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Crônica: características, tipos e exemplos

A crônica é um gênero textual curto escrito em prosa, geralmente produzido para meios de comunicação, por
exemplo, jornais, revistas, etc.

Além de ser um texto curto, possui uma "vida curta", ou seja, as crônicas tratam de acontecimentos corriqueiros do
cotidiano.

A palavra “crônica”, do latim chronica, refere-se a um registro de eventos marcados pelo tempo cronológico. Do
grego khronos, significa “tempo”.

Portanto, as crônicas estão extremamente conectadas ao contexto em que são produzidas, por isso, com o passar do
tempo, elas perdem sua “validade”, ou seja, ficam fora do contexto.

As características das crônicas

 narrativa curta;
 uso de uma linguagem simples e coloquial;
 presença de poucos personagens, se houver;
 espaço reduzido;
 temas relacionados a acontecimentos cotidianos.

Tipos de crônicas

Embora seja um texto que faz parte do gênero narrativo (com enredo, foco narrativo, personagens, tempo e espaço),
há diversos tipos de crônicas que exploram outros gêneros textuais.

Podemos destacar a crônica descritiva e a crônica dissertativa. Além delas, temos:

 Crônica Jornalística: mais comum das crônicas da atualidade são as crônicas chamadas de “crônicas jornalísticas”
produzidas para os meios de comunicação, onde utilizam temas da atualidade para fazerem reflexões. Aproxima-se
da crônica dissertativa.
 Crônica Histórica: marcada por relatar fatos ou acontecimentos históricos, com personagens, tempo e espaço
definidos. Aproxima-se da crônica narrativa.
 Crônica Humorística: Esse tipo de crônica apela para o humor como forma de entreter o público, ao mesmo tempo
que utiliza da ironia e do humor como ferramenta essencial para criticar alguns aspectos seja da sociedade, política,
cultura, economia, etc.

Importante destacar que muitas crônicas podem ser formadas por dois ou mais tipos, por exemplo: uma crônica
jornalística e humorística.

A Crônica no Brasil

A crônica foi inicialmente desenvolvida com caráter histórico (as crônicas históricas). Elas relatavam desde o século
XV fatos históricos (reais ou fictícios) ou acontecimentos cotidianos (sucessão cronológica), algumas com toque de
humor.

Mais tarde, esse gênero textual despretensioso foi se aproximando do público e conquistando os leitores mundo
afora. Hoje, esse fato é confirmado pela enorme difusão das crônicas, sobretudo nos meios de comunicação.

No Brasil, a crônica tornou-se um estilo textual bem difundido, desde a publicação dos "Folhetins" em meados do
século XIX. Alguns escritores brasileiros que se destacaram como cronistas foram:

 Machado de Assis
 Carlos Drummond de Andrade
 Rubem Braga
 Luís Fernando Veríssimo
 Fernando Sabino
 Carlos Heitor Cony
 Caio Fernando Abreu

Segundo o professor e crítico literário Antônio Cândido, em seu artigo “A vida ao rés-do-chão” (1980):
“A crônica não é um “gênero maior”. Não se imagina uma literatura feita de grandes cronistas, que lhe dessem o
brilho universal dos grandes romancistas, dramaturgos e poetas. Nem se pensaria em atribuir o Prêmio Nobel a um
cronista, por melhor que fosse. Portanto, parece mesmo que a crônica é um gênero menor. “Graças a Deus”, seria o
caso de dizer, porque sendo assim ela fica mais perto de nós. E para muitos pode servir de caminho não apenas
para a vida, que ela serve de perto, mas para a literatura (...).

