arcimboldo.

Trabalho: Os praticantes deverão desenvolver um auto-retrato à maneira


das “cabeças compostas” de Arcimboldo.

21
In: LIBRI, R. C. S. Arcimboldo. São Paulo: Editora Globo, 1996. (Coleção de Arte).
FACULDADE INAP Pode-se presumir que, quando ele deixou Milão, em 1562, par colocar-se a
serviço das cortes imperiais de Viena, e depois de Praga, já tinha imaginado as “cabe-
CURSO: DESIGN GRÁFICO ças compostas”: naquele no já circulavam em Milão composições caricaturais – cabe-
ças fálicas ou variações obscenas sobre órgãos sexuais masculinos – que eram muito
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. difundidas e que Arcimboldo devia certamente conhecer. A imagística do século XVI
era povoada por artifícios visuais e conceituais, como a anamorfose, a criptografia, os
AULA DO ARCIMBOLDO hieróglifos e as composições grotescas. Arcimboldo já devia ter-se exercitado com
sucesso ao fazer essas extravagâncias pictóricas.
LIBRI, R. C. S. Arcimboldo. São Paulo: Editora Globo, 1996.
(Coleção de Arte). Na Corte em Viena

Arcimboldo, “pintor figurativo” Em 1555, com a morte de seu tio-avô, o arcebispo Gianangelo, os favores dos
poderosos provavelmente declinaram, da mesma forma que, aos olhos de Giuseppe, a
Sabe-se pouco sobre a vida de Giuseppe Arcimboldo, à exceção de algumas in- atmosfera de Milão tinha-se degradado. Cidade imperial cheia de vida na época de
formações e lembranças que ele próprio se preocupou em divulgar, por intermédio de Ferrante Gonzaga, Milão se fechara com a chegada do novo regente, Felipe II, que
seus admiradores, quando voltou a Milão, em 1587, após passar 26 anos nas cortes de preferia viver recluso na fortaleza mosteiro do Escorial, e se tornara pouco condizente
Viena e Praga. A fim de “promover a sua imagem”, como se dirá hoje, contou a seus com a capacidade de invenção fantástica que tinha Arcimboldo. Ele aceitou, portanto,
biógrafos (o jesuíta Paolo Morigi, ou Morigia, cronista da vida Milanesa, o pintor o encargo de retratista oficial e de copista, que lhe fora atribuído pelo imperador Fer-
Gianpaolo Lomazzo, que mais tarde seria um dos grandes teóricos da pintura da dinando I, mudando-se para Viena. Realizou essa tarefa com grande dignidade, dedi-
época, e o cônego de Latrão, Grogorio Comanini, poeta e tratadista) detalhes de sua cando-se à cópia de retratos antigos – conservados no palácio real de Viena e destina-
vida e lembranças que, nas obras dos três autores, aparecem de forma muito seme- dos, talvez, a Innsbruck – que, no entanto, suscitaram pouco interesse e se dispersa-
lhante. ram. Além desse trabalho, certamente pouco atraente para ele, começou a pintar as
Arcimboldo nasceu muito provavelmente em Milão, em 1527, filho de Chiara famosas “cabeças compostas”, abandonando o estereótipo dos retratos oficiais. A
Parisi e de Biagio Arcimboldo, pintor que trabalhava na catedral graças ao parentesco primeira série das Estações data de 1563; duas delas, o Verão e o Inverno, estão con-
com o arcebispo Gianangelo. Foi justamente com o pai que Giuseppe começou seu servadas no Kunsthistorisches Museum de Viena; enquanto a Primavera foi desco-
aprendizado, documentado pelos Anais d Construção da Catedral, de 14 de dezembro berta em 1964 por A. E. Pérez Sánchez na Academia de Belas Artes de Madri. Em
de 1549 a 1558. Sobre essa época, em que ele aparece como “pintor de figuras”, te- 1564, quando Ferdinando I morreu, quem o sucedeu foi seu filho Maximiliano II,
mos poucas informações; sabemos que preparava os desenhos para os vitrais, mas, homem de grande cultura, dotado de um amor sincero pela arte. Era um apaixonado
nessas obras – Histórias do Velho Testamento e História de Santa Catarina de Ale- pela botânica: gostava de passar longas horas nos jardins de SUS residências, embele-
xandria –, realizadas em seguida por outros artistas, não é fácil encontrar indícios zados pelas mais recentes descobertas da agricultura. Seguiu com interesse a obra do
estilísticos precisos. Com seu amigo, Giuseppe Mada, trabalhou para a Heráldica de filósofo naturalista Clusius, que identificou e classificou as plantas, um trabalho cujos
Santo Ambrósio, pintando emblemas nobiliárquicos, hoje perdidos, e, depois de aban- resultados estão, provavelmente, na base das pinturas florais de Arcimboldo.
donar o trabalho na catedral, pintou o cartão de uma tapeçaria realizada em 1561 – Maximiliano, como todos os nobres e soberanos de seu tempo, gostava de co-
1562, no ateliê de Giovanni Karcher, para a catedral de Como, e que representava a lecionar em sua Kunst-und-Wunderkammer (câmara de arte e maravilhas), os objetos
Virgem Dormindo. A respeito desses primeiros anos de sua atividade foram encontra- mais estranhos possíveis. Por toda a Europa espalhavam-se coleções desse tipo, com-
dos, recentemente, documentos e atribuições importantes, como a que foi feita em postas de produtos raros e curiosos da natureza, objetos artísticos e badulaques varia-
1987 por Robert Miller, referente ao afresco da catedral de Monza que representa A dos. A mais famosa foi a Grosse Kunstkammer (Grande Câmara Artística), que Ferdi-
Árvore de Jessé. nando do tirol, o irmão de Maximiliano, montou em seu castelo de Ambras, perto de
Innsbruck. Esse “lendário gabinete de curiosidades”, hoje quase totalmente dispersas, “caprichos”, esses “quadros fantasistas”, como foram definidos, representam alegori-
compreendia vasos de cristal, objetos de ourivesaria e pedras trabalhadas, instrumen- camente as aspirações universais di imperador, das quais Arcimboldo tornara-se o
tos ópticos e musicais, relógios, marfim, coral, pequenos bronzes, cerâmicas, moedas, intérprete oficial.
mosaicos multicoloridos compostos a partir de penas de animais exóticos provenien- Esses retratos oficiais, de aparências grotescas, já tinham sido pintados em
tes das Américas. Nas paredes, estavam expostos curiosos animais empalhados, ossa- 1563 e 1566, e foram repetidos em 1572 e 1573. No início de 1569, os quadros foram
das pré-históricas e estranhezas pseudocientíficas que alimentavam a atmosfera irreal presenteados a Maximiliano II, por ocasião da passagem de ano. Segundo Sven Al-
das coleções. As pinturas de Arcimboldo, tal como estão documentadas nos inventá- fons, que em 1957, escreveu um ensaio sobre Arcimboldo, as Estações e os Elemen-
rios do Palácio Real de Praga, foram conservadas ao lado desses objetos esquisitos, tos, da mesma forma que outros quadros do artista, faziam parte de um projeto de
fazendo parte do estranho gosto das coleções imperiais. conjunto para um museu, um verdadeiro “gabinete de maravilhas”, que Maximiliano
Os anos mais fecundos, para Arcimboldo, em termos de trabalho e honrarias, tinha imaginado para Viena. As Estações e os Elementos teriam constituído uma sín-
correspondem ao reinado de Maximiliano. E todo o seu prestígio advinha de sua ca- tese visual do conhecimento do mundo natural e uma demonstração do que era o go-
pacidade de invenção fantástica: efetuou várias versões de seus quadros, destinadas a verno dos Habsburgo. Em sua alegoria, instauravam o paralelismo entre os alicerces
outras cortes da Casa de Habsburgo; algumas dessas cópias, devido à demanda, foram do universo natural e a liderança política e espiritual que se podia esperar do império:
executadas por outros pintores, e várias idéias originais só chegaram até nós sob a já que os Habsburgo aspiravam dominar o mundo inteiro, eles eram representados
forma de cópias ou réplicas. como onipotentes e onipresentes como as estações e os elementos, cuja duração é
No contexto cultural que cercava Maximiliano, Arcimboldo criou a nova ima- eterna.
gem do homem, completamente diferente do que tinham visto até então: o homem é A fim de explicar o complexo sistema de correspondências sobre o qual se ba-
uma parte da natureza, dos elementos e do tempo, e natureza, por sua vez, faz parte do seia a emaranhada iconografia, o erudito e historiador milanês Baptista Fonteius
homem. Maximiliano não podia deixar de se interessar por um espírito tão fantástico e Primo (Giovanni Battista Fontana), coordenador das festas e dos espetáculos da corte,
inventivo. escreveu Carmen, um pequeno poema que acompanhou os quadros quando eles foram
De dois retratos datados de 1556, O Jurista e O Bibliotecário (Antiquitas), são presenteados a Maximiliano.
conservadas pelo menos três cópias. Dois personagens da corte ali são representados: Embora de árdua leitura, com significados que, hoje, já não são mais tão claros
o vice-chanceler do império, Johann Ulrich Zazius, imortalizado com o rosto devas- para nós, trata-se de um documento muito importante para a compreensão das cir-
tado pela sífilis e o ventre avolumado por livros, e o historiador da corte e curador das cunstancias culturais e políticas que estavam na origem do ciclo de Arcimboldo. A
coleções imperiais, Wolfgang Lazius, homem de grande cultura, mumificado com recente descoberta, na Biblioteca Nacional de Viena, por Thomas da Costa Kauff-
sutil ironia, como se fosse um fantoche feito de livros, homenagem lúdica a quem, mann, do manuscrito conservado em duas versões datadas de 1568 e 1571 permitiu
mais do que qualquer outro, tinha-se empenhado em organizar a Kunstkammer de recuperar o significado das duas séries de quadros. Os oito retratos formam quatro
Maximiliano. Os dois quadros parecem ser uma espécie de brincadeira feita para ser pares que poderiam ter sido expostos lado a lado, na seguinte ordem: ar-primavera;
compreendida e apreciada pelos círculos da corte. De um nível expressivo absoluta- fogo-verão; terra-outono; água-inverno, de modo que, a cada estação, corresponda o
mente excepcional, tanto do ponto de vista da composição quanto da cor, eles mos- seu elemento próprio, alusão à política matrimonial feliz dos Habsburgo. A harmonia
tram os perfis severos e cerimoniosos dos representantes do poder imperial. que une as flores, os frutos, os animais e outros objetos reflete a concórdia e a paz do
governo de Maximiliano. As relações entre as estações e os elementos parecem pro-
Estações e Elementos: divertimento ou alegoria? clamar a sobrevivência no tempo do poder clemente e harmonioso dos Habsburgo.
Nas Estações, as épocas do ano correspondem aos quatro elementos (ar, água,
Quem observa os retratos da série Estações e dos Elementos, não pode deixar terra e fogo), formulados pó Empédocles e desenvolvidos na cosmologia aristotélica.
de reagir com curiosidade imediata: à primeira vista, esses retratos, que marcam o Aos quatro temperamentos (sanguíneo, colérico, melancólico e fleumático), que equi-
apogeu da carreira de Arcimboldo, dão a impressão de um divertido trabalho de fanta- valem aos quatro humores (sangue, bílis amarela, bílis negra, fleuma), estudados
sia e de invenção. Se as olharmos com atenção, essas “invenções bizarras”, esses anteriormente por Hipócrates, correspondem as quatro idades do homem: a primavera
jovem e lúdica, com caráter sanguíneo; o verão maduro, inflamado e colérico; o ou- grandiosas festas, que celebravam o poderio dos Habsburgo e a harmonia do mundo
tono envelhecido e melancólico; o inverno idoso e fleumático. São quatro retratos dos sob o seu reinado, durante o qual a Europa se unificara.
Habsburgo, que, dominando o tempo e as coisas, têm a possibilidade de se reconhecer As descrições que nos foram deixadas por Fonteius em Europalia permitem
em cada uma das estações e em cada um dos elementos. que penetremos na atmosfera da festa que se realizou em 26 de agosto de 1571: nessa
Ainda que algumas das explicações fornecidas por Fonteius pareçam ter sido ocasião, as Estações e os Elementos foram apresentados durante um grande desfile
inventadas a posteriori, para justificar os quadros como alusão à política matrimonial, alegórico que se desenrolou no palácio real de Viena. Durante o espetáculo, foi apre-
alguns detalhes confirmam, em geral, a sua interpretação. Em todos quadros, a con- sentada a disputa entre Juno e Europa, como pretexto para a afirmação do poderio do
junção das formas sob a aparência de guirlanda ou de coro parece ser a marca real ou imperador e da paz que reinava sob seu domínio.
imperial, e os sinais do poder estão dissimulados nas formas entrelaçadas de animais e Necessidade de símbolos e de alegorias essenciais, bem como a exigência de
vegetais: o busto do Ar é formado pela águia e pelo pavão, que constituem apoios para colocação do “governo terrestre” dentro de uma moldura cosmológica, fica muito
os emblemas na heráldica dos Habsburgo. O Fogo us a corrente da Ordem do Tosão clara nessa festa, transformando os sistemas filosóficos em espetáculo. E Arcimboldo
de Ouro, um medalhão com o emblema da Casa da Áustria e, como orelha, um atiça- consegue realizar tudo isso explorando a farsa e os efeitos estranhos, de modo a pro-
dor de lareira, outro objeto simbólico dos Habsburgo; armas, mechas e bocas de ca- vocar riso.
nhão aludem às campanhas militares contra os turcos. Na Terra, o pelo de carneiro do
Tostão de Ouro liga-se à pele do leão de Hércules, símbolo do reino da Boêmia, um Entre realismo e paródia
domínio dos Habsburgo que se consideravam os descendentes de Hércules e sustenta-
vam a Ordem do Tosão de Ouro como distintivo de sua família. No Inverno, há tam- Conhecem-se dois retratos de Arcimboldo. O primeiro data da década de 70
bém o casaco enfeitado com um atiçador e, nele, podem-se distinguir os quatro seg- aproximadamente e, atualmente, não se tem idéia de onde se encontra. Resta dele
mentos da letra M, de Maximiliano. apenas uma fotografia em preto-e-branco tirada por Benno Geiger, autor da primeira
A criação das séries sucessivas de estações e de elementos para outros impera- monografia sobre o pintor, publicada em 1954. O segundo Auto-retrato, executado
dores enfatiza também o simbolismo político. Quando Maximiliano, talvez em 1573, por volta de 1575, é uma aquarela conservada na Galeria Narodni de Praga. Ambos
encomendou uma série e Estações e de Elementos para o Eleitor Augusto d Saxônia, permitem perceber o caráter melancólico, a atitude aristocrática, a complexidade espi-
aparentemente a fim de garantir o apoio dele para suas posições políticas no império, ritual, a aparência de um intelectual que teve uma existência cheia de emoções inten-
fez com que o M coroado e o atiçador fossem substituídos, no Inverno, pelas espadas sas.
cruzadas da Saxônia, transferindo assim para essa Casa a mensagem do governador Através do filtro deformador da paródia, Arcimboldo observava também os
eterno. objetos de uso cotidiano: numa espécie de brasão doméstico representa o cozinheiro, o
taberneiro e o agricultor, os três mantenedores da casa. Para a Cozinha e a Adega,
Arcimboldo “Fabricator” utiliza objetos práticos com os quais confecciona armas, armaduras e utensílios arte-
sanais, objetos colecionados em grande quantidade pelo Eleitor da Saxônia, ao qual os
O espírito inventivo de Arcimboldo manifesta-se não penas nas “cabeças com- quadros eram destinados. Conhecemos a Agricultura, que ele representou várias ve-
postas”, mas também na organização dos torneios e festas cortesãs. Em 1570, ele zes, em diversas versões, graças a algumas gravuras do século XVI. Da Cozinha,
prepara a cenografia de um torneio organizado em Praga, para o casamento de Eliza- caricatura de um cavaleiro-cozinheiro que tem olhos arregalados, feitos de casca de
bete, a filha de Maximiliano II, com Carlos IX, o Rei da França. No ano seguinte, cria ovo, e um espeto pousado sobre o ombro como se fosse uma lança, e da Adega, retrato
os cenários erguidos em Viena por ocasião do casamento do arquiduque Carlos da de um fidalgo ornado com um penacho feito de rolhas e armado com um saca-rolhas,
Estíria, irmão de Maximiliano, com Maria da Baviera. Arcimboldo desempenhava as restam-nos apenas fotos em preto-e-branco tiradas por Benno Geiger, pertencentes à
funções de “Fabricator”, ou seja, concebia os espetáculos e os guarda-roupas para coleção de M. Müller, em praga (ignora-se onde os originais do pintor se encontram
eles, enquanto Fonteius, que ficou na corte de Viena de 1568 a 1571, pelo menos, era atualmente).
o coordenador e o autor do programa. Fonteius deixou-nos um vasto relatório dessas
De Viena a Praga A volta a Milão

