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MAR/ABR 2019
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A Economia Circular na
Indústria de pescado:
Panorama e desafios para a implantação
de sistemas produtivos
Ms Eng. Alexandre Gobbo Fernandes Eng. Fabrício Flores Nunes
Consultor Associado GEOCIDADES Diretor de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação
Membro sênior da CEP-Americas (Circular Economy Tecnológica do Instituto de Pesquisa, Extensão Rural
Platform of the Americas) e Organismos Aquáticos – PEROÁ
Consultor especialista em Economia Circular Consultor em Aquicultura Biotecnológica e Novos Negócios
geocidades.consultoria@gmail.com fabriciofloresnunes@gmail.com
O
e de sustentabilidade para o sistema agro-alimentar
consumo humano de alimentos tem um na “Oficina para Qualidade Alimentar e Natureza”
papel relevante para realizada pela OECD em Paris,
a agenda por um no artigo intitulado “Circular
desenvolvimento sustentável. Approach and the Sustainability
Levantamentos e cálculos da of the Agro-food System”. O
rede “Global Footprint Network” documento, muito aprofundado
site que monitora a pegada e técnico no tema, coloca
ecológica e a biocapacidade Nos Estados Unidos desde o início que o conceito
que ainda é mantida em todo
o mundo, defende que todos estima-se que 40% da economia circular no sistema
agroalimentar está relacionado
os países, indiferente de seu dos alimentos sejam à diversas questões ao longo
nível de desenvolvimento, têm de toda a cadeia de produção
grande responsabilidade sobre desperdiçados, o que é de alimentos. Nele, diversas
os desperdícios de alimentos.
Como um exemplo do impacto, equivalente à Pegada questões são apontadas para
a mudança para um modelo MAR/ABR 2019
nos Estados Unidos estima- Ecológica total do Peru e de produção mais circular,
se que 40% dos alimentos destacando três pontos chaves:
sejam desperdiçados, o que é da Suécia combinada. a) redução do desperdício
equivalente à Pegada Ecológica de alimentos e emissões na
total do Peru e da Suécia produção de alimentos -
combinada, ou a biocapacidade incluindo gases de efeito estufa;
total da Alemanha. Em relação b) reciclagem de embalagens
ao pescado, segundo o último relatório sobre o de alimentos e plástico, em particular e;
“Estado da Pesca e Aquicultura Mundial”, SOFIA c) uso em cascata de produtos alimentícios,
(FAO, 2018) estima-se que a perda seja de 35% do incluindo o uso para fertilizantes (Cingiz; Wesseler,
volume capturado. 2019).
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Segundo dados do Global Footprint Network (2019): é considerada um fator relevante para esses dois
setores, pois define a sustentabilidade do desempenho
e produtividade dos setores florestal e agrícola com
práticas que visam restaurar e ao mesmo tempo não
Cerca de um terço dos diminuir a capacidade regenerativa dos ecossistemas
1,3 bilhão
de toneladas/ano
alimentos produzidos no
mundo para consumo
(Preston; Lehne, 2017).
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cidadãos e peritos, empenhados no desenvolvimento interessadas dentro de um raio geográfico relativamente
das comunidades locais, são reunidos casos e estratégias pequeno para o intercâmbio de subprodutos e resíduos
para a implementação da economia circular em das atividades produtivas, valorizados como insumos.
zonas pesqueiras e aquícolas. O trabalho abrangente Exemplos de iniciativas que vêm apresentando
realizado por Burch et al. (2019) apresenta como a resultados positivos são:
implementação de sistemas econômicos circulares • O trabalho conjunto para desenvolver novas
poderiam ajudar os produtores e processadores locais cadeias de valor a partir das conchas de ostras como
a adaptar seu trabalho para criar formas de valorizar ao insumo para produção de ração animal, fertilizantes,
máximo os recursos utilizados nos processos, em vez tinta para estradas, filamentos para impressoras 3D e
de desperdiçá-los. Neste sentido, para planejar sistemas solas de sapato, realizado por 20-25 produtores de
econômicos circulares e concretizar este objetivo em ostras e uma fábrica local, em associação com um
um dado sistema específico (baía, enseada, município, laboratório de pesquisa na região de Auray e Vannes,
porto, região, etc), é necessário que os estoques e França;
fluxos de materiais (água, comida, excremento, águas • O apoio para testar um sistema circular na qual
residuais, etc) e substâncias (nitrogênio, fósforo, carbono os resíduos de restaurantes locais são coletados e
ou CO2, GEE’s, etc.) sejam quantificados e avaliados. De utilizados para produzir insetos, transformados em
forma geral, modelos econômicos circulares abrangem farinha de proteína para ração de peixes destinada à
diversos pontos de mudanças na visão estratégica, que aquicultura, realizado pelo Instituto Oceanográfico
impactam nas várias etapas da cadeia de valor, conforme Paul Ricard em Esterel Côte d’Azur;
pode ser observado na figura 1. O mesmo trabalho destaca benefícios potenciais da
A colaboração para criar uma economia circular implementação de modelos econômicos circulares para
muitas vezes envolve a utilização compartilhada de este setor:
serviços e infraestruturas que possibilitem trocas • Otimizar o uso dos insumos de matéria-prima virgem;
recíprocas e benéficas entre as diferentes partes em • Diminuir a geração de resíduos, descartados para
um território, destaca o trabalho. A chamada “Simbiose incineração ou aterro (duas práticas que incorrem em
Industrial” envolve a colaboração de todas as partes grandes riscos ao meio ambiente);
Figura 1. Algumas das perguntas estratégicas que devem ser feitas para estimular a reflexão sobre o potencial para o planejamento de
sistemas econômicos circulares que constituam mudanças estruturadoras das etapas da cadeia de valor de pescado.
