Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ELODIE BOUNY
RIO DE JANEIRO
2019
Elodie Bouny
Rio de Janeiro
2019
AGRADECIMENTOS
Ao meu parceiro de vida e de música Yamandu Costa, por confiar no meu potencial, por me
apoiar durante o processo de escrita desta tese e pelos conselhos sempre fundamentais. A
Antônio Jardim, pela orientação e escuta sempre atenta. Aos meus pais Francis Bouny e
Maria-Renée Bouny, pelos conselhos preciosos e pelo apoio constante. A Marcello
Gonçalves, pelas longas conversas, pelos conselhos preciosos, e pela amizade. A Marco
Pereira, pelos conselhos sempre sinceros e generosos e pela amizade. A Zé Paulo Becker,
Beth Marques, Luis Leite, Alessandro Soares e Pablo Márquez pelas conversas sempre
instigantes e pela amizade. Aos meus professores da Escola de Música da UFRJ: Marcos
Vinicius, Carlos Almada, Ana Paula Mattos, Márcia Taborda, Miriam Grosman. Aos colegas
Humberto Amorim, Paulo Pedrassoli, Marcus Ferrer, Graça Alan, Marcello Gonçalves,
Bartolomeu Wiese, Marcia Taborda e Celso Ramalho. Aos membros das bancas de
qualificação, monografia I, monografia II e defesa: Celso Ramalho, Humberto Amorim e
Eduardo Gatto, pela disponibilidade e orientação. Aos entrevistados Sérgio Assad, Egberto
Gismonti, Angelo Gilardino, Leo Brouwer, Clarice Assad, Dominique Chalhoub, Pablo
Márquez, Fabio Zanon, Edino Krieger, Lalo Schifrin, Mathieu Bonilla e Sylvain Cadars, por
dividir generosamente seus conhecimentos comigo. A Anat Cohen, André Boxexa, Nailson
Simões e Andrea Ernest-Dias, pelo olhar atento sobre a minha música. Aos compositores
Dušan Bogdanović, Carlos Franzetti, Clarice Assad, Sérgio Assad, Daniel Wolff, Marco
Pereira, por disponibilizarem as suas grades. A Rafael Iravedra, Marco Lima, Isabelle
Hernandez, Jerry TeMaat, Gil Costa, Tom Patterson, Jefrey Andrade e Beth Villela, pelo
apoio. A Gaëlle Solal, pela inspiração e pela amizade. A Clary Costa, pelo suporte. A Fran
Becher, Rosana Tiburcio, Dorothée Barberon, pelas revisões e tradução. A Mauro Rabacov,
pelos conselhos e pela escuta. A José Fernando Guitton Balbi, Graziela Wirtti e Jessyca
Matera dos Santos, pela ajuda. A Fernanda Moreira e a Aline Brufato. A todos que de perto
ou de longe, informal ou formalmente, me ensinaram música. O presente trabalho foi
realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –
Brasil (CAPES) – CÓDIGO DE FINANCIAMENTO 001.
Para aprender música precisamos conhecer as
regras.
Para criar música, precisamos esquecê-las.
BOUNY, Elodie. Nodus: o desafio de compor para violão e orquestra. Tese (Doutorado em
Música) – Escola de Música, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.
BOUNY, Elodie. Nodus: The challenge of composing for guitar and orchestra. Thesis
(Doctorate in Music) – School of Music, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2019.
Composers are faced with a challenge when writing for soloist guitar and
orchestra. The present thesis research focuses on some points concerning this challenge. By
nature, the guitar is an instrument that is barely able to stand out amongst an orchestra;
however, this barrier did not impede an ample production in the genre, especially after the
second half of the 20th century. Through the analyses of works composed for this type of
creation, this current research proposes strategies that may facilitate the writing for soloist
guitar and orchestra, with the goal of highlighting the timbre of guitar while establishing a
balanced resonance between both. The choice of orchestral textures is fundamental to
overcoming the challenge, as well as the technical knowledge in various areas, from the
writing for orchestra to the understanding of instrument amplification. The current thesis
document also includes a work composed by the author (Nodus), which was derived from this
research and the analyzed collected results throughout the process. The key features of the
present thesis may be summarized with the following questions: what are the strategies of
writing that will highlight the timbre of a soloist guitar when it is combined with the
orchestra? And, how to overcome the challenge of composing for guitar and orchestra?
1 INTRODUÇÃO
1
Estas expressões – sopros por um, por dois, por três – designam a quantidade de instrumentos que formam um
mesmo naipe. Sopros por dois significa que na orquestra serão duas clarinetes, duas flautas, dois oboés etc.
19
2
Informação obtida em uma palestra online dada por Fabio Zanon (ZANON, 2016a).
3
Violão de tamanho reduzido afinado uma terça acima da afinação tradicional.
4
Mauro Sergio Giuseppe Pantaleo Giuliani (1781-1829) foi um violoncelista, violonista e compositor italiano.
20
tanto para os instrumentistas quanto para os compositores. Em face disso, são apresentadas
algumas inovações criadas para aumentar o volume desse instrumento.
Nos métodos de instrumentação e orquestração podem ser encontradas várias
indicações sobre registro, tessitura, mistura entre os timbres da orquestra, tocabilidade do
instrumento, técnicas expandidas, curva dinâmica, entre outras características. Porém,
observa-se que o violão é pouco comentado nos métodos tradicionais de orquestração, nos
quais não existem exposições detalhadas das possibilidades técnicas do instrumento, nem
descrição de tessituras; isso provavelmente ocorre por não ser um instrumento da orquestra.
Com objetivo de suprir tal lacuna, farei essa descrição do violão e das suas possibilidades.
Ainda no segundo capítulo, são apresentadas algumas pesquisas que tratam
especificamente da mistura de timbres, uma vez que é, sem dúvida, um assunto relevante para
a presente pesquisa. Para concluir esse capítulo, destaca-se, ainda, como o timbre conseguiu
se impor na linguagem de alguns compositores e correntes desde o início século XX, se
libertando da sua subordinação à altura do som.
O terceiro capítulo apresenta um levantamento de peças para violão e orquestra e
uma análise de trechos de algumas delas para evidenciar configurações de instrumentação e
de orquestração favoráveis à valorização do timbre do violão, a partir das quais listo várias
texturas orquestrais e apresento diferentes estratégias de escrita favorável para a formação em
questão. Estas análises constituem uma parte importante da metodologia usada nesta tese.
As análises dessas obras são baseadas em gravações e grades das peças, tendo
sempre em mente que as primeiras podem não representar um retrato fiel devido à captação
ou mixagem que podem eventualmente ocasionar a supervalorização de um instrumento em
detrimento de outro. As análises se focam nos fenômenos de texturas orquestrais e
instrumentação; portanto, elementos temáticos, estruturais, melódicos ou harmônicos serão
observados eventualmente, de maneira secundária, já que não atendem diretamente às
questões levantadas na presente pesquisa. A metodologia de análise é baseada no tradicional
scoring de grades orquestrais, que consiste simplesmente em dissecar cada parte que forma a
textura orquestral analisada sob os aspectos diversos de técnica de escrita empregada para
cada instrumento (tessituras, dinâmicas, articulações, intensidade da textura, espectro
harmônico, dentre outros).
Além das análises de peças, foram realizadas doze entrevistas com personalidades
eminentes da área exclusivamente para a realização da presente pesquisa. São elas: Sérgio
Assad (compositor e violonista), Egberto Gismonti (compositor, pianista e violonista), Angelo
Gilardino (compositor e violonista), Leo Brouwer (compositor e violonista), Clarice Assad
21
5
A primeira tese no Brasil a apresentar uma tecnologia digital de áudio em uma pesquisa de Doutorado foi a de
Luis Leite, violonista, compositor e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, intitulada Música viva:
novas perspectivas sobre a prática da improvisação musical, de 2015. Nesta tese faço uso de QR Codes, tal
como Leite em sua tese, tendo sido, inclusive, aconselhada por ele a utilizar essa tecnologia.
22
Podemos dizer que sua origem remete ao Concertato do início do século XVII,
porém seu primeiro delineamento se dará após o advento do baixo contínuo e da
dicotomia instituída no período barroco entre acompanhamento e melodia e que se
manifestarão na música instrumental nas figuras dos solistas (concertino) e da
orquestra (ripieno7). Estamos nos referindo ao Concerto Grosso, forma de concerto
instrumental em que um pequeno grupo de “solistas” toca em contraposição a uma
pequena orquestra. As primeiras obras sob este formato datam de 1660 e figuram
entre seus principais compositores os nomes de Alessandro Stradella (1644-1682) e
Arcangelo Corelli (1653-1713). (ALMEIDA, 2006, p. 47-48, grifos do autor)
6
“De cette catégorie d'instruments, autrefois très nombreuse, il ne reste plus aujourd’hui que la mandoline, le
soprano de la famille des luths, et la guitare, toutes deux presque inusitées à l’orchestre et destinées à
disparaître dans un avenir peu éloigné. ...” (tradução nossa).
7
Ripieno se refere aos instrumentos que não tocavam nenhuma parte de solista, mas só em conjunto.
8
Rápido-lento-rápido, se refere à forma tradicional do Concerto, em três movimentos.
9
“Depois de anos de tentativas, por volta de 1680, aparece o Concerto Grosso, cujo responsável por fixar a
forma e o equilíbrio foi Corelli. No Concerto Grosso, um pequeno ensemble de músicos solistas, o concertinho,
se opõe à massa da orquestra. [...] O compositor alterna os soli e tutti como perguntas e respostas de um discurso
musical. [...] essa oposição é ainda mais marcada pelo fato que a escrita das partes dos solistas do concertino são
mais brilhantes e ornamentadas que as partes da orquestra formada pelos ripianos, que têm um papel de
acompanhamento” (GOTKOVSKY, [20--]); “Après un siècle de tâtonnements apparaît vers 1680 le concerto
grosso, dont il revient à Corelli d'avoir fixé la forme et l'équilibre. Dans le concerto grosso, un petit ensemble de
23
musiciens solistes, le concertino, est opposé à la masse de l'orchestre aussi nombreuse que possible et qui, pour
cette raison, prend le nom de concerto grosso (terme qui a fini par désigner l'œuvre tout entière). Le
compositeur, faisant alterner les soli et les tutti comme les questions et les réponses d'un discours musical, tire
un parti architectural du contraste entre le concertino et le concerto grosso. Cette opposition est encore
soulignée par le fait que l'écriture des parties de solistes du concertino est plus brillante et plus ornée que celle
de l'orchestre dont les exécutants, les « ripienistes », ont un rôle de remplissage”.
24
Considera-se de suma importância observar estes itens listados acima: eles são
bons conselhos que valem para qualquer concerto, mas talvez mais ainda no caso do concerto
para violão e orquestra.
Desde já é apresentada uma definição do que seria uma escrita transparente, pois o
termo será usado em vários momentos desta tese. Em oposição a algo opaco, a transparência
deixa “passar a luz” e permite ver todos os elementos com nitidez, mesmo quando
superpostos. Diz-se de Debussy que ele tem uma escrita transparente porque usa poucas
dobras e valoriza cada timbre e cada voz. Pode-se considerar que a ideia de transparência na
escrita orquestral resultou, entre outros fenômenos, na Klangfarbenmelodie, sobre a qual
falarei mais adiante.
No seu texto Texture in Post II World War Music, Strizich lista cada nuance entre
uma textura opaca e uma textura transparente: Opaca – Pitch-band (ultra saturação de alturas)
– micropolifonia – polifonia densa – multicamadas – textura de nuvem – polifonia disjunta –
multicamadas– pontilista – transparente (STRIZICH, 1991, n.p.).
A seguir, serão exemplificados esses itens acima, assim como serão propostas
algumas estratégias que irei extrair através da análise de alguns concertos. O concerto para
10
“1. Faire dialoguer soliste et tutti;
2. Échanger les rôles de premier plan et arrière-plan entre soliste et tutti;
3. Exploiter les contrastes de couleur qui mettent en valeur le soliste;
4. Séparer soliste et tutti par indépendance rythmique;
5. Utiliser à bon escient un accompagnement depouillé;
6. Favoriser les dispositions et registres qui valorisent l’instrument soliste”.
25
violão e orquestra já tem mais de dois séculos de história, conforme será abordado no tópico
seguinte.
Almeida (2006, p. 89) afirma: “a obra do compositor brasileiro que até hoje suscita discussões
sobre acabamento, forma, equilíbrio e balanceamento dinâmico, entre solista e orquestra, faz
dela também sob esse aspecto, uma das obras mais importantes do gênero”.
No início do século XX, o timbre ficou no centro das preocupações dos
compositores, e, provavelmente, não por acaso, o violão começou a ser integrado aos
ensembles e orquestras. A emergência de novos timbres não europeus contribuiu para que se
criasse uma nova relação com o som, mais ligada à diversidade e riqueza da matéria sonora.
Webern foi um dos primeiros compositores a repensar a importância de cada timbre dentro da
orquestra – qualquer que fosse seu tamanho – e essa tendência foi se confirmando ao longo
dos séculos XX e XXI.
Não é possível determinar ao certo quantos concertos para violão e orquestra
foram escritos até a atualidade; no Anexo A estão listados 1186 concertos compostos entre
1950 e 2019, embora não considere esta lista nem abrangente, nem definitiva.
No terceiro capítulo são propostos alguns itens que exemplificam estratégias de
escrita para violão e orquestra, ilustrando meu propósito com análise de trechos de concertos
selecionados. As estratégias propostas são ligadas à textura orquestral, escolha de registro,
dinâmicas, uso de técnicas expandidas, entre outras.
11
Ripieno se refere aos instrumentos que não tocavam nenhuma parte de solista, mas só em conjunto.
27
É possível notar algo estranho em relação a essa crítica, uma vez que não houve
trompetes e tambores na orquestra, pelo menos não na execução do Concerto Op.30.
Provavelmente, o autor da crítica exagerou a fim de sustentar o seu argumento desfavorável
àquela obra. Ocorre que Giuliani tomou algumas providências para garantir um melhor
equilíbrio, de acordo com Almeida (2006):
12
“Siehet man aber auf die Sache selbst…Nun, man denke sich nur eine Guitarre und ein Orchester mit
Trompeten und Pauken: gehört nicht ein fast unbegreiflicher Grad von Liebhaberey an diesem, doch ewig an
Klang armen Instrumente dazu, um bey so schönem Talent, sich ihm so ganz ausschliessend zu widmen, wie
Giul. gethan hat, und eine wenigstens eben so lebhafte Theilnahmen an dem Virtuosen, wie an seiner Kunst, um
diese seine Produktionen so hoch zu stellen? Ich wenigstens konnte mich bey Anhörung derselben des
Gedankens nicht erwehren: Was würde nicht die Kunst dabey gewonnen haben, wenn dies Talent, dieser
unsagliche Fleiss, und diese Beharrlichkeit in Ueberwindung der grössten Schwierigkeiten auf ein anderes, auch
für den Künstler selbst dankbareres Instrument verwendet worden wäre! – Hat denn nicht ein jedes Instrument
seine von der Natur ihm angewiesenen Gränzen? und muss nicht, werden diese überschritten, etwas wunderlich
Erkünsteltes, vielleicht Verschrobenes, allezeit die Folge davon seyn? Man weise die Guitarre in die ihrigen
züruck – sie bleibe Accompagnement – und sie wird jederzeit sehr gern gehört werden: aber als Solostimme, und
besonders als Konzertinstrument, kann sie nur die Mode rechtfertigen und schön finden! Dass ich damit dem
wahren Verdienst, das G., als Komponist und Virtuos hat, keinen Abbruch thun will, versteht sich von selbst”.
28
13
“In the solo guitar sections the orchestra is limited to soft, translucent and subdued string accompaniment
through rests and sustained notes that provide additional harmonic fills. Although Giuliani did not limit the
dynamic range of the orchestra to only pianissimo, piano or mezzo-piano, true orchestral fortes are restricted to
sections without the soloist. Giuliani never emasculates the orchestra by allowing the soloist to play
unaccompanied for prolonged periods of time. In fact the guitar plays unaccompanied for only 5% of the entire
concerto”.
14
Pré-Torres é uma referência ao novo formato e luteria estabelecidos pelo luthier Torres a partir de meados do
século XIX, que na época de Mauro Giuliani ainda não existia. O violão tinha então ainda menos volume do que
o novo violão instituído por Torres alguns anos depois.
15
“A plethora of difficulties have plagued the guitar concerto from its inception. Issues of balance and volume
and scarcity of well-written repertoire hindered the guitar concerto from outgrowing its perceived ‘novelty’
status that once made it popular during the early nineteenth century. With less than a dozen guitar concerti
written during the Romantic period it seems that composers had given up on the idea of trying to merge the soft
29
Fica nítido que as questões de equilíbrio e de volume do violão são as razões pela
qual o repertório para esta formação é limitado. Nota-se que enquanto a orquestra foi se
expandindo em tamanho e volume, o violão foi ficando cada vez menos atrativo para assumir
o papel de solista de orquestra.
2.1.2 Grandes incentivadores: Andrés Segovia, Julian Bream, Narciso Yepes , Los Romero,
e John Williams
spoken voice of the pre-Torres1 guitar with ever expanding Romantic orchestras” (Postlewate 2013a)”.
16
“Andrés Torres Segovia nasceu no dia 21 de fevereiro de 1893. Foi um violonista erudito espanhol, nascido
em Linares, Espanha, e é considerado o pai do violão erudito moderno pela maioria dos estudantes de música.
Segovia dizia que ele “resgatou o violão das mãos dos ciganos flamencos”, e construiu um repertório clássico
para dar lugar ao instrumento em salas de concerto. A introdução de Segóvia [sic] ao violão foi aos quatro anos
de idade. Seu tio teria frequentemente entoado canções para ele enquanto ele tocava um violão imaginário. Isso
incitou Segóvia a fazer sua jornada para elevar o violão para o status do piano e do violino. Em particular, ele
queria que o violão fosse tocado e estudado em todos os países e universidades do mundo, e passar seu amor
pelo violão para as gerações futuras. A primeira apresentação de Segóvia foi na Espanha, quando tinha 16 anos.
Poucos anos depois, ele fez seu primeiro concerto profissional em Madrid, tocando transcrições de Francisco
Tárrega e algumas obras de Bach, que ele próprio transcreveu e arranjou. Embora não fosse aprovado pela sua
família, ele continuou a perseguir seus estudos de violão. Sua técnica se diferencia das técnicas de Tárrega e seus
sucessores, como Emilio Pujol. [...] Como Segóvia progredia na sua carreira e tocava para audiências cada vez
maiores, ele constatou que os violões existentes não eram suficientes para tocar em grandes salas de concerto
porque não conseguiam produzir volume suficiente. Isso estimulou Segóvia para procurar inovações
tecnológicas que poderiam melhorar a amplificação natural do violão. Trabalhando junto com o
luthier Hermann Hauser, ele ajudou na construção do que é hoje conhecido como violão erudito, de melhores
madeiras e cordas de nylon. O formato do violão também foi mudado para melhorar a acústica. O novo violão
podia produzir notas com maior volume do que os modelos anteriores usados na Espanha e outras partes do
mundo produziam, embora fosse ainda baseado no modelo básico desenvolvido por Antonio Torres quase 50
anos antes de Segóvia nascer. Depois da viagem de Segóvia pelos Estados Unidos em 1928, Heitor Villa-Lobos
compôs os 12 Estudos e dedicou ao maestro. [...] Segóvia ganhou o prêmio Grammy pela Melhor Performance
Erudita – Instrumentista em 1958, pela sua gravação Segóvia Golden Jubilee. Em reconhecimento à sua enorme
contribuição cultural, ele foi elevado para a nobreza espanhola em 1981, com o título de Marquês de Salobreña.
Andres Segóvia continuou fazendo apresentações já idoso e viveu uma semi-aposentadoria durante os anos 70 e
80 na Costa del Sol. [...] Morreu em Madrid, vítima de ataque cardíaco, na idade de 94 anos, tendo completado
sua ambição de elevar o violão de um instrumento de dança cigana para um instrumento de concerto”
(MADEIRA, 2007a, grifos do autor).
30
17
Lista obtida por e-mail com Angelo Gilardino, supervisor responsável pelo arquivo de Andrés Segovia nas
Edizioni Musicali Bèrben desde 2002.
18
“Julian Alexander Bream (nascido dia 15 de julho de 1933 em Londres), é um alaudista e violonista
internacionalmente reconhecido. Depois de estudar com seu pai e tocar publicamente na sua cidade a partir dos
14 anos, Bream ingressou o Royal College of Music, paralelamente ao estudo do violão fora da escola. Ele foi
muito influenciado por Andrés Segovia e Francisco Tárrega, o grande violonista espanhol do século dezenove.
Depois do seu primeiro recital importante (em 1950 em Londres), ele tocou por toda Inglaterra, muitas vezes
para um público que não era familiarizado com o repertório clássico do instrumento. Em 1954 ele começou a se
apresentar internacionalmente. Ele começou a estudar alaúde em 1950, o que o levou a colaborar com o tenor
inglês Peter Pears em recitais de canções de John Dowland e outros compositores elisabetanos. Em 1961, ele
organiza o Julian Bream Consort, um dos primeiros grupos especializados em música antiga. O Consort é
formado por violino, flauta, viola da gamba, pandora, cittern, e alaúde. Vários compositores dedicaram obras a
Bream, dentre eles Benjamin Britten, William Walton, e Malcolm Arnold. Outra influência forte do Bream foi o
grande violonista belga Django Reinhardt. Bream é admirado pela sua precisão rítmica e o incrível lirismo da
sua paleta tímbrica” (JULIAN BREAM, [20--], tradução nossa). “Julian Bream, in full Julian Alexander
Bream, (born July 15, 1933, London), internationally celebrated English guitarist and lutenist who inspired new
interest in the music of the Renaissance lute. After studying with his father and performing locally from age 14,
Bream attended the Royal College of Music while pursuing private extracurricular study of the guitar. He was
much influenced by the styles of Andrés Segovia and Francisco Tárrega, the great Spanish guitarist of the 19th
century. After Bream’s first major public recital (London, 1950), he performed in concerts throughout England,
often to audiences unfamiliar with the classical guitar repertoire. In 1954 he began touring internationally. He
had taken up the lute in 1950, which led to a collaboration with the British tenor Peter Pears in performances of
lute songs by John Dowland and other Elizabethan composers. In 1961 he organized the Julian Bream Consort,
one of the first groups to specialize in early ensemble music. The Consort is composed of violin, alto flute, bass
viol, pandora, cittern, and lute. Composers who wrote music for Bream include Benjamin Britten, William
Walton, and Malcolm Arnold. Another great influence on Bream was Django Reinhardt, the Belgian jazz
guitarist. Bream was noted for his rhythmic precision and the exquisite lyricism of his tones, which were equaled
by only a few other guitarists in the world” (grifos do autor).
31
19
“Since non-guitarist composers do not have “a clue” on how to write for guitar, Bream wrote a paper in 1957
to aid them, hoping to encourage composers “to create a literature for an instrument that has been unduly
neglected” (BREAM, 1957/2003, pp.1, 8). [...] For Tanenbaum (2003, p. 191), Bream's work with composers
“directly helped create what may be the greatest legacy of music that any guitarist has left, far more diverse and
adventurous than what was written for Segovia.” According to Morris, Henze's Royal Winter Music I (1976)
“exists as a result of Julian Bream's request for a work similar in proportion and importance for the guitar as
the Hammerklavier of Beethoven is to the pianoforte” (NONKEN; MORRIS, 2002, p. 14)”.
20
Narciso Yepes nasceu em Lorca, Espanha, em 1927 e morreu em Murcia em 1997. “Violonista espanhol.
Famoso por sua guitarra de dez cordas. Narciso formou-se no Conservatório de Valencia sob a direção de
Vicente Asencio, um pianista e compositor que o motivou a transcrever no violão, recursos que possíveis em um
teclado, pareciam impossíveis em um violão. Estes estudos culminaram em uma técnica impecável e
revolucionária que logo o fizeram se destacar, chamando a atenção do regente Ataulfo Argenta quem o fez
debutar tocando com orquestra, em 1947. A gravação da peça Romance de amor para o filme de René Clément
em 1952, ajudou a impulsionar a sua carreira em um nível internacional. Vários compositores lhe dedicaram
obras, o que contribuiu de maneira decisiva para a implantação do violão como um instrumento de concerto com
repertório próprio” (BIOGRAFÍAS Y VIDA, s.d., tradução nossa); “Guitarrista español. Famoso por su
guitarra de diez cuerdas, Narciso Yepes se formó en el Conservatorio de Valencia bajo la dirección de Vicente
Asencio, un pianista que le motivó a intentar trasplantar a su instrumento musical muchas de las agilidades y
recursos que, posibles sobre un teclado, parecían inabordables en una guitarra. [...]. Numerosos compositores
escribieron obras para Yepes, como Salvador Bacarisse, Leonardo Balada, Ernesto Halffter, Xavier
Montsalvatge, Maurice Ohana y Joaquín Rodrigo, lo que, junto a su labor en la recuperación de numerosas
partituras olvidadas, contribuyó de manera decisiva a la implantación de la guitarra como instrumento de
concierto con un repertorio próprio”.
32
21
“Los Romeros [...] é um quarteto espanhol de violões, conhecidos comercialmente como ‘a família real do
violão’. Seus integrantes são todos da família Romero, originária de Andalucia (Espanha) e residente em
Califórnia (Estados Unidos). O quarteto foi fundado por Celedonio Romero em 1960, um violonista espanhol
nascido em Cienfuegos (Cuba), embora desde criança tenha crescido em Màlaga, cidade de origem da sua
família, até que em 1957, se exiliou nos Estados Unidos. durante a ditadura de Francisco Franco. O quarteto era
formado por Celedonio e seus três filhos, Ángel, Celín e Pepe. Em 1990, Ángel saiu do quarteto, sendo
substituído por Celino, filho de Celin. Celedonio morreu em 1996 em San Diego e seu lugar foi ocupado por
Lito Romero, filho de Ángel. Los Romeros ficaram mundialmente famosos pelo virtuosismo do quarteto, e
gravaram inúmeros discos [...]” (LOS ROMEROS, 2018, tradução nossa). “Los Romeros [...] es un cuarteto
de guitarra española conocido comercialmente como ‘La familia real de la guitarra’. Sus integrantes son todos
de la familia Romero, originaria de Andalucía (España) y residente en California (Estados Unidos). El cuarteto
fue fundado en 1960 por Celedonio Romero, un guitarrista español nacido en Cienfuegos (Cuba) aunque siendo
un niño se trasladó a Málaga, de donde era originaria su familia, hasta que emigró a los Estados Unidos
en 1957, durante la dictadura de Francisco Franco. El cuarteto quedó conformado por Celedonio y sus tres
hijos: Ángel, Celín y Pepe. En 1990 Ángel abandonó el grupo y fue reemplazado por Celino, hijo de Celín.
Celedonio Romero murió en 1996 en San Diego y su lugar fue ocupado por Lito Romero, hijo de Ángel. Los
Romeros se han hecho mundialmente famosos por su virtuosismo con la guitarra española. Han grabado
multitud de discos [...]”.
22
“John Christopher Williams nasceu em 24 de abril de 1941, e é atualmente um dos violonistas eruditos mais
conhecidos no mundo. Nasceu em Melbourne, Austrália, filho de pai inglês e mãe australiana/chinesa. John foi
instruído inicialmente por seu pai, e aos 12 anos foi para a Itália estudar com ‘O Maestro’, Andrés Segóvia. Mais
tarde, estudou piano na Royal College of Music em Londres, porque a instituição ainda não tinha um
departamento para o violão. Depois da graduação, foi oferecida a oportunidade de criar tal departamento. Em
1971 já era considerado um dos grandes mestres do violão e era um veterano em turnês ao redor do mundo; sua
33
A versão do violão tal qual a conhecemos hoje foi estabelecida em 1852, com a
construção do primeiro violão de Antonio Torres, luthier espanhol responsável por mudanças
definitivas na construção do instrumento. Torres foi decisivo no que diz respeito à luteria e à
melhoria do violão, especialmente no que se refere ao volume e à qualidade do som. Essa
evolução se deu no aumento das proporções do corpo e do braço do instrumento, na grossura
das madeiras e no modelo do leque interno formado por tiras de madeira afixadas no tampo
harmônico. Torres demonstrou a importância desse leque de madeira, construindo um violão
com fundo e aros feitos de papier maché e, ainda assim, obtendo um instrumento com um
som muito satisfatório. O luthier fixou o tamanho das cordas em 64cm e também instituiu a
largura do braço em, pelo menos, 5cm (TURNBULL, 1974).
Além da melhoria do som, Torres também contribuiu para a evolução da técnica
do violão, pois, deixando o braço mais largo, os violonistas ficaram mais confortáveis, já que
companhia, CBS, deu-lhe um prêmio por ter vendido mais de um milhão de discos, um feito raro para um artista
clássico que mal havia completado 30 anos. [...] Seu virtuosismo é um show à parte. Os círculos da música
clássica ainda eram extremamente circunspectos e não absorveram essa guinada sem chiar. Segovia disse: ‘este
rapaz está empenhado em destruir tudo aquilo que eu levei anos construindo’. John Williams foi acusado de
oportunismo, de ter-se vendido e ser viciado em publicidade. Em 1979, criou um grupo de rock progressivo,
o Sky, que teve extraordinário sucesso, inclusive o privilégio de ser o único grupo de rock a tocar na Abadia de
Westminster. John Williams é autêntico ao defender uma visão inclusiva das diferentes culturas musicais: para
ele, a música clássica é somente uma linha particular de desenvolvimento que não tem de ocupar
necessariamente uma posição central. É uma linha de pensamento que ele tem defendido desde os anos 60, muito
antes da moda, imposta pelas grandes companhias, de se fazer do cross-over um caça-níqueis. Ele já chamou a
atenção para a música asiática, australiana, africana, para o jazz e o pop, e nutre uma profunda admiração pela
música das Américas. Ao invés de fazer coletâneas com peças já batidas, ele sempre procura novo material para
seus discos e concertos [...]” (MADEIRA, 2007b, grifos do autor).
34
um braço muito estreito limita a liberdade dos movimentos da mão esquerda, especialmente
no repertório contrapontístico (TURNBULL, 1974). Essas mudanças eram destinadas,
sobretudo, a deixar o instrumento mais sonoro. Esse violão tinha um timbre cheio, com graves
profundos e agudos projetados, muito apropriado para o estilo de música escrito naquela
época.
Com o tempo, as dimensões do tampo foram aumentando, como explicita Naveda:
O aumento do tampo teve uma clara influência tanto no aumento da potência sonora
quanto nas características do timbre. No entanto, a construção de tampos com áreas
vibrantes maiores exigiu que fosse aumentada sua espessura o que acaba mantendo a
relação área/massa efetiva constante, a qual, de acordo com WRIGHT (1994) e
RICHARDSON (1994), precisa ser aumentada para se obter um incremento da
potência sonora do violão. O advento dos leques estruturados abaixo do tampo
(introduzido por Torres) foi um grande passo para a manutenção de áreas vibrantes
maiores sem o aumento da massa e da rigidez do tampo e ainda mantendo a
resistência suficiente para suportar a tensão das cordas. (NAVEDA, 2002, p. 83)
Robert Bouchet (1898-1986) foi um luthier francês que teve uma enorme
influência na história da luteria. Entre seus discípulos, encontram-se Daniel Friedrich e
Dominique Field, nomes muito respeitados na arte da luteria. Bouchet criou um leque (Figura
4), próximo do leque tradicional de Torres, mas com duas barrinhas transversais a mais.
