Você está na página 1de 7
7 Conversa de Bonecas O comissdrio Joost van Druisen, do Departamento de Estupefacientes de Amsterdao, estava em diivida, Pela sexta vez nesse ano —era Agosto — soube, pelo seu comissdério Ake Holl, que tinha chegado ao porto de Roterdao um carregamento gigantesco de estupefacientes. Como era hdbito num caso destes, ordenou ime- diatamente uma grande rusga. Mas, apesar de intensas investigacdes, esta rusga tivera apenas um éxito parcial: 29 quilos de haxixe puderam ser postos a salvo. Mas para onde poderia ter ido o restante produto? De que pais tinha sido importado o material? De que cidade? Em que barcos teria sido introduzida a droga no segundo maior porto do Mundo? De que maneira teria éxito esta organizacao cri- minosa? Perguntas ... Perguntas sobre perguntas, a que Van Druisen ainda nado conseguira responder, apesar de intensas investiga- goes. Finalmente, estavamos j4 a 21 de Outubro, surgia no horizonte um raio de luz e de esperanga no esclare- cimento de tudo. Assim, a policia conseguiu finalmente prender um dos cabecilhas. Tratava-se de Jan Kenatzky, naturali- zado polaco, que estava disposto a desabafar. 54 ae. Através dele, Van Druisen descobriu duas coisas: havia em Amsterdao um homem onde iam descarrilar todos os carris. Contudo, Zenatzky nao sabia nem o nome nem a morada deste chefe, pois todas as informa- gdes, tais como «Quando», «Onde», «Quanto», eram dadas pelo telefone. Por outras palavras: Jan Kenatzky conhecia apenas a voz da figura central. Mas a segunda informag&o era bem mais importante. Kenatzky desco- brira-a, apéds algumas suspeitas, apenas por mero acaso, e guardou-a como quem guarda um tesouro. Dizia ela que no dia S de cada més chegava ao aeroporto Skipol um francés de nome Mertier. Este Mertier era o men- sageiro da central e trazia, em cédigo, todas as informa- gdes acerca da poreao exacta, da data e do caminho através do qual a droga chegaria ao pais, ao tal chefe desconhecido. Joost van Druisen era demasiadamente desconfiado para comegar a vangloriar-se. Apesar disso, sentia uma sensacéo de comichado quando pensava no préximo dia 5. Contudo, ainda 15 dias o separavam daquele deci- sivo dia 5 de Novembro. Dia 5 de Novembro. Todos os preparativos estavam terminados. A rede era téo tapada que apenas poderia escapar um homem de tapete voador. O avido de Paris deveria aterrar 4s 10h. e 25m. Encarregada de tal, a Air France comunicou que se encontrava um tal Henry Mertier a bordo do Boeing 727. O plano do comissd4rio Druisen era o seguinte: uma vez que nao se conhecia a identidade de Mertier, tinha-se combinado com os funciondrios da alfandega para estes exigirem —o que nao € normalmente habito — os bilhe- tes de avido. Neles estavam escritos os nomes dos via- 55 jantes. Finalmente, deixar-se-iam conduzir por Mertier até junto do misterioso chefe. 10 horas e 40 minutos. Um dos funciondrios da alfandega tirara o boné O sinal combinado! : O meridional, que quase parecia um toiro e que estava diante dele, devia ser Henry Mertier. Consigo trazia uma pequena mala e, pela m4o, uma menina pequena. Ela tinha, quando muito, cinco anos. Os caracéis preto-azeviche caiam-lhe sobre os ombros, Falava incessantemente, comprimindo contra si uma grande boneca daquelas que falam. Mertier tomou um taxi. A elegante e enorme casa e o extenso jardim da Gorgan-Straat estavam cercados por mais de 30 policias. Precisamente hé um minuto, um homem tinha man- dado entrar Mertier. O comissdrio Joost van Druisen bateu a porta. Desta vez abriu a porta uma jovem. Provavelmente uma empregada, pois trazia um espanador na mao esquerda. Van Druisen empurrou a jovem, surpreendida, para o lado, mostrando-lhe o seu distintivo e dizendo baixinho: — Policia judicidria. Nem uma palavra alto, se me permite pedir. Onde esté metido o senhor Mertier? A rapariga comegou a tremer, apontou para uma porta de carvalho almofadada e balbuciou com uma voz trémula: —Com o do... com o do... —engoliu em seco. Van Druisen perguntou: —Com o doutor Van Escheboin? Desta vez ela fez um sinal afirmativo. Juntamente com outros trés policias, o comissario dirigiu-se & porta indicada, bateu rapidamente e abriu. 