(...) Ora, a crônica está sempre ajudando a estabelecer ou restabelecer a dimensão das coisas e das pessoas. Em
lugar de oferecer um cenário excelso, numa revoada de adjetivos e períodos candentes, pega o miúdo e mostra nele
uma grandeza, uma beleza ou uma singularidade insuspeitadas. Ela é amiga da verdade e da poesia nas suas
formas mais diretas e também nas suas formas mais fantásticas, sobretudo porque quase sempre utiliza o humor.
Isto acontece porque não tem pretensões a durar, uma vez que é filha do jornal e da era da máquina, onde tudo
acaba tão depressa. Ela não foi feita originalmente para o livro, mas para essa publicação efêmera que se compra
num dia e no dia seguinte é usada para embrulhar um par de sapatos ou forrar o chão da cozinha.”

Nesse trecho, tão esclarecedor, podemos destacar as características fundamentais da crônica, como, por exemplo, a
aproximação com o público, na medida em que contém uma linguagem mais direta e despretensiosa.

Além disso, o autor destaca um de seus principais aspectos, ou seja, a curta duração que possui esse produção
textual.

Como fazer uma crônica

 Escrever uma crônica requer planejamento, o que significa que antes de começar a redigir o seu texto você precisa
pensar na forma como pretende tratar cada um dos elementos que compõem a crônica: qual o tema, em que tempo e
em que espaço se situa, quais os personagens. Para tanto, vamos recordar o que um texto precisa para ser uma
crônica.
O que é crônica?

Crônica é um texto curto que narra uma situação cotidiana de forma criativa e humorada. Caracteriza-se por utilizar
linguagem simples, poucos personagens e ter tempo e espaço reduzidos.

Entenda-se por texto curto um texto que você não demora muito para ler. Embora não possamos definir um tamanho,
pode-se dizer que uma crônica pode ser lida de uma vez, sem exigir do leitor paragens durante a leitura.

Há vários tipos de crônicas - narrativa, dissertativa, humorística, descritiva, reflexiva - e cada uma delas apresenta
alguma característica particular.

1. Primeiro passo: escolha o tema

Uma das principais características da crônica é a abordagem de assuntos cotidianos ou muito falados no momento.

Relações conjugais, rotina semanal, férias em família e situações constrangedoras são temas sempre atuais. Mas se
você quiser algo do momento, esteja atento às notícias e a situações com as quais as pessoas se identifiquem
atualmente.

Exemplo de crônica que tem como tema relações conjugais:

“Minha mulher e eu temos o segredo para fazer um casamento durar: Duas vezes por semana, vamos a um ótimo
restaurante, com uma comida gostosa, uma boa bebida e um bom companheirismo.

Ela vai às terças-feiras e eu, às quintas.”

(Trecho de Crônica Engraçada, de Luis Fernando Verissimo)

2. Defina o tempo em que a narração se situa

Se o tema escolhido for algo que se mantém atual ao longo dos tempos, você pode escolher falar tanto no presente
como no passado.

E se o tema está em voga, você não precisa necessariamente situá-lo no tempo presente. Esta é uma oportunidade
de trazer um toque de humor a sua crônica abordando algo da atualidade, mas sob uma perspectiva passada.

Exemplo de crônica que se contextualiza na quarentena 2020:


“Quando abrir esta revista, você poderá estar chorando. Ou não, você poderá estar ouvindo o disco do Caetano com
os filhos — para mim, um verdadeiro ansiolítico — ou confiante, ou mesmo mergulhado em pessimismo. Eu, aqui da
minha quarentena privilegiada de São Conrado, não tenho como conhecer seu estado de espírito, como também não
conheço seu estado civil e muito menos seu estado de saúde. No entanto, há uma coisa a seu respeito que eu sei, e
é sobre isso que me arrisco aqui: você está em casa. Em casa. Seus amigos, se não forem médicos ou frentistas ou
enfermeiros ou farmacêuticos ou entregadores, também estão em casa, assim como seu maior desafeto ou o seu
primeiro amor.”

(Trecho de crônica de Maria Ribeiro para a revista Veja)

3. Decida o espaço em que a situação se desenrola

Na crônica, o espaço em que a história se desenrola é limitado. Isso acontece porque a crônica deve ser curta, não
havendo capacidade para desenvolver um texto que abranja uma série de locais diferentes.

