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UNIVERSIDADE DE LISBOA

Faculdade de Medicina Veterinária

DISTÚRBIOS COMPORTAMENTAIS RELACIONADOS COM O MEDO EM CÃES

JOÃO RICARDO FERREIRA TEOTÓNIO

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI ORIENTADOR

Doutora Maria Manuela Grave Rodeia Doutor Gonçalo da Graça Pereira


Espada Niza
CO-ORIENTADORA
Doutora Ilda Maria Neto Gomes Rosa
Doutora Luísa Maria Freire Leal
Doutor Gonçalo da Graça Pereira Mateus

2015

LISBOA
UNIVERSIDADE DE LISBOA

Faculdade de Medicina Veterinária

DISTÚRBIOS COMPORTAMENTAIS RELACIONADOS COM O MEDO EM CÃES

JOÃO RICARDO FERREIRA TEOTÓNIO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA VETERINÁRIA

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI ORIENTADOR


Doutora Maria Manuela Grave Rodeia
Doutor Gonçalo da Graça Pereira
Espada Niza
CO-ORIENTADORA
Doutora Ilda Maria Neto Gomes Rosa
Doutora Luísa Maria Freire Leal
Doutor Gonçalo da Graça Pereira Mateus

2015

LISBOA
Dedicatória

Para o Pipe, o meu companheiro de quatro patas

que nunca abriu a boca para me criticar ou

elevou a voz para me reprimir,

mas no silêncio das suas palavras

me ensinou as mais valiosas lições.

Que a tua sábia compreensão e infinita paciência

continuem a inspirar-me a ser melhor a cada dia.

"Tant que vous n'avez pas aimé un animal, une partie de votre âme sera toujours sans éclat,
endormie."

Anatole France

“Some people talk to animals. Not many listen though. That's the problem.”

A.A. Milne

“The greatness of a nation and its moral progress can be judged

by the way its animals are treated.”

Mahatma Gandhi

i
Agradecimentos
Aos meus orientadores, Gonçalo da Graça Pereira e Luísa Mateus, pelo incansável trabalho em
calendários reduzidos. À Dra. Kersti Seksel pela inspiração, exemplo e infindável conhecimento,
que marcou profundamente a minha visão da profissão e a minha visão de futuro. A toda a equipa
do Sydney Animal Behaviour Service e do Seaforth Veterinary Hospital, por terem tornado o meu
estágio no momento mais memorável da minha formação. Ao professor Telmo Nunes, pela
inestimável orientação no mundo da significância estatística. A todos os professores e
profissionais da Faculdade de Medicina Veterinária – obrigado por tudo o que me deram
diariamente ao longo destes 6 anos, e saibam a importância do vosso contributo para todas as
nossas conquistas no futuro. Que o conforto do conhecido não vos impeça de trilhar o caminho
imprevisível mas inevitável do progresso.

A todos os amigos de quatro patas que entraram no meu estudo e aos seus humanos, pelo trabalho
imenso na resposta às minhas infindáveis perguntas.

À minha família, pelo apoio incondicional, que me permitiu sempre tomar as minhas próprias
decisões, mesmo que desafiassem as suas mais profundas convicções. Ao meu avô Luís e
padrinho, por ter nascido antes do seu tempo, mas no tempo certo para se tornar num dos meus
maiores ídolos. Ao meu pai, por aceitar sempre quem sou com o maior orgulho nos olhos. À
minha mãe, que foi sempre o meu colo nos momentos mais difíceis e a maior entusiasta nas
minhas pequenas vitórias. À minha maninha, por ser a gémea mais perfeita, que me compreende
como ninguém e perdoa diariamente a minha imperfeição. Ao meu mano, que através do seu
olhar atento me fez sempre sentir o seu incondicional carinho e indisfarçável orgulho, desde o
momento em que me pegou ao colo pela primeira vez – prometo que voltarei sempre para te
abraçar.

A todos os meus amigos, os de hoje e os de ontem. Aos que se mantiveram próximos ao longo do
tempo, e a todos os outros que me ensinaram as mais valiosas lições antes de a Vida nos levar por
caminhos diferentes. Acredito que os amigos são a família que escolhemos, e não podia ter mais
orgulho nas minhas escolhas nem sentir-me mais privilegiado por fazer parte das vossas. Saibam
que o meu abraço se manterá sempre aberto para vocês.

À minha cara-metade, que soube sempre ver o melhor de mim e é o meu modelo diário de Amor,
sensibilidade, dedicação e excelência. Obrigado pela incomparável compreensão e motivação e
por acreditares sempre no melhor de nós. Obrigado por fazeres de mim o homem mais feliz do
Mundo. A oportunidade de te fazer feliz é o meu maior privilégio.

ii
Resumo

DISTÚRBIOS COMPORTAMENTAIS RELACIONADOS COM O MEDO EM CÃES

Os distúrbios comportamentais relacionados com o medo são comuns, induzem sofrimento nos
animais e prejudicam os laços afectivos com os seus donos. O presente estudo procurou, por um
lado, avaliar o envolvimento de variáveis intrínsecas e extrínsecas no desenvolvimento destes
problemas, através de uma análise estatística comparativa do tipo multivariada; por outro
descrever alguns factores na população de estudo que se demonstrem interessantes para a sua
compreensão. Os resultados realçam a relevância do aconselhamento de qualidade na matéria por
parte dos profissionais mais comummente solicitados (médicos veterinários e treinadores);
confirmam que estes distúrbios podem ser diagnosticados nos primeiros meses de vida do animal
(p<0.001); sugerem que coabitar com outros cães está positivamente correlacionado com o
diagnóstico destes distúrbios (p<0.05). Por outro lado, o estudo comparativo evidencia as claras
divergências na inferência de conclusões baseadas em métodos de análise estatística univariada e
multivariada, alertando para a necessidade de adopção de abordagens rigorosas e adequadas na
análise de relações biológicas. Estudos futuros deveriam dar mais ênfase aos aspectos genéticos
do comportamento de medo, de forma a compreender a relevância destes no desenvolvimento de
distúrbios relacionados.

Palavras-chave: distúrbios comportamentais; medo; cães

iii
Abstract

FEAR-RELATED BEHAVIOURAL DISORDERS IN DOGS

Fear-related behavioural disorders are common in dogs and they not only induce suffering in the
animals but they also damage the affective bond with their owners. The first part of the study
aimed to assess the relevance of intrinsic and extrinsic variables in the development of such
problems, using a comparative multivariate type statistical analysis. The second part sought to
describe some factors in the studied population that could help in further understanding it. The
results highlight the importance of giving quality advice to owners of these animals by both the
veterinarians and professional trainers. It is concluded that fear-related disorders can be
diagnosed as early as during the puppies’ first months (p<0.001) and a positive correlation was
found between living with other dogs and being diagnosed with such disorders (p<0.05). The
comparative study shows how disagreeing the conclusions can be when extracted from a
univariate analysis procedure, compared to a multivariate one. This should serve as an alert for
the need of adopting rigorous and adequate approaches when analysing biological relationships.
Future studies should focus on the genetic characteristics of fear behaviour, thus allowing us to
understand their relevance in the development of related disorders.

Keywords: behavioural disorders; fear; dogs

iv
RELATÓRIO DE ESTÁGIO
1. Local e duração

Como parte integrante do Mestrado Integrado em Medicina Veterinária, o meu estágio curricular
de fim de curso decorreu entre os meses de Fevereiro e Abril de 2015 no Sydney Animal
Behaviour Service (SABS), na Austrália, compreendendo um total de 500 horas.
O SABS é um serviço de especialidade de Medicina Comportamental em animais de companhia
que trabalha apenas por referência. Foi fundado pela Dra. Kersti Seksel em 1992 e a equipa de
veterinários é actualmente composta por si e por dois residentes da Especialidade – Dra. Caroline
Perrin e Dr. Andrew O’Shea.
A maioria dos casos são vistos nas instalações do SABS, localizadas em Seaforth (Sydney) e os
clientes deslocam-se a partir de toda a área geográfica do estado de New South Wales.
Alternativamente, oferece-se a possibilidade de realizar consultas ao domicílio, depois de
asseguradas a disponibilidade de todos os envolvidos e as devidas condições de segurança.
Um dia por semana, a equipa realiza consultas no Animal Referral Hospital (ARH), em
Homebush (Sydney) – um hospital de referência composto por profissionais diplomados nas mais
diversas Especialidades da Medicina Veterinária.

2. Supervisora directa do estágio – Dra. Kersti Seksel

A Dra. Kersti Seksel (BVSc, MRCVS, MA, FACVSc, DACVB, DECAWBM) é uma
profissional fascinante e a única no Mundo certificada por três colégios da Especialidade
(American College of Veterinary Behaviorists; European College of Animal Welfare and
Behavioural Medicine; Australian College of Veterinary Scientists in Animal Behaviour).
Pioneira na sua actividade, a Dra. Kersti é conhecida pelo seu esforço de evolução constante,
estando persistentemente na frente do pensamento vanguardista na área do comportamento
animal. Já durante os anos ’90, foi a impulsionadora dos conceitos de Puppy Preschool ® e
Kitten Kindy ® – aulas estruturadas de socialização e habituação para cachorros e gatos em fases
iniciais do seu desenvolvimento, acompanhadas de formação aos seus donos. Actualmente é
pioneira na utilização de psicofármacos na área de Medicina Comportamental e marca presença
assídua em diversas plataformas de interacção com a comunidade, desde a rádio, à televisão à
imprensa escrita (jornais e revistas). Do ponto de vista académico, criou e ministra o curso à
distância em Medicina Comportamental, pela Universidade de Sydney (altamente cotado pelos

v
colegas da Especialidade) e é professora na Charles Sturt University. É presença regular em
conferências internacionais e autora de livros e capítulos da Especialidade.
Durante os 3 meses de trabalho com a Dra. Kersti, o desafio mental foi uma constante. Ao tentar
compreender as razões mais profundas subjacentes aos problemas comportamentais dos animais à
consulta, ensinou-me que não existem curas milagrosas nem receitas exactas, numa área que tem
sofrido uma enorme evolução nas últimas décadas. Aliando o mais recente conhecimento
científico à sua vasta experiência e apurada sensibilidade, a Dra. Kersti mostrou-me como
trabalhar de forma íntegra, actualizada e eficiente numa área muitas vezes desvalorizada no meio
veterinário, mas essencial numa sociedade evoluída. Ao dedicar a sua vida à educação sobre os
problemas mentais dos nossos animais, marcou significativamente o meu percurso profissional,
as minhas convicções e interesses pessoais e até os meus valores individuais.

3. Actividades desenvolvidas durante o estágio

Durante as minhas 12 semanas de estágio tive a oportunidade de experienciar todas as actividades


desenvolvidas no SABS. Todas as semanas tínhamos dias dedicados às consultas e dias
dedicados à redacção dos relatórios. Nos dias de consultas, acompanhei o(s) veterinário(s) em
todas os casos, tirando as minhas próprias notas que seriam utilizadas para, juntamente com a
informação do questionário preenchido pelos donos, redigir o relatório final – a enviar ao dono e
ao médico veterinário assistente. Os relatórios eram altamente detalhados, variando de dimensão
entre 7 e 8 páginas. A casuística era muito variada e incluía, entre outros: ansiedade por
separação, ansiedade generalizada, medos e fobias, comportamentos compulsivos, disfunção
cognitiva canina e problemas de eliminação (cães e gatos).
À medida que o estágio progrediu, evoluiu também o meu envolvimento nas consultas. Desde a
primeira semana que foi solicitada a minha participação activa com questões pertinentes, tanto
aos donos como ao veterinário responsável pela consulta; a partir da segunda semana, foi-me
sendo solicitado que contribuísse no fornecimento de informação de base aos donos sobre o
diagnóstico e terapêutica do problema do seu animal de estimação. Durante o último mês foi-me
concedida a oportunidade de dirigir algumas consultas (de acompanhamento), sempre sob a
vigilância de pelo menos um dos veterinários da Especialidade. Estive ainda encarregue de fazer
agendamentos, comunicar com os donos e responder aos contactos via telefone. Periodicamente
foram organizadas sessões de discussão entre os membros do SABS sobre diversas temáticas
relacionadas com a Medicina Comportamental, que em muito contribuíram para o meu

vi
conhecimento na área. Estas sessões eram extremamente práticas e informais e o ambiente era
propício a um eficaz esclarecimento, assim como para a saudável discussão de diferentes
opiniões e pontos de vista. Estes momentos foram essenciais para a minha aprendizagem.
O SABS é um serviço diferenciado de alta qualidade e, como tal, muito procurado pelos
estudantes dos diferentes estados australianos para realizarem os seus estágios curriculares.
Durante a minha estadia – que foi mais longa do que a de qualquer outro aluno – estive
responsável por introduzir os restantes alunos à dinâmica do serviço e ajudá-los na redacção de
relatórios ou qualquer outra actividade que lhes fosse proposta.
O SABS colabora frequentemente com os organismos estatais, quer através de consultoria, quer
em participações em tribunal. Um destes serviços é a “avaliação comportamental de cães
perigosos” (Dangerous Dog Assessments), que consiste na exposição do animal a situações e
estímulos passíveis de lhe causar algum desconforto (ex.: aproximação de cães de peluche,
manusear a taça da comida, fazer movimentos bruscos, conter e manusear o animal simulando
avaliação veterinária, passear à trela na rua) e na avaliação da sua resposta. Este tipo específico
de consultas é, geralmente, realizado quando um animal foi considerado como perigoso pelos
serviços camarários, de acordo com a legislação local, e os seus responsáveis pretendem contestar
a decisão em tribunal. Durante o meu estágio tive a oportunidade de realizar algumas destas
avaliações – curiosamente, nenhum dos animais avaliado foi por nós classificado como perigoso.
Tive ainda a oportunidade de, por um dia, realizar uma observação comportamental (etograma)
de um grupo de Tigres da Sumatra em cativeiro no Taronga Zoo (Sydney), em que alguns dos
seus elementos demonstravam sinais de ansiedade. Colaborei ainda nas filmagens para um artigo
no jornal Sydney Morning Herald sobre a utilização de psicofármacos em animais de companhia.
Durante o decorrer do estágio levei ainda a cabo todas as actividades de recolha de dados para o
estudo retrospectivo que culminaria na minha dissertação, entre elas: finalização do questionário;
preparação dos envelopes para retorno dos questionários; recrutamento em pessoa de todos os
clientes do grupo controlo e do grupo de estudo; acompanhamento telefónico, quando necessário;
recepção e separação dos questionários; e introdução da informação numa base de dados.

vii
Índice
Dedicatória ........................................................................................................................................ i
Agradecimentos ............................................................................................................................... ii
Resumo............................................................................................................................................ iii
Abstract ........................................................................................................................................... iv
Relatório de Estágio ......................................................................................................................... v
Índice ............................................................................................................................................. viii
Índice de Figuras ............................................................................................................................. ix
Índice de Gráficos ............................................................................................................................ x
Índice de Tabelas ............................................................................................................................. x
Lista de Abreviaturas e Símbolos .................................................................................................... x
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1
CAPITULO 1: O cachorro em crescimento ..................................................................................... 2
1.1 Desenvolvimento cerebral após o nascimento ....................................................................... 2
1.2. Períodos de desenvolvimento comportamental..................................................................... 2
1.2.1 Desenvolvimento intra-uterino ....................................................................................... 3
1.2.2 Período neonatal .............................................................................................................. 3
1.2.3 Período de Transição ....................................................................................................... 4
1.2.4 Período Sensível .............................................................................................................. 4
1.2.5 Adolescência ou período juvenil ..................................................................................... 6
1.2.6 Idade Adulta .................................................................................................................... 7
1.3 Teoria da Aprendizagem: Como é que o animal aprende? .................................................... 7
1.3.1 Condicionamento Clássico .............................................................................................. 7
1.3.2 Condicionamento Operante............................................................................................. 9
1.3.3 Influência social e aprendizagem .................................................................................. 10
1.3.4 Habituação e Sensibilização.......................................................................................... 11
CAPÍTULO 2: Medo, Fobias e Distúrbios Associados ................................................................. 12
2.1 O medo ................................................................................................................................. 12
2.2 A ansiedade .......................................................................................................................... 12
2.3. Mecanismos neurofisiológicos do medo/ansiedade ............................................................ 13
2.3.1 A resposta ao stress: o papel do hipotálamo ................................................................. 13
2.3.2 Circuito neuronal do medo aprendido: o papel da amígdala e do hipocampo .............. 15
2.3.3 Mecanismos de regulação do eixo HPA pela amígdala e hipocampo .......................... 17
2.3.4 Alterações neuronais no cão ansioso: efeitos da exposição crónica ao stress .............. 17
2.4 Resposta comportamental ao stress/medo: compreender os sinais ...................................... 18
2.5 Factores determinantes da expressão de distúrbios comportamentais ................................. 19
2.5.1 A aprendizagem: importância da experiência passada ................................................. 20
2.5.2 O ambiente: importância do contexto ........................................................................... 20
2.5.3 A genética: importância da variação individual ............................................................ 21
2.6 Distúrbios comportamentais associados ao medo ................................................................ 22
2.6.1 Medo de pessoas ........................................................................................................... 22
2.6.2 Medo de animais ........................................................................................................... 22
2.6.3 Fobias ............................................................................................................................ 23
2.6.4 Ansiedade por separação ............................................................................................... 24
2.6.5 Agressividade por medo................................................................................................ 25
CAPÍTULO 3: Prevenção e Terapêutica de distúrbios associados ao medo ................................. 27
3.1 Prevenção ............................................................................................................................. 27
3.1.1 Educar os donos: a importância dos primeiros contactos ............................................. 28
viii
3.1.2 Socialização, habituação e estimulação ........................................................................ 29
3.1.3 Treino básico ................................................................................................................ 31
3.1.4 Os limites da prevenção ................................................................................................ 32
3.2 Terapêutica .......................................................................................................................... 33
3.2.1 Maneio do ambiente ..................................................................................................... 33
3.2.2 Modificação comportamental ....................................................................................... 34
3.2.2 Terapêutica farmacológica ........................................................................................... 39
CAPÍTULO 4: Estudo retrospectivo sobre distúrbios comportamentais relacionados com o medo
em cães. ......................................................................................................................................... 40
4.1 Objectivos ............................................................................................................................ 40
4.2. Material e métodos ............................................................................................................. 40
4.2.1 Questionário ................................................................................................................. 40
4.2.2 Amostras ....................................................................................................................... 41
4.2.3 Análise Estatística ........................................................................................................ 41
4.3 Resultados............................................................................................................................ 42
4.3.1 Estudo comparativo sobre as variáveis envolvidas no desenvolvimento de distúrbios
relacionados com o medo ...................................................................................................... 42
4.3.2 Análise descritiva de dados sobre animais diagnosticados com distúrbios relacionados
com o medo ........................................................................................................................... 45
4.4 Discussão ............................................................................................................................. 47
4.4.1 Sobre o estudo comparativo sobre as variáveis envolvidas no desenvolvimento de
distúrbios relacionados com o medo ..................................................................................... 47
4.4.2 Sobre a análise descritiva de dados sobre animais diagnosticados com distúrbios
relacionados com o medo ...................................................................................................... 51
CONCLUSÕES e CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 52
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................... 54
Anexo 1 – Questionário original distribuído aos donos para recolha dos dados ........................... 63

