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Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos foi elaborado para proporcionar

uma visão abrangente do assunto, incluindo desde a fase pré-analítica, passando


pelas fases analíticas até a hemostasia. Controle de qualidade, aspectos teóricos
e práticos relacionados ao eritrograma e ao leucograma – com especial destaque
*BAIN, B.J.
para as doenças associadas às alterações identificadas –, neoplasias hematoló-
Células sanguíneas: um guia prático – 5.ed.
gicas e imuno-hematologia eritrocitária completam o livro, que se caracteriza
pela linguagem objetiva e por ser amplamente ilustrado. ESTRIDGE, B.H.; REYNOLDS, A.P.
Técnicas básicas de laboratório clínico – 5.ed.
Concebido inicialmente para ser fonte de consulta de profissionais que se dedi-
cam à prática da hematologia laboratorial, estudantes de graduação e pós- FAILACE, R.
Hemograma: manual de interpretação – 6.ed.
-graduação, além de profissionais da área da saúde que buscam um aprendizado
relacionado a situações reais em hematologia, também se beneficiarão com a
HOFFBRAND; A.V.; MOSS, P.A.H.
leitura desta obra. Fundamentos em hematologia – 6.ed.

LONGO, D.L.
Hematologia e oncologia de Harrison (e-book)

SILVA, P.H.; ALVES, H.B.; COMAR, S.R.;


HENNEBERG, R.; MERLIN, J.C.; STINGHEN, S.T.
Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos

SOARES, J.L.M.F.; ROSA, D.D.; LEITE, V.R.S.;


PASQUALOTTO, A.C.
Métodos diagnósticos: consulta rápida – 2.ed.

XAVIER, R.M.; DORA, J.M.; SOUZA, C.F.M.; BARROS, E.


Laboratório na prática clínica: consulta rápida – 2.ed.

* Livro em produção no momento da impressão desta obra, mas que em breve


estará à disposição do leitor em língua portuguesa.
Nota
A hematologia está em constante evolução. À medida que novas pesquisas e a própria
experiência ampliam o nosso conhecimento, novas descobertas são realizadas. Os auto-
res desta obra consultaram as fontes consideradas confiáveis, num esforço para oferecer
informações completas e, geralmente, de acordo com os padrões aceitos à época da sua
publicação.

H487 Hematologia laboratorial : teoria e procedimentos [recurso


eletrônico] / Paulo Henrique da Silva ... [et al.]. – Porto
Alegre : Artmed, 2016.

Editado como livro impresso em 2016.


ISBN 978-85-8271-260-3

1. Farmácia. 2. Hematologia. I. Silva, Paulo Henrique.


CDU 615.12
Catalogação na publicação: Poliana Sanchez de Araujo – CRB 10/2094

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FASE PRÉ-ANALÍTICA EM
HEMATOLOGIA LABORATORIAL
1

O processamento das amostras para exames laboratoriais é composto por três


fases denominadas de pré-analítica, analítica e pós-analítica. A fase pré-analíti-
ca engloba todas as atividades que precedem o ensaio laboratorial, ou seja, com-
preende as atividades realizadas antes da determinação analítica. A fase analíti-
ca inicia-se com a validação do sistema analítico, passando pelo controle de
qualidade interno e se encerra quando a determinação analítica gera um resulta-
do. Já a fase pós-analítica inicia-se após a geração do resultado analítico, quanti-
tativo e/ou qualitativo, sendo finalizada após a entrega do laudo e interpretação
do resultado.1
Conforme o Quadro 1.1, cada etapa possui fontes de erros que afetam a qua-
lidade e confiabilidade dos resultados reportados. Com o uso de equipamentos
automatizados no laboratório de hematologia, o processo analítico e seu contro-
le se tornaram mais confiáveis. Contudo, erros ainda ocorrem e são, na maioria
dos casos, observados durante as fases pré e pós-analítica, as quais são conjunta-
mente chamadas de fase extra-analítica. Portanto, conhecer os fatores que in-
fluenciam a qualidade dos resultados, desde o preparo do paciente para a coleta
da amostra, passando pela análise propriamente dita, até a emissão dos resulta-
dos, é de fundamental importância para que sejam estabelecidas estratégias e
ferramentas de monitoramento dos processos envolvidos, de modo que funcio-
nem como planejado e especificado.
A fase pré-analítica envolve todos os fatores que devem ser levados em conta
antes da realização do exame propriamente dito e que exerçam influência direta
na interpretação dos resultados. Ela necessita de procedimentos que indiquem e
controlem suas possíveis falhas, de modo a permitir que as inferências dos estu-
dos de precisão e exatidão dos sistemas analíticos realmente contribuam para
melhorias das fases analítica e pós-analítica. As fontes de variação pré-analítica
podem ser divididas em variáveis fisiológicas, variáveis de coleta e manipulação
da amostra e variáveis endógenas, que são mostradas, de modo didático, no
Quadro 1.2. Cabe lembrar que tudo começa com a solicitação dos exames mais
apropriados, no momento certo, os quais serão interpretados corretamente, o
que traz benefícios aos pacientes, aos médicos e aos laboratórios.

VARIÁVEIS FISIOLÓGICAS
Determinados fatores fisiológicos, intrínsecos ao paciente, podem afetar os resul-
tados dos exames laboratoriais. Estes fatores incluem situação clínica do paciente,
idade, sexo e raça, jejum, postura, efeitos do exercício físico, ritmo circadiano, alti-
tude em que foram coletados os exames, gravidez e estilo de vida do indivíduo.

  SITUAÇÃO CLÍNICA
A situação clínica do paciente se refere ao porquê ele está realizando o exame
solicitado. Isso pode parecer uma situação irrelevante, mas na hematologia pode

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2  Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos

QUADRO 1.1  Fontes e frequências de erro que afetam a qualidade e confiabilidade dos resultados
FASE PRÉ-ANALÍTICA FASE ANALÍTICA FASE PÓS-ANALÍTICA
46-68% 7-13% 19-47%
ƒƒ Orientação inadequada ao paciente ƒƒ Falha no equipamento ƒƒ Perda do resultado
ƒƒ Tempo de jejum ƒƒ Perda da amostra ƒƒ Interpretação equivocada do resultado
ƒƒ Legibilidade da requisição médica ƒƒ Troca da amostra e ação subsequente
ƒƒ Requisição médica incorreta ƒƒ Contaminação entre amostras ƒƒ Erro na transcrição dos resultados
ƒƒ Interpretação incorreta da requisição médica ƒƒ Sistema analítico não validado ƒƒ Tempo de liberação dos resultados
ƒƒ Perda da requisição médica previamente à analise acima do especificado
ƒƒ Coleta inadequada ƒƒ Falhas não detectadas no controle ƒƒ Problemas com o sistema de
ƒƒ Estase venosa prolongada interno de qualidade: erro sistemático informação laboratorial
ƒƒ Utilização de tubo de coleta inadequado e erro randômico ƒƒ Valores de referência e limites de
ƒƒ Incorreta proporção entre sangue e decisão inapropriados
anticoagulante
ƒƒ Identificação incorreta do paciente
ƒƒ Transporte e armazenamento da amostra
inadequados
ƒƒ Centrifugação inadequada
Fonte: Adaptada de Lima-Oliveira e colaboradores2 e Plebani. 3

