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INSTITUTO DE ARTES
UNICAMP
2017
INSTITUTO DE ARTES
UNICAMP
2017
MEMBROS:
A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora encontra-
se no processo de vida acadêmica do aluno.
Agradecimentos
Ao meu orientador por acreditar no projeto e pelos conselhos durante esses anos.
Aos meus amigos Ricardo Appezzato, Rodolfo Vilaggio e Marcel Balciunas pela linda
contribuição artística em meu recital.
Aos meus professores de graduação John Boudler, Carlos Stasi e Eduardo Gianesella.
RESUMO
ABSTRACT
This dissertation deals with the repertoire where the timpani plays a role as soloist,
repertoire which is still underdeveloped in Brazil. The work Música concertante para
tímpanos e sopros, written by Ernst Mahle in 1958, is a seminal work of this repertoire and is
used in the dissertation as a background to treat the timpani as a soloist. The choice of
Mahle's work is due to two main reasons: for its historical relevance – considered the first
work of the repertoire for timpani soloist and chamber group in Brazil; of its peculiarities in
the instrument's sound exploration, including extended and innovative techniques for that
period. The dissertation discusses the innovations found in Mahle's work compared to what
was considered innovative in the use of timpani within the international repertoire at the time
when the composition was written. The main part of the dissertation is the interpretative study
of Mahle’s work where the author demonstrates the result of the interpretive decisions and the
consequent technical resolutions. The interpretative study uses a reconstruction of the artistic
thought of the composer based on his biographical survey, the analysis of the use of
percussion within the catalog of his works, as well as the inference of musical interpretation
contained in his books and also semi-structured interviews with the composer, to construct a
contextualized and coherent musical interpretation of the work. The result of the research
demonstrates the innovations found in Mahle's work and contributes to disseminate the
seminal work of the repertoire that has been performed so far only once.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Bach, Suite em Si menor, c. 15-19...........................................................................................23
Figura 2 - Händel, O Messias, c. 1-7 ............................................................................................................. 24
Figura 3 - Haydn, Concerto em Dó Maior para Violoncelo, c.1-2 .................................................... 25
Figura 4 - Bach, O Cravo bem Temperado, Prelúdio I, c. 3-4; 30-32................................................ 26
Figura 5 - Mozart, Sonata KV 280, c. 57-67. ............................................................................................... 27
Figura 6 - Sinais de Fraseado ............................................................................................................................ 28
Figura 7 - Dinâmica Natural .............................................................................................................................. 29
Figura 8 - Variáveis sobre o Andamento na Música................................................................................. 30
Figura 9 - Acelerando nas Cordas .................................................................................................................... 31
Figura 10 - Mahle, Solo para Vibrafone, c. 1-4.......................................................................................... 36
Figura 11 - Mahle, Solo para Vibrafone, c. 24-25 – exposição do tema de 12 notas. ................. 37
Figura 12 - Mahle, Solo para Vibrafone, c. 6-13 –Trecho da obra com articulação em staccato
....................................................................................................................................................................................... 37
Figura 13 - Mahle, Samba para Voz e Percussão, c. 14-15 ................................................................... 39
Figura 14 - Mahle, Samba para Voz e Percussão, c. 18-23 ................................................................... 40
Figura 15 - Mahle, Toada do Pai do Mato – início da obra .................................................................. 41
Figura 16 - Mahle, Toada do Pai do Mato - início da voz cantada na obra .................................... 42
Figura 17 - Mahle, Maracatu - início da obra, onde o surdo comanda o tempo ............................ 43
Figura 18 - Mahle, Maracatu – trecho em 2/4 ............................................................................................ 43
Figura 19 - Mahle, Concerto para Marimba – início do tema tocado pela marimba solo ......... 44
Figura 20 - Mahle, Concerto para Marimba - acordes em sequência ............................................... 44
Figura 21 - Mahle, Concerto para Marimba - acordes alternados ...................................................... 44
Figura 22 - Mahle, Concerto para Marimba, II Movimento – rulos no grave ................................ 45
Figura 23 - Mahle, Concerto para Marimba, III Movimento - síncopas .......................................... 45
Figura 24 - Mahle, Concerto para Marimba, III Movimento - trecho da primeira cadência .... 46
Figura 25 - Mahle, Sinfonia Modal - naipe de percussão ....................................................................... 47
Figura 26 - Mahle, Sinfonia Modal - naipe de percussão ....................................................................... 47
Figura 27 - Mahle, Sinfonieta - naipe de percussão .................................................................................. 48
Figura 28 - Mahle, O Caçador de Esmeraldas (Suite) - naipe de percussão................................... 49
Figura 29 - Mahle, O Caçador de Esmeraldas - ocorrência do vibrafone ....................................... 50
Figura 30 - Numeração empregada aos tímpanos ...................................................................................... 53
Figura 31 - Nakers ................................................................................................................................................. 54
Figura 32 - Hans Schaufelein, Procissão do Imperador Charles V, Alemanha, 1537 ................. 55
Figura 33 - Par de Tímpanos, Alemanha, metade do século XVII...................................................... 56
Figura 34 - Par de tímpanos da Prússia do Bavária, 1600-1700 .......................................................... 57
Figura 35 - Lully, Thésée .................................................................................................................................... 58
Figura 36 - Purcell, The Fairy Queen – IV ato – passagem de tímpanos ......................................... 58
Figura 37 - Haydn, Sinfonia nº 100, II Movimento – c. 158-164 ......................................................... 59
Figura 38 - Beethoven, Sinfonia nº 1, II Movimento – c, 48-56 ........................................................... 61
Figura 39 - Beethoven, Sinfonia nº 1, IV Movimento - c. 30-33 .......................................................... 61
Figura 40 - Tremolo: rulo e semicolcheia ..................................................................................................... 62
Figura 41 - Beethoven, Sinfonia nº 4, I Movimento – c. 307-315 ........................................................ 62
Figura 42 - Beethoven, Sinfonia nº 5, III Movimento ............................................................................ 63
Figura 43 - Beethoven, Sinfonia nº 9, II Movimento ................................................................................ 64
Figura 44 - Indicações de região de toque no tímpano ............................................................................ 68
Figura 45 - Indicação de movimentação da posição normal para o centro ...................................... 69
Figura 46 - Carter, sugestão de baquetas....................................................................................................... 69
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros - Síntese Analítica da Obra77
Tabela 2 - Comparação entre as técnicas utilizadas na peça de Carter e Mahle ........................ 108
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 15
1 O COMPOSITOR ERNST MAHLE ............................................................................. 18
1.1 O INTÉPRETE SEGUNDO ERNST MAHLE ......................................................................... 21
1.1.1 O Texto ................................................................................................................................................. 23
1.1.2 Ritmo........................................................................................................................24
1.1.3 Apoggiaturas e Trinados ................................................................................................................ 24
1.1.4 Prolongamento e Corte ................................................................................................................... 25
1.1.5 Retoque ................................................................................................................................................. 26
1.1.6 Fraseado.............................................................................................................................................27
1.1.7 Dinâmica .............................................................................................................................................. 28
1.1.8 Andamento .......................................................................................................................................... 29
1.1.9 Programação ....................................................................................................................................... 31
1.1.10 Atitude no Palco .............................................................................................................................. 32
1.2 A PERCUSSÃO NA OBRA DE ERNST MAHLE..................................................... 33
1.2.1 Música de Câmara e Concertos ................................................................................................... 33
1.2.2 Orquestra Sinfônica.......................................................................................................................... 34
1.2.3 Ópera ..................................................................................................................................................... 35
1.2.4 Solo para Vibrafone (1995)........................................................................................................... 36
1.2.5 Samba para voz e percussão (1976) ........................................................................................... 38
1.2.6 Duas peças para canto (barítono) e percussão (1977) ......................................................... 40
1.2.7 Concerto para Marimba (1999) ................................................................................................... 44
1.2.8 Sinfonia Modal (1983) .................................................................................................................... 46
1.2.9 Sinfonieta (1957)............................................................................................................................... 48
1.2.10 O Caçador de Esmeraldas (1977) ............................................................................................. 48
2 OS TÍMPANOS ................................................................................................................ 51
2.1 ASPECTOS TÉCNICOS............................................................................................ 51
2.2 ORIGEM ................................................................................................................... 53
2.3 INSERÇÃO NAS ORQUESTRAS SINFÔNICAS ..................................................... 57
2.4 OS TÍMPANOS NAS SINFONIAS DE BEETHOVEN ............................................. 60
2.5 O SÉCULO XX E AS NOVAS TÉCNICAS .............................................................. 64
2.6 EIGHT PIECES FOR FOUR TIMPANI..................................................................... 66
15
INTRODUÇÃO
As principais razões que me motivaram a iniciar esse projeto foram minha atuação
como timpanista em orquestras sinfônicas nesses últimos 15 anos e meu interesse em realizar
um trabalho de pesquisa dedicado ao tímpano. Uma questão que me incomodou muito quando
iniciei meu primeiro levantamento para a realização de um pré-projeto de pesquisa, foi o fato
de existir um repertório muito restrito no Brasil, tanto para peças solo, concertos e música de
câmara, como também pouquíssimo material bibliográfico sobre esse repertório. Ficou
evidente que falta muito a se escrever sobre os tímpanos, especialmente se compararmos com
o repertório disponível em outros países.
