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PUDOR
JULIANNA COSTA
Sem
PUDOR
© 2016 by Universo dos LivrosTodos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de
19/02/1998.
Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida
ou transmitida sejam quais forem os meiosempregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos,
gravação ou quaisquer outros.
Diretor editorial: Luis Matos Editora-chefe: Marcia Batista Assistentes editoriais: Aline Graça
eLetícia Nakamura
Preparação: Juliana Gregolin
Revisão: Rinaldo Milesi
Arte: Francine C. Silva e ValdineiGomes
Capa: Zuleika Iamashita
Costa, Julianna
Sem pudor / Julianna Costa. – São
Paulo: Universo dos Livros, 2016.352 p.
ISBN: 978-85-503-0005-4
1. Literatura brasileira 2. Ficçãoerótica brasileira I. Título
16-0704 CDD B869.93
Desempregada.
Dobrei meu braço ao lado do tecladoe apoiei a testa na dobra do cotovelo.
Eu estava exausta.
Não era sequer uma exaustão física, era apenas uma desistência mental, filosófica e
espiritual.
Nunca estive desempregada daquele modo antes. Até então, todos os momentos da
minha vida em que havia precisado de um emprego tinham sido normais. Eu saía do
emprego anterior por causa de uma proposta melhor ou pela ambição pessoal de
acreditar que merecia uma proposta melhor. E nunca estive enganada.
Estive no meu emprego anterior nos últimos dois anos, antes de ser sumariamente
demitida por “máconduta profissional”.
Claro que meus empregadores não eram imbecis cruéis, incapazes de compreender
que eu fugi da cidade quatro meses atrás porque corria risco de ser assassinada por um
chefe do crime organizado. Essa parte eles seriam perfeitamente capazes de
compreender.
Era a versão oficial dos fatos queeles tinham problemas em aceitar. Expirei
longamente,sentindo meucorpo inteiro doer. Fiquei horas e horas na internet, enviei
currículos,agendei entrevistas… apenas paradescobrir uma inevitável verdade: eu
não ia conseguir um emprego tão cedo. Para conseguir voltar à minha vida normal e
honrar o acordo que fizeracom o agente Zahner para manter YuriKulik bem longe
de mim, preciseimentir para todas as pessoas ao meuredor, apresentando–lhes
uma novaversão dos fatos e uma j ustificativa plausível para o meu
desaparecimento.
O problema recorrente, no entanto, é que o “plausível”, no meu caso, não inspirava
qualquer tipo de simpatia aos meus empregadores, antigos e eventuais. Eu tinha
deixado de ser a garota corajosa que enfrentou a máfia russa, colaborou com uma
investigação policial e tirou a roupa para salvar uma boate às vésperas da falência
para me tornar a garota maluca com um severo grau de ansiedade generalizada que,
em um ataque de pânico, tinha abandonado emprego, família e amigos, sem
qualquer explicação ou adeus, para fugir por algumas semanas com um gigolô que lhe
tirara a virgindade, em umas férias não planejadas.
A nova versão oficial dos acontecimentos trazia até fotos, especialmente
preparadas, minhas e de Devon em um barco qualquer. “Navegando para o horizonte
em um iate com um deus do sexo para esquecer as mazelas da minha vida.”
Essa era a resposta que, com palavras mais rebuscadas e educadas, eu era obrigada
a fornecer ementrevistas de emprego sempre que me era feita a pergunta de “E por que
abandonou seu emprego anterior?”.
É… Eu não ia conseguir um emprego tão cedo. E era melhor me conformar com
isso.
- É por isso que não arranja emprego, sua preguiçosa! – Monique estava em
nosso apartamento há dois segundos e eu já queria matá-la. – Fica cochilando quando
deveria estar procurando o que fazer. – recriminou.
Eu empurrei para o lado a caixa com meus documentos, certificados, diplomas e
currículos, só para encará- la.
- Quem te deu a chave? –resmunguei.
- E quem precisa de chave? Afechadura dessa porta está frouxa. Já disse a vocês que
isso é um perigo. Mas como estou lidando com a Mina preguiçosa e a Elise
desmiolada, acho que vocês nunca vão resolver esse problema.
– O que você quer, Mon? – Elisesurgiu do seu quarto para me resgatar.
– Não incomode a Mina, ela está muito estressada.
Monique me irritava, sem dúvidas. Mas acho que eu preferia a sua agressividade ao
zelo excessivo de Elise. Minha melhor amiga tinha ficado verdadeiramente
preocupada com meu desaparecimento e, então, com a descoberta do meu surto
mental. Ela sabia que esse tipo de fuga não condizia com minha personalidade e para
que eu tivesse recorrido a umasolução desse porte eu deveria estar bem afetada.
Quatro meses tinham se passado e ela tinha exigido que eu me mudasse para
sua casa. Elise usou como desculpa o fato de eu estar desempregada e sem nenhum
dinheiro além de minhas economias, mas eu sabia que, na verdade, ela só queria ficar
de olho em mim.
– Vim devolver isso. – Tirou da bolsa alguns colares. – E quero saber se vocês vão
sair hoje!
– Eu não tenho planos. – Elise levantou um ombro.
– Então vai para a festa de aniversário do Cristian comigo!
– Monique, se você não gosta dos amigos dele, precisa dar um jeito. Ou falar pra
ele. Não podemos ficar servindo de escudo para você sempre que…
– O Gerard vai estar lá – cantarolou.
Elise mordeu o lábio, controlando osorriso.
– Maldita. – Ela havia tomado adecisão e Monique desatou a rir.
– E você, Mina? Vem com a gente ouvai sair com o namorado?
Namorado.
Eu não gostava de pensar em Lance como meu namorado. Era cedo demais para
chamá-lo de namorado. Mas depois de dois meses conversando com ele quase todos
os dias e encontrando-o todos os fins de semana… era tarde demais para chamá-lo de
qualqueroutra coisa.
– Não é o namorado dela. – Elise me defendeu. Tivemos umas duas ou oito
discussões irritadas assim: Mon se referia a Lance como meu “namorado”, eu
dizia que não queria que o chamasse assim e, por fim, acho que Elise começou a
temer que eu tivesse outro surto mental e então resolveu interferir sempre que a
conversa ameaçasse ressurgir.
– Foi só uma pergunta, Elise! Não precisa ficar trabalhando como guarda-costas da
Mina sempre que ela ouvir uma pergunta de que não gosta.
– Mina não está bem, Monique! Parede ser inconveniente!
– Mina estava muito bem há alguns meses, quando resolveu mandar o trabalho se
foder e fugir com o
prostituto. Mas agora não está bem para responder a uma simplespergunta?
– Cala a boca, garota!
– Você tem que parar de tratá-la como se ela fosse uma flor delicada! Bault é uma
mulher adulta que vai ter que lidar com as consequências do que…
– Vou sair com o Lance – interrompi.
– Já temos planos para hoje à noite.
As duas se calaram, Elise desenhou um sorriso simpático no rosto e Monique fez
uma expressão de vômito.
As duas se puseram a combinar horários e etiquetas. Aproveitei a distração delas
para puxar meu celular e enviar uma mensagem para Lance.
~~
Toquei a campainha pela terceira veze ninguém atendeu. Elas não deveriam estar
em casa.
Isso não era bom.
Eu não podia ficar parado no meio docorredor.
Talvez minha nova amiga do supermercado me oferecesse abrigo até alguém
chegar. Sacudi meus cabelos, irritado. Era minha melhor opção. Dei um soco de
frustração na porta e já ia me virar de costas quando ouvi o rangido da madeira
cedendo.
Senti a testa enrugando ao perceber que a fechadura estava frouxa, o que não
permitia que a porta ficasse trancada.
Isso era péssimo para Mina e Elise. O que diabos aquelas duas estavam pensando?
Morando sozinhas em uma casa com uma porta que não tranca? No entanto, era
ótimo para mim.
Me enfiei no apartamento depois de verificar rapidamente os arredores e ter certeza
de que ninguém me observava.
O lugar era… estranho. Não era exatamente aconchegante como euimaginava que o
apartamento de Mina seria. Era tudo muito anguloso e aleatório. Abri a porta que
supus ser um dos quartos e o caos de roupas em cima da cama, sapatos espalhados
pelo chão e maquiagens em cima do móvel gritou em alto e bom som que minha Mina
controladora nunca poderia habitar um ambiente tão entrópico.
Testei a outra porta, me sentindo um pouco como Cachinhos Dourados na casa dos
ursos e vi algo que me pareceu bem mais familiar.
O lugar tinha um cheiro gostoso de velas aromáticas e estava arrumado com
metódica perfeição. As almofadas coloridas sobre a cama e a grande poltrona fofa
conferiam um ar envolvente ao quarto. Uma ideia de lar.
Todavia, foi a parede repleta de pôsteres daqueles filmes de drama que ela adorava
que me deram plena segurança de que minha garota morava ali.
Lavei o rosto e as mãos em seu banheiro e considerei esta ação um banho. Fora
uma longa viagem e um homem sempre deve tomar banho quando sexo oral é uma
possibilidade. Não é uma questão de safadeza. É uma questão de respeito. Não há
nada pior do que a ideia de uma garota quererfazer sexo oral em você e seu pênis estar
com cheiro de queijo.
Abri a porta do móvel embaixo da piana busca por uma toalha e…
Um vibrador.
Singelo, lilás, discreto, comprido. E um rabbit, ainda por cima!
Minha boca se abriu com um sorriso de surpresa.
Mina Bault, sua danadinha.
Tirei o vibrador de seu esconderijo e o coloquei em cima da cama. Era o tipo de
coisa que para a qual se precisariater acesso fácil.
Optei por tomar um banho completo e nem me incomodei em colocar a roupa de
volta. Eu queria ver Mina com vergonha. Ela ficava um espetáculo de tão linda
quando ficava com vergonha e já estava em crise de abstinência depois de tanto tempo
sem vê-la corar, dar seus socos desajeitados no meu braço e me chamar de
“impossível”. Eu precisava muito daquilo.
Deitei na cama e senti seu perfume nos travesseiros.
Quando dei por mim, estava com o nariz enfiado em um deles, apertando-o contra
o rosto, em uma típica atitude babaca que, até então, eu pensava que só existia
naquelas comédias românticas que fazem as mulheres mais inocentes chorarem pelos
olhos e pela vagina.
Se meu cunhado me visse agora, ia se sentir decepcionado.
Se minha irmã pudesse me ver agora,ia rir e dizer um “eu avisei”. Era o jeito dela…
Enquanto Sven sabia que eu era um predador, Lexa insistia em afirmar que eu era um
cara romântico que fingiaser algo que não era.
Mas, sozinho ali, envolvido por mais Mina do que eu jamais pensara em ter nos
últimos meses, eu me permiti aquelepequeno prazer proibido.
Meu pau começou a acordar e senti vontade de acariciar-lhe e dizer “isso, garoto, se
acalme, sua hora chegou”. Mas algo no criado-mudo chamou minha atenção e ligou
um botão no meu corpo me inundando em incômodo.
Estiquei o braço e peguei o porta- retrato que descansava embaixo doabajur.
Era uma foto de Mina… Minha Mina em um iate vestindo nada além de um
biquíni.
Com os braços gananciosos de Devonao seu redor.
Lance era legal.
Ele era até divertido.
Gentil, adequado, prestativo.
A cor de seus olhos era bonita e seu sorriso era quase charmoso.
Entramos em casa entre meios sorrisos e meias conversas, ele me ajudou a carregar
as compras e despejamos tudo ruidosamente em cimado balcão.
Lance acariciou meu braço e apertou minha mão. Eu tinha desenvolvido um
carinho por ele que era quase atrativo. Beijou minha bochecha e arregaçou as mangas
fazendo alguma piada boba sobre culinária.
Ele era bom para mim.
Nunca seria Ryker, mas seria bom.
E, simples assim, com um olhar em meio perdido entre as compras da cozinha,
resolvi que ia tentar fazer aquilo funcionar.
Tentar de verdade.
– Vai separando as coisas? – pedi.
– Vou. Para onde você vai?
– Vou só me refrescar e colocar algo mais confortável. – Sacudi os ombros,
indicando a roupa que eu tinha usado naminha primeira entrevista de emprego de
sucesso em meses – E aí eu volto pra gente comemorar.
Estalou um beijo no canto da minha boca e me permiti ficar feliz.
As engrenagens da minha vida estavam voltando ao seu devido lugar.
Pelo menos até eu abrir a porta domeu quarto, e o que me esperava ládentro
explodir a máquina da vida, arremessando as engrenagens, emcompleta desordem,
para todos os lados.Eu podia estar só alucinando pela falta de sexo. Ou Ryker
poderia estar no meio do meu quarto só de cueca?
Eu não sabia qual das duas versões eu preferia.
Se estivesse apenas alucinando, eupoderia ter minha vida de volta.
Se não estivesse, eu poderia terRyker.
Mentira… eu sabia muito bem qualera a minha preferência.
Abri a boca com um grito mudo.
– Eu posso explicar! – Ele correu para perto de mim. – Não grita, Mina, pelo amor
de Deus! – Juntou as mãos e entrelaçou os dedos.
– Ryker? – Eu queria abraçá-lo, mas o choque e a descrença eram tão grandes que a
primeira coisa que saiu da minha boca foi: – Por que diabos está só de cueca?
Ele se afastou apenas um passo e riu com vontade.
– É a primeira coisa que você nota, não é, safada?
Eu lembrava do seu cheiro. Lembravados seus olhos. Lembrava do seu sorriso.
Foi mais forte do que eu. Dei um passo adiante, vencendo a distância e passando
meu braço pelos seus ombros. Ele apertou minha cintura no mesmo instante e me
envolveu.
Eu não conseguia respirar.Eu não conseguia pensar.
O fato de que eu não podia contar para ninguém o que tinha acontecido me fez
sufocar os sentimentos que eu tinha por ele em algum lugar onde pudessem parar de
doer em silêncio.
Mas vê-lo ali, tão próximo… A saudade que eu sentia dele começou a me destruir e
eu soube que não importava mais: mesmo que ele fosse embora naquele segundo, meu
relacionamento com Lance não teria mais chances.
Eu nunca sentiria por homem nenhumo que eu sentia por ele.
Mas Lance ainda era um bom homem… eu não queria magoá-lo. Não poderia.
E além do mais… eu não tinha como saber se Ryker ficaria. Eu não tinha a menor
ideia do que estava acontecendo.
– O que está fazendo aqui? – Me afastei, segurando seus braços. – Não é perigoso?
O Zahner sabe que veio para Paris? E por que está só de cueca?
– Você não consegue ignorar a cueca,não é?
E como se minha situação não fosse ruim o suficiente, Ryker fez o que ele fazia
melhor: piorou tudo.
Me puxou, engolindo minha boca, meenchendo daquela saliva perfeita que eu tinha
aprendido a venerar. Seu corpo se aqueceu sob a palma das minhas mãos e eu soube
que meu sangue deveria ter descido inteiro, se concentrando na minha vagina e se
preparando rápidodemais.
Por dois meses Lance me tocou, e pordois meses meu corpo se recusou a colaborar.
Ryker me tinha por dois segundos. E o que eu poderia dizer? Será que havia alguma
parte de mim que ainda duvidavaque eu era dele?
Enfiou a língua na minha boca e perdi o chão. Seus braços me seguravam pela
cintura e eram o único apoio que eu tinha contra a gravidade. Segurei sua nuca com
desespero. Eu preferia morrer a vê-lo se afastar. Chupou minha boca, mordiscou meus
lábios, me tomou pela boca com violência até a tensão começar a se acalmar. O tesão
era imenso; a saudade, porém, era maior. E saudade pedia beijos, abraços, olhares e
palavras antes de nudez e cama.
Ryker segurou meu pescoço em suas mãos, passeando os polegares pelo meu
queixo, acariciando minha bochecha com as costas dos dedos e voltando e me
segurar.
– Eu estava precisando disso – suspirou ainda de olhos fechados. – Pronto. –
Abriu os olhos. – Pode voltara ficar estressada e fazer suas perguntas agora.
– O que está fazendo aqui? – murmurei.
– Acho que você está em perigo.
– É o quê? – exaltei-me.
– Não tenho certeza! – Abanou as mãos. – Mas vim porque… – Olhou para os
lados, à procura de uma resposta. – Vim porque queria ter certeza.
– Por que acha que estou em perigo? E não é mais perigoso para você? Onde está o
incompetente do Zahner? Ele sabe que você está aqui? Ele deixou você vir? Ou veio
com você?
– Mina, Mina, Mina! – pediu. – Calma. Faz quatro meses que a gente nãose vê. Me
dá alguns minutos para pegar o seu ritmo na velocidade nível desespero, tá? Zahner
não sabe onde estou, vim sozinho porque ele não ia medeixar vir.
– Por um bom motivo! Você precisa ligar pra ele! – Enfiei as mãos nos cabelos.
– Ele não pode vir aqui! Podecomprometer seu disfarce!
– E você não compromete?
– Eu sou sagaz. – Sorriu.
– Tenho certeza de que é – rosnei, sem paciência.
– Ninguém mais sabe que estou aqui.
– Mina? – uma voz lá fora me chamou. – Tem alguém aí com você?
– Merda! – sussurrei, empurrando Ryker pelo ombro.
Eu não queria magoar Lance e… eu nem pensei. Seja lá qual fosse o cenário, um
homem só de cueca no meu quarto era uma péssima cena.
Ele seguiu minha deixa, embora a contragosto, e se jogou no chão, ao ladoda cama,
longe da visão de Lance, que abriu a porta do meu quarto, curioso.
– Ahm… Está tudo bem?
– Está! – falei, sem fôlego.
– Ouvi você falando com alguém.
– Comigo mesma. – Minha boca estava funcionando sozinha. – Eu gosto de
falar comigo mesmo para me animar. Vai lá Mina – fingi. – Vai fazer um jantar
delicioso. Vai sim, eu confio em você. – Ai, Mina, cala a boca, por favor.
– Essas coisas. – Sorri.
Eu queria chorar.
Lance levantou os olhosinspecionando meu quarto.
– Quer ajuda com alguma coisa?
– Não, não. – Fiquei à sua frente para impedir que entrasse. Mais um passo e ele
veria Ryker no chão em toda a sua majestosa nudez. – Tudo certo.
Livre-se dele, Mina. Livre-se dele rápido.
Diga algo que o deixe constrangido.
Mas o que diabos deixa uma pessoa constrangida em poucos segundos?
Eu queria que Ryker me desse uma dica.
– Ahm… O que é aquilo? – Sorriu, eeu vi suas bochechas ficarem vermelhas.
Virei de lado e me deparei com o meuvibrador novo em cima da cama.
É… ele não precisava se preocupar com a máfia russa. Quem ia matar o Strome era
eu.
– Um vibrador. – Minha boca continuou, mesmo sem minha permissão.
– Vou me masturbar, era isso que eu ia fazer. Gosto de me masturbar antes dos
encontros. – Eu estava empurrando Lance para fora do meu quarto, plenamente
consciente que ficara mais envergonhada do que ele.
– Ah, Mina… – Segurou meu braço com intensidade. – Eu posso… ficar?
– Eu deixaria. – Minha voz era um ganido de desespero. – Deixaria de verdade.
Mas estou menstruada – menti.
– É muito desagradável. Preciso cobrir tudo com um plástico. – Continuei
empurrando-o para fora do quarto. – Parece um tsunami vermelho. Olha, me espera lá
na cozinha, tá? – Consegui colocá-lo além do limite da porta e me fechei dentro do
quarto sem esperar umaresposta.
Fiquei encarando a maçaneta e pensando em como era humanamente possível
alguém se meter nas coisas em que eu me metia. Ouvi a risada incontrolável e abafada
de Ryker contra o chão.
– Calado – resmunguei, sem me virar.
– Nem uma palavra.
– Vou ficar em silêncio. – Começou a se levantar. Estava vermelho, provavelmente
de tanto segurar o riso. –Mas só porque estou com medo do tsunami. – Tapou a boca e
não conseguiuparar de rir.
– Eu te odeio. – Balancei a cabeça.
– Mentirosa. Venha aqui. – Puxou-me de novo. Beijou-me de novo. Eu já estava
começando a esquecer dos problemas quando ele parou e… – Ele queria ficar –
hesitou, procurando meus olhos. – Você disse que ia se masturbar e ele pediu pra ficar.
Oh, Bault! – Distanciou-se de mim. – Quem é o palhaço?
- Quer me dizer que você não ficoucom mulher nenhuma nos últimos meses?
Ele mordeu o lábio inferior, me encarando com raiva.
– Quero que se livre dele.
– É um jornalista, é uma boa pessoa e…
– Não me importa. Livre-se dele.
– Ryker, eu não sei exatamente o que aconteceu ou como você voltou. Mas lembro
que nós estávamos em uma situação bem ruim antes.
Espremeu os lábios daquele jeito infantil que fazia quando contrariado.
Achei que ele ia continuar a reclamação, mas em vez disso, só segurou meu rosto
entre as mãos e raspou o nariz no meu.
Foi tão brusca aquela mudança... Da discussão infantil para o carinhoabsoluto.
Mas eu entendia.
Ele não queria brigar. Só queria me beijar, e foi isso o que fez. Eu agradeci, já que
estava na mesma situação.
O momento foi lento e íntimo.
Seus dedos nos meus cabelos guiavam meu rosto e posicionavam minha boca,
mantendo nossos corpos juntos. Arranhei seu abdome antes de chegar ao tórax e aos
ombros. A saudade que eu sentia daquele corpo conseguia ser ainda maior que o
tesão. Ryker escorregou a mão pela minha bunda e precisei incluir um quase em
minha afirmação. A saudade quase conseguia ser maior que o tesão.
Deveria ter sido só um beijo. No entanto, quando era Ryker quem estava ali, me
tocando e tomando-me para si, a química se transformava em algo a mais. Era uma
sensação que se espalhava pelo meu corpo inteiro, causando espasmos e arrepios. Uma
intensidade que parecia atravessar o caminho oposto à concentração do orgasmo que
liquefaziameu corpo e me derretia por completo.
Um beijo. Interminável.Maravilhoso.
Como Lance poderia algum dia secomparar?
Lance.
– Ryk… não… – gemi. Ele demorou a me soltar, mas finalmente cedeu.
Não completamente… Seus lábios raspavam nos meus, dentadas superficiais na
minha pele, lambidas deliciosas… Mas eu podia falar.
– Ryker, pare… – gemi, sem ar.
– Não – devolveu, dengoso. – Por favor, não peça isso. – Sua boca estava no meu
pescoço e minha razão começoua falhar.
– Ryker, não… O Lance… ele é um cara legal. Não posso fazer isso com ele. Não
posso agir assim.
– Eu não ligo nem um pouquinho pro Lance – sussurrou, rouco. Eu conhecia bem
aquela rouquidão e um tremor de reconhecimento desceu pela minha espinha. – Só
ligo para aquele vibrador em cima da cama. Aquilo é novo, Mina?
– Sorriu e eu o mordi. Seu sorriso tinha um sabor único.
– A gente tem que parar – avisei, sem conseguir parar de morder linha do seu
queixo. Senti a barba por fazer raspando na minha pele cada uma de minhas
terminações nervosas ficou excitada.
– Humm… Estou percebendo. – Riu, sarcástico, transbordando safadeza. – Você
não respondeu à minha pergunta. Quero saber se teve a coragem de roubar de mim a
chance de te ver usandoum vibrador pela primeira vez.
– Estou falando sério, Ryker. –Beijos, tantos beijos.
– Eu também. – Estava ficando embriagada de tesão. Eu precisava
trazer nós dois de volta pra realidade.
– Eu tenho um namorado. – Empurreiseus ombros com o poder de decisão que me
restava.
– Tem sim – sussurrou. – E agora que voltou, ele está com ciúmes. Então, é melhor
você se livrar do jornalista e voltar para que ele te ensine como usar um vibrador.
Três
– É ele?
Puxou meu casaco, querendo olhar afoto.
Estreitei os olhos, focando no homemdo outro lado da rua que passava obraço pelos
ombros da garota ruiva e a puxava de volta para o prédio. Ele olhava ao redor,
preocupado. Tentava desvendar os perigos das sombras e, ao mesmo tempo, estava
completamente alheio aos verdadeiros riscos.
Olhei para a foto mais uma vez. Mesmo na penumbra, não havia dúvida.
– Uspekh, camarada. É ele.
Cinco
O primeiro abraço fora o do meu avô, logo depois que os meus pais morreram. Eu
estava na casa de Elise naquela noite. Eles tinham saído e me deixado com a família
dela. Eu lembro que a casa estava cheia quando acordei. Lembro que a mãe de Elise
me segurou pelos ombros e lembro do seu olhar antes de me enfiar em um abraço
maternal. Ela não sabia o que me dizer… É o tipo de coisa que você não aprende na
escola, faculdade ou pós- graduação: como contar a uma criança que os pais dela
morreram. Meu avô chegou o mais rápido que pôde. A única pessoa viva da minha
família, além de mim. Ele era a única família que eu ainda tinha.
Quando paro para me lembrar, acho que ele me abraçou muito mais do que eu o
abracei. Acho que era porque eu ainda era jovem e faz parte das expectativas sociais
assumir que os mais velhos vão morrer antes. Meu avô deveria sentir o oposto… Sua
expectativa deveria ser que fosse morrer antes dos mais jovens. Sob essa perspectiva,
acho que eu era muito mais a última integrante da família para ele do que ele para
mim. É por isso que acho que foi ele quem me abraçou e que eu fui a abraçada. Seja
como for, foi ummomento singular que permanecia em primeiro lugar para mim.
O segundo abraço fora o de Elise, logo quando voltei para Paris, depois da minha
experiência insana no Lucky’s. Eu tinha perdido tanta coisa… Tinha perdido minha
inocência, minha virgindade, minha vergonha e, acima de tudo, tinha perdido meu
Ryker. Abraçar Elise trouxe a sensação de recuperar algo que eu pensava ter perdido,
mas que ainda estava lá. A sensação incomparável de ainda possuir algo no mundo.
Aquele abraço simbolizou que nada poderia me separar dela. Acho que eu estava
errada… Seja como for, dessa vez fui definitivamente eu quem abracei e ela quem foi
abraçada. Ou sufocada.
Eu nunca imaginei que algum outro abraço no mundo pudesse concorrer com esses
dois. Nunca imaginei que outro abraço sequer seria considerado para entrar na minha
lista minúscula e especial.
Porém, assim que vi Luckas parado à porta principal da boate que levava seu nome,
o letreiro em neon com luzes falhando, seus óculos modestos, sua postura longa e
arrebitada como sua casa de Amsterdã, seus olhos quentes e seu sorriso amigo…
Corri em sua direção, lancei meus braços ao redor de seu pescoço e o abracei com
força, bem apertado.
Eu me lembrava de suas palavras para mim e Ryker. A ajuda que ofereceu a bom
amigo e a uma completa estranha. Eu me lembrava de suas poucas palavras no funeral
de Spider e de como senti um arrepio pelo corpo inteiro quando ele abriu uma garrafa
de cerveja no meio do cemitério e bebeu um gole direto do gargalo oferecendo um
brinde silencioso. Acho que teria jogado uma boa quantidade do líquido sobre o
caixão como uma homenagem à nossa peculiar amiga, se a irmã de Spider não tivesse
feito algo semelhante primeiro.
Nila era o nome dela. Três anos mais nova, tinha acabado de se lançar à profissão
da irmã. Estava linda e sorridente, mesmo no funeral. Lembro que cheguei a imaginar
se havia alguma indisposição entre elas para que Nila apresentasse um sorriso tão
verdadeiro naquela situação. Pelo menos até me aproximar e ver que se formavam
lágrimas em seus olhos, apesar do sorriso. Um sorriso transcendental e uma atitude de
“eu sei que minha irmã me espancaria com chicotadas na bunda se me pegasse
fazendo qualquer coisa que não fosse cultuar a vida, principalmente em seu enterro”.
Serviu duas doses de tequila e sorveu um gole antes de oferecer outro ao chão. Vi seus
lábios se moverem em um diálogo querido e apressado com a lápide de sua irmã. Mas
não me atrevi a me aproximar. Não era um momento meu, mas de Nila. Era um de
seus abraços. Mesmo que não houvesse braços envolvidos.
Lucky apertou minha bochecha comose fosse um tio que eu não via há anos.
– Não conseguiu ficar longe de nós? – brincou. Ryker o cumprimentou e agradeceu.
Ele apenas pediu-lhe que deixasse de formalidades e nos ofereceu a chave do quarto no
primeiro andar. – Vão se ajustar bem lá.
– A boate está funcionando? – Zahner observou, por cima de nós. Sempre atento e
observador. Eu sentia um nervosismo quando ele apoiava as mãos na cintura daquele
jeito… como se ele estivesse sempre pronto para levar uma mão à arma.
O curioso era que Gareth Zahner era um dos homens mais charmosos que eu já
conhecera. Não se comparava ao meu Ryk, claro. Mas ele era alto, tinha um porte que
chamava a atenção, olhos profundos e aquele topete de cabelos finos e arrepiados que
não era exatamente de propósito, mas também não era completamente acidental.
Exibia um sorriso agradável e sedutor e seria um homem que suscita admiração e
suspiros não fosse sua obstinada intensidade. O homem exalava estresse. Ele falava
qualquer coisa e eu esperava que os arredores explodissem, balas voassem ou
sequestros acontecessem. Quando levava a mão à cintura, eu esperava que ele fosse
sacar a arma e atirar em alguém. Não importava em quem… Seria apenas para aliviar
o insistente estresse que carregava consigo. Eu me senti ridícula por pensar assim…
mas talvez ele precisasse de sexo.
Seria legal poder afirmar que a ideia de Zahner e sua suposta necessidade de sexo
tinha me encantado e me feito pensar em seu corpo nu se, por mais nada, pelo menos
para me dar a ideia de que Zahner era apenas um ser humano com quem eu poderia
fantasiar.
Mas nem isso…
Me detive naquele pensamento e até considerei imaginar seu corpo nu e…
absolutamente nada.
E não era apenas porque eu estava irremediavelmente apaixonada por Strome, mas
porque havia algo em Zahner que não pedia pena. Não pedia carinho. Não pedia
desejo.
Havia algo nele que solicitava apenas que estivesse atento, que não fizesse nenhuma
besteira e, acima de tudo, que não morresse. Não havia alívio ao seu redor. Só tensão.
– Está funcionando. – Lucky abriu um sorriso triste e eu imaginei que ele ainda
resistia bravamente, e que os meses não tinham mudado o fato de que ele precisaria
vender tudo para alguémcomo o Allender. Pelo seu sorriso murcho, imaginei que não
demoraria a fazê-lo.
– Precisamos colocar os dois ládentro sem chamar atenção – Zahner decidiu.
– E você? Não vai entrar?
– Não. Vou me livrar do carro primeiro.
Ryk tinha a mão na minha cintura e estava seguindo Lucky para entrarmos na boate
quando Gary puxou-o com força pelo braço.
– Posso confiar que vocês dois vão ficar aí dentro, escondidos, em silêncio e sem
fazer nenhuma idiotice até eu voltar?
Seu olhar era duro e eu quis revirar os olhos.
A gente sabe que você é o policial que está tentando resolver tudo e provavelmente
é quem tem mais conhecimento para nos tirar dessa, Zahner, mas não precisa agir
como um arrogante imbecil o tempo inteiro.
– Pode. – Ryker ofereceu-lhe um imenso sorriso de “eu queria que você fosse ali
tomar no seu cu e me deixasse em paz” que reproduziu com precisão os meus
sentimentos.
Zahner ainda hesitou e nos encarou por mais alguns segundos antes de soltarStrome
e nos deixar seguir. Eu sentia seu olhar cravado em nossas costas e tive certeza de que
ele só foi embora depois que nos viu entrar em segurança na boate.
Eu poderia dizer que o quarto no primeiro andar era exatamente como eu me
lembrava, mas não era.
Era completamente diferente.
O bom e velho ditado já dizia que nunca se pode voltar para casa. Não de verdade.
Ou sua casa mudou, ou quem mudou foi você. De um jeito ou de outro, nunca há um
retorno. Era assim que eu me sentia.
Talvez o quarto estivesse idêntico. Talvez nada tivesse sido movido nem um
milímetro. Mas eu tinha mudado, e muito. E todo o processo de metamorfose
começou ali: entre aqueles lençóis.
Ryker estava se despindo e eu nem me incomodei em recriminá-lo. Se ele quisesse
transar agora, seria muito bem- vindo. Na verdade, acho que mesmo que ele não
quisesse, eu iria sugerir.
Passei os nós dos dedos pelo topo de sua bunda onde a barra da cueca acabava,
dando passagem à curva na parte baixa de suas costas. Ele se virou com reflexos sobre-
humanos, puxando- me pelo braço.
– Safada – recriminou, apertando-meentre seus braços. Eu ri e ele me beijou.
Reagiu tão rápido que eu imagino que já estaria planejando algo semelhante antes
mesmo de meus dedos terem alcançado seu traseiro.
– Eu me lembro da primeira vez que te vi nua nesse quarto – suspirou.
– Quando arrancou minhas roupas e me fez gozar com a boca pela primeira vez –
completei, gulosa.
– Não! – exclamou, ofendido. – Não se lembra?
Estreitei os olhos, vasculhando minhamemória e…
– Eu estava tomando banho! – Lembrei, desferindo um tapa em seu ombro. – E
você veio me assistir porque é um pervertido – exagerei e me afastei. Ele me agarrou
pela cintura, me virou de costas e alinhou sua virilha à minha bunda, roçando nossos
desejos com sua fome característica.
– Ia ficar decepcionado se você tivesse esquecido – murmurou, mordendo minha
orelha, fazendo sua rouquidão me excitar.
– De como você é pervertido? – provoquei. – Jamais!
Ele riu e se afastou tão subitamente que, por um segundo, imaginei que a
brincadeira poderia tê-lo ofendido.Ryker estava vestindo a camisa de volta e subindo o
zíper.
– O que houve? – perguntei, preocupada.
– Vamos fazer isso. – A sacanagem em seu sorriso deixava evidente que estava tudo
bem. Ele tinha planos… masestava tudo bem.
– O que você quer? – Levantei uma sobrancelha.
– Quero que você vá tomar banho. – Lambeu minha boca. – Quero assistir com
calma desta vez.
Travei os dentes nos meus lábios e despi o casaco que Zahner me oferecera no
caminho. Eu e Ryker fugimos sem muitos pertences. Larguei o casaco sobre a cama e
o encarei enquanto decidia.
– E então? – pediu com urgência.
– Afaste-se – resolvi provocar. – Não me toque a não ser que eu peça, ok?
Ryker arregalou os olhos e abriu a boca, indignado.
– Não! Que brincadeira horrível!
Claro que não. Peça outra coisa.
Eu estava rindo.
Andei até o banheiro e ele me seguiu como um fiel animal de estimação.
Me livrei de tudo, menos da roupa íntima. Ainda estava em frente à porta do
banheiro. Tentei voltar ao quarto para repousar o resto das minhas roupas sobre a
cadeira ou a cama, mas Ryker estava quase em cima de mim. Não me tocava, mas
também não permitia que eu me movimentasse, de modo que eu só pude me esgueirar
ao seu redor para lançar as peças de roupa sobre seu ombro ou pelo canto entre sua
cintura e a porta. Eu ria enquanto ele mantinha as mãos enfiadas nos bolsos. Pelo
volume em sua calça, eu tinha ciência de que ele estava duro e que as mãos que enfiara
nos bolsos estavam cerradas em punhos.
Ele gostou da brincadeira.
Não vai me tocar a não ser que eu permita.
Estava me sentindo ótima e orgulhosa do meu conforto com meu corpo seminu. E
então… girei devagar na porta do quarto e seus dentes se enfiaram no lábio inferior
com tanta força que percebi os sulcos se formarem.
Ele estava com raiva? Ah, porcaria… Eu tinha tirado a roupa rápido demais, não
era?
Coloquei os braços longos e lentos sobre o meu corpo… Não ia servir para me
tapar, mas pelo menos iria conter meu constrangimento momentâneo.
– Acho que não sou boa nessa coisa de striptease. – Senti meus dentes baterem uns
contra os outros quando travei minha mandíbula. – Tirei tudo rápido demais, não foi?
Acho que não sei fazer sem Lucy e Spider… – Tentei rir e ajeitei o cabelo atrás da
orelha, tirando os fios soltos do meu campo de visão. Queria observá-lo melhor, no
entanto, ele não tinha soltado os dentes do lábio e eu não tinha certeza se isso era bom
ou ruim. Comecei a tremer de um jeito horrivelmente familiar, de quando a tensão de
véspera de prova meatingia.
– Coloco de volta? A minha roupa? – Ele ficou mudo. – Coloco, não é? Você disse
que queria me ver tomar banho, aí eu tirei de vez! Porém, se fosse pra me ver tirar
devagar, deveria… Por que não me disse? Tem que me avisar! – reclamei, sentindo
um ardor horrível subir pelas bochechas à medida que eu ficava mais e mais
consciente do excesso de roupas dele e da ausência das minhas.
– Coloco de volta? Ou só tiro o resto e entro no chuveiro? – ele não me respondia.
Eu atropelava minhas perguntas umas sobre as outras e ele se recusava a me
conceder uma resposta, de modo que meu pânico aumentou e aumentou: – Acho
melhor eu me vestir. Você me dá licença? Eu coloco de volta, aí tiro de novo e
depois…
Senti a parede do banheiro quando minha nuca e minhas costas se chocaram contra
ela. Ryker estava ao meu redor, me espremendo contra os azulejos frios. Não estava
me beijando, mas nossa distância não passava de uma fração de centímetro. Estava
tão perto que eu sentia seu hálito aquecendo os lábios quando ele respirava em mim.
– Estou tentando obedecer. – Inspiroucom dificuldade. – Estou tentando não tetocar,
já que você pediu. Estou agindode acordo com essa sua brincadeirinha desagradável,
mas está sendo bem difícil. – suspirou quente.
– Ah! – respirei aliviada. – Então eu estava fazendo tudo certo?
Ryker encarou o teto com uma risada breve e logo estava no meu pescoço… Rápido
demais. Raspando os dentes na linha do meu queixo como se não me morder
demandasse toda a sua força de vontade.
– Isso foi um sim? – Eu quis saber. A animação estava começando a me esquentar,
afastando o gélido receio temporário.
– Deixa eu te explicar como é – suspirou, fazendo nossos narizes se tocarem. – A
gente conversou sobre você tirar a roupa e eu fiquei duro. Vocêtirou a roupa e meu pau
cresceu no jeansa ponto de doer. Aí você...
– Não tem problema se foi rápido? – interrompi, preocupada.
– Bault! Estou tentando ser sensual! – reclamou, alto. – Você deixa? – exagerou na
indignação e eu estava rindo. Gesticulei um floreio para que ele, por favor,
continuasse.
– Onde é que eu estava?
– Ahm… – Estreitei os olhos. – Falar sobre tirar a roupa e ficar duro. Tirar a roupa e
ficar mais duro – revisei.
– Isso – proferiu cada sílaba com umacalma infinita. – Obrigado.
– Disponha.
– Não vá vestir a roupa de volta – decidiu com simplicidade. – Vá tirar o resto e
entre no chuveiro.
– Tem certeza? Porque eu posso tirara roupa mais devagar.
– Mina… eu já te vi tirar a roupa devagar vezes o suficiente. Juro. Acho que prefiro
quando você fica nua rápidomesmo. É mais seguro.
– Ok! Eu tiro? Você tira? Tanto faz? –Ergui os ombros.
Ryker se empurrou para trás e se sentou sobre a tampa do vaso.
– Você tira. – Indicou o chuveiro comum gesto e se recostou contra a parede.
Coloquei os braços para trás para abrir o fecho do sutiã.
Acontece que eu não tiro o sutiã assim… Acho horrível encontrar o fecho sem estar
olhando para ele, então eu geralmente dispo as alças, giro o sutiã e desataco com o
fecho na parte da frente, atividade essa que não exige nada da minha coordenação
motora. Entretanto, abrir um fecho sem vê-lo, com os braços estirados para trás das
costas, e um Ryker me assistindo com o olhar praticamente na altura da minha virilha,
era muito diferente.
A ação rapidamente se mostrou impossível e Ryker estava rindo daquele jeito
delicioso quando se levantou.
– Não ria! – Estalei um tapa no seu peito.
– Aqui. – Me abraçou. – Deixa eu te ajudar.
– Deixa eu virar de costas – sugeri, tentando escapar dos braços que me
esmagavam para que eu pudesse virar o fecho do sutiã para ele.
Sua pele subiu pelas minhas costas, seus dedos arranhando minha coluna. Para ele,
bastou apenas uma mão para abrir meu sutiã.
– Nossa! – Mantive a boca exageradamente aberta para indicar minha admiração.