Hoje em dia, os modelos de leque são muito variados e cada luthier desenvolve
um próprio segundo seus cálculos e pesquisas sobre som e acústica. Sabe-se que as inovações
desenvolvidas na luteria têm como objetivo aumentar o volume e a projeção do som do
violão. Algumas dessas inovações serão destacadas a seguir.
Lattice: essa técnica do lattice foi inventada pelo luthier australiano Greg
Smallman, que deixa o tampo muito fino, o que serve para reforçá-lo ao máximo possível
(Figura 5). O lattice pode ser feito de madeira, de carbono ou de uma mistura dos dois
recursos. Além do uso do lattice, Smallman criou uma grande diferença de densidade entre o
fundo e o tampo, com o intuito de evitar perda de vibrações e deixar o fundo do violão mais
pesado e curvo.
Hoje em dia, muitos luthiers usam materiais não convencionais na construção dos
seus violões. No início dos anos 2000, o luthier francês Jean-Luc Joie (2015) chegou a
construir um violão sem recorrer ao uso da madeira, o que se tornou um feito histórico na
história da luteria para violão. É possível, ainda, encontrar os seguintes materiais na
construção de violão moderno: fibra de carbono, que é bastante comum; alumínio; cobre;
grafite; luddite; silicone; poliestireno reconstituído; dentre outros.
As pesquisas desses luthiers de concepção mais moderna, também especialistas
em acústica, não cessam, pois estão sempre em busca de instrumentos mais potentes. Porém,
ainda existem luthiers cujo foco principal não é necessariamente a potência sonora, mas sim a
38
raramente, violonistas usam cordas de pesca em carbono, tendo estas como principais
vantagens o preço reduzido e a possibilidade de escolher o diâmetro da corda.
Observa-se neste comentário que é importante estar atento ao fato de que uma
amplificação moderada oferecera um resultado mais autêntico e com menos riscos de
microfonia. Nevada indica a seguir quais tipos de amplificação podem ser usadas para o
violão:
Durante os últimos 30-35 anos de carreira já usei quase tudo que existe no mercado:
Ovation, Takamine, Chet Atkins, Morris, Barcus Berry, Bags, Fishman, RMC,
AKG, Audio-Technica, Schertler, Frame... e outros que não consigo lembrar agora.
Todos estes sistemas fazem parte de um passado sofrido e frustrante: o som do
violão acústico que a gente tanto gosta, deixava sempre muito a desejar quando
amplificado. Surge agora na Alemanha o captador Carlos Juan que vem estabelecer
um novo parâmetro na amplificação do violão acústico. A história dos captadores
agora é definida por antes e depois de Carlos Juan. (BELLINATTI, 2010, n.p.)
[...] um interesse especial porque utiliza para a amplificação um sistema sem fio
High Fidelity absolutamente invisível e a qualidade do som é absolutamente
sublime. Este instrumento, novo sob vários aspectos, abre novos caminhos porque
dá a possibilidade de tocar em salas muito grandes com uma qualidade de som
idêntica ao som acústico. É muito importante para mim que toco há alguns anos em
grandes salas com amplificação externa que capta tradicionalmente o som; a
amplificação é confortável, mas a qualidade do som piora, já que o sistema
comprime as dinâmicas e as cores do som. Porém, com este sistema, o som
amplificado guarda todas as suas características musicais intrínsecas a um som
acústico. Com este instrumento que uso há 4 anos, posso fazer um crescendo durante
um minuto, enquanto com o sistema tradicional, o ambitus dinâmico era muito
23
“The resonance box simply enhances and subtly amplifies what’s already there. It also helps smoothen out any
rough edges. My second Rubio eight-string initially had a rather bright sounding first string, for instance, which
the resonance box helped mitigate. The box gives a feeling similar to that of releasing the soft pedal on a good
piano: with the box, you have a fuller resonance, one that seems more complete”.
42
menor. Posso dizer que a minha intepretação se beneficia, no geral, graças a esta
evolução técnica. (CAUVIN apud BANEL, 2013, grifos do autor e tradução nossa)24
2.4 Timbre
O timbre foi, durante muito tempo, subalterno à altura das notas, como expressa
Arnold Schoenberg na conclusão do seu tratado de harmonia: “podem ser reconhecidas, no
som, três qualidades: altura [Höhe], timbre [Farbe] e intensidade [Stärke]. Até agora, o som
tem sido medido somente em uma das três direções nas quais se expande: naquela que
denominamos altura” (1999, p. 578).
Contudo, à medida que os compositores procuraram entender do que ele era
composto, ele foi se tornando um elemento autônomo, mudando de lugar na hierarquia dos
sons e passando a ter um papel essencial no processo criativo dos compositores. O
24
“[...] elle présente un intérêt tout particulier car elle utilise pour son amplification un système sans-fil HF
absolument invisible et la qualité de son est absolument superbe. Cet instrument, nouveau sous cet aspect,
apporte une nouvelle dimension à la guitare car il devient possible de jouer dans des salles très importantes
avec un son identique à celui que produit un instrument non amplifié. C'est particulièrement important pour moi
qui ai surtout joué amplifié ces dernières années dans de grandes salles car, avec un micro posé de façon
classique devant la guitare, l'amplification permet d'obtenir un volume plus important, certes, mais le plus
souvent au détriment de la qualité du son car ce traitement compresse la dynamique et les couleurs. Or avec le
système que j'utilise, le son amplifié conserve toutes les caractéristiques musicales intrinsèques d'un son
acoustique. Avec cet instrument que j'utilise depuis 4 ans, je peux produire un crescendo sur 1 minute alors
qu'avec le système traditionnel, l'ambitus était nettement plus restreint. Je dois dire que mon interprétation
bénéficie globalement de cette évolution technique essentielle”.
43
Denomina-se assim, por metáfora, esta qualidade do som pela qual ele é acre ou
doce, surdo ou brilhante, seco ou macio. Os sons doces têm normalmente pouco
brilho, como os da flauta ou do alaúde; os sons brilhantes são sujeitos a serem acres,
como os da vielle ou oboé. Há alguns instrumentos que são surdos e acres; e é o pior
timbre. O timbre mais lindo é aquele que junta a doçura e o brilho. Assim é o timbre
44
25
“On appelle ainsi, par métaphore cette qualité du son par laquelle il est aigre ou doux, sourd ou éclatant, sec
ou moelleux. Les sons doux ont ordinairement peu d’éclat, comme ceux de la flûte ou du luth; les sons éclatants
sont sujets á l’aigreur, comme ceux de la vielle ou du hautbois. Il y a même des instruments tels que le clavecin,
qui sont a la fois sourds et aigre; et c’est le plus mauvais timbre; Et le plus beau timbre est celui qui réunit la
douceur a l’ éclat. Tel est le timbre du violon”.
45
Por outro lado, durante a segunda metade do século XX, a noção de timbre vai
mudando, ocupando então um papel de “composto” e não mais de componente, como
expressa Manoury:
Schoenberg, por sua vez, se expressa também neste sentido quando escreve no seu
livro Harmonia:
Não posso admitir de maneira tão incondicional, a diferença entre timbre e altura tal
e como se expressa habitualmente. Acho que o som faz-se perceptível através do
timbre, do qual a altura é uma dimensão. O timbre é, portanto, o grande território e a
altura um distrito. A altura não é, se não, o timbre medido em uma direção.
(SCHOENBERG, 1999, p. 578)
Nesta citação de Schoenberg, percebe-se que ele vai além, e coloca nitidamente o
timbre acima da altura.
Esling ([2009]) tenta também definir o timbre em sua tese, e afirma que:
26
“Le timbre est composé (entre autres choses) de hauteurs, donc de fréquences. La fréquence est la variation
régulière d’une amplitude – d’une certaine manière, d’intensité – dans une durée donnée. Les trois derniers
composants sont dépendants les uns des autres. La timbre ne peut donc pas être admis dans la même famille”.
27
“Quels sont les composants iniciaux, les particules de ce langage, et en fonction de quoi les déclarent-on en
tant que tels? Une des premières opérations consiste à séparer les éléments des fonctions ou de ses composants.
Là, une distinction apparaît: dans l’ancienne terminologie regroupant hauteur, durée, intensité et timbre comme
les quatre composants de base de notre sysifs tème musical, il faut noter que les trois premiers sont quantitatifs,
alors que le dernier est qualitatif. ... S’il en est besoin, les techniques de création assistées par ordinateur nous
prouvent que les hauteurs, intensités et durées sont mesurables (en Hz, millisecondes et niveau d’amplitude) et
que le timbre est le produit de la fusion de ces trois composants. S’il est effectivement formé de quantités (quel
objet ne l’est pas?), le timbre n’est pas un composant, mais bien un composé”.
46
Schoenberg entende a relação entre timbre e altura de outra maneira: “acho que o
som se faz perceptível através do timbre, do qual a altura é uma dimensão” (SCHOENGERG,
1999, p. 578), o que explicita o interesse dele em procurar outras possibilidades
composicionais que vão além de texturas orquestrais contrastantes ou fusionais. Em outras
palavras, por um lado existem as fontes, que são os instrumentos musicais, como abordado
nesta pesquisa, e, por outro, as qualidades sonoras, que poderiam ser observadas num mesmo
instrumento tocado com variações de timbre, em que surgem as conotações e metáforas, tais
como um som quente, um som redondo, um som áspero etc.
Essas fontes são aproximativas e relativas. Por exemplo, pode-se dizer que o
violino no registro agudo tem um timbre brilhante; mas também pode-se dizer o mesmo sobre
o trompete. Ocorre que isso não bastaria para criar similaridade de timbre entre os dois
timbres citados.
Quero chamar atenção aqui para o caráter polissêmico30 do timbre; por um lado,
ficou claro que cada objeto musical, ou instrumento, tem seu timbre: um ouvido não treinado
é capaz de distinguir o timbre de um piano do timbre de um trompete, por exemplo. Isso
parece óbvio, pois cada um tem um timbre bem diferente. Agora, um ouvido não treinado
28
“L’American Atandards Association (ASA) definit le timbre comme ‘les attributs de la sensation en termes
desquels un auditeur peut juger que deux sons de même hauteur et même volume sonore sont différents. Le
timbre serait alors une propriété intrinsèque à l’instrument qui interviendrait dans les tâches de différenciation
mais ne serait pas quantifiables positivement pour autant’”.
29
“It is important to begin by describing tone-colour as being the ‘quality of sound characteristic of a particular
type of instrument or voice, as opposed to its register or pitch.’ Thus even if a violin and a flute play exactly the
same note and volume, a listener is able to identified them as dissimilar sounds. Apart from differences between
distinct instruments, one may examine the differences within instrumental categories, such as subtleties between
two violins from different makers. In addition to this and relevant for this analysis, timbral differences on a
single instrument can be identified depending on the manner in which a particular note is performed. As one
example, if a note is played closer to the bridge of the guitar (or other string instrument), it sounds different
from the same note played closer to the fingerboard of the same instrument”.
30
Se diz de algo que tem mais de um significado.
47
31
“[Le timbre] peut être défini comme l’ensemble des caractères du son qui le réfèrent à un instrument donné.
[Cependant, on peut très bien parler du] timbre d’un son sans le rapporter clairement à un instrument
déterminé, mais plutôt en le considérant comme une caractéristique propre de ce son”.
48
nunca teve contato com timbres não ocidentais vai gostar do som do duduk32 armênio? Será
que um indiano acostumado com outros sistemas de afinações não irá estranhar os
instrumentos temperados ocidentais e seus timbres característicos? Entre os músicos clássicos
e populares costuma-se ter uma percepção muito diferente quanto ao timbre: os primeiros
estudam para obter um som projetado, rico em harmônicos e equilibrado, e os segundos não
se preocupam tanto com esses parâmetros. É o mesmo instrumento, mas existe um
preconceito entre as escolas, exatamente por uma questão cultural e estilística do timbre.
Como explica Murail (2005), em alguns estilos musicais o timbre é considerado
um elemento totalmente integrado ao discurso musical:
Para Pujol (1979), o timbre é algo muito mais ligado à sensibilidade do ouvinte,
pois as definições científicas não conseguem abranger uma explicação satisfatória, apesar de
contribuírem, em parte, para sua compreensão. E o autor assim se expressa sobre a definição
científica do timbre:
Certamente tudo isso tudo isso se refere à argumentos científicos] deve ser; mas
tem algo mais, por razão da nossa sensibilidade consciente e que não figura nestas
definições cientificas, razoadas e frias. Um algo mais variadíssimo que abarca desde
o mais insignificante até o mais transcendental para o nosso espírito. Um algo mais
que o gênio do homem pode transformar num elemento imaterial de um mundo
maravilhoso e fantástico, que seja capaz tanto de confortar a alma quanto um raio de
sol conforta o corpo. (PUJOL, 1979, p. 10, grifos do autor, tradução nossa)34
Para esse autor, o timbre é um fator relativo e pode ser “bom, ruim, melhor ou
pior segundo julgamento de valor dado por quem o aprecie” (PUJOL, 1979, p. 11)35,
32
Instrumento de sopro armênio.
33
“Timbre is one of the most sensitive categories of musical perception—of auditory perception in general, since
it is even at the base of spoken language. Our timbral perception is so acute that we can immediately identify the
sound of a familiar voice on the telephone, even though it has been drastically transformed by the filtering effect
of the telephone speaker. The increasing focus on timbre also connects to non-European musics, where melodic
or timbral ornaments are often considered an integral part of the discourse, or even an element of the modal
system (as in Vietnam)”.
34
“Cierto que todo eso debe ser; pero algo más también, por razón de nuestra sensibilidad consciente y que no
figura en esas definiciones científicas, razonadas y frías. Un algo más variadísimo que abarca desde lo más
insignificante basta lo más trascendental para nuestro espíritu. Um algo más que el genio del hombre puede
transformar en elemento inmaterial de un mundo maravilloso y fantástico, capaz de confortar el alma como
conforta al cuerpo um raio de sol”.
35
“El timbre puede ser bueno, malo, mejor o peor, según la valorización que le dé el sentido critico de quien lo
aprecia”.
49
Músicos tendem a pensar que os sons são fixos ou estacionários do início ao fim, ou
que aumentam ou declinam em volume, mas timbre é na realidade um vetor, ou um
objeto. Não prestamos muita atenção às nuances do timbre durante o decorrer do
tempo de um som, na música ocidental, principalmente por não ter um sistema de
notação prático ... Portanto, todo som é movimento. Ele se forma no tempo, e a sua
forma se percebe no tempo. (ERICKSON, 1975, p. 60, tradução nossa)36
Seja qual for a intenção, pode-se dizer que há basicamente duas formas de
considerar o timbre: por um lado a maneira objetiva, científica, além da linguagem,
e sem critérios estéticos, em que há uma extrema dificuldade em transferir os
critérios desde uma visão quantitativa até uma visão qualitativa. Com a ajuda de
gráficos e diagramas, muitos fenômenos acústicos podem ser descritos, mas a
qualidade de integração do som e do timbre na estrutura de uma composição está
ausente nestas medições. Mesmo quando se trata de fenômeno e de sua qualidade, é
sobretudo uma questão de percepção isolada, isenta de qualquer contexto. Eu sinto
que o valor verdadeiramente artístico do timbre é fundamentalmente esquecido
usando esta abordagem. Por outro lado, temos a maneira subjetiva e artística de lidar
com o timbre, como constituinte de uma linguagem musical, juntamente com os
critérios estéticos e formais que lhe dizem respeito ... Timbre existe esteticamente
quando está diretamente ligado à constituição do objeto musical. Por si só, timbre
não é nada. Obviamente, um som tem uma identidade; mas essa identidade ainda
não é um fenômeno estético. A identidade estética só aparece se houver utilização,
linguagem e composição. (BOULEZ, 2015, p. 211, tradução nossa)37
A visão de Boulez (2015) corrobora com o proposto por esta tese pois aceita de
fato a dificuldade de definir o timbre por um único prisma e, ao mesmo tempo, valoriza o ato
de criação que transforma o timbre em um fenômeno estético. Nessa mesma direção, Cadoz
(1991, p. 19) também afirma que “o timbre não é uma função da linguagem, ele é uma
materialidade obrigatória do processo produtor da vibração sonora”.
36
“Musicians tends to think of known sounds as fixed or stationary from beginning to end, or at most of waxing
or waning in loudness, wether timbre is fonctioning as carrier or object. We have not paid much atention of
timbral nuance during the time curse of the sound in western music, partly because we have had not practical
notation. [...] Yet, every sound is in motion. It is shaped in time and its shape is perceived in time”.
37
“Whatever the intention, it can be said that there are basically two ways of considering timbre: one is an
objective, scientific way, beyond language, and without aesthetic criteria, in which there is an extreme difficulty
in moving from the quantitative aspect back up to the qualitative. With the help of graphs and diagrams many
acoustic phenomena can be described but the quality of integration of sound and timbre in the structure of a
composition is absent from these measurements. […] of timbre, Timbre exists aesthetically when it is directly
bound to the constitution of the musical object. On its own timbre is nothing, like a sound on its own is nothing.
Obviously a sound has an identity; but this identity is not yet an æsthetic phenomenon. Aesthetic identity only
appears if there is utilization, language and composition”.
50
Esta reflexão vai além do timbre, mas não deixa de englobar também o aspecto do
timbre. O timbre é timbre a partir de um ponto de vista humano. Ele pode ser comparado,
avaliado, desde que ele seja desvelado pelo sentido artístico do ser humano.
Pode-se dizer que, em síntese, o timbre é um fenômeno multifacetado, suscetível
de ser percebido de maneiras diferentes; sensível às condições e contextos no qual evolui, ele
é um elemento relativo e não fixo. Portanto, considero primordial encarar a noção de timbre
por meio de diversos aspetos: alguns ligados à ciência, outros à psicoacústica, emoção,
contexto composicional, linguagem, cultura, dentre outros.
Esta noção [timbre global], primeiramente, não se situa no mesmo plano que o
timbre instrumental: se este se refere a uma realidade pré-existente, o timbre global,
51
por sua vez, é o resultado de uma junção, mais ou menos complexa, disposta no
espaço da partitura pelo compositor, e na qual o timbre instrumental é só um
componente. (BONNET, 1991, p. 336, tradução nossa)38
Fica nítido aqui na declaração de Bonnet que o timbre assumiu outro lugar e outro
papel na música ao longo do século XX, e é o que ele chama aqui de destruição do princípio
de identificação. Mas, se tem destruição, tem reconstrução, e dessa maneira os compositores
começaram a se apropriar do timbre e dos seus inúmeros recursos. Começaram a reconstruir
com novas bases, novas regras e novas exceções.
A seguir farei uma lista não abrangente de alguns fenômenos que foram
protagonistas dessa reconstrução, escolhidos segundo a relevância destes para a presente
pesquisa.
2.4.3 Klangfarbenmelodie
38
“Cette notion, tout d’abord, ne se situe pas sur le même plan que le timbre instrumental: si celui-ci renvoie à
une réalité préexistante, le timbre global, est lui, le résultat d’un assemblage plus ou moins complexe, disposé
dans l’espace de la partition par le compositeur, et dont le timbre instrumental n’est qu’une de ses
composantes”.
39
“La première est exterieure dans la mesure oú elle concerne l’imaginaire des compositeurs, lesquels semblent
avoir recherché de plus en plus des effets relevant du timbre global. Ils ont ainsi privilégié la perception de
grands ensembles au détriment de la perception des éléments qui les constituent. Au point qu’aujourd’hui
l’oreille, dans la plupart des cas, ne peut plus reconstituer la génèse des opérations qui sous-tendent les
oeuvres, car l’élaboration du timbre global entraîne inévitablement une plus grande complexité dans l’emploi
des composantes sonores, y compris des timbres instrumentaux. Il suffira de feuilleter même rapidement les
partitions d’orchestre de ce siècle pour sén convaincre. La deuxième raison est beaucoup plus fondamentale
puisqu’elle a trait à l’évolution du langage musical. En congédiant le système tonal et, par voie de conséquence,
le thématisme qui ne se définit que par rapport à lui, le dodécaphonisme, mais surtout le sérialisme ont détruit le
príncipe d’identification en instaurant un espace sonore non plus fonctionnel et hierarchisé mais relatif”.
52
central do conceito composicional. Ele descreve a sua visão do timbre e seu sonho da seguinte
forma:
Acho que o som faz-se perceptível através do timbre. O timbre é, portanto, o grande
território, e a altura, um distrito. A altura não é se não o timbre medido numa
direção. Se é possível, com timbres diferenciados pela altura, fazer com que se
originem formas que chamamos de melodia, sucessões cujo conjunto suscita um
efeito semelhante a um pensamento, então há de também ser possível, a partir dos
timbres da outra dimensão – aquilo que sem mais nem menos denomina-se timbre –
produzir semelhantes sucessões, cuja relação entre si atue com uma espécie de
lógica totalmente equivalente àquela que nos satisfaz na melodia de alturas. Isto
parece uma fantasia futurística, e provavelmente o seja. Mas se há algo em que
acredito firmemente, é que ela se realizará. [...] Melodias de timbres! Que finos
sentidos os que aqui diferenciem! Que espírito sublimemente desenvolvido o que
possa encontrar prazer em coisas tão sutis! Quem aqui se atreva a reclamar de
teorias! (SCHOENBERG, 1999, p. 579)
40
“L’idée, géniale, était de rendre l’immobilité changeante d’une couleur (Farbe) par l’alternance suntile de
deux sonorité sur un accord fixe”.
41
“The emancipation of tone-color was a significant and as characteristic of the first decades of the twentieth
century as the emancipation of dissonance. Tone-color was released from its complete subordination to pitch in
musical structure: until this point what note was played had been far more important than the instrumental color
or the dynamics with which it was played. The principal element of music was conceived to be pitch”.
53
agenciamento dos parciais que formam o espectro, considerando que o espectro do som é
estável. Portanto, “medir o timbre em função do espectro é como tentar fazer os sons ficarem
imóveis o tempo suficiente para analisá-los. Mas o som não permanece por muito tempo, e há
o perigo de obter informações baseadas em medições estáticas” (SETHARES, 2005, p. 32,
tradução nossa)42.
Sobre essa questão, Maia (2013) teve dúvida quanto à ideia da
Klangfarbenmelodie de Schoenberg e assim afirma:
Schoenberg (apud ROSEN, 1979) não foi o único compositor que adotou o timbre
como elemento essencial no seu processo de composição. Varèse, Scelsi, Grisey,
Penderencki, Murail, Schaeffer, Stockhausen, Ligeti, Xenakis, Debussy, Henry, Cage,
Schnittke são alguns exemplos de compositores que colocaram o timbre no centro das suas
pesquisas musicais.
Gostaria de me estender um pouco mais sobre o caso de Scelsi, não só por gosto
pessoal, mas porque, de fato, Scelsi tratava a orquestra como um grande espectro. A respeito
da música de Scelsi, Tristan Murail faz o seguinte depoimento no seu artigo Scelsi, Dé-
composer, traduzido por Robert Hasegawa do francês para o inglês:
Para Scelsi, o principal foco de composição passa a ser o que ele chama de
“profundeza” do som. É antes de tudo uma questão de trabalhar com o timbre, no
seu sentido amplo: o timbre global da orquestra como um todo. O compositor dessa
maneira se preocupa com dinâmicas, densidade, registros, dinamismo interno e
variações tímbricas, micro-variações de cada instrumento: ataque, tipos de sustain,
modificações espectrais e alterações de altura e intensidade. Instrumentos de cordas
friccionadas são ideais para esse tipo de escrita, graças a sua incrível flexibilidade e
o controle fino do timbre, livre das dificuldades dos instrumentos de sopro. A
obsessão do Scelsi com o som coloca ele em um movimento importante na história
da música ocidental. O timbre, primeiramente totalmente ignorado no processo
composicional, é eventualmente reconhecido como um fenômeno autônomo assim
como um parâmetro único e inteiro. Finalmente, ele submerge, ou melhor, engloba
as outras dimensões do discurso musical. Assim, mínimas flutuações do som
(vibrato, glissandi, mudanças espectrais, tremolo) não são mais meros ornamentos,
mas sim o texto em si. (MURAIL, 2005, p. 175-176, grifos do autor, tradução
nossa)43
42
“Using the spectrum as a measure of timbre is like trying to make musical sounds stand still long enough to
analyze them. But music does not remains still for long, and there is a danger of Reading too much into static
measurements”.
43
“For Scelsi, the principal object of composition then becomes what he calls the ‘depth’ of the sound. It is
primarily a question of working with timbre, taken in thebroadest sense: the global timbre of the orchestra as a
54
Hoje em dia, existem inúmeros compositores que trabalham com o timbre como
elemento central das suas composições. Scelsi foi uma inspiração notável para inúmeros
músicos, e principalmente para aqueles que formaram o grupo L’Itinéraire nos anos 1970
(Tristan Murail, Gerald Grisey, Roger Tessier, Michael Levinas).
whole. The composer is thusconcerned with dynamics, densities, registers, internal dynamism and the timbral
variations and micro-variations of each instrument: attacks, types of sustain, spectral modifications and
alterations of pitch and intensity. String instruments are obviously ideal for such writing, because of their great
flexibility and fine control of timbre, free of the difficulties of wind technique. Scelsi’s obsession with sound
places him in an important movement in the history of Western music. Timbre, at first entirely ignored in
composition, is eventually recognized as an autonomous phenomenon, then as a whole separate parameter;
finally, it submerges, or rather encompasses the other dimensions of musical discourse. Thus, minute sonic
fluctuations (vibrato, glissandi, spectral changes, tremolos) become not mere ornaments to a text, but the text
itself”.
55
(Danças Percussivas I, II), Luciano Berio (Sequenza XI), Edino Krieger (Ritmata), Tristan
Murail (Tellur), Elliot Carter (Changes), Alberto Ginastera (Sonata), Egberto Gismonti
(Central Guitar), Leo Brouwer em várias peças, para citar alguns compositores. Hoje em dia,
não é muito inovador usar técnicas expandidas, já que se tornou uma prática bastante comum.
Mais adiante na tese, irei citar exemplos específicos dentro de peças para violão e orquestra
nas quais tais técnicas são usadas.
Sempre na busca por novos timbres, começaram a surgir novos instrumentos que
integram a orquestra ocasionalmente (CHORIER, [20--]). No naipe das percussões, foram
introduzidos inúmeros instrumentos ou objetos de uso diário como, por exemplo, copos,
placas de alumínio, tubos de plástico, sirenes, tubos metálicos, entre outros.
Por outro lado, foram introduzidos na orquestra instrumentos de outras culturas,
como escreve Ross (2011) quando relata a surpresa de Debussy ouvindo pela primeira vez
sonoridades de outros lugares do mundo:
... Em 1889, ele visitou a Exposição Universal de Paris, onde eram exibidas
sonoridades e cenas exóticas de todo o mundo, graças a uma rede de regimes
coloniais opressivos. ... Debussy escutou extasiado a música de uma trupe teatral
vietnamita, com seus efeitos de gongos ressonantes e também um conjunto gamelão
javanês, com sua escala minimalista de cinco notas, sua delicada sobreposição de
timbres e seu ar de animação suspensa. A música desses conjuntos descreveu
Debussy “contém todas as gradações, até mesmo algumas que não sabemos mais
nomear, de modo que tônica e dominante não passam de fantasmas vazios para uso
de crianças espertas”. (ROSS, 2011, p. 55)
Debussy não foi o único a se maravilhar com timbres exóticos. White (1966)
também descreve o choque do Stravinsky ao ouvir pela primeira vez o som de címbalo, fato
ocorrido em 1915:
Um dia em 1915, Ernest Ansermet o levou [Stravinsky] para ouvir Aladar Racz
tocar címbalo húngaro no Bar Maxim’s em Genebra. Racz descreveu esse encontro
com entusiasmo: “Ansermet me perguntou se poderia tocar algo solo, mas eu
respondi que seria impossível por causa do barulho. Ansermet então pediu silêncio
ao dono do lugar, e toquei um kolo sérvio, e em seguida o amigo de Ansermet
correu para perto do címbalo. Era Igor Stravinsky. Ele tirou da manga com certa
dificuldade um caderninho no qual ele queria transcrever a música. Como um jovem
muito seguro que eu era, olhei para ele e pensei: ‘você nunca vai conseguir anotar a
música que estou tocando!’ [...] Stravinsky ficou fascinado com a forma do címbalo,
e por seu rico timbre e a técnica usada para tocá-lo. Ele imediatamente decidiu
adquirir um”. (WHITE, 1966, p. 242, grifos do autor, tradução nossa)44
44
“Sometimes in 1915, Ernest Ansermet had taken him to hear Aladar Racz play the Hungarian cimbalom at
Maxim’s Bar, Geneva. Racz has vividly described this meeting. ‘Ansermet asked me if I could play a solo; but I
answered that that was virtually impossible because of the noise. Ansermet then asked the proprietor to call for
56
Para introduzir esta análise sobre o timbre do violão, eis a seguir um trecho de um
depoimento de Andrés Segovia. Tal depoimento foi concedido para Christopher Nupen, autor
do documentário Andrés Segovia at Los Olivos (1967).
De fato, o violão é como uma orquestra que olhamos com binóculos ao contrário.
O que quero dizer é que todos os instrumentos da orquestra estão dentro do violão,
mas com menos potência sonora. Ele tem diferentes cores e timbres, e por isso é
necessário desenvolver essas qualidades do instrumento. (SEGOVIA, 1967,
silence, and I played a Serbian kolo, at which Ansermet’s companion rushed forward to the cimbalom. He was
wearing a monocle, a red tie, a green waistcoat and a tight jacket. It was Igor Stravinsky. He struggled with his
sleeve in order to shoot out his cuff, on which he wanted to note down the music. As a Young man I was rather
too sure of myself, and looked him up and down thinking ‘You won’t be able to take down what I am playing!’
[…] Stravinsky was fascinated by the trapezoid shape of the cimbalom, its full rich timbre, and the special stick
technique used in playing it. He immediately decided to buy an instrument for himself”.
57
tradução nossa)45
45
“For instance it is like an orchestra to which [sic] we could look to a reversed side of a binoculus [sic]. I
mean by that, that everything, every instrument of the orchestra is inside the guitar, but in smaller sound size. It
has many different color [sic), many different timbres, and it is necessary to develop those qualities of the
instrument”.
58
Na maioria dos métodos de orquestração, podemos achar uma tabela que descreve
o timbre dos instrumentos segundo a tessitura em que eles se encontram. Contudo, jamais
observei nada parecido para violão. Diante de tal lacuna, proponho uma tentativa de descrição
dos timbres do violão segundo as tessituras e digitações usadas. Cheguei ao resultado que
demonstro na Figura 8. Nota–se que os números circulados designam as cordas (Mi, Si, Sol,
Ré, Lá e Mi começando pela primeira corda, mais aguda) e os 0 (zeros), as cordas soltas.
Essa descrição, entretanto, não pode ser considerada uma referência confiável
porque nela o papel da mão direita é totalmente deixado de lado. Entretanto, na produção do
som, o papel da mão direita é de suma importância, já que ela é responsável por pulsar a
corda; a maneira de fazer a corda vibrar pode mudar muito e a maneira de pulsar depende de
59
vários fatores, tais como: qualidade das unhas, formato das unhas, ponto onde a corda é
pulsada, ângulo de ataque da unha, dentre outros.