Índice de Figuras
Figura 1 – Condicionamento clássico em três passos. Adaptado de Bowen & Heath (2005)........ 8
Figura 2 – Reforço vs punição; positivo vs negativo. Adaptado de Bowen & Heath (2005) ......... 9
Figura 3 – Resposta autonómica ao stress (eixo HPA). Adaptado de Bear et al. (2007).............. 15
Figura 4 – Localização da amígdala e do hipocampo, profundamente no córtex – vista medial
ligeiramente rodada do cérebro. Adaptado de Bear et al. (2007) .................................................. 16
Figura 5 – Circuito neuronal proposto para o medo aprendido. Adaptado de Bear et al. (2007) . 17
Figura 6 – Escada da agressividade. Adaptado de Shepherd (2009) ............................................. 27
Figura 7 – Tipos de recompensas, de acordo com Overall (2013a). ............................................. 35
Figura 8 – Representação esquemática de um protocolo de dessensibilização a um estímulo
sonoro. Adaptado de Yin (2009) ................................................................................................... 37
Figura 9 – Representação esquemática de contra-condicionamento a um estímulo sonoro.
Adaptado de Yin (2009). ............................................................................................................... 38

ix
Figura 10 – Modelo de regressão logística simplificado, mostrando as variáveis com co-relação
significativa com o desenvolvimento de distúrbios relacionados com o medo em cães ............... 45

Índice de Gráficos
Gráfico 1 - Frequências dos diferentes tipos de medos nos animais estudados. ............................ 46
Gráfico 2 - Distribuição da habituação ao estímulo problemático durante os dois períodos de
desenvolvimento estudados – período sensível e adolescência. .................................................... 46

Índice de Tabelas
Tabela 1 – Resultados da análise univariada. ................................................................................ 42

Lista de Abreviaturas e Símbolos


ACTH – hormona corticotrofina
CRH – hormona libertadora de corticotrofina
et al. – e outros (et alii, et aliae, ou et alia)
etc. – e assim por diante (et cetera)
ex. – exemplo
HPA – hipotálamo-hipófise-adrenal 1
i.e. – isto é (id est)
n.s. – não estatisticamente significativo

A presente dissertação não foi escrita ao abrigo do novo acordo ortográfico da Língua Portuguesa, por
vontade expressa do autor.

1
A glândula hipófise também é chamada de pituitária.
x
INTRODUÇÃO
Os problemas comportamentais são extremamente comuns em cães e são das principais causas de
eutanásia e abandono em animais de companhia por todo o Mundo (Martínez, Pernas, Casalta,
Rey, & Palomino, 2011; Salman et al.., 2000; Storengen, Boge, Strøm, Løberg, & Lingaas, 2014;
Tamimi, Malmasi, Talebi, Tamimi, & Amini, 2013). Os distúrbios relacionados com o
medo/ansiedade são dos problemas mais comuns, sendo fonte de imenso sofrimento para o
animal, bem como para os seus donos, afectando profundamente os laços emocionais que os
unem (Duffy, Hsu, & Serpell, 2008; Flannigan & Dodman, 2001; Guy et al.., 2001; Hsu & Sun,
2010; Temesi, Turcsán, & Miklósi, 2014).
O vasto progresso científico das últimas décadas revolucionou o entendimento desta temática,
colocando a tónica dos distúrbios comportamentais nas suas motivações
neurofisiológicas/emocionais. Torna-se assim incontornável a necessidade de compreensão dos
mecanismos subjacentes ao desenvolvimento destes distúrbios, tanto de um ponto de vista de
entendimento teórico, como da promoção de uma abordagem prática adequada.
Em primeiro lugar, a presente dissertação pretende apresentar de forma sucinta o entendimento
actual sobre os distúrbios comportamentais relacionados com o medo, focando-se,
essencialmente, nos mecanismos subjacentes ao seu desenvolvimento, nas variáveis intrínsecas e
extrínsecas que modulam a sua expressão e apresentando alguns dados sobre cada tipo de
comportamento passível de ser englobado nesta categoria. Serão ainda apresentadas algumas
ferramentas tidas como essenciais na promoção de uma vida saudável do cachorro em
crescimento, assim como os três pilares fundamentais na abordagem terapêutica de distúrbios
comportamentais relacionados com o medo.
O segundo objectivo é contribuir para esse entendimento científico, através da realização de um
estudo retrospectivo, dividido em duas partes. A primeira, através duma abordagem comparativa,
pretende aferir a correlação entre diferentes variáveis (intrínsecas e extrínsecas) e o
desenvolvimento de distúrbios comportamentais relacionados com o medo, através da
comparação entre uma amostra de estudo e um grupo controlo. A segunda pretende descrever
alguns factores relativos à amostra de estudo que se demonstrem interessantes para a sua
compreensão.

1
CAPITULO 1: O cachorro em crescimento
1.1 Desenvolvimento cerebral após o nascimento
Quando nasce, o cachorro já apresenta mielinização dos nervos craniais associados às funções
básicas de alimentação, equilíbrio e ajuste de postura – nomeadamente os nervos trigémeo ou V,
facial ou VII e vestíbulo-coclear ou VIII (Overall, 2013a). Apresenta ainda reflexos de sucção,
palpebral e fotomotor (piscar de olhos à luz), alguns mecanismos sensoriais associados a
estímulos tácteis (como os reflexos de Galant e auriculonasocefálico – permite-lhe orientar a
cabeça e pescoço no sentido do estímulo; reflexo anogenital – mecanismo de eliminação; reflexo
de empurrar da cabeça na direcção de uma fonte de calor; reflexo extensor cruzado – estímulo
flexor num membro origina a extensão involuntária do membro contralateral; reflexo de retracção
da cabeça – após estimulo no plano nasal; reflexo panicular – contracção do panículo) nocicepção
e sentido de gosto e olfacto (Beaver, 2009).
No entanto, a deposição de mielina (processo responsável pelo aumento da velocidade da
condução eléctrica dentro de e entre neurónios) dá-se de forma progressiva na maioria dos
restantes circuitos neuronais, fazendo-se coincidir com as também progressivas alterações de
comportamento típicas de cada etapa do desenvolvimento do cachorro (Fox, 1971).
Durante as 3 primeiras semanas de idade dá-se um aumento gradual da mielinização da medula
espinhal, raízes motoras e sensitivas e circuitos eferentes. Durante esta fase, o cachorro torna-se
responsivo a estímulos auditivos e visuais, apresenta reflexo de ameaça e melhora
significativamente a coordenação motora. A mielinização do córtex cerebral progride mais
rapidamente após este período e, por volta das 8 semanas, o cérebro do cachorro produz padrões
de electroencefalograma semelhantes aos de um cão adulto. Às 10 semanas este processo começa
a abrandar até o nível de mielinização se tornar relativamente estável por volta das 14-20
semanas (Fox, 1971; Overall, 2013a). Em humanos, sabe-se que a morfologia cerebral continua a
alterar-se de forma dinâmica, mesmo durante a idade adulta (Sowell et al., 1999). Dados
concordantes foram apresentados para ovelhas (Dwyer & Lawrence, 2005) e, embora ainda não
existam dados análogos em cães, admite-se que o mesmo se possa passar nesta espécie (Overall,
2013a).

1.2. Períodos de desenvolvimento comportamental


Na área do comportamento animal, o desenvolvimento é sempre entendido à luz da relação entre
a genética do indivíduo e a influência do seu meio-ambiente – epigenética (Duffy et al., 2008;

2
Goddard & Beilharz, 1984; Miklósi, 2007; Van Der Waaij, Wilsson, & Strandberg, 2008; Zovkic,
Meadows, Kaas, & Sweatt, 2013). Esta definição revela um desafio no estabelecimento de
períodos de desenvolvimento que sejam, ao mesmo tempo, específicos e abrangentes, pois a
variação característica entre indivíduos influencia o decorrer desta interacção epigenética. A
interpretação destes períodos de desenvolvimento deve, por isso, ser feita de uma forma lata,
sempre com atenção à variabilidade própria de cada indivíduo (Miklósi, 2007). Estes períodos,
embora variem na sua duração, seguem a mesma sequência de eventos em todos os indivíduos
(Landsberg, Hunthausen, & Ackerman, 2013).
Assume-se que estes eventos ao nível do comportamento são sempre precedidos por alterações a
outros níveis, nomeadamente o neuronal (Fox, 1965), o que torna possível a associação entre as
alterações neurológicas referidas anteriormente e os diferentes períodos de desenvolvimento do
cachorro. Para além da importante fase de desenvolvimento intra-uterino, são aceites cinco
períodos de desenvolvimento comportamental pós-natal (Markwell, 1987): (1) período neonatal;
(2) período de transição; (3) período sensível (também conhecido como período de socialização);
(4) adolescência ou período juvenil e (5) fase adulta.

1.2.1 Desenvolvimento intra-uterino


Os padrões comportamentais do indivíduo começam a ser moldados durante o seu
desenvolvimento intra-uterino. Embora não existam muitos dados relativos a cães, a evidência
científica tem-se vindo a intensificar, alertando para a necessidade de assegurar um ambiente
adequado ao animal gestante, de forma a potenciar o natural desenvolvimento da sua
descendência. Estudos em humanos demonstraram que a exposição a níveis elevados de cortisol
(característicos de situações de stress da mãe) durante o desenvolvimento embrionário afecta o
futuro temperamento da criança, assim como a sua capacidade cognitiva e padrão
comportamental (Bergman, Sarkar, O’Connor, Modi, & Glover, 2007; Davis et al., 2007).
Estudos em roedores reportaram resultados semelhantes, comprovando o efeito deletério do
stress durante a gestação no temperamento e comportamento social e sexual do futuro animal
adulto (Dahlöf, Hård, & Larsson, 1977; Joffe, 1965; Kapoor & Matthews, 2005).

1.2.2 Período neonatal


O período de desenvolvimento neonatal inicia-se ao nascimento e admite-se que termine por
volta dos 13 dias (Markwell, 1987). Durante esta fase, o cachorro é quase totalmente dependente,

3
orientando-se vagamente através de um sistema locomotor imaturo e de um conjunto de reflexos
que o atraem a estímulos tácteis e térmicos, já anteriormente relatados. O cachorro deve ser
familiarizado com o contacto humano directo e gentil a partir deste período, o que resulta em
cachorros mais confiantes e curiosos, com uma maior capacidade de aprendizagem e
emocionalmente mais estáveis (Fox, 1968; Gazzano, Mariti, Notari, Sighieri, & McBride, 2008;
Selye, 1952). A falta de estimulação nesta fase pode originar cachorros com uma reactividade
aumentada, em especial relativamente a estímulos tácteis (Overall, 2013a).

1.2.3 Período de Transição


Entre os 13 e os 19 dias, o cachorro entra num período de transição (Markwell, 1987). Com o
abrir dos olhos, a melhoria da acuidade auditiva e o desenvolvimento do aparelho locomotor, o
recém-nascido deixa de estar totalmente dependente da progenitora, tornando-se gradualmente
mais autónomo. O animal começa a dominar a locomoção e inicia o controlo voluntário da
eliminação (Houpt, 2011). Começa também a interagir com outros indivíduos, iniciando assim a
construção dos padrões de comportamento social do futuro adulto (Houpt, 2011). A partir desta
fase, o cachorro começa a beneficiar do contacto com outros cães, assim como da exposição a
novos estímulos visuais e auditivos, sempre de forma controlada, positiva e por curtos períodos
de tempo (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a).

1.2.4 Período Sensível


Assume-se que, de uma forma geral, o período sensível compreende o intervalo de tempo entre as
3 e as 12 semanas (Markwell, 1987). Conhecida classicamente como “período crítico de
socialização” esta fase do desenvolvimento do cachorro é, na verdade, mais correctamente
denominada “período sensível” (Overall, 2013a). Esta autora refere que o termo “período
sensível” apresenta algumas vantagens, entre elas: (1) não implica rigidez temporal, tomando em
consideração a variação entre indivíduos – que determina que diferentes indivíduos beneficiem
de uma exposição mais precoce e outros duma exposição mais tardia; (2) não implica
exclusividade, sendo que a não exposição durante este período não implica necessariamente nem
um impedimento à aprendizagem através de uma exposição mais tardia, nem um distúrbio
comportamental futuro; (3) abrange não apenas o processo de socialização mas também o de
habituação.

4
É durante o início deste período que o cachorro começa a afastar-se da mãe e a explorar o seu
ambiente. Aproxima-se curiosamente de objectos novos e estreita relações com os seus irmãos,
bem como com as pessoas com que contacta diariamente, começando a segui-las; o contacto com
a mãe diminui gradualmente (Landsberg et al., 2013). É nesta fase que o cachorro aprende a
brincar, estabelecendo e refinando os princípios básicos de comunicação, por tentativa e erro
(Overall, 2013a). Assume-se que a aprendizagem estável se inicia por volta das 8 semanas (Fox,
1966, 1971) e é nesta altura que os comportamentos característicos de medo começam a surgir
(Scott & Fuller, 1965). O córtex cerebral já se encontra suficientemente desenvolvido para
associar estímulos específicos com a sensação de medo, e o cachorro começa a manter na
memória experiências percepcionadas como negativas, que podem influenciar as suas futuras
relações sociais (Fox & Bekoff, 1975; Fox, 1966, 1971). Este é, no entanto, um mecanismo de
aprendizagem normal que promove a adaptação do animal ao seu ambiente (Overall, 2013a).
O período sensível é, portanto, uma altura de rápido desenvolvimento de padrões de
comportamento social (Scott & Fuller, 1965), revestindo-se de uma inegável importância. À
medida que o animal se torna apto (de um ponto de vista neurológico) para responder a um dado
estímulo, passa a beneficiar da exposição ao mesmo, impedindo uma eventual predisposição ao
desenvolvimento de problemas comportamentais relacionados com o estímulo em causa (Bacon
& Stanley, 1970; Overall, 2013a; Scott, 1963; Serpell & Jagoe, 1995). Durante esta fase deve,
então, assegurar-se que o cão tem acesso, de uma forma controlada e sempre associada a algo
positivo, a todo o tipo de estímulos relevantes para a sua vida futura. A não exposição do
cachorro a estes estímulos poderá resultar num inadequado estabelecimento de comportamentos
de brincadeira, em medo de pessoas e/ou outros animais ou em medo de estímulos desconhecidos
(neofobia) (Overall, 2013). Sabendo que o medo tem um papel preponderante no comportamento
de agressividade (Ley, Coleman, Holmes, & Hemsworth, 2007), estar-se-á a apostar na
prevenção de ambos os problemas comportamentais.
É importante mencionar que certos animais já apresentam comportamentos considerados
alterados durante este período de desenvolvimento. Um estudo recente revelou que 10% dos
cachorros vistos em consultas veterinárias de rotina (entre as 8 e 16 semanas) já apresentavam
comportamentos desviantes do normal – tentativa de fuga, orelhas para trás, actividade
excessiva/diminuta, comportamento exploratório diminuído, lamber de lábios, arfar (Godbout,
Palestrini, Beauchamp, & Frank, 2007). Estes animais foram acompanhados no tempo e a maioria
destes comportamentos em cachorro mantiveram-se na idade adulta (Godbout & Frank, 2011a).

5
1.2.5 Adolescência ou período juvenil
Às 12 semanas, o cachorro já aparenta ter as capacidades cognitivas básicas totalmente
desenvolvidas (Landsberg et al., 2013) e entra na adolescência ou período juvenil. Embora alguns
autores considerem que o período juvenil termina com a maturidade sexual (Scott & Fuller,
1965), sabe-se que, em cães, a maturidade sexual ocorre mais precocemente do que o
estabelecimento de padrões comportamentais de adulto (Miklósi, 2007). Será, portanto, mais
correcto considerar a adolescência como a fase de desenvolvimento entre o fim do período
sensível e o fim da maturidade social (Miklósi, 2007; Overall, 2013a).
A maturidade social é definida como um período de mielinização progressiva mas também de
regressão sináptica2 – que resultam em alterações neuroquímicas e comportamentais (Dwyer &
Lawrence, 2005; Sowell et al., 1999) e aceita-se que ocorra entre os 12 e os 24 meses, em cães
(Houpt, 2011; Miklósi, 2007; Overall, 2013a). Embora estes números não sejam totalmente
consensuais, espera-se que os emergentes desenvolvimentos nas técnicas imagiológicas – como a
imagiologia funcional – forneçam, num futuro próximo, dados específicos sobre neuroanatomia e
neurofisiologia que contribuam para o esclarecimento desta questão. Importa também referir que
a duração da adolescência varia grandemente com a raça do animal, sendo que raças mais
pequenas atingem a maturidade mais precocemente (Miklósi, 2007).
Embora o período juvenil fosse classicamente considerado uma fase de consolidação de
comportamentos previamente aprendidos, este entendimento tem-se vindo gradualmente a alterar,
considerando-se actualmente que a adolescência constitui um novo período sensível de
aprendizagem (Sachser, Kaiser, & Hennessy, 2013). Vários estudos em roedores comprovam esta
teoria, confirmando que, durante o período juvenil, o comportamento do animal ainda se
demonstra altamente susceptível às suas experiências sociais (Burke, Renner, Forster, & Watt,
2010; Delville, David, Taravosh-Lahn, & Wommack, 2003; Delville, Melloni, & Ferris, 1998;
McCormick, Nixon, Thomas, Lowie, & Dyck, 2010; Schmidt et al., 2010; Terranova, Laviola, &
Alleva, 1993). Um estudo mais recente em cães do exército confirma a importância das
experiências e comportamentos durante o primeiro ano de vida no temperamento e padrão
comportamental do animal adulto (Foyer, Bjällerhag, Wilsson, & Jensen, 2014).