– Acho que não deve ter sido sua primeira vez, não é? – Torcio nariz, brincalhona.
Mas Strome deteve meu sutiã nas mãos e os olhos nos meus seios daquele modo
predador que ele assumia quando a nudez era demais para que resistisse. Umedecia os
lábios com a língua enquanto dedicava longos segundos de observação, divididos entre
os seios, umapós o outro.
Eu me inclinei para tirar a calcinha e foi somente quando seu olhar se inclinou,
acompanhando os movimentosda minha nudez, que eu percebi o nível de sua hipnose.
Engoli em seco e me dirigi ao chuveiro.
Ele ficou de pé dessa vez, os braços cruzados com o ombro apoiado contra aparede.
Os cabelos bagunçados e aquele sorriso lindo. Seus olhos não encontravam os meus,
o que significava que ele estava se divertindo ao inspecionar cada centímetro da minha
pele. Liguei o chuveiro e deixei a água encharcar meus cabelos.
A água escorria pelo corpo dela, formando um fluxo contínuo entre os seios e
escorrendo até o meio de suas pernas.
Eu estava salivando. Achava avergonha de Mina excitante. Até ela tirara roupa com
tanta animação girando pelo banheiro, foi então que percebi que gostava dela sem
vergonha, também. Aí ela se atrapalhou com o fecho do sutiã e eu estava latejando
com tanta força que achei que ia romper as calças, porque aparentemente eu gosto até
de Mina desajeitada. Ela sorriu, ligou o chuveiro e eu quis beijá-la. Quis fodê-la. Quis
medeclarar e fazer amor. Qualquer coisa. Oque ela quisesse e do jeito que ela quisesse.
Foi então que percebi que eu gostava de Mina de qualquer jeito. E o mais curioso é
que ela não precisava nem estar nua. Desde que ela estivesse por perto, eu gostava dela
de qualquer jeito.
Se ela estivesse nua era melhor, obviamente. Mas se estivesse vestida, eu não iria
reclamar. Ela apertou os cabelos para que o excesso de água escorresse. Sorriu,
sapeca, afastando as gotas de água do rosto.
Eu não conseguia desviar o olhar. Não conseguia pensar em nada que não fosse
ela. Tirei a blusa sem dedicar muita atenção às minhas ações e chutei os sapatos para
o lado.
– Achei que só ia se aproximar quando eu pedisse. – Riu e eu quis apertá-la
todinha.
– Eu não prometi nada. – Empurrei as calças para baixo e peguei seu olhar curioso
em busca da minha ereção. – Quer ver mais de perto? – Sempre! – Deu um passo para
trás de modo a abrir espaço embaixo do chuveiro.
Ela era tão linda que me dava vontade de gritar. E quando ela ria desse jeito, sem
vergonha, sussurrando algo safado para mim, eu ficava tonto. Meu quadril se
aproximou primeiro e eu estava raspando nossas mais deliciosas partes uma na outra.
Um passo adiante e Mina estava apoiada nos meus ombros.
Beijou minha boca e se pressionou contra o meu tórax, encaixando o rosto na curva
do meu pescoço. Eu a abracei edeixei a água cair sobre nós.
Aquilo era bom. Aquele abraço quente, aquele banho gostoso, aqueles braços ao
meu redor.
Aquilo era tão bom. Apertei o abraço e fechei os olhos. Minha ereção perfurava a
carne da sua cintura, mas ela não reclamou. Minha Mina envergonhada que tinha se
acostumado com paus duros. Estava sorrindo.
Desfrutava do meu momento e da minhamenina.
Estiquei o braço e peguei o sabonete no apoio lateral. Ensaboei suas costas primeiro
enquanto ela permanecia abraçada comigo. A curva de sua bunda, o alto de suas
coxas… O sabonete escorregava suave e eu aproveitava para passar minha mão logo
em seguida. Eu poderia usar o pretexto de que queria apenas lavá-la melhor, mas…
quem eu estaria enganando?
Me ajoelhei e ensaboei o resto de suas pernas. Ela riu baixinho e se moveu para me
ajudar. Beijei o joelho antes de cobri-lo de sabão. Lavei seus pés com cuidado antes de
me levantar. Ela mantinha aquele sorriso comedido que me dava vontade de mordê-
la. Escolher uma porção de carne, de preferência a dos seios, e abocanhá-la com força.
Todavia, em vez disso, continuei minhas carícias com bolhas de sabão, dedicando um
cuidado especial a cada um dos mamilos. São partes delicadas do corpo feminino… e
precisam, portanto, de uma atenção especial.
Beijei seu pescoço e, com as mãos em concha, lavei-a por inteiro. Movendo seus
braços para colocá-la debaixo do jato, lavando cada parte do seu corpo.
Quando me dei por satisfeito, depositei de volta o sabonete no recipiente e alcancei
o pote que ficava ao seu lado. Mina enrugou a testa e eu compreendi sua dúvida.
– Shampoo? – Quis saber.
Eu ri antes de deixar a resposta escorrer com uma luxúria incontrolável:
– Sabonete íntimo.
Sua expressão se contraiu em uma preocupação intensa e a senti hesitar em meus
braços.
– Shh… – Pedi e a fiz se virar, mantendo sua bunda contra minha virilha,
esfregando minha ereção contra aquela curva perfeita…
Apliquei uma boa quantidade do líquido em minha mão antes de derrubar o pote
ruidosamente no chão molhado. Deslizei a mão por sua barriga e notei quando ela
prendeu a respiração.
Minha mão explorou cada canto da sua vagina. Ensaboando-a com dedos lentos,
girando ao redor do clitóris, percebendo os pequenos movimentos de contração em
suas pernas, que começavam a ansiar por mais. Prendi o lóbulo de sua orelha entre
meus dentes eenfiei a cabeça do meu cacete entre as bandas de sua bunda.
– Ryk… – gemeu.
– Não vou fazer nada, amor – acalmei-a. – Não vou fazer nada. Só é gostosinho
deixar aqui… nem que seja um pouquinho.
Mina inspirou profundamente e arrebitou a bunda o suficiente para que meu pau se
escondesse um pouco mais entre suas bochechas e eu estava de olhos fechados de
novo. Com sua boceta inteira em uma de minhas mãos, levantei a outra para agarrar
seu seio. Ela estava gemendo mais alto e eu não estava mais conseguindo controlar
meus dentes.
– Vocês voltaram!
O grito alto fez meu coração disparar em desespero, tomando a frente de Mina. O
pânico fez meu corpo inteiro se contrair e eu ia precisar de minutos – ou horas – para
superar a sensação de que meu peito ia explodir.
– Lucy? – reclamei.
Mina emitiu alguma exclamação alta ese enfiou atrás de mim.
Na nossa frente, a porta estava abarrotada de curiosos. Liderados por Lucy, quase
todos os nossos amigos da boate tinham aparecido para nos prestigiar.
E malditos fossem. Todos eles.
Novos planos
– Eu ainda não entendi quem é esse Herbeck de quem vocês tanto falam.
– Joanie! – Luckas pediu.
– Foi só uma pergunta! – ela se defendeu.
– Eu sei! E Ryker e Mina já concordaram que, desta vez, todo mundovai ficar por
dentro dos acontecimentos… Mas a irmã dele já está chegando. Vamos segurar as
perguntas por alguns minutos para que ele não precise explicar tudo duasvezes, sim?
– A gente já esperou quase um dia inteiro! Pode ser que ela entenda essa parte bem
rápido – Joanie reclamou, torcendo seu nariz afilado e cheio de sardas. – Ele podia ir
adiantando, caso eu seja mais lenta.
Quase um dia inteiro de espera e antecipação. Eu não sabia se estava mais nervosa
com a perspectiva de ser apresentada à irmã de Ryker, que era uma das minhas
autoras eróticas favoritas, ou ao cunhado dele, o presidente da maior empresa
pornográfica do planeta e que parecia ser algum tipo de super-homem que ele
idolatrava.
Luckas ofereceu a Joanie uma caretade desagrado como resposta e Devon inspirou
fundo para dizer alguma coisa enquanto Ryker se movia como se fosse pedir calma.
Zahner estava sentado porperto, prestes a entrar em ebulição,quando um barulho na
porta nos fez calar. Pela luminosidade na lateral do salão, era de se imaginar que
a porta estivesse aberta. Pude ouvir a voz de Brout cumprimentando alguém, seguida
por uma voz masculina intensa eprofunda. Prendi a respiração. Os estalos do
salto alto ecoaram pelo salão. Ela se aproximou e entrou no meu campo de visão
primeiro.
Lexa Strome.
Tinha algo imperial no modo como ela se portava e se movia. Diante de sua
presença forte, que indicava que nada a poderia atingir, era difícil acreditar que ela já
tinha passado por um trauma. Os longos cabelos loiros escuros lhe caíam até a cintura.
Uma mistura de fios cor de mel com um castanho muito claro em cachos soltos,
longos, pesados e invejáveis. Sua elegância seria considerada esguia, não fosse pelas
curvas angulosas em todos os lugares certos. Sua saia justa descia até os joelhos e
perpassava a cintura, delineando o corpo inteiro.
A camisa de seda, metodicamente colocada por dentro da saia, tinha as mangas
compridas dobradas em três quartos. Apenas um botão desatacado exibia o pingente
delicado de seu colar discreto, um pouco de pele e nada mais. Não havia decote a ser
exibido, não havia abertura na saia que comprometesse a integridade das coxas. Ela
era o símboloda pureza com um gosto incompreensível por sacanagem.
Talvez fossem os lábios que se entreabriam em um sorriso peculiar. Ou os olhos.
Um verde-azulado que lembraria com segurança o tom dos de Ryker, embora os dele
estivessem mais próximos do verde enquanto os dela se agarravam ao azul.
Foi então que notei as semelhanças…
Não fosse pela cor dos cabelos: os dele permeavam um castanho muito escuro eos dela
eram uma mescla inusitada de tons de loiro. Desconsiderando isso, eles seriam
perfeitamente reconhecíveis como membros da mesma família. Além da tez
semelhante, os traços sugeriam uma mesma ascendência, associados ao sorriso que eu
não conseguia exatamentedefinir.
Ela abriu o sorriso e os braços, e Ryker se levantou.
– Você deveria ligar com mais frequência. – Colocou o irmão mais novo dentro do
seu abraço e lhe ofereceu um beijo na bochecha que ficou registrado pela marca
vermelha do seu batom.
– Não gosto de incomodar.
– Não seja bobo, Ry. – Recriminou-o com um olhar que seria condescendente, se
não exalasse carinho.
– Ahm, Lex. – Virou-se para mim comum sorriso. – Essa é Mina. Ela é uma fã.
– Riu e eu tive certeza que a vermelhidão tinha assumido minhas bochechas para
sempre.
Eu me pus de pé com um solavanco eLexa me estendeu a mão.
– Como vai? – Seu sorriso era deslumbrante. Eu retribuí o gesto de simpatia e já
tinha a mão estendida no arquando ele se aproximou.
Seria impossível afirmar com certeza,mas acho que senti seu cheiro antes mesmo de
vê-lo. Percebi sua presença antes mesmo de saber como era seu rosto ou me certificar
de seu nome. Havia algo na sua mera existência que me fazia tremer. Como se ele
fosse capaz de infectar alguém com uma perigosa dose de feromônios por meio do ar
que respirava.
Ele abriu um sorriso e eu esqueci quedeveria apertar a mão de Lexa.
Em cima de seus saltos altos e finos, Lexa deveria beirar um metro e noventa. O
homem atrás dela era levemente mais alto. Seu físico era evidente mesmo por baixo de
paletó e casaco. Sua barba clara estava rala e por fazer. O maxilar quadrado e a
expressão descarada. O loiro de seus cabelos arrepiados era de um tom diferente dos
de Lexa.
Era um loiro mais claro e evidente. O tom de seus olhos também era diferente…
bem diferente… Um azul-claro que assumia uma profundidade tectônica, provocando
em mim um ardor que queimava em locais bastante inapropriados.
Ele se aproximou mais do que eu poderia imaginar e já invadia meu espaço pessoal
quando tomou para si a mão que eu mantinha no ar estendida para Lexa.
– Sven – sussurrou, antes de beijar meus dedos. – É um prazer conhecê-la.
Por que ele precisava pronunciar apalavra “prazer” daquele jeito?
Seus lábios se foram dos meus dedos, mas ele ainda sustentava o aperto em minha
mão, com os olhos fixos nos meus como se para prolongar a hipnose. E seja lá o que
fosse… estava funcionandoperfeitamente bem.
– Sven? – Ryker limpou a garganta e eu despertei com um estalo, tomei minha mão
de volta com educação. Mas meu captor não pareceu se incomodar ou se constranger.
Em vez disso, apenas aproximou o rosto do meu e respirou fundo, como se pudesse me
compreendermelhor pelo olfato. Nossos hálitos semisturaram e eu assisti à sua testa se
enrugar em uma proximidade perigosa.
– Virgem? – Ele estreitou um olho e eu entrei em pânico.
– Delvak! – Lexa estourou um livro contra suas costas e a hipnose se quebrou. Eu
dei um passo para trás e o vi sorrir antes de tirar o foco de mim e levá-lo a outra
pessoa.
Eu não era mais virgem, mas era consideravelmente inexperiente. Mas como ele
sabia? Como era possível saber? Pelo cheiro?
Virei o rosto para o lado, aproximando o nariz das minhas roupas na altura do
ombro e tentei fungar discretamente… Como era possível?
– Eu estava apenas dizendo “olá” – defendeu-se.
– Vá dizer “olá” para outra pessoa. – Lexa revirou os olhos e ele se foi. Lucy estava
de pé, o que era extremamente curioso.
Engoli em seco e recuperei o ar.
- Eu… sinto muito. – Meu rosto explodia em um vermelho que me fazia arder de
vergonha. Eu tinha encaradolibidinosamente o namorado da Dama Imperial do
Erótico. Que, por sinal, era minha cunhada. E tinha feito isso nafrente do meu
namorado.
Ter Ryker nu era uma coisa boa, mas vou te contar… Fora isso, ser eu era uma
merda.
– Não se preocupe, querida. – O modo descontraído com o qual ela sorriu me fez
crer que tudo estava realmente bem. – Ele faz isso.
– E você não se incomoda? Oh, desculpe! – Levei a mão à boca quando percebi
que a pergunta indevida tinha escapado rápido demais. – Não é da minha conta.
– Por que me incomodaria? – ela se limitou a responder.
Meu queixo caiu enquanto eu tentavaencontrar o sentido.
– Vocês… ahm… Ryker disse que você e ele…
– Não estamos juntos. – Ela puxou a orelha do irmão e Ryk chiou, irritado. – Ry
tem essa alucinação de que eu e Svennamoramos. Mas não é verdade.
– Não tenho alucinação nenhuma. Vocês dois só tem problemas paraassumir.
Ela poderia ter respondido. Poderia ter revidado e refutado. Usado argumentos que
pessoas normais usariam. Ou poderia ter ficado com vergonha e fugido do assunto.
Porém, em vez disso, ela apenas o segurou pelo queixo e sorriu, encarando seus olhos
com cuidado.
Sorriu como se ele fosse uma criança muito pequena que não entende
absolutamente nada de sexo ou relacionamentos. Como se a opinião dele sobre os
dois temas servisse tanto quanto a opinião de uma criança de dois anos sobre física
espacial.
Nunca tinha visto alguém tratar Ryker assim. Ele sempre tinha sido o deus-de- todo-
o-conhecimento até onde eu sabia, e ver que havia alguém no mundo que não apenas
ficava mais à vontade com o assunto do que ele, mas também era incapaz de se
constranger com algo ditopor ele foi realmente uma boa dose de ar fresco.
Eu me virei de volta para o grupo, tomando o cuidado de não fazer contato visual
direto com o senhor Delvak. Ele tinha acabado de cumprimentar todos aonosso redor,
de modo que só faltava Zahner.
– Gareth Zahner. – Eles apertaram asmãos com cordialidade. – Interpol.
– Ah, então você é o incompetente?
– Como é? – rosnou.
– O incompetente – Delvak repetiu, sem problemas. – É você?
– Não me conhece o suficiente para fazer esse tipo de ofensa. – Mordeu o lábio. Ele
estava tentando ser educado, mas estava exigindo tudo de si.
– Conhece a definição de incompetência, senhor Zahner? Significa inabilidade.
Inaptidão. Incapacidade de realizar algo.
– Depende do contexto – Lexa assoviou baixinho, fazendo Delvak interromper
seu discurso, controlando uma careta de irritação. Expirou fundo e lhe ofereceu um
sorriso de desagrado.
– Você quer falar por mim? –convidou.
– Acho que eu faria um trabalho melhor do que o seu na maior parte das vezes. –
Sorriu, absoluta, passando um braço pelos ombros de um Ryker que claramente se
divertia com a dinâmica entre os dois. – Mas ainda estou matando as saudades do
meu irmão. Pode continuar, obrigada.
Delvak abriu um sorriso mais amplo de quem estava lutando para ser agradável e se
voltou para Zahner.
– Até onde sei, você era responsável por cumprir um acordo, que era manter
aqueles dois a salvo. E, até onde sei, você foi incapaz de realizá-lo. Estou errado? –
continuou.
– Não gosto de você. – Gary decidiu em alto e bom tom.
– Homens geralmente não gostam – sorriu. – A não ser que eles sejam
homossexuais. Neste caso, não conseguem se distanciar. – Ele piscou um olho para
Lucy e tenho certeza que avi corar, o que não fazia qualquer sentido.
Delvak despiu o casaco e, quando ele desatou os botões do paletó para se sentar em
uma das cadeiras perto de Luckas, eu soube que ele era o tipo de pessoa impossível
de descrever.
O homem era sexo em um terno caro.
Sexo muito bom, por sinal.
– Então, moleque! – Riu para Ryker e ele foi se sentar ao seu lado. Me puxou pela
mão quando passou por mim. Senteiperto do meu namorado e respirei fundo.
– O que houve? A parte de ter visto o Kulik matar alguém eu já entendi. Explique o
resto.
Ryker falou rápido e suave, poupando apenas os detalhes que pertenciam apenas a
nós dois e seriam irrelevantes a terceiros. Começou repassando os eventos da
primeira noite em Paris, ignorando o motivo que nos unira naquela noite e eu lhe fui
profundamentegrata por isso.
Delvak e Lexa se entreolhavam em breves espaços de tempo, aguardando a
conclusão da narrativa que seguia com seriedade, mas sem maiores problemas. Pelo
menos, a cena se desenvolveu assim até Ryker chegar na parte da ligação que recebeu
na Itália. Ele fez uma pausa para respirar fundo e algo na sua postura deve ter
indicado a Lexa e a Delvak que as más notícias se aproximavam.
A explicação daquela parte da história fez o clima no salão mudar. Ryk murmurou,
em meio a doses precisas de nojo e fúria, a participação de Simak no nosso reencontro
com os russos, a mortede Spider e o motivo de estarmos fora do programa.
A menção ao nome do pai de Ryker fez Delvak cerrar as mãos em punhos. Seu
semblante alterou-se e o safado brincalhão tinha desaparecido. Ele estava sério como o
dia depois do Apocalipse e Lexa apoiou a mão em seu ombro, apertando-o em uma
carícia de conforto.
Sven esfregou os olhos por dois segundos.
– Não vou te enganar, moleque. Vocêse meteu em um problema bem sério.
– Eu sei. E detesto envolver vocês, mas…
– Deveria ter nos envolvido antes – Lexa falou com intensidade. – No entanto,
estamos aqui agora e vamos resolver.
– Ela está certa – Delvak falou. – Não acontece com frequência. – Sorriu e Lexa
ofereceu-lhe a língua em resposta,suavizando o clima de tensão ao nosso redor.
– Sven… – Ryker pediu devagar. – Não conhece algum policial por aqui?
Delvak expirou sem pressa, antes de se recostar na cadeira.
– Conheço muitos policiais, garoto. Mas os conheci quando eles estavam me
prendendo. Esse tipo de coisa não é umaboa fundação para uma relação deconfiança.
– Prendendo? – murmurei. – Você já foi preso?
– Atentado ao pudor mais do que qualquer outra coisa – explicou, gesticulando,
como se não fosse nada. – Mas isso não importa. Não é com a polícia que vamos
resolver o problema desta vez.
Ryker fechou e abriu a boca como se não soubesse qual era a intenção de Delvak.
– Nosso problema não é recuperar a reputação do agente Zahner nem transformar
vocês em testemunhas protegidas – suspirou. – O verdadeiro problema ainda é o fato
de vocês dois terem testemunhado um chefe da máfia russa cometer um assassinato.
Esse é o seu problema que nunca foi devidamente resolvido. Esqueça o resto! Esqueça
o Herbeck e Simak – cuspiu o último nome. – Esqueça o programa de proteção à
testemunha ou as politicagens da Interpol. Esqueça tudo. Seu problema é que a máfia
russa quer vocês dois mortos. Suas opções, de acordo com a polícia, sempre vão ser:
morrer ou passar o resto da vida escondidos. Masa polícia nunca vai lhes contar que
existe uma terceira porta.
Eu não tinha entendido. Contudo, pelas testas enrugadas, olhares estreitos e narizes
torcidos ao meu redor, tinha certeza que não era a única.
– Sven… – Lexa pediu baixinho. Ao contrário do resto de nós, ela tinha entendido
perfeitamente bem.
– Vocês estão tentando encontrar a solução na lei. – Ele pegou a mão que Lexa
posicionara em seu ombro e a segurou nas suas, numa tentativa de acalmá-la. – Mas
as soluções da lei são uma merda! Agora, nós precisamos procurar uma solução no
crime.
Dizer que todo mundo começou a falar ao mesmo tempo seria uma gentileza.
As pessoas estavam gritando. A começar por Zahner, que transformou sua
gargalhada de escárnio em uma interminável sequência de ofensas dirigidas a Delvak.
O baque alto fez todos se calarem mais uma vez. Lexa Strome tinha dado um
murro ruidoso em uma das mesas com tanta força que foi difícil imaginar que ela
não teria se machucado.
– Calem-se todos! – ralhou. – Vocês estão aqui há meses tentando resolver esse
problema e não tiveram sucesso.
– Bem, alguns de nós… – Höfler começou.
– Silêncio! – ela rosnou e ele se calou de imediato. – Errar é compreensível, só que
persistir no erro é estupidez. O modo como lidaram com tudo até agora foi ineficiente.
– Ou incompetente. – Svenacrescentou.
– Cale-se você também! – rugiu, e elelevantou as mãos em um pedido de desculpas.
– Nós vamos experimentar algo novo agora e eu não quero ouvir reclamações.
Todos sabemos a gravidade da situação. Não é brincadeira, não é festa. O que vai
acontecer a partir de agora vai ser ainda mais grave e só por optarem estar aqui,
aqueles de vocês que ainda não estão envolvidos, estão arriscando as próprias vidas
também. E eu não vou permitir queessa situação piore ainda mais por causade baderna
e infantilidades. Sven tem um plano, vamos ouvi-lo sem interromper, a não ser que
tenhamos algoprodutivo a acrescentar ou uma crítica construtiva pertinente. Fui clara?
O modo assustador como ela se impôs deixou todos nós aflitos e ávidos para
concordar. Delvak esperou alguns segundos antes de ter certeza que era seguro
continuar.
– O plano é tornar Yuri Kulikirrelevante. Dessa forma, mesmo que elequeira matar
vocês, não poderia fazer isso.
– E como você pretende fazer isso? –Zahner interrompeu e Lexa ficou lívida.
– Porque nós temos tentado há anos e…
– Vocês têm tentando dentro das leis – Delvak lembrou. – Não preciso fazer isso e
posso ser mais criativo.
– Criativo? É outra palavra para “ilegal”? – Zahner não parecia confortável com a
ideia e eu não o culparia por isso. Pelo contrário, senti- me aflita por ele. Não poderia
ser fácil estar naquela situação: ele era apenas um cara honesto que tentou nos ajudar
e que agora estava pagando por isso de todas as formas possíveis. Ele queria nos
manter a salvo e acabar com Kulik, certamente. Mas havia muito mais em risco. Sua
carreira, sua reputação. Sua vida...
Sven inspirou fundo como se Gary o deixasse exausto, mas Lexa tocou seu ombro e
falou por ele, talvez sentindo por Zahner a mesma empatia que eu.
– Senhor Zahner? – ela chamou. – Qual solução o senhor vê? – convidou, mais
polida desta vez. – Procurar ajuda da polícia? Por que eles acreditariam em qualquer
um de nós? Colocar tudo nainternet e correr o risco de sermos todos assassinados ainda
assim? Conseguir um empréstimo e fugir para Bali pelo resto de suas vidas? Qual é o
seu plano?
Gary a encarou em silêncio. Eu vi sua postura mudar. Não era mais defensiva e
estressada. Ele estava considerando…
– Eu não sei – admitiu, finalmente. – Não sei. – Enfiou a mão nos cabelos e eu
senti por ele… O homem que sempre tinha um plano estava completamente perdido e
isso deveria ser mais difícil para ele do que nós poderíamos compreender. Uma parte
de mim desejou ter sido mais paciente com ele nos últimos dias. – Eu queria poder
consertar a situação – admitiu para si mesmo. – Mas não sei como. – Largou- se na
cadeira e apoiou a testa no punho. Foi aí que percebi que ele estavadisposto a escutar.
– Eu tenho um amigo. – Lexa se sentou ao lado do agente com um sorriso
simpático. – Ele dizia uma coisa muito interessante, senhor Zahner…
– Gary – pediu. – Pode me chamar deGary.
– Gary – ela concordou com uma reverência breve. – Ele dizia que, ao se deparar
com um problema, a melhor coisa que se pode fazer é a coisa certa. A segunda
melhor coisa que se pode fazer é a coisa errada. E a pior coisa que se pode fazer é
não fazer nada.
– Não tenho certeza se estou entendendo aonde quer chegar. – Gary expirou,
cansado.
– Ela está dizendo que vocês já tentaram fazer a coisa certa. – Sven sorriu com
simplicidade. – Porém, agora, está na hora de fazer a coisa errada.
Todavia, lá estávamos nós. A boate estava lotada, os avisos sobre o show da Tímida
tinham sido devidamente espalhados e o stripper viciado em jogo já havia sido
enviado em sua missão há mais de uma hora. Gareth Zahner estavaparado em um dos
cantos do salão principal e parecia mais um segurança do que os próprios seguranças.
Era bom que ele nunca tivesse trabalhado disfarçado. Seria sumariamente identificado
e assassinado em questão de segundos.
Eu ia recriminá-lo pelo seu comportamento, mas a baderna contida perto da porta
dos fundos chamou minha atenção.
– Não é bom você ficar por aqui, Nila. Você precisa ir!
– Sei que eles estão aqui, Luckas! Eu falei com a Joanie!
– Joanie não deveria ter te contado nada. Menina, por favor, me escute…
– Era minha irmã! Eles mataram minha…
– Shhh! – O dono do estabelecimento puxou a bela jovem negra pelo braço e se
enfiou em seu escritório. Ia fechar a porta atrás de si, mas eu a barrei com o pé e entrei
com ele.
– O que está havendo aqui?
– Senhor Delvak. – Luckas encarou ochão, coçando a testa. – Nada, Nila apenas…
– Não é da sua conta. – Virou seus imensos olhos negros, me expulsando da
discussão.
– Por que não me diz qual é o assuntoe eu mesmo decido se é da minha conta?
– convidei.
– O assunto é o novo creme vaginal que eu quero usar para controlar a infecção na
minha boceta. É da sua conta? – rosnou.
Lambi meu sorriso, discreto.
Gostei de você, garota.
– Tem um novo chamado Ingensy que é muito bom. Ainda está na fase de teste, mas
posso te conseguir uns tubos, sequiser.
Enfiei as mãos nos bolsos e esperei sua reação. Ela apenas focou o olhar em meu
rosto com uma boca entreaberta de dúvida, acho que ela não deveria conhecer
ninguém mais inapropriado que ela mesma. Mas agora eu estava ali e isso ia mudar.
– Nila, o senhor Delvak é amigo de Ryker. Está aqui para nos ajudar com… bem,
com tudo.
– Qual é o plano? – ela sequer hesitou.
– O plano é você sair daqui e não se meter – decidi.
– Eu já pedi a ela, mas…
– Não vou embora. E, se não me deixarem participar, eu vou gritar na porta que a
máfia russa deveria vir até aqui. Vou até o jornal, se precisar!
Esfreguei minhas têmporas enquanto ela terminava a frase. Acho que Zahner estava
certo: Ryker deveria ter sido mais cuidadoso. A quantidade de pessoas que sabia
sobre aquele assunto, que deveria ser secreto, era cada vezmaior.
– E posso perguntar por quê?
– Era minha irmã! – sibilou.
– Sua irmã?
– Ela trabalhava aqui – Luckas explicou. – Os russos a assassinaram... –
murmurou, como se as palavras doessemquando estalavam em sua língua.
– Entendo…
– Nila, você está muito envolvida com isso. Emocionalmente…
– Estamos todos envolvidos, Lucky! Não venha com esse papo para cima de mim!
Spider era minha irmã. Ela morreu nesse buraco, assassinada por aqueles putos de
merda e se vocês tem um planopara vingá-la, eu tenho o direito de participar!
Luckas estava à beira de ser razoável mais uma vez. Eu o interrompi, porém.
– Vai ser feio – avisei.
– Não me importa. – Seus olhos brilharam de esperança.
– Vai ser ilegal.
– Meu jeito favorito!
Mordi o canto do lábio enquanto considerava.
Se ela já sabia de detalhes, eramelhor mantê-la por perto, de qualquer modo.
– Ela fica – resolvi e a vi sorrir pela vitória.
– Nós temos um problema. – Zahner abriu a porta e avistei Tim logo atrás dele.
– Timothy! – exclamei quando eles entraram. – Mas que merda! Não deveria estar
perdendo muito dinheiro em um jogo?
– Eles não foram! – alertou,apressado. – Os russos não estavam lá.
– Como não?
– Eles estão aqui. – Zahner apontou o polegar para o salão. – Estão sentados em
uma das mesas na esquerda há um tempo. Tim acabou de identificá-los.
– São os putos de merda que mataramAdrill?
– Quem é Adrill? – Tim estreitou os olhos.
– Spider. – Nila revirou os olhos antes de puxá-lo pela gola. – Foram eles?
– Não sei.
– A gente precisa sair daqui. Pegar Ryker e Mina…
Luckas estava concentrado em sua pequena crise de pânico enquanto Zahner
parecia se resumir a um pequenoponto geométrico cheio de ansiedade.
– Shhh, shhh! – pedi, gesticulando com firmeza. – Vocês estão enxergando asituação
pelo lado errado. São boas notícias. – Ri.
– É melhor você se esconder, Gareth
– Luckas pediu. – Se eles te virem, vão saber quem é.
– Ei, ei! Calma – avisei. – Nós queremos que eles vejam o Zahner.
– Mas o que diabos, Delvak?
– Vamos fazer o seguinte – coordenei.
– Está armado, Zahner?
– Claro.
– Esconda a arma direito, não os deixe perceber que está armado. Quero que se
sente no bar, peça uma bebida e se comporte como se estivesse desoladoe embriagado.
Pode fazer isso?
– Posso, mas como vou ajudar assim?
– Só obedeça. – Tirei o celular do bolso. Achara que ia ter mais tempo antes de
precisar fazer essa ligação, mas estava errado. – Agora… – Examinei ao redor, quando
coloquei o aparelho no ouvido. – Qual de vocês sabe usar uma arma?
Eu não estava com vergonha. Isso era um problema. Um problema muito sério. Ficou
decidido que Ryker ia me despir sozinho, já que a combinação com Devon da vez
anterior não tinha dado certo. Quando Tim saiu para uma noite de jogo com seus
colegas russos e eu me vi vestida no camarim por trás do palco sob a perspectiva de
ficar nua em público mais uma vez, a sensação que se apoderou de mim foi de
confiança.
Tínhamos um plano dessa vez. Não éramos cegos desesperados. Ter um foco e um
objetivo tinha me preenchido com a sensação de que podíamos concluir a missão com
sucesso. Podíamos aplicar um golpe, como nos filmes antigos, e podíamos roubar um
chefão da máfia e sair ilesos. Contávamos com o elemento-surpresa a nosso favor e
depois dos últimos meses e de todos os eventos que marcaram presença na minha
vida, eu não estava mais com medo.
Eu tinha me deparado com o corpo ensanguentado de uma amiga. Tinha
sobrevivido ao pânico da notícia sobre o sequestro de Ryker. Encarei minha velha
vida como uma pessoa nova e recebi de braços abertos os preconceitos e julgamentos
que vieram com a mentira que eu contei para me proteger.
Então, agora eu não tinha mais medo. Não tinha medo de fazer algo ilegal para me
vingar de um criminoso que roubara minha vida, nem de um político corrupto e
pedófilo. Não tinha medo de contar com amigos inusitados, não tinha medo de
homens grandes, nem de armas barulhentas. Em menos de um ano, eu tinha
sobrevivido a mais problemas do que muitas outras pessoas encontram em uma vida
inteira, e essa percepção me injetou com uma dose incalculável de confiança.
O que seria ótimo em qualquer noite do ano. Exceto em uma noite na qual eu teria
que apresentar um show chamado “Tímida”.
– Tudo bem com você? – Ryker beijou minha bochecha.
– Tudo está bem até demais – murmurei. – Acho que esse é o problema, Ryk…
Não sei se vou ficar com vergonha.
– Acho que posso resolver isso – sorriu, passando a língua pelos lábios. Eu gostaria
de dizer que fiquei receosa diante de seus planos, mas não fiquei. Não conseguia
imaginar uma frase dita por ele que pudesse transformar minha confiança em
vergonha.
– Não sei, não – constatei, nervosa.
– Olha só para você, duvidando das minhas capacidades! – cantarolou. – Vouter que
fazer o possível para te mostrar que está errada – prometeu. – Talvez eu te deixe
completamente nua.
– Pro Höfler me ver? – Ri de suas ameaças vazias.
– Ou eu te como no palco.
– Sem camisinha?
– Eu fiz uma bateria de exames na Itália e você nunca ficou com outro cara,ficou? –
Ergueu uma sobrancelha.
– Strome, se quer saber se fiquei comalguém depois de você, esse não é o jeito certo
de perguntar.
– E qual é o jeito certo de perguntar?
– quis saber.
– Boa sorte! – Lucy se aproximou com um sorriso, mas eu enxerguei através de seu
nervosismo antes que ela explicasse qualquer coisa.
– O que houve? – Ryker se adiantou, deixando claro que notou o mesmo que eu.
– Os russos já estão aqui – murmurou.
– O quê? Como? – indaguei. Ryker deu um passo adiante e me tomou em umabraço
protetor.
– O plano já era, Mina. Vamos só seguir com o combinado e deixar os capangas do
Kulik bem à vontade. Vamos fazê-los acreditar que venceram.
Eu sabia que era tudo parte do plano. Mesmo assim, ele tinha caminhado mais
rápido do que eu pude me preparar. Ryker segurou minha mão daquele modo
carinhoso que lhe era típico, sempre me suscitando a dúvida se ele queria me
reconfortar ou se queria serreconfortado. Talvez um pouco dos dois.
Apertei sua mão de volta.
– Como está sua confiança agora? – murmurou quando a música mudou,
anunciando que deveríamos subir ao palco. – Um pouco abalada? – Sorriu, gentil.
Eu acenei, confirmando. Mas “pouco abalada” era realmente uma gentileza. Duas
frases de Lucy e minha confiança estava completamente destruída.
– Olhe pelo lado bom – sugeriu. – O show não precisa mais ser bom e chamar
atenção. Pode ser sem-vergonhao tanto que quiser.
Ele estava certo. Pisquei um olho para ele apesar do nervosismo e senti seus lábios
nos nós dos meus dedos.
A boate ficou escura do outro lado da cortina e a luz clara do holofote iluminou o
lugar por onde entraríamos. Não queríamos penumbra dessa vez. Queríamos ter
certeza que qualquer um poderia nos identificar.
– Pronta? – Ryker me perguntou antesde entrar no palco.
Mas eu não respondi, apenas respireifundo.
Se eu estava pronta? Não faziadiferença.
A cadeira esperava por nós no centro do palco. Eu deveria me sentar nela e assistir
enquanto Mina dançava, resistir alguns segundos e depois começar a passar a mão
em seu corpo macio enquanto a despia.
A música tocava sedutora e, depoisde bons anos trabalhando comstriptease, apesar
de meu corpo estar acostumado a seguir seu ritmo de forma involuntária, eu me
percebi calmo e firme.
Meu quadril não se moveu. Minhas pernas não acompanharam a batida sensual
com um rebolado que eu sabia fazer, e que motivava as mulheres a travarem os dentes
nos lábios. Eu apenas atravessei o palco, puxando Mina atrás de mim, impelindo-a a
me seguir. Andei devagar o suficiente para que o público pudesse demorar o seu olhar
nela.
Me virei quando chegamos à cadeira e eu vi suas bochechas enrubescidas.
Não vai ficar com vergonha, não é?Até parece…
Puxei sua cintura esguia e lambi seu lóbulo antes de sussurrar.
– Você disse que não estava mais comvergonha, não é? – provoquei.
Sentei, permitindo que meus dedos escorregassem pelo seu quadril, seguindo meu
movimento, delineando a barra de sua saia como um moleque levado. Brincando com
meu indicador em uma das pontas, fingindo indecisão quanto a levantar ou não o
pano que a cobria.
– Dança pra mim – pedi, dengoso.
Ela levou as mãos à barriga e tentou assumir um gingado delicado, mas não era
isso que eu queria. Puxei seu quadril com violência, forçando-a a montar em uma de
minhas pernas. De frente para mim, contemplei suas bochechas vermelhas e seu
ofegar nervoso.
– Não quero essa merda que você dá pra eles todas as noites – murmurei em seu
ouvido, indicando a plateia com um movimento do meu queixo. – Quero algoespecial.
Algo só pra mim.
A luz iluminou seu rosto quando ela se virou de lado observando seus espectadores
e sua vergonha ficou ainda mais avassaladora sob os tons azuis e vermelhos dos
holofotes.
– Ryker… – pediu baixinho. – Não tem como ser só pra você. – suspirou, ainda
nervosa.
– Esquece que eles estão aqui. – Enfiei meus dedos por baixo de sua saia,agarrando
a popa de sua bunda. Apoiada em meus ombros, ela se ergueu por um segundo,
sobressaltada diante do meutoque. Seu olhar voltou-se para o mesmoponto na plateia e
eu o segui.
Delvak estava em uma das mesas na primeira fila. Tinha um copo de bebida à sua
frente, o cotovelo na mesa e o queixo apoiado na mão. Observava nossa apresentação
com zelo.
– Quer dar um show pra ele? – Mordi seu queixo. – Deixa eu te ajudar. – Belisquei
sua coxa e ela rebolou no meu colo. – Quero mostrar pra ele o que a minha virgem
sabe fazer.
– Sua virgem não sabe fazer nada! – sussurrou em seu típico desespero e eu tive que
lembrar que, embora risadasfossem uma parte constante dos nossos encontros sexuais,
elas provavelmente não agradariam ao público. Mordi língua e lábio e empurrei seu
quadril. Guiei-a para que se levantasse. Ela obedeceu.
– Rebola pra mim. – Mina olhou ao redor, hiperconsciente. – Ei! – chamei alto e
ela estalou de volta. – Rebola – sibilei, rude. – Devagar.
Apoiei o cotovelo em um dos meus joelhos e assisti Mina rebolar aquela bundinha
linda. Girou devagar fazendo o tecido leve saltar exibindo um pouco mais de pele.
Raspei meus dedos aqui e ali, sentindo-a se arrepiar.
Olhei para cima, assistindo aomovimento de seu corpo sob a luz da boate, deixando
minha mão se perder emsua pele.
É aquele calor maldito. As mulheres têm um calor bem no meio das pernas, antes
da boceta… Quando você sobe a mão pelo meio de suas coxas, direto ao ponto
especial entre suas pernas… antes de atingir o seu destino, sua mão capta um calor
exalado pela virilha. Um ardor febril que se apodera de sua mão como se estivesse
próxima ao fogo, num prenúncio do que está por vir. Aquele maldito calor que você
sente na mão quando a coloca entre as pernas de uma mulher e sabe que a bocetinha
está logo ali. Poucos centímetros mais acima evocê atinge o objetivo.
Mina rebolou no meio de uma plateia inteira. Mas não era para eles que ela
rebolava. Era para mim.
E, quando aquele calor da minha mulher atingiu minha mão, foi impossível não
ficar imediatamente duro.
Aproximei o nariz do seu joelho e estirei a língua para atingir sua pele. Lambidas
leves de saliva e desejo. Ela terminou sua volta e ficou de frente para mim. Aquela
postura rígida e ávida por novas instruções.