A afirmação de Traube, transcrita a seguir, reforça essa minha ideia:
Os principais parâmetros que afetam o envelope espectral são a escolha das cordas,
a posição do ataque da corda, e a direção na qual a corda deixa o dedo/unha que a
acionou. Além de usar cordas diferenciadas, o método mais efetivo para variar o
timbre de uma nota é mudar o ponto de ataque da corda. (TRAUBE, 2004, p. 20,
tradução nossa)46
46
“The main parameters affecting the spectral envelope are the choice of string, the plucking position and the
direction in which the string leaves the plucking finger. Other than using a different string, the most effective
method of colour modulation of atone is to change the point at which the string is plucked”.
47
“Caricaturando, estalando os baixos”.
60
Contudo, é preciso ter em mente que quem faz o som do violão não é só o
instrumento, mas em grande parte o instrumentista. Isto explica por que um mesmo
instrumento na mão de violonistas diferentes vai, muito provavelmente, soar de forma
distinta. Essa ideia é reforçada por Pujol (1979, p. 53, tradução nossa)48, que afirma: “[...] um
mesmo instrumento em condições iguais não soa igual nas mãos de diferentes violonistas. O
violoncelo de Casals, o violino de Kraisler ou um piano de marca escolhida não produzem a
mesma qualidade de som tratados por diferentes mãos”.
É preciso levar em conta, também, a importância do uso das diferentes madeiras
na construção do instrumento. As madeiras que são tradicionalmente usadas para a fabricação
do tampo – parte vibrante mais importante do violão – são o Spruce e o Red Cedar.
Tradicionalmente, o Spruce – o pinho – era mais utilizado para a construção do tampo. Trata-
se de uma madeira flexível que oferece uma boa projeção do som, que costuma ser muito
brilhante e clara. O pinho evolui com o tempo, e cabe ao violonista amadurecer o violão para
deixar o som mais cheio.
48
“[…] the same instrument in similar conditions, doesn’t sound alike in the hands of diferent performers.
Casals’s cello, Kraisler’s violin, or a piano of an especially good make would not yield the same kind of sound
when played by diferent hands”.
61
- PM: Exatamente! A projeção, é o peso, e é somente através do peso que você pode
conseguir projeção, é o peso aplicado na corda… e a potência, é o musculo. E de
fato, todos esses violões australianos que têm um volume gigante, quando você os
coloca numa sala de concerto, não soa melhor que um Lacote… um violão do século
XIX preenche mais a sala que um Smallman… (MÁRQUEZ, 2018)49
Neste depoimento de Márquez, fica evidente que a potência do som do violão não
é só ligada à fabricação dos instrumentos, tipo de madeira, escolha das cordas, mas também,
em grande parte, à habilidade do violonista em tirar som do instrumento.
Resumindo, o timbre do violão engloba vários fatores, desde a qualidade do
instrumento, as madeiras empregadas, a maneira do violonista projetar o som, o formato e
cuidado com as unhas, o tipo de cordas, o tipo de vibrato, a digitação escolhida, o lugar da
corda onde é realizado o ataque, a velocidade do ataque, dentre outros.
49
Entrevista concedida por Pablo Márquez, com gravação via Skype em 11 de março de 2018. A entrevista foi
transcrita e depois traduzida para a tese.
62
surgimento da polifonia, as vozes precisavam ser discriminadas uma das outras para guardar o
sentido de cada frase superposta; o timbre começou a exercer seu papel nesse momento
(MANOURY, 1991, p. 295).
É importante ressaltar que, enquanto o timbre da orquestra de Mozart e Haydn não
é tão pesado, o da orquestra de Beethoven é bem mais cheio. Nesse sentido, os compositores
românticos foram seguindo essa linha, procurando sons que se fundissem uns aos outros para
criar novos timbres homogêneos.
Destaco o fato de Berlioz (1844) ser uma das figuras mais importantes no que se
refere ao timbre e à mistura de timbres. É considerado que existe, certamente, um antes e um
depois da publicação do seu tratado sobre orquestração. Isso culminou com as orquestras de
Berlioz e de Wagner, que sonhavam com orquestras grandiosas e poderosas, com timbres
potentes e cada vez mais cheios.
A partir desse ponto, nos primeiros anos do século XX, compositores
impressionistas como Debussy e Ravel, por exemplo, seguiram um caminho mais ligado ao
timbre de cada instrumento, usando alguns timbres exóticos até então nunca utilizados na
orquestra tradicional. Wagner procurou opacidade entre os grupos de instrumentos, criando
texturas complexas. Isso foi o início de um novo caminho no qual o timbre passou a ser um
componente essencial na composição.
A Segunda Escola de Viena, formada por Schoenberg, Berg e Webern, rompeu
com o paradigma composicional e começou uma nova procura no que diz respeito à mistura
de timbres, tentando sempre valorizar, ao máximo, a individualidade de cada instrumento,
elaborando texturas sutis e transparentes em vez de timbres similares e fundidos, criando o
conceito composicional chamado Klangfarbenmelodie ou “melodia de timbres”, como já
mencionado.
Depois da Klangfarbenmelodie, assistimos ao surgimento da música espectral,
cujos representantes são Giacinto Scelsi, Gerard Grisey, Tristan Murail, Hugues Dufour,
Michaël Levinas, dentre outros. O princípio dessa corrente foi o de entender os detalhes da
representação do timbre e, esteticamente, opor-se ao movimento do serialismo, preferindo
pensar o som complexo como algo contínuo, microscópico, paralelamente à forma
macroscópica da obra musical como um todo. O timbre é o elemento central do conceito
espectral, que procura entender a construção deste e se baseia nas fundamentais, parciais e
transientes para compor.
63
50
“À partir de Debussy, l'individualisation des instruments devient de plus en plus grande, et l'orchestre cesse
d'être systématiquement découpé en familles groupées par affinités de timbres ou de techniques instrumentales
(bois, cuivre, cordes). Dans Farben, troisième des Cinq Pièces pour orchestre, op. 16 (1909), Schönberg fait
alterner deux groupes formés respectivement des flûtes, clarinettes, bassons et altos et des clarinettes, bassons,
64
cors, trompettes et violoncelles, avant de pulvériser littéralement l'orchestre classique en lui appliquant une
véritable écriture de musique de chambre, un grand nombre d'instruments paraissant jouer en solistes”.
51
“Avec Farben, Schoenberg pose les bases de la notion de texture et l’ppose à la notion de timbre tout en y
établissant le lien de continuité. ... Si l’école post-serielle” a eu pour centre d’intérêt les problèmes soulevés
par le structuralisme et la génèse des systèmes, l’héritage de l’école de Vienne a crée un vide particulièrement
difficile à assumer par la génération des années 50 et 60. ... :a volonté de faire de la musique en évacuant les
príncipes fondamentaux qui la régissent, me paraît témoigner d’une démarche tout à fait incohérente et ne
pouvais aboutir qu’à une impasse (ce qui s’est d’ailleurs produit) ... Contrairement à Schoenberg, Debussy ne
détruit pas un système pour en rétablir un autre mais libère le mouvement sonore des contraentes tonales de la
résolution et opere une mutation sur le système. Debussy fait éclater le système tonal de l’intérieur”.
65
integram esse coletivo que reivindica a chamada música espectral e foram profundamente
influenciados pelo compositor italiano Giacinto Scelsi (DELIÈGE, 2003).
Sobre a técnica de composição utilizada na música espectral, Dalbavie (1991, p.
321) pontua: “[...] as notas tocadas pelos instrumentos são os harmônicos dos espectros e a
orquestração é feita em função das amplitudes retribuídas pelos sonogramas”52. Essa nova
concepção do timbre constituiu a passagem entre o timbre como cor e o timbre como material
básico na composição.
2.7 Orquestração
Sobre este tema, Paul Mathews lembra que “a orquestração inclui o conceito de
instrumentação, mas também se preocupa com a organização dos timbres instrumentais e o
equilíbrio das partes de uma textura musical” (MATHEWS, 2006, n.p., tradução nossa)54.
Berlioz também faz essa distinção no prefácio do seu tratado, insistindo no fato de que
primeiro tem que se conhecer o mecanismo dos instrumentos, as faculdades expressivas de
cada um deles (instrumentação), para poder depois aprender a agrupar satisfatoriamente
(orquestração) (BERLIOZ, 1844, p. 2).
Ainda para reforçar esta ideia, Belkin escreve na introdução de seu livro:
O que é orquestração? Para nós, como campo de estudo, a orquestração vem depois
da instrumentação, etapa preliminar na qual o estudante explora o funcionamento
dos instrumentos e realiza o que é razoavelmente tocável por um instrumentista
52
“[...] les notes jouées par les instruments vont être les harmoniques de ces spectres et l'orchestration sera faite
en fonction des amplitudes issues des sonnogrammes”.
53
“Descriptions pratiques: il est evident qu’en ouvrant un traité d’instrumentation, vous êtes en mesure de
consulter la liste des instruments un par un, la description de leur registre en fonction de leur utilisation, les
ressources de dinamique, d’articulation, de vitesse, de longueur de souffle, etc. Outre cela, on vous donne
quelques recettes très disparates, sans cohérence [...]”.
54
“Orchestration subsumes the concept of instrumentation but is also concerned with the allocation of
instrumental timbre and instrumental weight to parts of a musical texture”.
66
Rimsky-Korsakov (1964) vai ainda mais longe quando escreve no prefácio de seu
método que:
Já disse antes que me parecia impossível indicar como realizar lindos efeitos
orquestrais, e que essa faculdade provavelmente desenvolvida por exercícios e
observações conscientes, eram faculdades tais como as da melodia, da expressão, e
até mesmo da harmonia, dotes preciosos que o músico-poeta, calculador inspirado,
deve ter recebido da natureza. ... Considerando o aspecto poético, esta arte se
ensina tão pouco quanto a de criar lindas melodias, lindas sucessões de acordes e
formas rítmicas originais e potentes. (BERLIOZ apud CARPENTIER, 2008, p. 39,
tradução nossa)57
55
“What is orchestration? For our purposes, orchestration follows instrumentation, where the student will have
learnt how instruments work, and what is reasonably playable by a good professional. The common conception
of orchestration as simply assigning timbres to lines is very inadequate. Timbre is a potent aspect of musical
character”.
56
“A treatise on orchestration can demonstrate how to produce a well-sounding chord of certain tone-quality,
uniformly distributed, how to detach a melody from it harmonic setting, correct progression of parts, and solve
all such problems, but never will be able to teach the art of poetic orchestration. To orchestrate is to create, and
it is something which cannot be taught. It is a great mistake to say: this composer scores well, or, that
composition is well orchestrated, for orchestration is part of the very soul of the work”.
57
“J’ai déjà dit, je crois, qu’il me semblait impossible d’indiquer comment on peut trouver de beaux effets
d’orchestre, et que cette faculté, développée sans doute par l’exercice et des observations raisonnées, était
comme les facultés de la mélodie, de l’expression, et même de l’harmonie, au nombre des dons précieux que le
musicien-poète, calculateur inspiré, doit avoir reçus de la nature. [. . .] Considéré sous son aspect poétique, cet
art s’enseigne aussi peu que celui de trouver de beaux chants, de belles successions d’accords et des formes
rythmiques originales et puissantes”.
58
“L’art de l’orchestration est par nature, eminemment personel. [...] Il est donc imperatif de s’approprier les
règles de l’art afin de pouvoir, par la suíte, les personnaliser. L’oreille ser ale faceur décisif tant pour le choix
des instruments que pour leurs combinaisons”.
67
Adam Carse termina seu livro The History of Orchestration com as seguintes
palavras:
Não é possível, sem tocar o instrumento, compor para violão de maneira satisfatória,
usando todos os recursos do instrumento. É preciso, para ter uma ideia do que os
virtuosos conseguem tocar, estudar as composições de famosos violonistas tais
como Zanni de Ferranti, Huerta, Sor... ... Os compositores não usam o violão nas
igrejas, teatros ou salas de concertos… O seu volume sonoro é fraco e não permite
associá-lo a outros instrumentos, ou vozes muito brilhantes. Seu caráter melancólico
e sonhador poderia ser mais valorizado. O violão, ao contrário de outros
59
“Orchestration has been many things to many composers. It has been a servant of the great, a support to the
mediocre, and a cloak for the feeble. Its past lives enshrined in the works of the great dead, its present pants
after the exertion of recent progress, and its future lies as completely hidden as it lay at the end of the sixteenth
century”.
68
Berlioz chama a atenção sobre um fato hoje sabido: escrever para violão necessita
de um profundo conhecimento do instrumento, para que seja possível usar todos os recursos
do instrumento da melhor forma possível.
Para Gevaert (1885), o violão e a mandolina, além de não terem seu lugar na
orquestra, estavam destinados a desaparecer: “Desta categoria de instrumentos, antigamente
muito numerosos, só ficou hoje a mandolina, e o violão, ambos muito inusitados junto à
orquestra e destinados a desaparecer num futuro não tão distante” (GEVAERT, 1885, p. 4,
tradução nossa)61.
Gevaert (1885), como se vê, nem considerou a possibilidade de usar o violão
junto à orquestra.
Seria preferível que fossem compostas obras de música de câmara nas quais o
violão assumiria seu papel: tenho certeza que poderia funcionar muito bem, e que,
por exemplo, um pequeno grupo instrumental, flauta com viola (ou corno inglês e
violoncelo) se misturariam perfeitamente com o violão. Quanto ao seu uso dentro
da orquestra, isso é possível em casos excepcionais; normalmente, o violão é
evocado por efeitos de timbre realizados pela orquestra. De toda maneira, se você
escrever para violão fazendo parte da orquestra, lembre-se de que tem pouco
60
“On ne peut, je le répète, sans en jouer, écrire pour la guitare des morceaux à plusieurs parties, chargés de
traits et dans lesquels toutes les ressources de l’instrument sont mises en oeuvre, il faut pour se faire une idée de
que les virtuoses savent produire en ce genre, étudier les compositions de célèbres guitaristes tels que Zanni de
Ferranti, Huerta, Sor... ... Les compositeurs ne l’emploie guère à l’église, au théâtre, ni au concert. La faible
sonorité dont elle est pourvue, et qui ne permet pas de l’associer à d’autres instruments ou à plusieurs voix
dotées d’un éclat ordinaire en est sans doute la cause. Son caractere mélancolique et rêveur pourrait néanmoins
plus solvente être mis en évidence. Le charme en est réel et il n’est pas impossible d’écrire de manière à le
laisser apercevoir. La guitare, à l’inverse de la plupart des instruments, perds à être employée collectivement.
Le son de douze guitares jouant collectivement est presque ridicule”.
61
“De cette catégorie d’instruments, autrefois très nombreuse, il ne reste plus aujourd’hui que la mandoline, le
soprano de la famille des luths, et la guitare, toutes deux presque inusitées à l’orchestre et destinées à
disparaître dans un avenir peu éloigné”.
69
Não se pode negar a contribuição dada pelo autor aqui citado; contudo, de 1954
até os dias de hoje, a evolução da luteria e das técnicas de amplificação tem sido
considerável e houve também mudanças na percepção que temos do violão empregado junto
com a orquestra.
Os violões, constituem uma família muito rica. Eles têm a reputação não usurpada
de serem instrumentos excepcionalmente completos (cada violão é um ensemble por
si só) e de uma grande complexidade de escrita para quem não tem familiaridade
com ele: aconselho aos que teriam interesse de escrever para eles, consultar métodos
especializados e conversar com instrumentistas. (ADLER, 2011, p. 1004, tradução
nossa)63
62
“Il serait à souhaiter que l’on écrivît des oeuvres de musique de chambre oú la guitare jouerait son rôle: je
suis certain qu’elles pourraient être très reussies et que par exemple un petit groupe instrumental: Flûte avec
alto (ou cor anglais et violoncelle) se fondraient parfaitement à la guitare, par des combinaisons de
l’orchestre normal. Quand à son utilisation dans l’orchestre, elle n’est à sa place qu’en des cas exeptionnels;
en general, on se contente d’évoquer plutôt la guitare, par des combinaisons de l’orchestre normal. De toute
façon, si vous l’écrivez comme faisant partie de l’orchestre, rappelez-vous qu’elle a peu de sonorité; en
conséquence, veillez à ne point la couvrir”.
63
“Les guitares constituent, en elles-mêmes, une famille d’une grande richesse. Elles ont la réputation
absolument pas usurpée, d’être des instruments à la fois formidablement complets (chaque guitare est un
ensemble à elle seule) et d’une grande complexité d’écriture pour celui qui n’y est pas familier: nous ne
saurions que trop conseiller, à ceux désireux d’écrire pour elle, de consulter des ouvrages spécialisés et des
instrumentistes”.
70
Nada é mais frustrante para um violonista do que tentar tocar contra uma
orquestração muito pesada. Apesar do fato que o violão pode ser tocado com
rasgueos sonoros, a maior parte do tempo o toque é sutil, delicado e sofisticado.
Tem que ficar claro que o instrumento não consegue projetar mais do que uma
orquestra pesada e que requer uma escrita apropriada. Cordas e sopros podem ser
usados com uma escrita leve, e metais podem tocar em momentos que o violão não
está tocando. Os melhores resultados são geralmente alcançados quando a orquestra
fica em silêncio durante os solos do violão. (MILLER, 2015, p. 349, grifos do autor,
tradução nossa)64
O autor não propõe nenhuma solução prática para inserir o violão na orquestra;
Miller (2015) somente preconiza uma escrita leve dos sopros e recomenda silenciar os metais
e a orquestra enquanto o violão está tocando.
A lista de métodos apresentada não é exaustiva, mas, sim, representa meu
referencial teórico básico em matéria de métodos de orquestração.
64
“Few instances frustrate classical guitarists more than trying to perform against an orchestration that is
weightily scored. Though classical guitar can be strummed loudly, most of the playing is subtle, delicate and
sophisticated in nature. One must understand that the instrument cannot project over a heavily scored orchestra,
and adjust one’s writing appropriately. Lightly scored strings or woodwinds should be used, and brass scoring
should be avoided when the classical guitar is featured. The best results are often achieved when the orchestra
tacets during solo (non-strumming) sections”.
71
Nota-se que a última frase da citação acima confirma o que afirmei desde o início
desta tese: “um insatisfatório equilíbrio em um concerto de violão não pode ser corrigido
fazendo pequenos ajustes ou através de amplificação”. É quase impossível compensar uma
escrita defeituosa através deste tipo de artificio.
A seguir, irei apresentar rapidamente cada concerto que é objeto de análise neste
capítulo, contextualizando a época, o estilo e alguns dados informativos ou anedóticos sobre
cada peça.
65
“The success of a guitar concerto depends greatly on the integration of the soloist with the orchestra and the
balance between the guitar and the orchestra through imaginative orchestration and clever use of dynamics.
According to Stephen Dodgson it is possible to accompany the guitar with an orchestra if the composer has a
very delicate approach without emasculating the orchestra through prolonged silences. Also, an unsatisfactory
balance in a guitar concerto cannot be rectified by making small adjustments to the scoring or through
amplification alone as the problem lies within the foundation of the work (Mackenzie 2006)”.
72
Esta lista de concertos não foi estabelecida com base na relevância histórica, mas
sim pensando na matéria-prima existente que possa embasar o meu pensamento e o meu
argumento. Escolhi limitar o número de concertos para conseguir fazer uma análise mais
aprofundada dos mesmos, com o objetivo de extrair os elementos e os exemplos necessários
ao meu discurso. As análises limitam-se à questão da orquestração e ao tipo de escrita, e não
contempla outras questões como, por exemplo, a estrutura.
O Concierto de Aranjuez é o concerto para solista e orquestra mais tocado até hoje
e arranjado para inúmeras formações. Foi composto em 1939 por Joaquín Rodrigo (1901-
1999), compositor espanhol. O concerto foi encomendado em 1938 pelo Marquês de Bolarque
e a estreia aconteceu em Barcelona no dia 9 de novembro de 1940, com Regino Sainz de la
Maza ao violão junto à Orquestra Sinfônica de Barcelona, sob a regência de César Mendoza
Lasalle (ALMEIDA, 2006). Esse é o primeiro de cinco concertos para violão e orquestra
escritos por Rodrigo. O compositor se inspirou na música antiga, mais especificamente nas
músicas de Domenico Scarlatti e de Padre Antonio Soler.
Segundo o biógrafo de Andrés Segovia, Alberto López Poveda (2009), Rodrigo
teria convidado Segovia para fazer a estreia do concerto, mas Segovia teria alegado que o
primeiro movimento estava escrito em uma região muito aguda para o violão e aconselhou
Rodrigo a transpor o movimento inteiro para uma tonalidade mais acessível. Rodrigo teria
recusado.
Outro fato também relatado por López Poveda (2009) é que Segovia teria pedido
adiamento, pois estava morando na América do Sul e a estreia seria em Barcelona;
novamente, Rodrigo teria recusado, ansioso para estrear a peça. Foi então que Rodrigo
convidou Regino Sainz de la Maza para tocar no lugar de Segovia. Em decorrência desse
episódio, Segovia nunca tocou nem gravou o Concierto de Aranjuez, apesar de ter declarado
que gostava muitíssimo da obra (GIMENO, 2010).
O Concierto de Aranjuez é formado por três movimentos: Allegro con spirito,
Adágio e Allegro gentile. A obra conta com uma formação de cordas, madeiras e metais,
além do violão solista.
O próprio Rodrigo se expressa sobre a dificuldade de equilibrar a escrita entre o
violão e a orquestra: “Hoje, quando ouço a orquestração deste trabalho, não consigo entender
73
por que tive tantas dúvidas e fui tão dilatório ao escrever os diferentes níveis do
acompanhamento” (RODRIGO, 2016, p. 224 apud FOURIE-GOUWS, p. 65, tradução
nossa)66.
Como escreve Fourie-Gouws,
Interessante notar aqui que Rodrigo justifica uma escrita delicada não só porque o
violão não possui um som potente, mas sim porque ele considera que o timbre delicado e sutil
do violão precisa ser respeitado, e por isso o compositor precisa ter cuidado para não
desnaturalizar a sonoridade preciosa do instrumento.
Sérgio Assad faz o seguinte depoimento sobre o Concierto de Aranjuez:
Isso ai foi um êxito ímpar, porque ninguém conseguiu fazer um concerto que tenha
aquela proporção, está tudo bem orquestrado, não é difícil para a orquestra, é bem
fácil até, tem muita cor, você ouve o violão sem que ele esteja amplificado,
realmente foi um grande feito, é bonito, e ele resistiu ao tempo, você escute ele hoje,
e é um concerto que ainda tem um certo frescor. (ASSAD, S, 2018)
66
“Today, when I hear the orchestration of this work, I cannot understand why I had so many doubts and was so
dilatory in writing out the different levels of the accompaniment”.
67
“Uma postura comum nas touradas espanholas tradicionais, nas quais a capa é afastada do touro enquanto o
matador mantém seus pés na mesma posição” (MERRIAM-WEBSTER ONLINE DICTIONARY apud
FOURIE-GOUWS, 2017, p. 65, tradução nossa); “A common pose in traditional Spanish bullfighting in which
the cape is swung away from the charging bull while the matador keeps his feet in the same position (Merriam-
Webster Online Dictionary)”.
68
“In order to overcome issues of balance and audibility Rodrigo wanted to achieve ‘a clearly defined
orchestration’ that would be ‘strong enough to give weight to the ephemeral sound of the guitar while still being
light as to not drown the subtle sounds of this Spanish instrument, except for those occasions when the orchestra
covers any instrument, including even the piano’ (Rodrigo 2016: 220). According to Rodrigo the strength of the
guitar is found in its delicacy and intense contrasts in sound which he compares to a ‘breeze which moves the
leaves of the gardens and only wishes to be strong like a butterfly, but as tightly controlled as verónica, the pass
of a bullfighter’s cape (Rodrigo 2016: 219). It would be wrong to expect power in this Concerto of mine, and
one can look in vain for great sonority; that would be to falsify the guitar’s essential nature, and debase an
instrument which is capable of creating the subtlest of sounds”.
74
segundo flautista tocando também piccolo), dois oboés (segundo oboísta tocando
também do corno inglês), dois clarinetes, dois fagotes, duas trompas e dois
trompetes. O tamanho da orquestra poderia facilmente ter encoberto o violão, mas
Rodrigo equilibra o solista e a orquestra usando orquestração transparente e leve,
onde o violão é destaque. Solos de instrumentos da orquestra são frequentemente
apresentados com o violão, incluindo o fagote, violoncelo, corno inglês, trompa,
oboé e primeiro violino. Rodrigo faz uso da qualidade timbrística destes
instrumentos de orquestra para criar texturas interessantes e uma conversa entre o
solista e a orquestra. (FOURIE-GOUWS, 2017, p. 66, tradução nossa)69
Andrés Segovia, que em um primeiro momento teria tido certas reticências com o
Concierto de Aranjuez (nunca o tocou), se expressou da seguinte forma depois de ouvir
Regino Sainz de La Maza tocando:
Ontem à noite fui ouvir o Concierto de Aranjuez, interpretado por Regino. Eu mudei
de opinião. Para mim, parece fresco, fluido e agradável, graças à orquestra. Mas
Sainz de la Maza, quem estudou muito, fez berrar o instrumento de uma maneira
muito dolorosa. Pino [artista espanhol Miguel Angel del Pino Sardá], que veio
comigo, disse que parecia que o violão estava sendo atravessado por pequenos
arames; e eu, com muita sinceridade, disse a Pino que, pela força aplicada para obter
o volume necessário, se meu som também chegasse a ser como o de Regino, eu
preferiria então desistir de tocar com orquestra imediatamente (como citado por
Postlewate 2013b: 28). (FOURIE-GOUWS, 2017, p. 71, tradução nossa)70
69
“Rodrigo uses an unprecedented combination of instruments to accompany the guitar in his Concierto de
Aranjuez, including a full string section, two flutes (with the second flutist doubling piccolo), two oboes (second
oboist doubling cor anglais), two clarinets, two bassoons, two French horns and two trumpets […]. The sheer
size of the orchestra could have easily drowned out the guitar, but Rodrigo balances the soloist and orchestra by
using transparent and light orchestration where the guitar is featured. Solo instruments from the orchestra are
often featured with the guitar, including the bassoon, cello, cor anglais, French horn, oboe and 1st violin.
Rodrigo makes use of the timbral qualities of these orchestral instruments to create interesting textures and a
‘conversational’ quality between the soloist and orchestra”.
70
“Last night I went to hear the Concierto de Aranjuez, played by Regino. I have changed my mind. To me it
seems fresh, fluid and pleasant, thanks to the orchestra. But Sainz de la Maza, who has learned it well,
screeched it out in a most sorrowful way. Pino [Spanish artist Miguel Angel del Pino Sardá], who came with me,
said that it seemed like the guitar was strung with little wires; and I, very sincerely, told del Pino that if, by the
force of getting the greatest sonority out of the instrument, my sound was like Regino’s, I would give up playing
with orchestra[s], immediately (as cited in Postlewate 2013b: 28)”.
75
... ele [Saci-Pererê] gosta de fazer brincadeiras com as pessoas, e fica rindo sempre
que algo dá errado...! Outra faceta dessa incrível criatura é que ele se torna um
pássaro, que canta uma música linda e triste. Quando se transforma em pássaro, Saci
é conhecido como Matita-Perê. (ASSAD, 2016, n.p.)
Jackson, crítico musical, estava presente na estreia da peça e tece elogios de várias
formas:
Esta peça também faz uso da orquestra de maneira inusitada, como na parte onde os
músicos batem com o pé no chão em um uníssono rítmico – lembrando um pouco
um dançarino de flamenco – ou quando uma linha musical é acompanhada por quase
inaudíveis sussurros e cochichos. É sem dúvida uma peça um pouco estranha em
alguns momentos, mas sempre altamente musical e atraente. ... É sem dúvida desse
tipo de peça envolvente e cheia de aventuras que o repertório para violão precisa
(JACKSON, 2016, n.p., tradução nossa)71
Esta crítica já deixa a entender que Assad usa recursos não tradicionais na sua
escrita, na qual a compositora procurou criar um ambiente ora misterioso, ora assustador, ora
cômico, através da criação de timbres extraordinários. Sendo assim, O Saci-Pererê é uma
peça na qual o timbre tem uma importância particular. A obra conta com uma formação de
cordas, sopros e metais, percussões, além do violão solista.
Outras obras para violão e orquestra de Assad: Álbum de retratos (2012),
Concerto for two guitars and strings (2018).
71
“This one also used the orchestra in unusual ways, with parts where the musicians stamped their feet
rhythmically in unison – sounding a bit like a flamenco dancer – or a musical line would have a strong
undercurrent of unintelligible whispering, then muttering. It was unquestionably bizarre in places, but always
highly musical and definitely compelling. Some of it had the sweeping grandeur of a great film score (though
usually with some odd twist thrown in); other sections were most mysterious [...]This is precisely the sort of
adventurous and involving piece the guitar repertoire needs more of. I hope other orchestras will take a chance
on it”.
76
Esta peça foi baseada na Sequenza XI72 para violão solo. A estreia aconteceu em
1992, com a interpretação do dedicatário da peça, Eliot Fisk, e com a Orquestra de
Beethovenalle e sob regência de Luciano Berio, em Bonn. A formação consiste em violão e
pequena orquestra (madeiras, metais, acordeom e harpas, além do solista). Esta é a única peça
de Berio para violão e orquestra.
Quanto à eletrônica, há pessoas que não conseguem ouvi-la direito, pois ela foi
pensada como algo que cria unidade e amplifica alguns gestos instrumentais, e não
como uma eletrônica solista, ela é realmente algo orquestral. Aliás, a ideia é que ela
esteja disposta dentro da orquestra no nível dos músicos, com duas caixas.
(BONILLA, 2018, tradução nossa)73
72
Luciano Berio escreveu 18 Sequenze para instrumentos solistas entre 1958 e 2004, fazendo uso de inúmeras
técnicas expandidas, como se quisesse mostrar tudo que é possível fazer no intrumento, explorando-o até o seu
limite.
73
“Quand à l’electronique, il y a des personnes qui ne l’entendent pas dans la pièce, elle me servait juste à creer
du liant, à amplifier certains gestes instrumentaux, mais ce n’est pas une electronique soliste, c’est vraiment une
77
A eletrônica aqui é uma cor orquestral, em outras palavras um recurso sutil que se
mistura com os outros timbres acústicos; a função dela aqui é a de se misturar e não de
contrastar. Bonilla compôs várias peças de música de câmara que incluem o violão, mas
Entailles é a única para violão e orquestra.
Esta peça é um pilar do repertório para violão e uma síntese da obra para violão de
Heitor Villa-Lobos. Ela foi encomendada em 1939 por Andrés Segovia e só foi terminada em
1951. Nota-se que o ano da encomenda é também o ano da estreia do Concierto de Aranjuez,
o que pode levar a pensar que possa ter sido decorrente de uma certa frustração por não ter
estreado o Concierto de Aranjuez. Para contextualizar ainda melhor a composição desta obra,
eis a seguir um trecho de uma carta de Segovia para Villa-Lobos escrita em outubro de 1951:
Meu caro Villa-Lobos: lamento profundamente que a longa carta que lhe escrevi
desde Siena não tenha chegado. É terrivelmente difícil para eu achar o tempo
necessário para escrever, por causa de minhas viagens e concertos constantes. Tanto
mais porque eu não queria me contentar com algumas linhas, mas com uma longa
missiva, colocando-o a par de tudo o que concerne à bela Fantasia Concerto. Sempre
esperando poder escrever com calma, dispondo de algumas horas de tranquilidade,
fiquei adiando a carta para você. Agora decidi, sobretudo porque Olga74 me trouxe a
partitura. Foi uma grande alegria recebê-la. As objeções que eu iria fazer diante da
redução para piano e guitarra, não têm mais fundamento, olhando a orquestração tão
leve e cuidada que você fez. Não tenho mais medo de que a guitarra seja encoberta;
vejo que os timbres dos diferentes instrumentos que, alternadamente, o acompanham
farão, ao contrário, sobressair o encanto único de sua sonoridade. (SEGOVIA apud
MELLO, 2009, p. 19)
electronique orchestrale.D’ailleurs l’idée etait qu’elle soit disposée à l’intérieur de l’orchestre au niveau des
musiciens, avec deux enceintes”.