2
Tradução livre de “synaptic pruning”, termo que se refere aos processos de redução do número de neurónios e sinapses, associados à maturação
neuronal típicas da adolescência (Bear et al., 2007).
6
Esta fase não deve, por isso, ser negligenciada e o cachorro deverá continuar a ser exposto a
contextos de aprendizagens de uma forma segura e controlada, assegurando sempre o seu nível de
conforto em cada situação.

1.2.6 Idade Adulta


O atingir da idade adulta não significa o fim da aprendizagem – na verdade o animal mantém a
capacidade de aprender novos comportamentos durante toda a vida e, sobretudo, de manter
comportamentos já desenvolvidos –, pelo que o fornecimento de um ambiente estimulante
reveste-se da maior importância durante toda a sua vida (Case, 2010).
Com o avançar da idade até ao período sénior, é natural que o animal vá perdendo esta
plasticidade cognitiva, principalmente na presença de distúrbios do foro mental, como a
disfunção cognitiva canina. Embora seja difícil de determinar com exactidão o início do período
sénior em cães, sabe-se que animais de maiores dimensões têm uma esperança média de vida
mais curta, e as alterações típicas de idade geriátrica surgem mais precocemente (Bonnett,
Egenvall, Hedhammar, & Olson, 2005; Greer, Canterberry, & Murphy, 2007). Estudos recentes
confirmam também que animais que sofrem de distúrbios de ansiedade têm uma maior tendência
para o desenvolvimento de doenças concomitantes – relacionadas, entre elas, com a exposição
crónica ao cortisol – e uma esperança média de vida mais curta (Dreschel, 2010).

1.3 Teoria da Aprendizagem: Como é que o animal aprende?


Uma simples definição de ‘aprendizagem’ é a aquisição a longo prazo de determinada
informação (ou desenvolvimento de determinado comportamento) em resposta à exposição e
repetição de um estímulo (Case, 2010; Overall, 2013a).
Embora existam diferentes mecanismos de aprendizagem, os mais relevantes para este trabalho
inserem-se na aprendizagem associativa – em que o animal estabelece uma associação específica
entre um estímulo, um comportamento e um resultado (Case, 2010) .

1.3.1 Condicionamento Clássico


O condicionamento clássico ocorre quando um animal forma uma associação entre dois
estímulos, um neutro e um naturalmente desencadeador de uma determinada resposta,
previamente independentes, condicionando o primeiro (Case, 2010). O exemplo mais conhecido
é o famoso reflexo de Pavlov, em que um cão associa um estímulo neutro (som de uma

7
campainha) à presença de comida e, após sucessivas repetições, passa a salivar em resposta ao
som da campainha, mesmo na ausência de comida (Pavlov, 1927). Este condicionamento dá-se
em três passos (Figura 1): (1) o estímulo não condicionado (que produz resposta naturalmente,
sem necessidade de condicionamento – ex.: comida) é apresentado ao animal e provoca uma
determinada resposta (ex.: salivação); (2) o estímulo neutro (ex.: campainha) é repetidamente
apresentado ao animal, ao mesmo tempo que o estímulo não-condicionado; (3) com o tempo, o
estímulo neutro (campainha) torna-se condicionado e passa a originar a resposta (salivação),
mesmo na ausência do estímulo natural (comida) (Bowen & Heath, 2005).

Figura 1 – Condicionamento clássico em três passos. Adaptado de Bowen & Heath (2005)

Estímulo não
condicionado Resposta não
(ex: comida) condicionada
2 º Passo

(ex: salivação)

Resposta condicionada
Estímulo neutro/
condicionado
(ex: som de
Os cães aprendem segundo este mecanismo de condicionamento clássico em diversas situações
do quotidiano. Algumas destas associações são agradáveis: a excitação ao ver o carro do dono,
depois de condicionado à experiência positiva de reencontro; ou urinar na relva depois de ser
recompensado frequentemente por essa escolha. Outras são desagradáveis: o medo de uma mão
erguida após um castigo físico; ou a apreensão com a aproximação do hospital veterinário após
repetida exposição a situações experienciadas como adversas.
O sucesso do condicionamento clássico depende de alguns factores, entre eles: a) contiguidade –
os dois estímulos deverão ser associados rapidamente no espaço e tempo; b) continuidade – ao
estímulo neutro dever-se-á seguir incondicionalmente o estímulo não-condicionado; c) relevância
– o valor do estímulo não-condicionado para o cão influencia a atenção dedicada ao estímulo
condicionado, com estímulos mais relevantes promovendo uma velocidade de condicionamento
maior (Case, 2010).

8
1.3.2 Condicionamento Operante
Outra forma de condicionamento diz respeito à aprendizagem em resultado das consequências
que se seguem ao comportamento exibido. O condicionamento operante (ou aprendizagem
instrumental) envolve a integração de três eventos: o estímulo, a resposta (comportamento) e a
consequência. Ao contrário do que acontece no condicionamento clássico, a relação estabelecida
pelo animal não é entre estímulos mas entre a resposta e a consequência dessa resposta. O que
determina a probabilidade do animal repetir determinado comportamento em resposta a um
estímulo é o efeito percepcionado das consequências desse comportamento (Bowen & Heath,
2005; Case, 2010). Desta forma, consequências que determinam uma maior probabilidade de
repetição do comportamento no futuro são consideradas reforço, enquanto as que diminuem essa
probabilidade são consideradas punição. O reforço e a punição podem ser tanto positivos como
negativos, sendo que, neste contexto, positivo significa exibir/apresentar/adicionar a
consequência e negativo significa retirar/remover (Figura 2).

Figura 2 – Reforço vs punição; positivo vs negativo. Adaptado de Bowen & Heath (2005)

Adicionar (+) R+ P+
estímulo
Remover (-)
estímulo R- P-

Um reforço positivo consiste, portanto, em adicionar uma consequência recompensadora,


aumentando a probabilidade de repetição de determinado comportamento (ex.: oferecer um
biscoito quando o cão se aproxima do dono durante um passeio); um reforço negativo envolve
retirar algo percepcionado como aversivo, de forma a aumentar a probabilidade de repetição do
comportamento (ex.: aliviar a tensão na trela quando o cão se aproxima do dono); punição
positiva consiste em adicionar uma consequência aversiva de forma a diminuir a probabilidade de
repetição (ex.: puxar a trela quando o cão se afasta do dono); punição negativa implica a remoção
de uma consequência recompensadora com o objectivo de diminuir a probabilidade de repetição
do comportamento que lhe deu origem (ex.: parar de andar quando o cachorro se afasta do dono).
Pode ainda argumentar-se que estes mecanismos não ocorrem em separado, servindo a divisão
antes mencionada mais um propósito teórico do que uma explicação absoluta. Um mecanismo de

9
punição positiva, por exemplo, ao cessar gera um mecanismo consequente de reforço negativo
(ex.: o cachorro que aprende que afastar-se do dono resulta num aumento da tensão na trela
também aprende que parar de se afastar origina um alívio dessa tensão). Reforço negativo e
punição positiva por um lado, e reforço positivo e punição negativa por outro, estão intimamente
relacionados – todo o reforço envolve, de certa forma, punição e vice-versa (Bowen & Heath,
2005; Case, 2010). É, por isso, da maior relevância compreender que o processo de aprendizagem
ocorre de uma forma constante e cumulativa, e o cão estabelece mecanismos de condicionamento
operante como resultado de todas as experiências na sua vida – o que significa que o dono deve
ter consciência das oportunidades que lhe dá para praticar cada comportamento e das eventuais
recompensas/punições que lhe oferece, mesmo as menos óbvias.

1.3.3 Influência social e aprendizagem


Os cães são animais sociais e, como tal, estabelecem interacções complexas com os restantes
membros dos seus grupos, modificando o seu comportamento em função do dos outros, num
processo apelidado de aprendizagem social (Miklósi, 2007). Embora não esteja totalmente
compreendido o mecanismo cognitivo envolvido nesta forma de aprendizagem, a maioria dos
investigadores concorda que ela é vantajosa relativamente à individual (Laland, 2004). Segundo
Case (2010), podem discernir-se quatro tipos de aprendizagem social:
1) Comportamento alelomimético: reflecte a tendência para animais do mesmo grupo
realizarem os mesmos comportamentos em conjunto (ex.: cachorros da mesma ninhada que se
alimentam, brincam e dormem ao mesmo tempo);
2) Facilitação social: ao contrário do comportamento alelomimético, em que indivíduos
com as mesmas motivações se juntam em comportamentos semelhantes, a facilitação social
envolve a alteração na motivação (e, consequentemente, no comportamento) do indivíduo,
quando inserido num determinado meio social. Um exemplo deste tipo de aprendizagem é
demonstrado por um cão que desenvolve uma preferência por um determinado alimento, depois
de o detectar através do hálito de um conspecífico (Lupfer-Johnson & Ross, 2007);
3) ‘Valorização local’ 3: tendência de um indivíduo em reagir da mesma forma que outros
no seu grupo a estímulos ambientais (ex.: cães que desenvolvem o hábito de rebolar sobre fezes
depois de experimentarem esse comportamento conjuntamente com outro membro do grupo);

3
Tradução livre do inglês de “local enhancement”.
10
4) Aprendizagem por observação: o animal aprende determinado comportamento ao
observar outro membro do grupo a executá-lo (ex.: cachorros filhos de cadelas de polícia que
aprendem a detectar narcóticos por observação da mãe em trabalho (Slabbert & Rasa, 1997)). O
mecanismo cognitivo de base deste tipo de aprendizagem é complexo, e o seu estudo tem
revelado conclusões bastante interessantes, entre elas a de que os cães têm a capacidade de
aprender determinados comportamentos por imitação de demonstradores humanos (Kubinyi,
Topál, Miklósi, & Csányi, 2003; Pongrácz et al., 2001; Pongrácz, Miklósi, Timár-Geng, &
Csányi, 2004; Topál, Byrne, Miklósi, & Csányi, 2006).

1.3.4 Habituação e Sensibilização


Habituação é a diminuição da resposta a um determinado estímulo, resultado duma exposição
contínua e prolongada ao mesmo (Overall, 2013a). É através do mecanismo de habituação que
um cachorro saudável integra os diversos estímulos não-ameaçadores do meio externo como
normais, desde que do seu contacto não resultem consequências relevantes (nem positivas, nem
negativas) (Landsberg et al., 2013). No entanto, se o estímulo desencadear no animal uma
resposta de ansiedade ou medo, a exposição prolongada ao mesmo impossibilita a habituação
(Overall, 2013a), dando lugar à sensibilização – aumento da reactividade a esse estímulo (Case,
2010). Por essa razão, a habituação só é recomendada como parte da terapêutica comportamental
em caso de estímulos não geradores de medo/ansiedade; se houver um estímulo gerador de medo,
poderá recorrer-se a um outro método denominado dessensibilização (Overall, 2013a), que será
abordado mais à frente (3.2).
A variabilidade na susceptibilidade à sensibilização poderá ser explicada, segundo Landsberg et
al. (2013) por três factores: (1) a intensidade do estímulo; (2) a genética do indivíduo; (3) o nível
de excitação do animal na altura da exposição ao estímulo.

11
CAPÍTULO 2: Medo, Fobias e Distúrbios Associados
Serão posteriormente apresentados algumas definições e conceitos considerados essenciais para a
compreensão dos distúrbios comportamentais relacionados com o medo. Embora a terminologia
não reúna o total consenso entre os profissionais da Medicina do Comportamento, seja pela falta
de um entendimento mais profundo da Ciência sobre alguns mecanismos fisiológicos
subjacentes, seja pelas diferenças de abordagem características das diferentes Escolas da
especialidade, foram escolhidos os termos considerados mais adequados de acordo com a presente
dissertação.

2.1 O medo
Medo pode ser definido como um estado mental e emocional desencadeado pela percepção de
uma ameaça ou estímulo aversivo e é uma resposta biologicamente adaptativa que desencadeia
mecanismos fisiológicos e comportamentais promotores da sobrevivência do indivíduo (Boissy,
1995; Duncan, 1993; Landsberg et al., 2013; Ohman & Mineka, 2001). O medo pode ser o
resultado de uma aprendizagem (ex.: um cavalo que aprende a manter-se afastado duma cerca
eléctrica depois de um único contacto aversivo) mas também pode ser inato (ex.: uma pessoa não
precisa de cair de um precipício para ter medo de alturas) (Bear, Connors, & Paradiso, 2007).
Embora este mecanismo desempenhe um papel essencial na adaptação evolutiva das espécies,
nem todos os medos são necessariamente adaptativos, nem tão pouco apropriados (Bear et al.,
2007). Se os medos ditos normais (e adaptativos) se expressam de forma proporcional ao nível de
ameaça real de determinado estímulo (i.e. ao aumento da intensidade/proximidade do estímulo
corresponde um aumento da resposta de medo), medos patológicos (mal-adaptativos) induzem
uma resposta desproporcional e descontextualizada (Overall, 2013a).
Estas manifestações comportamentais, sendo mal-adaptativas, são desproporcionais ao nível de
ameaça real, e não só não contribuem para a resolução do problema que as despoleta, como
interferem com o funcionamento normal do indivíduo (Landsberg et al., 2013). A exposição
sucessiva ao estímulo desencadeador não promove habituação, podendo mesmo potenciar o
agravamento da resposta de medo – sensibilização (Landsberg et al., 2013).

2.2 A ansiedade
O termo ansiedade descreve o estado emocional de apreensão relacionado com a antecipação de
uma experiência de perigo (Blackwell, Bradshaw, & Casey, 2013; Landsberg et al., 2013;

12
Overall, 2013a). O estado de ansiedade pode ser desencadeado por elementos específicos no
ambiente que antecipem uma experiência percepcionada como aversiva (Blackwell et al., 2013),
mas também se pode manifestar na ausência de qualquer estímulo observável – neste caso
qualificada como ansiedade generalizada (Landsberg et al., 2013). Também a ansiedade pode
desempenhar um papel benéfico para o indivíduo numa situação de perigo eminente, incitando-o
a tomar as medidas necessárias para evitar a eventual ameaça antes que o perigo se intensifique.
Das definições acima apresentadas decorre que a ansiedade é um estado de apreensão
relacionado com a antecipação de medo. No entanto, ansiedade e medo são altamente subjectivos
e difíceis de diferenciar, particularmente em animais (Sherman & Mills, 2008): por um lado,
porque muitas vezes ocorrem ao mesmo tempo ou de forma sucessiva (Rachman, 2004); por
outro devido à óbvia impossibilidade de avaliar os seus efeitos de uma forma directa (i.e. através
do auto-relato). Uma distinção prática é por isso difícil e está dependente da cuidada observação
das diferentes respostas comportamentais e fisiológicas (Paul, Harding, & Mendl, 2005).
Landsberg et al (2013) argumentam, por outro lado, que a presença de um estímulo identificável
desencadeador de uma resposta de medo poderá permitir a distinção com um estado inespecífico
de ansiedade.

2.3. Mecanismos neurofisiológicos do medo/ansiedade


Para melhor entender as manifestações comportamentais características dos estados de
medo/ansiedade, torna-se importante compreender os mecanismos neurofisiológicos que as
regulam (Landsberg et al., 2013).

2.3.1 A resposta ao stress: o papel do hipotálamo


O cérebro é o principal mediador da resposta ao stress4, responsável por: (a) filtrar a informação
do ambiente e identificar potenciais estímulos ameaçadores da homeostasia do indivíduo; (b)
regular todas as respostas (comportamentais, cognitivas, emocionais e fisiológicas) que permitem
ao indivíduo integrar e ultrapassar o estímulo de stress; (c) proceder a alterações – tanto
adaptativas como mal-adaptativas – da sua própria estrutura (neuroplasticidade) como resultado
das experiências stressantes (McEwen & Gianaros, 2011).

4
O debate é extenso relativamente ao termo “stress”, ao seu significado, às limitações decorrentes da sua utilização no âmbito da manutenção do
equilíbrio orgânico e às potenciais definições que possam substituir este conceito da melhor forma (McEwen & Wingfield, 2010; Romero,
Dickens, & Cyr, 2009). Esta análise está, no entanto, fora do âmbito desta dissertação, na qual o termo stress será usado como sinónimo de evento
ou experiência que ameaça a capacidade do indivíduo de se adaptar e manter o equilíbrio orgânico (Popoli et al., 2011).
13
O hipotálamo integra as diferentes respostas somáticas e viscerais às necessidades do cérebro
(Bear et al., 2007). A exposição a um estímulo de ameaça origina que o hipotálamo inicie e
regule um conjunto conhecido de reacções definidas como resposta de stress, caracterizada por:
(1) comportamento de aproximação/evitação5; (2) activação do sistema nervoso simpático; (3)
aumento da vigilância e da excitação6; (4) libertação de cortisol pelas glândulas adrenais (Bear et
al., 2007).
O comportamento de aproximação/evitação consiste num conflito interno entre a vontade de
investigar e a apreensão com a aproximação da potencial ameaça (Bowen & Heath, 2005). O
animal tende a diminuir a distância relativamente à ameaça, até atingir uma determinada
proximidade limite. A distâncias mais curtas do que este ponto crítico, tem tendência a afastar-se
(Bowen & Heath, 2005). Em animais saudáveis (ao contrário do que acontece aquando dos
distúrbios comportamentais), e se o estímulo de stress se demonstrar inofensivo e inalterado, o
grau de ansiedade diminui ao longo do tempo, assim como a distância a este ponto crítico, e o cão
acaba por ignorar o estímulo inicial – i.e. dá-se habituação (Bowen & Heath, 2005).
A activação do sistema nervoso simpático provoca a libertação de noradrenalina e adrenalina
pelas células medulares da adrenal (Cunningham & Klein, 2007). Estas hormonas promovem, por
um lado as respostas comportamentais de “fight-or-flight” e, por outro, as respostas fisiológicas
que as suportam, entre elas: aumento da frequência cardíaca, pressão sanguínea e frequência
respiratória; aumento da lipólise e da gluconeogénese (Landsberg et al., 2013).
O estado de vigilância/excitação é, na verdade, modulado por uma miríade de estruturas e
mecanismos que culminam numa despolarização e aumento da excitabilidade neuronal (Bear et
al., 2007). Para além da importante função da noradrenalina resultante da já referida activação do
sistema nervoso autónomo, são os chamados sistemas modulatórios difusos7 que desempenham o
papel mais determinante na regulação do estado de vigilância, entre eles: os neurónios do locus
coeruleus (por acção da noradrenalina); dos nuclei raphe (serotonina); do tronco cerebral e do
prosencéfalo basal (responsivos a acetilcolina); e do mesencéfalo (utilizadores de histamina)
(Bear et al., 2007).