– Já fez uma dança no colo de alguém? – murmurei e ela balançou a cabeça em
uma negativa. – Então venha aqui porque eu quero uma.
Coloquei-a de costas para mim. De pé, com uma de minhas pernas entre as suas.
– Rebola de novo, amor. Só que dessa vez, até sentar na minha perna. – Mordi a
bochecha da sua bunda e ela emitiu um grito rápido que quase me fez esporrar nas
calças. – E depois sobe de novo.
Ela obedeceu. Desceu devagar e, quando sua bunda tocou minha perna, fui eu quem
rebolei. Esfregando parte da minha ereção nela. Qualquer parte. Raspei os dentes em
seus ombros quando ela se ergueu novamente e forceio movimento para que ela ficasse
defrente para mim.
- Aqui. Assim. – Puxei um de seus joelhos e coloquei seu pé apoiado na cadeira
ao meu lado. Sentei na ponta do assento, enfiando as mãos por baixo de suas coxas,
puxei-a para mim pelabunda.
Mina vestia uma calcinha, mas não me importava. Enfiei nariz e boca entre suas
pernas e me esbaldei em seu calor delicioso. Lambi, mordisquei e rosnei. Senti suas
mãos nos meus cabelos, embora não soubesse determinar se foi porque ela buscava
mais equilíbrio ou mais prazer. Mordi seu clitóris e suas unhas se enterraram no meu
couro cabeludo.
Mais prazer.
Puxei o pano da calcinha para fora do caminho da minha língua, usando os dentes
desajeitados. Respirei fundo e comecei a sentir meu corpo tremer e falhar. Eu tinha
gozado naquelas pernasgostosas não fazia muito mais de dois dias.
Mas naquela bocetinha… naquela bocetinha rosada, depilada e suculenta… Fazia
muito tempo que eu não gozava ali.
A sensação provocada pela lembrança tomou o controle do meu corpo como um
ataque de pânico. Um frenesi de fúria. Um descontrole irremediável. Meus dedos
agarrados nas bandas de sua bunda puxando-a mais para dentro de minha boca. Eu
sentia a perna ao meu lado, apoiada na cadeira, tremendo involuntariamente.
Ela começou a gemer e eu soube que queriaengoli-la ali mesmo.
Enfiei a pontinha da língua dentro dela, só para provocá-la. Desferi uma lambida
longa e a empurrei para trás, com cuidado para que ela não perdesseo equilíbrio.
– Fique nua – pedi. Agora era eu quem ofegava em desespero.
– Ryker – gemeu, miúda. – Você tem que tirar. – Tentou recuperar o controle me
lembrando dos tópicos do show.
– Hoje não – rosnei. – Hoje você tira. Você tira pra mim. – Eu não consegui
controlar minha mão e só percebi que tinha estapeado sua nádega quando o golpe
estalou alto, assustando Mina e fazendo-a arregalar os olhos. – E vai tirar tudo –
gemi.
Eu não tirei os olhos dela. Não perdi um segundo. Não deixei que ela esquecesse
que só ela conseguia aliviar aquela minha fome.
E ela se despiu. A puta da minha virgenzinha se despiu toda como um presente pra
mim. Tirou cada uma das peças sem qualquer sensualidade. Despindo-as com tensão,
como se fizesse isso dentro do banheiro de sua casa quando estava com pressa para ir
para algum outro lugar. Mas eu estava duro. Eu estava irreparavelmente duro.
Latejando dentro das calças, meu coração explodia enquanto bombeava cada gota de
sangue exatamente para o lugar certo.
Mina tirou tudo menos a calcinha e o sutiã. Pretos.
Dei dois tapinhas no meu colo e ela obedeceu. Montando sobre minhas pernas,
envolvendo-me com suas coxas.
Seus braços passaram pelos meus ombros e eu senti o cheiro do seu hálito.
– Desabotoe a minha blusa – decidi.
Seus dedos frágeis e vacilantes assumiram minha camisa e eu enfiei o nariz na curva
do seu pescoço. Apertando sua bunda, sua cintura, o topode suas pernas… Lembrando
da geleia que comi de seus seios. Lembrando do sabonete que passei em sua entrada.
Enfiei a mão pela parte de trás de sua calcinha e escorreguei meu dedo entre suas
bandas, provocando a entrada de seu cu. Mina arfou e rebolou. Eu não saberia
precisar quando comecei a mover o quadril como se a estivesse fodendo, mas aí
estava…
Seus dedos tocaram meu tórax quandominha camisa estava aberta. Enfiando-sepelas
mangas e expulsando o tecido do meu torso.
– Minha calça – gemi. Mas Mina parecia estar envolvida exatamente pela mesma
sinfonia que eu e, mal eu tinha terminado meu pedido e suas mãos já estavam em
meus botões, libertando meupau ereto e faminto.
– Onde você quer que eu coloque?
Eu fechei os olhos. É incrível como aquela frase podia ser ridícula ao ponto de ser
anticlímax quando suspirada por uma atriz pornô ruim, logo depois de gemer que
aquele era o pau mais delicioso que ela já tinha chupado. Mas quando Mina as dizia…
Ela piscava seus olhos doces para mim, ficava vermelha e perguntavaapenas porque
ela realmente queria saber.
Não era falso. Era o exato oposto.
Não havia nada mais verdadeiro do que as dúvidas de Mina e uma coisaficou muito
clara para mim: eu não ia conseguir ver minha virgem tirar a roupa na minha frente,
rebolar sua bundinha exclusivamente para mim, me perguntar onde eu queria que ela
colocasse meu pau e, depois disso tudo, não comê-la. Seria impossível.
Pus-me de pé rápido demais e o passo para trás que Mina deu me avisou que ela
tinha se assustado.
Mas eu não parei. Eu não conseguia parar.
Avancei com brutalidade, enfiando minhas mãos por baixo de seus joelhos, apoiei
suas costas contra o pole dance à minha frente e a mantive colada comigo, alinhando
nossas virilhas.
– Quero que você coloque aquidentro.
– Ryker… – Um sorriso, seus olhos fechavam como se suas pálpebras fossem
pesadas demais para que ela os mantivesse abertos. – Coloca... – pediu. Lambi seus
lábios e Mina abriu a boca me deixando entrar com a minha língua. Bebi sua saliva,
gemendo com seu sabor.
Puxei sua calcinha para o lado. Mina forçou as costas contra o pole e me encarou
com a boca entreaberta para facilitar a respiração vacilante. Raspei a cabeça do meu
pau em seu suco, mordendo minha boca em um pedido mudo. Eu queria ter certeza
que ela queria.
O gesto de permissão que ela fez foi simples, mas claro. Então, ela segurou o pole
atrás de sua cabeça com uma das mãos e fechou os olhos, levantando o queixo rumo
ao teto.
Um movimento. Apenas um.
Meu quadril se jogou inteiro na direção dela e eu a penetrei.
Eu a penetrei em cima do palco.No meio daquela gente.
Sob os olhares dos russos, do Delvake do Höfler.
Mina manteve os olhos fechados e eutravei os dentes em seu queixo.
Ela me absorveu exatamente como eutinha antecipado: quente e suculenta.
Muito quente. Muito suculenta.
Daquele jeito que faz o homemamaldiçoar a mais fina das camisinhas por jamais ser
capaz de oferecer prazer remotamente próximo àquele.
Pressionei meu rosto contra o vale dos seus seios por dois segundos. Deixando a
sensação se firmar e aquietar. Tomando maior segurança nos impactos e no meu
movimento. Tudoaquilo não me serviria de nada se minhas pernas falhassem e eu não
conseguisse mais foder Mina porque estávamos os dois caindo pelo palco.
No entanto, verdade seja dita, era preciso que a queda me deixasse paralisado da
cintura para baixo para que me impedisse de continuar fodendo a Mina.
Principalmente depois de tanto tempo. Principalmente depois de tanta coisa.
Ela era minha agora. Toda minha. E um ataque nuclear me mataria com impacto
ou radiação, mas eu não parariao que estava fazendo para me proteger.
Seus dentes prendiam o lábio inferior com força suficiente para arrancar carne e,
mesmo assim, não eram suficientes para deter os gemidos que ainda escapavam com
sua respiração e quando coloquei a mão entre nossos corpos para estimular seu
grelinho, girando-o como uma azeitona carnuda entre meu indicador e polegar, Mina
me deu um soco no ombro com força e exclamou um palavrão delicioso. Me agarrou
pelo pescoço com força e escondeu o rosto no meu corpo. Ela me embalou e eu a
comi. Levantando suas pernas,espremida contra o pole.
Não sei se por vergonha, tensão ou prazer… mas Mina tinha um jeito de contrair os
músculos vaginais de uma maneira que me enlouquecia. Eu não tinha esquecido
daquilo… A cada vez que, nos últimos meses, eu tinha tentando levar uma mulher
para a cama, tinha lembrado desse apertão perfeito nomeu pau e no modo involuntário
como ela conseguia causar tamanho efeito.
E agora, sem camisinha. Sentindo a carne dela na minha carne… Tudo que eu
conseguia fazer era urrar e gemer. Lambendo seu suor frio, sussurrando minhas juras
ao seu ouvido, me derretendo; seu.
Havia passado meses sem ela.
Mina gritou meu nome alto e eu soubeque ela tinha atingindo o clímax.
Senti meu orgasmo se aproximando em uma retrospectiva de todo o tempo que
passara sem ela e de todo o tempo que passei tentando tê-la.
Meu esporro foi libertado com violência, me levando a um dos maiores êxtases que
eu já tinha experimentado na vida, apenas para me fazer perceber que Mina dava um
trabalho do cacete, mas que, assim como daquela vez na estufa de Bessie, nos
cobertores no chão e entre as flores mal-arranjadas… para mim, ela sempre seria a
mulher pela qual valia a pena esperar.
Sete
Coisas erradas para sedizer
Acenei devagar para Valerik e um meio sorriso arranhou seu rosto rude, maltratado
pelo sol e pelo gelo. Era o moleque que o senhor Kulik queria vivo e a menina que o
senhor Kulik queria morta. Eles foram imbecis para voltar ao mesmo lugar onde
haviam sido capturados da outra vez.
E ainda por cima tinham nos oferecido um pequeno show antes de se separarem
para sempre. Era poético,de certo modo. Um último adeus.
Eles se dirigiram para os bastidores quando o show acabou e eu lancei um olhar de
volta para o bar e para o inspetor da Interpol, curvado sobre o balcão e seu oitavo
copo de vodca desde que chegáramos. Ou pelo menos, deveria ser o oitavo. Eu tinha
perdido a conta em algum lugar perto do seis. E, pelo olhar bêbado em seu rosto, o
agente Zahner deveria ter perdido a conta também.
Ele não seria um problema para nós. O que também era poético, já que também
não pretendíamos ser um problema para ele. O garoto Strome desapareceria. A garota
Bault ficaria morta para trás. A polícia holandesa seria acionada e chegaria em suas
bicicletas, pedalando velozes pelos becos estreitos e ruas entre canais eencontraria um
ex-agente desertor procurado internacionalmente sobre o corpo ensanguentado da
jovem parisiense que ele sequestrara.
Simak e Kulik respirariam aliviados. Simak bradaria a todos os pontos cardeais que
jamais desistiria de buscar seu filho enquanto Kulik o manteria sob seus cuidados
como eterno refém… Vantagem sobre um político influente.
Justiça poética.
Bem… talvez não justiça.Mas poesia.
Ordenei à garçonete que trouxesse a conta. Levantaria apenas depois de pagar,
atraindo o mínimo possível de atenção e acabaria com tudo aquilo.
O garoto teria que ser forte, mas a garota… a garota ia receber a partefácil.
Não é difícil morrer nesta vida, é o que Maiakóvski diria, viver é muito mais difícil.
Assim que saímos do palco, Mina seescondeu atrás das mãos.
– Ai, minha nossa – murmurou, temerosa. – Ai, minha nossa… minha
nossa.
– Mina, calma – ri, afagando seu ombro.
– Ótimo espetáculo. – Nila se aproximou e…
– Nila? O que está fazendo aqui? Estou com vocês, explico depois –abanou a mão
no ar. – Eles estão vindo.Delvak estava logo atrás dela, seguido de perto por Lucky, e
Mina se escondeu ainda mais atrás das mãos.
– Estou ofendido – Sven começou,com a testa enrugada. – Se tivessem me contado
o que era o show da Tímida, eu teria vindo antes – reclamou. – Ryker, ótimo trabalho.
– Aproximou-se e colocou uma mão fraternal sobre o meu ombro. – Gostei do modo
como deu as instruções, foi claro, mas ao mesmo tempo misterioso. Ótimo trabalho,
moleque!
Eu abri a boca para agradecer, mas… agradecer a Delvak por achar que eu tinha
feito um bom trabalho comendo minha namorada não me pareceu razoável.
– E você. – Ele apontou um dedopara Mina. – Eu achei que era virgem.
– Espremeu os lábios. – Não é comum eu me enganar com essas coisas. – Mina
emitiu um gemido baixo de dor e constrangimento e eu comecei a sorrir, gesticulando
para Delvak ao sugerir que se calasse, mas ele me ignorou. – Da próxima vez, tente
caprichar nos gemidos, sim?
– Próxima vez? – Mina levantou os olhos arregalados para ele.
– Caprichar nos gemidos – repetiu a instrução. – Sinceramente – irritou-se.
– Eu estava na primeira fileira e mal conseguia te ouvir. Tem que lembrar que tem
uma música tocando, e precisa ser, no mínimo, mais alto do que a música, ou então
vai parecer que Ryker está tendo uma péssima performance.
Eu já tinha visto Mina vermelha e com vergonha em outros momentos. Mas nunca
daquele jeito. Ela tinha encontrado uma nova coloração na sua paleta de timidez e o
rosto assumiu um rubor tão vivo e intenso que tive certeza que ela explodiria.
– Delvak, não faça isso – pedi, tentando salvar minha namorada.
– Ah, perdão. – Ele revirou os olhos.
– Fez um bom trabalho também – elogiou, cansado, e eu percebi que meu pedido
tinha sido mal compreendido. – Conseguiu rebolar mesmo quando pressionada contra
um pole e com os dois pés fora do chão, e isso não é fácil.
Mina desistiu.
Desistiu de mim, do show, da conversa.
Mas acima de tudo, ela desistiu de Delvak. Passou por nós, chocando o ombro
contra o meu braço e correu para as escadas e o quarto, ainda contida em seu novo
tom de vermelho.
– Por que precisa fazer isso? – sorri, recriminando meu amigo.
– Não preciso. – Pareceu ofendido. –Foi você quem me mandou elogiá-la.
– Não mandei elogiá-la! – Levantei as mãos.
– Eu estava fazendo críticas construtivas sobre a performance sexual dela e você
me mandou parar.
– Parar de falar! – exclamei. – Não mudar de assunto!
– Ah. – Estreitou os olhos numa expressão confusa.
– Acho que não conhece Sven bem o suficiente, irmãozinho. – Lex se aproximou. –
Ele é incapaz de parar de falar.
– Onde você estava? – Delvak rosnou, percebendo a chegada da minha irmã.
– Sabe que horas são?
– Respondo suas duas perguntas se perguntar de novo com educação. – Seus olhos
brilharam por trás dos óculos, Sven respirou fundo e deixou os ombros caírem.
– Estávamos preocupados – generalizou, embora eu não estivesse nem um pouco
preocupado. Lexa sabia se cuidar muito bem e não era ela quem ia servir de isca para
mafiosos russos.
– Pierre quis jantar em um lugar afastado e eu não poderia negar depois de toda
sua ajuda com a divulgação do evento de hoje.
– Da próxima vez, dê meu número e eu nego por você.
– Ei! Vocês dois! – Nila chamou, irritada. – Russos. Plano. Alguém se lembra de
alguma coisa? – resmungou, sarcástica.
– Sim, Ryker. Vá para o camarim.
– Não é melhor ele ficar fora do caminho? – Lexa perguntou, eu podia ouvir a
preocupação com minhasegurança em sua voz.
– É melhor você não fugir com seu namoradinho no meio da minha operação, da
próxima vez. – Delvak recriminou.
– Sua operação?
– Porque assim saberia todo o plano. Mas agora não temos tempo: Ryker vai
sozinho, nós voltamos para o salão e você só fica quieta e me obedece.
Lexa tinha os braços cruzados sob os seios e os lábios apertados em uma única linha
rígida, como se desafiasse Delvak a lhe dar uma ordem. Qualquer que fosse.
– Temos que sair agora – continuou.
– Ryker vai para o camarim sozinho – sussurrou. Ele estava realmente tentando
manter a resolução, mas era perceptível que o foco firme de minha irmã começava a
constrangê-lo. Olhou ao redor por um segundo, ciente do perigo que se aproximava
antes de expirar longamente em desistência. – Por favor? – pediu. – Eu te explico em
um segundo.
Ela se virou e lhe deu as costas em resposta. Sven gesticulou para que eu andasse
depressa e a seguiu de voltapara o salão.
Fiquei de pé, encostado na porta fria do carro estacionado. Assistindo aos meus oito
seguranças dançarem ao meu redor, em constante vigilância para se certificar que
nenhum perigo nos surpreenderia.
O beco do lado de fora da boate era mal iluminado, elemento imprescindível
para um bom lugar de negócios. No letreiro, lia-se a inscrição “Lucky’s” desenhada
em um vermelho irritante de neon.
Seja lá qual fosse o presente que Sven Delvak tinha para mim, aquele era um
lugar peculiar, diferente das luxuosas boates e clubes eróticos em que ele geralmente
conduzia seus negócios.
Mas… desde que fosse um bomcavalo dado, eu não olharia seus dentes.
Verifiquei as horas. Ia precisar lembrá-lo de que eu era um homem ocupado e que,
da próxima vez que precisasse de minha ajuda, iria precisar ligar com maior
antecedência.
– Hideki-sama.Sama.
Ele nunca se dirigia a mim com respeito a não ser quando queria algo. Era seu
modo arrogante de pedir “por favor”, sem nunca realmente dizer as palavras.
– Senhor Delvak. – Apertei a mãoque ele estendia.
Atrás dele, dois homens armados conduziam dois outros algemados.
– O que temos aqui?
– Temos dois cavalheiros russos –anunciou.
– Russos? – Senti meus olhos se abrindo forçosamente.
– Sim. – Ele me ofereceu seu melhor sorriso sedutor e empresarial. – Hideki, tenho
uma proposta de negócios para lhe fazer.
Apertei a mão de Delvak e o assisti fechar a porta da boate depois de deixar seus
prisioneiros sob o controle dos meus homens. Os detalhes de nosso acordo ainda
precisariam ser estabelecidos, mas eu não via como aquilo poderia beneficiá-lo mais
do que a mim.
Observei meus cativos nos olhos.
Aquela seria uma ótima noite.
– Acabei de fechar um negócio muitobom envolvendo vocês dois.
– Sorri.
– Não vamos te contar nada.
– Ah, vão sim. – Ri da inocência deles. – Vão me contar tudo o que eu quero saber
e vão passar para Kulikexatamente a informação que eumandar.
– Vai nos ameaçar, agora? Nós sabemos como funciona, japonês. Não vai fazer
conosco nada que já não tenhamos feito com outros homens.
– Não se incomoda se eu discordar, não é mesmo? – Tirei o lenço do meu bolso. –
Nós, japoneses, podemos ser bem criativos. – Usei o lenço para proteger meus dedos
de sua imundície quando enfiei meu indicador sob o queixo do seu colega, verificando
seu rosto. Os que ficavam em silêncio quando capturados geralmente eram mais
difíceis de submeter. Encarei seus olhos frios por um segundo, aceitandoo desafio.
– Vai nos matar? – o silencioso quis saber.
– Matar? Não. De modo algum. – Soltei seu rosto e lhe ofereci um sorriso
reconfortante. – Vou lhe oferecer umemprego.
Mina estava deitada na cama com a cabeça enfiada embaixo dos travesseiros, como
um avestruz.
– Amor? – chamei, tentando não rir.
– O mundo acabou? – choramingou.
– O quê?
– O mundo? – chiou, debaixo dos travesseiros. – Acabou? Todo mundo morreu?
Porque eu só saio daqui quando isso acontecer.
Me coloquei de quatro sobre a cama e fui engatinhando até cobrir seu corpo com o
meu. Me deitei por cima dela, esmagando-a com meu peso.
– Onde está Mina? – murmurei, escavando o caminho até ela através dos
travesseiros. Faltava apenas um, que eu empurrei para o lado o suficiente para poder
ver seu rosto quando rolei, me deitando ao seu lado.
– Não foi tão mal assim.
– Ryker – gemeu. – A gente tem definições diferentes de “mal”.
– Podia ter sido pior.
– Ah, na minha vida abençoada? – reclamou, sarcástica. – Eu não duvido que nada
possa ser pior! No entanto, acho pouco provável que dessa vez isso fosse possível.
– A boate podia ter pegado fogo.
– As pessoas iriam embora e não teriam assistido até o fim! Teria sido melhor.
– Mas... você estaria distraída comigo e nós seríamos interrompidos por
bombeiros com jatos de água.
– Eu preferia isso aí.
– Ou o Höfler podia ter subido no palco – arrisquei o pior cenário que eu poderia
imaginar.
– Você ia ter ficado com raiva, brigado com ele e a gente teria saído do palco
mais cedo – decidiu. – Eu preferia isso também.
Mordi o lábio pensando em algo que poderia ser verdadeiramente horrível. Encostei
minha testa na dela arregalando os olhos em antecipação a pior das hipóteses: – Você
podia não ter gozado.
Mina emitiu um longo rosnado de dor e puxou o travesseiro de volta para cobrir o
próprio rosto.
– É sério! Já imaginou? Eu lá em cima do palco fazendo o meu melhor e você não
gozar? – continuei a piada na tentativa de fazê-la rir. – Ia ser horrível.
– Eu gozei na frente daquela gente. – Eu mal conseguia compreender suas palavras,
abafadas pelo travesseiro. – Aquela gente lá fora sabe o que eu grito em um orgasmo.
Quero morrer.
– Por que não disse que não queria?
– Porque eu queria – resmungou, dolorida. – Mas agora eu queria não querer.
– Amor! – Esperneei na cama, devagar, fazendo o impossível para não rir de sua
situação. – Já passou. Então, é melhor aproveitar e se preparar pra próxima.
– Próxima? – Ela se livrou do travesseiro e me encarou com olhos felinos. –
Strome, eu nunca mais subo naquele palco com você! Nunca mais nem fico perto
daquele palco com você!Nunca mais faço nada em público pertode você! – Eu acenava
em concordância com suas afirmações desesperadas. – Na verdade, decidi que vou
passar o resto da minha vida aqui dentro desse quarto.
– Posso ficar também? – perguntei temeroso, quando ela se escondeu em sua
caverna improvisada mais uma vez, porém, não sem antes arremessar um dos
travesseiros na minha cara. – Você nem perguntou se a coisa com os russos deu certo
– lembrei.
– Tomara que tenha dado errado – gemeu, escondida. – Deixa a porta destrancada,
se eles quiserem entrar pra me matar é mais rápido.
– Mina! – Tirei os travesseiros do caminho. – Não diga isso! – Me chateei.
– Eu não sou como você! – arfou. Seu rosto ainda estava perigosamente vermelho.
– Não sei o que fazer agora!
Larguei os travesseiros na cabeceira da cama e me apoiei sobre eles antesde abrir
o braço.
– Agora você me abraça – resolvi. – A gente acabou de fazer amor, eu gosto de
ficar abraçado depois que faço amor.
– Eu nem sei para o que eu reviro os olhos primeiro! – exclamou indignada. Mas
pelo menos ela estava se sentando na cama. Animação era bom sinal. – Para o fato de
que você considera “fazer amor” um sexo em cima de um palco, contra um pole, na
frente de uma plateia. Ou para essa sua conversa fiada de que gosta de ficar
abraçadinho depois de…
Eu a puxei com força para o meu colo. Tapei sua boca com uma de minhas mãos e
usei minhas pernas paramantê-la imobilizada.
– Pronto. – Afaguei seus cabelos com a outra mão, exagerando na intimidade de
nosso momento, claramente forçado para ela. – Você é tão romântica, minha linda.
Obrigado por ficar abraçadinha comigo depois que fizemos amor.
Foi impossível não rir.
Mas bem… considerando que eu tinha conseguido sobreviver até esse ponto sem
emitir nenhuma risada, acho que eu já estava pronto para sercanonizado.
Ela gemeu irritada, com minha mão tapando sua boca, balbuciando palavras
incompreensíveis.
– Ah, é verdade – provoquei. – Foi um sexo muito gostoso.
Seus olhos se estreitaram e suas palavras ficaram mais afiadas. Acho que escutei um
“Ryker” no meio de seus rosnados sob minha mão.
– Eu também quero de novo, amor. Mas um homem precisa descansar. – Eu podia
ver nos seus olhos que ela estava detestando minha brincadeira. – Você precisa ser um
pouco menos insaciável
– reclamei. – Gosto desse seu jeito safado, mas um cara precisa de um pouco de
tempo. Só uns minutos ou…
Ela lançou o joelho contra minha virilha e a brincadeira perdeu a graça. Toda a
graça.
– Pronto – chiou. – Pode ter os minutos que quiser agora. Satisfeito?Protegi minha
virilha com as mãos e lhe lancei um olhar de revolta antes de girar para o outro lado
para meproteger de sua personalidade maldita.
– Sua mulher cruel – sussurrei.
Mina espremeu os lábios, observando meu sofrimento por dois segundos e então se
aproximou.
– Desculpa! – pediu, alto demais. – É que você me irrita! – Passou as mãos pelos
meus cabelos com um olhar verdadeiramente arrependido e eu exagerei a careta de dor
para receber maiores cuidados. – Por que precisa fazer isso justo quando estou com
vergonha?
– Está doendo – choraminguei.
– Sinto muito. – Beijou minha testa e escorregou a mão pelo meu tórax. Eu
conheço Mina bem o suficiente para ter certeza de que, quando afagou minha virilha
atingida, foi apenas com aintenção de fazer um agrado em um zona machucada. Mas
é claro que meu pênis não recebe afagos em silêncio…
– Seu descarado. – O tapa no meu ombro estalou alto.
– Ai! Por que eu apanhei? – Arregalei os olhos. – A joelhada no saco até entendi
– admiti. – Mas esse tapa agora eu não mereci!
– Está ficando… – Abanou as mãos rapidamente, sugerindo palavras que não
queria pronunciar. – …animado – escolheu, me fazendo revirar os olhos.
– Sério que você não consegue dizer “ereto”, “excitado” ou “de pau duro”, Bault? –
recriminei, incrédulo. – A gente acabou de foder na frente de umas sessenta pessoas e
você está preocupada com vocabulário?
Apanhei de novo.
– Certo – aceitei. – Esse eu mereci.
– Você fingiu que tinha doído, mas estava duro! – reclamou.
– “Fingi”? Você me deu uma joelhada!
– Não foi tão forte assim.
– Não importa! Pênis não foram feitos para receber qualquer tipo de impacto, sua
maluca! Foram feitospara ser tratados com carinho. – Alisei minha ereção com amor
e ela começou a rir.
– Dramático.
– E ele só levantou porque você veio com essa sua mão safada e o acordou.
– Pare de tratar seu pênis como se fosse uma pessoa. – Riu.
– Fale mais baixo! – Balancei as mãos. – Senão ele te escuta, se ofende eaí você vai
reclamar quando ele se recusar a colaborar.
– Até parece que ele alguma vez na vida se recusou a colaborar.
– E é exatamente por ser um trabalhador tão fiel que deve ser respeitado.
Mina se jogou nos travesseiros, rindo, e eu repousei minha cabeça em seu
estômago, bem abaixo dos seus seios.
– Eu sei o que está fazendo. – Suspirou. – Obrigada.
– Por ter te explicado como pênisfuncionam? De nada. Não foi a primeira vez.
– Não. – Riu e deu um tapa leve e brincalhão em meus cabelos. – Por me distrair.
Me virei rapidamente, plantei um beijo rápido na sua barriga e enlacei sua cintura
com meus braços.
– Não sei como vou encarar todo mundo depois, Ryk… – confessou.
– Quer vê-los transando também? Porque, se isso ajudar, tenho certezaque pode ser
arranjado.
– Ryker, é sério. A gente transou na frente de todo mundo. Como pode estar tão
tranquilo com isso?
Me apoiei sobre o cotovelo, forçando meu corpo para cima até alinhar nossas
bocas. Eu a beijei sem pressa.
De início, meu plano era beijá-la e dizer algo que eu sabia que iria acalmá-la.
Entretanto, nossas bocas se juntaram e eu esqueci o que ia fazer depois. Posicionei a
mão em sua nuca e a mantive por perto. Prologamos o toque de lábios e salivas.
Colocar a boca de Mina na minha era um ato sacro. Eu podia fechar os olhos e
sentir toda a capacidade sensitiva do meu corpo se concentrar no ponto entre nossos
lábios. Aquela pequena porção de carne macia e gostosa que eu podia mordiscar e
lamber, me enchendo desatisfação.
Foi assim no dia na estufa de Bessie. Não no dia em que fui seu primeirohomem…
mas no dia em que a beijei. No dia em que nos escondemos e Mina se tornou minha
primeira mulher… A primeira para quem eu tinha contado tantos detalhes da minha
vida. A primeira com quem eu tinha me sentido completamente vulnerável e
protegido de verdade. A primeira que tinha sido não apenas amante ou amiga, mas
uma companheira. A primeira mulher que eu tinha beijado por horas sem pensar em
sexo.
Era aquela boca.
Aquela boca perfeita que era minha maldição em tantos sentidos.
Aquela boca que sorria e me fazia esquecer as palavras, que se espremia de
vergonha suscitando o meu riso, que deixava escapar uma língua descarada estirada
para mim ou que me beijava como se eu fosse o único homem do mundo. Me
beijava como se visse em mim exatamente o que eu via nela, e não havia sensação no
mundo mais plena ou satisfatória do que aquela.
Meu polegar girava por sua pele causando arrepios. Sua mão no meu tórax. As
unhas se movendo de leve em um arranhão suave.
Enfiei os dedos pelos seus cabelos, mal conseguindo continuar o beijo, tamanha era
minha vontade de sorrir.
Mina mordeu meu lábio inferior e o sacudiu de leve para os lados, antes de me
soltar.
– O que foi? – Ela riu.
– Eu te amo.
– O quê? – Seu sorriso sumiu. O quê? Eu não sabia o quê.
– Hum? – consegui exalar um gemido curto e pela primeira vez desejei que ela
não estivesse tão perto.
– O que você disse? – sussurrou com os olhos arregalados.
É, imbecil, o que é que você disse?
O que é que você abriu essa porra dessa sua boca imensa para falar sem pensar nem
por um segundo?
– Nada – murmurei. – Você ouviualguma coisa?
Ela estava perto demais. Eu não conseguia pensar.
Mina manteve seus olhos fixos em mim, sem conseguir entender o que estava
acontecendo comigo.
Uma pena que ela não estivesse entendendo, porque, se estivesse, ela poderia me
ajudar, já que eu estava completamente perdido.
Por que eu tinha resolvido dizer aquilo?
Por que agora?
Não houve um momento de realização. Não houve ato ínfimo ou demonstração
grandiosa. Nada deespecial tinha acontecido. Eu apenas a beijei, abri a boca e…
E agora?
Eu queria inverter os papéis e pedir para ela me explicar o que eu deviafazer.
Me ajoelhar no chão?
Isso, Ryker, seja um imbecil.
E mais que um imbecil! Seja um imbecil de um filme de época, em que as
mulheres se casavam na adolescência com homens escolhidos por seus pais. Que
ótima ideia.
Beijo a mão dela?
Tenho quase certeza que isso tambémdeve ser cena de algum filme idiota.
Se Mina gostasse de comédias românticas eu poderia, no mínimo, passar uma
imagem adorável com uma dessas atitudes. Mas a maldita gostava daqueles filmes de
drama em que alguém sempre vai embora em alguma jornada de autodescoberta. Será
que essa era a expectativa dela? Que eu levantasse da cama e fosse passear pela boate
enquanto pensava no que fazer e tentava descobrir minhasverdadeiras intenções antes
de voltar com uma conclusão apoteótica em que nem eu nem ela saberíamos o que eu
diria?
Seria uma linda jornada.E bem curta também.
Principalmente se eu topasse com Delvak ou Lucy assim que descesse o último
degrau da escada. Seria épico explicar para eles dois o motivo do meu passeio. Digno
de uma comédiapara eles e um drama para mim.
Contudo, não houve joelho no chão. Nem beijo nas mãos. Nem jornada de
autodescoberta.
Eu só fiquei ali, parado e perdido. Me sentindo preso e violado por uma emoção
que eu não lembrava de jamais ter experimentado… E certamente nunca naquela
intensidade: um sorriso de Mina, três palavras minhas, seus olhos nervosos fixos em
mim.
Eu estava morrendo de vergonha.
Era péssimo. A pior sensação do mundo.
Como diabos Mina conseguia viver com isso o tempo inteiro?
Ela estava certa: deveria ser horrível conviver com alguém como eu, que se
divertia de sua situação.
Eu queria reagir. Queria mudar de assunto. Queria lhe dirigir uma pergunta. Estava
disposto a qualquercoisa que acabasse com aquela minha sensação terrível.
Mas os segundos se prolongaram.
Se prolongaram longamente, até a expressão de Mina se suavizar em uma
desistência contida e hesitante.
Ela respirou fundo.
Meu coração parou de bater até eu ouvir suas palavras.
– Achei que tinha dito alguma coisa. - Suspirei. Ryker estava prendendo a
respiração.
Eu sabia o que ele tinha dito. Sabiamuito bem. Eu não tinha ouvido errado.
Mas, se ele tinha preferido voltar atrás, era melhor respeitar sua vontade.
Organizar uma trama para roubar um mafioso, transar na frente de um monte de
gente e me deparar com um “eu te amo” de Ryker era mais do que eu podia aguentar
naquele momento.
Tentei lhe oferecer um sorriso natural, mas tive certeza da falsidade estampada em
meu rosto. Ele ainda me observava como se esperasse uma continuação da conversa.
– Vai me contar o que houve com os russos? – Engoli em seco.
Seus olhos fitavam os meus, aguardando, silenciosos. Como se mantivessem uma
constante esperança que eu fosse dizer mais alguma coisa.
Mas o quê?
O que ele queria que eu dissesse? “Eu também te amo “? Logo depois
que ele retirou o que disse? E o que ele responderia depois?
Eu gostava muito dele. Estavaapaixonada. O sexo era divino. Eu confiava nele.
Mas se era amor?Eu não sabia.
E, verdade seja dita, sempre imaginei que, se nosso relacionamento se
prolongasse, seria eu quem diria algo assim primeiro. Ou pelo menos, seria eu quem
perguntaria a ele.
Nunca imaginei que ele pudesse simplesmente soltar essas palavras assim. Do nada.
“Se nosso relacionamento se prolongasse…”
Tudo com Strome tinha sido intenso e maravilhoso. Mas tinha sido igualmente
rápido. Poucas semanas juntos, seguidas de meses sem nos ver. Sempre cercados por
esse clima de tensão e desespero que tornava todas as experiências mais urgentes.
Será que nós resistiríamos a uma semana normal? Será que ele ainda acharia minha
vergonha linda depois de um dia de trabalho? Será que o sexo continuaria tão
excitante depois de meses juntos? Será que eu seria suficiente para ele, mesmo com
todas as minhas inseguranças? Será que ele seria suficiente para mim, apesar de todas
as suas incertezas?
Eu estava acostumada a cultivar raízes grossas e profundas. Mesmo que eu não
tivesse uma família além de Elise, tinha um lar e gostava dessa sensação. Ryker era o
oposto: conduzia uma vida nômade, sem planos, vivendo no improviso depois do
trauma que experimentou em sua infância. O único lar que ele já experimentou tinha
sido pervertido.
Quando todo aquele calor de uma situação emergencial, de quase morte e de
novidade após novidade se esvaísse, será que nosso sentimento aindaexistiria? Ou será
que nós dois apenas tínhamos encontrado conforto um nos braços do outro em um
momento ruim, não por opção, mas porque não tínhamos mais ninguém a não ser
um ao outro?
Ele ainda sustentava um sorriso esperançoso e eu quis dizer.
Quis dizer as palavras que imaginei que ele quisesse ouvir.
Eu queria amar Ryker. Queria que ele me amasse.
Queria que o plano de Delvak desse certo para que eu e Ryker pudéssemos nos
amar pelo resto de uma vida bem longa e tranquila.
Liste, Mina.Liste.
1 – Ryker disse que me ama.
2 – Ryker retirou o que disse antesde me dar a chance de responder.
Se ele apenas tivesse dito que me amava eu poderia… poderia compartilhar com ele
todos os meus medos. Poderia expressar tudo.
Mas ele voltou atrás. Ele se arrependeu.
Um cara como Ryk é acostumado a muito sexo e pouco sentimento. Se eu
desrespeitasse seu arrependimento e quisesse conversar mais, eu poderia acabar por
afastá-lo. Ou pior… forçá- lo a confessar um sentimento que me obrigaria a
corresponder.
Eu não queria dizer “eu te amo” para ele só por medo de morrer.
Não era justo.
E talvez fosse exatamente isso queele tivesse feito…
Ryker se curvou e riu para o chão.
Um sorriso triste e desolado.
As palavras se amontoaram em minha língua. Mas não era certo proceder desse
jeito. Se um dia eu confessasse aquelas três palavras para alguém não seria por medo
ou pânico.
Ele se moveu na cama e eu inspirei, pronta para lhe pedir que conversasse comigo,
mas ele me segurou pelo braço e me beijou. Foi feroz e súbito, me puxou para si,
mordendo meus lábios.
Desejei me entregar, mas nãoparecia natural. Algo no modo comoele me olhava…
Como o Ryker dos primeiros dias naquele quarto, o Ryker que me provocava e queria
me comer para provar um ponto. Não era o Ryker que me fazia sentir a salvo, o
Ryker queme chamava de “amor”…
Pressionada contra o colchão, ele colocou minhas mãos acima da minha cabeça,
mordendo meu queixo. Suspirando no meu pescoço. Afogando sua frustração no meu
corpo.
Eu não queria aquilo. Não o queria daquele jeito.
Queria meu Ryk de volta.
Por favor, que eu não o tenhaquebrado! Por favor, que eu não tenha destruído tudo.
Segurei seus ombros sentindo a pressão avassaladora de todos os problemas que
nos cercavam. O medo, a tensão, a raiva, a ousadia… Cada etapa de cada problema
que superamos juntos e que ainda teríamos que superar.
Era demais. Era uma tensão insuportável que se espalhava pelo meu corpo inteiro.
Toquei os ombros de Ryker e o empurrei devagar. Sua mão atingiu o meio das minhas
pernas no mesmo momento. Seus dedos bem treinados alcançaram meu clitóris. O
beliscão foi rápido e firme e meu corpo se desfez em ondas e vibrações.
Todo o desespero e tensão que assumia meu corpo de forma descontrolada se
concentrouimediatamente naquele ponto mágico atrás do meu umbigo.
Entretanto, meus lábios já tinham deixado escapar: – Ryk, não. Para.
Ryker se afastou e tirou as mãos do meu corpo. Seu semblante preocupado, suas
mãos nas minhas bochechas, procurando no meu olhar a resposta para o que estava
errado.
Ah, ele está aqui.Meu Ryker.
Estava ali.
Estava triste, decepcionado, arrependido.
Talvez até com medo.Mas estava ali.
Estava usando sexo como uma distração.
Talvez não fosse o meu primeiro reflexo depois de um “eu te amo” não
correspondido, mas agora que ele tinha apertado meu botão, eu estava ligada e
querendo mais.
Ele se inclinou para trás, de modo a sair de cima de mim. Obedecendo a minha
vontade.
Mas agora eu tinha mudado de ideia.Ainda tinha as mãos em seus ombros quando
o puxei de volta e o beijei.
Puxando sua nuca, cravando as unhas na sua pele.
– O quê? – suspirou quando nossos lábios se soltaram. – Você pediu para eu
parar.
– Mudei de ideia. – Sorri. – Fica comigo.
Seus lábios eram uma única linha rígida. A expressão indecifrável demonstrava que
ele estava fazendo algum cálculo impossível por trás de seus olhos esverdeados.
Sacudiu a cabeça, apoiando a testacontra a minha.
– Está com pena de mim? –sussurrou.
– O quê? Ryk! Não! – eu me prepareipara o monólogo mais apressado daminha
vida, mas palavra alguma foidita. Ele tomou minha boca mais umavez. Despiu o
roupão que eu tinhavestido precariamente e me estimulouem todos os lugares de
que eu gostava.