Maximiliano II morreu em 1576 e “foi sucedido à frente do império por seu Até 1587, Arcimboldo morou principalmente em Praga – para onde a sede do
filho Rodolfo, que favoreceu Arcimboldo e gostou tanto dele quanto havia feito seu governo tinha sido transferida em 1583 –, sempre trabalhando para Rodolfo. Mas,
pai”, segundo Morigia. como escreve Lomazzo, “ao sentir que estava envelhecendo, pediu-lhe a permissão
Rodolfo, nascido em 1552, tinha 24 anos quando subiu ao trono. De 1563 a para voltar a Milão, sua pátria, o que obteve com muita dificuldade, com a promessa
1570, vivera na Espanha, onde fora educado por seu tio, Felipe II. Os nos passados de continuar a satisfazer qualquer capricho que o seu soberano concebesse”. Em 1587,
junto dessa corte refinada e rigorosa deixaram nele sua marca, garantindo laços es- rico e célebre, voltou a Milão levando nos bolsos a soma de 1.500 florins. Depois de
treitos entre a Espanha e a Áustria. 26 anos de ausência, em que trabalhara para um único patrão, não podia ser precedido
Ao subir ao trono, Rodolfo manteve a maioria dos conselheiros em seus car- por um celebridade muito grande. Talvez por isso tenha querido tornar-se conhecido
gos, entre eles, Arcimboldo, que recebeu título de nobreza em 1580 e, dois nos mais em sua cidade natal, fazendo confidências biográficas e artísticas, falando de suas
tarde, tornou-se conde palatino. O cerimonial conservou toda a sua importância n vida recordações e fornecendo o catálogo de suas melhores obras a autores tão diversos
da corte e o simbolismo imperial foi preservado. Aos poucos, o caráter de Rodolfo se quanto Paolo Morigi, Gianpaolo Lomazzo e Gregorio Comanini. À exceção das pou-
transformou: ele se tornou cada vez mais imprevisível e melancólico, incapaz de se- cas informações que se preocupou em divulgar, por intermédio desses três admirado-
guir uma linha de conduta estabelecida; passou a levar uma vida sedentária e reclusa, res, nada sabemos dele, e é triste pensar que um homem de tamanha inteligência tenha
na fortaleza de Hadschin, que domina Praga. Ali, à semelhança de seu pai e do tio deixado tão poucos vestígios.
Felipe II, colecionava objetos estranhos, preciosos por sua estética ou curiosidade, As duas únicas obras conhecidas na Itália, durante a sua vida, eram provavel-
jóias, armas, instrumentos científicos, animais exóticos, pinturas sofisticadas. Obce- mente as duas “cabeças compostas” executadas em Milão, para Rodolfo II: Flora e
cado pela beleza e perfeição secretas, reunia todos esses objetos, que, para ele, cons- Retrato de Rodolfo II Vestido de Vertúmnio. Esses dois quadros foram mandados para
tituíam um abrigo para s pressões de um mundo exterior hostil. Arcimboldo também Praga, mas durante a sua execução, artistas, escritores e curiosos tiveram a oportuni-
foi encarregado de procurar peças antigas e objetos raros para a Wunderkammer do dade de apreciar a habilidade de seu conterrâneo. Flora, de que se conhecem duas
imperador, o que é atestado por uma viagem feita em setembro de 1582 a Aix-la-Cha- versões, uma em Paris e outra em Estocolmo, data de 1589: essa personificação da
pelle e a Kempten. O inventário da Câmara dos Tesouros e dos Objetos Artísticos de deusa da primavera, composta de flores, confirma o conhecimento que Arcimboldo
Praga, redigido em 6 de dezembro de 1621, mostra que ali se encontravam também tinha de botânica. A obra tornou-se célebre principalmente em função das descrições
obras de Arcimboldo. de Lomazzo e Comanini, que puderam vê-la. O curto texto de Gherardo Borgogni,
Sabemos muito pouco sobre a atividade do pintor na época de Rodolfo: os poeta que adquiriu uma certa fama em Milão fazendo versos sobre as grandezas e
quadros destinados o novo imperador foram executados depois de 1587, após Arcim- virtudes dos poderosos, é bem elogioso: as Rimas para o Sr. Giuseppe Arcimboldo
boldo ter voltado a Milão. Talvez ele tenha concebido seus quadros com uma dupla sobre o Retrato de Flora, que não são de qualidade poética brilhante, atestam, no
leitura, fazendo, por exemplo, naturezas-mortas, que, ao serem vistas de cabeça para entanto a forma como se espalhou pela cidade a fama das “fantasias” de Arcimboldo.
baixo, transformam-se em cabeças humanas, como O Cozinheiro – Natureza Morta. O Retrato de Rodolfo II Vestido de Vertúmnio, a última de suas obras conhecidas,
Mas não devia deter-se muito tempo nesse tipo de pintura que atraía o observador síntese estilística e iconográfica de suas invenções precedentes, foi enviada para Praga
pelo seu domínio técnico e imaginação, pondo-se a estudar assuntos muito mais vari- em 1591, acompanhada de um pequeno poema introdutório de Comanini, que já tinha
ados. Desses anos, datam 148 desenhos de vestimentas, penteados e enfeites para um escrito, em seu Figino: “Outros pintores a representaram (Flora), mas aqui o capricho
torneio de inverno, dedicados a Rodolfo em 1585. E do ano seguinte data uma série de e a invenção estão no fato de pintado uma mulher inteiramente composta de flores e
13 esboços sobre A Sericultura e o Trabalho com a Seda, projeto para um ciclo deco- um homem (Vertúmnio) inteiramente feito de frutas, coisa que não poderia ter nascido
rativo destinado à residência, em Praga, do barão Ferdinand Hoffmann von Grünpichl de nenhum outro espírito”. No pequeno poema de acompanhamento, Comanini com-
und Sterechen, conselheiro financeiro e presidente da Câmara da Corte Imperial. para Arcimboldo a Júpiter, que pôs fim ao caos dos elementos; da mesma forma, o
pintor “cheio de engenho” escolhe nos campos as flores e as frutas que a Natureza
tinha misturado, selecionando-as de forma a compor a cabeça de Vertúmnio. Assim Bibliotecário, tirada em 1904, foi levada para Paris pelo conde Frederick Ulrich
como Vertúmnio, o deus das mutações agrícolas sazonais contém em si todo o ciclo Wrangel, parente dos proprietários do castelo, e ele a mostrou a seus amigos pintores
do ano, também Rodolfo é senhor dos dias de seus súditos e, por isso, é semelhante ao de Montparnasse. Picasso foi um dos que viram e inspirou-se nela para fazer seu Re-
deus. Esta obra, bem como outros quadros de Arcimboldo, foi parar em Estocolmo em trato de Daniel-Henri Kahnweiller, pintado em 1910: o esquema de conjunto da com-
1648, quando, durante o Saque de Praga, os suecos pilharam as coleções imperiais. posição bem como os detalhes dos cabelos e da mão direita correspondem exatamente
Giuseppe Arcimboldo morreu em Milão, em 11 de julho de 1593. Um ano an- à pintura de Arcimboldo. Desde então, prosseguiu a redescoberta do artista, por meio
tes, Rodolfo o tinha nomeado conde palatino, para recompensá-lo por sua imaginação de imagens populares, caricaturas, da metafísica, do surrealismo, da Arte Bruta e do
e seus leais serviços “in picturis artificiosos et in aliis rebus plurimis” (com a arte de grafismo publicitário. No entanto, ainda não foi organizado um catálogo completo das
sua pintura e todas as muitas outras coisas). Ele foi enterrado na igreja de San Pietro obras que se pode com toda certeza atribuir a ele. Até hoje, não passam de uma dúzia
Dell Vigna, hoje desaparecida. os quadros que foram reconhecidos como de sua autoria.
Benno Geiger, autor da primeira monografia sobre Arcimboldo, publicada em
Os “arcimboldescos” e a redescoberta de Arcimboldo 1954, atribuía-lhe também todas as obras que retomavam ou evocavam seus temas
prediletos. Uma primeira distinção foi feita, logo depois, por F.C. Legrand e F. Sluys,
Fantasia e alegoria estão inseparavelmente ligadas na obra de Arcimboldo, que autores de Arcimboldo e os Arcimboldescos. Comanini, na sua época, já advertira
surpreendeu seus contemporâneos com sua poética do maravilhoso, sua busca da contra os plagiatos: “quantas pinturas grosseiramente compostas vemos nos ateliês de
novidade e do espanto, seu gosto pela metáfora e a emblemática. Mas poucas pessoas muitos pintores; todas elas são imitações de Arcimboldo e o saqueiam”.
perceberam a extensão do significado implícito em sua arte e nenhuma corrente artís- Da exposição de nova York, em 1936, até a retrospectiva organizada no Palato
tica perpetuou sua concepção e seus módulos de composição. Grazzi, de Veneza, em 1987, por ocasião do quarto centenário da volta de Arcimboldo
A ausência de testemunho a respeito de algumas de suas obras e o desconhe- a Milão, seu nome saiu de um esquecimento de 400 anos e suas obras continuam, hoje
cimento, até época bem recente, de explicações como as que estavam contidas nos ainda, a ser uma fonte de inspiração.
poemas de Fonteius, contribuíram para manter na sombra, durante 400 anos, a inter-
pretação estilística de sua arte. Pintores menores da sua geração e da seguinte retoma-
ram os seus projetos, mas o fizeram de forma medíocre, com o objetivo único de cau-
sar espanto. As obras desses “arcimboldescos” não têm nem qualidade artística nem
significado muito grandes; valem apenas pelo seu efeito decorativo. Uma outra cor-
rente seguiu o caminho da pintura antropomórfica, animando a natureza e dando-lhe
os traços de um rosto, num perfeita simbiose. Outros, ainda, exacerbaram o princípio
da imagem dupla, como Arcimboldo o fizera em O Verdureiro – Natureza Morta e O
Cozinheiro- Natureza Morta, bustos reversíveis, de tamanho natural, representando
um personagem que, colocado de cabeça para baixo, transformava-se numa travessa
de prata sobre a qual estavam dispostos legumes ou aves assadas.
Durante centenas de anos, os seus trabalhos e o seu nome foram esquecidos.
Depois, foram redescobertos, no início deste século, de maneira bastante misteriosa. O
nome de Arcimboldo é citado pela primeira vez pelo historiador de arte sueco Olof
Granberg. Em 1902, ele publicou um guia do castelo de Skoklosters, onde estão con-
servados os quadros enviados a Praga na época do saque de 1648. Granberg cita Ar-
cimboldo como “o ministro dos jogos de corte de Maximiliano”, autor de “quadros de
mau gosto, mas que eram muito apreciados numa certa época”. Uma fotografia do
FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DO ARCIMBOLDO