Exemplo de crônica sujo espaço escolhido é o Rio de Janeiro:

“Não sei como as coisas se passam em outros sítios. Aqui, no Rio, é uma calamidade, os jardins de infância faturam
por fora em nome dos santos juninos, e os pais são obrigados a gastar os tubos com fantasias caipiras que as
crianças sem entender e sem amar. Até o presidente da república bota na cabeça um chapéu de palha em frangalhos
e convida os ministros para um quentão oficial geralmente substituído por uísque 12 anos.”

(Trecho de Noites de Junho, Noites de Outrora, de Carlos Heitor Cony)

4. Escolha os personagens

Tal como o tempo e o espaço na crônica são limitados, os personagens também são.

Uma vez que o texto da crônica é curto, não há oportunidade para um grande elenco esboçar as suas ações.

Exemplo de crônica que se desenvolve em torno de um personagem:

“Foi em 1868. Estávamos alguns amigos no Club Fluminense, Praça da Constituição, casa onde é hoje a Secretaria
do Império. Eram nove horas da noite. Vimos entrar na sala do chá um homem que ali se hospedara na véspera. Não
era moço; olhos grandes e inteligentes, barba raspada, um tanto cheio. Demorou-se pouco tempo; de quando em
quando, olhava para nós, que o examinávamos também, sem saber quem era. Era justamente o Dr. Sarmiento, vinha
dos Estados Unidos, onde representava a Confederação Argentina, e donde saíra porque acabava de ser eleito
presidente da República. Tinha estado com o Imperador, e vinha de uma sessão científica. Dois ou três dias depois,
seguiu para Buenos Aires.”

(Trecho de O Futuro dos Argentinos, de Machado de Assis)

5. Defina o tipo de narrador

O foco narrativo utilizado na crônica é uma escolha importante, porque o narrador é o elemento que dá voz ao texto.

Se optar pelo narrador personagem, além de contar a história, o narrador também desempenha o papel de
personagem da crônica e, por isso, narra em primeira pessoa. Já o narrador observador é o que narra em terceira
pessoa.

Outra opção é o narrador onisciente, aquele que conta a história conhecendo tudo o que acontece nela, inclusive os
pensamentos de todos os personagens. Pode narrar em primeira ou terceira pessoa.

Exemplo de crônica cujo narrador é narrador personagem:

“É inútil deixar de confessar que tenho estado cerca de quatro horas por dia vendo futebol na televisão, e não há
esperança de que isso melhore antes de 11 de julho. Suponho que o leitor também esteja intoxicado de futebol, e
então, para variar, vou contar uma partida realizada há quase 37 anos, nesta cidade do Rio de Janeiro. Aqui está
minha narrativa, com pequenos cortes:”

(Trecho de Ultimamente têm Passado Muitos Anos, de Rubem Braga)


6. Escreva a sua crônica

Depois de planejar o seu texto, é o momento de redigir a sua crônica.

Lembre-se que esse gênero textual requer linguagem simples, e que pode ter um toque de humor, além do que se
caracteriza por ser um texto curto.

Aproveite os momentos em que está mais predisposto para escrever e escolha o ambiente mais adequado para
ajudar no seu trabalho.

No fim, revise a crônica atentando para eventuais erros de português ou de digitação. Ler em voz alta também ajuda
no processo de afinação do texto.

Crônica Narrativa

A crônica narrativa é um tipo de crônica que relata as ações de personagens num tempo atual e um espaço
determinado.

Em relação à linguagem, as crônicas narrativas possuem uma linguagem simples e direta e, muitas vezes, utilizam
do humor para entreter os leitores. Além disso, podem apresentar o discurso direto, onde há a reprodução das falas
dos personagens.

As crônicas narrativas envolvem os mais diversos tipos de narrador (foco narrativo) e, portanto, podem ser narradas
em primeira ou terceira pessoa.

Além da crônica narrativa, ela pode ser dissertativa-argumentativa ou descritiva. Entretanto, podemos encontrar uma
crônica que seja narrativa e descritiva ao mesmo tempo.