Em todos os lugares de que ele gostava.Eu ainda não tinha tomado banho depois
do show e ainda estava molhada, resquício dos líquidos sexuais meu e dele. Ryker
estava eretoe eu fechei os olhos quando uma de suas mãos guiou meu joelho para
lhe dar passagem. Esperei que ele se enterrasse em mim, mas em vez disso, senti-o
ao meu lado, rolando para alateral da cama.
Abri os olhos e vi seu braço estirado para o criado-mudo, a mão enfiada na gaveta
procurando…
Ele pescou uma tira curta de preservativos que deveria estar lá há alguns meses.
Rompeu uma das embalagens e vestiu a si mesmo, antes de me penetrar.
É ridículo, não é? Como coisas minúsculas conseguem assumir proporções
monstruosas?
Sempre usamos camisinha. Nossa! Até tínhamos desistido de penetração há poucos
dias, mesmo depois de tanto tempo de saudade, apenas porque não tínhamos
preservativo.
Ele me fizera vesti-lo em uma ou outra ocasião que eu detestei sumariamente. Era
complicado colocar aquela coisa em um pênis ereto; eu não sabia qual lado desenrolar
e sempre mesentia boba precisando de instruções.Preferia que ele mesmo colocasse.
Mas não hoje.
Hoje nós tínhamos transado semcamisinha e ele tinha dito que me amava.
Eu queria que ele me cobrisse e fizesse amor comigo.
Era estúpido… Preservativo era umaquestão de proteção e respeito, mas…
mas depois de tudo… eu sabia que era irracional, mas queria que ele tivesse retomado
de onde havíamos parado.
Ou, se era para usar a camisinha, que ele me fizesse vesti-lo. Que fizesse suas
brincadeiras irritantes e me deixasse com vergonha.
Era nossa dinâmica. Nossa interaçãoíntima.
Sem ela, eu sentia como se eu fosse mais uma.
Só mais uma das incontáveis mulheres que ele comeria em silêncio. Vestindo a
camisinha em si mesmo paraatingir seu próprio prazer mais rapidamente.
Ryker gozou de forma modesta e eu ainda não o tinha acompanhado.
Eu senti lágrimas caindo dos meus olhos, arrastando-se pela lateral do meu rosto.
– Não gozou ainda... – Sorriu. – Vou cuidar disso imediat... Mina?
Ryker se afastou, preocupado, tomando minhas lágrimas com os polegares, secando
meu rosto.
– Mina? – repetiu, alarmado. – O que houve? O que aconteceu? Eu devia ter
parado? Mina, sinto muito!
– Não, não foi nada. – Consegui sorrir. – Eu só… só fiquei triste. Mas já passou. –
Empenhei-me mais no sorriso.
Ele ainda resfolegava e me observou por alguns segundos, analisando minhas
palavras.
– Não passou. Eu sei que não passou. Fala pra mim.
Respirar começou a ficar difícil e eu ia chorar se continuasse assim.
– Acho… acho que sempre fizemos amor até hoje. Ou pelo menos era assim que
me sentia e agora… agora parece que estamos só… só… fodendo
– murmurei a palavra, sentindo-a doer na minha língua.
Ryker piscou duas vezes e então abriu aquele seu sorriso gostoso, ao deixar a
cabeça cair.
– Então, vibradores e sexo exibicionista foram sinônimo de fazer amor. Aí eu
digo que te amo e é foder?
– Senti algo dentro de mim congelar, mas o modo calmo como ele riu me fez
perceber que estava tudo bem. – Nunca tive problemas para entender as mulheres,
Bault, mas você é algo especial.
– Você disse que não tinha dito nada
– lembrei.
– Eu falei sem pensar. – Engoliu em seco. – Acho que foi a hora errada, não foi?
– Ah, Ryk! – choraminguei, me pendurando em seus ombros. – É só isso que eu
pensei. Acho que tem tanta coisa acontecendo… não me parece o momento para…
– Shh, shh. Eu sei. – Desceu a mão pela minha coluna. – Esquece que eu disse
qualquer coisa, está bem? – Raspou o nariz no meu com um sorriso simples e limpou
o que restava de minhas lágrimas, me fazendo sorrir. – Mas eu tenho permissão para
continuar? – Tinha um pouco mais de safadeza no seu sorriso agora, o que me
tranquilizou ainda mais. – Não gosto dessa ideia de gozar sozinho.
Beijei sua boca e senti sua mão voltar ao meu clitóris. Mas dessa vez… dessa vez
eu me entreguei. Gemi seunome baixinho e ele manteve sua testa contra a minha. Seu
nariz contra o meu.
– Não vou sair daqui – sussurrou,antes de me beijar.
Eu gozei na sua mão, entre seu beijo e sua carícia, sentindo o mundo inteiro
derreter ao nosso redor. Ele me abraçou, gentil, sem abandonar aquele beijo
carinhoso e suave.
— De novo? – A voz aguda na porta fez Ryker me soltar, assustado. Eu puxei os
lençóis me envolvendo, com raiva. – Quanta saúde, hein, Strome? – Nila estava na
porta do quarto e a lembrança do que tinha acontecido no palco há pouco tempo me
enfiou de volta na enchente de vergonha.
Sven vinha logo atrás dela e eu notei que ele levantara os polegares.
– Só vim avisar que está tudo resolvido. Eu e sua irmã estamos voltando para o
hotel. Nos vemo samanhã.
– Interrompeu meu sexo pra isso? – reclamou. – Achei que isso era pecado na sua
religião.
– Na minha religião, pecado é saber que sexo está acontecendo nas proximidades e
não ir me meter. E de nada. Sua irmã ia subir para se despedir, mas eu senti o cheiro
de sexo e achei melhor vir na frente.
– Obrigado. – Riu.
Eu olhei de um para o outro, indignada, antes de dar dois tapas com força no
ombro de Strome.
– ESSA GENTE NÃO BATE NA PORTA! –
rosnei. – Bota eles para fora, Ryker!Agora! Como pode ficar tão tranquilo?
– Mina… – Ele se virou para mim com exagerada desolação. – Vamos pensar pelo
lado bom… Pelo menos dessa vez, a interrupção foi depois que nós dois gozamos.
Com nossa sorte, acho que isso é o máximo que a gente pode pedir.
Oito
Jogos de sedução
– O que ainda está fazendo aqui? – Delvak estreitou seus olhos inquisitivos.
– Achei que você já tinha ido atrás dos seus amigos críticos.
– Não são amigos, no plural. É um crítico só que pode resolver tudo – expliquei. –
E eu já estou indo, mas preciso te pedir algo antes.
– Se tiver a ver com sexo, a gente pode fazer no palco na frente de todo mundo? –
Tocou minha cintura. – Não quero que seu irmão me deixe para trás
– concluiu com um dengo falso.
– Preciso que você converse comRyker.
– Sobre o sexo no palco? O dele ou onosso?
– Delvak! – vociferei. – Você pode dar uma pausa nas suas besteiras pordois
minutos? Por favor?
Seus ombros caíram quando ele expirou fundo. Seu toque na minha cintura ficou
mais pesado.
– O que houve? – Ele se declarou para Mina e não foi retribuído no momento.
– Isso nunca é bom. – A seriedade pacífica em sua voz me agradou. Saber que ele
não tinha feito alguma piadaridícula me informava que ele estavarealmente tendo uma
conversa sóbria. E eram muito raros os momentos em que ele não estava embriagado
pelo sexo.
– Ele está interpretando tudo errado, Sven – suspirei. – Continua com essa ilusão
perigosa que o único jeito de ser uma pessoa decente é sendo como você.
– Que fique claro que nunca concordei completamente com essa sua análise,
Lexie. – Balançou a cabeça devagar. – O garoto só está experimentando a vida. Sei
que eu exagero. – Abriu os olhos forçadamente.
– Mas ele não é como eu. Ryker tem a cabeça no lugar. Mesmo quando se mete em
um problema colossal como esse com que estamos lidando. Ele continua focado,
concentrado… Seu irmão é um bom menino.
– Eu sei disso tudo.
– Então por que está se metendo na vida dele? – recriminou. – Deixa eleencontrar o
próprio caminho.
– Não é isso, Sven! – Esfreguei minha testa com as mãos e ele soltou minha cintura
para apertar minhas mãos, tentando me acalmar. – Simak se meteu na vida dele
primeiro. Destruiu o garotomeigo e romântico que tinha lá dentro e agora… Agora
Ryker não tem rumo. Eleacha que é errado ser quem ele é.
– Tenho certeza que não acha isso.
– Não conscientemente. Mas eu conheço meu irmão! – Dobrei o lábio, birrenta. –
Svenie, por favor! Só faça o que estou te pedindo. Por favor? – Coloquei as mãos em
seus ombros, deixando meu olhar lhe explicar o quanto era verdadeiro meu pedido.
– O que quer que eu diga?
– Só converse com ele. – Dei de ombros. – Veja se ele está bem. Tente acalmá-lo.
Tenho medo que ele destrua tudo com Mina no calor do momento. Vai fazer isso?
Ele sorriu com aquela doçura que quase nunca demonstrava. Colocou os fios soltos
dos meus cabelos atrás daminha orelha.
– Sabe que faço qualquer coisa por você – sussurrou. Não havia qualquer dose de
sedução no seu tom. E eu adorava quando ele falava assim.
– O celular dele! – lembrei. – As pessoas guardam tudo nos celulares hojeem dia.
– É, Mina… Mas guardam tudo em um celular com senha. – Devon deu de
ombros. – Sem a senha do contador, a gente não consegue acessar asinformações.
– Você não conhece algum hacker, Interpol? – Lucy tocou seu ombro.
– Conheço. O departamento de informática da agência.
– Só? Não tem ninguém underground
que trabalhe por dinheiro ou drogas?
– Ah, claro! – Zahner deu um tapa naprópria testa. – Esqueci que estávamos em um
filme da Disney. Claro que conheço.
– Você é o agente secreto mais inútil que eu já vi. – Lucy torceu o nariz para acareta
de Gary.
– E que filme da Disney é esse que tem drogas? – Joanie parecia chocada.
– O seu amigo japonês não conhece ninguém? – Zahner quis saber. Ele sempre
voltava a esse assunto. Estava curioso para descobrir mais sobre a procedência das
amizades de Delvak.
– Não precisamos de nada disso. – Sorriu, calculista. – Só precisamos decorar sua
senha antes de roubar o celular.
– E como vamos fazê-lo nos mostrar asenha?
– Eu tenho um plano. – Piscou um olho. – Mas, para isso, vou precisar de uma
voluntária.
– Para dar em cima do contador? – Lucy riu. – Isso aqui é uma boate de prostitutas,
meu amor, voluntárias não vão faltar.
– Ótimo! – Bateu palmas. – Então vamos agir essa noite. Temos que atacar em
todas as frentes ao mesmo tempo. Lexa e Zahner cuidam dos restaurantes e o resto de
nós consegue as informações com o contador. Acabamos aqui? – Ele espiou Ryker com
uma urgência estranhaque chamou minha atenção.
Quer falar com Ryk, Delvak? Entra na fila.
Assim que essa reunião acabar, quem vai ter uma conversa com o Strome sou eu.
Lidar com sentimentos profundos seria estressante no meio de nossas tramas contra
a máfia. Mas qualquer coisa era melhor do que receber esse gelo de Ryker. Eu não
ia conseguir me concentrar para nada até resolver isso.
– Não acabamos – Joanie avisou. – Seduzir o cara não vai ser problema, mas você
ainda precisa explicar seu plano sobre como conseguir a senha dele.
Delvak inspirou profundamente e se preparou para falar. Eu não precisaria estar
presente para essa parte da lição. Não quando havia por perto pelo menos três ou
quatro mulheres muito mais capacitadas para seduzir um estranho doque eu.
– Ryker? – Toquei seu braço e notei oolhar de Delvak sobre nós mais uma vez. – A
gente precisa conversar. – Eu mantinha o canto do olho em Sven, tentando entender
o motivo do seu interesse discreto. Ele geralmente era mais evidente e barulhento que
aquilo.
Talvez tivesse algo a ver com a conversa que Lexa tivera com Ryker…
– Sobre? – Ele levantou uma sobrancelha.
O celular de Delvak tocou em seu bolso e ele se afastou, cumprimentando Lexa, do
outro lado da linha.
– Ryker – reclamei. – Vai mesmoquerer jogar esse jogo?
– Mina, eu…
– É O QUÊ? – A exaltação de Sven do outro lado do salão chamou nossa atenção.
Todos pararam suas atividades e ninguém sequer respirava. – Como assim, “uma de
cada”? De onde diabos você conhece esse homem, Lexa? – Ele ficou em silêncio
enquanto a esperava responder. – Então, você vai ficar? É isso? – Mordeu os lábios
com força. Eu toquei o braço de Ryker instintivamente, buscando proteção. – Ótimo,
volte e aí… Como assim não vai voltar? Eu não estou… – Esfregou a testa, irritado. –
Merda! Que bela merda! Ok. Eu ligo pra você em dois minutos. – Ele desligou o
telefone com raiva. – Mudança de planos, pessoal! O crítico, “amigo” da Lexa está
cobrando para nos ajudar a destruir a reputação dos restaurantes do Kulik em menos
de dois dias.
– Quanto? – Levei a mão aos olhos. Se fosse uma quantia alta teríamos que pedir
dinheiro emprestado… e à Lexa, provavelmente.
– Não é dinheiro que ele quer. Ele conhece Lexa e quer uma experiência única com
várias prostitutas. Negra, loira, morena, ruiva e asiática. Aomesmo tempo. – Sven nos
ofereceu um sorriso amarelo.
– Que diabo de amigo é esse? – Rykersoou preocupado com as amizades da irmã.
– Exatamente o que eu gostaria de saber – Delvak rosnou. – Mas, no momento,
não temos tempo. – Olhou para o relógio. – Jornalistas funcionam com prazos
apertados demais e nós queremos que ele tenha tempo para escrever um artigo bem
gordo. Quais de vocês topam? – Procurou ao redor.
Lucy, Joanie e Nila se entreolharam casualmente. Três prostitutas que fariam
qualquer coisa por Spider.
– Quem vai nos pagar pela hora? – Tonya quis saber. — Não me levem a mal, eu
também amo Spider e quero vingança pelo que aconteceu com ela. Mas trabalhar de
graça é contra minha filosofia.
– Eu pago! – Delvak deu de ombros. –Estamos resolvidos?
– Sem problemas, por mim. – Tonya sorriu.
– Precisamos de uma morena – Sven avisou.
– Skye! – exclamei, interrompendo-o.
– Skye vai ajudar.
– Tem certeza? – Ryker me olhou, incerto.
– Tenho. Ela é uma boa pessoa – decidi. – Não se dava bem com Spider, mas vai
ajudar. Sei que vai. Ela veio nos ver quando chegamos, lembra? E foi me visitar em
Paris. E… – Tentei lembrar outras ocasiões que confirmassem a veracidade de sua
amizade por nós. – Não importa! Eu ligo para ela! – Eu já ia seguir para pegar o
telefone, quando mevirei de volta, girando sobre meus pés para observar Sven. – Pode
ser que ela cobre também – avisei, sem jeito.
Ele riu e concordou com um gesto.
– Acho que ela é bem cara. – Enruguei minha testa, percebendo que, mesmo com
toda minha experiência recente, a verdade é que eu não fazia a menor ideia de
quanto uma prostitutadeveria cobrar.
Considerando minha breve e angustiante experiência com Ryker em nossa primeira
noite, eu também não sabia exatamente quanto cobrava um garoto de programa.
– Não é problema. – Sven acenou e eu confiei que minhas palavras sobre uma
prostituta “ser cara” teriam um significado para ele que não tinham para mim. Ele
deveria saber quanto custava, não é?
– Vou ligar para ela agora mesmo!
– Depois volte, preciso te ensinarcomo pegar o código do celular – disse. Eu tinha
dado dois passos completos antes de perceber que eu não conseguia compreender o
que ele dissera.
– O quê? – Virei de volta para ele.
– O código do celular. Preciso te ensinar como convencer o contador a te mostrar.
– Mas… mas… – Eu sabia que minha boca estava se movendo… mas minha mente
ainda estava preocupada demais em tentar colocar sentido nas palavras de Delvak.
Ele não precisava de mim para seduzir um estranho! Não quando estava cercado por
mulheres lindas e experientes no assunto. – Uma das meninas não pode…?
– Elas vão precisar ir. Todas. – Seu tom era de obviedade. – O idiota tarado quer
“uma de cada”. Parece que coleciona sexo. – Havia um tom brincalhão na
afirmação, mas a lembrança de Allender me fez tremer. Delvak não deveria fazer ideia
do quanto sua bobagem tinha um peso de realidade. – Não é problema para você, não
é, querida? Se conseguiu transar em público, consegue fazer um mísero homem
acreditar que está interessada por ele.
– Lucy! – Ryker se virou, assumindo uma postura muito similar à de Sven. Ele era
o líder agora. – Pegue as meninas e encontre Lexa. Sven tem o endereço? – Delvak
sorriu como se apreciasse ver Ryk assumir as rédeas. – Ótimo. Escreva para as
meninas. O resto de vocês, vão logo para o maldito bar para onde o contador
geralmente vai nos dias de hoje. Cheguem separados, finjam que não se conhecem.
Deem uma olhada ao redor. Vou ligar para todos vocês antes de sairmos. A gente
precisa ter o mínimo de certeza de que o lugar é seguro. Sven… eu e você ficamos
para trás. – Sven acenou, compreendendo.
Eu olhei para Ryker, sentindo o pânico se diluir. Mas aquela horrível sensação de
que eu ia sufocar ainda estava lá… me atormentando. Se eu falhasse, poderia colocar
todo o plano a perder. Toda a dedicação dos meus amigos, todo o risco que tinham
assumido…
Era demais: colocar toda a responsabilidade do nosso sucesso em uma tentativa de
sedução a ser realizada por uma garota que teve uma crise histérica de riso na primeira
vez que viuum pênis ao vivo.
Delvak se virou para as meninas, enquanto os rapazes se preparavam parasair.
Apertei a mão de Ryker à espera deinstruções.
Ele apertou minha mão de volta.
– Vem comigo? Eu apenas sorri.Vou.
Claro que vou.
Vou com você para qualquer lugar.
Mina não soltava minha mão. Eu não saberia dizer se era apenas por causa do
receio criado diante da situação recente ou se por causa de toda a situação de
confissão de sentimentos e mais toda aquela merda.
– Vai conseguir. – Encarei seus olhos,transmitindo segurança.
Eu queria me manter minimamente afastado. Eu a amava. Não era recíproco.
Minha cabeça girava em turbilhões inconstantes, principalmente depois de minha
conversa com Lexa. Será que ela estava certa? Será que eu nunca tinha conseguido ver
o amor com bons olhos? Ou era só sexo?
Não… Eu cedi ao que sinto por Mina, não foi? Admiti tudo. Eu não poderia fazê-lo
se Lexa estivesse certa.
Mina espremeu os lábios, nervosa, e eu quis me manter distante.
Mas era difícil. Era quase impossível.
– Ryker – murmurou muito séria. – Da primeira vez que tentei te seduzir, acabei te
causando um choque anafilático.
– E espremendo minhas bolas no punho, não esqueça essa parte. – Sorri diante da
lembrança. Eu não conseguia me manter apático com Bault.
– Pois é! Esse plano está fadado ao fracasso! A gente tem mais chances de seduzir o
contador se colocar você em um vestido e saltos.
– Não zoe comigo, Bault. Eu consigo fazer um vestido e saltos funcionarem muito
bem, ouviu? – brinquei, fingindo arrogância e ela riu. – Você vai conseguir. – Apertei
sua mão. – Vai dar tudo certo.
– Como pode ter tanta certeza?Eu não tinha certeza…
Senti um meio sorriso atingir meu rosto junto com a ideia.
– Finja que sou eu. – Levantei o ombro. – Finja que está falando comigo e
querendo me convencer a fazer algo.
– Eu sou péssima em te convencer. – Levantou uma sobrancelha e eu soube que ela
estava gostando da ideia.
– Faça isso e vai dar certo – prometi.
Mina acenou devagar e nos perdemos em silêncio, presos um ao olhar do outro
durante alguns segundos que passaram rápido demais.
– Está distante porque disse que me amava e eu não respondi? – sussurrou, como
se cada palavra doesse para sairda boca.
Um nó se atou na minha garganta, naquele local inconveniente bem abaixo da
glote.
– Não é uma boa ideia fazer isso agora.
– Ryk, diante da nossa atual situação em que cada dia pode ser o último, achoque o
melhor momento é agora – lembrou.
Sentei na cama, expirando. Cotovelos sobre os joelhos, afundei meus dedos nos
cabelos.
– Sempre achei relacionamentos tão simples – confessei. – E, de repente, ficou tudo
tão complicado.
– Relacionamentos sempre foramcomplicados. Sexo que é simples. – Sentou–se ao
meu lado, tocando meu joelho e eu abaixei os braços para observá-la. – Quer
dizer… – Arregalou os olhos. – Pelo menos para um de nós.
– Me fez rir.
Eu queria levar a mão à sua bochechae tocá-la. Queria acariciar seus braços, colocá-
la no meu colo e beijá-la a noite toda.
– Por que precisa ser tão complicado? – suspirei.
– Porque a gente nunca sabe o que a outra pessoa está pensando. “É de verdade?
Ele está me enganando? Ele está se enganando?”… Se eu soubesse tudo que está na
sua cabeça e você soubesse tudo que está na minha seria mais simples.
Sua explicação me divertiu.
– O segredo para um relacionamento saudável é a telepatia, então? Por que não me
avisou antes, Bault? – Estreitei os olhos.
Ela mordeu o sorriso, sustentando meu olhar como se arquitetasse um plano.
– Vamos fazer assim. – Ela se levantou e pegou o despertador na cabeceira. Girou
os ajustes na parte de trás e colocou o relógio sobre a cama antes de se sentar. –
Quinze minutos de absoluta honestidade.
– Do tipo: como eu gosto que uma mulher me chupe?
Ela fez uma careta para minha brincadeira.
– Acho melhor eu começar – decidiu.
– Mina… – Coloquei minha mão sobre a sua antes que ela ativasse o alarme. –
Tanta coisa pode dar errado nesse seu plano.
– Ryker. – Ela assumiu a coragem que eu não tive e sua mão estava no meu rosto,
espalhando eletricidade pela minha bochecha. – Você mal olhou para mim hoje. Eu
quero saber por quê – decidiu. – Só quinze minutos. Eu digo tudo. Você diz tudo. Sem
medo ou julgamento. E, quando os quinze minutos acabarem, a gente finge que nada
aconteceu e segue a partir dali.
– Quinze minutos?
– É menos tempo do que a gente passou no palco. – Sorriu.
– Mas suspeito que vá ser bem menosdivertido. – Suspirei.
Não tive tempo para me preparar ou sequer respirar fundo: Mina apertou o botão e a
contagem regressiva começou.
– Eu te amo – ela confessou e eu tremi. Cada pedacinho de pele vibrava de acordo
com as batidas pesadas do meu coração. – É assim que me sinto. É assim que eu acho
que me sinto. – Balançou a cabeça. – Mas eu tenho medo. Tenho medo porque a
gente se conhece há pouco tempo e tudo aconteceu de um jeito muito conturbado.
Tenho medo porque você é uma das pessoas mais descaradas que eu conheço. Top 5 –
afirmou, tentando nãosorrir.
– Não tenho sequer certeza sevocê sabe o que é estar apaixonado por alguém. E se você
estiver confuso? E se for apenas a intensidade de toda essa situação? Eu digo que te
amo também, você me beija, a gente faz amor e esqueço que o mundo existe. E depois?
E depois do sexo? E depois da máfia russa e da boate de striptease? O que sobra pra
mim? Antes, você tinha a novidade da caça pela minha virgindade. – Arregalou os
olhos, defronte à escolha de palavras.
– Teve a emoção da separação, do reencontro, da trama e do risco de vida… mas e
quando isso acabar? Se a gente ainda estiver vivo… você vem pra Paris comigo? Eu fico
em Amsterdã com você? Você vai continuar se prostituindo? Porque, sinceramente,
não sei como me sentiria com isso. Você abriria mão do seu jeito moleque- safado-
garanhão e stripper por mim? Seus rendimentos como garoto de programa? Ou
desistiria de mim? Desistiria daqui a uns meses assim que eu estivesse completamente
apaixonada por você? Admitir torna o sentimento mais real e tenho medo dessa
realidade, Ryker, porque você é sempre tão… imprevisível – gemeu e eu senti sua
angústia.
– Eu gosto de controle. Você sempre soube disso! E com você… com você não há
controle nunca! Transei na frente de um monte de gente ontem mesmo! – exclamou.
– Eu gosto do modo como você me faz sentir. Eu amo! Mas isso tudo pode dar tão
errado. Você achamesmo tão incompreensível e tão…
inaceitável… que eu tenha resolvido tomar um pouco de cuidado com meu coração?
Sua pausa se prolongou e eu suspeiteique era minha vez. Esfreguei a palma contra a
testa, lutando bravamente para puxar as palavras para fora.
Se ela fosse em algum aspecto como eu, estaria entrando em desespero diante do
meu silêncio a qualquer segundo. Seria ela a ficar com raiva e me ignorando, dessa
vez.
– Calma. – Entrelaçou nossos dedos, me surpreendendo. – Não é uma prova.
– Seu sorriso me enchia de paz. Ela era maravilhosa: toda ela. Seu jeito, sua
personalidade, sua voz, seu sorriso, sua beleza. – Não tem resposta errada. Apenas
diga a primeira coisa que vier à sua mente. Eu sabia exatamente o que estava na
minha mente.
– Sou mais inseguro do que você – meu sussurro mal se fazia ouvir.
Senti seu toque em minha mão hesitar, confuso. – Acho que por causa do modocomo
a gente se conheceu e do lugar onde a gente veio parar. Acabamos reduzindo tudo a
sexo, não foi? E aí você me considerou autoconfiante e eu te considerei inexperiente e
foi isso. Mas a vida é muito mais que duas pessoas nuas e suadas em uma cama. Ouno
sofá. Na cozinha… – Tentei lembrar.
– Em um palco…Ryk… – Riu, baixinho.
– Lexa me chamou para conversar hoje mais cedo.
– Eu vi.
– Ela me disse muitas coisas que eu odiei ouvir, mas… acho que ela tem razão.
Simak foi… – Passei os dedos na linha dos meus cabelos… Minha visão se embaçou e
eu senti que poderia chorar. Qual era o meu problema? – Não tive uma boa infância. –
Decidi usar outras palavras e o mundo voltou a entrar em foco. – Acho que passei
minha vida inteira fugindo do homem que eu temia me tornar. Acho que exagerei e…
acabei me forçando a ser algo completamente diferente.
– Algo como o Delvak?
– Talvez. – Me permiti respirar fundo.
Eu conseguia fazer isso. Eu conseguia desabafar e abrir o jogo. Não teria conseguido
com Lexa. Mas com Mina sempre foi diferente. – Sexo foi simples. Ser garoto de
programa, ser stripper, reduzir minha interação com mulheres a sexo, mesmo em
relacionamentos mais longos como foi com Skye. Eu não precisava pensar. Não
precisava encarar o medo ou a insegurança. Não sei por que foi diferente com você,
mas foi. Consegui contar sobre o que aconteceu com Simak e Lexa pela primeira vez
na minha vida e… foi bom. Com você não era só sexo. Apesar de ter muito sexo. –
Agora era ela quem ria. – Eu confio em você. Sinto como se tivesse alguém comigo.
De verdade.
Alguém que gosta de mim e que… não sei… Eu sempre estive sozinho e quando você
apareceu, pode ter sido rápido, mas… de repente eu não me sentia mais só. A cada dia
quepassa eu gosto mais de você. – Comprimi sua mão. – Mas você está certa, Mina. É
amor? Não sei. – Dei de ombros. – Acho que é… O que eu te disse foi só… foi natural
– decidi. – Só escapou. Eu não estava pensando no futuro, nem fazendo grandes
conjecturas. Foi só uma constatação. Algo que eu tive vontade de dizer. Espero que
você não me entenda mal, mas eu me arrependi.
– Se arrependeu? – Seu olhar caiu e segurei suas duas mãos com força.
– Não porque meu sentimento mudou, mas porque você está certa de novo: é
complicado demais. Principalmente na nossa situação. Você me fez um monte de
perguntas e eu… não sei responder metade delas. E acho que você também não saberia
responder se eu te perguntasse coisas parecidas. Acho quea gente… precisa conversar.
Mas não agora. Quero dizer… Se a gente morrer amanhã, não faz diferença a gente ter
decidido morar em Paris ou Amsterdã, não é? – lembrei, as articulações dosdedos pelo
seu rosto.
– Faz sentido.
Acenei devagar. Ela sorriu. Puxei suanuca para mim e beijei sua boca.
Soltei o beijo e Mina me deu umúltimo selinho que estalou bem alto. Meu sorriso
se abriu, imenso.
Ela me abraçou e nós deixamos os minutos restantes escorrerem devagar. Raspando
meu nariz no dela até o alarme soar estridente e ela se mover, rindo, para desligá-lo –
Não doeu, né?
Puxei sua cintura e deitamos na cama, um de frente para o outro, mantive sua mão
na minha, tocando seus dedos com carinho.
Vivi minha vida toda um dia de cada vez.
Mina foi a primeira pessoa na minha vida que me fez querer pensar em termo de
“anos”.
Era por isso que era diferente comela.
Sem saber, ela tinha me feito encarar os traumas da minha infância a fim de superá-
los. Enfrentar o fato de que a vida nem sempre dá o que a gente quer: às vezes ela nos
dá uma mulher que a gente ama e que não responde a declaração no mesmo segundo.
Ou nos dá um pai violento e uma irmã vítima. Nos dá impotência e nos mantém presos,
impossibilitados de nos defender ou de acolher as pessoas que amamos.
– Vem cá, eu quero te beijar de novo
– pedi.
Ela me beijou, e meu sorriso sedesfez em uma risada deliciosa.
– O que foi? – ela quis saber.
– Não, não – brinquei. – Seus quinzeminutos acabaram.
– Ah, isso é fácil de resolver! – Ela se esticou na cama, brincalhona, procurando o
relógio mais uma vez e eua segurei pela cintura. Fiz coceguinhas em suas costelas,
informando-a de que ela estava roubando.
– Me conta! – pediu. Eu sentia nossos hálitos se misturando e soube que eu não
poderia negar.
– Tem uma autora de que minha irmã gosta muito. Em uma passagem de um livro
dela, há uma citação que Lexa ama. Essa autora diz que muitas pessoas passam a vida
inteira hibernando. Você se levanta da cama, vai trabalhar, acha que está fazendo tudo
certo na vida… Aí, um dia, algo simplesmente acontece e você acorda. Percebe tudo
que estava fazendo errado. Tudo que era sem sentido. Tudo que você quer mudar. É
meio louco ver assim. – Mantive Mina bem perto, sua testa contra a minha. – Mas
acho que era isso. Eu estava hibernando. E você, com esse seu jeito maluco, sem
querer me fez repensar minha vida inteira. Acho que é por isso que eu te amo. – Sorri
e a beijei rapidamente. – Mesmo que dê errado, mesmo que você quebre meu coração
ou eu quebre o seu: eu sempre vou te amar. Vou te amar porque, sem você, eu teria
passado minha vida inteira alheio a mim mesmo. Vou te amar porque foi você quem
me acordou.
– E espremi suas bolas no punho! – lembrou.
– Claro! Não podemos esquecer essa parte. – Girei sobre ela. – Qual o homem que
não se apaixona por uma mulher que o deixa infértil?
– Ei! – Delvak estava na porta – Temos que ir ao hotel, para pegar um vestido da
Lexa para Mina. Vai ajudar no elemento sedução – explicou. – Estãoprontos?
Mina revirou os olhos e se esticou para encarar Delvak.
– Acho que a gente ia transar, mas você interrompeu tudo!
Eu gargalhei muito alto diante de sua ousadia.
– Ah, nesse caso eu espero. – Ele piscou um olho.
Mina beijou minha bochecha, antes dese levantar.
– Controle-se, Delvak – sugeriu, passando por ele. – Ou peço pra Lexa te dar uma
surra quando ela voltar – desafiou e eu arregalei os olhos em descrença.
A vida é assim… Te dá traumas, uma infância horrível repleta de abusos e uma
rotina de fugas. Aí, um dia, ela chega e te oferece uma Mina também.
Eu sorri ao assistir à minha namorada e ao meu amigo descerem as escadas
enquanto trocavam ofensas e elogios de duplo sentido. Eu não estava mais sozinho.
Talvez nunca tivesse estado.Talvez tivesse sido apenas uma opção. Talvez eu estivesse
fugindo tão rápido que nunca parei para notar os amigos e família que se dispunham
ao meu redor e que buscavam me alcançar.
Mas agora eu tinha acordado e estavapronto.
Agora eu não era mais impotente. Podia me defender e podia defender as pessoas
que eu amava.
Eu finalmente tinha compreendido que a vida não é apenas uma vadia nojenta. Ela
joga coisas horríveis para cima de você? Sim. Mas então, quando você menos espera,
ela entra em um quarto de hotel, disfarçada de uma cliente virgem, e te dá um presente
maravilhoso.
O plano de Delvak era bem simples.E a melhor parte é que podia ser dividido
em etapas facilmente listáveis:
1. Seduzir o contador.
2. Fazer o contador pedir meu telefone.
3. Exagerar na proximidade enquanto sussurrava o telefonefalso no ouvido dele.
4. Prestar atenção quando eledesbloqueasse o aparelho.
5. Decorar o número pela minhavida.
6. Distrair o contador enquanto Tim roubava o aparelho do seu bolso.
7. Roubar todo o dinheiro do mafioso e deixá-lo sem condições de perseguir
qualquer um de nós.
Eu não conseguia pensar direito. Minhas pernas tremiam, minha cabeça girava. Eu
só queria tomar um banho, fechar os olhos e dormir.
Talvez pular o banho.
A mão de Ryker me puxando era a única coisa que me mantinha firme na
realidade. Mas eu escapava a cada segundo.
– Acho que vou ter que te comer em boates mais vezes para você se acostumar –
constatou. Pisquei os olhos e percebi que não era uma piada. Ryker me ofereceu uma
garrafa de água que bebi inteira. Devolvi-a vazia e ele riu.
– O que foi? – perguntei, recobrando a consciência.
– Eu queria um gole. – Levantou um ombro, ainda sorrindo.
– Ai, amor! – Levei as mãos aos lábios. – Me desculpa! Eu pego uma para você!
– Não se preocupa. – Me abraçou antes de se inclinar no balcão.
Sven estava a poucos passos de nós e contador estava claramente mais satisfeito com
ele do que comigo. Tocava os antebraços expostos e o tórax na altura dos botões
abertos. Svensorria, enquanto o contador girava, preso ao seu campo gravitacional.
O maldito fazia parecer muito fácil.
– Ali. – Ryker apertou o abraço sugestivo e eu me virei para ver Lexa apoiada em
uma das mesas, a distância.
– Onde estavam? – Sorriu antes de dar um gole em sua bebida e eu soube que ela
não precisava de uma resposta.
– Como está? – Ryker perguntou, indicando Sven com o queixo. – Acha que ele
consegue o código?
– Ah, já conseguiu. – Lexa piscou os olhos com obviedade. – E já distraiu o
homem para que Tim roubasse seucelular.
Ryker enrugou a testa, confuso.
– E o que ainda está fazendo lá? - Já tentou escapar três vezes. – Riu.
– Mas o contador parece irreparavelmente apaixonado. Se recusaa deixá-lo ir.
– Não tem como a gente ajudar? – perguntei.
– Tem sim. Eu e Sven temos um código – explicou, passando a língua no lábio
inferior. Ela estava se divertindo.
– Um gesto para pedir auxílio em uma situação assim.
– E ele ainda não usou o gesto?
– Ah, já usou! – Riu alto. – Umas quatro vezes. Ryker riu, entendendo a
brincadeira da irmã.
– Não acha melhor ir até lá? – sugeriu, com calma.
– Não. – Torceu o nariz, risonha. – Ele sobrevive.
O contador virou–se para o balcão para pagar alguma bebida e Delvak lançou um
olhar firme e irritado para Lexa, com uma careta de indignação. Eu podia ler o “você
me paga por isso” na expressão dele. Seu novo amigo se virou, oferecendo-lhe um
copo da bebida e um brinde. Ele sorriu e observei a careta voltar ao seu rosto antes de
virar a dose.
– Ele vai se vingar de você depois – avisei.
– Vai. – Lexa me ofereceu um sorriso deslumbrante. – Mas não acha que vale a
pena? – Riu com gosto. – É tão raro ver Delvak perdido – suspirou.
– Por que ele simplesmente não dá o fora? – Höfler se aproximou de nós.
– Ainda está aqui? – Ryker mal se virou.
– Estamos todos aqui – resmungou. –Alguém pode responder? Por que ele não dá o
fora?
Eu e Ryker nos entreolhamos. Eu não entendia nada do mundo de seduções doresto
da gangue então era compreensível que eu não soubesse. Mas o fato de que Ryker
também não sabia me deixou confusa.
Lexa pigarreou antes de explicar: – Ele passou todo esse tempo demonstrando
interesse pelo homempara que anotasse seu telefone. Se simplesmente fosse embora, se
tornaria suspeito. Quando notar que seu telefone desapareceu, ele pode lembrar de
Sven. Para que o homem não suspeite, ele precisa simular que está realmente
interessado e que foi embora por algum motivo válido.
– E como vai fazer isso?
O contador estava próximo demais de Delvak, sussurrando algo em seu ouvido e, se
aquela não tinha sido uma propostapara irem para algum lugar mais reservado juntos,
eu não sabia o que mais poderia ser. Delvak sorriu beliscando o queixo do seu novo
amigo de um jeito envolvente, antes de passar os dedos pela orelha em um gesto
peculiar, que imaginei ser o código entreos dois.
Lexa abanou os dedos para ele em um“tchau” divertido e riu como se presenciasse a
piada da sua vida.
– A gente precisa do código que ele decorou – lembrei. – Para ativar o celular.
– Pegamos amanhã. – Lexa gargalhou.
– Lex… – Ryker pediu. – Não faz isso!
Ela expirou profundamente, irritada por não deixarmos que ela continuasse a se
divertir.
– Está bem, está bem.
Sven estava andando ao lado do contador em direção à saída da boate, e Lexa os
alcançou no meio do caminho. Três passos largos para alcançá-lo e lhe deu um ruidoso
tapa no meio do rosto.
Delvak parecia desorientado, entre uma irritação pela sua demora e uma satisfação
por ela finalmente ter se manifestado.
– SEU CANALHA! – berrou a plenos pulmões. O susto me fez segurar o braço de
Ryker num ato involuntário. – Você jurou que tinha acabado com essa vida.
O pânico que Delvak simulou foi bastante crível.
– Querida, eu posso explicar… – Ergueu as mãos, mas não antes de Lexa o
estapear mais uma vez.
– Você tem três filhos! Três! Estão em casa, esperando por você! E enquanto eu lavo
suas cuecas e explico para os seus filhos por que você tem que trabalhar até tarde, você
fica aqui… nessa… nessa… sodomia! – berrou, indignada. Ela era uma excelente atriz.
– Meu bem, me escuta...
– Não vou escutar! Seu canalha! Vou voltar pra casa! E você vai voltar comigo! Vai
explicar pro Junior por que perdeu a festa de aniversário dele! A Anaïs levou o
namorado para a festa! Queria te apresentar! Mas onde você estava? – Outro tapa. –
Onde?!
Delvak entortou o rosto, mordendo os lábios como se não acreditasse que Lexa ia
continuar a estapeá-lo.
–Estava aqui! – Indicou os arredores. Ela deveria estar se divertindo tanto. –
Confraternizando com… com… Eu não consigo nem falar em voz alta! Seu cafajeste!
O que o seu pai vai dizer? Os nossos vizinhos? O pessoal da igreja? – Vi os ombros de
Sven caírem, sem acreditar que ela iria tão longe. – Meu Deus! – Lexa levou a mão à
boca.
– O que o pastor vai dizer? Você vai ser expulso da congregação! Expulso! –
exclamou antes de se virar para se afastar.
Sven murmurou duas palavras para o contador, que parecia tão chocado quanto o
resto de nós. Eles se despediram rapidamente e Sven correu atrás de Lexa.
Eu, Ryker e Höfler nos entreolhamos.
Nenhum dos três conseguia comentar o que quer que fosse. Mas cada um correu mais
rápido que o outro para o lado de fora para encontrar Sven e Lexa.
Ela estava curvada sobre o próprio corpo e não conseguia parar de rir. Sven não
parecia compartilhar da sua alegria.
– Muito engraçada. Muito.
– A gente pode fazer isso de novo amanhã? – ela pediu, sem conseguir parar de rir.
– Junior e Anaïs, Lexa? Sério?