pedais e ostinatos rítmicos. Ao longo da obra o compositor utiliza somente quatro notas nos
tímpanos: Láb, Lá, Ré e Mib.
Deste modo, podemos afirmar que o principal objetivo dessa pesquisa é realizar um
estudo da obra onde serão tratadas decisões interpretativas do autor com a específica sugestão
de resolução das técnicas empregadas, bem como tratar das possíveis interferências ou
influências por parte do compositor Ernst Mahle na introdução de técnicas estendidas nos
tímpanos. Como objetivos secundários serão adicionados ao texto informações sobre obras
referenciais do repertório internacional e maior ênfase – de maneira mais detalhada – a obras
do repertório nacional para tímpanos solo ou solista.
17
18
Em 1949, Mahle regressa com sua família para Stuttgart, e em 1950 começa a se
dedicar ao estudo da composição, matriculando-se no curso da Staatliche Hochschule fur
Musik, sob a orientação do professor Johann Nepomuk David (1895-1987), com quem
estudou por um ano, obtendo uma base sólida de harmonia e contraponto.
19
o pai de Mahle a vir ao Brasil instalar uma filial da sua empresa, e em 1951 Mahle, seus pais e
dois irmãos deixam a Alemanha e fixaram residência no bairro do Brooklin, em São Paulo.
Sua vida aqui no Brasil era trabalhar com seu pai durante o dia e assistir concertos e
recitais em espaços culturais à noite, onde, em uma apresentação, conheceu Hans-Jachim
Koellreutter (1915-2005).
20
Mahle incorporou vários estilos ao longo da sua carreira, mas segundo Garbosa
(2002) era um compositor com tendências neoclassicistas. Para o compositor, três fatores
foram fundamentais na formação de seu estilo composicional: os ensinamentos
tradicionalistas com J. N. David, as técnicas de vanguarda com Koellreuter e o folclore
brasileiro, principalmente o nordestino, com os ritmos sincopados e suas escalas em modo
mixolídio. Esses seriam os três pilares de sua formação como compositor.
“Creio ser um artista que sintetiza, em sua obra, elementos diversos. Por outro lado
sigo meu próprio caminho – gosto de escrever obras que possam ser tocadas e que
os intérpretes, sejam eles alunos ou profissionais de gabarito, tenham prazer em
estudar e apresentar para um público, que também possa apreciá-las.” (KRAUSZ,
1999, p. 12)
Suas composições mais modernas e experimentais, ao longo dos anos, foram dando
lugar a um estilo mais nacionalista, com utilizações de melodias folclóricas e textos de
autores brasileiros, que ao mesmo tempo preservava a cultura nacional e auxiliava na
musicalização de jovens e crianças.
21
Nessa última Mahle trata dos aspectos das práticas interpretativas, desde como ler
um texto musical até mesmo como se comportar no palco. Além de complementar tudo que
foi dito nas apostilas anteriores, pois em sua visão todos os conhecimentos adquiridos são
utilizados pelo intérprete no fazer musical.
22
Para Mahle essas duas posturas extremas geram muita coisa errada, ou por força da
tradição ou por falta de pôr a teoria em prática. A solução segundo ele estaria numa atitude
intermediária: “o meio termo seria usar o conhecimento científico combinado com a força da
fantasia e submetido ao senso estético”. (BARROS, 2014)
Pensamos, uma vez que se trata de uma pesquisa focada na visão de um músico
intérprete a partir de uma análise interpretativa e performance de uma obra, que a necessidade
de uma compreensão maior e entendimento de como o autor vê a função do intérprete, ser de
fundamental importância para o resultado interpretativo. Seguimos a comentar sobre cada um
desses tópicos tratados por Mahle.
23
1.1.1 O Texto
Um dos problemas levantados na apostila seria com relação aos acidentes (bemol,
sustenido e bequadro), o intérprete deve compreender a obra do ponto de vista harmônico e
melódico, para poder avaliar criticamente as passagens duvidosas.
No trecho a seguir ele usa a Suite em Si menor de J. S. Bach com o trecho original e o
corrigido em seguida para mostrar o erro de acidente na partitura.
Figura 1 – Bach, Suite em Si menor, c. 15-19.
Mahle, D37, p. 2
Mahle propõe uma regra: “desconfie de toda nota que não se encaixa em sua visão
estilística da obra”.
24
1.1.2 Ritmo
O maior problema rítmico abordado na apostila por Mahle se refere ao ritmo pontuado
no período barroco, pois os compositores, na maioria das vezes, não os escrevia ou eram
apenas colocados no começo da música. Portanto cabia ao intérprete identificar em quais
situações tocar as notas pontuadas. Para um músico moderno, que não tem conhecimento de
tais convenções, novamente necessita usar seu senso estético para executar tais figuras
rítmicas. (Figura 2)
Mahle, D37, p. 7
25
decorrer da peça. Mahle enfatiza também o cuidado com as leis elementares da estética
musical. “Segundo C.P.E. Bach as apoggiaturas não devem maltratar as leis da harmonia. É
importante que elas resolvam num ponto onde haja consonância e que não produzam 5ª e 8ª
paralelas”. No final ele faz um comentário que não se deve aceitar nada ao pé da letra, e que o
melhor é sempre experimentar diversas possibilidades e submetê-las ao ouvido musical.
Mahle, D37, p. 14
26
“retoques” e “fraseado” Mahle abordará o assunto articulação, elemento que trará clareza na
relação entre os elementos do discurso musical.
Mahle, D37, p. 23
1.1.5 Retoque
Mahle, D37, p. 27
1.1.6 Fraseado
Mahle faz um paralelo entre música, linguagem e dança, muito em função de sua
formação antroposófica. “No canto o fraseado depende basicamente do texto e de seu sentido.
Isso é imitado na música instrumental: na respiração dos sopros e nas arcadas dos
instrumentos de corda”. A voz é, pode-se dizer, a primeira forma de contato do homem com
o universo sonoro, contato esse que se dá de forma ativa e não apenas passiva. Poucos autores
28
são tão enfáticos como Goethe, que se refere ao canto como instrumento originário, fonte de
toda música e elemento de ligação do homem com a natureza. (BARROS, 2014, p. 16)
Mahle, D37, p. 30
1.1.7 Dinâmica
29
Mahle, D37, p. 31
Mahle ainda aponta o exagero no volume nos tempos modernos: “De lá pra cá a
procura de volume cada vez maior começou a criar um problema que está culminando na
nossa era tecnológica [...] Temos de conseguir convencer as pessoas, excesso de volume é
uma forma de violência, e violência não resolve os problemas, cria outros. Nosso conselho é
usar a dinâmica bem variada e dosada, não tentar vencer pela força e cuidar especialmente da
capacidade de cantar e tocar em p e pp , capacidade indispensável para transmitir os segredos
da alma humana”.