QUADRO 1.2  Fontes de variação pré-analítica


VARIÁVEIS DE COLETA E MANIPULAÇÃO
VARIÁVEIS FISIOLÓGICAS VARIÁVEIS ENDÓGENAS
DA AMOSTRA
ƒƒ Situação clínica ƒƒ Identificação da amostra ƒƒ Presença de anticorpos circulantes
ƒƒ Idade ƒƒ Efeitos da infusão contra leucócitos e plaquetas (EDTA
ƒƒ Sexo ƒƒ Coleta sanguínea dependentes)
ƒƒ Raça ƒƒ Tempo de garroteamento ƒƒ Analitos que provocam interferência
ƒƒ Jejum ƒƒ Material do tubo de coleta ƒƒ Efeito de medicamentos e seus
ƒƒ Postura ƒƒ Ordem de coleta dos tubos metabólitos
ƒƒ Efeitos do exercício físico ƒƒ Homogeneização da amostra com o
ƒƒ Ritmo circadiano anticoagulante
ƒƒ Altitude ƒƒ Anticoagulante
ƒƒ Gravidez ƒƒ Confecção da extensão sanguínea sem
ƒƒ Estilo de vida anticoagulante logo após a coleta
ƒƒ Transporte e armazenamento inadequados
ƒƒ Centrifugação
EDTA, ácido etilenodiaminotetracético (do inglês ethylenediamine tetraacetic acid).
Fonte: Adaptada de Jury, Nagia e Tatsumi,4 Mullins, 5 e Narayanan.6

ser uma informação bastante útil, pois direciona a gênero e faixa etária. Ocorre um aumento subs-
análise e fornece segurança no momento de rela- tancial na contagem de glóbulos vermelhos nos
tar as alterações hematológicas observadas na mi- recém-nascidos em comparação com a dos adultos
croscopia. Uma doença hereditária se manifesta, em decorrência da glicose ser metabolizada muito
muitas vezes, desde o nascimento. O fato de o pa- rapidamente em neonatos. O aumento do oxigênio
ciente informar que estava bem e que passou a ter arterial logo após o nascimento ocasiona um au-
algum sintoma há pouco tempo, afasta a hipótese mento dos níveis de hemoglobina. Nos recém-nas-
de uma doença hereditária ou pode sugerir, por cidos, a contagem de neutrófilos é elevada e atinge
exemplo, o início de uma crise de hemólise.7 um valor máximo entre 1 e 2 dias após o nasci-
mento, enquanto a contagem de monócitos per-
  IDADE, SEXO, RAÇA, JEJUM E POSTURA manece aumentada até duas semanas após o nas-
A idade, o sexo e até mesmo a raça são fundamen- cimento e a contagem de eosinófilos por até uma
tais para a interpretação dos exames hematológi- semana. A contagem de linfócitos está aumentada
cos, pois os valores de referência foram definidos significativamente no momento do nascimento e
para diferentes populações e agrupados conforme permanece elevada em crianças de até 4 anos de

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Fase pré-analítica em hematologia laboratorial  3

idade. Já a contagem de basófilos permanece ele- aumentar­cerca de 8% em uma altitude de 1.400m


vada, mas apenas temporariamente, até um dia em relação ao nível do mar. A concentração de
após o nascimento. Saber se o paciente está em je- transferrina diminui com o aumento da altitude.
jum ou não é importante, pois o pós-prandial al- Na gravidez, ocorre um aumento do volume plas-
tera, principalmente, a linhagem leucocitária. mático médio que leva à hemodiluição. A velocida-
Não considerando situações de urgência e emer- de de hemossedimentação aumenta em até cinco
gência, nas quais os exames são solicitados a qual- vezes devido à presença de proteínas de fase aguda.
quer momento e sem necessidade de jejum prévio, Também ocorre aumento dos níveis de fator VII e
o período de jejum – habitualmente solicitado diminuição dos níveis de ferro e ferritina.6
para a coleta de hemograma e testes de coagula-
ção – é de 8 horas, podendo ser reduzido para 4   ESTILO DE VIDA
horas sem que haja grandes prejuízos e para 1 ou 2 O estresse e a ansiedade podem provocar aumento
horas em situações especiais que envolvam crian- temporário nas contagens de leucócitos. A inges-
ças de baixa idade e de baixo peso. Mudanças na tão regular de etanol pode provocar aumento do
postura, principalmente quando o paciente passa volume corpuscular médio (VCM). Em fumantes
da posição deitada para a posição em pé ou senta- de longo prazo, também pode ocorrer aumento do
da, provocam deslocamento da água corporal do VCM e das concentrações de carboxihemoglobi-
interior dos vasos para o espaço intersticial, que na, hemoglobina e nas contagens de eritrócitos e
resulta em hemoconcentração e causa flutuações leucócitos. O aumento dos leucócitos está correla-
entre 8 e 10% na hemoglobina, volume globular e cionado com o número de maços fumados.6
contagem de leucócitos em relação à concentração
inicial. O correto é padronizar a postura do pa- VARIÁVEIS DE COLETA E
ciente durante coletas subsequentes; contudo, MANIPULAÇÃO DA AMOSTRA
sempre que possível, recomenda-se fazer a coleta
Para minimizar o erro pré-analítico, algumas va-
com o paciente sentado.6-8
riáveis precisam ser padronizadas, como, por
  EFEITOS DO EXERCÍCIO FÍSICO exemplo, conferência do nome do paciente, técni-
E RITMO CIRCADIANO ca de coleta, tempo de duração da aplicação de
Perguntar ao paciente o que ele estava fazendo garrote (torniquete), locais de coleta, anticoagu-
antes da coleta de sangue é importante porque lantes utilizados para a coleta de sangue, relação
exercícios físicos, deslocamento até o laborató- sangue/anticoagulante e manuseio e processa-
rio de bicicleta ou em caminhadas apressadas mento das amostras.
alteram os exames hematológicos, aumentando
a contagem de leucócitos, por fazer um desloca-   IDENTIFICAÇÃO DAS AMOSTRAS
mento dos leucócitos do pool marginal para o Erros de identificação, tanto da amostra como do
circulante, assim como a contagem de plaque- paciente, levam a subsequentes erros de transcri-
tas. Exercícios físicos podem inf luenciar a he- ção de resultados, podendo acarretar a graves er-
mostasia, ativando a coagulação, a fibrinólise e ros médicos. O coletador deve se assegurar de que
as plaquetas. O horário da coleta se correlaciona a amostra que será coletada realmente seja do pa-
com o ritmo circadiano de f lutuações que ocor- ciente especificado na requisição médica. Esta si-
rem com certos hormônios, substâncias e célu- tuação constitui um problema crítico e não deve
las presentes na corrente sanguínea. Os níveis ser subestimada. Para assegurar uma correta
de ferro e as contagens de eosinófilos aumen- identificação do paciente, deve-se solicitar pelo
tam no período da tarde. Deve-se realizar a co- menos dois ou mais identificadores, tais como
leta dos pacientes em condições basais que se- nome e data de nascimento, sendo que estas infor-
jam reprodutíveis e padronizáveis.4,5,7,8 mações devem ser as mesmas que constam na re-
quisição médica. No caso de pacientes hospitali-
  ALTITUDE E GRAVIDEZ zados, a identificação por meios eletrônicos ou
Alterações nas contagens sanguíneas podem pulseiras com código de barras reduz o risco de
ocorrer quando realizadas ao nível do mar ou em erros de identificação dos pacientes. O número do
altitudes elevadas. Por exemplo, o volume globu- leito nunca deve ser utilizado como critério de
lar e a concentração de hemoglobina podem identificação. Para recém-nascidos e pacientes