ANATOMIA DA CABEÇA HUMANA


FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DO ARCIMBOLDO

ANATOMIA DA CABEÇA HUMANA – Geometrização.


Música: A Sagração da Primavera – Igor Stravinsky
FACULDADE INAP
Sugestões:
CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. Livro: VEIGA, José J. Sombras de Reis Barbudos. 4 ed. Rio De Janeiro: Ci-
vilização Brasileira, 1976.
AULA DOS CADAVRES EXQUIS Filme: O CÃO ANDALUZ. Direção: Luis Buñuel. França: 1929. 16 mim.

Objetivos:
1 – Produzir uma cena com cadavres exquis construídos durante a aula.
2 – Trabalhar o desenho coletivo, explorando o inusitado e improvavel..
3 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
des de produção.

Materiais: papel sulfite formato A4, lápis HB e materiais para arte-final.

História da Arte: Construção do imaginário surrealista através do jogo do


cadavre exquis22.
Apreciação: cadavres exquis.
Composição: composição de cena.

Roteiro:
1 – Comentários sobre o texto e exibição de imagens.
2 – Demonstração do exercício.
3 – Produção dos cadavres exquis.
4 – Reformulação dos resultados e composição da cena
5 – Arte final.

Trabalho: Os praticantes deverão desenvolver uma cena onde dois cadavres


exquis devam interagir em um mesmo contexto.

Especificações Técnicas: Formato A4 (mim), cores.


22
PIANOWSKI, Fabiane. Construção do imaginário surrealista através do jogo do cadavre exquis. Psikeba
revista de psicoanálisis y estudios culturales, Buenos Aires, n. 5, 2007. Disponível em:
<www.psikeba.com.ar/articulos/>. Acesso em: 17 dez. 2009.
FACULDADE INAP jeu de l´assassin [...], jeu du cadavre exquis"(JEAN, 1983 : s.p.). Além desses, havia
ainda o jogo das condições, o jogo de perguntas e respostas e vários jogos eróticos.
Apesar de aparentarem mera diversão, os surrealistas levavam esses jogos a
CURSO: DESIGN GRÁFICO
sério, de modo que, como afirma Passerou (1983: 53), "ponían en tales
«distracciones» una curiosidad casi experimental, ávida de averiguar que podía salir
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. del ámbito psicológico". Esses jogos eram um modo de fazer produtivo e ao mesmo
tempo divertido. Um momento de autoexploração e autoconhecimento através do qual
AULA DOS CADAVRES EXQUIS esperavam aumentar seu repertório de idéias e imagens a partir da ativação do
inconsciente. Colocavam tanta seriedade nos resultados que ao se analisar o dicionário
PIANOWSKI, Fabiane. Construção do imaginário surrealista compilado por André Breton e Paul Éluard (1987), não só há a definição do que se
caracteriza o cadavre exquis, como também há vários verbetes (caranguejo,
através do jogo do cadavre exquis. Psikeba revista de psicoa- dormitório, envilecido, pomba, sexo) em que o «responsável» é o cadavre exquis,
nálisis y estudios culturales, Buenos Aires, n. 5, 2007. Disponível como se fossem assinados por ele, assumindo-se assim como mais uma personalidade
em: <www.psikeba.com.ar/articulos/>. Acesso em: 17 dez. 2009. do grupo dos surrealistas, uma personalidade coletiva que refletia o que o grupo
idealizava, como afirma Sorane Alexandrian (1969: 50): "l´idéal du groupe était de
mettre le génie en commun, sans que personne n´ait à abdiquer son individualité".
Os jogos do surrealismo
Cadavre exquis: passando e produzindo o tempo