– Não sou boa para inventar nomes. Foram os primeiros que eu pensei – defendeu-
se.
– Não é boa para inventar nomes?
Você é escritora!
– Não sou boa para inventar nomes sob pressão – acrescentou. – Mas fora esse
detalhe, meu roteiro foi impecável
– afirmou, exuberante.
– Impecável – Ryker concordou, rindo.
– Que bom que se divertiram. Onde está o telefone?
– Peguei com o Tim. – Devon entregou o aparelho.
– Ótimo. Tenho o código, vou dar umaolhada nisso e elaborar o que podemos fazer.
Acho que está na hora de convidarmais adultos para a brincadeira. Porque eu, sozinho,
não consigo cuidar de todos vocês. – Torceu o nariz, oferecendo um olhar
recriminador para Lexa.
– Se a situação fosse o inverso e eu é que estivesse com o contador, você teria feito
pior. – Piscou um olho descarado.
– Não teria te dado um tapa!
– Três – ela corrigiu, rindo.
Ele fingiu rir, se aproximou, perigoso, e beliscou uma porção de carne na barriga
dela, bem abaixo do seio. Não foi a mim que ele beliscou, mas eu senti a pontada
intensa ainda assim.
– Quero ver você rir – a boca dele estava no canto do ouvido dela, suspirando em
sua pele – quando eu me vingar.
Eles entraram no táxi e Lexa ainda estava rindo das ameaças de Sven.
Eu não sabia como ela conseguia.
Não foi comigo que ele falou, masminha boca estava seca.
Ela sorriu e me desejou boa noite, mas eu segurei a porta do quarto para não
permitir que se fechasse entre nós.
– Quer entrar, Sven? – sorriu, provocando.
– Não sei se posso. – Mantive a seriedade. – Porque, se entrar, vou querer te punir
pelo seu comportamento essa noite. – Sorri. – E não sei se posso
– confessei.
Lexa espremeu os lábios em uma linha rígida.
– Você sabe que eu e ele temos um relacionamento muito aberto.
– Sei. – Acenei, ainda me apoiando na porta. – Mas também sei que você me
recusou da última vez. Então, não sei, Lex. – Passei a mão pelos cabelos, tentando ser
sedutor. Mas com ela... com ela nunca era fácil tentar nada. A única pessoa no mundo
que enxergava por baixo de toda minha merda sem qualquerdificuldade. – Quero entrar
– decidi. – Posso?
– Você é diferente para ele, Svenie – sussurrou. – Nosso relacionamento é aberto,
mas sei que ele tem ciúmes de você. Não sei se ficaria confortável se você me tocasse.
Concordei com um gesto, xingando o maldito de todos os nomes mais sórdidos
que eu conseguia imaginar. Uma mulher como Lexa não foi feita para um
relacionamento monogâmico. E ela tinha encontrado um poligâmico, mas ainda assim
não poderia se envolver comigo? Em que universo sádico algo assim seria justo?
– Sabe, Lex, quando eu toco uma mulher – suspirei, meu hálito em seu rosto. –
Meu objetivo não é conforto. – Toquei sua cintura. Ainda longe de suas nádegas,
apenas uma sugestão, não uma insistência. – Angústia, desespero, necessidade... –
Estreitei os olhos quando minhas palavras faltaram.
– Sofreguidão, anseio, tormenta... – ajudou.
– Isso, obrigado. Todas essas coisas, sim. Duas de cada, por favor. Mas conforto? –
Revirei os olhos e ela riu. – Você ficaria mais confortável se eu não te tocasse? –
desafiei, maléfico.
– Está dizendo que vai me punir sem me tocar, Delvak? – Piscou os olhos,
duvidando. – Levar uma mulher ao orgasmo sem um único toque? – A curiosidade
tinha fisgado a pesquisadora erótica e ela precisaria ir até o fim. – Impossível. Mesmo
pra você – decidiu.
– Quer me dar uma chance de tentar? - Mordi o lábio. – Pelo bem da ciência e da
literatura? – arrisquei.
Lexa me encarou com devota fixação.
– Sem um único toque?
– Se você tirar as próprias roupas. Se não, vou precisar fazer isso por você –
considerei. – Fora isso, nenhum toque.
– Eu tiro – resolveu e eu fiquei duro.Instantaneamente.
– Tudo bem. – Lambi os lábios. – Vamos descobrir se eu consigo.
Lexa não esperou que eu a conduzisse ao quarto ou indicasse que poderíamos
começar. Ela nunca esperava por homem algum. Para mim, a mulher decidida era o
fator máximo de sedução e meu pau, como bom companheiro que era, não discordava
de mim.
Não houve dança sensual, não houve espera por iluminação adequada, não houve
troca de olhares inseguros em um misto de timidez e hesitação. Ela se despiu sem
pressa como se estivesse sozinha no quarto. Seu olhar não desviava do meu por um
segundo que fosse, me mantendo hipnotizado e preso ao seu olhar, mesmo que seios
igualmente divinos e diabólicos já estivessem à minha disposição.
Eram os seus olhos. Era a sua convicção.
No despir. No falar. No caminhar.
Atravessando o quarto até onde a cama nos aguardava. Nua, acendendo as luzes
pelo caminho. Reconhecendo o meu olhar, atraindo minha atenção. Expondo seu
corpo enigmático, indiferente às próprias imperfeições com um poder tal que me fazia
crer que ela não as tinha. A sedução sempre esteve nas atitudes. Não nos corpos. Não
nos gestos. Não nos movimentos que os corpos fazemquando se amam ou se fodem.
Era a porra da atitude daquela mulher, que exalava a certeza de que poderia me
prostrar de joelhos, bem abaixo dos seus saltos, e me fazer rezar não a uma divindade,
mas a ela.
Sentou-se na cama e cruzou as pernas.
– Onde você me quer?
– Ao redor do meu pau. Rebolando, de preferência. Mas essa parte é opcional.
– Isso envolveria toque – recriminou,balançando o indicador.
– Coisa pouca. – Dei de ombros. – Eucoloco as mãos para trás.
Ela riu alto.
– Sven!
Aproximei meu rosto do dela. Respirei fundo. Sentindo seu hálito, fiz com que ela
sentisse o meu. Ela se calou. Nada de risadas, nada de sorrisos.
Ela me sentia.
Os dedos enfiados nos lençóis.Ela me sentia.
Fechou os olhos, entreabriu os lábios e deixou nossas respirações se misturarem.
Eu a sentia.
O calor do hálito maculava minha pele embora seus lábios nunca me tocassem,
prolongando eternamente a sensação insuportável que antecedia o beijo. Os instantes
eram ainda mais desesperadores, pois vinham recheados a convicção que o beijo não
aconteceria.
Levantei as mãos ao redor do seu rosto, mantendo as palmas próximas às suas
bochechas, mas sem tocá-las. Apenas circundando os fios de seus cabelos, impedido
pela áurea invisível eimpenetrável que nos separava.
Segurei os lençóis bem perto de onde estavam suas mãos, milímetros separavam
nossos dedos. Uma distância imensa. Me inclinei sobre ela, Lexa não cedeu. Os seios
firmes oscilando em suarespiração compassada.
Meus dedos flutuaram leves entre nós, delicados. Sem tocá-la, movi a mão em
direção ao seu pescoço. Devagar. Guiando.
Ela compreendeu sem que qualquer palavra fosse necessária e permitiu que minha
ameaça de toque a conduzisse. Afastando-se de meus dedos, seguindo adireção que eu
sugeria. Com ela deitadana cama, movi os dedos no ar, ao longo dos seus joelhos e ela
os afastou. Lenta no abrir-se, aguardando minha atenção. Expondo o rosa entre suas
pernas creme. Ela se movia, obedecendo a cada um de meus não toques como uma
coreografia ensaiada, transformando cada uma deminhas intenções em movimento.
Aberta para mim.Na cama.
Minha.
Me fazendo tremer e transpirar.
- Você me deixa guloso. – gemi, perdendo o controle. – Não é natural. – Ajoelhei na
cama. – Faz isso comigo. Me causa uma gula. – Me curvei sobre seu corpo,
desenhando seus arredores com meus lábios, fazendo-a sentir meu hálito, mas nunca
meus lábios. – E gula faz a gente querer lamber – sussurrei. – Querer morder – gemi,
alcançando seus mamilos eretos. – Querer comer.
– Sem falar – devolveu meus gemidos. Seus olhos estavam fechados.
– Você devia ser proibido de falar. – Tinha o lábio inferior preso entre os dentes. –
Sua voz tem uma coisa eróticaque não dá pra definir. Não há palavras no dicionário.
– Me explique com gemidos, então. Desci o rosto por seu abdome, encontrando o
ponto correto entre suas coxas e soprei. Muito, muito devagar. Senti o ar sair de
mim cheio de desejo e atingi-la, causando o exato efeito que eubuscava.
– Se você falar, vai ser fácil me fazer gozar – considerou. – Silêncio, Delvak.
– Maldita seja, mulher – recriminei, com uma careta. – Não posso nem falar?
– Achei que você gostava de desafios
– riu, agarrando os travesseiros, e eunão consegui resistir.
Com o nariz entre ela, respirei fundo. Tragando-a. Sentindo-a me possuir do único
jeito que me era permitido. Estirei a língua sem tocá-la, mas deixei uma única gota de
saliva escapar. Ela se curvou, tentando me observar, um meio sorriso que me deixava
mais duro que sua nudez.
O movimento em seu ventre foi fácil de identificar. Ela estava se contraindo por
dentro. Pompoarismo. Esticando e contraindo os músculos circunvaginais para tentar
aliviar o tesão que invadia sua pele.
Eu podia trabalhar com isso.
Apoiei meus braços no colchão, abraçando suas coxas, fazendo o impossível para
não tocá-la. A boca encaixada sobre sua bocetinha, quase depilada e os poucos pelos
querevestiam sua entrada.
Entreabri os lábios apenas o suficiente para abocanhar o seu grelinho, fosse essa
minha intenção, e deixei o ar sair de minha garganta. Quente e estimulante, cobrindo
seu ponto mais excitado com meu hálito febril. Lexa estremeceu, seu gemido foi se
intensificando.
Um sorriso impossível de conter.
Ela se contraiu e eu soprei. O ar quente acariciava sua intimidade, estimulando os
movimentos intensos quefuncionavam quase como umamasturbação.
Substituí o ar quente por um sopro frio e delicado, e Lexa agarrou os próprios seios,
gemendo mais alto.
Subi em direção à sua barriga, usandominha respiração para excitar ainda mais seus
mamilos hipersensíveis e a ouvi implorar. Uma interminável sequência de por
favores.
Por favor.Por favor.
Eu não sabia pelo que ela implorava.Para que eu a tocasse?
Para que eu a fodesse?Não importava.
Eu não tinha tempo para perguntar e duvidava que ela se desse o trabalho de
responder.
Foi meu hálito que cobriu seu corpo, estimulando o que mãos e beijos não
poderiam estimular. Meu hálito nos seus seios, na sua boca, na sua barriga, nos seus
braços, descendo pelo seu umbigo. De volta em sua bocetinha encharcada, pingando
entre os lençóis, aberta apenaso suficiente para que eu soubesse onde respirar.
Quis enfiar os dedos nela, ao menos para abri-la. Terminei por buscar meu pau e
acariciá-lo, apenas para manter minhas mãos ocupadas, se por nada mais.
Mas o que minhas mãos encontraram foi um cacete firme e duro como jamais antes.
Eu sentia cada uma das veias esticadas, pulsando, coléricas. Me amando por ter criado
a oportunidade. Me odiando pelos termos do acordo estabelecido.
Era Lexa.
Com Lexa, tudo sempre era mais intenso.
Fosse o toque ou sua ausência.
Eu não ia precisar de muito tempo.
Alternei a temperatura do único contato que me era permitido e seu gemido evoluiu
em um grito.
Acho que continuei respirando sobre ela.
Acho que consegui me impedir detocá-la.
Mas eu só acho.
Ela rebolou sob meus lábios, me fazendo querer lambê-la.
Me fazendo imaginar como seria lambê-la.
Me fazendo lembrar de como era lambê-la.
Eu explodi em minhas mãos. Espalhando esporro pelos lençóis e por suas pernas.
Em algum momento eu desisti, e meus lábios atingiram sua virilha. Acima do clitóris.
Sobre seus pelos. Apoiando meu queixo sobre seu osso púbico.
Ela terminou de gozar, antes de me lembrar que eu não deveria tocá-la e me fazer
levantar.
Eu amava sexo mais que qualquer coisa. E ir embora depois do orgasmo sempre fez
parte do meu sexo.
Mas não quando era sexo com ela, quando era orgasmo com ela.
Nesses casos, ir embora sempre era uma parte desagradável.
Principalmente em uma noite como aquela, que me dava a certeza que eu estava
indo embora depois de ficar com Lexa pela última vez.
Nove
Sven entrou na boate fazendo barulho e eu ainda estava com um pouco da dor de
cabeça da noite anterior.
– Onde está? – perguntou a Ryker.
– Zahner? Ele já foi. Assim que os jornais saíram com a denúncia. Acha que vai
funcionar?
– Vamos esperar que sim. Foi trabalho demais para que não dê certo.
– E o telefone? – Ryker quis saber.
A boate estava muito cheia e sempre tinha gente demais falando ao mesmo tempo.
Peguei um copo de água no bar e tomei uma aspirina.
– Se for ressaca, dançarina – Sven sugeriu –, é melhor beber mais um pouco de
álcool. Prefiro você bêbadaque incapacitada.
Eu queria lhe oferecer uma careta, entretanto, assim que levantei o rosto me
surpreendi por não encontrar Lexa atrás dele. Pelo barulho na entrada, ela também
tinha chegado e estava conversado com Brout. Mas a mulher atrás de Sven era
morena, com grandes olhos amendoados e uma boca desenhada que parecia estar
sempre na iminência de um sorriso.
A curiosidade nos meus olhos ointerrompeu.
– Ah, pessoal está é… – Virou-separa ela. – Qual nome está usando hoje?
– Lola está bem. – Sorriu.
– Lola! Todo mundo, esta é Lola. Lola, todo mundo. – Gesticulou. – Ela é uma
amiga do Hideki.
Lola. Eu lembrava desse nome.
– Seu amigo japonês de origens suspeitas? – Ryker provocou, cumprimentando
Lola com um aceno.
– Eu vivo de sexo, todos os meus amigos têm origens suspeitas.
Lola ergueu uma sobrancelha para o seu comentário e eu lembrei que Delvak
mencionou algo sobre os dois já terem se envolvido. Era sobre a morena que ele
estava falando, não era?
– É seguro trazer mais alguém para a equipe? – Joanie murmurou. – E se ela tiver
contato com o Kulik?
– Não tem – Sven decidiu. – Lola vai nos ajudar com a parte que não podemos
completar sozinhos.
– E que parte é essa? – alguém perguntou. Mas eu não estava prestando atenção,
minha cabeça latejava, incomodada.
– Zahner vai balançar seu distintivo da Interpol para a vigilância sanitária e, com
sorte, eles não vão verificar que ele foi suspenso. Se o blefe der certo, os
restaurantes de Kulik vão ser fechados em poucas horas. Mas isso é só uma das suas
fontes de renda. As outras três estão aqui. – Balançou o celular no ar. –Investimentos
pesados por meio de uma multinacional, lavagem de dinheiro através de uma agência
de turismo e um cofre bem grande e gordo entupido de notas e moedas de uns oito
países diferentes.
E assim, de repente, minha dor decabeça tinha piorado.
O plano era deixar Kulik pobre para torná-lo irrelevante. Mas como diabos a gente
ia fazê-lo perder todo aquele dinheiro?
– Quer dizer que estamos fodidos? – Ryker expressou meus pensamentos com
palavras mais objetivas.
– Zahner acabou de ligar. – Lexa se aproximou. – Deu certo. Ele já está a caminho.
– Não era melhor ele acompanhar o fechamento das unidades? Mande o
preguiçoso trabalhar! – Delvak reclamou.
– Fui eu quem pediu para ele voltar, Svenie. A polícia pode fazer isso sozinha. Ele
ficar passeando pela cidade no meio das forças policiais só aumenta o risco de alguém
reconhecê-lo.
Ele inchou como se quisesse esbravejar que ela estava errada, mas, em vez disso
apenas engoliu a própria angústia, me deixando muito confusa.
Eu brigava com Ryker daquele jeito quando a gente não transava. Desse jeito
impetuoso como se estivesse constantemente tentando se livrar da tensão sexual. Mas
Sven e Lexa não pareciam pertencer ao tipo de ser humano que guardaria qualquer
gota de tensão sexual mal resolvida.
Mas… o que eu entendia desse assunto? Ainda mais com essa dor de cabeça me
incomodando.
– Você está bem? – Ryker alisou meuscabelos, beijando minha bochecha.
– Pouco sono, pouca comida e acho que bebi um pouco antes de dar em cima do
contador ontem.
O sorriso que ele deu só para mim mefez melhorar muito mais que a aspirina.
– Vamos só sobreviver a mais isso e já cuido de você, combinado?
Eu acenei a cabeça, afirmando, embora tivesse certeza que o sorriso que devolvi já
deveria ter respondido pormim.
Delvak não tinha parado de falar e estava explicando os detalhes do seu plano.
Parece que ele e Hideki poderiam cuidar de uma parte, e Lola cuidaria do cofre. Nós
teríamos que resolver a parte da agência de turismo e Delvak tinha arquitetado um
plano muito elaborado ao longo de um intervalo de tempo muito pequeno. Não era de
se admirar que ele era CEO de uma multinacional.
O homem conseguia resolver problemas como um realizador de milagres e delegava
tarefas como um verdadeiro líder.
Ela já estava bem avançado em sua explicação quando ouvi a porta dos fundos se
abrir. Zahner acenou brevemente para mim e para Ryker quando entrou na boate e
então tudo aconteceu rápido demais.
Seus olhos passearam pelo salão e sua mão treinada estava no coldre,
desembainhando a arma. Seu olhar se cruzou com o de Lola e ela mergulhou para trás
do palco no momento preciso para escapar do tiro que Zahner disparou em sua
direção.
O barulho alto no ambiente fechado fez meu corpo inteiro vibrar. Minha cabeça
latejou como se fosse explodir e fiquei completamente sem reação. Ryker tomou minha
frente por instinto e eu meagarrei à sua camisa.
Delvak gritou em fúria, mas Zahner parecia possuído por um demônio quando
atirou de novo, buscando umângulo mais favorável.
Era diferente agora. Desde o começo, Zahner podia ter sido irritante e mandão, mas
fora sempre frio e lógico.
Agora ele tinha enlouquecido. Puxou o gatilho uma terceira vez e eu soube que ele
estava atirando para matar. Ninguém ousou se aproximar dele durante o frenesi de
insanidade, a não ser, curiosamente, a própria Lola que, com um movimento rápido
digno de ilusão de ótica fez parecer que tinha corrido para um lado do palco, mas se
arrastou pelo chão até o outro. Correu como um animal para cima de Zahner,
derrubando-o no chão com um chute firme e uma chave de braço. O cotovelo de Gary
atingia um ângulo não natural, enquanto Lola o forçava a se manterajoelhado. Tomou
a arma do agente queurrava em fúria.
Luckas pediu a Brout que olhasse os arredores para ver se os tiros não teriam
atraído atenção, mas Bessie estava lembrando que o lugar todo tinha isolamento
acústico por causa do som do DJ. Lucky pediu que ainda assim ela se certificasse,
enquanto Lola fazia o que só poderia ser descrito como desmontar toda a arma de
Gary com uma única mão, até não restarem mais que balas e pedaços de metal
espalhados pelo chão.
– Se acalmou? – Lola provocou.
– Assassina! – berrou e ela lhe deu um murro no nariz fazendo sangue escorrer. Eu
parei de respirar.
– E agora? – perguntou mais uma vez.
– Zahner, ela está com a gente! – Delvak se abaixou, imaginando que olhar nos
olhos de Gareth fosse uma atitude capaz de acalmá-lo. Não tenho certeza se
funcionou. – Ela vai roubar o cofre do Kulik para a gente. O plano não funciona sem
isso.
– Ela está no topo da lista de pessoas mais procuradas da Interpol. Você sabia disso?
– Gary falava depressa, movendo o braço, tentando fugir da imobilização à qual Lola
o tinha submetido.
– Não está, Gary – Delvak falou.
– Não está porque ela é problema demais! – Sua fúria lhe estremecia todo o corpo
como se ele tivesse perdido o controle dos músculos. – Alta espionagem
governamental! A lista na qual o nome dela consta não pode sequer ser aberta ao
público!
Lola sorriu como se ele lhe tivesse feito um elogio.
– Isso não nos importa. – Delvak virou-se para Brout, recebendo a confirmação de
que estava tudo certo. – Só nos importa que ela rouba coisas muito bem.
– E sabe o que ela cobra? Sabe como ela cobra?
– Já temos um acordo, Gary, não precisa se preocupar.
– E posso saber qual é? – urrou.
– Promete se comportar se Lola tesoltar?
Zahner trincou os dentes, forçando umgrito rouco para dentro do corpo.
Eu estava agarrada à camisa de Rykere sequer tinha percebido.
– Isso foi um sim? – Delvak esperou enquanto Zahner se manteve em silêncio.Depois
acenou para Lola indicando que o soltasse.
– Eu quero ouvir ele dizer “sim” – eladisse.
– Vá se foder! – rosnou.
– Gary, você não está colaborando! – Delvak estava perdendo a paciência.
Estávamos todos perdendo a paciência. Menos Lola. Lola parecia poder continuar ali
por dias.
– Sim, está bem? Merda! Eu espero vocês explicarem antes de matá-la.
Lola o soltou e não deu sequer um único passo para trás. Ele se levantou, forçando
o tórax contra o corpo esguio da morena. Tinha os lábios apertados emuma única linha
branca, e isso parecia ser a única coisa que o impedia de mordê-la. Até rasgar sua
carne ou até ficar duro. Eu não saberia dizer qual dos dois. Havia fogo nos olhos dele.
Umfogo que ódio puro não consegue se sustentar sozinho.
– Lola trabalhou para Hideki. Também já me conhece de… outros lugares –
explicou.
– Eu não confio em você, nem no seu amigo japonês, Delvak. Se essas são as duas
credenciais dela, a coisa não está boa.
– Cale-se, Zahner! Precisamos de Lola e vocês vão se comportar.
– Eu sempre me comporto. – Ela sorriu, ainda a milímetros dele. Não era apenas
que ela parecesse não ter medo da morte. Era como se ela tivesse certeza que a morte
tinha medo dela.
– Lola, por favor. – Sven soltou os ombros como um adulto implorando a duas
crianças que, por favor, parassem de brigar por bobagens. – Precisamos dela e
precisamos de você – continuou.
– Então, comportem-se como adultos e, quando tudo isso acabar, vocês retomam seja
lá qual for o problema que tinham antes.
– Quando isso acabar, vou te levar presa de volta pra Interpol – decidiu.
– Ah, achei que eles tinham te demitido. – Uma piscadela e Zahner estava
perdendo a razão de novo.
– Ora, mas que inferno! – Delvak se enfiou no meio dos dois. – Vocês não precisam
trabalhar um do lado do outro, mas vão precisar trabalhar juntos! – exclamou com
veemência e voltou-se para o inspetor. – Zahner, você quer seuemprego e credibilidade
de volta?
Entendi que Sven imaginasse que aquela era uma boa pergunta para incentivá-lo.
Mas nos olhos de Gary, a gente podia ver que ele não tinha certeza se preferia limpar o
próprio nome ou se lambuzar no sangue de Lola.
– E Lola, você não quer o dinheiro docofre?
– Foi isso que você prometeu pra ela?
– Zahner avançou para Delvak. – Esse dinheiro precisa ser retido como evidência.
Lola riu como se tivesse escutadouma piada particularmente engraçada.
– Está rindo da justiça. – Abanou asmãos. – Claro.
– Você chama de justiça, eu chamo deenganação de ignorantes.
– Você cala a boca, sua criminosa.
– Aposto que você está doido para vir calar. – Havia sensualidade no seu tom e isso
pareceu irritar Gary mais do que qualquer ameaça.
– Zahner… – Agora era Lexa quem seenvolvia. – Seja razoável.
– ELA TENTOU ME MATAR!
Lola revirou os olhos como se estivesse sem paciência para esse argumento
específico.
– E roubou uma coisa muito importante – acrescentou, com a boca cheia de
angústia como se nenhum dos presentes fosse capaz de compreender.
– É um transmissor de sinal tão potente que pode influenciar em determinadas
características climáticase até causar algumas catástrofes – ela explicou rapidamente.
– ISSO É INFORMAÇÃO CONFIDENCIAL!
– Ele queria, mas eu peguei e agora ele não consegue lidar com a frustração.
– CALA A BOCA!
Sven se sentou, esfregando as têmporas em uma evidente desistência.
– Fique calminho, Gar. – Lola expirou. – Sei que você só late e não morde, mas
não precisa se humilhar na frente dos seus amigos.
– Criminosa! Você traiu minha equipeinteira e nos deixou lá para morrer!
– Nunca traí ninguém. Eu nunca estivecom vocês, o que é bem diferente.
– Fui condenado a trabalho burocrático pelo resto da minha vida depois da sua
brincadeira!
– Bem feito. – Acenou. – Não é muito bom em seu trabalho, Gar. Se fosse, teria
notado a maníaca infiltrada na sua equipe usando um nome falso. – Piscou um olho.
– Vou te enfiar na cadeia e vou pegara Harpa de volta.
– Se pequenas mentiras assim te ajudam a dormir melhor à noite, eu não ligo.
– Sua mau-caráter do inferno. Nosdeixou lá para morrer.
– Eu deixei um revólver com você! – exclamou, indignada. – Se tivesse te deixado
para morrer, estaria morto agora.
– Vou te enfiar na cadeia. Vai apodrecer onde você merece.
– Ai, docinho. – Revirou os olhos. – A gente jogou e eu ganhei. Se quiser jogar de
novo, a gente joga. Mas precisa superar.
– Não vou trabalhar com você. Apanhe os pedaços da minha arma do chão, sua
vagabunda, e me devolva ela inteira. E depois volte pro buraco de lodo de onde você
saiu. Não preciso de você para…
Observei Lola revirar os olhos uma última vez antes de puxar Gary pela gola da
camisa. Passou a língua longamente pela boca dele, fazendo-o calar a boca. Zahner
engoliu em seco, a expressão perdida entre indignação e vontade de lambê-la de volta.
– Yuri Kulik – ela disse com sua voz suave e definitiva. – Você me odeia e pode me
pegar agora ou não. E se nós conhecemos seu histórico, docinho, não vai me pegar –
lembrou. – Mas pode pegar Kulik. Pode pegar Kulik essa semana. Depois, a gente
zera tudo e você vem atrás de mim de novo. – Levantou um ombro. – Peixe grande
como a máfia russa e quem sabe? Pode ser até que te tirem da burocracia e te
coloquem de volta em campo.
– Não vai me convencer – resmungou,com os dentes semicerrados.
– Não seja ridículo, Gar – ela sorriu.
– Já convenci.
Sven passou boa parte do dia falando apressadamente ao telefone com um milhão
de pessoas diferentes. Zahner parecia ter sido submetido a um feitiço perverso que o
esculpira em pedra, e elepermaneceu sentado em uma cadeira, com o corpo rígido e os
lábios travados. O olhar vidrado no horizonte ou em qualquer coisa que não fosse
Lola.
A atitude parecia exigir toda sua forçae ninguém o perturbou por isso.
Ninguém a não ser, é claro, a própria Lola.
Ela posicionou uma cadeira exatamente ao lado da dele, puxou assuntos que
mesmo à distância era certo que o incomodavam e, em um momento repleto de
adrenalina, arriscou-se a acariciar seus cabelos. O que foi respondido com um tapa
forte de um Zahner que se virou na direção dela, perdendo o controle e precisando ser
apartado por quase todos os presentes.
O resto de nós se sentou a uma distância segura e só não fez pipoca porque não
havia milho.
Era interessante como Zahner sempre tinha aparentado ser uma figura forte,
experiente e racional e ali, ao lado de sua velha conhecida, parecia um adolescente
perdido que puxa as trançasda coleguinha para não precisar pegar na sua mão.
Avaliando a conduta dos dois, acabei por perceber que nunca tinha atentado
verdadeiramente para a idade de Zahner. Ele era o agente da Interpol que andava
armado e sabia lutar alguma coisa. E, principalmente perto de nós, grupo de pessoas
insanas que aposta a virgindadedos outros, ele era um adulto.
Mas a verdade é que não deveria ter mais de 30 anos. Mesmo com as rugas de
preocupação, sua expressão não passava dos 27, talvez 28. Seus olhos azuis eram
escuros como se alguém tivesse jogado um bocado de escuridão na sua íris, os traços
firmes, o corpo largo esculpido em músculos excepcionalmente bem treinados, os
cabelos que subiam como um topete mal-educado apenas para cair logo em seguida
sob o peso dos fios lisos. Ele era bem bonito quando não estava carrancudo. E era
sempre charmoso, envolto em seu ar de perigo. Não que seu charme em algum
momento houvesse me atingido, mas eu não ignorava sua existência.
– Está se divertindo? – Ryker me empurrou com o ombro para indicar a dupla
composta pelo policialconcentrado e pela criminosa irritante.
– Ah, mas é claro! É relaxante assistir a uma situação de tensão sexual que não me
envolve. É bem raro poder aproveitar uma dessas.
Ele se afastou um pouco e parecia orgulhoso.
– Olhe para você! Identificando uma situação de tensão sexual!
Balancei a cabeça.
– Não é mérito algum, Ryk. Esses dois estão praticamente berrando um “me fode”
na cara do outro.
– Será que a gente estava assim também? – divertiu-se. – No começo? Quando você
queria morrer virgem antesde deixar eu te pegar? Será que todomundo que olhava para
a gente achava que a gente estava gritando um “me fode” para o outro?
– Eu estava – admiti com simplicidade e ele entalou com a própria gargalhada.
– Não vou nem tentar mentir. Mas não sei se alguémpercebeu.
– Todo mundo percebeu. – Lucy suspirou e percebi que nossa conversa era
pública.
– Todo mundo – Joanie concordou.
– Algum de vocês percebeu e contou para os outros – reclamei. – É isso que deve
ter acontecido, seu bando de fofoqueiros.
O clube inteiro me encarou com descrença.
– Sério? – pedi.
– “Eu não quero perder minha virgindade com o Ryker”. – Tim começou a fazer
uma interpretação aguda de minha voz que me assustou pela precisão. – “Tenho medo
que ele destrua meu coração” – terminou seu monólogo com a mais épica revirada de
olhos.
– Fala sério, bebê – Lucy riu. – Nem você acreditava nessa sua ladainha.
– Eu? E por que ninguém fala do Ryker? – Apontei. – Ele disse que eu ia me
apaixonar antes dele e mimimi e que queria ficar longe por causa disso.
– Vocês lembram que ela quase perdeu a virgindade com o Devon? – Joanie
apontou e estavam todos rindo, indicando que minha tentativa de reverter o jogo tinha
falhado severamente.
– Ei! Qual o problema? – Devon abriu os braços em sinal de indignação.
– E o Allender! – Skye lembrou. – Poxa, Mina, bem que você podia ficar virgem de
novo, hein? Foi tão divertido!
– Só está dizendo isso porque ganhouo dinheiro. – Lucy fez uma careta.
– Skye! – Esfreguei as têmporas. – Oque ainda está fazendo aqui?
– Não é culpa minha se vocês não sabem fazer apostas inteligentes – ignorou.
– A gente pode parar de conversarsobre minha virgindade? – pedi alto.
– Spider me contou que ela apostou em você pra tirar a virgindade dela, Lucy. –
Mal Nila fechou a boca e todos estavam repetindo em quem tinham apostado e eu
percebi que meu pedido tinha sido completamente ignorado. De novo.
– Obrigada. – Sorri, sarcástica, para ninguém.
– Ei! – Joanie bateu palmas. – A gente podia apostar alguma outra virgindade da
Mina, que tal? – Seus olhos brilharam e a animação se espalhou pelosalão.
– Não! – reclamei. – Não, não podem! Vocês são pessoas horríveis! Ryker,
manda eles pararem!
Ryker tinha os lábios espremidos emdúvida.
– Se dessa vez me falarem antes,quero participar da aposta – resolveu.
– STROME! – rosnei.
– Amor, a gente combina e ganha o dinheiro! – sussurrou, indiscreto.
– Anal? – o resto da boate ainda discutia.
– Será que ela já não experimentou isso?
Silêncio absoluto se fez ouvir quando todos pararam para me observar enquanto
consideravam. Eu engoli em seco e eles se desfizeram em uma risadade escárnio.
– Não.
– É. De jeito nenhum.
– A gente pode apostar o “quando”. Ou vocês querem apostar o “com quem”?
– Ei! – Ryker reclamou.
– Ah! Agora você reclama? – Desferium tapa no joelho dele.
– Mas o Ryker não pode participar, não é justo – Tim lembrou.
– Até parece que é ele quem vai decidir isso… – Devon ironizou.
– Eu odeio todos vocês – constatei. Eles estavam rindo e Ryker me abraçou,
beijando minha bochecha.
– Estou tentando resolver o problemada agência de turismo – Sven anunciou.
– Ainda não consegui falar com Oliver… É o cara que trabalha comigo. Vamos
precisar dele para essa parte do plano.
– Essa é a parte na qual a gente entra,não é?
– Exatamente. Agora só falta elaboraro jeito certo para convencer o investidordele a
fazer o dinheiro desaparecer. Depois, Lola rouba o cofre e o nosso problema acaba.
– Pode considerar a parte do cofrefeita. – Lola sorriu.
– Vamos considerá-la feita quandoestiver feita – Zahner rosnou.
– E como vamos fazer isso? Vai dar em cima do investidor também, Delvak?
– Ryker coçou a cabeça.
– Não vai ser tão difícil. Mas também não vai ser tão fácil. Primeiro, preciso de um
motivo para falar com o Allendere só depois…
– Allender? – Imaginei que tinha falado sozinha, mas o som saiu tão alto que
percebi que, ao meu redor, quase todos os meus amigos tinham ecoado a minha
surpresa.
– É. Cashel Allender – Delvak explicou. – A Allender Global é a investidora que
faz as aplicações financeiras do Kulik depois que o dinheiro é lavado na agência.
– Será que ele sabe disso? O senhor Allender? – Luckas levantou-se. – Se ele
soubesse que era ilegal, ele…
– Ele não liga. – Lexa levantou um ombro. – Allender sabe muito bem o que está
fazendo. A linha da ética dele é bemnebulosa.
– E por “nebulosa”, ela quer dizer“inexistente” – Sven concluiu.
– É, e… – Comecei a falar antes mesmo de decidir como ia terminar. – Ele
coleciona… – Engoli em seco. – Sexo. E mulheres… Sei que parece loucura e não
culpo vocês se nãoacreditarem, mas ele…
– Confie em mim, eu acredito – Delvak murmurou, sombrio.
– Vocês o conhecem? – Soube que o tema ainda era sensível para Ryker pelo modo
arredio como deu um passo na direção de Sven. Como se apenas o nome do homem
pudesse lhe colocar emmodo de alerta.
– Sim, e eu sei como eu o conheço. – Delvak estreitou os olhos, confuso. – Mas
como vocês o conhecem?
– Uma longa história… – Ryker expirou. – A versão mais curta é que ele queria
transar com a Mina. – Torceu o nariz. – E comprar o clube do Lucky.
O queixo de Sven caiu em um sorriso.
– Conte-me mais.
– Não, Delvak! – Ryker gesticulou de forma definitiva. – Não vou deixar Mina perto
dele, arranje outro plano.
– Não, não. – Balançou a cabeça, sem perder o sorriso. – Nada disso, garoto. É
sobre a parte do comprar o clube que eu quero saber.
– Ele estava interessado em comprar o estabelecimento – Luckas explicou. – Acho
que tem outros negócios por aqui.Eu fiquei bem sem opções, mas ainda estou tentando
resistir.
Delvak tinha um sorriso majestosamente atravessado pelo rosto e, pela expressão
no rosto de Lexa, ela deveria entender exatamente qual o plano traçado por ele.
– Onde acha que ele está? Em casa? –perguntou, à meia voz, para Lexa.
– A convenção em Düsseldorf é essa semana. Ele deve estar lá.
Sven ficou em silêncio por um instante antes de bater palmas, com empolgação: –
Luckas, preciso que ligue para Allender. Preciso que o faça agora. Diga a ele que
recebeu uma oferta melhor que a dele e que vai fechar a venda. Diga que vai fazer
isso essa noite. E… – Ele passou a língua pelo sorriso como se ele mesmo soubesse o
quanto é delicioso. – Essa parte é a mais importante – avisou. – Não deixe de
mencionar que o comprador interessadosou eu.
– E ele vai vir só porque ouviu seu nome? – Ao contrário de Delvak, Ryker não
parecia confiante.
– Vai – concluiu. – Ele vai vir correndo.
– Funcionou?
Zahner tinha os braços eternamente cruzados, uma algema biológica que o impedia
de avançar em Lola.
Delvak fitou Lexa, buscando confirmação.
– Funcionou.
– Tem certeza?
– Tenho. Ele estava doido para saber quem era o Hideki, tenho certeza que anotou
a placa.
– Pedi para o motorista estancar o carro. Qualquer coisa para lhe dar mais alguns
segundos para decorar.
– Longe de mim ser pessimista. – Eu conhecia o nível de nervosismo de Ryker pelo
modo como ele apertava minha mão. Era suave e carinhoso quando queria me
acalmar. Porém, quando ele imprensava meus dedos como se quisesse quebrá-los, é
porque estava em pânico. – Vocês irritaram o cara, mas o que garante que ele vai
partir em uma Cruzada de vingança?
Delvak era o oposto de Ryker e exalava uma tranquilidade budista, deixando claro
que ele acreditava que aquela seria a parte mais fácil de todo o plano.
– Cashel Allender é um adolescente.
– Tirou o paletó caro que tinha vestido exclusivamente para sua exibição diante do
velho amigo. – Ele só pensa em duas coisas: na próxima conquista e em como vai se
gabar dela. É um garoto mimado que considera a vida toda como se fosse apenas um
jogo. Para ser sincero, às vezes eu até gosto dele. – Alongou o corpo na cadeira,
esticando a coluna e esfregando os joelhos.
– Gosta dele? – Ryker parecia ter perdido um pouco da admiração que tinha por
Sven.
– Quando ele não está chamando sua irmã de… – rosnou, torcendo o nariz para
Lexa e engolindo a raiva. – Porque, quando ele menciona você... – manteve os olhos
nela – ...tenho vontade de abrir a barriga dele com uma navalha cega e enforcá-lo com
suas tripas. – Girou o gelo no copo de uísque sem elevar o tomde voz.
– Simpatizo com a ideia. – Ryker sentou-se ao seu lado, olhando para mim, e eu
soube que a admiração voltara.
– Mas no dia a dia, ele é só umacriança. Está sempre buscando se livrar do tédio, o
que faz dele uma companhia muito divertida. E sua coleção de sexo faz dele um bom
cliente.
– Então, vocês sabem dessa parte?
– Se sabem? – Lexa levantou uma sobrancelha em desaprovação. – Foram eles
que deram a ideia.
– Eles?
– Sven e Oliver – explicou, amarrando o longo cabelo loiro em um nó. – Deram a
sugestão a ele como uma brincadeira idiota que ele levou a sério demais.
– Porque ainda não passou da puberdade – Sven ironizou.
– Você também não – Lexa devolveu.
– E não sai por aí fazendo propostas indecentes para… – ela hesitou quando percebeu
a falha no próprio raciocínio.
– Nada não – desistiu. – Esquece.
– Será que a gente pode voltar ao problema principal? – Nila estalou os dedos,
trazendo-nos de volta à realidade.
– Cash acha que Lex tentou esconder Hideki dele. Acha que ela fez isso em meu
benefício. Ele quer ganhar de mim, então vai descobrir quem Hideki é, vai conversar
com ele e vai tentar um acordo melhor que o meu. Para nossa satisfação, Hideki está
sabendo de tudo e vai fazer exatamente o acordo que nós queremos que ele faça. Um
acordo bem lindo que vai foder os investimentos do Kulik.
– Ótimo. Então só falta a agência de viagens e o cofre.
– Já disse que o cofre não vai ser problema. – Lola se manifestou e Zahner tremeu
inteiro.
– Por que você não deixa para falar só quando alguém te perguntar alguma coisa?
– Porque, ao contrário de você,ninguém manda em mim. – Abriu uma barrinha de
cereais que trazia no bolso e a mastigou com alegria. Zahner não a encarava, o que
parecia diverti-la imensamente.
– Prender Yuri Kulik – Gary murmurou para si mesmo como um mantra. –
Prender Yuri Kulik Prender Yuri Kulik.