74
“Apesar de ter nascido em Manaus a família de Olga era meio que nômade, e quando a futura cantora estava
com onze anos os seus pais mudaram-se para a capital da Bahia, Salvador por um curto período, pois em 1923
eles mudaram-se novamente estabelecendo-se dessa vez na então capital federal, o Rio de Janeiro. Morando em
num casarão situado na Rua das Laranjeiras foi por lá que surgiu em definitivo o seu interesse pela música.
Ciente desse interesse os pais a incentivaram a partir de aulas de violão com o cantor e violonista Patrício
Teixeira. Em 1928 Patrício Teixeira a levou para a Rádio Clube do Brasil. No ano seguinte, realizou sua
primeira gravação para a Odeon, registrando a embolada ‘A mosca na moça’, de motivo popular e o samba do
norte ‘Sá querida’, de Celeste Leal Borges. Ainda em 1929, passou a estudar sob a orientação do compositor
Lorenzo Fernandez, com quem teve aulas de teoria, harmonia e composição. Pelo o que se vê a pretensa artista
mostrava interesse em ser uma artista completa buscando conhecimento até do instrumento. Em 1932, ingressou
no Instituto Nacional de Música, estudando sob a orientação de Lorenzo Fernandez. Concluiu o curso
rapidamente, diplomando-se no ano seguinte. Passou então a tomar aulas de canto com Riva Pasternak e
Gabriella Bezansoni. Em 1930, lançou mais três discos pela Odeon. [...] Em 1944, conheceu o violonista
espanhol Andres Segovia (1893-1987) com quem passou a viver. Segovia lhe dedicou várias transcrições e
arranjos para canto e violão. Passou desde então a residir em Nova York e empreendeu uma vitoriosa carreira
artística internacional, só voltando ao Brasil esporadicamente e chegando a lançar ainda dois discos na década de
1950. Uma curiosidade sobre Olga se dá através das composições feitas para sua interpretação. Vários
compositores lhe dedicaram obras e transcrições para voz e violão, destacando-se no conjunto dessas a da
famosa ‘Bachianas nº 5’ de Villa Lobos [sic] (original para oito violoncelos), feita especialmente para ela, que
contava com o apoio da esposa de Villa Lobos [sic], Dª Mindinha, para convencê-lo a tal empreendimento”
(NEGROMONTE, [20--]).
78
Villa-Lobos nunca se sentiu muito embalado para utilizar o violão como instrumento
solista no meio de uma orquestra, apesar da importância que este havia ocupado em
sua formação musical. De um lado porque ele não via exatamente que combinações
tímbricas poderiam ser utilizadas. De outro, porque achava um tanto quanto
aberrante a oposição de um violão solo a toda uma orquestra, dado, sobretudo, ao
seu baixo potencial. (PEREIRA apud ALMEIDA, 2006, p. 129)
Mais uma vez, fica claro que a mistura do timbre do violão com o da orquestra
constitui um real desafio. Contudo, é importante lembrar que o próprio Villa-Lobos era
favorável ao uso da amplificação para deixar a orquestra mais livre, como esclarece a seguir o
depoimento de Turíbio Santos:
Porém, Segovia era contra o uso da amplificação e por essa razão a estreia foi
realizada sem amplificação. Segundo Arminda Villa-Lobos, “a estreia foi ‘chocha’, pois,
apesar de se ouvir perfeitamente o violão, a orquestra não estava ‘solta’” (MELLO, 2009, p.
21). O próprio compositor escreve sobre o concerto: “obra escrita em 1951, para violão e uma
orquestra equilibrada com recursos de timbre que não se sobrepõe à sonoridade do solista. É
constituída de três movimentos: Allegro Preciso, Andantino e Andante, Allegro non Troppo”
(VILLA-LOBOS apud ALMEIDA, 2006, p. 130); fica nítido neste depoimento que a questão
do equilíbrio entre o violão e a orquestra era uma real preocupação para Villa-Lobos.
Houve alguns desentendimentos depois da entrega do manuscrito a Segovia; um
deles foi que o concerto não possuía cadência na primeira versão, então intitulada Fantasia
Concertante para violão e pequena orquestra. Segovia precisou ser extremamente insistente
para que Villa-Lobos concedesse uma nova versão onde constaria uma cadência, que se situa
entre o segundo e o terceiro movimento (SANTOS, 1975, p. 29). Por fim, Segovia teria feito
algumas mudanças na parte do violão, como esclarece Almeida:
meio dessa cópia, encontrou também três folhas em que Segovia havia escrito
algumas mudanças na partitura, segundo Gilardino, à revelia do compositor, com o
intuito de obter uma escrita mais violonística e sonora para o instrumento.
(ALMEIDA, 2006, p. 131)
O Concerto para violão e pequena orquestra, apesar de ser um dos concertos para
violão mais tocados no mundo, não teve uma trajetória fácil e foi bastante criticado,
principalmente no que diz respeito ao equilíbrio entre o solista e a orquestra.
A seguir, Fabio Zanon expõe algumas críticas sobre o concerto de Villa-Lobos e
também sobre outros concertos:
[...] tem muita coisa que eu acho que a orquestra soa forte demais, muito intrusiva,
mesmo quando você está bem amplificado, então é uma coisa curiosa isso, né?
Quando o compositor se dá essa liberdade, mas acaba experimentando coisas na
orquestração que não funcionam nem com microfone... Villa-Lobos tem isso
também. (ZANON, 2018)
Dependendo a gente dobra, com cello, dobra com a viola, dobra com o clarinete,
enfim, a gente tem uma tessitura muito limitada, então nesse sentido o dobramento
pode ser perigoso, porque acaba tocando todas as notas, inclusive aquelas que o
violão deveria estar tocando na sua harmonia, e o violão não aparece, acaba sendo
cancelado pelo som de certos instrumentos que nem fagote, clarinete, que não têm
muito volume, mas têm uma riqueza de harmônicos que acaba cancelando o violão,
e eu acho que isso é o grande problema do concerto de Villa-Lobos na verdade... Na
hora do tema seresteiro do primeiro movimento, a orquestra, aliás as cordas, estão
tocando exatamente as notas dos acordes do violão... então não use o violão, simples
assim... Mas eu me pergunto se o Villa-Lobos tinha visto alguma coisa de violão
com orquestra antes... talvez o Aranjuez, possivelmente o do Castelnuovo-Tedesco...
mais do que isso não deve ter visto... (ZANON, 2018)
75
“In an interview published in Les Cahiers de la Guitare (as cited by Postlewate 2013a: 32-34) Uruguayan
virtuoso guitarist Able Carlevaro (1916-2001), who had a close relationship with Villa-Lobos, mentions that
rather than a solo guitar concerto Villa-Lobos intended to write a concerto for guitar and percussion. However,
Segovia was adamant that percussion instruments “don’t go well with the guitar … What [the concerto] needs
are violins”. Later Villa-Lobos confided in Carlevaro: I have lost the concerto [for guitar and percussion]: I
am too tired and sick to find it. The concerto that is published is not the one that I wanted to write (as cited by
Postlewate 2013a: 34)”.
76
“Villa-Lobos avoids the grandeur of the symphonic solo concerto with the instrumentation and orchestration
remaining intimate and chamber music-like in character (Béhague 1994: 144). In sections where the orchestra
accompanies the guitar, Villa-Lobos often opted to divide the orchestral material into sections with either the
woodwinds or the strings accompanying the guitar. The alteration between instrumentation from phrase to
phrase during accompaniment as well as orchestral solo creates unique timbral interest. Full orchestral
accompaniment is reserved for sections in which the guitarist plays rasgueados. Villa-Lobos does not call for a
prolonged silence of the orchestra in order to achieve audibility for the soloist. In fact the guitar only plays
unaccompanied 8% out of the total number of bars of the entire concerto […] The guitar and orchestra are
highly integrated (73% out of the total number of bars in the concerto) and the soloist and orchestra often share
in the utilisation of a motif. In order to balance the delicate armistice between the soft spoken guitar and the
orchestra, Villa-Lobos gives instruments that are playing simultaneously with the guitar different rhythmic
figurations than those of the guitar. As with the other concerti examined in this study the orchestral
81
Por fim, cito a seguir um curto depoimento do compositor cubano Leo Brouwer
sobre o concerto para violão de Villa-Lobos:
[...] às vezes você tem uma peça que teria que ter quinze minutos, mas dura
quarenta, ou uma peça como o concerto de Villa-Lobos que poderia ser um
verdadeiro concerto, e é apenas um anúncio de um concerto porque não há
desenvolvimento, não há maturidade. Tem ideias bonitas e boa escrita, mas ele
apenas fez assim, e não mais. (BROUWER apud MCKENNA 1988, p. 111,
tradução nossa)77
Neste depoimento, Roussell é bastante positivo sobre a peça, mas expressa a sua
frustração pelo fato de não haver um clímax durante a peça; talvez, justamente por medo de
exagerar na escrita, Villa-Lobos acabou evitando momentos de maior expansão da orquestra.
Como descreve Tyranny ([20--]), esta peça foi uma encomenda do violonista
Ichiro Suzuki e do Festival Internacional de Liège, na Bélgica, sendo orquestrada numa
formação tipicamente debussyana com uma orquestra romântica mais duas harpas e uma
accompaniment often moves in crotchets with sustained notes and rests to provide transparency in sections
where the guitar is rhythmically active. Villa-Lobos further augments this transparency by assigning sustained
harmonics as well as pizzicato passages to the string section, creating an even thinner texture within the
orchestration”.
77
“So sometimes you have a piece that should be fifteen minutes but goes on for forty minutes, or a piece like the
Villa-Lobos concerto, that could be a real concerto, and it is justa n announcement of a concerto because there
is no development, there is no maturity. It has beautiful ideas and good writing, but he just did it like that and no
more”.
78
“The scoring is for small orchestra – mostly strings, with oboe, flute, bassoon, and a suggestion of brass for
the other coloration and weight. The solo instrument is kept in quiet voice, except for a point or two of moderate
stress, and is given, between the second and final movements, an extended solo cadenza which deals richly in
ornamentation and transmutation of the principal themes. Segovia played it, and Villa-Lobos conducted the
ensemble, in ways that were quite magic and always lovely to hear. The piece is expressive; it is beautiful. If
there are faults in it, one of them is its very insistence upon reticence and comparative absence of climax; its
preference of lyricism to stressful bravura”.
82
seção extensa de percussão, assim como a maioria das peças orquestrais de Takemitsu. É uma
escrita rica em texturas complexas como escreve Tyranny:
Vers l’arc-en-ciel de Takemitsu que é uma orquestração enorme, você tem de tudo
ali... mas ele usa de uma forma tão parcimoniosa, e com o ouvido tão apurado para
as dinâmicas de cada instrumento combinado com o que o violão pode fazer, que
você praticamente depois de acertar o volume do violão, ele funciona inteiro, da
primeira até a última página. E o que é principal, e para mim é fundamental, é que
você escuta as dinâmicas do violão, porque não é porque você amplifica e coloca
num volume muito alto que vai ouvir pp, p, mp, mf, f e ff, porque o violão já tem
essa coisa comprimida, tem essa compressão natural das dinâmicas, e no Takemitsu,
ele explora isso maravilhosamente. (ZANON, 2018)
Edison Denisov (1929-1996) foi um compositor russo que teve uma certa
influência da Segunda Escola de Viena e do serialismo. A formação é composta de madeiras,
metais, percussões e harpas, além do violão solista. Esta é a única peça para violão e orquestra
de Denisov.
Esta peça é uma das três obras para violão e orquestra compostas pelo compositor
uruguaio Abel Carlevaro (1916-2001), que deixou para o violão uma nova visão do estudo da
79
O glockenspiel é um tipo de xilofone com lâminas metálicas.
80
“Takemitsu layers timbres in dense textures, like Webern or Schoenberg, or creates fleeting passages where
densely harmonized lines occur in rhythmic unison among several instruments (for example, the shimmering tutti
figures for two harps, celesta, vibraphone and glockenspiel in the fourth measure of the introduction). As a
whole, the piece seems to proceed from conscious gestures ‘to the edge of dream’”.
83
técnica graças aos seus Cadernos81. A Fantasia Concertante foi encomendada pelos The San
Francisco Contemporary Music Players. A estreia aconteceu no dia 22 de abril de 1985, com
interpretação do próprio Carlevaro junto à orquestra citada acima, com regência de Jean-
Louis Le Roux, dedicatário da obra. A Fantasia Concertante foi publicada em 1997
(Chanterelle Heildelberg) e nela constam violão, orquestra de cordas e percussão
(ESCANDE, 2005).
Outras obras de Carlevaro para violão e orquestra são Concierto del Plata e
Concierto para Guitarra n.3.
81
Carlevaro publicou 4 Cadernos sobre técnica do violão que foram revolucionários e são referência até hoje –
Cadernos 1, 2, 3, 4 - Série didática para violão.
82
“Em toda Andaluzia, rocha de Jaén e búzio de Cádiz, as pessoas falam constantemente do duende e o
descobrem naquilo que sai com instinto eficaz. [...] Assim pois o duende é um poder e não um obrar, é um lutar e
não um pensar. Eu ouvi um velho violonista dizer: ‘O duende não está na garganta; o duende sobe por dentro a
partir da planta dos pés’. Ou seja, não é uma questão de faculdade, mas de verdadeiro estilo vivo; ou seja, de
sangue; ou seja, de velhíssima cultura, de criação em ato” (GARCIA LORCA, [1933], n.p.).
83
“Mais do que um símbolo musical da multimilenária cultura andaluza, o cante jondo («canto fundo»), tal
como o seu epíteto indica, exprime – através de uma ambiência sonora cristalizada ao longo de séculos e
assimilada na escrita pianística de um Albéniz ou de um Granados – o que de mais profundo encerra o espírito
popular” (LOPES, 2009, n.p.).
84
“L’oeuvre est le résultat d’une longue et attentive observation des différentes interprétations que les
guitaristes populaires ont donné sur tout les styles de base, en écoutant leur inspiration de chaque moment. De
manière évidente le concerto de Ohana est une référence aussi bien dans sa conception que dans son
instrumentation, au ‘duende’. Avec les moyens propres à l’auteur auxquels s’ajoutent les ressources de
l’instrumentations moderne (y compris certains éléments de la musique concrète), les Trois Graphiques recréent
des éléments essentiels du ‘cante jondo de la guitare”.
84
Nota-se que Ohana usa o verbo reforça quando se refere à massa harmônica
formada pela orquestra, enquanto o violão fica mais atrelado ao ritmo – de inspiração popular
espanhola – e à linha melódica. A orquestra está, então, a serviço do violão. Esta é a única
peça para violão e orquestra de Maurice Ohana.
Esta peça foi feita para Julian Bream, é um tipo de retrato dele. É triste, é agressivo,
é nostálgico, é inteligente, é neurótico... Julian nunca tocou música latina... só Villa-
Lobos, um pouco. Ele não gosta. [...] mas ele me pediu para escrever esse concerto
para ele, que é um tipo de concerto biográfico. (BROUWER, 2000, n.p.)
Foi escrita para violão solo, percussão e cordas e, como se pode ler no prefácio na
grade da orquestra, foi estreada no dia 30 de julho de 1986 por Julian Bream, e o Langham
Chamber Orchestra em Londres, sob a direção do próprio Leo Brouwer. Posteriormente, foi
gravada para o selo R.C.A., pelo R.C.A. Victor Orchestra, Julian Bream ao violão e Leo
Brouwer na regência.
Como se pode ler no prefácio da partitura, este concerto, às vezes chamado de
Concerto n. 4, foi comissionado pela Sociedade de Violão de Toronto. A estreia se deu no dia
26 de junho 1987 por John Williams durante o Festival de violão de Toronto, GUITAR 87’,
com direção do próprio Leo Brouwer.
O compositor, durante uma entrevista, explicou:
A seguir, a lista de peças para violão e orquestra de Leo Brouwer (um total de 22
peças):
85
“Il convient de noter que Ramon Montoya, représentant inspiré de la lignée dimprovisateurs virtuoses, a été
pendant quelques temps un collègue et ami d’Ohana. Le compositeur a pu s’inspirer des complexes subtilités
obtenues par l’articulation de ses pièces chantées ou dansées en étroit dialogue avec la guitare. Traité de cette
façon, le langage de la guitare met en relief le rythme, ainsi que la ligne mélodique. En revanche, c’est à la
masse harmonique de mettre en relief l’accentuation rythmique”.
85
Apesar de não ser uma peça para violão solista e orquestra, considero interessante
analisá-la e tê-la como um modelo de mistura de timbres satisfatório.
86
“J'ai rencontré Fuminori vers 2000-01 grâce à Atanas, qui le connaissais par le biais de sa femme japonaise.
L'idée d'une pièce soliste est venue très vite mais il a mis quelques années avant de l'écrire. Comme il est
pianiste à l'itinérarire la création s'est fait avec eux avec Mark Foster à la baguette lors d'un concert mélant sa
musique avec de la musique traditionnelle japonaise. Je pense qu'il a été très influencé par la pièce de Kurtág,
et ça s'entend clairement au début de l'octuor. Mais contrairement à l'oeuvre de Kurtág, l'idée globale de
l'octuor est que tout se qui se passe à l'orchestre est une sorte de résonnance de ce que la guitare fait” – em
entrevista por e-mail em 2019.
87
“Desde la primavera de 1926, los temas principales de esta obra ya germinaban en el espíritu de Ponce, pero
las circunstancias de mi vida errante, que nos separaron por largos años, le impidieron continuarla y llevarla a
su fin. La obra esperó hasta que, venciendo miedos y dudas sobre la factibilidad de escribir para guitarra con
87
Este concerto tem uma formação particular por usar uma instrumentação
extremamente reduzida: 2 violinos I, 1 violino II, 1 viola, 1 violoncelo, 1 contrabaixo, 1
flauta, 1 clarinete, 1 trompa e violão solista. Além desta obra, Arnold também escreveu a
Serenada para violão e cordas (1955).
3.2 Estratégias
3.2.1 Texturas
Na verdade, uma orquestra de solistas ou uma orquestra grande não faz mais ou
menos barulho... A percussão sim faz mais barulho, mas fora isso, é realmente a
Barely forty, Arnold’s output is already prodigious. [...] Fully aware that Spain is traditionally the “spiritual”
home of the guitar, Arnold has deliberately decided to give the instrument a more universal character. He has
successfully circumvented the Spanish overtones of the instrument by the subtle use of modal melodic material.
The opening movement is based on two themes, the first in the Dorian mode transposed and the second in the
Ionian mode transposed. The use of chordal ostinato is one of the more unusual features of the development
section. The Lento, which provides the central framework of the Concerto, was written as an elegy, in memory of
the famous French guitarist Django Reinhardt- a special hero of both Malcolm and myself. Its mood is reflected
in a finely dressed blues, briefly interrupted by a Vivace section. The last section, full of wistful humor and
lyricism, is in the form of a rondo. Here again Arnold keeps to strict modality, each of his four themes being in a
different mode. The coda, thrumming out the open string tuning of the guitar, works up to a great climax with a
breath-taking bravura twelve-fret (one octave) glissando”.
89
3.2.1.1 Definição
Erickson aprofunda ainda mais a sua reflexão, apresentando a textura como uma
forma tridimensional na qual a base seria mais larga que o topo:
Todas as texturas, sejam elas simples ou mistas, tendem a exibir esse formato –
largo na base e menor no topo – isso, dependendo da margem de manobra. Algumas
das passagens mais interessantes na música contemporânea são aquelas onde, graças
ao timbre, às dinâmicas, e outros fatores ainda, essa estrutura é reconstituída.
(ERICKSON, 1975, p. 154, tradução nossa)91
89
“En fait, um orchestre de solistes ou un grand orchestre ne fait pas plus ou moins de bruit... La percussion
oui, elle fait plus de bruit, mais hormis ça, c’est vraiment une question d’écriture, de la manière dont je vois ça,
ce n’est pas vraiment un problème d’instrument, mais c’est la manière dont c’est écrit”.
90
“Texture Always denotes some overall qualities, the feel of surfaces, the weave of fabrics, the look of things,
words from visual and tactile sense modalities are often appropriated for descriptions of sounds and their
combination: sharp, rough, dull, smooth, biting, bright, brilliant, brittle, coarse, thick, thin, dry, diaphanous,
airy, finespun, flaccid, fluid, gauzy, glittery, grainy, harsh, hazy, heavy, icy, inchoate, jagged, limpid, liquescent,
lush, mild, murky, pliant, relaxed, rippling, to name a few. During a past half-century, more music have been
written, in which texture itself is primary. […] Masses, clouds and other composite’s textural are by no means a
recent invention. Debussy, Strauss, Wagner, Berlioz, and their contemporaries, developed and vigorously
exploited, the potential of orchestral texture. But in most of the compositions of Varese, and in certain
compositions of Schoenberg, Berg, Webern and Stravinsky, texture is central, in no way a by-product of
contrapuntal, harmonic, melodic or rhythmic processes”.
91
“All musical textures, whether single or composite, exhibit this dimensional tendency, - big on the bottom,
small on top – if they have sufficient bandwidth. Some of the most interesting passages in contemporary music,
are those where, through, timbre, dynamics or others means, this space is restructured”.
90
Serão listadas a seguir algumas texturas usadas pelos compositores com o objetivo
de valorizar o timbre do violão em conjunto com o resto da orquestra, lembrando que na
maioria das vezes as texturas se confundem, se juntam e se separam. É importante ter isso em
mente, pois categorizar demais os fenômenos na hora de compor pode ser um desserviço à
música. Porém a listagem dos elementos composicionais tem como objetivo identificar as
diferentes estratégias e soluções possíveis, de modo algum instituir regras de composição.
Portanto uma textura orquestral bem pensada e realizada é uma das principais estratégias a ser
considerada quando o objetivo é obter um equilíbrio satisfatório entre o timbre do violão e o
da orquestra.
Se você está escrevendo um concerto no qual você quer que o violão fique ativo,
você pode fazer de duas formas, você vai fazer escalas, ou você vai fazer arpejos...
escalas e arpejos são duas coisas completamente diferentes, porque a emissão vai ter
uma passagem diferente, dependendo do que você tem detrás como suporte, mas das
duas formas, você tem que evitar colocar nota contra nota, se são muitas notas no
violão, você tem que segurar o que está acontecendo detrás, mas para quem tem uma
escrita polifônica como eu tenho, é irresistível você não criar linhas, mas às vezes
você tem que tomar cuidado. Estou movimentando, digamos, a parte das cordas e
tentando fazer algo mais interessante nas cordas, em vez de deixar tudo plano, vai
ter que ter muito cuidado, sobretudo os saltos que acontecem nos agudos, porque o
próprio ouvido tem tendência a seguir o que acontece no topo, isso eu tento fazer
hoje em dia, mais do que antes. (ASSAD, S, 2018)
Exemplo Musical 1 - Fantasia Concertante de Abel Carlevaro, p. 1-3 Intérpretes: Abel Carlevaro e The
Francisco Contemporary Music Players. CD Abel Carlevaro Ao Vivo Vol. 1 (CARLEVARO, 2002).
92
Figura 10 – Fantasia Concertant de Abel Carlevaro para violão, cordas e percussão (CARLEVARO, 1999, p.
1).
93
Figura 11 – Fantasia Concertant de Abel Carlevaro para violão, cordas e percussão (CARLEVARO, 1999, p.
2).
94
Figura 12 - Fantasia Concertante de Abel Carlevaro para violão, cordas e percussão (CARLEVARO, 1999, p.
3).
95
No ano de 1962 deu-se a primeira edição de uma das mais prestigiosas revistas
sobre música: Perspectives of New Music. Neste número inaugural constava o ensaio
“Stravinsky: the progress of a method” de autoria do grande teórico norte-americano Edward
T. Cone (1917-2004), que foi traduzido por Antenor Ferreira Corrêa e Graziela Bortz para a
Revista Música Hodie em 2007. Neste artigo, Cone explicita como acontece a técnica
chamada estratificação da seguinte forma:
composições foram compostas por voz, uma camada após a outra. (ERICKSON,
1975, p. 154, tradução nossa)92
A transparência do som pode ser mais bem atingida quando os elementos utilizados
são heterogêneos e não homogêneos. Cores similares, em particular timbres (tone-
colour) similares, se fundem demasiadamente um com o outro, formando acordes, e
isso dificulta muito a distinção da construção da textura. (SCHOENBERG, 2006, p.
138)
Exemplo Musical 2 – Chemins V de Luciano Berio, p. 17-19. Pablo Márquez e Orchestra Della Svizzera
Italiana. CD Maderna & Berio: Now, And Then (2017).
92
“We are seeing a resurgence of many techniques of layering from our own historical past and a remarkable
interest in those invented by other cultures. Much Western polyphony is stratified from some of the earliest
organa to the chorale preludes and other cantus firmus writing of Bach”.
93
“Individual timbres are stubbornly resistant to fusion in ordinary music listening, and a composer who
whishes to create ensemble timbres must take special care if he whishes to blend the instrumental timbres into a
new sound”.
97
94
“les groupes d’instruments s’organisent autour de la guitare avec des nuances de timbres qui ne se mélangent
jamais”.
101
com violão, no qual por exemplo podem entrar as cordas em geral com algumas cores
individuais que reforçam o timbre, mas não o volume. Isto é realmente muito eficaz”
(BROUWER, 2018). Brouwer considera aqui uma camada formada pelas cordas,
instrumentos que ele considera mais nobres, mais delicados; junto a esta primeira camada, ele
forma então outra ou outras camadas feitas de cores individuais, que eu entendo como algo
mais pontual, como se as cordas dessem a base harmônica e/ou melódica e o resto dos
instrumentos tivessem um papel de embelezamento tímbrico ou algo parecido, sem que nada
impeça que algum sopro possa também assumir o tema principal. Este tipo de escrita tem a
vantagem de não formar uma textura pesada, mas sim mais aérea, apesar de contar com a
presença da orquestra inteira.
Outro exemplo neste sentido é dado por Fourie-Gouws quando fala da
orquestração do Concierto de Aranjuez:
Segundo este depoimento, Rodrigo usa alguns instrumentos para fazer solos e
conversar com o violão, reforçando o uso de texturas estratificadas e antifonais, procurando
sempre valorizar o timbre individual de cada instrumento. A busca de transparência nas
texturas orquestrais levou à melodia de timbres idealizada e realizada por Schoenberg e seus
seguidores, cujo resultado foi a Segunda Escola de Viena – formada por Schoenberg, Berg e
Webern – que começou a usar a técnica da melodia de timbres, Klangfarbenmelodie.
Outra técnica de escrita em camadas que me parece muito eficaz é o uso de um
motivo repetido em um naipe, em forma de ostinato, e outros elementos temáticos colocados
por cima. O fato de ter algo que se repete, mesmo se for um motivo complexo, faz com que o
dito motivo vá naturalmente passar em segundo plano, por estar se repetindo ciclicamente.
95
“Rodrigo uses an unprecedented combination of instruments to accompany the guitar in his Concierto de
Aranjuez, including a full string section, two flutes (with the second flutist doubling piccolo), two oboes (second
oboist doubling cor anglais), two clarinets, two bassoons, two French horns and two trumpets […]. The sheer
size of the orchestra could have easily drowned out the guitar, but Rodrigo balances the soloist and orchestra by
using transparent and light orchestration where the guitar is featured. Solo instruments from the orchestra are
often featured with the guitar, including the bassoon, cello, cor anglais, French horn, oboe and 1st violin.
Rodrigo makes use of the timbral qualities of these orchestral instruments to create interesting textures and a
‘conversational’ quality between the soloist and orchestra”.
102
Outro exemplo neste sentido é o trecho da Figura 18, tirado do Concerto Mikis de
Sérgio Assad. Observa-se um ostinato nas cordas que fica se repetindo ciclicamente, deixando
espaço para o tema tocado no violão na dinâmica fortíssimo:
Figura 18 – Concerto Mikis de Sérgio Assad, compassos 71-80 (Acervo pessoal de Sérgio Assad)96.
Por fim, mais um exemplo deste tipo, trecho tirado de uma obra de Sérgio Assad
chamada African, terceiro movimento das 5 World Dances para violão e quarteto de cordas
(Figuras 19, 20 e 21), no qual se organizam várias camadas de motivos pequenos e repetidos
(um tipo de minimalismo repetitivo) no violão, violino II, viola e violoncelo para deixar o
96
Consultado pessoalmente.
105
Se contrapondo a este tipo de escrita, existe a textura que privilegia a mistura dos
timbres, que pode ser chamada aqui de blend que, literalmente, significa “mistura”. Este
termo é usado em diferentes áreas, como, por exemplo, no setor da enologia para descrever a
misturar de diferentes tipos uvas.
Articulação e fusão são duas noções essenciais para a orquestração, inclusive sem
diferenciar os tipos de formação (música de câmara e música de orquestra), como Boulez
propõe na citação acima.
Em sua tese de doutorado When timbre blends musically: perception and
acoustics underlying orchestration and performance, Sven-Amin Lembke (2014) propõe uma
teoria perceptiva para mistura de timbres no contexto musical, na qual as relações espectrais
entre timbres instrumentais são fatores determinantes. O autor faz um levantamento
bibliográfico das pesquisas sobre misturas de timbres existentes e cita Shumann (1929),
Kennan e Grantham (1990), Sandell (1991), Reuter (1996), Tardieu e McAdams (2012),
dentre outros autores, classificando as observações desses pesquisadores segundo os seguintes
itens: similaridade espectral; sincronização no ataque; dinâmicas; altura; voicing; fatores
ligados à performance; separação espacial.
De acordo com esse levantamento, Lembke (2014) concluiu que a similaridade
espectral, ou melhor, um centro de gravidade espectral similar, traria uma mistura de timbre
favorável e que a sincronização no ataque das notas tocadas também favorece a mistura do
timbre. Caso contrário, a nota tocada depois corre o risco de ter seu timbre encoberto pelo
timbre da primeira nota atacada e, ainda, pela sua ressonância.
97
“Le monde de la musique instrumentale est pratiquement divide en deux; cette division subsiste en dépit de
nombreuses franges intermédiaires. Je les appellerai le monde du petit nombre, soit la musique de chambre et le
monde du grand nombre, soit la musique d’orchestre. [...] Le petit nombre utilise, avant tout, l’ analyse du
discours par le timbre, créant l’intérêt par le raffinement, et par la division, tandis que le grand nombre utilise
surtout la multiplication, la superposition, l’accumulation, créant l’illusion, ce qu’Adorno appelait, à un autre
propôs, la fantasmagorie. Le grand nombre est, l’orchestre est le type même de la fantasmagorie, tandis que le
petit nombre est celui de la réalité directe, de l’analyse. Le petit nombre est, de préférence, le monde de
l’articulation, tandis que le grand nombre est essentiellement le monde de la fusion. Artivulation et fusion, ce
sont les deux pôles extremes de l’emploi du timbre dans le monde instrumental”.