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4  Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos

com dificuldades de comunicação, o coletador  COLETA SANGUÍNEA


deve valer-se de informações fornecidas por A coleta de sangue deve ser padronizada pelos la-
acompanhante ou equipe de enfermagem. A iden- boratórios a fim de evitar contagens espúrias e
tificação das amostras deve ser realizada logo artefatos gerados in vitro. A coleta sanguínea
após o término da coleta, na presença do paciente inclui­a punção venosa, o uso do anticoagulante
e antes de sair do local de coleta. A data e a hora da adequado, a correta homogeneização da amostra
coleta devem ser registradas no tubo, assim como após ser transferida para o tubo e, conforme o la-
a identificação do coletador.8,9 boratório, a confecção da extensão sanguínea sem
anticoagulante. A punção sanguínea pode ser rea-
  EFEITOS DA INFUSÃO lizada pelo sistema a vácuo e por seringa e agulha.
Nos pacientes que estão recebendo infusão de al- Na primeira situação, os tubos só devem ser reti-
gum medicamento ou soro fisiológico ou glicosa- rados do suporte após o preenchimento total do
do, as amostras de sangue não devem ser obtidas tubo; isso vai garantir uma correta proporção de
do local próximo à infusão e sim do braço oposto. sangue e anticoagulante. Logo após o tubo ser re-
Deve-se passar pelo menos 8 horas antes de se co- tirado do suporte, ele deve ser homogeneizado
letar sangue de um paciente que recebeu uma gentilmente por inversão. Isso garante a completa
emulsão de lipídios. O período de espera para co- solubilização do anticoagulante e a correta anti-
leta de sangue de pessoas que receberam uma so- coagulação da amostra de sangue. Deve-se sem-
lução rica em carboidratos, ou aminoácidos e pro- pre verificar a data de validade dos tubos, uma vez
teínas hidrolisadas, ou eletrólitos é de pelo menos que eles vão perdendo o vácuo ao longo do tempo,
1 hora depois da cessação da infusão. Para indiví- o que pode resultar em relações sangue/anticoa-
duos que receberam transfusões de sangue, a ex- gulante inadequadas.
tensão da hemólise e, com isso, o aumento dos Quando a punção é realizada com seringa e
valores de potássio, lactato desidrogenase e hemo- agulha, o sangue deve fluir para o interior da se-
globina livre estão diretamente relacionados com ringa sem que se tenha de fazer qualquer esforço
o tempo decorrido entre a produção do concen- para puxar o êmbolo. Quando isso não ocorre, o
trado de hemácias e a transfusão propriamente turbilhonamento ocasionado pelo esforço causa
dita.6 alterações celulares. A Figura 1.1 mostra a correta

1. Técnica de inserção correta. O sangue flui 2. Bisel sobre a parede superior 3. Bisel sobre a parede inferior da veia
livremente para dentro da agulha da veia não permite que o sangue flua não permite que o sangue flua

4. Agulha inserida além da veia 5. Agulha parcialmente inserida, provocando 6. Veia colabada
extravasamento de sangue no tecido

7. Quando a veia desliza, a agulha pode escorregar


para o lado e não penetrar na veia

FIGURA 1.1  Situações que ocorrem durante a inserção da agulha nas coletas sanguíneas.
Fonte: Adaptada de McCall e Tankersley.10

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Fase pré-analítica em hematologia laboratorial  5

técnica de inserção da agulha (1) e problemas que globular e a hemoglobina são menores no sangue
podem prejudicar a coleta, mas que devem ser capilar em relação ao venoso.11 A concor­dân­cia
contornados por um coletador experiente. entre esses autores se dá na contagem de plaquetas.
Terminada a punção, a agulha deve ser retira- A Figura 1.3 exemplifica os locais para a realiza-
da da seringa e o sangue passado aos tubos, respei­ ção da punção capilar.
tando a proporção de sangue e anticoagulante.7
Para a coleta dos exames hematológicos, a prefe-
Punção através das
rência é pela coleta de sangue venoso e a partir da impressões digitais
punção das veias do antebraço: mediana cubital,
cefálica ou basílica. Sempre ambos os antebraços
devem ser observados, e a punção, realizada na
veia mais visível. Antes da punção, deve-se fazer
assep­sia com álcool a 70%. A Figura 1.2 mostra a
representação esquemática das veias do antebraço.­
Posição lateral
Fossa do calcanhar
Veia antecubital Veia cefálica
mediana
cubital Artéria tibial Posição medial
posterior do calcanhar

FIGURA 1.3  Locais para a realização da punção


Veia cefálica
Veia basílica capilar.
Fonte: Adaptada de Mullins.5

Em idosos ou em pacientes com a pele flácida,


Veia basílica após a escolha da veia a ser puncionada, a pele deve
ser bem distendida com ajuda do polegar para evi-
tar sangramentos subcutâneos. Em situações em
que o paciente esteja com um cateter para a infu-
FIGURA 1.2  Representação esquemática são de soros e medicamentos, a punção sanguínea
das veias do antebraço. pode ser feita pelo próprio cateter. Contudo, uma
determinada quantidade de sangue, diluí­da pelo
Fonte: Adaptada de Mullins.5
líquido de infusão, deve ser descartada para que
Em crianças, quando o acesso venoso é difícil, se possa utilizar a amostra para a realização de
a coleta na jugular externa pode ser uma boa op- exames hematológicos. Quando o volume descar-
ção, mas também pode ser realizada a punção ca- tado é menor que o recomendado, podem ocorrer
pilar. A coleta do sangue capilar deve ser feita nas alterações no volume globular e nos leucócitos es-
partes externas, medial e lateral do calcanhar, sen- puriamente para menos. Recomenda-se que o vo-
do que este deve estar aquecido. A punção deve ser lume descartado seja pelo menos 4 vezes maior
feita com lanceta apropriada, após assepsia, e o que o volume do espaço morto do cateter, o qual
sangue deve verter espontaneamente, sem que ne- depende do seu comprimento e do seu diâmetro.
nhuma compressão seja feita com a intenção de Os resultados do tempo de protrombina (TP) e do
aumentar o fluxo sanguíneo. Existem diferenças tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPa)
nos resultados de alguns parâmetros hematológi- são inversamente proporcionais ao volume des-
cos entre o sangue capilar e o venoso. Para alguns cartado em pacientes heparinizados. Isso significa
autores, o volume globular, a concentração da he- que, se o volume descartado não for o ideal, ocor-
moglobina, contagem de eritrócitos, leucócitos, re aumento do TP e TTPa por interferência da he-
neutrófilos e monócitos são mais elevados no san- parina. Não se recomenda que exames para ava-
gue capilar, e a contagem de plaquetas é mais ele- liação da hemostasia sejam coletados do cateter;
vada no sangue venoso, talvez por adesão das mes- caso seja necessário, um volume mínimo de 30 mL
mas no local da punção capilar.4 Já outros autores deve ser descartado, especialmente se o tempo de
relatam que a contagem de eritrócitos, volume trombina (TT) for determinado.11

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6  Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos

Quando a coleta é realizada com sistema de do material que lhe foi enviado e que não tem res-
escalpe, sendo o tubo com citrato o primeiro a ser ponsabilidade sobre troca de amostras, sobre as
coletado, deve-se utilizar um tubo de descarte. O condições de coleta (traumáticas) e sobre o uso do
uso do tubo de descarte tem por finalidade anticoagulante (foi usado o anticoagulante correto?
preencher­o espaço morto do escalpe, de modo a A relação sangue/anticoagulante foi obedecida?).
garantir a proporção adequada do anticoagulante Essa responsabilidade deve estar documentada
em relação ao sangue total. Para fins de descarte, pelo laboratório junto ao(s) responsável(eis) pela
pode-se utilizar os próprios tubos de citrato ou tu- coleta e, no laudo, deve ser escrito “amostra envia-
bos sem qualquer aditivo.12 da ao laboratório”.
Amostras que chegam ao setor de hematolo- Uma causa grave e potencialmente fatal de
gia com volume menor do que o volume nominal erro pré-analítico é a troca de amostra ou coleta
do tubo ou visivelmente hemolisadas não devem de sangue de um paciente em um tubo identifica-
ser processadas. A primeira pode conter altera- do com o nome de outro, que gera um erro subse-
ções celulares causadas pelo anticoagulante, e a quente de transcrição do resultado. Esses erros
última, ser reflexo de uma coleta traumática.6 podem ocorrer em qualquer fase e, apesar dos sis-
A gasometria é muito solicitada em laborató- temas informatizados com código de barras para
rios que atendem a domicílio e a hospitais, in- a identificação das amostras dos pacientes, é es-
cluindo leitos de enfermarias, apartamentos, ber- sencial ter um processo de verificação cruzada.
çário ou unidade de terapia intensiva, e esse É interessante que o laboratório oriente e es-
exame exige coleta de sangue arterial, o qual, mui- clareça o paciente sobre os riscos de uma punção
tas vezes, é encaminhado ao laboratório na pró- sanguínea, um processo invasivo que pode ter
pria seringa, sem que haja divisão prévia da amos- como consequência a formação de hematoma, o
tra para os demais exames solicitados. A divisão que judicialmente caracteriza lesão corporal. No
posterior para realização do hemograma não deve dia da coleta, o paciente não deve realizar tarefas
ser feita porque não se consegue a perfeita homo- que exijam esforço físico com o braço que sofreu a
geneização do sangue no interior da seringa. punção. Essas orientações podem estar afixadas
Quando junto à solicitação de gasometria também na sala de coleta (em local perfeitamente visível)
se tem a do hemograma, a amostra sanguínea ou ser entregues ao paciente antes da coleta. Al-
deve ser separada no momento da coleta. A lâmi- guns laboratórios, ao cadastrar o paciente, geram
na deve ser confeccionada logo após o término da um documento que contém as informações sobre
punção, não sendo recomendado que ela seja feita os riscos da coleta. O paciente, após a leitura, dá
no laboratório, porque a gasometria é coletada ciência no documento.
com heparina e esta interfere na coloração das cé-
lulas. Outra situação em relação a pacientes inter-   TEMPO DE GARROTEAMENTO
nados (algumas vezes, pacientes ambulatoriais) é O tempo de garroteamento (aplicação do torniquete)
que a coleta pode ser difícil e a amostra inadequa- não deve ultrapassar 1 minuto e, logo após a entrada
da para o exame, mas, por insistência médica ou do sangue no bisel da agulha, ele deve ser liberado.
por se querer cumprir a prescrição solicitada, ela é Um garroteamento além desse tempo ocasiona es-
encaminhada para realização de exames hemato- tase localizada, hemoconcentração, hemólise e in-
lógicos. Esse tipo de amostra não é apropriado filtração de sangue nos tecidos, resultando em au-
para a realização de exames hematológicos, por- mento do volume globular e alterações no TP, TTPa,
que a interpretação do exame pode ficar muito fibrinogênio, D-dímeros e fatores da coagula­ção. A
comprometida. Muitas vezes, esse resultado ina- coleta de alguns testes especiais de coagulação,
dequado pode ser comparado com outro em que a como o fragmento 1+2 da protrombina (PF1.2) e o
coleta não estava difícil e não se tem uma explica- complexo trombina-antitrombina (TAT), deve ser
ção para a variação entre os resultados. realizada sem o uso de garrote, pois pode provocar
Em muitos hospitais com UTI (geral ou neo- elevações espúrias desses marcadores, particular-
natal) ou com berçário, a coleta não é realizada mente se o tempo de garroteamento ultrapassar 1
pelo laboratório. Nessas situações, a responsabili- minuto. Caso, na procura de uma veia, o paciente
dade sobre a coleta é do profissional que a executa fique garroteado por muito tempo, quando a veia
e não do laboratório, que passa a ser um executor for localizada, o garrote deve ser liberado e, após a

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Fase pré-analítica em hematologia laboratorial  7

normalização da circulação, em torno de 2 minutos, Nas punções capilares, recomenda-se que o


garroteia-se novamente para proceder a punção. primeiro tubo seja o de EDTA ou outro tubo com
Todos os fatores relacionados com os procedimen- anticoagulante, caso não tenha sido solicitado o
tos de coleta são de responsabilidade dos profissio- hemograma. Esse procedimento proporciona
nais do laboratório. Esses profissionais devem en- mais acurácia aos testes hematológicos.
tender plenamente a importância da coleta e dos
fatores técnicos sobre o resultado dos exames he-   MATERIAL DO TUBO DE COLETA
matológicos e devem ser reciclados periodicamen- (VIDRO OU PLÁSTICO)
te, no sentido de sempre melhorarem a qualidade Por muitos anos, os tubos de vidro foram o pa-
dos serviços prestados.11,13,14 drão para se obterem amostras de sangue em la-
boratórios clínicos. Contudo, devido ao interesse
  ORDEM DOS TUBOS crescente pela segurança dos profissionais do la-
NA COLETA DE SANGUE boratório, além da necessidade de facilitar a eli-
No momento da coleta, durante a troca de tubos, minação de resíduos biológicos, tubos de plástico
existe a possibilidade de contaminação de um foram desenvolvidos. Os tubos de plástico pos-
tubo para outro com microrganismos, aditivos e suem algumas vantagens sobre os de vidro: maior
líquido tecidual. Este último possui especial im- resistência a choques mecânicos, maior tolerância
portância nos testes de coagulação, tanto que, na a altas velocidades de centrifugação, menor for-
década de 1940, Armand Quick, o inventor do TP, mação de resíduos sólidos após incineração, além
afirmou que “suco de tecido” é o interferente ex- de serem mais flexíveis para uso em laboratórios
terno mais importante que pode influenciar a automatizados e com manuseio de amostras por
coa­g ulação e que qualquer traço desse suco deve- meio de sistemas robotizados.
ria ser excluído das amostras a serem analisadas.15 Nos exames de coagulação, quando se utilizam
O documento H3-A6 do Clinical and Laboratory tubos de vidro, a própria superfície interna do tubo
Standards Institute (CLSI)14 preconiza uma ordem pode atuar como ativador dos fatores de contato
de coleta para os tubos a vácuo cuja sequência é (cininogênio de alto peso molecular, pré-calicreína,
apresentada na Tabela 1.1. fator XI e XII), além de haver elevado risco de os