Vale lembrar que a crônica é um texto curto em prosa onde a principal característica é relatar acontecimentos
cotidianos de forma cronológica, daí seu nome. Esse tipo de texto é muito veiculado nos meios de comunicação, por
exemplo, jornais e revistas.

Como fazer uma crônica narrativa?

Para produzir uma crônica narrativa precisamos considerar os principais elementos que compõem uma narração.
São eles:

1. Enredo: história da trama, onde surge o tema ou o assunto que será narrado.
2. Personagens: pessoas presentes na história e que podem ser principais ou secundários.
3. Tempo: indica o tempo no qual a história está inserida.
4. Espaço: determina o local (ou locais) onde se desenvolve a história.
5. Foco narrativo: é o tipo de narrador que pode ser um personagem da trama, um observador ou ainda onisciente.

Além disso, devemos observar que os fatos são narrados em ordem cronológica e sua estrutura está dividida em:
introdução, clímax e conclusão.

É importante destacar que diferente de outros textos narrativos longos, como uma novela ou um romance, a crônica
narrativa é um texto mais curto.

Nesse sentido, por ser uma história breve, ela geralmente possui poucos personagens e um espaço reduzido.

Assim, depois de compreender todos os elementos que compõem uma narrativa, escolhemos o tema, quais serão
seus personagens, o tempo e o espaço que ela ocorre.

Exemplos de crônicas narrativas

1. Aprenda a chamar a polícia (Luís Fernando Veríssimo)

Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém andando sorrateiramente no quintal de
casa.
Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os leves ruídos que vinham lá de fora, até ver uma silhueta passando
pela janela do banheiro.
Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas internas nas portas, não fiquei muito
preocupado, mas era claro que eu não ia deixar um ladrão ali, espiando tranqüilamente.
Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço.
Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da casa.
Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por perto para ajudar, mas que iriam mandar
alguém assim que fosse possível.
Um minuto depois, liguei de novo e disse com a voz calma:
— Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa mais ter pressa. Eu já matei o ladrão com
um tiro de escopeta calibre 12, que tenho guardada em casa para estas situações. O tiro fez um estrago danado no
cara!
Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da polícia, um helicóptero, uma unidade do
resgate, uma equipe de TV e a turma dos direitos humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo.
Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de assombrado. Talvez ele estivesse
pensando que aquela era a casa do Comandante da Polícia.
No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse:
— Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão.
Eu respondi:
— Pensei que tivesse dito que não havia ninguém disponível.

2. Dois velhinhos (Dalton Trevisan)

Dois pobres inválidos, bem velhinhos, esquecidos numa cela de asilo.


Ao lado da janela, retorcendo os aleijões e esticando a cabeça, apenas um podia olhar lá fora.
Junto à porta, no fundo da cama, o outro espiava a parede úmida, o crucifixo negro, as moscas no fio de luz. Com
inveja, perguntava o que acontecia. Deslumbrado, anunciava o primeiro:
— Um cachorro ergue a perninha no poste.
Mais tarde:
— Uma menina de vestido branco pulando corda.
Ou ainda:
— Agora é um enterro de luxo.
Sem nada ver, o amigo remordia-se no seu canto. O mais velho acabou morrendo, para alegria do segundo,
instalado afinal debaixo da janela.
Não dormiu, antegozando a manhã. Bem desconfiava que o outro não revelava tudo.
Cochilou um instante — era dia. Sentou-se na cama, com dores espichou o pescoço: entre os muros em ruína, ali no
beco, um monte de lixo.