56 cas Bs GS iS Mertier e a pequena Nannette tinham ainda casacos de Inverno vestidos, e Nannette comprimia aj a a sua boneca contra o corpo. ned “G Oo Dr. Ari van Escheboin, 0 dono da casa, € 0 sey visitante tinham copos de conhaque na mio e parecia querer fazer um brinde. q Van Druisen apresentou-se. — Policia judicidria? Que significa isto? — pergun- tou Escheboin enrugando a testa. —Eu tenho um mandado de captura contra o senhor Henry Mertier. Nem Mertier nem o Dr. Van Escheboin pareciam especialmente surpreendidos. Este tiltimo dirigiu-se 4 sua secretdéria. E, enquanto levantava o auscultador, disse: —Eu vou telefonar ao meu amigo, o cénsul fran- cés. A situagéo ird, certamente, interessar-lhe. O comissdrio esbogou uma reveréncia. — Evidentemente que pode telefonar ao seu amigo, o cénsul francés. Ele pode visitar o senhor Mertier na prisio em qualquer ocasiao...— E com um sorriso ami- gavel, Van Druisen prosseguiu: —E se o seu amigo, 0 cénsul francés, nao se despacha, pode ir visité-lo também a si no mesmo local. Espero que saiba apreciar a minha boa vontade. O Dr. Van Escheboin voltou a pousar o auscultador no descanso. De repente, a sua cara pareceu tornar-se acinzentada e vencida. —Que quer o senhor dizer com isso? : —Daqui a uma hora, o mais tardar, terei nas minhas maos um mandado de captura também para si. E ainda uma ordem de busca, que nesta altura, tendo em vista certos acontecimentos, me parece set ainda mais interessante! —E de que me acusa? __Trdfico de estupefacientes, doutor Van Esche- boin! 58 O outro soltou uma gargalhada rouca. —-Se o senhor nao se tramar! Quase parecia que era o que iria acontecer. Uma grande derrota e uma situagdo ridicula ainda pior comecavam a desenhar-se. A busca feita a Mertier tinha trazido tao pouco a luz do dia como até aquele ins- tante — 20h. e 45 m. — a rusga feita a vivenda do Dr. Van Escheboin. — Nao lhe passou nada despercebido? — perguntou o comissdrio a um dos seus especialistas. Jaap de Moiselen abanou a cabega. — Nada, chefe. As investigagdes feitas com o apa- telho de raios X foram também todas negativas. Se Tappe e o seu grupo nao encontrarem nada, nao ha nesta casa mesmo nada de estranho. —E quanto a4 menina? — Foi a senhora Helgerson quem a revistou. Anita Helgerson estava junto a Moiselen. Como se estivesse apenas a espera da sua deixa, relatou: —Uma bonequinha encantadora. Confiante e meiga. Mas também ela nao tinha nada consigo. —Acaso a boneca nao terd nada? — gritou Van Druisen. — Uma boneca que fala, bastante comum. Néds inspecciondmos as roupas, desatarrachdmos-lhe a cabecga e cortémos todas as pecas—sem resultado. Isto é, o resultado foi a mitida comegar a gritar terrivelmente. Fred Amellen comprou-lhe uma boneca nova. Igual, evi- dentemente. —E acrescentou baixinho: — A conta esta sobre a sua secretdria, senhor comissdrio. Durante trés minutos 0 comissdrio andou de um lado para o outro sem parar. De repente deteve-se. Surgiu-lhe uma ideia incri- vel. Com trés passos chegou até junto da funcionaria. 59 —-Onde estd agora a boneca estragada? _Est4 ainda no meu armario! —respondeu Anita Helgerson assustada. — Traga-a. Cinco minutos depois, Joost van Druisen triunfava. Ele tinha descoberto a solucao. Uma solucio imensamente simples, mas atrevida. Tudo quanto ele tinha que saber estava na sua frente, palavra por palavra ... Meses mais tarde, ainda se comentava como seria possivel n&o se terem lembrado precisamente daquilo. Bem, afinal onde encontrou o comissdrio Van Drui- sen a solugao do caso? 60

Você também pode gostar