Você está na página 1de 7
9 A Grande Golpada Londres, 19 de Setembro, 9h. e 20m. John Melville Mitchell, 53 anos, franzia, zangado, ° sobrolho, quando o telefone comecou a tocar. — Sim, que se passa Kathie? — perguntou ele, um pouco mais desagradavel que de costume. —A sua esposa deseja falar-lhe! O semblante de Mitchell alegrou-se imediatamente. — Esta, querida, nao é nada habito tu telefonares a estas horas. Pensei que ainda estavas a dormir! Nenhuma resposta. Em compensagao, um ruido que parecia um solugar oprimido. Mitchell ficou perplexo e sentiu como que um estra- nho desassossego. —Estd, Diana, 0 que aconteceu? A voz de Diana interrompida pelos solugos: —John ... John, aconteceu ... aconteceu uma ... coisa horrivel ... Mitchell sentiu que de repente lhe custava a res- pirar. Depois apareceu uma outra voz na linha. Uma voz de homem abafada, claramente disfargada: ) — ica atentamente, senhor Mitchell. Se quiser que nada aconteca & sua mulher, faa o que lhe digo ... — Mas ... — queixou-se Mitchell. : i _— Nao me interrompa, senhor! Saia imediatamente, v4 ao banco na Richmond-Street e levante vinte mil libras em notas pequenas. Depois volte ao seu escritorio. 67 Sao agora ... nove horas e vinte Wilcox. Entregue-the o dinheiro .. pe Arthur A Ee de ee soou roucamente: Ts queria falar com i pee a minha mulher .. Siléncio. Depois: —John ... John, ajuda-me , » -.. por favor, por f, ajuda-me ... ajuda-me ... — A voz de Disiia Matched apagou-se como uma vela. Ouviu-se um estalido na linha. : Com os dedos a tremer, Mitchell discou o seu numero particular. Ocupado! Mais uma tentativa ... e agora teve de discar duas Vezes, porque no seu estado de nervos nao via bem ° marcador. Novamente ocupado. Tinham, com certeza, Posto o auscultador fora do descanso. Olhou para o relégio. 9h.e 24m... Como um Taio, veio-lhe a ideia da policia. Deveria ele ... Nao, pés este pensamento de lado, tao depressa quanto the tinha surgido. Levantou-se. Sentia as pernas pesadas e hirtas, enquanto o n6é na garganta se tornava cada vez mais apertado. Kathie Hamilton olhou estupefacta para o seu Palido chefe, como se se tratasse de uma assombra¢io. Ele tentava sorrir-the. — Vou ao banco, Kathie ... iS Ela fez um sinal afirmativo, apenas quando ele j4 tinha desaparecido ha muito. John Melville Mitchell, inico dono da afamada ourivesaria londrina Mitchells Goldhouse Company. atravessou a St. Patrick-Street como em transe, comprou na Bolton & Redford uma pequena mala azul ¢ diri- - por 68 giu-se a Richmond-Street. A cada passo ouvia a voz de a: «ohn, ajuda-me ... ajuda-me ... ajuda-me ...» Comegou a andar mais depressa, mas a voz con- tinuava: «ohn, ajuda-me ... ajuda-me ... ajuda-me ...» As 9h. e 55m. estava de novo sentado atrd4s da secretdria de mogno, tremendo. 9 horas e 56 minutos ... 9 horas e 57 minutos ... Olhava para o reldgio quase regularmente, em inter- valos de 10 segundos. 9 horas e 59 minutos ... Devagar e hesitante, tacteou até ao telefone; com um movimento prudente tirou o auscultador do descanso a Discou o seu numero particular ... Sem resul- “eS 10h e 10m. Daf a cinco minutos seria a altura. Os seus olhos envolveram a mala em cima da cadeira dos visitantes. 20 000 libras. Uma grande quantia de dinheiro, uma soma imponente! Mas parecia-lhe bastante insigni- ficante quando pensava em Diana. 10h. e 15m. Onde teria ficado esse senhor Wilcox? S6 nesta altura Mitchell sentiu o suor cair-lhe pela testa. O telefone. John Mitchell puxou o auscultador para junto de si. Ouviu a voz calma e pausada de Kathie Hamilton: —Um senhor Arthur Wilcox deseja falar-lhe, se- nhor! —Eu deixo ... mande-o entrar! A pessoa que entrou assemelhava-se, no porte ¢ na maneira de vestir, a um gentleman, segundo os melho- res moldes ingleses. Mitchell calculou que ele tivesse 30 anos. Wilcox fez uma reveréncia formal. 