3. Valente menina (Rubem Braga)

Debruçado cá em cima, no 13.° andar, fiquei olhando a porta do edifício à espera de que surgisse o seu vulto lá
embaixo.
Eu a levara até o elevador, ao mesmo tempo aflito para que ela partisse e triste com a sua partida. Nossa conversa
fora amarga. Quando lhe abri a porta do elevador esbocei um gesto de carinho na despedida, mas, como eu previra,
ela resistiu. Pela abertura da porta vi sua cabeça de perfil, séria, descer, sumir.
Agora sentia necessidade de vê-la sair do edifício, mas o elevador deve ter parado no caminho, porque demorou um
pouco a surgir seu vulto rápido. Desceu a escada fez uma pequena volta para evitar uma poça de água, caminhou
até a esquina, atravessou a rua. Vi-a ainda um instante andando pela calçada da transversal, diante do café; e
desapareceu, sem olhar para trás.
“Valente menina!” — foi o que murmurei ao acaso lembrando um verso antigo de Vinicius de Moraes; e no mesmo
instante me lembrei também de uma frase ocasional de Pablo Neruda, num domingo em que fui visitá-lo em sua casa
de Isla Negra, no Chile. “Que valientes son las chilenas!” dissera ele, apontando uma mulher de maiô que entrava no
mar ali em frente, na manhã nublada; e explicara que estivera andando pela praia e apenas molhara os pés na
espuma: a água estava gelada, de cortar.
“Valente menina!” Lá embaixo, na rua, era tocante seu pequeno vulto, reduzido pela projeção vertical. Iria com os
olhos úmidos ou sentiria apenas a alma vazia? “Valente menina!” Como a chilena que enfrentava o mar, em Isla
Negra, ela também enfrentava sua solidão. E eu ficava com a minha, parado, burro, triste, vendo-a partir por minha
culpa.
Deitei-me na rede, sentindo dor de cabeça e um certo desgosto por mim mesmo. Eu poderia ser pai dessa moça — e
me pergunto o que sentiria, como pai, se soubesse de uma aventura sua, como essa, com um homem de minha
idade. Tolice! Os pais nunca sabem nada, e quando sabem não compreendem; estão perto e longe demais para
entender. Ele, esse pai de quem ela falava tanto, não acreditaria se a visse entrar pela primeira vez em minha casa,
como entrou, com sua bolsa a tiracolo, o passo leve e o riso nervoso. “Como você pensava que eu fosse?” Lembro-
me de que fiquei olhando, meio divertido, meio assustado, aquela mocetona loura e ágil que só falava me olhando
nos olhos, e me fez as confissões mais íntimas e graves entremeadas de mentiras pueris — sempre me olhando nos
olhos. Disse-me que a metade das coisas que me contara pelo telefone era pura invenção — e logo inventou outras.
Senti que suas mentiras eram um jeito enviesado que ela tinha de se contar, um meio de dar um pouco de lógica às
suas verdades confusas.
A ternura e o tremor de seu duro corpo juvenil, seu riso, a insolência alegre com que invadiu minha casa e minha
vida, e suas previsíveis crises de pranto — tudo me perturbou um pouco, mas reagi. Terei sido grosseiro ou
mesquinho, terei deixado sua pequena alma trêmula mais pobre e mais só?
Faço-me estas perguntas, e ao mesmo tempo me sinto ridículo em fazê-las. Essa moça tem a vida pela frente, e um
dia se lembrará de nossa história como de uma anedota engraçada de sua própria vida, e talvez a conte a outro
homem olhando-o nos olhos, passando a mão pelos seus cabelos, às vezes rindo — e talvez ele suspeite de que
seja tudo mentira.

A crônica argumentativa é um tipo de texto em que a argumentação é a sua principal marca.

Ela é muito utilizada pelos meios de comunicação, sobretudo os jornais e as revistas.

A crônica argumentativa funde aspectos da crônica e dos textos argumentativos e se aproxima do Artigo de Opinião.
Ela pode ser do gênero narrativo, dissertativo ou descritivo.

Os cronistas, autores que escrevem as crônicas, expressam nesse tipo de texto um tema e sua posição, ponto de
vista ou juízo de valor sobre tal assunto.

Como fazer uma crônica argumentativa?