1.1.8 Andamento
30
Mahle, D37, p. 34
Por todas essas variáveis, Mahle conclui ser nulo o valor do metrônomo para a
determinação do andamento, e cita Goethe: “Na opinião de Goethe o tempo musical era um
tempo psicológico que não podia ser comparado ao tique-taque de uma máquina”. Ele coloca
o tempo musical como algo mais orgânico, em comum com as batidas do coração e com o
movimento dos planetas. Para Mahle, o andamento certo deve deixar tanto os músicos como
também o público à vontade.
31
Mahle, D37, p. 36
1.1.9 Programação
Os dois últimos assuntos tratados na apostila são totalmente práticos, e tentam abordar
aspectos da arte que muitas vezes os artistas não se preocupam ou ignoram. Por conta de sua
formação também como engenheiro e seu trabalho em metalúrgicas Mahle valoriza o trabalho
prático tanto quanto o intelectual.
Esta apostila é o registro de anos de experiência musical acumuladas por Mahle e seu
desejo sempre de informar e formar inúmeros músicos ao longo de sua carreira. O intérprete
para ele é, antes de mais nada, um músico, artista completo que domina todos os aspectos do
seu ofício (BARROS, 2014, p. 22)
33
34
35
1.2.3 Ópera
Primeira Fase: Caráter Experimental e moderno (Inicia seus estudos na Escola livre de
música Pró-Arte com Hans-Joaquim Koellreutter);
Essa divisão obviamente ocorre apenas como forma didática para analisarmos cada
obra, pois Mahle foi incorporando várias formas de compor ao longo de sua carreira e elas
foram se fundindo umas às outras, formando seu estilo como compositor.
36
Analisando a obra de Mahle, percebe-se o uso da percussão, de uma forma geral, bem
discreta e sem muito destaque, com exceção de algumas obras pontuais. Nesse ponto da
pesquisa a ideia é dar um panorama de como a percussão se insere em sua obra, utilizando
exemplos e análises de trechos que possam ser relevantes para a investigação. Passamos a
analisar algumas obras selecionadas do catálogo do compositor.
Esse pequeno solo para vibrafone, datado de 1995, dedicado ao vibrafonista André
Juarez, trata-se de uma obra que dialoga com a estética dodecafônica, e, portanto se insere
dentro de um estilo mais moderno de compor de Mahle.
37
Figura 11- Mahle, Solo para Vibrafone, c. 24-25 – exposição do tema de 12 notas.
Para uma melhor execução da obra o uso de quatro baquetas é o mais indicado, devido
aos saltos de oitavas e sextas, além da necessidade de se utilizar uma baqueta com a cabeça de
densidade média-dura devido a existência de colcheias e fusas durante toda a peça, o que pede
uma articulação em staccato, como podemos ver na Figura 12.
Figura 12 – Mahle, Solo para Vibrafone, c. 6-13 –Trecho da obra com articulação em staccato
38
Samba1
E o samba estronda
rebenta
retumba
ribomba.
E bamboleando em ronda
os pirilampos.
1
Disponível em <http://portugues1cedlan.blogspot.com.br/2014/07/a-semana-de-arte-moderna-de-1922-
o.html>. Acesso em 13 de Junho de 2017.
39
Um dos aspectos modernistas do texto é a distribuição espacial dos versos, que não
estão dispostos conforme os esquemas tradicionais. Não há preocupação com as rimas (que
são ocasionais), mas sim com o ritmo, bem evidente na sequência: "E o samba
estronda/rebenta/retumba/ribomba". Nesses versos, a sugestão do ritmo do samba é reforçada
pelo uso da aliteração (efeito sonoro provocado pela repetição de fonemas semelhantes numa
palavra, num verso ou numa frase), presente também nos últimos versos.
40
Nessas outras duas obras, Mahle se utiliza também de poemas como ponto de partida
para compor, porém aqui os poemas são musicados, com melodia e ritmo. Na primeira obra
chamada “Toada do Pai do Mato”, utiliza um poema de Mario de Andrade e na segunda um
poema de Ascenso Ferreira, dois importantes escritores do Modernismo e expoentes da
semana de arte moderna de 1922, assim como Guilherme de Almeida, mencionado
anteriormente na obra “Samba”.
41
42
43
44
Neste concerto para Marimba de 1999, outra obra também dedicada ao percussionista
André Juarez, Mahle utiliza a divisão em 3 movimentos, Allegro, Lento e Vivo. É o único
concerto escrito por Mahle dedicado a um instrumento de percussão, motivo pelo qual está
presente nessa pesquisa. Durante quase todo o primeiro movimento as semicolcheias serão o
ritmo principal a dar o balanço e direção, para orquestra e Marimba solo conduzirem o
discurso musical, como podemos notar nesse primeiro tema da marimba solo:
Figura 19 - Mahle, Concerto para Marimba – início do tema tocado pela marimba solo
45
O terceiro movimento é o mais brasileiro dos três, com presença marcante de síncopas
e com melodia e harmonia que remetem ao universo musical nordestino. Além de possuir
duas cadências, o grande desafio nesse movimento é buscar esse caráter entre o popular e o
erudito sem perder o vigor e densidade que a obra exige do intérprete.
46
Figura 24 - Mahle, Concerto para Marimba, III Movimento - trecho da primeira cadência
47
Essa Sinfonia Modal foi premiada no concurso nacional de composição para orquestra,
promovido pela Funarte em 1983. Numa 2ª versão foram acrescentados oboés e fagotes
instrumentos que por exigência do regulamento, não figuravam na partitura original.
48
sucesso, Mahle ampliou a orquestração a pedido de Samuel Kerr, que sugeriu três trombones,
tuba e percussão. É essa versão que geralmente é tocada. O naipe de percussão utiliza
exatamente os mesmos instrumentos da Sinfonia Modal (tímpano, bumbo, prato, triângulo e
caixa clara).
A obra foi escrita originalmente para balé, e posteriormente o compositor fez uma
versão somente para orquestra, uma Suíte com o mesmo nome “O caçador de Esmeraldas”. O
libreto de Ruy Affonso baseia-se no poema de Olavo Bilac “O caçador de Esmeraldas”. A
música é programática, isto é, cada uma das partes da suíte descreve uma cena, conforme
explicamos abaixo:
49
• Cena I – Representa o sertão com seus perigos, o sertão que não quer ser desbravado;
Representa ainda a vila de São Paulo, às vésperas da partida de uma bandeira;
• Cena III – A alegria da dança é breve, pois as mulheres tem o pressentimento de que
seus maridos não voltarão;
• Cena IV – A noite cai, todos vão dormir, os presságios são sombrios e os sonhos
tristes;
• Cena VI – A bandeira marcha em direção ao sertão, tendo a frente Fernão Dias Paes
Leme, o Caçador das Esmeraldas.
50
51
2 OS TÍMPANOS
Como principais aspectos que sofreram mudanças e foram evoluindo com o passar dos
anos podemos citar: suas medidas, o formato, forma de mudar a afinação, maneiras de
prender a membrana (pele) ao instrumento, e até as baquetas utilizadas para se tocá-lo. Toda
essa evolução tecnológica do instrumento aumentou o interesse dos compositores em utilizá-
lo e descobrir novas possibilidades sonoras.
O nome do instrumento tem origem do latim Tympanum (membrana que vibra) e seus
nomes atualmente podem variar entre tímpano (português), timpani (italiano), kettledrum
(inglês), pauken (alemão), timbales (francês e espanhol). Geralmente ele é citado no plural
por ser usado no mínimo em um par, além de ser um instrumento membranofone de
percussão, pois tem uma pele que é posta em vibração ao ser percutida.