A origem do surrealismo se mescla às práticas dadaístas, até atingir sua Entre todos os jogos experimentados pelos surrealistas, o que resultou em uma
autonomia em 1924, quando André Breton (1896-1966) escreve o primeiro Manifesto significativa produção tanto verbal como visual foi justamente o jogo do cadavre
Surrealista. De modo diferente ao que postulava o dadaísmo, este movimento "aceita a exquis, que, como afirma Breton (citado por MATTHEWS, 1986: 122), se portava
existência da arte e recupera a realidade figurada" (CORREDOR-MATHEOS & como "an infallible means of sending de critical mind on vacation and of fully
MIRACLE, 1979: 109), desse modo, "devolve ao artista a sua razão de ser sem impor, liberating the mind´s metaphoric activity". Além disso, segundo Bradley (1999), o
ao mesmo tempo, um novo conjunto de regras estéticas" (ADES, 1991: 91). jogo do cadavre exquis é um bom exemplo de uma das principais características dos
Para atingir seus objetivos, utilizaram, como principais ferramentas de primórdios do surrealismo: o contínuo intercâmbio entre o poético e o pictórico. Mais
trabalho, o automatismo e o registro dos sonhos, sem preocupação moral e na que isso, os cadavres exquis funcionavam como um instrumento para facilitar a busca
profunda busca em eliminar todo e qualquer controle exercido pela razão. Apesar de central do surrealismo: a evolução do conhecido para o desconhecido. Era o exercício
todos os esforços empregados para burlar qualquer tipo de preocupação estética ou do automatismo psíquico puro: "le cose vengono alla mente (e alla mano) per
moral, as obras não eram somente resultados do acaso, mas esse tinha um papel associazioni imprevedibili: «per un alto grado de assudità immediata»" (DELL´ARCO
relevante e pode ser entendido como o passo inicial para a produção surrealista, como , 1990: 9).
aponta David Batchelor (1999: 59) sob um comentário de Max Ernst, "un primer Esse jogo surgiu, segundo o próprio Breton (1948, p.5), por volta de 1925, na
momento en el que se generaba al azar un conjunto de líneas o formas, seguido por velha casa do aficionado por jazz e cinema, Marcel Duhamel, localizada no número
una segunda fase en la que el artista debía «extraer» las imágenes sugeridas por ese 54 da rua do Chatêau, onde reuniam-se juntamente com o pintor Yves Tanguy (1900-
material producido al azar". 1955) e com os poetas Jacques Prévert (1900-1977) e Benjamin Péret (1899-1959).
Durante a década de vinte, os surrealistas desenvolveram uma variedade de Segundo, a esposa de Breton na época, Simone Collinet (1948: 28):
técnicas para excitar a imaginação e desvelar o inconsciente. Dentre essas técnicas, C´est au cours d´une de ces soirées de désceuvrement et dénnui qui
criaram ou adaptaram jogos infantis com o objetivo de exercitar o automatismo, bem furent nombreuses au temps du surréalisme – contrariament à ce
como para descobrir elementos comuns da imaginação dos seus participantes. Além quóm se représent rétropecivement – que le Cadavre exquis fut
disso, essas atividades proporcionavam o afloramento das profundidade oníricas mais inventé. L´un de noi dit: «Si on jouait aux "petits papiers", c´est très
secretas que refletia-se também na obra individual de cada um deles. Os jogos mais amusant».[...] Au tour suivant, le Cadavre exquis était né. Sous la
comuns eram o "jeu du «si c´etait...» (variant do «portrait»), jeu de la verité (que plume de Prévert, précisément, qu en écrivit es premiers vocables,
servit de prètext à d`innombrables discussions et broullies), jeu de la phrase orale, si bien complétés par les suivants, l´un: boira le vin; l´autre: nou-
veau.
número ideal de participantes é três e a seqüência a ser seguida é: «cabeça-tronco-
De acordo com a declaração de Collinet (op. cit.), o nome surgiu do acaso, por pernas»; além disso, há a questão das cores que podem ser utilizadas, mas que devem
coincidentemente serem as primeiras palavras escritas no primeiro resultado do jogo. ser restringidas no transcurso do jogo ao número de cores usado pelo primeiro jogador
André Masson (1975: 30), recorda que foi Breton quem batizou o jogo. Mas na e de que o desenho deve se prolongar por duas ou três linhas para que o próximo
enorme quantidade de possibilidades, surgiria realmente esse termo – «cadáver» – participante possa continuá-lo. De acordo com essas regras, os cadavres exquis
como fruto do acaso? Essa é a pergunta que se faz Mario Spinella (1991: 194), ao visuais acabam ficando mais limitados que os verbais, pois nesses últimos não há esse
relembrar que um pouco tempo antes havia sido redatado - por André Breton, Louis controle preestabelecido para realizar a escolha do substantivo, adjetivo, verbo ou
Aragon, Joseph Delteil, Phillipe Soulpalt, Paul Éluard e Pierre Drieu La Rochelle - o advérbio, como ocorre com as cores e com as «linhas-guia». Por outro lado, enquanto
violento e polêmico panfleto "Un cadavre" para a morte de Anatole France que teve há uma ordem prescrita – estrutura gramatical - para que os resultados verbais tenham
uma grande repercussão não só entre os intelectuais. Além disso, Spinella questiona coerência, o visual, não precisa seguir rigidamente a seqüência predeterminada de
também a casualidade do aparecimento da palavra «vinho», uma vez que o próprio «cabeça-corpo-pernas» para garantir a comunicação.
Breton (1948: 6) ao recordar o surgimento do jogo cadavre exquis afirma que "chaque Cabe salientar que, mesmo com todas essas regras, a intervenção do acaso pela
soir ou presque nous réunissait autour d´une table où le Chateau-Yquem ne ignorância dos participantes em relação ao que foi escrito ou desenhado anteriormente
dédaignait pas de mêler sa note suave à celle, autrement tonique, de toutes sorte é a principal responsável pelo sucesso dos cadavres exquis tanto verbais como visuais,
d´autres crus". Sob essa perspectiva, portanto, não parece tão casual que logo após a afinal com a existência desses fatores não há como prever de que modo os
publicação de "Un cadavre" e rodeados de vinho apareça esse termo para designar o participantes integrarão as suas contribuições, uma vez que eles limitam o controle
jogo surrealista mais produtivo. E mais, se pensarmos o cadavre exquis na sua forma exercido pela razão.
visual, na qual a maioria dos resultados está intimamente relacionada com formas No caso específico da técnica da colagem (fig. 2) a estrutura do jogo se baseia,
antropomórficas, menos casualidade ainda encontramos no termo... Mas, a telepatia e de acordo com Mary Ann Caws (1997: 237), no recorte de imagens de um dicionário,
a intuição eram tão valorizadas e desenvolvidas no grupo surrealista, que se pode enciclopédia ou revista por cada um dos jogadores. As contribuições são, portanto,
justificar esse nome como uma obra do acaso intimamente vinculada ao desejo do imagens predeterminadas e serão escolhidas por cada um dos participantes na medida
inconsciente coletivo de seus membros. em que se desenrola o jogo. Assim, se constrói o cadavre exquis através da
Inicialmente, praticado na forma verbal, "le cadavre exquis boira le vin justaposição de imagens pré-existentes e generosamente disponibilizadas.
nouveau", transformou-se no clássico exemplo do jogo e o batizou. O procedimento Os cadavres exquis visuais resultam em "image des pus cocasses – monstre
para se jogar era muito simples, segundo Tristan Tzara (1948), a receita para o grotesque comme sorti d´un rêve chaotique – et qui ressorti à la surprise, à l´humour"
cadavre exquis escrito era: pegar uma folha de papel dobrada o número de vezes (BEAUMELLE, 1995: 53). Apresentam-se como uma imagem plural, caótica e
correspondente ao número de participantes, na qual cada um escreveria o que passava convulsiva e ao mesmo tempo enigmática, única e coesa, que tem na sensação do
por sua cabeça sem ver o que tinham feito anteriormente seus companheiros. Cabe inesperado toda a sua magia. como diz Collinet (1948: 28) ao relembrar-se dos
salientar que havia uma seqüência rígida a ser respeitada: substantivo- primeiros cadavres: "la suprise violent provoquait l´admiration, les rires, soulevait
adjetivo/advérbio-verbo-substantivo, com o objetivo de obter o mínimo de coerência une envie inextinguible de nouvelles images – des images inimaginables par un seul
no resultado que ao final seria lido para todos, pois os resultados totalmente absurdos cerveau, - issues de l´amalgame involontaire, inconscient, imprévisible de trois ou
e incoerentes acabavam, de acordo com Collinet (1948), parando no lixo. O clássico quatre esprits hétérogènes". E essa surpresa violenta, o inesperado – que Masson
exemplo, citado anteriormente, "o cadáver delicioso bebe vinho novo" é a forma mais (1975) coloca como essencial - não é uma sensação restrita ao público que vê essas
conhecida, porém, há outros exemplos que reproduzem e confirmam esse padrão imagens muito tempo depois, como nós, por exemplo; mas também é a sensação dos
estrutural, como: "La petite fille anemiée fait rougir les mannequins encaustiqués", próprios produtores ao visualizarem no final do jogo a imagem única e íntegra obtida
"L´écrevisse fardée éclaire à peine différents baisers doubles" ou, o mais complexo, através da contribuição de cada um deles e que reflete, na maioria da vezes, uma
"Monsieur Poincaré, honni, si l´on veut bien, avec une plume de paon, vaise sur la perfeita «telepatia». A unidade que essas imagens possuem constituem-se, segundo
bouche, avec une ardeur aue je en me suis jamais connue, feu Monsier de Borniol" Breton (citado por MATTHEWS, 1986: 126), em um verdadeiro enigma.
(BRETON, 1948: 7). A proposta comum de buscar liberdade poética através de uma ação coletiva é
Rapidamente, o cadavre exquis adquiriu também uma forma visual (fig.1) a responsável pela harmonia, pela extraordinária correspondência que as imagens
além da verbal, através do uso das técnicas, inicialmente, de desenho e, possuem e que, por sua vez, sempre causam mais surpresa que os equivalentes verbais
posteriormente, de colagem. Esse tipo, apesar de apresentar o mesmo funcionamento por ter a capacidade de criar sua própria forma de maneira particularmente única.
do verbal de dobrar o papel várias vezes e das participações ocorrerem na ignorância Como salienta Ágnes de Beaumelle (1995: 54):
das contribuições anteriores, tem particularidades acentuadas por Tzara (1948): o
[...] les ruptures de crayon, les differénces d´echelle, les modalités forma ao corpo humano, pois o ser humano com seu inconsciente, sonhos e desejos é
variables d´expression graphique, les champs disparates de a grande temática que move a produção de seus artistas.
l´imaginaire. Tout cela s´impose comme autant de donnéss faites Apesar dos primeiros cadavres exquis terem sido produzidos em 1925, os
pour déstabilisier toute cohérence plastique, pour alarmer celui qui mesmos só serão publicados pela primeira vez em 1927 na revista La Révolution
regarde. Surréaliste (nº 9-10, outubro). Nessa revista, alguns exemplos tanto visuais como
verbais – sem identificação de seus criadores, somente com a legenda: cadavre exquis
- são postos junto aos textos e comentários ou justapostos com narrativas de sonhos e
Enquanto os cadavres exquis desenhados são a cada vez construído por outros materiais visuais. A colocação dos exemplos de cadavres exquis ao longo da
imagens que até então não existiam no mundo real/racional, os verbais funcionam revista se dá de maneira aleatória, como salienta Dawn Ades (1997: 21): "the placing
mais como assemblages, ou seja, como um agrupamento de objetos encontrados e, of cadavres exquis throughout this issue of the journal is neither exactly random, nor
portanto, a surpresa passa a ser menor porque, mal ou bem, eles individualmente já intended to illustrate the texts. They are rather part of a continuous fabric of juxtapo-
eram conhecidos pelo espectador, em especial pelo produtor-espectador. Isso também, sition, which yields unexpected contrasts and analogies". Outros exemplos de cadavre
de certa maneira, ocorreria com o uso da técnica da colagem, mas não se pode exquis também foram reproduzidos no número especial da revista Variétés intitulado
esquecer que nesse caso tem que se levar em conta não só o fato de se estar, do "Le surréalisme en 1929" (RUBIN, 1969), mas aqui os autores das imagens foram
mesmo modo que nos desenhados, tratando-se de imagens, como também da nomeados: Joan Miró, Max Morise, Man Ray e Yves Tanguy e os autores das frases
capacidade associativa de fazer algo «visualmente funcional» com objetos tão tiveram suas iniciais indicadas (MARCEL, 1983).
díspares e que, como dito anteriormente, não necessitam coerência para poder A primeira exposição específica, que contava com imagens produzidas de 1925
comunicar algo, ao contrário, quanto mais paradoxais mais instigantes. a 1934, organizada por André Breton, ocorreu em outubro de 1948, na Galeria Nina
A proposta comum de buscar liberdade poética através de uma ação coletiva é Dausset - La Dragone, em Paris, e denominava-se "Le cadavres exquis son
a responsável pela harmonia, pela extraordinária correspondência que as imagens exaltation", os artistas que participaram foram, segundo o catálogo da exposição (que
possuem. Os cadavres exquis são "produtos do inconsciente coletivo, eles não possui imagens): Louis Aragon, André Breton, Robert Desnos, Victor Brauner,
demonstram, como os desenhos de doentes mentais e os desenhos mediúnicos, que a Paul Eluard, Marx Ernst, Jacques Hérold, Valentine Hugo, Greta Knuston, André
pintura, como a poesia, pode ser feita por todos (PICON, 1983: 86), realizando assim Masson, Joan Miró, Max Morise, Benjamin Péret, Jacque Prévert, Man Ray, Yves
o desejo de Lautreámont, "la poésie sera faite par tous" (LAUTRÉAMONT citado Tanguy, Tristan Tzara, entre outros. A grande maioria das imagens – senão todas –
por MASSON, 1975: 30). É na capacidade de produzir coisas coletivas não foram exibidas numa exposição de mesmo nome sob curadoria de Arturo Schwartz,
importando-se com a autoria ou com o «talento» e, portanto, desmistificando a «aura» realizada em 1975 em Milão (BRETON, 1975). Essa última tornou-se uma referência
ou o «gênio» do artista, que reside o maior mérito desse jogo e de seus jogadores. E, no tema pela edição de um catálogo no qual não só se reproduz as imagens expostas
dessa forma, veio a exercer profunda influência no modo de fazer arte de seus como também se republicam todos os textos produzidos para a exposição de 1948, de
sucessores. Como afirma Bradley (1999: 73): "sua ênfase na coletividade e na ruptura autoria de André Breton, André Masson, Tristan Tzara, Simone Collinet, Marcel
da distinção entre o privado e o público, o artista e o espectador, voltaria à tona em Duhamel e Jindrich Chalvpëcky. Pelo menos três outras exposições como essa foram
outros modos de fazer arte". realizadas na Itália em épocas posteriores, utilizando o mesmo material.
A temática que Tzara coloca em sua receita através da seqüência de «cabeça- Na busca por mais referências, tanto visuais como teóricas, foi possível
tronco-pernas» para os cadraves exquis desenhados é a de um corpo ou de atributos encontrar vários outros exemplos de cadavres exquis publicados em catálogos de
que o possam substituir. Assim, a maioria dessas imagens vai ter formas exposições temáticas sobre surrealismo de modo geral, sendo que especificamente
antropomórficas, mesmo quando algumas partes são substituídas por elementos sobre esse jogo surrealista foi encontrado apenas o catálogo da exposição itinerante
extraordinários. Breton (1975) afirma que os desenhos que obedecem a essa técnica, "Cadavre exquis", promovida pelo (1981) e que teve passagem pela Fundació Miró
por definição, acarretam no antropomorfismo, mas - mais do que pelas regras em Barcelona, no ano de 1983. Cabe ressaltar a existência do catálogo da exposição
estabelecidas - ele atribui esse motivo ao fato da técnica acentuar extraordinariamente "Dessins Surréalistes", também promovida pelo Centre Georges Pompidou, que nesse
as relações que unem o mundo exterior e o interior. De todos os modos, está claro que caso não se trata de uma mostra específica sobre cadavres exquis, mas que é relevante
essas figuras não pretendem imitar os aspectos físicos reais, porém, seu por conter um significativo número de imagens publicadas, além de um importante
antropomorfismo não pode ser considerado totalmente casual pela própria forma em texto teórico de referência, escrito por Agnés de Beumelle.
que se estrutura o jogo. Além disso, o corpo tem um significado vital dentro do Os dados apresentados acima demonstram que, apesar da enorme relevância
próprio movimento surrealista, uma vez que a maioria das obras remetem de alguma dos cadavres exquis no contexto surrealista de experimentações para eliminar o
pensamento crítico e liberar o pensamento metafórico, eles são poucos conhecidos
pelo público em geral, pelo modo esparso em que se apresentam. Sendo que, até o dia Foster afirman que los abruptos cortes de los desnudos femeninos
de hoje, não houve esforço em apresentar uma exposição ou publicação na qual se de los surrealistas convierten a alas mujeres en fetiches, una
reunissem o maior número possível de exemplares, juntando as coleções existentes. respuesta al miedo de castración.