5
O termo “evitação”, embora relativamente incomum, está descrito na língua portuguesa como “acto de evitar; escusa” (Dicionário da Língua
Portuguesa [em linha], 2015)
6
O termo original – “arousal” – não tem tradução directa em português, sendo “excitação” a aproximação mais correcta. Refere-se à estimulação
e activação do sistema nervoso, no sentido lato, induzindo um estado de responsividade/prontidão de acção (Association of Animal Behavior
Professionals, 1999).
7
Os sistemas modulatórios difusos consistem em 4 complexos diferentes de neurónios, com origem no cérebro e ligações dispersas e difusas,
cada um utilizando um neurotransmissor diferenciado. As funções exactas destes conjuntos de neurónios não são ainda totalmente conhecidas,
mas sabe-se que, entre outras, estão envolvidos na regulação da excitação/activação de outros neurónios, através da libertação de
neurotransmissores no fluido extracelular – em contraste com a convencional libertação em fenda sináptica (Bear et al., 2007). Uma discussão
mais aprofundada sobre os diferentes sistemas não se inclui no âmbito da presente dissertação.
14
O aumento dos níveis de glucose disponível é também favorecido pelo eixo HPA, através do
mecanismo ilustrado na Figura 3, que origina a libertação de cortisol pela zona cortical da
glândula adrenal (Bear et al., 2007; Cunningham & Klein, 2007). O cortisol promove, a par da
adrenalina, um efeito gluconeogénico e lipolítico que faz aumentar a concentração sanguínea de
glucose (Cunningham & Klein, 2007). Esta glucose é utilizável pelos músculos, mas também tem
um efeito ao nível do sistema nervoso central, nomeadamente na promoção da excitação (Bowen
& Heath, 2005).

Figura 3 – Resposta autonómica ao stress (eixo HPA). Adaptado de Bear et al. (2007)

Hipotálamo

Hipófise
anterior

Adrenal

Alterações
fisiológicas
de fight-or-
flight
Rim

Em resposta ao stress, os neurónios do núcleo paraventricular do hipotálamo secretam, para a circulação hipotálamo-
hipófisária, a hormona libertadora da corticotrofina (CRH) que, por sua vez, induz a libertação de corticotrofina (ACTH)
pela hipófise anterior. A ACTH é transportada pela corrente sanguínea até à glândula adrenal, onde estimula a libertação de
cortisol, molécula responsável pela resposta fisiológica ao stress por todo o organismo, incluindo, de novo, o hipotálamo.

2.3.2 Circuito neuronal do medo aprendido: o papel da amígdala e do hipocampo


Embora o hipotálamo seja responsável pela cascata de eventos descritos anteriormente, os
neurónios hipotalâmicos secretores de CRH encontram-se sob o controlo de duas outras
estruturas de enorme relevância, que moderam e modelam o processo de aprendizagem e resposta
ao medo aprendido: a amígdala e o hipocampo (Bear et al., 2007).

15
A amígdala é um complexo de núcleos situados no polo do lobo temporal, ventralmente ao córtex
cerebral, no plano medial. Estes núcleos podem ser divididos em grupos: basolateral,
corticomedial e central. O hipocampo é uma zona do córtex cerebral também situada no lobo
temporal e constituída por duas camadas de neurónios dobradas sobre si mesmas: gyrus dentatus
e corno de Ammon (Bear et al., 2007).

Figura 4 – Localização da amígdala e do hipocampo, profundamente no córtex – vista medial


ligeiramente rodada do cérebro. Adaptado de Bear et al. (2007)

A amígdala é a principal região envolvida no processamento cerebral do medo, coordenando a


resposta automática à ameaça e integrando a informação proveniente dos órgãos sensitivos (e
zonas correspondentes do córtex), do ambiente e da experiência prévia, através de circuitos
corticais e subcorticais (Breiter et al., 1996; Mathew, Price, & Charney, 2008). Recebe
informação das mais variadas estruturas (ex.: neocórtex de todos os lobos cerebrais, hipocampo, e
girus cingulatus) em direcção ao núcleo basolateral, onde processa essa informação.
Posteriormente envia-a ao núcleo central que medeia a comunicação com o hipotálamo (que
causa a resposta autonómica); o tronco cerebral (que inicia a resposta comportamental) e o córtex
cerebral (que resulta na experiência da emoção) (Bear et al., 2007; LeDoux, 2003). A figura 5
exemplifica este circuito neuronal para o caso de um estímulo auditivo.
O hipocampo está relacionado com diferentes tipos de memória, como a declarativa – que nos
permite relembrar factos e experiências do dia-a-dia – ou a espacial/contextual – relacionada com
contextos muito específicos (Bear et al., 2007; Popoli, Yan, McEwen, & Sanacora, 2011). A
vasta evidência científica indica que o hipocampo combina dados temporais e espaciais (entre
outros) relativos às vivências do animal e forma autênticos mapas mentais – memórias episódicas
profundas e completas – que contribuem sobremaneira para o processo de aprendizagem do

16
medo, através dos mecanismos de condicionamento, entre outros (Bear et al., 2007; Eichenbaum
& Cohen, 2014; LeDoux, 2000).

Figura 5 – Circuito neuronal proposto para o medo aprendido. Adaptado de Bear et al. (2007)

2.3.3 Mecanismos de regulação do eixo HPA pela amígdala e hipocampo


O eixo HPA é, portanto, regulado, por um lado pela amígdala, e por outro pelo hipocampo,
através de mecanismos contrários de estimulação-inibição (Bear et al., 2007).
A activação da amígdala promove uma estimulação do HPA e o consequente desenvolvimento de
todas as respostas associadas. O hipocampo, por sua vez, contém receptores de glucocorticóides
que respondem a elevações na sua concentração, resultado da libertação adrenal. Quando os
níveis de cortisol atingem concentrações elevadas, o hipocampo liberta o neurotransmissor
glutamato, inibindo o eixo HPA e a libertação de CRH (e, naturalmente, de ACTH e cortisol)
num importante mecanismo de feedback negativo (Bear et al., 2007; Popoli et al., 2011).

2.3.4 Alterações neuronais no cão ansioso: efeitos da exposição crónica ao stress


A exposição crónica ao stress, associada ao aumento dos níveis de cortisol, catecolaminas e
citoquinas pró-inflamatórias e ao declínio da actividade parassimpática, provoca alterações
estruturais nas diferentes estruturas cerebrais (McEwen, 2006).
Ao nível do hipocampo, provoca atrofia neuronal (por morte celular e retracção e simplificação
das dendrites), com diminuição da excitabilidade, supressão da neurogénese e diminuição da
capacidade de libertação de glutamato – afectando o mecanismo de regulação do eixo HPA (Bear

17
et al., 2007; McEwen, 2006; Popoli et al., 2011). Também o córtex pré-frontal sofre um processo
de simplificação dendrítica (McEwen, 2006).
Por outro lado, o stress crónico (assim como o agudo) promove hipertrofia neuronal na amígdala,
facilitando a expressão e aprendizagem de comportamentos de medo, ansiedade e, possivelmente,
agressividade (McEwen, 2006).
Distúrbios relacionados com o medo/ansiedade são, por isso, caracterizados tanto por um
aumento na actividade da amígdala como por uma diminuição da do hipocampo (Bear et al.,
2007).

2.4 Resposta comportamental ao stress/medo: compreender os sinais


As manifestações comportamentais de um cão são complexas e a sua observação não cuidada
pode originar erros de interpretação com consequências graves, tanto para o animal como para os
que o rodeiam (Landsberg et al., 2013), pelo que uma boa compreensão das mesmas é da maior
importância na abordagem aos distúrbios comportamentais.
O comportamento de medo é caracteristicamente direccional, no sentido em que, pelo menos ao
início, a resposta é orientada na direcção do estímulo (Bowen & Heath, 2005). Um cão exposto a
um contexto que lhe cause ansiedade ou medo pode exibir um conjunto de respostas
comportamentais passíveis de agrupar em 4 mecanismos principais8 (Bowen & Heath, 2005):
1. “Congelar” – o animal torna-se imóvel, eventualmente fixando-se no estímulo que lhe
causa apreensão;
2. Fugir – este é um comportamento típico que tem como objectivo aumentar a distância
entre a ameaça e o indivíduo, através da movimentação activa no sentido contrário ao da
ameaça. A intenção de evitar, o quanto possível, o confronto com o estímulo de stress é
considerada uma característica típica do comportamento de medo (Case, 2010);
3. Lutar – a exibição de uma resposta agonística que visa também aumentar a distância entre
a ameaça e o indivíduo, dando o animal uma clara indicação do seu desconforto com a
exposição ao estímulo. A exibição de agressividade como resposta ao medo pode ter
origem na impossibilidade de fuga (ex.: por contenção do animal ou exposição forçada)
(Case, 2010), ou em características intrínsecas ao indivíduo (ex.: predisposição genética,
aprendizagem prévia, etc.) (Bowen & Heath, 2005);

8
Por vezes apelidados em inglês de 4 Fs – “Freeze; Flight; Fight & Fiddle about”.
18
9
4. Actividade deslocada – conjunto de comportamentos normais da espécie, mas
executados fora do contexto (ex.: arfar sem evidência de calor ou esforço físico, salivar e
lamber os lábios sem a presença de alimento, caminhar10 incessantemente sem objectivo
claro, piscar os olhos sem cansaço aparente, espreguiçar-se ou bocejar sem ter acabado de
acordar, abanar o pêlo sem necessidade, focar um ponto com o olhar sem nenhum
estímulo observável, gemer ou ganir sem nenhum estímulo detectável, entre muitos
outros). Pensa-se que, da mesma forma que uma pessoa rói as unhas ao ver um jogo da
sua equipa de futebol ou esfrega a cabeça enquanto avalia uma decisão difícil, os animais
exibam os comportamentos anteriores – aparentemente sem qualquer finalidade – como
expressão de um conflito interno, resultante da ansiedade provocada pela exposição ao
estímulo em causa, e com o objectivo de a ultrapassar (Bowen & Heath, 2005).
A linguagem corporal de um cão com medo ou ansiedade é, geralmente, muito típica,
evidenciando uma ou mais das seguintes características: hipervigilância; corpo a tremer; corpo
encolhido ou ao nível do solo; zona dorsal encurvada; cabeça baixa e pescoço flectido
ventralmente; orelhas recolhidas caudalmente e encostadas ao crânio; evitação de contacto visual;
tentativa de se esconder; pupilas dilatadas; tensão nos lábios e na face; cauda tensa, recolhida
entre os membros traseiros, eventualmente em contacto com o corpo ventralmente;
comportamento de eliminação (i.e. micção, defecação ou secreção do líquido dos sacos anais) ou
motilidade intestinal audível; excessiva vocalização (principalmente no caso de cachorros e raças
pequenas) (Bowen & Heath, 2005; Dreschel & Granger, 2005; Godbout et al., 2007; Landsberg
et al., 2013; Overall, 2013a).

2.5 Factores determinantes da expressão de distúrbios comportamentais


Tal como referido anteriormente, o comportamento pode ser visto como o resultado da interacção
entre três factores principais: o acumular de um processo contínuo de aprendizagem; o
ambiente/contexto em que o animal se insere; e a variação individual (atribuída à genética) que
dita a sua sensibilidade a determinados estímulos e a consequente predisposição para o
desenvolvimento de determinada resposta comportamental (Duffy et al., 2008; Sachser et al.,
2013; Zovkic et al., 2013).

9
Tradução livre do inglês “displacement behaviour”, uma definição alternativa para “fiddle behaviour”.
10
Tradução livre de “pacing” – marcha constante, pelo mesmo percurso (Dreschel & Granger, 2005)
19
2.5.1 A aprendizagem: importância da experiência passada
Como foi abordado anteriormente, a aprendizagem é um processo contínuo de integração de
informação em resposta à exposição a diferentes estímulos e experiências (Overall, 2013a).
Iniciando-se nos primeiros momentos da vida do cachorro, este processo gradual permite-lhe
estabelecer os seus padrões comportamentais futuros, em resposta às experiências do passado,
sendo que a exposição ao mesmo estímulo em fases de desenvolvimento distintas tem o potencial
de originar aprendizagens diferentes (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a; Serpell & Jagoe,
1995). Por um lado, é verdade que a exposição do animal aos diferentes estímulos pode
desempenhar um efeito protector contra o desenvolvimento de distúrbios comportamentais, pois
o indivíduo aprende a relacionar os estímulos com resultados consistentemente neutros (ou
positivos). Por outro lado, os processos de condicionamento associados ao medo também
explicam a importância da aprendizagem no estabelecimento de respostas comportamentais
patológicas (Case, 2010; Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a). Esta aprendizagem promove a
já abordada modelação dos circuitos neuronais do indivíduo, alterando de forma profunda o seu
estado psico-emocional, a consequente expressão comportamental e a sua sensibilidade à
exposição ao stress.

2.5.2 O ambiente: importância do contexto


O ambiente ou contexto é aqui referido como o conjunto de variáveis extrínsecas ao animal, que
influenciam a sua realidade e, naturalmente, o comportamento (Hsu & Sun, 2010).
É fácil perceber que o ambiente e a aprendizagem estão inevitavelmente associados, pois o
sentido da aprendizagem depende das características do ambiente em cada momento e a
aprendizagem subjectiva prévia altera a percepção do ambiente pelo indivíduo (Overall, 2013a).
No entanto, para efeitos práticos, será aqui referido como um factor em separado.
Alguns exemplos de variáveis classificadas como ambientais são: características do dono (idade;
sexo; experiência prévia; personalidade); condições de vida (composição do agregado; zona de
residência; tipo de alojamento; área disponível; presença de outros animais no mesmo espaço);
interacção com os donos (tipo, frequência e duração); idade de separação da mãe/ de adopção;
frequência/método de treino (Hsu & Sun, 2010).
Os estudos sobre os efeitos destas variáveis ambientais no comportamento têm vindo a acumular-
se nas últimas décadas. Os resultados têm-se demonstrado, no entanto, inconsistentes, com
diferentes estudos a reportar tendências opostas relativamente à mesma variável. Um exemplo é a

20
influência da idade, sexo e experiência prévia dos donos – enquanto alguns estudos encontraram
uma correlação positiva com o desenvolvimento de problemas comportamentais (ex.: Jagoe &
Serpell, 1996), outros não encontraram qualquer correlação (ex.: Bennett & Rohlf, 2007; Hsu &
Sun, 2010).
Apesar da existência de resultados controversos relativos a quais as variáveis mais determinantes
e ao mecanismo exacto pelo qual o ambiente – no sentido lato – afecta o comportamento do
indivíduo, sabe-se que essa relação é real, com efeitos observáveis e mensuráveis (Bennett &
Rohlf, 2007; Dahlöf et al., 1977; Foyer, Wilsson, Wright, & Jensen, 2013; Kapoor & Matthews,
2005; Kubinyi, Turcsán, & Miklósi, 2009; Temesi et al., 2014; Van Der Waaij et al., 2008). A
uniformização de métodos e abordagens experimentais (desde os critérios de selecção nos
estudos, à colheita de informação e ao tratamento estatístico) é uma exigência emergente e
poderá, num futuro próximo, contribuir para uma mais completa compreensão deste fenómeno
(Diederich & Giffroy, 2006; Temesi et al., 2014).
O contexto social em que cada interacção ocorre também tem a capacidade de moldar a expressão
comportamental do indivíduo, através de diversos mecanismos previamente abordados no
capítulo 1.3.3.

2.5.3 A genética: importância da variação individual


A informação genética de cada indivíduo desempenha um papel crucial na forma como este se
relaciona com o seu meio, vivencia as suas experiências e integra aprendizagens (Casey, Loftus,
Bolster, Richards, & Blackwell, 2013; Dias & Ressler, 2013; Temesi et al., 2014)
Daí decorre que diferentes animais, criados no mesmo ambiente e sujeitos às mesmas vivências,
podem desenvolver um conjunto de comportamentos completamente distintos, em resultado do
seu processo – altamente subjectivo – de aprendizagem, modelado pela sua composição genética
única.
Por outro lado, a genética de um indivíduo é altamente influenciada pela contribuição dos genes
dos seus ascendentes familiares. Goddard & Beilharz (1985) encontraram evidências de uma
potencial heritabilidade elevada associada ao comportamento de medo, enquanto Van Der Waaij
et al. (2008) verificaram uma alta heritabilidade para sonofobia (fobia a determinados sons). Uma
outra equipa de investigadores descobriu que o condicionamento de um estímulo olfactivo
específico com uma experiência traumática em ratos adultos antes da concepção originou um
aumento da sensibilidade a esse estímulo nos descendentes das duas gerações seguintes (Dias &

21
Ressler, 2013). Este estudo não só comprova o efeito efectivo das experiências individuais do
animal no seu próprio material genético, como evidencia a transmissão dessa informação à
descendência e a sua importância no desenvolvimento dos seus padrões comportamentais.
Também Duffy et al. (2008) propõem o componente genético como responsável parcial pelas
diferenças na agressividade entre diferentes linhas reprodutoras de cães da mesma raça.
Importa, portanto, perceber a importância da variação individual na abordagem aos problemas
comportamentais, compreendendo cada animal como um ser único, com necessidades
particulares e susceptibilidades intrínsecas que, não sendo factor único no complexo puzzle da
formação dos padrões comportamentais, podem ser determinantes para o desenvolvimento de
comportamentos patológicos (Overall, Tiira, Broach, & Bryant, 2014).