– A parte da agência vai ser complicada. Vamos precisar organizar uma festa
insana nessa boate e fazê-la atrair muito sucesso. Vamos precisar vender pacotes
adiantados queinteressem a agência.
– O Show da Tímida? – perguntei, infeliz.
– Obrigado por oferecer, querida. – Delvak segurou meu queixo com seu sorriso
hipnótico. – Mas creio quevocês dois transando no palco não vão ser suficientes para
o que eu planejo.
– Quem falou em transar no palco? – me sobressaltei.
– A gente pode fazer umas coisas diferentes, Sven. – Ryker levantou um ombro. –
Usar uns brinquedos.
– Que brinquedos? – Bati o pé.– Não,não! – Gesticulei.– Nada disso.
– Se acalme, querida. Não seria suficiente, garoto. Vamos precisar trazer uma festa
de gente grande para cá para atrair a atenção necessária.
– Vai ligar para o Oliver? – Lexa quissaber.
– Vou. Preciso coordenar com ele e solicitar que mande um monte de coisaspara cá
e bem rápido. Vai ser um gasto vultoso, mas não tem problema.
Lucy e Nila já estavam planejando a festa que a Willex ia fazer na boate do Luckas.
Por algum motivo, estavam imaginando que a festa seria delas e se divertindo muito
com isso. Ninguém teve coração frio o suficiente paradestruir seus sonhos e lembrá-las
queteriam que trabalhar durante o evento.
Ryker me abraçou e apoiou o queixo no meu ombro.
Estalei um beijo na sua bochecha, fazendo-o sorrir.
– Estou orgulhosa.
Ele apenas enrugou as sobrancelhas em sinal de dúvida.
– De nós! – expliquei. – Estamos encarando a morte de um jeito mais ativo. –
Fechei o punho em uma péssima imitação da força de Lola e ele riu mais alto. – Nada
de se esconder e esperar a sorte nos salvar. Estamos resolvendo.
– É! Acho que dessa vez vai dar certo, hein?
– Não! – exclamei. – Alguma coisa ainda vai dar errado. – Levantei o ombro e ele
não conseguia parar de rir.
– Certeza. Sempre dá.
– E aí, o que a gente vai fazer?
– A gente vai resolver.
– Ah, claro.
– A gente sempre resolve.
Outro beijo na sua bochecha, mas dessa vez ele se virou e prendeu minha boca na
dele. Lambeu meus lábios e mordeu minha pele.
– Se tudo der certo – murmurei com a testa apoiada contra a dele –, daqui a uma
semana, o único problema que tereiserá o desemprego.
– Com suas habilidades de dança sensual, acho que podemos te arranjar alguma
atividade.
– Ou, pelo menos, continuar o Show da Tímida!
– Mina, sinto muito, mas acho que sua timidez não dura muito mais tempo. –
Gargalhou. – Está quase extinta a pobrezinha.
Enfiei o cotovelo nas suas costelas enquanto ele se contorcia, puxando meu queixo
com a mão para mais um beijo.
Era difícil saber qual beijo me agradava mais. Acho que eu preferia aquele beijo
assim: descontraído, entre sorrisos do dia a dia. Um beijo roubado seguido de um
cotovelo enfiado nas costelas. Nossa própria dinâmica de relacionamento. Era nossa.
Funcionava. Ele falava algo para me deixar constrangida, eu o surpreendia com meus
novos conhecimentos, ele apanhava, eu ganhava um beijo.
Era nossa definição. E servia para nós dois.
Servia muito bem.
Mas não serviria para sempre.Pelo menos não daquele jeito.
– Uma hora a gente vai precisar conversar. – Apliquei um selinho rápido nos seus
lábios quando ele deixou o beijo terminar.
– Quer acabar comigo, Bault? – Riu. Mas eu me mantive séria. Ofereci-lhe apenas
um meio sorriso educado.
Não estou brincando, agora, amor.
Precisamos conversar de verdade.
Seu tórax se pressionou contra mim quando ele inspirou profundamente.
– Sobre depois?
– Sobre depois.
– Achei que íamos deixar para fazer isso depois do Kulik. – Raspou as pontas
dos dedos pela minha testa, me libertando do meu próprio cabelo.
– Tenho medo que as coisas aconteçam rápido demais. – Busquei seu corpo,
ansiando pelo apoio dos seus ombros. – Se for assim que vai acabar… não quero ter
que me despedir em poucos segundos, como da outra vez.
– Mina…
– Ryk, a gente não pode se esconder. Preciso ouvir suas verdades e você precisa
ouvir as minhas.
– Mina, tudo está se encaixando. Daqui a poucos dias vamos estar livres do Kulik.
Foi você mesma quem disse que era melhor conversar sem essa sentença de morte
pairando sobre nossascabeças.
– Não precisa ser uma sentença de morte, Ryk. Mas se qualquer coisa der errado…
– O quê? – arriscou, demonstrando confiança em nosso plano.
– A gente precisa que Allender fale com Hideki, que Lola tenha sucesso e que a
festa dê certo. São peças demais. Se a gente perder qualquer uma delas, tudo cai por
terra. Não espero que isso acabe com o Kulik matando nós dois, Ryk. Mas pode
acabar com fugas. De novo. E eu não quero te ouvir suspirar um adeus apressado no
meu ouvido porque a gente não tem tempo para mais nada. Não vou passar por aquilo
de novo.
– Tá bem, tá bem. – Segurou meu rosto entre as mãos. – Então a genteconversa.
Hoje? Depois que todo mundofor embora?
– Outros quinze minutos dehonestidade? – brinquei.
– Acho que vamos precisar de uma boa hora dessa vez. – Experimentamos um tipo
novo de beijo.
Misturado com receio.Eu não gostava desse. Preferia o outro.
Nossas mãos se conservavam entrelaçadas quando Delvak desligou o telefone. Senti
as más notícias em seu rosto antes mesmo que ele falasse.
– Precisamos ir embora. – Despido da arrogância. Desconfiança. Despido das
constantes palavras descaradas.
Delvak parecia uma casca de um homem pequeno e sem rumo. Lexa o segurou pelos
braços, buscando os seus olhos.
– Sven? – ofegou.
– Harrel piorou. – Engoliu em seco.
– O que houve? – Estava tão perdida me desesperando com o medo de Sven que
sequer tenho certeza sobre quem perguntou. Talvez tenha sido eu.
– É o meu chefe. – Um breve sorriso dançou na sua expressão triste, como uma
lembrança saudosa. – Ele não está bem. Esteve internado. – Sua boca estava ressecada
e ele não conseguia pronunciar mais que algumas palavras de cada vez. – Piorou
muito. – Encarou o chão. – Vocês estão bem aqui… vão ficar seguros. Hideki… –
Gesticulou, tentando ordenar o pensamento. – Hideki vai voltar mais tarde. Ele vai
ajudar.
– Seu amigo japonês… – Zahner insistiu. – Se você precisa ir… nós precisamos
saber com quem estamos lidando. – Apoiou o punho na mão, arranhando o próprio
queixo, considerando os fatos. – Ele é Yakuza, não é? – Sua mandíbula estava travada
de ódio. – Seu plano é se livrar da máfia russa entregando o poder para a máfia
japonesa.
– Touchè, detetive – Delvak confirmou, simplesmente.
– Idiota – suspirou. – Substituir uma máfia pela outra não resolve o problema.
– Resolve o problema do Ryker. – Delvak estava seco. Ríspido. Como se a
notícia sobre seu amigo tivesse destruído sua disposição para discutir qualquer outra
coisa. – E não sei sobre qual problema você está se referindo. Mas esse é o problema
que eu vim até aqui resolver.
O silêncio sacro se prolongou até Delvak olhar para Lex mais uma vez.
– Sven… – Ela alisou o braço do empresário e observou Ryker, dividida entre se
despedir de um velho amigo ou ficar para proteger o irmão.
– Está tudo bem, Lexie. – Ryker me abandonou para segurar a mão dela e lhe
oferecer um abraço rápido, mas firme. – A gente se vira sozinho a partir daqui. Vou te
visitar quando isso acabar. – Sorriu e ela acenou, grata.
– Talvez se a gente esperar até Hidekivoltar? – pediu a Delvak.
– A gente precisa ir agora, Lex – murmurou. Suave e dolorido – Oliver acha que
ele não sobrevive a esta noite.
– Onde está o Delvak?
– Ele precisou resolver problemas pessoais. – Zahner assumiu a liderança assim
que Hideki cruzou a porta.
Piscou seus olhos estreitos em desconfiança e escutei as palavras em minha mente.
Ele vai dizer que só lida com Delvak.
– Ele nos contou quem você é. – Zahner adiantou-se como se tivesse antecipado
o mesmo problema que eu. – Nos informou para quem trabalha e qual o plano
completo.
Atrás dele, um de seus seguranças se moveu preparando-se para lutar ou intimidar.
Era mais alto e mais forte que Brout. O cabelo liso cortado muito curto se arrepiava
como uma penugem malcomportada. Seu nariz era enfiado para dentro do rosto e
havia uma pequena cicatriz de queimadura descendo pelo pescoço largo, mantinha os
braços cruzados com as mãos enfiadas nas axilas, a pressão em seu casaco delineava a
arma que ele trazia próxima às costelas e eu notei que talvezsuas mãos não estivessem
próximas às axilas e sim ao coldre. O outro segurança era mais peculiar.
Esguio e baixo, sentou-se em uma das mesas, comendo balinhas coloridas retiradas
de dentro de um saco plástico vermelho com estampas infantis. Seus olhos atentos
deslizavam, alegres e curiosos, sobre todos nós, mas sempre se detiam sobre Lola com
maior nível de sobriedade. Era como se ele tivesse analisado tudo e percebido nela a
única possibilidade real de perigo. Ela lhe devolvia sorrisos e olhares, mas não parecia
nem um pouco preocupada.
Era irônico imaginar que o pior e mais arriscado problema da minha vida deveria
ser só uma terça-feira para Lola. E exatamente por isso era reconfortante tê-la por
perto. Talvez não para Gary, mas para o resto de nós.
– Ele também me contou quem você é
– Hideki continuou, objetivo. – Por que devo acreditar que alguém da Interpol
cooperaria comigo?
– Já suspeitava antes de receber a confirmação e trabalhei com você ainda assim,
não foi?
Hideki olhou para Lola, permanecendo em silêncio.
– Não se preocupe com ele – ela garantiu.
Zahner inspirou fundo como se preferisse que Hideki desconfiasse de sua lealdade
do que tê-la garantida por Lola.
– Senhor Zahner. – O japonês alinhou o blazer. – Preciso da absoluta certeza que
Kulik não terá como reagir quando eu anunciar o prêmio pela sua cabeça.
Engoli em seco.
Esse é o plano.
Nós tiramos o poder de Kulik e Hideki cuida do seu assassinato.
Mesmo que ninguém o matasse, sem dinheiro e com uma recompensa pela sua
morte, ele se tornaria obsoleto. E nada daquilo poderia ser rastreado até mim ou
Ryker. Ele imaginaria que fora tudo obra da máfia japonesa.
Um golpe.
Puro e simplesmente. Delvak merecia os parabéns.
– Se Kulik tiver meios para reagir, a minha tomada da região vai se transformar em
uma guerra de máfias. – Balançou a cabeça. Ele nunca elevava a voz. Sempre
controlado e paciente. – E uma guerra não seria inteligente. Só aceitei participar
porque Delvak me ofertou uma garantia: Kulik saberia que fora tudo um golpe da
Yakuza apenas quando já tivesse perdido tudo. Nem um segundo antes. E agora ele se
foi. Você pode me fornecer a mesma garantia?
Era como nos filmes. Hideki sustentava uma eloquência que fazia comque cada uma
de suas palavras tivessem um peso obscuro causador de arrepios. Não era uma simples
pergunta. Ele queria que Zahner lhe fizesse uma promessa. Uma que, se não fosse
cumprida, traria consequências. E, ao contrário de Kulik, Hideki sabia nossos nomes,
sobrenomes e endereço.
– Posso. Tivemos apenas um contratempo – lembrou.
– Qual?
– A agência de turismo onde Kulik lava dinheiro. Pretendíamos levá-la à falência,
mas esse plano dependia da ajuda de Delvak.
– Para quê?
– Ele ia fazer uma festa.
O segurança magro abriu um sorriso gostoso de balinhas coloridas, divertindo-se
com o plano absurdo. Hideki apenas acenou, incrédulo.
– Só Delvak para planejar derrubar uma máfia com uma festa. A agência não será
um problema – resolveu. – Não posso oferecer algo tão glamouroso quanto sua festa,
mas posso resolver de forma igualmente eficaz.
– Ótimo. – Zahner juntou as mãos. – Então temos um acordo.
– Não comuniquei todos os meus termos ainda, senhor Zahner. Para resolver o
problema da agência, precisarei gastar um bom dinheiro. Preciso pagar alguém para
executar oplano por mim. Não quero minhas digitais nesse problema.
– Porque, se eu não cumprir minha parte do plano, um Kulik ainda poderosovai ser
problema para sua família – Gary concluiu.
– E eu não levo problemas para minhafamília – concordou.
– Tudo bem. Acho que o gasto vai valer a pena, não? Depois de tirar Kulik de
circulação, você será hegemônico.
– Meu acordo com Delvak não incluía isso, senhor Zahner. Não vou pagar por uma
parte do acordo que não concordei. O mais honrado seria você e os seus pagarem pelo
prejuízo.
Gary inspirou profundamente.
O potencial de lucro para Hideki era incontável, mas ele era um negociante. E
qualquer bom negociante veria que ele contava com todo o tempo e espaço paraobter o
melhor acordo possível, enquanto o resto de nós tinha uma arma metafórica apontada
para as cabeças. Nós não tínhamos tempo. Não tínhamosvantagem.
– E de quanto estamos falando? Hideki enfiou as mãos nos bolsos,
olhando para ninguém em particular. Fingia pensar em uma cifra, mas eu tinha certeza
que ele já tinha calculado.
– Delvak me contou o plano. Deve teraproximadamente 2 milhões de euros no cofre
que vocês pretendem roubar. Por aproximadamente 2 milhões de euros, eu resolvo o
problema da agência.
– Você resolve o problema da agênciapor uns 50 mil – Lola reclamou.
– Depende de quem contrataríamos.
– Hideki-san. – Gesticulou. Aquelaera a primeira vez que eu a via irritada.
– Jogue um corpo lá dentro e faça uma denúncia anônima para a polícia. O lugar vai
ficar interditado por semanas e não importa quão incompetente a polícia seja, com
certeza, vai achar algo suspeito.
– Quero algo mais definitivo.
– O dinheiro daquele cofre já me foi prometido.
– Não por mim, senhorita Ox. Eu cumpro apenas as promessas que eu mesmo fiz.
Lola rodou sobre os próprios pés, mordendo o lábio. A sugestão era contrária ao
plano dela e, se ela nãotopasse o roubo, todos nós estaríamos fodidos.
– Eu não vou atrás de você. – Zahner estava esfregando as têmporas, aquela
sugestão exigiu toda sua força de vontade. – Assim que voltar para a Interpol, te dou
uma semana antes de incluir sua presença nos relatórios. Te dou uma semana de
vantagem. Isso pagaos seus serviços?
– Não preciso de vantagem.
– Tire uma semana de férias, Lola! – Berrou com os dentes semicerrados. – Não
seria bom passar uma semana sem medo da polícia te engolir?
– Medo? – ridicularizou. – Se me derseis meses, eu considero.
– Eu te digo em que prisão ele está – decidiu. – E te garanto que não será uma
armadilha.
Eu consegui enxergar as veias no seu pescoço quando ela segurou a respiração.
Estava nervosa. Em pânico.
Pela primeira vez.
– Foi uma armadilha das outras duas vezes que o encontrei, Gar. Não vou confiar
em você dessa vez.
O resto de nós se entreolhou e até o homem das balinhas prendia a respiração para
evitar perder alguma informação.
– Vou com você roubar esse cofre – determinou. – Assim que você me entregar o
dinheiro, eu te digo qual é a prisão. Você conseguiria chegar até ele antes de eu ser
reinstituído na Interpol.
Lola sequer piscava.
– Não vou ter tempo para organizar uma armadilha. Você me dá o dinheiro. Eu te
dou o nome de uma prisão. – Estendeu a mão. – Temos um acordo?
O lábio de Lola tremia quando ela otocou.
– Um acordo, Zahner.
Lola carregou os blocos maciços de notas do cofre para a bolsa escura antes de
guardar os instrumentos que usou para arrombar a segurança em outra bolsa preta.
Eu sabia exatamente o que ela pretendia fazer e me senti até um pouco ofendido
que ela tivesse me considerado estúpido a ponto de cair naquele truque. Ia ser o fim da
noite, ela ia trocar as duas bolsas quase idênticas e me entregar a que contivesse os
instrumentos e não o dinheiro.
– Isso foi fácil – decidi, quando ela fechou o zíper e se virou para trancar o cofre.
Havia apenas uma diferença entre as duas bolsas compridas, uma pequena tarja branca
com a marca da mochila em uma delas. A dos instrumentos. Essa era a que eu
precisaria evitar.
– Diz isso porque eu me livrei de dois deles. – Indicou os três homens caídos no
chão com o queixo. – E você teve quecuidar de um só.
– Está querendo me convencer de quefoi difícil pra você?
– Não. – Sorriu. – Estou querendo dizer que não seria fácil para você. Ainda
amarrei os três e arrombei o cofre enquanto tudo que você fez foi ficar aí parado
sendo rabugento.
– Não ia te deixar vir sozinha.
– Sua preocupação com minha segurança me sensibiliza.
– Não é com sua segurança que estou preocupado – rosnei. – O que vai fazer com
ele depois de tirá-lo da prisão?
– Quem disse que vou tirá-lo da prisão?
– Vai precisar, não? Para...
– Shh. – Levou os dedos à boca. – Ouviu isso? – Alinhou o ouvido em uma das
direções e eu me virei para verificar. Eu sabia exatamente o que ela estava fazendo e
aceitei participar dojogo.
– Vamos sair daqui logo. O contador vai voltar para casa a qualquer instante.
Troca feita.
Trocou as duas bolsas quando eu não estava olhando.
Boa garota.
Levei a mão às duas mochilas, mas fuiimpedido pelo toque de metal na minha testa.
Lola apontava sua arma para minha cabeça.
– O nome da prisão, Gar – solicitou. O barulho do lado de fora ficou mais alto,
chamando minha atenção. – É a polícia – explicou. – Denúncia anônima. Estão vindo
buscar o ex-agente da Interpol que desapareceu sequestrando duas testemunhas. Não
facilite a vida deles – sugeriu, maldita, e eu quis enforcá-la. – Me diga o nome da
prisãoe eu te deixo ir. Talvez até te deixe levar o dinheiro.
Encarei seus olhos escuros.
– 2 a 0 pra você, hein?
– Eu sou boa assim. – Não havia alegria em seu rosto. – A prisão, Zahner.
– Fizemos um acordo, Ox. O acordo não incluía polícia ou arma. Só dinheiro em
troca de um nome.
– A polícia e a arma são para garantirque você vai cumprir sua parte.
– E o que me garante que você vai cumprir a sua?
Estreitou os olhos, pensando por um minuto.
– AQUI EM CIMA! – gritou, antes de se voltar para mim. – Que escolha você tem?
Senti meu rosto inteiro se espremer em uma careta de fúria.
– Calabouços de Domokos – menti.
– Já procurei lá.
– Não procurou bem o suficiente – rosnei, colérico.
Passos do outro lado da porta fizeram-na hesitar. Um único segundo. Agarrei-a pela
cintura e arremessei-a contra os policiais. Busquei a bolsa sem a tarja branca em um
instinto cego e me joguei pela janela por onde tínhamos entrado, deixando Lola para
trás edesaparecendo na noite.
– Acha que eles vão se matar? –Sentei na borda do palco ao lado de Ryker, depois
que todos se foram.
– Acho mais provável eles abandonarem o plano para ficarem nus.
– Na casa de um estranho? – Torci o nariz.
– Qual o problema? Nunca transou nacasa de um estranho?
– Todas as vezes que transei foram com você, Ryker. – Revirei os olhos e ele abriu
um imenso sorriso de satisfação.
– Precisamos mudar isso. – Lambeu o sorriso. – Você não ter transado na casa de
um estranho – explicou, muito rápido.
– Não a parte de só ter transado comigo.
– Tem algum lugar em mente? – Ri, deixando ele me beijar. A melhor sensação do
mundo: eu sempre detestei a temática sexo em qualquer outro contexto. Menos com
Ryk. Com ele, sexo era um de meus assuntos favoritos.
– Na casa do Devon ia ser genial!
– Ainda não sei qual o problema entrevocês dois.
– Sabe de uma parte.
– Ficou com a mulher dele?
– Fiquei.
– Ryker! – reclamei, dando um tapa no seu ombro.
– Não é como você está pensando! Não foi uma traição. Pelo menos não da minha
parte.
– Não consigo imaginar qualquer cenário em que isso seja possível – recriminei. –
Tem que pedir desculpas.
– Não vou pedir desculpas.
– Ryker! – reclamei de novo e ele segurou meu rosto com as mãos.
– Você também fica vermelha quando fica irritada. – Raspou a língua no meu
queixo, começando a se desfazer ao meuredor. – Tão linda.
– Não me engana! – Seus dedos escalaram a região do meu joelho ao meu quadril,
desviando da rota para desbravar entre minhas pernas e eu estava amolecendo.
– Com quantas mulheres casadas você acha que o Devon já ficou? – defendeu- se. –
Faz parte da profissão. Uma cliente te contrata e você não pergunta estado civil. Você
só diz quanto cobra e ela dizse aceita ou não.
Engoli em seco, sentindo minha vagina ressecar.
Era aquela realidade tão óbvia que você nunca para e se questiona. O céu é azul, a
grama é verde. Você só aceita. Nunca para um momento no seu dia para olhar e dizer
“Nossa, é mesmo! Como agrama é verde!”.
Ryker era um garoto de programa. Eu sempre soube disso.
Desde o primeiro segundo em que nosconhecemos.
Então, eu me apaixonei e ele foi meue nunca parei para considerar.
Eu o amava, e o trabalho dele nuncame impediria de amá-lo.
Desde que fosse no passado. Mas... e se fosse no presente?
Há quanto tempo ele era garoto de programa? Com quantas mulheres dormiu?
Tinha clientes regulares? Será que alguma delas já se apaixonou por ele? Será que ele
se apaixonou por alguma delas? Algum marido, namorado, noivo… já descobriu?
Algum já o agrediu? Será que ele já tinha sido preso por causa de sua profissão? Será
que tinha algum país em que ele não podia mais entrar? Ele tinha vontade de trabalhar
com outra coisa? Ele sempre pareceu tão feliz sendo stripper… sendo garoto de
programa… será que estava em seus planos exercer outra atividade? E se não estivesse?
Ele passaria suas noites na rua conferindo prazer a mulheres casadas enquanto eu
esperava que ele voltasse para me dar prazer?
Eu ainda o amaria nessas condições?
– A mulher do Devon te contratou. – Não era uma pergunta.
– Devon a traiu – explicou. – O que é um feito bem grande se você considerar que a
porra do cara já era um garoto de programa. Ele trabalhava com isso e a mulher dele
sempre soube e aceitou.
Eu estava sentindo uma fraqueza nas pernas.
Era possível, então… Estava na realidade de Ryker que uma mulher aceitasse estar
com um garoto de programa. Ele esperava que eu aceitasse também? Seria só
preconceito meu? Ou era algo que eu realmente não conseguiria suportar?
– Mas o Devon foi e ficou com uma das amigas dela enquanto ela estava viajando
a negócios. Ela descobriu depois. A amiga tirou uma foto e contoupra ela.
Monique.
Íamos sair para um jantar só de garotas e Monique ia sacar seu celular da bolsa e me
mostrar uma foto de Rykernu beijando suas coxas magras. “Ele me deu um desconto”,
ela iria dizer. “Já marquei de novo, acho que vou fazer dessas experiências algo
semanal”.
Talvez fosse preconceito.Mas eu não iria aguentar.Não ia suportar.
– E como… – Minhas pernas ainda tremiam. – E como ela sabia que a amiga não
era uma cliente? Devon podia estar só trabalhando. – Tentei soar casual, mas cada
palavra saía exasperada.
– Eles tinham um acordo. – Ryker levantou uma sobrancelha. – Ele não podia
trabalhar com pessoas próximas a ela: família, amigos, colegas de trabalho. Desde que
ele soubesse quem eram, lógico. Mas ela sempre fazia questão que soubesse.
– Então ele não estava trabalhando?
– Não. Foi de graça. Só porque ele quis.
– Ela ficou com raiva e se vingou ao te contratar.
– Exatamente.
– Você sabia disso? Quando ela te chamou?
– Imaginei. Mas faz parte da profissão não perguntar, Mina. A vida de um cliente
não é da minha conta. Se a gente tivesse ficado junto naquela primeira noite no hotel,
eu nunca teria te constrangido e perguntado por que você era virgem ou qualquer
detalhe.
– Não, não iria me constranger. – Sorri, amarela. – Fui bem capaz de fazer isso
sozinha, obrigada.
Ele riu. Seu braço encaixava na curva da minha bunda de um jeito estável. Como se
a gente se complementasse como duas peças de um quebra-cabeça. O problema é que
eu ainda não sabia que peça a gente formava.
– Como ele descobriu?
– Ela me chamou na casa deles, em um horário que sabia que ele voltaria. Eu não
fui informado dessa parte e quase levei um murro de graça.
– Devia ter deixado ele te dar ummurro.
– Não, não devia. – Apoiou a testa na minha, me encarando com suavidade. – Não
é assim que funciona, Mina. Se você trabalha em uma loja de revelarfotos…
– Loja de revelar fotos, em que séculovocê vive?
– Se você trabalha em um departamento de tecnologia! – Revirou os olhos. – E vê
nos e-mails de um cara casado que trabalha pra empresa que ele está tendo um caso,
você não denuncia para a mulher dele. Se você é recepcionista de um motel,
psicóloga, terapeuta, médica… e descobre que um paciente ou cliente está tendo um
caso, não cabe a você interferir. Não é sua vida. Não é ético em nenhuma profissão.
Com prostituição também não. Se Devon traiu a mulher dele ou se a mulher dele quis
devolver, não é da minha conta. Elame contratou, me ofereceu mais do que cobro e eu
geralmente aceito trabalhos assim de bom grado.
– Aceita?
– Claro! – Riu, sem entender o sentido da pergunta. – Você não faria o mesmo na
sua área?
– ...ou aceitava? – continuei a pergunta e ele ficou sério assim que compreendeu.
– Mina… não trabalhei com isso desde que nos conhecemos. – Eu sei.
– E a parte do strip você já sabe melhor do que ninguém. – Apontou parao palco.
– Eu sei.
– O único trabalho de sexo que tive nos últimos meses foi transar com você nesse
palco. – Deu dois tapinhas com o indicador.
– Eu sei.
– E por que está agindo como se não soubesse?
– É estranho, Ryker. – Me afastei,cruzando os braços.
– É estranho? O quê? – Ele abriu os braços, estava indignado. – Transar comigo o
tempo todo não foi. Perder a virgindade comigo ou dizer que me amava. E agora, de
repente, é?
– Não foi isso que eu quis dizer.
– Não posso voltar no tempo e mudaro que já fiz, Mina. E, sinceramente, mesmo se
pudesse, não faria isso. A prostituição permitiu que eu me afastasse da minha família
tóxica e criasse a vida que eu queria. Livre. – Sua ênfase na última palavra murchou
meu coração. Eu não queria ser a mulher a cortar suas asas e destruir sua liberdade.
Mas não poderia impedir, se ele optasse por encarar meu pedido desse modo. – Nunca
imaginei que fosseum problema para você.
– Está dizendo que vai continuar trabalhando com isso?
– Estou dizendo que não sei. – Ele parecia igualmente triste e irritado com o rumo
da conversa. – O que espera de mim, Mina? Não vou me tornar um empreendedor
rico e bem-sucedido do dia pra noite. Não tenho qualquer conhecimento específico em
algo que seja rentável. Eu gosto de escrever, certo… mas sequer mostrei para alguém
que não fosse um amigo ou dois. Não fiz uma faculdade de Letras rebuscada como a
minha irmã, eu mal terminei a escola! E não vou aceitar a ajuda dela, porque ela só vai
fingir que meus escritos venderam para me dar dinheiro e eu não quero viver minha
vida dependendo de ninguém desse jeito.
– Então está dizendo que vai continuar a se prostituir? – Minha voz enganchou na
garganta.
– Não! Estou dizendo que não sei – repetiu. – Não sei o que eu sei fazer, Mina.
Não sei como eu poderia sobreviver senão a partir disso.
– Eu posso te ajudar. Quando conseguir um emprego, posso…
– Não quero. Obrigado. – Virou-se decostas.
– Vai ser esse cara, então, Ryker? O cara que não aceita ajuda de mulheres?
– Não tem nada a ver com isso.
– Com o que tem a ver, então? – exclamei, sofrendo.
– Tem a ver comigo! Com o fato de eu ter assistido aos crimes do meu pai contra
minha irmã prescreverem diante da Justiça porque eu dependia dele para sobreviver e
não tinha coragem de encará-lo. Tem a ver com a independência que a gente adquire
quando não precisa de ninguém.
– É bom não depender de ninguém, Ryk. Mas também é muito solitário.
– Está dizendo que não vai querer ficar comigo se eu decidir continuar me
prostituindo?
– Estou dizendo que não sei – tomei suas palavras emprestadas.
Ele acenou, magoado, e o silêncio se prolongou desconfortável.
– Acho que temos nossa resposta. – Seu meio sorriso carregava tanta dor que
sequer devia ter existido. Havia desprezo no seu olhar quando se aproximou de mim,
mas eu não soube se era para mim ou para si mesmo. Estava tão perto, me forçando a
olhar para baixo para evitá-lo, para fugir da sua esfera. Mas ele já estava ali… tão
perto que, ao olhar para baixo, tudo que vi foram nossos corpos se aproximando
lentamente, adestrados a executar aquele movimento. Suas mãos se posicionaram em
meus cotovelos quando sua boca me encontrou. Havia um toque de amargo na nossa
eterna doçura e senti que poderia chorar.
Ryker, em sua eterna compreensão sobre o meu funcionamento, soltou meus lábios
para dedicar sua trilha de beijos aos meus olhos. Um beijo longo em uma das
pálpebras, selinhos curtos nas bochechas descendo o caminho que teria sido
preenchido por lágrimas se ele não estivesse sorrindo contra meu rosto e agarrando
minha bunda.
– O que está fazendo? – Ri.
– Me despedindo. Não era esse seu plano? – Mordeu meu pescoço.
– Não era a isso que estava me referindo.
– Era sim. Você estava se referindo asexo, sua safada.
A gargalhada aliviou a angústia carregada em meus pulmões por todo aquele
assunto desagradável e eu logo tinha me esquecido da profundidade de nossos
problemas mais uma vez.
– Eu quis dizer que a gente deveria conversar. – Enfiei meus cotovelos entre nossos
corpos, tentando salvar o que restava de nosso foco. – Decidir o que a gente vai fazer
depois.
Ele acenou, fingindo compreender, mas sem prestar verdadeira atenção.
– Você quis dizer que queria transar da última vez que a gente se separou, mas não
teve tempo. Não quer arriscar perder a chance de novo. Eu te entendo, amor –
continuou, brincalhão, me fazendo rir em meio a mordidas.
– Você entendeu tudo errado, seu tarado.
– Não quer sexo, então? – Afastou-se, enfiando as mãos no bolso. – Tudo bem. Sem
sexo. – Seu escrutínio analítico caiu sobre mim enquanto ele esperava, com um meio
sorriso perverso e divertido, que eu me desfizesse em inevitável frustração. Que foi,
óbvio, exatamente o que eu fiz.
– Quer mudar de ideia? – provocou, sorrindo.
– Não. – Minhas bochechas pegavam fogo. Estavam envergonhadas pela minha má
atuação e decepcionadas pela minha vagina. – Eu quero conversar. Mas agora… agora
– Sexo faz alguma coisa bizarra com uma parte específica do seu cérebro responsável
pela comunicação. O sangue desce para irrigar suas terminações nervosas e o
metabolismo do cérebro é diminuído a um ritmo digno de uma lesma indecisa. – Ah!
Você me fez esquecer o que eu ia dizer!
Sua mão larga e forte agarrava meu pescoço.
– Então venha aqui que eu te ajudo a lembrar.
O modo com o qual ele movia sua língua macia contra o céu da minha bocame fazia
suspirar e perder a razão. Espremia meu quadril contra a lateral do palco e descia as
mãos até minha cintura.
Antes de Ryker, nunca tinha notado o tesão muito peculiar que eu aparentemente
sentia por bundas masculinas. Uma curva gostosa que serve para prender uma calça
mais folgada e para preencher mãos gulosas. Agarrei suas nádegas com os dedos e
meus lábios com os dentes. O gemido emitido como um miado morno, derretendo
minha boca: – Gostoso… – murmurei.
– Era isso que você esqueceu de dizer? – Ofereceu a língua para que eu mordesse. –
Como pode ter esquecido isso? – divertiu-se, aceitando minhas mordidas intercaladas.
– Ryker, cala a boca.
– E me fode.
– Hum?
– É assim que se diz – explicou, acadêmico. – Cala a boca e me fode. Um
pedaço da frase não faz sentido semo outro.
Sua digressão me irritou.
– Vou te mandar calar a boca de novo.
– E eu só vou calar se você pedir pra eu te foder. – Riu.
Respirei fundo e abri a boca, reunindo coragem para me jogar na sua armadilha.
– Ficou com vergonha, foi? – provocou de novo. – Posso abrir as portas e
convidar o pessoal da rua para assistir. É assim que você gosta, não é? Quando eu faço
você gozar na frente de uma plateia. Vai ter que gemer mais altodessa vez, como…
– Ryker… – Revirei os olhos. – Cala a boca e me fode.
Ele agarrou seio e bunda com invejável apetite, mas não me beijou. Sua boca estava
ocupada demais se abrindo em uma risada interminável de satisfação.
– Minha garota!
– Cala a boca. – Belisquei sua bunda.
– Minha garota safada!
Não sei até que ponto foi de propósito, mas Ryker se dobrou sobre mim, fazendo
com que tropeçássemos ecaímos os dois sobre o palco.
– A gente vai subir para o quarto? – A pergunta era quase nula, já que a invasão de
seus dedos na parte interna de minha calcinha deixavam suas intenções bem claras.
– Ou... – Arregalou os olhos, animados com sua exclamação. – Pra casa do
Devon! Experimentar essa novidade para você.
– É. – Fingi tédio. – Sinceramente, Strome, já transamos no palco, estou
decepcionada. Está começando a ficar repetitivo… Ah! – Seus dedos encontraram
aquele ponto bem na lateral do meu clitóris que parecia fazer minha virilha se derreter
em lubrificante e arfei.
– Ah, desculpe. – Sarcástico. – Eu te interrompi. Estava dizendo alguma coisa?
Não era acidental.
Ele sabia exatamente qual era o maldito ponto, porque estava esfregando o polegar
nele de um jeito que deveria ser ou proibido por lei, ou obrigatório. Porque depois de
conhecê-lo uma vez, mulher nenhuma deveria ser obrigada a viver sem aquele toque.
Joguei a cabeça para trás, olhos fechados, sentindo meus cabelos searrastarem no
chão do palco.
– Esqueceu de novo? – Ele apertou com tanta força que teria doído se não estivesse
me fazendo encontrar o nirvana. – Eu te ajudo a lembrar, de novo. – Um beliscão e eu
não conseguiaparar de gemer. – Estava falando algo sobre decepção? – Ele girava meu
clitóris preso entre seus dedos, sem parar de esfregar o polegar no ponto perfeito.
Mordi a parte interna do meu lábio. Eu ia gritar. Era só uma questão de tempo. – E
repetitivo. – Seu dedo me invadiu, mas seria mentira dizer que gostei mais dele do que
do aperto do seu polegar. Aquele dedo suave e curvado dentro de mim era uma
delícia. Mas nada se comparava à copiosa massagemclitoriana à qual ele me submetia.
Ryker me despiu com a mão livre e eucolaborei como pude, o que não foi muito. Ele
não soltava minha virilha mesmo que eu debatesse as coxas contrao braço dele.
– Quero te ensinar outra coisa. – Lambeu meu pescoço logo abaixo da orelha,
antes de me forçar a ficar de quatro sobre ele. Soltou meu clitóris, parte de mim quis
reclamar por causa disso, outra parte porque temeu que ele quisesse sexo anal. Mas
sua língua me lambeu inteira e eu estava fechando os olhos para curtir o momento de
novo.
– Já ouviu falar dessa posição aqui? – Seu sussurro abafado foi de encontro à
minha vagina e seu hálito transformou o ar ali em um arrepio que percorreu minha
coluna, apressado. Desabotoei suas calças e Ryker me engoliu. Puxando meu quadril
para baixo, me forçando a sentar sobre sua boca. Como ele estava conseguindo
respirar, é algo que eu nunca saberia.
Sexo para mim sempre tinha sido difícil e complicado. Mesmo com Ryker, com
quem tudo era mais fácil, tive minhas complicações em um momento ou outro. Mas
instinto é uma coisa engraçada, delicada e curiosa que chega para assumir o controle
quando vocênão está esperando.
Era perceptível para mim porque era a primeira vez que acontecia. Eu sempre tive
certeza que era deficiente no quesito “instinto sexual” até Ryker me fazer aquela
pergunta curta antes de meengolir em cima daquele palco vazio.
Algo se apoderou do meu corpo comoum desejo que não conseguia mais ser contido
e rasgaria minha pele para fugir se não fosse controlado. E o único modode controlá-lo
era enfiando Ryker naboca. Ele estava rígido e imenso. Era tão delicioso que me fazia
ter vontade de gritar uma obscenidade.
Como um pedaço de carne cheia de sangue que o homem esconde dentro dascuecas
pode ter uma aparência tão gostosa? Antes de Ryker me parecia absurdo e até um
pouco nojento.
Mas ali estava ele, o membro tão grande que não conseguia ficar completamente
linear e, ereto, fazia um curva suave para a esquerda. Fechei o punho ao seu redor e
meus dedos não se fechavam. Eu o engoli de uma vez e, na minha gula, só percebi que
tinha sido ávida demais quando o reflexo de regurgitação se fez perceber. Recuei, mas
a vontade subsistia. Lambi a cabeça e Ryker gemeu entre minhas coxas, o que me
deixou ainda mais molhada. O chupão que ele me deu parecia servir para dar vazão
ao seu próprio prazer e eu o imitei, usando seu pau para aliviar a minha tensão.
Engoli-o bem fundo mais uma vez. Senti um pouco de orgulho da minha capacidade,
apesar de ser notável que a posição claramente facilitava a entrada de sua ereção na
minha boca. Segurei a base para controlá-lo melhor, era impressionante como ele
ficava mais largo e mais duro sob meu toque sempreque eu fazia algo certo.
Será que era assim que as pessoasliam umas às outras na cama?
Eu podia tentar…
Transformar Ryker no meu laboratóriopessoal.
Dei uma longa lambida de baixo acima. Duro.
Raspei os dentes na base. Duro. Deslizei os dedos na sua extensão.
Duro.
Cocei seus testículos, muito de leve,ainda possuída pelo trauma.
Mais duro.
Certo…
Raspei os dentes na glande. Mais duro.
Lambi sua cabecinha. Mais, mais duro.
Usei os lábios para empurrar a pele de sua cabecinha para baixo em uma
masturbação dócil e provocante, usandoapenas a pressão dos meus lábios. Tão duro.
Ryker se esticou e aumentou como nunca tinha feito antes. Ou talvez, eu não
estivesse prestando atenção das outras vezes. Talvez eu não soubesse nem em que
prestar atenção.
Eu já tinha elementos suficientes para trabalhar e acariciei seus testículos enquanto
o masturbava com os lábios entre mordidas e lambidas, arriscando engoli-lo o
máximo que eu conseguia emintervalos regulares. Ele não conseguia mais ficar parado
e impulsionava o quadril contra mim.
Está gostando.
Eu estou aprendendo.
Estava realmente desenvolvendo um ritmo interessante, mas foi aí que Ryker me
chupou com força. Sugou meu suco inteiro, estapeando meu clitóris com a língua e eu
soltei seu pau. Minha boca se abriu em um grito nervoso e tive que me dobrar com
esforço para conseguir colocá-lo na boca de novo. Ele me mordeu quando começou a
gozar e sentimeu corpo inteiro vibrando.
Seguiu-se um momento mágico em que toda a tensão se desfaz, espalhando
espasmos pelo corpo a partir da virilha e trazendo a certeza que, se o Paraíso existe,
ele tem que ser tão bom quanto um orgasmo, ou seria frustrante.