TABELA 1.1  Ordem dos tubos de coleta e as razões para tal ordem
ORDEM DE
TIPO DO TUBO COR DA TAMPA RAZÕES
COLETA
1 Hemocultura Geralmente amarela Minimizar as chances de contaminação bacteriana
2 Tubos com citrato de sódio para Azul Deve ser o primeiro tubo com anticoagulante, pois todos
coagulação os demais anticoagulantes e aditivos alteram os testes
de coagulação
3 Tubos com citrato de sódio para Preta Minimizar as chances de contaminação por outro
VHS automatizado anticoagulante senão o próprio citrato
4 Tubos de vidro para soro e sem Vermelha Prevenir a contaminação por aditivos de outros tubos
aditivos
5 Tubos de plástico para soro, com Amarela ou vermelha Devem ser preenchidos após os tubos de coagulação,
ativador de coágulo, com ou sem pois as partículas de sílica ativam a coagulação e alteram
gel separador os seus testes
6 Tubos com heparina com ou sem Verde A heparina altera os testes de coagulação e interfere na
gel separador de plasma obtenção de soro
7 Tubos com EDTA Roxa O EDTA é o maior responsável por problemas de arraste.
Eleva os resultados de TP e o TTPa. Diminui os níveis de ferro
8 Tubos com oxalato/fluoreto de sódio Cinza Aumenta os níveis de sódio e de potássio e altera a
morfologia dos eritrócitos
VHS, velocidade de hemossedimentação; EDTA, ácido etilenodiaminotetracético; TP, tempo de protrombina; TTPa, tempo de tromboplastina
parcial ativada.
Fonte: Adaptada de McCall e Tankersley10 e Clinical and Laboratory Standards Institute.14

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vidros­se quebrarem e provocarem cortes e é: eritrócitos (± 1,5%); leucócitos (± 3%) e plaque-


exposição­a material infectante. Embora os tubos tas (± 5%). Amostras­que vão ser recontadas e que
de coagulação possam ser de vidro ou plástico, os estavam­em repouso por algum tempo devem ser
valores de referência podem variar se a amostra é homogeneizadas por 15 minutos, principalmente
coletada em tubo de vidro ou em tubo de plástico. quando se quer confirmar a contagem de plaque-
Para evitar essa situação, os laboratórios devem tas. Amostras refrigeradas, antes de serem homo-
padronizar o tipo do material do tubo utiliza- geneizadas, devem adquirir a temperatura
do.11,13 Em relação ao hemograma, não há diferen- ambiente.­
ças evidentes e clinicamente significativas sobre o
uso de tubos com EDTA compostos de vidro ou  ANTICOAGULANTES
de plástico.16 Os anticoagulantes mais comumente utilizados
para exames hematológicos são o EDTA, a hepari-
  HOMOGENEIZAÇÃO DAS AMOSTRAS na e o citrato de sódio. O sangue coletado deve ser
APÓS A COLETA DE SANGUE anticoagulado com uma concentração adequada
Logo após a coleta, os tubos devem ser homoge- do anticoagulante, sobretudo para evitar erros re-
neizados suavemente por inversão para que o an- sultantes de uma relação sangue/anticoagulante
ticoagulante se misture adequadamente na amos- inadequada. Idealmente, as amostras sanguíneas
tra. Não se deve homogeneizar vigorosamente os normais devem ser processadas em até 4 horas
tubos de citrato, sob o risco de hemolisar in vitro e após a coleta e as anormais em até 1 hora depois.
promover a ativação das plaquetas e fatores da co- A dificuldade no laboratório é saber se a amostra é
agulação, interferindo, dessa forma, nos testes de normal ou não; ele deve, então, estabelecer um
coagulação. A homogeneização inadequada da protocolo que determine o tempo em que as
amostra promove a formação de microcoágulos amostras devem ser processadas e esse tempo
pelo fato do anticoagulante não se dissolver ade- deve ser o mais rápido possível. Na sequência, se-
quadamente. O documento H3-A6 do CLSI14 pre- rão descritas as características dos principais anti-
coniza que os tubos destinados ao hemograma coagulantes utilizados na hematologia, assim
precisam ser homogeneizados gentilmente por como possíveis problemas resultantes de uma re-
inversão durante 8 a 10 vezes, e os tubos destina- lação sangue/anticoagulante inadequada ou de
dos a testes de coagulação e VHS precisam, pelo um tempo de estocagem prolongado.
menos, de 3 a 6 suaves inversões.
Ácido etilenodiaminotetracético (EDTA)
  HOMOGENEIZAÇÃO DAS AMOSTRAS Embora uma ampla variedade de anticoagulantes
PREVIAMENTE À FASE ANALÍTICA tenha sido utilizada no passado na realização do
Há um intervalo de tempo, entre a coleta e a reali- hemograma, incluindo vários tipos de soluções de
zação do exame, em que o tubo fica parado e ocor- oxalato e até mesmo a heparina, o quelante de cál-
re a sedimentação dos eritrócitos. Para que a cio, chamado ácido etilenodiaminotetracético
amostra possa ser contada adequadamente, ela (EDTA – C10H16N2O8), ou alguns dos seus sais,
deve ser homogeneizada antes do exame, em ho- tornaram-se os principais anticoagulantes para a
mogeneizadores hematológicos por 5 minutos, coleta de amostras destinadas à realização de he-
sobretudo, se o analisador hematológico não pos- mogramas. Na molécula do EDTA, existem qua-
suir sistema de carregamento de amostras em ra- tro hidrogênios simétricos que podem ser substi-
cks. Caso possua, deve-se fazer uma validação do tuídos por potássio, sódio ou lítio, de modo a
mecanismo homogeneizador do contador. Para formar sais de EDTA que possuem elevada solubi-
isso, analisa-se uma rack com 10 amostras aleató- lidade no sangue. O EDTA exerce seu efeito por
rias, previamente homogeneizadas durante 5 mi- meio de uma forte ligação ao cálcio iônico presen-
nutos. Em seguida, deixa-se as amostras repousa- te no plasma, bloqueando efetivamente a coagula-
rem durante 4 horas para, após, serem analisadas ção e a agregação plaquetária. Apesar disso, o
diretamente e sem prévia homogeneização. A ho- EDTA não pode ser utilizado para o estudo dos
mogeneização será feita pelo mecanismo homoge- fatores da coagulação pelo fato de provocar mu-
neizador do analisador. Compara-se a contagem danças na estrutura química do fator V, fibrinogê-
de eritrócitos, leucócitos e plaquetas. A variação nio e trombina. A quantidade de EDTA necessária
máxima permitida entre esses dois procedimentos para a completa quelação do cálcio é balanceada

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Fase pré-analítica em hematologia laboratorial  9

com o desejo de minimizar os danos celulares, de Contagens hematológicas realizadas em amos­