109
Para Sandell (1991, p. 40): “misturas de timbres seriam aquelas nas quais a
individualidade e distinção de cada timbre são subordinadas a um resultado geral que tem
uma qualidade de timbre uniforme”. Por outro lado, é preciso ter consciência de que uma
mistura de timbres é obtida também pela qualidade de escuta e de execução que os intérpretes
terão e a sensibilidade destes para entender que juntos estão de fato criando um novo timbre.
O compositor Tanada deixa isso evidente quando escreve para percussão, no
compasso 65 da sua peça Octuor Concertant (Figura 22), “com a sonoridade que casa bem
com o som dos harmônicos do violão e da harpa”99. Ele aqui está confiando na capacidade do
intérprete para realizar o blend que ele imaginou e escreveu.
99
“[...] avec la sonorité qui se marie bien avec le son harmonique de guitare et harpe”.
111
Figura 23 – Textura blend em O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad (Arquivo
pessoal de Clarice Assad100)101.
100
Concedida por Clarice Assad através de e-mail.
101
Todos os arquivos pessoais incluídos na tese foram concedidos gentilmente pelos compositores das peças à
presente autora.
112
Esta textura é o primeiro ponto levantado por Adler no seu método Study of
orchestration (criar um diálogo entre o solista e o tutti) e talvez seja a mais óbvia e a mais
recorrente na escrita para a formação de violão e orquestra.
Segundo Gilardino102,
O entrevistado deixa evidente nesta declaração que a textura antifonal que ele
chama aqui de forma responsorial é uma solução eficaz, apesar de ser insuficiente. “Bons
compositores” devem ter outros recursos – outras estratégias – para conseguir este equilíbrio,
e são estas estratégias que procuro desvendar nesta pesquisa.
A textura que chamo de textura intercalada ou antifonal é a que o compositor
Mathieu Bonilla denomina de textura gruyère (em referência ao queijo esburacado), estratégia
que ele usou muito na sua peça Entailles. Ele a descreve de seguinte forma:
102
“Angelo Gilardino nasceu em 1941 em Vercelli (noroeste da Itália), onde estudou (violão, violonchelo e
composição) nas escolas de música locais. Sua carreira de concertista, que durou de 1958 a 1981, teve grande
contribuicão no desenvolvimento dos ‘holofotes’ no violão, fenômeno que surgiu ao longo do século XX. De
fato, ele deu performances de estreia de centenas de novas composições dedicadas a ele por compositores de
todo o mundo. Em 1967 Edizioni Musicali Bèrben nomeou-o para supervisionar o que se tornou a mais
importante coleção de música para violão do século XX e que leva seu nome. Desde 1982, ele publicou uma
extensa coleção de suas próprias composições. Ele também realizou 200 cursos, seminários e master classes em
vários países europeus a convite de universidades, academias, conservatórios, associações de música e festivais.
Como musicólogo, ele contribuiu consideravelmente para o repertório de violões da primeira metade do século
XX com a descoberta e publicação de obras importantes que eram desconhecidas ou consideradas como
perdidas, como Variazioni per chitarra de Ottorino Respighi, a Sonata para guitarra, por Antonio José e um
grande corpus de obras de violão escritas por Andrés Segovia por compositores espanhóis, franceses e britânicos
durante os anos vinte e trinta. Desde 2002, ele edita a publicação dessas obras (32 volumes) no Arquivo Andrés
Segovia, publicado pela Edizioni Musicali Bèrben. Ele também reconstruiu o concerto para violão e orquestra do
compositor russo Boris Asafiev, publicado pela Editions Orphée, e orquestrou o Hommage à Manuel de Falla do
compositor polonês-francês Alexandre Tansman, deixado inacabado pelo seu autor. O resgate dessas obras e sua
posterior publicação deram nova substância ao repertório histórico do século XX. Além disso, ele criou novas
configurações para guitarra e orquestra de itens famosos do repertório para violão solo. Em 1997 foi nomeado
diretor artístico da Fundação Andrés Segovia de Linares, Espanha, cargo que deixou no final de 2005. Ele
escreveu e publicou biografias de Andrés Segovia e Mario Castelnuovo-Tedesco e dois livros sobre os princípios
da técnica de violão. Ele publicou um manual para o benefício daqueles compositores que desejam escrever para
o violão, mas que não estão familiarizados com as complexidades deste instrumento. Ele também publicou um
manual de história do violão, um volume intitulado La chitarra e um número considerável de ensaios e artigos”
(ANGELO GILARDINO, 2018).
103
“Se con la parola equilibrio si intende evitare che l’orchestra sommerga la chitarra – come accade in non
pochi concerti del Novecento, scritti male – la soluzione tutto sommato non è difficile. Adoperare le forme
responsoriali, alternando il solista e l’orchestra, è una buona regola, ma insufficiente. Bisogna dosare le
sovrapposizioni con molta cura: non ci sono regole fisse, ma i compositori validi sanno come far coesistere la
chitarra con piccole sonorità di archi e fiati”.
113
É uma estratégia de escrita que usei nesta peça. Na verdade, mesmo que não pareça,
o violão quase sempre toca só. Grosso modo, ele toca nos buracos quando os outros
não tocam ... e a ideia, na maioria das vezes, é deixar o violão respondendo,
principalmente quando a orquestra toca forte, ela está sempre aí como um eco, e isso
faz com que ele aparece. (BONILLA, 2018, tradução nossa)104
Esta estratégia pode parecer óbvia à primeira vista, mas pode ser realizada de
maneira muito sutil, como mostra o exemplo a seguir (Figuras 24, 25 e 26), retirado da peça
para violão, eletrônica e orquestra de câmera de Mathieu Bonilla:
Exemplo Musical 3 – Entailles de Mathieu Bonilla, p. 21-23. Mathieu Bonilla e Orquestra de Alunos do
CNSMDP (BONILLA, 2011).
104
“C’est une des stratégies que j’utilise dans cette pièce. En fait, sans que l’on s’en aperçoive, la guitare est
presque toujours seule. Grosso modo, elle joue dans les trous quando les autres ne jouent pas. ... et l’idée,
c’est de laisser la guitare en réponse, principalement quand l’orchestre joue forte , elle est toujours présente
comme un écho, et cela fait qu’elle apparaît”.
114
105
Partitura concedida por Pablo Márquez.
115
Exemplo Musical 4 – To the Edge of the dream de Tōru Takemitsu, p. 11-12. John Williams e London
Sinfonietta. CD Takemitsu played by John Williams, 1991.
118
Exemplo Musical 5 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov, p. 24-27. Reinbert Evers (violão) e
orquestra desconhecida.
121
Page 24 of 72
00073608-8dc7-0005-5f52-4d53534f4c52
Figura 29 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov (DENISOV, 1991, p. 24).
122
Page 25 of 72
00073608-8dc7-0005-5f52-4d53534f4c5
Page 26 of 72
00073608-8dc7-0005-5f52-4d53534f4c52
Figura 31 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov (DENISOV, 1991, p. 26).
124
Page 27 of 72
00073608-8dc7-0005-5f52-4d53534f4c52
Figura 32 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov (DENISOV, 1991, p. 24-27).
125
Uma peça que eu acho maravilhosamente bem escrita é o concerto do Ponce... Ele
tem uma orquestração um pouco mais robusta, mas ele é feito em forma de diálogo e
esses diálogos dão super certo... É uma outra concepção, na qual ele arrisca mais na
textura, mas ele se garante explorando mais o diálogo. (ZANON, 2018)
Para ilustrar o comentário de Zanon, eis a seguir um trecho do Concierto del Sur
(Figuras 33, 34, 35 e 36) que é uma boa amostra do mencionado diálogo entre o violão e a
orquestra, e de sua escrita clara e antifonal. Do número 7 ao número 8, a orquestra toca em
um tutti, enquanto o violão fica em silêncio. No número 8, o violão entra acompanhado por
um ostinato dos violoncelos sempre no Si 2 e pianíssimo. Deste modo, o violão aparece com
extrema nitidez.
Exemplo Musical 6 – Concierto del Sur de Manuel M. Ponce, p. 15-18. Gérard Abiton e Ensemble Orchestral
Stringendo. CD Ponce: Complete Guitar Music (2015).
126
Exemplo Musical 7 – Concerto de Toronto de Leo Brouwer, p. 97-98. John Williams e London Sinfonietta. CD
The Black Decameron (1997).
131
Portanto, apesar da textura antifonal ser muito usada e bastante eficaz, ela não é
absolutamente necessária para conseguir ter uma escrita equilibrada entre o solista e a
orquestra, como explica Fourie-Gouws quando escreve sobre o Concierto de Aranjuez:
Nota-se que, quando extrapolada, a textura antifonal deriva para outra textura que
pode ser chamada de textura pontilista ou textura divisionista, termos emprestados do
universo pictural, do qual Seurat (1859-1891) foi representante como se vê a seguir (Figura
40), no quadro La Seine à la Grande-Jatte.
Figura 40 – La Seine à la Grande-Jatte de Georges Seurat (SEURAT, 1888 apud WIKIART, s.d.).
106
“In Concierto de Aranjuez Rodrigo never resorts to complete antiphonal separation of the soloist and the
orchestra nor does he emasculate the orchestra through prolonged silences in which the guitarist plays
unaccompanied. In fact, the soloist and orchestra are highly integrated throughout the concerto, playing
together in 62% of the total number of bars in the concerto, occasionally even sharing in the utilisation of
themes and motifs in tutti sections […] whereas the soloist only plays unaccompanied in 17% out of the total
number of bars, including cadenzas […]. Rodrigo uses pizzicato in the string sections as well as sordina (muted)
trumpets to create timbral variation and contrast as opposed to limiting the dynamic range of the instruments. It
would be wrong to expect power in this Concerto of mine, and one can look in vain for great sonority; that
would be to falsify the guitar’s essential nature, and debase an instrument which is capable of creating the
subtlest of sounds (Rodrigo 2016: 219)”.
135
É possível notar que o desenho é formado por pequenos pontos encostados uns
nos outros, porém sem sobreposição, que é a tradução em imagem da textura orquestral que
pode ser observada no exemplo a seguir, em um trecho de Threnody to the Victims of
Hiroshima, de Penderecki (Figura 41).
Este tipo de textura pode ser usado junto ao violão, pois, apesar de dar uma
impressão de massa orquestral, ela é leve por ser um tipo que chamaria de
superantifonalismo.
A textura ton sur ton é uma expressão criada por mim e se refere ao mundo das
cores, designa nuances diferentes da mesma cor. No campo da música, me refiro então aos
instrumentos da mesma família sobrepostos numa orquestração. Para citarmos um exemplo
extramusical, pode-se indicar a arte de Mark Rothko, quadros que são, à primeira vista,
monocromáticos, mas quando deles nos aproximamos é possível distinguir nuances sutis em
transparência, em densidade, em texturas de vários tons de laranja e vermelho (Figura 42):
136
Denisov certamente busca esse efeito em seu Concerto para violão e orquestra
(Figura 43) quando junta o violão à harpa e ao cravo, todos instrumentos de cordas
dedilhadas, assim como o violão. A sensação é de ouvir timbres próximos (aqui, por exemplo,
os três são instrumentos de cordas dedilhadas ou plectradas), porém sem ter de fato ter um
blend satisfatório. Eis um exemplo que ilustra bem o efeito tímbrico absolutamente original
com dinâmicas piano e pianíssimo.
Exemplo Musical 8 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov, p. 18. Reinbert Evers (violão) e
orquestra desconhecida.
137
Page 18 of 72
Figura 43 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov (DENISOV, 1991, p. 18).
Outro exemplo de textura ton sur ton pode ser visto no Concierto de la Amistad
de Lalo Schifrin (Figuras 44, 45 e 46). Como o próprio compositor afirmou em entrevista
concedida para esta pesquisa, a utilização da harpa junto ao violão se dá pelo seguinte motivo:
“Escolhi usar a harpa porque é um instrumento de cordas dedilhadas e é muito natural usá-la
junto ao violão”107. A simples aproximação dos timbres de cordas dedilhadas da harpa e do
107
“I chose the harp because as a plucked string instrument, it is a very natural combination with the guitar”.
138
violão já são uma justificativa suficiente para juntar os dois timbres, segundo Schifrin. Eis a
seguir um trecho do concerto onde essa textura fica muito aparente.
Exemplo Musical 9 – Concierto de la Amistad de Lalo Schifrin, p. 14-16. Angel Romero e Los
Angeles Philharmonic. CD Live at the Hollywood Bowl (2017).
139
Esta textura se aproxima do quarto ponto citado por Adler em seu livro Study of
Orchestration (separar o solista e o tutti por independência rítmica, conforme listado no item
1.1). Esse tipo de textura costuma ter um resultado satisfatório no que diz respeito ao
equilíbrio entre solista e orquestra, pois, graças ao contraste de escrita de cada parte, a vertical
e a horizontal, destaca-se com nitidez.
A seguir, eis um exemplo tirado da peça O Saci-Pererê, de Clarice Assad, no qual
o solista tem a linha principal, com intervenções pontuais (verticais) do tutti orquestral
(Figura 47). Os violoncelos e contrabaixos estão em homorritmía com o violão (exceto no
compasso 332 no qual eles se juntam ao resto da orquestra). As intervenções da orquestra são
com dinâmica p, sf, ff ou f, e sempre com acentos; porém em nenhum momento o equilíbrio
com o solista é ameaçado, já que são intervenções pontuais, criando uma textura na qual o
violão, os violoncelos e os contrabaixos assumem uma linha horizontal enquanto o resto da
orquestra tem intervenções verticais.
Exemplo Musical 10 – O Saci-Pererê, concerto para violão e orquestra de câmara, de Clarice Assad, p. 50.
Marc Teicholz e San Francisco Alumni Chamber Orchestra (Arquivo pessoal de Clarice Assad).
143
Figura 47 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarisse Assad, p. 50 (Acervo pessoal de
Clarice Assad).
144
Exemplo Musical 11 – Concerto de Toronto de Leo Brouwer, p. 52-53. John Williams e London Sinfonietta.
CD The Black Decameron (1997).
145
Para citar mais um exemplo deste tipo, eis a seguir um trecho do Concerto
Elegíaco de Leo Brouwer (Figura 50).
Exemplo Musical 12 – Concerto Elegíaco de Leo Brouwer, p. 28. Julian Bream e R.C.A. Victor Chamber
Orchestra. CD Julian Bream (BREAM, 1994).
147
Observa-se aqui que o violão toca a voz principal junto com as cordas, embora os
violinos I, violas, violoncelos e contrabaixos tocam notas pontuais nos segundos ou primeiros
tempos dos compassos (pp), e os segundos violinos criam uma base horizontal – que pode se
chamar de “cama” na gíria musical – de semicolcheias repetindo um lá grave (mp), região não
148
muito sonora do violino. Eis um exemplo de escrita na qual a orquestra mantém um discurso
horizontal e linear, sem muito evento, junto com acentos pontuais, o que deixa o violão
aparecer confortavelmente.
A seguir, um exemplo tirado do Concerto em Ré de Castelnuovo-Tedesco que
ilustra bem este tipo de textura (Figuras 51 e 52):
Exemplo Musical 13 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov, p. 67. Reinbert Evers (violão) e
orquestra desconhecida.
108
“Castelnuovo-Tedesco took every precaution to make sure that the guitar is naturally prominent by including
long cadenzas in each of the three movements. He also utilised the contrapuntal possibilities of the guitar in
order to diminish the need for orchestral support in solo passages (Valenzuela 2017: 13). In fact, the guitar
plays unaccompanied 29% of the entire concerto (see table no.2.2.1). Castelnuovo-Tedesco mostly limited the
dynamic range of the orchestral instruments from pianissimo to mezzo piano when the guitar is playing (except
when the strings are playing pizzicato), reserving a slightly fuller dynamic range for moments when the guitar is
silent. Castelnuovo-Tedesco also uses stark contrast in articulation between the soloist and the orchestral
accompaniment. The orchestra accompaniment intervenes only with the greatest delicacy, often interjecting with
either sustained notes or successions of a quaver note followed by a quaver rest pattern. Accompanying
passages in the strings are also often played pizzicato with light countermelodies primarily played by solo
woodwind instruments (Valenzuela 2017)”.
151
Page 67 of 72
Figura 53 – Concerto para violão e orquestra de Edison Denisov (DENISOV, 1991, p. 67).
152
Outro exemplo deste tipo pode ser visto na obra Chemins V de Berio (Figura 54):
Neste exemplo percebe-se na página 8 que a orquestra forma uma cama na qual o
violão se destaca com facilidade. No terceiro sistema da página 8 há uma textura antifonal, e
na página 9 começam uns acentos (verticalidade) em pizzicato. Inclusive nos dois últimos
compassos da página 9 percebe-se que os acentos em pizz dobram a melodia do violão
155
sutilmente.
Esta textura é uma das mais usadas na formação do gênero concerto em geral e
particularmente eficaz no que diz respeito ao equilíbrio entre o violão e a orquestra. Ela ecoa
o ponto citado por Adler em seu método The Study of Orchestration: usar com sabedoria um
acompanhamento leve, transparente (conforme citado no segundo capítulo desta tese).
3.2.2 Tessituras
A importância da escolha das tessituras é um dos pontos listados por Adler em seu
método Study of Orchestration: “privilegiar as tessituras orquestrais que valorizam o solista”
(2011, p. 611)109 . O estudo da instrumentação permite ao compositor conhecer as tessituras
mais favoráveis dos instrumentos e, por consequência, as mais desfavoráveis também, o que
em alguns casos pode ser bastante útil quando se trata de escrever para violão solista e
orquestra.
Como expressa o violonista Pablo Márquez, em entrevista concedida para esta
pesquisa, o violão desaparece quase sempre quando toca na mesma tessitura de outro
instrumento da orquestra:
Se você junta outro instrumento com o violão em uníssono, o violão vai sumir… por
exemplo no Villa-Lobos, quando não se escuta o violão, mesmo amplificado, é
quando ele toca no mesmo registro que a orquestra… A gente escuta o violão com
clareza quando ele sai desse registro e toca em outro. (MÁRQUEZ, 2018)
Tem certas obras, como por exemplo a Fantasia para um Gentilhombre [de Joaquín
Rodrigo], ou o Concerto em Ré de Castelnuovo-Tedesco, com uma boa orquestra,
pequena, bem ensaiada, em um espaço adequado, você consegue tocar sem
microfone, sem muita dificuldade na verdade porque ela é escrita de um jeito muito
transparente. A partitura é muito bem-feita nessas obras e, mesmo sem mic, o violão
brilha ali no meio. E outras obras, que são muito consagradas, como o Concerto do
Villa-Lobos, por exemplo, parece que a gente não consegue resolver aquilo nunca; a
gente estuda em casa, e é uma delícia, porque aquilo é tão bem concebido para
violão, mas aí, na hora que você chega na frente da orquestra, todas as coisas mais
bonitas ficam perdidas, fica parecendo uma maçaroca, parece que você está
mergulhando em alto-mar. (ZANON, 2018)
109
“Favoriser les dispositions et les registres qui favorisent l’instrument soliste”.
156
Na audição simultânea de dois sons de frequências [sic] distintas, pode ocorrer que o
som de maior intensidade supere o de menor, tornando-o inaudível ou não
inteligível. Dizemos então que houve um mascaramento do som de maior
intensidade sobre o de menor intensidade. O efeito do mascaramento se torna maior
quando a os sons têm frequências [sic] próximas. (FERNANDES, 2002, n.p.)
Exemplo Musical 14 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 9-10. Marc
Teicholz e San Francisco Alumni Chamber Orchestra. (Arquivo pessoal de Clarice Assad).
157
Figura 57 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara, p. 9 (Acervo pessoal de Clarisse Assad).
158
Figura 58 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara, p. 10 (Acervo pessoal de Clarisse Assad).
Dependendo do que você vai fazer com o violão, se você escrever na região aguda
dos violinos, tem que ser com dinâmica muito baixa, [...] sempre pianíssimo, e tocar
na região média do violão, isso combina legal, porque fica bem separado né, porque
essa coisa de tocar agudo no violão junto com as cordas no agudo lá em cima, é
confuso. (ASSAD, S, 2018)
159
Exemplo Musical 15 – Concierto de Aranjuez de Joaquín Rodrigo, p. 39. John Williams e Philharmonia
Orchestra. CD John Williams, Rodrigo (1989).
Nos exemplos citados neste item podemos ver nitidamente que Rodrigo adota
uma escrita meticulosa e delicada ao tratar do equilíbrio entre o violão e a orquestra. As
dinâmicas escolhidas para esta última se situam quase sempre num registro piano, e a
163
orquestra inteira só toca com dinâmicas mais intensas quando o violão sai de cena.
Sérgio Assad, em uma entrevista concedida para a presente tese, explica como
escreve as dinâmicas para conseguir os contrastes que ele procura:
Outra coisa que eu acho que adquiri experiência, é como você marcar na partitura
certa dinâmica que você quer, e a verdade é que os músicos não seguem o que está
escrito na partitura. Então essas nuances que a gente acredita que existem entre
mezzopiano e mezzoforte, você pode esquecer. Se você quer que eles toquem mais
fraco, você bota pianíssimo, ou bota ppp, eles vão tocar menos, mas eles vão se
fazer ouvir, eles vão tocar mais baixo do que eles tocariam normalmente. (ASSAD,
S, 2018)
110
“As Segovia was against amplification, apprehension regarding the audibility of the soloist was a legitimate
concern due to the sheer size of the hall and number of audience members; the première of the Concerto pour
guitare et petit orchestre took place in the large Houston Music Hall with an impressive total of 3040 audience
members in attendance (Patykula 2017: 23-24). At the first rehearsal before the première of Concerto pour
guitare et petit orchestre the composer’s common-law wife Arminda ‘Mindinha’ Neves Villa-Lobos (1912- 1985)
was instructed by Villa-Lobos to alter the dynamic indications in the orchestral parts, turning piano (p) into
pianissimo (pp) and pianissimo (pp) into pianississisimo (pppp). However, the practicability of these changes
are suspect as sections marked pianissimo […] are often in the upper range of woodwind and brass instruments,
resulting in difficulty with intonation. Segovia was apprehensive about the ‘heavy sound of the orchestra’ and at
the first rehearsal of the Concerto he inquired, ‘Mindinha, could you hear the guitar?’ She replied: ‘The fact is,
I couldn’t hear the orchestra’ (as cited in Postlewate 2013b: 30). Jokingly, Villa- Lobos commented that he was
no longer certain whether the work was for guitar and orchestra or for solo guitar (Santos 1985: 36)”.
164
111
“Équilibrer avec la guitare”.
165
Rodrigo ousa usar dinâmicas mais potentes na orquestra, mesmo quando o violão
está tocando junto, e mesmo assim ele é bem-sucedido no que diz respeito ao equilíbrio entre
o solista e a orquestra. Mais uma vez, o uso de dinâmicas mais ou menos potentes também
depende do tipo de escrita.
Vale a pena chamar a atenção para esta opção de escrita: o violão, mesmo sendo o
instrumento designado como o solista da orquestra, não precisa sempre estar em primeiro
plano. Ele pode se fundir dentro na massa orquestral, deixando aparecer seu timbre
camuflado, sutilmente. Nestes casos, normalmente o papel do violão é de preenchimento
harmônico, figuras rítmicas que dobram algum trecho do tema, ou então a execução de um
contracanto, como vemos a seguir no exemplo tirado do Concerto em Ré de Castelnuovo-
Tedesco (Figuras 63 e 64):
112
Partitura concedida por Pablo Márquez, dedicatário da obra.
113
“Whereas other composers, including Giuliani, Carulli and Castelnuovo-Tedesco, limit the dynamic range of
the orchestra to pianissimo, piano or mezzo piano when accompanying the soloist, Rodrigo adapts the dynamic
range of the orchestra to the material that the guitar is playing on a ‘micro structural’/sub-structural level. For
instance, when the guitar is playing rasgueados the accompanying orchestral instruments often play forte (see
music example no. 2.3.2) and, in contrast, when the guitar is playing punteado (plucking the strings) the
orchestral accompaniment is softer”.
166
Nas Figuras 65 a 68, mais um exemplo que ilustra o violão acompanhando dentro
da orquestra, neste trecho tirado do Concierto del Sur de Manuel M. Ponce:
No exemplo das Figuras de 65 a 68, apesar de o violão ter figuras rítmicas mais
complexas que o resto dos instrumentos, não é nada mais que um preenchimento harmônico,
só que em vez de ser realizado em forma de acordes, ele acontece em um ostinato rítmico-
harmônico.
172
Portanto, é importante ter em mente, tanto para quem escreve quanto para quem
interpreta (solista, orquestra, regente), em qual plano se encontra o solista, pois nem sempre
ocupará o primeiro.
Exemplo Musical 17 – Concierto de Aranjuez de Joaquín Rodrigo, p. 24. John Williams e Philharmonia
Orchestra. CD John Williams, Rodrigo (1989).
174
Quando a orquestra está só, sem o violão, ela precisa ser aproveitada ao seu
máximo. Primeiramente, para criar contraste, e segundo para que os instrumentistas possam
se expressar plenamente, já que quando o violão está presente, a escrita da orquestra é
normalmente delicada, com dinâmicas fracas, e nem sempre em registros favoráveis.
175
Em contraste com outros concertos para violão nos quais os compositores tendem a
atribuir dinâmicas mais altas para seções sem violão, Villa-Lobos frequentemente
usa um alcance dinâmico limitado e menor em seções onde o violão não toca. A
escrita e orquestração da orquestra tocando sem o solista é tratada com a mesma
delicadeza do que quando o violão está tocando (compassos 1-4 e 36-46 do segundo
movimento). De acordo com Mariz, o Concerto pour guitare et petit orchestre de
Villa-Lobos é extremamente lírico por natureza, mas ‘a única falha que se pode
encontrar é a falta fortuita de intensidade’ (Mariz como citado em Béhague 1994:
143), um eco da declaração do crítico do Houston Post após a estreia de 1956: Se
existem falhas, uma delas é a ausência do clímax; (Roussell como citado em
Patykula 2017: 25). (FOURIE-GOUWS, 2017, p. 95, tradução nossa)114
Figura 71 – Concerto para violão e pequena orquestra de Heitor Villa-Lobos, compasso 1-4, Segundo
movimento (VILLA-LOBOS, 1951).
114
“In contrast to other guitar concerti where composers tend to assign louder dynamics to sections without the
guitar playing, Villa-Lobos often uses limited dynamic range and smaller sections of the orchestra in sections
where the guitar does not play. Where other instruments play solo material the orchestration is treated with the
same delicacy and subdued dynamic range as when the guitar is playing (bars 1-4 and 36-46 of the second
movement). According to Mariz, Villa-Lobos’s Concerto pour guitare et petit orchestre is extremely lyrical in
nature but “the only flaw that one can find is the fortuitous lack of intensity" (Mariz as cited in Béhague 1994:
143), an echo of the Houston Post music critic’s statement after the 1956 première of the concerto: If there are
faults in it, one of them is its very insistence upon reticence and comparative absence of climax”.
176
Figura 72 – Concerto para violão e pequena orquestra de Heitor Villa-Lobos, compassos 36-46, Segundo
movimento (VILLA-LOBOS, 1951).
Figura 73 – Concerto para violão e pequena orquestra de Heitor Villa-Lobos, compassos 36-46, Segundo
movimento (VILLA-LOBOS, 1951).
177
Neste tutti, a orquestra inteira (menos a harpa) toca, inclusive os naipes de metais
completos (4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones). O violão não teria a mínima condição de se
juntar a esta massa sonora sem desaparecer. O compositor mostra o potencial da orquestra
inteira nesta passagem e cria um contraste rico e potente que a valoriza.
Não restam dúvidas de que o uso de técnicas expandidas constitui-se uma solução
valiosa para a questão do equilíbrio e de contrastes tímbricos entre o violão e a orquestra,
indo, de alguma maneira, de encontro ao abordado no ponto “Explorar contrastes de cor que
valorizam o solista”, citado por Adler (conforme capítulo 2, p. 24).
Técnicas expandidas são usadas frequentemente, mas algumas são mais inusitadas
e mais ousadas do que outras. No caso da escrita para violão e orquestra, me parece um
recurso eficaz para o equilíbrio dos timbres, já que pode criar barulhos e sons de pouco
volume sonoro e ainda com timbres inusitados. A seguir, nas Figuras 75, 76 e 77, um
exemplo do uso de técnicas expandidas que vão além dos próprios instrumentos, uma vez que
a compositora Clarice Assad pede estalos de dedos (finger click), batidas no chão (stomp),
barulhos com a boca (tsc, tsc, tsc) e onomatopeias (Psst! Ha! Huh? Shh!), além de uma certa
teatralização dos efeitos (surprised, confused, with one finger on the mouth, in disaproval).
Nota-se também um toyset na primeira percussão, que realiza umas intervenções pontuais
mais próximas do bruitisme (barulhos). Parece-me um trecho muito bem escrito, que
consegue criar uma atmosfera extraordinária, humorística e com timbres inusitados.
Exemplo Musical 18 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 13-15. Marc
Teicholz e San Francisco Alumni Chamber Orchestra (Arquivo pessoal de Clarice Assad).
179
Figura 75 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 13 (Acervo pessoal de Clarice
Assad).
180
Figura 76 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad p. 14 (Acervo pessoal de Clarice
Assad).
181
Figura 77 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarisse Assad, p. 15 (Acervo pessoal de
Clarisse Assad).
pede que os músicos falem alto (cordas nos compassos 4 e 5), cochichem (cordas no
compasso 6), cantem dentro da boquilha (trompete nos compassos 6 e 7), e ainda que o
percussionista gire um tubo de plástico (percussão nos compassos 8 e 9) para ilustrar a
chegada do Saci no redemoinho. Embora neste exemplo o violão não esteja presente, são
efeitos engenhosos e que, por serem delicados, certamente funcionariam junto ao solista.
Figura 78 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 1 (Acervo pessoa de Clarice
Assad).
183
Figura 79 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 2 (Acervo pessoal de Clarisse
Assad).
Exemplo Musical 19 – Concerto Infini de Atanas Ourkouzounov, p. 4-5. Zoran Dukic e Camerata Lutecia ao
vivo, arquivo do Youtube (DUKIC, 2016a).
Um pouco adiante, nesta mesma peça (Figura 82), observa-se mais uma técnica
expandida bastante usada na linguagem musical desde meados do século XX. Trata-se de usar
o arco nas lâminas do vibrafone (vibraphone avec archet).
Exemplo Musical 20 – Concerto Infini de Atanas Ourkouzounov, p. 27. Zoran Dukic e Camerata Lutecia ao
vivo, arquivo do Youtube (DUKIC, 2016b).
Ainda nesta peça, aparece uma técnica expandida menos comum, indicada desta
forma: “Tocar sem a pressão dos dedos”115 e com técnica de arco sul ponticello116 (Figura
83).
Exemplo Musical 21 – Concerto Infini de Atanas Ourkouzounov, p. 39. Zoran Dukic e Camerata
Lutecia ao vivo, arquivo do Youtube.
115
“Tocar sem a pressão dos dedos”.
116
Sul Ponticello significa “sobre a ponte” e ocorre quando o arco ataca a corda perto da ponte, criando um
timbre mais rico em harmônicos superiores, mais metálico.
187
expandidas que tem pouco volume sonoro, como percussões com vassouras, barulhos de
sopro e respiração, algo mais próximo ao barulho” (BONILLA, 2018).