Me joguei para o lado assim que consegui parar de tremer, ainda tentando recuperar
o fôlego.
– Não te ensinei a fazer isso – Ryker gemeu. – Quem te ensinou a fazer isso?
– Ele parecia sofrer de prazer, o que me deixou realizada ao ponto de não conseguir
descrever.
– Estava só experimentando –confessei.
Ryker respirou fundo duas vezes completas.
– Pois experimente mais vezes. – Sorriu.
Dei um tapa em sua barriga antes de levantar para me vestir. Foi só aí que percebi o
líquido escorrendo pelo meu queixo. Limpei minha boca com as costas da mão.
– Desculpe. – Tomou meu rosto, alisando minhas bochechas e lábios com os
polegares. – Me perdi. Não te avisei.
Ainda estava tentando processar o fato…
– Eu… engoli?
– Acho que não tudo. – Riu, ajudandoa me limpar. – Mas um pouco.
Estalei a língua na boca testando ogosto e Ryker gargalhou com força.
– Quer mais um pouquinho? Me dáuns cinco minutos – brincou e ganhou
outro tapa.
Eu ainda estava vestindo a calça quando a porta bateu, anunciando que tínhamos
companhia. Apressei-me em me recompor enquanto Ryker se rearrumava sem pressa,
rindo do meu desespero.
– Estão acordados. Bom. – Zahner chegou carregando uma bolsa escura. – O
dinheiro do Hideki. Parece que finalmente acabou. – Respirou fundo.
– Lola?
– Lola é problema de Lola. – Sorriu sem alegria, atirando a bolsa em cima do
palco.
Ela estalou com um som desagradável de metal batendo em metal e Zahner
arregalou os olhos em pânico.
– Não. Não, não, não!
Puxou o zíper e despejou o conteúdo ao nosso redor. Diversas ferramentas
estranhas que eu não sabia para que serviam.
– PUTA DO CACETE! – Zahner enfiou as mãos nos cabelos com muita força,
como se estivesse realmente disposto a arrancá-los pela raiz. – Aquela puta… – repetiu
em um sussurro baixo. – Não pode ser… – Virou a bolsa à procura de algo. Ryker
segurou meu pulso, indicando que eu desse um passo para trás.
Ele tomou minha frente por talvez temer algum episódio de insanidade de Gary,
demonstrando, assim, o ímpeto de me proteger. – Ela trocou as bolsas! – falou
sozinho. – Mas a que tinha os instrumentos tinha uma tarja branca bemali. – apontou,
irritado. Eu não sabia se ele estava nos explicando ou tentando aceitar a verdade, mas
me encolhi para ver a bolsa e passei o dedo na região que ele indicou.
– Tinha um adesivo aqui – avisei. – Édisso que está falando?
Havia insanidade nos olhos de Zahner quando ele puxou a bolsa para verificar a
verdade em minha constatação.
Passou o dedo pelos resquícios de cola de um adesivo que deve ter sido arrancado
rapidamente e começou a rir. Um riso de homens loucos.
– Era falsa. – As mãos estavam de volta nos cabelos. – Ela não trocou a bolsa, ela
trocou as tarjas. Colocou o adesivo na outra bolsa. A criminosa do caralho arrancou
a tarja de uma e colocou na outra.
Ele se sentou no palco. Nós nos abaixamos perto dele. Coloquei a mão em seu
ombro na tentativa de consolá-lo. O pobre Gary nunca iria admitir, mas gostava dela.
Mesmo que em um nível doido, psicopata e doentio… gostava de Lola. Eu entendia a
fúria e a revolta. Não era apenas por ter sido enganado, mas por ter sido enganado por
uma pessoa em quem ele queria acreditar. Eu tinha sentido fúrias e revoltas
semelhantes por Ryker um dia. Conseguia entender.
Mas independente da incômoda frustração que Gary sentia, Lola parecia não se
importar.
Hideki ia aparecer no dia seguinte querendo seu dinheiro.
E, a não ser que aqueles instrumentos espalhados pelo palco valessem
aproximadamente dois milhões de euros,estávamos todos fodidos.
Dez
Para quem estava preocupada com desemprego, Mina parecia desatenta aos seus
muitos talentos. O Lucky’s podia não ser a boate de maior prestígio na cidade, mas
não era um lugar pequeno e insignificante. Pelo contrário… as instalações tradicionais
tinham o seu porte e o seu allure, mas a jovem administradora não se deixava
intimidarpor nenhum desses aspectos.
Cinco minutos no telefone com um dos fornecedores e ela já tinha conseguido
negócios melhores que Luckas em cinco anos.
– Eles lembram dela. – Lucky bateu no meu ombro, rindo. – Quando eu disseque ia
passar o telefone pra ela, um deles chegou a xingar. – Riu.
– Ela negocia muito bem.
– É impressionante – concordou. – Ryker… acha que quando isso tudo acabar, ela
estaria interessada em um emprego?
Foi uma pergunta inocente. Luckas não tinha poderes sobrenaturais que lhe
permitissem ouvir pensamentos ou ler intenções. Mas sua inocência não impediu que
um incômodo se espalhassepelas minhas entranhas.
Mina amarrou os cabelos para mantê- los longe do ouvido que ela dedicava ao
telefone. Falava apressada, olhando para o relógio com frequência e rascunhando
números com um lápis de madeira. Mesmo em um clube de striptease, cercada pelo
cheiro de sexo, ter uma tarefa que ela podia realizar sem morrer de vergonha tinha lhe
conferido um ar profissional que eu achava igualmente sensual e intimidante.
Eu sabia lidar com a garota perdida que não sabia o que fazer com o homem só de
cueca no seu apartamento.
Mas e quando ela olhasse para mim com seus números e lápis de madeira? Quando
ela tivesse um emprego fixo e colegas de trabalho contadores, advogados e
economistas. O que diabos eu deveria fazer? Quais histórias eu ia contar na festa de fim
de ano da empresa dela? O que eu ia dizer quando o círculo de colegas engravatados se
apertasse até ficar claustrofóbico e me engolisse com perguntas sobre o que eu fazia, no
que eutinha me formado e onde já tinha trabalhado.
Mina não ter família tinha se tornado uma bênção para os meus delírios de
pesadelos diurnos. Como se apresenta um namorado garoto de programa para o seu
pai? Para sua mãe? Irmãos? Meus relacionamentos nunca tinham sido duradouros o
suficiente para que eu precisasse me preocupar com esse tipo de apresentação e, agora,
com uma mulher com quem eu planejava passar longos anos, a ríspida verdade é que
a maldição da garota órfã era um alívio para o namorado que não teria assunto para
debater com o sogro durante o chá.
Ela queria que eu largasse minha ocupação.
Não era um pensamento novo para mim. Eu não queria fazer isso para sempre.
Mas também não tinha exatamente um plano definido sobre como eu poderia parar.
Todavia, acampar no sofá de Mina, desempregado e ocioso, enquanto considerava
todas as possibilidades, não era uma ideia atraente. Teria que ser do meu jeito: eu
precisava me manter ocupado enquanto procurava outro meiode subsistência.
Claro que Mina não ia curtir essa ideia nem um pouco.
Eu não curtiria se estivesse na posição dela e é por isso mesmo que não podia
culpá-la por seu receio. Restava descobrir como eu ia desatar o nó que minha vida
tinha dado um jeito de amarrar.
Ela sorriu sozinha, fechando o punho em vitória, depois de uma boa notícia dooutro
lado da linha e eu me peguei rindo
com ela, mesmo que ela sequer estivessenotando minha presença.
Eu te amo e quero ficar com você.
Mas talvez um pouco de distânciafosse necessário em algum momento.
Um pouco de Paris para você. Umpouco de Amsterdã para mim.
Pelo menos até tudo se aquietar.Ia ser horrível.
Seu sorriso ainda estava lá, dançando vitorioso naquele rosto lindo. Eu queria me
sentar na cadeira à sua frente e assisti-la trabalhar a tarde toda. Roubar um beijo de
vez em quando não seria nada mal.
Eu quis que todos fossem embora à noite, para poder levá-la para a cama e contar-
lhe, olhos nos olhos. Mas os preparativos avançaram pela madrugada e acabaram
com metade de nós dormindo de qualquer jeito sobre sofás ou encostados nas mesas
quando o sol surgiu no céu.
E quando o dia se foi de novo, nós estávamos prontos.
Eu não tinha roubado beijos suficientes. Não tive tempo suficiente. Não falei
verdades suficientes.
Mina surgiu de volta no salão poucos minutos antes das portas se abrirem usando
um vestido curto e folgado com um decote imoral.
A piscadela que ela me deu de presente teve doses similares de purezae descaração.
Seu jeito Mina de ser nunca parava de me encantar. Devolvi com outra piscadela. A
minha, com certeza, bem mais indecente, com direito a uma leve passeada de língua
pelos lábios, indicando a fome em resposta à sua roupa. Ela revirou os olhos antes de
me lançar um beijo pelo ar.
Talvez a gente precisasse de um tempo afastado quando tudo aquiloterminasse.
E ia, sim, ser horrível.
Mas se fosse necessário para que ficássemos juntos no fim, eu faria.
Eu faria qualquer coisa.
Tinha sido uma excelente noite para o negócio do Luckas, mas não tinha sido
suficiente para resolver nossos problemas. Talvez Hideki aceitasse qualquer valor,
como eu acreditava que ele faria. Talvez não.
Strome ligou para a irmã como um golpe de misericórdia, mas nem ela nem o
namorado tinham dois milhões líquidos. A empresa de Delvak poderia fazer um
empréstimo… mas o chefe dele tinha falecido e todos os bens da empresa estavam
congelados devido a alguma cláusula do testamento.
Sven e Lexa iam voltar para conversar com Hideki, mas eu duvidava que fizesse
qualquer diferença. Ou ele aceitaria o dinheiro, ou não. A presença dos dois não iria
interferir em muita coisa.
Para todos os efeitos, a noite acabou se revelando melhor do que todos
imaginávamos e estava quase amanhecendo quando os convidados se foram e eu me
fechei no escritório do Luckas para tentar dormir algumas horas antes de precisar lidar
com a máfia japonesa.
A presença de um movimento desconhecido no escuro me fez puxar a arma por
instinto.
– Vamos fazer isso de novo? – ecoou suave e quente.
Segurei a arma com firmeza.
– Me dê um bom motivo para não atirar em você agora. E pode ser que eu atire
mesmo assim.
Lola sorriu na penumbra, balançando-se na cadeira do outro lado da mesa.
– Vim pedir desculpas, como uma boa garota, e você vai atirar em mim? O que isso
diria sobre você?
– Não estou preocupado com isso.
– Não… Está preocupado com isso aqui. – Ela se levantou para me mostrar a bolsa
escura e comprida.
– É meu dinheiro? O que você roubou? – Não ousei baixar a arma.
– É, e ainda te fiz um favor. – Sorriu.
– Eu troquei… Dá pra você apontar isso para outro lugar? – resmungou. – Sei que
não vai atirar em mim, mas está me incomodando.
Julguei sua expressão por algunsinstantes e apenas guardei a arma devolta no coldre
por um senso mórbido de curiosidade. Poderia ser tudo um golpe, mas eu queria saber
para onde elaia com toda aquela conversa.
– Me traiu de novo.
– Ah, não seja assim, Gar! – resmungou, arisca. – Você me jogou pra cima dos
policiais e fugiu!
– Policiais que você chamou para me cercar.
Ela ficou em silêncio. Tinha aquele sorriso curto e prepotente de quem sabe coisas
que não deveria saber e não tem medo de contar.
– Acho que estamos quites, então?
– Nem perto – exclamei, ouvindo as palavras autoritárias ecoarem nas paredes.
– Nem se eu te der isso? – Colocou a bolsa em cima da mesa. – Troquei as notas
para você. São sequenciais agora.
Minha boca se entortou em um sorriso antes que eu pudesse impedi-la. Não queria
demonstrar minha satisfação a Ox, no entanto meu reflexo foi quase instantâneo.
– Vou poder rastrear o Hideki depois que der esse dinheiro para ele.
– E se ele usar com qualquer coisa ilegal, você consegue prendê-lo. – Piscou um
olho para mim. – De nada.
– Pensei que ele era seu amigo.
– Já me pagou bem por alguns serviços. – Deu de ombros. – Me pagou mal por
outros. E você devia saber: eu não tenho amigos.
– Não, não tem. – Acenei antes de sersubitamente possuído por uma dúvida. –Onde
arranjou notas sequenciais assim tão rápido?
– Quer mesmo saber? – Ergueu uma sobrancelha.
– Não. – Gesticulei. – Estou bem, obrigado.
– Com medo de um pouco de ilegalidade? – Não resistiu à provocação. – Achei
que tinha superadoisso com sua carreira de fugitivo e tudo o mais.
– Vá se foder.
Sentei no sofá, passando a mão pelos cabelos. Lola sentou-se na borda da mesa.
Nós dois, no escuro, esperando. Acho que nenhum de nós sabia exatamente pelo quê.
Mas, quanto mais osilêncio se prolongava, mais eu sentia o calor que se espalhava pelo
meu esôfago, um desconforto que tomava conta do meu corpo sempre que ela estava
por perto.
– Por que voltou, Lola? – Eu estava com raiva. Não era uma fúria cega, mas uma
raiva contida. Uma capacidade de escolher o melhor momento para a violência, mas
ciente de que a violência seria inevitável. Nós dois não éramos feitos de materiais
compatíveis e não poderíamos ficar no mesmo ambiente por muito tempo sem que
algum desastreacontecesse.
– Crise de consciência? – arriscou, me fazendo rir alto. – Eu não queria ter te
passado para trás de novo.
– Se queria só trocar as notas, não precisava ter me enganado. Eu teria concordado
com esse plano.
– Eu não ia trocar as notas, a princípio. – Revirou os olhos. – Ia pegar o dinheiro
para mim e pronto.
– Acabou de dizer que não queria me enganar – apontei a contradição. – Qual dos
dois, Lola? Queria me enganar ou não?
– Eu não queria te enganar quando decidimos tudo. Tinha dito a mim mesma que ia
deixar você ganhar dessa vez.Mas… quando chegou a hora, eu…
– É da sua natureza – suspirei.
– Perdão?
– Não conhece a história da enchentena floresta?
Ela espremeu o sorriso.
– O escorpião vai se afogar e pede ajuda ao sapo para atravessar o rio – contou,
demonstrando que conhecia. – O sapo se recusa porque tem certeza que o escorpião vai
lhe picar. O escorpião promete e promete. Implora e implora.
O sapo acaba aceitando. – Gesticulou, simbolizando a travessia do rio.
– E, assim que chegam do outro lado e o escorpião está a salvo, ele pica o sapo –
concluí. – Enquanto morre envenenado… – dramatizei. – O sapo pergunta “Por quê?
Por que você fezisso?” E o escorpião simplesmente responde…
– “Desculpe” – enunciou. – “Mas é daminha natureza”.
– É da sua natureza – repeti. Ela sorriu de um jeito que parecia quase genuíno.
Teria me enganado se eu não aconhecesse tão bem. – Você é uma filhada puta incapaz
de compaixão ou lealdade.
– Ele não está nos Calabouços, não é?
– ignorou.
– Não – repliquei, sem arrodeio.
– Vai me dizer onde ele está?
– Não.
Ela acenou como se esperasse aquele tópico desde o começo.
Mas eu precisava saber…
– O que vai fazer com ele, Lola?
Quando o encontrar?
– Gosto que você diz quando e não se.
– Você é uma garota esperta. E ele não está tão escondido assim – provoquei. –
Estou decepcionado quenão o tenha encontrado ainda.
– Seja razoável, Zahner. – Riu e veio sentar-se ao meu lado. – Estou me
comportando.
Ela estava perto demais e, em breve, meus impulsos violentos não estariammais sob
controle. Levantei-me, por nenhum motivo além de me afastar dela.
– O que vai fazer com ele, Lola?
Ela tocou o lábio inferior, ainda perdida em pensamentos.
– Por que está protegendo um estuprador, Gary? – seu sussurro foi quase
inaudível.
– Não estou protegendo umestuprador, Lola. Só acontece que ele éa última isca
que me restou para te atrair.
– Me entregue ele e eu te arranjooutra isca.
– Não.
Ela estapeou os próprios joelhos.Esperava conseguir aquela informação, eu a estava
frustrando. Era uma sensaçãogostosa.
– Posso terminar o que comecei naquele dia, sabia? Posso enfiar duas balas na sua
cabeça e uma lâmina afiada no seu coração. – Ela precisou de dois passos para ficar a
centímetros de mim.
– Gostaria de ver você tentar.
– Eu me lembro de você ajoelhado e submisso no chão da última vez quetentou me
enfrentar.
– Me pegou desprevenido. Não vai acontecer de novo. – Eu sentia meu nariz se
retorcendo em uma careta irritada.
– Vai acontecer de novo. Quantas vezes eu quiser. – Respirou no meu rosto, me
contaminando com seu hálito delicioso, o que me fez travar os punhoscomo força. Era
uma tentativa de me impossibilitar de agarrar seu pescoço e espremê-lo.
– A única coisa que vai acontecer da próxima vez vai ser você levando uma surra.
– Rá!
– Uma que você já está merecendo hámuito tempo.
– Quer me espancar, Gar? – Inseriu um calor inapropriado às palavras. – Fui uma
garota má?
– Cale a boca. – Segurei seu maxilar com força. – Pare de jogar comigo, sua
criminosa. Não sou seu brinquedo.
– Não. Você é só o brinquedo do governo que paga seu salário. – Segurou meu
pulso, cravando as unhas na minha carne.
– Você não me conhece, vagabunda. –Salivei, meu queixo tremia.
– Nem você me conhece, seu animal. O segundo inteiro que nos encaramos em
silêncio pareceu uma hora.
– Quer transar comigo, Gareth? – sussurrou e sua expressão mudou.
As palavras escorreram, pesando no ar.
Posso ter gaguejado por um segundo,mas consegui rebater: – Não vai me convencer
a informar a localização dele.
– Já entendi essa parte. Não é a isso que estou me referindo. – Elevou um ombro. –
Estou dizendo que eu vou embora agora. – Eu ainda tinha os dedos nas suas
bochechas, o queixo dela contra o meu punho. – Não acho que vamos nos encontrar de
novo. Nunca mais. – Acenou. – Não podemos continuar cruzando o caminho um do
outro.
– Por que não? – arrisquei, embora já soubesse a resposta.
Lola levantou o rosto, senti seu hálitomorno quando respirou a centímetros demim.
– Naquele dia, na cabana – suspirou.
– Eu queria. E você também.
Engoli em seco. Se eu conseguisse encontrar minha voz, eu negaria. Seria mentira,
mas eu não daria o gosto da vitória a ela.
– Me arrependi depois que fomos embora. – Doía ouvir aquela confissão. Sempre
imaginara que seria satisfatório ouvi-la dizer palavras assim. Principalmente porque,
na minha imaginação, eu sempre ria na cara dela e a mandava se foder. Mas ali,
ouvindo cada palavra… não era o que eu queria de verdade. Ódio era mais fácil. –
Você me detesta, Gar – constatou. – E eu te detesto, também. – Travou a mandíbula.
– De um jeito que não dá nem pra descrever. Você me irrita e complica minha vida.
Meu trabalho. Meus clientes. – Minha garganta ressecara. – Mas naquele dia…
naquela cabana… eute quis. Então, estou te informando que pode me detestar amanhã
e todos os diasem sequência. Estou contando que vou fugir e que nunca mais pretendo
te encontrar de novo. Mas também estou dizendo que, se quiser me foder, essa noite é
sua única chance.
Eu não tremia mais. Nenhuma parte de mim.
O toque da minha mão no seu queixo ficou mais suave. Não muito… Ainda tinha
algo violento nas minhas intenções.Embora fosse um tipo diferente de violência. Minha
outra mão encontrou ocaminho pelos seus cabelos no mesmo instante que sua boca
tocou a minha.
Ela era saborosa como nada jamais tinha sido.
Suas mãos agarraram meus ombros com violência, cravando as unhas na minha
camisa até atingir a carne. Minha consciência nublada, meus sentidos acentuados.
Cada raspão de sua pele mefazia enlouquecer com o calor, o arrepioque meu hálito lhe
causava, as pálpebras pesadas mantendo seus olhos fechados. Um único gemido
escapou pelos seus lábios em um sinal de fraqueza que ela nunca ousava demonstrar.
Segurei seus cabelos escuros, um nó em minhas mãos, com força, erguendo seus lábios
rumo à minha boca.
Havia saliva. Havia língua. Mas, mais que tudo, havia dentes. Eu a mordia,
destilando o ódio de anos e ela devolvia como se quisesse provar um ponto: não havia
fúria contida por mim que ela nãopudesse imitar.
Nos odiamos e nos amamos em carícias contínuas de calma desesperada e furiosa
lentidão. Suas mãos estavam no meu pescoço enquanto eu a despia. Não estava me
sufocando, mas minha respiração já ofegante estava ainda mais prejudicada. Havia um
animal dentro de mim, uma besta enlouquecida, que eu mal conseguia controlar.
Então, eu me livrei de suas roupas, seus seios estavam expostos na penumbra e a
besta se libertou. Enfiei-os na boca, um de cada vez e depois repeti a ação, urrando em
rouquidão. Sua bunda estava nas minhas mãos. Pele em pelo, suscitando adúvida de se
ela mesma teria tirado a calcinha para me receber ou se a calcinha nunca existira.
Aquela dúvida me assombraria pela eternidade. Cada vez que a caçasse, ansioso por
apreendê-la, por encontrá-la, apenas para vê-la diante de mim e entrar em desespero,
me perguntando se a ausênciade roupa íntima era um hábito permanente para ela.
– Como é que uma mulher linda e safada como você ainda é virgem? Olhos verdes
e brincalhões procuravam me tirar do sério.
– Ah! – comecei, dissimulada. – É porque eu tenho mania de espremer testículos.
– Humm? – fingiu interesse.
– É tipo um fetiche incontrolável. – Arregalei os olhos e ele riu.
– Acho que eu suportaria isso, se pudesse ficar com você.
– Não sei não, viu? – Bebi um gole decerveja direto da garrafa.
– O último cara que me disse isso, ó… – gesticulei – ...caiu na cama agarrado à
virilha.
– Foi mesmo? – Roubou minha cerveja.
– Ficou vermelho como um morango.
Enfiou a mão nos meus cabelos e me beijou.
Não se afastou quando o beijo acabou, em vez disso, ficou raspando o sorriso no
meu, colando nossas testas. Ao nosso redor, a gangue inteira bebia, falava alto,
trocava as músicas… Uma comemoração acolhedora e genuína.
– Acabou, Ryk?
– Acabou. – Um selinho suave. – Zahner acabou de falar com Hideki. É Kulik
quem vai ter que fugir agora.
– E a gente?
– A gente espera um pouco. As influências que Kulik tem na polícia vão
desaparecer assim que os pagamentos pararem. As influências de Hideki vão se
conservar mais fortes e nós nos entregamos para um policial da confiança dele.
Depois, prestamosnossos testemunhos e livramos o Gary.
– Quer dizer que temos um tempinho de férias, então? – Lambi meu sorriso,
descarada. – Acha que essa gente toda vai nos dar uns dias a sós?
Ele olhou ao redor, infeliz.
– Esse bando de desocupados? Dejeito nenhum.
Ryker me abraçava de maneira confortável. Uma maneira íntima de casal que se
conhece e está junto há tempo demais para perder tempo com trivialidades como ficar
separados quando tudo o que se quer são toques intermináveis. Acariciava cada parte
do meu corpo que alcançava, mas não com sua típica luxúria. Era apenas um carinho
sossegado.
Beijei sua bochecha.
– A gente dá um jeitinho.
– Hum! – concordou, durante o gole. – Atrás daquelas cortinas ali. – Apontou a boca
da garrafa para o ponto atrás do palco onde ele tinha me agarrado dequatro.
– Ou um lugar novo – sugeri.
– A casa do Höfler?
– Ryker!
– Nada mais justo. Ele fica aqui incomodando o tempo todo.
– Não é nossa casa, Ryk. É a boate doLucky.
– Quando tivermos nossa casa, vou te comer na sala. Vou até deixar a porta
destrancada.
Meu sorriso se abriu, tão doce e gostoso… Sua frase foi tão gentil que euaté ignorei
seus eternos impulsos exibicionistas.
– Nossa casa? – Eu quis fingir recriminação, mas era impossível parar de sorrir.
– É. – Levantou um ombro, levementeconstrangido. – Um dia… quem sabe.
Então seus olhos encontraram os meuse ele sorriu.
Doce e gostoso assim como eu.Todo doce.
Todo gostoso.
Eu o beijei devagar. Lábios cheios e macios se dobrando ao encontro dos meus.
Massageando minha língua entre um desejo e uma mordida brincalhona.
– Estive pensando… – começou. –Sobre o que conversamos e… minhaprofissão.
– Hum? – Prendi meu lábio inferior com os dentes para não arriscar que ele
tremesse.
– Vou levar um tempo para… – Engoliu em seco. – Conseguir outra coisa para
fazer. Depois que isso tudo acabar, vou precisar de um tempo para me organizar e
descobrir outra atividadeque eu saiba fazer.
– Mas vai querer exercer outra atividade?
Desenhou meu rosto com indicador e polegar, da sobrancelha ao queixo.
– Algo me deu a impressão que você não ficaria comigo se eu continuasse no
mesmo ramo.
Ri baixinho.
– Não – exagerei. – O que te deu essa impressão? – Segurei sua mão nas minhas. –
Só não quero te dividir com ninguém – murmurei.
– Eu entendo. – Seu sorriso se traduzia em uma afirmação que ele sentia o mesmo
por mim. – Mas clientesnão seriam uma divisão, Mina. É só meutrabalho.
– Sei que isso é verdade. Mas de uma forma prática e impessoal, Ryk. Eu não acho
que ia conseguir lidar com isso muito bem.
Ele encarou o chão.
– O que foi?
– Não sei se você vai gostar.
– Não importa. – Eu estavapreocupada. – Me conta.
O que era agora? Algum outro mafioso russo também tinha nos visto? Ele achava
que a Yakuza ia nos trair e tentar nos matar? Algo pior?
– Acho que a gente vai precisar ficar separado por um tempo.
Algo pior.
– Por quê? – Me afastei um pouco, e ele não me prendeu pela cintura como sempre
fazia.
– Até eu me reorganizar, Mina… vouprecisar trabalhar com algo para me sustentar.
E não acho que você ia me querer em Paris fazendo isso, ia?
O baque alto e abafado ressoou, fazendo meu corpo tremer. Por um instante, eu
imaginei que a falta de controle sobre meu próprio corpo tinha sido causada pela
descoberta de que Ryker pretendia continuar a se prostituir por um tempo e não pela
descarga de adrenalina.
A porta principal pendia em sofrida inclinação, presa pelas poucas dobradiças que
tinham restado e os homens invadiram a boate tão rápido que não consegui sequer
contar quantos eram.
A lembrança do corpo ensanguentado de Spider nas escadas me fez congelar. Uma
memória tão recente e ao mesmo tempo tão distante em contraste com as
circunstâncias que se seguiram. Meu coração explodia em desespero, acelerado no
meu peito.
Eu e Ryker éramos a primeira linha deresistência diante da porta.
Se é que era possível se referir a nós dois como qualquer tipo de resistência.
Lá no fundo da minha mente, eu tinha conhecimento que Zahner estava armado em
algum lugar atrás de nós e quis me abaixar para deixá-lo lidar com a situação.
Mas o instinto tinha feito meu corpo agir antes de qualquer decisão.
Ryker apertou minha mão.Ele queria me proteger.
De novo.
Como sempre fazia.Eu o amava.
Eu o amava independentemente desuas intenções, profissões ou desejos.
E, mesmo que eu tivesse receio emadmitir aquilo, era verdade.
Eu o abracei, tomando sua frente, impedindo que o mal inevitável chegasse a ele.
Ou que, se chegasse, levasse a mim primeiro, porque eu não ia conseguir encarar seus
olhos frios e vidrados como fiz com Spider.
Um único momento me fez descobrir que a vontade de morrer a ter de viver sem a
outra pessoa não era um exagero propagado por romances. Era realmente uma coisa
real. Uma verdade absoluta.
Se nós íamos morrer, eu preferia ir primeiro.
Seus dedos, em pânico, se enfiaram na minha cintura tentando tomar minha frente,
mas era tarde demais. Eu já estava agarrada aos seus ombros, protegendo-o com meu
corpo, os olhos fechados e o nariz enfiado na sua camisa. Sentindo seu cheiro.
Sentindo seu coração bater tão veloz quanto o meu.
Esperei o estalar de um tiro que não veio. E, quando o grito grave ecoou pelo ar, eu
achei que era uma alucinação. Minha mente desesperada substituiu o pavor de
antecipação a um tiro por um som de esperança.
– Parados! Polícia!
O barulho atrás de mim se intensificou, me despertando.
Os resquícios da adrenalina em meu corpo me estremeciam de forma descontrolada.
Minhas pernas falharam ao ver os policiais fardados renderem os invasores e Ryker
tentou me segurar. Mina!
Nós estávamos no chão.
Levei um tiro.
Foi isso que aconteceu.
– Mina, você está bem? – Ryker passava as mãos pelas minhas costas emdesespero,
verificando minha integridade física. – Você está bem.
Precisei de alguns segundos para compreender que ele não estava perguntando.
Estava afirmando.
Eu estou bem.
– Estou bem – murmurei.
Ele levantou o rosto tentando entendero que tinha acontecido, embora sem sucesso.
Os invasores armados foram algemados e retirados da boate enquanto policiais de
capacete e investigadores de paletó e gravata entravam na boate. Paramédicos os
seguiram assim que a polícia atestou a segurança do lugar.
Eu ainda estava atordoada. Não tinha conseguido processar o perigo, quem dirá a
solução.
Nila e Lucy estavam de pé, abraçando uma à outra em um dos cantos da boate.
Pareciam tão confusas quanto eu. Tim, Devon, Luckas… Listei todos os meus amigos
de forma rápida e só consegui me acalmar depois de me certificar de que estavam
todos de pé.
Zahner tinha sido rendido. Ele deve ter puxado a arma durante o caos e, em sua
entrada, a polícia holandesa não parece ter feito distinção.
– Soltem-no! Tirem essas algemasimediatamente!
O homem que gritara tinha cabelos grisalhos e usava um sobretudo bege com barras
enlameadas. A boca formava uma linha rígida escondida pela barba malfeita de fios
prateados. Devia ter mais de sessenta anos, se movia como um homem sedentário e
esquecido. Massua voz portava a autoridade de um oficial no auge da vida.
– Soltem-no agora! – ordenou e os policiais obedeceram, livrando Zahner.
– Gareth Zahner?
– Sou eu – concordou.
– Onde estão os dois que estava protegendo?
Eu não conseguia respirar ou raciocinar. Assisti ao Zahner apontar para nós dois
como se fosse um filme. Uma história que acontece com outras pessoas.
O senhor autoritário seguiu a indicação de Gary e acenou para nós antes de se virar
para um dos policiais.
– Deixe-a entrar. – Sorriu.
Minha testa estava enrugada pela mais absoluta confusão mental. Eu queria muito
que alguém começasse a me explicar o que estava acontecendo em vez de só incluir
mais mistério à receita.
– Mina… – Ryker suspirou, chamando minha atenção para a pessoa que estava
barrada no que restava da porta da boate.
O policial deu um passo para o lado e deixou se aproximar de nós a mulher mais
linda e maravilhosa que eu já tinhavisto na vida.
Só percebi que tinha abandonado os braços de Ryker quando me joguei nos dela.
– Elise!
Ela me abraçou de volta entre lágrimas e sorrisos. Meu coração começou a se
acalmar enquanto eu recuperava o fôlego.
Tudo tinha sido rápido, insano e incompreensível.
Mas minha melhor amiga estava ali.Ia ficar tudo bem.
Paramédicos lançaram cobertores sobre alguns de nós como faziam nos filmes e eu
não entendi qual o propósitodaquilo. Eu não estava com frio.
Lucy e Joanie gritaram com alguns policiais que tinham interditado o bar e
conseguiram convencê-los a deixá-laspassar e pegar garrafas para todo mundo.
Nos sentamos no chão. O beco nos fundos da boate tinha sido fechado pela polícia,
mas estava menos lotado que o salão principal. Devon e Nila emitiam declarações a
oficiais atentos, Luckas acompanhava de perto a inspeção de seu prédio e Zahner tinha
desaparecido paraalgum lugar com o homem que o libertara.
– Como você chegou aqui? – Eu não conseguia parar de apertar Elise e era
recíproco.
– O inspetor Alfoit.
Eu conhecia aquele nome…
– É um amigo antigo dos meus pais, não se lembra?
Era verdade… Procurei por ele nos arredores, tentando inspecionar seu rosto com
mais cuidado, mas ele nãoestava por perto.
– Aquele senhor é o inspetor Alfoit?
– Ele mesmo. Ele é tipo uma lenda pra Interpol. – Riu. – Conhece muitagente.
– Mas como… Como você soube que poderia nos encontrar aqui? E… por que falou
com ele? Ele acreditou em você? Nós estávamos fugindo! – constatei, acelerada. –
Você deveria ter ficado longe, Elise, não era seguro! Ficou louca? – Outro pensamento
me ocorreu de repente. – Eu perdi meu emprego novo, não foi? Me demitiram?
Ela me abraçou com força.
– Estava com saudades de você, sua desesperada.
Eu também estava com saudades dela e a abracei de volta. Mas abanei a cabeça
pedindo respostas.
– Você está me ofendendo, Bault. – Revirou os olhos. – Acha que sou burra?
– Não, claro que não! Eu só…
– Te conheço desde que erámos pirralhas que fingiam ser adultas. – Deu um
peteleco irritado no meu nariz. – Achou mesmo que eu ia acreditar que você teve
algum colapso nervoso e desapareceu com um gigolô?
Eu sorri, desconcertada.
– Não – murmurei.
– Sabia que tinha acontecido alguma coisa. – Deu de ombros. – Principalmente
porque você deixou uma mensagem na minha secretária eletrônica antes de desaparecer
pela primeira vez.
Minhas sobrancelhas se uniram em questionamento.
– Não se lembra? – indignou-se.
– Da delegacia! – Estapeei minha própria testa. – Eu liguei para você! Mas você
ainda estava no hotel!
– É! – Balançou a cabeça, meridicularizando.
– Esqueci! Acho que tanta coisa aconteceu depois disso que…
– É, mas eu não esqueci! Me deixou desesperada, Bault! – Ela também deu um tapa
na minha testa. – Falando sobre como alguém morreu e sobre o estacionamento do
hotel. Não saiu nada no jornal, mas voltei lá e tinha uma parte do estacionamento
interditada pela polícia. As pessoas da recepção não davam qualquer resposta direta e
eu soube que havia algo errado. Eexplodiram seu apartamento! – exclamou, revivendo
um pânico que certamente deve ter sentido. – Disseram que foi escapamento de gás,
mas não sou idiota. Tentei falar com a polícia, mas ninguém me ouvia. Só o inspetor
Alfoit. - Alisou os cabelos, respirando fundo. – Aí, ele me mandou falar com um cara
daInterpol que trabalhava com máfias.
– O Gary! Foi você que mandou ele atrás da gente! – lembrei.
– Ele foi o único que me escutou de verdade. Aí desapareceu e pouco tempo depois
reapareceu afirmando que tudo não passara de um mal-entendido e que você fugiu
com o gigolô. Aparentemente, ele, assim como você, achou que eu era idiota –
recriminou.
– Eu só queria te proteger, Elise.
– Eu sei. – Beijou minha bochecha. –É por isso que nunca perguntei nada. Durante
nossa vida toda, era sempre eu quem nos metia em encrencas e você quem nos tirava.
Então, imaginei que se estava mentindo deveria ter um ótimo motivo e me limitei a
confiar em você.
– Eu te amo, sabe disso?
– Sei, sua maluca. Também te amo.
Fiquei preocupada com você.
– Achei que estava preocupada por causa do meu colapso nervoso e da fuga.
– Ri, lembrando. – Achei que estava estressada imaginando que eu poderia surtar de
novo.
– Estava desesperada porque você estava envolvida em um caso de assassinatos e
máfias! Foi por isso que insisti que ficasse lá em casa. Você não queria me contar, mas
isso não me impedia de tomar uma atitude.
– Você é a melhor amiga do planeta.
– Eu sei. Você me compra um presente caro quando conseguir um emprego novo.
– Combinado.
– Quando cheguei em casa e vi o apartamento destruído, tive certeza que ia te
achar morta. Quase morro junto, Mina!
– Sinto muito! Eu queria ter deixado alguma mensagem.
– Mas não podia, eu sei. Quando vi a história nos jornais e soube que você tinha
sido sequestrada pelo diarista e pelo agente da Interpol, fui direto falar com Alfoit e ele
ligou os pontos.
– Foi assim que nos achou aqui?
– O Matt. – Sorriu, piscando um olho para mim ao fazer referência ao garoto de
programa de quem era cliente regular.
– Ele é amigo do garoto de programa que ficou com você. O de verdade. – Revirou os
olhos. – Não aquele modelo que você colocou nas fotos.
Eu limpei a garganta, rindo de sua dedução e apontei para Devon do outro lado do
beco.
O queixo de Elise caiu copiosamente.
– Você conhece ele de verdade? – Deu três tapas com força no meu braço para
expressar sua descrença. – Me apresenta! Ele trabalha com isso? – sussurrou,
sugestiva.
Segurei a gargalhada enquanto Elise me beliscava.
– Matt me disse que eu podia tentar encontrar vocês aqui.
– Você é um gênio.
– Eu sei. De nada.
Ryker se aproximou devagar, trazendoduas garrafas de cerveja.
– Comemorar? – arriscou. Aceitei uma e Elise aceitou a outra, analisando- o de
cima a baixo.
– Vai me apresentar? – resmungou. – Ou vai manter a história de que o homem
seminu era um diarista?
– Você sabia que ele estava seminu?
– Bault, acha mesmo que sou idiota? – reclamou alto e Ryker acenou em
concordância.
– Te disse que ela tinha percebido.
– Eu não sabia o que dizer!
– Ela não pensa bem sob estresse – Elise explicou.
– E fala as besteiras mais engraçadas da história! – Ryker completou.
– Uma vez, na faculdade, faltei em uma prova porque estava de ressaca e Mina
tentou me livrar de um zero querendo convencer o professor que eu tinha
desenvolvido estresse pós- traumático temporário depois de pular de bungee jump no
fim de semana.
– Ela levou o amigo jornalista pra sua casa e me encontrou esperando por ela no
quarto. Aí, impediu que o amigo desse de cara comigo dizendo que precisava se
masturbar e pedindo praele esperar na sala.
Elise ponderou por alguns segundos encarando o vazio, enquanto eu mantinha uma
expressão emburrada, ansiosa para que um dos dois notasse que eu não estava
gostando da brincadeira.
– Tá – ela decidiu. – Sua história ganha. Não dava pra ter apresentado ele pro
jornalista como um amigo? – Virou-se para mim.
– Eu estava seminu na hora – explicou.
– Nossa, garoto. Você fica seminu o tempo todo, hein?
– Eu fico bem seminu. – Riu, galante.
– Não faça gracinhas comigo, rapaz. – Elise levantou o indicador e Ryker se
encolheu diante da minha amiga brava. –Peguete da Mina pra mim é mulher.
– Respeito isso. E pode chamar de namorado.
– Não, não posso. – Estirou a língua.
– Ainda não decidi se aprovo você. Só é namorado se for aprovado. Não explicou pra
ele como funciona, Bault?
Sorvi três goles da cerveja ignorando os dois.
– Salvei a vida dela umas duas vezes - contou, erguendo o indicador. –Convenci o
Zahner a levá-la de volta pra casa e elaborei um plano para que ela ficasse a salvo com
você. Voltei quando descobri que ela estava em perigo e ainda ajudei a tirar a gente da
confusão com a máfia de uma vez por todas.
Elise estreitou os olhos em uma minuciosa análise dos fatos.
– Foi você quem tirou a virgindade dela, não foi? – falou, mansa, ignorandotodo o
resto. – O cara que ela diz que estragou sexo pra ela com qualquer outro homem? O
fofinho que espalhou asflores?
Ryker abriu e fechou a boca em uma típica demonstração de peixe indignado diante
do elogio “fofinho”. Por fim, se resignou.
– Sou eu mesmo.
– Tudo bem. – Elise sorriu, dando umtapinha no seu ombro. – Gosto de você.
– Estou aprovado?
– A quem estamos enganando? – Ela riu. – Depois de compartilhar a história da
Mina dizendo que ia se masturbar para fugir do ex, quem seria capaz de te reprovar?