2.6 Distúrbios comportamentais associados ao medo


Vários distúrbios comportamentais terão por base uma resposta de medo, embora a sua
classificação varie substancialmente entre autores (ex.: Beaver, 2009; Bowen & Heath, 2005;
Landsberg et al., 2013; Overall, 2013; Temesi et al., 2014). As principais divergências prendem-
se com a ansiedade por separação e a agressividade. Para os efeitos desta dissertação, foi
adoptada a seguinte classificação de distúrbios comportamentais associados ao medo: medo de
pessoas (familiares e desconhecidas); medo de animais (familiares ou desconhecidos); fobias;
ansiedade por separação; agressividade por medo.

2.6.1 Medo de pessoas


O medo de pessoas pode evidenciar-se de diferentes formas. Alguns animais temem pessoas
particulares; outros têm um medo selectivo de acordo com determinadas características da pessoa
em questão (ex.: idade; género; aspecto; etc.); outros apresentam um medo generalizado de
pessoas desconhecidas; outros ainda sentem medo de qualquer ser humano, independentemente
da frequência e duração com que contactam com este (Bowen & Heath, 2005; Landsberg et al.,
2013).

2.6.2 Medo de animais


O mesmo se pode dizer sobre o medo de animais: a expressão deste distúrbio estende-se desde
medo de um determinado indivíduo (ex.: o cão do vizinho), a medo de animais com determinadas
características (ex.: todos os cães de grande porte, ou todos os gatos de pêlo branco, ou todas as

22
aves), ou mesmo à generalização do medo em relação a todos os animais, independentemente da
espécie, características ou familiaridade (Bowen & Heath, 2005).
2.6.3 Fobias
As fobias são respostas comportamentais mal-adaptativas, súbitas, extremas, profundas e com
efeitos de longa duração (Blackwell et al., 2013; Overall, 2013a). São uma expressão de medo
completamente desproporcional ao nível de ameaça real, com os animais a poderem demonstrar
os seguintes comportamentos: tremer, salivar, vocalizar, solicitar atenção humana, esconder-se,
arfar, mover-se incessantemente, eliminar inapropriadamente, fugir, destruir, e perder o apetite
(Blackwell et al., 2013; Dale, Walker, Farnworth, Morrissey, & Waran, 2010; Dreschel &
Granger, 2005).
Podem desenvolver-se fobias relativamente a qualquer tipo de estímulo, mas a relativa a
estímulos sonoros – sonofobia – é claramente a mais prevalente, predominantemente relacionada
com tiros, foguetes, fogo-de-artifício, ou trovoada/tempestades (Blackwell et al., 2013; Bowen &
Heath, 2005).
A sonofobia é um problema muito comum em cães: dados recentes indicam que cerca de 25%
dos donos reportaram que o seu animal de estimação sofre deste distúrbio (em resposta a
questionário escrito); esta percentagem duplicou (49%) quando os donos foram submetidos a
uma entrevista em pessoa (Blackwell et al., 2013). Este estudo também demonstra que os animais
com sonofobia tendem a reagir a mais do que um som específico, demonstrando a grande
prevalência do fenómeno de generalização entre sons (Blackwell et al., 2013).
A hipótese de existência de uma correlação entre sonofobia e propensão para exibir ansiedade por
separação tem sido confirmada por alguns estudos (Overall, Dunham, & Frank, 2001; Storengen
et al., 2014), e refutada por outros (ex.: Blackwell et al., 2013).
Outro tipo de fobia que vale a pena salientar, principalmente pela sua gravidade, é a neofobia –
resposta fóbica consistente e generalizada a qualquer tipo de estímulo desconhecido (Overall,
2013a). A autora teoriza que o risco de desenvolvimento deste tipo de resposta fóbica altamente
debilitante é mais elevado em animais criados em regimes intensivos, nas chamadas quintas de
cachorros11, pela inexistência de cuidado em providenciar um processo de habituação normal
durante a fase sensível de aprendizagem do jovem animal.

11
Tradução livre do inglês “puppy farms” – instalações de criação intensiva de cães, normalmente com sobrepopulação e défices de todo o tipo de
cuidados (higio-sanitários, sociais, comportamentais, etc.) (Overall, 2013a)
23
2.6.4 Ansiedade por separação
Ansiedade por separação pode ser definida como um distúrbio comportamental em que os cães
demonstram um conjunto de respostas típicas de ansiedade quando deixados sozinhos, ou
separados de uma pessoa (ou pessoas) com a qual tenham um forte laço afectivo (Overall et al.,
2001; Sherman & Mills, 2008). Esta terminologia não reúne, no entanto, consenso, sendo este
síndrome também referido, por exemplo, como stress por separação ou distúrbios relacionados
com a separação12(King et al., 2000; Landsberg et al., 2008).
Ao antecipar o evento da separação (ex.: quando os donos se preparam para sair de casa), os cães
que sofrem deste distúrbio demonstram comportamentos típicos de ansiedade, movimentando-se
excessivamente, vocalizando e tremendo (Butler, Sargisson, & Elliffe, 2011). Uma vez sozinhos,
evidenciam mais frequentes: vocalização, comportamentos destrutivos – direccionados às saídas,
numa tentativa de evasão (McCrave, 1991) – e eliminação inadequada (Horwitz & Mills, 2009;
Overall et al., 2001; Palestrini, Minero, Cannas, Rossi, & Frank, 2010; Sherman & Mills, 2008),
embora também possam demonstrar qualquer outro sinal não-específico de ansiedade (Storengen
et al., 2014). Estes animais não demonstram, por hábito, estes comportamentos no seu dia-a-dia
quando na companhia dos donos (McCrave, 1991).
Entende-se que o desenvolvimento de ansiedade por separação é um processo multifactorial. No
entanto, não existe um entendimento suficiente dos seus mecanismos de base para concordar
sobre quais os factores mais determinantes. Horwitz & Mills (2009) propõem como motivadores
deste comportamento os seguintes factores: medo (de estarem sozinhos ou sem determinada
pessoa); ansiedade (que é superada pela presença dos donos e agravada pela ausência destes
(Bradshaw, McPherson, Casey, & Larter, 2002)); ambiente pouco estimulante (durante o tempo
que estão sozinhos); ou híper-apego 13. Enquanto alguns autores encontram dados que suportam a
híper-apego como factor determinante (Flannigan & Dodman, 2001; Takeuchi, Houpt, & Scarlett,
2000), outros testemunham o contrário (McGreevy & Masters, 2008). Outros ainda sugerem que
o desenvolvimento de ansiedade por separação não depende de um excesso de vinculação entre
dono e animal, e que a diferença entre animais que desenvolvem esse distúrbio e os que não o
desenvolvem se prende com o tipo de vínculo estabelecido com os seus donos – não é uma
questão de excesso de vinculação mas sim de variação nas características dessa relação
(Parthasarathy & Crowell-Davis, 2006). A discrepância de opiniões (e de resultados) indica-nos

12
Tradução livre do inglês “separation distress” e “separation-related problems”
13
Tradução livre do inglês “hyper-attachment” – cães com esta característica seguem constantemente os donos e tendem a sofrer quando
separados destes (Appleby & Pluijmakers, 2004)
24
que diferentes estados emocionais/motivacionais/neurológicos possam estar na base do
desenvolvimento de ansiedade por separação – o que sugere que diferentes síndromes possam
estar a ser agrupados na mesma categoria erroneamente (Palestrini et al., 2010). Estes dados são
suportados por Temesi et al. (2014). O aprofundamento do estudo sobre este tema e o
esclarecimento dos mecanismos neurofisiológicos poderão vir a ajudar a melhor entender este
problema, ajustando a terapêutica e melhorando a taxa de sucesso (Palestrini et al., 2010).

2.6.5 Agressividade por medo


A agressividade é um comportamento normal em canídeos e pode funcionar ou como forma de
acesso a determinado recurso num meio competitivo, ou para proteger a integridade do indivíduo
(Ley et al., 2007). É um termo utilizado para descrever um conjunto de comportamentos, que
ocorre, geralmente, em contextos muito específicos e por curtos períodos de tempo, e de forma
alguma deverá ser interpretado como uma característica do indivíduo em questão – não existem
cães agressivos; a agressividade é uma resposta comportamental secundária a uma subjacente
condição emocional complexa e variável (Bowen & Heath, 2005; Bradshaw, Blackwell, &
Casey, 2009; Casey, Loftus, Bolster, Richards, & Blackwell, 2014; Horwitz & Mills, 2009).
Mais uma vez, não existe unanimidade na classificação dos diferentes tipos de agressividade (ex.:
Overall, 2013; Landsberg, 2013, Bowen & Heath, 2005). É, no entanto, consentido que a é uma
resposta frequentemente associada a um estado emocional de medo/ansiedade. Nestes casos, é
despoletada por um estímulo que o cão associa como ameaçador e a agressividade pode ser
direccionada a coisas, animais ou pessoas (adultas ou crianças), tanto conhecidas como
desconhecidas (Casey et al., 2013, 2014).
Inúmeros artigos têm sido publicados sobre agressividade nas últimas duas décadas (ex.:
Appleby, Bradshaw, & Casey, 2002; Bennett & Rohlf, 2007; Casey et al., 2013; Duffy et al.,
2008; Godbout & Frank, 2011b; Guy et al., 2001; Herron, Shofer, & Reisner, 2009; Hsu & Sun,
2010). Hsu e Sun (2010) apresentam uma boa revisão crítica dos estudos realizados até à data,
assim como das suas discrepâncias de resultados, avançando como principais razões a
inexistência de uniformidade no levantamento e tratamento estatístico dos dados. Estas
discrepâncias são evidentes na maioria dos factores tidos como predisponentes para a expressão
de comportamento agressivo, classificados por Hsu e Sun (2010) como: 1) factores intrínsecos –
ex.: género, raça, esterilização, idade; 2) factores ambientais – ex.: tipo de treino, interacção com
o dono, idade e género do dono, experiência prévia, origem do cão, idade de aquisição, propósito

25
para aquisição, zona de residência, área livre disponível, composição do grupo familiar. Casey et
al. (2014) também encontraram algumas diferenças significativas para certas variáveis, mas
sublinham a importância das características intrínsecas como factores determinantes. Por outro
lado, concluem que a agressividade não tende a co-ocorrer em diferentes contextos, sugerindo
que os cães aprendem a exibir esse comportamento em determinadas situações, não se
demonstrando agressivos na generalidade.
Shepherd (2009) desenvolveu uma ilustração explicativa da resposta comportamental do cão a
estímulos ambientais ameaçadores – escada da agressividade (figura 6) –, no intuito de explicar a
agressividade canina secundária ao medo. A intensidade da resposta aumenta gradualmente (do
verde até ao vermelho) de acordo com o nível de ameaça percepcionado pelo animal. Shepherd
realça a especificidade do contexto14 para cada resposta, propondo ainda que o cão só demonstra
os níveis superiores da escada se os inferiores – com o objectivo de apaziguar a situação de
stress, cessando o escalar da tensão – se revelem (ou tenham revelado no passado) ineficientes na
supressão do estímulo ameaçador (Horwitz & Mills, 2009). Um dos factores mais importantes na
abordagem à agressividade por medo é, precisamente, a compreensão de que uma resposta de
intensidade superior é, geralmente, precedida de outras de grau inferior, que frequentemente
passam despercebidas ao olhar destreinado e que é necessário reconhecer (Bowen & Heath, 2005;
Horwitz & Mills, 2009). A grande variabilidade fenotípica nas diferentes raças (resultado da
selecção artificial das mesmas) assim como algumas práticas de alteração estrutural dos cães (ex.:
cortar de cauda) impedem também a expressão (ou a compreensão) natural das respostas menos
intensas desta escada, tanto pelas pessoas como pelos outros cães. Demonstrando-se ineficientes,
o cão aprende a abandonar este tipo de resposta ao longo do tempo, vendo-se obrigado a exibir
comportamentos mais óbvios de desconforto (agressividade explícita)15, na expectativa que os
mesmos surtam os efeitos que os primeiros falharam em surtir (Bowen & Heath, 2005; Horwitz
& Mills, 2009).

14
Tradução livre do inglês “context-dependant”
15
Tradução livre do inglês “overt aggression”
26
Figura 6 – Escada da agressividade. Adaptado de Shepherd (2009)

A agressividade por medo é, portanto, uma resposta aprendida, expressa pelo animal em
situações que, segundo a sua experiência e percepção, não lhe oferecem outra alternativa na
protecção da sua integridade física (Bowen & Heath, 2005; Horwitz & Mills, 2009). É da maior
importância aprender a reconhecer o vasto leque de expressões comportamentais de
medo/ansiedade (discutidas de forma mais aprofundada anteriormente), de forma a prever e
impedir a exibição de respostas mais violentas e, naturalmente, perigosas.

CAPÍTULO 3: Prevenção e Terapêutica de distúrbios associados ao medo


3.1 Prevenção
Os problemas comportamentais são responsáveis por mais eutanásias e abandonos de cães do que
doenças infecciosas, neoplásicas e metabólicas juntas (Tamimi et al., 2013). A responsabilidade
da comunidade veterinária na educação da sociedade e na protecção animal deveria, por isso,
tornar a prevenção destes distúrbios uma prioridade. Citando Landsberg et al. (2013), a
prevenção é a melhor medicina.

27
3.1.1 Educar os donos: a importância dos primeiros contactos
A prevenção de problemas comportamentais (no geral) e relacionados com o medo (em
particular) começa na educação dos donos. Em resposta à ampla disseminação nos diversos
meios de comunicação de (des)informação desactualizada e prejudicial para o bem-estar dos
animais de estimação, torna-se imperativo que os veterinários forneçam aos seus clientes
informação alternativa de qualidade, actualizada, prática e sensível sobre como cuidar dos seus
animais de forma a promover a sua saúde física, emocional e mental (Seksel, 2008a).
Esta educação pode ser conseguida através de diversos meios – desde a criação de um correio
digital informativo periódico para subscrição dos clientes, à exposição e distribuição de cartazes e
folhetos informativos nos estabelecimentos veterinários, à participação em eventos sobre animais
de estimação na comunidade envolvente (Marder & Duxbury, 2008). No entanto, o ideal seria
disponibilizar um serviço de aconselhamento pré-adopção a futuros donos (Marston & Bennett,
2003; Seksel, 2008a). Este dever-se-ia focar em acompanhar o potencial dono numa decisão
consciente, realística e ponderada, combinando as características do indivíduo e do seu ambiente
com a do futuro animal de estimação, promovendo o estabelecimento de um vínculo forte e
duradouro entre os mesmos e diminuindo drasticamente a probabilidade de abandono (Marder &
Duxbury, 2008; Pierantoni, Albertini, & Pirrone, 2011) e de desenvolvimento de problemas
comportamentais (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a; Seksel, 2008a; Yin, 2009).
A verdade é que a oportunidade de educar os donos só surge, em regra, na primeira visita ao
veterinário, mas seja qual for o momento da intervenção é importante garantir que a pessoa crie
expectativas realísticas relativamente ao seu futuro melhor amigo (Marder & Duxbury, 2008). O
serviço de aconselhamento pode ser providenciado por outros membros qualificados da equipa
técnica que não o veterinário, e deve abranger os seguintes conteúdos: lista aconselhada de
material informativo (folhetos, livros, websites, DVDs…); locais de aquisição aconselhados;
características mais apropriadas do animal de acordo com o seu ambiente futuro (espécie, raça,
género, idade, etc) e do ambiente futuro com o animal; como cuidar apropriadamente do novo
animal de estimação (comida, cama, exercício físico e estimulação mental, brinquedos, cuidados
médicos, necessidades de supervisão, etc); obrigações legais (microchip, inscrição nas
autoridades competentes, vacinação); acessórios apropriados (trelas, arneses, açaimes, etc); treino
(básico, treino de higiene16, importância do reforço positivo); socialização e habituação; noções
básicas de comportamento (comportamento normal de acordo com a idade; como identificar

16
Tradução livre do inglês “house-training”.
28
potenciais comportamentos problemáticos) (Landsberg et al., 2013; Marder & Duxbury, 2008;
Overall, 2013a; Seksel, 2008a).
Estudos recentes comprovam o impacto significativo desta formação qualificada e adequada dos
donos na promoção duma interacção saudável entre estes e os cães, assim como na diminuição da
expressão de problemas comportamentais (Gazzano, Mariti, Alvares, et al., 2008).
Outro estudo realça a importância do fornecimento de informação adequada para ajudar a
introduzir cães adoptados em famílias com crianças, diminuindo a tipicamente alta taxa de
retorno de animais nestes ambientes (Duxbury, Jackson, Line, & Anderson, 2003).