52
Outra questão importante é com relação ao tamanho, que pode variar bastante, e essa
mudança modifica a tessitura de cada instrumento, pois quanto maior for sua dimensão, mais
grave será sua tessitura. A indústria padronizou basicamente 5 tamanhos de instrumentos com
diâmetros de 20¨, 23¨, 26¨, 29¨e 32¨ (polegadas) e essas medidas acabaram se tornando as
mais usadas no mercado. Basicamente cada tímpano atinge uma tessitura de no mínimo uma
quinta, sendo a extensão do conjunto todo podendo chegar a quase duas oitavas (Ré 1 a Dó 3),
podendo mudar de acordo com o modelo ou até a regulagem do instrumento. Tímpano 1 (Ré
1 a Lá 1), Tímpano 2 (Fá 1 a Dó 2), Tímpano 3 (Sib1 a Fá 2), Tímpano 4 (Ré 2 a Lá 2 ),
Tímpano 5 (Fá 2 a Dó 3). Entre os tímpanos temos uma divisão clara no que diz respeito à
tessitura de instrumento. Os instrumentos considerados amadores são constituídos de um
sistema de equilíbrio entre a pressão da pele, em geral sintética, e um sistema de molas em
contraposição, o que permite um limite pequeno de tessitura, próximo à uma quinta. Porém os
tímpanos considerados profissionais e encontrados em todas as maiores orquestras mundiais
são constituídos de um sistema que permite um travamento independente que permite um
controle maior e que consegue utilizar toda a flexibilidade da pele, que quase na totalidade é
de pele animal. Isso permite uma tessitura de no mínimo uma nona em cada tímpano.
Podemos observar que algumas orquestras, como a Filarmônica de Berlin, possuem tímpanos
em diversos tamanhos diferentes do padrão descrito acima, uma vez que tanto a sonoridade
como a qualidade de cada nota pode mudar sensivelmente com a mudança do tamanho do
corpo do instrumento.
53
Autoria do pesquisador
Como podemos perceber na Figura 30 a montagem dos tímpanos está do grave para o
agudo (esquerda para direita). Essa nomenclatura será utilizada neste trabalho, pois se trata de
uma maneira de padronizar o tímpano com outros instrumentos musicais, como por exemplo
o piano, a marimba, o xilofone e o vibrafone, dentre outros instrumentos melódicos, que
também possuem as notas mais graves a sua esquerda, bem como ser esta a configuração mais
comumente utilizada no Brasil. A montagem dos tímpanos dentro da escola Alemã, Vienense,
Holandesa, utiliza o tímpano mais grave a direita, ou seja invertido do que apresentamos
acima.
2.2 ORIGEM
1
A origem dos tímpanos modernos tal como conhecemos hoje em dia é vinculada aos
tambores orientais da família dos nakers. Esses podem ser descritos como pequenos tambores
com corpo de metal, em geral feitos de uma liga de cobre, em formato de tigela ou
semicircular, que são fechados somente por um lado com pele animal. (HASHIMOTO, 2015)
54
outra mão o tocava com uma baqueta – como nas cortes persas; ou em grandes formatos –
utilizados em exércitos militares – como os turcos. A presença dos nakers pode ser
encontrada ainda no império grego e romano. (ALTENBURG, 1795 apud TARR, 1974)
Figura 31 - Nakers
Um importante tratado dessa época foi escrito por um trompetista e organista chamado
Johann Ernst Altenburg (1734 – 1801), chamado Anleitung zur heroisch-musikalischen
Trompeter – und Pauker – Kunst ( tentativa de uma manual para trompetistas e timpanistas)
que foi publicado em Halle em 1795. No último capítulo ele trata dos tímpanos, e traz
importantes informações sobre o uso dos tímpanos na música de seu tempo.
55
O tímpano maior é usualmente chamado [de tambor] Sol, embora ele seja muitas
vezes afinado em Lá; o menor é chamado [de tambor] Dó e também é afinado
frequentemente uma nota mais alta, chamada Ré. O Sol do grande tímpano é o tão
conhecido grande Sol, e o Dó do mais agudo de pequeno Dó. O maior ou o tímpano
Sol, quando em uso, é colocado geralmente do lado direito, o menor como
consequência na esquerda. Se eles forem abafados, como por exemplo na ocasião de
um luto, eles são cobertos com um pano preto. Esse [abafamento] também pode ser
realizado encapando a baqueta ou a cabeça da baqueta com couro, tecido ou algo
semelhante. (ALTENBURG, 1795, In: TARR, 1974, p. 122).
Bowles, 2002, p. 97
Os tímpanos foram estabelecidos dentro das cortes europeias durante os séculos XVI e
XVII, e eles foram vinculados desde o início aos trompetes, e seu uso era limitado às cortes.
Em geral os tímpanos eram utilizados no formato menor no lado esquerdo, e maior no lado
direito, o que compensaria o peso da espada do cavaleiro. Porém com os tímpanos fora da
montaria essa tese enfraquece, surgindo então um novo conceito de que com o tempo os
tímpanos começaram a ser utilizados tendo o mais grave no lado direito, provavelmente
porque era a mão mais forte (maioria de músicos destros) para tocar os instrumentos maiores
e mais graves. Fato este mencionado como uma das possíveis razões pelo timpanista Richard
Hochrainer da Vienna Philharmonic Orchestra. (BLADES, 2005, p. 233)
56
Até o início do século XVII, os tímpanos eram tocados sempre em lugares externos
devido aos grupos e eventos em que eram usados. No início do século XVII o tímpano foi
introduzido em orquestras da corte e grupos de ópera, bem como em peças grandes
executadas em igrejas, e assim começou a estar mais presente em ambientes internos. Devido
a este novo uso em locais fechados, especificamente por causa da saída do instrumento de
cima dos cavalos, o instrumento precisou receber algumas adaptações. Para não ter que tocar
o instrumento no chão os timpanistas precisavam colocá-lo sobre um suporte (tripé) para
alcançar altura confortável de se tocar o instrumento. Posteriormente Michael Praetorius
adicionou ao instrumento um tripé de ferro forjado e uma alça, mas que era exclusivamente
para facilitar o armazenamento, sendo que era necessário o suporte para adequar a altura. O
tamanho desses tímpanos era de aproximadamente 24 polegadas de diâmetro (tímpano maior),
e de 18 polegadas de diâmetro (tímpano menor), com corpo tendo de 12 a 14 polegadas de
profundidade. (BLADES, 2005, p. 226)
57
Neste período a pele de couro de bezerro, o parafuso de tensão e o aro foram adotados
(primeiramente na Alemanha), isso permitiu afinar áreas individuais da pele separadamente e
criou uma pressão mais uniforme por toda a superfície do instrumento. Com este avanço, os
tambores estavam mais bem regulados, portanto, mais ressonantes. Os parafusos eram
afinados com uma chave solta (como a caixa-clara), o número de parafusos variava, sendo
que no início eram poucos parafusos e esse número foi aos poucos aumentando. No início do
século XVIII havia dezesseis parafusos, o que permitia uma afinação mais precisa, porém
levava muito tempo, assim o número foi reduzido para oito. (BRIDGE, 1994, p. 2)
Oliveira, 2015, p. 12
Embora os tímpanos já tivessem forte presença na música daquela época, ele não fazia
parte da música escrita para orquestra. Credita-se a ópera Thésée (1675) de Jean-Baptiste
Lully (1632- 1687) como sendo a primeira obra em que os tímpanos aparecem no contexto
orquestral. Tymbales (como Lully se referiu a eles) foram escritos no intervalo de quarta, uma
prática que permaneceria comum nos 200 anos seguintes. A partir de Lully, inúmeros
compositores começaram a escrever mais regularmente para os tímpanos e assim, a velha
maneira de tocar por improvisação deu lugar à música escrita. (BLADES, 2005, p. 236)
58
Hashimoto, 2014, p. 19
Uma análise da maneira como Johann Sebastian Bach (1685 – 1750) usava os
tímpanos em suas obras, mostra que ele utilizava o instrumento quase sempre com trompetes,
coro, e invariavelmente em momentos de clima de festa ou cerimônia pública em suas obras.