69 —E a minha maulher? — _ Esté vivae sobreviver4, transacciio, se o senhor conti Sato. — Dava a sensagao de que um sorriso brincava em torno dos labios do chantagista. Um sorriso irdnico, —Esperto e sensato como? — Do outro lado da rua hé uma cabina telefonica. De ld telefonarei ao meu sécio. Assim que eu abandone a cabina telefénica, espera mais cinco minutos —e depois pode telefonar & sua mulher... ou a policia! Mas se for um minuto antes... — Wilcox deu um passo em frente e nos seus olhos havia uma expressio selvagem — um minuto antes 0 senhor nao reconhecerd a sua mulher! Mitchell estremeceu. : —Pela tiltima vez, senhor, o dinheiro! —O ourives apontou para a mala. Wilcox abriu os fechos ¢ olhou para o contetido. Um abanar de cabega satisfeito. Mais uma rever€éncia. — Foi um prazer, senhor! ‘ ‘ iba Mitchell esperou um minuto e depois 7 para a janela; voltou para a secretdria; 0 ae teletone ainda estava ocupado; novamente para ae Wilcox atravessou agora a fua, en eda telefonica, pegou no auscultador, 5 Fe edonoa a discou—e voltou a desligar. Quando al ireccao a cabina telefénica, acenou para cima em direcgac Mitchell, que se desviou rapidamente da janela © othou . * Vol i ssar cinco minutos. YO! para O relégio. Devia deixar pa: V a a marcar o seu numero particular... tique — tq’ tou tl t — tique — tique, ocupado. perguntou ele. sem danos, a esta pequena nuar a ser esperto e sen- 7 Bea me Precisamente seis minutos passados, Mitchel] tele. fonou para a policia e, depois, foi a correr para a gara- gem da cave, até ao seu carro. ? Um engarrafamento de transito na Rackland-Road Teteve-o quase 20 minutos. John Melville Mitchel julgou desesperar. Diana, 28 anos, casada com Mitchell hé quatro anos. bem como 0 inspector Tom Garnett da Scotland Yard. esperavam-no juntos. Diana, pélida e trémula, Garnett cheio de impaciéncia. —Tenho imensa pena — balbuciou Mitchell rouca- Mente —, mas estava um camido virado na Rackland- -Road e nao se andava nem para a frente nem para trds Garnett abanou a cabega afirmativamente. —A sua mulher j4 me informou de tudo. Nio temos tempo a perder... — Eu estive sempre a tentar telefonar-te, mas estava sempre impedido ... Diana solugava. —O homem que te telefonou fez qualquer coisa ao telefone depois do telefonema. Eu quis telefonar quando ele se foi embora, mas nao consegui... O inspector intrometeu-se: — Podem falar disso mais tarde. Por favor, senhor, descreva-me o homem que 14 foi buscar o dinheiro e descreva-me também a mala. Mas exactamente! O mais pequeno pormenor pode ter muitissima importancia! Mitchell olhava para a sua chorosa mulher sem saber o que fazer, mas ela abanou a cabeca na sua direcgac —Eu ja estou melhor, querido... Agora tens de ajudar o inspector. E Mitchell relatou, Desde o primeiro segundo deste terrivel acontecimento. 72 Doze horas mais tarde. Era quase meia-noite .., Diana oferecia precisamente um whisky ao seu marido, quando este se levantou repentinamente, se diri- giu ao telefone e telefonou para a Scotland Yard ... Quando desligou, Diana olhou-o com uns olhos grandes e assustados. —Por que € que tem que cd vir um agente a estas horas, John? O olhar de John Mitchell era fixo, mas cheio de tristeza quando respondeu: —Ele vai interrogar-te, Diana! O copo de whisky caiu redondo sobre o tapete. —A mim? —Sim, Diana. $6 neste momento se me tornou claro que tu foste cumplice desta chantagem! Nunca houve um segundo homem ... Um caso muito dificil. Quem o resolver é de facto um detective eximio. A nossa pergunta: Através de que facto atribuiu Mitchell as culpas @ sua mulher? 3

Você também pode gostar