3.1.2 Socialização, habituação e estimulação


Socialização pode ser definida como o processo de aprendizagem de comportamentos aceitáveis
de acordo com as exigências da sociedade e pretende que o animal aprenda a aceitar naturalmente
o contacto próximo com pessoas e outros animais (Landsberg et al., 2013; Seksel, 2008a).
Na verdade, este processo é uma aprendizagem contínua que se inicia desde o nascimento,
embora seja consensual que assuma uma maior importância entre as 3 e as 12 semanas (período
sensível, discutido em 1.2.4). Uma boa socialização começa, portanto, antes mesmo do período
de adopção – que, segundo Landsberg et al. (2013) deverá decorrer idealmente entre as 7 e as 8
semanas –, devendo ser iniciada pelo criador, através da manipulação cuidada de todo o corpo,
exposição a pessoas com características diferentes, animais adultos bem socializados, etc.
(AVSAB, 2008; Gazzano, Mariti, Notari, et al., 2008; Howell & Bennett, 2011). Um outro
conceito de grande relevância a relembrar neste processo é a habituação – já referida em 1.2.4 e
1.3.4. A prevenção de respostas inadequadas a estímulos passa, portanto, não apenas pela
aceitação confortável do contacto próximo com pessoas e animais, mas também de todas as
situações e ambientes que farão parte da sua experiência futura.
Sabe-se que cachorros que não recebam suficiente estimulação sensorial têm uma maior
incidência de problemas relacionados com o medo, a aprendizagem e a integração social
(Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a).
Muitos donos – e profissionais – têm a ideia errada que a continuação do processo de
socialização pelos novos donos só deve ter início depois de completado o calendário vacinal.
Importa esclarecer que é do maior interesse do animal (e da sociedade em geral) que práticas
activas de socialização sejam iniciadas pelos donos muito antes do fim da vacinação, desde que
asseguradas as devidas condições higio-sanitárias do ambiente em que ocorrem, assim como o

29
estatuto vacinal dos animais envolvidos (AVSAB, 2008). Uma das formas mais expeditas de
promover uma correcta socialização e habituação nesta fase é a sua inscrição até às 14 semanas
nas chamadas “aulas para cachorros”17 (AVSAB, 2008; Duxbury et al., 2003; Landsberg et al.,
2013; Seksel, Mazurski, & Taylor, 1999; Seksel, 2008a; Yin, 2009). Estas aulas devem ser
dirigidas por profissionais e podem ser estruturadas de diferentes formas, mas o importante é que
os animais sejam expostos de forma gradual e continuada a outras pessoas, objectos (ex.: coleira,
brinquedos) e cachorros de idade semelhante, num ambiente controlado, adequado e sempre
positivo (ver proposta de estruturação de aulas por Seksel (2008a)). São ainda uma óptima
oportunidade para ajudar os donos a ensinar regras básicas de convivência em sociedade aos seus
animais. A primeira aula pode ser apenas para donos (mesmo antes da adopção) e poderá servir
para veicular toda a informação relevante nesta fase, referida em 3.1.1.
As aulas de socialização para cachorros são ainda uma óptima oportunidade para detectar
comportamentos desviantes que indiciem o desenvolvimento de distúrbios comportamentais no
futuro – o cachorro que se demonstre extremamente tímido e receoso e cuja gradual exposição a
diferentes estímulos não melhore a sua resposta, deverá ser referenciado para acompanhamento
por um profissional competente, a fim de efectuar um eventual diagnóstico e desenvolver um
plano terapêutico adequado (Overall, 2013a).
Os veterinários deveriam ainda disponibilizar e incentivar programas de habituação e
dessensibilização nas suas clínicas e hospitais, na forma de pequenas sessões, orientadas pela
equipa técnica auxiliar. Durante estes momentos, os cachorros aprendem a aceitar naturalmente a
generalidade dos procedimentos e manipulações a que serão sujeitos no futuro, assim como
ferramentas potencialmente úteis (como o açaime ou o colar isabelino), com o auxílio de técnicas
de condicionamento e reforço positivo (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a; Yin, 2009). As
aulas para cachorros são uma óptima oportunidade para iniciar este processo (Yin, 2009). Esta
aprendizagem pode tornar-se uma grande vantagem nas intervenções médico-veterinárias no
futuro, diminuindo o stress e as respostas de medo do animal nas consultas e diminuindo o risco
de acidentes, tanto em ambiente hospitalar como em situações inesperadas do quotidiano (Yin,
2009). Mais uma vez, a detecção de animais que não melhoram a sua resposta após estimulação
adequada, deve ser encarada com seriedade, visto se saber que comportamentos extremos de
ansiedade exibidos no veterinário, enquanto cachorros, tendem a persistir nos adultos (Godbout
& Frank, 2011a; Godbout et al., 2007).

17
Tradução livre do inglês “puppy classes”.
30
Por último, todos os animais requerem um ambiente estimulante e diversificado durante toda a
sua vida, que preencha as suas necessidades de exercício físico ao mesmo tempo que os estimula
a fazer as suas próprias escolhas através de variados desafios mentais (Seksel, 2008a). Alguns
exemplos de enriquecimento ambiental incluem brinquedos (de morder, estimulantes do olfacto,
entre outros), superfícies com diferentes texturas, esconder biscoitos por diferentes zonas da casa,
enterrar ossos no quintal, utilizar taças de comida com puzzles, inscrever o cão e o dono em
actividades de lazer/desporto (AVSAB, 2008; Seksel, 2008a). Cães mantidos em ambientes
monótonos e não estimulantes têm uma maior tendência para desenvolver comportamentos
inapropriados, como excessiva vocalização ou actividades destrutivas (Landsberg et al., 2013;
Overall, 2013a).

3.1.3 Treino básico


Competências básicas de treino podem ter profundas consequências na vida dum animal (ex.:
salvá-lo de atravessar indiscriminadamente a estrada, mantê-lo imóvel durante um procedimento
veterinário ou diminuir significativamente a probabilidade de retorno pós-adopção) (Landsberg et
al., 2013). O treino de competências básicas deveria, por isso, ser uma prioridade para todos os
donos, fazendo parte do conjunto de medidas preventivas de problemas comportamentais (Seksel,
2008a) porque: estabelece uma via prioritária de comunicação entre dono e animal (que deverá
sobrepor-se à maioria dos restantes estímulos externos); contraria o desenvolvimento de
determinados problemas comportamentais (Bennett & Rohlf, 2007); fortalece grandemente o laço
afectivo entre cão e humano (Marston & Bennett, 2003); e diminui probabilidade de abandono
devido a eventuais problemas comportamentais futuros (Bennett & Rohlf, 2007). Esta
ferramenta, por um lado, confere ao dono mais controlo sobre o comportamento do cão; por
outro, permite ao cão aprender um conjunto de comportamentos simples com consequências
previsíveis, que podem ser empregues em qualquer situação, mesmo em momentos de maior
insegurança. Esta via de comunicação deve ser bidireccional e o cão pode utilizá-la para veicular
informação importante ao dono, devolvendo ao primeiro algum controlo sobre o seu ambiente, e
ao segundo um maior conhecimento das necessidades e preferências do primeiro (Brammeier et
al., 2006) – um exemplo simples é o treino de um comportamento específico (ex.: sentar à porta)
quando o cão precisa de ir à rua (Overall, 2013a).
O treino do seu próprio animal de estimação torna ainda o dono num indivíduo mais informado
sobre o normal comportamento do animal; mais atento e interessado em educar-se; e melhora a

31
sua leitura da linguagem corporal e sinais comportamentais de conforto e desconforto,
promovendo interacções mais positivas e saudáveis para ambos (Brammeier et al., 2006).

3.1.4 Os limites da prevenção


Apresentados os seus vastos benefícios importa, por fim, compreender os limites das práticas
preventivas. Landsberg et al. (2013) realçam que a selecção genética ao longo de gerações e a
relação exclusiva que os cães partilham com os seres humanos transformou uma espécie, já
intrinsecamente social, em animais altamente afectivos, infantilizados e socialmente dependentes.
Se por um lado estas características conferem ao cão uma tremenda vantagem adaptativa e
evolutiva enquanto animal de companhia (Howell & Bennett, 2011; Kubinyi et al., 2003; Mariti
et al., 2013; Pongrácz et al., 2001, 2004; Rooney, Bradshaw, & Robinson, 2001; Udell, Dorey, &
Wynne, 2010), esta relação de dependência poderá ditar uma diminuída capacidade de interacção
individual com o ambiente, predispondo o animal a desenvolver alguns distúrbios
comportamentais (ex.: ansiedade por separação, neofobia) (Landsberg et al., 2013).
Por outro lado, tal como referido em 2.5, o comportamento é o resultado da interacção de três
componentes principais – o ambiente, a aprendizagem e a genética. Se as práticas correctas de
prevenção têm o potencial de actuar sobre os dois primeiros, o mesmo não se pode afirmar
relativamente ao terceiro. A genética do indivíduo é o resultado dos seus antecedentes familiares
e da sua própria variação individual, e não deve ser menosprezada (ver 2.5.3). A composição
genética dita quais os limites potenciais da expressão fenotípica – a nossa actuação permite
promover a direcção dessa expressão comportamental, apenas dentro dos limites definidos pela
genética (Overall et al., 2014). Por outras palavras, se a genética define um potencial visto como
um intervalo de valores entre 1 e 10, a nossa actuação pode promover a expressão preferencial de
um 5 ou um 8, mas nunca de um 11 ou de um 20.
Talvez por isso alguns autores reportem taxas de sucesso contrastantes na prevenção de diferentes
problemas comportamentais, propondo que essas diferenças se devem ao papel crucial da
genética como factor predisponente da sua expressão. Exemplo disto são Herron et al. (2009) e
Gazzano, Mariti, Alvares, et al. (2008) que concluíram que o aconselhamento pré-adopção
contribui para uma melhoria significativa no desenvolvimento de problemas comportamentais,
enquanto, por exemplo, Herron, Lord, & Husseini (2014) reportam que o aconselhamento não
teve qualquer impacto na prevenção de ansiedade por separação.

32
É importante mantermo-nos conscientes que os distúrbios comportamentais são fenómenos
complexos, cujo esclarecimento está longe de estar completo e que mesmo a melhor prevenção
pode alcançar resultados limitados.

3.2 Terapêutica
Um plano terapêutico para qualquer distúrbio comportamental deve actuar em 3 áreas distintas,
relacionadas com os seus três factores influenciadores: maneio do ambiente; modificação
comportamental e terapêutica farmacológica.

3.2.1 Maneio do ambiente


O maneio do ambiente do animal com distúrbios comportamentais envolve controlar e alterar as
diferentes variáveis ambientais que contribuem para a manifestação dessas alterações (Landsberg
et al., 2013). Segundo Overall (2013), este é frequentemente o primeiro passo (e o mais simples)
na abordagem terapêutica. Ao manter o ambiente controlado é possível diminuir o nível de
excitação/alerta do animal e criar condições para a diminuição da intensidade e frequência da
expressão destes comportamentos patológicos (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a). Como
referido anteriormente, um animal que viva com níveis de ansiedade anormalmente altos – neste
caso, decorrentes da antecipação dos estímulos causadores de medo – não lida bem com a
imprevisibilidade. É, portanto, necessário providenciar-lhe um ambiente controlado, previsível e
com estímulos de baixa intensidade (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a). Para tal, o papel da
evitação é fundamental – proteger o animal da exposição aos estímulos causadores de stress
promove duas alterações fundamentais para a melhoria da sua condição clínica: (1) ao permitir
que o animal não reaja aos estímulos, impede a evolução na aprendizagem do medo e no
estabelecimento dos padrões neuro-químicos e suas consequências metabólicas, já abordados
anteriormente; (2) ao manter o animal num nível emocional calmo e equilibrado, promove a
aprendizagem de novos comportamentos e respostas, essenciais para o desenrolar do plano
terapêutico e impossíveis de estabelecer em estados emocionais de stress, excitação ou alerta
(Overall, 2013a).
O maneio terapêutico pode actuar sobre diferentes ambientes do animal, entre eles o físico e o
social (Overall, 2013a). O ambiente físico envolve: o espaço físico em que o animal se encontra;
o conjunto de estímulos visuais, olfactivos, auditivos; quaisquer outros animais que consigo
partilhem o ambiente; objectos concretos (ex.: brinquedos, camas, taças de comida, cortinados,

33
portas) e abstractos (ex.: música ambiente). Importa compreender que o factor mais determinante
é a percepção do animal – no caso da ansiedade por separação, por exemplo, apesar do espaço
físico não mudar substancialmente após o afastamento do dono, a percepção do animal altera-se
profundamente, estimulando a manifestação dos comportamentos listados em 2.6.4. (Overall,
2013a). É, por isso, importante perceber se o animal não percepciona as modificações no
ambiente como punitivas, maximizando a percepção agradável e minimizando a aversiva, para
que os objectivos da manipulação sejam alcançados (Case, 2010; Overall, 2013a).
O ambiente social refere-se às interacções relacionais do animal e inclui as pessoas e outros
animais com que o cão interaja. A actuação no ambiente relacional está directamente associada à
modificação comportamental e tem como objectivo construir uma nova estrutura, com novas
regras que regulem todas as interacções do indivíduo com o meio (Landsberg et al., 2013;
Overall, 2013a).
Alguns exemplos de modificação ambiental são os seguintes: providenciar uma zona de
segurança para o cão (ex: um cesto, uma cama, um quarto); diminuir a exposição ao estímulo
causador de medo; mantê-lo à trela e sob olhar atento; construir uma vedação à volta da casa;
instalar estores nas janelas ou tornar vidros das portas opacos para bloquear estímulos visuais;
afastar objectos problemáticos do alcance do cão; instalar portões de bebé para impedir acesso a
certas zonas da casa; fornecer muitas oportunidades de enriquecimento social e físico; espalhar
brinquedos e estímulos diferentes ao deixar o cão sozinho; estabelecer um protocolo de
interacção entre visitantes e o cão (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a).
As vantagens da manipulação ambiental são vastas: a sua facilidade de aplicação, a
reversibilidade das medidas e o rápido surgimento de resultados ajudam o dono a melhor
compreender o seu animal, as suas necessidades e percepções e aumentam a confiança, a
motivação e, naturalmente, o sucesso do plano terapêutico (Overall, 2013a).

3.2.2 Modificação comportamental


A modificação comportamental é vista como a principal ferramenta na abordagem aos distúrbios
comportamentais (Landsberg et al., 2013) e, segundo Overall (2013) envolve:
(1) Alterar comportamentos num ambiente confortável e seguro;
(2) Fomentar um forte laço de confiança e segurança entre o cão e os responsáveis por ele, de
modo a substituir o antigo padrão de hiper-reactividade por uma nova forma de estar,
privilegiando uma atitude calma e ponderada;

34
(3) Possível implementação de um protocolo de dessensibilização (i.e. aprender a não reagir
quando exposto ao estímulo) e contra-condicionamento (i.e. utilizar o fenómeno de
condicionamento para substituir a resposta aversiva do animal por uma positiva).
A modificação comportamental não é sinónima de treino, não envolve qualquer tipo de noção
desactualizada de dominância ou submissão, nem pretende ser algo entediante (ou pior,
assustador) para o animal. Deve, isso sim, provê-lo de novas ferramentas que lhe permitam
interagir com o ambiente de uma forma mais segura, confortável e confiante, eliminando os
comportamentos problemáticos mas, mais importante, a motivação para a sua execução (Case,
2010; Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a; Yin, 2009). Num protocolo de modificação
comportamental, ao contrário do treino clássico, o objectivo principal é mudar o estado
emocional (e mental) do indivíduo, e não apenas o seu comportamento. Mais do que ensinar um
comportamento específico, é necessário garantir que o cão o executa a partir de um estado
emocional calmo e confortável – propício à aprendizagem eficaz e duradoura (Overall, 2013a).
A teoria de aprendizagem (1.3.) é, portanto, essencial na compreensão de um protocolo de
modificação comportamental. A relevância da recompensa (figura 7) e a ausência de punição
tornam-se determinantes neste processo, para que o animal associe os novos comportamentos a
experiências positivas, que substituam as suas anteriores percepções (Overall, 2013a; Yin, 2009).

Figura 7 – Tipos de recompensas, de acordo com Overall (2013a).

Comida

Evitar Contacto
desconforto físico

Acesso a Tipos de
brinquedo Elogio
especial recompensas

Integração
Brincar
social

Atenção

Um plano eficaz de modificação comportamental deve, por isso, respeitar as seguintes condições:
(1) evitar situações e estímulos associados ao comportamento indesejado; (2) ausência de

35
qualquer tipo de punição; (3) utilizar a modificação comportamental para ensinar o animal a estar
calmo e menos reactivo; (4) elogiar e recompensar todos os comportamentos desejáveis,
constantemente (Overall, 2013a).
Um dos aspectos essenciais é ensinar o animal que: não precisa de reagir da forma que está
habituado; será recompensado por não reagir; e sentir-se-á melhor se não reagir (Overall, 2013a).
Ao facilitarmos esta aprendizagem, possibilitamos ao animal a expressão de um leque variado de
escolhas comportamentais alternativas, que não lhe estavam disponíveis anteriormente, e que lhe
são mais benéficas (Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a).
Esta aprendizagem pode ser feita de várias formas, sendo o mais relevante que o animal seja
premiado, através da recompensa, por comportamentos sucessivamente mais calmos e de maior
duração (Landsberg et al., 2013). Desta forma, o cão aprende a associar um pedido (ex.: “Deita”),
a uma experiência positiva e previsível (ex.: receber um biscoito ou receber uma massagem). O
objectivo é que estes novos comportamentos sejam aprendidos de forma tão exaustiva pelo
animal que se tornem uma resposta automática de relaxamento18(Landsberg et al., 2013).
Embora comecem por servir para alterar o estado emocional do cão em situações neutras, uma
vez aprendidas, estas respostas podem ser utilizadas em quaisquer situações, eventualmente
integrando protocolos mais extensos de dessensibilização e contra-condicionamento (Landsberg
et al., 2013; Overall, 2013a).
Ao aprender a interagir desta forma estruturada e previsível, o cão readquire o controlo do seu
ambiente, o que por sua vez o ajuda a descontrair (Landsberg et al., 2013).

3.2.2.1 Dessensibilização e contra-condicionamento


A dessensibilização e o contra-condicionamento são duas ferramentas derivadas da teoria da
aprendizagem potencialmente úteis em protocolos de modificação comportamental (Case, 2010;
Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a; Yin, 2009). Embora estas técnicas tenham sido
classicamente utilizadas de forma indiscriminada em distúrbios comportamentais, elas não têm de
fazer parte de todos os protocolos terapêuticos – a sua implementação deve ser sempre o
resultado de uma cuidada reflexão sobre a necessidade do animal contactar com e alterar a sua
resposta aos estímulos em causa – e podem ser somente introduzidas numa fase mais tardia da
intervenção (Overall, 2013a).

