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2 0 - J U L H O DE 2010
O risco como poética artística
Leandro Furtado
O trabalho atenta para a problematização de um dos fundamentos das linguagens
artísticas: o desenho. Pensar mais do que um simples trazê-lo como matéria dos
sentidos é também questionar e expandir seu potencial como construtor de Sentido.
Ser no mundo, origem, sentido, desenho.
O primeiro desenho nas paredes das reira que nos traz um reconhecimento de
cavernas fundava uma tradição porque pertencimento ao mundo.
recolhia outra: a da percepção. A qua-
A linguagem do desenho de certa forma e
se eternidade da arte confunde-se com
por muito tempo foi apresentada em nossa
a quase eternidade da existência hu-
história da arte como acondicionante para a
mana encarnada e por isto temos, no obra de arte, um a priori.
exercício de nosso corpo e de nossos
sentidos, com que compreender nos- Era como um simples esboço de arte para
sa gesticulação cultural, que nos inse- as demais linguagens artísticas, enfim, uma
re no tempo.1 preconcepção de arte. Percebemos então
que desenho se dá em muito tempo como
Ao analisarmos o percurso do homem no uma preconcepção – e em preconceito –
mundo, verificamos que desde sempre ele do que seja obra de arte.
teve necessidade de exteriorizar e comuni-
Mais tarde, em meio às transformações
car o que sente e pensa. O percurso de vida
surgidas na arte moderna diante das clássi-
e evolução dos indivíduos e das culturas pro- cas categorias acadêmicas, se manifestaria
jeta-se em fatos, obras, objetos, marcas que novo e diferente interesse pelo desenho,
são registradas e permanecem materializa- mesmo aquele ainda incipiente e determi-
das sob diversas formas e ações ou até mes- nado pela pintura e escultura: até os esbo-
mo por pensamentos. Se a arte existe no ços mais sumários passaram a ser vistos
pensamento do artista, supõe-se que exista como fonte para o estudo e a avaliação das
sob condições reais, servindo a seu próprio obras e dos artistas.
fazer. A relação do pensamento com a arte
coloca a questão de sua existência e de sua Segundo o crítico de arte Paulo Venancio
realização na relação com o fazer. (Influência poética: dez desenhistas contem-
porâneos. Rio de Janeiro: MAMM, 1996), era
O fascínio que sentimos perante obras ar- como se o desenho, em sua incompletude
tísticas, seja um desenho rupestre, gótico, de obra para não ser mostrada, como que
renascentista ou contemporâneo, faz-nos em um paradoxo, realmente mostrava ali
pensar acerca do que estará no cerne des- uma pista para a compreensão completa da
sas obras para provocar tal efeito. obra acabada a que ele dera origem.
Série Desenhonírico, Esse enigma que nos instiga pode conter o E logo, com o aparecimento da psicanálise,
2009, fotografias desencobrimento de uma verdade, uma cla- esses esboços seriam de fato transformados
Notas
1. Merleau-Ponty, Maurice. A linguagem indireta e as vozes
do silêncio. In: O olho e o espírito. São Paulo: Cosac &
Naify, 2004.