Ao todo, os tambores são encontrados em 49 das composições de Bach: 39 músicas sacras, 7
cantatas seculares e 3 obras orquestrais. Em 45 casos as afinações cumpriam o intervalo
convencional de quarta justa, sendo a tônica Ré em 30 vezes, Dó em 14 vezes e Si bemol uma
única vez. Como exceção, em 4 casos Bach coloca o intervalo de quinta justa sendo a tônica
Sol. Neste caso ocorre uma transposição em oitava para se tocar a afinação pedida, pois na
época a nota Sol não poderia ser tocada ou sequer alcançada no tímpano menor, assim como a
nota Ré no tímpano maior. (BLADES, 2005, p. 245)
59
A construção de tímpanos era uma atividade manufaturada, o que fez com que o
processo de mudanças fosse mais lento, mas ao mesmo tempo cada tímpano foi considerado
uma obra de arte e diferenças grandes ou até sutis na construção de cada tímpano influenciava
também no som do instrumento. (BRIDGE, 1993, pp. 2-3)
Trompete
Tímpano
Imslp/Petrucci Music Library
60
Até o final do século XVIII, os tímpanos ainda eram tocados perto do centro da pele,
produzindo um som opaco. Bowles credita a Haydn a mudança do local de toque: “Haydn
parece ter demonstrado ao maestro George Smart em 1794, não só como segurar as baquetas
de tímpano, mas também um ponto mais "musical" de se tocar”. (BOWLES, 2002, p. 67)
Apesar de já ter ocorrido uma maior sensibilização musical no uso dos tímpanos na
música orquestral Ludwig van Beethoven (1770-1827) foi o primeiro a tratar os tímpanos
com maior grau de originalidade. Esta originalidade é encontrada em diversas obras, porém
são em suas sinfonias que se encontram os melhores exemplos de sua originalidade no uso
dos tímpanos.
61
Corroboro com a ideia de (HASHIMOTO, 2003, p. 18) sobre Beethoven, quando ele
afirma que é talvez o mais importante compositor para tímpanos de toda a história da música.
Ele libertou os tímpanos de seu uso convencional abrindo todo um espectro de possibilidades
que transformaram completamente o seu emprego na orquestra.
Tímpanos
Violinos
Imslp/Petrucci Music Library
No quarto movimento Beethoven escreve uma curta passagem solo para os tímpanos,
enquanto oboé, trompa e trompete possuem notas longas.
Trompete
Tímpano
62
Uma das características de Beethoven era a clara diferenciação na escrita dos tremolos
e semicolcheias.
Organizada pelo pesquisador
Tímpanos
Violinos
63
Tímpanos
Violinos
Viola
Cello
Baixo
Em sua Sinfonia Nº 8 (1812) Beethoven fez mais uma monumental prova de que os
tímpanos podem servir expressivamente e como pano de fundo para novas cores quando, no
terceiro movimento, ele escreve os tímpanos em uníssono com os fagotes e com as madeiras,
quebrando a tradição de sempre juntar os tímpanos com os metais, principalmente os
trompetes. No quarto movimento, ele pede que os tímpanos sejam afinados em uma oitava
(Fa2 –Fa3). Esta afinação em oitavas teria sido impossível dezoito anos antes da obra ser
escrita, pois os tímpanos mediam no máximo 24 polegadas de diâmetro. Supõe-se que até ao
momento da composição da Sinfonia N. 8 os tímpanos haviam aumentado para até 29
polegadas de diâmetro. (KRENTZER, 1969, p. 60)
64
Flauta 1
Tímpano
Violino 1
Duas grandes revoluções marcaram a passagem do século XIX para o XX. A primeira
sucedeu-se na própria arte musical, na sua linguagem, por meio da quebra dos modelos
tradicionais do fazer e do ouvir. Sempre tentando afastar-se do passado e buscando novas
saídas para uma arte que deveria sempre estar em evolução, artistas modernistas ou modernos
passaram a enfatizar a necessidade de uma nova arte, arte esta que atendia aos desejos de um
novo mundo, o das máquinas, das fábricas, da mecanização e das grandes cidades que
surgiam com seus problemas. A segunda e talvez a maior revolução foi a revolução industrial
que trouxe a possibilidade de se produzir música em massa e para a massa, a partir da
invenção do gramofone, da gravação, do rádio, entre outros. Nunca a música pudera alcançar
até então distâncias tão longas. (KERR, 2012, pp. 57-60)
65
“No final do século 19 e início do século 20 os tímpanos ganham novo fôlego com a
invenção dos pedais, que gradativamente possibilitaram a mudança efetiva de
afinação. Richard Wagner (1813-1883) utiliza dois timpanistas, cada um executando
um par de tímpanos, em seu ciclo Der Ring des Niebelungen (1853-1874), onde não
somente adiciona mais notas como também acomoda mudanças de tonalidade. A
escrita de tímpanos é detalhada e um timpanista pode realizar as mudanças de notas
enquanto o outro está tocando.” (HASHIMOTO, 2015, p. 29)
66
Nesse ponto chegamos na obra de Elliott Carter (1908-2012), Eight Pieces for Four
Timpani (1950-66), que sem dúvida marca esse período e representa tudo que de mais
inovador era escrito para o tímpano no século XX. Dentre as técnicas utilizadas podemos
destacar o uso de diferentes regiões na pele, diferentes baquetas, harmônicos, diferenciação
entre abafamentos e toques da mão na pele dos tímpanos, dead strokes, uso de abafadores,
tocar com a cabeça e com o cabo da baqueta, complexas modulações rítmicas, glissandos e
melodias executadas através do recurso do pedal, entre outros. A obra se tornou referência na
escrita para tímpano solo, pois aborda uma diversidade muito grande de sonoridades e timbres
no instrumento além de exigir um virtuosismo e técnicas apuradas do timpanista. Como essa
obra foi finalizada e editada em 1966 notamos que a obra “Música concertante para
Tímpanos e Sopros” de Ernst Mahle seria anterior a essa obra, pois se trata de uma obra de
1958, portanto Mahle fez uso das técnicas estendidas antes de Carter em sua obra. Claro que
são duas obras completamente diferentes, pois as peças de Carter são para tímpanos solo e
extremamente virtuosas em todos os aspectos, enquanto a obra de Mahle apesar de os
tímpanos serem solistas, estão acompanhados por outros instrumentos e não tem o mesmo
nível de exigência técnica. Mas como semelhança, podemos notar e comparar as indicações
67
de execução das técnicas estendidas das duas obras, e podemos concluir que possuem pontos
em comum.
Eight Pieces for Four Timpani é uma coleção de obras para tímpanos solo que foram
compostas entre 1950 e 1966 (“Saëta”, “Moto Perpetuo”, “Recitative”, “Improvisation”,
“Canaries”, “March”, “Canto” e “Adágio”), e revisadas em colaboração com o percussionista
Jan Williams. Carter escreveu as peças como estudos rítmicos de modulação usando quatro
notas acordes. (LARRICK, 1988, pp. 46-49)
Entre os anos 1964-66, Carter solicitou consultoria de vários timpanistas, entre eles o
próprio Lang e Saul Goodman, e foi principalmente assessorado pelo percussionista Jan
Williams. O resultado desses laboratórios e experimentações entre compositor e intérpretes
gerou a edição de 1966 que conhecemos hoje em dia. Em 1974, foi realizada a primeira
gravação da obra, em LP lançado pelo selo Odissey da Columbia Records, tendo Lang como
timpanista. (HASHIMOTO, 2015, p. 40)
Morris Arnie Lang, que atuou por quarenta anos na New York Philharmonic, conta
como foi o processo de contato com a peça:
Era uma manhã de sexta-feira em 1951; eu estava [na Juilliard School] tendo uma
“breakfast”-aula com Saul Goodman, o famoso timpanista da New York
Philharmonic. Tocando uma sinfonia de Beethoven, acompanhado de uma gravação.