18
Tradução livre do inglês “relaxation response on cue”
36
A dessensibilização consiste em reduzir gradualmente a resposta do animal ao estímulo do qual
tem medo, até se conseguir manter num estado emocional neutro na sua presença (Bowen &
Heath, 2005; Yin, 2009). Este objectivo é obtido através da exposição a intensidades do estímulo
gradualmente superiores. Idealmente, o animal só deve ser exposto a uma intensidade superior se
não apresentar qualquer reacção de medo na intensidade anterior, prevenindo o processo inverso
de aumento da sensibilização – já referido em 1.3.4 e abordado mais à frente (Bowen & Heath,
2005; Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a; Yin, 2009). Um exemplo típico de
dessensibilização a um estímulo sonoro está representado na figura 8. Note-se que a intensidade
do estímulo aumenta gradualmente, mantendo-se sempre abaixo do limiar de reactividade.
Figura 8 – Representação esquemática de um protocolo de dessensibilização a um estímulo sonoro.
Adaptado de Yin (2009)

Embora a dessensibilização seja potencialmente útil no caso de medos ligeiros, é geralmente


insuficiente na terapêutica de medos de maior intensidade (Yin, 2009). Para a generalidade dos
medos, mais do que neutralizar a resposta do animal ao estímulo, é necessário substituir a
resposta de medo por uma resposta alternativa (percepcionada como agradável), que seja
incompatível com a resposta aversiva anterior (Bowen & Heath, 2005; Overall, 2013a; Yin,
2009). Este fenómeno tem o nome de contra-condicionamento e está representado na figura 9.
Esta técnica baseia-se na teoria de aprendizagem e pode utilizar o condicionamento clássico
(1.3.1) ou o condicionamento operante (1.3.2) e é geralmente utilizada em associação com a
dessensibilização (Bowen & Heath, 2005; Overall, 2013a; Yin, 2009). A recompensa torna-se,
mais uma vez, fundamental para assegurar que o animal altere não apenas a resposta
comportamental mas também o estado emocional de apreensão que motiva o comportamento que
queremos substituir (Yin, 2009). Se não se alterar o estado emocional de base, muito dificilmente
se consegue alterar o comportamento, que é apenas e sempre a sua expressão (Overall, 2013a;
Yin, 2009).

37
Figura 9 – Representação esquemática de contra-condicionamento a um estímulo sonoro. Adaptado de
Yin (2009).

3.2.2.2 A importância da utilização de métodos humanos: o problema da imersão


Independentemente do tipo de intervenção comportamental adoptado, importa reforçar a
necessidade de utilização de protocolos de forma humana e sensível, respeitando o limiar de
reactividade do animal. A exposição prolongada do animal a um estímulo de intensidade
suficiente para desencadear uma resposta de medo tem o nome de imersão19 (Overall, 2013a;
Yin, 2009). Embora este método tenha sido extensamente utilizado no passado, hoje sabe-se que
não só é desumano como não traz, geralmente, benefícios e melhorias significativas – tendo
inclusivamente um grande potencial de sensibilizar ainda mais o animal (Overall, 2013a; Yin,
2009). Ao não ter em conta o seu estado emocional, a terapia de imersão não lhe fornece
ferramentas para substituir a resposta de medo por uma resposta alternativa; pelo contrário, pode
levá-lo a demonstrar o que se chama de desamparo aprendido – o animal aprende que não tem
qualquer controlo sobre o seu ambiente (e, na sua percepção, sobre a sua integridade física) e
quaisquer respostas comportamentais que exiba são ineficazes em terminar a exposição ao
estímulo, pelo que opta por deixar de exibir qualquer resposta. Este resultado é extremamente
danoso para o animal e, embora possa promover a extinção do comportamento inicial, representa,
na verdade, um agravamento na resposta neurofisiológica ao estímulo (Overall, 2013a; Yin,
2009).
Os protocolos de modificação comportamental devem, por isso, ser estruturados e realizados por
profissionais competentes, actualizados e sensíveis. Se o comportamento em causa não for
passível de alterar através de técnicas com humanidade, não existem quaisquer razões para
recorrer a técnicas insensíveis e arriscadas, devendo dar-se prioridade a estratégias de evitação e
eventual uso de medicação (Overall, 2013a)

19
Tradução livre do inglês “flooding”.
38
3.2.2 Terapêutica farmacológica
Os fármacos modificadores de comportamento têm vindo a ganhar espaço nos protocolos
terapêuticos actuais (Perrin, Seksel, & Landsberg, 2014; Seksel, 2008b). Diversos estudos
comprovam que a associação de um fármaco adequadamente escolhido com protocolos de
modificação comportamental e manipulação do ambiente origina resultados mais imediatos e
satisfatórios na resolução de distúrbios comportamentais (King et al., 2000, 2004; Landsberg et
al., 2008). O fármaco não deve ser visto como tratamento único, mas sim como coadjuvante de
uma adequada intervenção ambiental e comportamental (Bowen & Heath, 2005; Landsberg et al.,
2013; Overall, 2013a).
Ao representarem um papel fundamental na modificação de problemas comportamentais, estes
fármacos contribuem para a manutenção dos laços afectivos entre os cães e os seus donos e,
consequentemente para a diminuição das altas taxas de abandono e eutanásia registadas nestes
animais (Flannigan & Dodman, 2001; Martínez et al., 2011; Palestrini et al., 2010; Salman et al.,
2000; Scarlett, Salman, New, & Kass, 2002; Sherman & Mills, 2008).
Ao mitigarem os efeitos fisiológicos do stress crónico, podem ainda aumentar significativamente
a esperança média de vida nestes animais (Dreschel, 2010). Importa mencionar que o objectivo
não passa por conseguir um animal sedado ou não-reactivo, mas sim um animal equilibrado. Os
fármacos actuam ao nível molecular na estabilização do paciente com distúrbios
comportamentais, promovendo a sua estabilidade neurofisiológica e emocional, potenciando a
aprendizagem de novos comportamentos – essencial para a eficácia da modificação
comportamental – e, em última análise, contribuindo para o seu bem-estar (Overall, 2013a).
Uma discussão aprofundada dos fármacos disponíveis, mecanismos de acção, indicações, efeitos
adversos e sua posologia não se insere no âmbito desta dissertação e pode ser encontrada em
diversos recursos da especialidade (ex.: Overall, 2013b; Perrin et al., 2014; Seksel, 2008b).
Na utilização de qualquer um destes fármacos, o fornecimento de informação correcta e cuidada
aos donos é fundamental para assegurar uma boa cooperação na sua administração. A maioria dos
princípios activos demora várias semanas a surtir efeito visíveis e os donos precisam de
compreender a necessidade, na maioria dos casos, da utilização de medicação por um período
prolongado – meses a anos (Bowen & Heath, 2005; Landsberg et al., 2013; Overall, 2013a;
Seksel, 2008b).

39
CAPÍTULO 4: Estudo retrospectivo sobre distúrbios comportamentais relacionados com o
medo em cães.
4.1 Objectivos
O estudo teve como objectivo fundamental contribuir para o conhecimento actual sobre os
distúrbios comportamentais relacionados com o medo em cães. Em primeiro lugar, pretendeu
aferir a contribuição de diferentes variáveis para o desenvolvimento destes distúrbios, através da
comparação entre uma amostra de estudo e um grupo controlo. O segundo objectivo foi descrever
alguns factores relativos à amostra de estudo que possam ajudar na sua compreensão.

4.2. Material e métodos


4.2.1 Questionário
Os dados foram recolhidos através de um questionário (Anexo 1) desenvolvido pelo autor com o
apoio dos Orientadores. O questionário foi pré-testado por donos de cães da equipa do Seaforth
Veterinary Hospital e, após aferido e corrigido foi entregue em mão a donos de cães na região de
Sydney, NSW – Austrália, em envelopes pré-pagos, de forma a maximizar a taxa de devolução.
O questionário divide-se em 4 partes: (1) caracterização do dono – ex.: idade, sexo, experiência
prévia; (2) caracterização do cão – ex.: idade, idade de adopção, castrado/inteiro; (3)
caracterização do ambiente e historial do animal – ex.: origem, composição do agregado familiar,
ambiente em diferentes fases de desenvolvimento comportamental; (4) questões relativas apenas
à amostra de estudo (i.e. cães com distúrbios comportamentais relacionados com o medo) – ex.:
responsável pelo diagnóstico, descrição do distúrbio, existência de evento catalisador.
Esta investigação foi avaliada de acordo com os pré-requisitos éticos do Governo Australiano e,
do ponto de vista animal, foi dispensada a sua aprovação ética visto não haver qualquer
intervenção directa com qualquer animal envolvido, nem da parte do dono nem do investigador.
Do ponto de vista humano, a presente investigação foi classificada como de nível 1 (“Risco
insignificante”) – investigação que não prevê qualquer risco de dano ou desconforto, apenas
eventual inconveniência. Todo o estudo foi assim dispensado de apresentar uma submissão para
aprovação a um Comité de Ética australiano.
A página inicial, contendo o nome do respondente, foi destacada aquando da recepção do
questionário e guardada separadamente, assegurando o anonimato das respostas, pelo que
nenhuma relação poderia ser feita entre os dados analisados e os detalhes dos respondentes.

40
4.2.2 Amostras
Os animais incluídos no estudo satisfaziam os seguintes critérios de inclusão: a) foram adoptados
durante as fases iniciais do desenvolvimento comportamental; b) a idade actual estava
compreendida entre 18 meses e 11 anos de idade; c) todos os cães tinham de pertencer a
casas/famílias diferentes.
O grupo controlo foi recrutado no Seaforth Veterinary Hospital (Sydney), e consistia em animais
não diagnosticados com qualquer distúrbio comportamental relacionado com o medo. Neste
grupo foram devolvidos 38 questionários completos, no entanto: 2 foram excluídos porque a
adopção ocorreu durante ou após a adolescência e 6 donos que responderam que o seu cão tinha
um distúrbio comportamental relacionado com o medo não foram incluídos. O facto do
comportamento de medo ser dos mais facilmente reconhecíveis pelos donos (Goddard &
Beilharz, 1983; Jones & Gosling, 2005; Tami & Gallagher, 2009), foi a base da decisão de incluir
estes 6 indivíduos no grupo de estudo. Assim, o grupo controlo ficou composto por 30 animais.
O grupo de estudo foi recrutado no Sydney Animal Behaviour Service (SABS) aquando da
presença em consultas de seguimento com os seus animais. Todos os cães foram previamente
diagnosticados com um distúrbio comportamental relacionado com o medo por um dos
veterinários da equipa especializada em Medicina Comportamental do SABS. Foram devolvidos
33 questionários preenchidos, mas 2 foram excluídos por preenchimento incompleto e outros 2
por não cumprirem os critérios de inclusão. Como os 6 indivíduos mencionados anteriormente
foram integrados neste grupo, a partir do grupo controlo, o grupo de estudo final consistiu assim
em 35 animais.

4.2.3 Análise Estatística


Os dados foram analisados com recurso ao “R” – um programa de livre acesso para computação
estatística e análise gráfica (R-Team, 2015), o seu interface “R Commander” (Fox, 2005) e o
programa “Microsoft Excel 2010”.
Os dados do primeiro estudo foram analisados primeiramente com recurso a ferramentas de
análise univariada, ao que se seguiu uma análise multivariada de regressão logística, com o
objectivo de compreender eventuais relações entre variáveis e a sua contribuição efectiva para a
probabilidade de desenvolvimento de distúrbios comportamentais. Todas as variáveis
seleccionadas para integrar o modelo multivariado foram consideradas de significância estatística

41
moderada, com p<0.15. O modelo da regressão logística final foi obtido por um processo de
stepwise20 baseado no Critério Informativo de Akaike (AIC).
Foram utilizadas ferramentas de estatística descritiva tanto para variáveis qualitativas como
quantitativas. As variáveis numéricas foram testadas quanto à normalidade com o Teste de
Normalidade de Shapiro-Wilk21 e, de acordo com o resultado, foram testadas as diferenças entre
grupos através de um Teste de T para Amostras Independentes22 (para variáveis com distribuição
normal) ou um teste não-paramétrico de Wilcoxon23 (quando a normalidade não foi assumida).
Para variáveis qualitativas, os grupos de estudo e controlo foram comparados através de tabelas
24
de contingência e o Teste Exacto de Fisher foi aplicado para avaliar a significância estatística
das diferenças entre grupos. Foi utilizado um intervalo de confiança de 95%, em que p<0.05 é
considerado como estatisticamente significativo.

4.3 Resultados
4.3.1 Estudo comparativo sobre as variáveis envolvidas no desenvolvimento de distúrbios
relacionados com o medo
4.3.1.1 Análise univariada
Os resultados da análise comparativa univariada são apresentados na tabela 1.
Tabela 1 – Resultados da análise univariada.
p-value
Idade n.s.
Variáveis relacionadas

Género n.s.
com o dono

Nível económico do agregado familiar n.s.


Experiência prévia <0.05
Motivação para adopção n.s.
Fonte de instrução sobre comportamento animal <0.05

Idade n.s.
relacionadas com

Idade à adopção n.s.


Variáveis
o cão

Raça n.s.
Género n.s.
Origem do animal n.s.

20
Termo em inglês utilizado para descrever um processo combinado de selecção e eliminação de variáveis para um modelo de regressão logística
que utiliza tanto o processo progressivo (forward) como o regressivo (backward)
21
Shapiro-Wilk normality test
22
Two-sample t-test
23
Wilcoxon rank sum test
24
Fisher’s Exact Test
42
Forma de transporte após adopção n.s.
Composição da ninhada n.s.
Outros animais no agregado actual <0.01
Outros animais no agregado durante p.s. n.s.
Outros animais no agregado durante adolescência <0.05
Outros cães diagnosticados com distúrbios comportamentais no agregado durante ps. n.s.
Outros cães diagnosticados com distúrbios comportamentais no agregado durante n.s.
adolescência
Existência e idade de crianças no agregado durante p.s. <0.05
Existência e idade de crianças no agregado durante adolescência <0.01
Idade ao primeiro passeio na rua n.s.
Ambiente antes da adopção (Escala de Likert: 1= “muito calmo” a 50 “muito n.s.
agitado”)
Ambiente durante p.s. (Escala de Likert: 1= “muito calmo” a 5= “muito agitado”) <0.05
Ambiente durante adolescência (Escala de Likert: 1= “muito calmo” a 5= “muito n.s.
agitado”)
Idade ao início do treino n.s.
Responsável pelo treino do cão (treinador profissional, veterinário <0.05
comportamentalista, veterinário, enfermeira, dono)
Duração do treino n.s.
Método de treino (recompensa vs punição) n.s.
Frequência programa de socialização (ex.: aula de cachorros) durante p.s. n.s.
Frequência num programa de socialização (ex.: aula de cachorros) durante n.s.
adolescência
Nº de horas/dia que animal passa sozinho n.s.
Comportamento de medo em situações desconhecidas (escala de Likert de 6 pontos <0.001

com breve descrição e exemplos) *


Avaliação do processo de habituação durante p.s. (escala de Likert de 6 pontos com n.s.
breves descrições)
Avaliação do processo de habituação durante adolescência (escala de Likert de 6 n.s.
opções com breves descrições)
Frequência diária dos passeios durante p.s., adolescência e actualmente n.s.
Duração dos passeios durante p.s., adolescência e actualmente n.s.
Sinais prematuros de medo durante p.s. * n.s.
Sinais prematuros de medo durante adolescência * <0.001
Legenda: a coluna da direita corresponde ao valor de p e aos valores sombreados correspondem
diferenças estatisticamente significativas para a variável em questão. “n.s.”: não significativo; “p.s.”:
período sensível; ‘*’: variáveis que não fazem sentido testar como eventuais factores de risco, tendo sido
excluídas da análise multivariada

43
A grande maioria dos respondentes pertencia ao sexo feminino (88%, p=n.s.). Todos os donos
pertencentes ao grupo de estudo já tinham tido animais anteriormente, comparados com 87% no
grupo controlo. No entanto, tanto no grupo controlo como no de estudo, só metade dos inquiridos
disse ter mudado a forma como trata o seu cão devido à sua experiência prévia.
A maioria dos donos pertencentes ao grupo controlo (79%) referiu ter sido instruído sobre
comportamento canino em “aulas para cachorros” em comparação com apenas 50% no grupo de
estudo. Para além disso, 29% no grupo controlo disse ter recebido essa informação do veterinário
assistente, em comparação com 50% do grupo de estudo, embora essa diferença não seja
significativa para um intervalo de confiança de 95%.
A idade média dos animais foi de 5,2 e 4,4 anos respectivamente no grupo controlo e de estudo
(p=n.s.). Não se detectaram diferenças significativas relativamente à idade de adopção. Também
não foram detectadas quaisquer diferenças entre grupos relativamente ao estado sexual (inteiro ou
esterilizado).
A percentagem de agregados com mais do que um animal foi muito superior no grupo de estudo
em comparação ao controlo (69% vs 32%), tendência que se verifica desde o período sensível.
O ambiente do animal durante as diferentes etapas da sua vida (antes da adopção, durante o
período sensível e durante a adolescência) foi avaliado com uma escala de Likert de 1 (“muito
calmo”) a 5 (“muito agitado”). Não foram encontradas diferenças relativamente a antes da
adopção, embora mais de metade dos inquiridos não conseguisse dar uma resposta precisa e tenha
sido excluída da análise. No grupo de estudo, a classificação do ambiente durante o período
sensível foi superior ao controlo (p<0.05). Embora fosse superior também relativamente à
adolescência, a diferença não foi estatisticamente significativa (p~0.05).
A maioria dos animais neste estudo tinha tido algum tipo de treino (93% no controlo e 94% no
grupo de estudo). A percentagem de animais treinados pelos donos foi significativamente mais
alta no grupo de estudo (p<0.01). As diferenças no método de treino não foram significativas –
no entanto, enquanto 100% do grupo controlo referiu utilizar apenas métodos baseados em
reforço positivo, 18% dos inquiridos no grupo de estudo admite ter usado métodos punitivos ou
uma combinação de métodos baseados em punição e reforço.
Os donos do grupo de estudo avaliaram o medo dos seus animais quando expostos a situações
estranhas numa média de 4.6/6, enquanto os cães do grupo de controlo foram classificados, em
média, em 2.9/6 (p<0.001).

44
Dos 30 animais do grupo de estudo, 66% demonstrava sinais de medo durante o período sensível
(comparados com 40% no controlo), e esta diferença tornou-se estatisticamente significativa
durante a adolescência, com 91% dos cães em estudo (comparados com 50% no controlo,
p<0.001).