modo que o International Council for Standardi- tras coletadas em EDTA e armazenadas a 4 °C não
zation in Haematology (ICSH) estabeleceu uma apresentam erros significativos durante as primeiras­
faixa de concentração ideal que pode variar de 1,5 24 horas. Assim, o sangue pode ser seguramente­
a 2,2 mg do sal por mililitro de sangue. O EDTA- armazenado em refrigerador, ao longo de uma noi-
-K 2 e o EDTA-Na 2 são disponibilizados na forma te, para ser analisado no dia seguinte, desde que
de um spray seco que reveste a parede dos tubos. cuidados contra o congelamento sejam tomados.
O EDTA-K 2 é mais solúvel que o EDTA-Na 2 Tem sido sugerido que os resultados de hemogra-
(1.650 g/L contra­108 g/L, respectivamente), sen- mas de amostras coletadas em EDTA devam per-
do, por essa razão, o sal recomendado para uso manecer dentro de ± 5% dos valores iniciais quan-
rotineiro pelo ICSH. O EDTA-K 2 também elimina do armazenados a 4 °C durante 24 horas.4,19,21
efeitos dilucionais nas amostras, especialmente as Tempo de armazenamento acima de 24 horas
de pequeno volume. O EDTA-K 3 é comercializado pode produzir resultados conflitantes e pouco re-
na forma líquida e pode diluir levemente as amos- produtíveis, independentemente do desempenho
tras. Além disso, os eritrócitos podem ser contraí- analítico e da metodologia empregada no analisa-
dos devido a um efeito osmótico mais pronuncia- dor hematológico, haja vista ocorrer oscilação da
do que os demais sais do EDTA, resultando em estabilidade dos parâmetros hematológicos nesses
uma diminuição do volume globular de cerca de 2 tipos de amostra. Há parâmetros, como a conta-
a 3% nas primeiras 4 horas.4,14,17-19 gem de leucócitos, que são estáveis por 24 horas
A título de curiosidade, o EDTA também existe em temperatura ambiente e por até 48 horas a
na forma de EDTA-Li2 e EDTA-Na3. O sal dilítio 4 °C. Todavia, diferenças são encontradas, espe-
(EDTA-Li2) é efetivo em relação à ação anticoagu- cialmente quando métodos de contagem baseados
lante, possuindo uma solubilidade de 160 g/L, além no princípio da impedância são utilizados.19
de poder ser utilizado para dosagens bioquímicas; A contagem absoluta de linfócitos pode dimi-
contudo, é menos solúvel que o EDTA-K 2. Já o nuir progressivamente ao longo do tempo, poden-
EDTA-Na3, comercializado na forma líquida, não é do chegar a até 50% da contagem inicial após 72
recomendado por possuir pH elevado, que pode horas de armazenamento. Em situações especiais,
afetar adversamente proteínas do plasma e até mes- como a utilização da contagem absoluta de linfó-
mo tubos de coleta feitos de vidro.4,14,17-19 citos para quantificar CD4+, a amostra deve ser
Em muitos laboratórios clínicos, é comum o processada dentro de poucas horas e nunca ser
fato de amostras de sangue chegarem com atraso armazenada previamente.19
de 2 dias ou mais. Quando essas amostras chegam Depois de 8 horas de armazenamento em tem-
ao laboratório, é comum surgirem dúvidas sobre peratura ambiente, o VCM aumenta em uma taxa
aceitá-las ou não, quais parâmetros analisar quan- progressiva de 3 a 4 fL a cada 24 horas. Tal efeito
do a amostra for aceita e quais comentários repor- não é observado se a amostra for armazenada a
tar no laudo, considerando a confiabilidade ou 4 °C por até 24 horas. As contagens de reticulóci-
não dos resultados. Essas decisões requerem expe- tos geralmente são confiáveis por até 24 horas a
riência e conhecimento dos profissionais do labo- 4 ºC quando coletadas em EDTA; entretanto, em
ratório, sobretudo em relação às mudanças que temperatura ambiente, a contagem começa a di-
ocorrem nas amostras de sangue durante o perío- minuir dentro de 6 horas. Os eritroblastos tendem
do de armazenamento.­ a desaparecer da amostra dentro de 1 a 2 dias de
Quando a amostra é coletada em EDTA di ou armazenamento em temperatura ambiente. Den-
tripotássico e, em seguida, armazenada em repou- tro de 48 a 72 horas, e especialmente em tempera-
so na temperatura ambiente (18 a 25 °C), a conta- tura ambiente alta, começa-se a observar hemólise
gem de eritrócitos, leucócitos, plaquetas e os índi- nas amostras, fato este que resulta em diminuição
ces hematimétricos são, em geral, estáveis por até da contagem de eritrócitos e do volume globular,
8 horas após a coleta da amostra. A partir desse com aumento da hemoglobina corpuscular média
período, mudanças começam a acontecer; contu- (HCM) e da concentração de hemoglobina cor-
do, em até 24 horas de armazenamento, os resul- puscular média (CHCM) calculado.4,19,21
tados ainda se encontram dentro do limite de erro Percebe-se que alguns parâmetros são mais es-
permitido de Tonks.19,20 táveis quando mantidos em temperatura ambiente

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10  Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos

e outros quando refrigerados a 4 °C. Portanto, sanguíneas realizadas a partir de amostras coleta-
para que resultados equivocados não sejam gera- das com heparina apresentam uma coloração de
dos e liberados, deve-se evitar analisar amostras­ fundo avermelhada, e as bordas celulares ficam
além de 24 horas de armazenamento, indepen- realçadas­na mesma cor. A heparina inibe a ativi-
dentemente da temperatura. dade enzimática e não deve ser utilizada na técni-
Longos períodos de armazenamento das amos- ca de reação em cadeia da polimerase (PCR) com
tras coletadas em EDTA provocam mudanças sig- enzimas de restrição. Recomenda-se utilizar a
nificativas na morfologia das células sanguíneas. heparina na concentração de 10 a 30 U/mL de
Os neutrófilos podem apresentar mudanças no nú- sangue.4,11
cleo, o qual se cora mais homo­geneamente que em
Citrato de sódio
sangue fresco, tornando-se, às vezes, picnóticos e
O anticoagulante de escolha para o estudo dos fa-
apresentando figuras de cariorréxis. Pode-se ain-
tores da coagulação é o citrato de sódio (tubo com
da observar margens celulares irregulares e me-
tampa azul). A Organização Mundial de Saúde
nos definidas, e alguns vacúolos podem aparecer
(OMS) e o documento H21-A5 do CLSI12 reco-
no citoplasma. Os monócitos e os linfócitos so-
mendam o uso do citrato de sódio 3,2% (109
frem mudanças semelhantes, podendo apresentar
mmol/l), com o citrato na forma di-hidratada
pequenos vacúolos citoplasmáticos e lobulação
(Na 3C 6H5O7.2H 2O), em vez do citrato de sódio
irregular do núcleo.4,19
3,8% (129 mmol/l), embora ambos sejam adequa-
Já os eritrócitos podem apresentar crenação e
dos para os testes de coagulação.12,22 Para reduzir
esferotização após longos períodos de armazena-
a variabilidade nos testes de coagulação, os labo-
mento em contato com o EDTA. Todas as altera-
ratórios devem padronizar a concentração do ci-
ções morfológicas citadas anteriormente dimi-
trato e utilizar valores de referência apropriados
nuem quando a amostra é mantida a 4 °C, mas
para a concentração utilizada. O tempo para a
não são eliminadas, tornando imprescindível a
formação do coágulo in vitro tende a ser maior na
confecção de extensões sanguíneas o mais breve
presença do citrato 3,8% do que na do 3,2% pelo
possível após a coleta da amostra. Trabalhos suge-
fato de que quanto maior a concentração de citra-
rem que um atraso de 3 horas na confecção da ex-
to, mais cálcio adicionado no ensaio será quelado,
tensão é permitido sem maiores interferências.4,19
o qual se torna menos disponível para possibilitar
O fato de laboratórios utilizarem diferentes
a formação do coágulo. Laboratórios de apoio que
formas de EDTA pode, em alguns casos, dificultar
recebem amostras aliquotadas de plasma congela-
a comparabilidade de resultados. Esse erro é agra-
do devem ficar em alerta para a possibilidade des-
vado pelo fato de que, algumas vezes, pouco cui-
sas amostras terem sido coletadas com outros an-
dado é despendido para garantir a proporção cor-
ticoagulantes, uma vez que o EDTA e a heparina
reta de sangue/anticoagulante na amostra.
alteram os testes de coagulação.
Heparina A relação sangue/anticoagulante é de 1:9, uma
A heparina é um mucopolissacarídeo com carac- parte de anticoagulante para 9 partes de sangue. O
terísticas ácidas e exerce ação anticoagulante por citrato de sódio exerce sua atividade anticoagulante
ser um inibidor da molécula de antitrombina. devido à sua habilidade em quelar o cálcio, o qual é
Consequentemente, acelera a inibição dos fatores um componente fundamental para formação do
Xa, IXa e trombina. A heparina está disponível na coágulo. Tubos preenchidos com sangue em níveis
forma de sais de lítio, sódio e amônio. Ela preserva abaixo do volume adequado possuem proporção
a forma e o volume dos eritrócitos e é usada em aumentada de citrato em relação ao sangue, o que
vários testes que avaliam a série vermelha, sendo o permite aumentar a quelação de cálcio e pode levar
anticoagulante de escolha para a realização do a um aumento dos testes de coagulação. Tubos sub-
teste de fragilidade osmótica, além de ser o mais preenchidos com sangue em citrato 3,8% são mais
adequado para a imunofenotipagem por manter propensos à prolongação do tempo dos testes de
os leucócitos viáveis de um dia para o outro. A he- coagulação que aqueles com citrato 3,2%, pelo fato
parina não é adequada para o hemograma devido de que quanto maior for a concentração de citrato,
ao fato de induzir aglutinação de leucócitos e pla- mais cálcio adicionado ao ensaio será quelado. Tu-
quetas. Outra contraindicação é que as extensões bos subpreenchidos­mostram elevações significati-