Cadavres exquis: tipos e símbolos Juan Eduardo Cirlot (1997: 320), em seu Dicionário de símbolos, coloca que a
mulher na esfera antropológica – e não esqueçamos a relação dos surrealistas com a
Os cadavres exquis coletados nessa pesquisa, cem no total, foram classificados arte primitiva – corresponde ao princípio passivo da natureza. Esta questão pode ser
sob duas linhas gerais, a saber, «antropomórficos» e «aleatórios» ou «não- confirmada no fato de que, apesar de Breton (citado por DEXEUS, 2005: 322)
antropomórficos». declarar em Arcane 17 (1945) "sólo veo una solución: ya es hora de que las ideas de
Os de tipo «aleatório» ou «não-antropomórfico» (fig. 3) foram os mais la mujer prevalezcan sobre la des del hombre, cuya ruina está suficientemente clara
escassos, correspondendo a aproximadamente vinte por cento do total. Cabe salientar, en el tumulto de hoy en día", as várias mulheres que participaram como artistas do
que como no próprio surrealismo, nessa categoria as imagens são figurativas, não movimento só foram ser reconhecidas muitos anos depois.
tendo encontrado nenhuma de caráter abstrato, por mais difícil que seja a sua leitura. Mesmo assim, a mulher como símbolo estará presente na maioria das
Portanto, o resultado do jogo é uma imagem figurativa, que não remete produções surrealistas. No caso dos cadavres exquis encontrados, ela aparece sob
especificamente a um corpo humano, mas a algo semelhante a monstros ou a dois, dos três aspectos apontados por Cirlot (op. cit.): como mãe (pátria, cidade ou
estruturas/máquinas fantásticas. Os elementos mais recorrentes dentro dessa categoria natureza), relacionando-se também com o aspecto informe das águas e do
foram objetos e estruturas orgânicas, muitas sem forma definida e remetendo as inconsciente e como donzela desconhecida, amada ou alma, na psicologia junguiana.
garatujas dos desenhos infantis. De todos os modos, a figura da mulher sempre significou o que os surrealistas
Na grande categoria «antropomórfica» (fig.4), na qual a maior parte dos buscavam, ou seja, a intuição, a emergência dos sentimentos mais profundos e
cadavres exquis se enquadram, há uma tendência na composição de apresentar o desconhecidos.
corpo como um todo, indicando uma certa obediência a seqüência lógica «cabeça- Alguns fragmentos do corpo humano também se destacam nas imagens
tronco-pernas», estabelecida nas regras do jogo. Nessa categoria foram encontradas encontradas, como olhos, mãos, pés e o coração, valorizados pelo tamanho ou forma
imagens formadas com elementos da anatomia humana, animais, vegetais e objetos. em que estão representados. Entre eles a simbologia do olho se destaca nesse contexto
Essa rápida classificação teve o objetivo de ordenar as imagens, facilitando porque, de acordo com Cirlot (op. cit.: 346), o ato de ver tem uma correspondência
assim a visualização dos símbolos que aparecem na imagens. As cem imagens com a ação espiritual, simbolizando a compreensão, além disso aparece algumas
coletadas foram construídas a partir de um repertório imagético enorme, porém é vezes nas imagens encontradas de modo heterotópico, ou seja, deslocados de seu
possível salientar alguns símbolos que, com freqüência, se repetem. Com o objetivo lugar anatômico e transladados a diversas partes dos corpo em figurações fantásticas
de conhecer um pouco mais sobre o significado desses símbolos foram utilizados tomando significados diversos conforme o lugar em que se encontra, por exemplo se
dicionários de símbolos e de iconografia e suas definições são expostas a seguir. colocado na mão significa clarividência.
O símbolo que dominou nessas cem imagens foi, seguramente, a mulher, que As mãos, por sua vez, significam de modo geral a manifestação corporal do
apareceu em aproximadamente em cinqüenta por cento delas. Isso se dá tanto através estado interior do ser humano e a distinção entre mão direita e esquerda enriquece o
de fragmentos do corpo como a cabeça, lábios, seios, órgão sexual, cintura, como símbolo com o sentido adicional derivado do simbolismo espacial: o lado direito
pelos objetos femininos como saias, espartilhos ou sapatos. Isso não ocorre por acaso, corresponde ao racional, consciente, lógico e viril e o esquerdo todo o contrário. Se
porque, depois do romantismo, o surrealismo será o movimento artístico que mais atentarmos para as imagens, veremos como há uma predominância dessa última, o
significado dará a imagem feminina (CHADWICK, 2002: 7). Como salienta Victoria que corrobora com os ideais surrealistas. Além disso, muitas vezes as mãos aparecem
Dexeus (2005: 322): como garras que podem ser interpretadas como uma referência ao instintivo.
(CIRLOT, op.cit.: p. 303-04)
El tema del surrealismo y la mujer ha sido objeto de múltiples Em relação aos pés, esses estão de maneira geral relacionados com o suporte
interpretaciones. A modo de ejemplo: los surrealistas tuvieran una da pessoa, o que pode estar relacionado segundo alguns estudiosos com o símbolo da
visión romántica de la mujer como maga, musa y mujer-niña, visión alma, por significar o suporte do corpo, o que sustenta o homem em sua posição ereta
que las feministas consideran que responde a una actitud misógina (CIRLOT, op.cit.: 367). Além disso, aparecem também nas imagens muitos sapatos,
y que Simone de Beauvoir declaró cercana a la tradición de que como a pegada, tem um significado funerário. Para os surrealistas, "esta presencia
Fourier. La mujer encarnaba la belleza, la poesía, era la de los muertos entre los vivos sugiere ya lo que el surrealismo siempre tuvo de
indispensable mediadora con la naturaleza. Autores como Hal
práctica médiumnica, un entrar en comunicación con cierto «más allá» (SOLANA, seja, um espaço de comunhão. Dentro do contexto surrealista, o aparecimento de
2002: 9). guarda-chuvas e de mesas nos cadavres exquis também encontra relação na fórmula
Quanto à presença do coração, esta pode ser entendida pelo significado desse famosa de Lautréamont: "belo como o encontro de uma máquina de costura e um
símbolo como o verdadeiro lugar da inteligência, sendo o cérebro somente um guarda-chuva sobre uma mesa de dissecção".
instrumento de realização, além disso, pode significar também o amor como centro de Do mesmo modo que as mesas, as cadeiras aparecem em várias posições e em
iluminação e felicidade. (CIRLOT, op.cit.: 149-150) distintos tamanhos, e podem ter seu significado relacionado com a dignidade de um
Entre os animais, destacam-se os pássaros representados das mais variadas personagem enquanto vivo e com o suporte da alma depois de morto, como acreditam
formas, bem como outros seres alados, em especial com asas tanto de pássaros como alguns povos da áfrica negra (REVILLA, op. cit.: 340).
de borboletas. Para Cirlot (op. cit.:.356-58), todos os seres alados são símbolos de Finalmente, as garrafas que de forma geral significam o saber, conhecimentos
espiritualização, sendo que os pássaros em muitas tradições representam estados secretos ou revelações vindouras (CHEVALLIER & GHEERBRANT, 2003: 196).
superiores do ser, a alma. Além disso, simbolizam colaboradores inteligentes do Cabe salientar que esses três últimos elementos - mesa, cadeira e garrafa - estão
homem, atuando como mensageiros de um outro mundo. As borboletas, do mesmo intrinsecamente relacionados com o ambiente onde os cadavres exquis eram
modo que os pássaros, são emblemas da alma significando também uma atração produzidos e que é descrito com precisão por seus participantes – como já visto
inconsciente ao iluminado (op.cit.: 306-07). Os peixes também são freqüentemente anteriormente – demonstrando assim sua relevância nesse contexto.
utilizados e, de acordo com Cirlot (op. cit.: .366-367), em termos gerais o peixe é um Como se pode observar não foi realizada uma análise iconográfica profunda
ser psíquico, um «movimento penetrante» dotado de poder ascensional no inferior, dos símbolos e das imagens em que esses aparecem. Na verdade, realizou-se uma
quer dizer, o inconsciente. Este símbolo pode ter também, do mesmo modo que os pesquisa dos significados atribuídos aos símbolos mais freqüentes a fim de propiciar
pássaros, o significado fálico dotado de poder ascendente (sublimação e um primeiro passo para uma leitura rápida dos cadavres exquis apresentados. Cabe
espiritualização). salientar, porém, que uma interpretação mais aprofundada das imagens e seus
Finalmente, entre os objetos que aparecem de modo mais freqüente pode-se símbolos se coloca de maneira instigante e necessária para pesquisas futuras.
destacar: âncora, relógio, roda, objetos cortantes (facas e serras), guarda-chuva,
cadeira, mesa e garrafa. Considerações Finais
A âncora pode ser entendida como símbolo de salvação e esperança e quando
na posição invertida faz alusão a sua condição mística (CIRLOT, op. cit.: 80). A maioria dos símbolos encontrados tratam de elementos que eram
Os objetos cortantes, ao contrário de significar vingança ou sacrifício, tem considerados muito importantes para os surrealistas na sua busca pela libertação da
provavelmente relação com o conceito budista do termo de que o corte com uma faca mente das amarras da razão. Esses símbolos não têm seu aparecimento limitado aos
representa a liberação ao cortar os laços da ignorância e do orgulho (COOPER, 2000: cadavres exquis, ao contrário, são encontrados em toda a produção surrealista. Isso
63). Cabe salientar que na maioria das imagens esses objetos aparecerem relacionados demonstra que realmente a prática desse jogo, não só resultava em uma produção
com a figura feminina. coletiva significativa, como também iria influenciar as produções individuais de cada
O relógio, no imaginário surrealista, está relacionado com o conceito de um, na medida em que exercitava a imaginação dos seus participantes aumentando
máquina, utilizado de forma contundente por seus representantes: movimento assim seu repertório imagético e simbólico.
perpétuo, automatismo, mecanismo, criação mágica de seres com autonomia Sob essa perspectiva, os cadavres exquis assumem uma importância, em
existencial (CIRLOT, op. cit.: 387). especial na primeira fase do movimento, que até então não foi estudada e pode render
A roda é um símbolo bastante complexo e que possui inúmeros significados, uma excelente pesquisa, no sentido de buscar essas influências nas obras individuais
mas um deles que se adapta a situação surrealista é o conceito de roda como um dos principais participantes do jogo. Sendo que analisar o processo inverso, das obras
símbolo privilegiado do deslocamento, da superação das condições de lugar e do individuais ao cadavres exquis, também seria bastante produtivo, a fim de descobrir
estado mental que lhe é correspondente (REVILLA, 1990: 896), portanto, que pode se os símbolos que aparecem são mesmo frutos do acaso ou na verdade frutos de
ser lido nesse caso como a passagem do consciente ao inconsciente, do racional ao mentes impregnadas pelo labor diário. Muito provavelmente se encontrará um feed-
intuitivo. back entre a produção coletiva e a individual. Averiguar justamente quais são os
Os guarda-chuvas além de significarem proteção também têm sentido fálico. pontos desse intercâmbio é um tema interessante para investigações mais profundas
Segundo Cirlot (op.cit.: 360), o guarda-chuva é um símbolo paternal, por incluir sobre os cadavres exquis, seus antecedentes e suas influências na produção surrealista.
acentuada nota de sexualismo viril e a idéia de proteção, como também de luto. As
mesas são bastante diversas tanto em forma, tamanho ou colocação, esse símbolo
significa lugar de encontro tanto físico como espiritual (REVILLA, op. cit.: 255), ou
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DEXEUS, Victoria. La maga y la musa. In: AA.VV. París i els surrealistes. Catálogo de exposição.
Barcelona: CCCB, 2005.
FACULDADE INAP

CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.

AULA DOS CADAVRES EXQUIS


Trabalho: Os praticantes deverão produzir uma estampa a partir
FACULDADE INAP
dos dados obtidos nos exercícios preparatórios e aplicá-la em peças
CURSO: DESIGN GRÁFICO como, por exemplo, capas de caderno ou agendas..

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. Especificações Técnicas: Formato A4 em cores.


AULA DO PAUL KLEE
Música: Concertos para violino.
Objetivos:
1 – Produzir uma estampa e aplicá-la a um objeto como, por Sugestões:
exemplo, capa de caderno ou agenda.
2 – Desenvolver a percepção de forma e espaço. Livro: KLEE, Paul. Diários. Tradução de João Azenha Jr. São
3 – Trabalhar os conceitos de contraste, equilíbrio e harmonia. Paulo: Martins Fontes, 1990. (Coleção a).
4 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e Filme:
das possibilidades de produção.

Materiais: papel sulfite formato A4, dados, réguas, gabarito de


formas geométricas, cola, tesoura e materiais para arte-final.

História da Arte: Paul Klee23


Apreciação: Pinturas de Paul Klee.
Composição: Linhas, formas geométricas, contraste, harmonia.

Roteiro:
1 – Exibição e comentários sobre a obra de Paul Klee.
2 – Demonstração dos exercícios preparatórios.
3 – Divisão do papel em 16 partes (quadrícula).
3 – Elaboração do trabalho a partir dos dados obtidos nos exercí-
cios preparatórios.

23
PAUL Klee. Madri: Globus Comunicacióm. 1996. (Grandes Pintores do Século XX).
FACULDADE INAP falar de pintura moderna: a autonomia da obra de arte em relação às normas que re-
gem o mundo natural. Mas enquanto os cubistas, por exemplo, entendiam esta inde-
CURSO: DESIGN GRÁFICO pendência como requisito indispensável que habilita a pintura a proporcionar uma
representação mis rigorosa do mundo, Kandinsky e os outros artistas influenciados
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. pela teosofia e pelo espiritismo viam nela uma espécie de via iniciática para um de-
terminado universo celeste.
AULA DO PAUL KLEE
UMA ARTE TRASNCENDENTE
PAUL Klee. Madri: Globus Comunicacióm. 1996. (Grandes
Klee situa-se numa posição intermediária. Para ele a pintura é uma linguagem
Pintores do Século XX). específica que torna possível a mudança da “visão externa” para a “contemplação
interna”. Daí a importância da sensação, estado híbrido que tanto pertence ao objeto
O Universo Paralelo de Paul Klee percebido como ao sujeito que o percebe. Os dados da experiência sensorial são a
matéria com que se elabora o quadro, mas este supõe já uma ordem das coisas dife-
De entre as grandes personalidades da arte do século XX, a de Paul Klee é,
rente da natureza, sobre o qual exerce uma certa capacidade de revelação e transcen-
sem dúvida, uma das mais difíceis de enquadrar em termos de tendência, estilo ou
dência: “a arte – disse Klee – não reproduz o visível, mas torna-o visível”.
escola. Isto não quer dizer que Klee fosse um solitário que desenvolvia a sua obra à
margem da vanguarda artística; pelo contrário, durante a sua formação beneficiou do DESCOBRIR A COR
inquieto e agitado ambiente artístico que reinava em Munique nas duas primeiras
décadas do século. Participou, embora com modéstia, em O Cavaleiro Azul, a aven- Isso significa que a pintura participa de alguma forma da natureza, mas tam-
tura empreendida por Kandisnky e Franz Marc que conferiu credibilidade à pintura bém da fantasia, da psicologia e, inclusivamente, da antropologia. O que em Kan-
abstrata e, durante dez anos, foi um dos mestres da Bauhaus, a instituição fundada por dinsky e outros pioneiros da abstração remete sempre para um mundo espiritual inde-
Walter Gropius para aproximar a vanguarda artística à indústria na Alemanha de entre terminado, de natureza mística e religiosa, em Klee adquire vertentes mais variadas:
- guerras. líricas, poéticas e, até, humorísticas. O seu registro é mais amplo do que o de qualquer
um dos pintores com os quais a sua linguagem tem alguma relação e aborda domínios
EXPERIÊNCIA E NATUREZA que pareciam vedados à pintura não objetiva, como a reflexão crítica sobre o indiví-
duo e o poder que os cinco quadros sobre pontes e viadutos, pintados em 1937, encer-
De uma forma ou de outra, esteve sempre vinculado às iniciativas surgidas da
ram. Como tantos outros artistas modernos alemães, Klee sentiu de uma forma muito
corrente da modernidade artística no âmbito alemão, no entanto, a sua obra é irredutí-
direta a política cultural do nazismo, que o privou da sua cátedra em Dusseldorf, con-
vel pela sua singularidade. “Sou incompreensível do lado de cá”, escreveu Klee em
fiscou mis de cem obras suas dos fundos dos museus alemães e incluiu outras dezes-
seu diário no início de um célebre parágrafo que o seu filho mandou gravar na sua
sete na exposição “Arte Degenerada”, na qual um dos seus quadros era comparado a
sepultura em jeito de epitáfio. Esta afirmação coloca a sua pintura fora do terreno da
um desenho feito por um esquizofrênico. Klee reclamava-se “do lado de lá”, mas
representação objetiva, no âmbito espiritual sobre o qual Kandinsky e outros teoriza-
calhou-lhe viver numa época em que era difícil escapar à pressão direta dos aconteci-
ram e do qual nasceu a abstração. Contudo, Klee só seguiu em parte os seus passos. A
mentos. Embora Klee nunca tentasse codificar formalmente a sua linguagem pictó-
sua pintura não é exatamente abstrata, e não tanto porque nela aparecem com freqüên-
rica, os seus testemunhos acerca do funcionamento dos seus vários componentes são
cia vestígios figurativos – personagens, objetos, árvores, ideogramas – mas sim por
explícitos. Superfície pintada é uma espécie de topografia plana de sensações e signi-
uma vinculação com a experiência sensorial da natureza à qual nunca renunciou. Em
ficados. Os seus quadros tornam-se esquemas ou mapas de um universo invisível
1905 já se tinha apercebido de que “o objeto em si está certamente morto”, mas não “a
construídos a base de elementos visíveis. A cor, veículo primordial da sensação, é o
sensação que o objeto provoca”. O que Klee divide com Kandinsky é a inquietude
mais importante: Klee reconhece-se a si próprio como pintor ao “descobri-la” em
que, por um caminho ou por outro, assinala a linha divisória a partir da qual podemos
Tunes, em 1914. A cor dá a estrutura do quadro; de fato, as pinturas anteriores a Tu- FACULDADE INAP
nes são experiências sobre contrastes de luz e sombra. Por isso preferia a aquarela,
com os seus tons mesclados e vaporosos, à cor timbrada e saturada que quase todos os CURSO: DESIGN GRÁFICO
expressionistas alemães anteriores à Primeira Guerra Mundial tomaram dos fauves
franceses, e que tecnicamente se obtém melhor do óleo. A aquarela traduz melhor as MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO.
idéias de luz e espaço que Paul Klee associou sempre à cor.
AULA DO PAUL KLEE
RIQUEZA PLÁSTICA

A linha assinala percursos e tensões na superfície – a idéia de tempo, de que as


coisas não ocorrem simultânea, mas sim sucessivamente no quadro, é importante para
Klee -; mas também produz configurações com significado, muito figurativo – perso-
nagens, objetos -, muito ideogramático – uma superfície cruzada de linhas como um
campo arado, segundo o exemplo do próprio pintor. Esta última faceta domina os
pictogramas e hieróglifos dos seus últimos anos. Klee integra assim a sua anterior
formação como desenhador e gravador na linguagem pictórica. O resultado é uma das
obras mais ricas e singulares da arte moderna; uma das poucas que, conformando um
inimitável universo próprio e paralelo ao da experiência, determinam o seu destino.

DADOS COMUNS:

1 – DIAGONAL
2 – HORIZONTAL
3 – VERTICAL
4 – DIAGONAIS CRUZADAS
5 – ARCO
6 – CRUZ
Música: Música Medieval.
FACULDADE INAP
Sugestões:
CURSO: DESIGN GRÁFICO

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. Livro: BOCCACCIO. Giovanni. Decamerão. São Paulo: Abril Cultural,
1970. (Os Imortais da Literatura Universal).
AULA DA HERÁLDICA Filme: O NOME DA ROSA. Direção: Jean-Jacques Annaud. Alemanha:
1986. 130 mim.
Objetivos:
1 – Produzir um brasão familiar obedecendo às regras da heráldica.
2 – Trabalhar os conceitos de simetria e escalas tonais.
3 – Desenvolver a criatividade através do lúdico, da pesquisa e das possibilida-
des de produção.

Materiais: papel sulfite formato A4, nanquim, hidrocores ou canetas esfero-


gráficas.

História da Arte: Estética Medieval e Renascentista24.


Apreciação: Iluminuras.
Composição: Simetria, escalas tonais.

Roteiro:
1 – Exibição das imagens e comentários sobre as iluminuras.
2 – Demonstração de brasões.
3 – Exercícios de cruzamento de linhas para obtenção de tonalidades e desen-
volvimento de escalas tonais25.

Trabalho: Os praticantes deverão desenvolver um brasão familiar através de


pesquisa dos aspectos simbólicos de seus nomes e sobrenomes.

Especificações Técnicas: Formato 10x15 (mim), P&B.