Para elaborar uma crônica argumentativa, primeiramente escolha um tema contemporâneo que queira abordar, seja
a fome no mundo, o aumento do preço da gasolina, a economia brasileira atual, uma briga entre vizinhos, o aumento
do trânsito nas grandes cidades, dentre outros.

Feito a escolha, leia sobre o assunto, organize suas ideias e selecione argumentos.

Lembre-se que a crônica argumentativa tem que apresentar argumentos, senão trata-se de um texto meramente
informativo.

Uma importante característica das crônicas é o acentuado teor crítico, com presença de humor, ironia e sarcasmo.
Portanto, seja criativo!

Note que a crônica narrativa argumentativa narra uma breve história, com personagens, tempo e espaço. Ela pode
conter discursos diretos (com marca da fala dos personagens, por exemplo, o uso de travessão), indiretos (palavras
dos personagens proferidas pelo narrador, ao invés de utilizar as marcas pessoas) e os indiretos livre (fusão dos dois
tipos de discursos: direto e indireto).

Leia: Como fazer uma crônica

Principais características da crônica argumentativa

As principais características de uma crônica argumentativa são:

 Argumentação e persuasão;
 Linguagem coloquial, simples e direta;
 Textos relativamente curtos;
 Temas cotidianos e polêmicos;
 Crítica, humor e ironia;
 Induz a reflexão;
 Subjetividade e criatividade;
 Fusão do estilo jornalístico e literário;
 Poucos personagens, se houver;
 Tempo e o espaço limitados;
 Caráter contemporâneo.

Leia mais sobre esse assunto:

 Crônica
 Crônica Narrativa
 A Argumentação

Exemplo de crônica argumentativa


Segue abaixo um exemplo de crônica argumentativa do escritor brasileiro Luis Fernando Veríssimo, que apresenta
um texto crítico e humorístico sobre a falta de tempo nos tempos modernos:

Exigências da vida moderna (Quem aguenta tudo isso?)

Dizem que todos os dias você deve comer uma maçã por causado ferro.

E uma banana pelo potássio. E também uma laranja pela vitamina C.

Uma xícara de chá verde sem açúcar para prevenir a diabetes.

Todos os dias deve-se tomar ao menos dois litros de água.

E uriná-los, o que consome o dobro do tempo.

Todos os dias deve-se tomar um Yakult pelos lactobacilos (que ninguém sabe bem o que é, mas que aos bilhões,
ajudam a digestão).

Cada dia uma Aspirina, previne infarto.

Uma taça de vinho tinto também. Uma de vinho branco estabiliza o sistema nervoso.

Um copo de cerveja, para...não lembro bem para o que, mas faz bem.

O benefício adicional é que se você tomar tudo isso ao mesmo tempo e tiver um derrame, nem vai perceber.

Todos os dias deve-se comer fibra. Muita, muitíssima fibra.

Fibra suficiente para fazer um pulôver.

Você deve fazer entre quatro e seis refeições leves diariamente.

E nunca se esqueça de mastigar pelo menos cem vezes cada garfada.

Só para comer, serão cerca de cinco horas do dia.

E não esqueça de escovar os dentes depois de comer.

Ou seja, você tem que escovar os dentes depois da maçã, da banana, da laranja, das seis refeições e enquanto tiver
dentes, passar fio dental, massagear a gengiva, escovar a língua e bochechar com Plax.

Exemplos de crônicas

1. Crônica de Machado de Assis (Gazeta de Notícias, 1889)

Quem nunca invejou, não sabe o que é padecer. Eu sou uma lástima. Não posso ver uma roupinha melhor em outra
pessoa, que não sinta o dente da inveja morder-me as entranhas. É uma comoção tão ruim, tão triste, tão profunda,
que dá vontade de matar. Não há remédio para esta doença. Eu procuro distrair-me nas ocasiões; como não posso
falar, entro a contar os pingos de chuva, se chove, ou os basbaques que andam pela rua, se faz sol; mas não passo
de algumas dezenas. O pensamento não me deixa ir avante. A roupinha melhor faz-me foscas, a cara do dono faz-
me caretas...

