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12.º ANO
Eugénio de Andrade
Os trabalhos da mão
Começo a dar-me conta: a mão
que escreve os versos
envelheceu. Deixou de amar as areias
das dunas, as tardes de chuva
miúda, o orvalho matinal
dos cardos. Prefere agora as sílabas
da sua aflição.
Sempre trabalhou mais que sua irmã,
um pouco mimada, um pouco
preguiçosa, mais bonita.
A si coube sempre
a tarefa mais dura: semear, colher,
coser, esfregar. Mas também
acariciar, é certo. A exigência,
o rigor, acabaram por fatigá-la.
O fim não pode tardar: oxalá
tenha em conta a sua nobreza.
Eugénio de Andrade
Bom e Expressivo
Manuel Alegre
Jorge de Sena
Prospeção
A sílaba
Não são pepitas de oiro que procuro. Toda a manhã procurei uma sílaba.
Oiro dentro de mim, terra singela!
Busco apenas aquela É pouca coisa,é certo:uma vogal,
Universal riqueza uma consoante,quase nada.
Do homem que revolve a solidão:
O tesoiro sagrado Mas faz-me falta.Só eu sei
De nenhuma certeza, a falta que me faz.
Soterrado
Por mil certezas de aluvião. Por isso a procurava com obstinação.
Cavo,
Lavo, Só ela me podia defender
Peneiro, do frio de janeiro,da estiagem
Mas só quero a fortuna do verão.Uma sílaba.
De me encontrar.
Poeta antes dos versos Uma única sílaba.
E sede antes da fonte.
Puro como um deserto. A salvação.
Inteiramente nu e descoberto. Eugénio de Andrade
Miguel Torga
Os trabalhos e os dias
Sento-me à mesa como se a mesa fosse o mundo inteiro
e principio a escrever como se escrever fosse respirar
o amor que não se esvai enquanto os corpos sabem
de um caminho sem nada para o regresso da vida.
É preciso um país
E de Novo, Lisboa...
E de novo, Lisboa, te remancho,
numa deriva de quem tudo olha
de viés: esvaído, o boi no gancho,
ou o outro vermelho que te molha.
Um grande soberano
No seu triste destino
De ser um monstro humano
Por direito divino.
Miguel Torga
Espionagens verbais
Nuno Júdice
Comunhão
Lamento
No meu país não acontece nada
Pátria sem rumo, minha voz parada à terra vai-se pela estrada em frente
Diante do futuro! Novembro é quanta cor o céu consente
Em que rosa-dos-ventos há um caminho às casas com que o frio abre a praça
Português?
Um brumoso caminho Dezembro vibra vidros brande as folhas
De inédita aventura, a brisa sopra e corre e varre o adro menos mal
Que o poeta, adivinho, que o mais zeloso varredor municipal
Veja com nitidez Mas que fazer de toda esta cor azul
Da gávea da loucura?
Ah, Camões, que não sou, afortunado! Que cobre os campos neste meu país do sul?
Também desiludido, A gente é previdente cala-se e mais nada
Mas ainda lembrado da epopeia... A boca é pra comer e pra trazer fechada
Ah, meu povo traído, o único caminho é direito ao sol
Mansa colmeia
A que ninguém colhe o mel!... No meu país não acontece nada
Ah, meu pobre corcel o corpo curva ao peso de uma alma que não
Impaciente, sente
Alado Todos temos janela para o mar voltada
E condenado o fisco vela e a palavra era para toda a gente
A choutar nesta praia do Ocidente...
Miguel Torga E juntam-se na casa portuguesa
a saudade e o transístor sob o céu azul
A indústria prospera e fazem-se ao abrigo
PORTUGAL da velha lei mental pastilhas de mentol
1. Façam uma interpretação dos poemas: tema e assunto, principais recursos expressivos e a sua
expressividade;
2. Identifiquem a temática aglutinadora dos poemas (Representações do contemporâneo; Tradição
Literária; Arte Poética...), apresentando elementos textuais que fundamentem a mesma;
3. Se posicionem criticamente em relação aos poemas analisados, recorrendo a uma linguagem
valorativa e desenvolvendo um juízo de valor explícito;
4. Apresentem os pontos anteriores à turma numa intervenção oral que não deve exceder os 45 mn
por sala, distribuídos equitativamente pelos elementos do grupo de trabalho.