24
OSBORNE, Harold. A Estética Medieval e Renascentista. In: OSBORNE, Harold. Estética e Teoria da
Arte. 3.ed. São Paulo: Cultrix, 1978. P. 118 – 125.
25
Baseado na obra de Sol LeWitt “Quatro tipos básicos de linhas retas e suas combinações”, de 1969. In:
ARCHER, M. Arte Contemporânea: uma história concisa. São Paulo: Martins Fontes, 2001. (Coleção a).
p.74.
FACULDADE INAP um padrão estético notório e discutiam-se as obras de arte em relação os empregos a
que elas se poderiam prestar. Do ponto de vista da estética moderna, os valores que se
CURSO: DESIGN GRÁFICO lhes atribuíam eram instrumentais e não intrínsecos.

MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. O Caráter Teológico da Estética Medieval

AULA DA HERÁLDICA “Dir-se-ia que os valores estéticos conscientes”, escreveu o Sr. Frank P.
Chamber em The History of Taste (1932), “faltassem na chamada Era do Obscuran-
OSBORNE, Harold. A Estética Medieval e Renascentista. In: tismo, ou Idade Média, da Europa ocidental, como faltaram no fastígio da era grega”.
OSBORNE, Harold. Estética e Teoria da Arte. 3.ed. São Paulo: Cultrix, E André Malraux escreveu quase a mesma coisa: “A Idade Média tinha tanta idéia do
1978. P. 118 – 125. conceito que exprimimos pela palavra “arte” quanto os gregos e os egípcios, que não
possuíam palavra alguma para exprimi-la”. Para o pensamento medieval o conceito de
A atitude naturalista na arte parece como um aspecto da atitude científica di- beleza não implicava nenhuma conexão especial com o que denominamos belas-artes.
ante da natureza, surgida no auge da civilização grega. É um hábito mental tratar a Na verdade, dentre as belas-artes, só a música figurava entre as “artes liberais” e a
natureza como algo externo ao homem e separado dele, algo para ser estudado e ob- poesia era um complemento da lógica. Mesmo em relação à música, pregava-se a
servado com objetividade científica, senhoreado e aproveitado pelo homem, algo teoria matemática das escalas musicais, mas não se dava importância à composição
capaz de inspirar reações emocionais, ou de ser espelhado, lisonjeado ou melhorado nem à execução. “A recitação do canto-chão”, diz Frank Lloyd Harrison (British
pela arte. No pensamento chinês, a natureza e o homem não se achavam em oposição. Journal of Aesthetics, vol. 3, n.º 2), “era um dos elementos de um ciclo de atos rituais,
Presumia-se que o homem fosse parte integrante de uma natureza mais estupenda: os cujo ensaio não tinha quaisquer conotações estéticas notórias no sentido moderno.
mesmos processos e ritmos da vida repassavam o homem e a natureza. O ideal era Não visava, como tem visado grande parte da música religiosa a partir da Reforma, a
conseguir a unificação do indivíduo com o princípio cósmico, e não dominá-lo, repro- despertar sentimentos devotos ou místicos numa congregação. A presença ou ausência
duzi-lo ou observá-lo cientificamente. de ouvintes era totalmente irrelevante para a sua função como parte de uma cerimônia
Durante a Idade Média, no Ocidente, o ponto de vista naturalista herdado da litúrgica”.
Antiguidade clássica foi temperado pela doutrina teológica, que considerava tanto a Na Idade Média, tornou-se a estética um ramo da teologia e perdeu todo e
natureza quanto o homem criação de uma divindade suprema. A natureza da Divin- qualquer vínculo incipiente com atividade dos connoisseurs, que adquirira durante o
dade manifestava-se em Sua criação e a natureza externa passou a ser considerada Império Romano. Para o espírito medieval, o mundo visível era um símbolo do divino
como símbolo para o homem, da Natureza Divina. Em plano menos filosófico, as e não teria significado nem importância senão como símbolo. As coisas criadas só
obras de arte na era bizantina assumiram o caráter de teofanias, manifestações de uma possuíam realidade enquanto manifestações da Natureza divina e conducentes a uma
Divindade transcendente, ou de ícones, objetos através dos quase a devoção do ho- apreensão dessa Natureza. Como todas as coisas criadas, a obra de arte era havida por
mem poderia ser canalizada para o Deus supremo. Na Europa ocidental, a arte cristã imagem ou símbolo, isto é, teofania. Alcançava o seu propósito como revelação da
assumiu um caráter mais diretamente didático ou imprimiu-se-lhe uma função deco- Natureza Divina, não pela representação naturalista do mundo perceptível, mas evi-
rativa para glorificar a Igreja na terra. Em ambas essas manifestações se impôs à ati- denciando, na própria estrutura, a harmonia ou consonância matemática e intelectual-
tude naturalista precedente uma concepção religiosa da arte, que, todavia, não a modi- mente apreensível entre partes dissímeis, em que se supunha residisse a beleza de todo
ficou de todo. o universo. Não se concebia a beleza como valor independente de outros valores se-
De mais a mais, como aconteceu na Antiguidade clássica, apesar da bela eflo- não como a radiância da verdade (splendor veritatis) que fulgia através do símbolo,
rescência da criação artística, as obras de arte não eram avaliadas por padrões estéti- que era também esplendor da perfeição ontológica, a qualidade das coisas que lhes
cos, nem apreciadas pelo seu poder de evocar o prazer estético, mas por outros propó- reflete a origem em Deus e nos permite, através delas, lograr a visão direta da perfei-
sitos secundários, a que elas serviam; nessas condições, durante a Idade Média, faltou ção da Natureza divina. Assim sendo, tratava-se de uma qualidade finalmente apreen-
sível mis pela razão do que pelos sentidos. Máximo, o Confessor, definiu tipicamente teológico estranho e alheio a considerações estéticas. Enquanto que, para os chineses,
a “visão simbólica” como capacidade de apreender, através dos objetos da percepção o objeto de arte era, ao mesmo tempo, resultado e expressão da alcançada unidade
dos sentidos, a realidade invisível do inteligível que se esconde por trás deles. Com entre o homem e a natureza, no pensamento medieval era uma teofania, revelação ou
efeito, o motivo dominante da vida e da filosofia religiosas, durante toda a Idade manifestação de um Deus acima da natureza e intelectualmente apreensível, de sorte
Média, foi o desejo de ascender do mundo sensual das sombras e das imagens à con- que a maneira estética de estabelecer contato com as obras de arte estava sempre su-
templação direta da perfeição divina, a fim de mirar a sagrada realidade da verdade bordinada à maneira religiosa. Até o fim de sua vida, Santo Agostinho permaneceu
suprema com os olhos do corpo. fiel à crença de que o “número” pode levar o espírito, d percepção sensual das coisas
Essa atitude se opunha frontalmente ao naturalismo da Antiguidade e ao prazer naturais, à apreensão da verdade invisível de Deus. Otto Von Simson observou muito
clássico proporcionado pela beleza sensual, física, manifesta na arte e na literatura dos bem em A Catedral Gótica (1956): “N admiração pela sua perfeição arquitetônica, as
antigos, embora suposta na sua teoria. Aqui e ali, nos escritos dos primeiros Padres da emoções religiosas ofuscavam a reação estética do observador. O mesmo aconteci
Igreja, topamos com indícios acidentais de apreciação das belezas da natureza to com os construtores das catedrais”. Considerava-se a catedral não só como modelo do
intensa quanto a que mais fosse na literatura pagã. Mas esse sentimento veio a consi- cosmo, visto que se destinava a reproduzir, em seu plano e em suas proporções, a
derar-se suspeito e todo o fascínio do prazer encontrado no gozo sensual do mundo estrutura matemática do universo criado, mas também como imagem da Cidade Ce-
das coisas naturais passou a ser condenado por motivos tanto moralísticos quanto leste, da perfeição do mundo futuro. Era um lugar-comum dizer-se que a matemática
teológicos. Os trechos das Confissões de Santo Agostinho, em que ele repudia o seu da teoria musical encerrava um princípio cósmico universal de harmonia. A Música
juvenil pendor para a beleza natural e para o encanto sensual da música, pairou como enchiriadis (860 A.D) encontrou as razões mais profundas e divinas, inspiradoras das
manto mortuário sobre o pensamento medieval. Verdadeira beleza, supunha-se, harmonias musicais, nas leis eternas do cosmo. Na introdução ao seu Speculum Musi-
transcende a esfera sensual, pertence apenas a Deus e é apreendida, ou através da cae, escreveu Jacobus de Liège: “Compreendida num sentido geral, a música (isto é, a
intuição intelectual, ou , ainda mais perfeitamente, através da intuição mística. Mani- teoria musical) aplica-se objetivamente a todas as coisas, a Deus e às coisas criadas,
festa-se na harmonia matemática, proporção e “consonância” não produzidas pelo incorpóreas e corpóreas, às ciências assim teóricas como práticas”. Abelardo aventou
encanto sensual. Desacorçoava-se o gozo da beleza sensual e o deleite buscado nas que as proporções do Templo de Jerusalém eram as das consonâncias musicais e que
coisas naturais por si mesmas. Essa atitude está argutamente resumida nas palavras de essa perfeição sinfônica fazia dele uma imagem do céu. Escopo Erígena asseverava
Escoto Erígena: “Não é que a criação seja má, nem mesmo seja mau o conhecimento que pelas leis da harmonia e d a proporção se compõe todas as contrariedades e disso-
dela; mau é o perverso impulso que leva o espírito sensato a abandonar a contempla- nâncias entre as entidades individuais, e nessa lei musical enxergava a fonte de toda a
ção do seu autor e voltar-se, com apetite lascivo e ilícito, para o amor da matéria sen- beleza. “Pois beleza alguma se realiza senão pela congruência de similares e dissimi-
sível”. Motivos semelhantes induziram São Bernardo a tentar insensibilizar-se à be- lares, de contrários e opostos” (De divisione naturae, V, 36).
leza natural por amor de Cristo. Em 1335, o poeta Petrarca, que vivia à frente do seu Para o espírito medieval, as qualidades sensuais do mundo visível eram sus-
tempo, sentiu prazer estético ante a grandiosidade do Monte Ventoux, mas, perce- peitas: uma atração, um anteparo entre o homem racional e a realidade divina. A ver-
bendo seu erro, tomou de um exemplar das Confissões e sufocou os sentimentos de dadeira realidade apreensível estava na consonância, nas harmonias formais. Supu-
prazer:”...zangado comigo mesmo por não cessar de admirar coisas da terra, em lugar nha-se que o artista poderia criar genuinamente essa consonância ou beleza matemá-
de lembrar-me de que a alma humana, sem comparação, é o objeto de admiração. tica englobando tais proporções no objeto de arte sem visar a uma imagem exata ou
Mais uma vez desci a montanha, olhei para trás, e o píncaro altaneiro me pareceu ter ilusória das coisas visíveis.
pouco mais que um côvado de altura, comparado com a sublime dignidade do ho- Por conseguinte, se concebermos a estética como ramo da filosofia especial-
mem”. mente vinculado à teoria das belas-artes ou mesmo se a concebermos como teoria
O imenso abismo que medeia entre essa atitude, notável, ainda que relutante,, autônoma de beleza, não poderemos falar com propriedade em estética medieval.
expressão da ortodoxia medieval, e a atitude chinesa em face da natureza não precisa Durante o período medieval, a estética foi um ramo da filosofia orientada para a teo-
ser posto em destaque. À semelhança da chinesa, a estética medieval se opunha ao logia, sem conexões essenciais com as belas-artes nem com s belezas físicas da natu-
naturalismo. Mas, à diferença d chinesa, não passava de um apêndice de um sistema reza.