A seguir, darei outro exemplo de técnicas expandidas em um trecho da peça
Entailles de Mathieu Bonilla, no qual o compositor usa barulho de sopro na embocadura
(flauta), sopro sem embocadura (oboé, contrafagote trompa, trombone), golpes e fricções em
partes não tradicionais das percussões (na beira, no corpo do instrumento), cordas em pizz,
flautando, ponticello, e por fim o violão desafinado (notam-se duas partes para o violão na
grade: uma indica os sons reais e a outra os sons tocados no braço do instrumento).
Neste trecho, pode-se notar que não há nenhum instrumento que toca de maneira
tradicional, e isso proporciona um efeito inédito criado graças a uma textura que podemos
chamar de bruitiste117, como o próprio compositor a chama (Figuras 84 e 85).
Exemplo Musical 22 – Entailles de Mathieu Bonilla, p. 52-53. Mathieu Bonilla e Orquestra de alunos do
CNSMDP (BONILLA, 2011).
117
A palavra bruitiste se refere a bruit, que significa “barulho” em francês.
188
Mas se você vai tocar violão com orquestra inteira, se você vai usar todos os
instrumentos, incluindo os metais, é bem difícil... a não ser que você evite usar o
violão naqueles momentos. E se for usar o violão, provavelmente vai usar o violão
acompanhante, fazendo rasgueos, ou alguma coisa que faça barulho, porque não dá
para fazer filigranas com trompetes, trombones... (ASSAD, S, 2018)
Você tem que ter muita tarimba para escrever para percussão, mesmo... Eu tenho
uma solução. Uma solução muito simples: para quem não tem experiência, como eu
não tenho e eu continuo sem ter experiência, você pede a um percussionista para
fazer. [...] Você vai tentar fazer uma coisa que vai ser uma palidez perto de alguém
que sabe né. Você pode dizer o que você quer e a pessoa redistribui o que você quer
no papel. (ASSAD, S, 2018)
118
Em entrevista concedida à presente autora em 28 de agosto de 2018.
191
diferentes no braço do violão torna as possibilidades extremamente ricas. Outro elemento que
me parece essencial a ser investigado pelos compositores são os recursos oferecidos pelas
cordas soltas do instrumento, o que possibilita criar ressonâncias, simpatia, e também oferecer
soluções eficazes para alguns problemas técnicos: um pulo grande de um lugar a outro do
braço se torna muito mais fácil quando existe uma corda solta nesse microintervalo,
permitindo à mão esquerda se movimentar enquanto a mão direita pulsa a corda solta.
No seu tratado de orquestração, Berlioz lembra e adverte: “É quase impossível
escrever bem para violão sem saber tocá-lo. A maioria dos compositores que o emprega estão
longe de conhecê-lo: por isso, escrevem coisas de uma excessiva dificuldade, sem sonoridade
nem efeito” (BERLIOZ, 1844, p. 83)119.
Reforçando esta ideia, Clarice Assad expressa, em entrevista a Durek:
Não é fácil escrever para violão se você não tem ideia de como o instrumento
realmente funciona. Se você está na escola estudando para ser compositor, você vai
estudar muita música moderna, ou clássica, mas você não vai ver uma linha escrita
para violão. É raro. Então, os compositores nem pensam a respeito. Em aula de
orquestração tem um espaço muito limitado para o violão. Não é enfatizado, então
vira um bicho de sete cabeças para quem deseja escrever para o instrumento, mas
não conhece o som do violão. Eu sei onde estão os dedos na escala quando eu escuto
um arpejo porque eu ouvi isso inúmeras vezes. É parte do meu vocabulário musical,
cresci ouvindo aquilo. Mas para a maioria dos compositores é extremamente difícil
escrever para violão. (DUREK; ASSAD, 2012, p. 112, tradução nossa)120
Os concertos para violão escritos por compositores não violonistas são normalmente
menos idiomáticos do que aqueles escritos por seus colegas violonistas. Eles
geralmente incluem múltiplas frases virtuosísticas, mudanças de acordes não
violonísticas, grandes extensões na mão esquerda e algumas requerem correções
consideráveis para torná-los tocáveis. O Concierto de Aranjuez, visto por muitos
como o destaque do gênero concerto de violão, é bastante não idiomático em um
número de instâncias para o ponto que até mesmo violonistas de renome mundial
fazem algumas revisões editoriais sutis, e às vezes insatisfatórias (Godfrey 2013:
119
“Il est presque impossible de bien écrire la Guitare sans en jouer soi même. La plupart des compositeurs qui
l'emploient sont pourtant loin delà connaître; aussi lui donnent ils a exécuter des choses d'une excessive
difficulté sans sonorité et sans effet”.
120
“It's not easy to write for guitar if you have no idea of what the instrument really is. If you're in college
studying to become a composer, you study a lot of new music, classic, but you never see a line written for guitar.
It's rare. So, composers who are walking around don't even think about it. In orchestration classes, there is only
a sad, limited portion about the guitar. It's not emphasized, so it becomes a monster with seven heads for people
who want to write for it but don't know the sound of the guitar. I know where the fingers are if I hear an
arpeggio because I heard it too many times. It's part of my musical vocabulary; I grew up listening to it. But for
most composers it's ridiculously hard to write for guitar”.
121
“The guitar is a very complicated instrument, by being the only string instrument really polyfonic, it is
impossible to compose if you don’t play it, and if you don’t play it well”.
192
A meu ver, não é obrigatório ser violonista para escrever bem para o instrumento;
basta ver a realização extremamente satisfatória de vários compositores não violonistas. Na
presente pesquisa há o exemplo do Concierto de Aranjuez de Joaquín Rodrigo, ou do O Saci-
Pererê de Clarice Assad, ambos muito bem escritos. Porém um bom conhecimento dos
recursos, das técnicas e dos efeitos é absolutamente necessário.
A seguir listo alguns efeitos e técnicas que podem ser usadas, ressaltando que é
uma lista não exaustiva.
122
“Solo classical guitar concerti written by non-guitarist composers are often far less idiomatic than those
written by their guitarist counterparts. They often include multiple extended virtuosic runs, unidiomatic chord
shifts, large stretches in the left hand and some even require considerable editing to make them playable.
Concierto de Aranjuez, seen by many as the highlight of the guitar concerto genre, is fairly unidiomatic in a
number of instances to the point that even world-renowned guitarists make a few subtle and sometimes not-so
subtle editorial revisions (Godfrey 2013: viii-ix). Potential soloists should therefore also consider the
availability of performance editions to support preparation and interpretation of the guitar concerto”.
193
Exemplo Musical 23 – Concierto de Aranjuez de Joaquín Rodrigo, p. 10. John Williams e Philharmonia
Orchestra. CD John Williams, Rodrigo (1989).
194
cordas em rasgueado que cobre toda a tessitura do instrumento, dando um resultado muito
sonoro; as cordas tocam forte.
Observa-se aqui uma orquestração arriscada em termos de equilibrio sonoro, que é
compensada por uma escrita para violão que garante o volume suficiente para poder aparecer,
mesmo com uma orquestra bastante sonora.
Exemplo Musical 24 – Concierto de Aranjuez de Joaquín Rodrigo, p. 20. John Williams e Philharmonia
Orchestra. CD John Williams, Rodrigo (1989).
Exemplo Musical 25 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 29-30. Marc
Teicholz e San Francisco Alumni Chamber Orchestra (Arquivo pessoal de Clarice Assad).
197
Figura 88 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarice Assad, p. 29 (Acervo pessoal
de Clarice Assad).
198
Figura 89 – O Saci-Pererê para violão e orquestra de câmara de Clarisse Assad, p. 30 (Acervo pessoal de
Clarisse Assad).
199
No exemplo seguinte, Berio também faz uso da técnica do rasgueo para destacar o
violão (Figura 90).
Exemplo Musical 26 – Chemins V de Luciano Berio, p. 9. Pablo Márquez e Orchestra Della Svizzera Italiana.
CD Maderna & Berio: Now, And Then (2017).
200
Há cordas mais fracas no violão, mas, por exemplo, se o violão faz acordes de 5 ou
6 notas, e se forem rasgueados, não há problema, mas se o violão está ponteando,
isto é, tocando sons lineares e isolados, a orquestra não poderá ocupar a mesma
franja sonora. (BROUWER, 2018)
3.2.7.2 Harmônicos
Exemplo Musical 27 – Entailles de Mathieu Bonilla, p. 47-49. Mathieu Bonilla e Orquestra de alunos do
CNSMDP (BONILLA, 2011).
202
uma ressonância (sans attaque, pour créer une résonnance) tal como no compasso 298 nos
sinos tubulares. No compasso 308, flauta, oboé, fagote, trompa e trombone emitem sons de
sopro e o percussionista toca com vassouras nos tubos do xilofone. As cordas ficam tocando
harmônicos agudos durante o trecho inteiro.
Mais uma vez, o compositor busca um ambiente sonoro discreto, transparente e
delicado através de barulhos e efeitos de modo que os harmônicos delicados e cristalinos do
violão possam sobressair.
Exemplo Musical 28 – Concierto de Aranjuez de Joaquín Rodrigo, p. 18. John Williams e Philharmonia
Orchestra. CD John Williams, Rodrigo (1989).
206
3.2.7.4 Tremolo
Figura 95 – Exemplo de tremolo. Trecho de Ana Terra de Yamandu Costa (Acervo pessoal de Yamandu Costa).
Recomenda-se usar o tremolo em trechos não muito extensos já que é uma técnica
que pode ser cansativa para a mão direita se for realizada durante muito tempo e se o
violonista não tiver muita afinidade com a dita técnica.
3.2.7.6 Pizzicati
3.2.7.7 Scordatura
A lista citada não é exaustiva e existem inúmeras peças usando este recurso.
A sexta corda em Ré é uma scordatura muito comum, e, pela prática, a maioria
dos violonistas têm afinidade com tais mudanças e com as digitações que dela resultam.
Bonilla, em sua peça Entailles, usa uma scordatura pouco comum, como se pode ver a seguir:
na pauta do violão está especificada a scordatura mi - lá sustenido – ré – sol sustenido – si – e
mi afinado um quarto de tom abaixo (Figura 96).
Cito aqui duas peças que foram um sucesso principalmente nos anos 1990 e início
de 2000: Koyunbaba de Carlo Domeniconi e Due canzione lidie de Nuccio d’Angelo.
Naquela época, não havia um concurso de violão que não contasse com a interpretação destas
peças, pelo menos uma vez – e na maioria dos casos várias vezes.
A primeira, Koyunbaba, foi composta em 1984-85, e foi gravada várias vezes,
inclusive por solistas renomados como David Russell ou John Williams, por exemplo. A
scordatura recomendada para esta peça é em dó sustenido menor: da sexta até a primeira
corda, dó sustenido, sol sustenido, dó sustenido, sol sustenido, dó sustenido, mi.
O compositor explica aqui que a partitura é organizada em duas pautas: a de cima
representa os sons reais e a de baixo as digitações tradicionais; em outras palavras, as notas
que seriam emitidas se o violão estivesse afinado normalmente. Porém, apesar da escrita
considerar as notas ré, lá, ré, lá, ré, fá (da sexta até a primeira), Domeniconi recomenda a
afinação em dó sustenido menor e não ré menor.
123
“1. Luis de Narváez – Cancion del Emperador (Lute tuning/3=F-sharp) [...]
2. Dusan Bogdanovic – Mysterious Habitats (6=F) [...]
3. Joaquín Rodrigo – Invocación y danza (dropped D tuning) [...]
4. Rainer Brunn – Elemente – Wasser (6=C-sharp) […]
7. Elemente – Erde (6=C-sharp, 3=G-sharp) [...]
8. Eduardo Sáinz de la Maza – Habanera (dropped D/G) [...]
9. Andrew York – Sunburst (double dropped D) [...]
10. Toru Takemitsu – Equinox (other/6=E-flat and 2=B-flat) [...]
11. Carlo Domeniconi – Koyunbaba (open C-sharp minor tuning) – Moderato – 3:07 […]
15. Traditional (arr. J. Sutherland et al) – Simple Gifts (dropped D/G, D to C mid-piece) [...]”
210
124
A pauta de cima indica os sons reais. A pauta de baixo indica as digitações (scordatura). Sendo assim, uso a
afinação tradicional (ré-lá-ré-sol-si-mi), guardando os três baixos. Mas eu sugiro (dó sus. – sol sus. – dó sus. – lá
sus. – lá sus. – ré sus.).
211
[...] foi encomendada pelo violonista Turíbio Santos (n.1943), que na época, vinha
encomendando novas obras a compositores brasileiros, com intuito de publicá-las
pela editora francesa Max Eschig e gravá-las pelo selo ERATO. A Ritmata recebeu
apoio do Itamaraty, foi publicada em uma coleção chamada ‘Turíbio Santos’ da
supracitada editora e gravada em 1976. (KREUTZ, 2012, p. 2)
A Ritmata foi uma encomenda do Turíbio, mas ele me deu muita assessoria. A
primeira peça que fiz para violão, sem ser a Ritmata, foi um trabalho que eu fiz para
conhecer o instrumento, eu mesmo tentava encontrar os dedilhados. Eu não sei por
que cargas d’água eu comecei com um taping no violão, e na verdade eu usei esse
efeito mais do que está na partitura oficial da Max Eschig, mas o Turibio deu uma
cortada, ele achou que tinha muito taping, mas achei que ficou mais difícil de tocar
usando a digitação tradicional do que com o taping. E ele que batizou a peça de
Ritmata porque eu tinha dado o título de ‘Toccata para violão’ porque eu gosto
muito desse dinamismo rítmico da Toccata contemporânea, de Prokofiev por
exemplo, que tem essa energia rítmica, bem ritmada. Turibio batizou de Ritmata
como se fosse uma Toccata rítmica, eu falei ‘está bem, você é o padrinho da peça,
tens direito de batizar, e assim ficou... e um dia o Sergio Assad chegou assim para
mim: ‘Você sabe que você na Ritmata fez uma inovação? Ela é a primeira peça de
concerto onde é usado o taping!’ Depois, aquele menino americano, o Stanley
Jordan, começou a usar o taping... a diferença é que ele ficou milionário com isso, e
eu não. (KRIEGER, 2018)
125
“Frapper contre les cordes-main droite-main gauche”.
126
“La main droite doit se deplacer vers la gauche, sur la table d’harmonie d’abord et après sur la gauche”.
127
“La main droite se déplace vers la droite, battant les trois premières cordes”.
128
“Arthur Kampela. Nascido no Rio de Janeiro em 1960, venceu em 1995 o Concurso Internacional de
Composição para violão em Caracas (Venezuela) e em 1998 o Concurso de Composição para violão Lamarque-
Pons (Montevidéu, Uruguai). É reconhecido internacionalmente tanto como compositor quanto violonista
virtuoso, misturando o popular e vernacular com técnica textural contemporânea e complexidade rítmica e
também explorando os limites dos instrumentos com novas técnicas expandidas. Em 1998, Kampela recebeu o
título de Doutorado da Columbia University (EUA), onde estudou com Mario Davidovsky e Fred Lerdahl.
Também teve aulas de composição com Brian Ferneyhough em 1993. Ele recebeu comissões e prêmios da
Fundação Guggenheim (2014), Collegium Novum Zurique (2013), DAAD (Artist-in-Residence Berliner
Künstlerprogramm 2012-13), The New York Philharmonic (2009), Fundação Koussevitzky (2007), Fromm
Fundação de Música (1998), ISCM / World Music Days Stuttgart 2006, a Alemanha, Rio-Arte Foundation,
Brasil (1999) e bolsas de estudo do governo brasileiro (CNPq) e da Universidade de Columbia (1990-1998),
entre muitos outros. Kampela abriu novos caminhos [sic] de duas formas muito particulares: em primeiro lugar
fez a fusão entre estilos populares e vernáculos com técnicas de textura contemporâneas [sic]. O CD de 1988
‘Epopeia e Graça’ utiliza formas de músicas populares desconstruindo o samba, o jazz e o teatro musical, com
novos recursos musicais que criam um verdadeiro género [sic] híbrido. Em segundo lugar, trabalha com novas
técnicas extendidas [sic] para instrumentos acústicos. Na sua série de Estudos de Percussão para guitarra solo
(1989-presente), Kampela criou uma nova técnica de interpretação que se extende [sic] a muitos instrumentos
acústicos [...]” (MURRAY, 2016).
213
percussões nos instrumentos, como se pode observar nas duas primeiras páginas da bula para
executar as percussões no violão em Percussion Study I (Figuras 100 e 101):
Acordes de 6 notas
no violão e contraponto
leve na orquestra Orquestra toca
notas longas p e pp
Figura 103 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 2-3).
216
Pizz do
violão é
pouco
sonoro. A
orquestra
tem
acentos
pontuais e
notas
longas p.
Talvez o violão
fique encoberto aqui
Figura 104 –Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 4-5).
217
A orquestra intervêm
pontualmente
Figura 105 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 6-7).
218
Figura 106 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 8-9).
219
O violão sai e
a orquestra entra com
tutti e dinâmicas f e ff
Figura 107 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 10-11).
220
O violão volta
e a orquestra Esta escrita possibilita
“esvazia” muito volume no violão
novamente
Provavelmente
o violão
fica encoberto
no comp. 165
Figura 108 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 12-13).
221
Figura 109 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 14-15).
222
Figura 110 – Concerto para violão e orquestra de câmara de Malcolm Arnold (ARNOLD, 1988, p. 16-17).
Com a aparição da amplificação nos anos 1930, uma parte dos violonistas
começou a usar o recurso, principalmente no jazz e na música popular, enquanto no violão
clássico há uma certa resistência até hoje. A escola clássica tem uma concepção de som na
qual a questão da projeção e o preenchimento do espaço com o som é um assunto muito
trabalhado e bem desenvolvido, enquanto, nos demais estilos, o violão passa a ser amplificado
ou por microfone externo, ou por sistema integrado. Portanto, muitos solistas não se
preocupam tanto com a amplificação e muitas vezes nem possuem material próprio. Tomando
como exemplo o Concierto de Aranjuez, Fourie-Gouws explica:
223
129
“Considerable amplification in Concierto de Aranjuez has become a necessary aid for the guitarist in order
to ‘compete’ with the sound of such a large orchestra. While modern amplification has made leaps and bounds
since the days of Segovia and Sainz de la Maza, it still does affect the sound of the guitar. Considerable planning
and preparation effort is typically put in by soloists in order to be technically competent enough to perform
Concierto de Aranjuez, whereas amplification is often left as a last minute afterthought. Technical
considerations regarding how the guitar should be amplified, including the equipment that will be used and the
placement of the microphone and speakers, should be considered well in advance of a performance and the
opinion of a professional sound engineer should be part of the decision making process of both the soloist and
the conductor”.
130
“Pablo Márquez começou a estudar violão com 10 anos, e três anos depois ele realizou seu primeiro recital
com orquestra em Salta, cidade do nordeste argentino onde estudou e cresceu. Ele se aperfeiçoou com Jorge
Martínez Zárate e Eduardo Fernández, e seus anos de estudo terminaram quando completou 20 anos, ano em que
ele ganhou os concursos internacionais Villa-Lobos (Rio de Janeiro) e Radio France (Paris), com unanimidade.
224
referência no âmbito do violão clássico e que é solista de orquestra com certa frequência. Para
ele, a solução seria orientar os compositores a compor para formações menores, permitindo
que o violão toque sem necessidade de amplificar:
Para mim, o ideal seria orientar os compositores para que componham concertos de
câmara, como por exemplo o Concerto de De Falla para cravo solista e 5
instrumentos. Os compositores poderiam trabalhar com, digamos, um máximo de 10
instrumentos... eu acho que só assim, e com uma orquestração inteligente,
poderíamos alcançar um equilíbrio razoável digamos... e sem amplificação! Para
mim o ideal, é sem amplificação... você sabe por quê? Porque sempre que eu tentei,
mesmo nas melhores condições, em festivais importantes... sempre tem um pepino
com a amplificação...! Sempre! [...] Então precisamos orientar os compositores que
pretendem escrever para violão e orquestra... para outras formações um pouco mais
realistas... para mim violão e orquestra grande, é praticamente incompatível.
(MÁRQUEZ, 2018)
Mas para Chemins V [de Luciano Berio], por exemplo, eu toquei no Festival
Présences, em 2012, no Théâtre du Châtelet em Paris com o Philharmonique de
Radio France. No ensaio geral, na sala, o som estava ótimo, pensei “ótimo,
finalmente!”, mas à noite, era outra coisa, outro som... e aí, você não pode dizer que
são problemas de produção, são as melhores condições possíveis, mas mesmo assim
dá problema. Da mesma forma, quando gravei Chemins V pela segunda vez, ano
passado [2017] na WDR em Colonha, superorquestra, superprodução... durante o
ensaio geral, o som estava bom, e quando cheguei para tocar no concerto, o
microfone tinha mudado de lugar, em vez de vir da esquerda ele estava na minha
direita... [...] então, na verdade, é muito raro ter um momento no qual tudo funciona
como deveria. (MÁRQUEZ, 2018)
Músico completo, estudou música antiga com Javier Hinojosa, regência com Eric Sobzyck, Rodolfo Fischer et
Peter Eötvös, e assistiu às aulas do legendário pianita György Sebök, que marcou profundamente seu
desenvolvimento artístico. Especialmente dedicado ao repertório contemporâneo, ele trabalhou em colaboração
com Luciano Berio, Mauricio Kagel e György Kurtág. Pierre Boulez o convidou, para o décimo-sétimo
aniversário de Berio, para interpretar a Sequenza XI do compositor italiano, obra da qual ele vira intérprete de
referência. Ele estreou peças de Moultaka, Essyad, Maresz, Mantovani, Lazkano, Ibarrondo, Pécou, Strasnoy,
Torres Maldonado, Fiszbein, Kampela, Beytelmann, Tanada, Park, Dazzi et Naón, entre outros. Suas gravações
para os selos ECM, Kairos, Naïve, Harmonia Mundi e L’Empreinte Digitale receberam vários prêmios: Grand
Prix du Disque de l’Académie Charles Cros, le Prix Amadeus, RTL Classique d’Or, Quobuzissime, e foi votado
melhor CD de música antiga pelo Neue Musik Zeitung na Alemanha, e melhor CD clássico do ano por Readings
na Austrália. Pablo Márquez é professor na Musik-Akademie de Basel e é Professor Convidado no Pôle
Supérieur de Bretagne-Pays de la Loire, assim como na Universidade Pablo Olavide de Sévilha. Ele foi
premiado em Buenos Aires o Prêmio Konex em homenagem ao conjunto da sua carreira” (MÁRQUEZ, [2017]).
225
De certa forma eu acho que estou sempre testando porque eu não uso meu próprio
equipamento, porque acho que o equipamento precisa ser congruente com o lugar
onde você toca... você pode até ter um equipamento muito bom, muito caro, que
nem aquele Schlemper que muita gente usa, e que ajuda muito, claro. Mas ele não
funciona igualmente em qualquer espaço, então eu prefiro confiar no equipamento
que cada teatro tem... O problema é que tem teatro, que nem a Sala São Paulo, que
nem tem equipamento próprio, tem uns PA, mas não tem o equipamento adequado
para uma boa amplificação... então acabo contratando alguém para fazer...
(ZANON, 2018)
Fica evidente que ter bons microfones não soluciona toda a questão, mas, sim, um
bom resultado depende de vários outros fatores, como por exemplo o ângulo das caixas, como
ele expressa a seguir:
[...] no começo, quando não tem muita experiência, você coloca as caixas viradas
para plateia... e isso gera dois problemas: a orquestra continua sem ouvir o solista, e
você erra a direcionalidade do som, porque dependendo do lugar onde você está
sentado na plateia, você não ouve o som saindo do centro do palco, você ouve o som
saindo das laterais e isso é um efeito muito incômodo, é o que me deixa mais
irritado. Você olha pro palco mas o som vem da lateral. (ZANON, 2018)
131
“Fábio Pedroso Zanon (Jundiaí, SP, 1966). Violonista, arranjador, concertista e professor. Descobriu o violão
com o pai, aos oito anos de idade. Aos 13, tornou-se aluno de Antônio Guedes, que o acompanhou até seus
primeiros recitais, aos 16, em Jundiaí. Em 1982, participou de cursos de férias, como o Seminário Internacional
de Violão Palestrina e o Camping Musical Bariloche (ambos com Miguel Angel Girollet). Dois anos mais tarde
ingressou no bacharelado de composição da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo
(ECA/USP), seguindo paralelamente regência, na universidade, e violão, particularmente, com Henrique Pinto.
Com a criação do curso de violão e a contratação de Edelton Gloeden pelo departamento de música da
ECA/USP, Zanon trocou de especialização e se formou em instrumentação musical, em 1987. Nesse período
começou a participar de concursos nacionais, e venceu, aos 18 anos, o Concurso Jovens Solistas com a Orquestra
Experimental de Repertório, que o levou a se apresentar pela primeira vez com uma orquestra. Foi um dos
vencedores do Concurso Sul América, no Rio de Janeiro, em 1986, e finalista do Prêmio Eldorado, em São
Paulo, em 1987. Nesse ano classificou-se em terceiro lugar no Toronto International Competition, no Canadá. A
partir daí, seguiu a carreira de solista em recitais e orquestras pelo Brasil (Brasília, Vitória, Recife). Em 1991
partiu para a Inglaterra para realizar o mestrado na Royal Academy of Music/Universidade de Londres, com
orientação de Michael Lewin, seguindo, como segunda formação, regência com Denise Ham e assistindo a
cursos com violonistas como Julian Bream. Retornou aos palcos em 1995 com um concerto no Wigmore Hall,
em Londres, e, em 1996, venceu o 30º Concurso Francisco Tárrega, na Espanha, e o 14º Guitar Foundation of
America (GFA), nos Estados Unidos. Como resultado dessas vitórias, gravou os primeiros CDs e fez turnê de 56
concertos pelos Estados Unidos. No ano seguinte recebeu o Prêmio Moinho Santista, um dos mais importantes
estímulos à produção intelectual brasileira, nunca antes outorgado a um instrumentista. Apresentou-se pela
primeira vez diante de uma orquestra internacional, em 1998, interpretando o Concerto de Piazzolla para Violão
e Bandoneón, com a Orquestra Filarmônica de Londres. Desde então, realizou trabalhos em mais de 45 países
em salas como a Royal Festival Hall, em Londres, o Philharmonie, em São Petersburgo, e o Concertgebouw, em
Amsterdã, reunindo um repertório de mais de 40 peças para violão e orquestra, a estreia de um número
considerável de obras (Lina Pires de Campos, Ronaldo Miranda, Jan van der Roost) – algumas a ele dedicadas –
e a gravação de CDs que são reconhecidos como referência pela crítica especializada, principalmente Heitor
Villa-Lobos e o compositor italiano Domenico Scarlatti (1985-1757). Entre os prêmios mais recentes, destacam-
se o Carlos Gomes (2005), Diapason d'Or (França, 2008) e Bravo! (2010). Como pedagogo, ministra master
classes em escolas como a Julliard, em Nova York, e o Conservatório Gnessin, em Moscou, e desde 2008 é
professor visitante da Royal Academy of Music. Além disso, vem desenvolvendo, nos últimos anos, trabalhos
como radialista, escrevendo e apresentando O Violão Brasileiro (2006-2008), pela Rádio Cultura; regente, desde
2006; e escritor (Folha Explica: Villa-Lobos)” (FÁBIO ZANON, 2018).
226
Têm certas estratégias de interpretação que não funcionam quando a gente usa o
microfone. A primeira coisa é que as nuanças só vão aparecer se você tiver uma
ampla gama de sonoridade na faixa de pianíssimo, piano e mezzo-piano. Tocar cada
vez mais forte, simplesmente não aparece mais forte quando a gente toca com
microfone. O que a gente pode fazer é dar a ilusão de maior energia, tocando com
um ataque mais pontiagudo ou mais metálico, mudando a característica do som,
porque francamente, não é que o violão tenha uma sonoridade suave, além da gente
ter uma sonoridade muito mais suave do que qualquer instrumento da orquestra, a
gente não tem a gama de dinâmica. O nosso fortíssimo é no máximo um mezzo-
piano de violoncelo, então para os instrumentos que nos rodeiam dentro da
orquestra, a nossa gama de dinâmica é não existente, é uma coisa que vai do
inaudível ao pouco audível. Por isso é importante enriquecer essa gama suave,
porque a gente vai jogar com as vantagens do microfone, a gente vai dar uma ilusão
de gama de dinâmica mais ampla usando o microfone. (ZANON, 2016b)132
Cabe então ao solista se esforçar para desenvolver essa habilidade e ficar sempre
atento ao som amplificado que ele produz para conseguir modificá-lo com alguma mudança
tímbrica ou usando melhor a região da “gama suave” do violão, em vez de pensar a
amplificação como algo que simplesmente deixa o som mais forte.
Alguns solistas simplesmente se recusam a ser amplificados, e, provavelmente, o
caso de Andrés Segovia é o mais conhecido. Segundo ele, não haveria nenhum sistema de
amplificação fiel o suficiente ao som do instrumento acústico, como explica Fourie-Gouws, e
até com orquestra, ele se negava a amplificar o violão:
132
O trecho transcrito encontra-se entre 20min 54s a 22min 07s do vídeo.
133
“Segovia loathed amplification and refused to be amplified even when playing with an orchestra as he
believed that it would distort the natural qualities of the guitar’s sound. At thetime of the première of
Castelnuovo-Tedesco’s concerto this concern would have been warranted as limited advances in sound
engineering would not have been able to reproduce the ‘warm’ and ‘velvety’ natural tone that Segovia was
renowned for”.
227
Segovia inclusive era conhecido por não respeitar a hierarquia imposta pelo
sistema da orquestra no qual o regente comanda os músicos; Segovia diretamente pedia para a
orquestra tocar mais baixo:
Eu não sei, porque eu estou de trás do violão, não é a minha história amplificar o
instrumento, e a gente prefere tocar sem amplificação. Mas a experiência que nós
tivemos [nós se refere a Odair e Sérgio Assad que formam o Duo Assad], sendo
violonistas clássicos, que é uma dimensão diferente realmente da de quem toca
violão popular, porque quem toca violão popular e tem essa outra estética não está
tão preocupado com a realização sonora. Para nós, e você que é violonista clássica,
você também sabe disso, se não tiver o som acusticamente perfeito como a gente
ouve quando não tem nenhum meio de amplificação, a gente fica descontente.
(ASSAD, S, 2018)
134
“Segovia was infamous for personally instructing orchestra members to play softer during rehearsals. In an
interview Brazillian [sic] guitarist Ronoel Simões recalled such an occurrence in 1942 when Segovia performed
Castelnuovo-Tedesco’s Concerto no. 1, Op. 99 in São Paulo, Brazil, conducted by João de Souza Lima: There
was a violinist playing in that orchestra, named Aguiar, who was a friend of mine, and he told me about that
concert: ‘Listen, Simões, I played in those concertos and Souza Lima was the conductor, but Segovia was the
boss there, the one who talked to cellists and violinists, telling them that they were playing too loud and the
guitar could not be heard’ (as cited in Postlewate 2013b: 30). In an interview prior to a planned performance of
Castelnuovo-Tedesco’s Concerto no. 1, audibility of the guitar when accompanied by an entire orchestra.
Segovia confessed that his wife Paquita Madriguera (1900-1965), a Spanish concert pianist, had similar doubts
prior to the première when they were rehearsing the work using a piano reduction, “... which is why she sat in
the last row [at the orchestral rehearsals] and marvelled at the effect achieved by the sound of this instrument”
(Postlewate 2013b: 24)”.