Foi o que me aconteceu, depois da última vez que estive aqui. Há dias, pegando numa folha da manhã, li uma lista
de candidaturas para deputados por Minas, com seus comentos e prognósticos. Chego a um dos distritos, não me
lembra qual, nem o nome da pessoa, e que hei de ler? Que o candidato era apresentado pelos três partidos, liberal,
conservador e republicano.

A primeira coisa que senti, foi uma vertigem. Depois, vi amarelo. Depois, não vi mais nada. As entranhas doíam-me,
como se um facão as rasgasse, a boca tinha um sabor de fel, e nunca mais pude encarar as linhas da notícia.
Rasguei afinal a folha, e perdi os dois vinténs; mas eu estava pronto a perder dois milhões, contando que aquilo
fosse comigo.
Upa! que caso único. Todos os partidos armados uns contra os outros no resto do Império, naquele ponto uniam-se e
depositavam sobre a cabeça de um homem os seus princípios. Não faltará quem ache tremenda a responsabilidade
do eleito, — porque a eleição, em tais circunstâncias, é certa; cá para mim é exatamente o contrário. Dêem-me
dessas responsabilidades, e verão se me saio delas sem demora, logo na discussão do voto de graças.

— Trazido a esta Câmara (diria eu) nos paveses de gregos e troianos, e não só dos gregos que amam o colérico
Aquiles, filho de Peleu, como dos que estão com Agamenon, chefe dos chefes, posso exultar mais que nenhum
outro, porque nenhum outro é, como eu, a unidade nacional. Vós representais os vários membros do corpo; eu sou o
corpo inteiro, completo. Disforme, não; não monstro de Horácio, por quê? Vou dizê-lo.

E diria então que ser conservador era ser essencialmente liberal, e que no uso da liberdade, no seu desenvolvimento,
nas suas mais amplas reformas, estava a melhor conservação. Vede uma floresta! (exclamaria, levantando os
braços). Que potente liberdade! e que ordem segura! A natureza, liberal e pródiga na produção, é conservadora por
excelência na harmonia em que aquela vertigem de troncos, folhas e cipós, em que aquela passarada estrídula, se
unem para formar a floresta. Que exemplo às sociedades! Que lição aos partidos!

O mais difícil parece que era a união dos princípios monárquicos e dos princípios republicanos; puro engano. Eu
diria: 1°, que jamais consentiria que nenhuma das duas formas de governo se sacrificasse por mim; eu é que era por
ambas; 2°, que considerava tão necessária uma como outra, não dependendo tudo senão dos termos; assim
podíamos ter na monarquia a república coroada, enquanto que a república podia ser a liberdade no trono, etc., etc.

Nem todos concordariam comigo; creio até que ninguém, ou concordariam todos, mas cada um com uma parte. Sim,
o acordo pleno das opiniões só uma vez se deu abaixo do sol, há muitos anos, e foi na assembléia provincial do Rio
de Janeiro. Orava um deputado, cujo nome absolutamente me esqueceu, como o de dois, um liberal, outro
conservador, que virgulavam o discurso com apartes, — os mesmos apartes.

A questão era simples. O orador, que era novo, expunha as suas idéias políticas. Dizia que opinava por isso ou por
aquilo. Um dos apartistas acudia: é liberal. Redargüia o outro: é conservador. Tinha o orador mais este e aquele
propósito. É conservador, dizia o segundo; é liberal, teimava o primeiro. Em tais condições, prosseguia o novato, é
meu intuito seguir este caminho. Redargüia o liberal: é liberal; e o conservador: é conservador. Durou este
divertimento três quartos de colunas do Jornal do Comércio. Eu guardei um exemplar da folha para acudir às minhas
melancolias, mas perdi-o numa das mudanças de casa.

Oh! não mudeis de casa! Mudai de roupa, mudai de fortuna, de amigos, de opinião, de criados, mudai de tudo, mas
não mudeis de casa!