Mil anos depois, Vasari põe na boca do pintor florentino Buonamico Cristo-
Função Didática e o Critério Moral fano, cognominado Buffamalco, estas palavras: “Não pensamos em outra coisa senão
em pintar santos, tanto homens quanto mulheres, nas paredes e nos quadros... e assim
Num plano algo diferente, a arte eclesiástica na Idade Média possuí um caráter tornamos os homens melhores e mis devotos aos grandes, a despeito dos demônios”.
francamente didático. Encaradas, a princípio, com suspeição como relíquia e acervo Na teoria literária também já se convertera em lugar-comum a frase de Horácio se-
do paganismo, as artes foram gradativamente aceitas e toleradas à proporção que a gundo a qual a função da poesia é instruir e aperfeiçoar recreando. A doutrina nem
Igreja entrou a compreender-lhes a utilidade na educação de um populacho rude e sempre foi sustentada de forma tão crua como quando Enéias Sílvio Piccolomini es-
iletrado nos rudimentos da moral e da doutrina cristã. Este foi particularmente o caso creveu, em seu tratado De Liberorum Educatione (1450), que só se deveria conservar
do Ocidente, mas no Oriente também não faltou o motivo didático. O Professor P. A. dos poetas o que eles escrevem louvando a virtude e verberando o vício. Bernardino
Michelis principiou com estas palavras um artigo sobre “A arte bizantina como arte Daniello proclamou, de fato, um ponto de vista que perdurou por mais de um milênio
religiosa e didática” (British Journal of Aesthetics, vol. 7, n.º2): “A arte bizantina, ao observar: “A poesia pode ensinar com maior amenidade que o filósofo, disfarçando
sobretudo a pintura bizantina, era uma arte não só religiosa, mas também didática. lições proveitosas em ficções e fábulas, como médicos disfarçam as pílulas reves-
Tinha por objetivo ensinar, por meio dos seus ícones, a religião cristã ortodoxa até aos tindo-as de açúcar”. Em estilo semelhante, Boccaccio justificou a poesia dizendo que
analfabetos”. Segundo as palavras de Basílio, o Grande: “O que a narração verbal “ela afasta, pela sedução, as almas nobres das que se estão perdendo sob a doença
apresenta aos ouvidos, a imagem silenciosa revela pela imitação”. O ícone foi cogno- moral” e em sua Apologie for Poetrie, dois séculos depois, Sir Philip Sidney a des-
minado por Grogório de Nisa um “livro portador de linguagem”, que servia de instruir creve como “deleite que gera virtude”. Algo impaciente com a tendência moralística,
até iletrados pela simples contemplação da pintura. Em A Teoria Social da Arte ob- Tasso confessa: “Gastei a maior parte dos meus esforços procurando agradar, o que
servou Arnold Hauser (1951): me parece mais necessário e também difícil de conseguir; pois descobrimos pela ex-
periência que inúmeros poetas podem instruir-nos e beneficiar-nos muitíssimo mas,
Na opinião da Idade Média, a arte seria supérflua se toda a gente soubesse ler e seguisse uma corrente sem dúvida, nos proporciona pouquíssimo prazer”.
abstrata de raciocínio; a arte foi originalmente considerada como simples concessão às massas ignorantes,
Essa concepção didática da arte pode ser comparada e contrastada com o crité-
tão facilmente influenciáveis pelas impressões dos sentidos. Não se permitia, por certo, que ela consistisse
num “mero prazer para os olhos”, como disse São Nilo. O caráter didático é o traço mais típico da arte rio moral que predominou na Antiguidade. Platão admitia alguns modos de música
cristã, em confronto com a dos antigos. por seus efeitos fortalecedores e estimulantes sobre o caráter e condenava outros por
darem azo a excessos de sentimentalismo. Reprovava o drama, de um modo geral,
A concepção didática da função da pintura pode ser ilustrada pela narrativa po- porque este, no seu entender, estimulava o hábito d compaixão. Os gregos eram um
ética, escrita nos primeiros anos do século V, pó Paulino, Bispo de Nola, preocupado povo emocionalmente instável e em toda a sua filosofia social se mostravam obceca-
com s danças e folguedos em que o seu rebanho passava horas de vigília durante as dos pela necessidade de refrear uma tendência ao sentimentalismo, subordinando-o ao
festividades do santo padroeiro da sua igreja e que, desejoso de incutir-lhe melhor egoísmo racional num contexto social e apresentando a temperança e a moderação
disposição de espírito, teve a idéia de cobrir as paredes da igreja com pinturas sacras, como o ideal moral. Aristóteles adotou a linha oposta de Platão e em sua doutrina da
edificantes e atraentes, na esperança de que “as formas e cores se apoderassem dos catarse afirmou que as artes proporcionam uma vazão pra emoções represadas, que
espíritos pasmados dos camponeses”. Pois explica ele: não têm plena vazão natural nas condições d vida social. Mas conquanto as conclu-
sões fossem contrárias, o critério era idêntico. Avaliavam-se as artes em função dos
Enquanto a multidão, alternativamente, mostra os quadros uns para os outros, ou se põe a examiná-los seus efeitos de aprimoramento ou aviltamento do caráter do indivíduo como unidade
espontaneamente, já demora mis do que antes a pensar em festas, e se alimenta com os olhos em vez de
social e dos seus supostos efeitos sobre o próprio organismo social.
alimentar-se com os lábios. Dessa maneira, enquanto se maravilha com as pinturas, esquece a fome, um
hábito melhor se apodera gradualmente de todos, que ao lerem as histórias sagradas, aprendem com os
exemplos piedosos quão estimáveis são as santas ações e quão satisfatória para a sede é a sobriedade.
(Paulinos Nolanus, Poema de S. Fel. natal., ix 541 e seguintes)
FACULDADE INAP rior arredondada, inglês (de forma clássica ligeiramente modificada por saliências
angulares na parte superior, utilizado nas armas imperiais do Brasil), polônio, alemão,
CURSO: DESIGN GRÁFICO suíço.
Quanto à posição, os escudos podem ser naturais (ponta na vertical), ao balom,
MATÉRIA: EXPRESSÃO GRÁFICA E CRIAÇÃO. isto é, à moda valona, inclinado à esquerda ou à direita (à destra ou à sinistra), acosta-
dos, ou seja, ligados um ao outro.
AULA DA HERÁLDICA Dividem-se os escudos em seis partes: chefe ou parte superior, um terço da
dimensão total, no sentido horizontal; ponta, parte inferior, nas mesmas condições;
destra, flanco direito; sinistra, flanco esquerdo; campo, parte interna; abismo ou cora-
HERÁLDICA. In: ENCICLOPÉDIA Barsa. São Paulo: Encyclo-
ção, parte central. Esquerda e direita correspondem, num escudo, à esquerda ou à
paedia Britannica do Brasil Publicações Ltda., 1988. v. 8. p. 505 – 507. direita de um cavaleiro que acaso o usasse, e para o qual se acha hipoteticamente
voltado o observador.
Arte de elaborar ou interpretar as armas e os distintivos da nobreza, sobretudo Os tipos de escudos variam enormemente, existindo por exemplo escudos par-
os brasões. O vocábulo heráldica deriva do alemão Herald, anunciador, arauto. Servia tidos (divididos ao meio:partidos em pala, isto é, verticalmente do chefe à ponta; em
o brasão para identificar aquele que o ostentava, pois, como escreveu Granier de Cas- cortado, quer dizer, horizontalmente, de flanco a flanco), terçados (divididos em três
sagnac, os brasões constituem uma verdadeira linguagem, com sintaxe, gramática r partes), escartelados (em quatro partes), agironados (divididos em oito girões por duas
ortografia, cabendo à heráldica o poder de lê-la e escrevê-la. diagonais cruzadas, uma vertical e uma horizontal em cruz), em coração, isto é, escu-
A heráldica surge no tempo das Cruzadas, mas só a partir do séc. XIII obedece dos com outro escudo ao centro.
a preceitos rígidos e gerais. Foi então que cada família passou a dispor de seu brasão, Chamam-se peças nobres do escudo as suas divisões principais. Nobres de
propriedade pessoal e intransferível. primeira ordem são o chefe (cabeça), a pala (que ocupa um terço do escudo, verti-
A heráldica tem vocabulário próprio, cujo sentido convém esclarecer. Assim, calmente, na parte central), a fixa (ocupando um terço do escudo, horizontalmente, na
metais, cores e peles são, todos eles, cores ou, tecnicamente, esmaltes: o jalne (ouro) e parte central), a banda (um terço do escudo, diagonalmente, da destra à sinistra), a
a prata são esmaltes chamados metais; o goles (vermelho), o blau (azul), a sinopla barra ou contrabanda (idem, da sinistra à destra) e ainda a cruz, a aspa e a asna. De
(verde), o sable (negro), o sanguinho (violeta ou púrpura) e o laranja são designados segunda ordem são a bordadura, a dobrecruz (que divide o campo em seis partes), a
simplesmente como cores; ao grupo das peles, afinal, pertencem o arminho, o contra- campanha, o quartel-livre, a perla, que tem forma de Y.
arminho, o veiros e o contraveiros. A regra básica d heráldica é não por nunca num Certas famílias castigadas pelos soberanos têm suas peças diminuídas (que-
brasão metal sobre metal, cor sobre cor e pele sobre pele. Os brasões que não obede- bras): correspondem também certas diminuições a modificações de importância nos
cem tal regra ou são anteriores à codificação heráldica, ou falsos. Todos os esmaltes atributos heráldicos. As principais diminuições são: a cogula em lugar do chefe, a
possuem significado simbólico: o jalne simboliza a força, a riqueza; o blau, a justiça, divisa no da faixa, a verga no da pala, a escora no da aspa.
beleza; o sable, a prudência, a desilusão, e assim por diante. São às vezes chamadas peças nobres de terceira ordem certas peças comuns
Todo brasão possui elementos (1) internos, que dizem respeito à família e aos aos brasões mais antigos: a lisonja, a fusela, a mapla, a rustra, todas em forma de
feitos de quem o exibe, e (2) externos, que traduzem seu grau nobiliárquico, cargo, losango; ainda a bilheta, o besante, a arruela, o gonzo, o hamaide.
honrarias, posição. Apenas os elementos internos são inscritos no brasão; os externos Entre os atributos heráldicos, o mais usado é a cruz (cruz latina, grega, em tau,
adornavam a cimeira dos elmos. em forca, de Santo André, de Lorena, etc.), que data não raro do tempo das Cruzadas
Varia enormemente a forma dos escudos: chama-se escudo clássico ou francês, (templária, de Malta, teutônica, de Cristo, de Avis, de Calatrava). Outros atributos são
o retangular, com bico regular à ponta; em lisonja, aquele que tem forma de losango, anjos, querubins, serafins, vitórias, virgens, gigantes, corações, mãos, pés, leões, leo-
brasão eminentemente feminino. Há ainda escudos de tipo oval ou eclesiástico, qua- pardos, elefantes, lobos, serpentes, golfinhos.
drado (tornes), espanhol, português ou flamengo, que é retangular, com a parte infe-
São elementos exteriores do escudo as figuras e os ornatos que o ladeiam ou
contornam. São eles: as coroas (imperial, real, principesca, ducal, de marquês, de
conde, de visconde, de barão, de vidama, virol), os elmos (de imperadores e reis, de
príncipes), os lambrequins (manto de púrpura e arminho, para os soberanos), o pa-
quife, ou ornato em forma de folhagem, que descia do elmo.
Tais elementos referem-se à nobreza feudal; outros dizem respeito à militar
(condestável, duas mãos com espadas ao lado do escudo; general, duas bandeiras
cruzadas sob a ponta do escudo); à eclesiástica (papa, tríplice coroa; cardeal, cruz
patriarcal e o chapéu com 15 borlas em vermelho), a togada (chanceler, duas maças
cruzadas sob a ponta do escudo; juiz, a toga e capelo sob o escudo).

Sol LeWitt: “Quatro tipos básicos de linhas retas e suas combinações”, de 1969.

Eduardo Bernardes: Exercícios de cruzamento de linhas e escalas tonais com


nanquim, 2007.

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