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Fase pré-analítica em hematologia laboratorial  11

vas dos resultados quando o volume for menor que C = (1,85 × 10 -3) × (100 – VG) × (V)
75 a 90% do recomendado.13,23
C = volume de citrato que deve permanecer no tubo
Tubos preenchidos com sangue além do volu-
VG = volume globular do paciente
me nominal do tubo podem limitar o procedimento­ V = volume de sangue que será coletado
de homogeneização da amostra, resultando em for- 1,85 × 10 -3 = constante da fórmula
mação de microcoágulos in vitro. É proibido com-
binar 2 amostras de citrato do mesmo paciente, Considerando o exemplo anterior:
pois pode levar à duplicação da concentração e an-
C = (1,85 × 10 -3) × (100 – 70) × (5)
ticoagulante além da diluição da amostra, prolon-
C = 0,27 mL de anticoagulante para um VG de 70%.
gando o tempo dos testes.
A relação sangue/anticoagulante de 9:1 é váli- No exemplo proposto, caso a quantidade de
da para valores de volume globular (VG) ou he- anticoagulante não seja corrigida, haverá um ex-
matócrito (HT) de 45%, com uma variação permi- cesso de 0,23 mL de anticoagulante, e esse excesso
tida entre 25 e 55%. Valores de VG ou HT abaixo presente no plasma coletado irá inibir o cálcio uti-
ou acima desta variação devem ter a quantidade lizado na realização do TP (tromboplastina cálci-
de anticoagulante corrigida, pois o citrato se dis- ca) e do TTPa (adição de CaCl 2). A inibição do
tribui apenas no plasma e não entra nas células. cálcio (combinado com o anticoagulante em ex-
Amostras com VG > 55% mimetizam os efeitos de cesso) fará com que aumente o resultado do TP e
tubos subpreenchidos devido à menor quantidade do TTP. Caso o VG do paciente esteja abaixo da
de plasma disponível. Para exemplificar como variação permitida, haverá falta de anticoagulan-
deve ser feita a correção do anticoagulante, pode- te, levando à formação de coágulos ou microcoá-
-se supor que o laboratório colete 4,5 mL de san- gulos, ativando ou consumindo os fatores da coa-
gue para 0,5 mL de anticoagulante (relação 1:9). gulação, com resultados para mais ou para menos
Para um VG de 45%, tem-se 55 mL de plas- do valor real. Na prática, observa-se que VG abai-
ma em 100 mL de sangue total. Então: xo da variação não tem o resultado tão alterado,
55 mL de plasma .............. 100 mL de sangue total (VG 45%) mas valores acima da variação mostram resulta-
x mL de plasma .................................. 4,5 mL de sangue total dos bastante alterados. Sempre que o valor do VG
estiver fora da variação permitida, a quantidade
x = 2,475 mL de plasma em 4,5 mL de sangue total de anticoagulante deve ser corrigida.
para um VG de 45%.
O correto seria que, antes de coletar sangue
Caso o paciente tenha um VG de 70%, terá para TP ou TTPa, fosse feito o VG ou HT do pa-
30 mL de plasma. Então: ciente e, posteriormente, o sangue citratado fosse
30 mL de plasma .............. 100 mL de sangue total (VG 70%) coletado na relação correta. Como esse procedi-
x mL de plasma .................................. 4,5 mL de sangue total mento é inviável na rotina laboratorial, deve ser
padronizado que, após a centrifugação da amos-
x = 1,35 mL de plasma em 4,5 mL de sangue total tra sanguínea, seja avaliada a relação dos eritróci-
para um VG de 70%. tos sedimentados pelo plasma. É fácil evidenciar a
Deve ser utilizado 0,5 mL de anticoagulan­te quantidade de plasma com relação aos eritrócitos
para 2,475 mL de plasma (VG = 45%). O pacien­te quando o VG está abaixo de 25 ou acima de 55%.
em questão tem 1,35 mL de plasma; portanto, Caso tenha sido solicitado hemograma do pacien-
não pode ser utilizada a mesma quantidade de te, sabe-se qual o valor do VG e se a quantidade de
anticoagulante. A correção é feita pelo seguinte anticoagulante deve ou não ser corrigida. Caso
cálculo: haja necessidade de corrigir a quantidade de anti-
0,5 mL de anticoagulante ...... 2,475 mL de plasma (VG 45%) coagulante, uma recoleta deve ser solicitada.
x mL de anticoagulante ............ 1,35 mL de plasma (VG 70%) Uma maneira simples de superar os efeitos do
citrato nas amostras com VG elevado, consideran-
x = 0,27 mL de anticoagulante para um VG de 70%. do que, na maioria das vezes, as amostras apresen-
Conforme documento H21-A5 do CLSI,12 tam VG entre 55 e 65%, é remover 20% do volume
amostras com VG acima de 55% também podem de citrato de sódio contido no tubo de coleta.
ter a quantidade de citrato corrigida pela seguinte O tempo entre a coleta e a análise depende do
fórmula: exame a ser realizado e da temperatura de arma-

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12  Hematologia laboratorial: teoria e procedimentos

zenamento. A Tabela 1.2 contém o tempo de ar- As amostras devem ser transportadas para o labo-
mazenamento dos principais exames de acordo ratório o mais rápido possível, mas caso não se-
com a temperatura. jam, elas devem ser fixadas com metanol a fim de
Os cuidados pré-analíticos são críticos para preservar as características intrínsecas de cada
manter a integridade da amostra e a qualidade dos tipo celular.25 No Capítulo 3, Fase analítica: Aná-
resultados em hemostasia. O Quadro 1.3 resume lise morfológica do sangue periférico e sua corre-
informações sobre fontes de erro pré-analítico e lação com o hemograma, estão descritas as técni-
condições que tornam a amostra ideal ou não. cas de confecção e coloração das lâminas.