2. A sensível (Clarice Lispector)

Foi então que ela atravessou uma crise que nada parecia ter a ver com sua vida: uma crise de profunda piedade. A
cabeça tão limitada, tão bem penteada, mal podia suportar perdoar tanto. Não podia olhar o rosto de um tenor
enquanto este cantava alegre – virava para o lado o rosto magoado, insuportável, por piedade, não suportando a
glória do cantor. Na rua de repente comprimia o peito com as mãos enluvadas – assaltada de perdão. Sofria sem
recompensa, sem mesmo a simpatia por si própria.
Essa mesma senhora, que sofreu de sensibilidade como de doença, escolheu um domingo em que o marido viajava
para procurar a bordadeira. Era mais um passeio que uma necessidade. Isso ela sempre soubera: passear. Como se
ainda fosse a menina que passeia na calçada. Sobretudo passeava muito quando “sentia” que o marido a enganava.
Assim foi procurar a bordadeira, no domingo de manhã. Desceu uma rua cheia de lama, de galinhas e de crianças
nuas – aonde fora se meter! A bordadeira, na casa cheia de filhos com cara de fome, o marido tuberculoso – a
bordadeira recusou-se a bordar a toalha porque não gostava de fazer ponto de cruz! Saiu afrontada e perplexa.
“Sentia-se” tão suja pelo calor da manhã, e um de seus prazeres era pensar que sempre, desde pequena, fora muito
limpa. Em casa almoçou sozinha, deitou-se no quarto meio escurecido, cheia de sentimentos maduros e sem
amargura. Oh pelo menos uma vez não “sentia” nada. Senão talvez a perplexidade diante da liberdade da bordadeira
pobre. Senão talvez um sentimento de espera. A liberdade.
Até que, dias depois, a sensibilidade se curou assim como uma ferida seca. Aliás, um mês depois, teve seu primeiro
amante, o primeiro de uma alegre série.

3. O amor e a morte (Carlos Heitor Cony)

Foi em dezembro, dez anos atrás. Mila teve nove filhotes, impossível ficar com a ninhada inteira, fiquei com aquela
que me parecia a mais próxima da mãe.

Nasceu em minha casa, foi gerada em minha casa, nela viveu esses dez anos, participando de tudo, recebendo
meus amigos na sala, cheirando-os e ficando ao lado deles - sabendo que, de alguma forma, devia homenageá-los
por mim e por ela.
Ao contrário da mãe, que tinha alguma autonomia existencial, aquilo que eu chamava de “fumos fidalgos”, como o
Dom Casmurro, Títi era um prolongamento, o dia e a noite, o sol e todas as estrelas, o universo dela centrava-se em
acompanhar, resumia-se em estar perto.

Quando Mila foi embora, há dois anos, ela compreendeu que ficara mais importante -e, se isso fosse possível, mais
amada. Escoou com sabedoria a dor e o pranto, a ausência e a tristeza, e se já era atenta aos movimentos mais
insignificantes da casa, com o tempo tornou-se um pedaço significante da vida em geral e do meu mundo particular.

Vida e mundo que deverão, agora, continuar sem ela -se é que posso chamar de continuação o que tenho pela
frente. Perdi alguns amigos, recentemente, mas foram perdas coletivas que doeram, mas, de certa forma, são
compensadas pela repartição do prejuízo.

Perder Títi é um “resto de terra arrancado” de mim mesmo -e estou citando pela segunda vez Machado de Assis, que
criou um cão com o nome do dono (Quincas Borba) e sabia como ninguém que dono e cão são uma coisa só.

Essa “coisa só” fica mais só, nem por isso fica mais forte, como queria Ibsen. Fica apenas mais sozinho mesmo, sem
ter aquele olhar que vai fundo da gente e adivinha até a alegria e a tristeza que sentimos sem compreender. Sem Títi,
é mais fácil aceitar que a morte seja tão poderosa, desde que seja bem menos poderosa do que o amor.

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