Saul estava tomando seu café enquanto abria algumas cartas. (nada disso detinha ele
de corrigir meu ritmo ou afinação, ou de comentar sobre minha interpretação). Ele
abriu um envelope grande e tirou de lá um manuscrito, e batendo com dois dedos,
“tocou” a peça. Quando eu terminei o movimento da sinfonia, ele disse algo
parecido a isso: “Esses garotos não sabem como escrever para tímpanos – você quer
isso?” Sendo um estudante carente, qualquer coisa de graça era bem vinda. Quando
eu deixei o estúdio, eu olhei para o manuscrito das Six Pieces for Kettledrums de
Elliott Carter. Embora eu tivesse alguma experiência com música contemporânea,
aquilo parecia hieroglifos para mim. Dez anos depois, já como Timpanista
Assistente e Percussionista da New York Philharmonic, eu fui solicitado para tocar
algumas peças do Carter para uma série de música de câmara organizada por um
corajoso músico de cordas da Orquestra. Eu me reuni com Carter que sugeriu que eu
tocasse o Recitative e o Improvisation no concerto. Finalmente, eu tive que lidar
com a complexidade da música dele. (LANG, 2010)
68
Na figura 44 podemos ver as indicações de região de toque na pele, que irão aparecer
na partitura de “Eight pieces”. Exatamente como aparece na ilustração, teremos a posição
“Normal striking position on head” onde se toca entre a borda e o centro da pele, a posição
“striking at center of head” que é no centro exato da pele e a posição “striking on head very
near the rim”, que significa tocar na borda bem próximo ao aro do instrumento. Quando
69
Outro aspecto que contribui para a mudança de timbre nas peças de Carter é o uso de
diferentes baquetas e dos próprios cabos das baquetas em alguns momentos das obras. Carter
sugere quais baquetas devem ser usadas em cada momento para que se obtenha uma melhor
performance e sonoridade final.
Nas peças I, III, IV, V e VII (Säeta, Adagio, Recitative, Improvisation, Canaries)
Carter pede para que o executante escolha a baqueta que expresse melhor o caráter de cada
peça. Na VIII (March) ele sugere baquetas de feltro mais duras para uma articulação mais
adequada, enquanto na VI (Canto) há a necessidade de serem baquetas de madeira de caixa
clara. Na obra II (Moto perpetuo) Carter sugere um rattan coberto na cabeça com duas a três
camadas de um couro fino, que ele chama de corduroy (veludo) e na ponta da cabeça apenas
uma camada desse couro, para se obter o timbre desejado (figura 47), pois durante a obra há
indicações de se tocar tanto com a ponta quanto com a cabeça do rattan, como mostra a figura
48. Na IV (Recitative) a última nota da peça deve ser tocada com uma baqueta de bumbo com
feltro macio, e finalmente na I e VIII (Saëta e March) ele antecipa a necessidade de o
70
intérprete virar a baqueta e tocar com o cabo nos momentos que aparecer a indicação BUTT e
quando for para tocar com a cabeça da baqueta, maneira mais usual, aparecerá a indicação
HEAD.
A maneira como o percussionista vai percutir a pele também é abordada por Carter,
como, por exemplo, o deadstroke, movimento em que o intérprete ataca a pele mas mantém a
baqueta encostada nela após o toque, resultando em um som abafado, sem vibração. O
deadstroke vai aparecer nas peças II, IV (Moto Perpetuo, Recitative) e no final da I (Saëta)
representado pelo símbolo DS, e será imediatamente anulado com o símbolo NS (normal
stroke) o toque normal usado no tímpano, resultando na vibração da pele e na ressonância do
instrumento. Outro toque que vai aparecer em todas as peças exceto na VI (Canto) é o
abafamento com a mão. Na obra VI (Canto) vão aparecer os toques no aro do instrumento e
no aro e pele ao mesmo tempo (rim shot) como veremos na figura 49. Quanto a afinação dos
71
tímpanos, em quase todas as 8 peças Carter mantém a afinação fixa nos 4 instrumentos, com
exceção da III e da VI (Adagio e Canto) onde ele usa o recurso do pedal para realizar
melodias e glissandos.
Neste trecho da obra Saëta (Figura 51) podemos notar a indicação na parte superior do
pentagrama, todas as notas com haste para cima devem ser tocadas na região Normal do
instrumento e na parte inferior as notas com haste para baixo tocadas na região de Centro do
instrumento. A melodia principal vai estar nessas notas da região normal (N) do tímpano, pois
Carter coloca em cima delas um sinal de tenuto ou um acento, ficando as notas da região
central (C) em um segundo plano da frase.
72
Outros três recursos utilizados por Carter em Saëta são o uso do cabo das baquetas no
inicio da pagina 6, o deadstroke no final da obra e o abafamento rítmico com as mãos na
primeira metade da página 5. Usando o cabo das baquetas ele muda completamente o timbre e
a sonoridade naquele momento da peça. No deadstroke Carter utiliza uma dinâmica pp e um
ralentando, pois a intenção é ter o som “morrendo” aos poucos até chegar ao rulo final da
obra. No caso dos abafamentos rítmicos com as mãos, eles são parte da construção da frase
musical, Carter escreve onde deve ser o abafamento e qual nota deve ser abafada, sempre com
uma figura rítmica com um x na haste como mostra a Figura 54.
73
No peça “March”, a oitava e última do livro “Eight Pieces for Four Timpani”, Carter
indica na partitura onde o percussionista deve abafar cada tímpano, abafamento que deve ser
feito durante a execução da peça, para que ao final ele tenha a última frase da obra com todos
os instrumentos abafados e secos. Durante toda a obra, Carter usa o recurso de se tocar com o
cabo e a cabeça da baqueta para diferenciar duas frases distintas, uma na mão esquerda
tocando as notas Sol e Do (cabo da baqueta) que marca o tempo como uma marcha, e a outra
frase na mão direita tocando Mi e Si (cabeça de feltro da baqueta) que realiza deslocamentos
rítmicos, que caracterizam uma melodia e uma polirritmia em relação ao acompanhamento da
mão esquerda.
74
75
“Música Concertante para Tímpanos e Sopros” é uma obra para Tímpanos solo
acompanhado de octeto de sopros – incluindo fagote, clarinete em dó, oboé e flauta nas
madeiras; tuba, trombone, trompa em dó e trompete em dó nos metais. As afinações presentes
nos tímpanos durante a peça são: Lá/Láb/Ré/Mib.
Antes do início da obra Mahle elaborou uma folha de instruções para que o timpanista
entenda as técnicas que nela serão utilizadas. A presente análise tem como objetivo auxiliar o
intérprete numa execução da obra mais fundamentada em parâmetros técnicos e embasamento
teórico. Através de vídeos e fotos o autor demonstra suas decisões interpretativas para cada
técnica e timbre solicitados pelo compositor. Em seguida uma análise estrutural da obra, onde
a forma será baseada na repetição dos elementos rítmicos e motívicos apresentados de
maneira cíclica pelos tímpanos no decorrer do discurso musical, dando coerência à estrutura
da obra.
Algumas partes da obra são reapresentadas por Mahle, mas com alguns elementos
novos, ou nos tímpanos ou nos sopros. Até chegarmos à cadência, onde podemos notar
elementos usados durante toda a peça, mas apenas como citações, e com a liberdade do
intérprete para a improvisação. (Anexo 1)
76
tercinas finais dos tímpanos, com dinâmica ff e sforzando nos cinco compassos finais da
obra.