228
Se uma partitura para violão e orquestra estiver bem escrita, não é necessária
amplificação em salas pequenas ou médias (adequadas para música de câmara). A
amplificação é necessária em teatros e salas grandes. Amplificado, o solista não é
obrigado a sempre tocar ff, e pode trabalhar com expressão e nuances.
(GILARDINO, 2018)
Bonilla deixa claro que a amplificação, em sua concepção, precisa ser pensada
como um suporte sutil, e não como uma compensação de uma escrita defeituosa que iria
deixar os timbres deformados e o equilíbrio superficial, criado com volumes de amplificação
exagerados.
Zanon também contribui neste sentido:
135
“Nasceu em Brusque, Santa Catarina, a 17 de março de 1928. Iniciou aos sete anos estudos de violino com
seu pai, Aldo Krieger. Aos 15 transferiu-se para o Rio de Janeiro, para prosseguir sua formação no
Conservatório Brasileiro de Música, onde estudou com H. J. Koellreutter. Em 1945 passou a integrar o Grupo
Música Viva. Em 1948 foi escolhido em concurso para estudar com Aaron Copland, no Berkshire Music Center
de Massachussets [sic], EUA, onde assistiu também a aulas de Darius Milhaud. Estudou ainda na Juilliard
School of Music, de Nova Iorque com Peter Mennin (composição) e na Henry Street Settlement School of Music
com William Nowinsky (violino). Representou a Juilliard no Simpósio de Compositores dos Estados Unidos e
Canadá, realizado em Boston, e atuou como violinista da Mozart Orchestra de Nova Iorque. Retornando ao
Brasil em 1950 iniciou a atividade de produtor na Rádio Ministério da Educação, onde exerceu a função de
229
Eles [Sergio e Odair Assad] queriam algo para dois violões e pequena orquestra de
cordas. Mas o fato de ter sido um projeto de gravação já elimina a parte da
preocupação do equilíbrio, pois você pode equalizar e mixar, se bem que me
preocupei também... A estreia seria num festival de música brasileira em NY, mas
provavelmente eles usaram uma pequena amplificação... em todo caso, é sempre um
desafio. [...] Não, é uma preocupação normal, eu sabia que ia ter uma amplificação,
cuidar que a orquestra não encobre o violão, tentar fazer o máximo possível, um
diálogo, enfim, não tive que me preocupar muito, fui escrevendo... (KRIEGER,
2018)
Fica nítido que para Krieger, mesmo se preocupando com a questão do equilíbrio,
a amplificação não é uma questão central no processo de composição; ele realmente confia e
conta com ela para resolver qualquer problema de equilíbrio.
Da mesma maneira, Brouwer, quando questionado sobre eventuais problemas de
equilíbrio, responde: “Eu já escrevi para orquestra sinfônica completa, para orquestra de
câmara. Com os sistemas de amplificação atuais, não há problemas de volume” (BROUWER,
2018).
Seguindo um pensamento ainda mais forjado nesta direção, o entrevistado Lalo
Schifrin136 responde à pergunta “quais estratégias o senhor procurou na
diretor musical e organizou a Orquestra Sinfônica Nacional, e de crítico musical do jornal Tribuna da Imprensa.
Em 1952 estudou com Ernst Krenek no III Curso Internacional de Verão de Teresópolis, RJ. Com bolsa do
Conselho Britânico, estudou em Londres durante um ano com Lennox Berkeley, da Royal Academy of Music.
Em 1959 obteve o primeiro prêmio no I Concurso Nacional de Composição do Ministério da Educação, com
Divertimento para Cordas. Em 1961 seu Quarteto de Cordas nº1 obteve o Prêmio Nacional do Disco. Em 1965
suas Variações Elementares estrearam no III Festival Interamericano de Música de Washington, e no ano
seguinte seu Ludus Symphonicus estreou pela Orquestra de Filadélfia no III Festival de Música de Caracas,
Venezuela. Em 1969 e 1970 organizou e dirigiu os Festivais de Música da Guanabara, dos quais se originaram, a
partir de 1975, as Bienais de Música Brasileira Contemporânea. Entre os prêmios e honrarias que recebeu estão:
Prêmio Internacional da Paz do Festival de Varsóvia (1955); Prêmio da Fundação Rottelini de Roma (1955);
Medalha de Honra do Cinquentenário do Theatro Municipal do Rio de Janeiro (1959); Troféu Golfinho de Ouro
(1969 e 1988); Medalha do Mérito Cultural Cruz e Souza, do Conselho Estadual de Cultura de Santa Catarina
(1997); Troféu Barriga-Verde (1977); Comenda da Ordem Cultural do Ministério da Cultura e Belas Artes da
Polônia (1985); Medalha do Mérito Cultural Anita Garibaldi, do Estado de Santa Catarina (1986); Prêmio
Nacional da Música do Ministério da Cultura (1994); e Medalha Pedro Ernesto, maior honraria concedida pela
cidade do Rio de Janeiro. É membro do Conselho Estadual de Cultura do Rio de Janeiro. Dirigiu a divisão de
música clássica da Rádio Jornal do Brasil e exerceu a crítica musical no Jornal do Brasil. Em 1976 assumiu a
direção artística da FUNTERJ – Fundação de Teatros do Rio de Janeiro. Em 1979 criou o Projeto Memória
Musical Brasileira/PRO-MEMUS, junto ao Instituto Nacional de Artes da Fundação Nacional de Arte –
FUNARTE, do Ministério da Cultura. De 1981 a 1989 foi diretor do Instituto Nacional de Música. Foi
presidente da FUNARTE, da Fundação Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro e da Academia Brasileira
de Música. Seu catálogo inclui obras para orquestra sinfônica e de câmara, oratórios, música de câmara, obras
para coro e para vozes e instrumentos solistas, além de partituras incidentais para teatro e cinema. Suas
composições têm sido executadas com frequência no Brasil e no exterior, inclusive por orquestras do Rio de
Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Recife, Bahia, Belo Horizonte, Liège, Bruxelas, Paris, Londres, Munique,
Buenos Aires, Córdoba, Nova Iorque, Filadélfia, Washington, Colônia, Tóquio e outras” (ACADEMIA
BRASILEIRA DE MÚSICA, [2015?]).
136
“Dotado de um talento imenso, o pianista, regente e compositor Lalo Schifrin, nascido na Argentina, escreveu
mais de 100 obras para a televisão e o cinema incluindo as memoráveis trilhas dos filmes Missão Impossível
(1966), Mannix (1967), Starsky and Hutch (1975), Rebeldia indomável (1967) e Bullit (1968). Schifrin trabalhou
regularmente junto a Clint Eastwood (outro aficionado de jazz) em inúmeras contribuições incluindo os temas de
Dirty Harry films, Joe Kidd (1972) e Meu nome é Coogan (1968). Durante sua brilhante carreira, Schifrin
recebeu 5 Grammy Awards, e seis nominações ao Oscar. Schifrin se formou na Argentina e na França, e é um
pianista de jazz muito respeitado. Quando voltou à Buenos Aires em meados de 1950, Schifrin formou sua
230
[...] deve ter pensado, vou botar um microfone mesmo, então não vai misturar o som
do violão... mas na verdade, mesmo com microfone, tem um problema naquele
trecho [no tema seresteiro do primeiro movimento], assim como no final do primeiro
movimento, ou lá no meio do terceiro, onde está na mesma tessitura do fagote, o
violão desaparece, e desaparece exatamente nas passagens mais bonitas... O
Mignone tem esse problema também, o Aranjuez tem esse problema também...
Estou falando dos mais consagrados... Mas acho que esses compositores aprenderam
depois... Quem ouviu o Castelnuovo-Tedesco e a Fantasia para um gentilhombre,
nunca mais compôs do mesmo jeito. (ZANON, 2018)
própria banda que foi notada pela lenda do jazz Dizzie Gillepsie, que pediu para ele ser seu arranjador e pianista
oficial. Schifrin se mudou para os Estados Unidos em 1958 e a sua carreira decolou. Em paralelo às suas
composições para o cinema, ele é regente do London Philharmonic Orchestra, Houston Symphony Orchestra,
Los Angeles Philharmonic, Los Angeles Chamber Orchestra e muitos outros. Schifrin é um dos compositores
que mais contribuiu no mundo da trilha para cinema nos últimos 40 anos e continua compondo até os dias de
hoje” (SCHIFRIN, [2013]).
231
equilíbrio das partes. Ele cria uma textura densa, em uma tessitura próxima da do violão,
como se pode observar na grade a seguir:
Figura 111 – Concerto para violão e pequena orquestra de Heitor Villa-Lobos (VILLA-LOBOS, 1951, p. 10).
232
Figura 112 – Concerto para violão e pequena orquestra de Heitor Villa-Lobos (VILLA-LOBOS, 1951, p. 10-
11).
Sobre estes cortes da orquestra nas gravações exemplificadas nas Figuras 111 e
112, Fabio Zanon escreve no Fórum do site Violao.org, do qual ele é moderador:
No tema lento, aquelas tercinas nos violinos e as intervenções dos sopros atrapalham
a clareza do solista, que fica se esguelando [sic] para conseguir ser ouvido. Mas se a
gente tira, como nessa gravação, fica um vazio, a harmonia fica menos interessante,
falta colorido e atmosfera. O outro é o final do mesmo movimento. Aquela descida
dos violinos e a melodia em tercinas no último compasso são uma bagunça. [...] Mas
a gente tira e, de novo, fica [...] sem impacto. [...] No final, acho melhor admitir que
esse concerto é como um cachorro muito inteligente e amoroso, mas sem pedigree.
233
Temos de admitir a falta de pureza e tentar corrigir com uma boa microfonação e
acertando o equilíbrio nos ensaios. (ZANON, 2018c)
137
“Unlike Segovia, Villa-Lobos had no objections to amplification, in fact preferring that the guitar be
amplified as he felt that it gives the orchestra greater freedom (Santos 1985: 36). The idea that amplification
could thus not only benefit the guitarist but also give the orchestra greater freedom is an extremely significant
observation. Often the only concern taken into consideration regarding amplification is the audibility of the
classical guitarist and not whether the orchestra would or should be able to perform certain sections originally
marked pianissimo at pianississisimo”.
138
“Giuliani handles the orchestra with great sensitivity, making sure that it never clashes with the guitar but
rather accompanies it, always in a very restrained manner. Recommendations regarding the use of amplification
would thus be dependent on the size of the concert hall, whether the guitar is accompanied by an orchestra or
string quartet and whether the soloist is performing on a period instrument or a modern concert guitar. If the
concerto is being performed by the soloist on a period instrument with full orchestral accompaniment in a large
concert hall, amplification would be highly recommended. It would, however, be possible to perform the
concerto with an unamplified period instrument if accompanied by a string quartet in a smaller concert venue”.
234
elementos não estiverem bem resolvidos pode-se chegar a um resultado não satisfatório ou até
problemático, e, considerando-se as condições reais, é raro poder ter todas essas questões
funcionando juntas de maneira eficaz.
Outro fenômeno que acabou limitando as possibilidades de tocar sem
amplificação foi o aumento gradativo do tamanho das salas, como explicita a seguir Fourie-
Gouws:
139
“The small concert venues of the early nineteenth century paired with the softer dynamic range and colourful
timbres of the early Romantic guitar not only created an intimate experience for the audience but also assisted
with the audibility of the guitar as well as the balance between the orchestra and soloist. In the past century,
guitar concerti have been presented in larger and larger concert halls which often negatively affects the
audience’s ability to hear the soloist”.
140
“The guitar played in a large hall is not heard at its loveliest for most people in that hall; ideally, the guitar
should not be played in a large hall if we want to experience the full range of its tone, because it doesn’t sound
the same at a distance of 20 meters or more. This is because it’s a partly pe rcussive instrument, and the
percussive aspects carry more than its other dynamic and tonal qualities, so what we’re hearing is not really a
true guitar sound. So it’s not whether you can hear a guitar at the back of the Sydney Opera House, but what
you hear that counts. I find that amplification helps in that regard, but obviously it has to be well done (Williams
as cited in Classical Guitar Review Online)”.
235
Aconselho o uso da amplificação, desde que esta seja sutil e leve, sem deformar
muito o timbre e sem criar uma distância superficial entre o solista e a orquestra.
Nos próximos subtítulos, apresento alguns aspectos técnicos relativos à questão da
amplificação.
Mais uma vez, nota-se que a fidelidade do som amplificado depende do volume
requerido, no caso precisa ser um volume apenas o suficiente para equilibrar o som do solista
com a orquestra. Recomendo atentar sempre com muito cuidado para estes três aspectos no
momento da amplificação do violão. Também recomendo uma faixada de PA142 em
141
“O microfone DPA 4061 é um microfone omnidirecional, o que significa que nenhuma fonte sonora é
privilegiada, o microfone capta de maneira uniforme, dentro de um espaço formado por uma esfera teoricamente
perfeita. Usado para gravar sons de ambiente, o microfone omnidirecional percebe os sons em 360 graus, o que
significa que capta todas as fontes sonoras presentes no ambiente assim como as ressonâncias destas”
(MICROPHONE, [2004]).
142
PA (Public Adress System) são as caixas de som que estão no palco voltadas para o público. É o sistema de
amplificação em que é o som que vai direcionado para a sala, diferente do retorno, por exemplo, destinado ao
próprio músico.
236
Um violão com menos harmônicos possibilita que eu possa usar microfones mais
duros, tipo AKG144... O que significa isso? Que eu posso trabalhar com o microfone
perto o suficiente para que eu tenha um range de dinâmicas que não é do violão, mas
sim da aproximação ao mic, e como o microfone fica aqui [na frente da boca do
violão], e a orquestra fica atrás e não tem nenhum microfone para a orquestra, o som
da orquestra não duplica entrando no microfone, já que é um microfone direcional,
não é um microfone tão sensível. (GISMONTI, 2018)
Amplificação do violão tem que ter microfone específico que seja adaptado para o
range do violão, porque violão não adianta, se você comprar um Neumann com a
cápsula mais cara do mundo147, você não vai conseguir gravar uma nota do violão, o
range é muito pequeno em relação ao range do piano, ou da voz humana. [...] Então,
143
Som Quadrifônico também conhecido como estéreo 4.0 usa quatro canais de áudio onde os alto-falantes são
posicionados em quatro cantos de um ambiente reproduzindo sons inteiramente ou parcialmente independentes
em cada caixa de som. Foi um fracasso de mercado devido a sua complexidade técnica para instalação e alto
custo de implantação. Atualmente é substituído pelo Surround Sound. Neste caso trata-se de uma quadrofonia
vertical, são dois PA frente ao público e mais dois PA suspensos (QUADRIFÔNICO, [2009]).
144
Egberto Gismonti usa um microfone AKG direcional, “concebido para captar uma fonte sonora situada na
frente do microfone, eliminando o som fora do eixo. [...] a diretividade depende normalmente das aberturas
externas e passagens internas do microfone permitindo que o som atinja exatamente os dois lados da membrana”
(QU’EST-CE..., [2006], n.p.).
145
O microfone cardioide tem um espaço de captação do som que tem a forma de um coração direcionado para
frente do microfone e é muito usado para gravar instrumentos e canto.
146
A tessitura do violão se estende do Mi2 ao Dó6, sendo seu equivalente em frequências 82,40 Hz até 1046, 50
Hz (NASCIMENTO, 2011).
147
O microfone Neumann U87, muito usado em estúdios de gravação tem uma faixa de frequência que vai de 20
Hz até 20.000 Hz, que corresponde ao que o ouvido humano é capaz de captar (NEUMANN, [20--?]).
237
o primeiro passo para amplificar, é usar um microfone que tem uns cortes que o
violão exige, porque o violão não tem mais de 6000 ciclos148, não tem, não adianta...
“Ah mas se eu tiver 10000 eu vou ouvir harmônicos” , não vai nada, você pode até
ter a sensação de que está ouvindo, mas você na realidade está ouvindo a
ressonância da soma frequencial. Violão é um instrumento muito ruim para pensar
em volume e pensar em amplificação. (GISMONTI, 2018)
Agora quando você amplifica, você vai ouvir algo eletroacústico, não é mais
acústico, que a coisa que os violonistas não param para pensar. Quando você
amplifica, você tornou elétrico o som, já não é acústico mais... então se você está
amplificando o que você não está ouvindo, e violonista é o pior ouvinte de violão,
porque o som está indo para lá, para frente. Eu acho que isso é um primeiro dado
que tem que ficar muito atento. É tudo simples, mas faz muito sentido. Violão, se
você pegar – devem ter estudos sobre frequências de cada instrumento – se você
procurar o violão, não adianta, quantas vezes vi gravações, nas quais os violonistas
ficam pedindo microfones que o cara da mesa vai ter que cortar frequências até
morrer... (GISMONTI, 2018)
O sistema de amplificação usado por Gismonti – que ele atribui a Jan Erik
Kongshaug149 – consiste em colocar duas caixas ativas da marca Mackie (L x P x A 39,0 x
37,6 x 66 cm) viradas para o fundo da concha acústica do palco.
O lugar das caixas depende de cada teatro, do tamanho, do formato etc., por isso o
posicionamento das caixas é encontrado graças à uma pequena lanterna tipo laser, segundo
um teste de reflexão e refração, como expressa Gismonti a seguir:
[...] eu pego uma lanterna virada para o fundo, aponto a luz para parede, vejo o
circuito que ela dá para posicionar a caixa da esquerda e a da direita para que ambas
as lâmpadas percorram o teatro e se encontre no som, no centro do teatro, na cúpula,
onde é o surround. (GISMONTI, 2018)
Uma vez que o lugar certo das caixas é achado, o efeito de amplificação acontece
da seguinte forma:
Então não precisa fazer nada. É um microfone que passa na mesa, só para volume, o
som sai direto porque elas [as caixas] são ativas. Na medida em que pego uma caixa,
aproximo da madeira, do fundo do teatro, estou direcionando algo que sai com uma
sonoridade X e será amplificado com isto aqui, o que está amplificando isto aqui é
isto [ele bate na madeira]; a caixa de som é para você ter um som mínimo
amplificado. Como a orquestra está sentada, o público também e isto aqui [a
madeira] está atrás da orquestra, o som vai passar por cima da cabeça de todo
mundo. Então, o regente ouve, os músicos ouvem e o violonista ouve. E o público
não ouve o violão direita-esquerda, ouve no palco, junto com a orquestra.
(GISMONTI, 2018)
148
Mais precisamente, o violão tem no máximo 1046,50 ciclos por segundo, se consideramos a nota real mais
alta, Dó6 geralmente, e aproximadamente 6000 ciclos por segundo se consideramos todos harmônicos.
(CICLOS, [20--?]).
149
Jan Erick Kongshaug trabalhou como técnico de som do selo ECM durante décadas (GISMONTI, 2018).
238
Assim como Zanon, Gismonti dá muita importância ao fato de o som do violão vir
diretamente de frente e não em estéreo L-R de um PA frontal, já que o som do violão sai de
um lugar totalmente diferente daquele do posicionamento do violonista.
A título de informação, vale ressaltar que quando questionei o próprio Jan Erik
sobre esta técnica de amplificação que teria ensinado a Gismonti, ele respondeu:
[...] Tenho pouquíssima experiência com PA ao vivo, mas eu sei que representa um
desafio. O melhor som que você irá tirar é usando um bom microfone de gravação
(Neumann, Schoeps ou similar), mas o problema é que poderá acontecer facilmente
algum feedback do sistema de PA e do monitor. Se o violão já possui um microfone
integrado, isso pode ser usado para evitar os feedback , mas geralmente o som
desses di-mics é terrível. Me perdoe, mas eu não tenho bons conselhos enquanto a
isso. (ERIK, 2017, tradução nossa)150
E se você usar caixas grandes que viram para o público, tem que ver que o som
amplificado é mais veloz que o som acústico, pois ele está sendo impulsionado,
então tem um batimento de frações de segundos que fazem que o som chegue antes
do que a orquestra e se ele vai ressoando na sala, e quanto mais a orquestra está
próxima do fundo, da concha acústica, mais junto sai o som. Esse é o primeiro passo
que envolve, cabeamento, microfones, caixas de som, violão de menos ressonância
para poder amplificar sem medo... (GISMONTI, 2018)
Uma alternativa para esse impasse é o posicionamento das caixas de som atrás de
todo o grupo com as caixas em ângulo em relação ao microfone. Dessa maneira o
risco de microfonia é reduzido, pois o microfone fica localizado longe e desalinhado
com o sinal do alto-falante e o som do violão ainda provém de dentro do conjunto, o
que produz uma percepção sonora mais próxima do resultado acústico. Tal opção
também dispensa o uso de caixas de retorno para os músicos. (CHRISTÓFARO,
2010, p. 37)
Uma coisa é certa, é muito delicado amplificar o violão junto à orquestra, por
conta de várias razões: todos os músicos da orquestra e o regente precisam ouvir o violão; o
som do violonista não pode cobrir a orquestra o tempo inteiro, pois apesar de dar uma falsa
150
“I have very little experience with Live PA work, but I know this is a challenge. The best sound you will get
when you use a good studio-microphone (Neumann, Schoeps or similar) but the problem is that you will very
easily get feedback from the PA system and the Monitor. If the guitar has a built-in microphone you can use that
to avoid feedback, but the sound most of these di-mics sounds terrible. I am sorry, but I don´t have any good
advice in this matter”. Em consulta através de e-mail em 29 de julho de 2018.
239
impressão, também irá desnaturalizar demais o timbre do violão por estar com um volume
muito alto; as caixas precisam estar posicionadas estrategicamente para que o som não seja
amplificado desde as laterais do palco, mas sim numa posição que favoreça uma fonte mais
condizente com a posição do solista.
Durante uma entrevista concedida à autora, o técnico de som Dominique
Chalhoub explica o seu conceito de amplificação para esta formação específica:
Para começar, existem dois casos. O primeiro caso é quando estamos em um lugar
no qual a orquestra também vai ser sonorizada, e o outro caso, quando a orquestra
não é sonorizada, mas sim só o solista. Por exemplo, veja o Municipal [Theatro
Municipal do Rio de Janeiro], se a gente não usa a fossa e usa todo o palco, o
melhor seria ter duas caixas para ter uma boa difusão, na mesma linha que a
orquestra, porque assim a gente pode usar a acústica da sala e isso dá um resultado
mais natural, é só um reforço para poder passar por cima da orquestra e evitar que
solista tenha que fazer muito esforço quando a orquestra toca forte. Enfim,
normalmente os arranjos mais clássicos são pensados para que o violão possa
aparecer sem amplificação, era assim antigamente, com a única diferença que as
salas eram feitas para isso; também depende muito da posição do solista.
(CHALHOUB, 2018)
analisadas na presente pesquisa, eis alguns exemplos. Chemins V de Berio (Figura 113) e
Entailles de Mathieu Bonilla (Figura 114):
Figura 114 – Entailles de Mathieu Bonilla – Mapa de palco (Acervo pessoal de Mathieu Bonilla).
Figura 115 – Grabstein für Stephan de Gyorgy Kürtág. Espacialização da Orquestra (KÜRTÁG, 1989).
151
“Each group of instrument (marked with brackets) should be placed in a different part of the hall. Ideally, the
group encircle the public, and their vertical position may vary too. The whistles and gas signals should be
disperse around the audience, inside and/or outside the doors. Should the players need it, a second conductor
may help them out”.
152
“la percussion sera placée à proximité immédiate du soliste”.
242
Sem dúvida, esta questão é um dos pontos centrais para se pensar na hora de
compor para violão e orquestra. Considera-se na presente tese que a palavra orquestra
engloba todo tipo de ensembles de instrumentos, podendo ser orquestra sinfônica, com todos
os naipes representados, orquestra de cordas, orquestra de percussões, orquestra de sopros,
dentre outras. Inclusive, uma das estratégias para ajustar o equilíbrio sonoro entre o solista e a
orquestra é a escolha de uma formação adequada à escrita e à formação.
Desde a época barroca, o tamanho da orquestra evoluiu muito. A orquestra de
Haendel, de Haydn e de Mozart tinha mais ou menos 24 cordas no naipe, e esse número chega
a dobrar no século XIX com Rimsky-Korsakov ou Berlioz, atingindo então mais ou menos 80
243
músicos tocando no palco, número em vigor até hoje, podendo, muitas vezes, exceder esse
número. Evidentemente, pensando em uma peça para violão e orquestra, uma orquestra deste
tamanho me parece muito grande. Acredito que seria adequado pensar em um formato de
orquestra de câmara, totalizando no máximo 40 músicos, embora me pareça ainda mais
adequado pensar em uma formação ainda menor.
Segundo Pablo Márquez, os intérpretes têm o papel de conversar com os
compositores sobre as questões que este tipo de formação levanta:
Você pega cada instrumento da orquestra e cada um deles tem mais volume do que o
violão, então sempre vai ser um problema. Para mim o ideal seria orientar os
compositores para concertos de câmara, como por exemplo o concerto de De Falla
para cravo e 5 instrumentos. Os compositores poderiam trabalhar com um máximo
de 10 instrumentos por exemplo… Eu acho que só assim, e com uma orquestração
inteligente, a gente consegue um equilíbrio razoável… e sem amplificação! Para
mim é o ideal, sem amplificar… (MÁRQUEZ, 2018)
Fica nítido para Márquez que a orquestra precisa ser reduzida e, no conceito dele,
o violão poderia solar até sem amplificação. Na minha opinião, poderia ser encontrada uma
solução que permita uma amplificação leve e sutil, possibilitando o uso de uma orquestra um
pouco maior do que Márquez preconiza aqui.
Nas grades de orquestra, o número de cordas no naipe nem sempre é especificado.
É delicado aconselhar uma quantidade de cordas porque isto depende muito do tipo de escrita,
mas, com certeza, eu não ultrapassaria 25 cordas. O que para mim parece importante é o
compositor indicar precisamente a quantidade de cordas desejadas.
A quantidade de sopros precisa sempre ser especificada e, mais uma vez, o
compositor precisa ter bom senso ao escolher a quantidade de instrumentos por naipe; eu acho
arriscado passar de 2 por instrumento, mas essa escolha, assim como para as cordas, depende
do tipo de escrita.
Sobre este assunto específico, Egberto Gismonti se expressa da seguinte forma:
Não use mais do que quinteto de sopros... tira os metais e usa os quintetos de sopros,
no máximo de 2 em 2. E se você usar um só, exija que o oboé saiba tocar corno
inglês, para você poder mudar de instrumento. [...] Bom então se você trabalhar com
5 sopros, percussões, só se for uma coisa muito leve... e daí, [...] considerando de
maneira geral, não específico, mas com 5 sopros, você pode trabalhar no máximo
com 6-5-4-2-2 [cordas], porque tem uma regra matemática de som... Porque não
adianta pensar numa orquestra com 48 cordas, porque isso é para tocar Mahler, sabe
como é... [...] Mas também depende da música! (GISMONTI, 2018)
Fica claro na fala do Gismonti que ele usa estratégias para equilibrar a massa da
orquestra com a do solista; primeiramente, recomendando o uso do quinteto de sopros (flauta,
clarinete, oboé, fagote, trompa), limitando, assim, o uso dos metais a uma única trompa.
244
Segundo, trabalhando com um naipe de cordas reduzido em mais da metade do que haveria
em uma orquestra sinfônica normalmente. Porém, deixa entender que o tamanho pode variar
dependendo do tipo de música, do tipo de escrita. E, por fim, ele lembra de usar as percussões
com sabedoria, deixando-as muito leves.
Sobre esta questão, Angelo Gilardino dá a seguinte opinião: “Em geral, as cordas
funcionam bem em 4.4.3.2.1, os sopros devem ser por um, não há necessidade de dobrá-los.
No máximo um tímpano e, se desejado, um celesta ou glockenspiel por exemplo”
(GILARDINO, 2018).
No depoimento deste entrevistado, encontram-se conselhos semelhantes.
Gilardino aconselha o emprego de um naipe de cordas ainda mais reduzido (Gismonti
recomenda 6-5-4-2-2 para as cordas), sopros por um, o que leva a supor que ele não teria nada
contra usar metais também e, por fim, recomenda usar pouca percussão; nota-se que ele
preconiza o uso de percussões melódicas.
Em entrevista com Sérgio Assad, questionei: “A gente vê, por exemplo,
Takemitsu usando uma orquestra de quase 80 integrantes enquanto Tedesco pede menos de
20 músicos na orquestra, e são dois exemplos que funcionam na minha opinião. Você tem
algum tamanho ideal?”. Ele respondeu da seguinte forma:
Você não acha que isso tem a ver com a proposta do tipo de escrita? Takemitsu, não
é uma música que está dizendo um texto, ela está dando cores, é uma distribuição de
cores. Eu acho que nesse sentido você pode manipular esses corpos sonoros, essas
massas, de uma maneira inteligente, assim você pode realmente ter essas grandes
massas sonoras, o violão ali no meio vai soar legal. Agora, quando o violão é o líder
e está condizente com o tipo fazendo melodia, e a orquestra fazendo algo
complexo por trás, tem que ter muito cuidado, o violão é encoberto até por uma
flauta. (ASSAD, S, 2018)
153
“Castelnuovo-Tedesco limited the orchestra to sixteen players with a small string and woodwind section and
timpani […] with specific seating arrangement: violins, cello and double bass on the left side, second violins and
violas on the right and the woodwind section and timpanist at the back. Castelnuovo-Tedesco’s aim was to have
the orchestra present but not overbearing, adding colour and texture rather than power and weight to the
concerto (Otero 1999: 56; Grove Music Online, Westby). Segovia considered the work a tremendous success
and used the work as an example to convince other composers of the viability of balancing guitar with an
orchestra (Grove Music Online, Westby)”.
154
“Unlike Castelnuovo-Tedesco, who prescribed the number of string players, Rodrigo did not. Consequently
Concierto de Aranjuez, which already includes a rather large woodwind and brass section when compared to
other guitar concerti, is often performed with a fairly large string section. Considerable amplification in
Concierto de Aranjuez has become a necessary aid for the guitarist in order to ‘compete’ with the sound of such
a large orchestra”.
246
– violão;
– 3 flautas, clarinete em B♭, clarone em B♭, saxofone tenor em B♭, fagote;
– 2 trompetes em C, trompa em F, trombone;
– 2 harpas;
– marimba;
– acordeom;
– 12 violinos – 8 violas – 4 violoncelos – 3 contrabaixos;
– o total do efetivo é de 42 músicos.
Concerto em D, de Castelnuovo-Tedesco:
– violão;
– flauta, oboé, 2 clarinetes em A, fagote;
– trompa em F;
– tímpano;
247
– 2 violinos I;
– 2 violinos II;
– 2 violas;
– 2 violoncelos;
–1 contrabaixo;
– o total do efetivo é de 17 músicos.
– 4 trompas em B♭;
– percussões: 3 triângulos, 5 pratos suspensos, 3 tam-tams, crotales, sinos,
vibrafone;
– harpa;
– celesta;
– cravo (amplificado);
– piano;
– cordas;
– considerando um ensemble de cordas de câmara (28), o total do efetivo é de 48
músicos.
– quinteto de cordas;
– dispositivo eletrônico;
– sistema 5.1 Max/msp, 2 teclados midi (1x4 oitavas (teclado midi 1) +1x7
oitavas (teclado midi 2);
– o total do efetivo é de 17 músicos, mais o dispositivo eletrônico, são 18
elementos tocando.
– 8 violoncelos;
– 6 contrabaixos;
– o total do efetivo é de 79 músicos.