  CONFECÇÃO DAS EXTENSÕES   TRANSPORTE E PROCESSAMENTO


SANGUÍNEAS LOGO APÓS A COLETA As amostras devem ser acondicionadas em male-
As extensões sanguíneas confeccionadas com tas que ofereçam garantia de biossegurança no
sangue sem anticoagulante e imediatamente após transporte, assim como resistência a choque e va-
a coleta devem permanecer em temperatura am- riações de temperatura e pressão. De um modo
biente até secarem completamente. Não se deve geral, as amostras devem ser transportadas para o
assoprar ou utilizar secadores ou ventiladorespara laboratório em temperatura ambiente (15-22 °C) e
secar as extensões, nem deixá-las em temperatura no menor tempo possível. O ideal é que as amos-
ambiente durante mais de 5 horas, pois tudo isso tras de TP e TTPa sejam processadas dentro de 4
pode resultar em artefatos inaceitáveis, como horas após a coleta. Já as amostras de hemograma
equinócitos, esferócitos e leucócitos degenerados. devem ser processadas em até 6 horas quando

TABELA 1.2  Tempo de armazenamento dos principais testes de coagulação conforme a temperatura
EXAME TEMPERATURA AMBIENTE 2 A 8 OC –20 OC
TP 24 h, centrifugado ou não Não armazenar 2 semanas
TTPa 4h 4h 2 semanas
TT 4h Não armazenar 2 semanas
Fibrinogênio 24 h, se centrifugado Não armazenar, pois o fibrinogênio pode precipitar 2 semanas
Proteína C e S 4h Não armazenar 6 meses
Fatores Nunca armazenar em temperatura ambiente Não armazenar 2 semanas
Fonte: Adaptada de Adcock13 e Medeiros Jr e Munhoz.24

QUADRO 1.3  Fontes de erro pré-analítico e condições da amostra em hemostasia


FONTES DE ERROS PRÉ-ANALÍTICOS CONDIÇÕES IDEAIS DA AMOSTRA CAUSAS DE REJEIÇÃO DA AMOSTRA
Preenchimento incompleto do tubo Coleta sem trauma e com uso mínimo do Amostra coletada em outro anticoagulante
torniquete que não seja o citrato
Uso de outro anticoagulante que não seja Preencher o tubo adequadamente, Amostras totalmente coaguladas ou com
o citrato conforme volume nominal microcoágulos
Adicionar sangue de outro tubo Homogeneizar a amostra suavemente por Amostras preenchidas com < 75% do
para preencher um tubo de citrato 5-8 inversões volume nominal do tubo
subpreenchido
Homogeneização inadequada Transportar a amostra rapidamente para o Amostras preenchidas demasiadamente
laboratório e em temperatura ambiente
Armazenar amostra não centrifugada em Centrifugar dentro de 1 h após a coleta Amostras hemolisadas por provocarem
congelador flutuações nos resultados
Demora no transporte da amostra para o Fazer os testes imediatamente após a Amostras lipêmicas dependendo do
laboratório centrifugação, a qual deve fornecer um princípio empregado no coagulômetro
plasma pobre em plaquetas (< 10.000/µL)
Fonte: Adaptada de Adcock13 e Comar e colaboradores.23

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Fase pré-analítica em hematologia laboratorial  13

mantidas em temperatura ambiente e em até 24 ho- entanto, saídas de água dos eritrócitos junto com a
ras se armazenadas entre 2 e 8 °C.19,26 O docu- glicose restauram o VCM original. Esse efeito hi-
mento H18-A4 do CLSI 27 descreve detalhada- poglicêmico transitório pode ser superado por
mente os procedimentos para o manuseio e uma microdiluição da amostra de sangue em solu-
transporte de amostras de diagnóstico. Na he- ção salina e uma espera de 5 minutos até a amostra
matologia, é fundamental respeitar principal- ser analisada novamente.
mente as temperaturas de transporte a fim de não Hiperlipidemias, incluindo níveis de triglice-
alterar os fatores da coagulação e não degenerar as rideos superiores a 1.000 mg/dL podem provocar
células sanguíneas.8,27 aumento espúrio da concentração de hemoglobina
nos analisadores hematológicos pelo fato de ela ser
 CENTRIFUGAÇÃO determinada por espectrofotometria. Esse efeito
Recomenda-se que o tempo entre a coleta e a cen- pode ser superado por meio de centrifugação da
trifugação não ultrapasse uma hora. Como a amostra, retirada do plasma lipêmico e subse-
maioria dos exames de coagulação é realizada em quente ressuspensão do concentrado ou papa de
amostras de plasma pobre em plaquetas, com con- hemácias em igual volume de soro fisiológico ou
diluente do equipamento antes da análise. Após
centração de plaquetas no plasma inferior a
essa análise, considera-se apenas o novo valor de
10.000/µL, torna-se necessário verificar periodi-
hemoglobina e recalcula-se as constantes corpus-
camente o funcionamento da centrífuga. Para
culares (HCM e CHCM). Quanto aos demais pa-
essa verificação, deve-se selecionar algumas
râmetros, como contagem de eritrócitos, leucóci-
amostras da rotina e fazer a contagem de plaque-
tos e plaquetas e o volume globular, mantêm-se os
tas antes e depois da centrifugação. Após a centri-
valores da primeira análise, com a amostra ainda
fugação, todas as amostras devem ter menos de lipêmica, pelo fato de poderem ser alterados com a
10.000 plaquetas/µL, mas caso apresentem resul- manipulação da amostra para a dosagem da he-
tados superiores, deve-se aumentar o tempo de moglobina corrigida. A seguinte fórmula também
centrifugação ou ajustar as configurações da cen- pode ser utilizada para a correção da hemoglobina
trífuga a fim de se obter plasmas pobres em pla- em amostras lipêmicas; contudo, ela só funciona
quetas adequados para se realizar os testes de coa- para amostras com VCM dentro dos valores de re-
gulação. O estudo deve ser repetido após ajuste ou ferência. Da mesma maneira, a hemoglobina cor-
redefinição do tempo de centrifugação para ga- rigida substitui a antiga e recalcula-se as constan-
rantir a sua efetividade. A velocidade de centrifu- tes corpusculares (HCM e CHCM):
gação sugerida para gerar plasmas adequados é de
1500g durante 15 minutos ou mais.24,28 VCM (dentro dos valores
Hemoglobina de referência) × RBC
=
VARIÁVEIS ENDÓGENAS corrigida 2,98 × 10
VCM = volume corpuscular médio
  MEDICAMENTOS E ANALITOS
RBC = eritrócitos (do inglês red blood cells)
Vários medicamentos como anti-inflamatórios,
anticoagulantes orais, antirretrovirais, entre ou- A turbidez resultante da precipitação de pro-
tros, interferem nos exames hematológicos, e, por teínas monoclonais, vista em pacientes com mie-
isso, o paciente deve ser questionado quanto ao uso loma ou macroglobulinemia, pode falsamente
de medicamentos eventuais ou crônicos e a forma elevar a concentração de hemoglobina e a conta-
de administração. O laboratório deve estabelecer gem de leucócitos e, em alguns casos, com precipi-
um protocolo de questionamentos a ser respondi- tação intensa e com gelificação das amostras, im-
do pelo paciente. O preenchimento correto desse possibilita totalmente a análise automatizada.
protocolo fica a cargo da recepção do laboratório, a Aglutininas eritrocitárias, hiperglicemia,
qual deve estar capacitada para essa função. O au- fragmentação eritrocitária, contagens elevadas de
mento da concentração de uma substância quími- linfócitos, presença acentuada de plaquetas gigan-
ca pode afetar algumas determinações hematoló- tes, agregados plaquetários e microcitose intensa
gicas. Assim, níveis de glicose superiores a 600 mg/ provocam alterações espúrias da amplitude de
dL podem levar a um aumento transitório do VCM distribuição do tamanho dos eritrócitos (RDW,
na medida em que a água entra nos eritrócitos. No do inglês red blood cell distribution width).29-32

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Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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