4.3.1.2 Análise multivariada


O modelo final de regressão logística que melhor explica os dados em estudo encontrou algumas
variáveis que se co-relacionam significativamente com o desenvolvimento de distúrbios
comportamentais (figura 12)
Figura 10 – Modelo de regressão logística simplificado, mostrando as variáveis com co-relação
significativa com o desenvolvimento de distúrbios relacionados com o medo em cães
Coeficientes:
Estimativa Erro padrão z Pr(>|z|) Odds Ratio
2.109e+01 1.075e+04 0.002 0.9984
Ser o único animal em casa -5.196e+00 2.082e+00 -2.495 0.0126 * 180.549
Aprender comportamento c/ Vet 2.721e+00 1.303e+00 2.089 0.0367 * 0.066
Aprender comportamento c/ PT 3.530e+00 1.709e+00 2.066 0.0388 * 34.124
Ambiente agitado até aos 3 meses 8.868e-01 4.822e-01 1.839 0.0659 .
---
Códigos de significância: 0 '***' 0.001 '**' 0.01 '*' 0.05 '.' 0.1 ' ' 1

Desvio nulo: 73.001 em 52 graus de liberdade


Desvio residual: 24.633 em 43 graus de liberdade

AIC: 44.633
Número de iterações de Score de Fisher: 18

Ser o único animal em casa está negativamente associado a fazer parte do grupo de estudo, ou
seja, viver em agregados com mais do que um animal está positivamente correlacionado com o
desenvolvimento dos distúrbios comportamentais relacionados com o medo. Por outro lado, ser
instruído sobre comportamento animal pelo veterinário ou por um treinador profissional está
positivamente correlacionado com estar incluído no grupo de estudo.
A diferença entre os desvios nulo e residual indica que o modelo de regressão logística final
explica os dados melhor do que o modelo nulo (sem factores). O modelo também testou
negativamente para sobredispersão, indicando um bom ajuste aos dados analisados.

4.3.2 Análise descritiva de dados sobre animais diagnosticados com distúrbios relacionados
com o medo
Todos os animais foram diagnosticados previamente na clínica de especialidade de Medicina
Comportamental. Destes, apenas 10% tinham sido diagnosticados previamente pelo veterinário
assistente e menos de 7% por um treinador profissional. A grande maioria dos cães (75%) foi
diagnosticada com mais do que um medo patológico (gráfico 1), e o medo mais prevalente foi de
45
outros animais (66%), seguido de medo/fobia de ruídos (59%), ansiedade por separação (47%);
medo de pessoas (38%) e outros (28%).

Gráfico 1 - Frequências dos diferentes tipos de medos nos animais estudados.


66%
59%
47%
38%
Sim
Não

Animais Pessoas Ans. Ruídos


Separação

A grande maioria dos donos inquiridos (91%) reportou sinais prévios de medo nos seus animais
durante a adolescência sendo que, no entanto, o ladrar foi o único sinal significativamente mais
prevalente. Apenas metade dos inquiridos conseguiu identificar um incidente prévio que pudesse
estar relacionado com o desenvolvimento do medo em questão. Como apresentado no gráfico 2,
dois terços dos donos referem que o seu animal foi habituado ao estímulo problemático durante a
adolescência.
Gráfico 2 - Distribuição da habituação ao estímulo problemático durante os dois períodos de
desenvolvimento estudados – período sensível e adolescência.

66%

Sim
25% Não
Não sei

Até aos 3m Até aos 18m

Foram ainda analisadas as reacções dos inquiridos às demonstrações de medo dos seus animais:
cerca de 70% dos donos procuraram acompanhamento profissional; 70% tentaram acalmar o cão
dando-lhe atenção/afecto;15% puniram o comportamento; 18% ignoraram o cão enquanto
expressava estes comportamentos.

46
4.4 Discussão
4.4.1 Sobre o estudo comparativo sobre as variáveis envolvidas no desenvolvimento de
distúrbios relacionados com o medo
A relevância de variáveis intrínsecas e extrínsecas para o desenvolvimento de problemas
comportamentais tem sido alvo de diferentes estudos. Os resultados obtidos são, no entanto,
controversos, com estudos diferentes a publicar conclusões divergentes acerca da mesma
variável. Por exemplo, enquanto alguns alegam que a idade, sexo e experiência prévia dos donos
estão significativamente correlacionados com o desenvolvimento de distúrbios comportamentais
(Jagoe & Serpell, 1996; Kobelt, Hemsworth, Barnett, & Coleman, 2003; Podberscek & Serpell,
1997), outros não revelam existir qualquer correlação significativa (Bennett & Rohlf, 2007; Hsu
& Sun, 2010). O mesmo acontece com grande parte destas variáveis.
Estas diferenças podem dever-se à grande variação na metodologia de recolha e tratamento
estatístico dos dados por parte dos diferentes autores. Enquanto a maioria dos estudos emprega
metodologias estatísticas univariadas, a compreensão da real contribuição das diferentes variáveis
independentes para a variável dependente em estudo, assim como a eliminação de factores de
confusão25, carece de uma abordagem estatística multivariada, especialmente no estudo de
complexas realidades biológicas (Bender & Lange, 2001; Pocock, 1997). O presente estudo
procurou aplicar um método estatístico multivariado de regressão logística para compreender as
relações entre as diferentes variáveis de uma forma mais realista e precisa.
Esta abordagem permitiu ainda comparar as diferenças nas conclusões resultantes das análises
multivariada e univariada. A metodologia univariada levar-nos-ia a retirar conclusões que a
análise multivariada não suporta, entre elas: discordar de Jagoe & Serpell (1996) e Kobelt et al.
(2003) e concluir que as pessoas com experiência prévia com animais estão significativamente
mais predispostas a ter – ou reconhecer – animais com problemas comportamentais; concordar
com Hsu & Sun (2010) e Bennett & Rohlf (2007) que a dimensão do agregado familiar e, no
nosso caso, a presença de crianças durante o período sensível e a adolescência do cachorro está
positivamente correlacionado com o desenvolvimento destes distúrbios; deduzir que quanto mais
agitado (maior a exposição a diferentes estímulos, tanto geradores de experiência positivas como
aversivas) for o ambiente do animal durante o período sensível, maior a predisposição para o
aparecimento de distúrbios comportamentais.

25
Tradução livre do inglês “confounding factors” – variáveis que se correlacionam entre si e com a variável dependente.
47
No entanto, nenhuma das anteriores ilações foi confirmada pela análise estatística multivariada,
que apenas revelou diferenças significativas entre grupo controlo e de estudo para três variáveis.
Em primeiro lugar, a presença de outros animais na mesma casa foi positivamente associada ao
diagnóstico de distúrbios comportamentais relacionados com o medo. Uma interpretação possível
é a de que viver com outros animais pode estar directamente associado ao desenvolvimento
destes distúrbios. No entanto, sabendo que o medo de outros animais é o mais comummente
reportado tanto em estudos publicados (Temesi et al., 2014) como na nossa amostra (ver 4.3.2), é
possível que animais predispostos ao desenvolvimento destes distúrbios não tenham os
mecanismos emocionais (e neurofisiológicos) necessários para viver em contacto próximo com
outros animais, precipitando a expressão desse medo. Este factor não é comumente discutido na
literatura e os resultados reportados são recorrentemente contraditórios: enquanto Kumiko (2006)
concluiu que viver com outros animais é um factor de risco para o desenvolvimento de
sonofobias, Hsu & Sun (2010) reportaram que estes animais demonstram significativamente
menos comportamentos agressivos direccionados aos donos e Kubinyi et al. (2009) concluíram
que cães que coabitavam com outros cães estavam correlacionados com temperamentos mais
calmos.
As duas outras variáveis positivamente correlacionadas com distúrbios comportamentais
relacionados com o medo foram aprender comportamento animal com o veterinário e aprender
comportamento animal com o treinador. Apesar destes resultados, descontextualizados, poderem
originar interpretações bizarras, a conclusão mais lógica será que os donos de animais com
distúrbios comportamentais têm uma maior probabilidade de, em alguma fase, procurar a
intervenção de um veterinário ou treinador profissional. Não foi possível discriminar se esta
aprendizagem foi feita antes ou depois do desenvolvimento do distúrbio, pelo que, na ausência de
informações contrárias, estas variáveis não devem de forma alguma ser vistas como factores de
risco. No entanto, estes resultados reforçam a importância dos veterinários e treinadores
investirem na formação especializada e actualizada sobre distúrbios comportamentais, visto
serem as fontes primárias de informação a que recorrem os donos destes animais. Estudos
comprovam a eficácia de um aconselhamento profissional durante a infância do cachorro na
prevenção de problemas comportamentais (Gazzano, Mariti, Alvares, et al., 2008).
Diversos estudos encontraram uma correlação entre o ambiente e o desenvolvimento de
distúrbios comportamentais (Appleby et al., 2002; Foyer et al., 2013; Hsu & Sun, 2010; Temesi
et al., 2014). Embora, para este caso, os resultados da análise multivariada possam sugerir

48
concordância com os da univariada, no sentido de uma eventual correlação positiva entre viver
num ambiente agitado até aos três meses e desenvolver distúrbios comportamentais relacionados
com o medo, esta correlação não atingiu significância estatística (p=0.066). Seriam necessários
mais estudos para esclarecer esta potencial correlação.
O facto do grupo de estudo ter obtido uma classificação média na escala de comportamento de
medo estatisticamente muito superior ao controlo (p<0.001) corrobora os resultados de estudos
anteriores sobre a capacidade dos donos reconhecerem tal comportamento (Jones & Gosling,
2005; Tami & Gallagher, 2009). Este resultado legitima a inclusão no grupo de estudo de alguns
animais previamente inseridos no grupo controlo, após os seus donos reportarem níveis de medo
anormalmente altos.
Os animais do grupo de estudo demonstraram sinais comportamentais prematuros de medo mais
frequentemente do que no grupo controlo – durante a adolescência 91% dos animais do grupo de
estudo já demonstravam estes sinais (principalmente relativos a outros animais e ruídos), em
comparação com 50% no grupo controlo (p<0.001). Esta variável não foi incluída na regressão
logística por não representar qualquer tipo de potencial factor de risco, mas demonstra que sinais
prematuros de medo patológico podem ser detectados tão cedo como durante os primeiros meses
de vida. Estes resultados estão em concordância com outros estudos (Godbout & Frank, 2011a;
Godbout et al., 2007) e com a opinião de diversos especialistas em Medicina do Comportamento,
que dizem que estes distúrbios comportamentais podem ser detectados prematuramente e um
plano terapêutico pode ser iniciado durante a fase de crescimento do cachorro (ex.: Landsberg et
al., 2013; Overall, 2013a).
A ausência de correlações significativas é, em si, um resultado significativo, que: concorda com
Bennett & Rohlf (2007) que também não encontrou correlação entre o género do animal e
problemas comportamentais mas discorda de Hsu & Sun (2010) que descrevem os machos como
mais predispostos a demonstrar agressividade redireccionada ao dono ou de Temesi et al. (2014)
que concluíram que as fêmeas demonstram mais medo de outros animais; discorda também de
Blackwell et al. (2013) relativamente à influência da idade no desenvolvimento de sonofobias
(embora o presente estudo tenha a limitação de apenas incluir animais até aos 11 anos de idade);
concorda com Bennett & Rohlf (2007) relativamente à idade de adopção (sendo que também este
era um critério de inclusão no presente estudo) mas discorda que o treino tenha algum efeito na
expressão de distúrbios comportamentais. O estado sexual (inteiro ou esterilizado) do animal tem
sido associado a diferentes resultados em diversos estudos – ex.: Hsu & Sun (2010) reportaram

49
animais esterilizados como significativamente menos agressivos e Bennett & Rohlf (2007) como
menos ansiosos mas mais tímidos, enquanto Messam, Kass, Chomel, & Hart (2008) não
encontraram qualquer correlação. O presente estudo não permitiu avaliar esta variável, pois
apenas integrou 1 macho inteiro e 1 fêmea inteira. Este facto dever-se-á à elevada prevalência de
animais castrados na região de Sydney, altamente promovida pelas políticas locais e hábitos
culturais.

Limitações do estudo:
O presente estudo apresenta algumas limitações que devem ser consideradas para garantir a
correcta interpretação e acautelar a eventual extrapolação dos resultados.
Em primeiro lugar, sendo um estudo retrospectivo, não pode estabelecer relações definitivas de
causa-efeito entre variáveis – pode apenas revelar a existência de uma co-relação, mas não a sua
direcção (Hsu & Sun, 2010). Em segundo lugar, a dimensão da amostra de 65 animais pode ter
limitado a obtenção de resultados estatisticamente significativos para algumas variáveis que, no
caso de uma amostra maior, se demonstrassem relevantes.
Por outro lado, a redacção de algumas questões particulares pode não ter sido clara relativamente
ao momento a que se reportavam, o que foi especialmente relevante para o grupo de estudo.
Como não foram dadas indicações claras aos inquiridos sobre se estas questões remetiam a antes
ou depois do momento do diagnóstico, a interpretação dessas questões constitui, assim, outra
limitação (ex.: fonte de informação sobre comportamento animal; treino; duração e frequência
dos passeios).
Por último, o questionário não abordou informação importante sobre alguns factores intrínsecos
considerados essenciais no desenvolvimento de distúrbios comportamentais, como o historial
comportamental dos irmãos, pais e outros familiares. Esta foi considerada a limitação mais
importante do estudo, pois impediu a avaliação da relevância da genética no desenvolvimento de
distúrbios comportamentais relacionados com o medo.

50
4.4.2 Sobre a análise descritiva de dados sobre animais diagnosticados com distúrbios
relacionados com o medo
A análise descritiva sobre os animais diagnosticados com distúrbios comportamentais
relacionados com o medo teve como objectivo ajudar a compreender algumas tendências e
padrões reportados pelos seus donos.
Os dados indicam que apenas 10% destes animais foram previamente diagnosticados pelo
veterinário assistente e menos de 7% por um treinador (embora 94% dos animais tenha tido
algum tipo de treino). Importa salientar que esta amostra foi recolhida numa clínica de
especialidade, onde os cães foram efectivamente diagnosticados com um distúrbio específico. É,
portanto, possível que a maioria dos donos entenda que o diagnóstico foi feito pelo especialista e
não pelo veterinário ou treinador. No entanto, estes dados podem evidenciar a dificuldade dos
veterinários generalistas na abordagem e terapêutica de problemas comportamentais, dificuldades
previamente referidas por outros autores (Lord, Reider, Herron, & Graszak, 2008; Roshier &
McBride, 2013).
Três quartos dos animais apresentavam mais do que um medo patológico que, ordenados por
ordem descrescente de frequência, foram: medo de animais; medo de ruídos/sonofobia; ansiedade
por separação; medo de pessoas; outros.
Apenas metade dos inquiridos conseguiu identificar um incidente específico potencialmente
relacionado com o início da expressão de comportamentos desviantes do seu animal. No entanto,
91% reportaram sinais evidentes destes comportamentos durante a adolescência, embora 66%
tenham referido que o animal foi habituado (segundo a perspectiva do dono) ao estímulo
problemático durante os primeiros meses de vida. Estes dados permitem questionar a capacidade
dos donos em executar uma habituação adequada, assim como de detectar sinais iniciais
(geralmente subtis) de medo, o que transforma o processo de suposta habituação numa
sensibilização. Por outro lado, a ausência de um incidente claro que marque o início da resposta
comportamental patológica é concordante com alguns autores (ex.: Bear et al., 2007) que
afirmam que alguns medos são intrínsecos ao indivíduo, não dependendo de acontecimentos
específicos que os despoletem e, portanto, improváveis de prevenir.
Quando inquiridos sobre a sua reacção aos comportamentos do seu animal, os donos
responderam o seguinte: 70% tentou acalmar o animal com afecto; 70% procurou ajuda
profissional; 18% ignorou o animal enquanto este expressava o comportamento; 15% puniu o
animal de alguma forma. A análise destes resultados revela um desvio em comparação com a

51
literatura publicada, possivelmente devido a um viés de selecção da amostra: Blackwell, Twells,
Seawright, & Casey (2008) reportaram que apenas 18% dos donos de animais com distúrbios
comportamentais procuraram aconselhamento profissional, Blackwell et al. (2013) falam em 29%
e Lord, et al. (2008) afirmam que a maioria dos donos destes animais considera consultar um
treinador em vez de um veterinário. Mesmo na nossa amostra de donos privilegiada – no sentido
que a ligação ao animal e a importância na sua vida os levaram a investir em ajuda especializada
e na implementação de um exigente plano terapêutico –, 15% dos donos referiu utilizar técnicas
punitivas no seu animal. Como abordado anteriormente, a utilização de punição não traz qualquer
benefício para nenhum dos intervenientes, tendo já sido relacionada com um aumento da
probabilidade de ocorrência de respostas agressivas (Herron et al., 2009).

CONCLUSÕES e CONSIDERAÇÕES FINAIS


Os distúrbios comportamentais são uma das principais causas de eutanásia e abandono de animais
de companhia. Ambos os estudos desta dissertação realçam a necessidade do veterinário se
destacar como um profissional instruído, sensível e actualizado na matéria do comportamento
animal, de modo a conquistar a confiança dos donos. Este investimento possibilitará, no futuro, a
inversão da tendência verificada actualmente, em que os donos destes animais recorrem mais
prontamente a fontes de informação menos qualificadas. Conclui-se também que os distúrbios
comportamentais relacionados com o medo podem e devem ser diagnosticados precocemente nos
primeiros anos de vida, de forma a implementar planos terapêuticos adequados e eficazes.
Foi possível evidenciar o efeito do tratamento estatístico na inferência de conclusões, realçando a
necessidade de aplicação de métodos de análise multivariada no estudo de eventuais correlações
entre variáveis biológicas, com vista a obter resultados credíveis e realistas, que promovam a
correcta evolução do entendimento científico numa área de estudo tão complexa e relevante.
Coabitar com outros cães foi positivamente associado ao diagnóstico de distúrbios
comportamentais relacionados com o medo. Uma interpretação possível é a de que viver com
outros animais pode estar directamente associado ao desenvolvimento destes distúrbios. No
entanto, é possível que a expressão deste problema seja precipitada pela convivência próxima
com outros animais, em indivíduos predispostos para tal.
Estudos futuros dever-se-iam focar igualmente nos aspectos genéticos do comportamento de
medo, de forma a compreender a relevância destes no desenvolvimento de distúrbios
relacionados.

52
Por outro lado, a temática da agressividade ainda divide a literatura, com alguns autores a
defender a componente do medo como motivação essencial na sua génese e outros a entender que
a agressividade por medo é apenas uma das diversas formas possíveis de expressar agressividade.
Estudos futuros ideais seriam do tipo comparativo, estudariam amostras com dimensões
representativas, teriam um desenho prospectivo, englobariam as variáveis genéticas/familiares e
empregariam uma análise estatística adequada – muito provavelmente do tipo multivariado.

53
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4(Jun), 1–22.

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Anexo 1 – Questionário original distribuído aos donos para recolha dos dados

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