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Sangrada
Otávio Marques
Preto e Vermelho
Visto preto e vermelho
Pulso em preto e vermelho
Sou preto e vermelho
Vermelho do sangue arrancado
dos negros
Preto das cinzas que restaram
dos originários
Sou preto e vermelho
Resistência!
A cada passo resistência!
Mas em mim pulsa também o
branco
E eu renego
Eu renego!
Aos meus ancestrais me entrego
Sou cria de Tupã e Oxalá
Xangó, quando a tempestade vai
passar?
Quando o genocídio vai parar!?
Iansã me dê forças pra lutar
Guiado por caboclos e pajés
Dói a lembrança do grilhão nos
pés e da mata a queimar
Mas Guaraci me contou, à nós
há de brilhar
Só unidos iremos conquistar
A liberdade das correntes dos
cari
Sangraremos muito antes de
conseguir
Mas ai,
Quantos vão sangrar se você se
ausentar e só assistir?
Sejamos ao cari
A caipora ao invasor
Morte aos novos senhores de
escravos
Senhor de engenho moderno
veste terno.
Se sente a dor pelo ancestral,
Ódio ao opressor e
Empatia por um igual
Se o peito ruge,
O punho serra
E o medo não se faz presente
É mais um guerrilheiro alistado
Na guerra eminente
Mas o inimigo tá escondido
Muito bem armado
Mas relaxa guerreiro
Teus irmãos dão do teu lado
Não nego meus privilégios
Da pele clara
Dos traços singelos
Do cabelo liso
Mas estou ao teu lado
Que eu morra
Me manterei preto e vermelho
Me manterei guerreiro
Antifa
Pois hoje nos empurram às
favelas
Empurram-nos de nossas terras
Guarani-kaiowa mortos por
defenderem seu lar
Nos tiraram tudo
Menos o amor pelos nossos
Nos deram dor e ódio
Nada nos resta a não ser
devolver-lhes o presente
Para devolver-nos
Um futuro
PAZ
Você já viu a paz?
De perto, assim, olho no olho?
A paz é branca
Pálida…
...vampiresca
Vampiro precisa de sangue pra
sobreviver
E são os nossos os escolhidos
pra morrer!
A paz, vampiro, matou mais um
menino.
-Meu menino!
-Meu menino!
-Alguém viu meu menino!?
-Eu ouvi o tiro! Eu ouvi o tiro!
-Mas nunca mais vi meu menino
O menino brincava com bola
Mas foi a bala que goleou
E não importa, a Paz se
alimentou
A mãe saiu mais cedo do
serviço limpou tudo o mais
rápido que pode até cansar
Pra não notarem seu sumiço
Não podia deixar passar
Era aniversário do menino
E tinha que a cidade atravessar
Juntou os trocados que tinha
E foi um presente comprar
Presente este que o menino
nunca abriu
Presente e futuro do menino
destruídos!
Ele esperou, esperou, mas a
porta não se abriu
No dia seguinte procuraram,
ninguém a viu
Gritaram por ela, mas seu nome
se perdeu por entre os barulhos
de um fuzil
Aviso: Terrorismo!
Todo dia há mortos em nome de
um Deus maldito
Do Deus Capital, burguesia seus
profetas, seu cruzado um
policial.
Cruzam a quebrada
Fardados com o estandarte da
igreja Estatal
Armados.
Distribuem balas a quem
provava de outros doces.
É pipoca! É droga! É pipoca! É
droga! É pipoca! É droga!
POW!
Disparou,
não tem mais volta
Mas não importa
Ele por ser quem era
Por estar onde estava
Por ter a cor que tinha
Era inimigo deste deus
A encarnação de seus pecados
capitais
Dentro dele o potencial pra
destronar tais celestiais.
A paz, do deus capital
Apagou nosso ancestral
A paz, do capital
Tentam nos tornar omissos
A paz do capital
Cada Homicídio
por
Homofobia!
Machismo!
Racismo!
O próprio imperialismo!
Cada genocídio!
É a paz do capital
Lembrança secundária
Tentam quebrar nossos corpos
Pois não alcançam nossos
espíritos
Miram em nossas cabeças
Pra tontear nossas mentes
A cacetadas romper nossos
ideais
Mal sabem eles
Que os elos que nos unem
Foram forjados em dores
ancestrais
Desperto sem medo, sem
desespero
O braço lateja
Como a memoria
A lembrança do ódio no olhar
deles ao me golpear
Mesmo caído não cogitam nem
parar
-Sabe, era fácil me levar, a
viatura logo ali era só me
algemar…mas não...
O que seria de mim se eu não
encontrasse em algum lugar
A força pra gritar!?
Pra me levantar e os empurrar
-Engraçado, quando me ergui,
dei falta dos fardados, não
estavam mais ali!
Mesmo mancando
Um braço luxado
Até um dente lascado!
O espirito de revolta no peito
não foi abalado!
Nem mesmo arranhado!
Me vem a questão.
Causo confusão?
Pra justificar tal agressão
Tomaram minha poesia, vista de
um camburão
Como um molotov pronto pra
detonação
Não posso negar,
ambos são
Artefatos incendiários,
forjados pela população
Um lírico,
o outro explosão
Um incendeia a viatura
o outro o coração
Percebo agora
Resignifico o olhar
Não era ódio era medo
Eles temem
Amadurados por trás de escudos
tremem
Perante a revolta popular!
Dia na cidade
Caminho de um ponto qualquer
A todos os outros
Me pedem cigarros e trocados
Dou-lhes o que tenho
Em frente à igreja a pintura da
cidade
Um casal com seu colchão e
cobertor
Apesar do frio e mazelas
Sorriem
Embriagados!
De amor?
De loucura?
Ou seria efeito das garrafas
vazias jogadas ao lado
O que os aquece?
Nosso descaso?
Quando os ignorarmos
Eles ignoram o frio e a fome?
Numa praça no centro
Aprecio o sarau
Quis me deitar pelo banco
Notei as barras impedindo
Barras “ant-mendigo”
Cercado por prédios vazios
Cercados pelo cinza
Vindo de tão longe para ouvir
poesia
Prole parnasiana toma o palco
Brada que cultura não deve se
misturar a politica
Os meus, pretos e mulheres,
vindos de pontos tão distantes
quanto o meu
Diferente deles, homens,
brancos e velhos,
Vaiam
11 9 7376-0774