A Tabela 1 traz um quadro com uma síntese analítica da obra, para uma melhor
visualização da estrutura formal e seus elementos. A análise está embasada em Schoenberg
(1991), que indica a organização da peça em seções de acordo com seus elementos estruturais.
77
Tabela 1 – Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros - Síntese Analítica da Obra
78
A seguir faremos a explicação de cada uma das técnicas pedidas por Mahle antes do
começo da obra (ANEXO 6), utilizaremos o recurso de vídeo e fotos para elucidar cada
exemplo e deixar mais claro para o leitor como abordamos e executamos cada trecho da obra.
A decisão de utilizar 4 tímpanos exclui as mudanças de afinação, deixando-a fixa em Lá
/Láb/Ré/Mib, tornando a execução mais eficaz. Na Figura 59 uma foto do set em que foi
executada a obra:
79
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Com as mãos e baquetas em paralelo atacar a pele no centro. Observe, na Figura 61,
que mesmo o compositor tendo solicitado o toque no centro, na preparação da obra optei por
tocar levemente fora do centro da pele, obtendo um som com mais harmônicos e mais
ressonância, em consonância com a nota pedal do fagote.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
80
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Direcionar o movimento das baquetas da borda até o centro da pele, de uma forma
regular para se obter o efeito da mudança do timbre.
81
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Link com vídeo disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=U8xu0d2QIIg>
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Apoiar o pulso sobre a pele, e ao mesmo tempo tocar com as baquetas na região das
bordas do instrumento, com o objetivo de se obter um som abafado.
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Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=L5BkMKm-BuE>
Figura 68 - uma das técnicas utilizadas na obra – tocar no centro da pelo do tímpano
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83
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=Lt5VSJCHa8g>
Figura 71 - uma das técnicas utilizadas na obra – tocar na borda da pele do tímpano
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
84
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=b0r2NiKGGXI>
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85
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=GAPi16BpU4c>
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Logo em seguida ao toque na borda da pele com uma das baquetas, devemos apertá-la
com a outra baqueta para se obter o som de vibrato. Na partitura Mahle sugere que o vibrato
tenha ritmo de colcheias, mas optei por tocar semicolcheias por entender que como temos um
andamento lento, os espaços ficariam mais preenchidos e musicalmente o resultado seria mais
interessante. A melhor qualidade do vibrato foi obtida pressionando a baqueta não no centro
como sugere o compositor, e sim mais próxima da borda, como mostra a Figura 79.
86
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
No compasso 117, Mahle pede para que o executante aperte a pele do tímpano,
afinado em Mib, com o polegar; e na outra mão toque o ritmo com a baqueta. Nesse trecho
haveria necessidade de mudança de afinação usando dois tímpanos (da nota Mib para a nota
Ré). Como optei por usar quatro tímpanos, a afinação será fixa nos tímpanos 3 e 4, Ré e Mib,
respectivamente. Segue a partitura do trecho e o vídeo da execução do mesmo:
87
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros –Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=jrlFbDMQqBY>
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Colocar uma vassourinha de aço sobre o tímpano para que ao tocar no instrumento
com as baquetas obtenha-se o som de “chiado” da pele vibrando com o metal. Como decisão
final, optei por deixar uma estante com toalha pouco acima da pele do tímpano para que a
vassourinha (apenas a parte de metal) seja colocada rapidamente e sem barulho sobre a pele, e
o cabo da mesma fique na estante para mantê-la presa sem “dançar” sobre o instrumento e que
se ouça apenas o som da pele com os fios de metal da vassoura vibrando. Nos compassos 62 e
63 o compositor diferencia o timbre pedindo para se tocar no centro e borda. (Figura 85)
88
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
89
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=wi0xNDmZQ6s>
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Atacar a pele e o aro ao mesmo tempo com o cabo da baqueta (rimshot). Optei por
usar uma baqueta de caixa-clara (Mahle sugere uma baqueta de repinique) tocando de forma
invertida, ou seja, com o cabo e não com a cabeça. Comparada com a baqueta de repinique
sugerida por Mahle, a baqueta de caixa-clara resultou em uma sonoridade mais consistente do
timbre desejado.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=-yGb9TdQVGc>
90
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Aqui o pano deve ser colocado na borda e não no centro da pele, o resultado sonoro é
a ausência quase que total de ressonância e harmônicos.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Vídeo disponível no link <https://www.youtube.com/watch?v=wN0KfB_R3hg>
91
3.3 INTRODUÇÃO
Na introdução, a seção é iniciada com o ataque nos tímpanos com a nota Láb (o
material intervalar utilizado no tímpano ao longo da peça baseia-se principalmente no trítono
formado pelas notas Lab e Ré) no centro da pele com as duas mãos, como demonstra a Figura
91, juntamente em uníssono com a tuba na dinâmica ff e o fagote na dinâmica fp, enquanto os
sopros executam acordes com intervalos de quartas e quintas. Veja a Figura 92.
Não há indicação de que tipo de baqueta deve-se tocar esse trecho. O compositor
somente indicará baquetas de feltro no compasso 106 da obra. Deste modo, cabe ao intérprete
decidir qual tipo de baqueta seria mais adequado. Testamos três tipos de baquetas durante o
estudo da obra: baqueta com cabeça de feltro média, baqueta com cabeça coberta de tecido, e
baqueta com cabeça de madeira.
A decisão, após análise da obra, foi pela utilização das baquetas com cabeça revestida
por tecido, pois permite um ataque mais claro. O ataque no centro da pele com duas baquetas
ao mesmo tempo faz com que muito da projeção e duração do som seja curto quando
utilizamos uma baqueta coberta com feltro. Como o compositor indica por meio de uma
ligadura de lascia vibrare (deixar vibrar), a baqueta coberta com tecido nos parece mais
adequada. A cabeça de madeira não permite a projeção clara do harmônico gerado pelo toque
simultâneo das baquetas no centro da pele e por este motivo essa opção foi descartada.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
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Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Figura 94 - Ostinato 1
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
94
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
.
Deste modo, o autor segue o indicado no manuscrito e executa o toque em todo esse
trecho no centro das peles dos tímpanos. O mesmo ocorre na execução do rulo nos compassos
7 e 8 anteriormente explanados, onde o autor executa o rulo com a manulação respeitando a
informação contida no manuscrito da obra e excluída na versão editada, ou seja em tercinas,
como mostra a Figura 96.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
95
3.4 PARTE A
O autor sugere que o abafamento seja realizado encostando os pulsos das mãos na
região comumente utilizada para o toque considerado normal dos tímpanos, ou seja, próximo
da borda do instrumento. Isso ocasionará um abafamento mais eficiente para as peles dos
tímpanos do que abafar na borda extrema do instrumento o que gera harmônicos
proeminentes. Ao mesmo tempo o autor sugere que o toque com a baqueta seja executado na
mesma região de abafamento, porém do lado oposto, e não, novamente, muito próximo da
borda da pele.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
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Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Figura 100 - Ostinato 2 com indicação de mudança de região de toque
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
97
Nessa seção o motivo musical do tímpano continua com as mesmas notas – Lab e Ré –
mas com uma nova figuração rítmica baseada em tercinas de colcheias. Esse novo elemento
aparece também no restante do conjunto instrumental, dessa forma a parte B será construída
através do elemento de tercinas. Harmonicamente, o momento da mudança para a parte B é
marcada por um pedal da nota Lá nos metais nos compassos 30 e 31, chocando com a nota
Láb presente no ostinato do tímpano. Em alguns momentos enquanto o tímpano alterna Ré e
Láb, a tuba marca as cabeças dos tempos com Ré e Lá enfatizando o choque de semitons.
98
choque
entre o Láb
do tímp. e o
Lá da tuba
99
Essas notas no tímpano são tocadas com sforzato na cabeça do tempo, enfatizando o
choque da harmonia.