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• Desenvolver mais formas de gerar valor na relações entre pescadores, produtores de aquicultura,
produção, com insumos, produtos e processos; indústrias, sociedade civil e instituições locais. Isso
• Aumentar a resiliência da produção realizada por pode acontecer no nível de uma única iniciativa, como
comunidades. a criação de uma cadeia de fornecimento de conchas
de moluscos ou de carapaças de crustáceos, que
Além da recuperação de resíduos como matéria- exigirá o envolvimento de várias partes interessadas
prima de alto valor, numa Economia Circular e dependendo da escala de atuação, pode ser ser
produtores deverão repensar a maneira de usar os necessário mobilizar mais parceiros, identificar e
equipamentos e máquinas de pesca e aquicultura. apoiar o desenvolvimento de ideias inovadoras para
Para tanto, produtores colaborando em toda a cadeia, atividades específicas em economia circular e estudar
precisam questionar alguns processos e práticas atuais outras sinergias.
em busca de soluções inovadoras e novos modelos de
comercialização que irão exigir a agregação de mais Consulte as referências bibliográficas em
www.aquaculturebrasil.com/artigos
atividades e atores à cadeia de valor. Neste sentido,
modelos de compartilhamento e contratos de aluguel
e leasing ao invés da transferência de posse, devem ser
desenvolvidos para incluir a manutenção e a revenda e
prever a remanufatura e o upgrade de equipamentos,
utensílios e instalações. Sistemas econômico- Indústria de pescado e o plástico (Burch et al. 2019):
circulares, exigirão ainda diferentes cadeias de logística Graças à sua natureza resistente à decomposição,
e redistribuição, tanto para recuperação do valor de o plástico provou ser extremamente eficaz no meio
resíduos quanto para a utilização compartilhada de marinho. A indústria de pescado é, como outras,
equipamentos, utensílios e instalações pelo máximo de também dependente do plástico para, por exemplo,
tempo e qualidade, e demandando regulamentações as artes de pesca, equipamento de aquicultura,
adequadas para as novas atividades da cadeia circular engradados, embalagem, etc (Figura 02). No entanto,
de produção. o plástico é um material não biodegradável derivado
de combustíveis fósseis, que causam prejuízo aos
Conclusão ecossistemas marinhos.
A economia circular depende da colaboração entre De fato, as comunidades piscatórias estão bem
produtores. Sua finalidade é maximizar o uso eficiente conscientes das consequências devastadoras que os
e efetivo de materiais e isso envolve compartilhar microplásticos têm para os organismos marinhos. Mais
recursos e estabelecer correspondências entre as de 80% do lixo marinho da Europa é composto de
atividades produtivas e as necessidades de insumos das plástico de diferentes tipos e estima-se que 27% (11
partes de um sistema produtivo. Para tanto, existem 000 toneladas) são resíduos de plástico de artes de
algumas etapas para planejar cadeias de valor para uma pesca (redes, cordas, barcos, armadilhas, etc.). Isso
economia circular: faz com que o manejo do plástico seja uma prioridade
também para pescadores e produtores de aquicultura,
1. Analisar o potencial dos modelos em
se desejarem um ecossistema marinho saudável capaz
economia circular para as cadeias de valor;
de manter a produtividade da atividade (Figura 03).
2. Conscientização para mudar a mentalidade e
Exemplos de inovações que substituem o plástico
o comportamento nas atividades e operações;
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de fontes fósseis:
3. Aprofundamento nos conceitos e incentivo ao
• Novo composto bioplástico biodegradável com
empreendedorismo;
base biológica e compostável, fabricado industrialmente
4. Estabelecer arranjos e associações para
a partir de conchas de ostras. Este material poderia ser
colaboração, compartilhamento e simbiose industrial;
usado para criar coletores de sementes de ostra;
5. Repensar modelos de negócios baseados
• A corda usada para cultivo de mexilhões foi
na posse de produtos e atrair investimentos para
substituída por algodão biodegradável. Esta solução foi
inovações.
copiada do sistema Hairy Rope da Nova Zelândia e,
além de respeitar o meio ambiente, é mais eficaz para
Para o setor de pescado, encontrar sinergias e
semear filetes e coletar mexilhões.
estabelecer associações construtivas essenciais em
nível local, é fundamental o desenvolvimento de
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Figura 2. Estrutura de cultivo de ostras fazendo uso de bombonas e outras embalagens plásticas como flutuadores. A atividade de
cultivo de moluscos marinhos muitas vezes tem mais viés social do que econômico, impossibilitando o produtor adquirir materiais
e petrechos específicos, ou pelo inexistência no mercado nacional ou pelo alto custo de aquisição de equipamentos importados de
países com produção consolidada.
© amdro2003.blogspot.com
Figura 3. Bombonas plásticas específicas para serem utilizadas como flutuadores separadas para a reciclagem. A combinação água
do mar e exposição ao sol e intempéries diminui a vida útil dos polímeros, mesmo que específicos. O tempo de vida de polímeros
reutilizados ou adaptados é muito menor, e também menos resistentes aos manejos diários. Estas bombonas são de fazendas de
cultivo de ostras na Tasmânia.
© ABC Rural - Laurissa Smith
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