– Eu diria que posso explicar, mas algo me diz que o senhor já está ciente de tudo o
que aconteceu – sugeri.
– Sim – o Inspetor Alfoit concordou sem hesitar. – O político tcheco está envolvido
de algum modo nesta história, não é? A testemunha que você estava protegendo estava
envolvida em denúncias contra ele também.
– Sim. A testemunha é o filho dele e estou certo de que vai continuar cooperando.
– Ótimo. Fez um bom trabalho. – Mergulhou a mão em um bolso largo na lateral
do casaco e devolveu meu distintivo e minha arma. – Notei que você tem duas. –
Indicou a que eu tinha usado durante a invasão da boate.
– Quer me dizer que o senhor não tinha?
– Tinha umas três. – Acenou e eu ri.
Era uma honra estar na companhiadaquele homem.
– Já está tudo resolvido com a Interpol. Tive que gritar com alguns homens que se
acham grandes até eles perceberem que são pequenos.
– Acho que devo uma ao senhor.
– Acho que deve algumas – brincou, me fazendo sorrir.
– Algumas, então. Notícias do Kulik?
– Ele foi apreendido na tentativa de sair da Europa em um barco.
Temos provas suficientes para uma condenação bem longa, então ele fez um acordo
conosco.
Vai entregar fontes da família russa em outros locais em troca de uma sentença
mais branda.
A informação me fez rir.
– Falei algo engraçado?
– Engraçado, não. Irônico.
– Irônico?
– É… – Cocei o queixo. – Considerando a maneira como chegamos aqui, é no
mínimo irônico que Kulik vá passar o resto da vida no programa de proteção a
testemunhas.
– Ah, sim – compreendeu. – Irônico.
– O que mais? – Expirei. – Será que vou ser responsável por ele? – continuei me
divertindo.
– Não sei. O que acharia de voltar ao trabalho em campo?
Notícias boas podem nos fazer pular, gritar, nos exaltar. Mas algumas notícias
verdadeiramente boas nos fazem murchar. Como se todas as nossas forças fossem
economizadas naquele segundo antes da confirmação, de modo a extravasar em
uma comemoração posterior.
– Trabalho em campo, senhor?
– Acho que já passou tempo demais em funções burocráticas e em proteção de
testemunhas, Zahner. O que acha de retomar sua antiga posição?
– Contraespionagem?
– Uhum – confirmou. – O que acha?
– É… – Eu sabia as palavras, mas não conseguia encontrá-las. – É tudo o que eu
queria, senhor. – Suspirei.
– Ótimo. Acho que podemos dar um jeito. Um de seus antigos casos veio à tona.
Acho que não vou ter problemas em convencer seus superiores de que você seria o
melhor candidato para o trabalho.
– Qual caso, senhor?Ele respirou fundo.
– A rede de espionagem dos Escorpiões. Encontramos o símbolo deles em uma
cena do crime aqui em Amsterdã. Coincidência, hein? Que o lugar onde você escolheu
para se esconder foi justamente o lugar no qual um dos assassinos dos Escorpiões
resolveu aparecer.
Engoli em seco.
Ela não faria isso…
– Como foi essa cena do crime? – perguntei com cuidado, como um operador
aproximando-se de uma bombaarmada.
– Uma agência de turismo aqui em Amsterdã, há pouco tempo. Recebemos uma
ligação anônima sobre atividade suspeita lá dentro, a polícia chegou e encontrou as
portas abertas e escancaradas. Dois corpos lá dentro. Assassinato profissional. Dois
tiros no peito, um na cabeça.
– Dois corpos e uma ligaçãoanônima? – Eu tive que rir.
Filha da puta…
– É. Quer ouvir o mais curioso? Eramdois homens do Kulik.
Como ele tem caído nos últimos dias, a polícia achou que ele tinha ordenado
assassinato de dois de seus comandantes, para mantê-los emsilêncio. A teoria é boa: o
lugar estava todo revirado, muitos documentos desapareceram. Mas um ou outro foi
deixado para trás.
– E foram suficientes para descobrir que o lugar era uma fachada para lavagem de
dinheiro?
– Muito fácil, não acha?
– Muito – concordei.
– Também deixaram um papel amassado para trás. Um escorpião rascunhado. O
modus operandi da sua velha conhecida rede de espionagem.
– O senhor disse que estava tudo revirado. Acharam o papel amassado no meio do
caos? Não poderia ser algo antigo que um dos homens de Kulik tinhaguardado?
– Foi o que eu imaginei, no entanto, os oficiais que chegaram primeiro informaram
que a folha chamava atençãono ambiente. Parecia um recado deixadode propósito.
– Chamava atenção?
– Foi colocado em cima da única mesa que não tinha sido revirada. Com uma flor
em cima.
Uma flor…
Eu ri, balançando a cabeça.
– Deixa eu adivinhar… Um lírio? Nem precisei ouvir sua confirmação.
O rádio de pilhas ligado em uma estação qualquer tocava uma música doce e
preguiçosa. Cortei um pedaço do queijo que meu namorado guloso comeu da minha
mão antes que eu pudesse impedir. A toalha aberta no chão da estufa de Bessie,
comidas e bebidas espalhadas em nosso piquenique improvisado.
– De volta ao lugar onde tudo começou, hein? – Alisei seus cabelos quando ele se
reclinou, apoiando a cabeça no meu colo.
– Não começamos aqui! Começamosno hotel lá em Paris.
– Não de verdade… – defendi. – Foiaqui que eu e você começamos mesmo.
– Está querendo fingir que a noite no hotel nunca existiu, é? – Estreitou osolhos e
eu soube que ele ia me provocar.
– Querendo apagar da minha mente que a insaciável da Mina Bault agarrou o pobre
servente do hotel na mesma noite em que contratou um garoto de programa?
– Foi um mal-entendido! – Plantei umtapa na sua testa.
– E aqui vou eu: apanhando de novo. Você é a safada e eu apanho. Sempre assim.
– Achei que ele era você.
– Você achou que era eu? – Levantou- se. Havia tanta felicidade na sua expressão
que, apesar de irritada, precisei rir. – Calma, calma, calma. – Abanou as mãos. –
Nunca tinha me contado essa parte. Você beijou o garçom porque achou que ele fosse
o gigolô que você tinha contratado?
– É.
Eu não estava entendendo a graça. Mas Ryker, com certeza, estava. Porque se
curvou agarrado ao estômago em umatentativa fútil de controlar a gargalhada.
– Então você abre a porta pra um cara e o agarra sem nem perguntar quem é? –
Limpou as lágrimas que se formavam nos olhos. – E aí o gigolô de verdade… Eu… –
apontou para si mesmo com orgulho – ...chega e você oferece a mão para ele apertar,
cruza os braços e fica com aquela cara de entrevistadora?
– Fiquei constrangida.
– Você é muito engraçada quando fica constrangida! Posso contar essa história pra
Elise também? Vou ficar dois pontosna frente dela.
– Você e a Elise podem é parar de fofocar sobre minha vida.
– Não dá.Você não deixa! Não para de dar munição. – Ele estava rindo de novo.
Puxei seu rosto para mim com força.
Mordi seu lábio inferior e o beijei.
– Cala a boca – sussurrei.
– Sim, senhora. – Abriu a boca para me sugar, me impelindo a fechar os olhos e me
entregar. Perdida nele. – Viu como é fácil me fazer calar a boca? – murmurou. – Não
precisa gritar, nem mebater. – Alternava palavras com beijos.
– Bem mais fácil e eficiente.
– Ryker, cala a boca.
– Uhum. – Seu toque ficou mais intenso, ele me puxou para o seu colo, me
engolindo devagar.
O modo como cobriu meu corpo com o dele foi suave, despindo minha pele com
ternura. Roupas saíram do caminho aos poucos, de um modo descansado e inevitável.
Ambos sabíamos para onde estávamos indo, como da outra vez. Mas agora
caminhávamos com mais confiança.
Segura de que ele me amava.Segura de que eu o amava.
Demorou-se em beijos nos meus seios e ria sobre meus mamilos quando fiquei
arrepiada. Acariciei seu cabelo, assistindo aos arranhões de seus dente na minha pele
e me permitindo rir com ele. Raspando as unhas na sua carne, impulsionando-o pelo
caminho que eu queria, apenas para alisá-lo logo depois sobre as linhas vermelhas que
se formavam em sua pele.
Uma tarde longa e dócil. Sem preocupações.
Elise me esperava no hotel para irmosembora, mas isso seria mais tarde.
Agora, éramos só nós dois. Mais nada.
Dedilhei seus cabelos e massageei sua nuca. Com a boca na minha, ele retribuía a
massagem, porém em minha língua.
– Você me ama. – Riu, safado. Sua nudez, como a minha, era completa. Sentindo
o ar frio resfriando nossos corpos especialmente quentes. Minha pele vibrava sob a
batida conjunta de nossos corações, separados por poucas dezenas de centímetros. Um
enlace de pernas e ele estava tão perto de me penetrar quanto poderia ficar sem
efetivamente me possuir.
– E você me ama – devolvi.
Pensei que ele ia me lamber. Ou morder. Ou me oferecer seu sorriso safado e umas
palavras ousadas.
No entanto, em vez disso, ele apenas se manteve sério. Ele apenas acariciou meu
rosto com um toque tranquilo e gentil. E me beijou.
Daquele jeito maravilhoso que te faz fechar os olhos antes mesmo de as bocas se
tocarem porque você sabe exatamentecomo vai ser intenso.
Sua ereção se comprimiu timidamente no meu espaço apertado. Me tomando sem
pressa enquanto seu beijo me envolvia mais que a fusão de nossas virilhas. Agarrei seu
pescoço com um ardor doentio de necessidade. Não queria que ele se afastasse agora.
Não queria que ele se afastasse nunca.
– Não vá embora – pedi.
Ryker beijou minha boca entendendoalém do meu pedido.
– Poucas semanas, amor – suspirou, ondulando o corpo sobre o meu. Alternando a
dor que eu sentia pela separação iminente com o prazer que se concentrava cada vez
mais voluptuoso abaixo do meu umbigo.
Ele respirava contra minha boca, me entregando seu hálito e saliva, me encarando
enquanto eu transpunha meus limites para descobrir que êxtase pleno não era uma
mera expressão.
Êxtase pleno era o que acontecia quando Ryker me beijava. Quando me tomava
daquele jeito. Quando me chamava de sua. Quando me fazia promessas. Quando me
tocava.
Ryker era meu êxtase. E ele era pleno.
Pleno como o que se construía dentrode mim.
Aquele prazer que começa modesto até se mostrar arrebatador além de qualquer
nível de suportabilidade. Que me fazia estourar em gemidos loucos, mordidas de
lábios que não conseguiam me calar. Explodi ali: devagar, espiralando fora de
controle, sentindomeu corpo inteiro se abstrair em plenitude.
Olhei nos olhos dele. Recuperava meu fôlego enquanto ele perdia o dele. Sobre
mim e em mim. Apertando nossos lábios não em um beijo, mas em uma súplica. Um
desejo que não podia ser contido, reproduzindo o meu.
– Quantas? – gemi, quando ele caiu aomeu lado. – Quantas semanas?
– Poucas – repetiu, também ele ofegando.
Ryker tomou minha mão e a beijou antes de agarrá-la em um abraço contra seu
peito. As nuvens nos observavam através dos vidros translúcidos da estufa.
Separando-se de nós por uma cortina de plantas e flores.
Eu ainda sentia o gosto dele na minhaboca.
– Me prometa uma coisa.
Ryker se virou de lado, me puxando de encontro ao seu peito.
– Não beije outra mulher – pedi.
Ele enfiou os dedos pelos meus cabelos, acariciando minha face com o polegar.
– Mina, eu provavelmente vou ficar só com strip.
– Tudo bem. Mas prometa ainda assim.
– Prometo. – Apoiou-se no cotovelo para segurar meu rosto, contemplando o
fundo dos meus olhos. – Não vou beijarmais ninguém.
Balancei a cabeça devagar.Era péssimo.
Era pior do que péssimo.
Talvez fosse muito pior do que péssimo.
Mas eu o amava e há pouco tempo atrás estava disposta até mesmo a levar uma
bala por ele.
Que tipo de insanidade era aquela em que eu preferia morrer em seu lugar do que
aceitar um breve momento de separação no qual ele, talvez, transasse com outras
mulheres?
No entanto era isso… Eu realmente preferia morrer a imaginá-lo com outra mulher.
Não é sua escolha. É escolha dele.
A sua escolha é apenas decidir se quer ficar com ele ainda assim ou não.
– Não precisa se prostituir –murmurei.
– Eu preciso descobrir minhas alternativas, Mina. E preciso fazer isso sozinho.
– Só por orgulho? – falei, baixinho, para que ele não confundisse minha
preocupação com raiva.
– Independência é importante pra mim. – Beijou minha bochecha, levemente. –
Pode entender isso? Por mim?
– Vai fazer strips aqui no Lucky’s atéarranjar outra coisa?
– É o plano.
– E não vai se prostituir.
– É o plano.
– E se algo for contra o plano? –choraminguei.
– Mina, o que você quer que eu diga?
– Quero que diga que vem para Paris comigo – admiti. – Quero que diga que não
vai mais se prostituir. Quero que diga que a gente não precisa ficar separado.
Esperei sua resposta, no entanto ele apenas ficou em silêncio. Me observando, sem
saber o que responder. Enfim, sua falta de palavras disse mais do que qualquer palavra
poderia ter dito.
– Ninguém morreu! Veja só como tudodeu certo!
– Bem-vindo de volta, Sven. – Abracei meu amigo antes de beijar a bochecha da
minha irmã. – Como foram as coisas com o seu chefe? – Bem… – Ele enfiou as mãos
nos bolsos e encarou o chão com uma dor resignada. – Acho que alguém morreu,
afinal – murmurou muito baixo.
– O funeral foi… Ele tinha filhos? – mudei a pergunta, coçando a cabeça.
– História muito longa, moleque. Outro dia eu te conto. E por aqui tudo acabou
bem? Interpol voltou para a Interpol? Hideki ajudou vocês?
– Sim, sim! Tudo fantástico, seu planofoi incrível – agradeci.
– Ryker! – Lexa me recriminou. – Não massageie o ego dele mais do que o
necessário, por favor. Não é você que vai ter que conviver com ele depois.
– Perdão – me rendi, rindo.
– E onde está Mina? – ela quis saber.
– Voltou para Paris. – Engoli em seco.
Mina…
– E você? – Lexa piscou seus grandesolhos claros, me julgando. – Quandovai?
– Não sei ainda. – Ergui um ombro. –Tenho umas coisas para fazer aqui.
– Tipo o quê?
– Lexa! Tipo arranjar um emprego antes de ir embora para Paris.
– Já foi embora para Paris outras vezes sem emprego definido.
– Para me prostituir! Não vou meprostituir na cidade onde ela mora.
– Posso te ajudar a conseguir outroemprego – disse com simplicidade.
– Quero fazer isso sozinho.
– Por quê?
– Porque eu quero.
– Ryker…
– Lexa! Será que pode me deixar cuidar da minha vida sozinho?
– Sim! Porque você faz isso tão bem! Não é mesmo? Precisa de ajuda, Ry, mesmo
que não queira admitir.
– Não preciso. Sei me virar. – Esfreguei meus olhos, sentindo-os arder. Lexa
conseguia me tirar do sério.
– Não há nada de errado em precisar de ajuda, Ry!
– Eu sei. Obrigado. – Segurei seus ombros, tentando assegurá-la de algo que eu
sequer tinha certeza. – Me dá licença um instante?
Lucy e Joanie se aproximaram para cumprimentar os recém-chegados. Sven sorriu,
parabenizando nossos esforços com a festa e oferecendo para as garotas o que parecia
ser uma proposta de emprego. Ou um curso de algum tipo.
Fechei-me no escritório, largandomeu corpo cansado sobre o sofá.
Mina…
Nós nos falávamos o tempo inteiro. Pelo menos nos primeiros dias… Depois, ela
ficou ocupada com algumas coisas do trabalho. Parecia que nossa sincronia tinha
acabado: eu sempre ligava quando ela não podia atender e ela devolvia a gentileza.
Há três dias nos falávamos apenas por mensagens de texto e recados deixados na caixa
postal.
Ela parecia bem.Parecia feliz.
Não parecia sentir minha falta.
Estava ocupada demais recolocando avida nos eixos para sentir minha falta.
O jornalista estava de volta. “Apenas para uma matéria”, ela assegurara. Claro…
todos os jornalistas do planeta queriam a nossa história. Tinha sido apenas uma
cortesia dela cedê-la ao cara a quem ela tinha oferecido um pé nabunda.
A mim, restava ficar cozinhando em ciúmes. Esperando que a entrevista fosse
desagradável e desconfortável eque a presença dele a deixasse constrangida.
Ou pelo menos seria essa a minha expectativa se não soubesse que Mina fica ainda
mais linda e safada exatamente quando está constrangida.
Olhei meu celular mais uma vez.Eu queria fazer aquilo sozinho.
Eu sabia que todos iriam me apoiar se eu apenas falasse, mas queria… queria muito
merecer.
Não queria conseguir por causa da minha irmã, por causa do meu amigo, por causa
da minha namorada.
Não queria nem mesmo conseguir porque eu era o “cara do escândalo com a máfia
russa e o pai corrupto”.
Foi por isso que enviei o manuscrito para o meu amigo, Nick, com um pseudônimo.
Nicholas se prostituía assim como eu. Mas, ao contrário da minha atual situação, ele
não tinha qualquer intenção de abandonar a carreira. Uma de suas clientes trabalhava
para uma grande editora e… Não faria mal, não é?
Enviar o meu manuscrito mais razoável: a breve história da minha própria vida. Os
desfortúnios com minha família, minha interminável fuga, alguns elementos picantes
daprofissão… e Mina. Mais sobre Minado que qualquer outra coisa.
Arranjei um pseudônimo para ela também, ou eu correria o risco de apanhar de
novo.
Deter-me naquele pensamento me fez sorrir. Fiquei sentado, encarando meus pés,
me divertindo com meu próprio sorriso silencioso e a imagem da reação de Mina se
descobrisse que eu estava tentando ser um escritor.
– Estou entrando – avisou, antes de fechar a porta atrás de si.
– Sven, eu já estava saindo. – Engoli em seco, afastando as divagações. – Só
precisava de um segundo.
– Sua irmã consegue pressionar um homem até esmagar seus colhões, não é?
– Puxou uma cadeira para sentar-se na minha frente.
– Acho que você saberia disso melhor do que qualquer um. – Ri. Ele apenas acenou
por um instante.
Espremeu as mãos com os dedos entrelaçados.
– Ela mandou você vir aqui falar comigo?
– Mandou – confessou, sem hesitar. –Antes de irmos embora, na verdade. Mas não
tive tempo… A coisa toda commeu chefe aconteceu rápido demais.
Concordei com um gesto.
– E sobre o que ela quer que você converse comigo?
– Sobre sentimentos, propósitos devida e mais todas essas bobagens.
– E vai fazer isso?
Ele fez uma careta, como se dissesse “vamos, você me conhece melhor do que isso”.
– Tudo bem. – Ri. – E sobre o que vamos conversar, então?
– O que está fazendo, moleque? –Levantou uma sobrancelha, analítico.
– Sei o que estou fazendo.
– Ótimo, então me explique e assim eu me acalmo.
– Está preocupado comigo?
– Acalmo sua irmã – corrigiu.
– Por que todo mundo acha que não consigo me virar? – A indignação
transpareceu, evidente.
– Porque você é uma criança.
– Não sou uma criança. – Me pus de pé, – Sou um homem, Delvak. Mesmo que
você e minha irmã tenhamdificuldade em enxergar isso.
Eu falei ríspido e duro, mas ele não se abalou. Nem se moveu na cadeira em que
estava.
– Por que a deixou ir? – perguntou, me fazendo tremer.
– Porque primeiro preciso resolver algumas coisas sozinho. Preciso da minha
independência. Sou como você, Sven – tentei explicar de um jeito que ele
compreendesse.
– Isso de novo – resmungou. – Garoto, que alucinação insana é essa que você
tem? Precisa ser como eu ou está fodido, é isso? Não me entenda mal,é compreensível.
É óbvio que muitos homens seriam como eu, se pudessem. Mas por que você precisa
tanto disso?
– Não é uma necessidade. É um fato.
– Não, não é.Você não é como eu.
Não existe ninguém como eu.
Só eu. Eu sou único, exclusivo e patenteado. Consegue entender isso?
– Eu é que te pergunto por que você não aceita que alguém possa ser como você?
Ele respirou fundo, sacudindo os cabelos loiros e penteados com a mão irritada e se
levantou.
– Pare com a conversa de merda, moleque. Guarde essas bobagens pra suairmã e as
psicanálises dela. Diga pramim: por que deixou a namorada ir embora?
Mordi meu lábio, lutando contra meu instinto.
– Quero escrever – confessei antes que desistisse.
Sven piscou em descrença. Demorou alguns longos segundos antes de falar
novamente.
– É isso? – Abriu os braços. – Só isso? A grande coisa que você quer fazer sozinho
e que não quer ninguém por perto para ajudar? – Acenei, confirmando, embaraçado. –
Meu Deus, garoto. Do jeito que você estava dramatizando, pensei que estava
envergonhado porque tinha desenvolvido algum fetiche maluco em que
seu pau era sua namorada e você o chamava de Cecília e passava batom na cabecinha
antes de se masturbar.
– O quê?
– E daí que você quer escrever, qual o problema? Fale pra sua irmã não se meter –
avisou. – Não vai adiantar. Ela vai se meter. Mas fale.
– Não tenho nenhuma formação, Delvak. – Não considerei que seria necessário
explicar para ele a origem domeu constrangimento, mas aparentemente eu
precisava. – Mina se formou em Paris, tem mestrado e sabe- se lá mais o quê. Um
currículo gordo e invejável. Eu mal terminei a escola. Não sou minha irmã. Não vou
ser um autor premiado. Provavelmente vou vender exemplares de impressão barata
em algum sebo na margem do Sena! – exclamei, salivando. Colocar todos aqueles
receios para fora doía como uma ferida grande e purulenta que é espremida sem
pudor. Bastava esperar que ela se esvaziasse e um dia parassede doer. – Sendo gigolô
e stripper, sou diferente, sensual, erótico. Tenho um senso de aventura. Mas se eu vou
virar um escritor parisiense frustrado, como Mina vai me ver? E se escrever não der
certo? O que vou fazer? Poderia trabalhar como garçom pelo resto da vida, me
divertindo nos fins de semana com Lucy, Tim e Joanie, mas e Mina? Como ela vai me
apresentar aos amigos?
– Do mesmo jeito que sua irmã me apresentou – sussurrou e meu corpo congelou
na exata posição em que estava, como se Sven tivesse derrubado um balde de água
gelada na minha cabeça. Eu podia sentir o gelo correndo pelas minhas veias. – É com
esse nível de insegurança que você pensa ser iguala mim?
– Pra você é fácil falar. – Engoli em seco.
– Qual parte é fácil pra mim, Ryker? – Espremeu os lábios. – Nasci em um puteiro,
nunca conheci meu pai e nem poderia: minha mãe nunca soube qual camisinha de
qual cliente foi a que falhou. Você mal terminou a escola? Bem ou mal, pelo menos
terminou. Eu não cheguei nem perto. Você não tem graduação superior? Eu também
não. Você teve que se virar para conseguir alguma independência, sobreviver e ajudar
as pessoas que ama? Eu também.Você ficou nu em um palco nos fins de semana para
ganhar algum dinheiro? Eu também. Você ficou sozinho no mundo e sem família? Eu
também. E sabe onde euestou agora?
Na presidência de uma das maiores multinacionais do planeta. Você está
preocupado em não conseguir publicar um livro porque não tem diploma? Um
diploma é um recibo, Strome. Não tem nada que possam te ensinar na faculdade que
você não possa aprender sozinho. Vai ser mais difícil? Vai. Não tenha dúvidas. Mas
homens como eu e você não fomos forjados pra vida fácil. – Parou para respirar e eu
notei que ele estava ficando vermelho.
– Acho que você estava certo. Parece que eu e você temos muito em comum,
mesmo. A grande diferença entre nós vai ser esse ponto agora. – Apontou o indicador
para o chão – Quando eu era mais novo, conheci o amor da minha vida. Mas agi
como um pirralho imbecil que achou que independência era a coisa mais importante
que eu tinha. Eu era o garanhão fodedor que não precisava de ninguém: as pessoas é
que precisavam de mim. Eu a deixei ir embora e fodi tudo. – Balançou a cabeça, cheio
de rancor pelas próprias atitudes. – Agoraé sua vez, moleque. Não seja igual a mim.
Ele se sentou no sofá. Parecia destruído de um modo muito peculiar e eu imaginei
que nos poucos dias desde a última vez que nos vimos algo muito delicado devia ter
acontecido entre ele e Lexa.
– Eu menti – sussurrei, ao sentar ao seu lado. – Menti pra Mina. Eu contei a
história toda do Simak pra ela, mas… mas não consegui contar que ele era realmente
pai da Lex. Falei que ela era adotada. Por algum motivo… as palavras soaram
melhores desta maneira. Soaram como se um pai de verdade não fosse capaz de
trazer tamanha brutalidade à vida de um filho.
– Você é um homem melhor do que Simak, Ryk. – Apertou meu ombro. – Você
sempre foi. Não há nada do seu paiem você.
– Como pode ter certeza?
– Porque eu o conheci. E conheço você. Não precisa achar que o cara safado e
independente é o único tipo de homem bom no mundo. Não precisa ter medo de se
apaixonar e começar uma família, garoto. Não o deixe roubar isso de você.
Acenei devagar e me mantive um silêncio. Minha mente exibia diante dos meus
olhos toda a minha infância… A história da minha vida. Os primeiros capítulos do
meu livro. O lugar destruído e sem luz onde tudo começou.
– Nunca tive coragem… – engasguei. - nunca tive coragem de perguntar pra ela.
– Perguntar o quê?
– Perguntar pra Lex se ele… se ele realmente fez… algo. Eu dormia no quarto ao
lado, Sven. Se ele estuprou minha irmã a metros de distância demim, não sei se…
– Ele não fez. Parei de respirar.
– Não precisa ter medo de perguntar, Ry, e eu vou responder mesmo que não tenha
perguntado: ele não estuprou Lexa. Nunca. Mas abusou dela em quatro ocasiões. As
duas primeiras só a deixaram constrangida. Foi logo quando ele começou. Na terceira,
dei um chute no saco dele e quebrei seu nariz com um murro. Mandei-o pro hospital.
Na quarta, quem o mandou pro hospital foi a Lex. Sua irmã é a mulher mais incrível
que já conheci na minha vida. E já conheci muitas mulheres.
– Por que não estão juntos, Sven? Se é possível ser um homem bom em um
relacionamento, por que você nunca ficou com ela? Por que fodeu tudo? – usei suas
palavras.
– Porque eu não sou um homem bom. Não pra ela. – Sorriu com uma tristeza
palpável. – Mas nunca entendi por que étão importante pra você que eu e elaestejamos
juntos.
– Não sei. Acho que… ela ficou a salvo quando você entrou nas nossas vidas. – Ri,
discreto. – Parte de mim sempre teve certeza que ela estava segura com você. Que
você tomaria conta dela se eu não pudesse.
– Ah, Ryk… A vida mudou todos nós. Mas nenhum de nós ficou tão forte quanto
sua irmã. Ela não precisa de ninguém para cuidar dela. Ela é uma mulher. Deus sabe
que ela acaba cuidando de mim muito mais do que eu cuido dela. Ela não precisa de
nós, moleque. Mas se precisar… ela sabe que pode contar conosco. Sabe que estamos
aqui. Ela não precisa de você. No entanto, pelo que ouvi, tem uma jovem garota que
precisa. Ouvi que ela foi embora e que você a deixou ir, Ryk… Conta pra mim: você a
ama?
– Amo.
– Então o que diabos você ainda está fazendo aqui conversando comigo?
Lance sorriu ao guardar o gravador de volta na mochila. Sorriu diretamente para
mim, me obrigando a desviar o olhar.
Foi só uma gentileza. Por favor, não transforme isso em algo que não é.
Apertei meu celular nas mãos.
Eu queria falar com Ryker. Queria falar com ele o tempo inteiro.
Mas Strome era como um peixe. Eu não podia ficar agitando a isca sempre ou ele
iria embora. O maior problema é que agora eu temia que meu receio em afastá-lo era
justamente o que estava nosdistanciando.
Monique estava sorrindo para Lance e perguntando se ele queria beber alguma
coisa.“Agora ou mais tarde”.
O tipo de Monique era um cara bem específico: qualquer um que estivesse
interessado em uma amiga dela. Sua insegurança deveria ser avassaladora para ela
precisar ser sempre o centrodas atenções.
Sua insegurança ou sua chatice. Eu nunca sabia julgar com precisão.
Ela e Elise tinham transformado minha entrevista em uma pequena festa. Elise fez
isso em meu benefício, já que preferi contar toda a história de uma vez só e não ter que
repetir a narrativa sempre que um novo curioso do meu círculo de convívio mais
próximo aparecesse. Monique fez isso em benefício dela mesma, pois queria ser a
organizadora do evento, de modo que parte da luz do meu modesto holofote
sobrasse para ela.
Respondi às perguntas de Lance, de colegas de trabalho, vizinhos e alguns amigos,
muitos dos quais eu sequer lembrava os nomes. Pessoas que mal faziam parte da
minha vida tinham brotado do nada ansiosos por detalhes do caso mais comentado da
Europa.
Eu não fazia questão de ficar em evidência, por isso recusei educadamente todos os
jornalistas interessados. Mas Lance… eu devia umaa Lance. Em Amsterdã, o clube do
Luckas estava crescendo com o sucesso e aquele seria só o começo. Delvak tinha
chegado na Holanda e parecia querer investir no negócio como um parceiro
silencioso. Ia ser bom para todos.
Todos…
– Toda essa história é ótima, não é? – Monique cercou Lance. – Principalmente a
parte de Mina precisarde um gigolô para perder a virgindade!
– Exagerou no riso. – Essa parte é inesquecível! E tão verdadeira para quem a
conhece.
Elise revirou os olhos, mas Monique não me incomodava mais. Foi impossível
evitar a emoção sempre que eu mencionava Ryker.
Não era só a saudade de não o ver há quase duas semanas… Era a incerteza sobre
nossa situação atual. O não saber.Ele sempre conseguia ser irritantementevago quando
eu perguntava o que estava fazendo. Como se estivesse escondendo algo, por receio ou
vergonha, apenasreforçando minha ideia de que ele tinha voltado a se prostituir.
– Claro que deve ter sido horrível para o pobre rapaz ficar com Mina pendurada
nele durante todo esse tempo.
– Monique levou a mão ao peito se compadecendo por Ryker.
Mas eu não estava lhe oferecendo atenção. Estava ocupada demais em navegar
perdida em meus próprios devaneios.
Como esse relacionamento poderiadar certo?
Do outro lado da sala, Lance sorriu para mim me fazendo desviar o olhar, mas era
impossível não considerar os elementos: como seria um relacionamento com ele e
como seria umrelacionamento com Ryker?
Com Strome, tudo era sempre incerto e desconhecido. Quanto tempo uma viciada
em controle como eu poderia suportar algo do tipo?
Escutamos um baque alto contra a porta e uma voz irritada do outro lado.
– Ah, agora vocês resolvem consertara porta!
Ryker!
Elise o deixou entrar e eu me levanteipor instinto.
Era tão singelo esse efeito entre agente. Tão delicado e curioso.
Uma troca de olhares, por mais rápida e insignificante que parecesse, e estávamos
os dois sorrindo. Era a troca íntima de um sentimento forte. Verdadede um que só o
outro conhecia. Trejeitos, suspiros, anseios. Tão pouco tempo e tanta coisa.
Tudo se concentrava no sorriso que ele me concedeu, o qual tenho certeza de ter
retribuído.
Na sala cheia, eu só conseguia enxergá-lo.
Não conseguia pensar em convidados,em jornalista, em amigas ou inimigas.
Só o meu gigolô sem-vergonha sorrindo para mim.
Venceu a distância entre nós, me enfiando em seu peito, fazendo eu me sentir a
coisa mais preciosa que ele possuía. Eu o abracei de volta com a mesma intenção.
Meu bem mais precioso é esse teu sorriso.
Que me faz tremer os joelhos e encharcar a outra metade das minhaspernas.
Inspirei fundo para perguntar o que ele estava fazendo ali, mas ele me beijou e
palavras perderam a importância. Elas sempre perdiam a importância nessas ocasiões.
– Cheguei – suspirou quando me soltou.
– Percebi. – Deixei-o beijar meu sorriso. Eu precisava elaborar mais perguntas,
precisava tirar todas as minhas dúvidas. Sabia que ele ia rir e me chamar de
desesperada, mas eu precisava saber. Mais do que qualquer outra coisa. Inspirei mais
uma vez, pronta para o meu monólogo.
– Não me prostituí – respondeu o que seria a primeira de minhas perguntas, antes
mesmo que eu a fizesse. – Não fiz strips também. Porque… – enfatizou a palavra
como se soubesse que eu iria perguntar. E estava certo. – Não parecia certo, sem você
pra ficar lá me assistindo e se embebedando para conseguir sobreviver a toda minha
gostosura. – Piscou um olho. – Estive tentando publicar um de meus livros. Uma
autobiografia. Com pseudônimo. Um pra você também. Sim, você está na história.
Não, eu não inventei nada. Não sei se vou conseguir e pode ser que eu seja ruim.
Pode ser que eu seja um desastre, por isso não te falei nada. Estava com um pouco de
vergonha – admitiu, balançando a cabeça como se soubesse que era bobagem. – E com
um pouco de receio de te decepcionar. Você nunca me decepcionou, não queria ser o
primeiro. Apesar de que, se eu fosse o seu primeiro nisso também, seria até apropriado
– divagou. Eu podia notar que nossos convidados tinham nos cercado com uma
curiosidade intensa. Deixei que nos observassem, eu não conseguia fazer nada que
não fosse me perder em Ryker. – E é isso – constatou, baixinho. – Não sei se vou ser
um desastre, é possível que eu seja. Mas prefiro ser um desastre aqui perto de você.
Prefiro ser qualquer coisa perto de você. As coisas sempre dão certo quando você está
por perto. – Desceu os dedos pelo meu rosto, aquecendo minha pele. – Quer dizer: dão
errado. – Forçouos olhos. – Mas depois dão muito certo.
– Ele se desfez em um sorriso e eu o acompanhei, gloriosamente. – Acho que isso é
tudo. Mais alguma pergunta que você ia fazer? Ou já cobri todas? Ah, e eu te amo –
lembrou, casualmente. – Quer ficar comigo até a próxima coisa dar errado? –
Enroscou nossos narizes.
– A gente resolve juntos?
– Melhor maneira.
Entreabriu os lábios e me beijou de novo.
– Olha que ótimo! Mais material pra história! – Monique começou, aguda, se
intrometendo em nosso beijo. – Ryker, por que não conta um pouco como foi para…
– Você dá licença? – Ele a afastou com a mão, demonstrando um pouco de polida
rispidez. – Tô tentando agarrar a mulher que amo. Não a vejo nua há mais de uma
semana e você está incomodando.
– Ryker… – pedi baixinho. – Não precisa fazer isso. – Sorri. Ele lembrava de
Monique e talvez quisesse ajudar na vingança.
– Fazer o quê? – Piscou devagar.
Ele não lembrava.
Estava apenas sendo genuíno e espontâneo. Sua mão se empostara em minha
bunda quando me beijou, uma vez que terminara a pergunta. Ele não solicitava uma
resposta, não seria necessário. Ele queria me beijar.
E, muito provavelmente, me ver nua.
Sua língua invadiu minha boca e eu arecebi com saudade.
Não sei se foi de propósito ou se nós apenas nos desequilibramos, mas caímos, eu e
ele, pelo sofá e por cima dealguém.
Como ele não se incomodou, eu apenas o segui. Suas mãos escalavam minhas
pernas, afastando a saia e se arriscando pela minha calcinha. O rugido desesperado
que eu ouvi deve ter sido de Elise, que se pôs a colocar as pessoas para fora de casa.
Diante das circunstâncias, a maioria dos visitantes deve ter cooperado e os que não
cooperaram foram expulsos pela minha melhor amiga ainda assim.
Eu precisaria pedir desculpas.
Eu precisaria ficar com vergonha.
Mas isso seria depois. Agora, a salaestava silenciosa e deserta.
Ou, pelo menos, era o que euimaginava.
Não que eu me importasse.
Ryker tirou minha calcinha, me cobriucom seu corpo e me beijou inteira.
Eu não me importava com nada.
Doze
Novos começos
Ver Mina interagindo com minha irmã me dava ainda mais segurança em
relação aos meus planos.Ela já era da família.
Beijou minha bochecha e eu me virei,segurando seu queixo para beijar sua boca. Ela
protestou, argumentando sobre algo que tinha a ver com o batom, mas eu não ligava
para isso nem um pouquinho. Eu queria meu beijo e queria na hora. Lançou um tapa
brincalhão no meu ombro quando a soltei.
Caminhei até o bar, dedilhando a caixa do anel em meu bolso.
Reformulando o discurso que eu planejara. Verificando se eu tinha decorado as
palavras certas.
– E aí, vai falar agora?
– Falar o quê? – Levantei uma sobrancelha para Höfler.
– Pedir Mina em casamento. E nem inventa de negar.
– Shh! – Puxei-o pelo braço, observando ao redor. – É surpresa! Vai estragar tudo!
– Não vou. Só queria te pedir uma coisa – explicou, manso.
Devon me fazendo um pedido de forma educada era o tipo de coisa que chamava
minha atenção.
– O quê?
– Pode pedi-la em casamento amanhã?
– Por quê? – Ergui os ombros,levemente ultrajado com a intromissão.
– É porque a gente fez um bolão – justificou baixinho.
– É claro que fizeram.
– E eu apostei que ia pedi-la no dia depois da festa.
– É claro que apostou. Não vou mudarmeus planos para pedir minha namorada em
casamento porque vocês são um bando de desocupados viciados emjogos.
– Você me deve uma, Strome.
– Por qual motivo?
Apertou os lábios. Ele não se atrevia a proferir as palavras.
Respirei fundo… Com Mina, eu me tornei uma pessoa diferente. Uma pessoa mais
adulta do que antes. Ela diz que não e ri de mim. Mas percebo a mudança em
situações como essa.
– Se amava tanto sua mulher, nãodeveria tê-la traído, Dev.
– Não estou te culpando, Ryker.Encarei-o com descrença.
– Não estou te culpando mais – acrescentou. – Sei que foi culpa minha. Mas você
teve uma participação nisso.
– Está dizendo que vai deixar o rancor para trás se eu atrasar meu pedido de
casamento?
– É um bolão bem gordo. – Acenou.
– Não posso prometer nada. – Ri.
Ele deu dois tapinhas de “parabéns” no meu ombro antes de se afastar.
– E vocês dois? – Mina enlaçou minha cintura com o braço. – Sobre o que estavam
fofocando?
– Coisas de homens. – Devolvi a brincadeira, estirando a língua. Ela me beijou e
eu fechei os olhos. Deixei minhas pálpebras pesarem para mostrar a todos os
presentes o quanto eu a amava.
A minha pequena tímida descarada. Acariciei seu rosto ainda entretido no beijo,
puxando-a para bem perto, apertada no meu peito.
– Quero te perguntar uma coisa –suspirei, ainda considerando o pedidode Devon.
– É? O que foi? – Sorriu.Linda.
Tão linda.
Aquele sorriso deslumbrante quefazia o tempo parar.
Eu te amo tanto.
– Vou te perguntar amanhã – decidi,sorrindo.
– E falou agora só para me deixar curiosa? – Beliscou meu braço, indignada.
– É.Você fica linda quando curiosa – provoquei.
– O que é? Ryker! Uma dica!
– É uma coisa… – Encarei o teto na tentativa de ser o mais abstrato possível.
– Quero saber se você quer fazer uma coisa comigo.
– Humm! – Considerou, tocando o queixo. – E vai ser uma primeira vez? – Riu,
sapeca.
– Vai.
– E vou querer repetir? – Havia umasafadeza delicada no seu tom.
– Não. – Balancei a cabeça, fingindodecepção para confundi-la. – É o tipo de coisa
que você vai querer fazer uma vezsó e nunca mais!
– Tudo bem. Eu quero – decidiu,envolvendo meus ombros.
– Mas você ainda nem sabe o que é! –Ri.
– Não importa. Se é uma primeira vez com você, é claro que eu quero. – Beijou
minha boca demoradamente. Umcarinho sempre misturado a uma pitada de safadeza.
– Vai dar tudo errado! – exagerou, sorrindo. – Mas no fim, vaiser perfeito.
Epílogo
FIM.