Observa-se nos exemplos acima que o efetivo é muito variável, sendo o menor
composto para 17 instrumentos (Concerto em Ré, de Castelnuovo-Tedesco) e o maior por 79
251
(To the edge of dream, de Tōru Takemitsu). Apesar dessa variedade de tamanhos, vale
lembrar que Gismonti recomenda as cordas em 6-5-4-2-2, e Gilardino em 4.4.3.2.1, que são
formações reduzidas de cordas. Os mesmos entrevistados também recomendam usar os
sopros, no máximo em 2. Por outro lado, também vale lembrar o comentário de Sérgio Assad
sobre o assunto:
Você não acha que isso tem a ver com a proposta do tipo de escrita? Takemitsu, não
é uma música que está dizendo um texto, ela está dando cores, é uma distribuição de
cores. Eu acho que nesse sentido você pode manipular esses corpos sonoros, essas
massas, de uma maneira inteligente, assim você pode realmente ter essas grandes
massas sonoras, o violão ali no meio vai soar legal. (ASSAD, S, 2018)
Mais uma vez não há uma resposta definitiva para esta questão, mas, sim,
propostas relativas. Concluo, então, que o tamanho da orquestra é relativo ao tipo de escrita
empregada pelo compositor, e com certeza uma escrita mais transparente suporta uma
orquestra maior.
252
Para facilitar a leitura da grade, desenvolvi uma legenda de cores (Figura 117) que
ilustra as diferentes texturas orquestrais utilizadas na peça, como pode ser observado a seguir:
Figura 117 – Legenda de cores para texturas orquestrais empregadas em Nodus de Elodie Bouny.
4.3 Nodus
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No início desta tese, apontei para questões que constituem o desafio de compor
para violão e orquestra, que é essencialmente ligado a problemas de equilíbrio sonoro entre o
solista e a orquestra.
O objetivo principal foi fornecer ferramentas para os compositores, propondo
soluções técnicas e concretas, conceitualizadas com o auxílio de análise de peças. Foi então
constituída uma série de exemplos que não se instituem como regra, mas que podem ajudar a
elaborar os fenômenos de textura orquestral que são satisfatórios com o violão. Tal objetivo
foi atingido, e listei soluções que poderão ajudar quem encarar a empreitada de escrever para
esta formação.
Porém, é necessário ter sempre em mente que nenhuma receita pronta resolve os
problemas; o bom resultado de qualquer composição deste tipo envolve técnica, inspiração,
criatividade, dentre outros. Como bem escreve Rimsky-Korsakov (1964, p. 2): “Orquestrar é
criar, e isso é algo que não pode ser ensinado. É um grande erro dizer: este compositor
orquestra bem, ou essa composição é muito bem orquestrada, pois a orquestra é parte da alma
do trabalho”56. A meu ver, pode até ser ensinado, mas não é suficiente.
Evidentemente, este trabalho se preocupou com o solista-violão, mas certamente
os comentários tecidos nesta pesquisa poderão auxiliar em qualquer tipo de obra concertante,
seja para violão ou outro solista.
Por outro lado, é importante entender que o sucesso da interpretação de um
concerto envolve uma cadeia de várias pessoas, da qual o compositor faz parte, e de vários
elementos. A sala, a amplificação, a qualidade e o envolvimento da orquestra, a boa
comunicação com o regente, ensaios eficazes, dentre outros fatores, são fundamentais para
que o resultado seja satisfatório e condizente com o que o compositor pensou inicialmente.
Outro elemento que apareceu de maneira evidente ao longo da pesquisa é a noção
de relatividade entre o tipo de escrita e as escolhas feitas pelo compositor. Não adianta
recomendar uma instrumentação ideal ou um tamanho de orquestra mais adaptado, pois esse
tipo de decisão está diretamente ligado ao tipo de escrita, mais ou menos opaco e denso. O
compositor precisa ter consciência do seu estilo de composição e se adaptar em função deste
para fazer as melhores escolhas.
Também me parece muito valioso poder consultar os instrumentistas: por mais
que se estude instrumentação, nada substitui a prática. Quem sabe mais sobre o instrumento é
quem o toca e por isso a escrita de um concerto necessita de uma troca entre o compositor e
256
o(s) instrumentista(s), para que possa ser extraído o máximo do instrumento, a menos que o
compositor também toque o instrumento que irá ocupar o papel de solista.
O caminho do conhecimento da orquestra e dos seus desdobramentos é sem fim
porque ele é relativo à técnica, à criatividade, mas também ao próprio gosto de quem compõe.
Por outro lado, considero este trabalho um ponto de partida para maiores investigações que
sempre poderão apontar mais soluções e mais ferramentas, adquiridas com o passar do tempo
e com as experiências.
Por outro lado, é essencial ter em mente que o ato de orquestrar e compor, de
maneira mais geral, precisa transmitir algo autêntico, e que neste sentido a técnica e a teoria
são o caminho que permite atingir tal objetivo. Técnica e criatividade andando juntas, em um
equilíbrio perfeito, podem trazer algo verdadeiro.
Embora não tenha sido mencionado anteriormente nesta tese, me parece oportuno
citar Heidegger e a questão da técnica; sabe-se que a expressão technè é encarada como uma
forma de conhecimento que provoca uma abertura, ou uma clareira, para usar uma imagem
heideggeriana.
Portanto, technè não significa técnica no sentido moderno de métodos de
produção e reprodução, mas sim tem o sentido de conhecer de dentro, noutras palavras,
desvelar, ou revelar. Durante a sua conferência intitulada A questão da técnica155, Heidegger
proclama:
Somente onde um tal desocultamento acontece, dá- se o que é verdadeiro. Por isso, o
que é meramente correto ainda não é o verdadeiro. Somente o verdadeiro nos leva a
uma livre relação com o que nos toca a partir de sua essência. De acordo com isso, a
correta determinação instrumental da técnica não nos mostra ainda sua essência.
(HEIDEGGER, 1953, n.p.)
155
“A conferência A questão da técnica (Die Frage nach der Technik) foi proferida no dia 18 de novembro de
1953 no Auditorium Maximum da Escola Superior Técnica de Munique, fazendo parte do ciclo de conferências
cujo tema era As artes na época da técnica, promovido pela Academia Bávara de Belas Artes, sob a direção do
presidente Emil Preetorius. O texto foi publicado pela primeira vez no volume iii do anuário da Academia
(Redação: Clemens Graf Podewils), R. Oldenbourg München, 1954, p. 70 e ss. O texto desta tradução encontra-
se na coletânea Conferências e ensaios (Vorträge und Aufsätze), 2a. ed. Tübingen, Günther Neske Pfullingen,
1959”. Nota de rodapé 1 em A questão da técnica, com tradução de Marco Aurelio Werle (SCIENTIAE
STUDIA, 2007).
257
não se distanciar do objeto final, a criação, a obra. Emmanuel Carneiro Leão (1977) escreve
de maneira muito pertinente em um capítulo do seu livro Aprendendo a pensar, intitulado
“Os mecanismos da criação original”:
Mecanismos são processos nos quais se cria uma obra. A questão sobre os
mecanismos questiona, pois, a proveniência da obra. Segundo a convicção vigente,
uma obra provém da ação de mecanismos. Mas donde provêm e donde retiram sua
força criadora os mecanismos? – Não será da obra? – Pois, é a obra que impõe
determinados mecanismos, e impondo, lhes ex-põe à força criadora. Temos assim
uma conjuntura circular, excitante de questões: do mecanismo provém a obra e da
obra provêm os mecanismos. [...] Os mecanismos só se tornam veículos da criação
de uma obra quando a criação libertar a obra dos veículos. Pois então a obra será a
linguagem da criação. (CARNEIRO LEÃO, 1977, p. 189-190)
REFERÊNCIAS
ADLER, Samuel. The study of orchestration. New York: W.W. Norton, 2011.
AGUERA, Fernando Augusto. Julian Bream’s contribution to new guitar repertoire and
performance practice, with timbral analysis of his approach. 95p. Dissertation (Master in
Music) – Royal Welsh School of Music and Drama, Cardiff, Wales, 2011.
ANGELO GILARDINO. Bio. Angelo Gilardino. Sítio da Internet, 2018. Disponível em:
http://angelogilardino.com/bio/. Acesso em: 6 jan. 2019.
ARNOLD, Malcolm. Concerto para violão e orquestra de câmara. Los Angeles: Novello
& Co Ltd., 1988.
ASSAD, Clarice. O saci-pererê. Concerto for guitar and chamber orchestra. Portal eletrônico
de Clarisse Assad, 2016. Sítio da Internet. Disponível em: <https://clariceassad.com/o-saci-
perere/>. Acesso em: 16 nov. 2018.
BANEL, Philippe. Interview de Thibault Cauvin, guitariste. Tutti Magazine, Paris, 4 set.
2013. Sítio da Internet. Disponível em: <http://www.tutti-magazine.fr/news/page/Thibault-
Cauvin-guitare-Danse-avec-Scarlatti-fr/>. Acesso em 4 maio 2017.
BERIO, Luciano. Chemins V. Viena: Universal Editions, 1992. 1 partitura (75 p.)
259
BELKIN, Alan. A practical guide to musical composition. 2008. Alan Belkin. Disponível
em: <http://alanbelkinmusic.com/bk/F.pdf>. Acesso em: 6 jan. 2018.
BIOGRAFÍAS Y VIDA. Narciso Yepes. Biografías y vidas, Sítio da Internet. Disponível em:
https://www.biografiasyvidas.com/biografia/y/yepes.htm. Acesso em: 13 jan. 2019.
BLOCK, Adrienne. Timbre, texte et air; ou: comment le noël-parodie peut aider à l’étude de
la chanson du XVI ème siècle. Revue de Musicologie. Société Française de Musicologie,
Paris, t. 69, n. 1 (1983), p. 21-54.
BOULEZ, Pierre. Timbre and Composition-Timbre and language. In: MATHEWS, Paul.
Orchestration an Anthology of writings. New York: Taylor and Francis Group. 2015. p.
206-216.
BREAM, Julian. Guitar Concertos. Julian Bream e Melos Ensemble. London: RCA Victor
Red Seal, 1961. 1 LP.
BREAM, Julian; RCA Victor Chamber Orchestra. Julian Bream Collection Vol. 22.
England: RCA, 1994. 1CD.
BREAM, Julian. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation,
2018. Disponível em:
<https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Julian_Bream&oldid=52414565>. Acesso em: 20
jun. 2018.
BROUWER, Leo. Concerto Elegíaco. Paris: Editions Max Eschig, 1986b. 1 partitura (55 p.)
BROUWER, Leo. Leo Brouwer Interview with Tony Morris on Julian Bream Concierto
Elegiaco, Sonata CGA Int 2000. Classical Guitar Alive, 2000. Disponível em:
260
<https://soundcloud.com/classicalguitaralive/leo-brouwer-interview-with-tony-morris-on-
julian-bream-concierto-elegiaco-sonata-cga-int-20001>. Acesso em: 2 set. 2018.
BROUWER, Leo. An interview with Leo Brouwer. Guitar Review, n. 75, 1998. Disponível
em: <http://www.angelfire.com/in/eimaj/interviews/leo.brouwer.html>. Acesso em: 3 nov.
2018.
BROUWER, Leo. The Black Decameron. Intérprete: John Williams. Europe: Sony
Classical, 1997. CD.
CADARS, Sylvain. Amplificação. Entrevista concedida à Elodie Bouny por Skype no dia 12
de setembro de 2018.
CALBI, Evan. Los Angeles takes center stage for classical guitar. USC Thornton School of
Music, 29 set. 2015. Disponível em: <https://music.usc.edu/los-angeles-takes-center-stage-
for-classical-guitar/>. Acesso em: 4 mai. 2017.
CÂMARA, Fabio Adour. Sobre a composição para violão. 172f. Dissertação (Mestrado em
Música) – Escola de Música, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1999.
CARLEVARO, Abel. Abel Carlevaro Ao Vivo Vol. 1. Montevideo: Tacuabe. (C) 2002
Ediciones Tacuabe S.R.L., 1 de agosto de 2002. CD.
CARSE, Adam. The history of orchestration. (Primeira edição 1925). New York: Dover
Publications, 2012.
CICLOS por segundo (cps - Velocidade rotacional), frequência. In: Convertworld.com [20--
?]. Disponível em: <https://www.convertworld.com/pt/frequencia/ciclos-por-segundo.html>.
Acesso em: 16 nov. 2018.
CONCIERTO del sur para guitarra y orquestra, 1941– Manuel M. Ponce (1882-1948).
Boletín, Música en México, 3 set. 2016. Disponível em:
<https://musicaenmexico.com.mx/concierto-del-sur-guitarra-orquesta-manuel-m-ponce-1882-
1948/>. Acesso em: 8 out. 2018.
CONE, Edward T. Stravinsky: the progress of a method. In: BORETZ, Benjamin; CONE,
Edward (Orgs.). Perspectives of New Music 1. Princeton University Press. 1962, p. 18-26.
DENISOV, Edison. Concerto for guitar and orchestra. Hamburgo, Alemanha: Sikorski
Edition, 1991. 1 partitura (72 p.)
DYENS, Roland. Mes arrangements à l’amiable. Paris: Éditions Henri Lemoine, 2001.
FÁBIO Zanon. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São
Paulo: Itaú Cultural, 2018. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa12851/fabio-zanon>. Acesso em: 05 out. 2018.
FERNANDES, João Candido. Avaliação dos níveis de ruído em tratores agrícolas e seus
efeitos sobre o operador. 172 f. Tese (Doutorado em Agronomia) – Faculdade de Ciências
Agronômicas, Universidade Estadual Paulista, 1991. Disponível em:
<http://hdl.handle.net/11449/101842>. Acesso em: 20 jan. 2019.
FLOWERS, Corey James. Altered states of performance: scordatura in the classical guitar
repertoire. 57f. Dissertation (Doctorate Musical Arts) - University of Georgia, 2015.
FOLLAIN, Clément. Cordes sensibles. Guitare Classique. n. 57, p. 40-43, abr./mai. 2017.
FOURIE-GOUWS, Josina Nina. The solo classical guitar concerto: a soloist’s preparatory
guide to selected works. A mini-dissertation submitted in partial fulfilment of the
requirements for the degree Master of Music (Performing Art) Department of Music Faculty
of Humanities University of Pretoria, 2017.
GALEANO, Eduardo. Las palabras andantes. Buenos Aires: Catálogos S.R.L., 2001.
GARCIA LORCA, Federico. Teoria e prática do duende, [1933]. Grupo Tempo. Sítio da
Internet. Disponível em: <http://www.grupotempo.com.br/tex_lorca.html>. Acesso em: 8 out.
2018.
GIMENO, Julio. Un viaje sin destino: Andrés Segovia hacia el Concierto de Aranjuez. In:
SUÁREZ-PAJARES, Javier (ed.). Joaquín Rodrigo. “Nombres propios de la guitarra”, v. 8.
Córdoba: La Posada, 2010.
263
GILARDINO, Angelo. Violão e Orquestra. Entrevista concedida à Elodie Bouny por e-mail
no dia 18 de setembro de 2018.
GROVE MUSIC ONLINE. Scordatura. Oxford Music Online. Sítio a Internet. Disponível
em:
http://www.oxfordmusiconline.com/grovemusic/view/10.1093/gmo/9781561592630.001.000
1/omo-9781561592630-e-0000041698. Acesso em: 8 mar. 2018.
HANDEL, Saul. Timbre perception and auditory object identification. In: MOORE,
Beauregard Crawford (ed.). Hearing. San Diego, CA: Academic Press. 1995, p. 425–461.
HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. São Paulo: Edições 70, 2010.
JACKSON, Blair. Biasini Festival and Competition opens with two outstanding premieres.
Classical Guitar, 15 jan. 2016. Disponível em: <http://classicalguitarmagazine.com/biasini-
festival-and-competition-opens-with-two-outstanding-premieres/>. Acesso em: 3 nov. 2018.
JEFFERY, Brian. Giuliani: Guitar Concerto in A, op. 30. Tecla Editions, 1985. Disponível
em: <https://tecla.com/giuliani-guitar-concerto-in-a-op-30-the-complete-introduction/>.
Acesso em: 2 mai. 2017.
JOIE, Jean-Luc. Interview de Jean-Luc Joie, luthier de guitare. Tutti Magazine, Paris, 25
mai. 2015. Disponível em: <http://www.tutti-magazine.fr/news/page/Interview-Jean-Luc-
Joie-Luthier-Guitare-Bordeaux-fr/>. Acesso em: 4 mai. 2017.
JUAN, Carlos. The world's best acoustic guitar amplification. [20--]. Disponível em:
<http://carlosjuan.eu/references/> Acesso em: 5 mai. 2017.
KAMPELA, Arthur. Danças Percussivas (Percussion Study I and II). S.l. Edição particular
do compositor, 1995. Partitura.
264
KRIEGER, Edino. Violão e Orquestra: processo de composição dos concertos para violão e
orquestra de Edino Krieger. Entrevista concedida à Elodie Bouny. Rio de Janeiro, 22 de
agosto de 2018.
KÜRTÁG, György. Grabstein für Stephan, for guitar & instrumental groups, Op. 15c.
Budapest: Editio Musica, 1989.
L’HISTOIRE DES CORDES: ne pas perdre le fil…Guitarre Live, n. 26, mars. 2007. Sítio da
Internet. Disponível em: <http://www.guitare-live.com/magazine/26/l-histoire-des-cordes-ne-
pas-perdre-le-fil/366/2/>. Acesso em: 16 mai. 2017.
LEITE, Luis. Música viva: novas perspectivas sobre a prática da improvisação musical. 2015.
139f. Tese (Doutorado em Música) – Programa de Pós-Graduação em Música, Centro de
Letras e Artes, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.
LEMBKE, Sven-Amin. When timbre blends musically: perception and acoustics underlying
orchestration and performance. 2014. 193f. Thesis (Doctorate in Philosophy) – Music
Technology Area, Department of Music Research Schulich School of Music, McGill
University Montreal, Canada, 2014.
LOPES, António. Cante Jondo. In: E-DICIONÁRIO de Termos Literários, 29 dez. 2009.
Disponível em: <http://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/cante-jondo/>. Acesso em: 8 out. 2018.
LUNN, Robert Allan. Extended techniques for the classical guitar: a guide for composers.
Ohio: UMI Dissertation Publishing, 2010.
MADEIRA, Bruno. Andres Segóvia. Bruno Madeira. Sítio da Internet, 2007a. Disponível
em: http://brunomadeira.com/andres-segovia/. Acesso em: 6 nov. 2018.
MADEIRA, Bruno. John Williams. Bruno Madeira. Sítio da Internet, 2007b. Disponível em:
http://brunomadeira.com/john-williams/. Acesso em: 6 jun. 2018.
265
MANOURY, Philippe. Les procédés de composition utilisés dans “tensio”. Lettre aux
jeunes musiciens de l’Académie de Lucerne – Traité d’inharmonie, 2012. Disponível em:
<http://www.philippemanoury.com/?p=4965>. Acesso em: 4 mai. 2017.
MÁRQUEZ, Pablo. Violão e Orquestra. Entrevista concedida à Elodie Bouny por Skype no
dia 26 de agosto de 2018.
MÁRQUEZ, Pablo. Now, And Then. Pablo Márquez e Orchestra Della Svizzera Italiana e
Dennis Russell Davies. Berlin: ECM New Series, 2017. 1CD.
MATHEWS, Paul. Orchestration: an anthology of writings. New York: Routledge, Taylor &
Francis Group, 2006.
MAUNDER, Richard. The scoring of baroque concertos. Woodbridge: The Boydell Press,
2004.
MCKENNA, Constance. An interview with Leo Brouwer. Guitar Review, Nº 75, 1988.
Disponível em:
http://www.angelfire.com/in/eimaj/interviews/leo.brouwer.html?fbclid=IwAR3y0khD0tdNJS
bwDR96oqzvOeO43OfB5j65biRMJW_I-VhFnCPPb7LJMOY. Acesso em: 5 fev. 2019.
MILLER, R. J. Contemporary orchestration. New York: Taylor and Francis Group. 2015.
266
MR. BRIGHTSIDE. Les techniques modernes de lutherie pour guitare classique. [Mensagem
de fórum]. Guitarriste.com, 6 mar. 2015. Disponível em:
<http://www.guitariste.com/forums/accessoires-et-lutherie,les-techniques-modernes-de-
lutherie-pour-guitare-classique,475008.html>. Acesso em: 2 mai. 2017.
MURRAY, Daniel. Happy Days II. Daniel Murray – Universo em expansão, 2016.
Sítio da Internet. Disponível em:
http://danielmurray.com.br/universosemexpansao/arthur-kampela.html. Acesso em: 7 jan.
2019.
PONCE, Manuel M. Ponce: Complete Guitar Music. Intérprete: Gerard Abiton. Leeuwarden
(Holanda): Brilliant Classic, 2015. 1CD.
267
POVEDA, Alberto López. Andrés Segovia: vida e obra. Jaén: Universidad de Jaén, Servicio
de Publicaciones e Intercambio Cientifico, 2009. v. 1.
PUJOL, Emilio. El dilema del sonido en la guitarra. Milano: Ediciones Ricordi. 1979.
ROCH. Pascual. Modern method for the guitar: school of tarrega. New York: Schirmer,
1921.
RODRIGO, Joaquín. Concierto de Aranjuez for guitar and orchestra. London: Ernst
Eulenburg Ltd, 1985. 1 partitura (90 p.).
RODRIGO, Joaquín. Fantasia para un gentilhombre. London: Schott And Co, 1962.
Partitura.
ROSEN, Charles. Arnold Schoenberg. New York: The Viking Press, Inc., 1979.
ROSS, Alex. O resto é ruído: escutando o século XX. São Paulo: Companhia das Letras,
2011.
ROTHKO, Mark. Orange red orange by Mark Rothko (1961-2). Elyse Snow, 2013. Sítio da
Internet. Disponível em: https://elysesnow.wordpress.com/2013/03/14/orange-red-orange-by-
mark-rothko-1961-2/. Acesso em: 13 nov. 2018.
factors determining “blend”. 1991, 337p. Dissertation for the degree Doctor in Philosophy.
Field of Music Theory – Northwestern University. Evanston, Illinois, 1991.
SANTOS, Turibio. Heitor Villa-Lobos e o violão. Rio de Janeiro: Museu Villa-Lobos, 1975.
SANTOS, Jorge Luiz Lima. Textura Musical: Um esboço para uma revisão bibliográfica. In:
SIMPÓSIO BRASILEIRO DE PÓS-GRADUANDOS EM MÚSICA, 2, 2012, Rio de Janeiro.
Anais... Rio de Janeiro, 2012.
SCHIFRIN, Lalo. Biography. In: The official website of Lalo Schifrin, [jan. 2013].
Disponível em: <http://www.schifrin.com/biography.htm>. Acesso em: 13 nov. 2018.
SCHIFRIN, Lalo. Violão e Orquestra. Entrevista concedida à Elodie Bouny por e-mail em 6
fevereiro de 2018.
SETHARES, William A. Tuning, timbre, spectrum, scale. London: Springer Verlag, 2005.
SEURAT, Georges. La Seine à la Grande-Jatte, 1888. 1 Original de arte. Óleo sobre tela,
65x82 cm. Royal Museums of Fine Arts of Belgium, Brussels, Belgium. Domínio Público. In:
WikiArt, Virtual Encyclopedia. Disponível em: https://www.wikiart.org/en/georges-
seurat/the-river-seine-at-la-grande-jatte-1888. Acesso em: 11 jan. 2019
SMALL, Mark. Segovia’s Strings and the Augustine Collaboration. Classical Guitar, 11
nov. 2016. Sítio da Internet. Disponível em: <http://classicalguitarmagazine.com/segovias-
strings-and-the-augustine-collaboration/>. Acesso em: 4 mai. 2017.
STRIZICH, Robert. Texture in Post-World War II Music. Ex Tempore, Vol. V/2: Fall
1991; Disponível em: www.ex-tempore.org/strizich91/strizich.htm. Acesso em: 23 jan.
2019.
TAKEMITSU, Tōru. To the Edge of dream. Tokyo, Japão: Schott Japan Editions, 1993. 1
partitura (30 p.).
TELIN, Mike. Guitarist Paul Galbraith to present recital featuring works by Bach and Mozart
(May 30). Clevelandclassical.com, 28 mai. 2015. Sítio da Internet. Disponível em:
<http://clevelandclassical.com/wp-
content/uploads/2015/05/052815CICGFGalbraithPrev.pdf>. Acesso em: 5 mai. 2017.
TRAUBE, Caroline. An interdisciplinary study of the timbre of the classical guitar. 2004.
218f. Thesis (Doctor in Philosophy) - Music Technology Department of Theory Faculty of
Music McGill University Montreal, Canada, 2004.
TURNBULL, Harvey. The guitar: from the Renaissance to the present day. Westport, CA:
The Bolt Strummer, 1974.
TYRANNY, Gene. Toru Takemitsu - To the Edge of Dream, for guitar & orchestra.
Description by “Blue” Gene Tyranny. AllMusic, [20--]. Sítio da Internet. Disponível em:
<https://www.allmusic.com/composition/to-the-edge-of-dream-for-guitar-orchestra-
mc0002367763>. Acesso em: 3 nov. 2018.
VILLA-LOBOS, Heitor. Concerto para violão e pequena orquestra. Paris: Editions Max
Eschig, 1951. Partitura.
WHITE, Eric Walter. Stravinsky: the composer and his works. Los Angeles: University of
California Press, 1966.
ZANON, Fabio. Violão como solista de orquestra - Parte 1, 2016a. YouTube. Disponível
em:
https://www.youtube.com/watch?v=tIZDaCEKQ8c&fbclid=IwAR2OBsBS74uFa6jpRJjQUe
HC0vQSwUx9BUQtzf-kErkj8vnzOc10dvHB6bw. Acesso em: 21 dez. 2018.
ZANON, Fabio. Violão como solista de orquestra - Parte 2, 2016b. YouTube. Disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=38Ac5Jk7Rqg&fbclid=IwAR0FepWeu-
YDWVhTq6aubi69xo934dX1jNqg-EqPQC9fSpWoW1Cbs4vTTFU. Acesso em: 13 jan.
2019.
ZANON, Fabio. Sérgio Abreu: concerto para violão e orquestra de Villa-Lobos. In:
Fórum do site Violao.Org, 2016c. Disponível em: https://violao.org/topic/22917-sergio-abreu-
concerto-para-violao-e-orquestra-de-villa-lobos/. Acesso em: 13 jan. 2019.
ZANON, Fabio. Violão e Orquestra. Entrevista concedida à Elodie Bouny por Skype no dia
2 de agosto de 2018.
271
Ballou, Esther Williamson - Concerto for solo guitar and chamber orchestra
Barnes, Milton - Double Concerto for Two Guitars and String Orchestra
Blanquer Ponsoda, Amando - Homenaje a Juan Ramón Jiménez Concierto para guitarra
Brenet, Thérèse - Des grains de sable d'or aux mains Concerto for guitar and string orchestra
Casares López, Miguel Ángel - Concierto No.1 para bandurria, laúd, guitarra y orquesta
Cervo, Dimitri - Série Brasil 2010 n. 2 Concerto para Violão e Orquestra de Câmara - op.31
Codina i Torrecilla, Jordi - Música per a Galarina Version for guitar and string orchestra
Codina i Torrecilla, Jordi - Seis canciones españoles recopiladas por Federico García Lorca
Daniel, Omar - Only the Eagle Flies the Storm Version for guitar and string orchestra
Dodgson, Stephen - Duo Concerto for violin, guitar and string orchestra
Ford, Andrew - The Big Parade for concertino group, string quintet, string octet and three
orchestras
Gilardino, Angelo - Concerto per flauto, chitarra e archi La casa delle ombre
Gnattali, Radamés - Concerto para dois violões solistas, oboé e orquestra de cordas
Jalkanen, Pekka - Aeterna Double concerto for bandoneon, decacorde and chamber orchestra
Jong, Christiaan de - Pluk, blaas en strijk Concierto for flute and guitar and string orchestra
Kaipainen, Jouni - Chamber Concerto No.1 ...and then is heard no more... - op.73
Kalogeras, Alexandros - Seven Visions in the Shades of Azure Version for Guitar and
Orchestra
Kenins, Talivaldis - Concerto for flute & guitar with strings and percussion
Koch, Erland von - Fantasia melodica Version for guitar and strings
Koch, Erland von - Fantasia melodica Version for guitar and wind quintet
Krouse, Ian - Cantiga Variations Fractal In One Movement On An Ancient Spanish Song -
op.36
Lezcano, José - Concerto for Guitar, Strings, Percussion, and optional folk instruments
MacCombie, Bruce - Nightshade Rounds Version for Guitar and String Orchestra
MacDonald, Andrew Paul - Concerto for Guitar and Chamber Orchestra op.3
Marina, Carmen - Suite para guitarra y orquesta sobre motivos de la ópera Carmen
Mestres Quadreny, Josep Maria - L'Estro Aleatorio Six Concerts for a Soloist and Orchestra:
No.2 - Guitar and Orchestra
Montsalvatge, Xavier - Tema y variaciones sobre 'La Spagnoleta' de Giles Farnaby Version
for Guitar and Orchestra
Nagel, Gunther Maria - Variationi Concertanti über ein Thema von Beethoven
Nordgren, Pehr Henrik - Concerto for Guitar and Chamber Orchestra op.126
Olives Palenzuela, Juan José - Concierto para Clave, Guitarra y Conj. Camara
Paraskevas, Apostolos - The Feast Concerto for Four Guitarists and Orchestra
Pennisi, Francesco - Due poesie di Lucio Piccolo from: L'esequie della luna
Rääts, Jaan - Concerto for Flute, Guitar and Symphony Orchestra op.117
Rääts, Jaan - Concerto for Two Guitars and Symphony Orchestra op.111
Rääts, Jaan - Concerto for Violin, Guitar and Symphony Orchestra op.106
Rochberg, George - Eden: Out of Time and Out of Space Chamber Concerto for Solo Guitar
Roumain, Daniel Bernard - We March Concerto for Guitar and String Orchestra
Sanz-Burguete, Enrique - Ise monogatari II Version for soloists and string orchestra
Schmidt, Siegmund - Wolle die Wandlung. O sei für die Flamme begeistert.
Sculthorpe, Peter - Darwin Calypso Version for guitar duo and strings
Smoot, Richard Jordan - Chamber Concerto for Guitar and Chamber Orchestra
Smoot, Richard Jordan - Chamber Concerto for Guitar and Wind Ensemble
Sotelo, Mauricio - Como llora el viento ... Version for chamber orchestra
Tomasi, Henri - Concerto à la mémoire d'un poète assassiné, Federico Garcia Lorca
408
Vollmer, Ludger - Vergnügliche Geschichten aus dem Leben des großen Don Quijote
Walker, Timothy - Concerto for a Rainbow for guitar and chamber ensemble
Walter, Fried - Reflexe Variations Throughout the Centuries on a theme by Gaspar Sanz
Watkins, Michael Blake - Double Concerto 'after Psallein' for Oboe & Guitar
Yli-Salomäki, Aki - Smaller and Smaller Concerto for guitar and orchestra
Zehm, Friedrich - Divisions on the Song 'Let it be' (John Lennon/Paul McCartney)
412
Zulián, Claudio - Concerto per Chitarra Solista e Tredici Chitarre in Eco Lontano
Cinco peças na lista não são hiperlinks, portanto não estão ligadas ao site. Porém
considerei relevante inclui-las essencialmente pela qualidade musical e escrita satisfatória que
representam.