3.6 PARTE C
Aqui será explorada a técnica de vibrato neste mesmo tímpano grave, a qual será
realizada executando uma pressão da mão esquerda no centro da pele logo em seguida ao
toque da baqueta com a mão direita. No tímpano com a nota ré deverá ser colocado um pano
no centro da pele abafando-o e retirando parte de sua ressonância, sobre ele haverá ataques
sforzatos. A harmonia é estática, havendo a alternância entre dois acordes apenas: os metais
tocam Lá e Ré a maior parte do tempo, o destaque timbrístico está no naipe das madeiras.
Note a Figura 102.
100
Figura 102 - Técnica utilizada no tímpano na parte C
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
3.7 PARTE D
De forma estrutural podemos perceber uma imitação desse timbre do tímpano nos
outros instrumentos através de um trinado sobre uma nota pedal Mi, que aparece na flauta e
no clarinete nos compassos 68-75. No compasso 68 o tímpano interrompe o pedal na nota Ré
para iniciar o Tempo de Bolero, onde temos a volta da nota Láb no tímpano grave, retornando
às notas do trítono inicial, Láb/Ré. Nesse ponto, o timbre que antes existia como entidade
sonora autônoma no pedal em Ré, permeará o ritmo do bolero por conta da permanência da
vassoura sobre o tímpano agudo, neste caso assumindo a função de ornamentação timbrística,
como parte da figuração rítmica. Da mesma maneira, o timbre correlato presente nos pedais
do clarinete e da flauta, passa a assumir também uma função de ornamentação nos solos dos
sopros, através dos mordentes. (Figuras 103 e 104)
101
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Flauta
Tímpano
102
3.8 PARTE E
3.9 PARTE C’
103
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
3.10 PARTE B’
Dessa vez a parte que virá a seguir será B’ (Tercinas), já que o compositor
recombinará a ordem das partes anteriormente expostas. Como na parte C, há recorrências de
ataques sobre a nota Ré no terceiro tempo a cada 2 compassos dentro da métrica ternária. A
partir do compasso 151, com a interrupção do vibrato, temos uma mudança na característica
do som. Ao mesmo tempo ocorre um processo de deslocamento métrico quanto à ocorrência
dos ataques sobre a nota Ré. Inicia-se um acelerando escrito combinado com uma variação
agógica trazida pela indicação “crescendo e accelerando”. O rearranjo das seções formais já
citado trará, a partir daqui, ligeiras modificações nas transições entre as partes.
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
104
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
3.11 CADÊNCIA
Aqui veremos um apanhado de alguns dos materiais já vistos na obra. Nos dois
primeiros compassos (222 e 223), uma retomada do motivo do tímpano da parte E, em 10/8
com agrupamentos de 5 colcheias entre as notas Láb e Ré repetidas.
Dos compassos 224 a 226, o compositor passa a alternar entre essas duas notas, ainda
no agrupamento de 5 colcheias, transitando até o material das tercinas (parte B), com um
ritardando molto. Há uma fermata na barra de compasso que insere uma respiração para a
volta, a tempo (Allegro), do material do bolero.
105
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
No compasso 237 há uma retomada do rulo sobre a nota Láb com articulações de
tercinas (Figura 108), como na Introdução (compassos 7 e 8), seguido por 8 compassos até
chegarmos na CODA, onde se manterá até o compasso 260.
3.12 CODA
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
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Mahle, Música Concertante para Tímpanos e Sopros – Biblioteca da Escola de Música de Piracicaba
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Sopros. Como ambas as peças foram compostas no mesmo período e Mahle não tinha
conhecimento da obra de Carter, excluímos qualquer influência de um compositor sobre o
outro. No geral Musica Concertante tem nível relativamente fácil de execução, sendo o
grande desafio do percussionista buscar a qualidade dos timbres utilizados. Estabelecendo
relação entre as obras, foram constatadas semelhanças e diferenças quanto às técnicas
EIGHT PIECES FOR FOUR TIMPANI MÚSICA CONCERNTANTE
REGIÃO DE TOQUE NORMAL / CENTRO / BORDA NORMAL / CENTRO
BAQUETAS FELTRO / BAQUETA DE CAIXA CLARA / FELTRO / BAQUETA DE REPENIQUE
COURO / BAQUETA DE BUMBO / CABO
DA BAQUETA
MANEIRA DE TOCAR NORMAL STROKE / DEAD STROKE / NORMAL STROKE / ABAFAR COM A
ABAFAR COM A MÃO / ARO / ARO + PELE MÃO / ARO + PELE / PELE +
/ PRESSIONAR A PELE COM O DEDO VASSOURINHA / VIBRATO /
PRESSIONAR A PELE COM O DEDO
USO DE ABAFADORES BORDA BORDA / CENTRO
USO DO PEDAL SIM SIM
utilizadas, que podem ser observadas na Tabela 2.
Dentro dos contextos diferentes em que estão inseridas, música de câmara e solos,
observamos técnicas comuns entre as obras. Carter compôs para quatro tímpanos, Mahle tinha
a sua disposição dois instrumentos, o que trouxe a necessidade do uso do pedal, mas como
optamos pelo uso de quatro tímpanos, as mudanças de afinação foram descartadas.
Musicalmente Carter utilizou modulações rítmicas, polirritmias, abafamentos rítmicos,
glissandos e melodias com o pedal, dando um caráter virtuosístico para as obras. Já Mahle
coloca o tímpano como solista e integrado à orquestração junto aos sopros, os motivos
rítmicos aliados às mudanças de timbre, tocados pelo solista, dão forma e coerência estrutural
à obra.
Acredito que os dados resultantes das análises feitas no presente trabalho contribuam
para uma melhor performance da peça e também auxiliem intérpretes, compositores e
pesquisadores interessados sobre este tipo de repertório, incentivando uma maior produção de
obras e trabalhos acadêmicos dedicadas ao tímpano.
109
REFERÊNCIAS
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Ltda, 2005.
BOWLES, Edmund A. The Timpani: A history in pictures and documents. New York:
Pendragon Press, 2002.
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______. Os tímpanos no repertóri o orqu est ral brasil eiro e nas obra s
solo s brasil eiras. Tese de Livre Do cência. Universidade de Cam pinas.
Campin as, 2015.
LANG, M.; DOWD, C.; CIRONE, A. J. Percussion Master Class on Works by Carter,
Milhaud, and Stravinsky. Galesville: Meredith Music Publications, 2010.
110
MAX, R. Orchestral Excerpts for Timpani. Bryn Mawr: Theodore Presser Company,
2010.
McCORMICK, R.M. (1974). Eight pieces for four timpani by Elliot Carter: analysis
by Robert M. McCormick. Percussive notes the Journal of the Percussive Arts Society.
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Documents. Woodbridge, Suffolk: Paul Sacher Foundation and Boydell Press, 2008.
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111
TOKESHI, E. Ernst Mahle: violin sonatas and sonatinas (1955-80). 1999, 129 p. Tese
(Doctor of Music) – Northwestern University, Evanston, Illionois, 1999.
WILLIAMS, J. Elliott Carter’s “Eight Pieces for Timpani” – The 1966 Revisions.
Percussive Notes, dezembro, 2000.
112
ANEXOS
ANEXO 1- ENTREVISTA
113
ANEXO 2 – ENTREVISTA
Como meu trabalho defendo a idéia de que sua obra foi inovadora e precursora no Brasil no
uso do timpano como solista e das técnicas estendidas do instrumento, eu tenho algumas
duvidas com relação ao processo de composição:
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Timpanos (1990)
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Tímpano e Trompa
Obras de relevância escritas para tímpano solo com ou sem acompanhamento retiradas do
trabalho “A evolução mecânica e musical dos tímpanos no repertório sinfônico desde o
período barroco até os dias atuais”. (LOPES, 2015, p. 60)
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